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FONÉTICA E FONOLOGIA

Me. Paula de Freitas Denari

GUIA DA
DISCIPLINA
2019
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância

1. A LINGUAGEM

Objetivo:
Refletir sobre o conceito de linguagem e signo linguístico.

Introdução:
Desde que a humanidade percebeu as circunstâncias inerentes à vida em sociedade,
viu-se diante da necessidade de comunicar aquilo que sente, pensa, observa, registra e
interpreta do mundo. Todo esse processo de compartilhamento é bastante complexo, e por
isso o homem criou (e ainda cria) formas dinâmicas de representar sua realidade,
estabelecendo signos capazes de explicar e sintetizar suas ideias. O conjunto desses
signos, chama-se LINGUAGEM.

A criatividade humana estabeleceu então, como já foi dito, linguagens muito


dinâmicas para comunicar-se, valendo-se de diferentes signos: a imagem, o movimento, o
desenho, a cor e o ritmo, por exemplo: No entanto, a linguagem que se utiliza da palavra
como signo é de fato, a mais precisa. É através da palavra que o homem consegue
expressar por exemplo, a temporalidade de fatos, a especificidade de características,
sentimentalidades e dilemas.

Desse modo, é importante a observação de dois tipos de signo: signo não-verbal e


signo verbal, sendo o primeiro baseado em representações de cores, gestos, movimentos,
imagens e traços; e o segundo, baseado na palavra.

Considerando que a comunicação é um fenômeno social, portanto, é natural que as


sociedades tenham organizado códigos próprios em que as palavras correspondem a
valores e ideias de sua própria cultura. A esse código que utiliza palavras segundo uma
determinada lógica e cultura, chamamos LÍNGUA.

Linguagem, portanto, é todo sistema de sinais convencionais que nos permite


realizar atos de comunicação. Língua é o conjunto de sinais baseado em palavras.
(Ernani e Nicola, 1997).

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1.1. O Estudo da Língua


O estudo de uma língua - entendida aqui como um código sistematizado de palavras,
organizado segundo as características de um grupo de falantes e utilizado para
comunicação (vide idioma) – cabe à Gramática Normativa, que se preocupa com a
representação padrão de uma comunidade, tomando a palavra como objeto de estudo em
três aspectos: o sintático, o morfológico e o sonoro.
Este último aspecto (sonoro) é o assunto dessa aula.

Fonologia e Fonética
A Gramática Normativa estabelece uma área específica para o estudo do aspecto
sonoro das palavras: a FONOLOGIA.

FONOLOGIA uma área de estudo que abrange desde a identidade do som até a
interpretação da substância de um fonema. Essa área, no entanto, surgiu apenas no início
do século XX, e baseou-se em estudos anteriores, puramente descritivos, sobre a produção
e a articulação dos sons da fala: a FONÉTICA.

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Os estudos fonológicos também incorporaram teorias de linguistas do Círculo de


Praga (1928- 1939) como Nicolai Trubetzkoy e Roman Jakobson (Rússia); de Ferdinand
de Saussure (Suiça), André Martinet (França) e Émile Benveniste (nascido na Síria).

A maior parte da literatura que trata de Fonética e Fonologia vem tentando fazer
uma distinção entre elas que não tem convencido aqueles que se aventuram nessas
áreas. Primeiramente, deve-se dizer que tanto a Fonética quanto a Fonologia têm
como objeto de estudo os sons da fala. Ou melhor dizendo, tanto a fonética quanto
a fonologia investigam como os seres humanos produzem e ouvem os sons da fala.
Em segundo lugar, deve-se observar que é difícil, senão impossível, fazer fonologia
sem antes entender de (ou fazer) fonética. É preciso, então, conhecer um pouco
mais sobre o status de cada uma dessas subáreas, sem tentar fazer uma distinção
simplista de suas funções ou modos de ação.
(SEARA,2011)

O Círculo de Praga foi um grupo de críticos


literários e linguistas estabelecidos na
cidade de Praga. Seus membros
desenvolveram métodos de estudos
semióticos e de análise estruturalista entre
os anos 1928 e 1939. Depois da segunda
Grande Guerra o Círculo se desfez, mas seus
membros continuaram como grandes
influências na área da Linguística.

O objeto de estudo da fonologia, portanto, é a produção oral da palavra, que por sua
vez é a combinação de unidades sonoras que estabelecem, juntas, um significado.

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Cada unidade mínima de som formador das palavras é chamada de FONEMA.

Cabe frisar que o fonema não é qualquer som isolado e aleatório. Para ganhar status
de fonema, em nosso estudo, é preciso que esse som estabeleça distinções significativas
entre palavras. Observe:

As palavras que nomeiam os objetos – COLA, BOLA, MOLA- estabelecem-se e


diferenciam-se por apenas um som; esses sons distintivos são considerados fonemas.

Fonemas e sua representação


Para representar os fonemas de uma palavra, utilizam-se tradicionalmente barras
inclinadas, e símbolos especiais (assunto de outra aula) ao que chamamos de transcrição
fonética. Para exemplo inicial, observe o procedimento com o uso das barras:

COLA /KOLA/ percebemos aqui os fonemas /K/, /O/, /L/, /A/


1.2. A Classificação dos Fonemas
Os sons que utilizamos para a fala podem ser produzidos de maneiras diferentes,
mas sempre a partir da corrente de ar emitida pelos pulmões.
Os sons que são produzidos pela livre
passagem de ar pela boca ou pelo nariz são
chamados de VOGAIS.

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Já os sons produzidos com algum obstáculo (total ou parcial) à passagem de ar são


chamados CONSOANTES.

Esses obstáculos acontecem pela articulação de dentes, úvula, alvéolos, palato (céu
da boca), língua e lábios.

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CRISTÓFARO-SILVA, Thaïs ; YEHIA, Hani Camille . Sonoridade em Artes, Saúde e


Tecnologia. Belo Horizonte: Faculdade de Letras, 2009. Disponível em
fonologia.org. ISBN 978-85-7758-135-1.
CRISTÓFARO-SILVA, Thaïs ; YEHIA, Hani Camille . Sonoridade em Artes, Saúde e
Tecnologia. CD-ROM, Belo Horizonte: Faculdade de Letras, 2012. Disponível para
download em: fonologia.org. ISBN 978-85-7758-135-1.
PASCHOALIN, Maria Aparecida. SPADOTO, Neusa Terezinha. Gramática: teoria e
exercícios. Ed. Renovada. São Paulo:FTD, 2008.
SEARA, Izabel Christine.Fonética e Fonologia do Português Brasileiro.
Florianópolis: LLV/CCE/UFSC,2011. Disponível em:
slideshare.net/tomazinense/fontica-e-fonologia-do-portugus-brasileiro

2. APARELHO FONADOR E FONAÇÃO

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A produção dos sons que usamos para falar chama-se FONAÇÃO e acontece pela
ação conjunta de órgãos pertencentes ao aparelho digestório e ao aparelho respiratório,
aliados às pregas vocais (também conhecidas como cordas vocais) e à glote. A esse
conjunto chamamos APARELHO FONADOR, porque produz som (phono), voz.

É na laringe que se encontra o órgão que desempenha papel bastante complexo na


produção dos sons da linguagem humana, as cordas vocais, que, de acordo com
sua tensão e abertura, determinam os modos de fonação também conhecidos como
qualificadores de voz.
(MONTEIRO, 2009)

A figura a seguir mostra e nomeia os órgãos envolvidos na fonação. Observe:

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2.1. O Funcionamento do Aparelho Fonador


A fonação envolve um mecanismo de funcionamento entre os órgãos do aparelho
fonador. Alguns desses órgãos têm papel articulatório ativo (movimentam-se durante a
fonação) e outros órgãos têm papel articulatório passivo (apenas participam da produção,
mas não se movimentam).

Você pode observar os órgãos e seus respectivos papéis articulatórios na


figura a seguir:

papel articulatório ativo papel articulatório passivo

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2.2. A Produção da Fala


Considerando que a fala é o resultado da articulação dos sons produzidos pelos
seres humanos com a finalidade de comunicar-se, é imprescindível o entendimento de que
a voz é parte de uma linguagem.

Outro aspecto da fala, considera que modo como esses sons são produzidos e
articulados envolvem um código lógico (sons inteligíveis) segundo a cultura do indivíduo
falante. Isso significa que todo ser humano produz sons, mas a maneira como esses sons
são articulados é determinada também pelo idioma utilizado para a comunicação.

Para estudarmos a produção da fala é preciso observar os mecanismos de produção


dos sons e a articulação deles.
2.3. A Produção dos Sons da Fala
Há alguns aspectos que precisam ser considerados para classificar os sons
produzidos pelo aparelho fonador. A princípio, os sons (fonemas) são classificados como
vogais ou consoantes.

Quanto à produção das vogais observam-se ainda:


 O papel das cavidades bucal e nasal
 A intensidade do som
 O timbre do som
 A zona de articulação do som

Quanto às consoantes, observam-se:


 O modo de articulação
 O ponto de articulação
 A vibração das pregas vocais
 O papel das cavidades bucal e nasal

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2.4. Classificação das Vogais


1. Quanto ao papel das cavidades bucal e nasal na passagem do ar, a vogal pode
ser oral ou nasal.

pAto cabEça amIgo pOte cafUné

ORAL
É o som expelido livremente pela boca

anÃo parEnte Índio Ontem mUndo


NASAL
É o som expelido pela boca e pelas fossas nasais

2. Quanto à intensidade do som produzido, a vogal pode ser tônica ou átona (há
também uma classificação bastante específica de vogal subtônica).

tônica -é a vogal que sustenta a sílaba tônica. Ex: CAFÉ

subtônica (só aparece em palavras derivadas)- é a vogal que era tônica na palavra
primitiva, mas perde força na derivada Ex: CAFEZINHO

átona-é a vogal que sustenta as sílabas átonas. Ex: CAFÉ

3. Quanto ao timbre do som emitido, uma vogal pode ser aberta ou fechada.

São abertas as vogais a seguir: Timbre: efeito acústico resultante da


distância entre o dorso da língua e o véu
cavalo, mala, sabiá do paladar.

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chulé, amarelo, cafuné, esperto

cipó, depósito, paletó, negócio

São fechadas as vogais a seguir:

gelo, cotovelo, apelo, chupeta

vida, amigo, lápis, galinha

hoje, barco, bolso, folha

luva, agulha, saúde, junho

4. Quanto à zona de articulação do som, a vogal é classificada como anterior,


média ou posterior.

Vogais anteriores - na produção dessas vogais a língua se eleva em direção ao


céu da boca.



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Vogais médias – na sua produção, a língua permanece em repouso.

Vogais posteriores – na sua produção, a língua se eleva em direção ao véu palatino


(palato mole).

2.5.
Classificação das Consoantes
Segundo a Nomenclatura Gramatical Brasileira de 1959 (e não houve mudança
depois disso) as consoantes classificam-se:

1. Quanto ao modo de articulação: as consoantes podem ser oclusivas ou


constritivas.

oclusivas constritivas
na fonação, há um obstáculo total à saída do ar pela na fonação, há um obstáculo parcial à saída do ar.
boca, com uma abertura rápida. Subdividem-se em fricativas, laterias e vibrantes

pato, teia, casa, beijo, dia, gato fato, cebola,xícara,lua,carro

2. Quanto ao ponto de articulação, as consoantes classificam-se em:

bilabiais labiodentais
há o contato dos lábios superior e inferior. há contato do lábio inferior e os dentes incisivos.

sapo, abelha, macaco fada, vaca

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linguodentais alveolares
há aproximação da língua e os dentes superiores. há aproximação da língua com os alvéolos.

tela, navio saia, asa, lado, areia

palatais velares
acontece a aproximação do dorso da língua com o acontece a aproximação da parte posterior da
céu da boca (palato duro). língua com o véu palatino (palato mole).

cheiro, gente, pilha, manhã louca, fogo, rua

3. Quanto à vibração das cordas vocais, as consoantes podem ser surdas ou


sonoras

Surdas: a corrente de ar encontra a glote aberta e passa sem vibrar das


cordas vocais.

PATO, CASO, CEDO, FADA, PICHE

Sonoras: A corrente de ar encontra a glote fechada, forçando a


passagem e vibrando as cordas vocais.

BALA, DINHEIRO, VELA, GELO, AMORA

4. Quanto ao papel das cavidades bucal e nasal, as consoantes podem ser orais ou
nasais.

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Na fonação das consoantes orais, a corrente de ar sai apenas pela


cavidade bucal

BOLA, LATA, GATO, CARRO, CASA

Na fonação das consoantes nasais, o ar sai tanto pela cavidade bucal


quanto pela cavidade nasal.

MEDO, NARIZ, UNHA

CRISTOFOLINI, Carla. Produção e articulação dos sons da fala. Universidade


federal de Santa Catarina- centro de comunicação e expressão Letras Português
Disciplina DLLV 7004 – Fonética e Fonologia do Português
Disponível em:
moodle.ufsc.br/pluginfile.php/905248/mod_resource/content/1/Sons_da_fala_l
etras.pdf
PASCHOALIN, Maria Aparecida. SPADOTO, Neusa Terezinha. Gramática: teoria e
exercícios. Ed. Renovada. São Paulo:FTD, 2008.
MATTOS, J. S., “Um estudo comparativo entre o sinal electroglotográfico e o
sinal de voz”, Dissertação de mestrado em Engenharia de Telecomunicações, UFF
2008.
MONTEIRO, Maria Perpétua Teles Fonética e fonologia da língua portuguesa /
Maria Perpétua Teles Monteiro. – Recife: UPE/NEAD, 2009. 63 p.: il. – (Letras).

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3. PROSÓDIA E ENTOAÇÃO

“Gosto de sentir a minha língua roçar


a língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar a criar
confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões”
(Língua, de Caetano Veloso, 1984)

O estudo da fonação, como vimos na aula anterior, envolve muitos aspectos físicos
e articulatórios, mas não apenas isso. A produção da fala não pode ignorar fatores culturais
e ambientais do falante, e desse modo, envolvem-se nessa produção os tipos de fala, os
sotaques, os ritmos e os acentos do falante: esse é o objeto de observação da Prosódia,
área de estudo da Fonética que se dedica à conservação da pronúncia e das variações
melódicas da fala.

A prosódia está, no cenário de pesquisa atual, associada a fatores linguísticos como


acento, fronteira de constituinte, ênfase, entoação e ritmo, a fatores paralinguísticos
como marcadores discursivos (e.g., “né”, “entendo”, “an-han”) e atitudes
proposicionais (e.g., “confiante” e “duvidoso”) e sociais (e.g., “hostil” e “solidário”),
além de tratar de fatores extralinguísticos como as emoções. Todos esses fatores
se combinam com aspectos sociais e biológicos indiciais como gênero, faixa etária,
classe social, nível de escolaridade, entre outros.
(BARBOSA, 2012)

Estudar prosódia é observar o acento tônico dos fonemas ou sílabas,


diferenciando palavras ou registrando corretamente a duração, a intensidade e o tom dos
fones.

Como exemplo de diferenciação de palavras por meio da correta acentuação tônica


dos fones, lembremos de valido (verbo validar) e válido (adjetivo); Cupido (deus do amor)
e cúpido (ambicioso); fervido (particípio de ferver) e férvido (quente, ardoroso); em outros
casos, o conhecimento da prosódia garante a pronúncia correta de palavras como condor,
rubrica, ruim, austero, avaro, ciclope, filantropo, gratuito.

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Estudar entoação, refere-se a um aspecto mais específico da prosódia, que


observando a altura e o ritmo da palavra ou da oração alcança melhor e mais variada
compreensão daquilo que é dito.

Como exemplo da capacidade de variação significativa a partir do ritmo e da variação


melódica na produção do fone em uma frase, observe a distinção ocorrida nos enunciados
a seguir:

Cláudia chegou tarde da festa.


Cláudia chegou tarde da festa?

Do ponto de vista fonológico, os dois enunciados utilizam os mesmos mecanismos


fonação; no entanto, a variação da entoação (melodia, ritmo) realiza sozinha a distinção
entre assertividade e interrogação entre os dois enunciados.

É a prosódia que molda nossa enunciação imprimindo a “o que se fala” um “modo


de falar” que é dirigido intencionalmente ou não ao ouvinte.
(BARBOSA,2012)

Os estudos de Charles Bally, Ivan Fónagy, Maurice Grammont e Henry Morier


observaram que existe uma relação dinâmica e multilateral entre o som e o sentido, e
portanto, existe uma propriedade expressiva da prosódia, em que se consideram aspectos
atitudinais como a elocução e a postura; e aspectos indiciais como gênero e idade do
falante; e aspectos afetivos como ansiedade e humor. A essa área de observação
chamamos Fonoestilística.

Não há dúvida, de que na matéria fônica se escondem possibilidades expressivas.


Deve-se entender como tal tudo que produza sensações musculares e acústicas:
sons articulados e suas combinações, jogos de timbres vocálicos, melodia,
intensidade, duração dos sons, repetição, assonância e aliterações, silêncios, etc.
Na linguagem, essas estas impressões fônicas permanecem em estado latente
enquanto o significado e o matiz afetivo das palavras em que figuram sejam
indiferentes ou opostos a esses valores, mas brotam quando há concordância.
Assim, junto à fonologia propriamente dita há lugar para uma fonologia expressiva,
que pode trazer muita luz à primeira analisando o que nos diz o instinto: que há uma
correspondência entre os sentimentos e os efeitos sensoriais produzidos pela
linguagem. (BALLY, 1941)

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3.1. Sonoridade das vogais no português do Brasil


Nas aulas 1 e 2 tratamos da classificação e da produção das vogais em suas
propriedades primárias.

Acrescentaremos a esse conhecimento a noção de sonoridade, que em sentido


genérico refere-se aos sons e associa-se ao estudo de pronúncia, sotaques, melodia e voz
(prosódia).

Trataremos aqui de vozeamento e desvozeamento, nasalização e tensão.

Chama-se vozeamento a vibração das cordas vocais durante a fonação; as vogais


são fonemas naturalmente vozeados, no entanto, em algumas posições as vogais podem
sofrer um desvozeamento, ou seja, podem ser produzidas sem a vibração das cordas
vocais (mais fracas). Esse desvozeamento acontece na pronúncia de vogais em posição
átona final. Observe:
ralo leite queijo

Há vogais que, em função da aproximação com fonemas pronunciados com o véu


palatino abaixado, são percebidas como nasais. A esse mecanismo chamamos
nasalização.
lama, pinho, dengo

Tensão é a oposição entre sons vocálicos frouxos (átonos) e tensos (tônicos).


Observe por exemplo a diferença de tensão nas vogais da palavra sapo e saci.

Em sapo, a vogal [a] é tensa em relação a vogal [o], que é frouxa.

Já em saci, a vogal [a] é frouxa em relação a vogal [i] que é tensa.

3.2. Encontros vocálicos


O português brasileiro produz diferentes tipos de segmentos vocálicos (sons de
vogais seguidos). Esses segmentos podem acontecer na mesma sílaba, ou em sílabas
diferentes.
A fonação de dois ou três sons vocálicos na mesma sílaba chamamos ditongo ou
tritongo, respectivamente.

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O ditongo é o encontro de dois ( di-) sons vocálicos lado a lado, na mesma sílaba.
No entanto, um desses sons tem pronúncia mais fraca, e por isso é chamado de semivogal.

Em um ditongo, os sons vocálicos podem se posicionar de duas maneiras:

Observe que o segmento pode organizar-se do som mais forte para o som mais fraco
(vogal + semivogal) ou do som mais fraco para o som mais forte (semivogal + vogal). No
primeiro caso, denomina-se ditongo decrescente (devido à diminuição do tom na
fonação), e no segundo caso denomina-se ditongo crescente (devido ao aumento do tom
na fonação).

O segmento de três vogais na mesma sílaba chama-se tritongo. No entanto, é


preciso observar que no português, a vogal é a base fonética de uma sílaba, e portanto, em
cada sílaba só pode existir uma vogal. Entendamos vogal como som vocálico forte, em
oposição à semivogal (som vocálico fraco).

Portanto, a única disposição possível de três vogais na mesma sílaba é:

Há ainda um segmento vocálico em que embora as vogais (sons vocálicos fortes)


estejam lado a lado na palavra, separam-se em sílabas

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diferentes (lembre-se de que só cabe uma vogal em cada sílaba, portanto, não podem ficar
na mesma sílaba. Esse segmento denomina-se hiato. Observe:

3.3. Encontros consonantais


Assim como ocorrem segmentos de sons vocálicos, o português brasileiro produz
segmentos de sons de consoantes denominados encontros consonantais, e que podem
acontecer na mesma sílaba ou em sílabas diferentes.

Os segmentos em que os sons consonantais apoiam-se na mesma vogal (toda sílaba se


apoia em uma vogal) são chamados de encontros consonantais perfeitos. Nesses casos, as
duas consoantes permanecem lado a lado e na mesma sílaba. Observe:

Os segmentos em que os sons consonantais apoiam-se em vogais diferentes


(portanto, estão lado a lado na palavra mas separam-se em sílabas distintas) são chamados
de encontros semivogal + vogal + semivogal consonantais
imperfeitos. Observe:

Ao contrastarmos letra e fonema, é possível observar outro tipo de segmento


consonantal, ainda que apenas no plano fonético. O segmento fonético representado
ortograficamente por apenas uma letra chama-se dífono.

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BALLY, Charles. El Lenguaje y la Vida. Tradução de Armando Alonso. Buenos Aires,


Losada, 1941.
BARBOSA, Plínio A. Conhecendo melhor a prosódia: aspectos teóricos e
metodológicos daquilo que molda nossa enunciação. Rev. Est. Ling., Belo
Horizonte, v. 20, n. 1, p. 11-27, jan./jun. 2012.
Disponível em:
manualdefoneticaacusticaexperimental.com/assets/barbosa2012-3.pdf
MARTINS, Nilce Santanna. Introdução à estilística. São Paulo. Editora
EDUSP,.2008.
MONTEIRO, Maria Perpétua Teles Fonética e fonologia da língua portuguesa /
Maria Perpétua Teles Monteiro. – Recife: UPE/NEAD, 2009. 63 p.: il. – (Letras).

4. ALFABÉTICO FONÉTICO INTERNACIONAL (AFI) - Internacional


Phonetic Alphabet (IPA)

Ainda no século XVII, as estudos de fonética levaram os


pioneiros da ciência linguística a perceberem a necessidade de um
registro mais exato da fala, e isso levou-os a projetar uma forma
especial de representação, diferente do registro ortográfico.

Em 1886, o francês Paul Passy organizou símbolos em um


sistema que ficaria conhecido como Associação Fonética
Internacional e serviu de base para todas as outras versões futuras do documento.

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Essas “versões” desse sistema padronizado de notação são, na verdade, revisões


que adicionam, melhoram ou eliminam símbolos, reorganizam categorias de sons para
representar as variações de fones (sons) e adaptar-se a características de fala e entoação
em cada língua.

A última revisão do sistema - agora chamado de AFI (Alfabeto Fonético


Internacional) ou IPA (International Phonetic Alphabet) – foi feita em 2005.

O princípio geral do AFI é fornecer um símbolo para cada som ou segmento de


fala distinto. Os símbolos foram criados a partir das letras dos alfabetos grego e
romano, algumas derivadas e alguns símbolos não pertencem a língua nenhuma.

O AFI atual organiza seus símbolos em três categorias: letras, diacríticos e marcas
de prosódia.

As letras (107 no total) indicam os sons básicos – vogais e consoantes.

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Os diacríticos são 52 sinais usados sobre ou sob determinadas letras, geralmente


para lhes dar um valor fonético específico e permitir a correta pronúncia das palavras. Em
fonética podem indicar uma duração mais longa na fonação, nasalização, maior ou menor
tensão, vozeamento, etc.

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As marcas de prosódia (símbolos suprassegmentais) indicam velocidade, timbre,


acento tônico, articulação, fonação, entoação.

Não existe um alfabeto fonético brasileiro, uma vez que o AFI padroniza os símbolos
para cada som produzido em qualquer idioma. Sendo assim, cada língua utiliza apenas os
símbolos dos sons que pertencem ao seu conjunto fonético.

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É possível usar os símbolos do AFI para transcrever os sons da fala sob diferentes
níveis de precisão:

Transcrição Fonológica (ampla) - transcreve os símbolos entre barras / /. A


transcrição ampla apenas registra sons genéricos, considerados diferentes pelos falantes
de uma mesma língua. Nessa transcrição, os sons em suas sutilezas de dialetos, por
exemplo, são ignorados, e identifica-se apenas os componentes foneticamente relevantes
da palavra.

Transcrição Fonética (restrita) - transcreve os símbolos entre colchetes [ ]. Essa é


a transcrição mais precisa, em que os sons são descritos detalhadamente, preocupando-
se apenas com a exatidão do som produzido, e considera qualquer alteração como
relevante.

Compare:

Após essa aproximação com os símbolos fonéticos, vejamos alguns exemplos de


transcrição ampla e restrita, como modelos de estudo.

Fonte: Revista do GELNE, Natal/RN, Vol. 19 -


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5. FONEMA
Nas aulas anteriores abordamos o som sob seus aspectos articulatórios, e demos
ênfase à perspectiva da fonética – o fone.

Essa perspectiva, no entanto, precisa ser ampliada à medida que percebemos que
o fone é o aspecto físico do som, mas que este carrega consigo o aspecto abstrato quando
participa da linguagem e compõe significado.

Considerando essa abordagem mais ampla do estudo do som, a fonologia defende


que o fone, ao atribuir um valor distintivo entre palavras e agregar significado ao que se diz,
ganha o status de fonema.

Para compreender melhor, perceba que em Português do Brasil consideramos


diferentes as consoantes:

Essa diferença, no entanto, não leva em consideração o fato fonético ou aspectos


articulatórios (ambas têm a mesma fonação vozeada). O que nos leva a considerar
diferentes símbolos, nesse caso, é o traço distintivo (ainda que seja leve) que se percebe
em palavras como:

Esse fone com aspecto distintivo chama-se fonema. Ou seja: um fone (som) é
considerado fonema em caso de contraste que indique mudança de significado.

Um dos objetivos da análise fonêmica e estabelecer os sons que tem valor distintivo,
ou seja, servem para distinguir o significado das palavras
(SILVA, 1999)

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A partir dos estudos do Círculo de Praga


(citado na aula 1), alguns teóricos dedicaram-se a
observar o fonema e suas possibilidades de
interpretação na abordagem linguística. Entre essas
teorias podemos citar a Fonêmica e a Fonologia
Gerativa.

Por esses estudos destacam-se Edward


Sapir e Leonard Bloomfield (Fonêmica) e Noam
Chomsky (Fonologia Gerativa).

Para nossa aula, consideraremos a abordagem da Fonologia, que incorpora noções


dessas teorias e se preocupa com a organização dos sons em uma língua.
5.1. Fonema e letra
A observação dos fonemas nas palavras e sua representação exigem que se
diferenciem os registros fonológico e ortográfico. O registro fonológico é feito com o uso
dos símbolos fonéticos do AFI (Alfabeto Fonético Internacional – apresentado na aula 4), e
o registro ortográfico é feito com o uso das letras do alfabeto em cada língua.

Os dois alfabetos – fonético e ortográfico – não têm correspondência exata, uma vez
que o primeiro está relacionado à fonação, e o segundo relaciona-se a regras gramaticais
e formação de palavras escritas.

Como demonstração da não-correspondência exata entre fonema e letra em


Português do Brasil, podemos observar casos em que um determinado fonema pode ser
representado por diferentes letras:

E ainda, uma mesma letra pode representar diferentes fonemas:

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Outro fato da não- correspondência entre fonema e letra é o dígrafo:


ortograficamente, são duas letras lado a lado que representam apenas um fonema.
Portanto, em Português do Brasil existem palavras com números diferentes de letras e
fonemas. Nos exemplos a seguir, temos palavras com mais letras que fonemas.

Vale relembrar que na aula 3 (ao tratarmos de segmentos consonantais), citamos


que ao contrastarmos letra e fonema, é possível observar um tipo de segmento fonético
em que dois fones seguidos são ortograficamente representados por apenas uma letra: o
dífono – ou seja: existem palavras com mais fonemas do que letras. Relembre:

Fonética e Fonologia 27
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5.2. Alofones
No início dessa aula vimos que considera-se fonema o fone que é capaz de
diferenciar significado.

Agora, observe:

A variedade linguística típica em regiões diferentes do Brasil (sotaque) leva os


falantes a realizarem alguns fones de modo diferente, como é o caso da palavra “coração”,
que em São Paulo tem o som do “o” pronunciado fechado e em Salvador pronunciado mais
aberto, como “ó” (vide representação fonológica do exemplo acima).

No entanto, essa diferença na realização do fone não constitui mudança de


significado da palavra. Por isso, essa variação de pronúncia não produz novos fonemas.
Nesse caso, chamamos essas variantes fonológicas de ALOFONES.

Alofones são variantes fonológicas de um mesmo fonema.

A representação dos alofones é feita entre colchetes por tratar-se de uma transcrição
restrita.

Fonética e Fonologia 28
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5.3. Pares mínimos


Em Fonologia, para distinguir um fonema de um alofone, observa-se o contraste
entre os sons por meio de seus pares mínimos.

Pares mínimos são palavras que podem causar dúvida na pronúncia mas de
significado diferente, distintas por apenas uma única diferença fonológica (ou um ponto de
articulação, ou um vozeamento, por exemplo).

Consideramos /p/ e /b/ como fonemas, porque são sons


distintivos de palavras.

Esses sons são a única diferença entre essas palavras,


portanto, /p/ e /b/ são pares mínimos.
.
5.4. Arquifonema
Como já vimos, a representação de variantes sonoras chama-se alofone e é
representada em uma transcrição restrita. O fonema ao qual se referem essas variantes
chama-se ARQUIFONEMA e funciona como uma representação genérica dos alofones, ao
que chamamos de neutralização (usa-se um símbolo “neutro”, que representa qualquer
um dos alofones possíveis). Relembre o exemplo da transcrição feita da palavra “coração”
em suas variantes de pronúncia em São Paulo e em Salvador:

5.5. Os fonemas vogais do Português do Brasil


O estudo fonético-fonológico das vogais nos leva à percepção de um quadro de
vogais aparentemente complexo.

Fonética e Fonologia 29
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Essa aparente complexidade, na verdade, é o reconhecimento das possibilidades de


fonação das vogais.

Antes de mais nada, é preciso frisar que trataremos aqui de fonemas vogais, e não
de letras. Ortograficamente há 5 letras vogais: a, e, i, o, u. Porém, foneticamente
percebemos 12 fonemas vogais.

Observe:

7
fonemas

7 orais +5 nasais = 12

Somem-se a esses 7 fonemas orais, mais 5 fonemas vogais nasais:

5.6. Semivogais
O estudo dos segmentos vocálicos em português do Brasil revela que os sons vogais
[ i ] e [ u ] nem sempre são pronunciados como tônicos, e portanto não ocupam o papel de
centro de uma sílaba.

Essa pronúncia mais “fraca” acontece sempre que [ i ] e [u] acompanharem outro
som vogal tônico, formando um ditongo.

Fonética e Fonologia 30
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Para a transcrição fonológica desses sons, usa-se [y] para o “i” fraco, e [w] para o
som de “u” fraco. Observe:

Além disso, é preciso destacar que em português do Brasil, a pronúncia do “L” em


final de sílaba ou de palavra é realizada como [w]. Observe:

BRAGA & OLIVEIRA, Alzerinda de Oliveira e Marilucia Barros de. Fonética e


Fonologia. Curso de Licenciatura em Letras UFPA. Belém, PA, Editora : EditRedi
2014.
CÂMARA JR., Joaquim M. Para o estudo da fonêmica portuguesa. 2.ed. Rio de
Janeiro: Organizações Simões, 1977.
SEARA, Izabel Christine.Fonética e fonologia do português brasileiro : 2º período
/ Izabel Christine Seara, Vanessa Gonzaga Nunes, Cristiane Lazzarotto-Volcão–
Florianópolis: LLV/CCE/UFSC, 2011.

6. PADRÃO SILÁBICO DO PORTUGUÊS DO BRASIL

Cada idioma organiza-se fonologicamente de maneira particular, mas a sílaba é o


nível inicial dessa organização, já que a sílaba é um conjunto ordenado de fonemas.

Fonética e Fonologia 31
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As sílabas são o suporte da fala e são preenchidas por segmentos fonéticos. Cada
língua tem um modo especial de preencher as sílabas em função das suas
necessidades estruturais.
(CAGLIARI, 1981)

A palavra sílaba é uma variação do anglo-saxão, para o francês antigo sillabe;


em latim sílaba , do grego συλλαβή syllabḗ - pronúncia grega: [sylːabɛ̌ː]- e significa
"o que é levado em conjunto", referindo-se às letras que são tomadas em conjunto para
produzir um único segmento sonoro.

Nessa aula abordaremos a organização e os conceitos referentes ao português do


Brasil, e levando em consideração os estudos de Back (1973) e Mattoso Câmara Jr (1977),
pioneiros no estudo da Linguística no Brasil.

Eurico Back desenvolveu uma teoria própria


sobre o português do Brasil batizada como
Gramática Construtural da Língua Portuguesa
(1972) e seguia os modelos de Sapir, Bloomfield e
Martinet.
Joaquim Mattoso Câmara Jr. foi aluno de
Roman Jakobson nos EUA, e traduziu e publicou o
livro A Linguagem, de Edward Sapir (em 1954).

Algumas noções são essenciais para o estudo da sílaba e serão apresentadas nessa
aula. Primeiramente é preciso admitir que em português do Brasil a vogal desempenha
papel indispensável em uma sílaba (note que dissemos vogal, e não semivogal). Por sua
função essencial, dizemos que a vogal é elemento central e as consoantes e semivogais
são elementos periféricos.
Isso significa que a sílaba se organiza em torno de um fonema vogal. É esse fonema
vogal que sustenta outros fonemas chamados de periféricos: consoantes ou semivogais.
Portanto, não existe sílaba sem vogal e em cada sílaba só pode haver uma vogal. Uma

Fonética e Fonologia 32
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conclusão correta, portanto, é: se quisermos saber quantas sílabas tem uma palavra, é
preciso saber quantos fonemas vogais compõem essa palavra.

6.1. Estrutura interna das sílabas


Quanto à posição dos elementos que constituem uma sílaba, os estudos de
Chomsky (Princípios e parâmetros da Gramática Universal) sustentam que uma sílaba pode
ter 3 elementos em sua estrutura: ONSET, NÚCLEO e CODA.

O NÚCLEO é formado somente


por vogais e se constitui no pico
silábico. É essencial.

O ONSET (também A CODA ocupa a posição pós-


pode ser chamado de ataque) núcleo e não é essencial em uma
é a parte que ocupa a posição sílaba.
pré- núcleo na sílaba; não é

Detalhe: Podemos nos referir ao núcleo + coda como RIMA. Nesse caso, o diagrama
seria:

Exemplificando:

coração

Fonética e Fonologia 33
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CURIOSIDADE:
A palavra coda vem do latim coda, -ae. Pronuncia-se
É um substantivo feminino e pode significar:
1. [Antigo] Parte traseira. = CAUDA, RETAGUARDA
2. [Fonética] Parte final de uma sílaba, posterior ao núcleo.

O ONSET merece algumas observações que o classificam quanto aos fonemas que
o compõem.
"coda", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-
2013, https://dicionario.priberam.org/coda [consultado em 06-10-2019].
Esse elemento silábico pode classificar-se em simples ou complexo (ambos
opcionais).

Onset simples é aquele formado apenas por uma consoante.

Onset complexo é aquele formado por duas consoantes.

Observação: As consoantes (r fraco, lh, e nh) não podem ocupar o onset em


português. Lembre-se de que as palavras nhoque e lhama são empréstimos de outras
línguas.

6.2. O princípio da sonoridade


Diversas teorias concordam que a organização interna das sílabas é condicionada,
de alguma maneira, à sonoridade de seus elementos.

Fonética e Fonologia 34
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Considerando esse princípio de sonoridade, Mattoso Câmara – propõe a seguinte


organização de sílaba:

“De todos os pontos de vista, resulta como denominador comum um movimento de


ascensão, ou crescente, culminando num ápice (ou centro silábico) e seguido do
movimento decrescente, quer se trate do efeito auditivo, da força expiatória ou da
tensão muscular, focalizados nas diversas teorias.
Por isso é normalmente a vogal como som vocal mais sonoro, da maior força
expiatória […] que funciona (...) como centro de sílaba”
(CÂMARA, 1976)

6.3. Tipologia silábica do português


Considerando que sílaba fonética é um conjunto ordenado de fonemas, observemos
que em português existem maneiras diferentes de ordenar e combinar esses fonemas que
formam a sílaba.

A observação inicial divide as sílabas conforme seu comportamento, e as classifica


em abertas ou travadas:

Sílaba aberta (ou leve) - é a sílaba terminada em vogal CA-FÉ

Sílaba travada (ou pesada) - é a sílaba terminada em consoante AR-TE

Importante frisar que essa aula refere-se à estrutura da sílaba segundo o sistema
fonológico do português.
Vejamos o quadro Cada língua
a seguir queestrutura
resume aasílaba de maneira
organização dos diferente,
fonemas edentro
há casos
das
em que
sílabas o português
em núcleo da sílaba pode não
(combinações ser umadentro
possíveis vogal. das sílabas). Considere ( V ) vogal e
(C ) consoante:

V É
O quadro ao
Estudos
lado considera os
apontam que a
Fonética e Fonologia
estudos de 35
sílaba C+V é a BLEVINS (2006),
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C+V Casa
V+C Arte
C+V+V Paulo
C+C+V+C brando
C+C+V Plano
C+V+C Turma
C+C+V+C+C transtorno
C+C+V+V+C claustro
C+V+V+C Coimbra
C+V+V+V Uruguai

Concluindo, vale ressaltar a observação feita por MARTINS , aqui reproduzida:

“Considerar as diferentes estruturas silábicas da língua é importante (...), tendo em


vista que os aprendizes da escrita precisam conhecer todas elas, a fim de consolidarem
seu processo de alfabetização. Um outro ponto importante é não confundir a noção de
sílaba na fala e na escrita. Se, do ponto de vista da escrita, a palavra cha-ve apresenta
uma sílaba CCV e outra CV, do ponto de vista da fala, apresenta duas sílabas CV, tendo
em vista que é pronunciada como “xa-vi” na maior parte do país. Desse fato é que pode
ocorrer uma interferência da fala sobre a escrita do aprendiz, de modo que ele grafe duas
sílabas CV (“xavi”) e não uma CCV e outra CV para chave.

Seguindo esse raciocínio, a escrita da palavra xale – que tanto na fala como na
escrita apresenta a mesma estrutura silábica (duas sílabas CV) – tenderia a ser mais fácil
do que a escrita de chave. Acrescenta-se, ainda, a necessidade de reflexão sobre a divisão
silábica indicando os diferentes critérios que são aplicados na escrita e na fala. Um caso
típico é o da regra que indica que, na escrita, ao final de uma linha, quando dividimos uma
palavra, os dígrafos ‘rr’ e ‘ss’ não ficam na mesma sílaba. Assim a palavra ‘carro’, por
exemplo, seria dividida como ‘car-ro’. Essa divisão, no entanto, não implica que, na fala, a
primeira sílaba seja CVC. Aqui, como em vários casos de convenções, tem-se um
procedimento ortográfico e não fonológico.”

Fonética e Fonologia 36
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BACK, Eurico; MATTOS, Geraldo. Gramática Construtural da Língua Portuguesa.


São Paulo: FTD, 1972
BARBOSA, J .M. 1965. Études de Phonologie Portugaise. Lisboa: Junta de
Investigações Científicas do Ultramar. 2.ème éd.: Évora: Universidade de Évora,
1983
BARROSO, H. Forma e Substância da Expressão da Língua Portuguesa. Coimbra:
Almedina,1999.
BISOL, Leda. Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro.4 ed.
Porto Alegre: EDIPUCRS. 2005
CAGLIARI, Luiz Carlos. Elementos de fonética do português brasileiro. Campinas.
Tese (Livre docência) - Universidade Estadual de Campinas.1981
CRISTÓFARO-SILVA, T. Fonética e Fonologia do Português: roteiro de estudo e
guia de exercícios. São Paulo: Contexto, 2009.
HENRIQUES, Isabel. A importância da sílaba: uma reflexão fonológica. eLingUp
[Centro de Linguística da Universidade do Porto] Volume 1, Número 1, 2009
MARTINS, Raquel Márcia Fontes. Estrutura Silábica. Lavras: Centro de
Alfabetização e escrita – Ceale/FaE/; UFLA, disponível em
http://ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossarioceale/verbetes/estrutura-
silabica
SEARA, Izabel Christine. Fonética e fonologia do português brasileiro : 2º período
/ Izabel
Christine Seara, Vanessa Gonzaga Nunes, Cristiane Lazzarotto-Volcão–
Florianópolis: LLV/CCE/UFSC, 2011.
VANDRESEN, Paulino. A linguística no Brasil, 2001. Disponível em
http://comciencia.br/dossies-1-72/reportagens/linguagem/ling15.htm

7. A FONÉTICA DO INGLÊS

Um dos aspectos mais difíceis de aprender inglês é a pronúncia, e não apenas para
aqueles que aprendem inglês como segunda língua. O inglês britânico tem 44 sons
diferentes e cerca de 1.100 maneiras diferentes de escrevê-los. Para um falante não nativo
que quer aprender inglês, pode ser um desafio real pronunciar os diferentes fonemas

Fonética e Fonologia 37
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corretamente e, acima de tudo, reconhecer a pronúncia correta de uma palavra ao lê-la. A


mesma letra pode ser pronunciada de forma diferente em palavras diferentes. Além disso,
as palavras em inglês não têm acentos, mas enfatizam certas sílabas na palavra, que é
chamada de estresse.

Uma pronúncia correta é fundamental para evitar equívocos, satisfazer as suas


necessidades ou simplesmente ter uma conversa agradável. Dominar a pronúncia
do inglês demora algum tempo, por isso tenha paciência, nunca se dê por vencido
e não deixe de rir de si mesmo quando cometer um erro. [Source: BRENNER, Gail.
Inglês para leigos. P. 13. 2. ed. Rio de Janeiro: Starlin Alta Editora e Consultoria]

A melhor maneira de aprender a pronunciar bem as palavras e de ser compreendido


é consultar um bom dicionário fonético.

CURIOSIDADE: existem entre 30 e 40 dialetos da língua inglesa no Reino Unido, e


mais de 20 dialetos nos Estados Unidos.
7.1. História
Os compêndios produzidos para o ensino de língua inglesa do século XVIII já
mostravam uma preocupação com a parte fonética, uma vez que os estudos geralmente
eram iniciados com uma tentativa em se trabalhar o som das letras e, a seguir, das sílabas
e palavras do inglês. A sistematização da representação desses sons e a consequente
representação por símbolos fonéticos, no entanto, foi percebida no final do século XIX, com
o movimento de reforma dos estudos da língua inglesa. Entre os princípios da reforma,
destacam-se a reconhecida primazia da fala, a centralidade do texto contextualizado no
processo de ensino-aprendizagem e a prioridade absoluta de uma metodologia que focasse
nas práticas orais em sala de aula. (HOWATT, WIDDOWSON, 2009)

Ao estudarmos fonética, alguns questionamentos sempre ocorrem, em torno, por


exemplo, da dicotomia entre o inglês britânico e o inglês americano e a busca constante
pela pronúncia perfeita e pelo sotaque nativo. Algumas explicações, no entanto, são
necessárias. No atual mundo pós-moderno e globalizado, não se pode mais reduzir a língua

Fonética e Fonologia 38
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inglesa aos sotaques e particularidades de apenas dois países, quando entramos


constantemente em contato com tantos outros falantes de inglês dos mais diversos países,
e a comunicação estabelecida é assegurada, independente da pronúncia empregada,
desde que esta seja correta. Você alguma vez já fez esse questionamento? Sobre o
sotaque do inglês que você deseja obter? Ou sobre a primazia do sotaque de um país em
relação ao encontrado nos demais países falantes desse idioma?
7.2. AFI (alfabeto fonético internacional) e os fonemas da língua inglesa
Como já vimos em outra aula, para ajudar os estudantes de línguas e aqueles que
simplesmente desejam aprender uma língua estrangeira, os linguistas desenvolveram o
AFI, o Alfabeto Fonético Internacional. É um sistema de símbolos universais que classifica
todos os sons presentes nas diferentes línguas do mundo. Cada símbolo corresponde a um
fonema. Este é um alfabeto ideal que quebra barreiras linguísticas e pode ser entendido
por qualquer falante de qualquer idioma. Além disso, ao estudar inglês, o AFI é
fundamental. Isso ocorre porque contorna o problema ortográfico, ou seja, a falta de
correspondência entre a pronúncia de uma palavra e a maneira como ela é escrita.
Abaixo temos os fonemas da língua inglesa:

7.3. Writing X Pronunciation


O mesmo grafema (letter) não corresponde sempre ao mesmo fonema (sound), isto
é, não tem sempre a mesma interpretação, a mesma pronúncia

7.4. Consonant Sounds


De acordo com o vozeamento, os sons consonantais podem ser vozeados (voiced)
ou não-vozeados (unvoiced / voiceless). Quando o fluxo de ar passar pela laringe, na
altura das cordas vocais, o estreitamento da glote faz com que o som produzido seja

Fonética e Fonologia 39
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vozeado, enquanto que a abertura da glote faz com que haja pouco atrito nessa região e o
som produzido seja não-vozeado, ou seja, sem vibração das cordas vocais.

7.5. Fonemas Vocálicos


Ao estudarmos as vogais, não nos preocuparemos com as classificações já que as
vimos nas aulas anteriores.

Existem vogais longas e vogais curtas. As longas, como o próprio nome assinala,
são aquelas com uma duração maior para a sua pronunciação, enquanto que as curtas são
pronunciadas rapidamente. Analisando as vogais que são encontradas em pares, é fácil
percebermos essa distinção. As vogais longas são representadas por dois pontos. Vejam
o exemplo: a./i:/ - seat (vogal longa) b./I/ - sit (vogal curta

/ə:/ Schwa. Este é um fonema muito comum em Inglês que é encontrado em muitas
palavras. É uma vogal reduzida, frequentemente encontrada na sílaba final de uma palavra.
Também pode ser encontrado em algumas palavras onde a única vogal é encontrada entre
duas consoantes.

Exemplos: father (Pai)/ˈfɑːðə(r)/, mother (Mãe)/ˈmʌðə(r)/

Também está presente em sílabas fechadas não acentuadas.

Fonética e Fonologia 40
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Exemplos: president (presidente) /ˈprezɪdənt/, experimente


(experimento)/ɪkˈsperɪmənt/

/ʌ/: Este fonema é uma vogal curta perto de “a”. Muitas vezes, em inglês, ele é
associado ao grafema “o” na frente das consoantes “w” ou “c” e depois de um “n”

Exemplos: onion (cebola)/ˈʌnjən/, wonderful (maravilhoso)/ˈwʌndə(r)f(ə)l/, money


(dinheiro)/ˈmʌni/, monk (monge) /mʌŋk/, month(mês) /mʌnθ/, summer (verão)/ˈsʌmə(r)/, up
(acima)/ʌp/, to cut (cortar) /kʌt/

7.6. Fonemas Do Ditongo


Um ditongo é um conjunto de duas vogais. Em inglês, entretanto um ditongo pode
ser encontrado mesmo quando há uma única vogal na grafia que na transcrição fonética se
torna um ditongo. Segundo as classificações do AFI, existem oito fonemas que
correspondem aos ditongos. aqui estão alguns exemplos:

/eɪ/

Este ditongo é geralmente associado aos seguintes grafemas: o “a” em cake, o “ai”
no brain, o “ay” em play, o “ei” em eight, o “ey” em they e o “ea” no break.

Exemplos: way (caminho) /wei/, to say (falar) /to sei/, main (principal)/mein/, lane
(faixa)/lein/, face (face)/feis/, day (dia)/dei/

/ai/

Um ditongo encontrado em sílabas tônicas abertas, associado ao grafema “i” seguido


por “ld”, “nd”, “gh” ou “gn”.

Exemplos: mild (suave) /maild/, night (noite) /nait/, fight (briga)/fait/, right (direito)/rait/,
high (alto) /haɪ/, mind (mente) /maind/

Quando um “i” é seguido por um “r” em uma sílaba aberta.

Fonética e Fonologia 41
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Exemplos: hire (contratar)/ˈhaɪə(r)/, fire (fogo) /ˈfaɪə(r)/, to require (requerer)


/rɪˈkwaɪə(r)/

Outros Exemplos:
price (preço) /praɪs/, to try (tentar) /to traɪ/, mine (meu) /maɪn/, eye (olho) /aɪ/

Com um pouco de prática e uso do dicionário, você aprenderá a pronunciar palavras


em inglês de forma correta e fluente. Deve-se dizer que a melhor maneira de aprender a
pronunciar bem as palavras é sempre ouvindo.

CELCE-MURCIA, Marianne; OLSHTAIN, Elite. Discourse and Context in Language


Teaching: a guide for language teachers. 7th printing. Cambridge: Cambridge
University Press, 2009.
ODOY, Sonia M. Baccari et al. English pronunciation for brazilians:the sounds of
American English. São Paulo: Disal, 2006.

Fonética e Fonologia 42
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8. FONÉTICA E FONOLOGIA NA SALA DE AULA

A reflexão sobre as implicações da Fonética e da Fonologia no processo de ensino


e de aprendizagem da linguagem se justifica, inicialmente, por remeter à modalidade oral
da língua, cujo surgimento antecede o da modalidade escrita. Depois, um breve olhar sobre
tais modalidades nos faz perceber que a escrita não pode ser simplesmente uma forma de
reprodução da oralidade, dadas as diferenças entre as duas.

No entanto, vocês aprenderam nas disciplinas de didática alguns autores


importantes como Vygotsky, Paullo Freire e Piaget. Só que, muitas vezes, em sala de aula,
parece que nossos dilemas e dúvidas não são sanados por nenhum teórico. Esses
questionamentos se tornam ainda mais recorrentes quando pensamos na tecnicidade com
que ensinamos os conteúdos de Fonética e Fonologia, quando ‘transformamos’ a letra ‘p’
– que é como as crianças aprendem – em “consoante oclusiva bilabial desvozeada”, como
a descreve a Fonética. Qual é, de fato, a aplicação desta disciplina?

Para o professor, é necessário compreender os conceitos de Fonética e de


Fonologia, a fim de despertar, no educando, o interesse acerca dos fenômenos da
linguagem. Não se trata, pois, de uma compreensão academicista, mas, antes, formativa,
que nos dá condições pedagógicas de fazer o outro desvendar os mecanismos de uma
atividade que nos é própria.

Antes de mais nada é interessante perceber que os conteúdos de Fonética e de


Fonologia perpassam todo o currículo do ensino fundamental, até porque é nessa fase
escolar que se darão com mais ênfase as aquisições da fala e da escrita. No entanto, é
difícil perceber essa relação, isso só se dará se o professor de língua portuguesa possuir
essa habilidade em sua formação docente.

Vejamos de que maneira alguns conceitos dessa disciplina se apresentam no


currículo:
 Som e letra: apresentando, de forma adequada, a cada ano, a relação nem
sempre correspondente entre esses dois elementos, uma vez que temos mais
de um símbolo gráfico para alguns sons idênticos – caso do s / z / x, por
exemplo, em uso, leveza e exame.

Fonética e Fonologia 43
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 Vogais e consoantes: um dos pontos que mais chocou aos professores é


passar a ‘saber’ que não temos só cinco vogais, mas sete – se considerarmos
só as orais – ou doze – se incluirmos nessa conta as nasais. Embora esse
aspecto sobre as vogais pareça simples, ajudaria as crianças a perceberem
com mais nitidez questões regionais e variações.

Além disso, como é na educação fundamental que os alunos terão os primeiros


contatos com a escrita e com a leitura, torna-se importante a abordagem de aspectos
regionais mais recorrentes visando a uma conscientização de que esses traços não fazem
um registro ‘mais correto’, apenas demonstram características de variação – como
alçamento, abaixamento, harmonização, palatização, ente outros.

Não poderíamos deixar de refletir sobre as questões ortográficas, mais


especificamente os “erros” cometidos pelos pequenos em processo de aprendizagem.
Quando o educando utiliza X para escrever palavras que apresentam o aludido fone, mas
que se caracterizam ortograficamente por serem grafadas com CH, ou vice-versa, ele não
está simplesmente cometendo um erro ortográfico, mas tentando padronizar a escrita
dessas palavras a partir de seu conhecimento de mundo, a partirde sua percepção sobre a
relação entre som e letra.

O grande problema é que, muitas vezes, o professor não se aproveita dessa


percepção para proporcionar uma reflexão sobre a diferença desses aspectos da
linguagem: o oral e o escrito. Aliás, Possenti (2011, p. 51) faz uma interessante reflexão
sobre o erro ortográfico:

Os erros são resultado de tentativas de acertar. As hipóteses de quem escreve são


certamente equivocadas, mas não são estúpidas. Por exemplo, quem escrever
ezalstor (por exaustor) erra porque o x de fato representa o som [z] e o som [u] (ou
melhor, a semivogal [w]) ora é representado na escrita por u, ora por l (compare a
rima sumiu – Brasil). Seria estranho se os erros não tivessem nenhuma
regularidade. (POSSENTI, 2011, p. 51).

Diante da postura de apenas sinalizar como erro a padronização do aluno, não


somente se deixa de aproveitar um raciocínio proveniente de seu conhecimento de mundo,
mas também uma oportunidade de tomar tal padronização como um raciocínio válido em
uma área de conhecimento, mas que deve ser modificado em outra. Nas palavras de Paulo
Freire (2011), “não é possível respeito aos educandos, à sua dignidade, a seu ser

Fonética e Fonologia 44
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formando-se, à sua identidade fazendo-se, se não se levam em consideração as condições


em que eles vêm existindo, se não se reconhece a importância dos ‘conhecimentos de
experiência feitos’ com que chegam à escola” (FREIRE, 2011, p. 62). É papel do professor
conduzir esses conhecimentos, de modo a aproveitá-los da melhor forma no ambiente
educacional.

Como podemos observar, há algumas contribuições que os conceitos de Fonética e


Fonologia podem trazer para o ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Afinal, a
aquisição da escrita e da leitura necessita do conhecimento linguístico, de uma consciência
fonológica, dos sons e símbolos que compõem a língua materna do aluno, das
possibilidades de construção silábica, da prosódia, da ortografia, do funcionamento do
aparelho fonador e da produção dos sons da fala.

8.1. Troca de letras


Outro aspecto importante de ressaltar, principalmente para professores de séries
iniciais, refere-se à identificação de problemas de aprendizagem de escrita. Sabemos que
não cabe ao professor o diagnóstico médico, mas é na sala de aula que conseguimos
identificar que um aluno necessita de auxílio profissional.

A maioria dos alunos que apresenta dificuldade na escrita, não tem problemas em
entender ou falar palavras com sons trocados. Isto é, ao ouvirem, por exemplo, alguém falar
“pote”, não a confunde com “bote”, assim como, ao se expressarem oralmente, articulam
bem uma e outra palavra.

Quando os alunos estão aprendendo as convenções do sistema alfabético é comum


alguns cometerem trocas entre p e b, t e d, f e v. Essas trocas ocorrem devido ao fato
desses sons serem muito semelhantes em sua realização no aparelho fonador e, por isso,
ao escrever surgem dificuldades em diferenciá-los. Tecnicamente, esse grupo de letras
(P/B, V/F, T/D) é chamado de “pares mínimos”. Segundo Morais,

Esses sons são produzidos expelindo-se o ar do mesmo modo, do mesmo ponto de


articulação, diferindo apenas porque em um (por exemplo, o /b/) as cordas vocais
vibram, enquanto no outro som (por exemplo, o /p) elas não vibram. (MORAIS: 2003,
p. 29).

Fonética e Fonologia 45
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Assim, pode-se propiciar ao aluno atividades que o auxiliem a realizar essa análise.
Ao fazer confronto com as diferentes formas de escrita (FACA e VACA, por exemplo) e ao
evidenciar as correspondências letras /som o aluno se dará conta de que, em nosso sistema
de escrita, existe uma única e definida letra para notar o som em questão.

Alguns linguistas propõem que só se trata duas classes de sons como fonemas
distintos se comutar essas classes entre si, gerando enunciados diferentes. Por exemplo:
a classe dos sons representados por /p/ é um fonema distinto de /b/ em português porque
pato e bato são palavras com sentidos diferentes. Embora tenham várias características
fonéticas em comum, /p/ e /b/ são fonemas distintos no português porque a diferença entre
eles é usada na estrutura do idioma para criar enunciados distintos.

Na escrita o p e b são letras parecidas. Quando a perninha desce é um p, mas


quando sobe é um b, então subir e descer, descer e subir significa lateralidade e espaço. É
muito fácil para os adultos e complicados para as crianças na educação infantil e no ensino
fundamental. Uma letra parecida com outro signo gráfico, mas com traçado diferente, pode
representar, na leitura, um som diferente e, consequentemente, trará outro significado.
Quando uma criança não aprende a grafar bem, pode ser uma deficiência de percepção
espacial ou de lateralidade como também uma deficiência cognitiva. Morais, explica que a
troca de letras,

É a capacidade de a criança reter os movimentos motores necessários à realização


gráfica. À medida que a criança entra em contato com o universo simbólico (leitura
e escrita), vão ficando retidos em sua memória os diferentes movimentos
necessários para o traçado gráfico das letras. (MORAIS: 1986, p. 34).

Lidar com os fatos da língua como fatos da língua, realidades passíveis de serem
atestadas no convívio social, pode auxiliar o professor a encontrar essas formas de lidar
com as diferenças, de aproveitar os aspectos culturais em sala de aula. Tal aproveitamento,
por sua vez, além de proporcionar a valorização dos saberes do educando, também tende
a proporcionar novas discussões, a motivar o diálogo em sala de aula, a expandir a reflexão
sobre a linguagem a outros níveis, mediante a identificação de outros aspectos até então
não reconhecidos

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9. ATIVIDADES PRÁTICAS

Nessa aula, vamos propor algumas atividades para você refletir sobre seus
conhecimentos da disciplina e que poderão auxiliá-lo em sua prática docente.

Quando falamos em Fonética, voltamo-nos claramente para os sons. Assim, fica fácil
pensar em atividades a partir de áudios e vídeos. No entanto, o texto é capaz de trazer
essas particularidades, seja na transcrição literal, seja em uma reflexão como fez o ENEM
em 2010. Observe o texto da prova:

(ENEM-2010) Quando vou a São Paulo, ando na rua ou vou ao mercado, apuro o
ouvido; não espero só o sotaque geral dos nordestinos, onipresentes, mas para conferir a
pronúncia de cada um; os paulistas pensam que todo nordestino fala igual; contudo as
variações são mais numerosas que as notas de uma escala musical. Pernambuco, Paraíba,
Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí têm no falar de seus nativos muito mais variantes do
que se imagina. E a gente se goza uns dos outros, imita o vizinho, e todo mundo ri, porque
parece impossível que um praiano de beira-mar não chegue sequer perto de um sertanejo
de Quixeramobim. O pessoal do Cariri, então, até se orgulha do falar deles. Têm uns tês
doces, quase um the; já nós, ásperos sertanejos, fazemos um duro au ou eu de todos os
terminais em al ou el – carnavau, Raqueu… Já os paraibanos trocam o l pelo r. José
Américo só me chamava, afetuosamente, de Raquer. [Queiroz, R. O Estado de São Paulo.
9 maio 1998 (fragmento adaptado).]

Observem quantas possibilidades poderíamos trabalhar a partir de um texto desse.


O mais evidente deles seria relativo à Sociolonguística, mas a Fonética e Fonologia também
está presente. Tanto que a questão esperava uma resposta sobre Fonologia. Falar sobre a
diferença entre os sons e os falares do Brasil é fundamental para romper com os
preconceitos que trazemos.

Outra forma de se trabalhar essas diferenças é por meio do uso de tirinhas. Observe:

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Novamente vemos mais de um conteúdo possível, tanto a Semântica como a


Fonética. Nessa imagem, vemos claramente como a mudança de letra, muda o significado
de uma palavra e isto só é percebido na escrita ou pelo contexto. Há infinitas possibilidades
dentro dessa história, mas o interessante é que o texto se constrói a partir de questões
fonéticas.

Além do texto e da tirinha, também podemos pensar em como trabalhar a fonética


nas artes. Especificamente na poesia.

9.1. Poesia Fonética


A poesia é composta de várias vertentes, um deles é a poesia fonética, que pode ser
definida através de uma junção de fatores fonéticos específicos da linguagem tradicional,
que agem sobre os ideais sintáticos e semânticos mais tradicionais. Nesse tipo de estilo,
várias vezes não existe o uso de palavras, fazendo assim com que haja uma maior
aproximação com o mundo musical.

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Não é a mesma coisa que poesia sonora, algo que muitas vezes causa confusão nas
pessoas, no entanto as duas possuem diferenças que, se bem analisadas, irão mostrar que
as distinções são bastante válidas e de efeitos significativos

Na sua origem a poesia possui o fonetismo. A voz é usada, sendo que há muito
tempo as mesmas eram expressas oralmente, por declamação, sendo que alguns artistas
da época eram conhecidos por declamar poemas com extrema habilidade.

No século 20, a poesia foi praticamente usada em forma de música, ou melhor, em


fonética, pois valorizavam a expressão humana, sendo que a voz trazia mais emoção ao
que se lia.

Hoje, podemos encontrar fusão de gêneros e os poemas podem ser declamados em


forma de música, podem ser multimídia, podem muitas coisas

Esse é um exemplo de poema que privilegia os aspectos sonoros. Nesse a


exploração é bem evidente, no entanto há poemas que apenas trabalham as questões
sonoras como um dos aspectos do texto. Por exemplo, a aliteração e a assonância,
repetição de consoante e vogal respectivamente.

9.2. Fonética e sintaxe


Os estudos da interface entre fonética e sintaxe postula que a produção de uma
palavra isolada tem uma enunciação característica. No entanto, a enunciação de uma frase,
enquanto sequência de palavras, não é um mero encadear dessas enunciações isoladas.

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Há autores que defendem que esta representação fonológica estabelece relações de


interface com a sintaxe, isto significa que, de algum modo, a representação sintática pode
influenciar a representação fonológica e isso permite perceber por que é que a fonologia da
frase.
Podemos perceber nas frases abaixo:
(1) Foi embora? Não, está aqui!
(2) Foi embora! Não está aqui.

Ao mesmo conjunto de palavras estão subjacentes diferentes estruturas sintáticas,


o que se reflete na sua enunciação. Vejam-se a este propósito os exemplos (1) e (2).

O que queremos demonstrar é que a colocação ou não da pontuação modifica a


função dos termos das sentenças e, a partir disso, termos entoação diferente das frases.

Estes efeitos da sintaxe sobre a fonologia têm vindo a ser estudados, mas também
é possível a influência contrária e termos princípios fonológicos que restringem o número
de representações sintáticas.

9.3. Fonética e semântica


Com a evolução do latim para o português, ocorreram várias alterações a nível
fonológico, ou seja, nos fonemas ou sons que constituem as palavras. No entanto, estas
variações que se verificam no plano fonológico não se devem apenas a esta evolução:
dentro da própria língua portuguesa continuam a suceder processos evolutivos, muitos
deles frequentes em registos populares e outros decorrentes da oralidade.

Entre eles destacamos aqueles de mudança fonética, ou seja, de inserção ou


supressão de segmentos. Esse processo consiste em inserir novos sons ou fonemas numa
palavra (no início, no meio ou no final da mesma).
Prótese – inserção de um fonema no início de uma palavra.
Ex.: stare > estar
Epêntese – inserção de um fonema no meio de uma palavra.
Ex.: creo > creio
Paragoge – inserção de um fonema no final de uma palavra.
Ex.: ante > antes
Processo de supressão de segmentos

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Processo que consiste em suprimir sons ou fonemas numa palavra (no início, no
meio ou no final da mesma).
Aférese – supressão de um fonema no início de uma palavra.
Ex.: attonitu > tonto
Síncope – supressão de um fonema no meio de uma palavra.
Ex.: malu > mau
Apócope – supressão de um fonema no final de uma palavra.
Ex.: amore > amor

Essa modificação, muitas vezes também favorece a mudança de sentido do termo.


Ao longo dos tempos, as palavras evoluem ao nível fonológico, originando mudanças no
significante (na parte gráfica e acústica da palavra). Para além desta mudança, também é
possível verificar um outro tipo de evolução que ocorreu ao nível da semântica – palavras
cujo significante não se alterou, mas nas quais houve uma modificação no significado.

que está só, solitário – significado inicial


Ex.: solitariu > solteiro

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