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A Casa Do Pai
A Casa Do Pai
Ciência da Religião
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Resumo
Introdução
Conclusão e aplicações
Bibliografia
RESUMO
Este breve comentário tem a intenção de apresentar algumas das implicações de uma
das partes mais conhecidas do discurso de despedida do Senhor Jesus, conforme
retratado pelo evangelista João. O foco é a análise de João 14.1-14, levando em
consideração a divisão natural do texto, algumas implicações gramaticais e as indicações
do contexto. Seu objetivo principal é ser uma ferramenta para servir àqueles que buscam
compreender o texto em questão e evangelizar os que, porventura, tenham se
interessado em conhecer o Senhor Jesus. Apesar de tratar de questões profundas e
fundamentais à fé, a sua linguagem é simples, possibilitando que até o mais
despretensioso leitor compreenda sua mensagem. Foram consultados autores como
Donald A. Carson, John F. MacArthur e Frederick F. Bruce. As citações bíblicas, salvo
indicação em contrário, são da Nova Versão Internacional (NVI).
Palavras-chave: João 14, A Casa do Pai, Jesus Cristo.
INTRODUÇÃO
Após a apresentação do caminho para a casa do Pai, Tomé sai de cena e, agora, Filipe
passa a dialogar com o Senhor. Filipe se mostrou um tanto quanto ignorante ou até
inocente diante das afirmações anteriores de Jesus. O Senhor havia claramente exposto
qual o nível de seu relacionamento com o Pai ao dizer que conhecer o Filho significaria
também conhecer a Deus, que de outra forma seria inacessível[19]. Seja por ignorância
ou por inocência, o pedido de Filipe deu ocasião para que Jesus explicasse com clareza
ainda maior a profundidade de seu elo com o Pai. Filipe pediu: “Senhor, mostra-nos o Pai,
e isso nos basta” (v. 8).
Jesus responde ao pedido de Filipe mostrando uma verdade que é contínua no
Evangelho joanino: o relacionamento indivisível entre o Filho e o Pai. Em 1.18, João diz:
“Ninguém jamais viu a Deus: O Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o
revelou”. Em 5.36, encontramos Jesus dizendo: “Eu tenho um testemunho maior que o de
João; a própria obra que o Pai me deu para concluir, e que estou realizando, testemunha
que o Pai me enviou”. Em 8.38, ele diz: “Eu estou dizendo o que vi na presença do Pai”.
Em 10.15, ele diz: “Assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai; e dou a vida pelas
ovelhas”. Em 10.30: “Eu e o Pai somos um”. Em 10.38: “[…] para que possam saber e
entender que o Pai está em mim, e eu no Pai”. Em 16.15: “Tudo que pertence ao Pai é
meu”. Em 16.28: “Eu vim do Pai e entrei no mundo; agora deixo o mundo e volto para o
Pai”. Em 17.11: “Pai santo, protege-os em teu nome, o nome que me deste, para que
sejam um, assim como somos um”. E em 17.21: “Pai, que todos sejam um, como tu estás
em mi e eu em ti”. Aqui está uma infinidade de textos apenas do Evangelho de João que
poderiam ser utilizados pelo Senhor para lembrar Filipe que ele já conhecia o Pai e que,
portanto, seu pedido já havia sido atendido.
Reafirmando esta verdade o Senhor Jesus diz: “Você não me conhece, Filipe, mesmo
depois de eu ter estado com vocês durante tanto tempo? Quem me vê, vê o Pai. Como
você pode dizer: ‘Mostra-nos o Pai’? Você não crê que eu estou no Pai e que o Pai está
em mim?” (vv. 9-10b). Os questionamentos de Jesus são, obviamente, todos retóricos e
não exigiam uma resposta de Filipe. A prova que Jesus apresenta para mostrar que ele é
o Pai são unânimes em um só propósito é incontestável: Ele falava e fazia o que o Pai
queria que ele falasse e fizesse. Ele diz assim: “As palavras que eu digo não são apenas
minhas. Ao contrário, o Pai, que vive em mim, está realizando a sua obra. Creiam em mim
quando digo que estou no Pai e que o Pai está em mim; ou pelo menos creiam por causa
das mesmas obras” (v. 10b-11).
Os discípulos, como atesta a colocação de Filipe mesmo diante de toda a revelação
anterior de Jesus, eram muito tardios em compreender muitas verdades expostas pelo
Senhor. Todavia, como é possível notar em seu testemunho posterior, eles não
demonstravam dificuldades em crer e anunciar tais verdades, uma vez que elas haviam
sido compreendidas. Mesmo que no início eles tiveram dificuldades para compreender a
doutrina bíblica da trindade conforme exposta por Jesus, posteriormente, eles a
anunciaram direta e indiretamente em seus ministérios. Veja como exemplos os seguintes
textos: Romanos 8.14-17; 15.16,30; 1Coríntios 2.10-16; 6.11,14,15,19,20; 12.4-6;
2Coríntios 1.21-22; 13.13; Efésios 1.3-14; 4.4-6; 2Tessalonicenses; Tito 3.4-6; 1Pedro 1.1-
2; Judas 1.20-21.
Após falar que ele iria para a Casa do Pai, que iria preparar-lhes lugar, e que, quando
chegasse o momento oportuno, ele retornaria para levá-los consigo; após falar que ele é o
único caminho para o Pai, principalmente porque ele e o Pai são apenas um, o Senhor
Jesus diz que outro grande benefício de sua partida estaria no fato de que seus discípulos
seriam habilitados para continuar o ministério que ele começou, fazendo, inclusive, obras
maiores que as dele. O texto diz: “Aquele que crê em mim fará também as obras que
tenho realizado. Fará coisas ainda maiores do que estas, porque eu estou indo para o
Pai” (v. 12). Em 5.2, após curar o paralítico no tanque de Betesda, o Senhor Jesus disse
que ele mesmo faria obras maiores do que aquela. Agora os discípulos recebem a
promessa de que eles fariam obras maiores do que as que Jesus havia feito.
Obviamente, Jesus não está falando que seus discípulos teriam mais poderes do que ele,
mas realizariam obras maiores em extensão e em alcance. O foco aqui é claro. Jesus não
se refere somente a milagres físicos[20], mas principalmente a milagres espirituais
realizados por meio da obra do Espírito Santo que, após a sua partida, passaria a habitar
os crentes, concedendo-lhes poder (Atos 1.8). De fato, somente mediante a ação do
Espírito é que os discípulos seriam preparados para realizar tais obras maiores que as de
Jesus[21]. E tal situação é consoladora em face da partida de Jesus porque o Consolador,
o Espírito Santo, só seria enviado quando Jesus partisse, conforme nos relatam os
versículos 26 deste mesmo capítulo e 39 do capítulo 7. Uma questão importante aqui é
que as obras dos discípulos seriam maiores também pelo fato de que seriam realizadas
com base na obra completa do Senhor Jesus. Sobre isso, Donald Carson diz:
Em suma, as obras que os discípulos realizam após a ressurreição são maiores que
aquelas feitas por Jesus antes de sua morte, na medida em que aquelas pertencem a
uma era de clareza e poder introduzidos pelo sacrifício e exaltação de Jesus. As palavras
de Jesus e suas obras era, de alguma forma, veladas
durante os dias de sua carne; mesmo seus mais próximos seguidores, como os
versículos anteriores deixam claro, entenderam somente uma parte do que ele estava
dizendo.[22]
O cumprimento das promessas de Jesus está narrado no livro de Atos. Por exemplo, nos
primeiros dias após a partida de Jesus para o Pai, após um sermão de Pedro, três mil
pessoas foram batizadas. A partir daí, a narrativa de Atos mostra como a ação do Espírito
Santo foi fundamental na eficiência do testemunho dos discípulos ao redor do mundo. E,
sem dúvida, eles impactaram o mundo (Atos 17.6), arrebanhando mais seguidores para o
Senhor Jesus do que durante o seu ministério pessoal na Galileia e na Judeia. Estas
obras maiores ainda são as obras de Cristo, mas feitas sem sua presença física; feitas,
sim, pelo Espírito dentro dos seguidores de Jesus[23].
Outro consolo recebido pelos discípulos é o fato de que, para darem continuidade ao
trabalho do Mestre, eles receberiam das mãos do Pai (cf. 16.23) o que fosse necessário,
quando o pedissem em nome de Jesus. O texto diz assim: “Eu farei o que vocês pedirem
em meu nome, para que o Pai seja glorificado no Filho. O que vocês pedirem em meu
nome, eu farei” (v. 13-14). Infelizmente, muitos interpretam erroneamente este texto e,
com base nesta interpretação falha, formulam uma teologia da oração completamente
anti-bíblica. Eles têm visto o nome de Jesus como um amuleto que garante que
absolutamente tudo que for pedido em oração será necessariamente atendido conforme
solicitado. Segundo eles, quando uma petição feita a Deus não é respondida, é por falta
de fé daquele que pede.
Todavia, quando o texto é analisado com o mínimo critério, é possível notar que o
propósito do Senhor é fornecer a oração como um recurso para que eles peçam ao Pai o
que for necessário para dar continuidade à sua obra[24]. Em outras palavras ele está
dizendo: Eu estou indo embora para a Casa do Pai preparar um lugar para vocês. Logo
eu voltarei para buscá-los para que estejamos sempre juntos. Por enquanto, vocês vão
continuar a minha obra até que chegue o momento de eu voltar. E para que vocês
continuem o meu trabalho, eu fornecerei um recurso importantíssimo para que vocês o
utilizem para o benefício do meu Reino. Este recurso é a oração. Utilizem-no para os
propósitos do meu Reino, para minha glória. Se vocês o utilizarem assim, eu sempre os
ouvirei.
Ou seja, pedir em nome de Jesus não é apenas utilizar uma expressão no final de uma
oração. É, sobretudo, falar com Deus com o propósito de que seu Reino esteja
continuamente em expansão e, como consequência disso, glorifique o Pai e o Filho[25]. É
possível ver que é exatamente (para não dizer exclusivamente) assim que a oração é
utilizada pelos apóstolos em sua vida e ministério. Vejamos os seguintes textos como
exemplos: Atos 8.15; 13.3-4; Romanos 15.30-31; Efésios 6.18-20; Colossenses 1.9; 4.3-4;
1Tessalonicenses 3.9-10; 5.25; 2Tessalonicenses 3.1-2; Hebreus 13.18.
CONCLUSÃO E APLICAÇÕES
À luz das verdades apresentadas ao longo deste breve comentário, é possível chegar a
algumas conclusões. Talvez a mais clara delas seja o fato de que o Senhor Jesus é o
grande consolo do cristão, mesmo em meio à angústia, ao desespero e ao medo. Esse
consolo é garantido, não apenas pela certeza do retorno de Cristo. Não é apenas um
consolo futuro e profético. É também presente no agora. Isso quer dizer que hoje mesmo
o crente pode desfrutar do consolo de Cristo[26]. Primeiro, porque ele é o único caminho
para a Casa do Pai; depois, porque ele os capacita a dar continuidade à sua obra
disponibilizando recursos maravilhosos para isso. A habitação do Espírito Santo é um
conforto sem igual. E como se não bastasse, a certeza de que o Pai ouve nossas orações
através de Jesus é algo que não cabe no vocabulário humano.
Uma coisa maravilhosa é saber que Jesus Cristo irá voltar a despeito das falhas e
fracassos de seu povo. A promessa de seu retorno glorioso não é condicionada às ações
de quem quer que seja. Ele irá voltar e ponto. No tempo oportuno, ele aparecerá no céu e
reunirá os seus eleitos que, a partir de então, estarão para sempre em sua gloriosa
presença.
Talvez alguns fiquem angustiados ou temerosos ao ouvir palavras como essas. Talvez se
sintam inseguros ou despreparados para se encontrar com ele. É preciso lembrar que
diante da angústia dos discípulos, foi justamente a promessa de que Jesus iria voltar para
levá-los à Casa do Pai que os confortou.
A certeza de que um dos quartos que Jesus foi preparar na casa do Pai pode ser
experimentada mediante o arrependimento de pecados e o clamor pela misericórdia do
Senhor. Aquele que passar a desfrutar dessa certeza irá viver uma vida de alegria, dirigida
pelo Espírito Santo; receberá das mãos do Senhor todos os recursos necessários para
dar continuidade ao que Jesus começou; irá anunciar o seu Reino e a sua Palavra por
todos os dias de sua vida; e finalmente, quando chegar o momento, irá para a Casa do
Pai, onde irá desfrutar de sua gloriosa presença por toda a eternidade.
BIBLIOGRAFIA
BRUCE, F. Frederick. João: Introdução e comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo:
Vida Nova, 1987.
BUSHELL, Michael S.; TAN, Michael; WEAVER, Glenn L. Bibleworks 8. Versão
8.0.013z.1. Norfolk: Bibleworks, LLC, 2004.
CARSON, Donald A. O comentário de João. São Paulo: Shedd Publicações, 2007.
KITCHEN, K. A.; PAYNE, D. F.; HARRIS, B. F. Papiros e Ostracas. In: O Novo Dicionário
da Bíblia. Volume III. Editor em Português: Russel P. Shedd. São Paulo: Edições Vida
Nova, 1966.
LOPES, Augustus Nicodemus Gomes. The Father’s Home, and the way there. The Gospel
Coalition. Disponível em: http://resources.thegospelcoalition.org/library/the-father-s-home-
and-the-way-there. Acesso em: 25 de agosto de 2017.
MACARTHUR. John Fullerton, Jr. Bíblia de Estudo MacArthur. Barueri: Sociedade Bíblica
do Brasil, 2010.
[1] O autor é graduado em Teologia pelo Faculdade Batista Brasileira (FBB); é professor
de Noções de Hebraico Bíblico e Língua Portuguesa no Seminário Teológico Bíblico
Thompson (STBT) e exerce o Ministério Pastoral na Igreja Bíblica Congregacional de
Vitória da Conquista (Urbis I).
[2] LOPES, 2015, s.p.
[3] LOPES, 2015, s.p. (Tradução Livre)
[4] BRUCE, 1987, pp. 255-258.
[5] CARSON, 2007, p. 487.
[6] MACARTHUR, 2010, p. 1417.
[7] πιστεύετε é a forma do presente do indicativo ativo da segunda pessoa do plural e
também presente do imperativo ativo da segunda pessoa do plural do verbo πιστεύω.
Segundo Donald Carson, seja qual for a tradução correta, o texto relaciona Jesus com o
Pai como um objeto apropriado de fé, o que faz com que sua cristologia seja
formidavelmente elevada (CARSON, 2007, p. 488).
[8] BRUCE, 1987, p. 253.
[9] μοναὶ é o plural de μονή, palavra derivada do verbo μένω, cujo significado é
permanecer, ficar.
[10] BRUCE, 1987, p. 255.
[11] CARSON, 1987, p. 490.
[12] MACARTHUR, 2010, p. 1417.
[13] O único manuscrito mais antigo que traz o texto longo é a primeira edição do Papiro
66, ou Bodmer II (c. 200 d.C.), um manuscrito antigo do NT que contém João 1.1-14.26
(KITCHEN, PAYNE, HARRIS, 1966, p. 1197). A sua segunda edição traz o texto mais
curto. (BRUCE, 1987, p. 256)
[14] Segundo Donald A. Carson, “mesmo que a leitura mais longa 8seja de autenticidade
duvidosa, a leitura mais curta deve ser entendida da mesma forma”. (CARSON, 2007, p.
491 – nota adicional)
[15] Na construção narrativa do seu Evangelho, João destaca sete afirmações do Senhor
Jesus sobre si próprio: eu sou o pão da vida (6.35,51); eu sou a luz do mundo (8.12; 9.5);
eu sou a porta das ovelhas (10.7,9); eu sou o bom pastor (10.11,14); eu sou a
ressurreição e a vida (11.25-26); eu sou o caminho, e a verdade, e a vida (14.6); eu sou a
videira verdadeira (15.1,5).
[16] TOMÁS DE KEMPIS apud. BRUCE, 1987, p. 257.
[17] BRUCE, 1987, p. 257.
[18] MACARTHUR, 2010, p. 1417.
[19] BRUCE, 1987, p. 257.
[20] Segundo Donald A. Carson, as obras que Jesus havia realizado e as obras ainda
maiores que seus discípulos fariam não podem legitimamente restringir-se a feitos de
humildade (13.15), atos de amor (13.34,35) ou à proclamação das palavras de Jesus (v.
10). Para ele, as obras podem referir-se a mais do que os milagres do Senhor sem, no
entanto, excluí-los. (CARSON, 2007, p. 496)
[21] MACARTHUR, 2010, p. 1417.
[22] CARSON, 2007, p. 496.
[23] BRUCE, 1987, p. 258.
[24] MACARTHUR, 2010, p. 1417.
[25] MACARTHUR, 2010, p. 1417.
[26] Ibidem, p. 1416.
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