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Fonética e Fonologia

Professor Ruan Diniz


Aula 1

Refletindo sobre a fonética e a fonologia do


português brasileiro e seus campos de interface
Queridos alunos surdos, não me matem!
Mas considero importante vocês saberem
pelo menos o mínimo sobre a Fonética e a
Fonologia do português brasileiro.
Não vou mandar ninguém ficar repetindo
nada… Não é uma terapia
fonoaudiológica!!!
É apenas uma introdução ao assunto...
Pergunta: o que é objeto de estudo?
O que a Biologia estuda?
O que a Antropologia estuda?
O que a genética estuda?
O que a Fonética e a
Fonologia estudam?
Os sons da fala.
E no caso das línguas de
sinais?
Os parâmetros e
como a combinação
entre eles produzem
diferenças no
significado.
Já perceberam que nós,
brasileiros,
falamos/sinalizamos de
maneiras diferentes, mas
ainda assim conseguimos
nos compreender?
Vamos ver que a Fonética pode ser estudada a
partir de três pontos:
1) Fonética Articulatória: Baseia-se na articulação em si.
2) Fonética Acústica: Baseia-se na física acústica.
3) Fonética Perceptual: Baseia-se na percepção.
A descrição da fala não é uma descrição
ortográfica, ou seja, a representação da
escrita e a representação da fala são feitas de
forma diferente.
Então, vamos desvincular LETRA de SOM.
Como assim?
Você já percebeu, por exemplo a letra “X”?

Ela aparece em várias palavras da mesma


forma, mas com sons diferentes?
Por exemplo: “xícara”, tem o mesmo som
em “caCHorro” e “chuva”, mas se difere
em “exemplo”, “tóxico” e
“extraordinário”
Existe um alfabeto (existem alguns)
que não é o mesmo do nosso alfabeto
convencional. É o chamado alfabeto
fonético.
Os mais usados são o IPA (International
Phonetic Alphabet) - em português, AFI
(Alfabeto Fonético Internacional) - e o
SAMPA (Speech Assessment Methods
Phonetic Alphabet - em português,
Alfabeto fonético dos Métodos de
Avaliação da Fala).
Retomando os exemplos...
- A representação da palavra em português é “CHUVA”.
- A representação dos sons dessa palavra é ['ʃuva].
- A representação da palavra em português é
“XÍCARA”.
- A representação dos sons dessa palavra é [‘ʃikaɾɐ].
- A representação da palavra em português é
“TÓXICO”.
- A representação dos sons dessa palavra é [‘tɔk.si.kɔ].
É possível também perceber
essas diferenças na Libras
Você já reparou que os usuários da
Libras soletram seu nome com pequenas
alterações nas configurações de mãos,
mas ainda assim conseguimos perceber o
nome da pessoa?

Deem exemplos.
Já repararam que alguns sinais tem modificações
na configuração de mão, mas ainda assim
conseguimos perceber que sinal é?
- Exemplo:
- Mudança da Configuração de Mão: “NACIONAL”;
“CASA”;
- Mudança do Movimento: “ESCREVER”;
“OUVINTE”; “INTÉRPRETE”.
- Entre outros.
Vamos falar sobre essas e outras questões
nessa disciplina, tentando, na medida do
possível, fazer uma interface entre o português
e a libras.
Bom, então já sabemos qual o objeto de estudo da
Fonética e da Fonologia…

Qual é mesmo?
Investigar como os seres humanos (no caso das
línguas faladas) produzem e percebem a fala. E,
no caso das línguas de sinais, como os sinais (em
toda sua construção) são produzidos e recebidos.
Precisamos aprofundar alguns conceitos…
Vamos lá!
FALA.
Verbalização (não escrita) de uma língua.
ESCRITA.
Utilização de símbolos, em um suporte, onde há registro de
informações.
LÍNGUA ORAL.
Língua que utiliza os aparelhos
vocal e auditivo para produzir e
perceber a fala. São as línguas de
modalidade oral-auditiva, com o
português, o árabe e o romeno.
Pode se referir, também, às
línguas de sinais, em oposição à
língua escrita.
LÍNGUA ESCRITA.
Oposição à modalidade oral de uma língua.
LÍNGUA FALADA.
Termo usado de forma preferencial para as línguas de
modalidade oral-auditiva.
INTERLOCUTOR.
Pessoa que participa (interage) em uma conversa.
ORALIDADE.
Uso natural de uma língua de forma não escrita, produzida em
diferentes contextos discursivos.
Nas línguas faladas, para haver comunicação entre
duas pessoas, é necessário alguns requisitos
básicos. Por exemplo…
Um bom funcionamento do cérebro.
Dos pulmões.
Da laringe.
Do ouvido.
Dentre outros órgãos, além do reconhecimento da
pronúncia.
É importante também que haja captação
adequada das ondas sonoras.
E no caso das línguas de sinais???
Um bom funcionamento do cérebro.
Dos membros superiores (braços, antebraços,
punhos, mãos e ombros).
Da cabeça.
Na verdade, do corpo de forma geral.
Além do reconhecimento da pronúncia.
É importante também que haja captação
adequada dos sinais produzidos no espaço.
Voltando para o português brasileiro…
Podemos estudar a fala a partir de sua fisiologia...

Pelos órgãos que produzem a fala, como:


- Língua: articulação da maior parte dos sons
da fala;
- Laringe: “produção” da voz. Pode-se
distinguir os sons vozeados (sonoros) dos
não vozeados (surdos).
Podemos estudar a fala a partir dos sons gerados
pelos órgãos fonadores, com base nas propriedades
sonoras transmitidas por esses sons...
Ainda, podemos analisar a fala a partir do
processamento da onda sonora (percepção) de
quem ouve o que foi dito.
Em suma, a Fonética estuda a produção da fala,
levando em consideração a variação linguística), a
fisiologia dos indivíduos e suas características
pessoais.
Então, a Fonética Articulatória, ocupa-se em:
- Observar, se durante a produção de um som,
houve ou não vibração das pregas vocais,
definindo se ele é sonoro ou surdo;
- Descrever o movimento da língua dentro da
boca (trato vocal) e o movimentos dos demais
órgãos responsáveis pela produção do som.
Você já parou para pensar que conseguimos
perceber se uma pessoa é carioca, mineira,
nordestina, sulista, somente pelo modo como ela
fala (sotaque) ?
E em Libras, tem sotaque?
E também conseguimos perceber se um
determinado som pertence ou não a nossa língua…
Conseguimos perceber quando uma configuração
de mão não pertence à Libras? ?
A capacidade de identificar
sotaques e fonemas que não
pertencem a nossa língua, é
objeto de pesquisa da Fonética
Auditiva ou Perceptual.

Essa linha da Fonética tenta


entender como o som é tratado
no aparelho auditivo e como são
decodificados pelo nosso cérebro.
E a Fonética Acústica?

Investiga a produção sonora


com o auxílio de
equipamentos tecnológicos,
sendo avaliada a partir de
parâmetros sonoros. O
arcabouço teórico é a Física.
Para começarmos a diferenciar a Fonética da
Fonologia, vejamos o seguinte exemplo:

No sudeste, a palavra “TIA” - [‘ʧia] - é


pronunciada como se tivesse um “TCH” (chiado)
e, e no nordeste não tem essa característica.
A Fonética vai descrever de que forma os sons
foram realizados e a Fonologia vai explicar todo o
processo que gerou essas mudanças e condiciona
variações nas pronúncias.
E em Libras?
Qual o sinal do verbo
‘ENTENDER’?
A Fonética descreve o ponto de articulação deste
sinal e a Fonologia explica o processo que originou
essa mudança.
Um outro exemplo...
As palavras “FACA” e “VACA” têm pronúncias parecidas,
apesar de significados diferentes. A diferença está no som do
[f], que é surdo e, do [v] que é sonoro.
Os sons que distinguem palavras são chamados de
FONEMAS pela Fonologia.
E em Libras?
Qual o sinal das palavras abaixo?
MANTEIGA x PINTAR

CHICAGO x TEXAS

TRISTE x TESTE

AZAR x DESCULPA

SILÊNCIO x CALADO!

O que diferencia esses sinais?


Em suma, a Fonologia preocupa-se em tratar das
unidades que distinguem o significado das
palavras/sinais, além de organizar regras e
entender como se dá a variação.
Campos de interface
Alfabetização e ensino de língua materna
- Fundamental para professores que atuam na
alfabetização, para atender às necessidades
dos alunos;
- Saber lidar com a variação fonético-fonológica e
levar o aluno a compreensão, relacionando com
a escrita, principalmente de natureza social;
- Lidar de forma adequada com o preconceito
linguístico.
Ensino de línguas estrangeiras
- Conhecer o sistema fonológico de ambas línguas;
- Comparar os sistemas sonoros/quirológicos;
- As explicações fonético-fonológicas podem acelerar o processo
de aprendizagem.
Fonoaudiologia
- O fonoaudiólogo lida com alterações no processo de aquisição
da fonologia da língua (também devido a problemas
neurológicos e auditivos);
- Precisa compreender os mecanismos articulatórios, acústicos,
neuronais e cognitivos relacionados à produção e recepção da
fala;
- Para o trabalho de aprimoramento e reabilitação vocal,
precisa compreender a relação entre a produção dos sons e a
fisiologia do aparelho fonador.
Fonética forense
- Comparação de gravações de aúdios para achar um suspeito
de um crime, por exemplo.
Tecnologias da fala
- Síntese de fala (computador vocaliza um texto);
- Reconhecimento de fala (a máquina reconhece a voz humana);
- Interação via fala (integração dos dois acima).
Tradução
- Conhecer os sistemas sonoros da língua envolvidas;
- Para os intérpretes, é fundamental para que não haja
dificuldade de compreensão oral durante uma atividade
interpretativa.
Referências bibliográficas
SEARA, Izabel Christine; NUNES, Vanessa Gonzaga; LAZZAROTTO-VOLCÃO, Cristiane. Para conhecer: fonética e
fonologia do português brasileiro. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2017. 200 p.

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