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O mais antigo cemitério em funcionamento do Rio Grande do Sul, o Cemitério da Santa Casa de

Misericórdia é inaugurado em 1850, sendo o único cemitério da cidade de Porto Alegre até a
década de 1920 – o local, então, era destino de qualquer um, nobre ou escravo, que precisasse
ser enterrado na cidade. Acredito que, tão importante como o histórico do cemitério em si, seja
um diagnóstico das circunstâncias em que se encontrava o Rio Grande do Sul no momento da
inauguração do cemitério e da posterior construção dos mausoléus aqui denominados.

No transcorrer do século XIX o Rio Grande do Sul se envolveu em diversos conflitos políticos e
sociais, dentre os quais podemos destacar a Guerra dos Farrapos (1835) que atingiu diretamente
a cidade de Porto Alegre, e a Guerra do Paraguai (1865), conflito que rendeu títulos para alguns
dos nobres que repousam no Cemitério da Santa Casa. Aponto aqui estes momentos históricos,
pois, períodos de guerra e pós-guerra tem direta influência na economia e status social em
qualquer povo, em qualquer época. Pode-se dizer, então, que ínterim da inauguração do
Cemitério da Santa Casa a cidade de Porto Alegre estava se recuperando de um conflito que
impactou diretamente os cofres gaúchos (públicos e privados), e a época de sepultamento de boa
parte dos nobres igualmente data de um pós-guerra difícil e economicamente hostil – agora a
Guerra do Paraguai.

Segundo o artigo, estão enterrados no cemitério, por ordem cronológica de falecimento:


Visconde de São Leopoldo (1774/1847), Barão de Gravataí (1797/1853), Conde de Porto
Alegre (1804/1875), Barão de São Borja (1816/1877), Barão do Cahy (1817/1884), Barão de
Camaquã (1822/1893), Visconde de Pelotas (1824/1893), Barão de Nonoai (1829/1897), Barão
de Guaíba (1813/1902) e da Arquiduquesa de Áustria (1899/1977). O texto salienta a
simplicidade dos túmulos dos nobres gaúchos em comparação aos nobres cariocas e paulistas, e
conjecturo que muito se deve ao período decorrente. Além do mais, a maioria dos nobres aqui
mencionados tem títulos oriundos de proezas em guerra, sendo muitos estimados heróis. Seria
quase dispensável – e até um tanto hostil – a presença de onerosas e elaboradas ornamentações e
mausoléus perante a uma sociedade que já os reconhecia como de grande notoriedade e
imponência: os títulos por si só os fariam ter o prestígio esperado no pós-morte.

Outro ponto destacado no texto é a simplicidade dos túmulos da nobreza se comparados com
mausoléus da burguesia gaúcha. Aqui trago outros dois fatores: a guinada comercial que o Rio
Grande do Sul teve a partir da década de 1920, com o enriquecimento da classe burguesa, e uma
questão geográfica: se o cemitério era o único local para enterro de toda a população porto-
alegrense, e os melhores locais eram destinados a nobres, políticos e heróis de guerra, a
burguesia emergente carecia de um meio de se destacar e refletir sua riqueza nos túmulos.

Finalizo esta apreciação ponderando que, em 1893, data em que 07 dos 09 nobres mencionados
(descontando a arquiduquesa, que morreu na pobreza e anonimato), o cemitério da Santa Casa já
contava com 50.000 mortos segundo dados do portal oficial, sendo na época, bem como agora,
um reflexo da sociedade gaúcha: elites e nobreza apartadas dos pobres e indigentes, em locais
de acesso facilitado, asseio e status, com mausoléus, mesmo que simplificados, refletindo as
conquistas, títulos e fartura em vida.

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