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HAMARTIOLOGIA

Doutrina do pecado
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................49

1. SURGIMENTO DO PECADO ...................................................................................................................50


1.1 ORIGEM DO PECADO NO UNIVERSO ...............................................................................................50

2. ORIGEM DO PECADO NA RAÇA HUMANA ........................................................................................53

3. EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE PECADO ...........................................................................................55


3.1 PALAVRAS REVELADORAS ..............................................................................................................55

4. EVANGELHOS ...........................................................................................................................................57

5. TEOLOGIA PAULINA CONCERNENTE AO PECADO .......................................................................59

6. OS PRIMEIROS ESCRITOS SOBRE O PECADO .................................................................................61

7. CONSEQÜÊNCIAS IMEDIATAS DO PECADO ....................................................................................63


7.1 AFETOU SEU RELACIONAMENTO ...................................................................................................63
7.2 AFETOU SUA NATUREZA .................................................................................................................63
7.3 AFETOU SEUS CORPOS .......................................................................................................................63
7.4 AFETOU O MEIO AMBIENTE .............................................................................................................64

8. A UNIVERSALIDADE DO PECADO .......................................................................................................65

9. TEORIA DA IMPUTAÇÃO ......................................................................................................................66


9.1 TEORIA PELAGIANA OU TEORIA DA INOCÊNCIA NATURAL DO HOMEM .............................66
9.2 TEORIA ARMINIANA OU TEORIA DA DEPRAVAÇÃO VOLUNTARIAMENTE APROPRIADA...67
9.3 TEORIA FEDERAL OU TEORIA DA CONDENAÇÃO POR PACTO .................................................67
9.4 TEORIA AGOSTINIANA .......................................................................................................................67

10. REMOÇÃO DO PECADO .........................................................................................................................69

11. PECADO IMPERDOÁVEL ......................................................................................................................70

REFERÊNCIAS ................................................................................................................................................71
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

INTRODUÇÃO
Toda a Bíblia está centrada no tema da salvação. É um pressuposto básico e irrenunciável presente em
todas as suas páginas. Desde o livro de Gênesis, Deus anunciou o Messias que redimiria o pecado de todos
os seres humanos. A história de Israel se converte dessa maneira no grande gesto salvador. Todos os seus
acontecimentos e vicissitudes estão misteriosa e desconcertantemente ordenados para a vinda do Messias.
A condição pecadora da humanidade a incapacita para um encontro com Deus, que só é possível pela
gratuidade de seu amor e predileção, até a chegada definitiva do Salvador. Uma espera longa e confiante
que manteve de pé o povo escolhido, apesar de não cumprirem com o seu dever de permanecerem fiéis à
aliança com o seu Deus. De maneira extraordinária, os fatos vão mostrando a fidelidade inabalável de Deus,
que nunca volta atrás em suas promessas.
A vida, a paixão e a morte de Jesus aparecem de forma explícita com este caráter de libertação. É o
cumprimento de todos os anúncios feitos anteriormente. Jesus veio nos resgatar da morte, da lei e do
pecado. Entregou sua vida para a remissão do pecado do mundo e para tornar possível a nova e definitiva
aliança. Sua vida e ensinos são a manifestação deste esplêndido acontecimento. Ele nos revelou o rosto de
um Deus misericordioso e disposto a perdoar todas as vezes que for necessário.
A salvação em Jesus é o único meio de realizar o bem conforme o padrão divino, entretanto, não exclui
a liberdade frágil e pouco vigorosa do ser humano. Todos os seres humanos, enquanto peregrinarem por
este mundo, são capazes de optar por Jesus ou de rejeitar sua mensagem e pessoa. E qualquer uma dessas
decisões afeta o destino, a vida e o futuro do ser humano. Portanto, se o pecado não existisse (como apregoam
alguns) ficaria destituído todo o anúncio da revelação. Assim, negar a condição pecadora da humanidade e
de todos os membros que a compõem é se rebelar inteiramente contra a boa notícia dos evangelhos.
O único meio de conhecer um pouco mais sobre a natureza do pecado é por meio da revelação que as
Escrituras trazem sobre o pecado. A Palavra de Deus, a que nada é comparável, deu a conhecer a índole
deste ato. Conseqüentemente, iremos confrontar os termos bíblicos utilizados com as expressões usadas
pela tradição cristã.

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1 SURGIMENTO DO PECADO
Os seres humanos não estão acostumados a lidar com assuntos que lhe fogem da razão. E um desses
assuntos está relacionado com a presença e a origem do pecado. A Bíblia, que é a palavra final em questão
doutrinária e espiritual, nos informa que o pecado não ocorreu na terra e sim no céu. O céu foi manchado
antes de a terra ter sido maculada pela sua odiosa presença. Portanto, para que possamos compreender
melhor a realidade e a natureza do pecado, iniciaremos nossa pesquisa trazendo seu começo no Universo,
e depois seu começo na terra.

1.1 ORIGEM DO PECADO NO UNIVERSO


A existência do pecado é um fato inegável. Ainda que alguns filósofos hindus se refiram ao pecado como
“maya” ou ilusão, e os Cientistas Cristãos o chamem de “erro da mente mortal”, o fato é que o pecado existe.
Todos os homens são pecadores. Não é necessário ensinar o homem a pecar, faz parte de sua natureza desde
os primeiros dias de vida. Ninguém pode examinar sua natureza, nem observar a conduta de seus semelhantes,
sem se ver dominado pela convicção de que existe um mal chamado pecado. Sua presença no mundo é um
dos problemas mais desconcertantes para a filosofia e para a teologia. Desde longas datas, filósofos, teólogos
e cientistas têm debatido sobre a origem do pecado. Os filósofos de todos os tempos e de todas as escolas se
viram compelidos a discutir este tema. As teorias filosóficas, no que diz respeito à natureza do pecado, são tão
numerosas quanto as diferentes escolas de filosofia. Muitos, inclusive teólogos, recorrem à razão, ou melhor,
à especulação, para definir o que é o pecado, porém, a conclusão lógica e evidente não poderia ser outra: este
problema está além da capacidade humana.
Para piorar ainda mais a situação, alguns chegam a imputar a Deus a origem desse mal. Assim, como
teólogos, todos os estudantes das Escrituras devem averiguar se tal fato tem fundamento ou se não passa de um
conhecimento especulativo, meramente racional. Partindo desse pressuposto, as Escrituras, palavra final em
questão doutrinária, é explícita sobre o que diz a respeito de que tudo quanto Deus criou é motivo de adoração,
tanto nos céus quanto na terra. Os vinte e quatro anciãos se prostraram diante daquele que se encontra assentado
no trono e o louvaram, dizendo: “Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a honra e o poder, porque
todas as coisas tu criaste, sim, por causa da tua vontade vieram a existir e foram criadas” (Ap 4.11).
Num primeiro momento, poderíamos pensar que foi Deus quem criou o pecado, porém, as Escrituras excluem
inteiramente tal concepção, quando observadas em seu conjunto, texto e contexto. Por vários motivos, fica
desqualificada essa acusação, porque Deus não poderia pecar, jamais, pois Ele é santo: “... longe de Deus o
praticar ele a perversidade, e do Todo-Poderoso o cometer injustiça” (Jó 34.10). Não há injustiça em Deus:
“Suas obras são perfeitas, porque todos os seus caminhos são juízo; Deus é fidelidade e não há nele injustiça; é
justo e reto” (Dt 32.4). Deus não pode ser tentado pelo mal e muito menos tenta qualquer homem: “Ninguém,
ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém
tenta” (Tg 1.13). O Senhor Deus odeia o pecado: “Porque é abominação ao Senhor, teu Deus, todo aquele que
pratica tal injustiça” (Dt 25.16). Diante dos fatos, não há argumento. Considerar Deus autor do pecado seria uma
blasfêmia. Os homens podem até acusar Deus e dizer que o pecado foi culpa dele, mas isso não elimina a raiz
do problema.

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Antes de falarmos a respeito de um anjo que desejou ser igual a Deus, precisamos considerar a lei de Deus,
para que possamos compreender a transgressão (o pecado) cometida contra ela. Também precisamos saber a
respeito da natureza do pecado, porque, somente assim, compreenderemos sua origem no Universo. Charles
Hodge, ao analisar o pecado com a lei, chegou à conclusão que o termo lei “significa aquilo que nos obriga, um
mandamento de alguém com base na autoridade. Como regra, prescreve a consciência dos homens, e também
prescreve o que se deve e o que não se deve fazer [...]. A lei é aquilo que obriga a consciência”.1
Como afirmamos, baseado nas Escrituras, o pecado teve início no céu. Deus criou suas criaturas com a
liberdade de escolha, tanto as que estão nos céus quanto as que estão na terra. A grande pergunta é: “Qual é a lei
espiritual que abrange todas as criaturas facultando a liberdade de escolha?”. Várias são as linhas de pensamento
com relação a esta pergunta. Alguns dizem ser a razão. Para outros, a lei deve ser encontrada na ordem moral do
Universo. Outros, ainda, dizem que a única lei à qual as criaturas racionais se acham sujeitas é uma consideração
ilustrada pela felicidade do Universo. O que essas teorias deixam evidente é que todas negam o caráter específico
da obrigação moral. A mais convincente resposta está fundamentada na constituição da natureza do homem, ou
seja, a lei natural, inerente ao homem, que reconhece e aceita a suprema Autoridade, um ser racional e moral,
um Espírito infinito, eterno e imutável em seu caráter e perfeições. Todos os homens, em todas as eras e partes
do mundo, sob todas as formas de religião e de todos os graus de cultura, têm sentido e reconhecido que estão
sujeitos a um ser pessoal superior a eles próprios. Nenhuma forma de filosofia especulativa, por mais plausível ou
difundida que fosse, ou defendida confiadamente nas escolas, ou tomada privativamente, jamais pôde invalidar
este juízo instintivo e intuitivo da mente.
Por meio da lei natural, todas as criaturas racionais de Deus são livres para escolherem o que querem, tanto
as que estão nos céus quanto as que se encontram na terra. Foi por meio desta liberdade de escolha que o pecado
surgiu. Deus criou primeiramente as hostes celestiais. As Escrituras nos informam que quando Deus colocou os
fundamentos da terra, fundou suas bases e lhe assentou a pedra angular: “As estrelas da alva, juntas, alegremente
cantavam, e rejubilavam todos os filhos de Deus” (Jó 37.7). A conclusão a que chegamos é que eles existiam
antes da terra ser formada, ou mais especificamente, ser habitada pelo homem.
Para que o pecado seja pecado, é necessário haver uma culpa ligada a ele. E mais: que seja um ato voluntário,
criador de um risco juridicamente proibido, ou seja, algo em que se possa optar por certo e errado, fazer ou não
fazer. Foi num ambiente perfeito, santo, lugar da morada do Altíssimo, que o pecado surgiu. Um de seus querubins
ungidos, “o sinete da perfeição, cheio de sabedoria e formosura. Estavas no Éden, jardim de Deus; de todas as
pedras preciosas te cobrias: o sárdio, o topázio, o diamante, o berilo, o ônix, o jaspe, a safira, o carbúnculo e a
esmeralda; de ouro se te fizeram os engastes e os ornamentos; no dia em que foste criado, foram eles preparados.
Tu eras querubim da guarda ungido, e te estabeleci; permanecias no monte santo de Deus, no brilho das pedras
andavas. Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado até que se achou iniqüidade em ti. Na
multiplicação do teu comércio, se encheu o teu interior de violência, e pecaste; pelo que te lançarei, profanado,
fora do monte de Deus e te farei perecer, ó querubim da guarda, em meio ao brilho das pedras. Elevou-se o teu
coração por causa da tua formosura, corrompeste a tua sabedoria por causa do teu resplendor; lancei-te por terra,
diante dos reis te pus, para que te contemplem” (Ez 28.12-17).
Outro profeta complementa a revelação de Deus, expondo os motivos que levaram esse ser exaltado a cometer
tal aspiração:
“Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filho da alva! Como foste lançado por terra, tu que debilitavas
as nações! Tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono e no
monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei acima das mais altas nuvens e serei
semelhante ao Altíssimo” (Is 14.12-14).
A causa da queda desse ser é um dos profundos mistérios da teologia. Tudo indica que ele tinha originalmente
o que os latinos chamam de posse pecare et posse non pecare, o que significa: “a capacidade de pecar e a

1
HODGE, Charles. Teologia Sistemática. São Paulo: Hagnos, 2001, p. 620.

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capacidade de não pecar”. Ou seja, sua vontade era autônoma. Por cinco vezes, Lúcifer manifesta sua vontade,
como está registrada nas palavras acima. O primeiro pecado foi de rebelião contra Deus e total independência
dele. Vejamos:
“Eu subirei ao céu”. É uma referência ao lugar de habitação de Deus.
“Acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono”. Uma referência aos exércitos de anjos.
“No monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte”. A Bíblia usa a simbologia em algumas
de suas expressões. No simbolismo bíblico, uma montanha significa um reino, portanto, com essas palavras é
manifesto o desejo dessa criatura de possuir um reino terreno.
“Subirei acima das mais altas nuvens”. Muitas vezes, Deus manifestou sua glória em meio às nuvens:
“Quando Arão falava a toda a congregação dos filhos de Israel, olharam para o deserto, e eis que a glória do
Senhor apareceu na nuvem” (Êx 16.10). A glória nas Escrituras é, muitas vezes, simbolizada por nuvens. E
Lúcifer desejou possuir essa glória.
“Semelhante ao Altíssimo”. Esse foi o ponto culminante dos quatros desejo de Lúcifer. Todas essas declarações
expressam independência e oposição a Deus, uma ambição deliberada contra o Senhor.
A conclusão a que chegamos é que a queda desse ser se deu devido à sua revolta deliberada e autodeterminada
contra Deus. Foi sua escolha livre e seus interesses que o levaram a sair da posição para a qual fora criado.
Segundo as Escrituras, os resultados dessa queda foram diversos. Vejamos:

1. Satanás e mais um terço dos anjos perderam sua posição de destaque nos céus (Ap 12.9).
2. Todos eles perderam sua santidade original e se tornaram corruptos em natureza (Mt 10.2; Ef 6.11,12;
Ap 12.9).
3. Alguns foram lançados no Tártaro e estão acorrentados até o dia de hoje, sendo reservados para o dia
do juízo (Ap 9.11).
4. Alguns permanecem em liberdade e fazem verdadeira oposição à obra dos anjos bons (Ap 12.7-9; Dn
10.12,13,20,21; Jd 9).

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 1
1. Segundo a Bíblia, em que lugar teve início o pecado?
2. Como os cientistas cristãos definem o pecado?
3. Qual é o significado que Charles Hodge dá ao termo lei?
4. Quais são os resultados da queda registrados nas Escrituras?

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ORIGEM DO PECADO
2 NA RAÇA HUMANA
Os primeiros capítulos de Gênesis são os mais ricos em informação sobre a origem do pecado na terra e,
conseqüentemente, da raça humana. Há séculos, Gênesis sempre provocou acalorados debates.
Os seres humanos ocupam um lugar singular entre as criaturas. Só eles são feitos à “imagem e semelhança”
de Deus. “Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele
domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre
todos os répteis que rastejam pela terra. Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou;
homem e mulher os criou” (Gn 1.26,27).
Ao homem foi ordenado “dominar e subjugar” a terra.
Depois de criar os céus, a terra e a raça humana, Deus descansou (Gn 2.1).
“O Criador terminou sua tarefa: terra, seres humanos e vida vegetal e animal são todos bons, apropriados
para suas funções. Os seres humanos expressam a imagem de Deus ao se relacionar com o Criador e dominar os
animais e a terra de acordo com o mandamento do Senhor. Impecável no projeto, perfeita no propósito, a criação
reflete a genialidade e a unidade do Criador”. 2
De forma especial, havia um relacionamento entre Deus e a raça humana recém-criada. O Criador auto-existente,
auto-suficiente, transcendente e, ao mesmo tempo, presente e envolvido, pessoalmente cria o primeiro homem (Gn
2.4-7). A vida do homem procede de Deus e não de um ajuntamento aleatório de células e tecidos. Quando Adão
recebeu o fôlego da vida, tudo já estava preparado para sustentá-lo, em conformidade com Gênesis 1.3-26.
Havia, nesta terra, um jardim no qual o homem fora colocado para cultivar e guardar (Gn 2.15,19,20). Em
sua ocupação, o homem recebe de Deus liberdade total, apenas com uma restrição: não comer “da árvore do
conhecimento do bem e do mal; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (Gn 2.17). Fica
claro, então, que o favor divino não é incondicional, no sentido de que Adão poderia fazer o que bem entendesse
e continuasse desfrutando das bênçãos divinas. Pelo contrário, ele deveria observar a ordem divina para que
continuasse da maneira como fora criado. Para cumprir a ordem divina, ele deveria confiar na palavra de Deus e
acreditar em sua advertência.
Adão estava só. E viu Deus que isso não era bom. Então, o Senhor fez cair um pesado sono sobre o homem,
de modo que ele adormeceu e, de uma de suas costelas, fez o Senhor Deus a mulher (Gn 2.18,21,22). Com este
ato, Deus completa a raça humana. Ou seja, ao formar a mulher a partir do corpo do homem.
Tudo vai muito bem até o final do capitulo 2 de Gênesis. Deus havia criado um mundo ideal para a raça
humana, com um único mandamento proibitivo de não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal.
Os acontecimentos seguintes acabam com esta tranqüilidade. É-nos dito que “a serpente, mais sagaz que
todos os animais selváticos que o Senhor Deus tinha feito, disse à mulher: É assim que Deus disse: Não comereis
de toda árvore do jardim? Respondeu-lhe a mulher: Do fruto das árvores do jardim podemos comer, mas do fruto
da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Dele não comereis, nem tocareis nele, para que não morrais.
Então, a serpente disse à mulher: É certo que não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes
se vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do bem e do mal” (Gn 3.1-5).
A serpente, astuta, maliciosa, inicia sua conversa com a mulher, por meio de um questionamento bem
dissimulado acerca do único e simples mandamento dado por Deus. Em seguida, ela passa a negar as conseqüências
da ordem divina, fundamentando seu ataque ao caráter de Deus.

2
HOUSE, Paul R. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida, 2005, p.79.

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Depois de apreciar os argumentos da serpente, a mulher come do fruto que não poderia comer e aí faz que o
marido coma também (Gn 3.6). Essa quebra do mandamento dá início à mais drástica conseqüência para todos que
pertencem à raça humana: surge o pecado. Tudo começou com a falta de confiança em Deus. Adão e Eva ignoraram
a revelação da verdade e, por conta disso, todos os envolvidos recebem, como conseqüência, o juízo de Deus.
A serpente foi condenada a comer do pó da terra até que seja esmagada (Gn 3.14,15). Alguns têm dito, com
assertiva consideração, que aqui foi estabelecido um proto-evangelho. Ou seja, a primeira declaração das boas-
novas, pois Deus garante que o mal não dominará para sempre.
A mulher recebe dois castigos por suas ações: um físico e outro relacional. Dores acompanharão o parto (Gn
3.16) e “teu desejo será para o teu marido, e ele te governará” (Gn 3.16).
Para Adão foi-lhe dito que em fadiga obteria seu sustento enquanto vivesse.
Mesmo em face da desobediência, Deus age com misericórdia, aparando o casal caído (Gn 3.21), porém,
retira o casal do jardim, a fim de que não comam da árvore da vida (Gn 3.22-24). Daqui para frente, o pecado se
espalha rapidamente entre os filhos do primeiro casal.
Deus fizera o homem perfeito, à sua imagem e semelhança, e o colocara num ambiente perfeito, suprindo
cada uma de suas necessidades. Também lhe proporcionou uma companheira. Ambos possuíam livre-arbítrio,
porém, era necessário que sua liberdade de escolha fosse testada, a fim de que ficasse demonstrado que os dois
não serviam a Deus por interesse e, dessa forma, fosse evidenciada sua retidão de caráter. Diante de um único
mandamento, o homem poderia ter resistido à tentação, mas, infelizmente, preferiu o contrário.
O prejuízo que Adão e Eva tiveram em sua rebelião contra Deus foi a perda da imago Dei que desfrutavam.
Essa imagem se constituía de três aspectos: 1) a imagem natural, que lhes conferia a imortalidade, o livre-
arbítrio e os sentimentos; 2) a imagem política, que lhes atribuía autoridade para governar o reino natural;
e, o mais importante: 3) a imagem moral, que lhes impregnava de justiça e santidade verdadeira, que os
faziam semelhantes ao Criador em amor, pureza e integridade. Esse terceiro aspecto também lhes transmitiu
a capacidade intelectual.
A queda, porém, afetou os três aspectos e a conseqüência disso foi que os dois perderam a imago Dei. Todos
os aspectos da natureza humana foram contaminados pelo pecado. O amor e o conhecimento de Deus foram
substituídos pela a alienação e pela falta de desejo de conhecê-lo. A liberdade de escolha se rebelou contra a
vontade divina em desobediência deliberada. O intelecto se tornou obscuro e insensível.

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 2
1. Porque os seres humanos tem lugar singular entre as criaturas de Deus?
2. Qual foi o único mandamento de Deus ao primeiro casal?
3. Qual foi o prejuízo que Adão e Eva tiveram devido à sua rebelião contra Deus?

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EVOLUÇÃO DO CONCEITO
3 DE PECADO
O pecado sempre esteve presente na história da humanidade. Devido ao caráter salvífico de todas as religiões,
ignorar o pecado seria esvaziá-las do cerne de sua mensagem. Isso, no entanto, não significa que o pecado seja
a essência do cristianismo (que não é) ou de qualquer outra religião. Na verdade, o pecado não passa de uma
sombra. Mas sem o ressalto dessa sombra não seria possível perceber onde se encontra a verdadeira luz, como
anunciou o apóstolo: “A mensagem que, da parte dele, temos ouvido e vos anunciamos é esta: que Deus é luz, e
não há nele treva nenhuma” (1Jo 1.5).
Tal como aconteceu com outros fenômenos, o pecado também dominou as sociedades e as teologias no
passado. Hoje, o que se percebe é que sua imagem sofreu uma mudança profunda em nossa sociedade. A palavra
“pecado” está desaparecendo do vocabulário da maioria das pessoas. Atualmente, fala-se em tabu, mancha,
desordem, transgressão.
Nas sociedades primitivas, o pecado aparece como transgressão às regras da comunidade. Nas sociedades
politeístas, aparece como infração à ordem do mundo estabelecida pelos deuses, podendo provocar a ira de
tais divindades. Tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, encontramos ricos subsídios para percebermos o
mistério do pecado em toda a sua profundidade e amplitude. É assim que surgem nas Escrituras as concepções
de pecado como ruptura da aliança, como falta de vigilância e de oposição ao reino, como um mal que se vai
apoderando de todo o ser e de todos os seres.

3.1 PALAVRAS REVELADORAS


Na Bíblia, não encontramos um tratado sistemático sobre a doutrina do pecado. As Escrituras foram escritas
em épocas diferentes, por pessoas diferentes. Entretanto, todas inspiradas pelo Espírito de Deus. Sendo assim,
faz-se necessário recolher os dados espalhados em seus vários escritos produzidos em épocas diferentes, em
contextos diferentes e em gêneros literários diferentes. Isso, de forma alguma, altera o teor da revelação. Todavia,
partimos do pressuposto de que as Escrituras foram sendo outorgadas de forma progressiva. Assim sendo, não é
de se admirar que, nos textos mais antigos, encontram-se vestígios de uma concepção arcaica do pecado.
O vocabulário na Bíblia para pecado, assim como para qualquer outra realidade humana mais profunda, é
muito rico e variado. No Antigo Testamento, existem quatro palavras mais freqüentes e mais significativas que
indicam diferentes níveis de profundidade e, até mesmo, tonalidades diferentes com relação ao pecado.
A primeira é ajx – chata, usada nos escritos mais antigos, significando “falhar”, “errar o alvo”, e
ocorre 198 vezes.
A segunda, nwe – avon, que quer dizer: “iniqüidade”, e ocorre 231 vezes.
A terceira, evr – rasha, ou seja, “perverso”, e ocorre 250 vezes.
A quarta, evp – pesha. Embora seja a menos usada, traduz uma concepção mais profunda e completa,
significando “transgressão”. Esse termo, ainda que aplicado no mundo das relações entre as pessoas e os povos,
sua utilização possui, principalmente, conteúdo religioso. É um ir além, fazendo mais do que mandado. É ultrapassar
os limites que correspondem a cada qual. É não respeitar o direito dos outros, como uma espécie de violação que se
apodera daquilo que não lhe pertence. E mais: tem o mesmo sentido de prevaricação. Ou seja, avançar alargando o passo
mais do que é permitido, invadir a propriedade de outro (que se empregava na terminologia agrícola).
O Novo Testamento emprega cinco palavras gregas principais para o pecado que, juntas, retratam o seu
aspecto variado, tanto passivo quanto ativo. A mais comum dessas palavras é a9marti/a, (gr. hamartia), que

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descreve o pecado como um ato de não atingir o alvo, ou fracasso em alcançar um objetivo. A outra é a0diki/a (gr.
adikia), que significa “injustiça”, ou seja, uma profunda violação da lei e da justiça. Poneria, por sua vez, é o mal
de um tipo vicioso ou degenerado.
Os dois termos, amartia e adikia, parecem falar de uma corrupção ou perversão de caráter. As palavras mais
freqüentes são para/basiv (gr. parabasis), com a qual podemos associar para/ptwma (gr. paraptoma), uma
significando “transgressão”, ou seja, ir além do limite estabelecido, e a)nomi/a (gr. anomia), “falta de lei”, desprezo
e violação da lei, iniqüidade, maldade.
Como se pode averiguar, trata-se de um conceito que, por causa de sua riqueza, não pode ser expresso com um
único termo. As diferentes denominações que aparecem na Palavra de Deus são um claro indício dos múltiplos
aspectos que o pecado encerra em seu interior

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 3
1. Quais são as palavras que vêm tomando o lugar do termo pecado?
2. Quais são as palavras que o Antigo Testamento usa para pecado?
3. Quais são as palavras que o Novo Testamento usa para pecado?
4. Qual é o significado, no grego, do termo anomia?

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4 EVANGELHOS
Cada evangelho tem caracteristicas peculiares ao relatar a vida e ministério de Jesus. O propósito de Mateus
é demonstrar, sem deixar dúvida, que Jesus é o grande Messias, o Filho de Deus, o verdadeiro Rei prometido por
Deus e esperado, por muitos anos, pela nação judaica.
O evangelho de Mateus é marcado pelo anúncio da boa notícia de que “o reino de Deus está próximo” (4.17
e paralelos). Por conta disso, não é outra a tônica (ou ênfase) das bem-aventuranças (Mt 5; Lc 4.17) e, também,
dos discursos sobre missão (Mt 10), dos fins dos tempos (Mt 24), dos milagres (Mt 4.23; Mc 1.21; Lc 4.15).
Tudo isso despertava, entre o povos, os arquétipos do Messias esperado, com sua retumbante vitória definitiva
sobre as potências do mal.
Mateus conclui que “o povo que jazia em trevas viu grande luz, e aos que viviam na região e sombra da morte
resplandeceu-lhes a luz” (4.16).
Mateus interpretou esses acontecimentos históricos a fim de proclamar o que Deus fizera, por intermédio de
seu Filho Jesus, para redimir o homem de sua condição desamparada como pecador. O evangelista mostra que
Jesus é o Messias, o Cristo, que a nação aguardava com ansiedade. Aquilo que o homem não pode fazer por si,
Deus fez pelo homem, por meio de seu Filho, Jesus Cristo.
Assim como Mateus, Marcos também é explícito a respeito do bjetivo que apresenta: “Princípio do
evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc 1.1). O termo evangelho (eu)agge/lion – euaggelion) significava
“recompensa pela transmissão da boa-nova”.3 É a boa-nova do que Deus fez em Jesus Cristo (vida, morte,
ressurreição e exaltação de Jesus vistas como um ato poderoso de Deus), de acordo com a promessa do Antigo
Testamento, para vencer as forças do mal e salvar o homem de seu pecado, inaugurando, dessa forma, o seu reino
e oferecendo salvação com a chamada ao arrependimento e à fé.
Lucas, por sua vez, é conhecido como o evangelista que mais ressalta a misericórdia para com os pecadores,
ressaltando, desse modo, a salvação. É ele quem mais insiste na boa-nova “para os pecadores”. Sim, no plural,
porque, nesse contexto de Lucas, pecadores são vistos como aqueles que são excluidos pelos doutores da lei.
Jesus se senta à mesa com os publicanos e pecadores (Lc 5.27; 19.1-9; Mc 2.14). Age dessa forma porque
ressalta nos pecadores uma virtude fundante para a colhida da salvação, ou seja, a humildade (Lc 15.7; 18.13).
E, com isso, tansforma-os em verdadeiros destinatários do reino.
Na parábola do publicano, Jesus declara os pecadores justificados (Lc 18.9-14). Nas parábolas da misercicórdia,
chega a compará-los com uma “preciosa moeda”, dignos de serem recebidos com festa, mesmo no céu (Lc 15.1).
Jesus acolhe as prostitutas, permitindo que o toquem e o beijem (Lc 7.36-38; Mcs 2.16). Toma a defesa daquelas
mulheres (Jo 8). Por meio das prostitutas, estabelece um novo critério de perdão ilimitado, “porque muito amou”
(Lc 7.47). Proclama, em alta voz, que “elas precederão a todos no reino” (Mt 21.31).
Num primeiro plano, como representantes dos inimigos do reino e da pessoa de Jesus, não vão figurar os
pagãos, nem os pecadores públicos, mas justamente os grupos religiosos que dizem acreditar em Deus e o
invocam, mas servem de Deus e da religião para negar o Cristo. Tudo porque esses religiossos não viam o
comportamento de Jesus com bons olhos e, por isso, foram por Ele duramente criticados (Mt 11.19; Lc 7.34;
15.1,2; 19.7). Por outro lado, os desprezados, rejeitados e excluídos foram encontrados, porque Jesus “não veio
para os justos, mas para os pecadores (Lc 5.32; Mt 9.13). O próprio Jesus declarou sua missão ao afirmar que
veio “procurar e salvar o que estava perdido” (Lc 15.4). Os benefícios são inúmeros: é como o Pai que acolhe o
filho ingrato (Lc 15.20-24); é o credor que veio perdoar a dívida impagável (Lc 8.41-42); perdoa absolutamente
3
HALE, Broadus David. Introdução ao estudo do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2002, p.77.

CURSO DE TEOLOGIA 57
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

todos os pecados, até mesmo as blasfêmias, exceto o pecado contra o Espírito Santo (Mc 3.28).
Portanto, para Jesus, com o advento do reino, inicia-se uma era radicalmente nova. Todos têm que se redimir diante
dele e da sua proposta. Ninguém é justificado, mas todos podem encontrar a salvação, na medida em que se reconhecerem
pecadores e aderirem à sua proposta. Com tudo isso, fica claro que já não é um código religiosos ou moral que define a
identidade do pecador, mas seu relacionamento com o Deus salvador, em Jesus Cristo. Assim, ninguém é justo, todos são
pecadores e só podem ser justificados pela gratuidade divina, mas mediante a condição de se reconhecerem pecadores.
David Hale diz que “é interressante observar que a palavra ‘salvador’ não aparece em nenhum dos sinópticos,
exceto em Lucas (1.47; 2.11). Da mesma maneira, o substantivo ‘salvação’ e o adjetivo ‘salvo’ são encontrados
somente em Lucas, dos sinópticos”.4
Essa salvação, contudo, é para todas as pessoas.
O autor do quarto evangelho incluiu uma declaração a repeito do motivo que o levou a escrever o seu texto.
Podemos ver isso na seguinte referência: João 20.31, que diz: “Estes, porém, foram registrados para que creiais que
Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome”. João francamente declara que ele
escreveu para mostrar que Jesus é o Cristo (palavra grega para “Messias”), o Filho de Deus. Esse conhecimento produz
a salvação e assegura a pessoa quanto à vida eterna. “É interessante observar que, dos escritores do Novo Testamento,
só João prescreve o termo hebraico ou aramaico Messias (1.41; 4.25), e indica que Cristo traduz esta palavra”.5
Dos quatro evenglhos, o de João é o mais profundo e o mais complexo em sua abordagem sobre o pecado. O
autor usa um jogo de contrastes luz-trevas, verdade-mentira, amor-ódio, vida-morte, liberdade-escravidão. Muito
mais do que um eventual dualismo, ele evidencia o poder das trevas que se manifesta no pecado. Sua maneira
de abordar a questão do pecado é peculiar. Verifica-se uma nítida tendência de falar de pecado (hamartia), no
singular, isso pode ser um indicador de que ele não se procupava tanto com os pecados, no plural. Como o
apóstolo Paulo, ele focaliza sua atenção na raiz comum a todos eles.
Portanto, nos evangelhos, a vida, a paixão e a morte de Jesus aparecem de forma explícita e repetida com esse
caráter de librrtação. É o cumprimento de todos os anúncios feitos anteriormente. Jesus veio nos resgartar da
morte, da lei e do pecado. Entregou sua existência para a remissão dos pecados do mundo e para tornar possível
a nova e definitiva aliança, conforme havia predito o profeta:
“Eis aí vêm dias, diz o Senhor, em que firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá. Não
conforme a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; porquanto
eles anularam a minha aliança, não obstante eu os haver desposado, diz o Senhor. Porque esta é a aliança que firmarei
com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor: Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração
lhas escreverei; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo. Não ensinará jamais cada um ao seu próximo, nem cada
um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao Senhor, porque todos me conhecerão, desde o menor até o maior deles, diz o
Senhor. Pois perdoarei as suas iniqüidades e dos seus pecados jamais me lembrarei (Jr 31.31-34).
A salvação de Jesus, que possibilita a realização do bem, não exclui a liberdade do ser humano de praticar o mal.
Assim, cabe aos seres humanos optarem por Jesus ou rejeitarem sua mensagem e sua pessoa. Uma decisão séria que
afeta, principalmente, o nosso relacionamento com Deus e coloca em jogo o nossso destino eterno. Sendo assim, se o
pecado não existisse, ficaria destruído todo o anúncio da revelação de Deus. Negar, portanto, a condição pecadora da
humanidade e de cada um dos membros que a compõe é uma grande rebeldia contra a boa-nova dos evangelhos.

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 4
1. Qual é o propósito de Mateus ao escrever seu evangelho?
2. O que significa o termo evangelho?
3. Qual é o único evangelho em que aparece a palavra “salvador”?
4. Qual é o jogo de contrastes que João usa em seu evangelho para evidenciar o poder das trevas?

4 Ibid., p. 125.
5 Ibid., p. 162.

58 CURSO DE TEOLOGIA
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

TEOLOGIA PAULINA
5 CONCERNENTE AO PECADO
O apóstolo Paulo, valendo-se de um vocabulário amplo, introduz uma variedade de termos que denotam o pecado
ou os pecados. E faz isso para denotar e descrever vários pecados pessoais, sensuais, sociais, éticos e religiosos.
Em sua eístola aos rmanos, a qual Lutero,ao comentá-la, no prefácio diz: “Esta epistola é o livro principal do Nvo
Tstamento, o eangelho em sua forma mais pura. Merece não somente ser conhecida pelos cristãos, individualmente,
palavra por palavra, mas ser objeto de sua meditação dia-a-dia, como o pão cotidiano da alma”.
Paulo usa dez termos gerais para pecado. Vejamos:
1. Hamartia. Aparece, ao todo, 58 vezes, 43 em Romanos, como o seguinte significado: “errar o alvo”.
2. Hamarteema. Duas vezes, demonstrando o pecado como uma ação.
3. Parabasis. Cinco vezes, significando “transgressão”, ou seja, andar literalmente ao longo de uma linha,
mas não exatamente seguindo essa linha.
4. Paraptoma. Quinze vezes, significando “fracasso”, “falha”, “desvio da verdade e da retidão”.
5. Adikia. Doze vezes, significando “injustiça”.
6. Asebeia. Quatro vezes,significando: “impiedade”, “falta de reverência”.
7. Anomia. Seis vezes, com o significado de “ilegalidade”.
8. Akatharsia. Nove vezes, com o significado de “impureza”, “falta de pureza”.
9. Parokoee. Quatro vezes, significando “desobediência”.
10. Planee. Qatro vezes, como significado de “errar”, “vagar”.6

Paulo fala das “transgressões” (para/basiv – parabasis) cometidas por uma fraqueza (para as quais Deus se
inclina com misericórdia) ou por atos que podem ser um forte sinal de um endurecimento que se constitui num
obstáculo radical à graça (Gl 3.19; Rm 2.23; 4.15; 5.14).
Fala, ainda, do pecado como desobediência (Rm 5.19; 2Co 10.6), como erro voluntário (1Tm 6.10; 2Tm 3.13).
A preocupação do apóstolo Paulo com as obras da carne que excluem do reino é tão grande que ele faz uma
lista: “prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões,
facções, invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já,
outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam” (Gl 5.19-21).
Por várias vezes, ele retorna, especificando-as. Assim, na primeira carta aos coríntios, ele diz que “os injustos
não herdarão o reino de Deus. Não vos enganeis: nem impuros, nem idólatras, nem adúlteros, nem efeminados,
nem sodomitas, nem ladrões, nem avarentos, nem bêbados, nem maldizentes, nem roubadores herdarão o reino
de Deus” (1Co 6.9,10). Alguns cometiam pecados que os tornavam piores do que os pagãos: “Se alguém não tem
cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente” (1Tm 5.8).
Fala sobre incesto: “Geralmente, se ouve que há entre vós imoralidade e imoralidade tal, como nem mesmo entre
os gentios, isto é, haver quem se atreva a possuir a mulher de seu próprio pai” (1Co 5.1). Sobre heresias: “E até
importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós” (1Co 11.19).
Em suas cartas, Paulo busca as raízes mais profundas dos pecados. Para tanto, ele privilegia os termos iniqüidade
(gr. a)marti/a – hamartia) e impiedade (gr. a0se/beia – asebeia). Embora genéricos, esses termos indicam falta
reconhecimento de Deus (falta de reverência a Deus) e recusa de glorificar o Senhor. O apóstolo aponta, também,

6
TORREY, R. A. et al. Os fundamentos: a famosa Coletânea de textos das verdades bíblicas Fundamentais. São Paulo: Hagnos, 2005, p.350.

CURSO DE TEOLOGIA 59
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

para outra atitude geradora de pecado, como, por exemplo, a ganância (ai)sxrokerdh= – aischrokerdê): “raiz de
todos os males” (1Tm 6.10).
Paulo testemunha que o pecado entrou em nossa raça por intermédio da desobediência de Adão: “Portanto,
assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou
a todos os homens, porque todos pecaram [...] Pois assim como, por uma só ofensa, veio o juízo sobre todos
os homens para condenação, assim também, por um só ato de justiça, veio a graça sobre todos os homens para
a justificação que dá vida. Porque, como pela desobediência de um só homem, muitos se tornaram pecadores,
assim também, por meio da obediência de um só, muitos se tornarão justos” (Rm 5.12,18-19).
Ao contrário dos escritos rabínicos, Paulo afirma que o pecado entrou na raça humana por intermédio de Adão
e não de Eva. E mais: coloca o pecado em nível universal ao dizer que quando Adão pecou, “todos pecaram”
(Rm 5.12).

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 5
1. Quais são os pecados listados pelo apóstolo Paulo que impedem as pessoas de participarem do reino?
2. Segundo Paulo, quais são os pecados que tornam os crentes piores do que os pagãos?
3. Paulo busca as raízes mais profundas dos pecados. Para isso, quais os termos que ele privilegia?
4. Cite cinco termos gregos usados pelo apóstolo Paulo em seus escritos.

60 CURSO DE TEOLOGIA
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

OS PRIMEIROS ESCRITOS
6 SOBRE O PECADO
As primeiras gerações de cristãos, por causa da riqueza bíblica e do testemunho escrito de vários apóstolos,
não desenvolveram uma teologia do pecado. Por esse motivo, os primeiros escritos patrísticos apresentam apenas
esboços do pecado.
Clemente de Roma (†102), que “viu os apóstolos e com eles conversou, tendo ouvido diretamente a sua
pregação e ensinamento”, no final do século 1o teve de conter uma rebelião na igreja de Corinto. Ao escrever
para essa igreja, depois de elogiá-la, foi obrigado a denunciar uma atitude pecaminosa, que causaria péssimas
conseqüências. Os crentes da igreja de Corinto estavam se deixando levar pelo ciúme, pela inveja, pela discórdia.
Para Clemente, aqueles irmãos haviam-se afastado do temor de Deus e se tornaram cegos, comportando-se de
uma maneira indigna aos seguidores de Cristo.
Contemporâneo de Clemente de Roma, a Didaquê, uma espécie de catecismo dos primeiros cristãos, adverte
que “há dois caminhos: um da vida e outro da morte. A diferença entre ambos é grande. O caminho da morte é
cheio de ‘maldições’. Entre os muitos exemplos de novas fisionomias de pecadores vão figurar os estranhos à
doçura, os perseguidores dos bons, os assassinos de crianças, os sem compaixão com os pobres, os defensores
dos ricos, os juízes iníquos dos pobres...”. 7
Um fato marcante começou a surgir no meio patrístico: os pecados começaram a ganhar valoração de acordo
com sua gravidade. Vão surgindo acentos diferentes de acordo com o problema enfrentado. A Didaquê julga que
“tentar um profeta que fala pelo espírito” se constitui num pecado imperdoável. Clemente de Roma vai assinalar,
como grande pecado, a desobediência à hierarquia da igreja. Cipriano vai caracterizar, como um dos maiores
pecados, o rompimento da unidade da Igreja. Hipólito de Roma, na sua Tradição Apostólica, além de indicar
os pecados que o apóstolo Paulo havia catalogado como excludente do reino, destaca a idolatria e o exercício
de certas profissões. Tertuliano, por sua vez, depois de apontar sete pecados como sendo os mais graves, entre
os quais constava a apostasia, estabelece uma lista de pecados que, constantemente, é retomada nos primeiros
séculos: idolatria, homicídio e adultério.
Afirma-se que Agostinho de Hipona é o autor da expressão “pecado original”. Segundo alguns estudiosos, ele é o primeiro
e um dos mais importantes teólogos da história a elaborar, de modo sistemático, uma doutrina do pecado original.
O final do século 4o e, sobretudo o século 5o, foi uma época marcada pela apostasia e por muitas heresias,
quando Agostinho se confronta com os donatistas e os pelagianos.
Pelágio foi um moralista exigente que acreditava que, embora a maioria dos homens fosse má, eles eram
capazes de se redimirem, caso se esforçassem nesse sentido. Negou totalmente o pecado original. Para ele, o
pecado consiste não em herdar a natureza de Adão, mas em seguir seu exemplo, ou seja, que o pecado não reside
na natureza, mas, sim, na vontade. Segundo acreditava, o que é transmitido é apenas o mau exemplo que todos
os homens, desgraçadamente, imitam. Portanto, o homem não necessitava de um dom extraordinário da graça
para obter sua salvação. Com isso, Pelágio se coloca frontalmente contra o cerne da doutrina do pecado original
e provoca uma reação contundente da igreja, sobretudo por intermédio de Agostinho.
Pelágio encontrou em Agostinho seu maior opositor. Agostinho escreveu vários tratados contra essa doutrina,
sendo que o mais famosos deles foi De Spiritu et Lietra. O Concílio de Cartago, em 418 d.C., e o de Orange, em
429, além de condenarem as teses de Pelágio, vão, ao mesmo tempo, fixar e dar uma formulação mais precisa à
tradição apostólica referente ao pecado original.
Foi em meio a esses grandes debates teológicos que surgiu a concepção de pecados mais graves, período em que a
7
DIDAQUÊ. Catecismo dos primeiros cristãos. 5ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1986, 1 e 5.

CURSO DE TEOLOGIA 61
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

Igreja Católica irá desenvolver uma lista dos pecados “capitais”, por entender que todos os demais pecados surgem da
gula, da fornicação, da avareza, da tristeza, da ira, da preguiça, da vanglória e do orgulho.
A doutrina dos vícios capitais foi fruto do empenho de organizar a experiência antropológica, cujas origens remontam
a João Cassiano e Gregório Magno, que têm em comum precisamente esse ato de se voltar para a realidade concreta.
Ambos tratam de fazer uma tomografia da alma humana e, no que diz respeito aos vícios, surge a doutrina dos pecados
capitais, que encontra sua máxima profundidade e sua forma acabada no tratamento que confere Tomás.
Os pecados capitais, na enumeração de Tomás, são: vaidade, avareza, inveja, ira, luxúria, gula e acídia. Hoje, em
lugar da vaidade, a Igreja coloca a soberba e, em lugar da acídia, é mais freqüente encontrarmos a preguiça na lista dos
vícios capitais. Isto porque a soberba é considerada, por Tomás, como um pecado, por assim dizer, “megacapital”, fora da
série e, portanto, ele prefere falar em vaidade (inanis gloria, “vanglória”). Já a substituição da acídia pela preguiça parece
realmente um empobrecimento, uma vez que, como veremos, a acídia medieval e os pecados dela derivados propiciam
uma clave extraordinária, precisamente para a compreensão do desespero do homem contemporâneo.
Segundo Tomás de Aquino, este nome, vício capital, provém do termo caput: “cabeça”, “líder”, “chefe” (em italiano,
ainda hoje, há a derivação: capo, capo-máfia). Nesse sentido, os vícios capitais são sete vícios especiais, que gozam de
uma especial “liderança”. O vício é uma restrição à autêntica liberdade, é um condicionamento para agir mal.8
Entre Agostinho e a Reforma Protestante, passou-se um milênio. A escolástica, no que se refere ao pecado original,
dividia-se basicamente em duas escolas: a dos seguidores de Anselmo de Cantuária (1033-1109 d.C.) e a dos que
continuavam a tradição agostiniana, encabeçada por Pedro Lombardo (1095 – 1160). A primeira corrente define o pecado
original como “privação da justiça original”; a segunda, coloca o acento sobre a concupiscência. Combinando as duas
tendências, Tomás de Aquino vai dizer que, materialmente, o pecado original é concupiscência. Formalmente, esse pecado
é privado da justiça original.
A escolástica parecia abordar o pecado original de forma muito superficial para afetar decisivamente a natureza humana.
Suas teses eram que, após o pecado de Adão, as faculdades naturais do ser humano e a sua vontade permaneceram íntegras;
que o ser humano goza de livre-arbítrio; que o ser humano, por forças naturais, pode amar a Deus de todo coração e ao
próximo como a si mesmo; que o ser humano, enquanto depende dele, pode estar seguro de que Deus lhe dará a graça;
que basta a boa intenção para se achegar aos sacramentos.9
Para Lutero, o pecado original é a irresistível tendência para o mal, que todos experimentam, mesmo após o batismo.
Não é a mera transgressão de uma lei, mas uma radical disposição interna para fazer o mal. A condição indispensável para
a justificação é a consciência do pecado. Lutero escreveu um livro, intitulado A escravidão da vontade, em resposta a um
discurso violento de Erasmo, no qual defendia conceitos pelagianos. Lutero acreditava que Erasmo era “um inimigo de
Deus e da religião Cristã”, por causa do ensino que ministrava sobre o pecado original. É bom notar que o Catolicismo
medieval, sob a influência de Aquino, adotara um semipelagianismo, mesmo que na antiguidade houvesse rejeitado o
pelagianismo puro. Neste sistema, acreditava-se que o homem cooperava com a graça de Deus para a salvação.

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 6
1. Ao escrever para a igreja em Corinto, quais foram os pecados denunciados por Clemente de Roma?
2. Qual é a advertência do Didaquê aos cristãos?
3. Qual foi o fato marcante que começou a surgir no meio patrístico?
4. Quem usou primeiro o termo pecado original?
5. Qual é a concepção de Pelágio com relação ao pecado?
6. Quais são os sete pecados capitais?
7. Quais são os pecados capitais na concepção de Tomás de Aquino?
8. Qual é o entendimento de Lutero com relação ao pecado original?
8
AQUINO, Tomás de. Sobre o ensino (De Magistro) e os sete pecados capitais. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
9
MOSER, Antônio. O pecado: do descrédito ao aprofundamento. Rio de Janeiro: Vozes, 1996, p 61.

62 CURSO DE TEOLOGIA
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

CONSEQUÊNCIAS
7 IMEDIATAS DO PECADO
Quem não gostaria de saber o que teria acontecido se os nossos primeiros pais não tivessem desobedecido a
Deus. Entretanto, as Escrituras nada dizem a esse respeito. Sendo assim, faremos bem em evitar investigações
teóricas sobre aquilo que Deus não desejou revelar. Podemos imaginar que as conseqüências da obediência
seriam grandiosas, na direção certa, do mesmo que as conseqüências da desobediência foram negativas, na
direção errada. Partindo da revelação de Deus encontrada nas Escrituras, iremos nos certificar das conseqüências
do pecado sobre a vida de Adão e Eva, sua natureza, seus corpos, seu ambiente e sua posteridade.
O livro de Gênesis é a nossa fonte exclusiva de informação acerca desses acontecimentos, portanto, é lá que
encontraremos os elementos necessários para a nossa investigação.

7.1 AFETOU SEU RELACIONAMENTO


Antes da desobediência, Adão e Deus mantinham perfeita comunhão um com o outro; após a queda, esse
relacionamento foi rompido. A primeira reação do casal, após terem transgredido o mandamento explícito
de Deus de não comerem da árvore do conhecimento (Gn 2.17), foi a culpa. Após terem seus olhos abertos,
Adão e Eva sentiram o peso do aborrecimento de Deus. E não só isso. Sabiam que tinham perdido sua posição
diante de Deus e, conseqüentemente, eram réus do juízo divino. Portanto, ao invés de buscarem sua comunhão
após a desobediência, a primeira reação foi se esconder de Deus. Suas consciências culpadas não lhes davam
tranqüilidade, por isso tentaram se livrar da responsabilidade. Adão buscou se desculpar dizendo a Deus que foi a
“mulher que me deste por esposa, ela me deu da árvore, e eu comi” (Gn 3.12). A mulher, por sua vez, direcionou
a culpa para a serpente (Gn 3.13). Ambos tentaram se livrar da responsabilidade atribuindo a culpa a outrem.

7.2 AFETOU SUA NATUREZA


Ao criar o primeiro ser humano, Deus o fez inocente (ou seja, sem consciência do certo e errado) e santo
(puro). Logo, o homem não possuía uma natureza pecaminosa. Depois da desobediência, um sentimento de culpa
se apoderou de Adão e Eva, que passaram a sentir vergonha, opróbrio, poluição. A poluição (isto é, a corrupção)
é um aspecto que mancha a imagem mais externa e superficial, como se fosse um simples borrão que cai numa
página em branco.
O sentimento de contaminação é bem primitivo e até hoje é utilizado quando se deseja afastar uma criança de
uma ação má e perigosa. O kakos grego, como um oposto ao bom (agathós), está relacionado com a linguagem
infantil do excremento. Quando se quer dissuadir uma criança, para que não pratique uma coisa que não presta,
fazemos referência a este conceito. Tudo o que é mau se reveste de um sentido de sujeira, pois qualquer pessoa
que se aproxime e toque no que é mau se contamina.
E foi justamente o que ocorreu com Adão e Eva. O pecado operou uma mudança interior profunda e qualitativa.
Além de destruir a pureza interior, rompeu, ao mesmo tempo, a comunhão com os outros.

7.3 AFETOU SEUS CORPOS


O pecado afetou os seres humanos no mais profundo de sua personalidade, todo o seu ser foi impregnado, até
as suas entranhas mais íntimas. Deus havia dito que “porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás”
(Gn 2.17). A Bíblia é taxativa ao afirmar que “o salário do pecado é a morte” (Rm 6.23). Entretanto, não se
10
THIESSEN, Henry Clarence. Palestras em teologia sistemática. São Paulo: Imprensa Batista Regular, 2006, p.181.
11
Idem, 2006, p.181.

CURSO DE TEOLOGIA 63
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

refere apenas à morte física, que todos os seres humanos estão sujeito, Neste caso, o sentido de morte é mais
amplo, referindo-se à morte espiritual, física e eterna. Em Adão, todos passaram a experimentar a morte física,
tal como disse o apóstolo Paulo: “E Adão, todos morrem” (1Co 15.22). “O homem foi criado mortal, mas tinha o
privilégio de conseguir a imortalidade por meio da árvore da vida. Mas, or ter comido da árvore do conhecimento
do bem e do mal, perdeu sua liberdade de comer da árvore da vida”.10 Outra conseqüência do pecado foi que o
homem passou a sofrer com as doenças físicas.11

7.4 AFETOU O MEIO AMBIENTE


A sentença definitiva foi que “maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante
os dias de tua vida. Ela produzirá também cardos e abrolhos, e tu comerás a erva do campo. No suor do rosto
comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado; porque tu és pó e ao pó tornarás” (Gn .17-19).
Esse texto deixa claro que a toda a criação sofreu juntamente as conseqüências do pecado de Adão.
Paulo diz que “a criação está sujeita à vaidade, não voluntariamente, mas por causa daquele que a
sujeitou, na esperança de que a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da
glória dos filhos de Deus. Porque sabemos que toda a criação, a um só tempo, geme e suporta angústias até
agora” (Rm 8.20-22).
Provavelmente, no milênio esta maldição será retirada, conforme predisseram os profetas, de modo que as
feras selvagens se deitarão com os dóceis animais domésticos (Is 11.6-9; 65.25; Os 2.18).

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 7
1. Quais foram as quatro conseqüências imediatas do pecado?
2. Como o pecado afetou o relacionamento com Deus?
3. Como o pecado afetou a natureza do homem?
4. Como o pecado afetou seus corpos?
5. Como o pecado afetou o meio ambiente?

64 CURSO DE TEOLOGIA
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

A UNIVERSALIDADE
8 DO PECADO
A natureza e extensão do mal transmitido à raça humana, bem como a base ou a razão pelas quais os
descendentes de Adão foram envolvidos nas conseqüências negativas de sua transgressão, sempre formam
matéria de divergência e discussão. Entretanto, é fato que o pecado de Adão afetou não somente a ele, mas
também a todos os seus descendentes. Logo, todos os seres humanos são pecadores; todos são depravados,
culpados e condenáveis.
De acordo com a Bíblia, o pecado não é uma qualidade ou condição da alma que se revelou apenas em
indivíduos excepcionais, como, por exemplo, os ofensores notórios, ou em circunstâncias excepcionais, como,
por exemplo, nas primeiras eras da existência humana na terra, entre as raças semidesenvolvidas, ou em terras
onde as artes e as ciências são desconhecidas, ou em comunidades civilizadas, onde o ambiente local é prejudicial
à moralidade.
O pecado é uma característica peculiar da raça humana, é algo que se nasce com ele, existe em cada criança
nascida de mulher, e não meramente em tempos isolados, mas em todos os tempos, em cada estágio da vida,
embora nem sempre se manifestando na mesma forma.
As Escrituras dão testemunho da pecaminosidade de toda a humanidade. O Antigo Testamento afirma: “Porque
à tua vista não há justo nenhum vivente” (Sl 143.2). “Quem pode dizer: Purifiquei o meu coração, limpo estou
do meu pecado?” (Pv 20.9). Já no Novo Testamento, Paulo é enfático ao declarar que todo homem é pecador e
culpado e que a transgressão dos nossos primeiros pais constituiu pecadora a sua posteridade. Segundo Paulo,
“pela desobediência de um só homem, muitos se tornaram pecadores” (Rm 5.19), de modo que o pecado de Adão
é imputado à toda raça humana, logo “todos morrem em Adão” (1Co 15.22).
Na epístola aos romanos, o apóstolo argúi que tanto os gentios quanto os judeus se encontram “destituídos
da glória de Deus”, por haverem, todos, se rebelado contra o Senhor, tornando-se igualmente culpáveis diante
de Deus (Rm 3.23). Os primeiros, por se entregarem às mais vis abominações; os segundos, por imitarem os
primeiros.
A conclusão a que chegamos é que “o homem é primária e essencialmente um pecador, não devido ao que
faz, mas em razão do que é”.12 No catecismo maior de Westminster, lemos: “Caiu todo o gênero humano na
primeira transgressão? O pacto, sendo feito em Adão, como representante, não para si somente, mas para toda a
sua posteridade, todo o gênero humano, descendendo dele por geração ordinária, pecou nele e caiu com ele na
primeira transgressão”.
Como Deus pode considerar cada homem responsável por uma natureza depravada, por causa de um pecado
que o próprio homem cometeu, será discutido ao tratarmos da imputação do pecado.

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 7
1. De que maneira o Antigo Testamento testemunha sobre a pecaminosidade da raça humana?
2. Qual é a conseqüência do pecado imputado a Adão que reflete nos seres humanos?
3. O que o Catecismo Maior de Westminster declara sobre a pecaminosidade do homem?

12
TORREY, R. A. et al. Os fundamentos: a famosa coletânea de textos das verdades bíblicas fundamentais. São Paulo: Hagnos, 2005, p. 363.

CURSO DE TEOLOGIA 65
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

TEORIA DA
9 IMPUTAÇÃO
A Sagrada Escritura, em nenhum momento, busca legitimar a realidade do pecado. É pressuposto fundamental
que o pecado é um fato que não pode ser contrariado, nem negado. Entretanto, alguns, por intermédio da falsa
filosofia e da ciência materialista, recusam admitir sua existência. Como conseqüência direta dessa negação,
muitas teorias têm surgido, parte das quais deve ser considerada como apenas tentativas de se esquivar do
problema negando os fatos que as Escrituras põem diante de nós. Entre as tentativas de explicar as afirmações
das Escrituras, passamos a analisar algumas teorias que mais parecem merecer atenção.
Antes de mais nada, definiremos o que significa imputação: “atribuir ou computar alguma coisa a alguém”. No
sentido teológico e jurídico do termo, imputar “quer significar o ato pelo qual se declara que alguém, como autor ou
causador de uma ação, como efeito, de que é causa, deve responder pelas conseqüências da mesma ação”.13
Imputar pecado, no sentido bíblico e teológico, é imputar a culpa do pecado como obrigação judicial de
satisfazer a justiça.

9.1 TEORIA PELAGIANA OU TEORIA DA INOCÊNCIA NATURAL DO HOMEM


Pelágio foi um monge inglês que, em 409, apregoou em Roma seu sistema doutrinário. Ele dizia basicamente
que toda alma é criada imediatamente por Deus, e inocente, livre das tendências depravadas, e perfeitamente capaz
de obedecer a Deus, como Adão o foi na criação. O único efeito do pecado de Adão sobre seus descendentes é o
mau exemplo; de modo algum o pecado corrompeu a natureza humana, a única corrupção da natureza humana
é o habito de pecar que cada indivíduo contrai mediante a persistente transgressão da lei conhecida. Portanto, o
pecado de Adão teria atingido somente sua pessoa e não os seus descendentes.
Pelágio encontrou em Agostinho de Hipona seu maior opositor. Agostinho defendia que o pecado original de
Adão foi herdado por toda a humanidade e que, mesmo que o homem caído retenha a habilidade para escolher,
ele está escravizado ao pecado e não pode não pecar. Por outro lado, Pelágio insistia em que a queda de Adão
afetara apenas o próprio Adão, e que Deus exigia das pessoas apenas que vivessem de modo perfeito, tal como
foram criadas.
Agostinho obteve sucesso refutando Pelágio, mas o pelagianismo não morreu. Depois de ser condenado pelo
Concílio de Cartago, em 418, várias formas do pelagianismo surgiram, periodicamente, através dos séculos. Um
dos grandes debates durante a Reforma Protestante versou sobre a natureza e a extensão do pecado original. O
questionamento entre os estudiosos era: O pecado afetou Adão somente, ou todo o gênero humano? A vontade
do homem decaído é ainda livre ou escravizada ao pecado? Lutero escreveu um livro intitulado A escravidão da
vontade em resposta a um discurso injurioso de Erasmo, no qual defendia conceitos pelagianos. Lutero acreditava
que Erasmo era “um inimigo de Deus e da religião Cristã” por causa do ensino que ministrava sobre o pecado
original. No século 18, surgiu uma forma nova e levemente modificada do pelagianismo. Estamos nos referindo
ao arminianismo. Iremos falar a respeito a seguir.

13
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 24ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

66 CURSO DE TEOLOGIA
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

9.2 TEORIA ARMINIANA OU TEORIA DA DEPRAVAÇÃO VOLUNTARIA-


MENTE APROPRIADA

Jakobus Arminius (1560 – 1609), catedrático da Universidade de Leyden, Sul da Holanda, embora aceitasse
a doutrina da unidade adâmica da raça, apresentada tanto por Lutero como por Calvino, interpretava-a de
forma diferente, que veio a ser conhecida como semipelagianismo. Segundo Armínio, como conseqüência da
transgressão de Adão, todos os homens se acham naturalmente destituídos da retidão original. Assim, toda a
humanidade é incapaz, sem a ajuda divina, de obedecer perfeitamente a Deus ou de alcançar a vida eterna.
Strong nos diz que “esta incapacidade é física e intelectual, mas não voluntária. Por isso, em se tratando de
justiça, Deus confere a cada indivíduo, desde o raiar da sua consciência, uma influência especial do Espírito
Santo, suficiente para neutralizar o efeito da depravação herdada e tornar possível a obediência, provendo a
vontade humana de cooperação, que ainda pode praticá-la”.14
Para Armínio, a tendência do homem para o mal pode ser chamada de pecado, mas não envolve culpa ou
castigo. Logo, a humanidade não é culpada pelo pecado de Adão. Somente quando o homem consciente e
voluntariamente faz uso dessas tendências más é que Deus lhe imputa como pecador.
Interpretando o texto de Romanos 5.12, que diz: “A morte passou a todos os homens, porque todos pecaram”,
esta teoria defende que a morte física e espiritual incidiu sobre todos os homens não como castigo do pecado de
Adão, mas porque todos pessoalmente consentem em sua pecaminosidade por meio dos atos de transgressão.

9.3 TEORIA FEDERAL OU TEORIA DA CONDENAÇÃO POR PACTO


Esta teoria também foi chamada de “teoria da imputação imediata”, tendo Charles Hodge como seu principal
representante. Segundo esta teoria, Adão foi eleito, por indicação soberana de Deus, o representante de toda a
raça humana, pelo fato de Deus ter firmado um pacto com Adão. Pelos termos dessa aliança, Deus prometeu
conceder vida eterna a Adão e à sua posteridade se ele, por ser “o cabeça” representativo, obedecesse a Deus; do
contrário, como castigo à desobediência, a corrupção e a morte de toda a sua posteridade.
Como conseqüência do pecado de Adão, Deus considera todos os seus descendentes pecadores e os condena
por causa da transgressão da Adão. Como cumprimento dessa sentença de condenação, Deus cria imediatamente
cada alma da posteridade de Adão com uma natureza corrupta “que infalivelmente conduz ao pecado, e ela
mesmo é pecado”,15 por isso denominada de teoria imediata do pecado. Assim os defensores dessa teoria afirmam
que a corrupção da sua natureza não é a imputação do pecado de Adão, mas, sim, o seu efeito.
As Escrituras declaram que a ofensa de Adão nos tornou pecadores (Rm 5.19). Portanto, não somos pecadores
porque Deus nos trata dessa forma, mas, sim, porque somos pecadores na essência.

9.4 TEORIA AGOSTINIANA


Embora receba o nome de Agostinho (350-430), são encontrados vestígios nos escritos de Tertuliano, Hilário
e Ambrósio. Com exceção de Zwínglio, todos os demais reformadores defendiam esta teoria, que sustenta que
Deus, em virtude da unidade orgânica da raça em Adão, passou o pecado a toda a sua posteridade. Assim, o
pecado de Adão foi atribuído a todos como algo inerente ao ser, possuidor de uma natureza destituída de amor a
Deus e propensa ao mal.
De todas as teorias apresentadas aqui, esta é a mais satisfatória, porque explica a responsabilidade de todos
como conseqüência da natureza pecaminosa. É a que melhor se adapta às conclusões cientificas e filosóficas
modernas, que dizem que as tendências más são herdadas, que a raça humana veio de um mesmo tronco. E,
principalmente, por estar em concordância com as Escrituras ao afirmar que o pecado de Adão é a causa e o
fundamento da depravação, da culpa e da condenação de toda a raça humana.

14
STRONG, Augustus Hopkins. Teologia sistemática. São Paulo: Hagnos, Vol. 2, 2003, p. 215.
15
Ibid., p. 231.

CURSO DE TEOLOGIA 67
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 9

1. Por que a Sagrada Escritura, em nenhum momento, busca legitimar a realidade do pecado?
2. No sentido teológico e jurídico, o que significa o termo imputar?
3. O que diz a teoria de Pelágio com relação à imputação?
4. E a teoria de Armínio, o que diz sobre a imputação?
5. O que diz a teoria federal a respeito do mesmo assunto?
6. E a teoria agostiniana, o que tem a dizer?

68 CURSO DE TEOLOGIA
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

10 REMOÇÃO DO PECADO
O perdão do pecado é o cerne das boas-novas. Desde o Gênesis até o Apocalipse, o Deus dos céus anuncia seu
plano redentor. Deus é santo e justo, misericordioso e gracioso (Êx 34.6), e a Bíblia anuncia que Ele fez plena
provisão para harmonizar as reivindicações de clemência e justiça em seu próprio caráter ao enviar ao mundo seu
único Filho gerado, sobre quem lançou a iniqüidade de todos nós, conforme predissera o profeta: “O Senhor fez
cair sobre ele a iniqüidade de nós todos” (Is 53.6). E, como Cordeiro de Deus, Jesus, uma vez por todas, veio tirar
o pecado do mundo (Jo 1.29). Assim, toda a obra necessária para reconciliar os homens pecadores foi realizada
pela morte e ressurreição de Cristo e, desse modo, o mundo foi reconciliado com Deus (2Co 5.19). Por meio de
Jesus Cristo, podemos subjugar não apenas o pecado, mas, também, os efeitos causados pelo pecado.
Os homens, em toda parte, são convidados a se arrepender e a se converter, para que seus pecados possam ser
apagados (At 3.19). Nada mais é requerido dos homens, para que se tornem livres e completamente justificados
de todas as suas transgressões, do que a fé na propiciação da cruz (Rm 3.25).
As evidências do Novo Testamento sobre o que acabamos de dizer são claras. Ao examiná-las, parece lógico
iniciar com o anúncio do nascimento do Messias. Os nomes que Ele recebeu foram: Jesus (Yahweh, salvação)
e Emanuel (Deus conosco). Pois, no seu nascimento e por meio dele, o próprio Deus tinha vindo resgatar o seu
povo, ou seja, veio salvar o seu povo dos seus pecados (Mt 1.21-23). O apóstolo Paulo foi categórico ao afirmar
que Deus “nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo” e “estava em Cristo reconciliando consigo o
mundo” (2Co 5.18,19). Foi Cristo e por intermédio dele que Deus estava efetuando a reconciliação, trazendo
a paz pelo sangue da cruz, perdoando todos os nossos pecados, cancelando a dívida que existia contra nós,
levando-a, pregando-a na cruz (Cl 2.14,15). Como escreveu John Stott: “O amor divino triunfou sobre a ira
divina mediante o divino auto-sacrifício. A cruz foi um ato simultâneo de castigo e anistia, severidade e graça,
justiça e misericórdia”.16
Por intermédio de Cristo, tornamo-nos agradáveis a Deus que, mediante a adoção, concedeu-nos todos os
benefícios de filhos. Antes criaturas, agora somos filhos muito amados e com franco acesso ao trono da graça.

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 10

1. Quais são as evidências no Novo Testamento a respeito da remoção do pecado?


2. Quais foram às conseqüências da remoção do pecado?

16
STOTT, John. A cruz de Cristo. 11ª imp. São Paulo: Vida, 2006, p. 145.

CURSO DE TEOLOGIA 69
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

11 PECADO IMPERDOÁVEL
A solene advertência de Jesus a respeito de um pecado que não será perdoado, nem neste mundo nem no vindouro, é
registrada pelos três evangelhos sinópticos (Mt 12.31,32; Mc 3.28-30; Lc 12.10).
Jesus diz:
“Por isso, vos declaro: todo pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens; mas a blasfêmia contra o Espírito não
será perdoada. Se alguém proferir alguma palavra contra o Filho do Homem, ser-lhe-á isso perdoado; mas, se alguém
falar contra o Espírito Santo, não lhe será isso perdoado, nem neste mundo nem no porvir (Mt 12.31,32).
O apóstolo João fala de um pecado que não se deve orar por ele (1Jo 5.16).
Essas passagens, talvez, estejam falando de um mesmo pecado, ou, talvez, de pecados diferentes. Tal pecado,
geralmente, é conhecido como blasfêmia contra o Espírito Santo. Durante séculos, tem havido várias opiniões diferentes
a respeito da natureza desse pecado para o qual não há perdão.
Para alguns, esse tipo de pecado poderia somente ser cometido pelos contemporâneos de Jesus, durante seu ministério
terreno. Berkhof, Jerônimo e Crisóstomo eram simpatizantes dessa opinião.17
Para outros, esse pecado é a incredulidade que persiste até a hora da morte. Ou seja, aqueles que ouvem falar de Cristo
e não se decidem a seu favor e morrem na incredulidade. Agostinho seria o principal expoente dessa teoria.
No entanto, uma corrente mais moderna defende que esse pecado poderia ser cometido somente por uma pessoa
regenerada. E o texto bíblico que lança mão para fundamentar seu pensamento é Hebreus 6.4-6; Com isso, está querendo
afirmar que a rejeição de Cristo e a perda da salvação ocorrem por parte de um cristão verdadeiro.
A explicação majoritária que melhor se adapta ao texto bíblico defende que esse pecado consistia em rejeição e calúnia
(especialmente maliciosa) deliberadas à obra do Espírito Santo e, também, na atribuição dessa obra ao príncipe das
trevas. “Isso pressupõe, objetivamente, uma revelação da graça de Deus em Cristo, numa poderosa operação do Espírito
Santo; e, subjetivamente, uma iluminação e convicção intelectual tão fortes e poderosas que impossibilitam uma franca
negação da verdade”.18 E foi o que estava acontecendo com os fariseus que, além de verem com seus próprios olhos os
milagres que Jesus operava por intermédio do Espírito Santo, deliberadamente rejeitavam a autoridade e o ensino de
Jesus, atribuindo-os ao maioral dos demônios (Mt 12.24).
Jesus foi ao âmago da questão ao dizer que “todo reino dividido contra si mesmo ficará deserto, e toda cidade ou casa
dividida contra si mesma não subsistirá. Se Satanás expele a Satanás, dividido está contra si mesmo; como, pois, subsistirá
o seu reino?” (Mt 12.25-26).
Ou era Ele da parte de Deus (como diz ser) ou o reino das trevas estava dividido. Diante dos fatos, Jesus profere o
seguinte alerta: “Quem não é por mim é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha” (Mt 12.30). Dessa forma, Jesus
avisa que não existe neutralidade e, certamente, aqueles que, como os fariseus, opõem-se à sua mensagem são contra Ele.
Em seguida, acrescenta: “Por isso, vos declaro: todo pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens; mas a blasfêmia
contra o Espírito não será perdoada” (Mt 12.31).

VERIFICAÇÃO DE APRENDIZAGEM

CAPÍTULO 11
1. Como Jerônimo e Crisóstomo entendiam o pecado imperdoável?
2. De acordo com a corrente majoritária, o que seria o pecado imperdoável?
17
BERKHOF, Louis. Teologia sistemática. São Paulo: Luz Para o Caminho Publicações, 1996, p.254.
18
Idem, 1996, p.255

70 CURSO DE TEOLOGIA
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

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CURSO DE TEOLOGIA 71
MÓDULO 3 DOUTRINA DO PECADO

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72 CURSO DE TEOLOGIA
faculdade teológica betesda
Moldando vocacionados

AVALIAÇÃO - MÓDULO III


HAMARTIOLOGIA
1) Por que afirmamos que não foi Deus quem criou o pecado?

2) Quais são as cinco manifestações de vontade de Lúcifer, registradas nas Escrituras, que causaram sua queda?

3) Qual foi o prejuízo que Adão e Eva tiveram devido a sua rebelião contra Deus?

4) Quais eram os três aspectos da imagem de Deus no homem?

5) Explique a teologia paulina concernente ao pecado.

6) Quais são os pecados capitais, segundo a concepção católica?

7) Como o pecado afetou o relacionamento com Deus?

8) Qual foi a conseqüência do pecado para o meio ambiente?

9) O pecado é Universal ou não? Explique

10) Faça um breve comentário sobre a teoria pelagiana do pecado, refutando-a segundo as Escrituras.

CARO(a) ALUNO(a):
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folha de papel sulfite, sendo objetivo(a) e claro(a).
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