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O mercado de trabalho do setor sucroenergético no Brasil

Juliana Arouche Costa1

RESUMO
O objetivo deste trabalho é realizar uma análise do mercado de trabalho do setor
sucroenergético entre os anos 2003 a 2018, considerando suas três principais atividades
– fabricação de açúcar, produção de álcool e cultivo de cana-de-açúcar. Com base na
bibliografia apresentada e nos indicadores econômicos, houve uma perda no número de
postos de trabalho no setor de 6%, puxada pelo setor da cana devido ao aumento da
mecanização da colheita. Apesar disso, o subsetor do etanol foi o maior responsável pela
criação de postos de trabalho.
Palavras-Chave: mercado de trabalho, setor sucroenergético

1 INTRODUÇÃO

Introduzida há mais de cinco séculos no Brasil, a cultura e a economia canavieira,


cujo principal objetivo era a produção de açúcar, artigo de alto valor agregado no
comércio mundial, foi a primeira atividade econômica, cujas características básicas eram:
a monocultura (voltada para a exportação), latifúndio (grande unidade produtiva) e mão
de obra escrava.
A cana-de-açúcar, ao longo dos anos passa de principal atividade comercial
agrícola para a principal fonte de energia da biomassa, a nível nacional e no plano
internacional. No Brasil, a cana é a principal matéria-prima para a produção de açúcar e
etanol, atividades produtivas que juntas formam o setor sucroenergético, e atualmente a
produção de bioeletricidade também faz parte desse conjunto.
Neste percurso, o álcool, também conhecido como etanol, um dos produtos da
cultura canavieira, passa a ser introduzido na matriz energética do país. Sua entrada se
dá, primeiro como solução energética, sobretudo a partir da década de 1970, devido às
crises do petróleo no âmbito internacional e às do açúcar no mercado interno e externo.
E em segundo, como fonte de energia não poluente, principalmente partir de 1990, devido

1
Economista pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), mestranda em Desenvolvimento
Socioeconômico pela Universidade Federal do Maranhão. E-mail: juliana.arouche@hotmail.com
a maior preocupação ambiental com as emissões de gases causadores do efeito estufa
pelos combustíveis fósseis, caso do petróleo e seus derivados.
Devido, entre outros, a uma gama de elementos favoráveis que incluem o solo,
clima e tamanho do território do Brasil, o país é hoje o maior produtor mundial de cana-
de-açúcar e derivados, principalmente açúcar e álcool combustível. O Brasil possui uma
enorme vantagem comparativa no setor. Em 2017, o país chegou a ser o segundo maior
produtor de etanol no mundo, produzindo 27,3 bilhões de litros, perdendo, apenas, para
os Estados Unidos, com produção de 59,9 bilhões de litros no mesmo ano.
Além disso, o setor sucroenergético destaca-se por sua importante contribuição na
geração de renda e empregos. Segundo Cepea (2018), 3,2% do total da população
ocupada no agronegócio em 2017 estavam nas atividades do setor, e ainda abrange 8%
do total de empregos com carteira assinada dentro do agronegócio.
Nos últimos anos, sob a égide da mecanização e dos avanços tecnológicos tanto
no campo como na indústria, o mercado de trabalho tem passado por mudanças
institucionais que impactam diretamente no número e nas condições do trabalhador no
setor sucroenergético.
Apesar de todas as combinações de fatores positivos para o setor, por outro lado,
o mercado de trabalho do setor é fortemente impactado pelas transformações no padrão
de produção, sobretudo no cultivo da cana-de-açúcar, que passa a ser feito de modo
mecanizado substituindo o trabalho braçal pelas máquinas. Essa substituição tem efeitos
negativos sobre os trabalhadores, que em sua maioria, possuem baixa qualificação
profissional e baixo nível de escolaridade.
A partir desse cenário, o objetivo desse trabalho é realizar uma análise acerca do
mercado de trabalho no setor sucroenergético, considerando seus três principais
subsetores (fabricação de açúcar, produção de álcool e cultivo de cana-de-açúcar), cujo
propósito principal é contribuir para a compreensão do mercado de trabalho do setor de
maneira geral, propondo uma reflexão analítica sobre o impacto de aspectos institucionais
e conjunturais nesse mercado.
Para isso, este trabalho está estruturado em cinco seções, a primeira inclui esta
introdução. Na segunda parte, é feita uma revisão de literatura que norteia o presente
estudo; a terceira seção descreve os procedimentos metodológicos; a análise dos
resultados é feita na quarta seção. Por fim, na quinta seção, apresentam-se as
considerações finais.
2 REVISÃO DE LITERATURA

O setor sucroenergético no Brasil tem sido foco de diversas abordagens


acadêmicas, dentre elas, está a literatura de interesse deste artigo, que é voltada para
mercado de trabalho e o perfil do trabalhador do campo e da indústria desse setor. Ao
analisar a literatura sobre os impactos socioeconômicos associados ao cultivo da cana-de-
açúcar e sua expansão proveniente do aumento da produção de biocombustíveis, deixa
claro que há um vasto campo de estudos sobre os impactos no mercado de trabalho e
trabalhadores rurais.
Acerca do tema Mercado de Trabalho no setor sucroenergético, destacam-se os
trabalhos de Moraes (2007), Fernandes, Shikida e Cunha (2013), Wissmann e Shikida
(2017) e Dulci (2018).
No trabalho de Moraes (2007), é feita uma análise descritiva da evolução dos
indicadores sociais obtidos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e
Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), cujo objetivo é apresentar o debate sobre
“os impactos das principais mudanças institucionais sobre o mercado de trabalho,
priorizando a discussão sobre o setor agrícola” (MORAES, 2007, p. 606).
Nesse cenário, a análise de Moraes gira em torno do cultivo da cana-de-açúcar,
cuja atividade demandava bastante mão-de-obra, em sua maioria com baixa escolaridade,
e o impacto negativo da proibição da queima de cana-de-açúcar e do aumento da
mecanização da colheita sobre o número de empregados na lavoura:
Em 2005, segundo a PNAD, havia 519.197 empregados na cultura da
cana-de-açúcar do Brasil, cuja escolaridade média era de 3,9 anos de
estudo; 70% tinham até quatro anos de estudo e, destes, 154.598 podem
ser considerados analfabetos funcionais (até 1 ano de estudo).
(MORAES, 2007, p. 605).
Fernandes, Shikida e Cunha (2013) abordam sobre a análise do comportamento
do mercado de trabalho formal no setor sucroenergético no país pós-regulamentação,
utilizando dados da RAIS no período de 1995 a 2009 e o método shift-share ou estrutural-
diferencial. O intuito dos autores é analisar o comportando do mercado de trabalho, no
que diz respeito a geração de empregos nos estados brasileiros e entre as atividades
envolvidas.
A partir dos resultados, concluíram que a região Centro-Oeste é a que mais gerou
empregos no período, e a região que teve mais perdas de postos de trabalho foi o Nordeste.
Em relação aos subsetores, a indústria de açúcar e álcool, devido ao aumento da demanda
global pela biocombustível e expectativas positivas para o mercado do açúcar, foi a que
mais gerou postos de trabalho no período, em contrapartida ao cultivo de cana-de-açúcar
que foi o subsetor em que houve mais perdas, devido ao aumento da mecanização no
cultivo que acarreta redução do número de trabalhadores na lavoura.
O trabalho de Wissmann e Shikida (2017) apresenta uma análise para além dos
impactos no mercado de trabalho, eles também analisam os impactos econômicos e
ambientais da agroindústria canavieira. Concluíram que o setor passou por processo de
adaptação “com efeitos derivados dos compromissos com o meio ambiente”
(WISSMANN e SHIKIDA, 2017, p. 156), sendo submetido às exigências ambientais e
legais de produção.
Além disso, o setor é um importante gerador de empregos, fonte de arrecadação
de diversos tributos e produtor de energia limpa. Em relação aos impactos negativos, os
autores destacam: concentração fundiária intensificada pela monocultura extensiva;
sazonalidade da procura por mão-de-obra, uma vez que o setor demanda apenas em
períodos de colheita da cana que vai de abril a novembro (podendo variar); mecanização
do cultivo, que acarreta a perda de empregos, e muitas vezes o êxodo rural; entre outros.
(WISSMANN e SHIKIDA, 2017).
O trabalho mais recente citado é o de Dulci (2018), que analisa os impactos da
internacionalização da produção de cana-de-açúcar no Brasil sobre o trabalho e os
trabalhadores. A autora destaca que o setor sucroenergético é fortemente impactado pelas
crises do capital, uma vez que “aumentam (ou diminuem) os fluxos de capital ocioso nos
países centrais, que passam a inverter mais (ou menos) na produção de commodities e ate
mesmo na compra de terras (DULCI, 2018, p. 25).
A autora destaca que um dos impactos do processo da internacionalização da
produção canavieira é o fenômeno das migrações tão característico do setor, e que ocorre
porque o trabalhador precisa sair da cidade natal atrás de oportunidades na lavoura em
outros lugares, se submetendo, muitas vezes, a condições precárias de trabalho e moradia.
No âmbito do trabalho, os aumentos de produtividade que cabe em parte ao
aumento da mecanização, são frutos da maior exploração e intensificação sobre os
trabalhadores que ainda permanecem no trabalho manual. A autora ainda ressalta que
além das desigualdades de produção entre as regiões, há também uma gama diversificada
de trabalhos agrícolas manuais na atividade de cultivo da cana, chamando atenção para a
questão de possíveis violações dos direitos trabalhistas no setor.
3 METODOLOGIA

A metodologia deste estudo baseia-se no levantamento e na análise de dados


secundários, divulgados por fontes oficiais de informação e na análise de documentos e
bibliografias acerca do tema. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica elaborada a partir de
material já publicado, como livros, artigos e periódicos. Neste sentido, busca-se o diálogo
entre os trabalhos referenciados e os dados obtidos no período entre 2003 a 2018.

3.1 FONTE DOS DADOS

Para a construção dos dados deste trabalho foram consultados os bancos de dados
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Relação Anual de Informações
Sociais (RAIS). Para cálculo da produtividade do trabalho na indústria sucroenergética
foram considerados os valores da transformação industrial e população ocupada na
atividade, ambos os dados obtidos da Pesquisa Industrial Anual – Empresa, feita pelo
IBGE, agrupados na seguinte Classificação Nacional das Atividades Econômicas
(CNAE): 15.3 e 10.7-fabricação de açúcar e 23.4 e 19.3-produção de álcool.
Sobre emprego e grau de escolaridade dos trabalhadores, foram extraídos os dados
da RAIS, conforme a delimitação das seguintes subclasses da CNAE: a) 0113-0/00-
Cultivo de cana-de-açúcar; b) 1071-6/00-Fabricação de açúcar em bruto; c) 1072-4/01-
Fabricação de açúcar de cana refinado; d) 1931-4/00-Fabricação de álcool.
Em relação ao período estudado, que se inicia em 2003 e termina em 2018,
corresponde a uma nova fase do setor sucroenergético no Brasil que marcou um processo
de reestruturação iniciada a partir dos anos 2000 provocada por uma série de fatores, entre
eles estão: a) a produção dos veículos flex fuel no país a partir de março de 2003; b) o
aumento do preço internacional do petróleo; c) o aumento do consumo interno de etanol
como combustível de veículos automotores; d) o aumento da adição de álcool anidro à
gasolina e; e) o aumento das preocupações referentes ao aquecimento global, aliado ao
forte apelo das vantagens ambientais e à saúde proporcionadas pelo consumo do etanol
(COSTA, 2019).
Cabe lembrar ainda que, durante a construção do trabalho diversas fontes oficiais
foram utilizadas. Por conta disso, os dados apresentados e o período a que se referem não
são homogêneos e podem variar de uma instituição para outra.
4 RESULTADOS: ANÁLISE CONJUNTURAL DO MERCADO DE
TRABALHO NO SETOR SUCROENERGÉTICO

Com o intuito de analisar os principais indicadores acerca do mercado de trabalho


formal e de traçar o perfil do trabalhador do setor sucroenergético, esta seção está dividida
em três partes: a primeira discorre sobre a evolução do emprego formal no setor; a
segunda parte apresenta a evolução da produtividade do trabalho na indústria; e a terceira
parte mostra o nível de escolaridade dos trabalhadores.

4.1 EVOLUÇÃO DO EMPREGO

A evolução do número de empregados formais no setor sucroenergético, no


período de 2006 a 2018 (Gráfico 1) mostra que há dois momentos distintos. O primeiro
momento tem início a partir de 2003 (Gráfico 2) quando o número de empregados
apresenta uma trajetória crescente atingindo seu auge em 2011. De acordo com os dados
da RAIS, no período de 2006 a 2011, houve um aumento de 22% do número de
empregados considerando os quatros subsetores em conjunto. De todos os quatro
subsetores, o de cultivo de cana foi o que apresentou queda de 5%, já a produção de açúcar
e produção de álcool apresentaram aumento de 32% e 51%, respectivamente.
Podemos destacar alguns fatores que motivaram esse aumento, como: a)
surgimento dos carros flex a partir de 2003 e a perspectiva do etanol em se tornar uma
commodity, o que aumento a demanda por álcool hidratado, que passou de 3,2 mil m³ em
2013 para 10,9 mil m³ em 2011, atingindo pico em 2009 com uma demanda de 16,5 mil
m³ de acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis
(ANP); e b) a valorização do mercado do açúcar, marcado pela expansão da produção de
açúcar de 24,9 milhões de toneladas em 2003 para 38 milhões em 2011, segundo dados
da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA).
No segundo momento há uma tendência de queda iniciada a partir de 2012 até
2018, em todos os subsetores, com queda maior fabricação de açúcar (-24%). Alguns
fatores podem ser citados, inclusive a crise iniciada em 2008 que gerou um ambiente de
incertezas na economia, além disso, outros fatores foram: a falta de investimentos em
novas usinas, inclusive o fechamento de tantas outras, falta de reformas nos canaviais e
problemas climáticas que reduziram a oferta de cana e a demanda por trabalhadores.
Gráfico 1. Número de empregados em cada subsetor sucroenergético – 2006 a 2018
700000
600000
500000
400000
300000
200000
100000
0
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Cultivo de cana-de-açúcar Fabricação de açúcar


Fabricação de álcool Total
FONTE: RAIS/MTE (2021)

Considerando todo o período de 2006 a 2018, a produção de álcool foi o único


subsetor a gerar novos postos de trabalho (33%), já a produção de açúcar e a o cultivo de
cana perderam postos, uma redução de 1% e 30%, respectivamente.
Importante destacar que o processo de mecanização da colheita foi um fator
decisivo na queda do número de trabalhadores no cultivo da cana. Em 2007, a colheita
mecanizada correspondia a 24,4% da colheita total, já em 2018 esse nível cresce para
91,6% (CONAB, 2021). Esse processo foi induzido pelos impactos negativos ambientais
e sociais em relação a queima da cana-de-açúcar como método de despalha, que consiste
no uso de fogo para eliminação da palha e folhas secas, muito usado na colheita manual
e ainda aumenta a produtividade do trabalhador (MORAES, 2007).
O aumento dos impactos negativos da queima resultou em políticas
governamentais de contenção e eliminação gradual desse método antes da colheita, a
respeito disso, o governo brasileiro lançou o Decreto Federal nº 2.661, de 8/7/98, que
estabelece a eliminação gradual da queima da cana-de-açúcar no país. Apesar dos ganhos
ambientais, o cenário é prejudicial no campo social devido ao desemprego gerado.
Além do processo de mecanização, a indústria sucroenergética, após 1990, passou
por um processo de encerramento do seu paradigma subvencionista2 induzido pela
desregulamentação setorial que obrigou as usinas e destilarias a assumirem práticas de
concorrência impostas pelo livre mercado, em que muitas tiveram que adotar um
paradigma tecnológico com o intuito de minimização dos custos de produção com a

2
Ver SHIKIDA, P. F. A. A evolução diferenciada da agroindústria canavieira no Brasil de 1975 a 1995.
Piracicaba, 191 p. Tese. Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo,
1997.
introdução de novas tecnologias que poupassem o uso de mão-de-obra (FERNANDES,
SHIKIDA e CUNHA, 2013).
Na parte industrial do setor sucroenergético, dados do IBGE disponibilizados na
PIA (Gráfico 2) mostram que tem havido oscilação considerável no número de ocupados
desde 2003, mostrando dois momentos distintos conforme já mencionado acima.

Gráfico 2. Ocupação formal na indústria sucroenergética (em %)


0,20 600

População ocupada (mil)


0,15 500
0,10 400
0,05 300
0,00 200
-0,05 100
-0,10 0
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Taxa PO PO total

FONTE: Elaboração própria a partir de dados da PIA-EMPRESA/IBGE (2021).

A Tabela 1 mostra a distribuição de trabalhadores por faixa etária. A partir dos


dados apresentados, observa-se que, em 2006 e 2018, o maior número de trabalhadores
tinha entre 30 a 39 anos, correspondendo a 29% e 31% do total.

Tabela 1. Número de empregados do setor sucroenergético, por faixa etária.


2006 2018
Faixa Cana- Cana-
Etária de- Açúcar Álcool Total de- Açúcar Álcool Total
açúcar açúcar
Até 17 534 294 84 912 170 498 397 1.065
18 a 24 34.030 54.647 16.292 104.969 12.139 29.356 13.295 54.790
25 a 29 29.876 48.466 14.343 92.685 14.044 33.339 15.620 63.003
30 a 39 52.611 76.791 23.910 153.312 36.489 81.959 35.748 154.196
40 a 49 39.031 53.411 17.015 109.457 32.298 63.066 24.030 119.394
50 a 64 22.497 25.064 8.192 55.753 27.587 45.008 16.457 89.052
65 ou mais 1.579 1.326 454 3.359 2.847 3.805 1.072 7.724
Total 180.158 259.999 80.290 520.447 125.574 257.031 106.619 489.224
FONTE: RAIS/MTE (2021).

4.2 PRODUTIVIDADE DOS TRABALHADORES DA INDÚSTRIA

A produtividade do trabalho na indústria de sucroenergética, tomada pelo valor da


transformação indústria e do número de pessoal ocupado na atividade, tem alcançado
bons resultados. Conforme Gráfico 3, a produtividade tem apresentado trajetória
crescente, sobretudo, a partir de 2007, registrando crescimento acima do crescimento da
indústria de transformação.

Gráfico 3. Produtividade do trabalho nas indústrias de açúcar e álcool e de transformação


– 2003 a 2018 (R$/trabalhador)
180
160
140
120
100
80
60
40
20
0
2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018
Indústrias de transformação Industria de açúcar e álcool

FONTE: Elaboração própria a partir de dados da PIA-EMPRESA/IBGE (2021).

De acordo com Santos et el. (2016), o aumento da produtividade da mão de obra


decorre de algumas mudanças que aconteceram no ambiente de trabalho no campo e que
tiveram grande relevância social. A primeira foi, como já citada, a mudança no perfil de
ocupação no setor como resultado da introdução de tecnologias e da redução do trabalho
“pesado” da colheita manual, com a incorporação da colheita mecanizada, como resultado
das pressões e da maior fiscalização sobre os impactos ambientais e sociais no setor.
A segunda foi a perda de postos de trabalho nas lavouras que gerou “ganhos de
produtividade física, após adaptações, com economias de terras e mão de obra” (SANTOS
et el., 2016, p. 26). Além disso, a crescente produção, sobretudo a partir de 2007, também
tornou o setor menos intensivo em mão de obra e demandou uma força de trabalho mais
qualificada diante desse processo de mecanização das atividades nas lavouras e nas
indústrias, na busca de aumentar a eficiência do álcool e o rendimento da cana.
Além disso, o estudo feito por Vilas Boas e Dias (2008) cita outros fatores para o
aumento da produtividade para além da mecanização, como:
a expansão da fronteira agrícola para as regiões do cerrado; o desmonte
de pequenas propriedades agrícolas familiares; a seleção mais apurada
com a contratação de trabalhadores mais jovens, menor contratação de
mulheres e maior contratação de migrantes; a estratégia do contrato por
um “período de experiência”, que pode significar a demissão do
trabalhador que não consegue atingir a média de 10 toneladas/dia, antes
de se cumprirem os três meses de contrato, entre outras. (VILAS BOAS
e DIAS, 2008, p. 26-27).
4.3 NÍVEL DE ESCOLARIDADE DOS TRABALHADORES

Em relação ao nível de instrução do pessoal ocupado na atividade sucroenergética,


o Gráfico 4 mostra há uma evolução da escolaridade média dos trabalhadores do setor
para o Brasil. De 2006 a 2013, a maioria dos trabalhadores tinham de 1 a 5 anos de
estudos, mas esse movimento muda a partir de então, o maior número de trabalhadores
no setor passa a ter de 10 a 13 anos de estudo.

Gráfico 4. Escolaridade dos trabalhadores com vínculo ativo 31/12 – 2006 a 2018
300000

250000

200000

150000

100000

50000

0
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Analfabeto 1 a 5 anos 6 a 9 anos 10 a 13 anos mais de 13 anos

FONTE: RAIS (2021).

Pode-se dizer que o setor tem demandado uma mão-de-obra mais qualificada,
sobretudo, devido a mecanização do cultivo da cana que dispensa, gradualmente,
trabalhadores pouco qualificados, esse comportamento no mercado de trabalho do setor
gera impactos negativos no sentido de que o mercado acaba obrigando esses trabalhadores
a se qualificarem se não acabam ficando excluídos do sistema.

5 CONCLUSÃO

É inevitável a tendência de perdas de postos de trabalho menos qualificados, como


se observou no setor sucroenergético, e sobretudo, no cultivo da cana-de-açúcar devido a
mecanização da colheita. O mercado exige das empresas altas lucratividades para se
manter firme, e isso está associado a alta produtividade do trabalho, que está intimamente
ligada à redução do trabalho braçal e manual e o aumento das tecnologias no campo e na
indústria. Como disse Martelli (2003):
Quanto mais o trabalho humano torna-se prescindível, em razão do alto
grau de automação, maior é o nível de qualificação daqueles
trabalhadores que restaram no processo produtivo, tanto na fábrica
como no escritório. Os trabalhadores não precisam mais ser hábeis
manualmente, mas precisam desenvolver uma capacidade de abstração
e de rapidez no raciocínio lógico; precisam ter noções das ciências
exatas, de informática, de mecânica, precisam conhecer outras línguas
etc. (MARTELLI, 2003, p.33).
O que se percebe é que, no setor sucroenergético, incorporação de novas
tecnologias tem dispensado, mesmo que gradativamente, o trabalho vivo, o que acentua
a necessidade de formação e qualificação permanentes dos trabalhadores desse setor.
Entretanto, o modo como o mercado de trabalho vem se estruturando, tal responsabilidade
passa a ser do trabalhador, que tem o ônus de manter-se empregável, ou seja, manter-se
sempre atualizado, de maneira a garantir um diferencial competitivo. Dessa forma,
transfere-se a responsabilidade pelo desenvolvimento profissional e qualificação do
trabalho das instituições para os trabalhadores.
Apesar dos dados indicarem que há uma evolução da escolaridade média dos
trabalhadores do setor sucroenergético, ainda é muito alto o número de trabalhadores com
baixa escolaridade que, se mantendo a tendência de crescente evolução das tecnologias,
esses trabalhadores podem ter seus empregos perdidos. Além da crescente formalização
do trabalho, aumento da fiscalização para aplicação de leis trabalhistas, da pressão das
instituições, as condições de trabalho no setor, muitas vezes, são precárias, e em
determinados casos, continuam análogas à escravidão.
A absorção de muita mão-de-obra de baixa qualificação fazendo atividades que a
tecnologia já domina é uma espécie de símbolo dos velhos engenhos da época colonial
do Brasil, antes feito pelo mão-de-obra escrava e agora pela exploração trabalhista com
baixos salários e precárias condições ambientais desse trabalhador.
A educação, portanto, entra nesse cenário como elemento imprescindível da
manutenção do trabalhador, e as políticas públicas precisam ser voltadas para a
estruturação de melhores condições de estudo para esses trabalhadores, inclusive no
campo, e o fomento de estratégias voltadas para a absorção desses trabalhadores que saem
desse tipo de trabalho manual
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