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Programa Nacional de Cooperação Acadêmica (PROCAD)

Disciplina: História da Literatura e Crítica Literária


Curso: Aspectos e Conceitos do Comparatismo Literário e Cultural

Diálogos entre a geopolítica da comparação e representação


do Outro, em quatro obras literárias ambientadas na
Amazônia

Discentes:
Adriana de Sá Marques
Elysmeire da Silva de Oliveira Pessôa
Mestrandas do Programa do PPGMEL da Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
Geopolítica da comparação e representação do outro

Geopolítica

Geopolítica
das Representação
Línguas

Cor Local Orientalismo


Ocupação do espaço Amazônico
Como se configurou uma direção de sentido para
representar a Amazônia?
Sendo a literatura um local de interpretação e construção de narrativas, linguagens, vontades e
intencionalidades, por meio da análise e estudo literário se torna possível compreender ou ao menos,
ampliar as reflexões sobre as relações humanas, historicamente construídas e observadas pelas lentes
de autores e suas obras acerca de determinados espaços geolocalizados.
Em relação ao espaço amazônico, é importante considerar que muitas das tessituras narrativas, que
nos chegaram sobre a Amazônia, durante muitos anos, privilegiou apenas o discurso eurocêntrico, os
quais atribuíam à região visões muitas vezes utópicas e dissonantes entre si, oscilando as narrativas
entre os conteúdos edênicos - Paraíso Tropical e deletérios - o Inferno verde.
Para a GONDIM (2019), essa representação edênica da natureza vem seguindo um efeito cascata que
começou no imaginário medieval sobre o incompreensível oriente e a desconhecida América . A
autora, defende a ideia de que a Amazônia não foi descoberta, tampouco construída, e sim inventada
pelo colonizador europeu, tendo derivado na realidade, a partir do imaginário europeu acerca da
Índia, a qual por sua vez, foi fabricada pela historiografia greco-romana tendo como base relatos e
narrativas dos peregrinos, missionários, viajantes e comerciantes.(GONDIM, 2019,p.13). Destaca
ainda que ao longo do tempo tais ideias se difundiram no mundo por meio da ciência, da filosofia,
das letras. Permanecendo nos livros os mesmos traços fantásticos, revestidos agora de verdade
científica, utilizando-se do mesmo argumento de autoridade autoral.
Representação literária da/na Amazônia
Sempre existiram políticas de representação, especialmente em
ambientes coloniais, neocoloniais e pós-coloniais, de fato não existiu
a “natureza” como uma exterioridade pura ou um referente absoluto,
mas representações configuradas verbalmente, que não podiam ser
separadas daquilo que, em determinado espaço e tempo, se
qualificava como “natureza”.(JOBIM, 2020, p.65)

Considerando a Amazônia, como um espaço colonial (a partir da dominação europeia), e estando


sujeita à política de representação, da qual nos fala Jobim (2020), cabe-nos inferir que as
primeiras narrativas, retratam o colonizado a partir da lente do colonizador, revelando o sistema
de axiomas que o europeu conhecia no século XVI, ou seja, classificar o Outro na condição de
pagão ou cristão, civilizado ou bárbaro e tomando a sua própria concepção cultural como ponto
de partida (NOVAES, 1999) . Nesse cenário o europeu negou a cultura do nativo que passou a ser
concebido muitas vezes como o indolente, mau selvagem, canibal e, sobretudo, sem história. Tais
características fundamentam a construção do Outro e, consequentemente, de seu encobrimento
como denominou Dussel (1993).
O poder de narrar e o imperialismo

As histórias estão no cerne daquilo que dizem os


exploradores e os romancistas acerca das regiões estranhas
do mundo; elas também se tornam o método usado pelos
povos colonizadores para afirmar sua identidade e a
existência de uma história própria deles. (....) O poder de
narrar, ou de impedir que se formem e surjam outras
narrativas, é muito importante para a cultura e o
imperialismo, e constitui uma das principais conexões entre
ambos. SAID (2011, p. 11)
Obras literárias analisadas
Muraida (1785)
O livro Muhuraida ou Triumpho da fé na bem fundada Esperança da enteira Conversão, e
reconciliação da Grande, e feroz Nação do Gentio Muhúra, foi escrito em 1785, pelo militar
português Henrique João Wilkens, quando a serviço da Coroa portuguesa nas Comissões de
Demarcação dos Limites nos ―sertões amazônicos.
A obra destaca-se por ser o primeiro texto poético com estrutura épica, escrito em
Língua Portuguesa, a ter como cenário , o território que hoje se configura como amazônico,
inaugurando a literatura produzida a partir de então na Amazônia. Destaca-se também por
defender a atuação do colonialismo contra as populações indígenas. Por outro lado, permite
também verificar a luta e resistência aguerrida da etnia Mura, e registra a aculturação,
escravização e assassinato destes indígenas.
De acordo com Caldas(2007, p. 6) o dialogo entre ficção e a história, apresentado
na obra, nos permite compreender melhor a construção ideológica do colonizador sobre o
indígena, considerado à época como encarnação do Mal e responsável pelo atraso econômico
da região.
Costa (2013, p.104)), ressalta que a obra através da análise pós-colonial, permite-nos
perceber os aspectos negativos do processo colonizatório, tais como a exaltação do genocídio
de um povo e a conversão (representando o assassinato cultural) de uma etnia indígena.
Conforme narra o poema, o povo Mura foi reduzido e pacificado, porém ainda seus
descendentes persistem na luta pela conquista de um lugar digno nas terras em que sempre
habitaram.
Os Muras – Corsários Abomináveis
No início do poema o autor apresenta os Muras, como: corsários abomináveis,
ferozes, indomáveis¹. Após a conversão, o processo de adjetivação se transforma:
― sincero, verdadeiro, respeitável.

1- Canto Primeiro
Argumento
Mediante a Luz, e Graça, que se
implora,
De quem é dela Fonte; Autor Divino,
A Musa Época indica, que até agora
De horror enchia o peito mais ferino.
Do Mura a examinar, já se demora,
Usos, Costumes, Guerras, e o Destino,
Que, entre as informes Choças,
inaudito,
Ao prisioneiro dá, mísero, aflito.
O Triunfo da fé ?

XX
No Templo de Maria renascidos,
Na Graça batismal, os inocentes
Vinte infantes; alegres conduzidos
Pelos Bárbaros Pais foram contentes.
Na fé de mais progressos
despendidos,
Se ausentam cumulados de presentes
Penhor levando da felicidade,
Em cada filho, de Anjo a qualidade.
Relato de um certo Oriente
Relato de um certo Oriente (1989), de Milton Hatoum, se passa em
Manaus _ representada aqui vinculada aos processos migratórios. O enredo
tem como cerne a história de uma família de imigrantes libaneses , suas
vivências, dramas, memórias e mistérios, apresentadas ao longo de oito
capítulos por uma polifonia de vozes.

O Líbano , país situado no Oriente Médio – é o “ certo Oriente”, de que


trata a obra, onde é representado e referido através das memórias dos
diferentes narradores, os quais apresentam referências aos
costumes(religião islâmica e cristã; culinária, às línguas (árabe e francês) ,
decoração e literatura (As mil e uma noites) :

“O convívio com teu pai me instigou a ler As mil e uma noites, na


tradução de Henning. A leitura cuidadosa e morosa desse livro tornou
nossa amizade mais íntima; por muito tempo acreditei no que ele me
contava, mas aos poucos constatei que havia uma certa alusão aquele
livro, e que os episódios de sua vida eram transcrições adulteradas de
algumas noites, como se a voz da narradora ecoasse na fala do meu
amigo. (HATOUM,1989, p. 79)”
“Quem supunha, por exemplo, que da Amazônia só nos
viessem episódios de seringueiros ou de índios
massacrados, por certo recebeu com surpresa o texto em
surdina de Milton Hatoum, Relato de um certo Oriente
(89), em que a vida de uma família burguesa de origem
árabe, enraizada em Manaus, se dá ao leitor como um
tecido de memórias, uma sequência às vezes
fantasmagórica de estados de alma, que lembra a tradição
de nosso melhor romance introspectivo” (BOSI, 2006, p.
437). Imagem com
E é importante pensar o lugar não apenas como uma
Layout de
geolocalização em determinado território, no mapa
terrestre, mas como um ponto por onde passam ou
Legenda
Legenda
onde se estabelecem populações que lhe dão sentido.
(JOBIM, 2020, p. 82)
Amazonas, pátria da água (1987)
Amazonas, pátria da água(1987), de Thiago de Mello, é assim
denominada, em razão da pátria da água _ “a Grande Amazônia, toda
ela estar situada no trópico úmido”(MELLO, 2005, p.15). Ao longo
da obra, o autor, nos apresenta relatos, memórias, denúncias tanto
em prosa, quanto em poesia. Nos fala sobre a natureza, sobre o rio a
comandar a vida, em seus diferentes ciclos atravessando a floresta,
ditando o ritmo do tempo na vida dos povos amazônidas,
adentrando o imaginário poético em meio ao espaço das águas, onde
transitam a cultura e os mitos reinantes na região.
A Amazônia representada por Mello, nesta obra, abarca diferentes
nuances acerca da região – aborda aspectos sócio-histórico,
ecológico; identitário (cultura cabocla, indígena); mítico.
Amazonas, pátria da água
Relatos sobre o cotidiano A chegada da Cruz e do Arcabuz
Na sua casa, na sua comida, no • Como desde o dia em que essas
seu trabalho de cada dia. O águas foram navegadas pelas quilhas
das primeiras caravelas, os de fora
regime das águas é um elemento continuam a chegar, cada vez mais
constante no cálculo da vida do poderosos de ciência e cobiça. Já
homem. Porque são também chegam sabendo, mais do que nós,
ciclos econômicos. Grande sobre o que querem de nós. Já
vazantes significam fartas chegam sabendo onde é que estão as
mais preciosas riquezas da floresta,
colheitas: a terra da várzea até mesmo as que dormem debaixo
inundada é fertilizada pelo rio, do seu chão. Sabendo mais do que
que lhe acrescenta sais minerais nós. A Amazônia, contudo, nos
e matérias orgânicas. espera, a nós que a abandonamos.
(MELLO,2005, 27) (MELLO, 2007, p.18)
Referências
CALDAS, Yurgel Pantoja. A Construção Épica da Amazônia no Poema Muhuraida, de Henrique João Wilkens. 2007. 305 f. Tese
(Doutorado) - Curso de Doutorado em Literatura Comparada, Programa de Pós-graduação em Letras: Estudos Literários, Universidade
Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2007

COSTA, Verônica Prudente. Muraida: A tradição literária de viagens em questão. 2013. 158 f. Tese (Doutorado) - Curso de Doutorado
em Letras Vernáculas, Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas da Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2013

DUSSEL, Enrique. 1492 O Encobrimento do Outro: (A origem do "mito da Modernidade"). Petrópolis: Vozes, 1993. 190 p. Tradutor
Jaime A. Clasen

GONDIM, Neide. A invenção da Amazônia. 2ª edição. Manaus: Editora Valer, 2019.

HATOUM, Milton. Relato de um certo Oriente – Sao Paulo: Companhia das


Letras, 1989.

JOBIM, José Luís, org. Palavras da crítica – tendências e conceitos no estudo da literatura. Rio de Janeiro: Imago, !992.

_____. Literatura Comparada e Literatura Brasileira: circulações e representações. Boa Vista/Rio de Janeiro: Editora da
UFRR/Makunaima. 2020

MELLO, Thiago de. Amazonas: pátria da água -water heartland. São Paulo: Editora Bocatto, 2007. 164 p.
NOVAES, Adauto(Org.). A Outra Margem do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1999

SAID, E. W. Orientalismo. São Paulo: Companhia das Letras. 2007


________. Cultura e imperialismo. São Paulo: Companhia das Letras.2011

WILKENS, Henrique João. Muraida. Manaus: Valer, 2012. 80 p


A representação da Amazônia
em Seringal, de Miguel Jeronymo
Ferrante:
uma experiência estético-literária
OBJETO DA PESQUISA

Seringal (2007), escrito por Miguel


Jeronymo Ferrante, é um romance que
tem como representação o espaço da
floresta Amazônica no período do Ciclo da
Borracha, em 1940, no Acre. O período
configura-se como uma parte marcante na
história da economia e da sociedade
brasileira.

O espaço, em Seringal (2007), da


acepção metafórica, direciona-se para o
literal, revelando significados das relações
entre os personagens e esse ambiente
adverso, transportando o leitor a uma
concatenação de ideias e valores
inerentes àquela sociedade, mediante às
descrições de pensamentos, desejos e
ações delineados na narrativa.
A REPRESENTAÇÃO DA AMAZÔNIA EM UM
CONTEXTO HISTÓRICO DETERMINADO
No comparatismo, há uma certa geopolítica do olhar. O lugar em que o
comparatista vive, e de onde olha os outros lugares projeta de algum modo
suas particularidades na representação que elabora desses outros lugares.
Em vez de imaginar que é possível uma descrição “universal” de determinado
território, povo, paisagem, ou de sua literatura e cultura, recentemente
passou-se a associar as descrições aos olhares ou pressupostos
historicamente variáveis a partir dos quais elas são feitas, e a designar esta
associação como representação. (JOBIM, 2020,p.67)
“Há na paisagem parada um tom
de cinza de desolação e de
angústia. O ar mobilizado. Nem
uma asa, a mais ligeira brisa.
Tudo estático, a morrer
brutalizado pelo calor asfixiante,
sob a cúpula do céu.”
(FERRANTE, 2007, p. 13)
A REPRESENTAÇÃO DA AMAZÔNIA EM UM
CONTEXTO HISTÓRICO DETERMINADO
Na prescrição europeia sobre a representação da “Aquela árvore inocente era a inocente
“natureza” pelos literatos brasileiros, esta personagem central da perversidade com
“natureza” não estava “fora” dos sentidos que os patrões destratavam a pessoa
indefesa do seringueiro. Maldita opulência
constituídos pela cor local (em outras palavras: que não tem dó da diligência.”
esta “natureza” não era um referente separado (FERRANTE, 2007, p.9)
dos sentidos que lhe eram atribuídos, em uma
inscrição historicamente geolocalizada)
(JOBIM, 2020, p.65)

As imagens do espaço literário, caracterizadas em


cada momento da obra Seringal, são elementos
que o autor trouxe como verossimilhança com os
aspectos sociais de maneira que proporcionaram
a denúncia das injustiças, a partir da ficção, que
exterminou diversas vidas na região Amazônica.
GEOPOLÍTICA DO LUGAR INTRÍNSECA AO
ESCRITOR
A situação geopolítica do escritor sempre já está presente
naquilo que escreve, pois a partir do lugar onde vive é que ele
vai fazer suas escolhas, diante dos elementos literários e
culturais que circulam naquele lugar específico, e dos
sentidos que são dados a esses elementos, naquela situação
geopolítica particular. (JOBIM, 2020, p.82)

A leitura do romance Seringal é nostálgico reencontro com a minha


infância, subindo e descendo o rio Acre, entre Xapuri e Rio Branco. Em
Xapuri, nasci e fiz o primário; em Rio Branco, cresci fiz o ginásio, Conheci
alguns dos seringais onde se passa a comovente história contada por
Miguel Ferrante. O próprio Miguel era personagem do meu pequeno
mundo. Via-o passar sempre andando depressa, indo e vindo, pela rua da
frente, em Rio Branco.
(FERRANTE, 2007, p.11)
SERINGAL E SUAS PRODUÇÕES DE SENTIDO
E é importante pensar o lugar não apenas como uma
geolocalização em determinado território, no mapa
terrestre, mas como um ponto por onde passam ou onde
se estabelecem populações que lhe dão sentido.
(JOBIM, 2020, p. 82)

(...) é a partir de, com ou contra esses sentidos que a


discussão de ideias acontece. (JOBIM, 2020 p.83)

“PARAÍSO DE POUCOS,
CALVÁRIO DE TANTOS”
(FERRANTE) A verossimilhança na narrativa nos conduz a um
capitalismo que resultou numa rede de exploração das
personagens amazônidas por meio dos seringalistas.
Situação que nos aproxima com a história da
Amazônia a partir da linguagem literária que por si só
gera sentidos significativos.
A REPRESENTAÇÃO E A
ESTÉTICA DA RECEPÇÃO
La forma presentativa del
arte consiste em conducir
la percepción de lo
representado através de
la percepción de la forma
de la representación.
(JAUSS, 2002, p.20)

(A forma representativa da arte


Do ponto de vista da estética da recepção, o texto consiste em conduzir a percepção do
que é representado por meio da
apenas se “concretiza” através da atuação do leitor. percepção da forma de representação.)
(LIMA, 2002, p. 991)²

2. GUMBRECHT, Hans Ubrich. A teoria do efeito estético de Wolfgang Iser. In:Teoria da literatura em suas
fontes – vol. 2. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2002.
UMA EXPERIÊNCIA ESTÉTICA NA
REPRESENTAÇÃO AMAZÔNICA
Los belos paisajes y el campo conceptual de la natureza habrían
alcanzado tanto poder sobre nuestro comportamento porque se prefere
percibir las cosas através de los gafos de uns léxicos que com les própios
ojos. (JAUSS, p.66)
(As belas paisagens e o campo conceitual da natureza teriam alcançado tanto poder sobre
nosso comportamento, porque prefere-se perceber as coisas através dos óculos de um léxico
que com nossos próprios olhos.)

A la vista de la pluralidade de funciones sociales y de las versions


científicas del mundo, hacer presente el horizonte del mundo común a
todos y que el arte puede visualizar como um todo posible o realizable.
(JAUSS, p.73)
(Tendo em vista a pluralidade de funções sociais e as versões científicas do
mundo, torna presente o horizonte do mundo comum a todos e que a arte pode
visualizar como tudo o que é possível ou realizável.)
O TEXTO INSTRUI E O LEITOR CONSTRÓI¹
O sentido de representação está, entre
outras coisas, ligado a uma ausência
presente, e consequentemente a todas as
questões derivadas desse paradoxo: –
Como se elabora a ação ou efeito de
representar? O que se faz presente, quando
evocamos algo ausente através da
linguagem? Como se manifesta através da
linguagem o que passou, e já não existe
mais, a não ser em estruturas construídas
com a linguagem (entre as quais as obras
literárias)? (JOBIM, 2020, p.66)

(...) todo texto é um conjunto de símbolos


que dependem do leitor para serem
efetivados como tal. A obra literária,
portanto, não existe no texto, mas sim na
experiência da leitura feita por
determinado leitor localizado em um
tempo e espaço específicos (...) (COSSON,
2019, p.54)
1. COMPAGNON, Antoine. O leitor. In: O demônio da teoria – literatura e senso comum. 2ª ed. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2010.
RECEPÇÃO DO LEITOR A PARTIR DA
REPRESENTAÇÃO AMAZÔNICA
Leitor 1: Leitor 2:
Ao ler o livro me senti, em poucas As impressões que o livro deixou foram
páginas, como um seringueiro novato. A boas porque traz a realidade de hoje em
impressão não trouxe pensamentos bons dia. No livro Seringal o Coronel Fábio é
sobre como é gerenciado e a verdadeira um homem traíra e hoje em dia tem
rotina sobre o dia a dia dos muita gente assim. Amigos que falam que
trabalhadores de seringais, havendo são amigos, mas na verdade quando nós
discriminação e escravidão dos donos viramos as costas eles nos apunhalam
para com os trabalhadores. Me despertou pelas costas.
que existe a desvalorização em trabalhos
tão pesados e ao mesmo tempo honrado. O coronel Fábio subornava os
Eu achei muito explorador quem deveria trabalhadores, obrigava a trabalhar só
ser o protetor para com aqueles simples para trazer o lucro para o coronel. Os
e sonhadores de dias melhores. trabalhadores não tinham um bom
rendimento. Isso traz a realidade de hoje
Existiria melhoria de vida e trabalho se o em dia que nem o estupro que o
coronel e o político tivessem os mesmos Carlinhos fez com a Paula. O coronel não
idealismos de bem e trouxessem teve a atitude de punir o Carlinhos
segurança, conforto e estudo par o porque era filho do prefeito da cidade.
seringal Santa Rita.
A LITERATURA E A PRODUÇÃO DE
SENTIDOS
(...) eu sei que são apenas palavras, mas mesmo assim... (emociono-me como se essas
palavras enunciassem uma realidade). (BARTHES, p.78 E 79)

A literatura vale pelo espaço de representação social que oferece tanto ao autor
quanto ao leitor. Também vale pelo desvelamento crítico que promove ou possibilita
desvelar das representações veiculadas nas obras, assim como um espaço político.
(...) a literatura vale por ser um espaço de combate à opressão, a preconceitos e
discriminações de grupos minoritários, ao mesmo tempo que disponibiliza e valoriza
a representação positiva das identidades de gênero, classe, etnia e orientação sexual
em um posicionamento ético. (COSSON, 2020, p.102)

Texto e leitor se dissolvem em sistemas discursivos, que não refletem a realidade,


mas são responsáveis pela realidade, tanto a dos textos quanto a dos leitores. O leitor
é um outro texto (...) uma dimensão da individualidade dos textos, dos autores e dos
leitores, não resiste mais. (COMPAGNON, 2010, p.160)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não é a representação dos dados concretos particulares que produz, na ficção, o
senso da realidade, mas sim a sugestão de uma certa generalidade, que olha para
os dois lados e dá consistência tanto aos dados particulares do real quanto aos
dados particulares do mundo fictício. (CANDIDO, 1998, p.45)

As descrições do ambiente hostil assemelham-se à vida dos seringueiros e


conduzem o leitor a perpassar por sensações e sentimentos provenientes desse
espaço a partir de uma linguagem poética e detalhada. É a realidade externa
tornando-se elemento constitutivo da narrativa que gera sentidos significativos.

A literatura busca refletir sobre esse espaço físico “do real” em contraposição com
o espaço existente na criação literária.
Mergulho na profundidade das coisas por via
das aparências, esse é o modo da percepção,
do reconhecimento e da criação pela vida do
imaginário estético poetizante da cultura
amazônica.” (Loureiro, 2001:68)
REFERÊNCIAS
BARTHES, Roland. O prazer do texto. Tradução: J. Guinsburg. São Paulo: 1987.
CANDIDO, Antonio. Dialética da Malandragem. O discurso e a cidade. 3ª ed. São Paulo/Rio
de Janeiro: Duas Cidades, 1998, p. 19-54
COSSON, Rildo. Círculos de leitura e letramento literário. 1ª ed. São Paulo: Contexto, 2019.
COSSON, Rildo. Paradigmas do ensino da literatura. São Paulo: Contexto, 2020.
COMPAGNON, Antoine. O leitor. In: O demônio da teoria – literatura e senso comum. 2ª
ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.
FERRANTE, Miguel Jeronymo. Seringal. 3ª ed. São Paulo: Globo, 2007.
GUMBRECHT, Hans Ubrich. A teoria do efeito estético de Wolfgang Iser. In:Teoria da
literatura em suas fontes – vol. 2. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2002.
JAUSS, Hans Robert. Pequeña apologia de la experiencia estética. Barcelona, Paidós, 2002.
JOBIM, José Luis. Literatura comparada e literatura brasileira : circulações e
representações [livro eletrônico] / José Luis Jobim. -- Rio de Janeiro : Makunaima ; Boa
Vista : Editora da Universidade Federal de Roraima, 2020.
LOUREIRO, João de Jesus Paes. Cultura Amazônica: Uma poética do imaginário. São Paulo:
Escritura Editoras, 2001.

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