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Florianópolis - SC
2016
AS CINCO BLOGUEIRAS NA CAPA DA GLAMOUR: ANÁLISE A PARTIR
DA ESTÉTICA DA RECEPÇÃO
INTRODUÇÃO
1
As interações entre internautas/leitores e as blogueiras e sua equipe ocorrem no espaço de comentários
dos blogs, através das redes sociais e por meio de comentários do Youtube.
Os assuntos como beleza, bem estar e comportamento são ferramentas de
persuasão ao consumo nos discursos das blogueiras, mas também são assuntos
relevantes para a representação das suas identidades através das suas narrativas textuais
e imagéticas, podendo gerar identificação e admiração por parte de suas leitoras e
leitores. Portanto os blogs não são apenas uma ferramenta para a construção de
discursos, mas são parte de um processo criativo que permeia um sistema de
comunicação diferenciado das demais mídias e historicamente, são plataformas com
capacidade de arquivar memórias pessoais que contribuem para o processo de
construção da personagem blogueira.
O sucesso que as cinco blogueiras atingiram, inicialmente com as suas leitoras,
se estende do universo online da internet – redes sociais e blogs – para outras mídias,
como comerciais de televisão, anúncios em revistas, dentre outras, por meio da
divulgação de grandes empresas de produtos de moda e beleza. No campo da moda,
acompanhar as novidades é sinônimo de estilo, assim, as marcas e empresas de
confecções sugerem estilos de vida através de coleções que mudam de forma constante,
e os seus consumidores afirmam sua identidade social por meio da moda (ARAÚJO,
2009). As blogueiras fazem parte desse sistema através das escolhas dos produtos
certos, a composição do vestuário fotografado/filmado dialoga diretamente com um
estilo de vida que remete à sofisticação, à beleza e à elegância como qualidades que
podem ser adquiridas através do consumo. Por meio de parcerias com empresas e grifes
da moda, as blogueiras têm possibilidade de criar o conteúdo2 de publicidade e difundi-
lo para além do espaço dos blogs, o espaço das redes sociais e do Youtube.
As blogueiras Thássia Naves, Lalá Rudge, Helena Bordon, Camila Coutinho e
Camila Coelho escrevem e produzem material fotográfico e audiovisual sobre moda e
beleza, e adquiriram um status de produtoras no campo da moda, apesar de não serem
todas elas profissionais formadas nesta área específica. Seus blogs atingiram sucesso
pelo grande número de seguidores e leitores, gerando assim, valorização e investimento
por parte de grandes marcas que contatam as blogueiras em busca de parcerias.
Portanto, as blogueiras tecem relações intermediárias com consumidores e com
empresas diversas ao divulgarem no conteúdo dos seus blogs um estilo de vida que se
sustenta no consumo dos produtos certos e procurando manter a atualização constante
desse consumo.
2
O conteúdo pode ser produzido em formato de texto, geralmente curto e informal, de imagens
fotográficas e/ou ilustrações, e em formato de vídeo. Todas as linguagens possíveis podem ser
conjuntamente agregadas em uma única postagem no blog.
Ao se utilizarem da moda como símbolo de prestígio social, as blogueiras
acabam corroborando para o fortalecimento da cultura de consumo. No livro
“Elegância, beleza e poder: na sociedade de moda dos anos 50 e 60” Sant’Anna (2014:
09) constatou que naquela época na sociedade brasileira moderna a beleza era resultante
de um consumo que era assegurado pelo domínio do poder de compra ou econômico e
demandava compra de produtos, acesso a serviços de informação, viagens e tempo para
despender com esse processo (SANT’ANNA, 2014: 229).
O parecer outro colocou-se como possibilidade aberta a todos, mas parecer outro
exige competências diversas, como as que são expressadas pelas blogueiras na criação
do conteúdo de moda, pois reside no ato de escolher, que precede o consumo e o
qualifica. Os que souberam escolher e dominar o corpo indesejado para compor a
aparência ideal sobre si mesmos, tornaram-se “exibidos enaltecidos” e acabaram por
cadenciar a hierarquização social (SANT’ANNA, 2014: 231). Na atualidade, a
repercussão dos blogs nos mostra que
A profissionalização dos blogs de moda trouxe mudanças para as pessoas que
consomem as informações de moda assim como para os produtores desse conteúdo, pois
diz respeito a um meio alternativo de comunicação com conteúdo diferenciado daquele
encontrado em editoriais de revistas de moda, no qual são tecidas relações
diversificadas, ainda que subjetivas e ainda mais efêmeras pela dispersão de conteúdo
propiciada pela internet, mas também tornam-se muito mais dinâmicas e fluídas.
Ainda que os blogs apresentem um processo comunicativo diferente das mídias
impressas, especialmente devido ao seu caráter de plataforma que permite o acesso a
diferentes conteúdos em formato audiovisual, os blogs que analisamos com o passar do
tempo se tornaram verdadeiras páginas/empresas da web. Embora esses blogs procurem
sustentar o aspecto de diário pessoal com editoriais de “look do dia” que seguem a linha
do street style, agregam em sua estrutura a categorização de conteúdos de maneira
similar ao das revistas de moda, porém com a peculiaridade de trazerem características
de pessoalidade e intimidade com as leitoras.
Por sua vez, a utilização de linguagem informal e busca da intimidade com as
leitoras são estratégias às quais a revista Glamour, em suas diversas versões
internacionais adotou ao longo dos últimos anos, como uma maneira de atender a uma
demanda específica por esse tipo de conteúdo, por parte de leitoras jovens e
sintonizadas com as publicações veiculadas nas plataformas digitais. Desta maneira, a
revista promove seu conteúdo também em formato digital, e a versão Brasileira segue
este padrão de publicação e produção de conteúdo. Outra preocupação da revista, desde
o seu lançamento, é trazer a figura das blogueiras de moda e beleza para as suas capas e
conteúdos, pois ao posicioná-las lado a lado com celebridades diversas, a Glamour
acaba conferindo às blogueiras um status de celebridades. A parceria entre a Glamour e
os blogs é evidenciada na entrevista 3 realizada pela empresária e dona da plataforma de
blogs F*Hits, Alice Ferraz, com a diretora de redação da revista Glamour, Monica
Salgado, em junho de 2012, três meses após o lançamento da primeira edição da revista
no Brasil.
Esta estratégia é uma via de duas mãos. Se por um lado a revista procura se
mostrar inclusiva ao trabalhar com blogueiras como trabalha com celebridades, mas
destacando que se tratam de mulheres comuns, ela visa atrair um público leitor
abrangente, aquele que consome os conteúdos publicados nas plataformas digitais, por
meio da revista em formato digital. Por outro lado, as blogueiras passam a se promover
através da revista Glamour, tornando-se conhecidas e divulgadas em outras mídias,
abrindo as possibilidades de seu campo de atuação. Quanto mais conhecidas elas se
tornam, mais empresas, revistas, emissoras e grifes se interessam em estabelecer
relações de parceria com elas.
Por meio das reflexões de Sant’Anna (2007, 2014), que procura mostrar que a
sociedade contemporânea é também uma sociedade da moda e da aparência, procuro
compreender de que maneira a capa da revista Glamour Brasil número 16, de julho de
2013 contribuiu para a representação de uma imagem das blogueiras de moda como
mulheres reais, e como constituiu a possiblidade de agenciamento junto às suas leitoras
ao criar um modelo idealizado da persona blogueira.
3
Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=vYzEMpfzXgE>. Acesso em julho de 2016.
Meneses (2003, p. 30-31) propõe então, três focos estratégicos, para os quais é
preciso que o historiador que vai lidar predominantemente com a dimensão visual da
sociedade observe: o visual, que diz respeito à iconosfera e aos sistemas de
comunicação visual, bem como à produção, circulação, consumo e ação dos produtos
visuais; ao visível, que é a esfera do poder, os sistemas de controle, ou seja, o ver e ser
visto, o dar-se ou não a ver; por último, a visão que se relaciona com os papéis do
observador, modelos e modalidades do olhar, instrumentos e técnicas de observação.
Para analisar a capa de julho de 2013 da Glamour utilizei a metodologia de
Cassagne (1996) que propõe a realização de um inventário de questões que devem ser
feitas ao documento analisado, para compreender o contexto de sua elaboração, a
realizar a descrição do documento para em seguida, interpretá-lo. Procurei então, ao
lado da pesquisa sobre o autor da imagem, analisar o contexto que circunda o
acontecimento, através da análise de publicações que a própria revista realizou em
ambiente virtual antes e depois de publicar esta edição. Desta forma, o material
produzido pela Revista Glamour sobre a edição de julho de 2013 nos fornece
informações acerca das relações que são tecidas a partir da e na internet, especialmente
para atentarmos para as mudanças que foram geradas por esse processo de ganho de
visibilidade dos blogs. Após a descrição das imagens, realizamos a analise interpretativa
da imagem, levando em consideração através de Jauss as categorias fundamentais da
fruição estética e considerando o leitor intencionado de Ilser. As narrativas pessoais das
blogueiras, publicadas em seus blogs fazem a representação da personagem blogueira,
em um percurso pessoal dotado de sentido e completude, e a sua participação na capa
desta revista foi representada, especialmente pelas blogueiras mais votadas, Camila
Coelho e Camila Coutinho, como relevante para a experiência de vivenciar a
legitimação da sua profissão.
1. APRESENTAÇÃO DO DOCUMENTO
Foram produzidas duas capas desta edição, esta que é a versão presente nas
bancas e a outra é a versão para assinantes com a temática em Animal Print, porém,
mantendo disposições semelhantes entre as mulheres, as mesmas cores, fundo e as
mesmas chamadas de capa. Escolhemos analisar a versão de banca, por sua maior
visibilidade quando foi lançada. Na época de seu lançamento, custava 6 reais e
apresentando na capa, juntamente com o folder dobrado que a acompanha, a fotografia
das cinco blogueiras que são objeto da minha pesquisa para o doutorado em História: na
imagem encontram-se Camila Coelho e Camila Coutinho, no folder estão Lalá Rudge,
Thássia Naves e Helena Bordon com fotografia de Josep Ruaix Duran. Foram
publicadas duas capas da mesma edição, ambas contêm as cinco blogueiras fotografadas
por Duran, com o mesmo plano de fundo e as mesmas chamadas, o que muda são as
vestimentas das mulheres ali retratadas e a posição delas umas em relação às outras,
embora nos dois casos, Camila Coutinho e Camila Coelho continuem presentes na capa.
A fotografia foi retirada da internet, por falta de acesso à revista impressa. O
blog Vick News publicou a imagem que é uma reprodução, sem referenciar sua fonte,
em uma publicação de 04 de julho de 2013, que leva o título “Riberião Preto recebe
‘Tour Glamour’” e se refere à participação da blogueira Vick Sant’Anna no evento
promovido pela revista Glamour para divulgar a edição de julho de 2013, no espaço
Golf em Ribeirão Preto, com a presença da diretora geral da revista Mônica Salgado e
da diretora de moda Adriana Bechara. O blog apresenta também a fala de Mônica
Salgado sobre a realização desta edição da revista, porém sem citar se se trata de uma
transcrição a partir de um vídeo ou áudio, ou se parte simplesmente da livre
interpretação da blogueira sobra a palestra de Mônica Salgado. A capa da revista
impressa possui as dimensões 17x22 cm, conhecida como “travel size”, ou seja, seu
tamanho menor que a maioria das revistas da mesma categoria, permite que seja
adaptada pra bolsas e maletas femininas (ARANTES, 2014, p. 21).
1.1.2.1 O autor
De acordo com Sisson (2015, p. 53) o público alvo da revista Glamour são
mulheres entre 20 e 40 anos. Em uma palestra sobre a chegada da revista Glamour ao
Brasil realizada em 2012, a diretora de redação Mônica Salgado afirmou a respeito do
público alvo, fazendo referencia também à participação das blogueiras de moda no geral
desde a primeira publicação no Brasil: “A Glamour é uma revista que só inclui, nunca
exclui. Não gosto de falar tanto em idade do nosso target porque idade não está só no
RG, né? E os 40 são os novos 20!” 5. Outras referências afirmam que o público alvo é
composto por uma faixa etária abaixo desta, mulheres dos 20 aos 306, 25 e 357
Veicula um conteúdo adicional nas plataformas digitais das quais faz parte,
incluindo o formato de revista digital para assinantes: possui site com notícias e
matérias diversas, associadas ou não com as publicações da revista, comunica-se
também através das diversas redes sociais das quais faz parte. A revista Glamour foi
criada em 1939 e acabou sendo publicada em 16 países, sendo que se tornou líder de
mercado na Espanha e na Inglaterra (ARANTES, 2014, p. 19).
A Glamour conta com fotógrafos renomados, como J. R. Duran e Bob
Wolfenson para realizarem a produção de imagens para suas capas (ARANTES, 2014,
p. 19). O mesmo pode-se dizer da equipe que maquia e produz as modelos, com os mais
conceituados maquiadores, cabelereiros e manicures. Em suas capas figuram atrizes e
estrelas famosas no Brasil e no exterior. É o caso da produção da edição em análise. A
capa e as fotografias da matéria foram realizadas por J. R. Duran, e a equipe que
5
Disponível em <http://revistaglamour.globo.com/Redacao/noticia/2012/06/nossa-diretora-monica-
salgado-da-palestra-no-espaco-do-fhits.html>. Acesso em julho de 2016.
6
Disponível em <http://mundodasdicas.com.br/revista-glamour>. Acesso em julho de 2016.
7
Disponível em <http://www.emfechamento.com.br/2012/04/revista-criativa-sai-de-cena-e-da-
lugar.html#.V35aYqKgTfZ. Acesso em julho de 2016.
produziu as blogueiras contou com maquiagem de Diego Américo e Leila Turgante e o
cabelo foi produzido por Marcos Proença.
No site da revista Glamour encontrei uma reportagem de maio de 2013, que fala
sobre a proposta do concurso para eleger as blogueiras que apareceriam na capa da
edição de julho daquele mesmo ano, e apresenta as cinco mulheres, com uma foto do
look do dia de cada uma e com breves descrições sobre seus perfis, como idade, lugar de
onde veio ou mora e o número de seguidores na rede social Instragram. A reportagem
descreve como seria o processo de votação online e mostra uma ilustração para explicar
como as blogueiras ficariam dispostas na capa e folder 8. O artigo também anuncia que
se trata de uma edição especial:
(...) será nossa edição de real people, ou seja, os editoriais e a capa
serão estrelados por não-celebridades e não-modelos. E para coroar
essa homenagem à mulher de verdade, como a gente e como você,
tivemos uma ideia mara: uma capa com a cinco maiores blogueiras
que este Brasil já viu!.9
8
Na capa principal sairiam as duas blogueiras mais votadas, e no folder estariam dispostas as outras três.
9
Disponível em <http://revistaglamour.globo.com/Lifestyle/noticia/2013/05/vote-na-blogueira-da-capa-
camila-coelho-lala-rudge-camila-coutinho-thassia-naves-heleninha-bordon.html>. Acesso em julho de
2016.
10
Disponível em <http://revistaglamour.globo.com/Lifestyle/noticia/2013/05/vote-na-blogueira-da-capa-
camila-coelho-lala-rudge-camila-coutinho-thassia-naves-heleninha-bordon.html>. Acesso em julho de
2016,
Seguidores no Instagram (@lalatrussardirudge): 310k
Por que GLAMOUR ama? Lala tem cara de princesa, cabelo de
princesa, educação de princesa, se veste como princesa e é casada com
um príncipe!
Este artigo foi produzido dois meses antes do lançamento da edição de julho da
revista Glamour, e que os vídeos de divulgação que acompanham esse número da
revista, divulgados no canal do Youtube da revista Glamour, foram produzidos nesse
período de tempo, o resultado da votação que elegeu Camila Coelho e Camila Coutinho
para figurarem a sua capa, pois foram divulgados no mês de junho de 2013, um mês
antes do lançamento do número em questão da revista.
O comercial com os cinco vídeos das blogueiras foi produzido como uma
maneira de divulgar a edição de julho de 2013, mas também para mostrar um clima de
celebração através das imagens de making off, nos bastidores das seções fotográficas
com as blogueiras. Todas as blogueiras são questionadas sobre o que acharam de
trabalhar com o renomado fotógrafo espanhol Josep Ruaix Duran, que costuma
fotografar “celebridades”, ao que elas relatam ser um sonho ou uma realização. O tom
de comemoração se estende para as imagens dos bastidores que se sobrepõem às falas
das entrevistas realizadas pelas blogueiras, nas quais há uma casa luxuosa como cenário,
11
Disponível em <http://revistaglamour.globo.com/Lifestyle/noticia/2013/05/vote-na-blogueira-da-capa-
camila-coelho-lala-rudge-camila-coutinho-thassia-naves-heleninha-bordon.html>. Acesso em julho de
2016.
as blogueiras são vistas sendo produzidas por profissionais, fotografadas e filmadas, em
meio ao vestuário de grife. A característica de diário dos blogs, com publicações diárias
que acompanham as atividades cotidianas das blogueiras, ainda é muito valorizada, é
um dos aspectos que diferenciam os blogs das demais mídias e é um dos assuntos muito
explorados nas entrevistas que elas realizaram umas com as outras para a revista
Glamour.
Sobre a sua relação com a revista, as blogueiras Camila Coelho, Camila
Coutinho, Helena Bordon e Lalá Rudge deixaram evidente que já possuíam uma relação
com a equipe da revista, por terem participado de números anteriores a este, e é possível
perceber que a revista esteve preocupada em trazer as blogueiras para o seu conteúdo,
desde que começou a ser publicada no Brasil, reforçando e valorizando sua profissão,
visando ao mesmo tempo atrair os leitores que se encontram conectados nos blogs. A
estratégia de utilizar blogueiras no seu conteúdo é veiculada pela Glamour internacional
como é possível visualizar em seu site na internet, desta maneira, a sua versão brasileira
segue o padrão americano de produção de conteúdo. A revista procurou ressaltar o tema
da edição, de “real peaple”, no qual mulheres “reais” têm a oportunidade de serem
fotografadas e tratadas como celebridades e de aparecer no conteúdo da edição, como
uma estratégia para mostrar que valoriza as mulheres “reais”, assim como as suas
leitoras.
2. DESCRIÇÃO
12
Disponível em < http://www.vicknews.com/moda/ribeirao-preto-recebe-tour-glamour/ >. Acesso em
julho de 2016.
compartilhar do mesmo tecido, um cetim rosa claro, porém a primeira usa um vestido
tomara que caia e a segunda usa o tecido brilhante apenas na saia, enquanto que a blusa
de alças e decote em formato de coração é constituída de um tecido mais brilhante e cor
rosa levemente mais vibrante e com textura e detalhes dourados. A quebra do padrão é
instaurada na imagem pela roupa de Camila Coelho, que usa um body marrom escuro,
brilhante e texturizado, que lhe deixa as pernas malhadas à mostra. Para balancear a
nudez das pernas, a jaqueta clara/nude, curta na altura da cintura, esconde-lhe um dos
ombros e os braços, porém a quebra de padrão se estabelece quando a jaqueta desliza de
seu ombro direito, conferindo-lhe uma movimentação corporal que remete a uma atitude
mais ousada que a das demais blogueiras. Essa atitude pode ser percebida também nas
expressões faciais de cada uma delas: enquanto as Camilas sorriem um sorriso aberto e
revelador, dentes e língua a mostra, sorriso que pode ser ao mesmo sedutor e triunfante,
afinal as duas ganharam a votação online e se elegerem as blogueiras da capa, as demais
sorriem apenas com os lábios, um sorriso mais fechado, um quase não sorriso no caso
de Lalá Rudge, e Thássia sorri mais abertamente, porém só os dentes são visíveis.
Com tons de cabelo diferentes, as Camilas morenas, Lalá e Helena Loiras e
Thássia morena, seus cabelos foram modelados e penteados de maneira muito similar,
pode-se dizer que a produção da beleza das blogueiras as deixou padronizadas em
termos de cabelo e maquiagem. Todas possuem os cabelos ondulados, todos em um
comprimento médio, brilhantes e esvoaçantes, como se uma brisa movimentasse suas
mechas com o intuito de conferir um ar de glamour a todas elas. Seus cabelos foram,
também, divididos no meio para conferir-lhes simetria ao rosto. As maquiagens são
sutis, leves e neutras, todas utilizam batons em tom de rosa suave ou cor de boca,
delineadores para marcar os olhos de maneira suave e blush combinando com cada tom
de pele, para lhes conferir um ar saudável, o efeito de contorno permite afinar o rosto,
pode ter sido utilizado tanto na maquiagem quanto nos retoques posteriores da imagem
em programa de edição específico.
Acima do slogan temos os dizeres: “a revista feminina n. 1 da Europa agora no
Brasil. A chamada principal diz: “Do look do dia à capa da Glamour “, “As top 5
blogueiras do país”, e em letras maiores “Edição mulheres reais”, e por fim “lições de
moda e beleza de 36 moças como você”. Essas três chamadas parecem estar
interligadas, pelo tema que apresentam, mas também pelo proximidade de espaço entre
elas, ressaltam o tema da edição, que é “mulheres reais”, visível principalmente pelo
tamanho da fonte, muito maior que as demais chamadas. O tema se relaciona com a
votação que ocorreu em ambiente online para escolher as duas blogueiras que fariam
parte da capa da revista, assim a revista considera as blogueiras como “mulheres reais”,
ou seja, não celebridades (ao menos naquele momento), e para que duas destas cinco
selecionadas13 pela revista possam estar na sua capa, elas têm que passar por um
processo de votação que estabelece a hierarquia delas na fotografia.
As demais chamadas na ordem de leitura Ocidental, de cima para baixo e da
esquerda para a direita são: “Autoestima íntima: a ditadura da beleza chegou até a
vagina, e agora?”, “Make bom e barato: os mestres da beleza indicam 5 produtos
indispensáveis”, “Guia das dietas: tudo o que você precisa saber sobre os seis regimes
da moda”, “Garimpo no fast fashion: peças-chave com preço mínimo e máximo
impacto”. Sabe-se que a revista segue um cronograma realizado previamente para
definir o conteúdo editorial temático postado ao longo dos meses do ano, sendo que
julho apresenta sua edição de beleza (ARANTES, 2014, p. 20). As chamadas são todas
sobre moda e padrões de beleza, indicando que se trata de uma edição com tema
centrado mais em moda e beleza, e menos em comportamento ou celebridades. Por fim,
o ultimo quadro indica os nomes das blogueiras na ordem de aparição da esquerda para
a direita. Pelas chamadas é possível perceber que a revista se preocupa em chamar
profissionais especializados da moda e da beleza, para criar parâmetros que possam ser
seguidos e aprendidos pelas suas leitoras e legitimá-los.
3. INTERPRETAÇÃO E SIGNIFICAÇÃO
Meneses (2003, p. 11) propõe que o estudo da visualidade seja tratado pelos
historiadores como uma dimensão mais abrangente da vida social e dos processos
sociais, e não um estudo focado apenas nas fontes visuais, ou seja, sua atenção deve se
deslocar para o campo da visualidade. Neste caso, o visual, para Meneses (2003, p. 28),
se refere à sociedade, e não às fontes para o seu conhecimento, embora no contexto
dessa pesquisa, as fontes visuais sejam privilegiadas, ou seja, o que se pretende realizar
é uma história produzida a partir da análise de documentos de qualquer tipo, porém que
pretenda examinar a dimensão visual da sociedade (MENESES, 2003, p. 28). Para
tanto, é necessário que seja definida uma plataforma de articulação em uma
13
As cinco blogueiras em questão foram selecionadas pelo sucesso que tinham através do número de
seguidores nas redes sociais e o sucesso dos seus blogs, bem como pelos contatos que possuíam, como
era o caso de Lalá, cujo pai foi vice-diretor de marketing do Itaú Unibanco, e Helena Bordon, cuja mãe
Donata Meirelles é diretora de estilo da Vogue Brasil.
problemática histórica definida pela pesquisa, e não na tipologia documental da qual ela
se utiliza, ou seja:
(...) As séries iconográficas (porque é com séries que se deve procurar
trabalhar, ainda que se possam ter imagens singulares que funcionem
como pontos de condensação de séries ideais), não devem constituir
objetos de investigação em si, mas vetores para a investigação de
aspectos relevantes na organização, funcionamento e transformação de
uma sociedade. (...). (MENESES, 2003, p. 27-28)
Joly (1996, p. 54) afirma que existem duas considerações que devem preceder a
análise de uma imagem, são elas o estudo de sua função e o contexto de seu surgimento.
Desta maneira, é possível admitir que uma imagem sempre constitui uma mensagem
para o outro, assim é necessário, para melhor compreendê-la, buscar para quem ela foi
produzida, afinal a função comunicativa da imagem é que determina em grande parte a
sua significação (JOLY, 1996, p. 55-59). Sobre a fotografia de moda, a autora aponta
suas características:
Da mesma forma, a foto de moda, imagem implicativa e portanto
conotativa, também navega entre o expressivo, manifestado pelo
“estilo” do fotógrafo, o poético, manifestado pelo trabalho com os
diversos parâmetros da imagem (iluminação, pose...) e o conotativo,
isto é, a implicação do espectador, eventual futuro comprador. (JOLY,
1996, p. 58).
Para Iser (1996, p. 54), o texto não existe enquanto estrutura material, mas existe
na mente do leitor, através da leitura, desta maneira, o efeito estético se dá na estrutura
verbal e afetiva. O efeito estético não é o que existe de concreto no mundo, mas diz
respeito ao que acontece com o leitor a partir do contato com o texto, ou seja, o efeito e
a significação se realizam na experiência do leitor.
O leitor intencionado, proposta de Woff que Iser (1996, p. 71) discute, refere-se
à reconstrução da ideia do leitor que se formou na mente do autor. Trata-se de uma
ficção de leitor no texto que mostra as ideias do público de outras épocas e o esforço do
autor para se aproximar dessas ideias e responder a elas, definição que requer o
conhecimento do leitor do passado, bem como da história social do público, para que
seja avaliado o alcance e a função da ficção do leitor no texto, pois essa ficção permite
reconstruir o publico que o autor queria alcançar (ISER, 1996, p. 71). Na imagem do
leitor intencionado, expressavam-se as diferenças sobre as condições históricas que
influenciaram o autor no momento de produção do texto, portanto o leitor intencionado
pode nos ajudar a perceber as condições históricas da obra (ISER, 1996, p. 72).
Para Iser, “(...) a solução de conflitos só é capaz de desenvolver um efeito de
catarse ao envolver o leitor em sua realização. A obra de arte dá satisfação ao receptor
apenas quando ele participa da solução e não se limita a contemplar a solução já
formulada (...)” (ISER, 1996, p. 95). A catarse é a estrutura do efeito, decorre a partir da
solução do leitor sobre os gatilhos que foram ativados pela obra, surge a partir das
respostas que o leitor encontrou a partir do que a obra provocou. O prazer estético tende
a ser libertador, pois um dos mecanismos da catarse é o vivido que acaba sendo
repaginado com o novo sentido adquirido pelo leitor a partir do contato com a obra.
Enquanto Wolfgang Iser se referia à solução de conflitos pelo leitor, Hans Jauss
se voltava para um esquema de pergunta e resposta à obra literária, que entretanto, tem
grande aplicabilidade no uso da análise de imagens. Jauss (1979, p. 64-75) se preocupou
em fazer a historicização da palavra prazer evidenciando a importância histórico-
cultural do emprego do termo, especialmente em relação à experiência estética
elementar, desde o classicismo grego, passando pelo classicismo alemão, pelo
Renascimento, pelo Iluminismo, pelo Romantismo do século XIX, pelo materialismo
histórico de Marx, e examinando o conceito em Engels, Schiller, Brecht, Adorno,
Freud, Gadamer e Barthes.
Jauss inaugurou as vias de investigação para compreender a natureza das
relações entre obra e leitor e da experiência estética (ZILBERMAN, 1989, p. 52). Para
Jauss o significado de uma criação artística não pode ser alcançado sem ser vivenciado
esteticamente, ou seja, não há conhecimento sem prazer, forma então dois conceitos que
ocorrem simultaneamente e indicam que só se pode gostar do que se aprende, e só se
compreende o que se aprecia, de fruição compreensiva e compreensão fruidora
(ZILBERMAN, 1989, p. 53). A premissa de Jauss com a estética da recepção é a de que
a arte desempenha um papel ativo, faz história porque participa do processo de
motivação e formação do comportamento social, passa normas ao leitor que são padrões
de atuação, o leitor tende a se identificar com essas normas, que se transformam em
modelos de ação (ZILBERMAN, 1989, p. 50). O papel social da arte advém da
possibilidade de influenciar o destinatário ao veicular normas (reforça padrões vigentes
como o faz a cultura de massa) ou as criar. A arte pode se antecipar à sociedade, assim a
produção contemporânea é inovadora, rompendo com o código consagrado, possui um
caráter emancipatório. Possui natureza utópica por apresentar o que poderia ser ou ter
sido (ZILBERMAN, 1989, p. 50).
Ao enfatizar a função emancipadora da arte, a postura de Jauss se coloca como
Iluminista. Ele se filia à tradição da estética de Kant em oposição à de Hegel. Ele segue
a perspectiva da descrição de como a literatura veicula, cria ou destrói normas e verifica
a importância da identificação, condição da função comunicativa de um produto
artístico (ZILBERMAN, 1989, p. 51). De acordo com Jauss (1979, p. 75) “(...) o prazer
estético exige um momento adicional, ou seja, uma tomada de posição, que exclui a
existência do objeto e, deste modo, o converte em objeto estético. (...)”.
A experiência estética para Jauss é propiciadora da emancipação do sujeito, pode
preceder a experiência através da incorporação de novas normas e é antecipação utópica
e reconhecimento retrospectivo (ZILBERMAN, 1989, p. 54). A experiência estética diz
respeito ao sentimento de diferenciação, efeito produzido pelo reconhecimento do que
está presente e do que está ausente na imagem. Entre o produto e o consumo, o suporte
e as condições com que o produto ou imagem chegam até os seus consumidores não
podem ser desprezados.
O sujeito ao utilizar a sua liberdade de tomada de posição frente ao objeto
estético, pode gozar tanto o objeto quanto seu próprio eu e, ao realizar esta atividade, se
sente liberto da sua existência cotidiana. Desta maneira, para Jauss (1979, p. 76) “(...) o
prazer estético realiza-se sempre na relação dialética do prazer de si no prazer do outro
(...)”. Assim, “(...) O prazer estético que, desta forma, se realiza na oscilação entre a
contemplação desinteressada e a participação experimentadora, é um modo da
experiência de si mesmo na capacidade de ser outro, capacidade a nós aberta pelo
comportamento estético” (JAUSS, 1979, p; 77).
Jauss busca na tradição grega as definições para as três categorias centrais de sua
proposta de análise por meio da teoria da recepção: poiesis, aisthesis e katharsis. A
natureza libertadora da arte se explicita pela experiência estética que é composta por
essas três atividades simultâneas e complementares e sua concretização depende da
identificação do leitor. Esses são os aspectos principais da experiência estética. Essas
não são hierarquizadas entre si, mas são interativas e inacabáveis, possuem uma relação
de funções autônomas, não se subordinam uma a outra, mas podem ter relações de
sequência JAUSS, 1979, p. 81).
A poiesis remete ao prazer frente a obra que nós mesmos realizamos, diz
respeito à função da consciência produtora, pela criação do mundo como a sua própria
obra, em outras palavras, é o prazer de se sentir coautor da obra (JAUSS, 1979, p. 79-
81). A aisthesis refere-se ao prazer estético da percepção reconhecedora e do
reconhecimento perceptivo, é a função da consciência receptora, e apresenta a
possibilidade de renovar a sua percepção no que diz respeito à realidade tanto externa
quanto interna (JAUSS, 1979, p. 80-81). Já a katharsis é o prazer dos afetos provocados
pela obra capaz de conduzir o expectador à transformação de suas convicções e à
liberação de sua psique e dos interesses práticos e dos compromissos cotidianos, pois
lhe oferece uma visão mais ampla dos acontecimentos, estimula o leitor a julgá-los, isto
é, transforma a experiência subjetiva em intersubjetiva ao identificar normas de ação
predeterminadas pela obra (JAUSS, 1979, p. 80-81).
A metodologia a ser desenvolvida, partindo da teoria da recepção, implica
analisar a experiência de uma sociedade de leitores delimitada temporal e espacialmente
em sua relação comunicante, cujo cerne está vinculado a um prazer estético que se
realiza através do prazer de si no prazer no outro, balizado por estruturas culturais,
sociais e econômicas marcadas pela intertextualidade e interconicidade.
Boris Kossoy: As imagens-mundo afetarão a vida real, pois são feitas para
serem imitadas, consumidas na realidade material. Convivemos diariamente com elas, e
ainda que vinculadas diretamente ao mundo concreto, nos parecem ficcionais pelo que
representam: imagens da moda. São também as imagens criadas no passado, que
revivem de quando em quando, re-contextualizadas, imagens de arquivo: blogs de moda
são ótimo exemplo aqui. São representações, afinal, que produzem em nós novos
arquétipos, novos diálogos. Os produtores de imagens criam testemunhos que ainda não
o foram, documentos que virão a ser: imagens preconcebidas
A fotografia pode significar o que sobrevive daquele instante interrompido na
representação, é também a morte do objeto. Toda imagem fotográfica tem atrás de si
uma história. Para Kossoy, a representação fotográfica pressupõe que uma nova
realidade é criada em substituição daquilo que se encontra ausente.
A realidade que tomamos como documento é o objeto codificado formal e
culturalmente segundo uma construção técnica, ideológica, estética, ou seja, o
documento fotográfico não pode ser compreendido independentemente do seu processo
de construção da representação.
4. ALCANCE DO DOCUMENTO
A revista foi publicada em via impressa e também digital. Para além da edição
foram produzidos cinco vídeos de divulgação da edição, que foram liberados um mês
antes da revista ser publicada, e algumas matérias no próprio site da Glamour, as
primeiras convidando os leitores para fazerem a votação online para escolher as
blogueiras da capa, e as demais falando sobre cada uma das blogueiras, após o
lançamento da revista foram publicadas também as fotografias do making off no site.
Dentre as primeiras 18 edições da Glamour no Brasil, seu número de maior sucesso foi
justamente o número 16, aqui analisado, pois refletiu num aumento de 35% a mais nos
resultados de pages view no site da revista, que as demais edições 14. Houve inclusive,
uma publicação da Glamour no site, poucos meses antes do lançamento da edição de
julho, quando a votação online ainda estava ocorrendo, mostrando o apoio de diversas
celebridades à escolha de uma das cinco blogueiras em suas redes sociais.
14
Disponível em <https://2napp.wordpress.com/2013/09/12/glamour-girls-just-wanna-have-fun/> Acesso
em julho de 2016.
4.1.2 A posteridade
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2013. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=mvpw4iGpce0> Acesso em
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“The Big Five na Glamour: Helena Bordon” – Rodrigo Chiba e Marcelo Proença –
2013. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=PSgqnwt0oUg> Acesso em
julho de 2016.
“The Big Five na Glamour: Lalá Rudge” – Rodrigo Chiba e Marcelo Proença – 2013.
Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=B_AfMVfcPV8> Acesso em julho
de 2016.
“The Big Five na Glamour: Thássia Naves” – Rodrigo Chiba e Marcelo Proença – 2013.
Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=69FeBP-QEN8> Acesso em julho
de 2016.