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Copyright© - 2021- Ivani Godoy

Diagramação digital: Denilia Carneiro


Capa: Barbara Dameto

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.
Todos os direitos reservados. É proibido o armazenamento e/ou a
reprodução de qualquer parte desta obra, através de quaisquer meios —
tangíveis ou intangíveis — sem o consentimento escrito da autora.
Criado no Brasil.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº. 9.610/98,
punido pelo artigo 184 do Código Penal.
SUMÁRIO
VOCÊ É MINHA
Sinopse
Prólogo
1 – Injustiçada
2 – Conflito
3- Descoberta
4 – Influência
5 - Armação
6 – O Troco
7 - Escolha Difícil
8 - Renúncia
9 – Sobrevivendo
10 - Clube Rave
11 - Pedido Especial
12 - Desejo Ardente
13 – Casamento
14 - A Viagem
15 - O Fim
16 – Tormento
17 - A Verdade
Epílogo
A APOSTA
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Epílogo
LOUCO POR VOCÊ
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Epílogo
MARCA DA ESCURIDÃO
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Epílogo
DOMADO POR VOCÊ
Sinopse
Capítulo um
Capítulo dois
Capítulo três
Capítulo quatro
Capítulo cinco
Capítulo seis
Capítulo sete
Capítulo oito
Capítulo nove
Capítulo dez
Capítulo onze
Capítulo doze
Capítulo treze
Capítulo quatorze
Capítulo quinze
Capítulo dezesseis
Capítulo dezessete
Capítulo dezoito
Bônus
SEMPRE FOI VOCÊ
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Epílogo
Sobre a autora
Convites
VOCÊ É MINHA
Série Dilacerados
Livro I

IVANI GODOY
Copyright© 2018 Ivani Godoy

Revisão: Adriano Silva e Analine Borges Cirne

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da língua Portuguesa de 2009.
Todos os direitos reservados. São proibidos o armazenamento e/ou a
reprodução de qualquer parte desta obra, através de quaisquer meios —
tangível ou intangível — sem o consentimento escrito da autora.
Criado no Brasil.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº. 9.610/98 e
punido pelo artigo 184 do Código Penal.
As opiniões contidas no livro são dos personagens, em nada se assemelham
às opiniões do autor. Esta é uma obra de ficção, sendo os nomes e fatos
fictícios.
Sinopse
Samantha Gray é uma psicóloga infantil que se mudou para Manhattan
fugindo de um passado que a assombra desde a infância. Não confia nos
homens, pois o único que deveria protegê-la a destruiu de forma
irrecuperável. Sam viveu até então uma vida solitária, sem muitas pessoas
ao redor, mas tudo muda ao conhecer o CEO de olhos verdes intensos, um
homem controlador e que não aceita a palavra não como resposta.
Lucky Donovan sempre foi rodeado de mulheres, poder, conquistas e
influências, afinal, ele é dono de quase toda a América. No entanto, por trás
daquele sorriso sexy e quente, ele traz uma infância dilacerada e traumática,
e isso tudo muda quando conhece Samantha, a única mulher que disse não a
ele, e algo se transforma dentro de si – dali em diante, sabe que moverá Céu
e Terra para tê-la em sua vida e em sua cama.
Dois mundos diferentes. A dor e os traumas de seu passado os tornarão
unidos e fortes. Uma paixão avassaladora que os consumirá. Contudo, isso
será o suficiente? Eles serão capazes de deixar o passado e viver o futuro?
Descubra lendo esta linda história de amor.
Prólogo
LUCKY DONOVAN AOS OITO ANOS
Dezembro de 1994

Eu estava deitado na cama esperando mamãe chegar em casa. Fazia


cinco dias que a aguardava. Tudo já havia acabado na dispensa, não tinha
mais comida ou leite para eu me alimentar. A fome doía como se houvesse
alguma coisa roendo dentro de mim, como garras e lâminas afiadas, e eu só
podia esperar e fingir que essa dor, a qual me consumia, não estivesse de
fato acontecendo. Queria fazer algo, não só imaginar que estava cercado de
uma família amorosa, com pais bondosos e com muita comida e brinquedos.
Era Natal, e não havia nada para comer ou algum brinquedo para brincar.
Era o meu pior dia na Terra, e tudo o que eu queria era fugir, nem que fosse
em pensamentos.
— Fique em casa e não saia até eu chegar — pediu a mamãe.
Ela recebeu uma ligação e não pensou duas vezes em me deixar sozinho
naquela casa imensa e solitária.
— Mas o Natal é daqui a alguns dias, mamãe. — Chorei, não querendo
ficar sozinho de novo, principalmente à noite.
— Eu sei, mas volto antes de chegar o Natal. Amo você — declarou,
saindo pela porta e me deixando trancado.
Depois de quase uma semana, ela não tinha voltado ainda. Era noite, e,
em vez de medo por estar sozinho, eu me sentia aliviado, porque dormir era
a única forma de esquecer a fome tremenda que eu estava passando naquele
momento.
Eu poderia gritar e pedir ajuda, mas tinha medo de as pessoas me
levarem para longe da mamãe. Não queria ficar longe dela, por mais ausente
que ela fosse em minha vida.
Mamãe sempre me deixava ali sozinho, mas nunca tinha deixado de
voltar; agora ela não iria retornar para mim como sempre fazia. Agora era
para sempre. O meu coração doía com essa descoberta horrível. Como
saberia viver sem ela? O que seria de mim?
Minhas forças se acabaram, e caí no chão da cozinha com uma tigela
vazia...
Nesse dia, Mary me matou, mas ressuscitei após ouvir a voz de um
anjo.
Miguel.
1 – Injustiçada
SAM
— O que você deseja para o café da manhã? — perguntou a garçonete
do Green.
A garota parecia ter uns 18 anos mais ou menos. Era loira, com cabelos
compridos presos em um rabo de cavalo.
Eu gostava de tomar café e almoçar no Green, ia ali quase todos os dias
desde que comecei a trabalhar como psicóloga na Vênus havia uma semana.
A empresa beneficiava crianças que necessitavam de ajuda com problemas e
traumas de infância. Tantas pessoas sonhavam em entrar nesse
empreendimento, mas poucas tinham a mesma chance que eu. Dei graças a
Deus por conseguir o serviço. A companhia possuía várias instituições que
trabalhavam com crianças pelo mundo.
A Ônix era uma empresa bilionária de estilo, muito importante no ramo
de marketing empresarial. As duas empresas ficavam em um imenso edifício
na Rua 57, com vista para o Skyline de Manhattan, um dos principais
cartões-postais de Nova York. Os dois prédios eram como as Torres
Gêmeas, vizinhos, mas com uma passarela que ficava no nono andar, bem
onde eu trabalhava na Vênus; ela levava de um prédio ao outro.
Eu não conhecia o dono da Vênus, mas diziam que era muito rígido e
que nem em feriados dava folga para os colaboradores que trabalhavam em
sua empresa, ou seja, eu. Nunca gostei muito de feriados, então não
reclamava.
Quando me mudei para Manhattan, estava fugindo de um passado
obscuro para o qual jamais queria retornar nem sobre o qual desejava pensar
novamente. Por mais que tentemos fugir de um passado assim, ele está no
fundo de nossa mente, como um câncer enraizado, mas sem morrer. São
apenas lembranças sombrias.
Quando vim morar no Brooklyn, cheguei com a intenção de trabalhar e
ser uma profissional de sucesso e capacitada no meu ramo de trabalho,
afinal, amava o que fazia. Acho que, além do meu irmão, Bryan, e de minha
avó, Julia, que eu amava verdadeiramente, a minha profissão era a segunda
paixão.
Particularmente adorava trabalhar com crianças em risco social e que
sofriam por algum tipo de problema, porque um dia, havia muito tempo, eu
também tinha sido quebrada de todas as formas possíveis, quase de forma
irrevogável. Quem deveria ter me protegido quando criança não o fez, aliás,
foram eles que transformaram a minha vida em um pesadelo e tormento por
14 anos.
Tomei rapidamente meu cappuccino para não chegar atrasada ao
trabalho, porque a minha chefe era definitivamente uma bruxa, mas ela não
iria me fazer desistir dos meus sonhos. Não mesmo.
Ao terminar minha bebida, peguei um cappuccino para levar para
Diana, uma colega de trabalho.
Um cara se sentou na cadeira à minha frente. Eu o havia notado antes,
paquerando a garçonete loira que trabalhava ali, a mesma que trouxe o meu
pedido. Era um paquerador, com certeza. Seu rosto era lindo, muito parecido
com o de um modelo de revista famosa como a People. Seus cabelos loiros
batiam no queixo e eram lisos, mas parecia que ele gostava dos fios
bagunçados para todos os lados, como se tivesse acabado de acordar, mas
não de um jeito feio, e sim atraente. Devia ser moda para ele. Olhos cor de
uísque combinavam bem com seu rosto perfeito.
O cara me lançou um sorriso devastador, que fazia todas as mulheres
molharem suas calcinhas, até mesmo eu, afinal não era nenhuma santa.
— Eu posso me sentar com você, linda? — perguntou sorrindo, mas
havia se sentado antes que eu lhe respondesse.
— Pode — respondi com simpatia, peguei o copo de cappuccino para
Diana e me levantei. — Eu já estou de saída. Então fique à vontade.
Ele fitou meu corpo como se me despisse com seus olhos. Senti um
arrepio percorrer toda a minha espinha, mas isso não podia acontecer.
— Você não quer ficar comigo? — Lançou-me um sorriso. — Nós
podemos ir para o meu apartamento.
Com aquele rosto sexy e seu sorriso perfeito, faria qualquer garota sair
correndo com ele para qualquer lugar sem questionar ou pensar nas
consequências. Entretanto, eu não era assim, era mais do tipo que aprecia o
“felizes para sempre”.
Respirei fundo e olhei para ele sentado ali, à minha frente. Ergui as
sobrancelhas e lhe disse:
— Jamais ficaria com alguém como você, e por vários motivos.
Homens como você só querem uma coisa de mulheres como eu. Isso não é
algo que darei a ninguém igual a você. — Sorri amigavelmente. — Foi um
prazer conhecê-lo.
Saí antes que ele falasse algo, deixando-o ali com seu sorriso, embora
seus olhos mostrassem confusão.
Respirei fundo, entrei no imenso prédio de concreto, aço e vidro e fui
para o elevador da empresa Ônix, já que o da Vênus estava em manutenção.
O elevador também era de vidro grosso e mostrava toda a cidade de
Manhattan, uma bela vista para se acordar todos os dias, para quem podia ter
esse luxo, obviamente. Encontrava-me atrasada, e tudo porque fiquei
conversando com um idiota atraente no Green. Apertei o botão para meu
andar, mas, antes que as portas se fechassem, um homem entrou.
Santa mãezinha me abana, porque isso sim que é um homem!
Se ele estalasse os dedos, qualquer uma cairia de joelhos à sua frente
como uma submissa. Embora eu nunca fosse de fazer o que os homens
mandavam, poderia abrir uma exceção para aquele deus grego. Eu não sabia
qual era o mais belo dos dois, o homem ou a vista. Achava que ele era mais
belo que o Sol ao nascer.
Era alto, 1,90 m mais ou menos. Trajava calça jeans e camiseta preta
com jaqueta de couro também preta e aberta na frente. Seus cabelos
castanhos eram curtos, com uma mecha que caía sobre o olho direito,
fazendo o verde-floresta de seus olhos ficar mais lindo, e tinha uma boca
instigante. Que boca! Se o cara do Green era sexy, esse dava de mil a zero
em beleza. Era como comparar sorvete de chocolate com sorvete de
morango, e eu era completamente apaixonada por chocolate. Ele, sim, era de
molhar calcinha. Se fazia isso só com um olhar, imagina se me tocasse?
Tinha duas covinhas, uma em cada lado de suas bochechas, fazendo-o
mais perfeito do que já era. Só em olhá-las, tive vontade de colocar a minha
língua nelas... Nossa! Eu devia estar ficando louca. Definitivamente estava
com os parafusos soltos.
Ele me olhava como se quisesse me possuir naquele elevador.
— Oi — sussurrei.
Ele sorriu.
— Olá, doçura. Você é nova aqui na empresa? — Seu tom era cálido,
assim como ele.
Surpreendi-me. Ele estava flertando comigo?
— Sim. Comecei na semana passada. — Perguntava-me se ele, assim
como eu, ouvia o nervosismo em minha voz.
— Você deve ser bem gostosa na cama. — Seus olhos me devoravam
como se ele quisesse me comer.
Pisquei chocada com suas palavras.
— O que você disse? — Cheguei o mais longe dele que o elevador
permitia. Pensei ter ouvido errado.
— Minha sala é no último andar. Venha até lá comigo, e podemos nos
divertir muito juntos. — Olhou o número do elevador, que subia para o nono
andar, depois para mim. — Posso fazer valer a pena. Você é tão linda!
Arregalei os olhos, descrente e com raiva do que ouvia.
— Você é doido?! — Percebi que gritava.
Seu sorriso sumiu, e sua expressão se tornou sombria e fria, como se
ele fosse duas pessoas ao mesmo tempo.
— Eu faço o que quero e na hora que quero. — Seu tom deixava isso
bem claro.
Encolhi-me por estar sozinha com aquele lunático atraente. Certamente,
eu havia acordado com o pé esquerdo. Pelo menos o outro rapaz do Green
era mais simpático do que ele.
— Você pode fazer o que quiser da sua vida, que não me interessa. —
Apertei o copo, ainda olhando-o. — O que o seu chefe acha disso? De cantar
mulheres em elevadores?
— Eu não tenho chefe. — Cruzou os braços e estreitou os olhos.
Ri amarga.
— Ótimo! — grunhi. — Então é um playboy mimado que acha que só
porque tem dinheiro e beleza pode chegar assim e falar o que quer? As
mulheres caem aos seus pés só porque as chama para a cama? Pois fique
sabendo que a minha resposta é NÃO. — Meus olhos estavam frios. Não
tinha gostado nada daquilo, embora soubesse que algumas mulheres diriam
sim a ele, não pelo dinheiro, e sim pela sua beleza. Apostava que choviam
mulheres lindas em sua horta.
— Você não devia dizer isso a um cara como eu — alertou, meneando a
cabeça de lado.
— Sim, um idiota arrogante — sibilei. — Nunca vou ficar com alguém
como você, então pode procurar outra mulher.
Lançou-me um sorriso de lobo.
— Você não devia me desafiar...
— Não é um desafio, estou dando minha resposta. Não vou sair com um
homem que acha que pode tudo, fique ciente disso ― interrompi-o, cerrando
os dentes.
Ele deu um passo até ficar à minha frente, sem em momento algum
retirar os olhos de mim, parecendo um animal cercando sua presa. Eu queria
ir para mais longe dele, mas o elevador não permitia.
— Vou provar que ninguém me desafia, pois sempre consigo o que
quero.
A minha vontade foi de jogar o cappuccino na sua cara, mas controlei
esse impulso, afinal, não queria ser demitida por fazer algo assim na
empresa. Como um não podia ser um desafio? Aquele cara era louco, devia
procurar um psiquiatra.
— Pessoas normais chamam para encontros, e não para transar em sua
sala. ― Tentei outra abordagem em vez de jogar a bebida nele.
Seus olhos se tornaram grandes como os de uma coruja.
— Encontro? — repetiu a palavra como se tivesse sal em sua garganta.
— Eu não tenho encontros, só fodo.
— Então devo dizer que cantou a mulher errada.
Estava preparada para mais retaliação, mas a porta do elevador se
abriu no meu andar, e caminhei para a imensa passarela de vidro que dava
para a Vênus sem olhar para trás.
Cheguei ao salão onde havia algumas crianças que vieram para sessões
conosco. Podia vê-las brincando umas com as outras. O lugar era cor de
creme e cheio de brinquedos, e era nele onde elas esperavam sua vez.
Diana estava em pé, olhando as crianças. Ela era uma loira de corpo
esbelto, e eu não sabia como não tinha namorado ainda. Ela também era uma
psicóloga competente, tornamo-nos amigas desde que comecei a trabalhar
ali. Olhou-me assim que entrei no salão.
— Eu trouxe para você — disse, entregando-lhe o cappuccino.
A única que não ia com a minha cara na empresa era Sasha, uma de
minhas chefes. Eu não sabia os motivos, já que nunca tinha feito nada a ela
nem a ninguém.
— O que foi, Sam? — perguntou enquanto pegava o cappuccino. —
Obrigada.
Antes que eu tivesse tempo para responder, Sasha me chamou da porta
de seu escritório. Seu sorriso era de um gato que comeu o canário, mais
parecido com o gato de Cheshire[1]. Não era para ela estar com raiva por eu
estar atrasada? Fiquei desconfiada disso. Pelo seu sorriso, o que me
esperava não era nada bom.
Ela era uma mulher linda. Seus cabelos ruivos nos ombros eram lisos,
estava sempre com o rosto bem maquiado, parecia-se com modelos de
passarela, com seu corpo magro, mas com tudo no lugar. Naquele dia usava
um terninho rosa parecido com o meu, mas o meu foi comprado em um
brechó, enquanto o dela devia ser de alguma grife famosa.
— Lucky Donovan quer você na sala dele agora, Samantha Gray. —
Não era bem um pronunciamento, e sim uma ordem direta e sem nenhum
poder de recusa.
Olhei para Diana à frente e depois para ela, que estava sorrindo como
se tivesse acabado de ganhar na loteria.
— O que ele quer comigo? — sondei. Eu não sabia quem eram todos os
meus chefes, mas esse, em especial, algumas pessoas chamavam de
carrasco. Se ele me chamara a sua sala, boa coisa não era.
— Com certeza vai demitir você — anunciou ela, bem animada com a
situação.
Meus pulmões pareciam que tinham parado de funcionar, porque eu não
conseguia mais respirar. Era como se tivesse levado um soco na boca do
estômago ou caído de uma grande altura e me esborrachado no chão, sem
fôlego.
— O que foi que eu fiz para ser demitida? — Minha voz falhou no final.
Ela riu, sem se importar comigo.
— Para o Lucky mandar alguém embora, não precisa de motivos. Lucky
Donovan pode fazer tudo, afinal, é o dono desta empresa. — Seu tom parecia
de orgulho.
— Mas eu não fiz nada — murmurei.
— Com certeza você é mais uma dessas vagabundas que se deixam
encantar pelo charme de Lucky e seu dinheiro, mas não fique assim, esse é o
Lucky. — Ela revirou os olhos. — Ele não pode ver uma mulher bonita, que
entra em suas calcinhas, deixando-a logo depois como algo descartável,
igual está fazendo com você.
Meus olhos escureceram. Queria estrangular aquela víbora peçonhenta,
que me fez ver fogo de tanta raiva. Então ela achava que eu tinha ido para a
cama com aquele cara e por isso ele me dispensara? Isso significava que era
o que teria acontecido se eu tivesse conhecido aquele homem e ficado com
ele? Ainda bem que eu não o havia conhecido. Queria estrangular a Sasha
por pensar que eu era mais uma da lista de tolas descartadas pelo meu chefe,
mas não iria bater boca com ela, senão voaria em seu pescoço e seria
expulsa dali, o que seria terrível para meu currículo. Entrei de cabeça
erguida, então era assim que sairia.
— Você não sabe de nada — rosnei.
Ela deu uma risada exaltada, ignorando meu tom.
— Sugiro que vá logo; ele odeia esperar. — Deu mais um de seus
sorrisos de vadia e entrou em sua sala, batendo a porta.
— Não liga para a cadela rabugenta, ela está te provocando. Se Lucky
Donovan quisesse demitir você, ele não a chamaria em sua sala, ela mesma
faria isso. — Diana me olhou de lado. — Houve algo entre você e ele?
Pisquei ultrajada.
— Diana, eu nem o conheço! Por isso estou com medo de que seja uma
demissão. — Respirei fundo. — Onde é a sala dele? A víbora nem me disse,
e não vou perguntar a ela, ou vou arrancar seus cabelos.
Diana riu, mas parecia tensa.
— No último andar da Ônix, no corredor à direita.
— Último andar? Tem certeza? — Minha voz saiu alta, com uma
suspeita me atingindo.
— Sim, por quê?
Sacudi a cabeça. O cara do elevador não podia ser o meu chefe, tinha
que ser uma coincidência e nada mais. O filho da mãe me chamou para
transar na sala dele no último andar da Ônix e disse também que não tinha
chefe. Isso significava que ele não trabalhava para ninguém, pois aquela
empresa era dele? Maldição! Finalmente me dava conta do que estava
acontecendo comigo. Ele iria me dispensar por ter levado um fora? Não
acreditei que seria capaz desse ato desumano.
— Desgraçado! — rosnei, com os punhos cerrados e vontade de socar
aquela cara bonita. Como ele pode querer me demitir só porque eu não quis
transar com ele? Quem ele acha que eu sou? Uma vagabunda? Maldito!
Estava xingando-o em pensamento enquanto me aproximava de sua sala.
Se ele fosse mesmo me demitir, eu lhe diria algumas verdades.
— Olá, Sam. O senhor Donovan está esperando por você — disse
Nancy. Nós não éramos exatamente amigas, mas almoçávamos juntas de vez
em quando no Green. — Ele está na sala de reuniões.
Nancy era morena e bonita, casada e possuía dois filhos pequenos,
então eu não achava que o Lucky havia ficado com ela, não me parecia ser
uma safada ou vagabunda infiel. Isso fez com que eu me perguntasse: será
que ele fica com mulheres comprometidas? Sacudi a cabeça, reorganizando
meus pensamentos; não queria pensar ou saber sobre isso.
Ela foi até uma porta de madeira grossa e a abriu para que eu pudesse
passar.
— Entre. — Gesticulou.
Minhas mãos suavam frio devido ao meu nervosismo com o que viesse
a acontecer dentro daquela sala. Entrei e olhei ao redor.
O imenso cômodo tinha uns 10 m de largura por 10 m de comprimento,
mais ou menos isso. As paredes eram tomadas pelas cores branca e creme. O
lugar não possuía muita decoração, como quadros e fotos ou algo que
deixasse o ambiente alegre, pareceria meio triste, se não fosse pelas imensas
janelas de vidro que tomavam a parede à minha frente e a do meu lado
direito. A vista dali era ainda mais linda do que a da sala da cadela.
Lucky Donovan era o homem que estava sentado à outra ponta de uma
mesa grande de carvalho-branco. O homem do elevador estava todo
relaxado na cadeira e me olhava com um sorriso de canto de boca. Garanto
que foi pela minha cara de choque por ter descoberto que ele era mesmo o
meu chefe. Apesar das suspeitas, torcia para que estivesse errada, mas não
tive essa sorte.
Minha pulsação estava acelerada, com medo de que ele viesse a me
demitir por não ter ficado com ele. Talvez ele não me mande embora,
pensei. Estava prestes a implorar por meu emprego se fosse preciso, porque
não podia perdê-lo, não depois de ter ralado muito para consegui-lo. Além
disso, tinha a despesa do hospital em que Bryan havia sido internado no mês
passado. Ele não podia pagar, já que estava desempregado.
Antes que eu me preocupasse pelas várias razões por que não podia
perder meu emprego, ele falou, ou melhor, declarou com arrogância:
— Eu disse a você, sempre consigo o que quero. — Apoiou-se no
encosto da cadeira e cruzou os braços. — Aqui está você...
Inspirei fundo, controlando-me. Estava com raiva de sua prepotência e
arrogância, primeiro no elevador, depois ali.
— Ninguém pode ter tudo na vida. Nem mesmo você, que, pelo visto,
acha que pode tudo só porque tem o poder nas mãos. — Meu tom era
enojado ao dizer esse final. — Pessoas egoístas e sem escrúpulos, que
mandam seus funcionários embora por injustiça e sem se importar com nada,
sem ligar para o que isso causaria às pessoas, são dignas de pena. Você
apenas pensa em seu ego ferido por receber um maldito NÃO! — Expirei.
— Aprenda a conviver com isso.
Seus olhos escureceram, e o sorriso sumiu, tornando seu rosto sombrio.
— Eu não a demiti por não querer transar comigo. — Seu tom era frio
como o seu rosto.
Franzi o cenho.
— Então por quê?
Ele suspirou como se estivesse tentando se controlar.
— Chamei-a aqui para fazermos um acordo em troca de você continuar
trabalhando na minha empresa.
Pisquei, ultrajada. De todas as coisas que pensei em ouvir, essa não era
uma delas.
— Você é doido? Acha que, por ter dinheiro e poder, pode me
comprar? Nem sempre o dinheiro pode comprar tudo. — Minha voz soou
ácida.
Seu rosto era grave.
— Não estou oferecendo dinheiro para você ficar comigo, jamais faria
isso. — Lançou-me um sorriso de lobo prestes a dar o bote em sua presa. —
Não preciso de nada disso, já que tenho um charme que deixa as mulheres
loucas.
Respirei lentamente para me controlar e não voar no seu pescoço,
embora a sua última frase estivesse mais certa do que nunca. Ele não
precisava de dinheiro para ficar com uma mulher; apenas com um sorriso,
qualquer uma cairia de joelhos.
— Você está usando seu poder para me demitir caso eu não aceite seu
acordo, não é? Tudo porque levou um NÃO de uma mulher — sibilei entre
dentes. — Pessoas levam não o tempo todo. Precisa se acostumar com isso.
— Eu não levo não de ninguém. — Seu tom deixava bem claro isso, o
que só me deixou com mais raiva dele, se isso era possível.
— Meus parabéns! Você conseguiu o que queria. Eu me demito, porque
não há a mais remota possibilidade de fazer acordo com um cara como você
— rosnei com firmeza. Minhas mãos tremiam tanto que achei que estivesse
com Mal de Parkinson, mas era apenas a minha raiva se manifestando por
meio dos meus músculos.
Ele respirou fundo e descruzou os braços.
— Por que está com raiva? Eu nem disse ainda o que vou propor no
acordo... — Seu tom parecia mais calmo, embora confuso.
— Vindo de você, pode-se esperar tudo — disse com amargura. —
Seja o que for, a resposta é não.
Ele ignorou o que eu disse e continuou:
— Você pode ficar com o emprego se for a um encontro comigo. Não
estou falando de sexo, apenas um encontro e nada mais, como ir ao cinema
ou a um restaurante.
Lucky esperava uma reação. Ele era louco? Precisava ser seriamente
tratado por psicólogos. Eu não acreditava no que tinha acabado de ouvir de
sua boca. Contudo, para quem tinha me chamado para ir a seu escritório só
para que transássemos, era capaz de qualquer coisa para ter o que queria.
— Você tem uma ideia muito errada do que significa um encontro, devia
pesquisar no Google. Por me chamar aqui e propor isso, sua chance de ter
um encontro comigo é zero. Não que eu fosse aceitar antes disso. — Alisei
minha testa para aliviar minha dor de cabeça. O dia mal tinha começado, e
eu já tinha uma enxaqueca. Só esse homem para ter essa capacidade de
fazer isso com as pessoas, pensei amarga. — Posso não ter dinheiro como
você, mas tenho orgulho e dignidade. — Levantei o queixo e olhei dentro de
suas duas pedras de esmeralda. — Prefiro morrer atropelada ao sair daqui
ou até pedir esmolas na rua a ter um encontro com um homem como você.
Ele se levantou com os punhos cerrados.
— Eu lhe dei uma chance, estou fazendo o que você queria! — gritou,
fulminando-me com os olhos. — Não foi você mesma que disse que eu
precisava te chamar para um encontro se quisesse que aceitasse o convite
para sair comigo? Estou chamando agora. Podemos fazer o que você quiser.
Arregalei os olhos.
— Mas isso seria antes de você me chamar para transar na sua sala e de
usar ameaça de me demitir caso eu não viesse a ir a um encontro com você
— sibilei. — Você tem alguma ideia do que fez? Alguma noção? Isso não é
encontro, é ameaça. Jamais vou ficar com um cara à base de ameaças. Da
próxima vez, cheque a personalidade de uma mulher antes de chamá-la para
transar e propor acordos a ela.
Ele jogou as mãos para cima num gesto frustrado. Aquele homem era
bem estranho. Era eu que deveria estar frustrada e grilada por ele achar que
podia me subornar. Eu não estava apenas grilada, estava furiosa. O absurdo,
pelo que eu podia ver em seu rosto, era que ele realmente achava que eu
aceitaria sua proposta sem noção.
— O que você quer então para ir a um encontro comigo? Uma joia? Um
carro ou até um apartamento...?
Meus olhos estavam arregalados quando o interrompi, porque cada vez
que ele abria a boca, as coisas ficavam piores. Eu não acreditava que tinha
escutado tantas asneiras em um dia somente. Céus! Em que mundo ele vivia?
Ele achava que presentes caros e exuberantes conquistavam uma mulher?
Podiam até conquistar algumas, mas não a mim. Achei melhor ir embora
antes que arrancasse a cabeça dele e a pendurasse em um milharal para as
aves comerem.
— Eu vou dizer o que quero de você — comecei, tentando controlar
minha raiva. Ele esperou tenso ao ouvir o ressentimento em minha voz. —
Distância. Não quero ouvir falar de você. Não quero vê-lo ou saber que
existe neste mundo.
Dei as costas para sair dali, ignorando seus olhos arregalados e
aturdidos. Por alguns breves segundos, notei dor em seus olhos, mas não me
importei com isso. Devia ter me enganado.
— Espero nunca mais vê-lo em minha vida.
Ouvi Lucky inspirar e expirar como se estivesse dolorido.
— Você pode ficar com o emprego sem me dar nada em troca! — gritou
atrás de mim. — Não vou aceitar sua demissão!
Parei à porta, sem virar o corpo, apenas minha cabeça, e olhei em seus
olhos, que pareciam atormentados. Isso era estranho. Por que ele estaria
sofrendo? Era tão prepotente que achava que podia comprar e ameaçar as
pessoas só porque tinha dinheiro, não se importava com nada a não ser
consigo mesmo.
— É tarde demais para isso — respondi e saí dali antes que
desmoronasse na sua frente, mas percebi que me seguiu para fora da sala.
— Por favor, fique — pediu a meia-voz.
Pude ver que algumas pessoas que estavam na sala de espera do lado
de fora de seu escritório ofegaram com aquele gesto. Então supus que ele
nunca falava por favor. Só deve dar ordens, pensei amarga. O que poderia
tê-lo levado a agir assim comigo? Talvez remorso? Eu não sabia, mas
também não me importei, apenas queria sumir dali e deixar as lágrimas
caírem sem precisar segurá-las.
2 – Conflito
LUCKY
Havia acabado de ver a mulher mais perfeita dentro do elevador. Quase
não me controlei e a beijei lá mesmo, uma coisa que nunca tinha feito em
minha vida, afinal isso envolvia proximidade. Estranho, eu sei, mas nunca
sentia vontade de fazer isso até aquele momento.
Saí do elevador e fui para minha sala.
— Bom dia, senhor Donovan — falou Nancy, minha secretária, com seu
tablet em mãos. — O senhor quer ver a sua agenda para hoje?
— Não! — Entrei em meu escritório, e ela me seguiu. — Quero que
entre em contato com Sasha e Bastiam agora mesmo. — Olhei para ela. — O
Bastiam primeiro.
— Sim, senhor. — Sua voz era séria, mas eu podia senti-la encolhida.
— Mais alguma coisa?
Sentei-me em minha cadeira de madeira com estofado de veludo preto e
olhei para ela, meu rosto impassível
— Não.
Ela se virou e saiu quase correndo, parecendo estar com pressa de sair
de minha presença. Eu sabia que era rígido e autoritário, e não iria mudar só
porque algumas pessoas não gostavam do meu jeito de ser. Não tinha tempo
para me preocupar com o que os outros sentiam ou não ao meu respeito,
possuía normas especifícas para quem trabalhava comigo. Quem não tinha
eficiência no trabalho, não ficava em minha empresa, porque funcionários,
para mim, tinham que fazer o que era ordenado e com a competência de um
profissional que sua função desempenhada exigia.
Olhei ao redor de meu escritório espaçoso, iluminado naturalmente pela
claridade que se projetava pelas janelas em estilo francês. Eu gostava
daquela magnífica vista de Manhattan. Apreciava olhar para aquele
esplendor todos os dias, por isso comprei o prédio onde morava, que tinha
vista para a cidade e o Rio Hudson. Isso sim era uma vida confortável; nada
comparada à miséria de onde eu tinha vindo.
Deixei esses pensamentos de lado e, sem me dar conta, passei a pensar
na mulher mais perfeita que havia visto em minha vida, e olha que já tive
muitas mulheres lindas, mas nunca igual àquela. Seus cabelos negros e
anelados chegavam até a bunda gostosa, como uma cascata negra, e ficavam
mais divinos sobre sua pele de marfim. Entretanto, aquela boca vermelha e
carnuda era a coisa mais magnífica que eu já tinha visto. Não parecia usar
batom, eu apostava que era linda naturalmente. Seus lábios faziam com que
eu me lembrasse de rosas vermelhas.
O seu corpo curvilíneo era como uma obra de arte, e ela parecia não
saber o quanto ficava atraente naquele terninho preto, com saia lápis que
destacava suas curvas.
Se o Ryan visse aquela garota, com certeza cairia em cima dela e logo a
contrataria como sua modelo para desfilar para ele. Ryan tinha uma grande
agência de modelos, a Fashion Donovan. Eu sabia que ele já tinha ficado
com praticamente todas as mulheres de Manhattan e, com certeza, com todas
as suas modelos, mas não era para menos. O cara se parecia com um Adônis
– palavras das mulheres, não minhas. Eu também não me queixava da minha
beleza, afinal, conseguia todas que queria... até aquele dia.
Eu garantia que ele lucraria muito com ela sendo sua modelo, mas isso
não iria acontecer, porque eu não a deixaria Samantha trabalhar para ele. Ela
nunca desfilaria por aí com roupas íntimas para um bando de babacas
ficarem babando por ela. O único homem que apreciaria e tocaria naquele
corpo seria eu e mais ninguém. Soube seu nome pelo crachá que estava em
seu bolso, que ficava em cima de seu seio arrebitado e com certeza
saboroso.

Pedi ao Bastiam que descobrisse mais sobre Samantha, já que


trabalhavam juntos, então ele devia ter alguma informação sobre ela.
Rapidamente me mandou tudo sobre a tal mulher que me fascinou só com seu
jeito de ser e sua língua afiada, mas o que me deixou cismado foi saber que
ela não tinha parentes nem pais.
Nasceu em março de 1991, em Savannah, Geórgia, morava no
Brooklyn. Até aí, tudo certo, mas não ter pais? Quem nessa vida não tinha
pais, mesmo que fossem uns malditos desgraçados que não se importavam
com seus filhos? Alguém sempre vem de algum lugar. Talvez estivessem
mortos. Pelo que eu vi no relatório, ela não tinha família. Isso apenas me
estimulou a continuar com meu plano de conquistá-la de uma forma ou de
outra. Se o único jeito de eu tê-la era conquistá-la primeiro e ir a encontros,
então por que não? A droga era que eu não sabia nada de encontros. Não
tinha ideia de como isso funcionava, porque a única coisa que sabia fazer
com uma mulher era fodê-la e depois dispensá-la, mas sair para um
restaurante ou cinema? Eu nunca tinha feito nada disso.
Eu iria chamá-la ali para lhe propor um acordo, diria que, se ela não
fosse a um encontro comigo, eu a demitiria, mas é claro que não faria isso,
apenas precisava fazê-la sair comigo. Percebi que foi mancada chamá-la
para transar. Devia ter checado que tipo de mulher ela era antes de ir para
cima. Agora era tarde demais, porque, se eu não fizesse um acordo com ela e
usasse seu emprego e sua demissão ao meu favor, Samantha jamais aceitaria
sair comigo.

Quando propus o acordo a Sam, achei realmente que fosse aceitar,


porém ficou tão furiosa que seus olhos azuis pareciam chamas ardentes.
Depois de um tempo pensando nisso, percebi que foi um gesto
impensado fazer aquela proposta. Ela tinha todo o direito de me rejeitar e
gritar comigo. Depois que se demitiu e foi embora, compreendi a burrada
que fiz, porque, mesmo eu não demitindo Samantha, fui o causador do seu
pedido de demissão. Tentei voltar atrás, mas era tarde demais. Eu
definitivamente era um filho da puta fodido.
Samantha provou que tinha decência, não vi fingimento em seus olhos,
mas bem lá, nas profundezas daquele olhar, eu podia ver que tinha algo de
errado com aqueles olhos preciosos. Gostaria de saber por que o olhar
ferido de Samantha me incomodou. Ele já estava assim antes de ela se
demitir por minha estupidez, então eu não era o causador, mas podia tê-la
afetado ainda mais. Eu resolveria isso, iria trazê-la de volta nem que fosse a
última coisa que fizesse.
Sabia que, quando entrasse em suas calças e fizesse tudo de pervertido
com Samantha, a dispensaria. Só pensar nisso já era estranho, porque eu
gostava de sexo sem muito toque, não colocava minha boca nas partes
íntimas das mulheres e muito menos as beijava, mas com Samantha, queria
fazer tudo isso e muito mais. O que havia de errado comigo por desejar algo
que sempre me dava calafrios só em me imaginar fazendo?
Todo o meu medo e raiva vinham do meu passado fatídico, uma infância
que eu queria esquecer. Às vezes as lembranças vinham como bofetadas,
fazendo-me grunhir e gemer de dor e me retirando o fôlego.
— Senhor Donovan — chamou Silas, o gerente de marketing.
Eu estava sozinho naquela reunião, meu braço direito, Jordan Johnson,
estava viajando para comprar uma nova empresa no Kansas. Ele trabalhava
para mim e, além disso, era meu melhor amigo desde Harvard, quando
éramos ainda muito jovens.
Essa reunião era apenas com funcionários, discutíamos sobre a empresa
a qual eu desejava comprar, a Águia da Esperança, que ficava em Toronto e
beneficiava várias crianças por todo o mundo. Kevin, um dos meus
funcionários mais leais, estava encarregado de fechar com os proprietários.
Joguei-me no sofá perto da mesa assim que expulsei todos da sala de
reunião. Precisava ficar sozinho com a dor que estava me atormentando
desde que as portas das lembranças foram abertas. Olhei o teto branco.
Como aquela garota tinha trazido à tona as lembranças que estavam presas
no fundo de minha mente? Eu não queria me lembrar de nada do meu
passado, apenas esquecer tudo.
Sabia o que havia desencadeado as recordações. Foram os seus olhos,
que, mesmo em sua beleza azul celeste, tinham um abismo igual aos meus,
quando eu os via no espelho. E também suas palavras, que foram as mesmas
que Mary disse a mim quando eu tinha 15 anos e fui procurá-la. Meus pais
adotivos me ajudaram a encontrar a mulher que me abandonara. Eu queria
entender seus motivos para ter me deixado. Todavia, o que levei na cara?
Ela nem me deu a chance de abrir a boca e me expulsou de sua mansão, onde
morava com seu marido, em Moscou. Fechei os olhos e recordei aquele dia.

Eu estava nervoso enquanto me remexia no banco do carro de Miguel.


Eu o considerava um anjo que apareceu e me salvou naquele dia, naquela
casa, tanto tempo antes.
— Fique calmo, filho, vai dar tudo certo — disse para me tranquilizar.
Assenti e tentei me acalmar para deixá-lo tranquilo, mas me perguntava
o que eu estava fazendo. Por que queria saber daquela mulher? Ela havia me
deixado e ido embora, por isso eu nem deveria estar ali.
Olhei sua mansão em Moscou, três andares, tudo luxuoso. Eu apostava
que ela tinha vários funcionários a seu dispor. No entanto, também não
reclamava, afinal, os Donovans me deram tudo, e eu era grato a eles por
isso.
Saí do carro do Miguel e suspirei, olhando o imenso portão.
— Eu vou esperar aqui, ou quer que eu entre com você? — perguntou
num tom preocupado, ou foi o que me pareceu.
Olhei para ele e balancei a cabeça. E se a reunião com minha mãe não
fosse conforme eu estava esperando? Não queria preocupá-lo, então dei a
melhor desculpa que pude:
— Eu vou ficar bem, pode ir ao seu almoço com a Lana. — Laura era
sua esposa, mas todos a chamavam de Lana. — Eu tenho dinheiro para o
táxi. Vai dar tudo certo. — Sorri.
Ele sorriu também. Uma vez, disse-me que gostaria que eu sorrisse
mais, porque eram raras as vezes que isso acontecia.
Quando se foi, apertei o botão do portão e chamei no interfone.
Um homem alto e moreno veio me atender. Com certeza era o porteiro.
— O que posso fazer por você, meu jovem? — perguntou num tom
gentil.
Eu estava a ponto de responder, quando um carro chegou e parou
próximo a mim. O portão foi aberto, mas a mulher saiu do carro e me olhou
de cima a baixo como se eu fosse um moleque pedindo esmola em um
viaduto. Eu estava com jeans, camiseta preta e jaqueta, o que sempre usava.
Reconheci-a assim que meus olhos verdes encontraram os seus, que
eram iguais aos meus. Seus cabelos castanhos estavam soltos nas costas,
parecia que ela tinha acabado de chegar do salão de beleza, o que eu não
duvidava. Quando eu era criança, ela também era assim, vaidosa, mas se
arrumava em casa, já que não tinha dinheiro.
— O que faz na minha casa, moleque? Veio pedir dinheiro? — Pegou
notas na carteira e as jogou para mim. Eu não me mexi. Estava travado no
chão devido ao choque. O seu dinheiro bateu no meu peito e caiu no chão,
aos meus pés.
— Não quero ouvir você falar — rosnou antes que eu sequer abrisse a
boca. — Não quero ver você ou saber que existe neste mundo. Espero nunca
mais vê-lo em minha vida... bastardo.
Saí de lá correndo sem olhar para trás, para o monstro que era aquela
mulher que dizia ser minha mãe.

Samantha disse a mesma coisa que Mary me falou naquele dia. Ela não
sabia o que essas palavras desencadearam na porra da minha mente fodida.
Eu confiava e amava aquela mulher, que me decepcionou e me
abandonou como se eu não significasse nada para ela, e com certeza nunca
signifiquei, porque me deixou sozinho naquela casa. Às vezes eu chegava a
pensar: por que ela não me entregara para um lar adotivo ou me deixara na
porta de alguém? Eu sabia que algumas mães faziam isso quando não tinham
condições de cuidar de seus filhos, mas o que Mary fez foi desumano.
Quando eu pensava no falso amor que ela dizia sentir por mim... em suas
palavras... sentia vontade de vomitar.
“Eu te amo, meu garotinho.”
Eu poderia ter me esquecido de tudo isso, como acontecia com algumas
crianças, afinal, na época tinha seis anos, mas, para o meu azar, me lembrava
de tudo.
Expulsei as lembranças sombrias daquela mulher desalmada e voltei a
pensar na garota de cabelos negros. Era melhor isso que meu passado
sombrio.
Eu queria Samantha Gray em meus braços e na minha cama, gritando o
meu nome enquanto eu a possuísse de todas as formas possíveis. Queria
aquelas pernas longas enroscadas em meu quadril enquanto eu estivesse
dentro dela.
Eu teria aquela garota, só não sabia como conseguiria fazê-la mudar de
ideia a meu respeito. Ela foi a única pessoa em oito anos que me enfrentou
sem medo do meu poder. Eu sabia que as pessoas falavam sobre mim pelas
costas, mas nenhuma delas nunca chegou até mim e disse tudo o que pensava
como ela o fez, além da minha família, é claro. Acho que foi por isso que ela
me impressionou, fez-me querer devorá-la com minha boca, beijá-la em
todos os lugares de seu corpo, uma coisa que nunca quis ou fiz com nenhuma
outra. Mas que droga! O que irei fazer sobre isso?!
Ouvi passos aproximando-se de mim.
— O que foi, Lucky? — perguntou Ryan.
Eu tinha quase certeza de que era ele, ninguém mais entraria ali sem eu
chamar. Eu não poderia demitir meu irmão, mesmo se ele trabalhasse para
mim. Alguém da empresa devia ter ligado para ele e contado sobre a minha
loucura ao expulsar todos da sala de reunião, provavelmente por isso ele
estava ali, para me checar. Eu nunca tinha ficado descontrolado a ponto de
expulsar os meus funcionários. Meu trabalho sempre vinha em primeiro
lugar. Samantha me fez largar os meus princípios e conceitos. Maldição.
Ryan era meu melhor amigo e meu irmão desde que fui adotado por seus
pais quando tinha seis anos. Eles morreram em um acidente de carro quando
fiz 18, Ryan, 16, e Rayla, 13. Cuidei deles até que fossem capazes de
cuidarem de si mesmos.
Eu não gostava de reviver a minha vida antes dos seis anos. Aqueles
pesadelos torturantes me impediam de dormir à noite, pois tudo havia sido
real, por isso sempre bloqueava as memórias e focava no presente.
— Não aconteceu nada. — Minha voz estava grossa igual à de um
pássaro gripado. Pássaros ficam gripados? Não sei, mas parecia que algo
arranhava minha garganta.
— Não me parece nada — ele retrucou, parando ao meu lado. — Então
desembucha, cara.
Abri os olhos e o observei, sentado na mesinha de centro à minha
frente.
— O que está fazendo aqui? — questionei, ignorando a sua indagação.
Não queria falar sobre os meus problemas.
Ele estreitou os olhos.
— Eu perguntei a você primeiro, então pare de enrolação e diga logo.
O que houve?
Sentei-me no sofá e olhei para a imensa vidraça com vista para o
distrito de Manhattan. Em que lugar Samantha estava naquele momento? Eu
queria entendê-la e decifrá-la, para mim ela parecia um livro, mas fechado a
sete chaves.
Algo me ocorreu, e eu precisava ter certeza de alguma maneira. Ela
teria um namorado? Eu deveria ter perguntado, mas achei que não tivesse,
senão teria dito logo de cara. Além disso, Bastiam teria descoberto e
acrescentado essa informação no relatório dela. Entretanto, se por acaso
Samantha tivesse um namorado, o que eu faria com isso? Eu podia fazer tudo
e comprar todos, mas nunca me envolveria com uma mulher casada ou que
tivesse um namorado. Tinha de acreditar no relatório que recebi sobre
Samantha, pois, se pensasse que ela tinha outra pessoa, teria de desistir, e
isso não fazia parte dos meus planos.
— Quando eu cheguei aqui hoje para trabalhar, me deparei com uma
beleza rara no elevador. — Eu estava meio atônito. — Meu Deus! Tudo nela
era tão perfeito, como uma Afrodite.
Ele titubeou.
— Só por isso está assim? — Riu, gesticulando para mim. — Por causa
de uma garota? Não jogou seus encantos nela?
Fiz uma careta.
— Claro que sim, mas ela me deu um fora... — Encolhi-me, porque isso
nunca tinha acontecido antes. Todas as outras mulheres eram fáceis e teriam
aceitado minha oferta sem pensar no que eu estava disposto a dar a elas, mas
não Samantha Gray. Isso me fez ficar com raiva de mim mesmo por ter
sugerido lhe dar carros, apartamentos e joias; se Samantha os aceitasse, isso
confirmaria que só estava interessada no meu dinheiro, igual a todas as
outras mulheres que tentavam ter mais de mim do que apenas uma foda. O
problema era que Samantha não queria nada de mim: nem foda, encontros ou
presentes que estivesse disposto a lhe dar. Eu nunca sentira uma atração tão
forte assim por alguém à primeira vista.
Ryan gargalhou feito uma maritaca. Riu tanto que colocou as mãos na
barriga, debruçando-se sobre ela.
— Se veio aqui para rir da minha cara, é melhor ir embora — sibilei,
cerrando os punhos para não socá-lo.
Ele parou de rir e tentou se recuperar, sentando-se no sofá ao meu lado
e ficando ali como se fosse dono do lugar. Sua testa se vincou.
— Sério, irmão? Isso não é para tanto assim — sussurrou com
ceticismo. — Você sempre conseguiu tudo o que quis nessa vida. Então por
que esse desânimo e irritação?
Sacudi a cabeça.
— Não é esse o problema — reclamei. — É que essa mulher me faz
sentir vontade de beijá-la e querer colocar a minha boca em cada canto de
seu corpo. — Passei as mãos pelos meus cabelos. — Isso nunca aconteceu
antes... Jamais quis alguém como a quero.
Ele franziu a testa.
— Você disse que a encontrou no elevador, então ela trabalha aqui ou
veio a negócios.
Engoli em seco.
— Trabalhava. Propus algo a ela, mas essa garota ficou furiosa... Foi
minha culpa ela ter se demitido. — Meu tom era uma droga, não me sentia
nada orgulhoso da merda que havia feito. — Tentei voltar atrás, mas ela não
aceitou e foi embora, dizendo que não queria me ver nunca mais. Isso foi um
belo e bem merecido tapa na cara.
Ele me encarou com recriminação.
— O que propôs a ela para reagir assim e se demitir? — Levantou-se e
me olhou com seriedade. — O que aconteceu?
Contei a ele como a Rosa Vermelha entrou na sala de reuniões, brava
comigo e me chamando de diversos nomes, sem nunca abaixar a pose ou se
rebaixar. Ela parecia ter princípios. Eu só não sabia se isso era bom ou ruim
para o que eu queria dela.
— Ela chamou você de playboy mimado? — Ele sacudiu a cabeça,
rindo. — Já gosto dessa mulher.
— O sujo falando do mal-lavado — retruquei com dureza. — Você é
igual, então não me venha com essa merda.
Ele me olhou de modo provocativo.
— Será que eu teria alguma chance com ela?
Lancei a ele um olhar mortal.
— Fica longe dela, Ryan! — rosnei com os dentes cerrados. — Eu
estou falando sério.
Ele levantou as mãos como se se rendesse.
— Ei! Calma, cara. Só estava brincando. — Revirou os olhos. — Não
está mais aqui quem falou.
— Ótimo! — Soltei um suspiro frustrado. — Tentei pedir para ela
voltar para o seu serviço, mas...
Ele arqueou as sobrancelhas.
— O que ela respondeu?
— Que era tarde demais para isso e foi embora, dizendo que nunca
mais queria me ver à sua frente. — Eu não entendia o aperto no meu peito
por causa disso. — Tem algo nela que me fascina. Não sei se é o olhar
solitário, mas parecia haver um abismo dentro daqueles globos azuis. Tinha
alguma coisa lá. E, Céus! Aquela boca vermelha. Meu Deus, que boca era
aquela? Me dava vontade de beijá-la.
Ryan piscou.
— Você disse olhos azuis solitários e uma boca vermelha? — Ele me
observava com os olhos arregalados, parecia chocado com alguma coisa.
— Sim, por quê? — Meu tom era como lâminas chinesas, como
daquelas de filmes com adagas voadoras.
Ele suspirou e passou as mãos em seu cabelo bagunçado.
— Eu a conheci de manhã, no Green. Nossa! Ela é realmente uma
beleza. — Suspirou. — Eu fiz de tudo para entrar naquela sainha preta que
ela usava.
Meus dentes trincaram. Queria matá-lo por dizer isso e iria fazê-lo se a
tivesse tocado de alguma forma. Entretanto, por que isso me incomodaria,
visto que eu nem a conhecia direito? Não importava, eu apenas a queria.
— Você jogou as suas cantadas nela? — perguntei. Não sei se ele ouvia
a raiva na minha voz como eu a ouvia e a sentia saindo de minha pele como
radiação pronta para estourar.
Ele me olhou com ultraje.
— E quem não daria em cima daquela mulher? — retrucou. — Ela é um
inferno de mulher! — Imitou um violão com as mãos.
— O que aconteceu entre vocês? O que ela lhe disse quando deu em
cima dela? — Se ela tivesse caído em suas cantadas, e não nas minhas, eu
iria matar alguém, ou seja, ele...
Ryan sorriu como um gato.
— Nós transamos dentro do banheiro da lanchonete do Green —
tagarelou, mas percebi pelo tom de sua voz que estava tirando sarro de mim.
Levantei-me, cerrando os punhos e louco para socar a cara dele se não
parasse de me provocar.
— Não me faça perder o resto da minha paciência, Ryan — sibilei
entre dentes. — Porque a maior parte dela já se foi há muito tempo. E não
falta muito para perder o resto.
Ele suspirou.
— Fica frio, mano, porque não aconteceu nada entre mim e ela —
reclamou, enrugando o nariz. — Ela me deu o fora também, assim como deu
em você, mas é claro que não falou mal de mim ou coisa do tipo. Apenas
disse que caras como eu só queriam uma coisa de garotas como ela. —
Revirou os olhos. — Sexo, e isso ela não me daria nunca. Nesse caso, ela
estava certa. Não fico com mulheres certinhas, e sim com aquelas que não
querem compromisso.
Franzi a testa.
— O que ela quis dizer com “caras como você”? — indaguei, confuso e
doido para entendê-la de alguma forma.
Ele sacudiu a cabeça.
— Não sei, mas, pelo que percebi dessa mulher linda... — Interrompeu-
se assim que grunhi. — Desculpe, mas é verdade. O problema é que ela não
parece se envolver com ninguém, com nenhum homem. A garçonete do Green
me disse a mesma coisa. Ela comentou que essa garota sempre vai lá sozinha
ou com Diana, a psicóloga que trabalha aqui.
Eu havia notado algo nos olhos dela ao falar que eu usava o dinheiro
para conseguir o que queria, mas achei que disse aquilo porque estava com
raiva de mim. Agora via que não.
— Eu não sei, meu irmão, mas essa mulher não me deixa crer que ela
seja interesseira. — Ryan me olhou de lado. — Isso é bom, não acha?
Porque tem um monte de mulheres cercando a sua fortuna.
Eu, particularmente, não tinha certeza se era algo bom ou ruim, mas
fiquei ainda mais fascinado pela Rosa Vermelha. Queria entender a sua vida
e entrar fundo nela, saber tudo de que gostava. Até então não sabia uma coisa
sequer, a não ser que ela era psicóloga e que morava no Brooklyn. Eu
poderia encontrá-la, já que tinha seu endereço no relatório. Precisava saber
cada detalhe de sua vida particular, até a cor de suas calcinhas e as posições
em que ela gostava de transar. Tentei não pensar em outros homens tocando
aquele corpo perfeito.
— Você acha que ela tem namorado? — especulei.
Ryan pegou uma garrafa de uísque, colocou o líquido em um copo e
bebeu uns goles.
— Eu tenho certeza de que não...
Eu o interrompi.
— Como pode ter tanta certeza?
— Simples, meu irmão. — Bebeu outro gole de sua bebida. — Porque,
se ela tivesse, teria dito a você na hora da briga e a mim quando dei em cima
dela.
Eu sabia que havia algo a mais naqueles olhos lindos e ao mesmo
tempo vazios, embora não soubesse o que era. Isso me motivava a querer
ainda mais saber tudo sobre ela. Desejava saber seus desejos profundos e
torná-los realidade, todos eles. Como eu podia querer tanto alguém que tinha
acabado de conhecer? Não sabia, mas a desejava de qualquer jeito.
— Eu vou pedir ao Simon para pesquisar mais sobre ela — sussurrei,
pegando a garrafa de bebida de sua mão e bebendo um pouco do uísque.
Quem sabe assim eu relaxasse um pouco, porque estava precisando. Simon
era meu guarda-costas fiel, um amigo leal.
— Ela não parece ser igual a outras mulheres que pegamos e transamos
em uma noite — Ryan me disse.
— Eu sei, por isso quero saber mais sobre ela. Talvez assim eu a
entenda e consiga convencê-la a voltar a trabalhar aqui. — Precisava confiar
nisso, porque só assim eu poderia me acalmar e não enlouquecer de tanto
pensar sobre ela.
Ele sacudiu a cabeça.
— Você precisa tirar essa mulher do seu sistema, meu irmão, e ir até a
Rave catar qualquer vagabunda que esteja interessada em você, igual fez
ontem à noite. Deixa essa garota quieta. Isso vai ser melhor para os dois,
cara, confie em mim. — Sua expressão era séria ao me olhar.
— Eu não posso... também não quero outra mulher — disse, firme e
com convicção. — Só preciso dela e tê-la em meus braços. Nunca quis algo
como a quero.
Ele suspirou.
— Então pense bem, Lucky. Pense no que você realmente quer, porque,
se for só uma transa, ela parece estar fora da linha. — Seu olhar era sério ao
me dizer isso. — Eu não acho que ela transe por aí só por transar, então, se
você realmente só quer uma transa com alguém que não caiu de quatro por
você, desista dela, porque ela não parece ser assim.
Franzi o cenho.
— Como assim?
— Ela tem cara de ser uma mulher que quer corações, flores e uma casa
com uma cerca branca. — Ele revirou os olhos diante disso. — Desista
antes que, no fim, você acabe quebrando essa garota.
3- Descoberta
SAM
Após o episódio trágico que aconteceu na empresa Ônix, quando pedi
as contas da empresa Vênus porque não quis fazer um acordo com o patrão,
consegui um emprego em uma fundação que cuidava de crianças com
traumas. Essa era a minha área, a minha especialidade.
A instituição Fênix trabalhava com crianças e adolescentes que não
tinham família nem ninguém que se importasse com eles, por isso eu era
apaixonada pelo que fazia. Queria ajudar crianças e fazer com que elas
tivessem uma vida melhor ou ao menos fazê-las entender e lutar para deixar
o passado para trás e seguir em frente com suas vidas, livres da dor e das
perdas que um dia tiveram. A instituição Fênix não era tão elegante e famosa
quanto a empresa do Lucky, mas também era uma fundação importante. Eu
estava adorando trabalhar lá.
Três semanas depois que comecei a trabalhar na Fênix, fui a uma
fundação em Nova York com Michael, meu chefe. Era um evento para ajudar
crianças que precisavam de algum suporte psicológico e financeiro. Adorei
ser convidada por Michael. Mal começara a trabalhar e já fora convidada a
ir a um evento de prestígio como aquele. No começo, pensei em não aceitar,
porque lá teriam muitas câmeras, mas não podia deixar de ir. Então decidi
deixar o medo de lado e ir ao evento, mas ficaria longe das câmeras o quanto
possível.
Chegamos ao evento, em um salão branco com várias pessoas
elegantes. Alguns eram funcionários da empresa Martínez, outros eram
convidados de outras empresas e doadores. Fui apresentada a algumas
pessoas cujos nomes não me recordo. Acho que havia umas trezentas
pessoas ou mais, incluindo modelos, atores e cantores.
Um grupinho de empresários estava falando sobre Lucky Donovan ser
rígido e, às vezes, até frio, mas suas obras serem ótimas, pois ajudavam
crianças carentes, tirando-as da rua e providenciando lares felizes para elas.
Eu não sabia o que pensar ao descobrir sobre suas obras de caridade.
Desde o dia em que o conheci e fui embora de sua empresa, por vezes me
deparei pensando nele, no que o levou a fazer o que fez. Ele tinha o
complexo de querer que tudo fosse do seu jeito, e, quando não saía conforme
planejara, não aceitava. Eu não estou me referindo ao seu convite para eu
fazer sexo com ele, porque isso apenas significava que ele era um grande
mulherengo, mas sim ao fato de ter buscado uma forma qualquer para
conseguir o que queria e lhe foi negado. Foi o que o levou a tentar me propor
aquele acordo absurdo.
Depois de dois dias de minha demissão, a minha raiva do Lucky foi se
dissipando, principalmente depois que eu soube por Diana que ele
frequentava psicólogos. Eu não sabia qual era o seu problema, mas tinha
certeza de que era um maníaco por controle. Às vezes queria esquecê-lo, às
vezes não. Talvez ele tivesse se arrependido de me propor aquele acordo,
afinal, quando eu disse que sairia da sua empresa, ele me pediu para voltar.
Eu não quis, porque não podia ficar, não depois do que ele fez.
Parei de pensar em Lucky e olhei mais uma vez ao meu redor. O salão
estava cheio de convidadas, todas elegantes. Eu estava até envergonhada no
meio de tantas mulheres lindas com seus vestidos de festa. Eu usava um
vestido longo e preto, com decote caído nos seios, bonito, mas nada elegante
como os daquelas modelos.
— Está tudo bem? — sondou Michael ao meu lado, avaliando-me.
Eu não sabia se ele tinha sentido minha tensão, mas não queria
preocupá-lo, então me recompus.
— Sim.
Olhei para frente e me deparei com um homem moreno e alto, Martínez,
dono da instituição Martínez, conversando com Lucky Donovan. Congelei.
Michael seguiu meu olhar, e seus olhos escureceram. Eu não sabia
como ele tinha ficado sabendo sobre minha desavença com Lucky, não
perguntei isso a ele, mas tinha certeza de que ele sabia ou desconfiava.
— Eu não sabia que ele estava aqui. Lucky não avisa que vai
comparecer aos eventos, apenas aparece. — Sua voz tinha uma pontada de
amargura.
Eu não soube por que meu coração deu um solavanco alto, como se
fosse sair do peito. Não entendia essa reação do meu corpo ao vê-lo. Corpo
traiçoeiro!
Tudo estava correndo bem no evento, até que vi uma mulher morena e
com corpo de modelo o cercando com seu encanto e sorrisos. Ele também
sorriu para ela, como se estivessem em um clima. Foi quando Lucky me viu
com Michael, e seu sorriso desapareceu. Seus olhos, que se voltaram para o
meu chefe, eram como os de um assassino em série.
Ignorei Lucky durante o resto do evento inteiro, mas podia senti-lo me
observando onde quer que eu fosse, como um gavião.
Algumas pessoas me faziam perguntas como “você não é muito nova
para ser psicóloga?” ou “você e Michael são namorados?”. Eu respondia
a todas do melhor modo possível, sem fraquejar ou me envergonhar pelo fato
de a sala estar cheia de pessoas refinadas. Evitei a todo custo ser filmada e
que tirassem fotos de mim, pois não podia aparecer na TV e jornais.
— Michael é só meu chefe — declarava a verdade.
Após um tempo, passei a evitar perguntas.
Lucky não se aproximou de mim ou falou comigo no evento, talvez não
quisesse ser visto com uma antiga funcionária sua, e sim com as modelos que
o cercavam a todo momento.
Martínez subiu no palco que tinha no lado direito do salão. Falou das
obras que estavam fazendo com a ajuda de doações, como a abertura de mais
orfanatos, mais lares para crianças abandonadas e a contratação de mais
psicólogos, que iriam ajudar e direcionar as crianças e adolescentes.
— Com vocês agora, Lucky Donovan, que irá nos dizer um pouco mais
sobre os projetos futuros para ajudar nossas crianças e adolescentes.
Todos bateram palmas para Lucky, que foi até o palco, subiu dois
degraus e pegou o microfone, em seguida olhou para a plateia no salão.
As câmeras e fotógrafos se direcionaram para Lucky. Afastei-me sem
ser notada e fiquei ao fundo, escondida perto da varanda, assim ninguém me
veria. Se alguma foto minha saísse em jornais, se meu pai descobrisse onde
eu estava, ele viria atrás de mim. Isso não poderia acontecer.
Os olhos de Lucky varreram o local onde eu estava antes, mas não me
encontraram, então ele continuou procurando em silêncio, enquanto as
pessoas o esperavam falar alguma coisa. Depois de alguns segundos, ou
minutos, não sei, ele me achou escondida ali, sozinha. Franziu a testa como
se se perguntasse o que eu estava fazendo.
— Quando comecei a construir a Vênus, há oito anos, tinha um objetivo
em mente: conseguir resgatar o máximo de crianças e adolescentes, tanto das
ruas como de seus próprios pais. Nós sabemos que nem todos os pais
cuidam de seus filhos como deveriam. Muitas crianças são negligenciadas
dia e noite. Isso acarreta vários problemas psicológicos que afetam suas
mentes e, posteriormente, suas vidas. — Sua voz estava grave e séria. —
Para evitar que alguns caíam no mundo do crime, quero fazer algo para
ajudar a direcioná-las. Muitas pessoas que se tornaram assassinas foram
judiadas, maltratadas, pisadas, estupradas e espancadas quando crianças ou
adolescentes por amigos, colegas e familiares que deveriam protegê-las.
Muitas vezes nós nem sabemos dos maus tratos ou desconfiamos que
estão ocorrendo, talvez com alguém de nossa família. Ninguém sabia o que
estava acontecendo comigo na casa dos meus pais, as surras que eu
recebia sem merecer. Evitei esse pensamento e foquei no Lucky, que
continuou falando:
— Eu não me considero bom ou santo por fazer um trabalho
humanitário. Ao contrário, as pessoas dizem que sou o diabo. — Ele piscou
para os espectadores com um meio sorriso. Todos riram de sua piada.
Eu já tinha ouvido isso de algumas pessoas na empresa dele. Esse era
um dos muitos apelidos que recebia. Eu não acreditava que ele era ruim, só
complicado, arrogante, duro em alguns momentos e frio em outros. Depois
de saber o que ele fazia, o meu coração amoleceu.
Lucky continuou falando um pouco mais de seus projetos e sua meta,
como comprar uma empresa que abrigaria mais de mil jovens e crianças.
Fiquei feliz por ele fazer algo assim, acredito que o teria beijado por isso.
Não havia nada que me deixasse mais feliz do que ver pessoas ajudando
crianças, seres indefesos que precisam de nossa atenção, proteção e amor.
Lucky sumiu alguns minutos após seu discurso. Eu apostava que estava
com alguma mulher, porque, assim que desceu do palco, algumas garotas o
cercaram. Fiz cara de paisagem, pois Michael estava comigo, mas senti o
peito apertado, como se estivesse faltando ar em meus pulmões.
Pedi licença a Michael e fui ao banheiro, pois queria ficar um pouco
sozinha, mas, antes de chegar ao local, ouvi uma voz não muito distante:
— Ela está aqui junto àquele ser desprezível do Michael. — Era a voz
do Lucky. Eu conhecia seu rosnado muito bem.
Parei à porta do banheiro, pensando em se devia entrar ou seguir a voz
dele a fim de ver com quem ele estava falando sobre mim, porque eu sabia
que se referia a mim. Se estivesse conversando sobre mim com uma mulher,
eu iria esganá-lo.
— Ela deve ser especial, para deixá-lo inquieto assim por semanas —
observou uma voz masculina, mas, pelo timbre, não parecia ser um homem, e
sim um adolescente.
Pelo menos não é uma mulher, pensei.
Lucky suspirou.
— Ela é muito especial. — Seu tom era de orgulho no começo, mas
depois ficou triste quando continuou: — A única mulher que me deu um fora.
E não tiro sua razão, eu daria um fora em mim mesmo se fosse ela. Às vezes
me pergunto o que deu na minha cabeça para ameaçá-la daquele jeito.
O garoto riu.
— Você foi um cretino, admita. Mas qual a razão para ameaçá-la a ir a
um encontro? Só porque ela não quis transar com você?
Cheguei mais perto da sala no final do corredor. A porta estava
entreaberta. Espiei para ver quem estava com ele. Lucky estava de costas
para mim e olhava a cidade através das imensas janelas do lugar. Um garoto,
que devia ter entre 17 e 19 anos, estava sentado em um sofá, olhando para
ele. Era loiro e forte para sua idade. Eu apostava que praticava esportes.
Lucky balançou a cabeça.
— Não, eu não sei bem o porquê, mas nunca fui desafiado antes. Então
isso me pegou de surpresa. Quando dei por mim, já tinha proposto a ela ir a
um encontro comigo, assim eu não iria demiti-la. Voltei atrás na injustiça que
estava fazendo, mas Samantha nem quis me ouvir, apenas se demitiu. — Ele
tomou um gole da bebida que estava em suas mãos.
— Eu também não iria querer ver sua cara nunca mais, Lucky. Desculpe
dizer, mas você pisou feio na bola. — Seu tom era de crítica.
— Eu sei, por isso saí do salão para não vê-la com Michael, ou eu
perderia minha mente se o visse tocá-la mais uma vez, desde que não tenho
nenhum direito sobre ela.
Estreitei meus olhos, porque Michael não havia me tocado... Não, ele
pegara nas minhas costas por uns segundos, mas fez aquilo para eu descer o
pequeno degrau que havia no salão. Lucky tinha visto? Olhei para ele, que
parecia triste com o fato. Por que ele se incomodaria se alguém tivesse me
tocado? Bem, estávamos quites, porque eu não gostei de vê-lo com as
mulheres no salão.
— Hoje faz um mês que ela se demitiu por causa do meu egoísmo e três
semanas que eu soube que conseguiu um emprego na Fênix...
— Na verdade, você ligou para o Michael para ele dar o emprego a ela
— interveio o garoto. — Aposto que fez isso porque sabia que ela não
voltaria a trabalhar para você, então não quis deixá-la sem serviço, não é?
Ofeguei de choque com o que ouvi. Então ele tinha me ajudado a
conseguir o cargo de terapeuta na Fênix? Michael não me disse nada. Devia
ser por isso que ele pensava que tinha rolado algo entre mim e Lucky. Meu
coração se comoveu ainda mais com o gesto de meu ex-chefe ao me ajudar.
Isso provava que havia se arrependido do que me fez e que tinha um imenso
coração.
Lucky riu, mas parecia triste.
— Se você fosse maior de idade, o colocaria para trabalhar para mim.
— Lucky virou a cabeça para o garoto e sorriu. — Ainda anda procurando
saber tudo que faço? Se quiser saber mais sobre mim, é só perguntar, Logan.
Mas isso não significa que direi tudo.
Logan revirou os olhos.
— Na verdade, eu sei tudo sobre você, Lucky. É claro que a cada dia
descubro mais. — Meneou a cabeça de lado, ainda fitando Lucky como se
ele fosse um herói. Aquele garoto parecia amá-lo. — Sabe? Você seria
idolatrado se as pessoas soubessem realmente o que fez e ainda faz para
muitas pessoas carentes e pobres, como fez para mim. — Logan estremeceu,
como se se lembrasse de algo ruim.
Talvez esse menino seja um dos garotos que Lucky já ajudou, pensei.
Lucky bufou.
— Não quero ser idolatrado por ninguém. Quando ajudo uma pessoa,
não quero nada em troca, o faço porque quero ajudar crianças e adolescentes
que foram de alguma forma prejudicados. Muitos deles poderiam ter se
tornado criminosos, por isso faço o que puder para que isso não aconteça,
assim como Miguel fez por mim, me resgatando do fundo do poço para ser
alguém hoje — sussurrou.
Logan sacudiu a cabeça.
— Você fez mais que isso, Lucky, me salvou do meu pai, que me usava
como saco de pancadas, tanto que precisei de um transplante de fígado
urgente, e você doou um pedaço do seu. Quem nesse mundo faz isso para
alguém que não seja da família? Ninguém. Devo a minha vida a você,
sempre lhe serei grato.
— A única coisa que você precisa fazer é estudar, garoto, e não deixar
as lembranças e os pesadelos o dominarem. — Lucky o fitava. — Como
estão as consultas com a psicóloga?
Logan assentiu.
— Não tenho mais pesadelos sobre o que houve comigo, e as
lembranças nem vêm mais à minha mente. Eu me mantenho focado nos
estudos e no jogo, e, por falar em jogo, fui contratado pelos Raydes, dá para
acreditar? — De repente, ele parou de falar e olhou para o Lucky. — Você
não teve nada a ver com isso, não é?
Lucky sacudiu a cabeça.
— É claro que não, você é bom jogando futebol americano, Logan. Eles
seriam uns perdedores se não o contratatassem. Avise quando for jogar, que
eu irei vê-lo, ok?
Isso explicava por que Logan era tão musculoso para sua idade, ele
jogava futebol americano, e, pelo que eu via em jogos desse esporte, os
atletas eram fortes. Pelo que eu sabia, o time dos Raydes era o melhor da
temporada. Sabia disso por causa do Bryan, que assistia a partidas de
futebol americano.
— Obrigado, Lucky. — Logan pigarreou. — Eu aviso, sim.
Lucky olhou o relógio no pulso, checando as horas.
— Preciso ir embora, a festa já está quase no fim. — Olhou para Logan.
— O que eu fiz para você é nosso segredo, você sabe disso. Não quero que
as pessoas saibam de nada em relação a isso, porque, no dia em que doei um
pedaço de mim a você, não estava fazendo uma caridade, estava salvando
uma vida, a sua vida, garoto. E não me arrependo de nada.
Logan se levantou, foi até ele e colocou a mão direita em seu ombro.
— Eu sei, sempre vou dar valor a essa segunda chance que me deu ao
me salvar. — Seu tom era agradecido e emocionado. — Amanhã, eu vou
voltar para Seattle com meus pais, mas antes quis passar neste evento porque
sabia que você estaria aqui. Eles estavam loucos para te ver e falar sobre
outra instituição que estão abrindo em Seattle, tudo graças à sua ajuda.
— É, eu falei com eles agora há pouco. Milton e Linara parecem
realmente amar você como filho. — Não era uma pergunta, e sim uma
declaração, mas tinha uma nuance em sua voz que não entendi, parecia culpa.
— Sim, eles amam, e tudo graças a você, que os conseguiu para mim,
porque ninguém adota adolescentes de 16 anos, sempre preferem crianças,
ainda mais um como eu, que acordava no meio da noite gritando tão alto
como se estivesse sendo morto. — Ele estremeceu e mudou de assunto. — E,
quanto à garota de quem me falou, não dê mais mancada, Lucky. Se está
realmente a fim dela, lute, vá atrás dela e a chame para um encontro, mas
estou falando de um encontro com velas e essas coisas, não em sua cama. E
também não a ameace para sair com você.
Lucky respirou fundo, depois deu uma risada.
— Vou manter isso em mente, expert em mulheres.
Logan deu uma gargalhada.
— Oh, eu sou mesmo. Agora estou aproveitando minha vida de
adolescente ao máximo, como tenho direito. Afinal, fiquei 16 anos da minha
vida em cativeiro. Mas agora, aos 17, quero aproveitar tudo de bom. Não se
preocupe, não vou entrar em encrenca — falou, porque Lucky já ia abrir a
boca para dizer algo. — Mas você já passou da idade de ficar por aí,
cercado de mulheres que não significam nada para você. Deixe isso para
nossa geração.
Lucky gargalhou.
— Eu não acredito que estou sendo chamado de velho! Agora sou da
pré-história? — Bagunçou os cabelos de Logan como se ele fosse uma
criança.
Os dois pareciam irmãos falando assim. Eu queria saber o que Lucky
teve que passar em sua vida, por que se colocou no meio quando falou das
crianças que foram quebradas pelos seus pais. O que teria acontecido? Eu
não fazia a mínima ideia, mas devia ter sido uma vida sofrida igual à minha,
ou parecida.
Logan riu por um momento, depois ficou sério.
— Peça desculpas a ela, cara. Admita que errou, tudo bem? Isso é ser
humano, e você é bem humano, mesmo que, às vezes, não se considere assim.
Lucky pareceu pensar no conselho de Logan.
— Valeu pelas dicas e conselhos, garoto. É inacreditável receber
conselhos de um adolescente de 17 anos. — Balançou a cabeça. — Agora
vamos. Preciso vê-la antes que ela vá embora com aquele cara.
— Se os dois estiverem juntos, controle-se e não faça besteira —
advertiu.
— Com quem acha que está falando? Eu não faço escândalo por nada,
nem por uma mulher — replicou.
Logan revirou os olhos.
— Conheço você, Lucky. Quando perde a cabeça, só falta querer matar
qualquer um que entre em seu caminho. Então se controle ao redor dessa
mulher, porque, senão, vai piorar ainda mais as coisas.
— Sim, professor. — O divertimento era evidente em seu tom. Ele
parecia tão leve conversando com Logan, tão diferente do homem que
conheci na sua empresa. Fosse quem fosse aquele garoto, gostei de sua
presença na vida do Lucky.
Saí antes que me vissem, não queria ser pega espionando a conversa
dos dois. Sabia que nas últimas semanas havia ficado com raiva de Lucky
pelo que ele tinha feito, mas descobrir sobre suas obras e tudo mais que ele
fazia me fez perceber quem ele realmente era: um homem que sofreu muito,
que levou várias pancadas da vida. Então estar no controle era algo que
Lucky não só queria, mas precisava, como um escape, por isso não aceitou
bem o fora que lhe dei.
Fiquei esperando Lucky vir me pedir desculpas pelo que fez, assim
como Logan sugeriu que fizesse, mas ele não veio. Tentei não deixar meu
coração vacilar por causa disso e por ele ter ficado conversando com uma
modelo, Jennifer Liston, com quem saiu depois do evento, embora os dois
não tivessem se tocado. Contudo, eu não era nenhuma idiota para não saber o
que iriam fazer...
Deveria ficar feliz por Lucky estar com outra mulher. Isso significava
que ele decidira partir para outra, escolhendo me deixar em paz. Então eu
também iria esquecer que o havia conhecido.
4 – Influência
SAM
Depois que vi Lucky no evento ao qual fui, fiquei mais balançada por
ele do que já estava. Naquele dia, soube bastante coisa a seu respeito, coisas
que ele não queria que ninguém soubesse. Isso me fez perder o sono várias
noites, pensando no porquê de Lucky agir assim. Por outro lado, eu o
entendia; se fosse comigo, não seria diferente.
Apesar disso, eu não queria pensar em um homem mulherengo e sem-
vergonha como ele. Em um momento, ele dizia que queria me pedir
desculpas pelo que me fez; no outro, saía com uma mulher em vez de vir
falar comigo. Isso me deixou pensativa, devo admitir.
Outra coisa que também estava me deixando com o coração balançado
pelo Lucky, além de confusa, era o fato de, todos os dias, eu receber rosas
vermelhas com bilhetes. Minha casa estava parecendo uma floricultura. Nos
bilhetes do Lucky, ele dizia: “quer jantar comigo hoje, Rosa Vermelha?” ou
“vamos a um encontro de verdade?”. Ele mandou até o número de seu
telefone para que eu mandasse minha resposta, só não me pediu desculpas,
como uma pessoa normal faria, mas “normal” e “Lucky” na mesma frase não
combinavam.
Fiquei confusa no início, perguntando-me por que ele não tinha vindo
pessoalmente me perguntar isso. Por que mandar bilhetes igual a um
adolescente na escola? Porém, foi melhor dessa forma, porque assim eu não
cairia em tentação. Mesmo sentindo algo por ele, não poderia sair com
Lucky. Acreditava que ele estava apenas iludido por eu não ter ficado com
ele. Com certeza, assim que eu me entregasse, ele me jogaria fora igualmente
tinha feito com as outras mulheres que Sasha mencionou. Definitivamente, eu
não queria isso para minha vida.
Duas semanas depois do evento, entretanto, eu já estava com raiva de
tantas rosas, e nada de Lucky vir me convidar pessoalmente. Não liguei para
o número que mandou. Se eu ouvisse sua voz, não conseguiria dizer que não
podia ficar com ele por vários motivos. Primeiro, ele era rico. Segundo,
mulherengo, e que só estava iludido comigo por eu ter dito não a ele quando
deu em cima de mim. E tinha certeza de que, se aceitasse ir a um encontro
com ele, não conseguiria mais dizer não.
“Lucky, eu não posso aceitar ir a um encontro com você. Agradeço-
lhe pelas rosas, mas gostaria que não me mandasse mais nenhuma.”
Sabia que meu recado foi seco, mas era melhor assim, cortar o mal pela
raiz. Se eu deixasse meus desejos por aquele homem virarem algo mais,
estaria ferrada.
Parei de pensar em Lucky e foquei no meu trabalho. Era menos
complicado e trazia menos dor de cabeça.
Na Fênix, eu tinha um escritório apenas meu. Na Vênus, também tinha,
mas lá havia a cadela da Sasha para me atormentar. No meu emprego atual,
os meus colegas de trabalho eram maravilhosos. Trabalhava diretamente
com Ana, assim como fazia com Diana na Vênus.
Eu amava os garotos da Fênix, podia ver, em alguns olhos
atormentados, a mesma dor que um dia eu sofri e ainda tinha no fundo da
minha alma. Isso era algo que eu preferia evitar pensar, já que as lembranças
me faziam sofrer ainda mais.
Meu atual chefe era um homem muito bonito. Todavia, eu não sentia
nenhum interesse por ele, não como sentia pelo dono da Vênus. O que havia
de errado comigo? Será que eu tinha uma queda por bad boys? Lembrei-me
do homem na lanchonete do Green, que também era quente e fez meu corpo
estremecer só com o olhar, embora as sensações não foram nada comparadas
com as que Lucky me fazia sentir. Homens como eles irradiavam problemas,
assim como beleza. Deveria ser considerado crime perfeições como eles
andando entre nós, só para enfeitiçar mulheres tolas e desavisadas... como
eu. Era isso! Eu era uma tola por me interessar por um mulherengo.
Logo depois do evento da Martínez, pesquisei mais sobre Lucky, apenas
por curiosidade (bem, era isso que eu dizia a mim mesma). Sabia um pouco
sobre ele por meio do seu discurso e sua conversa com Logan. Vi nos
tabloides da internet que ele era visto constantemente com várias mulheres
diferentes: ruivas, morenas, loiras, todas lindas, algumas modelos, pelo que
notei, como aquela com quem ele saiu na noite do evento. Disse a mim
mesma que não deveria me preocupar com isso, embora notasse que algo no
fundo do meu coração doía sempre que eu pensava nesse fato. Eu só não
sabia os motivos!
Também descobri que ele foi adotado pelos Donovans aos seis anos de
idade, e não havia nada que relatasse sobre sua vida antes dessa idade. Tudo
era um grande mistério, e, apesar de eu querer investigar a fundo, não podia,
possuía meus próprios segredos.
Durante os dois meses que estava na Fênix, comecei a trabalhar com um
garotinho que tinha sete anos de idade e não falava com ninguém desde que
chegou, havia seis meses. Todas as psicólogas tentaram entrar em sua mente
e fazer com que se abrisse com alguém, mas sem êxito. Decidi tentar ajudá-
lo da maneira que pudesse. Precisava ter fé de que conseguiria trazer luz
para aqueles olhos negros.
Estava em meu escritório pequeno, mas aconchegante e do meu gosto.
Tinha uma mesa de ferro com vários papéis e relatórios de pacientes, um
armário com arquivos, um sofá bege de dois lugares e uma poltrona da
mesma cor.
Shaw era um garoto que viu a mãe ser assassinada pelo pai. Esse era o
motivo pelo qual ele não mais conversava com ninguém. Eu via, no fundo
daqueles olhinhos negros, um abismo de dor e sofrimento, como os meus
mostraram um dia.
Seu rostinho arredondado era um pouco cheio e com covinhas, tinha
cabelos negros na altura do queixo e boca pequena. Shaw estava sentado no
sofá, e eu, na poltrona em frente a ele, com uma agenda em mãos para anotar
qualquer progresso que ele viesse a fazer. Não obstante, Shaw nunca dizia
nada, apenas segurava um carrinho de polícia e não olhava em meus olhos.
— Shaw, querido, pode se abrir comigo — eu dizia isso todas as vezes
que me sentava com ele. E, como sempre, o garoto não dizia nada, apenas
ficava olhando o seu brinquedo.
Resolvi tentar uma tática diferente com Shaw naquele dia. Não sabia se
daria certo, mas não custava nada tentar.
— Shaw, eu vou contar uma história para você. — Suspirei, olhando o
jardim do lado de fora da janela do escritório. — De uma garotinha com
seus cabelos negros e trançados como a Rapunzel... Já ouviu a história da
Rapunzel? — Olhei para ele.
Seus olhos negros estavam nos meus e pareciam tristes, mas o menino
não disse nada, só assentiu.
— A garotinha adorava a Rapunzel. Ela sempre queria que sua mamãe
fizesse tranças parecidas, mas a sua mãe não se importava com ela, dizia que
ela era feia e não seria bonita para ninguém, que não deveria ter nascido,
porque era uma semente do Mal... — Precisei respirar fundo. — Seu pai a
adorava, e foi assim até que ela fez dez anos, quando ele começou a lhe bater
com o cinto, deixando marcas. A garotinha queria entender por que o pai não
a amava mais, assim como um dia a amou. Ela nunca soube o motivo. Toda a
infância daquela menina sempre foi conturbada e com pais monstros que a
machucavam todas as noites e dias. Por anos, ela sofreu nas mãos de quem
deveria protegê-la. Ela cresceu e até hoje tem pesadelos como consequência
de seu passado sofrido. — Limpei as lágrimas, que caíam dos meus olhos e
desciam pelas minhas bochechas. — Essa garotinha, que só queria ser
amada... sou eu.
Percebi que ele respirava com dificuldade, mas não disse nada, apenas
apertava o carrinho com mais força, como se estivesse com medo de se
lembrar do que estava guardado em sua mente.
— Eu... eu... — ele começou a falar.
Meus olhos foram para seu rosto molhado. Senti meu coração se
quebrando ainda mais ao ver a sua dor, mas apenas fiquei ali, olhando para
Shaw. Suas mãos estavam em punhos e apertadas sobre o seu colo, o
brinquedo esquecido. Não o interrompi, esperando que continuasse.
— Quando... — respirou fundo, e parecia doer — antes... eu brincava
na cozinha, esperando... mamãe... — Ele gemia, com os olhos fechados com
força. — Ela... ela estava fazendo comida para nós e para... ele. — Shaw
parecia com medo. — Papai chegou e começou a brigar e dizer coisas feias
que não entendi... Ele bateu na cara dela, e ela caiu no chão. — Ele
respirava de forma irregular, como se estivesse em um pesadelo real. Seu
peito subia e descia. — “Corre, Shaw...”, mamãe gritava. Eu queria correr,
mas não conseguia... Ele começou a rasgar sua blusa... Eu não queria que ele
a machucasse. Peguei uma garrafa de bebida, bati em sua cabeça e gritei
para que a deixasse em paz, mas... — Shaw gritou e colocou as mãos na
cabeça como se quisesse arrancar os cabelos.
Fui até ele e me sentei ao seu lado, tocando seu rosto.
— Shaw! — chamei-o, mas ele não me ouviu, continuou falando com
dor na voz. O meu coração estava da mesma forma: dilacerado. Como um
pai podia fazer uma barbaridade daquela na frente de uma criança indefesa?
Eu sabia que o desgraçado desumano ainda estava solto nas ruas, porque
fugiu antes que a polícia chegasse ao local do crime.
— Ele... me bateu, e eu bati na mesa... mas vi tudo. — Seus olhos
estavam fechados com força, como se não quisesse ver a cena macabra de
novo. — Papai batia nela várias vezes, enquanto ela gritava.
Céus, isso era demais! Como um pai podia machucar sua mulher na
frente de seu filho, uma criancinha de sete anos de idade? Onde estava a
humanidade dele? Igualmente, onde estava a do Dylan? Os dois eram
monstros que estavam soltos na Terra.
— Ela lutava com ele... Ele se zangou, xingando-a de nomes feios e
pegou uma faca... — Shaw começou a gritar, sacudindo a cabeça sem parar.
— Ele...!
— Shaw! Por favor, Shaw! — Puxei-o para os meus braços, beijando
seus cabelos. — Eu estou aqui e não vou deixar você!
Eu não sabia mais o que fazer para que ele entendesse que as
lembranças eram um pesadelo e que ele estava acordado.
— Shaw, meu amor, por favor. — Eu chorava por ele estar tomado de
dor. Queria retirar o seu sofrimento para que não sentisse mais nada, mas
como faria isso, se o meu tinha demorado anos? E ainda estava lá,
adormecido.
Shaw passou os braços em minha cintura e me apertou forte, como se
nunca quisesse me deixar ou que eu fosse embora.
— Por favor, nunca me deixe! — suplicou.
— Eu não vou, prometo. — Embalei-o mais apertado em meus braços,
querendo tirar toda a sua dor, mas não podia, apenas o amaria para sempre.
Tinha algo nele que me fazia sentir um carinho muito especial, querer
protegê-lo, e não era só por causa do meu trabalho. Depois de um mês e
meio cuidando dele, decidira adotá-lo. Já havia inclusive falado com
Michael sobre essa possibilidade, duas semanas após a decisão.
Shaw não respondeu nem falou mais nada naquele dia, apenas chorava
em meus braços, buscando proteção e amor.
Todas as coisas que aconteceram de ruim em minha vida nesses últimos
meses quase me fizeram cair, como o meu irmão levar uma facada para me
salvar do delinquente do Dylan, eu perder o meu emprego na Vênus, mas,
apesar de todas as coisas ruins que aconteceram, tive a chance de conhecer o
Shaw, e, depois disso, pareceu que uma luz entrou em meu peito e fez com
que eu me apaixonasse por aquele garotinho de apenas sete anos de idade.
Estava feliz por tê-lo em minha vida. Shaw foi como um milagre que Deus
enviou para mim, e acho que também fui para ele.
Na manhã de uma segunda-feira, quando cheguei ao meu trabalho, meu
telefone tocou.
— Alô?
— Como está a minha irmã favorita? — perguntou Bryan do outro lado
da linha.
Revirei os olhos.
— Da última vez que pesquisei, eu era a sua única irmã, seu tonto. —
Sorri, olhando o jardim da instituição. Ali tinham várias plantas e flores,
como jasmins e frésias.
As porcarias dos nossos pais fizeram apenas nós dois. Graças a Deus
por isso, porque, se tivéssemos mais irmãos, não sei o que eu faria caso
viesse a acontecer alguma coisa com eles, mas estava aliviada por Lisa não
poder ter mais filhos, assim ninguém iria sofrer nas mãos daqueles dois
monstros.
Tentei não pensar no passado e focar no presente. Com o telefone ao
ouvido, entrei na instituição e fui até minha sala.
— O que houve?
Ouvi-o bufar.
— Não posso ligar para minha maninha sem que tenha acontecido algo?
— retrucou em um tom magoado.
— É claro que pode, mas acho estranho você me ligar em meu horário
de trabalho. — Franzi os lábios. Ele sempre ligava à noite, quando eu estava
em casa, e não ali, no trabalho.
Ele suspirou.
— Eu só quero pedir a você o telefone daquela médica gostosa que me
atendeu no hospital.
— Você é doido, Bryan?! Não acredito que me ligou aqui, no meu
horário de trabalho, para isso! — exclamei. — Não posso de repente ligar
para a doutora e dizer: “Oi, doutora, o meu irmão quer ter um encontro
com você, então dê o seu telefone a ele”. — Suspirei. — E, além disso,
pelo que sei, você não precisa de mim para isso.
Meu irmão era um cara lindo e podia ficar com qualquer garota que
quisesse, era só estalar os dedos para isso. Éramos muito parecidos
fisicamente. Ele era forte, com músculos definidos, barriga tanquinho e uma
pele branca, mas bronzeada. Tinha cabelos negros da cor da noite e olhos
azuis atentos como os de um lobo, iguais aos meus.
— Eu sei, maninha, estou brincando. Apenas senti saudades de você.
Desculpe por ligar antes da hora — ele disse, sua voz divertida. — E,
querida, eu não tenho encontros, apenas quero entrar nas calças da doutora
— disse-me sem nenhuma vergonha. — Anjinho, eu apenas transo e nada
mais.
— Você é tão cheio de si, não é? Se não estivesse tão longe de mim, eu
bateria em você até criar juízo... — Levantei-me, peguei um copo de água e
beberiquei um pouco. ― Sorte sua que amo você mesmo que seja um sem-
vergonha.
Ele riu.
— Também te amo demais. ― Ele riu descaradamente. — Eu sou tudo
o que as mulheres querem e tenho tudo que as deixam ir às nuvens e voltar no
prazo de um segundo.
— Tão modesto, não? — Revirei os olhos novamente.
— Maninha, eu sou o sonho de todas, assim como você é o de todos os
homens — grunhiu o final. — Ainda bem que você não liga para os homens
como eu ligo para as mulheres. Assim sua castidade vai se manter intacta.
— Argh, vamos parar de falar sobre isso, ok? — Estava corada. Ainda
bem que ele não estava ali para ver. Mudei de assunto: — Eu vou passar
esse final de semana com você, mas não quero me deparar com mulheres em
seu apartamento. — Lembrei-me da última vez que estive lá e dei de cara
com uma garota nua na cozinha. Não queria passar por aquilo novamente.
— Certo. Então você soube alguma coisa do magnata? — Senti
desagrado em sua voz. — Eu fiz uma pesquisa sobre ele, e você não vai
acreditar nisso! Sua fortuna é estimada em 74 bilhões de dólares. Acho que
por isso tantas mulheres caem em sua rede, como um cardume.
O comentário me deixou sem ar. Achava que Lucky Donovan era rico,
mas não tanto assim. Quanto à sua opinião, eu não concordava que o
interesse das mulheres por ele fosse apenas pelo seu dinheiro. Não, era mais
que isso, afinal ele era um homem atraente.
— Sério? Isso é bom, assim ele não vai mais me procurar, já que não
tenho grana — sussurrei depois de me recuperar um pouco.
Talvez seja por isso que ele não veio me pedir desculpas
pessoalmente depois do evento, pensei amarga. Lucky continuava me
mandando bilhetes, mas, na última semana, em vez de rosas, começara a me
enviar brincos e correntes de diamantes. Devo dizer que fiquei puta com
isso. O que ele achava que eu era? Uma aproveitadora que precisava de
presentes caros para ser conquistada e motivada a sair com ele? Ele era
louco. Eu iria lhe devolver aquelas joias ainda naquele dia, assim que saísse
do trabalho. Tinha seis pares de brincos e correntes. Não queria nem
imaginar o valor de tudo junto, mas, sabendo agora o quão rico ele era,
podia imaginar... Chequei a caixa azul sobre a mesinha. Tinha lhe mandado
uma mensagem por seu segurança, que veio me procurar a mando do seu
chefe, dizendo-lhe que eu não poderia aceitar nenhuma das joias.
— Sim, ele é bastante poderoso aqui nos Estados Unidos. Acho que se
equipara ao presidente. Ajuda várias instituições beneficentes, e a maioria
delas não é relatada na mídia. Pelo que descobri, ele quer assim, mas eu não
ligo para o seu poder e suas obras beneficentes, o que preciso saber é se ele
a incomodou de alguma forma. — Seu tom era preocupado, não mais
brincalhão. — Se não me contar, vou bater aí, onde você trabalha.
Eu sabia que ele faria isso, era capaz de tudo por mim.
— Não tive mais notícias dele.
Eu não queria dizer-lhe que vi Lucky havia algumas semanas, no evento
na Martínez, e que, nesse dia, fiz descobertas impressionantes em relação a
ele, o que me deixou balançada, como também não pretendia lhe falar sobre
seus presentes extravagantes, nem que me pediu para ir a um encontro com
ele.
— Aqui está perfeitamente bem, Bryan, então não se preocupe comigo.
— É bom ouvir isso. — Ele parecia aliviado.
Decidi mudar de assunto.
— Se já começou a andar por aí com mulheres, então a lesão está se
curando bem, não é? — Meu irmão era um mulherengo nato, mas eu o amava.
— Perfeitamente bem, maninha — sussurrou, depois seu tom se tornou
sombrio. — Não teria ficado assim sem sua ajuda. Graças a você, eu fui
salvo...
Cheguei bem a tempo de chamar a ambulância para levar meu irmão,
que tinha levado uma facada na barriga. Seu próprio pai tinha feito isso com
ele, quando foi me procurar para me levar de volta para o Kentucky. Como
eu não estava em casa naquele dia, Bryan discutiu com ele e disse que eu não
iria a lugar algum. Foi quando ele ficou furioso e esfaqueou o próprio filho,
mas, para quem tentou fazer coisa pior com a filha, eu sabia que era capaz de
tudo. Depois disso, nos mudamos da Flórida. Eu fui para Nova York, para o
Brooklyn, e Bryan, para Nova Jersey. Não morávamos muito distante, a
apenas duas horas de carro.
Nunca vi tanta raiva e ódio como no olhar do Dylan para mim, nem
parecia que um dia ele me amara. Ele achava que eu não era filha dele, mas
a mulher que me deu à luz dizia que não o havia traído, mas também falava
que eu era a semente do Mal, não me suportava, pois teve depressão pós-
parto. Eu não queria saber nada deles, de nenhum dos dois desgraçados que
nos colocaram no mundo, porque nunca foram realmente meus pais. Nenhum
deles sabia o que era isso.
— Agora você está bem — sussurrei, limpando as lágrimas que
desciam pelo meu rosto. Ainda bem que Bryan não estava ali para me ver.
Ele suspirou.
— Sim, estou perfeitamente bem, tanto que, essa noite, vou a uma boate
pegar algumas gatas, já que fiquei em abstinência por causa do maldito
Dylan. — Seu tom era maligno no final. — Se algum dia eu voltar a vê-lo à
minha frente, vou matá-lo.
Um arrepio percorreu minha espinha, como se tivessem injetado água
gelada em minhas veias.
— Não pode fazer isso, está me ouvindo? — Minha voz se elevou um
pouco no início, mas depois baixei o tom.
— Por quê? Ele tentou fazer coisas horríveis com você...
Eu o interrompi, falando baixo e com raiva:
— Eu não estou preocupada com ele. Por mim, ele que se exploda. Se
você o matar, vai parar na cadeia, Bryan, e vai estragar as suas chances de
entrar na polícia e realizar seus sonhos.
Ele respirou fundo.
— Não irá acontecer nada comigo, Sam. — Seu tom era seguro e
confiante.
— Eu não posso ficar sem você... — Sentei-me de novo na poltrona e
passei as mãos nos cabelos em um gesto nervoso.
— Ei, vai ficar tudo bem comigo — prometeu com a voz suave. — Eu
vou me comportar, mas...
— Eu sei... — cortei-o, mas tive de me interromper por causa de
alguém batendo à porta. — Depois a gente se fala, Bryan, tem alguém me
chamando.
— Até logo, maninha. Eu amo você.
— Também amo você. — Encerrei a ligação e olhei para o rosto
sorridente de Ana à porta.
— Quem é o sortudo para quem você disse isso? — perguntou, curiosa.
— Não é ninguém no departamento amoroso... Ele é meu... — hesitei no
final. Não podia dizer a ninguém que Bryan era meu irmão. Talvez Dylan
ficasse sabendo de alguma forma sobre nós dois, era melhor não arriscar. —
Ele é só um amigo.
Ela riu sacudindo a cabeça.
— Amigo, sei.
— Sério, Ana, com ele não existe nada romântico. Tenho dó das garotas
que se apaixonam por ele — murmurei.
Ela assentiu, ainda meio sem acreditar. Ana era uma ruiva exuberante.
Seus olhos castanhos eram meigos e gentis.
— Michael quer você na sala dele — disse.
— Isso é bom ou ruim? — sondei, preocupada. Durante o tempo em que
trabalhava ali, eu nunca fora chamada à sua sala, conversávamos apenas fora
de lá.
Michael é um cara bonito, até poderia rolar algo entre nós, pelo jeito
que ele me olha... Expulsei esse pensamento da minha cabeça, tanto pelo
segredo que eu mantinha quanto por não conseguir pensar em outro homem,
apenas em um par de olhos verdes. Eu deveria ficar feliz por ter um rapaz
interessante igual ao meu chefe interessado em mim, mas não! Só conseguia
pensar no maior mulherengo de Manhattan, que achava que objetos caros
compravam tudo. Talvez ele não tivesse noção da idiotice disso, já que
nunca se importara ou correra atrás de uma mulher antes.
Ana franziu a testa.
— Eu acho que não deve ser ruim, afinal, você não fez nada de errado
— tranquilizou-me. — Você é uma profissional competente.
Assenti muda e fui falar com Michael. Ele estava sentado em uma
cadeira em seu escritório, o qual não era muito grande. Havia uma mesa de
madeira de mogno, uma estante com livros e um armário grande com
arquivos de pacientes e funcionários.
Michael apoiava os cotovelos na mesa e cobria o rosto com as mãos.
Seus cabelos loiros, que estavam um pouco compridos, caíam sobre as
mãos, que escondiam sua face. Percebi que seus músculos estavam tensos
através da camisa branca que ele trajava. Por alguma razão, meu coração
gelou de medo de que notícias boas não viriam dele.
— Sr. Michael? — chamei, entrando e pondo-me à sua frente. Chamá-lo
de senhor era estranho, já que ele tinha apenas 27 anos, três a mais do que
eu.
Ele deixou as mãos caírem de lado e me fitou com os olhos tristes.
— Michael, só Michael — Ele me pediu para chamá-lo apenas por seu
nome de batismo assim que comecei a trabalhar para ele, mas eu sempre
acabava esquecendo.
— Algum problema, Michael? — perguntei, mexendo as mãos em um
gesto nervoso.
— Sim — ele disse e apontou para a cadeira à sua frente. — Sente-se.
Sentei-me rígida como uma tábua. Olhei para ele, esperando que
falasse.
— Sam, hoje eu recebi uma ligação do Lucky Donovan.
O que Lucky queria com meu chefe? Eu não tinha a mínima ideia, mas,
fosse o que fosse, deixou Michael preocupado. Eu já estava temendo o pior.
— O que o Sr. Donovan queria? — Minha voz saiu vacilante, não soube
se Michael notou.
Ele respirou fundo.
— Eu sei que não tenho o direito de perguntar isso, mas aconteceu algo
entre você e Lucky? — Seus olhos azuis intensos me avaliavam.
Pisquei, chocada por Michael pensar que tinha acontecido algo entre
mim e Lucky. Talvez fosse por meu ex-chefe ter pedido para que o atual
arrumasse um cargo para mim na Fênix.
— O que ele disse? — sondei confusa.
Michael suspirou.
— Ele não disse nada sobre vocês dois...
Eu o interrompi:
— Não existe e não existiu “nós dois.”
— Existe algo, porque ele ameaçou que, se você não aceitasse ir a um
encontro com ele no restaurante Old Homestead Steakhouse amanhã à noite...
ele fecharia a Fênix.
O ar ficou preso em meus pulmões, impossibilitando-me de respirar por
instantes. Eu não acreditava que isso estivesse acontecendo de novo, mas
pelo menos não era uma demissão, só uma exigência do filho da mãe. Eu não
sabia o que faria, porque, se não aceitasse suas exigências e não fosse ao seu
encontro, a Fênix poderia ser fechada, ou eu teria de me demitir e ir embora,
mas isso iria prejudicar a adoção de Shaw. Nenhum juiz me daria a guarda
dele se eu não pudesse sustentá-lo. Levantei meus olhos para Michael.
— O que pensa em fazer comigo? Vai me demitir caso eu não aceite as
exigências dele? — A minha voz estava trêmula de medo.
Seu olhar era triste ao esconder o rosto nas mãos de novo.
— Eu realmente não sei o que fazer... — Sua voz saiu abafada pelas
mãos. — Ele não me deixou alternativa. — Michael tirou as mãos da face e
olhou para mim. — Se você não for falar com ele, Lucky pode fechar a
Fênix...
Eu queria gritar, mas saiu só um lamento. Eu sabia que ele era rico e
poderoso, mas mandar na empresa de outras pessoas já é demais, pensei
amarga. Talvez a instituição seja dele também.
— Ele tem todo esse poder, ou este lugar aqui também é dele?
Ele sacudiu a cabeça.
— Não, a Fênix é minha, recebi de herança dos meus pais. —
Encostou-se na cadeira. — Mas Lucky Donovan tem esse poder, pode fazer
tudo o que quiser dentro de Manhattan, aliás, dentro da América! Eu
definitivamente estou de mãos atadas e sem saber o que fazer! — Ele
expirou, a expressão irada.
— Eu não entendo por que Lucky está agindo assim, já que foi ele que
ligou para você me colocar aqui.
Então o filho da puta primeiro me chamava para transar, depois me
ameaçava para ter um encontro com ele. Ao não conseguir nada, mandava-
me rosas e diamantes e me convidava de novo para jantar. Como não aceitei,
então ele voltava às ameaças de novo.
Lucky foi esperto. Ele deveria saber que, ameaçando meu emprego, não
iria conseguir nada, porque eu preferia perder meu serviço a ir a um
encontro à base de intimidações. Entretanto, ao ameaçar fechar a Fênix, o
maldito com certeza sabia que tocaria em meu calcanhar de Aquiles. Não me
perguntei como ele sabia disso, porque não teria a resposta.
Michael franziu o cenho.
— Como sabe sobre isso? Lucky disse a você?
— Eu nem falei com Lucky. — Evitei sua pergunta. — Mas ele me
mandou alguns bilhetes me chamando para ir jantar com ele. — Deixei de
fora a parte das flores e joias. — Eu disse que não podia aceitar sair com
ele.
Ele deu um suspiro resignado.
— Lucky Donovan é conhecido por ter tudo o que quer.
— Nem tudo — grunhi.
Eu não sabia o que fazer, mas não podia deixar que o coração de gelo
do Lucky Donovan fechasse aquele lugar por minha causa, só para me
convencer a sair com ele. Ali se cuidava de muitas crianças que precisavam
de ajuda, e eu não podia tirar isso delas e do Michael, que amava a
instituição.
Meu mundo parecia estar desabando de novo. Vivia fugindo de um pai
desequilibrado, um monstro, e agora era perseguida por aquele cara mimado.
Sua insistência não passava de um capricho por ter levado um maldito NÃO!
Shaw, o que aconteceria com ele caso eu me demitisse? Sentia-me
destruída por dentro. Eu preferia mil vezes sofrer a causar mais dor em
Shaw, amava-o como se ele fosse meu filho, e como poderia ajudá-lo se não
trabalhasse mais ali? Como conseguiria sua custódia se não tivesse um
emprego?
— Eu acho que você devia conversar com ele — sugeriu Michael.
— Você acha que eu vou me vender para aquele desgraçado? — rugi,
meu autocontrole indo para o espaço. Só o Lucky para trazer o pior de mim à
tona.
Ele sacudiu a cabeça.
— Não estou falando de vocês irem para a cama ou coisa assim, jamais
diria isso — murmurou. — Apenas converse com Lucky, está bem? Não vai
arrancar pedaço se ao menos tentar, porque, pelo que notei, ele quer se
encontrar com você, não em termos sexuais, mas sim para conversar. Pelo
menos, foi o que ele disse. — Ele me fitou — Não estou dizendo isso só
porque não quero a Fênix fechada, mas porque sei que você vai querer se
demitir como fez na empresa dele. Agora pense apenas no Shaw, tudo bem?
Porque o juiz não vai aprovar a adoção se você não tiver um emprego fixo.
Encolhi os ombros, sem saber o que fazer.
— Eu vou pensar sobre isso — capitulei. Preferia pedir esmola a ficar
um segundo no mesmo espaço com Lucky Donovan, mas tinha de considerar
o Shaw, o meu garotinho lindo.
— Isso é bom.
Eu precisava mesmo falar com Lucky. Como ele ousava fazer
exigências de novo para que eu saísse consigo? Por que ele não era um cara
normal e me dizia: “estou a fim de você, Sam, aceita jantar comigo?”.
Lucky era complicação, uma das grandes, que eu não queria enfrentar, mas,
pelo jeito, não tinha muita escolha.
5 - Armação
LUCKY
— Senhor — chamou Simon, entrando em minha sala.
Conheci-o na Inglaterra, uns anos antes, em uma reunião para abrir uma
de minhas empresas por lá. Sabia, pela fortuna que eu tinha, que precisava
de um guarda-costas, afinal, não queria ser uma vítima de sequestro, além
disso, não podia ignorar os inimigos acumulados durante a ascensão do meu
império. Simon era forte e já tinha trabalhado nas forças armadas, serviu no
Iraque por vários anos, por isso o contratei.
— Sim, entre. — Sentei-me e olhei para ele ali, de pé à minha frente,
com as mãos ao lado do corpo e com o rosto impassível. — Ela mandou
alguma mensagem enquanto eu estava na sala de reuniões? — Estendi minha
mão para ele, pedindo meu celular.
Eu ia me aproximar de Samantha no evento do Martínez e pedir
desculpas por tê-la demitido injustamente. Entretanto, ela estava
acompanhada por Michael. Tentei não deixar isso subir à minha mente.
Alertei-o quando pedi para contratá-la: deixei bem claro que não fizesse
avanços com Samantha, ou eu acabaria com ele. Contudo, o filho da puta a
levou ao evento. Só não quebrei sua cara por estarmos cercados de pessoas
e por causa dela. Fiquei mais aliviado quando ouvi Sam dizer que não estava
saindo com Michael, mas vi nos olhos dele que estava a fim dela. Logan
também ajudou a me impedir de espancá-lo.
Eu não entendia a raiva e o aperto no peito que estava sentindo. Para
não fazer besteira, fiquei olhando-a de longe, até saí com uma modelo cujo
nome nem me lembrava, mas não fiquei com ela, não sentia mais desejo,
mais tesão por nenhuma mulher, apenas por Sam. Jordan e Ryan se
divertiram com a modelo, enquanto eu fui para o silêncio da minha casa,
pensando na Rosa Vermelha, a única mulher que não me queria.
Simon entregou meu telefone.
— Ela não vai aceitar sair com o senhor e também disse que vai
devolver as joias que deu a ela.
— O quê?! — Percebi que gritei. Não era difícil para mim conquistar
mulheres, mas jamais tinha encontrado uma tão difícil quanto Samantha. Com
as outras, bastava sorrir, e logo eu teria o que queria, mas com a Sam estava
tremendamente difícil, quase impossível. Alguns dias antes, ela enviou uma
mensagem dizendo para eu parar de mandar as rosas e afirmando que não
aceitaria o meu pedido para me encontrar com ela.
Olhei a nova mensagem. Samantha me agradecia por tudo, mas
informava que não aceitaria sair comigo e que devolveria as joias.
— Maldição! Por que ela tem que complicar tudo?! — Quando Logan
sugeriu que eu a conquistasse, achei que seria fácil, mas acabava de
perceber que não. Ele me disse que, quando um homem estava interessado
em mais do que apenas sexo, que o certo era conquistar uma mulher com
flores e joias. Como eu nunca tinha feito nada disso na minha vida, achei que
o garoto tinha razão. Quando as rosas não deram certo, mandei as joias, mas,
pela mensagem, Samantha não havia gostado de nenhuma das duas.
Aquela mulher entrara em minha cabeça como uma droga viciante; se
por acaso eu não a tivesse, ficaria louco. Não conseguia tirar Sam da minha
cabeça em nenhum momento.
Simon suspirou, seus ombros encolhidos, parado próximo à mesa.
— A senhorita Gray não parece ser dessas que gostam de receber joias
ou coisas caras. Pelo que descobri dela, gosta de simplicidade.
Ele devia ter razão, por isso ela não aceitara as joias. Samantha tinha
algo que a tornava diferente de todas as mulheres do mundo. Provavelmente
era por isso que eu não conseguia parar de pensar nela desde o dia em que a
conheci. Depois disso, Sam estava em meu sistema como uma droga ou um
câncer sem cura.
No começo, eu queria desistir e lutar contra o que estava sentindo,
fosse lá o que fosse, mas foi impossível esquecer aquela mulher de 1,70 m
de altura e olhos azuis como o céu em um dia de verão. Tentei tirá-la da
minha cabeça e do meu sistema e ficar longe, sabendo que a havia magoado
e que não a merecia. Só de imaginar essa possibilidade, sentia-me asfixiado,
como se meus pulmões estivessem com defeito, embora eu não soubesse o
que isso significava realmente, já que nunca tinha sentido nada parecido.
— Acho que você tem razão, mas do que será que ela gosta? — Queria
que Sam tivesse tudo que nunca teve na vida, como também realizar seus
sonhos mais profundos.
— Eu tenho um palpite, senhor. Aposto que ela gosta de coisas simples,
sem tanto valor... — disse Simon — como chocolates. O senhor percebeu
que ela lhe agradeceu só pelas rosas? Isso significa que gostou delas, não
das joias.
— Você pode estar certo — sussurrei depois de pensar um minuto.
Pelo que consegui descobrir, ela morava sozinha em uma casa de
aluguel no Brooklyn. Formara-se como psicóloga havia poucos meses e era
nova na área, afinal, tinha apenas 24 anos, mas, pelo que percebi, era
competente em sua função e amava sua carreira. Eu queria entender mais da
vida de Samantha, mas ela não estava facilitando as coisas para mim, e isso
me deixava nervoso.
— Eu acho que o senhor tem que ir até ela em vez de mandar bilhetes e
presentes — sugeriu Simon. — Ou desistir dela de vez.
Talvez, se eu a deixasse de lado, poderia esquecê-la, mas achava quase
impossível esquecer aquela mulher com rosto angelical e corpo
perfeitamente esculpido, porém precisava me controlar para não atrapalhar a
sua vida ainda mais do que já o tinha feito. Uma parte de mim dizia para eu
deixá-la ir, e a outra exigia que a tivesse em meus braços e na minha cama.
Qual delas venceria?
— Senhor... — Simon se interrompeu quando meu telefone começou a
tocar. Ele ficou de pé como uma estátua, seu rosto impassível, difícil de
decifrar.
— Espere um pouco, Simon, e já voltaremos ao assunto — ordenei
enquanto verificava que era uma ligação de Toronto. Era um telefonema
importante para os meus negócios, não podia rejeitá-lo.
Kevin era um dos meus representantes, que estava em Toronto para
comprar uma nova empresa, a Águia da Esperança, que tinha beneficiários
em todo o mundo. Ela era uma das empresas beneficentes mais importantes,
e, para minha sorte, os donos estavam querendo vendê-la. Eu queria comprá-
la e fazer um projeto que ajudaria muitas crianças e adolescentes. O nome do
projeto era Revolução.
— Espero que tenha boas notícias para mim, Kevin — anunciei ao
atender o celular, louco por pelo menos uma boa notícia no meio do caos em
que eu estava vivendo.
Ele suspirou do outro lado da linha.
— Senhor Donovan, tenho boas e más notícias — informou.
— Comece pela notícia boa — ordenei; já estava cansado de ouvir más
notícias.
Ele respirou fundo.
— Os acionistas da empresa Águia da Esperança disseram que vão
vender a empresa deles para o senhor, mas a má notícia é que só a venderão
caso o senhor se case e deixe de aparecer nos tabloides, nos quais sempre é
visto enroscado em mulheres aleatórias.
Meu queixo trincou.
— Por que a minha vida particular seria da conta daqueles estúpidos?
— sibilei entre dentes.
A linha ficou em silêncio por um minuto. Depois, ele falou com a voz
um pouco mais grave:
— O senhor Taym e os outros sócios contaram que estão vendendo a
empresa por motivos pessoais e que ela é herança de família. O sócio
majoritário, que é o filho mais velho do falecido Sr. Tyne, disse que só vai
vendê-la para pessoas de família, que respeitem o trabalho social e
beneficente. Para ele, se o novo dono for casado, isso o torna mais
confiável, pois não quer que a empresa afunde no futuro e o sonho de seu pai
morra. Mas, se você não...
— Eles não vão assinar o maldito contrato de compra e venda —
terminei por ele, com a voz fria e dura como aço. Dei um soco na mesa que
chegou a fazê-la tremer. — Maldição!
— Eles acham que, se você se casar e se tornar um marido fiel e
comportado, isso vai melhorar o seu empenho e elevar o nome da empresa,
que está em torno de quarenta anos no mercado. — Ele suspirou, chateado
com a imposição também.
Olhei para o teto branco, tentando me controlar para não perder a
cabeça ou arrancar a de alguém.
— Eles são uns malditos filhos da mãe — praguejei, inconformado. —
Eu tenho 28 anos, tenho um império imenso e consegui tudo isso sem a ajuda
de uma mulher. Posso muito bem cuidar dessa empresa também.
— Eu sei que sim, chefe, mas eles disseram que não tem acordo... ou é
isso ou nada feito.
Dei um suspiro resignado.
— Ofereça o dobro do dinheiro — disse a ele.
— Eu já tomei a liberdade de oferecer, senhor. — Ele pigarreou. —
Mas Colin Taym disse que sua resolução não tem nada a ver com dinheiro, e
sim com fazer a empresa não afundar no futuro.
— Eles acham que vou conseguir uma mulher assim, em duas semanas?
— Meu tom estava furioso. Eu já estava inconformado porque não conseguia
tirar Samantha da minha cabeça; agora isso?
— Se me permitir falar, chefe — ele começou —, eu tenho uma
sugestão.
Suspirei.
— Fale — disse em um tom duro e seco, frio como uma geleira do Polo
Norte. Servi-me de uma dose de uísque e a bebi em um só trago. Estava
precisando disso depois dessa notícia bombástica. Por que a droga de uma
certidão de casamento justificaria alguma coisa? Eu nunca deixara alguma de
minhas empresas falir, aliás, abria portas para novos serviços, não as
fechava. Não existia a palavra “falência” no meu vocabulário, inclusive já
havia ajudado várias empresas que se encontravam em crise financeira a sair
do buraco, mesmo não sendo minhas. Eu jamais deixaria um empreendimento
meu falir.
— Por que você não se casa com a Sasha? Ela é bonita, então talvez
vocês possam se tornar um casal — sugeriu.
Ri.
— Sasha é só uma funcionária, eu jamais me casaria com ela. —
Estremeci só em pensar nisso.
Ele suspirou.
— Não precisa existir uma relação sexual entre vocês, seria apenas um
casamento de conveniência — esclareceu. — Quando o contrato de compra
e venda da empresa estiver assinado, podem se divorciar sem nenhum
problema.
— Você acha que vou dar metade dos bens que eu consegui todos esses
anos a uma mulher? Uma funcionária minha? — perguntei, ultrajado.
— Vocês podem se casar sem comunhão de bens e com um contrato pré-
nupcial para que ela não tenha direito aos seus bens quando se divorciarem.
Franzi os lábios, pensando na ideia de Kevin, que, afinal, não era tão
ruim. Eu precisava ter a Águia da Esperança de qualquer jeito, mas uma
mulher interesseira me fazia pensar na minha fodida mãe, que foi embora
para se casar com um ricaço, e isso era tudo que eu não queria.
Eu confiava em Sasha. Nós nos conhecíamos desde a adolescência,
nunca tivemos relações sexuais, apenas éramos colegas de trabalho, mas eu
jamais me casaria com ela, porque tinha alguém em mente, muito mais eficaz
e que não era interesseira de nenhuma forma. Sabia que era quase impossível
fazê-la aceitar se casar comigo, mesmo se fosse por uma boa causa.
Precisava falar com ela de alguma forma para convencê-la a aceitar se casar
comigo.
— Diga aos acionistas da Águia da Esperança que aceito a proposta
deles. — Esperava fazer Samantha entender e aceitar a minha oferta, porque,
senão, eu estaria em uma enrascada total, e o culpado seria eu. — Eles
querem um casamento? Pois terão um casamento. Se esse for o único jeito de
eu ter a Águia da Esperança, eu me submeterei à imposição. — Dei de
ombros, embora Kevin não pudesse ver.
— A Sasha...
— Não é com a Sasha que vou me casar — cortei-o. — É outra mulher
que tenho em mente.
— Oh.
Pensei ter ouvido decepção em sua voz, mas devia ter me enganado,
porque ele não se beneficiaria com o meu casamento com a Sasha.
— Então está tudo bem — falou por fim, com a voz um pouco mais
grave. — Eu vou deixar todos a par da situação.
Coloquei o copo de uísque na mesa e apertei as têmporas, torcendo
para Sam aceitar a minha proposta.
— Faça isso — ordenei e encerrei a ligação. Olhei para o Simon, que
ainda estava de pé. — Preciso que descubra alguma coisa sobre Samantha
Gray, como uma dívida ou coisa do tipo, para que eu tenha um segundo plano
caso ela não aceite se casar comigo.
Ele estreitou os olhos.
— Senhor, eu já fiz isso — respondeu com a voz firme. — Ela deve 20
mil dólares a um hospital na Flórida, onde morava antes de se mudar para o
Brooklyn. Seu aluguel está atrasado. Ela renegociou a dívida com o hospital
da Flórida agora, que está trabalhando.
— Eu quero que essas dívidas sejam pagas até o final do dia, incluindo
todos os seus cartões de créditos, seguro de carro, tudo que estiver atrasado,
você entendeu? — ordenei.
Simon levantou as sobrancelhas.
— Sim, senhor.
— Eu sei que ela é diferente, por isso a quero para ser a minha esposa.
— Levantei-me e olhei a bela vista de Manhattan. — Ela não é interesseira
como todas as mulheres que conheci, provei isso no momento em que não
aceitou sair comigo, preferindo se demitir, além de ter rejeitado as joias.
Noto a sua repulsa pelo meu dinheiro.
— Isso é verdade, senhor.
Balancei a cabeça.
— Eu vou ligar para o Michael e montar meu plano para conseguir
fazer com que Samantha concorde em sair comigo, e assim eu poderei fazer
minha proposta de casamento a ela. — Quase ri disso. Como eu proporia
casamento a uma mulher que nem aceitava sair comigo? Eu devia estar
louco, Samantha havia me deixado assim.
— Eu vou jogar com as cartas que tenho, vou propor o acordo a ela
para que se case comigo, e, se ela não aceitar e eu não conseguir o que
quero, então a deixarei livre e não vou mais incomodá-la. — Passei as mãos
pelos cabelos, temendo que isso viesse a acontecer.
— Mas, senhor, você não acha melhor esperar a sua resposta para
depois pagar as dívidas? Ela pode não aceitar sua proposta.
Eu não queria pensar na possibilidade de ela dizer “não” para mim de
novo. Só em pensar nessa palavra vindo da sua boca, o meu coração se
encolhia, ficando do tamanho de uma noz.
— Eu não me importo com dinheiro, sabe disso. — Olhei para ele. —
Até fico feliz em ajudá-la.
— Mas e se ela aceitar? Não acho que vai transar com o senhor em um
casamento por contrato.
— Eu sei. Sexo não vai estar nas cláusulas de nosso contrato de
casamento. Se acontecer, será porque ela quer, mas eu jamais vou obrigá-la a
isso.
— Senhor, se não tiver sentimentos por ela, não devia conquistá-la nem
pedi-la em casamento. Ela não merece isso.
Se fosse outra pessoa a me dizer algo assim, eu teria dito para cuidar da
sua vida e deixar a minha em paz, mas Simon sabia de todos os cantos
escuros e profundos da minha mente e do meu passado. Ele era ciente da dor
que carreguei durante toda a minha vida feito uma droga. Ele era como da
minha família, a única pessoa de fora em quem eu confiava cegamente, assim
como Logan.
— Por que diz isso? — indaguei, embora já soubesse.
— Senhor, como eu disse, tem algo diferente nos olhos dela, como se
tivesse uma dor profunda ou sofresse por alguma perda. Essa dor é a mesma
que vejo nos seus olhos.
Assenti.
— Será que isso tem a ver com as contas do hospital na Flórida? —
Minha testa se vincou. — Ela perdeu algum familiar?
— Pelo que consegui descobrir, ela não parece ter família, apenas
amigos, sem namorado ou mesmo um “ex”. Mas o abismo está nos olhos
dela, senhor.
— Também percebi isso, Simon — sussurrei. — Acho que isso me fez
ficar mais curioso para descobrir o que ela tem debaixo da superfície. —
Tranquilizei-o: — Mas não se preocupe, Simon. Ela não é igual a todas as
mulheres que já tive, e, se eu ao menos chegar perto de seu coração, não a
deixarei escapar.
Ele sorriu aliviado. Essa era a primeira vez que eu o via sorrir durante
todo o tempo em que esteve comigo. Sempre teve a expressão dura como a
do soldado que foi, mesmo não exercendo mais a função.
— Faça isso, senhor — aconselhou. — Pois o senhor também precisa
ser feliz.
Saiu da sala, deixando-me de boca aberta como a de um peixe. Simon
me entendia e conhecia o meu lado quebrado. Quando o contratei para ser o
meu segurança, pude ver a dor em seus olhos negros. Era o mesmo abismo
que eu tinha nos meus. Ele nunca me contou nada do que enfrentou em sua
vida. Eu também não perguntei, pois sabia o quanto era difícil falar sobre a
dor. Era mais facíl esquecer – ou ao menos tentar.
Ouvi dizer que dor atrai dor. Talvez fosse por isso que eu me sentia
atraído por aquela mulher linda. Eu podia enxergar, no fundo do azul gelo
daquelas íris, algumas migalhas de chamas. Estava doido para tê-la comigo e
poder tirá-la de seu abismo, mesmo que, para o meu, não existisse essa
esperança.
6 – O Troco
SAM
Saí da Fênix sem saber o que fazer em relação ao Lucky, e agora estava
debaixo das cobertas, sem ter ânimo para sair ou até mesmo para procurá-lo
e dizer algumas verdades que ele precisava ouvir.
Eu tinha planos de adotar Shaw, mas como faria isso se perdesse o
emprego? Eu o queria tanto comigo, amava-o como se tivesse saído de mim.
Eu não sabia se conversava com Lucky ou se me demitia para a
proteção da Fênix, mas, se isso acontecesse, ficaria desempregada. Eu tinha
muitas dívidas. Havia negociado com o hospital da Flórida, mas chegaria à
estaca zero de novo?
Meu telefone tocava direto, mas eu o ignorava, porque eram ligações de
Diana e de Ana. Embora elas fossem as minhas duas únicas amigas de
verdade em Nova York, suas ligações iam direto para a caixa de mensagens.
A única ligação que eu iria atender seria a de Bryan, para que ele não se
preocupasse comigo e desconfiasse de que algo estava acontecendo. Não
disse nada a ele sobre o que o Lucky fez; se soubesse, já estaria ali para me
consolar e explodir a cara dele.
Já eram quase 7h da noite quando ouvi uma batida à porta. Gemi. Quem
poderia ser? Não era Bryan. Sempre quando vinha me visitar, ele avisava
antes. Eu não fazia a menor ideia de quem tinha vindo me ver, a não ser que
fosse a senhorinha dona da casa vindo cobrar o aluguel, que estava atrasado.
Eu logo seria despejada.
Fiquei quieta para quem quer que fosse à porta partisse, já que eu não
estava com ânimo para atender ninguém.
— Samantha! — ouvi o grito da Ana. — Eu sei que você está aí, então
é melhor abrir a porta, ou vou arrombá-la.
Quase revirei os olhos ao imaginar a doce Ana arrombando uma porta
de madeira, quebrando as suas unhas bem-feitas. O inferno devia estar
congelando naquele momento.
— Por favor, Sam, precisamos falar com você — implorou Diana, à
porta também.
O que elas faziam em minha casa àquela hora? Principalmente Diana.
Por que ela tinha vindo ali? Se Lucky soubesse que sua funcionária estava
ali, o que ele faria?
Ela é tão linda! Por que Lucky não a notou em vez de mim?
Ao pensar nele com outra mulher, meu estômago se revirou como se eu
tivesse comido algo estragado. Eu era uma completa estúpida! Como podia
pensar em um homem que ameaçava fechar um lugar que beneficiava tantas
crianças só para ter um encontro comigo?
Eu podia ir até o Lucky e conversar com ele, mas não ia fazer isso,
porque, se o fizesse, ele venceria. Eu era muito orgulhosa para fazer o que
ele queria, por isso preferia ficar ali até definhar.
As batidas e gritos insistentes à minha porta continuavam. Eu sabia que
Ana e Diana não desistiriam até que eu as atendesse. Levantei-me da cama a
contragosto.
— Oh, meu Deus! — Ana exclamou horrorizada, olhando-me de cima a
baixo. — Você foi violentada?!
Pisquei atônita, olhando meu corpo para ver o que a tinha horrorizado.
Eu estava descalça, com um shortinho curto e uma regata e com o corpo todo
amassado da cama. Com certeza meus cabelos pareciam um monte de feno
onde os passarinhos poderiam até fazer ninhos.
Diana sorria para mim.
— Parece que você teve uma relação amorosa com um cara quente.
Bufei.
— Dificilmente, já que, para uma pessoa ter sexo, é preciso ter um
parceiro, o que não é o meu caso neste momento — respondi, ficando de
lado para elas entrarem em meu humilde lar. — Entrem.
A casa era pequena, com dois quartos, sala, banheiro e cozinha. A sala
tinha dois sofás, um de dois e outro de três lugares, e uma mesinha de
compensado, onde ficava uma TV antiga e pequena. Eu ia jogar fora as rosas
que Lucky havia me dado, mas não consegui. Ainda bem que as deixara no
meu quarto, junto às joias, que eu iria devolver assim que estivesse pronta
para enfrentá-lo.
As meninas entraram e olharam ao redor como se esperassem encontrar
um homem saindo de algum lugar.
Ri sem humor.
— Não tem nenhum homem aqui, se é isso que estão procurando —
garanti às duas.
— Você parece horrível! — observou Ana.
— Como se um trem tivesse me atropelado — murmurei, com um gosto
amargo na boca.
— Um trem chamado Lucky Donovan, o deus do sexo? — inquiriu
Diana. — Ele vai pagar caro pelo que fez a você. E vai ser hoje.
Ergui as sobrancelhas.
— Como você vai fazer isso, se ele é seu chefe? — sondei.
Ela sorriu.
— Você verá.
— Não quero que você tenha problemas com ele por minha causa,
Diana — sussurrei.
— Não sou eu que vai fazer algo a ele, mas sim você. — Gesticulou
para mim.
Franzi o cenho.
— O que você quer dizer? Já ouviu aquele ditado que diz: “merda,
quanto mais mexe, mais fede?”
— Ditado bem feio! — Diana fez uma careta. — Viemos aqui para
levar você ao clube que Lucky frequenta.
Pisquei.
— O quê?! — exclamei. — Eu não quero vê-lo hoje, ainda mais em um
clube onde vai estar cercado por mulheres. Além disso, hoje é segunda-feira,
o local não deve estar funcionando. — Senti uma pontada dolorida no peito
ao pensar nele com outra mulher.
Diana levantou as sobrancelhas.
— Eu vou lá direto, e ultimamente sempre o vejo sozinho, sem nenhuma
mulher. Isso é bem estranho, já que sempre está, ou melhor, estava rodeado
de mulheres, mas não nesses dois meses... — ela parecia falar consigo
mesma no final. — E o Rave funciona todos os dias da semana.
Ana sorriu, batendo palmas como uma criança ao fazer uma travessura.
— Então pensamos que, de um jeito torto, o Lucky realmente está na
sua...
Eu a interrompi:
— Não quero ouvir nada sobre Lucky por um bom tempo... — Apontei
para mim mesma. — Por causa dele, eu agora pareço ter saído de um filme
de terror. Daria até para fazer um dos filmes do Tim Burton sem precisar
colocar maquiagem.
— Por isso precisamos ir ao clube Rave, para fazê-lo pagar —
interveio Diana. — Marquei com ele, dizendo que nos encontraríamos lá,
mas usei seu nome. Disse que aceitei me encontrar com ele.
Ergui uma sobrancelha.
— Como ir a um encontro com ele vai fazê-lo pagar por tudo o que me
fez? — questionei ironicamente. — Se vocês não se esqueceram, é isso que
Lucky quer, um encontro. Por isso estou assim hoje, por não ter aceitado.
— Você vai se aproximar do Lucky e mostrar todo esse material aí. —
Apontou para o meu corpo. — Vai dizer que, mesmo que ele deseje o seu
corpo, jamais vai tê-lo. — Sorriu animada. — Então vai pegar o cara mais
sarado e gostoso da balada e esfregar na cara dele.
Arregalei os olhos.
— Eu não estou a fim de dar um amasso em ninguém — rosnei, com
raiva de mim mesma, porque só queria ficar com um único homem, Lucky.
Pensei em como seria deixá-lo louco ao me ver dançando, divertindo-
me e o ignorando. Eu sabia que Lucky odiava ser ignorado. Depois, quis
bater em mim mesma por pensar nisso. Eu deveria correr para bem longe
dele e não o provocar.
Ele é o cara a quem você tem que dar o troco, não se esqueça de que
ameaçou destruir seus sonhos e agora está perseguindo você, uma voz
sorrateira disse em meu cérebro.
— Vamos lá, Sam, você não pode ser assim tão certinha, não é? —
insistiu Diana. — Não precisa transar com o cara se não quiser, apenas
esfregá-lo na cara do meu chefe.
— Faça Lucky Donovan comer poeira — pediu Ana.
Apertei os olhos por um segundo, depois olhei para Diana.
— Por que Lucky não fica em cima de você em vez de mim? —
reclamei. — Afinal, você é linda, além disso, também é funcionária dele.
Ela sorriu com candura.
— Porque eu tenho uma namorada.
Pisquei chocada.
— Namorada? Tipo... uma mulher? — indaguei, estupefata por nunca
ter notado isso antes.
Ela deu de ombros.
— Sim. Então eu não sou um partido para o meu chefe. — Ela levantou
uma sobrancelha feita por sombra negra. — Já que gosto da mesma fruta que
ele.
Fiz uma careta, mas assenti, muda, porque nunca fui preconceituosa com
ninguém sobre sua vida sexual. As pessoas ficam com quem quiserem, assim
eu pensava.
— Tudo bem — capitulei. — Vamos lá, dar uma lição ao bastardo de
uma figa. Eu apenas preciso de um banho.
Elas gritaram, animadas como duas crianças ao ganhar seus presentes
preferidos.
Deixei-as na sala e fui tomar banho e me arrumar para enfrentar o
dragão. Se eu ao menos pudesse domá-lo, seria bom, mas isso era algo
impossível.
Meia hora depois, estava com um vestido prata comprido, com costas
nuas, de alças finas e com um decote caído no meio dos seios. Era estilo
sereia, justo, e mostrava todas as curvas que eu tinha, bem sexy. Coloquei
sapatos pretos de saltos altos, deixei meus cabelos soltos nas costas para
cobrir um pouco a nudez e passei máscara de cílios preta para ressaltar o
azul intenso dos meus olhos e disfarçar o inchaço em minhas pálpebras
causado pelo choro mais cedo. Não passei batom, já que minha boca era
naturalmente vermelha.
— Minha nossa! — Ana bateu palmas. — Lucky vai cair de quatro por
você.
— Acho que todos os homens do clube Rave — declarou Diana,
sorrindo. — Mulher, você está um maldito avião.
Revirei os olhos. Não queria Lucky de quatro, apenas o queria fora da
minha vida de uma vez por todas. Senti um aperto insuportável no peito ao
pensar nisso, tão forte que me impossibilitou de respirar por um segundo.
Bryan sempre dizia que era fácil para mim ver além dos defeitos das
pessoas, ver algo de bom dentro delas. Lucky, apesar do jeito torto com que
fazia as coisas, praticava muitas ações que tocavam meu coração, como
ajudar crianças. Isso valia mais do que qualquer coisa para mim. Talvez
fosse por isso que eu não conseguia odiá-lo.
Ouvi atentamente o que Ana e Diana falaram dele ao longo do caminho
para o clube. Elas me disseram que Lucky não beijava ninguém, então eu
poderia fazer isso para ele desistir de mim. Diana disse que uma vez viu uma
garota o beijando sem sua vontade, e parecia que ele queria matá-la, por isso
teve essa ideia do beijo. Eu achava estranho um homem nunca ter beijado
ninguém em sua vida. Como ele podia fazer sexo sem beijo? O meu temor
era: e se eu não conseguisse esquecer o beijo? Porque eu já pensava nele
mais do que deveria sem beijá-lo.
Chegamos ao clube, que ficava a duas quadras da Fênix. O lugar era
grande, com dois andares. Na entrada, tinha uma placa com o nome clube
Rave, que piscava igual a um pisca-pisca, verde e vermelho.
Assim que entramos, senti um cheiro cítrico, misturado a feromônios no
ar. Devia ser proposital, para apimentar o lugar, que estava abarrotado de
gente. Tinha um brilho que vinha da bola que girava no teto, como se ali
houvesse várias estrelas brilhantes piscando e lançando lasers de luzes
coloridas no salão inteiro.
— Bonito! — disse enquanto íamos direto para o bar.
— Sim — disse Diana. Ela se sentou em uma banqueta alta ao bar, ao
meu lado direito, e Ana, ao esquerdo.
Olhei para o barman, que servia as bebidas. Ele era novinho, moreno,
com cabelos lisos e rosto de bebê. Parecia ter uns 18 anos mais ou menos,
mas devia ter mais, para poder trabalhar naquele lugar.
— Quero uma dose de uísque — pedi.
Ele me olhou com um sorriso.
— Identidade... — pediu.
Ri.
— Olha para mim, eu pareço ser menor de idade?
Ele me deu um olhar de cima a baixo e pareceu gostar do que viu,
depois riu.
— Você parece que vai fazer 18.
Sorri, embora sem vontade.
— Desculpe desapontá-lo — disse ironicamente. — Tenho 24 anos,
então não preciso de identidade.
— É melhor ser chamada de nova do que de velha. — Diana sorriu e
piscou para o garoto da bebida. Não sei por que ela flerta com homens, se
joga no time oposto...
Olhei ao redor à procura de Lucky, já que elas disseram que ele estaria
ali. Olhei para as pessoas dançando.
— Se você está procurando por ele, não vai encontrá-lo na pista de
dança. — Diana apontou para um canto do outro lado do salão imenso e
cheio de pessoas. — Ele não dança, pelo menos, nunca o vi fazendo isso.
No local para onde ela apontou, tinha uma cabine de seis metros,
parecendo uma sala VIP. Tudo para quem pode, não é? Dentro da sala,
havia quatro homens. Um deles estava com duas mulheres, uma de cada lado.
Reconheci o cara sexy do Green.
— Quem é o cara com as duas loiras? — sondei, avaliando-o.
— Ryan, irmão de Lucky — respondeu Diana. — Tão bonito e quente
quanto o irmão mais velho.
Assenti e olhei para o outro cara, ao lado de uma morena. Seus cabelos
eram loiros, nos ombros, e não dava para ver direito os seus olhos por causa
das luzes piscando, mas de longe ele parecia o Thor. Sasha estava lá
também, com um cara moreno vestido com terno e gravata.
Tinha uma garota de cabelos platinados ao lado de Lucky, mas os dois
não pareciam estar se tocando. Lucky estava de cabeça baixa, olhando seu
drinque no copo. A loira olhava para todos os lados como se procurasse ou
esperasse alguém. Os dois pareciam estar entediados.
— Hora do show — falei, bebendo um pouco de uísque, que desceu
queimando a minha garganta. — Isso é para eu ter mais coragem.
— Nós vamos ficar olhando daqui — disse Ana.
— Faça-o comer o pão que o diabo amassou — encorajou Diana.
Revirei os olhos, depois respirei fundo e fui em direção à cabine VIP.
Ouvi assovios sendo direcionados a mim, então supus que os caras tivessem
gostado da minha aparência. Eles abriam caminho para que eu passasse,
como se eu estivesse desfilando em uma passarela. Ignorei-os e segui em
frente.
Subi os dois degraus que davam na cabine, composta por três paredes
de madeira branca. Dentro do espaço pequeno, tinha uma mesa de metal
comprida, com seis cadeiras. O guarda-costas de Lucky impediu que eu
seguisse, mas, assim que viu de quem se tratava, afastou-se e me deixou
entrar.
— Nossa! — disse o loiro parecido com o Thor. — Com essa doçura,
eu iria até o fim do mundo.
Ryan olhou do irmão para mim com curiosidade.
— É justamente isso que Lucky quer fazer — disse e depois sorriu. —
Você se lembra de mim?
Olhei para ele e suas duas loiras siliconadas.
— O cara do Green...
— Ryan Donovan — disse com um sorriso travesso. — Irmão do
Lucky.
Assenti e olhei para o Lucky, que me observava como se não
acreditasse que eu estava realmente ali, à sua frente. Ele se levantou e deu
um passo em minha direção. Diana não tinha falado a ele que eu aceitei vê-lo
em um encontro? Por que a surpresa, então? Talvez achasse que eu não
viesse.
— Sam... — meu apelido saiu tão intenso de sua boca que parecia uma
melodia.
— Então essa é a linda garota em quem não para de pensar? — conferiu
o loiro com Lucky.
Tentei não deixar meu coração gravar o que acabara de ouvir, que
Lucky não conseguia parar de pensar em mim.
— Ela não é tão perfeita assim — arrulhou Sasha, com uma pontada de
inveja em sua voz.
— É claro que ela é — retrucou a loira platinada que estava ao lado do
Lucky. Ela era ainda mais bonita de perto: cabelos longos e olhos castanho-
claros. Usava um vestido branco de cashmere com alças grossas. — Você
está com inveja, Sasha.
Ignorei-os e apenas fitei Lucky, que estava de pé com as mãos aos lados
do corpo. Parecia nervoso e feliz ao mesmo tempo. Aproximei-me dele a
ponto de quase nos tocarmos e pude sentir o seu cheiro, uma fragrância
deliciosa da Dolce & Gabbana. Olhei em seus olhos verde floresta e
quentes.
— O que você quer de mim? — perguntei com a naturalidade que
consegui, que não era muita.
Seus olhos avaliavam o meu rosto como se ele achasse que eu estava
fazendo alguma piada com ele. Depois me deu um sorriso libidinoso.
— Eu quero você. — Sua voz era de molhar a calcinha, ou seja, a
minha calcinha branca de renda.
Fiz algo sem pensar nos custos, mas também sabia que não tinha outro
jeito. Se ele não gostava de beijar ninguém, então não iria gostar do meu
beijo também. Quem sabe assim ele desistisse de uma vez por todas de mim.
Talvez me mandasse para o espaço.
Por que eu estava tão nervosa?
Não pense, apenas aja, ordenei a mim mesma em pensamentos.
Joguei os braços ao redor do seu pescoço e coloquei a minha boca
sobre a dele, que se encontrava aberta por causa do choque. Eu sentia seu
corpo tenso e tremendo, como se estivesse triscando em um fio desencapado.
Parecia que Lucky estava sofrendo. Ele não correspondeu ao beijo, apenas
parecia petrificado.
Ouvi o riso de satisfação de Sasha por ele não retribuir o meu beijo,
mas a ignorei, porque isso fazia parte do plano. Então por que meu coração
doía tanto? Ele estava apertado com a rejeição do Lucky, mas não era isso
que eu queria? Abri os olhos, ainda com a boca na dele, e percebi que seus
olhos verdes pareciam chamas ardentes. Lucky parecia estar travando uma
luta feroz contra si mesmo. Era possível ver que ele queria o beijo, mas
parecia que retribuir lhe doía muito. Isso me cortou fundo, porque percebi
que ele realmente não beijava ninguém. Talvez teve algum trauma na infância
ou na adolescência, e essa era uma barreira que ele havia colocado. Eu não
queria ser a causadora de seu sofrimento,
Estava prestes a empurrá-lo e parar com o beijo que comecei, quando
ele apertou sua mão em minha cintura, a outra em meus cabelos, e me beijou
com tanto fervor que parecia que estava faminto havia dias e de repente via
um banquete à sua frente. Sua mão esquerda alisava a pele nua das minhas
costas, apertando-me mais contra o seu corpo. Pude sentir a sua necessidade
e desejo, tão fortes que achei que fosse me possuir ali mesmo. Devorava a
minha boca como se estivesse fazendo sexo com ela.
Droga, não foi assim que eu pensei que seria. Era para ele me rejeitar,
e não devorar a minha boca assim, na frente de todos. Eu podia detectar o
seu corpo rígido e o maxilar tenso, mas ele parecia não querer parar tão
cedo, como se não nunca tivesse o suficiente. Eu tinha de afastá-lo
imediatamente, ou não conseguiria mais fazer isso. Minha boca doía e
parecia inchada por causa da força do seu beijo, além disso o ar faltava em
meus pulmões. Meu corpo traiçoeiro era uma droga.
Volte para o plano, Sam, pedi a mim mesma.
Tirei as mãos de seus cabelos lisos e sedosos e empurrei seus ombros.
Pensei que ele ia lutar, mas se afastou, ofegante, depois me lançou um
sorriso devastador. Aliás, ele inteiro era devastador. Esse sorriso me custou
todo o autocontrole para não rasgar as suas roupas ali mesmo, sem me
importar que estivéssemos em um clube lotado de gente. Céus, o que havia
de errado com meu cérebro? Devia estar com defeito, precisava
urgentemente de um neurologista.
— Você deve saber que não beijo ninguém, não é? — Seus olhos se
estreitaram, focados nos meus.
Suspirei, ressentida.
— Pelo visto, é conversa fiada, já que devorou minha boca — retruquei
com a voz ácida.
Ele arregalou os olhos.
— Então você achou que, me beijando, faria com que eu desistisse de
você. — Não era uma pergunta.
— Pois deveria — repliquei. — Porque você não me quer...
— É claro que eu quero você — declarou com tom firme e convicto. —
Eu quero você como nunca quis nada em minha vida. — Seu sorriso agora
tinha uma potência de megawatts. — Tenho certeza de que meu beijo
comprovou isso.
Dei um suspiro frustrado.
— Não, você acha que me quer, mas isso não é verdade.
Ele me olhou de lado.
— Acha que não quero você? Eu nunca fiquei atrás de uma mulher
como fiquei de você por dois meses. Isso só prova o que eu quero.
— Essa é a diferença entre querer uma coisa e necessitar de algo. —
Tirei meu cabelo do rosto e o joguei para trás em um gesto nervoso.
— Qual é a diferença? — retrucou o loiro de olhos azuis. — Não é a
mesma coisa?
Lancei a ele um olhar assassino.
— Jordan — reclamou Lucky.
Suspirei, acalmando-me, depois tornei a olhar para o Lucky.
— Querer uma coisa é como desejar um carro esportivo, um sofá ou um
negócio... — suspirei — mas necessitar de algo é como sentir falta do ar que
se respira ou da comida quando se sente fome. Algo sem o qual não se pode
ficar.
Ele arregalou os olhos.
— Você está falando em amor?
— Sim. Eu quero um cara que me ame, uma pessoa que pense que sou
seu mundo, assim como ele será o meu. Quando alguém ama, quer fazer tudo
pela pessoa amada. Não estou falando em dinheiro, estou falando em dar ou
fazer coisas simples, como uma rosa colhida no jardim ou levar o amado
para um piquenique na beira de um lago. Tudo isso são coisas simples que
uma pessoa necessita em um relacionamento. — Isso era algo que nunca tive
em minha vida até então, apenas o amor do Bryan e da vovó. Eu queria ter
um amor assim um dia.
Levantei o queixo, firme, falando sem vacilar:
— Mas você não sabe o que é isso, porque nunca amou ninguém em sua
vida, apenas o seu dinheiro. — Essa parte era mentira, porque eu tinha visto
o jeito como ele olhava e falava com Logan, até doara uma parte de si
mesmo a ele. Naquele olhar, tinha muito amor, mas, para eu tirar Lucky da
concha que ele criara à sua volta, precisava dizer isso, porque, de outra
forma, ele nunca diria o que realmente sentia por mim, em vez de dizer que
só me queria. Eu desejava mais dele, não só uma noite de sexo quente.
Precisava saber se ele queria o mesmo que eu, porque, se quisesse só meu
corpo, isso nunca iria acontecer, nem que eu tivesse que ir para algum lugar
longe dele.
— Isso não é verdade! — retrucou ultrajado. — Eu mandei rosas para
você todos os dias durante três semanas, mas você não as quis. Até as joias
que lhe dei, disse que ia devolver...
Percebi que todos os seus amigos o fitavam com os olhos arregalados,
provavelmente pelo que tinha acabado de dizer, que me mandara rosas e
joias. Peguei a caixa na minha bolsa, onde estavam reunidos os brincos e
correntes, e a coloquei em suas mãos. Seus olhos fitavam incrédulos a caixa
de joias azul.
— Eu não as quero de volta.
— Não posso ficar com elas. Lhe agradeço pelas rosas, mas não por
isso. Não quero seus diamantes, não vê isso? Eu não sou assim, mas você
não deve saber disso... Talvez ache que o dinheiro e coisas caras façam uma
mulher ceder, mas não eu.
— Não penso isso de você, Sam. — Seus punhos estavam cerrados em
volta da caixinha. — Apenas quero ter um encontro com você. Isso é pedir
demais?
Eu precisava saber a verdade, o que ele realmente sentia por mim, se eu
era mais um caso de uma noite para ele ou algo mais.
— Então vamos dizer que eu aceite a sua cantada e fiquemos juntos
hoje. — Tentei não corar e ignorar os olhares de todos sobre mim.
Seus olhos se estreitaram, mas ele esperou que eu terminasse.
— Onde será? Em um apartamento? Ou até mesmo aqui, em um
banheiro qualquer? — Minha voz soou ainda mais fria no final da frase,
porque ele, sem dúvida, já fizera isso com muitas mulheres antes. — Vamos
dizer que seja em um hotel. Então, no dia seguinte, você me descartará como
se eu fosse um objeto, ou melhor, talvez vá embora antes que eu acorde e
deixe a conta para mim?
Ele trincou os dentes.
— Você está zombando de mim?
— Vamos lá, Lucky, não é isso o que você faz? Retiro a parte de você
sair sem pagar. — Meus olhos eram frios. — Mas, no fim, eu seria apenas
mais uma na sua lista.
— Você é diferente! — gritou, mas não alterando muito a voz. — Com
você, eu quero transar em cada canto da minha casa, na minha cama e de
todas as formas possíveis.
Prendi a respiração com o que ele disse e meu corpo foi tomado por
uma corrente elétrica. Com esforço deixei de lado o desejo que me queimava
em razão de suas palavras intensas, o fogo que me subiu dos pés à cabeça
como labaredas. Ergui o queixo e olhei para Lucky fechando a cara com ar
ofendido, embora não estivesse ofendida, mas precisava de mais do que “eu
quero você” vindo da sua boca. Eu precisava que ele falasse o que realmente
sentia para ter certeza de que não iria ser só mais uma na lista de mulheres
descartadas assim que me deitasse com ele. Por isso iria provocá-lo mais
um pouco. Esperava que ele sentisse o mesmo que eu.
— Você acha que sou uma vadia do tipo que você faz assim... — estalei
os dedos, dando ênfase às minhas palavras — e, na mesma hora, abre as
pernas para você?
— Não foi isso o que eu disse... — Ele cerrou os punhos novamente. —
Apenas quero um encontro com você. É tão difícil enxergar isso?
— Eu também queria muita coisa, como ter um emprego que eu amo e
que você ameaçou fechá-lo caso eu não saísse com você. Também quero
conhecer o Caribe e viajar em um cruzeiro. — Meu rosto era grave. — Mas,
Lucky, ninguém pode ter tudo no mundo, mesmo você, que tem tanto dinheiro.
Por isso, não vou ser mais uma mulher na sua lista de descartáveis, que deve
ser imensa.
— Como a torcida dos Beatles — disse Jordan.
Lucky lançou a ele um olhar de congelar o oceano.
— Cale a boca, ou te faço calar — sibilou e depois me fitou com os
olhos mais calmos. — Com você eu quero me casar.
Engoli em seco.
— Você me ama para pensar em fazer isso? — Tentei não deixar a
esperança me dominar. Talvez ele realmente me amasse, não? Uma coisa
aprendi no curso de psicologia: às vezes uma pessoa que não consegue
expressar o que sente busca outras formas de dizer, como ele fez com os
bilhetes que me enviou ou com as ameaças ao meu emprego. Eu precisava
que Lucky dissesse o que realmente pensava e sentia. — Você não parece
capaz de amar alguma mulher a ponto de pedi-la em casamento.
Ele piscou, ultrajado com o que eu disse. Seus olhos verdes pareciam
mais escuros quando ele estava com raiva, mas ele se controlou e falou
devagar:
— Estou falando de negócios...
Arregalei os olhos com descrença, furiosa. Meu peito doía, porque a
esperança de ele sentir algo por mim foi dissipada nesse momento. Na
verdade, foi arrancada do meu peito.
— Você está falando para eu me casar com você através de um acordo?
Um acordo do tipo que você oferece dinheiro para eu transar com você? —
Cerrei os punhos para não esmurrar a sua face. — Fique sabendo que não
sou uma prostituta, seu bastardo egoísta!
Ele engoliu em seco e piscou.
— Eu sei que você não é isso, Sam. — Ele passou as mãos nos cabelos.
— Não estou falando de sexo, é só no papel...
Interrompi-o furiosa:
— Pois fique sabendo, Lucky Donovan — cuspi seu nome. Finalmente
eu entendia o que aquele cretino pensava sobre mim. Então ele havia me
mandado recados e presentes somente para eu me casar com ele numa
espécie de contrato? Não deixei a dor se apossar de mim, e sim a raiva. Era
melhor lidar com ela do que com a dor de saber que ele só queria me usar, a
dor por ele não me querer ou sentir o mesmo que eu sentia por ele. Eu estava
até pensando em deixar de lado o que tinha vindo fazer ali, mas nossa
conversa não estava dando certo para nenhum de nós. — Eu não vou me
casar com você nem por todo o dinheiro do mundo! — esbravejei. —
Casamento para mim é somente por amor, e esse não é o seu caso, não é? —
Suspirei. — Você apenas me quer para provar a si mesmo que pode ter tudo
— sibilei entre dentes e cutuquei seu peito com o dedo. — Você nunca vai
me ter, porque eu jamais desceria tão baixo, ainda mais com alguém que
ameaça fechar o meu local de trabalho só para ter o que quer.
— Eu sinto muito por fazer isso. — Sua voz era só um sussurro. — Não
é só um acordo, é algo mais, como... — Ele parecia engasgado no fim, mas
não liguei para o que ele pensava, estava com raiva demais.
Recolhi a mão.
— Se você me queria, deveria ter vindo até mim pessoalmente, não
mandado cartas e presentes caros que não quero nem ameaçado meu chefe
dizendo que, se eu não saísse com você, iria fechar sua empresa. Que ser
humano faz isso?! — rugi.
Seu olhar estava entorpecido.
— Eu...
— Você está usando seu poder para ter o que quer, como sempre. E tudo
por quê? Por causa de uma maldita transa? — Eu não ia dizer essas últimas
palavras, mas ele me obrigou a fazê-lo ao me machucar ainda mais do que
antes. — Pois agora fique sabendo que vou encontrar um cara e deixá-lo
fazer isso. — Sorri de modo sarcástico. — Esse cara não será você, eu não
iria para a cama com um homem que usa ameaças e poder para ter o que
quer. — Dei um sorriso maroto. — Você quer sexo, mas não vai ganhar, não
de mim, pelo menos; prefiro ficar com qualquer um neste lugar.
Seus olhos de repente ficaram malignos.
— Você não ousaria...
Ri.
— Vamos pagar para ver, mas é isso que você faz, não é? Você compra
as pessoas como se fossem objetos. — Deixei o sarcasmo e o asco evidentes
em minha voz; era melhor isso a deixar a dor me consumir.
Ele respirava de modo irregular.
— Samantha, não teste a minha paciência...
Ergui as sobrancelhas para ele.
— E vai fazer o quê?
Ele tremia de raiva. Parecia que nunca havia sido desafiado em sua
vida. Sua ira aumentava sempre que eu o enfrentava, mas não liguei. Ele
havia me machucado ao quebrar as minhas esperanças assim que falou sobre
o casamento como uma espécie de negócio, o que significava que só me
queria para sexo e por capricho.
— Você pode ter a mim.
Ri com desdém.
— Nunca! — falei com a minha voz subitamente gelada. Meus olhos
estavam ferozes. Aproximei-me dele até meus lábios ficarem bem próximos
ao seu ouvido e sussurrei só para ele ouvir: — E algum homem deste lugar
vai ter o privilégio de ver que não há nada debaixo deste vestido, mas não
será você — menti só para atiçá-lo.
Ouvi-o se engasgar. Afastou-se como se eu o empurrasse. Seus olhos
estavam enervados.
— É melhor não fazer isso, ou vou cometer um assassinato...
Ri amarga.
— Vamos ver. — Virei-me para descer os degraus e ir direto à pista de
dança a fim de cumprir a segunda parte do plano.
Ele segurou meu braço.
— Sam...
— Não toque em mim! — Dei um safanão para me livrar de sua mão.
— Você é uma vagabunda, sabia?! — rugiu Sasha.
— Não, eu não sou, mas vou me tornar uma hoje — sibilei. — Por
culpa dele. — Apontei na direção do Lucky, mas sem olhar para ele. —
Agora eu vou me divertir e esquecer que conheci vocês algum dia.
Virei-me sem falar mais nada e saí dali. Ouvi barulhos e murmúrios
deles, mas logo foram engolidos pela música do local.
Cheguei à pista de dança. Estava tocando a música Cotton Eye Joe, de
Rednex. Eu adorava dançar essa música, então remexi os quadris,
rebolando-os de um jeito provocante, mas sem ser vulgar. De onde estava,
podia ver Diana dançando com uma loira e um homem dançando com Ana.
Senti mãos em minha cintura como se me abraçassem por trás. Por um
momento, achei que fosse Lucky, mas não era sua voz a sussurrar em meu
ouvido:
— Vejo que você deixou Lucky furioso. — A voz era quente.
Virei-me e dei um passo para trás, tirando as mãos daquele homem de
cima de mim, já que nem o conhecia.
O cara era moreno, com cabelos castanho-claros e um pouco
compridos, mas bagunçados. Parecia ser musculoso por debaixo de sua
camiseta preta, e sua pele era coberta de tatuagens, pelo menos a parte
exposta, como o braço direito e um pedaço do pescoço. As tintas coloridas
pareciam ser uma tribal e caveiras bem sinistras. Além da camiseta preta,
ele usava calça jeans, tinha um brinco na orelha direita e um sorriso sexy.
Será que só apareciam bad boys na minha frente?
— Vejo que não gosta dele — chutei, mas continuei me mexendo. Era
claro que eu não iria para a cama com ele nem com ninguém, não era dessas,
jamais me rebaixaria àquilo nem perderia a minha virgindade com um cara
aleatório. Queria aproveitar cada segundo quando fosse para a cama com
alguém e desejava que fosse para sempre. Por um breve segundo, pensei que
esse cara seria o Lucky, mas, pelo visto, estava enganada. Eu realmente era
uma idiota por ter pensado assim.
Seu rosto se tornou sombrio ao fitar o Lucky por sobre o meu ombro.
— Ele tomou algo de mim. — Seu tom era frio acima do ruído da
música.
Segui seu olhar e vi a garota de cabelos platinados. Ela estava sentada
no mesmo lugar e olhando para nós com expressão sofrida.
— A loira platinada? Ela está com ele? — Voltei meus olhos para o
cara sexy à minha frente e ignorei a expressão assassina do Lucky sobre nós.
Ele ainda estava de pé no mesmo lugar, parecia querer matar o homem que
falava comigo.
— Ela é irmã adotiva dele. — Suspirou. — Éramos namorados, mas o
Lucky me ameaçou para largá-la.
— Me deixa adivinhar: ele falou que, se você não a deixasse, fecharia
o seu negócio ou faria você ser demitido? — chutei, decepcionada ao pensar
que Lucky sempre usasse golpes tão baixos assim.
Ele riu amargo.
— Ele falou em fechar o meu negócio. Este clube é a minha vida, mas
eu estava disposto a perdê-lo só para tê-la comigo.
— Então o que aconteceu? Por que não estão juntos? — perguntei,
curiosa. Eu queria um amor assim, com um cara que fizesse qualquer coisa
por mim e não quisesse me ter à base de ameaças.
Ele meneou a cabeça. Percebi que nós dois estávamos parados ali, no
meio da pista de dança, embora a música estivesse rolando alta e as pessoas
dançassem ao nosso redor, mas não liguei muito para isso.
— Ela foi para a França e não lutou por nós. — Seu tom era de pesar.
— Essa é a primeira vez que a vejo em um mês. — Ele me olhou curioso. —
Mas e quanto a você e o Lucky?
Suspirei.
— Eu o conheci quando trabalhava para ele. Deu em cima de mim, e
dei um fora nele...
Ele riu.
— Isso deve ter sido interessante. Eu nunca soube que Lucky tenha
levado um fora de alguém — falou meio atônito.
— Sempre há uma primeira vez — declarei. — Ele não levou isso
muito bem e me forçou a pedir demissão da Vênus. — Tirei o cabelo do
rosto. — Sou psicóloga e amo meu trabalho. Depois, consegui um emprego
na Fênix, mas o filho da mãe exigiu que, se eu não fosse a um encontro com
ele, fecharia a instituição.
— Por isso você veio aqui se encontrar com ele?
— Eu vim, mas para dizer que não ia ficar com ele. — No fundo, sabia
que não era bem isso. Eu queria confrontá-lo e dizer o que sentia, mas o
resultado não foi o que eu esperava. — Ainda mais depois de ele dizer que
quer que eu me case com ele. — Minha voz saiu em um rosnado. Não
expliquei as circunstâncias do pedido de casamento, afinal, nem conhecia
aquele homem.
— O quê?! — Seu tom era estupefato, e olhou para trás de mim. —
Parece que você o deixou de quatro.
— Eu não acho isso — discordei. — Ele apenas quer me possuir por
não aceitar um “não” como resposta.
Ele franziu o cenho.
— Eu não acredito nisso. Por que você o beijou?
Funguei.
— Eu sei que ele não beija ninguém em seus encontros. Diana me disse
que uma vez uma garota o beijou, e ele quase bateu nela... Então...
— Então você pensou que, fazendo isso, o faria desistir e deixar você
em paz?
— Sim, mas aconteceu justamente o contrário — resmunguei.
— O que disse para ele ficar tão furioso na hora em que você se
afastou?
Ergui uma sobrancelha.
— Estava me observando?
— Eu vi quando você foi até eles, mas achei que era uma amiga, depois
vi que não, por isso fiquei curioso. — Ele me olhou de soslaio. — Então?
Ri.
— Eu disse que ele jamais teria meu corpo e que eu iria transar com
qualquer homem deste lugar, menos com ele. — Tentei não corar ao dizer
isso àquele cara atraente e tatuado.
O moreno sexy me fitou com olhos arregalados.
— Se você ainda quiser um cara para uma noite de sexo quente, estou
aqui para você. — Observou meu corpo. — Você é linda!
Revirei os olhos.
— Oh, não! Eu só disse aquilo para deixá-lo furioso, mas não penso em
fazer algo assim. Além disso, não é meu estilo sair por aí...
— Você é daquelas que gostam de corações e flores? — Ele riu.
— Eu só fico com caras por amor. Para mim, amor e prazer têm que
andar juntos — sussurrei só para ele ouvir, embora, naquele barulho,
ninguém ouviria nada.
Ele piscou, chocado com alguma coisa.
— Quantas vezes você já se apaixonou? — sondou.
— Nenhuma vez — disse a verdade.
Ele piscou de novo, impressionado.
— Quer dizer que você é...
Senti ultraje por ele chegar tão rápido a essa conclusão.
— Não vamos falar sobre isso — esquivei-me, corando, porque não
queria falar sobre a minha virgindade com um cara que acabara de conhecer.
Ele deu uma risada excitada.
— Lucky sabe disso?
— Por que ele haveria de saber? Minha vida particular só diz respeito
a mim — murmurei. — Eu nem sei por que estou falando com você.
Ele sacudiu a cabeça, ainda com ar divertido.
— Gostaria de ver a cara dele quando souber. — Riu de novo. —
Quero dar uma lição na Rayla, e você, nele. Que tal fingirmos que estamos
nos entendendo?
Suspirei.
— Por que não? Mas sem mãos bobas e sem beijos, entendido? —
adverti.
— Sim. Eu vou me comportar — prometeu.
— Ótimo. — Assisti a um filme uma vez em que a garota dançava de
um jeito sensual, mas sem parecer vulgar ou vagabunda. Olhei nos olhos
negros do cara. — Qual é o seu nome? Eu sou Samantha Gray.
Ele me deu um sorriso.
— Alex Jackson.
— Você tem algum parentesco com Alexia Jackson? — Lembrei-me de
ela dizer que seu irmão morava em Manhattan.
Ele arregalou os olhos.
— Se for uma mulher com cabelos dourados e olhos violeta chegada a
saltos e vestidos chiques, então, sim, é minha irmã. Você a conhece?
— Oh, sim, fizemos faculdade juntas. — Sorri. Como o mundo era
pequeno... Era impressionante eu encontrar o irmão de uma amiga ali,
naquele clube. Alexia realmente gostava de roupas elegantes, a menina tinha
uns 200 vestidos e sapatos de saltos alto. — Ela não me disse que seu irmão
era lindo.
Ele jogou a cabeça para trás e gargalhou.
— Então eu sou lindo? — Lançou-me um sorriso sexy.
— Sim, mas não precisa me dar esse sorriso de abaixar calcinhas,
porque nada vai acontecer entre nós, a não ser dançar para aqueles dois.
— Quer dizer que meu sorriso abaixa calcinhas, hein? — sondou,
rindo. Sua risada era muito sexy. A irmã do Lucky era uma idiota por tê-lo
deixado escapar.
— Sim, abaixa, mas...
— Mas não a sua calcinha — terminou a frase com um revirar dos
olhos. — Não me admira que Lucky esteja tão a fim de você a ponto de
persegui-la.
— Isso só mostra que ele é um canalha — rosnei.
— Não, isso mostra que ele viu algo em você, que eu também vejo...
— O que é?
— Você é pura e inocente para sua idade. Acho que você deve ter uns
23 ou 24 anos, estou certo? — Ele me avaliava.
— Tenho 24 — declarei. — E não sou inocente assim, porque, se fosse,
já teria caído nas garras dele e em sua cama.
Ele sacudiu a cabeça, ainda sorrindo.
— Vamos dançar ou não? — Coloquei as minhas mãos nos meus
cabelos e me movi conforme a música, rindo. — Rhythm of the Night, jura?
Adoro essa canção.
Ele riu e colocou suas mãos em minha cintura, enquanto eu me
balançava no ritmo dançante.
― Lucky está louco para me matar, posso ver em seus olhos. ― Ele
parecia divertido.
— Vamos ver isso. — Virei-me e fiquei de costas para o Alex,
enquanto as suas mãos passeavam por minha cintura. Eu balançava a cabeça
no ritmo da dança. Ele colocou o queixo no meu ombro, sua bochecha perto
da minha.
— Boa garota — disse, quase orgulhoso. Ele balançava os quadris, mas
sem roçar as suas partes íntimas em mim, o que achei bom.
— Se descer um centímetro, ficará sem as mãos — adverti quando ele
acariciou meu baixo-ventre.
Alex apenas riu e deixou as mãos onde estavam antes, em minha cintura.
Olhei para frente e me deparei com Lucky vindo em nossa direção com
um olhar gelado e mortal. O guarda-costas vinha atrás dele.
Seus amigos ainda estavam na salinha, observando-o. A loira lançava
um olhar preocupado para o irmão e o homem que ela abandonara.
Parei de dançar e fitei Alex com os olhos arregalados.
— Ele está vindo para cá — minha voz falhava. — E se ele quiser
bater em você? — Logo me lembrei do aviso do Lucky de que, se alguém me
tocasse, ele iria matá-lo. De repente fiquei preocupada com a vida do Alex.
Senti-me mal por tê-lo metido em meus problemas. Se acontecesse alguma
coisa com ele por minha culpa, Alexia iria me matar e esconder meu corpo.
— Vá embora antes que ele chegue — pedi a ele com urgência.
Alex me olhava sem nenhuma preocupação ou medo do Lucky.
— Ei, acalme-se, vai ficar tudo bem. — Tocou meu rosto.
— Tire as suas mãos imundas de cima dela — sibilou Lucky, chegando
até nós.
De repente, um punho passou por mim, indo direto para o queixo do
Alex, que cambaleou para trás. Ele se recuperou após alguns segundos e
colocou a mão no local atingido, depois olhou com uma fúria homicida para
o seu agressor.
— Não pretendo tirar as mãos dela esta noite — assegurou Alex em um
tom provocante. — Vou tocar muito mais nela do que apenas na cintura.
Eu queria pedir para Alex parar de provocar Lucky, ou ele o
machucaria, mas não tive a chance, porque Lucky se encheu de fúria e passou
por mim, ficando na frente do Alex e me arrastando para trás de si como se
fosse para me proteger.
— Eu vou acabar com você — sibilou.
Alex estreitou os olhos.
— Você já fez isso — rosnou. — Agora vai sentir como é bom quando
vê algo que gosta sendo tirado de você.
— Você nunca mais vai tocar na Sam, ou eu juro que vou destruí-lo! —
esbravejou.
Estreitei os olhos. Quem ele pensava que era para mandar em mim
assim e, ainda por cima, ameaçar as pessoas desse jeito? Logo Alex, o irmão
da minha amiga.
Observei que todos no clube tinham parado de dançar e assistiam aos
dois, que estavam um de frente para o outro. Nenhum dos dois piscava. Notei
que tinham quatro seguranças ao lado do Alex. Deviam trabalhar no clube.
Os amigos de Lucky estavam logo ali, atrás de mim, e, com eles, o Simon,
que segurava algo em sua cintura. Eu temia que fosse uma arma.
Meu Deus! O que eu fiz? E se todos ali brigassem por minha causa? Se
isso acontecesse, seria uma carnificina. Eu não podia deixar que isso
acontecesse. Além disso, a qualquer momento alguém ali poderia tirar fotos
deles ou gravá-los, já que Lucky era importante na sociedade, e eu não podia
aparecer na mídia.
Lucky estava prestes a bater no Alex de novo, mas entrei na frente, o
que foi uma burrice. Bem na hora, seu punho bateu no meu braço, próximo ao
ombro esquerdo. Não foi tão forte, provavelmente ele tentou parar para não
me acertar, mas estava muito em cima. Cambaleei para trás, mas Alex me
firmou, praguejando baixo por eu ter me machucado em sua luta boba.
— Ah, meu Deus! — horrorizado, Lucky balbuciou, olhando-me. —
Rosa Vermelha...
Saí correndo do clube Rave, ignorando quem gritou meu nome. Não
queria saber quem era no momento, apenas queria desaparecer dali e deixar
a dor me consumir, não a física, mas a que Lucky provocou em meu interior.
Tirei os saltos e corri descalça pela calçada. Virei à esquerda, indo na
direção da Fênix, que ficava perto dali. Lá, eu pediria ajuda para ir para
casa a fim de desmaiar nos lençóis e apenas sairia de lá quando a minha vida
voltasse ao normal ou, pelo menos, desejasse que meus caminhos e meu
coração não estivessem amarrados ao Lucky.
— Você, seu moleque, vai fazer o que eu mandar! — gritou a voz de um
homem não muito distante de mim.
— Eu... eu... não posso — chorava a voz conhecida.
Meu corpo tremeu em pânico. Aquela era a voz de Shaw. O que ele
estava fazendo ali? Não devia estar longe do abrigo da Fênix.
— Ah, você vai! — rosnou a voz do homem, em seguida ouvi o som de
um tapa. Shaw chorava baixinho.
Fui correndo na direção do som, virei a esquina e o vi no chão,
encolhido diante de um homem. O cara forte e barbudo estava pronto para
dar um chute em Shaw, quando me joguei contra ele, e ambos caímos no
chão.
Ouvi-o praguejar, mas o ignorei e tentei me levantar. Entretanto, não
consegui, porque o desgraçado me prendeu no chão e montou em cima da
minha cintura, segurando os meus ombros, que, por sinal, já estavam doendo.
— Você vai pagar por isso, sua vagabunda! — rosnou. Tinha hálito de
cerveja.
— Por favor, não machuque a Sam! — chorou Shaw, levantando-se e
olhando para nós dois.
Ele riu malicioso, olhando o meu corpo.
— Até que você é gostosa.
Tentei lutar, mas ele me prendeu no chão com sua força. Com um frio
em minha alma, percebi que a história se repetia. Aquele homem era o pai de
Shaw, eu podia ver a semelhança em seus olhos negros. Ele ia fazer comigo
o que fez à mãe do meu menino. Shaw não sobreviveria vendo a cena de
novo.
Fitei os olhos em pânico do meu garoto.
— Querido, corra! — gritei com uma súplica em meu olhar para que ele
fosse embora antes que fosse tarde demais.
— Sam...
— Não pense em mim, apenas corra, por favor! — implorei com os
olhos molhados. — Eu vou ficar bem — menti. Sabia que aquele desgraçado
não me deixaria sobreviver, mas não queria que Shaw presenciasse algo
assim novamente.
— Sam... — repetiu ele em um choramingo.
— Vá! — pedi. — Corra na direção de onde eu vim e peça ajuda! —
gritei, esperando que fosse rumo ao clube e torcendo para que alguém viesse
nos ajudar.
Ele assentiu chorando e saiu correndo.
— Volte aqui, moleque! — gritou Saul, o pai de Shaw, um bandido
assassino foragido. Olhou-me com raiva. — Você vai pagar por isso, sua
vadia! — Deu-me uma bofetada tão forte que cheguei a virar o rosto.
Tentei lutar, mas a luta era em vão, já que ele era muito forte, um
monstro, assim como Dylan, que tentara me fazer mal, mas nunca àquele
ponto, embora o teria feito se não fosse pelo meu irmão.
Saul empurrou meus ombros com força contra o chão. Cheguei a ficar
sem ar. Senti algo estalar bem onde Lucky havia batido, mas dessa vez
parecia que alguma coisa tinha sido quebrada. Todavia, o pior estava por
vir. Nunca imaginei que a minha primeira vez seria assim, através de um
estupro, e que, ao final, eu seria assassinada.
Se ao menos Shaw achasse alguém para pedir ajuda e vir me socorrer,
mas como ele o faria, se não conseguia falar com ninguém além de mim?
Porém, ele estava falando com seu pai mais cedo, então talvez eu tivesse
uma esperança de ser resgatada. Deus, por favor, que não seja tarde
demais! Minha súplica não foi tão longe, porque, após sentir uma pancada na
cabeça, tudo ficou escuro.
7 - Escolha Difícil
SAM
— Me desculpe, Rosa Vermelha, por magoá-la daquele jeito. — Ouvi
um suspiro dolorido do Lucky.
Lucky? O que ele fazia ali comigo? E onde eu estava? Lembrava-me de
quase ter sido violentada e morta. Será que isso aconteceu? Se sim, como o
estou ouvindo? Mas, se sobrevivi... Será que Saul conseguiu me tocar?
Droga! Eu queria acordar, mas não conseguia fazer isso. Era como se
estivesse dopada por morfina, sem forças para acordar. Apenas conseguia
ouvir. Estaria sonhando?
Senti o toque de suas mãos em meu rosto como se ele o estivesse
esquadrinhando.
— Eu prometo nunca mais magoar você. Sei que sou um crápula e que
fui egoísta por fazê-la sofrer. — Expirou próximo à minha cabeça, até pude
sentir seu hálito delicioso banhar meu rosto. — Eu ia conversar com você
naquela noite, no evento da Martínez, mas estava com medo de perder o
controle vendo você com Michael.
Senti lábios macios em minha mão. Queria pedir para Lucky esperar
que eu acordasse daquele sono sem fim no qual eu estava para que
tivéssemos uma conversa séria, como sempre quis desde que descobri o que
ele fez por mim, pedindo ao Michael para me oferecer um serviço na Fênix.
Não era justo eu estar dormindo enquanto ele me dizia tudo que eu sempre
quisera ouvir.
— Quero que saiba que eu sou um monstro, sim, não vou negar isso,
mas não exigi que saísse comigo porque queria entrar em suas calças e
depois dispensá-la. Eu quis você desde que a conheci. No começo, achei que
era só desejo por você ser linda. — Senti lábios na minha testa. — E você é.
Entretanto, não foi só isso. Em nenhuma hora eu parava de pensar em você.
Sei que deveria ter ido pessoalmente lhe pedir desculpas, mas estava com
medo de você dizer que não as aceitaria e de não me perdoar pelo que fiz.
Eu sei que fui um idiota e um estúpido por ter ameaçado você, mas agora vou
fazer tudo certo. O meu jeito distorcido de agir está errado. Veja isso, a
magoei tão profundamente que chega a ser criminoso. — Ele expirou como
se estivesse sofrendo.
Eu queria acordar para ver se a dor e a agonia que ouvia em sua voz
também estavam em seu rosto. Meu coração doeu ao sentir seu sofrimento.
Precisava despertar e dizer isso a ele, mas o sono era tão pesado.
— Eu sinto muito, Sam. Prometo que serei bom para você de agora em
diante. Nunca mais quero ser o causador da dor que vi em você...
Eu não esqueceria tudo que ele havia me contado. Quando acordasse,
iríamos conversar. Não estava com raiva pelo que ele fez a mim. No fundo,
eu não conseguia odiar nem meus pais. Bryan disse que eu era incapaz de
odiar alguém e que gostava disso em mim.
Tudo ficou em silêncio por um instante. Talvez eu tivesse voltado à
deriva, mas logo ouvi passos e depois uma voz. Meus ouvidos pareciam
estar tampados, era como se os sons viessem de longe.
— Como ela está, senhor Donovan? — perguntou uma voz masculina.
Eu queria abrir os olhos, mas eles estavam pesados demais. Apenas
fiquei no limbo, ouvindo a conversa.
— Ela vai ficar bem, Simon — respondeu Lucky.
— Eu tive tanto medo... — choramingou Shaw. — Pensei... que ele ia
fazer o... mesmo que fez a... minha... mãe... Eu não pude fazer nada, como
sempre...
Ouvi o Lucky rosnar como um leão assassino.
— Eu vou fazer de tudo para ele apodrecer na cadeia, embora adoraria
matá-lo. — Sua voz saiu fria, mas depois ele suspirou como se tentasse se
controlar. — Desculpe, eu sei que ele é o seu pai.
Shaw ficou em silêncio por um momento, mas enfim respondeu com a
voz tomada de dor:
— Ele... deixou de ser o meu pai... no momento em que tirou minha mãe
de mim... — Sua voz falhou.
— Agora está tudo bem, garotão — Lucky o tranquilizou. — Ele nunca
mais vai fazer mal a alguém. Eu prometo.
— Obrigado... senhor Donovan, por cuidar da Sam... — A voz de Shaw
era falha. Ele parecia uma criança que estava aprendendo a falar, mas fiquei
feliz por ele conversar com outra pessoa além de mim e seu horrível pai.
Lucky suspirou
— Eu gosto dela. — Riu amargo. — É mais do que gostar, mas não
consigo dizer as palavras...
— Eu sei como é isso. Posso ter apenas sete anos, mas sei. — Shaw
ficou em silêncio por um minuto e depois sussurrou: — Você tem medo de
dizer as palavras “eu te amo”, assim como eu tenho de não conseguir falar
com outras pessoas. Por quê, Lucky?
Lucky expirou.
— Eu... apenas não consigo dizer as palavras, porque essas eram as
palavras que a cadela da minha mãe costumava dizer para mim. — Seu tom
era sombrio ao falar da mãe. — A sua morreu para salvar a sua vida, já a
minha me deixou para morrer... — Sua voz soou como um rosnado no final.
— Eu jurei que nunca mais iria dizer essas palavras a alguém na minha vida,
por isso travo quando tento pronunciá-las. Também nunca conheci uma
pessoa que me fizesse sentir vontade de dizê-las.
— Até você conhecer a Sam — observou Simon com tom suave.
— Ela é fácil de amar... — falou Shaw.
— Vejo que a ama também — declarou Lucky.
Meu coração disparou ao ouvir isso da sua boca. Então me perseguir
não era só um capricho dele? Ele realmente me amava, apenas não conseguia
dizer as palavras e não sabia lidar com isso, já que nunca tinha amado
ninguém em sua vida e quem deveria tê-lo protegido e lhe ensinado sobre o
amor verdadeiro o traiu e não se importou com ele. A sua história era um
pouco parecida com a minha.
Ouvir tudo o que Lucky sentia por mim fez o meu coração amolecer de
novo, mais do que antes. Eu queria abraçá-lo, confortá-lo e lhe dizer que
sentia muito pelas palavras que lhe havia dito no clube Rave. Por que ele
não me disse a verdade naquela hora? Eu o teria ouvido e aceitado com o
maior prazer. Aliás, teria amado.
— Sim. Sam é como minha irmã mais velha. — Shaw riu com candura,
enquanto eu me enchia de júbilo. Nunca o tinha ouvido rir com alguém.
Quanto mais ele falava com Lucky, mais sua pronúncia melhorava. — Ela é
como um anjo que apareceu em minha vida para trazer luz.
— Sim, ela também é meu anjo — sussurrou Lucky. — A luz que
clareou a escuridão que havia em mim.
— Se a machucar de novo, eu vou arrebentar você — ameaçou Shaw.
Lucky suspirou.
— Como sabe sobre isso? Ela disse algo a você?
— Não, mas eu ouvi uma conversa da Ana com ela ao telefone...
— O que elas diziam?
— Ana estava preocupada, porque, depois que Sam saiu da empresa
naquele dia, ela não atendia as ligações dela e da Diana. — Alguém tocou
meu rosto com as mãos tão suaves quanto plumas. — Fiquei preocupado com
ela. Foi então que eu ouvi Ana falando ao telefone com a Diana sobre um
plano para você sair do pé da Sam e a deixar em paz. — Shaw rosnou as
palavras a seguir: — Por que a perseguiu, se a ama?
Lucky deu um suspiro desalentado.
— No começo, não lidei bem com tudo que aconteceu — murmurou. —
Eu sempre consigo o que quero. Então veio a Sam e disse “não” para mim,
algo que eu nunca havia recebido.
— Sério? Ninguém nunca disse “não” para você? — Era surpresa no
tom de Shaw? Eu também fiquei surpresa quando soube, e não estou me
referindo a mulheres, e sim a outras coisas, como no mundo dos negócios.
— Sim. Minha mãe me dizia “não” tantas vezes que, quando me tornei o
que sou, fiz uma promessa a mim mesmo de nunca mais aceitar um não como
resposta. — Ele respirou fundo. Parecia que a lembrança era dolorosa. —
Eu sei que magoei Samantha, por isso estou preparado para desistir dela e
deixá-la ser feliz. — Sua voz era só um sussurro tormentoso.
Meu coração disparou novamente. O que Lucky sentia por mim não era
forte o bastante para ele lutar? Eu queria desesperadamente implorar para
ele não desistir, não depois de eu ter descoberto que seus sentimentos por
mim eram verdadeiros, tanto quanto o que eu sentia por ele havia mais de um
mês, desde que descobri sobre suas boas ações, que ajudavam crianças
necessitadas pelo mundo afora.
— Por quê? Ela precisa que lute por ela... — disse Simon.
— Eu sei, mas e se eu fizer besteira e acabar a magoando ainda mais?
— Lucky resfolegou.
— O senhor só não pode ameaçar a Sam para ficar com você — disse
Simon.
— Sim, eu sei que ela gosta de você. Eu a vi com uma foto sua nas
mãos, numa revista, se perguntando por que você não era menos complicado
e por que ela não parava de pensar em você — disse Shaw.
— Eu vou tentar ser menos complicado para ela de agora em diante. —
Seu tom parecia ter um selo de promessa, mas também senti alívio em sua
voz.
— Acho bom, porque Sam é uma mulher para ser amada — declarou
Shaw.
Lucky riu.
— Eu não acredito que estou ouvindo isso de um garotinho de sete
anos. — Deu uma risada, mas logo a conteve. — Desculpe, garotão.
— Eu sei que vou fazer oito anos em algumas semanas, mas sou
inteligente. Não entendo por que converso com você e não travo, como
acontece quando tento falar com as outras pessoas. Com a Sam também é
assim. — Mudou de assunto de repente: — Mas se lembre, se partir o
coração da Sam, eu vou chutar as suas bolas.
Lucky gargalhou. Eu nunca o tinha visto assim, tão descontraído.
— Estou ciente disso — assegurou.
As vozes continuaram a sussurrar, e a escuridão se apossou de mim.
Não sabia se era por sono ou se eu tinha sido dopada.

Abri os olhos, e tudo que vi foi um teto branco. Era um quarto com
paredes claras e com lustre de cristal no teto. Sentei-me e olhei ao redor.
Tinha uma estante cheia de livros embutida em metade de uma parede e uma
TV enorme parecida com uma tela de cinema na outra metade. A vidraça que
ficava em outra parede oferecia uma vista deslumbrante do rio Hudson, o
que me fez amar o lugar. Do outro lado do vidro, havia uma varanda e um
pilar na forma de um semicírculo. Na varanda tinha uma espreguiçadeira, na
certa colocada ali para apreciação da vista da cidade à noite ou até mesmo
durante o dia.
A cama em que eu estava era uma california king, que cabia três
pessoas ou mais, com um colchão sedoso e lençóis de seda.
— Nossa! Isso que é quarto! — murmurei, pulando na cama como uma
criança na manhã de Natal. Eu podia morrer ali e ainda ser feliz.
Olhei meu pijama de shortinho curto e um top preto que mostrava a
minha barriga lisa. Aquelas roupas se pareciam muito com as que eu usava
para correr. De quem eram elas? Não me lembrava de ter me vestido assim.
E que quarto era aquele? Ou melhor, de quem ele era?
Olhei para o meu corpo e notei que meu braço esquerdo estava com
uma tala. De repente as lembranças da noite anterior inundaram minha mente.
Eu devia ter me machucado quando... Oh, meu Deus! Será que prenderam
Saul? E onde está Shaw?
Precisava saber onde eu estava e de quem era aquele quarto elegante,
mas o cheiro inconfundível daquele perfume caro da Dolce & Gabbana me
fez perceber que só podia ser dele.
Levantei-me, olhei no criado-mudo e vi um retrato com a foto de Ryan,
Rayla e Lucky. Os três estavam com traje de esqui.
— Será que foi ele quem me vestiu? Maldito seja! Se ele me tocou
enquanto eu estava apagada para colocar essas roupas, vou matá-lo —
rosnei comigo mesma.
Saí do quarto. O piso ali era da cor de areia da praia, assim como as
paredes. Passei por um corredor, mas não havia ninguém à vista. De repente,
ouvi vozes no andar de baixo, então as segui. Elas vinham do lado direito da
escada e, conforme eu me aproximava, ficavam mais claras.
— O que vai fazer, Lucky? — perguntou a voz do Ryan.
Ouvi um suspiro doloroso.
— Eu não sei, mas não vou me casar...
Meu coração martelou ao ouvir a palavra casar. Lucky estaria noivo
todo o tempo em que ficou no meu pé? Se isso fosse verdade, ele era um
tremendo cafajeste.
— Você não pode fazer isso — Ryan contestou. — Se não se casar, vai
perder a compra da empresa Águia da Esperança em Toronto.
— Eu não me importo com isso.
Andei mais um pouco e fiquei meio escondida no hall da sala de estar,
ainda ouvindo os dois e tentando segurar a minha dor e não chorar por saber
que ele precisava se casar com alguma mulher. Mulher é o que não falta
para ele, pensei amarga.
— Lucky, esse sempre foi o seu sonho. Você sempre almejou ajudar
crianças que necessitam de amparo — insistiu Ryan. — Essa é uma empresa
que vale bilhões, e eles a estão vendendo por milhões para você. Não pode
perder essa chance.
Lucky respirou fundo.
— Eu não vou me casar com outra mulher para ter uma empresa só
porque eles querem assim. Nunca. — Murmurou: — Eu quero a Sam... e só
ela. Mas não vou obrigá-la a ficar comigo... nunca mais.
— Talvez, se você explicar para Sam, ela possa entender que é para
ajudar crianças que estejam passando necessidade, como o Shaw — Ryan
pressionou.
— Não posso... — a sua voz desalentada cortou meu coração.
Então ele precisava se casar para tomar posse de uma empresa que
ajudava crianças carentes? Contudo, pelo que entendi, não podia fazer isso,
porque queria apenas a mim, e não outra mulher. Essa empresa devia ser a
que ele mencionara no discurso do evento da Martínez.
— Não vou submetê-la a isso, Ryan. Você viu a dor que causei a ela...
Céus, prefiro morrer a ver aquilo de novo. — Seus ombros estavam caídos.
— Não quero mais isso. Samantha vai ter sua vida de volta, mesmo que eu
não faça parte dela.
— Meu irmão, desde que a trouxe para cá, você não vai ao trabalho.
Ficar aí, sentado nesse sofá, não vai resolver nada, ainda mais bebendo
desse jeito. Isso não é certo — aconselhou Ryan, quase suplicante. — Você
precisa reagir, cara.
Ele suspirou desalentado.
— Logo ela vai acordar e vai embora. Posso não vê-la nunca mais. —
Resfolegou. — Eu nunca me senti assim em toda a minha vida. Parece que
estou desfalecendo aos poucos.
— Meu caro amigo, você caiu de quatro justamente por uma gata que
não quer nada com você — sussurrou Jordan.
— É um sentimento profundo. Dói só em pensar nela longe de mim. —
Seu tom era taciturno. — Mas é assim que deve ser, porque, quando ela
estiver boa, vai voltar para seu emprego e continuar com sua vida. Já falei
com Michael e não vou interferir mais.
— Aquele cara está louco para entrar nas calças dela, e você não vai
fazer nada? — retrucou Jordan.
— Eu quero fazer algo... Céus! Só em pensar nisso, me dá vontade de
matá-lo! — Seu tom era exasperado. — Mas não posso... — Gemeu como se
estivesse tomado pela dor. — Depois que a vi lá, no chão, com aquele cara...
Eu queria tê-lo matado, só não o fiz porque vocês dois me impediram. Mas,
ao vê-la desmaiada, achei que ela estava morta. Se estivesse, o que seria de
mim? A dor que senti foi demais, e ainda pior é saber que foi por minha
culpa que ela...
— Isso não é verdade, Lucky — discordou Ryan. — Foi aquele
desgraçado que bateu nela.
— Eu a soquei no mesmo braço que está com a tala... — seu tom estava
cheio de agonia. — Quem garante que não fui eu quem a machucou?
— Eu garanto — respondi, entrando na grande sala.
O cômodo era lindo. Tinha um lustre imenso no teto, e as paredes eram
creme. Um sofá grande na forma de L com almofadas pequenas ocupava
parte do espaço, tendo à sua frente uma mesinha de centro e, ao seu lado,
uma poltrona. A parede do lado direito, atrás do sofá, era inteiramente de
vidro, com uma bonita vista do horizonte. Logo à frente, tinha outra parede
de vidro, através da qual dava para ver a cozinha, do outro lado da imensa
sala. Céus, que lugar lindo!
Na sala estavam Jordan, sentado na poltrona vermelha, e Ryan de pé ao
lado dele. Lucky estava sentado de frente para os dois, na parte menor do
sofá em forma de L, e olhava para seu copo de uísque.
Os três arregalaram os olhos, fitando-me de cima a baixo em razão da
roupa curta e atraente que eu estava vestindo, mas não era minha culpa, pois
outra pessoa havia me vestido. Além disso, deviam estar impressionados
com a tatuagem de uma fênix que eu tinha no meu flanco direito, logo abaixo
do umbigo. Por causa do cós do short, só estava mostrando parte de suas
asas coloridas.
— Sam... — os lábios sexy do Lucky se mexeram num sussurro de
espanto conforme ele olhava meu corpo semiexposto.
— O que foi? Nunca viram uma mulher com uma tatuagem? —
resmunguei, chegando perto deles.
Jordan olhou para mim com um sorriso.
— Até onde vai essa tatuagem? — Ele gesticulou para minha barriga
lisa.
Sorri torto.
— Vai até um lugar ao qual você nunca terá acesso.
— Uau! — Ryan riu. — Essa vai ficar na história.
— Até parece que você também não quer saber até onde a tatoo dela
chega — retrucou Jordan.
Ryan me fitou de cima a baixo novamente com um olhar provocativo.
— Eu poderia ter visto se Lucky tivesse me dado uma chance. — Ele
parecia pensativo.
Seu irmão rosnou baixo:
— É melhor calarem a boca. E parem de olhar para o corpo dela. —
Lucky colocou sua bebida na mesinha de centro e me fitou. — Como você
está se sentindo? Não devia estar na cama?
— Céus, a cama! — Sorri para ele. — Acho que me apaixonei pela sua
cama.
— Por que não se apaixona pelo dono dela? — indagou Jordan com um
sorriso.
— Talvez se ele for bom igual à cama? — Meu tom era provocante, o
que fez Lucky arregalar os olhos.
Ryan riu.
— E se eu disser que aquela cama é minha? E que sou tão bom quanto
ela? — Seu tom era provocativo e brincalhão.
Sacudi a cabeça, sorrindo para ele.
— Não é sua cama, é do seu irmão — fui firme ao declarar isso e me
sentei ao lado do Lucky. — Aquela cama perfeita tem o cheiro dele. —
Recostei-me no sofá e suspirei.
— E que cheiro seria esse? — sondou Jordan.
Sorri vendo os olhos brilhantes do Lucky me observando atentamente.
— Lavanda floral com toques de café com creme e chocolate com
cobertura de mel.
Lucky esboçou um sorriso. Fiquei feliz por ele sorrir um pouco e,
assim, afastar aquele tormento que havia em seus olhos.
— Eu cheiro a tudo isso?
Assenti, muda, enquanto ele ampliava mais o sorriso sexy.
— Eu nunca mais quero tomar café com creme em minha vida — Ryan
arrulhou.
— Não sabe o que está perdendo — provoquei-o, depois falei sério: —
Ao acordar em um quarto que é como um sonho encantado e em uma cama
que parecia que eu tinha morrido e ido para o Céu, achei que estivesse em
algum tipo de reality show, com câmeras invisíveis me observando.
Jordan riu.
— Se você estivesse sem roupas, seria fascinante.
Lucky o fulminou, e logo seu sorriso sumiu.
— Certo, desculpe — disse, mas não parecia arrependido.
— Pode sonhar sentado, porque em pé vai se cansar — falei, então me
voltei para o Lucky. — Diga-me uma coisa: quem tirou as minhas roupas e
colocou essas? E de quem é esse shortinho curto? Juro, se for de alguma
mulher que você trouxe para cá, eu o tiro agora.
— Eu nunca trouxe nenhuma mulher à minha casa — falou Lucky com
sinceridade.
Arregalei os olhos, descrente.
— Quer dizer que aquela cama dos meus sonhos é virgem? — Meu tom
saiu duas oitavas mais agudo.
Ele riu torto.
— Espero desvirginá-la em breve. — Seu olhar varreu o meu corpo.
Senti o calor subir por ele como se um laser saísse dos seus olhos e me
fulminasse. — E, quanto às suas roupas, foi a Rayla que as trocou. Essas
peças devem ser dela.
— A loira do Alex? — perguntei, pegando uma almofada e a colocando
em meu colo, cobrindo meu busto e abdômen.
Ryan revirou os olhos.
— Alex não é namorado dela.
— Porque alguém estragou tudo sem pensar nos sentimentos dos outros
— retruquei.
— Está falando de mim? — rosnou Lucky.
— Tem mais alguém aqui que se mete na vida dos outros? — repliquei,
fitando-o.
Ele deu um suspiro desalentado e sem forças.
— Você estava muito à vontade com ele para se importar com os
sentimentos dela.
— Vocês dois precisavam de uma lição. Você... — eu o fitava, enquanto
ele retribuía com o olhar enervado — por se meter em minha vida, e ela, por
ser fraca e se deixar ser controlada por você e o seu poder.
— Eu não a controlo — rebateu ele.
— Alex ama sua irmã de verdade, tanto que estava disposto a deixar
você fechar seu negócio só para estar ao lado dela, mas ela simplesmente foi
embora. — Meu tom saiu amargo ao pensar na sua escolha tola.
— Você parece muito defensora dos outros — replicou.
— Eu defendo quem está certo. — Meneei a cabeça. — Eu defenderia
você também se estivesse certo, mas está sempre errado.
— Isso não é verdade.
— É claro que é. Você tem a sua própria maneira de conseguir as
coisas, mas nem sempre é o jeito certo. Como eu disse uma vez, o dinheiro
não compra tudo nessa vida. Algumas coisas são conquistadas com gestos.
— Gestos? — indagou ele.
Percebi que estava nervosa e que nos encontrávamos sozinhos. Seu
amigo e seu irmão tinham ido embora sem que eu notasse. Para onde, eu não
sabia, e também não me importava com isso no momento.
Peguei a mão do Lucky.
— Gestos como esse que fez por mim ao me salvar daquele cara.
Agradeço-lhe por ir lá... — Minha garganta se fechou em um nó.
Ele suspirou e apertou a minha mão, escorando a cabeça no encosto do
sofá como se tivesse perdido as forças.
— Quando eu vi você com Alex, meu sangue ferveu, não só de raiva,
mas também de dor. Ela tomou conta de mim. Era um sentimento que nunca
senti antes, apenas tinha em mente que não deixaria que você ficasse com
ele.
— Eu não ia ficar com ele — interrompi-o. — Apenas estávamos
dançando.
— Daquele jeito? — Ele riu sem vida. Seu olhar era inalcançável como
o Sol que vemos todo dia, o qual não podemos tocar, apenas sentir. — Mas,
mesmo se eu quisesse, não tinha o direito de interferir. Afinal, você não me
pertencia e não iria nunca me pertencer de nenhuma forma...
— Mas eu não tinha a intenção de ficar com ele. Não sei se você notou,
mas a única parte do meu corpo que ele tocou foi a minha cintura.
— Isso é motivo suficiente para eu querer matá-lo. — Seu tom estava
amargo.
— Alex ama a sua irmã, e, desculpe falar isso, mas ela é uma tremenda
de uma fraca por se deixar coagir por você.
— Eu só queria protegê-la — sussurrou, mas notei que estava
arrependido.
— Podemos proteger quem amamos, mas isso pode ser feito sem
interferências em sua vida. Você já se perguntou como ela se sente sobre
isso? — Levantei as sobrancelhas para ele.
— Estou tendo uma sessão com a psicóloga Samantha Gray? —
questionou, mas havia um esboço de sorriso em seus lábios. Minha nossa,
que boca! E como eu estava louca para devorá-la, ainda mais depois do
nosso primeiro beijo. Só em imaginar que ele nunca havia beijado alguém
antes de mim me fazia feliz e querer de novo. Entretanto, não podíamos
agora, porque os traumas dele teriam que se desfazer antes, com o tempo e
terapia.
— Desculpe, é que... quando vejo uma pessoa como você... —
gesticulei para ele — fico preocupada e procurando uma forma de poder
ajudar. — Tracei as veias de seu braço com minhas unhas.
Ele arqueou as sobrancelhas negras e grossas.
— Pessoas como eu? — incitou.
Suspirei.
— Alguém maníaco por controle, por querer tudo ao seu modo. Isso
sempre vem de algum trauma de infância. Quando crianças, nós deveríamos
ser bem criados e amados por nossos pais. Infelizmente, isso não acontece
sempre. E, quando nos tornamos adultos, carregamos as dores e as
lembranças dos maus tratos que sofremos. Uma pessoa com traumas de
infância, que não teve a vida que deveria ter tido... bem, em seu inconsciente
ficam presas memórias do que lhe aconteceu. Tudo que vemos, que ouvimos
e sentimos é captado por nossa mente. Buscamos evitar de toda forma
recordar o passado, assim a mente conjura só o que queremos. É por isso
que não conseguimos fazer determinadas coisas, que nossas mentes
bloquearam quando éramos crianças, para evitar sentir a dor, a perda e o
medo. — Eu olhava sua expressão sofrida. — Soube que vai a um psicólogo.
Ele não fala sobre isso com você?
— Não, porque não é algo que eu queira ouvir. — Sua voz estava
grave. Eu tinha pensado que era por causa das lembranças que minhas
palavras lhe provocaram.
Fitei-o, estupefata.
— Se você não gosta de ouvir a verdade, por que faz terapia? Está
jogando dinheiro fora.
— Eu não sei — admitiu por fim, recuperando-se e me olhando de lado.
— Talvez eu troque minha terapeuta por outra mais eficiente.
— Ela não pode ter medo de dizer a verdade a você — falei, e depois a
ficha caiu. — É uma mulher? — A frase saiu um tanto mais alta por causa do
choque.
Então Lucky tinha sessões com uma mulher. Eu apostava que eles já
tinham ficado juntos. Droga! Eu não queria me preocupar com isso, porque
era doloroso, mas era o passado dele. Eu não devia me importar, mas me
machucava saber que ele teve tantas mulheres.
— O que foi, Sam? Você está com ciúmes? — Seus olhos brilhantes
estavam arregalados e incrédulos.
— Não — menti.
Ele pegou meu queixo com os dedos.
— Sam... — Meu nome saindo da sua boca parecia tão doce. — Não
aconteceu nada entre mim e ela.
— Não? — Franzi o cenho. — Como não? Você é o tipo de toda mulher
na Terra.
Ele ergueu as sobrancelhas.
— Eu sou seu tipo de homem?
Sorri torto.
— Até se eu fosse lésbica, mudaria de time para ficar com você —
soltei a verdade.
Ele riu sacudindo a cabeça.
— É bom saber disso. — Sorriu, tocando a minha bochecha, mas logo
ficou sério. — Então você não ia ficar com aquele... com Alex.
Suspirei.
— Eu fiz aquilo porque estava com raiva de você por me mandar rosas,
bilhetes e joias, mas nunca aparecer pessoalmente na minha casa e me pedir
para sair com você... — E também pelo contrato de casamento que ele ia me
propor, mas preferi não falar sobre isso, afinal, pelo que ouvi mais cedo, ele
realmente precisava se casar, mas eu não sabia se podia aceitar uma
proposta de casamento baseada em qualquer coisa que não amor. Precisava
de mais tempo para pensar melhor, mesmo sabendo que aquele matrimônio
ajudaria muitas crianças.
Ele me interrompeu:
— Mas você disse não.
— Sim, eu disse, mas se você tivesse aparecido na minha casa
pessoalmente, sem imposições e ofertas, eu com certeza teria dito sim.
Entretanto, você não foi, assim como não se aproximou de mim no evento da
Martínez e, além disso, saiu de lá com outra mulher... — minha voz falhou.
Ele piscou.
— O quê? Eu não fiquei com ela nem com ninguém. — Ele tocou no
meu rosto. — Uma parte de mim queria ir até você para dizer tudo o que eu
estava sentindo e que me sufocava. Mas a outra tinha medo do que você iria
dizer. E olha que não sou de temer qualquer coisa. Sinto muito por tê-la
magoado. — Ele me olhou sério. — Acredita que não fiquei com ninguém?
Porque só você me importa.
— Acredito em você. Também sinto por tudo que eu disse no Rave. —
Encolhi-me contra suas mãos como um gatinho. — Então não ficou com sua
psicóloga?
Ele sacudiu a cabeça e sorriu.
— Eu não sou o tipo dela.
Meus olhos se arregalaram.
— O quê? Por acaso ela é lésbica?
Ele sorriu ao aproximar tanto o rosto do meu que senti seu calor em
minha face.
— Não — respondeu ainda sorrindo. — Mas ela tem o dobro da minha
idade.
— Oh! — Tentei desviar os olhos dos dele, mas não consegui.
— Você estava com ciúmes dela? Responda a verdade... — pediu antes
que eu mentisse de novo, parecendo esperançoso. — Preciso saber para
sossegar meu coração aflito.
Suspirei.
— Por que quer saber? — Sentia-me fraca ao ouvir a sua declaração.
Apertei tanto minha mão livre da tala em minhas coxas que achei que
ficariam com hematomas, só para não o puxar para mim e beijá-lo com
fervor.
— Porque eu estou louco para beijar você. — Ele fitava meus lábios
entreabertos.
— Não vai doer em você? — questionei com um fio de voz.
Ele deu de ombros.
— Talvez, mas não consigo resistir à vontade de devorar seus lábios de
novo, Rosa Vermelha. — Sua voz estava tomada de uma paixão capaz de
incendiar o planeta e meu corpo inteiro. Se uma palavra dele fazia isso com
meu corpo, imagina o que eu sentiria se transássemos? Perdi o fôlego.
— Eu não quero que sinta dor...
Lucky me interrompeu devorando a minha boca como se estivesse com
uma sede terrível e que não saciava havia muitos dias. Porém, eu podia
senti-lo estremecendo e seu maxilar tenso. Apesar do desejo, ele estava
sofrendo, e eu não queria isso. Tentei me afastar, mas ele não deixou isso
acontecer, deitou-me no sofá e pairou em cima de mim com todo seu peso.
Aprofundou mais o beijo, devorando cada canto da minha boca e sugando a
minha língua. Para quem nunca havia beijado, ele beijava muito bem.
Minha pele tremulava de prazer e queimava a cada toque seu, parecia
em chamas. Lucky palmilhava todo o meu corpo, acariciando-o como se
minha pele fosse a mais fina seda. O seu toque me enchia de fogo até nas
partes mais sensíveis.
Apertei-o contra mim, querendo mais dele, embora não tivesse brecha
alguma entre nós dois. Até me esqueci de que meu braço tinha uma tala.
Gemi assim que ele esfregou o seu quadril no meu e pude sentir a sua
necessidade intensa. O som que saiu da minha boca o incentivou a continuar,
ainda mais feroz e faminto. Suas mãos alisavam meus braços e desceram
para minha cintura, quadril e coxas.
Contudo, meu corpo travou assim que seus dedos foram para o meio das
minhas pernas.
— Lucky... não posso... — Eu não conseguia fazer aquilo, por isso
nunca tinha ficado com alguém. O desgraçado do Dylan me deixara uma
marca, de tal modo que nunca permiti a nenhum homem me tocar assim. Eu
não conseguia, mesmo que ansiasse pelo toque do Lucky como precisava do
ar.
Formei-me em psicologia não apenas para ajudar as pessoas que
necessitavam de terapia, mas também para descobrir e tentar curar as minhas
feridas devido à infância e adolescência que tive. Reminiscências daquela
noite terrível tentaram entrar em minha consciência, mas as bloqueei.
Lucky saiu de cima de mim como se eu o tivesse empurrado. Eu podia
ver o seu olhar magoado com as minhas palavras. Ele devia ter pensado que
eu não queria mais o seu toque, mas isso não era verdade.
— Me desculpe, Sam... Eu...
— Não tem pelo que se desculpar, Lucky. — Sentei-me e coloquei a
mão livre no meu colo. Precisava dizer alguma coisa para ele não se sentir
magoado, embora ainda não pudesse lhe dizer a verdade. — Acho que não
estou pronta para dar esse passo agora... Preciso de tempo, já que nunca fiz...
Ele me avaliava meio atônito.
— Sam, você é virgem? — Sentou-se perto de mim, tocou meu queixo e
o levantou para que eu olhasse para ele. — Eu preciso saber a verdade para
poder lidar com isso.
Afastei-me do seu toque de cenho franzido.
— Não tem que lidar com nada. — Minha voz soou baixa, mas com
uma pontada de dor. — Eu sei que está acostumado com mulheres
experientes fazendo tudo o que quer...
Ele tocou meu rosto de novo. Seus olhos verdes cintilavam como o Sol.
— Você é a única mulher que eu quero para sempre, com quem quero
desvirginar a minha cama, pela qual se apaixonou. — Beijou meu rosto, mas
percebi que sorria calidamente.
— Não é só a cama que você vai desvirginar — sussurrei, corando.
— Eu vou amar cada momento. — Beijou as minhas têmporas. — Não
importa o quanto eu tenha que esperar até você estar pronta.
Mas e se eu nunca estiver pronta?, pensei, aflita, mas não falei em voz
alta.
— Mas você tem as suas necessidades — sussurrei.
— Eu tenho uma mão para fazer isso. — Ele se afastou um pouco e me
lançou um sorriso devastador.
— O que você vai fazer com a mão, Lucky? — perguntou Shaw,
entrando de repente na sala.
Levantei-me depressa. Shaw estava com a testa franzida olhando de
mim para o Lucky, sentado no sofá com uma almofada no colo para esconder
a sua... Eu queria rir disso, mas Shaw não estava sozinho. Ryan e Jordan o
acompanhavam, com sorrisos estampados em seus rostos. Deviam estar
achando divertidos o meu desconforto e o estado do Lucky.
— Eu acho que o Lucky quis dizer que vai fazer um mingau — falou
Ryan com um sorriso debochado para o irmão, depois olhou para as minhas
bochechas rosadas.
Eu sabia muito bem que ele não estava falando de um mingau normal, e
sim de outra coisa. Fechei a cara para ele e olhei para o sorriso inocente do
Shaw.
— Eu adoro mingau! — Quicou, olhando para Lucky. — Você vai fazer
agora?
Lucky forçou um sorriso para o garoto e se levantou. Meu olhar foi para
sua calça para ver se estava alta, mas não estava. Os efeitos do amasso já
haviam passado, embora o meu corpo ainda estivesse quente por causa do
seu toque.
— Claro. — Olhou afiado para Jordan e Ryan. — Acho que vocês vão
querer me acompanhar também.
— Pode fazer você. — Ryan ainda estava sorrindo.
— Preciso de vocês comigo agora. — Seu tom parecia uma ordem. —
Precisamos conversar.
Nenhum dos dois pareceu se incomodar com a forma como Lucky
falava, já deviam estar acostumados ao seu tom autoritário. Os três saíram e
me deixaram sozinha com o Shaw, mas eu podia vê-los na cozinha através da
parede de vidro. Ryan e Jordan estavam sentados à mesa de vidro. Lucky
estava de pé, olhando alguma coisa no laptop. Apostei comigo mesma que
era alguma receita. Ri, mas o sorriso sumiu assim que Ryan e Jordan me
observaram com os olhos arregalados em razão de alguma coisa que Lucky
lhes disse.
Virei o rosto, corando, porque tinha cem por cento de certeza de que ele
estava falando sobre o fato de eu ainda ser virgem. Só isso poderia explicar
os olhares chocados e descrentes dos dois, pois eu sabia que não era comum
se deparar com uma mulher de 24 anos de idade que ainda não tinha
transado. Talvez eles pensassem que eu seguisse preceitos religiosos que
proibissem relações sexuais, mas não era nada disso, era um trauma do
passado que não me permitia ir em frente, e tudo por causa de Dylan. Tentei
esquecer isso e foquei no Shaw, ali comigo. Peguei a sua mão, levei-o para o
sofá e me sentei ao seu lado.
— Como você está, Shaw, com tudo isso? — indaguei.
Seu semblante se tornou triste.
— Eu não sei, mas tive muito medo de ele machucar você. — Sua voz
falhou.
Enlacei-o forte com o braço são.
— Eu estou bem, meu amor — tranquilizei-o. — Saul foi preso e não
vai mais nos machucar.
— Lucky prometeu que ele não vai mais sair da cadeia. — Afastou-se
para me olhar.
— Você confia nele?
Ele assentiu.
— Ele é um cara legal, por isso consigo falar com ele, assim como falo
com você.
— Eu percebi. Eu sei que Lucky é legal, mas ele tem um jeito
distorcido de resolver as coisas. — Sorri, mas logo fiquei séria. — Por que
estava lá fora naquele beco, sozinho, Shaw? Por que saiu do alojamento da
Fênix?
— Eu ouvi Ana ao telefone com Diana. Ela dizia que você estava triste
por algo que Lucky Donovan tinha feito. — Seu semblante mudou, ficando
tristonho. — Ouvi que você ia ao clube lá perto, então resolvi ir ver você.
Meu coração gelou diante de tudo de ruim que poderia ter lhe
acontecido fora da Fênix. Graças a Deus, ele estava bem.
— Eu sinto muito por ter ido embora sem falar com você. Eu sei que
nada justifica isso. — Enxuguei seu rosto lindo. — Mas prometo
recompensá-lo.
Um sorriso apareceu em seus lábios.
— Como?
— Vou falar com Michael e ver se você pode ficar em minha casa...
— Você vai embora? — perguntou Lucky, aparecendo na sala com uma
tigela branca nas mãos.
Seus olhos estavam cheios de sombras de novo. Eu podia ver dor,
perda, medo e outro sentimento que não consegui identificar.
— Esse é o meu mingau? — Shaw se levantou e foi até o Lucky.
Lucky forçou um sorriso para o garoto e lhe entregou a vasilha.
— É melhor se sentar à mesinha e comê-lo. — Ele fez uma careta. —
Experimente para ver se está bom.
Shaw franziu o cenho.
— Você nunca fez mingau? — Olhou para a tigela com receio de estar
ruim demais.
— Vamos, Shaw, experimente — incentivei.
Ele se sentou no chão, colocou a tigela na mesinha de centro e levou a
colher à boca.
Percebi que todos olhavam para o menino, assim como eu, querendo
saber a sua resposta.
— Hummm... — murmurou com os olhos fechados e depois olhou para
o Lucky. — Você sabia que eu não comia nada com açúcar ou apenas se
esqueceu de colocar?
Lucky sorriu.
— Eu sei que você não come nada que tenha açúcar, ao menos é isso
que diz no seu registro na Fênix — declarou. — É uma criança bem
diferente, devo admitir, porque todas que conheço particularmente amam
doces e chocolate.
— A Sam adora chocolate trufado. — Shaw sorriu para mim, mas
depois ficou triste. — Queria dar um a você de presente, mas não tenho
dinheiro.
Fiquei comovida com isso.
— Ah, meu amor, não precisa comprar nada. — Olhei de lado para ele.
— Como sabe que eu amo chocolate?
Ele continuou comendo o seu mingau, tentando ignorar a pergunta.
— Shaw...
— Eu ouvi você conversar com um cara. Ele dizia que seu aniversário
estava se aproximando, mas que você nunca queria sair para comemorar,
então ele daria chocolate trufado a você, embora o chocolate levasse você a
engordar, mas ele te amaria gorda caso isso acontecesse. — Ele riu
baixinho.
Perdi o fôlego. Então ele tinha ouvido a minha vídeo-chamada com
Bryan? Por sua expressão inocente, ele não devia ter ouvido toda a
conversa, por isso não tinha percebido que éramos irmãos.
— Quem é esse cara, Sam? — perguntou Lucky em um tom enciumado.
Olhei para ele e sorri, embora sem vontade.
— Somos apenas amigos — menti. — Eu não sou o tipo dele.
Ele piscou.
— Ele é gay? — indagou Ryan.
— Por que acha que um cara tem que ser gay para eu não ser o tipo
dele? — retruquei.
Ele me olhou de cima a baixo.
— Porque você é linda e, diga-se de passagem, ressuscita até os
mortos... — foi interrompido por um tapa que Lucky deu em sua cabeça. —
Ai, mas que droga, mano!
— Pare de babar por ela — rosnou e depois me olhou. —Por que razão
ele disse que te amaria até gorda?
Ri com a possibilidade de o Bryan ser gay. Céus, se ele soubesse disso,
ficaria surpreso. O homem era um mulherengo nato.
— Se ele é ou não, não sei, mas ele disse que não sou seu tipo. E não
sou de me meter na vida particular de ninguém — comentei para aliviar o
mau humor de Lucky, que tinha se elevado com a possibilidade de um homem
me amar. Olhei para o Shaw. — Sabia que é feio ouvir a conversa dos
outros?
— Desculpe, Sam, foi sem querer. — Ele parecia triste.
— Tudo bem, meu amor. Agora termine o seu mingau.
— Então você come chocolate e ainda tem um corpo desse? —
questionou Ryan.
— Me diz uma coisa. — Olhei de soslaio para ele. — Quando foi a
última vez que ficou com uma mulher?
Ele franziu o cenho, e não foi o único.
— Por que pergunta?
— Você olha meu corpo como se não ficasse com mulheres há anos —
falei baixo para Shaw não ouvir e cruzei os braços, tampando os meus peitos
da sua visão de gavião.
— Para seu governo, eu estive com duas mulheres ontem à noite. — Ele
esboçou um sorriso.
Arregalei os olhos.
— Duas ao mesmo tempo? Como em um ménage? — Tentei abaixar a
voz.
— Como sabe sobre ménage se nunca... — a frase do Jordan ficou
inacabada.
Ri.
— Só porque nunca fiz, não significa que não saiba o que é —
repliquei. — Além disso, leio muitos livros, e alguns abordam essa temática.
Ryan riu.
— Quer experimentar? — Lucky deu um murro no braço do irmão, que
chegou a se encolher. — Mas que droga, cara! Eu estou brincando!
— Desculpe desapontá-lo, mas essa não é a minha praia — falei depois
de me recuperar das risadas. — Eu sou uma pessoa que não divide nada,
muito menos um homem.
— Ah, Lucky, meu amigo, você já era, já que não consegue ficar com
uma mulher só. — Jordan deu um tapinha nas costas de Lucky.
Meu coração doeu ao ouvir aquilo. Pelo visto, ele não seria capaz de se
saciar com as mãos, como me disse. Como fui idiota por acreditar nisso.
— Juro, Jordan, que, se você não calar a boca, amanhã vai sair nas
colunas sociais sem o apêndice — rosnou Lucky.
Jordan se encolheu com o pensamento de algo assim acontecer. Ele com
certeza devia ter visto que seu amigo não estava para brincadeira, não diante
de sua expressão fria e hostil.
— Desculpe, cara, foi mal — sussurrou para Lucky, depois se voltou
para mim. — Com você, ele é diferente. Devo dizer que não ficou com
ninguém desde que conheceu você naquele elevador e depois em seu
escritório, quando entrou querendo bater nele. — Revirou os olhos azuis
ante o fato. — Não tirava você da cabeça.
Arregalei os olhos, fitando Lucky, que tinha um esboço de um sorriso de
diamante que cintilava mais que o Sol.
— Ah! — Eu não sabia o que dizer, não sabia se ficava feliz ou triste.
Optei por feliz. Aproximei-me dele, mordendo o lábio e lhe dando um olhar
penetrante. Sussurrei em seu ouvido: — Então você tem alguma prática com
as mãos. Continue assim, que no final será recompensado.
Senti que ele estremeceu ao ouvir minhas palavras.
— Sam... — sua voz também estava rouca.
Ri e me afastei alguns centímetros, colocando o dedo médio e o
indicador nos meus lábios e os beijando, depois os coloquei sobre os dele.
Queria beijá-lo, mas me controlei. Tentei me afastar, porém Lucky me pegou
pelo braço e puxou para si. Bati na parede dura de músculos que era o seu
peito delicioso. Arfei com o impacto e com o fogo que subiu em meu corpo.
— Eu exagerei com meu gesto? — murmurei.
— Você pode fazer o que quiser comigo e com meu corpo. — Tocou
meus lábios com a ponta dos dedos. Eles se abriram involuntariamente com
seu toque, tão quente quanto brasa ardente. — Eu não ligo se parecer um
maricas. — Sua boca se repuxou em um sorriso. — Você sabe da verdade.
— Colocou as mãos em meu quadril e o puxou para o seu. Senti a sua dureza
em meu estômago. — Isso aqui prova o que sinto por você... e isso. —
Aproximou a boca da minha como se fosse me beijar de novo. Eu estava
torcendo para que isso acontecesse. Mordi o lábio inferior para me
impossibilitar de fazer besteira e beijá-lo sem ele estar pronto.
Seus olhos ficaram injetados.
— Nossa! E, quando você faz isso, me deixa louco, algo que nunca
senti com ninguém. Você é diferente! Mexe com algo dentro de mim que me
dá vontade de devorar essa boca linda. — Seu tom estava gutural, talvez
pelo desejo.
Prendi a respiração com essa declaração.
— Por que você quer devorar a boca da Sam? — perguntou Shaw. —
Não pode simplesmente beijá-la?
Virei-me para o menino. Seus olhos negros estavam grandes como dois
pires, mas seus lábios estavam levantados em um sorriso.
Fiquei de costas para o Lucky e à sua frente, impedindo que Shaw visse
algo que não devesse. Lucky ainda estava a todo vapor atrás de mim.
Ryan e Jordan riam do meu desconforto e do meu rosto vermelho.
— Shaw... — minha voz falhou. — Não ligue para o que Lucky disse.
Eu já ia até o garoto, quando as mãos de Lucky pegaram a minha cintura
e me apertaram contra seu corpo, como se ele me abraçasse por trás.
— Se eu fosse você, não sairia daí — sussurrou Lucky bem próximo ao
meu ouvido. Senti seu hálito quente banhar a minha pele e o arrepio correr
através dela como uma corrente elétrica. — Ou o Shaw vai ter uma surpresa
que nunca viu antes.
Parei onde estava e prendi a respiração ao sentir a sua ereção em
minhas costas. Queria esmurrá-lo e beijá-lo ao mesmo tempo por isso. Sabia
que ele estava se aproveitando da situação.
Lucky passou os braços em minha cintura, deixando as mãos
descansarem em minha barriga. Senti seus dedos alisando a tatuagem. Queria
empurrá-lo, mas me segurei. Ele colocou o queixo no meu ombro direito e
olhou para o Shaw.
— Estou tentando convencer a Sam para que ela e você fiquem aqui até
ela ficar boa. — Seu tom era meloso.
— Lucky — adverti-o, porque isso era golpe baixo, ele estava usando a
criança. — Eu tenho que falar com Michael, e não acho que ele vá...
— Deixe que eu cuido do Michael — interveio Lucky.
Afastei-me dele e fitei seu rosto.
— Não gosto de como você resolve as coisas — rosnei.
Ele suspirou.
— Não tem outro jeito de resolver as coisas com Michael.
Funguei.
— Existe diferença entre falar e ameaçar. — Sacudi a cabeça. — Shaw,
querido, por que não pega o meu telefone? — Olhei para o Lucky. — Onde
ele está?
— Dentro do criado-mudo ao lado da minha cama.
Assenti e olhei para o Shaw.
— Você pode pegá-lo para mim?
— Sim, eu já volto. — Saiu correndo.
— Sem correr, você pode cair da escada e se machucar! — gritei.
Ryan e Jordan não estavam mais na sala, deviam ter ido a algum lugar.
Aproveitando que estávamos sozinhos, dei um tapinha em Lucky.
— Você se aproveitou da situação só porque o Shaw estava aqui.
Ele riu descaradamente.
— Você provocou isso. — Apontou para sua calça, que revelava um
volume alto por trás do jeans.
— Sério? Não me lembro de ter feito nada, apenas me aproximei de
você. — Meu tom era insinuante.
— Rosa Vermelha, seu toque desperta um vulcão que está preso e doido
para entrar em erupção. — Seu sorriso era libidinoso.
— Isso veremos, quando você desvirginar a cama e a mim. — Apontei
para o meu corpo e o fitei de um jeito sexy e inocente ao mesmo tempo. —
Mas posso não ser boa...
Seu olhar era cálido e devastador.
— Isso é impossível, Rosa Vermelha. — Sua voz estava pesada de
desejo. — Vou adorar morder cada canto do seu corpo saboroso,
principalmente essa tatuagem.
Fiquei sem fôlego.
— Céus! Se só essas palavras fazem meu corpo pegar fogo, imagina...
Seu sorriso era cativante.
— Quando eu estiver dentro de você? Vou fazer você gritar em cada
canto desta casa — ele falava sem nenhum pudor.
— Eu também o farei gritar.
— Eu adoro esse seu lado de gatinha provocante e vou adorar vê-lo em
minha cama.
Não pude deixar de sorrir e de me sentir feliz por ele gostar que eu
falasse assim com ele. Lucky parecia tão instigante.
Ergui as sobrancelhas para ele.
— E se eu parecer uma pantera selvagem, o que vai fazer? — Mordi o
lábio.
— Você vai me fazer gozar nas calças — sussurrou, mexendo-se contra
mim.
— E não vai ser o único! Se querem transar, por que não vão para o
quarto? — rosnou Jordan, entrando no cômodo ao lado de Ryan.
Meu sorriso sumiu, e fiquei constrangida por ser atrevida na frente
deles. Eu nunca tinha sido assim, nunca conhecera ninguém que me
interessasse daquela forma como o Lucky. Suas palavras acendiam cada
canto da minha pele e a transformavam em labaredas.
— Desculpe... É que... achei que não estavam aqui... — Eu ainda estava
sem fôlego pelo toque do Lucky, mas o que eu ia dizer? Eu não sabia por que
reagia assim, mas era mais forte do que eu, como se meu corpo e minha boca
tivessem controle próprio.
Lucky me olhou com um esboço de sorriso.
— Não precisa pedir desculpas, Rosa Vermelha. — Seu tom era
amoroso e quente ao mesmo tempo. — Você pode fazer e dizer o que quiser.
Suspirei, mas, antes que eu dissesse algo, Shaw chegou com o meu
telefone. Ignorei a todos e meu desejo por aquele homem.
— Obrigada, querido — agradeci ao Shaw enquanto pegava o meu
celular.
— Um cara ligou, parecia o mesmo que falou sobre os chocolates e que
você ia engordar comendo bombons. — Riu. — Ele estava preocupado com
você, já que não apareceu na casa dele como era para fazer. — Ele suspirou.
— Tentei acalmá-lo, dizendo que você está bem, mas acho que ele não
acreditou. Ele disse que, se você não ligar em dez minutos, ele vai bater em
sua casa.
Eu já estava discando o número de Bryan. Sabia que devia ter ligado
nos últimos dias, mas não tive oportunidade, já que estava meio moribunda.
Ele atendeu ao primeiro toque.
— Onde você está?! — gritou, e tive que afastar o telefone da orelha.
Olhei para o Lucky, que estava com a testa franzida. Cobri o celular
para abafar o som, fui até Lucky e sussurrei em seu ouvido:
— Sabe que é só você, que não tem ninguém em minha vida nem nunca
teve — sussurrei e me afastei. — Eu já volto — disse a ele e coloquei o
telefone ao ouvido, indo até a varanda, vendo a bela vista da cidade. —
Você está querendo me deixar surda?
— Como você está? — Seu tom era ansioso.
— Estou bem, Bryan — tranquilizei-o com a voz baixa para que não
escutassem da sala.
— O que houve? Você sumiu...
— Eu não sumi, apenas... Bryan, não posso falar agora, mas juro que
estou bem. Prometo que vou à sua casa no próximo fim de semana, e nós
conversaremos, tudo bem?
Fitei a sala, encontrando os olhos de gavião do Lucky sobre mim.
— Jura que está tudo bem? — sondou em dúvida.
— Eu juro! Tenho que desligar, mas estou bem.
— Amo você.
— Eu também — respondi e encerrei a ligação, discando em seguida
um número necessário.
— Alô? — falou Michael.
— Sou eu, Samantha...
— Sam? Você está bem? — Seu tom parecia preocupado.
— Sim, estou bem. — Suspirei. — Obrigada.
— Eu soube pelo que você passou nas mãos de Saul. Sinto muito.
— Já passou. O importante é que ele foi preso e não vai chegar perto de
Shaw nunca mais. — Assim eu esperava.
— Se tem o dedo do Lucky nisso, então com certeza não vai. — Tinha
um tom de amargura na voz dele ao pronunciar o nome do Lucky
— Queria saber de você se o Shaw pode ficar comigo na casa do
Lucky. — Assim que disse o nome do Lucky, arrependi-me, porque um
rosnado saiu da garganta de Michael.
— Sam, eu me importo com você, então vou perguntar algo... — Ele
parecia sem jeito. — Vocês estão juntos?
Respirei fundo, sem saber se estávamos em um relacionamento, afinal,
nem havíamos conversado sobre isso ainda.
— Não sei bem o que está havendo conosco, mas espero que sim.
— Eu sei que não é da minha conta perguntar ou falar sobre isso... —
Respirou fundo. — Ele vai pisar em você igual faz com todas.
Meu coração doeu com suas palavras. Temi que isso pudesse ser
verdade, mas então veio à minha mente a conversa que ouvi entre Lucky,
Simon e Shaw e me acalmei. Ele não faria isso comigo, porque se importava
e me amava, apenas não conseguia dizer em voz alta.
— Lucky está diferente. Ele é bom debaixo daquela fachada. Não vai
fazer isso — sussurrei.
— É um risco muito grande que você vai ter que correr. — Sua voz
soou triste.
— Vai deixar o Shaw ficar ou não? — Esquivei-me de suas palavras.
— Sam, se você tem planos de ficar com Lucky definitivamente, então
não vai poder ter o Shaw.
— O quê? — quase gritei. — Por quê? Você acha que o juiz vai ser
contra a adoção caso eu fique com Lucky?
Ele deu um suspiro desalentado.
— O problema não é o juiz, e sim o Lucky...
— Como assim? Por que ele não iria querer que eu adotasse o Shaw?
Ele tem várias empresas que beneficiam a adoção pelo mundo. — Minha voz
falhou com a possibilidade de Lucky não aceitar o Shaw.
— Eu vi uma entrevista dele na HBO em que ele dizia que ajudava
crianças carentes, mas que não queria ter filhos nem adotar nenhuma criança.
— Ele disse? — inquiri baixinho. Talvez fosse por isso que ele não
tinha adotado Logan, mesmo gostando do garoto.
— Sim. Eu sinto muito, Sam. — Seu tom era grave e triste.
— Não precisa sentir — murmurei, pensando em ter de escolher entre
os dois.
— Mas a boa notícia é que o juiz aprovou a guarda provisória de Shaw.
Meus olhos brilharam de lágrimas.
— Sério? — Eu tinha entrado com o pedido de guarda do Shaw havia
algum tempo. Ainda bem que não pedira demissão, porque, se estivesse
desempregada, o juiz jamais permitiria que eu tivesse a guarda do meu
garoto.
— Sim, estou falando sério — garantiu. — Então conversou com Lucky
sobre a exigência dele? Ouvi dizer que você ia pedir as contas daqui. Não
faça isso, Sam, vamos arranjar um jeito de resolver esse problema.
— Obrigada, Michael — disse comovida. — Mas não se preocupe,
porque o Lucky não vai mais interferir nos meus caminhos. Agora eu posso
ficar na Fênix sem correr o risco de ele fechá-la.
— Você está com ele por causa disso? — perguntou ultrajado.
— É bom saber que você pensa tão mal de mim e que eu me submeteria
a algo assim. — Minha voz soou grave.
— Lamento, Sam, não foi o que eu disse...
— Mas foi isso que deu a entender. — Suspirei. — Passo aí depois
para assinar os papéis da guarda provisória.
— Tudo bem, Sam. Sinto muito por ter dito algo que a insultou. Saiba
que não tive essa intenção. — Disse e desligou.
Meu Deus! O que eu farei agora? Se escolher o Lucky, perderei Shaw.
E se eu ficar com o Shaw, perderei Lucky. Eu nem o tinha ainda e já iria
perdê-lo? Como poderia escolher entre os dois? Não tinha que escolher,
porque, se o Lucky me quisesse, teria que aceitar o Shaw também. Nós dois
éramos um pacote só. Se Lucky não me quisesse com Shaw, então eu partiria
com o meu menininho lindo.
Limpei as lágrimas e voltei para a sala. Podia ver todos conversando
entre si, mas pararam de falar ao me olhar.
— Sam, o que foi? — perguntou Lucky num tom preocupado.
— Aquele cara te fez chorar? — rosnou Shaw. — Eu vou acabar com
ele.
Sorri em meio às lágrimas com a sua coragem de enfrentar o Bryan.
— Não. Ele não me fez chorar — tranquilizei-o. — Estava falando com
Michael.
Ele franziu o cenho.
— O que ele disse a você para ficar assim?
Notei que a expressão de Lucky ficou assassina, como um leão faminto
à procura de caça. Apressei-me a explicar, ou ele iria arranjar um jeito de
acertar as contas com meu chefe. Talvez, quando ele soubesse da verdade,
terminasse tudo comigo, até me expulsasse. Encolhi-me por dentro com a
possibilidade, mas não deixei isso apagar a felicidade que eu estava
sentindo por ter Shaw em minha vida para sempre. Isso era algo que eu
queria havia tanto tempo.
— O juiz disse sim — informei para Shaw, ignorando todos. Apenas
fitava o meu garotinho. Não pude deixar de ficar feliz ao ver seus olhos
brilhando como uma árvore de Natal. Havia contado a ele algumas semanas
antes que tinha planos de adotá-lo. Precisava saber se queria ficar comigo
caso o juiz dissesse “sim”. Shaw ficou muito feliz.
— Isso quer dizer que vou morar com você para sempre?! — Seu tom
era eufórico.
— Sim, meu pequenino. — Sorri em meio às lágrimas.
Ele correu e me abraçou pela cintura.
— Eu te amo tanto, Sam — sussurrou, chorando.
Olhei para o Lucky, atrás do Shaw, enquanto respondia:
— Você é a coisa mais importante da minha vida, Shaw. — Respirei
fundo. — Não desistiria de você por nada nesse mundo.
Os olhos do Lucky revelavam um terror e dor profundos. Parecia que
ele estava sendo perfurado por vários tipos de lâminas.
Ryan e Jordan observavam sua expressão, também preocupados com o
amigo.
— Você vai adotá-lo? — Sua voz saiu engasgada, como se ele tivesse
se afogado.
Suspirei, segurando a raiva, porque, se ele dissesse algo que magoasse
Shaw, eu iria acabar com ele.
— Sim — respondi, fitando seus olhos atormentados. — Eu nunca
agradeci a você por me forçar a me demitir naquele dia. Obrigada. Graças a
você, pude ter o Shaw em minha vida. Agora o meu garotinho lindo faz parte
da minha família.
Os olhos de Shaw brilhavam como duas pérolas negras.
— Eu já sou um homem, que tal me chamar de garotão em vez de
garotinho? — pediu, sorrindo.
Também sorri.
— Fechado, garotão. — Toquei seus cabelos.
— Eu tenho que sair... — disse Lucky, com dificuldade para falar. —
Não vou demorar.
— Não tem que me dar explicação. — Tentei ignorar a dor. — A casa é
sua, e não temos nada, não é?
Seus olhos se estreitaram ao ouvir o ressentimento e a raiva na minha
voz. Ele não disse nada, apenas virou as costas e foi embora. Ryan me deu
um sorriso de desculpas e saiu atrás do Lucky junto ao Jordan.
Tentei não chorar e deixar Shaw triste. Ele parecia tão alegre em morar
comigo que eu não faria nada para acabar com sua felicidade. Como algo
assim não comovia o coração do Lucky? Como não se render a um sorriso
daqueles, mais brilhante que o Sol?
— Sam, você está chorando por ele ter saído?
Fitei-o.
— Um pouco, mas ele vai voltar logo. — Sorri, aproveitando meu
garotinho nos meus braços. Era uma felicidade que nada apagaria. Eu dava
graças a Deus por ter Shaw em minha vida.

Fiquei até tarde esperando Lucky voltar para casa, mas já passava de
1h da manhã, e ele não havia chegado. Minha mente estava tão cheia de
pensamentos. O que me machucava e me fazia encolher-me na cama dele era
pensar que nunca iríamos desvirginar a cama. Pelo menos, ele não o faria
comigo. Naquele momento, Lucky poderia estar em qualquer lugar da cidade,
com outra mulher. E tudo porque ele não me aceitava com Shaw. Meu
coração doía fundo ao imaginá-lo tocando outra mulher. Minha alma
sangrava como se milhares de agulhas afiadas se enfincassem nela.
Eu estava tão feliz por Lucky não ter ficado com ninguém depois que me
conheceu, mas tudo isso podia mudar. Ele já devia estar com alguém, e eu
não ia ser capaz de perdoá-lo.
8 - Renúncia
LUCKY
Meu mundo desabou como se um tanque de guerra tivesse sido lançado
sobre mim, deixando-me destroçado e aniquilado, sem poder gritar por
socorro.
Na hora em que a Sam disse que ia adotar o Shaw, algo dentro de mim
se quebrou em pedaços como cacos de vidro, um sentimento sombrio se
sobrepondo à felicidade que eu sentia por tê-la em meus braços e por ela
retribuir o mesmo que eu sentia.
Perdi a minha alma já quebrada, esquecendo-me de morrer
completamente e ir para o abismo em que sempre estive antes de ter a Sam
em meus braços e sentir o sabor do seu beijo de mel. A perda estava me
sufocando por dentro, como se meus órgãos estivessem sendo esmagados por
um triturador de carne e deixando o meu sangue escorrer pelas frestas.
Estava completamente devastado por sair da minha casa e deixá-la com
aquele olhar. Céus! Seus olhos pareciam quebrados, e fui eu quem os
quebrou, deixando-a para trás só porque não conseguia lidar com a minha
merda distorcida.
A revelação bombástica que ela fez acabou comigo, pois percebi que o
céu estava azul com a sua presença e, com a iminência de perdê-la, se tornou
escuro, um cinza borrado, sem estrelas e sem luz, pois ela era a luz. Sempre
foi ela.
A palavra adoção tocou fundo em algo na minha alma negra como breu,
porque eu sabia que não conseguiria ser um pai amoroso e atencioso como
uma criança quer e necessita diariamente. Um pai verdadeiro. Eu não tive
isso até os meus seis anos, quando fui resgatado pelos Donovans, que foram
tirados de mim por um acidente de carro.
Eu ajudava pessoas que queriam adotar crianças necessitadas que
precisavam de um lar feliz e amoroso. Assim como um dia fui ajudado por
Miguel e Laura, os pais de Ryan e Rayla, outras crianças também precisavam
de uma oportunidade de serem felizes e amadas, mas eu não era um homem
digno de ter uma criança aos meus cuidados. Se isso acontecesse e eu não
conseguisse lidar, então seria parecido com ela, com a mulher que dizia ser
minha mãe e me deixou para morrer de fome naquela casa no meio do nada.
Eu precisava de tempo para pensar naquela bola de neve que a minha
vida estava se tornando. Vi nos olhos da minha Rosa Vermelha que ela não
desistiria do Shaw por nada no mundo, nem por mim. Ela mesma disse isso
antes que eu saísse da minha casa. Até disse que me agradecia por ser
demitida, porque assim o conheceu.
Eu estava correndo o risco de perder a mulher que mais amava na
minha vida, aliás, a única que já havia amado, embora não conseguisse dizer
essas palavras a ninguém em voz alta, nem mesmo a Sam. Uma frase tão
simples e tão profunda, mas que me fazia lembrar-me dela, da maldita
mulher que desgraçou a minha vida e que dizia ser minha mãe. Ela
pronunciava essa frase o tempo todo para mim, mas eu apostava que não
conhecia o significado.
“Eu amo você, meu filho”. Tantas vezes ela disse que me amava e
depois me dava um beijo, e eu, uma criança inocente, acreditava nela.
Contudo, isso nunca aconteceu, porque Mary não amava ninguém a não ser a
si mesma e ao dinheiro.
Cresci com trauma dessas palavras e de beijos em geral. Por isso, jurei
que nunca iria dizer a frase “eu te amo” para ninguém. Se eu falasse, seria
igual a ela, inescrupulosa e desumana. Também jurei nunca receber nenhum
NÃO em minha vida.
Samantha me fez cair de joelhos por ela como nunca o fiz por nenhuma
mulher. Sua bondade, tenacidade, sinceridade, sua glória e seu esplendor me
conquistaram. Ela não teve em nenhum momento medo de me enfrentar,
mesmo sabendo do que eu era capaz. Sua fibra fez com que eu me
apaixonasse por ela a ponto de não querer e não poder viver sem sua
presença.
Saí da minha casa e fiquei vagando pelas ruas de Manhattan, sem rumo
e sem destino. Precisava esfriar a cabeça para não fazer besteira e me
arrepender depois, além de buscar uma solução para o meu problema.
Jordan e Ryan foram comigo; não queriam me deixar sozinho do jeito que eu
estava. Certamente estavam com medo de eu ter um surto em algum lugar da
cidade.
— Aonde estamos indo? — perguntou Jordan do banco de trás do meu
Porsche preto.
— Precisamos falar sobre isso, Lucky — Ryan resmungou ao meu lado.
— Você não pode deixá-la só porque ela vai adotar o menino.
— Ou vocês calam a maldita boca, ou saem do meu carro — rosnei,
apertando minhas mãos no volante para controlar a raiva, não deles, mas de
mim mesmo por ser um egoísta tomado por merdas fodidas do meu passado.
Ouvi os suspiros exasperados dos dois, mas eles ficaram quietos e me
deixaram em paz. Eu poderia demitir Jordan da minha empresa, já que ele
trabalhava para mim, mas nunca faria isso, mesmo que agora me sentisse
como um lixo. Ele e Jason eram os meus melhores amigos.
Entrei em South Street Seaport, onde ficava o píer 17 e o iate Fênix e a
pequena lancha Schaefer 620. Era aquela lancha que eu queria, porque era
veloz, e eu precisava de velocidade.
Saí do carro quase correndo. Por sorte, eu tinha as cópias das chaves
dos meus barcos. Minha lancha tinha uma listra alaranjada, parecida com a
cor brilhante de uma fênix. Gostava desse pássaro, porque me sentia como
ele. Eu morri e nasci de novo, por isso a tatuei em minhas costas, para ter o
lembrete de como estava prestes a virar cinzas se Miguel não tivesse me
encontrado havia 22 anos. A Sam também tinha a tatuagem da fênix abaixo
do seu umbigo perfeito e descendo até mais embaixo, onde eu queria estar,
mas, pelo visto, isso não iria acontecer tão cedo.
Pulei na lancha e a liguei, acelerando para sair dali logo. Nem notei se
via o João, o piloto que tomava conta de meus barcos. Era ele quem pilotava
os barcos quando saíamos. Entretanto, naquele momento, eu precisava e
queria estar sozinho, sem ninguém azucrinando a minha cabeça.
Voei com a lancha, deixando Jordan e Ryan gritando no píer. Não me
importei, apenas queria correr e deixar a minha mente livre como o vento.
Só assim a dor não me tocaria, como a cadela que ela era, embora de todo
jeito estivesse me perseguindo como uma doença crônica.
— Droga, Lucky! Você não pode pilotar desse jeito! — ainda consegui
ouvir o grito exasperado do Ryan.
Eu não queria voltar e lidar com a dor que estava me esmagando de
dentro para fora, como um câncer sem cura, mas, ao invés de matar só a
matéria, esse estava matando a minha alma.
Naveguei por horas pelo Hudson e o mar à frente, sem ter hora de
voltar para casa, mas estava escurecendo, assim como a minha vida. Podia
ver o alaranjado do Sol se pondo no horizonte.
Jordan e Ryan ainda estavam no píer esperando por mim, furiosos por
eu os ter deixado para trás. Seguiram-me porque quiseram, eu não havia
pedido que viessem comigo.
Deixei a lancha no píer. O João não estava muito longe dali, mas não
parei para falar com ele. Sentia-me totalmente entorpecido.
Ryan me fuzilava com os olhos.
— Vejo que voltou — rosnou. — Sabe quantas reuniões perdi por ficar
aqui esperando você?
Ignorei-o e saí do píer, indo em direção ao meu carro estacionado ao
meio-fio. Pude ver os dois me seguindo e entrando no carro comigo. Segui
adiante, mas para onde? Eu não sabia, como também não queria saber do
meu destino ou da minha perda.
Pensei no passeio de lancha que havia feito, imaginei o ar puro e com
cheiro almiscarado do vento, tão puro e suave, banhando o meu rosto. Eu
queria ser normal e menos complicado para fazer Sam feliz.
Pensei e repensei, mas a única conclusão a que cheguei foi que eu não
era homem suficiente para fazer Samantha feliz como ela merecia. Percebia
isso por tudo que eu tinha feito a ela e a dor que lhe causava desde o dia em
que a conheci. Como fui capaz de machucar a única mulher que já amara em
toda a minha vida? A única que me fazia sentir vivo como nunca tinha
sentido antes? Eu era um monstro que deveria ser destruído por ousar tocar
naquele anjo perfeito.
Foi só quando a beijei no sofá da minha sala que pude sentir que Sam
também me amava, embora ela não tivesse dito nada a mim, mas senti em
cada toque e em cada beijo que trocamos.
Eu iria sofrer a ponto de quase morrer por me afastar, e ela também, por
me amar, mas era o certo a se fazer. Ela merecia alguém melhor do que um
homem que sempre a machucava.
— Em vez de ficarmos perambulando pela cidade como doidos... —
Jordan resmungou — por que não vamos ao meu apartamento?
Respirei fundo, mas meus pulmões doeram como se eu estivesse me
afogando. Talvez eles estivessem com defeito, assim como eu, por ter
nascido nesse mundo.
Não respondi, apenas dirigi para seu apartamento, que ficava na
cobertura do Lux. O hotel era do Jordan e não ficava muito longe de onde eu
morava, quase um de frente para o outro.
O pai de Jordan era um cantor famoso de rock, James Johnson, da
banda Clave. Ele comprou aquele hotel e o deu ao filho de presente de
aniversário de 22 anos, embora, com o dinheiro que Jordan ganhava por
fechar vários negócios para mim, com certeza compraria vários hotéis como
aquele. O cara tinha a conta recheada, me disse que estava investindo em
redes de hotéis, um ramo muito bom de investimento.
As paredes da sala eram cor de palha, e os vidros das janelas traziam
luz ao ambiente, fazendo-o mais aconchegante. A sala era bem-decorada e
organizada, com dois sofás marrons com almofadas coloridas, uma imensa
estante avermelhada que dava ao ambiente um ar sofisticado. Entre os sofás
e a estante ficava a mesinha de vidro de centro, e um tapete persa forrava o
chão.
O apartamento do Jordan era muito bem organizado e sem nenhum sinal
de coisas fora do lugar. As cortinas estavam puxadas para o canto das
imensas janelas. Ele tinha esse hábito de deixar tudo arrumado. Se não fosse
por ele ser um mulherengo, daria para ser um monge.
Eu sabia que Jordan não trazia nenhuma mulher para seu apartamento,
assim como eu nunca tinha levado nenhuma para a minha casa, nem
pretendia, porque a única que desejava e queria era a minha Rosa Vermelha.
Nós quatro fizemos uma promessa, Ryan, Jordan, Jason e eu, de não estragar
nossos lares trazendo uma foda qualquer para dentro deles.
Na parede à direita da estante, tinha um grande quadro de dois lobos
brancos rugindo um para o outro. Pensar em lobos de olhos azuis me fazia
pensar em Samantha, e a dor voltou mil vezes pior, como um tsunami sobre
mim. Ignorei-a e fui à imensa adega. Peguei uma garrafa de uísque, segui
para a varanda e me sentei em uma espreguiçadeira branca que ficava ali.
Apenas queria que a dor passasse ou que um meteoro caísse sobre mim,
porque eu não queria ficar como um invólucro vazio e sem vida na Terra. Se
fosse para isso acontecer, era melhor estar morto de uma vez.
Já eram quase 11h da noite. Fiquei olhando para o meu edifício
enquanto bebia. Dali dava para ver o meu prédio, e notei que todas as luzes
estavam apagadas, menos a do meu quarto. Sam estava lá, talvez esperando
por mim. Céus, o que eu faria? Eu precisava deixá-la para o seu bem, mas
doía tanto!
— Droga, Lucky, fala alguma coisa com a gente! — resmungou Ryan,
parando perto da imensa porta de vidro que dava para a varanda.
— Eu não quero pensar nem falar, apenas beber e fazer essa dor
passar... — Suspirei desalentado.
Ele deu um suspiro exasperado.
— Eu sei que você tem essa mania de pensar mal de si mesmo, pensar
que você não é bom o suficiente para educar uma criança, mas não se
esqueça de que foi você que terminou de nos criar. — A voz de Ryan era
séria, mas eu a senti se rachando no final. — E fez isso muito bem.
Quando os pais dele e de Rayla morreram, tomei conta dos dois. Sabia
que fiz um bom trabalho em educá-los, mas ter um filho era diferente, uma
responsabilidade que, só em pensar, estava me corroendo por dentro, como
um maldito verme que come tudo que vê. Era uma dor que não queria cessar
de nenhuma forma. Beber era a única forma de esquecer a dor e tudo que
estava acontecendo em minha vida miserável. Ou pelo menos tentar
esquecer, mas não acreditava que fosse possível.
Jordan e Ryan me deixaram sozinho com a garrafa de uísque.
Que sofrimento era esse que estava me consumindo por dentro?

Já eram 5h da manhã, e eu não tinha pregado os olhos um segundo, mas


cheguei à conclusão de que iria lutar pela Sam, mesmo que isso me fizesse
ser o pai de Shaw. Eu iria falar com ela e dizer que aceitava os dois em
minha vida e que a queria para sempre. O que não poderia suportar era vê-la
chorando, pois percebia, pelas luzes acesas do meu quarto, que ela ficara até
1h da manhã acordada, eu apostava que esperando por mim.
Naquele dia, depois do trabalho, eu iria falar com a Sam. Assim teria
mais tempo para arrumar a minha cara mal dormida e curar a ressaca. Até
parecia que eu havia passado a noite em uma festa ou fodendo alguém. Quase
ri disso, bem, se eu conseguisse rir de novo. Eu não queria transar por aí e
não ia ficar com qualquer mulher aleatória, apenas queria a minha Rosa
Vermelha. Sam estava em cada gota do meu sangue e em cada célula de meu
corpo. Ela era o ar que eu respirava dia e noite. Sem ela, eu não era nada,
não era ninguém, apenas um corpo caminhando sem vida.
Cheguei entorpecido ao meu trabalho. Devia ter ido para casa e pedido,
ou melhor, suplicado seu perdão por deixá-la sozinha todo o dia e a noite
anterior. Eu esperava que ela ainda me quisesse, porque, senão... não sabia o
que aconteceria comigo.
A nova assistente que contratei pulou assim que cheguei ao meu
escritório. A anterior, Nancy, havia se mudado de cidade. A nova secretária
era morena e bonita. Se eu não tivesse sido domado por uma mulher linda,
que me enfeitiçara de corpo e alma, provavelmente teria transado com ela.
Porém, isso estava fora de questão. Samantha Gray tinha me inutilizado para
todas as mulheres. Só em pensar em outra, eu me sentia enojado e com asco
de mim mesmo.
— Bom dia, senhor Donovan. Quer remarcar suas reuniões que foram
canceladas? — A sua voz mostrava bastante eficiência.
Não respondi. Passei por ela sem olhar para trás e abri a porta do
escritório, falando sem me virar:
— Eu não quero ser incomodado por ninguém. — Minha voz era fria e
hostil. Aliás, eu me sentia inteiramente frio.
— Mas...
Virei-me com um olhar mortal e gelado. Ela se encolheu onde estava.
— Qual a parte de ninguém que você não ouviu?! — esbravejei. — Se
alguém me incomodar, você estará na rua. — Entrei, deixando-a de olhos
arregalados.
Joguei-me no sofá, olhando para o teto. Ali, no silêncio da minha sala,
os únicos sons que eu ouvia eram o farfalhar do vento batendo na janela e as
batidas doloridas de meu coração quebrado. Ele dava cada fisgada que achei
que estava tendo um infarto fulminante aos 28 anos, mas é claro que não era
isso. A dor que eu sentia parecia estar me triturando por dentro. Era difícil
lutar e acreditar que eu realmente merecia uma segunda chance.
Peguei meu telefone e disquei o número de Simon, que atendeu no
segundo toque.
— Senhor — respondeu.
Precisei resfolegar.
— Onde está Samantha? — Minha voz estava quebradiça como vidro...
ou como eu mesmo.
Ele suspirou.
— Ela entrou no prédio da Ônix há dez minutos, senhor.
— O quê?! — Coloquei-me de pé.
— Sim, senhor. Ela entrou...
Cortei-o:
— Mas aqui ela não chegou.
— Se a senhorita Gray não foi visitar o senhor... — ele pareceu pensar
um pouco e depois prosseguiu — então talvez tenha ido ver a senhorita
Müller.
— Mas o que ela haveria de conversar com a Sasha? — rosnei, saindo
da sala e entrando no elevador rumo ao nono andar.
— A senhorita Müller foi ao apartamento do senhor e disse alguma
coisa para o menino Shaw que a senhorita Gray não gostou muito, porque
ficou furiosa. — Seu tom estava grave.
— Estou quase lá. — Desliguei.
Cheguei ao saguão da Vênus, mas não havia nenhuma criança ali
presente. Eu podia ouvir as vozes vindas da sala da Sasha.
— Então é você. — A voz do Kevin veio de algum lugar lá dentro. —
Ele pode não querer você, mas eu quero. Você parece ser um vulcão na
cama, se demonstrar nela toda essa selvageria.
— Solte-me! — Sam rosnou. — Isso é algo que nunca vai saber!
O meu sangue ferveu ao ouvir o que Kevin disse, tanto que queria matá-
lo, esfolar o desgraçado que estava assediando a minha mulher, a minha
preciosa Rosa Vermelha.
— Talvez eu consiga. — Pelo seu tom, parecia malicioso.
Entrei no escritório da Sasha e olhei para as costas do maldito, que
olhava para Samantha à sua frente.
— Não se você quiser continuar vivendo — sibilei.
Percebi que ele tremeu com a minha ameaça. Isso era bom, porque eu
não estava brincando nem um pouco. Estreitei meus olhos ao ver o estado de
Sasha. Ela estava toda descabelada e com várias manchas vermelhas e
inchadas em seu rosto, sem contar sua camisa, com dois botões abertos, e a
saia rasgada.
— Mas que droga está acontecendo dentro da minha empresa? —
Minha voz era mortalmente fria.
Sasha e Kevin se encolherem com o meu tom, mas, ao olhar para Sam,
percebi que ela estava com raiva, aliás, o sentimento ultrapassava a raiva,
era pura fúria e ódio. Encolhi-me por dentro com o ressentimento e o abismo
nos olhos dela. Senhor! Ela não ia me perdoar por ter fugido por quase 24
horas, como o maldito fodido que eu era. Estava tremendo por dentro com
medo de ela me deixar de vez.
— Já estou de saída da “sua” empresa — avisou com os olhos
fulminantes.
A dor se apossou de mim mil vezes pior do que antes. Foi tão forte que
achei que eu morreria ali mesmo.
— Sam... — tentei falar, mas parecia que tinha algo entalado em minha
garganta.
Ela me ignorou e fulminou a Sasha, que pareceu com medo e foi para
trás da mesa.
— E você nunca mais se aproxime de Shaw — sibilou.
O que Shaw tinha a ver com isso? Simon disse alguma coisa sobre
Sasha ter dito algo a ele que a Sam não gostou, mas parecia algo grave, para
deixá-la furiosa daquele jeito. Eu notava isso pelas roupas rasgadas de
Sasha, seus hematomas e os cabelos despenteados. Parecia que ela havia
levado uma surra.
— Porque, se você se aproximar dele... — continuou Sam com a voz
fria como uma geleira — juro que seu rosto vai ficar tão desfigurado que
nem o CSI vai identificá-la.
Sasha arregalou seus olhos castanho-claros de choque ao ouvir o
veneno na voz da Sam.
— Eu vou dar parte de você na polícia — sibilou Sasha.
Sam não pareceu se intimidar com suas ameaças de denunciá-la, mas é
claro que eu não deixaria isso acontecer com a minha Rosa Vermelha.
Nunca.
— Posso ir para a cadeia, mas você vai desejar nunca ter se metido
comigo — grunhiu ameaçadoramente.
Meu rosto era grave ao olhar sombriamente para Sasha. Quem ela
achava que era para ameaçar a minha mulher? Quase ri desse pensamento.
Eu até podia ter tomado Sam como mulher, mas, ao ver a frieza em seu olhar
para mim pouco tempo antes... eu tinha chegado tarde. Minha vida tinha
acabado de vez.
— Ninguém aqui vai para a cadeia. — Coloquei-me entre as duas, não
me importando com a Sasha, e sim com a minha Rosa Vermelha. Podia ver a
tala em seu braço. Parecia que ela tinha se esquecido de que estava
machucada. — O que está acontecendo aqui, e o que Shaw tem a ver com
isso? — Minha voz estava furiosa.
Sam suspirou.
— Eu já fiz o que tinha de fazer aqui. — O olhar que ela lançou para
Sasha era maligno e frio. — O recado está dado. — Virou-se para ir embora,
mas segurei seu braço, temendo que ela me deixasse de vez.
Eu precisava conversar com ela de algum jeito antes que ela decidisse
me deixar para sempre. Tinha de lhe dizer tudo o que eu sentia, dizer que ela
era tudo na minha vida. Até imploraria se fosse preciso.
— Sam...
Ela se esquivou de meu toque como se fosse veneno. A escuridão
começou a se espalhar por mim, forçando-me a cair em um abismo profundo,
do qual eu jamais poderia voltar à superfície. Perdera-a para sempre, e tudo
por causa do maldito trauma. Eu o havia deixado dominar a minha vida e
afastar a única luz que eu tinha, a única esperança de ser feliz.
Seus olhos também estavam entorpecidos.
— Por favor, se você realmente se importa comigo, não se aproxime de
mim... — Sam respirava de modo irregular e parecia que se esforçava para
não chorar, mas eu podia ver a sua boca trêmula.
Prometi a mim mesmo que nunca a faria chorar de novo se eu pudesse
evitar, mesmo que eu acabasse pagando o preço por isso, pois era melhor eu
sofrer a Samantha.
— Eu vou ficar longe de sua vida e não vou atrapalhar... Eu prometo.
— Segurei toda a minha dor e a guardei para não mostrar a Sam o quanto a
sua partida estava me despedaçando.
Seus lábios estavam trêmulos.
— Obrigada — sussurrou em um resfolegar e saiu quase correndo,
como se eu estivesse infectado por alguma doença contagiosa.
— Senhor, eu... — Kevin parou de falar com o murro que dei em sua
boca, que fez até o sangue descer.
Olhei para ele com uma fúria homicida.
— Se ousar tocar, olhar ou respirar o mesmo ar que Samantha, eu juro
que você vai ser destruído em segundos — sibilei entre dentes, olhando para
ele, que limpava o sangue que escorria da boca.
— Mas foi ela...
Cortei o latido da Sasha com o meu olhar fulminante.
— Isso vale para você também — rosnei. — O aviso foi dado para os
dois.
Voltei para meu escritório dormente, exceto pela dor que irradiava
como o meu sangue bombeando pelas veias. Sentia as trevas se apossando
de mim com tal poder que achei que desmaiaria no elevador. Céus, como
isso doía! Parecia que cada parte de mim estava morrendo aos poucos.
— Senhor... — começou a nova secretária. Nunca me lembrava do
nome dela, mas também não me interessava agora.
— DEIXE-ME EM PAZ! — esbravejei. — Ninguém entra aqui, ou não
verá o dia amanhã!
Entrei em minha sala e caí prostrado no carpete, deixando a dor me
tomar. Eu merecia isso por ser um idiota estúpido e deixar Samantha escapar
de novo. No entanto, dessa vez era para sempre. Eu havia perdido a coisa
mais valiosa que um dia já tivera. Esse buraco que estava sentindo em minha
alma parecia me esfolar vivo e nunca iria passar.
Que dor tremenda era essa, que eu nunca tinha sentido? Por que parecia
que eu estava morrendo e caindo em um abismo, sendo rasgado de dentro
para fora como se houvesse algo em meu interior me destroçando?
Eu sabia que, dali em diante, a minha vida desprezível seria como se eu
estivesse em um purgatório, e iria ser assim enquanto vivesse.
Pela primeira vez em 22 anos, chorei como uma criança e me deixei
cair à deriva em um oceano de dor.
9 – Sobrevivendo
SAM
Acordei cedo para ver se Lucky havia chegado mais tarde e eu talvez
não o tivesse visto chegar, mas, para meu pesadelo, ele não apareceu nem
ligou para dizer onde estava, nem mesmo para dizer que estava bem. Foi
ingratidão de sua parte, deveria pelo menos me dar notícias.
Precisava sair da sua casa antes que ele chegasse. Ele tinha ficado em
outro lugar só porque eu estava ali.
Minha mala rosa de roupas já estava no quarto. Supus que Lucky devia
ter mandado alguém ir buscá-la em minha casa. Desperdício de tempo, já
que eu não ficaria nem mais uma noite ali.
Vesti uma calça jeans skinny e uma blusa branca de alças por causa do
braço que estava com a tala, mas graças aos Céus não doía muito. Isso era
bom, assim eu podia voltar para o trabalho. Saí da casa de Lucky antes que
Shaw acordasse, pois precisava resolver algumas coisas antes de levá-lo
comigo para o apartamento no Brooklin, como por exemplo, a sua adoção.
Fui à Fênix e assinei os papéis que Michael organizara para a guarda
provisória de Shaw. Esperava que em breve pudesse adotá-lo de vez. Eu
nem acreditava que agora ele era meu. Nem por um breve segundo tive
dúvidas em adotar o meu garotinho. Se Lucky me quisesse, teria que aceitar
o Shaw também. A esperança era mínima a esse respeito, eu sabia que ele
não mudaria de ideia nesse caso.
Michael disse que eu me recuperasse antes de voltar ao trabalho.
— Não precisa se preocupar, eu vou ficar bem — tranquilizei-o.
Ele também mencionou que o Lucky ligou e falou que não se
intrometeria mais em meu trabalho. Quando eu soube disso, irritei-me com
Lucky. Quem ele pensava que era para se meter assim em minha vida? No
entanto, sabia que não adiantava confrontá-lo, pois perderia a batalha; era
como nadar e morrer na praia.
Optei por não dizer o que havia acontecido entre mim e Lucky ao
Michael, mas acreditava que ele logo iria saber. Não me importei com isso;
no momento apenas iria curtir Shaw em minha vida, como meu filho.
Informei ao Michael que retornaria ao trabalho na segunda-feira, pois
passaria aquela semana com Shaw. Queria levá-lo ao Central Park para fazer
piqueniques e aproveitar a nossa vida juntos, um novo futuro.
Liguei para Diana para saber se Lucky havia aparecido na empresa. Ela
ficou confusa por eu querer saber dele, mas disse que tinha chegado lá cedo
com cara de quem não dormiu à noite, e o pior, de quem tinha bebido e
farreado. O meu coração sangrou ao ouvir isso. Então ele tinha ido mesmo
procurar diversão com outras mulheres? Por que eu me surpreendia? Afinal,
ele é Lucky Donovan, o cara mais cobiçado da América, pensei amarga.
Como Jordan mesmo mencionara, ele não seria de uma mulher só, ainda mais
tendo de esperar por uma pessoa que não estava pronta. Fui uma completa
idiota por pensar que ele me aguardaria. Entretanto, têm males que vêm para
o bem; talvez não fosse ele o cara que iria me ajudar a superar o medo e meu
passado assombrado. Ainda assim, meu coração não aceitou isso muito bem.
Cheguei à casa do Lucky por volta das 10h da manhã para buscar o
Shaw e irmos embora antes que ele resolvesse voltar para lá, o que eu
acreditava que não faria enquanto eu estivesse lá, por isso iria facilitar as
coisas para ele e sair antes de ser expulsa.
Assim que entrei no apartamento de dois andares, ouvi um grito agudo
de Shaw vindo do andar de cima, provavelmente do quarto onde estava
dormindo. Achei que ele estivesse tendo um pesadelo, mas eram 10h, e ele
sempre acordava cedo. Corri para o segundo andar pulando os degraus de
dois em dois e entrei em seu quarto, que era grande, com cama king size,
lençóis azuis e cortinas de seda, janelas de vidro de cima a baixo, com uma
televisão de LED e um Xbox.
Simon estava à porta, olhando para dentro, mas sem se aproximar. Eu
sabia que esses eram os gritos de Shaw quando não queria ser tocado por
ninguém. Meu menino estava sentado no chão, encolhido perto da cabeceira
da cama, os joelhos dobrados no peito e a cabeça apoiada neles, chorando.
Passei correndo pela porta e me ajoelhei à sua frente.
— Shaw, meu amor! — Toquei seus ombrinhos e alisei seus cabelos
lisos.
Ele levantou a cabeça e seus olhinhos lindos. Lágrimas escorriam pelas
suas bochechas. Aquilo me cortou o coração. Não suportava vê-lo chorando
e tomado de dor, parecia doer no fundo da minha alma. Abraçou-me forte
como se quisesse me manter ali para sempre.
— Eu sinto muito, Sam... — sussurrava sem parar.
— Meu amor, me diz o que houve — pedi suplicante. — Você está me
assustando, Shaw.
Ele respirou fundo e se afastou, olhando meu rosto. Peguei-o, levei-o
para a cama e me sentei ao seu lado.
— Logo quando acordei, fui procurar você, mas não estava. O Simon
me disse que você tinha saído...
Eu o avaliava.
— Sim, eu fui assinar os papéis da sua guarda — declarei. — Por isso
está assim?
Ele sacudiu a cabeça.
— Por que não me disse que Lucky terminou com você porque resolveu
me adotar? — Ele se encolheu.
Meus olhos se arregalaram ao ouvir isso de sua boca.
— O quê? Quem lhe falou isso?
— Não importa. — Expirou. — É verdade?
— É claro que importa! — Peguei seu rostinho pequeno e lindo. —
Prometemos não esconder nada um do outro, lembra?
— Não quero que sofra, Sam... — Sua voz falhou ao me abraçar. —
Talvez fosse melhor...
— Não ouse pensar assim, Shaw! — interrompi-o, com o pânico
tomando conta de mim. — Eu não posso perder você... — Afastei-o para ver
seu rosto. — Nunca pense em me deixar, Shaw... Nunca!
Seus olhos ficaram marejados, ainda mais ao ver as lágrimas descerem
pelo meu rosto.
— Não chore, Sam! — pediu, quase desesperado.
— Então não fale em me deixar... nunca mais.
Ele assentiu.
— Por isso não fui embora sem falar com você. — Sua voz era só um
sussurro. — Mesmo depois de aquela mulher dizer todas aquelas coisas...
— Que mulher? — indaguei sufocada. — E o que ela disse? — Ele
hesitou em me contar. — Shaw, me diga a verdade.
— O Simon a chamou de senhorita Müller.
— O quê?! — gritei, com a raiva se apossando de mim. — O que ela
disse?
Ele se levantou e olhou pela janela.
— Ela disse que eu era um bastardo sem família e que ninguém me
queria por perto, que sou um órfão morto de fome... e que eu estava
atrapalhando seu relacionamento com o Lucky, porque ele nunca ia me
querer... — sua voz era quebradiça como vidro.
— Ela disse isso? — perguntei, os lábios rígidos e dentes trincados.
Segurei a raiva por Sasha tê-lo magoado, mas ela iria pagar por tudo e por
cada lágrima derramada por ele.
— Sim. — Ele limpou as lágrimas com as costas das mãos e me olhou.
— É verdade, não é?
— Shaw, querido. — Cheguei mais perto dele e peguei sua mão. — As
partes feias que ela disse não são verdades. Você não é um bastardo nem
morto de fome. — Peguei seu rosto em minhas mãos e olhei nas suas duas
pedras negras. — Quanto ao Lucky... Ele tem algum trauma de infância.
— Mas então... — Ele não terminou, embora eu sentisse a dor em seu
coraçãozinho.
— Posso gostar do Lucky, Shaw, só que você é mais importante do que
todo mundo. — Além do Bryan, pensei. Os dois eram tudo em minha vida.
Abracei-o e beijei seus cabelos. — Eu amo você, Shaw, mais do que a um
irmãozinho. — Beijei cada bochecha dele molhada pelas lágrimas. — Amo-
o como a um filho, como se tivesse saído de mim. — Afastei-me e olhei para
ele. — Então não se preocupe. Se Lucky não quiser você, é porque não
merece o que eu sinto por ele.
— Mas...
— Um dia, quando for adulto e tiver uma namorada... — interrompi-o
— se ela pedir para você ficar longe de mim, o que você fará?
Ele sacudiu a cabeça com veemência.
— Nunca, Sam! Se ela me amar, terá que aceitar você também. — Sua
voz tinha tanto fervor.
— O mesmo eu digo, meu lindo. — Beijei seu rosto e me afastei. —
Agora vamos embora desta casa, vamos para nossa casa.
Ele sorriu.
— Amo você, Sam, para sempre — sussurrou.
— Também te amo, garotão.
Saí da casa do Lucky sem olhar para trás. Meu coração estava
sangrando por dentro por ficar longe dele, porém não podia ficar com uma
pessoa que não queria o meu filho, porque era isso que Shaw era.
Eu ia pegar um táxi para ir embora para casa, mas Simon disse que me
levaria. Ele tentou me convencer a ficar e esperar o Lucky, dizendo que tudo
ia se acertar entre nós, mas eu não acreditava verdadeiramente nisso. Queria
nunca ter conhecido Lucky, para não estar sofrendo assim por causa dele.
Antes de ir para casa, eu ia acertar as contas com a vadia da Sasha. Ela
ia se arrepender por ter se metido no meu caminho e por ter magoado meu
garotinho.
Pedi ao Simon que me levasse primeiro à empresa do Lucky, dando-lhe
a desculpa de que ia lhe agradecer por me hospedar em sua casa, mas tinha
outra coisa em mente.
Na Vênus, fui direto para o escritório da Sasha, mas Diana entrou no
caminho antes que eu entrasse.
— Sam, o que faz aqui? — perguntou confusa e um pouco preocupada
ao ver meu estado. Minha raiva transpirava pelos poros.
— Sasha está aí?
— Sim, está na sala dela com...
Não ouvi mais nada, entrei sem bater. Arregalei os olhos ao ver a
cadela sentada na mesa e um cara entre suas pernas, beijando seu pescoço.
Sua saia estava suspensa até a cintura. Os dois se afastaram assim que entrei.
O homem se virou e me fitou com raiva a princípio, mas por segundos.
Assim que seu olhar de falcão comeu meu corpo, ele sorriu de modo
libidinoso. A camisa social estava com dois botões abertos, os cabelos
negros e anelados, revoltos, e os olhos castanhos, maliciosos.
Sasha abaixou a saia, e notei que usava uma calcinha vermelha de
renda. Sua camisa também estava aberta como a do homem. Ficou vermelho
escarlate assim que me viu.
— Mas que droga você está fazendo aqui?! — gritou, cerrando os
punhos. — Eu vou...
Parou de falar quando me aproximei e lhe dei uma bofetada que chegou
a virar o seu rosto.
— Sua vagabunda, você vai se arrepender por ter mexido comigo! —
esbravejei.
— Você ficou maluca?! — berrou, segurando sua face, que estava
vermelha.
Peguei seus cabelos e os puxei, dando-lhe uma rasteira e ignorando
seus gritos ao cair ao chão feito uma fruta madura. Sentei-me em seus
quadris; sabia um pouco de luta, que aprendi com Bryan. Dei outra bofetada
em sua cara e lamentei a outra mão não estar boa para poder usá-la também.
— Isso é por ter feito Shaw chorar... — Bati de novo. — E isso é por
ter dito aquelas coisas para ele.
Ela tentava se defender das bofetadas cobrindo o rosto com as mãos,
mas não conseguia.
— O que está esperando, Kevin, para tirar essa doida de cima de mim?!
— rosnou.
Kevin não moveu um dedo, permanecendo de braços cruzados a me
observar espancando-a.
— Eu não acredito que esteja apanhando de uma mulher com um braço
só! — Riu debochado, mas depois me segurou por trás, tirando-me de cima
de Sasha. Eu lutava em seus braços para me libertar e acabar com ela, mas
ele era forte.
— Como pôde dizer aquelas coisas para uma criança?! — gritei, sem
me importar se os outros ouvissem.
Ela se levantou, ajustando a roupa rasgada. Seus cabelos estavam
desgrenhados, e me olhava furiosa.
— Por sua culpa, o Lucky estava inconsolável ontem. — Sorriu como
se tivesse ganhado na loteria. — E você sabe onde ele foi buscar consolo?
Parei de lutar nos braços do Kevin. Ouvir essa informação foi como se
eu levasse um tiro no peito e desfalecesse aos poucos. Então ele foi buscar
consolo nela. Já era difícil descobrir que ele buscou consolo com uma
mulher, mas tinha que ser com ela? Meu mundo desabou.
— Então é você — a voz do Kevin soou bem próximo ao meu ouvido.
— Ele pode não querer você, mas eu quero. Você parece ser um vulcão na
cama, se demonstrar nela toda essa selvageria. — Senti-o me apertar contra
seu corpo. Mandei-o se afastar de mim e fui para longe dele, dizendo-lhe que
nunca iria me ter. Devolveu-me um sorriso irônico. — Talvez eu consiga...
— Não se você quiser continuar vivendo — disse Lucky, irrompendo
na sala.
Kevin, que estava de costas para ele, ficou tão branco como um
fantasma. Tudo aquilo era por medo de Lucky? Era como se ele fosse um
chefe mafioso ou algo do tipo. Para mim, ele não parecia perigoso, apenas
controlador.
Lucky estreitou os olhos para cada um de nós, ainda mais para o estado
de Sasha, que estava toda despenteada e com marcas vermelhas na face, fora
a camisa desabotoada e a saia rasgada.
— Mas que droga está acontecendo dentro da minha empresa? — Seu
tom era baixo, mas frio.
— Já estou de saída da “sua” empresa.
Ele me lançou um olhar entorpecido.
— Sam...
Ignorei-o e apontei o dedo para a cadela. Ela correu para longe e ficou
do outro lado de sua mesa, fugindo como se eu fosse uma cobra. Isso é bom,
assim ela não se mete comigo. Então a alertei para ficar longe do meu
garoto, ou ela ia se arrepender do dia em que nascera. Eu a deixaria
irreconhecível.
Ela ameaçou me denunciar à polícia, mas não fiquei com medo,
respondendo à altura.
— Ninguém aqui vai para a cadeia — interveio Lucky. — O que está
acontecendo aqui, e o que Shaw tem a ver com isso? — Sua voz soou
estranha ao dizer o nome de Shaw, como se estivesse com raiva.
— Eu já fiz o que tinha de fazer aqui. — Olhei malignamente para
Sasha. — O recado está dado.
Virei-me para ir embora, mas Lucky segurou o meu braço são.
— Sam...
Esquivei-me de seu toque como se doesse, e doía mesmo, como se
tivesse veneno em minhas veias, embora eu nunca houvesse sido picada por
algum animal peçonhento. Olhei em seus olhos assustados e confusos.
— Por favor, se você realmente se importa comigo, não se aproxime de
mim... — Respirei fundo, tentando me acalmar e controlar as lágrimas para
não descerem na frente dele.
Lucky resfolegou e assentiu.
— Eu vou ficar longe de sua vida e não vou atrapalhar... Eu prometo.
Assenti com os lábios trêmulos.
— Obrigada. — Saí dali quase correndo, porque a dor estava demais,
tão forte que estava me triturando por dentro.
Vi Diana, mas não podia falar com ela, afinal, queria me manter em pé e
não desmoronar. Talvez fossem ficar os três naquela sala, como em um
ménage, Lucky, Kevin e Sasha.
Quando cheguei ao elevador, desmoronei, escorando-me na parede e
deixei a dor sair como uma avalanche. Por sorte, estava sozinha, mas entrar
no elevador fez com que eu me lembrasse de quando o conheci, e a dor só
aumentou, como se uma onda gigante tivesse se apossado de mim, deixando-
me quebrada e destruída como nunca.
Saí do prédio deixando uma parte de mim. Sabia que nunca mais veria
Lucky de novo e que nunca seria completa novamente, mas precisava lutar
por Shaw, que precisava de mim.

Foi uma semana difícil, para não dizer dolorosa. Voltei para o trabalho
na Fênix. Era para eu voltar apenas na outra semana, como eu mesma tinha
pedido ao Michael, mas precisava manter a minha cabeça em foco, tinha de
trabalhar para não pensar em Lucky.
Michael me perguntou se eu estava bem para trabalhar por causa do
meu braço, e eu lhe respondi que sim. Ele queria saber por que eu estava
triste, embora já desconfiasse, pois foi ele mesmo que me alertou que, se eu
ficasse com Shaw, iria perder o Lucky. Afirmei que não era nada, e ele não
tocou mais no assunto, o que foi bom.
Contei tudo o que tinha acontecido comigo para Diana e Ana, pois as
duas eram minhas amigas, assim como contei ao Bryan tudo o que houve
comigo desde o meu primeiro encontro com Lucky até a nossa despedida na
sala da Sasha – outra coisa em que eu não queria pensar.
— Eu vou matá-lo — foi o que meu irmão me disse.
Demorei uma eternidade para fazê-lo se acalmar e não ir tirar
satisfações com Lucky. Disse-lhe que superei aquele golpe da vida. Bryan
não acreditou que eu o havia esquecido, mas pelo menos não quis mais matá-
lo. Eu tremia só de pensar nessa possibilidade.
Lucky cumpriu sua palavra, como disse que faria, não apareceu em
minha vida ou atrapalhou os meus caminhos. Era como se houvesse
desaparecido.
Apesar de ter prometido a mim mesma nem sequer pensar em Lucky,
quanto mais saber sobre ele, perguntei a Diana como ele estava. Ela me
disse que ficava até tarde da noite em seu escritório e estava mais mal-
humorado do que nunca, como um leão faminto e enfurecido.
Fiz um empréstimo para pagar a dívida com o hospital da Flórida, que
eu havia negociado depois que consegui o serviço na Fênix, e para pagar o
aluguel de minha casa e meus cartões de crédito. Quando fui pagar o aluguel,
que estava atrasado, a Sra. Valência disse que já havia sido quitado e pago
até o final do ano, ou seja, dali a muitos meses. Com o hospital, foi a mesma
coisa. Era muito dinheiro.
Quase caí de costas ao saber que foi Lucky. Só podia ser ele mesmo. A
funcionária do hospital me disse que a dívida tinha sido quitada havia duas
semanas, ou seja, antes de eu ser quase morta pelo pai de Shaw. Resolvi,
então, devolver a ele o dinheiro com que quitara as dívidas.
Depois de uma semana, tirei a tala. Não estava doendo mais. Eu não
gostava de andar de transporte público pela cidade, pois estava sempre
lotado, mas não precisei mais me preocupar com isso, porque, certo dia, dei
de cara com Ryan e seu Porsche prata em frente à minha casa. Ele me disse
que era o meu motorista, já que eu tinha recusado a ajuda de Simon, e disse
que não aceitaria “não” como resposta e que, se eu não aceitasse ir com ele
no carro, iria de ônibus comigo, mas ia ser assediado pelas mulheres, e a
culpada seria eu. Nessa hora, eu ri. Ele era famoso no mundo da moda.
Acabei aceitando a sua carona.
E, quando o Ryan não podia me levar, era a vez do Jordan. Com ele foi
mais engraçado, porque disse que, se eu não aceitasse sua carona em sua
Ferrari prata, iria implorar de joelhos. Eu ia adorar ver isso, mas fiquei com
pena, então aceitei. Entretanto, não era idiota para saber o que estava
acontecendo. Sabia que isso tinha o dedo do Lucky. Ele por certo imaginava
que eu não aceitaria a sua ajuda, por isso mandou seus amigos. Não deixei
que isso amolecesse meu coração quebrado, o qual ele mesmo quebrou.
Coloquei Shaw em uma escola perto de casa. Assim ficaria mais fácil
de eu pegá-lo na hora da saída.

Cheguei ao trabalho na sexta-feira e estranhei que todos me olhassem


como se estivessem com pena de mim.
— Eu sinto muito, Sam — sussurrou Ana.
A princípio, achei que Lucky não tivesse cumprido a sua palavra e
resolvido interferir de novo no meu trabalho.
Franzi o cenho.
— Por que sente muito? — indaguei com a voz estranha e olhei para o
Michael ao lado dela. — Vai me demitir?
Ele piscou.
— Não, mas acho que gostaria de ver isso. — Entregou-me uma revista
de fofoca.
Peguei-a com o cenho franzido, mas logo vi a imagem na capa. Ofeguei.
Era a foto do Lucky com uma mulher loira deslumbrante. Devia ser uma
modelo ou se parecia com uma. O pior era que ali dizia que os dois iriam se
casar. Não reparei no nome da mulher, porque, de repente, o ar nos meus
pulmões ficou preso, impossibilitando-me de respirar. Então Lucky
conseguira uma noiva para se casar apenas para comprar uma empresa
milionária? O que ele não faria pelo poder?
Todos estavam falando comigo, mas eu não conseguia ouvir nada,
apenas queria desaparecer. Tranquei-me no banheiro e deixei as lágrimas
caírem pelo rosto. Como ele podia ter ficado com a Sasha e agora se casar
com outra mulher? Ele realmente não se importava comigo e não tinha
sentimentos verdadeiros? Lembrei-me de ele dizendo que não se casaria com
ninguém, apenas comigo, mas, pelo visto, era uma mentira.
Meu coração sangrava fundo por não ter como competir com a noiva de
Lucky. Ela com certeza nunca teria filhos para não estragar seu corpo de
modelo, então ele não teria que se preocupar com isso. Comigo, ele teria um
fardo, Shaw e meus outros filhos, que eu queria ter um dia. Queria ter uma
casa com cerca branca e uma varanda enorme para me sentar e olhar meus
filhos brincando no jardim e agradecer a Deus por tê-los em minha vida, mas
Lucky não era o candidato para ser o pai dos meus filhos, jamais faria isso
por mim. Aquela mulher seria uma esposa troféu que não o julgaria pelos
seus erros nem cobraria nada dele, diferente do que seria se ele estivesse
comigo.
— Sam, eu sinto muito — sussurrou Ana assim que saí da cabine do
banheiro. Meus olhos estavam inchados, e o branco ao redor do azul estava
vermelho. — Michael deu o dia de folga para você.
Sacudi a cabeça.
— Vou ficar bem, Ana, e não preciso de um dia de folga. — Alisei
meus cabelos negros para ajeitá-los. — Eu não vou ficar cabisbaixa por
causa de um homem.
Seus olhos estavam tristes.
— Não achei que estivesse se apaixonando por ele — murmurou. — Se
soubesse, jamais teria sugerido que você o beijasse naquele dia no Rave.
Tentei não pensar naquele beijo e no que o seu toque causava em meu
corpo. Não podia pensar nele agora, que pertencia a outra.
— Não é sua culpa, mas eu vou esquecê-lo e tirá-lo do meu sistema. —
Suspirei. — Mesmo se Lucky não fosse se casar, eu não o teria perdoado por
ter ficado com Sasha.
— Ela é realmente uma vagabunda — concordou. — Olha, o que acha
de irmos para o Rave hoje? Talvez lá você possa encontrar alguém...
Eu não era dessas mulheres que ficavam com um cara para esquecer
outro, mas ela tinha razão. Eu precisava disso, precisava tirar Lucky do meu
sistema e da minha vida por inteiro.
Marcamos de nos encontrar no clube Rave. Deixei Shaw com a minha
vizinha, pois talvez viesse a ficar fora até tarde da noite e quem sabe
encontrasse alguém que fizesse o meu coração bater mais forte, assim como
Lucky fazia. Não, eu não podia pensar em amor, seria apenas sexo. Sempre
sonhara em me entregar por amor, mas a vida não era como queríamos, não
era tão perfeita como um conto de fadas. Talvez, quando eu ficasse com
alguém, esqueceria e tiraria o Lucky da minha pele e do meu coração.
10 - Clube Rave
SAM
A boate estava lotada, mas não liguei muito, apenas passeei os olhos à
procura de Diana e Ana. Para minha surpresa, as duas estavam sentadas na
cabine VIP com Ryan, Jordan e Rayla. Por um momento, meu coração gelou
ao imaginar ver Lucky ali também, mas ele não estava. Agora que estava
noivo, deveria estar com a noiva, não a deixaria para vir ali. Tranquei todos
os meus pensamentos e fui até eles.
Todos se impressionaram quando me viram chegando.
— Minha nossa! Você está deslumbrante nesse vestido! — Jordan
varreu os olhos sobre o meu corpo.
O vestido era vermelho, tomara que caia, de seda e com pedrinhas de
lantejoulas brilhantes na parte dos seios, seguindo até o meio das coxas,
deixando parte delas à mostra. Estava com sandálias gladiadoras de sete
centímetros, pretas. Meus cabelos caíam sobre as costas, formando uma
cascata de ondas negras.
— Obrigada. — Olhei para os dois.
— Por que se produzir assim? — Ryan gesticulou para o meu corpo.
— A Sam veio aqui hoje para encontrar um cara que a leve para a cama
— disse Diana, com uma piscadela para mim.
Todos os três ofegaram, menos Ana e Diana.
— Você o quê?! — Ryan quase gritou.
— Mas você é virgem! — Jordan sacudiu a cabeça.
— Não por muito tempo — declarou Diana.
— Não pode fazer isso com meu irmão — pediu Rayla.
Ri sem humor.
— Não posso fazer isso com ele? — Meu tom era amargo ao falar
olhando para cada um ali. — Foi ele que resolveu se casar com outra.
Ela me contestou:
— Ele não vai se casar com ninguém. — Sua voz parecia esperançosa.
— Eu vi uma foto em uma revista, dele com uma loira peituda. —
Tentei não deixar a dor transparecer na minha voz.
— Foi o Kevin que fez aquilo e quase perdeu o emprego ou teve a sua
cabeça na forca — declarou Ryan com um olhar sério. — Não Lucky.
Arregalei os olhos.
— Ele não vai se casar? — perguntei com alguma esperança.
— Não. Falei para ele ligar para você e explicar — rosnou Ryan. —
Aquele idiota!
Dei um suspiro desalentado.
— Se ele não disse nada, é porque quer que eu pense que vai se casar,
mas agora isso não importa mais. — Respirei fundo, com meus olhos
querendo marejar. — Ele ficou com alguém além de mim, e nunca vou
perdoá-lo.
Ryan me olhou como se eu fosse louca.
— Lucky não ficou com ninguém desde que conheceu você — falou
com convicção.
— Ficou, sim...
— E quem é essa mulher com quem você acha que ele ficou? —
replicou Rayla com os olhos estreitos.
— Sasha...
Ryan riu, cético.
— Você só pode estar brincando! — zombou ele. — Nem se ele não
amasse você, ele ficaria com Sasha. Nunca ficou.
Olhei para ele, incrédula.
— Eu tenho cara de que estou brincando? Ele ficou com ela, sim, e isso
eu jamais vou perdoar. — Afastei uma lágrima, zangada.
— Sam... — começou Rayla.
— Não quero falar disso com vocês. — Peguei a bebida do Jordan e a
tomei em um gole para criar coragem. O líquido desceu rasgando e
queimando minha garganta. — Agora vou procurar alguém que queira ficar
comigo a noite inteira e que me faça esquecê-lo.
— Lucky realmente ama você — Jordan me disse com um tom triste.
Ri com desdém.
— Quem ama uma pessoa não faz o que ele fez. Ele poderia ter vindo
me esclarecer sobre a foto na revista e também não deveria ter ficado com
aquela... — Trinquei os dentes. — Mas se ele realmente gosta de mim como
vocês estão dizendo, vai sentir tudo que eu senti quando soube que ficou com
a Sasha! — Inspirei fundo para me controlar. — Agora vou caçar um cara
que esteja disposto a me fazer esquecer tudo esta noite.
Saí da sala VIP antes que falassem algo mais sobre Lucky. Seus irmãos
disseram que ele não ficou com Sasha, mas eu não acreditava nisso, porque
nem esclarecer sobre a matéria da revista ele quis.
Ryan e Rayla me chamaram, implorando-me para não fazer aquilo, mas
os ignorei.
Cheguei à pista de dança e me deparei com Alex indo até a sala VIP. Eu
soube que ele e Rayla voltaram a namorar e fiquei feliz que os dois
estivessem bem e felizes. Alex era carta fora do baralho para mim, mas,
mesmo que estivesse solteiro, eu não ficaria com ele; queria alguém
estranho, alguém que eu não conhecesse e que não veria no dia seguinte.
— Oh, Sam, que surpresa! — Ele olhou para o meu corpo e piscou. —
Você está perfeitamente sexy!
— Não deixe Rayla ouvir isso. — Sorri, mas logo fiquei séria. —
Conhece algum rapaz decente que esteja disposto a ficar comigo hoje e que
não tenha envolvimento com drogas ou coisa do tipo?
Ele arregalou os olhos, ultrajado.
— Está querendo se vingar de Lucky, não é? Mas Rayla disse que ele
não está noivo e que...
Interrompi-o:
— Mas ele ficou com alguém antes e agora vai pagar.
— Sam...
— Vai me ajudar ou não? — Suspirei.
Ele também suspirou, coçou a cabeça e olhou por sobre o meu ombro
para Rayla.
— Tudo bem, mas antes me diz uma coisa. — Voltou seus olhos para
mim. — Você ainda é...
Encolhi os ombros, entendendo o que quis dizer.
— Por que isso importa? — reclamei.
Ele sacudiu a cabeça.
— Pelo visto, ainda é. Olha em volta e vê se acha alguém agradável e
atraente que lhe interesse.
— Hummm... — Fiz o que ele mandou.
Vi um cara magro e com óculos de grau, mas ele tinha cara de que não
ficaria comigo a não ser se nos casássemos antes. Outro cara estava
conversando com uma garota morena. Seu corpo era coberto de tatuagens, e
seus cabelos, loiros. Não deu para ver os olhos, pois estava de lado para
mim. O outro cara que estava ao seu lado também estava flertando com a
moça morena. Tinha cabelos ruivos e também era tatuado. Ou seja: bad boys.
Pelo visto, gostavam de sexo a três.
— Acho que você não está pronta para os irmãos da banda King. —
Ryan bufou, revirando os olhos. — Os dois só fazem ménage.
Estremeci. Não sabia se estava pronta para um cara, quanto mais para
dois.
Depois de alguns minutos procurando, avistei um homem sentado ao
bar. Estava de perfil, mas consegui vê-lo direito. Tinha uma tatuagem que
saía de sua camiseta branca pela gola, tomando parte do pescoço e o braço
direito. Seus cabelos eram castanho-claros e curtos, mas com mexas caindo
em cima dos olhos, cuja cor, àquela distância, não consegui discernir.
— Quem é ele? — perguntei curiosa.
— Hummm! — Seu olhar se voltou ao cara para quem apontei com o
queixo. — Jason. Acho que pode rolar algo com ele, já que não fica sério
com ninguém, mas é isso que você quer, não é? — Olhou-me de lado cheio
de significado. Não entendi, mas deixei passar. — Vai lá e chega nele.
Assenti, fui até o bar, sentei-me ao lado do Jason e olhei para o barman.
Não era o garoto daquele dia, e sim um cara mais velho, forte, musculoso e
bonito. Contudo, eu já tinha o meu tipo, que estava em algum lugar daquela
cidade.
— O que deseja? — Seu tom era malicioso ao me olhar.
— O mais forte que você tiver aí. — De repente, senti-me nervosa com
o que eu pretendia fazer. Por que as minhas mãos estavam suando frio?
Coloquei-as sobre o colo e as apertei.
Jason me olhou de soslaio. Notei que seus olhos eram cor de chocolate
e combinavam bem com as maçãs do rosto e a barba por fazer. Era forte e
musculoso. Eu podia ver a tatuagem mais de perto, parecia ser um pássaro.
Não era uma fênix, e sim outro animal, mas eu não fazia ideia de qual era. Ri
nervosa, desviando o olhar de seu corpo sarado. Por que eu não podia
simplesmente flertar igual fazia com Lucky? Com ele parecia tão fácil como
respirar.
O barman sorriu com seus dentes brancos e retos.
— Qual a bebida mais forte que já tomou?
Abaixei os ombros.
— Champanhe. — Nem contei com a bebida que peguei do Jordan logo
que cheguei, afinal, nem sabia o que era. Olhei para ele. — Mas ela não vai
me ajudar com o que eu preciso fazer agora. Preciso de algo forte e que me
dê coragem. Tenho 24 anos, a propósito.
Ele piscou, mas não pediu a minha identidade.
— Temos vodca com Martini. É bastante forte — disse e começou a
fazer a bebida para mim.
— Por que você precisa de coragem? — Jason me olhou de lado,
balançando sua bebida âmbar com a mão direita. A sua tatuagem seguia pelo
seu braço direito até a mão, e a asa parecia a de um falcão. Apenas dava
para ver uma parte dela; a outra devia estar no peito musculoso ou nas
costas.
Sorri nervosa, desviando-me de seus braços fortes, e fitei seus olhos.
— Porque preciso ir para a cama com você hoje à noite — fui direta,
embora corasse.
Ele piscou atônito e depois sorriu. Notei que tinha um piercing na
língua. Como seria beijá-lo com aquilo? Droga, por que eu não sentia nada?
Eu devia bater em minha cara.
— Oh, é muito reconfortante saber que você precisa de uma bebida
forte para ir para a cama comigo. — Seu tom era como se eu o tivesse
insultado, mas tinha um esboço de sorriso naqueles lábios carnudos.
— De-desculpe-me, é que não faço isso... Estou nervosa. —
Engasgava-me ao falar. Por que com Lucky eu não gaguejava ou mesmo
hesitava?
— Por que está fazendo isso? — Jason me avaliou enquanto bebia um
pouco de sua bebida.
Pisquei perplexa.
— O quê?
— Por que quer ir para a cama comigo se não está pronta? Não parece
ser por fama.
Corei mais intensamente.
— Preciso de um motivo para fazer isso? — retruquei, em seguida
arregalei os olhos. — Você disse fama? Por acaso você faz parte de uma
banda de rock famosa?
Ele riu sacudindo a cabeça. Sua risada era rouca e gostosa.
— Parece que você não vê muita televisão, estou certo? — observou,
revirando os olhos.
— Não vejo muito, mas não importa o que você é, não quero sua fama,
quero... — Queria que a dor passasse logo, que deixasse o meu corpo e a
minha alma quebrada.
Ele estreitou os olhos.
— Você não está pronta para isso. — Bebeu outro gole do drinque. —
Não sou o homem certo para ser o seu primeiro.
Engasguei-me, embora não tivesse nada na boca.
— Quem disse que você será o meu primeiro? — repliquei.
— Conheço uma mulher pura quando vejo uma. — Olhou-me de
soslaio. — Você é tão pura que aposto que nunca se tocou, não é?
Abaixei a cabeça, constrangida, porque ele estava certo. Nunca nem
sequer havia me tocado, nunca senti vontade até conhecer o Lucky. Seu toque
acendeu algo dentro de mim que incendiou todas as outras partes que
estavam apagadas, como um vulcão adormecido e que de repente explode.
Mas que droga!
— É por isso que você não quer ficar comigo? — Meu tom era
dolorido, não por ele não me querer, e sim pelo Lucky ter feito o que fez. Por
que ele tinha que estragar tudo?
Jason colocou a mão na minha coxa, e eu quase teria caído da cadeira
se ele não tivesse me pegado pelo braço.
— Por isso... Se você nem suporta que eu a toque, como pretende ir
para a segunda base? — Suspirou. — Adoraria ser o felizardo, mas sei que
não está pronta, não comigo, pelo menos.
Meu desânimo era forte. Queria tomar todas as bebidas do bar, mesmo
assim não acreditava que conseguiria tirar Lucky de mim. Era como a porra
de uma droga que foi injetada em minhas veias. Como eu podia correr do
toque de um homem como aquele que estava ao meu lado? Sabia a resposta:
porque, com ele, o meu passado vinha à tona junto à dor, o que não acontecia
com Lucky. Eu estava ferrada.
— Quem é o cara? — Jason olhou ao redor à procura de algo ou de
alguém, como se esperasse que a qualquer hora esse homem aparecesse.
— O cara?
— Posso ver a dor e a raiva em seus olhos. — Seu olhar era imperioso.
— Então tenho quase certeza de que você quer fazer isso para se vingar de
algo que ele fez. Não estou certo?
— Você lê pensamentos ou tem visões do futuro? — sussurrei aflita por
ele saber dos meus planos.
Ele riu e tomou outro gole do uísque.
— Não, mas estou certo, não?
Encolhi os ombros, olhando o mármore preto do balcão.
— Não é tanto uma vingança, quero fazer isso para me libertar...
— Como assim?
Eu não sabia se lhe contava essa parte da minha vida ou não, mas, se
não falasse, Jason não ficaria comigo. Talvez, se eu contasse tudo a ele,
pudesse me ajudar a tirar Lucky do meu sistema.
— Eu conheci um cara há algum tempo. O que ele tinha de irritante,
arrogante e egocêntrico também tinha de lindo e atraente. Mas ele é daqueles
que acham que, por ter poder e dinheiro, conseguem tudo o que querem. Se
ele tivesse me chamado para tomar um café ou almoçar, talvez eu tivesse
aceitado. Porém, sabe o que ele fez? — Ri com dureza. — Me chamou para
transar com ele em seu escritório e no meu horário de trabalho. Fiquei
furiosa e o mandei pastar. — Passei as mãos nos meus cabelos num gesto
nervoso. — Eu nem sabia que ele era meu chefe até ser chamada à sua sala e
ele ameaçar me demitir se eu não fosse a um encontro com ele. Mas...
— O que mudou para você se apaixonar por ele? — perguntou, de rabo
de olho.
— Eu sou psicóloga infantil e trabalhava na empresa dele...
— É um excelente trabalho — falou admirado.
— Obrigada. Eu amo o meu trabalho. — Apertei as têmporas, tentando
me controlar. Enfim, contei-lhe tudo o que aconteceu entre mim e aquele
playboy. — No começo, senti raiva, mas depois vi o que ele realmente era,
um cara complicado, mas legal e que se preocupava com os outros. Mas,
nesse último emprego, eu conheci Shaw. — Meu tom era de júbilo ao falar
de meu menininho lindo.
— Shaw? É algum outro cara? — indagou incrédulo.
Sorri com orgulho.
— Sim, ele tem 1,15 m mais ou menos e quase oito anos. — Meu rosto
ficou grave. — Ele viu sua mãe sendo morta pelo próprio pai. — Estremeci.
— Apeguei-me a ele, sabe? Tanto que resolvi adotá-lo.
— Um gesto nobre de sua parte. — Ele simpatizou com minha decisão.
Respirei fundo.
— Nem todos pensam assim. — Minha voz soou como um resmungo
dolorido. — Pouco tempo atrás, esse cara me salvou de ser morta pelo pai
de Shaw, e, a partir daí...
— Tudo mudou para você, não é? — terminou ele.
— Sim. Também entendi seus sentimentos por mim, soube o que ele
verdadeiramente sentia. — Afastei uma lágrima zangada. — Mas, quando eu
lhe disse que ia adotar o Shaw, ele não aceitou muito bem a notícia e foi
buscar consolo com outra pessoa.
— Ele ficou com outra mulher? — Seu tom estava irritado.
— Sim. — Resfoleguei. — Isso é algo que nunca vou perdoar.
— Por isso veio até mim? Para se vingar? — Não era bem uma
pergunta.
Dei um suspiro desalentado.
— A princípio, sim, mas também para esquecê-lo e tirá-lo de dentro de
mim. — Limpei as lágrimas. — Achei que ir para a cama com um cara
aleatório poderia me ajudar a esquecê-lo.
Ele riu.
— Isso não ajudará — disse com delicadeza, mas o senti encolhido,
como se soubesse por experiência própria do que estava falando. — Só por
alguns minutos, depois a dor volta com força.
— Eu sei — murmurei, então sorri para ele. — Você faz isso com todas
as mulheres que chegam a você? Porque, se for assim, a sua lista de
encontros deve ser um tanto precária.
— Você é diferente! — Olhou-me com um sorriso libidinoso. — Mas
você ficaria surpresa com a lista de mulheres que tive.
Tentei ver a sala VIP em que os amigos de Lucky estavam, mas não
consegui. Em vez disso, vi o próprio Lucky vindo em minha direção com um
olhar assassino, pronto para matar qualquer um que chegasse perto dele... e
de mim.
— Jason...
— Como sabe meu nome, já que não me conhece e eu não o disse a
você? — Sua testa se vincou.
— Alex me disse...
— Bastardo do Alex... — xingou baixinho.
Franzi o cenho.
— O que tem ele?
— Ele sabia que eu não ficaria com você.
— Por que não? — sondei, sentindo um baque em minha autoestima. —
É algo comigo?
Olhou-me ultrajado.
— Não, você é perfeita! O sonho de todos os homens. — Piscou para
mim.
— Então...
Suspirou, passando as mãos em seus cabelos.
— Eu só pego mulheres de uma noite e sem compromisso, e isso não
inclui virgens.
— Você já se apaixonou antes, não foi? E ela era virgem, não era? Por
isso que você não fica com mulheres puras.
Ele arregalou os olhos.
— Como sabe sobre isso? — Seu suspiro foi de dor. — Nunca contei
isso a ninguém.
— Simples, sou psicóloga, se esqueceu? Entendo o que faz as pessoas
fugirem de algum tipo de situação que vivenciaram e lhes trouxe cicatrizes.
Elas fazem de tudo para a mente não voltar ao passado.
Jason encolheu os ombros, olhando a sua bebida como se quisesse
decifrar os enigmas do Universo ou apenas voltar ao passado. Quem poderia
saber?
— Eu tinha 17 anos quando a conheci, a mesma idade que ela, mas era
tão diferente, sabe? Doce e meiga! A mulher mais perfeita que já conheci em
minha vida. — Ele me deu um sorriso triste.
— Por que não estão juntos se ainda gosta dela? — sondei curiosa.
— Era seu aniversário naquele dia e também fazia um ano que
estávamos juntos. Preparei um encontro no meu chalé no Texas. Tudo foi
perfeito naquela noite... Mas, depois da nossa noite juntos... — ele
resfolegou e pegou a minha bebida intocada, ingerindo-a também,
possivelmente precisando de mais álcool em seu sistema — ela foi embora
no dia seguinte, como se eu não significasse nada, e nunca mais a vi.
— Eu sinto muito — murmurei.
Ele me olhou, mas com os olhos entorpecidos.
— Em março fez nove anos que ela se tornou tudo para mim, mas, esse
dia, que iríamos comemorar, foi a última vez que a vi. Ela ficou como uma
tatuagem em minha pele, assim como o seu cara está na sua — murmurou. —
Você é daquelas mulheres que um cara quer cuidar e proteger como um
tesouro, assim como eu queria proteger a minha menina.
Sorri para aliviar a tensão, já que não podia tirar sua dor ao perder
aquela garota que ele ainda parecia amar.
— Mas pode não dizer a ele que não quer ficar comigo? — pedi.
— Ele? — Seus olhos lampejaram para o meu rosto.
Olhei na direção do Lucky, que já estava se aproximando de nós. Jason
seguiu o meu olhar e arfou.
— Droga! Não me diga que o tal cara de quem me falou é o Lucky? —
guinchou Jason.
Franzi a testa.
— Sim, por quê? Não me diga que também é daqueles que têm medo do
seu poder? — Minha voz estava amarga com esse fato.
Ele olhava de modo tempestuoso para o Lucky.
— É mais do que isso. — Fez um muxoxo de raiva. — Então você é a
garota? — Levantou-se, fitando na direção do Lucky, que estava cada vez
mais perto. — Eu sou uma besta mesmo. Por que não suspeitei de nada logo
a princípio? Somente o Lucky tem poder suficiente para ameaçar fechar os
caminhos das pessoas.
— Do que está falando? — Levantei-me também e fiquei ao seu lado.
— Eu estou morto — sussurrou.
— Não acredito que esteja com medo dele, com o tanto de músculos
que você tem — ironizei.
Ele riu, mas era uma risada nervosa.
— Eu te protejo — falei, saindo do seu lado e encarando o Lucky, mas
ele já tinha avançado e dado um soco na boca de Jason, que cambaleou para
trás, mas encarou o Lucky com um olhar triste.
— Eu vou matar você! — esbravejou Lucky.
Coloquei-me na frente dele e segurei a sua camisa branca. Empurrei-o
para trás para não bater mais em Jason. Céus, primeiro Alex, e agora Jason?
Aquele cara era uma máquina de bater nas pessoas.
— Que droga está fazendo, Lucky?! — vociferei.
— Eu posso explicar, cara — começou Jason, alisando a boca com a
mão. Vi um corte ali. — Eu não sabia quem ela era até agora.
Olhei para o Jason ainda segurando a camisa de Lucky para ele não
socá-lo de novo.
— Vocês se conhecem? — Minha voz soou aguda.
Lucky arfava, colérico.
— Você ia transar com um dos meus melhores amigos?! — cuspiu as
palavras como se houvesse um gosto amargo em sua boca.
— Amigo? — Afastei-me dele e fitei Jason com olhos arregalados. —
Eu nunca vi você com os outros.
— Eu estava viajando e cheguei hoje — esclareceu.
— E, se eu não tivesse vindo aqui, você ia transar com ela em algum
lugar por aí. — Lucky fuzilava Jason, que cruzou os braços.
— Ela não é dessas que a gente fode em um banheiro qualquer —
replicou com dureza.
Lucky me observou enervado.
— Eu também achava isso. — Sua voz era de desdém.
Isso me irritou.
— Olha aqui, seu bastardo idiota, eu tenho todo o direito de transar
com quem eu quiser, e você não tem moral para me julgar. — Cutucava seu
peito com raiva. — E, para sua informação, o Jason não aceitou ficar
comigo.
Lucky fitou o amigo, surpreso.
— Não?
Jason estreitou os olhos.
— Como eu disse, ela não é dessas garotas. É mais como uma joia para
guardar e proteger como um bem precioso.
— Você não quis, Jason, mas garanto que deve ter alguém aqui neste
lugar que vai querer ficar comigo! — Fuzilei Lucky.
Ele me fitava com os olhos tenebrosos.
— Não se você quiser ter Shaw em sua vida...
Meu corpo tremeu de medo.
— O que quer dizer com isso? — indaguei sufocada.
Seus olhos eram fendas afiadas nos meus.
— Quero dizer que, se você não for comigo agora, amanhã o juiz vai
revogar a guarda dele — falou convicto.
— Você não pode fazer isso... — Minha voz era um sussurro de dor.
— É claro que posso. — Seu tom deixava bem claro isso. Pegou meu
braço. — Agora vem comigo. — Olhou sombrio para o amigo. — Depois
vamos conversar.
— Pode apostar que sim — rosnou Jason. — E, se você fez o que ela
disse, eu mesmo vou acertar as contas com você.
Lucky o ignorou e me puxou. Não lutei contra ele, afinal, de que
adiantaria isso se, no final, ele podia fazer o que quisesse? Ele tinha poder e
capacidade de tirar Shaw de mim. Isso não poderia acontecer nunca.
Não vi ninguém na saída da boate, mas também não reparei em nada, já
que estava controlando a raiva para não fazer besteira e estragar as coisas
ainda mais, permitindo que Lucky destruísse o que sobrou da minha vida.
Chegamos ao seu carro, um Aston Martin Vanquish preto, mas não era
Simon que o dirigia, e sim ele mesmo.
— Entra. — Apontou para a porta aberta.
Fiquei com vontade de bater naquela face linda que tanto queria tocar,
mesmo se fosse através de uma bofetada, mas me contive e entrei calada.
Durante a maior parte do caminho, ficamos em silêncio. Suas mãos
apertavam com força o volante.
— Você ia transar com ele? — Lucky perguntou de repente, e
resfolegou como se a mera ideia o ferisse.
Ignorei-o e continuei olhando as ruas de Manhattan passarem por nós.
Meus olhos estavam molhados de raiva e dor.
— Sam, responde. — Sua voz estava grave.
— Responder o quê?! Hein, Lucky?! — esbravejei. — Se eu tivesse ido
para a cama com ele, não seria da droga da sua conta! Você me falou quando
foi para a cama com a Sasha?!
— Eu nunca transei com a Sasha. — Estendeu a mão para mim.
Esquivei-me, não querendo seu toque.
— Não foi o que ela disse... — Suspirei.
Ele estacionou, e foi quando notei que não estávamos na minha casa, e
sim em frente ao seu prédio.
— Por que parou aqui? Eu quero ir para a minha casa. — Saí do carro
às pressas. — Se não me levar, eu vou sozinha.
Ele já estava com os braços em minha cintura.
— Rosa Vermelha, por favor, vamos conversar.
— Não me toque! — gritei, esquivando-me dele. Por sorte, não tinha
ninguém na entrada do edifício. — Você tocou nela, mas me disse que ia
esperar! — Eu chorava.
— Rosa Vermelha... — Abraçou-me, ignorando os empurrões. — Não
houve nada entre mim e Sasha, eu juro — sussurrou em meu ouvido em tom
baixo, mas intenso. — Vamos para minha casa conversar. Aí, se você não
acreditar em mim depois disso, prometo que deixo você em paz para sempre
e não vou atrapalhar sua vida. — Afastou-se e me olhou suplicante. — Mas
vamos conversar primeiro.
Assenti, e ele me puxou para entrarmos no imenso saguão do prédio.
Notei bastante movimento lá dentro.
— Por que tem tanta gente aqui? — Olhei o grande cômodo, cheio de
pessoas bem trajadas. Parecia que o alvoroço vinha do salão de festa que
ficava à direita.
— Está tendo a festa de aniversário da filha de um embaixador — ele
me disse.
Isso significava câmeras. Eu precisava sair dali logo, antes de ser vista
com ele e sair em alguma coluna de famosos. Isso não seria nada bom para
eu guardar o meu segredo.
Olhei para ele, vestido com uma camisa social branca Calvin Klein e
calça social de linho preta, mas estava sem gravata e paletó.
— Você estava aqui, na festa...
— Sim, mas Ryan me ligou e disse o que você estava pensando em
fazer, então...
— Então você foi lá para impedir que acontecesse — interrompi-o. —
Você estava aqui sozinho ou com a sua noiva?
Ele suspirou.
— Não tenho noiva. — Franziu o cenho, olhando ao redor, e sua
expressão se tornou sombria quase de imediato. Percebi o que o deixou
assim, foi quando notei que alguns homens me olhavam. Embora meu vestido
não fosse tão refinado para uma reunião como aquela, era bonito e chamativo
de um jeito sedutor e não vulgar.
— Bando de urubus... — Lucky fez um muxoxo de raiva e passou os
braços em meus ombros como se fosse para provar que eu tinha dono.
Até pensei em me esquivar, quando ouvi uma voz feminina chamando-o.
— Lucky, onde você esteve?
Arfei, compreendendo tudo. Ele estava na festa com outra mulher? Não
era a Sasha nem a sua noiva de mentira. Essa era glamourosa, cabelo loiro
encaracolado nas costas, rosto perfeito como o de uma boneca e olhos azuis,
o sonho de todo homem.
Esquivei-me do toque dele e o fitei friamente, embora a dor fosse
evidente em meus olhos.
— Eu não acredito nisso — rosnei. — Pelo jeito, você não perdeu
tempo. Sasha, sua noiva modelo... e agora veio à festa com outra mulher?
— Sam... — Senti dor na sua voz. — Não é o que pensa.
Ri sem humor.
— Não? Eu não deveria me surpreender, afinal, você é Lucky Donovan.
— Meu tom era de desdém; por sorte, eu estava controlada.
— Sam...
A garota chegou até nós e sorriu deslumbrante ao vê-lo, como se
ganhasse um presente de Natal, ou seja, o Lucky. Eu pensava que tinha sido
sortuda por ganhá-lo, mas vi que não. Ela me fitou de cima a baixo, como se
estivesse me avaliando. Notei o seu sorriso triunfante desaparecer, sendo
substituído por uma carranca.
— Olá — cumprimentou num tom calmo, mas detectei que se esforçou
para manter a classe. — Posso roubar o Lucky um pouquinho? Temos que
tirar umas fotos.
Controlei a raiva e mantive a minha expressão estável.
— Imagina. — Olhei para ele, que me fitava preocupado. — Você pode
ir, se não se importar que eu também tire fotos com Jason ou até... — Parei
de falar diante do seu olhar tão sombrio como o de um assassino em série.
— É melhor não terminar. — Seu tom era de congelar o oceano.
Isso me irritou. Quem ele pensava que era? Ele saía com aquelas
mulheres e reclamava por eu pensar em sair com outros? Apesar da raiva, eu
não ia fazer escândalos ali, afinal, não era dessas; bastava o que fizemos na
boate do Alex.
— Quer saber? Para mim, já chega — disse num tom calmo, embora
não me sentisse assim; só eu sabia como estava por dentro. Sentia raiva e
dor, o que não era uma boa mistura. — Estou indo, tive o suficiente por hoje.
— Forcei um sorriso para a garota. — Foi um prazer conhecê-la.
Virei-me para sair dali antes que perdesse o resto do meu autocontrole.
Todavia, não fui muito longe, porque, de repente, a mão de Lucky pegou meu
braço e me puxou para o elevador.
Ele apertou o botão da sua cobertura.
11 - Pedido Especial
SAM
— Solte-me — rosnei assim que estávamos dentro da sua sala.
Lucky me soltou.
— Eu não transei com a Sasha! Você precisa acreditar em mim. —
Pegou minha mão direita e a colocou em sua calça, fazendo-me notar como
ficou duro com o meu toque. — Meu pau não esteve dentro de ninguém desde
que conheci você. Não toquei em mulher alguma, porque só você me
importa.
Prendi o fôlego e expirei, controlando-me.
— A garota lá embaixo? Ela parecia animada por ficar com você. —
Tirei a minha mão de sua calça, e dessa vez ele deixou.
Suspirou e passou as mãos nos cabelos.
— Eu fui lá sozinho e não fiquei muito tempo depois que Ryan ligou,
mas ela me pediu que tirasse fotos com ela.
— E você ia tirá-las. — Meu tom era sério.
Ele meneou a cabeça.
— Eram apenas fotos, e não fotos “juntos”. — Seu rosto estava
suplicante. — Nunca tive nada com ela.
Sacudi a cabeça.
— Vamos esclarecer uma coisa, Lucky: tudo o que você for fazer, pense
duas vezes. Se sair por aí tirando fotos com mulheres só porque elas querem
um cara bonito e rico, eu também farei isso; se transar por aí, saiba que
também irei. — Continuei, ignorando sua expressão: — Porque não sou
mulher que deixa seu homem sair por aí, posando de modelo para mulheres
que querem tirar uma casquinha.
Seus olhos brilharam.
— “Seu” homem gostoso e sexy? — Vi o esboço de um sorriso.
Ele me pegou. Cretino.
— Você entendeu o que eu quis dizer. — Sentei-me no sofá. — Quando
pensar em fazer algo assim, imagine-me fazendo o mesmo e, se doer em
você, saiba que também vai doer em mim.
Ele se sentou na mesinha de centro, de frente para mim, e me fitou.
— Eu sei. Não sou bom em relacionamentos, mas com você quero tudo
e muito além. Queria ter ido atrás de você quando saiu da Ônix, mas você
disse que, se eu realmente gostasse de você, não era para te procurar
novamente. — Suspirou. — Essa foi a primeira vez que me sacrifiquei por
algo ou por alguém. Sabia que sofreria em silêncio só porque prometi isso a
você. — Olhou além da janela e se virou para mim. — Quando a foto saiu na
revista, quase matei o Kevin por isso. Estava pensando em ir até você e
dizer que não era verdade, mas, se eu fosse, não conseguiria dizer adeus de
novo.
— Poderia ter ligado. — Minha voz era só um sussurro.
— Acredite, ouvir sua voz é a mesma coisa que ver você, tão difícil
quanto. — Lançou-me um sorriso triste. — Não fiz isso com a intenção de
machucá-la, jamais faria algo assim de novo.
— Vamos supor que eu acredite em você. — Minha voz estava cheia de
esperança. — Somos diferentes, Lucky.
Ele contestou:
— Não. Somos compatíveis.
Ri sem emoção.
— Em quê? Olhe ao seu redor, para o que você tem.
Ele franziu o cenho.
— O que isso tem a ver conosco?
Tirei as sandálias, que já estavam machucando meus pés. Percebi que
seus olhos brilharam de luxúria ante minhas pernas nuas. Tentei me recompor
e voltar à conversa séria.
— Tem tudo a ver. Primeiro, você é rico. — Estremeci. Seu mundo era
tão diferente do meu.
— Meu dinheiro é um problema? — perguntou ultrajado.
— Também, mas o pior é que existem coisas das quais preciso que
você não será capaz de me dar, e não posso dar o que você quer, Lucky. —
Limpei as lágrimas que caíram em minha face.
— É claro que pode. — Ajoelhou-se à minha frente e abriu as minhas
pernas, encaixando seu quadril no meu e apertando as minhas coxas.
Minha pele parecia que estava pegando fogo onde ele tocava. Lucky
correu seus dedos em minha clavícula, meu pescoço e entre meus seios,
sobre o decote do vestido. Senti que meus mamilos já estavam duros com
seu toque. Prendi a respiração e apertei as pernas em seu quadril, como se,
com esse gesto, eu pudesse tirar a dor que havia ali, mas sabia que ela não
pararia até ele tirá-la de lá.
Seus olhos eram brasas vivas ao me fitar com desejo e fome.
— Você me quer...
— Nunca disse que não queria — protestei, sem fôlego. — Mas não
posso fazer isso.
Ele arfou.
— Você estava a ponto de fazer com Jason — rosnou o nome do amigo.
— Ele é diferente.
Seu corpo inteiro tremeu, e ele já ia se afastar de mim, mas prendi as
pernas em volta de sua cintura, sem me importar que meu vestido levantasse.
Doeu em mim pensar que o que eu disse o magoava profundamente.
— Quer dizer que você ia para a cama com ele, mas não comigo? —
Lucky arquejou.
— Não foi isso o que eu disse. — Aproximei minha boca da sua, sem
deixar de fitar seus olhos entorpecidos. — No dia seguinte ao sex...
— Não diga a palavra; já está sendo bastante difícil me controlar aqui
— ele me interrompeu, estremecendo.
— Tudo bem. O que eu queria dizer é que, com ele, no dia seguinte, não
ia acontecer nada comigo assim que tivesse partido, mas, com você...
Seus olhos estavam bem abertos de curiosidade.
— O que tem eu?
— Você tem o poder de pegar o meu coração e esmagá-lo depois, e isso
seria o meu fim. — Encolhi-me. Tão pouco tempo, e eu já amava aquele
homem com cada fibra do meu ser.
Lucky me abraçou, beijou meu pescoço e o mordiscou. Tremi, e uma
corrente elétrica atravessou meu corpo dos pés à cabeça.
— Se você me der o seu coração, prometo guardá-lo e protegê-lo —
jurou na minha pele, traçando os lábios sobre ela — como se ele fosse o
tesouro mais precioso do mundo para mim. Você é a minha joia rara.
Eu estava ofegante com suas palavras e apertei meus braços à sua volta.
O que ouvi de sua boca foi a coisa mais linda que já tinha ouvido dele e
tocou cada canto da minha alma. O prazer estava me consumindo por dentro,
e eu já não tinha mais noção dos meus atos.
Lucky mordiscou a minha orelha, e gemi. Uma de suas mãos seguia pela
minha perna, enquanto a outra foi para o zíper do meu vestido, abrindo-o,
deixando-me com os seios excitados à sua disposição. Ele os apertou. Meu
corpo se remexia, e comprimi mais as pernas à sua volta, querendo-o dentro
de mim, ou explodiria.
Lucky riu do que estava fazendo comigo.
— Apenas me deixe apreciá-la. — Seus olhos se iluminaram como os
fogos em Quatro de Julho ao admirar meus seios expostos. — Tão lindos!
— Não vou desistir do Shaw — sussurrei. Assim, se ele quisesse se
afastar, essa era a hora. Contudo, não se afastou, continuou a tocar os meus
seios.
— Não acho que um garotinho conseguiria dar conta de uma mulher
com um corpo desse. — Apertou meus quadris e minha bunda, pressionando-
me contra a sua ereção, que parecia querer sair da sua calça. — Nem fazer
isso... — Colocou a boca em um de meus seios e o chupou por um minuto,
como se estivesse com fome. Meus olhos se fecharam com o prazer que eu
estava sentindo. — Então eu não preciso me preocupar com ele.
Eu estava sem fôlego, meu corpo desejando-o de todas as formas.
Apertei seus braços e forcei meus olhos a ficarem abertos.
— Lucky, estou falando sério. — Minha voz era ofegante. — Não quero
só o Shaw, quero ter mais.
Ele se afastou de repente. Achei que iria se apartar de vez, mas estava
errada. E como estava!
— Se quiser ficar com Shaw, não sou contra. Percebi que não consegue
viver sem ele. — Olhava-me, enquanto eu assentia. — Eu gosto daquele
garoto. Não é todo mundo daquele tamanho que ameaça chutar as minhas
bolas. — Riu, e suas covinhas de menino apareceram. Essa era a risada que
eu amava. — Eu sei que ele ama você, então Shaw é dos meus. Podemos,
sim, ter o Shaw. — Beijou a ponta do meu nariz sem nunca desviar os olhos
dos meus.
Tentei controlar a voz e a surpresa ante o que ele disse.
— E os outros?
Lucky afastou o rosto do meu com os olhos estreitos.
— Adotado, vai ser só o Shaw — disse com a voz grave. — Os outros
que vamos ter, sou eu que os colocarei aqui dentro. — Passou a mão na
minha barriga.
— Você faria isso?! — exclamei.
Ele sorriu e me deu um selinho.
— Samantha Gray, você ainda não percebeu? — Seu olhar era
cintilante como as estrelas que brilham de noite e o Sol que ilumina o dia,
lindo! — Eu faço qualquer coisa por você, tudo para tê-la em minha vida.
Ri em meio às lágrimas.
— E na sua cama dos sonhos?
— Oh, Rosa Vermelha, você não sabe o quanto! — Beijou as minhas
lágrimas.
Coloquei as mãos em seu cabelo e puxei seu rosto para o meu como se
fosse beijá-lo, mas apenas olhei em suas profundezas verdes. Embora eu
adorasse beijá-lo, não queria provocar dor nele ao fazer isso. Esperava que,
com o tempo, ele superasse aquele trauma.
— Se eu ficar com você, jura que nunca vai me quebrar de novo? —
Era para ser um pedido, mas saiu como uma súplica.
— Juro, porque, se eu quebrar você, também serei quebrado —
sussurrou.
Sorri.
— Então me leve para aquela cama dos meus sonhos, e vamos
desvirginá-la.
— Com prazer, Rosa Vermelha. — Pegou-me nos braços e me levantou.
Continuei com as minhas pernas e braços à sua volta. Subiu a escada para o
seu quarto comigo nos braços.
Assim que estávamos no cômodo, Lucky me colocou no chão, mas
continuou a beijar meu pescoço, tirando o resto do vestido, que senti caindo
aos meus pés e o chutei para o lado. Lucky se afastou para me apreciar sem
roupas. Eu podia sentir meu corpo pegando fogo, tanto pelo desejo quanto
pela vergonha de ficar exposta e nua na sua frente. Tentei me cobrir com as
mãos, mas ele não permitiu. Então as deixei pendidas nas laterais do meu
corpo. Seus olhos eram labaredas de desejo, de luxúria. Ele parecia um
animal faminto e doido para saciar sua sede e sua fome.
— Então essa é a tatuagem? Uma fênix? — Seus olhos estavam escuros
de tesão. — Quem a fez, foi homem ou mulher? Porque ela fica bem... — ele
se interrompeu, notando algo. — Por que está sem calcinha?
Revirei os olhos.
— Primeiro, foi uma mulher que fez essa tatuagem; segundo, estou sem
calcinha porque esse vestido marca, não é pelo que está pensando — falei
depressa.
Seus olhos lampejaram para o meu rosto.
— Só em imaginar que ele...
— Jason não me tocou — cortei-o.
— Mas ele ia fazer, e isso me deixa furioso. — Cerrou os punhos.
Fiquei com raiva de repente. Peguei uma toalha que estava no sofá ao
pé da cama e me cobri. Não estava preparada para discutir com ele estando
nua.
— Não pode me culpar por isso, eu achei que você tinha ficado com
aquela vaca — sibilei. — Sasha fez isso porque tem uma queda por você.
Ele me olhou de lado.
— Não dou a mínima para o que ela quer ou tem — disse com dureza.
— Porque o sentimento não é mútuo. Irei acertar as contas com ela depois.
Por causa dela, você ia... — Sua expressão se tornou escura como uma
tempestade. — Mas não estou acusando você, estou furioso com Sasha,
Kevin e Jason.
— Com Sasha, sim, por ter mentido que vocês transaram só para eu me
afastar de você, e Kevin também, por colocar naquela revista que você ia se
casar com outra mulher. Mas Jason não tem nada a ver com isso, ele não tem
culpa de nada, e, além disso... — sentei-me na cama e coloquei as mãos no
colo — quando ele tocou a minha perna... — interrompi-me diante do
engasgo de Lucky. Olhei para cima e vi que a sua expressão beirava a ira.
Ops, erro meu. Porcaria, por que não fiquei calada?
— Ele tocou em você?! — esbravejou.
Encolhi-me, porque nunca o tinha visto tão furioso, parecia até capaz de
matar alguém, ou seja, Jason. Ainda bem que ele não estava ali. Respirei
fundo.
— Eu fui até lá porque queria esquecer você.
— Nos braços de outro? — Seu olhar era enervado.
Dei de ombros.
— Todos dizem que isso ajuda, mas, quando ele me tocou, eu dei um
pulo, e não foi de susto. — Levantei-me e fui até Lucky sem nunca me
desviar de seus olhos. — Jason é perspicaz, ele sabia que tinha algo errado
comigo e disse que eu não estava pronta para aquilo, não com ele. — Além
disso, bem nas profundezas negras da minha alma, eu sabia que não ficaria
com Jason nem com ninguém além de Lucky. — Você é o único cara que
acende cada célula do meu corpo e tem poder de me fazer sentir viva com
apenas um olhar. Esse olhar que está me lançando agora queima e se apossa
daqui. — Peguei sua mão e a coloquei em meu coração. — Ele é seu e
sempre vai ser. — Deixei a toalha cair no chão e orientei sua mão,
passando-a por meus seios. Ele sorriu, já com bom humor, e até os apalpou.
Caminho certo para tirar a escuridão de seus olhos. — Eles são seus, e isso
também. — Levei sua palma para baixo, descendo por meu estômago até
entre as minhas pernas. — Ela é só sua e sempre vai ser.
Ele estava sem fôlego.
— Sim, ela é... — Pressionou-me lá.
Tremi, sem fôlego também.
— Você é o único que faz com que minha pele entre em combustão. —
Cheguei perto da sua boca e passei a língua em seus lábios. — Essa boca
também é sua. Eu sou toda sua.
Ele me abraçou forte, como se quisesse me manter ali para sempre.
— Tremo só de pensar nele...
— Eu não acredito que vai me deixar nua aqui enquanto briga por causa
disso — reclamei e mordisquei sua orelha para fazê-lo esquecer. Eu queria
esquecer também o que tinha estado prestes a fazer antes. — O que está
esperando para desvirginar a cama e a mim?
Lucky gemeu, mas pareceu mais um rosnado, e começou a beijar o meu
pescoço, apertar todas as partes do meu corpo como se quisesse se fundir a
mim. Senti a cama nas minhas costas. Ele pairou em cima de mim ainda
beijando o meu pescoço e desceu para os meus mamilos duros, ansiando
pelo seu toque tanto quanto a região entre as minhas pernas.
— Perfeitos! — sussurrou com ardor antes de colocar um deles na
boca, sugando-o, mordiscando-o e o lambendo com fome, como se não se
alimentasse havia muito tempo.
Ofeguei com a sensação causada por sua boca perfeita em meu mamilo.
Minhas pernas se abriram em um convite silencioso, e ele se encaixou ali,
como se fosse feito para ele. Eu arfava tão alto que chegava a ser
constrangedor, mas não dei a mínima para isso, apenas queria que a dor
acabasse.
— Saborosa — falou, abocanhando meu outro mamilo. Enquanto uma
de suas mãos estava no meu rosto, a outra estava no meu estômago. Meu
corpo se arqueou para cima, querendo mais do seu toque.
— Lucky, se eu não conseguir...
Ele tirou a boca do meu seio, e logo meu corpo gritou em protesto.
— Está vendo isso? Seu corpo anseia pelo meu toque. — Beijou meu
rosto. — Então acredite em mim, você não vai querer parar, vai gritar por
mais de mim.
Voltou a trilhar caminhos de beijos molhados pelo meu corpo, descendo
ao pescoço, seios e minha barriga lisa. Senti a sua língua na minha tatuagem
de fênix enquanto ele manipulava meus seios. Minhas mãos agarravam forte
suas costas, fazendo-o gemer.
— É linda assim como você!
— Você vai acabar comigo... — sussurrei sem fôlego, num apelo para
ele se apressar.
Abriu mais as minhas pernas, delicadamente, como se não estivesse
com pressa. Seus dedos trilhavam sobre minhas coxas, e ficou com o rosto a
centímetros do meu centro. Seus olhos brilharam como se adorasse vê-lo tão
perto, e ele me olhou lá de baixo com um sorriso sexy. Definitivamente, eu
amava aquele sorriso lindo.
— Eu nunca fiz isso antes, mas com você eu quero tudo, inclusive
saborear essa delícia. — Sentia seu hálito quente banhar minha vagina. Meu
corpo se impulsionou para cima, querendo-o, ou morreria. Seria possível
morrer por querer a boca de um homem gostoso entre as minhas pernas, na
região que latejava e ansiava por ele? Não sabia, mas meu corpo gritava por
aquele cara.
Eu estava eufórica por saber que Lucky nunca tinha colocado a boca em
uma mulher de modo algum. Dá para ser mais feliz do que isso? Meus
pensamentos se evaporaram assim que sua boca foi para o clitóris e o
prensou entre os dentes, em seguida o chupou como se sugasse algo
saboroso, lambendo-o, ou melhor, consumindo-o. Suas mãos prendiam meu
corpo para mantê-lo no lugar, pois eu me remexia como uma lagarta na areia
quente. Minhas mãos foram para os seus cabelos e os seguraram com força,
como se quisessem enterrá-lo mais em mim. Céus, que desejo era aquele? O
som que saía de minha garganta era alto, achei que podia ser ouvido em todo
o prédio, mas não eram gritos. Ainda.
— Goza para mim — sussurrou, dando um chupão em meu clitóris.
Gozei forte, chamando seu nome.
Ele não parou por aí. Meu homem quente enfiou um dedo em mim,
enquanto, com o polegar, esfregava meu clitóris, ao mesmo tempo em que
sugava meus mamilos.
— Oh, Céus! — Choraminguei, enfiando minhas unhas em suas costas
por cima da camisa. Queria tirá-la, mas estava sem forças, apenas com meu
corpo pegando fogo. Arqueei-me para cima assim que ele enfiou um segundo
dedo. Senti a invasão deles no meu hímen, mas o prazer era tanto que não
liguei.
— Porra, você é tão apertada — rosnou sobre meu mamilo, mexendo
seus dedos dentro de mim. Eu sabia que ele estava me alargando para si.
Com certeza gritei tanto que iria ficar rouca no outro dia, ao ver
milhões de estrelas no espaço. Tudo explodiu dentro de mim. Nunca tinha
sentido nada assim em minha vida. Ainda mole, eu o vi tirando as suas
roupas, camisa, calças e cueca boxer. Estava de costas para mim, portanto eu
podia ver seus músculos, mas também vi as grandes asas brilhantes e
coloridas que tomavam toda a extensão de suas costas largas. Era uma fênix
e muito maior do que a minha. No meio dela, estava escrito com tinta preta:
você me matou, mas eu renasci. Meu coração doía por saber que ele falava
de sua mãe. Lembrei-me da conversa dele com Shaw, quando falou que sua
mãe o tinha abandonado. Isso cortou meu coração.
— É linda! — sussurrei, olhando a ave colorida.
Ele se virou, já sem nenhuma roupa. Fiquei sem fôlego ao ver o meu
nome em cima do seu coração, Samantha, tatuado em tinta preta.
— E o que acha disso? — perguntou, subindo na cama e me olhando
ali, toda exposta para ele.
Minha respiração ficou presa nos pulmões.
— Quando você a fez? — Tracei os dedos em cima de cada letra
eternizada em seu peito duro e malhado.
— Depois que pensei que aquele cara...
— Shhh... — Toquei seus lábios com meus dedos. — Eu amei a
tatuagem. Por que não me contou que tinha uma fênix também?
Deu de ombros.
— Eu a fiz quando comecei a formar meu império. Do pó em que eu
estava, me reergui, mas o final da frase só se tornou real agora. — Olhou
meu corpo nu, e em sua face vi amor, luxúria e devoção. — Você me fez
renascer do pó, reviver e acreditar que posso ser feliz independentemente do
passado. Você me ensinou a... — Fechou as pálpebras por um instante,
depois me fitou com os olhos marejados.
— Eu sei — falei, porque ele queria dizer as famosas palavras, mas
não conseguia. Eu sabia da verdade. Ele beijou minhas pálpebras. — Eu
também fiz essa fênix porque ela renasce das cinzas, assim como eu queria
renascer. Queria deixar o meu passado de dor para trás e apenas reviver, e
consegui! — Beijei suas bochechas com covinhas de menino. — Você e
Shaw me ensinaram a amar e a ser feliz por completo. Mas você me ensinou
o grande significado do amor incondicional, que é capaz de entrar em nossas
almas quebradas e restaurá-las, fazendo uma alma nova e inteira. — Beijei
seu nariz sem nunca tirar meus olhos dos dele, que estavam marejados. Sabia
que tinha sofrido em suas mãos, mas, ao me salvar, percebi que ele tinha um
grande coração. — Você restaurou a minha alma quebrada, e, um dia, quero
restaurar a sua.
Ele também beijou as minhas lágrimas.
— Espero que me diga o que foi quebrado — sussurrou sem fôlego.
— Talvez outra hora — esquivei-me, olhando seu corpo nu, e vi a sua
ereção... Era grande e larga. Caberia em mim? Meus olhos deviam estar
enormes. — Oh, isso é...
Ele sorriu ainda emocionado.
— Você vai adorá-lo. — Lucky se posicionou entre minhas coxas. —
Ele vai te fazer gritar muito de prazer.
Corei, mordendo o lábio.
— Se for igual à sua boca, eu vou amar. — Sentia o calor aumentando
só por senti-lo na minha entrada.
— Acredite em mim, linda, meu pau é mil vezes melhor do que minha
boca. — Beijou a minha testa. — Você toma pílula? Porque eu não tenho
camisinha. Não transo mais desde que conheci você.
Pisquei.
— Por que eu haveria de usar se nunca... — Mordi o lábio. — Mas se
quiser, podemos parar.
Ele me olhou como se eu fosse louca ou se tivesse nascido outra cabeça
em mim. Quase ri da sua expressão estupefata.
— Eu aceitei ter filhos com você, mas não por agora. — Senti-o se
posicionar na minha entrada, olhando-me com fervor misturado a luxúria. —
Eu tiro antes. Quando eu entrar, vai doer. — Beijou meu pescoço. — Eu não
queria isso, mas...
— Não se preocupe comigo. — Beijei seu peito e passei a língua em
sua orelha. — Apenas quero você dentro de mim de uma vez.
Minhas mãos estavam em suas costas e cabelos, apertando-os contra
mim. Ele beijava meu pescoço e orelha, mordiscando e sugando. Senti uma
súbita dor quando ele empurrou um pouco. Minhas unhas se enfiaram em
suas costas, e evitei gritar, mas não consegui conter um gemido.
Ele parou, olhando-me preocupado.
— Sinto muito.
Eu estava ofegante, mas não queria que ele parasse.
— Tudo... bem...
Beijou-me, mas dessa vez na boca. Arfei, querendo devorá-lo com tudo
o que eu tinha.
— Se eu te beijar, você vai sentir dor — sussurrei em sua boca, mas
incapaz de me afastar dela.
— Você também, então vamos sentir os dois.
Eu sentia a sua língua fazer malabarismos com a minha a cada vez que
ele empurrava suavemente para dentro de mim. Gritei em sua boca quando
ele veio com tudo, mas o beijo abafou o som. Sua boca devorava a minha
como se eu fosse um sorvete saboroso que ele amava e nunca tinha o
suficiente.
Sentia o seu corpo rígido com o beijo e percebia que Lucky estava
lutando contra o que tinha em sua mente. Tentei afastá-lo, mas não consegui,
porque ele não permitiu e me beijava com mais força. Eu apostava que, no
dia seguinte, meus lábios estariam inchados pela força do beijo.
Depois de um momento, senti o desconforto se dissipar e o prazer tomar
conta do meu corpo como labaredas. Ansiava por ele se mexer dentro de
mim e me levar ao êxtase transbordante. Fechei as pernas em seus quadris e
levantei os meus para ele entrar mais fundo, enquanto minhas mãos
apertavam suas costas.
Lucky bombeava dentro de mim em um ritmo lento, depois foi
aumentando. Foi tão prazeroso que chegamos ao clímax juntos. Chamei seu
nome em sua boca quando vi milhões de estrelas, mas a sua língua abafou o
som eufórico. Ele estremeceu e rosnou, gozando junto a mim. Fiquei mole,
com os braços jogados na cama, um de cada lado do corpo, era como se eu
não tivesse energia. Lucky me beijou por mais alguns segundos e depois saiu
de dentro de mim. Estremeci diante do vazio deixado por ele.
— O que foi que eu fiz? — ouvi-o resmungar com raiva.
Fitei-o e o vi observando as minhas pernas com olhar entorpecido. Eu
podia sentir uma pontada dolorida entre elas e uma sensação molhada
causada tanto pelo meu sangue quanto por seu sêmen. Senti-me como se ele
tivesse me batido. Talvez doeria menos se o fizesse.
— Você se arrependeu, não foi? — Não soube se ele ouviu dor na
minha voz, mas não me importei. Tentei me levantar e ir embora antes de ser
enxotada por ele.
Lucky arregalou os olhos e me segurou antes que eu saísse da cama,
prendendo-me nela e ficando em cima de mim.
— Não é nada disso. — Acariciou meu rosto molhado. — Você é tudo.
Esse momento foi perfeito, e acredite em mim que vai ter mais dele. —
Beijou meus lábios de leve. — Era para eu ter tirado antes, mas
praticamente gozamos juntos.
Meu coração se aliviou por saber que ele ainda me queria. Não sei o
que eu faria se ele me rejeitasse, não queria passar por aquilo que passei
quando soube de sua noiva falsa.
— Vamos torcer para que nada tenha acontecido — sussurrei,
acalmando-o. — Eu quero ter filhos, mas não agora.
— Eu também — disse por fim, mais calmo, beijando minhas pálpebras
num gesto carinhoso. Foi ao banheiro e veio com um pano molhado.
— O que vai fazer? — sondei, olhando o pano em sua mão e seu corpo
sarado e nu como veio ao mundo.
— Limpar minha mulher. — Seu sorriso cintilava ao dizer minha
mulher.
— Sua mulher, hein? — murmurei, sorrindo também.
Ele se abaixou ao meu lado e me olhou com um sorriso malicioso.
— Abre as pernas — pediu, enquanto eu arregalava os olhos. Emendou,
antes que eu reclamasse de seu modo mandão: — Por favor.
Ri.
— Nossa! Lucky Donovan pedindo por favor? — Dei-lhe um sorriso
provocativo.
— Oh, Rosa Vermelha, por você eu faço tudo — declarou enquanto
limpava entre as minhas coxas com a toalha molhada. Assim que senti seu
toque, meu corpo se acendeu de novo.
— Suponho que esse não seja um hábito seu, tratar as mulheres depois
do sexo — adivinhei, mas gostei do seu gesto doce. Quem diria que o
homem frio, calculista e rígido pudesse ter esse lado meigo?
— Não, mas com você é diferente. — Piscou para mim e sorriu. —
Assim como eu não tinha o costume de beijar e colocar a boca aqui. —
Mexeu a toalha em minha virilha. Revirei os olhos de desejo. — Tudo com
você é diferente, Sam.
— Espero que seja para melhor. — Minha voz estava rouca de emoção.
— Oh, Rosa Vermelha, é tudo esplêndido. — Terminou o serviço e
jogou a toalha no cesto de roupa suja, depois colocou uma colcha sobre a
mancha de sangue no lençol, e nos deitamos em cima dela. Puxou-me para si
e beijou minha testa.
— Essa delícia de cama foi desvirginada. — Deitei-me sobre ele,
aconchegando-me em seu calor.
Ele riu, embalando-me em seus braços.
— Sim. — Beijou meus cabelos e ficou em silêncio. Pensei que tinha
dormido, por isso, quando falou, pegou-me de surpresa. — Sam, casa
comigo?
Sentei-me tão rápido que, se não fosse ele me segurar, eu teria caído da
cama. Achei que tinha ouvido mal. Meus olhos se arregalaram para ele,
deitado na cama.
— O quê? Por que você quer se casar comigo? — indaguei meio
atônita.
— Porque eu... eu... — Ele não conseguia completar a frase. Fechou os
olhos com força e respirou fundo, depois os abriu, mas estavam tristes e
chateados. — Por que eu não consigo dizer? Droga.
Sentei-me em seu colo e passei os braços em volta de seu pescoço,
porque isso doeu em meu coração. Não suportava que ele sofresse.
— Tudo bem, não precisa me dizer essa frase agora. — Beijei seu rosto
lindo e tenso. — Toda vez que você quiser me dizer essa palavra e não
conseguir, diga Rosa Vermelha, e eu vou entender o que quer me dizer.
Ele me abraçou forte por um segundo, depois me pôs de lado, beijando-
me antes de se levantar e ir até a cômoda pegar uma caixinha de veludo
vermelha na forma de uma rosa vermelha. Fiquei olhando a sua bunda nua.
Mordi o lábio, querendo senti-lo de novo dentro de mim. Nunca pensei que
sexo fosse tão bom.
Ele se ajoelhou na cama com a caixinha na mão. Engoli em seco, mas
esperei.
— Rosa Vermelha, eu preciso de você como o ar que respiro —
declarou. — Eu sei que não sou perfeito e que não a mereço... — ele expirou
— mas prometo tentar por você. Eu posso ter dinheiro e poder para comprar
tudo, mas não posso comprar o amor, porque isso é impossível! O amor
verdadeiro faz alguém querer dar o mundo ao amado, mas também o faz
querer ser seu mundo. — Sorriu torto, com suas covinhas. — Tudo isso é o
que sinto por você, Rosa Vermelha. Eu quero você, não, preciso de você
para dormir nesta cama pela qual você é apaixonada. — Piscou. — Mas
espero que seja mais apaixonada pelo dono dela, pois ele é completamente
por você. Se aceitar se casar comigo, prometo ser fiel e respeitá-la para
sempre.
Pisquei em meio às lágrimas e me joguei sobre ele, que caiu de costas
na cama comigo por cima.
— Eu não acredito que me pediu em casamento estando nu. — Beijei
cada canto de seu rosto. — A propósito, você tem uma bunda linda.
Ele riu no meu ouvido e empurrou meus ombros para trás. Eu estava
deitada sobre ele, apoiada nos braços, com meus cabelos negros caídos pelo
seu peito nu. Seu olhar era quente no meu.
— Eu achei que, estando nu, faria você aceitar. — Colocou meus
cabelos atrás das orelhas e me olhou com desejo. — Eu adoraria me enterrar
dentro de você de novo, mas você está dolorida.
— Não estou — menti. Com nós dois ali, nus, o desejo começava a se
acender em meu corpo de novo, tão forte que eu não me incomodava com a
dor de ter perdido a minha virgindade. A outra dor, de querê-lo dentro de
mim, era maior.
— Sim, você está — disse, revelando não acreditar em minhas
mentiras. — Você era virgem.
Olhei seus olhos verdes intensos e brilhantes como o Sol.
— Já tirou a virgindade de alguém antes? — perguntei, mas não
querendo saber a resposta se fosse “sim”.
— Não, mas gostei de ter feito agora com você. — Beijou meus lábios
por um momento e depois pegou novamente a caixinha, que tinha caído na
cama ao me jogar nele. — Vai se casar comigo, Samantha Gray?
Eu queria muito me casar com ele. Meu Deus, isso era tudo que eu
queria! No entanto, não podia, porque, se o fizesse, logo iria aparecer na
imprensa, e isso seria um problema. Eu o conhecia havia pouco mais de dois
meses, era um tempo muito curto para um casamento, mas a minha vida
inteira tive medo de enfrentar os problemas que me aconteciam. Tirando meu
trabalho, Bryan e vovó, não lutei por nada que eu queria, não até conhecer
Shaw e Lucky. Eles me deram força para lutar pelos meus sonhos.
Fitei seus olhos esperançosos e respirei fundo.
— Eu até poderia aceitar, mas com duas condições... — comecei,
pensando em um plano.
Ele franziu a testa.
— Que condições?
Sentei-me em seu quadril e o fitei, deitado e me olhando. Cobri meus
seios nus com os cabelos, mas ele os afastou e me deixou exposta. Fechei a
cara para Lucky, mas ele apenas sorriu. Respirei fundo, tentando me
concentrar.
— Primeiro, se nos casarmos, quero que seja reservado e sem
imprensa, que seja simples, só com os amigos. Não quero aparecer em
revistas igual aconteceu com a loira.
— Eu não ia me casar com ela — lembrou-me.
Balancei a cabeça.
— Eu sei, mas não quero aparecer na mídia. — Soprei para cima, para
tirar os cabelos dos olhos.
Ele me avaliava, tentando me ler, mas não conseguia, porque sempre fui
boa em guardar a minha expressão.
— Por quê?
Suspirei.
— Eu tenho uma profissão, Lucky, e não quero que ela seja realizada
por meio de seu nome, quero conseguir isso por mérito. — Olhei suplicante
para ele. Esse era o único jeito de nos casarmos, sem sair na mídia. — Sei
que você pode mexer os pauzinhos para que isso aconteça, embora, mais
cedo ou mais tarde, eles irão saber, mas não quero que seja no dia do nosso
casamento.
Ele pareceu pensar.
— Certo, vou fazer isso, mas não tenho um pauzinho, e sim um bem
grande. — Mexeu-se debaixo de mim, e senti que ele já estava pronto, a todo
vapor de novo. Ofeguei. — Ele fez você gritar muito hoje, e acredito que vai
fazer muito mais.
— Oh... — Fiquei sem fôlego e vermelho escarlate.
— Eu adoro essa cor em seu rosto. — Ele me puxou para me deitar em
seu peito e me abraçou forte. — E a segunda condição?
— Vamos nos casar sem comunhão de bens — declarei.
Todo o seu corpo tremeu debaixo de mim. Tive medo de olhar a sua
reação, apenas fiquei ali com a cabeça deitada em seu peito. Demorou muito
tempo até ele responder.
— Por quê? Tudo que é meu também passaria a ser seu. — Seu tom
parecia estranho. Não entendi.
Levantei a cabeça e fitei seus olhos indecifráveis.
— Eu não quero o seu dinheiro, Lucky, apenas quero você. — Beijei
seu rosto e passei a língua em suas covinhas, então sorri. — Sempre quis
fazer isso, desde o dia em que te conheci — sussurrei e fiquei feliz pelo
sorriso torto que apareceu em seus lábios. — Quero dormir e acordar com
você nesta cama... — Saí de cima dele e rolei no colchão espaçoso, ficando
de lado para ele. — Quero que você seja meu dia e minha noite.
Ele sussurrou em meu ouvido:
— Eu sou só seu para sempre — jurou. — E você é minha.
— Sim, eu só quero você. Isso é a única coisa que me importa. Não
quero saber o quanto você tem na sua conta bancária — toquei seu cabelo,
tirando-o de seus olhos, porque algumas mechas caíram sobre ele —, não
quero fazer parte disso. Não sou interesseira, Lucky. Não quero que as
pessoas comecem a falar quando souberem do casamento.
Ele se afastou um pouquinho, tirando os cabelos do meu rosto.
— É só não ligar para elas.
Sacudi a cabeça.
— Não é simples assim... — Toquei sua face. — Por favor, se você
quer que eu seja sua esposa, faça isso por mim. Esse é o único jeito de eu me
casar com você.
— Tudo bem. — Entregou-me a caixinha. — Aqui, para você. Uma rosa
vermelha para a Rosa Vermelha.
Sentei-me e abri a caixinha, tremendo de ansiedade do que viesse a ter
lá dentro. Ofeguei ao ver o que era, não quis nem pensar no valor. Era um
anel de ouro e diamante vermelho. A pedra era na forma de uma rosa
vermelha brilhante. Meus olhos estavam arregalados de choque.
— Céus, isso é...
— Não diga que é caro — pediu ele, ficando com o rosto a centímetros
do meu. — Eu aceitei suas condições, então aceite esse anel como prova do
que sinto por você.
Suspirei e assenti. Ele pegou a joia e a colocou em meu anelar
esquerdo, beijando cada dedo da minha mão. Seus olhos brilhavam como o
Sol, a Lua e as estrelas, acho que, se juntasse os três, não iluminariam tanto
quanto sua felicidade. Nesse caso, a minha também.
— Obrigada. — Deitei-me na cama, apoiei a cabeça no travesseiro e
olhei em suas duas pedras de esmeralda, brilhantes por eu ter aceitado sua
proposta.
Já estava tarde, e eu, exausta, mas não queria dormir e acordar no outro
dia e descobrir que isso era um sonho lindo, um que nunca achei ser
possível.
Lucky se deitou ao meu lado e me puxou para seus braços, suspirando
feliz.
— Rosa Vermelha demais... — sussurrou, beijando meus lábios de
leve.
— Eu também te amo demais — sussurrei e caí no sono.
12 - Desejo Ardente
SAM
Levantei-me por volta das 5h da manhã, latejando de desejo no meio
das pernas. Droga, ia acabar acordando o Lucky, mas queria acordá-lo,
assim ele me daria o que eu estava ansiando tanto que chegava a doer. Nunca
tinha sentido isso antes, mas gostei muito. Ele estava com a cabeça apoiada
no travesseiro e com os olhos fechados. Seus cabelos lindos caíam na testa,
deixando seu rosto sereno e com as covinhas que eu tanto amava. Seus lábios
estavam entreabertos, fazendo-me ansiar por eles. Maldição, minha vontade
era de beijá-lo, aliás, de devorá-lo.
Saí da cama antes que o acordasse. Vi a minha bolsa grande na poltrona
que ficava perto da janela na sala. Simon devia tê-la trazido sem eu notar
enquanto estávamos dormindo, igual fez da outra vez, mas acreditei que
agora ia ficar ali para sempre. Procurei para ver se dentro dela estava a
minha roupa de corrida e por sorte a achei no fundo da bolsa. Era um
shortinho curto de ginástica rosa e cinza, com lacinhos enfeitando a área das
coxas e cós grosso, e um top. Calcei os tênis e prendi meus cabelos em um
rabo de cavalo.
Escovei os dentes com uma escova nova que achei no banheiro de
Lucky e fui correr para espairecer e aliviar o desejo que estava sentindo
pelo corpo perfeito do meu homem. Para não pensar muito nisso, liguei para
o Bryan. Ele atendeu depois do terceiro toque.
— Alô? — respondeu uma voz feminina.
— Preciso falar com o Bryan — falei, confusa. Por que outra pessoa
atenderia seu telefone? Ele nunca deixava ninguém tocar nele.
— Quem é você, e o que quer com o meu homem, sua puta? — sibilou a
mulher.
— Que droga você pensa que está fazendo? — rosnou Bryan para a
garota, depois disse num tom delicado para mim: — Espere um segundo, luz
da minha vida.
— Você tem outra mulher! — gritou a moça, louca. Ela não tinha a
mínima ideia de quem meu irmão era. Se soubesse o mulherengo que Bryan
era, correria para longe.
Ouvi-o rir.
— Eu tenho várias outras mulheres — grunhiu. — Vou atender essa
ligação e, quando voltar, espero que tenha ido embora, ou eu mesmo te
colocarei para fora.
Esperei mais alguns segundos e me sentei em um banquinho de praça
não muito longe do prédio do Lucky. Falar com Bryan era importante. Eu não
sabia como ele iria reagir ao saber da notícia, mas esperava que ficasse do
meu lado, já que eu era sua irmã.
— Sam, o que aconteceu para me ligar às 5h da manhã? — perguntou
Bryan em um tom preocupado.
Suspirei.
— Vou me casar com Lucky — soltei em um fôlego só.
Ouvi-o se engasgar e ficar em silêncio por um minuto.
— Você tem certeza de que Lucky sente o mesmo por você? Que ele
quer se casar com você? Não é só pela empresa que ele quer comprar?
— Pelo visto, você fez o dever de casa — retruquei, passando a mão
pelo cabelo.
— Tenho que saber tudo sobre quem anda perseguindo a luz da minha
vida. — Seu tom era meloso.
Revirei os olhos.
— Não é pela empresa que ele quer se casar comigo. Se fosse por isso,
ele poderia ter qualquer uma, era só estalar os dedos.
— Sobre isso, você não é muito de perdoar traição, então o que houve?
— Ele não ia se casar, foi tudo ideia do funcionário dele, que fez sem
sua ordem e quase foi mandado embora e sem a cabeça. — Contei-lhe tudo
que houve desde que vi a matéria do falso casamento de Lucky, inclusive
sobre a mentira da Sasha. Ao lhe falar sobre Jason, ele pareceu chateado.
— Você ia transar com esse cara? — indagou irritado. Apostava que
ele estava passando as mãos pelos cabelos. Sempre fazia isso quando ficava
irritado.
— Não sei, mas fui lá com essa intenção. Ainda bem que não fiquei
com ele, ou agora estaria arrependida para sempre. — Estremeci ao pensar
em não ter Lucky em minha vida. — Eu sei que ele tem um jeito meio
distorcido de resolver as coisas, mas vou colocá-lo na linha.
Bryan riu.
— Se você conseguir isso, vou te dar os parabéns, maninha — disse
com uma risada.
— Eu queria você no casamento — murmurei.
Ele suspirou.
— Eu até faria um sacrifício e me disfarçaria para isso, mas lembra do
emprego que te falei que estava esperando?
Arfei.
— Sério? Agora quer dizer que meu irmão é um policial! — Sempre
fora seu sonho trabalhar na polícia.
— Sim, e a minha primeira tarefa vai ser hoje, no mesmo dia de seu
casamento...
Interrompi-o:
— Como é que sabe que o meu casamento é hoje, sendo que nem eu
sabia disso?
Ele deu uma risada gostosa.
— Ele fez preparativos para vocês irem para Vegas, então supus, agora
que você falou, que seja para o casamento.
— Acho que seu chefe vai ganhar na loteria por ter você — sussurrei a
verdade. — Será que você pode pelo menos fazer a vovó sair daquela
fazenda e ir participar do meu casamento?
— Eu acho muito arriscado, Sam, a não ser que pense em contar tudo ao
seu futuro marido — disse num tom preocupado. — Faz o vídeo de seu
casamento e nos manda.
— Não estou preparada para contar tudo a ele, por enquanto. —
Levantei-me para voltar; fazia tempo que eu tinha saído e nem havia corrido
ainda.
Terminei a chamada com o Bryan, dando-lhe boa sorte por entrar na
polícia, algo que sempre fora seu sonho.
Voltei para o apartamento de Lucky, digitei o código e entrei na sala.
Meus olhos se arregalaram ao ver várias pessoas sentadas no sofá na forma
de L, Ryan, Jordan, Jason, Rayla e Alex, menos Lucky, que estava de pé, e
Sasha, à sua frente e de costas para mim. Shaw estava ao lado de Lucky,
Simon devia tê-lo trazido. Aquilo me encheu de raiva. Como Lucky podia
trazer aquela mulher ali depois de ela ter feito o que fez a nós e ao Shaw,
após tudo que havíamos feito na noite anterior? Era demais para eu suportar,
ainda mais com meu menino presente! Eu poderia ter pedido para ele demiti-
la, mas não fiz isso, nem jamais faria, porque achava que não tinha esse
direito.
Sasha devia gostar dele, mas não o teria, porque Lucky era meu, e eu
não iria deixar nenhuma vadia tomá-lo de mim.
— Mas que droga você está fazendo aqui?! — esbravejei, entrando na
sala e ficando de frente para a cadela e ao lado de Shaw, para protegê-lo da
víbora peçonhenta. Fuzilei-a, meus punhos cerrados. Notei que todos
estavam com os olhos arregalados, mas não liguei para nenhum deles.
— Que roupa é essa? — rosnou Lucky atrás de mim. — Você saiu
assim?
Dei de ombros e continuei a encarar a Sasha.
— Eu disse para ficar longe...
Ela estreitou os olhos.
— Esta é a casa do Lucky...
— Não me importa de quem é a droga da casa! — proferi. — Falei
para ficar longe do Shaw, ou está querendo levar outra surra? — Dei um
passo para ela, mas as mãos do meu menino pegaram meu braço, então tentei
me controlar.
— Sam...
— Eu vim para me desculpar, mamãe ursa — disse ela.
Lancei-me para arrancar aqueles cabelos de fogo, mas Shaw puxou meu
braço de volta. Curvei-me e o fitei para ver se ele não estava assombrado.
— Você está bem? Ela não disse algo a você que o machucou?
Ele sacudiu a cabeça.
— Ela só pediu desculpas — sussurrou.
— Mas que droga! Será que dá para vocês pararem de ficar encarando
a bunda da minha mulher?! — guinchou Lucky.
Endireitei-me e fitei sua expressão de fúria. Parecia a ponto de matar
alguém. Notei que todos estavam rindo dele. Acho que fizeram isso para
provocar o Lucky, e, pelo visto, funcionou.
De repente, ele começou a desabotoar sua camisa branca. Logo já dava
para ver meu nome tatuado em seu peito com tinta preta.
— O que está fazendo? — perguntei.
— Estou tirando a camisa para dá-la a você e impedir que eu mate
esses idiotas — falou enquanto continuava desabotoando a peça.
— Não ouse tirar a camisa na frente dela! — rosnei, fulminando Sasha,
que estava de olhos arregalados vendo o meu nome no peito de Lucky. Não
dava para ver tudo, apenas um pouco, mas ela sabia que era isso.
Ele parou de desabotoar a camisa.
— Onde você estava vestida assim? — Gesticulou para minhas roupas.
— Isso é roupa de ginástica. Fui correr para espairecer, já que estava
ansiosa demais.
— Ansiosa com o quê? — incitou ele.
Mordi o lábio inferior. Ele estava de bermuda e com a camisa quase
toda aberta, mostrando o seu corpo lindo e saboroso. Um fogo desceu entre
minhas pernas, como uma corrente elétrica misturada com labaredas.
Ele sorriu malicioso ao ver o desejo em meus olhos, que o cobiçavam.
Estava louca para me apossar dele, rasgar suas roupas e devorar cada
centímetro do seu corpo.
— Eu já vi o peito dele nu, então não precisa ficar com ciúme. —
Percebi que Sasha tentava controlar a raiva.
Ergui as sobrancelhas entre ela e Lucky para ver se eu havia entendido
errado ou se era verdade o que ela deu a entender. Lucky passou o braço em
minha cintura e a fuzilou com frieza e desdém. Sasha se encolheu com seu
olhar tenebroso, do qual a maioria das pessoas tinham medo, mas eu não era
uma delas.
Ela se apressou em explicar:
— Isso, é claro, foi quando todos aqui fomos em férias para as
Bahamas...
Bahamas? Isso sim era um lugar lindo para férias, igual o Caribe. Eu
adoraria estar em um lugar desses com Lucky e não sair do quarto. Se bem
que, se não saíssemos do quarto, como iríamos aproveitar a vista? Bem, eu
não me importava com a vista do lugar, e sim em ter Lucky nu na cama
comigo.
— Eu só vim me desculpar com Lucky e, como vi o menino aqui,
aproveitei para pedir desculpas também...
Meu olhar para Sasha foi frio, aliás, eu adoraria matá-la. Era uma pena
que não podia.
— Não acredito em nada que sai dessa sua boca, porque, quando uma
pessoa faz algo e se arrepende, ela mesma pede desculpas, sem ser forçada
ou ameaçada por seu chefe. — Minha voz era tão fria quanto meu olhar. —
Então fica longe do Shaw. — Suspirei. — E fica longe do Lucky.
— Mas ele é meu chefe. — Ela olhou dele para mim, como se estivesse
preocupada em ser demitida.
— É claro que é, mas é só isso que ele vai ser seu. — Ri irônica. —
Você acha que não sei de seu interesse nele? Não adianta mentir — falei,
porque ela estava prestes a abrir a boca para dizer alguma coisa. — Mas ele
é meu agora, e não vou deixar uma desclassificada como você se meter no
meu relacionamento com ele, como fez antes — Dei um passo até ela, que
deu outro para trás. — Pode vê-lo e cobiçá-lo, não me importo, porque sei
que ele é perfeito e desejável, e tê-lo é como ganhar na loteria. Não digo
pela sua conta bancária, e sim por Lucky ser quem é, um homem com alma
linda e pura. — Eu sabia que Lucky não acreditava nisso, mas, apesar de
seus erros e falhas, ele era um homem maravilhoso, capaz de ajudar várias
crianças pelo mundo, por isso eu o amava mais a cada dia.
Aproximei-me mais de Sasha, mas ela não se mexeu, como se estivesse
hipnotizada por uma serpente.
— Lucky é perfeito de todas as formas, e você pode olhá-lo, mas nunca
ouse dar em cima dele, porque aí nós teremos um problema bem grande —
sussurrei em seu ouvido. Senti-a encolhida, mas ela não se afastou. Eu
apostava que estava olhando para Lucky, atrás de mim, e apenas não revidou
por ele estar ali. Disso, eu tinha certeza. — Porque, no final, sou eu quem ele
vai beijar, e em lugares que você nem imagina. — Sasha ofegou, e eu me
afastei dela sorrindo vitoriosa. — No final, ele é só meu. — Meu tom a
seguir foi sombrio: — Agora, se você disse tudo o que tinha a dizer, é
melhor ir embora. — Apontei para a porta.
Ela estreitou os olhos, fitando-me venenosamente, a cobra mostrando as
garras. Eu não sabia por que o Lucky ainda deixava Sasha trabalhar para ele;
se fosse eu, já teria demitido aquela víbora.
— Esta casa não é sua e...
Lucky a interrompeu:
— A partir de agora, é, então pode ir embora. — Sua voz era como uma
faca afiada, mas percebi que ele estava com dificuldade de falar. Devia ser
emoção pelas coisas que eu disse sobre ele.
— Mas vocês vão para Las Vegas para o casamento! Eu também queria
ir — reclamou ela.
Las Vegas? Então o que Bryan disse era verdade! Lucky realmente
estava pensando em nos casarmos em Vegas? Arregalei os olhos para ele.
— Nem morta ela vai para o nosso casamento — rosnei com os dentes
trincados. — Porque, se ela entrar por uma porta, eu saio por outra.
Lucky me puxou para seus braços. Tremi com seu toque, que pareceu
incendiar todo o meu corpo.
— Você é a coisa mais valiosa da minha vida, Rosa Vermelha. —
Beijou os meus lábios, e me derreti. Só não fui mais além pela presença do
Shaw; os outros já tinham desaparecido para mim, mesmo estando na sala,
apenas restava o meu corpo em chamas clamando por ele. — O meu prêmio
de loteria — declarou, afastando-se e me deixando ofegante e necessitando
por mais dele. Seu sorriso ofuscante sumiu quando ele fuzilou Sasha. —
Você não vai conosco, causou isso a si mesma inventando coisas, me
afastando da mulher da minha vida. É melhor você ir antes que eu a demita.
— Seu tom deixava bem claro que não a queria à sua frente. Pensei em
perguntar por que ele a mantinha trabalhando para si, mas eu também não lhe
contara tudo ao meu respeito, então deixei isso de lado por enquanto.
Sasha saiu sem dizer nada e com a cabeça baixa.
— Isso foi quente! — Ryan riu provocativo. — Parecia que você ia
beijá-la, Sam.
Fiz careta para ele, sentado ali.
— Ninguém mexe com o que é meu. — Mordi o lábio inferior ao olhar
novamente para Lucky, porque o fogo só aumentava ao admirar seu corpo
másculo.
— Acho que a noite de ontem foi curta — disse Jordan com um sorriso
torto.
Lucky arregalou os olhos, que depois brilharam.
— É por isso que foi correr? Por que estava ansiosa por mais? —
sondou com olhar malicioso e voz rouca de desejo.
Ignorei-o, embora fosse difícil, pois eu me sentia como uma pessoa há
muitos dias no deserto que de repente encontra um oásis. Releguei o desejo e
me curvei para meu menino. Percebi-o suspirando de alívio assim que Sasha
saiu. Fui beijar seu rostinho redondo, mas Lucky segurou o meu quadril por
trás.
— É melhor não se curvar, Rosa Vermelha, a não ser que queira me ver
quebrando a cara deles no dia do nosso casamento — sussurrou em meu
ouvido.
Senti o meu corpo pegar fogo novamente, como se ele despertasse
apenas com seu toque. Era como se uma corrente elétrica tivesse se
apossado de mim da cabeça aos pés.
— Ah... tudo bem — gaguejei, sem fôlego.
Lucky riu e se afastou, deixando-me ofegante. Eu apostava que ele sabia
o poder que o seu toque tinha sobre meu corpo.
Olhei a todos.
— Acho que Lucky já disse a vocês sobre o casamento.
— Sim — respondeu Rayla, avaliando-me. — Mas o que não entendo é
por que você não quer um casamento em grande estilo, com festa, buquê e
tudo mais.
Belisquei a ponta do meu nariz, tentando pensar em como diria isso a
eles de modo que entendessem sem eu precisar contar a verdade. Revelaria
tudo depois do casamento; antes, tinha medo de perder o meu noivo.
— Como disse ao Lucky, não quero subir em minha carreira por causa
de seu nome. — Olhei para ele, que fez uma careta linda. — Quero ter meu
nome com meu próprio trabalho e eficiência, sem depender dele ou do seu
nome para isso.
Ryan bateu palmas, todo animado.
— Então vamos todos para Vegas pegar gatinhas e...
— Ryan — interrompi-o em sinal de advertência. Olhei para o Shaw,
sorrindo divertido.
— Eu sei tudo sobre garotas. — Seu sorriso era lindo.
— É isso aí, camarada, bate aqui! — exclamou Ryan, estendendo o
punho fechado para Shaw colidir com o dele, mas o menino apenas ficou ali,
olhando seu punho, e encolheu os ombrinhos.
Ele não falava com ninguém, com exceção de mim e Lucky. Esperava
que, no futuro, ele ficasse bem e começasse a conversar com todo mundo.
Tinha fé nisso.
Ryan recolheu a mão.
— Certo, eu ainda vou conquistar a sua confiança. — Seu tom era
obstinado. — E nós dois vamos para minha casa em Aspen gritar daquelas
montanhas como dois loucos.
Os olhos de Shaw brilharam, mas ele não respondeu, só assentiu e
sorriu. Ryan sorriu ao ver a felicidade nos olhos do menino.
Arregalei os olhos para Ryan.
— Você tem uma casa em Aspen?
Ele me olhou de lado.
— Sim, por quê?
Sorri animada.
— Pode nos emprestar para passarmos a lua de mel lá?
— Não posso...
Meu sorriso morreu. Talvez ele não gostasse de emprestar sua casa.
— Oh, tudo bem...
Ryan riu de meu tom desapontado.
— Não é que eu não queira emprestar, Sam — ele se apressou em
explicar. — É que o Lucky não aceitaria isso.
Minha testa se vincou enquanto eu olhava o sorriso cativante do meu
noivo.
— Por que não aceitaria? Ele é seu irmão.
— Porque eu também tenho uma casa lá, e, se formos passar a nossa lua
de mel nesse lugar... — ele falou com um desejo quente na voz, tão quente
como brasa ardente — iremos para ela. — Franziu a testa. — Mas pensei
que você queria fazer um cruzeiro e ir para o Caribe.
Ergui as sobrancelhas.
— Como sabe sobre isso?
Ele encolheu os ombros.
— Quando discutimos no Rave, você disse que tinha o sonho de fazer
um cruzeiro e ir para o Caribe, mas não se podia ter tudo. — Ele se encolheu
com a lembrança.
Arregalei os olhos.
— Eu não acredito que se lembrou disso! — Sorri e toquei seu rosto.
— É um dos meus sonhos, mas Aspen é Aspen e, além disso... — coloquei
meus lábios em sua orelha e sussurrei para Shaw e os demais não ouvirem,
fazendo-o estremecer com meu toque — lá é frio, isso significa nós dois no
quarto juntinhos, sem roupas o dia e a noite inteiros.
Ele apertou a minha cintura, ofegante. Afastei-me com um sorriso
libidinoso.
— Você está sendo má — reclamou, sem fôlego.
— Por que você está sendo má, Sam? — perguntou Shaw, enquanto
todos ali riam do estado excitado de Lucky.
Segurei meu sorriso e olhei para meu garotinho, que me olhava confuso.
— Apenas disse ao Lucky o que vamos fazer em Aspen quando formos
até lá no mês que vem.
Lucky me interrompeu:
— Por que não vamos depois de nos casarmos? — Seu tom era
confuso.
Olhei para ele.
— Porque não tenho nem três meses de experiência no meu trabalho e
não quero pedir férias agora ao Michael. Tenho que ter pelo menos mais
alguns meses.
— Eu posso...
Interrompi-o:
— De jeito nenhum! Você não vai se meter em meu emprego. Não
vamos discutir isso agora. — Olhei para o Shaw e sorri. — Como foi a sua
noite?
Shaw me olhou com as pupilas dilatadas.
— Boa...
— Shaw, o que houve? Teve pesadelos? — Ele vinha tendo mais
pesadelos depois do que houve com o pai, pai, não, monstro, isso era o mais
exato para o que aquele homem era.
Esqueci-me da advertência de Lucky e já ia me curvar para falar com
Shaw.
— Sam — Lucky rosnou.
Endireitei-me e olhei para o garoto, que assentiu.
— Por que não me ligou? Eu pedi para me ligar a qualquer hora —
lembrei a ele.
— Eu sei, mas você estava tão disposta a sair com Diana e Ana que eu
não queria atrapalhar.
Sentei-me na mesinha e o puxei para perto de mim, olhando em seus
olhos.
— O que eu lhe disse? Não importa o que eu esteja fazendo, vou até
você. — Fui firme. — Shaw, eu posso estar do outro lado do mundo e
fazendo a coisa mais maravilhosa, ainda assim volto para você, está me
ouvindo?
— Sim, Sam. Eu sinto muito. — Ele me abraçou forte. — Amo você, eu
só não queria atrapalhar de novo.
Beijei seu cabelo, sentindo seu cheiro doce.
— Você nunca atrapalha, meu amor. — Afastei-me e sorri. — Você é a
melhor coisa que aconteceu em minha vida.
Ele sorriu deslumbrante.
— Você foi meu melhor presente de todos os tempos — afirmou.
— Oh, garotão, pode apostar que não foi só o seu — assegurou Lucky
com fervor.
Shaw assentiu.
— Quando voltarmos de Vegas, irei levá-lo ao parque de diversões,
depois ao zoológico, como estava previsto para seu aniversário — disse a
ele.
Ele sorriu animado.
— Obrigado. Lá deve ter montanha-russa igual na Disneylândia —
sussurrou pensativo.
Ele sempre quis ir à Disney, mas naquele momento eu não podia levá-
lo, já que havia começado a trabalhar em pouco tempo. Michael talvez
quisesse me demitir, e eu não podia perder meu emprego.
— Prometo que, no ano que vem, quando eu estiver mais livre, iremos à
Disney — jurei. Além disso, precisava pagar ao Lucky as minhas dívidas, as
quais ele tinha quitado.
Shaw sorriu, concordando.
— Shaw, em cima da minha mesa, em meu escritório, tem um presente
para você — disse Lucky.
Os olhos do garoto, surpresos, voltaram-se para ele.
— Sério? Um presente?! — Sua voz estava eufórica. — O que é?
Lucky sorriu ao ver os olhos brilhantes do menino.
— Ingressos para você ir a todos os brinquedos da Disneylândia se
quiser. Consegui hoje cedo, sei que pisei na bola essas semanas. Espero que
goste, acho que acertei seu desejo — falou ele, sorrindo de lado. — Embora
eu ache que não vai conseguir ir a todos os brinquedos.
— É sério?! Para todos eles?!
— Lucky... — adverti-o.
Shaw olhou para mim, e seu sorriso perfeito desapareceu como uma luz
sendo apagada. Odiei-me por ter causado isso a ele, mas não queria que
Lucky gastasse seu dinheiro conosco. Isso fazia de mim uma pessoa ruim?
— Não quer que ele dê os ingressos a mim? Então não vou aceitar. —
Sua voz murchou, assim como seu rosto lindo.
Eu estava prestes a devolver seu sorriso quando Lucky suspirou e falou
comigo em um tom calmo:
— Sam, nós vamos nos casar hoje, então Shaw vai ser tão meu quanto
seu. — Ouvi a sua felicidade ao me dizer isso. Também fiquei feliz que ele
gostasse do meu garotinho. Era isso que eu queria, não era? — Posso lhe dar
qualquer presente que ele quiser.
Eu não podia impedir que Shaw aceitasse o presente, já que o fazia
feliz assim. Em meu coração, queria dar tudo de melhor a ele. Que mãe não
iria querer isso?
— Tudo bem, querido. — Sorri para ele, emocionada. — Vamos à
Disney.
— Obrigado, Sam — sussurrou, beijando meu rosto.
— Tudo para vê-lo feliz.
Ele se afastou e olhou para o Lucky.
— Posso ir ver os ingressos? Preciso ver que são reais e que não estou
sonhando.
Lucky bagunçou seus cabelos.
— Sim, são reais, garotão — declarou ele, feliz por Shaw. — Estão
sobre a mesa do escritório.
— Obrigado, Lucky! — Abraçou sua cintura. — Mas quero que saiba
que não vai me comprar, porque, se magoar a Sam de novo, eu vou chutar as
suas bolas. É uma promessa.
Ouvi todos rirem disso, incluindo Lucky.
— Shaw! — repreendi-o. — Não pode dizer esse tipo de palavras para
as pessoas.
Ele se afastou e me olhou sorrindo.
— Desculpe, Sam — falou e saiu correndo rumo a uma porta que ficava
perto da escada. Devia ser do escritório.
— Você parece amá-lo muito, não é? — observou Rayla com emoção
na voz.
— Como se ele tivesse nascido de mim.
— Ainda bem que não nasceu — sussurrou Lucky.
Olhei para seu sorriso devastador. Por sorte eu estava sentada, ou
cairia com as pernas bambas.
— Porque isso significaria que alguém já teria estado dentro do que é
só meu. — Seu sorriso era torto e provocativo. Isso roubou meu fôlego. —
Todos os filhos que vão sair de você serão colocados aí por mim. E essa é a
melhor parte e que vou adorar fazer.
Minhas pernas já estavam moles com suas palavras, então ficaram
piores, aliás, eu inteira estava amolecida e ofegante.
Corei e olhei para o sorriso de todos, ficando ainda mais nervosa.
— Querem parar de ficar encarando a Sam e a deixando envergonhada?
— rosnou Lucky para eles.
— Você é o único que está deixando-a assim ao dizer coisas como
essas na nossa frente, seu idiota — replicou Rayla.
Olhei para ela e sorri, ficando ainda mais vermelha.
— Você tem razão. — Suspirei. — As palavras dele entram fundo em
mim.
— Eu gosto de entrar fundo — declarou Lucky com fervor na voz.
Fuzilei-o.
— Você não devia dizer essas palavras na frente das pessoas — acusei-
o. Precisei respirar profundamente para me recompor. Olhei em volta e dei
um sorriso meigo a Rayla.
— Quero pedir desculpas a você.
Ela franziu o cenho.
— Pelo quê?
— Por ter dançado com Alex naquele dia, mas saiba que eu não tinha a
intenção de fazer nada, apenas dar uma lição em você e no Lucky.
Ela encolheu os ombros.
— Foi uma dança bem grudada, mas não posso reclamar por ter
acontecido algo, afinal, fui embora e o deixei. — Sorriu triste. Alex alisou
seus braços, reconfortando-a. — E não tenho nenhum ressentimento de você
por isso.
— Obrigada, lamento pelo que fiz, mas você e Lucky precisavam de
uma lição e sair das conchas em que estavam vivendo. De qualquer forma,
deu certo, pois fez vocês dois ficarem juntos.
Ela sorriu, e dessa vez pareceu real. Fiquei feliz com isso.
— Ele é bom de cama e sabe dar conta do recado.
— Argh — sibilou Lucky, estremecendo. — É melhor não dizer nada.
— Eu estou com Lucky — concordou Ryan, encolhido. — Não quero
essa imagem na minha cabeça, ou vou querer matar meu amigo.
Ri e olhei para Alex.
— Eu aposto que sim — disse e ouvi o rosnado de Lucky perto de mim.
— Mas o que não entendo é por que você fez o que fez.
Alex franziu o cenho.
— Como assim? Ser bom de cama? — Seu sorriso estava dançando em
seus lábios.
Bufei ao revirar os olhos.
— Não. Você sabia o que eu pretendia fazer e me mandou para o Jason.
Lucky arfou antes que eu terminasse de falar e foi na direção de Alex.
Levantei-me e me coloquei na sua frente para impedi-lo.
— Lucky, pare — pedi, segurando seu peito.
— Eu vou acabar com você, seu miserável! — esbravejou, fuzilando o
cunhado.
Fitei seus olhos hostis.
— Você não vai fazer isso — protestei. — Agora pare de dar chilique e
o deixe terminar de falar.
Lucky suspirou, mas relaxou nos meus braços. Virei-me de costas para
ele e olhei para Alex, sentado no sofá, sem se abalar com o fricote do Lucky.
— Eu não disse para você optar pelo Jason, apenas falei para escolher
alguém que achasse atraente, porque não tem como transar com alguém sem
sentir atração.
Lucky rosnou atrás de mim. Afastei-me para trás até bater em sua
parede de músculos.
— Lucky, por favor — pedi suplicante.
A testa de Alex estava vincada.
— Você estava balançada pelos irmãos Kings, mas, acredite em mim,
não estava pronta para aquilo.
— Os caras da banda King? — indagou Lucky horrorizado. — Você ia
ficar com Nilan e Gave?
Engoli em seco.
— Não. Eu não estava preparada para um homem, imagina para dois...
— Ri sem humor e olhei para o Alex e os outros, encarando-me de olhos
arregalados. — Mas vocês sabiam que Jason era amigo de Lucky, então por
que não interferiram?
— Simples, porque você estava segura com Jason até Lucky chegar e
consertar a burrada que fez não esclarecendo tudo para você — Ryan se
intrometeu.
— Sim, eu sabia que não faria você mudar de ideia, já que estava
decidida, mas, quando você notou Jason, então eu soube que podia interferir,
mas talvez ele... — Alex apontou o queixo para o Lucky — não tivesse
ficado com outra mulher, como você pensava que ficou, porque, cá entre nós,
ele seria um completo idiota se tivesse feito isso.
— E por isso vocês a mandaram para mim? — Jason inquiriu antes que
eu me recuperasse do choque por saber da armação. — Eu devia dar uma
surra nos três por fazerem isso. — Olhou feroz para Ryan, Alex e Jordan,
depois sorriu com candura para mim. — De qualquer forma, agradeço,
porque gosto de você, preciosa.
Lucky fechou a cara para o amigo.
— Espero que esse gostar a que esteja se referindo seja amigável, ou
vai andar por aí sem as bolas — sibilou entre dentes.
Jason riu para o amigo, sem se deixar abalar, e depois para mim.
— Você gritava inocência, não só em relação a sexo, mas a tudo, e isso
não é para mim. — Senti tristeza em sua voz. Jason devia estar se lembrando
da garota do seu passado. Queria tanto ajudá-lo, mas como?
— Por isso a incitei a ir para o Jason. — Alex olhava para o Lucky. —
Outro cara ficaria com ela, seria louco se não fizesse isso.
Lucky silvou um som ininteligível, mas ficou quieto.
— Vocês falam em inocência como se eu tivesse algo diferente —
retruquei.
— Oh, preciosa, acredite em mim: você é perfeita — declarou Jason
me fitando, mas logo desviou os olhos diante do rosnado de Lucky. — Mas
eu pego mulheres experientes, depois as dispenso sem compromisso. —
Olhou-me de lado. — Você é algo para guardar e proteger como uma joia
preciosa, como disse a você. Fico feliz por ter dito não, porque, se eu
tivesse feito algo com você, iria me arrepender para sempre.
— Por causa do Lucky. — Não era uma pergunta.
— Sim, mas também por você. Eu sabia que merecia mais do que
aquilo. — Sua testa se vincou. — Apenas toquei sua perna, e você quase
saiu correndo como se eu fosse estuprá-la. — Ele estremeceu. — Não sei,
mas tinha algo de diferente em você, eu apenas não sabia o quê. — Ele me
avaliava; todos pareciam fazê-lo.
Eu não podia dizer o que quase aconteceu comigo no passado, que fazia
com que eu me sentisse daquele jeito. Era algo que estava enterrado fundo
em minha mente, e eu esperava que continuasse lá por enquanto.
— Eu acho que foi o que aconteceu no beco com o pai de Shaw.
Quando uma pessoa passa por algo assim, demora um tempo para se
recuperar. — Sorri para aliviar a tensão de todos. — Também estava
chateada com Lucky, mas de uma coisa eu tinha certeza: não conseguiria
ficar com você, mas lhe agradeço por me dar um fora no Rave, pois, se
fôssemos para outro lugar, a coisa ia ficar bem embaraçosa.
— Acho melhor parar de falar sobre isso, Sam. — Lucky colocou as
mãos em minha cintura, abraçando-me por trás. — Estou fazendo de tudo
para me controlar ao ouvir você dizendo que ia ficar com outro cara. —
Seus dedos alisavam minha barriga esguia. Senti um arrepio atravessar meu
corpo dos pés à cabeça.
— Você não corre do toque dele. — Jason sorriu para mim. — Era isso
que você devia sentir quando ficasse com alguém. Por isso fico feliz por
vocês dois.
— O toque do Lucky é como uma energia elétrica, porque, com apenas
um, ele incendeia todo o meu corpo e me faz quase entrar em combustão. —
Minha voz estava fraca. — É como se dentro de mim tivesse um vulcão
adormecido e, com apenas um toque dele, tudo explodisse.
Lucky riu baixinho.
— Como isso? — Pressionou-se mais em minhas costas. Senti seu
hálito e sua boca em meu pescoço, e minhas pernas ficaram moles como
gelatina. Gemi, fechando os olhos. Meu corpo parecia um fio desencapado
ante seu toque.
— Não faz esse som para eles — ordenou, também ofegante, beijando
meu pescoço. — Esse som é só meu.
Era fácil para ele dizer, não era ele quem estava sentindo tudo aquilo,
todo aquele desejo vibrando pela minha pele, pelo meu corpo, como uma
maldita labareda. Concentre-se, Sam, entoei como um mantra. Embora eu
adorasse sentir isso, não gostava que fosse na frente dos outros.
— Droga! Se você quer transar com ela, pelo menos a leve para o
quarto, Lucky, ou vai querer que todos aqui gozemos ouvindo esses sons? —
queixou-se Ryan.
Saí dos braços do Lucky tão rápido que cambaleei e já ia caindo em
cima do Jason, o que não ia ser nada bom. Ele até levantou as mãos para me
segurar, mas Lucky foi mais rápido e me puxou para seus braços musculosos
e perfeitos, olhando ferozmente para o amigo.
— Se tocar nela, eu juro que quebro seus dois braços, e não haverá
lutas de MMA para você por um longo tempo — rosnou.
Olhei admirada para o Jason, que sorria, sem se preocupar com a
ameaça de Lucky.
— Você luta? Eu achei que tocava em alguma banda. — Estabilizei
minha respiração e meu autocontrole.
Ele revirou os olhos.
— A única coisa que toco são os punhos. — Levantou os antebraços e
punhos fechados na frente de seu rosto como se fosse lutar boxe.
— Agora, com vocês, o letal, mortal e destruidor... Balaaaaaaa, a fera
dos ringues! — Jordan ergueu a mão como se segurasse um microfone e
narrou como um locutor de lutas.
Arregalei os olhos.
— Seu nome no ringue é Bala?
Ele assentiu.
— Sim. Você não parece conhecer pessoas famosas, não é? — Parecia
mais uma afirmação que uma pergunta.
— Sim, não sou fã disso. — Franzi os lábios. — Certo, vamos nos
conhecer melhor. Ryan mexe com moda.
— Ei — ele me interrompeu, recriminando-me. — Não mexo com
moda. Falando assim, você parece diminuir a minha masculinidade. Sou
dono da Fashion Donovan.
Como se alguma coisa fosse tirar a masculinidade dele... O cara era um
Adônis sensual em pessoa, olhos cor de uísque, corpo torneado de músculos
definidos, pele bronzeada. Eu tinha dó da garota que se apaixonasse por ele.
Olhei, então, para Jordan.
— Você também é algum famoso que não conheço? — sondei. —
Porque parece o Thor com esse cabelo loiro e olhos azuis.
Ele riu, revirando os olhos.
— Não sou famoso, mas apareço nas colunas sociais por causa do meu
pai.
— E quem é ele? — perguntei curiosa.
— James Johnson. Você o conhece?
Sacudi a cabeça.
— Não, desculpe — murmurei.
— Ele é cantor de rock — esclareceu, não muito animado com isso.
Assenti.
— Isso explica por que não o conheço. Sou fã de música country —
esclareci, depois me voltei para o Jason. — Então você luta, Bala.
Ele revirou os olhos por eu usar seu apelido de ringue. Talvez eu não o
tivesse pronunciado da forma como suas fãs o gritavam. Esperava vê-lo lutar
em breve.
— Sim, sou campeão faixa preta em kung fu, muay thai e MMA. — Seu
tom era animado ao falar de sua ocupação.
Senti-me confusa.
— Se você sabe lutar assim, por que deixou Lucky bater em você?
Lucky riu, confiante.
— Rosa Vermelha, ele não deixou. O acertei porque sou faixa preta
também e mais ágil do que ele, apenas não sou lutador profissional.
— Você sabe lutar?
— Sim. Faço isso nas minhas horas vagas. — Seu tom parecia
satisfeito. Pelo visto, era seu hobby.
Fiquei de frente para ele e o fitei.
— Me ensina?
— O quê? Você quer aprender a lutar?
— Quero aprender a me defender de situações perigosas — esclareci.
Pensei em meu pai pegando-me à força e me batendo. Talvez, com alguma
prática e técnica, eu conseguisse evitar que isso acontecesse de novo. Bryan
podia me ensinar, mas morávamos em lugares diferentes e, além disso, com
meu casamento, ficaria complicado esconder meu segredo.
— Se for por isso, não precisa, o Simon vai levá-la a todos os lugares
aos quais quiser ir.
Fechei a cara para ele.
— Não vou andar por aí com um motorista e segurança — rebati. Tinha
comprado um carro usado havia poucos dias. — Para isso, eu tenho o meu
carro.
— Aquela lata velha? — Balançou a cabeça categoricamente. — Sam...
— Lucky Donovan, não ouse comprar nenhum carro para mim — rosnei
feroz —, se não quiser ter problemas.
Ele deu um suspiro frustrado.
— Não vou fazer isso.
Assenti, mas fiquei confusa por ele aceitar tão facilmente sem lutar o
dia inteiro. Deixei passar por enquanto.
— Ótimo, mas, e quanto às lutas, vai me ajudar? Eu estava procurando
uma academia de luta, até fui à Falcon... — interrompi-me, olhando para
Jason. — Seu nome é Jason Falcon?
— Sim.
— Então a academia Falcon é sua? — Não era bem uma pergunta.
Lembrei-me de alguém falar de Jason Falcon quando estive lá alguns meses
antes. Quem diria que um dia eu o conheceria em pessoa?
— Sim. — Sorriu como um gato. — Você vai aprender a lutar lá?
Sacudi a cabeça.
— Não, o meu salário não cobre o custo dela — sussurrei.
Ryan riu sacudindo a cabeça.
— Você vai se casar com um dos homens mais ricos do mundo e fica
preocupada com o custo de uma academia? — Seu tom era incrédulo.
— Já conversei com Lucky sobre isso, irei me casar com ele sem
comunhão de bens, então não tenho nada. Apenas quero a ele.
— Sam...
Encarei Lucky.
— Não vamos discutir sobre isso — protestei. — Você já aceitou as
condições, se lembra?
Ele estreitou os olhos.
— Mas isso não significa que vou deixar você viver só à custa do seu
salário, aliás, você nem precisa trabalhar depois de se casar. — Sua voz
estava um pouco animada com isso.
Olhei-o de forma dúbia.
— Você ficou maluco? Eu amo o meu trabalho e vou continuar
trabalhando. Não ouse fechar as portas para mim — rosnei.
— Se nem se casaram e já estão assim, imaginem depois? — observou
Rayla.
Encolhi os meus ombros.
— Talvez se ele não tivesse tanto dinheiro, não brigaríamos tanto —
murmurei comigo mesma.
Ele arregalou os olhos.
— O meu dinheiro te incomoda? — Seu tom era de ultraje.
— Sim, e muito. — Apertei os lábios. — Somos de mundos diferentes,
mas sou egoísta demais para ficar longe de você.
— Oh, Rosa Vermelha, você não vai para longe de mim nunca. —
Lucky me abraçou e sussurrou em meu ouvido: — Eu sinto seu corpo ansiar
pelo meu dentro de você, não é?
— Lucky... — Minha voz falhou.
Ouvi os outros rirem. Eu não era puritana, mas estava envergonhada por
não conseguir resistir ao Lucky na frente das pessoas.
— Sam, se você quiser, eu posso dar aulas a você — disse Jason.
— Não valoriza o que tem no meio das pernas? — sibilou Lucky.
Revirei os olhos.
— São só aulas, Lucky... — comecei, mas ele me interrompeu, com os
olhos furiosos:
— Aulas em que ele pode passar as mãos em seu corpo? — Sua voz
estava enciumada. — Nem morto!
Olhei para seus amigos.
— Ele sempre foi assim, um homem das cavernas? — sondei curiosa.
Ryan riu do apelido que dei ao seu irmão, e os demais o
acompanharam.
— Não, querida, ele transava e descartava as mulheres logo em
seguida. Todos aqui gostamos de sexo selvagem.
— Sexo selvagem? Como Christian Grey?
Ele arqueou as sobrancelhas.
— Vejo que leu Cinquenta Tons de Cinza.
— Sim, eu gosto do livro — sussurrei.
— Também gosta de ser amarrada e ter sexo selvagem? — perguntou
Jason, curioso e com as sobrancelhas erguidas.
Fiz uma careta, corando.
— Gosto de várias cenas quentes do livro.
— Cite uma — incentivou-me Jason.
Passei as mãos no cabelo.
— Hummm... — Procurei na minha mente. — Tem uma em que ele
prende Ana na cama com as mãos amarradas e vai passando uma pedra de
gelo em seu corpo. Fogo e gelo, uma mistura interessante.
— Essa cena é quente. — Rayla se abanou.
— Sim — concordei, sentindo-me excitada só em me lembrar. — Quer
dizer que vocês fazem isso direto?
Jordan sorriu.
— Deixar uma mulher presa enquanto a devoro é bem excitante. — Ele
me olhou de lado. — Você vai adorar isso.
Olhei para o Lucky.
— Você também gosta de amarrar mulheres?
Ele sacudiu a cabeça.
— Não — respondeu. — Já que isso inclui ter que colocar a boca em
todo seu corpo, algo que nunca fazia. — Ele me lançou um sorriso. — Mas,
com você, eu vou fazer tudo, já que gosta de cenas assim.
Fiquei vermelha com suas palavras e olhei para todos, mas, antes que
pedisse para mudar de assunto, Jason comentou:
— Você vai adorar cada parte disso.
— Certo, vamos mudar de assunto. — Olhei para Alex. — Eu liguei
para Alexia, mas ela está em uma palestra na Suíça.
— Minha irmã trabalha muito, vivo dizendo isso a ela. — Ele deu de
ombros.
— Você conhece a irmã dele? — perguntou Rayla confusa.
— Sim, estudamos juntas na faculdade — sussurrei. — Bem, vou tomar
um banho e tirar essa roupa, que parece incomodar o Lucky, mas não sei o
porquê.
— Não sabe? Querida, esse shortinho deixa suas coxas perfeitas
expostas, além de sua barriga, ainda mais com essa tatuagem exposta, na
qual todos os homens pensam em passar a língua. — Seu tom era um
resmungo.
Ri.
— Lucky, você não pode imaginar o que os outros estão pensando. —
Ergui as sobrancelhas. — Você diz isso só porque é você quem pensa nessas
coisas.
— Estou certo sobre isso — falou em um rosnado. — Sei o que cada
maldito bastardo aqui está pensando.
— Somos homens, querida, e você tem um corpo perfeito. — Ryan
piscou para mim, mas não vi interesse em seus olhos, apenas provocação
com o irmão.
— É melhor calar a boca — sibilou Lucky.
— Mas estou curioso. — Jason fitava minha tatuagem enquanto tomava
a sua bebida. — Que tatuagem é essa? Parece uma fênix, estou certo? Ela vai
até onde? Porque aí só aparece um pedaço das asas.
Sorri.
— Sim, é uma fênix e vai até um lugar ao qual nenhum de vocês vai ter
acesso. — Olhei para cada homem na sala e deixei o mais lindo para o final.
— Só você, sempre.
Ouvi vários engasgos distintos.
— Você quer dizer que ela vai até...
Lucky cortou Jason:
— É melhor não dizer essa palavra.
Mudei de assunto antes de fazer meu noivo perder a cabeça:
— Eu vou subir, mas antes quero saber, quando vamos para Vegas?
— O jatinho estará pronto às 3h da tarde.
— Jatinho? — pensei no Bryan dizendo que Lucky tinha preparado tudo
para Vegas naquele dia, mas ele não disse nada sobre um jatinho. O bastardo
sabia, por isso não disse nada! — Vamos de jato?
Lucky franziu a testa.
— Sim, por quê?
Suspirei.
— Eu acho que vou precisar de uma bebida antes — minha voz falhou
no final.
— Você tem medo de avião? — perguntou incrédulo.
— Sim, um pouco — admiti envergonhada.
— Se você quiser, podemos ir de carro. — Ele fez uma careta, talvez
pensando em dirigir por 4.073 quilômetros até Vegas só porque eu temia
voar.
— Não, está tudo bem. — Sorri para tranquilizá-lo.
Subi as escadas para o quarto dele e já fui tirando as roupas. Precisava
de água gelada para esfriar a vontade que havia entre as minhas pernas desde
que acordei. Nunca pensei que sexo fosse tão arrebatador assim, mas
adorava aquilo, aliás, estava amando o desejo incontrolável.
O banheiro de Lucky era do tamanho de três quartos meus, possuía um
espelho que pegava a parede inteira do lado direito e tinha uma banheira
grande e branca, um imenso boxe, um balcão enorme de mármore e um
lavabo creme.
Entrei debaixo do chuveiro gelado, mas a água fria não resolveu muito
o que eu estava sentindo. O fogo ainda estava ali, consumindo-me, achei até
que gritaria. Nunca havia me tocado antes, porque jamais sentira a
necessidade, mas há sempre uma primeira vez, não é? Escorei-me na parede
do banheiro, coloquei a mão direita entre minhas pernas e me toquei,
enquanto a outra mão acariciava meus mamilos rijos. Meu corpo tremia de
desejo.
— Mas que droga é essa?! — rugiu Lucky.
Afastei as mãos e olhei para ele, à porta do banheiro, olhando-me com
luxúria e raiva, mas não me importei muito com isso, apenas me joguei em
seus braços, mesmo molhada, querendo-o desesperadamente, tanto que
chegava a doer.
— Por favor, eu preciso... Por favor... — implorei ofegante.
Ele me pressionou na parede e me fitou com os olhos quentes de
luxúria.
— Você estava se tocando, Sam? — Estava com dificuldade de respirar
também. Sua voz estava rouca.
Assenti, sem forças para falar, enquanto sua língua mergulhava em meu
pescoço e chupava minha pele. Ele soltou um rosnado do fundo da garganta.
— Não quero que faça isso.
Assenti de novo, sem saber se ele podia sentir a minha cabeça se
mexendo. Minha voz havia muito tinha sumido.
Ele se afastou, e seus olhos eram ardentes.
— Estou falando sério, Sam. — Seu olhar estava grave. — Se você
estiver com vontade de transar, então me chame, que irei para você. —
Pegou meu seio e o apertou, beliscando a ponta. Gemi. Ele colocou a mão
entre minhas pernas e a pressionou, esfregando meu clitóris. — Só eu posso
fazer isso, está me ouvindo? Eles são meus. Todo o seu corpo é meu.
— Sim... Por... favor...
— Oh, querida, eu vou cuidar de você. — Pegou-me nos braços e me
sentou no mármore da pia. Abriu as minhas pernas e colocou a boca entre
elas, chupando, mordendo, lambendo meu nervo inchado e dolorido de
desejo por aquele homem lindo. — Isso é meu, e só eu posso tocar, chupar,
morder e comer — rosnava. — Nem você pode tocar, está me ouvindo?
Apenas consentia movendo a cabeça. Não sabia se ele podia ver, mas
também não me importava. Sua boca se afundou de novo em mim, e tudo
gerou uma explosão. Meu corpo se arqueava, querendo mais dele, ainda
mais quando ele chupou meu clitóris como se fosse algo saboroso, de outro
mundo, como néctar ou ambrosia.
— Oh, Lucky! — Sentia o meu orgasmo prestes a chegar. Minhas mãos
apertavam sua cabeça para a afundar mais em mim, levando-me outra vez ao
esplendor.
— Porra, ela é saborosa como o maldito mel... — Ele enfiou dois
dedos também, e logo eu estava gritando seu nome de novo e de novo.
Gozeis várias vezes seguidas, nem sabia que isso era possível, mas, com a
língua de Lucky, foi. Ele continuou com os dedos dentro de mim e levantou o
rosto para beijar o meu pescoço.
— Ela é minha, e só eu posso fazer isso. — Mexeu os dedos em meu
interior, e eu agarrava suas costas, apertando-o e clamando seu nome.
— Eu. Quero. Você. Dentro. De. Mim. Agora. — Enfiei minhas unhas
em sua pele.
— Seu desejo é uma ordem, Rosa Vermelha. — Ele se afastou um
pouco, pegou a camisinha dentro do bolso de sua bermuda e rasgou o
saquinho com os dentes. Tirou as suas roupas e se encaixou dentro de mim
tão fundo que gritei.
— Nossa! Você é apertada, minha Rosa Vermelha. — Sua voz estava
grave de desejo. — Só minha e vai ser para sempre.
— Lucky! — Agarrei seus cabelos, olhei seus olhos quentes e sua boca
perfeita. Eu queria tanto beijá-lo, mas não podia pedir isso a ele, mesmo que
doesse dentro de mim não o fazer.
— Você quer me beijar, não é?
Fitei seus olhos, escuros de um prazer tremendo. Ele parecia bêbado de
desejo, assim como eu.
— Não se preocupe comigo, apenas mexa essa bunda bonita —
sussurrei sem fôlego.
— Bonita, hein? — rosnou e colou a sua boca na minha, devorando-a
com fome enquanto estocava dentro de mim. Meus cabelos estavam
enrolados em um punho, e sua outra mão pressionava minha bunda, enquanto
ele devorava minha boca e bombeava dentro de mim. Minhas mãos estavam
em suas costas, as unhas tão apertadas que achei que perfurariam a sua pele,
mas ele não reclamou, então não liguei.
Meu corpo virou bilhões de explosões de fogos de artifício quando
cheguei ao meu clímax arrebatador, e eu gemia em sua boca.
— Esses gemidos são só para mim! Nunca mais geme perto de ninguém.
— Seu corpo ficou tenso. Eu sabia que ele estava prestes a gozar.
— Sim — respondi, enquanto ele gozava dentro de mim, apertando-me
como se quisesse se fundir comigo.
— Você é tão linda! — declarou. — Meu raio de luz que consome a
escuridão.
— Amo você, Lucky. — Beijei seu coração, com meu nome nele, seus
olhos quentes e vidrados em mim.
— Eu também, Rosa Vermelha, enquanto eu respirar nesse mundo.
13 – Casamento
SAM
A viagem para Las Vegas não foi muito longa no jatinho particular do
Lucky. Shaw foi com os outros no jatinho de Ryan. Rayla se ofereceu para
levá-lo; imaginei que ela quisesse que eu ficasse a sós com Lucky. Tive que
tomar um pouco de uísque para relaxar, mas o que me fez relaxar mesmo foi
o toque do Lucky a viagem inteira. Ele me beijava e alisava minha pele,
assim nem pensei muito que estava nas alturas.
Seu jatinho era bem elegante, como tudo do Lucky. Tinha duas carreiras
paralelas de bancos estofados e cobertos de veludo. Possuía até uma suíte,
aonde o Lucky me levou, com assento reclinável, outro assento para
visitante, uma cama grande com colchão macio e lençóis de linho egípcio,
minibar e TV de LED.
— Muito lindo — falei, olhando a cama e com vontade dele de novo.
Nós dois tínhamos transado duas vezes no banheiro de sua casa, mas a
vontade persistia. Olhei para ele com um olhar de desejo. — Acha que
consegue mais?
Ele sorriu.
— Ah, Rosa Vermelha. — Pegou-me pela cintura e me colocou deitada
na cama. — Levante as mãos.
Fiz o que ele pediu, ergui as mãos rumo à cabeceira da cama. Lucky
tirou a minha blusa e desabotoou meu sutiã. Fiquei ali, à sua frente, com
meus seios de fora. Embora ele já viesse provando meu corpo desde o dia
anterior, nunca era o suficiente.
— O que vai fazer agora? — sussurrei sem fôlego. Ele estava vestido
com uma camisa social esportiva listrada de azul e preto e uma calça preta.
Tirou a gravata preta que estava usando e se debruçou sobre mim,
amarrando as minhas mãos na cabeceira da cama com ela. Seus olhos
estavam tão quentes que eu podia sentir a minha pele pegando fogo.
— Vou fazer isso — respondeu com a voz rouca, tirando a minha calça
jeans e a calcinha.
Ficou ali de pé, seus olhos devorando meu corpo nu e amarrado na
cama. Seu olhar incendiava toda a minha pele como um laser, como se eu
fosse a coisa mais linda e preciosa que ele já havia visto em sua vida. Eu
não podia me sentir mais feliz do que já era. Aquele homem era meu amor,
minha vida, minha alma.
— Tão porra de linda!
— Vai ficar aí só me olhando ou vai entrar em ação? — provoquei
ofegante, abrindo as minhas pernas em um convite. Eu podia corar, sim, mas
não deixaria a vergonha de estar nua à sua frente me dominar, afinal, ele ia
ser meu marido.
Ele me lançou um sorriso libidinoso. Estava de pé fora da cama, mas
perto de mim, tão perto que eu podia sentir seu cheiro, uma mistura de
sabonete, desodorante masculino e aquela fragrância perfeita da Dolce &
Gabbana.
— Tão ansiosa! — Pousou os olhos no meu corpo mais uma vez com
desejo, luxúria, amor e devoção. — Uma verdadeira obra de arte! —
Debruçou-se sobre mim, beijou a minha testa e se afastou. — Eu já volto.
Arfei.
— O quê? Você vai sair?!
— Não vou demorar, Rosa Vermelha.
Soltei um bufo, tentando me soltar, mas sem conseguir.
— Eu não acredito que vai sair daqui e me deixar nua e amarrada! —
reclamei, mexendo as mãos.
Seu sorriso era quente, lindo de morrer.
— Não se preocupe, querida, eu vou cuidar de você. — Eu podia
detectar a verdade em cada palavra, bem como a fome.
Suspirei.
— O que tem mais importante lá fora do que nós... — Não consegui
terminar e virei o rosto corado.
Ele tocou a minha face com as pontas dos dedos. Seus olhos eram
devassos, então lambi meus lábios.
— Não tem nada mais importante que devorar esse corpo gostoso. —
Beijou as minhas pálpebras e me deu um selinho.
— Então por que vai sair? — perguntei confusa, querendo mais do seu
toque e dele dentro de mim.
— Uma surpresa para você, minha futura esposa.
— Não quero surpresa, quero você agora.
Ele riu do meu resmungo e beijou a ponta do meu nariz.
— E você vai ter cada centímetro meu. Agora espere aqui por mim —
disse e se levantou, indo até a porta de correr do quarto.
Como ele pode me deixar assim e sair para fazer sabe-se lá o quê?
Maldito seja!
— E se alguém entrar aqui enquanto você estiver fora e me vir assim,
nesse estado? — provoquei-o.
Ele parou antes de chegar à porta e olhou para mim, para o meu corpo
nu, estendido na cama. Pressionei minhas pernas uma contra a outra para
abafar o desejo ardente.
— Ninguém vai entrar aqui e ver o que é meu. — Seu tom era sério ao
dizer isso, mas os olhos, apaixonados. — Porque essa porta só é aberta com
código, e ninguém o possui, somente eu.
Respirei fundo, controlando-me.
— Eu vou te dar um minuto; se não aparecer, irei começar a gritar —
ameacei-o.
— Você vai gritar, sim, mas por outra coisa — disse-me com um
sorriso lascivo e saiu pela porta de metal.
Comecei a contar para passar o tempo; era melhor do que pensar que
estava nua, exposta e presa. Mesmo sabendo que ninguém mais podia me ver,
isso era bem constrangedor. Eu esperava mesmo que Lucky fizesse valer a
pena.
Depois de eu contar até cem, a porta do quarto se abriu. Meu coração
parou ao imaginar que não fosse o Lucky, mas era ele com uma bandeja de
comida: morangos, iogurte, champanhe e uma vasilha com gelo.
Ele sorriu ao colocar a bandeja recheada em cima de uma mesinha que
tinha ao lado da cama.
— Não demorei. — Parecia orgulhoso de si mesmo.
Fechei a cara.
— Você me deixou aqui para buscar comida? — Meu tom era ultrajado,
revelando inclusive um pouco de raiva.
— Ei, lindinha, não fique brava comigo — pediu ele, aproximando seus
olhos dos meus. — Tudo isso aqui vai te dar um prazer tremendo.
Ergui as sobrancelhas.
— Como? Me alimentando? Eu não estou faminta de comida, e sim de
outra coisa... — Olhei para suas calças, mordendo o lábio inferior. Eu devia
ter virado uma ninfomaníaca, mas não ligava, porque estava adorando esse
desejo e fome que tinha por ele.
Lucky sorriu pervertido ao seguir o meu olhar.
— Sempre faminta.
— Oh, você não sabe o quanto — sussurrei. — Se as minhas mãos não
estivessem amarradas, eu já teria me tocado.
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Por que acha que as amarrei?
— Pensei que tivesse me amarrado por outra coisa. — Meu tom era
amargo.
— Vejo que a minha mulher está impaciente — disse, alegre com esse
fato, ainda mais sabendo que era ele a me deixar assim.
— E como! — rosnei, depois falei com um tom calmo e meloso: — Por
favor, preciso de você para acabar com esse fogo que parece me consumir
por dentro quando você não me dá o que eu quero.
Lucky começou a tirar a camisa, e não pude deixar de adorar seu corpo
saboroso, que estava diante de mim, cheio de músculos fortes e definidos. Eu
podia até contar os gominhos que tinham em seu abdômen.
— Está vendo algo que gosta? — provocou malicioso.
— Você está sendo mau — acusei-o.
Lucky apenas sorria enquanto tirava a sua calça e boxer de um jeito
lento, como se fosse para me matar a cada segundo vendo seu corpo gostoso.
Assim que ficou nu, subiu na cama, beijando meus pés com leves toques dos
lábios.
— Lucky...
Seus lábios estavam em minhas coxas. Eu sentia o toque queimando
minha pele, seu hálito quente beijando-a, fazendo-me arder. Gemi, mexendo-
me, querendo me soltar e voar em seus braços para Lucky acelerar e me dar
o que eu tanto ansiava.
— O que você quer que eu faça, querida? — Senti a sua língua em
minha virilha, bem perto do meu centro, que estava latejando. — Você quer
que eu beije aqui? Ou aqui? — Beijou o outro lado da virilha, mas nunca
onde eu ansiava.
Meu corpo saltou como se seu toque agisse como um ímã.
— Lucky... por favor... — Meus olhos estavam fechados, enquanto eu o
queria dentro de mim. Necessitava tanto dele como precisava de ar.
— O que você quer? Me diz, que eu faço. — Sua voz era grave de
desejo e luxúria ao passar a língua em minhas coxas, perto do meu ponto
sensível, mas nunca onde pulsava.
— Por favor... — Abri mais as pernas e levantei os quadris, querendo
que ele colocasse a boca em mim. Eu poderia ficar constrangida depois,
porque agora não ligava para isso, apenas o queria.
— Eu quero palavras — exigiu ele, soprando minha parte sensível.
Seu hálito quente queimou ainda mais que seu toque. Eu não acreditava
que ele ia me fazer dizer as palavras, mas, para acabar com o fogo e o
desejo, eu faria tudo.
— Quero a sua boca em mim.
Ele se afastou, porque não senti mais o seu toque em minha pele. Abri
os olhos e encontrei os dele em mim, com desejo ardente, escuros de fome.
— O que foi? Se não me quer, então solte as minhas mãos e me deixe
cuidar de mim.
Seus olhos se estreitaram. Ele se levantou da cama, foi até a bandeja,
pegou um morango bem vermelho, mergulhou-o no iogurte e veio com ele
estendido em minha direção.
— Sabe o que vou fazer com isso?
Franzi a testa.
— Comer? — zombei.
Ele revirou os olhos verde floresta e subiu na cama com o morango e
um copo pequeno com iogurte.
— Agora vou precisar que você fique quietinha. — Não pareceu um
pedido, e sim uma ordem. Eu estava prestes a reclamar, quando ele colocou
o morango na minha boca, impossibilitando-me de falar. — Não o coma ou o
morda até eu pedir.
Fuzilei-o com os olhos, já que a fruta me impedia de falar. Eu até podia
sentir o suco agridoce de morango com iogurte em minha boca. Grunhi
enquanto Lucky beijava meu rosto.
— Agora eu vou cuidar da minha futura esposa, porque sei que está
muito quente, então vou refrescá-la. — Pegou o copo de iogurte gelado e
começou a despejar o creme sobre mim, como se eu fosse um bolo e ele o
estivesse confeitando. — Parada — mandou, pois eu já estava me mexendo
sentindo o iogurte gelado sobre minha pele ardente. Fiquei imóvel, vendo a
sujeira que ele estava fazendo comigo. O iogurte escorria sobre meus seios
duros e no meio da minha barriga, fazendo uma linha reta até o meu centro
quente.
— Hummm! — Ofeguei ao sentir o gelo e o fogo ali, juntos.
— Delícia — ele sussurrou, colocando o copo na mesinha e olhando a
sua obra de arte no meu corpo. — Magnífica!
— Hummm... — isso era tudo o que eu podia dizer, já que estava com a
boca cheia.
— Porra, que visão de outro mundo! — Lucky colocou a boca sobre o
meu seio direito e sugou com fome o iogurte que estava ali, depois foi para o
outro seio, mordiscando e lambendo. — Esplêndidos!
Meu corpo queimava com ele me lambendo assim, quase me levando à
combustão espontânea. Céus, era como se eu estivesse dentro de uma
fornalha sem me queimar, porque a única coisa que eu sentia era um
tremendo prazer que me fazia ver estrelas, aliás, uma constelação inteira.
— Hummm... — queria gritar o nome dele e pedir que se apressasse e
fizesse esse fogo sumir, mas, com a boca cheia, não tinha como falar, apenas
gemer.
Ele seguiu sugando o creme gelado que estava na minha barriga, e senti
a sua língua no meu umbigo e no meu baixo-ventre. Meu corpo se ergueu,
querendo-o logo; se eu não o tivesse, morreria. As pessoas morriam de
desejo? Eu não sabia, mas eu morreria, sim, se ele não matasse logo o fogo
que me consumia.
— Você é muito gostosa. — Colocou a boca no meu centro, e tudo
explodiu em mim enquanto ele sugava cada canto do meu clitóris como se
ele fosse o iogurte que estava sobre mim.
Meu corpo explodiu em milhões de estrelas no espaço cósmico. Nem
percebi que havia mordido o morango, partindo-o ao meio, e o suco desceu
pelo meu queixo. Fiquei mole enquanto tremia após o orgasmo. Lucky se
elevou sobre mim e passou a sua língua mágica pelo suco do morango,
depois comeu o pedaço da fruta que tinha caído entre os meus seios.
— O morango mais gostoso que já comi em toda a vida. — Seu olhar
estava cálido. — Está mais calma?
Engoli a outra metade do morango saboroso.
— Ainda não. — Olhei para seu pau a todo o vapor, necessitando de
cuidados. — Ele precisa ser descarregado.
Lucky sorriu.
— Oh, e ele vai. — Sua voz soou sexy. Posicionou-se no meio das
minhas pernas, já preparado com a camisinha, afinal, não queríamos que eu
engravidasse tão cedo.
— Quero que me desamarre. Preciso tocar você.
Ele me soltou e massageou os meus pulsos, que estavam vermelhos por
causa da minha pele branca.
— Você se machucou? — De repente, ele parecia preocupado.
Sacudi a cabeça e coloquei as mãos em sua bunda, fazendo-o entrar em
mim.
— Não. Agora eu preciso sentir essa belezura dentro de mim ... —
Gemi, incapaz de terminar de falar assim que ele se apossou de mim.
— Não chame meu pênis de belezura, isso diminui a minha
masculinidade — repreendeu ele.
Revirei os olhos.
— Nada que eu disser vai diminuir seu brinquedo. — Coloquei meus
dedos em seus cabelos e puxei sua cabeça para mim como se eu fosse beijá-
lo, mas não o fiz, apenas sussurrei: — Agora me fode, me faz ver estrelas e
gritar seu nome em cada canto deste quarto.
E assim ele fez, três vezes, até chegarmos a Vegas, onde seria o nosso
casamento e onde eu teria o Lucky para sempre em minha vida. Era como se
eu estivesse sonhando. Não queria acordar e descobrir que tudo era um
sonho lindo.
Ana e Diana foram conosco no jatinho de Lucky. Eu havia chamado
Michael, mas ele disse que não podia ir, pois tinha um compromisso
importante. No entanto, Ana me informou que ele não tinha nenhuma reunião,
não naquela semana. Lucky me disse que ele tinha sentimentos por mim, por
isso não ia aparecer em meu casamento. Tentei não me sentir culpada por
isso, pois não queria que ele sofresse, pois gostava de meu chefe como um
amigo.
Lucky alugou uma igrejinha pequena no centro de Vegas. Ali, tudo
brilhava à noite. O esplendor era mágico. Gostei muito, ainda mais porque
Lucky seria meu para sempre.
Rayla me levou a uma loja de vestidos de noiva de todos os tipos e
tamanhos. Escolhi um comprido e com alças finas, mas ela sorriu e me
mostrou um lindo vestido branco, que era um pouco caro para usar uma noite
só. Argumentar com Rayla era quase tão irritante e cansativo quanto debater
com Lucky, por isso eu sabia que não ia adiantar.
Quando me vi no espelho, quase tive um troço. O vestido era apertado
em minha cintura, mostrando as minhas curvas, tomara que caia, e na região
dos seios havia vários brilhantes que eu podia jurar serem verdadeiros. A
parte de baixo era rodada e com uma camada de renda branca na forma de
rosas. Gostei, mesmo que fosse uma peça bem cara. Não vi o preço, mas
garantia que devia ser exorbitante.

Logan chegou depois e já estava enturmado com todos os nossos


amigos. Não falei muito com ele, já que Lucky estava ao meu lado o tempo
todo, mas esperava ter a oportunidade de pegá-lo sozinho para
conversarmos.
Perguntei ao Lucky por que gostava tanto de Logan. Pelo breve
momento em que vi os dois juntos, no evento da Martínez, notei que
pareciam se amar como irmãos.
— Eu o conheci quando fui a minha empresa em Seattle. Estava na rua,
dirigindo para o hotel, quando Logan entrou na frente do carro, quase me
fazendo atropelá-lo... — Lucky estremeceu. — Eu fui até ele e vi que tinha
algo errado.
Sentei-me perto dele. Estávamos no hotel perto da igreja onde íamos
nos casar.
— O que ele tinha?
— Seu corpo estava todo machucado, e saía sangue de sua boca. Ele
desmaiou nos meus braços. Pensei que estava assim por ter participado de
alguma luta de rua, mas a médica no hospital ao qual o levei disse que ele
havia apanhado com algo pesado, como uma barra de ferro. Suas lesões
eram tão profundas que arrebentaram seu fígado... Precisava urgentemente de
um transplante. — Ele pegou minha mão e a apertou. — Tentei conseguir um
doador para ele em sua família, mas, quando cheguei à sua casa para
conversar com seus pais, descobri que sua mãe tinha morrido quando era
criança e que o garoto era cuidado pelo pai — riu amargo —, se é que
podemos chamar aquilo de pai. O filho da puta bêbado disse que o menino
podia morrer, que ele não estava nem aí para ele e que, se ele tinha
sobrevivido, então era porque não havia batido o suficiente.
Meu coração sangrou ao ouvir aquilo. Como monstros como ele tinham
filhos? Não deveriam ter essa capacidade nunca, assim como meus pais.
— O que aconteceu com esse homem? Ele foi preso?
— Eu o denunciei às autoridades, e o filho da puta vai demorar anos
para ver a luz do dia — rosnou com os punhos cerrados.
— Então você doou seu fígado ao Logan, não foi? — Não era bem uma
pergunta, já que eu tinha ouvido os dois conversando no evento.
Ele me olhou de lado com um sorriso.
— Estava ouvindo naquele dia, não é? Tive a sensação de estar sendo
observado, mas não tinha certeza.
Corei.
— Sim, ouvi tudo desde o começo. Aquilo me fez amá-lo ainda mais.
Naquele momento, eu vi o homem lindo e maravilhoso que havia por baixo
daquele cara arrogante e controlador. — Beijei seu rosto. — Logan parece
um garoto legal e gosta de você.
Lucky sorriu. Seus olhos sempre brilhavam ao dizer ou ouvir sobre
Logan, assim como eu ao falar de Shaw. Eu me perguntava: por que ele não o
adotara? Contudo, depois do trabalho que ele teve para aceitar Shaw, eu o
entendia.
— Sim, ele é um garoto incrível. Quando tudo aconteceu, seu pai foi
preso e ele não tinha um lugar para ficar. Eu o trouxe comigo para minha
casa em Manhattan até conseguir um lar para ele. Sabia que era raro casais
quererem adolescentes, mas consegui um casal de amigos em Seattle.
— Por que não ficou com ele você mesmo? — sondei curiosa.
Ele suspirou.
— Rosa Vermelha, você sabe como eu me sentia em relação a adoção.
Consegui superar isso graças a você, porque perder você seria mil vezes
pior do que o meu trauma em relação a isso. — Beijou minha testa. — Você
me transformou em algo bom.
— Lucky, você já era bom antes de mim, só autoritário e rígido. Então
vai conversar com Logan?
Ele franziu o cenho.
— O que quer dizer?
— Lucky, meu amor, eu vi o olhar de Logan ao ver você com Shaw lá
na sala. Era como se ele se perguntasse o motivo de você não ter ficado com
ele quando tudo aconteceu. Não entendi na hora, mas, agora que falou sobre
ele ter ficado com você por um tempo, percebi que era essa a dúvida dele.
— Eu não podia ficar com ele naquele tempo, não consegui, mas
queria... — sussurrou.
— Eu sei, querido, mas talvez ele não saiba. Converse com ele, ok?
Ainda temos tempo até o casamento.
— Tudo bem, vou conversar com Logan. Você quer ficar com ele? Se
quiser, posso falar com o garoto...
— Lucky, meu amor, hoje ele tem uma família que o ama muito, não é?
— Esperei ele assentir e continuei: — Mesmo se ficássemos com ele, Logan
não seria feliz, porque ama seus pais adotivos. Você só precisa explicar suas
razões por não ter o adotado naquela época. Ele vai entender, porque, pelo
que vi, Logan é um garoto especial e centrado.
— Obrigado, linda! Você é a melhor mulher do mundo. — Beijou-me,
depois se levantou e foi ao quarto do Logan, que estava no mesmo
apartamento que nós, na cobertura do hotel.

Entrei na igrejinha em Vegas. Um ministro administraria o casamento.


Eu não queria mais nada, só aquele homem que estava no altar e que seria
meu marido, lindo com um terno Vanquish preto com gravata-borboleta.
Ryan estava gravando nosso casamento. Pedi a ele que fizesse isso para
mim, assim, eu enviaria a gravação a vovó e Bryan, já que nenhum dos dois
pôde estar comigo.
Quando chegou a hora de nossos votos, eu disse o que Lucky
verdadeiramente significava para mim. Ele havia se tornado mais do que o
ar que eu respirava. Ficamos de frente um para o outro e de lado para os
pouquíssimos convidados que tínhamos, os amigos dele – Jason, Alex,
Rayla, Ryan, Jordan, Logan e Simon, que, além de funcionário, era um amigo
fiel – e, da minha parte, Shaw, Diana e Ana.
— Lucky Donovan, quando você entrou em minha vida, foi como um
trem de carga, embora eu não me arrependa de ter entrado naquele elevador
e ter conhecido o homem mais lindo, sexy e quente que já conheci. — Sorri
para ele em meio às lágrimas. — E bota lindo nisso! — Respirei fundo,
ignorando seu olhar cálido. — Você me ensinou o significado do amor
verdadeiro e a ser feliz como nunca fui. Amo você por sua personalidade
difícil, rabugenta, controladora e cheia de poder. Prometo amar o homem
bom e também o quebrado e selar todas as suas rachaduras com meu amor
incondicional. Prometo amá-lo e fazê-lo feliz enquanto eu viver, porque sou
do meu amado, e meu amado é meu.
Uma vez, eu fui a uma igreja com minha avó, quando tinha 16 anos. Não
me lembro do nome do templo, mas estava acontecendo um casamento. Foi
onde ouvi a noiva dizer essa frase: “eu sou do meu amado, e meu amado é
meu”. Minha avó dizia que, na igreja que ela frequentava, os fiéis
acreditavam que essa frase bíblica fazia os casamentos serem mais
abençoados por Deus, por isso a usei no meu.
Terminei de declarar todo o meu amor, que eu sentia por ele com tal
vigor que podia senti-lo em cada parte da minha alma e do sangue que corria
em minhas veias.
Chegou a sua vez de falar o que sentia por mim. Apenas em ouvir a sua
voz demonstrando seu amor por mim, enchi-me de júbilo.
Lucky respirou fundo e parecia que também queria chorar, mas era mais
controlado do que eu, que já estava chorando.
— Antes de minha preciosa mulher entrar em minha vida, eu vivia em
um mundo em que havia estrelas no céu, o Sol que iluminava o dia e a Lua
que iluminava a noite, mas nada disso podia iluminar a escuridão que havia
em mim, porque eu era cego, até que encontrei você, Rosa Vermelha, naquele
elevador, e ali o Sol nasceu em minha vida, como se ele estivesse
adormecido por 28 anos. De repente acordei, o Sol resplandeceu e se
apossou de mim, curando o que estava quebrado em meu coração e em minha
alma danificada, que agora pertencem a você, minha Rosa Vermelha — disse
isso tudo sem pausas longas, mas eu o sentia inspirando às vezes, como se
tentasse se controlar.
Eu estava sem ar por sua declaração intensa e por saber que significava
tudo aquilo para ele, assim como ele significava para mim.
— Pode beijar a noiva — falou o reverendo assim que declaramos os
nossos votos.
Lucky me puxou para seus braços e me beijou de forma intensa e
possessiva por alguns minutos, deixando-me sem fôlego e com o corpo
pegando fogo.
— Agora você é minha — sussurrou em meu ouvido como uma
adoração divina.
— E você é meu! — falei com júbilo, beijando a sua boca. Eu queria
aprofundar mais o beijo, mas meu menininho estava ali, assistindo-nos, então
me controlei. Deixaria o desejo para depois.
Quando fui assinar a certidão de nosso casamento, tentei a ler para
comprovar se era real, para ter certeza de que Lucky Donovan era meu
daquele momento em diante, mas não consegui, já que sua boca não saía do
meu pescoço e do meu ombro. Isso era uma distração e tanto.
Assim, ocorreu tudo bem em meu casamento, embora, no final da
cerimônia, houvesse algum alvoroço de jornalistas querendo entrar na capela
onde estávamos. Tivemos que sair pelas portas dos fundos às pressas para
não sermos vistos. Enquanto isso, os guarda-costas que Lucky tinha levado
conosco os impediam de entrar.
Nunca tive tanto medo em minha vida de ser filmada ou sair em algum
tabloide, já que notícias assim correm igual peste em uma aldeia. Entretanto,
graças aos Céus, deu tudo certo para nós. Tirando o incidente dos fotógrafos,
o resto foi perfeito, embora eu preferisse que Bryan e vovó estivessem ali.
Eu sabia que estava sendo covarde por não contar ao Lucky a verdade sobre
mim, mas temia perdê-lo.
Aquele era o meu casamento dos sonhos com o homem perfeitamente
lindo e sexy por quem me apaixonei. Nunca pensei que amaria uma pessoa
assim. Eu estava feliz, não, feliz era pouco, era mais como transbordante de
êxtase.
14 - A Viagem
SAM
Nossa lua de mel foi perfeita e cheia de alegria. Não era para irmos à
lua de mel logo após o casamento, só mais para frente, mas, como sempre,
Lucky interferiu, ligando para Michael e pedindo minhas férias antecipadas.
Fiquei furiosa com ele, porque só soube disso quando seu jatinho pousou em
Aspen. Liguei para o Michael a fim de me desculpar e dizer que eu iria
trabalhar na segunda-feira, mas ele me liberou durante aquele mês para eu
aproveitar a minha lua de mel, embora eu ouvisse a dor na sua voz, o que me
fez sentir mal. Todos os nossos amigos ficaram em Vegas após meu
casamento para se divertirem, menos Logan, que voltou para Seattle
prometendo que iria passar as férias de final do ano conosco.
Nós ficamos uma semana em Aspen, depois fomos a um cruzeiro no
Oceano Pacífico. Foi um dos momentos mais lindos da minha vida. Shaw foi
conosco, por isso não foi bem uma lua de mel, foi mais como férias em
família, um tempo que eu estava adorando passar ao lado do homem que eu
amava como nunca amei ninguém em minha vida e com meu filho.
Um mês depois do casamento e das férias, Lucky e eu fomos à
Disneylândia levar Shaw para passar o dia e ir a todos os brinquedos,
embora ele não tivesse andado em todos, pois eram tantos que logo se
cansou. Todavia, nunca o vi tão feliz como naquele dia. Aquilo me encheu de
uma alegria sem fim, tanta que achei que meu coração fosse explodir. Foi o
aniversário mais feliz que ele já teve. Fiquei feliz em lhe proporcionar isso.
No último brinquedo, a montanha-russa, fiquei para trás, porque, quando subi
na roda-gigante, fiquei enjoada e com medo de vomitar lá em cima. Lucky
queria chamar o médico, mas eu não precisava, afinal estava bem. Devia
apenas ter sido algo que comi e não me fez bem, mas, fora isso, eu estava
completamente feliz, porque tinha uma família que eu amava demais.

Na sexta-feira, após um mês e meio do casamento, fui visitar Lucky na


empresa e me deparei com uma conversa de Kevin ao telefone com uma
mulher. Falavam de uma transferência de dinheiro da empresa de Lucky para
uma conta na Suíça.
— Sim, senhora, eu vou transferir logo o dinheiro.
Saí dali antes que ele me visse. Não ia deixar assim, porque Lucky não
merecia que isso acontecesse com ele. Peguei meu telefone e liguei para o
Bryan. Ele era o único que podia me ajudar com isso.
— Anjinho, como tem passado em sua vida de casada? Diga que Lucky
está tratando você bem, porque, senão...
Interrompi-o:
— Lucky é o homem mais amoroso e carinhoso que já conheci em
minha vida.
— E onde eu fico nessa? — inquiriu, magoado.
— Você é o irmão mais perfeito do mundo — anunciei com júbilo e
depois falei sério: — Preciso que faça algo para mim.
— Luz da minha vida, você sabe que faço qualquer coisa por você. Eu
te dou a Lua se me pedir.
Revirei os olhos ante a hipérbole, embora ele não pudesse me ver.
— Quero que faça um dossiê completo de um cara chamado Kevin
Brown. Ele trabalha para o Lucky — sussurrei. — Acho que está roubando
do Lucky, porque ele falou com outra pessoa de uma transferência para a
Suíça.
— E você está preocupada com o patrimônio do seu marido, Anjinho?
— brincou ele.
Bryan sabia que eu não era interesseira, mesmo que a mulher que nos
colocou no mundo sempre dissesse isso.
— Não seja bobo — repreendi-o. — Apenas estou preocupada com
Lucky, porque ele não merece isso.
— Por que você acha que consigo fazer isso? — ele perguntou em um
tom nada sério.
— Meu menino, eu sei que você pode fazer isso e muito mais. — Entrei
em um corredor longo em que uma das paredes era cor de creme, e a outra,
de vidro, com vista para a cidade linda. — Você é um hacker brilhante, por
isso o departamento de polícia o contratou. Acredito que logo será recrutado
pelo FBI ou a CIA, já imaginou?
— Dificilmente. — Sua voz estava rouca, como se ele estivesse
escondendo um segredo ou algo assim. Deixei passar, porque, se fosse algo
importante, ele me diria.
— Então, por favor, faça isso por mim.
Ele bufou.
— Sim, eu faço, mas nunca mais me chame de menino, por favor. —
Riu zombeteiro. — Porque isso diminui a minha masculinidade, que, por
sinal, é bem elevada.
Revirei olhos.
— Oh, maninho, nada do que eu diga vai diminuir seu brinquedo, afinal
você anda pendurado em mulheres lindas o tempo todo — declarei com
ceticismo. — Você é um Adônis, meu querido.
Ele riu descaradamente.
— Sim, isso é verdade — concordou com tom matreiro. — As
mulheres com quem fiquei realmente são lindas e gostosas, e elas dizem que
sou bom de...
Cortei-o:
— Me poupe dos detalhes sórdidos. — Falei em um tom leve: — Eu
vou visitar a vovó amanhã e depois vou ao seu apartamento. Por favor, não
leve ninguém lá nesse fim de semana, tudo bem? Porque vou levar Shaw
comigo e não quero que meu filho veja nada indecente.
— Ele ia gostar disso.
— Bryan... — repreendi-o ultrajada.
— Estou brincando, maninha — ele me tranquilizou. — Prometo que
não haverá ninguém lá.
— Até mais — sussurrei. — Eu amo você.
— Eu também, maninha, vou esperá-la em casa.
Encerrei a ligação e cheguei ao escritório do Lucky. Sua recepcionista
se levantou e estreitou os olhos.
— O Lucky está? — perguntei.
A garota me observava de cima a baixo. Notei que seus olhos
escureceram com ar invejoso. Meus cabelos estavam soltos nas costas, e eu
vestia saia lápis e blusinha branca. Achei um pouco lisonjeiro.
Aquela não era a Nancy, a mulher que trabalhava ali quando entrei
naquele dia para xingar o Lucky. Era morena, estava com cabelos presos em
um coque no alto da cabeça e tinha corpo de modelo.
— Ele está em uma reunião, mas, se você quiser esperar. — Parecia
fazer um esforço para ser educada, mas apontou para um sofá cor de creme
que ficava em um canto na sala de espera. — Quem eu devo anunciar?
— Sam. — Eu não sabia o porquê, mas não queria dizer Samantha
Donovan. Esse sobrenome ainda me provocava arrepios sempre que eu
pensava nele, mas era a prova de que estávamos casados. Olhei para meu
anel na forma de uma rosa vermelha.
Sentei-me para esperar meu marido. Marido... essa palavra ainda
adoçava a minha boca como mel. Pensar nisso me lembrou da nossa primeira
noite depois de casados, em Aspen.

Chegamos à sua casa em Aspen depois do casamento. Era enorme. Não


dava para ver direito do lado de fora, pois era noite, embora fosse bem
iluminada e com algumas paredes de vidro. Shaw estava cansado e foi
dormir. Quando entrei no nosso quarto, surpreendi-me ao ver a cama
california king enfeitada de rosas vermelhas. Em cima dela estava escrito
com pétalas de rosas “eu te amo’’. No chão cor de areia, havia mais pétalas
de rosas. Eu nem me importei com todos os detalhes lindos e sofisticados,
apenas com aquele “eu te amo” escrito ali. Lucky não podia dizer as
palavras, mas assim também servia. Eu nunca tinha visto nada mais lindo e
romântico. Havia champanhe em cima do criado-mudo dentro de um balde
de gelo e uma vasilha com chocolate derretido. Isso acendeu ainda mais o
meu desejo por ele, ao imaginar o que havíamos feito em seu jatinho. A
visão e a lembrança fizeram o tesão florescer dentro de mim.
— Como você fez isso? — Meu queixo estava caído ao ver o quarto
cheio de rosas e sentir seu cheiro inebriante.
Ele riu ofuscante e passou os braços por trás de mim, beijando o meu
pescoço e o lóbulo da minha orelha. Eu tremi.
— Surpresa para minha Rosa Vermelha — sussurrou contra a minha
pele, que já estava pegando fogo com seu toque. — Pedi a Simon para
preparar tudo antes que chegássemos aqui.
Eu estava sem fôlego com seu toque. Parecia que estava incendiada dos
pés à cabeça. Como eu amava aquele contato! Virei-me, passei os braços em
volta do seu pescoço e inclinei a cabeça para o lado, dando-lhe mais espaço.
Nós dois estávamos bem colados, mas parecia que não era o suficiente
estarmos assim. Eu precisava dele então e sempre. Minhas mãos foram para
sua camisa e a puxaram, abrindo-a, deixando os botões voarem para todos os
lados, na pressa de tirá-la do seu corpo. Ele puxou as alças do meu vestido,
que caiu ao chão, deixando-me só de calcinha preta e sutiã de renda da
mesma cor.
— Espero que não seja sua camisa preferida — sussurrei, beijando seu
peito nu e gostoso.
Ele riu deliciado.
— Minha querida, não tem nada mais importante do que o seu toque
mágico, que incendeia cada parte de mim. — Ele estava sem fôlego ao dizer
isso. Já ia me levar para a cama, mas me afastei. Lucky ergueu as
sobrancelhas. — O que foi?
Não falei nada, apenas caí de joelhos à sua frente e desabotoei as suas
calças, tirando-a junto à sua cueca.
— Sam... não precisa fazer isso... — Ele estava ofegante.
Eu olhava para sua ereção ali, apontando para meu rosto e livre das
roupas. Fitei seu rosto com o cenho franzido.
— Você não quer que eu faça?
Ele piscou, parecendo chocado que eu pensasse isso. Ajoelhou-se na
minha frente, tocou meu rosto com as pontas dos dedos e me fez olhar para
ele, porque eu tinha abaixado a cabeça.
— Rosa Vermelha, não sabe o quanto quero isso. — Beijou meu rosto.
— Apenas não quero que faça nada obrigada, e sim porque quer fazer.
— Eu sei que não tenho nenhuma experiência...
Ele me interrompeu, beijando a minha boca e me tirando o fôlego.
— Adoro que não tenha experiência, isso significa que não tocou em
ninguém.
Afastei-me dele, sorrindo de leve.
— Seu bobo. — Dei-lhe um tapinha no ombro. — Agora se deite na
cama e me deixe praticar sexo oral no meu lindo e sexy marido.
— Adoro essa cor em seu rosto. — Afagou minha face com a ponta dos
dedos. — Você fica assim toda vez que fala ou ouve a palavra sexo.
— Você vai ver mais dela quando eu... — interrompi-me, olhando para
o seu bem precioso. — Se eu não conseguir engolir, promete não ficar...
Ele me interrompeu, colocando dois dedos nos meus lábios e me
silenciando:
— Shhh... Eu não ligo para isso, você sabe. Como eu disse, você só faz
se quiser. Jamais vou obrigá-la a algo.
Assenti e me sentei na cama. Esperei-o se deitar de costas no colchão,
com sua ereção apontando para cima. Prendi meus cabelos num coque e me
sentei em suas pernas. Peguei seu pênis na mão direita e o movimentei para
cima e para baixo até ver sair o pré-sêmen. Eu nunca havia feito isso, mas li
bastante livros eróticos, então talvez eu não fosse tão ruim.
Lucky estava ofegante, cheio de desejo, pelo que eu podia ver em seus
olhos abrasadores. Mantinha os punhos cerrados nas laterais do seu corpo,
como se tentasse se controlar. Acariciei a ponta da sua coroa, e ele soltou
um gemido do fundo da garganta.
— Sam...
Curvei-me e passei a língua na ponta, sentindo o gosto meio salgado do
pré-sêmen. Não achei ruim, mas preferia que fosse adocicado. Foi então que
tive uma ideia. Por que não?
Lucky estava de olhos fechados, mas os abriu assim que me afastei
dele, fitando-me confuso.
— O que foi? Não gostou? — Percebi uma nuance que não entendi em
sua voz grave de desejo.
— Fique parado — mandei, porque ele já estava se levantando para me
colocar debaixo dele e me possuir. Talvez achou que eu não havia gostado
de fazer aquilo, mas eu tinha outra ideia. — Ele apenas precisa ser adoçado.
Ele arregalou os olhos vendo-me pegar o chocolate derretido. Voltei a
me sentar em suas pernas, coloquei os dedos no chocolate e os levei à minha
boca, fechando os olhos. Ouvi-o gemer, apertando as mãos em minha cintura
com força.
— Você está acabando comigo... — Sua voz estava rouca de desejo e
paixão.
Abri meus olhos e fitei suas íris verde floresta se incendiando como um
canavial.
— Lembra-se do que fez comigo no avião? — Ergui as sobrancelhas,
chupando meus dedos num gesto sexy.
Seus olhos se estreitaram.
— Isso é uma vingança? Porque eu fiz você gritar — sussurrou com a
voz ardente.
Sorri de modo libidinoso.
— Agora sou eu quem vai fazer você gritar — minha voz também
estava grossa.
— Eu já estou a ponto de gritar vendo você lamber esses dedos.
Derramei um pouco de chocolate sobre a ponta de seu pênis, que ficou
parecendo um pirulito de chocolate. Dei-lhe o copo para segurar enquanto eu
colocava a boca sobre a coroa e lambia o sabor agridoce. Baixei mais a
boca, quase levando-o ao fundo da minha garganta. Apertei um pouco a
cabeça de seu pênis com os lábios, traçando a língua em volta dele. Lucky
gemeu em resposta. Senti suas mãos em meus cabelos, segurando-os bem
forte, mas sem me machucar. Notei que ele estava quase no auge do prazer
ardente que se apossava dele. Eu podia detectar pelos ruídos que saíam de
sua garganta. Para apimentar ainda mais, pressionei suas bolas enquanto
balançava minha cabeça para cima e para baixo, sugando seu líquido pré-
ejaculatório.
— Rosa Vermelha, eu vou gozar... — sua voz era cálida ao avisar.
Apenas acelerei mais os movimentos e comprimi mais as suas bolas,
então senti seu esperma bater no fundo de minha garganta e engoli tudo.
Assim que terminei, afastei-me e olhei para ele ali, todo mole, observando-
me com um sorriso. Limpei meus lábios com as costas da mão.
— Foi bom? — sondei preocupada. Eu sabia que Lucky havia estado
com várias mulheres experientes que fizeram sexo oral nele, mas não queria
pensar nisso, ou meu ânimo iria embora, e não queria estragar a nossa lua de
mel.
Ele se sentou depressa e me puxou para seus braços, devorando a minha
boca.
— Posso sentir meu sabor em sua boca linda e gostosa — sussurrou nos
meus lábios. — E, para quem nunca fez isso, você se saiu uma expert. — Ele
se afastou com as sobrancelhas erguidas. — Onde aprendeu a fazer...
— Livros... — Sorri.
Ele também sorriu e me deitou na cama, pairando em cima de mim e
beijando a minha garganta.
— Continue lendo esses livros, e vamos fazer tudo o que diz neles. —
Sua voz era parcialmente maliciosa. De repente rasgou minha calcinha e
sutiã. Meu corpo saltou com esse gesto. — Agora eu vou satisfazer a minha
linda esposa que me fez um boquete incrível.
— Foi mesmo incrível? — perguntei animada.
— Foi tudo, Rosa Vermelha.
Lucky pegou o chocolate derretido e o derramou sobre os meus seios
duros, descendo sobre a minha barriga até minha intimidade. Colocou a sua
boca quente e gostosa sobre o creme sépia, lambendo-o até não restar nada
em minha pele. Quando a sua boca e língua mergulharam em meu clitóris,
lambendo-o e chupando-o com fome e sede, gritei de prazer.
— Você é saborosa — falou com júbilo, beijando meus lábios.
— Você também é — sussurrei.
Ele riu, beijando a minha pele vermelha e se levantou, indo até a
cabeceira da cama para pegar a camisinha e a colocando. Eu pretendia
começar a tomar pílula logo, assim ele não precisaria mais de preservativos.
Eu estava louca para que isso acontecesse.
Lucky ficou de pé do lado da cama, observando-me com os olhos
quentes e cheios de luxúria, amor e devoção.
— Nossa! Você é tão linda! — Seu tom era de contemplação. Seus
olhos eram tão intensos, as pupilas dilatadas de desejo e fome, como não se
alimentasse havia dias.
Ficamos aquela noite inteira acordados fazendo amor. Eu não me
cansava nunca, mas era assim com Lucky, parecia que eu não tinha o
suficiente dele e do seu corpo.

Uma porta grande de madeira foi aberta, e por ela saíram vários
homens vestidos de ternos, livrando-me dos meus devaneios com o meu
marido deslumbrante e saboroso.
Um cara loiro e com olhos azuis veio em minha direção. Usava um
terno caro, com certeza era dono de alguma empresa ou algo do tipo.
— Nossa! Por que uma beleza rara assim está sozinha aqui? — Lançou-
me um sorriso lascivo.
Antes que eu respondesse, ouvi o rosnado de Lucky atrás dele.
— Essa mulher não está disponível para você nem para ninguém. —
Veio até mim e passou os braços em minha cintura, olhando impassível para
o cara. — Essa beleza rara é a minha esposa, Samantha Donovan. — Seu
tom ao pronunciar o meu nome e sobrenome era de júbilo.
Vários homens ali ofegaram com a notícia, mas não disseram nada,
apenas demonstraram sua surpresa no olhar. Eu agradecia aos Céus e ao
Lucky por, durante o tempo em que estávamos casados, não ter sido filmada
ainda. Devia ser por isso o espanto de todos.
O homem loiro diante de mim sorriu de modo vago.
— Oh, então é com essa mulher que você se casou? — Ele me olhou de
lado. — É mais linda do que a mulher que saiu na foto nos tabloides uns dois
meses atrás.
— Sim, ela é. — Lucky apertou minha cintura e falou num tom mortal:
— Então sugiro que fique longe dela se não quiser ter problemas comigo.
— Ei, relaxa, não está mais aqui quem falou. — Saiu quase correndo
por causa do rosto sombrio do meu marido.
— Lucky...
— Vem comigo. — Puxou-me para seu escritório, que ficava na porta
ao lado da sala por onde ele saiu, a de reuniões. — Por que não pediu para
me chamar? Eu teria saído da reunião — disse-me assim que entrei no
cômodo.
Uau, então era assim o escritório dele? Tinha uns dez metros de largura
por dez de comprimento, uma estante enorme recheada de livros do lado
direito logo na entrada, dois quadros abstratos. As paredes eram de cores
claras, menos a que dava para o lado externo do prédio, que era de vidro.
Ao fundo ficava sua mesa, bem organizada, com um notebook, canetas, lápis
e papéis. Era mais lindo do que a sala de reuniões, mas tão requintado
quanto. Tinha um sofá enorme em frente à sua mesa e três cadeiras, uma que
supostamente era a dele, que ficava de costas para a parede de vidro, atrás
da mesa, e duas à frente.
— Não pedi para chamar porque eu podia esperar — respondi, ficando
de pé perto do sofá. — Também não queria atrapalhar.
— Você nunca atrapalha, Rosa Vermelha. — Pegou meu rosto e fitou as
profundezas dos meus olhos. — Todas as vezes que vier à Ônix, entre em
meu escritório e peça para me chamar se eu não estiver aqui.
— Eu não acho que sua nova secretária vai me deixar fazer tal coisa. —
Suspirei.
Ele estreitou os olhos, foi até sua mesa e pegou o telefone, colocando-o
ao ouvido.
— Suzanny, quando a senhora Samantha Donovan vier à empresa, me
chame, não importa o que eu esteja fazendo. — Ouviu o que ela disse, mas a
cortou: — Não importa que eu esteja com o presidente dos Estados Unidos.
— Sua voz era crua e fria. — Ela sempre vai vir em primeiro lugar. Me
chame, ou estará no olho da rua. — Encerrou a ligação.
— Por que falar assim com seus funcionários?
Ele meneou a cabeça.
— Às vezes, eu tenho que manter as rédeas curtas para tornar um
funcionário competente. Se ele não fizer o que é mandado, então não serve
para trabalhar para mim.
Ergui as sobrancelhas.
— Às vezes? — Meu tom era de ironia. — Você poderia ser mais gentil
com as pessoas.
Ele sorriu malicioso.
— Minha preciosa esposa, eu sou gentil. — Pegou-me pela cintura e me
sentou em cima de sua mesa, empurrando seus papéis e o computador para o
lado. — Agora vou lhe mostrar a minha gentileza.
— Lucky, alguém pode entrar — sussurrei sem fôlego, mas incapaz de
resistir a ele.
— Ninguém entra aqui, querida, sem eu chamar, pode acreditar em mim.
— Abriu as minhas pernas, levantando a minha saia até a cintura e se
encaixando entre elas. Colocou seus dedos em minha calcinha de renda. —
Você está molhada para mim? — Beijou meu pescoço e mordiscou minha
orelha. — Adoro isso.
Gemi, apertando meus braços em suas costas cheias de músculos
perfeitos e definidos.
— Deita na mesa, bebê — pediu ele. Deitei-me de costas, e meus
cabelos se derramaram pela borda, fazendo uma cascata de cabelos negros.
Ele tirou a minha calcinha preta de renda.
— Coloque os pés um em cada lado dos meus ombros — ordenou,
tirando meus sapatos e beijando as minhas panturrilhas, que já estavam em
seus ombros. Tremi com seu hálito quente banhando minha pele sensível.
Lucky inspirou com a cabeça entre as minhas pernas abertas para ele.
— Você cheira tão bem. — Triscou o nariz no meu centro dolorido de
necessidade dele, então senti a sua língua dentro de mim. — É de dar água
na boca.
— Lucky! — gritei, sem me importar que alguém ouvisse, enquanto ele
devorava meu clitóris com sua língua mágica. Meu corpo se enchia de
prazer, tremendo, prestes a explodir. — Por favor!
— O que você quer? — Enfiou dois dedos em meu interior conforme eu
gritava o seu nome. Deixei a cabeça cair para trás e senti uma das suas mãos
nos meus seios duros de prazer. Ele ainda me devorava com os dedos e a
boca. Minhas pernas prenderam sua cabeça ali, querendo-o ainda mais.
— Nossa! Você é tão linda — sussurrou com a voz cálida de desejo. —
Goze para mim, querida.
Meu corpo se arqueou como se quisesse flutuar no céu, então gozei em
sua boca. Fiquei mole e sorri para ele, excitado.
— Eu não tenho camisinha aqui. — Olhava meu corpo com desejo.
— Eu tenho na minha bolsa. — Apontei para ela no sofá.
Ele pegou o preservativo, desabotoou as calças e a colocou em sua
ereção perfeita, então me fitou.
— Por que tinha uma camisinha em sua bolsa? — Posicionou-se entre
as minhas pernas já abertas para ele.
— Porque iríamos precisar dela! — respondi e gritei assim que ele
entrou em mim e parou, com a sobrancelha erguida.
— Você veio aqui só para transar comigo?
Encolhi os ombros.
— Você me disse para eu não me tocar, então... — minha voz falhou. —
Sinto muito.
— Por quê? — Puxou as minhas mãos e me sentou. O meu peito ficou
colado ao dele. — Por que você sente muito?
Escondi o meu rosto em seu ombro, enquanto suas mãos estavam em
minhas costas e em minha bunda, apertando-me mais contra si.
— Sam...
— Não sei... Talvez... você não quisesse que eu viesse aqui, mas não
consegui...
— Ei, Rosa Vermelha... — Pegou meu rosto e fitou as profundezas dos
meus olhos. — Você pode vir aqui a todo momento que quiser, qualquer dia;
não importa o que eu esteja fazendo, vou ficar com você. — Empurrou mais
fundo dentro de mim. — Eu adoro estar dentro de você. Então é mais do que
bem-vinda a vir aqui.
Ele balançava os quadris, estocando dentro de mim e beijando meu
pescoço. Minhas mãos estavam em suas costas. Levantei o rosto para o teto,
embora estivesse de olhos fechados e tomada por êxtase.
— Lucky...
Sua boca cobriu a minha, e desfrutei do êxtase transbordante. Logo
estava mole em seus braços. Tive o que queria e o que ansiava desde cedo,
pois estava com uma vontade louca por sexo desde que nos casamos.
— Minha esposa está saciada o suficiente? — Ele beijou mais uma vez
os meus lábios.
— Hummm — gemi. — Você acha que consegue uma segunda rodada?
Tenho mais camisinhas na bolsa.
Ele riu e me abraçou forte.
— Acho que estou sendo usado — reclamou, ainda beijando minha
pele.
Dei uma risadinha.
— E você não gosta de ser usado? — provoquei-o.
Ele beijou as minhas têmporas.
— Por você, a qualquer hora.
Então me fez gozar mais duas vezes, e logo eu estava saciada – por ora.

Estava sentada no sofá, e Lucky de frente para mim, sentado em sua


cadeira e mexendo em seu computador sobre a mesa já arrumada da bagunça
que fizemos. Eu já teria ido embora, mas Lucky me pediu para o esperar,
pois levaria só dois minutos para ir comigo, então não sairíamos do quarto a
tarde inteira.
Ele estava sentado, digitando algo em seu computador, sereno e
relaxado, ombros largos e peito musculoso até através da camisa que estava
usando. Seu corpo me enchia de desejo e me dava água na boca, tanto que eu
tinha vontade de passar a língua nele inteiro.
— Se você continuar olhando para mim com essa cara linda e faminta,
vamos ficar aqui de novo e de novo. — Seu tom era devasso.
Tremi e apertei uma perna contra a outra, controlando o meu desejo,
afinal teríamos toda a tarde.
Ele pegou o telefone.
— Cancele todos os meus compromissos para esta tarde — ordenou e
suspirou com irritação. — Eu pago a você para obedecer e não para fazer
perguntas — rosnou e desligou.
— Não pode falar com seus funcionários de um jeito menos rude? —
Meu tom era de crítica.
Ele me olhou de lado, já com a raiva controlada.
— Vou deixar você opinar em alguma coisa aqui em minha empresa
quando aceitar metade do que é meu.
Ofeguei de pavor e pesar, depois relaxei.
— Não, obrigada. — Minha voz falhou quando falei: — Eu... eu quero
dizer uma coisa a você, mas não sei como começar.
Ele se sentou ao meu lado.
— Pode falar, estou ouvindo — sussurrou.
— Preciso viajar.
— O quê?! — Seu tom saiu alto e agudo. — Para onde?
— Para a casa da minha avó — respondi. — Perto da fronteira com
Nova Jersey.
— Eu não sabia que você tinha avó. — Franziu a testa. — Quando
puxei a sua ficha, não dizia nela que você tinha avó ou qualquer parente
vivo.
Suspirei, porque sabia que existia a possibilidade de alguém checar
mais fundo, por isso Bryan fez desaparecer todo meu histórico de antes, todo
meu parentesco. Era por isso que eu usava o sobrenome da minha avó. A
mulher que dizia ser minha mãe não quis colocar o sobrenome do meu pai,
Dylan Walker. Achei até bom não ter seu sobrenome.
Evitei responder o seu último comentário. Esperava que ele não
insistisse por respostas.
— A minha avó, Julia, tem uma fazenda perto de Nova Jersey. Já faz
tempo que não vou lá, e ela já está reclamando. Também vou levar o Shaw
comigo para ela conhecê-lo.
Ele assentiu.
— Eu também vou com você.
Sacudi a cabeça.
— Não precisa...
Ele me interrompeu, com os olhos em fendas:
— Como assim não preciso? — Sua voz soou irritada e confusa.
Respirei fundo.
— Você tem uma reunião esse final de semana em Toronto, com os
empresários da empresa Águia da Esperança, então precisa preparar tudo.
Seus olhos escureceram mais.
— Você é mais importante do que tudo nesse mundo.
— Eu sei, mas você precisa fechar esse contrato e comprar essa
empresa para ajudar mais crianças que necessitam de ajuda. Dessa vez, eu
vou sozinha, mas da próxima, vamos os três juntos, está bem?
Ele suspirou de má vontade.
— Tudo bem. — Beijou a minha testa. — Quanto tempo pretende ficar
na fazenda de sua avó?
— Dois ou três dias no máximo. — Beijei as suas covinhas lindas. —
Segunda-feira estou de volta. De qualquer forma, você vai estar em Toronto.
Ele me abraçou forte.
— Vai ser horrível ficar sem você e Shaw — disse com tristeza, depois
me afastou e me olhou. — Lá tem algum peão? Se tiver, leve somente calças
frouxas e blusas largas.
Dei um tapa nele e sorri.
— Quer parar de bancar o homem das cavernas?
Ele riu sem humor.
— Isso é impossível, ainda mais com a perfeição que está ao meu lado.
— Deu um suspiro desalentado, colocando a cabeça em meu pescoço. —
Vou sentir sua falta.
— Eu também.
15 - O Fim
SAM
Cheguei à fazenda da minha avó, que ficava perto de Nova Jersey. Era
uma hora e meia de Manhattan até lá. Antes de chegar à Nova Jersey, virei à
esquerda em uma estrada de chão. Já fazia mais de quatro meses que não a
visitava. Aquele lugar foi meu lar desde os meus 15 anos, quando fugi da
casa dos bastardos que diziam ser meus pais.
A estradinha era estreita, e as duas margens eram cercadas por árvores,
formando uma espécie de muro. Atravessei a porteira de madeira, que já
estava aberta, porque ela sabia que eu logo estaria ali. Meu avô, Samuel, e
ela compraram a fazenda antes de Lisa nascer. Anos depois, quando minha
mãe tinha oito anos, meu avô morreu de câncer nos pulmões. Então vovó
ficou tomando conta da fazenda sozinha.
Eu podia ver o gado pastando nos pastos verdejantes não muito longe
dali. Cheguei ao casarão feito de grandes tijolos e pintado de cor de
abóbora. Ele possuía dois andares, com varandas contornando a casa inteira.
As janelas eram antiquadas, de madeira avermelhada. Na parte da frente do
imóvel, na varanda, tinha um banquinho que era preso ao teto com cordas,
que ela fez para mim, para quando a visitava, e tinha uma grande cadeira
escorada na parede perto da porta.
Estacionei o Mercedes preto do Lucky, aliás, meu, porque ele pegou
meu carro e o vendeu sem meu consentimento. Quando chegamos à casa dele
após o nosso casamento, no lugar do meu Mazda antigo, havia aquele
Mercedes. Lucky disse que queria me dar um Maserati, mas sabia que eu não
aceitaria, então pegou leve e me comprou esse carro, embora ele fosse um
pouco demais também.
A minha avó correu com alegria quando cheguei. Tinha cabelos
branquinhos igual algodão, mas nem parecia ter a idade que tinha. No
próximo mês, ela faria oitenta anos, mas parecia ter a força de uma mulher
de quarenta. Vestia um macacão largo e estava com um chapéu cobrindo
parte dos seus cabelos curtos.
Foi difícil deixar o Lucky em casa e vir ficar uns dias com a vovó, por
mais que eu o quisesse comigo. Ele não poderia vir, afinal, tinha a compra
de uma empresa para fazer, e eu não queria atrapalhar seus negócios. Essa
empresa parecia ser muito importante para ele.
— Minha neta preciosa! — guinchou vó Julia com alegria e quase me
arrastou do carro para o seu abraço de urso. Embora ela não fosse gorda,
tinha a força de um homem. Eu sempre brinquei sobre ela ter mais força e
coragem do que muitos jovens por aí.
— Olá, vovó! — Eu não podia chamá-la de Julia, só de vovó, a fim de
ninguém saber seu nome verdadeiro, mas eu adorava me dirigir a ela daquele
modo carinhoso, porque vovó e Bryan eram tudo para mim, junto a Shaw e
Lucky, que eram a minha vida.
— Quantas saudades, meu amor. — Ela se afastou e observou Shaw,
que tinha saído do carro, mas não chegou perto dela, apenas a fitava com
seus olhinhos negros e lindos. — Esse deve ser o menino Shaw.
— Sim — respondi. Já havia dito sobre o Shaw a ela, então estava
familiarizada um pouco com os traumas dele.
Entramos na casa, e olhei para a sala; nela tinham quatro janelas, que
estavam abertas, o que arejava o lugar; dois sofás com colchas de retalhos
feitas à mão por vovó; uma estante com uma TV pequena e algumas fotos
minhas e de Bryan na parede. Não vi nenhuma foto da minha mãe. Depois do
que meu pai fez e do apoio que recebeu de minha mãe, vovó não falou mais
com sua filha, apenas disse que a Lisa estava morta para ela, assim como
estava para mim.
— Então, como é esse seu marido bilionário? Eu soube que ele é um
dos homens mais poderosos dos Estados Unidos — começou vovó, indo
para a cozinha. Eu sentia o cheiro de purê de batatas e rosbife. Ela sabia que
eu adorava, por isso fez para mim.
— Lucky é maravilhoso! — declarei com orgulho. — Eu vou lá em
cima deixar as malas, depois nos falamos.
Subi e desfiz as malas, a minha e a do Shaw, que ficou no quarto do
Bryan. Na parte de cima, havia cinco quartos: um meu, um do Bryan e um da
minha avó e dois para os hóspedes. O quarto do Bryan ficava na primeira
porta à direita, de frente para o meu. O piso da casa era de madeira, as
paredes dos quartos eram brancas, e neles havia duas janelas de madeira,
que estavam abertas, com vista para a frente da fazenda. As camas eram
grandes, cobertas com colchas brancas, com dois criados-mudos e um abajur
em cima de cada um deles perto das cabeceiras.

A tarde de sábado na fazenda passou rápido. Cavalguei pelos pastos,


contei tudo a vó Julia sobre o Lucky desde que nos conhecemos. Ela não
ficou muito feliz com o que ele fez comigo quando nos conhecemos, mas eu
lhe disse que ele não teve uma vida fácil, assim como eu. Isso amenizou a
sua raiva ou antipatia por ele.
Vovó e eu estávamos na sua cozinha cor de areia, com um fogão
vermelho antigo e os armários de mogno de quando ela se casou, havia uns
cinquenta ou sessenta anos mais ou menos. O cômodo era grande, tinha uma
imensa pia de mármore preto na parede em que ficava a enorme janela.
— Se você o ama tanto, conte a verdade a ele — ela me disse enquanto
preparava o jantar.
Suspirei.
— É tão difícil pensar no passado. As acusações que ela me fazia,
dizendo que eu era interesseira e corria atrás de homens na cidade em que
morávamos... Tenho medo que ele pense que quero seu dinheiro.
— Mas você não fazia isso, então não tem que se envergonhar de nada
ou temer. Se ele a ama, vai acreditar em você.
Ela abaixou o fogo da panela e se sentou na cadeira de madeira de
mogno à minha frente. A mesa de madeira nos separava. Seus olhos estavam
tristes ao me fitar, talvez pensando no quanto sofri por causa das pessoas que
se diziam ser meus pais, mas eles nem sabiam o que significava essa
palavra.
— Também é difícil pensar que tenho uma filha que não se preocupa
com seus filhos, mas sim com seu marido, um estranho ao seu próprio
sangue. — Pegou a minha mão direita, sobre a mesa, e a apertou.
— Vovó, eu sei que para nós é difícil esquecer algo assim, mas temos
que seguir em frente. Hoje eu tenho Lucky e Shaw, tenho mais razão para
viver e seguir em frente, além de Bryan e a senhora, que são tudo para mim.
— Eu fico feliz que você tenha Shaw e Lucky, meu amor, porque
precisa ser feliz depois de tanto sofrimento. — Ela limpou algumas lágrimas
que desciam pelo meu rosto.
— A senhora também. — Sorri para aliviar a tensão. — Não pense que
não notei a troca de olhares entre a senhora e aquele peão.
Ela revirou os olhos azuis.
— Isso é impossível, já que sou uma idosa e não tenho mais... como os
jovens falam? — Ela passou a mão na testa como se tentasse se lembrar de
algo. — Ah! Sim, eu não tenho mais tesão igual a você e seu marido.
Corei ao pensar em minha vida sexual com meu marido lindo e gostoso,
e bota gostoso nisso.
— Eu acho que John e eu estamos apenas fazendo companhia um para o
outro. — Ela sorriu, olhando através da janela aberta para o estábulo. Achei
que estava querendo ver o senhorzinho de uns oitenta anos também, a julgar
pela sua pele branca enrugada. Isso me lembrou do Lucky, dizendo-me para
vestir roupas largas por causas dos peões dali. Se ele soubesse que o único
fixo tinha mais do triplo da minha idade, acho que riria disso.
Respirei fundo.
— Eu fico feliz com isso, vovó, você merece — disse, depois corrigi,
com tom um pouco rouco: — Nós merecemos a felicidade depois de tantas
lágrimas e lamentações.
— Sim, nós merecemos — concordou, olhando-me de lado. — Mas um
relacionamento à base de mentiras não é saudável. Mentiras sempre vêm à
tona, e não de um jeito bom, minha querida.
— Eu sei que isso está errado, vovó. Penso em contar para ele assim
que eu voltar para Manhattan — sussurrei, passando as mãos nos meus
cabelos, presos em um rabo de cavalo.
— Fico contente com isso.

Acordei na manhã de domingo com sono, porque fiquei até tarde


falando com Lucky na noite anterior. Ele já estava de volta de sua viagem a
Toronto.
Cavalguei pela fazenda mais uma vez e nadei no lago que tinha no
coração de lá. A água era cristalina e bem gostosa de se tomar banho. Eu
estava com saudades, porque não ia lá havia mais de quatro meses.
Naquela tarde, Shaw e eu fomos visitar Bryan em seu apartamento em
Nova Jersey. Passamos a tarde com ele e almoçamos em sua cozinha
pequena, com mesinha de madeira de pinho, geladeira branca e fogão de
inox.
— Conte como você está — exigiu ele assim que me sentei à mesa.
Shaw estava na sala jogando Xbox. Eu não sabia por que um marmanjo
com 26 anos tinha um console de jogos. Ele disse que era para jogar com
amigos nos fins de semana.
Conversamos por algumas horas, então chegou a hora de eu voltar para
a casa da vovó.
— Eu vou sentir a sua falta, preciosa — declarou Bryan, beijando a
minha testa. Estávamos no meio da rua, em frente ao seu prédio.
Fitei os olhos azuis de meu irmão, que usava jeans rasgados nos joelhos
e uma camiseta preta que ficava bem em sua pele branca. Os cabelos
estavam bagunçados como se tivesse acabado de acordar, mas esse era seu
estilo, um charme para as mulheres.
— Eu também irei sentir saudades, maninho. — Suspirei. — Quando
chegar em casa, vou dizer a verdade ao Lucky, assim não precisarei
esconder vocês dois dele. Agora ele sabe que tenho uma avó e logo vai
querer conhecê-la, então vou apresentar você a ele também.
— Eu acho bom mesmo, porque meu serviço é em Manhattan. —
Olhou-me de lado. — Nos veremos direto, porque não vou ficar longe da
minha maninha linda.
Sorri e o abracei forte.
— Eu estou tão feliz por ter todos vocês ao meu redor! — Não via a
hora de contar ao Lucky, porque odiava mentir para ele.
Voltei para a fazenda e ajudei a minha avó em sua horta de legumes e no
seu galinheiro, embora não entendesse nada de galinhas, mas ajudou a passar
o tempo.
Julia estava perto do curral de madeira, conversando com o peão da
idade dela. O John era moreno, mas forte e com cabelos grisalhos. Usava um
jeans folgado e uma camiseta branca. Os dois pareciam bem íntimos, então
fiquei feliz em ver que ela estava bem e que tinha companhia.
À noite, desci a escada para a sala e olhei para a televisão, que estava
ligada. A imagem que vi em um programa de fofocas quase me matou: uma
foto do Lucky aos beijos com a sua secretária. Os dois estavam no Green. Na
legenda, dizia que ele estava se separando de mim e que já tinha outra
mulher na lista.
Senti como se minha alma tivesse sido arrancada do meu corpo, mas a
dor da traição estava ali, comendo-me viva, como larvas carnívoras. Senti a
dor me sufocando e a escuridão se apossar de mim.

Acordei e vi que já estava clareando lá fora e que eu estava no meu


quarto. Foi quando me lembrei do que vi, e a dor voltou mil vezes mais
forte. Como Lucky pôde fazer isso comigo?! Eu me entregara de corpo e
alma a ele, que me traíra só porque eu não estava lá para ele. Talvez desde o
começo ele fizesse isso comigo. Quiçá eles até já estivessem juntos quando
fui visitá-lo em sua empresa antes de eu vir para a fazenda.
Quando desmaiei, Julia pediu a um dos peões temporários da fazenda
me levar para cima. Depois que acordei, ela ficou comigo até eu jurar que
estava tudo bem. Tive de me manter firme e calma, embora não me sentisse
assim; por dentro, entretanto, eu me sentia destruída, destroçada, e foi Lucky
quem matou a minha alma, com um tiro certeiro direto em meu coração
quebrado.
Saí naquela manhã e deixei Shaw com a minha avó, embora ele não
conversasse com ela ainda, apenas sorrisse. Ela não queria que eu saísse,
aliás insistiu que eu fosse ao médico, mas eu não precisava de um, e sim de
uma solução.
Fui ao banco retirar um dinheiro para ajudar a minha avó, já que eu não
pretendia voltar para casa, ou melhor, para a casa de Lucky. Talvez ele até
tivesse levado aquela mulher para lá na minha ausência. Céus, como uma
traição podia doer tanto assim? Sentia-me como se estivesse morrendo aos
poucos, com um câncer incurável.
Quando imprimi o extrato da minha conta bancária, quase tive uma
síncope. Havia dois milhões de dólares nela. Eu tinha certeza de que era
obra de Lucky. Talvez ele tivesse feito isso para me pagar de alguma forma
por ele ter conseguido um contrato bilionário, já que eu, tão estúpida, ajudei-
o a conseguir, mas, se ele achava que podia me comprar, estava muito
enganado!
Fui ao gerente do banco e disse que queria devolver todo o valor,
inclusive os 30 mil dólares com que ele havia pago minhas dívidas antes de
nos casarmos. Não queria dever nada a ele, não queria nada dele!
Eu não sabia o número da conta do Lucky, e o gerente não podia me
ceder essa informação, mas o Bryan, como sempre, ajudou-me com isso,
descobrindo e me passando os dados bancários. Assim, devolvi tudo e
cancelei a conta, para ele não fazer isso novamente.
Eu não sabia o que faria no dia seguinte, mas de uma coisa tinha
certeza: não podia e não iria perdoá-lo por me trair. Ele deveria ter sido
homem e ter terminado tudo comigo antes de ir para a cama com outra
mulher. A dor era sufocante, quase destruía os meus ossos e nervos, mas
principalmente o órgão mais importante: meu coração.
Bryan ficou furioso com o que o Lucky fez comigo, até queria ir acertar
as contas com ele, mas não deixei isso acontecer, porque era eu que iria
resolver o assunto, não ele. Porém, iria fazê-lo na hora certa, depois que a
dor aliviasse, embora, pela sua profundidade, estivesse tremendamente
difícil.
Quando cheguei já à noite na fazenda, ouvi a voz de Shaw falando com
Julia. Fiquei feliz por isso. Vovó sempre foi alegre e extrovertida. Eu queria
levá-la aonde eu fosse, mas ela não saía daquele lugar, dizia que lá estava
toda a sua vida, então eu não insistia mais.
Por volta das 10h da noite, levei Shaw para sua cama, e já ia contar
uma história para ele quando ouvi um estrondo na porta de baixo. Vovó
gritou. Shaw já ia gritar, quando cobri a sua boca.
— Shhh, não grite — pedi, olhando em suas duas bolinhas negras
assustadas. Eu via o medo nos olhos do meu menino.
Ele assentiu.
— Você não pode entrar em propriedade privada, Dylan! — gritou
Julia, com raiva.
Meu sangue gelou, como se tivessem injetado nitrogênio em minhas
veias. Meu pai estava ali e certamente tinha vindo para me levar consigo ou
fazer coisas piores comigo. Céus, o que eu faria? Como poderia lidar com
ele? Bryan não estava, então era eu sozinha.
Tirei o Shaw da cama e abri a porta do guarda-roupa, que era grande e
embutido na parede. Afastei as roupas e o coloquei lá dentro. Ele
choramingava baixinho. Fitei seus olhos cheios de lágrimas.
— Não importa o que ouça, não saia daí até eu chegar.
— Sam, não vai... — Ele chorava.
— Eu vou ficar bem, prometo. — Beijei seu rostinho molhado. — Não
saia nem grite, por favor. Promete?
Ele assentiu, chorando em silêncio, e se abaixou no cantinho do
armário, perto das minhas roupas e sapatos. Saí do quarto, fechando a porta
e peguei o telefone para mandar uma mensagem para Bryan.
“Bryan, Dylan está aqui na fazenda e vai querer me levar com ele. Eu
não sei o que fazer. Por favor, pede ajuda.’’ Cliquei em enviar.
Meu coração estava destroçado por dentro, por ter descoberto a traição
de Lucky e por ter vovó ameaçada por aquele canalha desprezível do Dylan.
Eu queria ser forte para aproveitar e fugir, mas não podia, não com a vida
dela e de Shaw em jogo. A minha vida já não tinha muita importância, já que
Lucky a tinha destruído. Ele me quebrara de tal modo que eu não ia me
recuperar tão cedo. Por isso, agora eu era uma casca vazia. A única alegria
que sentia era ter vovó, Shaw e Bryan.
Lembrei-me da felicidade que eu sentia antes, porque voltaria para ele,
mas tudo havia mudado. Eu estava sem rumo e sem chão. Por que ele teve
que destruir tudo o que tínhamos? Ou eu achava que tínhamos.
Fui para a escada de madeira.
— Sai da frente, sua velha... — Dylan rosnou com sua voz grossa. —
Eu estou aqui para buscar a Samantha.
— Ela não está aqui — ouvi vovó dizer.
— É claro que está — retrucou com a voz mortal. — Eu chequei antes
de vir. — Riu com desdém e depois gritou: — Desça aqui agora, Samantha,
ou a sua velha arcará com as consequências!
Um frio desceu por minha espinha, fazendo-me gelar assim que ouvi um
som de um baque. Desci a escada com as mãos e o corpo tremendo como se
eu estivesse entrando em hipotermia. Meus olhos varreram a sala, e vi a
vovó desmaiada no chão perto do sofá. Com certeza ele tinha batido nela,
por isso o barulho de pancada que ouvi.
— Vovó! — gritei, correndo para o seu lado e tocando seu rosto. — Por
favor, acorda!
— Você não vai poder ajudar, Sam. — Ele pegou meu cabelo e o puxou.
Gritei de dor.
Fitei o monstro. Ele era forte e tinha cabelos negros e longos, estava
barbudo, parecia que não se barbeava nem tomava banho havia dias. Eu
inclusive sentia o cheiro de bebida. Seus olhos eram azuis, assim como os
meus e os de Bryan. Eu não entendia por que ele falava que eu não era sua
filha, já que eu me parecia com ele. Estava furioso comigo, mas isso não era
novidade, sempre ficava assim e sem motivos.
— Por favor, pai, vai embora — supliquei, chorando.
— Eu não sou seu pai! — esbravejou. — Eu queria que fosse... — no
final sua voz tinha uma pontada de tristeza, mas depois mudou, tornando-se
fria como uma geleira. — Você está impura, então é hora de eu tirar a sua
impureza.
Dylan tirou o seu cinto. Ele ia me bater, e o Shaw poderia ouvir os
meus gritos, que eu sabia que sairiam, assim como saíam antes, quando ele
me batia. Isso não podia acontecer, porque Shaw já testemunhara violência
demais durante sua vida inteira. Virei-me e corri.
— Não adianta fugir, Sam, porque eu vou encontrá-la! — Dylan gritou
enquanto me seguia para fora.
Fui para o celeiro. Talvez ali estivesse o senhor John, que poderia me
ajudar, e assim Shaw não ouviria nada. Contudo, ao entrar, tropecei e caí no
chão. Estava escuro, senti o feno na minha cara. Engasguei-me com a
pancada.
Dylan já estava ali e puxou o meu cabelo de novo. Gritei, sentindo uma
dor aguda na cabeça. Eu estava de bruços no chão, não tive tempo para me
levantar e continuar correndo.
— Vamos aproveitar dessa vez, doce Sam. — Senti-o se sentar em
minha bunda e a ponta de uma faca passeando nas minhas costas.
— Solte-me! — Tentei lutar contra ele, mas era inútil, era como nadar,
nadar e morrer na praia.
Dylan se levantou, e então senti as cintadas nas minhas costas. Uma dor
aguda atingiu meu baixo-ventre, e a escuridão se apossou de mim. Talvez
fosse a morte? De qualquer forma, estava feliz por a dor ter ido embora.
Todavia, no fim do túnel escuro, pensei ter ouvido a única voz que me
livraria da morte.
Rosa Vermelha!, gritou a voz, tomada de terror.
16 – Tormento
LUCKY
Desde que vi as fotos de Sam com outro homem, senti-me cercado de
dor por todos os lados. Ela foi a única mulher que fez como se o mundo
fosse um arco-íris em um céu azul de um brilho intenso. Eu me sentia assim
com Sam e Shaw. Sem os dois em minha vida, era como se eu estivesse na
escuridão, sem luz e sem vida, como se o Universo não tivesse Sol nem Lua
para iluminar meus caminhos, apenas um abismo.
Arrependi-me de ter concordado com a ideia do Kevin de tirar aquelas
fotos me mostrando aos beijos com minha secretária. Ele fez com que elas
vazassem no mesmo dia. Fiquei pálido depois que as vi. Não fui homem o
suficiente para enfrentar a Sam e buscar uma razão para ela ter me traído
com aquele cara. Meu mundo desabou depois que vi aquelas fotografias
dela, sorrindo enquanto ele a beijava. Tudo se quebrou, assim como no
passado. Duas mulheres me enganaram e me traíram. A que me dera à luz e a
que se tornara a minha razão de existir e respirar nesse mundo.
Kevin queria que eu ficasse de verdade com a minha secretária, mas eu
não podia. Não via mais as mulheres assim, para mim era somente a Sam.
Por isso apenas tirei as fotos, porque queria magoá-la assim como ela me
magoara ao me trair; magoar não era a palavra certa, e sim destruir. Eu não
suportava a ideia de tocar em outra mulher. Definitivamente, a Sam havia me
arruinado para todas as mulheres do mundo.
Eu não sabia nada dela, porque não me ligou para falar mal de mim e
pedir o divórcio, o que destruiria ainda mais a minha vida. Se ela não
pedisse o divórcio, eu teria que fazê-lo, mesmo que morresse depois. Eu lhe
daria até o final da semana para me procurar; se não viesse, eu iria procurá-
la e me divorciar dela. Maldita a hora em que fiz com que nosso casamento
fosse em comunhão de bens, embora ela não soubesse disso, porque assinou
a certidão sem ler, mas, quando soubesse, eu não sabia se iria querer a
metade do meu dinheiro. Se quisesse, os meus advogados disseram que,
como houve traição, ela sairia sem nada.
Cheguei à minha casa naquela noite depois do trabalho. Embora não
tivesse cabeça para nada, precisava me manter ocupado, ou enlouqueceria.
Na casa, o vazio se tornava quase insuportável, com sua ausência e a de
Shaw. O que faria aliviar a dor seria beber algo forte. Eu nunca me sentira
daquela maneira. A dor parecia se entrelaçar ao meu sangue e órgãos como
um câncer agressivo.
— Mas que droga está acontecendo aqui?! — esbravejei, olhando a
minha sala cheia de gente. Não muitas, apenas meus amigos. Kevin de pé
perto do sofá na forma de L; Ryan e Jordan com duas mulheres cada um;
Jason também estava lá, com uma loira pendurada nele.
— Trouxemos alguma diversão para você... — começou Ryan, mas o
cortei com um olhar frio.
— Eu não quero droga de diversão! — rugi. — Só quero beber. —
Olhei para todos ali. — Sozinho, então tirem essas vadias da minha casa
antes que eu perca o resto do meu controle.
— Você precisa transar.
— É melhor calar a boca, Ryan, e fazer o que mandei. — Meu tom era
mortalmente frio. Estava a ponto de atacar meu próprio irmão.
Ele bufou.
— Chegou a hora de irem, garotas — Ryan disse para elas e se levantou
do sofá. — Ele está ranzinza hoje.
— Poderíamos fazer você relaxar — falou uma loira, batendo os cílios
para mim.
Meu estômago se embrulhou como se eu tivesse comido comida
estragada.
— SAIAM AGORA!
Respirei fundo assim que todas saíram da minha casa. Olhei para os
caras ali.
— Agora é a vez de vocês.
— Nós não vamos embora — assegurou Ryan, encarando-me.
Fuzilei-o com o olhar mortal.
— Você vai sair, sim, nem que seja a pontapés, aliás, todos vocês. Eu
os quero fora da minha casa! — ordenei com ira.
Antes que todos protestassem e eu os jogasse para fora, a porta do
elevador se abriu, e entraram três caras armados em meu apartamento. Todos
ofegaram de pavor, inclusive eu. Não imaginei que ali houvesse assaltos,
dada a forte segurança do prédio. Aquilo nunca tinha acontecido. E logo
quando dei folga ao Simon...
— Todos sentados agora — ordenou um cara loiro.
Eram três homens, um loiro, que estava ao lado direito de um moreno, e
um ruivo, ao lado esquerdo desse. O moreno de olhos azuis me fitava com
ódio, parecia a ponto de me matar, embora, no fundo, eu quisesse que ele me
matasse, só assim a dor passaria. Esse cara não carregava arma, apenas os
dois que o ladeavam. Reconheci o moreno de cabelos negros e lisos como o
homem da foto com a Samantha. Esse era o cara que estava com a minha Sam
nos braços, Bryan Scott, de acordo com a pesquisa que Simon me enviara,
depois que recebi as fotos dele com a Sam. Não consegui descobrir mais do
que isso, o que era estranho, era como se ele fosse um fantasma, mas eu não
tinha cabeça para pensar nisso, não com a dor que estava sentindo.
— É você... — minha voz era para sair irada, mas saiu rouca de dor.
Seus olhos azuis eram coléricos, direcionados a mim. Tão rápido que
mal deu para eu assimilar, ele estava em cima de mim e deu um soco tão
forte na minha boca que fez o sangue descer na hora.
— Não se aproximem dos dois, ou eu atiro em vocês — rosnou o loiro,
apontando a arma para o meu irmão e os meus amigos.
Meu sangue gelou; não queria que ninguém se machucasse.
— Façam o que ele diz — pedi, enquanto me preparava para me
defender.
Bryan me olhava com fúria.
— Você destruiu a luz da minha vida! — gritou com ira. — Você
quebrou a Sam ao sair com a sua secretária e fazer festas com a mulherada!
Franzi o cenho.
— Você só pode estar brincando com a minha cara! — esbravejei. —
Foi Sam quem me traiu...
Ele me cortou com ferocidade e desdém:
— Ela nunca faria isso! — Seus olhos eram mortais. — Ela ama você,
seu babaca estúpido!
— Ela ama meu dinheiro. — Meu tom soou sem vida.
Ele riu amargo.
— Você não a conhece mesmo, não é? Já checou a sua conta bancária
hoje? Porque lá você vai encontrar os seus dois milhões, que depositou na
conta dela sem ela saber. — Sua voz estava fria. — Ela os devolveu junto
aos trinta mil com que você pagou as contas dela pouco tempo atrás. Sam
também encerrou sua conta para você não fazer mais isso.
Olhei confuso para ele e depois para o Kevin.
— Isso é verdade, Kevin? Essa quantia foi transferida da conta dela
para a minha?
Kevin estava nervoso. Isso parecia estranho.
— Não, não é verdade — respondeu depois de um minuto de silêncio,
embora sua voz também estivesse ansiosa.
Bryan riu.
— Sério? — Arqueou as sobrancelhas para o Kevin. — Foi transferida
hoje às 12h, por ela mesma.
Eu estava com uma puta raiva. Então ele tinha estado com ela naquele
dia? E ainda tinha a audácia de vir à minha casa me dizer isso?
Ele pegou a sua mochila preta, que estava em suas costas, e tirou dela
uma pasta.
— Isso é para você. — Jogou-a para mim.
Peguei-a automaticamente, sem saber o que havia ali.
— O que é isso?
— Tudo o que você precisa saber está aí — disse-me, mexendo em seu
laptop.
Olhei para a pasta e arfei. Ali estava o dossiê completo do Kevin. Ele
vinha transferindo milhões da minha conta para a dele. Ali estava tudo,
saldos, transferências entre contas, depósitos e saques, tudo feito pelo
Kevin.
— Mas que droga é isso?! — rugi.
— O que foi? — perguntou Kevin em tom agudo.
Agora eu entendia o motivo do seu nervosismo. O bastardo vinha me
roubando!
— Você está me roubando, seu desgraçado?! — esbravejei, com os
punhos cerrados.
— Sim, ele está. — Bryan disse com frieza.
Kevin arregalou os olhos, fitando-o e depois a mim.
— Ele está mentindo... — começou a dizer, mas Bryan o interrompeu:
— Sério? Kevin Brown, nascido no dia 18 de setembro de 1985.
Morava em um orfanato, em Ohio, desde os quatro anos, e foi adotado aos
dez por uma família de empresários de Moscou. Seu pai adotivo se chamava
Jackson Rules, naturalizado russo... — Olhou para ele com a sobrancelha
erguida, como se o convidasse a desmentir tudo.
— Cale essa boca... — rosnou Kevin, com os punhos cerrados.
Bryan olhou para ele como se fosse um inseto.
— O nome da mãe adotiva era Mary Rules. — Olhou-me. — Lembra-se
desse nome?
Arregalei os olhos, e a dor voltou como uma onda gigante que parecia
estar me perfurando de dentro para fora. O ar de repente parecia tóxico,
tanto que eu queria uma máscara de gás.
A vadia da minha mãe me abandonou para eu morrer naquela casa a fim
de se casar com um velho rico. Olhei o dossiê, que comprovava que dinheiro
roubado pelo Kevin de mim era sempre transferido para uma conta na
Suíça... no nome dela. Maldita seja!
— Você estava roubando de mim para a vadia da minha mãe?! —
Minha ira pulsava quase palpavelmente.
Kevin me olhou de repente, e a máscara caiu.
— Ela planejava tirar todo seu dinheiro. — Ele riu de modo
zombeteiro. — Mas quanto mais dinheiro tirava, mais você ganhava.
— E por isso decidiu que, além de desviar $ 900 mil por mês, tinha de
desviar mais $ 400 mil, não é? — Meu tom era tenebroso.
Ele olhou malignamente para o Bryan.
— Essa outra parte vai para você, seu desgraçado? — sibilei, querendo
socá-lo, mas estava sem energia. Talvez fosse porque não tinha comido nada
desde o dia anterior ou talvez fosse apenas a minha dor, que me manteve com
os pés presos no chão. — Você e ela vão para a cadeia e não vão sair de lá
tão cedo.
— Você prenderia a sua mãe? — Seu tom era provocativo.
— Ela não é a minha mãe — rebati. — Ela deixou de ser assim que me
abandonou para se casar com um homem rico. E vai pagar por tudo, e você
também, já que é o seu comparsa.
— Estava tudo dando certo, mas você... — ele olhava friamente para o
Bryan — e a vadia da Samantha tinham que se meter no que não era da sua
conta. Acha que não a vi perto de minha sala, enquanto eu falava com a
Mary? Com certeza foi ela que deu com a língua nos dentes.
Eu estava prestes a quebrar sua cara, mas Bryan foi mais rápido,
lançando-se para ele como se fosse um ninja. Os dois eram fortes, mas Bryan
era cheio de músculos e uma cabeça mais alto que Kevin. Ele parecia um
lutador, como Jason. Desceu os punhos fechados no peito de Kevin, que caiu
contra a minha parede, sem fôlego. Bryan lançou outro soco em seu rosto, e o
sangue escorreu, manchando a sua camisa.
— Você quebrou o meu nariz! — gritou ele com voz anasalada.
— Nunca ouse falar da Sam. — Outro murro em sua mandíbula. —
Nunca! — gritou, batendo de novo. — Ela é uma santa, seu maldito bastardo,
você ouviu? Santa!
Parecia possuído pela raiva. Eu até poderia impedi-lo de fazer isso,
mas Kevin merecia muito mais. Eu estava doido para quebrar a cara dele
também.
Ninguém se mexeu, deixando Bryan espancar Kevin. Pelo que eu sabia
do verme, ele não sabia lutar, e, pelo visto, aquele homem sim. Ele devia ser
da minha idade ou da do Ryan mais ou menos, era mais velho do que a Sam.
— Bryan, você vai matar o cara, largue-o — pediu o cara loiro. — A
Sam não iria gostar disso.
Com a menção ao nome da Sam, Bryan suspirou profundamente e soltou
o Kevin, desmaiado no chão, checando uma artéria em seu pescoço.
— Ele está vivo. — Seu tom demonstrava que não parecia muito feliz
com isso.
— O que a Sam tem a ver com vocês? — perguntou Ryan, chocado. —
Ela é sua aliada?
Bryan limpou o sangue das mãos em sua calça jeans e olhou para ele.
— Não, ela nem sabe que estou aqui.
— E por que você está aqui? — indaguei com ceticismo.
Seu olhar era mortal ao se direcionar a mim.
— Para lutar com você e te dar uma lição. — Riu com desdém. —
Quando a Sam começou a trabalhar em sua empresa, achei que isso seria
bom para ela crescer, porque ama o que faz. Mas você deu em cima dela, e
tudo mudou. Ela não me contava para eu não me preocupar. Até parece que
eu não a conheço. — Ele sorriu amorosamente.
Um punhal entrou em meu coração quebrado.
— Ela sempre me protegeu, desde criança, embora eu também a
protegesse de tudo e de todos. — Seu rosto ficou sério, e olhou para mim. —
Você fechou as portas para ela, até pensei que ela odiava você depois disso,
mas não! — Ele sacudiu a cabeça. — Ela se apaixonou por você. Eu disse
para ela não fazer isso, mas era tarde demais.
Ele falava da Samantha com amor, mas não vacilava ao dizer que ela
estava apaixonada por mim. Que droga isso significava? O que eu estava
perdendo?
— Então ela foi visitar a vovó e, quando olhou para a TV, o que viu? O
bastardo do marido com uma amante pendurada no pescoço — sibilou.
— Eu não tenho amante — retruquei.
— Foda, transa, trepada. — Seu tom era de escárnio. — Tanto faz, tudo
dá no mesmo.
— Por que isso importa agora? — Minha garganta arranhava como se
tivesse sal. — Ela me traiu mesmo.
Bryan arregalou os olhos e me fitou como se eu fosse louco.
— Sam nunca trairia você — murmurou. — Ela morre por você.
— E o que significa isso? — Tirei as fotos do bolso e as dei a ele.
Desde que recebi aquelas fotos, carregava-as comigo para todos os lados.
Parece loucura, mas aquilo me fazia pensar em por que ela tinha me traído.
Eu queria entender. Por que eu não tinha sido suficiente?
Ele pegou as fotografias e as observou com os olhos estreitos, virando-
as, vendo cada ângulo delas.
— Você a traiu só por causa disso? — replicou com dureza.
— Como “só por isso”? — sibilei. — Ela mentiu para mim!
— Hummm... — Ele se movia para frente e para trás, como um leão
prestes a dar o bote. — Por que não perguntou a ela antes de se vingar?
— Não precisava, afinal, essas fotos mostram tudo. — Eu estava
encolhido de dor. — Vocês estão se beijando.
Ele riu com raiva.
— Eu deveria matar você por fazê-la sofrer.
Respirei fundo, mas doeu.
— Vá em frente e faça, então, mate-me, porque você estaria me fazendo
um favor. — Resfoleguei.
— Mas que droga! — rugiu Ryan. — Uma mulher não vale isso!
Bryan e eu olhamos para o Ryan, ambos com a expressão furiosa.
— Ela vale — dissemos em uníssono, o que foi estranho.
Bryan me olhou com as sobrancelhas erguidas.
— Você aceitaria ser morto?
Assenti, mudo.
— Bom saber. — Ele riu, depois revirou os olhos, avaliando-me. —
Não sei quem tirou essas fotos, mas o que está aí não é a verdade. Aposto
que foi tudo armação de Kevin para separar vocês dois.
Meu coração queria acreditar nele para sossegar a minha alma ferida.
— O que você é dela? — Alguma relação eles tinham, já que ele não
tinha nada de gay, como ela mesma disse. Tinha certeza de que era o mesmo
cara a quem ela havia se referido dizendo não sentir nada por ela no dia em
que descobri sobre a adoção do Shaw.
— Sou irmão dela, então não tem a mais remota chance do que está
aqui, nessas fotos, ser verdade — disse com convicção. — Quem tirou essas
fotos sabia o que estava fazendo, porque pegou um ângulo perfeito, como se
estivéssemos nos beijando.
Ofeguei, e não fui o único. Pude ver os olhos arregalados de todos ali,
com pena de mim. Entretanto, uma parte minha estava aliviada com isso,
embora a outra parte dissesse que eu já a perdera, pois ela pensava que eu a
havia traído com a minha secretária. Tinha medo de ela se vingar de mim
como ela me disse um dia, que, se eu fizesse isso, se a traísse, ela também o
faria.
— Eu a perdi.
— Sim, você a perdeu — ele concordou. — Vou pegar a ela, minha avó
e o garoto, e vamos embora para um lugar longe de você.
— Você não pode levá-la de mim! — Minha voz estava tomada de
desespero.
— É claro que posso, e vou fazer isso. — Seu olhar era frio. — E você
não vai me impedir nem vai fechar os caminhos dela de novo — rosnou com
os punhos cerrados. — Ou eu juro que seu dossiê estará em todos os jornais
do país, então vai se afastar e ficar longe dela.
— Eu não posso. — Meu tom era um gemido de dor. Não me importava
com a porcaria do meu dossiê, só me importava com ela. — Vou implorar
que ela me perdoe.
Ele riu.
— Sam pode ser boa, mas se tem uma coisa que ela nunca perdoa é
traição. — Ele me olhou de lado, furioso. — E você a traiu da pior maneira
possível.
— Eu não a traí. — Soltei o ar contaminado dos meus pulmões.
Ele arqueou as sobrancelhas para mim.
— E as fotos, o que significa aquilo?
Suspirei.
— Da mesma maneira que significam as suas com ela, uma armação —
afirmei. — Quando eu vi as fotos dela com você, o meu mundo desabou. Foi
como se estivesse em uma alta altitude e de repente caísse em uma
velocidade mortal, arrebentando todos os meus órgãos. — Encolhi-me. —
Kevin sugeriu que eu fizesse o mesmo que ela. — Sacudi a cabeça. — Mas
eu não penso em mais ninguém dessa forma. Deixei de pensar quando
conheci a Sam. — Funguei para não chorar. — Ela roubou a minha alma e o
meu coração. Tudo isso foi entregue a ela. — Gesticulei para o meu corpo.
— Sem ela, eu não vivo, eu vegeto como um zumbi ou uma alma penada.
Ele me avaliava para descobrir se eu estava dizendo a verdade.
— Hummm, bom, mas eu vou lutar com você. Você vai pagar por toda
lágrima que ela derramou por sua causa.
Encolhi-me ao pensar no seu sofrimento.
— Pode fazer, não vou revidar — sussurrei, ficando ereto e com os
braços pendidos ao lado do corpo.
Ele sorriu como um gato prestes a comer um canário.
— Eu vou adorar fazer isso. — Levantou os punhos para mim, enquanto
eu fechava os olhos, esperando os socos, afinal, merecia sofrer.
Ouvi o bip de uma mensagem.
— Droga! — balbuciou Bryan com tom horrorizado.
Abri meus olhos e vi que os dele estavam completamente aterrorizados,
cheios de pavor, medo e desespero diante de uma mensagem no seu celular.
Algo tinha acontecido. Seria com a Sam? Ela estava bem?
— O que foi?
— Meu pior pesadelo. — Ele me fitou com os olhos cheios de terror;
pareciam lacrimejados. — Vamos ter que resgatá-la.
Meu coração se afundou e meu mundo começou a desabar novamente
quando ele disse essas palavras.
— O que significa isso? — questionou Ryan, olhando os caras com as
armas calibre 38 nas mãos. — Não dá para abaixarem isso, já que estamos
todos entendidos por aqui?
— Abaixem as armas — Bryan pediu sem tirar os olhos em chamas de
mim. — Você tem um helicóptero, não tem? Ele está aqui, no arranha-céu?
Por favor, diga que sim.
— Sim, tenho uma reunião amanhã de manhã em Nova York, por isso
ele está aqui, para sairmos cedo, mas dá para dizer o que está acontecendo?
— pedi com um leve tremor nas mãos, com medo da verdade.
— Nosso pai a pegou. — Seu tom era de asco ao dizer a palavra pai.
— Por que isso seria um pesadelo? — perguntou Jordan taciturno.
— Porque ele é um ser abominável — respondeu num tom frio. — O
pior do planeta.
— Ele vai machucá-la? — Minha voz espelhava a dele, cheia de dor e
desespero.
— Da pior maneira possível.
— Não me diga que ele quer... — Não consegui terminar. Por favor,
Senhor, não o deixe tocá-la, pensei.
— Mas ele é pai dela! — Jason exclamou horrorizado.
— Ele acha que ela não é filha dele, porque a doida da minha mãe diz
que ela é a semente do Mal. Os dois são lunáticos, deviam estar em uma
clínica psiquiátrica. — Ele suspirou, guardando o notebook, que estava na
mesinha, e colocando a mochila nas costas. — Eu fiz o DNA algum tempo
atrás, então descobri que ela é de fato filha do bastardo fodido.
— Isso é abominável! — Jason se levantou. — Eu quero matar esse
filho da puta por sequer pensar em tocar na preciosa.
— Eu vou fazer isso — respondeu Bryan sombrio, e depois me olhou.
— Nós vamos de helicóptero ou não? Porque não temos como chegar à
fazenda a tempo de carro.
Pisquei, ainda entorpecido pela dor. Se ele a tocou...
— Vamos — sussurrei. — Mas eu dei folga para o Simon hoje, então
ele não está aqui. Ele é o único que sabe pilotar o helicóptero, que está na
cobertura do arranha-céu.
Bryan olhou para um de seus amigos, o loiro, e assentiu.
— Calebe sabe pilotar helicópteros e aviões, não se preocupe. Ele vai
nos levar — declarou.
Bryan, Calebe e o outro cara, cujo nome eu não sabia, também foram
conosco.
Liguei para o Simon, dei-lhe o endereço da fazenda e o mandei ir para
lá o mais rápido possível. Também ficou encarregado de chamar a polícia no
caminho para lá.
— Foi por isso que não dissemos a ninguém que éramos irmãos. Assim,
ele nos rastrearia até onde morávamos. — Bryan deu um suspiro
desalentado. — Por algum tempo, conseguimos manter isso em segredo, mas
a foto dela aparecendo no jornal como sua esposa traída deve tê-lo feito
descobrir a verdade, por isso a encontrou.
Fiquei furioso comigo mesmo, porque, se algo acontecesse com a Sam,
a culpa seria somente minha e da minha burrice.
— Se ele a tocar, eu vou matá-lo — rosnei, olhando as luzes dos
arranha-céus de Manhattan e pensando em se, algum dia, veria um brilho
assim na minha vida de novo. Esperava que sim, porque, se eu perdesse a
Sam, ficaria eternamente na escuridão.
— Afinal, o que você faz? — perguntou Jordan ao Bryan. — Porque
parece que entende muito de computadores, para descobrir tudo sobre o que
Kevin andava fazendo, até rastrear contas na Suíça.
— Sou formado em ciência da computação — respondeu, passando as
mãos nos cabelos. — Eu entendo tudo sobre computadores, alguns me
chamam de hacker. Eu trabalho para a polícia.
Ryan o fitou, estupefato.
— Você é policial?
Bryan assentiu e olhou para seus dois amigos, o piloto e o outro, que
estava ao lado do Calebe.
— Nós três somos, mas consegui o emprego há pouco tempo. Foi assim
que consegui descobrir tudo sobre Kevin, entrando nos computadores dele e
dos bancos para onde o dinheiro foi enviado.
— Aquele bastardo vai pagar por te me roubado — sibilei.
Nathan, um de meus empregados, pegou o desgraçado e o levou ao
hospital, depois anunciou o roubo à polícia. Entreguei o dossiê a ele para o
dar ao meu advogado, Dennis.
— Sam o ouviu falar ao telefone sobre uma transferência de dinheiro da
empresa, então me pediu para checar as coisas. — Ele riu sem humor. — Ela
sempre se preocupa com as pessoas.
Eu sabia disso muito bem.
Depois disso, ficamos em silêncio até chegarmos à fazenda. Bryan
pediu para pousarmos um pouco longe, assim o maldito não nos veria ou
ouviria.
O helicóptero pousou, nós descemos e corremos em direção à sede da
fazenda. Antes de chegarmos à casa, ouvimos um grito de raiva vindo do
celeiro.
Bryan e eu paramos, olhamos um para o outro com os olhos cheios de
pavor e pesar.
— Vamos cercar o celeiro. Daqui ele não sai — disse Bryan aos outros
e depois a mim. — Você vai pela frente, e eu vou pelos fundos.
Assenti e fui em direção à porta de madeira da frente, mas ela já estava
aberta. Entrei sem ser notado e me horrorizei com a cena diante de mim. Sam
estava no chão cheio de feno, parecia inconsciente ou... Não, não, não, ela
não pode estar... Ela está bem! Ela tem que estar bem!, pensei como um
mantra.
Um cara alto, moreno e cabeludo, com barba por fazer, deu uma cintada
nas costas dela, mas ela nem reagiu a isso, porque estava desmaiada.
— Garota vadia! — ele gritou e já ia dar-lhe mais uma cintada. Eu já
estava me preparando para matá-lo, quando Bryan foi mais rápido e deu um
murro em cheio no rosto do canalha, que cambaleou e caiu em cima de um
fardo de feno.
— Rosa Vermelha! — gritei, angustiado.
— Cuide dela até a ambulância chegar! — gritou Bryan para mim,
ainda olhando o homem caído ali, com os olhos arregalados sobre o filho.
Como um pai podia fazer isso com sua filha? Ou uma mãe, como a minha,
que havia me deixado sozinho para morrer? Aqueles seres abomináveis não
deveriam ser pais.
Corri para ajudar a minha preciosa esposa. Ajoelhei-me ao seu lado e
toquei seu rosto.
— Sam, meu amor, acorda — choraminguei, alisando seu rosto
molhado. Ela estava chorando antes de desmaiar. — Por favor, abra os
olhos. Seu irmão chamou a ambulância, e os paramédicos logo estarão aqui.
Promete aguentar por mim? — Beijei seus lábios e a virei de costas. — Eu
te amo tanto! — Não doeu dizer essas palavras, porque era verdade.
Ela estava suja de feno, e o pior era ver que suas calças estavam sujas
de sangue. Meu Deus, não! Ele não pode ter feito isso com ela! Segurei
toda a minha fúria e dor enquanto via Bryan socando a cara do desgraçado
maldito.
— Você estuprou a sua filha?! — esbravejei com fúria.
— Ela não é minha filha! — gritou de volta.
— Sim, ela é — rosnou Bryan, dando um chute na boca do estômago do
pai. — Eu mesmo fiz o DNA de vocês. — Pegou o cara, que já estava todo
ensanguentado, e o jogou na parede como se ele não pesasse nada.
O cara ficou ali, encolhido e segurando o peito.
— Ela não é. — Ele resfolegou.
— Se lembra daquele dia em que foi preso em sua casa no Kentucky?
— Bryan olhava friamente para o homem ali, como se ele não fosse seu pai.
O bastardo estreitou os olhos.
— Como sabe sobre isso?
— Porque fui eu que o encontrei — respondeu num tom frio. —
Trabalho para a polícia. Fiz tudo isso para proteger a minha irmã do canalha
que se diz ser nosso pai. — Ele expirou. — Você é o bastardo do pai que
tentou violentar a própria filha muitas vezes, e agora teve sucesso!
O cara estava de olhos arregalados sobre a filha no chão, inconsciente.
— Olha o estado em que você deixou a sua filha, a filha que um dia
você já amou. — O tom da voz de Bryan era sombrio e mortal.
— Meu Deus! O que eu fiz?! — Cobriu o rosto com as mãos. — Eu não
a toquei... só bati nela... — Ele se engasgou.
— Isso vai ser suficiente para deixar você por um bom tempo na cadeia
— asseverou Bryan.
— Eu vou assegurar que nunca mais veja a luz do dia — sibilei entre
dentes, querendo matá-lo eu mesmo, mas não queria deixar a Sam sozinha.
A ambulância chegou, e os paramédicos a colocaram na maca, pondo
uma máscara de oxigênio em sua boca e nariz para ajudá-la a respirar. Uma
socorrista disse que ela estava com hemorragia interna, mas que ela ia ficar
bem. Eu não soube se ela disse isso para me acalmar. Desejava que ela
realmente ficasse bem.
A polícia também chegou, e levaram Dylan para o departamento de
polícia. Meu advogado ia cuidar para que ele não saísse nunca mais da
cadeia.
Uma policial feminina apareceu perto da ambulância onde eu estava ao
lado da minha Rosa Vermelha.
— Tem um garotinho em um quarto no primeiro andar da casa, mas ele
está chorando muito e não deixa ninguém chegar perto dele. Está dentro de
um armário e, quando nos aproximamos dele, grita como se o estivéssemos
ameaçando. — A policial me olhou. — Você o conhece? A senhora Julia, a
dona daqui, tentou tirá-lo de lá, mas não conseguiu.
Pisquei, olhando para o andar superior da propriedade.
— Droga! É o Shaw. — Olhei para o Bryan, que estava perto da
ambulância. Meus amigos estavam próximos dali também. — Ele não vai
ouvir ninguém, só a mim. Então fica com a Sam enquanto falo com Shaw.
— Pode ir, minha avó e eu vamos com Samantha na ambulância. —
Olhou para uma senhora com cabelos brancos que usava um cachecol em
cima de um vestido xadrez. Tinha um enfermeiro cuidando de sua cabeça,
parecia machucada. — Se acontecer algo ao Shaw, Sam surtaria e nos
mataria. Eu tomo conta dela para você.
Assenti, ainda não querendo deixá-la, mas eu sabia que tinha que tomar
conta de Shaw, porque já o amava como a um filho, então teria que protegê-
lo e não machucá-lo mais do que já tinha sido maltratado.
Quando cheguei ao quarto no primeiro andar, ouvi o seu choramingo.
Isso cortou meu coração. O cômodo era grande, com duas portas de madeira.
Uma era a do banheiro, e a outra, do armário de roupas. Vinha dali o
choramingo do garotinho.
— Shaw — chamei. — Garotão, abre esse armário e vem para fora.
— Não saia daí até eu chegar — ele entoava o tempo todo.
— Eu sei que a Sam lhe disse isso, mas preciso que venha para fora
para eu falar com você.
— Por que eu confiaria em você?! — gritou num tom dolorido.
— Porque eu sou seu amigo, garotão.
— Você fez a minha Sam sofrer! Ela chorava e chorava depois que
assistiu você com outra mulher! — Sua voz era ácida, mesmo assim estava
dolorida. — Você é um canalha egoísta!
Respirei fundo.
— Sim, eu sou, mas, acredite em mim, aquelas fotos não eram reais. Eu
nunca traí a Sam — declarei, encolhido com o seu sofrimento. — Ela é toda
a minha vida.
Ele ficou em silêncio lá dentro. Então contei, tentando convencê-lo a
sair dali:
— Quando eu tinha seis anos, a minha mãe saiu de nossa casa e me
disse para eu não sair de casa até que ela voltasse. Fiquei por sete dias, mas
não conseguia mais, já que eu estava fraco de fome. — Expirei; tudo doía.
— Um dia, ia passando o pai do Ryan perto da minha casa. Ele me
encontrou, mas, se eu não tivesse gritado por ajuda, ele nunca saberia que eu
estava ali, sozinho e faminto. — Passei a mão direita no meu rosto para
controlar minha dor. — Sai daí e vem para mim. Quando a Sam estiver boa,
eu levo você para vê-la.
Não demorou muito, ele abriu o armário, saiu com os olhos vermelhos
de chorar e correu, abraçando-me forte. Vestia um pijama de coelhos.
— Vai ficar tudo bem — prometi, alisando seus cabelos.
— Vejo que conseguiu tirá-lo do armário — disse a policial, olhando o
Shaw nos meus braços. — Qual é o seu nome?
Shaw não respondeu, apenas escondeu o rosto no meu pescoço.
— Ele não fala — declarei.
Ela levantou as sobrancelhas para mim.
— Eu o ouvi falando com você.
Suspirei.
— Ele era uma criança do lar Fênix — esclareci.
— Oh.
— Sim. Samantha o adotou, eu e ela somos os únicos com quem ele
conversa, mas Sam ainda está trabalhando com ele. Ela é psicóloga. —
Deitei-o na cama e coloquei a coberta sobre ele. Passei a mão em seu rosto.
— Tenho que ver como a Sam está, Shaw, então, por favor, dorme um pouco.
Prometo que agora está tudo bem.
Ele não queria ficar sozinho, então deixei o Simon com ele no quarto,
mas não tirava a sua razão por ter medo, ainda mais depois de tudo que
passou.

Cheguei ao hospital e me deparei com os meus amigos na sala de


espera. Alex e Rayla também estavam ali. Todos estavam com a expressão
horrorizada.
— Como ela está? — perguntei com medo da resposta. Eu não podia
perdê-la, simplesmente porque não conseguia viver sem ela. Se Samantha se
fosse, eu não conseguiria seguir em frente, não poderia sobreviver no mundo
sem Sam.
Bryan já ia responder, quando o médico apareceu ali, com seu jaleco
azul.
— Doutor, como Samantha Donovan está? — questionei.
Ele me olhou.
— Você é o marido dela?
Assenti.
— Sim. Ela vai ficar bem? — Minha voz estava ansiosa.
— Ela teve uma costela quebrada e está com um inchaço no cérebro,
mas o pior é que perdeu muito sangue, e não temos seu tipo sanguíneo aqui,
no estoque, já que usamos todas as bolsas que tínhamos nas vítimas que
sofreram no acidente aéreo ontem. A não ser que um de vocês tenha o tipo
sanguíneo A ou O, positivo ou negativo. — Olhou ao redor da sala à procura
de um consentimento. — O tipo A positivo só pode receber sangue desses
tipos.
Entretanto, todos ali negaram ter os tipos sanguíneos necessários. O
meu era B positivo.
— Temos que fazer alguma coisa, droga! — esbravejou Bryan. — Ela
não pode morrer!
— E tem que ser rápido, porque ela corre o risco de perder a criança
— anunciou o médico.
Fitei-o com os olhos arregalados.
— Ela está grávida? — Ofeguei.
— Pelo jeito, você não sabia. Ela está grávida de seis semanas, por
isso seu estado é crítico, e corre o risco de perder a criança.
O meu coração martelava descompassado contra minhas costelas.
Samantha estava grávida do meu filho, mas corria o risco de perdê-lo. Não,
isso não podia acontecer! Eu precisava dos dois comigo! Tinha de arranjar
um jeito de salvar ambos, mas como?!
— Olá — saudou uma garota, aproximando-se de nós. — Não pude
deixar de ouvir a conversa. — Ela parecia tímida. — Não sei quem é a
mulher grávida, mas meu sangue é A positivo e não tenho quaisquer doenças,
então, se vocês quiserem, posso dar o meu sangue a ela.
A garota tinha cabelos pretos anelados presos em um rabo de cavalo.
Seus olhos eram negros como ônix, a boca voluptuosa e em forma de
coração. Usava jeans skinny e uma camiseta preta folgada com a estampa de
uma banda de rock.
Todos olhamos para ela, esperançosos. Bryan segurou os ombros da
mulher de olhos negros e fitou suas íris profundamente.
— Obrigado — agradeceu, comovido e feliz. — Você é um anjo.
Ela fez uma careta e se afastou de seu toque, então olhou para o médico.
— Posso fazer agora, pois tenho que trabalhar. — Sua voz era suave e
meiga.
— Qual é o seu nome, gata? — indagou Ryan para ela, que o olhou com
o cenho franzido, sacudiu a cabeça e não respondeu.
A garota entrou na sala em que a Sam estava no CTI. Ryan ficou
resmungando por ela nem ligar para ele, nem mesmo dizer seu nome. Não me
importei com isso, apenas tinha alguma esperança de ter minha Rosa
Vermelha de volta, bem como meu filho. Eu mal podia acreditar que seria
pai. Pensava que, se um dia tivesse um filho, não saberia educá-lo ou amá-
lo, mas percebia que isso não era verdade, porque aquela sementinha sendo
gerada dentro da barriga de Sam já tinha se apossado de mim por inteiro,
assim como a mãe fez comigo só com um olhar. Finalmente eu podia dizer
que tinha uma família, e era Sam quem tinha me dado.
17 - A Verdade
SAM
Acordei do que parecia ter sido um coma intenso, mas, antes que
abrisse os olhos, senti uma mão tocar a minha barriga, e a voz que jamais
pensei ouvir de novo estava ali, perto de mim. Parecia ser um sonho lindo,
eu não queria acordar tão cedo.
— Sabe — fiquei em choque, porque achei que ele estivesse falando
comigo, mas depois ele emendou —, meu filho? — sussurrou, alisando a
minha barriga. — Eu nunca pensei que ficaria tão feliz em ser pai, mas gostei
disso.
Perdi a minha respiração ao ouvir o que ele havia acabado de dizer. Ele
disse filho? Eu estava grávida de Lucky, era isso? Por esse motivo ele
estava alisando a minha barriga? Senti seus dedos tão suaves sobre meu
abdome. Entretanto, eu não podia ter esperança de tê-lo de volta, porque ele
me traíra, e isso eu não podia perdoar. Mesmo que estivesse grávida, não
poderia ficar com ele.
Lucky não pareceu sentir meu nervosismo, porque continuou a falar com
minha sementinha, aliás, nossa pequena sementinha, tão pequenina que eu só
tinha vontade de protegê-la.
— Quando eu era pequeno, não tinha a vida que toda criança deveria
ter. A minha mãe... — Ele riu com amargura e dor. — Não posso dizer que
aquela mulher sabe o que é a palavra mãe e o significado dela, porque uma
mãe protege seu filho e não o deixa sozinho em uma casa quando ele tem
apenas seis anos e vai embora, dizendo que voltará, mas não pensa em
voltar. Ela era uma prostituta barata que saía com caras, enquanto eu ficava
lá por dias, trancado em uma casa sozinho e com fome. Lembro-me de que
não tinha nada para comer, e como doía! Eu gritava por ela até cansar e
desmaiar. — Ele respirava de modo irregular.
Meu coração doía. Queria poder amenizar sua dor, mas como? A minha
também estava ali, dentro de mim.
— Essa vida desgraçada durou até meus seis anos e meio. — Ele riu
sem vida. — Recordo que ela nunca saía no Natal, mas, assim que recebeu
uma ligação, não pensou duas vezes e saiu, me deixando sozinho, e nunca
retornou. “Mamãe, não saia hoje”, supliquei chorando. “Ele é um cliente
importante, por isso tenho que ir”, ela me disse. “Mas hoje é Natal”,
reclamei. Lembro que passei aquele Natal sozinho. Passaram-se dias, e nada
de ela aparecer ou voltar para me resgatar daquela casa. A comida começou
a acabar, até que chegou o dia em que fiquei com fome. Mas, dessa vez, ela
não voltou.
Eu senti lágrimas caindo de seus olhos lindos e preciosos na minha
barriga. Lucky estava chorando. Eu queria tanto reconfortá-lo, mas esperei,
pois ele precisava se abrir.
— Eu já estava quase sem forças e caído no chão da cozinha. Foi então
que ouvi alguém passando perto da casa e conversando, acho que ao
telefone. Tinha prometido a ela que não sairia dali, mas simplesmente não
podia morrer de fome. Tentei achar energia de onde não tinha e gritei por
ajuda. — Ele suspirou. — O pai do Ryan me achou no chão da cozinha. Ele
quebrou o vidro da porta e entrou, me pegando no colo. Lembro-me de ele
dizer que eu estava leve e desnutrido, por pouco ele não conseguiria me
salvar.
Meu coração, que batia por ele, estava partido por sua história triste.
Não importava o que ele havia feito comigo, a sua dor ainda me cortava
fundo.
— Quando eu saí do hospital, ele disse que eu os teria como uma
família. Mas nunca me esqueci daqueles momentos de tormento, da fome...
da dor... do desespero. — Ele resfolegou. — Mas o pior veio depois,
porque, quando fui localizar a desgraçada da mulher, descobri por que ela
não voltou daquela vez. Descobri que havia simplesmente me deixado lá
sozinho e foi viver com um homem cheio da grana, em Moscou. — Sorriu
com desdém. — Já pensou? Uma mãe deixando seu filho sozinho em uma
casa num lugar longe, deixando-o lá para morrer sozinho e de fome, enquanto
ela estava cercada de dinheiro? Ela quase me matou. Se não fosse pelos
meus pais adotivos...
Lucky ficou em silêncio tanto tempo que achei que tinha acabado de
contar sobre sua vida difícil e sua mãe cadela. Embora a minha vida também
fosse uma droga, vivendo com aqueles dois que se diziam meus pais, ao
menos eu tinha meu irmão por mim. Graças aos Céus que eu cresci, e eles
não tinham mais poder algum sobre mim. Limpei minha cabeça, não
querendo pensar neles agora e no que Dylan tinha acabado de fazer comigo,
quase tirando minha vida.
— Meu filho — seu tom era de orgulho de novo ao dizer as palavras
—, eu vou fazer tudo que estiver ao meu alcance para você ter tudo que um
dia não tive. — Seu tom era de promessa. Senti sua mão em meu rosto, mas
permaneci imóvel para ele não descobrir que eu estava acordada. — Eu sei
que não tenho o direito de pedir seu perdão. Depois que vi suas fotos com o
Bryan, abraçados, achei que estivessem juntos. Por que você nunca me disse
que tinha um irmão mais velho? Pensei que tivesse me deixado, igual ela fez
comigo, me deixando para trás somente para eu morrer enquanto ela se
casava com um homem rico. Por favor, volte para mim, Rosa Vermelha. —
Senti seus lábios nos meus.
Então Lucky tinha visto fotos minha e do Bryan e pensado que eu o
estivesse traindo com outro cara? Como ele podia pensar isso, depois de
tantas vezes que eu disse que o amava? Embora eu entendesse seu lado
desconfiado, por sua mãe tê-lo deixado, eu nunca o machucaria ou o
abandonaria por ninguém nesse mundo. Isso tudo era minha culpa, por não
ter dito a verdade a ele quando tive a chance. Lucky havia me traído porque
achava que eu o estivesse traindo, não porque não me queria mais. Eu podia
sentir seu amor enquanto ele se abria comigo.
Ele colocou o rosto em meu pescoço, e sua voz saiu como um sussurro
de dor e tormento:
— Mesmo que você não me queira mais... — senti seu corpo tremendo
— eu vou passar o resto da minha vida rastejando aos seus pés e implorando
seu perdão, mas, por favor, me perdoa, porque eu amo você e simplesmente
não posso viver sem você.
Prendi a respiração ao ouvir a sua declaração. Abri os olhos e vi seus
cabelos castanhos ali, tão perto do meu rosto. Senti seu cheiro almiscarado
misturado àquele perfume amadeirado caro e as lágrimas salgadas banhando
minha pele. Aquele ser deslumbrante estava ali, nos meus braços, abrindo-se
comigo e revelando o seu amor por mim. Eu sabia que custava muito para
Lucky falar sobre seu passado. O mundo era cheio de crueldade, os meus
pais também não valiam nada. Meu pai quase me matou, por isso eu estava
no hospital, cercada de aparelhos. Eu também precisava desabafar com ele e
lhe contar a verdade sobre tudo, mesmo que isso não pudesse mudar o que
ele fez comigo por causa da minha mentira.
— Quando eu era criança... — Ele se mexeu nos meus braços assim que
ouviu a minha voz, mas coloquei as mãos em seus cabelos e prendi sua
cabeça em meu pescoço. Não queria perder a coragem. — Só me deixe
terminar antes que eu perca a coragem.
Ele mexeu a cabeça, assentindo.
— O Dylan me amava e me protegia da minha mãe, que jurava que eu
era a semente do Mal — eu disse com a voz embargada. — Uma vez, até, ele
me pegou antes que eu caísse de uma árvore. Quando completei dez anos,
tudo mudou, ele começou a beber e se transformou em algo que eu não
reconhecia. Aquele cara legal e amoroso foi se tornando desalmado e bruto.
— Resfoleguei, porque doía pensar nisso. — Eu sempre apanhava dele.
Apenas se o olhasse, já era motivo para ele tirar seu cinto e me bater. Isso
durou até meus 15 anos... — Minha voz falhou, e lágrimas desceram.
Lucky se afastou para me fitar. Dessa vez eu o deixei fazer isso, já que
estava sem forças para prendê-lo perto de mim. Seus olhos verdes estavam
atormentados ao ver a dor nos meus e as lágrimas que desciam pelo meu
rosto, mas não disse nada, apenas esperou que eu desabafasse.
— Naquele dia, seria o baile de primavera da escola. Eu estava muito
animada para ir, porque nunca havia ido a um baile antes, ainda mais com um
garoto. Um garoto da escola tinha me convidado para ser seu par. — Ri sem
humor. — Acho que ele era o único que me queria.
— Isso não é verdade — Lucky discordou com um olhar intenso e
amoroso. — Você é linda!
Peguei meu celular na mesinha perto da cabeceira da cama e procurei
nas minhas fotos salvas. Eu tinha cabelos negros, usava óculos e roupas
largas.
— Essa era eu quando tinha 15 anos. — Entreguei o celular a ele. —
Com óculos de grau e roupas largas.
Lucky fitou a minha foto e sorriu com amor.
— Ainda linda! — Seu tom era de júbilo.
Sacudi a cabeça, decidindo não discordar dele; discutir com Lucky era
perda de tempo.
— Eu estava me preparando para ir ao baile, com um vestido branco e
cabelos soltos. — Olhava minhas mãos ao falar. — Foi quando... ele entrou
em meu quarto, fedendo a cachaça, e ficou furioso ao olhar para mim vestida
daquele jeito. Parecia um namorado possessivo e ciumento em vez de um
pai. — Limpei as lágrimas, que caíam pelas minhas bochechas. — Rasgou o
vestido no meu corpo. Lembro-me de que nunca senti tanto medo na vida.
Seu olhar no meu corpo vestido só com a roupa íntima... Seus dedos...
Lucky respirou fundo, controlando a raiva, mas eu sentia a sua fúria
pelo Dylan, tanto que achei que seria até capaz de matar o meu pai. Tocou
meu rosto molhado, mas senti a sua mão tremendo.
— Ele de algum jeito tocou em você? — Sua voz fervilhava por trás da
calma.
Neguei com a cabeça.
— Não, ele não chegou a fazer isso, mas eu vi que ele ia... Vi nos olhos
dele. — Encolhi-me com a lembrança. — Mas, graças a Deus, o Bryan
chegou, entrou em meu quarto e viu o que estava acontecendo. Dylan ficou
furioso por ter sido interrompido e disse que, se nós dois contássemos a
alguém, ele bateria no Bryan, igual fazia comigo.
— Então você não o denunciou. — Não era uma pergunta. Ele sabia que
eu jamais arriscaria a vida do meu irmão.
— Não, eu não podia deixar que ele batesse no Bryan também. —
Suspirei. — Quando completei 16 anos, ele tentou de novo, mas meu irmão
estava lá outra vez. Ele não me deixava sozinha um minuto com ele. — Ri.
— Nós sempre protegemos um ao outro.
— E sua mãe?
Ri com desdém.
— Depois desse dia, contei a ela, mas não acreditou e riu de mim.
Então contei a vovó, que ficou furiosa com a mamãe. Quando cheguei
naquele dia em casa, ela me bateu até cansar. — Ele limpou as minhas
lágrimas. — Me chamou de vagabunda e disse que eu andava “dando” para
todo mundo da cidade em troca de dinheiro, em vez de acreditar em mim,
que era a sua única filha. Ela ficou do lado dele. Além disso, manchou meu
nome pela cidade inteira. — Expirei, controlando a dor. — Então fui morar
com minha avó até ir para a faculdade. — De repente, olhei para ele
assustada. — Minha avó... como ela está? E Shaw?
— Ei, fique calma — pediu assim que notou meu estado. — Ela e Shaw
estão bem, não se preocupe com eles.
Suspirei.
— Fico aliviada com isso — falei, e continuei meu relato: — Depois
que me formei, Bryan foi morar comigo. — Olhei seus olhos verdes e lindos.
— Uma vez você me perguntou por que eu tinha 24 anos e ainda era virgem.
Bem, eu acho que, de alguma forma, eu pensava que havia me tornado aquilo
de que ela me chamava. Acho que vem daí a minha aversão ao seu dinheiro.
— Nosso — ele me corrigiu.
— Eu achava que, se lhe contasse a verdade, você não acreditaria em
mim, assim como ela.
— Se tivesse me contado, eu teria acreditado em você. — Eu ouvia a
verdade em cada palavra.
— Eu sei. — Encolhi-me no colchão. — Por isso não critico você por
ter ficado com...
Ele arregalou os olhos, estupefato.
— O quê? Eu juro que não fiquei com nenhuma mulher. Nunca trairia
você, mesmo pensando que me traiu.
A esperança renasceu em mim.
— Não ficou? Mas eu vi...
Lucky suspirou, e uma sombra escura atravessou suas feições.
— Aquilo tudo foi estupidez minha. Uma armação. — Passou as mãos
em seu cabelo bagunçado. — Depois que vi suas fotos com o Bryan, o
primeiro pensamento que me veio à cabeça foi que você estava me traindo
com ele, já que, pelas pesquisas que eu tinha feito sobre você, não descobri
nada sobre um irmão. O que queria que eu pensasse com vocês desse jeito?
— Pegou uma foto e me deu. Era do Bryan beijando a minha testa em frente
ao seu apartamento, mas, daquele ângulo, parecia ser um beijo na boca. —
Ele era o cara que você disse que era gay.
— Eu não disse que Bryan era gay, apenas que eu não fazia o seu tipo,
já que somos irmãos. — Revirei os olhos. — Pode acreditar, ele não tem
nada de gay, acho que é pior do que o Ryan. — Sorri meio boba para ele. —
Então você não ficou com ninguém?
— Não, porque a única pessoa que eu quero é você. Por isso concordei
com a ideia do maldito Kevin. Ele queria que eu a traísse, mas aceitei, idiota
que sou, armar aquilo para me vingar de você. Isso é algo de que vou me
arrepender para sempre. Aquelas fotos foram armação, igual a sua com
Bryan. Tudo armação do Kevin com a Mary para nos separar.
Levantei as sobrancelhas.
— Mary?
— A vagabunda da mulher que diz ser a minha mãe. — Soltou uma
risada com raiva e asco. — Ele é enteado dela, e os dois eram aliados para
me roubar.
Arregalei os olhos de choque.
— Eu fico feliz que não tenha feito de verdade o que ele sugeriu. —
Sorri, pegando a sua camisa preta e o puxando para mim, ignorando uma
pontada de dor nas costelas. — É bom saber que o homem por quem me
apaixonei ainda é só meu.
— Apaixonou-se? — Ele esboçou um sorriso.
— Claro, porque, se eu não tivesse me apaixonado, jamais teria me
casado contigo.
— E eu achando que se casou comigo por causa do meu charme... —
Sorriu e aproximou o rosto do meu. — Eu posso beijá-la? Porque estou
doido para fazer isso há muito tempo.
— Depende. — Olhei-o de um jeito ardente. — Você não disse a
palavra-chave.
Ele franziu o cenho.
— Que palavra-chave? Você quer que eu lhe peça perdão? Quer que eu
me ajoelhe aos seus pés? — Ele já estava se levantando, quando firmei
minhas mãos em sua camisa.
— Não. Você não disse que me ama. — Tinha dito enquanto pensava
que eu estava inconsciente, então não valia.
Aproximou novamente a face da minha, tão perto que eu podia sentir
seu delicioso aroma, que adorava. Roçou os lábios nos meus.
— Eu sou loucamente, completamente apaixonado por você. Estou de
quatro, cinco e seis por você, de todas as posições possíveis. — Seu tom era
cálido ao dizer tais palavras.
— Fico feliz em saber disso. — Sorri, tocando seu rosto lindo e suas
covinhas. — Eu amo você demais.
— Eu também amo você — declarou com fervor e se afastou, depois
me deu um selinho. — Pensar que perdi você foi a coisa mais apavorante do
mundo. Não quero sentir isso novamente, como na semana passada.
Arfei.
— Quer dizer que estou apagada há uma semana? — Meu tom soou alto
entre as paredes do quarto.
Seus olhos gloriosos estavam mais lindos que o Sol ao nascer.
— Sim, foi uma semana difícil de suportar... — Sua voz estava rouca
com a lembrança. — Quase morri ao ver você naquele chão, cheia de
sangue, mil vezes pior do que aconteceu com Saul.
Estremeci.
— Mas agora estou bem — garanti, não querendo pensar no que
aconteceu. — Estou louca para ir embora daqui.
— Sam, você tem um machucado em suas costelas e quase perdeu nosso
filho por causa da hemorragia. — Ele tremeu ao pensar nisso. — Vai levar
alguns dias para receber alta.
— Você está bem com a minha gravidez? — perguntei hesitante. — Eu
não sabia que estava grávida, devo ter ficado na nossa primeira vez juntos,
já que não usamos camisinha.
— Eu sei. — Beijou a minha face. — Mas estou em êxtase ao descobrir
que vou me tornar pai de um filho seu.
Sorri alegre.
— Fico feliz em ouvir isso. — Beijei-o. — Amo você.
— Também amo você, minha Rosa Vermelha.
Epílogo
SAM
Um mês se passou após a minha estada no hospital. Soube por Bryan
que meu pai estava na prisão e que recusou ser defendido por um advogado,
disse que merecia estar lá e não ser absolvido de nada. Eu não soube bem o
que sentia com isso, mas, lá no fundo, achava que ainda o amava, embora
não estivesse pronta para perdoá-lo pelo que fez comigo a minha vida
inteira.
Eu soube que a minha mãe foi visitá-lo, mas ele não quis a sua visita,
afinal, foi ela quem lhe disse que eu não era filha dele. Em parte foi por
culpa dela o que ele fez comigo. Ela saiu de lá chorando. Bryan me disse que
ela queria me ver e pedir perdão por ter me causado tanto sofrimento.
— Eu não posso perdoá-la, talvez algum dia, quando as feridas
cicatrizarem, mas agora não posso — respondi a ele assim que falamos
sobre o assunto. — Você vai perdoá-la?
— Nunca vou perdoar nenhum dos dois. Para mim, eles estão mortos.
— Essa foi a sua resposta. Depois disso, não falamos mais sobre o assunto.

Durante minha convalescência, Lucky contratou uma médica para cuidar


de mim. Eu estava havia mais de um mês em abstinência sexual por causa da
surra que levei do Dylan, que quase me fez perder o meu bebezinho.
Perguntei à doutora Sandra se eu já podia fazer sexo, e ela me disse que, se
eu estivesse me sentindo bem, não havia problema algum. Então, como eu
não sentia nenhuma dor, podíamos desfrutar um do outro, algo que eu ansiava
demais.
Assim, fizemos amor várias vezes, à noite e de manhã, antes de ele sair
para o trabalho. O fogo que eu estava sentindo era fora do normal. A doutora
Sandra, a minha ginecologista e obstetra, disse que mulheres grávidas
secretavam mais hormônios, por isso essa vontade de fazer sexo toda hora.
Amei a ideia.
Aquele era o primeiro dia de trabalho de Lucky depois que saí do
hospital. Também seria o meu primeiro dia, e eu tinha de comparecer a um
evento na Fênix, que seria realizado para arrecadar fundos para a instituição.
A festa aconteceria em um salão grande e decorado com luzes e flores
de várias cores e aromas diferentes, rosas vermelhas e brancas, tulipas e
outras que não recordo. Ainda não tinha começado. Localizei Michael e Ana,
que, para a minha surpresa, estavam de mãos dadas. Fiquei feliz; pelo menos
ele estava seguindo em frente.
Ana usava um vestido preto tomara que caia, bem justo, acentuando
suas curvas. Michael estava com um terno preto que combinava com seus
cabelos loiros e olhos azuis. Os dois faziam um belo casal.
— Oi, pessoal — cumprimentei-os.
Os dois me olharam com expressões tristes.
— O que foi? Teve algum problema com o evento?
Michael suspirou.
— Lucky me ligou e pediu para eu demiti-la — disse com um semblante
inexpressível.
Meus olhos se arregalaram.
— Ele fez o quê?! — percebi que gritava.
— Acho melhor você conversar com ele, Sam — Michael falou, ainda
calmo. Não parecia ter raiva em seus olhos dessa vez.
— É o que eu vou fazer agora! — rosnei, cerrando os punhos. Virei-me
para sair dali e encontrar o causador da minha raiva. Ele que se preparasse.
— Depois nós conversamos.
— Vai dar tudo certo, Sam — assegurou Ana a meia voz. Pelo tom,
parecia que ela escondia algo de mim, porém eu estava com raiva demais
para pensar com clareza.
Cheguei ao Mercedes, e Simon abriu a porta para mim. Ele era agora
meu motorista e guarda-costas. Tive uma briga com Lucky por causa disso,
mas acabei cedendo depois que ele disse que pessoas podiam me usar para
chegar até ele, ainda mais por eu não estar mais sozinha, tinha um ser
pequenino crescendo dentro de mim.
— Para onde, senhora Donovan? — perguntou.
— Para a Ônix — respondi com raiva, não dele, é claro, mas do Lucky.
Cheguei ao escritório pisando duro e vendo brasas na minha frente de
tanta ira.
— Você não pode entrar na sala, o senhor Donovan está em uma reunião
— disse a Suzanny, entrando na minha frente. Ela era a garota que apareceu
nas fotos com Lucky naquela armação.
Fuzilei-a com uma cólera tremenda, capaz de matar alguém, pois, se já
não ia com a cara dela antes, imagina depois do que houve? Levantei a mão
e desci uma bofetada em sua face que fez a sua cabeça girar.
— Saia da minha frente! — rosnei. — Esse tapa é por ter se submetido
a posar para fotos com meu marido.
Ela segurou o rosto vermelho e riu com desdém, a serpente mostrando
as presas. No entanto, eu era uma leoa.
— Marido? Você o traiu, sua vadia! — guinchou ela.
— Na verdade, não o traí, porque aquele cara da foto é meu irmão. —
Minha voz era seca. — E você será despedida antes que termine o dia, sua
vagabunda.
— Eu vou acabar com você! — rosnou ela e veio para cima de mim,
mas o Simon a pegou, afastando-a.
— O chefe disse para ninguém a tocar.
Isso me fez ver fogo ainda mais. Ignorei os dois e entrei na mesma sala
em que entrei um dia para xingá-lo. Isso era meio irônico, porque agora eu
vinha fazer a mesma coisa.
Assim que a porta foi aberta, ouvi a voz furiosa dele:
— Quem ousa interromper... — a sua voz mortal sumiu assim que me
viu ali, furiosa. Passou os olhos na Suzanny e no Simon perto da porta e por
fim os pousou em mim novamente. — O que está acontecendo, Sam?
Cheguei à mesa que nos separava e bati as mãos nela. E rugi, ignorando
os olhares de todos os supervisores da empresa:
— O que está acontecendo?! Você ainda tem a audácia de perguntar?!
— esbravejei. — Você não tem o direito de se meter na minha vida!
Ele ergueu as sobrancelhas.
— Você já sabe...
— Mas é claro que eu sei! — rugi. — Como ousa dizer ao meu chefe
para me demitir?! — eu gritava, tremendo de raiva. — Você não pode fazer
isso só porque tem o poder nas mãos!
— É claro que posso. — Seu tom deixava bem claro isso. — Você é
minha esposa, e não a quero trabalhando lá.
— Você não quer? — Inspirei fundo, controlando-me. — E onde eu vou
trabalhar, então?
— Você não precisa...
Eu o interrompi:
— Não é porque me casei com você que vou ficar em casa, gastando
seu dinheiro. — Suspirei. — Eu sempre trabalhei e vou continuar assim,
querendo você ou não.
— É um desafio? — perguntou, incrédulo.
— Não, mas não vou ficar em casa comendo à custa de um homem...
Foi a vez de ele me interromper:
— Seu marido, pela lei dos homens e de Deus.
Expirei, controlando-me.
— Claro, mas o que quero dizer é: eu preciso trabalhar, não só pelo
dinheiro, mas também porque amo meu trabalho.
Ele assentiu depois de um minuto.
— Você quer um trabalho, não é?
— Sim. — Eu o fuzilava. — De preferência, um em que você não se
meta.
— Você não quer que eu seja o seu chefe? — Seu tom era ultrajado. —
Você já trabalhou aqui.
— Não estou falando disso, apenas estou dizendo que quero trabalhar
em um lugar onde você não se meta por ser o meu marido ou porque tem
dinheiro.
Ele se recostou na cadeira e suspirou.
— Certo, eu não vou me meter.
— Sério? — questionei, chocada, achando que tinha ganhado a batalha
facilmente. — Posso voltar para o meu trabalho sem ter medo de que você
feche o lugar?
— Não. — Ele sacudiu a cabeça.
— Fale de uma vez, não estou com paciência! — rosnei.
Ele ergueu as sobrancelhas.
— O que vai fazer se perder a paciência?
— Lucky! — Ou eu respirava ou voava no pescoço dele.
— Tudo bem, você vai trabalhar na Vênus de volta.
Franzi a testa.
— Você ouviu o que eu disse? Eu não vou trabalhar onde você manda...
Ele me cortou:
— A Vênus não é mais minha. — Sua postura era relaxada.
— Não? Você a vendeu?
Ele negou com a cabeça.
— Não, eu não vendi a minha empresa, apenas a dei de presente.
Meus olhos pareciam saltar das órbitas. Nunca imaginei que ele fosse
tão nobre ou altruísta ao dar uma empresa milionária a alguém.
— Oh! — Varri os olhos ao redor da mesa, sobre os homens que ali se
encontravam, todos de terno e gravata, encarando-o incrédulos também. —
Para algum deles?
Lucky revirou os olhos.
— Eu jamais daria a minha empresa, que é a minha vida, a um
funcionário — retrucou.
— Então para quem... — Calei-me com assombro e, ao encarar aqueles
olhos verdes intensos, brilhantes e excitados em expectativa, pude confirmar
minhas suspeitas. — Você não fez isso!
Ele sorriu como uma criança ao ganhar seu presente preferido.
— Meus parabéns, você é a nova dona da Vênus! — Seu tom era
ansioso.
Ofeguei de pavor e pesar, uma mistura não muito boa.
— Você não fez isso! — repeti, tão alto que provavelmente dava para
ouvir lá de baixo. — Você é doido?!
Ele franziu a testa.
— Estou completamente são. Agora há pouco, quando eu disse que
tinha dado a minha empresa, você não deu esse chilique; por que agora,
quando soube que era para você, está assim? — Gesticulou para mim com ar
confuso.
— É diferente...
— Diferente como? Me explique qual a diferença entre eu dar um
presente a minha esposa ou a um funcionário! — Seu tom era de ultraje.
— Presente é uma joia ou flores, não uma empresa de milhões! —
gritei.
— Bilhões — corrigiu ele, calmo.
Eu respirava profundamente para me controlar. Peguei um copo com
uma bebida qualquer que estava sobre a mesa. Não sabia o que era, mas
serviria para me controlar um pouco. Contudo, antes que eu o levasse à
boca, Lucky o tomou da minha mão.
Fitei-o feroz.
— O que foi?!
— Você não pode beber, se esqueceu? — lembrou-me de que eu estava
grávida.
Suspirei e olhei ao redor.
— Vocês se importariam de nos deixar a sós um minuto? Eu preciso ter
uma conversa com esse... — fulminei o Lucky e cerrei os dentes — senhor.
Todos olharam para ele como se buscassem sua permissão.
— Ela manda — respondeu sem tirar os olhos de mim.
— Não estou mandando, estou pedindo por favor — declarei a todos.
Os supervisores se levantaram e saíram, apenas um ficou por último.
Era moreno, parecia ter uns quarenta anos mais ou menos. Sorriu para mim.
— Você pediu por favor? — Parecia impressionado.
— É claro que pedi. — Sorri. — Afinal, sou educada.
Ele sorriu para o Lucky.
— Devia aprender com ela. — Seu tom parecia não ter medo da fúria
do chefe.
— Vá embora, Mike — rosnou ele.
— Você não pode fazer isso — falei assim que todos saíram.
— É claro que posso, porque eu sou o dono — replicou.
— Isso é loucura! Não vou saber administrar essa empresa! —
reclamei, jogando-me no sofá e o fitando. Ele estava de pé, com um sorriso
sexy.
— Você não sabe o tanto de pensamentos quentes que estou tendo com
você nesse sofá. — Seu olhar era cálido.
Apertei as minhas coxas para segurar o desejo que havia entre elas.
— Lucky, estou falando sério.
— Eu também. — Ele veio até mim, ajoelhou-se à minha frente e
colocou os dedos nos meus joelhos, abrindo as minhas pernas.
— Lucky, nós estamos na sala de reuniões — protestei, sem forças.
Ele sorriu travesso.
— Oh, eu sei. — Seus dedos seguiam pelas minhas coxas.
— O que os outros vão pensar? — Minha voz ficou fraca ao sentir as
suas carícias.
— Eles estão aqui para trabalhar, não para pensar — retrucou. —
Afinal, eu sou o dono.
— Não é porque é o dono que tem que dar mau exemplo — rebati e
tirei a suas mãos de mim. — Por mais que eu queira, a resposta é não. Estou
aqui tratando de coisas sérias, e você fica levando para esse lado.
Ele suspirou e se sentou ao meu lado.
— Quero que você aceite esse presente, porque eu estou dando,
querendo você ou não. — Seus olhos agora eram suplicantes. — Por favor,
aceita?
Suspirei também depois de um longo minuto de silêncio.
— Tudo bem, aceito. — Não tinha como lutar contra o Lucky, era como
combater uma onda gigante.
— Sério? — Seu sorriso se tornou esplêndido.
— Sim, mas com duas condições.
— Quais?
— Primeiro: quem demite os funcionários?
Ele estreitou os olhos.
— Carlos, do RH, mas ele só faz isso quando eu o mando fazer.
— Ótimo. Já que você gosta tanto de se meter no meu trabalho, quero
que demita essas pessoas. — Peguei o papel na minha bolsa azul, que
combinava com meu vestido azul de cashmere. Entreguei-lhe a lista de
nomes de mulheres com quem ele já havia ficado. Descobri isso quando pedi
a Bryan que fizesse um dossiê de todas as mulheres que trabalhavam na Ônix
e na Vênus. Através desse dossiê, além de saber com quem Lucky tinha
transado, fiz uma descoberta importante.
Ele pegou o papel e leu os nomes, que estavam escritos nos dois lados,
e eram apenas as que trabalhavam ali, nos dois prédios; ainda havia mais,
funcionárias de subsidiárias. Tentei não ficar com raiva disso, afinal, era o
seu passado.
— Você quer que eu demita todas elas? — Ele me avaliava.
— Sim, incluindo a sua secretária, que, por sinal, tem uma queda por
você.
— Eu já ia fazer isso, afinal, nenhuma boa mulher se submeteria ao que
ela aceitou. Mas e as outras? Por quê?
— Porque, se eu trabalhar aqui, não quero ficar olhando para essas
mulheres e imaginar que elas já transaram com meu marido nem que já
ficaram em cada canto desta empresa...
Ele me cortou:
— Não fiquei com nenhuma mulher dentro da minha empresa, jamais
faria isso. — Ele sorriu torto. — Apenas com você, na minha sala.
— Lembra quando me conheceu e me chamou para transar em seu
escritório? Você mal me conhecia.
— Pode ser, mas com você sempre foi diferente. Aqui ou na minha
casa, eu apenas a queria. — Ele beijou a minha mão. — Agora tenho você só
para mim.
Revirei os olhos.
— Como conseguiu esses nomes, já que nem eu sabia?
— Quando eu soube do golpe do Kevin, descobri que ele estava aliado
a uma mulher.
Os advogados de Lucky colocaram Kevin e Mary, sua madrasta, na
cadeia. Ficariam lá por um bom tempo. Lucky também conseguiu reaver seu
dinheiro. Ele foi ao julgamento dela e a detonou. Não pude ir, já que estava
acamada pela surra que levei do meu pai, mas, quando ele voltou para casa,
percebi que estava sofrendo por tê-la enfrentado. Eu não disse nada, apenas
o abracei e o beijei, mostrando-lhe meu amor e que ele não estava sozinho.
— Não estou falando de sua mãe, mas sim de uma pessoa aqui da
empresa. Bryan fez o dossiê sobre as mulheres com quem você já ficou e que
trabalham aqui. — Fiz uma careta. — Fiquei espantada com a lista geral,
acho que daria uma biografia: “A vida secreta de Lucky Donovan.”
Iria mostrar a ele a outra pessoa aliada de Kevin; precisava que ele
mesmo visse ao invés de eu falar.
— Sinto muito que o meu passado a magoe — murmurou com um olhar
injetado. — Talvez, se eu tivesse tido uma vida diferente, não teria feito o
que fiz.
— Não estou acusando-o por seu passado, Lucky, não tenho esse direito
— sussurrei. — O que estou dizendo é que não quero você perto delas. —
Olhei de lado para ele. — Sei que você pode mexer os pauzinhos, tenho
certeza de que adora fazer isso, então faça com que nenhuma delas fique
desempregada. Afinal, não sou nenhuma víbora.
— Tudo bem — ele assentiu. — Eu vou fazer isso. — Beijou meu
rosto. — Tudo para ver a minha esposa feliz.
— Obrigada.
— E a segunda condição?
Afastei o rosto do dele para fitá-lo.
— Quero que dê folga a todos que trabalham para você quando for
feriado, porque todos têm família e precisam passar esses dias ao lado dela,
assim como eu preciso passar ao lado do meu marido lindo e gostoso. —
Sentei-me em seu colo.
Ele me apertou em seus braços e beijou meu pescoço.
— Então eu sou gostoso, hein? — Mordiscou a minha orelha direita.
— Lucky, estamos em seu horário de trabalho — critiquei, sem fôlego
com seu toque. — E você tem que voltar para sua reunião.
— Não tem mais reunião — declarou, beijando a minha pele.
— Você não pode fazer isso...
— É claro que posso. — Seus lábios saíram do meu pescoço e foram
para minha boca. — Eu sou o dono, então posso fazer tudo.
— Lucky, estou falando sério. — Tentei me levantar, mas ele apenas me
colocou com delicadeza deitada no sofá grande e confortável e pairou sobre
mim. — Lucky, alguém pode entrar aqui.
Ele me ignorou e suspendeu meu vestido até o pescoço, deixando-me
nua, apenas de calcinha. Seus olhos vagaram pelo meu corpo. Lucky estava
sentado em cima dos meus quadris, mas sem colocar peso. Eu sentia a sua
ereção contra mim, isso só incendiava ainda mais meus hormônios
incontroláveis por ele.
— Lucky... — gemi — alguém... — Ofeguei quando ele colocou as
mãos nos meus seios e os apertou delicadamente.
— Ninguém vai entrar aqui. — Olhava meus seios com desejo faminto.
— Acha que já tem leite?
— Ainda não — respondi ofegante. — Mas alguém pode entrar e me
ver assim.
Ele varreu os olhos por meu corpo e suspirou, pegando o seu telefone e
ligando para alguém.
— Simon, não deixe ninguém entrar na sala de reuniões, ou a sua
cabeça estará a prêmio. — Desligou, deixou o telefone cair e sorriu, olhando
meu corpo com desejo. — Ninguém mais pode ver essa obra-prima, apenas
eu.
A sua boca cobriu a minha com uma fome exasperada, a mesma que eu
sentia. Depois, desceu para os meus seios e os chupou com força, e eu gemi
de volúpia, abrindo as pernas em um convite silencioso.
— Isso mesmo, querida, abra as pernas para mim — sussurrou,
chupando meu outro seio duro. — Eles são saborosos... Sortudo do meu
filho, quando nascer.
Peguei a sua camisa e a desabotoei, tirando-a e a sua gravata, jogando-
as no chão. Apreciei a bela vista de seus bíceps definidos. Ele esfregou a
sua ereção já grande e pronta em mim, e soltei um gritinho, recompondo-me
a seguir por saber que não podia.
— Pode gritar o quanto quiser. — Lucky pareceu ler a minha mente. —
Aqui é à prova de som. Grita, pois quero ouvir você chamando meu nome.
— Rasgou minha calcinha com um puxão.
Eu estava prestes a protestar, quando ele enfiou dois dedos dentro de
mim, e gritei com o súbito prazer, enquanto ele chupava meus seios e mexia
os dedos em meu interior.
Deixei o corpo arqueado, procurando mais o dele, e gozei intensamente.
Se o lugar não fosse à prova de som, meu grito seria ouvido pelo prédio
inteiro.
— Isso, bebê. — Ele tirou os dedos de mim e abaixou as suas calças, e
logo eu estava no céu. Não precisávamos mais de camisinha, assim eu podia
sentir ainda mais o seu calor. Isso me levou à loucura.
— Eu gosto de ouvir você gritar no seu êxtase. — Lucky estava
ofegante. — Esse é um som que quero que ninguém nunca ouça.
— Ah! — gritei de novo, para o seu deleite, e logo chegamos ao clímax
juntos.
Fiquei o que pareceu um longo tempo mole no sofá. Lucky saiu de
dentro de mim, arrumou as calças e foi até o banheiro se limpar. Logo voltou
com um pano molhado.
— Abra as pernas — pediu.
Olhei para ele, corando.
— O que vai fazer?
— Limpar a minha querida esposa. — Aproximou-se de mim e me
limpou.
Depois que ele retornou ao banheiro, sentei-me e abaixei o vestido.
— Você me deixou sem calcinha — acusei assim que ele saiu do
banheiro. Ele colocou a camisa e a gravata de volta e me olhou com um
sorriso travesso.
— Ninguém vai saber que você está sem calcinha, apenas eu. — Seu
tom era malicioso.
— Muito refrescante. — Levantei-me, peguei a peça íntima inutilizada
e a joguei no lixo. — Acho que a mulher da limpeza vai ter uma surpresa ao
ver isso.
Ele chegou perto de mim e arrumou meus cabelos, que deviam estar
bagunçados pelo “amasso” no sofá, depois beijou meus lábios.
— Ela vai pensar que eu estava fazendo amor com a minha linda esposa
— sussurrou com ardor.
— Acho melhor parar de me beijar, ou vamos parar naquele sofá de
novo.
Ele franziu a testa.
— Ainda está com vontade?
Encolhi os ombros.
— Não sei, mas essa gravidez está me matando de desejo. Tenho
vontade quase toda hora. — Escondi meu rosto no seu peito. — À noite,
quando acordo e fico olhando você dormir...
Ele me afastou e me olhou.
— Por que não me acorda? Eu adoraria realizar essa sua vontade a
qualquer momento com o maior prazer.
Suspirei.
— Não quero incomodá-lo. Entendo que já ficamos mais de um mês
sem sexo, mas a doutora Sandra disse que a gravidez aumenta meus
hormônios e pode causar essa vontade, chegando a doer se eu não fizer sexo.
— Pois, de agora em diante, você vai me procurar a todo momento que
estiver com vontade. — Sua voz era séria.
Sacudi a cabeça.
— Mas não posso. Você tem que trabalhar, e não vamos ficar assim de
novo. — Apontei para o sofá. — Se você cobra algo de seus funcionários,
tem que dar exemplo, e sem essa de que é o dono.
— A que horas esse desejo vem a você? — Ele parecia sinceramente
preocupado com isso.
— De manhã, quando acordo; às 9h; na hora do almoço; às 3h da tarde;
e à noite. Também quando acordo de madrugada com um desejo esmagador
por você — sussurrei.
Ele beijou meu rosto vermelho.
— Vou providenciar para realizar essas vontades, não se preocupe. —
Seu tom parecia uma promessa.
Sacudi a cabeça.
— Você não pode realizar todos os meus desejos a todo momento. Eu
posso aguentar até a noite.
— Nada disso — discordou. — A minha Rosa Vermelha vai ter tudo o
que deseja. — Sorriu com malícia. — Eu vou adorar fazer isso. Mas agora
vamos, que vou apresentar a Vênus você. Afinal, só tenho três horas.
Ergui as sobrancelhas. Era meio-dia. Eu não sabia o que ele faria dali a
três horas. Talvez tivesse outra reunião agendada.
— O que vai acontecer daqui a três horas?
Encostou os lábios em meu ouvido e sussurrou:
— Vamos ter a segunda rodada, minha esposa linda.
Ri.
— Você vai seguir isso ao pé da letra, não é?
— Sim. E vou amar cada parte disso.
Ele me levou até a Vênus, então fomos aonde seria minha sala, no
último andar do prédio. Tentei não pensar no peso disso. Conheci algumas
pessoas legais quando havia trabalhado ali.
Quando cheguei à recepção da minha nova sala, deparei-me com a
minha secretária. Era morena e parecia ter uns 25 anos mais ou menos. Seus
cabelos negros eram longos, mas estavam presos em um rabo de cavalo.
— July — Lucky nos apresentou —, essa é minha esposa, Samantha
Donovan.
— Você é casada. — Não era uma pergunta, pois eu via a aliança em
seu dedo.
— Sim, há cinco anos — respondeu ela, meio nervosa.
— Agora entendo. — Ela estava em um relacionamento, por isso não
estava na lista de Lucky.
Ele me fitava com as sobrancelhas erguidas, mas não disse nada.
— Por quê? — perguntou ela, confusa. — Eu vou ser demitida?
— É claro que não! — Sorri para tranquilizá-la.
— Vou levar a senhora Donovan para conhecer o escritório da diretoria
executiva, que agora é dela. E, de agora em diante, só a chame de senhora
Donovan, entendeu? — ele falou de um jeito meio rude com a funcionária.
Fiz uma careta, mas não disse nada. Sabia que Lucky iria reclamar de
alguma coisa, ou eu não me chamava Samantha Donovan. Esse sobrenome
ainda me dava arrepios, mas era o preço para tê-lo comigo.
— Sim, senhor — disse ela depressa, depois me olhou. — Desculpe,
senhora.
Suspirei.
— Não tem problema. — Sorri. — Pode chamar a Sasha e dizer para
ela vir aqui, ao escritório do Lucky?
— Seu escritório, não meu — ele corrigiu, passando o braço em minha
cintura.
— Eu sei. — Olhei para July. — Mas você vai lhe dizer que o Lucky
quer falar com ela.
— Eu? — indagou ele, sem entender.
Ignorei-o.
— Apenas diga isso a ela, está bem? E não diga que estou aqui, por
favor.
Ela assentiu, ainda confusa.
— Sim, senhora, eu o farei — garantiu.
Lucky me levou à sala imensa. Devia ter uns nove metros de largura por
dez de comprimento. As paredes eram de cor creme, bem, onde tinha parede,
porque o escritório tinha uma bela vista panorâmica de Manhattan em razão
das paredes de vidro de cima a baixo.
— UAU!
— Gostou? — Ele me olhou preocupado. — Se não gostou, podemos
reformá-lo para você.
Assenti.
— A sala é linda, mas falta colocar um pouco de vida aqui — anunciei,
animada com a ideia. — Irei adorar transformar este lugar em um ambiente
alegre.
— Que bom! — Ele me abraçou e beijou o meu pescoço. O fogo se
reacendeu de novo, tão forte como um vulcão. — Adoro ver esse sorriso
lindo em seus lábios. Que boca linda! Quase me mata só olhar para ela.
— Ah... eu sei de algo que me deixaria completamente feliz. — Virei-
me e apertei meus quadris contra os dele. — Preparado para a segunda
rodada?
Seus olhos brilharam. Não haviam passado nem vinte minutos desde
que nós dois tínhamos ficado em sua sala de reuniões. Meus hormônios
estavam à flor da pele.
— Com o maior prazer, meu amor — respondeu, inclinando-se para me
beijar, mas fomos interrompidos pelo som do telefone chamando sobre a
mesa com tampo de vidro. — Maldita hora de tocar!
Sorri.
— Vamos fazer depois — declarei, afastando-me dele e atendendo o
telefone. — Sim?
— Senhor Lucky, a senhorita Müller está aqui — anunciou July, meio
nervosa.
Percebi que ela me chamou de Lucky. Isso queria dizer que não deu a
entender que eu estava ali. Gostei dela logo de cara.
— Espere um minuto e a mande entrar — pedi e desliguei. Fitei o
Lucky.
— Por que você quer falar com a Sasha?
Suspirei.
— Lembra agora há pouco que eu disse que o Kevin estava aliado a
outra mulher além da sua mãe?
Ele arregalou os olhos.
— Não vai me dizer que era a Sasha! — Seu tom revelava surpresa e
raiva.
— Sim, era ela o tempo todo — respondi, observando sua reação.
— Eu não acredito que ela fez isso comigo!
Estreitei meus olhos.
— Por que não? Veja o que ela disse para o Shaw, uma criança. Céus,
quando vai deixar de ser cego?! — rosnei, afastando-me dele.
— O quê? Sam...
O que mais me doía era o fato de ele não ter confiado em mim quando
deveria, mas acreditava naquela víbora peçonhenta. Expirei, controlando a
dor.
— Vá se esconder no banheiro, então vai saber de tudo. — Apontei
para uma porta de madeira que ficava ao lado da mesa.
— Sam, não foi isso que eu disse. — Ele deu um passo para mim, mas
me afastei, não querendo seu toque naquele momento. A dor toldou seus
olhos, foi como se eu lhe tivesse batido, porém, também estava doendo em
mim a sua falta de confiança.
— Apenas faça o que eu pedi, por favor — falei, limpando as lágrimas.
— Eu não vou, até dizer que acredita em mim. — Ele pegou meu rosto e
me fitou. — Sei que errei por não acreditar em você mesmo vendo as fotos,
mas saiba que, de agora em diante, vou sempre confiar, porque você é a
mulher da minha vida e mãe dos meus filhos. Desse aqui... — colocou a mão
na minha barriga — e do Shaw. Por favor, diga que acredita em mim.
— Sim — sussurrei em meio ao choro. — Não liga para as lágrimas,
acho que faz parte da gravidez. Desculpe-me por estar sensível.
— Tudo bem, meu amor. — Beijou meus lábios e foi se esconder no
banheiro.
Limpei meu rosto e me controlei para receber a traidora.
Ela bateu à porta e entrou, mas devo admitir que gostei do choque em
seu rosto ao me ver ali em vez de Lucky. Ela estava com um terninho preto e
com dois botões do blazer abertos, eu apostava que tinha feito isso para ele.
Vagabunda de uma figa, nem respeita homem casado!
— Cadê o Lucky? — Seu tom era seco.
— Isso não é da sua conta, Sasha — respondi friamente.
Ela olhou ao redor, como se o procurasse. Depois que viu que eu estava
sozinha, a sua máscara caiu. Ela sorriu como uma hiena.
— Eu soube que voltou para o Lucky — desdenhou. — Tento imaginar
o que ele viu em você... uma caipira sem graça e morta de fome.
Ri com desdém.
— Olha quem fala — critiquei. — Uma mulher que foi criada em um
orfanato até os dez anos. — Eu não gostava de descer tão baixo, mas não
deixaria Sasha me humilhar.
— Sua vagabunda! — Tentou me bater, mas me defendi, dando-lhe um
empurrão que a fez quase cair de seus saltos Louboutin.
— Nunca mais pense em me bater, ou eu acabo com seu rosto — rosnei.
— Ao menos, nunca fui para a cama com caras aleatórios.
— Eu transo com quem eu quiser — grunhiu, arrumando os cabelos.
— Nisso, concordo com você. Mas o que não entendo é por que traiu o
Lucky? Ele arrumou um emprego para você nesta empresa! Como ousou
roubar justamente a ele para o Kevin?
Ela piscou.
— Você não sabe do que está falando — sibilou, mas senti a sua voz
tremendo.
Ri provocante.
— Eu vi vocês dois se pegando em sua sala, se esqueceu?
Ela riu.
— Estávamos apenas aproveitando um ao outro — retrucou. — Isso
não prova nada.
— Você é uma vadia safada! — Cerrei os dentes. — Bryan fez um
dossiê seu, e descobrimos as transferências da Vênus para sua conta. Está
lembrada disso?
Ela ficou tão branca como a neve, o sangue fugindo de seu rosto.
— Você está mentindo! — Deu um passo até mim, possivelmente com
uma vontade louca de me bater.
— Oh, não estou, e você sabe disso. — Encarei-a friamente. — Você
sabe o que Lucky vai fazer quando souber? Vai te mandar para a cadeia,
onde está a mãe dele e o Kevin.
— Lucky não vai me prender. — Seu tom era provocativo. — Além
disso, onde você acha que ele buscou conselho quando viu as suas fotos com
aquele cara? Eu disse que você o traía desde o começo.
— Sua descarada! — rugi. — Eu nunca traí o Lucky!
Ela riu com desdém.
— Mas ele traiu você. — Sorria como o Gato de Cheshire.
Meu coração deu um solavanco tão grande que eu achei que morreria.
— Você está mentindo — retruquei, mas pareceu um lamento. — Lucky
não fez isso.
— Lembra-se das fotos? Aquilo realmente aconteceu.
— Não... — Minha voz falhou, uma dor forte me atingindo. — Ele me
garantiu que não tocou nela.
— E acredita nele? — Ela arqueou as sobrancelhas bem-feitas. — Você
acha que ele mudaria por você?
Não respondi, porque a dor que se apossou de mim era tremenda. Achei
que morreria. Se por acaso abrisse a minha boca, gritaria ou choraria, mas
não iria fazer nenhuma das duas coisas, portanto só fiquei ali, controlando-
me. Senti uma pontada em minha barriga. Precisava ficar calma, pois a
médica disse que eu não poderia ficar nervosa, mas, com tudo que estava
acontecendo era difícil. Seria verdade? Lucky teria mentido para mim?
— É claro que eu mudei por ela — assegurou Lucky, saindo do
banheiro e a fuzilando com frieza, depois olhando para mim com uma
expressão preocupada ao me ver com a mão na barriga. Correu para mim e
me abraçou forte. Tentei afastá-lo, mas não deixou, aumentou a pressão.
— Eu juro, Sam, pelo que mais amo no mundo. — Afastou-me e me
fitou com intensidade. — Eu não toquei em nenhuma outra mulher depois que
conheci você. — Beijou as minhas lágrimas. — Por favor, acredite em mim.
Eu amo você e só você.
Fechei os olhos por um breve momento, sentindo seu toque
esplendoroso em minha pele. Percebia a sinceridade que vinha dele, e meu
coração se aliviou com isso, a dor desapareceu por completo. Passei os
braços em sua cintura e inspirei seu cheiro inebriante.
— Confio em você — sussurrei. — Sempre.
Ele assentiu e me avaliou.
— Você está bem? — perguntou preocupado.
— Agora estou — garanti e fulminei Sasha. — Não acredito em nada
que sai da sua boca.
Sasha olhava com pânico para Lucky.
— Eu posso explicar — começou sua ladainha. — Eu só fui para a
cama com ele...
Lucky a cortou:
— Não me interessa com quem você foi para a cama. O que me faz
ficar furioso é o fato de você e Kevin terem traído a minha confiança. — Seu
tom era frio e mortal. — Céus, eu estava cercado de víboras e não sabia!
— Eu sei que não é desculpa, mas fiz isso por você.
Lucky riu com desdém.
— Por mim? — Seu tom era ultrajado. — Você armou, não só uma, mas
duas vezes para me separar da mulher da minha vida e, além disso, ainda me
roubou! Como diz que fez isso por mim?
Ela ficou ali, parada, observando a frieza e o desdém do Lucky.
— Eu sabia que essa... — Fulminou-me com ódio. — Eu tinha certeza
de que ela iria roubar tudo de você! Não queria que ficasse pobre, por isso
fiz o que fiz, mas saiba que tinha a intenção de lhe devolver tudo.
Lucky gargalhou com asco.
— Você só pode estar zoando com a minha cara, porra! — Seu tom era
um rugido.
— Sempre fui completamente apaixonada por você — ela riu com
lágrimas descendo pelo rosto —, mas você nunca quis ficar comigo, embora
ficasse com todas as outras mulheres.
Senti o meu coração parar com o rumo da conversa. Eu sabia que era
por isso que Sasha era assim, pois sempre soube que gostava do Lucky. Não
era à toa que sempre me odiou.
— Você só pode estar louca se pensa que um dia eu a foderia — ele
rosnou. — Eu confiava em você mais do que em um funcionário qualquer,
como uma amiga, mas você me traiu.
Suspirei, e Lucky me olhou preocupado.
— Eu vou dar uma volta por aí — falei, afastando-me dele. —
Enquanto isso, você resolve esse problema.
— Problema? Nós tivemos problemas apenas depois que você entrou
em nossas vidas, vadia! — Sasha grunhiu.
— Não fale mal da minha esposa — sibilou Lucky entre dentes.
— Você é um frouxo por fazer tudo que essa desgraçada quer! —
rebateu. — Não está vendo que ela manipulou você?!
— Ela pode fazer qualquer coisa comigo. — Ele sorriu para mim com
um prazer quente nos olhos. — Eu sou seu para sempre. — Depois, seus
olhos, agora frios, pousaram em Sasha. — Quando você disse aquelas coisas
sobre Shaw e me separou da Sam, relevei por amizade aos seus pais
adotivos, mas, diante do que você fez, não posso e não vou tolerar isso. Você
não fará mais parte de nada que envolva a minha vida.
— Não pode me tirar da sua vida! — ela gritou, então suplicou: — E se
eu pedir desculpas e implorar?
— Não fará diferença, porque quem me trai uma vez não é perdoado.
— Seu tom era mortalmente frio.
— Mas você a perdoou pelo que ela fez! — Apontou o queixo com
asco para mim.
Eu estava prestes a revidar, mas o Lucky falou antes:
— Sam nunca me traiu. Aquele cara das fotos é irmão dela, então pare
de dizer besteiras! — rosnou feroz. — Você vai ser acusada de ser cúmplice
do Kevin e arcará com as consequências.
Ela arregalou os olhos.
— Eu não posso ir para a cadeia!
— Pensasse nisso antes de me trair e roubar o que é meu. Agora é tarde
para arrependimentos. — Pelo seu tom, não haveria perdão. Ainda bem que
eu era amiga dele, não inimiga.
— Eu sou a gerente administrativa desta empresa e quem a faz
funcionar, então não pode me demitir. — Seus lábios tremeram.
— Você tem razão — concordou Lucky. — Eu não posso.
Meu coração ficou em frangalhos, pois, depois de tudo, ele ainda
acreditava nela. Por que não acordava logo? Maldita desgraçada! A minha
vontade era de matá-la.
— Então vai me deixar ficar? — Parecia haver esperança em sua voz.
— Eu prometo nunca mais fazer isso.
Encolhi-me e olhei para a imensa vista. Lucky teria que escolher, pois,
se aquela vagabunda e ladra ficasse ali, eu não ficaria com a empresa. Não
havia nada nesse mundo que me fizesse trabalhar no mesmo lugar que aquela
mulher.
Lucky ficou preocupado ao observar minha reação, percebi por suas
palavras:
— Meu amor, a empresa é sua — disse tranquilamente. — Cabe a você
tomar essa decisão.
— Mas você vai perdê-la, e já disse que são amigos e que confia nela
— murmurei.
— Ela não é minha para eu perdê-la. — Ele beijou meus lábios. —
Você é. A minha esposa linda e mãe do meu filho.
Ouvi o ofegar da Sasha.
— Você engravidou somente para prendê-lo, não foi? — rugiu para mim
e depois olhou para ele. — Não está vendo? Ela é uma golpista, Lucky!
Fuzilei-a.
— Não engravidei para segurá-lo — rosnei, mas, de repente, me senti
preocupada que o Lucky desse ouvidos a ela. — Eu juro, Lucky, jamais faria
isso.
Ele me beijou de novo, sorrindo.
— Eu sei que não, mas adorei saber que serei pai. — Seu tom era de
orgulho. — O meu herdeiro.
— Eu desisto — arrulhou Sasha, quase encolhida.
Nós dois olhamos para ela.
— O quê?! — Meu tom saiu alto pelo choque.
— Você realmente a ama. — Não era uma pergunta. — Já teve centenas
de mulheres, mas nunca beijou nenhuma delas, nem quando transava.
— Posso saber como sabe sobre isso, já que nunca transamos?
Ela riu sem vontade.
— Tenho minhas fontes. As mulheres sempre diziam que você era bom
de cama, mas que apenas tinha um defeito, que não colocava a boca nelas de
modo algum — murmurou.
— Porque nenhuma delas teve qualquer importância para mim. Apenas
a Sam. — Ele fitava minha boca e meus olhos. — Essa boca é tudo que um
dia ansiei. Você foi a única e sempre vai ser. — Ele pareceu falar isso para
tranquilizar o meu coração, que estava angustiado ao ouvir sobre as suas
conquistas, mas ouvir essa declaração da sua boca fez com que eu me
sentisse melhor.
Sorri.
— Obrigada — agradeci a ele e a fulminei. — Você está demitida. Não
fará mais parte desta empresa de agora em diante.
— Você não pode fazer isso!
Levantei o queixo.
— É claro que posso. Como Lucky disse, agora esta empresa é minha,
então posso fazer tudo. — Meu tom era gelado.
— Não vai conseguir uma pessoa mais eficiente do que eu! — retrucou.
— Ah! É claro que vou — declarei, sorrindo. — A mesma pessoa que
descobriu suas fraudes e as de Kevin. Ele nunca me roubaria, diferente de
você.
— O seu amante?
— Ele não é meu amante, sua depravada! — sibilei. — Bryan é meu
irmão. — Disse num tom calmo ao Lucky: — Eu vou ao banheiro e, quando
sair, não quero que ela esteja aqui. — Saí antes da resposta dele. Entrei no
banheiro enorme e cercado de mármore branco florido.
Saí depois de alguns minutos, esperando que Sasha já tivesse ido
embora. Não a vi, mas sim Ryan, com uma calça jeans e uma camiseta
branca e jaqueta preta. Ele estava na frente do Lucky.
Ryan sorriu para mim com malícia.
— Ora, ora, se não é a minha cunhada preferida — disse, abraçando-
me.
— Ela é a sua única cunhada, seu idiota — disse Lucky.
Ryan riu, depois se afastou, olhando-me.
— Eu vim propor algo a você.
Levantei as sobrancelhas.
— O que é? — perguntei curiosa.
— Quero que você desfile com minha nova coleção. — Sua voz era
animada.
Arregalei os olhos.
— Mas em sua empresa só desfilam mulheres com roupas íntimas e de
corpos perfeitos. Eu não acho que eu fique bem de roupas íntimas, ainda
mais desfilando — declarei.
— Você só pode estar brincando! — sua voz saiu alta de choque. —
Você tem o corpo mais perfeito que já vi, e olha que já vi todos os tipos de
mulheres lindas.
Lucky rosnou furioso.
— Pare de falar do corpo da minha mulher. — Seu tom era sério. —
Esqueça, Ryan, porque ela não vai desfilar por aí só com a porcaria de uma
calcinha e um sutiã.
— Olha quem fala. — Ryan levantou as sobrancelhas para o irmão. —
Quem sempre via os meus desfiles e gostava.
— Você disse bem, gostava, mas foi antes, e é por isso que não vou
deixar a minha mulher desfilar por aí assim, com um bando de homens
babando por ela. — Seu tom era frio e decisivo.
― Meu corpo não é tão perfeito assim — reclamei, corando.
— Cunhada, você tem um dos corpos mais perfeitos que já vi, poderia
ser minha modelo. — Piscou para mim, o que fez Lucky rosnar como um
leão. — Ei, calma aí, meu irmão, só estou dizendo a verdade.
— É melhor calar a boca antes que eu te faça calar com meus punhos.
— Seu olhar era tenebroso.
— Nunca pensei que você algum dia seria tão ciumento assim. —
Sorriu da careta de Lucky e depois me olhou. — Soube que você vai
trabalhar aqui.
— Não tive opção em relação a isso. — Funguei.
— Como assim? — ele sondou curioso.
— Seu irmão ameaçou fechar de novo o local onde eu trabalhava,
imagina? — Ele não disse isso com essas palavras, mas foi o que entendi.
Meu tom era crítico ao olhar feio para o Lucky. — Ele me deu duas
alternativas, ficar em casa ou pegar a Vênus e dirigi-la. Loucura, não é?
— Com certeza! — Piscou chocado. — Eu nunca faria uma coisa dessa
com alguém, nem se eu amasse a pessoa. — Ele revirou os olhos ante a
ideia. — O que nunca vai acontecer. Jamais daria uma empresa a uma
mulher, só se eu estivesse louco.
— Já ouviu aquele ditado que diz que quem cospe para cima cai na
cara? — indaguei. — Então, sim, isso pode acontecer com você.
Ele sacudiu a cabeça, negando.
— Eu sou livre como um pássaro. — Sorriu, mostrando seus dentes
brancos e brilhantes. — Não há ninguém nesta cidade que se recusaria a ir
para a cama comigo. — Ele me olhou de lado. — Só você, que me deu um
fora.
— Você acha que eu ficaria com um cara que tinha acabado de flertar
com a garçonete do Green e depois veio com esse sorriso para cima de
mim? Isso nunca aconteceria.
— Sabia que você foi meu primeiro e único fora? — Seu tom era quase
de ultraje, como se fosse impossível para ele levar um fora de uma garota.
— Foi bom você ter dado o fora nele. — Lucky pareceu aliviado com
isso.
— Eu tinha muitos problemas para me deixar levar por um bad boy —
sussurrei.
— Você me acha um bad boy? — perguntou magoado.
— E não é? Aposto que tem tatuagens por aí. — Apontei para o seu
corpo.
Ele deu um sorriso cativante.
— Oh, sim, eu tenho. Você quer ver?
— Nem sonhem com isso — rosnou Lucky para mim e seu irmão.
Sorri, passando os braços em volta da sua cintura.
— Não se preocupe, meu marido, as únicas tatuagens que quero ver são
as suas. — Ele sorriu. Ouvi Ryan bufar. — Eu sabia que você era um
mulherengo — falei ao meu cunhado.
— Mas você ficou toda derretida por mim, vi pelo seu olhar. — Ele
piscou para mim.
― Isso é verdade?! ― gritou Lucky, a ponto de atacar o irmão, fitando-
me de olhos arregalados.
Corei, mas dei de ombros.
— Lucky, você foi o meu primeiro e espero fervorosamente que seja o
último, mesmo assim não significa que eu não olhava os outros homens, bom,
antes de ter você na minha vida. Afinal, sou humana. — Observei o sorriso
do Ryan. — Mas isso não quer dizer que fiquei derretida ao ver você.
— Sentiu algo por ele? — rosnou Lucky.
Expirei, tentando me controlar.
— Lucky, o fato de eu nunca ter estado com um homem antes de você
não quer dizer que eu nunca quis. — Corei ao dizer isso. — Você não pode
me condenar, já que teve centenas de mulheres em sua cama. — Minha voz
saiu amarga.
— Ninguém nunca esteve em minha cama — falou num tom mais leve.
— Só você.
— Você entendeu o que eu quis dizer — rebati.
— Eu aceito, mas não significa que eu goste. — Fechou a cara para
Ryan. — Muito menos com o meu irmão.
Ryan riu.
— Ei, cara, não houve nada entre nós...
Lucky o cortou, feroz:
— Por causa dela.
— Sim — concordou ele, olhando-me de soslaio. — Mas fez bem você
me dar o fora naquele dia. Eu me sentiria mal levando uma garota como você
para dar uma rapidinha — ele me disse, ignorando o rosnado do Lucky. —
Por mais que tenha o corpo esculturalmente lindo. Meu irmão tem sorte.
— Sim, eu tenho — Lucky falou com júbilo, depois continuou num tom
ríspido para o irmão: — E pare de chamar o corpo da minha mulher de
lindo.
— E não é? — retrucou uma voz conhecida atrás de mim.
Virei-me para o meu irmão, que tinha entrado no escritório e me fitava
com um sorriso gracioso. Corri até ele e o abracei.
— Senti saudades — murmurei em seu ouvido.
— Nos vimos esse final de semana. — Ele se afastou e beijou a minha
testa. Sempre fazia isso quando nos encontrávamos.
— Parece uma eternidade — sussurrei, afastando-me dele, que sorriu
deslumbrante para mim.
— Por que está vestida assim?
Eu sabia que se referia ao meu vestido elegante e justo. A minha barriga
ainda não tinha crescido muito, afinal, estava fazendo 13 semanas de
gravidez.
— Eu ia para o trabalho.
— Assim? — Ele gesticulou para mim.
Ergui as sobrancelhas.
— Ei, quem é o meu marido? O Lucky ou você? — retruquei, cruzando
os braços.
— Não é porque se casou que não vou me meter. — Ele sorriu com
amor. — Para mim, você vai ser para sempre a minha garotinha.
— Essa garotinha vai fazer 25 anos daqui a uns meses e está esperando
um filho. O seu sobrinho. — Revirei os olhos. — Eu ia para o evento
beneficente que ia ter na empresa onde eu trabalhava.
Ele arqueou as sobrancelhas.
— Trabalhava?
Contei-lhe tudo sobre a ameaça do Lucky até a minha posse daquela
empresa.
— Você é dona da Vênus. — Ele parecia chocado, mas não era para
menos.
— É o que parece — resmunguei.
— Por isso chamei você aqui — disse Lucky, passando os braços em
minha cintura e olhando para Bryan. — Eu gostaria de saber se você pode
ajudar a Sam a administrar esta empresa. Sei que é policial, mas pode ajudá-
la de onde estiver, afinal, é expert em informática.
— Sério? — Ele parecia euforicamente feliz.
Os dois começaram a falar sobre a empresa, o seu desenvolvimento e
outras coisas que eu não entendia, afinal, não era muito boa em números, mas
meu querido irmão era um craque nisso. Pedi uma pizza enquanto
conversavam.
— Certo, a reunião está marcada para em torno das 5h da tarde —
falou-me Lucky. — Irei apresentar para os funcionários a nova dona da
Vênus.
— Todos vão achar que você é louco — comentei.
— Eles podem achar o que quiserem, porque não me importo, apenas
me importo com a sua opinião. — Sorriu de lado. — Eu era o dono da
empresa, e ninguém manda em mim.
Sorri amarelo.
— Vamos ver quem manda em quem.
— Nunca imaginei que ele seria domado por uma mulher. — Ryan
parecia quase pasmo.
Olhei para ele.
— Um dia você também vai ser domado por uma mulher, vai cair de
quatro. E, quando esse dia chegar, eu lhe darei os parabéns. — Sorri
provocante.
— Aposto um milhão de dólares que isso nunca vai acontecer. — Ele
sorriu também.
Arfei atônita, mas depois me recompus. Ele falava em apostar um
milhão como se não fosse nada.
— Eu poderia até apostar, mas não tenho dinheiro para isso.
Ele piscou.
— Você é casada com um dos homens mais ricos do mundo, tem uma
empresa que vale bilhões e ainda fala que não tem dinheiro? — Seu tom e
rosto estavam incrédulos.
Expirei.
— Eu posso ser dona daqui, mas não significa que o dinheiro seja meu.
— É claro que é seu, e, além disso, somos casados. Tudo que é meu é
seu — falou Lucky. — Se quiser apostar, pode fazer.
— Não gosto de apostar dinheiro — revelei depois de me recuperar.
Alguns dias antes, eu soube que ele me enganou na hora de assinar os papéis
do casamento, tirou-me a atenção somente para eu não ler o que estava
escrito. Casamo-nos com comunhão de bens. Fiquei furiosa com ele, mas já
era tarde demais.
— O quê? Você tem medo de perder? — provocou Ryan.
— Hummm, não, só não acho justo apostar dinheiro. — Franzi os
lábios, depois sorri para ele. — Já sei! Que tal isso, se você cair de quatro...
— Você quer dizer ela ficar de quatro, não eu — ele me cortou.
— O que eu quis dizer é, se você namorar uma garota e for fiel a ela —
avaliava seus olhos arregalados —, sem fazer sexo com ela nem com
ninguém, eu topo apostar.
— Você quer que eu fique sem sexo por muito tempo e, além disso, com
uma namorada? — guinchou ultrajado.
Vi, pelo canto do olho, Bryan e Lucky rindo da cara do Ryan.
— Sim. Se, durante esse tempo, você se apaixonar por ela, vai dar um
baile, dançar com ela para todos verem você e, por último, dizer que a ama.
— Meu tom era sério.
— Eu nunca fui a um baile e muito menos dancei. O que meus amigos
vão pensar? — retrucou. — O pior é ficar sem sexo.
Sorri torto.
— Todos nós sabemos que você gosta de mulher, e estará acompanhado
de uma garota linda — disse, depois o provoquei: — A não ser que você
queira levar um homem.
Ele se aproximou tanto de mim que senti seu calor. Seu rosto ficou a
centímetros do meu.
— Se a tocar, estará morto — sibilou Lucky.
Ryan sorriu travesso.
— Eu concordo, mas, se eu ganhar, você vai desfilar para mim. Se eu
perder, faço o que você disse. — Ele revirou os olhos com isso.
O sangue fugiu do meu rosto.
— Para você?
— Não estou dizendo para mim especificamente, afinal, valorizo a
minha vida. — Observou a fúria do Lucky. — É apenas um desfile que a
Fashion Donovan vai fazer daqui a alguns meses com mulheres gestantes e
não gestantes. Você é perfeita para isso.
— Esse desfile é sobre o quê? — indaguei meio sufocada.
— Com a nova coleção de lingerie.
— De jeito nenhum! — rugiu Lucky.
Eu não sabia bem como iria sair dessa. Alexia poderia me ajudar com
isso, mas, se ela aceitasse namorá-lo, talvez viesse a se apaixonar por ele.
Isso seria o fim do mundo, ainda mais se ele não retribuísse o interesse dela.
E eu seria a culpada por isso. O certo era eu deixar bem claro para ela, falar
a verdade sobre o playboy mulherengo que o Ryan era, assim ela não se
iludiria. Para falar a verdade, eu não estava muito preocupada com essa
aposta, apenas queria que ele ficasse firme com alguém, como aconteceu
com o Lucky.
— Fechado. — Peguei a sua mão e a apertei, mas ele me puxou como
se fosse me abraçar. Só não fez isso porque o Lucky o impediu, olhando com
ferocidade para o irmão.
— Não ouse tocá-la. — Seu tom era mortal.
Ryan deu um passo atrás. Não parecia abalado pela ira do irmão.
— É só um abraço, cara.
— Sem abraços, estamos entendidos? Afinal, você teve uma queda por
ela.
— Eu não tive uma queda por ela — retrucou. — Apenas queria...
— É melhor nem terminar.
— Certo, senhor ciumento. — Deu um soco de brincadeira no braço do
Lucky. — Agora eu tenho que trabalhar, pois tenho uma reunião daqui a uma
hora. — Olhou-me sorrindo. — Vou arranjar a garota.
— Não, senhor — cortei-o. — Eu vou escolhê-la.
— De jeito nenhum! — retrucou ele. — E se você me escolher uma
baranga? Eu tenho um gosto peculiar.
Sorri torto.
— Eu sei o seu gosto, não se preocupe. Pernas longas, corpo curvilíneo
e rosto que os homens morreriam só de olhar. — Pelo canto dos olhos, vi
Bryan levantar uma sobrancelha. Ele já sabia a quem eu me referia, mas não
disse nada. — Com essa garota, eu vou saber se vocês ficaram juntos ou não,
porque ela não vai ser comprada. Você é um homem lindo, e ela pode cair
em suas garras, porém não é tola para se apaixonar por você.
— Parece que você está descrevendo a si mesma, e não essa mulher.
Afinal, quem ela é? — Seu sorriso era divertido.
— Oh, não, essa pessoa que vai fazer de tudo para seduzi-lo é a
personificação da beleza e a rainha do gelo, portanto não corro o risco de
ela se apaixonar por você. Ela não é igual às garotas que você está
acostumado a pegar, que logo vão fazendo tudo o que você quer.
— Eu sou assim? Porque você não caiu em meus encantos.
— Porque não sou idiota a esse ponto. — Suspirei. — Ela também não
é, por isso, meu amigo, se você quiser ganhar a aposta, vai ter que ser forte e
resistir à própria Afrodite.
— Aposto o contrário, porque, assim que ela me vir, vai cair de quatro.
— Ele riu com malícia e confiança.
— Boa sorte, meu camarada. — Bryan deu um tapinha no ombro dele.
— Você vai precisar namorá-la, porque é impossível resistir a ela.
Ryan olhou para ele.
— Ela é tudo isso?
— Ela é perfeita e, além disso, gostosa. Então você vai ter que usar
muito a mão no banheiro. — Bryan riu descaradamente.
— Você ficou com ela?
— Bem que eu tentei, mas ela disse que não fica com parentes de
amigos. — Ele não parecia satisfeito com isso. — Ela é a melhor amiga de
Sam.
Ryan me fitou com os olhos estreitos.
— Quero uma garota menos bonita. Que tal uma com óculos fundo de
garrafa e roupas de uma freira?
— Vai ser ela — falei firme. — Essa, eu tenho certeza de que não será
comprada por você.
— Você não se preocupa que ela fique com o coração partido assim que
essa aposta acabar?
— Essa aposta não é para você conquistá-la, e sim para resistir a ela ou
cair na tentação, estamos entendidos? Além disso, se a magoar, vai ter que
arcar com as consequências comigo e com Alex.
— O que o Alex tem a ver com isso?
— Essa garota é a irmã dele, Alexia. Então espero que essa aposta
fique longe dos ouvidos dele, ou você terá um olho roxo.
Ele bufou.
— Não tenho medo dele. — Seu tom era firme e confiante. — Mas sou
forte o suficiente para resistir a essa mulher. Quando for a hora, me avisa,
que vou dar uma festa para apresentá-la como minha namorada. — Bufou
com a palavra e saiu do escritório.
— Ele é tão seguro de si — falei assim que ele foi embora.
— Sim — respondeu Bryan. — Eu vou lá fora dar uma palavrinha com
Alex antes de ele ir.
Observei-o.
— Vê se fica do meu lado, afinal, sou a sua irmã — rosnei.
— Sempre, Anjinho. — Beijou meu rosto e saiu.
Lucky me olhou de lado.
— Não importa se ele cair ou não por essa mulher, não tem a mais
remota possibilidade de você desfilar para ele.
Sorri e beijei seu rosto lindo.
— Eu sou psicóloga infantil, não ficaria bem para minha imagem
desfilar por aí com roupa de baixo.
— Então por que aceitou? — perguntou, confuso.
— Porque ele precisa de uma lição, e também torço de verdade para
que ele e Alexia se entendam. — Suspirei. — Bom, isso se ela me ajudar. —
Coloquei meus braços em volta de sua cintura e o apertei contra mim. —
Está pronto para outra rodada?
Ele sorriu, esquecendo-se do irmão.
— Com certeza. — Suspendeu-me do chão. Trancei as pernas em sua
cintura e o beijei, faminta, pois ele disse que não doía mais quando me
beijava, aliás, era justamente o contrário. Fiquei feliz com isso.
Lucky me colocou no sofá e pairou em cima de mim, pegando meu rosto
com ambas as mãos e me olhando intensamente.
— Eu te amo demais — declarou. — Você é o meu Sol, que brilha de
dia, e as estrelas, que brilham à noite. Sempre vou precisar de você, pois é o
meu tesouro mais precioso nesse mundo. Isso aqui sempre vai ser seu —
colocou a minha mão em seu coração, que batia forte —, porque ele só está
batendo aqui, no meu peito, por causa do amor que sinto por você, minha
Rosa Vermelha.
Eu estava com os olhos molhados.
— Você também é tudo em minha vida, o ar que eu respiro, meu bilhete
da loteria e a cura do câncer. Você é meu milagre! Eu amo você de corpo,
alma e coração, que é todo seu, assim como o seu é meu. — Podia parecer
clichê dizer isso a ele, mas eu não ligava, era tudo verdade.
— Para sempre! — jurou, beijando-me.
A APOSTA
Série Dilacerados
Livro II

IVANI GODOY

2ª Edição
2019
Copyright© - Ivani Godoy
Revisão: Kátia Regina Souza

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.
Todos os direitos reservados. É proibido o armazenamento e/ou a
reprodução de qualquer parte desta obra, através de quaisquer meios —
tangíveis ou intangíveis — sem o consentimento escrito da autora.
Criado no Brasil.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº. 9.610/98,
punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Capítulo 1
Proposta

ANGELINA
— Shane, vamos logo — gritei para o meu irmãozinho. — Estamos
atrasados.
Desde que meus pais morreram, há três anos, eu tomava conta dos meus
irmãos. Shane tinha oito anos, e Lira três. Eles eram “meu tudo”, a razão da
minha vida. Dispunha das suas guardas desde então.
Shane apareceu na porta com sua mochila do Homem-Aranha nas
costas. Ele possuía cabelos lisos e castanhos na altura do queixo. Seus olhos
negros pareciam voar longe como um falcão, tal qual os meus. Lira era a
minha gracinha, minha bonequinha linda, de cabelos loiros encaracolados até
a cintura e os olhos azuis mais belos que já vi. Minha mãe estava grávida
dela quando houve o acidente, porém, graças aos céus, conseguiram salvá-la.
Shane foi até mim e sorriu.
— Estou pronto — disse.
— Eu também! — Lira pegou a minha mão e fez um rodopio. — Estou
mais linda que você.
Eu ri.
— É claro que você está, minha bonequinha perfeita. — Beijei-a na
bochecha. Ela usava um vestido rodado e florido.
Seus olhos brilharam ao me ouvir elogiá-la, adorava me escutar
dizendo que era bonita. Esses dois eram meu mundo, eles me faziam querer
lutar contra tudo e contra todos, só para vê-los felizes.
— Vamos, então.
Deixei Lira e Shane na escola perto de casa, onde ficavam o dia todo,
para eu poder trabalhar mais calma. Em seguida, fui para o meu serviço de
faxineira. Eu conseguiria ter arrumado um emprego melhor, mas tive de
deixar a faculdade para cuidar dos meus irmãos. No entanto, não me
arrependia desta escolha, faria tudo de novo. Eles eram tudo o que tinha de
precioso neste mundo.
No mês anterior, descobri que Shane tinha uma doença no coração, e
que necessitava de cirurgia. Sempre achei que fosse sadio, mas há alguns
meses ele desmaiou, fizemos um check-up e constatamos a causa. Meu irmão
precisava de certos cuidados, proteção e tudo mais.
Curiosamente, no dia em que estava no hospital para pegar os exames,
consegui auxiliar uma mulher grávida doando meu sangue. Quando ouvi que
ela estava prestes a perder seu filho e a sua vida... não pude deixar de ajudá-
la, precisava fazer isto por mim e por aquela família.
Acho que todas as coisas acontecem por obra divina, como eu ter o
mesmo sangue que aquela garota e estar lá no momento certo. Ou eu poder
contar com meus irmãozinhos pequeninos que, com seu amor, me davam
forças para seguir em frente. Embora isso não compensasse as perdas de
meu passado, com certeza ajudava, mesmo que o buraco em meu peito fosse
permanente.
Shane seria operado daqui a um mês. Com a proximidade do dia, meu
coração trovejava de medo. A minha pulsação ficava forte, como um tambor,
ao imaginar perdê-lo... Não, eu não podia focar nisso, ocorreria tudo bem na
cirurgia, o médico disse. A ansiedade estava me matando, me comendo viva.
Não gostava de pensar em cirurgia, meus pais entraram em uma para serem
operados e não voltaram mais. Contudo, agora era diferente, Shane colocaria
um marca-passo, um procedimento simples pelo que consegui descobrir.
Entretanto, eu apenas tinha medo.
Cheguei ao imenso Hotel Plaza. O local tinha janelas e portas repletas
de vidros. Eu não entrava pela frente, e sim pelos fundos; dali já dava para
ver que o hotel era deslumbrante.
— Olá, Angie — Maria me cumprimentou. Todos meus amigos me
chamavam de Angie, esquecendo meu nome verdadeiro: Angelina Mary
Stone.
Ela era a nossa chefe, um amor de pessoa. De cabelos grisalhos,
parecia ter uns cinquenta anos mais ou menos, não que eu fosse perguntar
isso a ela.
— Bom dia — suspirei, ouvindo-a dizer onde eu ia ficar. Peguei os
dois últimos apartamentos do penúltimo andar, menos a cobertura. Não
perguntei o porquê, não fazia parte da minha função sair mexericando por aí.
Trabalhava naquele prédio há somente uma semana, e não pretendia deixar
escapar esta grande oportunidade, com eles pagando tão bem. Nunca ganhei
tanto.
Fui para o apartamento mencionado por Maria. No andar havia duas
moradias, uma do lado direito e outra no esquerdo. Cada uma dava quase
dez do apartamento onde eu morava. A da direita era maior.
Demorei cinco horas para limpar o primeiro apartamento, enorme e
cheio de prêmios pendurados na parede branca, muitos deles de concursos
relacionados a empresas de moda. Ali havia ainda uma foto de um homem
lindo e sexy, de cabelos loiros, olhos cor de whisky e pele branca
bronzeada. Sua boca estava levantada em um sorriso arrebatador. Vestia um
terno preto tanques. Ryan, assim se chamava, pelo menos era o que dizia
embaixo das fotos.
Não era a primeira vez que o via: o encontrara no hospital, quando doei
meu sangue para aquela mulher que estava prestes a perder o bebê. Lá, já
senti algo em meu peito no momento em que ele perguntou o meu nome e
nossos olhos se chocaram. Meu coração bateu mais forte e o estômago se
encheu de borboletas.
Descartei a ideia de tentar algo a mais, caras lindos e ricos sempre
queriam nos usar e depois jogar fora. No entanto, pensei nele por semanas.
Como um rosto que vi apenas uma vez não saía da minha cabeça? Estava
ficando louca.
Dava para imaginar a ironia do destino? Eu ir trabalhar no seu
apartamento — pelo menos achava que era dele, já que tinha várias coisas
de moda e muitas fotos.
Ryan estava ao lado da modelo Rayla Donovan, uma loira platinada de
olhos castanho-claros. Talvez fossem irmãos, porque se pareciam muito.
Deslumbrantes! Esta era a palavra para descrevê-los.
Terminei de limpar o imenso apartamento de seis quartos. Um deles, a
suíte máster, dispunha de uma cama California king e, em seu lado direito,
de um sofá na forma de L que ficava perto de uma parede de vidro. Fora os
demais cômodos: academia com piscina, sala de jogos com mesa de sinuca e
vários outros. Para a minha sorte, não estavam tão sujos assim, então não foi
preciso caprichar tanto. Se fosse dar uma limpeza geral neste imenso
apartamento, levaria o dia inteiro.
Deixei de bisbilhotar coisas que não me diziam respeito e fui para o
apartamento em frente a este.
Estava tudo uma bagunça, com garrafas de champanhe caídas por todos
os lados no chão cor de madeira. As paredes eram creme e não havia nada
enfeitando o lugar, como quadros e outras coisas, apenas dois sofás: um
grande encostado na parede, e um de três lugares no centro da sala.
Demorei quase três horas limpando todos os cômodos, faltando ainda a
suíte e a cozinha. Deixei a suíte por último e fui para a cozinha. Embora
fosse menor do que o outro apartamento, era tão elegante quanto.
A cozinha, toda branca, contava com uma ilha em mármore cor de areia
no seu centro. O fogão era de inox, os armários claros, e, a geladeira,
duplex.
— Quero que saiam agora! — rosnou um homem, irritado. Isso me fez
levar um susto, pensei que estava sozinha.
Não me contive e fui para a porta da cozinha dar uma espiada.
Arregalei os olhos ao ver duas loiras, ali, só de calcinha, com enormes
peitos de fora, parecidos com melões gigantes. Uma era baixa, e a outra mais
alta.
O cara que gritava estava de costas para mim, apenas vi uma tatuagem
em seu dorso, um desenho colorido de um grande dragão cuspindo fogo.
Vestia somente cueca. Seus músculos eram bem malhados e, os ombros,
largos e definidos; parecia tenso. “Corpo divino” descreveria bem a
imagem.
Não acreditei que o homem mandou as duas embora, estando peladas.
Nossa! Isso era repugnante, tratar mulheres como objetos descartáveis.
— Por que está nos expulsando? — perguntou a baixinha.
— Não gostou dos momentos que tivemos essa noite? — A garota mais
alta alisava os seios, num gesto sedutor.
Ele suspirou, como se tentasse controlar a raiva.
— Olha, não interessa se eu gostei de foder as duas — disse com tom
de desdém. — Foi apenas isso. Agora saiam da minha casa!
Não pude ver sua expressão, mas pelos olhos arregalados delas, notei
que o olhar do cara era mortal, à semelhança da voz.
As garotas pegaram suas roupas, vestiram-se rapidamente e foram
embora. Se tivessem um pouco de decência, nunca mais voltariam, depois de
serem humilhadas assim.
Ele se virou para mim. Ofeguei. Seus cabelos loiros eram longos, na
altura do queixo, mas bagunçados. Os olhos cor de whisky me miraram. A
boca sexy, o peito tonificado... Impressionante! Nossa, que homem era esse?
Parecia um daqueles modelos deslumbrantes. Logo o reconheci da foto com
a Rayla e do hospital; ao vivo, era mais gato, como eu me lembrava de
minhas fantasias com ele. Quase ri por me imaginar transando com um
homem desses, que pegava duas mulheres de uma vez. Depois que o vi no
hospital, fiquei pensando nele direto por semanas, até que coloquei um ponto
final e disse a mim mesma que não ia focar minhas energias em um cara com
quem não tinha a menor chance. Foi bom eu parar de sonhar acordada.
O que ele fizera com aquelas mulheres me deixou com repulsa, tive
vontade de vomitar. Corri para a cozinha e comecei a lavar as vasilhas sujas
que estavam ali. Eu esfregava um prato — de porcelana inglesa ou francesa,
não entendia muito disso, mas sabia que era caro — quando senti meu corpo
formigar e fraquejar. O calor estava em todos os lugares, como se eu
estivesse perto de uma fornalha acesa, aquecendo minha pele suave. Embora
as minhas mãos se encontrassem debaixo da torneira de água fria, ainda me
sentia quente.
Sentia que ele estava chegando perto de mim, mas não me virei. Se eu
me virasse, seria pior. “Será que ele vai me mandar embora? Droga, não
posso perder este emprego. Preciso deste serviço mais do que nunca”. Meu
corpo tremia com sua proximidade, podia inalar seu cheiro de sabonete de
lavanda.
— Você é a nova faxineira. — Não era uma pergunta.
Dei um pulo assim que ouvi seu sussurro na minha nuca. O prato que
estava na minha mão caiu no chão, virando milhares de pedaços. “Meu Deus,
agora eu realmente estou demitida”. Olhei para os olhos estreitos do cara e
comecei a tremer.
— Desculpe... — disse. Suas íris eram fendas escuras. — Eu não
estava espiando, juro. Só ouvi vozes e fui ver quem era... — falei,
envergonhada, provavelmente com meu rosto todo vermelho.
Ele não disse nada, apenas me olhava.
— E também pelo prato. — Olhei para os cacos quebrados no chão. —
Prometo que pagarei. Pode descontar do meu salário. — Tentava não
demonstrar meu desespero. “Por que ele tinha que ter pratos tão caros?”.
Fitei-o de volta, com lágrimas já escorrendo pelo rosto. Ele me
observava atentamente.
— Por favor, não me denuncie para a agência, eu preciso muito deste
trabalho... eu... — emendava sem pausas.
Então ele me interrompeu:
— Não vou dizer nada, acalma-se. — Suspirou ao notar meu terror. —
Não precisa chorar, não ligo para a droga do prato. — Seu tom de voz
parecia irritado. Com o quê? Eu não sabia.
Assenti nervosa, dado o jeito com que me olhava, como se eu fosse um
enigma. Tentei ignorá-lo e fui limpar os cacos no chão. Ele continuou ali, em
pé e de braços cruzados. Para a minha sorte, o cara vestira ao menos uma
bermuda jeans; para o meu azar, estava sem camisa. Evitei mirar seu peito nu
enquanto eu fazia o meu serviço. Fugi para o quarto antes que ele dissesse
alguma coisa.
O local estava uma bagunça. Ofeguei ao ver as cordas na cama, e
também uma madeira na forma de X com ataduras, como a cruz de Santo
André; certamente prendia suas parceiras ali. Tentei não pensar na forma
com que ele fazia sexo. Isso não era da minha conta.
Depois de limpar tudo, fui me trocar no banheiro dos empregados. Tirei
o uniforme — um vestido preto — e vesti uma calça de moletom e uma
camiseta folgada com o logotipo de Alan Jackson, meu cantor preferido.
Decidi sair antes que o cara aparecesse de novo, todavia, ele estava na
sala, sentado no sofá maior. Vestia agora uma calça jeans, e ainda estava sem
camisa. Seria difícil me concentrar com ele assim. O homem segurava um
copo de vidro na mão, o líquido parecia ser whisky, com duas pedras de
gelo dentro. Parei de frente para ele.
Seus olhos estavam em mim, assim como na cozinha.
— Precisamos conversar — ele me disse.
Engoli em seco. “Ele vai me demitir. Oh, Deus!”. Tentei de tudo para
não chorar de novo. “Se me mandar embora, o que vou fazer? Este é o lugar
onde eu ganho mais!”.
— Ei, não precisa entrar em pânico. — Ele me avaliava. — Como eu
falei, não vou demitir você, ou contar o que houve aqui.
Suspirei, mas estava longe de ser por alívio.
— O que o senhor quer? — Minha voz saiu trêmula.
Parecia que ele havia tomado banho e não fora ali, devia ter ido ao seu
outro apartamento. O que me fez perguntar: o que era este apartamento em
que eu estava? Algum tipo de prostíbulo?
Fiz de tudo para não olhar o seu corpo, e que corpo! Santa mãezinha,
dava vontade de lambê-lo todo. Eu devia estar louca, mas o cara era um
Adônis. Perfeito!
Ele franziu o cenho.
— Quantos anos acha que eu tenho?
Estreitei meus olhos. “Qual será o motivo da pergunta?”.
— Hummm — murmurei estupidamente. — Vinte e quatro? — Pareceu
mais uma indagação.
Ele sorriu. Seus dentes eram brancos como marfim.
— Vinte e seis, então pare de me chamar de senhor. — Tomou um gole
da bebida. — Não sou nem um ano mais velho do que você.
Assenti, muda, não querendo corrigi-lo: na verdade, eu era dois anos
mais nova que ele, ou quase, já que fazia aniversário no dia vinte de outubro,
ou seja, no mês seguinte. Queria que ele falasse logo o que desejava de mim.
— Quantos anos você tem? — questionou.
— Faço vinte e quatro no mês que vem.
— Certo, então sente-se e vamos conversar? — convidou. Arregalei os
olhos.
— Acho que não posso.
Ele franziu a testa.
— Por que não?
— Porque os empregados não devem sentar junto com os patrões. — Eu
me remexi nos calcanhares. — Seria demitida da agência por isso.
Seus olhos não deixaram os meus.
— Eles não vão saber — garantiu.
— Eu... — comecei a insistir. Aos iniciar meus trabalhos naquela
agência, eles deixaram esta norma bem clara. Ele me cortou.
— Eu sou o patrão aqui. Estou mandando você sentar. — Sua voz
apresentava raiva no final.
Senti-me acovardada por seu tom controlador. Se ele me mandasse cair
de joelhos, eu faria sem pestanejar. Sentei-me reta com as mãos no colo.
— Tudo bem, mas só tenho vinte minutos — falei, deixando bem claro
que não dispunha de muito tempo, afinal, tinha mais trabalho para fazer.
— Onde vai depois? — Demonstrava curiosidade.
— Eu tenho trabalho em uma hora — respondi honestamente. Por sorte,
a última casa que eu pegaria era pequena, no Bronx.
— Se você trabalha daqui a uma hora, por que tem de sair em vinte
minutos? — Ele se remexeu no sofá, sem nunca deixar de me avaliar.
— Porque eu pego o ônibus — suspirei. — O que deseja comigo?
Ignorou a minha pergunta e fez outra.
— Você não tem carro?
— Não. — Eu estava sem entender o porquê do cara inquirir tanto
sobre mim.
— Todas as pessoas têm que ter um carro, nem que seja velho —
criticou.
— Eu tinha, mas precisei vender — sussurrei. Depois que meus pais
morreram, passei alguns apertos financeiros. — O que você quer?
— Você tem raiva de mim, Anjo? — perguntou e avaliou a minha
reação.
Além dos meus pais, ninguém nunca me chamou de “Anjo” antes.
— Dificilmente, já que nem o conheço. — Mexia as minhas mãos num
gesto nervoso com seu olhar intenso.
— Eu vi seu olhar quando me enxergou com aquelas garotas. — Seu
tom era cômico.
— Isso não me dá motivo para ter raiva ou algum outro sentimento
parecido por você — retruquei.
— Mas você não gosta do modo com que trato as mulheres.
— Isso não é da minha conta, como eu disse, sou uma empregada e
estou aqui para trabalhar, e não para cuidar da vida dos patrões. — A minha
voz saiu um pouco ácida no final. — Não me interessa se trata as mulheres
como lixo.
— É isso que você pensa de mim?
— O que eu penso não importa.
Ele assentiu e sorriu.
— Você quer ganhar um milhão de dólares? — perguntou.
Meus olhos se arregalaram, sem entender.
— Não jogo na loteria, então não tenho como eu ganhar esse valor —
falei por fim.
Ele riu, sexy e rouco. Droga! Por que tinha de ser tão lindo? No
hospital, no mês passado, perguntou meu nome, mas eu não disse nada,
apenas queria sair daquele lugar o mais rápido possível e beber para ver se
a dor sumiria. Não era de tomar álcool, mas após pegar os exames de Shane,
eu precisava. Johnny ficou comigo aquele dia. Um amigo de ouro.
Pelo visto, ele não se lembrava de mim. Quase ri disso, um homem que
tratava as mulheres daquela forma com certeza não se recordaria de nenhum
rosto depois do ato, muito menos do meu, uma qualquer sem graça que ele
viu apenas uma vez.
— Eu posso pagar isso, se você fizer algo por mim. — Sua voz era
calma.
— Olha, eu não sei o que você quer, mas a resposta é não.
— Você nem sabe o que é para dizer não! — replicou.
— Algo assim, vindo de uma pessoa como você, não pode ser boa
coisa. — Bem que o dinheiro ajudaria a pagar todo o tratamento de Shane,
mas seria certo me submeter a isso pelo meu irmão?
— O que quer dizer com “uma pessoa como você”? — Escorou as
costas no encosto do sofá. — Você sabe quem eu sou?
— Não, mas o que você deseja deve ser algo errado. — Minha voz era
grossa. — Eu jamais desceria tão baixo, mesmo sendo pobre.
Ele estreitou os olhos.
— Garanto que não é nada ilícito ou perigoso. — Sua voz rouca estava
calma, como se tivesse toda paciência do mundo.
— Certo, vou arriscar — falei. — O que é?
— Quero que seja a minha namorada por um mês ou dois. — Seu olhar
abrasador se aprofundava no meu.
Eu gargalhei.
— Você só pode estar brincando comigo!
— Sua risada é linda, Anjo. — Ele fitava a minha boca.
A minha risada sumiu. De repente, senti raiva e me levantei depressa.
— O que você acha que eu sou, uma prostituta? — gritei. — Nunca
venderia meu corpo, nem por todo o dinheiro do mundo.
— Não estou falando de sexo. — Ele se ergueu também. — Jamais
pagaria por isso. Foda tenho de graça, é só estalar os dedos.
Eu o avaliava para ver se dizia a verdade. Nas últimas frases com
certeza sim: o cara era um maldito deus grego.
— Se não é sobre sexo, então se trata do quê? — deixei sair o
sarcasmo. — Se num estalar de dedos tem qualquer garota que quiser, por
que eu serviria?
— Caso eu resolva contar o motivo, você promete pensar na resposta?
— Parecia quase suplicante, esperançoso.
— Não sendo nada indecente ou que exija que eu cometa algum
assassinato... — retruquei.
Ele riu, deliciado. Apenas fiquei ali acompanhando a sua risada
gostosa, que me deixava boba.
— Sente-se. — Gesticulou para o sofá onde eu estava há pouco.
Assenti e me sentei.
— Eu tenho uma amiga... — começou. Levantei uma sobrancelha com
censura. Cá entre nós, esse cara não era do tipo que tinha amizade com
mulheres; aparentava catar o que queria e dispensar logo depois, como eu o
vi fazer. — Não é esse tipo de amiga. Ela é mulher do meu irmão, o Lucky...
— O que tem ela? — perguntei. Lucky Donovan era o marido da mulher
para quem doei meu sangue. Sabia que ela sobreviveu, assim como a criança
que estava esperando, pois pedi ao Johnny para checar para mim. Fiquei
feliz com isso. Mas fingi que desconhecia Lucky, já que ele não se lembrava
de mim.
— Ela tem o corpo perfeito para o que quero fazer... — disse, e depois
acrescentou ao ver o espanto em meus olhos. — Pare de ficar com essa cara
de terror e me deixe terminar de falar — repreendeu-me.
— Desculpe.
— Eu sou o dono da Fashion Donovan. Você conhece a empresa?
Neguei com a cabeça.
— Não, mas parece que tem a ver com moda, certo? — Meu
conhecimento da área era bem escasso, afinal, me fazia lembrar de alguém
que não queria, não agora; não podia focar em Ângela se quisesse continuar
em pé, respirando.
— Sim. — Ele franziu o cenho. — Você aparenta não me conhecer das
revistas e dos tabloides.
— Não tenho tempo para fofocas sobre famosos, trabalho quase doze
horas por dia — declarei.
— Tudo bem. Eu tenho uma agência de modelos — disse ele. — Quero
que a Sam venha desfilar para mim. Então fizemos uma aposta. — Deixou
escapar uma careta linda. — Ela é contra eu ficar com garotas aleatórias
todos os dias, descartando logo depois, como hoje. Se eu conseguir namorar
firme com alguém até o desfile, sem trair ou transar, ela trabalhará para mim
na Fashion Donovan.
Eu o olhava, incrédula.
— Por que não oferece dinheiro a ela?
— Samantha não é como todas as mulheres. — Seu tom denotava
carinho ao falar da cunhada, mas nada romântico. — Ela não liga para
dinheiro, embora seja casada com o meu irmão, um dos homens mais rico do
mundo.
— E se você perder? — perguntei.
— Eu teria que ir a um baile...
— Como é que é? — Achei que tinha ouvido errado.
— É isso que você escutou — rosnou.
Gargalhei mais uma vez. Ele fechou a cara linda para mim. Tentei
abafar o sorriso do meu rosto, sem sucesso.
— O que há de errado com um baile? — perguntei. Ele me encarou
como se eu estivesse louca.
— Prefiro doar todo o meu dinheiro a ir a um baile — retrucou.
— Nossa! Você já foi rejeitado em um? Parece ter sido abandonado ou
coisa assim — observei, apontando para ele.
— Baile significa dança, garotas certinhas e comportadas, isso não é
para mim. — Estremeceu. — Gosto do fácil, admito.
Eu o mirava, ultrajada.
— Para você dispensar mais fácil no dia seguinte, como lixo?
Deu de ombros.
— Elas têm o que querem de mim, fazem as suas próprias escolhas. —
Passou a mão esquerda entre os cabelos loiros bagunçados. — Eu só cato
cada mulher uma vez, não repito a dose.
— E as garotas aceitam isso? — Pisquei, chocada. Ele sorriu, devasso.
— É claro que sim. Sou tudo que elas querem, nem que seja por uma
noite.
Sacudi a cabeça, descrente.
— Essas garotas são idiotas por se deixarem ser usadas assim. — Teria
de achar outro cara para eu fantasiar como meu príncipe encantado. Esse
tremendo mulherengo não serviria mais.
Ele sorriu torto.
— Você ficaria comigo se eu quisesse. — Piscou.
Revirei os olhos.
— Oh, seu ego é um pouco grande, não? — Ri. — Sem chances de um
dia eu ir para cama com você. — Ele não precisava saber que esteve nas
minhas fantasias mais profundas desde que o vi no hospital, isso era só para
mim. Evitei pensar nisso, pois o cara era bem observador.
— Eu duvido. — Demonstrava confiança.
Bufei.
— Por que você não chama uma das mulheres que estavam aqui? —
Tentei não corar ao imaginar ele dando conta das duas de uma vez só. Um
ménage. Isso soaria interessante para os livros que gostava de escrever.
Talvez eu fizesse uma história desse gato loiro com olhos cor de whisky.
— Ficou maluca? — quase gritou, e o vi estremecendo. — Eu não
repito a dose, como já disse, além disso, preciso me manter sem sexo, e com
elas ou outra garota fácil vai ser difícil conseguir. Sam até pretendia me
arrumar sua amiga, só que com essa seria impossível resistir, como o canto
da sereia. Isso é justamente o que ela quer, mas...
— Mas comigo você não teria esse problema de transar uma vez, que
dirá meses, não é? — Tentei não me desapontar com isso, era melhor assim.
Caso ficasse com esse homem lindo, seria chutada para fora de sua casa no
dia seguinte.
— Por isso a escolhi. — Ele me olhou. — Quando apareceu ali na
porta da cozinha — gesticulou para o recinto —, logo soube que seria você.
— Por quê? — Franzi o cenho.
— Porque assim estarei seguro. Não fico com garotas virgens, não é a
minha praia. E você não vai tentar me seduzir durante a noite.
Fiz uma careta.
— Nisso concordamos — falei e depois retruquei: — Quem disse que
eu sou virgem?
— Essa cor vermelha que aparece em seu rosto sempre que ouve a
palavra “sexo”. Sinto o cheiro de virgens de longe.
Bastardo.
— Você é tão...
— Charmoso?
Eu revirei os olhos. Estava pensando em “convencido”, mas deixei
quieto.
— Quer dizer que minha pureza estará segura nas mãos de um playboy?
— Eu não sou um playboy.
— Não? Que seja! No que o nosso relacionamento se basearia? Se por
acaso eu aceitasse, como seria?
Seu belo rosto anguloso, de nariz reto e perfeito, me encarava. Agora
ele estava com alguma esperança de que eu fosse aceitá-lo.
— Você virá morar aqui por todo o tempo que ficarmos juntos e não vai
trabalhar de doméstica de novo. — Ele suspirou.
— O que há de errado em trabalhar de doméstica? É um emprego
honrado como outro qualquer.
Acho que ele notou meu tom de crítica, porque logo se apressou em
explicar:
— Não estou dizendo isso para desmerecer o seu serviço, e sim porque
a mídia descobriria e seria um alvoroço. Eles começariam a falar: “Se você
tem dinheiro, por que não dá uma vida melhor para sua namorada?”, coisas
deste tipo.
Após avaliá-lo, confirmei que estava sendo sincero.
— Tudo bem, mas não posso largar o meu trabalho, preciso dele.
— Você terá um milhão, pode fazer o que quiser com isso.
— Não, eu não vou aceitar um milhão. — Estremeci com a ideia de
dispor de tanto dinheiro.
— Eu dobro para dois milhões — soltou, sem nem mesmo pensar.
Ofeguei de pavor e pesar.
— O quê?
— Já falei, prefiro dar todo o meu dinheiro a ir a um baile. — Ele não
parecia mesmo preocupado com a quantia, e sim comigo não aceitando sua
oferta. O cara era estranho, o que havia de errado com um baile?
Respirei fundo.
— O que eu quis dizer é que eu vou aceitar vinte e cinco mil, e não esse
valor todo que você disse.
Sua testa se franziu.
— Por que pedir uma quantia tão inferior a que eu ofereci?
— Só vou aceitar porque preciso desse valor exato. Se eu ganhasse
tudo que propôs, me sentiria suja.
— Não vamos transar, já disse.
— Eu sei, mas eu apenas sou assim. — Dei de ombros. — Se você
concordar em me dar os vinte e cinco mil, eu aceito. Mas não posso deixar
meu trabalho, preciso dele. Não vou ser sustentada por ninguém.
— Eu não vou sustentá-la, pode ficar tranquila. — Colocou a mão no
queixo, pensativo.
— Então, o que vamos fazer? — perguntei. — Tenho de trabalhar em
alguma coisa.
— Vou conseguir um emprego para você — disse ele. Comecei a
discordar, mas o homem falou antes. — Não temos escolha. E você também
precisa de um carro, não pode andar de ônibus por aí. Namorar um famoso
tem seu lado chato.
— Não tenho dinheiro para comprar um carro.
— Se pegasse o valor que eu quero lhe dar, teria.
— Não, desejo a quantia que pedi, e já tenho planos para ela que não
envolvem comprar um automóvel.
Ele suspirou.
— Certo, posso te emprestar um carro meu.
— Não acho que eu ficaria bem em uma Ferrari — murmurei.
Sorriu de um jeito cálido.
— Oh, sim, seria o anjo mais perfeito do mundo.
Revirei os olhos com a palavra “anjo”. “Estou longe de ser um”,
pensei.
— Eu aceito, mas o carro tem de ser de acordo com o salário que eu
vou receber, não posso ter um Porsche sendo que, nem se eu trabalhasse a
minha vida inteira, não conseguiria comprar um. — Mordi os lábios. —
Todos saberiam que é seu, e não quero ser acusada de oportunista —
funguei. — Posso ser pobre, mas tenho orgulho do meu nome limpo, espero
continuar assim.
— Você que sabe. — Ele parecia querer fazer o que pedi, assim eu não
desistiria. — E onde vive?
— No Bronx. Sobre isso, não posso morar com você. — Olhei ao
redor, para o apartamento grande e com poucos móveis, apenas dois sofás,
um de três lugares, outro na forma de L, uma estante vazia.
Ele bufou.
— Você não moraria aqui. Seria em minha casa, lá tem quartos...
— Não é esse o problema. — Eu o cortei. Não estava a fim de falar
sobre Shane e Lira, afinal, isso não era da conta dele. — Nós só vamos
namorar e não casar, então não precisamos morar juntos.
Ele aquiesceu.
— Casamento não é minha praia. — Piscou para mim. — Sou um
pássaro livre, não quero ficar preso em uma gaiola.
— Casamento para mim é precioso e sagrado. Inclusive, pretendo me
casar vestida de branco em uma igreja e passar a lua de mel em Santa
Bárbara, embora fosse adorar conhecer o Rio de Janeiro. Ouvi dizer que é
uma cidade linda.
Arqueou as sobrancelhas bem alinhadas.
— Por que não o Caribe ou o Havaí? Enfim, Santa Bárbara e Rio de
Janeiro também são belíssimos.
— Porque esses outros dois lugares são mais caros. Com certeza, meu
futuro marido não terá dinheiro para irmos a eles — falei sinceramente.
Engasgou.
— Você tem um noivo?
Eu o olhei ultrajada.
— É claro que não! Se eu tivesse um namorado, não aceitaria sua
proposta. — Suspirei, mirando a vista para a cidade. — Mas sonhar não
custa nada.
Ele riu, provocante.
— É bom saber que você sonha com um príncipe encantado montado
em um cavalo e uma casa com cerca branca.
— Como sabe que esse é o meu sonho? — Sorri, ignorando seu
sarcasmo.
O homem sacudiu a cabeça loira e me olhou de soslaio com um sorriso
devastador, o que levou todo o meu autocontrole. Quase desmaiei com
tamanha beleza.
— Definitivamente, você é outra coisa. — Ele não tirava os olhos da
minha boca e das minhas íris negras, como se quisesse mergulhar dentro
delas.
Eu o ignorei e perguntei:
— Em que serviço eu vou trabalhar? Não posso ficar parada.
— Você terminou seus estudos? — indagou, pegando a garrafa de
whisky e enchendo o copo. — Ou fez algum curso?
— Não pude terminar a faculdade... Parei no meio. E fazia um curso,
mas também tive de parar. — Minha voz estava trêmula no final.
— Por que não concluiu? — Curioso, tomava a bebida da cor de seus
olhos.
Dei de ombros.
— Aconteceram algumas coisas... Bom, não deu para finalizar. — Foi
nessa época que meus pais morreram e eu tive de sair da faculdade para
trabalhar e cuidar de Shane e Lira.
Ele assentiu com o cenho franzindo.
— Você sabe mexer com computador? — perguntou.
— É claro que sei — declarei, animada. — Faço resenhas de livros
todas as noites no meu blog.
Arregalou os olhos.
— Você tem um blog? — perguntou. Percebi que ele parou de beber
para me fitar, esperando a minha resposta.
— Sim — confirmei. — “Livros do coração”.
— Então você gosta de ler. — Não era bem uma pergunta, e sim uma
afirmação. Afinal, se fazia resenhas, deveria gostar de ler.
— Sim — respondi. — É uma paixão. Estava me formando em
Literatura.
Ele assentiu, impressionado.
— Acho que já sei qual é o trabalho certo para você — relatou. — Me
dê seu telefone para eu te ligar — pediu.
— Certo, mas que trabalho é? — inquiri.
— É surpresa. — Sorriu de um jeito maroto. — Amanhã você saberá.
Eu me levantei.
— Só espero que não seja em uma boate ou algo assim — ameacei-o
com veemência —, senão cortarei as suas bolas e darei aos porcos.
Ele se levantou, colocou o copo na mesinha de vidro de centro e se
aproximou de mim.
— Anjo — a palavra deixou seus lábios de modo doce como mel —,
meu corpo é perfeito demais para ser jogado aos porcos. — Passou a mão
direita em seu peito nu e sexy; não olhei, ou perderia o fio da meada.
— Cuidado com o ego — retruquei —, ele causa cegueira.
Seu sorriso era ofuscante.
— Duvido disso! — Estendeu o braço direito para mim. — Então,
fechado?
— Sim. — Apertei a sua mão e soltei-a após sentir uma corrente
elétrica atravessar meu corpo. — Diga-me uma coisa.
— Sim...? — Ele parecia distraído, olhando meus olhos. Por qual
motivo seu olhar intenso me queimava?
— Você disse que é irmão do Lucky...
— Sim. — Seus olhos se estreitaram. — Você o conhece?
— Não... Bom, já o vi — esclareci. — A esposa dele estava perdendo
o filho, então eu doei o meu sangue para ela, já que eles não tinham o nosso
tipo lá, no momento. Ela e a criança se curaram?
— Sim. Os dois estão bem. É com ela que fiz a aposta. Você foi bem
generosa com o que fez naquele dia.
— É o mínimo que qualquer um faria — sussurrei. — Não podia deixar
de ajudar uma pessoa que precisava. — Sorri. — Estou feliz que ela esteja
bem.
— Por que não me disse seu nome naquele dia, quando perguntei, no
hospital?
— Por que eu haveria de dizer? — Pelo menos ele se lembrou de mim.
Encolheu os ombros.
— Não sei, mas você me ignorou como se eu não existisse...
Eu ri.
— Deixa-me adivinhar, isso nunca aconteceu antes com você?
— Levei um fora da minha cunhada antes dela conhecer meu irmão, mas
foi só ela em toda minha vida — revelou.
— Mulher sábia, sua cunhada.
Revirou os olhos.
— Nos vemos amanhã? Eu te ligo. — Ele pegou um molho de chaves no
bolso da calça, tirou uma preta e me deu. — Aqui está a chave do carro que
deixei na garagem, lá embaixo. É só apertar o alarme que descobrirá qual é.
— Okay — aquiesci. — Você nem perguntou o meu nome. Como pode
confiar em mim a ponto de saber que não levarei seu carro para longe?
— Seu nome é Angel, e eu sei que se me roubar e me enganar,
conseguiria achá-la...
— Meu nome é Angelina, não Angel — corrigi.
Ele curvou a cabeça de lado.
— Angel combina mais, porque você não tem nada de “pequeno anjo”.
É um anjo em tamanho real. — Piscou para mim, ignorando meus olhos
arregalados por ele conhecer o significado do meu nome. — E não há lugar
onde possa se esconder de mim.
Ri em um misto de nervosismo e espanto. Como sabia o meu nome, se
não o disse a ele? Decerto ligou para o setor de recursos humanos do hotel,
era a única explicação plausível.
— Você está parecendo um cara da máfia ou algo assim. — Ergui as
minhas sobrancelhas. — É algo do tipo?
Revirou os olhos de novo, mas percebi que segurava um sorriso. Por
que se tornava tão mais lindo quando sorria? Devia ser considerado um
crime ele sorrir assim.
— Oh, Anjo! — Esta foi a sua resposta.
Pude ver que ele não era mafioso, apenas cheio da grana e com um ego
muito grande, embora realmente fosse tudo de maravilhoso e muito mais.
Para piorar, tinha aquele sorriso libidinoso. Isso deixava as minhas pernas
bambas.
— O que devo vestir nessa entrevista amanhã? — indaguei, mudando
de assunto, e também querendo saber onde trabalharia no dia seguinte.
— Hummm... — Ele me fitou de corpo inteiro, parecendo tirar as
minhas medidas. Vestia calça e blusa largas, logo, escondia bem minhas
curvas. — Pode ser um vestido, uma saia, ou algo assim.
— Bom, Ryan...
Sorriu como se ganhasse na loteria.
— Você sabe meu nome. — Pareceu impressionado.
— Está em sua corrente. — Apontei para o colar de ouro trançado em
seu pescoço. Além disso, vira na foto em seu outro apartamento, mas não
disse nada.
— Então você estava olhando meu peito nu? — Ergueu as sobrancelhas,
chegando perto de mim enquanto falava. Eu me afastei para trás até bater as
minhas costas na parede ao lado da porta de saída. — Anjo... — sussurrou
tão próximo que senti seu hálito de whisky banhar meu rosto.
— Não me chame assim — pedi com a voz fraca, mas com alguma
compostura. Eu o empurrei para longe. — Fique distante de mim. Nós
somente fingiremos namorar, sem toques.
Ele cruzou os braços.
— Vamos ter de nos tocar na frente das câmeras.
Encarei-o com o cenho franzido.
— Por que eu teria de aparecer na frente das câmeras com você?
— Anjo... — Grunhi, contudo, ele me ignorou, e continuou com uma
paciência exagerada. — Frequentaremos coquetéis e festas após os desfiles
de moda, necessitarei de você ao meu lado, já que é a minha namorada.
— Tudo bem, mas só na frente das câmeras, e sem mão boba — adverti.
Ele suspirou.
— Neste final de semana haverá uma festa no clube de um amigo meu.
Nós dois vamos ter de comparecer — disse ele. — Antes, precisamos
aprender mais a respeito um do outro para não dar furo.
— Certo, mas me avise quando, e nós falaremos sobre isso. Até lá,
mantenha distância — alertei.
Ele concordou.
— Irei para o trabalho resolver algumas coisas, depois te ligo.
Trocamos números.
— Quem vai saber dessa nossa situação? Para eu ficar preparada.
— Sam, Jordan, Lucky, Jason e o irmão da Sam, o Bryan.
Eu me encolhi por dentro.
— São muitos — reclamei.
— O que foi? — sondou, preocupado.
— Eles vão achar que sou uma vadia safada pensando em dinheiro...
— Ei, eles não são assim, mas se realmente estiver preocupada,
podemos dizer que você aceitou isso para conseguir um emprego melhor —
sugeriu.
— Eu me sinto como a Julia Roberts em Uma linda mulher, sem a parte
da prostituição.
— Eles sabem que não vamos transar, porque se fizer isso perco a
aposta — sussurrou, tentando me tranquilizar. — Não se preocupe com isso.
— Enquanto nós dois estivermos namorando, de fachada, você vai me
trair às escondidas? — perguntei.
Ele sorriu, jocoso.
— O quê? Está com ciúmes, Anjo?
Bufei.
— Claro que não! Mas não estou a fim de passar por corna na frente
das câmeras e das pessoas. Então é melhor manter suas calças fechadas por
enquanto.
— Você vai me deixar sofrer assim?
Sorri, inabalável.
— Você tem duas mãos, use-as. — Abri a porta para sair. — A gente se
vê amanhã.
Já estava atrasada para o serviço, embora não fosse mais precisar dele.
Só esperava que o trabalho no dia seguinte fosse algo bom para mim.
Antes que eu fechasse a porta, o ouvi arrulhando.
— Sabe o quanto isso é absurdo? Nunca precisei usar as minhas mãos.
Diverti-me com isso e fui embora. Para ele, devia ser horrível ficar
sem sexo, uma vez que vivia de mulher em mulher. Eu não o conhecia bem,
porém, acreditava que me entreteria muito com essa situação.
Quando cheguei ao estacionamento subterrâneo, apertei o botão do
alarme do carro, e um Volvo cinza apitou.
— Nossa! Não acho que meu salário dê para comprar um Volvo —
sussurrei, sozinha em meio ao escuro, a despeito de ser aproximadamente
quatro horas da tarde.
— Garanto que dá sim, e ainda sobra — falou uma voz profunda atrás
de mim.
Um grito saiu da minha garganta e o alarme do carro caiu no chão. O
Volvo começou a apitar. Eu olhei para o Ryan, ali, de pé, com um sorriso no
seu rosto perfeito.
— Droga, Ryan! Você quer me matar do coração?
— Desculpe. — Ele não parecia nada arrependido, aliás, ria da minha
reação. “Bastardo”, pensei. — O que acha que uma pessoa faria com você
em um estacionamento subterrâneo de um hotel como este, cercado de
câmeras?
— As probabilidades são diversas — retruquei, olhando ao redor. —
Já vi muita coisa acontecendo em um estacionamento no CSI.
Ele gargalhou, e sua voz rouca e linda ecoou no lugar, fazendo um som
tanto assustador quanto sexy.
— Você tem muita imaginação, hein? — Pegou o controle do chão e
desligou o alarme que soava estridente.
— Não. Só sou precavida — retorqui, olhando o seu carro. — Com o
salário que vou receber vai dar para comprar um Volvo?
— Oh, sim, com certeza, não se preocupe — tranquilizou-me,
entregando a chave que caiu na hora do susto. — Ninguém vai suspeitar que
é meu.
— Bom, então qual desses é o seu? — Ali só havia Ferraris, Porsches e
outros carros que eu não conhecia. Eu me virei e fitei seus olhos, que
estavam brilhantes.
Ele sorriu.
— Aquele — apontou para um Bugatti Veyron preto.
— U-a-u! Por dentro deve ser bastante confortável — murmurei comigo
mesma.
— Você não imagina o quanto. — Seu tom era malicioso. — O banco é
ótimo, dá até para fazer...
— Pelo amor de Deus! É melhor não terminar — soltei em repulsa. —
Vá logo.
Quando me virei para ir embora, ouvi um bip não muito longe, alto o
suficiente para me assustar e pular direto nos braços de Ryan. Sentia seus
músculos fortes através da camiseta que ele usava. O desejo de passar as
mãos por aquele bíceps sarados era grande, tive de me controlar para não
fazer besteira.
Seus braços esguios, mas fortes, me seguraram pela cintura.
— Acho melhor você parar de assistir ao CSI. Ou talvez só esteja louca
para cair nos meus braços — murmurou num tom cálido, com sua boca
matadora perto do meu ouvido. Meu corpo inteiro parecia ter sido tocado
por um fio desencapado.
Arfei e me afastei dele, como se o homem estivesse me empurrado.
Encarei-o, amarga, mas podia sentir que meu rosto estava vermelho.
— Eu só me assustei.
— E correu direto para mim? — Riu de um jeito matreiro. — Espero
que você se assuste mais vezes na minha companhia.
— Cale-se — rosnei. — Já vou, e me ligue se precisar de algo.
— Posso precisar de você à noite para manter a minha cama aquecida
— provocou. Lancei a ele um olhar mortal. — Desculpe, mas eu gosto de
vê-la assim. — Fitava minha face corada. — Você fica mais linda.
— Assim como? — perguntei, embora já soubesse a resposta.
— Vermelha. Tanto de vergonha quanto de raiva. — Tocou meu rosto
com os dedos cálidos. — Fica tão linda, Anjo!
Dei um safanão em suas mãos.
— Sem toques, esqueceu? — Minha voz falhou com o meu corpo
entrando em curto circuito por causa do toque dele.
Levantou as sobrancelhas na forma de V.
— Foi você que se atirou em meus braços agora há pouco.
— Você é tão... — as palavras fugiram.
— Gostoso? Lindo? — completou. Não era isso que eu estava
pensando, todavia, não deixava de ser verdade.
Revirei os olhos.
— Não permita que o seu ego te engula — alertei enquanto entrava no
carro e ligava-o. Por sorte, andava com todos os meus documentos, até
minha habilitação. Depois, olhei para ele. — A gente se vê.
— Pode apostar que sim, Anjo — garantiu com um tom libertino.
Bufei e deixei passar o apelido, não adiantava discutir com ele: sempre
fazia o que queria, aparentemente. Eu só esperava não me arrepender mais
tarde desse acordo que fizemos.
Capítulo 2
Mensagens

ANGELINA
Cheguei à escola para pegar Lira e Shane mais cedo. Queria passar um
tempinho com eles, já que não precisaria trabalhar naquele dia. Lira sorriu
para mim, e seus olhinhos azuis se arregalaram assim que viu o automóvel
novo que eu dirigia.
— Você comprou um carro, Angie? — animou-se.
— Não, meu anjinho, é só emprestado de um amigo — respondi ao
entrarmos no veículo.
Passamos a tarde inteira no parquinho perto de casa. Este era um dos
meus momentos mais alegres, ficar com meus irmãos e poder assistir à
felicidade dos dois amores da minha vida.
Chegamos por volta das seis horas da tarde ao meu apartamento. Ele
era bem pequeno, mas aconchegante. Na sala havia dois sofás velhos, mas
conservados, um de três lugares e um sofá-cama. O de três assentos ficava
escorado na parede central, com o sofá-cama ao seu lado. De frente para os
dois, se encontrava uma mesinha de madeira e uma estante com uma TV
pequena, onde Shane e Lira assistiam aos seus programas preferidos, e eu, às
vezes, via CSI Nova York.
— Vão tomar banho e se preparar para jantar — pedi à Lira e ao Shane.
Foram para o seu quarto, que se localizava diante do meu. Como só
tínhamos dois quartos, dividiam o mesmo. Quando meus pais morreram, nós
já morávamos aqui neste apartamento. Eles — Amélia e Lorenzo —
pensavam em comprar uma casa maior, que comportasse todos nós — Shane,
eu e Lira, que estava a caminho. Eu podia ter várias lembranças dolorosas
neste lugar, mas também tinha várias memórias boas, que me traziam muita
felicidade, como mamãe na cozinha fazendo jantar para nós e para o papai.
Ela era linda, com seus cabelos negros e olhos azuis, similares aos de Lira.
Dava para entender por que papai se apaixonou por ela à primeira vista. Já
eu e Shane puxamos à cor de olhos do papai, e os cabelos da mamãe.
Lorenzo também era lindo, um loiro formoso de íris negras. Lembro-me dele
chegando do trabalho, beijando cada um dos seus filhos, e depois mamãe. A
distância só aumentava mais a dor, mas a morte é algo com que temos de
conviver, não é o que dizem? Por sorte, tinha meus irmãozinhos que tanto
amava.
Esquentei o espaguete com queijo e coloquei na mesa da cozinha. A
minha cozinha era pequena, com uma pia de mármore e um armário branco...
Bem, um dia foi branco. Meu fogão era vermelho e velho, mas bom,
funcionava direito ainda.
— A comida está na mesa, venham jantar — gritei para Shane e Lira.
— Já estamos indo — berrou Shane de volta, logo se encaminhando até
a cozinha. Ele estava vestido com seu pijama do Homem-Aranha. Amava
este personagem, e Lira a Barbie.
— Vou ao apartamento do Johnny, então não abra a porta para ninguém
e, qualquer coisa, grite — pedi a ele, indo para a sala.
Shane me olhava com o cenho franzido.
— Eu protejo a Lira, não se preocupe — disse com convicção. — Sou
o homem da casa.
Ri e beijei seus cabelos molhados com cheiro de shampoo de morango.
— Sei que sim, meu amorzinho. Já volto.
A minha garganta se apertou porque nós dois nascemos com uma
doença no coração. Meu pai também tinha bloqueio atrioventricular total,
usava marca-passo desde os vinte anos, ou seja, um total de vinte e dois anos
com o dispositivo, e era saudável. Se não fosse o acidente de carro há três
anos, ele ainda estaria conosco. A minha doença diferia da de Shane e papai,
eu era cardiopata. Dava graças a Deus por Lira ser saudável.
Bati à porta do apartamento de Johnny e Charles, ao lado do meu. Os
dois se tornaram meus melhores amigos desde que nos mudamos para este
prédio. Eram namorados — cá entre nós, um baita desperdício, porque oh
meu Deus, que homens!
Sorri quando a porta se abriu e Johnny apareceu do outro lado. Tinha
um metro e oitenta, mais ou menos, o mesmo tamanho do Ryan, cabelos
curtos com mechas e olhos verdes sexy. E bota sexy nisso! Seu corpo era
forte e musculoso, vamos dizer que parecia um bad boy. Vestia bermuda
jeans, sem camisa. Eu podia contar os gominhos em sua barriga tanquinho —
um, dois, três, quatro morrinhos de abdômen. Deslumbrante!
— Devia ser considerado um crime você ficar andando por aí assim —
acusei, apontando para seu corpo sarado, repleto de tatuagens coloridas, uma
série de borrões indistinguíveis. Apenas discernia algumas imagens,
números e frases em egípcio, ou algo parecido com isso.
Entrei em seu apartamento. A sala era igual à minha, mas com móveis
mais caros, já que os dois tinham empregos bons. Johnny trabalhava de
segurança em uma boate — chamada Rave, ou coisa assim. Charles atuava
como chef em um restaurante de Manhattan, sendo talentosíssimo com
comidas italianas. Foi com ele que aprendi a fazer espaguete.
Johnny riu, fechando a porta.
— Estou na minha casa, querida, aqui ando até pelado — disse. —
Você que fica cobiçando meu corpo.
Revirei os olhos.
— “Cobiçando” é uma palavra forte, só estou admirando seus bíceps
sarados — esclareci com um sorriso. — Cadê o Charles?
— Estou aqui — falou uma voz rouca atrás de mim.
Eu me virei e quase babei olhando seu corpo. Charles era mais magro,
mas musculoso também, com um corte de cabelo curto (estilo social), íris
ônix, rosto delicado e um pouco largo, e queixo quadrado.
— Vocês dois vão acabar me matando de combustão espontânea,
sabiam? Um está sem camisa — gesticulei para o Johnny, que sorria de lado,
e em seguida para o Charles —, e você, só de toalha.
Charles sacudia a cabeça, divertido.
— Poderíamos fazer um ménage — sugeriu, sentando no sofá na forma
de L e olhando para mim com um sorriso no rosto. Johnny também ostentava
um sorriso de menino perverso.
— Faríamos um excelente trabalho com você — Johnny entrou no jogo.
— Obrigada, mas não. — Ri. — Vocês dois são maus — reclamei, me
sentando perto do Charles.
Ele soltou uma gargalhada e me abraçou, beijando a minha cabeça.
— Oh, Borboleta — disse Charles. Fiz uma careta devido ao apelido;
já não bastava Angie e o recente Anjo, de Ryan. Charles sempre me chamou
assim, devido à minha borboleta desenhada na virilha. Ele nunca a viu
inteira, claro, apenas o pedaço à mostra quando usava short curto.
Johnny sentou do meu outro lado e pegou a minha mão.
— Você vai encontrar o cara certo.
Eu ergui as sobrancelhas.
— E como eu saberia que esse cara chegou ou vai chegar? — Tentei
não pensar no Ryan.
Johnny beijou os dedos da minha mão, subindo pelo meu braço, até se
aproximar dos meus lábios. Fiquei de olhos arregalados mirando sua boca
sexy e suas belas íris. Cara, eu era uma mulher de carne e osso, sujeita a cair
em tentação com esses dois... Mas eu sabia que jamais faria isso.
— Você vai sentir seu coração acelerar forte no peito, como se fosse
sair pela boca. Sua pele vai esquentar, como se estivesse perto de uma
fornalha, sempre que ele chegar perto de você ou apenas te olhar. Seu
estômago parecerá ter mil borboletas dentro.
Engoli em seco.
— Isso tudo talvez com apenas a respiração dele em seu ouvido, ou seu
cheiro másculo e rico — interveio Charles, sussurrando. — Quando se sentir
assim, saberá quem é o cara.
Prendi o ar, não pelos toques deles, mas porque me senti deste modo
mais cedo, ao chegar perto do Ryan. Seu calor era inconfundível, parecia
que incendiaria todo meu corpo e minha alma.
Eu me levantei e olhei para os dois, sentados no sofá, me fitando com
as sobrancelhas erguidas.
— Tem algo que eu quero contar a vocês, mas não sei como começar.
— Minha voz falhou. Será que me achariam uma vadia interesseira?
— Você achou esse cara, não foi? — perguntou Johnny, me mirando de
lado.
— Como ele é? — sondou Charles.
Passei a mão nos cabelos, que estavam num rabo de cavalo bagunçado.
— Vocês se lembram daquele serviço que consegui na semana passada?
No edifício Plaza?
— Não vai me dizer que o cara é de lá? — indagou Charles, de olhos
arregalados.
— Borboleta, caras daquele mundo só querem uma coisa de garotas
doces como você: — falou Johnny — entrar em sua calcinha e depois largá-
la.
— Não é sobre isso.
Contei aos dois o que aconteceu no apartamento do Ryan.
— Ryan Donovan? — interrompeu Johnny, chocado.
— Você o conhece?
— Quem não conhece o cara? — replicou e depois suspirou. — Você
sabe, ele tem uma grande fama de mulherengo. Cada dia com uma garota
diferente.
— Eu sei — funguei —, mas e quanto ao dinheiro, acham que sou uma
vadia por aceitar?
Charles se levantou e veio até mim.
— Não, você não é nenhuma vagabunda interesseira, Angie, apenas
precisa do dinheiro para cuidar do seu irmão. — Ele me abraçou forte. —
Fizemos uma vaquinha e juntamos esse valor para você.
Eu me afastei dele.
— Vocês fizeram isso para mim? — Chorei, comovida, olhando de um
para o outro.
— É claro que fizemos. — Johnny também me abraçou. — Você é nossa
irmãzinha linda, Borboleta.
Eu os beijei no rosto.
— Vocês dois sãos os melhores amigos do mundo. — Sorri, me
afastando deles. — Não há nada que não façam por mim, não é?
— Oh, Borboleta, se você precisasse de um transplante de rins, daria
um dos meus... — disse Charles.
Johnny assentiu.
— Eu também, tudo para vê-la feliz — falava sério. Não sabia o que
fizera para merecer amigos iguais a esses dois.
Limpei as lágrimas com as costas das mãos.
— Estão me fazendo chorar — sussurrei, comovida. — Amo vocês
como os irmãos mais velhos que nunca tive.
— Também amamos você, Borboleta — declarou Charles com fervor.
— Então você vai voltar atrás com o riquinho? — sondou Johnny,
avaliando meu rosto.
— Não posso, prometi a ele. — Ri. — Acreditam que ele estava
disposto a dar dois milhões para eu ser sua namorada, só para não ir a um
baile?
Charles arregalou os olhos, descrente.
— Sério?
— Sim, mas eu não podia aceitar, me sentiria suja caso pegasse esse
dinheiro todo — suspirei. — E agora... Não posso deixar ele na mão.
Só de imaginar não o vendo mais, me sentia vazia, sem ar em meus
pulmões, com o coração batendo descompassado ao mesmo tempo. Era
estranho, porque acabara de conhecê-lo. Esperava que minhas fantasias não
se excedessem tanto, porque eram aquilo: apenas fantasias, jamais poderiam
se tornar realidade, mesmo tendo agora um contato mais próximo, após um
mês sonhando com ele, e percebendo que de príncipe não tinha nada.
— Oh, o que significa essa pontada de dor em sua voz? — observou
Charles me olhando de lado.
Eu me encolhi.
— Não é nada — menti.
Ele não caiu nessa.
— Você não consegue se imaginar ficando longe dele, não é? — Estava
preocupado comigo.
— Prometi a ele que o ajudaria. Sei que é um risco, afinal, ele está
cumprindo uma aposta ao namorar comigo. — Dei de ombros. — Claro que
o cara jamais sentiria algo por mim, estando cercado por modelos lindas.
— Você já se olhou no espelho? — retrucou Johnny. — Borboleta, você
é maravilhosa. Se um dia eu deixasse de gostar de homens, você seria a
única mulher com quem ficaria.
Ri, agradecida.
— Vai dar tudo certo, mas agora vou embora, ver o que os meninos
estão fazendo. — Aproximei-me deles e abracei um de cada vez.
— Se precisar de nós, é só chamar — disse Charles.
— Se o trabalho novo que ele arranjou for algo indecente, me avise que
dou um jeito nisso — garantiu Johnny.
— Acho que não é nada indecente, isso mancharia a sua imagem —
tranquilizei-os. — Boa noite aos dois.
— Boa noite, Borboleta — disseram em uníssono quando fui em
direção à porta. Após, Johnny falou sozinho: — Tome cuidado, Angie, não
quero ver a minha menina com o coração partido por causa desse homem.
Ele tem “destruidor de corações” escrito no rosto.
Meu coração martelava nas costelas, com medo de que eu viesse a me
apaixonar. Ryan definitivamente tinha o poder de estraçalhar sentimentos, tal
qual dissera Johnny. Contudo, não seria correto deixá-lo na mão, se eu
conseguia ajudá-lo.
Cheguei em casa e coloquei Shane e Lira para dormir. Fui para o meu
quarto tomar banho e checar que roupa usaria no dia seguinte em minha
entrevista, mesmo não sabendo bem que serviço era. Isso estava acabando
com os meus nervos. Não queria algo sexy, mas também não vestiria nada
feio. Por sorte, tinha a minha saia social rosa que combinaria com uma blusa
branca e um terninho por cima. O conjunto ficaria bem independente do
emprego.
Depois de jantar, fui direto para o meu quarto torcer para dar tudo certo
na entrevista. Estava quase dormindo quando ouvi o bip de uma mensagem.
Ao ler de quem era, não acreditei no que via. Talvez tivesse dormido e
sonhasse, só isso explicaria ele estar mandando uma mensagem para mim.

Ryan: Você está dormindo?

Ri sozinha, rolando na cama feito uma adolescente boba ao receber um


recado do garoto de quem gosta.

Eu: Não, mas estou surpresa que o homem mais popular entre as
mulheres esteja mandando mensagem para uma garota simples como eu.
Ryan: Vejo que pesquisou sobre mim. E você não tem nada de
simples, Anjo.
Eu: Oh, eu precisava ver onde me meteria com um cara igual a você.
Ryan: “Meteria” é uma palavra boa.
Aposto que ele riu ao escrever essa frase.

Eu: Cale a boca.


Ryan: Não estou falando, e sim escrevendo.

Ignorei-o e soltei outra pergunta, satisfazendo minha curiosidade.

Eu: Você costuma fazer isso com todas as mulheres? Enviar


mensagens?

Ele ficou tanto tempo sem responder que pensei ter desistido. Então o
celular bipou com um novo alerta.

Ryan: Não. Como eu disse, só transo e mando as garotas embora


depois.

Enviou outra antes que eu falasse algo sobre sua forma horrível de
tratar as mulheres.

Ryan: Mas você é diferente, Anjo!


Eu: Sim. Eu definitivamente sou diferente: morena, desengonçada,
sem pernas bonitas iguais às das loiras que estavam em seu
apartamento, ou das outras que apareceram em fotos ao seu lado.

Isso era verdade. Quando pesquisei por ele na internet, antes de me


deitar, pude ver que era muito fã de loiras de corpos esbeltos, embora eu não
devesse me preocupar com isso, já que não tínhamos nada um com o outro.

Ryan: Você não se olha no espelho com frequência, Anjo?

Pareceu uma crítica.


Eu: Eu me olho no espelho, por isso eu digo que não sou um anjo,
muito menos linda.

Escrevi a verdade e cliquei em “enviar”.

Ryan: Acho que eu preciso abrir seus olhos e mostrar a beleza que
você tem.
Eu: Sou o que sou, Ryan, e nada mudará isso.
Ryan: Veremos, Anjo.

Suspirei e escorei a cabeça no travesseiro. Já ia retrucar, mas ele


mandou mais uma mensagem.

Ryan: Como você está dormindo?

Ri, sacudindo a cabeça.

Eu: Com uma camiseta e sem calcinha.

Escrevi esse final e enviei para provocá-lo. Ele não disse nada por
algum tempo, fiquei preocupada.

Eu: O que foi? Você está aí?


De repente, meu celular bipou.

Ryan: Você quase me aleijou.


Eu: O quê? Eu não fiz nada!

Não sabia do que ele estava falando.

Ryan: Eu estava correndo na esteira, perdi o equilibro e caí.


Eu: Oh, se machucou?
Temia ter exagerado na dose.

Ryan: Não, mas isso foi a coisa mais sexy que já li em uma
mensagem.

Arregalei os olhos.

Eu: Eu estava brincando, seu bobo.

Cliquei e mandei outra a seguir.

Eu: Você malha às onze horas da noite?


Ryan: Não estava conseguindo dormir.

Sorri feito uma boba.

Eu: O quê? Estresse por abstinência sexual?


Ryan: Vai ser um mês longo!

Ele enviou mais uma antes de eu responder.

Ryan: Mas depois do que disse, posso fantasiar com você sem
calcinha e de camiseta.

Arfei, corando. Ainda bem que ele não estava ali para ver meu rosto e
meu corpo vermelho, em fogo devido ao seu comentário.

Eu: Engraçadinho, não quero que você fantasie comigo.


Ryan: Desculpe, vou me comportar.
Eu: Devo me preocupar com o trabalho amanhã?
Ryan: Não, mas o Daniel é um tanto mulherengo, então vou ter de
deixar a minha marca em você na frente dele.
Eu: O que quer dizer com isso?
Ryan: Vamos nos beijar.

Quase gritei. Sabia que precisaríamos fazer isso em algum momento,


mas não achava que seria tão cedo.

Ryan: O que foi? Ainda está aí?

Ele escreveu, pois fiquei muitos minutos em silêncio, refletindo sobre


nunca ter sido beijada.

Eu: Sim. Desculpe. Acho que vamos ter um problema com isso...
Ryan: O quê? Você voltou atrás?
Eu: Não, mas eu nunca... beijei ninguém antes.

Passou-se uma eternidade até sua próxima resposta. Acho que a


informação o pegou de surpresa.

Ryan: Droga! Como isso é possível?


Eu: Eu não sei.
Ryan: Você é perfeita! Qualquer homem ficaria louco com você por
perto.

Fiz uma careta para esta frase; não era verdade.

Eu: Estava esperando o meu príncipe montado em um cavalo


branco.
Ryan: Príncipe?
Eu: Esqueça, eu quero dizer o cara perfeito.
Ryan: Não existe homem perfeito neste mundo.
Eu: Sonhar não custa nada. Mas eu vou beijá-lo amanhã, não se
preocupe.
Ryan: Estou contando os minutos, Anjo.

O que isso significava? Será que estava louco para me beijar, tanto
quanto eu desejava sua boca saborosa? Algo me dizia que ela teria gosto de
framboesa, e eu adorava este fruto.

Eu: Tenho de dormir agora, para acordar cedo amanhã.


Ryan: Boa noite, Anjo.
Eu: Boa noite, Ryan.

Meu coração pulava sempre que ele me chamava de Anjo. Não devia
gostar disso, mas eu gostava, e muito. Não tinha a menor chance com um
homem igual a ele. Ryan ficava com mulheres diferentes a cada dia, fora a
parte dele ser rico e eu não. Como competiria com seu estilo de vida repleto
de modelos perfeitas? Patinhos feios não se tornam princesas. Era melhor eu
continuar a esperar o meu príncipe montado em um cavalo branco. Talvez
ele não demorasse a aparecer, certo?
Capítulo 3
Minha namorada

RYAN
Fiquei olhando o carro da garota sair do estacionamento, já me sentindo
vazio por estar longe dela. Quando a vi naquele dia, no hospital em Trenton,
Nova Jersey, devo admitir que fiquei pensando nela por semanas — não sei
se por sua beleza e inocência, ou pelo fato da menina me ignorar. Tentei
parar com isso, focar em outra coisa, mas não adiantou de nada. Um mês
depois, a reencontrei no meu apartamento.
Conversando com ela, notava sua beleza tanto por dentro quanto por
fora. Meu Deus! O que era aquilo? Um anjo lindo que apareceu em minha
vida. Esta frase dizia tudo. A mulher tinha uma doçura que gritava para mim,
fora a parte dela ser uma maldita Afrodite. Pele branca, mas um pouco
queimada do sol, perfeita sem qualquer maquiagem e outros produtos de
beleza... Cabelos negros e anelados como ondas do mar, sempre presos num
rabo de cavalo. Olhos escuros como a noite, e uma boca era matadora.
Não acreditava que estava sonhando com uma mulher que acabara de
conhecer. Bom, já a encontrara no mês anterior, porém, naquele dia nós nem
nos falamos direito. Nenhuma garota nunca me fez sentir nada parecido com
isso. Eu a queria tanto que chegava a doer. Já estive com muitas, mas para
nada além de sexo. A menina, no entanto, era doce, meiga e especial, uma
joia preciosa a ser guardada e querida. Nossa! Devia ser considerado um
crime eu desejá-la com tamanha intensidade. Precisava me manter a
quilômetros de distância dela e de sua inocência, que gritava para mim como
uma gralha maldita.
A pior coisa que podia acontecer, aconteceu: virarmos namorados.
Quase ri da palavra “namorados”, nunca pensei ser possível para mim. “Mas
isso tudo é por causa de uma aposta”, dizia a mim mesmo. Lá no fundo, sabia
que significava mais, e isso me assustava. Vê-la de novo mudou algo dentro
de mim, ainda não sabia bem o quê. Não gostei.
Cheguei por volta das quatro e meia em minha empresa, a Fashion
Donovan. O prédio onde funcionava tinha trinta andares; a minha sala ficava
no último. Não fui trabalhar mais cedo, pois dormi tarde na noite anterior,
após um coquetel na casa do meu estilista. Logo depois vieram as entrevistas
e tudo desandou com as perguntas sobre meus pais... Não conseguiria
adormecer nem que eu quisesse, porque a dor e os pesadelos estavam ali, me
fazendo companhia.
— Pierre está esperando você para o ensaio das modelos — disse
Sandy, a minha secretária.
Sandy era uma mulher linda. Loira de olhos azuis, corpo curvilíneo e
com pernas longas. Transei com ela logo que a contratei; era claro que ela
queria mais. Foi quando dei o ultimato: trabalhar aqui sem insistir nesta
ideia ou ser demitida. Eu não repetia a dose. Agora ela era toda profissional,
embora, às vezes, via alguns botões de sua camisa abertos, mostrando um
pouco do seu decote. Eu não ligava; depois de passar uma noite com alguém,
acabava a graça. Sim, era egoísta, contudo, não pretendia mudar, mesmo com
Angelina dominando a porra da minha mente.
— Obrigado, depois falo com ele. — Entrei na minha sala. — Ligue
para o Daniel Luxem e transfira para mim — solicitei.
Eu não era rude com meus funcionários igual ao meu irmão — Lucky
tinha um jeito distorcido de tratar as pessoas. Felizmente, Sam estava o
colocando na linha. Eu gostava disso. Já passara da hora dele virar
“humano” de novo. Lucky teve uma vida difícil quando criança, sua mãe o
deixou para morrer... Se é que se pode chamar aquilo de mãe. Uma cachorra
de rua era mais mãe do que ela foi um dia, mulher desalmada que tenta matar
seu filho, e anos depois rouba dele milhões em um golpe... No mês passado,
Lucky soube que Kevin, seu ex-funcionário, era quem estava extorquindo ele
junto com a sua mãe. Por sorte, ela fora presa, e esperava que ficasse lá por
muitos anos.
O bastardo do Kevin, filho adotivo dessa desalmada, teve uma vida de
luxo e grana, ao contrário do meu irmão, que ela largou no meio do nada.
Meu pai salvou Lucky ainda criança.
Meu corpo doía tanto que fiquei sem fôlego, tudo por lembrar do meu
pai. Era nessas horas que eu bebia e ficava com mulheres, para ver se
aliviava a dor de perdê-los... Claro, a angústia nunca ia embora, apenas
ficava dormente por pouco tempo, e voltava com força total, como um
tsunami. Meus pais faleceram em um acidente de carro, quando eu tinha
dezesseis anos e, mesmo agora, com vinte e seis, o sofrimento continuava
forte demais para suportar.
Depois de rever a mulher linda na qual fiquei semanas pensando, a dor
parecia mais fraca, não tão grande como na noite anterior, aturando uma
entrevista em que tive de falar sobre os meus pais; por isso fiquei com
aquelas duas loiras. Não adiantou. A cura foi reencontrá-la, a garota de
olhos negros que brilham como a lua no céu. Ainda doía, claro, mas não
igual a antes. Eu só não entendia o porquê disso, por que estava reagindo
assim a ela.
— Sim, já vou fazer isso — respondeu Sandy, saindo da sala, me
tirando dos meus pensamentos.
O escritório era simples, com uma mesa grande de vidro e vista para a
cidade que tanto amo, Manhattan, onde nasci e fui criado. A parede central
tinha cor creme e, o resto, fora feito de vidro de cima a baixo. Um quadro
enorme da minha irmã Rayla em um desfile de moda em Moscou enfeitava o
ambiente. Ela era alta e tinha corpo curvilíneo. Seus cabelos loiros
platinados estavam soltos e caíam sobre as costas. Minha irmã era a única
mulher de quem exibia fotos em meu serviço e em minha casa, por ser
igualmente a única que amo e amarei para sempre. Bom, também a minha
mãe, claro. Mas ver as fotos de minha mãe me machucava, por isso as
deixava guardadas.
Rayla era modelo há anos, desfilava para mim sempre que podia. Para
a minha tristeza, logo se casaria com o bastardo do Alex, dono da boate
Rave. Os dois sofreram uma separação alguns meses atrás por causa de
Lucky, porém, reataram o relacionamento. Eu torcia por eles, a despeito de
tudo. Queria a felicidade da minha irmã, ela merecia.
Olhando ao redor da minha sala espaçosa, com sofá marrom arrastado
para o lado da parede à direita, me sentei na cadeira de estofado preto e
olhei a vista dos prédios à frente, e também o rio Hudson, um pouco longe da
Fifth Avenue, onde minha empresa se localizava. Dava para enxergá-lo
mesmo assim — do meu escritório, ao menos.
“O que será que a Anjo está fazendo agora? Será que ela está pensando
em mim?”. Sacudi a cabeça, tentando mudar meu foco.
— Como você é estúpido — falei comigo mesmo.
De repente, o telefone tocou. Peguei-o, colocando no ouvido.
— O que foi, Sandy?
— O senhor Luxem na linha dois — respondeu ela. — Vou passar a
ligação.
— Olá, Daniel.
— Ryan, quanto tempo.
Revirei os olhos. Daniel era dono da Editora Luxem, herdada do seu
pai, Michael Luxem, que morreu ano passado de câncer nos pulmões. Por ser
meu amigo desde a escola, com certeza me ajudaria a colocar minha
namorada dentro de sua empresa. “Minha namorada?”. Devia estar louco
pensando nisso como se fosse verdade.
— Nos vimos na semana passada, lembra? — Estive com ele na Rave e
ficamos com uma garota cujo nome não recordava. Foi um ménage incrível.
Ou eu achara incrível antes da Angel entrar em minha vida e bagunçar minha
cabeça. Agora, não sentia vontade de nada similar àquilo.
Ele riu.
— É verdade — disse, lembrando. — Vamos sair neste fim de semana?
Tenho duas gatas que entraram para trabalhar aqui. — Seu tom de voz
demonstrava animação com a ideia de pegar essas meninas.
Suspirei. Poderia ficar com elas sem ninguém saber, mas não faria isso
com minha namorada, ela merecia respeito. Fora a parte de não querer outra
mulher, porque não conseguia tirá-la da minha cabeça. Porra! Estava
amaldiçoado.
— Vou passar...
— O quê? — me interrompeu, chocado. — Desde quando você
dispensa uma mulher?
— Desde que iniciei meu namoro — declarei.
Desta vez, o idiota gargalhou tão alto que tive de afastar o telefone do
meu ouvido.
— Acho que estou ouvindo coisas — falou, depois se calou por um
minuto. Com riso na sua voz, prosseguiu: — Você bebeu?
— Quer ficar quieto e ouvir, idiota? — rosnei com os dentes cerrados.
Ele suspirou.
— Certo, vá em frente, meu amigo. — Pude perceber que ele estava se
segurando para não gargalhar novamente.
“Bastardo”, xinguei em pensamento.
— Eu te liguei para você conseguir um trabalho aí na editora para uma
pessoa... — Coloquei os cotovelos na mesa e a mão direita no meu cabelo.
Ficou em silêncio durante um segundo.
— Vamos por partes — murmurou. — Quem é essa pessoa?
Respirei fundo.
— Seu nome é Angelina Mary Stone, ela é a minha namorada. — Senti
um gosto bom na minha boca ao dizer a última palavra, querendo que fosse
real, e não apenas atuação. Enquanto a Anjo arrumava meu apartamento,
liguei para o RH do hotel e chequei o nome dela. Lucky e Bryan tentaram
localizá-la depois da doação de sangue, todavia, a mulher sumiu do mapa.
Se não fosse o fato de Sam estar bem, acharia que a imaginei aquele dia no
hospital.
— Sério? — Seu tom era ultrajado. — Por que não a contrata como
modelo?
Não conseguia imaginar Angelina sendo modelo algum dia. Ela, com
sua doçura tímida, não se sentiria bem de lingerie em uma passarela. E só de
imaginar essa possibilidade, me dava vontade de matar qualquer bastardo
que pudesse vir a olhar aquele corpo que eu jurava ser perfeito. Decerto
usava aquelas roupas largas para esconder suas belas curvas.
— Não a quero por aí desfilando em uma passarela, com homens em
volta babando. Além disso, ela ama livros, até tem um blog e faz resenhas.
— Sério? Deixe-me dar uma olhada aqui. Qual é o nome do blog? —
Ouvi ele clicando o mouse e teclando em seu computador.
— Ela mencionou algo como “Livros do coração”.
— Achei... Oh, céus! Ela é linda! Meio nerd, mas linda. Você tem razão
de estar todo raivoso. Pele branca, cabelos pretos anelados, olhos negros...
— Não estou raivoso — sibilei. — Angelina apenas não é para isso.
— As resenhas parecem excelentes. Você sabe se ela já fez algum curso
ou se formou em alguma coisa?
— Iniciou a faculdade de Literatura, mas não chegou a terminar.
— Por quê? — perguntou, curioso.
— Não sei, ela não me disse — respondi. Era verdade, não me contou,
foi propositalmente vaga em relação a isso. Não quis forçar o assunto, com
medo de que a garota mudasse de ideia. — Então, vai arrumar o serviço ou
não?
Ele suspirou.
— Se fosse por mim, daria o trabalho a ela, mas estou vendendo a
minha parte da editora para o Franklin.
— Aquele velho de sessenta anos que vive com mulheres de vinte
penduradas em seu pescoço? — Minha voz saiu alta. Não iria deixá-la perto
daquele homem. Era como jogar um gatinho para um leão faminto. Isso nunca
aconteceria.
— Sei que o cara gosta de mulheres que poderiam ser suas netas, mas
ele já é dono do resto da empresa. — Deu um suspiro longo. — Você sabe,
tenho projetos com corrida de carros, este sempre foi o meu sonho.
O que eu faria? Poderia arrumar algum outro serviço para ela em
qualquer lugar, talvez comigo mesmo, como secretária. Mas ela parecia amar
tanto os livros...
Abri meu computador e busquei por seu blog. Havia tantas publicações
que resenhou, isto era sua paixão. Enxerguei o brilho em seus olhos ao falar
em um vídeo sobre a obra Um amor para recordar. O livro contava a
história de uma garota doce e meiga que se apaixonou por um encrenqueiro;
no final, ela o transformou... Mas a personagem morre com uma doença...
Muito triste. Não sabia o que eu faria se isso acontecesse comigo. A vida
seria realmente uma droga se eu me apaixonasse e, de repente, ela morresse,
então era melhor eu não deixar isso acontecer nunca, não me dava muito bem
com perdas. Concluía isso pelos meus pais.
Podia apostar que ela era louca para encontrar um cara assim e se
apaixonar. Meu estômago deu voltas com isso. O que estava prestes a fazer
contrariava todas minhas ações passadas, em se tratando de uma mulher que
praticamente acabei de conhecer, mas não conseguia parar de pensar nela
nem por um segundo. Merda!
— Cara, você está aí? — chamou Daniel. — Queria poder ajudar,
mas...
Eu o interrompi.
— Você me vende a sua parte da editora?
Ele ofegou, e não era para menos: jamais tomei uma atitude parecida
com esta.
— Sério, cara? Você quer comprar a editora só para essa mulher
trabalhar nela?
Esfreguei meus olhos.
— Eu também quero a parte do Franklin — declarei num tom firme. —
Não há a mais remota possibilidade de eu deixar aquele cara perto dela.
— Não sei se Franklin vai vender sua parte, afinal, ele é sócio do meu
pai há décadas. Além disso, está ansioso para colocar as mãos no negócio
inteiro.
— Mas você não vai vender para ele, e sim para mim, não é? — pedi
apressadamente, não querendo perder a chance. — Pago o dobro do valor
que ele ia dar por ela.
Daniel xingou baixo do outro lado da linha. Supus que o preço era alto,
mas não liguei muito para isso.
— Certo, cara, somos amigos, farei isso por você. — Suspirou. — Mas
ele não vai querer vender a parte dele, vocês serão sócios.
— De jeito nenhum! Ele aceitará minha proposta — rosnei.
Ficou em silêncio um segundo, ponderando o que eu disse.
— Não acho que você tem todo esse poder. — Parecia ter certeza deste
fato.
— Conheço alguém que pode fazê-lo mudar de ideia. — Somente o
Lucky dispunha desta capacidade. E já que era meu irmão, faria o que eu
pedisse.
— O que dirá ao Lucky? — perguntou, sabendo a quem eu me referia.
— Que eu quero investir em algo de valor, como a editora.
Ele riu. Apostaria que o bastardo revirou os olhos.
— Ryan, você nunca leu um livro na vida, como pode comprar uma
editora? E, o pior, como pretende mantê-la funcionando? — troçou.
Funguei.
— Um passo de cada vez. — Passei a mão nos cabelos. — Primeiro,
quero a empresa para ontem, sem aquele bastardo lá quando ela começar a
trabalhar amanhã de manhã.
— Sugiro que Lucky faça um milagre — riu, nada confiante.
— Lucky consegue ter tudo o que quer nesta vida — respondi. Isso era
verdade. Até aquele instante, ele nunca levara um “não” de ninguém, apenas
da Sam, uma vez, quando a conheceu, porque dinheiro não podia comprar
amor.
— Realmente... — concordou.
— Quando será sua próxima corrida? — sondei, tentando pensar em
algo.
— Daqui a três ou quatro meses, mais ou menos — respondeu, confuso.
— Por quê?
— Até lá, você pode ficar como chefe dela? — pedi, quase suplicante.
Ele expirou.
— Farei isso só porque é para você, cara, porque somos amigos há
décadas.
— Você fala isso como se fôssemos velhos.
Daniel riu.
— Ryan, eu tenho vinte e oito anos, e você vinte e seis, não somos mais
tão novos. Agora, falando sério, deixarei meu contrato pronto amanhã, assim
que você chegar com ela aqui na editora.
— Entro em contato quando falar com Lucky.
— Boa sorte, cara, você vai precisar para conseguir o que quer.
— Obrigado.
Desliguei o telefone, peguei meu celular e liguei para o Lucky.
— Espero que seja importante. — Ele atendeu no quarto toque, meio
ofegante.
Eu sacudi a cabeça.
— O que foi? Você estava correndo? — zombei. Ele, com certeza,
transava com a Sam. Esses dois pareciam coelhos. Não era de se estranhar,
com uma mulher daquelas, quem não pareceria? Embora Angel fosse mais
perfeita que qualquer garota que já conheci neste mundo.
— Engraçadinho — rosnou. — Eu já estava indo para a segunda
rodada. Agora me diga o que você quer para eu acompanhar a minha mulher
no banho.
Ri enquanto pegava o whisky e colocava no copo.
— Preciso comprar uma empresa para ontem, e quero que você me
ajude, porque o cara parece não ter a intenção de ceder a parte dele. —
Tomei um gole bem grande da bebida; careceria disso para enfrentar as
perguntas que ele faria a seguir. Lucky não deixaria isso quieto.
— Empresa? Que tipo de empresa? Moda? — sondou, profissional.
Suspirei.
— Não é de moda. — Respirei fundo e soltei a bomba: — É uma
editora.
Ele ficou calado um segundo e depois desatou a rir como uma gralha,
igual ao Daniel. Maldito seja.
— Certo, cadê o meu irmão e o que você fez com ele?
— Rá, rá, é sério — rugi. — Comprarei a editora Luxem, do Daniel, a
parte que era do pai dele, mas preciso da do Franklin também.
— Oh, o velho tarado? Eu já o vi em alguns negócios onde fui. —
Suspirou, resignado. — O que o dinheiro não faz?
— Não quero saber da vida daquele safado, apenas desejo sua parte na
empresa. Preciso que ele assine os papéis da venda.
— Se você quer tanto essa editora, mesmo não conhecendo nada sobre
a área, por que não se torna sócio dele? O cara pode ser mulherengo, mas
sabe administrar uma empresa muito bem...
— Não — cortei-o. — Quero ser o dono dela sozinho, sem ele por
perto! Vai me ajudar ou não?
— Por que está bravo? — indagou, confuso. — Ele te fez alguma
coisa?
Respirei fundo, tentando me acalmar.
— Não. Eu nem o conheço. — Bebi outro gole. — Só preciso que me
ajude sem fazer tantas perguntas.
— Não pode me culpar por querer descobrir o motivo para comprar
uma empresa que não é de seu ramo. Droga, Ryan! Você não entende nada de
editoras, nunca sequer leu um livro. Como pretende fazê-la funcionar sem
falir? — questionou num tom calmo, apesar de eu sentir um toque de
nervosismo ou preocupação em sua voz. — Quando compramos um negócio,
temos que saber tudo sobre ele...
— Estou ciente disso. Contratei alguém que entende e vai gerenciá-la
para mim — blefei. Angelina não poderia, sem treinamento, administrar uma
empresa dessas, porém, Daniel lhe ensinaria. Bom, não custava tentar.
Depois eu falaria com ele sobre isso.
— Essa pessoa é uma mulher? — comentou, incrédulo.
— Quer parar de fazer tantas perguntas e me ajudar a comprar a
editora? — rosnei com os dentes cerrados.
Ele respirou fundo.
— Certo. Vou falar com Franklin, então daqui a algumas horas ele vai
entrar em contato com você para assinar os papéis da venda.
— Você parece confiante.
— Não há dúvidas quanto a isso — respondeu. — Nós só precisamos
encontrar algo contra ele e usar a informação. Só não deixe a Sam saber —
disse bem baixinho, para ela não ouvir.
— Minha boca é um túmulo. Contanto que eu tenha essa empresa em
meu poder, não ligo para mais nada.
— Você vai tê-la ainda esta noite. Jamais aceito “não” como resposta
— sussurrou, rindo. — Apenas da minha Rosa Vermelha... Felizmente, não
durou muito, e agora tenho a minha obra de arte nua no meu banheiro.
— Está me dando algo no que pensar — brinquei. Embora houvesse
uma época em que a desejei... Bem, isso foi antes de saber que Lucky se
apaixonara.
Ele sibilou.
— Faça isso e eu o mato.
Ri, sacudindo a cabeça.
— Como está a segunda lua de mel?
Gargalhou com bom humor.
— Esplêndida! — falou em júbilo. — Não tem como ser mais perfeita
do que isso.
— Quando vocês voltam?
— Semana que vem.
Lucky e Sam estavam em sua segunda lua de mel em sua casa nas
Bahamas. Na primeira, visitaram Aspen. Sam queria minha casa para passar
a ocasião, mas a do Lucky era muito maior. Ela nem desejava viajar, na
verdade, mas meu irmão a convenceu, porque na outra eles levaram Shaw, o
garotinho que os dois adotaram; desta vez, ele ficou com a avó da Sam.
Eu me despedi dele e fui trabalhar. Havia algumas modelos que
contratei para desfilar com a nova coleção de lingerie dali a um mês ou dois
na Flórida — a data não fora definida ainda. Era para eu estar lá no palco,
vendo o ensaio delas, mas mandei o meu estilista, Pierre, e o gerente de
vendas, Roger, irem no meu lugar.
Pierre arregalou os olhos e disse:
— Tem certeza? É um desfile com mulheres lindas e gostosas. Você
nunca perdeu um. — Seu tom aparentava incredulidade. — Talvez você
consiga uma diversão.
Não estava com vontade. Deixaria qualquer decisão necessária em suas
mãos, afinal, ele era o estilista e tinha bom gosto. Seus talentos já me
renderam muito dinheiro, era brilhante.
— Tem certeza que não está doente?
Sacudi a cabeça, sorrindo, e fui embora. Quase ri sozinho depois, por
minha falta de interesse nessas mulheres. Queria culpar a aposta feita com a
Sam, mas sabia que não era isso, porque apenas ela vinha em minha cabeça:
a morena de olhos escuros como a noite e com lábios carnudos em forma de
coração. Naquela boca residiam todos meus pecados; não tinha direito de
desejar algo tão precioso como o meu Anjo.
Já passava das sete horas quando o Franklin me ligou e marcou a
reunião em seu escritório no centro. Pude ver, pelo seu tom, que aceitaria,
contudo, não parecia nada feliz com isso. Bom, problema dele.
Assinamos os papéis na frente do seu advogado, do advogado do Lucky
e do meu. Seu nome era Dennis, e tinha a cara séria como a do Simon, o
guarda-costas do Lucky. Poderia ter sido um soldado um dia, mas acho que
não foi.
— Isso não vai ficar assim — rosnou Franklin, me fuzilando com os
olhos hostis.
Lucky me mandou o relatório dele. O cara era um tremendo de um
canalha. Além de ficar com mulheres mais novas, também pegava menores
de idade. Lucky tinha fotos dele com garotas de quatorze e quinze anos, e
jogou tudo nas mãos do seu advogado. Talvez fosse por isso que seu olhar
era mortal ao fitar Franklin. Se a informação vazasse, o velho não veria a luz
do dia nunca mais na sua vida, por ser um pedófilo que merecia estar preso.
Diria ao Bryan para cuidar dele, já que era um policial.
Estreitei meus olhos.
— O que foi? É uma ameaça? Se for, deixarei avisado, caso aconteça
algo comigo e com a minha família — rosnei, doido para acertar a cara do
velho tarado. — Você será o único responsável.
— Estarei do seu lado — falou Dennis, sombrio. — Para eliminar a
escória da Terra.
Franklin suspirou e mirou seu advogado.
— Acabamos por aqui. — Pegou sua pasta e saiu porta afora, sem nos
olhar. Estava furioso comigo.
Sorri por ter a Luxem só para mim. Amanhã, compraria a parte do
Daniel. Meu Anjo teria um lugar para trabalhar sem ninguém dar em cima
dela, muito menos um velho asqueroso que precisava tomar um balde de
Viagra para ter uma ereção.
Fui para casa. Jordan e Jason me ligaram, me chamando para irmos à
Rave. Respondi que não estava a fim de festejar. Eles perguntaram se eu
queria que levassem algumas garotas para o apartamento onde eu ficava com
as mulheres. O prostíbulo, como ela disse. Ri com esse termo. Ela nem
percebeu que falou isso em voz alta no meu apartamento. Eu não queria
mulher nenhuma porque somente pensava nela, a linda morena exuberante.
Ali eu descobri que estava definitivamente ferrado.
Capítulo 4
Primeiro beijo

RYAN
Desde ontem à noite não dormia direito. Até queria, mas era quase
impossível, não conseguia parar de pensar na mulher de corpo perfeito.
Embora eu não a tenha visto direito por causa das suas roupas folgadas, já
imaginava suas curvas incríveis, algo bom para eu passar as minhas mãos. O
que estava pensando? Angelina era diferente de todas as garotas que
costumava pegar e descartar logo em seguida. Foi idiotice propor a ela ser a
minha namorada, tudo para ganhar a aposta da Sam. Eu sabia que podia ter
Alexia, com toda a sua beleza loira, mas nada comparado a essa mulher
divina, que me tocou fundo. Isso era algo que não podia acontecer.
Seria errado ficar preso com mulheres fáceis; apesar de Alexia não se
comportar assim, ela faria de tudo para eu cair em tentação, ao contrário da
Angie. Eu não ficava com alguém duas vezes, muito menos aceitava passar
meses preso a uma pessoa que abriria as pernas quando eu quisesse. Eu tinha
de me manter em abstinência até depois do desfile. Ficar sem mulheres era
uma droga, precisaria usar as mãos como um adolescente na puberdade.
Meus testículos já doíam de tanto tesão, mas eu ganharia essa aposta, custe o
que custasse.
Escolhi a garota mais doce e meiga para isso, pois era intocável para
mim. Tão perfeita, tão pura! Deixaria as minhas mãos longe dela, para o seu
bem. Nunca fiquei com uma virgem que nunca beijou ninguém em sua vida.
Choquei-me ao descobrir isso nas mensagens que trocamos. Quase ri de mim
mesmo. Quando um dia pensaria em mandar mensagem para uma mulher? O
inferno devia estar congelando. Todavia, não pude resistir; até conseguia
visualizar o rosto dela vermelho no momento em que perguntei com que
roupa ela dormia. Não esperava pela resposta que recebi, mas admito que
gostei.
Caí da maldita esteira quando li aquilo, ela dizendo estar sem calcinha,
mesmo sabendo que mentia. Tinha cara de quem dormia com um conjunto de
calças e camisetas de bolinhas e corações, aqueles mais desgastados. Não
parecia o tipo de mulher que usava lingerie. Ficaria linda e sexy de qualquer
jeito.
Acordei cedo depois de dormir quase duas da madrugada, ansioso para
vê-la novamente. Isso me assustava, nunca me senti assim em relação a uma
garota antes. Eu não podia deixá-la entrar em meu coração... Se permitisse,
ela desapareceria igual aos meus pais... Bloqueei este pensamento. O nosso
namoro era só uma aposta e nada mais. Entoei isso como um maldito mantra.
Quando cheguei ao Bronx, notei a simplicidade do lugar. O pior era que
lá você poderia levar um tiro sem saber de onde viera a bala. Senti um nó
dentro de mim, porque aquele não era o local ideal para ela morar. Queria
lhe dar tudo de bom, mas a garota não aceitaria. Admirava sua honestidade,
dava para ver pelo dinheiro que rejeitou, aceitando uma quantia
insignificante para mim. Eu não compreendia o porquê de ela precisar
somente daquele pequeno valor. Talvez um dia me contasse.
Parei em frente ao prédio onde Angie morava, um edifício antigo de
cinco andares, com paredes desbotadas e uma escadaria de incêndio
fornecendo acesso às janelas, entrada fácil para um ladrão. Isso me
preocupava muito. Contrataria alguém para vigiá-la sem que percebesse.
Nossa! Estava virando um perseguidor? Era só o que me faltava.
Eu já ia deixar o carro quando a vi saindo pela porta do prédio. Vestia
uma blusa branca com uma saia social rosa que deixava suas curvas bem à
mostra, provando que eu estava certo sobre seu corpo deslumbrante. Os
cabelos negros e anelados balançavam acima da bunda, angelicais. Céus, e
que bunda! Ela não estava sozinha, e sim abraçada com um cara moreno e
forte, cheio de tatuagens nos braços, desenhos que não consegui decifrar de
longe. Trinquei os dentes e fechei os punhos com força.
— Mas que droga — praguejei sozinho. — Quem é esse idiota?
Ela me disse que não tinha namorado. Será que havia mentido para
mim? Parecia tão sincera. “Mulher é um bicho traiçoeiro”, pensei com raiva.
E por que eu me importava com seu possível namorado? Angelina não
me pertencia para eu poder reclamar disso. Deixaria as coisas bem claras
para ela, como, por exemplo: se namorava, poderia ter me dito e recusado a
proposta. Droga!
Saí do meu Bugatti sem tirar os olhos dela. Usava uma bolsa de alça
grossa e salto alto, aumentando sua altura de um metro e setenta para um e
oitenta. O que me impressionou mais foram suas pernas longas, tudo de bom.
Só de imaginar outro homem tocando-as, me dava vontade de socá-lo,
estrangulá-lo e levá-lo para a cova.
O cara a puxou para si e ia colocar os lábios nos dela. Eu acelerei os
passos para impedir que isso viesse a acontecer, ou ele seria morto e eu
pararia na cadeia.
— Que merda está acontecendo aqui? — rugi com os punhos cerrados.
Afastou-se dele, como se o homem a empurrasse. Desequilibrou-se e
logo cairia, mas eu a peguei pela sua cintura fina de violão. Não sabia por
que usava aquelas roupas folgadas, escondendo tamanha perfeição, porém,
gostava disso: assim nenhum bastardo a cobiçaria. Diferente de mim,
completamente fodido de interesse.
Angelina levantou a face e puxou a cabeça para trás, de modo a olhar
para mim; alguns fios de seu cabelo foram parar em seu rosto. Eu os
coloquei para trás da orelha e notei que utilizava um par de brincos de
esmeralda.
A garota sorriu para mim. Nossa! Era como abrir as portas do céu e
ouvir os anjos cantando em adoração à sua perfeição. Sem falar nesses
lábios em forma de coração, deliciosamente beijáveis.
— O que faz aqui? — perguntou, afastando-se de mim para me olhar
direito.
Queria saber se ela também sentia essa eletricidade diante do meu
toque. Meu corpo inteiro reagia a isso. Estreitei meus olhos, mirando os
dela, e depois o cara que me fitava com um sorriso idiota.
A Anjo piscou.
— Oh, este é o Johnny, meu amigo. — Apontou para o babaca, que
sorriu ainda mais para mim. — Esse é o Ryan, de quem lhe falei.
Encarava a menina com as sobrancelhas levantadas.
— Você costuma beijar todos os seus amigos assim? — deixei o
sarcasmo sair alto e claro.
Um tom de rosa lindo se apossou de sua pele branca.
— Não... — Sua voz falhou.
— Eu ia ensiná-la a beijar. — O cara me disse com ar divertido.
Fuzilei-o.
— E não pensou duas vezes antes de enfiar a sua língua na garganta
dela, não é? — sibilei.
O homem gargalhou e deu de ombros. Fiquei vermelho, dando um passo
em sua direção com os punhos cerrados, pronto para tirar aquele sorriso da
sua cara.
Ela se colocou no meio de nós dois, de costas para ele e de frente para
mim.
— Por que você está reagindo assim? — perguntou, confusa.
— Porque ele está com ciúmes — disse Johnny, achando graça.
— Não estou. — Nunca senti ciúmes de ninguém na minha vida, e nem
pretendia. Minha vontade era a de esganar esse cara.
Angelina estreitou os olhos por um momento, logo sorrindo (e, no
processo, acabando com meu coração). Seu sorriso ainda seria a minha
perdição.
— Você está preocupado com o que as pessoas vão pensar se verem
Johnny e eu nos beijando, não é? — falou como uma declaração.
Isso nem passou pela minha cabeça, apenas não queria outro cara
tocando nela.
— Sim, já que estamos namorando. Estranho chegar aqui e pegar esse
cara enfiando a língua em sua garganta.
— Oh, não era nada disso... — começou, mas ao ver a minha fúria, se
calou e corrigiu: — Desculpe, eu só não queria passar por inexperiente
quando me beijasse. — Abaixou o rosto, envergonhada. — Talvez você não
fosse gostar.
Ela era louca? Como não amá-la por não ter experiência? Porra, ficava
contente com isso.
Toquei seu queixo e levantei seu rosto para enxergar seus olhos úmidos,
que não permitiam às lágrimas escapar.
— Tudo bem, Angelina. — Minha voz soou um tanto grossa devido às
emoções novas que sentia. Estava com ciúmes, sim, e não suportava vê-la
triste. O que aconteceu comigo?
— Garanto que ele beija melhor do que eu — zoou o cara.
Suspirei, controlando a minha fúria quase palpável.
— Vamos? Ou iremos nos atrasar — falei por fim, querendo sair logo
dali, antes de eu cometer um crime.
— Claro. — Assentiu e foi abraçar o homem. — Obrigada por tudo,
Johnny.
Johnny sorriu por cima do ombro dela, ainda a abraçando, e apertou a
sua bunda. O fogo tomou conta de meu corpo, achei que estouraria como um
vulcão. Dei um passo em sua direção, mas o bastardo piscou para mim e foi
embora dando um “tchau” por cima do ombro. Angie se virou com um
sorriso deslumbrante, que sumiu como uma luz sendo apagada ao ver a minha
cara lívida.
— O que foi?
— Vamos — respondi, indo em direção ao meu carro.
— Eu não vou com o seu Volvo? — indagou, confusa, me seguindo.
— Não.
Cheguei ao carro e entrei, acompanhado por ela. Partimos. Angelina
ficou calada.
— Por que está com raiva de mim? — Sua voz com sotaque sulista era
só um sussurro.
— Por que o deixou passar a mão em sua bunda depois de quase tê-lo
beijado? — Apertava o volante com força. — Você tem alguma coisa com
ele?
— Não acredito que esteja me perguntando isso. — Pareceu magoada,
fazendo eu desejar morrer. — Você pensa tão mal de mim?
— O que você quer que eu pense, Angelina? Eu o vi quase enfiar a
língua em sua boca, e ainda por cima pegar na sua bunda! — gritei
involuntariamente, tamanha a minha raiva.
— Não entendo por que está tão bravo.
Expirei para me acalmar, ela tinha razão: não era meu direito sentir isso
e descontar nela. Angie jamais me pertenceria.
— Você está certa, desculpe — falei por fim.
Ela suspirou aliviada.
— Pode se tranquilizar, não sou o tipo dele. Se fosse, nunca o deixaria
pegar na minha bunda.
Fitei-a de olhos arregalados.
— Todos os homens a cobiçam. Você é o tipo de garota que deixa
qualquer um bobo. — “Como eu”, pensei com amargura.
— Não ele — repetiu, me encarando. — E também não sou o tipo de
todos.
— É claro que é!
— Não sou o seu — rebateu.
Desliguei o carro na Morris Park Ave.
— Por que paramos aqui?
Virei para ela.
— Você é mais do que meu tipo — declarei, e depois a ficha caiu. — O
cara é gay?
— O nome dele é Johnny — retrucou, defendendo-o. — Como você
sabe disso?
— Só assim um homem não se interessaria por você. — Eu me
perguntava quando ela ia notar o quão linda era. A menina não enxergava sua
própria beleza, a beleza que via a quilômetros de distância, a qual tirava
meu sono e me fazia perder a porra da minha mente.
Corou, mas riu um pouco.
— Então você é gay — disse ela. Eu ri junto.
— Oh, eu não sou. — Se ela imaginasse meus gostos na cama e o que já
fiz com mulheres, nunca mais diria isso.
— Por que paramos, não estamos atrasados? — Mudou de assunto.
— Por isso. — Inclinei a cabeça na direção dela e coloquei a mão
direita em seus cabelos, puxando-a para mim e devorando aqueles lábios
carnudos. Para falar a verdade, tive vontade de tomá-la desde que a vi a
primeira vez no hospital.
Eu a peguei desprevenida, mas isso foi bom. Senti seu sabor de
morango, delicioso. Beijá-la era como matar a minha sede em um oásis no
meio do deserto.
As minhas mãos vagaram em sua cintura fina e em seus fios perfeitos
várias vezes. Segurei-a pela cintura e a sentei em meu colo, sem nunca tirar a
boca da dela. Sentia suas mãos em meu peito e em meus cabelos. Ela gemeu
quando mordi a sua boca e suguei sua língua; quase fiquei louco. Eu
esquadrinhava seu corpo com os dedos e segui até a barra da saia, ao que a
garota endureceu. Afastei-me, interrompendo o beijo. Deus, e que beijo!
Nunca senti tanto desejo por ninguém, e parecia longe de estar saciado.
— Desculpe, me deixei levar — sussurrei com falta de ar. Essa garota
era a minha ruína.
Ela assentiu, também sem fôlego, focalizando meus lábios e meus olhos,
que agora pareciam bêbados. Via a mesma fome e desejo nos dela. Droga!
Acabaria magoando-a e não queria isso. Só de pensar em vê-la sofrendo, me
encolhia por dentro.
Angelina se afastou, suspirando, e se ajeitou no banco, arrumando seus
cabelos bagunçados.
— Isso foi... U-A-U.
— Que bom que gostou — respondi com um sorriso devasso.
— Se o beijo é assim, imagine... — interrompeu-se, fitando as minhas
calças a pleno vapor, duro como uma rocha. Seu olhar era tão quente que
tremi, quase gozando.
— Pare de me encarar assim — pedi, meio ofegante. Quando fiquei
desse jeito com um amasso? Nunca! Perdi o controle. — Estou tentando me
comportar.
A garota expirou, um tanto... desapontada?
— Ah, a aposta.
Trinquei os dentes.
— Não estou falando da aposta, Anjo, e sim que você merece coisa
melhor. Não sou seu cavaleiro da armadura brilhante, e nunca serei.
Ela bufou.
— Foi só um beijo, Ryan, não estou pedindo para se casar comigo. Sei
que não faço o seu tipo.
— Não, você não faz. — Não queria dizer isso, mas necessitava
impedi-la de se iludir comigo.
Soltou um olhar fulminante.
— Olhe aqui, sei que vamos ter de nos beijar algumas vezes — seu tom
era enervado —, e lamento que para você seja ruim... Sugiro que use
bastante enxaguante bucal para diminuir o asco.
Eu arquejei.
— Ficou maluca? Quem falou em ter nojo? — Bati as mãos no volante.
— Droga, Anjo, vejo como seu corpo reage ao meu toque, e por mais que eu
goste dos seus beijos e carícias, não posso...
Ela piscou.
— Ryan, eu não transaria com você ou faria algo mais do que beijá-lo.
— Passou as mãos nos cabelos num gesto nervoso. — Se fizesse, me sentiria
como uma prostituta, e isto eu não sou.
— Por quê?
— Estou sendo paga para ser sua namorada, e não outra coisa. Sem
chance de sexo — murmurou. — Você pode ter um monte de mulheres, é só
estalar os dedos para elas caírem de joelhos aos seus pés, mas eu não. —
Aparentava tristeza. — Meu corpo pode sentir algo por você quando me
beija, porém, eu o controlo. Homens como você só servem para quebrar
corações.
— Eu... — comecei a me desculpar; ela não permitiu.
— Então — cortou ainda com fúria na voz —, se você quiser dizer algo
a mim ou achar que estou passando dos limites, apenas fale, não me humilhe
novamente. — Fungou, olhando a janela. — Sei que não sou nada se
comparada às mulheres que já teve, não chego aos pés delas. Você não
precisa me lembrar.
Sentia-me um completo estúpido por fazer isso com ela, uma besta-
quadrada. Deveria apanhar até virar um homem digno. Ela já se achava
inferior às outras, por que fui falar aquilo? Merda! Queria dizer que ela era
incomparável, contudo, fiquei quieto.
— Perdoe-me, Anjo... Sinto algo por você, mas não desejo que crie
laços comigo. Juro que nunca mais vou dizer nada que a magoe. — Ergui a
mão direita. — E para que fique sabendo, seu beijo é o melhor que já tive.
— Toquei sua boca aberta. — Oh, Deus, estes lábios! Vai ser difícil
esquecer, mas farei de tudo para não feri-la, prometo. — Olhei dentro de
suas duas pedras de ônix. — Você me perdoa? Por favor?
Afastou-se de mim. Eu me encolhi, com medo de ela ter se zangado de
novo. Felizmente, Angie sorriu.
— Alguma vez você já pediu perdão a alguém, ou por favor?
Respirei aliviado.
— Não, esta é a primeira.
“Um monte de primeiras vezes”, pensei. Primeira crise de ciúmes,
primeiro beijo a me consumir, primeira mulher de quem quero mais que
sexo, primeira para quem compro uma empresa.
— Tentarei tomar isso como um elogio — disse ela, jogando seus
cabelos atrás dos ombros. O cheiro de lavanda dominou o ambiente, me
deixando tonto e duro de novo.
— É um elogio, mesmo que às vezes eu seja um idiota, como agora há
pouco — declarei.
Lançou-me um sorriso tênue.
— Tudo bem. — Ficou séria: — Quando tudo isso acabar, espero
continuarmos amigos. Você é um cara legal, com algumas exceções.
Ri com isso.
— Obrigado, mas depois do trato acabar, não acho que possamos ser
amigos. — Meu tom era triste. Só de pensar nisso, sentia um vazio no peito.
Angelina me olhou com suas íris inalcançáveis, agora sem brilho.
— Por que não? — Murchou como uma flor ao morrer.
— Porque não posso ficar perto de alguém por quem sinto essas coisas
— sussurrei.
— Que coisas?
— Você sente o mesmo que eu. — Olhei-a de soslaio. — A eletricidade
e o desejo forte de me enterrar dentro de você.
Ela engasgou com isso.
— Eu não sinto vontade... — interrompeu-se, fitando minhas calças. —
Oh, céus, isso é...
— Chama-se desejo, algo que eu nunca senti desta forma por mulher
nenhuma em minha vida. — Com as outras era apenas sexo, sem tanto querer.
Mirou-me de olhos arregalados.
— É claro que já, afinal, você fica com milhares de mulheres diferentes
— acusou.
— É puramente sexual...
Arqueou as sobrancelhas negras e alinhadas.
— E comigo não é?
— Oh, com você é diferente, não é só sexo, tem algo a mais. — Eu me
encolhi. — Não estou pronto para enfrentar isso.
— Bom, da próxima vez, diga a verdade. Gosto de ser franca com as
pessoas, e que elas sejam comigo. — Pegou a minha mão e a apertou. —
Você apenas precisa ser sincero sempre, sem precisar me magoar para me
afastar. Vou entender. — Bagunçou meus cabelos. Eu nunca gostei de
mulheres tocando em mim, mas ela era uma exceção. Sempre deixava as
demais amarradas ou algemadas na hora do sexo para evitar toques. — Está
perdoado, mas vamos evitar nos beijar com frequência.
— Sim — assenti.
Ficamos em silêncio até chegar à editora do Daniel, ou melhor, à minha.
Ela não se localizava muito longe da minha agência de modelos, situada na
Fifth Avenue. A editora ficava dois quarteirões à frente, na Madison Ave.
Parei diante do prédio envidraçado de vinte e cinco andares — dava
uma bela vista para quem passava na rua —, com paredes de tijolos
avermelhados posicionadas em locais estratégicos. Na fachada, lia-se
“Editora Luxem”, o sobrenome do Daniel. Manteria o nome por ora, depois
mudaria para Editora Donovan. Se fizesse isso agora, ela descobriria que
era minha a empresa e, talvez, não quisesse mais trabalhar ali.
Seu olhar se fixava no edifício, como se tivesse ganhado o melhor
presente do mundo. Logo se virou para mim, com seus olhos brilhando.
— É aqui? — Parecia em dúvida.
— Sim — respondi, gostando de vê-la feliz. Valeu cada centavo pago.
Quando Lucky mencionou que deu a Vênus para Sam, achei que ele estava
louco. Agora, eu comprara uma editora somente para ela trabalhar com o que
amava. Éramos dois doidos. Apenas queria fazer tudo por esta mulher que,
em menos de doze horas (ou até antes disso, desde o hospital), se instalara
sob a minha pele. Quanto mais ficava perto dela, mais difícil era pensar que
teria de deixá-la no final da aposta.
— Tem certeza? — perguntou, como se isso fosse bom demais para ser
verdade. — É tão lindo!
Sorri.
— O meu amigo é o dono — menti. — E que bom que gostou. Imaginei
que se encaixaria bem em uma editora, por adorar livros.
— Oh, aqui é o céu. — Piscou com as íris brilhantes. — Farei de tudo
para passar no teste.
Franzi a testa.
— O serviço já é seu, não precisa de teste nenhum. — Não paguei uma
fortuna para submetê-la a um maldito teste.
Anjo sacudiu a cabeça.
— Você já fez o bastante por mim, agora é por minha conta. — Fitou-
me suplicante. — Quero ter uma prova ou entrevista como todo mundo. Ao
menos um contrato de experiência, por favor.
Eu suspirei. Como ela não tinha experiência, não seria aprovada se a
editora fosse de outra pessoa. Jamais diria isso a ela. Admirava seu esforço
em lutar por algo que desejava, mesmo que lá no fundo eu quisesse somente
dar tudo a ela. Era estranho… Nunca liguei para nada, para nenhuma mulher
que não fosse Rayla ou minha mãe.
— Tudo bem. Mas se ele der em cima de você, aí eu me meto sim.
A garota sacudiu a cabeça.
— Jura que o dono disso ia querer algo comigo...
Se ela soubesse de tudo, veria o quão errada estava: comprei a editora
somente para realizar seu sonho. Caso alguém além de Lucky descobrisse o
que fiz, diriam que perdi a cabeça. Mas eu não dava a mínima para a opinião
de terceiros; minha única preocupação era colocar este sorriso lindo no
rosto dela.
— Você deveria se olhar mais no espelho — adverti. — Não importa se
os homens têm dinheiro ou não, quando eles a veem, ficam loucos.
— Bobagem — descartou com um gesto de mão.
Deixei passar. Mesmo quando tudo acabasse, insistiria para ela manter
seu emprego, pois parecia tão animada. Por isso comprei a editora, assim
não corria o risco de ela ter de sair caso eu partisse mais para frente. Uma
pontada de dor atingia o meu coração ao pensar em deixá-la. Alisei meu
peito para ver se aliviava; não adiantou.
Chegamos à recepção do prédio e fomos para o vigésimo quinto andar,
onde ficava a sala do Daniel — por três ou quatro meses, até ele ir embora
para participar de suas corridas de carro, seu sonho. O cara era um piloto
nato.
Lá estava Karen, a secretária do Daniel. Loira, com cerca de um metro
e oitenta, e corpo curvilíneo por debaixo do terninho colado. Eu e Daniel
fizemos um ménage com ela uma vez. Depois disso, os dois saíram algumas
vezes. Viramos amigos, ou melhor, não nos tornamos inimigos — eu não era
de ter amizade com mulheres.
Ela sorriu para mim ao chegarmos perto de sua mesa.
— Como vai, Ryan? — cumprimentou num tom meloso.
Angelina fechou a cara para Karen e eu. Com um sorriso forçado,
passou o braço em minha cintura, me segurando de lado.
— Você vai me apresentar sua amiga, amorzinho? — disse ela. Podia
ver que se esforçou muito para não grunhir.
Sua expressão era intensa. Irritara-se comigo ou com a garota? Eu não
sabia. Imagine se ela descobrisse que já rolou algo comigo e a Karen?
Gostei de vê-la enciumada. Sua mão por cima da minha camisa gerou um
frenesi em meu corpo, dos pés à cabeça. Eu me perguntava se ela sentiu o
mesmo. Esperava que sim, do contrário, seria injusto.
Karen desfez seu sorriso por um instante ao me perceber acompanhado.
Logo voltou ao normal, educada e eficiente em seu trabalho.
— Oi, Karen, esta é minha namorada, Angelina. — Olhei de uma para a
outra. — Anjo, esta é Karen, secretária do Daniel.
Ouvi Karen ofegar.
— Anjo? Namorada? — inquiriu, um tanto ultrajada.
Chocara-se com isso, afinal, eu nunca namorei ninguém; meu negócio
era pegar, provar e largar, sem compromisso.
Angel deu um sorriso doce.
— Apelido carinhoso — respondeu, beijando meu rosto. — Não é,
amorzinho?
Mirei-a com um esboço de sorriso. Ela estava se comportando assim
por ciúmes de Karen. Angie não gostou da afabilidade da secretária em
relação a mim, mas não reclamei, afinal, fiz o mesmo com o tal de Johnny —
e, a despeito dele ser gay, eu continuava com vontade de quebrar as suas
duas mãos por pegar naquela bunda perfeita e gostosa com a qual eu tanto
sonhava. “Ela não é para você”, lembrei-me. Céus, Angie era tão doce e
pura que dava raiva imaginar outro cara tocando naquela perfeição de corpo.
Eu sorri, entrando no jogo.
— É claro, Anjo — puxei-a para os meus braços e a beijei com
entusiasmo e fervor. Estava louco para ter mais desta boca saborosa. Nunca
seria o suficiente, sempre desejaria mais e mais dela. Se o beijo era assim,
nem conseguia conceber a ideia de estar dentro da garota, com ela gritando o
meu nome, algo que nunca deixei acontecer: quando ficava com uma mulher,
a impedia de gemer o meu nome.
— Você trouxe a nova contratada para beijá-la na minha empresa ou
para me apresentar? — zombou Daniel.
“Minha empresa”, pensei, só não disse em voz alta.
Pretendia ignorá-lo, mas Angie estava se afastando. Segurei-a perto de
mim, passando os braços em sua cintura e sussurrando em seu ouvido.
— Já ouviu aquele ditado: “Quem mexe com fogo acaba se
queimando?”. — Afastei o meu rosto do dela e sorri para tranquilizá-la. —
Está tudo bem, Anjo.
Ela fitava o Daniel, escorado no batente da porta de sua sala com um
sorriso de gato prestes a comer um canário. Sabia o que ele pensava, que
Angelina era similar à Karen, compartilhável. Estava redondamente
enganado: a menina não era para mim, e muito menos para ele. A sua fama
de conquistador era igual à minha, se não pior.
— Sem chance disso acontecer — rosnei para ele, pegando na mão dela
e a levando para a sala do cara. — Não divido com ninguém, está me
ouvindo?
Daniel tinha boa aparência. Um metro e oitenta e oito, cabelos negros e
curtos, chegado à roupa social, terno e gravata. Não entendia como ele não
se sufocava naquilo. Nem morto eu usaria essas coisas.
Angelina estreitou os olhos com o que eu disse, contudo, não falou
nada. Assim que entramos, Daniel fechou a porta. A sua sala parecia uma
biblioteca, coberta de estantes recheadas de livros que eu não conhecia. Não
era muito fã de leitura. No entanto, não me arrependia de ter comprado a
editora: tudo para ver minha mulher feliz. “Minha mulher!”. Maldição,
estava enlouquecendo.
Ele se sentou em sua cadeira, de frente para nós, e apoiou as mãos
sobre a mesa de madeira avermelhada, com vários papéis em cima. Eu não
sabia o que fazer com isso depois de findado nosso acordo; não queria
pensar nisso agora.
Angelina, encantada, fitava os livros em cima da escrivaninha de
Daniel.
— Você tem First Folio, de Willian Shakespeare? — espantou-se.
Daniel olhou para o livro e depois para ela, com um sorriso.
— Já leu?
— Não, mas sei que há poucos dele. Vi que o cofundador da Microsoft,
Paul Allen, adquiriu um por seis milhões em 2001 — disse, um tanto
impressionada com o valor.
— Gostaria de ler? — Não parecia uma pergunta.
Angelina suspirou e ficou reta na cadeira.
— Quem não gostaria? — Sorriu para ele. — Mas seria impossível,
então me contento outros livros.
Ele assentiu.
— Este livro foi do meu pai, que o comprou há alguns anos, pois
colecionava coisas antigas. — Isso era verdade, a casa do senhor Michael
parecia mais um museu, não sabia o que a senhora Amélia faria com as
antiguidades dele, agora que o homem morreu. — Nunca li. Se você quiser
emprestado...
Ela engasgou.
— Oh, não! — falou, após se recuperar.
Daniel franziu o cenho.
— Por quê?
Angie suspirou.
— Mal nos conhecemos, e o livro vale uma fortuna... Se eu estragasse
ou se roubassem... — Estremeceu. — Obrigada por oferecer.
Daniel me encarou como se perguntasse: “O que você está fazendo com
essa garota doce e meiga?”. Era a questão que eu levantava a mim mesmo
desde que a reencontrei. Depois, meu amigo se virou para ela.
— Sei que não nos conhecemos, mas já que botou meu amigo aqui no
cabresto — seu tom no final era incrédulo —, pode pegar emprestado.
Revirei os olhos com o termo. Até parece que um dia ficaria com
somente uma mulher, ainda mais para sempre. Isso era o que eu me dizia a
todo o momento, um mantra maldito para não cair em tentação, tentação esta
que estava ao meu lado.
— Bom — continuou —, se você quiser, confio que nada acontecerá ao
livro.
Não precisava dizer que a obra também era minha, já que comprei a
editora com tudo dentro. Daria de presente a ela antes do nosso acordo
findar.
Angie estava um tanto chocada pela proposta do Daniel, aliás, eu
também. Só esperava que ele não estivesse bancando o galinha para cima
dela, por saber que a garota amava livros.
— Obrigada por sua gentileza, vou passar — respondeu, nervosa,
pigarreando. — Mudando de assunto, primeiro quero me desculpar.
Nós dois ficamos confusos.
— Pelo quê? — Daniel inquiriu.
— Por encontrar Ryan e eu nos beijando. — Enrubesceu. A cor em seu
rosto era linda.
Meu amigo estreitou os olhos para mim. Em seguida, fitou-a com a
expressão mais calma.
— Oh, não se preocupe, estou acostumado com o Ryan fazendo isso.
— Quer dizer que ele ficava beijando mulheres por aí, em público? —
questionou com uma pontada de ciúmes.
Daniel bufou.
— Beijar? Não, querida, ele mal jogava a camisinha fora e saía do
local onde estava. Por isso te dou os meus parabéns por domá-lo.
— Certo, vamos falar de trabalho ou do meu passado? — rosnei,
fuzilando o bastardo.
Ele sorriu e assentiu, sem se preocupar com meu tom ameaçador.
— Então, “Anjo” ou “Angelina”?
— Angelina Mary Stone. Só o Ryan me chama de Anjo, ignore-o.
Sorri torto.
— É o que você é, meu Anjo. — Eu me aproximei sem tirar os olhos
dos dela, que deu um tapinha no meu braço.
— Comporte-se — advertiu.
Daniel encarava nós dois, estupefato.
— Angelina, você fez alguma coisa antes? Cursos?
Ela puxou seu currículo da bolsa e entregou-o a ele. Daniel o pegou e o
leu por alguns minutos.
— Aqui diz que interrompeu a faculdade de Literatura quase no final,
por quê?
Angie expirou, segurando uma mecha de seu cabelo e enrolando-a nos
dedos. Notei que ela sempre fazia isso quando ficava nervosa.
— Meus pais morreram em um acidente de carro... Por isso não deu
para terminar. — Sua voz era um sussurro de dor. Os olhos umedeceram,
sem chegar a derramar lágrimas.
Eu pisquei, chocado, não fazia ideia de que isto também acontecera
com ela. A dor de perder meus próprios pais continuava presente, fincando
fundo. Deveria ser igual para Angie.
Com um olhar, pedi a Daniel que mudasse de assunto. Ele suspirou.
— Eu sinto muito.
Angelina respirou fundo.
— Está tudo bem — falou, mas não estava... Escutava o sofrimento em
sua voz.
— Você será a minha nova assistente pessoal. — Trocou de assunto;
nenhum de nós estava pronto para ver uma mulher em prantos, ainda que
certa por se sentir assim.
— E a Karen? — grunhiu o nome da secretária. Acho que ela já
suspeitava que tivemos algo no passado para reagir deste modo.
— Ela vai se casar...
— Casar? — soltei, descrente. Karen era uma mulher de balada e
diversão, costumava dizer que nunca se prenderia a alguém.
— Por que o interesse? — Angie me censurou.
Olhei-a de forma dúbia.
— Não há interesse algum! Só tenho olhos para você, Anjo — declarei
a verdade: parecia que todas as mulheres do mundo haviam sumido para
mim, existia apenas ela.
A garota sorriu com candura.
— Isso é bom, porque se reparar em outra, vai ficar sem os olhos —
ameaçou.
Não sabia se disse isso porque sentia ou pelo fato de Daniel estar
presente. Gostei, tirou a tristeza de suas belas íris.
— Hummm — murmurou Daniel, curioso.
Ela se recompôs e se virou para ele com cenho franzido.
— Sendo sua assistente, vou precisar sair da cidade? — perguntou,
preocupada.
— Sim, sempre que eu tiver de viajar a trabalho, você irá comigo.
Não gostei da ideia dela longe de mim e perto de Daniel. Estava prestes
a discordar, Angie não iria a lugar nenhum. Porém, ela falou antes.
— Não posso dormir fora de casa. — Notei que ela estava nervosa,
com medo de que esta notícia a fizesse perder o emprego. Era claro que isso
não atrapalharia em nada, eu estava mais do que feliz por ela não ir a
qualquer local distante.
— Você tem filhos? — sondou, intrigado.
Angelina respirou fundo.
— Não, apenas dois irmãos de quem tomo conta. Preciso ficar com
eles.
Arregalei os olhos, desconhecia esta parte de sua vida também. Por que
não perguntei nada à garota? Eu era uma besta mesmo.
Ele assentiu, um tanto chocado, assim como eu.
— Quantos anos eles têm?
— Shane tem oito, e Lira tem três, aliás, faz mês que vem. — Expirou,
como se a data fosse dolorosa de lembrar. Eu não entendia, não era para ser
um dia alegre, um aniversário?
— Três anos no próximo mês? — Ele buscou alguma coisa no currículo
dela. — Foi nesse período que você saiu de Columbia, não? Foi por eles
que deixou a universidade?
— Sim, estava na faculdade quando recebi a notícia do acidente...
Mamãe estava grávida de Lira, graças a Deus conseguiram salvá-la. — Riu
com amor. — A minha bonequinha linda. Depois, a assistente social entrou
em contato comigo, me dando opções. Primeira: permitir ao estado tomar
meus irmãos de mim ou dá-los para minha tia Alice. — Sacudiu a cabeça. —
Jamais deixaria isso acontecer. São tudo o que sobrou da minha família, sem
eles eu morreria. Segunda: conseguir um trabalho e tomar conta deles. Foi o
que fiz, e não me arrependo de nada.
Daniel pigarreou, comovido, tal qual eu. Como uma pessoa
maravilhosa, que se sacrificava pelos outros se esquecendo dela própria,
aparecera na minha vida? Um bastardo filho da puta que podia machucá-la.
Não... Não feriria a única capaz de encher meus dias de luz. Repetiria isso a
mim mesmo até enraizar a mensagem no meu cérebro.
— Certo, vamos fazer o seguinte. Você vai trabalhar como minha
assistente, mas não viajará comigo. — Colocou o currículo dela na mesa. —
Avisarei com antecedência quando isso tiver de acontecer, e você preparará
tudo para mim.
Ela assentiu.
— Sim, pode deixar. — Parecia quase eufórica. Eu também estava feliz
por vê-la radiante.
— Ok. — Levantou-se e pegou uma pasta em uma gaveta na estante. —
Darei um manuscrito a você, para ver como se sai.
— Tenho um manuscrito que eu mesma escrevi. Sempre ando com ele,
você pode lê-lo se quiser — falou meio tímida.
Daniel se impressionou.
— Você escreveu um livro?
— Sim. — Ela pegou uma pasta rosa na bolsa, com vários papéis
dentro. — Sei que não terminei a faculdade, mas aprendi bastante coisa pela
internet e pelos livros.
Ele deixou seus papéis de lado e segurou a pasta.
— “Dilacerados”? — Leu o título. — Pode fazer uma síntese?
Angie ficou nervosa, mexendo numa mecha de cabelo.
— Hummm. — Pigarreou. — Conta a história de Elizandra, uma garota
simples, mas com garras para lutar pelo que quer. Ela trabalha em uma
lanchonete para sustentar seus irmãos pequenos e sua mãe doente. Neste
lugar, conhece Nathan, moreno, alto, de olhos intensos, cor de ouro. Ele é
dono de uma empresa de sucesso, e devido à sua fama, é cercado de
mulheres, uma diferente a cada dia. Elizandra se apaixona por ele e o homem
a quebra, o que acontece sempre que uma garota simples passar a amar um
playboy. Não sou muito boa para resumir em voz alta, mas me dou bem no
papel, prometo.
Ficamos pasmos. Daniel folheou algumas páginas, arregalando os
olhos.
— Vejo que é um livro com um dominante e uma submissa. — Piscou.
— Você gosta deste tipo de história?
Ela corou.
— Sim, embora nunca me submeteria a isso.
Ergueu as sobrancelhas.
— Nunca fez sexo assim?
Ficou mais vermelha ainda e olhou para mim, buscando ajuda. Fuzilei
Daniel.
— Isso não é da sua conta — sibilei entre dentes. — Foque no trabalho.
O cara sorriu, inabalável.
— Desculpe, Angelina, apenas fiquei curioso pela história.
— Só porque escrevo a respeito disso, não quer dizer que eu faça tudo
— afirmou com seu sotaque sulista, que a tornava mais sexy, quase
impossível de resistir. Devia dar graças ao meu autocontrole; acho que logo
ele vazaria pelas frestas. — Este livro faz parte de uma trilogia. Não estou
pedindo para publicá-lo, e sim para olhá-lo e ver como eu me saio. Por
favor, me diga a verdade, não deixe que sua amizade com Ryan o influencie.
Do contrário, nunca vou aprender com os meus erros e corrigi-los.
Ele assentiu, ainda um tanto chocado.
— Passarei para nossa revisora, veremos como é a sua escrita — disse,
fechando a pasta. — Hoje, Karen resumirá todas as suas funções.
— Obrigada — respondeu animada. Percebi seus olhos estreitos com a
menção do nome da Karen. Reparara que ficou mais aliviada depois de
saber do casamento da secretária. Como se fosse querer alguma coisa com
ela... Só a minha doce namorada para pensar isso.
Daniel chamou a Karen e as duas saíram, nos deixando sozinhos.
— Onde você achou essa garota? — indagou, logo que deixaram a sala.
Suspirei.
— Ela faxinou meu apartamento. Mas já a tinha visto antes, porque
doou sangue para Sam.
— Oh, então ela é a mulher em que você estava pensando este mês
todo? — Sua voz soou aguda.
— Quem disse que eu estava pensando em uma mulher?
— Lembra da semana retrasada, quando ficamos com aquela garota na
Rave?
Eu sacudi a cabeça.
— Não me lembro, estava um pouco chapado.
— Você a chamou de Anjo enquanto a fodia. Não acredito que a mulher
de suas fantasias bateu à sua porta um mês depois que a conheceu no
hospital.
— Ironia, não? — trocei de mim mesmo.
— E você já foi oferecendo um emprego a ela? Ou melhor, comprando
uma empresa só para ela ter onde trabalhar sem correr o risco de ser
demitida ou assediada? — sondou de forma dúbia.
Estreitei os olhos.
— Se alguém daqui fizer algo assim, será mandado embora em dois
segundos, isso se eu não o matar antes — rosnei.
— Vejo porque gosta dela.
— Ela é diferente de todas que conheci, não liga para o meu dinheiro. É
boa, doce e meiga — falei um pouco da verdade.
— Posso ver isso. Ela é virgem? — Ele me avaliava. — Vocês já foram
para a cama? Porque pela forma que disse que não a dividiria e pelo rosto
vermelho da garota, parecia ter algo mais. Enxerguei que ali tem inocência.
— Ela não é dessas mulheres com quem você sai e logo vão abrindo as
pernas. A Anjo...
— Por que a chama de Anjo? — Parecia abismado com isso.
— Ela é como um anjo lindo, cercado de doçura e bondade, que se
sacrifica pelos outros, se esquecendo dela própria. Como você viu agora:
desistiu de tudo pelos seus irmãos. E não transamos ainda, estou esperando o
seu momento. — Não contei a verdade a ele; sabia que isso nunca
aconteceria.
— Então, ela...
— Sim — cortei.
Daniel suspirou, olhando a pasta de Angelina e seu manuscrito sobre a
mesa. Não imaginava que ela havia escrito um livro. Era uma garota vibrante
e muito talentosa, pelo que percebi.
— Olhe, Ryan, nós somos amigos há muito tempo. Já vi você pisar em
mulheres mais do que eu. Por favor, não a quebre.
Fitei-o, desconfiado.
— Por que você se preocupa? É igual a mim — retruquei.
— Eu sei, mas nunca me aproximei de garotas semelhantes a ela. Pense
bem, Angelina já sofreu demais, não acha?
Ele tinha razão, eu não podia e não faria isso com ela. Não a
machucaria, faria de tudo para impedir.
— Não a magoarei — jurei para mim mesmo.
— Fico feliz com isso — respondeu, mais calmo. — Agora vamos
tratar de negócios. — Pegou uma pasta preta na gaveta da mesa e passou-a
para mim. — Aqui está a escritura da editora. Eu soube que Franklin não
queria assinar.
Ergui as sobrancelhas.
— Soube? Ou ele veio reclamar?
— Veio aqui dizer para eu não vendê-la, porque você iria afundá-la em
um mês. — Revirou os olhos. — Respondi que não tinha muito poder para
lutar contra Lucky Donovan...
— Não sei por que ele queria a editora, se nem aparenta saber ler. O
velho safado gosta é de meninas novas. — Soltei com amargura ao pensar
nisso. — Assinarei o contrato, e inclua este livro na lista. — Apontei para a
obra que ela desejava.
— Você vai comprar um livro de seis milhões para uma mulher? —
inquiriu, ultrajado.
— Adquiri uma empresa que custa mais do que isso, por que não posso
comprar um livro junto? — retruquei, rubricando as páginas e assinando ao
final.
— Meu amigo, você foi fisgado — disse com uma risada. —
Finalmente domaram Ryan Donovan.
Não discordei, pois eu não sabia realmente o que estava acontecendo
comigo. De uma coisa tinha certeza: faria tudo para vê-la sorrindo. Sua
alegria iluminava a minha vida. Para ela eu daria o sol, as estrelas e todo o
universo, se me pertencessem.
Capítulo 5
Ciúmes

ANGELINA
Acordei hoje cedo na esperança de que o serviço que Ryan prometeu
fosse bom e respeitável, porque cá entre nós, ser faxineira podia ser
cansativo, mas era um trabalho digno, então esperava continuar assim. Não
faria algo desonroso, que envergonhasse meus irmãos no futuro.
Quando cheguei à Editora Luxem, pensei estar em um sonho lindo, do
qual a qualquer hora pudesse acordar, e o castelo viraria pó.
Ryan e eu entramos no prédio de paredes cor de creme, com um lustre
enorme no teto principal. Também havia fotos de autores recebendo prêmios.
Adorei. Ao chegarmos à recepção, no último andar, com vista para a cidade,
vi uma mulher loira de corpo perfeito e pernas longas. Seus cabelos estavam
presos em um coque.
Ela sorriu ao avistar Ryan. Não gostei do jeito com que olhou para ele,
como se já tivesse provado do fruto, ou coisa assim. Não duvidava nada
disso, afinal, ele era um mulherengo, e, com certeza, ficara com quase todas
as garotas da cidade.
O meu chefe era um cara moreno de olhos cor de mel, muito lindo,
ainda mais com seu meio sorriso ao me fitar de lado. Usava roupa social
Vanquish. Um terno como aquele custava uma fortuna. Pelo seu sorriso sexy,
era outro conquistador, à semelhança de Ryan.
Quando Ryan disse ao Daniel que eu não era para ser dividida,
compreendi que compartilhavam mulheres, deviam fazer isso quase sempre,
um ménage. Bem, já tinha visto Ryan com duas, mas dois homens e uma
garota? Interessante!
Isso se parecia muito com a história do livro que escrevi, Dilacerados,
mas eu não era Elizandra para me apaixonar por um playboy cheio da grana.
Se isso acontecesse, me quebraria aos pedaços, sem conseguir me reerguer.
Com Caim foram cinco anos até superá-lo. Com Ryan seria impossível
esquecer, passaria a eternidade o amando.
A minha entrevista com o dono e presidente da Luxem foi bem-
sucedida. Porém, quando chegou a parte de eu falar o porquê de não
conseguir terminar meus estudos, achei que não conseguiria contar da perda
dos meus pais. Deixei de lado a outra perda que tive, a da minha outra
metade. Bem, era assim que as pessoas definiam gêmeas, não? Afirmavam
serem uma só carne. Ângela era tudo na minha vida. Parei de pensar isso ou
sucumbiria ali, na frente do meu novo chefe e do Ryan. Isso não podia
acontecer. Coloquei a dor de lado e me concentrei no trabalho.
Depois que Karen me falou sobre o serviço, não me pareceu nada
difícil. Ela me mostrou onde ficava cada manuscrito que precisava ser visto,
e me fez fazer três capítulos para ver como me saía. Consegui concluir após
algumas horas.
— Você é boa — expôs, lendo o manuscrito corrigido.
— Obrigada — agradeci meio sem jeito.
— Desculpe falar — começou, hesitante —, mas eu nunca pensei que o
Ryan seria um dia fisgado por uma mulher. — Sorriu para mim.
Evitei um suspiro.
— Também custo acreditar — menti, porque isso nunca aconteceria
(não comigo, pelo menos).

Ryan me levava todos os dias para o trabalho na editora. Tentei


impedir; foi em vão. Ele me deixava e buscava. Estava preocupada porque o
que eu sentia por ele crescia a cada dia, impossível de controlar. Quando ele
chegava perto de mim, meu coração palpitava e meu estômago parecia ter
mil borboletas.
Ele me largou na Luxem sexta-feira e foi para sua empresa. Lá, se
cercava de mulheres, uma mais linda do que a outra. Quando olharia para
uma garota sem graça igual a mim? Nunca! Não era nada comparada às
modelos bem-vestidas com as quais convivia. Minhas roupas se resumiam a
jeans e camisetas folgadas, e meus cabelos eram arrumados em casa, e não
num salão de beleza.
Aprendi muita coisa ao longo da semana na minha função na editora, foi
bom para mim. Amava trabalhar lá. Na sexta-feira, Daniel disse para eu ir
embora mais cedo porque ele também estava saindo.
Não encontrei Ryan à minha espera. Pensei em pegar o ônibus, estava
acostumada, contudo, não podia: por namorar com ele, alguém poderia me
ver e filmar, e no dia seguinte eu apareceria na televisão e nas revistas. Não
queria isto, era melhor eu me manter no escuro. Sabia que não ficaria muito
tempo escondida das câmeras, entretanto, faria o que pudesse para
prolongar. Peguei meu celular e liguei para ele.
— Alô? — respondeu uma voz de mulher.
Um frio desceu por minha espinha ao imaginá-lo com outra. Será que já
tinha arranjado alguém?
— Ryan está? — sondei. “Talvez tenha discado o número errado por
engano”.
— Quem deseja? — inquiriu a garota, um tanto irritada.
— Angelina, queria falar com ele — sussurrei, tentando não
transparecer a dor na minha voz.
— Olhe aqui, Angelina, o Ryan não pode atender porque está em sua
sala com uma modelo linda, então você já era.
— O quê? — Quase gritei em frente à empresa. Ela desligou sem
responder.
Não acreditava que aquele cretino fez isso comigo. Ele não me queria
tanto como sua namorada? Como pôde sair por aí para transar com outras
mulheres? Quem saberia que fez uma maldita aposta, certo? E, além disso,
como eu descobriria que ele não estava cumprindo com sua parte? Coitada
dessa Sam, com certeza estava sendo enganada, tal qual eu.
— Vadia — rosnei para o celular.
— Algum problema? — indagou uma voz profunda atrás de mim.
Eu me virei e encontrei Daniel, que me mirava com um olhar
preocupado.
— Não — menti.
— Você parece com raiva — observou, não acreditando em mim.
Eu suspirei.
— Eu vim de carro com Ryan, mas agora ele está ocupado. — O ruído
que saiu da minha garganta era de asco e ódio.
Ele estreitou os olhos.
— Ryan disse isso para você? — Seu tom tinha uma pontada de fúria
direcionada ao amigo.
— Não, mas uma mulher do outro lado da linha sim — murmurei.
— Deve ser a Sandy, a secretária dele. Quando Ryan está em reunião,
ele deixa seu telefone com ela. — Fitou-me de lado. “Sei muito bem em que
tipo de reunião está”. — Se você quiser, te dou uma carona até sua casa.
Arregalei os olhos.
— Moro no Bronx, a mais de meia hora daqui — falei após me
recuperar. — Vou pegar um ônibus.
Daniel sacudiu a cabeça.
— Nem pensar, se você não tem carro para ir embora, vou levá-la. —
Seguiu até uma Ferrari preta estacionada ali perto, na vaga do presidente.
Desativou o alarme e abriu a porta para eu entrar. — Venha.
— Não posso incomodá-lo — sussurrei.
— Angelina, entre no carro. — Pareceu mais uma ordem. Na sequência,
emendou mais brando: — Por favor?
Assenti e me sentei em sua Ferrari chique com estofado preto. Ele
seguiu para o Bronx. Nós dois ficamos em silêncio inicialmente.
— Você mora no Bronx há muito tempo? — perguntou, querendo bater
papo.
— Há cinco anos, mais ou menos. Meus pais se mudaram para cá
depois... Quando eu tinha dezenove.
— Onde vivia antes da mudança?
— Nashville. — Lá ficou difícil para nós depois que Ângela morreu...
Parei neste pensamento ou desfaleceria.
Daniel riu e apertou um botão do MP3 embutido no carro, e o som de
Gone country, do Alan Jackson, encheu o veículo.
— Então você deve gostar de música country — disse ele. Não era
bem uma pergunta.
— Alan Jackson é o máximo — falei, tamborilando a mão na minha
perna no ritmo da música. — Meu sonho é um dia conhecê-lo.
— Levaria você, se Ryan não fosse me matar.
Meu telefone tocou. Peguei e vi o nome do bastardo piscando na tela.
Apertei “ignorar”.
— É ele, não? — sondou.
— Sim — respondi, ouvindo I'll Try, canção que parecia ter sido feita
para o Ryan e eu, embora ele não tivesse de lutar ou querer algo comigo,
pois nunca mudaria, mesmo caso se apaixonasse por mim.
— Não vai atender?
— Não agora. — Olhei para fora da janela, focando no fim de tarde e
tentando não pensar no que aquela mulher disse, nele em sua sala com uma
modelo linda. Talvez o cara voltaria atrás com a proposta, mas poderia ao
menos me avisar, correto?
O telefone do Daniel começou a tocar.
— Oi, Ryan. Sim, é Alan Jackson. Sabia que o sonho de Angelina é
conhecer ele?
Fitei-o com o cenho franzido. Não queria que dissesse isso para o
Ryan, afinal, não era da sua maldita conta, e nem de ninguém.
Ele suspirou.
— Eu nunca tocaria nela. — Revirou os olhos. — A não ser que ela
quisesse. — Bufou. — Estou brincando, cara. — Dirigiu-se a mim: — Ele
quer falar com você.
— Não quero conversar com ele agora — respondi, virando a cabeça.
Meus cabelos revoavam num coque solto, devido aos vidros abaixados.
— Ela não quer falar com você. — Respirou fundo e respondeu a uma
pergunta que não ouvi: — Não. Seja lá o que tenha feito, Angelina parece
estar com raiva. — Escutou e depois disse: — Não, ela não me contou nada.
Daniel desligou o telefone e ficou em silêncio por um segundo.
— Posso saber o que ele fez? — inquiriu, curioso.
— Não quero tocar no assunto — falei com um suspiro desalentado.
— Tudo bem. — Voltou ao silêncio. — Onde eu a deixo?
Dei o enderenço de minha casa e seguimos sem dialogar. Logo
chegamos em frente ao meu prédio, com paredes avermelhadas e desbotadas
devido ao tempo e à chuva. Este lugar era meu lar há cinco anos.
Daniel avaliava o edifício e as ruas nada seguras. Eu não andava à
noite sozinha, e quando fazia isso, Johnny ou Charles me acompanhavam.
— Sei que não é uma rua famosa de Manhattan, mas é o meu lar. —
Observava seu rosto rígido.
— Com o salário que ganhará na editora, você pode sair daqui quando
quiser.
— Não quero — declarei. — Tenho amigos neste lugar.
Sorriu, decidindo não discutir comigo.
— Certo. Até amanhã. — Aproximou-se como se fosse me beijar.
Eu me afastei.
— O que está fazendo?
Ele ainda sorria.
— Despedindo-me de você com um beijo no rosto — respondeu, sem
nenhuma vergonha.
— Sei que você e o Ryan compartilhavam mulheres, mas isto não é
comigo. — Apertei a minha bolsa no colo. — A única coisa que podemos
ser é amigos, e sem beijos.
Daniel piscou.
— Como sabe sobre eu e Ryan?
Ri, amarga.
— A partir do comentário dele de não me dividir — bufei. — Jamais
faria algo assim.
— Eu sei, além disso, nunca a desrespeitaria, e não só pelo Ryan, que
parece sentir algo por você. — Soava sincero. — Desculpe-me se dei a
entender outra coisa.
— Tudo bem, até amanhã então. — Saí de sua Ferrari e entrei no
prédio, encontrando Johnny na escada. Ele olhava de mim para o veículo que
virava a esquina.
— Sai com um bofe lindo e chega com outro mais bonito ainda? —
observou quando passei por ele para subir a escada e ir para o meu
apartamento no segundo andar.
— Não deixe Charles ouvir isso. — Sorri. — Como estão Lira e
Shane? Se comportaram bem?
Ao sair hoje pela manhã, deixei meus bebês na escola, e Johnny os
pegou para mim, pois não sabia em que horário voltaria para casa do
serviço, porque Daniel disse ontem que íamos passar da hora. Contudo,
houve um imprevisto, e ele saiu mais cedo, me liberando também.
— Perfeitamente bem — respondeu. — Shane está um craque em Xbox.
Fiquei feliz com meu irmãozinho estando bem. Tudo que eu queria era
que aquele exame estivesse errado, assim ele não passaria por isso, afinal,
eu também tinha um problema no coração e nunca precisei fazer nenhuma
cirurgia, só vivia à base de remédios diariamente. Felizmente, agora eu
disporia de dinheiro para o tratamento dele.
Peguei Shane e Lira e fui para o meu apartamento. Convidei Johnny e
Charles para irem jantar comigo e comemorar meu novo emprego na Luxem.
Era para ter celebrado no dia em que comecei a trabalhar, mas foi corrido,
então decidi adiar para hoje, já que saí mais cedo.
Charles chegou por volta das cinco. Sua beleza masculina incendiou a
sala. Vestia jeans rasgado e uma camisa xadrez enrolada nos cotovelos.
Gato! Pena jogar no outro time. Azar das mulheres, e sorte do Johnny.
Fui tomar banho enquanto deixei-os na sala. Vesti um shortinho curto
que usava em casa e que mal tapava minha bunda; não me preocupei, eles
não sentiriam nada ao me ver assim. Coloquei um top que mostrava toda a
minha barriga e meu piercing no umbigo. Esta era a minha roupa de dormir,
estava preparada para a noite.
Ouvi a campainha tocar, imaginei que fosse o Johnny com a pizza de
pepperoni e o champanhe, que eu tanto amava, para comemorarmos. Mesmo
não podendo beber por causa dos remédios, às vezes eu tomava algo — não
muito, claro. Também bebia se estava sofrendo, principalmente no dia do
meu aniversário e da Ângela... Vinte de outubro, uma data que me sucumbia;
ficar alcoolizada era a única forma de esquecer a dor nesse dia, que era para
ser tão especial. Fazia isso em casa, no meu quarto, olhando sua foto, seu
sorriso jovial mais deslumbrante que o sol. Seis anos sem minha metade. A
angústia logo voltava, tinha de conviver com ela. Meus irmãos e amigos me
mantinham sã nesta terra. Se não fossem eles, não sabia o que seria de mim.
Talvez um dia essas feridas se curassem.
Terminei de secar meus cabelos negros ondulados e os deixei cair em
cascatas nas costas, indo para a sala. Lá, me deparei com Ryan de cara
fechada, sombrio ao ver as roupas que eu estava vestindo na presença de
Charles. Lembrei-me que ficou furioso com o Johnny por querer me ajudar e
me ensinar a beijar, tudo por não saber da sua sexualidade.
Cruzei os braços diante do peito.
— O que está fazendo aqui? — rosnei. — Achei que tivesse mudado de
ideia.
Seus olhos se arregalaram.
— Quem disse isso? — indagou com a voz fria.
— A mulher que estava com seu telefone. Ela falou que você estava
muito... ocupado — expliquei, controlando a raiva.
— Não acredito que aquela va...
Cortei-o.
— É melhor vigiar o que fala — alertei e indiquei o Shane, que estava
de testa franzida, olhando de mim para o Ryan. — Se comportaram bem?
— Sim — respondeu Shane, ainda fuzilando Ryan. — Quem é ele? E
por que está gritando com você?
Eu suspirei.
— Ryan é meu namorado... Ou era — sussurrei, sem ter certeza disso.
Antes que alguém falasse, a campainha tocou.
— Shane, vai lá ver se é o Johnny. Se for, atenda; se não for, me chame.
— Sim — respondeu, correndo na direção da porta com Lira em seu
encalço.
Ryan pegou meu braço.
— O que esse cara está fazendo aqui? E com você vestida assim? —
sibilou.
Tentei me esquivar de seu toque, contudo, ele era forte demais, e o
contato me deixava mole.
— Solte meu braço — urrei.
— É melhor largar ela — ameaçou Charles, se pondo de pé,
prenunciando o início de um problema grande.
— Ou fará o quê? — grunhiu, se lançando para meu amigo.
Eu me pus na frente de Charles e coloquei as mãos no peito de Ryan,
empurrando-o para trás.
— O que está fazendo? Ficou maluco? — disse, sem alterar a voz para
não assustar Lira e Shane. Peguei seu braço e puxei-o para o meu quarto,
fechando a porta e encarando sua face lívida.
— Eu, maluco? A minha namorada pega carona com seu chefe, não
atende as minhas ligações, agora chego aqui e vejo um homem na sala, com
você praticamente nua.
Fechei a cara.
— Não estou nua — retruquei. — Aquela mulher contou que você
estava em seu escritório transando com uma modelo.
Ele arregalou os olhos de fúria.
— Vadia — rosnou de novo, mirando-me com os olhos estreitos. —
Ouvindo isso, sem saber se era verdade, você já foi ficando com outro cara?
— Eu não saí com ninguém — rebati. — Além disso, por que você se
importa? Afinal, este namoro é só de fachada e nada mais.
— Pelo mesmo motivo que você não gostou de pensar que eu estava
transando por aí. — Seu rosto era grave ao se aproximar de mim.
Eu me afastei com a intensidade do seu olhar predatório. Minha perna
bateu na cama.
— Ryan... — alertei, mas era tarde demais. Sua boca atingiu a minha,
devorando com fome e com raiva. Caí de costas no colchão, tendo ele
pairando em cima de mim, beijando-me sedento. Abriu minhas pernas com
seu joelho e se encaixou ali, esfregando-se em minha pélvis. Estava tão
pronto que eu podia sentir a sua necessidade, similar à minha. O desejo
latejava em meu centro, doido para ser saciado.
Minhas mãos passeavam em suas costas e em seus cabelos, apertando
mais seu rosto contra o meu. Seus beijos eram famintos, como se estivesse
há vários dias sem se alimentar, e sua necessidade era urgente. Gemi em sua
boca, e este som só o fez ser mais veloz, degustando cada canto de mim.
— Ryan... — sussurrei em seus lábios, buscando alguma coerência. Era
difícil, seu toque incendiava todo o meu corpo.
— Hummm. — Ele tirou os lábios dos meus e encostou a sua testa na
minha.
Fitei suas íris, tão cálidas, uma fornalha acesa.
— Não suporto a ideia de alguém tocando em você, nesta pele linda de
pêssego. — Ele alisava meu rosto com as pontas dos dedos longos.
— Ninguém me tocou.
— O cara na sala — grunhiu.
— Ele é namorado do Johnny — esclareci com dificuldade de respirar.
Ryan levantou o rosto.
— Os dois estão realmente juntos? — murmurou, engasgado.
— Sim. E você quase bateu nele — acusei.
Seu semblante agora era triste
— Sinto muito. — Escondeu o seu rosto no meu pescoço e inalou meu
cheiro. “Ainda bem que acabei de tomar banho”. — Este é um sentimento
novo para mim, não estou sabendo lidar com isso.
Eu suspirei.
— Eu sei, tudo também é novo para mim — declarei. — Nos
conhecemos há praticamente uma semana e não suporto a ideia de você
tocando em outra mulher.
— Não toquei em ninguém, juro, Anjo. — Sua voz era sincera.
— O que vamos fazer, Ryan? Não posso me apaixonar por alguém que
tem o poder de me destruir — articulei, sôfrega.
Ele se afastou para fitar meu rosto. Seus olhos estavam injetados.
— Você tem esse mesmo poder sobre mim. — Sacudiu a cabeça com
dor visível em seus olhos. — Eu não posso...
Ele nunca daria o braço a torcer para o que sentimos um pelo outro. Eu
não imploraria, a despeito de conhecer a reciprocidade de nossas emoções.
Talvez não fosse mulher suficiente para ele...
— Entendo. Não se preocupe — murmurei, escondendo minha angústia.
— Acho melhor irmos para a sala.
Ryan aquiesceu, saindo de cima de mim. Arrumei meus cabelos e
roupas e passei por ele, que pegou meu braço.
— Você está bem com isso? — sondou.
Ele era louco? Como perguntava se eu estava bem, quando não dava
uma chance para o nosso relacionamento? Ignorei a fisgada em meu coração
e forcei um sorriso.
— Sim, não se preocupe comigo. Sei que isso é só uma aposta — falei
e saí dali às pressas, antes que ele verbalizasse algo.
Cheguei à sala e me deparei com Charles e Johnny sentados no sofá de
dois lugares, e Shane e Lira no outro. Os quatro já comiam pizza.
— Vejo que não nos esperaram — acusei, me colocando ao lado de
Shane.
— Não achei que vocês dois sairiam daquele quarto tão cedo. —
Johnny olhou para o Ryan.
Bufei, ignorando seu comentário provocativo.
— Lira, querida, sente no meu colo para o Ryan ficar aí, ok? — Estendi
os braços para ela.
Minha bonequinha vestia um pijama da Barbie. Fez uma careta e olhou
para o Ryan.
— Não posso sentar no seu colo? — perguntou a ele, animada.
— Lira...
Ryan me cortou.
— Claro, princesa. — Ele caminhou até ela.
Lira ficou de pé no sofá e bateu palmas, toda animada.
— Eba! — cantarolou, pulando nos seus braços. — Quando eu crescer,
vou me casar com você.
Ryan se sentou e a botou em seu colo.
— Quando você crescer, ele estará velho, querida — eu disse.
— Velho, mas ainda lindo — garantiu o cara, sorrindo de modo
devasso para mim.
Revirei os olhos.
— Vejo que você tem um ego e tanto — Charles afirmou, fuzilando
Ryan.
— Lamento ter perdido a cabeça agora há pouco.
Eu arregalei os olhos. O inferno devia ter congelado para ele pedir
desculpas a outra pessoa. Charles piscou, atônito. Recuperado, sorriu
amigavelmente.
— Tudo certo, cara, mas se magoar a nossa garota, teremos contas a
acertar.
— Eu também acertarei as suas bolas! — Shane anunciou.
— Shane... — repreendi-o.
Ryan riu, e todos olharam para ele.
— Desculpe. — Tentou se recompor, fitando Shane ao seu lado. —
Você parece o Shaw.
Meu irmão franziu a testa.
— Quem é Shaw?
— É o filho adotivo do meu irmão, Lucky, e sua esposa, Sam. Ele
também ameaçou acertar as... — Parou, parecendo lembrar que Lira estava
ali, e corrigiu: — Acertar o Lucky, caso ele viesse machucar a Sam.
— Quando vai me apresentar a ele? — Seu tom agora era curioso e
empolgado.
— Logo, assim que Lucky e Sam chegarem de férias, estão em Vail...
— Vail, no Colorado? Nossa! Quero ir lá um dia. Soube que é bom para
esquiar. — Shane soou animado.
— Shane, querido, para esquiar em um lugar daquele você precisa
aprender muito, e isso só quando for grande — alertei.
— Posso levar vocês lá algum dia — convidou Ryan.
Estreitei meus olhos.
— Não faça promessas que não vai cumprir — deixei o alerta.
— Quem disse que não posso cumprir? — rebateu com doçura.
— Você é o máximo — gritou Shane, contente.
— Se você vai levar ele para viajar, eu vou querer uma Barbie — falou
Lira com a voz suave.
Eu fechei a cara.
— Lira, querida, você tem mais de cem Barbies. — Olhei para os dois.
— Parem de pedir coisas ao Ryan.
Ela cruzou os bracinhos de um jeito teimoso.
— Quero uma Barbie Princesa.
— Chega. — Encarei-os. — Não quero que peçam nada ao Ryan, estão
me ouvindo? Ele não é nenhum Papai Noel que anda distribuindo brinquedos
por aí.
— Quem disse que não sou? — retrucou.
— Não comece, Ryan — rosnei, virando-me para Shane e Lira. —
Vocês já comeram?
— Sim — responderam em uníssono. Shane prosseguiu: — Angie,
agora que arrumou um serviço onde ganha mais do que nos outros, você vai
comprar o meu Xbox?
— Depois de passar a minha experiência de três meses, compro para
você.
Ouvi Ryan dar um suspiro frustrado que ignorei completamente.
— Três meses? Vai demorar tanto tempo! — reclamou.
— Shane, venha cá. — Peguei suas mãos e girei de frente para ele. —
Sei que ainda é criança, mas você precisa entender que não podemos ter tudo
o que desejamos. Às vezes, é necessário esperar. — Toquei seu rostinho
triste por ver a dor nos meus olhos. — Queria poder fazer mais...
Ele me abraçou forte.
— Desculpe, Angie, não quis te magoar — choramingou. — Saiba que
eu vou te amar para sempre; de noite, enquanto as estrelas iluminam a
escuridão, e de dia, quando o sol brilhar. Você é tudo, Angie.
Acho que aprendeu falar assim por causa dos livros. Ele adorava ler.
Será que se tornaria um escritor? Só de pensar no futuro, minha garganta se
fechava...
— Oh, meu amorzinho. — Beijei seus cabelos com cheiro de shampoo
de morango e chorei, não pude evitar, o medo veio com força total ao
imaginar o que ele passaria daqui a três semanas.
— Não fique assim — pediu com dor. — Desculpe... — Sua voz linda
falhou.
— Oh, querido. — Afastei-me e fitei-o com meus olhos molhados. —
Não é por isso que estou chorando, meu amorzinho.
Ryan, Charles e Johnny não desviavam o olhar de nós. Johnny e Charles
sabiam do meu problema; Ryan, no entanto, estava confuso e preocupado
comigo, a julgar por sua expressão.
Shane tinha lágrimas no rosto.
— Então por que está chorando? — sussurrou.
Limpei as gotas e forcei um sorriso.
— Não ligue para mim, meu amor, apenas estou feliz por ter você e Lira
em minha vida. — Beijei seu rosto molhado. — Agora está na hora de
escovar os dentes e ir para a cama.
Ele assentiu e sorriu.
— Eu te amo demais, Angie. Mais do que o céu, mais do que o mar e o
universo inteiro. — Abriu seus braços, dando ênfase às palavras.
Meu coração sempre se derretia com suas declarações. Shane
costumava falar isso antes de dormir; nunca me cansaria de ouvir.
— Eu também te amo, querido, de montão — jurei e olhei para Lira,
que dormia nos braços do Ryan.
Levantei-me e estendi os braços para pegá-la.
— Me dê ela — pedi.
O cara sacudiu a cabeça e se ergueu com Lira no colo.
— Eu a levo para cama, me diga onde fica.
Pisquei, um tanto estupefata.
— Na primeira porta, em frente ao meu quarto — respondi, atônita.
— Eu te mostro — falou Shane, saindo com Ryan para o dormitório
deles.
Fiquei no meio da sala com meus olhos ainda úmidos.
— Ei, vai dar tudo certo — garantiu Charles, vindo me abraçar. —
Estaremos com você, Angelina.
— Só espero mesmo que seja gay, porque se não for, vou quebrar todos
os seus dedos e braços. — Ouvi a voz sombria do Ryan.
Afastei-me do Charles e focalizei um Ryan impassível. Notei que ele
segurava duas bonecas Barbie de Lira nas mãos. Charles sorriu para ele,
nada afetado com sua ameaça. Os dois eram homens fortes, porém, o Ryan
era mais.
— Não se preocupe, sou fiel e amo o Johnny. Sem chance de isso
acontecer, principalmente com uma mulher. — Meu amigo me olhou,
sorrindo. — Mesmo que seja a gostosa da Angie.
— Então vamos deixar algo claro aqui — começou Ryan de modo
tenebroso. — Não quero ver nenhum dos dois pegando na bunda dela ou a
beijando. Se isso acontecer, aí sim teremos um problema.
— Ryan! — reclamei. Ele não tinha esse direito, éramos namorados de
fachada (e, se fosse de verdade, ele continuaria não podendo interferir na
minha vida, ameaçando meus amigos). Ainda mais depois de dizer que não
queria ter nenhum sentimento por mim.
Charles e Johnny se entreolharam.
— Certo — Charles assentiu com a voz grossa.
— Não vamos fazer nada que o deixe com ciúmes — falou Johnny com
um sorriso.
Ryan fez uma careta. Ali, percebi que para ele deveria ser difícil sentir
ciúmes de alguém com quem não queria estar, por isso lutava contra esse
sentimento com unhas e dentes.
Johnny e Charles foram embora para seu apartamento. Quando eles se
mudaram para o prédio, há um bom tempo atrás, achei que não daríamos
certo; estava errada. Havíamos nos tornado uma bela família.
— O que você tem? — perguntou assim que os dois saíram, avaliando
minha face úmida.
— Nada — respondi, pegando a caixa de pizza quase vazia, levando-a
para a cozinha e a colocando sobre a mesa. Com tudo o que houve, esqueci
de comer.
Limpei a sala e me sentei à mesa da copa. Pus uma fatia no prato, com
bastante queijo, e tomei um gole do champanhe.
Ele me seguiu, arrastando a cadeira e sentando de frente para mim.
— O que foi? Não vai comer? — Ryan também não se alimentara. —
Sei que não é nenhuma refeição que vale mais que o meu salário, mas é
gostosa.
Estreitou os olhos com o meu tom de crítica.
— Eu não como pizza — respondeu de modo frio.
Pisquei com minha pizza quase chegando à boca e arregalei os olhos
para ele.
— Quem neste mundo não come pizza de pepperoni? — Meu tom era
ultrajado.
Ele sorriu, maroto.
— Eu.
Ignorei seu sorriso sexy, que me deixava sem fôlego e com as pernas
bambas. Lá fora começou a cair uma forte chuva, tanto que achei que logo
haveria um dilúvio.
— Você já jantou? — perguntei.
Ele negou com a cabeça.
— Não, depois que saí da minha empresa não pensava em outra coisa a
não ser encontrar você para saber o que se passava. — Ele trincou os dentes.
— Fiquei furioso ao descobrir que estava vindo de carona com Daniel. Sabe
que espécie de homem ele é? Faz de tudo para entrar nas calças das
mulheres.
— E você é igual a ele. Devo ficar longe também? — inquiri, tomando
um pouco da minha bebida.
Desconsiderou o questionamento.
— Quando tiver um problema, me ligue que eu vou até você...
Cortei com ceticismo.
— Para quê? Para alguma mulher do outro lado da linha me dizer que
você está transando em algum lugar da sua empresa?
— Eu nunca transei em minha empresa, e não seria agora que faria isto
— rosnou. — Minha casa e meu trabalho são valiosos para mim, jamais
sujaria eles assim.
— Por isso tem o prostíbulo? — Deixei a comida de lado, perdi a
fome.
Ele arqueou as sobrancelhas.
— Prostíbulo?
— O apartamento ao lado do seu. — Guardei a pizza na geladeira e
tomei o resto do champanhe. Sempre bebia chá verde, mas hoje teve pizza,
então pedia algo a mais.
Ele riu.
— Agora o meu apartamento é um prostíbulo? — zombou.
Dei de ombros.
— Abatedouro, prostíbulo e outros nomes que surgirem para o que se
faz lá. — Meu tom era seco.
— Não faço mais nada lá — respondeu, me olhando de esguelha.
— Mas fará em algumas semanas. — Minha voz saiu fria ao pensar
nisso. Logo ele estaria livre para ficar com mais mulheres.
Ryan não disse nada, isto só provava que eu estava certa. Doeu...
— Já que não come pizza, o que você quer? Não tenho nada de rico. —
Abri a minha geladeira. — Pra beber, tenho refrigerante, suco e chá. E
sobrou champanhe, se quiser.
— Por que insiste tanto em falar sobre riqueza e pobreza?
— Por que é isso que somos, Ryan. — Eu me virei para ele. — Você é
rico, cercado do bom e do melhor. Acho que nunca lavou uma colher na
vida, não é?
Ele fez uma careta e não respondeu.
— Trabalho desde que me conheço por gente — continuei. — Amo
pizza com bastante queijo, cachorro quente e lasanha. — Passei a mão no
meu piercing. Ele acompanhou o meu gesto, desejoso. — Adoro uma carne
assada.
— Você come de tudo e ainda tem esse corpo? — Seu olhar vagava
pela minha silhueta, como se estivesse tirando as minhas medidas. Talvez
fossem os remédios que eu tomava que possibilitavam tal “façanha”. —
Deus a abençoe — disse, malicioso. — Ele é perfeito.
Revirei os olhos.
— Você quer comer ou não? Está chovendo muito, não poderá dirigir
assim — mudei de assunto.
— É claro que posso — retrucou, focalizando o temporal do lado de
fora da janela.
— Acontecem muitos acidentes devido a esse tempo ruim. — Eu me
encolhi para não pensar nisso, ou me lembraria das perdas que tive.
Notei que Ryan também ficou mal, virando rapidamente para a janela,
de modo a esconder sua expressão. Ao que parecia, acidentes mexiam tanto
com ele quanto comigo. Queria perguntar o que houve para deixá-lo deste
modo. Céus, era uma incompetente mesmo, pesquisei sobre sua vida
amorosa — se é que se podia chamar aquilo de “amorosa” —, contudo, não
procurei acerca de sua família. Sabia que ele tinha uma irmã e um irmão,
mas só. Talvez algo ocorrera com seus pais. Desejava descobrir, entretanto,
me controlei, afinal, eu não gostava de ficar falando sobre os meus pais.
— É verdade — concordou em um tom assombrado.
— Você pode dormir no sofá-cama. Não é como sua California king,
mas bastará. — Lavei os pratos e coloquei-os para escorrer, não tinha uma
secadora. Não desperdiçaria dinheiro com isso, se dispunha de duas mãos.
Estava calado, fitando a rua.
— Você vai querer comer? — insisti. — Tenho lasanha ou posso fazer
sanduíches.
Ele desviou da janela e se virou para mim.
— Sanduíche, por favor, mas não como nada que tenha queijo — pediu
com a voz rouca.
— Nada que tenha queijo? Nossa! É o que mais amo — falei e fui pegar
os ingredientes para fazer seu sanduíche: tomate, alface, maionese e bacon.
— O que quer beber? Refrigerante? Chá, leite ou champanhe?
— Leite serve.
Entreguei a ele.
— Vou arrumar o sofá enquanto você come.
Busquei as cobertas no armário de roupas, bem como um travesseiro, e
coloquei-os no sofá-cama. Em seguida, peguei as duas bonecas que estavam
em suas mãos mais cedo, agora atiradas no sofá de dois lugares. Uma Barbie
usava um vestido preto justo tomara que caia; nas costas, havia um detalhe
na forma de círculo onde se via sua “pele” nua; no busto, a roupa era presa
por dois grampos, com um “S” de renda. Não usaria este tipo de vestido,
mas tinha gente que sim.
A outra Barbie tinha um vestido branco, longo, com uma manga só e um
bordado floral. Na região da barriga, era rendado e mostrava o umbigo.
Descia até os pés de forma elegante.
Eu desenhei esses modelos e muitos outros para as bonecas de Lira.
— São lindos — declarou Ryan, entrando na sala. — Nunca vi essas
roupas em bonecas antes, onde as conseguiu?
Olhei para cima e o vi de braços cruzados, as íris fixas em mim.
— Ah, eu que fiz — respondi a verdade.
Ele piscou, atônito.
— Todos aqueles outros também? — Apontou para o quarto de Lira e
Shane.
— Sim, quando não escrevo, ou estou resenhando, eu desenho. Lira
gosta de colecionar Barbies e de mudar suas roupas direto, então decidi
improvisar vestidos a partir dos modelos que criei.
— Posso ver os desenhos deles? — indagou.
Concordei. Fui até o meu quarto e peguei um caderno, que dei a ele.
— Aqui.
Ryan olhou cada vestido que estava sobre o papel branco. Ficou
atônito. Havia quase quinhentos ali, afinal, desenhava desde os quatorze
anos.
— Já pensou em ser estilista? — sondou.
Neguei com a cabeça.
— Desenho por desenhar, não é uma paixão como escrever livros de
romance — sussurrei.
— Sabia que vestidos como estes podem valer uma fortuna? — Indicou
o caderno.
Sacudi a cabeça.
— Quem pagaria por isso? — repliquei.
— Sou dono de uma agência de moda, Anjo, acredite em mim.
— Quer dizer que você se interessou?
— Com certeza. — Continuava a inspecionar os desenhos.
— Então fique com eles — pedi, pensando no quanto eu devia a ele por
ter um emprego, e quem sabe logo um livro lançado.
Ele piscou, aturdido.
— O quê?
— Pode ficar com os desenhos — anunciei de novo, apontando para o
caderno grosso em suas mãos.
— Isso vale muito dinheiro.
— Bem, você já me pagou vinte e cinco mil para eu ser sua namorada, e
arrumou um serviço para mim. — Passei os dedos nos cabelos. — Pegue
esses desenhos e considere-os pagos, o que acha?
— Então o nosso acordo estaria cancelado... — Sua voz falhou.
— Vou cumprir a minha promessa porque quero, e não por dinheiro.
Acho que isso ajudaria a não me sentir tão suja.
Ele suspirou.
— Não fizemos nada que justifique você se sentir assim.
— Ryan, nós nos beijamos, e às vezes não conseguimos nos controlar,
como aconteceu no quarto há pouco. — Sentei-me no sofá-cama. — Por
favor, aceite.
Ele ficou em silêncio por um segundo e se encaminhou ao meu lado, na
sua cama improvisada.
— Tudo bem, mas vou pagar o que realmente valem. — Estava prestes
a discordar; ele falou antes. — É o justo.
Ryan colocou o caderno na mesinha perto do sofá e depois tirou a
jaqueta e camiseta. Mirei seus gominhos sexy. Seu corpo era perfeito, cada
curva musculosa onde eu adoraria passar as mãos.
— Está vendo algo de que gosta aí embaixo? Meus olhos ficam aqui em
cima — falou num tom matreiro.
Bufei, desviando o rosto.
— É melhor dormirmos, já é tarde. — Eu me levantei, contudo, ele
segurou meu braço.
— Fique comigo por enquanto — pediu. — Prometo me comportar.
Apaguei a luz da sala e me deitei ao lado dele. Eu sair dali seria a
mesma coisa que um dependente químico resistir a uma droga, ou um bebum
ao álcool.
Ryan pegou a minha mão e ficamos de barriga para cima, encarando o
teto. Tentei não pensar no que o seu toque fazia comigo. A luz da cozinha
estava acesa, trazendo um pouco de claridade para a sala.
— Posso fazer uma pergunta? — indagou depois de um grande silêncio.
— Claro — respondi, hesitante, sem saber o que ele queria.
— Por que chorou ao abraçar o Shane? Não parecia ser por ele ter me
pedido para levá-lo a Vail, e nem pelo Xbox — chutou. — O que era?
Vacilei.
— Anjo — disse ele —, você nunca quer me contar nada. Será que vou
sempre descobrir pela boca dos outros?
Decidi continuar sem revelar nada sobre Shane, não estava pronta para
isso. Então resolvi contar um pouco sobre mim.
— Bom, eu amo música country, adoraria conhecer Alan Jackson. É
algo em que estou trabalhando, verei se consigo ir a um show dele em Nova
Jersey, no próximo ano.
— Eu a levo — disse como uma declaração.
Olhei para ele e dei um sorriso triste.
— Ryan, no ano que vem nós dois nem estaremos nos falando, o acordo
acaba antes...
— Por que me sinto tão sufocado sempre que a ouço dizer que não
vamos mais nos ver? — Levantou a mão e tocou o meu rosto,
esquadrinhando-o como se tentasse memorizá-lo.
— Isso também acontece comigo — murmurei. — Estou com medo...
O homem buscava respostas em minha expressão.
— Medo de quê?
— Medo de me apaixonar por você. — Ri, sem humor. — Céus, só de
imaginar, eu me sinto vazia e dormente ao mesmo tempo. Isso é algo que não
pode acontecer, entende? Você me esmagaria, me dilaceraria.
Ele me puxou para seus braços quentes e fortes. Expirei, fechando as
pálpebras, sentindo seu calor aquecer o meu corpo.
— Isso não vai acontecer. — Nem Ryan parecia acreditar em suas
palavras.
— Já está acontecendo — sussurrei, encolhida. — Olhe para nós, mal
conseguimos ficar longe um do outro. Sei que você sente o mesmo. Talvez
nós devêssemos tentar...
Ele saiu rápido dos meus braços, como se ali tivesse fogo, aterrorizado.
— Não pode acontecer — insistiu, taciturno. — Não devo me
apaixonar por você... nunca. — Pegou sua jaqueta e o caderno de desenhos.
— Isso acaba agora.
— Ryan... — Eu estava prestes a chorar, mas não queria na frente dele,
então me segurei.
— Não diga nada, por favor, não quero quebrá-la... — Sua voz era um
sussurro de dor. — Acabarei fazendo isso se continuarmos... — Saiu, me
deixando sem palavras.
Peguei a camisa que, na pressa, deixou para trás, e caí de joelhos com
ela nos braços, soluçando, dilacerada por uma angústia que nunca pensei que
sentiria de novo. O mesmo aconteceu com Caim, quando me apaixonei por
ele há seis anos. Para piorar, o que sentia pelo Ryan era muito, muito maior.
Capítulo 6
O passado

ANGELINA
O dia seguinte foi difícil, após Ryan ter terminado comigo, deixando
tudo que tivemos e vivemos para trás como se não fosse nada. Já deveria
estar nos braços de outra mulher. E eu permanecia ali, aos pedaços,
destroçada por causa dele. Fui idiota por ter aceitado ser sua namorada.
Quando um homem daqueles olharia para mim? Era estúpida por cogitar
isso.
Deixei Lira e Shane na escola na segunda-feira e cheguei mais cedo ao
trabalho. Depois do serviço, planejava devolver o carro e ir de ônibus para
casa. Sempre andei assim e nunca morri, por que haveria de mudar agora?
Na Luxem, Daniel me perguntou o que acontecera comigo, em razão da
minha expressão tão triste. Imaginei que eu devia estar horrível, nem a
maquiagem encobriu as olheiras fundas. Eu apenas disse que não dormi bem
à noite. Ele não acreditou e pegou seu telefone. Sabia que ele ligaria para o
Ryan. Deixei-o e fui trabalhar, assim a tarde passaria, e esperava inutilmente
que a dor também.
Karen não apareceu hoje, o que foi bom, não estava querendo ver
nenhuma mulher que já foi dele — tolice minha, já que ficou com
praticamente todas as garotas de Nova York, talvez dos Estados Unidos.
Assim que deu a minha hora, saí antes do Daniel me ver, porque tinha
certeza de que ele me encheria de perguntas que eu não queria responder.
Ao estacionar o Volvo do Ryan em frente ao prédio dele, prestes a sair
do carro, o vi entrando no prédio com uma loira de cabelos longos. Linda!
Ela usava um vestido vermelho bem apertado em suas costas, mostrando
suas curvas incríveis e deslumbrantes. Foi como um soco no estômago, bem
acertado.
Os dois conversavam. Ele vestia calça jeans e jaqueta preta, e estava
de costas para mim, portanto não me viu. Entraram no prédio.
Coloquei a mão direita sobre o meu coração dolorido, decidida a não
chorar: tinha de devolver seu carro e dar o fora antes que ele saísse de novo.
Idiotice, pois o maldito acabara de subir para levá-la ao seu apartamento de
foda.
Olhei para dentro, através dos vidros das janelas, para garantir que
sumiram de vista, e deixei o carro. Enxerguei o manobrista do hotel, um cara
alto e moreno. Ele sorriu quando me aproximei.
— Olá. — Peguei as chaves do Volvo e entreguei-as em sua mão.
— Qual é o seu carro, moça? — perguntou, estreitando os olhos ao
reparar em minha expressão. — Você está bem?
Pigarreei.
— Sim, o carro é aquele. — Apontei para o Volvo. — É do Ryan
Donovan, você pode estacioná-lo na garagem e dar a chave para ele, por
favor.

A semana passou voando, mas a dor estava lá, como sempre. Ver Ryan
com aquela garota no Plaza esquartejou meu coração. Muito pior do que um
dia senti pelo Caim, meu primeiro amor. Nunca foi tão forte quanto era com
Ryan.
No dia seguinte, após eu ter devolvido o carro, estava me preparando
para ir ao serviço de ônibus quando Daniel apareceu na minha porta,
oferecendo uma carona. Não queria aceitar, porém, ele ameaçou me demitir
caso eu não aceitasse. Isso era obra do Ryan — só podia —, a não ser que
Daniel estivesse dando em cima de mim, o que achava improvável, já que
era o melhor amigo do bastardo.
Mais tarde, fomos ao restaurante Frutos do Mar, no centro de
Manhattan. Quando Daniel me chamou para jantar, primeiro não aceitei. No
entanto, ele disse que era para conversarmos sobre a possibilidade de eu
publicar meu livro, então obviamente concordei. O ambiente envidraçado
garantia uma bela vista para o rio Hudson. Embora fosse noite, as ruas
estavam iluminadas.
— Daniel, este restaurante deve ser muito caro, como vou ajudar a
pagar? — reclamei ao adentrarmos o imenso salão com mesas redondas e
quadradas, forradas por toalhas de linho branco. As cadeiras de madeira
eram de camurça bege.
Daniel vestia uma camisa preta listrada de azul, com mangas enroladas
até os cotovelos, e calça social esporte preta. Estava elegante! Ele sorriu
para mim de modo simpático.
— Este lugar é do meu avô, não pago quando venho aqui. — Piscou. —
Bônus de família.
Eu suspirei.
— Você é da família, eu não — lembrei-o. — Não acho que meu
salário pague algo daqui.
— Não precisa, Angelina, viemos para tratar de trabalho, fica por
minha conta. — Eu estava prestes a discordar, mas ele falou antes: — Todos
os negócios são tratados assim, o contratante é quem paga. — Virou-se para
mim. — Vamos fazer o seguinte: se alguma vez sairmos sem nenhum negócio
envolvido, nós dividimos a conta, que tal?
Não precisava dizer a ele que nós nunca sairíamos nesse contexto, e
sim apenas por assuntos relacionados ao trabalho. Não queria me envolver
com alguém tão cedo. O rosto do Ryan surgiu em minha mente; ignorei-o, não
querendo pensar nele de nenhuma forma.
Assenti e nos encaminhamos a uma mesa perto da janela. Logo que
entrei, enxerguei Ryan sentado a uns sete metros de onde estávamos. Vestia
jeans, jaqueta preta aberta e uma camiseta branca. O que quase me
desfaleceu foi vê-lo com a mesma loira do seu prédio. A garota estava
sentada ao seu lado, em uma mesa grande e quadrada, feita para caber várias
pessoas.
Ryan fulminou Daniel; se seus olhos fossem laser, meu chefe já estaria
morto. Não sabia por que razão ele agia assim, como se doesse me ver com
outra pessoa. Talvez machucasse mesmo, mas ele não daria o braço a torcer.
Em vez disso, ficava com sua loira. “Deve ser mais sério com esta garota, se
está com ela desde segunda-feira, e hoje é sexta...”, pensei.
Havia mais duas mulheres ao seu lado, igualmente lindas e
deslumbrantes. Uma de cabelos loiros platinados, que reconheci: sua irmã,
acompanhada de um moreno cheio de piercings na orelha e no nariz. E a
segunda de cabelos negros, olhos talvez azuis; não dava para ver direito,
pois ela estava de lado, conversando com um homem. Lembrei dele do
hospital, de quando vi Ryan pela primeira vez. Era moreno, de olhos verdes
e brilhantes. Tinha mais outro cara, lindo e sexy, ao lado da garota morena.
Era forte e musculoso, quem sabe um campeão de vale-tudo, mas podia estar
errada.
— Não sabia que eles estariam aqui hoje — avisou Daniel, seguindo
meu olhar. — Ele parece querer me matar.
— Ele não tem o direito de reclamar ou dar algum palpite, já que está
com uma mulher — retruquei, retirando meu foco do grupo e me virando
para Daniel.
— Podemos ir a outro lugar...
Eu cortei.
— Não sou de fugir de coisa alguma. Se ele está com alguém, o
problema é dele. — Sorri. — Vamos nos sentar ou não?
Daniel retribuiu o gesto e me levou a uma mesa não muito longe do
Ryan. Estava de costas para o grupinho, mas podia sentir o olhar do maldito.
Concentrei-me em Daniel, que puxou a cadeira para eu me sentar, e se
colocou à minha frente.
— Então, o que achou do livro? — perguntei, arrumando os talheres
por ordem de tamanho, do maior ao menor. Fazia isso para ocupar minhas
mãos trêmulas, querendo matá-lo, junto à garota ali atrás de mim. Nunca
baixaria o nível, ele só ficaria mais convencido e diria que eu não
significava nada.
— Você está calma. — Sua voz demonstrava confusão.
— Por que não estaria?
— Por ver o Ryan acompanhado. — Olhou a mulher por sobre o meu
ombro.
Eu ri, sem vontade nenhuma.
— Ele é solteiro e desimpedido, fica com quem quiser — fui firme. —
Assim como eu.
Arqueou as sobrancelhas.
— Você pretende ficar com alguém para se vingar? — Suspirou. —
Não acho que ele esteja com ela.
Sacudi a cabeça, descrente.
— Sério? O que fazem juntos, então? — Prossegui, sem deixá-lo falar:
— Tanto faz, mas eu não desceria tão baixo. Quando ficar com alguém, será
porque quero, e não por vingança ou algo do tipo. Agora vamos parar de
falar dele e começar a conversar sobre o livro, afinal, foi para isso que
viemos hoje, certo?
— Não só por isso — disse, quase magoado. — Mas já que você quer
ir direto ao ponto...
— É melhor, assim vamos embora mais cedo. — Precisava sair logo
dali, antes que eu perdesse o meu autocontrole.
— Tudo bem. — Acenou para um garçom moreno e másculo vir nos
atender.
O cara era alto, usava uma calça social preta e uma camisa branca com
dois botões abertos. Sorriu para nós ao se aproximar da mesa.
— Oi, Daniel — cumprimentou, pousando o olhar em mim com um
sorriso libertino. — E você é...?
— Alguém que está fora da linha para você, Jack — Daniel avisou,
divertido. — A não ser que você queira ter problemas com Ryan.
— Ryan? — Surpreendeu-se. — Achei que ele estivesse com aquela
gata loira.
Fechei a cara para o Daniel e sorri para o moreno.
— Não tenho nada com Ryan, aliás, com ninguém. — Joguei meus
cabelos para trás.
Ele gargalhou como um lobo.
— Podemos resolver este problema, o que acha? — Sua voz era
lasciva.
— Que tal depois? — Claro que não ficaria com ele, nem agora e nem
nunca. Não era de flertar com homens, contudo, estava gostando disso. —
Por ora, quero um chá verde.
Franziu o cenho.
— Chá?
— Sim, eu amo — assegurei, ignorando seu espanto. Não diria que não
podia ingerir nenhuma bebida alcoólica por causa dos remédios para o
coração. Apesar do meu médico não mencionar nada sobre isso, apenas
deduzira. Remédios e álcool não eram uma boa combinação.
— Aqui não temos chá, senhorita...
— Angelina — emendei. — O que vocês têm?
— Champanhe, conhaque e variedades em vinhos italianos, franceses e
irlandeses.
— Ah — murmurei.
— Jack, vamos esperar um pouco para pedirmos — disse Daniel. —
Agora pare de dar em cima dela, antes que o Ryan saia de sua mesa e venha
matar você.
O cara olhou para o Ryan e depois para mim, com cenho franzido.
— Ele parece mesmo querer acabar comigo. Isso é estranho. Se está
com a loira, por que se importa?
Daniel cortou-o.
— Vá atender as outras mesas, depois te chamamos.
Jack saiu, e eu olhei para o Daniel.
— Por que o expulsou?
— Para o Ryan não acabar preso. — Suspirou. — Isso foi para
provocar ciúmes?
— Ryan não sente nada por mim, muito menos ciúmes — retruquei com
ceticismo. — Apenas queria ver se eu ainda sabia flertar, não pretendo ficar
com ele, afinal, caras iguais a ele, e iguais a você e ao Ryan, são
destruidores de corações. Não tenho a intenção de ter o meu partido por
nenhum dos três.
— Mas você tem sentimentos pelo Ryan...
Interrompi-o.
— Isso não importa agora — repliquei, amarga. — Vamos ao que
interessa. Fale sobre o livro, lembre-se de que me prometeu a verdade, não
importa se for ruim.
Daniel assentiu, um tanto desolado.
— Sim, nas páginas cento e oitenta, duzentos e cinquenta e trezentos e
sessenta estão as cenas mais quentes de sexo... — Sorriu, travesso. — Para
quem nunca fez, você sabe muita coisa...
Quase engasguei.
— Quem lhe contou isso?
— Ryan...
— Delator! — sibilei, furiosa por Ryan ter dado com a língua nos
dentes. Não era assunto para ele falar por aí com outras pessoas. Idiota! —
O que há com as cenas?
— Você descreveu tudo nos mínimos detalhes, todavia, as sensações
durante o sexo não saíram tão, bem... Como posso dizer... Faltou vivenciar o
teor dos sentimentos de quando ele a devora com a língua mágica...
— Certo, entendi. — Estava corada pela forma com que ele me olhava,
não com desejo ou algo assim, somente interessado em minha resposta. —
Não descrevi bem as sensações de Elizandra? Você acha que é por minha
falta de experiência no assunto?
Aquiesceu.
— Sim, o livro é perfeito, mas para uma personagem amarrada e sendo
chicoteada, ela não parecia tão exultante...
— Quem está amarrada e foi chicoteada? — indagou uma voz profunda
e sexy do nosso lado na mesa.
Deparei-me com um par de olhos azuis, intensos como o céu de verão, e
um sorriso devasso em lábios carnudos avermelhados. Uma boca que
qualquer mulher mataria para beijar. Os cabelos negros caíam na altura do
queixo, espalhados como se tivesse acabado de acordar. Um verdadeiro
Adônis. Poderia estar em uma capa de revista masculina ou na People.
— Se for você quem gosta disso, vou adorar te ensinar alguma coisa —
disse um outro cara, loiro com cabelos compridos nas costas, presos num
rabo de cavalo. Muito gato! Sua boca estava levantada em um sorriso torto.
— Será que eu morri e fui para o paraíso? — murmurei, embasbacada.
— Acho que somos nós quem estamos no céu. — O cara de cabelos
negros piscou para mim. — Oh! Eu me lembro de você no Hospital, em
Trenton, Nova Jersey.
Também pisquei, recordando do cara que me agarrou e que achei que
fosse me beijar lá mesmo. Lembrei-me do fogo que subiu em meu corpo
quando ele me tocou. Nada comparado ao toque do Ryan, claro, seria como
equiparar uma fornalha acesa a um vulcão em erupção.
— Lembro de você também, o irmão da garota que estava prestes a
perder o bebê. — Levantei e fiquei diante dos dois.
— Ah, sim, esta é a garota que doou sangue para Sam — assentiu o
loiro, rememorando também. Não recordava dele no hospital, apenas de
Lucky, Ryan e esse cara com olhos azuis-celestes.
O moreno sorriu e se aproximou, como fez aquele dia, agora me
abraçando e girando.
— Obrigado, você salvou a pessoa que mais amo neste mundo.
Ofeguei de choque e vergonha por estarmos em um restaurante cheio de
gente. Ouvi um baque não muito longe, algo se quebrando.
— Bryan, acho melhor soltá-la — avisou Daniel, tenso.
Bryan riu e me colocou no chão.
— Desculpe, cara, por agarrar assim seu encontro...
— Droga, isso não vai prestar — rosnou Daniel, se colocando de pé.
Segui seu olhar e vi que Ryan fuzilava Bryan de modo mortal. “Eu vou
matá-lo!”, li em seus lábios. Percebi que o barulho anterior foi dele
esmurrando a mesa, onde enxerguei alguns copos caídos. A mulher do Lucky,
Sam, aparentava preocupação.
Afastei-me dos braços do Bryan e mirei suas íris confusas. Ryan não foi
até nós, o que era bom.
— Conhece Ryan? — sondou, me levando para a mesa onde o grupo
estava.
— Bryan — reclamei, puxando meu braço e me distanciando dele.
— Desculpe, apenas queria lhe apresentar a minha irmã.
Vi a garota morena de olhos azuis, parecida com ele. Ostentava um
semblante cauteloso, desassossegada pela briga iminente.
— Oi — sussurrei, envergonhada por ser trazida à mesa deles. Ignorei
Ryan e sua raiva.
— Olá — respondeu Sam.
Bryan sorriu, colocando a mão direita no meu ombro.
— O mundo é pequeno, nós encontramos a... — Parou e se virou para
mim: — Qual é o seu nome?
— Angelina — disse e me esquivei gentilmente dos seus braços, tanto
pelos olhos ferozes do Ryan quanto por mim. Esse cara era bem estranho,
primeiro me arrastava até lá, agora passava a mão nos meus ombros? Era
como se estivesse provocando alguém, ou seja, o Ryan. Não quero ficar no
meio.
— Você está saindo com ele agora? — Ryan inquiriu, seus punhos
cerrados.
— Está saindo com ela? — Indiquei a loira ao seu lado.
— Eu não...
— Está sim — retrucou Bryan, falando pela primeira vez com ele. —
Não é para comunicar o seu namoro com Alexia que estamos aqui? Não
viemos comemorar?
Escondi minha dor.
— Parabéns, pelo visto não perdeu tempo. — Girei nos calcanhares
para voltar à minha mesa e avisar o Daniel que iria embora. Não conseguiria
ficar, vendo-o com outra.
Bryan me segurou e me puxou para os seus braços, tão forte que ofeguei
com o impacto em seu peito duro.
— Tire as mãos de cima dela agora. Angelina não te pertence — rosnou
Ryan, se levantando.
Eu me afastei do Bryan e fitei Ryan. Sua expressão era maligna ao
afrontar o moreno, que parecia não ter medo algum.
— E eu pertenço a você, Ryan? — sibilei.
Ele piscou.
— O quê?
— Está vendo? Você não sabe o que quer! Não sou a sua propriedade
para fazer assim — estalei os dedos — e esperar que eu caia aos seus pés.
— Eu não...
Cortei-o, indignada.
— Se você pode pegar mulheres por aí, também fico com quem quiser.
— Pousei meus olhos na loira, logo passando a reparar no restante da mesa:
estavam todos atônitos.
A expressão de Ryan se tornou lívida. Se a situação fosse outra, eu teria
me encolhido.
— Juro, Anjo... — Ao escutarem seu modo carinhoso de se referir a
mim, seus amigos se abismaram, como se ele estivesse falando um idioma
desconhecido. — Vou matar qualquer um que a tocar, e não me importo de
passar a vida em uma maldita cadeia.
— Você não pode ameaçar as pessoas que se aproximam de mim —
grunhi com os dentes cerrados. — Fez a sua escolha quando saiu da minha
casa. Conviva com isso.
Antes dele dizer algo, Lucky se aproximou.
— Ryan, venha comigo, precisamos conversar. — Seu irmão cochichou
algo em seu ouvido. Os dois, junto ao cara musculoso, se afastaram. O
homem com tatuagens em seu pescoço e braço também sumiu de vista, e o
loiro foi com ele, não sem antes me lançar um olhar curioso.
— Menina, o que você fez com esse homem? — Bryan sorriu para mim.
— É um milagre alguém deixar Ryan Donovan de quatro.
— Papo furado — dispensei seu comentário com um gesto.
— Bryan, fique longe dela, você ouviu Ryan, ele não parecia estar
brincando. — Sam ficara angustiada. Ela pegou a sua mão e apertou-a. —
Por favor.
— Ei, mana, não vai acontecer nada comigo — tranquilizou-a.
— Não se preocupe, Sam. Não vou ficar com seu irmão — falei, não
querendo assustá-la, afinal, ela estava grávida. E era verdade: jamais ficaria
com alguém que não amasse.
— Não? — Bryan piscou. — Pensei que faríamos o que estava dizendo
antes... Você amarrada na cama enquanto eu a possuo — sondou, sem nem um
pouco de vergonha.
Corei, mas sorri.
— Era uma cena do meu livro, que Daniel está querendo publicar. —
Minha saiu fraca.
— Livro? — indagou, desapontado. — Então você não faz nada
daquilo?
— Nunca fiz — admiti, mexendo meus calcanhares no salto de dez
centímetros.
Ele estreitou os olhos.
— Você nunca fez sexo selvagem ou nunca fez...
Cortei-o com o rosto escarlate.
— Não é da sua conta — retruquei. — Vamos esquecer tudo, ok?
Bryan assobiou, tomando meu retruco como um sim.
— Isso explica a histeria do Ryan. — Mirou-me de lado. — Fora a
parte de ser linda.
Sam parecia impressionada.
— Foi um prazer conhecê-la — disse a ela. — Agora vou me sentar,
antes que o dono venha reclamar por estar incomodando vocês.
— Sente-se com a gente — pediu a garota.
— Eu... — Olhei para o Daniel ao meu lado, que me fitava com um
sorriso doce e torto.
— Por mim, tudo bem.
Sorri para Sam.
— Certo.
Todos nós sentamos ao redor da grande mesa. Foi preciso colocar mais
uma de quatro cadeiras junto.
Ryan, Lucky, o homem loiro com cara de Thor e o sujeito musculoso
não tinham voltado do banheiro ainda. Devia estar difícil controlar a fera.
Não entendia por que ele fez isso, não era Ryan quem estava com outra
garota? Contudo, não parecia se importar com ela e seus sentimentos. Bem, e
quando que ele já se importou com uma mulher? Bastardo egoísta.
Daniel sentou do meu lado direito e Bryan no esquerdo. Sam estava do
outro lado da mesa, perto do cara moreno, namorado da Rayla, a irmã do
Ryan. Havia três cadeiras vazias entre os dois. A loira se situava perto da
modelo. Alexia, este era seu nome.
— Onde conheceu o meu irmão? — perguntou Rayla. — Lembro-me de
você do hospital, e naquele dia nem falou com ele. Transando não estão, já
que acabei de ouvir que nunca ficou com ninguém, ou, pelo menos, foi o que
entendi.
Suspirei. Ficou fácil de deduzir que eu era virgem. Contei a verdade, já
que não existia mais namoro de fachada. Daniel sabia de tudo, expliquei a
ele terça-feira, após me interrogar onde estava meu carro desaparecido, pois
devolvera ao Ryan.
— Reencontrei Ryan ao faxinar seu prostíbulo.
Ela franziu o cenho.
— Prostíbulo?
— O apartamento onde ele leva as mulheres para abater — esclareci,
pensando nas loiras que ele expulsou como se fossem cadelas.
Ela riu com o termo, e não foi a única.
— Você chama aquilo de prostíbulo?
— E não é? Eu o vi mandando duas loiras nuas embora, sem respeito
algum. — Meu tom era amargo.
— Vadias nasceram para isso — declarou Bryan com uma risada.
Sam fechou a cara para ele.
— Todas as mulheres são seres humanos e merecem ser tratadas como
tal — repliquei. — Isso deve estar nos genes dos playboys. O que me
lembra de uma vez que assisti a uma novela pela internet, acho que do
México, que dizia: “as tontas não vão para o céu”. Por “tontas”, entendo
“mulheres que gostam de homens fortes e tatuados”.
Rayla e Sam arregalaram os olhos com isso.
— Nem todos os caras são assim — discordou Rayla. — Alex não é.
Ergui as sobrancelhas para o cara tatuado, cheio de brincos, correntes e
piercings.
— Sério? Bom, com certeza foi um dia, meus parabéns por domá-lo.
Ele franziu o cenho.
— Não sou um cavalo para ser domado — retrucou.
Bufei e depois sorri.
— Todos os bad boys são...
Bryan me cortou.
— Isso é uma mancha em nossa honra.
— Ele tem razão — concordou Daniel, ofendido.
Revirei os olhos.
— Apenas digo a verdade. — Fitei os dois, séria. — Bad boys pegam
garotas e as descartam como objetos, sem se importar com seus sentimentos.
Então quando encontram mulheres diferentes ao que estão acostumados e
sentem algo por elas, lutam contra e fazem cagadas, tentando esquecer e
voltar às suas vidas normais. Portanto, são cavalos a serem domados.
— Estamos falando dos bad boys ou do Ryan? — replicou Bryan.
— Dele e de vocês que seguem o exemplo.
Todos ficaram em silêncio por um momento. Em seguida, Rayla
questionou, curiosa.
— O que houve entre vocês?
— Ryan propôs que eu fosse sua namorada para ganhar a aposta que fez
com você. — Virei-me para Sam. — Acho que ele queria tê-la desfilando
para ele.
Seu rosto se transfigurou em uma careta.
— Sabia que ele ia arranjar um jeito de conseguir outra mulher para a
aposta, sem ser a Alexia. Maldito seja. — Ela olhou para a loira, que até
então não havia dito nem uma palavra; notei que a todo o momento seus
olhos estavam no Bryan. Interessante! Será que Alexia estava a fim dele?
Senti meu estômago revirar: se ela gostasse do Ryan, eu não poderia
competir com esse corpo fabuloso.
— Não entendo, se ele estava namorando você de fachada — sondou
Bryan —, por que o cara aceitou jantar com a Alexia?
Soltei um suspiro desalentado.
— Terminamos na sexta-feira — disse, pegando um fio de cabelo e
enrolando no meu dedo. — Nossa situação ficou um tanto... intensa para os
dois. Pelo visto, ele seguiu em frente com o plano.
— Eu já tinha desistido da aposta — Ryan se aproximou de nós e
sentou com Alexia.
Tentei não demonstrar a dor que senti ao vê-lo perto de outra mulher.
Deixei meu rosto impassível, sem expressão. Fazia sempre isso no passado,
quando escondia de Ângela meu amor por Caim; agora não tinha dificuldade
mais.
— Por quê?
Ele deu de ombros e não respondeu. Acho que não aguentou ficar sem
sexo fácil. Viveria livre para desfrutar de quem quisesse. Com certeza
estivera com várias desde o dia em que foi embora da minha casa. Senti
como se houvesse minhocas vivas em meu estômago.
— Não faça essa cara, Anjo. — Sua voz era um sussurro de dor.
Suspirei, mas doeu.
— É a única que eu tenho. Se não quer olhar para ela, talvez não
devesse ficar me encarando — redargui com ceticismo.
Ele expirou, triste.
— Que cara ela está fazendo, Ryan? — questionou Rayla, curiosa.
Sua face estava entorpecida.
— Ela está com raiva, pensando que eu já fiquei com várias mulheres
nesse tempo em que estamos separados, não é? — Seus olhos prenderam os
meus com uma grande intensidade.
Arqueei as sobrancelhas.
— E não ficou? — perguntei.
— Isso não é da sua conta.
Outra vez, escondi o sofrimento, assim ele não desconfiaria da
proporção do mal que suas palavras me faziam.
— Você tem razão, não tenho o direito de saber — concordei com
escárnio. — Assim como você não tem o direito de se intrometer no que eu
vou fazer hoje.
Seu rosto se tornou sombrio.
— O que fará hoje? — soltou cada palavra pausadamente.
Coloquei meus braços sobre a mesa e me curvei para frente em sua
direção. Seus olhos foram para o meu decote em V e escureceram, não de
raiva, mas de desejo.
— Não é da sua conta — repeti sua frase e sorri. Endireitei-me na
mesa, pois não era só Ryan que estava vendo meu decote: o cara musculoso
cheio de tatuagens e o loiro de olhos azuis também olhavam.
— Você não quer me ver perdendo a cabeça...
— Cale a boca! — cortei, furiosa. — Pare de ameaçar as pessoas!
— “Pessoas” não. — interrompeu-me, irado; bem, acho que “irado” era
eufemismo. — Homens que estão te comendo com os olhos. — Sua voz soou
mortalmente fria. Bufei.
— Eles podem fazer o que quiserem. — Dei de ombros. — Como eu
disse, você não é meu namorado, e muito menos meu dono. Deveria reagir
assim com a sua namorada, e não comigo.
— Não tenho namorada. Não devo satisfação a ninguém.
— Não vou discutir de novo com você — falei e olhei para o Daniel.
— Acho melhor irmos embora.
— Não, por favor, espere — pediu Sam, com as íris azuis molhadas. —
Nem agradeci por você ter salvado a minha vida. — Ela chorava. — Lucky
contou a todos que você doou sangue para me ajudar.
— Oh, Rosa Vermelha, não chore — pediu Lucky, preocupado com a
esposa.
— A gravidez me deixa assim. — Ela sorriu, limpando as lágrimas. —
Tentei te localizar em Nova Jersey, sem chance. Pedi até para meu irmão,
que é craque em computador, e nem ele conseguiu.
Impressionei-me com Bryan.
— Você é um hacker?
— Sim, busquei arquivos do hospital com seus dados para localizá-la e
poder agradecer por ter salvado a vida da minha irmã e do meu sobrinho,
mas não fui capaz de encontrar nada. — Seu tom era confuso no final.
Eu ri, deixando todos surpresos.
— Desculpem-me. Tenho um amigo que também é um hacker brilhante e
estava naquele dia no hospital comigo. Foi ele quem deletou todos os
registros a meu respeito. Já serviu no exército há alguns anos. Chama de
“vírus negro” ou algo do tipo.
— Por que esconder seus arquivos? Para não ser encontrada? E quem é
esse cara que é bom em computador? — sondou Bryan, num misto de
confusão e curiosidade. — Preciso conhecê-lo.
— Quando eu estava no hospital, recebi uma notícia ruim, fiquei sem
chão. — Fitei Sam, escorada nos braços do marido. — Soube do que se
passava com você, e não pensei duas vezes em ajudar. Embora estivesse
ciente de que tinham dinheiro, não fazia ideia de quem eram.
— O que isso tem a ver? — perguntou Lucky, atarantado.
Contei a todos que certa vez ajudei uma senhora, impedindo-a de ser
atropelada ao atravessar a rua, e sua filha megera, em vez de me agradecer,
jogou dinheiro em cima de mim, praticamente me dando uma esmola. Fiquei
furiosa na ocasião.
O pessoal da mesa ostentava expressões impressionadas, como se eu
fosse uma maldita heroína. Não era; estava longe disso.
— Juro, nunca senti tanta raiva na minha vida. Se não fosse pela
senhorinha, eu a teria feito engolir o dinheiro de volta. Fui embora
mancando, deixei as notas para um morador de rua. Pelo menos ele ficou
feliz com isso. — Passei as mãos nos cabelos. — Esperaria um
agradecimento, claro, mas não dinheiro. Se eu quisesse ganhar para salvar
pessoas, teria me tornado médica. Bom, de qualquer forma, não desejava que
isso se repetisse, ainda mais naquele dia em que a minha cabeça não estava
tão bem, após a notícia ruim que recebi.
— Que notícia? — inquiriu Ryan, me avaliando.
— Isso não importa. — Focalizei os olhos molhados da Sam. —
Desculpe por pensar que fossem assim também...
— Oh, está tudo bem agora — sussurrou. — Mesmo se você não se
entender com Ryan, ele é de fato um cavalo...
Todos riram (Bryan e Daniel muito mais, porque sabiam o significado
da palavra).
— Ei, o que é isso, Sam? — rosnou, olhando feio para ela.
Ignorou-o e me deu um sorriso, sendo retribuída.
— Sim, definitivamente é — concordei.
— Quer parar de zombar de mim? — sibilou, me fuzilando. — Por que
está me chamando assim?
Sam revirou os olhos.
— Diga uma coisa — começou ela, ignorando o rosnado do Ryan.
— Sim?
— Você falou que escreve livros, não?
— É.
— Que tipo de livro?
Eu sorri.
— Romances, mas este é de dominante e submissa.
— Sério?
— Aham.
Ela colocou as mãos na mesa, encarando-me com brilho e excitação.
— Conte-me alguma coisa, adoro esse tipo de livro. Leio e depois faço
igual com Lucky. — Corou, mas não deixou de falar o que pensava. Gostei
disso nela.
— Maldição, Sam! Não quero escutar sobre suas perversões na cama
— urrou Bryan.
— Ele é meu marido, você não pode fazer nada em relação a isso.
Entenda como pagamento por todas as vezes em que ouvi mulheres gritando
no seu quarto.
Notei, por um breve segundo, Alexia estremecer com o que a Sam disse
a respeito do Bryan com outras. Ela realmente tinha uma queda por ele.
— Ryan é quem gosta desse negócio de dominante e submissa — eu
disse.
Lucky deu um sorriso devastador. Sam dispunha de motivos para se
apaixonar por ele, o cara era inesquecível, ainda mais quando sorria torto
com suas covinhas de bebê.
— Como sabe sobre o Ryan? — Lucky indagou.
— Vi algemas, cordas, chicotes de montaria e várias outras coisas no
seu prostíbulo.
Desta vez, Lucky jogou a cabeça para trás e gargalhou alto. Nem
parecia se importar com as pessoas ao redor. Depois de um segundo, me
olhou de lado:
— Você está se referindo ao apartamento onde ele leva as mulheres?
— Sim — balbuciei, sem entender a sua euforia.
Antes que comentássemos mais sobre o assunto, um senhor de meia
idade chegou à mesa e se apresentou como o avô do Daniel. Era um cara
legal, e chamou os homens para irem bater um papo com ele na sala de
jogos. Eu nem sabia que havia isso naquele restaurante chique.
Pelo jeito do senhor Arnaldo, parecia bem simples. Adorava pessoas
assim, que não deixavam o dinheiro e a soberba subirem à cabeça.
Ficamos na mesa só as meninas e eu. Bem melhor, precisava pedir a
opinião delas em relação a algo. Uma ideia que tive, esperava funcionar.
— Conte-nos, você seria uma boa submissa para o Ryan? — sondou
Sam ao estarmos sozinhas (bom, sem os garotos).
— Nem morta — me precipitei. Hesitante, mudei a resposta: — Enfim,
entre quatro paredes talvez pudesse ser diferente — admiti, a despeito de
estar ciente de que isso não aconteceria nunca. — É aí que entram meus
problemas com o livro: descrever as cenas quentes. Daniel disse que é pela
minha falta de experiência no assunto. Precisarei sentir tudo por mim mesma
antes de publicá-lo. — Meu rosto queimava.
Em seguida, dividi com elas o meu plano de fazer o Ryan sair da toca.
— Pode dar certo, tomei uma atitude similar com Lucky — disse Sam.
— Esses caras têm medo de falar o que sentem, temem o desconhecido.
— Meu irmão não deixa as pessoas se aproximarem dele, acho que
para não sofrer mais perdas. Ele foi o mais afetado pela morte dos nossos
pais — explicou Rayla.
— Isso se chama escape, correm de tudo que pode causar dor a eles no
futuro. — Sam franziu o cenho. — Uma baita idiotice. Se Ryan aceitasse
seus sentimentos (cá entre nós, ele é louco por você), sofreria bem menos e
não a perderia.
— Alguém deveria dizer isso a ele… Se depois do que eu fizer hoje
Ryan não aceitar, vou renunciar dele, mesmo não querendo. — Encolhi-me
com a ideia do bastardo não me querer. Olhei para Alexia, tão calada até
agora. — Assim que ele chegar, você estará pronta para o que combinamos?
A garota mirou o lugar onde os homens estavam, e seus olhos
encontraram os do Bryan. Após, voltou-se a mim.
— Sim, eu topo. E se ele resolver não der o braço a torcer? Nós dois...
— Não terminou. Estremeci ao imaginar os dois se beijando.
— Posso lidar com isso — falei, mais para mim mesma. — Além
disso, preciso dar um jeito na minha falta de experiência.
Antes que as meninas contra-argumentassem, Bryan retornara.
— Se você quiser, posso resolver esse seu problema. — O safado
sorriu torto ao chegar na mesa junto com todos os caras.
Sentaram-se nos seus lugares. Ryan, perto de Alexia, bateu os punhos na
mesa, fuzilando Bryan ao meu lado.
— Estou falando sério, não ouse tocá-la — rosnou, sombrio.
Estreitei meus olhos.
— Você não tem o direito de... — eu me interrompi com a cena que vi a
seguir.
Não desejaria reencontrá-lo nunca, contudo, ali estava Caim, o cara por
quem um dia fui apaixonada, acompanhado de uma garota morena alta e
esbelta.
Caim encorpou desde a última vez que o vi, há três anos; enxergava seu
corpo musculoso debaixo da roupa social, calça e camisa. Seus cabelos
castanho-claros encurtaram. Olhei para ele esperando sentir algo, e nada.
Nem raiva havia mais. Sua presença apenas me fez lembrar-me dela... Com
isso, a dor veio num tsunami.
— Você parece que viu um fantasma — observou Ryan.
Eu me recuperei, ou melhor, tentei fazer a imagem de Ângela ir embora.
Ao mesmo tempo, não queria, mas se pretendia continuar respirando,
precisava deixá-la partir e focar no cara ali no restaurante. Encarei Bryan.
— Você pode trocar de lugar com Ryan? — pedi com a voz aguda.
Ele franziu o cenho.
— Por quê?
— Porque necessito fazer uma coisa, e Ryan não vai deixar eu me
comportar assim com você sem um escândalo. Não tenho tempo para isso
agora — esclareci, meio suplicante, me escondendo ao seu lado. — Por
favor, depois eu explico.
Bryan assentiu e se levantou, trocando de lugar com Ryan, que foi para
o meu lado com as sobrancelhas levantadas.
— Você apenas queria minha companhia?
Bufei.
— Você se acha mesmo, não?
— Sim — respondeu sem nenhum pudor.
— Se não fosse por sua crise de ciúmes, teria feito com Bryan o que
vou fazer com você. — Claro que não usaria Bryan, pois Alexia parecia ter
sentimentos por ele.
— Não estava com ciúmes — rosnou.
Levantei uma sobrancelha.
— Não? — Peguei seus ombros e virei meio de lado para me cobrir da
visão de Caim. — Quem disse que mataria o Bryan se me tocasse? Até onde
eu sei, isso se chama ciúmes, idiota. — Bem na hora, Caim olhou para a
mesa. — Maldição...
— O que foi?
— Tantos restaurantes na cidade e nos encontramos aqui? — Soltei um
muxoxo de raiva, logo fitando a face confusa do Ryan. — Fingi ser sua
namorada, e agora quero que finja ser o meu, caso ele venha até nossa mesa.
— Ele? — A voz soou embargada.
Olhei por sobre seu ombro, e ele me seguiu.
— Você conhece o filho do desembargador? — Ficou rouco.
— Sim, fui apaixonada por ele quando eu tinha dezessete anos.
Ele arfou.
— Namoraram?
Eu ri.
— Não, nunca tivemos nada um com o outro, apenas nos apaixonamos.
Não que isso seja da sua conta.
— É bem difícil imaginar o filho do desembargador amando alguém. —
O falso Thor me mirou de esguelha. — Ele é como nós, não se prende a
nada.
Revirei os olhos. Sabia disso; de vez em quando, me deparava com a
foto de Caim nos tabloides, pendurado em morenas esbeltas.
— Descobri recentemente que ele está noivo. Acho que casa em
fevereiro com a modelo Kate Smith — disse Lucky. — Inclusive, fui
convidado para a cerimônia.
Esperei sentir algo com essa notícia, como ciúmes ou dor. Meu único
lamento era que, se ele não tivesse ido embora, Ângela poderia estar ao seu
lado, comigo. Como doía me lembrar da pessoa que eu mais amava no
mundo...
Peguei a bebida do Daniel e tomei. O líquido desceu rasgando por
minha garganta em chamas. Ignorei, a angústia que estava sentindo era pior.
— Que droga é isso?
— Vodca, minha querida — respondeu Daniel.
— Te incomoda ele estar noivo? — perguntou Ryan, um tanto
vulnerável.
Suspirei.
— Minha situação com Caim é... complicada — respondi. Dirigindo-
me a todos da mesa, falei: — Desde já, quero pedir desculpas.
— Pelo quê? — sondou Alexia.
Ri, nervosa.
— Porque sempre que nos encontramos, nós dois acabamos brigando.
— E você quer me usar para fazer ciúmes nele? — protestou Ryan,
magoado.
— Ciúmes seria se eu estivesse interessada nele e vice-versa. Posso ter
amado Caim um dia, e ele a mim, mas passou.
— Se ele amava você, por que não ficaram juntos? — indagou o loiro.
— Vamos dizer que tinha alguém no meio...
— Kate? — averiguou Rayla.
— Quem? — Minha voz estava grogue com as lembranças jorrando de
minha mente.
— A sua noiva, a moça que está com ele.
— Não, isso que houve entre nós foi há quase sete anos. Tínhamos
vidas diferentes... O destino nos separou antes de ficarmos juntos. Acho que
não era para ser.
— Você lamenta por isso? — Ryan quis saber.
— Na época, sim. Hoje, ele só me lembra dela... — Peguei o copo e
bebi outro gole. — Desculpe, gente, não posso falar sobre isso.
— Se você não o ama mais, por que dói tanto tocar no assunto? — Ryan
resfolegou.
— Por causa de Ângela — respondeu a voz profunda de Caim atrás de
mim.
A dor veio misturada com o desespero de imaginar o rosto sorridente
de minha irmã diante de Caim, e depois sua expressão desolada ao perdê-lo.
Tudo por minha causa.
Respirei fundo e me levantei, girando para encará-lo. Ali estava o
homem que um dia amei, usando um terno Vanquish. Caim continuava lindo,
agora com vinte e quatro anos. O tempo lhe fez bem. Seus olhos verdes
sempre foram a ruína para mim e para todas as garotas do mundo.
Parecia triste
— O que faz aqui? — questionei. Deixara sua noiva sozinha na mesa.
Sempre que nos víamos, ele arranjava um jeito de dizer que me amava.
Esperava que não fizesse isso de novo, pois estava praticamente casado.
— Precisava falar com você. — Olhou para a mesa e franziu o cenho.
— Desde quando você é amiga dos Donovan?
— Faz pouco tempo — respondi, emendando: — Caim, não temos mais
nada a conversar. Chega de brigas, de machucar um ao outro.
Lembrei-me da última vez que o vi no cemitério, quando meus pais
foram enterrados. Ele apareceu dizendo que queria me dar apoio por minha
perda, mas eu não aceitei e gritei com ele na frente das pessoas. Foi injusto
da minha parte, mas estava cercada de dor naquele dia.
— Sei que foi uma má ideia ir ao funeral, isso provavelmente lhe trouxe
várias lembranças indesejadas...
Cortei-o.
— Pare — pedi com a voz fina. — Perdi a cabeça, mas nada daquilo eu
sentia de verdade, apenas estava ferida e descontei em você. No entanto, não
significa que precisamos reviver o assunto.
— Por quase seis anos eu pensei que você me odiava por ter ido
embora, e logo depois... — interrompeu-se ante a minha face lívida. — Tudo
bem, não vou falar sobre ela.
— Bom, porque não quero discutir e feri-lo mais. Espero que seja feliz.
Riu, mortificado, passando as mãos nos cabelos.
— Quando fui embora, tentei de tudo para esquecê-la e tirá-la de mim.
Parece que esse amor está em meu sangue como um vírus maldito, sou
incapaz de eliminá-lo. Fiquei com várias mulheres em razão disso... Nunca
foi igual.
— Agora deve ter me esquecido, já que vai se casar — observei num
sussurro, esperançosa de que ele refizesse sua vida sem pensar no passado.
O que Caim sentia por mim não era amor, e sim ilusão, querendo e desejando
que viéssemos a ter o futuro com que sonhávamos antes de tudo desmoronar
por completo.
— Então sabe que vou me casar em fevereiro. — Não era uma
pergunta. Avaliava-me sem tirar os olhos de mim.
— Meus parabéns — respondi, sincera.
Riu com escárnio.
— Maldição! Como posso amar tanto uma mulher sendo que nunca a
toquei por malditos sete anos? — Sua voz era amarga. — Sete anos sem
sentir o gosto de sua boca e do seu corpo.
Ouvi um grunhido sair da garganta do Ryan, indicando uma possível
briga. Não queria mais escândalos, então me recompus e disse algo que ele
não gostaria de escutar.
— Espero que vocês dois sejam felizes.
— Pensei em muitas coisas que talvez você falasse para mim, mas
“parabéns” não era uma delas. — Soou amargo.
Eu suspirei.
— O que esperava? — Minha pergunta era retórica.
— Uma palavra sua e não me caso com ela. — Aparentava ter
esperança.
Arregalei os olhos, não estava pronta para isso. Droga! Como reagiria
sem magoá-lo mais? Ele jurava me amar. Uma vez fomos amigos, e eu não
queria que sofresse, todavia, precisava abrir seus olhos para o futuro, para
ele seguir em frente sem sonhar com o passado. Não era psicóloga, não
obstante sabia que, quando uma pessoa desejava tanto algo, acabava
pensando não poder viver sem aquilo, embora tudo se resumisse a ilusões
projetadas em sua mente.
— Caim, já passamos por muitas coisas juntos, ou quase juntos... —
Olhei dentro de suas íris verdes. — Em nome de nossa amizade, você
precisa se libertar da nossa história. Ela não existe mais, não retornará. O
destino quis diferente. — Aproximei-me, ficando a um passo dele. — Não
consigo oferecer mais nada... Não depois de Ângela...
— Angie... — sussurrou. Sempre me chamava assim, e o apelido pegou
na escola, por isso o tinha até hoje. Caim mordeu os lábios, se segurando
para não chorar. — Posso ter uma noiva e me casar com ela, mas jamais lhe
esquecerei.
— Você é capaz — insisti com veemência. — Só nunca tentou de fato
— murmurei. — Chegou a hora de seguir em frente, com sua noiva que
parece amá-lo muito, senão ela já estaria aqui, brava com você e comigo.
Não deixe a oportunidade escapar de suas mãos por causa do passado.
— Ela sabe o que sinto por você.
Respirei fundo e fitei a garota, cujos olhos estavam molhados. Droga!
Uma mulher que deixa seu namorado ir atrás de outra e continua ali deve
amá-lo muito. Voltei-me a ele.
— Caim, você tem uma noiva, e eu tenho um namorado...
Interrompeu-me, atônito.
— Namorado? — soltou a palavra com asco. Olhou por sobre meu
ombro, para a mesa, e parou em alguém atrás de mim. Não precisei virar
para saber que era o Ryan, a sua presença incendiava todo o meu corpo.
Ryan me abraçou de lado.
— Olá, Caim. — Sua voz era mortalmente fria.
Caim se voltou a mim.
— Você está namorando Ryan Donovan? — cuspiu as palavras.
— Sim.
Riu com desdém.
— Conhece a fama dele? Droga, Angelina! Ele vai pisar em você, igual
faz com todas as mulheres... Não vê isso? — Suas mãos estavam em punhos,
doido para acertar o Ryan.
— Bem, você também esmagou meu coração, e eu sobrevivi, não? Se
por acaso Ryan fizer o mesmo, aguentarei novamente. — Encolhi-me com a
ideia, acho que morreria caso isso acontecesse, pois o que sentia pelo Ryan
era muito maior.
Ryan apertou minha cintura e beijou meu rosto.
— Nunca farei isso, Anjo — jurou com intensidade na voz.
“É só por atuação”, repeti a mim mesma como um maldito mantra, mas
meu coração queria ter esperança.
— Caim, eu amo o Ryan como nunca amei ninguém na minha vida —
falei. Iria magoá-lo, porém, não havia outro jeito de resolver. Além disso,
era a verdade: estava completa e irrevogavelmente apaixonada.
Ryan não disse nada, mas senti a sua respiração pesada, reconhecendo a
sinceridade em minhas palavras.
— Você... — Caim parecia engasgado.
Eu expirei.
— Você deve sim se casar! Merece ser feliz, e sua noiva também. E só
vai conseguir se deixar o passado para trás — respirei fundo. — Talvez um
dia possamos voltar a ser amigos...
Caim assentiu, mordendo os lábios com força. Fazia isso sempre que
segurava o choro. Encarou Ryan com frieza.
— Se você a magoar, o destruirei — ameaçou. — Não me interessa
quem é o seu irmão.
— Ele não vai fazer isso — garanti, porque Ryan já estava abrindo a
boca e dali não sairia nada de bom, apenas geraria mais brigas entre os dois.
— Adeus, Caim.
Ele respirou fundo, como se doesse.
— Posso dar um abraço de despedida em você? — pediu, suplicante.
Não sabia o que dizer, Ryan não permitiria. Seu braço se transformou
em aço à minha volta.
— Anjo — enunciou com tanto fervor e adoração que quase acreditei
—, se você fizer isso, não poderei me controlar. — Ryan virou para Caim.
— Acho melhor ir atrás de sua noiva antes que acabe ficando sem as duas.
Agora a Angelina é minha.
O olhar de Caim inquiria se era este o meu desejo. Aquiesci, ao que
desapareceu do restaurante. Sua noiva não estava mais ali, talvez cansara de
esperar por ele. Torcia para que os dois se entendessem. Saí dos braços do
Ryan e sentei na minha cadeira como uma boneca quebrada.
— Você está bem? — indagou Sam, preocupada.
Sorri para ela.
— Vou ficar.
Pareceu não acreditar em mim, mas nada disse.
— Que bom.
— Quem é Ângela? — perguntou Rayla, me olhando de lado. — Sua
rival?
Resfoleguei.
— Rival? Não, era a pessoa que eu mais adorava no mundo. Faria tudo
por ela, até entregar o garoto que amava de mão beijada... — Entornei outra
dose da bebida, fechando as pálpebras com força para controlar a dor. Olhei
a mesa sem nada ver. — Desculpem-me, gente, não posso falar sobre ela... A
não ser que queiram me ver tomando todo o álcool deste lugar e ir parar no
hospital.
Não fizeram mais perguntas a respeito, embora a curiosidade fosse
palpável. Falar sobre Ângela era um campo minado. Se eu insistisse,
acabaria explodindo aos pedaços.
— Mudando de assunto: você não vai mais namorar a Alexia? —
perguntou Bryan, erguendo as sobrancelhas para Ryan. — Vai ficar com
Angelina?
— Por que, está interessado? — fuzilou-o em retorno, hostil.
Bryan sorriu ao modo do gato Cheshire, não se preocupando com a ira
do outro. Decerto dizia essas coisas porque estava com ciúmes de Alexia,
comprovando as minhas suspeitas de que havia uma queda mútua ali. Por que
não estavam juntos, se os dois se gostavam? Talvez fosse como Ryan e eu.
— Se você ficar com Alexia, a Angelina estaria livre. — Pude
perceber que não falava sério.
Ryan já ia se levantar para atacá-lo, mas eu o segurei em seu lugar.
— Fique quieto — rosnei, furiosa. — Isso é algo que eu também quero
saber.
Ele respirou fundo.
— O que você quer... eu não posso dar. Não namoro, apenas fodo e
dispenso logo depois, como você mesma já viu.
Guardei a dor para mim; precisava seguir em frente. Chegara a hora de
ele provar que sentia o mesmo ou desistir de vez. Eu me virei na cadeira e
fiquei diante dele, sustentando seu olhar. Coloquei meu plano em ação.
— Não acredito em você. Apenas diz isso para convencer a si mesmo.
Ryan estreitou seus olhos.
— Fico com quem eu quiser — retrucou.
— Prove — desafiei.
Pasmou-se.
— O quê?
— Prove que pode ficar com quem quiser, beije Alexia. — Mantive-me
firme. Era um jogo perigoso, mas necessário.
Ele piscou, chocado, me avaliando.
— Se por acaso fizer isso, como reagirá?
Eu me arrumei na cadeira e peguei a taça de champanhe, bem mais
fraco do que a vodca que havia bebido antes. Todos ali me olhavam em
silêncio, esperando a minha reação.
— Encerramento. — Tomei um gole da bebida, deixando tudo para trás.
— Tal qual fiz com Caim.
— Eu não sou ele — sibilou.
— Não, você não é. É mil vezes pior — declarei. Sua capacidade de
me destruir era muito grande. — Não vou continuar nessa, como uma
adolescente imatura que não tem certeza do que quer. Sei que você tem
sentimentos por mim, Ryan, mas não pretendo aguardar a vida inteira
enquanto você decide o que deseja.
Ele expirou.
— O que quer dizer?
— Quero dizer que você tem uma decisão a tomar, porque até agora
esteve em cima do muro.
— Não tenho nada a decidir. — Soava enervado.
Peguei meu telefone na bolsa.
— Certo, você fez a sua escolha — Aproximei-me como se fosse beijá-
lo. Ele prendeu a respiração, no entanto, permaneceu ali, intenso,
acompanhando-me morder os lábios. Seus olhos escureceram mais com isso.
— Agora eu faço o que quiser, e você não vai se meter mais na minha vida.
— Você não ousaria...
Ergui-me e me afastei, fitando seus amigos. O irmão dele parecia triste.
— Escolha dele, vocês viram. Com licença, preciso fazer uma ligação.
— Saí antes que dissessem algo.
Capítulo 7
Sensações

ANGELINA
Liguei para o Johnny.
— Oi, princesa — respondeu, animado. — Os meninos estão bem.
— Eu sei, Johnny, confio em você.
— Como foi o jantar? Deu tudo certo quanto ao livro?
Suspirei.
— Você não vai acreditar no que aconteceu hoje.
Contei tudo brevemente.
— Sério? — abismou-se. — Encontrou com os dois?
— Sim, mas eu te liguei para pedir um favorzão. — Mesmo ele sendo
gay, corei ao pensar no que viria a seguir.
— Você pode pedir o que quiser, Borboleta. Charles e eu estamos aqui
para ajudá-la.
— Sabe aquelas cenas do livro, as mais picantes, onde a garota está
amarrada e o cara faz várias coisas com ela? — sussurrei.
— Sim — respondeu, meio confuso.
— Então, o Daniel disse que faltou sentimento ao descrevê-las... Pela
minha falta de experiência com o assunto. — Sacudi a cabeça. — Já
imaginou uma mulher de quase vinte e quatro anos que nunca teve um
orgasmo?
Ele riu.
— Está perdendo a melhor sensação do mundo.
— Pois é! Por isso liguei.
Expliquei o meu plano para fazer Ryan sair da concha em que vivia.
Envolvia o maldito ficar sabendo que Johnny me ajudaria nas cenas do livro.
Esperava que, quando descobrisse, admitisse seus sentimentos. Sem dúvida,
eu não ficaria com meus amigos, pois só tinha olhos para um homem.
— Vamos fazer isso sim, por você — falou Johnny. — Tomara que ele
faça o que espera, Angelina. Não quero que sofra.
— Obrigada, Johnny, aguardo sua ligação. Ele precisa ouvir e pensar
que vai me ajudar. — Também torcia para Ryan ficar comigo.
Desliguei e voltei para a mesa onde estavam todos jantando.
— Não sinto nada por ela — ouvi Ryan dizer a alguém.
Falava de mim, lutando contra suas emoções para não dar o braço a
torcer.
— Que bom que você pensa assim, significa que você não vai se meter
com o que vou fazer assim que eu sair daqui. — Sentei na cadeira ao seu
lado e troquei um olhar com as meninas.
Sua expressão era tempestuosa.
— O que pensa em fazer? — rosnou com os punhos cerrados.
— Tic tac — sussurrei friamente. — Sua escolha foi feita, esqueceu?
Sou livre para fazer o que eu quiser.
Expirava sôfrego, se controlando.
Ignorei-o e avistei os frutos do mar nos pratos de todos, inclusive no
meu. Por que era alérgica a isto? Busquei Daniel, procurando uma resposta a
uma pergunta estúpida: só tinha este tipo de comida ali?
— Pedi para você, não sabia o que queria, então escolhi lagosta.
— Obrigada, mas vou deixar passar. — Empurrei a refeição para o
meio da mesa; todos pararam de comer e se voltaram a mim.
— Por que não vai comer? — perguntou Rayla. — Não gosta de
lagosta?
— Não é isso. — Sorri gentilmente. — Sou alérgica a frutos do mar.
Quando tinha treze anos, comi e fiquei uma semana respirando com ajuda de
aparelhos em um hospital.
Tentei não pensar naquela ocasião. Ângela se enfureceu comigo,
brigava a cada dia para eu prestar mais atenção no que ingeria.
— Oh, por que não me disse quando eu mandei a mensagem com o
nome do restaurante? — questionou Daniel, confuso.
— Acho que estava nervosa demais sobre o livro, não prestei atenção,
desculpe. Mas aproveitem — sussurrei, envergonhada.
— Se você quiser, podemos ir a outro lugar — sugeriu Daniel, pronto
para se levantar.
— Não se preocupe, eu já estava de saída. Preciso fazer algo com
Johnny.
— O que vai fazer com esse idiota às onze horas da noite? — grunhiu
Ryan.
Fuzilei-o.
— O único idiota aqui é você — rosnei. Ao mesmo tempo, meu telefone
tocou e atendi. “Bingo, bem na hora, Johnny”, pensei. — Oi, querido, qual
foi a resposta do Charles? Vai me ajudar com as cenas do livro?
Escutei algumas pessoas ofegarem (os homens, pelo menos; as meninas
sabiam do plano). Quem fez mais alto foi Ryan.
— Charles concordou, se ele participar também — anunciou meu amigo
com um sorriso na voz. Disse isso caso o Ryan pudesse ouvir algo. Mesmo
assim, eu engasguei com a bebida. Não sabia o porquê, já que não faríamos
nada, era apenas atuação.
— Angelina... Sinto muito, pensei que ele escutaria — falou.
— Desculpe — pedi aos demais. Coloquei a bebida na mesa e olhei
para o Daniel. Meu rosto deveria estar vermelho, contudo, precisava
terminar meu plano.
Sam assentiu, ao que seu marido estreitou os olhos, passeando-os entre
nós, desconfiado. Não liguei. Esqueci meu rosto rubro e fui adiante.
— Você acha que um ménage com dois caras resolveria o meu
problema em relação às sensações descritas no livro? Charles disse que
Johnny só concorda se ele também participar. É claro que não vai haver
sexo, e sim... outras coisas... — Tentei soar normal, ignorando o setor
masculino da mesa.
Alguns homens engasgaram com a comida, e outros com as bebidas.
Desconsiderei, focando em um Daniel espantado.
— Oh, com certeza...
— Tantos homens aqui e você vai estudar as cenas com esses caras?
Garota má — Bryan sorriu para mim.
Retribuí o gesto. Se ele soubesse que tudo fora armado entre eu e as
meninas...
— Fechado, Johnny, passarei no Belas Country e comprarei o mousse,
depois vou para sua casa... — De repente, meu telefone sumiu da minha mão
e voou para o outro lado da sala, batendo em uma janela de vidro que virou
apenas cacos. Os outros frequentadores do restaurante se assustaram.
Não me importei com o julgamento de estranhos, mas com as íris
afiadas de Ryan em mim, furioso. Esperava uma reação dele, todavia, não
isso.
— Que droga você pensa que está fazendo? — disse, me erguendo, sem
alterar a voz, pois não queria chamar atenção de ninguém, ao contrário dele.
— Sabe quantos meses levei para pagar aquele celular, seu estúpido?
Ele se levantou também.
— Eu compro outro, aliás, te dou uma maldita loja de smartphones se
quiser — gritou de volta. — Acha que tenho sangue de barata para ouvi-la
dizer essas coisas na minha frente?
Explodi. Certo, era tudo planejado, sim, apenas não contava que ele
fosse ficar tão furioso a ponto de quebrar meu celular. Por que simplesmente
não falava “Não fique com o Johnny, o único que tocará em você sou eu.
Você é tudo que eu quero, Angelina”? Por que complicava tudo? Ele me
deixou com raiva.
— Não foi você mesmo quem jurou não sentir nada por mim? Fez a sua
escolha, não reaja como um namorado traído. — Minhas mãos tremiam,
então as cerrei para não voar no pescoço dele e estrangular aquela cara
linda.
— Isso foi para me testar? — perguntou, descrente.
Trinquei os dentes e falei através deles:
— Não preciso testá-lo. — Ele estava mais certo do que imaginava. —
Mudou de ideia? Quando eu sair por aquela porta, não quero vê-lo nunca
mais na minha vida, entendeu? Decida já.
Ryan ficou calado. Era o fim de tudo, ele jamais insistiria em mim.
Precisava ir embora para cair na cama e chorar sozinha por um amor não
correspondido.
— Levo você para casa — informou Daniel. — Afinal, viemos juntos.
— Não é necessário, vou de ônibus ou de táxi — murmurei.
— Nem pensar — falou Ryan.
— Você perdeu o direito de opinar sobre a minha vida a partir do
momento em que fez sua escolha — sibilei. Todos seus amigos estavam de
olhos arregalados, inclusive o irmão dele, que parecia triste. Sam e as
meninas também estavam, pois nosso plano furou, e bem furado. —
Desculpem-me qualquer coisa, tenho de ir embora.
Saí de lá sem olhar para trás. Ouvi chamarem pelo Ryan, e antes que eu
chegasse à porta de vidro de correr, ele segurou meu braço.
— Se quer conversar, então vamos — falou.
O restante do grupo apareceu também.
— Não vou impedir que a leve, mas se a tocar sem sua vontade, aí
teremos problemas — Bryan ameaçou, num tom de policial impondo uma lei.
— Nunca a machucaria — sussurrou, vulnerável. Ryan olhou para
Alexia: — Você pode ir com Bryan ou Jordan? Preciso falar com ela
sozinho.
A garota sorriu e assentiu, piscando para mim, tal qual Sam e Rayla. Eu
não disse nada, não sabia o que pensar, tudo dependeria de nossa conversa.
— Não se preocupe comigo, vou ficar bem — garantiu.
— Onde vai levá-la? — perguntou Daniel.
— No Belas Country, aonde ela já ia antes. Se quiserem, nos
encontramos lá. — Deu de ombros.
Minutos depois, estávamos voando no seu Bugatti Veyron preto. Já
andara nele, nas várias caronas que me deu para o serviço. Por dentro, era
caramelo-ouro, com costura tipo diamante, alguns detalhes em prata, e
diversos botões que eu não sabia nem para que serviam. Tudo ali gritava
“grana”, assim como os demais pertences de Ryan.
O Belas Country ficava alguns quilômetros antes da entrada do distrito
de Bronx. Assustei-me ao conferir o velocímetro, que constava 260 km/h.
— Dá para ir mais devagar? — pedi, irritada. — Não estou a fim de
morrer em um acidente de carro, tenho duas crianças dependendo de mim.
Ele não respondeu, mas reduziu para 100 km/h. Parou o veículo no
acostamento da rodovia logo em seguida. Um Porsche passou por nós —
pelo menos eu acho que era um Porsche —, e outro carro que não deu para
ver, pois estava escuro. Ambos buzinaram; ouvi Bryan gritar:
— Aproveitem!
Outros quatro carros os seguiram. Um eu acho que era do Lucky, o outro
era do Daniel. Já os dois últimos não reconheci, talvez do cara tatuado e da
irmã de Ryan. Não deu para registrar as marcas; corriam muito.
— Dirija, Ryan, não pode estacionar nesta rua deserta. Quer que alguém
roube seu carro? Ele deve valer uma fortuna!
— Dois milhões — falou em voz baixa.
Fiquei espantada.
— Mais um motivo para irmos embora daqui. — Minha voz saiu fraca.
— O que vai fazer além de me raptar?
— Anjo... — Vi a dor naqueles olhos lindos através da luz do painel de
controle. — Você ia mesmo ficar com aqueles...
— Por que se importa com isso, se não quer nada comigo? Não vou
esperar que um dia me queira. Não sou desse tipo — sussurrei, abrindo a
porta e saindo. Fiquei na frente do automóvel, que estava com faróis ligados.
Ele também saiu e me pegou pela cintura, me abraçando e devorando a
minha boca com uma fome incontrolável. Nossa paixão seria capaz de
devastar o mundo, e eu nem teria notado.
Seus beijos eram urgentes e estridentes. Chupou a minha língua, me
fazendo ofegar de prazer em sua boca. Coloquei as mãos em seus cabelos
lindos e sedosos, trazendo seu rosto mais para o meu, querendo que ele
matasse aquele desejo que eu estava sentindo.
Senti minha bunda no capô do carro. Ryan ficou ali, entre as minhas
pernas, se esfregando com tamanho atrito. Alguma parte racional do meu
cérebro queria reclamar que estávamos em uma rodovia e a qualquer hora
poderia passar alguém, mas não liguei, apenas sentia a sua necessidade
contra a minha de forma louca. Prendi minhas pernas em sua cintura,
apertando mais seu quadril no meu.
Nossa! Era uma sensação maravilhosa, ele me agarrando desse jeito,
como se quisesse se fundir comigo. Deitou-me no capô do carro e se dobrou
em cima de mim, tomando a minha boca. Meus lábios se inchavam pela força
do beijo. Ele estava com gosto de whisky, um sabor dos céus. Suas mãos
desciam pelo meu corpo e abaixaram o meu vestido, o suficiente para exibir
meus seios. Os lábios desceram para o meu pescoço e peito. Também senti a
parte de baixo do meu vestido subir acima da cintura. Fiquei nua para ele, e
não me incomodei.
— Você não está usando calcinha — sussurrou sedento, beliscando
meus mamilos.
Arfei com a excitação, quase implorando por seu toque.
— Calcinha deixa marca no vestido — falei. Sentia sua dureza ali, na
minha pele. Suas mãos vagueavam por todo o meu corpo. Ele colocou a boca
no meu seio direito e sugou-o, faminto.
— Nossa! Eles são fabulosos. — Apertou mais forte, acredito que
gritei de êxtase. — Pode gritar, Anjo, estamos sozinhos. Aposto que faço
você gozar só chupando esses seios lindos e saborosos.
Ele estava certo. Quando cheguei lá, gritei tão alto que meus ouvidos
até doeram. Foi belíssimo, vi milhares de estrelas. Ryan não parou por aí:
desceu seus lábios pela minha barriga, passando a língua. Meu corpo mexia
como o de uma lagarta na areia quente, tanto era o fogo que o incendiava dos
pés à cabeça. Ele circulou a língua no piercing no meu umbigo.
— Quis fazer isso desde o dia em que o vi na sua casa, e você vestindo
aquele maldito shortinho curto. Não sabe o quanto me segurei para não
rasgá-lo e me enterrar dentro de você.
Eu arfava, almejando que matasse aquele fogo a me incendiar.
Ele pegou as minhas coxas, que estavam em volta de sua cintura,
dobrou-as e botou-as em cima do capô do carro, com salto e tudo.
— Ryan, os saltos vão riscar o carro — balbuciei, ofegante, e já ia
tirando as pernas, mas ele as colocou de volta no capô, deixando-as abertas
e vulneráveis para si.
Seu rosto se ergueu, fitando-me com um meio sorriso libertino. Por
onde seus olhos passavam, faziam surgir labaredas pelo meu corpo.
— Uma verdadeira obra de arte em cima do meu carro e acha que me
importo com uma pintura? — soprou com fervor, levando sua face até as
minhas partes íntimas, que nunca tinham sido tocadas por ninguém. — Não
sabe o quanto eu sonhei com isso...
Logo sua boca estava lá, me devorando. O fogo foi tanto que me erguia
do capô, achando que sairia voando. Suas mãos eram as únicas coisas que
me mantinham firme, enquanto me degustava, ou melhor, me consumia.
Parecia estar sobre brasas vivas. Arqueei-me, necessitando de mais dele, a
ponto de gritar. Agarrei seus cabelos, o sentindo chupar meu clitóris com
força e fome. A sensação de outro mundo levou-me a mais um orgasmo
alucinante.
— Isso é só meu. — Sugou a região, dando ênfase ao que disse. Suas
mãos foram para os meus seios. — Eles também.
Gemi e não respondi, sabia que não era verdade, mas não pensei nisto
no momento ou estragaria tudo. Urrei seu nome ao chegar ao terceiro
orgasmo. Nem sabia que isso era possível, ter orgasmos múltiplos; pelo
visto, sim.
— Isso, Anjo, grite o único nome que vai sair dessa boca linda quando
estiver gozando — sussurrou com a voz embargada de desejo.
Ryan levantou o corpo, tirando sua jaqueta e camiseta, expondo aqueles
músculos perfeitos e definidos. Desabotoou as calças e puxou-as para baixo,
junto com sua cueca boxer, deixando sua beleza dura e reta para mim. De
repente, me senti tensa, não querendo fazer isso. Não queria que minha
primeira vez fosse desse modo. Pretendia perder a minha virgindade com um
homem que me amasse, que quisesse estar comigo sempre, e não um que
tinha medo dos seus sentimentos por mim. Esse cara não era o Ryan, e nunca
seria, independente de minha vontade.
— Relaxe, Anjo, não vou transar com você aqui, jamais tiraria sua
virgindade no capô do meu carro.
Eu corei.
— Oh! Então você quer que eu coloque a boca? — Apoiei-me nos
cotovelos e levantei a cabeça para olhar melhor seu corpo perfeito e pronto,
com sua ereção ali, diante de mim.
Ele sorriu para mim e se curvou, beijando meu rosto vermelho de
vergonha, afinal, eu nunca tinha feito isso.
— Vou usar sim essa boquinha linda e saborosa, mas não hoje. —
Beijou-me. Senti seu gosto agridoce. — Você é deliciosa.
Senti-o lá na minha entrada e fiquei tensa.
— Relaxe — pediu de novo. — Não vou entrar, apenas quero esfregar
meu pau nestes lábios rosados da sua boceta gostosa, e neste broto que está
inchado e vermelho de tanto eu chupá-lo.
Ofeguei com sua boca suja. Nunca pensei que gostaria que um cara me
falasse obscenidades, porém, escutando Ryan, adorei. Meu fogo aumentava a
cada segundo. Eu o senti se esfregando na minha entrada e no meu clitóris, e
tudo parecia que estava explodindo dentro de mim.
— Ryan! — Minhas mãos foram para as suas costas e pressionei-me
mais junto a ele. Acho que minhas unhas entraram em sua pele, mas não
reclamou de dor, então deixei passar. Gozei com um grito rouco, e logo
depois senti seu corpo tenso, bem como o esperma caindo pela minha
entrada e descendo para o capô do carro. Arquejávamos após o clímax de
outro mundo. Ficamos os dois ali, moles, tentando recuperar o fôlego.
— Promete que ninguém nunca vai tocar neste corpo, Anjo? — Beijou e
lambeu meu pescoço.
— Não posso prometer isso — sussurrei. Precisava que ele decidisse
agora ou tudo acabaria hoje.
Ryan se desvencilhou de mim, como se eu tivesse batido nele, e ficou
na minha frente, me mirando com os olhos de ventania, mortificado.
— Você não pode querer outro cara depois do que acabamos de ter
aqui. — Soava vulnerável novamente.
Levantei-me do carro, notando as minhas pernas molhadas.
— Limpe-se com a minha jaqueta. — Sua voz estava grossa, mais do
que o normal.
Havia dor em sua face. Eu me senti mal por isso, mas era preciso fazê-
lo enxergar o que estava em jogo caso não decidisse logo. Segurei as alças
do meu vestido, cobrindo meus seios nus. O clima estava um pouco frio; não
liguei. Peguei sua jaqueta atirada no capô e me limpei. Abaixei meu vestido,
arrumando-o para não parecer amassado, um problema sem muita solução.
Procurei por arranhões no capô, e não deu para ver direito, devido à
escuridão e à cor do veículo — preto. Parecia amassado.
— Quantas vezes você já transou neste carro? — perguntei, colocando
a mão na sua cintura.
Soltou um suspiro desalentado, vestindo sua camiseta e passando as
mãos nos cabelos.
— Tenho certos limites. Não transo na minha casa, na minha empresa e
nos meus carros. Você foi a exceção.
Meu coração idiota quase teve um infarto. No entanto, precisava
esclarecer as coisas.
— Ryan, mesmo que nós tenhamos feito isso aqui, você não vai dar o
braço a torcer, e eu não posso ficar te esperando até estar pronto para ficar
comigo. — Expirei. — Eu não posso...
Fiz menção de voltar ao carro, ignorando seus olhos angustiados, mas
ele me puxou para seus braços, pondo uma mão atrás do meu pescoço e
aproximando meu rosto a centímetros do seu; com a outra, apertava a minha
cintura. Segurava-me firme, como se não quisesse me soltar nunca. Escondeu
a face nos meus cabelos, e ouvi-o suspirar contra a minha pele.
— Não suporto a ideia de alguém fazendo tudo que acabei de fazer com
você e muito mais. — Esquadrinhava os dedos de sua mão em minha pele.
— A escolha é sua, Ryan. Assim não dá para ficar. Eu me apaixonei por
você, e você por mim, tenho certeza.
Afastou o rosto do meu. Por um momento, achei que ele ia negar, tal
qual sempre fazia. Todavia, me deu um sorriso brilhante.
— Nunca imaginei que esse dia chegaria. — Pegou uma mecha de meu
cabelo e inalou-a, como se fosse a coisa mais cheirosa do mundo.
— Que dia? — indaguei com esperança. Meu coração estava
descompassado de medo dele não aceitar o que sentíamos um pelo outro.
Tomou meu rosto em suas mãos e olhou bem no fundo dos meus olhos,
intenso.
— O dia em que seria domado por uma mulher — disse com fervor.
Eu ri, em meios às lágrimas.
— Isso quer dizer que vamos namorar de verdade?
Limpou as gotas que caíam pelo meu rosto, beijando-me com
suavidade.
— Não sou bom em relacionamentos, na verdade, nunca tive em um —
assumiu. — Mas acredito que, se eu fizer besteira, você vai me pôr na linha.
Arrastei minhas mãos por debaixo de sua camiseta, tocando sua barriga
tanquinho.
— Com certeza — assenti, emocionada, e depois fiquei séria: — A
única coisa que nunca perdoarei é se você me trair, Ryan. Aprenda com
Caim.
Não obstante, com Caim foi diferente; desisti dele por amor, um amor
lindo e puro. Pesando na balança hoje, entre o que eu sentia pelo Ryan, sabia
que nunca conseguiria desistir dele igual fiz com Caim, por ninguém, nem
mesmo por Ângela.
— Jamais faria isso, Anjo... Desde que a conheci, você é a única em
que penso. — Pôs as mãos na minha bunda e puxou meu quadril para o dele.
Senti seu monte grande ali, a todo vapor. — Isto aqui prova que só você tem
esse poder sobre mim.
Engasguei com o fogo renascendo. Não podíamos fazer isso ali de
novo, tivemos sorte de ninguém passar com o carro. Era melhor não abusar.
— Ryan... — Minhas pernas já estavam bambas.
— Eu sei. — Beijou meus lábios mais uma vez e se afastou. — Vou me
comportar até o jantar no Belas Country.
— O que vai acontecer depois? — perguntei, entrando em seu
automóvel, deixando a jaqueta suja aos meus pés para ser lavada.
Ele me olhou de lado enquanto dava partida.
— Você não vai escrever as cenas do livro? Não acha que eu vou
deixar aqueles dois... Céus, só de pensar nisso me dá vontade de matá-los!
— Apertou suas mãos no volante; os nós dos dedos ficaram brancos.
Deitei a cabeça em seu ombro, tranquila pela sensação maravilhosa de
tê-lo ali perto, sabendo que tudo era real, que me queria de verdade e não
lutaria contra.
Estava perto de contar a ele que foi tudo armação para sair da redoma
em que vivia e aceitar o que sentia por mim. Entretanto, Ryan parou seu
carro e me beijou, me fazendo esquecer do resto.
Chegamos ao Belas Country, o restaurante caipira onde amava ir. A
entrada revestida de pedrinhas brancas formava um corredor grande,
levando a uma porta de vidro de correr. O telhado era de palha, na forma de
chapéu de camponês, com uma placa grande piscando em vermelho, trazendo
o nome do restaurante. Já escutava a música country lá de dentro.
Ryan me puxou para seus braços, beijando a minha testa.
— Você é só minha, e eu serei somente seu, para sempre — jurou com
fervor, tomando meus lábios de novo, faminto. — Com você, nunca é o
suficiente. Vamos entrar antes que eu mude de ideia e a leve embora daqui.
Assenti, meio tonta pela intensidade do beijo. Estava molhada de novo
só de sentir seu toque e sua voz sexy. Céus, a sensação de gozar era
maravilhosa, fora do comum. Foi algo tão intenso que pensei que
desfaleceria em seus braços. Amaria ter mais sensações como aquela, tudo
com ele.
Capítulo 8
Trato

ANGELINA
Entramos no grande salão. Do lado direito, havia mesas de madeira
com cadeiras de carvalho branco, e várias pessoas sentadas. Do outro lado,
ficava um palco de madeira com som baixo e microfones. Ali se faziam os
shows ao vivo. O meio se destinava a quem quisesse dançar música country.
A maioria das pessoas usava roupas ao estilo do local: botas, calças jeans,
camisas xadrez e chapéus de caubói.
— Preciso ir ao banheiro me limpar — cochichei em seu ouvido.
Ele riu, beijando meu rosto.
— Se quiser companhia...
Enrubesci.
— Oh, não! Se entrarmos os dois, não sairemos de lá tão cedo.
— Esta é a ideia.
— Seja bonzinho — repreendi.
Fui para o banheiro me limpar e ajeitar meus cabelos. Quando saí, me
deparei com Ryan tirando fotos com três garotas, duas abraçadas nele, e
olhando para a câmera do celular de uma loira. As que estavam com ele
eram morenas e usavam saias curtas, botas de cano alto e top. A do lado
direito, esbelta, tinha uma mão sobre seu peito, bem onde eu tocara minutos
antes. Vê-lo com essas mulheres cortou meu coração, senti-me traída.
Cheguei perto da loira que tirava as fotos e estava de costas para mim.
Os olhos do Ryan encontraram os meus. Seu sorriso brilhava, à
semelhança de um diamante no sol. Ao ver minha expressão fechada, a cara
de felicidade sumiu como uma luz sendo apagada.
— Anjo...
Li meu apelido em seus lábios, contudo, ignorei e fui sentar numa mesa
grande, no canto, meio afastada da multidão. Ali estavam todos seus amigos
— que já considerava meus também. Do lado esquerdo, ficava Sam, seguida
por Lucky, Rayla e seu namorado. No direito, alguém que ouvira chamarem
de Jordan, Daniel, Alexia e Bryan.
Ryan gritou meu nome, mas segui em frente. Ia me sentar na cadeira
perto do Daniel, deixando um assento vazio à minha esquerda para o Ryan;
antes disso, ele pegou a minha mão e apertou-a delicadamente, fitando meu
rosto.
— O que foi? — indagou, confuso.
Virei a cabeça de lado, concentrada em seus olhos lindos. Como tinha
coragem de perguntar?
— As garotas tocando em você. — Sentei, acompanhada por ele.
— Só estava tirando fotos — respondeu baixinho.
— Certo. — Céus, um homem que teve milhares de mulheres devia
saber que nenhuma garota ficaria feliz com isso. Ryan nunca ligou para
ninguém para entender a gravidade da situação. — Como se sentiria se eu
tirasse fotos abraçada com Bryan, Daniel, Jordan e este aqui? — Fitei o cara
musculoso que parecia ser lutador ou algo do tipo.
— Jason — apresentou-se.
— Você luta? — sondei, intrigada.
Ele se voltou à Sam, e depois a mim, sorrindo.
— Sim, como descobriu?
— Seus músculos. — Apontei com os dedos para o corpo tatuado.
Desta vez ele riu, ou melhor, gargalhou, e não foi o único.
— Luto sim...
— “Bala” é seu apelido no ringue — contou Sam.
— Sério? Por quê?
— Porque quando estou no ringue, só tenho um objetivo: derrubar meu
oponente com um único soco e ganhar a luta. — Piscou, sorrindo de lado. —
Já foi em alguma luta antes?
Assenti de forma dúbia. Esperava poder vê-lo competir um dia, seria
interessante.
— Sim, uma vez, mas era em um clube clandestino...
— O que fazia em um clube de luta clandestino? — indagou Jason antes
do Ryan, que já ia abrindo a boca para falar.
— Minha amiga é da polícia. Ela estava investigando esse lugar, fui
junto para não deixá-la sozinha. Algo bem estúpido, já que é uma policial...
Bom, aconteceu uma briga com uns caras que queriam ficar com a gente. Um
deles passou a mão em sua bunda; ela não vestia o uniforme, e sim um par de
calças coladas, mostrando suas curvas. — Imitei um violão com as mãos. —
Aí, como diz um certo ditado, “A merda caiu no ventilador”.
— O que houve? — Jason parecia bastante interessado.
Ri, sacudindo a cabeça.
— Oh, ela não deixou barato, pegou a mão do cara e quebrou dois
dedos dele. Acho que até hoje ele não pode ter filhos, após ela fritar suas
bolas. — Passei as mãos nos cabelos.
— Garota, me apresente essa mulher — pediu, risonho. — Gosto de
gente assim.
Sorri.
— É mesmo linda, tem um metro e setenta e sete, cabelos loiros cor de
ouro, olhos verde-esmeralda e um corpo que todo homem adoraria tocar.
Quando ando com ela, os caras babam. Aposto que se os mandar ajoelhar,
eles fariam sem questionar.
Jason se curvou para frente com as mãos sobre a mesa, me olhando
intensamente.
— Como sabe que os caras não estavam babando por você? Afinal,
você é linda. — Levantou as mãos e mirou Ryan após seu rosnado: — Só
declarando o óbvio.
Revirei os olhos.
— Vamos dizer que ela tem curvas bem distribuídas pelo corpo. E só
um defeito...
— O quê?
— Sua boca...
— Ela não tem dentes?
Gargalhei.
— Johnny a chama de... — curvei-me para frente e falei baixo: —
“amolecedor de pênis”.
Todos na mesa riram, enquanto Jason fez uma careta.
— O que isso quer dizer? Que ela não é boa de cama? Esse Johnny já
ficou com ela?
— Dificilmente, já que Johnny é gay. Foi ele quem sumiu com meu
arquivo do hospital. É casado com Charles. E se eu tivesse uma fortuna em
mãos, daria tudo ao cara que conseguisse chegar nela com sucesso... Ela
praticamente odeia a “escória” que são os homens. Palavras dela, não
minhas.
— Escória? O que houve com ela para reagir assim?
— Bem, a conheci na Universidade de Columbia, há quase cinco anos.
Depois, se mudou para Trenton, fugindo de um cara que a usou. Não sei bem
a história, ela não me disse, porque doía falar sobre ele. Esse cara a quebrou
de uma forma que considero irreversível. Não perguntei, afinal, também
tinha a minha dor naquela época e não gostava de falar disso. — Expirei,
olhando um aquário repleto de peixinhos, não deixando minha mente
regressar àquela época. — Era doce, meiga e tímida, logo no começo. Usava
vestidos compridos, cabelos presos em um rabo de cavalo e óculos de grau,
bem nerd, digamos. Certo dia, porém, apareceu toda arrumada na faculdade,
vestindo uma calça de couro que abraçava seu corpo com espartilho, e que
mostrava seus bem formados seios. Não de um jeito vulgar, e sim sexy. E
abandonou os óculos. Foi quando nasceu essa garota com nova
personalidade. Em vez de sua beleza e elegância fazerem os homens caírem
aos seus pés, ela os expulsava como uma peste.
— Decerto em razão de um trauma grande que teve. Cada pessoa encara
do jeito de que carece para tentar de alguma forma aliviar sua dor —
declarou Sam. Sorriu ao ver meus olhos arregalados. — Sou psicóloga. Pelo
modo como foi machucada por esse cara, sentiu necessidade de se afastar
dos homens em geral.
— Oh! Acho que por isso ela entrou para a polícia, para se resguardar.
É também uma tremenda lutadora.
— Onde ela está? E qual é o seu nome? — perguntou Jason, intrigado.
— Trenton, Nova Jersey. Fui lá no ano passado, em sua casa, quando
visitamos o clube de luta clandestino. Eu a chamo de Borboleta... — falei.
Também estive em sua casa após pegar os exames de Shane.
Ele arfou de olhos arregalados.
— Borboleta? — Sua voz saiu sufocada, e a face parecia torturada.
— Sim, apelidei-a assim e ela odeia. Tem uma borboleta nas costas,
acima da bunda. Eu tenho uma igual, que ela me obrigou a fazer para selar
nossa amizade.
— Qual o nome dessa mulher? — indagou Jason, nervoso.
Todos da mesa olhavam para ele para tentar entender seu
comportamento, principalmente a Sam, que estava com o cenho franzido.
— Tabitta Rodrigues — respondi, avaliando sua reação. Tomou sua
bebida em um gole e fechou as pálpebras em agonia. — Você a conhece?
Abrindo-as, me encarou de forma distanciada, inalcançável. Não
compreendi.
— Não — respondeu somente, desviando o rosto.
O grupo ficou em silêncio por um segundo. Pensei que ele conhecia
Tabitta... Talvez ela só o lembrasse de alguém de seu passado. Foquei no
agora, e em não me meter na vida dos outros, pois se quisesse que
soubéssemos de algo tão pessoal, ele mesmo nos diria.
Mirei Ryan, que estava de cenho franzido na direção de Jason, mas logo
se voltou a mim, sorrindo.
— Então, vai responder à pergunta? — retomei nossa discussão. Ele
ergueu uma sobrancelha. — Como se sentiria me vendo tirando fotos, bem
colada, com seus amigos homens?
Suspirou.
— Ficaria furioso, pronto para matá-los — disse, chegando bem perto
de mim, pegando meu rosto entre suas mãos e olhando no fundo dos meus
olhos. — Prometo não deixar ninguém mais me tocar, satisfeita?
Sorri com deleite e dei um selinho nele.
— Completamente — respondi e me afastei de suas mãos. O restante da
mesa demonstrava surpresa com nosso diálogo, inclusive Jason, cujos olhos
cor de chocolate, no fundo, continuavam em chamas. — O que foi?
Rayla ergueu as sobrancelhas:
— O que você fez de tão bom para domar meu irmão? — Passou as
unhas vermelho-sangue na borda da taça, sem tirar os olhos de nós dois. —
É praticamente um milagre.
— Sou boa com cavalos. — Ri.
Ryan rosnou, e os demais caíram na gargalhada, até Jason. Agradeci por
ele sorrir novamente. Não sabia o que o deixou triste, esperava que ficasse
bem.
— Minha tia me deu o Neve quando eu tinha quatorze anos, era um
cavalo selvagem. Foi uma luta para ele permitir que o montasse. Finalmente
consegui, e até hoje sou a única. Por isso, fiz uma promessa a ele: só me
casarei com o homem que conseguir montá-lo. Acho que vou morrer solteira
— brinquei.
— Por isso você disse que esperava o príncipe encantado montado em
um cavalo branco? — Ryan entornou um gole longo de sua bebida.
— Sim. Não precisa ser um príncipe, apenas conseguir domá-lo. Levei
um ano para isso. — Fitei seu rosto temporariamente pálido. — O que foi,
Ryan?
Ele sacudiu a cabeça.
— Por que se importa tanto com a opinião de um cavalo?
— Ele não é só um cavalo... Não vai me dizer que está com ciúmes do
Neve?
Estreitou os olhos.
— Não tenho ciúmes — rosnou.
— Não? — Rayla riu, explicando a mim: — Ryan tem medo de
cavalos. Quando era criança, caiu de cima do seu pônei e nunca mais
montou.
Arregalei os olhos.
— Sério? Interessante!
Frio, Ryan virou da irmã para mim, com uma expressão de congelar o
oceano.
— O que é tão interessante? — cuspiu.
Ignorei o seu tom.
— Você é um homem...
Sorriu, zombeteiro, deixando a sua raiva para trás.
— Até agora há pouco, da última vez que chequei, era, sim.
Corei, recordando o que nós fizemos no carro. Tentei recuperar meus
pensamentos.
— O que estou dizendo é que você é forte para lutar por aquilo que
quer. Todos aqui são, eu acho. Quando você deseja algo que vale muito a
pena, tem de ir atrás, lutar, perseverar. Fiz isso com o Neve, não desisti dele.
Portanto, me tornei boa em domar cavalos.
Ele grunhiu.
— Eu não sou um animal — sibilou através de seus dentes trincados.
— Não, você parece mais um ogro ou um homem das cavernas. —
Beijei seu rosto lindo, que fazia uma careta. — Você quebrou meu celular
com raiva, tudo para eu não ir...
Seus olhos ficaram escuros.
— É melhor nem terminar isso, se não quiser que eu mate aqueles
dois...
— De que estão falando? — inquiriu Rayla, ainda atônita ao constatar
que Ryan era de fato capaz de sentir ciúmes de uma mulher. O inferno devia
estar congelando. Logo ela sorriu, batendo palmas: — Está se referindo ao
Johnny e Charles? Eles só ajudaram a armar para salvar o relacionamento de
vocês.
Ryan arregalou os olhos para todas nós mulheres, que ríamos com
cumplicidade.
— Você não ia ficar com eles?
Sacudi a cabeça.
— Não, mas precisava fazer você enxergar que podia me perder caso
não desse o braço a torcer.
— Não acredito que fui enganado por vocês — grunhiu.
— Funcionou, não é? — sussurrei, pegando a carne assada que estava
sobre a mesa em uma bandeja grande. Também tinha farofa de tomate com
carne seca e salada. Coloquei um pedaço de carne na boca, fechando os
olhos por um segundo, sentindo o sabor delicioso e o alimento se
desmanchando ali. Eles trouxeram a comida antes que chegássemos, Ryan e
eu. Mergulhei outro pedaço no molho vermelho.
— Sou apaixonada por este molho. Venho aqui duas vezes por semana,
talvez até mais, dependendo do tempo.
— Você come isso tudo e continua com esse corpo? — Rayla gesticulou
para mim com uma inveja amigável. — Queria ser assim.
Sorri.
— Você é modelo e tem um corpo lindo. Dizem que algumas ficam
muito tempo sem comer para conseguir. — Engoli a carne, fazendo esforço
para não gemer devido ao gosto fabuloso.
— Sim, muitas fazem isso. E você aí, comendo de tudo!
— Você é linda, Rayla! Não precisa se preocupar com a comida. Gosto
de você do jeito que é, magra ou gorda. — Alex riu da careta dela com a
palavra “gorda”. — Para mim, é perfeita.
Pareceu aliviada com isso.
— Hummm, obrigada.
— É uma questão de metabolismo, não sou de engordar facilmente, vem
de família.
— Deus abençoe a genética. — Ela sorriu para mim.
— Parem de olhar a minha mulher — reclamou Ryan para os caras da
mesa.
Eu ri.
— Céus, Ryan, controle esse ciúme. — Bebi o meu chá, observando os
caras solteiros. — Não faço o tipo deles.
Ryan riu com desdém.
— Anjo, você é cega, a única que não nota o tanto que sua beleza
resplandece em todo o lugar que entra.
Bufei.
— Não é verdade. O que eu quero dizer é que vocês quatro — dirigi-
me a Bryan, Daniel, Jason e Jordan — gostam do fácil, porque o que vem
fácil, vai embora fácil, assim não precisam se prender a ninguém ou dar
satisfação. Os outros já foram domados. — Apontei para Lucky, Alex e
Ryan. — Só falta vocês.
Bryan riu com a ideia de ele ser fisgado por uma mulher.
— Desculpe, garota, isso não vai acontecer comigo. — Exalava
confiança.
Reparando nele, no entanto, via como olhava para Alexia sempre que
ninguém estava notando. Significava que tinha uma queda por ela, com
certeza, talvez virasse algo a mais no futuro.
— Vamos ver! Humm, aposto que até o final do ano que vem, vocês
quatro também já terão sido fisgados por mulheres — falei, tomando meu
chá.
Desta vez foi Jordan quem gargalhou alto.
— Aposto um Bugatti nisso...
Engasguei com a bebida e tossi. Ryan deu uma palmadinha nas minhas
costas.
— Você está bem? — sondou, preocupado.
Antes que eu dissesse alguma coisa, os outros ali começaram a soltar
suas apostas.
— Dou uma Ferrari zerada. — Jason piscou para mim.
Estava de olhos arregalados, muda.
— Eu, uma Maserati — anunciou Daniel, sorridente.
Sacudi a cabeça, tonta.
— Eu apostaria um carro como esses, mas não tenho dinheiro para
isso... Só agora comprei uma Range Rover para mim.
Sam cortou o irmão e olhou para mim:
— Ele vai apostar um Porsche.
Bryan levantou as sobrancelhas negras para a irmã.
— Vou?
Ela sorriu para o irmão, assentindo.
— Sim, afinal, você está lucrando muito para a empresa do Lucky...
Lucky a corrigiu.
— Sua empresa.
Fitou-o com amor.
— Nossa — retificou. — Então ele pode apostar.
Pigarreei, mas minha garganta estava seca.
— Gente, eu até apostaria, mas não tenho nada que vocês queiram... —
sussurrei.
— Você poderia fazer um pole dance para nós — brincou Jordan.
Ryan sibilou.
— Você não teria tempo de assistir, morreria antes disso acontecer.
Alisei as minhas têmporas, tentando pensar no que eu daria a eles.
Dinheiro não tinha, mas dançar como uma stripper? Ryan jamais permitiria,
caso eu perdesse. Além disso, nunca me submeteria a rebolar assim na frente
de um homem.
— E vocês, o que iriam querer? — questionei a Daniel, Bryan e Jason.
— É melhor vigiarem o que pedirão — rosnou Ryan, sombrio.
— Quero que você aceite um presente meu sem reclamar do valor ou
coisa do tipo. — Daniel me lançou um sorriso.
— Que presente?
— Na hora você saberá, quando perder a aposta. — Seu tom era
confiante. — Isso ou o pole dance.
Sacudi a cabeça e olhei para o Jason.
— E você?
— Que você faça uma tatuagem escolhida por mim.
Ofeguei, mirando seus braços com tintas coloridas e pretas. Estremeci
ao imaginar isso no meu corpo.
— Não posso escolher? Acho que não ficaria bem toda pintada —
lamentei.
— Prometo que não será um dragão, aves ou nada tão colorido. E o
local também é por minha conta.
Levantei meus olhos para ele; percebi que não mudaria de ideia. Mas o
que era uma tatuagem, afinal? Encarei Jordan, que sorria vendo o meu
pânico.
— Eu quero que coloque um piercing...
Cortei-o.
— Já tenho um piercing.
Ele levantou as sobrancelhas.
— Onde?
— No umbigo.
Sorriu de modo provocante.
— Não, você vai fazer um pouco ao sul de lá.
Engasguei, mesmo sem nada na boca. Escondi o rosto nas mãos.
— Isso é... — Não sabia bem o que dizer, não queria perder essa
aposta.
— Você ainda não ouviu a minha parte — Bryan disse.
Tirei minhas mãos do rosto e olhei para ele.
— Você pode atirar em mim depois de eu realizar todos os pedidos
deles.
Riu e sacudiu a cabeça.
— Se eu atirasse em você, iria preso e Ryan me mataria.
— Com certeza — concordou Ryan, seco.
— Eu não vou querer nada...
Fiquei surpresa.
— Não?
— Você salvou a vida da minha irmã, então fica por isso. — Levantou
as sobrancelhas. — E já está contando que perderá? Porque você vai.
Eu me arrumei na cadeira e observei minhas mãos. Nunca fui de desistir
por nada no mundo, não seria agora que faria isto.
— Vamos fazer o seguinte: conseguirei uma garota para cada um de
vocês, e os quatro vão namorar com elas por dois meses, incluindo passeios
no parque, piqueniques, cinema e outros programas de casal.
Jordan me examinava como se eu estivesse falando em um idioma que
ele não conhecia. Quase ri da sua expressão estupefata.
— E quanto ao sexo?
Dei de ombros.
— Se elas quiserem, vocês que se entendam, não vou me meter nisso.
Minha única condição é que, nesses dois meses, sejam fiéis a elas ou
perderão a aposta.
— Você acha que acontecerá com a gente o mesmo que com Ryan? —
indagou Bryan, descrente.
— Se elas forem ótimas domadoras de cavalos, sim — respondi com
um sorriso.
Lucky gargalhou junto a Ryan.
— Não estou achando graça — resmungou Jordan, de cara fechada.
— Quer desistir?
Estudava-me, provavelmente me achando louca.
— Não desisto de uma aposta, nunca.
— Bom saber, pois já conheço duas para dois de vocês. Logo estarão
domados. — Ignorei suas caretas e pousei meus olhos no Jason. —
Começarei por você.
Ele levantou as sobrancelhas.
— Por que eu?
— Porque a garota que tenho em mente é ideal para você, e não para
eles. — Peguei meu chá e o bebi. Tabitta me mataria, porém, talvez isso
fizesse com que os dois se entendessem. Pelo jeito com que Jason reagiu a
ela, parecia conhecê-la. Ele também aparentava ter sofrido por amor. Depois
procuraria saber mais a respeito disso. A única forma seria perguntando à
Tabitta se ela conhece Jason.
— Qual é o seu nome?
— Surpresa. Não fique preocupado, ela é linda, combina com você.
— Está me chamando de lindo? — riu.
Revirei os olhos.
— E não é? — Sorri, levantando meu chá, ignorando o grunhido do
Ryan. — Um brinde ao Hospital Sagrado Coração, que vai ganhar uma
bolada.
Sam franziu o cenho.
— Como assim?
— É um hospital para crianças que sofrem do coração, mandarei os
quatro carros para lá, se eu conseguir ganhar — informei. Esperava não
perder no final.
Todos arfaram.
— Você não vai ficar com eles? — perguntou Jason, me olhando como
se tivesse nascido três cabeças em mim. Não era o único com esta
expressão.
— Claro que não! Não sairia por aí em um Bugatti de dois milhões de
dólares! — exclamei. Ryan fez uma careta. — Seria assaltada logo na
esquina. E só de imaginar esse valor reunido, me dá calafrios. Não lutei ou
trabalhei por ele. O propósito de ganhar essa aposta será para um bem
maior: colocar vocês quatro no cabresto e ajudar crianças que precisam de
auxílio.
— É muito nobre de sua parte. — Sam sorriu para mim.
Dei de ombros.
— Apenas é um lugar que precisa de ajuda — respondi. Seria lá que
Shane colocaria seu marca-passo, em duas semanas. Eles me deram
remédios para ajudar o movimento do coração dele, pois estava muito fraco.
Por isso sua fadiga e falta de ar, igual vi hoje cedo. Tinha medo dele não
aguentar uma cirurgia, mesmo sendo simples. Ao pensar nisto, meu coração
doía fundo.
— Você é incrível! — declarou Ryan, maravilhado.
Sorri para ele, mas o gesto morreu ao notar duas mulheres ali, olhando
para o Ryan. Uma era morena, com cabelos chanel; vestia jeans e jaqueta. A
outra, loira, usava um vestidinho curto. Seguravam um celular grande na
mão.
— Podemos tirar uma foto com você, Ryan Donovan? — perguntou a
morena.
Permaneci controlada, não faria escândalo, fosse por isso ou por
qualquer coisa. Era óbvio que elas queriam tirar uma casquinha dele.
Ryan reparou em meu rosto impassível. Com um sorriso educado, que
não deixava de ser sexy, passou seu braço sobre meu ombro e me puxou para
ele.
— Pode tirar.
A mulher morena franziu o cenho.
— Achei que tiraríamos abraçadas com você, como vejo nas revistas
— balbuciou.
— Desculpe, mas minha namorada aqui — me lançou um sorriso de
candura — não gosta que eu tire fotos abraçado com outras garotas. Não é,
Anjo?
Exultante, já nem ligava para a existência dos demais.
— Sim, namorado. — Aproximei-me na intenção de beijá-lo e parei
ali, a centímetros de sua face.
— Oh, Anjo! Faço tudo para vê-la feliz — jurou, colocando a mão nos
meus cabelos e puxando meu rosto para o dele. De repente, estava
devorando a minha boca. Uma corsa que ansiava por água, era assim que eu
me sentia pelos seus beijos. Ele não parecia se importar com seus amigos
ali, e nem com a minha boca com sabor de chá, e a sua de whisky. Eu
também não ligava: quando o beijava, tudo sumia; o tempo, as pessoas, o
mundo. Restava somente nós dois.
— Se vocês fizeram isso para despistar as mulheres, conseguiram.
Agora se contenham — brincou Rayla.
Envergonhada, me afastei, contemplando o grupinho de garotas que
queriam o meu homem. Sentavam-se a umas três mesas da nossa, ainda
embasbacadas com a reação dele.
— Agora elas sabem que você tem dona.
Ryan me olhou de esguelha.
— Quer dizer que você é minha dona?
Sorri, beijando seu rosto.
— Claro que sim — afirmei. A música country estava baixa e suave,
não tinha começado a apimentar ainda.
Ele riu, levando minha mão aos seus lábios.
— Você me inutilizou para todas as mulheres.
Meu peito inchou, achei que explodiria.
— Acho bom mesmo — disse e me distanciei, tentando me recompor,
afinal, estávamos em um restaurante cercado de pessoas. Peguei um pedaço
de pizza e comi. Logo me lembrei do Johnny e Charles, e de meu celular
quebrado.
— Empreste-me seu celular, já que fez o favor de quebrar o meu? —
Olhei feio para o Ryan.
Sua expressão agora era triste.
— Sinto muito, darei outro a você — respondeu, me entregando o seu.
— Para quem vai ligar?
Era um iPhone do último modelo. Chique. No plano de fundo, havia
uma foto dele com Jason, Jordan, Daniel e Lucky. Os cinco estavam com
bermudas, saindo do mar com seus bíceps sarados e tatuados. Em Jason, vi
desenhada uma águia preta, no lado direito do peito, e outra colorida —
desta, aparecia apenas um pedaço das asas nos seus braços; supus que a
tatuagem inteira estava nas costas. Jordan tinha uma cruz preta, que pegava
do peito até abaixo do umbigo, e outras tribais nos braços e no ombro
esquerdo. Daniel e Lucky não tinham nada na frente, só se estivessem nas
costas, onde não dava para enxergar na foto. Um grupo formidavelmente
sexy, principalmente Ryan.
— U-A-U — destaquei as letras separadamente. — Acho que vou pegar
vocês como modelos de capa dos livros que farei. Venderia como água,
ficaria rica. E colocaria vocês dois nisso também, Bryan e Alex.
— Deixe-me ver? — pediu Sam, estendendo a mão para o celular.
Notei uma aliança grossa de ouro em seu dedo, e outro anel com a pedra na
forma de uma rosa vermelha. Dei a ela o celular.
— Hummm, isso é uma ideia maravilhosa — concordou Daniel. — Mas
não para mim. Seu livro é sobre um empresário alto e musculoso, com
tatuagens. — Virou-se para Lucky. — Acho que você faria o papel perfeito.
Lucky levantou as sobrancelhas.
— Nem morto. — Seu tom era frio.
Daniel deu de ombros e não disse nada.
Sam sorriu, olhando a foto e depois o marido. Aquela expressão
sombria dele se transformou em amor ao mirar sua mulher. Ali vi adoração,
devoção.
— O seu corpo é o mais lindo de todos, meu amor. Ryan, depois envie
esta foto para mim — pediu, ao que Ryan assentiu. Voltou seus olhos para o
marido: — Você ficaria perfeito de modelo de capa de livro.
Ele fez uma careta.
— Rosa Vermelha, sou um empresário, não um modelo. Já pensou o que
os outros diriam sobre isso? Duvidariam do meu poder. — Soava grosso,
mas controlado. — Ryan poderia fazer isso, já que a namorada é dele, não?
— Elevou seus olhos para o irmão.
— Acho que sim — concordei, sorrindo para Ryan. — Você poderia
fazer o papel do malvado, o Ruger. Ele tem os olhos frios, iguais aos seus...
às vezes.
Ele riu, ou melhor, gargalhou, e não foi o único. Eu os ignorei e disquei
o número que queria. Dirigi-me ao Ryan:
— Seu celular deveria ter senha, sabia? Qualquer um pode pegá-lo e
usar como se fosse você — falei enquanto o telefone chamava.
— Ninguém mexe nele — assegurou. — Só eu.
— Sério? E quanto à sua secretária do outro dia?
— Ela não trabalha mais para mim — respondeu, um tanto sombrio.
Antes que eu dissesse alguma coisa, Johnny atendeu.
— Alô? — parecia confuso, em razão do número desconhecido.
— Johnny, sou eu. — Olhei para a cara feia do Ryan, que tomava sua
bebida.
— Está tudo bem? — inquiriu, preocupado. — Tentei te ligar, mas você
não atendeu.
— Isso porque o homem das cavernas aqui pegou meu celular e lançou-
o contra a janela de vidro do restaurante, após ter ouvido a nossa conversa
— murmurei.
Ouvi os outros rirem do termo. Ryan grunhiu.
— Então deu certo o plano? — perguntou, divertido.
— Não sabe o que está perdendo nos rejeitando — Charles gritou ao
fundo.
Eu sorri.
— Hummm. — Encarei Ryan, taciturno. Não entendia sua antipatia pelo
Johnny. — Deu certo, sim, agora ele está amarrado a mim.
Com isso, a sombra escura em sua expressão se dissipou por completo.
Pegou meus cabelos e ficou brincando com eles.
— Fico contente — falou Johnny. — Você merece ser feliz.
— Obrigada. — Minha garganta se fechou com a emoção. — Como
estão Lira e Shane?
— Dormindo — respondeu. — Se você vai para o apartamento do Ryan
me diga agora, assim deixamos as crianças aqui hoje.
Já era quase meia-noite, então eu passaria a noite na casa do Ryan e
amanhã voltaria para a minha. Não gostava de dormir longe de Shane e Lira.
Também não tinha certeza se Ryan me levaria para a sua casa ou para o seu
apartamento de foda. Se fizesse isso, iria embora na mesma hora.
— Sim, irei com ele — sussurrei. — Obrigada por tudo.
— Amigos servem para isso. Amamos você, Borboleta.
— Eu também amo os dois. Qualquer coisa, liguem para este telefone.
Despedi-me e desliguei. Peguei um naco de carne e comi com farofa.
Estava uma delícia. Virei para o Ryan com o garfo espetado em um pedaço.
— Prove — pedi, e ele abriu a boca. Era um gesto romântico em
público, e nem liguei, adorava isto.
Meus olhos foram para o seu rosto risonho. Notei, pela minha visão
periférica, que todos da mesa também o observavam, espantados. Desfrutei
do momento.
— Já que você está namorando ela de verdade — começou Sam,
olhando o Ryan —, isso significa que vamos ter um baile?
Ryan escondeu o rosto no meu pescoço.
— Me mate.
Ri, alisando seus cabelos loiros.
— Será divertido — declarei. Depois sussurrei em seu ouvido, só para
ele: — Podemos sair mais cedo para ir fazer besteirinha.
Afastou-se e sorriu tal qual o gato Cheshire.
— Gosto de como isso soa — disse, desejoso. Prosseguiu, para Sam:
— Pode preparar o baile.
Sam bateu palmas, animada como uma criança que ganha um presente
de que gosta.
— Eba! Vamos ter um baile!
Lucky a puxou para seus braços.
— Sim, vamos ter um baile, Rosa Vermelha.
Fiquei confusa com a felicidade dela por ir a um baile, embora eu
também tivesse perdido o meu quando fiz dezoito anos. Ângela e eu
estávamos contando os minutos para irmos à festa da escola, já maiores de
idade. Logo veio o fim... E nossos sonhos foram interrompidos.
— Ela não teve um baile — disse Ryan no meu ouvido.
Eu suspirei.
— Eu também não... — murmurei, não querendo lembrar-me daquele
dia. Uma tragédia sempre é uma tragédia.
— Anjo — sussurrou, vendo a dor na minha voz.
— Estou bem. — Tomei a bebida.
Todos estavam calados, prestando atenção em mim.
— Não se preocupem comigo — menti.
No salão, havia algumas pessoas dançando, homens vestidos com jeans
desgastados, botas de caubói e chapéu. Outras estavam em pé, assistindo.
Isso me deu uma ideia, compartilhada com Alexia, Rayla e Sam.
— Vocês topam dançar comigo? — Aparentaram desconfiança. —
Vamos nos divertir, ok? O que é melhor do que estar aqui, cercados dessas
pessoas maravilhosas, nos mexendo ao som de músicas animadas?
— Vamos dançar, então. — Alexia sorriu para mim. A garota realmente
era linda, uma loira deslumbrante.
— O mesmo aqui — falou Rayla. — Faz tempo que não danço. Sabe,
nós poderíamos fazer uma vez por mês um dia de garotas, o que acham?
— Estou dentro! — exclamou Sam. — Então vamos nessa.
Levantei-me e beijei os lábios do Ryan.
— Não quer vir comigo?
Ele fez uma careta.
— Você sabe que não danço, mas pode ir se divertir com as garotas —
disse.
— Aprecio isso, querido — sussurrei, beijando seus lábios de novo.
— Vamos sacudir os esqueletos — gritou Rayla, contente.
Capítulo 9
Escolho você

RYAN
Saí da casa da Angelina após ouvir sua confissão, achei que estava
sendo esmagado de todas as formas possíveis. Sabia que ela se apaixonara
por mim, podia sentir em cada carícia, em cada beijo; na forma com que
aqueles olhos negros me fitavam, com tanto fervor e fome. Deus! Por que
uma mulher como aquela foi se apaixonar por um homem como eu?
Cheguei ao meu apartamento de foda querendo quebrar tudo, porque
representava o bastardo sujo que era. Encontrei-o ocupado por Jason, Jordan
e quatro mulheres. Os dois estavam sentados no sofá, enquanto elas
dançavam para eles. As garotas eram bonitas, devo admitir. Esperei sentir
algo, que meu pau se levantasse, e nada. A única coisa que eu sentia era
raiva. O pior era saber que um dia fiz parte disso.
Rememorando, percebi que eu costumava ser um bastardo filho da puta
que não queria nada sério com ninguém. Agora que conhecera essa garota, no
entanto, não suportava viver sem ela de nenhuma forma. O meu maldito
coração palpitava sempre que estava por perto, e se longe, me sentia vazio.
Todos olharam quando entrei na sala. Os dois sorriram para mim.
— Ainda bem que veio participar da festa — anunciou Jordan,
animado.
— Isso mesmo, estávamos esperando por você — Jason assentiu.
Uma das quatro mulheres se vestia praticamente com roupas de
stripper. Isso me enojava ainda mais.
— Vamos fazer você feliz. — Ela veio me tocar.
Fechei a cara de um jeito sombrio.
— Toque em mim e eu vou esquecer que você é uma mulher — sibilei
entre dentes.
Ela se afastou como se eu tivesse batido nela; claro que nunca tocaria
em uma mulher assim, não deixaria suas mãos poluídas tirarem o cheiro da
Angel de minha pele
Jason se pôs de pé e ficou na frente das garotas, com cenho franzido.
— Qual é a porra do seu problema? — rugiu.
Olhei dele para o Jordan.
— Vocês vão querer comprar este lugar? — Nem chamei aquilo de
apartamento, de fato não era, e sim um abatedouro, um prostíbulo. Este
pensamento me fez uivar de dor e raiva de mim mesmo, pois a mulher que eu
queria estava sofrendo, e eu ali, nesse antro de perdição do caralho.
Os dois me encararam como se tivesse nascido mais uma cabeça em
mim.
— O quê? — indagou Jason.
— Que porra está dizendo? — perturbou-se Jordan.
Expirei, fechando as pálpebras com força. A face de Angie! A dor
estava evidente ali. Abri-as e encontrei as íris azuis do Jordan e os olhos cor
de chocolate do Jason.
— Vocês têm cerca de três segundos para avisar se querem comprar
este lugar, ou vou expulsar essas mulheres daqui e destruir tudo. — Minha
voz era fria.
Finalmente se deram conta de que eu não estava brincando. Algo no
meu rosto chamou atenção deles, não sei o quê. Talvez a raiva? A dor? O
desespero? Tudo isso em uma enxurrada de emoção.
— O que aconteceu com você? — perguntou Jordan. — Cara, você não
está bem. — Mirava-me de cima a baixo. — Está todo molhado. O que
houve?
Nem notara isso antes; havia ficado muito tempo debaixo da chuva,
olhando o apartamento dela, com tudo gritando em mim para eu subir de
volta e a tomar em meus braços, de todas as formas possíveis.
— Vocês vão ficar com ele? Não as quero aqui, se o lugar ainda for
meu. — Apontei o queixo para as garotas.
— Certo. — Jason se dirigiu a elas: — Meninas, desculpem, meu
amigo aqui precisa de nós. Vão embora, nos vemos depois.
Esse “depois” nunca chegaria, porque Jason não era cara de ligar para
alguém. Elas saíram sem falar nada.
— Ótimo, agora conte o que aconteceu com você — exigiu Jason.
Minha vontade era de apenas sentar em algum lugar e tentar esquecer o
que não podia ser esquecido.
— Não quero falar, só desejo sair daqui. — Observei o local com
repugnância. Fui embora, e eles me seguiram sem fazer perguntas.
Foi isso o que Lucky sentiu quando estava com problemas para aceitar
a Sam com Shaw? Aquele dia em que apareceu na casa do Jordan e bebeu
para esquecer. Lucky pensava que não tinha capacidade de cuidar de uma
criança, o que era um absurdo, já que praticamente criou Rayla e eu, e fez um
bom trabalho.
Isso levou-me a me lembrar dos meus pais, de quando se foram... para
sempre. Essa era a razão para eu não poder ficar com a única mulher que já
quis nesta vida. Ela merecia algo melhor do que eu, um cara que a fizesse
feliz. Céus! Só de imaginar outro tocando aquele corpo e beijando aquela
boca linda com sabor de fruta, me dava vontade de matá-lo, mesmo não
tendo direito sobre ela.
Jason e Jordan permaneceram comigo, em silêncio. Entenderam que eu
não responderia nunca. Não conseguia falar porque a dor estava me comendo
vivo.
Fui trabalhar em minha empresa na segunda, contudo, sabia que não ia
ser capaz de me concentrar, por isso voltei mais cedo para casa. Logo na
entrada, me deparei com uma loira deslumbrante com cabelos e pernas
longos, e olhos cor de violeta, acho; não deu para ver direito, afinal, não ia
ficar encarando a garota. Linda! Em outros tempos, estaria louco para dar em
cima dela, porém, não via mais as mulheres deste jeito. Era como se todas
fossem homens aos meus olhos. Ridículo, eu sei, mas era assim que me
sentia.
Logo depois de trocarmos algumas palavras, descobri que era Alexia,
Sam a havia chamado. Foi então que me lembrei da maldita aposta. Com
tudo o que estava acontecendo, nem recordara isso. Não faria mais apostas e
desmancharia esta, não me importava de perder.
O cara da portaria entregou a chave do meu Volvo e disse que Angelina
a dera a ele. Fiquei mais louco ainda, sabendo que ela tinha acabado de
fazer isso. Corri para fora para ver se eu ainda a encontrava, mas não
adiantou. O pior: ela provavelmente me viu na entrada com Alexia, deve ter
pensado que eu a levaria para o meu apartamento de foda. Droga! Tinha nojo
de mim mesmo e deste lugar. Jordan disse que ficaria com ele. Bom. Pelo
menos eu me livrei.
Foi o pior dia da minha vida. Angelina estava sofrendo, pensando que
eu segui em frente e já recorrera a outras mulheres, algo que não aconteceria
nunca, porque ela me estragou para todas. Como pode uma pessoa fazer isso
sem nem transarmos? Arrebatou-me apenas com um beijo. Imagine se a
tivesse em minha cama, comigo dentro dela, fazendo-a gritar meu nome?
Seria a coisa mais perfeita do mundo, o mundo que agora escurecera sem
ela.
No mesmo dia, Lucky e Sam me visitaram. Não liguei muito, a despeito
de precisar falar com a Sam. Não estava com cabeça para nada, somente
meu Anjo importava. Liguei para o Daniel e contei sobre Angie ter
devolvido o carro. Queria dá-lo a ela, mas a garota nunca aceitaria. Pedi
para ele buscá-la em sua casa e levá-la à Luxem todos os dias. Daniel
contra-argumentou que ela não aceitaria sua carona, e conhecendo Angelina,
eu também tinha certeza de que não. Disse a ele que se ela não aceitasse,
deveria ameaçar demiti-la. Eu jamais faria isso, óbvio.
Vi seus desenhos de moda, foi impressionante saber que tinha talento
para isso também, apesar de não ser sua paixão. Os modelos de vestidos
estavam perfeitos para cerimônias de Oscar e Grammy. Isso dava quase
cinquenta mil, mais ou menos. Todavia, diria a ela que valia duzentos, assim
compraria um carro decente. Angie precisava ser menos certinha em relação
ao dinheiro. Era similar à Sam neste sentido: nenhuma delas ligava para
isso, não gostavam de receber coisas caras. Adoraria dar tudo à Angelina.
Agora entendia o que o Lucky passava ao querer presentear Sam inutilmente.
Parecia que algo dentro de mim se quebrava cada vez que pensava nisso.
Era sexta-feira, completava uma semana desde que saí do seu
apartamento. Uma semana de vazio sem ela. Sam marcou um jantar no
restaurante do avô do Daniel, onde anunciaria o meu namoro falso com
Alexia. Claro que isso não aconteceria. Evitei todos naquela semana, não
estava a fim de conversar com ninguém. Eles sentiram que algo estava
errado comigo, acho que me diriam no jantar.
Peguei Alexia em frente à sua casa, ou melhor, na casa de Alex, que
ficava perto da Rave. Alex era meu cunhado. No começo, pensei que ele e
Rayla não durariam juntos, mas o amor que sentiam um pelo outro era mais
forte do que os obstáculos que enfrentaram. Reforçava o que eu teria de
passar caso quisesse ficar com Angelina. Ela valeria a pena, era eu quem
não valia nada.
Ao deixar meu apartamento, estava disposto a abrir mão da aposta.
Para ser franco, desistiria da minha fortuna por ela, se assim tivesse seu
corpo nu debaixo do meu, não só uma vez, mas para sempre. Esses dias
longe foram insuportáveis, sabendo que estava na companhia daqueles dois
caras, que até podiam ser gays, mas suas aparências não me tranquilizavam.
Eram fortes e musculosos, com tatuagens. Isso me matava aos poucos. Como
não tinha direito sobre ela, sofria em silêncio.
A viagem com Alexia até o restaurante foi silenciosa. A garota
perguntou somente uma coisa:
— Bryan estará lá?
Aquiesci, não entendendo a princípio o que ela queria com ele. Fitando
seus olhos violetas, pude ver que tinha uma queda pelo cara, ou algo mais.
Eu não disse nada, afinal, não era da minha conta.
Chegamos ao restaurante do avô do Daniel. Estava pronto para dizer a
todos que eu não aceitaria o namoro de fachada, porque a única mulher que
eu queria era ela, meu Anjo. Não tinha contado a ninguém a respeito de
Angelina, apenas o Daniel sabia disso. Revelaria naquela hora... Foi quando
ela entrou no restaurante com meu amigo ao seu lado, sem se tocarem. Senti
muita ira, contudo, me controlei.
Estava linda! Usava um vestido vermelho brilhante de alças finas
trançadas, apertado em seu corpo, deixando suas curvas bem à mostra, com
decote V no meio dos seios perfeitos. Seus cabelos, soltos nas costas,
formavam ondas. Os lábios carnudos estavam com um batom, acho que de
cereja ou morango. Isso me deu ainda mais vontade de devorar aquela boca
linda. Quando ela entrou no restaurante, todos os homens a fitaram. E, como
sempre, parecia alheia a isso, um anjo com seu esplendor, iluminando o
lugar.
— Uou! Quem é aquela belezura com Daniel? — sondou Jason,
babando. — Será que ele está saindo com ela?
Cerrei os punhos com força só de imaginá-lo, ou outro cara, tocando
naquele corpo perfeito. Trinquei os dentes e falei através deles:
— Se Daniel ousar encostar nela, eu o mato.
Observou-me com cenho franzido.
— O quê? Você a conhece? Cara, me apresente a ela.
— Fique longe — falei, seco.
Nossos olhos se encontraram, pude enxergar a dor em sua expressão.
Assim que viu Alexia do meu lado, o sofrimento se transformou em raiva.
Ela me ignorou e sentou de costas para mim. Seu vestido longo exibia costas
nuas, cobrindo somente a bunda e a frente, deixando a beleza de sua pele de
seda à mostra.
Segurei-me para não acabar com o Daniel. Se ele estivesse fazendo
investidas nela, eu o mataria. E o pior foi Jack, o garçom que a paquerou,
sem nenhum medo que eu fosse matá-lo. Mas como ele saberia que ela era
minha, se não estávamos juntos?
Bryan chegou junto com Jordan e parou direto em sua mesa, antes de
irem para a nossa. Ficou conversando com Angie e a fez rir de algo que
disse. Ela se levantou e continuaram conversando; após, a pegou nos braços
e a rodopiou. Vendo esta cena, minha ira chegou ao auge. Era tanta que eu
podia sentir meu corpo tremendo forte.
Lucky ficou me olhando por um segundo, e depois para Angelina. Não
liguei para ele, confrontaria Bryan por ousar tocar nela. Antes disso, meu
irmão me obrigou a sair dali, dizendo que se eu fizesse isso, a envergonharia
na frente das pessoas, por isso saí de lá e fui para o banheiro tentar me
acalmar.
— Que droga está fazendo? — esbravejou Jason quando a porta do
banheiro se fechou.
Esmurrei a parede. Doeu, mas não liguei.
— Vou acabar com ele, se aquele bastardo ousar tocá-la. Juro. —
Minhas mãos tremiam tanto que achei que fossem cair.
— Ryan, quem é essa garota para você? Eu me lembro dela do hospital,
quando doou sangue para a Rosa Vermelha. — Lucky franziu o cenho. —
Você parece ter sentimentos por ela, não?
— Eu... — Não sabia de fato o que sentia, apenas tinha certeza de uma
coisa: com Bryan ela não ficaria. Se isso acontecesse, não responderia pelos
meus atos. Só de pensar, meu peito se apertava, me sufocando, esmagando
meus pulmões aos poucos, como uma doença incurável. Era algo que nunca
experienciei por ninguém em minha vida.
— Ryan, nos diga o que está acontecendo — pediu Lucky, calmo. —
Por que tem agido tão estranho nesta semana, evitando todos?
Suspirei, desgostoso.
— É coisa do imprinting...
— Que porra isso significa? Imprin...
Cortei Jason.
— Imprinting, aquela coisa que os lobos do Crepúsculo têm quando
veem uma mulher e se apaixonam, esquecendo tudo à sua volta —
resmunguei, apertando meu nariz. Foi o que aconteceu comigo ao ver a
Angelina pela primeira vez.
Jordan gargalhou feito um papagaio.
— Você leu Crepúsculo? Está doente? — Veio até a mim, colocando a
mão na minha testa para medir a minha temperatura.
— O inferno deve estar congelando — zombou Jason, entre risadas.
Cerrei os dentes.
— Querem parar, os dois? Não li nenhum livro, porra, apenas estava
buscando respostas para o que eu sinto, e me deparei com essa palavra
esquisita, e outras como “buu”, “puf”, e “ban”. — Dei de ombros, parecendo
idiota.
Jordan se curvou para frente de tanto rir. Eu estava a ponto de esmurrar
sua cara quando Lucky falou:
— Vamos chamar de amor à primeira vista, foi isso que aconteceu com
minha Rosa Vermelha e comigo.
— Não, vamos chamar de Bala, igual ao apelido do Jason nos ringues,
porque a porrada é certeira. — Jordan apertou os lábios, tentando não rir.
Lucky revirou os olhos.
— Você fala isso porque não aconteceu com você, quero ver o dia em
que for fisgado.
— Oh, cacete, que nunca aconteça algo assim. — torceu Jason. Voltou-
se a mim: — Como conheceu essa garota? Foi atrás dela depois que a viu no
hospital?
— Não, a encontrei de novo há duas semanas, fazendo faxina no meu
antigo apartamento.
— Você vendeu o seu apartamento? — indagou Lucky.
— Para o Jordan. Não ia usá-lo mais.
— O que houve depois? — Meu irmão parecia curioso.
— Eu a chamei para ser a minha namorada por causa da aposta com a
Sam.
Contei tudo a eles, sobre o que sentia quando estava perto dela e o
pagamento da aposta.
— Você ofereceu um milhão? — Jordan ficou atônito.
Só não mencionei que foram dois, e não um.
— Sou mais dar todo o meu dinheiro do que ir a um baile. — Estremeci
com este pensamento. “Baile” era um tema perigoso para mim, desenterrava
lembranças há tempos trancadas dentro de meu ser. Impedia-me de pensar
para não desfalecer.
— Então ela é uma golpista? Pegou o dinheiro e agora está saindo com
Daniel? — analisou Jason, sem entender.
— Não está saindo com Daniel, ele nunca a tocaria. — Ri sem humor.
— E ela não aceitou esse dinheiro, e sim vinte e cinco mil.
Os três franziram o cenho, confusos.
— Por que vinte e cinco mil, em vez de um milhão? — Lucky
perguntou.
— Não sei o porquê, não me disse, apenas falou que era para algo
importante. — Passei as mãos nos cabelos e olhei para o Lucky. — Lembra
que pedi sua ajuda para comprar a Editora Luxem do Daniel?
Ele arregalou os olhos.
— Não vai me dizer que você comprou uma empresa que não é o do seu
ramo apenas por uma mulher? — Não escondeu seu choque, evidente em seu
rosto embasbacado.
— Oh, merda! — Espantou-se Jordan, com os olhos arregalados como
os de uma coruja.
— Sim, uma dupla bosta — concordou Jason, estupefato. — Você deu a
ela uma empresa?
Ri, nervoso, com a mão direita na cabeça.
— Não, foi para conseguir um serviço para ela, já que seria minha
namorada. E também porque ama livros, até tem um blog onde faz resenhas.
Daniel disse que estava vendendo sua parte da empresa ao seu sócio
tarado...
— ...então decidiu comprá-la. — Não era uma pergunta. Lucky sabia
disso.
Dei de ombros.
— Sim. Poderia ter encontrado para ela um emprego na minha empresa,
ou na sua. Mas Angelina ama livros, então tinha de ser lá. Daniel concordou
em vender sua parte, mas o Franklin não, e eu nunca deixaria aquele velho
safado perto dela. Por isso pedi sua ajuda.
— Algo impensado, devo dizer, já que você não entende nada de
editoração — falou.
— Pode ser, e dane-se. De qualquer maneira, jamais jogaria um gatinho
no meio de leões famintos.
— Você acha que ela é inocente mesmo? — Jason levantou as
sobrancelhas para mim. — A mulher te enfrentou ali, com garras de onça, e
não de um gatinho.
Eu sorri, agora verdadeiro.
— Ela é assim quando fica brava. — Contei a eles acerca de seus
design de vestidos, e também sobre escrever livros. — Inclusive, aquela
roupa que está usando é uma obra dela. Ela também os faz, quero dizer,
costura.
— Por isso você estava estranho desde sexta-feira, querendo quebrar o
seu antigo apartamento. E também não ficou com ninguém, só agora sairia
com Alexia... — ponderou Jason — Foi tudo por ela?
— Não quero nenhuma outra mulher depois que a conheci. Não vou
ficar com Alexia. Vim aqui hoje para dizer isso. Apenas meu Anjo importa
para mim.
— Anjo? — Jordan levantou uma sobrancelha.
— Ela parece um anjo, com sua beleza, pureza e inocência. — Cocei a
cabeça. — É doce e meiga, embora eu adore vê-la se irritar de vez em
quando, fica mais linda.
Lucky riu.
— Meu irmão, você foi fisgado, assim como eu.
Pensei em discordar, entretanto, sabia que era verdade. Meu pior temor
se realizou: fui fisgado por uma mulher. Maldição, o que faria agora?
— Não acredito que você foi domado por uma boceta. — Jordan sorriu,
zombeteiro.
— Eu não diria isso, já que nunca transamos.
Ele arregalou os olhos.
— Você está apaixonado por uma mulher com quem nunca transou?
— Ela não é assim. A Anjo está mais para casas no subúrbio com
cercas brancas e príncipes montados em cavalos pedindo sua mão. — Este
representava meu outro problema, o motivo pelo qual eu deveria ficar longe
dela: não era esse cara, nunca seria.
Jason e Jordan riram. Lucky apenas me olhou de lado.
— Ela é virgem, então? Se não fosse, vocês já teriam transado —
sondou Jason, ao que assenti. — Bem que tinha algo de inocente naqueles
olhos...
— Meus amigos estão todos caindo por garotas virgens — lamentou
Jordan. — Primeiro a Sam, e agora essa Anjo. Qual é o nome dela mesmo?
— Angelina. E não sei o que fazer — admiti.
Lucky colocou os braços nos meus ombros.
— Então tome uma decisão, meu irmão. Pelo que notei dessa garota, ela
não parece aceitar as suas cagadas. Pense bem antes de perdê-la.
Eu me encolhi.
— Não posso me afastar — murmurei.
— Vamos lá para fora, e se comporte. — Lucky suspirou. — Não quero
a minha mulher estressada com nada.
Horas depois, me encontrava sentado no Belas Country, esperando
minha linda namorada voltar para a mesa, pois fora dançar com as meninas
no salão. Observando sua beleza e pensando na personalidade maravilhosa
que estava por trás disso, soube que foi a melhor escolha que eu já fiz, não
me arrependia de nada. Deveria levantar as mãos para o céu e agradecer por
ela ter cruzado meu caminho. Sorri ao imaginar as coisas que faríamos logo
mais, a possibilidade de sentir seu gosto de novo.
— Nunca imaginei que um dia eu veria esse sorriso bobo em seu rosto.
— Jordan me olhou de esguelha.
— Eu também não. A Anjo é tudo — declarei.
Lucky sorriu.
— Fomos fisgados por mulheres maravilhosas que se tornaram o nosso
mundo. — Encarou Daniel, Bryan, Jordan e Jason: — Agora falta vocês
quatro.
Bryan revirou os olhos azuis-celestes.
— Vocês nunca vão me ver caindo por uma mulher — garantiu com
firmeza.
— O mesmo vale para mim. — Jordan levantou seu copo de whisky e
brindou com Bryan e Daniel.
— Com certeza — concordou Daniel, sorrindo.
— Mulher é para foder e pronto — disse Jason, entornando sua bebida
e olhando para a pista sem parecer ver nada.
Isso me fez pensar na conversa que ele teve com Angelina sobre sua
amiga policial. Ficara bem interessado, mas quando ela disse seu nome, foi
como se levasse um soco no estômago. Decerto a conhecia de alguma forma.
Sempre soube que ele tinha uma tristeza grande em seu passado. Suspeitava
de que já se apaixonara, e isto deixou uma marca profunda. Talvez fosse por
essa policial. Esperava que meu amigo encontrasse a felicidade logo.
— Rapidinho estarão amando também. Não se esqueçam da aposta:
namorar por dois meses sem traição e mantendo seus paus dentro das calças,
a não ser que suas parceiras queiram transar também. Mas do jeito que a
Anjo é, vai achar umas mulheres mais certinhas. — Ri, sacudindo a cabeça.
— O carma para vocês. Adorarei ver isso.
— Eu também — Lucky se divertiu.
— Já estou quase arrependido — falou Bryan.
— Vai desistir? — provoquei.
Ele bufou.
— Não desisto de uma aposta, nunca. — Sorriu e fitou Jason. — Pelo
menos ela vai começar com você. Até lá, posso transar à vontade.
— Torço para a garota ser gostosa, e não virgem, doce e essas merdas.
— Jason suspirou, tomando mais um gole de bebida.
— Talvez seja a policial. Já imaginou ela algemando você, e não o
contrário? — sondou Bryan, sorrindo.
Jason se engasgou com o álcool, perturbado e tomado por uma dor
momentânea. Todavia, também enxerguei esperança ali. Ele queria que fosse
ela, podia ver em seu rosto. Estava confirmado: a conhecia de algum lugar.
Voltei-me à minha perfeita namorada. Ela sorriu assim que seus olhos
pousaram em mim, deslumbrante como um amanhecer. Este sorriso sempre
destruía a minha existência.
Notei um cara perto da Anjo, encantado com sua beleza. Trinquei os
dentes.
Daniel seguiu meu olhar e bufou também.
— Acho que tem alguém interessado demais, não?
Cerrei os punhos. Fui até ela e encarei o homem que a cercava como um
abutre.
— Ryan... — pediu, colocando as mãos no meu peito. Não bateria nele,
embora vontade não faltasse, apenas deixaria algo claro.
— Ela tem namorado, fique longe. — Beijei-a na frente de todos,
saboreando seus lábios deliciosos com vitaminas A, B, C, D, a porra do
alfabeto inteiro. Afastei-me depois de um minuto e reparei nos olhares
surpresos, tanto do caubói quanto dos outros frequentadores do local. Estava
ciente de que eu era um mulherengo, mas isso era demais, como se ninguém
acreditasse que eu seria capaz de namorar.
— Eu sou seu namorado — falava para ela, alto o suficiente para os
demais escutarem. — Os outros até podem vê-la e cobiçá-la, afinal, é linda
mesmo. Contudo, sou o único homem que faz seu coração acelerar, o único
que, se pudesse, lhe daria o céu, a lua e as estrelas. O que eu posso garantir
é o meu amor, o meu coração e a minha alma. Você foi a única que entrou e a
única que ficará, vou amá-la para sempre. — Dei mais um selinho em sua
boca aberta de choque.
Ouvi assovios, os quais ignorei, focando em minha musa. Todos
voltaram a dançar, me deixando apreciar minha adorada namorada.
— Você também é muito importante para mim. Se estou doente, você é o
meu remédio. Se estou faminta, você é o meu alimento. Se estou na
escuridão, você é o meu guia. Se estou triste, você é a minha felicidade —
sussurrou no meu ouvido.
Quando declarei o que sentia, não a imaginei fazendo o mesmo.
Adorava saber que meu amor por esta linda mulher era retribuído.
— Dance comigo. — Angie passou os braços em meu pescoço.
Apertei sua cintura fina.
— Por mais que eu ame estar com você, explorando suas curvas
perfeitas, preciso negar o convite. Mas ficarei de olho nesses babacas. —
Fuzilei alguns ali e dei mais um beijo nela.
— Vá lá com os homens e nos deixe aproveitar a noite. — Rayla me
puxou dos braços da minha garota — Chega de melação. — Afastou
Angelina para longe de mim.
De acordo, voltei para a mesa.
— Eu quase chorei — zombou Jordan, fingindo limpar o rosto.
Bastardo.
— Divirta-se por enquanto. Quando encontrar uma mulher que faça isso
com você, sou eu quem vou rir. — Dei um soco de brincadeira nele. — No
final, ela será tudo para você. Assim como a Anjo se tornou a razão de eu
viver, desde o dia em que a conheci. Sou o homem mais sortudo da face da
Terra porque, por um milagre, ela me ama de volta.
Angie dançava a música Cotton Eye Joe Rednex, balançando seus
quadris conforme a canção. Não sabia como as quatro não caíam de seus
saltos de dez centímetros. Mulheres... Achei sexy. Talvez, mais para frente,
pediria a ela para fazer pole dance para mim. Sorri com a ideia
maravilhosa.
— A Rosa Vermelha dança muito bem. — Lucky olhava para sua
mulher. — Adoro vê-la alegre.
Bryan riu.
— Eu também amo vê-la feliz. Ela sempre adorou dançar, fazia aula na
escola. — Seu tom demonstrava orgulho.
Sam poderia ser bela, porém, meu interesse continuava em Angie;
devorava seu corpo com os olhos. Cada movimento me deixava louco.
Angelina virou de costas para nós, foi quando vi a tatuagem de uma
estrela de sete pontas acima da sua bunda perfeita. Minhas mãos coçaram,
querendo tocá-la. Ainda bem que teria a noite inteira com ela, adoraria cada
minuto.
— Você viu a tatuagem que a Angelina tem nas costas? Parece uma
estrela com alguns nomes nas pontas — observou Bryan. — De quem serão?
Dei uma cotovelada na sua barriga. Ele praguejou baixo.
— Pare de cobiçar a minha mulher — rosnei. — Olhe a Alexia.
Ele riu do rosnado do Alex.
— Quero minha irmã longe das garras desse aí — falou Alex. — Ela
não merece sofrer de novo.
— De novo? — indagou Bryan.
Alex suspirou, coçando sua barba por fazer.
— Ela se apaixonou uma vez, quando tinha dezenove anos. O cara a
destruiu por dentro e por fora, tanto que meus pais tiveram de interná-la. Ao
sair, ela já não se importava com os homens. — Passou as mãos nos cabelos.
— Acho que ela fica longe deles para se proteger e não ficar daquele jeito
novamente.
— A Sam não deve saber disso, senão teria me contado. — A voz do
Bryan saiu grossa, vendo Alexia dançar com as meninas.
— Ninguém sabe, meus pais a levaram para a Suíça... Depois,
morreram — explicou Alex. — Por isso eu estava com medo dela entrar
nessa de namorada falsa com você. — Dirigiu-se a mim. — Você tem essa
capacidade com as mulheres.
— Temo igualmente por Angelina. — Daniel me olhou, sério. — Não a
quebre, ela já se machucou uma vez. E, com você, seria uma queda maior do
que com o Caim.
— Não vou feri-la — prometi. — Saiba que ela tem mais capacidade
de me destruir do que eu a ela. Nunca imaginei que isso aconteceria, sempre
me esquivei, optando por mulheres fáceis. Um simples olhar dessa garota,
com quem nem transei, me desarmou.
— Isso se chama amor, meu irmão. — Lucky passou o braço direito
sobre o meu ombro. — Você está completamente apaixonado por ela.
— Eu sei, e isso me assusta demais. — Jamais pensei em me declarar
para uma mulher, em especial na frente de um monte de gente, como acabara
de fazer.
Ela veio até mim com um sorriso lindo. Eu me levantei e a puxei para
os meus braços. Peguei-a firme, me enchendo do êxtase por estar ao seu
lado, domado.
— Você estava mais que gostosa rebolando essa bundinha linda —
sussurrei em seu ouvido.
Angie riu baixinho e murmurou também:
— Fiquei toda molhada só de ouvir isso.
Minhas mãos apertavam sua cintura fina e macia.
— Anjo...
Ela riu de novo e se afastou, sem nunca tirar os olhos de mim. Deu-me
um selinho.
Quando imaginaria que um dia eu desejaria me casar com alguém?
Agora, em sua presença, estava louco para possuí-la de todas as formas
possíveis. Queria tê-la comigo o tempo inteiro. A garota me fisgou, me
domou de corpo e alma.
No próximo final de semana, teria um desfile em uma ilha na França.
Era para ser na Flórida, porém, fora transferido. Ao voltar, a pediria em
casamento. Não dissera a ninguém o que estava planejando, seria uma
surpresa para ela. Gostaria muito que Angie fosse comigo; conhecendo-a,
sabia que não largaria o serviço para viajar. Sendo o dono da Editora
Luxem, não me oporia, contudo, ela não poderia descobrir isso por enquanto.
Pretendia chamá-la mesmo assim, mais tarde, na minha casa e na minha
cama.
Nunca pensei que chegaria o tempo em que eu levaria uma mulher para
o meu verdadeiro apartamento. Com ela, queria tudo: filhos, casamento e um
lar com varanda, cerca branca e um jardim na frente. Seria o seu cavaleiro,
faria qualquer sacrifício, até domar um maldito animal selvagem.
— E você tem namorado? — um cara perguntou à Alexia. Ela e as
meninas já estavam vindo sentar em nossa mesa.
A garota piscou e mirou Bryan, buscando ajuda. Não sabia por que não
respondia ela mesma. Ele pareceu entender o olhar, pois se levantou e deu
um passo à frente, encarando sombrio o homem vestido de caubói.
— Sim, você está olhando para ele. — Sua voz soou fria. — Então, se
não se importa, pare de dar em cima dela.
O cara piscou e depois sorriu, envergonhado.
— Desculpe — disse e se retirou.
— Quer dançar comigo? — perguntou Bryan, pegando a mão de Alexia
e a levando para a pista.
— Sim, eu quero.
Bem colados, um tanto afastados de nós, os dois dançavam e discutiam
ao mesmo tempo. Ela disse algo para ele, dando as costas e voltando à mesa.
Antes que chegasse, Bryan a puxou para os seus braços e a beijou, tão
faminto e profundo que pareciam que se fundiriam um ao outro. Ele segurava
sua cintura fina e os seus cabelos, aproximando seu rosto do dela. A garota
correspondia, apertando suas mãos em seu peito e cabelos negros.
Alex pareceu não gostar disso nem um pouco, mas ali tinha algo. Por
isso Bryan estava provocativo comigo, por causa de Alexia; sentia ciúme.
Agora fazia sentido.
Parei de prestar atenção nos dois e foquei na minha amada, que estava
do meu lado com um sorriso enorme em seu rosto angelical. Pensativa, fitava
Bryan e Alexia. Talvez seria Alexia o par dele na aposta.
Capítulo 10
Inocência

RYAN
Angelina e eu nos despedimos dos meus amigos e fomos embora para a
minha casa. Ao passarmos em frente ao meu antigo apartamento, ela
estremeceu. Acho que pensou que eu a levaria para lá. Isto nunca
aconteceria, pois a garota valia mais do que qualquer coisa neste mundo. Ela
era o meu futuro, o meu raio de luz, e um dia seria a mãe dos meus filhos.
— Ele foi vendido — anunciei, avaliando seu rosto.
Angie piscou.
— O quê?
— O prostíbulo, como você mesma o chama. — Revirei os olhos com o
termo que inventou. — Eu o vendi na sexta-feira passada.
Ela sorriu; brilhava mais do que o sol. Meu Deus! Jogou-se para mim,
colocando seus braços e suas pernas ao meu redor.
Eu a segurei por sua bunda linda, entrei em casa e fechei a porta, tudo
com ela nos meus braços.
Angelina beijava meu pescoço.
— Você não tem ideia de como fico feliz com isso.
Eu ri e a levei até o toalete, ligando a torneira da banheira branca. O
local era grande, com piso cor de areia, uma pia de mármore preta e um box
de tamanho considerável.
Coloquei-a sentada no balcão da pia enquanto enchia a banheira com
água quente e espuma de lavanda, seu cheiro.
— Fique aqui — pedi.
Ela assentiu, mirando-me com os olhos bêbados de desejo. Quase me
esqueci de tudo que precisava fazer. Nós tínhamos ficado no carro, então ela
precisaria de um banho, e eu também.
Escutei o barulho de panos caindo ao chão. Quando olhei para cima, a
vi nua. Reparei em suas pernas longas e perfeitas, o quadril com curvas, sua
boceta linda e raspada, a barriga lisa e os seios pequenos, que cabiam
perfeitamente em minhas mãos. Seu rosto inocente estava um pouco corado,
sorridente.
Fiquei extasiado, com uma enorme vontade de possuí-la ali mesmo,
devorando-a de todas as formas possíveis. Precisava me controlar, porque
ela era virgem. Antes que eu pudesse pedir para ela ter dó de mim — não
era justo ficar nua na minha frente, provocante —, Angie se lançou na minha
direção e me beijou com uma fome que nem acreditava ser possível. Nossos
lábios doeriam depois; não me importei.
Agarrei-a pela bunda e a apertei. Ela enrolou os pés em minha cintura,
gemendo em minha boca, com as mãos em meus cabelos, prendendo meu
rosto junto ao seu. Nossa! O beijo estava selvagem e faminto dos dois lados.
Prendi-a na parede, pressionando meu quadril contra o dela. Em seguida, me
afastei um pouco, colocando um dedo em sua entrada molhada.
— Não vou tirar sua virgindade hoje, mas posso abrir um pequeno
caminho? — pedi.
— Hummm — gemeu, incoerente.
— Você quer isso? — sondei. Não faria nada sem sua permissão.
Angelina passou a língua no meu pescoço. Reprimi um gemido e me
controlei para não fodê-la forte.
— Sim, eu quero tudo que você quiser. — Sua voz falhava de desejo.
— Transarei com você, só não hoje. — Não sabia quanto tempo
aguentaria minhas bolas azuis. Seria um sacrifício danado me esfregar contra
ela e não colocar para dentro, como eu gostaria.
— Ryan... — Inseri um dedo em sua boceta apertada e perfeita.
— Isso mesmo, chame meu nome enquanto eu a faço gozar. — Empurrei
tudo. Ela estremeceu. Com o polegar, acariciei seu clitóris, acelerando os
movimentos, o que a deixou nas nuvens. Seu corpo se projetava para cima e
para baixo, querendo acompanhar o meu dedo dentro dela.
— Oh, isto é o céu!! — gritou, apertando minhas costas. No dia
seguinte, estaria cheio de arranhões. Não liguei.
Acelerei mais a pressão contra seu clitóris. Ela explodiu, jogando sua
cabeça para trás, fechando os olhos e urrando meu nome. Nunca vi nada mais
lindo.
— Perfeita! Tão linda quando goza — sussurrei, maravilhado, olhando
seu rosto suado e trêmulo com seu orgasmo alucinante.
Ela sorriu, meio tímida.
— Não é gozar que me faz sentir mole e em êxtase, e sim você.
Eu ri e a coloquei na banheira com água morna, cheia de espuma.
Apoiou-se na borda, sem nunca tirar os olhos de mim.
— Você está muito vestido, não acha?
Sorri, passando a camiseta por cima da cabeça e a jogando no chão.
Notei que observava minha barriga, e suas íris escureceram ainda mais
quando tirei a calça e a cueca.
— Vendo algo que gosta? — sondei, entrando na banheira junto com
ela.
— Sim, você é tão perfeito! — falou, quase pasma. — Será que isto
não é um sonho? E amanhã acordarei e você não estará mais aqui?
Puxei-a para o meu colo, sentindo meu pau duro em sua entrada
perfeita. Controlei-me, pois ela não estava pronta. Toquei seu rosto e os
cabelos, presos num coque bagunçado, talvez para não os molhar na
banheira. Seus olhos negros como ônix me fitavam com intensidade.
— Sou real, e quando amanhecer, continuarei aqui, e no dia seguinte, e
no outro... — Beijei a ponta de seu nariz. — Serei tão grudento que você
brigará comigo querendo espaço.
Ela riu, passando a língua nos meus lábios.
— Vou amar, porque isso significa que ficaremos assim. — Rebolou no
meu colo e meu pau salpicou para cima, querendo ser enterrado.
— Anjo...
— Agora é a minha vez — disse, saindo do meu colo e ficando ali na
minha frente.
Eu franzi o cenho.
— Sua vez?
— Você colocou a boca em mim, farei o mesmo em você.
Queria tanto que isso acontecesse comigo, com nós, mas não a forçaria
a me dar prazer como dei a ela.
— Tem certeza disso?
Mirava meu rosto.
— Você não quer que eu faça porque não tenho experiência? — Sua voz
era só um sussurro, mas detectei a dor ali. Foi como um soco no estômago.
Eu me ajoelhei na banheira e a puxei para os meus braços. Beijei-a por
um momento, fitando suas íris negras umedecidas. Como podia pensar que eu
não a queria por sua falta de experiência, se esta questão me deixava
imensamente feliz?
— Anjo... Quero isso mais do que qualquer coisa. Sonho com esses
lábios carnudos em volta do meu pau, chupando e sugando, há muito tempo.
— Toquei seus lábios abertos de choque. — Quanto a não ter experiência, eu
me sinto um bastardo sortudo, porque significa que você nunca colocou essa
boquinha no pau de ninguém. Será só minha. E você pode fazer qualquer
coisa com meu corpo.
Angie me deu um sorriso que cintilava o lugar e meu coração.
— Você pode me ensinar para eu ficar experiente só para você. —
Beijou meu rosto, sem desviar os olhos. — Quero fazer isso. Não estou
pronta para transar, mas podemos fazer todo o resto. — Sorria como um gato
prestes a comer um canário. — Sente-se na beirada da banheira. — Indicou
o canto. — Apoie as costas na parede.
Fiz o que ela pediu, deixando que assumisse o comando. Quase ri disso.
Quando na minha vida sonhei em permitir a uma mulher tomar as rédeas no
quarto? Nunca! Essa garota veio para me fazer cair de joelhos. Não estava
reclamando.
Angelina se ajoelhou, colocando as mãos em cada uma das minhas
pernas. Seus seios desnudos estavam empinados na minha direção, tudo para
minha cobiça e tentação. Ela encarou meu pau duro como granito e seus
olhos brilharam com o que viu, o que me fez quase gozar. Lambeu os lábios,
em expectativa para saboreá-lo. Pegou meu pau duro em suas mãos pequenas
e apertou-o delicadamente. Não sabia o que estava fazendo, mas, mesmo
assim, fiquei perto de gozar antes da hora. Ela trançou os dedos na coroa,
pegando uma gota do meu líquido lubrificante e colocando-a na boca.
Gemi, apertando minhas mãos na beira da banheira com tanta força que
achei que os nós dos dedos ficariam brancos.
— Você está me matando aqui — sussurrei com a voz gutural e
anasalada.
Ela sorriu de modo libidinoso.
— Hummm, nada mal. — Curvou-se para frente e colocou seus lábios
em forma de coração na cabeça do meu pênis, passando a língua em volta
dele como se fosse um maldito pirulito. Levou-o mais ao fundo de sua boca e
sugou forte; meu corpo tremeu.
Gemi, fechando os olhos e sentindo o prazer me dominar. Ficava louco
ouvindo seus gemidos e gracejos. Eu era um cara grande, e tinha orgulho
disso. Ela não conseguiria me colocar inteiro em sua boca quente, mas o
êxtase que eu sentia dizia o contrário.
Abri os olhos e alisei seu rosto corado.
— Aperte a boca um pouco mais, não deixe os dentes pegarem nele —
pedi, traçando suas têmporas suavemente.
Obedeceu-me com intensidade. Uma visão de outro mundo: ela com a
boca cheia.
— Isso, agora segure com a outra mão o que sobrou do meu pau, o que
você não conseguiu colocar na boca.
Usou a mão direita, balançando para cima e para baixo, em
conformidade ao ritmo de seus movimentos, sugando-o e lambendo-o.
— Isso mesmo. — Fechei os olhos de novo, sentindo o êxtase chegar
tão intenso que coloquei minha cabeça contra a parede. Estava prestes a
gozar com cada sugada que ela dava.
— Anjo... — Minha voz falhou. — Se não quiser que eu goze em sua
boca, precisa tirar agora...
Apenas gemeu e acelerou mais os movimentos, levando-me bem ao
fundo de sua garganta, apertando meu pau mais uma vez. Foi quando eu
explodi, gritando seu nome, o nome pelo qual tinha adoração.
Ganhei muitos boquetes em minha vida, e com mulheres experientes,
contudo, nunca foi como este... Com ela, eu vi estrelas. Não! Vi uma
constelação inteira, ficando mole. Para quem nunca fez sexo oral, ela se saiu
muito bem. Parte da minha alegria residia no fato de sua boca nunca ter
estado em outro homem. Pensar nisso me dava vontade de matar um. Por
sorte, ela era só minha, e seria para sempre.
Angelina liberou meu pau mole e levantou seus olhos quentes e bêbados
para mim, limpando sua boca com as costas das mãos.
— Então, como me saí?
Detectei nervosismo em sua voz. Será que ela estava preocupada de eu
não ter gostado? Era louca?
— Você foi excepcional, tão incrível que estou até mole. — Era
verdade, foi o melhor boquete de todos os tempos.
Ela sorriu brilhante e me abraçou.
— Farei melhor na próxima vez, me esqueci de apertar suas bolas.
Dizem que isso deixa os homens loucos — sussurrou, beijando meu pescoço.
Gemi, saindo da banheira e a levando comigo nos braços.
— É melhor pararmos por hoje, já está tarde. — Eu não queria parar,
aliás, queria ficar com ela a noite inteira, sem espaço para descansar. —
Amanhã continuamos.
Angie franziu os lábios em um biquinho bonitinho, algo que sempre
achei fútil e sem graça em mulheres, mas nela era lindo e fofo.
— Mas me deu vontade de novo enquanto chupava você. — Mordiscou
meu ouvido. — Estou toda molhada, e não é da água da banheira.
Rosnei, feroz, devorando sua boca, sentindo o gosto do meu gozo nela.
Dei à minha mulher gostosa aquilo pelo que tanto ansiava: eu.
Capítulo 11
O tempo não apaga

ANGELINA
Acordei com o sol brilhando do lado de fora das janelas de vidro. As
persianas estavam recolhidas, por isso a claridade ali dentro. Já era tarde,
só não sabia o quanto. Observei o corpo quente e másculo por quem estava
completamente apaixonada. Sorri ao me lembrar do que fizemos à noite,
ardia ao pensar nos detalhes. Foi o melhor sexo oral da minha vida... Aliás,
foi o único.
Ryan estava com sua barriga tanquinho para cima, sem camisa, de boxer
preta, com a mão direita sobre seus olhos fechados, e a outra em minha
cintura. Seu rosto esculpido parecia sereno ao dormir um sono profundo. A
boca sexy, entreaberta, me deixava com fome dele de novo. Estava louca
para acordá-lo para continuarmos de onde paramos — e, agora, fazer o sexo
realmente, já esperara demais. Queria sentir seu corpo sobre o meu e
realizar meu sonho de possuir este homem gostoso e lindo.
Saí de fininho da cama, não querendo acordá-lo. Já era quase meio-dia
no relógio do despertador. Ainda bem que hoje era sábado, então
poderíamos aproveitar mais. Notei que estava sem roupas. Peguei uma
camisa verde dele e vesti; batia nos meus joelhos.
Fui à cozinha fazer o café da manhã para nós dois, pois estava faminta.
Era enorme, com armários de aço na parede, um fogão inox perto da pia de
mármore e uma ilha grande no meio da cozinha. Em cima da pia, havia uma
janela de vidro que exibia uma vista linda para o horizonte onde o sol se
escondia à noite.
Anos atrás, Ângela e eu fizemos uma promessa: no dia em que
completássemos dezoito anos, viajaríamos pelo mundo e veríamos o sol
nascer em vários lugares. Um sonho interrompido por causa de um monstro
que nos seguiu e fez meu carro capotar. Ela amava o sol, então eu o
observava todas as vezes que se punha, como se minha irmã estivesse logo
atrás, olhando para mim.
Preparei waffles e panquecas. Por sorte, sabia onde ficava tudo, pois
havia arrumado sua casa antes de ir trabalhar na editora. Depois que fiz o
café da manhã, organizei a mesa com leite, suco e iogurte. Após me
alimentar, saí da cozinha e segui para a sala de estar, gigante, com vista para
a cidade, dois sofás grandes na forma de L e uma estante com uma TV de 50
polegadas. Sentei-me em uma mesinha perto da janela de vidro e passei a
fitar Manhattan; um paraíso de se olhar por anos e nunca se cansar.
Peguei o iPhone do Ryan de cima da mesinha. Na noite anterior, deixara
seu número com Johnny para ele me ligar caso precisasse de mim. Vi as
mensagens perdidas de meu amigo, eram muitas. Será que aconteceu alguma
coisa? Não, tinha certeza de que tudo estava bem. Não podia sempre pensar
no pior, sabia que meus garotos encontravam-se seguros.
Ouvi passos vindo do corredor enquanto discava para Johnny. Olhei
para cima e me deparei com a bela visão do homem mais lindo do mundo.
Um verdadeiro Adônis. Peguei o celular e bati fotos, querendo eternizar a
imagem diante de mim, tudo para minha cobiça. Esse deus grego era só meu.
Quando tivesse meu telefone, passaria as fotos para ele.
Ryan usava cueca boxer, sem camisa, mostrando o V perfeito da barriga
tanquinho com alguns gominhos, o peito forte e os ombros largos. Seus
cabelos estavam bagunçados de um jeito sexy. Essa visão me encheu de
cobiça.
Arregalou os olhos assim que bati a primeira foto e sorriu torto para a
segunda.
— Espero que não pretenda mandar isso para ninguém. — Soava rouco
de sono, fomos dormir mais de três horas da manhã.
Eu pisquei.
— É claro que não! Elas são o meu presente.
Ele veio até mim, me puxou para seus braços fortes e me beijou como
se eu fosse seu café da manhã; de fato, eu queria ser. Retribuí o beijo com
igual vigor e paixão. Logo fomos interrompidos pelo toque do celular.
— Hummm — murmurou em minha boca. — Deixe-o tocar.
Era isso que eu queria, mas não podia ignorar a ligação. Afastei-me do
meu homem lindo e mirei seus olhos quentes.
— É o Johnny — disse, acrescentando mediante seu rosnado: — Não
seja assim. Eles são meus amigos.
Ryan assentiu sem querer e se distanciou, sem retirar a expressão
quente de seu rosto, me derretendo por dentro.
— Eu sei, desculpe. Prometo que serei legal com aqueles dois.
Contanto que mantenham as mãos longe do que é meu, não teremos
problemas.
Ergui minhas sobrancelhas.
— Eu sou sua?
Ele riu, lançando um olhar ávido ao meu corpo, que foi direto no meu
centro.
— Você é toda minha, Anjo, dos pés à cabeça. — Deu um sorriso
pervertido. — Quer mais provas?
Engoli em seco, pegando fogo. Era tão difícil resistir a ele, ainda mais
com esse corpo quase nu, me olhando como se quisesse me levar para a
cama e não me deixar sair dela tão cedo. Tonificado, com músculos
definidos em todos os lugares certos: peito, pernas, braços. Fora o rosto
esculpido, as íris cor de whisky, a boca sexy levantada em um sorriso
libidinoso. Nossa! Com esta visão, meu núcleo queimava em atrito.
Impossível me segurar, como um drogado tentando resistir ao seu veneno
preferido. Contudo, precisava saber o que estava acontecendo com meus
irmãos.
— Atendo enquanto você toma café da manhã — falei, levando o
celular ao ouvido.
Ele sacudiu a cabeça, ainda sorrindo. Tão lindo que só pude ficar ali,
encarando-o de boca aberta como um peixe.
— Preferiria me alimentar de outra coisa... — Notou que eu vestia sua
camisa, e seus olhos escureceram mais. Depois, virou-se e foi para a
cozinha, sem notar o efeito de suas palavras em mim, um maldito vulcão
prestes a explodir.
Estremeci e me recuperei.
— Oi, Johnny. — Minha voz saiu fraca, então pigarreei.
— Angelina. — Parecia nervoso.
Um gelo desceu por minha espinha, me deixando tensa.
— Aconteceu alguma coisa com os meninos?
— Anjo... — Ryan me chamou num tom preocupado. — O que houve?
Caminhava em minha direção com um iogurte de morango em mãos.
— Não, os meninos estão bem, se acalme — Johnny me tranquilizou.
Coloquei minha mão direita no coração e suspirei aliviada.
— Graças a Deus. Então qual é o problema? Você parece agitado. —
Sinalizei para o Ryan voltar a tomar café, mas ele balançou a cabeça e ficou
ali perto do sofá, atento.
— Não ligue a TV, Borboleta... — pediu Johnny, um tanto aflito.
— O quê?
Ele suspirou pesadamente.
— Não ligue a TV, por favor — repetiu, suplicante. — E não saia nas
ruas agora.
— O que está na TV? — Fiquei confusa. O que poderia estar passando
de tão grave que ele não queria que eu visse? Corri até o sofá, peguei o
controle e liguei o imenso aparelho.
Ofeguei de pavor e pesar; fotos minhas e do Ryan no Belas Country
estampavam a tela: eu o beijando na mesa, eu dando comida para ele em sua
boca. E o que vi em seguida fez meu mundo cair de vez, uma imagem que
arrancou meu coração...
— Anjo — chamou Ryan, aturdido, chegando perto de mim.
Escutava Johnny ao fundo, no entanto, meus ouvidos pareciam
obstruídos com algodão. Fui tomada de dor por todos os lados. Na TV, uma
menina de dezessete anos e meio festejava com homens aleatórios, usando
roupas curtas e provocativas, com olhos negros e vazios; olhos que um dia
brilharam mais que o sol.
Ryan arquejou. Não liguei que a princípio ele pensasse que fosse eu.
Não era eu ali, e sim ela... A pessoa que representava tudo na minha vida.
Agora, todos esses malditos jornalistas falariam mal da minha irmã, usando
meu nome nas imagens que ali circulavam. Também diriam que eu pretendia
dar o golpe do baú no Ryan, fora os nomes impróprios que utilizariam os
veículos midiáticos.
Meus olhos se encheram de lágrimas com a dor que se apossou de
mim... Tão forte que tudo embrulhou dentro do meu corpo. Corri para o
banheiro e caí de joelhos no chão, vomitando no vaso sanitário o que comera
há pouco. Ryan correu para o meu lado e pegou meus cabelos. Esquivei-me
dele, me sentindo como aqueles jornais me descreviam.
— Não chegue perto mim — gritei, chorando.
Ele deu um suspiro desalentado.
— Anjo, eu sinto muito.
Por que ele sentia muito? Por que estava sofrendo? Não queria que
sofresse por minha causa. Sentei-me no chão do banheiro e escorei a cabeça
na parede de azulejo frio, tentando aliviar a dor.
— Johnny, o que está havendo com ela? — perguntou Ryan, com o
celular que caiu em algum lugar.
Ignorei a conversa deles, só pensava em Ângela. Ela fez tudo aquilo,
saía com caras aleatórios, porque não pôde lidar com a angústia de perder
Caim. Não lutou de outra forma para seguir em frente, não, recorreu ao
álcool e a homens desconhecidos. Tentei salvá-la do poço onde estava se
afundando; não consegui.
Histérica, me debatia no chão do banheiro, querendo que o sofrimento
fosse embora, mas ele nunca iria... Não me importava em me machucar, uma
dor a mais não faria diferença.
— Anjo — balbuciou Ryan, assombrado ao acompanhar minha crise.
Estava entorpecida de amargura por todos os malditos lados.
Braços fortes me pegaram, me suspendendo do chão, me aninhando ali
como se eu fosse um bebê frágil. Ainda me debatia, pedindo para ele me
soltar, contudo, Ryan não deu ouvidos, apenas me prendeu na cama com
minhas mãos em cima da cabeça e seu corpo sobre o meu, impossibilitando-
me de lutar.
Minhas forças foram embora; fiquei ali, mole por um segundo,
soluçando e gemendo. Por que eu não fui com ela? Ângela me deixou sozinha
para lidar com tudo isso, com sua perda. A escuridão que me rodeava era
profunda, impedia-me de ver as coisas ao meu redor.
— Por quê? — urrei. Seus braços fortes continuavam a me firmar em
seu aperto.
— Oh, Anjo... — falava agoniado, incapaz de me trazer de volta da
escuridão.
— Por que ela me deixou? Por que não me levou junto? — Através na
névoa escura, ouvia vozes não muito longe, mas era incapaz de chegar até
elas. A dor em meu coração me cegava, como se eu estivesse em uma
maldita fornalha, me queimando sem poder morrer...
— Porque você precisava cuidar de seus irmãos. — Ryan resfolegou,
me trazendo de volta ao presente. Parecia que eu estava em uma rua deserta,
caçando e gritando, querendo encontrar Ângela. Pedi para me levar com ela
a todo custo. Em meio ao negrume, não conseguia ver nada, muito menos
quem eu tanto desejava. Somente sentia a dor a me consumir.
Abri meus olhos molhados de lágrimas e encontrei os de Ryan.
— E para eu amar você. — Beijou minhas lágrimas, carinhoso, não de
forma sensual, me tratando como a coisa mais preciosa de seu mundo.
Gemi, sacudindo a cabeça. Mentalizei Lira, minha bonequinha linda, e
meu irmão, que precisavam de mim, que eu fosse forte para eles. Não podia
me permitir cair agora, lutaria por quem amava, enfrentaria a dor que estava
esmagando meu corpo, meu coração.
— Lira... Shane. — Minha voz saía quebradiça como vidro.
— Eles estão na sala.
— Eu preciso... — Tentei me levantar, mas ele não me deixou.
Ryan respirou fundo.
— Você precisa se controlar antes, porque senão vai preocupá-los.
Fechei meus olhos por um segundo, depois os abri, acompanhando sua
face apreensiva. Eu estava vermelha e inchada de tanto chorar. Não sabia
por quanto tempo saí de mim, talvez horas? Minutos?
Ryan me fitava, entorpecido. Tirou suas mãos das minhas e alisou minha
bochecha, meus olhos, minha boca. Esquadrinhou meu rosto como se
estivesse memorizando-o.
— Desculpe-me...
Encostou sua testa na minha sem desprender os olhos dos meus.
— Sei o quanto doeu ver aquelas fotos. — Sua voz tinha uma pontada
de raiva. — Meus advogados estão entrando em ação para processar todos
esses abutres desgraçados.
— Quanto tempo fiquei fora?
Ele se encolheu.
— Quarenta minutos, mais ou menos...
Quarenta minutos? Lembrava-me de estar em um lugar escuro e rodeada
de dor, um pesadelo do qual não podia acordar.
— Eles disseram que quero seu dinheiro... — Minha voz falhou;
escondia meu rosto em seu pescoço. — Eu não quero, Ryan. Nunca quis. —
Apertei meus braços em suas costas. — Você precisa acreditar em mim.
Depois da minha crise, me dei conta de que talvez ele estivesse
pensando isso, que eu estava interessada em seu dinheiro. Nunca fiquei com
tanto medo de perdê-lo como agora, principalmente após saber o quanto ele
me amava. Esperava que esse amor fosse suficiente para ele nunca duvidar
dos meus sentimentos.
— Oh, Anjo! — Sentou-se na cama e me puxou para seu colo, me
embalando tal qual uma criança e beijando meus cabelos. — Você não é
interesseira. Rejeitou dois milhões, me deu seus modelos de vestidos que
valem quase duzentos mil só para pagar os vinte e cinco mil que aceitou
antes, e também pelo serviço que eu consegui para você. — Afagava meus
cabelos. — Se fosse uma golpista, teria pego os dois milhões na hora sem
nem mesmo pensar. Não o fez porque é pura. — Deu um selinho na ponta de
meu nariz. — Acredito em você de olhos fechados.
Engoli em seco.
— Ryan...
Ele alisou as minhas têmporas.
— Nunca senti tanto medo quanto há pouco, vendo você daquele jeito,
sem poder fazer nada, sem poder enfiar a mão em seu peito e arrancar toda a
sua dor… Eles vão pagar por isso. Eu juro.
— Sei que ela fez tudo aquilo, saiu para festas e com caras aleatórios,
mas foi porque não soube lidar com a dor de perder Caim. — Ainda assim,
eu não o culpava mais. Ninguém podia escolher quem amar. Talvez se eu o
tivesse conhecido depois dela, ele teria se apaixonado por Ângela, em vez
de mim?
Coloquei meu ouvido no coração do Ryan, de modo a aliviar um pouco
a dor da lembrança. Concentrei-me no ritmo de suas batidas e no seu cheiro,
que me deixava bêbada.
— Eles não têm o direito de falar sobre ela assim — chorei. — Minha
irmã não está aqui para se defender.
— Eu sei, meu Anjo, eles não tinham, mas vão pagar — concordou. —
Prometo.
— Confio em você.
— Você pode lutar, é muito forte, uma guerreira. Saberá defendê-la com
garra. E estarei com você até o final. Sempre.
Afastei meu rosto de seu peito e conferi sua expressão solene.
— Dói tanto falar sobre ela — murmurei com lágrimas a escorrer.
— Eu sei, querida. — Limpou-as com as pontas dos dedos.
— Às vezes, sinto raiva por ela ter ido... Prometemos nunca deixar uma
a outra — sussurrei. — Se eu tivesse feito mais...
— Tudo acontece nesta vida por uma razão — disse suavemente.
Tomou fôlego, fechando os olhos: — No dia em que meus pais foram para
Nova York de carro, era para eu ter ido com eles. Minha mãe estava
promovendo um baile de caridade, ela sempre fazia isso e me chamava,
querendo me prender a alguma garota certinha. Nunca dei ouvidos. Não
estava pronto para deixar a farra; com dezesseis anos, eu era igual a logo
antes de conhecer você.
Abriu os olhos e beijou meu nariz. Depois voltou a cerrá-los, acho que
para controlar a dor.
— Por isso minha aversão a bailes, porque me lembram ela. Era para
eu estar lá naquele carro com eles. Você não sabe o quanto pensei nisso
durante vários anos, que eu podia ter partido junto. Não era a minha hora,
mas eu pensava em mil maneiras de impedir o acidente, se estivesse lá...
Encolhi-me por dentro, por sua perda tão similar à minha. Ryan,
erroneamente, se culpava por isso.
— Você não tem culpa. — Ele abriu os olhos com o som da minha voz.
— Se estivesse lá, também teria... E jamais nos conheceríamos.
Ele beijou a minha testa.
— É o que repito a mim mesmo depois que a encontrei. Sabe quantas
vezes eu desejei estar lá e ter ido com eles? Muitas. Por isso lutei contra o
que sentia por você no começo. Não queria permitir que entrasse, porque
logo iria embora e desapareceria como eles.
— Isso é...
Ele me interrompeu.
— Ridículo, eu sei, mas era assim que eu me sentia. Meu amor por
você é maior do que qualquer coisa. Maior do que a culpa, maior do que o
mundo. Então entendo como se sente em relação à sua irmã, mas aqui há
pessoas que precisam de você. Seus irmãozinhos ali na sala, preocupados
com você. — Deu-me um selinho. — E eu. Nunca dependi tanto de ninguém
em minha vida.
— Também preciso de você, Ryan. — Beijei sua boca por um segundo.
Na sequência, me afastei dele com meus olhos arregalados. — Oh, meu
Deus!
— O que foi? — Soou urgente ao tocar meu rosto com as mãos.
Fiz uma careta.
— Eu vomitei e nem escovei os dentes. — Saí de seus braços e corri
para o banheiro, já pegando uma escova nova. Ele tinha um estoque dentro
da gaveta. Coloquei a pasta, escutando sua risada gostosa e ardente.
Fitei-o com o cenho franzido.
— Por que está rindo?
— Meu Deus, como você é linda! — Ele riu mais, pegou a minha
escova e jogou-a na pia de mármore. Eu estava prestes a reclamar quando
me beijou com fervor e adoração, uma mistura muito boa. Tentei empurrá-lo,
pois precisava me limpar, contudo, Ryan não deixou. Não tive forças para
impedi-lo. Ele chupou a minha língua como se fosse um pirulito saboroso.
— Poderia aprofundar mais o beijo, mas a sala está cheia de gente,
incluindo seus irmãozinhos... — Riu, sacudindo a cabeça e se afastando um
pouco. — Shane já chegou bravo comigo, pensando que era eu o motivo de
você chorar daquele jeito.
Arregalei os olhos.
— Ele sabe?
— Eu estava no telefone com Johnny quando ele ouviu seus gritos. —
Encolheu-se com a memória, depois sorriu. — Shane me deu dez minutos
para eu levá-la à sala ou ele entraria aqui e acabaria comigo.
Gargalhei, porque só meu garoto diria isso sem se importar de estar
falando com um homem. Era o meu protetor.
— Este riso é a coisa mais linda que já ouvi — declarou, observando
minha boca. — Pelo menos você sorriu um pouco.
Antes que eu respondesse, escutei a voz urgente do meu garotinho lindo.
— Angie — gritou, batendo à porta do quarto.
Respirei fundo.
— Estou saindo, meu amor — respondi, deixando os braços do Ryan.
Escovei meus dentes e penteei meus cabelos com os dedos; pareciam um
monte de feno. Já ia desistir e prendê-los em um rabo de cavalo, mas Ryan
pegou um pente na gaveta e veio atrás de mim para arrumá-los. Fiquei
surpresa.
Ele arqueou uma sobrancelha, me fazendo inveja.
— O que foi? — Olhava-me através do espelho.
— Você é o homem mais perfeito do mundo, o sonho de toda mulher —
falei, maravilhada por ele me amar.
Ryan sorriu.
— Anjo, sou assim só para você, ninguém mais. — Terminou, deixando
meu cabelo escovado e em ondas às minhas costas. — Como você disse, se
você estiver doente, procurarei o remédio; se estiver sofrendo, farei de tudo
para aliviar a dor; se chorar, secarei suas lágrimas com meus beijos; se
precisar de um amigo, estarei lá para você; se necessitar de um amante, serei
o seu; se quiser ir para a lua, a levarei. No final, quero ser o seu mundo, pois
você é o meu.
Como um homem mulherengo podia ser capaz de dizer tudo isso? Santa
Mãe do Céu, tirei a sorte grande por esse deus grego me amar.
— O que foi? Parece impressionada. — Sorriu torto.
— Ryan Donovan, o deus do sexo puro, o queridinho das mulheres, está
fazendo um poema à sua namorada?
Seu sorriso brilhava como diamante. Iluminava tudo: meu ser, minha
vida.
— Deus do sexo, hein? — Virou a cabeça para trás e gargalhou. —
Repito: só faço coisas assim para você. Mais uma primeira vez para eu
colocar na minha lista.
— Existe uma lista? — perguntei, ultrajada.
— Você está bem, Angie? — sondou Shane, me interrompendo de falar
que ele era o melhor homem do mundo, pular em seu pescoço e beijar cada
canto de seu rosto lindo.
Eu me recompus e saí do banheiro, gritando na direção da porta do
quarto:
— Sim, já vou sair. — Ryan ficou escorado no batente da porta. Seus
olhos estavam quentes, mas preocupados. Usava uma bermuda jeans, sem
camisa.
— Seus amigos estão lá fora? — Corei ao relembrar a crise que tive.
Ele assentiu.
— Agora são seus amigos também. — Olhou-me de lado.
— Não tenho roupas aqui, apenas o meu vestido.
— O Johnny trouxe algumas para você. — Foi até uma cadeira que
ficava no canto e pegou uma bolsa rosa, a mesma que comprei no Walmart no
ano passado. — Até que ele serve para alguma coisa.
Ryan sorria de leve. Em sua presença, a dor ficava menor. Estava
doendo, sim, contudo, ele a tornava mais suportável. Como se, de alguma
forma, Deus o tivesse enviado para me ajudar a passar por tudo que estava
enfrentando com Shane e minhas perdas... Era grata aos céus por ele ter
aparecido na minha vida.
Fui para o banheiro me trocar, porque não tinha muito tempo. Precisava
encarar meus problemas, encarar um bando de jornalistas. Vesti um jeans
skinny e uma blusa de alças finas, afinal, o tempo estava bom lá fora, a
despeito de não poder sair do hotel por enquanto.
Ryan não entrou comigo no banheiro; se entrássemos os dois ali, não
sairíamos tão cedo, e meu menininho estava impaciente do outro lado da
porta. Meu belo namorado já estava vestido com um jeans desbotado e uma
camiseta que abraçava seu corpo tonificado, com logotipo de uma banda de
rock que não conhecia. Seus cabelos loiros estavam de um jeito bagunçado e
sexy. Lindo, era esta a descrição ideal.
— Esqueça esse pensamento por enquanto. — Sorria cálido.
Ele estava certo: tínhamos problemas para enfrentar lá fora.
— Angie, você está demorando muito, então eu vou entrar. — Shane
anunciou, abrindo a porta. Correu até mim e abraçou minha cintura. Tinha
oito anos, mas era um menino grande. Acho que puxaria os quase dois metros
do meu pai. — Mana, você estava chorando por quê? — Sua voz tinha uma
pontada de raiva. Ele se afastou de mim e estreitou os olhos para Ryan. — É
por causa dele?
Mirei seu rostinho preocupado.
— Shane, meu amor, o Ryan está me ajudando a passar por isso tudo...
Ele me interrompeu.
— O que aconteceu? Está toda vermelha e inchada — rosnou, fechando
os punhos. Shane tinha um metro e trinta, grande como papai em sua idade.
Quando completasse quinze anos, ficaria mais alto que eu, se não antes. De
qualquer maneira, sempre seria meu bebê. — Quero acabar com quem fez
você chorar assim.
Eu ri, abraçando-o forte. Seu cheiro natural de bebê e sabonete de
morango me deixava inebriada com amor. Queria sentir isto por toda a minha
existência.
— Eu te amo muito, meu amor. — Beijei seu rostinho.
— Por que ficou triste agora?
— Não estou triste... Estou feliz por ter você e Lira em minha vida. —
Pigarreei. — Agora vá com Lira.
— Promete ficar bem?
Levantei a mão direita para cima num sinal de juramento.
— Palavra de escoteira.
Soltou uma risada gostosa e rica.
— Você nunca foi escoteira.
Baguncei seus cabelos.
— Sim, eu fui, mas uma péssima — cochichei.
Riu de novo e foi para a sala, fechando a porta. Fiquei ali, mirando a
porta de madeira e lamentando por ele estar doente.
— Anjo, o que está acontecendo? O que foi? — Ryan correu para o meu
lado e me abraçou. — Por favor, me conte.
— Não posso perdê-lo, Ryan... — choraminguei.
— Eu não vou... — interrompeu-se, me afastando e olhando meu rosto.
— Você não está falando de mim, não é?
Balancei a cabeça.
— Preciso ser forte por ele. — Fechei os olhos por um momento.
— É sobre o Shane? — Parecia confuso. — Você não vai perdê-lo,
querida, aquele garoto venera o chão que você pisa.
Respirei fundo e abri os olhos, fitando suas íris preciosas.
— Aquele dia no hospital em Nova Jersey, descobri que Shane tem uma
falha no coração, e precisará fazer uma cirurgia...
— O quê? No coração?
Aquiesci.
— Sim, foi por isso que aceitei o dinheiro da aposta, para poder
adquirir alguns remédios. A cirurgia foi marcada para daqui a duas
semanas...
— Não vai acontecer nada com ele, eu juro.
— Talvez se eu... — Minha voz falhou no final.
— Não existe “se”, Anjo. Quando algo assim acontece conosco, temos
que acreditar que tudo dará certo — disse, alisando meus cabelos que há
pouco escovara.
— Obrigada por estar aqui e me dar forças para seguir em frente. — Eu
o abracei forte.
— De nada, sua felicidade é a minha — respondeu e segurou as minhas
mãos. — Agora vamos lá para a sala, temos de enfrentar esses abutres
falando coisas ruins de você. Processarei todos eles, garanto. — Sua voz
soou fria.
Caminhamos até a sala de mãos dadas. Todos já estavam ali nos
esperando. Ostentavam expressões preocupadas comigo, alguém que eles
praticamente conheceram no dia anterior. Achei que duvidariam de mim,
porém, estava errada. Alguns se sentavam no sofá na forma de L: Jordan,
Jason e Rayla, de mãos dadas com Alex. Alexia estava perto de Bryan, sem
se tocarem, um par perfeito e lindo. Lucky abraçava a Sam. Charles e
Johnny, de pé, situavam-se perto do sofá. Daniel estava próximo aos meus
amigos. O grupo tinha olhos tristes, alguns com mais raiva, e não de mim,
pelo que percebi.
Sam veio na nossa direção e me abraçou por um momento.
— Lamento, querida, por esses idiotas terem feito isso com você —
sussurrou com doçura e uma pontada de ira.
Meu coração saltou por ela se preocupar comigo. Forcei um sorriso
para tranquilizá-la.
— Eles estão falando muitas coisas ruins a meu respeito. — Olhei cada
um, por último o irmão do Ryan, o Lucky. Ele tinha o poder de fechar as
portas para algumas pessoas, por isso desejava me explicar, não gostaria que
ele entendesse mal o que sentia pelo seu irmão. — Quero que saibam que
não tenho interesse no dinheiro do Ryan. Eu o amo, é por isto que estou com
ele.
— Eu sei, querida. — Lucky me puxou para os seus braços. — Confio
em você.
— Obrigada — sussurrei, comovida.
— Certo, chega — rosnou Ryan, me tomando dos braços do irmão. —
Abrace sua mulher, não a minha.
Encarei-o de forma dúbia.
— Não acredito que até do seu irmão você tem ciúmes.
Beijou-me na testa.
— Sinto ciúmes de você com todos os homens deste mundo. — Mirou
Charles e Johnny, perto de nós. — Incluindo eles dois, que não gostam de
mulher.
— Gostamos de mulher — replicou Charles. — Apenas não da mesma
forma que você.
Ryan revirou os olhos.
— Você é... — Minhas palavras fugiram.
— Lindo? — falou com um esboço de um sorriso.
Estava prestes a retrucar quando a campainha tocou. Todos ficaram
confusos.
— Quem será? — Jordan franziu o cenho para Ryan. — Você está
esperando alguém?
Meu namorado balançou a cabeça e foi abrir a porta.
— Que diabos você está fazendo aqui? — esbravejou. Em seguida,
escutei o barulho de um punho acertando a carne de alguém, acompanhado
por um gemido de dor.
Corri até o hall e arregalei os olhos. Caim estava ali, massageando o
queixo em que Ryan havia batido. Ryan imprensou-o contra a parede.
— Não bata nele, por favor — gritou a namorada de Caim.
Surpreendi-me ao vê-la ali, junto a ele. Bom, pelo menos os dois
continuavam namorando.
— É por sua causa que a irmã dela ficou daquele jeito... — sibilou
Ryan na cara de Caim. — Agora Angie está sofrendo com isso.
— Porra, você não sabe de nada — retornou Caim.
Puxei Ryan para ele parar de bater no outro.
— Não é culpa dele. — Fiquei de frente para o Ryan e toquei seu rosto
rígido e tenso. Seus olhos foram para mim. — Por mais que eu odeie admitir,
ela foi a única que se deixou levar por esse caminho. Eu estava com a mesma
dor que ela naquela época, por Caim ter ido embora, e não fiz o que ela fez.
— Expirei, me controlando. — Acalme-se.
Ele respirou fundo para se controlar e assentiu. Fitou Caim com frieza,
mas não disse nada. Eu também olhei meu quase ex, ainda atônita.
— O que faz aqui?
Parecia triste.
— Vim resolver as merdas que estão falando de sua irmã. E impedir
que falem mal de você, aquelas fotos nem suas são. — Esfregou o queixo. —
É tudo minha culpa.
— Caim...
Ele me interrompeu.
— É verdade, eu deveria ter aberto o jogo com ela desde o início, antes
que as coisas tomassem aquelas proporções. — Suspirou. — Montei uma
coletiva com os jornalistas aqui no salão.
— Você fez o quê?
— Sim, vamos esclarecer as coisas com esses fodidos, depois você
pode processá-los se quiser.
— Mas Caim, eles nem tocaram em seu nome — argumentei. — Você
está de casamento marcado... — Olhei para sua noiva. — Não devia estar
nesta situação, nem neste escândalo.
— Se você fez isto porque pensa que vai ter algum mérito com ela,
esqueça — rosnou Ryan. — Angie é minha.
Caim olhou frio para ele. Após, voltou-se a mim, mais brando.
— Não estou fazendo isso por uma chance com você, Angie. Pensei no
que disse sobre eu viver no passado; estava certa. — Encarou, triste, sua
noiva, e depois eu. — Te amei muito, mas agora chegou a hora de eu seguir
em frente. Além disso, este idiota a adora, devo admitir. — Aparentava ter
respeito por Ryan. — Ainda mais depois das fotos de vocês dois juntos no
restaurante country, que estão em todos os lugares.
Ryan saía com muitas mulheres antes de eu entrar em sua vida, mas não
em restaurantes e encontros iguais a como foi comigo, só em festas e
baladas.
— Idiota é você. — Ryan urrou, já indo para cima de Caim; eu o
segurei.
— Ryan... — repreendi, olhando Caim. — Então agora você decidiu
que, na realidade, nós nunca existimos? Não romanticamente, é claro. Fomos
amigos um dia, espero continuar assim. E gostaria de ser sua amiga também.
— Dirigi-me à namorada dele.
Ela deu um sorriso doce.
— Você parece uma pessoa legal. Contanto que não esteja interessada
em Caim, podemos sim ser amigas.
— Quem tem Ryan em sua vida não pensa em mais ninguém — garanti
com júbilo. Caim focalizava a namorada com um semblante impressionado,
como se estivesse se perguntando: “O que eu fiz para merecer esta
mulher?’’.
Devia agradecer mesmo, porque nenhuma garota suportaria o que ele
fez com ela, deixá-la para correr atrás de outra.
— Então você vai me ajudar? — perguntei.
— Sim — assegurou. — Marquei uma reunião daqui a uma hora com
nós dois juntos, para esclarecermos as coisas.
— Ele quer que eu quebre a cara dele? — Ryan sibilou.
— Ryan... — repreendi-o de novo, embora estivesse doida para
quebrar sua cara também se ele insinuou algo como estarmos juntos, ainda
mais com sua namorada presente. — O que quer dizer com “juntos”? Há
pouco você falou em desistir de que um dia existiu nós dois...
Ele respirou fundo.
— Olha, o único jeito de despistarmos os jornalistas é contando o que
realmente aconteceu. E faremos isto juntos, mas não juntos num sentido
romântico. — Deu um olhar triste. — Foi por minha causa que Ângela fez
aquelas coisas. Agora temos uma nova vida, e não podemos deixá-los se
intrometerem nela. — Passou as mãos nos cabelos. — Estarei com Kate, e
você com Ryan. Vamos calar a boca desses estúpidos.
— Isto é loucura, ela nunca deu uma entrevista para um monte de gente
— retrucou Ryan. Disse para mim: — Mas a decisão é sua.
— Vai querer se esconder para sempre? — perguntou Caim, me
olhando de lado. — Você está namorando uma figura pública, qualquer coisa
que fizer afetará a imagem dele.
— Eu lido com isso, não você. — Ryan cerrou os punhos. — E não me
importo, contanto que ela esteja comigo. Você só está querendo dar motivos
para ela me deixar. Isso não vai acontecer, eu a seguiria nem que fosse no
inferno.
Arregalei os olhos com suas palavras. Antes que eu falasse algo, Caim
rugiu.
— Não é nada disso, seu estúpido. O que estou dizendo é que temos que
esclarecer as coisas, porque eles estão falando mal dela, e isso não pode
continuar assim, porra! — Virou-se para mim. — Ele é um idiota, você sabe
que estou certo.
— Não ligue para o que esse cretino diz. — Ryan me olhou nos olhos.
— Não me abala eles falarem de minha carreira ou não.
Suspirei. Ele estava fazendo isso para eu não ter de enfrentar um mar de
repórteres querendo me devorar viva, mas eu não podia deixar isso
acontecer com Ryan, ele não podia levar seu nome à lama por minha causa.
— Ele está certo, Ryan, tenho de enfrentar tudo isso hoje. Não posso me
esconder, deixando seu nome sendo arrastado junto com o meu. Preciso ir lá
e declarar que eu não sou interesseira, que não estou atrás do seu dinheiro.
— Apertei a ponta de meu nariz. — E também por Ângela, que não está aqui
para se defender. Eu estou e vou dizer a esses estúpidos que o que quer que
ela tenha feito não é da maldita conta deles. A única que tem o direito de
dizer alguma coisa dela sou eu, porque a amo com cada gota de meu sangue.
Vamos nessa. Esses idiotas vão engolir suas palavras.
Ryan sorria de orelha a orelha, quente. Tive de me controlar para
manter meu foco.
— Você realmente gostou daqueles modelos de vestidos que fiz? —
sondei.
Ele franziu o cenho, sem entender.
— Sim, são fabulosos, inclusive tenho o contrato comigo para você
assinar. Pierre, meu estilista, pediu para eu contratá-la para trabalhar com
ele na Fashion Donovan. Os vestidos estarão no nosso próximo desfile,
daqui a alguns meses na Califórnia.
— Pierre Delacourt tem um bom gosto — Rayla falou atrás de nós. —
Por que não aceita ser estilista para o Ryan?
Sacudi a cabeça.
— Gente, eu desenho por hobby, não por paixão. O que amo são os
livros — afirmei. — Além disso, trabalho na Luxem, a editora do Daniel e o
sonho de todos os escritores. Quem iria querer mudar isso? — Peguei uma
troca de olhares entre Lucky, Jason, Jordan, Daniel e Ryan. Não entendi
muito bem.
— É verdade, Anjo, temos que fazer o que amamos. Se você ama
escrever livros, então é lá na editora que você vai ficar... — Beijou minha
testa.
— Posso fazer os dois, os livros para mim, e os vestidos ou qualquer
roupa que eu venha desenhar para você.
— Eu aceito se você me deixar pagar o devido valor...
— Se eu quiser presenteá-lo e não cobrar, é problema meu — falei com
segurança.
— Isso é verdade, mas não concordarei, porque não é justo com minha
namorada linda que gosta de ajudar a todos sem pensar nela mesma. —
Beijou meu nariz, enquanto eu fazia uma careta. — Felizmente, eu penso em
você a cada maldita hora. — Num estalo, emendou outra questão: — Por que
você perguntou sobre os vestidos agora?
Mordi meu lábio inferior. Seus olhos foram para eles e escureceram.
— Estou preparando minhas respostas. — Fitei o Johnny. — Preciso ir
em casa pegar um vestido para a entrevista.
Johnny sacudiu a cabeça.
— Não pode sair daqui, lá embaixo está lotado de repórteres, e
algumas fãs malucas do Ryan. Todas contra você.
Andava de um lado a outro do hall de entrada.
— Não acredito nisso — resmunguei. Essas mulheres que fizeram
coisas que nunca fiz agora estavam contra mim? Era culpa do Ryan por ter
ficado com toda a América do Norte. Não disse nada, afinal, ele se
preocuparia ainda mais com isso, e seu passado não era tão importante
quanto suas ações presentes.
— Sobre as garotas, não posso fazer nada. Namorar com homens com
cara de Adônis é pedir por isso. — Sam sorriu para o marido, que fez uma
careta linda. — Quanto ao vestido, consigo te emprestar um, temos
praticamente o mesmo corpo.
— Já que a Sam não vai mais desfilar para você, que tal pegar a
Angelina no lugar? — Jason disse para o Ryan com um esboço de um
sorriso, decerto na intenção de provocá-lo. Pelo visto, conseguiu.
— Porra nenhuma que vou deixar vocês, babacas, verem a porra de seu
corpo. São loucos se acham isso. Essa perfeição é apenas para mim.
Revirei os olhos com a hipérbole.
— Ryan, querido, estou longe de ser perfeita. — Sorri para Sam. —
Obrigada, mas vou usar um dos vestidos que eu fiz sem precisar do dinheiro
do Ryan. Nem o conhecia quando o costurei. — Passei as mãos nos meus
cabelos e falei ao meu namorado: — É um dos modelos que estão com você.
Se eu vestir antes do desfile, vai me processar?
Notou que eu não estava falando sério.
— Oh, Anjo. — Sorriu maliciosamente ao mirar meu corpo. — Tem
outro jeito de me pagar.
Ryan puxou meus cabelos delicadamente e cheirou uma mecha deles. Eu
tremi com seu toque. Mesmo depois de tudo, ainda sentia vontade dele como
nunca. Ignorei esse desejo e fitei Caim; não havia dor em seus olhos. Acho
que ele entendeu que nunca houve um “nós”, somente estava iludido com o
passado.
— Daqui a quanto tempo é a entrevista? — sondei.
Ele olhou no seu Rolex.
— Quarenta minutos, mais ou menos.
Pedi para Johnny trazer o vestido que fiz no propósito de ir para o meu
noivado... Bom, quando encontrasse um noivo. Agora tinha Ryan em minha
vida. Não sabia aonde iríamos a partir dali, entretanto, com certeza não
podia viver sem ele. Só de pensar nesta possibilidade me encolhia por
dentro.
Ryan e os outros caras desceram para o salão no qual se daria a
entrevista. As garotas ficaram na sala, exceto Alexia, que foi comigo para
ajudar a ajeitar o meu cabelo no quarto do Ryan. Não gostava de me arrumar
cercada de gente. Tolice, eram mulheres iguais a mim.
Alexia fez um coque no alto da minha cabeça, com mechas dos dois
lados do meu rosto. Colocou rímel nos meus olhos e sombra ao redor deles,
não muita. Ficou bonito, destacou bastante minhas íris negras e meus e cílios
longos.
— Como você sabe tanto sobre cabelos e maquiagens?
— Fiz um curso alguns anos atrás — respondeu. — Quero que saiba
que não ia namorar o Ryan, fui àquele restaurante dizer isso a todos. Fiquei
feliz por ele se declarar a você.
Avaliava seus olhos violetas através do espelho. Vi sinceridade neles.
— Obrigada. Posso saber por que não ia ficar com ele antes de
descobrir sobre nós dois? Ryan é lindo... — Estava curiosa a respeito dela,
a mulher parecia guardar muitos segredos. — Se não quiser contar, não
precisa — acrescentei, pois hesitou.
Alexia riu, passando as mãos em seus cabelos loiros.
— Vamos dizer que um cara alto, moreno, de olhos azuis e boca
matadora me impede de pensar em outra coisa — revelou. No entanto, ainda
havia algo escondido. Não pedi para que me contasse; eu também guardava
segredos, inclusive do Ryan.
— Sabia que você e Bryan estavam juntos!
— É complicado nosso lance. — Ela suspirou. — Vamos ver como isso
se desenrola.
Deixei quieto; Alexia não diria mais nada, a menina era fechada.
Gostava dela.
Sorriu ao dar os seus últimos retoques em mim.
— Nossa, mulher, você está um avião. — Assoviou. — O Ryan que se
cuide.
Fui colocar a roupa. O vestido, na região do busto, tinha a forma de
duas maçãs, e escamas até abaixo dos peitos. Na altura da barriga, a cintura
era colada ao corpo, exibindo minhas curvas em razão da renda transparente.
A saia, cor de ostra, fora feita num material grosso, ficando acima dos
joelhos. Na região rodada, havia uma estrela de sete pontas bordada, e em
cada uma delas coloquei uma pérola, por serem tão preciosas quanto os
nomes desenhados na tatuagem às minhas costas. Fechava-se com uma tira
trançada, em vez de botões ou zíper.
Sentia-me confiante, apesar da tensão em relação ao que encontraria
diante daquele mar de jornalistas. Olhei para o espelho e falei a mim mesma:
— Seja forte. — Seria o meu mantra também depois da entrevista. —
Vamos lá.
Capítulo 12
Vamos jogar!

RYAN
Depois da noite anterior, achei que passaria o dia inteiro me
maravilhando e amando minha garota linda. Estava pensando em levá-la para
jantar e ir ao cinema, algo que nunca fiz em toda minha vida. Com ela, queria
fazer tudo, nem que fosse dançar a maldita Macarena.
Custava a acreditar que aquela mulher maravilhosa era realmente
minha, e que a tive em meus braços toda a noite, dormindo juntinhos. Dormir
junto trazia suas vantagens: beijá-la, sentir seu cheiro de morango, ter ela
nua esparramada na minha cama, onde podia saboreá-la a qualquer momento
que desejasse, ou seja, sempre, pois era simplesmente viciante. Jamais teria
o suficiente.
A porra das fotos na TV veio em um mau momento. Não queria que
saísse na maldita mídia. Mataria todos aqueles bastardos que ousaram dizer
aquilo dela e de sua irmã. Quando enxerguei as imagens da garota exuberante
de cabelos e olhos negros se agarrando a dois caras no maior esfrega, pensei
que estivesse vendo coisas. A menina das fotos parecia perdida e tinha olhos
vazios, sem nenhuma esperança. Percebi logo de cara que não era meu amor.
Angelina jamais faria algo do tipo. Além disso, fui o único que a tocou.
Agradecia a tudo por aquela mulher ser minha, tão doce e pura; nunca se
submeteria a ficar com caras aleatórios.
Já suspeitava que ela tivesse uma irmã, porque o maldito Caim a
chamou de Ângela, muito parecido com Angelina. Não desconfiava que fosse
sua irmã gêmea e houvesse morrido. Johnny me contou sobre a separação
dela e de Caim, a briga dos dois nesses últimos anos. Bom, ficava feliz por
aquele idiota não a ter tocado, pois só de pensar... me dava vontade de
acabar com sua raça.
Angelina amava sua irmã, a dor era evidente em seus olhos negros
borrados de lágrimas. Eu me lembrei dela dizendo que Ângela era sua alma
gêmea. Queria muito ajudá-la e tirar sua dor, impedir que ela chorasse mais,
mas não podia fazer nada, apenas mostrar o meu amor por ela.
Quase tive um colapso ao ver o estado em que ela ficou no banheiro, a
crise que teve; por pouco não se machucou. Nunca me senti tão impotente em
minha vida. Fiquei do seu lado até meu Anjo se acalmar.
Agora estava lá, esperando-a chegar para começar a entrevista e calar
esses malditos que andavam falando mal da minha garota.
O salão grande, cor de creme, lotara-se de jornalistas aguardando nossa
conferência à imprensa. Conversavam entre si, ansiosos por uma aparição da
Anjo. Alguns repórteres nos olhavam confusos, sem saber o que estava
acontecendo. Nenhum deles entendia o motivo da presença de Caim e por
que pediu a coletiva. Ninguém se aproximou para solicitar respostas, estava
bem claro que só falaríamos depois que minha linda namorada chegasse.
Encontrava-me perto de Caim e Lucky. Ainda bem que meu irmão me
acompanhara, caso eu precisasse dele. Alguns jornalistas pensavam em ir até
nós, e só de olhar para a cara sombria do Lucky, saíam quase correndo.
Acho que suas carreiras dependiam muito disso, dessa informação.
Fiquei nervoso com a possibilidade dela perder o controle na frente
daquele bando de abutres, rondando uma notícia para vender e ganhar um
bônus. Angie não estava acostumada com isso, não saberia lidar. Se eles
dissessem algo que a ofendesse, assassinaria todos com minhas próprias
mãos.
— Relaxe, Ryan, tudo dará certo, cara — pediu Lucky, vendo meu
nervosismo.
— Ela não está acostumada a isso, Lucky — reclamei, observando o
mar de repórteres. — E se Angie me deixar? Se pensar que é demais para
aguentar?
Caso Angelina acabasse nosso namoro, não saberia o que seria de mim.
Ela era a única mulher que enchia meu coração de gozo e alegria. Precisava
dela como do ar que respiro.
— Cara, você não conhece mesmo a Angie. Quando minha amiga ama
alguém da forma que ama você, ela não desiste — explicou Johnny. — Vi o
jeito como ficou quando a deixou. Ela não comia direito, não dormia, tudo
por sua causa. Então não tenha medo dela não querer continuar só porque
você é famoso, seria impossível.
— Acha que ela vai querer passar por aquilo de novo? — Charles me
olhou de lado.
Eu me encolhi ao pensar na dor que causei à Angie na semana anterior,
tudo porque não aceitava o que sentia por ela, a razão da minha existência.
Faria qualquer coisa para não a ferir novamente.
Caim estava em silêncio ao lado de sua noiva. Era uma morena bonita,
mas eu só tinha olhos para a minha namorada.
— Obrigado — disse a Caim. De madrugada, pedi ao Simon para
procurar saber tudo sobre ele. Fiquei chocado ao descobrir que ele ajudou
Angelina, arrumando serviços para ela, mesmo sem minha amada saber
disso. Ajudou a tirar a antipatia que eu sentia por ele.
O cara franziu a testa.
— Pelo quê?
— Você conseguiu muitos trabalhos para a Anjo sem ela saber. O que
não entendo é por que não arrumou um serviço melhor, menos cansativo e
sofrido.
Ele suspirou.
— Ela não deixava currículo para outras funções, apenas de faxineira e
doméstica — disse num tom triste. — Eu não podia fazer nada. — Levantou
as sobrancelhas. — Vai contar isto a ela?
— Não, não é minha história para contar — falei a verdade.
— Bom, porque se dissesse algo, também teria de dizer sobre a editora
que comprou somente para ela trabalhar lá.
Arregalei os olhos.
— Como sabe?
Ele sorriu.
— Do mesmo modo que descobriu a meu respeito. Tudo para ajudá-la.
A proeza com a editora foi impressionante.
Estava pronto para responder que não me arrependia, quando ouvi
alguns murmúrios encantados ao redor do salão.
— Maldição! — praguejou Jordan. — Meu amigo, você ganhou na
porra da loteria.
Levantei a cabeça e notei que todos olhavam para a entrada. Eu me
virei e ofeguei com a visão exuberante adentrando o salão como uma maldita
rainha.
A Anjo estava com as mãos trêmulas. O que me deixou de queixo caído
foi sua beleza com aquele vestido, que preenchia suas curvas perfeitas, todo
modelado com detalhes magníficos. O resto desapareceu: só havia ela.
Estendi a mão à minha namorada e a puxei para os meus braços,
devorando sua boca perfeitamente “beijável”. Notei os flashes das câmeras
através das minhas pálpebras fechadas, e não liguei. O mundo inteiro
poderia acabar e eu nem me importaria.
— Você está deslumbrante — declarei, me afastando dela sem querer.
A entrevista foi boa, Angie se saiu muito bem respondendo cada
questão, esclarecendo que as fotos eram de sua irmã. Caim também apareceu
e contou a sua versão na história de Ângela, e os motivos que levaram minha
cunhada a cair ao fundo do poço. Disse que não podia ficar com ela porque
era novo na época, e que depois de sua morte foi até em terapeutas para
aliviar a culpa.
— Não sou psicóloga, mas eu sei que as pessoas têm várias formas de
lidar com a dor: beber, fumar, ficar com estranhos, tudo para se esconderem
do sofrimento, tentando aliviá-lo. — Angie encolheu os ombros. — Ela
escolheu festejar e sair com os homens errados.
Angelina contou acerca da perda dos seus pais e de ter que largar a
faculdade para cuidar de seus irmãos. Havia angústia em sua voz ao narrar
os acidentes que levaram seus pais e Ângela. Queria poder tirar sua dor, mas
tudo que conseguia era assegurar meu amor incondicional a ela.
Alguns ali arfaram pela história triste e pelo trabalho duro para garantir
a vida honrada que mantinha sempre, mesmo com as lutas vencidas. Angelina
deu a volta por cima, nocauteando as críticas dos jornalistas. O resto do
problema meu advogado resolveria.

Após terminar a reunião, subi com minha linda e gostosa namorada para
o meu apartamento, de modo a comemorar a sua entrevista brilhante.
Expulsei todos da minha casa para ficar a sós com minha mulher. Shane e
Lira foram com Sam e Lucky, os dois levariam os meninos para passear, algo
assim. Precisava agradecer à Sam por isso.
— Você se saiu perfeitamente bem — sussurrei contra sua pele linda.
Ela foi mesmo perfeita, mas mais perfeito ainda seria tomá-la de todas as
formas.
Comprei um terreno perto do rio Hudson, onde estava construindo uma
casa. Copiei o modelo de uma página do caderno de desenhos que ela me
deu. Dei três meses para o engenheiro terminá-la, pois seria o tempo que
levaria para preparar o casamento. Bom, esses eram meus planos, esperava
que ela dissesse sim.
Levei-a para o quarto. Torcia para Jordan ter feito o que eu pedi a ele.
Ao entrar, percebi que me amigo não me decepcionou.
Fiquei um pouco atrás, deixando-a observar os objetos sobre o colchão
e a mesa de madeira que coloquei ali no canto, ao lado da cama. De repente,
me senti nervoso ao mostrar para ela esse meu lado. Talvez Angie não
quisesse nada disso, ser minha submissa. Se fosse assim, retiraria tudo
rapidamente; ela era mais importante do que meus desejos carnais.
Havia algemas, chicotes de montaria, bondage slaves, cordas de
restrições, grampos de mamilos e outros sex toys. Não usaria tudo nela, só
algumas coisas. Bom, isso se Angelina deixasse, claro. Seus olhos já
grandes ficaram ainda maiores ao ver o poste de pole dance colocado
próximo de um suporte de porta-algemas.
O rosto lindo corou diante de tudo, principalmente dos vibradores para
clitóris que comprei para usar nela.
— Nós vamos...? — Nervosa, foi incapaz de prosseguir.
Fiquei de frente para ela e fitei seus olhos negros.
— Anjo, nós não vamos fazer nada que não queira, ok? Apenas vamos
jogar, e se não gostar, paramos. — Dei de ombros. Nunca a obrigaria a agir
contra sua vontade.
Ela assentiu, mordendo seus lábios.
— Só jogar? — Sabia no que ela estava pensando. Queria muito que
fosse hoje, que ela estivesse pronta. Notando sua tensão, via que não.
— Prometi que só tiraria sua virgindade quando estivesse preparada.
Se não for hoje, tudo bem. — Desenhei seu queixo com os dedos. — Vamos
jogar igual fizemos ontem, mas com brinquedos. Você confia em mim?
— Com a minha vida — respondeu, sem nem mesmo pensar.
Era o filho da puta mais sortudo da face da terra por ter uma mulher
dessas.
— Não fique nervosa, relaxe — pedi após me recuperar.
Transara com várias mulheres desta forma, amarrando-as e as deixando
submissas. Todavia, com elas, eu ordenava e era obedecido; com Angel,
fazia questão de que ela apreciasse cada segundo, tal qual eu.
— Estou nervosa. E se eu fizer algo errado? — Entristeceu-se.
Toquei o belo rosto e levantei seu queixo para que olhasse para mim.
— Não fará nada de errado. Fique tranquila e me deixe tomar conta.
Ela sorriu como o sol, atingindo direto o meu coração, todo dela.
— Tudo bem, serei sua submissa — anunciou, séria, se afastando de
mim. Em seguida, colocou as mãos nas costas e abaixou a cabeça. — O que
quer que eu faça, senhor?
Como não amar uma mulher dessas? Ali, me apaixonei de novo por ela.
Não consegui me segurar e ri. Não dela, claro, e sim do seu jeito inocente, se
esforçando para tudo dar certo. Oh, porra, se eu não gostava disso... Eu
adorava! Se soubesse quem a enviou para mim, eu me ajoelharia aos seus
pés em gratidão por toda a minha vida.
Ela franziu a testa, um tanto irritada.
— Desculpe, você fica mais linda se submetendo às minhas vontades.
— Sentei-me na beira da cama sem nunca tirar meus olhos dela. — Tire a
roupa bem devagar.
Engoliu em seco, mexendo as mãos às suas costas.
— O vestido é de laço, não conseguirei desatá-lo sozinha, senhor —
sussurrou.
Apertei os lábios para não rir dela me chamando de senhor. Não havia
coisa mais linda.
— Querida, você pode me chamar... — me interrompi, olhando de
soslaio para ela. — Que nome você me daria no quarto? Escolha, e toda vez
que formos jogar, você se dirigirá a mim por ele.
Angelina franziu os lábios, pensativa, e logo sorriu. Se ela soubesse o
que esse sorriso fazia comigo, teria um pouco de dó de mim e do meu pau,
duro como uma rocha.
— Estrela.
— Estrela? — sondei, confuso.
Mirou-me bem no fundo dos meus olhos.
— Você é minha estrela de mil pontas, porque há mil motivos para eu
amá-lo — falou, convicta.
Era mesmo um bastardo sortudo da porra.
— Venha aqui — chamei, estendendo minha mão para ela.
Angie fez o que eu pedi, sem nunca tirar os olhos de mim. Segurei-me
para não a beijar com todo o meu amor e esquecer os jogos. Virei-a de
costas para mim. Assim que senti aquela pele linda e sedosa em minhas
mãos, me deu vontade de atirar tudo para o espaço e possuí-la. Peguei as
tiras do vestido em meus dedos.
— Vou rasgá-lo — disse com a voz grossa de desejo.
— Não! — gritou, em seguida baixando sua voz para um tom suave. —
Desculpe...
— Por que não? — perguntei, querendo entender sua reação.
Ela pigarreou.
— Estrela, este é o vestido que fiz para usar no dia do meu noivado.
— Felizardo do seu noivo então, não é? — Sorri, desfazendo os laços.
— Hummm, acho que sim. — Sua voz tremeu quando meus dedos
tocaram sua pele.
Evitei rir.
— Então vamos manter o vestido, certo?
— Seria bom, Estrela. — Ouvia o sorriso na sua voz.
A peça caiu no chão aos seus pés. Saiu dela e se abaixou para pegá-la.
Fui tomado por uma visão incrível de sua bunda linda com um maldito fio
dental. Assoviei por entre os dentes.
— Porra! — rosnei, cerrando os punhos. Era uma visão única.
Angie colocou seu vestido na beira da cama e ficou na mesma posição
de antes, com as mãos para trás e a cabeça baixa.
— Sabe dançar? — perguntei quando se posicionou na minha frente.
Era uma pergunta idiota, já que a vira dançando no Belas Country.
Ela piscou e assentiu.
— Sim, fiz aulas quando era mais nova — respondeu.
Peguei meu iPhone e coloquei uma música da Beyoncé, Halo;
combinava com ela. O som fluiu no quarto.
— Dance no poste para mim — ordenei.
Ficou um tanto assustada, mas concordou, corando. Tão linda!
Foi até o poste, a alguns metros de onde eu estava sentado na cama. Pôs
as mãos no metal e começou sua dança sensual. Girou com as pernas para
cima e abertas, me deixando com a visão do paraíso. Parecia aquelas
pessoas que fazem ginástica olímpica. Sua destreza e habilidade eram de
outro mundo.
A cena deixou meu pau mais duro ainda, um feito praticamente
impossível. Seria difícil me segurar só esfregando sua boceta suculenta.
Fez um último movimento e pousou com classe, depois sorriu para mim,
um pouco ofegante. De repente, fiquei preocupado.
— Você está bem? — sondei.
Aquiesceu
— Apenas faz tempo que não danço assim — explicou, já retornando à
posição de submissa.
Como eu queria essa mulher! Toquei seu rosto com as pontas dos dedos
e desci sobre seus seios rosados e duros, mesmo através do seu sutiã de
renda tomara que caia, na cor igual à do vestido. Seu peito subia e descia
com a respiração alterada devido ao meu toque em sua pele de pêssego.
— Você confia em mim?
Assentiu sem conseguir falar, porém, eu precisava escutar sua resposta.
Peguei seus cabelos e enrolei-os em minha mão direita, puxando-os para
trás, não forte para não machucá-la.
— Quero que diga — ordenei, encarando seus lindos olhos quentes,
bêbados de desejo por mim.
— Si-sim... — gaguejou, ofegante.
Afastei-me dela para evitar beijá-la, o que me levaria a esquecer de
tudo e tomá-la antes da hora. Caminhei em direção à cama.
— Vá para a plataforma onde fica o suporte das algemas e se ajoelhe
no meio dela com as mãos para trás e a cabeça baixa — mandei, sem me
virar, ou não cumpriria nada dos meus planos.
Ouvi-a arfar, encaminhando-se aonde pedi. Tinha quase certeza que
tirou os sapatos, porque não escutei o barulho dos saltos.
Quando pedi ao Jordan para colocar a plataforma no canto do meu
quarto, e que ela teria de ser revestida de camurça e veludo para não
machucar os joelhos dela, o babaca gargalhou, porque o normal seria elas se
ajoelharem no chão mesmo. Não queria os joelhos da minha garota
vermelhos e ralados, então não liguei para seus deboches. Um dia, ele seria
fisgado por uma mulher e entenderia o que eu sentia pela Anjo.
Peguei as algemas de couro, cobertas de veludo, e me virei para ela na
mesma posição que a mandei ficar: ajoelhada com as mãos para trás e a
cabeça baixa.
— Malditamente linda! — declarei, chegando perto.
Ela me fitou através de seus cílios grossos e negros e arregalou os
olhos para as algemas de couro macio em minhas mãos. Não pretendia
marcar sua pele linda, por isso escolhi aquelas.
— Você quer isso? — indaguei, avaliando sua reação.
— Sim, eu quero tudo com você — falou, segura.
Sorri, me segurando para não beijá-la.
— Obrigado, linda. — Ajoelhei-me ao seu lado e coloquei as algemas,
prendendo seus pulsos atrás das costas e beijando sua cabeça com cheiro do
paraíso. — Sente-se sobre seus calcanhares.
Fez o que mandei. Estava adorando vê-la submissa, embora também
amasse enxergá-la perdendo o controle de vez em quando; ficava mais linda
quando estava irritada.
— Boa garota. — Fui até a cama de novo, agora para pegar a venda
preta, e algumas outras coisas que usaria nela.
— Cobrirei esses lindos olhos, está bem?
— Sim. — Fechou as pálpebras e se remexeu sobre os calcanhares.
Com certeza estava toda molhada e quente. Adoraria saciar seu prazer.
Coloquei as outras coisas no chão, perto dela, e tapei seus olhos com a
venda. Depois, me afastei, a encarando algemada com as mãos para trás e
vendada, indefesa, à minha mercê.
— A visão mais linda do mundo — grunhi, tirando minhas roupas e
jogando por cima do ombro. Peguei meu pau, que já estava duro como
granito e pingando com meu pré-sêmen no chão. Cheguei mais perto dela. —
Abra essa boquinha linda.
Abriu a boca e colocou sua língua para fora, como se estivesse pedindo
por ele. Oh, porra, se eu não gostei... Quase gozei antes da hora.
— Você quer meu pau em sua boca, não é? — Batia punheta enquanto
ela gemia.
— Sim...
— Darei o que minha menina deseja. — Passei a ponta inchada e
vazando líquido em seus lábios e língua. Ela gemeu e abocanhou meu pau
quase inteiro. — Está com fome, querida?
Gemeu de novo, agora com a boca cheia. Não havia nada mais lindo
neste mundo do que aquela visão: sua boca voluptuosa em volta do meu pau,
que sumia com ele dentro dela. Toquei seu rosto enquanto Angie sugava e
lambia, degustando-me.
— Porra — grunhi, fechando meus olhos. — Vou deixar por sua conta,
não quero machucá-la, então leve tão fundo quanto puder, ok?
Acelerou mais o movimento de sua língua, já expert. Dava-me tesão
imaginar que fui eu quem a ensinou a fazer um boquete incrível — diga-se de
passagem, o melhor da minha vida. Ela circulava a língua em volta do meu
pau e chupava como se fosse um maldito pirulito. Meu corpo tremeu e gozei
em sua boca, sabia que não duraria muito, não com ela querendo me comer.
Abri meus olhos bêbados e moles. Só essa mulher me deixava assim
depois de um boquete. Estava louco para transar com ela, enterrar tão fundo
que não andaria em linha reta por semanas, mas esperaria seu momento.
Tirei meu pau de sua boca e a olhei, passando a língua nos lábios,
limpando-os. Queria beijá-la, contudo, assim não conseguiria fazer o que eu
desejava. Eu me agachei na sua frente e peguei seu sutiã com fecho frontal e
soltei-o, jogando-o longe.
— Obrigado, querida, pelo boquete incrível que me deu. — Não resisti
e beijei sua boca com meu gosto meio salgado harmonizando com seu sabor
frutal. Tive de lutar contra tudo para me afastar dela, em especial depois do
seu gemido de dor. Sabia o que Angelina queria. — Cuidarei de você —
prometi, afastando meu rosto do dela. Peguei o óleo aromatizado que fazia as
mulheres se excitarem ainda mais e despejei-o sobre sua pele de seda. Ela
se remexeu, já sentindo o efeito. Quase sorri, porque o óleo deixava a
pessoa louca de prazer, aumentava sua libido.
Porra! Adorava vê-la assim, tão quente e toda molhada para mim.
— Sou um filho da puta sortudo — rosnei, indo para trás dela.
Coloquei o vidro no chão e esparramei o líquido sobre seu corpo com as
mãos, pelos seios rosados e inchados. Massageei seu peito e ela gemeu,
fechando as pernas uma contra a outra. Doía nela de tanta vontade. Eu não a
deixaria sofrer.
— Está molhada para mim, querida? — Tirei seus cabelos das costas,
mordiscando sua orelha. — Você quer meus dedos em sua boceta apertada?
— Sim... — Ofegou ao sentir meus dedos dentro de sua calcinha. O
óleo continuava neles, isso aumentaria seu prazer. Quando toquei seu
clitóris, ela gritou, jogando a cabeça para trás, no meu ombro. Empurrou seu
quadril na direção da minha mão, querendo mais. Então lhe dei o que
precisava.
— Abra um pouco as pernas — sussurrei em seu ouvido. Ela gemeu e
fez o que eu mandei. — Isso, querida.
Peguei o pedaço de pano de sua calcinha e o rasguei. Seu corpo
convulsionou como se tivesse levado um choque elétrico.
— Vou enfiar dois dedos hoje, sim? — Eu também arfava, já pronto de
novo. Agora, entretanto, era hora do prazer dela, tudo para satisfazê-la.
Angie assentiu. Deixei passar porque sabia que ela não conseguiria
falar nada. Puxei-a, escorando suas costas em meu peito nu, e coloquei meus
dois dedos dentro dela, o médio e o indicador; com o polegar, circulava seu
clitóris. Não demoraria a gozar. Agarrei seu corpo e a pus de joelhos,
segurando-a, pois ela não teria forças para nada, uma vez que suas pernas
estavam bambas. Com a outra mão, apalpei seus seios, amassando-os e
beliscando-os, enquanto mordiscava seu pescoço. Meu pau cutucava sua
bunda linda, mas era ela primeiro, depois eu. Angie berrava, tanto que meus
ouvidos provavelmente doeriam. Eu não me importava, amava vê-la toda
eufórica. Ela balançava o quadril junto com os movimentos de minha mão.
Acelerei mais o gesto, dentro e fora dela.
Gemeu, com a cabeça em meu ombro, e gritou.
— Linda demais! — exclamei ao sentir seus dedos em volta do meu
pau, apertando-o. Assoviei. — Está vendo como ele está duro? Isto tudo é
por sua causa — chupei sua orelha.
Ela gemeu novamente e começou a bater uma para mim. Suas mãos iam
para cima e para baixo, me deixando louco.
— Maldição! — Estava perto de gozar; só ela fazia isso comigo.
Dominava meu corpo, mesmo sem saber.
— Eu estou perto... tão perto. — A voz linda com sotaque sulista falhou
de desejo e prazer.
— Goze para mim, Anjo — pedi, mexendo mais meus dedos dentro
dela. E foi o que fez, gozou forte. Eu me segurava para não terminar antes.
Ao vê-la desmoronar nos meus braços, gritando meu nome, transbordei
também.
Eu me afastei, não querendo sujar seu corpo delicioso, afinal,
estávamos apenas começando. Fechei meus olhos, me deliciando com seu
toque ao me levar à loucura.
— Nossa! Isso foi... — Ficou sem fôlego. Virou a cabeça e sorriu para
mim. Mesmo com seus olhos vendados, sabia que brilhavam como o sol.
Eu sorri, beijando seu nariz.
— É só o início, querida. — Levantei-me, levando-a comigo, ignorando
seu gemido de prazer com o que eu disse.
— Então nós...
Fitei seu rosto lindo.
— Quer continuar jogando? — inquiri.
Ela sorriu e concordou.
— Sim, Estrela, estou gostando muito... — Enrubesceu.
Eu ri, desprendendo sua mão direita da algema. Massageei-a.
— Elas machucaram sua mão?
— Não, minha pele é branca e fica marcada com facilidade. Está tudo
bem.
Carreguei-a até a parede, prendendo seus dois braços abertos por cima
da cabeça nas correntes que estavam ali. Dei um leve puxão, conferindo o
trabalho.
— Você gosta de me ver presa, não? — Riu, deliciada.
Retribuí o gesto, embora ela não pudesse ver, por causa da venda.
— Você, à minha mercê? Com certeza. — Puxei sua venda para cima
um pouco, pois precisava que ela visse uma coisa. Angie piscou com a
claridade e observou o saquinho em minhas mãos. — Quer usar?
Surpreendeu-se com os grampos de mamilos. Com um esboço de
sorriso, falou:
— Achei que um Dom fizesse o que quer no quarto, sem se preocupar
com a opinião de sua parceira.
Tirei os grampos do saquinho, divertido. Não gostaria de usar nada nela
que já tivesse sido usado, queria tudo novo, pois merecia do bom e do
melhor.
— É assim, mas com você é diferente. Faço questão que goste também.
— Bati de leve meu dedo em seu nariz. — É para o prazer de nós dois.
— Estou amando cada coisa que fizemos, e acredito que também vou
adorar as outras surpresas que preparou.
Peguei os grampos e olhei de lado para ela.
— Fico feliz com isso. Pronta?
Aquiesceu. Coloquei os grampos nos bicos de seu peito. Angelina
ofegou assim que eles apertaram.
— É desconfortável um pouco, mas veja isso. — Puxei um.
Ela gritou.
— Oh, porra!
Eu ri.
— Você, xingando?
Apertou as pernas juntas, tentando tirar o atrito que estava ali.
— Nossa! Isso foi... — Não achou uma palavra para descrever o que
sentia.
— Vai adorar ainda mais depois. — Coloquei de volta o grampo e
puxei a venda para cobrir seus olhos de novo. — Vou tapá-los porque será
mais prazeroso.
Peguei um chicote preto com várias tiras. Passei-as sobre o pescoço, os
seios e a barriga lisa. Ela ofegava alto, gemia ao mesmo tempo que mexia o
corpo junto com as algemas que a deixavam indefesa.
Com uma mão, segurei o chicote, e com a outra o meu pau, que já estava
duro de novo. Maldição, nunca endureceu tão rápido assim, apenas ela tinha
este poder sobre ele. Puxei o chicote e bati as tiras em sua barriga lisa. Ela
gritou de novo, mas não de dor, e sim de prazer. Acertei seus seios lindos.
Adorava ouvi-la berrar de desejo, ciente de que fui quem a deixou assim.
Ela estava perto de gozar, então joguei o chicote no chão e caí de
joelhos na sua frente. Seu corpo perfeito tremia, tamanho era o desejo e fogo
que ela sentia, tal qual eu. Peguei suas pernas e a suspendi.
— Coloque suas pernas em volta do meu pescoço — pedi a ela com o
meu tom rouco de desejo, prazer e fome, uma mistura muito boa.
Angelina arquejou com a minha boca em seu clitóris, sugando e
lambendo, degustando seu delicioso sabor de creme. Eu a chupava enquanto
batia punheta, porque se colocasse meu pau para esfregar em sua boceta, não
resistiria e acabaria fazendo uma besteira sem ela estar pronta.
Suas pernas apertavam meu pescoço, me dando mais prazer. Eu estava
com uma mão no meu pau e a outra segurando sua bunda, para ela não cair e
não machucar seus pulsos presos nas algemas. Imprensei-a contra a parede,
firmando mais seu corpo.
Nunca me preocupei com os prazeres das mulheres, sempre foi só para
o meu benefício, embora elas se satisfizessem por tabela. Com a Anjo era
diferente: amava vê-la gritar, gemer e implorar por mais. Ela estava tão
vidrada no êxtase que o que disse me pegou de surpresa:
— Ryan... coloque dentro... de mim — gritava a cada segundo que eu a
estocava com a minha língua.
Tirei a minha boca e olhei para ela, pensando ter ouvido errado.
— Anjo, tem certeza? — sondei, entre a dúvida e a esperança.
— Sim, tenho, por favor.
Não respondi, apenas a devorei ainda mais, levando-a às nuvens. Puxei
os grampos de mamilos e a fiz gritar de êxtase. Depois do ápice ela ficou
mole, então tirei suas pernas do meu pescoço e coloquei-as em volta de
minha cintura. Levantei com ela nos braços, escorando-a contra a parede e
retirando as algemas, que prendiam seus pulsos.
— Agora chegou a hora de fazer amor com a minha linda namorada.
Capítulo 13
Primeira vez

ANGELINA
Ri com o que ele disse. Considerando tudo que aconteceu ao longo do
dia, com as fotos de Ângela saindo na TV, não achei que pudesse ficar feliz
como estava. Ryan era o meu milagre.
Seus olhos foram para a minha boca e vi um lampejo de felicidade por
eu estar rindo.
— Desde quando Ryan Donovan faz amor?
Ele sorriu.
— Desde que ele se apaixonou pela mulher perfeita que se tornou seu
mundo inteiro. — Mirou-me de soslaio. — Então, fará amor comigo?
Escondi meu rosto em seu pescoço, tímida.
— Mil vezes sim.
— Esta é a risada que venero. — Beijou minha pele. — Eu a amo.
Mordisquei sua orelha e coloquei a língua no seu ouvido.
Ele apertou minha cintura e rosnou feroz, me colocando na cama com
suavidade e pairando sobre mim.
— Desde o dia em que o vi no seu apartamento, você se tornou uma das
razões para eu respirar, Ryan. Aliás, acho que foi até antes disso, quando o
conheci no hospital. — Peguei seu rosto lindo em minhas mãos e olhei bem
no fundo de seus olhos brilhantes. — Eu te amo, não posso viver sem você,
sem o seu toque, sem os seus beijos.
Deu um selinho na ponta do meu nariz e sorriu, o sorriso lindo que eu
amava. Depois, beijou minha boca com carinho, amor e devoção. Enquanto
uma de suas mãos esquadrinhava meu corpo, a outra foi para o meio de
minhas pernas. Enfiou dois dedos e, com o polegar, circulou meu clitóris.
— Não vou tirar sua virgindade hoje...
— Estou pronta, Ryan. Já passou da hora, fiz uma promessa a mim
mesma de que me entregaria a você hoje — declarei, beijando-o com fervor.
Ele mexeu mais os dedos; tremi e já estava quase gozando quando ele os
tirou. Prestes a reclamar, senti-o na minha entrada, empurrando um pouco.
Minhas pernas estavam em sua volta e, as mãos, em seus ombros.
Apertei-o ao sentir a sua intrusão. Ofeguei com um pouco de dor, afinal, o
homem não era pequeno, mas o adorava assim.
Seu corpo congelou e ele afastou o rosto, olhando-me preocupado.
— Você está bem?
Assenti, ainda arfando.
— Não quero machucá-la — disse com uma pontada de tristeza.
— Não vai, eu confio em você. — Coloquei meu rosto em seu ombro.
Ele suspirou.
— Tudo bem — sussurrou e empurrou de uma vez.
Mordi sua carne, marcando-o; ele não reclamou. Estremeci com a dor
súbita, então Ryan parou de se mover e esperou eu me acostumar com ele
dentro de mim. Beijou-me em uma tentativa de aliviá-la, lento e amoroso. A
agonia sumiu após um minuto de carícias, dando espaço para o prazer.
Comecei a mexer meus quadris. Ele tomou isso como um motivo para se
mover também, sempre devagar, com medo de me machucar.
— Ryan, estou bem agora — alertei em sua boca.
— Estou fazendo amor — disse, deliciado. — Ouvi dizer que é para ir
devagar.
— Até um idoso aceleraria além disto. — Levantei meus quadris,
querendo mais.
Ele me olhou e riu.
— Depende... No meu caso, quando ficar velho, pretendo tomar um
balde de Viagra para levantar o meu pau e te fazer gritar como agora.
Eu ri, não pude evitar ao imaginar o Ryan velho.
— Sua risada é tão linda — sussurrou, abobado, olhando minha boca.
Sacudi a cabeça.
— Esqueça esse negócio de fazer amor lento. Eu quero ver estrelas!
Ele fez o que eu pedi. Não podia esperar menos, o cara era bom. Bom
nada, maravilhoso. Cada estocada me levava a enxergar uma constelação
inteira. Gemia, gritando seu nome, até explodir como um vulcão.
Ele chegou lá logo depois; seu corpo ficou rígido e estremeceu.
Murmurava meu nome com adoração, caindo mole em cima de mim e
rolando de lado para beijar meus cabelos.
— Você está bem? — Ofegava, talvez pelos ruídos e grunhidos que deu
ao estocar dentro de mim. Só em pensar nisso, tudo recomeçava a queimar.
Senti minhas pernas molhadas. Levantei-me depressa, de olhos
arregalados.
— Oh, droga! — Corri para o banheiro sem me importar em estar
pelada, liguei o chuveiro e fui lavá-las, torcendo que tudo saísse antes do
pior acontecer. Não entendia bem disso, então esperava que lavando logo
após o sexo eu não engravidasse.
— Machuquei você? — Apressou-se atrás de mim e entrou no
banheiro.
— Você não usou camisinha — critiquei. Por ser experiente, Ryan
deveria ter pensado mais sobre isso do que eu, que estava bêbada de desejo
por ele.
— Estou limpo — prometeu.
— Não me preocupo com doenças, e sim com gravidez. — Continuei
lavando. Seria tarde demais?
— Você não quer ficar grávida? — Seu tom tinha uma nuance que não
entendi.
Parei o que estava fazendo e olhei para ele ali, de braços cruzados, nu
com toda sua glória exposta.
— O que foi?
— Um filho seria bom para nós. — Deu de ombros, contudo, havia
excitação na sua voz.
— Você intencionalmente não usou proteção? — perguntei, estupefata.
Admitiu sem arrependimento, pegando um pano para se limpar, sem
tirar os olhos de mim.
— Será o fruto do nosso amor.
Ignorei suas palavras, focando em meu maior medo. Por que não tomei
remédio antes? Maldição! O médico deixou bem claro que se eu
engravidasse, minhas chances seriam mínimas de sobreviver na hora do
parto. Eu tinha cardiopatia, o que impedia meu coração de se movimentar
igual ao de uma pessoa sadia. Precisava tomar remédios direto, então um
parto seria arriscado, pois o órgão poderia falhar...
Olhei para ele, que estava sorrindo com a ideia de ser pai. Como eu
diria a Ryan que jamais teríamos filhos? Apagaria aquela alegria estampada
em seu rosto.
Ele estreitou os olhos.
— O que foi? Você não quer ser mãe do meu filho? — Ouvi uma
pontada de dor na sua voz.
Engoli em seco.
— Ryan, nós nem nos casamos ainda — falei, ignorando o tremor.
Necessitava ganhar tempo para pensar sobre isso. Claro que logo teria
de contar a verdade a ele. Será que me deixaria? Queria matá-lo ao imaginar
que ele seria capaz. Brigaria comigo se eu não fosse sincera. Eu conseguiria
arriscar a minha vida para vê-lo feliz? E por que a ideia de ser mãe de um
garotinho loiro com olhos caramelos me alegrava? Decerto porque seria
filho dele.
— Nós vamos nos casar em breve. Se você quiser esperar, usarei
proteção de agora em diante. Porém, já é tarde demais.
— Por quê?
— Porque você já engravidou. — Seu tom tinha tanta confiança que me
encolhi.
— Ryan, as chances de eu engravidar na primeira vez são... — Na
realidade, as chances eram altíssimas sem camisinha, mas eu precisava
manter a esperança.
Deixei esse assunto perigoso de lado por ora, pois não sabia o que
fazer em relação a isso, e fui para o quarto. Havia sido um dia longo, com
tudo o que aconteceu comigo. Deitei na cama.
— Durma um pouco. Depois, continuaremos nos divertindo. — Ele
também deitou ao meu lado e beijou meus cabelos.
Aconcheguei-me em seus braços com os olhos fechados.
— Você é o meu milagre enviado por Deus — sussurrei com um sopro.
— E você é o meu Anjo. — Senti seus lábios nos meus por um breve
segundo. Dormi tomada por êxtase.
Ryan foi para a França para um desfile que haveria lá. Queria que eu o
acompanhasse, mas não pude, porque tinha de trabalhar e cuidar dos meus
irmãos. A semana que passou fora maravilhosa, aproveitei cada segundo ao
seu lado. Sempre ficávamos juntos, tanto que eu já estava profissional no
sexo oral.
Fazia três dias que viajara, todavia, parecia uma eternidade sem ele.
Todas as noites nos falávamos por Skype até tarde, o que amenizava um
pouco a saudade.
Eram dez horas da noite de segunda-feira quando ele ligou. Eu estava
deitada na cama só com a sua camiseta, a que ele deixou comigo logo que
nos conhecemos. Guardei-a para mim, assim sentiria seu cheiro delicioso
impregnado nela.
— Oi, namorado — atendi meu telefone.
Ele riu.
— Olá, Anjo. Amanhã estarei em casa por volta das sete ou oito horas
da noite. — Sua voz grossa demonstrava desejo. — Estou louco para chegar
e matar a saudade.
Suspirei.
— Também sinto sua falta.
Meu peito doía com a distância, tanto que às vezes mal conseguia
respirar direito. Mas ele precisava do seu trabalho, eu não podia ficar muito
colada. Talvez Ryan achasse ruim, ouvi dizer que homens não gostam disso.
— Está se comportando? — inquiri. Ele estava cercado por modelos
lindas e formosas, podia até ser que tivesse ficado com algumas delas no
passado. No entanto, não havia motivos para a minha insegurança: ele me
amava. Mas eu era uma garota simples, jamais conseguiria competir com
uma modelo, caso ele mudasse de ideia.
— Quem tem uma mulher igual a você não olha para outra. Você é
incomparável, Anjo. Quando Deus a criou, jogou o molde fora — afirmou,
rouco. Prendi a respiração ao ouvir a sua resposta. Ele sempre dizia coisas
lindas para mim, nem parecia que um dia foi mulherengo. Adorava isso. —
Você é tudo na minha vida.
Rolei na cama e olhei para a foto de plano de fundo do seu celular, que
antes tinha também os seus amigos. Colocara ela num quadro em cima da
minha mesinha de cabeceira. Usei o Photoshop e deixei somente ele com seu
peito nu, escorrendo água do mar nos seus olhos lindos, descendo pelo corpo
sarado. O sorriso sexy que lançava para a câmera era deslumbrante como o
sol.
— Sei que estou sendo paranoica, mas com você cercado de mulheres
lindas... é um pouco difícil.
— Você é a única que eu quero — garantiu — Só você. De onde veio
essa insegurança?
Respirei fundo.
— Não sei... Às vezes penso em você com essas modelos... —
sussurrei; jamais seria igual a elas, belíssima.
Ele me interrompeu.
— Anjo, não pense nisso, ok? Eu só tenho olhos para você. Posso estar,
sim, cercado dessas mulheres, mas nenhuma delas é você. Nenhuma delas faz
o meu coração bater como se fosse sair do peito só por olhar seu rosto.
Nenhuma delas enche meu estômago de borboletas ao ouvir sua voz.
Nenhuma delas me tocou fundo como você, quando roubou minha alma, meu
coração e meu mundo.
Prendi o fôlego por um segundo, me sentindo a garota mais feliz do
planeta. Ele também era o único homem que eu amava e queria para sempre,
mais do que tudo nesta vida.
— Confio em você.
— Fico feliz com isso. — Ouvi um sorriso em sua voz rouca e sexy
como o pecado. — Você está sozinha em seu quarto?
Pisquei confusa pela mudança de assunto.
— Quem mais estaria aqui?
Ele riu, deliciado.
— Vá até sua porta e a tranque, depois tire as roupas e deite na cama —
ordenou com sua voz grossa.
Arregalei os olhos.
— Vamos fazer sexo por telefone? — Obedeci. Fechei a porta e
coloquei o celular no viva-voz.
— Ligue seu notebook, entre no Skype e coloque na cadeira ao lado da
cama para que eu possa ver todo o seu corpo.
Desliguei o celular e nos conectamos pelo Skype. Assim que a tela veio
à vida, vi meu milagre do outro lado. Estava sentado no meio da cama,
escorado na cabeceira, vestindo uma camiseta preta, mas nu na parte de
baixo, uma visão dos deuses. Queria perguntar por que ele estava com a
camiseta, por que não a tirou, mas ele falou antes de mim.
— Você tem algum brinquedo aí que possa usar?
Ajeitei meu note na cadeira ao lado da cama e fiquei sentada sobre
meus calcanhares, olhando para ele ali, sentado como um deus grego.
— Hummm — murmurei. — Tenho um vibrador.
Seus olhos brilharam.
— Que tipo de vibrador? — Segurava o riso.
Engoli em seco.
— Na forma de um pênis...
— Você tentou usá-lo?
— Hummm — pigarreei. — Tentei na noite em que nos falamos pela
primeira vez por mensagens... Pretendia dormir e não conseguia, pensando
em você, no desejo que despertou em mim. Doeu quando comecei a
colocar... Então parei. — Eu me remexi nos calcanhares, procurando ignorar
seu olhar ardente, como se o sol estivesse bem ali beijando minha pele.
— Oh, eu que ganho com isso. — Seu sorriso era ofuscante. Ele virou a
cabeça de lado, sem nunca tirar os olhos de mim. — Doeu porque você era
virgem na época, fico feliz por ter parado. Amei ser o primeiro e espero
fervorosamente ser o último. Mas estou curioso, aonde conseguiu o
vibrador? Você não é do tipo que compra isso.
Não queria dizer a ele que foi o Johnny que me deu para eu ir
experimentando antes de ficar com homens. Se contasse, geraria uma
discussão, algo que não desejava.
— Tabitta me deu quando veio aqui — menti. Sempre que nos
encontrávamos, ela tentava fazer minha cabeça a comprar vários brinquedos
sexuais para eu usar na minha menina, palavras dela, não minhas. Ela tinha
um monte dessas coisas.
— Tire sua camiseta bem devagar — ordenou. Comecei a fazer o que
ele pediu. — Esta é minha camiseta? Sexy pra caralho.
Assenti, muda. Fiquei de joelhos diante da tela, só de calcinha fio
dental que mal tapava a frente, imagine atrás? Seus olhos escureceram ao
olhar a peça vermelha da Victoria's Secret, toda rendada.
— Porra! Fio dental — grunhiu, pegando seu pau duro como rocha.
Desejava tanto ele comigo para eu colocar minha boca e sugar tudo. — Tire
sua calcinha, querida. — Sentei na cama e joguei a lingerie no chão. —
Agora se ajoelhe, do jeito que você estava antes.
Minha timidez foi para o espaço.
— Sente-se sobre os calcanhares, mas com as pernas abertas, expondo
a sua boceta gostosa para mim — grasnou feroz, sacudindo seu pau para
cima e para baixo. — Agora eu quero que você coloque uma mão em seus
seios deliciosos e a outra em sua vagina suculenta. Porra, queria estar aí
para devorá-la inteira.
Gemi, fechando os olhos ao posicionar meus dedos no clitóris,
esfregando-o.
— Abra os olhos — ordenou. — Eu os quero em mim.
Acatei. Minha visão foi direto para o seu pau caindo pré-gozo,
deixando minha boca cheia de água. Quem diria que algum dia eu acharia um
boquete bom? Dizem que as mais quietas são as piores; concordo com quem
inventou esta frase. Lambi meus lábios.
— Está com vontade de colocar meu pau em sua boca? — falava rouco
ao ver o desejo em meus olhos.
Perdera a capacidade de formar frases há muito tempo, tudo o que eu
podia fazer era concordar. Meu corpo pegava fogo.
— Ótimo. — Pareceu orgulhoso com isso. — Agora aperte seu clitóris
e finja que são meus dedos, minha língua lambendo seu broto rosado, mais
saboroso que qualquer comida.
Tremia tanto, a ponto de gozar ao tocar meu clitóris e beliscar meus
seios, tal qual ele fazia quando estávamos juntos.
— Caralho! — Seus olhos se fixaram no meio das minhas pernas,
vendo eu me tocar. — Tire a mão desses seios lindos e coloque dois dedos
dentro de você. Com a outra, continue a brincar com seu clitóris.
Fiz isso, mexendo para dentro e para fora. Já estava gritando pelo
orgasmo que se aproximava. Gemi, rebolando meus quadris junto aos
movimentos das minhas mãos. Acelerei o ritmo e meus gemidos ficaram
maiores, incapaz de manter meus olhos abertos.
— Porra, porra, porra. — Tomou ar. — Esta é uma visão que guardarei
para sempre. — Soltou uma respiração áspera por entre os dentes. — Puta
merda! Perfeita.
Meus olhos bêbados encontraram os dele ali, todo quente.
— Goze para mim, querida. — pediu.
Suas palavras foram como um raio direto no meu centro, após a última
estocada de dedos. A voz sexy desencadeou toda a explosão que tive dentro
de mim. Precisei apertar a boca para não berrar. Ele estava perto de chegar à
sua libertação. Por sorte, o volume do Skype era baixo.
Tirei os meus dedos de dentro de mim e mirei seu corpo tremendo, o
rosto tenso e o maxilar contraído, quase gozando. Coloquei meus dedos na
boca, sugando meu líquido sem nunca desviar o olhar.
Parecia bêbado de luxúria, prazer, amor e desejo, uma mistura muito
boa que eu amava. Gozou grunhindo meu nome, ou melhor, meu apelido:
Anjo.
Ficou mole por um tempo, igual a mim.
— Foi abduzido? — sondei depois de recuperar o fôlego. Deitei na
cama, exausta, ajeitando a tela do note para mostrar o meu rosto.
— Sim, acho que vi estrelas... — Fitava-me através dos seus olhos
anuviados. — Quando você lambeu os dedos, fui ao paraíso e voltei em
segundos. Puta merda, aquilo foi perfeito, uma visão dos céus.
Sorri, meio mole depois do êxtase.
— Foi sim, perfeito — concordei, sonolenta.
— Vá dormir, Anjo, amanhã nos falamos — prometeu.
— Eu te amo, Ryan. — Adormeci antes de ouvir sua resposta.
Capítulo 14
Medo

ANGELINA
Acordei cedo com um sorriso bobo após sentir um grande êxtase na
noite anterior. Nunca pensei que faria sexo assim, por Skype, mas amei. Foi
tão bom quanto seria pessoalmente.
Eu me levantei ainda nua e fui tomar banho. Trajei um vestido florido
de alças trançadas. Na região dos seios, era justo, e não muito rodado na
saia. Batia no meio das coxas. Calcei botas de caubói que iam até a canela e
coloquei um suéter por cima.
De repente, ouvi os gritos urgentes de Lira. Saí correndo do quarto em
direção à cozinha, de onde vinha o barulho. Ela parecia estar chorando.
Quando cheguei, me deparei com uma cena que me levou a gritar em
desespero. Daria para me ouvir do outro lado do quarteirão. Shane estava
caído no chão, todo mole... Como se estivesse... “Não, não, não, não, por
favor, não deixe que ele... Oh, Deus, não. Você não pode levá-lo de mim, não
pode”, implorava. Era para ser só uma simples cirurgia, então por que ele
passou mal?
Caí de joelhos ao seu lado e toquei seu rostinho lindo. Meu irmão
estava gelado...
— Shane, por favor, acorde — supliquei.
De repente, eu não estava sozinha. Fui tirada de cima dele por Charles,
enquanto Johnny massageava o peito de Shane e fazia respiração boca a
boca.
— Shane... — chorava.
— Ele vai ficar bem, Borboleta — Charles disse.
— Não posso perdê-lo, não posso — gemi, fechando os olhos.
Ângela se foi, assim como os meus pais, e agora Shane estava... Ele
ficaria bem, eu tinha de confiar e acreditar nisso. Não podia deixar as outras
perdas me dominarem.
— Ele está respirando de novo — avisou Johnny, preocupado. — A
ambulância está a caminho.
— Ele está dodói? — perguntou Lira, chorando.
Peguei-a nos braços, precisava dela perto de mim. Se Shane não
conseguisse... Não, deveria pensar positivo.
— Ele vai ficar bem — sussurrei, querendo acreditar naquela
promessa. Quando perdi Ângela, eu tinha tanta fé de que ela sobreviveria
àquele acidente... Aliás, que nós duas sobreviveríamos e escaparíamos do
crápula delinquente que fez meu carro capotar. Com meus pais foi a mesma
coisa... Temia pelo pior, mas lutaria e não perderia a fé.
Os paramédicos chegaram, colocaram Shane na maca e o levaram para
a ambulância. Charles pegou Lira e saiu do apartamento. Busquei minha
bolsa e fomos para o hospital.
Shane foi encaminhado à sala de exames para checarem seu estado; não
pude acompanhá-lo. Fiquei ali, entorpecida, na sala de espera, em um
corredor branco e comprido. Parecia que eu estava morrendo aos poucos.
Charles chegou alguns minutos depois.
— Onde está Lira? — questionei, sem vida.
— Deixei-a com a minha mãe, não sabemos quanto tempo vai demorar
aqui. — Sentou-se ao meu lado esquerdo, e Johnny no direito. — Ele ficará
bem, Angie.
— Sim, Shane sairá dessa, querida — garantiu Johnny.
Chorei em seus braços pelo que me pareceram horas. Soluçava e não
me importava que me vissem sofrendo. Só queria meu irmão curado e
comigo.
— Preciso contar algo a vocês dois.
— Pode falar, estamos aqui para o que quiser — incitou Charles.
— Com certeza — concordou Johnny.
— Hoje, faz seis anos que Ângela se foi. Estou completando vinte e
quatro anos... — Nunca revelei o dia exato do meu aniversário. Era para ser
uma data feliz, contudo, ela só me lembrava de uma tragédia que nunca
esqueceria.
Os dois ofegaram em sincronia.
— Angelina...
— Já pensaram no carma que é isso? No nosso aniversário de dezoito
anos, a perdi. Agora Shane está... sabe-se lá Deus como. — Expirei,
limpando as lágrimas. Curvei-me para a frente e coloquei minha cabeça em
meus joelhos, fechando os olhos. — Não era para ele passar mal assim.
Shane estava com fadiga esta semana, mas o médico disse que era normal...
— Ele vai ficar bem — Johnny reiterou.
— Espero que sim. Estou com medo. — Ajeitei-me no banco,
colocando a cabeça no encosto do sofá. — Eu vou contar a todos e quero
vocês no apartamento do Ryan comigo.
— Porque não os chama aqui? É melhor do que ir até lá só para dizer
sobre Shane — falou Charles.
— Porque eu quero contar tudo, tanto a respeito de Shane como o que
houve naquela noite em que perdi Ângela, um dos momentos mais tristes da
minha vida. Eu já os considero meus amigos. Vocês estarão comigo?
Os dois concordaram em me ajudar. A cada dia, criava mais laços com
aquelas pessoas. Sam era uma ótima companhia, saí com ela algumas vezes
enquanto Ryan viajava. Alexia e Rayla também. Por isso não queria deixá-
las de fora em um momento tão difícil para mim.
— Obrigada, amo vocês dois.
Escrevi a todos uma mensagem para que me encontrassem na casa do
Ryan às sete e meia da noite, assim daria tempo dele chegar. Não liguei para
ele, não queria incomodá-lo; conversaríamos mais tarde, quando voltasse de
viagem. Eram a recém onze horas e estava ansiosa para vê-lo. Todos os
meus amigos responderam dizendo que estariam lá no horário marcado.
Ficaria a tarde inteira com Shane, rezando para ele melhorar. Precisava
deste milagre em minha vida, precisava do meu irmão comigo.
Passava das duas da tarde quando o médico deu o veredito: Shane
estava bem, mas precisava ser operado o quanto antes.
— Administramos um sedativo para ele dormir. A cirurgia para colocar
o marca-passo deverá ser feita o mais rápido possível, não poderemos
aguardar mais uma semana. Marcamos para amanhã, às nove horas.
— Ele corre risco de vida? — indaguei num sussurro, já sabendo a
resposta.
— Não se preocupe, ele ficará bem se a cirurgia for realizada o quanto
antes. Tenha fé.
Aquiesci, muda. Fé... Tinha tanta antes das perdas... Não resolveu muita
coisa. A despeito disto, não abandonaria a esperança de logo ter o meu
bebezinho comigo e bem.
Entrei no quarto onde ele se encontrava dormindo com um lençol
branco sobre seu corpo. Meu coração doía vendo meu menino naquela cama,
mesmo o médico dizendo que ele estava a salvo. Não conseguia parar de ter
medo.
— Mamãe, papai e Ângela, se vocês estiverem me olhando aí do céu,
por favor, me ouçam. Necessito dele aqui comigo. Se Shane partir para onde
estão, não saberei o que fazer... Lira depende de mim. — Toquei seu rostinho
lindo. — Por favor, Deus, se você existe, não o deixe morrer, ele e Lira são
a razão da minha existência, minhas metades. — Beijei sua testa. — Amo
você, meu garotinho lindo, amo para sempre.
— Estou bem, Angie — sussurrou.
Virei para cima e me deparei com um par de olhos negros que me
fitavam confusos. Chorei de felicidade por vê-lo consciente.
— O que está havendo?
Sorri em meio às lágrimas ao ouvir sua voz linda que sempre iluminava
minha vida.
— Oh, meu Deus! Você está bem, meu amor? — Abracei-o forte,
beijando seu rostinho lindo.
— Não chore, Angie — implorou.
— Estou chorando de alegria!
Ele me abraçou, me reconfortando, repetindo a cada segundo que estava
bem. Inalava seu delicioso aroma, que me trazia luz e paz. Ficamos
conversando e sorrindo. Esperançosa de que tudo daria certo, não me
permiti pensar negativo ou ficaria louca. Queria somente apreciar a
felicidade por meu lindo irmão estar seguro.

Entrei na casa do Ryan usando a chave que me deu antes de ir viajar.


Não deveria estar ali com meu irmão hospitalizado, contudo, era necessário.
Aquele era para ser um dia especial, o melhor da minha existência,
afinal, tinha meus irmãos e o amor do homem com que todas as mulheres
sonhavam. Tirei a sorte grande. Porém, a vida nem sempre acontece como
queremos, não é direcionada conforme desejamos. Se fosse assim, eu podia
apertar o botão de rebobinar e voltar seis anos, quando tudo se desenrolou e
um pedaço da minha alma se foi.
Perder alguém no dia do meu aniversário... Era muito azar, nasci
amaldiçoada ou algo assim. E anos depois, mais uma vez, enfrentava o
mesmo medo... Não podia cogitar perder meu maninho, tinha de ser forte.
Reuni todos meus amigos, só não chamei Tabitta porque ela estava
trabalhando fora da cidade, acho que em Kansas — pelo menos foi o que
disse Samira, a babá de Emily.
Ao entrar no apartamento, fui para a cozinha. O grupo estava sentado ao
redor da imensa mesa. Do lado esquerdo, Caim, Kate, Jason, Johnny, Daniel,
Bryan e Jordan. Do direito, Ryan, Charles, Alexia, Sam, Lucky, Rayla e
Alex. Havia uma cadeira vazia ao lado de Ryan, provavelmente para mim.
Todos me olharam assim que me aproximei. Quando convidei Caim e
sua noiva, não achei que ele iria, mas precisava dele ali. Ainda bem que
apareceu.
Pareciam preocupados comigo. Não sabia o que viram no meu rosto,
mas deveria ter sido o suficiente para assustá-los.
— O que está acontecendo, Anjo, e por que não atendeu às minhas
ligações? — perguntou, vindo até mim e beijando a minha testa.
— Esqueci meu telefone em casa — respondi, me afastando dele um
pouco.
— Tem algo errado, eu posso sentir — disse, avaliando meu rosto.
Assenti e dirigi-me ao grupo.
— Olá, pessoal, fico feliz que tenham vindo. — Soava rouca pela dor,
tanto de meu irmão hospitalizado como também por Ângela.
Caim me olhou de lado.
— Você me ligou e me pediu para vir aqui hoje. — Seu tom era
confuso. — Posso saber por quê?
— Sim — respondi, olhando cada um ali. — Vou contar algo a vocês,
porque já os considero meus amigos... — Remexi-me na cadeira. — Peço a
compreensão de todos para que não me interrompam... — Meu rosto já
estava molhado. — A dor é insuportável quando falo neste assunto, é como
se eu estivesse sendo rasgada viva.
Não me senti assim ao dar a entrevista apenas porque, naquele dia,
Shane estava bem. Tentei ignorar o medo, segurando um dos copos cheios de
whisky e bebendo em um gole só. A coisa desceu rasgando minha garganta;
não liguei.
— Não acha que está exagerando na dose? — comentou Sam, avaliando
meu rosto. — O que aconteceu para deixá-la assim?
— Estou aqui para contar algo a vocês, algo que aconteceu seis anos
atrás, quando metade de minha vida foi ceifada.
— Angelina, você sobreviveu ao acidente — comentou Caim.
Ri em meios às lágrimas.
— Para quê? Para sofrer ao perdê-la. Queria ter ido com ela. — Eu me
encolhi. Ryan estremeceu ao meu lado e alisou meus ombros.
— Nunca pense isso, Anjo, não posso imaginar ficar sem você —
sussurrou no meu ouvido, acariciando meus cabelos.
— O que desencadeou isso? Na entrevista você não estava assim ao
falar de sua irmã — falou Daniel, perceptivo.
Expirei e me arrumei na cadeira.
— Hoje faz seis anos que ela se foi, não é? — Caim me olhou de lado.
Encolhi os ombros.
— Este é um dos motivos... Há sete anos, quando morávamos em
Nashville, eu estava na ponte do rio Cumberland. Sempre ia lá para apreciar
a vista, adorava olhar a água corrente e me inspirar para escrever histórias.
Eu era do jornal da escola e fazia muito isso naquela época. Certo dia, um
carro parou enquanto me maravilhava com a vista. Um garoto saiu do
Porsche vermelho-sangue. Pensei que passaria direto, mas estacionou o
veículo e veio até mim quase correndo, dizendo: “Por favor, não pule dessa
ponte”. Apenas fiquei lá, olhando o desconhecido, confusa. Quem era ele?
Por que achava que eu pularia? Mal soube o que responder. “Seja qual for o
seu problema, não faça isso, a morte não é a solução”, ele insistia. Continuei
atônita, mas consegui tranquilizá-lo: “Não vou me matar. Jamais faria isso”.
O garoto suspirou de alívio, questionando: “Então por que está aqui?”.
Expliquei que apenas gostava de apreciar a linda vista. Ele concordou
comigo sobre a beleza do lugar e perguntou meu nome. “Angelina. E o seu?”,
respondi. “Caim’’, disse ele. Desse dia em diante, nos tornamos amigos. Ele
foi estudar na mesma escola que Ângela e eu. Nós éramos gêmeas idênticas,
mas com personalidades diferentes.
Suspirei, focalizando minhas mãos sobre a mesa, sem nada ver, presa
no passado.
— Quando cheguei em casa naquele dia, disse à Ângela sobre o garoto
lindo que tinha acabado de conhecer, e que achou que eu fosse pular da
ponte. — Mirei os olhos tristes de Caim, continuando: — Não mencionei o
seu nome, não sei o porquê, talvez estivesse distraída por suas roupas caras
e pelo Porsche reluzente. No dia seguinte, nos encontramos na escola,
teríamos aulas juntos. Também passamos a nos ver fora dela. O que eu sentia
se tornou mais do que amizade. Ângela tinha ficado doente naquela semana,
por isso não foi à aula e não conheceu Caim. Na segunda-feira, três semanas
depois de nosso encontro inicial, Caim disse que me amava e que queria
namorar comigo. Surpresa, acabei ficando sem reação e não aceitei de cara.
Logo várias coisas aconteceram ao mesmo tempo. Mamãe ficou doente,
então tive de cuidar dela. Shane era pequeno nessa época e também não
estava saudável... Talvez fosse uma virose. Certa noite, decidi dar a minha
resposta a Caim, mas antes de falar com ele, Ângela entrou em nosso quarto
toda animada com o garoto novo que conhecera, com quem almoçou. Quando
ela disse que era o Caim, tudo mudou.
— Só fui almoçar com ela porque pensei que era você — Caim
explicou.
— Ela não disse nada sobre você falar que me conhecia. — Olhei para
ele. — E Ângela nunca mentiu para mim.
— Sim, porque naquele dia eu não disse seu nome, apenas a chamei
para almoçar comigo. Rapidamente percebi que aquela garota à minha frente
e a menina que eu amava não eram a mesma pessoa. Supus que fossem
gêmeas, ia te perguntar a respeito disso quando nos víssemos. As
personalidades de vocês duas eram diferentes.
Ri sem humor.
— Esse foi um dos motivos para eu ter ficado calada após ela me dizer
que gostava de você — murmurei. — Ângela usava as roupas de moda,
sempre extrovertida e viva. Eu era sem graça, gostava de ler, não comprava
peças chiques, usava jeans velhos e camisas largas. Quem era eu para me
comparar a ela?
— Droga, Angelina, isso não foi o problema — assegurou Caim com
dentes cerrados. — Você me jogou para ela, pediu para eu namorá-la,
sabendo que eu amava você.
Encolhi-me com o ressentimento na voz dele.
— Eu sei, mas ela o amava. Nunca a tinha visto assim, tão feliz. A
alegria dela vinha em primeiro lugar. — Tomei outro gole da bebida.
— Mesmo às custas da sua? — retrucou Daniel.
Eu expirei.
— Sim — respondi a verdade. — Ela valia cada dor que eu sentia,
porque faria o mesmo por mim se soubesse que eu amava Caim. Assim que
ela descobriu o que eu sentia, quis desistir dele, mas já era tarde demais, os
dois haviam ficado. Durante cinco meses do namoro de vocês, consegui
esconder o que sentia, porém, quando soube o que havia acontecido, não deu
mais. Achei que a dor me consumiria...
— De quem é a culpa? Angelina, eu cheguei a implorar para que ficasse
comigo. Estava disposto a largar tudo por você — replicou Caim com uma
pontada de raiva. — O que você fez? Deixou-me e, para piorar, me jogou
nos braços de sua irmã.
— Quando ela chegou em casa e disse que vocês... — Parei por um
instante, me direcionando à Kate. — Você não tem ciúmes do passado dele,
tem?
Ela levantou uma sobrancelha bem-feita e alinhada.
— Vocês transaram?
Ouvi um ruído sair dos peitos de Ryan e Caim. Ignorei os dois
— Nós nem nos beijamos, que dirá fazer sexo — declarei. — Ângela,
sim. Quando ela me contou o que tinha acontecido, tudo veio à tona: a dor, o
amor que eu sentia pelo Caim. Não pude esconder dela, por mais que eu
quisesse. Foi um mês difícil para mim, acredito que para ela também. Fiquei
uns dias na fazenda da minha tia. Precisava de tempo para esquecer tudo. —
Voltei-me a Caim. — Ao chegar em casa, duas semanas depois, soube que
você tinha ido embora e a deixou quebrada, assim como eu...
Ele suspirou, me olhando com suas íris escuras e tempestuosas.
— Eu não tive escolha, Angelina. Não podia ficar com ela sendo que
amava você. Não seria justo com nós três, precisava ir... Aquilo estava me
matando aos poucos, como um maldito câncer...
Mordi os lábios.
— Ela se tornou diferente depois que você se foi. Chorava por nós duas
e por você, Caim. Chegou um dia em que parou e começou a ir às festas,
ficar com caras aleatórios. Graças aos céus, nossa amizade permanecia a
mesma. Lidamos com a dor de maneiras diferentes. Ela optou por se divertir,
e eu me atirei nos livros.
Fiz uma pausa, antecipando a angústia que me causaria narrar os
próximos acontecimentos.
— No dia anterior ao nosso aniversário de dezoito anos, ela foi para
uma festa na fazenda do filho do prefeito, cujos pais tinham saído da cidade.
Já era tarde e ela não voltava para casa. Meus pais estavam com Shane na
minha tia Alice. Era por volta das duas da madrugada de vinte de outubro, o
dia do nosso nascimento, pois já havia passado da meia-noite. Hoje faz seis
anos que sua vida foi ceifada... Fui atrás dela, pois estava cansada de ficar
esperando. Não podia dizer aos meus pais, nunca a entregaria. Quando
cheguei na fazenda, a vi dançando com dois garotos, um à frente e o outro
atrás. Beijava ambos. Quase caí de costas ao ver o quão longe ela tinha ido,
o quão no fundo do poço estava. Só a enxergava caindo, sem poder tirá-la do
abismo. Puxei Ângela para longe dessa festa, ou zona, longe daqueles
malditos bastardos que se aproveitavam dela, só porque não estava em seu
juízo perfeito. Eu a levei comigo, não ia ficar ali vendo aquela maldita orgia.
Ao colocá-la no carro, percebi que ela devia ter bebido alguma coisa
estranha. Foi quando senti alguém agarrando meus cabelos por trás e me
derrubando no chão, montando em mim.
— Quem era? — inquiriu Ryan, sombrio.
— Stive Lutner, o filho do prefeito, um dos que estavam com Ângela.
Ele me disse que eu o tinha impedido de transar com ela, agora ocuparia seu
lugar. Ameaçou tirar minha virgindade. — Estremeci com as lembranças de
suas mãos, seu toque nojento. — Tentei gritar, mas com o barulho da festa,
era impossível me ouvirem... Nunca senti tanto medo na minha vida. Ele me
bateu para eu calar a boca.
— Esse cara tocou em você? — perguntou Caim num tom mortal.
— Não, Ângela pegou um pedaço de pau e o acertou em cheio na
cabeça. Eu estava com muito medo para me sentir culpada por ferir alguém
ou checar se ele estava morto.
— Que tenha morrido ou ido para a cadeia — rosnou Jason.
Eu ri, amarga.
— Nem uma coisa, nem outra. O desgraçado assassino está livre,
sempre em festas e viajando pelo mundo, como se a vida que ele tirou não
significasse nada para ele. O que o dinheiro não compra? Ele controla tudo,
pelo menos a lei.
— Como assassino? Não foi um acidente? — indagou Caim.
Eu sacudi a cabeça.
— Não. Dirigi para casa depois que entramos no carro, faltava dois
quilômetros para chegar na cidade, quando uma Strada Cabine Dupla bateu
na lateral do Chevrolet antigo do meu pai. Pertencia ao Stive, costumava vê-
lo dando cavalo de pau pela cidade. Ele fez de tudo para me tirar para fora
da estrada. Lembro-me de estar com medo, e Ângela gritando que não queria
morrer. Perdi o controle ao fazermos uma curva. Bati em uma árvore e tudo
escureceu.
Respirei fundo para conseguir prosseguir:
— Abri os olhos algum tempo depois. Ela estava do meu lado no CTI,
com seu corpo já sem vida, porque acabara de partir. Os médicos
continuaram lutando por ela, mas era tarde demais... Uma parte da minha
alma partiu com Ângela. — Limpei minhas lágrimas. — Vocês não precisam
dizer que sentem muito, eu sei — falei, pois as bocas de todos já estavam se
abrindo.
Sam, Rayla, Alexia e Kate tinham os olhos molhados. Alexia parecia
tensa, atormentada por um abismo de dor, vivendo um pesadelo pessoal de
lembranças despertadas pela minha história. Bryan a fitava com
preocupação, aparentando saber o que desencadeou a angústia visível em
sua face. Queria descobrir porque ela estava assim, mas não tinha tal direito.
Ademais, já havia a minha própria dor para me preocupar, a qual ninguém
podia tirar de mim. Seja lá o que fosse que ela tentava esquecer, torcia para
conseguir.
Forcei um sorriso sem vontade, entornando minha bebida.
— Acho que só sou azarada com tantos acidentes de carro.
— Isso não é verdade, o que houve com sua irmã foi assassinato —
falou Bryan, nervoso. — Vou apurar o caso, esse canalha não vai sair
impune.
— Gente rica não vai para a cadeia. E se for hoje, amanhã será solto —
cuspi, amarga.
— Vamos ver quem tem mais poder, ele ou eu — sibilou Lucky.
— Quanto ao acidente dos meus pais, estava na faculdade quando
ligaram para me contar. Os dois lutaram pela vida por dias, e eu com fé,
orando para sobreviverem. — Coloquei meus cotovelos na mesa e cobri os
olhos. — Mas a esperança se foi... Eles morreram e meu mundo desabou de
novo, como se eu batesse de frente com um tornado. — Não senti nada de
orgulho ao revelar a próxima parte, a fraqueza ao pensar em tirar minha
vida. — Fui para a ponte do Brooklyn, já morávamos aqui. Nashville ficou
difícil para todos nós vivermos, a saudade dela era muita.
— O que foi fazer na ponte? — perguntou Ryan com um leve tremor na
voz.
Deixei minhas mãos caírem e olhei para elas sobre a mesa. Não custava
nada dizer a verdade a eles, afinal, foi para isso que os convidei.
— Eu fui para acabar com meu sofrimento...
Todos ali ofegaram de pavor. Eu também reagiria assim se estivesse de
fora da situação. Há uma frase de William Shakespeare que diz: “Todo
mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente”. Era real. Eu me
sentia sem solução naquela época. Pesando na balança, não faria isso hoje,
não era fraca igual a antes. E tinha uma rede de apoio: amigos verdadeiros,
meu namorado e meus irmãos, não me sentia mais sozinha.
— Você tentou se matar? — esbravejou Ryan com os punhos cerrados.
Eu me encolhi.
— Eu ia, mas quando estava me preparando para isso, uma assistente
social me ligou, explicando que, com a morte dos meus pais, eu seria a
responsável por Shane e Lira, que era recém-nascida. Os dois me deram
forças para lutar e viver por eles... Mas tudo que é bom dura pouco...
— Aconteceu alguma coisa com eles? — perguntou Ryan, preocupado.
Senti sua mão ao meu redor, me abraçando. Levantei minha cabeça sem
nada ver.
— No hospital, no dia em que doei sangue a você — olhei para Sam,
que também estava com os olhos marejados e a cabeça escorada no ombro
do marido —, recebi o resultado dos exames do Shane... Ele tem uma doença
no coração e precisa de cirurgia. Estava prevista para a semana que vem,
contudo, ele passou mal hoje cedo e foi internado.
— O quê? — Ryan quase gritou. — Por que não me disse?
— Não queria incomodar, e Shane já estava até falando, então podia
esperar até você chegar aqui.
— Você devia ter me ligado, droga, é para isso que servem os
namorados, não? — disse num tom magoado.
— Eu sei, sinto muito — sussurrei. — O médico disse que a cirurgia
acontecerá amanhã às nove.
— Estaremos com você para o que precisar, cunhada — disse Rayla.
— Obrigada, eu só vim aqui para contar a todos vocês o que aconteceu
comigo, e por que sofri tanto hoje. É bom estar cercada de amigos em uma
hora dessas.
— Queria que tivesse vindo a mim antes, não importa onde eu estava e
o que fazia, iria correndo. Você é mais importante do que tudo em minha
vida.
Ao fitar seus olhos, pude ver o amor que sentia por mim, tão intenso
quanto o meu por ele. Era grata por tê-lo em meus braços.
— A dor é demais, Ryan. Hoje faz seis anos que Ângela se foi, e
amanhã faz três da morte de mamãe e papai. Não posso perder Shane
também...
— Não vai perdê-lo. Ryan ou Lucky podem conseguir o melhor médico
do país para fazer a cirurgia dele — falou Sam com alguma esperança,
olhando o marido e Ryan, que assentiram.
Precisava ter fé para que meu irmão saísse dessa e ficasse conosco por
muitos anos. Meu pai tinha marca-passo e vivia bem, com Shane seria assim
também.
— Vamos ter esperança, Anjo, nada de ruim vai acontecer a Shane —
prometeu Ryan. — Estou com você sempre.
Ergui-me, mirando todos ali. Nem queria imaginar minha expressão,
devia estar toda inchada.
— Obrigada por virem hoje, deixando seus afazeres de lado.
Sam se levantou e me abraçou.
— Amigos são para isso, querida. Lucky conseguirá um cirurgião
especializado em coração, ok?
— Agradeço — sussurrei.
Forcei um sorriso para Kate.
— Foi bom conhecer você. Espero que o que eu disse aqui não atinja os
dois, desejo que sejam felizes. — Dei um abraço nela. O que tive com Caim
ficara no passado. Perguntei a ela: — Você se importaria de eu abraçá-lo?
Kate sorriu gentilmente.
— Tudo bem, se não o ama mais. — Fitou Ryan.
— Ela pode não se importar, mas eu sim — rosnou, já de pé, olhando
friamente para Caim. — Se não quiser ficar sem as mãos, é melhor se manter
longe dela.
Caim sorriu e o encarou de frente.
— Não tenho medo de você. — Foi me abraçar, ignorando o Ryan.
Ryan se lançou na sua direção, e eu me coloquei entre os dois, atenta à
expressão assassina do meu namorado.
— Ryan, era só um abraço...
Ele me imprensou contra a geladeira e encostou sua testa na minha.
— Anjo, perdão... Olha só o que me faz fazer.
Suspirei, tentando controlar meu corpo com o toque dele.
— Eu não fiz nada, mas tudo bem. — Quase desfaleci mirando suas íris
cálidas.
Beijou a minha testa e se afastou.
— Obrigado, querida — disse. — Agora vamos para o hospital ver o
nosso garoto.
Assenti, em êxtase por ter um homem desses na minha vida.
— Tive a sorte grande de arranjar alguém como você. — Toquei seu
rosto — Você me conhece mais do que eu mesma para saber onde minha
mente está neste momento.
— Eu sei, porque a minha também não sai daquele hospital. Passei a
amar Shane e Lira.
Deixamos o apartamento e nos encaminhamos ao hospital. Ao
chegarmos, Ryan foi falar com o médico e acertar tudo para a cirurgia. Como
não amá-lo?
— Ele está dormindo agora, seus batimentos se estabilizaram, então não
se preocupe. — Sentou-se ao meu lado na cadeira na sala de espera. — A
cirurgia foi transferida para o meio-dia.
De repente me senti alerta, avaliando se ele estava escondendo algo de
mim.
— Por quê? — Bebi o resto do leite que ele trouxe para mim.
— Porque o médico especialista em cardiologia vem de Houston para
cuidar do caso. Ele é o melhor do mundo.
— Ryan...
Interrompeu-me.
— Não vamos discutir dinheiro agora, Anjo. Shane também é
importante para mim, portanto, farei tudo a meu alcance para ajudá-lo.
— Você é o anjo que Deus enviou para a minha vida para me ajudar a
passar por isso. Se estivesse sozinha...
Ryan apertou seus braços à minha volta, como se quisesse me manter ali
para toda a eternidade.
— Sempre estarei ao seu lado — jurou, comovido pelas coisas que
disse a ele. — Feliz aniversário, linda. Obrigado por me fazer feliz.
Orei para tudo dar certo no dia seguinte. Que Deus me desse ouvidos e
meu irmão ficasse bem.
Capítulo 15
A espera

RYAN
O desfile na França foi um sucesso com minha nova coleção de
lingerie. Era para Sam ter participado, mas perdi a aposta por causa da
Anjo. Não que eu me arrependesse de escolhê-la, aquela mulher surgiu para
trazer luz à vida vazia que eu levava, agora completamente preenchida com
ela ao meu lado.
Os vestidos dela seriam lançados na Califórnia em alguns meses,
acredito que se tornariam um sucesso. Contava com isso, pois eram
esplêndidos. Estava orgulhoso pelo talento de Angie.
Quando cheguei da França, fui visitá-la, doido para vê-la, abraçá-la,
beijá-la e passar o seu aniversário juntos. Até aluguei o restaurante Baboo,
conhecendo seu amor por comida italiana. Seria o primeiro encontro oficial
de toda a minha vida.
Soube que ela iria ao meu apartamento aquela noite. Pensei que seria
para nós conversarmos, mas ela convidou a todos, os meus amigos e os dela.
Quando ela falou que quase cometeu suicídio diante da morte de seus
pais, foi como se tudo dentro de mim se partisse ao meio, temendo que ela
tivesse pensando nisso de novo. Graças a Deus, Angelina já não considerava
esta opção. Porra! Por ela eu enfrentaria o inferno, moveria céus e terra.
Meu amor faria o mesmo por mim.
Ao ter a Anjo em meus braços pela primeira vez, custei a acreditar
realmente que faríamos amor. Pensava que ela estivesse se guardando para
seu futuro marido. Pelo olhar dela, Angie achava que isso não aconteceria
comigo. Não por falta de amor, e sim por não acreditar que eu me
comprometeria tanto. Antes de conhecê-la, de fato, eu pensava assim
também. Angie mudou isso, não sabia o que essa mulher tinha. Fez com que
eu desejasse tudo: casamento, filhos. Por ela, andaria em brasas sem ter
medo de me queimar.
Se minha garota quisesse casar, assim seria, nem que para isso eu
tivesse de enfrentar um maldito cavalo.
Enquanto criança, adorava cavalos, achava fascinante como eles
troteavam livres pelos pastos verdejantes do haras dos meus pais, hoje meu.
Algumas vezes, frequentava o local só para vê-los correr, com suas crinas ao
vento. Queria montá-los e sentir o ar puro beijar minha pele, o sol banhar
meu rosto, mas tudo não passava de um sonho. Caí de um pônei quando tinha
sete anos. Já pensou, um homem crescido com medo de cavalos? De
qualquer forma, precisava acabar com este temor, porque era o único jeito
de provar para Angelina que eu valia a pena, que por ela levaria uma
maldita bala.
Minha amada era melhor do que tudo que já experimentei. Seu gosto de
fruta, seus gemidos doces, maldita canção para os meus ouvidos. E os
gritos? Simplesmente divinos, algo que queria escutar para sempre. Se
alguém um dia me dissesse que eu faria amor com uma mulher, teria rido na
cara dele, perguntado se havia bebido. Mas fazer amor, transar, foder com
ela, era tudo o mesmo, igualmente perfeito.
Não dormi à noite, conversado com o Lucky e o doutor Raul Smith, um
cardiologista especializado em todos os tipos de problemas no coração.
Lucky disse que ele era o melhor. Esperava que sim, porque não queria vê-la
destruída.
Meu irmão mandou os exames de Shane por e-mail para o doutor
providenciar tudo. A cirurgia foi marcada para o meio-dia, duraria em torno
de duas a quatro horas. O médico o transferiria para o Hospital Mount Sinai,
de Manhattan.

Chegamos ao hospital. Já estava tudo pronto e organizado para a


cirurgia. Lucky cuidara dos detalhes para mim. Meu irmão valia ouro.
Os médicos e enfermeiros levaram Shane para o centro cirúrgico.
Angelina ficou ali, nos meus braços.
Quando a vi chorando ao lado da maca de Shane, que estava dormindo,
aquilo me doeu por dentro. Cada lágrima escorrida ardia em mim. Nunca
pensei que dedicaria minha vida a uma pessoa, a ponto de sentirmos a dor
um do outro.
— Vai dar tudo certo — garanti. Esperava estar correto em relação a
isso... Do contrário, nem queria imaginar...
Ela não respondeu, acho que não conseguiria falar nada. Eu precisava
acreditar que Shane ficaria bem.
Estava com medo dela ter uma recaída e fazer alguma besteira, mesmo
dizendo que jamais se mataria, porque agora dispunha de motivos para viver.
Fiquei mais do que feliz em ter gozado dentro dela sem preservativo na
nossa primeira vez, uma coisa que nunca aconteceu comigo. Queria que ela
engravidasse de mim, ter um filho seu era tudo o que mais desejava desde o
dia em que me apaixonei.
Vendo-a em meus braços, temendo pela vida do irmão, torcia para
Angie estar grávida. Almejava lhe dar mais motivos para viver, não só por
mim ou por seus familiares, e sim por nosso filho também.
Era estranho, contudo, tinha certeza de que ela engravidou. Chame de
sexto sentido ou esperança, embora não acreditasse em nada disso, não
custava tentar. Um filho dela seria tudo de bom: uma menina com cabelos e
olhos negros como os da mãe. Porra, precisaria atirar em vários bastardos
na minha porta que viessem procurá-la quando crescesse.
Nunca fui de sonhar com nada, a não ser minha carreira. Após a Anjo,
passei a fantasiar com uma série de situações. Primeiro que Shane ficasse
bom logo, isso era nossa prioridade. Depois, casar com a mulher que amo,
torná-la a senhora Donovan. Ademais, que ela entrasse na igreja grávida do
nosso filho. Seria o cenário mais lindo do mundo. Já amava a criança antes
dela existir.
Fazia uma hora que a cirurgia tinha começado. Angelina agora dormia,
o que só foi possível com a ajuda de uma enfermeira, que administrou um
calmante. Isso porque, a cada minuto, ela queria saber como estava indo o
procedimento, e andava sem parar de um lado para o outro.
Estávamos todos reunidos na sala de espera, aguardando o fim daquela
tortura, meus amigos e os dela. Johnny e Charles eram realmente seus
companheiros fiéis, não a deixaram por nenhum instante.
— Ela é uma guerreira — disse Lucky, sentando ao meu lado e
focalizando Angie adormecida, deitada no banco com a cabeça no meu colo.
— Sim, ela é. — Alisei seus cabelos sedosos.
— Com todas as coisas que passou, deveria ter desistido ou feito
alguma besteira — falou Daniel do outro canto da sala, sentado em uma
cadeira.
Olhei para ele.
— Ela disse que mesmo que as coisas não saiam como desejamos e
queremos... jamais se mataria, igual pensou em fazer uma vez... E também
falou que ela não suporta a ideia de me ver sofrendo. — Meu peito se inchou
com isso. Ficamos conversando até tarde sobre o seu passado, sua vida
quando criança, até o dia em que me conheceu.
— Angelina ama muito você, Ryan — Sam declarou.
Como que para confirmar as palavras de minha cunhada, a Anjo apertou
minha camiseta, que segurava firme, escorando o rosto na minha barriga e
suspirando em meio ao sono.
— Eu sei. Nunca quis dar meu coração a alguém que tivesse o poder de
me destruir.
— Amar não envolve sempre destruição — Sam sussurrou.
— Sim, mas quando ela disse que já pensou em se matar antes... algo
em mim se quebrou. Se ela fizesse isso de novo, iria acompanhá-la... —
Fitava o seu rosto lindo, sem o qual não poderia mais viver.
— Você não pode amar alguém tanto assim. — Jordan me olhava
preocupado, como se eu já fosse pular de um prédio.
— Mas eu amo. Amo tanto que não dá para viver neste mundo se ela
não estiver aqui.
— Entendo este sentimento. — Lucky observou Sam. Decerto estava
pensando no dia em que quase foi morta pelo seu pai desalmado. Esperava
que ele apodrecesse na cadeia.
— Eu não compreendo. — Jordan sacudiu a cabeça.
— Isso porque você nunca se apaixonou — disse a ele. — Quando isso
acontecer, entenderá.
— Jamais vai acontecer comigo. — Fez uma careta, ainda
desacreditado.
Depois de cinco horas de cirurgia, o médico apareceu. Tinha uns
cinquenta anos, mais ou menos.
— Como ele está? — A Anjo perguntou.
O médico, Raul, suspirou.
— Teve uma parada cardíaca, mas conseguimos trazê-lo de volta e bem
— apressou-se em dizer após notar o grito silencioso que ela soltou. — As
próximas vinte e quatro horas serão essenciais para sua recuperação.
Permaneci ao lado de Angie o tempo todo. Dado momento, porém,
percebi que ela carecia de espaço, preferindo ficar sozinha com um Shane
adormecido. Deixei-os e fui para a sala de espera. Tranquilizei meus
amigos, avisei que podiam ir embora descansar, porque tudo dera certo.
— Como os dois estão? — perguntou Sam.
— Shane está dormindo e a Anjo está com ele, agora mais calma.
Sam caminhou até mim e alisou meu braço. Eu estava esgotado, já fazia
quase um dia inteiro que eu não dormia.
— As coisas vão se ajeitar, cara — garantiu Caim, tocando meu ombro
para me confortar.
— Obrigado — pigarreei diante de sua sinceridade. Ele e sua noiva
permaneceram a cirurgia toda conosco.
— Qualquer coisa, nos chame, estarei aqui pela Borboleta — disse
Charles.
— Estaremos — corrigiu Johnny. — Angie é nossa irmãzinha, e nós a
amamos.
Todos meus amigos foram embora; mais tarde voltariam. Caim e Kate
também, não sem antes insistir que, se houvesse um problema, não hesitariam
em retornar.
Eu precisava fazer uma ligação importante, uma que não dava para
adiar mais. Poderia requisitar a ajuda de Bryan, todavia, necessitava
resolver isso por mim mesmo. Liguei para quem eu queria.
— Ora, quem é vivo sempre aparece. — Atendeu no segundo toque.
— Olá, Dominic. — O seu nome de MC era Shadow, porque o cara
tinha um ar sombrio que de longe se enxergava. Era o líder dos MCs da
Fênix em Chicago. Nos tornamos amigos ao estudarmos juntos em Harvard.
— Você foi quem sumiu — retruquei.
— Tem uma festa esta noite, se quiser aparecer. — Eu podia ouvir o
sorriso na sua voz.
Ele sempre me convidava para festas em seu clube; nunca aceitei.
Antes, porque se eu aparecesse com uma prostituta em alguma foto, a mídia
me encheria o saco — nada contra elas, claro; ser famoso tinha suas
desvantagens. Concluía isso pelas imagens que saíram da irmã da Anjo, o
alvoroço que deu. Agora, por outro lado, não aceitaria o convite porque
tinha uma mulher perfeita que me amava de modo recíproco. A única que
queria para sempre.
— Vou recusar. — Sentei-me na cadeira.
Ele riu.
— Novidade... — Aposto que revirou os olhos.
Eu ri também.
— Tenho um favor a pedir. — Ele seria capaz de encontrar quem eu
estava procurando. Depois que soube do cara que matou a irmã da Angel,
resolvi não deixar isso impune. Ela disse que ele só se safou porque tinha
dinheiro. Vamos ver o que faria agora.
— Quem eu preciso matar por se meter com um dos nossos? — Seu tom
era sombrio. Se o Lucky, às vezes, colocava medo nas pessoas, imagine esse
cara? Era a personificação do mal.
Gargalhei, sacudindo a cabeça.
— Matar? Ninguém. Caçar? Sim.
Ele suspirou.
— Quem?
— Um cara chamado Stive Lutner. Ele é de Nashville. Seu pai foi
prefeito de lá, ou coisa assim.
— O que quer que façamos com ele?
— Que o traga até mim. — Meus punhos se fecharam. — Temos um
acerto de contas a fazer.
— Não quer que cuidemos disso para você? E o que ele fez?
Respirei fundo para me controlar.
— Ele tentou estuprar minha namorada e a perseguiu, matando sua irmã
gêmea no processo. Saiu ileso porque tinha grana, e a garota não. — Meus
dentes estavam cerrados por pensar nisso.
— Eu soube pelos jornais que foi fisgado por uma boceta... Quem diria,
hein? Ryan Donovan?
Não fiquei com raiva dele por dizer isso da minha namorada, era o seu
modo de falar. Os MCs tinham seus próprios costumes. Não precisava
mencionar que fui domado pela Angel sem ao menos chegar perto dessa
parte de seu corpo. Óbvio que, quando cheguei, fiquei mais viciado ainda.
— Olha quem fala! — Sacudi a cabeça. — Soube pelo Nasx quando o
vi há alguns meses que você também foi domado. Ela deve ser um maldito
avião para conseguir tal façanha.
Havia felicidade em sua voz.
— Evy é tudo de mais perfeito que já vi na minha vida, a mulher mais
linda do mundo. — Seu tom agora era de júbilo. — E é uma maldita ninja
nas facas.
— Bom, pelo menos se pular a cerca, ela corta suas bolas — brinquei.
— Meu amigo, meu pau não quer outra boceta, apenas a dela, então
ficará seguro em minhas calças — disse com convicção.
Cocei o queixo.
— O mesmo aqui, cara. A Anjo veio me completar de todos os lados.
Mulheres, bebidas, festas e fama nunca preencheram o vazio que eu sentia,
apenas ela.
— Anjo? — indagou.
— Isso a define pela doçura e bondade. Exceto quando fica irritada, aí
solta suas garras — declarei com amor.
— Nós somos os bastardos mais sortudos por conseguir que mulheres
como Evy e sua Anjo gostem de caras como nós. Fico feliz por você.
— Agradeço a tudo por ela ter aparecido em meu caminho, cara.
— Eu também agradeço pela Evy. — Suspirou. — Como está o Jason?
Soube que ele vai para a França participar de uma luta. Faz tempo que não
falo com ele. — Fungou. — Mudando de assunto, você pretende matar esse
cara? — sondou, sem me dar tempo de responder quanto ao Jason.
— Queria poder dizer que sim, mas não vou arriscar que um dia a Anjo
descubra que fui o mandante de um assassinato, e acabe me deixando.
— Se ela te amar de verdade, vai entender.
— Fácil falar... Não pretendo esconder segredos dela. Já basta te pedir
para encontrar esse cara e ter um “papo reto” com ele. — Olhei para a porta
do quarto, ainda fechada. — Quero fazê-lo pagar. Talvez ele tenha algum
podre escondido além dos que conhecemos, aí posso mandá-lo por toda sua
vida para a cadeia.
— Você é um bom homem, Ryan, sempre soube disso. — Seu tom era
orgulhoso como o de um pai coruja, a despeito de ser somente dois anos
mais velho do que eu.
— Você também. — Minha garganta se fechou com a emoção.
Ele riu.
— Sei que está dizendo isso só porque somos amigos, mas obrigado.
No meu mundo, não podemos demonstrar fraqueza e bondade, ou os tubarões
nos engolem vivos. Vou encontrar esse cara e procurar seus podres. Daemon
é um grande rastreador. Assim que o acharmos, entro em contato.
— Agradeço.
— Ryan — chamou a voz capaz de me trazer do mundo dos mortos.
Olhei para cima e a enxerguei rindo. A visão mais perfeita do universo.
— Preciso ir, Dom — pigarreei com um suspiro. — Estou no hospital.
Meu cunhado de oito anos fez uma cirurgia. A Anjo está chegando aqui.
— Ele está bem?
— Sim, graças a Deus. — Eu me levantei. — Ficarei aguardando sua
chamada.
Desliguei e fitei Angelina.
— Como você está? — Peguei sua mão.
Ela sorriu, o sorriso deslumbrante que há alguns dias eu não via.
Iluminava toda minha vida e minha alma
— Ele acordou, Ryan — falou, eufórica.
— Oh, Anjo, estou tão feliz com isso. — Abracei-a e beijei sua cabeça.
— Eu também, sinto vontade de gritar.
Eu ri.
— Bom, os gritos vão ter de esperar, já que estamos em um hospital.
Agora vamos lá ver nosso garoto.
Capítulo 16
Alma partida

ANGELINA
Os três meses que passaram foram os melhores de minha vida em todos
os sentidos, tudo estava em seu devido lugar. Shane se recuperou bem da
operação que fez em outubro. Brincava normal, claro, comigo não o
deixando extrapolar para não correr o risco de dar um problema na cirurgia.
Seguia à risca a recomendação do médico para ele ficar curado logo.
O baile que Sam organizaria (uma vez que o Ryan perdeu a aposta) foi
adiado, porque ela estava grávida de sete meses e sentindo algumas dores,
então o médico recomendou repouso absoluto. Lucky não a deixava fazer
nada. Certo ele, com uma gravidez assim não se brinca.
Em dezembro, Ryan me levou ao Times Square em Nova York. Quando
eu disse que morava no Bronx há cinco anos e não conhecia aquele lugar, ele
não pensou duas vezes. Não revelei a ele o porquê de nunca ter ido lá antes:
achava que era frequentado só por pessoas finas e ricas, todavia, estava
redondamente enganada. Amei sair em um encontro com ele.
Olhei para o homem deslumbrante ao meu lado. Ele estava vestido com
jeans escuro, camisa preta e uma blusa de lã por cima, por causa do frio. Eu
usava calça jeans, blusa grossa, um casaco marrom para me aquecer e botas
de caubói que Ryan comprou para mim. A temperatura não atrapalhou nosso
passeio.
— Ryan Donovan em um encontro? — Sorri ao chegarmos ao
Rockefeller Center. Ele me levou para ver o pôr do sol do terraço.
Apaixonei-me pela vista, mesmo que, nesse dia, não houvesse um sol
aparente se pondo no horizonte. As nuvens estavam carregadas no céu,
prenunciando a chuva. Talvez nevasse na virada do ano, dali a algumas
semanas.
Ele riu, me apertando em seus braços.
— Mais uma coisa que vai para a lista de primeiras vezes com você. —
Beijou meu rosto. — Terei muito mais para colocar, estamos apenas
começando.
Aquele dia foi um dos mais lindos da minha vida. Após o terraço,
patinamos no gelo. Ele não queria ir, porque não sabia como; felizmente,
cedeu ao meu pedido.
— O que não faço por você? — falou ao entrarmos no centro de
patinação, próximo ao Times Square.
— Por isso amo você — declarei, sorrindo de lado. — Prometo que, ao
chegar em casa, o recompensarei.
Fitou-me com desejo.
— Oh, querida! Estou contando com isso.
Sacudi a cabeça, ainda sorrindo. Nós colocamos os patins e fomos para
a pista de gelo. Deu um passo e já ia caindo, mas segurei suas mãos e fiquei
de frente para ele.
— Droga, Anjo, não sei andar nesta merda!
— Não é difícil, é como aprender a andar de bicicleta. Feche mais as
pernas — pedi. Ele acatou. — Darei um passo para trás e você me segue,
ok?
— Vou parecer uma maricas — reclamou, observando ao redor para
ver se alguém estava olhando.
— Sei, com toda a certeza, que você não é uma maricas — sussurrei,
sedutora. — Talvez eu tenha de refrescar sua memória. — Também conferi
se ninguém estava perto, mas os demais patinadores se encontravam a uma
distância considerável. Sorri, devassa. — Não foi na minha boca que gozou
logo cedo?
Ele piscou e me puxou para os seus braços, todavia, foi rápido demais,
caindo de costas no gelo, e eu por cima dele. Gemeu com a pancada no chão
e meu peso, mas seus braços continuavam firmes em minha cintura.
— Esqueci os malditos patins — rosnou, ofegante. — Você está bem?
Eu sorri.
— Perfeitamente bem. Na próxima vez que estiver de patins, seria
interessante lembrar de não puxar as pessoas bruscamente.
Ele riu.
— Oh, caralho, se vou usar esta merda de novo! — Beijou a ponta do
meu nariz. — Você é a culpada por falar assim comigo enquanto estamos
cercados de gente.
— O quê? Não gostou de eu dizer que amo seu pau na minha boca ou
que você me perverteu? — Mordi meus lábios.
— Maldição — praguejou. — Vamos embora agora, porque mesmo
com minhas bolas congelando neste frio, eu as quero enterradas em você.
Meu corpo tremeu, querendo ele também, desejando-o tanto que
chegava a doer. Eu me levantei e o ajudei a se erguer para irmos aproveitar
cada momento que esse homem tinha a oferecer a mim.
Já era quase dez da noite quando saímos do Times Square. Mal
aguentava esperar chegarmos em casa, estava faminta demais por ele.
Como o aquecedor estava ligado, não morreria de frio quando tirasse a
roupa. As janelas do carro eram escuras, então quem surgisse do lado de
fora do estacionamento da loja não nos veria. Ryan saiu e foi comprar algo
que o Jordan pediu. Ele ficou confuso quando eu disse que ia esperá-lo no
carro, mas não falou nada. Eu precisava tirar minhas roupas.
Estava no Mitsubishi L2OO Triton dele — o carro era lindo, devo
dizer. Meu homem gostava de colecionar máquinas velozes. Já eu, não
entendia nada delas. Continuava usando seu Volvo para ir ao serviço; era o
mais simples no meio de seus sete automóveis, que incluíam: Porsche,
Ferrari, Maserati, Range Rover e, por fim, o Bugatti, um dos meus favoritos,
pois remetia a lembranças da primeira vez que ficamos juntos. Agora seria
do Mitsubishi que teria recordações.
Ao entrar no banco de trás, ignorando que eu estivesse em um
estacionamento, já fui tirando as roupas: calcinha, sutiã, calça e blusa, deixei
apenas o casaco comigo, que ia na altura dos joelhos. Sentei-me e esperei
por ele.
— Anjo... — interrompeu-se, entrando no carro e vendo que eu estava
no banco traseiro. — O que faz aí?
Não respondi, apenas abri o jaleco e mostrei a ele o que o casaco
escondia.
— Porra, Anjo — praguejou e olhou ao redor, vendo se avistava
alguém. Rosnou e saiu do carro, abriu a porta de trás e entrou, me puxando
para os seus braços, devorando a minha boca. — Não consegue esperar até
chegar em casa? Minha mulher está faminta? — sibilou na minha boca. Sua
mão direita foi para o meio das minhas pernas. — Droga, encharcada.
— Você me faz assim, quente e molhada. — Mordisquei seus lábios.
— Merda, querida, vamos ter de ser rápidos aqui, a loja fecha em meia
hora. — Ele me afastou um pouco e tirou seu pau duro e gostoso para fora de
sua calça. — Droga, não tenho preservativos comigo. — Olhou-me de lado.
— Quer arriscar?
Evitei um suspiro, porque já era tarde demais para me prevenir. Ainda
não fizera o exame, mas tinha certeza de que eu estava grávida, algo em que
não queria pensar.
Não disse nada, apenas montei nele e desfrutei do paraíso.
— Cavalgue em mim — ordenou, tirando meu casaco e abocanhando
meus seios. Passava de um a outro, sugando, mordendo, lambendo-os. Suas
mãos estavam em meus quadris, apertando-os, me ajudando a cavalgar. —
Apertada demais, porra.
Puxei seus cabelos, querendo ver seu rosto e beijar sua boca. Meu
corpo tremia pelo êxtase. Sabia que não demoraria muito a gozar. Levei
meus lábios aos seus e devorei, faminta, sua boca com gosto do whisky que
tínhamos tomado no restaurante; bebi somente um gole, por suspeitar da
gravidez. Esses beijos eram o meu alimento, a minha vitamina, o meu tudo.
Ele não falou enquanto transávamos, ou melhor, fazíamos amor — dizia
que todo sexo comigo era fazer amor. Achei incomum ele ficar calado
durante a transa; pensei que fosse porque alguém poderia nos ouvir ali. Só
depois que terminamos, enquanto estávamos ofegantes, indagou:
— Por que você fica tensa sempre que o assunto é gravidez? — sondou,
olhando nos meus olhos.
Eu suspirei.
— Quero tudo com você, Ryan. — Coloquei minha cabeça em seu
ombro. — Eu o amo.
— Também a amo, Anjo, tanto que às vezes não consigo nem mensurar.
Não foi a primeira conversa que tivemos sobre filhos. Sempre que
tocávamos no assunto, ele ficava pensativo e me avaliava. Decerto achava
que não queria filhos com ele; não era verdade. Desejava tudo com ele,
porém, não podia. Estava sendo covarde por não contar a verdade; precisava
revelá-la, e logo.
O meu livro seria lançado no próximo mês. Sentia-me feliz pelo meu
sonho realizado. Um dos sonhos... Agora só faltaria eu me casar com meu
lindo namorado, o homem mais perfeito do mundo para mim.
No meio do êxtase, vivendo com meu Ryan, uma coisa estava me
incomodando e me fazendo perder o sono à noite: a menstruação atrasada há
três meses. Esta era a minha preocupação, porque ela nunca atrasou nem um
dia. Sempre fui daquelas mulheres bem reguladas. Sentia um frio na espinha,
porque sabia o que isso significava: eu estava grávida. Aquela nossa
primeira vez teve uma consequência, porque ele não usou preservativo,
querendo me engravidar. Pelo visto, conseguiu.

Quando recebi o resultado do exame, tudo em mim se desfez, minha


alma se partiu. Teria de contar ao Ryan a verdade.
Encarava a folha onde se lia “positivo”. O médico, ao ver minha
expressão de horror, me deu um panfleto de uma clínica de abortos. Poderia
xingá-lo por me oferecer isso, mas minha mente estava entorpecida e
dormente. Jamais acabaria com algo tão valioso. Nunca tiraria a vida do meu
filho. Logo, ao saber que aquele ser pequeno estava dentro de mim, tudo
mudou. De repente, me enchi de júbilo e êxtase. Já não me importava que
minha vida estivesse em risco. Apenas queria esse ser precioso a salvo,
como nunca quis nada na minha vida. Até mais do que o pai dele.
Uma semana após receber o resultado do exame, contaria ao Ryan toda
a verdade sobre mim e nosso bebezinho. Era tarde demais, mas ele tinha de
saber do risco que eu correria no momento do parto. Esperava que ficasse ao
meu lado até o fim, porque sua força e amor me dariam mais estímulo para
lutar pela vida e continuar em frente, até o último segundo.
O dia havia chegado. Pedi à Sam para deixar meus irmãozinhos em sua
casa, assim conversaria mais à vontade com Ryan. Seria bem difícil, quase
impossível evitar que ele sofresse. Eu também sofreria; aliás, já estava.
Encontrava-me um caco pelas lágrimas que ele derramaria — hoje, amanhã,
até o dia em que nosso bebê nascesse, se eu sobrevivesse.
Em muitas situações que enfrentei em minha vida, não tive fé. Agora,
precisava usar a minha fé se eu quisesse viver e fazer o homem que eu
amava feliz.
Entrei no apartamento do Ryan, após deixar meus irmãos na casa da
Sam. Correção: nosso apartamento, foi isso que disse a partir do momento
em que eu fui morar com ele, levando Shane e Lira.
Ryan estava em pé no meio da sala, com a expressão sombria, fria e
também com raiva. Eu já tinha visto ele com raiva, sim. O pior dia foi
quando eu duvidei dele. Sua expressão naquela ocasião estava igual à de
agora.
— Que porra isto significa? — Esbravejou, levantando um papel na
mão.
Reconheci o exame de gravidez que fizera há oito dias, antes de ele ir
para o desfile na Califórnia. Eu já deveria ter lhe contado... Seria por isso a
sua ira?
— Eu posso explicar... — comecei, mas fui interrompida.
— Explicar? Diga como pode explicar isto? Este exame foi feito antes
de eu ir para a Califórnia, por que não me contou?
— Não queria trazer problemas para a sua viagem...
— Problemas? — gritou. — Estava louco para ser pai, e você sabia
disso. — Expirou, tentando se controlar.
— Eu sei, é por isso que eu não disse nada. — Meus olhos já estavam
molhados vendo a dor nos dele, e isto era só a ponta do iceberg. O que eu
revelaria a seguir o destruiria.
— “Eu sei”... — Ele riu, sem vida. — Pensou em abortá-lo?
Levantei a cabeça subitamente.
— O quê? — Minha voz saiu aguda. Ele ficou louco? Eu nunca faria
isso.
Levantou o folheto da clínica de aborto para mim. Devo ter guardado
por engano quando peguei o exame do médico. Sabia o que ele estava
pensando.
— Você estava tentando abortar o nosso bebê? — Sua dor era tanta que
eu me encolhi, como se tivesse levado um tiro no peito. Acho que doeria
menos.
— O quê? Não...
— Então como explica esta merda, Angelina? — Abanou o folheto da
clínica na mão. — Você não me contou que estava grávida, e além disso,
achei este panfleto de uma maldita clínica de aborto.
— O médico viu minha expressão... e deve ter pensando que eu não o
queria... então me entregou o folheto. Eu devo ter pegado ele junto com os
exames sem saber.
Seus olhos ficaram escuros.
— Sua expressão estava aterrorizada? Tudo porque não queria ter um
filho meu? — lamentou.
Eu explodi, me rasgando por dentro, assim como ele seria rasgado tão
logo eu terminasse de falar.
— Não posso ter filhos — disse, chorosa. — Eu nasci com um
problema no coração, quase igual ao do Shane, mas o meu é mais grave.
Tenho cardiopatia. Meu coração bate mais lento do que o das outras pessoas,
por isso tomo remédios. Não sobreviveria até o final da gestação. Era por
isso que eu estava com medo. — Fitei sua face repleta de angústia e outras
emoções que me matavam aos poucos. — Assim como estou vendo agora o
terror em seus olhos...
Os papéis em suas mãos caíram no chão; aparentava não ter mais força
para segurá-los. Ele parecia não estar respirando, o ar lhe fugia. Olhava de
meu rosto para a minha barriga, talvez se perguntando qual de nós dois era
mais importante para ele. Orava para que fosse nosso filho, e não eu.
Sacudiu a cabeça várias vezes, tentando acordar de seu pesadelo
pessoal. Meu coração estava sangrando tanto que achei que morreria ali.
— Ryan, vai ficar tudo bem, conseguirei ter nosso filho e viver —
tranquilizava-o.
Mirava-me com sua expressão sem vida.
— Vamos para a clínica de aborto — disse com a voz morta.
O ar saiu dos meus pulmões ao pensar em suas palavras... Com certeza
ouvi errado.
— Repita?
— Vamos tirar isso. — Apontou para a minha barriga, assustado. —
Não vou deixar você morrer...
Mal sabia ele que eu já estava morrendo ao ouvi-lo se referir deste
modo ao nosso pequeno anjo. O que mudou sua mente? Oh, não! Não me
livraria do meu ser precioso, jamais.
Minhas mãos foram à minha barriga, num gesto inútil para protegê-lo de
todos, até do seu pai. Levantei o rosto, ignorando as lágrimas que escorriam
por minha bochecha.
— Não vou abortá-lo — declarei com a voz mais firme que consegui.
Encarava-me como se eu tivesse perdido minha cabeça.
— O quê? Não pode continuar com esta gravidez — soltou a última
palavra com asco. — Ele vai matar você.
— Vou lutar pela vida, mas se não conseguir — respirei fundo —, ele
terá você.
Parecia me achar louca.
— Nunca vou aceitar algo que a matou.
Engoli em seco com sua frieza.
— Ele é parte de você também — sussurrei com dor na alma por sua
incompreensão. Entendia que ele estava sofrendo ao descobrir acerca do
risco que correrei, todavia, não pensei que me mandaria abortar nosso
bebezinho. Foi como se ele tivesse enfiado as duas mãos em meu peito e
rasgado meu coração.
— Não, você é parte de mim, se ele a machucar... — Sua voz
estremeceu ao dizer isso. — Eu não posso... Simplesmente não posso. Se
você me ama, vai tirá-lo...
— O quê? Posso amar você com a minha vida, porém, não farei isso —
resfoleguei. — Não sou capaz de assassinar meu filho, um ser pequenino que
não tem como se proteger. A única pessoa que pode garantir sua segurança
sou eu. Se me fizer escolher entre os dois, por mais que eu ame você,
perderá para ele. Sempre.
— Ele vai matá-la! — gritou.
— Eu não me importo! — rebati. — Ele é parte sua também, como eu
poderia fazer algo assim? Seria o mesmo que levantar uma arma e atirar em
você. Eu já o amo, Ryan, e é tão forte quanto o que nós sentimos um pelo
outro. Se eu tiver de morrer para trazê-lo ao mundo, que assim seja.
Ryan deu dois passos para trás, estupefato.
— Você não pode querer algo que a ferirá. — Sua voz era quebradiça
como vidro. — Precisamos tirá-lo.
Interrompi-o, em choque.
— Ele é seu filho, seu bastardo, devia pensar nele, não em mim! Não na
dor que sentirá caso eu não sobreviva. Lute por ele, fique ao meu lado, não
me obrigue a destruir este ser precioso.
— Não posso — repetiu. Levava as mãos à cabeça, parecendo
pretender arrancar os cabelos. — Porra, porra, porra... — Pegou as chaves
do carro na mesinha e foi em direção à porta.
— Onde você vai? — perguntei, logo atrás dele.
Ryan parou com a mão na maçaneta e não se virou, matando o que
restava da minha alma quebrada.
— Encontrarei um jeito de tirar essa coisa... Antes que ela a mate. —
Bateu a porta com tanta força que o trinco tremeu.
Meus joelhos ficaram fracos e cederam. Era a pior dor de toda a minha
vida. Com sua partida, fui rasgada irrevogavelmente. Lá fora, era dia, mas
meu interior escurecera, se tornando um buraco, um vácuo nas profundezas
da terra.
Sabia o que eu precisava fazer. Não queria... Tomar tal atitude acabaria
comigo, contudo, não tive escolha. Não podia me livrar do meu filho, isto
nunca aconteceria. Ele já era o meu mundo inteiro, assim como seu pai, que
agora estava procurando um jeito de matá-lo.
Peguei o celular e liguei para a única pessoa capaz de me auxiliar a
protegê-lo.
— Angelina? — Atendeu na segunda chamada.
— Tabitta, eu preciso de sua ajuda.
Capítulo 17
Quebrado

RYAN
Fui para o meu desfile na Califórnia, e tentei levar Angelina comigo,
mas ela não quis, disse que tinha de trabalhar. Isso era algo que teria de
contar a ela quando chegasse em casa, sobre ela ser a dona da editora, e não
o Daniel. Afinal, ele precisava deixar a editora para se lançar de cabeça em
seu sonho de ser um piloto de corrida.
Ainda bem que o meu último dia na Califórnia passou. Eu gostava de
trabalhar, claro, mas nesse desfile não estava com a cabeça no lugar, e sim
com a mente a quase dois mil quilômetros de distância, pensando na minha
linda mulher.
O desfile foi um sucesso, ainda mais lançando os vestidos da Angelina.
Assinei contrato com várias redes de lojas, tanto daqui dos Estados Unidos,
como do Japão e da Alemanha. Estava feliz com isso, mas ficaria mais
contente quando chegasse em casa e finalmente pudesse estar junto da minha
mulher, que ficou me aguardando. Desejava que ela tivesse uma boa notícia.
Há três meses andava ansioso porque a menstruação da Angelina não
desceu, então contava os dias nos dedos e torcia para ela estar esperando o
nosso pequeno anjinho.
Eu tinha um desejo forte de um dia ser pai, mas nunca aparecera a
mulher certa para concretizar este plano, até que o ser mais lindo do mundo
surgiu na minha vida, me fazendo cair de joelhos.
Quando me mudei para o meu apartamento — que agora era o nosso
apartamento —, chamei-a para ir morar comigo, mas ela arrumou um monte
de desculpas: “Meus irmãos estão numa escola do Bronx e não podem mudar
de colégio agora”, como esta e várias outras. Eu a convenci com meus dedos
dentro dela, uma arma não muito justa de usar, mas, porra, adorava vê-la
gritando, dizendo que faria tudo que eu pedisse.
Estava louco para vê-la, ainda mais depois de passar cinco dias fora,
sem seus toques, sem seus beijos. Esses dias foram os mais longos da minha
vida, isso porque não tinha minha namorada comigo.
Quando retornei, olhei todos os quartos à sua procura, e não a avistei.
Logo senti um aperto no peito, mas depois pensei: “Ela deve ter ido na
Sam”. Isso sempre acontecia comigo. Sabe quando você vive algo tão bom e
maravilhoso que custa a acreditar ser real? Eu me sentia assim com ela, que
era tudo de mais precioso para mim. Então, às vezes, tinha medo dela
desaparecer como num passe de mágica.
Eu ia ligar para Angelina assim que guardasse o anel de diamante
amarelo, com a pedra na forma de uma estrela e a palavra “anjo” dentro.
Mandei o joalheiro fazer assim porque são símbolos importantes para nós
dois: o anjo a representa para mim, e a estrela representa a mim para ela.
Meu peito inchou quando me lembrei dela dizendo que eu era a sua estrela
de mil pontas, pois tinha vários motivos para me amar. Eu só não conseguia
imaginar quais eram eles. Considerava-me um bastardo sortudo por aquela
mulher me querer, e pretendia pedi-la em casamento hoje.
Guardei o anel para mais tarde. Tive de esperar três meses para a nossa
casa ficar pronta, para então, assim, pedir sua mão. O dia mais esperado, o
dia com que tanto sonhei, chegara.
Escondi a caixinha azul com o diamante de dezoito quilates e já estava
fechando a gaveta quando avistei papéis de exames. Podia apostar que era a
ultrassonografia do nosso pequeno anjo. Eu sentia meu peito bater forte,
como se quisesse sair pela boca. Tinha certeza de que ali estava o que eu
tanto queria.
Assim que abri, li “POSITIVO”. O nosso bebezinho se encontrava
dentro dela, tão pequeno e indefeso, e eu já queria protegê-lo para sempre.
Antes de deixar a felicidade me dominar por completo — a ponto de gritar
feito louco —, enxerguei duas coisas que fizeram meu corpo congelar e
minha alma sangrar. Se alguém enfiasse as mãos em meu peito usando garras
no meu coração para esmagá-lo, acho que doeria menos. Não podia acreditar
no que estava vendo.
A data do resultado dos exames era de antes de eu ir para a Califórnia.
Então ela já sabia que estava grávida e não me dissera nada? Deixou-me
aflito esse tempo todo, sonhando e rezando para ela estar esperando nosso
filho? Eu desejava tanto ter logo meu pequenino em meus braços, e que ele
fosse parecido com Angelina. Por que escondera a informação? Por qual
razão faria isso comigo?
Um tremor se apossou do meu corpo ao ver um panfleto de uma clínica
para abortos. Não! Ela não podia fazer isso... Não a mulher que eu conhecia
e amava. Daria sua vida pelos seus irmãos e por mim, então como não
aceitaria nosso fruto, que fizemos com todo nosso amor? Deveria haver outra
explicação para toda esta porcaria. A partir do momento em que a conheci,
ela se tornou a razão da minha existência, assim como o nosso filho que
estava dentro dela.
Fui para a sala ainda tonto com tudo que descobri, iria atrás dela para
confrontá-la e buscar explicação para essa merda. Respirei fundo, tentando
controlar minha ira.
Estaquei ao vê-la entrar pela porta e me fitar com seus olhos negros
marejados. Acho que tinha algo a me dizer, porque seu rosto estava sério e
úmido. Eu seria capaz de matar e morrer por essa mulher. Por que fez isso
comigo? Antes que Angie falasse algo, esbravejei:
— Que porra isto significa?
Observou a minha mão, que carregava o exame, e arregalou os olhos.
Enxerguei arrependimento ali, não obstante, isto não atenuou a minha raiva.
— Eu posso explicar... — Sua voz tremeu, mas eu estava irado demais
para me preocupar com isso agora.
— Explicar? Diga como pode explicar isto? — Sacudi o resultado na
mão. — Este exame foi feito antes de eu ir para a Califórnia, por que não me
contou?
Encolheu-se diante da minha raiva.
— Não queria trazer problemas para a sua viagem.
Angelina endoidou? Caralho! Eu precisava me controlar ou perderia o
resto da minha fodida mente.
— Problemas? — rugi. — Estava louco para ser pai, e você sabia
disso. — Expirei, tentando me controlar com várias golfadas de ar.
Seu belo rosto já estava molhado e sofrido. Quis abraçá-la e beijar suas
lágrimas, secá-las com minhas carícias, dizer que tudo ficaria bem e não era
necessário chorar. Todavia, a vontade de descobrir a verdade foi maior.
— Eu sei, é por isso que eu não disse nada. — Mordeu os lábios,
controlando o choro.
Estreitei meus olhos.
— “Eu sei”... — Ri com amargura. Tudo em mim parecia estar morto
ou morrendo aos poucos. Nosso futuro dependeria do que ela responderia:
— Pensou em abortá-lo?
Maneou a cabeça para trás num rompante e me encarou como se eu
fosse louco. Meu coração se encheu de esperança, querendo que não
passasse de um engano, que houvesse outra explicação para essa porra.
— O quê? — quase gritou.
Mostrei o panfleto que achei no meio do exame, sobre a maldita clínica
de aborto. Nem li o nome do lugar, pois a palavra “aborto” me cegou na
hora. Seus olhos ficaram maiores do que antes.
— Você estava tentando abortar o nosso bebê? — A dor que eu sentia
saiu bem visível na minha voz, afinal, já dominara o meu corpo.
Angelina deu um passo para trás, como se eu tivesse batido nela. Pela
dor em seus olhos, acho que machucaria menos se eu tivesse feito isso.
Ambos sofriam.
— O quê? Não... — Aparentava sentir-se traída, sem motivo: fora eu o
enganado.
— Então como explica esta merda, Angelina? — Amassei o folheto. —
Você não me contou que estava grávida e, além disso, achei este panfleto de
uma maldita clínica de aborto.
Apertava suas mãos pequenas na lateral do corpo, num gesto nervoso.
— O médico viu minha expressão... deve ter pensado que eu não o
queria... então me entregou o folheto. — Sua voz falhou. Por que reagira
assim ao nosso filho? Sempre foi tão pura e doce, eu mal acreditava no que
via e ouvia. — Eu devo ter pegado ele junto com o exame sem saber.
Meus olhos ficaram sombrios, mas evitei a dor que estava ali me
comendo vivo, pois se sua expressão era tão ruim a ponto do médico lhe
entregar o folheto de uma maldita clínica só para ela tirar nosso bebê...
Então ela realmente não o queria? O fruto do nosso amor?
— Sua expressão estava aterrorizada? Tudo porque não queria ter um
filho meu? — pretendia urrar, mas saiu um lamento.
Lembrei desses três meses de ansiedade e euforia, aguardando a notícia
de que estava grávida. Quando eu mencionava isso, Angelina ficava distante,
até mesmo com um olhar entorpecido. Pensei estar vendo coisas; agora
compreendia a razão por trás do seu distanciamento. Ela não o queria, não
como eu.
E assim, num grito de dor, revelou algo que não só desmoronou minha
vida, mas também a minha alma. Creio que morri ali.
— Não posso ter filhos. Eu nasci com um problema no coração, quase
igual ao do Shane, mas o meu é mais grave. Tenho cardiopatia. Meu coração
bate mais lento do que o das outras pessoas, por isso tomo remédios. Não
sobreviveria até o final da gestação. — Tomou fôlego sem nunca tirar os
olhos de mim, petrificado. — Era por isso que eu estava com medo...
A bomba foi tão grande que perdi todo o ar dos meus pulmões. Entrei
em pânico.
— Assim como estou vendo agora o terror em seus olhos... — disse-me
ela.
Sim, estava tomado de pavor. Tudo me consumiu, me matando por
dentro tal qual uma maldita erva daninha. Teria de escolher entre as duas
coisas mais importantes da minha vida: ela ou o nosso bebê! Se Angelina
ficasse com ele... eu perderia tudo. Se ela não conseguisse... seria o fim da
minha existência.
Nunca quis entregar meu coração a alguém por causa de cenários
similares a este, em que corria o risco de um dia perdê-la, como aconteceu
com os meus pais. Era a pessoa mais valiosa do meu mundo inteiro, a única
que me enchia de júbilo, paz, alegria, amor. Meu céu, minha estrela, meu sol,
minha lua e todo o maldito universo. Sem Angelina, não resistiria... Não
mesmo.
Queria brigar com ela por não ter me dito logo de cara a verdade. Se
tivesse me contado, não estaríamos nesta situação. Eu não a teria
engravidado e também não precisaria escolher entre os dois — isso se ela
conseguisse chegar até o ponto de nosso anjinho nascer.
Porra! O que faria? Desejava nosso filho, no entanto, não aceitaria
perdê-la. Sacudi a cabeça várias vezes tentando sair desse pesadelo em que
me encontrava. Como pode uma pessoa estar em êxtase em um segundo, e no
outro o mundo desmoronar sobre si, deixando-a no mais completo tormento?
Os meses em que nós dois estivemos juntos foram uns dos melhores da
minha vida...
Em retrospectiva, quando saí desgovernado do meu apartamento, sem
chão, e disse aquelas coisas a respeito dela tirar nosso bebê, quis bater na
minha cara. Fui egoísta, sim. Era um filho da puta por tê-la deixado sozinha
para lidar com tudo. Angelina também está sofrendo: por ela, por mim e
pelas palavras feias que proferi.
Fui para a nossa casa, a que comprei para ela, para morarmos juntos
após o casamento, que era para ser dali a um mês. Será que tudo viraria pó?
A vida que sonhávamos juntos ainda existiria? Eu seria forte o bastante para
vê-la moribunda? Não, eu não permitiria que nada acontecesse a ela.
Observei nossa casa com paredes cor de areia, de dois andares.
Angelina gostava de janelas largas de vidro, para dar claridade ao ambiente,
então pedi ao engenheiro para fazer assim. Também havia uma varanda que
ladeava toda a residência, com uma bela vista para onde o sol se punha no
fim de tarde. Notei que ela adorava vê-lo, porque sempre que o sol estava se
pondo, ia para a janela da cozinha do apartamento.
Pensava em como seríamos felizes ali, juntos: Lira, Shane e o nosso
anjinho. O mesmo anjinho que eu disse para ela tirar... Oh, Deus! O que eu
fiz? Por que eu falei aquilo para Angie? Imploraria por seu perdão, nem que
fosse de joelhos.
Meu coração sangrava pelo risco que ela correria estando grávida, e,
paradoxalmente, se acelerava de felicidade por saber que carregava meu
filho. Faria tudo que ela quisesse neste mundo. Ficaria ao seu lado,
independente do que acontecesse... Seria forte por ela. Como lhe disse uma
vez, se ela chorasse, secaria suas lágrimas; se sofresse, removeria sua dor.
Voltei para o apartamento, já mais calmo, louco para abraçá-la, beijá-
la, garantir que tudo ficaria bem e que eu a amava com toda a minha alma,
que não sairia do seu lado. Ao chegar, por volta das cinco da tarde, a casa
estava em completo silêncio. Um gelo desceu pelo meu corpo. Não, ela não
iria embora assim, não me deixaria, a despeito de eu merecer isto, depois de
tudo que disse... Não podia viver sem ela.
Corri, procurando em cada canto da casa, por último em nosso quarto.
— Anjo! — chamei. Como respostava, objetive o silêncio pétreo. Abri
o armário e suas roupas não estavam mais lá.
“Não, não, não, não...”, pensei, desesperado, com minha visão
turvando. Não sei bem o que houve depois do meu mundo cair sobre mim.
Apenas ouvia a voz alterada do Lucky, e outras que não identifiquei. Tudo
em mim estava dormente e sem vida, ela me matou ao partir.
— Meu Deus! Ryan, o que houve? — rugia meu irmão.
Não respondi; sinceramente, não ligava para o caos no meu
apartamento. Parecia que um furacão passara por ali e destruíra tudo. Os
sofás jogados pelos cantos, as mesas reviradas, a televisão quebrada com
milhões de cacos de vidro espalhados por todo o chão...
Estava de joelhos perto de um espelho quebrado, bem onde fizemos
amor antes de eu ir para a Califórnia. Onde a fiz enxergar sua beleza na
tentativa de acabar com a insegurança que a acometia cada vez que eu
viajava. Fizemos amor, e mostrei à Angelina a mulher magnífica e linda que
era. Somente ela existia na minha vida, ninguém mais.

Sabia que ela estava insegura por eu ir para a Califórnia. Ela sempre
ficava assim quando eu viajava para os desfiles de minha empresa. Nós
estávamos sozinhos em casa. Shane e Lira foram para a Sam, brincar com
Shaw. Aproveitei para desfrutar da minha mulher.
— Venha aqui. — Puxei-a para a frente do espelho da sala.
Arregalou os olhos.
— O que vai fazer?
— Mostrar a beleza de mulher que você é. Mostrar que somente você
faz isso comigo. — Fiquei atrás dela e imprensei meu pau na sua bunda.
Angie engoliu em seco e fechou as pálpebras. — Abra os olhos e veja a obra
divina diante deste espelho.
Seu corpo nu refletido ali me matava de prazer. As íris vidradas
estavam presas às minhas.
— Observe a minha mão acariciando seu clitóris, este broto rosado e
suculento que é meu alimento. Agora abra mais as pernas para eu colocar
meus dedos dentro desta boceta deliciosa.
Fez o que eu mandei, ofegante. Com a minha mão direita, enfiei dois
dedos dentro dela, e com a esquerda, amassei seus mamilos saborosos. Sua
pele tremia, ela não demoraria a gozar de novo. Nós já tínhamos ficado no
quarto, ou melhor, jogamos lá. Fiquei feliz por gostar das brincadeiras
comigo. Tudo que pedia, Angie fazia. Adorava isto.
— Por que você fica insegura sempre que vou para a agência ou viajar
a trabalho? — Mexi meus dedos dentro dela; com o polegar, acariciei seu
clitóris.
Ela piscou com os olhos bêbados e me encarou. Depois, desviou o
rosto. Eu interrompi o movimento. Angelina choramingou.
— Preste atenção em mim, ou não vai receber meus dedos e meu pau —
rosnei. — Quero a resposta.
Respirou fundo.
— Porque elas são lindas, e você já ficou com todas... — Sua voz
falhou.
Suspirei.
— Para deixar bem claro: não fiquei com todas as minhas modelos.
Aquelas com quem mantive relações e que estão comigo ainda, são hoje
casadas ou têm namorados. As outras não trabalham mais para mim. — Tirei
a mão do seu peito e toquei seu rosto lindo.
Ficou surpresa.
— Não há nenhuma modelo com quem já tenha ficado que ainda
trabalhe para você e esteja solteira?
Estreitei meus olhos.
— Por que duvida de mim? Não acredita quando digo que só você
importa? — sibilei, um tanto irritado.
Mordeu os lábios.
— É que elas são tão perfeitas... Às vezes, acho que não sou mulher
suficiente para você...
Ela era louca? De onde saiu isso? Quando enxergaria que era
maravilhosa?
— Olhe para essa mulher no espelho e diga o que você vê nela —
ordenei. Engoliu em seco, todavia, obedeceu. — Descreva-a.
Ela suspirou.
— Pele branca, bronzeada. Olhos negros como a noite, que brilham
como a lua sempre que ela olha para você. — Fitou-me e continuou: —
Cabelos pretos anelados, caindo em cascata nas costas. Boca voluptuosa em
forma de coração. Corpo...
Hesitou, notei que ela não gostava de algo nele, e eu queria saber o que
era, porque via Angelina como uma maldita obra de arte.
— Continue.
— Corpo curvilíneo, barriga lisa com uma borboleta azul tatuada na
virilha... Seios... Eles são pequenos.
— Você não gosta do tamanho?
— Eu... — titubeou.
— Responda, você realmente não gosta deles?
Ela pigarreou.
— Todas as mulheres com quem você ficava tinham os peitos grandes...
Diferente de mim...
Eu a interrompi.
— E estou com elas agora? Fiquei mais de uma vez com alguma delas?
Engoliu em seco.
— Não...
— Com quem eu estou agora, Anjo? Por qual mulher meu pau fica
duro? Qual devoro todas as noites? Qual nome grito quando gozo em sua
boca ou dentro dela? Para qual fiz uma tatuagem em meu peito? Hein, Anjo?
Para quem digo, todas as manhãs, que é a minha luz, o meu milagre, a razão
de eu existir neste mundo? — Mirava-me com seus olhos como os de uma
coruja. Prossegui, ignorando a dúvida em sua face. — Quem é essa mulher
que tem a porra de um corpo esculpido que me faz gozar sempre? Quem?
— Eu...
— Sim, você, porra! — grunhi com os dentes cerrados. — Então não
tenha ideias que não existem, porque a única que eu quero é esta aqui,
refletida no espelho. A linda morena gostosa em quem sou viciado, na sua
boca, nos seus seios que adoro saborear, na sua boceta, em toda você. —
Voltei a mexer meus dedos dentro dela. — Olhe para a única mulher que meu
pau e eu queremos, e me diga: ela não é linda?
Observava a si mesma, contudo, estava tão bêbada de desejo que
provavelmente mal conseguia se ver direito.
— Eu quero ouvir sua voz.
— Sim, ela é linda, e você a ama. — Seus olhos encontraram os meus.
Neles, havia tanto amor, tanta admiração; eu era seu maldito mundo.
— Sim, com toda a porra da minha alma. Ponha as duas mãos no vidro
do espelho e veja a mulher que eu amo. — Retirei meus dedos dela, o que a
fez choramingar. Peguei seu quadril por trás e segurei-o, vendo sua bunda
gostosa. — Firme-se no espelho e empine essa sua bundinha linda para trás.
Ela ofegou e fez o que eu pedi. Sabia no que pensava, que eu usaria sua
bundinha hoje. Porém, Angelina não estava pronta. Talvez um dia a teria de
todos os ângulos.
— Mente suja. — Dei um tapa em sua bunda. — Um dia a possuirei,
mas não hoje.
— Oh... — gemeu assim que entrei dentro dela, saboreando a sensação
de sua vagina apertada.
— Quem eu estou comendo agora? — rosnei.
— Eu... — gritou.
— Sim, você, Anjo. A única que vou foder, saborear, comer e com
quem farei amor até os últimos dias da minha vida — ofegava falando com
ela enquanto estocava. Mordisquei sua orelha ao gozar dentro dela, gritando
seu nome com adoração.

Sentia dor em minha mão, talvez houvesse cacos de vidro nela. Não me
importei, porque dor maior eu vivenciava por todo o meu corpo. Pulsava
cada vez que eu respirava, por ela ter ido embora, me deixando quebrado e
destruído, aliás, morto.

Durante três meses, vivi em um completo tormento sem a Anjo. A


primeira semana após ela sumir foi insuportável. Eu apenas ficava em nossa
casa — falo “nossa” porque sempre pertencerá a ela, não interessa onde
estiver. Ali viveríamos e seríamos felizes... Não mais...
Olhava a cama California king, a qual não chegou a usar. Quantas
vezes sonhei com isso, em possuí-la ali de todas as formas possíveis. Agora,
restava o vazio, a perda e o sofrimento. A dor me apossou tanto que eu só
bebia dia e noite, até cair em um torpor, sem me preocupar com nada, muito
menos comigo, que poderia correr o risco de morrer alcoolizado. A morte
seria bem-vinda naquele momento de tormento.
Tudo estava escuro, apesar da luz que brilhava durante o dia e das
estrelas que iluminavam a noite. Estava cego, não via nada disso. Antes, só
enxergava beleza, pois era feliz com a companheira mais bela do mundo,
quiçá dos mundos; falo no plural porque, se existem outros universos por aí,
ninguém em nenhum deles se compararia a ela. Encontrava-me em um
abismo profundo, e a bebida anestesiava minha angústia.
Mais uma semana se passara, meus amigos e meu irmão foram até a
nossa casa, gritando para eu abrir a porta. Não ligava para nada, ficava sem
responder, entorpecido por todos os lados. Bebia vendo as fotos de nós dois
juntos no Belas Country. Ali, mostrávamos toda nossa alegria e amor,
aproveitando a noite como um casal.
“Anjo, por favor, me diga onde está, preciso tanto de você”. Esta foi
uma das mil mensagens que enviei a ela.
Entendia seus motivos, ela não me queria porque eu era um bastardo
insensível, por isso não respondia às mensagens.
Lucky surgiu para me tirar do meu torpor. Ele já aparecera antes, mas
não respondi. Pelo visto, encontrara uma forma de entrar.
— Não vou deixar você fazer isso com sua vida — rosnou, me puxando
pela camisa e me levando ao banheiro. Empurrou-me para debaixo do
chuveiro, ligando a água gelada. Eu me encolhi, sem discutir. Meu corpo
tremeu com a baixa temperatura. — Você vai lutar, porra! Não ouse desistir
— sibilou. — Vamos encontrá-la, então aguente firme, caralho.
Depois que Angie se foi, tentei achá-la em todos os lugares. Bryan
também, usando seus meios de hacker, contudo, sem nenhum resultado ou
sinal de onde estaria. Foram meses de busca.
Todos os dias eu mandava mensagem para ela, sem retorno.
“Sinto tanto sua falta, Anjo, me perdoe”.

Enquanto eu esperava por respostas de Bryan e até de Daemon, o


motoqueiro do MC da Fênix, contei ao Dominic o que havia acontecido
comigo. Ele se prontificou a me ajudar, enviando Daemon, o melhor
rastreador à sua disposição.
Angelina corria risco de vida, e eu estava longe dela, sem poder fazer
nada, sem poder tirar sua dor.
Três semanas após ela ter me deixado, fui a Nashville, na fazenda de
sua Tia Alice. A mulher era já uma senhora de cinquenta anos, mais ou
menos; não que fosse perguntar a ela, claro. Indaguei apenas se a Angelina
esteve lá.
— Aqui ela não apareceu — disse. — Já faz uns três anos que não os
vejo, nenhum deles: Shane, Lira e a doce Angie. Uma garota de ouro.
Depois que eu contei a ela sobre o que estava havendo com a Angel e o
porquê de ela ter ido embora, a senhora Alice ficou furiosa. No entanto,
também vi preocupação pela vida da sobrinha. Prontificou-se em nos
auxiliar na procura. Eu agradeci.
Pesquisei sobre sua doença. Cardiopatas não podem ter filhos pois sua
respiração, já fraca, piora com a gravidez. Pelo que descobri através do
médico que operou Shane, ela carecia de certos cuidados, tais como um
obstetra, nutricionista, psicólogo e outros, porque para entender a fala de
médico, só com um dicionário junto. Igualmente, precisava de um
cardiologista acompanhando-a com frequência. Porra! Ficaria louco assim,
sem saber como ela estava.
A noite sempre era a ruína da minha existência, porque com ela vinha
tudo: a saudade, a impotência, o sofrimento. Tudo se tornava mais escuro.
Não conseguia respirar direito, meus pulmões pareciam se fechar, impedindo
o ar de sair. Experienciava uma dor profunda em meu coração, com garras
afiadas esmagando-o.
Sentado na varanda dos fundos, olhando o nada, sentia o vento gelado
beijar minha pele. A dor já tinha me consumido tanto que agora estava
dormente.
Quando chegou março, a filha da Sam nasceu. Lucky me chamou para eu
ir vê-la na maternidade; não consegui... Por mais que amasse meu irmão, não
fui capaz. Acabaria desfalecendo lá mesmo, me lembrando do meu próprio
filho, o qual cogitei matar. Quando pensava nisso, me dava vontade de me
atirar na frente de um carro. Só não o fiz pela carta que ela me deixou. Ao
lembrar de suas palavras, reavivava a esperança de encontrá-la para dizer o
quanto a amava e pedir o seu perdão.
Ela já estava grávida de seis meses. O nosso pequeno anjinho devia
estar grande em sua barriga. Queria tanto tê-los comigo naquele momento.
Relia a carta escrita com sua caligrafia:

Ryan,
Sei que está sofrendo muito por receber esta notícia assim, e sofrerá
ainda mais quando eu for embora, mas eu não posso ficar aqui, não
quando você quer matar o pequeno tesouro que Deus nos deu.
Lutarei com unhas e dentes pela minha vida, por você, pelos meus
irmãos, por nosso bebê. Eu prometo, querido.
Você disse que se algo acontecesse comigo, não iria aceitá-lo. Não
faça isso, Ryan. Ele é parte de você e de mim, nós dois o fizemos com o
nosso amor. Então, se algo der errado, não o tire da sua vida, pois ele
precisará de você para protegê-lo e amá-lo. Então, por mim, não abandone
nosso pequeno milagre.
Imploro que tenha forças e lute por ele, não se entregue à derrota.
Não se entregue à bebedeira e às mulheres aleatórias. Talvez eu não tenha
o direito de exigir isso, ainda mais quando pretendo sumir, porém, faça
pelos bons momentos que tivemos juntos. Saiba que não guardo rancor por
querer tirar nosso pequeno anjinho. No fundo, compreendo que disse
aquilo da boca para fora, porque estava sofrendo. Se eu sobreviver ao
parto, retornarei para você, mesmo que não me queira mais, insistirei em
conquistar seu perdão, para que me aceite de volta.
Ryan, não me agrada deixá-lo. Isto está me matando aos poucos, a
cada segundo. Gostaria de tê-lo ao meu lado, agora e sempre. O amor que
sinto por você vai além de tudo, acho que até da morte.
Fique com Deus, meu amor, minha vida.
Seu Anjo.

Meu telefone tocou quando estava indo para o haras encontrar o Neve.
Nesses três meses na solidão e escuridão, consegui domar o cavalo dela. Só
precisava encontrá-la para nos casarmos.
Arregalei os olhos vendo quem era.
— Por favor, me diga que descobriu onde ela está — falei assim que
atendi.
— Sim, eu a encontrei — respondeu Daemon.
Capítulo 18
Esperança

ANGELINA
Há três meses, minha vida se tornara um completo martírio... Três
meses sem respirar direito, e quando fazia, parecia doer tudo dentro de mim.
Três meses sem dormir, sem comer. Três meses sem viver, pois meu mundo
desabou. Três meses que perdi o homem que amava, o pai da minha filha.
Coloquei as mãos na barriga já grande, sentindo-a chutar. Lágrimas
escorriam pelo meu rosto e caíam no meu peito.
— Meu amor, queria tanto que seu pai estivesse vendo isto, sentindo
você mexer aqui dentro. — Alisei minha barriga. — Ele sonhava com você,
sabia? A chamava de “pequeno anjo”... — gemi em meio ao choro.
Isso era o que resumia meus dias: chorar deitada na cama e pensar nele.
Estava morrendo aos poucos por não saber dele.
Quando procurei a ajuda de Tabitta e fui ficar em sua casa na praia,
pedi para ela não contar nada sobre Ryan que viesse a aparecer na TV ou nas
redes sociais. E que não mencionasse nem o seu nome. Caso eu descobrisse
como ele resolvera lidar com a dor... Se escolheu o mesmo caminho de
Ângela após Caim a abandonar... Oh, céus, que não tenha feito nada disso e
esteja bem. Quase ri com a ideia, pois tinha certeza de que ele não estava.
Sofreria porque eu parti sem dizer nada.
Naquele dia, depois que ele saiu à procura de um jeito de tirar a nossa
filha, peguei Shane e Lira e fomos para a casa de Tabitta, deixando a minha
alma para trás.
Não sentia dores da gravidez, apenas minha respiração estava cada vez
mais lenta e pesada. O médico Julian, que sabia do meu caso, disse que
teríamos de fazer uma cesariana ao completar oito meses de gestação, ou
seja, dali a dois meses. Ainda assim, as chances de eu sobreviver seriam
pequenas. Felizmente, o amor e o prazer de carregar a minha filha superava
tudo. Sim, uma filha, quando fiz a ultrassonografia descobri que era uma
menina. Fiquei feliz demais. Seria uma garotinha linda, porque puxaria ao
pai, ou seja, teria de tomar cuidado com os garotos.
Soube que a Sam teve uma menina também. Queria estar lá para
conhecê-la, mas não conseguiria ir e vê-lo; precisar partir de novo seria
como a morte.
Escrevi várias cartas para serem entregues caso eu não resistisse ao
nascimento de minha filha. Muitas delas para Lira e Shane, a serem entregues
em cada um de seus aniversários, no dia em que começassem a namorar, em
seu casamento, quando tivessem filhos... Também fiz vinte e cinco cartas
para a minha filha, Victoria. Em todas, dizia o quanto a amava e adoraria
estar com ela, mas que não podia, pois me ocupava a acompanhando do céu.
As cartas faziam parte do meu plano B, pois eu lutaria pela vida até o
último minuto. Contudo, talvez fosse mais fácil se Ryan estivesse ao meu
lado. Se eu sobrevivesse, o procuraria e pediria perdão por abandoná-lo.
Samira levou Lira e Shane para sua casa em Trenton, a alguns
quilômetros dali. Ela era uma garota doce e meiga, a melhor amiga de
Tabitta. Iria com as crianças — Lira, Shane e Emily, filha de Tabitta — num
parque perto de sua casa. Minha amiga ficou comigo, não querendo se
distanciar caso viesse a acontecer alguma coisa.
Já era quase hora do almoço. Como sempre, não sentia fome, embora
soubesse que precisava me alimentar; comia mesmo sem ter vontade.
Guardei as cartas em uma caixa de sapato para serem entregues no
momento certo. Acariciei minha barriga, tentando acalmar seus chutes,
porque eles me deixavam ofegante, apesar de amar senti-la. Isso significa
que seria sadia. Entoei uma cantiga de ninar que fiz para ela e para mim:
“Durma, durma, meu pequeno anjo, que papai logo virá para nós, e com seu
amor nos tirará da solidão”.
Estava cantando quando a porta se abriu num rompante. Minha
respiração falhou ao ver quem estava ali.
Ryan me fitava com seus olhos atormentados. Balançou a cabeça,
parecendo acordar de um pesadelo. Piscou três vezes para checar se era eu
mesma ali. Fiquei paralisada, em pé, perto da mesinha, com uma mão na
minha barriga.
Estava mais magro, dava para ver através de sua camiseta que perdeu
bastante peso. Então ele também deixara de se alimentar direito? Ao redor
dos olhos, a cor roxa denunciava noites mal dormidas. Pelo jeito, também
não se barbeava há muito tempo.
— Ryan... — Minha voz falhou. Ali estava um rosto que sonhei em
rever, ao longo de três meses de solidão e vazio sem ele. E agora aparecia
lá, na minha frente. Meus olhos umedeceram devido às lágrimas que desciam
pelo meu rosto. — Oh, Ryan...
Ele correu até mim, caindo de joelhos na minha frente e abraçando a
minha cintura, colocando a testa na minha barriga inchada. Esta menina seria
grande; puxou ao seu pai, que tinha um metro e oitenta.
— Ah, Anjo, eu sinto muito. — Beijou minha barriga. Eu usava um
shortinho curto e um top. Seu pequeno gesto me fez prender a respiração. —
Nunca quis dizer tudo aquilo de você, pequeno anjo.
Minhas mãos foram para seus cabelos, que também estavam grandes,
batendo nos ombros. Há muito não viam um corte. Tão diferente do que
costumava ser...
— Perdoe-me, meu filho. — A dor era evidente em sua voz e olhos,
aliás, por todo ele.
Não queria interromper seu momento, mas eu precisava.
— Filha... — Soava rouca.
Ele afastou sua cabeça e me observou com os olhos de menino perdido,
que depois se iluminaram um pouco.
— Droga! Terei de comprar uma arma se puxar a você. — Deu mais um
beijo na minha barriga. Erguendo-se, tocou meu rosto e limpou minhas
lágrimas. Notei uma cicatriz em sua mão direita. Parecia ter levado pontos, e
não foram poucos.
Meu coração gelou.
— O que é isso? — perguntei, passando o dedo nela
Ele respirou fundo e fechou os olhos.
— Aquele dia, depois que saí do meu apartamento sem rumo, fui para a
casa que mandei fazer para morarmos juntos depois de casados.
Arregalei os olhos, interrompendo-o.
— Você comprou uma casa?
Puxou-me para a cama e se sentou ao meu lado. Eu ainda segurava sua
mão. Ele assentiu.
— Comprei o terreno logo que começamos a namorar, e fiz a casa. —
Encolheu-se. — Foi para lá que eu fui ao deixar o meu apartamento. Quis
olhar o lugar onde viveríamos para sempre juntos... Fiquei nela por horas.
Ao retornar, você não estava... — Deitou no meu colo, como uma criança
perdida que necessitava da mãe. — Shane, Lira e você... Tinham ido
embora, e ninguém sabia para onde. — Expirava com dificuldade. — Foi
quando achei a carta que deixou, e a li.
Pensei na carta e tentei me acalmar para controlar a dor, a minha e a
dele. O homem em meus braços era uma casca vazia do que deixei há três
meses.
— Ryan... — comecei, mas ele não me ouviu e continuou, preso naquele
pesadelo.
— Você tinha ido, suas coisas sumiram... Enlouqueci e quebrei todo
meu apartamento, nosso quarto, nossa cama... Tudo dentro de mim se partiu,
foi como cair da porra de um prédio e foder todos os meus ossos. Respirava,
embora muito mal, porque até isso doía. — Ele tomou fôlego. — Voltei
arrependido por ter dito aquelas coisas para você, sobre a nossa menina. —
Virou o corpo, ainda deitado no meu colo, e colocou a boca na minha
barriga. — Não sei por que falei aquilo... Juro, Anjo, não queria... — Seus
olhos, que um dia foram brilhantes e lindos, agora estavam quebrados. Oh,
Deus, e fui a responsável.
— Não se atormente mais — supliquei. — Eu sinto muito.
— Eu é que sinto por magoá-la, por dizer aquelas coisas a você e à
nossa garota. — Alisou minha barriga, bem na hora ela chutou forte.
— Oh! — Ofegou, atônito, e se sentou na cama. — Ela se mexeu! —
Um sorriso lindo surgiu em sua boca, puro e verdadeiro.
Fiquei feliz que nossa filha resolveu chutar para acabar com as chamas
de tormento de sua mente. Esperava alegrá-lo em breve. Deitei na cama com
a barriga para cima, para deixá-la por conta dele, que se posicionou ao meu
lado, sem tirar a mão de nosso bebê.
— Ela nunca para quieta, às vezes não me deixa dormir à noite —
sussurrei, colocando minha boca em sua testa. — Ryan...
Acredito que ele compreendeu o desejo que sentia, a ponto de quase
implorar, afinal, foram meses separados, e não sei o que ele fez sem mim,
mas... não, eu não queria descobrir. Tinha medo da resposta e não poderia
culpá-lo, pois fui eu quem o largou.
— Não houve ninguém — garantiu, lendo o meu rosto. Fazia isso muito
bem, eu não conseguia esconder nada dele. — Sempre será só você, meu
Anjo. — Beijou minhas têmporas e testa, nunca a boca.
— Amor... — reclamei, pegando seus cabelos e puxando-o para mim,
devorando seus lábios, dos quais estava morta de saudades. Louca, queria
compensar cada maldito dia perdido. Gemi ao sentir seus dedos hábeis em
meu corpo. Todo o desejo adormecido nesses meses reacendeu tão forte que
achei que gozaria só com seus beijos, um bálsamo para mim.
Uma de suas mãos foi para o meio das minhas pernas. Gelei, não
porque não queria isso, queria mais do que o ar que eu respirava, mas já
fazia meses que não me depilava, e a coisa lá estava feia.
Ele sentiu meu constrangimento e tirou sua mão de mim. Fitou-me,
preocupado.
— Você sente alguma dor? Desculpe...
Eu o interrompi.
— É que já faz tempo que não me depilo, e a coisa lá embaixo não está
bonita... — Corei. — Nem consigo ver meus pés.
Gargalhou, exibindo dentes brancos como o sol. Levantou-se e pegou
minha mão, me levantando junto.
— O que foi? Aonde vamos?
Não respondeu, apenas me guiou até o banheiro. Meu quarto não era
grande, tinha uma cama de casal, dois criados-mudos e uma penteadeira
onde ficavam minhas coisas.
Ao entramos, observou o pequeno toalete e fez uma careta linda. Não
era nada igual ao seu, que dava quase cinco daquele.
Virou-se para mim e tirou o top preto que eu usava em casa e o meu
short curto; estava muito quente. Não reclamei, permiti que fizesse o serviço,
seja lá sua intenção.
— Sorte sua não ter um homem aqui, esta porra de short é mais
parecido com uma calcinha — resmungava, já tirando meu fio dental. — Oh,
merda, como espera que eu tenha controle vendo isso?
Sorri, o meu primeiro sorriso verdadeiro em eras.
— Quem disse que eu quero que você se controle? Querido, estou na
seca há meses, desejando e sonhando com um único homem, que agora está
neste banheiro me despindo.
Ele sorriu com a mesma felicidade que estava estampada em meu rosto.
— Por mais que goste desta calcinha, ela precisa sair. — Largou-a no
chão. Levantou, foi até o lavabo e voltou com a vasilha e o estojo que eu
usava para me depilar.
Entendi o que ele pretendia.
— Você não vai fazer isso — falei, cobrindo minha frente, mas nem era
preciso: pelo tamanho da barriga, não dava para ver nada. Sorte a minha que
não tive estrias.
Sorriu com candura.
— Você disse que não enxerga mais. Então, sim, depilarei minha futura
esposa. — Abaixou-se diante de mim. — Agora fique quietinha para eu não
a cortar, está bem?
Tentei retrucar, contudo, ele estava tão animado que deixei, ignorando
meu rosto vermelho.
— Você já fez isso antes? — sondei, sem querer saber de fato.
Sentia a lâmina raspando minha pele, e suas mãos tão leves quanto uma
pluma. Respondeu sem tirar os olhos do seu serviço:
— Não, nunca. Mais uma coisa para a lista de primeiras vezes.
— Hummm — murmurei, lembrando que ele já tinha dito isso antes. —
Cite o que mais está na lista.
Ele riu, a risada que eu amava.
— Bom, vamos ver: a primeira para quem mandei mensagens, a
primeira com que fiz sexo no meu carro e no meu apartamento. A primeira
que mexeu comigo de imediato. A primeira em que pensei ao deitar para
dormir, ao me levantar de manhã e no restante do dia.
Ryan suspirou. Não pude esconder minha surpresa. Ele finalizou o
trabalho e limpou o lugar que raspou com o chuveirinho. Assim que a água
tocou no meu clitóris, dei um gritinho e o desejo reacendeu, divertindo-o.
— Sensível. — Levantou-se e focalizou meus olhos. — A primeira
mulher para quem faço poemas. A primeira com quem vou a encontros. A
primeira para quem compro uma empresa só para ela trabalhar. A primeira
que pretendo presentear com um livro raro de Shakespeare. A primeira com
quem faço amor. A primeira que roubou minha alma, meu coração e tudo que
há em mim. A primeira e única que me dará nossa princesinha. — Beijou
meu nariz e sorriu. — Espero acrescentar muito mais à lista.
Meus olhos estavam arregalados de choque ao ouvir aquilo.
— Você comprou a editora do Daniel só para eu entrar lá? — Meu tom
era ultrajado. — E o livro de Shakespeare?
Deu de ombros, como se isso não fosse nada.
— Para você eu daria a lua e as estrelas que brilham à noite. Daria o
sol que ilumina o dia, daria a minha vida. — Aproximou o rosto do meu,
polegadas de distância. — Nada importa se eu não puder tê-la. Nesses três
meses, confirmei tudo isso. Dormia e acordava nas trevas. Na sua ausência,
passei a vivenciar um purgatório. Ou pior, era como estar no inferno... —
Limpou as lágrimas que caíam por minha face. — Quando cortei meu braço,
e Lucky me achou ferido e perdendo sangue, queria morrer, queria que ele
não tivesse chegado e me socorrido...
Chorei mais, então ele me abraçou.
— Não chore, li a carta onde falava o quanto amava eu e a nossa filha.
E que se você sobrevivesse, voltaria para mim e imploraria por meu perdão.
Anjo, não é você que tem de pedir perdão, e sim eu que preciso rastejar aos
seus pés e suplicar por sua misericórdia.
Sacudi a cabeça em seu peito.
— Não precisa, não. Fui eu a errada desde o começo, não contei a
verdade sobre a minha doença no coração. Se você soubesse, teria se
prevenido e nada disso aconteceria. Agora que ela está aqui, não me
arrependo; exceto por partir e não enfrentá-lo, mas eu estava com medo...
Beijou minha cabeça.
— Eu sei, nós dois erramos. Vamos resolver esse problema, já passou...
Afastei-me dele e mirei seus olhos.
— Problema?
— Sim, vim buscar minha mulher e meus queridos cunhados, que
considero meus filhos. Vou levá-los para casa, mas antes... — Distanciou-se
e se ajoelhou na minha frente, tirando do bolso da calça jeans um diamante
com uma pedra na forma de uma estrela, com o nome “Anjo” escrito dentro.
Parecia ter uns dezoito quilates.
Arregalei os olhos sabendo o que ele faria a seguir.
— Ryan, eu estou nua aqui, você acabou de... E grávida, inchada, com
os pés igual a um pão que cresceu para fora da forma. Meus peitos estão
grandes, parecem dois melões... E você vai me pedir em casamento? — Meu
coração batia a mil. Poderia dar problema naquele momento e não teria nada
a ver com a minha doença.
Ele sorriu com amor, desejo e devoção ao fitar meu corpo, não se
importando com o inchaço. Esse homem me completava.
— Você é a mulher mais linda do mundo...
Cortei-o.
— Dizem que o amor é cego, agora acredito nisto.
Ryan sacudiu a cabeça.
— Eu não sou. Anjo, você é minha vida, minha alma, sem você eu não
vivo, apenas vegeto como um zumbi. Mas um zumbi lindo e gostoso. —
Piscou para mim com um meio sorriso e estendeu a mão. — Aceita ser a
minha esposa? Prometo amá-la enquanto viver, e também depois.
Fiquei incrédula. Teria pulado nele se não fosse a barriga.
— Sim, mil vezes sim! — exclamei ao ver o diamante pesado no meu
dedo. — E você não precisa domar o Neve. Eu sei que me ama.
Ele se levantou e me beijou com amor, ternura e devoção. Seus beijos
eram como raios, um pouco dele e já estava toda consumida pela corrente
elétrica. A barba pinicava um pouco. Estava na hora dele fazê-la sumir.
— O quê? Agora que consegui domá-lo, após dois meses de treino? —
sussurrou, se afastando de mim com um brilho nos olhos.
Eu arfei.
— Você conseguiu domar o Neve? Ele deixou você subir nele?
Ryan riu, pegando a lâmina de barbear do chão, junto com a vasilha,
para guardá-las. Não deixei, tomando-as de suas mãos. Ele ergueu suas
sobrancelhas.
— Caí um bocado de vezes, mas conversei com ele e expliquei que
seria o único homem que sempre a amaria como você merece. Ninguém iria
tocá-la, a não ser que quisesse morrer. — Deu de ombros. — Então consegui
montá-lo.
— Você foi até Nashville?
— Quando desapareceu, fui até a casa da sua tia, pensando que estaria
lá. Pedi a ela para levá-lo ao meu haras. Contei sobre sua promessa ao
Neve. — Olhou-me de lado. — Aliás, está furiosa com você por esconder
muitas coisas dela.
Eu suspirei. Sabia disso, só não queria preocupá-la.
— Depois conversarei com ela. — Puxei uma cadeira, peguei seu braço
e o fiz sentar. Levantei minhas mãos com o estojo e a vasilha. — Devo trocar
o estojo para raspar sua barba?
— Vai me barbear? — Sorriu. — E por que eu não usaria esse aí?
— Porque você raspou lá... em mim? — incitei.
Ryan jogou a cabeça para trás e gargalhou por um segundo.
— Anjo, minha boca já esteve em cada canto de sua vagina, não tem
problema usar o estojo na minha barba.
Corei com seu olhar quente no meu corpo. Peguei o sabonete, já que
não tinha creme de barbear, e raspei toda sua cara linda, deixando-a lisa
como veio ao mundo. Observei seu corpo.
— Há outro lugar que precisa ser raspado? — Fitei suas calças,
mordendo os lábios.
Ele riu.
— Não, eu já raspei meu saco, aquele troço coça quando tem cabelos.
Ri também. Seus olhos foram para a minha boca.
— Senti tantas saudades de sua risada.
Eu ainda sorria quando guardei o estojo e peguei a tesoura, olhando seu
cabelo.
— Você confia em mim para cortá-los?
— Confio em você de olhos fechados, para tudo — disse com
convicção.
— Se fosse você, não iria tão longe. Vai que eu encurte demais? —
provoquei, balançando a tesoura.
— Você continuaria me querendo careca? — Levantou as sobrancelhas.
— Querido, iria querê-lo de todos os jeitos. Mas já amava seu cabelo
antigo — falei, moldando os fios com a tesoura, na altura da orelha. Afastei-
me e sorri. — Lindo!
— Você que é! — Ergueu-se, pegou os cabelos do chão e jogou no
cestinho de lixo. — Vou tomar um banho, quer me acompanhar?
Aquiesci com meu corpo pegando fogo, ansiando pelo seu toque. Ele
ligou a água quente, me virou de costas e agarrou meus cabelos.
— Vai lavá-los?
Eu sacudi a cabeça.
— Lavei mais cedo, preciso prendê-los. — Eu já ia fazer isso, mas ele
tirou a minha mão do caminho e os amarrou num coque.
Pegou o sabão e a bucha e se agachou atrás de mim, lavando minhas
costas. Senti-o passar o dedo na estrela de sete pontas, onde futuramente
tatuaria os dois nomes que faltavam: Ryan e Victoria, as minhas outras
razões de viver. Contei a ele o nome que pretendia dar a ela.
— Victoria? — perguntou.
Acariciei a barriga.
— Sim, porque será uma vitória tê-la e ver seu rosto lindo. Aposto que
puxará a você.
— Nada disso, eu a quero igual a você, morena com olhos negros —
discordou.
— Independentemente de com quem se pareça, vamos amá-la — falei.
Ele suspirou.
Olhei para trás, para Ryan agachado lavando minhas costas e bunda.
Fiquei nua na frente daquele homem de vários jeitos, todavia, sempre corava
quando me expunha tanto.
— Sim. — Beijou uma ponta da estrela. — Eu sabia que era onde
colocaria o nome de nossa filha. — Como não amar um homem desses?
Tomamos banho juntos e ele ainda não havia me tocado. Eu estava a
ponto de gritar por isso. Ryan me secou, e em cada lugar que sua mão
passava, minha pele incendiava.
— Ryan... — clamei por mais.
Ele beijou meu nariz.
— Cuidarei de você, mas não aqui. — Puxou-me para fora do banheiro
e me deitou na cama, posicionando-se ao meu lado. Beijou minha boca por
um momento e logo seguiu para o meu pescoço, lambendo, mordiscando e
chupando.
Eu ofegava alto, segurando seus braços bem forte, a ponto de deixar
marca.
— Ryan! — Cerrei as pálpebras, sentindo seus dedos e suas mãos
sobre o meu corpo.
Ele me virou de costas e escorou-as em seu peito, com a boca no meu
pescoço. Uma mão agarrava e beliscava meus enormes peitos duros; a outra
foi para o meio das minhas pernas.
— Molhada para mim — sussurrou no meu ouvido. Enfiou dois dedos e
circulou meu clitóris. Logo vi as estrelas de que tanto sentia saudades. Gritei
seu nome, não me importando de escutarem. — Tão sensível, porra —
rosnou, circulando mais rápido. Tudo explodiu, me levando ao céu em
segundos.
Manteve seus dedos dentro de mim, até meu corpo parar de vibrar com
o orgasmo que acabara de ter. Fiquei mole.
— Foi rápido esse.
— Hummm — murmurei sem forças, ofegante. Parecia ter corrido uma
maratona, mas era porque havia ficado muito tempo conversando e em pé.
— Está passando mal? — questionou, preocupado.
Sacudi a cabeça — ou, pelo menos, tentei; estava pesada.
— Ficarei bem, é só o cansaço — consegui dizer.
— Onde guarda seus remédios? — perguntou, alterado.
Eu me virei, coloquei minha cabeça em seus ombros e o abracei.
— Não posso tomar remédios, traria sequelas à nossa filha, então
decidi parar até ela nascer. — Fechei os olhos. — Mas isso me deixa tão
fraca...
— O que agravou sua condição? Por favor, não me diga que foi o que
acabei de fazer com você!
— Não, depois que parei de tomar remédios, minha respiração passou
a falhar. — Era incapaz de abrir os olhos. — Então não posso ficar muito
tempo conversando... Rouba a minha energia...
— Anjo — a tristeza estava ali em sua voz linda —, entrarei em contato
com o médico, enquanto isso você dorme um pouco.
— Não vá embora — implorei, segurando seu pescoço. Sentia raiva
por não conseguir lutar contra minhas pálpebras. — Não posso viver mais
sem você, é pior do que pensar em morrer.
Ele beijou de leve meus lábios.
— Não vou a canto algum enquanto você estiver respirando neste
mundo. — Seu tom tinha uma nuance que não entendi.
— Ryan, não... — comecei, sem forças para prosseguir. O que ele
queria dizer com aquela afirmação? Tive vontade de gritar, porém, me vi
sem poder reagir.
— Durma, Anjo. — Senti seus lábios na minha testa. — Agora estou
onde queria, nos braços da mulher que é dona da minha alma.
Não desejava dormir, por medo daquele sonho lindo acabar. Contudo,
não deu para segurar, e pela primeira vez em três meses, dormi como um
anjo, sem os costumeiros pesadelos que me assolavam dia e noite. Ryan não
iria a lugar nenhum sem mim. Ele me amava. Com este pensamento,
adormeci. Antes, pensei ter ouvido:
— Eu a seguirei, Anjo, onde for, porque aqui neste mundo não posso
viver mais sem você...
Capítulo 19
Luz e trevas

RYAN
Quando descobri por Daemon onde Angelina estava, fui correndo para
Nova Jersey. Só de imaginar que já estive uma vez na casa de sua amiga
Tabitta — a policial — à procura dela, mas a cadela disse que não sabia de
nada, e que mesmo se soubesse não me diria, sentia muita raiva. Naquela
hora, quis esfolá-la viva, mas deixei quieto, porque minha cabeça não estava
boa, então, para não fazer besteira, fui embora.
Toquei a campainha da casa na esperança de vê-la. A residência de
dois andares era feita de madeira avermelhada, ficava perto da praia. A
porta se abriu, e não tive tempo de processar o que estava para acontecer,
apenas senti o vento de um punho vindo em minha direção. Por reflexo,
desvencilhei-me, já querendo matar a cadela louca, mas o Jason interveio e
puxou Tabitta para longe de mim. Eu sabia que os dois se conheciam e
pareciam se amar, mas nenhum dava o braço a torcer para isso.
Quando falei em aparecer ali, ele se prontificou em ir comigo. Eu não
tinha cabeça para assimilar sua relação com ela, não liguei, no entanto, meu
amigo merecia coisa melhor do que essa víbora.
A garota era linda, sim, loira com o corpo cheio de curvas, ainda mais
usando aquelas calças de couro sintético preto e espartilho, bem como um
salto de dez ou mais centímetros, não sabia direito. O seu único defeito era
sua boca, porque, cá entre nós, era louca. Assim que abriu a porta, já foi
voando em minha direção. Por pouco eu não levei um soco na cara. Apenas
não fui em cima dela porque não batia em mulheres, e Jason a levou para
longe de mim. Escutei-a me xingando de tudo quanto era nome; até os MCs
ficariam para trás com seu vocabulário vil.
Subindo a escada de madeira, parei um segundo para ouvir o que
parecia ser uma canção de ninar, cantada por uma voz que me tiraria do
tormento que eu estava vivendo.
“Durma, durma, meu pequeno anjo, que papai logo virá para nós, e com
seu amor nos tirará da solidão”.
Abri a porta num rompante, e ali estava: o meu Anjo de cabelos negros,
com sua barriga enorme; ficara mais linda grávida. Visualizava um menino
parecido com ela, com tudo seu e nada meu. Corri até Angie e caí de joelhos
à sua frente, beijando nosso fruto que estava ali dentro, gerado com tanto
amor... Esperava que fosse forte e saudável.
Ficamos a tarde inteira juntos, comigo alisando sua barriga. Quando
senti nossa filha — sim, uma filha! —, fiquei muito emocionado. Torcia para
Victoria se parecer com sua mãe, mas maldição, precisaria me manter atento
a qualquer malandro que quisesse se aproveitar do meu bebezinho. Seria sim
meu bebê até ficar velha; se decidisse se tornar uma freira, melhor ainda.
O nome de nossa filha seria Victoria, pois era o nosso pequeno milagre,
uma guerreira que sobreviveria assim como Angelina. Toda vez que pensava
nisso, me dava um aperto no peito. Esses meses vivendo, ou melhor,
vegetando longe dela... Não aguentaria de novo. Não podia mais viver sem
ela. Encolhi-me ao imaginar um cenário onde ela não resistisse... Só me
restaria uma coisa a fazer.
Há seis meses, quando a palavra “suicídio” cruzava a minha mente,
sentia raiva das pessoas que davam fim às suas vidas. Talvez agora isso
fosse a minha sentença, dependeria de como ela se sairia no nascimento de
nossa filha. Não mencionei a ninguém meus planos; se dissesse, todos se
oporiam, acho que me prenderiam e jogariam a chave fora, até eu voltar a
mim. Mas ninguém estava na minha pele, só eu entendia o tormento que vivi
e sofri nesses meses sem ela. A solidão, a dor, a angústia, o desespero, tudo
era mil vezes pior que a morte.
Notei que Angie estava feliz, ou melhor, radiante por nossa
reaproximação. Contudo, também percebi que sua saúde se debilitara,
sempre ofegava como se tivesse feito ginástica ou corrido bastante. Não
gostei nada disso, e dela ter dito que parou de tomar os remédios porque não
queria afetar nossa filha. Não sabia o que senti em relação a isso, não
desejava prejudicar Victoria, todavia, também não queria ver a Anjo mal.
Não dava para conciliar as duas vontades? A despeito disto, confiava que
tudo daria certo. A esperança de vê-la bem era a única coisa que me impedia
de enlouquecer. Sentia-me entre a luz e as trevas. A luz seria estar ao lado
dela, e as trevas era a impotência de enxergá-la definhando a cada segundo,
e eu sem poder fazer nada, apenas assistindo a tudo...
Observar seu rosto lindo enquanto dormia tão pacífica apertou meu
coração. Não podia perdê-la, era a única forma de eu viver neste mundo.
Deixei-a dormindo com sua respiração pesada. Não queria sair de
perto dela, mas precisava fazer algo o mais rápido possível. Desci a escada
com meu celular na mão, já discando o número do médico, registrado caso
precisasse dele.
— Como ela reagiu a você? — rosnou Tabitta com um gosto amargo na
boca, como se tivesse comido algo estragado.
Ignorei-a e liguei para o médico, Raul Smith, o mesmo que operou
Shane. Expliquei quanto ao estado da Anjo e ele se prontificou a estar ali de
manhã, bem cedo, para avaliar a situação dela.
Passei a noite ao seu lado, acompanhando seu sono instável. Puxei-a
para os meus braços e beijei sua testa e seu nariz. Não queria dormir, porém,
estava cansado por ter ficado várias noites acordado.
Inalei seu cheiro de morangos e suspirei feliz: a mulher em meus braços
era quem eu amava com toda a minha alma. Com ela, estava em casa.
Durante meses, minha vida se resumiu à solidão de sua ausência.
Agora, com ela e minha filha, por fim via a luz. Pela primeira vez em muitos
anos, rezei a um Deus no qual nem sequer acreditava direito. Pedi que não
levasse as duas mulheres, porque eram minha razão de viver.

Acordei seis horas da manhã com meu telefone tocando. Saí da cama
sem acordá-la. Linda, dormia de barriga para cima, com uma mão sobre o
seu ventre, como se estivesse protegendo nosso bebê. Seus cabelos negros
estavam em cascatas em cima do colchão, com alguns fios em seu belo rosto.
Nunca vi nada mais belo que esta visão. Tirei uma foto e coloquei como
plano de fundo do meu celular.
Notei que sua respiração estava mais pesada do que ontem à noite.
— Alô? — respondi, sem olhar a tela.
— Sou eu, Raul, estou aqui na porta da casa que você me indicou.
— Aguarde um minuto — disse e desliguei. Saí do quarto de fininho,
observando-a dormir com seu pijama: calça e camiseta largas. Ainda bem
que era comprido, não gostaria que ninguém a visse quase nua. Fui abrir a
porta para o médico que veio de Houston para ver como Angelina e nossa
filha estavam.
Olhei para o cara careca de meia idade. Gente fina, conseguiu salvar o
Shane, e esperava que fizesse o mesmo por minha futura esposa e nosso
bebê.
— Bom dia, doutor — cumprimentei.
— Bom dia, senhor Ryan — respondeu formalmente.
— Ela está no quarto, vamos lá? — De repente, escutei-a gritando meu
nome como se estivesse em um pesadelo e eu fosse sua âncora. Corri,
pulando os degraus de dois em dois para chegar até ela, deixando o médico
para trás.
Entrei no quarto vendo-a sentada na beirada da cama com os olhos
cheios de lágrimas e uma mão na barriga. Eu me agachei à sua frente e toquei
seu rosto molhado.
— Você está bem? Está sentindo dor? — Minha voz saiu alta de
preocupação. Eu já ia chamar o doutor quando suas mãos pegaram minha
camisa e me puxaram. Ela escondeu o rosto no meu pescoço, chorando.
— Oh, Ryan... — lamentava.
Alisei seus ombros e cabelos, tentando tranquilizá-la, temeroso.
— Anjo, me diga o que houve, estou preocupado com você — pedi, me
esforçando para ficar calmo.
Angie suspirou e me apertou mais em seus braços. Parecia não querer
me deixar nunca.
— Eu acordei e você não estava aqui... Então eu pensei... — Sua voz
linda sumiu.
Entendi o que ela dizia, qual era o seu medo. Afastei-me para ver seus
olhos lindos e molhados.
— Estou aqui, não vou a lugar nenhum. — Beijei seus lábios salgados
por conta das lágrimas e depois as sequei com as pontas dos dedos. — Juro
pela nossa filha.
Após um segundo ela assentiu, mais calma. Antes que falasse algo, ouvi
alguém pigarreando. Nós dois olhamos para a porta. O médico estava ali, de
pé, fitando-nos e sorrindo. Pretendia ignorá-lo, mas ela se afastou e olhou de
mim para ele, confusa.
— Shane? — Soou embargada.
Óbvio que se preocuparia com Shane em primeiro lugar, não? Sempre
se deixando por último!
— Não, ele está bem — garanti. — O doutor veio por você.
Raul entrou no quarto.
— Bom dia! Nós nos encontramos de novo, Angelina — disse,
colocando sua maleta preta sobre o criado-mudo. — Vim examiná-la, posso?
Angie piscou e sorriu para mim, um gesto capaz de iluminar minha vida
e me resgatar da escuridão. Ali, havia adoração e amor; isto também estava
nos meus olhos.
Ela se recompôs e assentiu.
— Tudo bem, doutor — respondeu, meio ofegante. Piorava a cada hora.
Tentei não deixar minha preocupação incomodá-la, não queria estressá-la.
Afastei-me para ceder espaço ao doutor.
Passados alguns minutos, Raul se virou para nós dois.
— Então, doutor, como ela está? — sondei, ansioso.
Ele suspirou, dirigindo-se à Angie:
— Eu soube que você interrompeu a medicação para o coração...
A Anjo aquiesceu.
— Sim, não queria machucá-la. Remédios fortes deixam sequelas, por
isso parei. — Alisava a barriga.
— Tem algum médico acompanhando sua condição e a gestação?
Ela franziu a testa.
— Sim. Por quê?
Estreitou os olhos.
— O que ele falou sobre parar com os remédios para o coração?
Franziu a testa.
— Disse que prejudicariam o bebê. Por quê? — Sua respiração já
estava mais desigual do que há alguns minutos.
— Sinto avisar, mas esse médico não sabe de nada. Por ser formado,
devia entender mais acerca de seu problema. Parando de tomar os
comprimidos, sua respiração tende a enfraquecer, como agora, e cada vez
ficar pior. Mesmo com os remédios, sua gravidez é de risco. É um milagre
ter chegado tão longe. Já não deveria ter oxigênio para sua filha e você.
— Então ela corre risco de vida? — Ficou em choque.
Ofeguei de pavor, um sentimento que compartilhávamos.
— Não só sua filha, você também — assegurou. — Onde estão seus
exames mais recentes?
De olhos arregalados, apontou para o armário de roupas. Notei que se
esforçou muito para levantar a mão direita.
— Dentro de uma caixa vermelha...
Fui até lá, peguei os exames em uma pasta branca e entreguei ao doutor.
— Aqui.
Ele conferiu cada folha de papel. Demorou alguns segundos para dar
seu veredito.
— Pelo que vejo aqui, você está grávida de seis meses. Poderíamos
fazer uma cesariana, mas sua filha nasceria prematura extrema. — Voltou a
checar os papéis, tanto da gravidez como os referentes ao coração dela. —
De imediato, precisamos interná-la para conduzir novos exames, além de
arranjar um pediatra e um obstetra com urgência para sabermos se já
podemos realizar a cirurgia. — Olhou para nós dois. — Quero deixar claro
que sua operação é de alto risco, contudo, farei o que posso. Vamos levá-la a
Houston, lá tenho o doutor Christian, pediatra, a obstetra Camille, e Dennis,
ginecologista, os melhores de seus ramos. E minha equipe toda. Precisamos
fazer isso o mais rápido possível.
Arquejei pensando em como sua vida poderia acabar em questão de
segundos. E eu achando que teria mais tempo com ela... Não quis continuar a
imaginar tal possibilidade. Tinha de acreditar que ela ficaria bem.
Quando meus pais morreram, não deu tempo de rezar. Não que eu
rezasse na época, nunca fui em igrejas, mas minha mãe ia todos os domingos.
Se havia um Deus no céu, que ajudava as pessoas que a ele recorriam,
implorava para ouvir minha súplica e fazer com que minha mulher
sobrevivesse. Não podia simplesmente viver sem ela, de nenhuma forma.

Arrumamos as malas e embarcamos no meu jatinho, equipado com o


necessário para fazê-la respirar melhor. Chegando a Houston, fomos direto
para o hospital, localizado no centro da cidade. Meu coração gelava de
medo e ansiedade. Ela já estava tão fraca que foi preciso colocá-la em uma
maca. Fiquei com Angie até terminarem todos os exames, tanto do coração
como os de nossa filha. A obstetra e o ginecologista disseram que o bebê
estava bem formado, mas depois do parto precisaria permanecer no hospital
até ganhar peso.
Meus amigos estavam lá — Sam, Rayla, Jordan, Lucky, Daniel e Alex
—, e também os dela — Johnny, Charles e Tabitta. Devo dizer que gostei do
jeito com que Tabitta se importava com a Anjo; vi seu sofrimento, embora
não a perdoasse por ter escondido Angelina de mim, em razão do que perdi
todos esses meses, não acompanhando minha filha crescer em sua barriga.
Não enxerguei Bryan e Alexia, embora os dois tivessem sido informados
sobre o estado da Angel.
— Vai dar tudo certo, Angie — Charles disse, beijando sua testa, e
Johnny também.
— Estaremos aqui com você — Johnny alisou seu rosto.
— Obrigada, pessoal — sussurrou, ofegante. — Vocês são os melhores
amigos de todos os tempos...
— Eu a amo, sempre — declarou Tabitta, chorando.
Ela não respondeu, acho que não conseguia falar. Em seguida, seus
olhos molhados pousaram em mim. Estava deitada na maca, já indo para o
centro cirúrgico. Meus olhos umedeceram.
— Amo você, Ryan — afirmou, meio sem ar. — Lutarei por nossas
vidas, tanto a minha como a de nossa filha.
Não consegui falar por um segundo, sentia minha garganta entupida. Fiz
um esforço para me acalmar e tranquilizá-la no processo, não queria
estressá-la e piorar seu estado. Guardei a dor para mim, não deixando
transparecer no meu rosto.
— Sim, eu sei que vai — sussurrei e beijei de leve seus lábios. — Eu
também te amo para sempre, minha vida.
— Promete que se for para escolher entre eu e Victoria... você vai
salvá-la?
Arregalei os olhos diante do que ela me pedia. Isso era impossível.
Jamais poderia fazer essa escolha. Seria como me dividir ao meio.
— Anjo...
— Prometa, Ryan — suplicou. — Por que se me escolher... eu não
conseguirei... — Sua voz sumiu, desmaiando na minha frente.
Comecei a gritar, sacudindo-a para fazê-la acordar e voltar para mim.
Fui arrastado para longe, longe da minha vida, longe da minha alma.
Epílogo
Dois meses e meio depois...
— Anjo, você não pode me deixar, você me prometeu que lutaria pela
sua vida. Brigue por mim, por nossa filha linda, que por sinal, se parece com
você. — Ryan sussurrou. — Sei que prometi para você que se... por acaso,
não voltasse para mim... eu viveria e cuidaria de Victoria, mas não posso
cumprir esta promessa caso não retorne. Não consigo viver neste mundo sem
você. — Expirou, pesaroso. — Lucky e Sam cuidarão dela para nós. Eles
prometeram.
Através da névoa, ouvia a voz da pessoa que seria capaz de me resgatar
da escuridão em que eu me encontrava. Seguindo o som, lutei pela luz,
porque sabia que eu teria de voltar para ele, para o meu amado.

Quando acordei naquele hospital, vendo o homem que eu mais amava


na minha vida perto de mim, com os olhos fundos e arroxeados por causa das
noites mal-dormidas, soube que havia ganhado um presente. Desde o
primeiro segundo em que o conheci, percebi sua perfeição. Depois disso, me
apaixonei ainda mais por ele. Abri os olhos porque precisava lhe dizer isto.
Ele não respondeu, apenas escondeu seu rosto em meu pescoço e chorou.
Ali, prometi que nunca mais o faria sofrer assim, não se eu pudesse
evitar. Também jurei dar mais valor à vida e à oportunidade que me foi
dada. Era um milagre eu ter sobrevivido.
Outra coisa que me enchia de júbilo a cada dia era minha filhota linda.
Ela precisou ficar mais dois meses no hospital até ganhar peso e receber
alta. Graças aos céus, estava bem agora, e tão esperta!
Victoria era seu nome, pois foi uma vitória tê-la em meus braços, e nos
braços do pai. Ryan se tornou o pai mais coruja que já vi nesta vida. Nossa
garota não podia dar um gritinho e ele já estava com ela nos braços. Nos
dois primeiros meses, não deixava ninguém além dele pegá-la. Nossos
amigos foram nos visitar em nossa nova casa logo quando saímos do
hospital, e tive de brigar com Ryan por isso, então ele deu uma aliviada.
Estava difícil, fora a manha que colocou nela por não largá-la um segundo no
berço. Com quase dois meses e meio em casa, Ryan não queria ir trabalhar,
só para ficar tomando conta de nosso bebê. Quase chutei-o porta afora.
Quando Ryan me levou para conhecer nossa nova casa, ou melhor, a
mansão que ele fez, copiando a casa dos meus sonhos, nem acreditei. Como
não amar um homem desses? Agradecia aos céus por tê-lo em minha vida. A
casa era ladeada por uma varanda generosa e bem ampla. Eu amava isso!
Ryan fez meu sonho se tornar realidade.
O primeiro livro da série Dilacerados, escrita por mim, seria lançado
no próximo mês nas livrarias aqui dos Estados Unidos. Já era para ter saído,
mas não deu, devido à minha gravidez e fuga de Ryan, e depois a minha
quase morte. Após a cirurgia, renasci graças ao amor do Ryan. Estávamos
mais felizes do que nunca. Tudo que passei na minha vida me levou àquele
exato momento. Sofri em demasia, as perdas que tive foram dolorosas, mas,
no final, fui recompensada pelo homem maravilhoso com quem me casaria e
pela minha filha, que ele e Deus me deram. Era feliz também por ter meus
irmãos saudáveis e contentes, bem como vários amigos que dariam tudo por
mim.
Mirei meus olhos negros no espelho, brilhantes como o sol, de puro
êxtase. Rosto corado, lábios com batom na cor cereja. O vestido de noiva
era tomara que caia, com detalhes em pérola. Acentuava bem minhas curvas,
que graças a Deus estavam nos lugares certos. Não queria engordar mais, foi
uma luta perder cinco quilos dois meses depois de ter Victoria. Ryan disse
que não precisava, porque me amaria mesmo assim, mas eu não aceitei,
ainda mais com ele cercado de modelos dotadas de corpos deslumbrantes.
Quando eu respondi isso, ele apenas sacudiu e cabeça e me disse que, para
ele, só existia eu e mais ninguém. Ademais, me colocou na cama e fez o
maior sexo oral que já tive, afinal, não podíamos transar ainda, já que fizera
a cirurgia do coração há somente dois meses.
Olhei para baixo, no top do meu vestido. Escondida pelo pano estava a
cicatriz do tamanho de uma moeda americana. Cheguei a ficar inquieta com
isto certa noite, não querendo me despir diante de Ryan, todavia, ele garantiu
que ainda tinha o corpo mais lindo do mundo e beijou a marca do peito e a
da cesariana. Eu me derreti com seu gesto de amor.
— Está pronta? — perguntou Tabitta, me observando de cima a baixo.
— Linda!
Corei.
— Obrigada — sussurrei.
— Ainda dá tempo de mudar de ideia. — Fez uma bela careta.
Eu sorri. Desde que ela descobriu sobre minha gravidez de alto risco,
já não foi com a cara do Ryan. Eu quase morrendo não ajudou muito a
situação. Ela o culpava por isso, mas ele não era o responsável, e sim as leis
da vida. E não me arrependia, porque agora tinha minha filhota linda. Ela era
uma mistura de nós dois, pele branca com cabelos negros, e íris cor de
caramelo iguais às do pai. Linda, minha garotinha!
— Meninas? Vamos logo com isso. — Sam entrou no quarto com seu
vestido vermelho-sangue, que caiu bem com seus cabelos negros. — Ryan
está impaciente no altar, tive que dar a Victoria para ele não vir procurá-la.
Tabitta sibilou.
— Se aquele desgraçado não me der ela na hora da cerimônia, eu vou
matá-lo. — Jogou seus cabelos loiros atrás das costas.
Tabitta sempre foi uma mulher linda, mas nesses meses estava vendo
algumas diferenças nela, um brilho a mais. O motivo? Jason Falcon, o amigo
de Ryan. Quando soube que ele era o homem que tinha abandonado minha
melhor amiga, fiquei furiosa, só não fui atrás dele porque acabara de ser
operada. Ryan me tranquilizou, dizendo que ele nunca a abandonou de
nenhuma forma, ela que foi embora sem dizer nada. Queria saber mais sobre
isso, mas Tabitta falou que era melhor não, então deixei quieto. Mas ali tinha
uma história, um segredo que ela guardava a sete chaves. Esperava que me
contasse um dia.
Revirei os olhos, pensando no Ryan com nossa bebezinha, nossa razão
de viver. Admirava seu amor por nossa filha.
Eu estava no quartinho da igreja onde seria realizado o nosso
casamento. Era branco, com um espelho grande, para o qual me encontrava
de frente. Dei as costas e fui enfrentar a minha realidade, meu destino,
caminhando pelo corredor que dava para a entrada no salão da igreja. Lira e
Emily eram minhas damas de honra e foram na frente.
Johnny me acompanharia até o altar, pois o considerava meu irmão mais
velho. Antes, porém, tinha uma surpresa para o meu futuro marido, o pai da
minha filha, da única, já que nunca mais poderia engravidar, por isso tomava
remédios para evitar. Completados dois meses e meio após o parto e a minha
cirurgia, fizemos sexo. Esse tempo era mais pela cirurgia, porque o
resguardo acabara há semanas.
Todos os dias de manhã, Ryan me lembrava de tomar remédios, até que
aquilo me cansou e passei a usar um anticoncepcional em formato de
injeção, que durava meses. Não contente com isso, ele foi em busca de um
profissional a pedido de respostas, para ver se eu corria perigo mesmo com
o medicamento. Sabia o motivo do seu medo, e disse para ele ficar tranquilo,
ou envelheceria antes da hora.
— Não ligo se eu envelhecer, meu pau sempre vai ficar duro quando
ver você. — Lançou-me um sorriso amarelo e sumiu com sua cabeça entre as
minhas pernas, me fazendo ver uma constelação inteira.
Voltei ao presente para fazer o que precisava. A porta do corredor se
abriu; permaneci escondida. Olhei para o Johnny, que sorria para mim.
Finalmente apareci e entrei no salão da igreja, que estava toda
decorada com flores de diversos tipos (rosas, tulipas e jasmins) e cores
(brancas, vermelhas e azuis). O aroma era de outro mundo.
Nos bancos do lado direito estavam os amigos dele e seus funcionários.
Fiquei preocupada que convidasse alguma modelo com quem ficou no
passado, mas Ryan jurou que não faria isso comigo. Disse que só havia seis
modelos que costumavam trabalhar para ele e com as quais tinha se
relacionado, contudo, quatro possuíam namorados e duas eram casadas, e
arranjou serviço para elas em outra agência, onde ganhariam mais. Fez isso
para eu não me preocupar quando ele fosse trabalhar, e também para eu não
cruzar com alguma mulher que foi dele no passado. Pulei em seus braços e o
beijei como se o mundo estivesse acabando.
Ele também chamou os motoqueiros MCs da Fênix, de Chicago. Quando
conheci Dominic e sua esposa, Evelyn, gostei deles logo de cara. Os dois
formavam um casal lindo. O cara era um show de homem, moreno, um metro
e oitenta e oito, forte, olhos verde-esmeralda, com cílios grossos e cabelos
castanho-escuros. Tinha uma tatuagem de cobra no braço direito, como se ela
estivesse subindo pelos músculos, e no antebraço esquerdo o nome
“Evelyn”. Havia outras escondidas pela camiseta e jaqueta sem mangas com
emblema da Fênix. Seu apelido no clube era Shadow, talvez pelos seus olhos
mortais. Já Evelyn, sua namorada, era uma ruiva deslumbrante com cabelos
anelados e olhos cor de ouro. A mulher dispunha de um maldito corpo
sarado, deslumbrante.
Também conheci Daemon, o rastreador do MC, foi ele quem me
encontrou. Não sabia seu nome verdadeiro, apenas o apelido, mas o cara era
um deus grego tatuado. Forte, um metro e noventa, olhos caramelo-ouro,
cabelos curtos, brincos em sua orelha direita e um alargador. Ao rir com
Nasx, notei seu piercing na língua. Havia mais visíveis, no entanto, podia
jurar que existiam alguns em outros lugares também. Não que eu quisesse
ver... Ele estava com jeans rasgados nos joelhos e uma camiseta branca com
um colete com o logotipo da Fênix. Carregava uma corrente grande no cós da
calça, presa à sua carteira, no bolso da frente. Nela, havia um par de
soqueiras. Não queria nem imaginar o que fazia com aquilo.
Que coisa! Esse clube de MCs da Fênix tinha somente homens gatos.
Isso me deu a ideia de fazer um livro nesta temática.
Nasx era o vice-presidente, um loiro de um metro e oitenta e nove com
cabelos longos caindo nas costas. Seu corpo musculoso fora forrado por
tatuagens, como os dragões nos braços despidos. Vestia uma jaqueta sem
mangas de couro. Seus olhos eram azul-cobalto. Conclusão: lindo!
Ganhei até um beliscão do Ryan por olhar demais Daemon e Nasx.
Claro que para mim só existia meu futuro marido, e para provar isso faria
uma declaração de amor, embora ele já soubesse o quanto eu o amava e
venerava o chão em que pisava.
Os MCs tinham suas jaquetas por cima das roupas que usavam.
Dominic perguntou se eu queria que eles as tirassem. Obviamente disse não,
não me importava com suas roupas. Apenas falei para ficarem à vontade. Ele
me convidou para ir ao seu clube em Chicago. Aceitei, pois estava louca
para conhecer o lugar e escrever meu novo livro.
Do lado esquerdo, estavam meus amigos: Charles, Jason, Jordan,
Daniel, Alex, Rayla, Bryan, Alexia, Caim, Kate e minha tia, que chegou há
dois dias. Ficou furiosa comigo quando saí do hospital, onde quase morri e
não contei para ela. E também por todas as dificuldades que sofri antes de
conhecer o Ryan, o esforço de trabalhar para conceder uma vida digna aos
meus irmãos. Não me arrependia.
Sam estava preparando um baile, que aconteceria assim que
voltássemos da lua de mel. Não sabia bem aonde Ryan me levaria; quando
perguntei, apenas disse para confiar nele.
Lucky e Sam eram nossos padrinhos de casamento. Estavam no altar, e
Lucky segurava sua filha nos braços, uma bebezinha linda que parecia mais
com ele do que com a mãe: pele branca, cabelos castanho-claros e olhos
azuis. Linda.
— Está maravilhosa, Borboleta — disse Johnny assim que cheguei
perto dele.
— Obrigada, meu amigo — agradeci. Segurou meu braço e seguimos
em direção ao altar.
Vi Ryan discutindo com Tabitta para decidir quem ficaria com nossa
filha. Ela estava com um vestidinho branco e uma tiara na cabeça. Jason foi
para perto de Tabitta, impedindo que um matasse o outro. Os dois eram
como gato e rato, mas eu amava ambos e acreditava que com tempo eles se
dariam bem. Deixaria a poeira baixar quanto à minha quase morte, de que
ela tanto o acusava.
— Gostaria de cantar uma canção para o homem mais lindo do mundo,
que se encontra em cima desse altar, com nosso grande milagre em suas
mãos. — Assim que minha voz saiu pelo alto-falante, Ryan girou na direção
das portas duplas e avistou meus nele.
Vestia uma camisa branca com terno por cima, sem gravata, pois não
queria se sentir sufocado com aquela droga — palavras dele, não minhas.
Estremeci com seu olhar intenso, mas me mantive controlada.
— Poderia citar um milhão de motivos para dizer porque amo você,
mas vou dizer nesta canção de Michael Bolton, All for love. Nós enfrentamos
muitas coisas para ficarmos juntos: o medo, a dor, a escuridão, o tormento e
até a morte. Agora, eternizaremos nossa relação porque fizemos “Tudo por
amor”, como diz a música.

A noite torna-se amanhecer


Para provar que o amor continua
Está escrito nas estrelas e no fundo do meu coração
É com você onde eu ainda permaneço
Através de cada página que viramos
Cada lição que aprendemos
Finalmente nos libertaremos, ou nos forçamos a submeter
Porém o amor está certo e nunca errado
Sabemos que podemos dizer que demos tudo
Demos tudo por amor
A cada passo do caminho, entregamos nossa alma
Demos tudo por amor, tudo por amor
Nas orações silenciosas que rezo
Que palavras nunca poderiam ser ditas,
Para alcançar dentro de seu coração
Não importa onde você esteja
Prometo que encontraremos um caminho
Para caminhar pela estrada que já conhecemos
A estrada que nos guia para casa
Um milhão de sonhos
Eu tenho idealizado e em cada um deles eu via
Seu rosto e você sozinho.

Mudei o final, de “sozinha” para “sozinho”, apenas para mostrar o


quanto esse homem era meu mundo inteiro, o ar que eu respirava. Cantava o
refrão da música dando passos até ele. Tabitta pegou nossa filha de seus
braços, desta vez ele deixou, pois estava chocado demais. Seu rosto brilhava
de felicidade.
Continuei a entoar a canção sem nunca tirar meus olhos dos seus.

A vida passa tão depressa


Pelos segredos que permanecem
Rapidamente o futuro torna-se passado.
Quando eu te abraçar novamente
Estarei te abraçando eternamente
Nas orações silenciosas que rezo
Que palavras nunca poderiam ser ditas,
Para te alcançar através da escuridão
Para alcançar bem fundo no seu coração
Prometo que encontraremos um caminho
Assim como a noite torna-se amanhecer
Pra provar que o amor continua
Através de cada página que viramos
Cada lição que aprendemos
Finalmente nos libertaremos, ou nos forçamos a submeter
Porém o amor está certo e nunca errado
Nós damos tudo por amor.

Ao terminar, vi-me diante dele, com a face molhada. Ele também


parecia querer chorar, todavia, era mais forte do que eu.
— Você me deu mais razões para viver neste mundo, me deu uma filha
linda, um amor pelo qual lutar e viver — sussurrei. — Eu o amo.
Ele me pegou nos braços e me rodou, me beijando com toda a sua
ternura.
— Porra, amo você — grunhiu na minha boca.
Alguém pigarreou do meu lado, então me recompus, afinal, estávamos
em uma igreja. Afastei-me do Ryan e mirei o padre, envergonhada,
entregando o microfone a ele.
— Desculpe por isso — falei.
Ele apenas sorriu.
— Agora que declararam seu amor, vamos começar?
Nós assentimos.
— Sim, senhor — respondi.
— Sim.
— Estamos nesta igreja para abençoar os noivos, caríssimos amigos,
para o vosso propósito de abençoar o matrimônio deste casal, e que seja
firmado na presença de Deus. O senhor já vos consagrou pelo Santo
Batismo, vai agora dotar-vos e fortalecer-vos com a graça especial de um
novo Sacramento. Para poder assumir o dever de mútua e perpétua
fidelidade e as demais obrigações do matrimônio. Diante da Igreja, vou,
pois, interrogar-vos sobre as vossas disposições.
Fitou-nos. Estávamos de frente a ele e de costas para os nossos amigos.
— Ryan Donovan e Angelina Mary Stone, viestes aqui para celebrar o
vosso matrimônio. É de vossa livre vontade e de todo o coração que
pretendeis fazê-lo?
— Sim — respondi, apertando sua mão na minha.
— Porra, sim — anunciou com um sorriso de diamante.
Ouvi risadas dos nossos convidados, mais vindas dos MCs, sentados
nas cadeiras.
— Ryan, estamos em uma igreja, pare de ficar dizendo palavrões —
repreendi.
Ele olhou para o padre, que o encarava de cenho franzido.
— Desculpe, continue.
O padre Francisco assentiu.
— Vós que seguis o caminho do matrimônio, estão decididos a amar-
vos e a respeitar-vos, ao longo de toda a vossa vida?
— Sim. — Observei seus olhos brilhantes e abrasadores. — Para
sempre.
— Para sempre, Anjo — jurou. — Até além da morte.
— Uma vez que é vosso desejo contrair o Santo Matrimônio, unais as
mãos direitas e manifestais o vosso consentimento na presença de Deus e da
sua Igreja.
Fiquei diante do meu lindo e futuro marido, com a mão na sua.
— Eu, Ryan Donovan, recebo você, por minha esposa, Anjo, e prometo
ser fiel, amá-la e respeitá-la, na alegria e na tristeza, na saúde e na
doença, todos os dias da minha vida.
Nosso amor enfrentou tudo isso e resistiu firme e forte. Esperava que
agora só viessem alegrias para nós e nossa filha linda. Quando o Ryan falou
“Anjo” nos votos, o padre ficou com o cenho franzido, mas não disse nada.
Acho que já o ouviu me chamando assim, pois era o único nome pelo qual se
referia a mim. Como não ficar feliz com isso?
— Eu, Angelina Mary Stone, recebo você por meu esposo, Estrela, e
prometo ser fiel, amá-lo e respeitá-lo, na alegria e na tristeza, na saúde e na
doença, todos os dias de nossas vidas.
Também troquei o nome dele por “Estrela”, porque era minha estrela
de mil pontas, pois havia mil motivos para amá-lo. Seus olhos cintilaram ao
ser chamado assim. Sabia o que significa, por isso se iluminou.
O padre ignorou todas nossas mudanças nos votos e continuou.
— Eu os declaro marido e mulher. Não separe o homem o que Deus
uniu. Pode beijar a noiva...
— Graças a Deus, porra — rosnou. Ignorou a risada dos convidados e
a careta do padre, apenas me fitava com intensidade. — Eu te amo, Anjo.
Eu sorri.
— Também amo você, minha Estrela.
Então ele me beijou, selando nossas vidas juntos.

FIM
Louco por você
Série Dilacerados
Livro III

IVANI GODOY
2ª edição
2018
Copyright© - Ivani Godoy

Revisão: Kátia Regina Souza

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.
Todos os direitos reservados. É proibido o armazenamento e/ou a
reprodução de qualquer parte desta obra, através de quaisquer meios —
tangíveis ou intangíveis — sem o consentimento escrito da autora.
Criado no Brasil.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº.
9.610/98, punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Prólogo

EMILY
Quando descobri que o homem que admiro era de fato meu pai, não
pude acreditar. Sempre fui louca por ele — calma, gente, por “louca” me
refiro ao fato de ser sua fã, e ele, meu grande herói; minha mãe surtaria se
pensasse o contrário. Farei oito anos daqui a algumas semanas.
Achei na gaveta secreta da mamãe a foto dele. Lá, ela guardava seu
maior segredo. Um segredo que nunca quis me contar, por mais que eu
insistisse. Por sorte, ela esqueceu a chave antes de ir trabalhar. O que era
estranho, já que nunca a deixava, mas hoje parecia distraída e mais feliz.
Tentei buscar alguma resposta dela, mas eram sempre vagas quando
perguntava o que mamãe não queria responder. Como quando inquiria sobre
o meu pai.
— Mamãe, quem é meu pai? — repetia desde sempre.
— Ele é alguém de quem não precisa saber — replicava. — Apenas se
foi.
O “se foi” eu entendia de dois jeitos: ou morreu, ou a abandonou
grávida de mim. Eu poderia tentar fazer uma pesquisa, ou pedir para o
Nathan fazer para mim, já que o garoto era bom em computador, mas nem o
nome dele eu sabia, por que ela não disse. Aliás, ela não disse nada.
Antes de mamãe sair, perguntei de novo a respeito do meu pai. Sua
resposta foi diferente.
— Amanhã a gente conversa sobre isso.
Eu não queria esperar esse amanhã que talvez nunca viesse a acontecer;
queria a resposta naquele momento.
Cansei de aguardar e abri sua gaveta com a chave que peguei sem ela
saber. Não gosto de fazer isso, porque teria de mentir para ela, mas não
conseguia esperar. Foi quando encontrei as fotos dela com Jason Falcon no
tempo em que ele era mais novo. Acho que na escola em que estudava, em
Austin, no Texas. Os dois estavam sorrindo e pareciam se amar muito. Ela
gargalhava para a câmera, enquanto ele a fitava com adoração.
O que me causou estranheza foi saber que ele desconhecia minha
existência, porque nas colunas sociais onde o via aparecer, dizia não ter
filhos. Jason não parecia estar mentindo.
Agora eu compreendia todas as vezes que brigava comigo quando me
pegava assistindo a uma entrevista dele na TV ou na internet. Ela, com
certeza, não queria que eu descobrisse sobre isso, que ele é meu pai. Mas ali
estava a prova, em minhas mãos: fotos dos dois juntos, o amor presente em
cada linha do rosto dela, e do dele também.
Comparei-me com os dois. Eu tinha cabelos castanho-claros, que
batiam nas costas. Parecidos com os fios curtos dele. Os de minha mãe eram
louros, cor de ouro, e, seus olhos, verde-esmeralda. Já as minhas íris eram
cor de chocolate, iguais às de Jason. Tudo em mim se assemelhava mais a
ele do que a ela. Isso confirmava as minhas suspeitas de que Jason era o meu
pai.
Eu sabia que ele estava em Trenton lutando hoje, era um esportista
brilhante. Eu amava assisti-lo; claro que minha mãe não deixava, por causa
das cenas fortes. Porém, eu escapulia e via assim mesmo, principalmente
quando ela viajava a trabalho, isto é, quase sempre.
Nossa! Ele derrubava os caras com apenas um golpe. “Bala” era seu
apelido. Gostei.
Eu não podia perder a chance de conhecê-lo pessoalmente, já que
estava na mesma cidade que eu. Minha mãe ficaria furiosa comigo, mas não
deixaria a oportunidade passar, ou nunca mais teria uma igual.
Sentia-me mal pelo que fiz com Samira, ela era gente boa. Nathan me
garantiu que aquela seria a dose certa do remédio para dormir, usei somente
as medidas que indicou. Assim, ela não passaria mal, apenas apagaria por
algumas horas. Samira cuidava de mim sempre que minha mãe viajava.
Depois pedia perdão.
Encontrava-me no salão do Hotel Calion, no centro de Trenton, a
cidade onde moro desde que nasci. Estava pensando e armando um jeito de
entrar sem ser notada pela recepcionista que fica no balcão na entrada. Sabia
que ele estava hospedado ali, porque Nathan pesquisou tudo certinho; meu
amigo era um gênio. Eu o ajudei na investigação. Investigação? Estava
pensando como minha mãe.
Liguei cedo dizendo que era fã de Jason, indagando se ele estaria no
hotel à noite. Por incrível que pareça, a mulher respondeu. Talvez
imaginasse que, por eu ser criança, não apareceria lá e ficaria gritando por
ele. Bem, ela não me conhecia... Herdei a teimosia de minha mãe.
Preparava-me para entrar em ação quando um homem alto surgiu, ele
era forte e meio velho, acho que tinha uns quarenta anos, mais ou menos. Sua
expressão era sombria, vazia e fria, tal qual à que vi uma vez na pasta da
mamãe, de um cara do mal que ela prendeu. Quando perguntei o que o velho
de cabeça branca fizera, ela não quis me contar. Achei estranho um senhor
daquela idade ser preso por um crime.
Do lado do homem sinistro havia um garoto de prováveis onze anos,
bem maior que eu. Vestia jeans rasgados e camiseta preta, e tinha cabelos
louros e olhos negros. O adulto segurava seu braço ao passar pela
recepcionista. Aproveitei a deixa e fui para perto do homem, fingindo estar
com ele, mesmo não indo com a sua cara. Um erro que, se minha mãe
soubesse, me mataria. Ela sempre dizia: “Não aceite nada de estranhos, seja
caronas, doces ou o que for”. Costumava cumprir suas ordens, contudo, hoje
estava muito ansiosa para ver o Jason e não liguei para nada, nem para
minha segurança, pela qual mamãe tanto zelava. Ela era bastante protetora
comigo.
Aprendi muita coisa com minha mãe, uma policial. Ensinou-me desde
pequena; bom, desde que comecei a entender o bastante para diferenciar um
cara do bem de um do mal. Sei lá, esse homem ali parecia mal. Talvez pelo
jeito com que apertava o braço do garoto, que estremecia de dor, ou pelo seu
olhar frio. O menino não estava ali porque queria estar, e sim fora forçado a
ir com esse homem. Seria um pai abusivo? Não gostei nada disso. Minha
mãe sempre foi aberta comigo sobre maus-tratos às crianças.
O barbudo entrou no elevador com o garoto. Fui junto, mesmo
estremecendo por ficar perto dele em um espaço pequeno e fechado. Corri o
risco. Ainda bem que a moça da recepção não reparou em mim, ou, se
reparou, supôs que eu estava com ele. Por ela ser recepcionista, deveria
prestar mais atenção nas coisas.
Assim que as portas se fecharam, os olhos negros do cara foram para
mim e brilharam com malícia. Eu sabia que ele era malvado! Enxergava em
sua face. Também sabia que judiava de crianças pela forma que apertava o
menino. Com minha mãe, aprendi a odiar esse tipo de homem. Ela sempre
falava que caras que pensam em fazer maldade com crianças não deveriam
existir na Terra. Concordava com ela, principalmente depois de cruzar com
esse aí.
Abri a mochila que carregava nas costas e a deixei assim, caso
precisasse usar a arma de choque que minha mãe me deu para situações
como essa. E também o spray de pimenta no bolso do lado.
O cara apertou o botão para o décimo andar. Ele não disse nada, mas eu
podia sentir seus olhos a cada segundo em mim. Tremi de medo, apenas não
deixei transparecer, ou ele venceria. Apesar de que, se tentasse alguma coisa
comigo, venceria de todo jeito, já que era um homem grande.
Por sorte, ele estava indo para o mesmo andar do meu pai, que
provavelmente se encontraria no seu quarto, porque a luta acabou há algumas
horas. As pessoas que trabalhavam para ele também estariam, tinha certeza
disso. Bom, esperava que sim, para o meu próprio bem.
O elevador se abriu quase em frente ao número do quarto do meu pai —
sabia qual era porque umas mulheres subiram antes, dizendo estarem indo
para lá. Ele era bastante mulherengo, será que foi por isto que se separou de
minha mãe? Bom, logo descobriria a verdade. Não podia ficar pensando no
que era e no que não era, precisava saber de tudo.
O cara olhou para os dois lados do corredor, com certeza checando
para ver se havia alguém por ali. Ele estava prestes a agir, podia sentir.
Fitou-me com olhos de lobo mau.
— Vocês dois vêm comigo. — Não parecia uma pergunta.
O garoto se esquivou do seu toque e ficou na minha frente, como se
fosse me defender do cara. Não teríamos capacidade de lutar com ele, afinal,
éramos crianças, mas podíamos tentar, porque eu não o acompanharia de
jeito nenhum.
— Você não vai levá-la para sumir com ela igual fez com minha irmã,
seu canalha — sibilou o menino com o rosto duro. Vendo-o assim, parecia
mais velho do que era de fato.
O homem fechou a cara e cerrou os punhos, pronto para acertar o
garoto. Agi por instinto: peguei o spray de pimenta e apertei o frasco,
espirrando em seus olhos. Sorte minha que ele não era um gigante, acho que
tinha um metro e oitenta, mais ou menos.
Ele uivou de dor, e suas mãos foram para seu rosto, enquanto eu peguei
a do garoto e levei-o na direção do quarto de Jason. Toquei a campainha
várias vezes e virei para trás, o cara estava vindo na nossa direção, com
seus olhos agora vermelhos. A porta se abriu e eu entrei correndo com o
garoto ao meu lado, passando pelo homem que a abriu.
— Quem diabos são vocês? — indagou o cara, chamado Silas ou algo
assim, treinador do Jason. Era forte, moreno, parecido com o Samuel L.
Jackson (que eu conhecia dos filmes dos Vingadores). — Esta festa não é
para criança.
Eu estava prestes a pedir que fechasse a porta quando o malvado pegou
meu braço. Gritei tão alto que a música parou. Todos ficaram em silêncio,
acho que de choque, paralisados. Antes, estava havendo uma festa, repleta
de mulheres com poucas roupas e bebidas. Não vi meu pai em nenhum lugar.
O garoto do meu lado pegou algo no bolso e enfiou na mão do cara que
me segurava. Era um estilete. O maldito berrou de novo, soltando meu braço.
Eu parecia um robô, executando ações de modo automático. Não pensei
em nada, apenas segurei a arma de choque, apontei para o seu peito e
disparei. Ele caiu no chão, mole. Antes, ouvi seu urro.
— Que droga está acontecendo aqui? — rosnou uma voz grossa. — Que
gritos são esses?
Jason saía por uma porta de madeira, acho que do quarto. O que me
deixou chocada foi que ele não estava sozinho.
Ofeguei, olhando a única pessoa que nunca pensei em ver ali.
— Mamãe?
Capítulo 1
Disfarce

TABITTA
— Bom dia, Taby — cumprimentou meu chefe assim que entrei no meu
serviço na agência do FBI do Brooklyn.
Teria de me mudar para lá no próximo mês, porque trabalhava muito
longe da minha casa atual. Morava em Trenton, Nova Jersey. Samira ficava
com Emily enquanto eu viajava, o que era quase sempre. No entanto, não
queria abusar da boa vontade dela, por isso no Brooklyn seria melhor para
nós, assim ela ficaria com Mama.
O departamento se situava em um prédio pintado de branco de quatro
andares, no centro do Brooklyn, com várias janelas de vidro. Gostava de
trabalhar ali, amava o que fazia, bem como adorava meu chefe, que era um
George Clooney gato.
Sorri para ele.
— Thomas, bom dia — disse, beijando seu rosto. Ele tinha cinquenta
anos, era casado com Sandra há quase trinta. Os dois me ajudaram muito em
um momento ruim da minha vida, no qual não tive mais ninguém, então eu os
considerava como se fossem meus pais.
Em casa, eu o chamava de “Papy”, e ali por Thomas, pois estávamos
em um ambiente de trabalho. Tanto ele quanto eu levávamos nosso serviço a
sério.
Eu me formei na polícia há pouco tempo, ainda estava no período de
experiência, assim disse Papy, mas já prendi vários assassinos e bandidos
corruptos. Apenas um, o pior de todos, não consegui pegar ainda. O motivo
de eu me tornar policial: Sebastian Ruiz.
— Sem beijos no trabalho, já disse — me repreendeu, se afastando de
mim.
Ele me alertara que ali nos trataríamos como os dois profissionais que
éramos, e deixaríamos nossa ligação de pai e filha de lado. Às vezes, eu
esquecia.
— Você morreria sem meus beijos. — Sorri, pegando um café preto
sem açúcar na cafeteira e tomando um gole. Isso me ajudava a relaxar.
Sentei à mesa. A sala não era grande, havia apenas a mesa com três
cadeiras, sendo que uma era a minha; um sofá pequeno no canto; e um
armário com vários arquivos. Meu trabalho envolvia mais o meu PC.
Ele revirou os olhos negros.
— Você é indomável — disse, colocando-se na cadeira diante de mim.
Seus cabelos eram um pouco brancos, usava óculos de grau e era um tanto
robusto. Eu o amava.
— Concordo. — Houve um tempo em que um homem me domou, e, em
certo nível, continuava exercendo seu efeito sobre mim até hoje, tanto que
não estive com ninguém depois dele, enquanto o tal já ficou com metade da
população feminina da Terra.
Expulsei esse pensamento ou sucumbiria na frente de Thomas. Isto não
poderia acontecer, ainda mais no meu horário de trabalho.
Thomas e Sandra sabiam que existiu alguém importante na minha vida,
alguém que era meu mundo inteiro. Somente desconheciam quem era, eu não
disse nada, pois ele se tornou bastante famoso: Jason Falcon, o Bala, como
as pessoas o chamavam. Uma vez, fui a uma luta sua, mas não fiquei muito
tempo, após reparar que a tatuagem que fizemos juntos tinha desaparecido de
seu corpo. Foi como se ele pegasse uma navalha e rasgasse o meu coração.
Dada a dor insuportável, fui embora. Depois disso, passei a evitar
reencontrá-lo; por sorte, a internet e a TV mostravam quase todos os seus
passos.
— Por que não sai e namora um pouco? O agente Marrone tem
demonstrado interesse — falou Thomas, interrompendo meus pensamentos.
Pigarreei, tentando retornar ao presente, não querendo pensar em Jason.
Sei o que desencadeou essas lembranças: mais cedo, antes de levar Emily à
escola, ela me perguntou sobre seu pai de novo, onde ele vivia, o que fazia e
por que não a procurava. Eu não podia responder a nenhuma dessas
questões, para sua proteção, e de Jason. Se Sebastian soubesse dele... Não
queria nem cogitar isto. Faria o que fosse preciso para manter ele longe de
mim, o fiz por oito anos e sete meses, aguentaria mais um pouco, não me
importando que isto me matasse a cada segundo.
Foquei no agora, no meu trabalho, e tranquei minhas emoções — ou,
pelo menos, tentei.
— Lincoln? — Sorri sem vontade. Era um dos meus muitos disfarces,
fingir felicidade sendo que meu coração sangrava aos poucos. — Ele tem
uma namorada, mas não pode ver uma mulher que seus olhos só faltam sair
de órbita.
— Ele tem? — indagou com descrença.
Eu ri.
— Está vendo? Sim, mas seu comportamento cafajeste não é de um
homem comprometido. — Bebi mais um gole do meu café. — Sabe quando
eu transaria com um homem daqueles? Nunca, a não ser para eu cortar suas
bolas e fazê-lo comer.
Desta vez, Papy gargalhou. Ele e Mama não se importavam com minha
linguagem, falava o que pensava e não me importava nem um pouco.
— Bom ponto, um homem que não respeita sua mulher devia estar
sozinho. — Fez uma careta. — E quis dizer para você namorar alguém, não
necessariamente transar.
Eu sacudi a cabeça.
— Papy... desculpe, Thomas — corrigi antes dele me advertir por
chamá-lo assim. — Não estou a fim de arrumar namorado, aliás, minha vida
está boa do jeito que está, sem um homem para se meter nela.
— Está para nascer um homem que vai domá-la e fazê-la cair de
joelhos. — Mal sabia ele que já existia um cara capaz disso, somente não
podia tê-lo. — Durante os oito anos que a conheço, até agora, só vi você
tratando-os com gelo e mais nada.
Mudei de assunto, não queria falar com ele sobre romance. Já fui
rasgada, e não havia a mais remota possibilidade de eu ser de novo, mesmo
se Jason não estivesse incrustado no fundo de minha mente e em meu
coração.
— O que faz aqui na minha sala? — sondei, curiosa. Ele não ia muito
ali, para evitar falatório por eu ser sua suposta protegida. — Não que eu não
queira sua companhia, claro — acrescentei.
Ele sacudiu a cabeça.
— Você sempre foge quando o assunto é seguir em frente com sua vida,
não? — criticou de um jeito paternal. — Taby, quero que seja feliz, não só
comigo e Sandra e com a nossa Emily, mas também que encontre alguém
capaz de alegrá-la como você merece.
Evitei um suspiro, pois isso era impossível: a felicidade plena era algo
que não sentia há tempos, aproximadamente oito anos e sete meses. As
únicas luzes na minha vida eram Emily e meus pais adotivos, Thomas e
Sandra. E também Samira, amiga que cuidava de Emily para eu trabalhar;
era meus pés e minhas mãos, não sabia o que faria sem ela quando me
mudasse, sentiria muita falta. Além deles, havia ainda a minha doce amiga
Angelina.
— Não preciso de ninguém, Thomas, apenas de você, Mama e Emy.
— Emy me ligou hoje cedo... — começou, me observando de lado.
— O que ela queria? — Lembrei que a peguei no telefone antes de ir
para o serviço, mas ela disse que estava falando com Nathan, seu coleguinha
da escola, por isto não dei bola. Ela mentiu para mim? O que queria com
Thomas para não me dizer a verdade?
— Ela me disse que você chegou triste ontem à noite e foi chorar em
seu quarto. — Seu tom denotava preocupação comigo. — O que aconteceu
com você? Não tivemos nenhum caso que abalasse seu emocional para agir
assim. É outra coisa?
Eu me levantei e olhei a rua lá fora da janela de vidro. A minha sala
ficava no segundo andar do edifício. Não me abalava sempre com o meu
serviço, só quando o assunto era crianças maltratadas e abusadas, ainda mais
sexualmente, este era meu ponto fraco. Por esse fato, caso fosse preciso,
havia um psicólogo à disposição no trabalho.
Não queria lembrar do que houve ontem à noite, mas as lembranças
estavam ali, me comendo viva.
Estava saindo do shopping em Nova York, fui lá para comprar uma
fantasia para Emily e algumas coisas para a nova casa no Brooklyn. Foi
quando vi Jason abraçado com uma mulher morena; morena vírgula, ela tinha
pele branca e cabelos negros. Vê-lo com outra não foi o que me quebrou,
embora isso também tenha doído muito. O que me fez sangrar foi vê-lo
passando a mão em sua barriga de grávida e a chamando de “preciosa”.
Havia muito carinho ali, mas nada romântico. Enxergara aquela garota na TV,
alguns meses atrás: era mulher de Lucky Donovan, um dos homens mais
influentes da cidade, pelo que soube, e melhor amigo de Jason.
A dor naquela hora foi tremenda, quase desfaleci lá mesmo no corredor
da loja, mas me controlei, ou ao menos tentei. O gesto carinhoso dele para
com ela foi demais, era pior do que saber que ele estava fodendo por aí,
porque naquele momento eu queria que fosse comigo, o que era impossível.
Eu ansiava tanto por seu toque que tudo em mim gritava pedindo para ser
feito ou morreria.
Vendo a cena dele passando a mão na barriga daquela mulher me fez
lembrar e desejar que ele tivesse feito o mesmo quando eu estava grávida de
nossa filha. Queria suas mãos, seus beijos e tudo que ele viesse a dar. Eu
teria tudo isso se não tivesse partido, ou talvez estivéssemos sob lápides
agora... Estremeci. Isso não aconteceria.
Foi por isso que saí de lá quase correndo antes dele me ver, por mais
que eu o quisesse, eu não poderia.
Thomas veio até mim e me abraçou, me reconfortando.
— Taby, querida...
— Eu vi alguém que não vejo há muito tempo — comecei a contar.
Fomos interrompidos com a porta sendo escancarada, e depois uma voz.
— Ora, ora, será que a dona Sandra sabe que a está traindo com uma
mulher mais nova, Thomas?
Eu me afastei de Thomas enquanto ele fazia uma careta pela suposição
do imbecil que entrou sem bater, como se a sala fosse dele.
Fuzilei o babaca. Ele tinha olhos negros e sorriso de comedor de
merda, achando que sabia de tudo, mas na verdade não sabia de nada.
— Isso que está atrás de você se chama uma porta, e ela estava fechada.
Deveria bater antes de entrar, idiota, não acha? — Cerrei meus punhos,
querendo esmurrá-lo.
Um cara que estava ao seu lado riu. Ele tinha cabelos negros curtos,
com mechas sobre seus olhos azul-cobalto, que combinavam com a pele
bronzeada e barba por fazer.
— Gosto dela — disse com um sorriso que faria as mulheres caírem de
joelhos aos seus pés. — Eu falei para batermos antes de entrar.
O comedor de merda o fuzilou.
— Que tal ficar calado, Bryan? — rosnou ao outro, que só deu de
ombros, ainda sorrindo. Após, seus olhos mortais pousaram em mim. —
Você tem a boca muito espertinha, não é?
Dei de ombros.
— É o que dizem. — Se ele achava que teria medo dele, estava muito
enganado. Já lidei com homens piores. — O que faz aqui na minha sala?
Garanto que não veio só para ver se minha boca é esperta.
Ele pareceu não ligar para o que eu disse, deixando-me com mais
vontade de quebrar seus dentes.
— Estou curioso. — Olhou de mim para Thomas. — Vocês dois...
Revirei os olhos.
— Não existe “nós dois”, seu idiota, ele é como um pai para mim.
Agora diga logo o que quer ou desapareça da minha sala, porque só de olhar
para sua cara me dá vontade esmurrá-la.
Ele fechou a cara e deu um passo até mim com os punhos cerrados.
Perguntei-me se ele iria realmente me enfrentar; quase ri disso. Não sei
quem ganharia: ele era forte, mas eu sabia lutar, derrubei caras maiores que
ele.
Thomas se pôs entre nós para evitar a carnificina que eu estava prestes
a fazer nesse arrogante.
— Tabitta, sossegue — ordenou, fitando sombriamente o homem que
vestia um terno social que valia mais do que minha moto. — E você também,
Dennis. O que faz aqui? Não veio de Manhattan apenas para ver se eu estou
traindo minha esposa — sibilou.
Dennis revirou os olhos.
— Precisamos dela para uma missão junto com o agente Bryan. —
Olhou para mim e depois para o cara de olhos azuis.
— Tantos agentes na CIA e você vem no FBI buscar uma minha? — O
tom de Thomas era de desdém. — Por que não foi no FBI de Manhattan ou
no seu departamento?
— Você quebrou o regulamento de não contar a ninguém sobre nós. —
O cara teve a audácia de fechar a cara.
Thomas riu de modo frio.
— Não vai precisar dela para sua missão? Então com certeza ela terá
de saber de onde vocês são e o que vão fazer, não é?
— Posso recusar, chefe?
Dennis me cortou.
— Você não pode.
Eu ri, pensando em esmagá-lo com o salto de dez centímetros da minha
bota.
— Não perguntei a você. — Mirei meu chefe, ignorando o rosnado do
Dennis.
— Você não pode recusar — repetiu. — Ou trabalha conosco, ou vai
presa.
Gargalhei de modo zombeteiro.
— Posso saber o que fiz de tão grave que a CIA precisa me levar
presa? Não estou conspirando contra o meu país ou algo do tipo. Essa é a
função de vocês, não?
— Tabitta — Thomas me repreendeu.
— Você tem uma ligação com quem precisamos prender, estamos atrás
dele há muito tempo. — Observou com atenção minha reação diante de suas
palavras.
Ri com escárnio.
— A única ligação que você vai achar entre eu e um bandido é minha
bota indo parar em suas bolas como um presente de boas-vindas.
Dennis sorriu, não sei se zombando de mim ou pelo que eu disse. Medo
de ser presa eu não tinha, afinal, não devia nada a ninguém.
— Mostre a ela, agente Bryan.
Franzi a testa enquanto Bryan abria sua bolsa preta nas costas e pegava
uma pasta da mesma cor, entregando-a a mim. Olhei para Thomas, que estava
de cenho franzido. Abri a pasta e o que vi fez meu coração saltar pela boca,
minhas mãos suaram frias de dor e medo. Eu ofegava.
— Tabitta, o que é? — indagou Thomas.
Eu o ignorei, passando folha por folha. A primeira foto mostrava eu,
uma adolescente de dezessete anos, ajudando sua avó a fazer compras na
esquina de casa. Margareth, com seus sessenta anos, cabelos grisalhos e pele
enrugada pela idade, sorria para mim. Lembrava-me desse dia, eu não queria
ir com ela, não gostava, porque vovó conversava com todos e demorava a
voltar para casa. Sinto falta disso, da sua alegria.
Alguns dias depois da minha fuga naquela noite, chequei nos jornais e
até na polícia se havia notícias de um corpo encontrado na rua em que
morávamos em Austin. Foi um choque descobrir que não, mas isso não me
dava esperança de ela estar viva, eu tinha certeza de que ele apenas sumiu
com o corpo, só para eu não achá-la. Aposto que Sebastian fez isso, assim
ninguém investigaria o assassinato.
Tudo em mim doía, meu coração estava sangrando pelas memórias
vivas daquele dia. Bloqueei isso ou desfaleceria ali, na frente dos agentes.
“À noite você se deixa sucumbir à dor, Tabitta”, pensei como um mantra.
A outra foto era de um homem que procurei por anos provas para
mandá-lo para cadeia pelo resto de sua vida, foi por isso que me tornei
agente do FBI, sabia que logo encontraria seus podres: tráfico humano,
tráfico de drogas e vários outros crimes. Até agora, não conseguira provas
suficientes. Sempre que chegávamos perto, outra pessoa assumia a culpa e ia
para a cadeia no lugar do salafrário desumano.
Entretanto, eu também encontrei pessoas que trabalhavam para ele,
como Franklin Salazar, um velho que vivia pendurado em meninas menores
de idade. Um pedófilo desgraçado, no qual adoraria colocar minhas mãos.
Seu pau não levantaria nunca mais, nem à base de remédios, depois que eu
acabar com ele.
Nas fotos seguintes, o velho safado apertava as mãos de Sebastian Ruiz
em sua casa no México, com duas meninas de quatorze ou quinze anos atrás
deles. Elas estavam de cabeça baixa, uma morena e outra ruiva. Eu sempre
odiei homens que abusavam de mulheres, para mim todos deveriam ser
decapitados. Claro, por ser uma policial, com obrigação de fazer justiça, não
deveria pensar isso; não ligava. Esses vermes não deveriam existir.
Respirei fundo. Olhei para Dennis, que pela primeira vez estava sério.
— O nosso infiltrado no cartel no México nos disse que Sebastian Ruiz
teve uma filha. — Ele me olhou de lado, me sondando. — Uma filha que
desapareceu com sua avó no Texas, e nunca mais voltaram para lá. Onde
vocês duas foram morar? — Apontou para a pasta — As fotos mostram só
Sebastian e os seus homens saindo da casa, não vocês. Onde está sua avó
agora? Eu tenho quase certeza que ela não sobreviveu, não é?
Evitei sua pergunta e fiz outra. Não queria pensar naquele momento, eu
já tentara imaginar o que aquele crápula fez com minha avó, mas nada de eu
descobrir isso. Talvez ele tenha tirado ela de lá pelo mesmo lugar que eu saí
da casa, foi a única conclusão que achei. Talvez eles soubessem que havia
câmeras no local.
— Não. Mas se tem um infiltrado no seu cartel, por que precisa de
mim? Ele não pode buscar as provas de que carecem?
— O agente Milles foi descoberto e morto há alguns dias — falou
Dennis, sombrio. — Por isso vim aqui hoje.
— Você deu queixa do Sebastian Ruiz matando sua avó? — questionou
Bryan.
Eu suspirei.
— Queixa sem corpo? Por quatro anos tive esperança dela, de alguma
forma, ter sobrevivido. Com o tempo e sem notícias, cheguei à conclusão de
que ela morreu mesmo, mas não podia ligar Sebastian ao crime, por isso me
tornei policial, para buscar prendê-lo. — Minha voz estava fraca no final.
— Vamos conseguir pegar esse cara — garantiu Bryan.
— E o que tenho a ver com isso? Eu não tenho nenhuma relação com
seus crimes e sua crueldade.
Ele riu como se guardasse um segredo, ainda sexy.
— Tabitta Rodrigues Ruiz, nascida no Texas em agosto de 1989, mãe
Luciene Rodrigues, ex-mulher de Sebastian Ruiz. Foi assassinada em julho
de 1991 no México. Você foi criada por Margareth Rodrigues, que está
desaparecida desde março de 2006 — falava sem nem mesmo olhar na
pasta. — Diz que ela foi assassinada por Sebastian, e que presenciou todo o
acontecido, e logo depois você desapareceu sem deixar rastros. Todos na
cidade pensam que vocês se mudaram.
— Como vocês a descobriram aqui? — A voz do Thomas soava rouca.
Podia ver que ele estava magoado por eu esconder isso dele. Devia ter
contado a ele e Mama sobre meu passado e minha avó. Eles foram sempre
bons comigo. Eu era realmente uma cadela egoísta.
— O que nos levou a você foi nosso infiltrado no México mencionando
seu nome antes de sua vida ser eliminada a mando de Sebastian. —
Suspirou. — Então chequei mais a fundo e a achei, uma agente do FBI.
— Eles sabem onde estou morando e onde trabalho? — Minha voz
falhou, temendo que ele viesse atrás de mim e descobrisse sobre Emily.
— Sebastian sabe que você está no FBI, um dos subordinados dele até
sugeriu que a pegasse para trabalhar para eles. — Bryan sacudiu a cabeça
com desdém. — Mas ele disse que você não os ajudaria nunca. Supus que
ele sabe que você o odeia, e que quer sua ruína.
— Com cada fibra do meu ser — disse com ferocidade.
— Por isso queremos você conosco, assim que prendermos Franklin
Salazar, e você fizer a prisão dele. Nós pensamos que ele sairá da toca, pois
Franklin é seu braço direito. É onde pegaremos Sebastian e seus cúmplices
— explicou Bryan, sério.
— Conseguimos a informação de que Salazar é o cabeça do tráfico
humano. Não há sucessor para este cargo, por isso temos certeza de que
Sebastian mesmo vai assumir o que Salazar fazia depois que o trancafiarmos
— disse Dennis.
— Está falando em me usar como isca para atrair Sebastian?
— Não temos outro jeito, a solução é você nos ajudar. O problema é
que não é só ele que está nesse ramo, há peixes maiores ainda, incluindo
agentes do FBI e do meu departamento, deputados e vários políticos, juízes...
a lista é imensa.
— Daqui? Quem seriam esses? — Fiquei em choque. Tentei imaginar
todos com quem trabalhava e pensar que algum deles era um maldito rato.
— Não posso dizer, não posso deixar que vaze, e descobrirem que
suspeitamos deles. Quero pegar todos os ratos de uma vez — rosnou Dennis.
Eu sorri.
— Dê-me cinco minutos com cada um deles, vou ensinar o que faço
com ratos e pedófilos.
— Tabitta, nosso serviço é prendê-los e mantê-los presos, não dar
lições usando a força — contra-atacou Thomas.
Dennis revirou os olhos.
— Vamos achar provas suficientes para mandá-los por toda sua vida
para a cadeia. Não posso mais mandar infiltrados para o cartel, afinal,
levaria anos para a pessoa chegar perto dele, e mais mortes que não quero
ter sob minhas mãos. Agora ele está desconfiado e sua segurança foi
reforçada, então vamos atraí-lo para fora do México e buscar mais provas
contra ele. — Pela primeira vez, Dennis parecia triste, acho que devido ao
seu agente que morreu.
— Qual o plano? Eu sei que Franklin Salazar é um tremendo de um
canalha que abusa de meninas novas. Como será a operação? Precisamos de
algo concreto para o prendermos e o deixarmos lá sem direito à fiança.
Dennis foi até minha mesa, pegou um pendrive e colocou em meu
notebook. Seus olhos se estreitaram ao ver a foto de duas pessoas no plano
de fundo do meu PC.
— Jason Falcon? Quem diria que a dama de gelo tem um ponto fraco
por um homem. Há uma aposta correndo por aí sobre você gostar de mulher
— provocou.
Revirei os olhos e bufei. Até parece que não ouvi isso antes. Ali estava
a foto de Jason no ringue de luta, e Emily sorridente ao sair da escola no ano
passado. Os dois amores da minha vida.
— Apenas faça o que tem de fazer e pare de prestar atenção no que não
diz respeito a você — repliquei.
— Acho que você precisa de um homem de verdade, e não ficar
sonhando com um famoso — ronronou. — Se quiser, estou disponível. —
Seu olhar varreu meu corpo, dando um sorriso.
Eu ri com desdém.
— Você acha que tem chance comigo? Se enxergue, nem se eu estivesse
bêbada ficaria com você. Cuide do seu trabalho, em vez de dar em cima de
mim. Vamos ao plano, já que veio aqui até falando em me prender por estar
aliada com um homem que tem centenas de mortes nas costas, tráfico de
menores e de drogas, porte ilegal de armas e obstrução da justiça. Eu me
pergunto por que ainda não aniquilaram o filho da puta... Não seria a
primeira vez que a CIA faz algo assim por debaixo dos panos.
— Você tem uma ideia muito errada da gente — rosnou, mas abriu o
arquivo no PC e virou a tela para nós.
— Pelo visto, você sabe bastante sobre seu pai... — começou Bryan.
— Oh, oh, pare aí, não é por que aquele monstro deixou seu esperma na
minha mãe que quer dizer que seja meu pai — rosnei. — O único pai que
considero é o Thomas.
— E eu aqui pensando que vocês eram amantes. — Dennis sorriu para
mim e para careta do Thomas. Os olhos do Papy estavam grandes, acho que
mais pelo que eu disse dele, que o considerava meu pai. — Mas ela é muita
areia para o seu caminhão.
— Pare de dizer besteira e explique o plano, não vou arriscar minha
cabeça ajudando a CIA sendo que nem trabalho para eles.
— Você é o nosso melhor elo para usar contra ele. Aqui. Precisamos
derrubar todos seus pontos de drogas, prostituição e vários outros. No final,
você irá à TV e dirá que logo ele será preso.
— Aposto que ele vai ficar furioso com isso.
— Sim, ele vai, mas acreditamos que, em vez de mandar alguém matá-
la, virá ele mesmo, é aí que o pegaremos. — Apontou para a tela. Ali, havia
dois contêineres perto de um píer, estava noite, mas alguma claridade
emanava de um poste de luz não muito longe. O que vi na outra foto me
chocou e me fez quase vomitar: as portas abertas do contêiner e, dentro,
várias mulheres, aliás, crianças e adolescentes. Da faixa dos quatorze aos
dezenove anos, sujas e encolhidas.
— Essas fotos foram tiradas no porto de Oakland, na Califórnia,
semana passada. Aqui há mais ou menos quinze meninas, pelas notícias que
tive da polícia local, que logo acionou o FBI porque sabiam de quem era
aquilo, e que o departamento do FBI estava atrás deles há tempos. Thomas
chamou o UNODC, o Escritório das Nações Unidas. As garotas eram de
países diferentes, algumas do México, outras do Brasil, Argentina, Tailândia
e China. Todas raptadas de suas famílias.
— Houve quatro casos como esses no Texas, na Geórgia e na
Califórnia. O policial Lewis, da Califórnia, me ligou e pediu para nós
montarmos um esquema para encontrar as pessoas que estavam fazendo isso.
Então chegamos ao suspeito que temos, por isso Lewis nos avisou de novo
sobre essa apreensão que fez na Califórnia — elucidou Thomas. — Alguns
agentes foram para lá buscar mais provas contra o suspeito que foi preso,
falar com os pais das garotas e sondar se possuem mais suspeitos neste caso.
— Por que não me disse sobre isso? — perguntei, magoada.
Ele levantou as sobrancelhas negras para mim.
— Tabitta, eu sou chefe deste departamento, nem sempre posso dizer
tudo aos meus funcionários. Querendo ou não, aqui você é uma, e lá fora é
minha filha, então trate de aceitar. E também não vi você me dizendo sobre
seu pai ser um dos homens mais procurados da América. Um homem com a
ficha tão extensa quanto o fã-clube dos Beatles.
Eu me encolhi por dentro com o ressentimento em sua voz.
— Sinto muito...
— Depois vamos conversar sobre isso, em casa com Sandra. Agora,
estamos no trabalho. — Usava um tom duro. Sempre falava assim quando
estava magoado ou me reprendia. — A polícia encontrou um homem com as
meninas, o nome dele é Tom Myers. Ele foi encarcerado e morto na prisão
no dia seguinte, antes de falar algo. Acredito que Sebastian mandou executá-
lo para não delatar nada que tenha feito ou mandou fazer, como raptar as
garotas.
— Certo, então o que Franklin tem a ver com essas meninas? Sei que
aquele velho safado fica com garotas menores de idade, mas ele também
participou desta vez? Ele estava lá nesse dia? — sondei, embora crente que
sim.
— Sim, ele estava na Califórnia, mas o desgraçado tem um álibi.
— Me deixe adivinhar: disse que estava transando em um quarto de
hotel qualquer, não é? — indaguei com amargura.
— Sim, foi checado nas câmeras de segurança do Hotel Belmont que
esteve realmente lá com uma mulher maior de idade. Por isso, não
conseguimos ligar ele ao tráfico de humanos. Sabemos que ele estava lá, só
não conseguimos provar — disse Bryan.
Dennis me olhou.
— Aí que você entra, Franklin abriu um clube de BDSM Fetish em
Manhattan. Acreditamos que, neste lugar, não frequentam só meninas maiores
de idade, já que seu fetiche é mais por garotas novas.
Odeio homens abusadores de menores. Por mim ele estaria morto.
Contudo, antes eu teria o prazer de fazê-los comerem seus paus e os
estupraria com uma pá enferrujada para eles saberem como é bom ser
rasgados.
— Qual vai ser o meu disfarce? Se você disser que vou ter de servir de
submissa a alguém, te castro aqui mesmo. — Fuzilei o Dennis — Amo meu
trabalho e adoraria ver Franklin servindo de mulher na prisão, mas não vou
foder...
— Ninguém aqui falou que vai foder alguém — retrucou. Senti-o se
encolher. Era bom mesmo, porque não transaria por aí para cumprir meu
trabalho e levar alguém preso. Se eu fosse assim, poderia ter entrado
disfarçada no cartel do México, dizendo que estava com Sebastian, e feito
tudo que quisesse até ele abaixar a guarda e matá-lo. Não sou capaz, por isso
minha justiça e vingança estão demorando tanto.
— Tenho uma agente disfarçada lá dentro que está fazendo isso, mas ela
não é a submissa, e sim o contrário. Fizemos assim para ela não precisar se
deitar com ninguém, mas, às vezes, isso acontece, faz parte do trabalho. —
Dennis acrescentou, me olhando de lado.
— Bom, ainda bem que não trabalho para CIA, não é? — retruquei,
depois franzi o cenho. — Então o que vou fazer lá dentro? Faxina?
Dennis e Bryan fitaram meu corpo. O olhar do Dennis era de quem
queria me devorar, mas Bryan apenas me mirou incrédulo, como se
duvidasse que eu serviria para ser faxineira. Esse homem com cara de bad
boy, com certeza, já foi fisgado por uma mulher.
Dennis riu.
— Desculpe — disse, entre risos. — Querida, se você estivesse
vestida de faxineira, seria a fantasia de todos os homens daquele lugar. Logo
Franklin estaria entrando em contato com você para trabalhar para ele. Você,
com certeza, sabe o que exerce sobre os homens, não é?
Sei que sou bonita, não posso dizer que puxei os genes dos meus pais.
Puxei vovó quando era nova. Ela tinha cabelos louros e longos, olhos verde-
esmeralda e corpo curvilíneo, assim como eu. Vi sua foto uma vez. Linda!
Esta palavra a descrevia. E ainda era até o dia em que Sebastian a matou
friamente na minha frente; ele pode não ter puxado o gatilho, mas não
significa que ele não a matou.
Pigarreei, ignorando o aperto no meu peito com lembranças dolorosas.
— Então o que vou fazer? Qual será meu papel? — Tentei controlar a
voz.
O cara de pau sorriu, eu sabia que ali tinha coisa.
— Você será a submissa de Bryan...
— Espere, o quê? — interrompi, chocada — Eu não vou...
Bryan me cortou.
— Não vamos transar ou algo do tipo, apenas fingir que sou seu mestre.
E, você, minha submissa.
— E se houver uma situação em que tenhamos de fazer alguma coisa?
— sussurrei.
Sua expressão caiu um pouco, acho que com medo de algo que eu não
sabia o que era.
— Vamos torcer para que isso não aconteça, porque não estou a fim de
trair minha namorada. — Estremeceu com esse pensamento. Gostei dele,
isso que era homem fiel, e não o bastardo do Lincoln, que não respeitava a
coitada da sua namorada.
— A nossa agente infiltrada dará cobertura a vocês dois. Não posso
dizer quem é ainda; ela vai procurá-los assim que chegarem lá amanhã à
noite. Nós precisamos de todas as provas que conseguirmos contra Franklin
Salazar. Vamos pegar os peixes pequenos, depois o grande.
Certo, eu não gostei disso, mas penso que podia lidar. Esperava não
precisar tocar em Bryan ou fazer as coisas que fazem naquele tipo de clube.
Nunca fui em um, porém, sabia como funcionava.
Logo começamos a tramar nosso plano de ação. Não apreciava meu
papel lá dentro, e nem o fato de servir de isca para atrair Sebastian do
México aos Estados Unidos, no entanto, me sacrificaria para ligá-lo ao
tráfico de humanos, que estava acontecendo aqui como uma maldita praga.
A justiça por seus atos estava para começar. Eu faria de tudo para ele
cair; aliás, não só ele, mas todo seu império do crime.
Capítulo 2
Reencontro

JASON
— Jason, se concentre, cara — ordenou Silas, o meu treinador. Ele
também era meu amigo há muito tempo, acho que desde que me tornei lutador
profissional, há quatro anos.
Silas me achou brigando na faculdade e nas ruas de Cambridge,
Massachusetts. Aquele foi um tempo difícil para mim, pois minha cabeça não
estava em um bom lugar. Caçava brigas com todo mundo que me olhava. Ele
me treinou para descarregar por meio do esporte essa raiva que me consumia
vivo.
No ringue, deixava sair todas as frustrações e a raiva presas dentro de
mim, me corroendo como larvas de fogo. Essa ira que me consumia se dava
por causa de uma garota do meu passado, uma que ficou na minha maldita
pele, como uma tatuagem. “Ou pior, porque tatuagens podem ser removidas.
O sentimento por ela, não”, pensei, amargo. Mulheres, bebidas, nada a apaga
de dentro de mim.
Em março, fará dez anos desde que Tabitta se tornou tudo na minha
vida. Ela era doce, meiga, tão linda e inocente que eu só queria colocá-la em
um pedestal e dizer para ninguém tocá-la. E, se por acaso isso acontecesse,
eu o mataria.
Por um ano ela foi meu mundo inteiro, por um ano ela se tornou minha
razão de viver, de ser feliz. Depois, se foi como um cometa, deixando-me
destroçado e cheio de raiva por não ter sido homem suficiente para ela.
Mesmo que oito anos e nove meses tenham se passado após sua partida, não
conseguia esquecê-la, sentia o seu cheiro de jasmim a me consumir todas as
noites. Seu gosto de pêssego ainda parecia estar na minha pele e na minha
boca.
Quando conheci Tabitta, ela se tornou minha luz no meio da escuridão
que eu vivia. Minha vida em casa não estava boa, aliás, nunca foi, era como
viver no inferno. Entretanto, com ela, tudo era o paraíso.
Eu já tive milhares de mulheres, mas nenhuma delas me marcou do
mesmo modo. Nenhuma mulher me fez sentir como se o ar me faltasse só ao
olhá-la. Nenhuma delas fez meu coração bater tão forte, como se fosse parar,
só em estar perto dela. Nenhuma mulher me fez esquecê-la, nem mesmo por
um segundo. Era só sexo, mais nada. Acho que era por isso que eu as
deixava amarradas e as fodia por trás, assim não veria seus rostos e não me
sentiria culpado por usá-las como eu fazia.
Senti um soco em minha boca e cambaleei para trás, me trazendo de
volta ao presente.
— Droga, Jason — sibilou Silas. — Onde está a sua fodida mente?
Nós dois treinávamos no ringue para uma luta que teria em alguns dias
em Nova Jersey. Esse era o meu problema: onde a porra da minha mente se
encontrava, deixando meu cérebro mais fodido do que já era. Soube por
Angelina que Tabitta morava em Trenton.
Suspirei, limpando a boca e tirando o sangue dali.
Merda, por que não parava de pensar nela nem por um segundo? Desde
o dia em que Angelina, a namorada do Ryan, disse que era amiga da Tabitta,
eu andava assim desligado. Isso foi há dois meses. Quando soube onde
morava e que ela não estava longe de mim, eu mal pude acreditar. Acreditar
que eu a encontrei após anos sem saber seu paradeiro, como estava vivendo,
se estava feliz. Depois desse dia, ela estava mexendo e fodendo com a minha
cabeça de novo, ainda mais do que antes.
Não fui procurá-la em sua casa, mesmo sabendo onde ela morava e o
que fazia da sua vida. Tão diferente do que ela imaginara. Lembro-me de
Tabitta dizer que sonhava em ser professora de jardim de infância, porque
amava crianças. Uma profissão muito diferente do que aquela com que
trabalhava hoje. Jamais imaginei que se tornaria uma agente do FBI. Ela com
armas nas mãos, enfrentando homens que poderiam machucá-la... Só de
pensar nisso, me dava vontade de matar todos que tentassem, qualquer um
que encostasse um dedo nela. Ainda tinha o instinto de protegê-la, igual fazia
no passado.
Eu não conseguia simplesmente ir vê-la, pelo fato de eu não ser capaz
de perdoá-la pelo que fez, por ter me deixado sem dizer adeus. Quais foram
as suas razões? Eu não fui suficiente para ela? Não fui homem o bastante? Às
vezes, achava que era por essa razão que eu ficava com mulheres aleatórias,
como se fosse provar algo com isso, como se fosse provar que eu era bom
de cama ou apenas bom o suficiente. Mas isso não acontecia, porque logo
depois eu me sentia como um lixo. Dava razão a ela para ter me deixado.
— Maldição! — rosnei, saindo da minha academia que ficava na
Madison Ave.
Silas praticamente me expulsou de lá, já que não estava conseguindo me
concentrar em nada no treino. Já era quase onze horas da noite. Chega! Isso
acabaria hoje, eu não podia ficar com essa raiva se apossando de mim por
ela ter me deixado no passado sem nenhuma explicação. Precisava fazer
alguma coisa, mas o que iria me ajudar?
Cheguei ao clube de BDSM Fetish, que ficava mais afastado do centro.
Nunca frequentei este lugar, era novo, acho que abriu há pouco.
Não fui à Rave, mesmo com meus amigos estando lá e me convidando.
Minha cabeça não estava boa para ficar perto de alguém, eles começariam a
fazer perguntas que eu não poderia responder. Não agora. Não com a porra
do meu peito me sufocando.
Precisava me manter no controle ou explodiria. O único lugar onde
podia conseguir isso era o clube de dominantes. Há tempos não ia a um
desses: fazia dois meses que não ficava com mulher nenhuma, não sentia
vontade de fazer sexo com ninguém mais. Não depois de saber onde Taby
vivia, só a uma hora e meia de mim. Tão perto, e ao mesmo tempo tão longe.
Como o sol: eu o vejo, mas não posso me aproximar ou tocá-lo.
Entrei no clube, estava meio escuro, com luzes vermelhas. Era assim
mesmo, pois dava mais suspense, vontade e prazer. As paredes do salão
eram vermelhas.
Uma mulher nua e presa por correntes pendia do teto. Outras, de
joelhos, prostravam-se na frente de seus Dons. Pensei que, vendo essas
cenas, meu pau levantaria. Pelo jeito, me enganara. Estava frustrado por não
sentir nada assistindo a cenas de sexo dos Dons com suas submissas. Não
tinha vontade de fazer o mesmo com uma mulher qualquer desse lugar,
apenas sentia nojo disso tudo. Nojo e raiva de mim mesmo, por ser tão
fodido.
Estava prestes a dar a volta e ir embora quando vi alguém que eu nunca
pensei em ver de novo, não ali naquele lugar. Sonhava o tempo todo em
reencontrá-la, contudo, nunca num ambiente como o clube. Travei meus
músculos e meu coração bateu forte no peito, parecia que logo teria um
enfarto. Mas eu não me importaria de morrer vendo, pela última vez, o rosto
que sempre iluminou meu mundo.
Tabitta estava na minha frente; a menina de dezoito anos que usava
vestidos longos, cabelos presos num rabo de cavalo e óculos de grau agora
estava ali. E virou um mulherão. Linda! Embora ela sempre tenha sido.
Sempre foi como um sol para mim, onde entrava, iluminava tudo com seu
esplendor e doçura.
Usava seus cabelos louros soltos às costas. Com salto alto, tinha um
metro e oitenta, mais ou menos. Lembro-me de gostar de colocar meus dedos
nos seus fios lisos e sedosos. Seu cheiro de jasmim era de outro mundo. Sua
silhueta estava mais delineada do que me lembrava; antes, ela era mais
cheia, não gorda, claro, apenas seus vestidos a deixavam um pouco maior, o
que achava bom, assim ninguém veria seu corpo, além de mim. Ela também
usava óculos de grau na época, escondendo seus olhos verde-esmeralda.
Mesmo com eles, não deixava de ser linda, tal qual agora.
Tornara-se ainda mais perfeita, mas a reconheceria em qualquer lugar
do mundo. Vendo-a assim, me dava vontade de matar qualquer um que
olhasse para ela. Porém, isso não podia acontecer, porque ela não me
pertencia mais.
Encontrava-se a alguns metros de mim, vestindo uma saia de couro
preta curta que parecia mais um cinto, nem podia chamar aquilo de saia, pois
o tecido mal cobria a bunda dela. Vestia um sutiã preto, também de couro.
Seu rosto estava forrado com maquiagem, bem diferente da menina doce pela
qual me apaixonei: no passado, ela não gostava de usar nada de maquiagem,
e mesmo assim continuava linda; aliás, era mais linda sem. Foi isso que me
fez apaixonar por ela.
Entrou no salão e foi direto até um homem acompanhado de duas
mulheres. A primeira era loura, de joelhos na sua frente, com os braços
presos para trás; bonita, mas não chegava perto da borboleta. Havia também
uma morena do lado do cara, usando um vestido vermelho; não parecia
submissa.
Taby não me viu, porque estava de costas para mim. Mesmo no escuro,
enxerguei a tatuagem de borboleta nas suas costas, perto da bunda. Pedi para
fazermos juntos, simbolizando nosso amor. Ela ainda estava ali. Eu que
escolhi esse lugar, por que era um local que eu gostava de ficar beijando. A
minha tatuagem fiz no meu peito direito, mas a cobri com uma águia; era
doloroso demais vê-la todos os dias e saber que nosso amor se foi, ou o
dela, pelo menos. O meu continuava vivo, me comendo e me corroendo por
todos esses anos. Pelo visto, Taby não apagara a dela. Eu queria saber seus
motivos para não removê-la de sua pele, já que me tirou da sua vida como se
eu não fosse nada.
Sua barriga lisa, onde muitas vezes passei a língua, estava de fora. O
que eu amava fazer; aliás, eu amava fazer tudo com ela. Por que ela estava
naquele clube? Por que se vestia assim? Como se fosse uma dessas garotas
submissas? Tabitta até tinha o colar de submissa. Será que era uma submissa
de alguém? Meu peito doeu em resposta, por vê-la desse jeito. O pior seria
ela estar com alguém. Com certeza pertencia a algum desses caras.
Ela chegou no cara barbudo, que estava com as duas mulheres. Será que
era dele? Se fosse, por que as outras duas estavam ali?
— Oh, maldição, não vou simplesmente ficar vendo isso e não fazer
nada — sibilei, olhando com fúria para o cara.
Taby sorriu para ele ao se aproximar. O bastardo largou a mulher de
joelhos à sua frente e foi ao seu encontro. Que homem não iria? Só se fosse
cego. Ele pegou seu colar e a puxou para ele, como se fosse beijá-la. Ela
desviou o rosto, e ele beijou seu pescoço.
Eu poderia ter ficado ainda mais furioso vendo essa cena, se não
estivesse enxergando suas mãos em punhos, como se quisesse acertá-lo na
cara. Bom, eu estava louco para fazer isso também. Meu sangue ferveu
quando ele pegou sua bunda. Eu me sentia como se tivesse uma bomba
dentro de mim, pronto para explodir em mil pedaços.
Cerrei meus punhos e fui até eles sem me preocupar onde eu estava e
que eu poderia ser preso por isso. Puxei o braço dela para longe dele e
esmurrei o cara, que já ia reclamar, mas não teve tempo, porque caiu
desacordado no chão. Eu só ouvi o poc do meu punho acertando sua face.
— Que porra foi essa — ela rosnou, irritada. Fez menção de me
acertar, mas ela travou no chão, com as mãos caindo ao lado do corpo assim
que seus olhos encontraram os meus. Congelou no lugar, como se tivesse
sido petrificada.
Eu pude ver que ela me reconheceu na mesma hora, talvez já soubesse o
que eu me tornei, a fama de lutador. Sua respiração ficou ofegante, como se
tivesse corrido muito e cansado. Mas também vi dor em seus olhos verdes.
— Jason... — Sua voz falhou.
Nesse momento, parecia que existia somente nós dois. O clube sumiu,
as pessoas sumiram. Custava a acreditar que ela estava na minha frente. E
que eu a amava da mesma forma que antes. Entretanto, também senti raiva
por ela ter me deixado sozinho para superar sua perda, seu abandono. O que
não foi superado merda nenhuma, a dor sempre esteve comigo, agora ela só
aumentou mil vezes, tanto que era quase difícil respirar.
— Olá, Tabitta, quanto tempo. — Soei duro ao cumprimentá-la.
Seus olhos se estreitaram com o ressentimento na minha voz. O que ela
queria? Que eu a recebesse em um tapete vermelho cheio de rosas? Ela foi
embora sem nenhuma explicação, porra. Taby devia ter sido mulher o
suficiente para dizer que não me queria mais na sua vida, dizer que acabou e
pronto.
Algumas pessoas gritaram pelo segurança. A mulher loura começou a
berrar. Não dei uma mínima para isso.
— Quem é ele? — indagou a morena que estava ao lado do cara.
Tabitta piscou, saindo do congelamento, e olhou sobre o meu ombro
para alguém. Depois, pegou meu braço.
— Eu resolvo isso, então continue — respondeu à mulher sem tirar os
olhos de mim. Puxou-me para um corredor meio escuro, com as paredes de
vidros, onde podíamos assistir aos quartos.
Ela pegou algo no sutiã e colocou no ouvido: uma escuta.
— Houve um problema, continuem sem mim. — Estava rouca.
A garota foi disfarçada àquele lugar, usando só esse pedaço de pano?
Seus superiores aceitaram isso? Malditos bastardos. Aposto que todos
gostavam de vê-la assim.
— Ele ia encontrar com o seu subordinado, foi quando... — Ela parou e
me olhou de lado. — Bom, o James Martine está inconsciente agora.
Franklin acabou de chegar.
Eu segui sem dizer nada, esperando para ver o que ela faria. Tabitta me
puxou para um dos quartos, que estava recheado de coisas, como a cruz de
Santo André no canto e uma plataforma cheia de correntes em uma parede.
Ali era onde os Dons prendiam suas parceiras para elas ficarem à sua
disposição.
Ela suspirou e continuou falando com quem quer que fosse pelo fone
sem fio.
— Alguém do meu passado — respondeu enquanto fechava a porta.
Aquilo foi como um soco no estômago. Se eu lutasse com dez homens e
tivesse apanhando deles, não doeria tanto quanto doeu ela dizendo isso.
Então Taby me considerava apenas alguém do seu passado, que nunca
significou nada? Alguém sem importância?
Expirei para me acalmar e tentar controlar a dor que me comia vivo.
— Sim. Mantenha-me informada. — Desligou a coisa e me olhou com
os olhos de ventania, o seu verde me pareceu mais escuro. — Por que droga
você foi bater no James?
Estreitei meus olhos.
— Ele tocou em sua bunda. — Cerrei os dentes. — O que tinha na
cabeça para se submeter a isso? A se vestir assim, e ainda por cima vir em
um lugar como este?
Ela maneou a cabeça de lado e riu, amarga.
— Falou o cara que fica com duas mulheres de uma vez? Agora está se
preocupando se um homem tocou em minha bunda? — dizia, venenosa. —
Você só pode estar brincando com a minha cara, porra!
— Até parece que você também não ficou com homens por aí depois de
ir embora e me deixar sem uma maldita nota dizendo pelo menos adeus —
rosnei. Não precisava explicar que nunca fiquei com duas mulheres ao
mesmo tempo, apenas com uma, e dividia ela com meus amigos, Ryan e
Lucky, antes de se apaixonarem por suas namoradas. Jordan também.
Eu queria matar todos os homens que a tocaram durante toda sua vida,
desde quando ela foi embora até o maldito inconsciente lá no salão.
Seus olhos verdes viraram tempestade. Eu sabia que ela estava perto de
perder a cabeça, parecia que queria bater em mim, podia ver suas mãos em
punhos, destacando os nós dos dedos. Tão diferente da doce e meiga garota
que conheci e pela qual me apaixonei há quase dez anos. Essa parecia mais
uma leoa do que um gatinho manso.
Ela estava prestes a dizer algo, mas foi interrompida pelo seu celular. O
som veio do meio de suas pernas.
— Lugar legal para esconder um telefone — eu disse, desejando que
minha boca estivesse onde ele estava agora. Eu faria um trabalho excelente.
Taby grunhiu para mim, pegando o celular na cinta-liga em suas coxas e
atendendo.
No momento em que eu disse que ela ficou com outros homens, percebi
um brilho de dor em seus olhos, fora sua reação, foi como se eu tivesse
batido nela. Ela ficou com outros caras, não ficou? Taby não pode ter
passado esses anos sem que um cara a tocasse, se foi embora porque não fui
homem suficiente para ela. Eram muitas perguntas, e nenhuma resposta.
Ela atendeu e logo arregalou os olhos.
— O quê? — Passou a mãos nos cabelos num gesto exasperado. Notei
suas unhas vermelhas. — Maldição! — Mirou o espelho na parede, que dava
para o corredor. Ali era onde as pessoas assistiam aos casais transando nos
quartos. Alguns iam lá só para assistir, e não para participar.
— Quantos minutos tenho? — Suspirou. — É claro que vou fazer,
vamos pegar aquele cretino custe o que custar.
Ela me olhou ao desligar o telefone.
— Eu tenho que prender um cara...
— Franklin Salazar? — chutei.
Já ouvira falar desse velho com mais de sessenta anos que ficava com
menores. Ryan, alguns meses antes, conseguiu umas fotos dele com menores
de idade e o ameaçou para comprar sua parte na Editora Luxem. Depois, deu
as fotos ao Bryan, que disse que cuidaria disso. Talvez fosse montar um
esquema para prendê-lo, somente não informou quando. Acredito que não
pudesse contar, por não ser permitido pelos seus superiores.
Droga! Ele sabia que Tabitta estava ali hoje. Por que não disse nada?
Eu quase ri disso. Como ele me contaria, se não sabia que eu a conhecia?
Aliás, ninguém sabia. De que forma diria aos meus amigos que a única
mulher que eu amei foi embora porque não fui suficiente para ela?
— Você o conhece? — indagou.
— Não, mas ouvi dizer que ele fica com menores, é verdade? É por
isso que está aqui. — Não foi uma pergunta: era óbvio que ela estava ali por
isso.
— Sim, preciso prendê-lo. Não posso dizer muito, já que não fui
autorizada a isso, mas estamos há eras o cercando, por isso não tenho muito
tempo. — Olhou para o espelho com a expressão preocupada.
— Tempo para quê?
Ela me fitou.
— Franklin está vindo checar se você está me punindo. Ele acha que
você é meu dono, e eu o desrespeitei indo para outro cara. Ele virá ver o que
fará comigo para me castigar como Dom. — Riu com desgosto. — Ironia,
não? Vindo de um homem que sai com várias mulheres ao mesmo tempo.
— O que vamos fazer? — sondei, antecipando o que ela ia sugerir. Eu
estava louco para isso acontecer, louco querendo tocá-la novamente, após
anos. Só de pensar, meu pau ganhou vida, uma vida que perdera há dois
meses pelas outras mulheres quando soube onde ela estava.
— Vamos ter que atuar como dominante e submissa. — Pareceu não
gostar dessa parte. Isso foi como um soco no estômago.
— O quê? — Eu não a tocaria se ela não me desejava, não como eu
ansiava por ela. Porra! Isso era demais.
— Isso mesmo. — Foi tirar sua saia. Um sutiã preto segurava seus
seios fartos, um pouco maiores do que aos seus dezoito anos. Agora, com
vinte e seis, tinha um corpo até mais fabuloso. — Garanto que está
acostumado a ver mulheres sem roupas. — Seu tom era amargo feito fel no
final.
Observei seu rosto lindo e moldado, como se um artista habilidoso a
tivesse feito. Era um pouco cheio, embora suave, com boca voluptuosa,
olhos verdes e cílios bem desenhados, que a deixavam mais linda. Ela
estava com raiva de mim por ter tido outras mulheres?
— Se não tivesse ido embora, garanto que jamais haveria outra mulher
na minha cama — sibilei.
Ela engoliu em seco e olhou para o chão por um segundo, depois
sacudiu a cabeça se esforçando para não perder o controle.
— Isso não vem ao caso agora. — Soou grossa, como se estivesse com
dor.
Mas quem deveria sentir dor era eu, e não ela, que me deixou. Hoje, a
revendo, o abismo no meu peito se escancarou. Não sabia se seria capaz de
deixá-la partir... Ao pensar nisso, sentia que morreria...
Ela já estava descendo o zíper da minúscula saia. Coloquei minhas
mãos em cima das suas; ela tremeu ao meu toque, como se tivesse recebido
um choque.
— O que está fazendo? — Meus olhos não deixaram os dela. Não sabia
do que seria capaz se alguém a visse sem roupas assim. Mataria qualquer
um.
— Não temos escolha, ok? Ele chegou aqui com uma menor, com
certeza vai me checar antes de prosseguir. — Seu tom era sombrio e com
asco ao falar sobre Franklin. — Ele vai entrar em ação com a menor, então o
prenderemos. — Olhou nos meus olhos, e vi minha dor refletida nos dela. —
Estamos há muito tempo tentando pegá-lo, não posso desperdiçar esta
oportunidade.
— Não vou transar com você aqui, com pessoas olhando — retruquei.
Ela estreitou os olhos.
— Você não faz isso sempre? Não é por isso que está aqui? — A
amargura marcava presença, mas ela expirou para se controlar e pegou meu
pulso. — Por favor, eu não tenho muito tempo.
Eu suspirei. Ela estava certa, foi para isso que fui lá, porém, tinha
desistido e já ia embora, então a vi e não pude abandoná-la.
— Tudo bem, mas você me obedecerá, ok? Se não quiser assim, não
vamos fazer nada. — Deixei o ultimato, afinal, eu precisava estar no
controle, e não havia nada melhor do que com ela.
— Certo, use seu lado Dom comigo, já que você não veio aqui à toa. —
Novamente, a dor se expressava em suas palavras.
Expirei, tentando não pensar no seu sofrimento. Eu já mal suportava
aquele em meu peito. Encarei a parede com várias correntes. Eu a prenderia
ali, assim o velho tarado não poderia ver seu corpo esculpido. Peguei sua
mão e a levei onde as correntes estavam.
Ela levantou as sobrancelhas, olhando de mim para a parede.
— Ainda fará o que eu disser? — sondei de novo.
Suspirou, frustrada, fitando o espelho e depois eu.
— Tudo bem. — Ficou perto da parede vermelha cheia de correntes.
Virei-a de costas para mim e a porta, deste modo, todos veriam somente
sua parte traseira. Se aquele velho pensava que a enxergaria nua, estava
redondamente enganado.
Ela fungou quando prendi suas mãos nas algemas de couro vermelhas
para cima da cabeça, com os braços abertos.
Peguei seus cabelos e coloquei no lado direito do rosto. Lambi seu
pescoço e sua orelha. Taby tremeu. Eu gostava de ouvi-la ofegar e suspirar
de prazer, aquilo era música para meus ouvidos. Algo que sempre sonhei em
escutar de novo, pois nunca esqueci.
— Agora, olhos na parede, e não olhe para mim até eu mandar —
ordenei e mordisquei sua orelha.
Ela gemia e respirava alto. Eu me afastei e fui a um armário, porque
sabia que as coisas de que precisava estavam ali. Todos os clubes eram
parecidos, eles deixavam tudo pronto para você pegar e usar.
Escolhi uma venda preta de couro com renda e um chicote de várias
tiras. Voltei onde ela estava amarrada e à minha mercê, toda para mim.
Coloquei o chicote no bolso de trás da minha calça jeans e beijei suas costas
lindas. Adorava beijá-las, não sabia bem o porquê, mas amava fazer isso,
desde sempre. Depois, desatei o fecho do sutiã.
— Vamos tirar isso, sim? — Estava rouco de desejo, prazer, luxúria e
muito amor não correspondido. Tentei não pensar nisso, ou meu pau nem
levantaria.
Ela gemeu de novo e fechou os olhos, apertando as pernas uma na outra,
querendo tirar seu atrito.
— Está molhada para mim? Responda — mandei, porque ela hesitou.
— Sim, muito molhada — revelou, ofegante.
— Bom saber. Agora vou cobrir seus olhos, assim será mais prazeroso.
— Tapei seus olhos lindos com a venda.
Mirei o vidro e vi o sorriso cruel do Franklin. Ele estava com uma
menina loura do seu lado, acho que ela devia ter no máximo dezesseis anos.
“Esse homem é um canalha”, pensei com rancor. Não via a hora de o
prenderem.
Deixei de lado quem assistia e olhei para a obra de arte esculpida à
minha frente, com as costas nuas e perfeitas. Ela estava apenas com a saia e
os seus saltos. Eu não tiraria a última peça de roupa, não na frente desse
bando de abutres, porque não era só o Franklin que estava ali, havia outros
caras desconhecidos.
Peguei o chicote e passei as tiras pelo seu corpo. Ela estremeceu, mas
não disse nada. Bati em suas costas. Tabitta gritou e ofegou ao mesmo tempo.
— Já fez isso antes? — sondei, querendo saber algo dela, e, ao mesmo
tempo, não desejando escutar a resposta. Por sorte, esses quartos eram à
prova de som. Os bastardos só podiam nos ver.
— Não, mas é bom sentir dor e prazer.
Eu sorri.
— Que bom que gostou. — Fiz de novo em suas pernas, sua bunda e
suas costas. Não bati com força, não queria machucá-la.
Suas mãos puxavam as correntes no ato de prazer, fazendo o tilintar
delas correr pela sala. Eu sabia que ela estava a ponto de gozar.
Olhei para a janela e vi o velho safado empurrar a menina para o quarto
de frente a este e fechar a porta.
Bryan apareceu no corredor e sorriu, piscando através do vidro. Já o
outro cara que estava com ele olhou para Tabitta e estreitou os olhos, depois
franziu o cenho para mim. Parecia, pela sua expressão, ter um monte de
perguntas, eu só não sabia quais seriam elas. Tinha uns cinquenta ou sessenta
anos, talvez. Havia ainda outro homem que estava olhando Tabitta, esse com
luxúria. Minha vontade foi de quebrar sua cara, mas me controlei. Fui até a
janela e apenas baixei a cortina vermelha, impedindo-os de ver algo.
Agora éramos só nós dois. Caminhei até ela e a virei de frente para
mim, então vi seus seios que tanto amava chupar. Afrouxei as correntes para
não machucarem seus braços esticados e retirei sua saia minúscula.
— Você disse...
— Não tem ninguém olhando, cobri com as cortinas. — Fitei seu corpo
nu, exceto pela calcinha de renda vermelha que mal tapava sua boceta, na
qual estava louco para colocar a boca, a fim de saborear o gosto que tanto
queria de novo.
— Deslumbrante! — rosnei, colocando um mamilo na boca e o
sugando. Ela gritou, mas logo se calou. — Pode berrar, essas paredes são à
prova de som.
Eu lambia, mordiscava e chupava seus mamilos. Minhas mãos foram
para sua calcinha; rasguei o pedaço de pano. Taby ofegou, e antes que
recuperasse o fôlego, enfiei dois dedos dentro dela e circulei seu clitóris
com o polegar. Ela puxou as mãos com seu corpo tremendo, estava perto,
podia sentir. Então retirei os dedos. Tabitta fez um muxoxo de reprovação.
— Não pare, estou tão perto...
Caí de joelhos à sua frente e vi o seu monte de Vênus escorrendo suco
devido ao prazer. Levantei sua perna direita e coloquei no meu ombro. Inalei
seu sexo com cheiro de jasmim, tal qual eu me lembrava. Suguei seu suco
como se não me alimentasse há anos, pois, de fato, não me alimentei dela por
muitos anos: quase nove sem seus gemidos, sem provar e degustar seu gosto
de pêssego que era meu êxtase, e, pelo visto, continuava sendo.
Peguei sua bunda linda e a trouxe mais para mim. Mordisquei seu
clitóris de leve, então ela gritou, com seu êxtase batendo na porta, e gozou na
minha boca. Eu a segurei firme, lambendo-a até ela parar de tremer.
Levantei-me e abaixei a braguilha de minha calça jeans, tirando meu pau
duro para fora. Com suas pernas em volta de mim, enfiei meu pau em sua
boceta molhada, gostosa e apertada. Estava sem o piercing que tinha no
pênis; sempre que treinava ou lutava eu tirava, mas adoraria tê-lo ali, só
para ele encostar-se ao seu clitóris e fazê-la gritar ainda mais.
Coloquei minha boca na dela e a beijei enquanto estocava meu pau
dentro de sua boceta apertada. Ela gritava, e eu a mordia, degustando e
lambendo seus lábios e sua língua saborosa, tanto que senti gosto de sangue.
Não liguei, apenas queria matar essa fome que me consumia há muitos anos.
Nenhum de nós disse nada. Eu sabia que se falasse algo estragaria as
coisas naquele momento, então fiquei quieto.
A cada estocada do meu pau dentro de Tabitta, eu queria ir mais fundo,
o bastante para me fundir a ela, se assim fosse possível. Desejava ficar ali
para sempre, mas não podia segurar mais. Logo que ela gozou, eu a
acompanhei, desfrutando do êxtase tanto meu quanto de Taby ao vê-la
desmanchar nos meus braços. Eu a beijei por mais alguns segundos até
pararmos de tremer do nosso pós-orgasmo.
Não queria sair dali de dentro dela, estava tão quente e confortável. No
entanto, fomos interrompidos por alguém batendo à porta.
Nessa hora, ela afastou sua boca e desprendeu suas pernas da minha
cintura.
— Maldição! — praguejou. — Me solte, eu preciso me vestir.
Tirei a venda de seu rosto. Ela piscou por um segundo. Precisava saber
o que Tabitta estava pensando sobre o que acabáramos de fazer. Antes, ela
era fácil de ler, como um livro aberto; agora, não conseguia decifrá-la, ela
parecia ter mil cadeados.
Fechei minha calça e soltei suas mãos das correntes e algemas. Ela
suspirou e observou seu corpo, depois me fitou de olhos arregalados.
— Droga, você não usou a maldita camisinha — reclamou.
Foi a primeira vez que perdi o controle em toda a minha vida. Nunca
transei sem camisinha, apenas com ela no passado, quando era só minha.
Agora, eu não sabia a quantos homens ela pertenceu. Só de pensar em outro a
tocando, fiquei furioso.
— Eu estou limpo — disse e inquiri: — E você?
Seus olhos viraram fendas enquanto vestia a saia e o sutiã. Ela ficou
sem calcinha, porque eu rasguei a sua. Ajeitou sua roupa e foi para o
banheiro, evitando a pergunta. Ela estava muito mudada; antes, quando
ficava nua na minha frente, corava em um tom de rosa lindo, eu achava tão
perfeita a cor na sua pele. E hoje? Não... Esta mulher e a menina que amei
eram tão diferentes e, simultaneamente, tão iguais. Queria descobrir o
motivo que a levou a me deixar e mudar da água para o vinho. Precisava
saber se a culpa foi minha. Onde foi que errei? Não dei valor suficiente a
ela?
— Por quê? — Segui-a até o banheiro.
Tabitta me encarou após se ajeitar na frente do espelho.
— Por que o quê?
Eu ri, amargo.
— Você só pode estar brincando comigo! Você foi embora sem dizer
uma maldita palavra, apenas desapareceu do mapa. Por que simplesmente
não disse que não me queria mais? E que encontrou algo melhor... — Essa
parte era bem esquisita. Lembro-me de acordar em um quarto de hotel em
Chicago com Dominic do meu lado. Ele apenas me disse que ela lhe pediu
para me levar para longe de Austin. E não falou mais nada. Eu queria
quebrar sua cara aquele dia, mas não era culpa dele por ter feito o que
Tabitta solicitou. Na ocasião, ele estava todo machucado, não ia piorar as
coisas.
Voltei para Austin depois e fui até sua casa, mas ela estava vazia. As
pessoas disseram que ela e sua avó tinham ido embora da cidade, e que
ninguém sabia para onde. Surtei, não recordo o que aconteceu em seguida
porque a dor foi forte, fiquei uma semana bebendo no chalé até Dominic ir lá
e me levar para longe, dizendo que soubera que ela foi para Massachusetts.
Fiquei anos lá, e nada dela aparecer.
Ela expirou e fechou os olhos por um momento. Após, me olhou: a
máscara estava de volta, sua frieza era tanta que me encolhi. Contudo, por
um instante, pensei ter visto dor em seus olhos.
— Não é hora para conversa. — Esquivou-se com frieza. — Deixe o
passado para trás.
Cerrei os dentes.
— Meu pau estava dentro de você há um segundo atrás, e você quis
aquilo, não minta para mim — sibilei.
Ela passou por mim, saindo do banheiro.
— O que tivemos foi apenas sexo, e mais nada. — Sua voz saiu aguda.
— Era preciso fazer aquilo para ganharmos tempo.
Aquelas palavras saindo de sua boca foram como um tiro no meu peito,
apenas para terminar de me matar.
— Então você só transou comigo para resolver um caso?
Ela me fitou com os olhos frios como uma maldita geleira.
— Sim, foi só por isso, então siga com sua vida, finja que nunca me viu
aqui. E esqueça o passado, pois ele não volta mais.
Eu custava acreditar que estava ouvindo isso da sua boca. Ela
enlouquecera? Como podia pedir isso depois de tudo que vivemos juntos,
depois de hoje? Depois de eu sentir seu gosto, de estar com meu pau dentro
dela? Como ela pôde dizer isso? Nunca achei que algo doeria tanto após ela
ter me deixado, mas isso era mil vezes pior, ver sua frieza e saber que nunca
seria bom o bastante para ela, jamais seria. Isso era o que o velho sempre
dizia a mim, que minha mãe foi embora e me deixou porque eu não era
suficiente para ela e nem para ninguém.
Passei por Tabitta ou faria uma besteira da qual me arrependeria pela
eternidade, como implorar que ficasse comigo.
— Meus parabéns pelo seu bônus — desdenhei, abrindo a porta. — Um
dia você foi o meu mundo inteiro, agora você não é nada.
Saí sem olhar para trás, abandonando para sempre a única mulher que
deixei entrar e que quebrou meu coração em milhões de pedaços — não só
uma, mas duas vezes.
Capítulo 3
Convite

TABITTA
Passado

Estava atrasada para ir à escola, aliás, sempre chegava atrasada, mas


naquele dia foi porque meu alarme não despertou para me acordar na hora
certa. Eu morava com vovó, porém, ela saiu cedo e não pôde me chamar.
Sempre que acordava atrasada ela me chamava.
Minha mãe morreu quando eu tinha dois anos, fui criada por minha avó.
Na verdade, mamãe foi embora depois que me teve e nunca mais veio saber
de mim. Vovó não falava muito dela, apenas que ficou muito iludida pelo
meu pai e perdeu a cabeça, fazendo o que ele queria. Eu não entendi o que
ela quis dizer com isso, e até perguntei, mas ela não contou. Ao inquirir à
vovó sobre meu pai, ela evita falar nele. Acho estranho, contudo, se ele não
liga para mim, eu também não vou me importar com ele. Afinal, até agora,
nunca precisei, e espero nunca precisar.
Quando me mudei para o Texas, três meses antes, e fui estudar nessa
escola, conheci um garoto tão lindo! Seus cabelos na altura do queixo, um
pouco de barba por fazer, olhos cor de chocolate e olhar intenso me
conquistaram logo de cara. No princípio, achei que estava só me iludindo,
como uma adolescente que sonha em ficar com o menino mais popular da
escola.
Depois de muito observá-lo de longe, vendo-o ficar com várias garotas
da escola e nunca olhar para mim, quase ri ao pensar nisso: quando um
garoto que jogava no time de futebol me notaria? Jamais! Eu não era nada
como elas e suas minissaias e blusinhas minúsculas. Usava vestidos largos e
óculos. Ele tinha razão em não reparar em mim, embora doesse enxergá-lo
com outras.
Teve uma vez que o vi no ginásio com Pamela, a rainha do baile da
escola. Loura e linda! Ela estava de joelhos na sua frente e já ia abrir suas
calças. Eu ofeguei. Acho que foi alto, porque seus olhos se conectaram aos
meus por breve segundo, antes de eu me virar e sair correndo. Ouvi ele me
chamar e não parei, só deixei de correr quando cheguei à minha casa e
chorei com a dor que me consumiu. Naquele momento, soube que o amava.
Eu estava tão longe que não senti quando topei em alguém. O impacto
foi grande, teria caído se não fosse por braços fortes a me segurar. Meus
livros não tiveram a mesma sorte: foram todos ao chão.
— Que porra, olhe por onde anda — disse uma voz de mulher. — Você
devia me impedir de cair, e não ela.
Virei para cima e me deparei com um par de olhos chocolate e um
sorriso sexy no canto da boca. Ele estava de jaqueta e jeans desgastados.
Arregalei os olhos e ajeitei meus óculos no rosto. Era só o que me
faltava, não podia ter me deparado com outras pessoas, em vez desses dois?
Eu me afastei de seus braços como se tivesse levado um choque, não o
querendo perto de mim; ainda mais depois dele ter passado a noite com
Pamela, que estava ali na minha frente.
Notei também a presença de Dominic e Joana, amiga de Pamela, duas
vagabundas de primeira. Ela era morena, de cabelos negros. Já Dominic era
lindo: moreno, alto, olhos verdes e sorriso sexy. Claro, não tanto quanto
Jason.
— Você está bem? — sondou Jason.
— Eu estou — respondeu Pamela. Ela usava saia e blusinha rosa. Não
sabia como ela vestia isso na escola sem o diretor reclamar, talvez por ser
filha dele. — Agora deixe essa sonsa e vamos embora. Olhe para ela... —
Fitava-me com seus olhos castanhos zombadores. Sempre que ela me via era
isso, me esnobava e dizia que Jason nunca ia ser meu. Eu a ignorava, mas ela
tinha razão. — Esses vestidos são de sua avó?
Jason suspirou e estreitou os olhos, mirando-a. Vi raiva estampada em
suas feições lindas. “Estranho, já que os dois ficaram juntos na noite
passada”, pensei, amarga.
— Eu não estava falando com você — falou, sombrio. Achei o tom
esquisito, ele não falava assim com ninguém, não que eu tenha visto. — Só
porque já fodemos algum dia não significa que temos alguma coisa, então vê
se me erra e vá procurar sua turma.
— Jason...
Ela começou, mas ele a interrompeu de forma abrupta.
— O que tivemos há duas semanas e antes disso foi tudo foda, nada
mais.
Ignorei os dois e fui pegar meus livros, não querendo pensar que ele
falou que ficou com ela há duas semanas; foi no dia que eu os vi no ginásio.
Bem, isso não significava que ele não ficou com outra garota. Eu não achava
que ele tratava as mulheres assim, mas, pelo visto, estava errada.
Eu me levantei com meus livros nos braços e olhei os dois, ela com
expressão humilhada, e ele furioso; furioso era pouco.
— Peço desculpas aos dois — disse a eles. Ela o xingava de tudo
quanto era nome, para o que ele não parecia ligar. Seus olhos não me
deixaram. Procurei entender a razão dele me olhar tanto, porém, precisava ir
para a aula e deixá-los resolverem seus problemas.
Eu me virei e saí correndo, para longe deles.
— Ei, espere — gritou Jason. Não parei, apenas fui embora. — Taby, te
vejo depois da aula.
Não compreendi o que ele quis dizer com me ver depois, ele sempre
era o primeiro a partir, quando eu saía da escola ele já tinha ido.
Estaquei e o encarei. Jason, de braços cruzados, me fitava. Pamela e
Joana já tinham ido embora, apenas Dominic estava à espreita, esperando
por ele.
— Não perca seu tempo. — Vi seus olhos se estreitarem antes de eu me
virar e ir embora. Não fui muito longe antes dele me agarrar pelo braço e me
prender na parede. Os livros já iam cair de novo, mas ele impediu,
segurando-os firme. — Argh!
Arregalei meus olhos. Seu rosto lindo estava a centímetros do meu
rosto. Seu hálito de menta me banhou, me deixando tonta. Minhas pernas
ficaram bambas, meu coração bateu forte como um tambor e meu estômago
se encheu de borboletas.
O que aconteceu foi tão rápido que fiquei sem fala por alguns segundos.
Esperava ele dizer alguma coisa, porque eu perdera o controle do meu corpo
há muito tempo, no momento em que ele me tocou e uma corrente elétrica se
apossou dos meus pés à minha cabeça. O que esse garoto quisesse fazer
agora eu deixaria, pois não me controlava mais.
Observei sua boca e seu rosto com barba por fazer, a qual queria que
roçasse em minha face, para eu sentir a textura. Como seria beijar essa boca
levantada em um sorriso sexy com dentes brancos e retos? Olhei seus olhos e
vi que brilhavam. Ele parecia gostar de me deixar boba.
— O que você... — Até minha voz falhou com tudo que estava
acontecendo.
Ele aproximou seu rosto e encostou seu nariz no meu, com a boca
próxima à minha e olhos fixos em mim. Os meus olhos estavam grandes
como os de uma coruja.
— Vou te esperar na hora da saída — repetiu, mas na posição em que
estávamos se tornava intenso e difícil de resistir. — Você confia em mim?
Eu não podia responder estando tão perto dele. Então eu assenti, muda,
ignorando seu hálito sobre mim.
Deu um selinho na minha boca aberta de choque e depois,
simplesmente, se virou e foi embora, me deixando ali, abobada por ele. Meu
coração fazia tum, tum um milhão de vezes. Tentei recuperar o fôlego para ir
para a sala, já que estava atrasada demais.
Durante a aula de francês, fiquei pensando: o que o levou a conversar
comigo? Três meses e ele nunca me disse um “oi”, por que agora seria
diferente? O que ele estava ganhando com isso? Ficar comigo que não era,
sempre estava cercado de mulheres lindas.
Não prestei atenção na aula, pois minha cabeça se encontrava cheia de
um garoto gostoso com cara de bad boy. Se vovó soubesse, me esganaria. Ou
talvez não.
Na hora da saída, eu o vi me esperando escorado no meu carro. Ele
parecia aqueles modelos lindos que posam para fotos de propagandas de
automóveis.
Havia algumas garotas próximas dos veículos delas, olhando para ele, a
uns seis metros de Jason, o comendo de longe. Ele causava esse encanto
sobre as mulheres; não as culpava, eu também tinha essa mesma fraqueza por
ele. Mas era diferente delas, que só queriam um passatempo ou um rosto
bonito: eu o amava.
Jason sorriu assim que cheguei perto. Seu sorriso faria qualquer menina
abaixar a calcinha, inclusive eu, se ele pedisse, todavia, não seria do seu
feitio ordenar algo do tipo.
— O que faz aqui? — Quando ele disse que me esperaria na hora da
saída, não achei que estivesse falando sério.
Afastou-se do carro e ficou na minha frente.
— Avisei que ia esperar por você, não foi? — Seu tom continha algo
que não identifiquei, parecia raiva, mas do quê? Eu não sabia.
— Sim, só achei que estava brincando... — Interrompi-me com a
sombra que apareceu em seu rosto.
— Olhei em seus olhos e perguntei se acreditava em mim. Por que
mentiu dizendo que sim? — indagou com amargura.
Engoli em seco.
— Não menti, queria acreditar em você, mas... — Fitei as garotas que
ainda nos encaravam como se elas estivessem se perguntando por que ele
conversava com uma menina sem graça, sendo que as tinha à sua mercê. Não
precisava ler mentes para saber que imaginavam isso. — Certo, então o que
queria conversar comigo? Por que me esperar? — Voltei-me para ele.
Ele estava a um passo de mim, observando meu rosto atentamente.
— Quero convidá-la para ir a uma festa comigo hoje à noite — disse,
ainda com sua expressão de falcão.
Meus olhos se arregalaram por um segundo.
— O que foi? Por que o espanto? — Deu uma risada gostosa e rouca.
Franzi a testa, pensativa. Esse cara lindo, que não olhou para mim por
três meses, enquanto eu sonhava com ele todas as noites, do nada resolveu
falar comigo e me convidar para uma festa? Eu estava achando suspeito
demais.
— O que está ganhando com isso? — Fui passar por ele para abrir a
porta da minha Mercedes, contudo, ele pegou meu braço. Devo dizer que
uma corrente elétrica atingiu meu corpo como um raio?
— O que quer dizer com essa pergunta? — Percebi que ele sentiu raiva
de novo; acho que não gostava que duvidassem dele.
Suspirei e mirei suas íris sombrias.
— Caras iguais a você não chamam garotas como eu paras festas, não
se não estiverem fazendo uma aposta ou com a intenção de humilhá-las em
público. — Era verdade. Se aceitasse e ele fizesse isso, acho que morreria.
Jason soltou meu braço depressa, como se eu tivesse batido nele.
— Então é isso que pensa de mim? Que só porque sou popular também
sou esnobe e cruel a esse ponto? — rosnou com os dentes cerrados. — Eu
não humilho as pessoas.
Levantei as sobrancelhas.
— Não? E o jeito com que tratou sua namorada mais cedo foi o quê? —
falei “namorada” para não dizer amante, enrolada, foda e outros nomes
dados para o que ele fazia com elas.
O garoto suspirou para se controlar.
— Ela sabia que não ia ter nada de mim, apenas sexo, e isto já foi
cortado também. — Seus olhos se estreitaram. — Não gostei dela falar mal
de você.
— Você nem me conhece...
Ele me cortou.
— Está enganada, eu te observo desde que chegou aqui há três meses,
sempre te olho de longe. Quando está lendo, fica tão concentrada, como se
esquecesse de tudo à sua volta. Quando está preocupada e estudando,
nascem ruguinhas em suas sobrancelhas. Quando está feliz, seus olhos se
iluminam através dos óculos. E quando sorri, é como o sol, resplandece em
todos os lugares.
Ofeguei, porque não sabia que ele prestava atenção em mim. Fiquei
contente por não ser só eu que o observava de longe. Será que ele reparou
nisso? Reparou que eu o idolatrava à distância?
— Por que nunca me disse um “oi”, então? Sempre passa por mim e
finge que sou invisível. — Se ele se importava a ponto de me notar tanto, por
que nunca disse nada? Queria que ele tivesse se aproximado, como agora,
mas há dois meses, ou antes. Ele não sabia o quanto doeu ser ignorada por
ele. Não ligava em ser invisível para os outros. Com Jason, pela primeira
vez na vida desejei ser vista, e pela primeira vez na vida tive inveja de
garotas como Pamela.
Ele suspirou e coçou a cabeça.
— Como você disse há pouco, garotas doces e puras como você não
saem com garotos como eu. — Havia ressentimento em sua voz, e
direcionado a ele mesmo, e não a mim.
— O que quer dizer com “doce e pura”?
— Você é meiga, inocente, ajuda pessoas. Quando vai à livraria à noite
buscar livros, todas as quartas e sextas-feiras, você passa na lanchonete do
lado e compra dois cafés e pães para entregar ao senhor que vive no beco.
Eu a ouvi chamá-lo de James.
Meus olhos pareciam saltar das órbitas.
— Você estava me seguindo?
Deu de ombros.
— Eu fui te observar uma noite e vi você saindo sozinha. Não sabia
aonde estava indo, então a segui. Você saiu a pé, e não de carro, as ruas
estavam escuras, e tem muita gente ruim neste mundo — repreendeu-me. —
Não devia andar à noite sozinha. O pior foi quando se dirigiu à biblioteca e
passou pelo beco onde ficam alguns desabrigados. Você deu um oi a todos
ali. — Sacudiu a cabeça. — Depois, comprou seus livros e fez o percurso de
volta. No outro dia, eu fui à biblioteca perguntar com que frequência você ia
lá à noite. Disse que era seu amigo e não gostava disso, nem um pouco, de
você andando sozinha. O responsável pela biblioteca concordou comigo;
falou seus horários e os dias em que você ia buscar livros.
— Você me acompanha todas as noites? Bem que pensei que estava
sendo seguida — falei comigo mesma, depois para ele, e sorri: — Obrigada
por cuidar de mim. — Peguei sua mão e a apertei.
Ele suspirou e se aproximou de mim, colocando um fio solto do meu
rabo de cavalo atrás da orelha. Eu estremeci.
— Não foi nada. Se algo acontecesse com você, acho que os mataria.
— Demonstrava um forte sentimento na voz.
Expirei com seu toque e proximidade.
— Você realmente gosta de mim?
Jason olhou para o céu por um momento, depois para mim, com um
sorriso.
— Quando chegou à escola, eu fiquei fascinado por ser diferente de
tudo que já vi em minha vida. Você veste essas roupas largas e não liga para
o que os outros dizem ou pensam. Gostei disso, por isso não me aproximei,
não por achá-la feia ou algo assim, você é linda. Seu rosto, seus olhos
verdes e esses óculos ficam belíssimos em você.
— Por que só agora? — Dei um passo para trás, me afastando dele.
Seus olhos se estreitaram, então logo acrescentei, porque quando ele ficava
enraivecido e magoado doía em mim. — Fica mais fácil ter coerência para
conversarmos.
— Minha aproximação a abala? — Parecia divertido com esse fato.
— Com muita frequência — admiti, corando.
Ele riu. Sua risada era tão linda que só fiquei olhando.
— Fico lisonjeado com isso — disse. Após, tornou-se sério. —
Quando me viu no ginásio com a Pamela... — Eu me encolhi, não querendo
pensar naquele momento e no que ela ia fazer com ele. — A dor em seus
olhos ao me ver ali... Tomei uma decisão, sabia que não podia ficar com
outras garotas, como vinha fazendo só para me manter longe de você. Cortei
todas e decidi esperar alguns dias para nos falarmos, mas estava sem
coragem. — Riu, passando as mãos nos cabelos. — Fiquei com medo de
você me dar um fora e dizer que não sou bom o bastante, mesmo vendo e
sentindo o que sente por mim. Hoje, quando a toquei, meu coração bateu
forte, como se fosse sair pela boca. Meu corpo parecia ter sido tocado por
um fio desencapado, o calor foi enervante. Eu sabia que não podia lutar
contra o que sentia.
Ainda estava pasma com tudo que falou. Gostei disso, então por que
não dar uma chance a ele?
— Tudo bem, eu vou à festa com você hoje, mas nos encontramos lá,
ok? E onde é? Na sua casa?
Seus olhos escureceram quando mencionei sua casa. Não entendi a
reação.
— Não, na do Dominic, ela fica nessa rua aqui. — Apontou a rua da
escola e me deu o endereço.
Não perguntou o porquê de eu não querer que ele fosse na minha casa;
acho que sabia o motivo. Minha avó era calma, contudo, parecia o Hulk
quando explodia, e talvez não aprovasse eu saindo com um garoto igual a
ele, cheio de tatuagens e brincos na orelha direita.
Jason trabalhava em uma academia, fora do seu horário de aula. Eu o vi
treinando lá. Pelo que percebi, parecia gostar de fazer isso.
Dominic ou Dom, como ele o chamava, tinha dezenove anos e um
sorriso sexy, mas quando ficava bravo, sua expressão se tornava sombria,
tanto que aparentava já ter matado milhões. Ouvi dizer que ele era de uma
gangue, porém, não sabia se isso era verdade.
— Eu sei onde ele mora.
— Sabe? — indagou com a voz um tanto mortal.
Apressei-me em explicar, porque ele furioso não era bom.
— Já o vi lavando seu carro quando passava com o meu em frente à sua
casa.
Ele suspirou, provavelmente de alívio. Será que imaginou que eu fiquei
com o Dominic? Poderia ter rido disso, o cara era pior que Jason quando se
travava de mulheres, um tremendo de um garanhão e mulherengo.
— Bom, então está combinado: às oito horas lá?
Antes que eu respondesse, ouvi a voz grossa de Dominic. Eu me virei e
ali estava ele vestido com calça jeans desgastada e camiseta. Sorria para o
Jason. Oh! Esse homem destruiria muitos corações só com isso. E olha que
era um sorriso natural, sem ser o que ele lançava para as mulheres. Se este já
era assim, imagine o outro?
— Vamos, Jason? — chamou, aproximando-se de nós. — Eu trouxe
Melissa e Sara para nos divertirmos.
Com ele havia duas garotas, uma morena e uma loura, ambas muito
bonitas. Eu não tinha amigos ali, afinal, morava na cidade há apenas três
meses. Conversava somente com a turma dos nerds, e não a dos descolados.
— É Amélia — corrigiu a garota loura.
— Não importa — redarguiu sem olhar para ela, seus olhos estavam em
nós.
A menina suspirou e não respondeu. Como elas aceitavam isso? Como
ficavam com caras que não se importavam em aprender seus nomes? O pior
era que Jason ficaria com ela também... Quase ri por ter pensado que ele
namoraria só comigo. Não disse nada e passei por ele, que segurou meu
braço, como fez antes, mas agora me escorou no carro com seu corpo me
prendendo.
— Não vou ficar com ela e nem com ninguém, prometo.
Encarei as garotas e o Dominic, que estava nos mirando com os olhos
estreitos.
Assenti para Jason.
— Responda, quero ouvir sua voz dizendo que acredita em mim. —
Soava sério, ficava assim quando eu desconfiava dele. — Olhe nos meus
olhos e diga.
Eu suspirei.
— Acredito.
— Não, você não acredita, posso ver em sua expressão. — Balançou a
cabeça, rindo com amargura. Sua face estava transfigurada pela dor
novamente, tudo por eu não acreditar nele. Isso feriu meu coração.
Respirei fundo.
— Eu vou tentar confiar, ok? É o que posso prometer, afinal,
praticamente acabamos de nos conhecer, a confiança vem com tempo e
ações, não é? — Era o mínimo que eu podia fazer.
Ele concordou. A angústia pareceu sumir de seu corpo, e eu fiquei feliz
com isso.
— Nunca vou quebrar sua confiança em mim, prometo. — Havia um ar
de juramento em cada palavra. Ele deu um beijo no meu nariz num gesto
carinhoso. Depois se afastou, cedendo espaço para eu abrir a porta do carro.
Riu quando eu tropecei com as pernas bambas por causa dele.
— Agora acredito no que meu toque faz — divertiu-se.
Corei diante de seu sorriso sexy. Entrei na Mercedes e saí dali. Antes
dele subir em uma Harley preta antiga, pude ouvi-lo falando com Dominic:
— Eu estou fora, cara, e você sabe disso.
Fiquei feliz com sua resposta. Esperava que ele não me quebrasse mais
para frente. Era um risco, todavia, não podia deixar de confiar que ele daria
o braço a torcer. Uma coisa que me fez também aceitar foi que eu vi
vulnerabilidade em seus olhos, era como se ele gritasse “não duvide de
mim”.
Disse à vovó que ia à festa na casa de uma amiga; não revelei que
estava indo à casa de Dominic, ou ela não deixaria. Ouvi dizer que lá havia
muitas bebidas, que ficavam juntos na frente das pessoas e fumavam. Não
sabia se isso era verdade.
Vovó acreditou, pois nunca menti para ela. Eu me senti mal por fazer
isso, mas era incapaz de rejeitar ir a uma festa com Jason.
Eu me olhei no espelho para checar minha roupa. Estava com uma saia
jeans na altura das coxas e uma blusa rosa. Calcei minha bota preta. Não era
muito chegada à moda, mas me arrumava algumas vezes. Usava vestidos por
gostar deles. Deixei meus cabelos louros soltos nas costas. Tirei meus
óculos de grau; eu os usava mais na escola e quando eu lia, porque senão
minha cabeça doía muito.
Adorava filmes e livros de romance, mas era mais apaixonada por
livros. Sempre quis viver um romance igual aos dos livros, contudo, nenhum
garoto olhava para mim, eles me achavam esquisita e feia, embora eu
considerasse minhas roupas bonitas. Sonhava em encontrar um garoto que
enxergasse através delas, que não se importasse com o que eu vestia.
Esperava que Jason fosse como os caras dos livros que li algum tempo atrás,
por exemplo, London Carter em Um amor para recordar. Ele não ligou para
as roupas que a personagem usava; claro que não deu o braço a torcer no
começo, porém, depois que aceitou o que sentia, sua vida mudou para
sempre, tanto que ele a amou até muitos anos na sua velhice, após a morte da
protagonista. Quem dera eu tivesse um amor assim? Um amor que nem o
tempo e a distância pudessem apagar.
Cheguei à casa de Dominic às oito em ponto. Estava nervosa, mas me
controlei. Tirei o meu casaco, desliguei o carro e fui para a casa de dois
andares com paredes brancas. Antes que saísse do automóvel, ouvi um
gemido de uma mulher não muito longe dali, atrás de uma árvore. Fiquei sem
acreditar que alguém faria sexo na frente da casa.
Tentei ver se avistava alguém mais nas proximidades, mas não vi
ninguém, todos já deviam estar dentro da residência. Também não vi o casal
sem moral e sem vergonha na cara.
Sabia que Dominic morava com sua mãe, a qual trabalhava de
enfermeira à noite, na cidade, então ele aproveitava bastante. Ela era
daquelas mães liberais, afinal, ele era maior de idade.
Eu ia ignorar o casal e sair do carro quando ouvi uma coisa que me fez
gelar no lugar.
— Vai, Jason, mais forte! — Reconheci a voz de Pamela.
Não houve resposta dele; ela continuou gritando.
— Seu pau é gostoso, me faça gozar como só você sabe...
Sacudi a cabeça, chorando e com a mão na boca para não sair som. Não
queria que eles me vissem ali, não desse jeito que eu estava. Fui idiota por
confiar nele, por pensar que um dia teria uma chance. Com certeza era tudo
armação para eu ser humilhada e sofrer, já que ele parecia saber que eu o
amava. Brincou comigo e com meus sentimentos, dizendo que sentia o
mesmo por mim.
Saí de lá jurando nunca mais acreditar em ninguém. Faria de tudo para
esquecê-lo e tirá-lo do meu coração, da minha cabeça e de cada canto que
ele ocupasse em meu corpo e minha alma.
Capítulo 4
Prisão

TABITTA
Presente

Soube que Shane, irmão de Angelina, a minha amiga desde a faculdade,


fez uma cirurgia para ele colocar um marca-passo. O garotinho tinha
problemas no coração. O procedimento estava previsto para dali a uma
semana, até tinha feito horas extras para repor meu dia, porque pretendia
ficar com ela, dando forças e dizendo que sempre estaria ali por eles.
Quando descobri que Shane passou mal, corri para o hospital. Dava para
pensar no gelo que senti ao me deparar com a sala de espera lotada de seus
amigos? Claro que até aí tudo bem, porque ela era fácil de amar, me
lembrava de mim antes da minha vida acabar. O que me paralisou foi ver
alguém que não queria; não poderia deixar que ele desse por minha
presença. Jason Falcon.
Eu me escondi no canto, assistindo à Angie deitada no colo do seu
namorado, Ryan Donovan. Ela parecia estar dormindo, o que era estranho, já
que seu irmão estava no centro cirúrgico.
— Como Angelina conseguiu dormir? — sondou Jason, fitando-a
inconsciente.
— Dei um calmante para ela — respondeu Ryan com um suspiro. Bom,
isso explicava.
Quando Angie disse que estava namorando esse cara, o Ryan, quis ir até
Manhattan somente para bater nela e abrir aquela sua cabeça, para lhe
ensinar que homens como aquele não se interessavam em relacionamentos
com meninas doces como ela. O cara era um tremendo de um mulherengo. Vi
que me enganei. Fiquei feliz com isso, ela merecia alguém que a amasse, e
pelo olhar de Ryan, ele não só parecia amá-la muito, mas também adorá-la.
Olhei ao redor da sala lotada de caras: um louro com cabelos
compridos nas costas e presos; um segundo coberto de tatuagens e de mãos
dadas com Rayla Donovan, acho que era seu namorado; e vários outros. Não
prestei muita atenção em nenhum, porque minha concentração estava fixa em
alguém que ocupava minha mente dia e noite. Ele vestia calça jeans e camisa
branca com jaqueta por cima. Sempre gostou de usar jaqueta, mesmo o
tempo estando quente. Ele olhava para o Ryan e Angie sentados no sofá,
como se doesse vê-los assim. Talvez isso trouxesse várias recordações de
nós dois juntos, a angústia era visível em sua expressão. Queria tirá-la dali,
seus olhos eram lindos demais para estarem sofrendo; sabia que não podia.
Fiquei esperando escondida até a cirurgia acabar, tentando achar uma
brecha para encontrá-la sozinha. Já era tarde quando Ryan deixou o quarto.
— Achei que o carrapato não ia sair nunca — falei, entrando no quarto
de hospital com várias máquinas do lado da cama de Shane. Ele estava
deitado com um lençol azul o cobrindo. Havia um aparelho indicando seus
batimentos.
Angie estava sentada ao lado da cama segurando sua mão, com os olhos
molhados. Levantou a cabeça assim que ouviu minha voz.
— Tabitta? Faz horas que está aí? Desculpe, estou meio longe... —
Olhou para a cama e limpou as lágrimas.
Fui até minha amiga e puxei-a para os meus braços. Ela chorou por um
momento.
— Vai dar tudo certo, Angie, ele vai ficar bem, querida — disse,
alisando sua cabeça.
Ela se afastou e limpou o rosto, assentindo.
— Você tem razão, o pior ele já passou no centro cirúrgico, não é? E
graças a Deus permanece aqui.
— E vai continuar conosco por muito tempo, pode acreditar. — Fui
firme ao dizer isso, pois acreditava sinceramente. — Shane vai te dar muitas
dores de cabeça quando crescer e trazer namoradas para transar em sua casa.
Ela riu, depois quase se espantou e me abraçou de novo.
— Só você mesmo para me fazer rir em uma hora destas. — Afastou-se.
— Obrigada, Taby, por vir de tão longe me ver e saber como Shane está.
— Querida, somos amigas para isso, para os bons e maus momentos, na
saúde e na doença. — Pisquei e sorri. — Se ficássemos juntas, poderíamos
usar isso no nosso casamento.
Ela riu e bufou.
— Não, agradeço, mas vou passar. — Beijou meu rosto. — Obrigada
por vir aqui e me fazer sorrir.
— Sempre que precisar de uma líder de torcida é só gritar que venho
correndo, ok? — Era verdade. Quando a conheci, há cinco anos, ela me
ajudou muito, esteve lá por mim todas as vezes que sofri. O bom era que
Angie não perguntava o que tinha acontecido, apenas esperava meu
momento.
— Queria ir visitá-la na sua casa, mas seu namorado não te deixa
sozinha um segundo. — Desejava ter isso um dia de novo, igual tivemos no
passado. Na verdade, gostaria de ter tudo que já tive, mas com Jason, e não
com outra pessoa. — Não que isso não seja bom. Ele é legal para você? Se
um dia ele a enganar ou machucá-la, vou castrá-lo e fazê-lo comer seu
próprio pênis.
Ela sorriu e corou, garanto que tendo pensamentos indecentes em
relação a Ryan.
— Oh, ele é tão bom para mim, sabe? Contratou o melhor médico do
país para fazer a cirurgia do Shane. Queria que o conhecesse.
Fiz uma careta.
— Não posso... Não que eu não queira, apenas não dá agora. — Mudei
de assunto, ou pelo mesmo tentei: — Quando Shane estiver bom para viajar,
o leve ao Brooklyn na casa da Mama, assim poderei vê-lo, ok? Emily está
me deixando doida reclamando de saudades dele. E, por favor, não leve seu
namorado.
Ela franziu a testa.
— Você está fugindo do Jason? Assim que disse seu nome na frente
dele, algum tempo atrás, ele parecia conhecê-la e estar sofrendo por isso.
Pelo menos foi o que vi em seus olhos. — Ela me olhou de lado. — Vocês
dois tiveram alguma coisa, não é? Ele é o cara que te abandonou? Diga,
porque se for eu que vou castrá-lo.
Ri, alisando seus cabelos.
— Eu gostaria de ver você pegando em um pênis para cortá-lo —
sussurrei, caso Shane acordasse, depois suspirei. Queria contar a ela e não
podia. Quanto menos gente soubesse, melhor. O único que conhecia toda a
verdade era Dominic, o chefe dos MCs da Fênix de Chicago. Não podia
envolver mais ninguém.
— Quanto menos souber sobre isso, melhor, ok? Não posso falar nada,
se eu pudesse, contaria. É mais seguro deixar assim. E vamos manter o
brinquedo do Jason como está, certo? — Fez uma careta enquanto eu sorria.
Esperava usar essa parte dele em breve, assim que eu resolvesse minha vida.
Ela estava prestes a dizer algo, talvez apontar que guardo coisas dela.
Porém, não podia me aproximar muito de Angie para não trazer perigo à sua
vida, nem à de sua família. Já tinha de tomar cuidado e proteger Mama,
Papy, Samira e minha filha, os mais próximos de mim. Os de longe que
resguardava eram Angie, seus irmãozinhos, e o principal deles, Jason.
Dominic conseguia se cuidar sozinho, dispunha de vários aliados. Eu tentava
não saber o que ele fazia, porque, se soubesse, precisaria prendê-lo.
— An... gie... — balbuciou Shane, abrindo os olhos.
Fiquei feliz por ele estar bem, o médico disse que no dia seguinte já
poderia ir para casa.
— Olá, garotão, eu estava dizendo à sua irmã que você ia ficar bem e
que ia namorar muito — murmurei, beijando sua testa.
— Eu vou namorar a Emily — sussurrou ele com os olhos brilhantes.
— Vamos ver daqui uns vinte anos, sim? — Sorri junto com Angie.
Gostei de vê-la contente.

— Mamãe, me leve para a casa da tia Angie — Emily pediu assim que
me sentei à mesa para tomar café da manhã. — Eu quero ver o Shane.
Nós estávamos na cozinha. Ela era grande e branca, com armários cor
de areia (porque amo essa cor), fogão de inox e geladeira duplex. A mesa
em que estávamos se cercava por seis cadeiras avermelhadas. As janelas de
vidros tinham vista para o jardim.
Eu suspirei. Olhei seus cabelos castanhos e olhos da cor dos de seu pai.
Tão linda minha menina. Desejava levá-la para ver Shane, mas não podia
arriscar e me deparar com Jason. Se ele a visse, saberia que ela era dele na
mesma hora, porque a garota era sua cópia viva.
— Vamos ver depois que eu chegar do trabalho. Agora tenho que ir,
meu amor. Amo você, querida. — Beijei suas bochechas e me esquivei mais
uma vez de seu pedido, não sabia até quando conseguiria manter isso
trancado dentro de mim. Sabe quando tem algo guardado e você quer apenas
explodir para aquele fardo ficar mais leve? Estava assim há oito anos e nove
meses, carregava uma rocha sobre meus ombros.
Desde que saí de casa hoje cedo, contava os minutos para prender
Franklin Salazar, o abusador de menores. Se fosse por mim, faria uma
coivara de fogo e jogaria todos lá dentro sem ao menos perder uma noite de
sono. Cruel, eu sei, ainda mais eu sendo uma policial, mas era o que sentia.
O plano estava certo, o disfarce também, era só esperar e prendê-lo
com a boca na botija. Tudo quase foi por água abaixo assim que eu o vi ali
no clube. Sabia o que Jason foi fazer lá, com certeza conseguir mulheres, o
que não era difícil para ele, bastava estalar os dedos. Tentei não pensar
nisso.
Após todos esses anos ele estava igual. Eu o via nas revistas e TV.
Além disso, o encontrei pessoalmente uma vez no clube de luta, na loja em
Nova York, e também no hospital quando fui visitar Shane. Quase nove anos
e só o enxerguei três vezes, e meio de longe, sem sentir o seu cheiro de
lavanda com um toque de menta, que não foi perdido com o tempo: pelo
visto, ele ainda tinha esse aroma. Mesmo antes ele não gostava de usar
perfume, apenas desodorante masculino, e amava tudo que tinha menta. O seu
cheiro ainda estava em minha pele.
Não queria dizer a ele tudo que disse, não queria ver a dor naqueles
olhos como eu vi quando falei que não significou nada o que tivemos, que
seu toque, seu gosto e seus beijos foram apenas para ajudar no caso. Estava
mentindo, porque significaram tudo para mim. Fazer sexo com ele foi aquilo
com que sempre sonhei, era o que desejava e queria para sempre.
Gostaria de revelar a verdade, os motivos de eu partir e das decisões
que tomei, o que realmente houve naquela noite que era para ser o dia mais
feliz da minha vida, quando eu o tinha, quando estávamos comemorando
nosso primeiro ano juntos. Um ano de felicidade e amor. Queria contar
porque não disse adeus; se eu falasse, aquilo me mataria, não teria coragem
de partir.
Vendo a sua dor — aliás, ultrapassava a dor —, ele estava quebrado, e
fui eu a responsável... Nesse momento, percebi a intensidade do seu amor
por mim, um amor que, quando mais nova, sonhava em ter; um amor que
ultrapassasse tudo, barreiras, o tempo, os obstáculos, que nunca fosse
esquecido. Notei isso hoje ao rever esse homem, soube que o que tínhamos
antes ainda estava vivo e forte.
Suspirei ao lembrar da mulher que um dia fui, com olhos verdes que
brilhavam de felicidade, agora vazios. O rosto bonito, antes meigo, se tornou
sombrio e sem vida, mesmo correndo sangue em minhas veias. Eu estava
viva e morta ao mesmo tempo. Viva porque tinha a Emily, meus pais, amigos,
e por ver Jason ainda respirando. Sua sobrevivência neste mundo valia
qualquer sacrifício, mesmo que significasse permanecer em tormento por
anos.
Limpei as lágrimas dos meus olhos, tentando controlar a dor. Ela nunca
iria embora, estava gravada em mim como um câncer. Apesar disso, não me
arrependia de amá-lo, o sofrimento que sentia era a única lembrança do que
vivemos.
— Recomponha-se, Tabitta — sussurrei a mim mesma. — Não quebre
agora.
Lavei meus olhos e enxuguei-os, saindo do banheiro. Não reparava à
minha volta, só o que eu via e sentia era a dor de Jason. A porta se abriu e
Lincoln entrou após Jason sair. Tentei não pensar no sofrimento de meu
amado ou desmoronaria. Lincoln parecia ter raiva, eu o conhecia bem para
saber que ele estava furioso, embora não soubesse o motivo, e também não
me interessava. Éramos apenas colegas de trabalho e nada mais.
— Nem comece — falei, passando por ele, que já ia abrir a boca, com
certeza para criticar o que fiz.
Lincoln segurou meu braço.
— Tabitta, sério, o que você fez? Transou com o cara? — rosnou.
Ele era alto, forte, com cabelos curtos e olhos claros. Sempre quis ficar
comigo, porém, nunca aceitei. O cara era um tremendo de um sem-vergonha.
Estreitei meus olhos.
— Se eu transei ou não, isso não é da sua maldita conta — sibilei.—
Cuide da sua vida e me deixe em paz.
Bufou, enraivecido.
— Tudo bem, a vida é sua. — O desdém estava em cada palavra. — Já
que gosta de se sentir assim.
Ergui as sobrancelhas.
— Assim como? Termine.
Ele suspirou.
— Deixe para lá. De onde você conhece Jason Falcon? Ele bateu em
James Martine, o aliado de Franklin, o nocauteou com um soco, só porque
ele a tocou.
Expirei, tentando me controlar.
— De novo, não é da sua conta. — Cerrei os dentes, querendo
machucá-lo. Não desejava conversar sobre Jason agora, muito menos com
ele.
Lincoln com certeza estava pensando que eu era mais uma foda dele, e
que amanhã Jason me trocaria por outra. Eu achava que não chegaria até
amanhã, afinal, a noite ainda não acabara. Ele podia já estar com alguém,
ainda mais sofrendo do jeito que estava depois de tudo que eu disse a ele.
Não podia pensar nisso, precisava focar no caso do Franklin, porque
com ele preso, Sebastian sairia da toca e eu o capturaria, então iria atrás de
Jason e diria toda a verdade.
— Conseguimos prender o Franklin com provas suficientes para ele
passar um bom tempo na cadeia? — perguntei, cruzando por um corredor
cheio de agentes. O lugar fora evacuado para a operação. Havia alguns
policiais no quarto de frente ao que eu estava. Com certeza, foi ali que o
velho tarado levou a menina.
— Sim, nós o prendemos — afirmou assim que estávamos perto de
Thomas.
Thomas franziu a testa para mim, me avaliando. Notei que ele sabia
agora que Jason não era qualquer um, ainda mais depois de ter visto sua foto
com Emily no meu PC, e eu ficando com ele. Papy compreendia que eu
jamais aceitaria fazer o sacrifício de ficar com um homem aleatório. Depois
conversaria com ele e Mama.
Quando contei tudo aos meus pais sobre meu passado, não mencionei
Jason, apenas vovó e o filho da puta que dizia ser meu pai. Os dois
aceitaram bem, só ficaram um pouco magoados comigo por não ter revelado
antes a verdade.
Papy tirou sua jaqueta preta e deu para eu vestir. Eu sentia um pouco de
frio, pois minha roupa mostrava todo o meu corpo, e estava sem calcinha,
porque Jason rasgou a minha.
Dennis chegou com Bryan com um imenso sorriso de comedor de
merda.
— Nem comece — rosnei antes que ele pudesse abrir a boca.
Dennis me olhou de lado.
— Eu não disse nada...
— Mas ia. — Mudei de assunto: — Onde o velho está?
— Foi levado só de cueca para a prisão. — Bryan riu com um revirar
de olhos. — Está na sala de interrogatório da polícia local.
Eu ri também.
— Uma visão bem bonita, não acha? Um velho e sua bunda murcha.
Todos gargalharam, até o Thomas, que sacudiu a cabeça.
— Você não existe, agente Tabitta.
— Nosso departamento ficou melhor com você nele, Taby — o agente
Milton me disse. — Quarenta anos no FBI, e só nesses dois últimos passei a
sentir mais ânimo no trabalho, sua disposição é contagiante. Ainda mais para
um velho como eu.
— Você não é velho, apenas enxuto, dá até um caldo grosso. — Sorri
para o senhor de quase sessenta anos, um grande amigo. Acho que se
aposentaria no ano que vem.
Thomas bufou.
— Vamos interrogar Franklin Salazar — Papy falou, seguindo para fora
do clube. — Os agentes Milton e Raul coletaram todas as provas contra ele.
— Onde está a garota? — perguntei, o acompanhando também.
— Peguei sua declaração. — respondeu Milton. — Ele ofereceu um
carro novo, um apartamento e outras coisas para ela.
— Quantos anos ela tem?
— Dezesseis. — Thomas soou seco. — O que farão o pai e a mãe
dessa menina e de mais seis que achamos nos quartos com homens, incluindo
dois políticos? As famílias sempre sofrem pelos filhos. A agente Desiree
está neste momento conversando com os pais delas.
— Espere, seis garotas? — Meu tom saiu um pouco alto, então abaixei
a voz. — Não era só a que estava com ele?
Thomas meneou a cabeça.
— Não, com ela eram sete. Seis vieram aqui porque queriam, mas uma
menina não estava por vontade própria. Agora está sendo examinada, porque
um cara a machucou um pouco com seu jeito sádico e doente.
— Essas meninas são tontas por acreditarem em homens como Franklin
e James. Esses canalhas as machucam e entregam para caras estupradores.
Como podem não ver isso? Como podem querer algo assim? — Tinha
vontade de abrir suas mentes, mas não podia, porque só elas seriam capazes
disso.
Quando saímos da boate, vi Jason dirigindo sua Ferrari cinza. O que me
cortou fundo foi que ele não estava sozinho, havia uma mulher loura ao seu
lado; não deu para vê-la direito. Ele passou devagar, sem tirar os olhos de
mim. Por um breve segundo se ateve no Lincoln. Pareceu querer matá-lo.
Vê-lo com outra mulher foi um soco no estômago, como se ele tivesse
enfiado as mãos em meu coração e o triturado tal qual carne moída.
— Olhe quem já está com outra mulher — comentou Lincoln, encarando
o Jason e a loura.
Meu peito subia e descia com o tormento. Tentei expirar para controlar
a dor que estava me comendo viva. Merecia isso ou coisa pior, se tivesse
coisa pior. A própria morte seria um alívio. Eu o magoei tão profundamente
que chegava a ser criminoso. A extensão da dor que vi em seus olhos era
intensa, me consumia a cada segundo.
Queria mais que tudo neste mundo arrancar sua angústia de uma vez por
todas. Não era justo com ele. A melhor das hipóteses seria se ele me
esquecesse, não? Quase ri disso; se em nove anos ele não me esqueceu, não
seria agora que aconteceria, considerando o que repetimos juntos, que senti
seu cheiro, seu gosto, e ele o meu.
Entendia que Jason fora ferido por minhas palavras duras, mas ele não
poderia ter esperado para pegar outra mulher? Não esfriou nem o que
acabáramos de ter. Como ele pôde fazer isso comigo?
“Maldição! Concentre-se, Tabitta”, pensei, forte.
— Você está bem? — sondou Thomas num tom preocupado, olhando de
Jason para mim.
Respirei fundo, desviando os olhos e cobrindo meu rosto com uma
máscara fria. Não deixaria que notassem meu interesse nele; Sebastian tinha
gente em todos os lugares, inclusive onde eu trabalhava.
— Estou — menti. Tranquei a dor dentro de mim; lidaria com ela
depois, e não agora, com os olhos de todos à minha volta sobre mim.
— Tem certeza? — sussurrou, acho que para os outros não ouvirem.
— Sim, eu tenho.
Jason virou a esquina com sua nova foda.
— Então vamos embora.
Sabia que ele queria retrucar, mas não disse nada. Apostaria que era
por estarmos cercados de gente, e também por estarmos trabalhando.
Capítulo 5
Interrogatório

TABITTA
Entrei na cela onde Franklin, sentado em uma cadeira, estava com as
mãos algemadas nas costas. Os outros seis presos continuavam sendo
interrogados pelos demais agentes. Eu fiquei com o velho, já que tinha de
colocar o nosso plano em ação.
— Você e aquela cadela desgraçada vão pagar por isso — Franklin
sibilou, fuzilando-me com raiva. — Não vou ficar preso por muito tempo.
Anya era a mulher enviada por Dennis, que também estava disfarçada
no clube.
Levantei uma sobrancelha, chegando perto dele, e parei a um passo. O
agente Chris estava atrás dele, hoje era seu último dia trabalhando conosco,
ele estava montando uma empresa de segurança junto com seu primo;
desejava sorte para eles. Agora chegara a minha parte do plano.
— Você não devia ameaçar a filha do seu chefe, ele poderia mandar
matá-lo na cadeia. — Olhei de lado para ele. — Claro que ainda
agradeceria se ele o fizesse, por acabar com a escória fodida que você é.
Acho que ele parou de me ouvir no momento em que mencionei seu
chefe e o fato de ser sua filha... Eu não queria ter o sangue daquele monstro,
mas isso era algo que não poderia mudar.
O maldito olhou ao redor, como se buscasse câmeras, mas nessa sala
não tinha nenhuma, não que ele soubesse: estavam escondidas.
— Qual é a pegadinha? Acha que sou burro para cair na sua conversa?
— zombou. — Você é uma cadela que só está procurando matar sua
coceira... — Sorriu. — Posso dar um jeito em você...
Gargalhei com desdém, fitando Chris, que ainda estava sério, mas vi-o
revirando os olhos.
— Ouviu isso?
Chris riu. Era um cara bonito, apenas não me interessei por ele e nem
por ninguém. Havia apenas um homem de quem gostava dessa forma, o único
que não podia ter.
— Cara, se enxergue, você viu o homem com quem ela estava? Acha
que vai querer um velho como você?
— Nem se eu estivesse bêbada — rosnei, depois voltei aos planos,
pois não pretendia passar a noite olhando para seu rosto asqueroso.
— De qualquer forma, não acredito em você. — Mirou-me com seus
olhos zombadores. — Com certeza está checando para ver se eu falo algo.
Não vou dizer nada.
Caras como ele são muito espertos, contudo, acabara de admitir que o
conhecia. Ele nem sabe disso, mas sua forca estava preparada.
— Acredita mesmo nisso? — Dei um passo para o lado, ainda o
fitando. — Tenho provas que colocariam você na prisão, com direito à pena
de morte...
O filho da puta riu.
— Pena de morte? Estamos em Manhattan, aqui não existe pena de
morte. Além disso, nunca estuprei ninguém, elas estão comigo porque
querem.
— Aí é que você se engana. Foi acusado de estuprar e matar uma
menina de dezessete anos no estado do Texas. Acredita que lá tem pena de
morte? É só mandarmos você para lá.
Seu rosto ficou tão branco que parecia papel, ele sabia que menina era.
Algumas semanas antes, descobri por Bryan, que investigou o caso de
Franklin. A garota era ninguém menos que Pamela Andrew; uma cadela, eu
sei, na escola ela me humilhava muito, mas nunca merecia ter sido morta
como foi.
Entretanto, isso significava que ele esteve lá naquele dia com
Sebastian, somente não na minha casa, porque não me lembrava dele. Pamela
foi morta na mesma noite em um hotel, supunha que fosse depois que ela
deixou o quarto de Dominic, quando fui procurá-lo para pedir sua ajuda para
levar Jason embora. Seu corpo foi encontrado no rio Colorado após alguns
dias, por pessoas que andavam pelo local. Na autópsia, descobriu-se que ela
foi violentada várias vezes. Tinha sinais de luta, ou seja, ela o enfrentou
antes de morrer. A ira se apossou de mim ao saber de tudo isso. Queria
matar eu mesma os homens que faziam esse tipo de coisa, pena que não
podia.
A polícia local tentou descobrir todos esses anos o que aconteceu com
ela, mas só conseguiram quando Bryan, um hacker brilhante, achou uma
gravação do hotel mostrando Franklin e Pamela juntos no corredor, entrando
no quarto dele. Então os proprietários resolveram abrir o jogo: eles foram
ameaçados a não dizer nada, ou sua família sofreria as consequências.
Contaram que ele foi embora sozinho, a garota não saiu junto, então o casal
suspeitou que os caras que estavam com Franklin a levaram pela janela, já
que estava hospedado no térreo. As câmeras comprovaram isso.
Quis esganar o velho por fazer isso com uma garota inocente. E mesmo
se não fosse inocente, ninguém merecia uma morte assim. Felizmente, seus
dias estavam contados.
Não desejava o mal de Pamela, embora não gostasse dela ter ficado
com Jason antes que eu entrasse em sua vida e se tornasse seu mundo inteiro,
como ele disse quando saiu do clube. Não queria pensar no que falou depois,
não, eu não podia aceitar, precisava fazer o necessário para ter o homem que
eu amava.
— Então, o que vai ser, Franklin? Fará um acordo conosco? Eu não
gosto disso tanto quanto você. Caras como você não deveriam estar vivos, e
sim apodrecendo no inferno, que é o seu lugar. Você vai pagar por estuprar e
matar Pamela Andrew, e também por ficar com menores e vendê-las no
mercado negro.
— Você não tem provas disso — retrucou.
A porta se abriu num rompante. Bryan entrou furioso e foi direto no
Franklin, pegando ele e imprensando contra a parede.
— Me diga o que você quer com esta mulher. — Pegou uma foto e
colocou na cara do velho.
Franklin arregalou os olhos para a imagem.
— Onde conseguiu isso? — perguntou, irritado.
Cheguei mais perto dos dois e olhei confusa para o Bryan. Por que ele
interrompeu o meu interrogatório? Não era para o cara estar ali.
— O que foi, Bryan? Que foto é essa?
— Responda, droga, o que você queria fazer para essa garota? Sua foto
estava na parede do seu quarto com um maldito X na cara dela —
esbravejou Bryan, esmurrando-o na parede.
Franklin gemeu com a pancada.
— Por culpa dessa vagabunda o desgraçado do Ryan Donovan me
chantageou para comprar a Editora Luxem, ela era minha — rosnou. — Ele
não tinha o direito.
Bryan riu com desdém.
— Para ser uma empresa de fachada, igual vinha fazendo às escondidas
de Daniel Luxem, o filho do Michael, seu sócio? Você fazia falcatruas
fingindo que levava uma quantia exorbitante de livros em contêineres para
várias cidades, mas, na verdade, carregava garotas para vendê-las no
mercado negro, não é?
Arregalei os olhos. Essa empresa era a mesma em que Angelina
trabalhava? Um frio desceu por minha espinha. Sabia que ela e Ryan eram
namorados, mas não que ele tinha comprado a editora. Será que adquiriu
essa empresa somente para ela trabalhar nela? Se fosse, ele era bem
altruísta.
Peguei a foto da mão do Bryan e ofeguei: ali estava Angelina abraçada
com Ryan, e um X vermelho em cima do rosto dos dois. Ele planejava
alguma vingança?
— O que pretendia fazer com Angelina? — sibilei, querendo matar esse
homem ainda mais.
— Responda agora ou nada de acordo com você — falou Papy,
entrando também na sala.
— Sim, eu usava as embarcações e forjava pedidos de livros, levava as
garotas no lugar para vendê-las, faturei milhões com isso. — Riu.
— Agora não vai faturar mais, já que vai para uma prisão até aguardar
julgamento — disse Papy. — Agente Bryan, solte-o. O interrogatório acabou
por hoje.
— Agente Bryan, solte Franklin agora — mandou seu chefe, pois Bryan
hesitou diante da ordem de Papy.
Bryan suspirou, frustrado, e o largou, ou melhor, o jogou no chão sem
nenhum tipo de simpatia — não que eu não faria o mesmo que ele, claro.
— Quero as localizações dos negócios de Sebastian, onde ficam seus
contatos e seus nomes. Quero tudo, então desembuche — ordenou Thomas.
— Vocês são loucos se acham que podem pegar alguém como ele. Há
infiltrados seus em todos os lugares. Assim que eu assinar esse acordo, serei
um homem morto.
— Daremos proteção a você — assegurou Papy. Pelo seu tom, ele não
parecia gostar disso; ninguém com coração iria querer um homem desses
vivo, não com tudo que ele fez.
O velho riu.
— Ninguém conseguiria me proteger do chefe. Sem chance de eu
entregá-lo, prefiro pegar a pena de morte, pelo menos assim seria rápido. Já
com ele? — Maneou a cabeça de lado, se ajeitando no chão. — A única
coisa que posso dizer é que vai haver uma transportação quinta-feira.
Ele nunca dizia “Sebastian”, dava o seu testemunho sem usar o nome do
meu falso pai diretamente, assim não teríamos mais provas contra ele.
— Transportação de quê? — perguntou Papy.
Franklin levantou as sobrancelhas.
— O que vocês acham?
— Onde? — rosnei.
— Vão ter de descobrir por vocês, não é esta sua função? Têm três dias
para fazer isso, ou aquelas lindas borboletas voarão para seus donos. —
Sorriu e assoviou.
— Elas são seres humanos, seu... Você me dá nojo — falei com repulsa.
Saí da sala antes que eu esganasse o velho asqueroso. Precisava fazer uma
ligação importante.
Não podia contar à Angelina que sua vida corria perigo, mesmo com
Franklin preso. E ela acabara de passar uma barra com seu irmão...
Peguei o celular para ligar para a única pessoa que podia protegê-la.
— Para quem pensa em telefonar? — indagou Bryan, chegando perto de
mim.
Olhei para ele.
— Preciso proteger a garota da foto, eu a conheço, Bryan, somos
amigas. — Levantei a foto da Angie, que ainda segurava. — Eles precisam
de proteção.
— Eu já cuidei disso, não se preocupe — ele me tranquilizou. —
Também sou amigo dos dois, Tabitta. Falei com Lucky, o irmão do Ryan. Ele
tem bastante influência em todos os lugares, irá protegê-los.
— Eu ia ligar para ele, mas já que o fez, obrigada, Bryan — agradeci
— O que Lucky disse?
— Ele não quer preocupar seu irmão, então vai colocar guardas que
vigiem ele e Angelina vinte e quatro horas por dia, até sabermos que eles
não correm mais perigo. Estarão protegidos, Tabitta. — Aproximou-se e
tocou meu ombro, me reconfortando. Eu nem notei, mas estava tremendo.
Conheci Angelina quando estudávamos juntas, alguns anos atrás. Ela
entendia a minha dor porque sentia algo parecido por ter perdido alguém
naquela época. Eu sofria pelo Jason, enquanto ela sofria pelo Caim, o seu
primeiro amor. Ficava alegre por ela ter encontrado uma nova e recíproca
paixão.
Eu já estava de saída da agência quando Bryan me chamou. Achei que
era para mais um interrogatório sobre Franklin.
— Tabitta.
Ele vinha em minha direção. Eu estava na calçada da sede da delegacia
de Manhattan. O prédio era de tijolos vermelhos e forrado nos vidros, não
muito diferente da nossa sede.
— O que foi? Algum problema no caso?
— Não, Dennis e Thomas estão cuidando e montando uma estratégia
para pegarmos o Sebastian, agora que Franklin não está querendo ceder. Mas
não foi por isso que te chamei. — Sacudiu seu celular preto na mão. —
Recebi uma ligação de um amigo meu sobre uma briga de bar...
Eu o cortei.
— Não sei se você sabe, mas brigas de bar são trabalho da polícia, e
não nosso. Meu trabalho é prender gente perigosa como Franklin, e não ir
atrás de alguém que bebeu demais e está causando encrenca.
Ele suspirou, sacudindo a cabeça.
— O cara bêbado que está causando encrenca é o Jason.
Eu arfei.
— Maldição! O que ele tem na cabeça? — rosnei. — Onde fica esse
bar?
— Venha comigo resolver esse problema. — Seguiu em direção à sua
Range Rover.
Chegamos ao bar perto da praia. Era pequeno e meio afastado da
cidade. Eu não entendia o que ele foi fazer em um bar. Bem, eu o machuquei
tanto, vi a dor queimando em seu rosto, então devia ser por isso que ele
estava ali.
Entramos no estabelecimento repleto de cadeiras de madeira
espalhadas pelo pequeno salão. Não tinha muita gente ali, apenas alguns
homens bebendo e outros jogando sinuca.
Jason discutia com um cara barbudo. Havia um senhor no bar, e Bryan
foi conversar com ele. Decertou foi ele que ligou para o Bryan. Cheguei
mais perto do Jason e ouvi sua discussão.
— Você acha que quero sua mulher? — desdenhou, apontando para a
garota do lado do barbudo, uma morena bonita. Meu coração foi atingido ao
pensar que ele já estava com outra. Onde se encontrava a loura? Achei que
estavam juntos.
— Acha que sou burro? Vi vocês dois. — O cara apertou o taco em
suas mãos, como se quisesse bater no Jason com ele.
— Ela veio até mim para pedir um autógrafo. — Sua voz saiu um pouco
arrastada. Estava bêbado, porém, não muito.
— Você acha que não conheço Jason Falcon das colunas sociais, com
mulheres penduradas no pescoço? — rosnou o cara.
— Ele está falando a verdade, Paulo, eu só queria um autógrafo —
disse a mulher.
— Posso saber o que está acontecendo aqui? — perguntei, ficando
entre os dois.
Jason me olhou e sorriu para mim por um momento. Em seguida, virou-
se para Paulo.
— Você já foi enfeitiçado por uma boceta vodu?
O cara franziu o cenho. Olhou para mim e para a arma no meu coldre.
— Vocês são da polícia? — inquiriu a mim e Bryan. — Só estou vendo
a arma, cadê o distintivo?
Peguei no bolso da calça e mostrei para ele.
— Aqui.
— FBI? — praguejou.
Jason me pegou pelo braço e puxou para ele, quase nos fazendo cair.
— Ela me pegou com sua boceta vodu. — Fitou meus olhos. O amor
imenso estava ali, visível. — Meu pau só se levanta quando você está perto.
Ergui uma sobrancelha para ele.
— Sério? Não era o que parecia. Vi você saindo da boate com uma
loura não tem muito tempo — soltei, sarcástica.
Ele franziu o cenho.
— Alexia? Eu não estava fodendo ela e nem ninguém.
Bryan ofegou atrás de mim.
— Alexia estava na boate hoje? — indagou, sufocado, ou foi o que me
pareceu.
Jason olhou para ele.
— Sim, dei carona para ela, já que estava chorando muito e não parecia
bem para dirigir.
— Droga! — xingou e me olhou. — Você segura as pontas aqui?
Preciso esclarecer algumas coisas com ela. Com certeza viu algo que não
aconteceu.
Eu sabia que ele estava com alguém, só isso explicaria o fato dele não
ter dado em cima das garotas e de mim, porque o cara era um maldito deus
grego.
— Deve ter visto você com outra mulher. Estava aos prantos, dizendo
que mentiu para ela e a traiu — Jason falou.
Eu não vi Bryan com ninguém. Nós dois tivemos de ir a um quarto e
ficar bastante tempo lá, para todos pensarem que estávamos fodendo. Mas
isso não aconteceu. Ela devia ter enxergado ou ouvido algo que a fez pensar
que ele estava a traindo comigo. Precisei deixar Bryan sozinho no clube para
ver se eu buscava uma confissão de James, foi quando Jason apareceu e
estragou tudo. Felizmente, agora o filho da puta do James estava preso, já
que foram encontradas várias coisas que envolviam ele com menores em seu
carro.
— Pode ir, Bryan, eu resolvo aqui — garanti, enquanto guardava o meu
distintivo.
Ele assentiu e saiu correndo do bar. Esperava que os dois se
entendessem.
Dirigi-me ao cara e sua mulher:
— Estamos resolvidos ou teremos de ir à delegacia?
— Contanto que ele fique longe da minha garota — rosnou o homem,
furioso.
Jason bufou.
— Eu já disse, meu pau só se levanta por uma mulher. — Sorriu para
mim. — Você.
Revirei os olhos.
— Certo, vamos embora, então. — Peguei seu braço para tirá-lo dali.
Indaguei ao senhor do bar: — Quanto ele deve a você?
O senhor de meia-idade olhou para o Jason, que estava cheirando meu
cabelo. Ele sempre gostou de fazer isso.
— Pode deixar, não é a primeira vez que ele bebe demais no meu bar.
Amanhã ele vem e acerta a conta, não se preocupe.
Eu franzi a testa. Jason ia direto ali para beber? Ele sempre ficava
assim? Isso tudo era minha culpa.
Fui ao bar com Bryan em seu carro, mas ele partira para resolver seus
problemas com Alexia. Esperava um dia também resolver os meus com esse
homem do meu lado, que era a minha vida.
— Cadê a chave do seu carro? — perguntei assim que paramos perto
do seu automóvel.
— Hummm, no meu bolso da frente — respondeu, sem nunca tirar os
olhos de mim. Era como se estivesse com medo de eu desaparecer.
Coloquei minha mão em sua calça e peguei as chaves do carro.
Seguimos para sua mansão na beira do mar, um lugar lindo, eu devo dizer.
Sua casa possuía dois andares, já tinha visto em uma revista de moda.
— Como sabia que eu morava aqui? — sondou assim que estacionei
seu carro na garagem imensa. Havia mais veículos ali, só não reparei nas
marcas.
— Sei tudo sobre você — respondi ao entrarmos em sua sala.
Ele ligou a luz usando um controle remoto. Não sabia como ele achou
no escuro, ainda mais estando bêbado.
A sala era imensa, com paredes marrons, uma cor bem estranha para
um ambiente caseiro. Os móveis também eram marrons e pretos, tanto os
sofás na forma de L quanto a estante embutida na parede. Não havia quadros
ou fotos; a sala era linda, mas parecia sem vida.
— Estranho, porque eu não sei nada sobre você — retrucou, tirando sua
jaqueta e deixando-a no sofá.
— Eu tive um dia longo e não quero discutir, em especial sabendo que
amanhã não vai lembrar nada que conversarmos hoje.
— Vou me lembrar de tudo, não estou tão bêbado assim.
Balancei a cabeça.
— Você tem uma linda casa, embora um pouco triste. Por que cores
escuras?
Ele deu de ombros.
— Dizem que o ambiente em que se vive revela o que você é por
dentro. — Expirou, ao que eu me encolhi. Antes que eu dissesse alguma
coisa, ele continuou: — Por que eu não fui homem suficiente para você?
— O quê?
— Eu não fui suficiente para você...
A dor que se apossou de mim era tão terrível que me deixou sem fôlego
por um momento. Entendia que foi preciso deixá-lo, todavia, não imaginava
que ele pensava que não era homem suficiente para mim. Ele era tudo, todos
esses anos e eu continuava o amando da mesma forma que antes.
— Você sempre foi o bastante para mim, Jason, nunca pense o contrário
— falei a verdade.
— Então por que foi embora aquele dia, me deixando vazio e morto por
dentro?
Expirei e fechei os olhos por um momento, estabilizando minha
respiração e a dor que me consumia.
— Me diga o que houve, borboleta? — pediu, tocando meu rosto e o
esquadrinhando.
Seu toque era quente e abrasador na minha pele. Abri os olhos meio
úmidos, encarando-o ali tão perto de mim.
— Não posso...
— Por quê? — Seus dedos seguiam por meu rosto e lábios.
Ele parecia não saber o que seu toque fazia com meu corpo. Eu me
afastei.
— Eu tenho que ir embora. — Ficaria em um hotel nas proximidades.
Era para ir à casa do Papy no Brooklyn, mas já era quase duas da
madrugada, então continuaria por aquela vizinhança mesmo.
Ele me segurou antes que eu saísse e me puxou para si.
— Tudo bem, não vou perguntar mais nada, ok? Apenas não vá embora
hoje. — Seu tom era suplicante, e sua voz linda tremeu.
Fitei seus olhos. Estava com medo de eu ir embora e deixá-lo de novo;
parecia quebrado. Eu quebrei esse homem no momento em que o abandonei,
e ele nunca se recuperou. Por isso precisava concluir minha missão e trazer
luz ao cara na minha frente.
— Certo. — Peguei sua mão e levei para a escada.
— Obrigado. — Aparentava estar um pouco mais feliz.
— Onde é o seu quarto?
— Na segunda porta à direita.
Deparei-me com um recinto branco; bom, ao menos ele não era marrom
ou preto, igual ao resto da casa. A cama era king size, com lençóis claros.
Na parede à direita estava uma TV enorme, e, na esquerda, uma imensa
janela de vidro. Não tinha muita coisa lá, como quadros e outros enfeites.
Meu coração doeu pela culpa ser minha por ele estar assim.
Soltei suas mãos, sentei na cama, e tirei minha camiseta e jaqueta preta.
Depois, as botas escuras, a faca no meu tornozelo, o coldre com a arma e a
calça.
— Nunca pensei que veria você com uma arma um dia.
Virei para cima e notei que ele estava me olhando com um esboço de
um sorriso. Gostei de ver esse sorriso verdadeiro em seu rosto. Fazia muito
tempo que não o enxergava deste modo.
— Eu também não. — Retribuí o gesto.
— Já atirou em alguém com ela? — sondou.
— Já, mas não matei ninguém ainda, espero que nunca precise. —
Estremeci. Eu era uma boa atiradora, mas sempre mirava em pernas e mãos,
nunca em um órgão vital. Orava para que jamais viesse a precisar.
Ele olhou meu corpo tão logo tirei a minha calcinha e o meu sutiã. Seus
olhos eram quentes.
— Você não cora mais. Sempre que eu encarava seu corpo, seu rosto
ficava vermelho — observou.
Revirei os olhos e fui para o banheiro.
— As coisas mudam.
— Algumas mais que as outras — disse, me seguindo. Seu tom foi de
crítica. Falou antes que eu pudesse retrucar: — Você é tão linda! —
sussurrou, quase abobado. — Sempre foi como o sol.
Eu me virei já debaixo do chuveiro, com a água quente a escorrer, e
olhei para ele todo nu, com sua beleza dura exposta. Seus músculos estavam
cobertos por tatuagens. Eu o puxei para mim e o beijei, querendo mostrar
tudo que não podia dizer em voz alta. Apertei meu corpo contra o dele,
saboreando as sensações lindas e maravilhosas. Seus braços agarravam
minha cintura com força.
Logo em seguida, ele estava dentro de mim. Coloquei minhas pernas à
sua volta, enquanto ele me imprensava contra a parede e me penetrava com
seu pau.
Gemi, sentindo seu membro gostoso. Cada estocada me levava mais
perto do prazer. Esperava que ele não caísse e me levasse, já que está meio
bêbado.
Seus lábios tomaram meu pescoço e minha orelha, mordiscando-os e os
lambendo. Gritei, escorando a cabeça na parede. Queria apenas que esse
homem matasse o desejo e a fome que sentia por ele. Cada estocada me
levava ao limite, à porta do meu orgasmo.
Ele afastou o rosto do meu e fitou meus olhos com luxúria, amor e
adoração.
— Eu te amo, borboleta, sempre amei e sempre vou amar — declarou
com fervor.
Meu coração rachou com essa manifestação. Uma parte de mim ficou
feliz em ouvir isso. Desejava que nossa história fosse real, igual foi um dia.
Era o que me dava mais forças para lutar e viver neste mundo sem ele,
sabendo que no futuro ficaríamos juntos. Eu não respondi, apenas beijei sua
boca e chupei sua língua, desfrutando de seu gosto delicioso.
Apertei sua cabeça contra mim, querendo mais, querendo colocá-lo
dentro mim. Urrei em sua boca assim que meu orgasmo bateu, tão forte como
um raio. Depois de um segundo, seu corpo tremeu. Gozou dizendo “eu te
amo” de novo. Ele me beijou e escorou sua testa na minha, sem nunca tirar
os seus olhos brilhantes dos meus olhos bêbados por ele.
— Não me afaste de novo, por favor. — Meu coração sangrou com
isso. Não podia ficar próxima dele, mesmo desejando isso com a minha
vida. Talvez se mantivéssemos nossa relação em segredo? Esperava que
funcionasse.
Soltei minhas pernas à sua volta e me afastei, pegando a bucha de banho
para ensaboá-lo. Não respondi.
— Por que não responde quando falo com você? — Seu tom era
quebradiço como vidro.
Observei seus olhos atormentados.
— Porque não devo prometer o que não posso cumprir. — Minha
garganta se arranhou.
— Por que não? Sinto que me ama também, vejo através dos seus
beijos, do seu toque e do seu olhar. — Acariciava meu rosto ao dizer isso.
Eu expirei.
— As coisas são complicadas. Se quiser que eu fique aqui, não faça
perguntas hoje, ok? — pedi, quase suplicante.
Ele assentiu, mordendo os lábios. A minha falta de respostas às suas
perguntas o machucava. Isso era pior do que tudo.
Passei a bucha em sua pele cheia de tatuagens. Ele tinha um falcão nas
costas, e asas de falcão nos braços. Ensaboei o local onde deveria estar a
tatuagem de borboleta que fizemos juntos, simbolizando nosso amor.
Rachei, não consegui mais segurar a dor que estava me sufocando
quando vi que ele removeu nossa tatuagem. Se ele a apagou, era porque não
queria mais sentir nada por mim. Se não tivesse minha filha, teria
desmoronado de vez. Vendo o lugar coberto com outro pássaro, eu me
afundei.
Deixei-me cair no chão do banheiro e chorei em demasia, me
quebrando na sua frente. Ele agachou, me puxou para o seu colo e desligou a
água. Suspendeu-me do chão em seus braços e me levou para o quarto, me
secando e me depositando na cama. Deitou ao meu lado, me puxando para
junto de si.
— Eu tive que tirá-la... A dor era demais quando a via em meu peito...
Por não saber o motivo pelo qual me deixou. Pensar que não fui homem
suficiente para você, que não fui o bastante, que talvez fiz algo para merecer.
Meus olhos estavam molhados.
— Você não fez nada de errado, Jason, sempre foi maravilhoso. Eu não
queria ter ido embora aquele dia. — Toquei seu rosto com barba por fazer,
em choque com o que eu disse. — Foi preciso.
— Por quê? — Ele limpava as lágrimas da minha face. — Eu não
entendo...
— Não precisa entender. Só saiba que fiz tudo isso por você. — Minha
voz falhou.
— Por mim? — Seu tom saiu alto no quarto. — Que droga isso quer
dizer?
— Eu tive de ir embora, não podia colocar sua vida em perigo...
— Borboleta...
Eu o beijei, impedindo-o de falar.
— Se amanhã você se lembrar do que conversamos hoje, eu contarei
tudo — disse a verdade. Esperava que ele se lembrasse, assim eu tiraria
esse fardo de cima dos meus ombros. Aninhei-me em seus braços. — Vamos
dormir agora.
— Eu vou me lembrar de tudo — prometeu.
Capítulo 6
Tiroteio

TABITTA
Acordei cedo e olhei ao redor no quarto branco. Senti um corpo ao meu
lado, virei e ali estava ele. O homem com o qual eu sonhava dia e noite. Seu
corpo musculoso despido, sua pele macia que tanto amava. Alisei seu peito,
seu rosto e sua boca.
Ele pegou minha mão. Ao se dar conta, fugiu tão rápido que logo estava
fora da cama, longe de mim.
— Não me toque — gemeu, colocando as mãos na cabeça devido à
ressaca. Seu cérebro parecia estar dando voltas como um redemoinho.
Deixá-lo uma vez antes foi insuportável; beber era a única forma que
achei de aliviar a dor. Se eu não tivesse Emily, não sabia o que teria
acontecido comigo. Provavelmente não estaria aqui agora. Por isso tinha
certeza de que Deus e esse homem me deram ela para passar por tudo.
— O quê? — Doeu perceber que ele não queria o meu toque.
Ele me olhou com o cenho franzido.
— Tabitta? O que faz aqui?
Gelei. Então ele não se lembrava do que tivemos na noite anterior? O
pior: ele pensou que eu fosse uma de suas vagabundas com quem transa e
esquece no dia seguinte. Doeu tanto, como se ele enfiasse as mãos em meu
peito e esmagasse o meu coração.
Não disse nada, apenas vesti minhas roupas e guardei minha arma na
cintura e minha faca na joelheira, calçando as botas.
— Responda, droga! — gritou, ao que gemeu pela ressaca.
Fuzilei-o enquanto colocava minha jaqueta de couro.
— Você não se lembra de nada mesmo?
Ele estreitou os olhos com o ressentimento na minha voz.
— Do que eu deveria me lembrar? Me diga. — Veio em minha direção.
Eu sacudi a cabeça.
— Esqueça, se você não se lembra, é porque não era importante. — Saí
do quarto, desejando ir embora dali e deixar a dor me consumir; ela estava
me esmagando por dentro.
— Tabitta, espere — gritou, indo atrás de mim. Deve ter notado que
estava sem roupas, porque o ouvi praguejar.
Ignorei-o e desci a escada correndo. Abri a porta num rompante e ali
estava uma loura, mas não a de ontem à noite. Essa tinha cabelos louros
platinados e olhos castanho-claros. Reconheci a modelo Rayla Donovan,
irmã do Ryan e Lucky.
Precisava ir embora antes que acabasse matando alguém.
— Quem é você? — perguntou ela na varanda. Passei sem responder.
— Tabitta... — gritou Jason.
— Jason, pensei que não trouxesse mulheres para sua casa — comentou
Rayla num tom confuso.
Isso me pegou de surpresa. Ele não levava garotas para sua casa?
“Talvez tenha ficado comigo só porque estava bêbado demais”, pensei,
irritada.
— Tabitta, quer esperar? — rosnou à meia-voz. — Como consegue
correr com esses saltos?
— Para quê? Vai me chamar para fazer um maldito ménage com você
dois? — Ele me pegou pela cintura. Eu podia lutar, mas jamais o
machucaria, e, com certeza, perderia.
— Fique calma e me conte a verdade, preciso ouvi-la dizer.
Expirei, me controlando, e me virei ainda em seus braços para enxergar
seus olhos.
— O que você quer que eu diga, Jason? Que eu abri a porra do meu
coração para você ontem, e hoje você não se lembra de nada do que houve
com a gente? — Suspirei. — Mas talvez seja bom.
— Você se abriu comigo? Por que não esperou até eu estar sóbrio? —
Seus olhos estavam grandes.
Eu ri, amarga.
— Você disse que se lembraria de tudo quando acordasse hoje, não
achei que estivesse tão bêbado. Me enganei, não é?
Ele colocou as mãos na cabeça.
— Não consigo me lembrar de nada, me diga o que houve!
— Não...
— Como não? — cortou.
— Talvez seja melhor assim. — Eu me afastei dele. Estávamos na
frente da sua casa.
— Melhor para quem? — censurou. — Para você vir até mim e depois
dizer que o que tivemos na boate não significou nada?
— Eu já disse o quanto significou. Mas você não se lembra, não é? Só
vamos esquecer isso, ok?
— Oh, porra nenhuma! — sibilou. — Eu preciso saber o que aconteceu.
— Então trate de lembrar, porque eu não direi nada. Não me procure
até recordar.
— Maldição, Tabitta, e se eu não lembrar nunca?
— Continue fazendo o que fazia antes, garanto que mulheres não
faltarão.
Ele seguiu meu olhar para a garota que estava na varanda nos fitando
com curiosidade. Depois, me encarou de olhos arregalados. Eu pensei que
ela namorasse aquele cara tatuado que vi no hospital quando fui visitar
Shane; talvez tenham terminado.
— Rayla? Ela é namorada de um amigo meu. Eu não tenho e nunca tive
nada com ela. — Voltou-se para mim. — Você é a única mulher que eu quero,
Tabitta.
Ele me puxou para seus braços e me beijou; isto é, a palavra certa seria
me consumiu. Foi então que ouvi pneus derrapando e me afastei dele,
olhando para o portão. Ofeguei ao enxergar um carro abrindo as portas; meu
instinto foi protegê-lo ainda mais quando eu vi suas armas.
— Corra para dentro da casa — ordenei, pegando sua mão e o
conduzindo.
— O que... — Parou de falar ao escutar os tiros por todos os lados.
Rayla começou a gritar e entrou na mansão, assim como Jason e eu.
— Abaixem-se! — berrei aos dois. Eles fizeram o que mandei,
escondendo-se atrás de um móvel. Balas voavam e quebravam os vidros.
— Oh, Deus! Eles vão nos matar — chorou Rayla, assustada. — Eu
nem tive a chance de dizer ao Alex que estou grávida.
Ela alisava sua barriga, amedrontada. Eu já estive com esta sensação
uma vez. Cheguei perto dela e toquei suas mãos.
— Não vai acontecer nada com você, tudo bem? — prometi. Eu me
levantei, peguei minha arma e a destravei. Olhei para o Jason. — Fique com
ela, eu vou cuidar deles. Chame ajuda.
Ele pegou meu braço.
— O que vai fazer, ficou louca? Espere a polícia chegar.
Eu ri.
— Eu sou policial, se esqueceu? Já enfrentei coisa pior que um bando
de atiradores. Não a deixe sozinha. — Saí correndo na direção da garagem
antes que ele dissesse alguma coisa. De lá, teria uma visão melhor dos caras.
Precisava saber quem eram esses homens, se estavam ali atrás de mim
ou de Jason. Um frio desceu por meu corpo: e se o Sebastian descobriu
sobre eu e Jason? Foi por isso que mandou homens atrás dele? Se o matasse,
também acabaria comigo. Maldito desgraçado. Eu teria que deixar Jason de
novo, não ficaria ao seu lado com sua vida correndo perigo.
Cheguei à garagem e mirei em um dos homens. Eram pelo menos três,
dois atirando e um no carro.
Comecei a atirar e acertei um homem na perna. Logo o outro estava
mirando em mim, atingindo a parede ao meu lado. Senti alguém ao meu redor
e apontei a arma na cara do Jason. Meu coração gelou.
— Droga, Jason, o que faz aqui? Eu poderia ter atirado em você. —
Estremeci. Empurrei ele para o canto. — Era para você ter ficado com a
Rayla, e não vir atrás de mim.
Ele suspirou.
— Ela está segura lá em cima. Eu não podia continuar escondido e
deixar você enfrentando esses bandidos sozinha.
— Sou treinada para isso. — Saí da parede e mirei no carro, atirando
nos homens.
— Tabitta, sua cadela, eu sei que está aí, seu pai manda lembranças —
gritou um dos caras, e depois seguiram-se tiros atrás de tiros, com certeza de
uma metralhadora. Como o portão estava aberto, alguns pegaram nos carros
de Jason.
Jason sibilou com punhos cerrados, não por seus carros alvejados junto
com sua casa, e sim por eles terem me xingado.
— Fique calmo, não entre na dele. Já fui xingada por nomes piores, não
ligue — pedi, apertando a minha mão na arma. — Diga ao Sebastian para
sair da toca e me encarar como o homem que ele nunca foi. Senão, juro que
seu império no crime vai cair. E com vocês junto, seus paus-mandados.
— Ele quer você longe dos seus negócios. Se não o fizer, acabaremos
com todos que ama, inclusive esse lutador de araque por quem é apaixonada.
— Riu. — Adorarei fazer isso.
— Eu vou protegê-lo de escórias como você e o bandido do Sebastian.
Franklin foi só o começo, acabarei com tudo dele, pode dar o recado.
— Pai? Sebastian? — indagou Jason, estreitando os olhos. — Se ele é
seu pai, por que quer matá-la?
— Não, ele quer matar você e me levar com ele, mas isso não vai
acontecer. — Atirei novamente, acertando no ombro de um.
— Vou matar você, sua puta — rugiu o cara atingido.
— Sério? Deixe eu te dizer uma coisa, seu filho da mãe. — Estava a
uns dez metros deles, a parede grossa nos separava. — A polícia está a
caminho, vou amar enfiar seu traseiro na cela de uma prisão.
Ele riu.
— Ninguém está vindo, eu interceptei a frequência da polícia e disse
que era engano. Não é maravilhoso? A casa está cercada, não tem para onde
fugir.
Ouvi mais carros parando do lado de fora. Então a ajuda veio? Eram
seus capangas, como ele acabara de informar. Olhei para o Jason.
— Precisamos sair daqui. Onde está Rayla?
— No andar de cima. Eu tenho um quarto protegido onde guardo meus
pertences valiosos, com porta de aço e chumbo, como as de cofres de
bancos.
— Vamos para lá, então. — Corremos em direção à escada.
— Renda-se, Tabitta, suas munições estão acabando, e a ajuda não virá.
Quando a pegarmos, revezaremos com você. Vamos ver se é tão boa na cama
quanto sua boca atrevida sugere.
Eu o ignorei, mas Jason se retraiu ao ouvir essa ameaça. Puxei-o,
relevando sua raiva. Chegamos ao final do corredor, diante da porta grossa.
Ele digitou a senha, e entramos.
Quando ele disse que tinha coisas valiosas, pensei que fossem joias,
quadros e dinheiro, nunca o que estava à minha frente.
Em uma parede havia algumas armas nove milímetros e outras, além de
uma rede de computadores de primeira geração. Reconheci as câmeras na
cidade de Austin, várias delas, em cada canto das ruas. Arregalei os olhos e
o fitei, enquanto ele acabava de fechar a porta.
— O que é tudo isso?
— Oh, graças a Deus, vocês estão bem — disse Rayla, aproximando-
se. — Por que a polícia está demorando tanto? Liguei para eles e me
disseram que logo chegariam.
— Vamos dar um jeito de sair daqui. — Eu esperava mesmo que
pudéssemos fugir, já que a polícia não estava vindo. Olhei para o Jason, que
me fitava. — Sabia que você não pode ter tantas armas assim? Se a polícia
entrar aqui, vão pensar que está contrabandeando. E essas câmeras? Por que
está vigiando Austin?
Ele não respondeu, apenas foi no computador, colocou a imagens dos
homens lá fora na tela e ativou o leitor facial. Logo tínhamos os nomes dos
bandidos.
— Victor Cortesia. — Apontou para o homem moreno. — Acusado de
tráfico humano, roubo, estupro e assassinato.
— Ele está lista de procurados do FBI — comentei. Fiz toda uma
pesquisa dos capangas do Sebastian procurados pela justiça. Sabíamos que
sua fortaleza ficava no México, tão protegida e armada quanto Fort Knox. Se
fôssemos fazer uma emboscada lá, teríamos grandes perdas, ainda mais pela
quantidade de armas e homens de que dispunham. Por isso queríamos que ele
saísse da toca e cometesse os crimes ele mesmo, sem que alguém levasse a
culpa. Mas estava difícil de fazer isso. — Vai me dizer para que tudo isso,
Jason? As armas, a espionagem em Austin e estes computadores?
Ele suspirou e me olhou de lado.
— Responderá às minhas perguntas?
— Justo. — Olhei pela janela de vidro coberta com uma cortina escura.
— A janela é a prova de balas — afirmou Jason.
Eu assenti, precisava tirar todos dali. Avistei um fuzil M16. Era isso ou
nada. Não deixaria esses criminosos impunes.
Quando fui pegar sua arma, Jason perguntou:
— O que fará com ela?
— Eu vou para o telhado atirar neles. Pegue Rayla e fuja daqui,
cobrirei vocês. Use meu telefone para entrar em contato com um cara
chamado Thomas e diga o que está acontecendo. Ele vai mandar os homens
certos, que não estão na folha de pagamento de Sebastian.
— Oh, porra, se eu vou deixar você aqui... Não ouviu o que eu falei
desses homens? Eles são estupradores e assassinos da pior espécie, sem
chance de eu largar você sozinha.
— Eu não tenho escolha, eles vão nos cercar e destruir sua casa...
— Acha que eu me importo com a porra da casa? Não ligo para isso, eu
me importo com você, então se você for para o telhado, eu vou junto.
— Droga, Jason, por que não faz o que peço pelo menos uma vez?
— Porque eles podem matá-la, não vê isso? Ou fazer coisa pior, como
o cara lá fora disse agora há pouco. Não venha dizer para eu ficar e esperar,
porque isso não vai acontecer.
Sabia que ele não mudaria de ideia, sempre foi cabeça dura. Amava
isso nele. Peguei o meu celular e liguei para o Papy, ele nos ajudaria.
Garantiu que os policiais viriam em alguns minutos.
Sentei em uma cadeira assim que desliguei o celular. Jason se
encontrava de pé à minha frente, depois sentou em um sofá perto da Rayla.
— A polícia logo chegará — disse a eles. — Você deve esconder essas
armas ou eles vão prendê-lo.
— Tenho porte para cada uma delas, então estou bem com isso.
Ficamos em silêncio. Pelo menos o tiroteio acabara. Acho que eles não
queriam chamar tanto a atenção, mas não significava que desistiram; deviam
estar se aproximando em silêncio. Esperava que a ajuda chegasse rápido.
— Desde quando conhece Jason? — perguntou Rayla a mim.
— Em março vai fazer dez anos, estudávamos juntos na escola em
Austin quando eu tinha dezessete — respondi. — Três meses depois,
começamos a namorar.
— Quanto tempo vocês ficaram juntos? Desculpe perguntar isso, mas
parece que ainda se amam. — Olhou de um para o outro.
Expirei, conferindo os homens lá fora através das câmeras. Parecia que
montariam guarda. Alguns começaram a entrar na casa. Contei oito caras.
— Um ano. — A dor forte me impediu de respirar por um segundo.
— Posso perguntar por que se separaram, sendo que ainda se amam?
Respirei fundo, mas foi ele quem respondeu.
— Ela foi embora — gemeu, baixando a cabeça.
— Jason... Eu sinto muito — murmurei.
Levantou os olhos para mim.
— Eu só queria entender por que me deixou. — Seu tom era um
sussurro de dor. — Não me venha com essa história de que me disse ontem.
— Acrescentou assim que eu abri a boca.
— Fui embora para protegê-lo, Jason. Se eu não tivesse partido, hoje
você não seria o que é...
— Acha que eu prefiro a fama a você? Daria tudo que tenho para tê-la
de volta, minha herança e meus bens, até a porra da minha alma!
Engoli em seco.
— Não precisa dar nada. De qualquer forma, não importa mais, ele
sabe que você existe e o quanto é importante para mim.
— Do que está falando?
— Sebastian, o meu pai. Ele vai querer usar você contra mim para me
atrair. Por isso, de agora em diante, você terá que andar com os seguranças
que vou arranjar.
— Oh, caralho se vou, não preciso de nenhum segurança — rosnou com
os punhos cerrados. — Sou lutador, esqueceu?
Levantei as sobrancelhas.
— Até onde eu sei, lutador não pode contra balas, não é? E mesmo
você possuindo porte de armas, não pode andar armado e atirar por aí; já um
segurança profissional, sim, se for preciso.
— Não vou ficar com segurança algum. — Foi firme.
Suspirei, esfregando a testa.
— Se não aceitar proteção, eu não vou poder ficar do seu lado, vou ter
de ir embora, só assim estará seguro. Por favor, me deixe terminar — falei,
porque ele já ia abrindo a boca. Vi a dor em seus olhos ao me imaginar
partindo. — Ou pode aceitar os seguranças que eu conseguir, e me ter por
perto.
O brilho que adentrou seus olhos foi tremendo, mais que o sol de verão.
A felicidade me tomou com tanta força que achei que logo gritaria, embora
continuasse preocupada com o que podia acontecer com ele e Emily, e
também meus pais e amigos. Torcia para o plano de Dennis e Thomas
funcionar, pois estava cansada de me esconder e ficar longe do homem que
amava.
— Quer dizer que você não vai embora, não vai me afastar mais? —
Levantou-se, me puxou para seus braços fortes e me beijou.
Quase esqueci que tínhamos companhia e estávamos cercados por
bandidos perigosos e armados. Afastei-me dele, fitando seus olhos
brilhantes e seu sorriso.
— Não, de qualquer forma, ele sabe sobre você. — Meu celular tocou.
Era Emily.
— Quem é Emily? — sondou.
Distanciei-me, não querendo ter essa conversa. Contaria sobre Emily,
mas não agora, conosco presos e com bandidos lá fora nos cercando.
Chequei as câmeras de dentro da casa, eles já estavam chegando ao corredor
quando ouvi as sirenes, trocas de tiros lá fora e carros saindo em alta
velocidade.
Escutei os bandidos praguejarem e fugirem. Oh, isso não aconteceria.
Eu fui para a porta. Jason pegou meu braço.
— O que vai fazer?
— Eles estão escapando, preciso pegá-los — respondi. — Pode abrir a
porta?
Ele não quis, a princípio, mas logo abriu. Eu não tinha tempo a perder,
não podia ficar esperando e deixá-los fugirem. Observei o corredor vazio.
— Os policiais estão aqui para fazer isso — respondeu com uma
pontada de medo em sua voz.
Virei e olhei para ele.
— Jason, eu sou uma agente, este é o meu trabalho. Preciso pegar o que
está correndo pelos fundos — falei, segurando minha arma e saindo antes
dele dizer algo.
Diego Sales estava fugindo pela janela do quarto do Jason. Eu corri
atrás dele e apontei a arma antes dele pular:
— Parado ou eu vou atirar — ordenei.
Ele estacou e se virou para mim com um sorriso e a arma apontada na
minha direção.
— Abaixe a arma e coloque as mãos para cima.
Ele sacudiu a cabeça.
— Você sabe que não vou fazer isso. Atire em mim, e eu em você, e nós
dois morreremos, o que acha? — disse sem nenhum medo. — Eu sou mais
experiente. Já matou antes? Aposto que não.
Eu já fiquei com uma arma apontada para mim no passado, e sempre
que isso acontecia, meu corpo gelava e minha pele suava, mas nunca deixava
transparecer, pois assim o inimigo ganharia.
— Então temos um problema, não é? Porque eu também não vou baixar
a arma. Renda-se antes que eu atire em você. Garanto que minha pontaria é
boa. — Não queria matá-lo, mas não tinha opção. Estava a ponto de puxar o
gatilho quando um tiro acertou seu ombro, fazendo sua arma cair no chão.
Olhei para trás dele: Lincoln estava ali, na varanda, e foi prender o
cara.
— Você está preso. Qualquer coisa que disser poderá ser usada contra
você no tribunal...
Um policial veio e levou Diego embora. Antes dele passar por mim,
ameaçou:
— Isso ainda não acabou.
— Tire esse cara daqui antes que arranque sua cabeça — rosnei.
— Tabitta, você está bem? — sondou Lincoln, vindo até mim. Não deu
tempo de responder, pois ouvi o grito dolorido do Jason.
— Taby! — Ele apareceu na porta e me olhou dos pés à cabeça, depois
correu até mim e me abraçou. — Você está bem?
Abracei-o, sentindo seu aroma que tanto amava.
— Estou, Jason — tranquilizei-o, beijando sua boca e esquecendo de
todos ao meu redor. Para mim, a Terra desapareceu.
Eu parei ao ouvir um pigarrear distinto, sabia que era o Papy. Mas
fiquei abraçada com ele, não queria me distanciar nem por um segundo.
Vi preocupação na face do Papy. Ele correu até mim e me abraçou, me
tirando um pouco dos braços do Jason.
— Está bem, querida?
— Estou, Thomas, não se preocupe.
Ele sorriu para mim, depois encarou Jason com seriedade.
— Jason, este é Thomas, meu chefe e meu pai adotivo.
— Prazer em conhecer o senhor — Jason disse, apertando a mão do
Papy.
— Há um quarto cheio armas no corredor — um policial recém-
chegado informou.
— Ora, ora, será que vamos ter de prender o famoso Jason Falcon por
posse ilegal de armas? — cacarejou Lincoln, sorrindo para o Jason. Ele
adoraria que isso acontecesse.
Jason fechou a cara para ele. Isso me lembrou do olhar que lançou ao
Lincoln na boate. Será que ele pensava que tive algo com meu colega?
— Você não vai ter essa fama às minhas custas — rosnou e dirigiu-se
para o Papy: — Tenho posse de todas elas. Sou colecionador de armas e
motos, podem ver as duzentas motos que tenho no casarão ao lado.
Arregalei os olhos com esse fato. Duzentas motos? Oh, eu adoraria vê-
las, era apaixonada por elas também. Andava mais de moto, só usava carros
quando saía com Emily.
Alguns policiais ofegaram, inclusive Papy. Já o Lincoln fechou a cara.
— Com certeza quero ver as provas.
— Isso não é sua função, e sim tomar o depoimento de Diego Sales e
descobrir para onde Victor Cortesia foi. Os policiais vão cuidar disso —
ordenou Papy.
A polícia pegou nossos depoimentos, de Jason, Rayla e meu. Diego foi
levado para interrogatório; após, seria conduzido à prisão.
— Você está bem? — perguntei à Rayla depois que demos nosso
depoimento. — Não quer um médico? Afinal, passou por um grande susto
hoje.
— Estou bem, o Alex já está a caminho. — Ela me abraçou por um
segundo, mas logo depois um cara chamou seu nome.
— Rayla!
Eu me afastei e vi o mesmo cara musculoso e cheio de piercings e
tatuagens que enxergara no hospital. Ele se aproximou dela e a abraçou forte.
Este devia ser o Alex, seu namorado.
Deixei o Jason em sua casa com dois policiais de guarda e liguei para o
Bryan. Ele conseguiria alguns guarda-costas profissionais para tomar conta
da segurança de Jason. Eu ficaria mais aliviada com isso. Gostaria de fazer
eu mesma, porém, precisava trabalhar para colocar Sebastian na cadeia de
uma vez.
Capítulo 7
Proteção

JASON
Estava grilado por ter esquecido a noite de ontem, por não me lembrar
de nada do que ela disse. Como esqueci algo tão importante? Algo que
estava querendo ouvir por anos? E por que ela não esperou eu estar sóbrio
para me dizer a verdade?
Sentia raiva por aqueles homens terem atirado em nós, aliás, nela. Taby
disse que eles estavam me querendo, mas não acreditava nisso, não depois
de dizerem o que fariam com ela se a pegassem. Por que ela não foi arrumar
uma profissão menos arriscada? Maldição! Se todas as vezes que sai para
trabalhar Tabitta enfrenta homens perigosos assim, eu ficarei louco da
cabeça.
Já lutei com vários caras fortes e bons em um ringue, mas nunca senti
medo. Ouvindo o que aqueles bandidos diziam que iam fazer com ela, eu me
enfureci, querendo matar todos. Graças a Deus foram presos, menos um,
Victor Cortesia, o pior deles. Ela sim devia andar com guarda-costas, e não
eu.
Tabitta saíra há alguns minutos, mas deixou dois policiais comigo. Eu
não queria a proteção de ninguém, contudo, a garota disse que se eu não
aceitasse, ela iria embora. Eu não podia deixar isso acontecer.
Nem acreditava que a tinha de volta na minha vida. Gostaria de saber
mais sobre o que houve aquele dia. Ela disse que fez para me proteger, mas
do quê? E de quem? Seria do seu pai bandido? Eram muitas perguntas, e
nada de respostas. Queria insistir para me dizer, mas tinha medo de que, se a
pressionasse, ela se afastaria.
— Fiquei aliviado e feliz por estarem bem — disse Lucky. — Quase
tive um ataque do coração ao saber do que houve aqui. Eu vim direto da
empresa para cá, não disse nada à Rosa Vermelha, não queria preocupá-la.
Lucky, Jordan e eu estávamos sentados na mesa da cozinha, o único
móvel que não foi alvejado.
— Fez bem, mas acredito que logo ela saberá, já que os jornalistas
estão em todos os lugares feito um bando de abutres. — O meu agente estava
cuidando dos repórteres em volta da casa, e de alguns fãs preocupados
comigo. Luís garantiu para todos que eu estava bem. Falei para ele deixar
Tabitta fora disso, afinal, não queria as câmeras na cara dela. Esses
bandidos podiam usar isso e machucá-la. Tremia só de pensar.
Rayla e Alex conversavam entre si lá na sala de estar. Assim que eu
liguei para o Lucky e contei o que houve, veio correndo para cá, preocupado
conosco. Amigos assim são verdadeiros, como o Dom também era. Eles são
mais que amigos: são a família que nunca tive.
Contei aos dois o que aconteceu no clube ontem, ou melhor, nessa
madrugada, porque já era tarde àquela hora, sobre os tiroteios, e também a
respeito de Tabitta, que me trouxe bêbado para casa.
— Essa Tabitta é aquela que Angelina mencionou, a policial? —
Estreitou os olhos, me avaliando. — Por que nunca me disse sobre ela antes?
Sou seu melhor amigo.
Eu me encolhi com sua acusação. Ele estava certo, deveria ter contado
há anos tudo o que houve comigo, mas não podia na época, a dor cortava
fundo. Como diria a eles que a única mulher que amei na vida e amava até
hoje me deixou por eu não ser homem suficiente para ela? Era isto o que eu
pensava antes de descobrir o seu amor por mim. Machucava falar sobre esse
assunto.
— Deveria ter contado, sim, sinto muito por esconder isso de vocês —
sussurrei. — Doía demais mencioná-la.
Ele assentiu.
— Bem que eu percebi que tinha algo de errado com você, seus olhos
demonstravam um sofrimento cuja origem eu desconhecia. Nunca perguntei o
motivo da dor visível em seu rosto, porque sabia que no dia em que
estivesse pronto, você me diria; não só a mim, mas também para todos
aqueles que o amam. — Ele expirou — Às vezes dói falar e lembrar, sei
disso, já que vivi algo parecido toda a minha vida.
Jordan concordou e falou, bebendo seu whisky, embora fosse cedo:
— Sim, cara, somos mais que amigos, somos irmãos. Mas estou
curioso: quando conheceu esta mulher? Parece que não foi agora, e sim há
muito tempo. Vejo essa dor em seus olhos desde Harvard, quando nos
conhecemos.
— Na escola onde estudava, em Austin, a vi pela primeira vez. Logo
sua doçura e pureza me conquistaram. Ela era meiga, e agora está diferente,
impulsiva e com garras, como uma tigresa. Gosto dela assim também. —
Passei as mãos no cabelo. Era verdade: não importava o que ela se tornara,
eu a queria com a mesma intensidade.
— Se a ama tanto, por que a deixou antes? — sondou Lucky, confuso.
Eu expirei.
— Não fui eu quem a abandonou. Ela foi embora...
— Eu não entendo — sussurrou Jordan. — Então ela é uma...
Olhei para ele com o rosto duro.
— É melhor nem terminar — cortei-o. — Ela teve seus motivos.
— E quais foram? — indagou Lucky. — Ao menos disse por que foi
embora?
— Eu não sei, Taby não me contou. — Minha voz saiu baixa.
Lucky trincou os dentes.
— O quê? Ainda assim vai defendê-la? — Soava incrédulo. — Sei que
a ama, mas ela tem de dizer tudo a você. Não pode deixar por isso mesmo.
— Entendo sua fúria, mas não fiquem deste jeito. Também me senti
assim no começo, porém, não posso viver sem essa mulher, Lucky. Fiz isso
por anos e foi um completo tormento, era como se eu estivesse respirando,
mas morto. — Eu a amava tanto que estava disposto a ter somente o que ela
me desse, mesmo meu coração doendo por querer saber tudo sobre ela,
saber a verdade.
— Posso ver, meu amigo. Entretanto, viver com segredos não é certo,
você não pode aceitar ficar com ela sem saber o que aconteceu, o que a
levou a deixá-lo, não é justo. Nenhum dos dois vai ser feliz com isso. Posso
ver em seus olhos o quanto machuca quando fala que não sabe o porquê dela
ter partido. Isso não é vida.
Lucky estava certo, todavia, tinha medo de prensá-la a dizer a verdade
e ela ir embora.
— A única coisa que sei é que ela me deixou pela minha segurança... —
Bom, foi isso que ela disse quando estávamos presos no quarto.
Jordan me interrompeu.
— Como assim?
Eu suspirei.
— Depois desse tiroteio de hoje, com aqueles caras dizendo que o pai
dela exigiu que ela saísse do caso ou seria o fim... Tenho certeza que tem o
dedo dele nisso. — Olhei para os dois. — Estou com medo, esses caras são
barra-pesada da pior espécie.
— Quem é o pai dela? — perguntou Jordan. — Não deve ser nada bom,
já que mandou alvejar vocês.
— Sebastian Ruiz, chefe do principal cartel do México, conhecido por
matar pessoas, estuprar, traficar drogas e humanos, e por vários outros
crimes.
— Como sabe sobre isso? — Jordan estava assustado.
— Ouvi alguns policiais falando dele e do que faz. Temo por ela.
Depois, vou conversar com Taby para ver se vem ficar aqui. Colocarei mais
seguranças no local para impedir que o que aconteceu hoje se repita.
— Ela vai aceitar? Não acha que está se precipitando, a chamando para
morar com você? E se ela estiver interessada em seu dinheiro? — Jordan
emendava os questionamentos.
— Ela não é assim, nunca foi, e mesmo agora mudada, continua a
mesma nesse sentido. Sinto que me ama, seu amor é tão intenso quanto o
meu. O problema é esse enrosco dela não me contar o que houve aquela
noite e depois me deixar sem dizer nada.
Eu não permitiria que a dúvida e os meus pensamentos nebulosos
atrapalhassem a felicidade que eu estava sentindo por tê-la de volta nos
meus braços.
Resolvi mudar de assunto, dirigindo-me ao Lucky. Falar do passado me
deixava sem controle. Faria de tudo para resolver esse pepino antes que algo
grave acontecesse. A sua segurança vinha em primeiro lugar. Até porque,
com ela segura, talvez um dia me contasse.
— Rayla falou a você ou ao Ryan sobre estar grávida? Logo teremos
mais um bebê por aí. — Ryan estava em uma reunião de trabalho em
Chicago, por isso Lucky falara para ele que Rayla esteve envolvida no
tiroteio. Não queria preocupá-lo, mas as notícias voavam, então logo
saberia.
Lucky arfou.
— Rayla está grávida? — Seu tom saiu duas oitavas acima.
Antes que eu respondesse, ouvi um arfar alto atrás de mim. Olhei para a
porta da cozinha: Alex estava ali, de pé e olhos arregalados, buscando Rayla
do seu lado como se procurasse uma resposta.
Ela me fuzilou.
— Obrigada por ficar calado, Jason — reclamou.
— Desculpe, achei que não tinha contado sobre isso só ao Alex.
Alex estreitou os olhos para a amada.
— Você não ia me dizer que espera um filho meu? — Seu tom era
ultrajado e magoado.
Ela se encolheu.
— É claro que eu ia contar, mas neste final de semana, quando
estivéssemos em nossas férias nas Bahamas.
Ele sorriu e a pegou nos braços, girando-a. Alex também tinha uma
surpresa para ela programada: pediu sua mão ao Lucky e Ryan. Disse que
tinha a intenção de propor casamento durante a viagem.
Fiquei contente pelos dois estarem bem e felizes. Pela primeira vez na
minha vida, não sentia inveja ao ver um casal apaixonado, fosse Lucky com a
Preciosa, Ryan com a Anjo dele, ou esses dois. Não invejava porque tinha o
mesmo com Taby agora, e esperava termos para sempre. Não sabia o que
aconteceria conosco, mas não a deixaria partir de novo, não mesmo.
— O que está acontecendo aqui, pessoal? — Bryan entrou na cozinha,
seguido por dois homens altos, fortes e com as expressões sérias, como a de
Simon. Eu não os conhecia.
— Que droga houve com seu olho? — indagou Jordan, preocupado,
acho que com medo dele ter apanhado em uma luta. — Está brigando por aí?
Parece que o cara acertou de jeito.
O entorno de seu olho estava roxo. Eu me lembrava de ter visto ele na
boate esta noite, será que houve uma luta por lá? Depois de levar um fora
mais uma vez da Taby, eu fui embora, não podia ficar tão perto dela, doía
muito sua rejeição. Acredito que fui beber, após? Deu um branco, não
recordava nada até hoje cedo, quando abri os olhos e vi Taby na minha
cama.
Bryan sorriu.
— Vamos dizer que uma loirinha esquentada ficou furiosa comigo e
desceu uma bola de cristal na minha cara. — Passou as mãos nos olhos e
estremeceu.
— Ela viu você com outra na boate ontem à noite, não foi? — Botei a
mão direita na cabeça. — Lembro-me de dar carona a ela, e que estava
chorando muito, e a deixei no seu apartamento.
— Você traiu minha irmã, seu desgraçado? Vou acabar com você —
rosnou Alex. — Quando me pediu para namorar com ela, eu te falei para
nunca fazê-la sofrer!
Eu sabia que os dois começaram a namorar há algum tempo, logo
depois de um encontro do nosso grupo no Belas Country. Bryan olhou para
ele.
— Eu nunca trairia Alexia. Ela apenas soube que fiz algo, que não
aconteceu realmente, por isso ela fez isto. — Apontou para o seu rosto. Não
parecia irritado com o machucado.
— O que ela pensou que fez, então? — sondou Alex. — Deve ser sério,
porque o ferimento está bem feio.
Bryan estreitou os olhos para mim.
— Humm, não acho que vá gostar dessa parte. Quero que saiba que
quando entrei sozinho no quarto do clube com Tabitta, nós não...
— Vocês ficaram sozinhos num quarto? — indaguei com dentes
cerrados.
— Não, bem, sim... — ele se interrompeu quando me lancei na sua
direção e o prendi na parede. — Mas que porra! Eu não a toquei, juro.
— Então o que foram fazer?
Ele levantou uma sobrancelha.
— Não confia nela?
Grunhi e soltei-o, ele tinha razão. Não era certo duvidar da Taby, ela
jamais faria isso, mesmo não a conhecendo bem hoje, sentia seu amor por
mim. Eu me afastei dele, fui até uma garrafa de whisky e bebi direto dela.
— Cara, relaxe, nós fomos naquela boate disfarçados, estávamos
atuando que éramos parceiros, ela minha submissa, mas sem fazer nada na
frente das pessoas...
— Isso quer dizer que fizeram pelas costas? — inquiriu Jordan.
Fechei os olhos com força por um momento e depois encarei Bryan, que
me fitava.
— Como eu disse, não houve nada entre nós. Precisávamos manter as
aparências, e uma das garotas observou que não íamos muito ao quarto,
então tivemos de improvisar para que pensassem que estávamos nos
divertindo. Eu nunca enganaria minha namorada com ninguém, mesmo que a
Tabitta seja perfeita.
— O que essa operação é, pode nos contar?
Bryan olhou para o Jordan.
— Desculpe, é segredo, há coisas no meu trabalho que não posso
revelar. E acredito que ela também não.
“Ótimo! Mais segredos”, pensei, irritado. Ao menos os segredos quanto
ao seu serviço eu tolerava de boa, ao contrário dos que guardava sobre sua
partida.
— Com tudo que aconteceu hoje, você precisa ser protegido vinte e
quatro horas por dia. Esses caras aqui vão fazer isso... — Bryan ajeitou sua
jaqueta e olhou para mim com uma expressão séria
— Eu não preciso de proteção, Tabitta sim. Aqueles malditos querem
ela, não eu — cortei o Bryan.
Bryan suspirou.
— Sim, mas ela está segura com seus amigos agentes. Não se preocupe
demais com Tabitta, foque em você.
Bryan olhou para os dois homens que estavam calados. Um era moreno,
e o outro louro.
— Esses são Landon e Chris. A partir de agora, serão seus seguranças.
Se sair para qualquer lugar, eles irão segui-lo e fazer sua proteção.
— Ele tem razão, Jason, esses caras são barra-pesada, como disse há
pouco, e podem vir atrás de você. Por favor, fique com eles, assim ficaremos
mais tranquilos — falou Lucky.
Eu não gostei disso. Queria protegê-la, mais do que a mim mesmo.
Bryan disse que os caras eram profissionais, sabiam lutar e lidar com várias
situações. Esperava que estivesse certo, porque não podia nem imaginar
minha vida sem ela de novo.
—Fique com eles por enquanto, não deve demorar muito para
prenderem esses homens, não é? — Jordan olhou para o Bryan em busca de
afirmação.
— Sim, nós vamos prendê-los logo — respondeu Bryan, mas não senti
muita confiança em sua voz. Mudou de assunto rapidamente, direcionando-se
ao Lucky: — Onde está a Sam?
Chequei meu telefone para ver se tinha alguma ligação de Taby. Não
havia nenhuma. Optei por acreditar na palavra do Bryan de que ela estava
bem e continuaria assim.
Lucky respirou fundo.
— Eu não disse a ela ainda. Logo que chegar em casa eu conto, não
gosto de manter segredos. — Foi uma indireta para mim. — Eles sempre
vêm à tona, nem sempre de um jeito bom. Vocês devem lembrar disso, não é?
Sabia do que ele estava falando: referia-se à Sam ser irmã do Bryan, o
que ela escondeu do Lucky, e isto quase a matou.
Entretanto, o que Tabitta guardava de mim não era nada como isso. E
seja qual fosse o motivo, eu aceitaria. O pior era ficar sem ela.
Capítulo 8
Armação

JASON
Passado

Três meses vendo a loura tímida com seus vestidos largos e óculos de
grau no corredor da escola, nas salas de aula, tão diferente das garotas a que
eu estava acostumado, que só se importavam com seus cabelos e suas unhas
bem-feitas. Essa menina não ligava para nada disso. Foi o que chamou a
minha atenção. Sua inocência, pureza e doçura me fizeram gostar mais dela,
como nunca gostei de ninguém na minha vida.
Meus amigos começaram a rir de suas roupas largas de vovó, mas eu os
cortei, dizendo que se algum deles falasse mal dela, ia se ver comigo.
Nenhum era páreo para mim. Ou até acho que Dom ganharia, caso
lutássemos, mas ele era meu melhor amigo, jamais brigaríamos.
Tanto tempo escondendo o amor que eu sentia por essa garota... Não
adiantou nada eu me afastar dela por sua proteção. Eu não era bom, não o
suficiente para merecê-la. Vivia com meu pai bêbado e desempregado, e
tinha uma mãe que o abandonou.
Assim que ela me viu com Pamela no ginásio, eu enxerguei a dor nos
seus olhos, e soube que ela também me amava. Tinha medo de chegar até a
menina e dizer o que eu sentia. Cortei as garotas depois que soube que era
recíproco, não vi sentido em continuar com a mulherada sendo que pensava
só nela, Tabitta.
Quando a toquei para impedi-la de cair no corredor, meu corpo pareceu
ter sido tomado por uma corrente elétrica. Soube que não podia e não queria
ficar longe dela de nenhuma forma, mesmo não a merecendo.
Fui até sua casa numa noite e a vi saindo para ir à biblioteca, até aí tudo
bem, mas ela foi a pé e atravessou o beco escuro de um bairro não muito
bom para garotas andarem sozinhas, principalmente àquele horário.
Andou um quilômetro para pegar livros e passar onde ficavam os
moradores de rua. Todas as noites que ia lá, ficava conversando com um
senhor. Ela levava comida e café, e às vezes papeavam por muito tempo.
Mudei meu horário de trabalho na academia para os dias em que Tabitta
não frequentava a biblioteca. O atendente disse que ela ia lá duas vezes por
semana.
Eu precisava saber se ela ficaria bem andando naquelas ruas escuras. A
garota não parecia enxergar a maldade nas pessoas, contudo, eu via alguns
homens do beco olhando para ela de uma forma que não gostei. No dia
seguinte, fui bater um papo com os caras que estavam lá, alguns até usando
drogas. Dom foi comigo, todos do lado errado da lei ouviam ele.
Tabitta parecia ser de uma família rica, seu carro era uma Mercedes. Eu
não tinha nada para dar a ela, mas esperava ser um lutador um dia e levá-la a
um restaurante caro, porque ela merecia do bom e do melhor.
Ignorei todas as coisas que o velho dizia a meu respeito, que ninguém
me queria, que nenhuma pessoa lutaria por mim, que sou um bastardo
abandonado pela própria mãe. Não deixaria essas lembranças e ofensas me
atingirem e destruírem a única luz que achei no meio da escuridão.
Custava a acreditar que Taby aceitou sair comigo, meu coração batia
alto e descompassado sempre que pensava em finalmente sentir o gosto de
seus lábios lindos. Estava louco para tê-la em meus braços, adorá-la e amá-
la como merecia.
Cheguei ao buraco que era a minha casa. Não falava isso por ser pobre,
e sim pelo velho estar lá sentado e bêbado naquele sofá carcomido da sala,
sem fazer nada, apenas definhando em sua amargura e seu desprezo por tudo
à sua volta, inclusive a mim. A nossa casa era pequena: dois quartos, sala e
cozinha.
Julio estava bêbado no sofá como sempre. Desde o dia em que minha
mãe nos abandonou, quando eu tinha oito anos, para viver sua vida sem um
marido e filho, ele ficou amargurado. Quando era pequeno e não sabia me
defender, me batia com o que tivesse na sua frente. Para ir à escola, eu tinha
de vestir roupas que cobriam as marcas da surra. O crápula era esperto,
batia onde ninguém podia ver. Se exagerava e eu ficava de cama, o velho
ligava para a escola e dizia que eu estava doente. De fato, estava, mas era
ele que me deixava assim.
Por que uma mãe largaria seu filho de oito anos sob responsabilidade
de um bêbado? Era uma pessoa que não deveria ser mãe nunca na vida.
O velho (como eu o chamava, porque aquilo não era pai, ele nem
saberia o que significava tal palavra) me culpava por minha mãe ter ido
embora, mas a culpa era dele por não parar em casa e estar sempre bebendo.
Quando eu fiz quinze anos e ganhei músculos, ele tentou me bater, e eu o
derrubei no chão, falando que da próxima vez que ousasse me tocar, se
arrependeria. Depois disso, ele começou a provocar e dizer coisas que me
machucavam; fazia porque sabia que doía em mim, mais do que se me
batesse na cara.
— Já chegou o bastardo que nem a mãe quis. — Era deste modo que me
dava boas-vindas. Dizia isso todas as vezes que eu chegava em casa.
Ele estava lá sentado bêbado, com uma garrafa de Jack Daniels nas
mãos. Acabou com todo o seu dinheiro na poupança para comprar álcool,
não sabia como ainda não morrera de tanto beber.
Ignorei suas provocações e fui para o meu quarto. Ele era gordo e
barbudo, nem se cuidava mais. Mesmo com as portas fechadas, podia ouvi-
lo me xingando:
— Você é um verme imundo que ninguém quer por perto. Ninguém
nunca vai te amar e lutar por você, se nem sua mãe lutou.
Bloqueei sua voz, pensando na garota que aceitou que eu a levasse para
um encontro. Quando um dia eu imaginaria que iria a um encontro? Nunca,
para mim era só foda e diversão, nada mais. Entretanto, com Taby não era
assim, ela me fazia querer ser tudo para ela, assim como ela se tornou meu
mundo inteiro. Taby era a única luz que tinha nesta vida, o resto era só
escuridão e abandono.
Fui tomar banho. Considerei bater uma visualizando ela, mas eu
prometi que me comportaria. Sabia que não ia possuir seu corpo hoje, mas
eu não ligava, apenas a queria do meu lado. Por ela, esperaria o tempo que
fosse. Não arruinaria a sua confiança em mim, jamais.

Cheguei à casa do Dom alguns minutos antes da hora marcada. Quando


ela disse que me encontraria ali, entendi que não queria que eu fosse à sua
casa por causa da sua avó. Nenhuma família aprovaria sua filha ou neta
saindo com um cara cheio de tatuagens e piercings. Gostaria que ela visse o
que eu era por dentro, e não minha aparência, e que a senhora Margareth
soubesse o quanto amava sua neta; faria tudo por sua felicidade.
Dom estava com duas meninas, uma de cada lado, sentado em um sofá.
Ele sorriu assim que cheguei.
— Sabia que ia aparecer hoje — disse. Apontou o queixo para a
menina morena do seu lado direito e a loura do lado esquerdo. — Escolha
uma para você.
Eu sacudi a cabeça.
— Não, valeu, mas pode continuar. — Peguei uma cerveja. — Estou
esperando alguém.
— Aquela garota? — Sua voz saiu alta em meio ao barulho da música.
Suas festas eram como as de uma fraternidade, repletas de agitação e
diversão. Para mim, não faziam sentido se Taby não estivesse comigo.
Estreitei meus olhos.
— O que quer dizer com “aquela garota”? Diga, Dom. — Cerrei os
dentes.
Ele sorriu.
— Não estou dizendo nada que a insulte, apenas que ela não é deste
nosso mundo, Jason. A menina é inocente e pura, fora a parte de ser rica.
A mãe do Dom era enfermeira, e seu pai estava preso por roubo. Dom
trabalhava, mas nunca me disse onde e o que fazia. Quando perguntei, falou
para eu não me preocupar, então supus que boa coisa não era. Eu, às vezes,
abria seus olhos para não fazer besteira, mas até eu estava fodido com o pai
que tinha.
Não disse nada e fui pegar outra cerveja. Sabia que ele estava certo,
mas não podia mais ficar longe dela, já me mantivera afastado tempo
demais, e cada um desses dias foi uma tentação, um tormento, vendo-a sem
poder tocá-la ou dizer como estava linda.
Já passava das onze, e ela não apareceu. Fiquei inquieto, com medo
dela não vir. Tabitta prometeu que confiava em mim e estaria ali hoje. Então
por que não viera? Meu coração bateu forte em meu peito por ela não confiar
em mim, sem ao menos tentar me dar uma chance.
— Ela não vai vir, cara — zombou Dom. — Pegue qualquer uma dessas
garotas aqui, vamos nos divertir.
Quis esmurrá-lo, mas ele estava chapado demais. Eu não respondi, só
dei as costas e saí para ir embora. Sem ela, a festa não tinha sentido.
— Aonde você vai? — gritou Dom.
— Embora — falei sem me virar. Parti antes que ele dissesse mais
alguma coisa.
Subi em minha moto e fui até sua casa enorme, de dois andares, com
varanda na frente. O seu quarto ficava no lado esquerdo. Ia lá quase todas as
noites para ficar vendo-a estudar na sua escrivaninha, perto da janela.
O seu quarto estava escuro. Como ela pôde dormir e furar nosso
encontro? Fiquei furioso por isso.
Estacionei minha moto atrás de uma moita, assim ninguém a enxergaria.
Havia uma árvore enorme no quintal, com um galho dando para sua janela.
Subi nele e fui até a janela de vidro, que parecia mais uma porta. Não estava
fazendo barulho, mesmo sabendo que sua avó tomava remédios para dormir
— ouvi-a dizer a uma menina da sua sala.
Para a minha surpresa, não estava trancada; falaria com ela sobre isso
depois. Onde já se viu ir dormir sem conferir se as portas e janelas estão
fechadas? E se não fosse eu ali, e sim outra pessoa, que podia fazer mal a
ela? Um ladrão ou um estuprador? Não havia muitos desses na cidade, mas
cuidado nunca era demais.
Entrei e fechei sem fazer barulho, o quarto estava um pouco claro com a
luz que vinha do banheiro. Então ela tinha medo do escuro? Fui até a porta
de madeira e a tranquei, caso sua avó acordasse e nos visse juntos. Eu me
virei e olhei para ela deitada na cama de barriga para cima. Vestia um top
preto, mais parecido com um sutiã, e um shortinho preto e curto, deixando
sua barriga de tanquinho e coxa expostas. Oh, porra! Que imagem, estava
louco para passar as mãos nesse corpinho sarado. Ainda bem que ela vestia
aqueles vestidos, assim ninguém veria sua silhueta fabulosa.
— Você mentiu, Jason. — Soluçou durante o sono. Agarrava tão forte
um ursinho, como se fosse um bote salva-vidas.
Parecia que esteve chorando antes de dormir, aquilo me cortou fundo.
Eu não suportava que ela sofresse assim. O que será que houve? Estava
sonhando comigo? E por que ela disse que eu menti, se foi ela quem não
apareceu no nosso encontro?
Não queria acordá-la, mas precisávamos conversar. Aproximei-me de
sua cama e sentei ao seu lado. Necessitava saber o porquê de não ter ido à
festa, e por qual razão chorava.
Quando sentei na cama, ela abriu os olhos e já ia gritar. Subi em cima
dela e tapei sua boca, impedindo-a de acordar toda a vizinhança.
Seus olhos verde-esmeralda me fitaram na escuridão. A princípio,
demonstravam medo; depois que me reconheceram, tornaram-se furiosos.
— Eu vou tirar a mão de sua boca, mas não grite, ok?
Ela assentiu.
— O que diabos está fazendo aqui? — Teria gritado se pudesse.
Eu ri baixinho.
— Esta é a primeira vez que a vejo xingando.
Tabitta grunhiu.
— Você quer me ver braba? Pois eu estou agora, seu bastardo, filho da
puta. — Começou a me bater no peito. Seus socos eram fortes e doeu. Não
queria que meus músculos machucassem suas mãos, então segurei-as e as
coloquei em cima de sua cabeça no colchão. Qual seria o motivo da raiva?
— Posso saber o que eu fiz para você ficar assim? — perguntei.
Fechou os olhos, como se doesse me encarar.
— Abra os olhos e responda.
Apenas virou a cabeça de lado e soluçou.
— Taby, me diga o que houve, por favor — supliquei, não gostando de
vê-la daquele jeito.
— Você mentiu para mim. — Sua voz falhou.
— Posso saber em quê? Estou confuso aqui.
Ela riu, amarga.
— Vai, Jason, mais forte... — Estremeceu e olhou para mim. — Seu pau
é gostoso, me faça gozar como só você sabe... Lembra disso?
— Que história é essa de pau e ir mais fundo? — Se alguém ousou
dizer alguma besteira a ela, eu os mataria. — Taby, conte o que quer dizer
com isso. Por que não foi ao nosso encontro? Você disse que estaria lá...
— O quê? Para servir de vela? Talvez você me chamasse para ver você
transando com outra. — Tentou me bater, mas eu a prendi, impossibilitando-
a de fazê-lo.
Arregalei os olhos.
— Transar com quem? De que droga está falando?
Ela expirou.
— Eu fui à maldita festa, mas o que vi antes? — sibilou. — Você
transando com a Pamela atrás de uma árvore, e ela gritando seu nome
enquanto estava sendo fodida.
Agora entendia sua fúria, contudo, eu não fodi ninguém. Decerto
Dominic estava por trás disso, junto com a cadela da Pamela.
— Vou matar aqueles dois — urrei. Por isso ela disse que a traí, porque
prometi que não ficaria com nenhuma mulher. Nem punheta eu bati para não
quebrar a promessa, e agora ouvia isso? — Você me viu com ela? Eu. —
Gesticulei para mim. — O meu corpo.
Ela fungou e me fitou de olhos arregalados.
— Não, apenas ela chamando o seu nome...
— Por que não foi checar para ver se era eu mesmo?
— E dizer o quê? Como poderia competir com uma garota que tem um
corpo igual ao da Pamela?
Estreitei meus olhos.
— Esse corpo sobre o qual estou deitado, pelo que vejo, é perfeito. E
gosto dessa perfeição sendo escondida por debaixo dos seus vestidos largos.
— Com um joelho, abri suas coxas e esfreguei meu pau duro em sua boceta.
Ela engasgou.
— Jason... Então não ficou com ninguém? — Tinha esperança.
Baixei a cabeça e beijei a ponta do seu nariz.
— Não, o único que vi com ela foi Dominic — rosnei. — Acertarei as
contas com ele.
— Por que eles fizeram isso?
— Eu não sei, mas vou resolver isso amanhã. Agora quero fazer outra
coisa.
— O que é? — Ela ofegava.
Eu a beijei, degustando de sua boca, seus lábios e sua língua, seu sabor
era de mel. Soltei suas mãos e as coloquei em seus cabelos. Ela me abraçou,
gemendo também, e tirou minha jaqueta. Eu me afastei um pouco para ela
tirar a minha camiseta.
— Adoro ver você sem camisa — confidenciou, passando as mãos nas
tatuagens que fiz quando tinha quinze anos, um falcão nas costas e asas nos
braços. Gostava desse pássaro. — Por que um falcão? — sondou, acendendo
a luz do abajur para ver melhor, traçando os dedos nas asas dele no meu
braço.
— São pássaros que possuem velocidade em seus voos e enxergam
longe. Queria ser como eles, livre para fazer o que desejar neste mundo. —
Suspirei.
— Você se sente preso?
— Na maioria das vezes, sim — respondi. — Depois que a conheci,
não me sinto mais assim, e sim feliz por tê-la em meus braços.
— Fico contente com isso. Eu quero tatuar uma borboleta azul algum
dia, mas minha avó me mataria — disse, tocando meus cabelos. — Uma vez
eu vi você sem camisa e gostei das tatuagens; me motivou ter uma também.
— Onde me viu sem camisa? — Não me lembrava de ter ficado sem
camisa na frente das pessoas, nem para transar eu tirava as minhas roupas.
Dom falava que eu era esquisito, porém, não achava que havia necessidade
de tirar as roupas somente por uma foda.
— Jogando bola na casa do Dominic. — Estremeceu, então supus que
tivesse me visto com alguma garota nesse dia. Quando jogávamos bola, eu
tirava a camisa. Talvez alguma menina de que não recordo tenha se
aproximado de mim.
— Prometo que não tocarei mais em nenhuma mulher. — Beijei seus
lábios. — Só você.
Ela sorriu.
— Parece que estou sonhando ao tê-lo em meus braços. Sempre te achei
como o sol, inalcançável. — Acariciou meu rosto. Eu estava com barba por
fazer.
— Eu também te achava inalcançável, mas aqui estamos. — Beijei-a no
pescoço, nos lábios, e desci para seus seios.
Congelou, então afastei meu rosto e fitei seus olhos grandes.
— Prometo me comportar.
Ela suspirou.
— Não foi por isso que eu gelei — começou a se explicar.
— Não vou fazer nada que não queira, pode ficar tranquila.
— Eu sei, é que nunca fiz isso antes. Posso não ser aquilo com o que
está acostumado.
Eu a interrompi com um beijo.
— O que importa é que vai ser você, a mulher que eu sonho em tocar,
amar e beijar todos os dias e horas da minha vida. Vou fazer o que você
quiser, ok?
— Eu estou pronta. — Ela foi firme, colocando suas mãos no botão de
minha calça jeans. Gemi com seu toque, que incendiou todo o meu corpo.
— Que tal nós só brincarmos hoje?
— Por quê? Não me quer?
— É claro que quero, sonho com isso há meses, desde que a conheci.
— Peguei os seus seios por debaixo do top e apertei-os.
Ela ofegou e abriu as pernas para mim, como em um convite. Isso me
deu mais incentivo para apreciar essa obra de arte. Eu me sentei em seus
tornozelos, mas sem colocar peso, e tirei seu top. Taby se levantou um pouco
para eu fazer isso. Olhei seus seios rosados e lindos. Ela tentou se cobrir,
mas eu não deixei.
— Eles são perfeitos, não os esconda de mim. — Estava maravilhado
ao abocanhar um seio dela e chupar forte, lamber e degustar.
Saiu um ruído de sua garganta, como se já quisesse gritar. Por mais que
eu desejasse ouvir seus gritos, isto não podia acontecer, pois sua avó dormia
no quarto ao lado. Eu afastei meu rosto e olhei para ela.
— Vou precisar que não faça barulho, certo? — sussurrei, passando a
língua no bico do seu peito.
— Eu vou tentar, Jason, mas é tão bom... — ofegava.
Deixei seus seios e desci meus lábios para sua barriga plana e sexy.
— Ficará melhor ainda. — Peguei o seu shortinho curto.
— O que vai fazer? — Sua voz se tornara rouca com o prazer.
Ela estava de olhos arregalados.
— Confia em mim? — sondei, tirando seu short junto com a calcinha,
assim que ela assentiu.
— Sim...
— Ótimo. — Observei sua boceta lisa e exposta para mim. Coloquei
meu rosto na frente dessa gostosura. — Esta boceta suculenta é minha, só
minha.
— Jason... — gemeu em uma oração e abriu mais as pernas, como se
não controlasse seus atos.
Estava necessitada, assim como eu.
— Abra as pernas e coloque-as nos meus ombros — ordenei. Ela fez o
que eu pedi, meio tímida. — Se for gritar, pegue o travesseiro para abafar o
som, querida. Eu adoraria ouvi-la, mas isto poderia acordar sua avó. —
Cobri minha boca com seu sexo encharcado e a devorei, lambendo seu
clitóris. Meu pau estava como rocha, mas agora era para o seu benefício.
Assim que mordisquei seu clitóris com sabor de pêssego ela gritou
contra o travesseiro. Suas pernas estavam cruzadas na minha cabeça,
apertando-a, querendo mais da minha boca. Eu que não recusaria à minha
bela e linda mulher. Tracei minha língua em seu centro latejante e virgem,
que esperava desvirginar em breve. Lambi e chupei até que a senti tremer e
gozar. Suguei todo seu gozo como um alimento saboroso.
Eu me afastei assim que Taby ficou mole. Fui para cima dela e tirei o
travesseiro do seu rosto.
— Então, como foi? — sondei. — Gostou?
Ela me encarou com os olhos abrasadores.
— Foi maravilhoso. — Sorriu. — Nossa! Estou até mole.
— Fico feliz por satisfazê-la. — Beijei sua boca, traçando sua língua e
deixando seu sabor ali. — Agora vou esfregar meu pau nessa boceta
suculenta, mas sem entrar.
— Por que não? Estou pronta.
— Está tarde, e como é a sua primeira vez, quero que seja especial.
Também não tenho camisinha comigo, afinal, fui à festa com a intenção de ter
um encontro com você, e não transar. — Beijei suas pálpebras e me afastei,
tirando minha calça jeans e abaixando minha boxer. Peguei meu pau duro e
esfreguei em sua boceta molhada. Abafei seus gritos com outro beijo, me
saciando com seu gozo e suas unhas em minhas costas.

Acordei antes do amanhecer. Precisava sair da casa sem sua avó


acordar, não queria trazer problemas para Taby. Eu me vesti e beijei seus
lábios de leve. Olhei para a linda loura esparramada na cama, os cabelos
sedosos espalhados no colchão e nos lençóis brancos, seu rosto belo e
esculpido, seu corpo nu. Nem acreditava que a tive em meus braços;
esperava ter muito mais. Coloquei um lençol para cobrir meu bem precioso.
Bati uma foto e deixei como plano de fundo do meu celular.
Ela gemeu assim que eu a beijei.
— Preciso ir antes que sua avó acorde. Pode continuar dormindo, é
cedo demais para se levantar. — Alisei seu rosto. — Hoje é sábado, quero
que vá a um lugar comigo. Ok?
— Vou a qualquer lugar com você — disse com um suspiro. — Eu o
amo, Jason.
Meu coração deu um solavanco, como se fosse parar a qualquer
momento, com apenas dezessete anos. Ela foi a primeira pessoa em todo o
mundo que disse que me amava, nem meus pais falavam isto. Eu quase ri,
aqueles dois amavam só a si mesmos. Nem lembrava muito de minha mãe
antes dela ir embora.
Eu não era de chorar, mas agora queria, ouvindo essas palavras da
única mulher que me fazia sentir vivo.
— Também amo você, minha linda — declarei, mas ela já estava
dormindo. Diria para minha preciosa depois.
Dei mais um beijo nela e saí pela janela. Chegara a hora de eu resolver
as coisas com Dom...
Parei assim que vi a avó da Taby perto da minha moto. Ela estava com
um robe branco e os braços cruzados.
— Minha neta não é um brinquedo para você usá-la e dispensar, como
está acostumado a fazer — rosnou Margareth. — Conheço sua fama, Jason
Falcon. Fiz minha pesquisa depois que soube que minha neta se apaixonou
por você.
Eu respirei fundo, temendo que ela me afastasse da Taby. Não
suportaria ficar longe dela.
— Eu sei que ela não é um brinquedo, senhora, jamais a desrespeitaria
assim. Não vou mentir que sou santo, mas o que sinto pela Taby é verdadeiro
— garanti.
Ela estreitou os olhos.
— E como explica você saindo de sua janela no romper da aurora? Isso
é um desrespeito com sua imagem — acusou.
— Ontem à noite tivemos um mal-entendido, precisava resolver as
coisas com ela.
— E não podia esperar até hoje? — retrucou.
Balancei a cabeça.
— Não. Sei que comecei com o pé esquerdo, devia ter vindo falar com
a senhora primeiro — sussurrei, nervoso.
Ela me interrompeu, ainda com aço na voz.
— Sim, você deveria.
— Estava com medo de não me aceitar como seu namorado. Ela merece
alguém melhor do que eu, mas nunca vai achar alguém que a ame tanto —
disse e depois supliquei: — Imploro que não me impeça de vê-la, não posso
viver sem ela. — Se eu não podia antes, imagine agora que sentira seu gosto,
seu cheiro e seu amor, que estava incrustado em minha pele, no meu ser.
Ela suspirou e me avaliou por um momento. Pareceu acreditar em mim.
— Olhe, moço, não julgo as pessoas por suas roupas, ou por você estar
coberto de tintas. Só quero o bem da minha neta. Se ela o ama, não vou
atrapalhar, mas se magoá-la, acertarei as contas com você. E nada de dormir
no seu quarto ou entrar pela janela. Se quiser entrar, entre pela porta da
frente e será bem-vindo. Aqui é uma casa de respeito. E também há hora de
chegar à noite.
Suspirei e sorri.
— Sim, senhora, obrigado por não afastar a luz da minha vida —
agradeci.
— Só faça minha neta feliz — pediu.
— Eu vou, prometo. E já que não é contra o nosso namoro, posso pegá-
la hoje antes do almoço? Quero levá-la a um lugar.— Acrescentei rápido: —
Não se preocupe, não é nenhuma festa, apenas um local que é importante
para mim; espero que seja para ela também.
Ela sorriu.
— Tudo bem. Tome conta dela.
— Tomarei.

Cheguei à casa do Dom. O sol estava saindo, mas tinha certeza que sua
mãe não tinha voltado; ela retornava por volta das dez horas. Dom sempre
levantava cedo para arrumar a bagunça da festa, antes dela chegar em casa,
ou melhor, ele colocava as garotas para fazerem isso. Tudo por uma noite
com ele.
Entrei, ignorando Alicia, Laura e a cadela da Pamela. Aproximei-me
dele, que estava perto do sofá com cara de ressaca, e desci um soco na sua
boca. Nós sempre fomos amigos, nunca brigamos assim, mas agora estava
furioso por ter feito o que fez. Ele sempre me ajudou em horas difíceis.
Lembrava-me da última vez que meu pai triscou a mão em mim, eu tinha
quinze anos e estava na cozinha quando ele entrou bêbado, claro, e começou
a me xingar, dizendo que minha mãe se foi por minha causa. Respondi que o
culpado era ele por ser um bêbado fodido que não conseguia parar em
emprego nenhum. Eu não vi chegando, só senti o cabo de vassoura pegar
minha cabeça. Fiquei zonzo na hora, e o sangue escorria.
Naquele dia, saí de casa e conheci Dominic, um garoto de dezessete
anos, forte em termos de músculos, pois era lutador. Ele deu pontos na minha
cabeça e queria me levar ao hospital, mas eu não aceitei. Dom sabia suturar
muito bem, já que sua mãe era enfermeira; devia ter aprendido com ela.
Depois disso, viramos melhores amigos, e ele me ensinou a me defender do
meu pai e de quem quer que fosse.
— Que porra é isso, cara? — rosnou, limpando o sangue da sua boca.
— Ah, você já sabe.
— Do quê? Que você bolou um plano fingindo ser eu transando com a
puta da Pamela, tudo para Taby ver?
— Eu não sou uma puta — defendeu-se ela.
Fuzilei-a.
— Cale a maldita boca. Só não faço com você o que fiz com o Dom,
porque não bato em mulheres.
Ela estremeceu ante minhas palavras. Não liguei. Olhei para o Dom.
— Por que fez isso?
Ele suspirou.
— Desculpe, cara, achei que você estava entrando em uma furada
saindo com uma garota igual a ela. Não sabia que estava tão fissurado na
garota...
Cortei-o, com os punhos cerrados.
— Direi apenas uma vez, Dom, então preste atenção. Você é meu
melhor amigo, nunca houve limites entre nós dois. Agora, existe uma linha
que não pode ser cruzada. Taby é esta linha, que não vou tolerar ser
ultrapassada por ninguém, nem mesmo por você — ameacei, ácido. — Eu a
amo, e por ela derrubaria até meu melhor amigo.
Ouvi as garotas arfarem. Dom, primeiro, arregalou os olhos; após, o
bastardo sorriu. Livrou-se de eu quebrar sua cara só porque o sorriso de
merda que estava dando era por parecer impressionado.
— Não acredito que foi domado por uma...
Eu o interrompi.
— O que eu disse sobre a linha não ser cruzada? — lembrei. — Ela
não é dessas que você fode por aí, Taby é mais como o para sempre.
Pretendo dar isso a ela algum dia.
O bastardo ainda sorria. Muitas vezes, antes de eu saber lutar, Dom me
defendia de garotos de rua. Eu não conseguia enfrentar nenhum deles, por
serem maiores que eu. Dom dizia aos meninos da nossa cidade para ficarem
longe de mim. Ele até lutou com três garotos, e venceu sem nem mesmo
piscar. Eu o considerava desde então como um irmão mais velho e protetor.
— Prometo me comportar. Se é importante para você, agora é minha
irmã também. — Foi até mim e bateu de leve nos meus ombros. — Seja
feliz, cara, você merece.
— Obrigado. Vou sair com ela na hora do almoço, depois irei levá-la
na oficina às quatro horas.
— Já vai apresentar aos caras? — Ergueu as sobrancelhas.
Fechei a cara.
— Oh, porra não! Só você estará lá para eu fazer uma tatuagem, e nela
também.
— Tatuagem? Tipo para selar o amor de vocês dois? — O bastardo não
escondia seu sorriso de merda. Ignorei e respondi normal.
— Isso, então esboce uma borboleta azul para mim. Você me deve isso,
não acha? — O filho da mãe era bom tatuador, fez todas as minhas tatuagens,
e ficaram excelentes.
— Sim, cara, eu devo.

Depois de pegá-la em sua casa, levei-a no carro do Dom, um Cadillac


preto. Ele tinha mais ciúmes desse carro do que algum dia já teve de alguém.
Taby estava nervosa no banco da frente. A minha intuição me dizia o
porquê.
— Sabe que não farei nada se não estiver pronta, não é?
Ela assentiu e mordeu os lábios.
— Estou falando sério, Taby.
— Eu confio em você — respondeu e escorou a cabeça no meu ombro.
Passei meu braço em volta de sua cintura e beijei seus cabelos.
— Obrigado, linda.
Andamos mais alguns quilômetros pela estrada. Fui a um ponto alto, do
qual dava para ver a cidade inteira de longe. Parei o carro em frente a um
chalé grande de madeira. Quando achei esse lugar abandonado, procurei
pelo dono, que morava em Manhattan. Eu tomava conta dele desde então.
Ela olhava cada canto ao redor com seus olhos arregalados,
maravilhada pela vista.
— Uau, isso é tão lindo. — Chegou mais perto do chalé avermelhado.
— De quem é?
— De um senhor que mora em Manhattan. Cuido daqui, venho neste
lugar quase todos os dias.
Seu sorriso lindo morreu. Pensei nas minhas palavras, o que ela
entendeu por elas? Depois de um segundo, percebi que achou que eu levava
garotas lá. Fui até Taby, coloquei dois dedos debaixo do seu queixo e o
levantei, porque ela tinha baixado a cabeça.
— Nunca trouxe nenhuma mulher aqui, só você. — Beijei sua testa. —
Sempre será só você.
Tomei-a com fervor e adoração, degustando-a. Suas mãos apertaram
minha cintura, gemendo. Eu me afastei sem querer.
— Por mais que eu a queira agora, isso vai ter que esperar. Preciso te
mostrar uma coisa. — Sorri vendo o brilho de felicidade em sua expressão,
visível mesmo através dos óculos. — Venha comigo.
Impressionou-se ao entrar no chalé e ver uma cama de casal California
king com lençóis brancos, forrados com pétalas de rosas sobre ela e o chão.
Tudo isso foi realizado com a ajuda de Dom, afinal, ele me devia por tentar
afastá-la de mim. Não sabia como fez ficar bonito assim, mas o bastardo
conseguiu.
— O que achou? Pensei em como nosso primeiro encontro deveria ser
especial, então resolvi preparar isso. — Gesticulei para o chão e a cama.
— Está tudo lindo, tanto que estou sem palavras. — Riu, pegou uma
pétala e a cheirou. — Quem diria que um bad boy faria isso para uma
menina.
Eu ri também.
— Estava esperando a garota certa aparecer na minha vida para bancar
o romântico.
— Eu sou a garota certa? — Ela me olhou de esguelha.
Puxei-a para os meus braços.
— Você é tudo, preciosa.
— Obrigada. — Sorriu e observou a bancada da cozinha americana,
forrada de coisas gostosas para nosso almoço. Gastei metade do meu salário
com esse encontro, mas valeu cada sorriso de felicidade dela. — Vamos
sentar, estou faminta.
— Eu também. — Olhei para seu corpo, com um vestido de verão
moldado às suas curvas, e não igual aos que ela costumava usar.
Senti-a tremer com minhas palavras. Sabia que ela queria ficar comigo,
assim como eu a queria. Seus olhos foram para a cama e depois para a
comida, acho que pensando em qual escolheria primeiro.
— Vamos almoçar, em seguida partimos para o outro tipo de fome, que
estou doido para saciar também.
Comemos enquanto conversávamos sobre sua vida no Kansas antes de
se mudar para Austin. Sua mãe morreu quando ela era pequena, foi criada
por sua avó. Não conheceu seu pai. Também nunca teve nenhum amigo ou
namorado. Eu gostei dessa parte, a de não ter namorado.
— E os seus pais? — perguntou, mordendo um morango cujo suco
escorreu pelo canto de sua boca. Ela passou a língua, lambendo o local. Nem
sabia o que aquele gesto fazia comigo.
— Deixe que eu cuido disso. — Aproximei meu rosto do dela e a
suguei.
Arregalou os olhos inocentes, corando em sua pele branca. Eu me
afastei e respondi à sua pergunta, mesmo não querendo falar sobre esse
assunto.
— Minha mãe foi embora quando eu tinha oito anos e me deixou com
meu pai — disse, vago. Não precisava contar dos espancamentos que sofria
do meu próprio pai. Essa parte escura da minha vida só pertencia a mim.
— Oh, sinto muito — murmurou.
Não gostava de ver a pena na expressão das pessoas. Felizmente, não
enxerguei pena nela, só solidariedade.
— Não precisa sentir. — Peguei sua mão e levei na direção da cama.
— Queria algo especial para sua primeira vez, mas se não estiver...
Ela me interrompeu se jogando nos meus braços, com pernas e braços à
minha volta, e me beijando. Retribuí o beijo, desfrutando do seu amor e
prazer. Eu a depositei na cama e pairei em cima dela, sem nunca me afastar
daqueles lábios saborosos com gosto de morango.
Passei as mãos em seu corpo perfeito, levando uma delas ao meio de
suas pernas e alisando seu centro por cima da calcinha. Ela levantou a bunda
para cima, querendo mais do meu toque para aliviar e tirar seu atrito. Eu me
afastei um pouco e tirei seu vestido, deixando-a com apenas um conjunto de
sutiã e calcinha brancos. Apertei seus seios e coloquei seus mamilos na
minha boca, sugando com fome. Meu pau já estava duro, querendo ser
enterrado nela. Taby gritou assim que eu abocanhei seu mamilo e rasguei sua
calcinha, alisando seu clitóris.
— Aqui você pode gritar à vontade que ninguém vai ouvir, apenas eu.
Adorarei cada gemido que soltar. — Pus dois dedos dentro dela e a senti
estremecer. Esfreguei seu clitóris para levá-la ao prazer. Ela rebolava junto
com meus dedos.
— Jason... — Taby estava prestes a gozar, eu podia sentir. Tirei meus
dedos, fazendo-a choramingar. Gostei da garota me querer tanto quanto eu a
ela. Fiquei de joelhos em cima dela, removi minhas roupas e botei a
camisinha no meu pau duro. Seus olhos brilharam ao olhar para ele, depois
corou; essa cor era linda. Eu me posicionei entre suas pernas e fitei suas íris
verdes.
— Eu a amo, Tabitta — declarei e empurrei devagar, fazendo-a se
acostumar comigo.
Ela ofegou e sorriu em meio à dor.
— Também amo você — sussurrou, me abraçando e trazendo minha
boca para a sua. Taby gemeu nos meus lábios e logo estávamos nos
movimentando em sincronia, saciando-nos. Pela primeira vez, fiz amor com
uma mulher que eu realmente amava com cada fibra do meu ser. Uma mulher
que amaria para sempre.
Capítulo 9
Pesadelos

TABITTA
Presente

Quando saí da casa do Jason, fui com Papy para o Brooklyn. Não
queria deixá-lo, mas sabia que por ora ele estava seguro. Por via das
dúvidas, além dos policiais que deixei lá, também liguei para o Bryan dar
uma ida à sua casa. Bryan ficou também encarregado de conseguir dois
guarda-costas para Jason. Eu não o conhecia bem, porém, sabia que podia
confiar a segurança de meu amado a ele, já que os dois eram amigos.
Na volta para a casa, Papy me encheu de perguntas sobre Jason: como
eu o conheci, por que terminamos, se ainda nos amávamos...
Revelei toda a verdade a ele, que merecia saber disso. Falei que
precisei deixá-lo pela sua segurança, porque corria perigo nas mãos do
Sebastian. Isso agora mudara, uma vez que esse segredo foi descoberto,
então eu o protegeria com a minha vida se fosse preciso.
— Ele sabe por que você o largou?
— Dei um resumo, mas ele não conhece os detalhes. Contarei a ele, só
estou esperando o momento certo.
— Você está com medo, isto é normal, querida. Diga-me uma coisa:
também vai revelar a ele sobre Emy ser sua filha? Jason merece saber.
— Sim, eu sei que ele merece. Já que estou ao seu lado, não quero mais
mentir para ele, Papy, e não vou. Lamento não ter dito a verdade a você e
Mama, doía falar nesse assunto, sinto muito.
Ele deixou uma mão no volante e, com a outra, me abraçou, beijando
meus cabelos.
— Não precisa sentir, querida, está tudo bem. Posso entender por que
não disse nada.
— Obrigada, pai.
— Emy vai adorar saber que é filha de Jason, pois gosta dele, uma fã
de carteirinha. — Riu, orgulhoso. — Ele parece ser um cara legal, fora a
parte de ter sido mulherengo enquanto vocês dois estavam separados esses
anos. — Papy me olhou de lado. — Você vai ficar bem com isso? Sei que
não foi culpa dele sair com mulheres, já que ele pensava que tinha ido
embora, mas não deixa de doer, não é?
Emy sempre foi fã de Jason. Se ela soubesse que ele estava na TV, fazia
suas tarefas e ia para frente dela só para vê-lo. Eu só não a deixava assistir
às lutas, não era para criança.
— Sim, Emy vai adorar saber que ele é seu pai — murmurei. — Jason
é fácil de ler, eu pude perceber que ele ficava com essas mulheres para
provar um ponto a si mesmo. Achava que não foi homem suficiente para
mim... Por eu ter ido embora sem dizer adeus.
— Isso não quer dizer que será fácil — insistiu.
— Sei que não vai. São consequências dos meus atos. Mas o pior será a
hora em que eu disser toda a verdade. E se Jason não quiser me perdoar?
Afinal, são quase nove anos escondendo sua filha.
Ele alisou meus ombros.
— Pelo pouco tempo que estive perto daquele homem, percebi o quanto
ele a ama, Taby. Não há nada que faça ou tenha feito que o motivaria a
pensar o contrário. Então não tenha medo, tudo bem?
Eu assenti e não respondi, não tendo certeza de que aquilo era verdade.
Se Jason escolhesse me odiar, eu aceitaria. Merecia por tê-lo abandonado.
Assim que chegamos à casa do Papy no Brooklyn, desci de sua
Mercedes. A residência tinha dois andares, paredes de tijolos vermelhos e
uma varanda na frente.
— Olá, filha. — Mama sempre me chamou assim, e eu adorava isso.
Ela era uma mulher bonita, de cabelos negros com alguns fios brancos. Não
era vaidosa, tinha uma política de que as pessoas deviam aceitar o que
realmente são. Eu não discordava, achava que todos deviam fazer o que
querem e gostam.
Abracei-a por um segundo, me reconfortando com isso. Sempre que o
fazia, me lembrava da vovó, de chegar da escola e correr para os seus
braços. Confortava-me saber que eu era amada por ela, mesmo que não tenha
sido pelos meus pais. Se é que podia chamar aquilo de pais... Uma mãe que
só me teve e deu para a minha avó, e dois anos depois foi morta no México,
provavelmente por Sebastian. Como uma mulher podia aceitar um homem tão
inescrupuloso? Vovó dizia que eles se amavam, mas isso não era amor.
Quem ama não vende sua mulher, como ele fez.
— Mamãe, ficou sabendo que Jason Falcon vai lutar aqui em Trenton
este final de semana? Não acredito que vou estar na mesma cidade que ele!
— falou Emy, entrando na sala toda eufórica.
Ela estava com um vestido rosa e uma sapatilha que dei a ela na semana
anterior. Linda, minha filhota. Às vezes, à noite, eu a olhava dormir e
imaginava o que fiz de bom para merecer algo tão precioso para mim como
minha menina. Era a luz que Deus enviou para eu passar por todo o calvário
que foram esses anos sem o Jason. Ela se parecia muito com ele.
Eu suspirei.
— Sim, eu soube — respondi, entendendo o porquê dela falar disso.
— Podemos ir vê-lo, mamãe? Ele está tão perto! — suplicou. — Por
favor. Faça isso como presente de aniversário, eu não quero mais nada,
apenas conhecê-lo pessoalmente, nem que seja uma vez na vida.
Expirei e troquei um olhar com Papy, cuja expressão sugeria um “Não
disse?”. Ele chamou mamãe e foi para a cozinha, de modo a me deixar a sós
com Emy para eu resolver tudo. Não podia dizer nada a ela, não antes de
falar com Jason. Meu coração se partiu por ter de negar isso a ela, com seu
aniversário sendo dali a duas semanas. Esperava que Jason estivesse
conosco nesse dia importante de nossas vidas. Para ele também se tornaria,
quando soubesse a verdade.
— Emy, querida, um ringue de lutas não é lugar para crianças — me
esquivei. Precisava saber a reação de Jason antes de apresentá-los.
Seu semblante mudou, ficando triste.
— Oh... — O tom desapontado cortou meu coração. Eu não podia fazer
nada, não agora.
Passei a tarde inteira com ela, tentando alegrá-la e distraí-la de Jason
um pouco, mas sabia que não desistiria. Por isso, falaria com Jason logo e
diria a verdade.
Esses dias foram cheios no trabalho. Eu estava junto com minha equipe
buscando descobrir novos lugares e os pontos que Franklin usava para
prostituição infantil. Desmanchamos três casas usadas para prostituição de
menores em três cidades diferentes: Michigan, Ohio e Boston.
Foi uma semana corrida. Fiquei feliz por resgatarmos essas crianças
vivas, que teriam agora um futuro pela frente. Seus sonhos, interrompidos
por causa de homens abusadores de menores, seriam retomados. Para elas,
se tornaria um trabalho difícil seguir em frente com todos os pesadelos e
traumas, mas, pelo menos, estavam vivas. Isso era o que importava.
Quinta-feira, fomos a Riverside, subúrbio localizado quatorze
quilômetros a oeste de Chicago, e três fora dos limites da cidade.
Bryan descobriu a localidade onde o contêiner cheio de garotas estaria.
À meia-noite, as meninas seriam levadas para pontos de prostituição em
vários lugares. Eu não ia permitir isso. Faltavam dez minutos para meia-
noite. O pior era que o lugar estava cheio de contêineres, acho que uns
cinquenta, mais ou menos. Por isso, nos dividimos para procurar o certo.
— Jason sabe que está aqui? — sondou Bryan do meu lado.
Encontrávamo-nos numa rua afastada, mal movimentada. Os malditos a
escolheram justamente por isso, assim evitariam pessoas descobrindo o que
tinha dentro.
Eu respirei fundo.
— Disse para ele que estava vindo a trabalho, não entrei em detalhes.
— O que ele achou? — Chegamos perto de umas árvores próximas ao
local. Lincoln, Papy e Dennis estavam lá. Não entendia porque a CIA
participava da missão, não era sua função. Eles ficavam mais responsáveis
por investigarem e fornecerem informações de segurança nacional aos
senadores do nosso país. Caçar Sebastian tudo bem, ele era considerado
perigoso para a nação, mas ali encontraríamos só seus servos. Quando
perguntei ao Papy sobre isso, ele disse que Dennis combinou de continuar
com a gente até prendemos Sebastian e seus comparsas. Também falou que
isso era uma missão pessoal para ele, mas Papy não quis revelar o porquê,
ou talvez não soubesse. “Bom, para quem Sebastian não fez algum mal?”,
pensei, frustrada.
— Ele queria vir comigo. Não deixei, afinal, há muito pessoal do
Sebastian por aqui. — Tentei não pensar nisso agora, não gostava nem de
imaginá-lo lá.
— O que aconteceu naquela noite que o deixou? — inquiriu, curioso.
— Vai me dizer por que terminou com Alexia? — Levantei a
sobrancelha para ele. — Até dois dias atrás, vocês pareciam no maior love,
e agora está assim, como se num purgatório.
Ele expirou e estremeceu. Fins de namoro deixam qualquer um
destruído. Não entendia por que eles terminaram, os dois faziam um casal
tão lindo. Eu a conheci pessoalmente dois dias antes, em um restaurante onde
fui jantar com Jason. Ela estava lá com Bryan. Uma loura deslumbrante, isso
a descrevia.
— Bom ponto, mas eu não posso dizer nada sobre isso. — Sua voz
demonstrava devastação. — Agora vamos esquecer nossas vidas pessoais e
nos concentrar no caso.
Eu não ia insistir, já que ele não queria contar. Esperava que os dois se
entendessem logo. Foquei na missão, esquecendo o resto.
Assim que Thomas deu um sinal, nós invadimos o local, que parecia um
sítio, separados em duplas. Eu fiquei com Bryan. Havia sete homens na
entrada, mais cinco perto de dois contêineres, vigiando-os. Supus que ali
tinha coisa.
— FBI, abaixem as armas e levantem as suas mãos — gritou Thomas, e
os tiros começaram.
A minha função e do Bryan era tirar as garotas com segurança, enquanto
o resto do pessoal, junto com a polícia local, prendia todos e descobria se
havia mais meninas ou drogas nos outros contêineres.
Bryan desarmou dois e atirou em mais dois. Eu acertei um no braço. Ele
estava me dando cobertura para eu abrir o primeiro contêiner. Os tiros
pareciam ter cessado. Escancarei a porta com meu coração acelerado, com
medo delas estarem machucadas. “Não, essas meninas estão bem, preciso
acreditar nisso”, pensei.
Assim que a porta foi aberta, com a arma em punho, mirei no homem na
frente das várias garotas, acho que dez, mais ou menos.
— FBI, abaixe a arma e levante as mãos — ordenei.
O cara ignorou o que eu disse e apontou sua arma na minha direção.
Meu corpo estava gelado, minhas mãos suavam, eu temia que o pior
acontecesse. Em dois anos, nunca matei ninguém; agora, sabia que não ia
passar. Foi tão rápido que mal deu para assimilar: uma garota correu,
querendo fugir, e veio na minha direção; o cara estendeu a arma e disparou, e
eu também. Meu corpo parecia estar no piloto automático. A menina caiu nos
meus braços sangrando, e o cara foi ao chão com um tiro na cabeça.
Ignorei meu corpo tremendo e olhei a menina loura de uns quinze anos,
mais ou menos. Acho que gritei por uma ambulância e para salvarem sua
vida, mas eu estava entorpecida. Tudo doía. Não lembro muito bem o que
houve depois, apenas que fui levada para uma escuridão profunda.
Acordei visualizando um teto branco e ouvindo um bip não muito longe
de mim. Tentei recordar o que aconteceu: a menina nos meus braços, o cara
morto no chão...
— Oh, meu Deus! — Fui me levantar, mas mãos me impediram de fazê-
lo.
— Você precisa se acalmar e ficar quieta — pediu Papy com a voz
trêmula.
Fitei seus olhos tristes. Parecia que não era o único, Lincoln e Bryan
também estavam ali, perto de mim. Encontrava-me em um hospital. Olhei
para o meu ombro enfaixado e senti uma dor aguda proveniente dele.
— O que houve? A menina está bem? — perguntei ao Papy.
Todos baixaram seus rostos, então um frio desceu por minha espinha,
me deixando sem fôlego, esmagada por dentro.
— Ela não resistiu, filha. A bala atravessou seu coração. Não vimos
que tinha outro cara no lugar, ele acertou seu ombro, por isso está no
hospital. — Papy alisou meus cabelos. — Sinto muito, querida.
Não consegui impedir que as lágrimas caíssem. Eu poderia ter sido
mais rápida, puxado o gatilho antes. Abracei Papy, ignorando todos ali,
deixando-me apenas sentia a dor em meu peito. Eu sabia que meu trabalho
era perigoso, não só física quanto mentalmente. A angústia que vivia agora
era pior que a dor no meu ombro machucado.
A sensação de impotência me consumia aos poucos. Papy ficou comigo
me reconfortando, embora não estivesse doente. Eles queriam me manter no
hospital até o outro dia, mas eu não aceitei. Naquele momento, eu só queria
ver uma pessoa e sentir seus braços, para ver se ele tirava essa dor.

Toquei a campainha da casa de Jason e ninguém atendeu, então peguei a


chave que me deu e entrei. Não reparei ao redor, contudo, Jason consertou a
residência; até foi pintada com tintas claras, mas não reparei na cor.
Encaminhei-me ao quarto, tirei as roupas e deitei debaixo das cobertas,
querendo ser enterrada por elas. Era tarde, só não sabia que altura da
madrugada. Expirei seu cheiro nos travesseiros.
Não liguei para ele, não queria atrapalhá-lo onde quer que estivesse.
Talvez tivesse saído com seus amigos. Isso era bom, pelo menos não estava
em algum lugar bebendo, igual fazia antes de eu entrar em sua vida de novo.
Por sorte, não se tornou um alcoólatra, tal qual seu pai.
Adormeci e sonhei que estava em um corredor escuro, iluminado por
somente uma fonte de luz. Ouvia tiros ao meu redor, olhava assustada, mas
não via nada. Meu coração gelou quando percebi que era eu quem atirava.
Logo depois, apareceram vários corpos aos meus pés, pessoas gritando,
então a voz fina da garota que morreu, com seu vestido branco banhado de
sangue.
— Você me matou — disse ela, o líquido vermelho escorrendo de sua
boca e seu nariz.
— Não! — gritei, abrindo os olhos com meu coração palpitando.
— Taby, querida, o que houve? — saudou a voz de Jason ao meu lado.
Não disse nada, apenas o abracei forte, expirando seu cheiro que
consumia meu corpo e minha alma, me deixando calma, apesar de ainda
sofrer e tremer pelos acontecimentos do dia.
— Eu estou bem — menti.
Ele suspirou e me afastou para fitar meu rosto. A luz do quarto estava
acesa, por isso enxergava sua face linda e gloriosa, mas também ansiosa. Só
não via direito por causa das lágrimas.
— Taby, não minta para mim. Cheguei aqui ouvindo seus gritos lá da
sala, até pensei que estava sendo ferida — sussurrou. — Não me diga que
está bem...
— Desculpe. — Meu corpo tremia como se eu estivesse com febre,
todavia, me sentia gelada como um cadáver, igual à garota e ao cara em
quem atirei. — Oh, Deus, Jason! Eu... eu... — Sentei-me na cama e olhei
minhas mãos.
— Borboleta, você está me assustando. O que houve nessa viagem? —
Seu tom era agoniado ao escutar a dor na minha voz. — Estou ficando louco
aqui.
Expirei e limpei as lágrimas que escorriam pelo meu rosto, sentindo
uma pontada no ombro, então contei tudo que aconteceu, da prisão que
fizemos e das garotas que libertamos. Exceto uma...
— É minha culpa... Eu deveria ter atirado antes no cara.
Ele pegou meu rosto e beijou as lágrimas que caíam da minha face,
olhando dentro dos meus olhos.
— Querida, você está assim não só pelo que aconteceu com a garota,
mas também por ter atirado nesse homem. Você nunca matou alguém antes,
então a culpa e remorso estão te consumindo. — Beijou a minha testa. —
Lembra daquela vez que acertou Mika na cabeça por ele fazer bullying com
uma menina do primeiro ano? — Assenti, sem saber aonde queria chegar.
— Sim — minha voz estava rouca, então pigarreei. — Ele estava
dizendo coisas feias a ela, mas não foi só por isso que bati na sua cabeça
com o cabo da vassoura do zelador, e sim porque ele me disse que eu era sua
puta. No dia seguinte, Mika chegou todo machucado na escola... Então foi
você que fez aquilo com ele! Não que não tenha merecido.
— Bom, ele teve o que mereceu, sim, por falar isso da minha linda
namorada. O que estou dizendo é que depois de bater na cabeça dele e
assisti-lo desmaiar no chão, eu vi o desespero em seus olhos, o medo de
estar morto, mesmo ele sendo um filho da puta. Você não foi feita para ser
policial, talvez devesse ter se tornado professora, como era seu sonho.
— Eu sei, mas esse cara era um assassino, um estuprador e um maldito
desgraçado, ele merecia morrer. A garota não... — murmurei.
— A despeito desse homem ser tudo isso, você não queria matá-lo,
Taby, porque não está em seu sangue tirar a vida de uma pessoa. Por isso
está assim, sofrendo. — Pegou-me no colo e beijou meu pescoço, traçando-o
com a língua. — E não se esqueça de que a amo, então seja qual for o
problema que tiver, sempre estarei aqui para ajudá-la.
Meu coração se aliviou ao perceber a verdade na voz dele. Sabia que
Jason faria tudo por mim, assim como eu faria por ele. Meu amor me apertou
em seus braços, mas eu gemi com a dor.
— Taby? — Afastou-se, preocupado. — O que foi?
— Humm, acho que me esqueci de mencionar que levei um tiro.
Ele arfou, observando meu corpo. Jason me colocou delicadamente na
cama, me tirando do seu colo e abrindo a camisa que eu vestia. Seus olhos
ficaram grandes e assustados vendo a faixa no meu ombro, tapando um seio
com ela. O tiro acertou em cheio, ainda bem que não pegou meu coração ou
outro órgão vital.
— Tiro? — engasgou-se. — Não precisa ir ao médico?
— Estou bem agora, Jason, já fui medicada em Chicago, não se
preocupe...
Ele cortou, exaltado.
— Não me preocupar? Chego em casa e sou recebido com os gritos
torturantes da minha mulher, depois descubro que um desgraçado atirou
nela? Não me peça para ficar calmo... — interrompeu-se ao ver meu sorriso
de felicidade ante o que disse. — Por que está feliz? Não que eu não ame
seu sorriso, adoro vê-la assim.
— Venha aqui e tire essas roupas — pedi, indo remover sua camisa,
mas meu braço doeu. — Maldição, isso não vai ser bom.
— Taby, não acho que devemos fazer isso hoje — falou em um
sussurro, mas ficou só de boxer preta.
Eu ri.
— Não vamos transar, Jason, não acho que eu esteja boa o suficiente
para isso, tanto mental como fisicamente. — Peguei sua mão enquanto ele se
deitava. — Eu só quero adormecer nos seus braços e sentir seu cheiro. Mas
gostei do que você falou.
Ele me aninhou contra si e beijou meus cabelos.
— Seja o que for que eu disse que a alegrou, fico contente.
— Você disse que sou sua mulher.
— Você é, Taby, sempre foi, desde o dia em que a conheci e a fiz
minha. — Deu um beijo casto na minha boca. — Se quiser, podemos tornar
isso oficial.
Meu peito se apertou com suas palavras. Queria ser sua esposa mais do
que nunca, mais do que tudo neste mundo, contudo, não podia aceitar sem ele
saber da verdade. Preciso revelar tudo. Porém, não hoje; agora desejava
apenas sentir seu calor e seus braços à minha volta.
— Podemos ir a Las Vergas, não é? — sussurrei, gostando do plano.
— Você não sonhava em se casar em Maui, no Hawaii? Ainda quer ou
tem algum outro lugar onde deseja fazer? — Sua mão alisava minhas costas.
Sorri, eufórica por saber que ele ainda recordava do meu sonho de me
casar em uma ilha paradisíaca.
— Faria isso por mim?
Seu sorriso em resposta era lindo e maravilhado.
— Taby, você sabe que faria tudo por você. Era um sonho que eu
também tinha, nós vivemos ele por um ano, não foi? Mesmo perdendo você
esse tempo, continua sendo da minha vontade. Por isso comprei uma casa em
Kaanapali Beach. Todo ano, no seu aniversário, vou para lá. Era como se,
estando na ilha, permaneceria perto de você. — Sua voz se tornou baixa com
a lembrança da minha partida. — Hoje estamos juntos de novo e podemos
realizar o nosso casamento dos sonhos lá, sim.
— Lamento que tenha sofrido, Jason. Quero que saiba que nunca foi a
minha intenção.
— Sei que não. Não quero que fique triste, por isso... — Tirou-me dos
seus braços e se levantou.
Eu franzi o cenho.
— O que vai fazer?
Ele não respondeu. Foi até uma porta de madeira grande e entrou no
imenso closet. Segundos depois, voltou com uma caixinha azul. Eu arregalei
os olhos, olhando da caixinha para ele.
— Jason...
— Guardei o anel que dei a você aquele dia, o qual, por alguma razão,
deixou para trás. — Sentou-se na cama. Quando eu ia fazer o mesmo, ele me
impediu. — Fique quietinha para não machucar o ombro.
Meu coração estava em disparada ao ver o pequeno anel de ouro com
uma pedra azul dentro. Esta pedra era maior do que a anterior.
— Coloquei uma pedra maior, porque agora posso pagar. — Piscou
para mim. — Eu poderia comprar outro anel mais caro, mas eu a conheço,
sabia que ia amar o antigo, porque ele simboliza os quase dez anos que amo
você, e que vou amar até o dia em que morrer. Aceita se casar comigo?
Minha garganta se fechou. Eu queria aceitar o anel de volta, entretanto,
não podia fazer isso com ele. Jason tinha uma luta sábado, precisava estar
com a cabeça no lugar ou perderia. Eu não sabia como seria sua reação ao
descobrir tudo.
Ele franziu a testa, me avaliando.
— Não quer? Posso comprar outro...
— Não tem nada a ver com o anel, Jason, é só que eu não posso aceitar.
— A dor que se apossou de seu rosto foi tão grande que achei que morreria.
Ele entendeu errado. — Espere, deixe-me terminar. Não falei que não
aceitaria ser sua esposa, porque isso é algo que quero há muito tempo.
Domingo, depois da luta em Trenton, gostaria que repetisse a pergunta. Desta
vez, eu aceitarei.
— Por que nesse dia, e não hoje? — sondou, confuso.
Peguei sua mão.
— Porque antes de concordar, preciso te contar toda a verdade sobre o
que houve naquela noite. Não posso me casar com você escondendo esse
segredo. Não seria justo. — Suspirei com uma ferroada no braço. — Droga,
esse braço vai me encher o saco. Pode pegar na minha bolsa os meus
remédios?
Ele estava meio perturbado com o que eu disse sobre o casamento, mas
assim que notou minha dor, sua expressão ficou ansiosa e preocupada.
— Não quer ir ao médico ou pedir para o meu médico vir aqui? —
Entregou-me os remédios e um copo com água.
— Guarde o anel para depois. Agora deite aqui perto de mim na cama,
preciso senti-lo.
Ele não respondeu. Antes de deitar, pegou o anel de diamante azul,
simbolizando a borboleta que selou nosso amor, tirou a corrente que tenho no
pescoço, colocou-o ali e a devolveu a mim.
— Ele ficará com você, e tão logo me disser tudo, poderá botá-lo em
seu dedo, assim saberei a sua resposta. — Deitou-se ao meu lado, me
aninhando em seus braços.
— A minha resposta é mil vezes sim, Jason, nunca pense o contrário.
Sei que está confuso, mas peço que espere só mais um pouco, tudo bem? —
Suspirei, já sentindo o peso dos remédios. — Acho que esses remédios
derrubariam até cavalos.
— Esperarei o tempo que for. Agora durma, meu amor. — Beijou meus
lábios. — Eu a amo para sempre, Taby, minha borboleta azul.
— Eu também amo você...
Capítulo 10
Renúncia

TABITTA
Passado

Faz um ano que conheci Jason, o garoto bad boy que se tornou meu
mundo inteiro: meu namorado, meu amigo e meu amante. Oh, esta última
parte era a que eu mais gostava, ser sua de forma incondicional.
O momento mais feliz foi o dia em que ele me levou para fazer uma
tatuagem. O que fez meu coração saltar de felicidade foi ele também fazer
uma igual à que eu sempre quis.
— Essa borboleta selará nosso amor para sempre — disse Jason. Fiz
uma borboleta azul acima da bunda, nas costas.
Nosso ano juntos foi maravilhoso. Jason me levava à casa do Dom
para as festas que havia lá. Depois de algum tempo com Dom, pude perceber
que ele era um cara legal, um amigo que Jason adorava, então também passei
a amá-lo.
Minha avó gostava de meu namorado como se ele fosse da família.
Alegrava-me o fato dela se dar bem com o homem que eu amava, e com o
qual pretendia me casar um dia. Passaríamos a nossa lua de mel em Maui, no
Hawaii, um lugar que sempre achei lindo. Quando mencionei isso a Jason,
ele disse que era um dos seus locais favoritos, e gostaria de conhecê-lo junto
comigo, assim que ele se tornasse um lutador profissional, como era seu
sonho.
Já era quase sete da noite, Jason e eu ficamos de nos encontrar na
cabana de que ele tomava conta. Comemoraríamos o meu aniversário, e
também um ano de namoro.
Uma vez, fui à sua casa, e seu pai me deu medo; estava bêbedo e
xingava o Jason com coisas que o faziam sofrer, culpando-o por sua mãe ter
ido embora. Eu estava prestes a fazer aquele velho engolir todas suas
palavras, mas Jason me tirou de lá antes disso. Até achei bom, não queria
que ele enfrentasse seu pai por mim; mesmo o cara sendo o crápula que era,
ainda era pai dele. Depois disso, passamos a nos encontrar em outros
lugares, principalmente na cabana, que se tornou nosso refúgio e ninho de
amor
Eu estava na sala dando um abraço na vovó antes de ir ver Jason. Já
havia contado a ela que não era mais virgem, e vovó foi compreensiva,
ciente de que eu e Jason nos amávamos e que pretendíamos ir para a
faculdade juntos, só não sabíamos onde, ainda. E, depois, nos casaríamos.
Eu contava com isso.
A porta foi escancarada em um rompante, tendo sido chutada. Gritei
com o susto, porque isso nunca aconteceu. Assaltos eram incomuns nessa
região, e nós também não éramos tão ricos. Vivíamos da aposentadoria do
meu avô, que morreu quando eu era pequena.
Entraram na sala três homens, dois morenos, por volta de vinte ou trinta
anos, mais ou menos, exceto pelo cara do meio, que devia ter uns quarenta e
cinco, a julgar pelos longos cabelos ligeiramente grisalhos e barba por fazer.
Vestia-se de preto, parecia um gângster, e seus amigos estavam armados.
Vovó ficou na minha frente, como se para me proteger dos bandidos.
Pareceu se esquecer de que empunhavam armas, e não podíamos com eles.
— O que está fazendo na minha casa, Sebastian Ruiz? Você não é bem-
vindo aqui — rosnou ela com os punhos cerrados.
— Eu vim ver minha filha — disse com os olhos em mim.
Fiquei espantada. Então esse homem era o meu pai? O cara que nunca
se importou se eu estava viva ou morta? Como minha mãe se envolveu com
ele, sendo que podia enxergar a maldade de longe, incrustada em si? Sua
expressão era sombria.
— Você é... — As palavras fugiam devido ao choque.
— Sou seu pai e vim buscá-la....
— Para quê? Para fazê-la se prostituir também, como fazia com a mãe
dela? — vovó rugiu. — Você não passa de um monstro, seu desgraçado!
Ofeguei de pavor. Ele forçava a minha mãe a vender seu corpo? Esse
homem era um animal desalmado dos piores, como pôde querer isso para
sua esposa e sua filha? Ele devia tentar me proteger, e não o contrário.
Estava prestes a dizer que não iria a lugar algum na sua companhia,
jamais, porque o único homem que tocaria meu corpo seria Jason, e mais
ninguém, quando ouvi um tiro. Vovó arquejou com a mão no peito. Virei-me
para ela, pronta para perguntar se estava bem, mas vi sangue, e vovó caindo
no chão.
Parecia que estava em um pesadelo, contudo, continuava acordava,
assistindo à minha avó morrer. Botei-me de joelhos ao seu lado e gritei para
chamarem uma ambulância. Soluçava e gemia ao mesmo tempo.
A mulher que me criou engasgou com o sangue que saía de sua boca.
— Oh, Deus, vovó! — Estava desesperada, com medo de perdê-la. Isso
não podia acontecer, ela era tudo na minha vida.
— Eu mandei você atirar nela? — sibilou Sebastian, o monstro que
tirou a minha avó de mim. Depois ouvi outro estampido. Pensei que o cara
tivesse atirado de novo, agora em mim, mas o homem que atirou em vovó
estava estirado no chão da sala, morto. Sebastian matou seu próprio
capanga? Eu não liguei, apenas não queria que vovó morresse e me deixasse.
Precisava dela comigo.
— Vá para o quarto branco... Lá tem tudo de que vai precisar... —
sussurrou em seu último suspiro.
Teria de deixar a dor para mais tarde, agora precisava sair desse lugar,
como vovó pediu. O quarto branco a que ela se referia era um ambiente que
preparou, pensando que um dia necessitaria usá-lo. Não entendi na época,
não achei que correríamos perigos a ponto de carecermos de um quarto para
nossa proteção. Ela sabia que algo ruim aconteceria algum dia, que o
monstro do meu pai viria atrás de mim.
— Tabitta, venha comigo ou eu vou matar todos que ama. Seus amigos,
conhecidos e vizinhos serão mortos se não me acompanhar. — Ouvi
Sebastian em algum lugar ali perto.
Eu me movi no piloto automático, precisava sobreviver por mim, pela
vovó e pelo Jason. Depois prosseguiria com meu luto. Corri para o quarto
que ficava no final do corredor.
— Não a deixe fugir, ou eu mato você também — gritou o monstro.
Um cara veio atrás de mim. Meu coração gelou assim que ele tentou
pegar meus cabelos. Fui mais rápida e coloquei a palma da minha mão para
abrir a porta. Entrei no quarto e fechei-a logo a seguir. A porta só abria com
as digitais minhas e de vovó, então eles não conseguiriam entrar.
Era um quarto de três e meio por três e meio, com uma porta de aço
reforçada com concreto e revestida de aço inoxidável. Quando perguntei se a
vovó estava fazendo um cofre para guardar os bens que não tinha, ela apenas
deu uma risada. Uma risada que nunca mais ouviria...
Tinha celulares descartáveis, e cartões de crédito e débito em meu
nome. Coloquei tudo na bolsa preta para levar nas costas e peguei uma mala
maior com dinheiro dentro, não sei quanto, e também não me importava
agora.
Há um ano, vovó me levou ali e mostrou onde ficava tudo. Falou que se
um dia precisasse sair às pressas, poderia carregar o essencial, como
dinheiro, cartões e passaporte. Estava com minha bolsa no meu ombro, onde
se encontrava meu celular, que logo peguei e quebrei com o pé. Não sabia
como isso funcionava, talvez ele rastreasse o meu número. Se esse homem
fosse igual os caras dos filmes, faria algo assim.
Saí pelo alçapão no meio do cômodo. Embaixo ficava o túnel que dava
a quatro quadras de casa. Segurei as duas bolsas, por sorte uma era pequena,
e corri pelo túnel usando uma lanterna para enxergar e não me machucar,
pois não teria como explicar os machucados ao Jason depois.
Sebastian não podia saber do Jason nunca, porque se isso acontecesse,
ele o mataria como fez com vovó... Jason teria de sair da cidade; se ficasse,
seria o seu fim. Sebastian poderia usá-lo para me levar com ele e fazer o
quisesse comigo, e o pior, não deixaria Jason vivo no processo.
Conhecia só uma pessoa que podia me ajudar a protegê-lo. Cheguei à
casa do Dom, ele estava dando uma festa. Isso não era novidade, já que o
fazia direto. Deixei as mochilas em seu Cadillac Eldorado 67.
Entrei quase correndo e parei alguns de seus amigos, que estavam
bebendo e se divertindo, ao contrário de mim, destruída por dentro.
— Vocês viram o Dom? — Ofegava por ter corrido.
Algumas pessoas disseram que não sabiam dele, outros comentaram que
ele estava com alguém no seu quarto. Pensei nesses adolescentes se
divertindo sem saberem que suas vidas pudessem correr perigo, devido ao
monstro que era o meu pai. Talvez ele os massacrasse só porque alguns
estudavam comigo, ele mesmo disse que mataria todos à minha volta.
— A polícia está vindo, precisam ir embora, a não ser que queiram ir
para a cadeia. — Muitos ali eram menores de idade. Todos saíram correndo
como o diabo fugindo da cruz.
Esqueci sobre eles por enquanto e dirigi-me ao quarto do Dom, abrindo
a porta sem bater. As horas estavam correndo, não podia enrolar mais e
deixar Jason resolver me buscar em casa, isto seria o fim dele e o meu.
Arregalei os olhos com o que vi. Pamela estava de joelhos na frente do
Dom, com o pau dele em sua boca. Uma visão que não queria ter nunca.
Balancei a cabeça para expulsar essa cena da minha mente.
— Tabitta, o que foi? — Dom se pôs de pé nu. Eu não olhei, não
querendo essa memória para a posteridade. Pamela estava nua também e
ficou ao lado dele, me encarando com raiva. Dom não parecia
impressionado com a nudez da garota.
— O que você quer? — gritou. — Já não tem o Jason, agora vai querer
o meu Dom também?
Dom estreitou os olhos para ela, pareceu se esquecer de que os dois
estavam pelados.
— Você é só uma foda, um pedaço de carne, nunca se esqueça disso —
desdenhou, sombrio. Eu me encolhi por ela. — Quer saber? Nem um pau
você é boa para chupar, então pegue suas roupas e vaze da minha frente.
Dom era um cara legal, mas quando essa sombra entrava em suas
feições, era como se ele fosse outra pessoa. A causa? Eu não fazia ideia.
Uma vez, perguntei ao Jason sobre isso, mas nem ele que era o seu melhor
amigo sabia de nada.
Pamela pegou suas roupas no chão e saiu chorando porta afora.
— O que foi? — perguntou num tom confuso. — Por que está aqui? Não
era para você estar em um encontro com Jason no chalé?
— Coloque suas roupas, pegue tudo que precisar e bote na mochila,
porque precisamos ir embora.
— O quê? Por quê? — Franziu a testa.
— Porque você está indo embora da cidade agora.
Ele arfou.
— Eu não vou a lugar algum, Taby. O que houve, por que está agindo
assim?
Fui ao seu armário e peguei suas roupas do cabide. Suas mãos
seguraram meu braço e me sacudiram. Percebi que estava tremendo, mas
tentei me controlar, não me permitiria quebrar.
— Me diga o que há, porque está me deixando doido.
— Precisamos ir logo, eles podem estar a caminho daqui, atrás de mim
e do Jason. — Fitei-o com os olhos molhados. — Por favor, só quero salvá-
lo.
Engoli o choro. Precisava ser forte para o que faria a seguir, depois eu
poderia me desmanchar à vontade, já que estaria sozinha e com minha alma
vazia.
— Quem são essas pessoas que estão atrás de você e Jason? — Vestiu
jeans e camiseta. — Talvez eu possa cuidar deles...
— Não! — gritei. — Eles parecem ser da máfia ou coisa assim.
Mataram a vovó.
Espantou-se.
— O quê?
— Dom, não podemos ficar conversando, precisamos ir até a cabana
antes que Jason resolva aparecer lá em casa, aí sim estaremos todos mortos.
— Eu me encolhi com essa ideia. — Pegue o que necessitar, porque vocês
não vão voltar mais. Esse homem deve saber tudo sobre mim e Jason, e pode
usá-lo para chegar até nós.
— E minha mãe? — Botou mais roupas dentro da mochila.
— Você a busca antes de sair da cidade. Leve-os para longe de Austin,
distante desse homem.
— Quem é esse cara? Qual é o seu nome? — perguntou assim que
entramos em seu carro.
— Meu pai, Sebastian Ruiz.
Pisou no freio devido ao choque.
— Desculpe, você disse “pai” e “Sebastian Ruiz” na mesma frase? —
Seus punhos estavam cerrados no volante com força.
— Já ouviu falar dele? — Arregalei os olhos.
— Sim, ele é o chefe do maior cartel mexicano, um dos homens mais
poderosos no mundo do tráfico, tanto humano como de drogas. — Soava
amargo. — Soube que tem federais atrás dele, mas nunca conseguiram
provas o suficiente para derrubá-lo.
— Esse desgraçado usava minha mãe para se prostituir, e ia me levar
com ele...
— Faria o mesmo com você? — rosnou.
— É o que parece. Caras como ele não têm amor paternal, aliás, acho
que nem sabe o que é isso. — Limpei as lágrimas do meu rosto. — Tenho
medo de que ele vá atrás de Jason, então é melhor para todos... eu ir
embora... — Precisei respirar, porque depois disso estaria apenas vegetando
na Terra. — Ele disse que se eu não fosse, mataria todos meus amigos e
vizinhos.
— O que pensa em fazer, Taby? — inquiriu, me avaliando.
— Você vai levá-lo junto com sua mãe para longe daqui. Para alguma
cidade fora do Texas — murmurei.
Ele me olhou de lado.
— E você?
— Eu vou embora também, mas não com vocês, não vou correr o risco
deles me acharem e matarem Jason... — Minha voz falhou.
— Tabitta...
— Eu o amo como nunca amei ninguém nessa vida, por sua segurança
sou capaz de tudo, até de viver na solidão para ele ficar seguro e feliz,
mesmo que seja longe de mim. Jamais colocaria Jason em risco. — Peguei
sua mão, a que não estava no volante. — Por favor, fique do meu lado.
Ele respirou fundo.
— Você sabe o que está me pedindo? — Sua voz estava quebradiça
como vidro.
— Sei que será difícil, já que ele é o seu melhor amigo, mas é a sua
própria segurança que está em jogo. — Expirei; meus pulmões doeram.
Suspirou.
— Ele vai sofrer, Taby. Aquele cara morreria por você — sussurrou,
entristecido.
— O importante é ele continuar seguro e vivo... — Meu peito pesava
com o que aconteceria comigo e com ele dali para frente.
Assim que chegamos, Dom desligou o carro. Por sorte, era noite. Jason
não veria o Dom, mas saberia que era ele no carro.
— Vá buscar sua mãe, passe longe da rua de casa. Depois, venha pegar
o Jason. Ele estará inconsciente, então cuide dele, ok? Enquanto isso, vou me
despedir.
— Dirá que vai embora?
— Não, não posso dizer adeus, não conseguirei partir assim... E
também ele jamais permitiria.
— Aonde você vai depois daqui?
— Não sei ainda. — Toquei a mochila preta e grande no banco de trás.
— Isso é para vocês viverem por enquanto. Não diga que eu dei, invente
alguma coisa. O que está aqui bastará para vocês dois irem à faculdade e se
formarem. Têm notas boas, poderão entrar em qualquer uma.
Abriu a bolsa e assoviou. Eu não sabia quanto tinha, mas era mais de
quinhentos mil, acho que por isso meu ombro ficou doendo por carregá-la no
túnel escuro.
— Menina, de onde esse dinheiro saiu?
— Minha avó sabia que logo esse homem chegaria para nos procurar,
por isso arrumou tudo, o quarto com porta de aço e leitor de digitais, e o
túnel por debaixo da casa, foi assim que fugi. — Peguei a mochila menor e
coloquei no ombro.
— Daqui a meia hora, eu volto. — Parecia estupefato com o que eu
disse e tinha o semblante triste pelo que teríamos de fazer.
Fui para a cabana, nosso ninho de amor, onde era para comemorarmos o
dia mais importante da minha vida, nosso primeiro ano de namoro. Tudo que
é bom dura pouco, não?
Antes que eu batesse, ele abriu a porta e olhou o carro do Dom indo
embora.
— Aquele é o Dom?
Segurei tudo para não chorar ao ter de deixá-lo.
— Ele me deu uma carona, disse que não queria que eu perdesse nossa
comemoração.
— Por que não veio no carro da sua avó? — questionou, confuso.
Controlei a dor por perder vovó. Nem um enterro eu poderia dar a ela,
tudo por culpa daquele maldito monstro desalmado.
— Ela o usaria hoje — menti. Jason sempre foi bom em me ler, logo,
puxei uma máscara de tranquilidade e sorri, trancafiando minha dor.
— Então vamos aproveitar! Um ano de namoro; com certeza, haverá
muito mais. — Sorriu com tanto amor que me encolhi, porque amanhã esse
sorriso lindo não estaria mais estampado em seu rosto.
Beijei-o para mostrar o quanto eu o amava com cada fibra do meu ser.
Logo ele me odiaria e tentaria me esquecer nos braços de outra mulher.
Jason tirou minhas roupas e colocou-se dentro de mim.
— Promete que nunca ninguém tocará esse seu corpo, Taby, só eu? —
Sempre perguntava isso, era como se tivesse medo que o sonho lindo que
estávamos vivendo acabasse. Ele nem imaginava que esse sonho terminaria
antes mesmo de começarmos nossa vida juntos.
Gritei em cada estocada dada, até que gozamos em sincronia. Fitei seus
olhos lindos e brilhantes.
— Prometo ser sempre sua, e de mais ninguém — jurei com tudo da
minha alma, que urrava de dor. Eu sabia que ele não cumpriria sua promessa
de só pertencer a mim, não depois de pensar que o abandonei.
— Eu a amo, para sempre.
Beijei a borboleta que tatuou no peito, simbolizando nosso amor.
— Eu também te amo mais que a vida. — Isso era verdade. Decidi me
submeter a uma existência de solidão e tormento apenas para ele ficar
seguro.
— Taby, me dê sua mão — pediu, ao que obedeci. Não sabia o que ele
faria, mas jamais hesitaria diante de um pedido desse homem. Fiquei
surpresa assim que vi um anel de ouro com uma pedra azul no meu dedo. —
Eu te amo mais que o sol e as estrelas. Por você, eu daria minha vida, minha
alma e tudo que há em mim. Tabitta Rodrigues, aceita ser minha esposa?
Prometo amá-la para sempre.
— Sim, mil vezes sim — respondi, beijando-o de novo e entregando
meu amor e corpo a ele. No dia seguinte já não poderia fazer isso... Queria
chorar com a dor no meu peito, contar tudo, mas não podia. Apenas me
desfrutei dele e de todo seu amor por mim.
Levantei-me depois da segunda vez que ficamos juntos. Chegou a hora
de comer o bolo que ele fez para mim. Comemoramos meu aniversário,
enquanto ele cantava parabéns. Era um momento que queria registrar para
sempre, uma lembrança que não esqueceria jamais.
Coloquei um sonífero em sua bebida. Minha alma cortava por fazer isso
com ele, contudo, não havia alternativa.
— Beba um pouco. — Entreguei o suco; logo ele apagaria.
Podia deixá-lo acordado e simplesmente ir embora, mas sabia que ele
partiria atrás de mim e reviraria cada canto da cidade. Isso não podia
acontecer, não com Sebastian à solta. Depois que Dom os levasse para
longe, seguiria na direção contrária. Faria com que Sebastian me localizasse,
talvez em Londres ou na China, assim tiraria o foco dos meus amigos e do
garoto que amava. Um purgatório, era isso que minha vida se tornaria dali
em diante sem Jason, o único homem que eu amei e amaria para sempre.
Capítulo 11
Luta

TABITTA
Presente

Cheguei ao clube onde seria realizada a luta de Jason contra um


campeão de peso-pesado, Dilano Alfred, mais conhecido como Escorpião,
por ter o artrópode desenhado no peito. Jason era apelidado de Bala.
Sempre que ele entrava no ringue, meu coração tremia com medo de se
machucar. Graças a Deus, ele nunca se feriu gravemente em suas lutas.
Antes de eu ir para lá, o Bryan me procurou e disse que Dennis e
Thomas já tinham formado um plano para tirar o Sebastian da toca onde
estava escondido. Franklin não aceitou o acordo, temendo por sua vida. Eu
achei bom, porque caras como ele mereciam perpétua e pena de morte, e não
um combinado que facilitaria sua vida, sendo que ele não facilitou em nada
para todas as meninas que sequestrou e estuprou.
Não gostei do que Dennis propôs, ele queria me usar como isca para
atrair Sebastian. Até aí já tinha concordado antes, o que não me deixou feliz
era que ele sugeriu usar o meu relacionamento com Jason para sair na TV e
nos jornais, assim o crápula do Sebastian iria atrás de mim e tentaria fazer
alguma coisa comigo e com Jason, tal qual fez no passado, com a minha avó.
Mas agora eles o impediriam. Isso me pareceu frio da parte dele; Papy não
concordou, claro.
— Não arriscaria nenhum dos meus agentes, muito menos a vida de um
civil — rosnou Papy quando Dennis me chamou para dizer o plano, já que eu
tinha recusado quando Bryan me contou.
— Jura? Não é porque ela é sua filha amada? Eu arrisquei os homens
que mandei para se infiltrarem no cartel do Ruiz, e você não quer arriscar
uma sua? — sibilou Dennis.
Antes que virasse uma discussão entre os dois, pois o clima lá ficou
bem tenso, expliquei a minha ideia:
— Que tal eu sozinha fazer a missão? Tiramos Jason disso, porque não
vou envolvê-lo, colocando em perigo a sua vida. — Olhei feio para o
Dennis. — Vocês escolhem. Ou infiltramos mais pessoas no cartel de
Sebastian, mas isso levaria tempo e mais mortes indesejadas. Também
podemos continuar desmanchando os pontos de prostituições e drogas, e tudo
que pertencer a Sebastian, e a cada ação dar uma entrevista e o acusar de ser
o mandante. Não acredito que ele vá nos processar por falta de provas, seria
muita cara de pau.
Dennis sorriu. O bastardo ficou satisfeito. Deu-me vontade de arrancar
o sorriso fodido do seu rosto com meu punho na sua cara.
— Isso pode acontecer, agora que saiu em uma revista mexicana que
Sebastian Ruiz não é chefe de cartel coisa nenhuma. Garanto que ele
ameaçou o dono da publicação ou a empresa foi comprada. Com essas
acusações, ele ficaria furioso porque sua filha está desmanchando seus
negócios lucrativos e jogando seu nome na imprensa. — Assentiu, animado.
— Mas vai arriscar sua vida — disse Papy, não gostando da ideia.
— Não me importo, contanto que ele perca tudo, seu reinado, seu
império no crime. Vou ficar bem, Thomas — falei, vendo a preocupação em
seu rosto. — Mesmo afastada do caso, ajudarei vocês a prender Sebastian e
todo seu séquito de bandidos.
Estava afastada do FBI por enquanto, devido ao tiro que levei em
Chicago. Já não doía mais, mas Papy não me deixou voltar, porque os pontos
seriam abertos.
Os pesadelos ainda me assombravam tanto que acordava à noite
gritando. Eles só não apareciam quando dormia com Jason ou Emily, minhas
duas razões de viver. Jason me obrigou a frequentar a psicóloga que Papy
arrumou para eu ir. Estava indo nela uma vez por semana.
Entrei no clube lotado de mulheres gritando “Bala”, e algumas
“Escorpião”. Dei meu nome ao segurança, que já sabia que eu viria; Jason
deixou-o na lista de acesso ao local onde os lutadores ficavam.
Avistei Chris e Landon, os guarda-costas de Jason que Bryan conseguiu.
Eu os conhecia: afastaram-se do FBI e se tornaram seguranças renomados.
Landon era um cara louro com cabelos curtos e olhos negros, e Chris,
moreno, forte e mais sério. Landon sorriu para mim assim que cheguei perto
deles.
— Oi, Landon, como está nosso homem? — perguntei ao me aproximar.
Sacudiu a cabeça, fazendo uma careta. Ele era lindo, mas ouvi dizer que
não ficava a sério com ninguém. Coitadas das mulheres com quem se
envolvia.
— Vamos tirar a parte do “nosso homem” da equação, aí sim eu
respondo que está tudo bem por aqui. — Piscou. Logo que nos conhecemos,
ele deu em cima de mim, mas eu não quis, então nos mantivemos apenas
colegas de trabalho. — Se você quiser trocar por uma mulher, estou dentro.
A não ser que tenha mudado de ideia e queira sair comigo.
Chris riu.
— Cara, você não valoriza sua vida? Jason está a caminho, e pela sua
cara, ele vai treinar com você antes da luta.
Landon seguiu o olhar do Chris e eu também. Vi Jason vindo com seus
olhos lindos, mas mortais, direcionados ao Landon.
— Está saindo com ele? — inquiriu, incrédulo. — Achei que gostasse
de mulher.
Eu ri.
— Não é porque não vou para cama com todos que dão em cima de
mim, que quer dizer que sou lésbica — retruquei e dei um passo, ficando de
frente para o Jason.
Ter esse homem diante de mim fazia parecer que estava vivendo um
sonho lindo, do qual não queria acordar nunca. Antes que eu dissesse alguma
coisa, ele me puxou para seus braços e devorou a minha boca. Eu sabia o
que estava fazendo: dando um recado a todos os homens do lugar, deixando
claro que eu tinha dono. Eu que não ia reclamar de jeito nenhum. Retribuiria
à altura. Fomos interrompidos com o grito de seu treinador.
— Jason, você tem que aquecer.
Tentei me afastar, mas seus braços não deixaram. Ele me consumiu
mais, tanto que meus lábios estavam duros pela força do beijo. Depois,
distanciou-se com um sorriso.
— Já estou aquecendo — respondeu ao seu treinador. Dirigindo-se a
mim, acrescentou: — Seja bem-vinda.
Pela primeira vez em muitos anos, minhas pernas ficaram bambas
devido aos seus beijos e amassos. Sempre adorava isso, amava como meu
corpo reagia a ele.
— E que boas-vindas, não é? — Sorri e me afastei, mas segurei sua
mão direita, que estava com umas ataduras brancas. Olhei sobre seus ombros
e vi um homem moreno nos encarando surpreso, talvez por Jason estar com
alguém. — Seu treinador está esperando você.
Ele estreitou os olhos por um segundo e encarou Landon atrás de mim,
mortal.
— Você está aqui para trabalhar ou dar em cima da minha mulher? —
rosnou.
— Jason, somos colegas, então relaxe, ok? Concentre-se na sua luta e
nada mais — eu disse.
— Sossegue, cara, desde que conheço Tabitta, ela não ficou com
nenhum homem, não que eu saiba. Até achei que fosse lésbica.
Eu revirei os olhos.
— Jason — chamou Silas, seu treinador. — Deixe para namorar depois
da luta.
Ri e beijei seu rosto.
— Vá, ficarei bem aqui até a hora em que for lutar. Depois, precisamos
conversar, tudo bem? — Hoje teríamos a nossa conversa difícil.
Ele me avaliou, espantado.
— Você não... — Sua voz estava tomada de dor.
Logo entendi o seu medo: ele estava achando que eu o deixaria de novo.
Isso não aconteceria nunca. Estando perto dele, sabia que jamais teria forças
para abandoná-lo mais uma vez. Eu devia ter ficado calada.
— Jason, não é nada disso. — Aproximei-me e sussurrei em seu
ouvido: — Eu juro.
— Então é sobre o quê? — sondou, afastando o rosto dele para ver o
meu. — É sobre o que disse antes, sobre revelar tudo?
Antes que eu respondesse, o locutor anunciou:
— Agora, com vocês, o letal, mortal e destruidor... Balaaaaaaa, a fera
dos ringues. Vocês o querem?
Várias pessoas gritavam seu nome, e mulheres soltavam “gostoso” e
outros elogios — todos verdadeiros, devo dizer.
— Chegou a hora de ir lutar, vá — pedi com a voz tranquila. — Eu não
vou a lugar algum.
— Na hora da luta, fique perto do Silas, tudo bem? — Eu estava prestes
a discordar, quando ele acrescentou: — Por favor, se eu não ver você, vou
ficar louco.
Suspirei e dei um selinho nele.
— Eu prometo, agora vá. — Eu o empurrei na direção do seu treinador.
Jason vestia um calção preto e estava sem camisa. Cobriu seus ombros
largos com um roupão escuro.
Ele assentiu e se foi, sem nunca tirar os olhos de mim, até que saiu
porta afora. Meu coração doeu, porque fui eu quem deixou esse medo nele.
Se eu não tivesse aberto minha boca, ele não estaria temeroso. Esperava que
isso não atrapalhasse sua luta.
— Tabitta, o que fez a esse homem? Ele parecia assustado com a ideia
de você partir — observou Landon.
— Vamos deixar isso de lado e tratar de sua segurança — me esquivei.
Fui para perto de seu treinador e sentei em um banco de madeira. Olhei
para o Jason, no ringue junto com o Escorpião. Todavia, seus olhos vinham a
cada segundo em mim, como se para ter certeza de que eu não fugira. Sorri
para tranquilizá-lo.
— Desde quando conhece Jason? — perguntei a Silas, enquanto a luta
não começava. Os dois lutadores estavam de frente um para o outro, com um
juiz perto.
— Há quase quatro anos eu o encontrei brigando nas ruas de
Cambridge, Massachusetts. Nele eu vi um garoto com potencial, mas que
carregava uma dor profunda e muita raiva. Então disse para usar essa raiva
nos ringues, e foi o que ele fez. Deu certo, mas ele nunca me disse o porquê
da raiva e da dor que eu via em sua expressão, até aquele dia na casa dele,
em que vocês foram atacados.
— Segunda? — Foi quando dormi em sua casa e voltamos a namorar.
— Sim, ali eu descobri que você sempre foi a causadora da angústia
que o consumia. — Olhou-me de lado, depois para o ringue — Veja sua
expressão, está a cada segundo com medo de você desaparecer daqui. Não
foi preciso contar sobre vocês dois, enxerguei o amor e a preocupação nos
olhos de Jason aquele dia.
Eu encolhi os ombros.
— Acho que falei demais antes dele subir no ringue...
— O que disse a ele? Num momento estava feliz por vê-la, e no outro
estava com medo de perder algo, ou melhor, você.
Eu suspirei.
— Apenas disse que tínhamos de conversar, mas ele levou como se eu
já fosse contar que ia embora e o deixar. E não é isso que vai acontecer,
entende? — Jason se esquivou de um gancho de direita. — Eu não posso
mais viver longe dele, já fiz isso por anos, e foram somente trevas em minha
vida. — Tirando minha filha e meus amigos.
— Não acha que foi uma hora inapropriada para dizer isso? —
censurou.
— Eu sei, expliquei que não era nada, que não iria a lugar algum, mas...
— Mas ele não pareceu acreditar.
Estava prestes a comentar que isso não fazia sentido quando meu
telefone tocou.
— Preciso atender. — Ele assentiu e foi para perto do ringue, onde
Jason deu um soco em Escorpião, que cambaleou para trás. Fiquei feliz por
ele estar vencendo a luta. Seus fãs iam à loucura com cada golpe dado no seu
adversário, principalmente as mulheres. Algumas até gritavam para ele se
casar com elas ou levá-las para sua casa. Tentei não pensar em Jason com
essas garotas, e nas que teve antes de eu retornar.
Precisava saber que tipo de problema Landon mencionou. Ele mandou
uma mensagem dizendo para encontrá-lo no banheiro dos lutadores, porque
tinha um pepino lá para resolvermos.
— Preciso ir ao banheiro e já volto — falei ao treinador de Jason.
— Droga, mulher, se você sair agora ele não vai lutar mais. Já está mal,
não parece estar se concentrando — criticou.
— Ele está lutando bem, não vê? Está ganhando...
Ele me cortou.
— Ganhando? Já era para ele ter nocauteado o cara faz minutos —
reclamou. — Agora quer sair?
— Eu não quero sair, mas tenho um problema para resolver que
envolve a segurança de Jason. E seu bem-estar é mais importante do que
tudo. — Parti antes que ele falasse algo e corri para o banheiro, onde
encontrei Chris e Landon apontando a arma para um cara vestido de preto,
escorado na parede do canto. Parecia que os dois cuidaram dele muito bem,
porque havia machucados em toda a parte.
— O que está acontecendo, por que esse homem está ferido? —
perguntei.
Landon sorriu.
— O nosso cara aqui estava armado e veio com a intenção de atirar em
Jason, não é? — Landon chutou o homem no chão.
O bandido, forte e moreno, gemeu com a pancada das botas de Landon e
olhou para mim. Sorrindo, pareceu esquecer as dores que devia estar
sentindo com todos esses ferimentos.
— Eu vim para acabar com você, não com Jason, sua puta desgraçada,
e vou matá-la. — Levantou-se e veio em minha direção, querendo me atacar.
Não deu tempo de eu me defender, ou de os seguranças interferirem: um
punho acertou o cara, que caiu desmaiado no chão. Era o Jason. Arfei,
mirando seus olhos que estavam em mim, arregalados do que podia jurar ser
medo.
— Droga, Jason, você sempre dá socos assim nas pessoas? E por que
não está no ringue?
— Eu ganhei a luta — respondeu. — Que droga está acontecendo aqui?
Espantei-me.
— Você ganhou a luta?
— Por que parece incrédula? — Landon ergueu as sobrancelhas
inquisitivas para mim. — Ele é Jason Falcon, a fera dos ringues, não fica
mais de dez minutos em um.
— Diria que estou impressionada. — Cheguei até Jason e peguei sua
mão direita. — Não tinha que estar no palco recebendo seu prêmio?
Ele respirou fundo.
— Sim, mas eu não a vi, então encerrei a luta e fui te procurar... Pensei
que... — Estremeceu. Eu sabia o que ele pensou, que eu havia ido embora.
— Ei, estou aqui — sussurrei, depois virei para o cara inconsciente. —
Com ele apagado, não vamos saber seu motivo para querer me matar.
— Desculpe por isso, mas quando ele te chamou daquele nome, não
pude me controlar. — Jason apertou minha mão.
Olhei para o Chris.
— Leve-o para a polícia e fale para eles o interrogarem. Precisam
descobrir o porquê dele me odiar a ponto de vir armado em um clube cheio
de pessoas inocentes.
— Tudo bem — disse e saiu, levando o cara desacordado com a ajuda
de Landon.
Jason me beijou e me levantou do chão, me imprensando na parede.
Coloquei minhas pernas à sua volta. Meu braço não doía mais, então
podíamos aproveitar, mas não era o momento.
— Jason, não tem que estar lá fora? — ofegava nos seus lábios.
— Agora eu só preciso estar dentro de você — respondeu, baixando a
alça da minha blusa enquanto consumia a minha boca. Eu não usava mais a
faixa, já que meu machucado parecia seco, só uma gaze por cima.
Sabia o que ele estava fazendo ou tentando fazer: era como se estivesse
querendo deixar claro que era bom o suficiente para eu não deixá-lo.
Meu corpo inteiro ardia pelo fogo causado por seu toque, suas carícias
e seus beijos, que me levavam ao céu. Não queria interromper nosso
momento, desejava matar essa ardência dentro de mim.
— Jason, eu não posso... — sussurrei, desprendendo minhas pernas de
sua cintura e colocando meus pés no chão.
Afastou-se rápido, como se eu fosse uma cobra. O tormento era visível
nele.
— Não, você não pode... — Sua voz falhou, tomada de dor. Pôs as
mãos nos cabelos, parecendo querer arrancá-los.
— Jason...
— Você não pode me deixar de novo, não pode. — Seu desespero
machucava a minha alma. Estava a ponto de dizer que não ia fazer isso
quando ele caiu de joelhos na minha frente, abraçando minha cintura para me
manter ali para sempre. — Não posso viver sem você... Não posso. Fiquei
louco desde o dia que disse que ia me revelar tudo, mas logo vieram os
pesadelos, onde você me deixa sozinho de novo... A agonia é demais, eu
não...
Minha garganta se fechou. Ali estava alguém que eu quebrei há anos,
que se tornou a casca de um homem que um dia foi. Precisava deixar claro
que nunca o abandonaria. Toquei seus braços e o puxei para cima.
— Levante-se, Jason — pedi. Ele ergueu a cabeça e olhou para mim
com suas íris lindas e marejadas. — Não vou deixar o único homem por
quem eu andaria em brasas, enfrentaria tudo como enfrentei nesses anos,
vivendo na solidão para mantê-lo a salvo. Não vou embora, não vou
abandoná-lo, Jason. Eu o amo com cada fibra do meu ser, da minha alma.
Não quero que tenha medo ou desconfie de mim sempre.
Ele se levantou sem piscar e tirar os olhos de mim, com medo de eu
desaparecer em uma nuvem de fumaça.
— Pensei que estava prestes a dizer que tudo tinha acabado mesmo
antes de começar, igual acontecia nos meus pesadelos. — Chegou perto e
tocou meu rosto. Eu não sabia que ele estava tendo pesadelos também. — Se
não é isso, por que me pediu para parar?
— Você parecia estar querendo provar alguma coisa transando comigo.
Nem sempre sexo é a chave de tudo — sussurrei.
— Não é só para provar que sou homem o bastante, era porque eu
queria você, Taby, tanto que não sei o que fazer para controlar o medo de
perdê-la de novo.
— Você é mais do que homem para mim, não precisa provar nada em
relação a isso, ok? — Beijei seu peito nu. Sob essa tatuagem de águia era
onde estava a nossa borboleta; mesmo ela tendo sido apagada, beijei o
pássaro, porque ele amava essa ave, e tudo que Jason amava, eu também
adorava.
Minhas mãos foram para sua bermuda e a abaixei junto com a cueca.
Peguei seu pênis, que ficou duro com meu toque. Caí de joelhos na sua frente
com seu membro na minha cara e olhei para ele.
— Taby, você não é mulher para ficar de joelhos na frente de um
homem, ainda mais dentro do banheiro de um clube, você merece muito mais
— disse, segurando meus ombros na intenção de me levantar. Balancei a
cabeça, puxando seus shorts até seus joelhos. Usava mais a mão boa, não
forçando o meu ombro machucado.
— Quero isso com você, agora. — Peguei seu pau e coloquei na minha
boca, sem tirar os olhos dos dele.
Ele alisava meu rosto enquanto eu chupava e lambia forte, fazendo com
que fechasse os olhos.
— Oh, porra! Isso é bom — rosnou, rouco com desejo. Ele se escorou
na parede e suas mãos foram para a minha cabeça, alisando meus cabelos.
Estava sem prática nessa área, afinal, foram anos sem fazer um boquete
nele, e estava mais grosso agora do que aos seus dezoito anos, embora ainda
saboroso como antes. Lembrava-me da primeira vez que fiz um boquete nele,
foi quando tatuamos as nossas borboletas. Naquele dia, fomos comemorar na
cabana, então ele me ensinou a chupar seu pau, o que adorei. Depois disso,
fazíamos quase todas as noites.
Amava sentir seu gosto meio salgado de pré-sêmen, adorava mais ouvir
seus gemidos e gracejos. Aposto que ele não estava falando com medo de
alguém ouvir, porque estávamos no vestiário do clube.
— Maravilhoso como eu me lembrava — rosnou sem fôlego. — Estou
perto, tão perto...
Acelerei meus movimentos e apertei suas bolas, deixando-o mais
alucinado. Com um ruído do fundo da garganta, ele gozou na minha boca.
Eu estava com um baita tesão também, mas agora era para ele, não eu.
Precisava mostrar que estaria ali quando ele precisasse de mim.
A nossa conversa seria bem complicada. Não sabia se ele me perdoaria
por ter feito tudo que fiz para protegê-lo, e também por esconder nossa filha.
Esperava que sim.
Capítulo 12
Cativeiro

TABITTA
— O que foi? Está silenciosa — sondou Jason, enquanto me abraçava
de lado e beijava meus cabelos. Nós dois estávamos indo para o hotel onde
ficaria hospedado junto com as pessoas que trabalhavam para ele.
— Estou bem — menti.
— Não faça isso.
— O quê?
— Não minta para mim — pediu. — Sempre que o faz, meu coração
gela, pensando no pior. Antes era fácil ler você, agora não é tanto, isso me
deixa doido.
Eu me encolhi.
— Talvez isso aconteça...
— Tabitta, pelo amor de Deus! — Alterou-se dentro do carro. Foi tão
alto que o motorista dele olhou para nós no banco traseiro. — Você vai me
deixar maluco aqui.
— Não estou falando que eu vou deixá-lo, mas o que direi a você hoje
pode mudar sua opinião quanto a querer ficar comigo. Talvez não me queira
mais. — Minha voz falhou.
— Nada vai mudar, Taby. Eu a amo a ponto de não conseguir respirar
sem você. — Beijou meus lábios.
Eu assenti, mas não respondi; talvez não fosse verdade. A cada segundo
que nos aproximávamos do Hotel Calion, meu coração gelava e minhas mãos
suavam. Nunca me senti assim, nem mesmo quando apontavam uma arma
para mim. Expulsei esse pensamento, ficaria pior se me lembrasse do que
houve em Chicago.
Na suíte do hotel, havia algumas meninas dançando com poucas roupas.
O pessoal que trabalhava para ele estava ali, como o agente Luís, o treinador
Silas, e também alguns colegas de Jason.
Tinha um homem louro com cabelos compridos abaixo dos ombros.
Lembrava-me dele do hospital, quando fui visitar Angelina e Shane. E outro
com cabelos negros e curtos, com roupa social em vez de jeans e jaqueta,
como o cara louro. Também me recordava dele do hospital.
— Ora, ora, quem é essa...
Jason cortou-o com os punhos cerrados.
— É melhor vigiar o que fala, se não quiser precisar de um médico,
Jordan. — Jason me abraçou forte de lado e olhou para os caras. — Esses
são meus amigos, Daniel — gesticulou para o moreno de cabelos negros,
depois apontou para o outro — e Jordan, que vai levar um soco se não parar
de encarar você.
Jordan sorriu, inabalado.
— Estou te olhando não por ser linda, sabemos que isso você é. Apenas
fiquei impressionado por conhecer pessoalmente a mulher que fez Jason se
apaixonar por ela há quase dez anos, e mantê-lo fissurado até hoje — disse,
chocado que alguém amasse uma pessoa por tanto tempo. Decerto nunca se
apaixonou. Adoraria ver isso acontecendo com ele. — Angelina vai amar
saber disso.
Levantei as sobrancelhas.
— Angelina? Por que ela amaria Jason estar com alguém?
— Quer calar a boca, Jordan? Ou eu vou ter que fazer isso? — sibilou
Jason, fuzilando o amigo.
— Deixe-o contar, estou louca para saber o que Angelina tem a ver com
a história — pedi.
— Fizemos uma aposta alguns meses atrás com Angelina... Daniel —
apontou para o seu amigo —, Bryan, Jason e eu.
— Que tipo de aposta? — Angelina participando de uma aposta? Isso
era novo. Desde que a conheci, a menina nunca se arrumava ou saía para se
divertir, o que era um erro, já que a garota era linda.
— Jordan — avisou Jason.
— Não seja estraga-prazeres. — Sorri. — Eu quero saber.
— Nós quatro temos que namorar uma menina durante dois meses. —
Revirou os olhos. — Sem as trairmos, e também levando-as a piquenique e
parques. Um carma, não acha?
Joguei a cabeça para trás e gargalhei por alguns segundos.
— Sério? Oh, vou adorar presenciar isso — disse, entre risadas. —
Não sabia que Angelina era tão espirituosa em propor isso a um bando de
bad boys mulherengos como vocês.
— Ela disse que ia começar por Jason — contou Jordan.
— Até desconfiamos que você fosse a amiga policial que ela
mencionou. Dá para acreditar na coincidência? — Daniel sorriu para mim e
Jason.
— Quanta gentileza dela me arrastar a essa aposta, não é? — Sacudi a
cabeça, ainda sorrindo. Jason me avaliava. — Embora eu fosse adorar os
passeios no parque e piqueniques com você.
Ele sorriu para mim e beijou meus cabelos.
— Eu também adoraria, querida — declarou.
— Devo mencionar que você é mais linda do que ela disse? — falou
Jordan, depois se apressou em explicar após o rosnado de Jason: — Com
todo o respeito, claro.
Revirei os olhos.
— Obrigada, Jordan.
Jason fechou a cara.
— Quero que leve essa festa para outro lugar — ordenou, dirigindo-se
a Silas e seus amigos.
— Não precisa mandá-los embora, apenas vamos para o quarto. —
Peguei sua mão. — Deixe-os fazerem sua festa enquanto fazemos a nossa.
— Já gosto dela — Jordan sorriu, piscando para mim.
Jason me puxou para um quarto, aliás, uma suíte máster, com cama
California king com lençóis brancos, alguns outros móveis, como sofá e
mesas, e uma vista para a cidade.
— Então Angelina fez uma aposta com vocês, hein? — inquiri,
querendo saber o que ele pensava sobre isso.
Ele me puxou e me abraçou forte.
— Sim, mas não estou com você por uma aposta. Sabe disso, não é? —
Beijou-me por um momento.
— Eu sei. Jason, nós precisamos ter a conversa agora.
— Estou tremendo aqui, nunca reagi assim, nem quando vou lutar.
— Desculpe, preciso revelar a verdade, o que houve aquela noite, o
porquê de o deixar, e também outra coisa. Não sei se vai me perdoar. Espero
que sim, porque o amo. — Fomos interrompidos por um grito de criança, o
que fez meu corpo tremer e gelar, pois reconheci a voz.
— Não pode ser! — sussurrei, correndo atrás de Jason, que já estava
indo para a sala.
— Que droga está acontecendo aqui? — rosnou Jason.
Assim que cheguei à sala, me deparei com alguém que não deveria estar
ali. Seus olhos foram do Jason para mim, arregalados.
— Mamãe?
Todos da sala me encaravam, menos Jason, concentrado em Emily. Não
liguei a princípio por ele descobrir sobre ela desse jeito. O pior era que
havia um homem desmaiado e ensanguentado no chão, e, perto da minha
filha, um garoto louro, acho que de uns onze anos, mais ou menos. Emily
segurava um taser que dei a ela.
— O que está fazendo aqui? E quem é esse homem caído no chão? E
esse menino? Por que saiu de casa? Cadê a Samira? — Emendei uma
pergunta atrás da outra. — Responda, Emily.
Ela deu o taser ao menino.
— Descobri que Jason é o meu pai, mamãe. Por que nunca me disse a
verdade? Foi porque ele a abandonou e não queria ficar conosco? — A dor
era evidente na sua voz.
Um ruído sofrido saiu da garganta do Jason. O restante das pessoas
estava em silêncio, em choque ao descobrir tudo.
— Nós vamos conversar sobre isso, mocinha, assim que eu souber
quem é esse homem e por que usou um taser nele. E, ao que parece, seu
amiguinho aqui furou sua mão, porque ainda segura a arma do crime. — O
garoto carregava um estilete. — Quem começa?
— Esse desgraçado raptou minha irmã — disse o menino, pegando uma
foto do bolso e me mostrando. Ela era loura, acho que tinha uns quinze anos.
— Eu estava chegando em casa quando eu vi esse cara a colocando em seu
carro hoje cedo.
— Como veio parar com ele? — sondei, já querendo matar esse filho
da puta por raptar uma garota.
— Fui à polícia, mas eles não ligaram para mim, por ser uma criança.
Então andei pelos bairros caros daqui, já que seu carro era um Maserati. Foi
quando eu o vi e o enfrentei, dizendo que queria minha irmã de volta. O
homem falou que se eu quisesse ver minha irmã, deveria ir com ele. Não
acreditei nele nem um pouco. — Gesticulou a cabeça na direção da Emily.
— Sabia que era malvado. Quando ele viu sua filha, o seu olhar era daqueles
pedófilos, nos ensinaram sobre isso na escola. Não gostei do jeito com que
olhou para ela.
— Eu sei me defender — replicou minha garota.
Fechei a cara para ela, com o meu coração gelado devido ao perigo que
passou e o que poderia ter acontecido.
— As coisas não estão bonitas para você, mocinha. Se for para fazer
gracinha, é melhor ficar calada. Agora eu quero que vocês dois vão para
aquele quarto e fiquem lá até eu chamar. — Apontei para o quarto onde eu
estive com Jason há pouco. — Sem reclamações.
— Mas mamãe... eu queria... — Ela olhava para o Jason, que parecia
uma estátua ali de pé. Emy queria a verdade, mas teria de esperar.
— Agora, Emily! — ordenei. Só usava esse tom quando precisava. —
Depois conversaremos.
Assim que os dois foram para o quarto, virei para o Jason, que me
fitava em transe.
— Entendo que tenha muitas perguntas, e vou responder a todas elas,
mas preciso me livrar desse lixo. — Abaixei-me diante do homem e mexi em
seus bolsos.
— O que está fazendo? — questionou Jordan.
— Preciso achar algo... ah, aqui. — Peguei o celular, a sua carteira e a
chave do quarto dele. Procurei o meu telefone.
— Para quem vai ligar? — indagou o agente do Jason. — Não pode
chamar a polícia daqui do quarto do Jason, se a imprensa souber, será um
desastre. Agora que acalmou sobre o ataque na casa dele, não podemos
encarar mais escândalo.
— Por isso vamos levá-lo para o seu quarto, cuja chave eu tenho. —
Sacudi-a a eles.
— Sua filha é bem valente, não é? — Jordan piscou para mim e Jason,
um tanto chocado. — Acho que puxou a vocês dois. Eu nem acredito que tem
uma filha! Você sabia sobre ela e não nos disse, Jason?
Deixei-o murmurando com Daniel e Jason, e fui virar o rosto do cara no
chão. Olhando para ele, fiquei com mais raiva do que esse maldito queria
fazer com minha filha.
— Algum de vocês pode trazer minhas algemas e minha arma? Estão na
minha bolsa no quarto — pedi, checando sua identidade. — Ora, ora, se não
é Júlio Weston.
— Conhece esse cara? — perguntou Silas, me entregando o que
solicitei.
— Sim, ele está na lista de procurados do FBI. É acusado de
homicídio, sequestro e tráfico humano. — Algemei suas mãos e dei um tapa
na cara dele para acordá-lo, mas o bastardo nem se abalou. — Droga, acho
que o choque foi grande. Podem me ajudar a levar esse filho da puta para o
seu quarto? — Havia cinco homens ali: Luís, Silas, Jordan, Daniel e Jason.
Daniel e Jordan o carregaram. Jason continuava em silêncio esse tempo
todo, acho que furioso e com raiva demais para dizer algo. Eu liguei para o
Papy. Depois eu falaria com Jason.
— Taby, não está de licença? — perguntou Papy ao atender o telefone.
Eu só ligava nesse número quando era trabalho.
Contei a ele tudo o que aconteceu, tanto acerca do cara que tentou me
matar no clube, quanto do bandido foragido Júlio Weston, que queria levar
minha filha com ele. Também disse que ele estava no Hotel Calion
algemado, e pedi para enviar agentes.
— A Emy foi até o hotel para ver o Jason a essa hora da noite sozinha?
— Senti sua voz tremendo.
— Pois é, Papy, mas isso é minha culpa, eu deveria ter suspeitado que
ela estava aprontando alguma coisa, toda entusiasmada, querendo conhecer o
Jason. — Olhei para ele do meu lado, abrindo a porta do quarto e entrando.
— Nós estávamos fazendo uma emboscada para prender esses bandidos
hoje. Júlio e Matias Weston não verão a luz do dia nunca mais — rosnou.
O apartamento era grande e vazio, exceto por um sofá e colchões em
vários lugares. Não desejava nem pensar o que eles faziam nesses colchões
ou eu mataria esse cara antes da polícia aparecer. Apontei para o sofá.
— Coloque ele ali. — Viemos Jordan, Daniel, Jason e eu. Nenhum
deles conversava muito, então o barulho que ouvi ao entrar no apartamento
me fez ver fogo: gemidos, e não de prazer, mas de dor, provenientes do
quarto.
Olhei para os caras ali.
— Papy, fique na linha. Vocês três, me esperem aqui. — Coloquei o
celular no viva-voz e escondi no meu top. Levantei minha arma e fui na
direção do quarto.
— Taby... — chamou Jason à meia-voz. Era a primeira vez que ele
dizia meu nome, depois de tudo. Acho que temia por minha vida.
Eu o ignorei e fui em silêncio ao quarto. O que vi me enojou e me fez
querer matar ao mesmo tempo.
Havia um homem sem camisa e com as calças abaixadas e uma garota
amarrada na cama, sem roupas. Sua boca estava com um pano,
impossibilitando-a de gritar. O medo e o terror eram evidentes em seus
olhos.
— FBI, coloque as mãos para cima onde eu possa ver — gritei. O cara
deu um pulo e já ia pegando sua arma na cabeceira da cama para atirar em
mim.
Eu estava prestes a puxar o gatilho quando alguém deu dois tiros no
peito do cara, que caiu para trás, morto. Vi Bryan com os olhos sombrios e
sua arma em punho. Não deixei de me sentir aliviada por ele ter aparecido,
porque na hora de atirar eu gelei. Não estava preparada para fazer isso de
novo, por isso tanta terapia
— O que faz aqui? — inquiri, olhando ao redor.
— Estava junto com os agentes preparando a emboscada. Devido ao
que aconteceu, tivemos de acelerar as coisas. — respondeu, soltando as
mãos da garota e tirando a mordaça de sua boca. — Vai ficar tudo bem,
somos da polícia.
A menina chorava e se cobriu com o lençol.
— Eles chegaram a... — sondei.
— Não, vocês apareceram a tempo de impedir. Obrigada. — Parecia
agradecida e aliviada.
— Tudo bem. — Não falei sobre seu irmão, achei melhor esperar. Era a
mesma garota que vi na foto do menino no apartamento do Jason. Ainda bem
que impedimos uma catástrofe.
— Há mais meninas ali dentro. — Ela apontou para uma porta do lado
direito do quarto. — E alguns homens com elas.
Bryan e eu corremos para a porta. Meus nervos travaram vendo umas
sete meninas entre doze e dezessete anos, todas encolhidas lá dentro, em
cima de colchões sem lençóis. E os caras em pé, vestindo as calças; acho
que ouviram os tiros. Duas garotas estavam machucadas.
— Oh, Deus! — exclamei. — Papy, olhe isso. — Mandei fotos das
garotas em cativeiro para ele e dos homens que procurávamos: políticos e
alguns empresários.
— Estamos entrando no prédio — respondeu.
— Algumas não parecem ser dos Estados Unidos, precisamos contatar
as embaixadas de seus países. — Meu coração sangrou só de pensar que
minha filha poderia ser uma delas, com algum desgraçado abusando dela.
Bryan mandou todos se deitarem no chão e os algemou.
— Vamos ver como aparecerá amanhã na TV. “Senador foi pego com
menor de idade em cativeiro’’. Sabe qual é a parte boa disso tudo? Você não
vai ver a luz do dia nunca mais, seu traste! — Virei para as duas meninas
machucadas: — Qual deles fez isso com vocês?
Apontaram para um cara alto, parecia que lutava boxe; era um político
também.
— Solte-o, Bryan. Vamos ver se ele gosta tanto de bater em mulher me
enfrentando mano a mano.
— Isso não vai acontecer — rosnou Jason, entrando no local e arfando
vendo os homens e as garotas encolhidas no canto, chorando. — Você ainda
não se curou da ferida, e se um filho da puta desses a tocar, eu o mato, Taby.
Sabia que ele faria isso mesmo, logo, deixei Bryan resolver tudo
enquanto o resto dos policiais não chegava. Voltei para a sala bem a tempo
do outro filho da puta acordar.
— Que droga é você? — Júlio piscou, amarrado.
— FBI, você está preso. — Dirigi-me a Daniel, Jordan e Jason, que
estavam do meu lado ainda com os olhos arregalados: — Voltem para o seu
apartamento e me esperem lá. O FBI e a polícia estão a caminho,
provavelmente a imprensa também. Não quero o nome de Jason no meio
desse falatório, com políticos abusadores de menores.
— Não vou deixá-la — disse ele. Olhou sombrio para o homem no
sofá. — Ainda mais com esse crápula e os caras presos naquele quarto.
— Ela não estará sozinha, Jason, lhe farei companhia. E você não pode
ficar aqui. Retorne ao seu apartamento. Assim que terminarmos, ela voltará.
— Bryan entrava na sala. Virou-se para Jordan e Daniel: — Levem ele antes
que seja tarde demais.
Os dois foram para perto do Jason e pegaram o seu braço. Ele não se
moveu; seus olhos estavam em mim, com medo de me perder, não sabia se
para a morte ou por tudo que houve entre nós.
Segurei seu rosto em minhas mãos e olhei dentro de seus olhos.
— Vou ficar bem, prometo, não vou lutar com nenhum deles, juro. Cuide
de Emily para mim, ok? Daqui a pouco estarei lá e poderemos conversar
direito, tudo bem?
Ele tremeu o canto da boca e assentiu, saindo com seus amigos. Encarei
o cara no sofá.
— Estou sangrando, me leve ao hospital — pediu.
Eu ri.
— Está ouvindo isso, Bryan? Ele quer um hospital. O que acha que
somos? — Amarrei seus pés um no outro; suas mãos já estavam algemadas.
Fitei-o com frieza.
— Quantas das meninas naquele quarto disseram que estavam com dor
ao serem violentadas? Quantas gritavam, chorando, pedindo por
misericórdia? — Peguei suas bolas e apertei forte. Ele berrou de dor. —
Quantas, hein, seu filho da puta?
— Você é louca? — Ofegou. — Se são policiais, por que estão fazendo
isso? Eu vou processá-los.
— Oh, me processar? Se eu não tivesse prometido ao meu namorado
que não lutaria com ninguém, adoraria enfrentá-lo e vê-lo sangrar, verme
maldito, assim como todas as meninas que sequestrou, inclusive a minha
filha, minha bebê, que você queria trazer para cá, para estes monstros. —
Apertei mais o seu pau por cima da calça, enquanto ele uivava.
Bryan chegou com uma faca afiada de cozinha nas mãos. Júlio arregalou
os olhos.
— O que pensa em fazer? — Arquejava. — Oh, porra, sinto muito pela
sua filha, seja ela quem for.
— A criança do elevador, lembra? Ela tem oito anos e você ia
sequestrá-la. Sabe a raiva que me dá ao pensar nisso? O que me dá vontade
de fazer? Talvez, se cortasse suas bolas, você não estupraria mais meninas
ou as sequestraria para dar a caras como esses malditos que estão presos
naquele cômodo — rosnei. — Grite, ninguém vai ajudá-lo.
— Seu irmão está morto, agora vamos aliviar a dor de ter suas bolas
esmagadas ou arrancadas. — Bryan alisou a faca afiada.
Claro que não faríamos isso, mas ele não precisava saber. Até eu fiquei
espantada com minha raiva desses vermes, mas só de pensar no perigo que
minha filha correu, me encolhia por dentro.
— Queremos respostas, e você as dará a nós. — Não era um pedido do
Bryan. O cara era alegre quase sempre, contudo, algumas vezes, detectava
algo sombrio através dos seus olhos azuis.
Apertei mais as bolas do Júlio, que gritou. Ficaria dolorido por
semanas, o que era bom: todo sofrimento para ele era pouco.
— Eu falo, apenas tire essa mulher louca de perto de mim...
Eu me afastei um pouco e sorri, satisfeita. Ele nos entregou todas as
bocas de tráfico humano da cidade e de vários outros lugares. Os dois, e
mais alguns homens, estavam envolvidos nisso. Deu nomes de políticos e
famosos, os que foram pegos ali.
Os agentes e a polícia chegaram e os levaram embora, um morto e o
outro vivo — conhecendo Sebastian, não por muito tempo, já que ele deu
com a língua nos dentes. Deus me perdoe, mas não tinha dó desse tipo de
gente. Podia até estar sendo antiprofissional, mas era o meu jeito de resolver
as coisas. Os crápulas deputados e senadores também foram detidos; a
perícia examinaria o local para descobrir o que mais houve lá.
As meninas foram levadas ao hospital para fazerem acompanhamento
médico. Após, seriam enviadas às suas famílias.
Quando acabei de dar meu depoimento, o garoto foi levado para junto
da irmã, e ligaram para sua mãe.
Concedi uma entrevista a uma TV, pondo em ação o plano que sabia que
ia funcionar. A carta já tinha sido jogada, agora era só esperar o resultado.
Fui para o apartamento do Jason. Ele estava sozinho, os seus amigos
tinham ido embora.
— Acabou? — sondou, me olhando de cima a baixo. Enxergou sangue
em mim. — Está machucada? O corte abriu? Você prometeu que não lutaria
com nenhum deles.
Neguei com a cabeça, indo até o quarto. Ele me seguiu.
— Não lutei, juro. O sangue não é meu. — Fui ao banheiro e tirei
minhas roupas, precisava ficar livre do cheiro de podridão daqueles
monstros.
Escorei-me na parede e chorei, sobrecarregada pelas meninas que
tiveram suas inocências perdidas, por minha filha que quase foi uma delas e
pela dor que Jason estava passando agora por minha causa.
— Taby... — A impotência se fazia presente em sua voz ao se agachar
na minha frente e me puxar para os seus braços.
— Elas são apenas crianças e tiveram sua inocência roubada por
aqueles bandidos... — gemi, agarrando sua camiseta. Tentei tirá-la, mas ele
me impediu.
— Taby, não. Está querendo fazer o mesmo que eu no clube, tudo por
medo de perdê-la. — Pegou meu rosto nas mãos e olhou bem no fundo dos
meus olhos. — Eu me lembro de tudo que houve naquela noite, depois da
boate, na minha casa, cada coisa que disse. Não vou deixá-la por não me
dizer que tivemos uma filha. Ela é minha filha, não é? Porque se parece
comigo.
— Eu nunca estive com nenhum outro homem, apenas você — sussurrei.
— Eu te fiz essa promessa na nossa última noite, prometi que nunca deixaria
ninguém me tocar. Eu a mantive.
— Oh, Deus, Taby! — Expirava para se acalmar e controlar a dor que
sentia. Queria poder acabar com ela, mas não era capaz. — Sinto muito.
Desculpava-se por ter quebrado a sua promessa, e eu mantido a minha.
Mas fui eu quem o abandonou e o deixou lidar com a dor sozinho.
— Não precisa sentir, Jason. No momento em que o deixei, sabia que
isso ia acontecer, era inevitável. — Eu me encolhi ao pensar nele e nas
mulheres que teve.
Desligou a água, me secou e me enrolou na toalha. Depois, segurou
minha mão e me puxou para a cama, onde Emily dormia. Já passava das três
da madrugada.
Vesti uma camiseta dele e um short que ficou maior do que eu. Jason
deitou-se de um lado da nossa filha, e eu do outro. Beijei seus cabelos.
— Oh, Deus! Se algo tivesse acontecido com ela... — Chorei.
Chegou mais perto e abraçou nós duas.
— Não aconteceu nada, então não fique pensando nisso tudo. — Alisou
meu rosto, limpando as lágrimas. — Não suporto vê-la chorando. Vá dormir
um pouco.
— Preciso te contar o que aconteceu aquele dia... — Minha voz saiu
fraca, estava sem energia. Foi um dia longo, o mais longo da minha vida.
Mas eu estava aliviada por ter as duas pessoas que eu mais amava nos meus
braços.
— Amanhã conversaremos. — Beijou meus lábios. — Amo você.
— Eu também amo vocês dois... — Estava dormindo antes de terminar
de falar.
Capítulo 13
Acerto de contas

JASON
Não preguei os olhos essa noite, observando as duas mulheres da minha
vida. Taby já era há quase dez anos, a partir do momento em que a vi.
Naquele dia, ela se tornou meu mundo inteiro. Agora, vendo minha filha, uma
filha que eu nem sabia que eu tinha... Seus cabelos castanhos, pele branca e a
maçã do rosto arredondada, cílios grandes e negros, e olhos iguais aos meus.
No clube, lutei mal porque minha cabeça não estava no ringue, e sim no
que Taby disse. Temia que ela estivesse me deixando, assim como foi nos
meus sonhos, ou melhor, pesadelos, que tive desde a hora em que ela falou
que revelaria a verdade sobre o que aconteceu naquela noite, e que isso
poderia nos afastar.
Nunca pensei que meu coração fosse se amedrontar por quase perdê-la
várias vezes em uma única semana para a morte. Quando aqueles bandidos
atiraram em nós dois na nossa casa, temi por sua vida, ao mesmo tempo que
queria acabar com aqueles filhos da puta.
Depois, quando ela foi baleada em Chicago, e no dia anterior, com
aquele homem no clube... Eu ia dar mais que um murro nele, só não o fiz por
ela. E mais o que houve aqui do lado, no outro apartamento.
Ser policial acarreta riscos, mas isso já era demais. Queria que ela
retomasse o plano de se tornar professora, como foi sempre seu sonho. No
entanto, vi que as coisas mudaram. Por que não escolheu uma profissão
menos arriscada? Se toda vez que ela saísse pela porta eu ficasse
preocupado com o que aconteceria, envelheceria antes do tempo ou surtaria.
Meus nervos estavam tão rígidos ontem que não consegui adormecer,
pensando no perigo que as duas correram. Graças a Deus, estavam em
segurança nos meus braços, a minha mulher e a minha filha, Emily.
Sentado no sofá, esperava Tabitta chegar da sua casa. Ela foi lá deixar
Emily com Samira e falar com seu pai, que estava na cidade. Taby o
chamava de Papy, embora seu nome fosse Thomas. Não sei bem a história,
mas parece que ele era como um pai para ela. Gostei de minha preciosa ter
encontrado pessoas que a amavam e a protegiam, como esse Thomas e sua
esposa, Sandra.
Emy ficava com Samira, uma garota muito legal e doce, pelo que notei
dela quando foi ali. Eu disse que não precisava mandá-la para casa, porque
já estive longe da minha filha tempo demais, oito anos sem ela. Tabitta
insistiu, então supus que nossa conversa não seria nada fácil. Eu estava
nervoso com o que ela iria me contar.
Fui até a cozinha, peguei uma garrafa de whisky e um copo e caminhei
para a sala, de modo a esperar por ela. Liguei a TV e me deparei com Taby
dando uma entrevista, falando das meninas que foram achadas, e que mais
uma rede de tráfico humano e prostituição foi fechada.
Tabitta e Thomas se encontravam perto um do outro. Ela estava séria e
com raiva, podia ver nos seus olhos através das câmeras.
— O que vocês pretendem fazer para acabar com o tráfico humano e as
casas de prostituição infantil? Os envolvidos eram somente esses dois
homens e aqueles políticos? — A repórter citou os nomes dos caras que
foram presos.
Ela olhou para a câmera, como se quisesse dar um recado a alguém.
— Pretendemos acabar com essa corja de bandidos que usam crianças
para ganhar dinheiro. Escute, seu crápula, o pegarei, não importa onde esteja
escondido. Vou prendê-lo e você nunca mais verá a luz do dia.
— Então realmente já sabem quem está por trás disso tudo? Vocês
podem dizer o nome? — A repórter sondou.
Ela assentiu.
— Sabemos sim, seu nome é Sebastian Ruiz, um homem perigoso,
capaz de tirar a vida de alguém em um segundo. Mas vamos pegá-lo e fazê-
lo pagar por tudo — declarou com firmeza.
— Assistindo à minha entrevista? — perguntou, entrando na sala.
— De um a dez, o quanto seu pai, que você provocou em num programa
de TV, é perigoso? — Coloquei a garrafa na mesinha de centro, e fiquei com
o copo cheio de bebida. Desliguei o aparelho.
Ela suspirou e sentou-se perto de mim no sofá.
— Mil, e ele não é meu pai, Papy é.
Ofeguei de pavor.
— E você o enfrenta assim, em público? Ele com certeza verá isso, não
é?
— O que queria que eu fizesse? — Pegou o meu copo e bebeu o resto
em um gole. — Por culpa desse cara, eu fiquei longe de você. Por culpa
dele, milhões de adolescentes com um futuro pela frente perderam seus
sonhos. Ele sequestrou essas meninas e as levou para longe de suas casas, de
suas cidades, e até de seus países, para forçá-las a vender seus corpos.
— Ele queria que ficássemos separados, por isso você foi embora?
— Vou te contar tudo que houve aquela noite — sussurrou. Primeiro,
falou sobre estar de saída de sua casa quando apareceram e mataram sua
avó.
— Espere, ele assassinou a sua avó? — a interrompi, chocado.
Encontrava-me tão absorto em felicidade por tê-la de volta que esqueci de
perguntar onde sua avó estava. — Mas eu voltei lá no dia seguinte e não
soube de morte alguma. Todos pensaram que vocês saíram da cidade para
nunca mais voltarem, por isso espalhei câmeras em Austin, para ver se
retornariam algum dia.
Ela se encolheu no sofá.
— Sim, ele a matou e depois sumiu com o corpo dela. Eu não podia ir à
polícia, já que ele é chefe de um cartel mexicano e teria várias pessoas
compradas lá. Além disso, não havia um corpo.
Não acreditava que a dona Margareth estava morta. Lembrava-me de ir
àquela tarde pedir a mão da Taby em casamento. Ela nem por um minuto
hesitou em dá-la a mim, um rapaz que só tinha um emprego em uma academia
e treinava para ser um lutador um dia. Sua avó não ligou para isso, ela me
aceitou para sua neta, concedendo sua benção a nós.
Meu coração se apertou ao saber o quanto Taby sofreu sozinha. Ela se
manteve pura, e eu fiquei com centenas de mulheres no intuito de esquecê-la.
Quando pensava nisso, sentia ódio de mim mesmo.
Ela relatou os seus minutos de agonia ao fugir deles, e também a sua
escolha por minha proteção, porque não me queria morto. E continuou com
seu relato nos mínimos detalhes.
— Dom te ajudou a me dopar para você se afastar de mim? — rugi
depois que ela me revelou toda a verdade. A dor que teve de enfrentar sem
auxílio, com a perda de sua avó e a descoberta de que seu pai era um
assassino e a queria com ele para fins desumanos...
Terminou afirmando que sofreu todos esses anos por ter me escondido a
verdade sobre me abandonar e a respeito de nossa filha.
Eu estava com raiva, e não dela, como Taby esperava e temia, e sim de
alguém que pensei ser meu melhor amigo, por quem entraria na frente de uma
bala.
Ela se encolheu com minha fúria, mas se apressou em explicar:
— Dom fez o que fez para protegê-lo, Jason. Ele sabia do que
Sebastian era capaz, até já tinha ouvido falar dele, acho que daqueles caras
mal-encarados com quem saía.
Eu me levantei, furioso, com os punhos cerrados.
— Não, Taby, ele era meu melhor amigo, devia ter me dito a verdade,
entende? Eu merecia saber. Você estava sofrendo sozinha em algum lugar
deste mundo, grávida, tudo por ele não me dizer a verdade.
Ergueu-se também e ficou na minha frente.
— Jason, por favor...
Sacudi a cabeça, tentando clarear minha mente. Confiava nele
cegamente. O quanto chorei e sofri após a partida dela... Ele estava lá,
presenciando tudo, e não fez nada. A mulherada que eu fodia para abafar a
dor, enquanto ele sabia que Taby me amava, e o porquê de ter partido.
Oh, Deus! Eu não a merecia, não merecia essa mulher que sacrificou
tudo por mim. Ela fazendo o impossível para a minha proteção, e eu fodendo
o mundo inteiro no intuito de esquecê-la, esquecer a única que já se
preocupou comigo e me amou de forma incondicional. O que ela sacrificou,
e o que eu fiz?
— Eu não mereço você. — Afastei-me dela me sentindo imundo, um
canalha egoísta que não merecia nem estar na sua presença.
Virei e saí do prédio com ela gritando atrás de mim para eu esperar e
me acalmar. Eu não precisava ficar calmo, precisava era quebrar a cara de
um traíra que me enganou por quase nove anos, nove fodidos anos.
Estacionei o meu carro em frente ao clube dos MCs. Estava irado e
doido para matar o meu ex-amigo.
Entrei no clube pisando forte e vendo tudo embaçado, tamanha era
minha fúria por aquele falsário. Passei pelo garoto na porta, ignorando
quando ele me saudou. Todos ali me conheciam, afinal, sempre que podia
passava lá.
Entretanto, nunca fiquei com nenhuma prostituta do lugar. Até pensei em
ficar uma vez, mas o bastardo sabia da verdade sobre Taby, e provavelmente
por isto não deixou. Mas isso não mudava nada, porque peguei várias
mulheres. Porra! Porra.
Assim que entrei no clube, me deparei com vários MCs: Nasx, Daemon,
Kill e outros. Todavia, procurava apenas um, que estava sentado no sofá
perto de uma ruiva exuberante. Ela não parecia ser prostituta, não mesmo.
Ele se levantou e sorriu ao me ver, porém, o sorriso sumiu ao notar a
minha cara de fúria; acho que fúria era pouco, estava mais para serial killer,
parecia até o Kill (ou melhor, Michael, seu nome real). O bastardo era um
cara de coração frio; pelo menos era o que sua expressão demonstrava.
— Jason, o que... — interrompeu-se quando soquei sua boca e o sangue
jorrou. Ele cambaleou para trás. Alguns caras tentaram me parar, mas
derrubei todos. Armas e facas foram apontadas para mim. Não liguei: peguei
o Dom pelo colete e olhei em seus olhos.
— Solta-o ou eu vou atirar — rosnou alguém com quem não me
importei.
— Ninguém atira — ordenou Dom.
— Mas esse louco vai matar você! — sibilou a ruiva, irritada comigo.
— Quando descobriu? Ela te contou? — sondou, sem nunca desviar os
olhos de mim.
Eu o prendi na parede e soquei seu estômago com força; ele gemeu.
Sentia alguns caras se aproximando.
— Ninguém entra nesta briga.
Seu clube inteiro estava doido para atirar em mim. Eles matariam e
levariam um tiro por Dom, como eu também teria levado um dia.
— O quê? Que meu melhor amigo me traiu, porra? — Dei mais um
soco. — Eu confiava em você com a minha vida! — E outro.
Ele não estava se defendendo, apenas apanhava calado, exceto pelos
gemidos. Seus amigos queriam impedir, mas não o fariam, porque seguiam as
ordens de Dom, já que ele era seu chefe. Eu só não sabia dizer da ruivinha
brava.
— Não vai se defender? Só vai ficar aí levando? — Joguei-o em cima
de uma mesa de sinuca e peguei o taco de bilhar. — Eu confiei no meu
amigo, e o que você fez? Ajudou ela a me deixar, e tudo para quê? Você se
interessou por ela? Por isso a ajudou a se livrar de mim?
Sentou-se na mesa e limpou o sangue que escorria pela sua boca.
— Você é louco? Nunca me interessei pela Tabitta, ela sempre foi uma
amiga para mim, assim como você, Jason.
Eu ri com desdém.
— Amigo não faz o que você fez, não deixa uma mulher colocar seu
amigo para dormir, depois o leva embora e a abandona grávida de uma filha
dele para se virar sozinha, porra! — Minha carne tremia devido à raiva que
me consumia.
— Grávida? Ela não me disse isso. — Havia dor em seus olhos. — Se
quer tanto me matar, me mate logo, cara. Não acho que socos são suficientes
para me fazer pagar por ajudar Taby. Se quiser acabar com a minha vida,
fique à vontade, ninguém vai impedir.
— Não conte com isso. — A ruiva me peitou com um olhar homicida.
Após, virou-se para o Dom: — Se ele o ferir mais, vou acertá-lo, e não
perderei uma noite de sono com isso.
A ruiva tinha cabelos anelados e íris cor de ouro.
— Então, quer me enfrentar? Pode vir, seu filho da puta, não tenho
medo de homens fodões como você — sibilou, com uma adaga em cada mão,
pronta para atirar.
Eu estreitei os olhos.
— Esta é a linha que você não pode ultrapassar, igual me falou uma
vez. — Dom olhou para a ruiva e depois para mim. — Ela é a linha que
ninguém cruza.
Fuzilei-o.
— Você cruzou essa linha quando a deixou ir embora e não me contou
nada. — Dei mais um soco na sua cara. — Seu bastardo!
— Dom! — gritou a ruiva, chorando, prestes a atirar suas adagas, mas o
tiro veio antes.
Congelei pensando que alguém tinha atirado em mim. Não senti dor
nenhuma, mas o espelho do lado de nossas cabeças se espatifou em milhares
de cacos de vidro.
Todos observavam a porta da frente, com suas armas direcionadas para
lá também. Surpreendi-me vendo Taby, que também segurava uma arma nas
mãos.
— Abaixe a sua arma agora — rosnou um prospecto, querendo bancar o
machão.
No clube dos MCs, existia uma hierarquia: prospecto, quando se está
iniciando para se tornar um motoqueiro MC com colete e tudo; vice-
presidente, igual a Nasx; e presidente, como o Dom. Ele era o cabeça do
grupo.
Eu me esqueci do Dom e da minha raiva por ele, e fui até ela, que
parecia não ligar para mais de vinte armas apontadas para si. Eu já estava
ficando louco, porque se alguém atirasse nela, não sabia o que faria.
Morreria ou iria para a cadeia, porque ninguém a machucaria e sairia vivo.
— Ninguém atira — ordenei aos caras sombrios.
Taby riu, ignorando-o e fitando o garoto.
— Quantos anos têm? Dezesseis? Sua mãe sabe que está aqui, menino?
— zombou.
O garoto inflou o peito.
— Tenho dezenove anos e não preciso da autorização da minha mãe
para fazer o que quero. — Ainda apontava a arma para ela.
— Você possui licença para ter uma arma? — Ela não conseguia ver as
coisas e simplesmente deixar seu lado policial de fora. Fez o mesmo comigo
na minha casa, checando a procedência da minha coleção de armas.
Taby sorria inabalável, como se esses homens fossem brincadeira de
criança. Ela abaixou sua arma.
— Eu, ahm... — Piscou, meio chocado, buscando o Dom atrás de mim.
Com certeza não possuía porte.
— Todos abaixem as porras das armas — ordenou Dom, gemendo de
dor. — Tripper, você também.
— Espere, Tripper é nome ou apelido? — indagou Taby ao garoto, que
já tinha abaixado sua arma.
Tripper sorriu para ela.
— Apelido.
Ela assentiu e olhou para todos ali.
— Eu deveria prendê-los por não terem licença para armas de fogo.
— O que está fazendo aqui? — perguntei.
Ignorou-me e falou num tom de acusação:
— Vejo que descarregou sua raiva. Compensou viajar quase doze horas
para acertar as contas com Dom?
— Não cheguei nem perto de liberar toda minha raiva. — Eu podia ter
ido de avião, mas eu precisava pensar, então fui de carro.
— Certo. — Seu tom era seco. Ela deu a arma para Tripper, que
arregalou os olhos, principalmente quando tirou sua jaqueta e ficou só com o
espartilho, que deixava meus lindos bebês arrebitados.
— Não use essa arma, agora ela tem suas digitais. — Piscou para ele.
O garoto ofegou.
— Como sabe tanto sobre porte de armas e digitais? Você é algum tira?
— Acertou na mosca, Tripper.
Todos arfaram em sincronia perfeita, espantados. Olhavam para o Dom
como se buscassem respostas às suas perguntas mudas.
— De que departamento você é? — questionou Tripper.
Ela sorriu.
— FBI, e estou fora da folha de vocês — falou com um revirar de
olhos.
Ouvi maldiçoes de todos os lados, mas não do Dom. Ele sabia o que
ela era, só podia saber, não tinha como o cara ficar tanto tempo no escuro.
— Relaxem, não estou aqui em busca de nada ilegal. Mas devo apontar
que isso não parece faltar. Estou certa?
— Vai nos prender? Porque só vai revistar o lugar se tiver um mandado
de busca — disse Kill com seu olhar mortal e frio. Quando o conheci, eu me
perguntava às vezes se ele era mesmo humano. — Por que o maldito FBI
mandou uma va...
Cortei-o, cerrando os punhos.
— Termine essa frase e vou esquartejá-lo com as suas próprias facas
— sibilei. Tinha cabelos negros na altura dos ombros e barba por fazer. Foi
andando para mim, assim como eu ia para ele, para enfrentá-lo. O clube
inteiro ficou paralisado, apenas Dom deu um suspirou frustrado.
— Michael — chamou uma voz atrás dele. — Eu não posso ficar um
segundo longe e você já quer acabar com alguém?
Era uma garota pequena com um vestido florido, cabelos negros com
tranças nas costas e olhos verdes. Conheci Michael no clube de luta em
Cambridge, há alguns anos, quando estudava em Harvard. Ele namorava
Isabelle, uma garota doce e gentil. Fiquei sabendo que os dois se separaram
há quase cinco anos. Depois disso, ele bebia direto e se tornou mais sombrio
e mortal do que já era. Não éramos bem amigos, só colegas.
Ele sorriu para ela, guardando suas adagas nos bolsos da calça.
— Isy! — Pegou a baixinha nos braços e a levantou do chão, beijando
sua boca, esquecendo que nós estávamos ali.
Nessas horas, via que Michael era humano, embora parecesse ter algo
amedrontador nele — não igual ao passado, claro, quando perdeu Isy. Já vi o
mesmo no Lucky antes da Sam entrar em sua vida, e também via às vezes no
Bryan. Ele usava aquela máscara de garoto extrovertido, mas havia sombras
mortais em seus olhos; o abismo estava lá, o afogando a cada dia. Eu só não
sabia o porquê.
Vivendo com Dom por anos, fiquei bom em lê-lo. Talvez pelo peso da
culpa todo esse tempo, mantinha uma expressão mortalmente fria para quem
não o conhecia, por isso seu apelido era Shadow.
— Tio Jason — chamou uma coisinha minúscula, puxando minha
camisa. — Você veio aqui para me ver?
Olhei para baixo e me deparei com um monte de cabelos negros e um
par de olhos verdes. Ela sorria para mim. Eu sorri também, pegando Bella
nos braços.
— Oh, coisa pequena, como você está, querida?
Então ela contou que seu papai lhe comprou um cachorro. Michael
criando um cão? Essa eu gostaria de ver. Reparei que todos me olhavam,
tanto os MCs como Taby.
— O que foi? — perguntei.
— Desde quando a conhece? — Michael, confuso, fitou Isy, que já
estava no chão ao seu lado.
— Tio Jason bateu nos caras maus que queriam machucar mamãe e eu
— falou Bella antes de Isy.
— Caras maus? Isy? — indagou Michael, taciturno.
Suspirei e coloquei-a no chão.
— Princesa, pode ir brincar... e, hum, me deixe falar com seu pai e sua
mãe? — pedi.
Ela cruzou os bracinhos.
— Não pode bater no meu papai, ele é bom, não é um cara mau. Ele
disse que me ama até a lua.
Sorri para ela.
— Você é uma coisinha linda. — Eu me agachei à sua frente e coloquei
seus cabelos volumosos atrás da orelha. — Juro não brigar com seu pai, tudo
bem?
Bella sorriu e assentiu. Foi até Michael, que a pegou nos braços e a
beijou em ambos os lados da bochecha, fazendo-a rir de cócegas devido sua
barba grande. Depois, ela saiu para a porta da cozinha. Michael olhou para
mim e Isy.
Contei a ele que estava em Dallas para uma luta, andando no meu carro
para o hotel, quando três caras cercaram uma mulher e uma criança. Não
sabia que era Isy até acabar com os caras.
— O que eles queriam? Era gente do Berry? — sondou Michael.
Ela suspirou.
— Acredito que sim, porque um mês depois Bella foi sequestrada e eu
vim parar aqui. — Ela se encolheu, e ele colocou o braço direito à sua volta.
Michael assentiu e me olhou, agradecido.
— Obrigado por salvar minhas duas razões de viver — falou, mirando
Isy e na direção da porta onde Bella se foi.
— E eu, onde fico nisso? — arrulhou a ruiva perto do Dom, magoada,
mas parecia estar brincando.
— Você também, minha preciosa. — Sorriu para ela. Ele estava com
Isy e essa ruiva com Dom, então o que diabos era isso? Algum tipo de orgia?
— Evelyn é irmã do Michael — disse Dom, vendo minha confusão.
Lembrava-me de Dom mencionar uma vez que a família de Michael foi
morta e, sua irmã, sequestrada. Bom, ficava feliz que os dois tenham se
reencontrado. Deve ter uma história bem interessante envolvida nisso, uma
que não estava a fim de saber agora. Talvez depois, com menos raiva.
— Tremo só de pensar no perigo que você correu todos esses anos
sozinha, longe de mim, e tudo para quê? Para eu não matar meu presidente?
— Seu tom agora era mortalmente frio.
— Bem-vindo ao clube. A sua foi embora para você não matar alguém,
já a minha se foi para eu não morrer. — Trinquei os dentes para o Dom, com
minha ira crescendo de novo.
— Cadê aquelas mulheres que engravidam dos homens para prendê-
los? — falou Nasx, sorrindo, acho que para aliviar a tensão. — Não que eu
queira isso acontecendo comigo. Portanto, crianças, usem proteção.
Taby deu um suspiro frustrado, ignorando-o, e veio na minha direção.
— Você quer descarregar a raiva? Então lute comigo. Afinal, nós dois
que mentimos para você. Eu o deixei, e ele ajudou, então lute, porra —
gritou.
Ofeguei de pavor e pesar; só de imaginar alguém a machucando, ficava
grilado, até se fosse eu mesmo.
— Não vou lutar com você — disse a ela. — Jamais faria isso.
Taby meneou a cabeça.
— Não vá me dizer que tem medo de lutar com mulheres. — Enxerguei-
a passar rápido por mim, depois minhas costas bateram no chão duro de
cimento.
Arquejei com a dor nas minhas costelas. Antes que eu recuperasse o
fôlego, ela montou em mim e começou a socar meu peito. Porra! E que
socos.
— Reaja, seu bastardo, não quer descontar a raiva? Então revide —
rosnou em cada pancada.
Ouvi várias pessoas rindo, inclusive a ruivinha e o bastardo do Nasx,
que parecia uma gralha maldita.
— Luta de Jason Falcon ao vivo, e eu nem preciso pagar por isso —
Nasx cacarejou feito uma galinha. Como se ele pagasse para assistir às
minhas lutas. Todos meus amigos tinham passe livre aos eventos.
— Isso, loura, acerte seu pau e o esmague para nunca mais funcionar
com nenhuma mulher — gritou a ruiva para Taby, enquanto eu grunhia com
os socos.
Taby parou por breve segundo e olhou para Evelyn com um sorriso.
— Não posso machucar seu pau, preciso dele para me dar vários
orgasmos.
Mais gargalhadas na sala. Aproveitei sua distração e a rodopiei sem
machucá-la, colocando-a de costas, comigo por cima, e prendendo-a com as
mãos para cima e suas pernas presas às minhas.
Ela me fuzilou, tentando se soltar.
— O quê? Só vai me prender no chão? Lute comigo, não é isso que
você queria?
Respirei fundo.
— Sim, mas não com você. Droga, Taby, por culpa dele, você sofreu
sozinha, enquanto eu...
— Então é esse o problema — sibilou. — Me solte.
— Vai me atacar de novo?
— Não — grunhiu, mostrando os dentes, tão linda que só queria beijá-
la.
Eu a libertei e me levantei, pegando seu braço para erguê-la também.
Ela até pareceu esquecer que levou um tiro há nem uma semana. Ficou na
minha frente, ainda irritada.
— Essa é a causa da raiva, e não por Dom me ajudar, não é? Está se
culpando porque não fiquei com nenhum homem depois de você, enquanto
você ficou com toda a população feminina do país? — Se suas palavras
fossem facas, eu estaria todo cortado.
— Ele sabia da verdade, devia ter feito algo... para eu não...
— Sair fodendo tudo que se movia em uma tentativa de tirar sua dor?
Se você está grilado com isso, então vamos ver... — Olhou para os homens
dali. — Quem daqui é solteiro e quer transar comigo?
Todos arregalaram os olhos e não disseram nada.
— Oh, cacete, isso não está acontecendo — xinguei, frio igual a uma
geleira.
Ela me fitou, venenosa.
— Não é esse o seu problema? Sua culpa te comendo vivo? Se é por
isso, fico com vários homens e estamos quites, o que acha?
Ofeguei pensando nela com outros. O que eu achava? Ela era louca de
perguntar isso? Tentei me acalmar, mas estava difícil.
Por sorte, nenhum dos caras disse nada. Deviam entender que briga de
casal ninguém se mete. E minha paciência não estava boa, caso isso viesse a
acontecer. Eu conhecia a maioria dos homens dali, eles me respeitavam e
vice-versa. Até o Nasx que sempre foi brincalhão ficou quieto.
— Isso não está acontecendo, Taby — repeti com ferocidade. — E não
é só por isso, bati nele porque Dom mereceu, tanto que não se defendeu. —
O cara permanecia calado, sentado em um sofá. — Garanto que se fosse a
ruiva, se ela e eu fizéssemos o que vocês dois fizeram, ele reagiria da
mesma forma. — Meus olhos varreram dela para ele, encolhido no sofá,
respirando mal pelos ferimentos (merecidos).
— Você acha que eu me juntaria a um verme como você? — rosnou
Evelyn, me fuzilando e dando um passo até mim com os punhos cerrados.
Dom pegou seu braço e a puxou para ela sentar ao seu lado, gemendo no
processo.
— Evy, se controle, mulher, você não pode atacar um homem forte no
mano a mano. Se ele a machucar, um de nós dois teria de matar o outro. E
não estou a fim de assassinar um irmão.
Bufei.
— Não bato em mulheres, você deveria saber disso — retruquei.
Evelyn olhou para mim e sorriu. Essa garota era outra coisa, sua boca
atrevida e com garras de leoa, havia motivos para Dom ter sido domado por
ela, o que era praticamente um milagre. Bem, milagres aconteciam, até Ryan
também foi domado.
— Pois eu bato com maior prazer em homens. Quer experimentar? —
Dom a segurava firme pelo braço, impedindo-a de vir até mim.
Taby riu. O som que eu amava. Gostei de vê-la sorrindo, sempre que
mencionávamos ou ela ouvia das mulheres que tive, ela sofria. Fiquei
contente que a ruiva a fez sorrir, mesmo sendo às minhas custas. Essa era
minha maior tristeza: não podia mudar o passado, não podia mudar o que fiz.
— Você é das minhas, porque eu também bato em homens, pergunte a
todos os caras que já prendi. Aposto que não terão filhos por muito tempo,
incluindo o último, cujas bolas esmaguei. — Parecia deliciada com isso.
— Espero nunca ser preso por você, então. — Nasx sorriu para ela. —
Eu já gosto dessa garota. — Dirigiu-me a mim, assim que rosnei: — Com
todo respeito, é claro.
Revirei os olhos; acreditava nele. Os MCs da Fênix tinham suas regras,
e envolverem-se com mulheres comprometidas era uma das que nenhum
podia infringir. Adorava Nasx, ele me lembrava Bryan, sem a escuridão que
cercava seus olhos, às vezes. Bryan tinha isso, esperava que Alexia a tirasse
de lá, mas a menina era igual a ele, exceto que a escuridão dela parecia ser
de dor, enquanto a do Bryan era outra coisa que eu não conseguia identificar.
Agora que eu estava mais calmo, deixaria Dom falar sua versão da
história.
— Por que a ajudou com o plano tosco daquele dia?
Taby me cortou.
— Não era tosco, era para sua própria segurança — retrucou.
— Uma segurança que não pedi e da qual não precisava — rosnei e
fitei Dom, esperando que falasse.
— Quando Taby me encontrou na minha casa aquela noite e me pediu
para levá-lo para longe, eu não queria fazer aquilo porque eu era seu amigo,
e você ia sofrer...
— Sofrer? Eu estava morto esses oito anos e nove meses — sibilei num
tom entrecortado.
Tanto Taby quanto ele se encolheram.
— Eu sei, cara, e lamento por isso, mas eu já sabia da fama de
Sebastian Ruiz naquela época. Ele era conhecido por ter tudo o que quer,
liquidando quem passasse pelo seu caminho. Incluindo você, Jason. —
Alisava a mão da garota. — Ele queria Taby e podia usar você para chegar
até ela, e obrigá-la a fazer qualquer coisa.
Gelei com a ideia de Sebastian, que todos temem, levando Taby. Pensei
naqueles caras na minha casa, dizendo que se a pegassem iam revezá-la...
— Deixei-a na cabana e fui buscar minha mãe no hospital. Antes que eu
chegasse lá, fui abordado por três caras armados com metralhadoras. Eles
me levaram a um armazém abandonado e me prenderam, querendo saber da
Tabitta. — Expirou, controlando a dor.
Acho que Dom precisava de um médico, devo ter exagerado. Continuou
com seu relato. Imagino o medo que deve ter sentido na frente desses homens
armados ameaçando matá-lo.
— Olhe aqui. — Levantou sua camisa, mostrando a barriga. Nela, havia
uma cicatriz de faca. Mais em cima havia duas tatuagens de revólveres, um
de cada lado, com os canos apontados para dentro. Nos cabos, estava escrito
“MC” e “Fênix”.
— Você disse que tinha brigado com alguns caras, mas não mencionou
que eles eram do cartel — acusei.
Abaixou a camisa e me olhou. Notei que tatuara também o nome da
Evelyn no antebraço esquerdo. No direito, eu sabia que ele tinha uma
serpente enrolando seu braço. Achei sinistro quando o vi.
— Eu menti, eles iam acabar comigo, mas... — Olhou para a serpente
no seu braço. — Um cara chamado cobra me ajudou a me libertar. Ele era
dos MCs da serpente. Eu ia lá direto. Lembra que perguntava o que eu fazia
quando eu sumia?
Assenti. Eu achava que ele estivesse em alguma gangue, apesar de não
considerar os MCs como uma: eram mais uma família imensa que morreria e
mataria uns pelos outros. Apreciava a lealdade entre eles.
— Ele morreu aquele dia para me salvar — continuou num sussurro.
— Por isso a tatuagem no braço, em homenagem a ele. — Não era uma
pergunta.
— Sim, ele era um irmão verdadeiro. Nós dois lutamos com os caras.
Eu pensava que os homens eram do Sebastian Ruiz, já que procuravam Taby.
Mas não...
— Espere, então de quem eram? — A voz da Taby saiu alta. — Quem
mais estaria à minha procura?
— Seu nome era Hector Salgado, um chefão do cartel dos lobos
solitários. Cada cartel, máfia e MCs têm suas marcas. — Olhou para Nasx,
que sorriu. Ele estava sempre de bom humor, acho que fazia isso para aliviar
a tensão.
— Se você gosta de me ver tanto sem camisa, é só pedir, VIP. —
Piscou, brincalhão. Tirou seu colete preto com emblema da Fênix e camiseta,
virando as costas para nós, ignorando o bufo e revirar de olhos do Dom. Ali
estava uma fênix, colorida e brilhante. No meio dela, lia-se “MC Fênix”.
Uma tatuagem impressionante que cobria todas as suas costas.
— Todos aqui a temos; os homens, pelo menos. Com eles não é
diferente. Por isso descobri a verdade. Rendi dois e o torturei até saber o
que eram — hesitou neste final, observando a reação da Taby, uma agente
que trabalhava pela lei. — Eram inimigos do Sebastian Ruiz e queriam você
como moeda de troca ou algo assim.
— O que aconteceu depois? Porque já passava das duas aquela noite e
você não tinha chegado à cabana — murmurou ela.
— Assim que eu consegui fugir, fui ao hospital e dei pontos na ferida
aberta. Se não tivesse feito, teria morrido de hemorragia. Também avisei
minha mãe que ficaria fora da cidade por um tempo. Achei melhor não a
levar comigo. Enquanto isso, ela iria para a casa de sua irmã, no Arizona.
Quando cheguei para te contar que não era só seu pai que estava atrás de
você, e que tinha outro cartel querendo pegá-la, você já tinha ido. —
Suspirou com um olhar triste para Tabitta e eu. — Tinha duas opções: ir
atrás de você para tentar de alguma forma protegê-la desses dois cartéis,
mesmo sabendo que não era páreo para eles na época, ou levar Jason para
longe. Não consegui ajudá-la, Taby, sinto muito. Não tinha como proteger os
dois ao mesmo tempo.
— Tudo bem, Dom, não o culpo. Eu é que sinto muito por você ter sido
ferido aquele dia por minha causa.
— Não sinta tanto, porque eu matei dois homens aquele dia, Taby, então
você terá a escolha de me prender agora. Vai fazer isso? Se for, agora é sua
chance. — Ele se levantou meio sem fôlego pelos socos que eu dei nele. A
ruiva estava ao seu lado. A cada arquejo de dor, ela me lançava punhais com
os olhos.
Não ia bater boca com ela sendo que Dom a amava. Gostei de ele ter
encontrado algo bom, mesmo que fosse essa ruivinha esquentada.
Os seus amigos do clube estavam de olhos arregalados, alternando
entre Dom e Taby. Tabitta foi até ele e segurou suas mãos, depois o abraçou
forte.
— Eu não estou aqui como policial, Dom, estou aqui como amiga e
irmã — sussurrou, alisando suas costas. — Não tinha ideia do quanto sofreu
para manter Jason seguro. Obrigada por tudo, por protegê-lo.
Fitou-me com um olhar triste.
— Irmão é para isso, não é?
Eu estava agradecido por tudo que ele fez por mim e por Taby. Meu
peito ardeu por sua dor, por ter sofrido e vivido aquilo nas mãos de
assassinos. Isso amenizou um pouco da raiva que sentia.
A ruiva fechou a cara vendo a Taby abraçada ao Dom. Eu também não
gostava disso, mas confiava nos dois. Mentiram para mim, mas também
sofreram com tudo isso. Não perdoara Dom ainda, deixaria o tempo agir.
— Tem uma coisa que não entendo: quando você soube onde Taby
estava? Todos aqui se assustaram por ela ser do FBI, e você não ficou nada
chocado. Suponho que descobriu há muito tempo e não disse nada a mim,
inclusive que ela morava a uma hora e meia da minha casa, não é?
Ele se afastou de Taby e sentou de volta, segurando a barriga.
— Quando eu vim para o MC da Fênix, pedi ao Berry (ou Charles,
como você o conhece) para investigar sobre a Taby. Descobri o que ela era e
onde morava, mas ele me proibiu de chegar perto dela, por ser uma agente.
Se eu me aproximasse, ele saberia. Eu seguia sua liderança, afinal, ele era
meu presidente até alguns meses atrás, quando foi morto.
— Que apodreça no maldito inferno, que é o seu lugar — sibilou Kill.
Não queria estar na pele desse cara se ele estivesse vivo e nas mãos do
Michael.
— Eu queria ir lá e contar tudo a você. — Seus olhos verdes foram
para mim. — Mas as coisas aqui saíram dos eixos, então não pude. Estava
me preparando para ir logo, mas quando vi Tabitta na TV hoje de manhã,
tive certeza de que logo saberia dela. Estava indo para Manhattan te
procurar, contudo, você chegou antes.
— Sim, eu soube dela pela namorada do Ryan. Angelina e Taby são
amigas desde a faculdade.
— Conversei com Ryan alguns meses atrás, ele me disse que é
plenamente feliz com essa mulher, fico alegre por ele. Até me pediu para
localizar alguém chamado Stive Lutner, acho que tentou violentar sua
namorada e matou a irmã dela.
— Espere, ele pediu a você para localizar Stive Lutner? — cortou
Tabitta com a voz aguda. — Esse filho da puta foi quem atacou Angelina e
sua irmã gêmea? No aniversário de dezoito anos de Angie, ela foi buscar
Ângela em uma rave. Sua irmã estava andando com pessoas do lado errado,
Angelina fez de tudo para tirar a menina do fundo do poço. Não sei da
história inteira, já que doía nela falar sobre isso. Apenas disse que um cara
chamado Stive fez ela e sua irmã saírem da estrada, matando Ângela no
processo. Não tinha ideia de que esse cara era o mesmo serial killer de
quem estou há um ano e meio a atrás.
— Você o conhece? — indaguei.
— Ele está na lista de procurados do FBI, assumi uns dois casos dele
neste ano. Stive Lutner pega as mulheres e as mantém em cativeiro por
semanas, torturando-as com cintos, facas e estiletes. Uma vítima que
sobreviveu nos contou que além dele as espancar, deixa sua autoestima lá
embaixo, desmoralizando-as... — esclareceu, reparando em minha confusão.
— O bastardo começa a namorar suas vítimas e depois as captura, tortura,
estupra e mata. Estamos caçando ele há eras, mas sempre que chegamos
perto, arruma um jeito de fugir. Até seus pais, que eram prefeitos em
Nashville, ele matou. — Suspirou, frustrada e com raiva. — Se tiverem
notícias dele, me informem. O maldito precisa pagar por tudo que fez com
dezoito garotas, que eu saiba; deve haver mais.
— Se encontrarmos esse serial killer, entro contato com você —
prometeu Dom.
— Obrigada... — interrompeu-se ao conferir uma mensagem que
acabara de chegar. Virou-se para Dom: — Se tiverem algo aqui no clube ou
ao redor que não esteja dentro da lei, sugiro que fiquem nas sombras por esta
semana, ok? Principalmente nos bairros afastados.
— O que você vai fazer? — sondou Nasx, sério pela primeira vez. —
Vai mandar revistar nossas casas noturnas?
— Eu soube de uma apreensão que fizeram esta semana aqui em
Chicago. Será algo assim de novo? Saiba que não temos nada a ver com isso
— falou Dom. — Estou vendo quem são os fodidos desgraçados que estão
fazendo da minha cidade um ponto de tráfico humano...
— E quando pegarmos eles, vamos mostrar o que fazemos com gente
desse tipo — Kill terminou a frase, aposto que por Taby estar ali.
Nenhum de nós disse nada, nem mesmo ela. Eu que não sentia pena
desses caras nas mãos de Kill.
Capítulo 14
Aliança com o inimigo

TABITTA
Uma semana tinha se passado após eu levar um tiro. Minha recuperação
estava indo bem. Voltaria a trabalhar depois do feriado do final do ano.
Meus pesadelos tinham sumido, graças à Linda, a psicóloga que eu
frequentava.
Papy descobriu que o homem que queria me matar no clube era filho de
Clara Daves. David Daves tentou me assassinar para se vingar de Sebastian,
mandante de morte de sua mãe. A polícia estava apurando o caso, mas se
tratando do Sebastian, não duvidava de nada. Porém, se David achava que
me matando faria Sebastian perder uma noite de sono, estava redondamente
enganado. Era capaz de aquele crápula agradecer a quem fez o serviço.
Foram fechados vários pontos de prostituição. Prendemos diversos
bandidos acusados de tráfico humano. Mesmo afastada, eu os ajudava
sempre que podia. Não conseguia ficar de fora, vendo a injustiça, e eu sem
poder fazer nada.
Jason estava tão apegado à nossa filha que fazia tudo por ela, até ir à
escola e dizer aos coleguinhas que era o seu pai. Sua alegria era contagiante,
nunca vi meu bebê tão feliz assim na vida. Ela já amava o Jason, mesmo
antes de saber que era seu pai. Agora que descobrira, estava no céu.
No aniversário dela, fomos almoçar fora. Bom, esse era o meu plano,
mas Jason, como sempre, interveio e fez uma imensa festa, convidando mais
de cem pessoas, mais amigos dele do que meus. Ele disse que queria
apresentá-la a todos, queria que conhecessem sua filha e sua mulher. Eu
adorava quando ele falava que eu era sua mulher.
A festa estava sendo realizada no grande salão do Hotel Plaza, que
pertencia a Lucky Donovan.
— Papai — gritou Emily, correndo na direção do Jason. Ela vestia um
vestido branco rodado, com uma tiara de borboletas. Seus cabelos estavam
soltos e seus olhos brilhavam ao fitar Jason. Eu amava isso, adorava sua
felicidade.
— Sem correr, Emily — a reprendi.
Ela parou na nossa frente e pegou a mão de Jason, que logo a segurou
nos braços.
— O que minha princesa quer? Me diga que eu faço.
Revirei os olhos.
— Cuidado com o que promete, essa danadinha pode ser bem
convincente quando deseja algo — falei, indo me sentar e deixando os dois
conversarem. Antes, ouvi o que ela pediu, o que me fez rir sozinha.
— O senhor pode ser o Papai Noel este ano na escola? Cada ano é o
pai de um aluno. Meu nome foi sorteado, e meus colegas disseram que você
não aceitaria, por ser famoso. Mas eu disse que você é o melhor pai do
mundo e concordaria, não é? — Sua alegria era tanta que seria impossível
Jason negar. Não que ele pretendesse, já que fazia tudo que ela queria.
— É claro que estarei lá, minha linda. Vou ser o Papai Noel e darei
presentes a todos — garantiu com carinho na voz e jubilo, beijando-a em
ambas as bochechas. — Este final de ano será inesquecível para a minha
princesa.
— Obrigada, papai! — Ele a colocou no chão e Emy saiu correndo toda
eufórica, gritando para seus amigos. — Meu papai vai ser o Papai Noel mais
lindo do mundo, e disse que dará brinquedos a todos nós. — A turminha de
amigos dela comemorou.
Jason ficou lá, parado, olhando para ela como se grato por tê-la. Eu
também agradecia aos céus por ter os dois na minha vida.
Estava sentada em uma mesa grande, sentindo os olhos de uma pessoa
em mim. A mulher do Lucky me mirava com cara de poucos amigos. Eu
sabia que ela estava reagindo assim por eu ter abandonado Jason no
passado. No momento em que os vi juntos, percebi que ela gostava mais dele
do que dos seus outros amigos. Felizmente, não havia sentimento romântico.
O amor dela pelo seu marido, um homem moreno de cabelos castanhos e
olhos verdes, era evidente.
— Você está linda! — sussurrou Jason no meu ouvido, assim que
chegou à nossa mesa.
Eu vestia um vestido vermelho de cashmere tomara que caia, todo
modelado no meu corpo. Ele usava uma calça jeans e camisa branca,
enrolada até os cotovelos.
— Você também. — Sorri. — E aí, Papai Noel, hein? Ela te convenceu
a isso? Saiba que vou adorar ver você gordinho.
Ele riu, olhando por sobre meu ombro, acredito que para Emily.
— Emy está tão animada com isso, então não me importo. — Deu de
ombros e beijou minha testa. — Sua felicidade é tudo para mim.
Angelina não pôde vir no aniversário de Emily porque foi viajar com
seu namorado para Vail. Bryan me disse que ela foi passar o fim de semana
lá com seu gato louro de olhos caramelos. Gostei da minha amiga estar feliz
com Ryan. A viagem foi programada por Lucky e Bryan para tirá-la da
cidade por um tempinho, depois de eu ter dito aos dois o que Stive Lutner
era de verdade, um maldito serial killer que poderia resolver procurá-la.
Quanto ao bastardo do Franklin, até agora não fizera nenhuma investida,
então não faria mais, assim eu esperava. Por via das dúvidas, havia guarda-
costas acompanhando os dois e as crianças vinte e quatro horas por dia.
Escondidos deles, claro. Lucky disse que não queria que seu irmão se
preocupasse com nada. Admirava esse seu jeito protetor.
Rayla e seu namorado estavam perto dos pequenos que brincavam mais
afastados; acho que ela gostava de crianças. Talvez pensasse no seu filho,
que viria em alguns meses. Samira estava ao seu lado. Ela era uma morena
linda, alta, com corpo fabuloso. Bem nerd, lembrava eu na escola, com
vestidos largos e tudo mais. Samira não era de se arrumar para nada. Isso
não mudava o quanto ela era perfeita, mas ela não parecia acreditar.
Na mesa estavam Jason, Sam, Lucky e eu. Jordan e Daniel não tinham
chegado ainda. Bryan e Alexia também não, mas estava cedo; logo
apareceriam. Pela expressão que vi no rosto de Bryan no dia anterior, ele e
Alexia não tinham voltado. Seja qual fosse o problema dos dois, esperava
que resolvessem, porque se amavam.
Suspirei, olhando para Sam e sua cara emburrada. Estava assim desde
que entrei no salão.
— Ok, desembuche — falei a ela. — Sei que deseja dizer alguma
coisa, então diga.
Lucky e Jason permaneceram calados.
— Tudo bem, se você quer assim... — Ela se ajeitou na mesa e me
fuzilou.
— Rosa Vermelha, deixe isso quieto.
Ignorou seu marido e me fitou, soltando a raiva que estava sentindo.
— Você abandonou o Jason, quebrando seu coração, e não deu sequer
sinal de vida. Sabe o que fez? A ferida que deixou? O tanto que ele sofreu
por sua causa, todos esses anos? Você não o merece, não depois de como
agiu.
Jason expirou.
— Não diga isso, preciosa, ela não fez...
— Ela tem razão — concordei, encolhendo os ombros. — Mas também
está errada. Eu sei que não mereço Jason depois do que o fiz passar, mas não
me arrependo disso, só me arrependo de fazê-lo sofrer. Tê-lo deixado é a
razão para ele estar vivo agora, a razão pela qual entrou na faculdade,
conheceu seu marido e realizou seu sonho de se tornar lutador.
— Mas ele não queria nada disso, Jason queria você — rosnou.
— Eu também queria ficar ao seu lado, mas não podia. Não foi só ele
que sofreu esses anos, eu tive que andar me escondendo durante muito tempo
desse homem que queria a morte das pessoas que eu amava. Tive que
aprender a lutar sozinha quando eles me acharam na Rússia, na China e em
vários países no primeiro mês longe de Jason. Na minha fuga para Chicago,
fui atingida na barriga e descobri que estava grávida, também quase a perdi.
— Olhei para Emily brincando com um menino moreno. Acho que era Shaw,
o filho adotivo da Sam e Lucky. — Foi onde conheci meus pais adotivos.
Eles me deram proteção e me ajudaram a me esconder em uma casa na
Sibéria até Emily nascer e eu ver o que faria da minha vida. — Respirei
fundo. — Então eu não podia ficar com ele, porque esse cara poderia levá-lo
e me obrigar a fazer o que ele queria, e eu faria qualquer coisa para salvar a
sua vida, não me importando o que viesse a acontecer comigo. Por causa de
Emily, não deixaria isso acontecer.
Jason ofegava.
— Você não me disse isso — acusou.
Mirei seus olhos grandes e tristes.
— Você não precisava saber de tudo de ruim que me aconteceu. Eu só
não disse nada para protegê-lo.
— Eu não queria proteção, maldição!
— Para que saber, para se torturar ainda mais? Eu também não quero
me lembrar daquele tempo sombrio da minha vida. A única luz que veio para
iluminar o meu caminho foi Emily. Por ela e por você, Jason, sobrevivi a
todos esses anos. — Sam estava com os olhos molhados. Perguntei a ela: —
Você não faria o mesmo por seu marido? Ou ficaria junto dele, não ligando
para os riscos?
Ela se encolheu com o que eu disse. Lucky me lançou um olhar
venenoso, que ignorei; olhares assim não me causavam medo, já estava
acostumada a ver isso todos os dias no meu serviço, então não me
importava.
— Você está fazendo ela chorar — advertiu-me.
Estreitei meus olhos.
— Não era a verdade que ela queria ouvir? Aqui está a realidade.
Quando conheci o Jason, ele só tinha Dom. Falo de amigos verdadeiros, não
esses que, em qualquer dificuldade, se afastam de você, igual aconteceu com
seu pai e sua mãe...
— Taby... — avisou Jason.
— O que está acontecendo aqui? — perguntou Jordan, chegando até
nós. Daniel estava ao seu lado.
Eu respirei fundo.
— Sentem que vou contar uma história a vocês. — Jason espantou-se
com o que eu disse. — Eles precisam saber da verdade, querido. Tudo bem?
— Que verdade Jason não contou a nós? A mim, que sou seu melhor
amigo? — Lucky acusou com os dentes cerrados. — Você já não contou que
foi apaixonado por uma mulher por anos, e ainda por cima a amava até hoje.
— Abaixe a crista, cara. Antes de você chegar acusando-o, deixe eu
falar primeiro — rosnei, não gostando de ele olhar assim para Jason, como
se meu amado o tivesse traído.
Ficaram quietos, a despeito de contrariados.
— Ótimo. — Virei para Sam. — Gosto de como se preocupa com ele,
da forma que o ama também. Ele merece isso, merece ser amado, porque
nem sempre foi assim.
Peguei uma taça de champanhe e tomei um gole.
— Seu pai era um tremendo de um hipócrita e desgraçado, e não é só
porque está morto que vou mudar minha opinião sobre ele. Julio sempre
dizia ao Jason que ninguém lutaria ou ficaria com ele, que ninguém se
importaria. Mas Jason se provou forte, não ligando para seu pai. Pedi para o
Papy descobrir o seu paradeiro, checar como estava indo sem seu filho. Não
que eu me preocupasse, não era isso. Fui visitá-lo no hospital para dizer
algumas verdades que estavam entaladas por anos na minha garganta e
mostrar o que o filho dele tinha se tornado, o cara maravilhoso que sempre
foi, e que não havia nada que ele pudesse fazer em relação a isso.
Contei aos seus amigos o que disse ao pai de Jason. Falei que pelo
homem que eu amava, faria e fiz de tudo para mantê-lo feliz. Meu sacrifício
por Jason só provava que ele era importante. Por ele, eu entraria na frente de
uma bala.
— Espero que isso nunca venha a acontecer — sussurrou.
Eu sorri.
— Também espero. Eu disse a ele que Jason se tornou um lutador, não
só no ringue, mas no sentido de seguir em frente, tendo tudo o que sempre
quis. Que mesmo eu estando longe, você permaneceria vivo e seguro.
— Eu tive algumas coisas nesse tempo, sim, mas o que mais desejava
era você. Não estou lhe acusando ou reclamando... Se fosse comigo, eu faria
o mesmo para vê-la segura — declarou.
— Eu sei que sim. — Alisei sua mão e olhei seus amigos. — Vocês
parecem ser amigos de verdade dele, então aqui vai a pergunta: o que fariam
no meu lugar e do Dom? Ele se sacrificou por Jason, se tornou líder dos
MCs para protegê-lo. Dom sabia que eu fazia o mesmo, mas não era
suficiente para afastar o Sebastian, então virou Shadow e fez coisas que nem
quero imaginar para manter Jason a salvo. Isso é amizade e amor.
Lucky fitava Jason com compaixão e tristeza, acho que pelas coisas que
seu amigo passou.
— Quando conheci Dom e você naquele clube de luta em Cambridge,
senti que tinha algo de errado com os dois. Mais com ele, pois inúmeras
vezes eu o peguei pesquisando sobre um homem parecido com um gângster.
Não vi o nome porque ele desligava o PC quando eu entrava, alegando que
era um trabalho que estava fazendo para uma garota. Cá entre nós, quando
Dom faria isso por uma mulher? Nunca, as mulheres que faziam para ele, e
não o contrário. Mesmo achando estranho, deixei quieto na época. — Lucky
tomou sua bebida. — Acho que não devia ter feito isso, devia ter checado
mais a fundo, tentado ajudar de alguma forma.
— Você é poderoso agora, mas mesmo com seu dinheiro, não iria
querer bater de frente com o Sebastian, não seria páreo para ele. Ele é chefe
do cartel mexicano...
— Não é bom você sair falando sobre mim por aí, já que meu nome
está sendo procurado. — Escutei a voz dos meus pesadelos.
Eu me coloquei de pé num salto e olhei para o homem que esperava
rever, mas comigo armada, colocando-o na cadeia. E ali estava, desarmada,
na festa de aniversário da minha filha, onde havia muitos adultos inocentes e
crianças. Os convidados do Jason não tinham chegado ainda. Só Silas, seu
agente e seus amigos mais próximos. Papy e Mama também não tinham
aparecido. Torcia para que Thomas notasse algum movimento estranho e
mandasse os agentes para prender esse homem. Infelizmente, com o que
tínhamos dele, não pegaria perpétua. Landon e Chris estavam no canto com
suas armas apontadas para os homens de Sebastian. Seus capangas estavam
sem nada nas mãos, mas isso não significava que não estivessem armados.
— Todos atrás de mim — falei sem alterar a voz. Não foi preciso
repetir. Somente Jason se manteve ao meu lado.
Sebastian vestia-se de preto, com um terno caro que valia mais do que
meu salário. Também, com o tanto que faturava com coisas ilegais...
Preferiria andar nua a comprar algo com dinheiro de sangue, conquistado
mediante vidas destruídas.
— O que está fazendo aqui? — Tentei não deixar minha voz falhar,
temendo pelos meus amigos. Ele estava cercado por cinco caras.
Ele riu.
— É assim que trata seu pai?
Eu desdenhei.
— Pai? Você é muito ousado, seu crápula, para vir aqui e dizer isso.
Você foi apenas o doador de esperma para minha mãe e nada mais. Talvez eu
nem seja sua, já que a obrigava a se prostituir por aí.
Estreitou os olhos.
— Você não sabe de nada, menina. Vamos conversar em um lugar com
menos pessoas ao redor. — Olhou por sobre meu ombro e sorriu, acredito
que para Emily. — Minha neta é linda!
Cerrei os punhos e dei um passo até ele. Jason me puxou de volta.
— Fique longe dela ou acabo com você — sibilei.
— Vim aqui para informar que sua vida corre perigo...
Ri com desdém.
— Não precisava deixar seu reinado no México para me dizer que
pretende me matar. Eu já sabia disso. Agora que está aqui, pretendo prendê-
lo por todos os crimes que cometeu na sua vida.
— Não estou falando de mim, se eu quisesse matá-la, já teria feito há
muito tempo — retrucou.
— Você tentou me matar muitas vezes. Na Itália, na China e até aqui no
país, em Chicago, há quase nove anos. Recebi um tiro na barriga, quase
perdi minha filha. E assassinou a minha avó. O que fez com seu corpo?
Jogou em algum lugar qualquer? Dentro de um rio?
Ele suspirou.
— Primeiro: não matei sua avó, foi Pablo, que foi morto logo em
seguida por ter feito o que fez. Também não mandei meus homens a matarem,
foi Hector Salgado, o antigo...
Eu sabia quem era Hector Salgado, pesquisei mais sobre ele depois que
Dom o mencionou.
— Sei quem ele é, o antigo chefe do cartel da família Salgado ou Lobos
Solitários, como eram conhecidos. Foi morto há mais de sete anos... —
Parei, porque foi bem nessa época que deixei de ser perseguida. — Você o
matou! Por quê? Porque me queria levar para me prostituir para você? E aí
se livrou de um chefe de cartel para que ele não o impedisse, me
assassinando?
Deu um passo na minha direção. Jason me colocou atrás dele e fuzilou
Sebastian.
— Se tocá-la, juro que o mato — rosnou Jason com os punhos cerrados.
Pareceu se esquecer de que falava com um bandido.
Os seus seguidores já estavam colocando suas mãos no paletó, acredito
que para pegarem suas armas. Meu coração gelou no meu peito, com medo
de uma possível catástrofe.
— Se vocês sacarem suas armas na frente da minha neta, arranco seus
fígados e os faço comer — ordenou num tom mortal.
Saí de trás de Jason e encarei Sebastian. Todos se recompuseram e não
fizeram nada, acho que conheciam o chefe que têm para saber que ele faria
isso mesmo.
— E quanto à casa do Jason, há duas semanas? Três homens, sendo dois
deles Diego Sales e Victor Cortesia, que fugiu, atiraram contra nós. Então,
sim, você mandou me matar — falei, ácida.
— Não mandei que fizessem isso. Depois terei uma conversa com eles
por ousarem agir pelas minhas costas. — Seu tom era maligno. Não queria
estar na pele de Cortesia e Sales.
Expirei para me acalmar.
— Só me diga o que veio fazer aqui e vaze da minha frente, a não ser
que pretenda confessar seus crimes e me deixar prendê-lo. — Não tinha
esperança quanto a isso.
Esse era o problema: nós não conseguimos provas suficientes para
levá-lo por toda a sua vida à prisão. Ele usava seus cúmplices para fazer o
serviço sujo e, quando eram pegos, confessavam que fizeram tudo por conta
própria. Papy disse que há nove anos tenta arranjar provas para trancafiá-lo;
até agora, não teve êxito. Sempre escapava pelos dedos, como água.
Ele riu, sacudindo a cabeça.
— Não posso protegê-la da prisão, então não, não serei preso hoje... —
Foi interrompido quando as portas se abriram. Por elas, entraram Papy,
Dennis, Lincoln, Bryan e mais agentes do FBI. Apontavam suas armas para
Sebastian e seus homens.
— FBI, mãos para cima, onde eu possa ver. — gritou Papy.
Olhei assustada para onde Emily e seus coleguinhas estavam, mas não
os vi, e nem o garotinho da Sam. As outras pessoas ficaram em silêncio.
— Tire todos daqui, agora — ordenou Bryan a alguém.
— Rayla levou as crianças para o apartamento do Lucky, eles estão
bem, não se preocupe — garantiu Jason, notando a minha preocupação.
Papy fuzilava com frieza Sebastian.
— Olá, agente Smith, nos vemos de novo — Sebastian encarou Papy de
frente. Não parecia temer as armas apontadas para si. Contanto que seus
servos não sacassem as suas também, ficava tranquila.
— Eu vou prender você agora — rosnou Papy.
— Pelo quê? Até onde sei, você não tem provas conclusivas contra
mim, não aquelas que tanto deseja — desdenhou. — E agora estou aqui
porque você não soube protegê-la, e, por sua culpa, a vida dela corre perigo.
— Apontou o dedo para mim, enraivecido.
— Desde quando se importa com sua filha? Você é um desumano
desgraçado, que não liga para nada, exceto faturar dinheiro às custas de
inocentes. Não me venha com essa de pai protetor, porque isso você não é, e
nunca foi.
— A única ameaça para mim é você, seu desgraçado. — Aliviei-me
pois todos saíram dali, embora contrariados, forçados pelos agentes. Sam
não queria ir, mas Lucky a levou, não desejando arriscar a vida do seu bebê
e de sua esposa.
— Eu não vou sem ela. — Jason segurava minha mão, fuzilando um
agente.
Fiz um sinal para meu colega deixá-lo. Sabia que ele não me
abandonaria, eu o conhecia bem.
Sebastian olhou para mim.
— Você, com sua ideia estúpida de me atrair para fora do México,
soltou meu nome na TV. Os Bravata viram, agora virão atrás de você, não
entende? Não sabe o que eles fazem?
Cortei-o, furiosa.
— O quê? Você é diferente dos Bravata? Diferente de Andrey Jacov, o
chefe da máfia? Eles são uns fodidos mafiosos russos que faturam mais de
setenta bilhões de euros por ano, com mais de duzentos e cinquenta mil
bandidos à sua disposição e quase dois milhões de seguidores pelo mundo
todo. — Deu um sorriso de merda, maravilhado por eu saber algo assim. —
O que, não achou que eu sabia de tudo isso? Você comete os mesmos crimes
que Andrey: tráfico de drogas, prostituição, tráfico humano, tráfico de
órgãos, homicídio, extorsão e lavagem de dinheiro. O que mais tem para eu
colocar na lista? Você e esse mafioso desgraçado não deviam estar soltos,
deviam estar no inferno, que é o seu lugar.
— Impressionante a forma com que nos odeia...
Eu o interrompi.
— Odeio todos que fazem mal no mundo; você é um deles.
Sebastian sacudiu a cabeça.
— Em vez de ficar rosnando para mim, me acusando de fazer tudo isso,
deveria tomar cuidado com sua segurança. Provavelmente conhece o que
Andrey faz com seus prisioneiros — rosnou de volta. — E você não está
ajudando concedendo entrevistas, falando a meu respeito.
— Espere, o que os Bravata querem com Tabitta? — indagou Papy.
— Capturá-la, claro, para chegar até mim. Eu a mantive nas sombras
por muito tempo, mas ao sair na TV, eles descobriram que ela é minha filha e
virão atrás dela. Por isso eu vim aqui, para protegê-la.
— Não preciso da sua ajuda, aliás, não preciso nada de você e de seus
modos sujos de resolver as coisas. — Olhei para o Papy — Se vai prendê-
lo, tire-o da minha frente antes que eu mesma atire nesse monstro.
— Mesmo que me leve preso, não vou ficar lá por muito tempo, sabem
disso. Vocês têm alguma prova contra mim que me deixará trancafiado para
sempre? Aposto que não. Evidências não conclusivas jamais convencerão o
júri a me dar pena de morte ou ao menos perpétua. — Fitou cada um dos
agentes e, por último, Papy.
— Temos Franklin, vocês dois estavam conversando na sua casa no
México, e com menores do lado.
— Isso, minha querida, não prova nada, apenas que ele foi me visitar
com suas mulheres, mas eu não sabia que elas eram menores de idade. E ele
não lhes disse nada além disso, até onde me informaram.
— O que ele foi fazer lá, se não tinham negócios juntos? — sibilou
Bryan.
— Propor negócios que não aceitei, claro.
Bufei, indignada.
— Você consegue se safar em tudo, não é? Mas aqui vai outra: na noite
em que matou minha avó, você e seu bando foram filmados saindo da nossa
casa em Austin. Também assassinou Pablo, o cara que atirou em vovó, e
ocultou os cadáveres.
Sorriu, inabalado com o que eu disse.
— Sim, fui avisar que sua vida corria perigo com Hector Salgado atrás
das duas, todavia, você não me deixou contar nada disso depois que Pablo
atirou na sua avó, simplesmente se trancou no cofre.
— O que queria que eu fizesse, hein? Ele era seu servo e matou minha
avó...
Cortou-me.
— Sem o meu consentimento. E sim, se você testemunhar, pode me
acusar de matar Pablo, mas aí está: vai mesmo querer me prender por um
assassinato, sendo que alega que cometi milhares de crimes, pelos quais
mereceria a pena de morte? E não ocultei o corpo de sua avó, ela está
enterrada em um cemitério. Direi onde depois que pegarmos Andrey.
— Você é um tremendo de um desgraçado — rosnei. — Vou te fazer
pagar por todas as vidas que destruiu, todas as crianças raptadas que foram
obrigadas a ganhar dinheiro para você. Não posso provar ainda, mas
conseguirei, nem que seja a última coisa que faça na vida.
— Eu não vou impedir. Agora, acredito que temos um problema maior.
Soube por uma fonte confiável que Andrey Jacov está em primeiro lugar na
lista de procurados do FBI, não? Vocês não podem e não vão conseguir
capturá-lo sem mim. Tenho um plano para prendê-lo. O que vai ser? Sei que
não têm provas suficientes contra ele, por isso nunca o pegaram, porém, eu
tenho. O suficiente para ele ser extraditado para os Estados Unidos e julgado
aqui, e não na Rússia. Cederei elas a vocês, se trabalharmos juntos.
— Você está dizendo para nos unirmos para capturar Andrey Jacov, é
isso? — Dennis riu, sacudindo a cabeça. — Por isso apareceu aqui sem ter
medo de ir preso por assassinato... Sabia que precisaríamos de você para
capturar o chefe da máfia russa.
— Nós não precisamos dele, podemos pegá-lo sozinhos, sem esse
assassino desalmado nos ajudando — grunhi, não gostando da ideia de me
aliar ao criminoso que mais queria capturar. Sem chance no inferno.
— Sabe que depois de prendermos Andrey, pegaremos você também,
não? — Dennis questionou com as sobrancelhas levantadas.
Sebastian sorriu.
— Vamos ver. Há apenas uma condição para eu trabalhar com vocês.
— Cruzou os braços e olhou para mim. — Tabitta não estará no caso.
Arfei diante de sua petulância. Procurei Papy com o olhar. Sebastian
continuava com seu sorriso, o qual odiava; era como se estivesse sempre um
passo à minha frente. Eu me enfureci e me lancei contra ele, mas não cheguei
perto de quebrar sua cara, porque Jason me pegou por trás e apertou seus
braços à minha volta, me impedindo de esganar esse homem desgraçado.
— Tabitta, pare — ordenou Papy. Só usava esse tom quando encarnava
o papel de chefe, colocando o de pai de lado. Eu me recompus e fuzilei
Sebastian. — Ele tem razão...
Eu o cortei.
— O quê? Não pode me tirar assim do caso!
— É claro que posso, sou seu chefe. Além disso, Andrey a quer, não
vamos levá-la até ele e entregá-la de bandeja. Você ficará afastada do caso e
ponto final. — Olhou para Sebastian. — Agora vamos andando, estou louco
para saber seu plano. Se não for bom, você ficará um bom tempo na prisão,
mesmo que não seja acusado de seus verdadeiros crimes.
Capítulo 15
Perdão

TABITTA
Cheguei à casa do Jason furiosa, pisando forte e querendo matar
Sebastian com minhas próprias mãos. Como ele ousava dizer que não faria
parte desse caso? Maldito! Ele não era nada, apenas um assassino filho da
puta que achava que podia dar as cartas. O pior foi que Papy aceitou suas
condições.
— Taby, querida, isso foi melhor, seja qual for o motivo para esse cara
exigir que se afastasse. Eu surtaria de tanto medo. Se já não bastasse um
cartel mexicano atrás de você, agora vem essa máfia russa? Como manter
minha mente sã com você longe de mim? — Aproximou-se e tocou meu
rosto. Nós estávamos na sua sala. — Pelo modo que seu pai...
Eu o interrompi:
— Ele não é meu pai, Papy é.
— Eu sei, linda. O que quero dizer é que tudo isso levaria tempo e você
teria que ir para a Rússia com eles. Não posso deixar isso acontecer, ficaria
louco aqui pensando no pior.
Nesse ponto ele tinha razão. Queria fazer parte da investigação contra
Andrey, contudo, teria que ficar meses afastada de Jason e Emily, e não
conseguiria. Já fiquei longe dela a trabalho, mas nunca durante meses.
Como a festa de Emily foi interrompida, ficamos de levá-la para se
divertir no zoológico, porque ela amava animais. Puxou à vovó, que só não
criava um monte de gatos porque eu era alérgica a pelos. Por isso nunca
pude comprar um cachorrinho para Emily. Esperava que quando tudo isso
acabasse, aquele desgraçado contasse onde vovó foi enterrada.
Fitei o anel de noivado no meu dedo. Queria casar o quanto antes, mas
como pensávamos em casar na praia, precisava que todos esses chefes de
cartel e da máfia russa estivessem presos. Odiaria ser interrompida no meu
casamento, aí sim mataria alguém. Então Jason e eu decidimos realizar a
cerimônia depois deles serem presos. Nenhum sairia livre disso, não mesmo.
Passei a morar em sua casa. Eu ia me mudar para o Brooklyn, mas ele
me convenceu, já que estávamos noivos, a morar juntos até nos casarmos.
Claro que mudei a cor da casa e até os móveis, tornando o ambiente mais
alegre, combinando com a família feliz que éramos, e não sombria, como
estava a vida dele antes de nos reencontrarmos. Havia fotografias de nós três
em todos os lugares.
Olhei para o meu lindo namorado, ou melhor, noivo, e o beijei.
Precisava senti-lo nem que fosse um pouco, mesmo que não pudéssemos nos
aprofundar mais no beijo, porque nossa filha estava na porta ao lado.
— Eca, vocês dois. Beijo é algo nojento, cheio de saliva — disse
Emily, entrando na sala. — Quando eu namorar o Jacob, não vou beijá-lo.
Eu sorri. Jacob era o garoto que estava com ela no Hotel Calion. Toda
vez que me lembrava de resgatarmos sua irmã, Julie, das garras daqueles
estupradores, sentia mais ódio de Sebastian.
Fui visitar os dois irmãos há alguns dias, moravam em um trailer
afastado do centro. Meu coração sangrou ao ver o estado em que viviam. Sua
mãe estava doente, vivia mais internada do que com eles, então os dois
ficavam bastante tempo sozinhos e indefesos, por isso a garota foi
sequestrada. Veria como poderia ajudá-los de alguma forma. Jacob era um
garoto que valia ouro, doce e gentil, mas ficava furioso quando se deparava
com injustiça. Dei meu telefone a ele para me ligar caso acontecesse algo.
— Emy, Jacob é cinco anos mais velho que você. E você é nova demais
para pensar nisso. — Jason se afastou de mim e olhou para ela.
Jacob tinha treze anos (e, sua irmã, quinze), e não onze como eu havia
imaginado. Apenas era baixinho.
— Só vai namorar quando o cara em questão me derrotar no ringue.
Ela arregalou os olhos.
— Mas o senhor é invencível, nunca perdeu uma luta na vida.
Jason sorriu com a declaração dela e a pegou pela cintura,
suspendendo-a do chão e beijando sua cabeça. Eu adorava ver momentos
como esse dos dois juntos.
— Por isso mesmo, querida. Não vai namorar nunca.
Revirei os olhos para os dois. Antes que eu dissesse que Jason não
podia controlar para sempre a vida de nossa filha, meu telefone tocou.
— Alô? — sondei, confusa, porque não havia identificação na tela.
— Senhora agente, Julie e eu precisamos de você — disse Jacob; só ele
me chamava assim. Soou urgente e amedrontado.
— Jacob? O que foi, aconteceu alguma coisa?
— Meu pai veio ao nosso trailer querendo levar Julie e eu com ele, mas
não posso permitir, ele é igual ao cara do hotel. Por favor, nos ajude —
implorou. — Foi ele quem deu Julie para o cara que a levou aquele dia.
— Calma, Jacob. Cadê sua mãe?
Ele suspirou, parecendo chorar.
— Mamãe está no hospital... Ela está morrendo.
Olhei para Jason e minha filha, ambos assustados.
— Vocês têm um lugar onde possam se esconder até eu chegar aí? Estou
em Manhattan agora, demorarei algumas horas. Qual é o nome desse cara?
— Samuel Diaz. E temos sim. Assim que a senhora chegar, me ligue,
que atendo e digo onde estou. — Parecia correr. — Obrigado, senhora
agente.
— Taby, o que foi?
Desliguei o telefone e peguei as chaves da Mercedes.
— A mãe de Jacob foi internada e seu pai louco, que por sinal parece
ser quem entregou sua irmã a Matias e Júlio Weston, está atrás dos dois.
Estou indo para sua casa agora resolver isso. Fique com Emily...
— Oh, coisa nenhuma, você não vai sozinha, eu vou junto — falou com
firmeza. — Já te vi em perigo demais por hoje, então sem reclamação, eu
vou com você.
Suspirei, desistindo. Chegamos a Trenton uma hora e meia depois.
Liguei para Jacob, e ficamos de nos encontrar no hospital.
Os dois estavam lá fora me esperando, com suas roupas um pouco
rasgadas e sujas. Um homem alto aguardava na frente dos dois. Jacob entrou
na frente da irmã, encarando-o com frieza.
Saí do carro antes que Jason encostasse na vaga e corri, ignorando meu
noivo praguejando baixo.
— Você não é meu pai, desgraçado. Nunca ligou para mim, por que só
agora apareceu?
— Sua mãe está morrendo, vocês dois não têm ninguém além de mim.
— Virou na direção de Julie. — Vou saber usá-la muito bem.
Ela cuspiu na cara dele.
— Vá à merda, seu crápula. Se acha que vou com um desgraçado igual
a você, está enganado. Foi você quem me deu para aquele cara no hotel, e
ele levou meu irmão. Por sorte, fui liberta pela agente que cuidou de nós.
O cara fez menção de dar um tapa na Julie, porém, eu o impedi,
chegando por trás dele e colocando a arma na sua cabeça.
— Se tentar alguma coisa eu atiro em você agora, Samuel Diaz. Ou eu
devo te chamar de Dentinho? — Prostrei-me na frente dos garotos e peitei o
verme. Alguns de seus dentes faltavam.
Eu dei o nome do cara para Bryan puxar sua ficha antes de ir para lá.
Era um tremendo de um filho da puta, um cafetão de segunda. Era pai só de
Jacob, e não de Julie. Decerto usaria a garota, uma loura linda para fins
inescrupulosos. Mas isso não aconteceria, eu não permitiria. Perguntava-me
o que Rebeca, a mãe deles, viu neste homem... Por que se envolveria com
alguém igual a ele?
— Quem é você, sua vadia desgraçada... — Foi interrompido por um
soco de Jason; mais um dente caiu no chão, e ele tombou, desacordado.
Sacudi a cabeça, repreendendo Jason.
— Querido, você precisa se controlar, não pode simplesmente chegar e
derrubar os criminosos com um soco. Sabe aquele ditado “Pergunte primeiro
para bater depois”?
Deu de ombros, perguntando aos garotos.
— Vocês estão bem?
Antes que eu respondesse, Julie saiu do seu lugar e deu um tapa no
rosto de Jason, pegando todos de surpresa, inclusive Jason.
— Ficou maluca, Julie? — criticou Jacob, segurando seu braço.
— Eu não acredito, Jacob, é ele mesmo! — disse e gritou eufórica.
Abraçou Jason, pegando-o desprevenido.
Jacob revirou os olhos.
— Ela é uma fã de carteirinha de Jason Falcon. Tem fotos dele em
todos os seus cadernos.
Julie riu e se afastou de Jason. Parecia estar sonhando acordada.
— Desculpe por bater em você, precisava ver se você era real mesmo.
— Quicava de tão feliz. — Sempre sonhei em me casar com você quando
crescesse.
Eu ri.
— Você e toda a população feminina do universo — falei. — Vou
chamar a polícia para prender Samuel Diaz, já que ele é procurado.
Julie piscou.
— Desculpe por agarrar ele assim, mas eu sonhava em vê-lo há muito
tempo, até fui à sua luta com Escorpião.
— Não tem problema, querida, Jason tem esse efeito nas pessoas,
mulheres principalmente. — Beijei de leve os lábios dele, que fez uma
careta com a menção às mulheres. — Farei a ligação. Enquanto isso, entrem
no hospital e procurem saber como vai Rebeca.
Ele arfou.
— Rebeca? — Seu tom saiu estranho ao pronunciar esse nome.
— Sim, a mãe dos meninos que está internada aqui.
Assentiu e foi com os garotos para dentro do prédio. Ignorei sua reação.
Será que ele a conhecia? Será que Rebeca era Bechy? Não podia ser. Fui
interrompida em minhas conjecturas
— Alô? — Minha voz soou grossa.
— Não sabe o que descobri sobre Rebeca Louis Falcon. Ela é a mãe de
Jason, Taby, precisa dizer a ele antes de chegarem.
— É tarde demais para isso, Bryan. Depois eu ligo, tenho que ir. —
Corri para a entrada do hospital, avisando ao guarda de lá para chamar a
polícia e prender Samuel Diaz, que deixei algemado e inconsciente.
Cheguei ao quarto informado pela enfermeira, onde estava deitada na
cama e moribunda a mulher que abandonou Jason quando criança, largando-o
com o monstro do seu pai. Eu tinha antipatia pelos dois por fazerem Jason
sofrer todos aqueles anos. Agora me deparava com seus filhos, irmãos de
Jason... Escondi minha antipatia pela mulher no seu leito de morte.
Acabara de falar com o médico: o câncer atingira todos os seus órgãos;
eles deram horas para ela. O estranho era que o médico também disse que se
tivesse tratado há alguns meses, ela teria se salvado. Por que não buscou a
ajuda de Jason? Ele teria auxiliado, mesmo não gostando dela por deixá-lo.
Assim que entrei no quarto, ouvi o sussurro dela falando com ele. Seus
ombros estavam tensos e rígidos enquanto fitava a mulher, e suas mãos em
punhos.
— Você me abandonou com aquele homem, agora está pedindo para eu
esquecer todas as...
— Jason, você pode ser adulto, mas não faça mamãe chorar ou
brigaremos — rosnou Jacob.
— Jacob, querido. — Sua voz saía fraca ao falar com eles. Jason se
parecia com ela. Tinha cabelos castanhos, com alguns fios brancos, e um
rosto demonstrando envelhecimento precoce. Ela não tinha mais de sessenta
e cinco anos, mas sua aparência estava péssima. A doença e o sofrimento
acabam com as pessoas. — Ele tem razão para me odiar, eu o deixei quando
era pequeno e indefeso nas mãos do pai dele. Não conseguia mais ficar com
um homem que me batia. Mas eu estava doente na época, não podia ficar
com você. — Olhou para o Jason. — Se tivesse, teríamos morrido os dois
sozinhos, sem dinheiro e sem lugar para morar. Não estou pedindo que me
perdoe, porque isso é impossível. Aceitei esta doença como um castigo por
fazê-lo sofrer todos esses anos.
— Mamãe, não morra — pediu Jacob, tocando o rosto dela. Ele estava
chorando. — A senhora agente e Jason vão levá-la a um hospital melhor,
então...
— Meu garoto, sempre tentando conseguir um jeito de me salvar...
— Se a senhora sabia que Jason Falcon era nosso irmão, por que não
pediu a ele para contratar um médico bom que a curasse? — Julie sussurrou
com lágrimas nos olhos.
Rebeca respirou fundo e se encolheu, tossindo por alguns segundos.
— Mamãe! — gritaram Jacob e Julie em uníssono.
Jason saiu do transe e deu mais um passo na direção da cama, mas
parou quando Rebeca falou, ofegante:
— Jason... Eu o magoei muito, não achava justo aparecer e pedir algo
assim a ele, só por ser famoso e ter dinheiro. Eu mereço seu ódio por mim...
— Não odeio a senhora. Houve um tempo que sim, mas não mais. —
Chegou perto de sua cama e tocou o rosto dela, limpando as lágrimas.
— Eu sempre amei você, Jason, tanto que guardo suas coisas de quando
era criança no trailer. Carrego comigo tudo que era seu. Foi a forma que
achei de ter um pedacinho de você comigo. Sinto muito, meu filho. Eu tentei
te achar depois, na Geórgia, mas seu pai se mudou, levando você com ele, e
perdi o contato...
— Está tudo bem, mamãe. Não fale agora, apenas descansa um pouco...
— Eu não tenho muito tempo. Você precisa tomar conta dos seus irmãos
para mim. Sei que o pai de Jacob vai querer ficar com ele só para ter Julie,
então os proteja. Eu me entristeço de partir e não poder protegê-los.
— Prometo, ninguém tocará nos dois, juro pela vida da minha filha.
Ela sorriu.
— Não esperaria nada menos de você, Jason. Com o sofrimento que
deve ter passado com seu pai, você nunca se tornaria igual a ele. Sempre foi
um garoto bom.
Jason respirou fundo.
— Tudo graças à Tabitta, minha noiva. Ela transformou a escuridão que
eu tinha, em luz. E me deu uma filha linda, olhe ela aqui. — Tirou seu celular
do bolso e mostrou a foto de Emily jogando um beijo para ele. — Ela é meu
raio de sol.
— Linda! Se parece com você. Fico feliz que esteja contente, meu
garoto. Tornou-se um homem grande e forte. — Pousou os olhos atrás dele e
se deparou comigo ali, espiando o momento da família. — Foi você quem
trouxe a luz para a vida do meu filho?
Eu me endireitei e entrei no quarto, ficando perto do Jason, que estava
com os olhos úmidos. Sabia que a morte dela estava chegando. Meu coração
doeu por ele, porque ao contrário do seu pai, sua mãe se arrependeu do que
fez. Eu queria tirar sua dor, mas não podia.
— Ele também trouxe luz à minha — falei a verdade. — Quero dizer
que descanse em paz. Jason e eu perdoamos a senhora por tê-lo deixado.
Juramos dar amor e carinho a Jacob e Julie.
Ela olhou para Jason por um segundo, como se estivesse buscando
confirmação para o que eu falei.
— Sim, perdoo a senhora. — Abaixou-se, beijando a testa dela. —
Também sempre te amei e vou amá-la para a eternidade, mamãe.
Alguns segundos depois, Rebeca deu seu último suspiro. Os meninos
começaram a gritar e chorar ainda mais, depois o médico entrou e a deu
como falecida, desligando os aparelhos. Era como se ela estivesse se
mantendo viva só para vê-lo antes de morrer. Felizmente, os dois se
despediram.
Abracei os meninos, oferecendo conforto a eles, já que não podia tirar
a dor que sentiam. Jason saiu do quarto quase correndo. Eu me afastei deles,
cujos olhos vertiam lágrimas.
— Já volto — falei aos dois e fui atrás de Jason. Ele estava do lado de
fora do quarto, no corredor, e já ia lançar um soco na parede. — Não ouse se
machucar! — gritei.
Ele freou o seu punho e me fitou com seus olhos atormentados, também
molhados.
— Nunca se machuque porque está sofrendo, Jason. Se quiser bater em
algo porque está assim, bata em mim...
Puxou-me para seus braços e chorou.
— Dezoito anos sem ela, sem saber nada a seu respeito, e quando a
encontro, em quinze minutos minha mãe morre? Não é justo, por que ela não
me procurou? Poderia estar viva agora... — continuou balbuciando.
— Você precisa ser forte, seus irmãos necessitam de você, tudo bem?
Carecem do seu apoio. E eu estarei ao seu lado, sempre — jurei. — Agora
vamos voltar para o quarto, pegá-los e organizar o funeral de Rebeca.
Capítulo 16
Promessa

TABITTA
Três meses depois

Foram três meses difíceis, mas também felizes por ter Jason, Emily,
minha família, meus amigos e os dois novos irmãos de meu amado noivo.
Jacob e Julie estavam lidando do jeito que podiam com a perda de sua mãe.
Adoravam ficar com Jason e comigo. Ele ficou com a guarda definitiva de
Jacob, já que o pai dele era um criminoso e passaria muitos anos na cadeia.
Jason pegou as coisas que sua mãe guardava dele: meias, chupeta,
macacãozinho e uma carta, onde dizia que sentia muito por tê-lo deixado, e
também para cuidar dos irmãos. Ficou destruído por semanas após sua
morte, mas Emily, Jacob e Julie faziam biscoito e chocolate e levavam na
cama para ele.
Entretanto, o que fez Jason levantar mesmo e deixar um pouco sua dor
de lado foi o sofrimento do Ryan. Não que eu me importasse com aquele
filho da puta...
Há três meses, Angelina me procurou pedindo minha ajuda para
protegê-la, porque Ryan queria que ela tirasse o filho dos dois. Isso já me
fez odiá-lo muito mais. E o pior: falou que, ao ter o filho, corria perigo de
morrer. Angelina era cardiopata, então não podia ter filhos sem se arriscar.
— Tem certeza de que você quer isso? — inquiri, assim que a levei
para minha casa de praia, um lugar que ninguém sabia que tinha. Eu iria
guardá-la de todos, inclusive de seu namorado, que não queria que ela
tivesse a criança justamente para não morrer no parto.
A casa de madeira avermelhada dispunha de quatro quartos, sala e
cozinha.
Ela suspirou com os olhos molhados.
— Só não conte a ninguém que estou aqui, muito menos ao Jason,
porque tenho certeza de que ele diria ao Ryan... — Encolheu-se. — Também
não me diga nada do que vier a saber lá fora sobre ele... De como está
lidando com a dor.
— Eu prometo, Angie, não vou dizer nada — jurei.
Essa promessa que fiz à Angie me custou muitas brigas com Jason, mas
não ia traí-la, porque ela precisava da minha ajuda e proteção.
— Ele é meu amigo, droga, e está sofrendo agora, não vê isso? —
sibilou uma noite, quando pediu para eu dizer o paradeiro dela.
— Não posso quebrar minha promessa. Se aquele filho da puta se
preocupasse com ela, não a mandaria abortar seu filho. Só não fui lá dar uma
lição nele porque ela pediu — gritei de volta.
Depois disso, tivemos várias discussões. Para não brigar mais, me
mantive focada no trabalho, e ele viajando para suas lutas. Eu ligava todas
as noites. Jason atendia, mas não dizia nada, e ficávamos os dois ali, sem
falar por um momento. Até ele suspirar e dizer que me amava, e eu de volta.
Isso acontecia sempre que estávamos longe um do outro.
Por três meses, mal nos tocamos, e quando fazíamos, ao acabarmos, ele
virava as costas para mim, me ignorando. Eu sabia que merecia isso por
esconder Angelina.
Johnny e Charles, amigos de Angelina (e namorados, o que era um
desperdício, porque os bofes eram lindos) cuidavam dela para mim enquanto
eu não podia durante esses meses. Eles a amavam tanto quanto eu. Mas eu
escapulia durante o serviço e ia com ela nas suas consultas médicas. Pegava
ruas diferences para não ser seguida por alguém que estava caçando Angie,
Bryan era um deles.
— Seu bebê está se formando bem, acredito que daqui a dois meses já
podemos fazer uma cesariana — o médico disse. — Completaram seis
meses hoje, então com oito meses podemos tentar. Você aguentará até lá?
Angelina ficava mais fraca a cada segundo, tanto que nos dez últimos
dias tive de dizer ao Jason que ia a trabalho ao Alaska, só para fazer
companhia a ela. Ele desconfiou, seus olhos se estreitaram, mas não disse
nada, já que nossa comunicação estava nula por enquanto. Esperava fazer as
pazes em breve.
Angie estava ofegante, mal andava e ficava sem ar. Eu queria ajudar,
contudo, não podia fazer nada por ela, apenas permanecer ao seu lado e
amar a filha que ela estava esperando.
— Que nome vamos dar à nossa menina? — indaguei ao colocá-la na
cama. Escondia meu desespero e medo de que ela não resistisse à cirurgia.
Ela não precisava saber o quanto estava sofrendo por me sentir impotente.
Angie sorriu, arquejando, e alisou a barriga. Deitei ao seu lado e
também passei a mão ali, sentindo nossa bebê chutar.
— Victoria, porque se parecerá com o pai e será um milagre tê-la. Eu
vou conseguir, certo, Taby? — perguntou, chorando. Eu a abracei forte e
beijei seus cabelos.
— Vocês duas conseguirão, minha querida. Nós ainda vamos atirar nos
garotos que vierem convidá-la para sair — eu disse.
Ela riu.
— Só você para me fazer rir em uma hora assim. Mesmo ele não
estando aqui comigo... — Expirou, fechando os olhos. — Estou feliz por
nossa filha estar bem...
Eu não queria pensar no Ryan, porque sempre que o fazia, me dava
vontade de matá-lo. Por que aquele filho da puta não usou preservativo? Se
ele tivesse feito isso, hoje a vida dela não correria perigo. Não só ela, como
Victoria também.
Mandei Emily, Shane e Lira, irmãozinhos de Angelina dos quais ela
tomava conta desde que seus pais morreram, irem passear com Samira, que
ficou ao meu lado o tempo todo. Uma amiga que valia ouro.
Estava prestes a ligar para Jason. Ele chegaria aquele dia de uma luta
em Londres. Eu precisava fazer alguma coisa por Angie, estava com medo
dela não conseguir. E ela amava aquele fodido do seu namorado. Se ele a
fizesse feliz, talvez isso desse mais forças para minha amiga lutar por sua
vida.
A campainha tocou antes que eu pudesse ligar para ele. E não foi
preciso, porque era Ryan na porta. Uma fúria me subiu por ele estar ali, de
pé, enquanto ela estava acamada e com a respiração pior. Sua cardiopatia se
agravara porque resolveu parar de tomar os remédios para não prejudicar a
bebê.
Abri a porta e olhei para o cara de quem sentia raiva desde que soube o
que ele fez. Não dei a mínima para se estava sofrendo ou não. Fechei minhas
mãos em punhos e fui esmurrar sua cara, mas o bastardo se esquivou.
— Seu filho da puta — rugi. Estava prestes a matá-lo, mas fui levada
para longe dele pelo Jason, que me pegou pela cintura e me carregou até a
cozinha. — Vou cortar seu pau com faca cega e fazê-lo comer, seu
desgraçado. Vou pegar uma pá e estripá-lo com ela! — continuei xingando. O
que me fez ficar com mais raiva foi que ele me ignorou e subiu a escada,
indo para o quarto de Angelina.
Jason me imprensou na parede.
— Quer se acalmar? Você não pode enfrentar um homem como Ryan, a
sua cabeça não está em um bom lugar neste momento. — Afastou-se, mas
sentia que ele estava grilado comigo, foi assim durante três meses.
— Ele merecia que eu fizesse coisa pior — rosnei. — Castrá-lo ainda é
pouco.
— Ficou maluca? Ele está sofrendo todo esse tempo longe dela, droga,
e você podia ter aliviado isso para ele, mas não o fez. Decidiu até se afastar
de mim só para não ter que contar. Como foi seu trabalho no Alaska? —
acusou. — Você mentiu para mim.
Estreitei os olhos.
— Você também mentiu quando disse que ainda estava em Londres, não
é? Enquanto, estava em um maldito clube de strippers em Chicago com Dom
— sibilei.
— Acha que eu a trairia? — Uma sombra escura atravessou suas
feições. Isto me lembrou de quando o conheci e duvidei dele, sua expressão
ficava assim.
— Faz quanto tempo que não transamos? Uma ou duas semanas? Isso
sem contar que era frio depois que terminava, o que sempre comprova que o
homem tem outra mulher...
Ele me cortou, agora furioso.
— Você não confiou em mim para resolver a coisa com Ryan e
Angelina, apenas a escondeu e não me disse nada. Vi meu amigo definhando
a cada dia sem ela. E sabe por que eu queria ajudá-lo, mesmo ele não
merecendo? Porque eu fiquei daquele jeito quando me deixou, e não foram
três meses não, foram quase nove anos num maldito purgatório. — Expirou,
ganhando gás. Eu me encolhi por lembrar do seu sofrimento. — Ele está
agora lá em cima naquele quarto sofrendo, vendo a sua mulher doente e
moribunda, sem saber se ela vai sobreviver ao parto. Como acha que ele
está, hein?
— Ele pode estar sofrendo, mas eu fiz uma promessa a ela, não podia
dizer nada a ele e nem a ninguém...
— A sua proeza com a promessa diminuiu o tempo dos dois, porque ela
pode...
Eu me lancei para ele, batendo no seu peito. Peguei-o desprevenido.
Estava sofrendo e com raiva dele pensar e dizer isso.
— Ela não vai morrer, está me ouvindo? Ela não pode morrer! —
Socava e chorava ao mesmo tempo. — Se ela precisar de um coração novo
para viver, eu lhe dou o meu...
— Oh, Deus, Tabitta! — balbuciou entristecido e me puxou para si. Eu
quebrei ali, nos braços de Jason, despedaçada tanto por ficar longe dele esse
tempo, quanto pelo meu medo de perder Angie, que era mais como a irmã
que nunca tive, tal qual Samira.
Ele alisava meus ombros, esperando que eu me acalmasse.
— Nunca a trairia, Taby, independentemente de estarmos brigados,
jamais tocaria em outra mulher. Só você importa. — Beijou a minha testa.

A cirurgia de Angie foi marcada para aquele dia, porque ela acordou
pior, não conseguia nem se mexer direito.
Estávamos todos na porta que levava ao centro cirúrgico, observando-a
encolhida na maca, ofegante pela dor que sentia.
— Vai dar tudo certo, Angie — Charles disse, beijando sua testa, e
Johnny também.
— Estaremos aqui com você — Johnny alisou seu rosto.
— Obrigada, pessoal — sussurrou. — Vocês são os melhores amigos
de todos os tempos...
— Eu a amo, sempre — declarei, chorando. Queria acabar com seu
sofrimento, mas não podia.
Angie não respondeu, acho que não conseguia falar. Para ela, devia ser
doloroso conversar, sendo que não tinha muito oxigênio nos pulmões.
Depois, seus olhos molhados pousaram em Ryan. Os dele também estavam
úmidos. O cara realmente a amava, e não era pouco.
— Amo você, Ryan — afirmou, meio sem ar. — Lutarei por nossas
vidas, tanto a minha como a de nossa filha.
Ele ficou em silêncio por um instante, sem conseguir falar, acredito que
controlando o desespero por ela entrar naquela sala sem saber o que
aconteceria com Angie e nosso bebê. Sim, “nosso”, pois eu seria a segunda
mãe de Victoria.
Minha amiga o encarava com ansiedade, como se buscasse saber que
ele acreditava nela quando dizia que voltaria.
— Sim, eu sei que vai — disse e a beijou nos lábios. — Eu também te
amo para sempre, minha vida.
Eu estava encolhida e chorando, tamanha era minha dor e impotência, à
semelhança de Ryan. Jason passou os braços à minha volta e beijou minha
testa, me dando conforto.
— Promete que se for para escolher entre eu e Victoria... você vai
salvá-la?
Arregalei os olhos diante do que ela pedia para ele. Todavia, depois de
pensar um segundo, eu faria a mesma se estivesse no seu lugar. Se fosse para
optar entre eu e Emily, salvaria minha filha.
Notando a dor e o desespero de Ryan, percebi que seria um tormento
imenso escolher entre as duas pessoas que ele mais amava. Seria como ser
dividido ao meio.
— Anjo...
— Prometa, Ryan — suplicou. — Porque se me escolher... eu não
conseguirei... — Sua voz sumiu quando ela desmaiou ali na nossa frente.
Todos nós soltamos gemidos de dor e desespero com medo de perdê-la.
Ryan começou a gritar, tocando seus ombros, mas Lucky e Jason foram até
ele e o arrastaram para longe dela. Os médicos a levaram correndo para o
centro cirúrgico.
— Deus, Lucky! Se ela morrer, eu... — Ryan estava em pânico. Ele se
escorou na parede e quebrou ali, puxando as pernas e se abraçando,
parecendo uma criança desolada.
Lucky ficou falando com ele, tentando aconselhá-lo e acalmá-lo. De
repente, Ryan se levantou e seus olhos pousaram em mim, o tom caramelo
escurecido. Lançou-se na minha direção. Por sorte, Jason tinha um bom
reflexo e o impediu de me atingir.
— Por sua culpa tive pouco tempo com ela — esbravejou, querendo me
matar. — Sua vadia desgraçada...
Foi cortado quando Jason o imprensou na parede; chegou a gemer.
— Entendo seu sofrimento, porque fiquei do seu lado todo esse tempo
em que ela não me revelou onde estava Angelina. Arrisquei meu
relacionamento por você, porque não achava justo sofrer longe da sua
mulher. Mas não ouse chamá-la assim de novo, ou eu vou esquecer que está
sofrendo e revidar como homem — alertou Jason.
Lucky entrou no meio e afastou Jason, olhando de um para outro.
— Maldição, porra! Estamos em um hospital e sua mulher está tendo
sua filha agora, então não pense que teve pouco tempo com ela, porque
haverá mais para vocês dois, ok? Um futuro onde criarão sua filha juntos —
disse para um Ryan encolhido.
Ryan não respondeu. Foi para uma vidraça com vista para a cidade,
mas aposto que ele não via nada, apenas escuridão e dor. Eu estaria assim se
fosse Jason naquela sala, por isso não briguei ou senti raiva dele, embora
ainda guarde ressentimento por ele não ter se prevenido.
Lucky se virou para o Jason.
— Não é hora para isso, nem o lugar, droga. — Jogou as mãos para
cima num gesto frustrado. Sam foi até Ryan e passou os braços na cintura
dele.
— Falei com a enfermeira para saber como ela está...
— O que ela disse? — A voz dele parecia morta, aliás, ele parecia
morto.
— Que a respiração dela estabilizou e estão fazendo a cesariana neste
momento. — Soava fraca. — Ela vai ficar bem, Ryan. Não precisa temer.
— Angie é uma guerreira, sempre foi. Lutou pelos irmãos, pelos
amigos, agora fará o mesmo por você e sua filha — declarou Charles,
olhando o Ryan. Ele não viu, porque fitava a janela de vidro.
— Ela vai sair dessa e voltará para nós — assegurou Johnny.
— Vocês dois também sabiam onde ela estava esse tempo todo e não
disseram nada — sussurrou desprovido de vida, sem olhar para Johnny e
Charles.
Johnny suspirou.
— Eu lamento, cara. Ela nos pediu segredo, e minha ajuda foi para
rastrear as consultas médicas e deletar tudo para o Bryan não achar nada. —
Mirava as costas do Ryan. — Sei que foi errado, mas não podia dizer “não”,
eu a amo como uma irmã.
— Fizemos isso por Angie — afirmou Charles a todos.
— Vocês três são um bando de traidores — Ryan, venenoso, falou para
Charles, Johnny e eu. — Torçam para ela sair dessa ou eu vou destruí-los.
— Olhou para o Jason. — Não me importa se ela é sua mulher ou não.
Jason já ia dando um passo até ele, mas segurei sua mão e o mantive
perto de mim. Ryan deu de ombros com o meu gesto, virou as costas para nós
e seguiu fitando o nada.
Não liguei para suas ameaças, porque sabia que ele estava sofrendo
com tudo o que aconteceu. Se não fosse isso, ele jamais ameaçaria as
pessoas. Muito menos a mulher do seu amigo.
— Não é só você que a ama, ouviu? Nós também a amamos e estamos
com ela há mais tempo que você. — Eu não queria abrir minha boca,
contudo, não conseguia simplesmente deixar de lado.
— Eu não quero ouvir sua voz — rosnou para mim.
— Sosseguem, os dois — ordenou Jason.
— Ele começou... — Meu telefone tocando me interrompeu. Franzi a
testa, não queria atender ninguém agora, mas era o nome do Bryan. O que
será que ele queria? Pelo que eu saiba, estava trabalhando disfarçado na
Rússia para podermos pegar o chefe mafioso.
— Oi, olha, agora não é um bom momento para falarmos...
— Quem é? — perguntou Jason.
Bryan me cortou.
— Alexia foi sequestrada...
— Oh, meu Deus, não! — Meu tom saiu agudo e mais alto. Abaixei a
voz porque uma enfermeira fez careta para mim.
Jason veio até mim.
— Você está bem?
— Não entre em pânico agora, mas tem alguém disfarçado aí no
hospital para matar Angelina. Chris e Landon a pegaram e está sendo
mantida em uma sala até a polícia chegar. Stive Lutner queria vingança, e
sequestrou Alexia também.
— Oh, Deus! — repeti. — Resolverei isso e depois vou aí te ajudar.
— Não precisa, tem muita gente aqui para me dar cobertura, apenas
cuide da Angelina. Agora tenho que ir.
Guardei o celular e peguei a arma na minha bolsa.
— Tabitta, pelo amor de Deus, me diga o que houve, está me deixando
louco. — Jason pegou meu braço.
— Não posso explicar agora. — Saí correndo, parei na frente do Lucky
e olhei para ele, que ficou tenso me vendo com uma arma. — Não deixe
Jason vir atrás de mim.
Fui à sala onde a mulher estava sendo mantida sob custódia,
supervisionada por Landon e Chris. Encarei-a com uma fúria assassina, me
controlei para não puxar o gatilho; se o fizesse, me arrependeria para
sempre. Sentava-se na cadeira, algemada com as mãos para trás. Landon e
Chris conseguiram uma sala vazia para eu interrogá-la até a polícia chegar.
— Como a descobriram aqui? — perguntei aos dois. — Qual é o nome
dela?
— Luana Savvy — respondeu Landon. — Bryan ligou e me disse o que
estava acontecendo, então fiz uma varredura pelo hospital e descobrimos
essa mulher, que não trabalha aqui, vestida com o uniforme de enfermeira.
— Agora me diga onde está Alexia...
— O que minha irmã tem a ver com isso? — perguntou Alex.
Virei-me e estavam todos ali, espantados, Jason incluso.
— Eu falei para impedir Jason de vir me procurar — recriminei Lucky.
— O que está acontecendo? Quem é essa garota e o que a Alexia tem a
ver com isso? — perguntou Jason, chegando perto de mim.
Ignorei-o e fitei a menina, que estava chorando.
— Quero saber onde ela está e por que veio para matar Angelina.
Todos arfaram, em especial Ryan, ao meu lado.
— Você tentou matar minha mulher? Porra! — gritou na cara dela,
fazendo-a ir para trás com o corpo. A cadeira só não caiu porque estava
escorada na parede.
— Stive me pediu para acabar com sua vida, ele disse que nós dois só
podíamos ficar juntos se eu injetasse a agulha com veneno na garota antes
dela ter a criança, assim morreriam as duas. — Sorriu para nós, balançando
a cabeça como se tivesse um tique nervoso. — Ele me ama, sei que vai fazer
a loura pagar.
— Oh, Deus! Ela é louca. — Entrei na frente do Ryan, que parecia que
queria matar a garota de uns vinte anos, mais ou menos. — Ryan, eu cuido
disso, então se afaste. Lucky — chamei o irmão dele, porque Ryan hesitou.
Olhei para a garota morena com cabelos longos e presos em um rabo de
cavalo. O que a loucura não fazia? Isso não era amor, ela precisava de um
psiquiatra urgente.
— Vou te dizer quem é Stive Lutner: um monstro. Ele conquista suas
vítimas, as sequestra, espanca e estupra, depois joga seus corpos no lixo.
Quer mais ou continua apaixonada? — Meu tom era mortal, ignorando seus
olhos arregalados. — Me diga onde esse maldito levou Alexia, ou eu juro
que vou usar um método de descobrir as coisas nada dentro da lei. Adianto
que será doloroso.
Então ela me disse que ele estava em Chicago, e Alexia em um hotel em
Nova York. Pena que nos encontrávamos longe demais para acabar com o
verme desgraçado. Mas eu não entendi: se ele estava em Chicago, por que
manter Alexia em cativeiro em Nova York?
Alex saiu desesperado assim que soube da localização de sua irmã.
Rayla foi com ele. Liguei para o Bryan para avisar sobre Alexia, caso já não
soubesse; afinal, talvez tivesse descoberto seu esconderijo antes de mim. Ele
disse que Daemon, do MC Fênix, já estava com ela. Bryan falou que o cara
era um excelente rastreador, foi ele quem encontrou Angelina para Ryan.
Indaguei o que fariam quanto ao Stive, e Bryan respondeu que quanto
menos pessoas soubessem onde estava, melhor. Um gelo desceu por minha
espinha ao imaginar que tivesse matado o cara. Não que Stive não
merecesse, porque merecia, sim. Mas se Bryan fizesse isso, estragaria sua
vida.
Quatro horas depois do episódio da louca assassina, o médico apareceu
e avisou que a cirurgia foi bem. O tempo seria essencial para sua
recuperação. Fizeram a cesárea e operaram seu coração.
— Então ela vai viver? — sondou Ryan com esperanças na voz.
— As primeiras vinte e quatro horas nos dirão — disse o médico, Raul,
o mesmo que operou Shane, irmão da Angelina, alguns meses atrás.
— E a Victoria, como está? — questionei.
— Ela está bem agora, mas na incubadora por ter nascido prematura.
Acredito que vai sobreviver.
Fomos para o berçário ver nossa bebezinha linda. Angelina não
podíamos visitar ainda, só quando ela fosse para o quarto.
— Oh, que perfeita! — Queria pegá-la nos braços, mas não podia, teria
de esperar. Ela era tão miudinha. Enfiei as mãos no buraco da incubadora e a
toquei. Victoria estava dormindo. Acariciei seu rostinho redondo e meio
inchado.
— Fofinha da tia. — Sam, que também teve uma menininha linda,
babava por ela.
— Mamãe número um não pode estar aqui agora vendo você, mas a sua
segunda mamãe está, e sua tia também — sussurrei, sorrindo.
Ryan se aproximou. Seus olhos estavam molhados e maravilhados,
como se presenciasse um milagre. E, realmente, era um milagre ela estar
viva.
— Quer tocá-la? — perguntei a ele. — Coloque o braço aqui. — Fez o
que eu pedi sem reclamar, acho que ele não estava vendo mais nada ali, só
ela, Victoria. Meio desajeitado, tocou seu rostinho lindo.
— Tão pequena e linda! Como a mãe — murmurou. — Maravilhosa,
meu pequeno anjo.
— Sim, ela é. — Lucky sorriu, batendo nas costas do irmão.
— Se Angie não conseguir...
— Angelina ficará bem, Ryan — garantiu Lucky.
— Eu só estou dizendo... Você pode tomar conta da minha filha? Você e
Sam são as únicas pessoas que conheço e nas quais confio para amá-la, além
de Rayla, mas ela está grávida — sussurrava atormentado ao irmão.
— Prometemos, Ryan. Mas Angelina vai ficar bem, acredite e tenha fé
— assegurou Sam.

Três dias depois da cirurgia, Angelina acordou. Não pude ficar mais
feliz com isso. Agora minha amiga estava segura de dois loucos, porque
Franklin disse que não tocaria nela e nem em ninguém da sua família, e Stive
Lutner... Bem, desse não tive notícias.
A alegria de ter Angelina e Victoria perto de nós superava tudo. Pedi a
todos para manter a sua tentativa de assassinato longe dos seus ouvidos, até
que ela ficasse cem por cento boa.
Capítulo 17
Infiltrados

JASON
Dois meses e meio depois

Olhei para a mulher que estava debaixo de mim, com meu pau
penetrando-a centímetro a centímetro, suas unhas rasgando minhas costas e
seus pés prensando minha bunda, querendo mais de mim.
— Céus! — gritou. — Sim, Jason, me fode mais forte.
— Oh, querida, eu vou — rosnei e dei o que minha garota queria. A
cada estocada, a levava ao ápice do prazer. Coloquei uma mão entre nós e
esfreguei seu clitóris, fazendo-a gritar. — Goze no meu pau, quero senti-lo
quente com seu gozo.
Empurrei mais forte meus quadris, em sincronia com os dela. Adorava
a sensação de ter meu pau dentro de Taby, sentir suas unhas me deixando
marcado. Ela disse que o faz para todas as mulheres na academia verem que
tenho dona; aprecio essa possessividade. Ela puxou minha boca para a dela
e chupou minha língua com um gemido rouco, até que gozou gritando, mas
nossas bocas abafaram o som. Eu a segui logo após. Fiquei em cima dela por
um segundo, depois me retirei e beijei sua testa.
— Essa foda foi... uau — sussurrou, beijando meu peito. Sempre fazia
isso onde ficava nossa tatuagem, como se a quisesse ali de volta. Não dizia
nada, mas eu entendia.
— Vou fazê-la de novo — disse, avaliando seu rosto. — A tatuagem,
quero dizer.
Ela sorriu.
— Não precisa, Jason. Sei que estou aqui. — Colocou a mão em meu
coração. — É por isso que eu beijo o local, agradecendo por estar dentro de
você sempre.
Eu sorri.
— Também gosto de estar dentro de você. — Beijei seus lábios, depois
falei sério: — Sim, você está no meu coração, mas quero uma tatuagem que
simbolize não só você, mas Emy, Jacob, Julie e minha mãe.
— Hummm — murmurou e pegou minha mão. — Você pode pôr as
iniciais dos nossos nomes nos seus dedos. Ficaria lindo. Também farei, mas
colocarei os nomes nas asas da borboleta. O que acha?
— Como é possível eu amá-la mais do que já amo? — perguntei a mim
mesmo. Ela tratava meus irmãos como se fossem nossos filhos.
Jacob e Julie estavam indo à escola que Emy frequentava. Os dois se
deram bem ali, adaptando-se depressa. Às vezes Emy chegava reclamando
que Jacob não a deixava conversar com nenhum coleguinha da escola.
Gostava de como protegia as duas meninas; enfrentou um homem em um
elevador só para salvar minha filha, e nem sabia que era tio dela. Tremia ao
pensar nos perigos que encararam aquele dia, não só ele, mas Julie também.
Por sorte, Emy não pensava mais em namorar o Jacob, já que eram parentes.
Argh, não queria imaginá-la namorando alguém, talvez daqui a uns vinte
anos.
— Fico feliz com isso — falou, sorrindo. — Acha que consegue mais
uma? — Ela me montou. Olhei para cima, me deparando com a coisa mais
bela do mundo. Antes de continuarmos, parei, pois ouvi um carro
estacionando na frente da casa. O segurança deve ter reconhecido, já que
deixou entrar.
— Acho que vamos ter que esperar. — Sentei-me com ela ainda no meu
colo, peguei o seu seio e coloquei-o na boca, mordiscando. Taby gemeu e já
ia encaixar meu pênis na sua entrada, quando a campainha tocou sem parar.
— Juro que vou matar quem estiver na porta — rosnou, saindo de cima
de mim e indo no banheiro se limpar. Vestiu um top e short curto, deixando
sua barriga à mostra, e as pernas também.
— Vai descer assim, sendo que nem sabemos quem está lá embaixo? —
Levantei-me também e coloquei uma bermuda. Ia vestir uma camiseta, mas
ela precisava mais. — Bote isso para eu não assassinar alguém por olhar
minhas gostosuras. — Pus a mão na sua boceta por cima do short e apertei-a.
Ela gemeu, e o som foi direto no meu pau.
— Maldição! — sibilou com raiva, saindo do quarto pisando forte.
Ri do seu jeito fogoso e sexy. Taby abriu a porta e meu ânimo se foi.
Por ela entraram Dennis, Lincoln e Bryan. Os três ergueram as sobrancelhas
para nós, Dennis e Bryan sorrindo; já o filho da puta do Lincoln fez uma
careta desgostosa.
— Interrompemos alguma coisa? — perguntou Dennis com um sorriso
debochado.
Observei a reação dela, para checar se ao menos ia corar um
pouquinho, mas nada. Apenas estreitou os olhos.
— Sim, estávamos indo para a segunda rodada e vocês nos
interromperam — rosnou, enquanto eu sorria, orgulhoso da minha mulher
fogosa. — Então espero que seja importante.
Dennis revirou os olhos.
— Eu diria que lamento empatar, humm... o momento de vocês, mas é
necessário. — Seu tom agora era sério. — A festa de casamento do Ryan
Donovan será vigiada pelos Bravata...
Taby ofegou de pavor.
— Espere, o quê? — arquejou. — Vamos prendê-los antes disso, não
é? Eles não podem estragar o casamento da minha amiga.
— Nós pensamos em usar seu relacionamento com Jason hoje na festa.
Vocês entram em uma discussão, e Tabitta sai correndo da igreja, levando
todos a segui-la.
— Isso não vai acontecer. Não vou deixar esse bando de assassinos ir
atrás dela — rosnei com os punhos cerrados. — Por que não aparecem lá e
prendem todos os suspeitos?
— Porque não sabemos quem são, só que estarão à espreita para levá-
la com eles. E para não haver tumulto ou até tiroteio na igreja, decidimos
fazê-la se afastar das pessoas. Nós a seguiremos. E quando os capangas de
Andrey aparecerem para sequestrá-la, pegaremos eles — falou Lincoln.
Tinha algo nesse cara que me fazia não confiar nele, e eu não parecia ser o
único que notava isso; Bryan o olhava com raiva.
Ela avaliou os três ali na sala.
— Mas assim não pegaremos o Andrey! Sei que ele está em algum lugar
escondido em Manhattan, então o que vocês querem não é só que eu saia da
festa, e sim que seja capturada com uma escuta. Deste modo, teremos provas
contra ele. — Ela era esperta, soube exatamente o que eles estavam
enrolando para dizer.
— Isso não está acontecendo — grunhi para os três. — Sem chance no
inferno.
— É o único jeito — interveio Dennis. — Sem isso, não vamos pegá-
lo, porque ele não vai sair da toca. O que adianta termos as provas e não a
pessoa para prender?
— Irônico, não é? Temos Sebastian Ruiz, mas não provas suficientes
para prendê-lo, e temos provas sobre Jacov, mas não conseguimos chegar
nem no mesmo espaço que ele — Bryan parecia falar com ele mesmo. — O
homem está fora do radar.
Ela ignorou Bryan e me fitou. Eu conhecia esse olhar, era de quando ela
queria fazer algo para um bem maior, mesmo que se sacrificasse no
processo. Minhas entranhas se reviraram, eu não podia deixar isso
acontecer, não podia.
— Jason, querido, dependemos disso para sermos felizes, precisamos
dele preso e do Sebastian também. — Olhou para o Dennis. — E se ele
quiser me usar de moeda de troca com Sebastian? Garanto que não vai se
entregar para me libertar.
— Bom, ele não terá exatamente uma escolha, então o bastardo estará lá
quando Jacov exigir a troca. Prenderemos os dois de uma vez — assegurou
Dennis. — Topa?
— Papy não sabe desse nosso esquema, não é? — inquiriu.
Dennis olhou para o Lincoln, que parecia nervoso demais para o meu
gosto.
— O agente Lincoln disse que tinha conversado com Thomas, e que ele
concordou.
Ela estreitou os olhos para Lincoln e Dennis, depois suspirou.
— Tudo bem, eu aceito — disse.
Assim que os três saíram, correu para o andar de cima, e eu a segui.
— Sabe que isso não vai acontecer — falei, vendo-a ir para o banheiro
e tirar as roupas. — O que está fazendo, Taby?
Ela não respondeu, só me mostrou uma escuta no bolso do shortinho que
usava antes. Eu já ia abrir a boca, mas ela me silenciou, beijando-me,
gemendo e gritando, em êxtase.
— Me foda mais fundo. Isso mesmo, querido, amo seu pau dando cada
estocada dentro de mim. — Ela me cutucou para eu dizer mais alguma coisa.
Revirei os olhos, mas entrei no jogo, seja lá qual fosse seu plano. Sabia
que ela tinha um. Virei-a de costas para a parede.
— Você ama meu pau, querida? — Tirei para fora meu pênis e penetrei-
a por trás, fazendo-a gritar. — Então ele é todo seu, cada centímetro. —
Puxei seus cabelos para trás, lambi seu pescoço e mordisquei sua orelha.
Uma mão amassava seus seios, e a outra circulava seu clitóris.
— Oh, céus! Isso mesmo, mais forte — gritou.
Seja quem fosse que colocou a escuta, curtiria uns bons gemidos. Fiz
uns sons mais altos para abafar os dela ao ser fodida, não queria nenhum
filho da puta ficando excitado às suas custas.
Dei mais duas estocadas e acelerei meus movimentos no meu bebezinho
rosado. Puxei de leve seu clitóris, ao que chamou meu nome e se
desmanchou nos meus braços. Gozei logo em seguida.
— Você nunca me decepciona, querido noivo — sussurrou, beijando
meu peito, e foi para o chuveiro toda sorridente.
— Eu e meu pau estamos aqui para servi-la, minha querida noiva. —
Tirei minhas roupas e entrei no chuveiro com ela. — Agora vou mostrar o
quão bom eu sou com a boca.
— Oh, querido, já sei o quão talentosa sua língua é — murmurou,
rouca. Apertou suas pernas, contendo o atrito ao imaginar minha boca
sugando sua boceta deliciosa. Mas eu não daria mais um show da minha vida
privada para quem estivesse ouvindo.
— Você a fez ficar talentosa, porque eu a coloquei só em você em toda
a minha vida — disse a verdade. Por mais que tenha feito muito sexo por aí,
nunca botei minha boca nas mulheres, nem antes de conhecer a Tabitta.
Ficava feliz por não ter feito, porque o sorriso que ela me lançou agora valia
mais do que tudo na vida.
— Você é o melhor homem do mundo. — Pulou nos meus braços. — Eu
o amo.
— Eu também, minha linda. — Dei um beijo de leve nos seus lábios.
Saímos do chuveiro e nos vestimos, eu de jeans e camiseta com jaqueta,
e ela com uma calça de couro, moldando suas curvas gostosas. Fomos para a
garagem.
— Então, vai me dizer o que está acontecendo?
Taby olhou para mim.
— Quando os três vieram aqui naquela hora, Lincoln se aproximou de
mim e tocou minha bunda...
— Espere, o quê? — cortei-a, furioso. — Eu vou quebrar todos os seus
dedos.
— Pode fazer isso depois. Na hora, eu senti e também ia bater nele,
mas Bryan me lançou um olhar significativo, que normalmente só dá quando
está planejando alguma coisa.
— Você está dizendo que esse filho da puta do Lincoln é infiltrado...
— Acabei de falar com Bryan, soube que Lincoln é russo e trabalha
para o Jacov. Ninguém nunca desconfiou dele, afinal, não tem sotaque. Sua
mãe era americana. — Ela suspirou. — Ele nunca chamou Papy ou perguntou
nada, planejava me levar lá, ter Sebastian e ficar comigo.
— Porque ele tem uma queda por você, não é? Deve estar furioso
depois do que tivemos no banheiro. — Avaliava seu rosto lindo.
— Sim, todos esses anos trabalhando com Lincoln, aprendi que, quando
está com raiva, faz muita besteira, impedindo-o de pensar direito. Por isso
ele vai dar um passo em falso e Bryan o pegará, mas precisamos deixá-lo
pensar que vou para Jacov, como era o plano.
Levantei uma sobrancelha.
— E você não vai?
— Eu vou, mas com uma equipe que não me trairia, porque estando lá
precisarei de proteção. Uma pessoa que seja influente nesse terreno, em
quem nós dois confiamos — sussurrou, observando meu rosto.
— Dom — eu disse, e ela assentiu. — Ele virá para o casamento do
Ryan. Daemon ajudou muito na localização de Angelina.
— Eu sei, Bryan marcou para encontrarmos com Dom daqui a alguns
minutos, no Hotel Riff. Então vamos, preciso ir lá e voltar sem que ninguém
me veja saindo até a hora do casamento. — Abriu a porta de uma das minhas
Mercedes, entrou no banco de trás e se abaixou.

Chegamos ao quarto do hotel onde Dom estava junto com Daemon,


Nasx, Michael e a ruivinha, que me olhou de cara feia. Ela ainda não
esqueceu que eu bati no Dom alguns meses atrás.
— Olá, Taby — Dom a cumprimentou. Todos vestiam roupas de
motoqueiro. — Jason.
Nós fizemos as pazes quando fui a Chicago alguns meses antes. Eu
estava desolado naquele dia, tinha brigado com Taby porque ela não queria
falar sobre Angelina. Conversamos e nos entendemos. Claro que isso gerou
desconfiança da parte de Taby, quando descobriu que visitei o clube de
strippers do Michael, mas eu só fui lá porque era onde Dom estava. Fiquei
furioso por ela desconfiar de mim, como se fosse possível eu traí-la com
outra mulher. Só ela importava.
Saudei os quatro caras. A ruiva levantou as sobrancelhas
— E quanto a mim, não vai me cumprimentar?
Revirei os olhos.
— Para quê? Você não vai com a minha cara. Se eu desse as costas,
aposto que ficaria tentada a enfiar suas adagas nelas.
Ela riu.
— Tentação seria ver o Dom nu e não poder desfrutar do seu...
— Pelo amor de Deus, Evy, não quero ouvir você dizendo isso de
qualquer homem, mesmo que seja seu marido, ou eu vou querer cortar o seu
pau e fazê-lo comer — rosnou Michael.
— Vocês se casaram? — perguntou Tabitta. — Não lembro de ser
convidada.
Dom riu.
— Ainda não, mas será logo. Quero que vocês dois sejam os padrinhos.
— Aceitamos, sim. — Taby sorriu, depois ficou séria. — O nosso
também acontecerá logo, assim que Jacov e Sebastian estiverem presos.
— Bryan nos disse da emboscada. Mas Jacov não é idiota, saberá o que
está acontecendo, mesmo se não tivesse X9 lá dentro — disse Dom.
— Eu sei, há infiltrados tanto de Sebastian como de Jacov no FBI. A
única pessoa em que confio lá dentro é o Papy, acredito que o Bryan também.
E em você, Dom, por isso estou aqui, preciso ser capturada por Jacov, mas
com a certeza de que serei protegida quando tudo ficar feio. — Ela suspirou.
— Você sabe que vai ficar feio e ainda quer ir? — indaguei — Fique
aqui, eles podem conseguir outros agentes para fazer isso.
— Jacov me quer, e não outra pessoa. — Fitou-me, suplicante. — Se
nós tivéssemos opção, tomaríamos outro rumo, mas não há.
Suspirei, não gostando nem um pouco dela correr perigo para prender
um bandido da máfia russa. Queria ir no seu lugar, mas não podia.
— Vamos bolar o plano, então — disse Nasx com um sorriso e
segurando um par de brincos, eu acho, em suas mãos. — Isso ficará bem em
você.
— São escutas? Eles vão perceber, caras como eles são preparados
para tudo — assegurou Taby.
— Por isso esse piercing aqui é para a sua... — Olhou para mim, que
fechei a cara. O bastardo continuava sorrindo. — Bem, ninguém vai te
revistar lá embaixo. Além disso, ele é forrado por um plástico especial, caso
usem detectores de metal.
Eu trinquei os dentes.
— Você não vai colocar suas mãos na boceta da minha mulher, porra!
— Eu não vou colocar as mãos, e sim o piercing nela...
— Oh, cacete se vai... Eu boto, sempre fiz os do Dom na escola.
Taby riu.
— Gente, eu mesma ponho, já furei ela uma vez alguns anos atrás,
quando perdi uma aposta com Angelina. — Pegou o piercing nas mãos do
Nasx.
— Estraga-prazeres — murmurou Nasx. Ele se livrou de eu quebrar sua
cara, porque sabia que ele estava brincando.
— Vamos testar, vá no banheiro e coloque para checarmos se é bom ou
não. Fiz umas melhorias para o pano não atrapalhar na hora de ouvirmos —
falou Daemon para Tabitta. — Enquanto isso, eu vou arrumando o aplicativo
para escutarmos tudo de onde estivermos.
Ela foi ao banheiro e ficou por alguns minutos. Depois deu um grito,
mas não foi de dor. Eu corri para lá, ignorando a risada de Nasx e Daemon.
— Filho da puta! — gritou ela.
Entrei e fechei a porta, vendo-a escorada na parede com as pernas
abertas, uma no vaso e a outra no chão. Ela me mirou com os olhos vidrados.
— Desculpe, são piercings vibradores que Daemon inventou, não
sabíamos que funcionava, agora sabemos. Este que está aqui na minha mão é
a escuta — gritou Nasx entre risadas, batendo à porta. Não era só ele que
ria.
Abri a porta, peguei a escuta fechei rápido, não querendo que ele visse
nada.
— Adoraria entrar num ringue com você, Nasx, vou te fritar as bolas —
Taby rosnou e sorriu para mim. — Acho que gozei.
Eu ri e me agachei na frente dela. Trisquei seu piercing brilhante, e ela
gritou mais uma vez, entre xingamentos e adoração. Coloquei minha boca no
local, sugando o suco proveniente de sua boceta saborosa.
— Maldição, Jason! — Pegou meus cabelos e apertou meu rosto contra
suas pernas, querendo mais da minha boca. Dei a ela, dançando com a minha
língua sobre seu clitóris, sentindo o gosto que eu tanto amava.
— A escuta funciona bem, pessoal. Chega de pegação, porque o
casamento começa em duas horas — berrou Nasx, rindo.
Saí do banheiro, mas só quando fiz minha mulher gozar na minha boca.
Naquele momento, me encontrava no paraíso, mesmo sabendo que estaria no
inferno dentro de algumas horas.
Capítulo 18
Salvador

TABITTA
O casamento de Angelina ia de vento em popa. Estava contente por sua
felicidade com seu marido e nossa princesinha linda.
— Taby, estou com medo desse homem fazer algo a você, mesmo
estando vigiada por várias pessoas — sussurrou Jason, entristecido.
Peguei seu rosto em minhas mãos e fitei seus olhos lindos. Queria dizer
a ele o que descobri há alguns dias, mas temia que, se revelasse isso, Jason
não me deixaria ir a canto algum. Chegamos tão longe para desistir de pegar
o mafioso. Essa corrida infernal tinha de acabar hoje.
— Vai dar tudo certo, eu prometo. — Esperava estar correta em relação
a isso ou faria esse homem sofrer ainda mais.
— O que está acontecendo aqui? — perguntou Lucky, bem na hora que
Jason ia me interromper. Acho que tinha noção de que estava escondendo
algo dele. Mesmo comigo usando minha máscara, ele sabia quando eu
mentia, foi assim que descobriu que eu estava com Angelina.
— Nada, está tudo bem — menti.
— Nada uma porra — rosnou Lucky. — Acha que sou idiota? Estou
vendo os olhares que dão a Dom e Bryan, então me contem. Não quero que
nada estrague a felicidade do meu irmão. Ele já sofreu muito, não acham? —
acusou-me.
— Eu não posso dizer, mas vou resolver tudo — garanti.
Lucky fechou a cara com minhas palavras vagas.
— O que ela vai resolver, Jason? — Buscou o amigo à procura de
resposta.
Eu suspirei.
— Vou me despedir dos noivos. — Saí antes dele falar algo. Fui até
Angie, que estava em uma salinha no fundo da igreja, com Ryan ao seu lado.
Ela amamentava a bebezinha.
— Você está feliz por passar a vida inteira com esse traste? — Olhei
feio para ele, que retribuiu com o mesmo desgosto.
— Não briguem, os dois — falou, sacudindo a Victoria já amamentada.
Sorri para ela e estendi os braços para pegar nossa bebezinha.
— Venha com a mamãe dois...
Fui cortada pelo Ryan.
— Você não é mãe dela, porra! Não há a mais remota possibilidade de
eu ter enfiado meu pau em você, preferiria me castrar — rosnou, me
fuzilando com seus olhos frios.
Sorri com deleite.
— Eu posso cuidar disso. — Dei um passo na direção dele, mas
Angelina se colocou na frente.
— Não deixaria isso acontecer, preciso do seu... — ela se interrompeu
e olhou para Victoria, depois para mim, corando. — Preciso dessa parte na
lua de mel.
— Não se preocupe, eu te dou a coleção de pênis que tenho guardada
em casa — brinquei. Usava bastante vibradores antes de Jason entrar de
novo na minha vida. Agora não precisava mais, já que dispunha de um de
carne e osso.
Ryan grunhiu e saiu gritando o nome do Jason.
— Já vai tarde, carrapato. — Olhei para Angelina, que estava sorrindo.
— Sabe que terá de perdoá-lo um dia, não? Não foi culpa dele, e por
causa disso nós temos ela. — Beijou Victoria.
— Eu sei, mas gosto de vê-lo arrancando os cabelos e indo reclamar
com Jason, sabendo que não vai resolver nada. — Sorri.
— Quando vai me contar tudo sobre Jason e você? — questionou, me
avaliando.
Suspirei.
— Quando você chegar da lua de mel. Eu prometo.
— Eu a amo, Tabitta. Você é uma amiga que vale ouro — declarou.
— Não seria melhor diamante? Eles são mais caros — provoquei. —
Também amo você...
Fui interrompida pelo meu telefone tocando.
— Oi, Samira, já chegou em casa? — Ela tinha ido embora há pouco
tempo. O ruído de choro que ouvi em seguida drenou todo o sangue do meu
rosto. — Samira?
— Fique calada ou sua amiguinha gostosa vai pagar por isso — sibilou
uma voz masculina.
— Não a machuque, por favor. — Pedi silêncio à Angie, que estava
assustada. — O que você quer?
— Nós dois sabemos o que eu quero, agente Rodrigues, então vamos
esquecer as formalidades e ir direto ao assunto. Seu pai tem algo que desejo,
provas contra mim. Preciso delas hoje. Você terá uma hora, ou sua amiga
pagará o preço.
— Não seria mais fácil eu levar Sebastian até você? Perguntaria
diretamente a ele e teria sua vingança. — Tentei ganhar tempo. Sebastian
estava sob custódia da polícia, contudo, jamais cederia essas provas tão
facilmente. Não daria tempo de salvar minha amiga.
Ele riu.
— Você vai entregar seu pai? Os filhos hoje em dia não nos dão mais
valor como antigamente — recriminou
— Sebastian não é meu pai, e sim um assassino que merece morrer.
— As horas estão correndo, agente Rodrigues. Vá buscar seu pai na
toca onde ele estiver, e se encaminhem ao lugar que informarei por
mensagem — ordenou, impaciente.
Desligou o telefone. Eu ainda respirava mal. Sabia que Daemon já teria
ouvido pela escuta. Olhei para Angelina.
— Preciso que faça algo por mim, ok? — supliquei.
Ela assentiu, muda, acho que em choque.
— Quero que vá lá fora no salão e chame todos para cá, diga que fará
um discurso ou algo assim. — Continuei, porque ela já ia abrir a boca: —
Não faça perguntas, pois não posso responder. Só faça isso, tudo bem?
Prometo que trarei Samira de volta.
Triste, foi reunir todos na salinha com dez de largura por dez de
comprimento, um quartinho nos fundos. Lugar perfeito para mantê-los
seguros até eu resolver os problemas.
Alguns convidados do noivo tinham ido embora; ficamos só nós
(amigos próximos, como Jordan, Daniel e Simon, guarda-costas de Sam), os
MCs, Lucky e sua família. Além dos amigos da Angie, Johnny e Charles. Sua
tia já tinha ido também, o que achei bom, menos uma para me preocupar.
— O que ele queria? — perguntou Daemon, trocando um olhar com
Dom do outro lado da sala.
Daemon era um cara lindo. Forte, alto, com olhos caramelo-ouro,
cabelos curtos, brincos em sua orelha direita e um alargador. Tinha um
piercing na língua que notei quando riu para mim, ao sair do quarto após
testar a escuta na minha menina. Ele estava de jeans rasgado nos joelhos e
uma camiseta branca com um colete com logotipo da Fênix. Usava uma
corrente grande no cós da calça, prendendo a sua carteira que se encontrava
no bolso da frente. Na corrente, tinha um par de soqueiras. Adoraria vê-lo
em ação.
— Preciso levar Sebastian até Andrey ou aquele fodido mafioso vai
matar a Samira, mas antes quero deixar todos aqui seguros. — Minha voz
falhava.
— O que fará com Jason? Garanto que ele não vai ficar e deixar você ir
com dois assassinos frios. — Olhou para o Jason, que conversava com Ryan
e Lucky.
— Aqui para você. — Evy me entregou um “boa noite, Cinderela”. —
Não deixe Dom saber, ou contará ao Jason. Ele disse que nunca mais vai
guardar dele segredos em relação a você.
— Você vai botar Jason para dormir? — indagou Daemon.
— Sim, e você não vai dizer nada. Hora do show — falei e levantei a
taça. Nós estávamos numa salinha nos fundos da igreja. Achei mais prudente
colocá-lo para dormir do que aturar uma briga. Fui até o Jason e entreguei
um copo para ele, que sorriu.
— Por que isso?
— Um brinde aos noivos — sussurrei, triscando os lábios no
champanhe, e vendo-o beber seu whisky com gelo. — E à família linda que
me deu. Seus irmãos e nossa filha.
Depois de alguns minutos, o remédio fez efeito.
— Você também... — Sua voz falhou. — O que você fez? — Seus
braços seguraram os meus e seu copo caiu no chão.
Meu coração doeu ao enxergar a traição em seus olhos. Eu me segurei
para não chorar, precisava ser forte.
— Sinto muito, Jason. Saiba que o amo com toda minha alma —
sussurrei.
— O que você fez com ele? — rosnou Lucky, segurando Jason,
impedindo-o de cair no chão.
— Não deixe ela ir... — Então apagou. Lucky amaldiçoou, colocando-o
no sofá. Virou-se para mim. — Explique-se. Agora.
Expirei e contei a todos o que aconteceu e o que precisava fazer.
Depois de deixá-los seguros na igreja, fui à procura de Sebastian. Chris e
Landon ficaram de guarda.
Bryan encarregou-se de me entregá-lo na ponte do Brooklyn. Assim que
estacionei a Mercedes do Jason, o homem entrou no meu carro.
— Olá, minha filha.
— Não sou sua filha. Vamos acabar logo com isso.
Liguei para o número da Samira. Atenderam no segundo toque.
— Eu estou com ele, agora quero ouvir a voz dela para saber se está
bem.
— Taby, me tire daqui, por favor, esses homens são maus — suplicou.
Meu coração doeu por ela estar em perigo por minha causa.
— Vou te trazer de volta, prometo...
— Vá para o Pier 17, em Manhattan. Se eu souber que a polícia está
envolvida nisso, começarei a desmembrar sua amiga, dedo por dedo.
Expirei para me acalmar. A ida para Manhattan estava silenciosa, então
resolvi descobrir mais sobre o cara ao meu lado, porque uma coisa me
deixou confusa, e demoraríamos um pouco para chegar.
— Por que aceitou ir comigo? E sem essa de que é um bom pai, isso
sabemos que não é. Você mata pessoas, sequestra crianças e as obriga a se
prostituírem. Como uma pessoa assim pode ter amor por alguém? — Apertei
minhas mãos no volante.
— Sim, não ligo para nada neste mundo, sou frio, um monstro. Minha
alma foi levada de mim no dia em que Andrey Jacov matou sua mãe grávida
do meu filho e a deu para os seus homens estuprarem, rasgando-a inteira e
me fazendo presenciar tudo. Vi a única pessoa que eu amava nesta vida
sendo violentada — esbravejou. — Então não, eu não sinto pena de ninguém,
hoje eu não sinto nada, porque estou morto por dentro, Tabitta. Morto!
— Oh, meu Deus! — balbuciei, chorando e tremendo horrorizada.
Tantas vezes pensei que ela tivesse me deixado e ido viver sua vida com ele,
sem filhos para atrapalhar. Depois, o odiei por obrigar a minha mãe a ficar
com caras, sendo que isso não aconteceu, ela foi... Oh, céus.
— Tabitta — gritou alguém, e logo senti um tapa na cara.
Pisquei e olhei para mim mesma, ainda sentada no carro, trêmula. Notei
que estávamos um tanto longe do Pier 17. Mirei o cara do meu lado. Não
sabia mais o que ele era.
— Você deu um tapa na minha cara. — Minha voz saiu fraca. O veículo
estava parado em um acostamento, logo na chegada de Manhattan.
— Você estava entrando em pânico, tive de fazer alguma coisa, porque
temos problemas. — Aproximou-se dos meus seios, mas olhando para mim.
Decerto sabia que tenho uma escuta, e imaginava que fosse ali. — Eu só
espero que vocês a protejam, pois há alguém que ficará furioso com isso. Ao
contrário de mim, ele se preocupa com ela e derrubará qualquer um que a
coloque em risco.
Franzi a testa.
— Quem é essa pessoa de que está falando? — perguntei, curiosa.
— Logo saberá — respondeu, dando de ombros.
Queria saber a quem se referia, todavia, ignorei minha vontade, porque
algo estava me deixando tensa e amedrontada.
— Você não pensa em sobreviver a isso, não é? Pensa em matá-lo, e
depois o quê? Fugir? Vingança não leva a nada...
Ele riu.
— Você me procurou por anos para se vingar do que eu fiz, ou do que
acha que eu fiz — lembrou-me.
— Sim, mas eu queria você preso, não o mataria, não sou uma
assassina. — Tentei não pensar no homem que matei em Chicago ao tentar
salvar a garota.
— Vamos deixar essa história de lado e nos concentrar neles. — Virou-
se para frente.
Segui seu olhar e ofeguei. Havia dois carros pretos parados diante de
nós. Sete caras armados saíram dos veículos, e um veio em nossa direção.
— Saiam e caminhem até aqui — ordenou um homem com sotaque
russo.
Minhas mãos tremiam. Alisei a barriga, tentando me acalmar.
— O que é isso? — indagou, sombrio.
Sebastian notou minhas mãos por cima da barriga. Eu as retirei e saí do
carro.
— Nada.
Ele amaldiçoou alguma coisa e escreveu uma mensagem: “Ela está
grávida, a proteja, Nikolai”. Queria perguntar quem era, mas os caras do
Jacov estavam ali e podiam ouvir.
Eles nos revistaram atrás de escutas, mas não encontraram. Colocaram
capuzes em nossas cabeças. Andamos mais um pouco e o carro parou. Não
disseram nada, e nós dois também não. Senti-me ser retirada do automóvel.
Caminhamos alguns metros; ouvi um solavanco e senti o cheiro de água
salgada. Estávamos perto do mar, talvez em um barco. O capuz foi retirado
da minha cabeça e pisquei para a claridade, ofegando de pavor.
Na minha frente havia mais ou menos uns duzentos homens. Estávamos
em um navio da marinha, parecido com um Destroyer USS Mason. Ele era
enorme para caber todas essas pessoas, vestidas com ternos e gravatas.
— Olá, Tabitta. — Lincoln estava perto de um homem mais ou menos
da idade de Sebastian.
— Lincoln, você é um rato — xinguei, enojada.
Sorriu como se eu o tivesse elogiado. Bastardo filho da puta. Segurei
minha língua para não insultá-lo, temendo por eu não estar sozinha e me
machucar. Estava impressionada comigo mesma por me manter no controle
até agora. Quando soube o que esses homens cruéis fizeram com minha mãe,
entrei em choque, mas não podia quebrar, precisava ser forte para enfrentar
tudo. Choraria quando estivesse nos braços do Jason, tanto pelo risco que
estava passando, quanto pela dor de perder minha mãe de um jeito trágico e
por mentir para meu amor.
— Nos vemos de novo, não é? Faz quanto tempo mesmo? — zombou
Jacov, sorrindo de modo frio para Sebastian.
Minhas mãos estavam em punhos para dilacerar sua cabeça.
— Vinte e três anos, quando você matou minha esposa que esperava o
meu filho. — A raiva predominava na sua voz e expressão.
— Oh, sim, a doce Luciene. Aquilo foi um recado para nunca me
traírem de novo. Você era um servo perfeito, até que se apaixonou e ficou
mole. No nosso mundo, não pode haver amor, você deveria saber disso.
Espantei-me com a revelação de que ele trabalhava para Jacov.
Sebastian estava com sua expressão dura.
— Hoje eu sei disso. Você a entregou para trinta homens abusarem dela.
— Cerrou os dentes. — E a matarem no final.
Jacov deu de ombros. Sua frieza me deixava com vontade de matar o
filho da puta.
— Veja por este lado: você matou todos eles.
— Faltou um, é por isso que estou aqui — rosnou e depois gritou: —
Agora!
Não sei bem o que houve, mas um tiroteio teve início. Eu não sabia
quem atirava, os MCs ou os federais. Estava desarmada, então não podia
lutar muito, nem corpo a corpo, já que eu não devia levar nenhuma pancada.
Corri para dentro do barco para achar Samira. Era por isso que eu
estava ali, acima de tudo. Os dois assassinos que se engolissem. Não ligava
para eles, mas torcia para Sebastian matar Jacov, porque prisão para ele
seria pouco depois do que fez com minha mãe.
Passava de porta em porta para ver se eu a avistava, mas não a vi em
nenhuma das cabines do navio. Porão! Isto, ela devia estar no porão. Estava
prestes a ir procurar, quando alguém pegou meu braço. Era o Lincoln.
— Me solte, seu filho da puta, traidor — gritei, dando um safanão nele.
— Sua puta desgraçada, sabia que eu tinha colocado uma escuta em
você e ainda assim transou com aquele desgraçado para eu ouvir tudo —
esbravejou. — Você gritando! — Colocou as mãos nos cabelos, como o
louco fodido que era. — Aqueles sons me atormentam.
— Ele será meu marido em breve, posso fodê-lo o quanto eu quiser, e
quer saber? Seu pau é bom, ele é bom, amo tudo do Jason. Se quer lutar,
vamos lá.
— Eu poderia e vou, assim que tirar esse bastardo que está na sua
barriga. Achou que eu não sabia? Vi você indo comprar um teste de
gravidez. Aposto que deu positivo, já que agora há pouco a enxerguei com
sua mão no ventre.
Arregalei meus olhos.
— Você andava me seguindo? — Minha voz aguda ecoou nas paredes
do navio.
— Sim, precisava arranjar um jeito de capturar você para fazer tudo
que sempre sonhei com seu corpo. Agora quero rasgar sua barriga e tirar
esse feto imundo de dentro.
Teria que lutar com ele, mano a mano. Esperava ganhar e não sair
machucada.
— Não chame meu filho de bastardo ou feto, ele é alguém que terá
muito amor, meu e do seu pai — sibilei, pronta para brigar. — E você, seu
verme, jamais possuirá meu corpo, porque ele pertence ao meu marido, o pai
dos meus filhos.
Gritava parecendo estar possuído ou algo assim. Veio na minha direção
com os punhos cerrados, mas não chegou até mim, porque caiu no chão
alguns passos antes.
Enxerguei fios em suas pernas e alguém o arrastando para longe. Era um
cara vestido de preto, com cachos dourados e olhos verde-esmeralda. Virou
Lincoln de barriga para cima e colocou seu coturno preto sobre ele, que
perdeu o ar, assustado. O garoto devia ter por volta de vinte e poucos anos.
Acho que Lincoln o conhecia de algum lugar, e tinha medo dele.
Dominic disse que é possível reconhecer as gangues pelas marcas e
tintas. O garoto tinha dragões nos braços e em um pedaço do pescoço. O
resto devia estar debaixo da camiseta preta.
— Jacov ganhou uma passagem só de ida para o inferno, e agora será a
sua vez, mas de modo bem mais doloroso. — Fitou-me de lado, como se nos
conhecêssemos há anos. Eu nunca o vira antes. Era um maldito deus grego,
com músculos fortes e tonificados. Decerto malhava.
— Se você quer a cadela, pode ficar. É uma puta desgraçada que não
vale nada, nem uma foda — disse com alguma esperança de que o garoto não
fosse matá-lo.
Chamava de “garoto” porque havia algo de juvenil nele, embora
existisse também algo de adulto e sombrio. Uma mistura bem diferente, que
nunca enxerguei em nenhum criminoso com o qual me deparei.
— Você que não vale nada, Lincoln. É um bastardo estuprador. Quantas
vezes já fez isso com mulheres, hein? Quantas vezes não aceitou um “não” e
levou para o lado da violência? Você é um verme, um lixo. — Cuspi na cara
dele.
O garoto esboçou um sorriso, como se gostasse do jeito com que tratava
caras como Lincoln.
— Você será preso, seu corrupto, por trair o nosso país, e nunca mais
verá o dia de novo — prossegui.
Lincoln olhou para o garoto desconhecido e franziu o cenho.
— Eu vou para a prisão? — Mantinha a esperança, mas quando viu o
rosto do garoto, tão sombrio e mortal, ficou branco. Acho que sabia do que o
menino era capaz, ao contrário de mim.
— Até deixaria você ir para a prisão, se não tivesse tentado colocar
suas mãos imundas em cima dela. — Apontou o dedo na minha direção. —
Ninguém a toca e sai vivo. Tire isso pelo Sebastian, que só se preocupava
com vingança e não se importou de trazê-la aqui. Porra! Então não, você não
vai para uma prisão federal, e sim para outra muito pior. Lá, desejará morrer
a cada maldito segundo, o que não acontecerá tão cedo.
Lincoln estremeceu e começou a implorar por sua vida, gritando para
não ser levado às masmorras dos Dragon. Berrava que sentia muito por ter
me insultado de alguma forma, contudo, suas súplicas não comoveram o
garoto. Ele olhou para trás e dois homens vestidos como ele, nos quais eu
não tinha reparado antes, caminharam até nós.
— Leve-o daqui, depois acerto minhas contas com esse verme imundo.
— Desceu o soco na cara do Lincoln, fazendo-o cair desmaiado.
— Não o mate, você pode ser preso por isso. Entregue-o às
autoridades, que saberão fazer o necessário — falei a ele.
Revirou os olhos verdes. Ele me lembrava alguém, mas não sabia
exatamente quem. Ou talvez estivesse enganada.
— Vamos sair daqui — disse, sem me responder. Foi seguir por um
corredor.
— Não posso ir embora — sussurrei.
— O quê? Como assim? — Virou-se para mim com um olhar
exasperado, que ignorei completamente. — Tem quase trezentos homens dos
Bravata aqui e chegarão mais, precisamos ir.
— Minha amiga Samira está aqui embaixo em algum lugar, acredito que
no porão.
Nós seguimos para lá. Ele entrou primeiro e averiguou o local, acho
que para ver se havia problemas ou não.
Eu estava com o coração na mão, rezando para ela estar bem, e que
esses homens não a tivessem tocado de nenhuma forma.
— Я нашел тебя кроликом.
“Eu achei você, coelhinha”, falou em russo. Pelo menos foi isso que
entendi. Porém, o garoto não parecia nada russo; depois pesquisaria mais
sobre ele. Agora só queria salvar minha amiga e nada mais.
Continuou na nossa língua:
— Vou tirar você daqui — disse a ela.
Eu me aliviei ao vê-la bem, sem nenhum arranhão. Dei graças a Deus
por isso.
— Não ouse se aproximar de mim, seu tarado estuprador. Não vou
deixá-lo me tomar à força e, se tentar, cortarei seu pau pequeno e o farei
comê-lo inteiro, seu filho da puta! ― rosnou Samira, furiosa.
O cara grunhiu de raiva, não pelas palavras dela, e sim pelo que viu.
Samira estava nua e amarrada com as mãos para cima, presa em correntes. O
rosto do garoto ficou duro como pedra.
Foi ajudá-la a se soltar.
— Coelhinha, eu tomo conta de você — jurou, baixinho.
Enquanto ele a auxiliava, eu olhava ao redor, checando para não vir
ninguém. Esperava que não, não estava a fim de matar mais ninguém, mesmo
que fosse um assassino igual a esses caras.
— Samira? Sou eu! Esse cara não vai te fazer mal, ok? Ele veio para
nos tirar daqui — tranquilizei-a.
— Oh, Taby, ainda bem que você está comigo. Sabia que me salvaria.
— Sua voz estava fraca.
— É claro que eu viria! Você e Angelina são como irmãs para mim —
declarei. Ela suspirou, olhando o rapaz que a auxiliava a se libertar.
Perguntei a ele: — Qual é o seu nome? Você não me disse como se chama.
— Não disse e não vou dizer — respondeu. Amaldiçoou quando a
pegou pela cintura. — Prenda suas pernas à minha cintura.
— Por quê? — indagou.
— As correntes estão esticadas demais, preciso delas frouxas para
soltá-las..
O cara só poderia ser o tal Nikolai. Ele soltou uma das mãos de
Samira. Ela tirou sua venda e o encarou, piscando algumas vezes. Não
entendi sua expressão de raiva direcionada a ele.
Antes que eu perguntasse alguma coisa, gritei quando Nikolai jogou
uma faca acima da minha cabeça, acertando a testa de um homem que caiu no
chão com a lâmina cravada no cérebro.
— Avise quando for soltar facas por aí, ok? Você poderia ter me
acertado — rosnei.
— Isso não aconteceria, sou bom demais. — Soltou as algemas,
desprendendo-a das correntes.
Tirou sua camiseta e a entregou para Samira, que estava de pé,
cobrindo seu corpo com as mãos.
Notei que as costas dele eram cercadas por tintas de dragões, e também
algumas caveiras.
— Tatuagens legais — observei.
Ele não respondeu, apenas olhou para o corredor e amaldiçoou. Fechou
a porta, trancando-a por dentro. Conversou em russo com alguém por um
relógio no seu braço, que, com certeza, era alguma engenhoca feita para
escuta. Eu não entendia muita coisa em russo, então só captei alguns trechos,
como “explodir a lateral para sairmos”.
— Você vai explodir o lugar? — Arquejei. — Vamos morrer afogadas!
— Vejo que fala russo. — Ele me fitou com a expressão mais calma, a
despeito de ainda ter aço em seus olhos. — Sim, eu vou, pois não temos
escolha. Há mais homens dos Bravata entrando aqui, e, com certeza,
querendo usá-la como escudo contra os tiras que estão lá fora cercando o
lugar.
Ele nos escondeu em um canto e usou seu corpo para nos proteger da
explosão. De repente, a parede explodiu e a água começou a entrar na
cabine.
Samira parecia prestes a entrar em pânico; era pior do que ser
algemada.
— Ela não sabe nadar — informei ao Nikolai, que praguejou.
— Fique comigo, ok? Depois que sairmos daqui, nós vamos nos
encontrar — falou com os olhos nos dela.
Parei de ouvir quando a água nos cobriu e saímos pelo buraco. Ele
ajudou a Samira. Surpreendi-me ao me deparar com um submarino pequeno.
Nadei até uma porta que se abriu e a água entrou conosco dentro do
corredor. As portas foram fechadas e, finalmente, pude respirar.
— Vocês estão bem? — perguntou Dominic, de pé na minha frente,
junto com Daemon e Michael. Nasx estava ao seu lado também.
— Não teria deixado você se soubesse o que ia acontecer. Certamente
eu teria ido embora junto, como estava nos planos — Nasx falou para
Samira.
Os dois ficaram amigos após Angelina ter decidido deixar Ryan.
Aparentava preocupação.
— Estou bem agora, Nasx. — Ela o abraçou, mas o cara loiro o tirou
de cima dela e o prendeu na parede com uma faca em sua garganta.
Armas e adagas foram expostas de todos os lados, tanto dos MCs
quanto dos homens que estavam com esse meu salvador.
— Fique longe dela — alertou, frio.
Pretendia me levantar e impedir o massacre; eu não entendia por que
ele se preocupava com Nasx. Talvez fosse daqueles machos alfa que, ao ver
uma mulher uma vez, pensa que ela é dele. Entretanto, tudo girou e Dom me
pegou antes que eu caísse no chão.

Abri os olhos. Estava em terra seca, com os MCs me cercando, deitada


no colo do Dom. Levantei a tempo de avistar meu salvador indo embora em
um barco.
— Eu vou te ver depois, Nikolai, e descobrirei tudo sobre você. —
Forcei um grito para ele ouvir do lugar onde estava.
Ele olhou para mim e sorriu, triste.
— Gostaria que não fizesse isso — gritou de volta. Dirigindo-se à
Samira do meu lado, jurou: — Eu voltarei para cumprir a promessa que fiz a
você.
— Ele está dizendo que vai sair comigo em um encontro? — Ela se
espantou.
— Acho que ele está pensando mais em sexo, porque caras como ele
não costumam ter relacionamentos — sussurrei, mas talvez ele mudasse,
Dom e Jason mudaram quando se apaixonaram. Após checar se todos os
MCs estavam ali, indaguei:— O que aconteceu lá no navio com Jacov e
Sebastian? — Lembrava-me de Nikolai dizer que os dois morreram, mas
como? Será que um matou o outro? Seja como fosse, ficaríamos melhor sem
eles poluindo o planeta.
Dom suspirou.
— Vamos dizer que nenhum deles vai respirar neste mundo de novo.
Devem estar apodrecendo no inferno. — Seu tom era maligno. — Agora
vamos, Jason está louco sem saber de você. E você precisa ver um médico.
Por que não disse que estava grávida?
— Estou bem. Foi só estresse mesmo. Só quero ver Jason.
— Quer que eu vá junto, caso se sinta mal? — sondou Samira.
Sacudi a cabeça.
— Não se preocupe. Mas, se quiser, pode ir para a minha casa.
Antes dela decidir voltar para Jersey, Samira estava pensando em ficar
uns dias na cidade. Achei bom, porque sentia sua falta.
— Vou ficar com Mary, assim dou um jeito de ver você depois —
respondeu.
Mary era nossa amiga de Jersey, mais da Samira do que minha, mas
gostava dela.
Nós já estávamos no carro, indo para a casa de Jason. Julie, Jacob e
Emily dormiriam no Lucky até eu me entender com meu noivo.
Assim que desci do carro, Jason correu porta afora para me abraçar
forte e me beijar, como se não quisesse me deixar nunca.
Agradeci ao Dom e aos seus irmãos MCs. Tinha mil perguntas sobre o
garoto Nikolai, mas não queria falar sobre isso no momento, e sim sentir
esse homem nos meus braços.
Jason tirou minhas roupas ainda molhadas e me banhou no chuveiro.
Apenas depois de tudo foi que a crise de choro bateu: por minha mãe; pela
quase morte minha e do filho no meu ventre; e por descobrir algo que jamais
pensei que existia. Eu sabia quem o garoto era, ou ao menos suspeitava, só
não sabia como isso era possível. Descobriria toda a verdade e o procuraria
onde fosse.
— Sinto muito, Jason — sussurrei, beijando-o. — Sei que tem muitas
perguntas e acusações, mas pode brigar comigo outra hora? Agora eu só
quero que faça amor comigo, para eu esquecer tudo que passei hoje.
E assim ele fez.
Epílogo

TABITTA
Duas semanas depois

Entrei na academia do Jason com o resultado nas mãos. As minhas


suspeitas de quem Nikolai era foram confirmadas por um exame de DNA.
No navio, quando ele me cobriu da explosão, peguei uns fios de cabelo dele
sem ele notar. Agora tinha certeza.
Também confirmei a minha gravidez com um teste. Jason foi comigo
fazer o ultrassom. Ele disse que participaria de perto de toda a gestação, já
que perdeu a de Emily. Decidiu se aposentar das lutas, agora ele queria ser
professor. Apoiei, assim ele estaria em casa todas as noites, comigo e com
as crianças.
Os federais vieram me perguntar como sobrevivi àquele naufrágio.
Disse que um homem me salvou e vestia uma máscara, então não pude ver
quem era. Não podia entregar o meu irmão; ele só foi lá aquele dia para me
proteger do que estava prestes a acontecer comigo por culpa de Sebastian.
Estava infringindo a lei ao mentir, mas não me importava.
Os federais, junto a Papy e Dennis, classificaram mais de mil pessoas
envolvidas em crimes, as quais foram presas. Segundo o departamento
antidroga dos Estados Unidos, apreenderam no outro barco, em Long Island
Sound, sessenta quilos de cocaína, trezentos quilos de metanfetamina,
trezentos quilos de maconha e duzentas armas. Em outro navio, havia
cinquenta garotas de vários países.
Papy disse em uma entrevista que as detenções eram resultado de mais
de nove anos de investigações, graças ao empenho de dois mil agentes, tanto
dos Estados Unidos como da Rússia e do México. E que o líder do cartel
mexicano, Sebastian Ruiz, foi morto junto com o líder dos Bravata, Andrey
Jacov, durante a operação.
O encarregado dos navios era Lincoln, então supus que meu plano de
desorientá-lo funcionou, porque foi um descuido dele, sabendo que dois
bandidos iam se encontrar, deixar suas drogas e outras coisas por perto para
serem descobertas. Azar para eles, sorte para nós.
Foi uma prisão impressionante para a carreira deles. Para mim nem
tanto, porque Jason me proibiu de trabalhar nas ruas capturando bandidos até
nosso filho nascer. Não discordei; já me arriscara demais. Durante o dia,
ficava no departamento da agência conferindo arquivos, e à noite voltava
para minha família.
Havia diversos homens no ringue treinando com Jason. Quem não ia
querer treinar com meu talentoso futuro marido? Nosso casamento estava
marcado para o próximo final de semana na nossa ilha dos sonhos, no
Hawaii.
Sam deu a ideia de fazermos o baile logo depois. Era uma festa que era
para ter acontecido há muito tempo, após Ryan ter perdido uma aposta.
Adorei a ideia de um baile nas praias do Hawaii.
Jason estava de costas para mim e de frente para seus alunos. Eu não os
tinha visto, porque não ia ali há dias. Todos pararam e olharam para mim.
— Por que pararam? Continuem — ordenou, virando para trás e me
vendo. Falou para os caras: — Voltem ao treino, ou querem que eu arranque
os olhos de vocês?
— Conhece essa mulher? — perguntou um garoto de uns dezesseis
anos, mais ou menos. — Ela é muito linda.
Sorri, chegando mais perto.
— Obrigada, querido. Vou roubar meu noivo um pouquinho e já
devolvo, ok?
Puxei Jason para sua sala no fundo da Academia Falcon. Empurrei as
coisas da mesa para o chão, tirei meu vestido e o beijei, devorando sua
boca.
— Taby... — rosnou. — Estou suado.
Baixei seu short, peguei seu pau duro em minhas mãos e coloquei na
minha entrada. Eu já tinha tirado minha calcinha no carro.
— Não ligo, você fica mais gostoso assim. Agora me foda. — Prendi
minhas pernas à sua volta e o beijei, enquanto ele estocava dentro de mim.
Suas mãos apertavam minha bunda, trazendo-a mais para perto dele. Ele me
fodia, duro, até que eu gozei, gritando na sua boca. Deu mais duas estocadas
e gozou também, chamando meu nome.
Nós dois ficamos ali, ofegantes. Dei mais um selinho nele e sorri.
— Olá, querido noivo. Só vim checar se ainda não desistiu do
casamento. Estou te fazendo lembrar o quão bom é isso, caso queira desistir.
— Remexi meus quadris com seu pau ainda em mim.
— Eu amo ser abordado assim por você. Satisfazer minha mulher é
prioridade. — Ele me beijou mais uma vez.
— Que bom ouvir isso, porque tenho algo a dizer — sussurrei nos
lábios dele.
Jason afastou o rosto e me olhou com o cenho franzido.
— O que é?
— Vou a Moscou esta noite. O resultado do exame que fiz de Nikolai
deu positivo. — Há algumas semanas, falei das minhas suspeitas para ele, e
que fiz o exame de DNA. Também descobri quem Nikolai era, por isso a
apreensão de Jason quanto a eu ir à casa de um mafioso. O meu querido
irmão era o líder de uma máfia russa, os Dragon. Felizmente, pelo que
descobri, ele não fazia o mesmo que Jacov. Cometia uma série de atos
ilegais, mas não tráfico humano e crimes bárbaros contra inocentes.
— O quê? — Ele ia se afastar, porém, prendi as minhas pernas à sua
volta. — Veio aqui achando que comigo estando dentro de você eu diria sim
para ir à sede de uma máfia?
Sorri, ignorando sua cara fechada.
— Foi ideia da Evy. Ela disse que funciona com Dom quando quer
alguma coisa — disse, depois falei sério: — Eu preciso falar com ele e
preencher as lacunas que não estão batendo, entende? Ele não vai me
machucar ou deixar alguém fazer isso.
— Você não tem certeza disso — rosnou. — E não acho legal falar do
seu irmão com meu pau dentro de você.
Ele estava certo. Desprendi minhas pernas dele e ajeitei o vestido,
enquanto Jason vestia o short.
— Eu não vou sozinha...
— Quem mais vai? — sondou, agora calmo. Isso era estranho, achei
que ele ficaria furioso. Pelo jeito, me enganei.
— Dom, Nasx, Daemon e Bryan... Estava pensando em ir sem você
saber, mas prometi que nunca mais esconderia nada. Preciso ir lá conversar
com ele. Sebastian sabia sobre meu irmão, até mandou uma mensagem no
carro para Nikolai quando descobriu que eu estava grávida. — Alisei meus
cabelos, fui até ele e toquei seu rosto. — Queria que você fosse comigo.
Ele me abraçou e beijou minha testa.
— Eu já ia antes de você dizer, Dom me ligou e contou tudo, mas gostei
da forma como pediu. — Afastou-se sorrindo, para o meu alívio. — Quando
quiser qualquer coisa, é só me pedir desse jeito, eu vou adorar dar a você.
A academia em Moscou contava com um ringue no seu centro, mas ao
redor dele, em vez de cordas, havia telas grandes, acho que para que os
lutadores não fugirem. Não queria nem ver que tipo de luta faziam ali;
provavelmente era ilegal.
Eu estava entre Jason e Dom, com Bryan, Nasx e Daemon do outro
lado.
Nikolai brigava no ringue com dois caras atacando-o ao mesmo tempo.
— Isso não é ilegal? Dois contra um — sussurrei. Os cinco riram.
Nikolai livrou-se de um dos caras que tentou dar um chute nele. Rodopiou e
acertou o homem no estômago, e outro na boca. Logo estavam os dois
adversários no chão.
— Será que não tem ninguém aqui para me enfrentar? — questionou
Nikolai, limpando o suor do rosto e saindo do ringue de cabeça baixa.
Meu coração bateu forte, porque desde que peguei o exame, a ideia de
ter um irmão me agradava. Era algo que nunca imaginei ter.
Corri até ele e pulei nos seus braços. Peguei-o desprevenido, então
cambaleou para trás e piscou algumas vezes, me firmando em seu colo.
— Que tal comigo? Eu poderia chutar sua bunda — sussurrei, ofegante
pelo impacto.
Jogou a cabeça para trás e riu, uma risada gostosa. Observando seus
cabelos louros e com cachinhos, pude ver a familiaridade que estava
deixando passar no barco, e que me levou a suspeitar de que ele, com
certeza, era meu irmão caçula. Eu queria saber como Nikolai sobreviveu
àquilo tudo que aconteceu com nossa mãe.
— Eu adoraria, mas daqui a uns meses, já que está grávida — disse
deliciado, enquanto eu puxava seus cachinhos dourados.
Alguém arfou.
— Não acredito que você engravidou uma mulher, cara. O que houve
com os preservativos? — zombou um homem forte, chegando até nós. Seus
olhos claros como água estavam arregalados. — Você estragou toda sua
vida.
Nikolai revirou os olhos, e eu me afastei dele. Parecia que o cara
assustado vomitaria a qualquer momento, como se fosse com ele. Eu poderia
ter rido disso, mas o Nikolai já estava rindo por nós dois.
— Esse é Alexei, meu melhor amigo e ajudante — explicou. — E
também meu irmão.
Alexei pigarreou e me encarou. Tinha a pele bronzeada, cavanhaque,
cabelos castanho-claros e olhos azuis.
— Tem certeza que o filho é dele? — Aparentava ter algo entalado em
sua garganta.
Bufei.
— Se eu fosse namorada dele, e você me fizesse essa pergunta, eu
fritaria as suas bolas. — Ri da sua feição estupefata, e os demais me
acompanharam. — O filho não é dele, e sim daquele homem lindo e gostoso
ali. — Apontei o dedo para o Jason, que estava sorrindo de orelha a orelha.
— Ela é o cartão vermelho — Nikolai falou.
— Eu não sou cartão vermelho — retruquei e virei-me para Alexei, que
me fitava espantado, agora por outra razão. — Tabitta Rodrigues.
— “Cartão vermelho” significa que você é intocada, tanto na Rússia
quanto em toda América. — Nick piscou para mim. — Tomarei um banho e
iremos para a minha casa.

A casa de Nikolai era imensa, com três andares e arquitetura estilo


francês. Eu gostei. Havia seguranças por todos os lados.
— Agora vamos conversar nós dois... ― começou Nikolai.
Jason cortou-o.
— Eu não vou deixá-la.
Nick olhou para ele e assentiu. Dom e Bryan ficaram junto com os
guardas do Nick, enquanto Daemon e Nasx nos vigiavam da porta.
Seguimos para o fundo da casa, a um quintal em um jardim cheio de
flores de todos os tipos e todas as origens. Eram as rosas que vovó amava e,
no fundo, o mar lindo e azul. Havia um pote em cima da mesa.
— Naquela noite, quando os homens do Hector estavam atrás de você,
e o filho da puta do Sebastian saiu do México para ir buscá-la em Austin, eu
supliquei para ele não ir, para deixar eu resolver as coisas, mas o que ele
fez? Não deu ouvidos. — Expirou e prosseguiu, olhando o oceano. — Fui
atrás dele, mas cheguei tarde. Vovó estava no chão, sem vida. O bastardo
desgraçado simplesmente foi embora e a largou lá. Olhei as câmeras para
ver se ele tinha levado você com ele, mas graças a Deus, descobri que não.
Esforçava-me para me controlar vendo sua dor, igual à minha por nossa
avó. Será que vovó o conhecia?
— Quando Jacov matou minha mãe... — corrigiu-se, virando-se para
mim — nossa mãe, ela estava grávida de sete meses, indo para o oitavo.
Estava praticamente morta no momento em que Sebastian cortou sua barriga
e me tirou. Depois me levou a um hospital e sumiu do mapa. Passei por
vários lares adotivos e fui adotado pelos pais de Alexei; eles realmente
gostavam de mim.
— Onde eles estão agora?
— Foram mortos pelos Bravata há doze anos, então Alexei tomou seu
lugar até eu completar dezesseis anos. Alexei não queria o cargo de chefe
dos Dragon, ele nunca quis. Quando ocupei a função, fui ao México e disse
ao Sebastian para ficar longe de você, que não a queria misturada nisso tudo,
você merecia mais.
— O que ele respondeu? — sondei, com o coração apertado por sua
dor. Eu me escorei no Jason, que estava me dando suporte.
— Não deu ouvidos. Eu devia ter impedido ele naquela época, assim o
merda não teria deixado matarem nossa avó. Sebastian foi em busca de sua
vingança, enquanto eu procurei arranjar um jeito de salvar sua vida. Quando
foi ferida em Chicago, considerei a gota d’água. Cacei Hector Salgado e o
matei, mandando um recado a todos que se metessem no meu caminho.
Coloquei o cartão vermelho em você. — Endureceu com as lembranças.
— Ele me disse que foi ele quem matou Hector para eu ficar livre. —
Meu tom era amargo. Não sabia o que pensar sobre Nikolai matar pessoas e
eu não poder prendê-lo.
Riu com amargura.
— Com certeza estava usando você e seu departamento para chegar até
Jacov. O filho da puta deve ter adorado quando você saiu das sombras.
Assim que apareceu na TV e o ameaçou em público, todos os Bravata foram
para cima. Sebastian tinha provas para Jacov ir para a cadeia, mas ele não o
queria preso. Ele queria vingança por ter matado nossa mãe, só pensava
nisso e em mais nada. Há algumas semanas, falei para ele não colocar você
no meio. Se desejasse fazer, que fosse sozinho. Sebastian não ouviu, como
sempre. Fiquei mais furioso ainda quando soube que estava grávida e no
meio daquela corja de animais desgraçados. — Cerrou os punhos com força.
— Fui até lá para salvá-la e matar os dois monstros.
— Você os matou? — A pergunta saiu alta no lugar que parecia uma
varanda de flores.
Virou de costas para o mar e me fitou.
— Estou contando tudo isso correndo o risco de você me prender. Não
resistiria, caso queira. E nenhum dos meus homens se meteria.
Surpresa, avaliava se ele dizia a verdade. Pude notar que sim, mas eu
jamais faria isso.
— Devo informar que não posso mais prendê-lo, já que não sou mais
uma agente. Meu chefe deve estar vendo agora a minha carta de demissão. —
Sorri diante de seus olhos arregalados. — Não nasci para ser policial.
Quando estava em Chicago e atirei naquele homem, fiquei semanas indo a
uma psicóloga. Até pensei que fosse pela garota que morreu, mas não, foi
tudo aquilo. Eu só me tornei policial para chegar a Sebastian. Agora que ele
se foi, quero uma vida pacata, sentar em uma varanda e ver meus filhos
brincando no jardim; cuidar dos meus cunhados e dos meus pequenos
amores. — Alisei a barriga e sorri para Jason. — E ser uma esposa e dona
de casa em tempo integral.
— Você é minha linda e sonhada esposa. — Deu um selinho em mim e
suspirou.
Olhei para o meu irmão, que nos mirava com a expressão mais branda.
Ele parecia leve, como se tivesse tirado um peso das costas.
— Você também merece ser feliz, meu irmão, ainda mais depois da vida
dura que teve. Eu tive sorte de ter vovó por dezoito anos, e você? Aquele
desgraçado devia ter dado você à vovó também... — declarei. Depois um
pensamento me veio à cabeça: — Mas me diga uma coisa: se ele deixou
você bebê no hospital, como depois de grande descobriu sobre ele?
— Após ser adotado pelos Dragon, sempre procurei meus pais
verdadeiros. Nunca tive êxito, porque ele não deixou seu nome no hospital.
Quando eu tinha quinze anos, Alexei achou alguém que foi ao hospital à
procura de um menino deixado lá há quinze anos. Até pensei que fosse a
minha mãe, mas a mulher que procurava a criança era de idade. Então
Alexei, que é craque em computador, fez uma busca minuciosa. Descobri que
tinha uma irmã e uma avó, a qual meses depois morreu sem saber sobre mim.
Também aprendi tudo sobre Sebastian e sua vingança.
— Por que não foi nos visitar, já que sabia a nosso respeito? —
sussurrei.
— Para protegê-las da vida que levo. Você era vibrante e feliz, não
queria atrapalhar; decidi não interferir. — Passou as mãos nos cabelos.
— Você pode mudar, se não é feliz nessa vida — falei, tocando seu
rosto.
— Não é tão ruim agora que Jacov se foi, espero que continue assim.
Além disso, quando se entra neste mundo, há uma regra que não pode ser
quebrada: você entra vivo, e só sai morto. — Puxou-me para seus braços e
me colocou de frente para o pote de barro.
— Isso não é justo — reclamei. — As pessoas têm direito ao livre-
arbítrio.
— A vida não é justa, querida irmã. — Apontou para o pote. — Peguei
o corpo da nossa avó aquele dia e o trouxe comigo. Se fosse por Sebastian,
ela não teria nem um enterro. Mas não podia trazer você junto ou dizer o que
tinha acontecido. Decidi cremar seu corpo e, assim que nos conhecêssemos,
jogaríamos suas cinzas no mar.
Eu já estava chorando. Ele me abraçava de um lado, e Jason do outro.
Atiramos as suas cinzas no mar, onde vovó poderia descansar para sempre.
Eu não acreditava que as pessoas que morriam nos viam aqui na Terra, mas
se existisse algo assim, esperava que ela enxergasse que, depois de muitos
anos, os seus netos estavam juntos finalmente.

Desfrutava de uma vista linda do mar durante meu casamento ao ar livre


em Kaanapali Beach, em Maui, no Hawaii. Improvisamos um altar na areia.
Ao redor da praia, havia hotéis e casas, com coqueiros altos, deixando tudo
mais que perfeito.
Nesses três dias, conheci lugares incríveis. Jason, Emily, Jacob, Julie e
eu visitamos crateras vulcânicas e colinas. Claro que não chegamos perto
com o helicóptero, eu não queria me aproximar demais. Jason nos levou a
Wailea para ver as tartarugas-verdes. O lugar inteiro era mágico. Emily
estava mais que feliz, e eu também por ver a minha família contente.
Todos os meus amigos estavam ali para celebrar o nosso casamento.
Até meu irmão apareceu com Alexei. Eu ia pedir para ele me levar ao altar,
mas Papy estava tão animado com essa ideia que não quis decepcioná-lo.
Mama, igualmente, encontrava-se eufórica por mim. Deus me deu uma
família maravilhosa.
— Você já tem uma coisa nova. — Mama alisou meu vestido de noiva
com alças finas e colado no meu corpo.
— Então pensamos que precisa de uma coisa azul — disse Sam,
colocando um broche no meu vestido branco. Ela usava um vestido prata
tomara que caia, deslumbrante.
— E uma coisa velha...
Cortei Angelina, linda em seu vestido azul modelado às suas curvas.
— Eu já tenho a coisa velha. — Levantei o anel. — Jason me deu antes
de nos separarmos, há mais de nove anos, então conta, não é?
Samira piscou, impressionada, e sorriu. Ela usava um vestido com
decote em V, mostrando o vão entre seus seios. Uma roupa bem diferente de
como costumava se trajar. Devo dizer que seu sequestro a mudou. Se ela está
feliz assim, eu também ficava.
— Agora falta algo emprestado — começou ela, mas fomos
interrompidos por meu irmão entrando no quarto improvisado que fizemos
com um toldo, cercado de lençóis brancos. Vi isso em um filme e peguei a
ideia, achei tão bonito o vento balançando o tecido.
— Eu tenho algo emprestado para você, querida irmã — disse,
colocando uma corrente com pingente de coração em meu pescoço. — Era
de nossa mãe. Há uma foto de você bebê junto com ela sorrindo. Acredito
que estava feliz por tê-la. Eu a carrego comigo desde sempre.
Comecei a chorar. Por sorte, minha maquiagem era à prova d’água,
graças à Alexia, a minha maquiadora e cabeleireira.
— Obrigada.
Papy chegou e me levou para a entrada da fileira de cadeiras. Do lado
direito estavam os MCs e os Dragon, e no esquerdo os meus amigos e de
Jason. Dom e Evy eram nossos padrinhos por parte de Jason, assim como
fomos os deles alguns dias atrás. Os meus eram meu irmão e Samira. Ela e
Angelina tiveram que tirar cara ou coroa, já que não consegui escolher entre
as duas. Mas deu tudo certo.
Emily e Lira foram minhas damas de honra, tal qual no casamento de
Angelina. As duas usavam vestidos rosa e volumosos. Ficaram lindas, com
seus cabelos soltos nas costas, Lira toda loira como uma boneca, e Emily
deslumbrante como uma princesa. Elas levaram nossas alianças.
Já estava escurecendo quando nós dois declaramos nossos votos.
— Desde que tinha dezesseis anos, sonhava em ter um amor que me
enxergasse como eu era por dentro, e não meus vestidos largos de vovó. —
Estava de frente para meu lindo marido, que olhava com adoração. — Igual
acontecia nos livros. Quando me apaixonei perdidamente por você, Jason, e
soube que sentia o mesmo por mim, me vi realizada. Você era mais do que eu
merecia. Agradeço aos céus por finalmente conseguir um amor que
transcendeu o tempo. Acredito que vamos ficar juntos para sempre.
Assim que terminei de falar o quanto ele era importante na minha vida,
eu já estava chorando.
— Algumas pessoas celebram um ano que virá, ou um presente que
ganham. Eu celebro o dia em que a conheci, porque quando você entrou em
meu mundo, eu estava perdido, sem rumo e sem direção, mas seu amor
trouxe de volta as cores à minha vida. Você me ensinou a amar e ser amado.
— Ele sorriu. — Eu prometo amá-la enquanto eu respirar neste mundo.
Prometo amá-la para sempre, minha borboleta azul.
Eu o beijei antes da benção do padre. Ouvi risadas, mas não liguei;
apenas meu marido importava.
— Como está se sentindo, senhora Falcon? — sondou no meu ouvido
depois do casamento. Nós estávamos em uma tenda com as laterais abertas e
a brisa nos atingindo. O baile acontecia a todo vapor.
Sam parecia demasiadamente alegre por estar em um baile. Ela disse
que amou ter uma festa ao luar. Angelina dançava com Ryan. Com o passar
dos dias, perdi a antipatia que sentia por ele, pois via o quanto esse homem
adorava minha amiga. Ele até foi dançar com ela, algo que não gostava de
fazer, segundo Angie.
— Maravilhosamente bem, meu marido. — Eu o beijei por um momento
e me afastei. — Vamos para o nosso quarto? Angelina ficará com as
crianças.
— Seu desejo é uma ordem, minha esposa. — Ele estava adorando
isso.
E eu também, porque agora começaria o nosso “Felizes para sempre”,
interrompido há nove anos.
Hoje tenho um amor que nem o tempo e nem a distância apagaram. Um
amor como sempre sonhei para mim.
FIM
MARCA DA ESCURIDÃO
Série Dilacerados
Livro IV

IVANI GODOY
3 ª Edição
2021
Copyright © - Ivani Godoy

Revisão: Analine Borges Cirne

Esta é uma obra ficcional.


Qualquer semelhança entre nomes, locais ou fatos da vida real é
mera coincidência.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser
utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem a
autorização por escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº.
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do código penal.
Prólogo

ALEXIA
Meu coração martelava, palpitava e gritava de medo do demônio
desalmado que um dia eu havia amado e que tinha se aproximado de mim
fingindo me amar só para depois me sequestrar e me levar para aquele lugar,
aquela masmorra que me dava calafrios e desespero. Porque ali eu estava
sozinha e desamparada, sem ninguém, sem meus pais, meu irmão e meus
amigos; só éramos eu, a dor e a solidão.
Estava em uma gaiola sem nada no meu corpo, que ele violava pelo que
parecia uma eternidade. Tudo em mim doía, gritava socorro, mas minha voz
não saía mais devido à sede e à fome, por ele não me dar água nem comida.
Alex e meus pais deviam estar preocupados comigo, porque era para eu
ir até a loja da esquina, mas não contava que Samuel aparecesse e me fizesse
entrar em seu carro após apontar uma arma para mim, obrigando-me a ir
consigo, e depois levada para aquele lugar e mantida em cativeiro por dias.
Minhas forças tinham se acabado, mas não foi isso que me destruiu, e
sim a confiança, o amor que eu sentia por aquele monstro, que no começo era
um cara legal, mas logo se transformou em um demônio desalmado. Nesse
dia ele me aniquilou de forma irreversível.
Capítulo 1
ALEXIA
Um mês se passou depois do encontro com Bryan no restaurante Belas
Country, e eu sem sair de casa e cabisbaixa, isso por ser mais uma vez idiota
e por confiar nos homens. Aquela raça não prestava. Um exemplar dela
quase tinha me matado uns cinco anos antes. Depois de tanto tempo, o único
que me fazia sentir algo por um deles não me queria; beijou-me no
restaurante, depois ficou com outra mulher em seu apartamento.
Bryan definitivamente era um bastardo filho da puta, mulherengo. Eu fui
ao seu apartamento no dia seguinte ao encontro no Belas Country para
entender qual era o nosso lance, porque sentia que ele me queria também,
ainda mais ao me beijar daquele jeito, tão intensamente, como se quisesse
devorar a minha boca, meu corpo e minha alma. Pensei que ele só não me
possuiu lá mesmo por estarmos em público. Contudo, depois de vê-lo com
uma morena, percebi que me enganei, ainda mais vendo os dois só de toalha,
como se tivessem saído do banho naquele momento.
Saí correndo de lá, na verdade, nem entrei; quando ela abriu a porta e
eu vi os dois daquele jeito, só corri, chorando. Até pensei que ele viria atrás
de mim e falaria que aquilo era uma ilusão, mas ele não veio; aquilo
realmente aconteceu, ele ficou com outra, não comigo.
Sofri por semanas, depois fiquei com raiva, tanta que, se eu o visse na
minha frente, o esmagaria com meus saltos Louboutin. Quem ele pensava que
era para pisar em mim assim? Beijar-me em um momento e, na mesma noite,
ir para a cama com outra?
Depois de um mês sem sair de casa, eu estava na boate Lux, à qual
minha amiga Claire me convidou a vir consigo e Luana. Claire era uma loura
linda e formosa, e Luana, uma ruiva exuberante. Havíamos sido colegas de
faculdade, na qual eu fazia Marketing, mas tive que parar para tomar conta
de uma escola. Pretendia retomar no ano seguinte, só não sabia ainda que
curso faria, talvez designer de moda, já que amava comprar sapatos e
vestidos glamourosos. Terminaria meus estudos bem mais velha que o
normal, pois também tinha feito a high school tarde, pois fiquei muito tempo
em um hospital psiquiátrico.
Nós três éramos amigas. Ainda faltava uma, Samantha, mas ela estava
casada com Lucky Donovan, um homem lindo e poderoso. Samantha era irmã
do cara mulherengo que me deixou com um buraco enorme no peito, porque
eu já nutria sentimentos por ele havia muito tempo.
Apaixonei-me por Bryan quando o vi no dia em que ele foi visitar Sam
na faculdade. Ele até deu em cima de mim, mas vi que ele só queria uma
coisa naquele tempo. Eu não estava pronta para transar com ele naquela
época, mas depois, sim, por isso fui ao seu apartamento, para conversarmos
e talvez até ficarmos juntos, fazermos algo além de beijar, mas encontrei
Bryan com outra mulher.
— Hoje você vai transar com um cara gato, Alexia — declarou Claire
enquanto caminhávamos pela boate até nossa mesa. Acrescentou, assim que
abri a boca para dizer que tinha ido ali para acompanhá-las e comemorar o
aniversário de Luana, não para transar por aí: — E sem essa de não estar
pronta, porque já estou cansada de ouvir isso de você.
Só tinha uma pessoa com quem eu pensava em fazer sexo, e justamente
ele não me queria desse modo, apenas me via como a melhor amiga da sua
irmã. Talvez nem me achasse bonita.
— Eu só estou aqui por vocês, pelo aniversário da Luana e mais nada,
então esqueça essa coisa de me fazer me interessar por alguém, porque isso
não vai acontecer — rosnei, aproximando-me da mesa, meio afastada do
salão.
Mikael e Julian já estavam sentados ali. Mike, como o chamávamos, era
namorado de Claire havia algum tempo. Era dono da boate onde estávamos,
no Centro de Nova Iorque, um loiro lindo com sardas. Claire dizia que as
amava. Eu também via Luana direto com Julian, que era um cara moreno,
com olhos negros, forte. Aliás, tanto ele quanto Mike eram fortes, afinal,
jogaram basquete na escola, mas Mike seguiu com a boate, e Julian ainda era
um jogador.
— Você está linda, meu amor — disse Julian, beijando Luana. — Feliz
aniversário.
Ela riu e corou. Estava mesmo deslumbrante. Vestia um vestido rosa-
claro de cashmere com sandálias de salto alto. Seus cabelos ruivos
combinavam com seus olhos castanho-claros. Os dois formavam um casal
lindo. Eu ficava contente por minhas amigas estarem bem e felizes.
— Obrigada, querido.
Se não fosse pelo aniversário de Luana, eu não teria saído de casa. Era
a única solteira daquele grupo, provavelmente por isso elas ficavam tentando
me arrumar um namorado, pois eu tinha acabado de completar 24 anos e
ainda não havia tido um. Entretanto, apenas um cara me interessava dessa
forma, com aquele par de olhos azuis, corpo forte e pegada firme. Bem, não
se pode ter tudo que se deseja, não é? Se fosse assim, a minha vida teria
sido diferente quando eu tinha 19 anos... Expulsei esse pensamento, afinal,
era uma noite alegre, não era hora de pensar no meu passado obscuro.
— Oi, gente — falei aos dois, mas eles mal olharam, só assentiram
para mim enquanto adoravam suas namoradas. Achei bom. Um dia queria ter
aquilo também, ver aquele olhar de adoração na pessoa pela qual me
interessasse. Bem, milagres assim não acontecem, pois Bryan é indomável
e galinha.
Claire abraçou Mike, e nos sentamos à mesa na sala VIP da boate.
Aquele lugar me lembrava muito o clube que meu pai deu para meu irmão,
Alex, em Manhattan. Ele sempre amou isso, até já foi DJ em várias casas
noturnas, inclusive no Japão, na China e em alguns outros países. Por isso
papai deu a boate a ele, no intuito de fazê-lo sossegar. Acredito que
funcionou, mas, no fundo, foi Rayla, sua namorada, quem o colocou na linha.
Olhei as cores vivas do lugar. Estava lotado de gente dançando e se
divertindo.
— Olá, pessoal, vejo que cheguei atrasado — falou Jack, o irmão
sarado de Claire, loiro, alto, forte, com olhos cor de mel e sorriso
encantador. — Desculpem, tive que resolver algumas coisas antes de vir
para cá.
— Chegou bem na hora de levar nossa amiga Alexia aqui para dançar e
se divertir — disse Luana.
— Aliás, vamos todos dançar — falou Claire, pegando a mão de Mike
e indo para a pista de dança.
Eu estava perto de reclamar, quando Jack pegou minha mão e me levou
para a pista. Jack, Claire e eu fomos criados praticamente juntos, os dois
eram como irmãos para mim e Alex, embora eu soubesse que Jack queria
mais que minha amizade, mas eu não podia me entregar a ele nem a
ninguém... com exceção de Bryan.
— Jack, eu não quero dançar, não estou com ânimo para isso hoje —
reclamei quando ele ficou à minha frente e colocou as mãos em minha
cintura, puxando-me para si. Sussurrou em meu ouvido:
— Não olha agora, Alexia, mas, a alguns metros daqui, o cara por quem
você é apaixonada está com uma mulher, ambos sentados a uma mesa, e o
filho da puta ainda me olha como se quisesse me matar. Dá para acreditar
nisso? — em sua última frase, parecia falar consigo mesmo.
Meu coração deu um solavanco tão grande que acreditei que dava para
ser ouvido do outro lado do salão e através da música dançante que estava
tocando. Ao virar o rosto na direção em que Jack olhava, deparei-me com
um par de olhos azuis me fitando do outro lado do salão. Bryan estava ao
lado da mesma morena que eu tinha visto no seu apartamento havia um mês.
Então ele realmente se prendeu a uma mulher? Achei que meus pulmões
estavam com um defeito que impediam o ar de sair. Eles combinam... Eu e
ele, não.
“Ninguém quer você, não vê isso, sua puta?” Uma voz que eu não
queria ouvir invadiu minha cabeça. “Só eu”. Então a cena veio à minha
mente. Tentei bloqueá-la, mas ela estava ali, comendo-me viva. Suas mãos
no meu corpo...
Ele não está aqui, Alexia, se controla, entoei a mim mesma,
expulsando aquela voz da minha mente. Bryan, olhos azuis, lábios
avermelhados e beijo de mel, repeti isso várias vezes. Esse era o mantra
atual que eu invocava para as lembranças ruins irem embora de vez.
— Alexia — chamou Jack.
Virei o rosto e fitei meu amigo, que se encontrava com um olhar ansioso
e preocupado. Então percebi que tinha ficado meio absorta por alguns
segundos enquanto ele sacudia meus ombros, talvez querendo me trazer de
volta dos meus pensamentos.
— Eu estou bem, não se preocupe comigo — menti, ofegante. Era como
se eu tivesse subido uma ladeira correndo e de repente ficasse sem fôlego.
— Só preciso de ar fresco... e sair daqui, ir para onde eu não precise ver os
dois...
— Vem comigo, sei de um lugar ideal — falou, pegando minha mão e
me levando por uma escada para o terraço do prédio.
Eu já havia ido ali uma vez com Claire e Luana. O lugar tinha a vista
mais linda de todas, dava para ver Nova Iorque inteira de lá.
Escorei-me à grade do parapeito do terraço e olhei as luzes lá embaixo
e ao longe. O clube de Mike era no alto do prédio do pai dele, o senhor
Martínez, dono da Fundação Martínez, que beneficiava várias crianças pelo
mundo, como a Vênus, da Samantha. Lucky, seu marido, deu a empresa Vênus
para ela de presente. Embora eu não tivesse inveja dela por isso, porque só
queria uma coisa, ou alguém, que estava lá embaixo na boate com sua
namorada, e, quanto a mim... estava ali, sofrendo por ele.
— Você sabe o que sinto por você, não sabe, Alexia? — começou Jack,
pegando nos meus ombros e me deixando de frente para si. Fitou-me. —
Desde os 15 anos, no baile da escola, eu já queria você, mas depois viajei
para a Inglaterra, e, quando voltei, você estava naquele hospital na Suíça...
Eu sei que não sente o mesmo por mim, que gosta daquele cara lá embaixo,
mas podemos tentar.
Eu mirava seus olhos brilhantes pela luz da lua e das estrelas. Não
sentia nada por ele, exceto amor de irmão. Entretanto, meu coração doía por
não corresponder ao seu amor, que eu podia sentir e ver...
— Jack, eu não... — fui interrompida por sua boca na minha e seus
braços à minha volta.
Ele aproveitou meus lábios abertos de choque por ouvir suas palavras e
os devorou como se não se alimentasse havia anos e não quisesse nunca mais
parar.
Se quem eu quero não me quer, então por que não dar uma chance ao
meu amigo, que me ama? Talvez depois, com o tempo, o amor surja, não é?
Igual acontece em filmes e livros de romance.
Eu estava a ponto de retribuir seu beijo, quando Jack foi arrancado de
perto de mim e lançado em cima de uma mesa próxima de nós e na qual eu
não tinha reparado antes.
Jack arquejou com a pancada, enquanto eu ofegava de pavor vendo
Bryan em cima dele, espancando-o. Quando ergueu a mão para esmurrá-lo na
face de novo, gritei:
— Bryan, não! — Corri até ele e peguei seu braço para o impedir de
bater de novo em meu amigo, que estava sangrando um pouco. Estaria com
uma hemorragia maior se não tivesse se defendido do ataque. — Mas que
droga! O que você tem na cabeça?!
Ele não parecia querer parar de bater em Jack, que enfim estava
revidando. Os dois pareciam saber lutar, mas Bryan estava em vantagem.
— Você vai ficar longe dela, ou eu juro que vou matá-lo — sibilou
Bryan, lançando mais um soco em Jack, que se defendeu com destreza.
— Não vou ficar longe dela, cara, a não ser que ela queira. Ao
contrário de você, eu a amo e não quero apenas entrar em suas calças só
porque ela é gostosa — rosnou Jack, limpando a boca, que estava sangrando.
— Você não sabe de nada, porra! — Ele ia bater em Jack de novo, mas
o impedi entrando em sua frente e o empurrando para trás.
— Maldição, quer parar de tentar bater nele?! — Estava prestes a dizer
para ele voltar para sua namorada, que, por sinal, deixara na boate para vir
atrás de nós. Se ele se importasse realmente comigo, ao ver o beijo, devia
ter falado algo para mim, não ter batido em Jack.
— Bryan, que droga! O que está fazendo aqui? — indagou sua
namorada, chegando até nós e olhando a cena. Suas íris negras pousaram em
mim e sua testa se franziu.
Não liguei para isso, porque estava com raiva demais de Bryan por
tudo o que ele tinha feito. Afastei-me dele.
— Você não devia estar aqui, Bryan. Pega sua namorada e vai embora
— ordenei, deixando a raiva se apossar de mim; era melhor do que a dor em
meu peito, que estava me sufocando, quase me impossibilitando de respirar.
Aproximei-me de Jack sem tirar minha atenção de Bryan.
— Bryan, temos que ir agora. — A mulher pegou seu braço, puxando-o
para irem embora.
Entretanto, ele parecia travado me olhando. Por um breve momento, vi
a dor nos seus olhos, mas foi tão rápido que logo passou, e sua expressão se
tornou sombria, ainda mais ao fitar Jack ao meu lado.
— Toque em um fio de seu cabelo, e eu vou caçá-lo e acabar com você
— ameaçou.
— Se eu quiser, isso não é da sua maldita conta! Buscou minha opinião
para andar transando por aí? Não fez isso, não é? — sibilei já com lágrimas
escorrendo por meu rosto. — Agora some da minha frente, porque não quero
saber de você nunca mais!
A garota o arrastou, mesmo ele não querendo ir embora.
Uma relação bem estranha a que eles têm. Como uma namorada
aceita isso sem reclamar ou ficar furiosa por ele bater em um cara por
causa de outra mulher? E por que ele veio até mim preocupado por eu
ficar ou não com alguém?
Quando eu disse para Bryan ir embora e que eu não queria vê-lo, notei
uma chama de dor em seus olhos lindos, porém tristes. Embora eu o tivesse
mandado embora, não queria que ele fosse de verdade, queria que ficasse
comigo e dissesse que só queria a mim, não outras mulheres por aí. Todavia,
com Bryan era assim mesmo, ele nunca se contentaria só com uma mulher,
sempre teria que ter mais. E eu jamais aceitaria isso. Se Bryan me quisesse,
teria que ficar só comigo, porque eu jamais dividiria um homem, ainda mais
o homem que eu amava.
— Você está bem, Jack? — Olhei para ele, que limpava o seu rosto.
Ele suspirou.
— Sim, mas preciso ir ao banheiro me limpar para não assustar
ninguém.
— Lamento pelo que aconteceu, não sabia que ele seria capaz disso —
sussurrei.
— Não foi sua culpa. ― Deixou bem claro que só existia um culpado.
— Agora vou cuidar desse sangue. Nos encontramos lá dentro.
Voltei para a boate e forcei um sorriso, pois não queria estragar a
comemoração de Luana porque não conseguia parar de pensar em um bad
boy mulherengo que não se prendia a ninguém. Ele nunca se prenderia a mim,
uma garota simples que vivia tendo crises de paralisia quando as lembranças
sombrias do que tinha vivido no passado voltavam a atormentá-la.
Jack foi ao banheiro para se arrumar e dar um jeito em sua face; ele
também não queria estragar o momento de Luana.
Bryan continuou na boate com sua namorada. Eu o ignorei por todo o
tempo em que estive lá, até que falei para as meninas que voltaria para o
meu apartamento. Elas não queriam me deixar ir sozinha, então eu disse que
iria com Jack.
Ele não se queixou por eu usá-lo assim, mas me senti mal, porque, por
mais que seu beijo fosse bom, eu não sentia nada por ele. Seu beijo com
sabor de menta era tão diferente dos beijos doces de Bryan... Eu amava sua
boca e seus beijos, tudo nele. Sabia que era burra por ainda querê-lo depois
de vê-lo com outra mulher, mas não podia esquecê-lo. Queria poder, mas não
conseguia.
Luana e Claire não viram problema em eu sair com Jack. Eu tinha
certeza de que, na mente delas, nós ficaríamos juntos, mas isso não
aconteceria. As duas sabiam que eu não era mais virgem, embora não
soubessem como perdi a virgindade, ou melhor, como ela foi arrancada de
mim havia uns cinco anos por um desgraçado que deveria estar apodrecendo
no inferno. Elas só sabiam que eu fiquei internada por um tempo, mas todos
pensavam que era por causa do meu cativeiro. Ninguém sabia o que
realmente aconteceu naquele lugar, só os policiais, meus pais e meu irmão,
que guardaram isso muito bem.
— Você está bem para ficar sozinha? — sondou Jack parando seu carro
em frente ao meu apartamento.
O prédio possuía cinco andares. Eu morava no último, pois adorava
lugares altos, de onde eu podia ter uma vista panorâmica.
Respirei fundo, mas doeu fazê-lo. Queria ficar sozinha e deixar a dor da
rejeição de Bryan me dominar, me consumir.
— Eu vou ficar bem — menti. Acrescentei, assim que ele abriu a boca
para dizer, possivelmente, que sabia que eu estava mentindo: — Eu sinto
muito por ele ter batido em você por minha causa.
— Não sinta, não foi sua culpa aquele idiota agir daquele jeito por
ciúmes. O que não entendo é por que, se ele ama você, não faz nada para tê-
la e fica com outras mulheres... — Ele parecia falar consigo mesmo no final,
mas estremeci ao imaginar Bryan com outra mulher. — Desculpe por dizer
isso; só não entendo.
— Ele não me ama — murmurei num choramingo. — Por que eu não me
apaixonei por você?
Ele beijou meus cabelos.
— Porque ninguém manda no coração, Lex. Se mandasse, você já seria
minha mulher e com certeza mãe dos meus filhos — falou com tanto amor
que me senti mal por gostar de outro cara que não assumia o que sentia.
— Eu sinto muito.
Chorei em seus braços, depois fui para o meu apartamento quase
correndo, querendo apenas mergulhar na minha banheira e chorar por um ano
inteiro.
Capítulo 2
ALEXIA
Quando entrei no corredor do meu andar, notei que tinha algo errado; a
porta do meu apartamento estava entreaberta. Meu coração gelou ao pensar
em Samuel. Havia algumas semanas eu vinha recebendo recados sinistros,
ameaças de morte por mensagens em meu celular. Até troquei o número, mas
as mensagens continuaram. Supunha que eram do monstro que desgraçou
minha vida e que nunca havia sido preso. Eu não fui à polícia saber dele
depois que saí do hospital. Meu pai, quando estava vivo, cuidou de tudo. Eu
apenas soube que Samuel não tinha ido para a cadeia.
Meu coração estava batendo alto enquanto eu me aproximava mais do
apartamento no corredor vazio, embora fosse tarde para me deparar com
alguém ali.
Ao chegar mais perto, ouvi uma música soando através da abertura da
porta. O Lago dos Cisnes, de Tchaikovsky. No passado eu gostava muito de
ouvi-la, porque sonhava em ser bailarina, mas esse sonho morreu quando
Samuel, o monstro, destruiu-me. Ele me fez odiá-la, assim como eu o odiava
com todas as forças, o que me fazia ficar de pé e não deixar o passado me
dominar e me levar ao fundo do poço em que eu havia estado alguns anos
antes.
Assim que ouvi essa canção tocando na caixinha de música com uma
bailarina que ganhei da minha mãe, virei-me e saí correndo, mas colidi com
um peito musculoso, o que me fez gritar tão alto que acreditei que dava para
ouvir no prédio inteiro. Naquela hora fiquei cega de medo, ódio, dor e
apenas bati na pessoa que, em minha mente, me segurava e me esmurrava.
— Me solta, seu desgraçado! Eu odeio você, seu monstro! Você
destruiu minha vida há cinco anos e tem a audácia de vir me procurar?! — eu
gritava e chorava enquanto batia no peito do cara. De repente minhas costas
estavam na parede, e minhas mãos, erguidas acima da cabeça. Ele estava me
imobilizando.
“Você gosta disso, não é?”. Senti as cintadas em minha pele, batendo-
me até eu dizer que gostava daquilo, daquele ato horrendo e desumano.
“Você é minha puta, não é?”
Fechei os olhos, sacudindo a cabeça, querendo esquecer todas aquelas
lembranças que não queria ter mais. Bryan, pensei nele, visualizei seu belo
rosto e respirei fundo. Foi então que ouvi vozes perto de mim. Na verdade,
era uma só voz me chamando. A princípio, achei que estava imaginando,
então a voz ficou mais alta e mais clara.
— Alexia!
— Bryan? — Percebi que quem me segurava era Bryan, e não o imundo
do... Não quero pensar nele agora, nem nunca! Já tive crises demais hoje!
— Alexia, me diz o que houve, porque estou louco aqui ouvindo seus
gritos de dor e tormento, como se alguém estivesse te batendo... — Sua voz
falhou. — Me diz! Se aquele maldito da boate tocou em você, eu vou matá-
lo, eu juro!
Pisquei e me mexi, e ele soltou minhas mãos. Sabia a quem ele se
referia.
— Jack não fez nada. — Minha voz estava rouca pelas lembranças que
me atormentavam havia anos, ainda mais quando as crises vinham.
Caminhei para o meu apartamento. Sabia que tinha que enfrentar o que
estivesse lá dentro. Não podia fugir para sempre, como um gato medroso e
assustado, embora com motivos. Precisava tentar. Além disso, não estava
sozinha.
— Você saiu correndo e deixou a porta aberta? — O tom de voz de
Bryan era de acusação e crítica, mas também tinha uma nota de confusão. —
O que houve de errado para sair correndo?
Eu ia ignorá-lo, mas depois pensei que ele podia me ajudar a descobrir
se era realmente Samuel que estava fazendo aquilo comigo, afinal, Bryan era
policial e podia investigar as ameaças. A invasão à minha casa, deixando a
música como um recado, só podia ser obra de Samuel, já que era o único que
sabia que eu amava aquela canção antes de ele me fazer ouvi-la tantas vezes
enquanto estava em seu poder.
— Quando cheguei, ela estava aberta... — mal terminei de falar quando
ele me puxou para trás de si e pegou sua arma, apontando-a para a frente e
abrindo o restante da porta com a sua bota preta.
— Droga, Alexia, por que não disse isso logo? — grunhiu, acendendo a
luz na entrada.
A canção ainda tocava, e a bailarina dançava rodopiando na caixa de
música.
— Você deixou a caixinha ligada?
Respirei fundo, tentando bloquear as lembranças que aqueles acordes
me traziam.
— Não, por isso saí correndo, porque não a deixei ligada e a minha
porta estava entreaberta. Se fosse só pela porta, pensaria ser um ladrão, mas
essa música tem um significado; sei quem é a pessoa que deu corda na
caixa...
Ele olhou todo o apartamento, mas estava vazio. Era claro que estaria,
Samuel não seria estúpido a ponto de se deixar ser pego. Eu me lembrava de
ele dizer que as autoridades eram lerdas, por isso nunca o pegariam.
Enquanto isso, ele raptaria mais garotas tolas e inocentes como eu...
— Está limpo, sem sinal de arrombamento. Você sabe quem invadiu sua
casa? Qual o nome da pessoa? Me passa, para eu investigar. Sou da polícia,
lembra?
Ri com amargura.
— A polícia não vai achar nada, esse cara se move como uma sombra.
Ninguém vai chegar perto dele, a não ser que ele queira. Ele não para até ter
o que quer... — Minha voz falhou enquanto eu estendia a mão para fechar a
caixinha de música, mas Bryan me impediu.
— Não toque em nada, pode ter digitais na caixa e em outros lugares do
apartamento. — Ele pegou o telefone e falou com um cara chamado Calebe.
Deixei-o conversando e fui para o quarto arrumar umas roupas para
mim. Precisava ir para outro lugar até tudo se resolver completamente.
Também tinha de checar se algo havia sido levado. Samuel não era ladrão,
mas quem sabia o que mais aquele monstro se tornara após aqueles anos,
além de ser um estuprador de mulheres inocentes?
Eu não iria para a casa do Alex, já que não queria trazer problemas
para ele, mas precisava dar um tempo de Nova Iorque, ficar longe de Claire
e Luana. Não podia deixar aquele ser desprezível chegar perto delas.
Precisava fazer Mike e Julian as levarem para umas férias longe dali, longe
daquele desgraçado que, depois de quase cinco anos, resolveu voltar para
terminar o que começou e foi interrompido.
Depois que as roupas estavam colocadas na mala, fui até minha caixa
de joias. Não era por ser fútil e gostar de me arrumar, embora gostasse; eu
me importava com aquelas joias porque tinham sido de minha mãe, que me
deu antes de morrer. Então, aonde eu fosse, levava-as comigo como
lembrança.
Assim que abri o pequeno baú, encontrei um bilhete.

“Você é minha puta, não daquele policial de merda. Se eu vir você


com ele, vou matá-lo e esquartejá-lo...”

De repente o bilhete foi arrancado de minhas mãos, e corri para o


banheiro e vomitei no vaso sanitário tudo que tinha ingerido devido às
lembranças jorrando em minha mente como um maldito câncer incurável.
— Alexia...
Ignorei o chamado e tirei as roupas, entrando debaixo do chuveiro.
Precisava arrancar as lembranças do seu toque asqueroso em minha pele.
Água e lágrimas caíam em minha face, repercutindo a dor e o desespero que
apertavam meu peito, sufocando-me.
Fazia tempo que eu não tinha essas crises, mas sabia o que as
desencadeara: seus bilhetes ameaçadores e os nomes de que ele me chamava
e que ainda me davam calafrios na espinha e na alma.
— Alexia! — Bryan pegou a bucha que eu esfregava em minha pele e a
jogou longe de mim, em seguida desligou o chuveiro. — Não pode machucar
a si mesma! Seja o que for que esse cara fez com você, eu juro que vou fazê-
lo pagar, Luz do Sol.
Fitei seus olhos, que revelavam seu sofrimento ao me ver quebrada
daquela maneira. Nem minhas amigas me tinham visto assim, só meus pais e
Alex. Eu não queria que Bryan me visse daquele modo, mas precisava dele.
Somente seu rosto e sua voz faziam as vozes que me atormentavam irem
embora. Joguei meus braços em seu pescoço e o beijei, querendo que ele
tirasse de mim tudo que restara daquele monstro que destruíra minha alma,
deixando-a em pedaços.
— Luz do Sol... — repreendeu-me, afastando-me da sua boca, mas não
deixei.
— Por favor, tira ele de mim, por favor... — chorava ao suplicar,
agarrando-me fortemente a Bryan, não me importando em me humilhar para
ganhar qualquer coisa dele. Só precisava, com o toque que eu sempre
sonhara em sentir, arrancar aquilo que estava poluindo a minha pele.
Ele não disse nada, só me olhou por um segundo e logo estava me
beijando a todo vapor, do jeito que eu queria e sonhava com seus beijos
doces, mas naquele instante com gosto de bebida e cigarros. Eu não sabia
que ele fumava, mas não me importei com isso, apenas queria desfrutar do
máximo dele, porque no dia seguinte não teria aquilo de novo.
Tirei sua jaqueta e camiseta e logo fui para suas calças, tirando o seu
cinto e desabotoando sua calça, tudo com meus lábios nos dele, sua língua
devorando a minha com fome, com prazer e desejo, como se não se
alimentasse havia dias ou anos e de repente achasse um banquete para se
fartar. Eu estava igual a ele, faminta.
Coloquei minhas pernas à sua volta e logo o senti dentro de mim,
enchendo-me e me fazendo ansiar ainda mais por ele. Senti minhas costas na
parede, então ele estocou seu pau em meu interior, levando-me ao limite do
prazer e me fazendo ver estrelas. Nenhum de nós disse nada além de
gemidos. Então gritei em sua boca quando gozei, com ele vindo logo depois
de mim.
Eu nunca havia gozado em toda a minha vida, aquele era meu primeiro
orgasmo. Quando perdi minha virgindade, foi através de um estupro, então
não sentia nada em relação ao sexo, apenas repulsa; com Bryan, porém,
sentia tudo, prazer e paixão.
Bryan era um cara fechado, difícil de se ler, mas senti naquela hora que
ele também me queria tanto quanto eu, apenas não dava o braço a torcer.
Também notei que ele era bastante carinhoso, principalmente ao beijar a
minha pele onde a boca daquele monstro havia estado, como nos meus
seios... Estremeci ao me lembrar da dor.
Ele encostou a testa na minha, com seus olhos nos meus.
— Está bem agora? — sondou, beijando minhas pálpebras com carinho.
Ainda estava dentro de mim.
Encolhi-me como um gatinho em seus braços e escondi meu rosto em
seu pescoço, sentindo seu aroma delicioso de desodorante masculino.
— Desculpe por atacar você assim, não sei o que aconteceu. Eu só
queria...
— Eu sei, e não estou reclamando por ter acontecido. Isso era algo com
que eu sonhava há muito tempo. — Ele beijou minha testa e suspirou como
se adorasse meu cheiro.
Afastei-me e olhei para ele, que estava sorrindo. Bryan tinha dois
lados, um sombrio e outro divertido e doce. Ele sorria e brincava com todos,
mas eu já o vira sombrio em alguns momentos, como na hora em que bateu
em Jack. Tinha algo nas profundezas de seus olhos que afirmava que ele
tinha falado a verdade quando disse que mataria meu amigo. Ele não parecia
falar aquilo só porque estava com raiva, no calor do momento.
Eu estava a ponto de lhe perguntar por que ele não tinha vindo até mim
ao invés de procurar outra mulher, uma que, ao que parecia, havia deixado
na boate para vir ali. No entanto, fomos interrompidos por alguém batendo à
porta. Apertei-me mais contra Bryan, olhando a porta do banheiro fechada.
— Eu pensei que você disse que alguém tinha entrado aqui, mas, ao
invés de revistar o lugar, está...
— É melhor calar a boca, Calebe, ou vou arrancar seus dentes —
rosnou Bryan, depois sussurrou, beijando meu rosto: — Tome um banho e se
vista enquanto eu falo com eles, tudo bem?
Assenti, muda, desenrolando-me dele. Senti um vazio assim que ele
esteve fora de mim.
— Droga, não usamos camisinha — reclamou ele, abotoando suas
calças. Pegou a camisa e a jaqueta e as vestiu.
Notei que ele tinha várias cicatrizes em seu peito, fora as tatuagens que
o cobriam em vários lugares do corpo. Onde e como ele as tinha
conseguido? Seu tórax, além das cicatrizes, era coberto por tatuagens, tinha
um ponto parecido com um mapa, com nomes neles. Dois nomes, na verdade,
Emília e Emma, com letras em chamas. Quem eram elas e onde estavam?
Não perguntei, já que não era o momento para isso, mas achei estranho, pois
não eram nomes de mulheres de sua família, pelo menos das que eu
conhecia.
— Eu tomo pílulas anticoncepcionais, então pode ficar tranquilo, que
não vou engravidar para prender você — disse com acidez, acrescentando
quando ele estava perto de dizer algo: — Mas não poderei me livrar de
qualquer doença que venha a ter, já que você fica com tudo que se move.
— Eu nunca transei sem camisinha. Filhos são o que me preocupa,
porque não quero tê-los, e, se alguém engravidar de mim pensando que vai
me prender, mando abortar. — Seu tom soou sombrio.
Encolhi-me ante sua expressão soturna, e algo dentro do meu peito doeu
por ele não querer filhos e, o pior, dizer que mandaria uma mulher abortar
um ser pequeno e indefeso dentro dela... como havia acontecido comigo
havia quatro anos... Parei de pensar nisso, ou sucumbiria ainda mais do que
ao pensar no que Samuel me fez naquele cativeiro.
Olhando para Bryan, vi a sombra que o cercava. Só não sabia o que o
levara a ficar assim, desumano, porque um cara que menosprezava um bebê
ou um feto dessa forma era desumano para mim. Contudo, normalmente ele
não era assim. Por que dizia isso, então?
— Tudo que você está pensando sobre mim é verdade, Alexia, então
sugiro que se mantenha longe de mim para o seu bem. Se espera uma casa
com cerca branca e filhos, não sou esse homem — disse ele, depois saiu
batendo a porta e me deixando chocada.
Eu custava a acreditar que ele dizia a verdade. Sentia que ele criara
uma gaiola à sua volta, impedindo-me de a atravessar. Eu não queria nada,
apenas que me deixasse entrar para ver e lhe mostrar a luz em seu interior, a
mesma luz que um dia eu havia perdido, mas, com o passar dos anos,
começou a brilhar de volta, mesmo que a dor nunca fosse embora. O que
acontecera com ele para ficar assim? Isso teria a ver com aquelas cicatrizes
e os nomes que estavam gravados em seu peito? Acreditei que não teria
resposta para aquilo.
Depois de dar meu depoimento sobre a pessoa que invadiu meu
apartamento, e eles revistarem minha casa, Bryan me levou embora. Disse a
ele que ficaria em um hotel, mas ele não deixou e me levou para uma casa
em Manhattan. Até achei que fosse de um amigo seu, mas percebi que não
era quando ele estacionou seu Range Rover depois de entrar em uma casa
com portões grossos de ferro. Ele desceu do SUV. Eu já ia descer, quando
ele disse:
— Fique no carro até eu checar tudo. — Não era bem um pedido.
Só não o mandei catar coquinho porque estava cansada demais e com
raiva de tudo, do desgraçado do Samuel por resolver me procurar e de
Bryan por me ignorar completamente depois de termos transado no banheiro.
Quase ri ante esse pensamento. Como se ele fosse agir de modo diferente
comigo só porque transamos... Ele faz isso com todas as mulheres, para ele
foi apenas sexo entre nós dois... Já para mim? Eu estou irrevogavelmente
apaixonada por ele.
Depois de ele fiscalizar a casa, fomos até a porta, que tinha quatro
cadeados e três caixas de código alfanuméricos. Havia câmeras para todos
os lados.
— Para que tanta segurança? Tem algum presidente importante aqui? —
indaguei, porque a casa era mais protegida que o Fort Knox.
Ele não respondeu, e eu não insistiria por migalhas de sua atenção. Se
ele não se importava comigo, não iria me incomodar. Eu não deveria ter
vindo, mas não queria trazer perigo para meus amigos e meu irmão, por isso
segui Bryan sem reclamar. Era isso que eu dizia a mim mesma.
— Seu quarto vai ser aquele ali. — Ele apontou à direita para uma
porta que estava fechada, depois para a porta que ficava de frente para essa.
— Nunca entre naquele quarto a não ser que eu deixe ou a chame para entrar.
Notei que ele falava comigo como se eu fosse uma estranha e não a
melhor amiga de sua irmã ou a mulher que ele estava fodendo
Assenti, muda. Com certeza ali era o seu quarto, e ele não queria que eu
fosse lá. Quase ri por ter imaginado que dormiria com ele naquela noite.
— Eu tenho que sair, mas não vou demorar. Preciso ir pegar Brenda na
boate...
Quando ele disse isso, foi como se enfiasse a mão em meu peito e
arrancasse meu coração aos pedaços. Talvez doesse menos se fizesse isso de
modo literal. O que eu podia esperar dele?
— Não é o que pensa — disse ao ver a agonia em meus olhos.
Possivelmente eu não consegui escondê-la a tempo.
Não falei nada e fui para o quarto, ou me quebraria na sua frente, e isso
não podia acontecer.
— Alexia...
— Só vá embora para sua mulher, ou talvez tenha mais, não é? Vá logo,
Bryan, e me deixe sozinha. — Não esperei ele responder, apenas me tranquei
no quarto e coloquei a mão na boca para abafar o som do choro para ele não
ouvir, mas, depois de uns minutos, ouvi o som do seu carro indo embora. Foi
quando me deixei cair no poço de dor que estava me sufocando.
Olhei para a cama califórnia king e o quarto espaçoso, todo branco,
com fotos de Sam na parede. Então aquele quarto era dele? Eu não dormiria
naquela cama! Quantas mulheres ele havia levado ali? Com certeza milhares.
Incluindo a Brenda...
Arrastei-me ainda chorando até o carpete e me deitei lá, porque achava
que ele não tinha transado no chão; pelo menos, esperava que não.
Na manhã seguinte, assim que eu acordasse, iria embora. Talvez, se eu
fosse para a casa de praia do meu irmão, no Caribe, conseguisse ficar
segura. O que eu não podia era ficar com Bryan, vendo-o com outras
mulheres. Eu não suportaria novamente o que aconteceu naquela noite,
quando ele me deixou ali sozinha, arrasada e foi atrás de outra mulher.
Encolhi-me, não querendo pensar em minha vida. Só esperava que o dia
seguinte fosse melhor.
Capítulo 3
BRYAN
Saí da minha casa, reforçada com câmeras e outros dispositivos de
segurança para, caso eu precisasse algum dia, deixar alguém que eu amasse
protegido, mas nunca em minha vida tinha pensado que seria a mulher
deslumbrante com cabelos cor de ouro, aquela que eu sonhava em tocar
havia muito tempo. Eu finalmente a tinha possuído, mas não do jeito que
queria. Quando pensava em ficar com Alexia, seria pela vontade dela, não
para tirar a porra de um desgraçado de suas lembranças.
Só em pensar no que aquele homem devia ter feito com ela para lhe
causar a dor que eu vira mais cedo naquele dia, dava-me vontade de
esquartejá-lo, porque a morte era pouco para ele. O seu inferno chegaria
quando eu o pegasse e fizesse tudo que jurara nunca mais fazer.
Eu tinha meu emprego na CIA, para a qual gostava de trabalhar, fora a
parte de ter de manter segredos das pessoas que eu amava, como Sam, vovó
e, depois, Alexia.
Pude ver em seus olhos que ela pensava realmente que eu saí da casa
para ficar com outra mulher, mesmo que eu tivesse acabado de transar com a
garota. Eu sempre havia feito isso com as mulheres, mas com ela não era
assim. Alexia tinha algo que fazia minha escuridão diminuir, seu sorriso, sua
voz...
Desde o dia em que eu soube, por Alex, seu irmão, no Belas Country,
que um cara a machucara tanto que foi preciso ela se internar em uma
clínica, mesmo dia em que eu a beijei pela primeira vez, percebi o que ela
realmente sentia por mim. Inclusive podia ver isso na forma como ela me
olhava e quando ficamos juntos. Também senti sua dor por pensar que eu
ficaria com outra pessoa.
Na noite do nosso primeiro beijo, notei-a tensa o tempo todo, tanto que
supus que o cara que a havia machucado fez com que ela não quisesse mais
ficar com homens. Por isso fui embora sozinho e não a convidei para o meu
apartamento; não queria trazer mais dor a ela.
No dia seguinte, ela foi ao meu apartamento e viu Brenda, minha colega
de trabalho e a mulher com quem meu chefe ficava. Tínhamos trabalhado
disfarçados naquela noite, mas Alexia pensou que estávamos fodendo. Eu
sabia que deveria ter esclarecido as coisas, mas não podia, não queria
infectar a luz que existia nela com a minha escuridão, então deixei que
pensasse isso e me afastei dela, pois já sofrera demais, e comigo sofreria
muito mais, porque eu fazia isso com as pessoas próximas. Elas se
machucavam ao confiar em mim.
O destino era realmente uma cadela. Duas mortes eu tinha nas costas
por não conseguir fazer o meu trabalho direito, se é que podia chamar o que
fiz, naquele ano de escuridão, de trabalho. Quando eu trabalhava para Pietro,
conhecido por todos como Black, não era um “serviço”, e sim uma maldição
que acabou levando minha alma, tudo para pagar a dívida que meu pai devia
a ele, se é que eu podia chamá-lo de pai. Dylan era um ser desumano que
quase matou a filha e o bebê que ela esperava.
Entretanto, paguei essa dívida. Não foi por ele, mas sim por Sam,
porque eu conhecia Pietro, e, quando se devia a ele, liquidava-se a dívida ou
se pagava o preço, inclusive a família do devedor, do modo mais doloroso
que existia.
Enfim eu estava protegendo uma mulher com quem eu me importava
mais do que comigo mesmo, cujo algoz, que queria levá-la novamente,
ninguém conseguia localizar. Todavia, ele não me conhecia; eu iria encontrá-
lo e acabaria com ele, embora não pudesse fazer isso sozinho, porque tinha
de trabalhar e tomar conta de Alexia para que aquele desgraçado não a
machucasse de novo. Oh, o inferno iria cair se isso acontecesse. Eu
derrubaria quantos fossem necessários para impedir que ela sofresse mais
uma vez.
Eu só conhecia uma pessoa que podia me ajudar com isso. Para minha
sorte, ele se encontrava em Nova Iorque.
Meu telefone tocou quando eu estava indo para o inferno em que estive
havia tanto tempo e para o qual teria que retornar. Pietro era o chefe do MC
Scorpion, que não conhecia a palavra chamada lei. Os federais estavam em
cima deles, e, se eu fosse ao seu encontro, também estaria na lista de
procurados. A sede de seu clube era no Kentucky antes, mas foi transferida
para próximo a Nova Jersey.
Olhei a chamada sem registro e franzi o cenho por alguém ter aquele
número. Só Sam o tinha, mas o nome dela estava registrado, diferente
daquele.
— Alô? — Minha voz saiu dura.
— Olá, Scott. Como tem passado? — saudou Shadow, o presidente do
MC Fênix em Chicago.
Nós dois nos conhecíamos havia alguns anos, desde quando eu fui a
Chicago fazer um trabalho para Pietro, o último. Shadow me ajudou a me
livrar da dívida que eu tinha com Pietro, que era pior do que vender a alma
ao diabo, aliás, ele era o diabo em pessoa na Terra.
Shadow sempre me chamava de Scott porque eu usei meu segundo nome
quando o conheci, mas depois nos tornamos colegas, irmãos, na verdade. Era
assim que eu os considerava, ele e todo seu pessoal do MC, uma família que
nunca tive.
— Bem. Suponho que seja importante, para deixar sua mulher na cama
e vir falar comigo às 3h da madrugada — falei com um suspiro, mas era
bom, eu precisava falar com ele.
Ele suspirou também.
— Eu sei o que está acontecendo, então me encontre no clube do MC
em Nova Iorque AGORA. — Seu tom não soava como um pedido. Ele deve
ter-se dado conta de que era o tom que usava com seus homens, pois falou de
forma mais leve: — Scott, eu sei o que aconteceu com a garota que você está
protegendo e que ela é importante para você...
O carro deu um solavanco quando pisei no freio, parando-o
instantaneamente.
— Como sabe sobre isso? — Olhei ao redor bem a tempo de ver uma
moto parar perto do meu carro.
— Siga Daemon até o clube, Scott, e vamos conversar sobre sua garota.
— Shadow, me diz que porra está acontecendo! — grunhi com raiva.
— Apenas siga Daemon, e vamos conversar.
Liguei o carro e segui o motoqueiro.
Assim que cheguei à sede do motoclube Fênix em Nova Iorque, não
reparei muito no local, pois estava preocupado demais com o que Shadow
disse sobre Alexia. Ele parecia saber realmente quem ela era e o que estava
acontecendo.
Entrei no clube, ignorando a festa que estava rolando e as mulheres
nuas que se encontravam ali com os caras. Enquanto eu as via, não sentia
absolutamente nada. Alexia havia chegado arrebentando, porque, depois de
apenas um beijo dela, eu não queria mais mulher nenhuma; agora que eu tinha
sentido seu calor e estado dentro dela, seria pior ainda. Só ela mesmo para
pensar que eu a tinha deixado para procurar outra mulher. Contudo, fui
culpado por lhe dizer que buscaria Brenda na boate. Dennis que se virasse
com ela, já que a mulher era dele, ou melhor, sua “ficante”, porque aquele
cara não ligava para ninguém, só para si mesmo e seu trabalho.
Fui direto a Shadow, sentado ao lado de Nasx, Michael e Daemon, que
acabava de se acomodar. Estava ali também outro cara, moreno e alto, com
colete do MC.
— Há quanto tempo, Scott — saudou Shadow. — Sente-se. Vamos
conversar.
A mesa à qual estávamos era mais afastada do pessoal que se
encontrava no salão, assim ninguém ouviria o que iríamos conversar. Isso
era bom.
— O que sabe sobre Alexia, e como Daemon estava me seguindo...?
Ele me cortou:
— Não estava seguindo você, e sim ela...
Cerrei os punhos com força. Se por acaso ele estivesse interessado em
Alexia, eu o mataria.
— Vamos deixar de lado esse veneno que está em seus olhos; posso ver
que quer matar o Daemon — declarou Shadow, olhando-me de lado e dando
um gole na sua bebida. — Nós estamos atrás dela porque chegamos à
conclusão de que nosso alvo quer sua garota...
— Espere, o quê?! — Minha voz saiu duas oitavas mais alta. Alguns
dos MCs fecharam a cara para mim, mas não me importei com isso. Foi
apenas o meu medo, que veio à tona. Se não bastasse um lunático que a ferira
no passado, em quem eu estava louco para colocar as mãos, eles vinham
dizer que havia outro cara querendo-a? Porra! Eu jurei não matar mais
ninguém, mas assim fica difícil.
— Que porra isso significa? Quem é esse cara? Me diz, que vou matá-
lo.
— Esse é o nosso problema. Quando chegamos perto, ele escapa como
uma sombra...
— Sombra? — interrompi Nasx. — Qual seu nome? E o que ele fez
para vocês o caçarem?
— Ryan Donovan me pediu para pegar o cara que tentou estuprar sua
namorada e matou a irmã dela. Então, estávamos caçando esse cara até uma
casa em Seattle. Foi quando achamos uma garota em cativeiro, morta, e uma
foto da sua mulher no quarto do cara. Por isso a estamos vigiando desde
então, porque pensamos que ele virá atrás dela.
— Se vocês estão vigiando, então sabem quem entrou no apartamento
dela esta noite e quem é esse desgraçado? — Minha voz saiu num sibilar.
— Seu nome é Steve Lutner. O bastardo é um sádico fodido, que
conquista garotas inocentes e jura que as ama, depois as mantém em
cativeiro por uma semana, as espanca, maltrata, estupra e depois mata. — O
tom de Shadow era sombrio. Ele me olhou de um jeito que fez gelar minha
alma escura. Eu sabia que não ia gostar do que ele estava prestes a me dizer.
— Acreditamos que sua garota é uma delas, a única que sobreviveu, e que
agora ele quer terminar o serviço que ficou inacabado.
— Pelo que consegui descobrir, Alexia foi sequestrada por quase uma
semana, mas um cara do FBI a encontrou toda machucada, desidratada e
fraca por falta de água e comida, fora as lesões em seu corpo. Seu pai a
internou em um hospital psiquiátrico, porque ela ficou traumatizada. E não é
para menos; pelo modo como a encontraram, acharam que ela não
sobreviveria devido às lesões profundas que teve — disse Daemon sombrio.
Meu peito se apertou, meu sangue gelou nas veias ao saber o quanto
minha garota sofrera nas mãos daquele desgraçado filho da puta, então
ferveu a ponto de eu querer fazer o que tinha jurado que nunca mais faria em
minha vida. Eu não me importava de passar a vida na cadeia por matar um
ser daquele tipo. Assim que o pegasse, adoraria fazer tudo que estava louco
para fazer com ele. O inferno estava para começar em sua vida, e ele nem
percebia.
Quando Alex mencionou que Alexia foi quebrada, achei que um
bastardo a tinha machucado, como acontecia às vezes no fim de um
relacionamento. Ao descobrir tudo isso e presenciar o modo como ela se
comportou mais cedo naquela noite, senti mais raiva de mim por não ter
pesquisado mais sobre ela e ter descoberto pela boca dos outros o que lhe
aconteceu. Por isso a sua crise, o seu medo daquele homem.
— Eu hackeei todas as câmeras próximas à casa dela, e aqui está a cara
do serial killer. Eu soube que o que ele fez com Alexia fez também com
mais 18 garotas, mas nenhuma sobreviveu, só ela. A garota que encontramos
junto à foto de Alexia estava morta. — Daemon empurrou uma foto de um
cara moreno com cabelos curtos e usando óculos escuros, certamente para
não ser reconhecido, uma vez que não havia outro motivo para ele usar
óculos de sol à noite.
— Comprovamos que ele é de fato Steve Lutner, filho do senhor e da
senhora Lutner, que o bastardo matou, esquartejou e deixou bem na frente da
prefeitura, para toda a população da cidade ver. O cara é definitivamente
fodido da cabeça, para não dizer um demônio — falou Shadow. Seu nome
verdadeiro era Dominic, mas poucos o chamavam assim ou pelo seu outro
apelido, Dom.
— Peguei também imagens das câmeras de locais de onde algumas das
vítimas dele foram levadas, mas ele está sempre diferente, olha aqui. —
Daemon me deu um envelope.
Em algumas imagens, o homem estava barbudo, em outras, com cabelos
longos e ruivos, ou louros, ou negros. Em umas estava sem óculos; em
outras, com óculos de grau, representando nerds.
Quanto mais eu via sua face, mais ódio sentia daquele cara. Estava
louco para matá-lo, assim como ele fez com aquelas garotas inocentes, com
famílias que as amavam... E ele tinha ferido a minha garota. Ela era minha,
ninguém nunca mais tocaria nela, ou eu jurava que acabaria com quem quer
que o fizesse, incluindo aquele fedelho do clube que estava doido para ter o
que era meu.
— Eu quero cópias delas; vou ver o que acho a partir daqui. Agora que
sei quem ele é, fica mais fácil. Por suas diversas aparências, imagino que ele
use nomes diferentes. Isso significa que o nome do cara que Alexia deu a
mim não era verdadeiro. Ela se referiu a ele como Samuel, não Steve. Ele
sabia que seu nome era procurado pela polícia e pelo FBI pelas mortes de
outras garotas, por isso sempre devia mentir seu nome para elas. — Bebi um
gole de uísque e olhei para Shadow, que me observava. — Se o pegarem
antes de mim, fiquem sabendo que ele é meu.
— Scott, você é um policial, não pode sujar seu nome e suas mãos
assim...
Estreitei os olhos.
— Acha que me importo com meu nome ou o que vier a acontecer
comigo? — Meu tom saiu frio, mas ele não ligou, afinal, era sombrio igual a
mim, se não pior. — Eu não me importo, apenas quero que ele pague pelo
que fez a ela. A sua morte vai ser lenta, com requintes de crueldade.
— Ele vai pagar, mas não pode ser você a fazer isso. Pense nela, na sua
garota. O que ela iria achar disso, de você buscando vingança para o que
aconteceu com ela?
Por instinto, olhei para a câmera no meu celular e a vi. Ela estava no
quarto que eu lhe designara em minha casa. Eu a havia colocado ali
justamente para vê-la aonde quer que eu fosse. O que vi me deixou grilado.
Ela estava dormindo no chão, sobre o carpete. Abraçava-se tão forte, como
se agarrasse um bote salva-vidas. Parecia tão inocente e frágil que eu só
queria protegê-la de quem quer que quisesse lhe fazer mal, de quem ao
menos sonhasse em tocar minha Luz do Sol. Ao mesmo tempo sentia ódio de
mim mesmo por, depois de a ter encontrado daquele jeito, assustada e com
medo, em vez de a ajudar, ter transado com ela como o fodido que eu era.
Olhei para as outras câmeras para ver se avistava algo de estranho ao
redor da casa. Foi quando vi o garoto da boate no seu carro em frente ao
portão da minha casa, talvez pensando em chamar ou entrar, o que seria
impossível, pela segurança dela. Ele devia ter nos seguido.
Trinquei os dentes, tentando me controlar para não correr para lá e
matar o cara errado, embora esse eu também quisesse morto, porque só em
pensar nele a beijando de novo me enchia de fúria.
— Pode me procurar sempre que precisar. ― Shadow e eu nos
parecíamos, éramos sombrios e tínhamos feito coisas pelas quais jamais
teríamos misericórdia de Deus ou alcançaríamos a redenção. Eu não ligava
muito para onde minha alma fosse depois que eu morresse, ou era assim que
eu pensava antes de Alexia entrar em minha vida. Sua luz e beleza
resplandeciam como o sol na minha vida. Eu a chamava de Luz do Sol por
esse motivo, e ela nem sabia. Desejava ser alguém melhor para viver com
aquela mulher deslumbrante.
Queria não matar mais ninguém, mas, vendo a imagem daquele filho da
puta e sabendo que ele estava à procura dela para terminar o que começara
anos antes, eu estava decidido a lhe mostrar quem era o demônio, o que eu
era capaz de fazer. Eu o ensinaria a nunca mais se aproveitar de garotas
inocentes.
— Preciso ficar de frente para esse verme maldito, tenho de olhar nos
olhos dele e lhe mostrar que agora ela não está sozinha para enfrentá-lo igual
esteve no passado.
Shadow suspirou.
— Vou te dar uma chance com ele, mas você não vai matá-lo, é um
homem da lei e não tem como limpar seu nome ou fazer trabalhos sujos para
pagar dívidas como fez para saldar a dívida do bastardo do seu pai ou se
vingar.
Meu pai era um fodido que não ligava para seus filhos. Ele até gostava
da minha irmã quando ela era pequena, mas, quando ela completou dez anos,
tudo mudou. Eu podia ver que minha mãe tinha ciúmes ao ver Dylan perto de
nós, possivelmente por isso ela disse que Sam não era sua filha, e, como o
bastardo fodido que meu pai era, acreditou nisso. Ele começou a beber e a
frequentar salas de jogos, então virou o mal em pessoa, e o pior, trouxe a
maldade para minha família, tanto que tive que dar minha alma para proteger
minha irmã.
Havia quase um ano, eu tinha levado uma facada dele. O bastardo
apareceu em meu apartamento em Nova Jersey querendo saber de Samantha.
Eu não esperava isso, razão pela qual fui pego de surpresa. Depois daquele
dia, eu soube que espécie de monstro ele era, e o pior, o que tentou fazer
com a filha, a minha irmã querida. Finalmente ele estava apodrecendo na
cadeia e só sairia de lá morto.
Shadow olhou para uma ruiva bonita conversando com algumas
mulheres a uma mesa não muito longe. Eu sabia que ele tinha caído de quatro
por uma mulher, soube havia pouco tempo, mas fiquei feliz pelo cara, porque
havia alguém que aceitava seu lado escuro. Eu queria algo assim, queria que
a Luz do Sol me aceitasse como eu era realmente, não aquele cara alegre que
todo mundo achava que eu era, mas aquele que ninguém nunca via de
verdade, nem mesmo minha irmã.
Shadow me fitou de volta com um olhar sério, aquele que ele
costumava dar às pessoas com quem se preocupava.
— Hoje temos mulheres que são nossas razões de viver. Por elas nós
matamos e morremos. Não é assim com a sua? — Era uma pergunta retórica,
pois ele sabia como eu me sentia. Na minha vida, existiam três mulheres que
eram meu tudo, por quem eu daria minha vida e mataria, Sam, vovó e minha
Luz do Sol, que estava em minha casa dormindo.
Saí do motoclube prometendo ao meu irmão Shadow que ia procurá-lo
caso precisasse da sua ajuda. Eu sabia que, no MC Fênix, teria as minhas
costas e as da minha família protegidas. Devia a ele a minha vida, acreditava
que parte da minha alma também.
Fui para casa pensando em mandar o garoto da boate embora, porque,
pelo que eu sabia, ele ainda estava na porta da minha propriedade mantendo
a guarda. Só não sabia por que ele ainda não tinha tocado a companhia e
chamado Alexia ou até mesmo ligado para ela.
Assim que cheguei ao portão da minha casa, vi o rapaz caído na
calçada, todo cheio de sangue. Pela sua camisa ensopada, ele havia levado
um tiro ou fora esfaqueado. Corri até ele e me ajoelhei ao seu lado.
— Maldição, garoto! Por que você veio aqui, hein? — Chamava-o de
garoto, embora fosse um homem formado como eu, porque, embora eu
tivesse 27 anos, completados em setembro, parecia muito mais velho que
ele, provavelmente por ter tido de amadurecer à força.
Seu pulso estava fraco, e ele cuspiu sangue ao tentar falar, mas, apesar
disso, soltei a respiração, que estava presa, aliviado por ele estar vivo. Era
certo que eu tinha pensado em sua morte, mas foi na hora da raiva; eu não
queria aquilo de verdade.
Ele bancava o idiota por estar ali, mas amava Alexia e só queria ver se
ela estava segura. Quem não amaria uma mulher como aquela? Não apenas
por sua beleza, mas por seu interior. Samantha dizia que as pessoas sempre
podiam contar com ela quando precisavam.
— Ele queria... mas eu não o deixei entrar...
— Não fale agora — pedi, ligando para a emergência. Disseram que
logo estariam ali.
— Precisa protegê-la... Ele disse que, não importa onde ela esteja, ele
vai pegá-la e castigá-la...
— Eu prometo que a protegerei. Agora pare de falar, OK?
Depois que a ambulância e os policiais chegaram e fizeram o seu
trabalho, fiz o meu investigando as câmeras ao redor da casa, dando à
polícia local as cópias das filmagens. Pelo que notei, Lutner não parecia
estar se escondendo. Isso me ajudaria a pegá-lo, eu esperava.
Fiquei mais alguns minutos conversando com Calebe sobre a segurança
de Alexia e o atentado contra a vida de Jack, amigo dela. Calebe trabalhava
comigo, mas precisou pedir umas férias devido a um acidente que o deixou
meio abalado, mas, como éramos amigos, ele estava me ajudando a ficar de
olho em Alexia e protegê-la.
Alexia não sabia de nada do que tinha havido do lado de fora da minha
casa, porque o imóvel era à prova de som e equipado com proteção contra
invasão, então lá de dentro não era possível ouvir nada do que acontecia do
lado de fora. Fiquei feliz por ela ainda não saber nada. Assim que Jack
estivesse fora de perigo, eu lhe diria o que tinha ocorrido, que seu amigo
agira como um herói.
Liguei para o hospital a fim de checar o garoto. A atendente me
informou que ele estava em cirurgia, mas que me manteria informado a
respeito de qualquer novidade.
Estava entrando em casa quando ouvi os gritos de Alexia. Corri com
meu coração tremendo, pensando que, de algum modo, aquele desgraçado
tivesse passado pela segurança e entrado ali sem eu saber.
— Bryan, não me deixe... — Sua voz falhou, cheia de dor e desespero.
Ela estava deitada ainda no carpete, evitando a cama. Só pude presumir
que pensava que eu tinha dormido com outras mulheres ali, o que não
acontecera.
Agachei-me perto dela e toquei seu rosto, suado com o pesadelo que
estava tendo. Parecia ser comigo, já que disse meu nome em tom
desesperado.
— Luz do Sol — chamei-a, sacudindo seus ombros. — Acorde, é só um
pesadelo.
Ela abriu os olhos, molhados de lágrimas, e me viu ali. Logo me
abraçou forte, como se eu fosse seu bote salva-vidas, e suspirou no meu
pescoço.
— Bryan, eu pensei que estava morto... Sonhei que você tinha levado
um tiro e estava... — sussurrava e me apertava ainda mais contra si.
Se ela soubesse que não tinha sido só um sonho, mas que o alvo do tiro
não era eu, e sim seu amigo, eu apostava que ficaria preocupada e exigiria ir
ao hospital.
Peguei-a nos braços, levei-a para a cama e a depositei com delicadeza
nela.
— Eu estou bem, Luz do Sol, não se preocupe comigo. Só preciso de
um banho e já volto...
Ela se afastou de mim como se eu a tivesse empurrado, e pensei nas
minhas palavras. O que ela tinha entendido? Havia dor na beleza violeta de
seus olhos.
— Você estava com sua namorada, não é? — A amargura era como fel
em sua voz.
Coloquei-me sobre ela e beijei sua testa e suas pálpebras, então fitei
seus olhos arregalados.
— Eu não estava fodendo ninguém. Acha que eu ficaria com você e
depois sairia para transar por aí? Mesmo eu sendo um canalha, jamais faria
isso, muito menos com você. — Beijei sua boca, interrompendo o que ela
estava prestes a falar, e logo estava dentro dela de novo, saciando a minha
fome por aquela mulher e jurando que sempre protegeria a única luz que
enchia de gozo meu peito e minha alma.
Capítulo 4
ALEXIA
Acordei cedo, caçando o corpo másculo e gostoso que eu tive o prazer
de tocar e ter em meus braços. Dormir ao lado de Bryan durante aqueles dois
dias desde que ele tinha me levado para sua casa foi um sonho que eu
ansiava havia muito tempo, desde o dia em que eu soube que estava
apaixonada por aquele homem lindo e forte.
Eu confiava em que Bryan me protegeria do desgraçado do Samuel, que
não deixaria nada acontecer comigo, por isso estava em sua casa sem
reclamar – embora eu jamais reclamaria com o sexo que estávamos tendo.
Além disso, minha presença ali evitaria levar o perigo e problemas para meu
irmão e meus amigos.
A procura pelo corpo de Bryan não logrou resultados; ele não estava na
cama. Eu tinha acordado tarde, porque o sol já tinha nascido. Fui tomar
banho para depois procurá-lo e perguntar o que estava acontecendo conosco,
porque eu não podia continuar transando sem saber a que nosso
relacionamento se resumia. Namoro? Caso? Foda? Ou tinha algo mais? Eu
não aceitaria ir para a cama com ele caso Bryan quisesse ficar com mais
mulheres por aí e se ele me considerasse apenas mais uma foda em sua vida.
Vesti um vestido de cashmere bonito e elegante. Não estava me
arrumando para ele, porque sempre me arrumava assim. Gostava de vestidos
elegantes para usar no dia a dia, por isso trabalhava e investia em vestidos e
sapatos, era quase maníaca compulsiva; em meu apartamento já não cabia
mais nada.
Por falar em trabalho, eu tinha que ligar para Robert, o meu braço
direito e coordenador na escola particular onde eu era diretora. Ocupava o
lugar que era do meu pai na escola infantil da qual ele era dono, por isso não
me formei como meus amigos. Após sua morte, tive de tomar conta do
estabelecimento.
Amo crianças..., pensei, mas evitei continuar a pensar nisso, ou
sucumbiria ali mesmo com lembranças que não queria recordar tanto acerca
de meu passado quanto do que Bryan disse sobre não querer ter filhos e suas
razões desconhecidas para isso.
Fui para a sala e ouvi vozes masculinas. Meu nome foi citado, então
fiquei curiosa para saber com quem Bryan estava falando, ainda mais sobre
mim. Esperava que ele não falasse sobre nossa vida sexual para outras
pessoas, igual já o ouvira falando muitas vezes com seus amigos e até com
minha melhor amiga, irmã dele, sobre as mulheres com que ele ficava – algo
em que eu preferia não pensar.
— Vai contar a ela sobre o que aconteceu com o garoto? — perguntou a
voz grossa de um cara.
Cheguei à sala e me deparei com Bryan e um cara louro que estava
sentado no sofá de frente para ele, pele branca, mas bronzeada, com
cavanhaque. Eu já o vira, em meu apartamento, depois de sair do banheiro –
foi ele que bateu à porta do cômodo logo após eu transar com Bryan. Seu
nome, caso eu não estivesse enganada, era Calebe.
Bryan suspirou.
— Eu vou dizer assim que ela acordar... — Passou a mão na cabeça
num gesto nervoso.
— Não estou mais dormindo. O que tem para me contar? — interrompi-
o, entrando na sala.
Os dois olharam para mim assim que entrei no cômodo com
predominância de branco, um sofá em L e uma TV gigante num painel de
madeira na parede. Não tinha reparado, mas o lugar era bem organizado para
um homem.
Calebe me fitou de olhos arregalados, assim como Bryan. Deve ser por
eu ter escutado a conversa deles, pensei. O homem deu um sorriso torto.
— Vejo por que a está mantendo em casa, cara. A mulher é a porra de
um avião — disse um cara alto, moreno, com cabelos ruivos e sorriso sexy,
que eu não tinha notado. Ele estava saindo da cozinha, vestia jeans e
camiseta preta e estava com uma cerveja na mão.
— Joshua, cale a boca — rosnou Bryan, levantando-se e se virando
para mim, mas notei um toque de tensão nele. — Como você está?
Notei que ele não veio até mim para me abraçar ou me beijar como
tinha feito nesses dias em que eu estava com ele. Quase ri pensando em
Bryan sendo carinhoso fora da cama com uma mulher ou na presença dos
outros. Talvez fosse como eu tinha pensado, eu era apenas mais uma foda
para ele.
Perguntei, para não ter de pensar mais naquilo:
— Então alguém vai me dizer o que está acontecendo aqui? Por acaso
prendeu a pessoa que invadiu meu apartamento? Eu já posso voltar para lá?
Bryan me cortou:
— Não prendemos o desgraçado que fez isso, mas eu vou pegá-lo e
fazê-lo pagar por tudo que fez a você. — Seu tom era uma promessa. Tinha
algo sombrio em sua voz ao dizer isso. Quando ele falava em fazê-lo pagar,
não estava se referindo a levá-lo para a cadeia, e sim a algo mais sério,
como matá-lo, de preferência com muita dor, pelo menos era isso que eu
sentia no tom amargo de sua voz.
Ainda não tinha dito a ele nem a ninguém o que aconteceu comigo
naquele tempo, quando fui quebrada, despedaçada por um cara desgraçado
que podia ter voltado atrás de mim depois de anos. A dor e os traumas me
levaram para uma clínica por muito tempo, na Suíça, para que ninguém
especulasse o que tinha acontecido comigo, mas, graças a Deus, eu estava
bem e não voltaria para lá jamais. Não deixaria um fodido psicopata
controlar minha vida. Por isso o cara que estava atrás de mim tinha de ser
preso.
Eu estava prestes a perguntar novamente o que estava acontecendo,
quando a campainha tocou. Bryan suspirou e foi atender a porta. Fiquei ali,
meio sem jeito, cercada por aqueles homens, que deviam trabalhar com
Bryan na polícia, mas o estranho era que eles não usavam uniforme como os
policiais que haviam me interrogado na noite anterior. Vestiam jeans,
camiseta e jaqueta de couro, pareciam bad boys.
Bryan voltou para a sala – o hall não era visível de onde eu estava – me
avaliando. Foi quando vi Brenda, vestida com um vestido preto, toda
arrumada.
A dor em meu peito me sufocou por alguns segundos. Pensei que tinha
levado um soco no estômago.
— Bryan, vamos! — chamou a mulher, puxando seu braço como tinha
feito na boate, levando-o na direção do quarto em que ele disse para eu não
entrar.
Ele vai permitir a entrada dela? Então sou menos importante para ele
do que essa mulher? Sou a porra da sua amante?! Oh, Deus, uma amante!
O que deu em mim para me tornar isso?! Por que não posso arrumar um
homem só meu? Um homem que não queira me usar... Usar, isso, todos eles
me usam... Um me deixou quebrada porque fui idiota por acreditar nele, e
agora esse aqui, que dorme comigo em um momento e no outro está com
outra mulher. Não posso aceitar isso!
— Alexia... — ouvi-o me chamando, mas não liguei, apenas saí
correndo para a cozinha e tranquei a porta, querendo ficar sozinha. Não olhei
para a mobília, para nada, porque estava vendo tudo embaçado por causa
das lágrimas.
Preciso sair daqui o mais rápido possível, não posso aceitar isso!
Não vou viver em uma casa para a qual ele traz mulheres a fim de ficarem
juntos. Depois eu, como uma idiota, fico com ele também, aceitando ser a
sobra de um mulherengo que não se prende a ninguém. Um resto, é isso
que eu sou. Um maldito resto! Oh, Deus, no que me tornei?
Saí pela porta dos fundos, ignorando seus gritos ao me mandar abrir a
porta da cozinha, ignorando-o e entrando em seu carro, que, para minha
surpresa, estava com as chaves. Bom para mim e azar para ele. Assim que
liguei o veículo e pisei no acelerador, parti rumo ao portão fechado. Eu ia
derrubá-lo usando a frente do carro, quando os portões se abriram.
Olhei pelo retrovisor e vi Bryan apertando o botão do controle-remoto
do portão, certamente não querendo seu carro e sua propriedade destruídos,
pensei amargamente. Isso me deu vontade de jogar o carro de cima de uma
ponte de tanta raiva que estava sentindo naquele momento, tanto que minhas
mãos tremiam.
Como esse desgraçado traz outra mulher onde estou? Como ele pôde
me usar assim?! Deixei minha raiva um pouco de lado para receber uma
ligação de Claire. Eu não queria envolvê-la em tudo aquilo, no perigo que
rondava feito um abutre na carniça, por isso precisava falar com Mike e
Julian, pedir a eles para levarem Claire e Luana para umas férias
prolongadas em algum lugar longe de Manhattan. Também precisava
procurar algum lugar seguro para ficar sem ser a casa de Bryan. Eu que não
ficaria lá, vendo-o levar mulheres para o mesmo lugar onde me mantinha.
— Oi, Claire...
Ela me interrompeu falando e chorando:
— Jack foi baleado há dois dias, está no hospital... Tentei te ligar, mas
só dava fora de área...
— Espere, o quê? — Meu pé pisou no freio devido ao choque, e fui
para frente. Meus peitos bateram no volante, fazendo-me ofegar de dor e sem
ar nos meus pulmões. Antes que eu me recuperasse, o carro bateu em outro
que parou sem dar seta, ou deu e eu não vi.
Olhei para ver se o motorista estava bem, se havia se machucado de
alguma forma. Meu Deus, espero que não. Meu peito se aliviou assim que o
homem saiu do veículo, embora estivesse uma fera, e era para estar, já que
seu automóvel era um Maserati.
— Claire, em que hospital ele está? Eu tenho que resolver um problema
aqui e já vou para aí o mais rápido possível.
Ela me deu o endereço, e, para minha surpresa, era em Manhattan. O
que Jack estava fazendo ali? Pelo que eu sabia, ele não tinha parentes no
distrito. Teria ido atrás de mim após me deixar em casa? Ficara sabendo de
alguma forma que meu apartamento foi invadido? Se fosse assim, como ele
tinha me achado?
Saí do carro para enfrentar o cara furioso por eu ter batido em seu
veículo caro e novo. O homem era forte e moreno, barbudo. Eu não sabia de
onde, mas achava que o conhecia de algum lugar.
— Que porra, mulher! Olha o que você fez com meu carro, que acabei
de comprar! — ele praticamente gritou.
Foi então que me lembrei dele do grupo de apoio que eu frequentava,
para mulheres que tinham sido maltratadas por seus namorados e maridos.
Ele era ex-marido de uma mulher que ia toda semana aos encontros, Eliana.
Ver aquele canalha ali me deu ainda mais raiva do que quando o vi batendo
no rosto dela um dia, em frente ao grupo de apoio. Eu só não fui até eles
naquela hora porque ela me pediu com os olhos, de longe, para eu não me
meter. Depois me contou que ele era perigoso e que sempre batia nela antes
que eles se separassem. Eu queria entender o que mulheres que apanhavam
de seus companheiros tinham na cabeça para aceitar algo assim.
Eu sabia que tinha de ir ao hospital para descobrir o que acontecera
com Jack, e aquele canalha estava me impedindo de chegar até lá, um fardo
que não deveria estar livre, e sim na cadeia.
— Desculpe, eu vou pagar o conserto... — Tentei controlar minha
raiva; mesmo ele sendo um bastardo, eu estava errada por não olhar o
caminho.
— Com o quê? Dando em uma esquina qualquer? Acha que não me
lembro de você, sua loura safada, que está doida para um homem a pegar e
fazer o que quiser com você? Você convenceu a minha mulher a me largar!
Agora vai pagar por isso! — Tirou uma arma das costas e a apontou para
mim.
Meu sangue gelou, porque acreditava que morreria baleada por aquele
cara barbudo e feio. Armas já tinham sido apontadas para mim antes, quando
Samuel me fez entrar em seu carro e desgraçou minha vida... Até então eu
tinha cicatrizes daquele tempo, não só na minha alma, mas no meu corpo
também.
— Eu estou de olho em você há dias. Estava só esperando o momento
certo para pegá-la sozinha. — Seu cheiro de cachaça estava vindo até mim.
— Eu vi você saindo do seu prédio e entrando nesse carro. — Apontou para
o SUV de Bryan. — E depois entrou em uma casa de um cara grã-fino, com
certeza cheio da grana, para lhe dar uma vida boa, sua cadela.
Eu não precisava mencionar que Bryan não era rico, mas isso me fez
perguntar como ele tinha aquele casarão superprotegido, porque aquilo
custaria uma nota preta. Com qual dinheiro ele a deixara segura daquele
jeito? Eu teria tempo de perguntar isso a ele algum dia? Talvez morresse ali,
naquela hora, sem ver mais ninguém que eu amava. Eu não podia aceitar
isso!
— Você armou para eu bater em seu carro, seu bêbado fodido! Por isso
que a sua mulher te largou, porque você é um canalha, alguém que, mesmo
tendo dinheiro, não é ninguém, e sim um fracassado filho da puta que anda
batendo em mulheres indefesas! Por que não enfrenta um homem do seu
tamanho em vez de uma mulher que não tem como se defender?
Alex sempre dizia que, quando eu ficava com raiva, falava demais. A
fúria do homem chegou ao auge; ele logo estouraria, e eu seria seu alvo.
— Você vai vir comigo, sua vadia! Eu vou lhe ensinar uma lição! —
rosnou ainda com a arma apontada para mim.
Antes que eu pudesse correr para trás do carro ou tentar fugir para outra
direção, duas caminhonetes pretas estacionaram cantando pneus perto de
nós. Aproveitei a distração daquele fodido e corri para trás do Range Rover,
escondendo-me dele e do pessoal dos carros também, fossem quem fossem.
— Oh, meu Deus! — Ouvi tiros, entrando em piloto automático e
saindo de trás do veículo. Entrei correndo no parque vazio à margem da
avenida, fugindo do fogo cruzado. Dois dias seguidos sendo caçada por dois
homens diferentes, e nenhum deles valia nada.
Braços envolveram minha cintura por trás enquanto eu estava correndo.
Gritei e xinguei quem quer que fosse. Meus cabelos soltos voavam no meu
rosto devido ao vento no parque.
Capítulo 5
ALEXIA
— Me solta, seu desgraçado! Se ousar me tocar, eu vou cortar seu pau
mole e fazer você comê-lo, seu filho da puta... — interrompi o que estava
falando ao ouvir uma risada rouca e gostosa que reconheci.
— Meu pau não é mole, e você o sente duro agora em sua bunda, não é?
E você gritou muito toda vez que ficamos juntos, querendo e pedindo mais
dele... — sussurrou em meu ouvido com um tom rouco e ardente como
labaredas.
— Bryan? — Virei-me de lado e olhei seu rosto perto do meu. Contudo,
em vez de sentir alívio, senti raiva por tudo que ele fez comigo, por levar
outra mulher para sua casa, ainda por cima comigo lá dentro. Afastei-me de
seus braços. — O que faz aqui? Veio pelo seu carro? Não se preocupe, eu
vou pagar o conserto...
Seus olhos se tornaram escuros de repente, e a expressão alegre se foi,
dando espaço para algo sombrio, mas, nas profundezas daquela beleza azul,
consegui ver as chamas.
— Acha que eu estava preocupado com um carro ao invés de com
você? — sibilou.
— Você ia se ocupar logo, então não me faça acreditar que pensava em
mim. Acha que só porque preciso de sua proteção por causa daquele homem
atrás de mim vou aceitar ser usada por você? — sibilei de volta, cutucando
seu peito com o dedo. — Fique sabendo, seu bastardo filho da puta, que não
vou ser sua amante. Eu não nasci para ser a segunda; ou sou a única, ou
esqueça que existo.
Virei-me para ir embora, pegar um táxi e ir para algum lugar bem longe
dele e da mulher, que eu podia ver com Calebe e Joshua. Isso me fez ficar
mais furiosa do que qualquer coisa. Por que ele a trouxe aqui?!
— Acha que estou fodendo por aí? Eu só coloquei meu pau em uma
boceta em um maldito mês inteiro, depois do Belas Country, e foi na sua,
então não estou traindo você com ninguém — falou agora mais calmo. — Eu
vou te explicar tudo, mas depois. Agora vamos embora; você está muito
exposta aqui.
Eu o avaliava para descobrir se estava dizendo a verdade ou não, mas
não vi mentiras nos seus lindíssimos olhos.
— Não ficou com ninguém depois do Belas Country? — murmurei, não
querendo que ninguém me ouvisse, embora seus amigos estivessem um pouco
longe de nós. O parque estava deserto naquela manhã, talvez porque o céu
prometesse chuva.
Respirei fundo, com esperança de que ele não tivesse mesmo ficado
com ninguém.
— Sim, porque você, com apenas um beijo, me domou, tanto que não
quero mais nenhuma mulher, só você, minha Luz do Sol. — Aproximou-se
de mim e me puxou para seus braços.
Afastei meu rosto do dele e franzi o cenho.
— Isso é mentira. Naquele dia, no seu apartamento, eu vi vocês dois...
— Apontei para a mulher e depois para ele. — Você não se explicou, me
deixando pensar que estavam juntos após me rejeitar naquela noite.
— Eu fui um idiota. Queria protegê-la de mim, então deixei que
pensasse que tinha acontecido algo entre mim e Brenda, mas nada aconteceu.
Depois do restaurante, fui trabalhar, e ela estava comigo, então dormiu na
minha casa... mas no quarto de hóspedes, não comigo. Acha que eu
mancharia seu gosto doce com o sabor de outras mulheres? — Ele me pegou
pela cintura e me beijou.
— Confiarei em você até que me desaponte — respondi em sua boca,
meio ofegante e impressionada por ele não ter ficado com ninguém.
— Obrigado, linda! Agora vamos embora. Amanhã te levarei para
depor contra esse verme, que estava armado e querendo atirar em você... —
Seu tom estava mortalmente frio.
Pude perceber que ele queria matar o cara, não o levar preso, porque a
sombra que eu via algumas vezes em seus olhos estava lá.
Dei um suspiro triste.
— Obrigada, mas eu preciso ir para o hospital ver o Jack. Não sei o
que houve, mas Claire estava chorando quando me ligou.
— Sobre isso, eu também preciso lhe contar uma coisa sobre seu
amigo... — Ele soltou a palavra “amigo” com um grunhido. Parecia não
apreciar o Jack.
Não gostei do tom da sua voz, era como se ele soubesse o que
realmente tinha acontecido com ele. Isso era possível? Não duvidava de
mais nada.
— O que houve? Você sabe algo sobre isso? Porque achei estranho ele
estar em Manhattan, quando não tem amigos aqui. Será que ele veio atrás de
mim antes de ontem? — Tentei me afastar, mas Bryan não deixou. — Você o
viu naquela noite? Bryan, preciso saber a verdade.
Um grunhido saiu de seu peito. Tentei me afastar de novo, mas ele
novamente não deixou, apenas me apertou mais em seus braços fortes, como
se estivesse me reconfortando.
— Sim, eu sei o que aconteceu com ele, porque têm câmeras por toda a
casa, como deve saber. Foi como eu o vi na frente do portão da minha casa
antes de chegar, mas, quando cheguei...
Interrompi-o:
— Como você o viu antes de chegar em casa?
— Pelo meu celular; assim posso manter o olho em você mesmo não
estando perto. Mas, quando cheguei, ele estava ferido em frente ao portão,
então chamei a emergência para socorrê-lo.
Arregalei os olhos, descrente, e me afastei de Bryan; dessa vez ele
permitiu.
— Você sabia que ele foi ferido desde quando cheguei à sua casa e não
me disse nada? Não me chamou? — Meu tom soou alto devido à descrença
por ele ter me escondido algo tão sério. Era para eu estar no hospital com
Jack desde o início.
— Ei, sei que devia ter dito a você, mas não consegui, não sabendo de
tudo pelo que passou, e o pior, sabendo que algum filho da puta, além de
entrar em seu apartamento, nos seguiu até minha casa. Como Steve Lutner
não conseguiu entrar devido à segurança reforçada que tenho, viu o garoto
espiando minha casa e atirou nele. Por quê? Não faço ideia. Talvez porque
seja um fodido doente que precisa estar no inferno.
Um som agudo saiu de dentro de mim. Percebi que era um grito.
— Você não devia ter me escondido algo importante assim, não importa
o que tenha acontecido comigo... — interrompi-me, chocada com algo que
ele disse. — Esse Steve Lutner é aquele cara que Angelina disse que a
perseguiu e matou sua irmã ou é um nome parecido?
Angelina era namorada de Ryan Donovan. Meu irmão era namorado da
irmã dele. Lembrei-me de que tinha ido à casa de Ryan alguns dias antes
porque Angelina me chamou. Ela fez uma reunião com todos os seus amigos
por causa de uma batalha pela qual estava passando. Seu irmão, Shane,
precisou fazer uma cirurgia cardíaca, colocou um marca-passo. Nessa noite,
ela contou o que aconteceu com sua irmã, Ângela. Lembrei-me de que ela
falou sobre Steve Lutner e que esse cara quase a estuprou e acabou matando
sua irmã.
— Sim, o mesmo cara...
— Mas por que ele está atrás de mim? Foi esse cara que entrou em meu
apartamento, não Samuel? — Não pude deixar de ficar aliviada por não ser
ele.
Bryan veio até mim e pegou minha mão. Começamos a caminhar até
onde seus amigos estavam levando preso o sujeito que tentou atirar em mim
porque sua mulher o deixou. Gostei muito de ela ter feito isso com aquele
maldito. Nenhuma mulher merecia ser espancada, por isso eu fazia aulas de
luta na academia de Jason Falcon, um lutador brilhante amigo da namorada
do meu irmão.
— Essa é uma das coisas que preciso contar depois que formos
embora, mas, como sei que não vai deixar seu amigo nesse momento, vamos
para o hospital. Depois conversaremos, tudo bem?
Eu não queria deixar para depois, precisava desvendar aquele mistério:
por que um homem que eu nem conhecia queria me matar? No entanto, Jack
estava no hospital por minha culpa. Como eu podia olhar nos olhos de Claire
e pensar que era por minha causa que seu irmão estava ferido?

Quando entrei na sala de espera, Luana, Mike e Julian estavam


sentados, todos cabisbaixos por nosso amigo estar ferido. Claire não estava
à vista, nem seu pai, o senhor Milles. Certamente estavam com Jack no
quarto, pois não iriam querer deixá-lo sozinho.
Bryan me disse que falou com o médico e tudo ocorreu bem na cirurgia
que ele tinha feito na madrugada do dia anterior. Eu não sabia como ele
conseguiu informações sem ser da família; talvez tenha usado sua
prerrogativa de policial. Não me importei mais com isso, queria apenas que
meu amigo ficasse bem. Precisava vê-lo para saber seus motivos para ir me
ver na casa de Bryan.
Só então percebi que estava tremendo. Minhas mãos tremiam tanto
devido ao meu nervosismo quanto ao medo de perdê-lo. Nós éramos
praticamente irmãos.
Meus três amigos me olharam assim que entrei na sala.
— Como Jack está? Onde está Claire? — sondei. — Desculpem, só
soube agora. Eu teria vindo antes se soubesse do que tinha acontecido com
ele. — Lancei um olhar feio a Bryan, que ignorou.
— Ele passou por uma cirurgia, mas agora está bem. Já está no quarto.
O senhor Milles e Claire estão com ele — Luana me disse. — Claire esteve
aqui agorinha e disse que ele queria te ver assim que acordou. Ele parecia
preocupado com você. Aconteceu alguma coisa entre vocês? — Chegou
perto de mim e sussurrou: — Achei que vocês dois tivessem saído juntos
naquela noite, que finalmente iam ficar juntos.
Um rugido de fúria saiu do peito de Bryan. Pelo jeito, ele ouviu suas
palavras. Estava próximo demais de mim para não ouvir.
— Isso não aconteceu nem vai acontecer — rosnou sombrio para ela.
Luana e Claire sabiam da minha paixão por Bryan desde a faculdade.
Sabiam até que eu tinha uma foto dele que roubei de Sam quando ele a
visitou um dia. Ela me olhou com muitas perguntas mudas; sabia que não era
o momento. Com certeza me encheria de indagações depois.
— Eu vou tentar entrar lá e ver como ele está — falei.
Capítulo 6

ALEXIA
Entrei no quarto seguida por Bryan, que não me deixava sozinha um
segundo; não liguei, contudo. Apenas queria ver meu amigo. Jack estava
acamado, coberto por lençóis, ladeado pelo senhor Milles e Claire. Os três
me olharam.
— Oi — sussurrei com a voz rouca devido ao choro. Meus olhos ainda
estavam molhados e vermelhos.
Jack me olhou de modo preocupado, checando para ver se eu tinha
algum ferimento. Seu olhar nada tinha de romântico ou sexual ao me fitar dos
pés à cabeça. Isso era bom.
— Você está bem? — Sua voz saiu rouca, e ele se encolheu devido à
dor.
— Era eu que devia perguntar isso, não você — falei, em seguida me
voltei para Claire e seu pai. — Desculpem, eu só soube agora, quando ligou
para mim, Claire.
O senhor Milles me abraçou por uns segundos. Ele sempre fazia isso
desde que eu era pequena. Considerava-o um segundo pai para mim.
Adorava aquela família.
— Está tudo bem, querida, agora nosso garoto está bem — disse e
franziu a testa para Bryan. — O que está fazendo?
Bryan estava em cima de uma cadeira, colocando algo no teto no canto
do quarto. Não olhou para nós enquanto respondia:
— O cara que atirou em seu filho sabe que o garoto sobreviveu e virá
terminar o serviço, que ficou inacabado. Como não podemos trocá-lo de
hospital ainda, vamos trocá-lo de quarto, e um agente nosso vai fingir ser o
rapaz...
— O nome dele é Jack — rosnei, porque, sempre que ele dizia as
palavras “garoto” e “rapaz”, tinha um toque de desdém.
Bryan estreitou os olhos enquanto me fitava, mas não respondeu, só deu
de ombros.
— Que seja. O que importa é que ele vai ser transferido de quarto, e,
quando o criminoso chegar aqui, o prenderemos. — Seu tom soou mortal no
fim.
— Você é policial? Onde está seu distintivo? — perguntou o senhor
Milles.
Bryan sorriu. Seu sorriso parecia esconder muitos segredos. Eu podia
ver que ali tinha coisa.
— Você vai ver no seu devido tempo — falou e continuou instalando o
que me parecia uma pequena câmera.
Ignorei-os e cheguei mais perto de Jack, tocando seu rosto lindo e
ansioso, embora com alguns hematomas, resultado da briga que teve com
Bryan.
— Eu fiquei com tanto medo depois que soube do que houve com você.
— Eu estava na casa tentando... — Sua voz ofegava devido ao esforço.
— Não fale, ou será que vou ter que tampar sua boca? — sussurrei, não
querendo vê-lo com dor.
Ele sorriu.
— Eu sei de algo que você pode fazer que me impedirá de falar. — Sua
voz ainda estava ofegante.
— Isso não vai acontecer — rosnou Bryan em tom sombrio. — Porque,
se a beijar, vou ter que matá-lo ao invés de protegê-lo.
Jack, que sorria alguns segundos antes, ficou sério e olhou entre mim e
Bryan.
— Você não pode aceitar ficar com ele, não pode aceitar ser a outra
nunca...
Bryan o interrompeu:
— Ela não é a outra nem a primeira, é a única, e pare de falar, ou vai
arrebentar os pontos no seu peito — Bryan disse num grunhido. — Preciso
de você sadio e fora daqui, se possível, do país.
— Não vou deixar Alexia com um canalha como você! — Sua voz soou
alta, e o som do aparelho que monitorava seu coração ecoou ao lado da
cama.
— Que história é essa de sair do país? — o senhor Milles perguntou
preocupado. Ele se parecia com Jack, mas tinha quase 60 anos. — Você está
namorando esse cara que diz ser policial?
— Eu não disse que sou da polícia, embora seja de certa forma —
replicou Bryan. — E sou namorado de Alexia, querendo vocês ou não.
Pisquei diante do que ele tinha acabado de dizer.
— Ela parece não saber disso — disse Claire, olhando entre nós dois.
E eu não sabia mesmo. Não sabia o que tínhamos, mas tinha certeza de
que sentíamos algo um pelo outro. Bem, eu o amava. Quanto a ele, eu não
tinha ideia. Talvez sentisse algo por mim. Esperava que também fosse amor.
— Ela sabe. — Ele sorriu para ela.
Notei que Claire prendeu a respiração ao admirar seu sorriso sexy e
lindo. Quem não reagiria assim a ele? Aquele homem tirava o fôlego de
qualquer mulher.

Depois da transferência de Jack para um novo quarto, Calebe ficou


vigiando o cômodo do lado de fora. Enquanto isso, Bryan tentaria pegar
aquele Steve, que eu não conhecia e que queria me matar e quase acabou
com a vida de Jack.
Fiquei com meu amigo até ele dormir com a ajuda dos remédios. Não
queria fazê-lo sofrer, mas percebi que isso era impossível; não podia
corresponder ao seu amor.
— Então, hein, danada? Finalmente você conseguiu fisgá-lo — falou
Claire. — Eu pensei que ia acabar ficando com meu irmão, já que ele a ama,
e você amava Bryan, mas ele nunca se interessou. Então o que mudou?
Eu, ela e Luana estávamos sentadas em um sofá que havia no quarto.
— Eu não sei direito o que aconteceu. Lembra que fui ao restaurante do
avô de Luana, onde era para eu namorar Ryan Donovan... — Luana Luxem
era prima de Daniel Luxem, dono da editora Luxem, uma das editoras mais
famosas e influentes nos Estados Unidos.
— Pena que não namorou aquele bofe sarado — disse Luana sorrindo.
Sorri também.
— Eu não ia namorá-lo, já que somente Bryan me importa desse jeito.
— Corei. — Angelina tem uma puta sorte, embora Bryan seja tudo para mim.
— Então vocês transaram!? — gritou Luana batendo palmas.
— Psiu! — Olhei preocupada para Jack, checando se ainda dormia.
Aqueles remédios derrubavam até cavalos. — Fale baixo para não o
acordar.
— Nos conte como foi. Ele realmente é bom de cama? Ouvi dizer que
ele gosta de sexo quente, de deixar as mulheres amarradas e algemadas e até
de bater nelas com o cinto — falou Claire. — Isso é verdade?
Fiquei meio ofegante ao ouvir isso. Já tinha ouvido que Bryan gostava
de sexo assim, ele até queria fazer com Angelina, lembrava-me de ele ter
dito isso no restaurante naquele dia. Ela apenas estava falando das cenas do
livro que lançaria em breve, mas ele pensou que ela queria fazer sexo duro,
então sugeriu ajudar nas cenas do livro. Aquilo era algo em que eu não
queria pensar. Meu coração doeu, porque achava que não podia dar algo
assim a ele. Sexo com Bryan, tudo bem, afinal era maravilhoso. Entretanto,
se ele quisesse mais que isso, eu seria capaz de lidar? Seria capaz de ficar
presa e algemada de novo sem surtar? Bryan me deixaria caso eu não
quisesse sexo com bondage?
— Alexia?
Pisquei, com Claire chamando-me de volta ao presente.
— Não fizemos isso, só sexo, e foi maravilhoso — respondi tentando
regular a voz para elas não perceberem meu incômodo. — O homem é tudo
de bom.
— Sim, ele tem um sorriso de molhar calcinha, não é? — Claire piscou.
— Sei que molhou a sua. E, pelo olhar que o vi lançando no quarto para
você, ele parece adorá-la.
— Não sei bem o que estamos fazendo, porque Bryan é difícil de se ler,
mas acho que ele sente algo por mim. Não falamos disso, embora eu tenha
certeza de que ele sabe que eu o amo. — Esperava que Bryan sentisse o
mesmo.
— Adoro ver esse brilho em seus olhos, minha amiga, é raro ver isso
— falou Claire, alisando meus cabelos.
— Eu estou completamente apaixonada por aquele homem. Sabe
quando você só quer uma pessoa e mais ninguém, quando cada rosto bonito
que você olha não significa nada, só o dessa pessoa? Tudo nele é perfeito, e
isso vocês viram com seus próprios olhos.
Luana sorriu animada.
— Eu estava torcendo para que você namorasse alguém, mas aquele
pedaço de carne é tudo, menina. — Ela me deu um tapinha nas costas.
— Vocês viram aquele sorriso? — inquiriu Claire. — Se eu não amasse
Mike, minha calcinha estaria toda molhada.
Ri, sacudindo a cabeça.
— Ele tem esse efeito nas mulheres... — interrompi-me ao som de tiros
em algum lugar lá fora.
Logo a porta do quarto se abriu, e Mike, Julian, o senhor Milles e
Calebe entraram no quarto, que pareceu pequeno com tantos homens grandes.
Quando Bryan disse que estava montando um plano para prender aquele
Steve, eu não achei que tiros estariam envolvidos ou que tudo sairia do
controle.
As meninas correram para seus namorados.
Fui até Calebe, que estava perto da porta.
— Onde está Bryan? — Meu coração estava acelerado, temendo o pior.
Só havia me sentido assim uma vez, quando meu irmão me disse que
mamãe e papai morreram num acidente de avião. Eu estava para ter alta da
clínica psiquiátrica e fiquei uma semana em um quarto, sem ver ninguém
devido à dor. Apenas meus amigos e meu irmão me impediram de voltar à
clínica.
— Bryan com certeza está bem — assegurou Calebe com voz firme.
Eu não acreditava nele nem um pouco, então tentei passar pela porta
para checar se Bryan estava bem, mas não fui muito longe, porque Calebe me
pegou pela cintura.
— Me solta, eu preciso ver se ele está bem! — gritei, batendo em seus
braços e chutando seus pés. Os tiros continuavam, então fiz algo impensado:
peguei suas bolas e as apertei – talvez forte demais.
Calebe rugiu e me soltou.
— Maldição, mulher! — gritou com raiva.
Não liguei, só saí correndo pelo corredor, pegando uma vassoura
abandonada ali, provavelmente por algum funcionário da limpeza que fugiu
ao escutar os tiros. Ouvi Calebe amaldiçoar atrás de mim. No entanto,
continuei correndo, pois queria saber de Bryan. Para minha surpresa, o
corredor daquela ala do hospital estava vazio. Estava prestes a seguir na
direção em que ouvira os tiros havia alguns minutos. Depois daqueles sons
pavorosos, o silêncio era cortante.
— Eu sei que está neste hospital, minha doce Alexia, então me escute,
sua cadela, porque sou seu dono e, quando eu a tiver à minha mercê, vou
adorar ouvir seus gritos. São música para os meus ouvidos — disse a voz
dos meus pesadelos nos últimos anos, mas daquela vez era real, uma voz que
eu gostaria de nunca mais ouvir pelo resto da minha vida. Só então percebi
que a voz dele saía pelos alto-falantes que havia pelos corredores. Eu não
sabia se já estavam lá ou se Samuel os tinha colocado.
Eu não estava pensando em dizer nada, muito menos para um louco
varrido e monstro assassino, mas não queria deixar o medo me dominar.
Então me permiti ser governada pela raiva; era melhor lidar com ela a entrar
em choque e surtar.
— Acha que gritava de prazer, seu doente?! — berrei no corredor
vazio, sem saber se ele ouviria ou não. Ele ficava irado sempre que era
contrariado.
Vamos ver isso! Aquela adolescente que não dizia nada morreu
naquela semana, eu me tornei outra pessoa agora, uma que não liga para
você, seu fodido!
— Eu não tenho dono! Quer saber, seu filho da puta? Vou adorar enfiar
um pau nessa sua bunda feia e estripá-la toda, seu fodido de merda! — Eu
sabia que, quanto mais falasse, se ele estivesse ouvindo, mais ficaria
furioso, tanto que acreditava que me mataria se tivesse a chance. E aquele
bastardo podia estar em qualquer lugar ali.
Cinco anos antes, eu não podia lidar com ele porque não sabia lutar,
mas finalmente aprendi. Entrei em uma academia e aprendi a me defender de
caras que quisessem me fazer mal, porque não havia nada pior do que ser
indefesa. Eu havia jurado a mim mesma nunca mais estar naquela posição.
— Já ouviu aquele ditado, “não cutucar a onça com vara curta?” —
indagou uma voz atrás de mim. Virei-me e rodopiei o cabo da vassoura,
acertando um cara louro de jaqueta escura, mas não reparei muito em sua
aparência ou roupa, apenas me defendi. Não era Samuel, mas talvez fosse o
tal Steve.
— Eu vou acabar com você, seu imbecil de merda! — Continuei
atingindo-o com o cabo da vassoura, mas alguém me pegou por trás. Ignorei
os grunhidos e gemidos de dor do cara louro, pisei no pé daquele que me
agarrava e lancei minha cabeça para trás, acertando seu rosto. Ouvi
xingamentos vindos dos dois.
— Maldição! Não vamos te machucar, garota! — rosnou o louro.
— Eu já ouvi isso antes desse louco fodido que está dizendo que vai me
levar e acabar comigo! — grunhi, soltando-me e correndo deles, já que não
podia lidar com uma dupla de caras musculosos. Todavia, não fui longe,
porque mais dois caras me cercaram.
O cara louro era bonito, bem, bonito era pouco, tinha 1,98 m, cabelos
longos presos em um rabo de cavalo, corpo musculoso forrado de tatuagens,
pelo menos na pele exposta, como nos braços, e olhos azuis-cobalto.
O homem cujo nariz machuquei tinha 1,90 m, olhos cor de ouro, cabelos
curtos, era forte e gostava de brincos e alargadores nas orelhas.
Os outros dois caras que me fecharam, impedindo-me de fugir, um era
alto e forte, olhos verde-esmeralda com cílios grossos e cabelos castanho-
escuros na altura dos olhos, com tatuagem de cobra no braço direito, como
se estivesse subindo pelo braço, e, no esquerdo, o nome “Evelyn” no
antebraço. O outro era moreno, com cabelos negros longos, na altura dos
ombros, barba por fazer, olhos pretos mortais. Ele me lembrava um serial
killer.
Fechei a cara para os quatro caras musculosos do MC Fênix. Pelo
menos era isso que diziam seus coletes de couro.
— Eu não vou com vocês, não mesmo, e, se ousarem me tocar, juro que
arranco seus paus e os faço comer! — Não sabia de onde conseguia coragem
para desafiar aqueles homens musculosos e sarados, mas os enfrentei,
mesmo sendo uma tentativa estúpida da minha parte.
Todos riram, achando minhas palavras divertidas. Eu estava prestes a
voar em cada um deles, quando o louro bonito falou:
— Querida, se você ficasse comigo, não seria à força, e sim com você
gritando e ansiando por mim, e amaria meu pau, jamais iria querer cortá-lo.
— Ele piscou para mim.
— Nasx, se falar de pau com minha namorada de novo, sou eu que vou
cortar seu brinquedo e fazê-lo comer — disse Bryan com um rosnado,
aparecendo de repente.
Olhei para Bryan, que estava atrás do cara de olhos verdes. Chequei
para ver se ele estava ferido; para o meu alívio, não estava. Corri para ele e
me joguei em seus braços, ignorando todos os homens ali, porque tinham
mais deles além dos caras do MC, como também um vestido com terno
preto, de cabelos escuros, olhos negros e sorriso sexy.
— Você está bem? — sondei, beijando seus lábios, que eu tanto amava.
Ele aprofundou mais o beijo, tanto que achei que logo estaríamos
tirando as roupas. Até me esqueci do lugar em que eu estava, dos homens à
minha volta, até do assassino que um dia destruíra a minha vida, algo que eu
não deixaria acontecer de novo.
Bryan riu nos meus lábios, mas era uma risada tensa.
— Eu que devia perguntar isso a você. Não era para estar aqui, mas no
quarto com seus amigos.
Afastei meu rosto dele e o fitei.
— Eu ouvi tiros, então saí correndo para saber se você estava bem...
— Como escapou do Calebe? — Ele arqueou as sobrancelhas.
Sorri, meio tímida.
— Ele tentou me segurar, mas... bom, acho que ele vai ficar com raiva
de mim por um tempo, isso se não quiser me matar. — Olhei para os homens
tatuados.
— Bateu nele como fez com a gente? — gemeu Nasx, com a mão na
barriga. — Minha barriga dói pela pancada que você me deu com o cabo da
vassoura.
— E meu nariz logo estará inchado — falou o cara com sorriso sexy e
olhos claros como ouro.
— Vocês não sofreram tanto, ao contrário de mim, que não sei se terei
filhos algum dia — reclamou Calebe, entrando no corredor ainda mancando
pelo que eu lhe fiz.
— Você chutou as bolas dele? — Nasx caiu na gargalhada e gemeu,
pondo novamente a mão na barriga.
— Eu acho que foi mais espremer com a mão — sussurrei. Notei que
todos os homens estremeceram com a ideia de ter suas bolas esmagadas. —
Sinto muito por ter feito o que fiz a vocês, mas precisava saber se Bryan
estava bem após ouvir os tiros. — Virei-me para ele, que estava de olhos
arregalados, impressionado com o que fiz àqueles homens, embora eu não
soubesse se tinha sido corajosa ou tola.
— Onde aprendeu a se defender assim? — questionou Nasx. — Porque
é a porra de uma lutadora. Não sei como luta com saltos dessa altura.
— Frequento a academia Falcon — informei. — Bryan, você ouviu a
voz no alto-falante? Eu não entendo. Não era para ser Steve Lutner que ia
aparecer? Então por que ouvi a voz de Samuel?
Bryan suspirou, e sua expressão se tornou sombria.
— Ele fugiu antes que pudéssemos chegar até ele. Alguém o estava
ajudando, por isso a troca de tiros. Agora vamos para casa, a polícia
continuará cuidando do caso. — Ele pegou minha mão para me tirar dali.
— Não posso deixar Jack aqui sozinho. E se esse... resolver aparecer?
— Têm guardas o protegendo, não se preocupe com isso — avisou o
cara de terno. — E você aqui não seria de serventia nenhuma, só correria
mais perigo e nos traria problemas...
Ri, amarga.
— Não vi resultado algum em sua presença aqui, já que deixou Samuel
escapar. E quem diabos é você afinal?
Seus olhos se tornaram escuros.
— Você é uma...
— Dennis... — alertou Bryan, mortal — é melhor controlar o que diz.
Dennis suspirou.
— Vamos acabar com isso logo. Depois falo com você. Temos
negócios a fazer — disse e saiu.
— Quem é esse idiota?
Todos riram.
— Meu chefe — respondeu Bryan e sussurrou em meu ouvido: —
Agora vamos embora, querida, porque temos que conversar.
Capítulo 7

ALEXIA
Assim que chegamos à casa de Bryan, fomos para o quarto. Seus
amigos não vieram conosco. Depois de conversar um pouco com os MCs, eu
já gostava deles. Todos eram legais e tinham protegido, junto a Bryan, tanto
a mim quanto Jack e meus outros amigos. O pai de Jack iria transferi-lo para
outro hospital, onde ele ficaria até receber alta, depois seria levado por
guardas para ser protegido, já que era uma testemunha fundamental para
pegarmos Samuel e Steve Lutner. Isso estava me deixando confusa.
Bryan me olhava o tempo todo, parecia esperar que eu fosse entrar em
choque com tudo que aconteceu.
— O que foi? — perguntei, sentando-me na sua cama, levantando as
pernas e tirando minhas sandálias de salto. Notei que seus olhos
escureceram ao olhar minhas coxas expostas.
— Você não está surtando com o que viu e ouviu hoje no hospital?
— Por que eu deveria? Às vezes é melhor deixar a raiva se apossar de
mim em vez da dor que tenho ao reviver as lembranças obscuras do meu
passado — expliquei, tirando meu vestido e me deitando sem nunca tirar os
olhos dele.
Bryan pairou em cima de mim, beijando meu pescoço, traçando os
lábios sobre ele com desejo, então me esqueci de tudo, apenas desfrutei dos
seus beijos e carícias. Suas mãos eram labaredas no meu corpo, fazendo-me
gemer de prazer. Tirei sua jaqueta e camisa e logo desabotoei suas calças,
louca para senti-lo dentro de mim e nos fundirmos em um só.
— Alexia... — ele disse meu nome como um louvor. Entretanto, ao
invés de entrar em mim, sua boca desceu para os meus seios, lambendo-os e
os degustando com fome, enquanto uma de suas mãos ia até entre minhas
pernas e esfregava meu clitóris. — Molhada pra cacete!
— Sim, e querendo você dentro de mim... — Gemi ao sentir sua boca
descer pela minha barriga. Abri minhas pernas em um convite silencioso.
Porém, antes que seus lábios chegassem ao meu centro, que já estava
pulsando de desejo por ele, senti-o tenso. Bryan se afastou, e logo entendi o
que ele estava vendo ali, algo que ninguém nunca tinha visto antes. Ninguém
sabia o que havia acontecido comigo além de meu irmão, meus pais e a
equipe médica.
— Alexia, isso é... — Seu tom estava assombrado.
Expirei para controlar a dor e as lembranças daquele dia. Precisava ser
forte para não me deixar sucumbir como no passado.
— Sim, eu tive uma filha. — Meu coração doeu ao recordar o bebê que
eu tinha perdido. Provavelmente foi por isso que eu pirei ao acordar e não a
ver comigo, quando descobri o que havia acontecido com ela. — Então,
Bryan, não fique preocupado que eu queira prender você com uma
gravidez...
— Alexia... eu fui um idiota ao dizer aquilo. O que existe em mim... é
algo escuro. Não queria manchar sua luz... Então busco sempre uma forma
para fazer você se afastar de mim, e ao mesmo tempo não quero. É
impossível conciliar os dois desejos.
— Bryan, todos temos escuridão dentro da gente... — comecei, mas ele
me cortou:
— Luz do Sol, a sua escuridão não tem comparação com a minha. Se eu
contasse... você não ficaria comigo, iria fugir para longe.
— Nada vai me afastar de você a não ser uma traição; o resto, aturo
tudo — falei com intensidade, querendo deixar bem claro que ele podia
confiar em mim. Se para isso fosse preciso que eu lhe contasse a minha
história, que assim fosse.
Ele riu com amargura, sentou-se na cama e me admirou com seus olhos
brilhantes e meio tristes.
— Eu nunca trairia você, Lex, nunca! — Tocou meu rosto assim que me
sentei ao seu lado.
— Confio em você — sussurrei. Levantei-me e fui até a janela, olhando
a vista lá fora. Peguei uma camisa dele e a vesti, já que não faríamos mais
nada, não naquele instante, com as lembranças me consumindo por dentro a
ponto de me deixar sem ar.
— Alexia, o que houve? Cadê ela? — ele murmurou. — O que
aconteceu? Sabe que pode confiar em mim sempre, estou aqui e não vou
deixar nada acontecer com você, prometo.
— Eu poderia dizer o mesmo a você. — Virei-me e apontei para suas
cicatrizes profundas. Algumas pareciam costuradas de forma grosseira,
como se ele não tivesse recebido pontos de modo profissional.
Seus olhos viraram sombras de novo. Eu sabia que ele não diria nada,
não naquele momento.
— Quanto à minha história, ou pesadelo, como preferir... Conheci
Samuel quando ainda estava na escola.
— O nome dele é Steve Lutner, não Samuel. Ele usa vários nomes
diferentes para fazer o que faz, para conquistar mulheres indefesas e as
capturar, depois abusar e matar. Até agora foram 18, 19 com você, a única
que sobreviveu a ele. Por isso esse fodido sádico está atrás de você.
— Você está dizendo que Samuel Lewis é na verdade Steve Lutner, o
mesmo que matou a irmã de Angelina? — Minha voz saiu rouca.
— Sim, ele é um serial killer procurado pelo FBI, e não só aqui, é um
dos mais procurados no mundo.
Ele me pediu para continuar a contar minha história, mas precisei de
uns minutos para pôr a cabeça no lugar, pois estava confusa. Também não
conseguia entender como um ser abominável como aquele existia, alguém
que deveria estar morto e no inferno.
— Samuel, ou Steve, era atencioso comigo como ninguém jamais tinha
sido. Eu era jovem e ingênua, acreditava no que ele dizia e declarava a mim.
Era uma adolescente que não me arrumava, não me enturmava muito com as
pessoas, e, quando um cara carinhoso se aproximou e disse que eu era
linda... acreditei. — Olhei para a janela sem nada ver. — Eu sei que fui tola
em acreditar nisso...
Senti seus braços à minha volta, abraçando-me por trás. Sua atitude era
reconfortante.
— Você não foi idiota, caras como esse sabem como chegar em uma
garota, conquistá-la e conseguir o que querem — falou num tom calmo, mas
senti, por trás de sua calma, que ele estava borbulhando de raiva.
— Eu o namorei por dois meses, e tudo estava indo bem, mas não
estava pronta para me entregar a ele. Eu tinha sonhos de me casar antes,
sabe? Lia nos livros histórias bonitas relacionadas a casamento e sonhava
em me casar na neve, porque amo a neve. Adoro vê-la caindo... — Fechei os
olhos por um momento, desfrutando de um sonho que nunca aconteceria.
Bryan estava tenso ao meu lado, mas não me interrompeu.
— Ele não aceitou isso muito bem... — Estremeci quando as
lembranças sombrias cobriram as boas.
— O que ele fez? — Tinha um tom mortal em sua pergunta, como se ele
quisesse matar o meu algoz. E eu não duvidava disso, mas não o deixaria
sujar mais sua alma matando alguém, mesmo que fosse um ser monstruoso
como Steve. Já bastava o que Bryan teve de fazer ou aturar, algo que trouxe
aquela escuridão que havia dentro dele, como ele mesmo tinha dito. Eu não
podia deixá-lo ter mais daquilo.
— Um dia eu fui a uma loja perto de casa, e ele apareceu e me mandou
entrar no seu carro. Eu sabia que ele estava nervoso, tenso, não parecia o
mesmo cara que eu namorava e gostava. Não entrei, mas então ele apontou
uma arma para mim e me forçou a ir com ele... Lembro-me de ficar com tanto
medo... — Minha voz era só um sussurro.
— Se você não quiser falar agora, tudo bem — disse ele baixinho e
alisando meus cabelos, talvez tentando me acalmar.
— Eu preciso desabafar com alguém... Isso parece estar marcado em
minha pele. Pois bem, ele me levou a um calabouço em um lugar bem
afastado, como uma fazenda, eu acho. Não reparei na hora, pois estava com
muito medo. Sabia que algo terrível estava para acontecer. — Respirei
fundo, ainda de olhos fechados. — Fiquei lá por cinco dias, mas me pareceu
um ano ou uma eternidade. Quando ele me colocou na cama e algemou
minhas mãos e pés...
— Alexia...! — A dor e a raiva estavam em seu tom e em suas mãos em
punhos fechados.
— Me deixa terminar, por favor... — supliquei com meus olhos
molhados. — Lembro-me da dor que senti ao ter meu corpo não só violado,
mas chicoteado enquanto eu gritava, mas sabia que a ajuda não ia chegar.
Desejei morrer naquelas horas. Ele me xingava e me mandava ser obediente.
Às vezes, para me livrar da dor, eu fazia o que ele queria, então gritava, mas
o fodido achava que eram gritos de prazer. Depois de dois dias seguidos, já
não aguentava mais. Seu toque, seu corpo e tudo nele me causavam repulsa.
Caso não fizesse o que ele queria, seus castigos iam ficando piores. Ele me
prendeu em uma gaiola, nua, sem água ou comida, e, quando eu ficava à
deriva, vagando em minha própria mente, ele me jogava água gelada,
fazendo-me gemer, porque nem forças para gritar eu tinha mais. Também não
tinha mais esperança de ser encontrada. Não viva, pelo menos. Eu pensava:
por que estava ali? Que pecado tão grave eu cometi para suportar e aturar
tudo aquilo? Depois de cinco dias de cativeiro, ele ficou bravo e falava
sozinho. Eu já vi pessoas com problemas mentais, ele tinha esses sintomas.
Desmaiei. Quando acordei, estava em um hospital, com pessoas me tocando.
Depois tudo ficou confuso. Foi quando fui levada para uma clínica
psiquiátrica, na Suíça. Meus pais não queriam especulações sobre mim aqui.
— E sua filha...?
Meu peito se apertou tanto que parecia que estava sendo esmagado e
triturado. Saí do seu abraço sem responder, porque não conseguia falar mais.
Algo enorme estava entalado em minha garganta. Cheguei ao banheiro e
liguei o chuveiro com água gelada. Precisava dela agora, para me lavar,
porque me sentia suja, mas, antes que eu pegasse a esponja a fim de esfregar
meu corpo, Bryan me impediu e me puxou para seus braços.
— Meu Deus, Alexia! — Seu tom era devastado e cheio de impotência.
Foi quando eu chorei. Chorei pela perda da minha bebezinha. Não
importava como ela tinha sido concebida, eu a amava profundamente.
Bryan não me disse nada, apenas desligou a água e me deixou chorar
em seus braços. Sentou-se no chão e me colocou em seu colo.
— Eu a amava — sussurrei, encolhida em seus braços. — Seus chutes,
seu choro quando nasceu... mas então, quando acordei no outro dia, papai
disse que ela tinha morrido... Não vi seu corpinho, porque surtei e me
internaram de novo.
— Você não estava internada quando a teve? — sondou ele com a voz
grossa.
— Sim, estava, mas em outra ala, pois me sentia melhor por causa da
gravidez. Ela me deu motivos para viver. — Limpei as lágrimas. — Eu
ansiava por ver seu rostinho, sentir seu cheiro, mas então ela se foi após ter
ficado minutos comigo. Eu não me importava com a forma como ela foi
concebida e nem com quem era seu pai, apenas a amava. Por ela, eu daria
minha vida se fosse preciso. Eu estava muito mal até dois anos atrás... mas
decidi que precisava reagir, não podia ficar daquele jeito para sempre. Alex
sofria com aquilo, meus pais também. Então lutei e fiquei boa. Não curada,
pois isso jamais... irá acontecer. — Minha voz falhou.
Ele franziu a testa.
— Por que não a deixaram vê-la? — Seu tom estava confuso e parecia
desconfiado. Do quê, eu não sabia.
Suspirei.
— Eu não sei. Pedi ao papai para vê-la uma última vez, mas ele disse
que já a tinham enterrado. Achei estranho, pois tinham se passado só seis
horas. Depois que fiquei boa, quis saber onde ela tinha sido enterrada, mas
ele morreu antes de poder me contar, e Alex estava no Japão na época, então
não soube informar, já que papai não disse nada a ele. — Respirei fundo,
controlando a minha dor.
Ele suspirou.
— Então até hoje você não só não pôde vê-la antes do enterro, como
também não sabe de seu paradeiro?
— Sim, papai não me disse. Por esse motivo, todo ano, no dia do seu
aniversário, vou a Zurique, na Suíça, porque sei que foi lá, em algum lugar,
que meu pai a enterrou, mesmo eu não sabendo o local. Fui para lá no dia do
casamento da Sam, por isso não participei dele. Sempre digo às pessoas que
vou assistir a palestras, mas vou para lá para ficar nem que seja por umas
horas perto dela.
— Deve ter um atestado de óbito em algum lugar na clínica em que
você ficou, não é? — sondou, levantando-se e me levando junto.
— Tentei conseguir uma cópia, mas eles não me deram — falei com
amargura.
— Vou ver o que consigo descobrir, o.k.? Qualquer coisa, te aviso.
Arregalei os olhos, fitando-o.
— Faria isso por mim?
— Por você, eu faço tudo, Luz do Sol! — assegurou com ferocidade. —
Agora quero pedir que nunca mais se machuque de novo porque pensa que
está suja. Jamais faça isso! — Ele pegou meu braço e me levou para fora do
quarto.
— Bryan, eu estou molhada — sussurrei, olhando para ele, cuja calça
jeans semiaberta também estava molhada.
Ele sorriu travesso.
— Eu gosto de você molhada, querida. — Sua voz estava sexy e rouca,
fazendo-me queimar entre as pernas. Se fosse em outro tempo, ainda mais
depois de eu ter recordado tantas lembranças ruins, suas palavras me fariam
surtar, mas Bryan tinha algo que fazia a dor ficar suportável. Nunca parava
de doer, claro, mas eu me sentia confortada ao lado dele.
— Aonde vamos? — inquiri confusa, seguindo-o para o corredor.
Bryan não respondeu, apenas pegou a maçaneta da porta do quarto em
que ele disse que ninguém podia entrar e a abriu.
— O que estamos fazendo aqui? Que quarto é esse?
— É um quarto que uso para trabalhar e me exercitar — respondeu
assim que entramos.
O quarto não era bem um quarto, e sim uma sala gigantesca, com uma
parte voltada para jogos, ringue de luta, outra com muitos computadores
instalados e várias telas, em que, no momento, eu conseguia ver imagens de
câmeras de vários pontos da cidade e daquela casa, inclusive do quarto que
eu estava ocupando.
Uma parede atrás do ringue tinha um arsenal de fora a fora com vários
tipos de armas.
— Nossa, você tem um arsenal aqui. É liberado ter tantas armas assim?
Ele riu, pegando a minha mão e me levando para o ringue.
— Sim, tenho posse sobre elas, então não são ilegais.
— Por que estamos em um ringue de luta? — perguntei, avaliando o
lugar.
Ele não respondeu e foi até onde estava um saco de areia. Pegou duas
luvas de boxe e me entregou.
— Quando estiver com raiva e com dor e sentir vontade de machucar a
si mesma, não faça isso. Venha aqui e bata nesse saco até cansar. Só nunca
fira a si mesma. — Ele tocou meu rosto. — Não suporto vê-la machucada.
— Certo — sussurrei, estremecendo com seu toque. — Faço isso com
Ramiro.
— Ramiro...? — Seu tom tinha algo sombrio, como se quisesse matar
alguém.
— Ele é o personal trainer da academia que frequento, a do Jason. Ele
disse que, quando eu for bater no saco — gesticulei para o saco de areia ali,
pendurando por correntes — para eu levantar a perna assim. — Fiz o
movimento e dei um high kick no saco.
— Eu vou matá-lo — rosnou, puxando-me para seus braços fortes.
Pisquei e afastei o rosto, fitando seus olhos brilhantes, mas ferozes.
— Por quê? — sussurrei ofegante pelo fogo em meu corpo causado
pelo seu toque.
— Esse miserável diz isso porque adora ver você levantando as pernas
gostosas numa calça justa e ver sua bunda. — Ele apertou minha bunda,
virou-me de costas e me pressionou em suas calças. Pude sentir que ele
estava a todo vapor, quase tão duro como granito.
— Eu uso short, Bryan... — Revirei os olhos.
— Querida, já viu sua bunda? Se, nesses vestidos que usa, você fica
sexy, imagine com um shortinho curto? Porra, você não vai mais treinar lá
para esse merda te comer com os olhos! Quando quiser treinar, eu te ajudo.
Eu estava prestes a reclamar, mas ele me beijou e me deitou no chão do
ringue, pairando em cima de mim. Seus lábios eram urgentes nos meus,
ferozes e famintos, parecia que não tínhamos o suficiente um do outro.
Ele deixou os meus lábios e foi para o meu pescoço. Eu estava
ofegante, mas não liguei, apenas queria aquele homem mais do que tudo no
mundo. Queria tê-lo para sempre, amava-o tanto que, se eu o perdesse, não
sabia o que seria de mim.
Bryan puxou a camiseta que eu estava usando – dele – e a rasgou, e
logo foi a vez do meu sutiã. Seus olhos azuis eram brasas vivas. E logo
abocanhou meu seio, desfrutando dele e o sugando forte. Senti-me
arrebatada. Meu corpo queimava devido ao seu toque e às carícias, que me
faziam gemer como nunca, sem me importar com quem escutasse.
— Bryan! — gritei assim que sua boca devorou meu centro. Ele sugava
e lambia cada canto, mas fui ao delírio quando chupou meu clitóris.
Prendi sua cabeça com minhas coxas e levantei a bunda do chão,
querendo mais de sua boca, de sua língua mágica, que me levava quase a um
arrebatamento. Eu ia às nuvens e voltava.
— Você é saborosa demais! — Ele deu um último chupão e logo depois
colocou dois dedos dentro de mim enquanto esfregava meu clitóris com a
língua, até que eu gozei gritando seu nome e fiquei mole no chão.
— Então, como foi? — sussurrou, beijando meus lábios. — Sinta seu
gosto, que, de hoje em diante, será minha melhor vitamina.
— Cara, você é bom — falei, toda mole, e o empurrei até ele se deitar
e eu ficar por cima. — Agora é a minha vez de chupar você, querido.
— Alexia...
— Nunca fiz isso, mas acredito que vou amar, afinal, quando leio livros
com cenas assim, me dá um baita tesão. — Prendi meu cabelo em um coque
e me abaixei para beijar seus lábios, que estavam sorrindo. — O que foi?
— Você com tesão por ler um livro. Gosto disso. — Ele me beijou,
apertando-me mais em seus braços.
— Seus beijos são bons, mas quero outra coisa — sussurrei, depois
algo me veio à mente. — Aqui têm câmeras que estão nos filmando?
Ele riu.
— Querida, todos os cômodos têm câmeras, mas este aqui não, afinal,
ninguém entra aqui se eu não quiser, então não se preocupe, porque jamais
filmaria o que acontece entre nós — falou, beijando minha bochecha.
— Que alívio! Agora vou treinar um boquete em você — avisei,
beijando seu tórax e me deliciando com seu corpo saboroso, que eu amava.
Então dei de cara com os nomes em seu peito, sobre os quais eu estava
supercuriosa. O que acontecera com as donas daqueles nomes?
— Emília e Emma? Quem são elas? — Notei que seu corpo ficou tenso
com minha pergunta e que ele fechou os olhos de dor e tormento. — Bryan,
quem são elas?
Ele me tirou de cima de si, sentou-me ao seu lado e se levantou,
passando por uma porta que só então percebi. Supus que era um banheiro.
Peguei uma camisa que estava em cima de uma cadeira, até estava com o
cheiro de Bryan, vesti-a e o segui.
Era mesmo um banheiro. Pela toalha no chão, ele tinha acabado de se
secar e estava se vestindo.
— Bryan...
— Não, Alexia, não posso falar agora. — Sua voz estava grave e
irritada.
— Me diz o que está havendo, porque esses nomes devem significar
algo para você, senão não teria agido assim, correndo desse jeito. — Peguei
seu braço. — Olha para mim, droga! Não vou deixá-lo sair sem ao menos me
dizer o que está havendo com você.
Ele respirou fundo e puxou o braço.
— Não tenho que dizer nada a você — retrucou.
— É claro que tem. Nós estamos juntos, não é? Temos que contar tudo
um para o outro.
— Você acha que, só porque estamos fodendo, tem algum direito de
saber sobre mim? Não tem! Não se meta no que não é da sua conta, caralho!
— rugiu e saiu do banheiro e da sala.
Eu não tinha ideia de quanto tempo fiquei no banheiro em estado de
choque, dolorida, porque aquelas palavras eram como um tapa. Acreditei
que teria doído menos se ele tivesse me batido, porque era como se Bryan
tivesse enfiado as mãos em meu peito e esmagado meu coração até não restar
mais nada, apenas vazio.
Eu não vou me quebrar agora, não de novo! Como ele pôde me dizer
isso após eu ter me aberto para ele, após dizer tudo o que sentia a ele?!
Chegou a hora de eu tomar as rédeas da minha vida. E para isso preciso
tirar Bryan da minha vida.
Capítulo 8

ALEXIA
— Alexia, querida, o que foi?
Robert era o meu braço direito. Na verdade, aquele homem era meus
pés e mãos na escola.
Fazia alguns minutos que eu tinha chegado ali, e minha expressão devia
tê-lo alertado de que alguma coisa acontecera comigo. Minha cara devia
estar pior do que eu imaginava. Havia tentado melhorar, mas provavelmente
não fui bem sucedida.
Depois que Bryan saiu desgovernado no dia anterior, esperei-o o resto
do dia e da noite, até a manhã do dia seguinte, mas ele não apareceu, então
peguei parte de minhas coisas e fui embora da sua casa, não querendo estar
lá quando ele voltasse. Se não tinha voltado ainda, era porque não se
importava comigo. Não queria vê-lo por enquanto, não depois do que ele me
disse. Meu peito doía com a possibilidade de não o ver mais, mas talvez
fosse bom, afinal, ele só vivia me magoando, dizendo coisas que me feriam.
Eu sabia que ele as falava somente para eu o deixar, que eu não devia ouvi-
las, mas não podia. Aquelas palavras ainda corroíam minha mente a cada
segundo.
— Estou bem, Rob, apenas... problemas — menti para o homem de
meia-idade moreno e de cabelos grisalhos. — Sei que vai viajar esse fim de
semana. Enquanto isso posso ficar na sua casa? — pedi enquanto via as
crianças comerem.
Era sexta-feira, por isso elas estavam animadas, pois o fim de semana
estava chegando. Eu não sabia como o meu seria, porque, desde que revi
Bryan na boate, minha vida se transformou em um reboliço, sendo
perseguida por um homem que estava em meu encalço.
Eu amava aquele lugar, adorava ver as crianças correndo pelo jardim,
brincando, alimentando-se, suas risadas e sorrisos.
— Tia Lex, isso é para você. Uma flor para uma flor — disse Ariane.
Ela tinha 4 anos, cabelos louros e olhos azuis intensos. Sempre que eu
estava perto dela, meu coração batia forte. Eu não entendia o motivo disso.
Gostava de todas as crianças ali, mas sentia algo a mais por Ariane. Sua avó
era a dona Aria, a cozinheira da escola, uma ótima pessoa que eu admirava
de coração. Eu soube que os pais de Ariane morreram quando ela era
pequena, então ela era criada pela avó. Aria era conhecida dos meus pais
desde a minha adolescência. Eu achava que era por isso que ela ainda
trabalhava ali, apesar da idade.
Abaixei-me na frente dela e peguei a flor que ela me deu de presente.
Eu guardava todas que ela me dava. Era claro que murchavam, mas não me
importava. Seu carinho por mim alegrava minha alma.
— Oh, minha princesinha linda, obrigada! — Abracei-a, beijando seus
cabelos lindos e sedosos. Seu cheiro era maravilhoso e me fazia lembrar da
bebê que perdi. Se ela estivesse viva, estaria com a idade de Ariane. Eu não
me importaria com quem ela se parecesse, mesmo que fosse com aquele
monstro, contanto que estivesse viva.
— Por que está chorando, tia? — perguntou Ariane um tanto magoada.
— Não gostou da rosa?
Eu me afastei e sorri para tranquilizá-la; não queria que ela ficasse
triste, parecia doer em mim.
— Não, querida, eu amei a rosa, apenas estou feliz, então não liga, o.k.?
Agora vá brincar com seus coleguinhas — falei, cheirando a rosa.
Ela sorriu radiante com minha resposta e foi brincar com suas colegas
no pátio. Já eram quase 2h da tarde. Eu queria ir aonde Jack estava para
ficar com ele e Claire, mas não podia, já que eles corriam perigo. Eu
também corria risco na escola, vim somente para deixar tudo organizado.
Precisava me afastar das crianças. E se aquele lunático do Steve tentasse
fazer algo a elas? Eu não podia deixar isso acontecer.
— Ela ama muito você, sabia? — disse Rob ao meu lado. Até tinha me
esquecido dele.
Fitei-o.
— Eu sei. A conheço há um ano e meio, desde que vim para cá, e não
largamos uma da outra. De vez em quando, a levo para passar uns dias
comigo. — Eu amava quando isso acontecia, quando Aria me permitia levar
Ariane para minha casa.
Rob me deixou ficar em sua casa naquele fim de semana. Eu precisava
de um momento a sós para pensar no que iria fazer, já que não voltaria para a
proteção de Bryan.
Aria entrou na minha sala quase já no fim do expediente. Mais cedo, ela
tinha dito que precisava falar comigo. Pelo seu tom, parecia sério. Eu
esperava que não fosse nada grave, a conhecia desde que tinha 15 anos e ela
veio trabalhar com papai e mamãe quando fundaram a escola.
— Oi, menina Alexia — disse ela e tossiu. Ela sempre me chamava
assim.
Corri até ela e a ajudei a se sentar. Ela tinha uns 60 anos, e seus cabelos
estavam grisalhos.
— O que foi? Está doente? Por que veio trabalhar, então? Devia
descansar — falei com minha voz alterada, vendo-a assim e não sabendo o
que fazer.
Ela sorriu para mim, meio abatida. Com ela perto de mim, percebi
como estava sem cor, como se estivesse exangue. Aria parecia doente.
— Eu estou bem — disse ela, mas tossiu e colocou uma toalhinha na
boca.
— Eu vou chamar um médico — falei, pegando o telefone para ligar
para um médico conhecido.
— Não, eu não preciso de médico, mas sim falar com você. — Ela
pegou um papel na bolsa e me entregou. — Isso pertence a você, menina
Alexia. Não tenho mais ninguém a quem recorrer, só você.
Peguei o papel sem ter a mínima ideia do que se tratava. Seria alguma
receita médica e ela precisava de ajuda para a compra dos remédios?
Porém, se fosse isso, por que ela teria dito que pertencia a mim?
— O que é isso? — indaguei, então li o documento, em que ela falava
que estava me dando a guarda definitiva de Ariane. Arregalei os olhos e fitei
Aria, encolhida na cadeira.
— Eu tenho câncer nos pulmões. Não tem cura, é terminal. Os médicos
me deram dias de vida. Nem era para eu estar aqui, mas não quero passar
meus últimos dias em um quarto de hospital, e sim ao lado de Ariane e
dessas crianças, que são a minha vida. — Sua voz foi fraquejando enquanto
falava.
— Não fala — pedi. — Fica quieta para não piorar. Por que não me
disse antes? E por que dar a mim a custódia de Ariane? Você deve ter algum
parente vivo.
— Não tenho, menina, só você. Vejo como gosta dela, e ela de você,
então pode cuidar bem dela e amá-la como se fosse sua filha. Por favor, não
tenho mais ninguém a quem confiar sua segurança e educação.
O que eu faria? Queria Ariane para mim, porque amava aquela
garotinha esperta demais para sua idade, mas conseguiria ficar com ela sem
que as lembranças me dominassem, sem pensar na minha filha, que era para
ter a idade dela? E, se eu ficasse com ela, jamais teria Bryan. Não que eu
fosse ficar com ele depois que me disse que o que tínhamos era só sexo.
Sexo, não; foda, o que era pior. Eu não conseguia entender por que ele reagiu
daquela maneira quando eu lhe perguntei sobre os nomes tatuados em seu
tórax. Quem eram aquelas mulheres? Sam não tinha mencionado que ele já
fora apaixonado por alguma mulher ou que havia tido uma filha. Seria por
isso sua aversão a filhos, tanto que até chegou a dizer que faria uma mulher
abortar caso ficasse grávida para prendê-lo? Como se eu fosse fazer algo
assim...
Ao olhar para o documento mais uma vez, eu já tinha tomado a decisão.
Jamais deixaria uma garotinha desprotegida por causa de um cara.
— Eu vou tomar conta dela, prometo — jurei, assinando os papéis,
embora imaginasse que aquilo não tinha bases legais, mas, se aquela era a
única coisa que deixaria Aria feliz e tranquila, eu não me importava. Depois
entregaria o documento nas mãos do advogado dos meus pais. Ele me diria o
que eu precisava fazer para ter Ariane legalmente.
Aria sorriu, contente, mas logo começou a tossir. Para meu horror, a
toalhinha ficou vermelha de sangue.
— Oh, meu Deus!
Ignorei quando ela disse que estava bem e chamei a emergência. Quem
está bem cuspindo sangue de seus pulmões? Ninguém!
Capítulo 9

ALEXIA
Assim que chegamos ao hospital, levaram Aria para a emergência, e um
médico a consultou. Meia hora depois, ele confirmou o que ela me disse,
mas os dias que ela tinha se transformaram em horas de vida. Por que ela
não descansara ao invés de fingir estar bem para ir trabalhar? Ela precisava
de repouso.
Ariane estava comigo e chorava pela sua avó, embora ela não soubesse
o que estava acontecendo, apenas que Aria estava dodói. Eu queria poder
livrá-la daquela dor, mas não podia. Jurava que a protegeria e tomaria conta
dela como se fosse minha filha, porque eu já a amava dessa forma.
— Precisa tomar conta dela, menina Alexia... — A voz de Aria estava
muito fraca ao pedir isso, mais moribunda do que antes.
Ela estava num leito de hospital, cercada de aparelhos para ajudá-la a
respirar, mas, mesmo com eles, estava ofegante. Olhou para a neta ao meu
lado.
— Obedeça à tia Alexia em tudo que ela pedir. Faz isso para vovó?
— Sim, vovó, eu faço. — Ariane pegou a mão da avó e a beijou. —
Você vai ficar boa, não vai?
— Estou doente, meu bem, não vou mentir. Depois que vovó for para o
Céu, ainda vai olhar você de lá e desejar que seja feliz aqui ao lado da
menina Alexia. — Aria me olhou com os olhos cansados. Eu sabia que ela
não queria ir embora na presença da neta. — Pode ficar com ela lá fora?
Mas antes pegue a minha bolsa. Tem uma carta dentro dela. Quero que a leia,
mas só quando eu me for, tudo bem?
Franzi a testa, confusa, mas não disse nada, só assenti. Sabia que ela
não seria capaz de responder às perguntas que eu tinha no momento. Peguei a
carta de dentro da sua bolsa e a coloquei na minha a fim de cumprir minha
promessa. Talvez aquela missiva tirasse minhas dúvidas.
— Prometo que só vou abrir... depois... — Minha voz falhou por causa
do choro, mas me segurei, porque precisava ser forte por Ariane. Deixaria
minha dor para depois. Naquele momento, só a queria segura, e comigo a
menininha não teria segurança, não até que Steve fosse preso ou morto. Eu
sabia que não devíamos desejar a morte dos outros, mas não me incomodaria
nem um pouco se ele morresse.
Lutner era um hacker, então só outro hacker poderia encontrá-lo. Bryan
ainda não conseguira localizá-lo. Eu só conhecia outro cara fera em
computadores, que podia localizá-lo para que Ariane ficasse segura, porque
Steve com certeza seria capaz de matar uma garotinha, se descobrisse que eu
estava com ela. Eu duvidava que ele se importasse com a idade de suas
vítimas.
Sabia que estava exposta demais naquele hospital. Por instinto, olhei ao
redor à procura de algo suspeito, mas o que vi foi um par de olhos caramelo
me fitando e um sorriso sexy.
Já eram quase 18h, e eu estava cansada. Desde o dia anterior, eu não
descansava, mas não me importava. Não sairia dali até... Não queria pensar
no fim de Aria. Queria que existisse uma cura para que ela pudesse criar sua
neta, mas sabia que era impossível.
Fui até Daemon – foi assim que Nasx o chamou no hospital. Deixei
Ariane sentada em um sofá perto de mim, pois não queria perdê-la de vista
um segundo.
— O que faz aqui? Está me seguindo? Se está aqui a pedido do Bryan,
mande aquele filho da puta ir para o raio que o parta, que não quero saber
dele — grunhi sem alterar a altura da voz, afinal, estávamos num hospital, e
não queria que a criança ouvisse meus palavrões.
Seu sorriso me deu vontade de socá-lo na cara. Eu estava grilada, mas
não podia descontar em todos o que Bryan fez comigo, ou melhor, o que
disse antes de me deixar sozinha, afinal, ninguém tinha culpa, só ele.
Havia ligado para Alex da escola dizendo que estava com problemas e
estava prestes a contar-lhe sobre Aria quando Bryan tomou o telefone da
mão do meu irmão. Percebi que era ele porque ouvi sua voz do outro lado da
linha. Na hora desliguei na sua cara, segurando o choro e a raiva. Quem ele
pensava que era para querer falar comigo depois do que tinha feito?
— Você não está com seu celular. Bryan está louco atrás de você. O que
tem na cabeça? Não sabe que está sendo caçada por um lunático? — rosnou
Daemon, perdendo o sorriso.
— Não quero saber nada do Bryan. Se você veio aqui porque ele pediu,
pode dar meia volta e ir embora — sibilei. Olhei para o outro lado bem a
tempo de ver um cara passando a alguns metros de nós, vestido com roupas
de médico. Usava óculos e tinha barba, mas eu conhecia aquele rosto muito
bem, dos meus pesadelos e lembranças. — É ele...
Não soube como Daemon ouviu alguma coisa, pois meus lábios
estavam rígidos ao dizer aquilo. Ele me colocou atrás de si bem a tempo de
ver Steve virar o corredor. Entretanto, antes disso, seus olhos encontraram
os meus. Ali tinha tanta frieza... Era como se estivesse me dando um recado:
logo nos encontraríamos.
— Aquele cara vestido de médico? — Daemon inquiriu com a voz
grossa de fúria e saiu correndo atrás dele assim que assenti sem falar nada,
chocada demais para isso.
Peguei Ariane no colo para caso precisasse correr com ela e tirá-la
dali. Esperava que ele não tivesse me visto com ela, já que a menina havia
estado sentada no sofá. Ele me viu com Daemon, e seus olhos ficaram
escuros de raiva.
Antes que eu pensasse mais sobre isso, houve uma correria de médicos
e enfermeiros para o quarto de Aria. Corri para lá com meu coração
acelerado de medo de que ela já tivesse partido.
Entretanto, assim que passei por algumas pessoas que pareciam
congeladas, parei de súbito e ofeguei. Nas paredes, estava escrito em
vermelho, como se a tinta usada fosse sangue: Imunda, mentirosa, traidora!
Sua alma vai queimar no inferno!, e muitas palavras de baixo calão. Ainda
bem que, ao passar pela porta, eu tampei o rosto de Ariane para que ela não
visse a avó se essa tivesse falecido. Estava prestes a olhar para Aria,
torcendo para ela estar bem, mas meus instintos diziam que não; inclusive
sabia quem era o responsável por tudo aquilo.
Todavia, a mão de alguém cobriu meus olhos para que eu não visse
nada. Estava a ponto de gritar e lutar se fosse preciso, pois não iria embora
dali com quem quer que fosse, mas ouvi a voz baixa:
— Sou eu, Nasx, então não me bata, porque até agora a minha barriga
dói daquela surra de vassoura. — Puxou-me suavemente dali.
Oh, Deus! Ela morreu por minha causa! Se eu não estivesse perto
dela, Aria não teria sido assassinada, teria morrido por causa de sua
doença! Quem aquele cretino pensa que é para fazer algo assim e ainda
desejar a danação da alma de alguém? Era ele que deveria estar
queimando no inferno!
— O que aconteceu com vovó? — perguntou Ariane com a voz fininha.
— Lembra de ela dizer que ia para o Céu? — Ela assentiu, então
continuei: — Pois é, meu amor, ela foi agora, mas Aria sempre vai estar
conosco.
Quando ela estivesse mais velha, eu explicaria melhor sobre perdas e
tudo mais. Naquela hora, só queria sair dali e levá-la a algum lugar seguro,
longe das vistas de Steve. Eu queria ficar ali e cuidar do velório e enterro de
Aria, mas, pelo que eu imaginava, já que não vi seu corpo, acontecera um
assassinato, então demoraria um pouco para liberarem o cadáver. Eu me
sentia como um robô, ligada no automático. Não sabia como estava de pé
ainda.
— Vai ficar tudo bem, gatinha — assegurou Nasx com os braços em
meus ombros. — Estamos aqui para protegê-la desse... — Ele se conteve,
olhando para Ariane, que estava com a cabeça no meu ombro.
Percebi que estava tremendo, mas me esforcei para não tremer mais,
para ser forte pela criança. Não queria chorar na sua frente. Depois choraria
em minha casa... Quase ri. Eu não tinha mais casa, já que não podia ir para
lá. O lugar mais seguro para mim era a casa de Bryan, que era reforçada no
quesito segurança. Eu ficaria lá só para me manter segura? Não. Porém,
ficaria lá para ver Ariane segura? Sim, sem pensar duas vezes. Sabia que
seria difícil a minha estada lá depois de tudo. Só esperava que ele não
levasse outras mulheres para casa enquanto me acomodava, mas acreditava
que não. Bryan podia ser um mulherengo, mas não era um canalha.
Assim que saímos do hospital, Daemon ia entrando com a expressão
furiosa.
— Você o pegou? — sondei, embora sem esperança.
Ele suspirou.
— O cara é rápido, devo admitir. Acredita que ele fez a porra de um
sinal abrir só para eu não o alcançar? Acho que ele não está agindo sozinho,
porque, para controlar os semáforos, ele teria que hackear um computador,
mas, pelo que pude ver, a única coisa que ele tinha era uma faca... — Calou-
se devido a Ariane, que estava dormindo nos meus braços. Por sorte, ela não
era pesada.
Daemon me mostrou uma faca que estava dentro de um saquinho.
— Acredito que esteja com digitais, porque ele estava sem luvas. Não
parece se importar mais em se esconder...
Cortei-o:
— Isso é bom ou ruim?
— Não sabemos, porque esse cara é louco de pedra.
— É um assassino que matou uma mulher doente a sangue-frio e, ainda
não contente com isso, escreveu com sangue dela nas paredes um monte de
expressões horríveis, maldições, xingamentos — declarou Nasx de modo
sombrio.
— Espere, ele matou alguém lá dentro? — rosnou Daemon furioso. —
Eu liguei para Bryan, ele... — Calou-se quando Bryan estacionou seu carro
perto das motos dos MCs. Notei que tinham mais deles, uns 15, mais ou
menos, quase fechando a rua inteira. Havia carros de polícia também.
Bryan me olhou em pânico e me checou dos pés à cabeça para ver se eu
estava bem enquanto vinha em minha direção. Quando viu Ariane, deteve-se.
Notei dor em seus olhos, como se aquela cena o ferisse. Isso me fez pensar
que os nomes que estavam em seu peito fossem de uma mulher e talvez uma
criança, sua filha. Não sabia como reagir a isso. No entanto, não o acusaria
se fosse algo assim, afinal, eu também havia tido uma filha... Ela só não
estava ali. Provavelmente, a dele também não. Eu só queria que ele
confiasse em mim e me dissesse a verdade em vez de me machucar para me
afastar.
— Encontrou o desgraçado? — perguntou Bryan a Daemon com os
dentes trincados.
— Acho que temos que conversar. — O cara me olhou de lado. — A
sós se possível.
Eu poderia retrucar, mas estava cansada demais para fazer tal coisa.
— Certo, essa é minha deixa para sair — falei, olhando para Nasx e
Daemon. — Obrigada a vocês dois por estarem aqui, senão não sei o que
teria acontecido.
Nasx veio até mim e me abraçou, mas logo me soltou após o rosnado
que Bryan deu. Ignorei isso e fui até Daemon para abraçá-lo, mas ele se
afastou.
— Eu valorizo o que tenho no meio das minhas pernas, mulher —
comentou, sorrindo para mim, depois olhando de forma sombria para Nasx,
que revirou os olhos.
— Somos amigos, não é, gatinha? — Sorriu para mim, depois para
Bryan. — Eu a chamo assim não por ela ser gata, embora seja, mas pela
porrada que ela nos deu.
— Não precisa dizer nada ao Bryan. — Olhei para seus olhos azuis,
escuros como uma tempestade. — Afinal, não somos namorados, não é?
Apenas foda.
Capítulo 10

ALEXIA
Saí de lá antes que voasse em sua face linda e o beijasse. Às vezes
achava que era idiota por aceitar tudo que ele fazia e me dizia, fazendo-me
chorar, como no dia anterior. E eu tinha um forte pressentimento de que não
seria a última vez. Queria poder estar errada quanto a isso.
Fui até o carro de Bryan, não ao meu, que estava no estacionamento do
hospital. Depois teria que vir buscá-lo. Estava com Ariane nos braços e não
queria acordá-la. Eu iria com ele para sua casa, porque era o lugar mais
seguro para ela naquele momento, bem como para mim.
— Onde vai deixar a criança? — questionou ele assim que entrou no
carro.
— O nome dela é Ariane, e ela vai ficar comigo. Se você não quiser,
me avisa, que saio do carro e vou com Nasx para o clube dele. — Meu tom
era frio, aliás, eu me sentia fria devido a um misto de dor, raiva e medo.
Bryan rosnou de um jeito mortal e apertou as mãos com força no
volante.
— Isso não vai acontecer, porra! — grunhiu, depois respirou fundo. —
Eu te liguei o dia todo desde que desligou na minha cara quando telefonou
para Alex, e você não atendeu o maldito celular.
— Por que eu atenderia depois do que disse a mim, Bryan? Queria falar
com você ontem, mas sumiu. Agora quer que atenda suas chamadas? É muita
cara de pau a sua — sibilei e olhei pela janela, tentando me controlar, ou
esganaria aquele homem, que era minha razão de viver. Esperava ser algo
assim para ele também.
Senti sua mão em meu ombro como se estivesse me reconfortando. Eu
não queria sua pena, então me esquivei do contato, não desejando suas mãos
em mim naquela hora. Quando eu poderia pensar que um dia fugiria do
toque de Bryan? Nunca. Bem, tudo tem sua primeira vez.
— Não toque em mim... — Se ele me tocasse, eu não iria me controlar,
não conseguiria me afastar dele e me quebraria na sua frente. Isso não podia
acontecer, pois eu não queria sua pena. Apenas iria para sua casa porque
Ariane precisava ser protegida.
— Eu sinto muito, Alexia... — Sua voz estava tão baixa que eu quase
imaginei tê-la ouvido.
A voz frágil como vidro estilhaçado quase me fez esquecer da minha
própria dor, mas eu não podia fingir que nada tinha acontecido, não depois
do que ele me disse. Ele precisava decidir se eu era importante para si ou
não, porque, pela forma como sempre me feria, parecia que eu não
significava nada para ele.
— Eu tive um dia longo e estou cansada. Não quero discutir com você
hoje.
Bryan ficou em silêncio depois disso. Achei bom, precisava arejar a
cabeça.
Assim que entramos na casa, ele foi para a sala de computadores,
acredito que socar alguma coisa, pela raiva em sua expressão, toda dirigida
a si mesmo, não a mim ou a outra pessoa, eu tinha certeza. Queria poder tirar
aqueles sentimentos dele, mas não podia, só se ele me deixasse entrar em seu
coração.
Segui para o cômodo ao lado do dele; não iria para o seu quarto, já que
não estávamos juntos, não éramos namorados como eu tinha pensado. Se ele
quisesse foder, teria que procurar outra pessoa, uma idiota que aceitasse
qualquer coisa que ele quisesse dar. Se bem que eu era uma tola também,
pois amava havia tanto tempo aquele homem que não suportava ficar longe
dele. Sua dor parecia doer em meu peito. Eu devia tentar esquecê-lo, afinal,
se ele não ligava para a minha dor, por que eu deveria ligar para a dele?
Também havia Ariane, a garotinha linda que eu amava desde que a
conhecera. Como Bryan parecia não se dar bem com crianças e eu estava ali
de favor, não queria incomodá-lo, então ficaria no meu canto. Esperava que
isso funcionasse. Rezava para ter capacidade de vê-lo a todo o momento sem
tocá-lo, sem querer estar ao seu lado, beijá-lo e amá-lo. Havia uma
montanha gigante nos separando, porque era isso o que seus segredos eram,
uma maldita montanha intransponível.
Coloquei Ariane ainda dormindo na cama de casal que havia no quarto,
com janelas que davam para o jardim da frente. Não tinha muita coisa no
cômodo, só a cama, um guarda-roupa e uma TV.
Fui para a suíte de Bryan, já que algumas de minhas coisas estavam lá,
umas poucas peças que não levei quando parti dali naquela manhã. Tinha de
levá-las para o quarto onde eu ficaria com Ariane, assim não precisaria
entrar no lugar a todo momento e sentir o cheiro dele.
Resolvi tomar banho na suíte dele para não acordar Ariane. Minha
garota tinha passado por muita coisa naquele dia. Tão pequena e já
enfrentara tanto... Entrei no chuveiro e peguei a esponja de banho, querendo
tirar tudo de mim, libertar-me do que tinha acontecido, da dor, das perdas,
de tudo que me corroía viva, como se chamas invisíveis me queimassem.
Mãos que eu conhecia bem pegaram as minhas e tiraram delas a esponja
que eu esfregava em minha pele. Eu sabia que era Bryan atrás de mim, sentia
seu calor, tão forte que parecia que iria me queimar, mas de forma boa, pois
aquilo significava que seu corpo estava moldado ao meu.
— Não pode se machucar por minha causa, Luz do Sol. — Ele me virou
e escondeu seu rosto em meu pescoço, na cortina do meu cabelo, abraçando-
me forte. Bryan respirou meu cheiro como se fosse algo que adorava. — Eu
não valho isso, na verdade, não valho nada... — Sua voz estava tão quebrada
que eu me encolhi por dentro. Deixei de lado minha dor, porque sentia que a
dele era maior, tão intensa que me tirou o fôlego.
— Eu não ia me machucar, Bryan — garanti, apertando meus braços à
sua volta, sentindo seu calor irradiando pelo meu corpo, coração e alma.
— Eu quero que saiba que não queria dizer aquilo, só falei para afastá-
la, para você não saber nada sobre o meu passado... É tão escuro que não
consigo nem recordar... Essas lembranças me assombram e vão assombrar
para sempre.
Meu peito doeu com sua dor. Eu faria de tudo para ajudá-lo. Esperava
que ele me permitisse entrar em sua alma. Não suportava quando me afastava
só para eu não ter conhecimento do seu sofrimento e sua dor. Fosse o que
fosse que acontecera com as donas daqueles nomes, havia-o marcado para
sempre.
— Seja o que for que aconteceu com você, eu vou estar sempre ao seu
lado. — Fui firme em minha promessa. Precisava que ele soubesse que eu
não o deixaria nunca, não importava o quão grave fossem seus segredos.
Bryan não se afastou de mim, apenas me apertou mais em seus braços e
gemeu como se sentisse dor. Com certeza estava preso em seu próprio
pesadelo.
— Não vai, porque a escuridão está aqui dentro, os demônios que me
atormentam estão aqui. — Senti seus lábios em meu pescoço. — É por causa
disso que vou perdê-la no final... quando descobrir.
— Não vai, Bryan! — insisti com ferocidade. — Eu juro! — Afastei-
me dele e fitei seus olhos lindos e atormentados. — Confie em mim.
— Eu confio em você, mas o que há em mim é grande demais, por isso
não quero que se aproxime de mim, é escuro demais e vai poluir você e sua
luz...
Eu o interrompi:
— Acha que não tenho escuridão? Eu tenho, Bryan. Quando fecho os
olhos, sempre vejo os demônios que me atormentam. — Respirei fundo.
Ele sacudiu a cabeça.
— Não são iguais aos meus. Você foi a vítima. Quanto a mim, fui o
algoz; elas foram as vítimas. — Apontou para os nomes femininos em seu
peito.
Olhei para as letras que formavam os nomes “Emília” e “Emma” em
seu peito nu, já que ele estava sem camisa. Depois de ouvir que elas tinham
sido vítimas, perdi o fôlego ao imaginar o que ele tinha feito com elas.
— Está vendo o pavor em seus olhos? E nem sabe os motivos. Imagina
quando souber... Você não vai aceitar nunca...
Olhei suas íris em chamas.
— Deixa que isso eu decido, não você — retruquei. — Só me diz uma
coisa, você estuprou alguma delas?
Ele arregalou os olhos e arfou como se eu tivesse batido nele, então se
afastou de mim.
— O quê?! Não! Eu jamais faria isso com alguém! Posso ser um
monstro, mas não a esse ponto! — declarou com ferocidade, mas o tormento
ainda estava lá.
Suspirei aliviada.
— Acredito em você. Não queria te acusar, Bryan, apenas quero
entender a sua dor para poder ajudar você. — Toquei seu rosto com barba
por fazer. — Não pode me afastar sempre que a situação ficar ruim. E não
pode me machucar no processo.
Ele me abraçou de novo.
— Não desista de mim! — suplicou. — Você é a única luz capaz de
apagar a escuridão que há em meu interior!
Meu peito se aliviou por saber que ele me queria, que só não estava
sabendo lidar com todos os sentimentos e segredos que o dominavam.
— Eu não vou, também não vou perguntar o que houve em sua vida que
o assombra até hoje, mas quero que saiba que, se os nomes em seu peito
forem de uma mulher que você gostou e uma filha que perdeu, entendo e
aceito.
Quando ele me olhou, parecia ter uma chama de vida em sua face. Era
bom ele saber que eu jamais iria deixá-lo, não importavam os motivos que o
haviam levado a se fechar.
— O quê? Não! Eu nunca engravidei ninguém, muito menos fui
apaixonado, antes, por nenhuma mulher. — Sua voz era sincera. — É só
que...
— Quando estiver pronto para falar, eu vou estar aqui para você, tudo
bem? — Beijei seu rosto em ambos os lados. — Seja o que for, não vou
correr, Bryan, porque amo você.
Ele me beijou e me possuiu debaixo do chuveiro, mas uma coisa não me
passou despercebida: ele não devolveu minha confissão.
Capítulo 11

BRYAN
Passado

Havia acabado de sair da minha casa, ou melhor, da casa dos meus


fodidos pais. Nem podia chamar de pais uma mãe louca que odiava os
filhos, até os chamava de “sementes do mal”, e um pai bêbado que só sabia
jogar, beber e gastar o salário do seu antigo trabalho, do qual, por sinal,
tinha sido demitido devido às faltas e à bebedeira.
Apenas quem valia alguma coisa naquela família, sua única luz, era
minha irmã, Samantha, e minha avó, Julia. Sam havia estado com vovó até
pouco tempo antes. Estava na faculdade, terminando psicologia. Ela
finalmente realizaria seu sonho de ser psicóloga e ajudar crianças que
necessitavam de auxílio. Um gesto nobre da parte dela. Eu a amava ainda
mais por isso.
Eu só tinha vindo ao Kentucky naquele dia porque precisava pegar
algumas coisas minhas que haviam ficado para trás quando saí de lá após
terminar a faculdade de ciências da computação, mas descobri que a cadela
da minha mãe as jogara fora. Eu sabia que era cruel pensar nos pais dessa
forma, mas era verdade. Os dois não valiam um dólar.
Uns 15 caras mais ou menos, montados em Harleys, pararam em frente à
casa dos meus pais. Todos, pelo que vi, estavam armados até os ossos, eram
tatuados, e alguns me olhavam com raiva, como se quisessem me matar,
embora eu não soubesse quem eram eles. Pelo que estava escrito em suas
jaquetas, eram motoqueiros da gangue Scorpion. Eu já tinha ouvido falar
deles, mas não os conhecia pessoalmente.
Parei na varanda, a uns 10 m deles, não por medo, porque eu já tinha
enfrentado coisa igual ou pior. Lembrei-me de ser parado pelo chefe da
máfia russa e obrigado a ir com seus capangas até Nikolai, um garoto de 19
anos na época, mas com poder imenso nas mãos, dono de milhões de euros e
chefe de milhares de mafiosos pelo mundo. Suas palavras eram ouvidas nos
quatro cantos do mundo, e quem lhe desobedecesse acabava sob sete palmos
de chão. Não era à toa que seu apelido era Dark.
Os quatro que apearam de suas motos estavam com armas apontadas
para mim. Eram fortes, com cara de assassinos; não lhes custaria nada puxar
o gatilho de suas armas e acabar comigo. Na verdade, eu apostava que
estavam doidos para fazer isso.
Senti um certo temor, claro. Não achava que admitir temer por minha
vida era uma fraqueza. Contudo, não era covarde e não demonstrei qualquer
receio na frente deles.
— Venha conosco agora. O chefe quer falar com você em outro lugar —
ordenou um cara moreno e barbudo com uma cicatriz na testa. Pelo seu tom,
eu não tinha poder para recusar.
Olhei os caras que estavam sentados em suas motos e identifiquei o
chefe deles, um homem moreno, forte, com olhos mortais. Em sua jaqueta
estava escrito “Presidente” e “MC Scorpion”. Seus olhos negros me
avaliavam como se sondassem o que eu diria.
— Quem são vocês para aparecerem aqui e me obrigarem a ir falar com
seu chefe? — perguntei, mas sabia que não me dariam uma resposta.
— Nós fazemos as perguntas aqui, não você — rosnou um cara
cabeludo, com dentes amarelos e dedos no gatilho, loucos para puxarem. —
Vem com a gente, ou será que vou ter que atirar em você?
— Não perderemos uma noite de sono com isso — sibilou o cara da
cicatriz.
Estreitei os olhos, varrendo os rostos de cada um, por último, o chefe.
— Cara, se quiser atirar, vá em frente, mas não vou falar com você sem
saber o motivo e para onde quer me levar — desafiei-o.
O líder tirou seus óculos escuros e gritou, já que estava um tanto longe
de mi:
— Você é um cara corajoso ou tolo!
— Posso ser os dois — respondi ainda calmo. Na minha vida, já tinha
aturado tudo, participado de lutas livres e até ilegais, já tivera armas
apontadas para mim, então nem me mexi. As armas dos motoqueiros me
davam calafrios, lógico, mas não demonstrei.
— Entre no seu carro e nos siga, garoto. Só queremos conversar.
Fiz o que ele disse, não sabendo que, naquele dia, seria o meu fim, que
eu perderia o resto de luz que ainda havia em mim e a chance de ser alguém
algum dia, diferente dos imundos dos meus pais.

Na sede do MC Scorpion, Black, o líder, falou-me da dívida enorme


que meu pai tinha com ele e que, se eu não a pagasse, Sam e vovó seriam as
únicas que pagariam o preço. Ou seja, eu não tinha escolha, já que preferia
morrer a deixar alguém machucá-las. Sabia que, quando ele falou que as
machucaria, não estava se referindo apenas a um arranhão, e sim a coisas
terríveis, que deixariam a alma delas na escuridão, num abismo negro e sem
fundo, assim como eu ficaria ao trabalhar para ele a fim de salvar as duas
mulheres que amava.
Uma semana depois da minha visita a Black, passei a ser forçado a
trabalhar para ele em prol da proteção de Sam e vovó, além de meus pais.
Nenhum dos dois merecia aquilo, já que foram eles que nos colocaram em
risco. Descobri que minha mãe disse a Black que eu pagaria a dívida deles,
pois já havia crescido e era capaz de sujar as mãos. Pelo menos foi isso que
ela me disse quando a confrontei após saber o que fez.
— Você ficou maluca? Já não fez o suficiente transformando a vida da
Samantha em um inferno, tanto que ela teve que sair de casa? — sibilei
entredentes, com os punhos cerrados para não fazer besteira.
— Ela é uma puta que estava se insinuando para o seu pai, o meu
marido...
Cortei-a:
— Você ouve o que diz?! Qual a porra do seu problema?! Ela é sua
filha! — rugi, louco para quebrá-la ao meio, só não o fiz porque não batia
em mulheres, não por ela ser minha mãe. Até uma cadela de rua era melhor
do que ela.
— Você e ela não deveriam ter nascido! Por culpa de vocês, seu pai
não liga para mim e não me ama mais! — ela esbravejou com os punhos
cerrados. — Vocês são sementes do mal!
— Você é louca! Devia estar em um hospício! Ou talvez seja só um
monstro mesmo! Porque nunca vi uma mãe querer a maldade para os seus
filhos por inveja! — Sacudi a cabeça com raiva.
— Eu não sou louca, apenas amo mais seu pai do que uns filhos
ingratos como vocês! — Ela deu um passo em minha direção, mas parou e
me fuzilou com o olhar. — Como você pode ter acreditado naquela cadela
da Sam dizendo asneira sobre seu pai? Acha que ele algum dia iria querer
ficar com ela, uma sonsa sem graça? Não, por isso não acreditei em nada do
que ela disse!
— Filhos ingratos? O que fizemos de tão ruim? Você, por ser nossa
mãe, deveria ter nos protegido, não mentido dizendo que Sam não era filha
dele só porque ele gostava dela como pai! Você disse mentiras que o
destruíram e o transformaram no monstro que ele é hoje! — esbravejei. —
Você preferiu a porra de um homem fodido e bêbado que anda com putas em
zonas aos seus próprios filhos!
Eu não estava preparado ou pensava que ela viesse a fazer o que fez.
Voou em cima de mim para me bater por eu ter falado mal do seu marido
desgraçado. Não permiti. Peguei seus pulsos e a joguei no sofá pequeno da
casa.
Eu não a machucaria, afinal, não encostava a mão em mulheres, mas não
a deixaria me bater por causa de um desgraçado. Sorte minha Dylan não
estar ali, ou eu não sabia o que aconteceria, porque com certeza o quebraria
ao meio caso ele dissesse algo.
— De hoje em diante, vocês dois, seus malditos, estão mortos para
mim. Avise àquele crápula pinguço do seu marido que, se eu o vir perto da
minha irmã, vou matá-lo, esquartejá-lo e transformá-lo em comida de
tubarões. — Era verdade; se ele se aproximasse de Samantha, eu o mandaria
para o inferno, onde era o seu lugar, o lugar para homens que tentavam
abusar de suas próprias filhas.
Ela arregalou os olhos castanho-claros e grandes. Lisa era uma mulher
formosa, ou tinha sido um dia, mas estava envelhecida e aparentava ter mais
do que sua idade.
— Você não ousaria! — gritou ela, pondo-se de pé e me fuzilando com
ódio no olhar.
Ela não deveria sentir aquele sentimento por nós, pois éramos seus
filhos de sangue. Na verdade, nunca nos amou nem sabia o que era esse
sentimento.
— Não? Você não me conhece. — Sorri de modo frio. — Espere para
ver o que faço se ele se aproximar nem que seja 1 km dela. Isso será seu fim,
e, se você se meter no caminho, também será o seu.
— Eu dou parte de você se algo acontecer ao meu marido, seu moleque!
Levantei as sobrancelhas e sacudi a cabeça, deixando passar, porque
discutir com alguém cego era perda de tempo. Esperava que um dia ela
acordasse e visse a burrada que estava fazendo ao ficar do lado de um
homem em vez do lado dos filhos. Também torcia para, se isso acontecesse,
não fosse tarde demais, porque o que eu lhe disse era verdade. Se Dylan se
aproximasse de Sam, eu acabaria com ele, e não de maneira fácil, mas lenta
e dolorosa.
Saí daquela maldita casa e daquela família para sempre, sem olhar para
trás. A minha única família agora era vovó e Sam. Por elas eu morreria e
mataria, como estava fazendo ao trabalhar para Black.
Para eu poder pagar a dívida do filho da puta do Dylan, teria de
eliminar sete homens para o líder do MC Scorpion. Não importava se
fossem bandidos, traficantes e gente da pior espécie no mundo, eu não
achava certo matar pessoas. Mesmo assim, estava tirando a vida delas.
Já tinha eliminado quatro dos sete, mas o quinto homem era gente boa,
um trabalhador honesto, não um bandido que já matara mais do que eu podia
imaginar, como os anteriores. Aquele cara tinha família, mulher e criança
pequena, apenas estava envolvido com Black porque o primo de sua esposa
devia uma nota preta a ele dos jogos e apostas em cassinos clandestinos que
ele possuía. Então, em vez de cobrar do devedor, Black queria cobrar de
seus parentes.
Eu não podia eliminar aquela família apenas porque Pietro – nome
verdadeiro de Black – queria. Podia ter feito várias coisas para ele das
quais jamais teria alguma redenção ou perdão de Deus ou da minha família,
coisas que nunca me imaginara fazendo antes de Black me cobrar a dívida de
Dylan, coisas que talvez me impedissem de trabalhar ao lado da lei, como
era meu sonho, mas não teria a morte de um inocente em minha alma escura e
cheia de trevas. Não podia fazer aquilo, ou perderia o que restava dela, isso
se restasse ainda algo dentro de mim, porque Black levara tudo.
Entretanto, se eu não fizesse o que ele queria, ele iria atrás da minha
irmã e da minha avó e as mataria, porque não era homem de não cumprir sua
palavra. O cara era um demônio em pessoa na Terra.
Entrei no clube do MC Scorpion, que ficava afastado da cidade,
Louisville, perto de uma mata, com certeza para fazer o que quisessem sem
serem notados ou presos por isso. Além disso, o maldito tinha quase todos
os policiais em sua folha de pagamento.
Eu sabia que estava selando minha morte ao aparecer no clube para
dizer que não faria mais serviços para ele. Black não ficaria feliz com isso,
mas eu não me importava mais com aquele fodido de merda
Já tinha ido a um motoclube antes, ao de Shadow, o MC Fênix. Sabia o
que eles faziam com as prostitutas, mas no Fênix elas estavam lá porque
queriam, não obrigadas, como eu via em alguns rostos ao entrar no clube
Scorpion. Seus rostos pareciam mortos e sem esperança de um dia elas
saírem daquele inferno. Eu também esperava sair em breve daquele maldito
purgatório.
Pensei em denunciá-lo às autoridades da cidade, mas não faria isso,
pois ele tinha comprado a maior parte da polícia. Inclusive alguns policiais
salafrários estavam no antro quando entrei lá naquela noite. Segurei a raiva
para não os matar ali, naquele momento, porque aqueles caras deviam ser a
lei, não trabalharem no mundo do crime.
Black estava com duas mulheres, uma em cada lado, e uma terceira
ajoelhada à sua frente como se fosse um cachorro, não uma pessoa.
Soltei um ruído de raiva e nojo ao ver a cena, ainda mais quando ele
puxou os cabelos da garota ajoelhada para forçá-la a colocar a boca nele,
mas me controlei.
— Coloca logo essa maldita boca em mim, sua puta! Vamos ver o quão
bem você sabe chupar um pau — rosnou e parou de falar quando olhou para
mim.
Esforçava-me para não me meter naquilo, vendo-o forçar a menina, que
parecia estar ali obrigada.
Encarei o monstro diante de mim, embora eu fosse um monstro também,
mas jamais faria o que ele fazia, não só ele, mas também seus malditos
seguidores de merda. Eu jamais tocaria em uma garota sem sua vontade,
mesmo se aquela menina ali fosse maior de idade, mas eu tinha certeza de
que não era. Meu Deus!
Não sabia o que fazer sobre aquilo, mas não tinha a mais remota chance
no inferno de eu sair e deixar aquela criança à mercê daquele bando de
demônios.
Se Shadow estivesse ali, a salvaria, porque caras como Black
manchavam os nomes dos MCs. O pessoal do MC Fênix não era em nada
parecido com aquele.
Parei em frente a ele, com alguns dos seus homens me ladeando como
leões prontos para darem o bote. Contudo, eu não cairia sozinho; caso fosse
atacado, levaria alguns comigo, mas primeiro tiraria a garota dali.
— Seu serviço não foi confirmado — comentou ele, empurrando a
garota.
— Isso porque eu não fiz — respondi enquanto segurava a garota para
ela não se machucar, o que foi um erro de minha parte naquele momento.
— Você a quer? — Ele apontou para a garota ao meu lado. Ela estava
nua e encolhida, tentando se cobrir do olhar faminto daqueles MCs
desgraçados.
Soltei a menina, que não saiu do meu lado, e olhei para Black.
— Você sabe que não sou estuprador como vocês — sibilei. — E você
disse que os caras eram gente ruim, da pior espécie, e não trabalhadores, que
se esforçam dia e noite para ganhar o próprio sustento. Pelo amor de Deus!
Eles são inocentes e não têm nada a ver com vocês aqui.
— Eles não são inocentes, Scott, e o primo da mulher dele me deve uma
nota preta. Se você não me pagar, sua família paga o preço! Devia pensar
nisso antes de fazer besteira, porque você tem uma irmã linda de quem
poderíamos usufruir muito aqui, não é, rapazes? — Ele olhou para seus
fodidos e asquerosos homens, que sorriram como os demônios que eram.
Controlei-me; não cairia em sua provocação. Sam estava escondida dos
radares de todos. Ela estava na faculdade, mas eu havia trocado seus dados.
Mesmo um hacker mais brilhante que eu não conseguiria descobrir seu
paradeiro, muito menos aqueles monstros.
— Vocês nunca vão tocá-la! E, se você quiser acabar com alguém,
então vá atrás desse cara que deve a você, e não da sua família inocente, que
nem sabe o que está acontecendo — grunhi com os punhos cerrados. Eu
avisei aos integrantes daquela família que sumissem por um tempo, senão
seriam mortos.
Senti uma pancada em minhas pernas que me fez curvar para frente.
Controlei a raiva e a dor e não gemi. Não daria aquele gosto a eles.
— Respeite o chefe, seu merda! — esbravejou o cara da cicatriz, cujo
nome eu nem sequer queria saber.
Black riu amargo.
— Alguns meses atrás, quando o peguei para fazer essas tarefas, eu não
sabia que ia ser um bunda mole — disse de modo frio. — Achava você
petulante e cheio de marra, mas agora? Vejo que me enganei, pois não passa
de um coitado todo sentimental.
Respirei fundo, mas me controlei.
— Pode me chamar do que quiser, mas não vou tirar a vida de pessoas
inocentes, ainda mais crianças e mulheres. — Encarei seus olhos mortais.
Naquele instante, não tive medo daquilo, nem das armas apontadas para
mim. — Sem chance no inferno!
Ele levantou as sobrancelhas.
— Não? Vamos ver isso.
Preparei-me para fosse lá o que ele iria fazer comigo. Eu não o temia,
tinha vindo armado para caso nossa conversa saísse do controle.
Entretanto, o que ele disse a seguir fez gelar até a minha alma. Meu
coração se encheu de pavor como nunca, nem quando estive perto da morte
algumas vezes, como quando Nikolai me levou consigo.
— Peguem essa garota — falou, olhando para a menina ao meu lado.
Ela estava muito perto de mim, como se eu fosse seu bote salva-vidas.
Não sabia por que ela não havia ido embora. Seus olhos pousaram em mim
como se suplicassem que eu a protegesse de qualquer coisa. Maldição! No
final, morreríamos nós dois.
Ela gritou assim que o cara da cicatriz a pegou pelos braços e a jogou
no chão, pondo-se sobre ela como se fosse possuí-la ali mesmo, e eu não
duvidava nada disso, já que ele era um demônio estuprador fodido.
— Revezem essa puta. Vamos ver o quanto uma virgem aguenta. Quem
quer ser o voluntário? Eu queria me candidatar a romper esse hímen, mas
negócios primeiro, depois o prazer. Se ela resistir a vinte homens, eu ficarei
por último. — Ele me encarou, desafiando-me a interferir em seus planos
doentios.
Trinquei os dentes, ainda de joelhos, tentando controlar meu ódio por
aqueles estupradores desgraçados. Naquele momento, meus sentimentos em
relação à morte de pessoas cruéis assim mudaram. Se fosse por mim, mataria
cada um deles sem perder uma noite de sono por isso. Aliás, provavelmente
seria capaz de dormir cantando só por acabar com a vida daqueles vermes
imundos. O primeiro seria Dylan, meu próprio pai, por ter tentado mexer
com a própria filha. Uma pessoa assim era humana? Não tinha como ser. Eu
só não o matara porque fiz uma promessa a Sam. Porém, vendo o que ocorria
à minha frente, não podia simplesmente ir embora como se nada tivesse
acontecido, como se eu não tivesse visto uma barbaridade assim. Eu não era
esse tipo de homem. A garota era quase uma criança, e o pior, virgem, no
meio daquele bando de abutres.
Maldição! O que eu faço? Se eu me meter, nós dois vamos acabar
mortos, mas, se não fizer nada, esses caras vão matar essa menina. Não
posso deixar isso acontecer.
Mesmo se eu não saísse dali com vida, resolvi ajudá-la. Não me
importava comigo, mas com ela, com Sam e vovó, que ficariam
desprotegidas caso eles soubessem onde elas estavam. Eu protegera Sam a
tornando impossível de ser rastreada, mas aqueles bandidos certamente
sabiam que minha avó Julia tinha uma fazenda em Nova Jersey. O primeiro
lugar onde eles iriam buscar informações ou fazer coisa pior seria lá. Eu não
podia deixar isso acontecer. Precisava ficar vivo para protegê-las.
O cara desdenhoso da cicatriz estava prestes a tirar seu pau de merda
de dentro das calças para estuprar a garota, mas eu não deixaria isso
acontecer. Oh, porra, não mesmo. Não sou desumano a esse ponto, não sou
capaz de ver uma crueldade dessa e não fazer nada.
Levantei-me com os meus punhos cerrados e nocauteei dois que a
rondavam e o desgraçado que estava em cima dela. Um deles estava a ponto
de chutá-la, mas o joguei longe e dei uma voadora em um, derrubando o da
cicatriz em cima de uma mesa, que se espatifou. Desejava que cacos de
vidro tivessem se enfiado na bunda daquele fodido.
Depois tudo pareceu acontecer ao mesmo tempo. Os caras me cercaram
enquanto eu levantava a menina, que estava chorando e ficou colada em mim,
olhando os caras à nossa volta.
Vários policiais de merda estavam lá, calados todo o tempo, sem fazer
nada ou tentar proteger a menina. Os desgraçados pareciam animados com o
que fariam com ela. Eu só não os derrubei porque estava longe deles e
cercado de vários MCs. Além disso, proteger a garota era o mais importante
naquele momento.
Coloquei-a atrás de mim e olhei para todos à minha frente, cujas armas
estavam apontadas em nossa direção. Estavam doidos para puxar o gatilho e
olharam para Black em busca de confirmação.
A menina se grudava ainda mais às minhas costas e gemia baixinho.
Sorri para eles. Todos me olharam como se eu fosse louco. Não sabiam
de meu “plano B”. O cara da cicatriz estava se levantando meio tonto e cheio
de sangue e pegou um taco de bilhar da mesa que tinha ali. Depois fitei
Black, que parecia furioso. Contudo, não dei a mínima; deixaria para me
preocupar com isso depois. Queria apenas sair com vida dali e levar aquela
garota para os seus pais.
— Nos deixe sair daqui sem lutar, Black. Vai ser melhor assim. —
Queria sair dali sem mortes, tanto da minha parte como da dele, mas, se ele
escolhesse errado, eu teria que fazer o que tinha planejado, e isso não seria
nada bom.
Ele riu. Aliás, todos ali riram, zombando de meu pedido.
— Acha que vou deixá-lo livre depois que você não cumpriu o que
deveria e ainda por cima bateu em meus homens por essa puta desgraçada?
— rosnou Black, estendendo a mão para o maldito da cicatriz, pedindo o
taco.
Eu podia imaginar o que ele estava pensando. Não queria me matar com
uma bala, afinal, assim eu não sofreria. Ele queria me espancar e fazer coisa
pior, ensinar-me uma lição por eu não lhe ter obedecido. Eu sabia disso
porque já o tinha visto fazendo algo assim com um cara que não fez o que ele
mandou.
A ira me dominou ainda mais do que antes quando ele xingou a garota,
pois foi ele que a trouxe para aquele lugar.
— Feche os olhos e segure em mim — pedi à menina, mas nem
precisava, porque ela já se agarrava ao meu corpo igual macaco a uma
árvore.
— Oh, Senhor, eu nem tive a chance de conhecer meu filho ainda —
sussurrou.
Isso me pegou de surpresa, porque Black disse que ela era virgem.
— Você não é virgem? — perguntei, não que isso tivesse feito alguma
diferença na hora de escolher protegê-la. Eu a teria ajudado não importava o
tipo de mulher que ela fosse.
— Não. Estou grávida de dois meses — murmurou para os caras não a
ouvirem. — Uma menina aqui disse que, se eu dissesse que era virgem,
demoraria mais tempo para eles me tocarem...
Praguejei baixinho. Como isso só acontece comigo?, pensei.
Foquei em dois caras ao lado de Black, peguei minhas adagas atrás de
mim e as lancei no peito deles ao mesmo tempo. Eles caíram no chão,
provavelmente mortos. Então apertei o detonador que estava em meu bolso.
E tudo explodiu lá fora, afinal, eu não queria matar as mulheres que estavam
ali dentro, que eram, em sua maior parte, inocentes. A distração ajudaria em
nossa fuga, ainda mais pelo fato de as motos dos MCs estarem destruídas
naquele instante, pois parte dos explosivos estava nelas.
A explosão foi tão grande que as paredes e o chão tremeram. Black
latiu ordens para ver o que estava acontecendo. Eu apostava que ele estava
pensando que era a invasão de alguma gangue qualquer das redondezas,
afinal, o cara era cheio de inimigos.
Os asseclas de Black que estavam no salão correram para fora. Peguei
a mão da garota, e disparamos para os fundos. Atravessamos alguns
corredores e cômodos, e tive que derrubar alguns caras no processo.
Quando eu montara as bombas do lado de fora do clube, pensava que
fugiria sozinho dali, não com uma garota, ainda por cima grávida. Meu
Deus! Em que mundo estamos? Ela é quase uma criança! Esses jovens não
conhecem a maldita camisinha?
Não podia me acontecer mais nada, porque eu tinha acabado de cutucar
o demônio, e, quando ele viesse atrás de mim, não estaria sozinho, mas com
centenas de seguidores. Porque, quando Black tinha uma coisa, ele ia até o
fim do mundo para buscar, e a garota, em sua mente de merda, pertencia a
ele.
Senti algo molhado em minha roupa preta enquanto corríamos pela mata
nos fundos do clube. Havia deixado meu carro não muito longe dali. Ignorei
a ferida e corri com a menina pelas árvores e moitas.
Capítulo 12

BRYAN
Presente

Depois que saí de casa após dizer palavras cruéis a Alexia, passei a
noite no loft que eu tinha no Centro da cidade. No dia seguinte fui visitar
Samantha no intuito de me acalmar e aliviar a dor que estava apertando meu
peito, sufocando-me de dentro para fora, desde que as portas das lembranças
foram abertas.
Havia algum tempo, Sam tinha a capacidade de tirar um pouco da
escuridão que havia em mim. Atualmente havia Alexia, a mulher de boca
quente que me enlouquecia, fascinava-me. Toda a escuridão, quando eu
estava perto dela, desaparecia, como se ela fosse o sol, o meu sol, a minha
luz.
Entretanto, após ela querer saber o que houve comigo no passado e a
menção dos nomes que estavam tatuados em meu peito, praticamente surtei.
Antes de voltar para casa, acabei na cobertura de Sam e Lucky, seu
marido.
Quando Sam começou a namorar Lucky, eu não queria, afinal, ele quase
praticamente obrigou minha irmã a ficar com ele, tanto que ela se demitiu da
empresa dele, onde trabalhava, a Vênus. Contudo, ele a salvou de ser morta
pelo pai de Shaw, o garotinho que ela adotou com Lucky. Isso me fez dar o
braço a torcer e aceitar o relacionamento deles.
Ao olhar para a morena de olhos azuis como os meus e ver sua
felicidade, eu me enchia de júbilo. Eu a via pouco, porque gravidez era algo
em que eu não queria pensar. Gravidez e crianças me traziam vários
pesadelos. Sam estava grávida, teria sua filha em março. Eu sorria e
brincava com isso, chamando a bebê de “sobrinha”, mas meu peito se
apertava com a dor que quase me sufocava, impedindo o ar de ir para os
meus pulmões.
Ela não sabia o que acontecera comigo, nem o que eu tinha feito pela
segurança dela, de minha avó e de... parei nesse pensamento, porque era um
terreno perigoso, que me enchia de fúria e dor ao mesmo tempo, raiva por eu
não ter conseguido fazer nada para salvá-las...
— Oi, sumido — falou Sam, abraçando-me assim que entrei em sua
casa, forrada de imensas janelas e móveis elegantes.
Lucky estava sentado no sofá, assim como todos. Eu não sabia que era
uma reunião familiar. Se soubesse, nem teria vindo. Rayla, irmã dos
Donovans, estava perto de Alex, irmão de Alexia. Angelina também estava
ali com Ryan, seu namorado, bem como Jordan. Todos estavam no sofá em
forma de L, conversando entre si. Eu queria dar meia volta e ir embora, mas
Sam agarrava meu braço apertado, o que me impedia de fazer tal coisa.
Fazia dias que eu não ia à Vênus, que gerenciava com ela, embora eu
fizesse bem meu serviço de longe, tanto que a empresa estava lucrando.
Samantha não ligava para dinheiro, mas eu ficava feliz por ela ter
conseguido tudo que um dia sonhou e não pôde alcançar devido aos nossos
pais.
Algum tempo antes, Ryan me dera umas fotos de um cara chamado
Franklin Salazar com menores de idade. Estávamos trabalhando para
prendê-lo. Aquele fodido usava a editora Luxem, que era de Ryan e de
Daniel, para contrabandear menores. Ele usava os livros para isso; fazia
pedidos grandes de mercadoria, mas levava meninas no lugar. Só em pensar
nisso me fazia querer matá-lo em vez de prendê-lo. Era uma pena que, desde
2007, em Nova Iorque não tinha mais corredor da morte, porque era isso que
ele merecia.
Ryan comprara a editora havia algum tempo para Angelina trabalhar,
um gesto nobre de sua parte. Nobreza, pelo visto, era algo de família, porque
Lucky deu a Vênus, que valia bilhões, a Sam. Outro Donovan não podia ser
diferente.
Jason, um amigo, também estava ali, meio distante das pessoas e
cabisbaixo. Eu queria dizer a ele que estava trabalhando disfarçado com
Tabitta Rodrigues no caso de Franklin Salazar e seu chefe, Sebastian Ruiz.
Eu apostava que Jason e Tabitta tiveram um lance e se amavam, ainda mais
depois de ter visto a foto de Jason no computador dela. Entretanto, não podia
revelar aquilo a ninguém, já que era meu disfarce. Eu e Tabitta juramos ficar
em silêncio sobre aquilo. Era um dos problemas que eu tinha. Quase ri ao
pensar no termo “problema”, porque eu estava lotado deles. Meus demônios
me consumiam, a mulher que eu amava estava sendo perseguida por um
lunático que deveria estar morto, e eu tinha de esconder dela onde, de fato,
eu trabalhava. Alexia pensava que eu era um simples policial, quando eu era
um agente da CIA. Não eram muitas as pessoas que sabiam disso.
Eu era um hacker excepcional, por isso, assim que iniciei meu trabalho
na polícia de Nova Iorque, quase um ano atrás, fui sondado e recrutado pela
CIA e me tornei um agente. Estava havia alguns meses em uma missão na
qual trabalhava disfarçado junto a outros agentes da lei, como Brenda, contra
uma rede de pedofilia que tinha ramos em cerca de oito países.
Dennis e eu fomos à sede do FBI recrutar Tabitta para a tarefa de pegar
o chefe mafioso mexicano Sebastian Ruiz, que era um grande chefe do crime
organizado junto a Franklin Salazar. Sebastian era pai de Tabitta, que o
odiava, pois ele matara sua avó. Ela era a única que podia nos ajudar a ter
sucesso na empreitada, porque policiais de vários departamentos de muitos
estados e o FBI tentaram prendê-los, mas não conseguiram. Quando
chegavam perto deles, outras pessoas assumiam a culpa e iam para a cadeia
no lugar daqueles salafrários desgraçados.
Tabitta era uma agente dedicada, amava seu trabalho, assim como eu.
Por isso eu aceitei trabalhar para a CIA tão jovem, para fazer a diferença.
Sabia que havia muitos policiais corruptos, como eu mesmo já vira. Ela
trabalhava duro para colocar o pai na cadeia, assim como eu mesmo tinha
feito com o meu.
Nós dois ultimamente estávamos trabalhando em um clube de BDSM
chamado Fetish, em Manhattan, como um casal, mas não fazíamos nada, pois
era apenas um disfarce. Além disso, apenas uma mulher me importava dessa
forma, como apenas um homem importava para ela.
— Bryan? — chamou Sam, trazendo-me para o momento, ali em sua
casa.
— Apenas trabalhando muito — respondi, beijando sua testa.
Tudo naquela sala gritava elegância e grã-finesse. Eu também tinha
bastante dinheiro, ganhei muito trabalhando para Black, embora não pudesse
dizer que aquilo foi um trabalho de verdade. Eu não mexi naquela grana até
Sam começar a correr perigo. Por isso construí minha casa e a equipei com
todo tipo de segurança, para o caso de ela precisar de novo. Graças a Deus
não precisou. Pelo menos aquela casa, erguida com dinheiro sujo, estava
servindo para manter a Luz do Sol segura. Eu esperava em breve pegar
aquele estuprador que estava atrás dela. Tinha dó de sua pele quando eu
colocasse minhas mãos nele e fizesse tudo que desejava.
— Você trabalha demais, meu irmão, fazendo dois serviços, para a
Vênus e a polícia — disse ela, aproximando-se do marido.
Não disse nada. Queria lhe dizer o que eu realmente era, que não era
um simples policial, mas um agente da CIA, que trabalhava infiltrado em
muitos casos, mas não podia, nem para Alexia, embora eu visse a
curiosidade em seus olhos. Eu me sentia mal por isso, por esconder a
verdade das duas, principalmente de Alexia, mas não podia dizer nada.
Lucky ajudou Sam a se sentar. Olhava para ela com adoração, como se
ela fosse uma rainha.
— Que bom, Bryan, que você chegou. Eu estava pensando em você —
disse Angelina sorrindo animada com alguma coisa. Só podia ser a maldita
aposta, na qual eu não queria pensar, afinal, estava com Alexia porque
queria, não por causa de um desafio. Um mês antes, no Belas Country,
havíamos feito uma aposta sobre quem seria domado primeiro. Ela iria
conseguir mulheres para mim, Jason, Jordan e Daniel. Começou com Jason e
Tabitta, que ainda estavam se acertando, mas eu acreditava que logo
chegariam lá. Apostava que eu e Alexia seríamos o próximo casal a se
formar e que era disso que Angelina estava falando.
Levantei as sobrancelhas e sorri, embora forçado, tanto que eu apostava
que o sorriso saía meio desfigurado. Enquanto isso, Ryan grunhia olhando
para sua namorada.
— Anjo, que porra é essa? — Seu tom soou mortal na imensa sala.
Ela riu e sussurrou algo em seu ouvido que o deixou calmo, porque sua
expressão sombria foi embora. Só Ryan para pensar que uma mulher
daquelas iria olhar para mim ou para alguma outra pessoa. Angelina o
adorava, eu podia ver em seu olhar o seu amor por Ryan, porque era o
mesmo olhar que eu notava nos olhos de Alexia quando direcionados a mim.
O amor é um troço perigoso e complicado, mas é bom, porque traz
paz e alegria... pensei. Bem, isso quando estamos perto de quem amamos,
mas, como sou um idiota, fico magoando Alexia para fazê-la se afastar de
mim no intuito de protegê-la. Isso acaba me quebrando, porque, se causo
dor a ela, mesmo que seja para o seu bem, fico arrasado.
Sentei-me perto de Jordan e olhei para Angelina.
— Sério? O que estava pensando? — provoquei, falando algo que
jamais aconteceria, mas não consegui parar, apenas saiu: — Está querendo
uma dose de um cara quente?
— Ryan, não! — Angelina tentou detê-lo antes que um soco fosse
desferido na minha boca.
Eu não sabia no que eu estava pensando para arrumar confusão. Estaria
tão fodido que caçaria briga com qualquer um, até um amigo? Lembrei-me
de uma época sombria da minha vida, em minha adolescência, em que
brigava muito, por isso eu tinha várias cicatrizes. Participava de lutas livres
e ilegais no intuito de aliviar minha dor interna, mas ela nunca ia embora,
assim como jamais iria.
Senti o sangue escorrendo pelo soco bem dado e merecido por eu não
respeitar uma mulher comprometida, embora eu não tivesse pensado muito
no que ia falar. Eu podia ver Ryan falando alguma coisa para mim, ouvia
uma cacofonia de outras vozes, mas elas pareciam tão distantes... ou talvez
fosse eu que estivesse longe.
Fechei os olhos, esperando mais de seus socos. Precisava sentir mais
dor. Eu não tinha feito Alexia sofrer? Então precisava de sofrimento também.
Aquilo era pouco comparado ao que eu fiz a ela.
A surra que eu tanto esperava não veio, então abri as pálpebras e fitei
os olhos cor de uísque, que me perscrutavam, estreitos.
— Você quer isso, não é? Por esse motivo disse aquilo, para eu bater
em você. — Não era uma pergunta, mas uma declaração. — Maldição!
Ryan devia ter visto em meus olhos a dor que estava ali, consumindo-
me como uma erva daninha, embora ninguém soubesse os motivos.
— Bryan... — A dor na voz de Sam era evidente. Outra mulher que
sofria por mim.
Respirei fundo, tentando controlar-me, porque Samantha estava
chorando. Eu preferia sofrer sozinho, não suportava ver as mulheres que eu
amava sofrendo. Eu era a porra de um fodido que deveria consertar suas
merdas, não ficar por aí caçando confusão.
Angelina se aproximou de Ryan e o tirou de perto de mim. Ele se
afastou sem reclamar ou dizer alguma coisa. Era como se entendesse o que
eu sentia, por isso não me atacou mais.
Todos estavam calados. O silêncio era cortante.
Levantei-me sem dizer nada e saí, ou melhor, tentei, pois Sam pegou
meu braço.
— Bryan, o que está havendo com você? — sussurrou com voz
dolorida. — Você tem andado sumido e agora aparece aqui assim, estranho e
caçando briga. O que houve?
— Eu sinto muito por tudo, mas preciso sair. — Tentei sair de novo,
mas ela novamente me impediu.
— Não, você não precisa. O que precisa é dizer o que está havendo
com você. Olha para você, parece tão atormentado... — Ela me olhava quase
suplicante. — Por favor, Bryan, você precisa me dizer...
Cortei-a, peremptório:
— Não preciso nada, droga! — Joguei as mãos para cima num gesto
exasperado. — Será que todos querem saber o que está havendo comigo?!
Maldição, eu só quero que não façam tantas perguntas!
— Fale baixo com ela, cara, ou eu juro que vou acabar com você, não
me importa se é seu irmão — rosnou Lucky com os punhos cerrados.
Gostei de ele tomar as dores de Sam e a proteger de mim, um maldito
bastardo imundo. Eu queria bater em mim mesmo por ter gritado com ela,
algo que nunca havia acontecido, bem como por ter sido tão grosso com
Alexia, que devia estar sozinha e sofrendo em minha casa, não atendendo a
nenhum telefonema, enquanto eu estava ali, arranjando confusão.
Porra! O que há de errado comigo? Por que estou aqui ainda?
Preciso ir para casa e dizer a Alexia que só ela me importa, que nunca foi
foda entre nós, e sim amor. Todo sexo com ela é feito com amor.
Ignorei todos ali e mirei os olhos molhados da minha irmã.
— Eu sinto muito, Sam, por ter gritado com você. Minha cabeça não
está muito boa hoje, embora isso não seja desculpa para o que fiz. — Cocei
a testa, tentando aliviar a minha dor de cabeça. Tudo em mim doía como uma
cadela.
— Está tudo bem, meu irmão, mas, seja o que for, quando estiver
pronto, estarei aqui para você. — Ela me abraçou forte. — Eu amo você,
nunca se esqueça disso.
Respirei fundo, fechando os olhos por um momento. Ela me amava,
assim como Alexia. Uma era minha irmã querida, enquanto a outra era a
minha razão de viver.
— Eu também te amo, Sam, e lamento ter perdido a cabeça com você e
ter provocado vocês dois. — Afastei-me dela e olhei para Angelina, que
parecia triste, e para Ryan, ao seu lado, cuja expressão estava séria.
— Tudo bem, às vezes todos nós explodimos de vez em quando —
falou Angelina sorrindo de leve. — Está perdoado. Além disso, eu sabia que
você estava brincando, afinal, não sou uma loura linda com pernas longas
que conheço. — Piscou para mim como se estivesse cheia de segredos.
Se eu não estivesse todo fodido, teria revirado os olhos, porque sabia
que ela estava falando de Alexia, a minha Luz do Sol.
— Alexia querida, respire e fale devagar, o.k.? — Alex falou.
Arregalei os olhos ante esse nome e olhei para ele, que estava ao
telefone com sua irmã. Voei em sua mão, tomei-lhe o celular e o comprimi
em minha orelha. Talvez tivesse acontecido algo com ela, além de eu ter sido
um idiota.
— Alexia! — chamei, depois ouvi seu suspiro, e a linha ficou muda.
Liguei de novo, ignorando o olhar furioso de Alex. Maldição, ela não
atende!
— Que droga está fazendo?! — esbravejou ele, pondo-se de pé na
minha frente.
— O que ela disse a você? — perguntei-lhe, ignorando sua pergunta,
porque estava parecendo um louco varrido, mas não me importei, apenas
precisava saber se tinha acontecido algo com minha garota.
— Eu não vou dizer nada, porra! — rosnou, cerrando os punhos. —
Você está desequilibrado, precisa ser internado em um hospital psiquiátrico!
Dei um passo até ele, louco para quebrar sua cara, mas pensei em
Alexia. Ela não iria gostar disso, com certeza brigaria comigo para proteger
seu irmão. Quando uma pessoa me colocaria em primeiro lugar em sua vida?
No entanto, como Alexia me colocaria, se eu não deixava, se a afastava?
Sam tinha Lucky; vovó, sua fazenda e os animais. A única pessoa que eu
tinha era Alexia, mas, como um idiota, a estava afastando da minha vida.
Uma vida que, sem ela, era só trevas.
Esperava que ela estivesse bem, porque, se algo lhe acontecesse, eu
não sabia o que faria. Talvez derrubasse aquela cidade inteira e matasse
quem entrasse em meu caminho. Ela está bem. Se tivesse acontecido algo,
Calebe teria me ligado para avisar, pensei, desejando intensamente que
aquilo fosse verdade.
Alexia com certeza ligara para o irmão para pedir ajuda. Talvez
quisesse sair da minha casa. Se fosse isso, eu não poderia deixar que
acontecesse. Minha propriedade era o único lugar em que ela ficaria segura,
longe das garras de Steve Lutner. Havia várias pessoas atrás daquele cara,
mas ninguém o havia localizado ainda. Eu joguei arquivos e fotos nas mãos
de Johnny, o melhor amigo de Angelina. O cara era bom em computadores, e,
como eu não podia ficar o tempo todo trabalhando naquilo, pedi ajuda a ele,
bem como a Joshua, que também era fera nisso. Acreditava que em breve
eles me dariam boas notícias, então eu poderia respirar melhor, sabendo que
Lutner estaria a um passo de ser capturado.
— Bryan, o que está acontecendo aqui? O que você quer com Alexia?
Aconteceu algo com ela? — A voz de Sam soou alarmada.
Não respondi, apenas liguei para Calebe para aquietar meu coração, ou
ficaria mais louco do que já estava.
— Ora, se não é...
Cortei-o, porque não estava com bom humor para ouvir suas gracinhas.
— Alexia está aí? Porque ela acabou de ligar para Alex, seu irmão. —
Peguei meu celular e avistei as câmeras do quarto, sala, cozinha, e nada de
vê-la.
— Claro que ela está. Estou no portão da frente, e, por aqui, ela não
saiu — assegurou ele.
Suspirei frustrado.
— Dê uma olhada na sala dos computadores e nos banheiros, porque
são os únicos lugares que não têm câmeras. Ela não está nos outros cômodos,
estou olhando para eles — falei enquanto me encaminhava para a porta, mas
Alex pegou meu braço.
Até pensei que era por causa de seu telefone, ao qual eu ainda estava
falando com Calebe. Todavia, ao ver sua expressão sombria, percebi que era
por Alexia. Enquanto eu estava falando com Calebe, acabei me esquecendo
de que estava cercado de pessoas, que me observavam de olhos arregalados.
— O que você quer com minha irmã? E o que significa “ela não está
nos outros cômodos”? Está mantendo minha irmã presa? — Chegou mais
perto de mim, olhando-me com ferocidade. Parecia capaz de me matar.
Fuzilei-o com os olhos.
— Vai responder o que ela falou a você? — devolvi a pergunta.
Ele suspirou.
— Ela está na escola e me disse que teve um problema, por isso estava
chorando. Isso é verdade, ou vocês têm algum lance e você a fez chorar?
— Que tipo de problemas? Ela disse a você? — sondou Rayla em tom
preocupado.
— Ela não me disse, já que alguém fez o favor de pegar meu telefone...
— rosnou Alex, tomando o aparelho da minha mão e mandando uma
mensagem, certamente para a irmã. Depois me olhou com os olhos estreitos.
— É por sua causa que ela estava chorando? Porque, se a fez chorar, eu vou
acabar com você.
Não respondi, porque uma sensação gelada desceu pelo meu corpo,
fazendo-me encolher. Alexia não estava mais segura, ainda mais estando em
um lugar sem vigilância alguma.
Liguei para Calebe de volta, de meu próprio celular.
— Ela não está aqui, deve ter saído pelos fundos — respondeu ele
assim que atendeu.
— Encontre-a — rosnei, embora ele não tivesse culpa. Alexia era uma
mulher engenhosa; quando queria algo, não descansava até conseguir. Ela
com certeza não queria que ninguém soubesse que tinha saído. Não sabia dos
riscos?
— Farei isso, mas, se ela saiu, com certeza Daemon está atrás dela.
Sabe que ele não a deixa fora da sua vista um segundo — ele disse com um
suspiro.
Tentei não pensar naquilo, porque sabia que Daemon tinha uma queda
por Alexia, mas, quando sua segurança estava em jogo, a proteção que ele
poderia lhe dar era mais importante do que meu ciúme.
Liguei para Daemon.
— Por favor, me diz que você está com ela à vista agora — falei assim
que ele atendeu.
— Sim, eu estava vigiando os fundos da casa, já que Calebe estava na
frente, quando ela pegou o carro dela, que Nasx trouxe, e saiu. Já faz
algumas horas que ela entrou na escola, mas uma ambulância chegou faz
pouco tempo.
Ofeguei de pavor, mas ele continuou:
— A ambulância não é para ela, mas para alguém que passou mal lá
dentro, acho que uma senhora. Os paramédicos a levaram para o hospital
mais próximo da escola.
— Fique de olho nela, não a perca de vista um segundo.
— Sim, irmão.
Alex tornou a segurar meu braço para evitar que eu saísse.
— Me solta — sibilei entredentes.
— Porra, isso não vai acontecer! Você não vai sair daqui sem dizer
nada! Quero saber por que você anda vigiando minha irmã e por que ainda
têm outros caras a seguindo! Quero saber de tudo agora!
— Você quer a verdade? Pergunte a ela, porque não vou dizer nada a
você nem a ninguém! — grunhi, puxando meu braço. — Se você não sair por
bem do meu caminho, eu juro que vai sair por mal.
Ficamos encarando-nos mortalmente. Eu sabia que ele merecia saber,
mas aquela história tinha que ser contada por Alexia.
Rayla foi até ele e pegou seu braço, obrigando-o a sair do meu
caminho.
— Alex, meu amor, deixe Bryan ir. Depois você fala com Alexia e
descobre o que está acontecendo, por favor — suplicou ela, com medo de
nós dois brigarmos.
Ele não queria, mas ela insistiu, então, sem olhar para mim, pegou seu
celular para ligar para a irmã.
Dei as costas a todos e fui embora quase correndo para o hospital a fim
de buscar minha mulher.
Capítulo 13

BRYAN
Acordei cedo e saí, deixando Alexia dormir, já que o dia anterior tinha
sido longo para ela. A perda de sua cozinheira pelas mãos de Lutner a
abalara. Na verdade, os últimos três dias haviam sido pesados para minha
garota, com a invasão a seu apartamento, o que aconteceu no hospital onde o
garoto amigo dela foi internado e o assassinato de Aria, bem como a maneira
como eu a tratei.
Eu, Shadow e os outros tínhamos que montar uma estratégia para pegar
Steve Lutner logo, porque ele sempre estava em sua cola quando ela saía, e
eu não podia deixá-la presa para sempre em minha casa. Alexia precisava
ter uma vida sem medo, seguir em frente... comigo ao seu lado. Queria que
ela andasse contente, livre, não com um alvo em sua testa.
Precisava falar com Alex também e resolver as coisas que tinham
ficado pendentes na casa de Sam, depois falar com Joshua e Johnny, que
eram ótimos hackers. Eles precisavam me dar uma maldita luz para encontrar
aquele psicopata desgraçado. Daemon também era bom nisso, mas eu
necessitava dele na proteção de Alexia.
Eu tinha de organizar tudo, já que, nos últimos meses, estava
trabalhando disfarçado e não podia estar 24 horas por dia com ela. Eu não
sabia qual era pior, Sebastian Ruiz ou Steve Lutner. Os dois deviam estar
queimando no inferno, e eu teria prazer em mandá-los para lá, pelo menos
Steve, depois que conseguíssemos descobrir seu paradeiro.
Também precisava manter meu disfarce para Alexia não descobrir onde
eu estava trabalhando, primeiro, porque ela não entenderia, segundo, porque
eu não queria caras como Salazar e outros fodidos que trabalhavam para ele
colocando os olhos nela. Já bastava Lutner, que era meu pesadelo vivo, um
do qual eu não estava conseguindo me livrar.
Emprestei meu apartamento para Nasx e Daemon enquanto eles
estivessem na cidade. Shadow os liberara por quanto tempo eu precisasse.
Eu agradecia ao meu amigo, ou melhor, irmão, porque, mesmo não tendo o
mesmo sangue, nós éramos irmãos, parceiros para tudo que viesse.
A porta vermelha se abriu assim que bati, mas não foi Alex que a abriu,
e sim Rayla, com seus cabelos platinados presos em um rabo de cavalo.
Parecia que ela ia sair, mas, pelo que eu sabia, ela gostava de estar arrumada
o tempo todo, não importava onde e com quem estivesse.
— Oh, Bryan! — Parecia surpresa e preocupada ao mesmo tempo,
talvez pelo que tinha acontecido na casa do Lucky. — Aconteceu algo com
Alexia?
Quase revirei os olhos ante isso. Como se eu estaria ali caso tivesse
acontecido algo com minha Luz do Sol... Nós estávamos bem, ela me
prometeu que não desistiria de mim, que, não importava o que acontecesse,
estaria ao meu lado. Eu não podia ficar mais feliz do que quando ouvi suas
palavras, embora temesse lhe contar tudo que já havia feito, as coisas feias e
cruéis, como matar pessoas.
— Não aconteceu nada com Alexia, ela está bem — tranquilizei-a. Ela
estava parada à porta, ainda segurando a maçaneta, impedindo-me de entrar.
— Alex está? Posso entrar para falar com ele?
Ela piscou, parecendo só então perceber que eu estava à porta e ela não
me convidou a entrar.
— Oh, desculpe! Claro, entre. — Deu-me espaço para passar.
A sala da casa de Alex era grande, com sofá em forma de L num canto e
uma TV enorme. Não reparei em mais nada, porque naquele momento ele
entrou no cômodo. O que tínhamos para conversar não era fácil, mas
ajudaria a nossa relação, afinal, eu não queria brigar com a família de
Alexia.
— Rayla, quem era na porta... — Ele parou assim que me viu e franziu
a testa. — O que faz aqui?
Suspirei. Não merecia nada menos que isso, por isso não reclamei de
seu tom seco. Olhei para Rayla, que tinha ido para perto dele.
— Pode me deixar sozinho com Alex, Rayla? — pedi a ela num tom
calmo, assim não a assustaria mais. Já bastava o receio que estava vendo em
seus olhos.
— Eu não acho bom... — Ela olhava entre nós dois, preocupada com
seu namorado, com certeza com medo de que brigássemos.
— Eu não tenho segredos com ela, então, seja qual for o motivo para
você estar na minha casa a essa hora da manhã, pode dizer na frente dela. De
qualquer forma, contarei tudo a ela depois... — começou, mas eu o
interrompi:
— Jura? Então ela sabe o que houve há cinco anos com Alexia? Os
motivos de ela ter sido internada em um hospital psiquiátrico?
Ele ficou branco, parecia que o sangue tinha fugido de sua pele
bronzeada. Alex não se parecia em nada com Alexia. Ela era loura, enquanto
ele tinha cabelos escuros, era coberto de tatuagens e com brincos em sua
orelha.
— Alex...? — sussurrou ela. Pela forma como franzia o cenho, não
parecia saber de nada.
Ele piscou, saindo do estado catatônico em que se encontrava.
— Rayla, pode ir. Depois te conto tudo, o.k.? — falou com a voz aguda.
— Tudo bem. — Ela parecia mais preocupada que nós dois
brigássemos que pelo fato de ele não lhe ter dito a verdade sobre Alexia.
— Não vamos brigar, pode ir tranquila — informei. Eu não tinha ido
até ali para brigar, era justamente o contrário. Precisava fazer as pazes com
meu cunhado, já que não renunciaria a Alexia.
Assim que Rayla saiu da sala, Alex me fitou com cenho franzido.
— Como sabe sobre o passado de Alexia?! Anda investigando a vida
dela?! Por quê?! Não é suficiente persegui-la por aí?! — esbravejou, cheio
de ira.
Eu estava calmo, diferente do dia anterior, então relevei seus gritos e
acusações, até porque eu merecia, de certa forma, pela forma como o tratei.
Apesar da calma, estava com medo de que viesse a acontecer alguma coisa a
Alexia, ainda mais depois de ambos os episódios em hospitais, quando
aquele merda teve oportunidade de a levar consigo. Caso Daemon não a
tivesse seguido, eu nem podia imaginar o que teria acontecido. Tremia só em
pensar na possibilidade de que ela se machucasse. Mesmo a proteção de
Daemon e Nasx não foi suficiente para proteger Aria, a cozinheira de Alexia,
da morte. Lutner, além de matar a mulher com requintes de crueldade, ainda
escreveu um monte de coisas horrendas sobre ela com seu próprio sangue.
Aquelas palavras demonstravam que ele tinha bastante raiva da mulher; foi
isso o que deu a entender ao chamá-la de usurpadora, traidora, mentirosa,
imunda e desejar que a alma dela queimasse no inferno. Isso me fazia
perguntar como Lutner conhecia Aria e por que a odiava tanto. Os
xingamentos e o sangue esparramado pelo quarto do hospital demonstravam
isso. Eu esperava que Johnny descobrisse para mim o que havia por trás
daquele assassinato.
— Ela me contou sua história, não investiguei nada sobre sua vida...
Alex ofegou.
— Espere, o quê? Alexia te contou toda a verdade sobre o seu
passado? Mas como, se ela não conta isso a ninguém? — Estreitou os olhos.
— O que está acontecendo entre vocês? Perguntei a ela ontem, mas não quis
me dizer nada, e você também não me disse.
Suspirei, então lhe contei tudo que Alexia me disse acerca da sua vida,
os momentos ruins, a dor, a perda, sua alma quebrada aos pedaços por causa
de Steve Lutner, o cara que abusou dela e quase a matou e voltou para
terminar o serviço.
— O desgraçado do Samuel na verdade é Lutner? E está atrás dela? —
Seu tom parecia magoado. — Por que ela não me contou e veio até mim, que
sou seu irmão?
Respirei fundo. Entendia Alexia. Ela queria proteger o irmão, assim
como eu protegi a minha irmã de algumas coisas sombrias que já haviam
acontecido comigo. Nunca lhe havia dito nada, pois não sabia como ela iria
reagir. Talvez me aceitasse e me redimisse dos meus pecados, mesmo que eu
achasse que nunca seria absolvido.
— Porque esse cara toca nas pessoas próximas a ela, assim como fez
com Aria e Jack. — Passei a mãos nos cabelos, tentando relaxar.
— Meu Deus! Eles estão bem? Conseguiram sobreviver a esse cara?
Pelo que ele fez com Alexia, não parece ter uma gota de humanidade —
sondou preocupado. — Deus me perdoe por pensar dessa forma, mas
homens assim deveriam estar mortos e no inferno.
Espero mandá-lo para lá em breve, pensei. Entretanto, de certo modo,
aquilo me preocupava, porque eu acreditava que, se fizesse com aquele
maníaco o que tinha vontade de fazer, Alexia não me aceitaria, pois eu me
afundaria ainda mais no abismo escuro de minha alma. A luz de Alexia
amenizava a escuridão, mas não a eliminava totalmente, esse era o preço a
pagar por meus pecados. E eu temia que, se me afundasse ainda mais, nada
poderia me fazer retornar à luz.
— Jack está bem, foi operado e está sendo protegido por policiais,
mas, em relação a Aria, não conseguimos chegar a tempo. Ele a matou.
Disfarçou-se de médico e chegou perto dela sem que ninguém o visse. Ele
poderia ter levado Alexia, se Daemon não estivesse com ela.
— Então Alexia não me disse nada sobre isso para ele não chegar até
mim e Rayla?
— Sim. O foco dele são mulheres, então tome conta da sua e deixe que
eu protejo Alexia. Juro que não vou deixar nada acontecer a ela! — prometi
com fervor.
Esperava estar certo, porque, se eu não conseguisse protegê-la e ela se
machucasse... Não, eu não podia admitir a possibilidade. Tinha que pensar
que o prenderíamos ou o mataríamos.
— O que houve ontem? Vocês brigaram? Porque ela parecia com raiva
quando perguntei sobre você.
— Mais ou menos...
— Como assim “mais ou menos”? Você a deixou sozinha, por isso ela
saiu, não foi? — Seu tom agora era acusatório. — Porque ela me disse que
está ficando em sua casa, mas que não era para eu fazer perguntas, que,
quando pudesse, ia me contar tudo. Que droga isso significa?
— Eu preciso contar a ela algo sobre meu passado que nunca contei a
ninguém, mas não aceitei isso bem quando ela cobrou de mim. — Apenas
Shadow sabia sobre o que me aconteceu, de onde vinha a escuridão que eu
tinha. — Mas prometo que isso não vai mais se repetir.
Ele assentiu.
— Eu suspeitava que Alexia amava você desde a faculdade, ainda mais
depois de saber que ela queria colocar seu nome em sua pele. Seria sua
primeira tatuagem, mas não deixei, já que você nem sabia que ela existia.
Eu não sabia sobre a tatuagem. Esperava em breve poder colocar seu
nome em meu coração também, porque aquela mulher chegara ali para ficar.
— Eu sabia, mas estava fodido na época, não podia me envolver com
alguém assim, como estou pronto hoje. — Isso era verdade. Eu desistira de
Alexia uma vez no passado porque Emília e sua filha, Emma, precisavam de
mim. Depois, quando as duas se foram, uma parte de mim se fora junto a
elas.
— Você a ama? Faria qualquer coisa por ela? Como acabou de dizer
que a protegeria, me pergunto: até que ponto? — Ele me avaliava.
Eu não precisava pensar na resposta, já que sabia havia muito tempo.
Até gostava de sentir o que sentia por ela.
— Sim, eu a amo como nunca amei ninguém na minha vida e sou capaz
de qualquer coisa por ela.
Suspirei. Quando ela declarou que me amava, gelei por dentro, não por
não sentir o mesmo por ela, mas por Alexia ser a primeira mulher a dizer
aquilo para mim, além de Sam e vovó. Eu esperava me confessar para ela
naquela noite, no jantar ao qual iria levá-la. Calebe ficaria com Ariane, a
neta de Aria, para que eu e Alexia pudéssemos ter um encontro.
Quando Alexia disse que só ficaria em minha casa se Ariane também
ficasse, achei que a perderia para sempre, já que tinha certeza de que não
conseguiria ficar em um lugar com uma criança fazendo-me lembrar da
princesinha linda que era Emma. Pensar nela me fazia refletir no que eu tinha
sido capaz de fazer, na vida dela e de sua mãe, que eu havia destruído.
Acariciei os nomes sobre o meu peito para tentar aliviar a dor
insuportável que eu carregava havia quase um ano. O estranho era que eu não
tinha pensado nisso na noite anterior e mais cedo naquela manhã, quando vi
Ariane na cozinha tomando leite. Ela não chamou Alexia para preparar seu
café da manhã, ela mesma foi até a geladeira, pegou a bebida e a tomou. Eu
lhe perguntei se queria açúcar, mas ela disse que não podia tomar nada doce
porque tinha uma doença, então supus ser diabetes. Mais tarde, pesquisei
sobre ela e descobri que realmente tinha a doença. Gostei dela e me senti
aliviado, porque as dores dos traumas não me assombraram como sempre
faziam quando eu estava perto de uma criança.
O enterro de Aria seria naquela manhã. Tentei dar um jeito de Alexia
não ir, mas ela não aceitou. Como parecia gostar realmente da mulher, não
insisti. E, pelo que eu soube, Aria não tinha parentes vivos. Entretanto, o que
me angustiava era que eu teria de trabalhar naquele dia e não poderia
acompanhá-la. Por isso estava buscando um jeito de prolongar o funeral a
todo custo, para que nada desse errado em relação aos esquemas de
proteção.
Alex aceitou o meu namoro com sua irmã. Fiquei contente com isso,
embora eu não a deixaria mesmo se ele não concordasse, porque amava
Alexia.
Estava para sair da casa dele para ir falar com Shadow, mas, antes de
sair, deparei-me com um porta-retratos de uma menininha loirinha com
cabelos lisos e olhos violeta ao lado de uma mulher que eu achava ser a mãe
de Alex e Alexia. Tinham fotografias dos pais deles em toda parte na sala,
um homem moreno e uma mulher loura.
— O que foi? — questionou Alex seguindo meu olhar e riu
amorosamente. — Alexia. Ela tinha quatro anos quando papai tirou essa foto
dela.
A menina da foto era a fotocopia de Ariane, loura, pele branca, nariz
bem-feito. Peguei o porta-retratos e o trouxe para mais perto. Elas eram
quase idênticas, a única coisa diferente era a cor dos olhos, porque os de
Alexia eram violeta, já os de Ariane, azuis.
— Mas como isso é possível? — sussurrei comigo mesmo, ainda em
choque.
— O que não é possível, cara? Essa menina na foto é, sim, Alexia...
— Não é isso. A neta de Aria é a cara de Alexia nessa foto. —
Levantei o porta-retratos.
— Eu não era amigo dela, já que mal a conhecia, viajava muito
trabalhando como DJ, até construir a Rave, mas Aria era “amiga” dos meus
pais desde que construíram a escola. Bem, eu soube que, pouco antes de
papai e mamãe morrerem, eles não estavam se dando bem com ela. Acho que
a amizade deles foi abalada por alguma coisa. — Ele coçou o queixo,
pensativo. — Mas Alexia levava Ariane para casa consigo às vezes, em suas
férias. Foi assim que vi a garotinha e notei que ela era a cópia de Alexia, até
na inteligência, alta para sua idade. Fico triste por Aria ter partido, ainda
mais de um jeito tão cruel.
— Então Aria era próxima de vocês? — sondei, minha mente girando
com uma suspeita incabível, mas provável.
— Um pouco. Como eu disse, não tinha muito contato com ela. Mas
Alexia sempre foi próxima dela e da neta, mesmo quando a amizade entre
Aria e meus pais ficou abalada. Lex até levou a menina em uma viagem ao
Alasca quando ambas estavam de férias a fim de verem a Aurora Boreal. Eu
inclusive chamei sua atenção, porque ela estava se apegando demais a
Ariane, talvez pensando na sua bebê, que morreu. — Seu tom no final estava
triste.
— Por que seus pais não a deixaram ver a criança depois de morta?
Afinal, independentemente de como Alexia estava, merecia saber de tudo.
— Eu não estava no país nessa época, estava em Tóquio. Nem sabia
quando ela ir dar à luz. Quando soube, papai e mamãe disseram que a
criança tinha morrido e que os dois a enterraram para Alexia não sofrer
mais, mas isso era impossível, porque nunca vi minha irmã tão quebrada,
assim que voltei ao país com urgência poucos dias depois. — Ele
estremeceu, provavelmente recordando o sofrimento de Alexia. — Estava
mil vezes pior do que antes... depois do que aquele ser abominável fez com
ela.
— Seus pais não disseram onde enterraram o bebê. — Tudo o que eu
ouvia me fazia suspeitar ainda mais de que minhas suposições estavam
certas.
— Não. Até achei estranho na época, porque nenhum dos dois disse
nada, apenas que era melhor assim para Alexia não sofrer mais do que já
estava sofrendo e que, dessa forma, ela se curaria mais rápido. — Ele deu
um suspiro frustrado. — Não concordei com isso, uma, porque ela ficou
pior, não melhorou em nada, e outra, porque ela amava aquela criança em
sua barriga. Você devia ter visto o sorriso dela e o brilho em seus olhos.
Tentei achar o lugar em que a criança foi enterrada, certidão de óbito, mas
não consegui.
Como os pais de Alexia tinham feito aquilo com a própria filha? Eles
não perceberam que, ao fazer aquilo, fariam com que ela sofresse ainda
mais? Se ela tivesse a menina ao seu lado, talvez recebesse alta do hospital
psiquiátrico mais cedo. Eles tiraram dela a única coisa que a faria ter forças
para lutar contra os traumas. Lembrei-me de ela dizer que não se importava
com a forma como a criança tinha sido gerada, que a amava quando ainda
estava dentro dela. Esse amor seria ainda maior quando o bebê nascesse.
Eu queria entender o que levava os pais a fazerem tantas tolices
pensando que estavam protegendo os filhos, mas, na verdade, estavam
trazendo-lhes dor e sofrimento, como os pais de Alexia fizeram ao esconder
que a neta havia sobrevivido, dando a criança para outra pessoa cuidar. Isso
me fez perguntar: Lutner sabia disso? Foi por esse motivo que ele tinha
matado, xingado e amaldiçoado Aria?
— O que foi? — perguntou Alex, avaliando-me. — O que está
pensando? Você está com essa expressão sombria, como se quisesse matar
alguém.
Quero mesmo, mas eles já estão mortos, pensei amargamente.
— Se minhas suspeitas estiverem certas, isso vai acabar com Alexia —
falei e ergui o porta-retratos. — Posso ficar com essa foto dela?
— Claro, eu tenho outra no meu quarto. Mas de que suspeita está
falando? Até que ponto isso afetará Alexia? — Ele arregalou os olhos,
fitando a foto, depois a mim. — Não, eles não seriam loucos a esse ponto,
não é?
— Vou apurar tudo e descobrir a verdade. Assim que souber, conto a
você. Mas me diz uma coisa. Seus pais morreram em um acidente de avião,
não é? Descobriram os motivos da queda?
— Eles estavam indo para a Suíça para buscar Alexia, que ia receber
alta da clínica, quando o avião teve um problema e caiu, matando cem
pessoas... — Ele estremeceu. — Do que está suspeitando?
— Acredito que Lutner está por trás disso, assim como fez com Aria.
De um jeito distorcido e desumano, ele achou um jeito de se vingar das
pessoas que mentiram para Alexia. — Franzi a testa. — Sua mente é doentia,
acredito que ele queira Alexia só para si. É bem possível ser por isso que
ela seja a única de suas vítimas que ele não matou.
— Você está dizendo que esse cara pode ter assassinado meus pais?
Mas por que não fazer isso só com os dois e deixar as outras 98 pessoas
inocentes a salvo?
— Eu vou investigar direito, mas não duvido de nada vindo daquele
psicopata. Agora preciso ir embora. — Olhei para a porta por onde sua
namorada tinha sumido. — Fique perto de Rayla e a mantenha sob segurança
24 horas por dia. O forte dele são as mulheres. Inclusive vou falar com
Lucky para vigiar Sam. Acredito que Simon faz isso bem, mais dois
seguranças são melhores.

Cheguei em casa depois de organizar tudo com Daemon, falar com


Lucky e fechar as pontas soltas em relação à segurança de todos durante o
funeral de Aria. Eu não podia deixar passar nada, afinal, um erro seria fatal,
e vidas poderiam ser tiradas, então evitaria isso a todo custo para proteger
meus amigos e minha razão de viver.
Calebe e Ariane estavam sentados no sofá, mas não vi Alexia. A
menina me olhou e perdeu o sorriso radiante que tinha, resultado de algo que
Calebe lhe disse.
Ela era tão parecida com a Alexia da foto que eu não tinha dúvidas;
aquela menina era a bebê que Alexia pensava que tinha morrido, mas
acabava por voltar para ela quatro anos depois.
— Cadê Alexia? — perguntei, checando ao redor, procurando minha
mulher.
— A titia entrou naquela sala. — Ela acenou para minha sala de
computadores. — Ela disse para eu ficar com o tio Calebe.
Calebe riu e alisou seus cabelos.
— Tio, hein? Gostei disso, princesa — falou, piscando para ela.
Ela sorriu. Até sua risada parecia demais com a de Alexia.
— E quanto a ele, como devemos chamá-lo? — Calebe apontou o dedo
para mim.
Ariane seguiu seu gesto e franziu os lábios em forma de coração.
— Acho que de Lobo.
— Lobo? — Ergui as sobrancelhas.
— Você tem os olhos azuis iguais aos lobos que a professora Anna
mostrou pra gente. Seus olhos são bonitos, mas frios, sabe? Você nunca ri. —
Ela sorriu. — A tia Lex disse que você está ficando velho e ranzinza.
Ri alto com o que ela disse. Depois eu mostraria a Alexia quem era o
“velho”.
— Gostei do apelido — declarei. — Agora vou falar com Alexia.
Fui até a sala onde ela estava. Assim que entrei, vi algo que quebrou
meu coração. Alexia estava socando o saco de areia. Ela socava tão forte,
era como se estivesse batendo em alguém. Eu temia que ela se machucasse.
De repente, Alexia soltou um grito de furar os tímpanos, tomada de dor
e raiva. Depois caiu de joelhos no ringue com as mãos em punhos. Corri até
ela e, ao me aproximar, vi uma carta caída no chão.
Capítulo 14

ALEXIA
Depois de ter me entendido com Bryan na noite anterior, eu estava mais
calma ao acordar na manhã seguinte. Ainda estava triste pelo assassinato de
Aria, mas me sentia bem com Bryan e Ariane naquela casa segura.
Lembrei-me da carta que Aria deixara para mim. Ao abri-la e começar
a leitura, minha calmaria se dissipou como poeira no vento.

Querida menina Alexia.

Eu não tenho muito tempo de vida, então estou deixando esta carta
para você saber toda a verdade. Eu sei que, assim que a ler, jamais terei
seu perdão, mas tudo bem, o que importa é que você saiba de tudo.
Há quatro anos, minha filha, Amanda, sofreu um acidente de carro
junto ao seu esposo. Ela esperava um filho, mas nenhum deles resistiu ao
acidente. Foi bem na época em que você teve sua filha.
Seus pais, Igor e Isabel, me perguntaram se eu podia ficar com sua
bebê... Eles me disseram o que tinha acontecido com você, a crueldade que
lhe tinham feito. Então, pensando que você, ao ver a criança, não
conseguiria seguir em frente, eles resolveram se desfazer dela. Eu lhes
avisei que isso podia ser pior, mas não quiseram me ouvir.
Menina Alexia, você estava tão feliz pela gravidez, eu sentia isso
quando nos falávamos pelo telefone. Me parecia impossível que não
amasse a criança. Seus pais disseram que, se eu não ficasse com ela, iriam
entregá-la a um lar adotivo, então fiquei com ela. Sabia que, comigo, você
teria a chance de ter sua filha de volta no futuro.
Há seis meses descobri que tenho câncer. Eu poderia ter buscado a
cura, mas não o fiz, porque acredito que mereço isso, mereço ser castigada
por toda a dor que você sofreu, menina. Lamento muito por isso. Eu queria
poder voltar no tempo e fazer o certo, mas não podemos mudar o passado,
apenas tentar consertar os erros no presente.
Se estiver lendo esta carta, é porque fui embora para sempre. Não
preciso pedir para você proteger Ariane e amá-la, porque você já faz isso.
Espero que um dia me perdoe.

Lamento por tudo.


Aria.

Fiquei cega de dor, de raiva. Como meus próprios pais tiveram a


coragem de tirar a minha filha de mim? Eles não se importavam com meu
sofrimento? Senti um desejo imenso de me machucar fisicamente para que a
dor interna, mil vezes maior, fosse embora, mas me lembrei do saco de areia
que Bryan me falou para usar naqueles momentos e corri até o ringue na sala,
disparando socos e mais socos com toda a força que eu possuía. Quando
senti que não era suficiente, dei um grito forte e me deixei cair, chorando.
Braços fortes me ergueram e me envolveram.
— Deus, Alexia! Eles não podiam ter feito isso com você — Bryan
sussurrou, beijando meus cabelos.
Eu me agarrava forte a ele, chorando, sentindo seu cheiro, que sempre
me iluminava, para me controlar. Antes, pensar em Bryan me ajudava a me
livrar das lembranças que me atormentavam; naquele instante, sua presença
também ajudava a aliviar a dor de ser traída pelos meus próprios pais, a dor
que as suas mentiras haviam me causado por todos aqueles anos.
— Como eles puderam fazer isso comigo?! O tanto que eu sofri
pensando que ela estivesse morta... Oh, Deus! Enquanto ela estava lá o
tempo todo, tão perto de mim, e eu não sabia! Mas eles, sim! — Minha voz
falhava.
Ele respirou fundo.
— Não queria que soubesse assim...
Afastei-me dele depressa, pensando que ele também sabia e omitira a
verdade.
— Você também sabia e não me disse?! Mentiu para mim, Bryan?!
Ele arregalou os olhos.
— Claro que não, suspeitei agora há pouco, quando vi isso. — Ele me
entregou uma fotografia de quando eu era pequena.
Olhei o rosto da menina loura igual Ariane, a única diferença estava na
cor dos nossos olhos. Como eu não tinha suspeitado antes? Como não
percebera? Éramos idênticas!
— Você não tinha como saber disso, Alexia, eles foram errados ao
fazer isso com você, querida... te negar a acompanhar a vida de sua menina
— disse ele, respondendo à pergunta que eu não sabia que tinha feito em voz
alta.
— Não, não deviam ter mentido para mim, nenhum dos dois! — Olhei
para Bryan, que me fitava com olhos preocupados. — Onde conseguiu essa
foto?
— Na casa do Alex...
Cortei-o:
— Será que ele sabia...? — Encolhi-me por dentro. Se ele também
tiver me traído assim...
— Pelo que conversamos, ele não sabe de nada, nem suspeitou da
menina, mas eu, sim.
Um pensamento triste de repente passou por minha mente. Era hora de
seguirmos em frente, cada um para um lado. Bryan, sabendo que eu tinha uma
filha, não iria querer ficar comigo, por causa de sua aversão a crianças.
Ariane era tudo para mim. Eu sempre iria preferi-la a ele, mesmo antes de
descobrir que ela era minha filha.
Afastei-me de Bryan, fiquei de pé e limpei minhas lágrimas. Queria
muito que ele me aceitasse com Ariane, mais do que qualquer coisa no
mundo, mas sabia que era algo impossível.
— Alexia...? — Seu tom estava confuso por eu ter me afastado dele,
mas senti algo mais ali, como uma pontada de dor.
— Não vou desistir dela, Bryan, então, como você não pode aceitá-la,
acredito que tudo acabou entre nós, mesmo eu não querendo isso — falei
com a voz mais firme que pude, mas só eu sabia como estava por dentro.
Bryan me puxou para seus braços e me beijou, não, devorou a minha
boca, degustando e lambendo cada canto dela com uma fome incontrolável.
Eu estava prestes a seguir adiante e puxá-lo para o banheiro da sala a fim de
terminarmos o que começamos, mas primeiro precisava ouvir o que ele tinha
a dizer. Além disso, ouvi um pigarro e uma risada.
Afastei-me, toda vermelha, e olhei para a porta. Calebe se encontrava
ali, com um sorriso torto, e Ariane estava ao seu lado, mas ele tampava seus
olhos para ela não ver nada.
Meu coração bateu forte ao vê-la ali, diante de mim, tendo consciência
de que era minha filha. Eu nem acreditava que, depois de anos, a teria de
volta, quando nem sequer sabia que estava viva até aquele dia.
— Ela ouviu você gritando e não me deixou em paz até trazê-la —
disse Calebe ainda sorrindo.
Ele não viu nada, afinal, nem tínhamos começado, só nos beijamos
enquanto Bryan, com as mãos em minha bunda, apertava-me contra si. Meu
rosto esquentou ao sentir seu desejo ali, estampado em suas calças. Ele se
escondeu atrás de mim para Ariane não ver nada, já que Calebe tirou a mão
de seus olhos.
— Oi, querida. — Minha voz estava rouca, então pigarreei para me
recompor diante dela.
Ela estreitou os olhos ao olhar de mim para Bryan.
— Você fez ela chorar? — Cerrou os punhos pequenos.
Sorri.
— Não, querida, ele não fez, aliás, ele é o meu suporte. Se não fosse
por Bryan, não sei o que seria de mim... mas não liga, é problema de gente
grande, o.k.? — falei, indo até ela sem olhar para Bryan. Percebi que ele
prendeu a respiração ante o que eu disse, sobre ele ser meu suporte, mas era
verdade. Eu ainda estava sofrendo, mas, em seus braços, tudo melhorava. A
dor estava ali, mas suportável, como se ele fosse meu bálsamo.
— Se importa de me ajudar a preparar o almoço? — chamei-a, saindo
da sala onde estávamos. E olhei para Bryan, de pé atrás de mim. —
Conversaremos depois sobre aquele assunto.
Ele se aproximou e sussurrou em meu ouvido para ninguém mais ouvir:
— Não importa o que aconteça, eu quero você. Sempre irei querer
você. — E se afastou. Sorriu para Ariane, que nos olhava curiosa. — Vai
fazer algo para o Lobo comer, porque ele está faminto.
Ela sorriu brilhante.
— Lobo? — Ergui as sobrancelhas para os dois.
Bryan beijou meu rosto.
— Ela me apelidou assim, já que não sorrio muito e tenho olhos azuis
— respondeu, depois olhou para a menina. — Mas eu sorrio, viu? E vou
sorrir mais com você morando conosco.
— Eu vou morar com vocês agora?
Olhei dela para Bryan.
— Tem certeza de que pode lidar com isso? — sondei, ainda em
dúvida.
Ele ainda sorria.
— Por você, eu faço tudo. — Ele beijou a minha testa. — Agora posso
ter uma palavra com Calebe...? — Ele me olhou de lado. — Você sabe
cozinhar, Lex?
Revirei os olhos.
— Claro que sei, moro sozinha, se esqueceu? — Peguei a mãozinha de
Ariane, e fomos para a cozinha.
Eu queria saber sobre o que ele falaria com Calebe. Teriam descoberto
alguma coisa acerca de Steve...? Pensar nele gelou minha alma. E se ele
soubesse que tivéramos uma filha? E se ele quisesse vir atrás dela e de mim?
Bem, de mim, ele já estava. Quanto a Ariane, não podia saber dela nunca!
Ainda bem que estávamos seguras dentro daquela casa.
Enquanto cozinhava com minha filha ao meu lado, minha cabeça girava
com tantos pensamentos. Pensei que, naquele mesmo dia, aconteceria o
funeral de Aria. Eu não sabia o que sentiria ao ir ao seu velório, afinal, ela
mentiu para mim, assim como meus pais. Contudo, evitou que meus pais
colocassem Ariane em um orfanato, então isso a redimia. Eu não podia
guardar mágoa dela, afinal, morreu por minha causa.
Coloquei o espaguete na mesa grande, deixei Ariane comendo e fui ao
quarto de Bryan, que seria o meu também enquanto estivesse ali. Precisava
me arrumar para ir ao enterro, porque Aria não tinha nenhum parente.
Seríamos só eu, Alex e algumas pessoas da escola que amavam nossa
cozinheira e amiga.
Capítulo 15

ALEXIA
Meu telefone tocou enquanto eu tirava a roupa e ia tomar banho. Estava
suada devido aos socos no saco de areia. Inclusive meus braços doíam por
causa disso.
— Alô? — atendi sem olhar a tela e liguei o chuveiro após acionar o
viva voz e colocar o aparelho sobre a pia.
— Isso que está caindo é água? Está no chuveiro? — perguntou Jack
com riso na voz.
— Droga! Espere. — Desliguei a água, corada pelo fato de estar nua,
embora ele não pudesse me ver. — Desculpe por isso, Jack, achei que fosse
uma das meninas.
— Está se desculpando por estar no banheiro e...
Cortei-o, acalorada:
— Certo, o que deseja? Como está a ferida? — Prendi o meu cabelo, já
que não queria molhá-lo. — Estão todos bem?
— Você está perguntando se o lunático apareceu por aqui querendo nos
matar? — Seu tom estava sombrio, cheio de raiva. — Eu queria estar bem
para protegê-la.
— Não precisa me proteger, Jack, estou bem, mas preciso desligar.
Tenho que ir ao enterro de Aria...
— Ela morreu?! — gritou. — Ai... — queixou-se.
— Jack, fica quieto, o.k.? Não se mexa, está tudo bem — tranquilizei-o.
Nesse instante, a porta se abriu e Bryan entrou, calado, todo nu, coberto de
tatuagens e gloriosamente duro, inclusive ficou mais duro aos meus olhos,
porque, assim que fitei seu pênis, ele ficou ainda mais ereto, como se
sentisse meu olhar.
Ele não disse nada, só se agachou à minha frente com os olhos em meu
centro nu. Balancei a cabeça, pedindo silenciosamente para ele não fazer o
que eu pensava que iria, não com Jack no outro lado da linha, podendo ouvir
tudo.
— Droga, eu queria estar com você nessa hora... — A voz de Jack se
perdeu quando Bryan esfregou a língua em meu clitóris.
Segurei seus cabelos, tentando afastá-lo, mas isso o motivou a
continuar. Segurei-me na pia enquanto ele pegava uma das minhas pernas e a
colocava em seu ombro a fim de poder me devorar mais.
— Alexia, está aí? — sondou Jack.
Eu me esforcei para me controlar, para lhe responder sem gemer
conforme tudo queimava em mim.
— Sim... — Saiu um barulho estranho da minha garganta assim que
Bryan enfiou a língua dentro de mim e em seguida mordiscou meu clitóris. —
Maldição!
— O que foi, Alexia? — inquiriu Jack em tom preocupado.
Olhei para baixo e encontrei um par de olhos azuis me espiando, e seus
lábios se curvaram em um sorriso lindo e safado que me deixou de pernas
bambas. A cada estocada de língua, ficava mais difícil segurar os gemidos,
porque minha vontade era de gritar tamanho o prazer.
— Estou... bem... Apenas o xampu, que caiu no chão... — Respirei
fundo. — Tenho que ir, Jack.
Desliguei o celular e fechei os olhos, querendo mais daquele homem
que estava me consumindo. Puxei seus cabelos e apertei sua cabeça em meu
centro. Para onde foi a minha vergonha nessa hora? Para o espaço! Quem
pensaria em vergonha com um desejo daqueles queimando no corpo?
Ninguém! Até uma freira cairia sem se arrepender depois.
Bryan deu mais um chupão em meu clitóris, então gozei intensamente.
Segurei-me para não gritar, ou Ariane apareceria ali para saber o que estava
havendo comigo.
— Então, gostou? — indagou, erguendo-se aos poucos e seguindo com
a língua em minha pele. Mordiscou meus seios, depois me beijou, deixando
meu gosto, meio salgado, em minha boca.
Gemi de novo, com meu desejo florescendo novamente por aquele
homem. Afastei-me com bastante sacrifício assim que ele ia enfiar sua
delícia de pau em mim, mas eu tinha outra ideia.
— Alexia? — sondou confuso.
Peguei sua mão, levei-o para debaixo do chuveiro e me ajoelhei à sua
frente, admirando-o. Eu amava tudo naquele homem.
— Alexia... não precisa fazer isso...
— Eu sei que não, mas quero. — Segurei seu membro duro e o apertei,
deslizando para cima e para baixo.
Ele gemeu, escorando-se na parede e me fitando com adoração.
Passei a língua em sua cabeça rosada, lambendo o pré-sêmen que
escorria e não desperdiçando uma gota, e logo coloquei o membro inteiro em
minha boca, ou melhor, o que consegui, já que ele não era pequeno. Eu
adorava o seu pau, que me fazia gritar de prazer.
Quanto mais ele gemia, mais forte eu o sugava, levando-o à loucura.
Suas mãos apertavam meus cabelos, mas não me forçavam a ir mais fundo.
Bryan me deixava tomar dele o quanto eu conseguia. E eu o amava ainda
mais por isso.
O fogo se reacendeu em mim, fazendo-me gemer com ele. Segurei o que
não coube em minha boca de seu membro e o movimentei para cima e para
baixo. Coloquei minha mão direita entre as minhas pernas e circulei meu
clitóris, levando-me ao limite. Eu já tinha me tocado antes pensando nele,
então estava familiarizada com isso, mas, com seu pau em minha boca, as
sensações eram mais intensas.
— Estou perto de gozar... — Sua voz falhou no final, assim que dei uma
sugada forte, levando-o à borda.
Acelerei os movimentos em meu clitóris enquanto chupava Bryan com
tudo que eu tinha. Então senti seu gozo bater no fundo de minha garganta
conforme eu gozava também.
— Porra, Luz do Sol! Eu estou mole aqui — sussurrou ele com a voz
fraca.
— Porra digo eu! Estou até com as pernas bambas — murmurei.
Ele me levantou e me escorou de frente para a parede e de costas para
ele. Eu sabia o que ele ia fazer, mas aquela era uma posição em que eu não
conseguia ficar. Tentei bloquear as lembranças das mãos sujas de Steve me
segurando assim e da dor que senti...
— Bryan...
Ele afastou os lábios do meu pescoço e se afastou, virando-me de frente
para si. Acreditei que ele ouviu a dor na minha voz, confirmando-a ao ver as
lágrimas em meu rosto.
— Alexia, o que foi? Machuquei você? — Seu tom era preocupado.
Abracei-o e aspirei seu cheiro, tentando me acalmar e bloquear as
lembranças sombrias.
— Não, mas podemos fazer outra posição? — Tentei manter minha voz
calma para não o deixar chateado.
Talvez, com o tempo, Bryan me deixe, já que eu não posso fazer muita
coisa com ele, não o que ele está acostumado a fazer e gosta, como ser
algemada, fazer sexo por trás e outras coisas, como ser chicoteada. Isso
eu jamais vou poder fazer!
Um ruído saiu de seu peito, e reconheci a fúria, e não era pouca,
inteiramente dirigida ao monstro que me estragara para sempre. Seria
irreversível? Eu esperava um dia ficar curada.
— Tudo bem, vamos tomar banho — falou, beijando meus cabelos.
— Bryan, nós podemos seguir, só não assim... — comecei, mas ele me
cortou com a voz calma, embora eu sentisse a raiva fervilhando em seu
peito:
— Alexia, já estamos atrasados para o velório. Depois continuamos. —
Beijou meus lábios de leve.
— Mas... — Temi que ele ficasse com raiva de mim por não ter
continuado.
— Luz do Sol, não há a menor chance de ficarmos juntos depois de eu
ver a dor em seus olhos com a lembrança... Só vamos tomar banho agora,
tudo bem?
Assenti, mas meu peito doía por não ser uma mulher completa para ele,
tudo por culpa daquele desgraçado que me arruinara.
Escondi minha dor e meu medo, mas parecia que Bryan me conhecia
bem, porque, assim que terminamos o banho, ele me puxou para seus braços
e beijou a minha testa.
— Você não sabe como eu me sinto ao ver a dor em você e não poder
fazer nada, não conseguir chegar à pessoa... que te causou isso. — Sua voz
soou atormentada no fim da frase. — Mas vou pegá-lo, eu juro, e, quando
isso acontecer...
Gelei ao ouvir seu tom mortal.
— Você vai entregá-lo às autoridades, Bryan. Promete... — falei com a
voz um pouco grossa demais e trêmula.
— Não posso prometer isso, porque não sei o que farei caso o encontre
pessoalmente.
Meu coração disparou, temendo o que ele viesse a fazer com Steve. Ele
merecia, mas Bryan não podia se afundar no desejo de vingança. Eu via a
escuridão em seus olhos. Se ele deixasse a ira dominá-lo, haveria mais dela
em seu olhar, e eu não podia deixar isso acontecer.
— Bryan...
— Alexia, não vamos discutir isso agora, tudo bem? É irrelevante —
Seu tom era duro.
Suspirei e saí irritada do banheiro. Como ele podia me dizer que aquilo
não tinha importância? Eu também queria Steve morto, mas não queria a
alma de Bryan morta. Chateada e preocupada, não disse nada enquanto me
arrumava.
Saímos de casa ainda calados e continuamos assim até chegarmos à
igreja que Aria frequentava todos os domingos. Ariane ficou em casa com
Calebe. Eu não podia deixá-la à vista de Steve.
Algumas pessoas já estavam ali. Alguns rostos eram conhecidos da
escola, outros deviam ser conhecidos dela, talvez frequentadores da igreja.
Eu esperava que não tivéssemos problemas ali como no hospital.
Bryan, ainda calado, deu-me um beijo casto quando me deixou no
templo. Eu também não disse nada, mas queria que ele mudasse de ideia ou
que Steve morresse pelas mãos de outra pessoa.
Os MCs estavam ali. Alguns eu não conhecia, somente Nasx, Daemon,
Shadow e Michael, cujo apelido eu descobri que era Kill. Até parecia, pela
expressão sombria que ele demonstrava de vez em quando, que ele matara
mil vezes, o que eu não duvidava, mas não podia julgar ninguém sem
conhecer sua história.
— Está tudo coberto. Tentei transferir o velório para outro lugar, mas
não consegui — disse Daemon olhando ao redor como se caçasse alguém, ou
melhor, o monstro chamado Steve Lutner. — Cobriremos você, Alexia. Não
se preocupe. Há irmãos nossos aqui disfarçados, checando movimentos
suspeitos.
Suspirei aliviada ao ouvir isso, mas esperava que acabasse logo e que
aquele criminoso fosse preso antes de Bryan colocar as mãos nele.
Aproximei-me do caixão lacrado. Daemon disse que não podiam deixá-
lo aberto porque o que tinham feito com ela assombraria as pessoas.
Estremeci. Eu não vi como ela tinha ficado no hospital, pois Nasx não
deixou. Senti-me aliviada, porque já bastavam os pesadelos que eu tinha;
não queria ter mais nenhum.
Meu coração doía por Aria. Sabia que ela me enganara por quatro anos,
mas não me afastara de Ariane. Ela me deixava levá-la nas férias comigo
para onde quer que eu fosse, até fora do país. Que pais ou avós fariam isso?
Então eu supunha que ela não me queria longe de minha filha.
— Eu perdoo você, então vá em paz — sussurrei, alisando o caixão de
madeira.
Eu não sabia o que acontecia com as pessoas quando morriam. Sempre
ouvi a parte de “ir para o Inferno ou para o Céu” dependendo do que tinham
feito enquanto estavam vivas. Porém, fosse como fosse, eu não acreditava
que Aria iria para o Inferno. Eu precisava acreditar que ela seria redimida,
afinal, cometeu erros, mas quem não os comete nessa vida? Além disso, ela
pediu perdão e disse a verdade no fim da vida.
O padre ministrou algumas palavras para a redenção e salvação da
alma de Aria. Eu estava chorando. Então senti braços à minha volta, mas não
eram os que eu ansiava, e sim os de Daemon. Bryan não podia estar comigo,
uma vez que estava trabalhando e não conseguiu tirar folga. Mesmo assim,
senti-me confortada por Daemon e protegida por seus amigos MCs.
Daemon não saía do meu lado. Sua proteção estava cerrada. Eu queria
entender por que ele era tão presente. Seria só por ser amigo de Bryan?
Porque mal nos conhecíamos. Ele era um cara legal. Eu acreditava que
seríamos grandes amigos depois que tudo aquilo terminasse.
Após as palavras do padre, meus colegas da escola me incentivaram a
falar alguma coisa também. Eu não tinha vergonha disso. Adorava falar,
embora com certeza choraria na frente de todos os meus colegas e dos
amigos de Aria, uma pessoa amada.
— Oi, pessoal. Estamos reunidos aqui por um motivo triste, a morte de
uma pessoa querida por todos nós. O que posso dizer sobre Aria, ou mama,
como as crianças a chamavam na escola? Ela era uma pessoa maravilhosa,
meiga, gentil e caridosa. Não havia nada que pedíamos a ela que nossa
querida Aria não se esforçasse para fazer. — Olhei para sua foto sorridente
perto do caixão, que estava no altar da igreja. Imaginava que fosse a sua
bondade que a fez aceitar o pedido dos meus pais para que ficasse com
minha menina.
As pessoas estavam sentadas nos bancos em frente e me fitavam com
seus olhos molhados pela perda de uma amiga, assim como eu, mas me
controlei para terminar meu pequeno discurso, que era de coração.
— Todos nós cometemos erros, inclusive ela, mas ninguém merece o
que lhe fizeram. Eu não sabia que Aria estava doente até ontem, quando foi
levada para o hospital e cruelmente assassinada... — Estava prestes a
continuar, quando senti uma sensação estranha. Sentia-me observada. A
igreja inteira estava me fitando, mas era diferente. Era uma atenção que me
deixava inquieta.
Olhei discretamente para cada canto do recinto e cada pessoa à minha
frente, mas não vi ninguém que não deveria estar ali, não Steve, pelo menos.
De repente, no coro[2] da igreja, acima da entrada, deparei-me com o
monstro, que me fitava sorrindo de forma cruel, como se gostasse de me ver
chocada. Expulsei todas as lembranças sombrias que eu tinha dele; não lhe
daria o gostinho de mostrar meu medo, afinal, aquele desgraçado amava
isso. Respirei fundo, ignorando seus olhos em mim, e encontrei o olhar de
Daemon, torcendo para ele perceber que algo estava errado.
Para meu alívio, Daemon devia ter notado, porque olhou para os outros
MCs ali, que assentiram, comunicando-se entre si em sua linguagem de
sinais própria. Sabendo que eles estavam alertados, deixei minha raiva
tomar conta de mim e disse tudo o que pensava de Steve Lutner, olhando-o
diretamente:
— O monstro que fez isso não deveria estar solto. Aliás, desculpe-me
por dizer isso, padre, esse homem merecia estar queimando em um caldeirão
de fogo, não falo no Inferno, porque sei que ele vai para lá por sua
desumanidade, mas sim aqui na Terra, como suas vítimas sofreram, porque
eu soube que Aria não foi a única vítima desse demônio desgraçado. Se eu
tivesse uma chance, o mataria da pior maneira possível, mas ele se esconde
atrás dos outros. É um covarde.
Seus olhos estavam cheios de raiva, suas mãos, em punhos e os dentes,
trincados. Apesar do receio, ergui mais a cabeça; não deixaria aquele
monstro saber que eu estava tremendo por dentro, porque uma coisa eu
aprendi nos meus dias de cativeiro com ele: aquele cara gostava de ver o
medo nas pessoas, a impotência delas ao estarem à sua mercê. E eu não lhe
daria aquele gostinho; não mesmo.
— Covarde, é isso o que ele é... — Fui interrompida pela boca de
Daemon na minha. Senti gosto de menta, porque meus lábios estavam abertos
devido ao choque.
Capítulo 16

ALEXIA
Meus olhos estavam abertos de choque, e, pela minha visão periférica,
notei que não era a única, afinal, estávamos em uma igreja velando uma
amiga. O que deu em Daemon? Por que fez isso? Não era por gostar de mim,
então supus que fosse algum plano que eles tinham bolado. Perguntei-me se
Bryan estava ciente daquilo. Se estivesse, o que eu faria a respeito? Porque,
se ele deixara uma pessoa me beijar, seus sentimentos não eram fortes como
os meus, porque eu o mataria se me traísse.
O beijo durou alguns segundos, então Daemon me virou, e ouvi um tiro
próximo a nós. Recuperei-me do choque do beijo, que me encheu de fúria.
Olhei para cima e vi Steve correndo. Não soube o que deu em mim, só saí
correndo atrás dele.
Antes de ir para o templo, peguei uma das armas de Bryan. Eu não
sabia usá-la muito bem, mas aprenderia atirando naquele monstro que teve a
audácia de ir até a igreja onde estava sendo velada uma mulher que ele
matou. Ouvi um xingamento de Daemon, mas não liguei, saí dali bem a tempo
de ver o crápula pulando uma janela. Ficamos nos olhando, um de frente
para o outro. Rosnei, furiosa, assim como ele, que parecia um daqueles bois
bravos, soltando fumaça pelas ventas.
Levantei a arma e puxei o gatilho, então ouvi o som do tiro e um
gemido. Steve me fitou com os olhos arregalados, como se não acreditasse
que eu tinha feito aquilo. Ele não me conhecia; por Bryan, eu era capaz de
tudo, até de matá-lo se fosse preciso.
De repente motos apareceram de todos os lados, atirando em mim, mas
não me acertaram.
— Se ela levar um tiro, mato vocês! — gritou Steve para os caras, que
pareciam ser MCs também, mas com coletes com o nome Scorpion escrito.
— Ela é minha para eu fazer o que quiser e castigá-la da forma como ela
merece!
Não liguei para isso, estava prestes a dar outro tiro nele; se estava
falando, então ainda estava vivo. Contudo, não fui muito longe, porque os
MCs Fênix apareceram e revidaram os tiros com outros. Não sei bem o que
houve, porque Daemon me jogou dentro do carro, e partimos. Enquanto isso,
os MCs Fênix e Scorpion lutavam, tudo por minha causa. Se algo
acontecesse aos meus amigos, que me protegiam, seria minha culpa.

— Oh, Deus, o que eu fiz?! Só o queria morto para Bryan não ter que
fazer isso! Não posso deixá-lo matar Steve... — Chorava deitada na cama de
Bryan.
Ainda bem que Ariane está dormindo no outro quarto, assim ela não
vê isso... pensei angustiada.
Daemon estava sentado ao meu lado, alisando meus cabelos, que
estavam sobre um travesseiro todo molhado de lágrimas.
— Vai ficar tudo bem, todos estão bem agora, a situação foi controlada.
— Limpava minhas lágrimas, que não paravam de cair. — Não sabíamos que
esse cretino estava aliado ao MC Scorpion. O desgraçado fugiu, mas vamos
dar um jeito de pegá-lo, eu prometo.
— Bryan não pode matá-lo, Daemon... Isso encheria de mais sombras a
sua alma... Já é difícil trazer luz para ele... Como posso impedir isso? —
Observei seus olhos caramelo.
— Juro que nunca vou deixar isso acontecer. Prometo que o impedirei
de fazer isso — jurou, abaixando a cabeça como se fosse me beijar.
— Daemon, por favor, não... — supliquei, não sabendo seus motivos
para me beijar àquela hora, mas não queria que as coisas se complicassem
ou ficassem esquisitas entre nós. Então achei melhor esclarecer as coisas. —
Daemon, sobre o beijo...
Ele sorriu e beijou minha testa.
— Era preciso beijar você...
Ele se interrompeu quando foi tirado de perto mim e preso na parede
por um Bryan mortal. Eu já o tinha visto sombrio, mas daquele jeito, nunca.
Parecia que mataria alguém, no caso, Daemon, que deu um gemido com a
pancada.
— Você, seu maldito, como ousa beijá-la?! Porra! — Deu um soco na
boca de Daemon, que cerrou os punhos e empurrou Bryan.
— Você está preocupado com um beijo? Deveria pensar na dor que
Alexia está sentindo agora! — esbravejou. — Por sua culpa ela atirou em um
cara, contrariando o que ela é, só para você não ter que fazer isso! Então
devia pensar antes de me ameaçar por tê-la beijado, porque era preciso algo
assim para deixar Steve furioso e fazer besteira...
Bryan o cortou, feroz:
— E matar todos à volta dele?! — Deu um passo até Daemon.
Os olhos de Daemon estavam mortais também. Pelo que percebi, ele
não parecia temer a ira de Bryan.
— Escuta, Bryan, você é meu irmão...
Ele riu amargo.
— Irmãos não tentam roubar a namorada do outro! Acha que não
percebi como olha para ela?! Você a quer!
Eu estava paralisada ouvindo a discussão dos dois, mas prendi a
respiração ante o que Bryan disse. Não, isso era impossível!
— Sim, eu a quero, aliás, gosto dela...
Ofeguei, porque não tinha percebido isso, afinal, fazia poucos dias que
o conhecia, mas descobrira que ele estava havia meses me vigiando. Então
Daemon sentia mais por mim do que amizade?
Não fui a única a ofegar com isso; percebi que tinha mais gente à porta,
vendo tudo. No entanto, não reparei em quem era, já que estava temendo
pelos dois, que pareciam prestes a se matar.
— Eu vou matar você, seu desgraçado! — Bryan se lançou sobre
Daemon, mas Shadow entrou no meio para impedir a catástrofe.
Também me levantei na tentativa de acalmar os dois, mas minhas pernas
pareciam travadas no chão, enquanto os fitava de olhos arregalados.
— Maldição, o que está havendo?! — rosnou o presidente do MC, um
tanto sombrio. Enfim eu entendia por que o chamavam de Shadow; seu olhar
estava cheio de sombras ameaçadoras ao olhar entre os dois. — Daemon.
Daemon não olhou para ele, só fitava Bryan.
— Eu não roubo mulher de irmão, independentemente se gosto dela ou
não. Jamais entraria no meio de vocês dois, mas, se não resolver suas
merdas e a perder, vou lutar por ela, cara, e não vou desistir até conseguir.
— Seu alerta estava em cada palavra que dizia. Entretanto, ao falar
novamente, sua voz soou calma: — Todos temos escuridão, Bryan, só temos
que escolher entre deixar a luz dominá-la ou as sombras nos comandarem.
Será a sua escolha, então a faça bem, porque, se escolher a escuridão, você a
perde. — Seu dedo apontou para mim. — Porque ela sofre por você não a
deixar entrar e consertar o que está quebrado.
Bryan olhou entre nós dois.
— Você contou a ele os nossos problemas? — Seu tom saiu magoado,
mas o meu soou raivoso por ele pensar que eu diria aos outros algo que só
dizia respeito a nós.
— Claro, disse até quantas vezes transamos por dia! — sibilei furiosa e
senti Daemon se encolher. Fui até ele e peguei suas mãos. — Desculpe, eu
não sabia o que sentia por mim. Lamento por isso, mas não posso. — Olhei
para Bryan, que parecia controlado, braços cruzados, depois olhei para o
rosto triste de Daemon. — Eu...
— Não precisa dizer nada, loura, eu sei que o ama. Não é toda mulher
que tenta matar um homem para salvar a alma de outro ao impedir que ele
venha a fazer isso. — Ele deu um passo até mim e caiu para frente, nos meus
braços.
— Daemon? — chamei, caindo de joelhos com o peso do homem,
afinal, ele tinha 1,90 m de altura e uns 100 kg de peso. Senti algo molhado
em minha mão, que estava em seu tórax, e a olhei, ofegando a seguir. — É
sangue! Oh, Deus! Ele foi baleado!
Capítulo 17

ALEXIA
Shadow tirou Daemon de cima de mim e o colocou na minha cama,
estendido e desmaiado.
— Maldição, Daemon, por que não nos disse que estava ferido? —
criticou, abrindo sua jaqueta preta e vendo a mancha de sangue por toda a
sua camiseta. Por isso não víamos o sangue, por causa da cor de sua roupa.
— Precisamos de um médico ou levá-lo a um hospital — afirmei
chorando, vendo meu amigo estirado na cama, ferido e inconsciente.
— Não podemos levá-lo ao hospital, porque isso incluiria boletim de
ocorrência, e teríamos que contar o que houve na igreja — disse Nasx,
olhando o amigo desmaiado. — Precisamos conseguir um bom médico.
— Conheço um confiável, já que você não podem ser vistos — avisei,
pegando meu telefone e ligando para um amigo meu que estava se formando
em medicina.
Quinze minutos depois, Paulo Figueiredo, meu amigo de ascendência
brasileira, chegou e entrou no quarto, que parecia muito apertado por estar
tomado de homens fortes – Nasx, Shadow e Michael, bem como Bryan ao
meu lado –, e ainda tinha mais gente na sala, cerca de uns 16 caras.
Os olhos de Paulo se arregalaram ao se deparar com tantos homens, um
deles ferido. Estudávamos na mesma universidade antes de eu sair.
— Lex, o que está havendo? Quem são esses homens? — sondou com
os olhos estreitos.
— Você está aqui para cuidar dele, não para fazer perguntas — sibilou
Michael.
Percebi que Paulo prendeu a respiração. Senti-o tremendo, afinal,
provavelmente ele não tinha visto nada assim na vida. Fechei a cara para
Kill, ignorando suas sobrancelhas desafiando-me a dizer algo. Bem, ele não
me conhecia, pois eu não fugia de um desafio.
— Paulo, não ligue para esses homens e seu jeito grosseiro de falar.
— Grosseiro...? — inquiriu Michael revoltado.
— Kill, fica frio — ordenou Shadow para ele, que ficou quieto.
Paulo ofegou e pegou meu braço como se fosse me tirar dali na marra.
Seus pais eram brasileiros, mas ele nasceu ali.
— Kill? Meu Deus! Eles são assassinos e estão te obrigando a ficar
aqui, não é?! — Sua voz saiu alta e trêmula ao encarar cada rosto.
Paulo sempre foi uma criatura estudiosa e bondosa. Quando eu
precisava dele, lá estava para me ajudar, mesmo quando ainda estava no pre-
med.
Nasx riu.
— Cuidado para não mijar nas calças, garoto, e calma, que ninguém
aqui vai te machucar. Ignora Kill, esse é seu jeito de ser — falou ele,
tranquilizando meu amigo.
— Paulo, estamos perdendo tempo — informei com o coração
acelerado. — Salve meu amigo, por favor. Ele se machucou para me salvar.
Ele assentiu e foi averiguar o estado de Daemon. Depois de alguns
minutos de averiguação, olhou-nos.
— Ele levou um tiro...
— Não diga, Sherlock — rosnou Kill e olhou para Shadow. — Estamos
perdendo tempo com esse garoto, não podemos deixar Daemon morrer.
— Eu não sou um garoto, tenho 25 anos. — A voz de Paulo soou alta e
irritada. — Se me deixasse terminar de falar, saberia o que estou tentando
dizer. Ele levou um tiro pelas costas, e a bala atravessou. Isso é bom. Agora
vamos estancar a hemorragia. Se possível, podem esvaziar o quarto para eu
trabalhar?
Shadow acenou para todos, que assentiram, ficando só ele ali, além de
mim e Bryan.
— Vamos, Alexia — chamou esse.
Paulo me observou com os olhos arregalados, depois fitou a cara
fechada de Shadow. Ele não queria ficar sozinho com eles.
— Eu vou ficar aqui com eles. Se quiser, pode ir — falei, sentando-me
no sofá do quarto, o que fez Paulo respirar normalmente.
Bryan estreitou os olhos e foi ficar ao lado de Shadow perto da porta,
cochichando, com certeza sobre o que aconteceu naquele dia.
Ignorei-os e ajudei Paulo a suturar a ferida da bala de Daemon. Eu
limpava o sangue em sua pele morena com um pano úmido. Ele possuía
muitas tatuagens e cicatrizes, como Bryan.
— O que aconteceu com você? — indaguei baixinho e alisei sua testa,
que estava quente. Seus cabelos negros estavam sobre seu rosto bonito, tão
sereno enquanto estava apagado.
— Pelos cortes, são facadas, e não foram poucas. Parece que alguém
estava amolando a faca em sua pele. — Paulo estremeceu ao dizer isso
enquanto costurava a abertura que a bala deixara perto de seu ombro. Então
o virou de bruços, e o que vi me assombraria para sempre.
— Oh, Deus! Daemon... — Suas costas estavam grossas, como madeira
riscada a faca. A tatuagem da fênix que tinha nas costas não conseguia
encobrir isso, as coisas horríveis que tinham feito com ele. — O que fizeram
com você?
— Ele nunca contou sua história. Ninguém sabe — disse Shadow,
respondendo a minha pergunta.
— Por isso ele disse sobre a escuridão... Ele sabe disso, porque já
viveu na pele. — Minha voz falhou devido ao sofrimento do meu amigo.
— Todos nós temos um passado escuro, só temos que ter certeza de se
queremos viver no presente ou no passado, ou seja, deixar a escuridão tomar
ou não conta de nós — declarou Shadow com um suspiro preocupado. — É
fácil amar Daemon e se apegar a ele. Ele é calado, mas, quando precisamos
dele, o cara dá sua vida por um irmão ou por quem gosta, não pensando no
que vier a acontecer consigo.
— Assim como fez comigo, porque ele estava ao meu lado quando me
beijou. — Um ruído saiu da garganta de Bryan; reconheci a raiva. — Então
ele me rodopiou, e depois ouvi um tiro. Ele com certeza previu o que
aconteceria, por isso foi atingido no meu lugar... para me salvar.
— Sim, como eu disse, ele daria a vida pelas pessoas que ama, e você
é uma delas. Eu não sabia que ele estava sentindo isso por você; se
soubesse, teria dado a função de te vigiar e proteger a Nasx. Sei que você
não sente o mesmo por ele, afinal, é mulher de um irmão e ama seu homem.
Paulo não disse nada enquanto trabalhava. Quando ele cuidava das
pessoas, não pensava em nada, só se concentrava no seu serviço. Por isso eu
o chamei, sabia que ele podia lidar com Daemon e sua ferida e salvá-lo sem
ser necessária a ida a um hospital.
— Me sinto mal com tudo que aconteceu hoje, esse cara atrás de mim,
matando pessoas como Aria e atirando em outras, como Jack e Daemon...
— Jack Milles levou um tiro? — interrompeu-me Paulo com a voz
alterada enquanto aplicava uma injeção em Daemon.
— Ele está bem agora, não se preocupe com isso — falei para
tranquilizá-lo.
— Agora é só esperar e ver como ele reage, mas parece que a bala
atravessou a parte superior do tórax e das costas, não acertando nenhum
órgão vital ou articulação. Acredito que ele ficará bem, afinal, já deve ter
aturado coisa pior que isso. — Paulo olhou para as cicatrizes de Daemon e
estremeceu, certamente pensando no que acontecera em sua vida. Eu
acreditava que não teríamos nenhuma explicação, porque Daemon não
parecia o tipo que se abria com as pessoas.
— Obrigada por ter vindo, e confio que não dirá nada a ninguém do que
viu e ouviu aqui — falei, abraçando-o.
— Vai custar caro, afinal, me deve um encontro que furou no dia da
graduação, quando foi para casa com Jack. — Ele franziu o cenho. —
Ficaram juntos naquele dia?
Ri.
— Não ficamos juntos. Satisfeito? — falei, afastando-me dele, porque
senti a tensão de Bryan, e, para ele perder a paciência depois de já ter
passado por tanto, não demoraria. — Ele não tinha um par de olhos azuis e a
boca avermelhada que eu conheço.
— Ele? Então é o irmão da Sam? — sondou checando Bryan. — Faz
tempo que não a vejo. Soube que ela se casou com Lucky Donovan.
Revirei os olhos. Todos nós estudávamos na mesma universidade – eu,
Luana, Claire, Sam, Jack, Mike, Julian e Paulo – e, apesar dos diferentes
cursos, tanto no college quanto na pós, éramos amigos.
— Que tal fazermos um dia de fraternidade quando eu resolver alguns
problemas que tenho? Assim todos nos reunimos e comemoramos, sim?
Paulo ficou de me ligar depois para organizar a reunião, afinal, eu não
tinha cabeça para isso, não com tudo que estava acontecendo comigo e com
as pessoas que eu amava.
Os MCs ficariam ali por enquanto, até Daemon se restabelecer, e
bolariam um plano mais completo, agora que sabiam que Steve estava aliado
ao MC Scorpion. Pelo que notei das conversas deles, aquele MC era inimigo
mortal do MC Fênix. Eles não me disseram nada, mas eu sabia que a
situação estava preta para o nosso lado. Meu medo era perder gente do
nosso lado. Eu não podia aceitar nunca algo assim. Precisava fazer alguma
coisa, mas o quê?
Dois dias se passaram depois que Daemon foi baleado. Ele ainda
estava ali, mas parecia ter melhorado. Fiquei aliviada com isso. Shadow foi
embora e deixou Nasx ali conosco. Eu não ligava, já que Bryan não ficava
muito tempo em casa. Cada vez saía mais, principalmente à noite. Eu sabia
que ele estava trabalhando em algo da polícia, então não me incomodei, mas
sentia falta de estarmos juntos.
Ariane estava animada com a casa cheia de gente, ou melhor, de
homens. Antes só tinha o Calebe, depois tinham mais dois, já que Michael
resolveu ficar também. Eu o chamava assim quando ele estava calmo, e de
Kill quando assumia sua expressão furiosa. Ele brincava muito com Ariane,
e gostei de que ela fosse capaz de fazer aquele homem sorrir.
Fui ao quarto de Bryan, onde Daemon estava. Eu dormia com Ariane no
outro quarto, já que Bryan não passava a noite mais em casa. Tentei não
pensar nisso.
Assim que entrei, vi Daemon gemer e murmurar alguma coisa
incoerente. Aproximei-me dele e toquei seu ombro para acordá-lo.
— Daemon... — Interrompi-me ao ser jogada na cama, e ele pairou em
cima de mim com as mãos em meu pescoço como se quisesse me sufocar.
Devo ter gritado, porque de repente a porta se abriu. Entretanto, não me
importei com quem era, apenas mirava o olhar de dor de Daemon. Aquela
dor vinha do mais profundo do seu ser, algo que eu via no espelho todos os
dias. Fosse o que fosse que acontecera com ele, era algo sério, que deixou
marcas profundas, e não só em sua pele, mas também em sua alma.
Antes de ele me sufocar, voltou a si e percebeu o que estava fazendo.
Saiu de cima de mim, ficou de pé e gemeu. Talvez tivesse se movimentado
rápido demais e seu machucado se inflamara.
— Maldição, Nasx! Por que a deixou perto de mim? — rosnou Daemon
com os dentes trincados.
— O que está acontecendo? — questionou Bryan, entrando no quarto e
me olhando sentar na cama, onde Daemon estava antes. Abaixei meu vestido,
que tinha se levantado um pouco. — Que porra está acontecendo aqui?
Levantei-me e corri assim que Bryan se lançou sobre Daemon, mas
Nasx foi mais rápido e se colocou na frente, impedindo seu caminho.
— Bryan, não foi culpa dele. Eu o vi tendo um pesadelo e toquei nele...
— Ele atacou você? — Sua voz estava fria como uma geleira.
— Me desculpe, loura, não achei que fosse você... — Ele estremeceu e
olhou para Nasx. — Droga, eu poderia tê-la machucado.
— Lamento, cara, eu só fui à cozinha. Não achei que ela apareceria
aqui e esqueci que isso não podia acontecer — falou de modo triste.
Respirei fundo, segurando firme o braço de Bryan, que estava calado,
avaliando Daemon, mas pensei ter visto entendimento ali, porque o vi
relaxando.
Olhei para Daemon, que estava triste ao me observar. Fui até ele e
peguei sua mão, apertando-a. Ele estava vestindo apenas uma calça jeans, e
as gazes tampavam seu ferimento. Ignorei suas cicatrizes; muito
possivelmente ele não gostava que as pessoas as vissem.
— Daemon, não precisa se desculpar por isso, o.k.? Eu devia...
— O quê? Falar de longe? — Seu tom estava ácido. — Estou feliz que
não sinta nada por mim. — Tentou soltar minha mão, mas não deixei. —
Quem iria querer sentir?
Fitei Nasx e Bryan.
— Podem me deixar a sós com ele? — pedi, principalmente ao Bryan,
que fechou a cara.
— Não conte com isso...
— Bryan, por favor, preciso conversar com Daemon — supliquei. —
Nós já vamos sair.
Ele não queria, mas saiu; antes, porém, alertou-nos:
— Cinco minutos.
Fiz uma careta assim que eles saíram, em seguida olhei para Daemon.
— Daemon, se eu não amasse o Bryan, teria o maior orgulho de te amar,
seria um privilégio. Não me importaria o que aconteceu em seu passado. É
claro que eu iria querer saber o que se sucedeu e tudo mais, para você reagir
assim quando estava dormindo e ter tantas cicatrizes — sussurrei, apertando
suas mãos.
— Eu contaria se dividisse a minha cama... mas sabemos que isso não
vai acontecer, não é? Porque você o ama assim como ele a ama. Por isso a
preocupação e os ciúmes dele por você.
Arregalei os olhos, admirando seus olhos intensos, que esboçavam um
sorriso.
— Eu sei e torço para aparecer uma pessoa que seja especial e o ame
muito, porque você merece. Espero que não demore muito; tudo que sente
por mim, você vai ver que será fichinha em comparação ao que sentirá por
ela — sussurrei, beijando sua bochecha macia, depois me afastei.
— Agora vamos para a sala. Preciso sair deste quarto e ver alguma
coisa após anos nesta cama. Além disso, logo ele vai aparecer aqui. —
Daemon sorriu, mas o seu sorriso não chegou aos olhos.
— Não foram anos, e sim dois dias — respondi sorrindo.
Eu só esperava que tanto ele quanto Jack um dia fossem felizes, afinal,
eram garotos lindos. Almejava que as garotas sortudas que aparecessem nas
suas vidas viessem a ver o que eles tinham por dentro, não somente sua
beleza física, assim como eu vi em Bryan.
Capítulo 18

ALEXIA
Um mês e meio depois de sermos alvejados em frente à igreja, ainda
não tínhamos descoberto o paradeiro de Steve. Para meu azar, o cara não foi
morto. Assim disse Nasx, que soube por uma pessoa que ele estava na sede
do MC Scorpion. Os federais estavam atrás dele desde então. Eu esperava
que os prendessem logo, antes de Bryan o pegar e fazer o que disse que
faria.
Enquanto isso, tinha algo que estava me deixando inquieta. Bryan estava
esquisito. Desde que eu disse que não conseguia ficar naquela posição, no
banheiro, ele não me tocava mais. A princípio, achei que fosse porque Nasx
e Daemon estavam na casa, mas pouco depois eles foram embora. Mesmo
assim, ele não tentou mais.
— O que foi, Bryan? — sondei em uma noite em que ele chegou tarde.
Isso não era surpresa, já que seu trabalho ocupava horas da sua noite.
— Estou cansado — disse, como em todas as vezes em que vinha para
casa e se deitava ao meu lado.
Aceitei isso até a noite em que peguei uma conversa dele com Calebe,
no qual mencionavam que ele estava trabalhando em um clube de BDSM
chamado Fetish com uma mulher chamada Tabitta. Na hora em que soube
disso, pareceu que parte de mim foi destruída. A dor era insuportável, mas
eu não cairia; precisava saber o que estava havendo e por que ele estava
trabalhando disfarçado. Ele se submeteria a tudo pela sua profissão, até me
trair?
Enfim eu estava em frente ao clube Fetish, meio afastado de Manhattan.
Nunca tinha ido a um local assim antes. Talvez aquela fosse a praia de
Bryan. Afinal, ele fazia sexo duro antes de mim, que era quebrada, não
conseguia fazer o que ele gostava. Era por isso que ele não ficava comigo
havia tanto tempo? Talvez não conseguisse mais levantar seu maldito pau em
minha presença, por isso dava a desculpa de que estava cansado.
Entrei no clube olhando ao redor, para suas luzes vermelhas e mulheres
nuas para todos os lados, algumas de joelhos em frente aos homens. Uma
mulher estava suspensa de ponta-cabeça e envergada como um arco.
Sinistro. Algumas das garotas estavam algemadas enquanto eram espancadas
por homens mal-encarados.
Eu tremia conforme lembranças assombrosas me assolavam, mas me
mantive firme; não ia surtar, precisava descobrir a verdade fosse ela qual
fosse. Tinha de ver com meus próprios olhos.
Dei mais alguns passos, então vi Bryan sorrindo e conversando com
uma mulher morena e alta. Ela colocou uma de suas mãos no peito dele, mas
ele a tirou.
— Eu soube que ficou quase uma hora no quarto com sua submissa.
Posso saber o que fizeram lá de tão especial? — inquiriu a mulher com voz
melosa.
Ele deu seu sorriso normal, mas que fazia qualquer mulher cair de
quatro. Aquela com certeza o queria de todo jeito. Meu coração batia alto e
despedaçado ante o que ouvi, mas, finalmente estando ali, eu precisava ouvir
tudo até o fim.
— Quer mesmo ouvir? Bem, eu a algemei na cama, de bruços, com sua
bunda para o ar, então a chicoteei e devorei sua boceta ao mesmo tempo,
depois a fodi com força. — Seu tom era provocativo.
— Isso me deixou até molhada — disse a mulher, colocando a mão no
meio das pernas. — Quer ver?
Não fiquei para ouvir sua resposta. Corri, chorando e com um nó no
estômago. Vomitei ao imaginar Bryan fazendo o que disse com outra mulher.
— Alexia?
Por um momento achei que fosse ele, mas não era sua voz. Limpei a
boca e olhei para Jason Falcon, que estava saindo da boate também.
— J-Jason? — Minha voz falhou, então pigarreei para limpá-la e
controlar o que estava sentindo.
— O que faz aqui? — Sua voz também parecia igual à minha. Seus
olhos castanhos chocolate estavam cheios de chamas de uma dor profunda.
Não perguntei por que, afinal, se eu mal dava conta do que estava
sentindo, não aguentaria sequer pensar no sofrimento dos outros. A dor
estava me consumindo.
— Está indo embora? Pode me dar uma carona? Acho que não vou
conseguir dirigir... — Minha voz estava grossa pelo choro, e minhas
lágrimas me cegavam. Se eu fosse de carro, correria o risco de cometer um
acidente.
— Você viu Bryan com outra, não é? — indagou, avaliando-me.
Não respondi, afinal, não conseguiria falar sem gritar ou xingar, e o
único que merecia aquilo era Bryan, que estava lá dentro, talvez até
pensando em fazer um ménage com duas mulheres.
Jason não disse mais nada. Apenas saímos dali, mas o notei, antes de
dar partida, olhando com dor para uma loura com saia curtíssima e jaqueta
por cima, saindo do clube. Ela era linda.
Eu a fodi com força, essas palavras arranhavam meu cérebro, fazendo-
me querer gritar. Era para eu ir para a casa de Bryan, onde estava
hospedada, mas precisava falar com ele sozinha e botar um fim em nosso
relacionamento como adultos, e lá, com Calebe – ao qual despistei ao fugir
da casa – e Ariane, não seria possível.
Minha cabeça pegava fogo. Perguntava-me sem cessar se Bryan estava
no clube apenas disfarçado ou se ele queria aquilo e dava a desculpa do
disfarce para fazer o que realmente gostava.
Jason me deixou no prédio do apartamento de Bryan em Manhattan, já
que eu não podia ir para o meu. Eu sabia que, assim que ele chegasse em
casa, iria procurar por mim, então, quando me ligasse, eu lhe diria onde
estava. Todavia, ele nem sonhava o que estava para acontecer consigo. Eu
acabaria com aquele traidor de merda!
Chorei, gritei, mas com as mãos na boca para abafar o som enquanto
subia pelo elevador e entrava no corredor do andar do apartamento, ou os
vizinhos logo chamariam a polícia para descobrir o que estava acontecendo.
Depois de tanto chorar e lamentar, em vez da dor, eu estava com raiva de
Bryan por ter me usado. Se ele não me queria, era bom ter dito isso antes de
ir procurar outra mulher. Mesmo se fosse algo necessário para a conclusão
de um caso, eu não aceitaria algo assim. Jamais me submeteria àquilo,
mesmo amando-o como o fazia.
Estava quase alcançando a porta quando alguém pegou meu braço.
Prestes a gritar, percebi quem era.
— Daemon? O que faz aqui? — questionei, enxugando meu rosto
molhado.
Ele estreitou os olhos.
— Eu é que pergunto isso. O que faz aqui a essa hora da noite? E como
conseguiu sair da casa sem Calebe ver? — sondou confuso e irritado.
Pigarreei.
— Eu precisava ver uma coisa e não podia esperar — falei, tentando
controlar o choro.
— O que você viu? Alexia... me diz o que viu! — pediu preocupado,
aproximando-se mais de mim.
— Eu não quero falar sobre isso agora. — Esquivei-me, então
acrescentei, assim que ele estava prestes a retrucar: — O que está fazendo
aqui?
Ele suspirou.
— Alguns de nós, MCs, estamos aqui, no apartamento do Bryan, já que
ele não está usando esse lugar por enquanto. Vamos entrar.
Assenti e entrei no apartamento de Bryan, que era como um loft. Logo
na entrada tinha um sofá tão grande que uma pessoa podia dormir
confortavelmente nele. Em frente a ele havia uma estante com uma TV
imensa, na qual estava passando um filme pornô ao qual Nasx estava
assistindo.
Logo adiante havia uma cozinha com balcão de mármore separando-a
da sala. Tinha uma escada que dava para um andar acima, onde eu podia ver
uma cama e um guarda-roupa. Gostei dali, aconchegante e simples.
Nasx se colocou de pé e olhou de mim para Daemon, franzindo a testa.
— O que está fazendo aqui?
Não respondi; sentei-me no sofá, peguei uma cerveja que estava em
cima da mesinha de centro em frente ao sofá e tomei um gole bem grande. Eu
gostava de cerveja, mas a bebida me deixava bêbada rápido, de modo que eu
fazia coisas das quais não me lembrava no dia seguinte.
— Daemon... — insistiu Nasx, indo para perto dele. Os dois ficaram
me olhando.
— Eu não sei. Eu estava chegando aqui quando a vi à porta, chorando.
Disse que saiu porque precisava ver uma coisa, mas não disse o que era —
murmurou em tom confuso.
Ignorei-os e assisti ao filme. Na cena de sexo da vez, uma mulher
estava nua e presa a uma cruz em forma de X. Um homem à sua frente, só de
calça jeans e com um chicote, a açoitava. Levantei-me e cheguei mais perto
da TV, ouvindo-a gritar, mas seus gritos não eram de dor.
— Por que eu não posso fazer isso?! Por que não posso ser suficiente
para ele?! — gritei meio histérica, pegando os dois de surpresa, mas não
liguei.
— Alexia, do que está falando? — sondou Daemon. — Está se
referindo ao Bryan?
Olhei para ele com lágrimas se derramando pelas minhas bochechas.
— Por que não sou mulher suficiente para ele? — Olhei para a tela
onde, naquele momento, o casal transava com a garota ainda presa, sendo
fodida com força. — Não posso dar o que ele precisa...
— O que Bryan fez? — ele insistiu.
Sequei uma cerveja e peguei outra, assim a dor passaria, já que eu
ficaria bêbada logo, logo.
— Buscou fora o que não pude dar a ele... — Minha voz estava morta,
assim como eu.
— Você está dizendo que ele a traiu? — O tom da voz de Daemon era
fatal.
— Isso não é possível! Bryan é louco por você, mulher — disse Nasx.
— Se ele fez isso, eu vou matá-lo — rosnou Daemon com os olhos
sombrios.
— Não pode. — Minha voz saiu meio enrolada. — Eu é que vou matá-
lo.
— Vai matar quem? — perguntou Bryan, entrando na sala.
Encarei-o de modo feroz, peguei a primeira coisa que vi à frente e
joguei nele.
— Seu desgraçado traidor! Por que não me disse que estava fodendo
por aí?! — Voei em seu pescoço, mas tropecei em razão das pernas bambas.
Daemon me impediu de cair e quebrar a cara.
Bryan rugiu, mas não me importei.
— Acho que bebeu demais — Daemon falou baixo para mim, depois
com acusação para Bryan, que estava tampando um olho com uma das mãos:
— Espero que tenha uma explicação muito boa para isso.
Estreitei os olhos, firmando-os nos de Bryan.
— O que foi? Não está querendo nem me ver mais... É por isso que está
tampando o olho? — murmurei, mordendo o lábio, magoada, e fitei Daemon
ao meu lado, ainda me firmando. Minha voz saiu arrastada: — Eu sou...
assim tão feia, que não querem olhar para mim?
Nasx riu, então me fitou com um sorriso sexy. Eu não devia estar tão
bêbada, se conseguia diferenciar um sorriso sexy de um normal.
— Querida, você é perfeita, mas está vendo isso? — Ele pegou algo no
chão e o levantou.
Fui até ele meio cambaleando, contente por não cair. E peguei a coisa
brilhante, então notei que era um globo de neve de cristal.
— Mas está errado... — comentei, olhando-o de perto. — A terra está
de cabeça para baixo...
Ele riu de novo e virou o globo, então vi a neve caindo e me lembrei do
meu casamento, que eu queria que fosse na neve. Olhei para Bryan, ainda
tampando seu olho.
— Por que tinha que estragar tudo? Era para nós nos casarmos na
neve... mas então você mentiu e me traiu, tudo porque não fiz o que gosta...
— acusei-o, chorando e observando a neve cair.
— O que eu gosto? — Sua voz parecia embargada, como se tivesse
algo nela.
Suspirei irritada, peguei seu braço e o levei até a TV. Na cena da vez, a
mulher estava algemada à cabeceira da cama e com a bunda no ar enquanto o
cara a chicoteava. Era a mesma cena que ele descrevera para a mulher no
clube.
— Seu desgraçado, como pôde fazer isso comigo?! — Voei nele e
esmurrei seus peitorais, fazendo-o arfar e cair sentado no sofá,
provavelmente de susto ou surpresa, pois eu não era forte assim, ainda mais
meio bêbada.
Percebi que ainda estava com o globo de neve na mão. Talvez fosse por
isso que ele se encolhera. Continuei esmurrando-o até que ele pegou meus
pulsos e me rodopiou, deitando-me no sofá e pairando em cima de mim.
— Maldição, Alexia — grunhiu e olhou para cima. — Vocês poderiam
nos deixar a sós? Podem ir para minha casa. Aproveitem e digam o que
aconteceu ao Calebe, que deve estar surtando por ela ter saído escondida de
novo.
Não liguei para aquilo, só queria aliviar a dor que estava em meu peito.
— Por que eu não fui suficiente para você?! Por que não me disse que
precisava de mais do que só sexo?! — choraminguei, encolhida sob ele.
— Por Deus, Alexia! Acha mesmo que eu trairia você depois de tê-la
em meus braços, depois de sentir seu gosto, seu cheiro, que tanto adoro?
Meus olhos molhados se arregalaram, e alguma esperança inundou meu
peito.
— Eu ouvi você conversando com uma morena que estava te tocando...
— Mas eu tirei a mão dela de cima de mim.
Franzi a testa.
— Isso é verdade, mas depois você começou a dizer o que fez no
quarto com outra mulher, uma submissa... — Encolhi-me por dentro ao
pensar nessa cena.
— A mulher com quem eu disse que fiquei é uma policial do FBI
infiltrada, assim como eu, como policial, naquele clube para prender um
pedófilo desgraçado que não vai ver o sol nascer nunca mais, e não ficamos
juntos como você pensa. Aquela mulher que estava conversando comigo
trabalha no clube, estava desconfiada de mim e Tabitta, porque éramos para
entrar lá como um casal, mas não ficávamos juntos ao vivo, o que gerou
desconfiança...
— Mas então...?
— Ficávamos, sim, em um quarto, mas sem fazer nada. Tabitta não é
dessas, e eu também não. Por mais que eu goste do meu trabalho, jamais vou
ficar com outra pessoa para concluir um caso, porque eu amo você, Alexia,
só você. — Então ele me beijou intensamente, mas gemeu de dor e se
afastou.
— O que foi? — Foi então que notei seu olho inchado. — O que houve
com seu olho... Oh, Deus! O globo! — Alisei seu rosto lindo e sereno. —
Sinto muito por ter machucado você. Acho que agora estou pensando no que
fiz. Eu sou mole para bebida, uma vez fiz strip-tease. Minha sorte era que só
tinham mulheres.
Os olhos dele tinham ficado escuros no início de minha última frase,
mas, após ouvir o final, ele relaxou e beijou meu rosto.
— Que bom, porque, quando você tiver que fazer um strip-tease, quero
que faça apenas para mim — comunicou com a voz abrasadora e beijou
minhas pálpebras. — Lamento que tenha sofrido ao ouvir o que falei, mas
quero que saiba, Alexia, que, independentemente de como façamos sexo,
você me realiza em todos os sentidos, porque você é a única que me tem
dentro de você. — Ele remexeu seus quadris para enfatizar o que dizia.
Gemi, sentindo-o pronto ao se encaixar entre minhas coxas abertas. Eu
estava latejante por ele. Fazia muito tempo que estava seca e faminta por
aquele homem.
— Você não me tocou todo esse tempo — acusei, acariciando seus
cabelos negros e barba por fazer.
— Sinto muito, Luz do Sol, mas, depois do episódio no banheiro, eu
não sabia como faria isso. Fiquei com medo de que, quando eu ficasse com
você, trouxesse alguma lembrança ruim. Prefiro mil vezes morrer ao ver
aquela dor de novo em seus olhos e voz, não se eu puder evitar.
Suspirei.
— Bryan, nós já transamos antes várias vezes, e isso não aconteceu.
Apenas sexo por trás é complicado, mas podemos tentar... Eu quero fazer
tudo com você...
— Alexia, eu nunca vou fazer algo que traga lembranças que irão
atormentá-la e lhe causar dor...
— Mas sexo comum não é suficiente para você... — falei num
choramingo. Vi sua reação ao olhar aquela cena na TV, parecia que seus
olhos brilhavam como fogos de artifício. Eu precisava superar meu medo de
ficar amarrada.
Ele levantou as sobrancelhas ante o que eu disse.
— Como sabe do que gosto ou não? — retrucou. — Sei que ouviu
muitas coisas de mim da Sam, por serem amigas, mas nada daquilo importa
mais. Você, Alexia, é importante, não entende? Só quero você.
Eu estava prestes a replicar dizendo que não tinha entendido se ele
queria mais ou não. Entretanto, Bryan me soltou e nos despiu. Logo ele
estava dentro de mim, enchendo-me, saciando-me de algo pelo que eu estava
faminta: aquele homem.
— Isso é o paraíso, Luz do Sol. Com você, tudo é perfeito, ou melhor,
esplêndido. — Ele me beijou novamente, trazendo-me à borda do prazer.
Colocou a mão entre nós e circulou meu clitóris. — Eu te amo mais que a
qualquer coisa no mundo. Sexo, foda, trepar... com você, tudo é fazer amor.
— Eu também amo você, Bryan... Sei que posso não lembrar muita
coisa amanhã, mas espero me lembrar de você me dizer que me ama —
sussurrei.
— Amanhã, depois e depois eu digo de novo — sussurrou, dando uma
última estocada dentro de mim, levando-me ao Quatro de Julho em pleno
mês de dezembro.
Contudo, eu tinha em mente que só seria feliz por completo quando
superasse o meu medo e pudesse dar tudo ao meu homem lindo e gostoso.
Capítulo 19

ALEXIA
Após minha ida ao clube Fetish e a reconciliação com Bryan na mesma
noite, nós voltamos a fazer sexo normal. No entanto, eu precisava controlar
meu medo de ser amarrada, então pedi ajuda ao Nasx. Eu ia pedir ao
Daemon, mas, como ele tinha sentimentos por mim, decidi não o magoar,
porque eu não gostaria que o garoto que eu amasse pedisse minha ajuda para
superar algo em prol de sua namorada. Eu ficaria destruída ante algo assim.
Fui jantar uma noite com Bryan e nossa filha. Ele disse que já gostava
dela assim e a tratava dessa forma. Quem não amaria uma garotinha como
aquela, esperta e carinhosa? Fosse qual fosse o motivo da aversão dele a
crianças, estava passando, e eu dava graças aos Céus por isso. No
restaurante a que fomos, conheci Tabitta, a policial que estava trabalhando
disfarçada e parceira de Bryan. A loura era deslumbrante, mas o que me
chocou foi ver que ela estava com Jason. Bryan me disse que os dois
estavam juntos e que tiveram um lance no passado. Olhando os dois juntos,
era notável que se amavam muito. Eu desejava que os dois fossem felizes.
Como não tivemos mais notícias de Steve, resolvi fazer minhas tarefas
normais. O Natal estava chegando, então eu precisava comprar muitos
presentes para todos, um em especial para Ariane, pois seria o primeiro que
eu lhe daria como mãe, não como amiga. Ela passou a me chamar assim, e eu
apostava que foi Calebe quem a incentivou. Eu ainda não lhe havia dito que
era sua mãe de verdade, afinal, ela era pequena. Eu a deixaria crescer um
pouco mais, ou talvez lhe contasse depois que os problemas passassem.
— Ainda está decidida? — sondou Nasx assim que estávamos na casa
que ele alugara, num lugar ermo, sem vizinhos muito próximos para não
ouvirem meus gritos, porque isso iria acontecer, eu não tinha nenhuma
dúvida.
— Claro — falei firme. — Vamos começar. Eu sei que no começo
posso entrar em crise, então não entre em pânico e espere até... bem, até a
situação ficar pior.
Ele respirou fundo.
— Ficar pior?! O que isso quer dizer? — Sua voz soou alta na sala
grande e vazia.
— Eu desmaiava algumas vezes quando era algemada; talvez isso
aconteça — murmurei com o corpo trêmulo.
Ele ofegou e olhou para uma porta fechada. Imaginei que, naquele
cômodo, deveria ter colocado tudo o que eu precisava para perder o medo
de bondage de uma vez por todas.
— Talvez não devêssemos... — começou Nasx com tom preocupado,
mas o cortei, ficando de frente para ele:
— Por favor, Nasx, preciso controlar esse medo que vive dentro de
mim, não só para dar ao Bryan tudo que ele anseia, mas também por mim.
Quero ser uma mulher normal, sem ter crises, ainda mais durante o... hum,
você sabe. — Corei ao insinuar aquilo ante um homem.
— Se Bryan souber, vai me matar — afirmou, mas não parecia ter
medo. — Não quero perder sua confiança em mim, porque somos irmãos.
— Não vai, e você não está me obrigando a isso, eu estou te
implorando para me ajudar — garanti, apertando suas mãos. — Por favor.
Ele assentiu e abriu a porta, deixando-me ir na frente para ver tudo o
que ele organizara. Não era nada do que eu tinha pensado, totalmente
diferente dos meus pesadelos, do que eu tinha vivido.
Havia uma cama king size com lençóis vermelhos e cabeceira de ferro,
onde estavam algemas. Na parede ao lado tinham fileiras de correntes e,
perto delas, uma cruz em X como a que eu vi na TV. Além disso, o quarto
estava decorado, havia cortinas vermelhas. Tudo parecia lindo.
— Achei melhor mudar o cenário, deixar o quarto parecendo uma sala
de prazer, não de tortura, porque sexo assim — ele gesticulou para os
objetos — pode ser prazeroso, mas algumas pessoas fodidas confundem
prazer com escravidão e suplício. Você só tem que pensar que aqui é um
local de prazer, tudo bem?
Assenti, respirando fundo ao olhar ao redor.
— O que vou fazer primeiro? — Tentei deixar minha voz estável.
— Qual dos objetos ativa mais seus traumas? — sondou, avaliando-me.
Minha respiração acelerou ao olhar por mais tempo para as algemas na
cama.
— Alexia...
— A cama. Eu ficava muito nela com as mãos e pés algemados,
enquanto... — Minha voz falhou, tentando bloquear a visão daquelas cenas,
daqueles momentos terríveis de agonia e tortura.
— Talvez seja melhor começar com outra coisa e deixar essa por
último — disse ele com a voz preocupada, possivelmente com medo de que
eu surtasse.
Não respondi, mas assenti, tentando estabilizar a respiração, que
parecia cada vez mais aguda e ofegante, como se eu tivesse subido uma
ladeira quilométrica correndo.
Ele me levou até as correntes que estavam presas na parede e olhou nos
meus olhos.
— Tem certeza? — perguntou de novo.
Assenti, mas não respondi, não sabendo como minha voz sairia. Então
Nasx prendeu meus braços e pernas abertos, e tudo escureceu, levando-me
de volta ao pesadelo.

Minhas mãos e pernas estavam acorrentadas, prendendo-me à cama. Eu


estava nua, meu corpo todo doía pelas cintadas que recebi de Samuel
(durante o pesadelo, eu ainda não o via como Steve Lutner). Porém, o doente
não achava isso suficiente, ele tinha que violar mais do meu corpo e da
minha alma, que estavam quebrados.
Fechei os olhos, não querendo ver nada, mas ele bateu em meu rosto,
fazendo-me fitá-lo. Seu sorriso cruel estava em sua boca, que tinha uma
marca que eu causara nele com meus dentes logo que me prendeu ali, mas
era impossível lutar.
Seu cheiro de cerveja e cigarro, seus dedos em minha pele, seu membro
em mim... Então surtei novamente, gritando, porque isso me enojava ao ponto
de querer vomitar. E desmaiei.

Abri os olhos; estava deitada no banco de trás do meu carro, com Nasx
dirigindo. Suas mãos brancas apertavam tão forte o volante que eu achei que
o quebrariam.
— Nasx? — Sentei-me e olhei para os meus pulsos vermelhos, quase
em carne viva. — Maldição! Eu surtei, não foi? Como vou explicar isso ao
Bryan?
Ele respirou fundo.
— Nunca vi nada assim antes, seus gritos torturantes... — Ele
estremeceu, mas senti raiva em seu tom. Eu sabia a quem se destinava essa
fúria. — Do que se lembra?
— Lembro-me de estar algemada, mas não naquela parede e com as
correntes, mas em uma cama, e ele estava lá... — Sacudi a cabeça,
expulsando as lembranças sombrias.
— Talvez seja melhor deixar isso quieto. Bryan te ama, Alexia, ele
jamais vai deixá-la independentemente do que fizerem ou não — falou quase
suplicante. — Talvez você possa frequentar psicólogos; eu soube que eles
ajudam muito nesses casos.
Respirei fundo, porque parte de mim queria desistir, mas parte não
queria, a maior. Eu queria ser uma mulher normal, sem medo de provar tudo
com Bryan.
— Eu sei, mas já frequentei demais psicólogos na clínica psiquiátrica
em que fiquei internada, e isso não resolveu nada — informei, suspirando e
olhando os pulsos machucados. — Vamos continuar até eu conseguir me
controlar, mas primeiro preciso resolver esse problema com meus pulsos.
Podemos ir ao shopping?
— Mulher, você acabou de desmaiar por causa de um trauma e quer ir
ao shopping? — Ele sorriu descrente e sacudindo a cabeça loura.
— Preciso comprar braceletes que cubram essas feridas, que inclusive
podem se tornar hematomas, ou ele vai desconfiar. Não quero que Bryan
saiba de nada até eu conseguir me fortalecer.
— Tudo bem, eu vou fazer isso por você e pensar em algo que não
machuque mais a sua pele — concedeu, e seguimos para o shopping.
A partir daquele dia, passamos a ir todas as tardes à casa para treinar.
Nas primeiras vezes, eu desmaiava e era levada para dentro do pesadelo das
lembranças. Era como se eu estivesse viajando de volta ao passado e
vivendo aquilo tudo de novo.
No quarto dia de treino, imergi em um pesadelo em que estava
amarrada de bruços à mesa, com os braços abertos, a bunda para cima e os
pés no chão.
Você é minha puta, falava aquele demônio, batendo em minhas nádegas
nuas com um chicote de montaria. As chicotadas eram tão fortes que eu
gritava de dor e desespero.
A névoa das lembranças passou a se misturar com o presente, e eu não
sabia mais o que era real ou não. De repente, uma voz inconfundível me
trouxe ao presente.
— Alexia... — chamava Bryan a todo momento o meu nome,
desesperado.
Aquela voz era capaz de me tirar dos piores pesadelos. Eu podia estar
no inferno, que ela tinha o poder de me resgatar de lá.
Abri os olhos e estava no cômodo que Nasx arrumou para mim, presa à
Cruz de Santo André. Pesquisei sobre ela, já que me deixou curiosa o fato de
uma cruz com nome de santo ser usada para aquele tipo de coisa. Lembrava-
me de ser colocada ali antes de surtar de novo, como sempre, mas fui trazida
de volta pela voz do único homem que era capaz de me ressuscitar dos
mortos.
Não era Nasx à minha frente, embora eu pudesse vê-lo todo machucado
num canto. Parecia que tinha levado uma surra, e não fora leve, pelo sangue
que saía de sua boca.
Meu coração gelou ao tomar consciência de que, por minha causa, ele
apanhou de Bryan, que estava à minha frente com os braços cruzados,
olhando-me.
— Saiam os dois agora — rosnou Bryan sem tirar os olhos de mim.
Percebi que ele falava com Nasx e Daemon – esse estava perto da
porta.
— Porra, eu não vou deixar você assim, como está, com ela — grunhiu
Daemon, olhando furioso para Bryan.
Bryan suspirou e puxou a arma, apontando-a para Daemon, que não
parecia preocupado com isso.
— Shadow, leve-os agora daqui, ou não respondo por mim — sibilou
num tom mortal.
— Daemon, venha comigo, deixe Bryan resolver isso com sua garota —
falou Shadow, cuja presença só então notei, olhando com expressão triste
para Bryan. — Lembre-se, Bryan, a luz sempre vence a escuridão.
Assim que todos saíram – inclusive da casa, já que ouvi o som de
motos se afastando –, foquei em Bryan, que guardou a arma. Eu ainda estava
chocada por ele ter puxado a pistola para um dos seus amigos.
— Bryan... — comecei, mas parei ao ser interrompida por sua fúria.
— O que acha que pode me dizer quanto a isso?! Acha que não vi as
marcas nos seus pulsos e tornozelos?! Porra! Sabe o que estou sentindo
agora?! Quase matei o Nasx hoje! Não sabe o quanto me segurei para não
fazer isso!
— Mas não fez, você é bom...
Ele riu sem vida.
— Bom? Acha que sou bom ao deixá-lo viver? Você não entende, não
é? Ver você amarrada e gritando... e aquele fodido assistindo a tudo e não
fazendo nada!
— Porque eu pedi a ele para me ajudar a acabar com o medo das
lembranças e ser completa para você... — Chorei e tentei respirar fundo
para me controlar.
Ele se aproximou de mim e colocou as mãos nos meus cabelos,
puxando-os para trás com força, embora não a ponto de me machucar. Por
incrível que pareça, gostei disso.
— Você quer ser fodida assim? — sibilou, pegando uma faca na sua
bota e deslizando a folha suavemente em minha pele, então passou a lâmina
no vestido, cortando-o em duas metades e o arrancando do meu corpo.
Ofeguei tanto pela lâmina quanto por estar sendo despida. O sutiã e a
calcinha foram as próximas peças a serem rasgadas.
— Ainda vai me deixar fazer tudo que quero com seu corpo? É isso que
você quer? Você ainda vai querer um monstro fazendo isso?
— Você não é um monstro...
— Não? Você não sabe como está minha mente agora; se soubesse, iria
fugir de mim, Alexia — declarou de um jeito sombrio. — Olhe dentro dos
meus olhos; os demônios estão aí dentro, loucos para serem soltos e matar
sua fome.
— Eu confio minha vida e minha alma a você — afirmei com forte
convicção.
Seus olhos escureceram.
— Você não devia dizer isso a alguém como eu. — Ele se afastou,
pegou um chicote e veio até mim com os olhos me pedindo para pará-lo, mas
eu não ia fazer isso.
— Pois eu digo, quero que faça comigo tudo que fez com as mulheres
que já passaram pela sua vida, não me importa o que seja! — garanti com a
voz segura.
Tinha algo nos olhos dele que estava diferente, mas não me deu medo,
porque eu acreditava que Bryan nunca me machucaria de nenhuma forma.
Ele rosnou e assentiu, com seus olhos azuis escuros como uma
tempestade. Ele veio até mim e me beijou, mordendo meu lábio tão forte que
senti o sabor de sangue, mas não liguei. Estava amando ver o fogo em seus
olhos lindos e raivosos. Esperava que meus treinos tivessem tido efeito.
Então seus lábios seguiram para minha orelha, mordiscando o lóbulo e
me fazendo gemer, ansiando por ele, por aquele homem, que me curava até
de um trauma que sempre me atormentara, ainda mais depois daqueles quatro
dias de enfrentamento das lembranças. Ouvindo sua voz, tudo ficava
suportável. Eu nem imaginava que sua voz, seu cheiro e seu olhar eram a
arma que eu precisava para não cair nas profundezas do abismo que foi
aquela semana nas mãos de um psicopata, e acreditava que poderia estar
com Bryan completamente sem surtar.
Ele se afastou e escorou a ponta do chicote em minha pele, fazendo
meus braços mexerem e as correntes tilintarem. O som me fez estremecer,
mas foquei na imagem de Bryan ali, e não naquelas que me causavam medo e
dor.
— Quer isso, Alexia? — inquiriu como se sentisse que eu precisava
ouvir sua voz para aquietar meu coração e meu medo das correntes.
— Sim; com você, eu quero tudo — falei a verdade, porque meu corpo
e minha alma queriam aquele homem mais do que eu precisava comer e
respirar.
— Bom — disse em tom quase orgulhoso e bateu em meus peitos com a
ponta do chicote.
Ele fazia isso várias vezes enquanto meus olhos se fechavam, sentindo
o prazer se apossando de mim dos pés à cabeça, quase me fazendo entrar em
combustão. Meus gemidos eram altos, porque nunca tinha sentido nada
daquilo antes, o prazer, o fogo devorando-me, consumindo-me. Essa palavra
descrevia tudo. Bryan me consumia.
— Olhos em mim. — Bateu em minha boceta, da qual meus sucos
escorriam, deslizando pelo interior de minhas coxas devido ao meu prazer,
desejo e fogo. — Você quer minha boca? Ou o chicote?
Abri os olhos e fitei suas íris brilhantes.
— Sua boca, eu a adoro. — Olhei sua boca avermelhada, que esboçou
um sorriso.
Então ele se agachou à minha frente e devorou minha boceta, lambendo-
a, degustando-a tanto que logo vi milhares de estrelas. Ele já havia colocado
a boca em mim muitas vezes, mas daquela vez foi fora do normal, tanto que
logo gozei em sua boca.
E não parou por aí. Em vez de entrar em mim, como sempre fazia, ou de
me deixar colocar a boca nele, soltou minhas mãos e pés e me pegou nos
braços, já que eu estava mole pelo orgasmo. Levou-me para a cama,
deitando-me nela, e se afastou, olhando-me de pé perto da cama.
— Deite de bruços agora — ordenou, e, assim que estremeci, pois essa
posição era a pior, porque eu tinha medo de não conseguir ultrapassar o
medo e deixar o prazer e o amor por aquele homem me consumirem,
acrescentou: — Ouça a minha voz, a siga, o.k.?
— Sim, Bryan. — Respirei fundo e fiz o que ele mandou, deitando-me
de bruços nua e abrindo os braços na direção das algemas. Ofeguei ao sentir
o medo começar a me dominar ao ser algemada. Flashes de lembranças
acometeram minha mente, mas a voz de Bryan, como sempre, trouxe-me de
volta.
— Luz do Sol, sou eu aqui... — Pôs-se sobre mim, puxou meu cabelo e
lambeu minha orelha. — Ouça minha voz, sinta meu cheiro e meu pau duro
querendo se apossar de seu corpo enquanto levanta essa sua bunda linda e
gostosa.
Meu coração bateu forte com sua voz sexy expulsando todo o medo que
queria me governar. Aquele homem era a luz que iluminava a minha
escuridão, assim como eu sonhava um dia ser para ele.
— Hummm, nunca fiz nessa posição, mas com você, quero tudo —
sussurrei.
— Mas eu pensei que, devido ao seu trauma dessa posição... era isso
que tinha acontecido — falou em tom grave, mas respirou fundo para se
controlar.
— Não, ele só gostava de me pôr assim para me bater com o cinto... —
Minha voz tremeu.
Ele me interrompeu.
— Não pense nisso agora, pense só em mim e no meu toque e saiba que,
se eu bater em sua bunda assim, será para o seu prazer, não para lhe causar
dor, tudo bem? Quer tentar? — Beijou minhas costas. — Se você não quiser,
eu paro. Jamais vou fazer algo que não queira ou que a machuque.
— Eu quero, Bryan! — garanti com ferocidade, para ele ter certeza de
que eu não estava mentindo. Gritei assim que ele deu um tapa na minha
bunda, mas não senti apenas dor – leve –, e sim um fogo ainda maior me
consumindo, tanto que acreditei que gozaria se ele continuasse. — Oh, Deus!
— Gostou? Quer mais? — Senti outro tapa, perto de minha boceta, e
gemi, querendo juntar as minhas pernas para aumentar o atrito, mas suas
mãos impediram que isso acontecesse.
— Bryan, por favor! — Eu me remexi e levantei os quadris, querendo e
ansiando por ele onde latejava, a cada toque no meu clitóris. — Eu quero
você dentro de mim agora!
— Seu desejo é uma ordem, minha Luz do Sol! — Então ele estava
dentro de mim, possuindo-me por trás, mas, pela primeira vez tendo um
homem contra minhas costas, eu não estava sendo levada pelas sombras, mas
sim pela luz chamada Bryan. Ele era a minha luz na escuridão.
— Eu te amo, Luz do Sol. Com você aqui, a escuridão se aquieta dentro
de mim — sussurrou quando eu estava deitada em seu peito e quase
dormindo.
— Um dia quero poder tirar toda ela... Quero ser a luz no abismo
escuro que às vezes domina sua alma. — Dormi antes de ouvir sua resposta.
Capítulo 20

BRYAN
Passado

Quando levei um tiro no clube MC Scorpion, achei que eu e a garota


que eu tinha salvado não conseguiríamos fugir, mas, graças ao Shadow, que
veio me ajudar, conseguimos escapar. Eu precisava protegê-la dos monstros
que a queriam. Black não deixava a sua “mercadoria” nas mãos de outras
pessoas, porque era assim que ele via aquela menina, uma mercadoria que
estava à sua disposição para qualquer coisa que ele quisesse, sem poder de
recusa.
— Você tinha que se meter em problemas, não é? — acusou Shadow. —
Toda vez vou ter que aparecer e limpar a sujeira que faz?
Eu estava sentado em seu Cadillac preto. O bastardo tinha mais ciúmes
daquele carro do que um dia já sentira de alguém. Isso quase me fez rir, já
que ele nunca havia se interessado de verdade por uma mulher. Para ele,
assim como para mim, era só foda e curtição.
— O que ia fazer? Deixar aqueles caras estuprarem a garota? Porra,
não tenho sangue-frio para isso, e você também não. — Olhei de lado para
ele. — Não é?
Shadow suspirou e olhou para o banco de trás, onde a menina estava
dormindo.
— Como ela pode dormir assim depois de quase ter sido atacada? —
Seu tom era incrédulo.
— Ela disse que está grávida, então deve ser isso — respondi, sentindo
o buraco de bala doer. Estava sob um pano, mas ele não conseguia estancar o
sangue, tanto que pensei que logo desmaiaria devido à hemorragia. A
princípio, pensei que fosse de raspão, mas parecia que não.
Shadow ofegou.
— Caralho, me diz que o filho não é seu! — Sua voz saiu duas oitavas
mais alta, fazendo a garota se mexer no banco de trás, mas não acordou com
o seu chilique. — Droga, cara, se fez isso, eu mesmo decapito você e jogo
sua cabeça aos porcos, porque ela deve ter só uns 15 ou 16 anos, não mais
do que isso.
Revirei os olhos.
— Não é meu filho, aliás, nem conheço essa garota. Pedofilia não é
minha praia, odeio quem faz esse tipo de coisa, como você deve saber.
Shadow sabia tudo o que havia acontecido comigo e minha família
torta, então estava por dentro do porquê eu odiava abusadores de crianças e
adolescentes.
— Eu sei, desculpe, cara. Será que é filho de algum deles? Se for,
vamos ter uma luta feia pela frente — falou, entrando na cidade de
Middletown. — Vamos parar aqui e dar um jeito nesse seu ferimento.
Suspirei.
— Eles achavam que ela era virgem. Mesmo se for algo assim, eu não
me importo. Não vou deixá-la com eles. Só preciso escondê-la em algum
lugar seguro. Não posso ficar com uma menina grávida andando sem rumo,
já que não sei bem o que fazer agora — disse e saí do carro, chamando a
garota. — Acorda. Vamos ficar aqui alguns minutos, depois seguimos
adiante.
Ela piscou, olhou para mim e saiu do carro, então viu Shadow e pegou
meu braço, apertando-o e se escondendo atrás de mim.
— Por favor, não me dê para outros homens! — suplicou agarrada às
minhas costas.
Shadow riu.
— Querida, saiba que eu nunca enfiaria o meu...
— Shadow — cortei-o, um alerta em meu tom, já que estávamos diante
de uma garota que era quase uma criança e que, ainda por cima, estava
grávida. Olhei para ela. — Não liga para ele. Não vamos te machucar, não
tem a mais remota chance de nem eu nem ele encostarmos um dedo em você,
o.k.?
Ela assentiu, aliviada.
Nós nos hospedamos numa pousada de beira de estrada e entramos no
quarto, que tinha duas camas de casal e um sofá grande. Shadow saiu e
comprou roupas para nós dois, em seguida me costurou. A bala tinha
atravessado meu abdome, não pegando em nenhum órgão, ou pelo menos eu
esperava que não. O sangramento havia parado, e isso me tranquilizou,
porque, se eu desmaiasse ou ficasse muito fraco, não teria como proteger
aquela menina, minha irmã e vovó. Shadow disse que tinha alguém de
confiança cuidando de Sam na faculdade, mesmo que eu tivesse apagado os
rastros dela. Estava feliz por isso, porque não podia estar em dois lugares ao
mesmo tempo.
— O que faremos agora? — sondou Emília – era esse o seu nome,
conforme nos avisara havia pouco tempo –, vestida com calça e suéter de
moletom azul.
Suspirei.
— Vou te levar à casa de um amigo meu, que tomará conta de você até
eu resolver tudo isso — falei, indo olhar a janela para ver se alguém tinha
nos seguido até ali.
De repente senti braços em minha cintura apertando-me por trás.
— Por favor, não me afaste de você! Eu não confio em mais ninguém
neste mundo! — suplicou ela, chorando e me abraçando ainda mais.
Meu coração doeu por ela. Sabia que não podia deixá-la sozinha. Olhei
para Shadow, que observava a menina agarrada a mim como um carrapato.
— Cadê seus pais? Não pode ficar com eles? — sondou meu amigo.
Segurei delicadamente as mãos sobre a minha cintura, afastando-as de
meu corpo, virei-me e fitei os olhos dela, molhados de lágrimas.
— Por favor, não me leve de volta para aquele monstro! — implorou,
limpando as lágrimas. — Ele não me deixava sair de casa, nem mesmo para
ir à escola e há pouco tempo me deu àqueles homens para pagar uma dívida!
Meus pulmões travaram. Parecia que eu tinha levado um soco no tórax,
pior do que o tiro que recebi na barriga. Maldição! Uma suspeita me veio à
mente.
— Se não saía de casa, quem é o pai do seu filho? — sondou Shadow,
com certeza tendo a mesma desconfiança que eu.
Ela se sentou no sofá e se encolheu num canto, levantando as pernas
como se estivesse se protegendo.
— Minha mãe morreu há alguns meses, então ele bebe muito e diz que
me pareço com ela...
— Você está querendo dizer que esse filho é do fodido do seu pai?! —
Cerrei os punhos, com as suspeitas sombrias se confirmando. Queria
esmurrar alguma coisa devido à minha ira, mas não queria assustá-la, então
me controlei.
— Onde ele mora? — perguntou Shadow mortalmente, com os dentes
trincados.
Ela o fitou com olhos assustados.
— Não vai me entregar a ele, não é? Por favor, não faz isso comigo! Eu
faço o que vocês quiserem! Não reclamo de nada e não critico sobre comida
ou roupas, serei boa, apenas não o deixe...
— Não vamos dar você a esse fodido, apenas vamos dar uma lição a
ele que esse desgraçado nunca vai esquecer em sua vida — sibilou Shadow.
Ela suspirou aliviada e nos deu o endereço daquele bêbedo e
estuprador, que logo estaria no inferno que estava preparado para gente
como ele. Eu não me incomodava em tomar a vida de merda de pessoas
desumanas como aquela, de dar mais um pedaço de minha alma para o
abismo ao fazer aquilo.
Deixei-a no quarto e saí da espelunca de beira de estrada. Precisava
falar com Shadow sozinho, sem Emília por perto. O que eu tinha a dizer não
era para seus ouvidos.
— Shadow, ele é meu assim que o pegarmos — avisei, escorando-me
em seu carro ao seu lado.
Ele suspirou e olhou para a pousada desbotada pela chuva e para a
janela do quarto onde ela estava.
— Deus, me deparo com cada tipo de homem que minha vontade é
matar cada um! Só não eliminei os MCs fodidos do Scorpion porque meu
presidente não deixou; se eu pudesse ir contra Black e o maldito pai de
Emília, eu iria, Bryan, mas não sou o chefe e sigo as ordens de Berry — ele
me disse com um suspiro desalentado.
— Eu sei, cara, e quero lhe agradecer por ter cuidado das minhas
costas todos esses meses em que eu estava pagando a dívida dos meus pais.
Você ficou comigo e me ajudou em várias situações. — Cocei meu queixo
barbudo. — Não tinha como eu ir lá e fazer o que ele me pediu àquele casal.
Eles são pessoas boas, você viu, não é?
— Sim. Eles estão cobertos agora, e o primo está arrumando um jeito
de pagar sua dívida para Black deixar sua família em paz. Pelo menos o cara
tem colhões — falou ele e me olhou de lado. — Não pode se apegar a essa
menina e sabe disso, não é? Não pode ficar com ela para sempre. Você tem
sonhos, Bryan, e precisa ir atrás deles.
— Eu não estou me apegando a ela, só protegendo-a de caras que lhe
querem fazer mal. Isso não vai acontecer enquanto eu viver. — Suspirei, não
me importando com o que eu queria naquele momento. — E quanto a eu me
tornar policial? Isso pode esperar um pouco, até ela completar a maioridade
e poder cuidar de si e da criança que vai nascer. Enquanto ela ainda for
menor de idade, eu a protegerei.
Shadow riu, mas era uma risada tensa.
— É disso que estou falando, Bryan, você desiste dos seus sonhos pelo
bem dos outros. Com o serviço que fez hackeando uma conta para Dark, o
chefe da máfia russa, você ganhou uma bolada preta, e o que fez? Investiu na
sua irmã, fazendo-a ser aceita na faculdade. — Seu tom era ao mesmo tempo
de reprovação por eu sempre me dedicar aos outros e de orgulho por eu
fazer o que era certo.
— Como sabe sobre isso? Conhece Nikolai? — perguntei curioso.
O homem, ou melhor, o garoto de apenas 19 anos era uma das pessoas
mais influentes da Rússia.
— Sim, já fizemos negócios juntos. Apenas um moleque e já nesse
ramo. Por isso pense bem, Bryan. Você ainda tem uma chance de realizar
seus sonhos, como Dark e eu não tivemos — disse baixo e suplicante.
— E o que faço com ela? Não posso simplesmente deixá-la sozinha,
uma garota de 15 anos grávida do fodido pai, que logo vai para o inferno,
porque vou mandá-lo para lá — garanti num tom mortal.
Ele deu um suspiro triste.
— Não posso deixar isso acontecer — contestou ele, avaliando-me de
perto.
— O que você fez? — Afastei-me do carro, olhando para ele, que
cruzou os braços. Não parecia preocupado com meu tom; ele se garantia,
mas eu também.
— Você escolheu essa vida, cuidar de uma garota e de um bebê, se
tornar um agente da lei e defender seu país, então não pode ficar por aí
matando pessoas, não importa o que tenham feito. Precisa se estabilizar,
cara, e seguir seu sonho.
Ri, amargo, passando as mãos nos meus cabelos para não atacar meu
amigo.
— Então vou deixá-lo simplesmente escapar disso? Não vou fazer
nada? Cara, não posso deixar por isso mesmo, tenho que... Ele tem que pagar
pelo que fez a ela.
— Não se preocupe, Bryan, porque agora, nesse exato momento, esse
merda está tendo o que merece, com juros e de jeito bem lento — falou
sombriamente. — Apenas tome conta da garota e do bebê, pegue o dinheiro
que você tem e tenha uma vida normal como todo mundo. Nem todos têm
uma segunda chance.

Depois da conversa com Shadow, eu e Emília nos mudamos para a


Carolina do Norte, onde comprei uma fazenda e algumas cabeças de gado
leiteiro. Passamos a morar lá com novos nomes – Christopher e Christina
Wolf –, e eu trabalhava como fazendeiro. Ela fingia que era minha esposa e
que era maior de idade.
Emília já fazia parte da minha família, como Sam e vovó. Assim que a
criança nasceu, Emília a chamou de Emma, e gostei disso. Fazia muito tempo
que eu não era feliz assim, estando com alguém que já considerava uma
irmãzinha, que era mãe de uma bebezinha linda que eu via como uma
sobrinha.
Dois anos passaram voando, e Emma estava com 1 ano e 5 meses e
Emília, com quase 18 anos. Tornou-se uma mulher inteligente e perspicaz,
muito madura para sua idade. Eu a amava como uma irmã tanto quanto amava
Samantha.
Sam estava indo bem na faculdade. Um dia fui visitá-la e conheci uma
de suas amigas, uma loura chamada Alexia, tão linda e formosa que tudo em
mim gritava querendo aquela mulher, mas tinha algo de diferente nela, e eu
não sabia o que era. Não aprofundei o contato, já que não queria contaminá-
la e trazê-la para a escuridão que me cercava. Além disso, eu não podia ter
um relacionamento naquela época, afinal, tinha Emília e Emma na minha
vida.
Não tínhamos mais notícias do MC Scorpion, mas eu sabia que eles
estavam nos procurando. Quando alguém traía Black, era caçado e eliminado
sem direito a perdão. Na sua mente fodida, eu o havia traído, tanto por não
ter terminado de pagar a dívida do meu pai quanto por lhe subtrair um
pagamento que recebeu do pai de Emília.
Eu sabia que Shadow estava segurando as pontas para mim, para não
sermos encontrados ali. Agradecia a ele por isso, por ir contra seu chefe
para me proteger. Esperava que um dia pudesse lhe agradecer pessoalmente,
quando tudo aquilo passasse.

— Como foi no serviço hoje? — Emília perguntou, colocando um prato


de arroz e frango na minha frente. Ela sabia que eu adorava aquela
combinação.
Sorri para ela.
— Foi bom, consertei a cerca, que estava caindo, assim o gado não
foge — respondi enquanto comia.
Ela franziu o cenho.
— Quando vai sair? Quero dizer... sair com uma mulher. Desde quando
nós viemos para cá, você não sai, só trabalha nesta fazenda, de que você nem
gosta...
— O quê? — Nós já havíamos falado sobre aquele assunto várias
vezes, mas eu sempre me esquivava.
— Já conversamos antes, Bryan, quero que saia e se divirta com alguma
mulher.
— Não quero sair...
— Bryan, eu sei que está fugindo de Black, mas você precisa ter uma
vida lá fora, não em uma fazenda — insistiu, pegando uma carta no bolso e
me entregando.
— Onde a encontrou? — Era uma carta de aceitação na polícia de
Nova Iorque.
— A achei no bolso da sua calça. Eu nem sabia que você tinha se
inscrito para a polícia. Posso ver que é algo que você ama fazer. Está
vendo? Seus olhos brilham querendo isso, Bryan. Você só não aceitou por
minha causa e de Emma. Por isso viemos morar aqui, não foi? Não precisa
desistir de nada por nós, pode seguir seus sonhos. Já renunciou demais, não
acha?
— Olha, eu não vou aceitar isso e fim de conversa — avisei. — Eu
escolhi essa vida e vou vivê-la.
— Mas, Bryan... — começou ela em tom suplicante, mas a cortei de
modo definitivo:
— Não vamos mais falar sobre isso, tudo bem?
— Pelo menos saia esta noite e encontre alguém, já que faz muito tempo
que...
Fuzilei-a com os olhos, mas ela sorria tranquilamente, feito uma
pestinha.
— Certo, eu vou, mas não quero mais falar desse negócio de polícia e
tudo mais, porque eu não me arrependo de estar aqui com você e Emma.
Jamais pense isso, Emília. — Não me arrependia mesmo, só de não ver Sam
e vovó com a frequência que eu gostaria.
— Ok. Enquanto você estiver fora, eu vou costurar algumas roupas para
Emma, que está a cada dia maior. E preciso consertar uma roupa para a dona
Laura. — Sorriu animada.
— Só espero que leve a roupa até a casa dela; não gosto daquela
mulher aqui.
Dona Laura era a dona da fazenda vizinha à nossa.
Fiz uma careta.
— Não gosta que ela belisque suas bochechas? — Ela riu.
Sacudi a cabeça enquanto ela lavava a louça suja e eu a enxugava.
— Não sou uma criança para ela fazer isso, e aquela história de filhos?
Meu Deus! Ela me disse para ter uns nove, como ela. — Estremeci ao
imaginar aquilo.
Os olhos de Emília se arregalaram.
— Só espero que, quando se casar, você se divirta fazendo seus filhos
— brincou ela.
Fazer não era o problema, mas com quem eu queria fazer, uma loira que
não saía da minha cabeça: Alexia.
— Querida, não esqueça que ela pensa que somos casados, então isso
vale para você também. — Saí da cozinha, e ela me seguiu.
— Cruz-credo, não estou a fim de ter filhos por um bom tempo. Além
disso, eu nem tenho um namorado, alguém para chamar de meu.
— Um dia terá — falei, beijando sua testa.
Tomei banho e me arrumei para sair. Já eram quase 7h da noite. Estava
pensando em ir a um bar e pegar alguma garota. Já fazia um bom tempo que
eu não ficava com ninguém. A última vez foi quando eu tinha ido comprar
ração para o gado e ficado com uma garota no banheiro de sua loja. Eu nem
sabia seu nome, nem me importava, pois a única mulher que eu queria de
verdade não podia ter.
Pelas últimas notícias que eu tive dela, Alexia estava indo bem na
faculdade, junto a Sam, e se formaria no ano seguinte.
Cheguei à sala e olhei para Emília, que estava costurando. Ela era boa
nisso. Alegrava-me o fato de o seu passado não a ter traumatizado, como
acontecia a muitos por aí, como também me deixava feliz que ela amasse
Emma, não importando o modo como ela foi concebida. Emília agradecia a
Deus por Emma ter nascido perfeita e saudável, já que ambas eram filhas do
mesmo pai, um homem que estava queimando no inferno, graças a Shadow,
que deu um jeito de alguém mandá-lo para lá. Entretanto, nem sempre foi
assim; logo no início de nossa convivência, eu a via lutar contra seus
pesadelos. Finalmente ela havia se acalmado.
Emília olhou para mim sorrindo assim que entrei no cômodo.
— Ficou bom sem aquela barba que o fazia parecer mais velho do que
é de fato. — Veio até mim e bagunçou meu cabelo. — Esse é o seu charme,
não o deixe de lado. Vai conquistar todas esta noite.
Ri e a abracei rapidamente.
— Só quero que saiba que você e Emma são muito importantes na
minha vida.
— Bryan, eu também amo você, como irmão. Agora vá se divertir. Ou
está tentando se tornar um monge?
— Isso não é minha praia — respondi, indo para o quarto de Emma. —
Agora vou me despedir da minha boneca. — Entrei no quarto onde a menina
estava dormindo e vi minha princesinha linda. Como podemos amar uma
coisinha tão pequena assim? — Boa noite, princesa linda. Eu te amo
demais!
— Nós também amamos você — disse Emy escorada à porta. — Agora
vá para seu encontro.
Capítulo 21

ALEXIA
Presente

Quando acordei de manhã, estava em êxtase, tão feliz por ter ficado
com Bryan algemada sem surtar ou entrar em pânico. Ele foi maravilhoso.
Todo o momento em que o medo ameaçava me dominar, ele me tranquilizava
com sua voz, com seus beijos de mel, que eu tanto amava.
Contudo, assim que me levantei, senti minhas pernas bambas e uma
dorzinha estranha entre as pernas. Eu nunca tinha transado tanto em minha
vida, sem contar quando estive com Steve, afinal, aquilo não era sexo, mas
estupro.
Olhei para o meu corpo e ofeguei ao ver machas roxas por todo lado,
mas não era de se estranhar, afinal, eu era muito branca e ficava marcada
com facilidade. Dei alguns passos, sentindo meu corpo rígido, como se
tivesse feito muita musculação e não aguentasse andar no dia seguinte.
Olhei ao redor, no quarto da casa que Nasx alugou para eu treinar
bondage. O treino só foi efetivo e perfeito com Bryan. Quando pensei em
seu toque, fiquei com vontade dele de novo, com uma fêmea no cio.
Enverguei um vestido azul que estava em uma cadeira. Eu não sabia
quem o havia trazido, mas não me importava, afinal, o que eu usava foi
inutilizado por Bryan.
Procurei-o no banheiro, já que ele não estava no quarto, depois segui
para a sala vazia e o vi de pé à janela de vidro, olhando para fora.
Fui até ele para abraçá-lo e lhe agradecer pela noite mais maravilhosa
da minha vida.
— Não toque em mim — falou com a voz gélida, virando-se e me
fitando com olhos sombrios.
— O quê? Por que não posso tocá-lo? Ainda está bravo por eu ter
pedido ajuda a Nasx? Quero que saiba que ele só me algemava, não me
tocava, então não precisa ter ciúmes. — Sorri. — Nossa! Foi a melhor noite
da minha vida...
— Você ainda sorri?! — esbravejou, afastando-se de mim. — Eu
praticamente estuprei você!
Arregalei os olhos com descrença.
— Espere, o quê? Você não me estuprou, Bryan. Não se lembra do que
tivemos? — Franzi o cenho. — Ontem tinha algo a mais em seus olhos, mas
não consegui identificar o que era.
— E ainda assim me deixou tocar em você, porra! Alexia, não sabe o
que sinto quando vêm flashes à minha mente de você gritando “pare”...
— Como não se lembra do que houve, do que aconteceu ontem?!
Enquanto estive com você, só gritei de prazer! — Alguma coisa em seu olhar
me fez suspeitar de algo. — Fora você ter me encontrado aqui com seu
amigo, aconteceu mais alguma coisa? — Dei um passo até ele, mas Bryan
recuou, e parei onde estava.
Ele respirou fundo.
— Meus pais foram mortos ontem. Dylan foi espancado até a morte na
prisão, e minha mãe, em sua casa. — Sua voz soou sem vida ao dizer isso.
— Oh, meu Deus! — Cobri a boca com uma das mãos tamanho o
choque. — Sinto muito, Bryan. Sabe quem foi? Será que foi Steve?
— Pelas câmeras na prisão, que filmaram, sim. Ele se vestiu de guarda,
entrou e fez o que fez. Acredito que também tenha sido ele que fez isso com
minha mãe, mas em sua casa não há câmeras.
Meu estômago embrulhou, e só não vomitei por não ter nada no
estômago, mas aquela informação me encheu de fúria. Por que eu não o
matei quando atirei nele?! Se eu tivesse feito aulas de tiro, teria acertado
precisamente, não teria errado.
— Maldição! Bem que eu podia tê-lo matado! — rosnei com os punhos
cerrados.
— Queria ter feito isso? Você não sabe o que está dizendo para falar
algo assim.
— Por quê? Só porque você me acha perfeita? Não sou perfeita, Bryan,
e queria tê-lo matado, porque agora você vai fazer isso, não é?
— Sim, vou matá-lo e de maneira dolorosa. — Sua voz era fria e
desumana.
— Não pode! Por favor, Bryan! Eu sei que ele matou seus pais, mas não
faz isso! Não deixe a escuridão vencer você... — comecei, mas ele me
interrompeu:
— Meus pais? Você acha que quero vingá-los? Não, não me importo
com eles, mas com o que esse verme fez a você e tantas mulheres inocentes.
Por isso vou matá-lo de maneira lenta e torturante, como ele fez com todas as
outras vítimas.
— Bryan, você não é um monstro como ele. Eu sei que está sofrendo
pelos seus pais, mas não fique assim, vamos dar um jeito nisso... — Queria
tocar nele para tranquilizá-lo, mas seus olhos pareciam um abismo escuro e
profundo, como se a escuridão estivesse vencendo.
— Não estou assim por meus pais. Alexia, eu sou um monstro, que a
violou como esse imundo. Acha que sou diferente dele? Você gritava, e eu
não ouvia! A minha alma estava negra naquela hora. Shadow e Daemon não
deviam ter me deixado sozinho com você! — Colocou as mãos nos cabelos
como se fosse arrancá-los e fechou os olhos ante a dor. — Seus gritos me
assombram, e será assim para sempre.
— Bryan, meus gritos quando você chegou aqui eram de dor e medo,
mas porque eu estava imersa num pesadelo lúcido com aquele demônio!
Depois que você me tocou, gritei de prazer, não de outra coisa! Pode confiar
em mim? — inquiri em tom magoado.
— Por quê, se você diz isso apenas para eu não sofrer e não me sentir
culpado por algo que fiz? Maldição, você tem trauma de ser algemada e
fazer sexo por trás, e eu fiz tudo isso! Não vê o monstro que sou?!
— Não, não vejo! Se você se lembra dessas partes, por que não se
lembra das outras, quando eu pedia e ansiava para ter seu toque, seus beijos
e tudo que estava me dando? — sussurrei. — Ficamos várias vezes assim, e
eu não surtei, amei cada momento. Você não é um monstro. Nunca pense isso.
— Eu não sou? E esses demônios que estão aqui dentro de mim há tanto
tempo? Quer ouvir minha história?
Então ele narrou sobre o MC Black, do motoclube Scorpion, que
ameaçou sua família caso ele não matasse algumas pessoas. Disse que
assassinou quatro, mas que não pôde fazer isso com um, que era inocente, e,
quando foi dizer ao chefe do MC que não trabalharia mais para ele, as coisas
saíram do controle.
Contou que salvou uma menina de 15 anos que foi estuprada e estava
grávida e a qual Black via como sua posse. Após isso, Bryan foi viver com
outros nomes junto a essa menina, chamada Emília, e sua bebê, Emma. Falou
sobre a noite estranha em que teve uma conversa com Emília sobre seus
sonhos deixados de lado para protegê-las.
— Sabe o que é mais estranho? Eu não queria realizar sonhos. Eu as
amava, embora como irmã e sobrinha, e isso bastava para mim.
Assenti.
— O que aconteceu depois? — sondei, porque algo havia acontecido
com elas, já que ele tatuou o nome de ambas em seu peito, como uma
lembrança e homenagem.
— Recebi uma ligação informando que Sam tinha sido atacada. Aquela
vez em que ela ficou no hospital, lembra? E Fui ajudar minha irmã. — Ele
não me esperou responder e continuou, mas eu me lembrava desse dia, tinha
estado muito preocupada com minha amiga: — Quando voltei para a
fazenda, a casa tinha virado pó; havia pegado fogo com elas dentro... — Ele
fechou os olhos por um segundo, depois respirou fundo e os abriu. —
Shadow disse que elas morreram.
Meu peito se apertou. Sentia tanto sua dor que fiquei sem ar por um
momento. Fui até ele e passei os braços à sua volta, mesmo que ele tentasse
não me deixar abraçá-lo.
— Por favor, Bryan... — supliquei, olhando seus olhos em chamas. —
Eu sinto muito pela perda que teve, mas isso não é sua culpa.
— Estou cansado de ouvir que não é minha culpa... — falou com os
olhos molhados.
— Mas não é, e sim de quem fez isso com elas, assim como também
não é sua culpa que a gente tenha transado várias vezes nessa noite —
garanti ainda o fitando. — Foi tudo de bom, Bryan. Espero que se lembre.
— Não posso ficar perto de você agora... Toda vez que vejo esses
flashes e olho para você, me sinto um desumano igual a esse cara de quem
estamos atrás, Lutner. — Afastou-se de mim, e deixei, já que estava chocada
com suas palavras. — Acabou tudo entre nós, Alexia.
Perdi o fôlego, algo parecia me sufocar, e meu coração bateu tão rápido
que era como se o estivessem esmagando. Eu não aceitaria isso, não depois
do que tivemos naquela noite, quando ele provou que me amava de verdade
ao não deixar a escuridão dominá-lo.
— Eu não aceito isso...
— Você não precisa aceitar; apenas acabou tudo entre nós — cortou-
me, sombrio.
Ele estava me afastando, sempre fazia isso quando a situação se
apertava.
— Então me diz uma coisa: quando você estiver sozinho sem mim e
sofrendo, porque é isso que vai acontecer quando me deixar, vai ficar com
outras mulheres? Diga a verdade, Bryan, não aquela que vai me ferir para me
afastar de você, como fez no começo.
Ele prendeu a respiração e olhou para o chão.
— Eu sei que não vai, Bryan — continuei assim que ele não respondeu.
— E sabe por quê? — Seus olhos atormentados pousaram em mim. —
Porque você me ama e não quer outra pessoa, e sabe como sei? Porque meu
corpo e meu coração são apenas seus, Bryan. Só você me importa assim. —
Fui até onde ele estava, paralisado, e dei um selinho em seus lábios. —
Tome seu tempo, mas não acabamos. Eu não aceito isso, não depois do que
me provou e me disse essa noite. E você vai ficar feliz quando se lembrar de
tudo. Você sabe onde me encontrar.
Saí da casa chorando, claro, e fui embora, abandonando alguém que
amava mais do que tudo em minha vida, mas não era para sempre. Eu lhe
daria tempo, porém, não aceitaria o fim do nosso relacionamento.

Eu e Ariane fomos passar o Natal na casa de Samantha, assim como


Daemon, que era minha sombra. Sua marcação em mim era cerrada, não me
deixava sozinha um segundo. Bryan não apareceu. Eu sabia que tinha lhe
dado tempo, mas estava preocupada que ele acabasse fazendo uma besteira
para a qual não houvesse mais volta.
Então tive uma ideia e sorri. Bati palmas, chamando atenção.
— Pessoal, quero pedir a ajuda de vocês, mulheres, com o meu
casamento...
— Casamento? — indagou Alex. — Aquele cretino do Bryan não
terminou com você?
— Bryan não é um cretino — dissemos Sam e eu em uníssono. Então
continuei: — Ele teve alguns problemas dos quais ninguém precisa saber, já
que não é da conta de ninguém.
— Mas eu tenho o direito de saber, afinal, sou irmã dele — disse Sam.
Ela era muito parecida com ele, cabelos negros e olhos azuis, boca
avermelhada.
— Quando ele estiver pronto, contará a você — falei. Pelo que eu
descobri, ela ainda não sabia que seus pais tinham sido mortos por um
lunático doentio. Quem deveria lhe contar aquilo era Bryan, não eu. — O
que quero é que me ajudem a preparar o casamento para a semana que vem.
— Por que a pressa? — indagou Alex com o olhar estreito na minha
barriga, talvez pensando que havia uma criança ali dentro e prestes a nascer.
— Não tem nada a ver com filhos, gente, não estou grávida — falei.
Ainda não tinha contado a ninguém que Ariane era minha filha, apenas a
Alex, e lhe pedi segredo até tudo se resolver.
— Bryan sabe que vai se casar? — indagou Nasx com um sorriso e os
olhos revirando.
Dei de ombros.
— Ele vai saber quando vocês, homens, o trouxerem até mim para o
nosso casamento, porque quero me casar na neve, como sempre sonhei. E, de
acordo com a previsão do tempo, vai nevar dentro de uma semana. Vão me
ajudar ou não? — Olhei para todos na sala da casa de Lucky Donovan,
esposo de Sam, um homem lindo, moreno, de olhos verdes como uma
floresta.
— Estamos nessa, cunhada! Vamos realizar o casamento em dois
segundos! — disse Rayla sorrindo. — Poderíamos até nos casar juntas, mas
quero me casar numa catedral, não sob a neve.
As mulheres ficaram animadas por mim e disseram que estariam
comigo.
A expressão de alguns homens estava chocada, enquanto outros
sorriam.
— Vocês vão levar o noivo até o altar ou não? — sondei levantando as
sobrancelhas.
— E se ele não quiser casar? — questionou Nasx. — Afinal, Bryan está
sumido.
— Garanto que você e Daemon sabem onde ele está, não é? E, se ele
não quiser vir, tragam-no na marra, amarrado ou até nocauteado. Somente
não machuquem seu rosto. Mas ele vai se casar querendo ou não. — Fui
decisiva.
Fazia uma semana que Bryan havia sumido. Eu estava dando-lhe tempo,
mas descobri naquela noite que não podia esperar mais. Ele precisava sair
de sua concha e ver o que nós dois tínhamos, não fugir de mim por algo que
ele não fez.
Todos se prontificaram a me ajudar em tempo recorde para organizar
tudo. Rayla, Samantha, Angelina e Tabitta iriam ajeitar tudo. Também chamei
Luana e Claire para participarem da organização da cerimônia e da festa.
Eu sabia que os rapazes levariam Bryan para o casamento, que seria
feito no jardim da casa dele. Era o lugar mais seguro, pois ninguém de fora
poderia entrar e atrapalhar a cerimônia.
— Como você está? — perguntou Daemon chegando até mim e se
sentando ao meu lado. — Nasx disse que ligou agora para Bryan, falando
sobre o casamento, mas ele disse que não vai se casar.
— Isso é tolice, Daemon, ele não me forçou a nada, como pensa. Se eu
tivesse uma forma de provar isso a ele, que, mesmo dominado pela sua
escuridão, ele jamais me machucaria... — sussurrei, limpando as lágrimas
que começaram a cair. — Não suporto que ele sofra, é como se minha alma
estivesse se desfazendo.
— Se for por isso, eu tenho as gravações daquele dia. Instalei câmeras
no quarto para gravar tudo e mostrar a você depois, mostrar seu sucesso —
disse Nasx se aproximando de nós. — Estão no meu computador. Juro que
não assisti nada.
Levantei-me com esperança de aquela gravação mostrar toda a verdade
ao Bryan.
— Onde ele está agora?
Capítulo 22

ALEXIA
Assim que desci do carro junto a Daemon, que se recusava a me deixar
sozinha, depois de uma viagem que durou mais de 12 horas, olhei para a
casa pequena da fazenda em Culberson, Carolina do Norte. Então foi ali que
tudo acontecera, onde ele perdera sua amiga e a menininha Emma. Pelo
visto, ele estava sofrendo mais do que antes e foi para ali justamente para se
torturar. Ele deveria ter construído outra casa no lugar após o incêndio que
acontecera havia cerca de um ano.
— Só quero lhe agradecer por tudo que fez por mim e pela minha filha,
e saiba que amo você... — ouvi uma voz de mulher ali perto.
Entrei na casa e vi Bryan de costas para mim, diante de uma mulher de
cabelos escuros em estilo chanel. Arfei, talvez muito alto, porque os dois se
viraram e olharam para mim.
— Não é o que pensa, Alexia. — Ele veio até mim com os olhos em
chamas.
Eu tinha tanta certeza de que ele não ficaria com ninguém, de que
apenas eu importava para ele, que fiquei chocada. Pelo visto, eu havia me
enganado. Todos os meus projetos para o casamento viraram pó, assim como
eu. Apenas a dor existia.
— Você a largou e veio transar com uma puta qualquer? — sibilou
Daemon olhando para a mulher.
Ela o olhou indignada.
— Veja como fala comigo, seu cretino! — rosnou de volta.
Ignorei-os, virando as costas para sair dali, enterrar-me em algum lugar
e deixar a dor me consumir. Contudo, Bryan pegou meu braço.
— Espere, Luz do Sol, não é o que pensa — falou baixinho e
suplicante.
— Me larga! — Puxei meu braço. Ele se afastou como se eu tivesse
batido nele. — O que tem para explicar? Que você não quer casar comigo
porque anda fodendo por aí?
— Maldição! Eu não estou fodendo ninguém...
— Não era o que parecia, principalmente depois de eu ouvir um “amo
você”! — Lancei-me contra ele, batendo em seu peito com meus punhos
cerrados. — Seu desgraçado! Como pôde fazer isso comigo?! Como você
ousa?!
Ele segurou meus pulsos, mas chutei sua canela com meu Louboutin, o
que o fez praguejar.
— Ela é a Emília...
Parei de lutar e olhei entre os dois.
— Mas você disse que ela morreu...
— Eu não estou morta, também não sou nenhuma puta. — Fuzilou
Daemon com o olhar.
— Ele sofreu durante todos esses meses enchendo sua alma de
escuridão por pensar que você estava morta. — Afastei-me de Bryan. —
Como ousa, sua vadia?! — Voei para cima dela, mas não fui muito longe,
porque Bryan me segurou. — Você não tinha esse direito!
— Eu não sabia que Bryan pensava que eu tinha morrido, porque, se
soubesse, teria vindo antes e dito a verdade.
— Por que fugiu dele, então? Você não devia ter feito isso, sua...
— Olha, eu lamento pelo que fiz, mas tinha meus motivos, e Bryan sabe
quais são. — Ela o encarou. — Sabe onde me encontrar.
— Luz do Sol, acalme-se — pediu Bryan depois que a tal Emília foi em
direção à porta da casa.
— Ela se fingiu de morta? — perguntei assim que ela e Daemon saíram
da sala.
— Não, só foi embora. Não sabia que eu pensava que elas estavam
mortas... — Ele se encolheu.
— Não entendo... Então como?
— Shadow mentiu para mim. — A dor pela traição se revelava em seu
tom.
— Espere, o quê? Como aquele motoqueiro de araque fez algo assim?
Vou estripá-lo com uma pá! — Cerrei meus punhos. — Como ele pôde ficar
calado enquanto via você se afundando cada vez mais? Não só ficar calado,
não houve omissão! Ele mentiu deliberadamente!
Bryan riu. Era o som que eu amava ouvir.
— Você não pode bater em um homem, porque, se algum deles encostar
em você, eu o mato, entende? Mas vou resolver as coisas com ele depois.
Agora me diz, de onde vem essa selvageria?
— Acho que treinei muito na academia essa semana em que você fugiu
de mim, e isso me dá mais garra...
— Com certeza aqueles babacas só ficam olhando para você em seu
shortinho curto.
Ergui minhas sobrancelhas.
— Está com ciúmes?
— Não é porque terminamos que deixei de amar você — falou
calmamente.
Sorri.
— Não acabamos, querido. Eu lhe disse que apenas lhe havia dado um
tempo. Então vamos nos casar?
— Eu não posso, não depois do que fiz a você. Sei que está tentando
aliviar a minha culpa, mas isso não vai acontecer. — Ele cerrou os punhos.
— Lembra dos treinos que eu fazia com Nasx? — Continuei
rapidamente ao notar que ele abriu a boca para xingá-lo: — Então, ele
estava gravando tudo para me mostrar depois. — Peguei o pen drive. —
Aqui estão todos os detalhes dos nossos momentos juntos, desde o instante
em que eu estava gritando na escuridão e segui sua voz me chamando e me
trazendo de volta ao presente, até a manhã seguinte. Você não me estuprou,
Bryan. Eu sabia que jamais faria isso. Você preferia morrer a me machucar.
Mesmo na escuridão em que se encontrava, você pediu a minha opinião,
nunca me subjugou, e, quando eu sentia medo, sua voz me trazia ao presente,
me norteava, era minha bússola.
— Eu... — Ele pegou o pen drive e o olhou com esperança.
— Vamos ver o que tem aqui dentro, porque eu não assisti ainda, já que
praticamente voei para cá.
Ele me levou para um dos quartos, no qual havia alguns computadores,
já que ele era fera em computação.
— Então como tem certeza do que eu fiz? — Sua voz estava cheia de
dúvida. — Sempre que essa escuridão chega, não me lembro de muita coisa.
Por isso, quando ela me domina, venho para cá e deixo Shadow avisado
para não me deixar fazer besteira, mas ele não me impediu naquele dia.
— Ele confia em você, Bryan, assim como eu confio, e não preciso
assistir, porque me lembro de cada detalhe daquela noite, querido, cada
toque, beijo, gemido e sua voz, que tem o poder de me tirar do abismo. —
Sentei-me num sofá. — Desde quando essas sombras o controlam?
— Desde o dia em que eu soube que elas estavam mortas. — Sua voz
falhou, mas ele respirou fundo, sentou-se ao meu lado, encaixou o pen drive
num laptop e acionou o arquivo de vídeo que havia nele.
— E a notícia da morte dos seus pais desencadeou tudo, não foi? Você
se importava com eles.
— Eu não ligo... — Seus ombros se encolheram, mostrando que ele
estava mentindo, talvez até para si mesmo.
— Não importa como nossos pais são, Bryan, eles sempre serão nossos
pais. É bom você se importar, isso significa que é humano e tem sentimentos
— expliquei, vendo a cena em que eu me debatia na Cruz de Santo André e
gritava de medo e asco, mas ele me despertava do pesadelo com sua voz
linda e sedosa.
— Eu a trouxe de volta! — Seus olhos estavam muito abertos e
impressionados.
— Mesmo antes do encontro no Belas Country, ainda na época da
faculdade, quando eu entrava em surto, pensava no seu rosto, nos seus olhos,
boca e voz. Eram como um mantra para me manter controlada. — Olhei para
ele e para a tela que mostrava nós dois juntos, cada detalhe ali.
Como o vídeo era longo, pois havíamos transado por horas, aceleramos
o filme. O sorriso que Bryan deu assim que ele terminou foi maravilhoso,
mais lindo que o sol ao nascer.
— Cinco vezes? Isso explica as minhas pernas bambas. Foi a foda do
ano! — Sorri para ele. — Não sabia que tinha tanta energia assim. Fiquei
andando torta por uma semana, mas adorei.
— Eu também achei que não seria capaz. — Ele fechou o notebook e o
colocou no chão, então me deitou no sofá e pairou em cima de mim, beijando
meu pescoço. — Mas gostei. Estou louco para fazer de novo, já que estamos
secos há uma semana.
— Damon me manteve entretida...
Seu corpo ficou rígido, e ele se afastou para me olhar. Vi fúria ali,
assim como dor.
— Que porra está dizendo?! Se aquele desgraçado a tocou, eu vou
matá-lo!
Ri e toquei seu rosto.
— Eu estou falando de vibradores em forma de pênis que tenho...
Ele ficou ainda mais furioso e já ia se afastar, mas não deixei,
prendendo-o com minhas pernas à sua volta. Já ficara longe dele por tempo
demais.
— Você usou vibradores com nomes de outros homens? De Daemon?
Cortei-o:
— Eu disse Damon, não Daemon. Estou falando do ator Ian
Somerhalder, de Diários do Vampiro. — Beijei seus lábios. — Estou
brincando, não usei minha coleção de vibradores, por isso estou aqui, quente
e molhada por você. O que vai fazer a respeito disso?
Ele se afastou, mas continuou com os olhos escuros, apesar das íris
azuis.
— Porra! Quando voltarmos, vou jogar todos fora! O único pau que vai
entrar nessa boceta maravilhosa é o meu! — Ele se remexeu para se encaixar
mais em minha boceta, que estava ansiando por ele cada vez mais. — E você
só irá pensar em mim quando eu foder você.
— Seu desejo é uma ordem, querido. Mas, por mais que eu queira ficar
com você, Daemon está lá fora, e não quero magoá-lo... — Meu tom era
triste.
Durante todo aquele tempo ele ficou comigo, protegendo-me. Eu até lhe
pedi que fosse embora, assim seria mais fácil me esquecer, mas o cara era
turrão, disse que não iria até tudo se resolver. Parecia que tinha esperança,
caso eu não ficasse com Bryan.
— Ele tem que aceitar, querida, afinal, você é minha, sempre foi desde
que bati os olhos em você, a loura perfeita usando saltos e vestido elegante
— disse, beijando-me em seguida, ou melhor, devorando-me.
Eu estava prestes a me deixar levar por suas carícias e amor, quando
ouvi barulho de moto, e não era só uma, pareciam várias de uma vez.
Bryan saiu de cima de mim e correu para a janela. Logo praguejou,
correndo até a sala.
— O que foi, Bryan? — perguntei, seguindo-o para o cômodo. Bem na
hora Daemon entrou carregando uma menininha nos braços, e Emília vinha
logo atrás.
— É o Black — disse Daemon com um rosnado.
— Acho que eles descobriram que estou viva — ela murmurou.
— Meu Deus! Será que Steve está junto?! — Minha voz saiu duas
oitavas mais alta. Eu já ia espiar pela janela, mas Bryan pegou meu braço e
me puxou para perto de si.
— Não. Shadow foi até o Black para perguntar o motivo de ele estar
com Steve Lutner, um dos homens mais procurados do FBI.
— E esse cara disse por que se aliou com aquele monstro? — inquiri.
— Black não sabia quem ele era. Steve pagou para que eles o
protegessem ao ir à igreja, mas não sabiam que os MCs Fênix estariam lá e
que você era protegida deles...
— Mas o que isso tem a ver? Quero dizer, pelo que ouvi desse Black,
ele não parece ser diferente de Steve. Por que Black não lutaria contra
Daemon e Shadow? Ele tem medo de vocês? — Olhei para Daemon.
— Black não tem medo de ninguém — ele respondeu. — Shadow o
obrigou a sair de cena não por medo, mas para ele pagar o marcador que
devia. E, antes que pergunte o que é marcador, é uma dívida que nós, MCs,
prezamos em cumprir, e, se ele não fizesse... — ele deu de ombros — bom,
teria que lidar com as consequências e enfrentar Shadow. Nesse caso Black
perderia, já que ele tem vários aliados, e não somos procurados como ele.
Um erro, e Shadow o mandaria para a cadeia.
— Eu sei que você está aí dentro! Saia e nos enfrente como o homem
que você não é, Scott! — ouvi gritos lá fora.
Eu sabia que o segundo nome de Bryan era Scott, porque Sam me disse
uma vez.
O cara louco lá fora continuou gritando, mas tanto Bryan quanto
Daemon o ignoraram.
Daemon entregou Emma, que estava querendo puxar seu brinco na
orelha, para Emília.
— Não pode puxar isso, princesa — disse em tom suave.
Gostei de ver seu sorriso ao olhar para a menininha, que era a cara da
mãe.
Bryan arrastou o sofá para um canto. Aproximei-me dele quando tirou o
carpete do chão.
— O que está fazendo? O que tem nesse alçapão? — Ele puxou a
argola, abrindo a tampa no chão, então assoviei. — Querido, eu espero ser
sua amiga para sempre — falei, olhando várias armas de variados modelos.
A única que eu conhecia era o revólver calibre 38.
Ele sorriu para mim.
— Você será mais do que isso, minha linda, vai ser minha esposa e mãe
dos meus filhos. E, por falar nisso, como anda nossa filha? — Ele me olhou
de lado enquanto pegava as armas. — Sinto falta dela.
— Vocês dois têm filhos? — sondou Emília nos olhando. — E vão se
casar?
— Não é minha filha de sangue, mas eu a amo como se fosse. E vou me
casar com essa mulher semana que vem, já que uma danada de uma loura não
desistiu de mim. — Ele sorriu para ela. — Estou louco para você ser minha
esposa, senhora Scott...
— Eu também, querido. E não vão ser uns bastardos de MC que andam
pendurados em motos que farão com que isso não aconteça. — Peguei uma
arma e puxei a trava. — Nem que para isso eu tenha que atirar em todos eles.
Bryan riu e tomou a arma da minha mão.
— Luz do Sol, você não vai atirar em ninguém, o.k.? Porque, se alguns
desses merdas tocarem em você, aí, sim, teremos um Apocalipse na Terra,
pois não restará nenhum deles vivo. — Tocou meu rosto. — Você é a única
luz que ilumina a minha escuridão; se eu perder você, perco tudo: a vida, o
ar que respiro. Entendeu? — Ele se levantou e olhou para Emília, que nos
fitava chocada. — Vocês duas fiquem quietas. Deixem que Daemon e eu
resolveremos isso.
— Mas, Bryan, se eles quiserem atirar em você...
Ele me interrompeu:
— Não vão, confie em mim.
Eu não gostava disso, mas acataria sua ordem para resolver logo as
coisas e ir embora para minha filhota linda, que deixei com Rayla. Calebe e
o segurança dela estavam de olho nas duas, o que me deixava mais tranquila.
— Vamos resolver isso logo — ele falou, saindo da casa seguido por
Daemon, ambos empunhando armas.
Capítulo 23

ALEXIA
— Estou curiosa... — falei, observando Emília. Tinha ficado ao seu
lado olhando pela janela, enquanto Emma brincava no chão. Era linda, com
pele branquinha e olhos escuros.
— Sobre o quê?
Olhei pela janela novamente e vi os mesmos homens que vi na igreja,
mas lá não havia reparado muito neles, já que balas voavam para todos os
lados. O principal, claramente o líder, era moreno, tinha cabelos negros e
usava uma jaqueta de MC com o nome Scorpion escrito. Daemon e Bryan
estavam a uma certa distância deles. Não tinha muita certeza se era isso, mas
achei que o pessoal do MC abaixou as armas ao ver Daemon e seu colete
com o nome do MC Fênix.
— Você não parece amá-lo, quero dizer, não parece estar apaixonada
por ele. A forma como o olha é como eu olho para um amigo meu. Nunca
gostou dele de outra forma? Se já, eu não sou contra, só estou curiosa, afinal,
isso seria no passado.
— Eu não o amo assim e nunca amei, só tenho Bryan como um irmão
que nunca tive na vida. Não sei, era bom me sentir protegida e querida,
porque não me lembro de alguma vez ter tido algo assim. — Suspirou.
— Você se sacrificou para que ele tivesse uma vida e pudesse realizar
os sonhos, como acabou fazendo. Eu faria o mesmo por Bryan se estivesse
no seu lugar. — Sorri, depois fiz uma careta. — Já o Shadow, eu vou chutá-
lo quando o vir.
— Acredito que Shadow se sacrificou bastante por Bryan. Sei que não
justifica o fato de ele ter mentido dizendo que morri. Mas ele com certeza
deve ter feito coisas horrendas para Black apenas para que Bryan ficasse
livre.
Sacudi a cabeça.
— Não quer dizer que ele não mereça ter sua bunda chutada.
— Vamos nós duas chamá-lo para um duelo. — Sorriu com um revirar
de olhos. — Bryan sempre amou você, até tinha uma foto sua na carteira.
Sempre que pensava que eu não estava vendo, ele olhava para ela. Pode
conferir, que ainda deve estar lá. Estou feliz por vocês. Vejo como ele olha
para você; é como se estivesse em um mar, se afogando, e de repente você
aparecesse; como se estivesse em um deserto sem nada para beber e comer,
e de repente encontrasse um oásis. Você é a salvação desse homem, Alexia.
Ele a venera. — Sorriu e olhou para fora. — Quero que um cara me olhe
assim um dia, como se eu fosse seu mundo inteiro ou fizesse parte dele.
— Com o pai de sua filha não foi assim? Bryan me disse que você foi
estuprada. Foi pelo pai de seu filho ou algum outro cara? Eu sei que tinha 15
anos, mas... — sondei, curiosa em relação ao assunto, porque Bryan foi vago
ao me falar sobre ele.
— Ele era meu pai... me vendeu como pagamento de uma dívida para
Black. Por isso ele está aqui, querendo “o que é dele” — sibilou com a voz
cheia de ira.
— Oh, Deus! Sinto muito por isso.
— Não gosto da piedade das pessoas — sussurrou.
Coloquei a mão em seu ombro.
— Não é pena, é entendimento. A minha filha também veio de um
estupro, de um lunático serial killer. Ele conquista mulheres idiotas, como
eu fui, e as leva para um cativeiro por semanas, mas o que ele faz... é como
se estivéssemos no inferno. Eu não conseguia ficar presa em correntes;
Bryan me ajudou a superar isso. Ele é como um anjo que apareceu na minha
vida. Ariane e ele são meu mundo inteiro.
— Nunca me arrependo de ter escolhido ter Emma. Mas confesso que
pensei em tirá-la quando descobri a gravidez. As lembranças e pensamentos
pelo fato de ter sido violentada eram demais. Devo dizer que foi uma época
muito perturbada a que passei. Mas, quando senti Emma chutar, tudo mudou,
sabe? Não sei explicar. Hoje, eu adoro ver o sorriso dela, ouvi-la me
chamando de mamãe. Não há nada mais lindo do que isso.
Então contei sobre a minha história, que tive de ficar internada em uma
clínica psiquiátrica e pensei que minha filha estava morta. Eu já a amava
tanto, mesmo antes da descoberta. Sim, eu também não me arrependia de ter
minha menina.
— Meus pais queriam que eu abortasse. Eu não sou contra quem opta
pelo aborto após ter sido violentada, mas acho que a decisão deve ser da
mulher, como também a decisão de ficar ou não com a criança. Devia ter
partido de mim a decisão de não criar minha menina, não dos meus pais. —
Meus olhos estavam úmidos. — Por culpa do meu pai, eu perdi quatro anos
com Ariane. Mesmo depois que pensei que ela estivesse morta, eu ainda a
amava. Graças a Deus, ela voltou para mim. Assim que tudo isso acabar, vou
registrá-la como minha filha.
— Nossa filha. Eu serei pai dela — afirmou Bryan, entrando na sala
com Daemon, que parecia muito chateado.
Olhei para os caras, que iam embora em suas motos. Graças a Deus
ninguém saiu ferido ou morto. Isso era muito estranho. Por que partiram sem
lutar?
— O que aconteceu? — perguntei, indo até Bryan e o abraçando,
aliviada por ele estar bem.
Ele me abraçou forte por uns segundos e se afastou, tomando a arma que
eu segurava.
— O que eu falei sobre armas, Luz do Sol? — repreendeu-me.
— Era por garantia, sabe? Para o caso de eles atirarem em vocês dois
— murmurei.
Ele balançou a cabeça.
— Estava pensando em atirar neles? — Seu tom era descrente. —
Ainda bem que não houve luta então, né?
— O que vai fazer para o filho da puta em troca da minha liberdade e
da de Emma? — questionou Emília preocupada. — Porque Black não faz
nada de graça, e seu preço é alto, Bryan.
Ele suspirou e olhou para ela e Daemon.
— O que propôs, Bryan? Sabe que não pode fazer nada para eles. Se o
departamento de polícia souber que você está metido com esses caras, a sua
carreira vai acabar. Seus sonhos... — sussurrei ansiosa, preocupada que ele
tivesse mais uma vez dado sua alma ao diabo.
Ele beijou minha testa.
— Não vou fazer nada para eles. — Afastou-se e observou Daemon. —
Daemon fez um acordo com Black que ele não pôde recusar.
— Você? Que tipo de acordo alguém como você faria para me salvar?
Matar alguém? — Parecia muito chateada ao piscar chocada para Daemon.
Achei que fosse por ele tê-la chamado de puta quando mal havia colocado os
olhos nela. Eu também estaria furiosa no lugar de Emília caso isso
acontecesse comigo.
Daemon a fitou com expressão de poucos amigos.
— Alguém como eu? Acha que sou assassino? Você, sua ingrata,
deveria me agradecer, já que salvei sua bunda, salvei você de ser levada por
aqueles homens para servir como prostituta deles.
Eu nunca tinha visto Daemon assim, tão irritado. Já o vira calmo e
calado, atormentado, chateado, mas nunca furioso, ainda mais por aquele
sentimento ser direcionado a uma mulher que tinha acabado de conhecer. Era
estranho.
— Você me chamou de puta, se esqueceu? — ela grunhiu, parecendo tão
raivosa quanto ele. — Você não sabe nada sobre a minha pessoa, seu
crápula, para me xingar.
Ele cerrou as pálpebras e respirou fundo, como se tentasse se acalmar.
Em seguida voltou a fitá-la.
— Pegue sua filha e vamos embora agora. — Era uma ordem. Não
deixei de notar que ele não se desculpou com ela por xingá-la.
— Eu não vou a lugar algum com você! Nem se eu fosse louca —
contrariou-o.
— Você não tem uma maldita escolha. Ou vem comigo, ou vai voltar
para o Black e seus homens. E, quando uma pessoa é dele, o que ela tem
também é considerado dele, entende o que quero dizer?
Ela arregalou os olhos, fitando Bryan em pânico.
— Bryan... sei que me odeia...
— Odiar você? — ele indagou bruto. Pelo que eu conhecia de meu
homem, ele ainda estava com raiva por ela ter ido embora. — Eu apenas
estou furioso pelo que fez, mas minha raiva mesmo é de outra pessoa.
Eu sabia que Shadow estava frito, mas não tinha pena dele, afinal, fez
Bryan padecer por um ano inteiro.
— Olha, Emília, os MCs têm uma lei que seguem claramente e que não
pode ser quebrada, nem por Black, que não liga para nenhuma regra —
continuou Bryan.
— Qual lei é essa? Todos esses MCs fodidos são bandidos e
estupradores, não ligam para a lei — afirmou ela.
Bryan se adiantou para lhe responder, porque, pela expressão de
Daemon, não sairia nada de bom se ele abrisse a boca naquele instante, o
que parecia ser sua intenção.
— Sim, tem uma lei que não pode ser quebrada por nenhum deles:
ninguém pode mexer com a mulher de um irmão, porque é contra as regras
fazer isso. Se mexer com sua mulher, mexerá com todos os membros do
clube, e, como Daemon mencionou antes, Shadow é bem conhecido, mais do
que Black, então ele não tem escolha a não ser obedecer à lei. — Ele olhou
dela para Daemon.
— Oh, Deus! Você está querendo dizer que disse ao Black que sou
mulher desse cara? — Apontou para Daemon. — Nem morta fico com esse
homem.
— Querida, eu preferia cortar meu pau a enfiá-lo em alguém como você
— rosnou Daemon. — Afinal de contas, não curto crianças mimadas. — E
saiu batendo a porta.
Emília pegou um cinzeiro e o jogou na porta, despedaçando-o, depois
gritou quando ele a chamou de forma grosseira para irem embora, lá de fora.
Capítulo 24

ALEXIA
Meu casamento foi organizado para aquele dia, e tudo estava ocorrendo
maravilhosamente bem. Minhas melhores amigas eram perfeitas; foi uma
correria com os preparativos, pois se passou apenas uma semana entre minha
decisão e o dia marcado.
Rayla me comprou um vestido dos sonhos, branco com pedrinhas
brilhantes, com um ombro só e uma capa por cima. Olhei-me no espelho
vestida com ele. Meus cabelos louros estavam encaracolados e presos para
cima, mas com algumas mechas soltas ao lado do meu rosto maquiado.
— Linda! Mas, querida, acho melhor andarmos logo. Algumas pessoas
estão reclamando do frio — falou Samantha. — Como eu poderia supor que
um dia veria você casada com meu irmão? Que tivesse alguma mulher que o
domasse? — Ela sorriu. — Fico feliz que tenha sido você.
— Eu também estou feliz por isso, mas agora vamos; não quero as
bolas do meu marido geladas, afinal, vou precisar muito dessa parte essa
noite — comentei, saindo do quarto e seguindo para o meu grande dia.
— Eca! Não quero imaginar algo assim a respeito do meu irmão. —
Sam estremeceu.
Alex se posicionou ao meu lado. Vestia um terno preto com gravata.
Ficara encarregado de me levar até o altar que fizemos no jardim para
aquele grande dia, um dos mais felizes da minha vida. O outro foi o dia em
que eu soube que minha filha estava viva.
— Muita felicidade, minha irmã. Você merece, após tantas coisas que
lhe aconteceram. — Beijou minha testa, depois olhou à nossa frente, para
minha princesa. Ariane estava com um vestido branco rendado e rodado,
parecendo uma boneca loura. Ela segurava um buquê de flores com cores
sortidas. — Não acredito que sou tio e pai ao mesmo tempo.
Rayla descobriu havia pouco tempo que estava grávida. Eu estava feliz
demais. Tinha minha filha e o homem dos meus sonhos, com o qual iria me
casar e teria uma sobrinha, e meu irmão tinha encontrado sua felicidade.
Ariane, como dama de honra, seguiu adiante com seus passinhos curtos,
e eu e meu irmão fomos logo atrás. Assim que saí da casa, olhei para o céu,
sentindo a neve beijar meu rosto. Ainda bem que minha maquiagem era à
prova d’água.
Olhei ao redor para a vista magnífica. Por causa do gelo e da neve,
estava tudo branco e parecendo cheio de cristais. O altar estava mais à
frente, e, dos dois lados do corredor até ele, havia algumas filas de cadeiras
decoradas com guirlandas de flores coloridas, contrastando com o branco
predominante daquele dia de inverno. Meus amigos estavam nas cadeiras do
lado esquerdo. Olhei à direita; ali estavam os MCs, tanto os Fênix de
Chicago quanto os Fênix de Nova Iorque (aos quais eu não conhecia muito) e
as mulheres daqueles que tinham namoradas ou eram casados. Shadow se
encontrava ao lado de sua namorada, uma ruiva esquentada que só faltou
bater em Bryan por seu acerto de contas com o motoqueiro por ele ter
mentido sobre Emília. Ele até estava com o olho inchado.
Pensar em Emília me fez lembrar que tinha chamado Daemon para vir
ao casamento. Ele disse que precisava de um tempo, e eu o entendia. Bryan
tinha tentado entrar em contato com eles no dia anterior, mas não conseguiu.
Eu sabia que meu futuro marido estava com raiva dela, mas queria sua amiga
e a filha, que ele considerava uma sobrinha, em seu casamento. Eu só
esperava que Emília e Daemon não estivessem se matando.
Todos se levantaram assim que pisei no corredor, onde havia um tapete
que ia até o altar de madeira coberto por camurça verde, mas branco pela
neve que caía.
Olhei para o meu futuro marido no altar e me controlei para não
tropeçar pela fraqueza nas pernas. Ele estava de terno preto e com seus
cabelos negros molhados e penteados para cima, mas os flocos de neve em
sua roupa e nas mechas de cabelo o faziam ficar mais lindo do que já era.
Seus olhos azuis se iluminaram ao me ver ali, adorando o homem que eu tive
a sorte grande em encontrar.
Assim que chegou ao altar, Ariane foi para onde estavam as crianças,
em uma tenda feita especialmente para elas, afinal, não queríamos nenhuma
delas pegando um resfriado devido à baixa temperatura.
Bryan pegou minha mão, que meu irmão lhe entregou, e a levou aos
lábios sem tirar os olhos de mim.
— Espero que a faça feliz, ou te faço em picadinho — alertou Alex.
— Eu farei. — A promessa estava em cada palavra que ele dizia.
O padre pigarreou, provavelmente querendo apressar as coisas para
não congelar. Também ouvi Nasx gritar:
— Casa logo com ela, Bryan, porque estou congelando aqui, ou vou
subir no altar e tomar seu lugar!
Bryan revirou os olhos. Então o padre passou a ministrar a cerimônia.
Fiquei de frente para Bryan para lhe dizer o que ele significava para mim, o
que trouxe para minha vida, mas ele falou antes:
— Alexia, você viu luz em mim quando tudo que eu via eram trevas,
escuridão, dor e desespero. Você me salvou do abismo em que eu me
encontrava. Você me ensinou a ser feliz e a amar a mim mesmo, alguém que
eu desprezava, porque acreditava que não tinha redenção. Mas lá estava
você, lutando, me amando e me dando uma felicidade que jamais pensei que
pudesse sentir ou merecer. — Tirou um floco de neve que caiu no meu nariz.
— Você é alguém que quero para sempre, a mulher, mãe dos meus filhos, a
minha Luz do Sol, e prometo amá-la enquanto eu respirar neste mundo.
Respirei fundo em meio às lágrimas, porque ele disse tudo o que eu
pretendia e ainda mais.
— Querido noivo, você também foi meu anjo, minha luz, meu suporte,
meu milagre. Eu já estava pensando que não existia mais felicidade, não
depois do que houve comigo, mas estava errada, porque, quando eu tinha
pesadelos, você estava comigo, me resgatando deles, me trazendo para a luz
— sussurrei com meus olhos marejados. — Você me ensinou o verdadeiro
significado do amor, um amor verdadeiro e puro, capaz de superar tudo, a
dor, as lembranças ruins, os pesadelos. Você me resgatou do abismo e
restaurou tudo que estava quebrado em mim. — Levei sua mão que eu
segurava ao meu peito, bem sobre onde batia o meu coração. — Bryan Scott,
eu sou a mulher mais sortuda deste mundo por ter um homem maravilhoso
como você ao meu lado, um homem capaz de fazer sacrifícios, como fez pela
sua irmã, por Emília e por Emma. Um homem que desistiu de seus sonhos
por amor a elas. Como não amar um homem assim? Você é o meu milagre, e,
se eu visse Deus pessoalmente, lhe agradeceria dia e noite por você ter
entrado em minha vida. Eu vou te amar para sempre.
Mal terminei de falar, ele já estava me beijando com ferocidade. Logo
ouvi assovios vindos de todos os lados.
— Já que se beijaram antes de eu concluir, eu vos declaro marido e
mulher — disse o padre.
Dirigimo-nos para dentro da casa, que parecia pequena para todos que
estavam ali, mas demos um jeito.
Todo mundo nos desejou felicidades. Os primeiros foram meu irmão e
minha cunhada.
— Sejam felizes, minha querida — disse Rayla com os olhos
vermelhos. Com certeza tinha chorado ao assistir à cerimônia.
— Obrigada.
Samantha e Lucky se aproximaram. Ela também tinha estado chorando,
mas, pela tristeza em seus olhos, não parecia que era apenas emoção.
— Bryan... — Ela mordeu o lábio.
Ele a puxou para seus braços.
— Assim que terminar a minha lua de mel, preciso te contar sobre o
que ouviu hoje. Não agora. Pode esperar? — Beijou sua testa e se afastou
um pouco, olhando-a atentamente.
Samantha assentiu ainda chorando. Sua barriga estava enorme, ela
ganharia o bebê dentro de três meses. Seu marido a abraçou, reconfortando-
a. Não seria fácil quando ela soubesse de toda a verdade acerca da morte de
seus pais.
Angelina e Ryan vieram também.
— Parabéns aos dois — cumprimentou Angelina, abraçando-me e
depois estendendo os braços para Bryan, mas Ryan a puxou para longe dele.
Ele era um louro bonito; não, bonito era eufemismo. Lindo seria a palavra
certa.
— Anjo, você quer que eu mate o noivo em seu casamento? Para
desejar felicidades, não precisa de abraços, é só dizer.
— Eles são nossos amigos, Ryan, não precisa ter ciúmes — disse
Angelina.
— Anjo, ele queria ficar com você, se esqueceu? Quando penso nisso,
me dá vontade de esganá-lo — rosnou encarando Bryan, que estava sorrindo.
— Eu não ia ficar com ela, só disse aquilo para você e Alexia saírem
de suas conchas e mostrarem o que sentiam, você por Angelina, e Alexia por
mim.
Arregalei os olhos para ele.
— Eu não demonstrei ciúmes nenhuma vez naquele dia. — Embora
tenha sido difícil me controlar diante tudo o que ele disse a ela.
— Você acha que não, mas se esqueceu de que sei ler seu corpo? Você
tentou esconder, mas senti tudo, por isso a beijei naquele dia. — Ele me
puxou para seus braços e me beijou até ouvirmos um pigarro próximo a nós.
Shadow se aproximou com Evelyn, que estava de cara fechada para
Bryan, mas o MC estava sorrindo, mesmo meio torto e com um olho inchado
devido aos socos que levou. Pelo que eu soube, o cara até havia estado
acamado.
— Felicidades aos dois, principalmente a você, Bryan. Tinha esperança
de que sua vida mudaria no futuro, e mudou para melhor. Seja feliz, meu
amigo. Mesmo que esteja com raiva de mim, espero que um dia possa me
perdoar.
— Amigo?! Esses dois brutamontes não são seus amigos! É bom que
nunca mais os veja! — rosnou Evelyn, olhando para Jason e Bryan. — Eles
bateram em você! Como amigos fazem isso?
— Ele mereceu — responderam Bryan e Jason em uníssono, o que foi
esquisito. Eu não sabia que Jason também já havia batido em Shadow.
Evelyn voou em cima de Bryan, mas foi pega pelo namorado, que a
manteve no lugar.
— Por que não batem em mim, seus cretinos? Façam isso, que acabo
com os dois! — ela sibilou. — Mesmo sem minhas facas, eu os esquartejo.
— Mulher, se eles fizessem isso, ambos estariam mortos, porque
ninguém toca em você — declarou Shadow em tom calmo, levando-a para
longe de Bryan e Jason.
— Eu pensava que eu era uma fera, mas sou um gato manso em
comparação a essa leoa enfurecida — comentou Tabitta sorrindo e bateu
com carinho no peito de seu namorado. — Não se preocupe, querido, eu te
protejo dela.
Depois disso, tudo voltou ao normal, mas eu queria mesmo era estar
com meu marido, por isso saímos da festa mais cedo. Samantha ficaria com
Ariane para mim. Nós iríamos a um hotel, que já estava fortemente
protegido. Bryan averiguara tudo com Johnny, um cara legal que conheci na
casa de Ryan quando Angelina falou sobre seu passado para nós. Era lindo,
cheio de músculos e tatuado; um desperdício, pois era gay. Tinha se casado
com um homem chamado Charles.
Eu esperava que tudo ocorresse bem, porque não queria ser
incomodada na minha lua de mel.
Entramos no quarto de hotel, branco, com uma cama de casal elegante,
redonda e com espelho no teto. Não reparei em mais nada assim que Bryan
me puxou para seus braços firmes e devorou minha boca, mordendo meus
lábios com força, mas não liguei. Apenas queria que meu marido matasse o
fogo que me consumia dos pés à cabeça.
— Então, querida esposa, o que você quer? Sexo normal ou mais
quente? Sabe que só vou fazer o que você quiser — sussurrou, mordendo de
leve minhas orelhas.
— O que quiser, marido; com você, eu supero tudo. — Segurei seu
rosto. — Eu sei que, se eu começar a sentir algum medo, você me trará de
volta, como fez naquela vez. Vamos treinar até tudo ser superado.
Ele sorriu e beijou minha testa.
— Primeiro vamos tirar esse vestido. — Ele me virou de costas e abriu
os botões, beijando minha pele a cada vez que desabotoava um, até que
terminou tudo, e o vestido caiu no chão aos meus pés. Ele assoviou. —
Porra, sem calcinha.
— Bryan... — sussurrei assim que ele deu um beijo em minha bunda,
seguido por um tapa. Gemi pelo fogo que se gerou entre as minhas pernas,
que me fez remexer as coxas em busca de mais atrito. — Estou molhada...
— Eu vou te ajudar com isso, minha linda... — murmurou, tirando suas
roupas, e olhei seu peito, onde tinha o nome de Emília e Emma, mas também
tinha o de Ariane, o meu e o da sua irmã, o que me deixou surpresa, pois
ainda não tinha visto a tatuagem.
— Quando fez? — sussurrei, alisando os nomes em seu tórax. — São
lindas.
— Hoje de manhã. Quando estava afastado de vocês, senti tanto a sua
falta... Então decidi fazer a tatuagem para sempre ter vocês aqui também,
perto do meu coração, apesar de que também estão dentro dele. — Ele
acariciou minha face. — Esse rosto é um sem o qual não posso viver mais,
nem quero.
— E não vai! — prometi, abraçando seu pescoço e o beijando com
ferocidade.
Ele me colocou na cama ainda me beijando e me rodopiou, deixando-
me por cima dele.
— Monte em minha boca, querida, quero provar esse mel que está
escorrendo — ordenou com a voz rouca.
Arregalei os olhos, mas assenti. Faria qualquer coisa por aquele
homem. Ajoelhei-me com seu rosto entre minhas coxas e me abaixei. Meus
pensamentos, constrangimento, tudo o mais foram para o espaço assim que
sua boca me consumiu. Ele circulava sua língua experiente em minha vagina
e sugava meu clitóris, tanto que eu rebolava sobre seus lábios. Suas mãos
amassavam meus peitos e beliscavam os bicos, trazendo-me para a borda,
até que gozei gritando seu nome. Passaram-se alguns segundos até que fui
trazida de volta para a Terra.
Olhei para baixo e encontrei as íris azuis brilhantes admirando-me com
adoração. Corei e me deitei sobre seu corpo sem tirar meus olhos dos dele.
Sentia-o duro entre minhas pernas.
— Céus! Eu nunca vi ninguém mais linda e maravilhosa que você na
minha vida! Foi incrível ver você rebolando em minha boca enquanto eu
comia sua boceta deliciosa... — Ele me beijou, e senti meu gosto em sua
boca, então, sem aviso, ele me penetrou, fazendo-me gemer, saciando-me e
me enchendo com aquela parte do seu corpo que eu tanto amava, assim como
ele inteiro.
— Me cavalgue — ordenou com os lábios roçando os meus.
Passei a me mexer para frente e para trás sem nunca tirar os olhos dele.
Ali tinha amor, devoção, adoração e paixão, tudo o que eu também sentia.
— Ah, Bryan...
— Geme, minha linda, geme o meu nome! — pediu. Sua mão direita foi
para o meu clitóris, esfregando-o de forma cada vez mais acelerada. —
Goza no meu pau, minha esposa!
Suas palavras foram como um gatilho direto ao meio de minhas pernas,
então gozamos juntos e chamando um pelo outro. Eu estava no céu.
Capítulo 25

ALEXIA
Quatro meses depois

— Quando papai vai chegar? — perguntou Ariane assim que nos


sentamos à mesa de jantar.
— Não vai demorar — respondi.
Quando Bryan disse que iria para a Rússia a trabalho e que não podia
me dizer mais nada sobre o assunto, porque era sigiloso, pedindo apenas que
eu confiasse nele, concordei, apesar da saudade e do medo que sentiria de
que algo lhe acontecesse. Eu confiava cegamente nele, sabia que jamais iria
me trair, nem por seu trabalho.
Fazia quatro meses que ele estava naquele caso, e já estávamos em
abril. Eu esperava que tudo terminasse logo para ele voltar para casa. Ele
havia tirado uma semana de folga para ficar com Ariane e comigo. Minha
menina me chamava de mamãe e a Bryan de papai. O amor dele por minha
filha me fazia amá-lo e adorá-lo ainda mais.
Durante esses meses aconteceram muitas coisas, tanto ruins quanto
boas. Angelina engravidou, embora não pudesse, pois tinha um tipo de
cardiopatia. Ryan não aceitou muito bem isso, e eu achava que eles
discutiram por ela não querer abortar. Ela foi embora, e ninguém sabia de
seu paradeiro, mas eu acreditava que Tabitta sabia, já que as duas eram
melhores amigas. No entanto, mesmo se ela soubesse, jamais trairia
Angelina.
Ryan ficou destruído com sua partida, nem era mais aquele rapaz alegre
e vibrante que um dia foi, parecia apenas um zumbi, sem vida. Sam, Lucky,
todos tentavam tirá-lo do abismo em que estava, mas ninguém conseguia.
Lucky o levou ao médico para dar pontos em sua mão, que ele
machucou ao destruir seu apartamento, mas, pelo que eu via, ele não parecia
se importar se estava ferido ou não. Eu já tinha estado assim uma vez,
quando pensei que Ariane tinha morrido. Para mim, tanto fazia estar operada
ou não, ter de tirar os pontos da cesariana depois. Aqueles pontos e a dor
eram as únicas lembranças de que ela havia existido.
Eu soube que Daemon e Johnny estavam atrás dela para descobrirem
seu paradeiro e trazê-la de volta. Estava torcendo que a encontrassem, ainda
mais pelo fato de que sua gravidez era arriscada. Eu sabia que ela jamais
desistiria de um filho, nem em prol de sua própria vida e a pedido do homem
que amava. Eu mesma não fiz isso, embora o pai de Ariane fosse um
psicopata, então não imaginava que ela consentiria em abortar o filho do
homem da sua vida.
No mês de março, Sam teve sua bebezinha. Todos fomos ao hospital
visitá-las, exceto Ryan.
— Ele disse que não consegue vir aqui e ver minha filha, quando não
sabe como a dele está, como estão as duas — disse Lucky olhando para Sam,
que segurava a bebê nos braços. Era uma linda menina, puxara aos dois.
— Eu o entendo, querido — disse ela, acalentando sua bebê.
Bryan lhe contara toda a história sobre seus pais. Eu a vi chorando pela
morte dos dois, mesmo sendo eles quem eram, porque não importavam o que
tinha feito, ainda eram seus pais. Bryan e Lucky a consolaram. Depois disso,
ela passou a ir quase diariamente ao cemitério. A seu pedido, os dois foram
enterrados em Nova Iorque.
— Eu também, Rosa Vermelha. Só espero que eles consigam localizar
Angelina, para o bem do meu irmão — falou Lucky em tom preocupado.
— Daemon é bom em localizar pessoas. Ele vai encontrá-la, e nós
vamos ver que ela está bem, que nada aconteceu com ela e com seu bebê. —
Assim eu esperava.
— O pior é que Tabitta com certeza sabe. Isso até causou algumas
brigas entre Jason e ela, mas... — eu tinha certeza de que Lucky a xingaria,
mas, após um rosnado de aviso de Jason, prosseguiu em tom calmo — ela
não vai dizer.
— Eu tentei fazê-la falar, mas não consegui. Sua amizade com Angelina
a faz ser bastante leal — falou Jason com um suspiro triste. Seus olhos
estavam fundos, como se não dormisse havia dias.
Ele tinha acabado de saber que sua mãe estava viva por todos aqueles
anos e que ele tinha dois irmãos. Contudo, ela estava doente e morreu havia
pouco tempo. Ele mal a reencontrou, e ela se foi. E ainda se juntava a isso os
problemas com Tabitta, por isso suas olheiras fundas.
— Eu não tiro sua razão, faria o mesmo por Sam, Luana e Claire, que
são minhas melhores amigas — sussurrei.
Luana e Claire visitaram Sam também, mas ficaram pouco tempo, já que
ainda não podiam sair livremente. Steve ainda estava solto, e não sabíamos
onde ele estava, nem o que planejava fazer. Não tínhamos como saber o que
uma mente doentia como a dele era capaz de elaborar. Bryan me disse que,
após Black expulsar Steve do seu clube depois que descobriu que ele era um
serial killer, também não o viu mais.
Nasx e Calebe eram meus guarda-costas e de Ariane, seguiam-me para
todo canto, inclusive na escola, porque eu não deixei de ir, já que fazia
meses que não sabíamos de Steve. Estava torcendo para ele aparecer logo a
fim de o pegarmos de uma vez por todas, porque era horrível ficar sempre
preocupada e olhando por cima do ombro.

— Tem certeza de que quer fazer isso? — sondou Brenda.


Ela e um cara chamado Bruno, colega de trabalho seu, haviam me
chamado para me usar como isca para capturarem Steve Lutner de uma vez
por todas. Eu também queria isso, queria Steve preso e não morto pelas
mãos de Bryan, algo que estragaria a vida dele para sempre, e a minha
também, já que éramos um só.
— Sim, tenho certeza de que quero fazer isso. Quero esse desgraçado
preso, de preferência longe das pessoas que amo — asseverei com firme
convicção.
— Estamos todos equipados, e vamos protegê-la de Steve Lutner —
garantiu Bruno. Ele era forte, moreno e vestia terno, mesmo não estando frio
no momento. Pelo visto, gostava de se vestir bem.
— Precisamos fazer isso o quanto antes, porque Bryan chega amanhã, e
ele não vai deixar isso acontecer — assegurei a eles.
Nós três estávamos em um banheiro de um restaurante no Centro de
Manhattan. Brenda me ligara marcando encontro ali. Eu deixara Nasx no
salão e viera ao banheiro. Calebe tinha ficado com Ariane em casa, já que eu
não podia trazê-la.
Duas semanas antes, Brenda me visitou no intuito de pedir desculpas, e
fomos à sala de computadores, único lugar da casa que não tinha câmeras e
onde poderíamos conversar sem que ninguém nos ouvisse. Ela me falou que
seu chefe precisava da minha ajuda para pegar Steve. Eu aceitei mesmo
sabendo dos riscos para minha vida.
Bruno assentiu para mim e me entregou dois pequenos objetos.
— O que é isso? — perguntei, olhando para os dois agentes.
— Um é uma escuta para ouvirmos tudo que vocês falarem. O outro é
um rastreador para sabermos onde quer que você vá. Se ele conseguir te
raptar, saberemos onde estão. Apenas precisa esconder muito bem isso para
que Steve não descubra — respondeu Bruno.
Assenti, porque, se Steve descobrisse que eu estava sendo rastreada,
seria o meu fim. Eu não sabia se seria capaz de controlar os pesadelos
lúcidos se fosse levada e algemada, porque era isso o que ele faria se
conseguisse me sequestrar novamente.
— Mas como vamos fazer isso? Como vou escapar de Nasx? Porque
ele não vai me deixar sair sozinha daqui.
Eu gostaria de dizer a verdade a ele, mas não podia, não quando sua
lealdade estava com Bryan, por isso tinha que fazer aquilo sozinha. Bem, não
sozinha, mas com Bruno e Brenda. Além disso, ele disse que havia mais
agentes envolvidos no caso. A maioria não concordava em me usar, mas era
a única forma de pegarmos Steve, já que ele me queria tanto para terminar o
que começou.
Eu aceitei fazer parte daquilo porque pensava o tempo todo no que
aconteceria se Bryan o encontrasse e matasse, porque era isso o que
aconteceria caso ele colocasse as mãos em Steve. Eu não podia deixar isso
acontecer, não podia permitir que ele acabasse com sua carreira e sua vida.
Bryan valia mais do que qualquer coisa que viesse a acontecer comigo.
Brenda sorriu e baixou mais o decote de sua blusa branca.
— Eu dou um jeito nisso enquanto você foge. Não perca o rastreador,
porque, senão, estaremos mortos quando Bryan descobrir. Aquele cara é
capaz de tudo por você, até matar colegas e agentes da lei. — Ela deu um
suspiro.
Esperei alguns minutos depois que ela saiu com seu plano para distrair
Nasx. Que homem heterossexual não se distrairia com ela? A mulher era uma
morena exuberante, com seios fartos, um colírio para os olhos. Ainda bem
que Bryan não se interessara por ela.
— Vai dar tudo certo. Têm agentes de confiança nesse caso e vão ficar
de olho em você — atestou Bruno, preparando-se para sair do banheiro,
quando uma senhora entrou.
— Vocês, jovens, não podem esperar chegar em sua casa? Aqui é o
banheiro de um restaurante, pelo amor de Deus — rosnou a mulher,
possivelmente pensando que nós transamos ali.
Olhei para Bruno, que fingia arrumar suas calças. Quase revirei os
olhos ante a cena; só não o fiz porque estava tensa pelo que ia acontecer.
— Com uma mulher dessas, eu não conseguiria nem chegar à esquina —
replicou Bruno dando um sorriso para a senhora, que estava na casa dos 60
anos.
Assim que saímos do banheiro ignorando os olhos arregalados da
mulher, olhei para a mesa onde Nasx estava sentado de frente para o
banheiro, mas Brenda se aproximou dele e fingiu que tropeçava. Nasx a
segurou para impedir que ela caísse no chão.
— Agora vai — falou Bruno.
Aproveitei a distração de Nasx e saí do restaurante movimentado.
Talvez fosse por isso que Brenda escolheu aquele local.
Capítulo 26

ALEXIA
Olhei para meu antigo prédio em Nova Iorque. Eu venderia meu
apartamento, já que estava morando com Bryan em nossa casa segura.
Mesmo depois que tudo aquilo passasse, eu continuaria lá, já que amava o
lugar. Foi nele que descobri que Bryan me amava, bem como onde foi
realizado meu casamento com ele.
Respirei fundo e entrei na portaria, depois subi pelo elevador até o meu
andar. Não podia fraquejar. Apesar disso, um arrepio desceu por minha
coluna, mas me controlei. E se Steve tivesse hackeado as câmeras do prédio,
estivesse me observando e, ao me ver tremer, desconfiasse de algo? Nada
podia dar errado naquela noite.
Assim que entrei em meu apartamento, ouvi a música tocar na minha
caixinha de música. Tudo dentro de mim gritava para fugir, como aconteceu
quando Bryan me seguiu depois da boate naquela noite em que Steve esteve
ali. Eu sabia que, se ele estivesse me vigiando assim que saísse sozinha do
restaurante e pegasse meu carro, seguindo o caminho mais comum para meu
prédio, ele me seguiria e se apressaria a entrar ali antes de mim. Bem, assim
eu esperava.
— Eu me pergunto se você é estúpida por se livrar de seu guarda-costas
e vir aqui sozinha — ouvi a voz do meu pesadelo, mas daquela vez era real.
Virei-me e olhei para o cara que um dia destruiu minha alma, que
felizmente foi reconstruída por Bryan. Eu não deixaria aquele imundo
desgraçado destroçá-la de novo, nem que para isso tivesse que matá-lo com
minhas próprias mãos.
Eu ainda estava perto da porta, e ele, sentado confortavelmente no meu
sofá, como se fosse o dono do lugar. Vestia jeans e camiseta, seus cabelos
estavam longos e oleosos, bem como sua barba cheia e desgrenhada. Eu não
achava que era um disfarce, apenas que ele era um imundo que não ligava
para nada, nem para sua higiene.
— Samuel? Ou devo te chamar de Steve? — ironizei, fuzilando-o com
os olhos.
— Então já sabe sobre mim — disse, apontando uma arma em minha
direção, como já tinha feito outras vezes.
— Que você é um desgraçado, desumano e estuprador de mulheres?
Que usa de disfarces e outros nomes para conseguir seu intento? Você não
vale nada, não passa de um fodido imundo que merecia estar morto! —
sibilei com os dentes cerrados, louca para voar nele. Como eu tinha
aprendido a lutar, não tinha medo de ter de enfrentá-lo no mano a mano, mas
ele estava armado, o que dificultava as coisas.
Sua expressão se modificou, revelando sua ira, que era tanta que ele
pulou do sofá com a arma em punho. Suas mãos tremiam tanto que achei que
ele estava prestes a puxar o gatilho.
Meu sangue gelou, mas não demonstrei meu receio, afinal, não queria
que ele pensasse que eu era fraca e medrosa como antes. Precisava ser forte,
porque ele gostava de fraqueza e impotência.
— Sua puta desgraçada, você é minha e faço com você o que eu quiser!
Minha puta, não daquele fodido de merda! — vociferou. — Agora venha
aqui, tire as roupas e se dobre no sofá, que eu vou te ensinar uma lição!
Tentei esconder meu pavor e asco. Eu nunca mais me submeteria àquilo.
— Você só pode estar louco se acha que vou deixar você me tocar —
desafiei-o. Eu sabia que estava sendo idiota, afinal, ele estava armado, mas
não deixaria o medo tomar conta de mim, e sim a raiva que eu sentia daquele
monstro. — O único homem que me toca é meu marido!
— Você vai fazer o que eu mandar, porra! — rosnou, vindo para cima
de mim. Pensei em correr, mas, como não podia estragar o plano, fiquei
quieta e o deixei pegar meu braço e me jogar no sofá. — Agora tire suas
roupas, ou eu tiro!
— Não vou me despir! Acha que sou aquela idiota medrosa que fazia
tudo que você mandava? Se quiser atirar em mim, vá em frente, seu cretino
de merda, mas não vou fazer isso! — Cerrei meus punhos, louca para acertar
sua cara imunda. Esperava que os agentes entrassem logo e o prendessem,
mas eles precisavam de uma confissão da localização de alguns corpos de
garotas que nunca haviam sido encontrados.
Ele levantou a mão direita como se fosse bater em meu rosto, mas seu
telefone tocou.
— O que você quer, Olivia? — questionou, colocando a ligação no
viva voz, falando num tom meloso, como falava comigo antes de me raptar
no passado.
— Estou no hospital. Já vou entrar para fazer o que você quer — falou
uma voz feminina. — Depois vamos ficar juntos, não é?
Eu não estava entendendo nada. O que a mulher faria em um hospital?
Quem era a tal de Olivia? Aquela louca parecia gostar dele. Certamente não
sabia nada sobre o monstro que ele era.
— Sim, apenas mate aquela cadela da Angelina e sua filha bastarda —
ele respondeu e desligou.
Meu sangue gelou a ponto de meu corpo tremer. Angelina estava em um
hospital e, pelo que parecia, ganharia sua filha. Aquele monstro queria matá-
las? Eu precisava saber tudo sobre aquilo, então olhei para ele. Eu sabia que
fazer aquele ser abominável ficar com raiva não ajudaria em nada. Então
resolvi fazer um jogo diferente. Só esperava que, quem quer que estivesse
ouvindo pela escuta, alertasse Angelina.
— O que você tem contra Angelina? Ela não te fez nada! Você que
matou a irmã dela e a fez sofrer — perguntei num tom tranquilo, embora
fosse difícil manter a calma.
Ele me olhou de lado.
— Eu sou o que sou por culpa dessa vadia desgraçada e da puta da
irmã dela! — sibilou, abrindo dois laptops nos quais eu não tinha reparado
ainda. Nas telas, as imagens pareciam captadas em tempo real das câmeras
de um hospital. Seria onde Angelina estava?
— Você matou a irmã dela, quase estuprou minha amiga e ainda saiu
impune por ser rico...
Ele me fitou com os olhos sombrios de um demônio capaz de matar
qualquer um.
— Impune? Acha que não fui castigado, porra? Aqueles desgraçados
dos meus pais me levaram para um colégio interno na Inglaterra só para não
causar problemas para eles, já que eram políticos! — Ele se levantou e
pegou uma garrafa de bebida no meu aparador. — Aqueles imundos nem
checaram o lugar para saber se era realmente uma escola de confiança! Não,
eles só queriam se livrar do estorvo que eu era!
Um nó apertou minha garganta ao imaginar o que tinha acontecido lá.
Com certeza não fora boa coisa. Eu podia ver pela sua expressão colérica e
atormentada, cheia de asco e dor, que algo terrível acontecera com ele
naquele lugar. Eu até podia imaginar o que era.
— O que houve lá? — perguntei, depois acrescentei, não o querendo
com mais raiva, afinal, precisava ouvir a verdade dele: — Pode me dizer?
Ele se sentou perto de onde havia deixado os computadores, ainda
bebendo e apertou um botão. As imagens que vi, captadas de câmeras, me
assombrariam para sempre. Só não vomitei porque não tinha comido nada no
restaurante, afinal, fui lá para me encontrar com Brenda e Bruno, não para
comer.
No vídeo que passava, havia adolescentes presos em correntes em uma
fileira, todos nus, enquanto alguns homens abusavam deles. Minha vontade
era de acabar com todos.
— Oh, meu Deus! — sussurrei, engasgada como se tivesse alguma
coisa na garganta ou no peito.
— Deus não existe! Sabe o quanto gritei por ele para me salvar
daquilo?! Muitas vezes, assim como você e as garotas que matei gritavam
pedindo socorro, mas Ele não as ouviu, nem a mim! — Seus olhos pousaram
nos meus. — Por culpa de Angelina e meus pais, fui parar naquele inferno e
me tornei esse monstro que sou!
— Por isso matou seus pais? — Era uma pergunta retórica, porque eu
sabia que foi ele que matou os próprios pais, como também as garotas, como
se fosse uma vingança distorcida pelo que lhe aconteceu. — Por que não ir
atrás dos caras que te fizeram sofrer, em vez de torturar e matar garotas
inocentes, com sonhos pela frente? — Apontei o dedo para a tela do
notebook sem olhar para ela. Não conseguiria ver mais aquelas cenas
horrendas. Eu pensava que não existia monstro pior do que aquele que estava
à minha frente, mas acabava de descobrir que, sim, existia.
— Por que eu não faria isso? E os meus sonhos, que foram destruídos?
Alguém pensou em mim? Meus pais? Não, ninguém pensou, então não me
importo com ninguém! — esbravejou, mexendo no teclado, então vi um casal
nu e acorrentado a uma parede. Eles estavam cobertos de sangue, como se
tivessem sido espancados de tantas formas diferentes que sua pele foi
arrancada, como se estivessem esfolados. Por sorte ele não colocou o som,
só as imagens.
Desviei os olhos da cena, porque não podia mais ver aquelas
atrocidades. Um tremor passou por mim assim que uma suspeita terrível se
instalou em minha mente.
— Você grava todas as torturas e assassinatos? Todas aquelas garotas?
Eu...?
Ele sorriu de modo doente. Meu estômago se contorceu.
— Sim, precisava assistir a tudo depois e ver o que precisava ser
melhorado, aperfeiçoado.
— Meu Deus, você é um demônio!
— Sim, eu sou — respondeu como se eu o tivesse elogiado. — Eu
coloquei fogo naquele colégio de merda para o qual meus pais me
mandaram, mas, antes, fiz todos que cometiam as atrocidades e os que
sabiam o que acontecia ali e não faziam nada pagar na mesma moeda.
— Oh, Deus! — Engasguei-me ao pensar em algo horrível. — E os
garotos vítimas como você? Os salvou?
— Por que me daria a esse trabalho? Aqueles moleques tinham medo
dos guardas, por isso não os denunciavam, então também mereciam morrer
queimados — respondeu em tom frio. — Assim como meus pais e os pais de
Angelina. Eu ia tirar tudo dela, até seus irmãos. Aquela maldita criança era
para morrer com sua mãe, mas sobreviveu.
Dei graças a Deus por Lira, uma das irmãs de Angelina, ter sobrevivido
ao acidente que aquele desgraçado causou à família. Até o momento, todos
pensavam que tinha sido um simples acidente, mas foi um assassinato.
Outro pensamento me ocorreu, e meu sangue gelou.
— Matou meus pais também? Porque não descobriram as causas da
queda do avião até hoje. — Estava tremendo de raiva, tanto que faltava
pouco para eu voar na cara dele. Pelo menos ele deixara a arma sobre a
mesinha de centro, onde estavam os laptops.
— Aqueles desgraçados? Ainda os chama de pais? Eles te mandaram
para uma clínica psiquiátrica e falaram que nossa filha morreu! Do mesmo
modo fez aquela cadela velha da sua cozinheira, que cuidou de nossa filha
como se fosse dela, não ligando uma vez para você! — Mexeu no teclado do
PC, e ali estava o vídeo de ele matando Aria, mas não o olhei; não podia
lidar com aquilo.
— Como sabe disso? Andava me vigiando? Então por que não apareceu
antes? Por que se contentou matando outras garotas inocentes? Os corpos de
algumas delas sequer foram encontrados! — A menção aos cadáveres das
garotas fora planejada com Bruno e Brenda, que precisavam da informação.
Ele me fitou com os olhos estreitos.
— Acha que sou idiota? Que não sei que está com escuta? Você não ia
vir aqui à toa, não é? Não sabendo o que eu faria com você. — Ele se
levantou e me olhou de lado. — Tire as roupas e mostre a escuta.
Fiquei de pé também, olhando-o de igual para igual. Não fugiria dele,
afinal, ele já tinha falado tudo, menos a localização das meninas
assassinadas. Resolvi, então, barganhar com ele, ou ao menos tentar.
— Se eu tirar a roupa e provar que não tenho escuta, vai me dizer onde
estão os corpos? — Tentei colocar persuasão em meu tom de voz. — Steve,
você já destruiu os corpos dessas meninas; por favor, me diz onde eles estão,
para suas almas terem um pouco de sossego.
— Acha que vou dar sossego às almas delas?! — gritou, voando sobre
mim, que caí de costas no sofá com ele por cima. Estava furioso demais.
Pelo visto, meu plano não deu certo. — Alguém pensou em minha alma?! —
Ele pegou meu vestido e o rasgou. Então ficou mais furioso ainda ao ver o
nome de Bryan e o de Ariane em meus seios. — Você é minha, sua puta! Essa
filha é minha, não daquele policial de merda!
Eu não soube bem o que houve, estava preparada para tudo, mas,
quando ele me tocou, fiquei imobilizada. Devia ter surtado, porque não
ouvia nada, só sua voz me xingando no passado e suas mãos imundas me
agredindo, como se estivesse entrando num pesadelo lúcido... Oh, meu
Deus! Isso não pode acontecer de novo! Tentei lutar contra as lembranças
daquela época horrível, nas quais estava me afundando, mas não consegui.
Bryan! Ele podia me salvar da minha mente presa nas lembranças
sombrias. Seu rosto lindo, sua boca de mel, seu toque, que aquecia minha
pele, seu cheiro, que inebriava minha vida. Sua voz, então, que era capaz de
me trazer do inferno em que estava vivendo ao me lembrar daquelas cenas,
do meu corpo acorrentado, algemado, de suas mãos cruéis... Bryan! Ele era
meu salvador, minha fortaleza.
— Alexia... — chamou sua voz a pouca distância de mim. Seu tom
estava calmo e carinhoso, mas senti fúria e preocupação nele com o que
estava acontecendo comigo.
Segui a sua voz e abri meus olhos, deparando-me com os olhos azuis
que eram capazes de me trazer de volta para a luz. Aquele homem era o meu
milagre.
— Bryan... — Notei que minha voz estava rouca, provavelmente pelos
gritos que eu dei no pesadelo e na realidade também. Ele estava em cima de
mim no sofá, prendendo minhas mãos para cima, com a testa na minha e os
olhos nos meus. — Oh, Deus, Bryan... eu...
Ele soltou minhas mãos, e o abracei forte, sentindo o seu cheiro rico,
inundando-me em sua luz e tentando acalmar a escuridão que havia se
apossado de mim. Fazia meses que eu não surtava assim. A última vez tinha
sido durante a prisão na Cruz de Santo André. O toque de Steve desencadeou
tudo, as lembranças, a dor, as perdas.
— Eu estou aqui, Luz do Sol. Sinta o meu cheiro e ouça a minha voz,
ouça e volte para mim. Sinto muito, querida — sussurrou Bryan com a voz
sem vida.
Antes que eu lhe perguntasse por que sentia muito, quando ele não tinha
nada a ver com o que aconteceu comigo, pois eu aceitei servir de isca para
prender Steve, percebi, enfim, a movimentação ao meu redor. Olhei em torno
e me deparei com a sala cheia de MCs e agentes da lei, como Shadow,
Daemon, Nasx, Bruno e Brenda e alguns outros, mas não me importei,
porque Steve estava de joelhos.
Bryan saiu de cima de mim assim que me remexi debaixo dele. Olhei
para meu corpo, para meu vestido em pedaços. Na parte de cima estava
quase nua, só com meu sutiã branco. Bryan tirou sua jaqueta e a colocou
sobre mim.
— Obrigada. — Pigarreei para conseguir falar, então olhei para Steve,
que me encarava furioso.
— Não adianta me prenderem! Eu vou voltar e acabar com o resto das
pessoas que você ama uma a uma!
— Cale a sua boca! Tirem esse cara da minha frente antes que eu perca
o resto do meu juízo! — rosnou Bryan.
Os agentes o levaram dali. Fiquei aliviada depois que ele saiu
carregado, xingando e me ameaçando. Eu não queria me aproximar daquele
cara nunca mais. Cheguei mais perto de Bryan, como se buscasse mais
conforto, mas também para acalmá-lo.
Alguns dos agentes pegaram os laptops onde estavam os vídeos que
aquele lunático fez de suas vítimas.
Bruno estava com a face machucada. Eu apostava que tinha sido Bryan
quem fez aquilo, por ele ter me colocado naquela situação.
— Eu quero ir para casa — falei a Bryan, colocando a cabeça em seu
ombro.
— Alexia! — um grito agudo, de furar os tímpanos, soou.
Olhei para a porta e vi meu irmão tentando entrar no apartamento, mas
um policial não permitia. Seu rosto estava tomado de dor e pavor. Sorri de
leve para ele. Eu só queria estar perto da minha família, da qual Alex fazia
parte.
— Vamos para casa, meu amor — afirmou Bryan e olhou para Bruno.
— Depois falo com você.
Epílogo

ALEXIA
Dois meses e meio depois

Durante os últimos meses, superei a minha crise, graças a Deus e a


alguém, que matou Steve com um tiro na cabeça quando ele estava sendo
transferido para um presídio.
— Foi você? — perguntei a Bryan assim que li no jornal sobre a morte
dele.
Nós estávamos em casa. Ele mal parava lá devido ao caso em que
estava trabalhando. Não perguntei a ele que caso era, mas Tabitta me disse
que estavam tentando prender o líder de uma máfia russa, Andrey Jacov.
— Luz do Sol, se eu fosse matá-lo, não seria com um tiro na cabeça,
quando ele não sofreria nada; seria lento e doloroso. — Sua voz soou fria ao
dizer isso.
Quando Bryan me resgatou de Steve, disse que soube que eu estava no
meu apartamento porque colocou câmeras lá para caso Steve resolvesse
voltar. Sua viagem da Rússia para os Estados Unidos foi adiantada porque
conseguiu resolver o que quer que foi fazer lá. Daemon, que tinha acesso às
imagens das câmeras em tempo real, viu o que estava acontecendo e ligou
para ele, que já estava a caminho de casa.
Bryan me disse que ouviu meus gritos de longe e que isso foi
perturbador. Vários agentes já tinham tentado, mas ninguém conseguia me
trazer de volta. Eu só despertei do pesadelo ao ouvir a voz dele, que teve de
escolher entre matar Steve e me trazer de volta. Por um momento, agradeci
por minha crise; por causa dela, Bryan não matou ninguém, e sua alma estava
completa.
A filha de Ryan e Angelina era uma bonequinha linda, parecida com os
dois. Estava cada vez mais forte e esperta. Ela nasceu prematura, e, graças a
Deus, Angelina sobreviveu à cirurgia cardíaca que precisou fazer.
Olivia Savvy era a garota que foi presa em flagrante tentando matar
Angelina porque Steve pediu a ela. A garota era uma louca varrida. Como
pudera fazer isso só porque um cara desequilibrado lhe pedira?
Bryan, eu e Ariane fomos visitar Angelina assim que ela saiu do
hospital com sua bebezinha, Victoria. Contudo, Ryan mal nos deixava chegar
perto dela. Aquele cara, que um dia fora mulherengo, tornou-se o maior
papai coruja que eu já conhecera na minha vida. Eu mal peguei Victoria um
pouquinho, e ele já tentou tomá-la de mim, mas Angelina se meteu no meio,
repreendendo-o.
Ela estava sentada em um sofá na sua nova casa, que ele construíra para
ela, grande e magnífica. Ryan tinha muito bom gosto.
— Ela é minha — reclamou ele como uma criança e não um homem de
27 anos.
Angelina lhe estendeu a mão, e ele foi de bom grado até ela.
— Eu sei, querido, mas eles são nossos amigos e querem ficar um
pouco com ela.
Depois dessa suave reprimenda, ele não se meteu em nossa
“paparicação” com Victoria, o milagre vivo. Era em momentos como aquele
que eu tinha ainda mais certeza da existência de Deus e nunca me arrependia
de ter mantido a minha fé, porque Ele também fez milagres na minha vida:
permitiu que eu fosse a única sobrevivente quando raptada por um serial
killer; devolveu-me minha filha; curou-me do trauma, da dor e da escuridão
que eu sentia; e me deu um marido maravilhoso e amigos incríveis que eu
adorava ter por perto.
Eu e Bryan resolvemos esperar para ter filhos. Eu queria um menino,
mas primeiro terminaria a faculdade de marketing e faria um curso de
designer de moda, uma coisa que eu amava, mais do que o balé, que um dia
fora meu sonho, mas não estava curada para voltar a dançar ainda. Talvez um
dia conseguisse ouvir música clássica ou ver espetáculos de balé sem sentir
calafrios. Há um ditado que diz que o tempo cura tudo. Eu acreditava nisso,
porque já havia sido curada de muitos traumas, de feridas profundas e dores
que me assombravam.

Estávamos trancadas dentro de um cômodo na igreja onde foi realizado


o casamento de Ryan e Angelina. No entanto, as coisas se complicaram havia
meia hora. Tabitta colocou Jason Falcon para dormir com Boa noite,
Cinderela e saiu com os MCs e Bryan.
Eu não queria deixá-lo ir, mas confiava nele para cuidar de si mesmo e
se proteger, afinal, logo ele prenderia os homens de Jacov, aquele caso seria
finalizado e ele poderia voltar para mim e Ariane.
— Você sabia disso? — rosnou Jason assim que acordou e foi direto
até Evelyn, que estava sentada em um sofá. — Sua desgraçada, eu vou
acabar com você!
— Ela me pediu, e eu a ajudei. — Evelyn se levantou também, com
dois punhais nas mãos. A garota manejava facas que era uma beleza.
Tripper, parente adotivo de Isabelle, esposa de Kill, entrou no meio dos
dois. O garoto de uns 19 anos mais ou menos era um prospector do clube,
pela jaqueta que usava, mas pareceu mais velho ao falar sombriamente para
Jason:
— Se tocar nela, sabe que teremos mortes aqui. Shadow não deixa
ninguém a tocar, muito menos Kill.
Lucky segurou Jason, mas eu sabia que ele não encostaria o dedo em
Evelyn, tanto por ela ser uma mulher quanto por ser namorada de seu melhor
amigo.
Depois disso, tudo ocorreu bem. Os federais, com a ajuda dos MCs,
prenderam vários mafiosos de quem estavam atrás. Dois morreram, e um
deles era o pai de Tabitta, Sebastian Ruiz, mas não vi tristeza da parte dela
por isso.
Assim que o MC Landon e Chris, o guarda-costas de Tabitta, que
estavam do lado de fora da porta, protegendo-nos, entraram e disseram que
tudo tinha acabado e que todos estavam bem, enfim pude respirar aliviada.
Liguei para Bryan, e ficamos de nos encontrar em casa.

BRYAN
Depois de tudo acabado após meses de investigação, prendemos vários
bandidos mafiosos, e outros foram mortos ao trocar tiros com os federais e
agentes da CIA. Fui agradecer aos meus amigos MCs, principalmente a
Shadow, que era meu melhor amigo. Ele sempre guardara minhas costas. Eu
confiava na polícia, mas tinham muitos infiltrados nela, por isso eu pedira
ajuda a Shadow. Também sabia que ele estava protegendo Tabitta para
Jason. Se acontecesse algo com ela, Jason morreria. Aquele cara adorava
aquela mulher, assim como eu amava Alexia.
— Obrigado, irmão. — Apertei sua mão. — Espero que tenhamos paz e
sossego por enquanto.
— Deus lhe ouça! — exclamou Nasx. — Não vejo a hora de voltar para
casa e me divertir com a mulherada. Eu te convidaria, mas você já tem uma,
não é? — Ele piscou para mim.
Revirei os olhos. Só pensava em Alexia. Eu nem podia acreditar que
tinha chegado o fim das perseguições, bandidos e chefes de máfias. Queria ir
para casa e relaxar com minha mulher.
— Sim, e a minha me ligou e disse que está me esperando em casa —
respondi e olhei para Daemon, que estava em sua Harley preta. Fui até ele e
dei um tapa de leve em suas costas.
— Obrigado, Daemon, por sua ajuda. Sei que fez isso por ela, mesmo
assim agradeço de coração — falei a verdade.
Ele deu de ombros.
— Não foi só por Alexia, mas tudo bem — respondeu. — Tome conta
dela.
— Eu cuidarei, prometo — jurei. — E você cuide de Emília e Emma.
— Eu as protegerei, não se preocupe. Agora preciso ir encontrá-las —
respondeu, ligando sua moto e partindo.

Quando cheguei em casa, as luzes de nosso quarto estavam acesas. Eu


sabia que Alexia não dormiria antes que eu tivesse chegado. Eu havia falado
com Dennis, meu chefe, algumas semanas antes e dito que só trabalharia nos
casos de Sebastian Ruiz e Andrey Jacov e depois me demitiria. Aquele era
meu último dia na CIA. Não podia trabalhar em um emprego que sempre me
impedia de dizer a verdade à mulher que eu amava e que me fazia ficar
tempos longe de casa. Iria me juntar aos federais, que já me sondavam fazia
um tempo.
Assim que abri a porta, deparei-me com uma cena que até hoje custo a
acreditar que era real. Alexia estava algemada na cama, gloriosamente nua e
exposta para mim. Ela sorriu assim que entrei no quarto.
— Olá, querido marido. Como eu sei que teve um dia difícil, vou te dar
o que precisa para relaxar e trazer sua mente de volta de onde quer que ela
esteja.
— Isso é inacreditável... — sussurrei abobado por ela estar presa sem
gritar ou surtar.
— O que foi? Vai ficar aí parado ou vai entrar em ação? — indagou,
abrindo mais as pernas, mostrando sua boceta gostosa para mim.
Eu estava louco para tê-la, mas precisava de um banho antes de ficar
com a minha garota, tirar toda aquela sujeira de mim, o que aconteceu
naquele dia, as mortes dos bandidos em que eu atirei.
Foi o banho mais rápido da minha vida. Saí nu do banheiro e fui até
Alexia, ainda esparramada na cama, com seus cabelos caídos no colchão, um
pulso algemado na cama e o outro só encaixado no aro. Gostei que ela
fizesse aquilo por mim. Só ela me conhecia quando minha mente escurecia, e
ultimamente isso acontecia bastante, muito possivelmente pelas garotas que
achamos em um contêiner num navio, algumas mortas, outras vivas, outro
caso que concluímos. O tráfico humano era chefiado pelo rato disfarçado no
FBI, Lincoln, que devia estar no inferno naquele momento. Se dependesse de
Dark, eu acreditava que não seria uma morte lenta... Nikolai era conhecido
por não perdoar.
Chega de pensar nisso, agora só tenho de me dedicar à minha musa, à
mulher mais linda do planeta, que está aqui fazendo de tudo para eu não
me fechar na escuridão.
— Por mais que eu ame ver você presa, minha querida esposa, hoje só
quero fazer amor com a minha mulher. — Tirei suas algemas e subi em cima
dela, enterrando-me em sua boceta apertada. — Agora estou no paraíso.
— Você também é meu paraíso, querido — disse, beijando-me e
prendendo suas pernas na minha bunda enquanto eu a penetrava centímetro a
centímetro.

— Espero que amanhã se lembre do que tivemos, mas, se não lembrar,


mostro a você — falou ela, beijando meu rosto e minhas pálpebras com
carinho. — Espero um dia ser a luz no meio da sua escuridão.
Eu ainda estava dentro dela, depois de ter gozado sem pressa. Não
queria fazer mais nada com pressa, afinal, teríamos muito tempo para foder.
Naquela noite, eu só queria amar aquela mulher maravilhosa. Admirei seus
olhos lindos.
— Luz do Sol, você já é a luz que incendeia toda a minha escuridão.
Com você ao meu lado, ela não existe. Você me salvou, assim como salvei
você. — Olhei para as algemas jogadas num canto da cama. — Nós
completamos um ao outro. — Mexi meu pau já duro de novo dentro dela.
Com Alexia, nunca era suficiente. — Eu amo você. Você é minha, e nada nem
ninguém vai tirá-la de mim.
— Para sempre, Bryan — jurou, beijando-me com um gemido que eu
amava, adorava, venerava, idolatrava.
Naquele momento, agradeci a Deus por Ele me dar mais uma chance de
me redimir dos meus pecados, porque eu estava feliz como nunca havia sido
em toda a minha vida, ao lado da minha mulher, que me trouxe luz, paz,
esperança e, principalmente, amor.

Fim
DOMADO POR VOCÊ
Série Dilacerados
Livro V

IVANI GODOY
Copyright © - Ivani Godoy

Revisão: Analine Borges Cirne

Esta é uma obra ficcional.


Qualquer semelhança entre nomes, locais ou fatos da vida real é mera
coincidência.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser
utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem a
autorização por escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº. 9.610/98 e
punido pelo artigo 184 do código penal.
Sinopse
Jordan sempre foi acostumado a ter a mulher que desejasse. A sua vida
era regada a muito sexo e curtição. Arrepiava-lhe a ideia de se prender a
apenas uma mulher, assim como via acontecer aos seus companheiros de
festas.
Entretanto, esse seu modo de enxergar a vida cai por terra quando
conhece a irmã do seu melhor amigo.
“Eu estava animado, pois imaginava que nos divertiríamos muito, mas
não contava que fosse conhecer uma caipira linda e sexy com botas de
caubói. Até quando conseguiria esconder a verdade dela?”
Tudo o que Laurel deseja na vida é ter o amor de seu irmão, filho do
seu padrasto, pelo qual sempre foi apaixonada. Com o coração partido, ela
foge de homens que agem como seus irmãos, que possuem uma banda de
rock – as mulheres chovem aos pés deles.
“Cafajeste? Depravado? Devasso? Mulherengo? Eu simplesmente
queria distância de homens assim, pois eram tudo o que meus irmãos eram.
Contudo, eu os amava.”
Entretanto, toda sua convicção muda quando conhece
Taylor, loiro, olhos azuis, forte, másculo e dono de um incrível sorriso
encharca calcinha. Imaginar sentir aquela boca mandona em seu corpo a
excita como nunca. Será que ela finalmente encontrou o cara que sempre
desejou e sonhou, o seu caubói?
Capítulo um

LAUREL
— Oh, meu Deus! — gemi, agarrando a mão do homem que estava ao
meu lado no avião assim que ele decolou.
— Fique calma e respire fundo, caipira — pediu ele alisando minha
mão, que segurava no intuito de me acalmar – assim pensei.
Eu estava indo para Las Vegas, ao casamento do meu irmão Shade.
Andar de avião sempre me deixava nervosa e tremendo, porque minha
família havia morrido em um acidente aéreo cinco anos antes. Fugia disso o
quanto podia, mas às vezes não era possível evitar.
Antes de o avião decolar, um rapaz louro tinha se sentado ao meu lado;
era alto, cabelos longos, mas estavam amarrados num rabo de cavalo. Seus
olhos eram tão azuis quanto o céu em um dia de verão. Ele tinha a aparência
do Thor.
― Me desculpe, é que aviões me deixam trêmula de medo, mas tenho
que ir para Vegas para um evento importante ― sussurrei envergonhada,
porque não era para uma mulher de 24 anos ter esse tipo de medo.
Certamente ele me acharia estranha.
Evento importante? Quase ri com esse pensamento. O casamento de
Shade definitivamente não era importante, não para mim; ao contrário, era a
minha cruz, meu calvário.
― O que você vai fazer em Vegas, para andar em algo que te
amedronta? ― sondou curioso, ou foi o que me pareceu.
Suspirei, porque aquele era um assunto sobre o qual eu não queria
conversar, não com a dor recente em meu peito, capaz de esmagá-lo.
Shade era meu irmão, embora não de sangue, filho do homem que se
casou com a minha mãe antes de os dois morrerem no acidente aéreo. Eu
considerava o meu padrasto, Louis, um pai, já que o meu genitor verdadeiro
desapareceu quando eu era criança e nunca deu as caras na minha vida. E eu
acreditava que nem faria isso.
Desde que Shade veio morar conosco junto a Louis, eu me apaixonei
por ele perdidamente. Até meus 15 anos, pensei que fosse uma paixonite de
adolescente, mas, conforme o tempo passava, o que eu sentia foi ficando
mais forte. Eu o amava em segredo, porque ele não sentia o mesmo por mim.
Shade me amava como uma irmã, assim como faziam meus irmãos de sangue,
Nilan e Gave.
Naquele dia, Shade estava se casando com uma mulher que não o
amava, e nem ele a ela. Eu não sabia o verdadeiro motivo para ele se casar
com ela, já que não tinha nenhum sentimento pela cadela. Eu falava isso da
Melissa não por inveja por ela estar se casando com Shade, mas porque
aquela mulher era uma verdadeira golpista de fama.
Shade era vocalista da banda King, que criou junto aos meus irmãos. Os
três tocavam havia mais de seis anos e eram conhecidos internacionalmente,
por isso viviam viajando pelo mundo. Eu quase nem os via.
― Você está bem? Está tremendo ― sondou o louro, trazendo-me de
volta ao momento.
Suspirei para me controlar, afinal, vivia com aquele sentimento por
Shade havia tantos anos que nem podia imaginar não o sentindo mais,
embora fosse mais saudável se o esquecesse, porque ele pertenceria a outra.
Fitei os olhos azuis do cara ao meu lado. Ele ainda estava segurando
minha mão, e, por incrível que pareça, seu toque me deixou bem calma.
Talvez fosse seu sorriso educado, embora também sexy. Ele parecia saber o
poder que exercia nas mulheres, como eu, que, por um segundo, até me
esqueci do Shade. Gostei da sensação. Talvez eu e aquele cara pudéssemos
ser amigos no futuro. Eu devia estar louca, porque nem o conhecia.
Embora ele não consiga tirar o meu medo de avião, pensei.
― Me distraia, por favor ― pedi a ele com a voz rouca.
Ele me lançou um sorriso tão lindo que tive que piscar. Eu só podia
ficar olhando, embasbacada, de boca aberta. Era bem provável que aquele
homem me distraísse apenas com aquele sorriso de lábios perfeitos
curvando-se levemente para cima.
― Você que pediu.
Eu pensei que ele fosse contar quem era e inventar alguma coisa. No
entanto, olhou ao redor como se estivesse checando se estava vindo alguém e
me beijou. Devo admitir que tudo dentro de mim se desfez, meu coração
palpitou forte, minha pele formigou e uma eletricidade tomou meu corpo
intensamente, tanto que pensei que seria consumida pelo prazer que senti.
Seus lábios eram macios e deliciosos como sorvete de morango. Seus
braços apertavam minha cintura como se ele quisesse se colocar em meu
interior, no sentido figurado, claro, mas acredito que o teria feito no sentido
literal caso estivéssemos sozinhos. Eu não soube como, mas ele tirou o cinto
de segurança e se aproximou mais de mim.
Apertei minha mão direita em suas costas, querendo-o mais contra mim,
mas o assento não permitia. Com a mão esquerda, eu alisava seus cabelos
lisos e sedosos, que cheiravam a xampu.
Aquele era o meu primeiro beijo de verdade, porque não contava o que
eu tive com Samuel, que me beijara no baile da escola, um beijo roubado. Já
aquele cara estava devorando minha boca de forma selvagem e faminta.
Aproveitei o máximo daquele momento maravilhoso, porque estava
gostando muito enquanto sua língua acompanhava cada canto de meus lábios,
fazendo-me estremecer e quase gemer. Só não o fiz por causa das pessoas
que se encontravam ali.
Uma parte do meu cérebro me dizia para não o beijar, afinal de contas,
eu nem o conhecia, mas a outra falava vai e aproveita, você já sonhou
demais com alguém que não pode ter. Bem, isso era verdade, porque antes
eu sonhava que Shade seria o meu primeiro em tudo, mas isso nunca
aconteceria, ainda mais depois que ele se casasse com Melissa.
O cara alisava minhas costas num gesto de carinho, o que fez com que
eu apertasse minhas coxas uma na outra por causa do atrito que estava
sentindo em minha intimidade, tanto que gemi baixinho. Ainda bem que não
estávamos perto de ninguém; aquela parte do avião estava praticamente
vazia, embora, se eu gemesse alto, como era minha vontade, os outros
passageiros certamente ouviriam.
Ele se afastou, porque eu não tinha mais forças para fazer tal coisa,
aliás, estava mole, e não era a única; seus olhos eram abrasadores nos meus.
― Não geme assim, ou vou esquecer que estamos em público. ― Sua
voz também estava quente, assim como seu olhar.
Assenti, muda, porque acreditei que tinha perdido a voz. Com certeza
não sairia nada de minha boca, ao menos não de modo coerente e composto.
Eu não sabia que beijos eram capazes de arrebatar uma pessoa; porque foi
isso que aconteceu comigo.
Ele me deu mais um selinho e me abraçou de lado, colocando minha
cabeça em seu ombro, então ajeitou o cinto de segurança.
― Isso é estranho, beijei um cara do qual nem sei o nome ― sussurrei
com a voz ainda fraca. Aliás, se eu estivesse de pé, com certeza teria caído,
com as pernas bambas como as minhas estavam.
Ele riu, e o som fez meu corpo tremer, tão gostoso como uma risada de
bebê.
― Taylor ― disse. Senti seus lábios em minha testa. ― E qual é o seu,
linda?
― Laurel.
― Muito prazer em conhecê-la, Lau. ― Ele piscou para mim. ―
Adorei a forma como nos conhecemos.
Corei.
― Já abreviando meu nome? ― Sorri e afastei o meu rosto do dele.
― Fica mais lindo ― comentou. ― É claro que você também é.
― Jura? Ninguém nunca me disse isso antes, além dos meus irmãos e
meus pais. Mas obrigada.
― Só estou dizendo a verdade ― disse, triscando na ponta do meu
nariz com seu dedo.
― Por que me beijou? ― questionei, corada e curiosa, incapaz de não
perguntar. ― Você tem um jeito de que não se interessa pelo tipo de mulher
que eu sou.
― Tipo de mulher que você é? ― Estreitou os olhos.
― Você parece ser o tipo de homem que só pega louras formosas, com
pernas lindas. ― Suspirei. ― Eu não sou nada dessa forma.
Olhei minhas roupas, saia jeans, botas de caubói, blusa xadrez. Eu as
adorava e não mudaria, porque queria que o cara em questão ficasse comigo
por quem eu era, não por me vestir na moda. Meus cabelos eram compridos,
mas estavam presos em um rabo de cavalo. Eu não era feia, mas não era
como aquelas mulheres que ficavam horas no espelho se embelezando para
sair.
Taylor tocou meu rosto.
― Você é mais do que linda, caipira, tão sexy com essas botas de
caubói que fez todos os malditos bastardos do aeroporto virarem o pescoço
para olhá-la. ― Sorriu torto para mim. ― E não fique zangada com o
apelido, apenas acho que combinou com você. Gostei desse seu jeito e peço
para que não mude nunca.
Ele era tão diferente de todos os homens que eu já tinha visto, diferente
dos meus irmãos. Suas palavras derreteram meu coração. Eu nunca havia
conhecido um homem assim antes, mas gostei. Não ligava por ser chamada
de caipira, mas no bom sentido, claro.
― Obrigada ― sussurrei constrangida e me ajeitei no banco. ― Mas e
você, o que faz? Vamos conversar, assim não penso em onde estou.
― Tudo bem. ― Ele se manteve segurando minha mão como se fosse o
meu namorado. Seu tom de voz despertava algo em meu corpo que eu não
entendia muito bem. ― Você tem namorado?
Ri amarga.
― Acha que eu teria deixado você me beijar se tivesse um? ― Meu
tom soou seco.
Eu não era santa, claro, mas também não era uma vadia, que namorava
um cara e saía beijando outros homens. Tentei tirar a minha mão da dele, que
não permitiu.
― Não quis ofendê-la, só queria entender; nunca conheci ninguém igual
a você. ― Parecia realmente curioso.
― Igual a mim como? Que não se atira em você rasgando suas roupas e
devorando seu corpo sexy? ― Corei, mas era verdade. Eu não era assim. Se
meus irmãos soubessem daquele beijo, matariam Taylor. Para eles, eu ainda
era uma adolescente desprotegida, não uma mulher de 24 anos.
Ele riu.
― Isso é meio exagerado. ― Revirou os olhos. ― Corpo sexy, hein?
Não sou tudo isso.
Ele era cego, porque o cara era um Adônis em pessoa, formoso, sexy,
atraente e sedutor.
― Que tipo de mulher costuma namorar? ― indaguei curiosa, mas já
imaginava: igual a Melissa.
Ele sacudiu a cabeça, divertido.
― Nunca namorei ninguém na minha vida.
Pisquei.
― Nunca? Mas você é lindo... Oh, meu Deus! Você é mulherengo,
cafajeste, safado e salafrário, não é? Você só pega mulher pelo sexo! ― Meu
tom saiu alto no início, então o diminui. Eu não sabia o motivo da minha
surpresa; o cara era um tremendo deus grego. ― De um homem assim, eu
quero distância.
― Nossa! Você odeia tanto assim esse tipo de homem? ― Ergueu as
sobrancelhas, depois sorriu. ― Não se preocupe, eu não sou assim. Só a
beijei porque precisava acalmá-la, mas não me arrependo, porque também
queria beijá-la.
Não parecia ter mentira em seu tom nem em sua expressão.
― Desculpe, mas acontece que meus irmãos são assim. Eu os amo mais
do que tudo, mas a forma como eles ficam com as mulheres, descartando-as
logo em seguida, me deixa irritada.
― Você é contra o modo de eles agirem. ― Não era uma pergunta; acho
que ficou evidente pela minha reação que eu não gostava daquilo.
― Sim, mas tudo bem, mesmo se você for assim. ― Olhei para ele. ―
Você me ajudou ao me distrair com o beijo, embora isso não vá se repetir.
― O prazer foi meu ― respondeu, depois repetiu a pergunta do início,
uma que eu estava evitando responder, mas não tinha mais como burlar: ―
Mas o que pretende fazer em Vegas?
Suspirei triste, pensando no que aconteceria naquela cidade.
― O meu irmão vai se casar hoje... ― sussurrei.
― Você não parece feliz ― observou.
Sacudi a cabeça.
― Não estou, a mulher é uma cadela fria e interesseira, só está com ele
pela fama. ― Meu tom era amargo.
Ele arqueou as sobrancelhas.
― E o que seu irmão é? Jogador de futebol ou algo assim?
― Ele é vocalista da banda King, uma banda de rock.
― Eu li em uma revista que os integrantes dessa banda são irmãos.
Suspirei.
― E são. Nilan e Gave são meus irmãos de sangue, já o Shade é...
― Oh, esse tom não é nada bom ― falou meneando a cabeça de lado.
― O que realmente sente por esse Shade? Você gosta dele, não é?
― Eu o amo há dez anos, mas nunca tive uma chance. ― Limpei uma
lágrima que caiu pela bochecha. ― Ele só me vê como sua irmãzinha caçula,
que precisa ser protegida. Só estou aqui, neste avião, algo que me faz temer,
porque o amo independentemente do que ele vai fazer hoje.
Taylor deu um tapinha de leve na minha perna, mas onde ele tocou ficou
queimando como brasa viva. Uma reação bem estranha, porque, se eu amava
Shade, então não deveria sentir isso por ninguém, não é?
― Ele é cego, devo dizer. ― Sorriu. ― Você é linda, ainda mais com
esses olhos cor de chocolate. Essa boca... ― ele aproximou os lábios dos
meus, mas não me beijou ― me dá vontade de beijá-la e nunca mais deixá-la
partir.
Sorri da sua tentativa de me fazer sentir bem naquele momento.
― Adorei beijá-lo, nem acredito que foi meu primeiro beijo, ainda
mais com um cara que conheci em um avião.
Ele me olhou de soslaio.
― Primeiro beijo? ― indagou. ― Mas você é perfeita, ainda mais com
esse sotaque sulista. Você é de Dallas?
― Sim, e não sou perfeita. Bonita, talvez. E, quanto ao beijo, eu estava
esperando por Shade, pensando que um dia ele viesse a olhar para mim.
Mas, alguns dias atrás, ele chegou lá em casa e disse que ia se casar com
Melissa. Fiquei sem chão, acredito que ainda estou... ― Expirei. ― Um
amor impossível.
― Por que me deixou beijá-la? Se não quisesse, eu não teria feito, juro
― falou, passando a mão direita em seus cabelos.
― Eu sei, mas está tudo bem. De qualquer forma, eu jamais teria uma
chance mesmo de beijar Shade ― murmurei pesadamente.
― Eu diria que sinto muito, mas estaria mentindo, porque adorei ser o
primeiro. ― Ele sorriu de lado. ― Poderia ser o primeiro em outra coisa
também.
― Não acha que está pedindo muito? Eu mal o conheço para fazer isso.
O beijo, tudo bem. ― Peguei uma bebida que a aeromoça havia nos trazido
momentos antes e a tomei. Eu realmente estava desesperada para conversar,
porque estava falando de coisas muito íntimas com um estranho, bom, um
estranho sexy e lindo.
― E você, senhor Tay? Posso te chamar assim, já que me apelidou de
Lau? ― Ergui as sobrancelhas.
― Claro que sim, caipira. ― Piscou para mim. ― Pode me chamar do
que achar melhor.
Bebi mais um gole do champanhe.
― Isso é bom, me deixa contente. Preciso parecer alegre ao ver aqueles
dois se casando. ― Olhei-o de lado. ― Você poderia me acompanhar no
casamento.
― Dificilmente, já que um amigo meu também vai se casar em Vegas.
― Oh, está bem então ― murmurei.
― Podemos nos encontrar depois num lugar chamado Vergas Hotel. Ele
é um hotel, mas tem restaurante e boate nele também. Lá tem de tudo, então
podemos nos divertir. O que acha? É melhor do que ficar trancada em um
quarto chorando. ― Ele suspirou. ― Posso te fazer esquecer as coisas um
pouco, isso será minha meta essa noite. Prometo que vai se divertir.
― Tem razão, com você falando comigo, nem reparei em nada... Oh,
merda! ― Era nessa hora que me dava um frio na barriga e me fazia querer
gritar, mas é claro que não fiz isso.
― Está pousando ― comentou, apertando a minha mão.
― Não me diga, Sherlock. É nessa hora que me dá mais medo...
― Sei de algo que vai acalmar você. ― Pegou minha cabeça, enfiando
os dedos em meus cabelos e devorou minha boca, aliás, consumiu-a.
Por um instante, eu me esqueci de onde estava, das pessoas. É uma
pena não esquecer o meu amor por Shade também, pensei. Isso seria
maravilhoso.
― Senhores, já pousamos ― disse a aeromoça, assustando-me. Eu nem
tinha visto a hora da aterrissagem, nem ouvido as instruções de segurança.
Éramos os últimos passageiros ali. O meu cinto estava no lugar, mas o de
Tay, não, por isso seu beijo estava explosivo e seu corpo, colado ao meu.
Afastei-me da sua boca, que parecia com mel de tão boa.
A aeromoça olhava para Taylor, mas que garota não faria o mesmo?
Contudo, ele nem ligou, só me fitava com um sorriso lindo.
― Desculpe-me, nós já estamos saindo ― respondi com a voz um
pouco fraca.
Aquele homem era definitivamente uma força da natureza. Como era
capaz de me deixar toda mole e fraca com um beijo?
Deixei o avião com Tay ao meu lado, mas sem nos tocarmos. Como não
íamos passar muito tempo, tínhamos trazido pouca bagagem, na cabine
mesmo, por isso fomos direto para a área de desembarque. Vi o Milton me
esperando. Ele era o segurança dos meus irmãos, mas eu não queria ir com
ele para o hotel onde todos estavam, principalmente Shade e Melissa.
― Acho que o segurança do seu irmão está aqui ― falou Tay, fitando
Milton.
― Como sabe que ele é um segurança e está me esperando? ― Franzi a
testa.
― Simples, o cara é forte, parece ser do exército, tem olhos sérios, e
você o encara como se o conhecesse, então chutei, mas pelo visto acertei. Só
não entendo algo: eles devem saber que você tem medo de avião, então por
que não foram te buscar?
― Porque era para eu vir com uma amiga minha, mas ela teve que fazer
outra coisa. ― Na verdade, eu nunca havia contado a nenhum dos meus
irmãos sobre meu medo de avião. Escondia muito bem isso quando estava
com eles. ― Não quero ir com ele, preciso ficar um tempo longe de todos e
preparar minha expressão.
― Vou te ajudar com isso. ― Pegou minha mão. ― Venha comigo.
Capítulo dois
LAUREL
Meu telefone tocou enquanto eu estava num carro com Tay.
― Onde está? Milton ficou te esperando no aeroporto, mas você não
apareceu ― falou Nilan em tom preocupado.
Expirei.
― Eu só preciso de um tempo sozinha antes de ir para a cerimônia.
O casamento aconteceria no salão do hotel onde eles estavam. Como
um casal podia se casar fora de uma igreja? Melissa não estava grávida,
porque, se estivesse, Shade teria nos contado. Por que se casar com ela se
ele não a amava?
Nilan suspirou.
― Eu sei que as coisas estão difíceis para você agora, ainda mais tendo
de vir aqui e fingir que tudo está bem ― falou com sua voz um pouco grossa
―, que não está doendo enquanto assiste ao Shade se casando com outra.
Nilan sabia do que eu sentia, porque uma noite ele me viu chorando
quando vi Shade se pegando com uma garota após o término de um dos
shows deles. Eu tinha ido para lá com a ideia de lhe dizer o que sentia, mas
ele estava com outra.
― Está chorando? Me diz onde está, e eu vou te buscar ― ouvi
impotência na sua voz.
Eu não queria que ninguém me visse assim, só queria ficar sozinha, mas
Tay não deixou isso acontecer. Meu irmão faria o mesmo se soubesse onde
eu estava. Nem eu sabia, mas também não me importava.
― Estou bem ― falei, depois corrigi: ― Vou ficar. Vou tentar ir ao
casamento, mas, se não conseguir, te ligo, ok?
― Nesse momento não é bom você ficar sozinha ― disse Tay assim
que desliguei o telefone.
― Eu sei, mas realmente preciso de um momento sozinha ― pedi a ele.
― Obrigada por tudo, caso não nos virmos mais.
― Não vou embora sem antes procurá-la ― informou, olhando o hotel
onde eu iria ficar. Não era aquele em que estavam meus irmãos e vovó.
Tay não queria me deixar, mas assentiu, o que foi sensato da parte dele.
Provavelmente ele percebeu que eu realmente queria aquilo. Gostei da forma
que ele estava me ajudando, mesmo sem me conhecer.
Entrei no quarto pequeno do hotel, ainda mais em comparação à suíte
em que meus irmãos estavam hospedados para o casamento.
Eles torciam para que eu vendesse a fazenda onde morava, em Dallas,
mas não podia, pois ali era o lugar onde mamãe viveu sua vida inteira, e eu
não conseguia me desfazer dele. Além disso, eu amava tudo naquela
propriedade. Muitas pessoas já haviam me procurado para tentar comprar a
fazenda com o intuito de fazer um hotel afastado da cidade, ainda mais com o
lago no coração do local. O lugar era paradisíaco, apaixonante, e não digo
isso porque era meu. Não queria ver ninguém destruindo a propriedade para
fazer um hotel. Eu expulsaria qualquer um que tentasse.
Entretanto, não era burra. Sabia que, por trás das propostas de compra,
tinha o dedo dos meus irmãos. Eles que a elogiavam e anunciavam a
interessados, querendo me forçar a vender, mas isso não aconteceria. Eu não
permitiria que algum engomadinho tirasse a fazenda de mim. Todos da minha
família queriam que eu saísse de lá para viajar, fazer algo por mim, mas até
então eu não tinha descoberto qual era a minha paixão, além de montar um
haras e uma pousada.
Antes de me apaixonar por Shade, eu sonhava em me casar com um
caubói, embora esse sonho não tivesse se perdido, porque ele vestia calça
jeans apertada e botas de caubói. Sempre achei isso sexy em um homem.
De banho tomado, vesti um vestido frente única, mas não dispensei
minhas botas de caubói, as quais ganhara do Nilan. Arrumei-me, mas não
para Shade, já que ele nunca havia me notado. Soltei meus cabelos,
deixando-os cair em minhas costas.
Tinha chegado a hora de colocar um ponto final naquilo, de desistir de
Shade e parar de ficar sonhando com ele. Não era para ser eu a ficar com
ele, mas não deixava de doer. Talvez, se ele amasse Melissa, eu aceitaria o
casamento de modo mais fácil, mas nenhum dos dois se amava para tal
compromisso.
Peguei um táxi, não querendo ir com o Milton. Precisava ficar sozinha e
longe da fama de meus irmãos. Gostava do fato de eles terem realizado seus
sonhos, como se tornarem cantores famosos e andarem pelo mundo.
Inclusive, eles fariam uma turnê durante dois meses na Europa. Entretanto,
ser famoso também tinha suas chatices, como andar nas ruas e ver aquele
bando de mulheres barulhentas gritando por eles.
Eu evitava ser filmada o quanto podia. Os três me ajudavam com isso,
não deixando sair nada sobre mim na mídia. Esperava que eu passasse
despercebida naquela noite também. Não queria que ninguém visse minha
expressão, pelo menos os repórteres, por isso coloquei um casaco escuro
para ninguém me reconhecer.
Fiquei escondida durante toda a “reunião”. Não parecia uma cerimônia,
porque todos ali pareciam estar participando de um velório, não de um
casamento. Isso me deu mais raiva. Por que ele vai se casar, então?
Ali no salão não tinha muita gente, era uma recepção simples, sem
muito luxo. Fiquei surpresa quando disseram que não se casariam na igreja,
ainda mais por Melissa aceitar isso.
Shade estava onde fizeram um altar improvisado. Estava vestido de
preto, os cabelos castanho-escuros bagunçados. Ele não havia tirado suas
roupas de caubói para vestir terno. Ficou lindo do mesmo jeito. Tinha a
barba por fazer e os olhos tão negros como a noite. Sua expressão era como
se estivesse em um enterro. Eu queria sacudi-lo para não fazer aquela
besteira, mas não conseguia fazê-lo enxergar a verdade. Então, com um
aperto no peito, via-o destruir sua vida.
Melissa estava com um vestido de noiva que combinava com sua pele
branca e cabelos vermelho fogo. Ela era uma ruiva deslumbrante. Era uma
pena que estava levando consigo o homem que eu queria para mim. Estava
sorrindo, mas parecia forçado, embora eu pudesse estar vendo coisas que
não existissem ou querendo respostas que não teria.
A dor estava consumindo-me, tanto que era impossível ficar ali por
mais tempo, por isso saí sem que ninguém me notasse. Possivelmente nem
me viram chegar ao casamento. O que eu ia dizer aos noivos se
permanecesse lá? Muitas felicidades ou meus pêsames? Não sou de pensar
e querer o mal dos outros, então preferi partir.
Limpei meu rosto assim que entrei em um bar. Não reparei no nome
dele, mas também não me importava, só queria beber para esquecer.
― Me dá uma bebida, por favor. Qualquer coisa forte ― pedi ao
barman.
O rapaz me trouxe uma bebida qualquer sem fazer nenhum comentário.
Talvez já estivesse acostumado a ver mulheres chorando em seu bar, afinal
de contas, estávamos em Las Vegas, a cidade do pecado e das fortunas.
Dizem que quem tem azar no amor, tem sorte nos jogos, ou o contrário. Vai
saber...
― Você não devia estar sozinha aqui ― comentou uma voz conhecida
ao meu lado depois que eu tinha tomado algumas doses.
Levantei a cabeça e vi Taylor ao meu lado de braços cruzados.
Coincidência?
― Sim, eu devo, ou melhor, preciso. E você não tinha um casamento
para ir? ― retruquei, levantando o copo para beber mais um gole do
bourbon, mas ele não deixou e tomou o copo da minha mão.
― Acho que já bebeu demais ― declarou de um jeito mandão.
― Ei, isso é meu! ― rosnei, tentando pegar o copo de volta, mas ele o
levou para longe, colocando-o no balcão.
Atraiu-me para um canto escuro, e meu corpo se chocou com o dele,
fazendo-me ofegar com o impacto.
― O que está fazendo? ― Fitei seus olhos azuis e lindos.
― Eu disse que você bebeu demais. Está na hora de parar. ― Seu tom
parecia uma ordem.
― Você não é meu dono. Se eu quiser beber todas as bebidas daqui,
então vou beber ― silvei, chorando e batendo nele. ― Você não pode me
dizer o que fazer da minha vida!
Ele pegou minhas mãos.
― Eu sei que está sofrendo, mas ficar chorando e bebendo não vai
resolver nada. Seja uma mulher decidida e não uma fraca ― disse sem tirar
os olhos dos meus. ― Então, em vez de ficar triste e desesperada, faça algo
que nunca fez na vida, mas que sempre quis, embora não tenha feito por
achar impróprio ou errado.
Pisquei, contendo as lágrimas.
― O que eu mais queria fazer? ― Mordi o lábio, pensando.
― Sim. Me diz qualquer coisa, vou te ajudar a fazer. ― Seu sorriso era
travesso. ― Prometo que não deixarei você sofrer esta noite.
― Jura? Qualquer coisa?
― Qualquer coisa.
― Hummm, fazer uma tatuagem, me casar com um caubói e fazer sexo,
esses três sempre foram os meus desejos. ― Sonhava em fazer isso com
Shade, um sonho que não podia realizar.
Ele piscou.
― Essas três coisas? ― Meneou a cabeça. ― Não quer mais nada?
― Só essas três, mas não tem como eu fazer nenhuma delas ― sussurrei
derrotada. ― Talvez a tatuagem; ela é mais simples do que as outras coisas.
― Claro que tem. Eu prometi tudo que você quisesse, e por que não
podemos fazer, não é? ― Ele me puxou para fora da boate, deixando uma
nota de cem dólares ao cara do bar.
― Vai me ajudar a realizar? A tatuagem, tudo bem, mas me casar e ter
sexo? ― Corei, mas ele não viu, pois me rebocava dali.
― Não irei reclamar quanto ao sexo. ― Sorriu, levando-me a um carro
preto.
― Sempre sonhei em me casar na igreja e depois fazer amor com meu
marido. ― Minha voz estava meio arrastada. Acho que a bebida tinha culpa
pela coragem que eu sentia naquele momento, porque, se eu não tivesse
bebido, fraquejaria com certeza.
― Vamos cuidar disso hoje, mas primeiro vamos fazer a tatuagem.
Conheço um lugar ótimo, já fiz algumas das minhas lá. O cara é meu amigo.
Olhei seu braço, que tinha uma tribal e alguns outros desenhos. Eu
quero uma âncora, pensei.
Chegamos a uma lojinha de tatoos. Era pequena, mas gostei dela.
― Olá, Jordan, há quanto tempo ― saudou um homem coberto de
tatuagens assim que entramos na salinha.
― Jules. ― Jordan sorriu.
― Espera, seu nome não é Taylor? ― perguntei, pensando que ele tinha
mentido.
― Tenho os dois nomes, mas gosto quando você me chama de Tay. ―
Piscou para mim, depois olhou para o cara e a mim de novo. ― Laurel, esse
é Jules, um amigo meu. Fiz várias tatuagens dele, e ele fez algumas das
minhas.
― Olá, Jules ― cumprimentei-o. ― Me chamo Laurel.
Ele sorriu.
― Prazer em conhecê-la. ― Levou-nos a uma sala onde ele realizaria o
procedimento. ― O que deseja fazer?
― Eu quero uma tatuagem de âncora.
― Por que uma âncora? ― sondou Tay com os olhos estreitos,
parecendo saber o significado.
― Ela simboliza firmeza, segurança, convicção, mas também pode
significar atraso e um fardo a ser carregado. ― Suspirei com pesar. ― Acho
que esse final combina comigo.
― Não combina ― retrucou. ― Mas, para simbolizar a âncora e ficar
mais linda, vamos colocar uma flor-de-lis, que significa poder. Você precisa
disso para conseguir tudo o que deseja. Soberania e honra, você já tem com
seus irmãos, e acredito que com qualquer pessoa, como também lealdade. ―
Ele sorriu ante a última palavra. ― Você é pura e tem uma alma bondosa.
― Não tenho...
― Sim, você tem ― contra-atacou. ― Eu vi o que fez com aquele
senhor que ia atravessando a rua. Foi ajudá-lo antes de entrar no hotel e o
levou a uma igreja a cinco quarteirões de lá.
Pisquei chocada.
― Você estava me vigiando? ― inquiri em tom incrédulo.
Ele sorriu enquanto Jules esboçava a arte que faria em meu corpo.
― Você é alguém que deve ser protegida, não podia deixá-la sozinha
em uma cidade desse tamanho, sendo que não conhece ninguém.
Fiquei de boca aberta por ele querer me proteger e me fazer apreciar
tudo que faríamos naquela noite. Por isso, antes de entrar ali, eu desliguei
meu celular, para não ser encontrada por ninguém, nem mesmo por Nilan e
Gave. Deixei apenas uma mensagem dizendo que havia ido embora para
casa. Não gostava de mentir, mas o que diria a eles? Estava ali fazendo uma
loucura! Só torcia para que eu não me arrependesse de nada. Só viveria o
momento, não pensaria em Shade nem no que ele estava fazendo com sua
mulher. Precisava esquecê-lo de uma vez por todas.
― Onde vai querer a tatuagem? ― perguntou Taylor olhando meu
corpo. Vi seus olhos pegarem fogo pelo desejo que sentia.
Antes que eu respondesse, Jules trouxe a arte para eu ver se havia
ficado do meu gosto.
― Veja se esse desenho está bom ― falou, entregando-me o croqui.
Uma flor-de-lis se entrelaçava a uma âncora num misto de vermelho,
verde e preto. Ao invés de ficar feia ou esquisita aquela mistura de cores,
ficou linda.
― Uau, está perfeita! Como será que vai ficar depois de feita na minha
virilha? ― comentei comigo mesma, questionando-me se ia ficar bem no
meu corpo. Ainda bem que eu estava em dia com a depilação total que usava
― Porra! ― grasnou Taylor. ― Vai ficar deslumbrante, só que é uma
região a qual ninguém consegue ver, a não ser se você estiver de biquíni.
Não quer em um local visível?
― Não, quero que seja aqui mesmo ― falei, apontando para o local,
mas estava nervosa, porque meus irmãos tinham bastantes tatoos e diziam
que doía na hora de fazê-las.
― Está com medo? ― Taylor alisou minha mão num gesto calmante. ―
Não fique, eu estarei ao seu lado, caipira. Sempre.
― Cavalheiro ele, não? ― Sorriu Jules. ― Agora tire a calcinha e se
deite ali.
― Isso não vai acontecer ― rosnou Tay com a cara fechada. ― Eu faço
a tatoo, só me dê as coisas que preciso.
― Acha que vou deixar outra pessoa tatuar no meu estúdio? ― Jules
arqueou as sobrancelhas negras.
― Lembra o que me deve? Me deixe tatuar minha garota, e a dívida
estará encerrada ― disse Tay.
Jules avaliou Tay e depois deu de ombros, sorrindo.
― Ótimo, agora o estúdio é seu.
Fitei Taylor.
― Você está dizendo isso para que eu não fique nua na frente do cara?
Aliás, eu acho que não preciso tirar a calcinha, apenas abaixar e mostrar o
local onde quero o desenho.
― Sim, mas, pelo tamanho, nós podemos só esboçar e tatuar depois...
Cortei-o, dizendo com firmeza e não deixando minha voz fraquejar:
― Eu aguento, pode fazer completa.
― Tem certeza?
― Sim, vamos nessa ― tentei soar confiante, assim ele não deixaria
para outro dia, porque talvez eu não estivesse mais ali.
Jules saiu, deixando tudo que Tay precisava para fazer a tatoo. Eu não
sabia o que ele devia ao Taylor para nos deixar sozinhos em seu estúdio,
mas devia ser algo grande, porque ele parecia gostar de tatuar.
― Deite nessa mesa ― Taylor ordenou.
Fiz o que ele mandou sem reclamar, curiosa para saber como a tatuagem
ficaria. Sempre quis fazer uma tatoo, mas meus irmãos, até Shade, diziam
que eu não deveria, que algo assim deixava a pele feminina feia, por isso
nunca a fiz. Porém, naquele momento, em que se encerrava tudo entre mim e
o que eu esperava de Shade, eu mudaria a página. Ao menos até quando eu
acordar amanhã, não pensarei mais nele, repeti isso como um mantra.
― Posso? ― Ele pegou a barra do meu vestido e a suspendeu assim
que assenti, corando, é claro, mas ia evitar ficar com vergonha.
Seu toque provocou chamas em meu corpo, fazendo-me remexer. Seus
dedos em minha pele eram como brasas ardentes. Meu peito subia e descia,
e fitei Taylor enquanto ele fazia o processo.
― Não fique com vergonha de mim. ― Ele deixou o vestido na minha
cintura e seguiu com seus dedos traçando minha barriga até minha calcinha.
Eu ofegava, mas me controlei para não gemer.
― O que está sentindo? ― Sua voz parecia controlada, apesar de que
senti seu divertimento com meu estado. O homem sabia o efeito que tinha nas
mulheres, só podia ser.
― Garanto que os tatuadores não fazem isso com seus clientes, ou iriam
presos... ― Minha voz falhou quando seu dedo roçou em cima da renda
branca da minha calcinha.
― Vai me prender? ― sondou com um sorriso safado.
Fechei os olhos ao sentir seu toque e apertei minhas coxas, querendo
sentir mais o atrito delicioso. Gemi e perdi a capacidade de falar e de
controlar meu corpo, que parecia ter vontade própria. Eu devia me
preocupar com o lugar em que estava, mas não dei a mínima.
Taylor riu perto do meu pescoço. Senti seu hálito em minha pele, o que
a fez formigar.
― Posso aliviar você? ― Ele não esperou uma resposta e começou a
esfregar por cima da calcinha, depois a puxou de lado, e devo dizer que fui
arrebatada.
Seus dedos circulavam meu clitóris, fazendo-me gritar, mas logo me
calei devido ao lugar em que estávamos e por seus lábios, que foram para o
meus e devoraram minha boca com tanta fome que meu corpo se lançou para
cima querendo mais do que apenas seus dedos e lábios.
Gritei tamanho o meu êxtase, mas sua boca abafava os gritos,
impossibilitando de alguém ouvir. Minhas mãos apertavam seus cabelos,
puxando-o mais contra mim. Meu gozo chegou com ímpeto capaz de
explodir, e de fato o fiz assim que vi milhões de estrelas.
Taylor ficou me beijando mais alguns segundos e com a mão em minha
boceta, até que parei de tremer após o orgasmo.
― O que achou? ― sondou, alisando minha face com carinho.
Abri os olhos e me deparei com os seus e com um sorriso no canto da
sua boca.
― Nossa! Não é nada parecido quando gozo com meus vibradores... ―
comentei. ― Estou até mole.
Ele praguejou.
― Cristo! Você faz isso? ― Sua voz estava rouca de desejo. ― Um dia
eu gostaria de vê-la se tocando.
Pela forma como Tay falava, parecia que nos veríamos de novo. Eu
queria isso, aquele homem era muito bom no que fazia, isso porque ainda
nem havíamos feito sexo.
― Sim. ― Corei.
Ele me deu mais um selinho, mas parecia impressionado. Era claro que
eu era virgem, de homens, pelo menos, tudo por ficar esperando um cara o
qual nunca iria ter, mas não era totalmente, já que havia tirado minha
virgindade com um vibrador em forma de pênis. Minha amiga que me dera
de presente. Depois disso, eu o usava direto.
― Você é uma caipira muito linda, ainda mais com essa cor vermelha
em seu rosto ― falou, abaixando um pouco minha calcinha. ― Vamos
terminar logo isso para podermos ir embora.
Taylor era um homem lindo, disso eu não tinha dúvida. Havia algo nele
que me fazia ser eu mesma, não uma menina calada aceitando o que seus
irmãos queriam. Aquela jamais diria o que falava com Taylor, fora a parte
de ele me fazer esquecer tudo à minha volta, de me animar para eu não ficar
chorando com um pote de sorvete nas mãos.
Então ele começou a fazer a tatuagem, e a coisa doía, mas não liguei;
apenas estava me renovando após tudo o que aconteceu.
Fiquei calada olhando seus olhos azuis enquanto ele fazia o serviço.
Assim que ele terminou, passou um remédio ou alguma pomada, não sabia
dizer, mas imaginava que era para não infeccionar o local.
Tay me ajudou a levantar e me deu um espelho, então vi a tatuagem no
meu corpo. Ela ia do meu quadril direito até a virilha, uma âncora preta com
talos verdes trançando-se sobre ela e culminando na flor-de-lis vermelha.
― É tão linda! ― sussurrei pasma.
― Sim, é linda ― concordou, mas, pelo seu tom, não parecia estar
falando da tatuagem.
Levantei a cabeça e vi que os seus olhos estavam em mim. Sorri.
― Você tem talento, ficou perfeita.
― Obrigado. Agora vamos para o próximo passo, o casamento ―
falou, ajudando-me a baixar o vestido. ― Já preparei a igreja.
― Como, se não saiu do meu lado? ― Arqueei as sobrancelhas. Eu só
o vira conversar com Jules antes de ele sair.
― Tenho um amigo aqui que fez um favor para mim.
Taylor tinha um toque delicado, mas também um pouco misterioso. Eu
gostava disso; nunca havia conhecido alguém como ele.
― Jules?
― Não, outro, mas deixa pra lá e vamos aproveitar.
― Tudo bem, mas, e depois que nos casarmos, como vamos nos
divorciar?
Ele arqueou as sobrancelhas.
― Nem nos casamos, e já quer se separar de mim? ― Fingiu estar
espantado.
― Vamos nos casar e mal nos conhecemos, além disso, não estamos
apaixonados um pelo outro ― comentei assim que estávamos perto de uma
igrejinha que não ficava muito longe do estúdio de tatoos.
― Não se preocupe, eu cuidei disso também. Amanhã assinamos o
papel do divórcio. O que acha?
Eu devia estar louca para concordar com aquilo. Podia culpar a bebida,
mas não estava assim tão chapada, mas ela me dava coragem, já que eu era
muito medrosa para lutar pelo que queria.
― Ok, então. ― Sorri. ― Se meus irmãos soubessem que vou me
casar, eles matariam você, principalmente o Nilan, que é o mais protetor de
todos.
― Então não vamos dizer a eles, não é? ― Piscou para mim. ― Agora
vamos nos vestir de modo apropriado para um casamento.
― Não posso me casar assim? ― Apontei para o meu vestido. ― Não
tenho vestido de noiva.
Ele balançou a cabeça.
― Eu disse para não ligar para isso, que já ajeitei tudo, incluindo um
vestido que vai caber perfeitamente nesse seu corpinho sexy. ― Ele varreu
os olhos sobre mim com um sorriso sedutor.
Capítulo três
LAUREL
Taylor tinha razão, o vestido coube perfeitamente em mim. Era uma
pena não ser real, mas o cara era bom em escolher, porque ficou perfeito. O
vestido branco tomara que caia tinha pedras brilhantes na região dos seios e
era colado no corpo, mostrando minhas curvas.
Segui para a porta da igreja sem ninguém para me conduzir. Meus
irmãos me matariam se soubessem o que eu estava fazendo sem eles. Bem,
eu ia parar de me preocupar com os outros um instante e me preocupar
comigo mesma, fazer algo por mim. Quando eu me casasse de verdade,
deixaria que eles me levassem ao altar. Não poderia convidá-los para meu
primeiro casamento, porque todos matariam Taylor por me ajudar com
aquilo, incluindo Shade.
Sempre quando eu via os casamentos nos filmes, ficava louca para um
dia ser eu a entrar na igreja, enquanto o meu noivo me esperava chegar até
ele sem tirar os olhos de mim. Sabia que daquela vez nada aconteceria como
o desejado. Entretanto, ao entrar no corredor da igreja, quase tive uma
síncope e arregalei os olhos, incrédula.
Tay estava no altar da mesma forma com a qual eu sonhava que um
homem estivesse me esperando, mas o que me chocou e me fez gostar ainda
mais dele foi ver que estava vestido de caubói, jeans, botas, cinto com fivela
estilo country, camisa xadrez e chapéu Stetson.
Seu sorriso era deslumbrante ao me ver ali de boca aberta, ainda mais
ao varrer seus olhos sobre mim. Era como se eles fossem lasers, porque meu
corpo ficou como brasa.
― Você está lindo! ― exclamei, falando a verdade, porque aquelas
vestes eram bem diferentes das que ele usava antes, jeans e camisa branca.
Ele sorriu.
― Sou eu que devo dizer isso. Você está magnífica, caipira. ― Seu tom
era orgulhoso e quente. ― Nossa! Você está de tirar o fôlego! É isso, estou
sem fôlego só em olhá-la.
― Obrigada, caubói. ― Fiquei à sua frente.
― Adorei esse vestido, ainda mais com essas fodidas botas sexy de
caubói.
O reverendo ministrou nosso casamento.
― Devemos dizer os votos? Não é errado jurar em uma igreja quando
não vamos cumpri-los depois? ― comentei baixinho.
― Aqui é Vegas, nada conta ― respondeu ele, olhando-me de lado.
― Para mim conta quando é juramento, ainda mais na casa de Deus. ―
Franzi os lábios. ― Que tal assim? ― Fitei seus olhos lindos e divertidos.
― Eu, Laurel Mary King, aceito você, Taylor, como meu marido nesta noite.
Prometo amá-lo hoje e respeitá-lo e fazer todas as suas vontades enquanto
permanecermos casados.
Ele sorriu, gostando do que eu disse, e repetiu:
― Eu, Jordan Taylor Johnson, aceito você, Laurel, como minha esposa
nesta noite. Prometo amá-la hoje e respeitá-la e fazer todas as suas vontades
enquanto permanecermos casados.
O reverendo nos declarou casados.

― Como está se sentindo, senhora Johnson? ― Taylor me pegou nos


braços assim que chegamos à porta do meu quarto no hotel.
― O que está fazendo? ― Dei um grito. ― Me coloque no chão!
― Não é isso que um marido faz? Pega sua querida e amada esposa e
passa com ela nos braços pela soleira da porta?
Sorri, pegando seu chapéu.
― Tão cavalheiro, meu caubói.
― Gostei disso, minha caipira. ― Sua voz soou doce, mas cheia de
luxúria.
Nem reparei no quarto ou na mobília, só conseguia vê-lo ali, como
também sentir meu corpo pegando fogo dos pés à cabeça.
Tay me colocou sentada na cama e ficou à minha frente.
― O que disse nos votos é verdade? ― sondou ele. ― Você vai fazer
tudo que eu pedir?
― Sim, o que deseja que eu faça? ― Corei, mas fui firme.
Ele abriu os braços.
― Quero que me dispa.
Engoli em seco, mas assenti e me levantei, indo até ele. Coloquei
minhas mãos na sua camisa e desabotoei os botões um por um, deparando-
me com uma cruz preta no peito, que pegava de cima até abaixo do umbigo, e
outras tatuagens nos braços e no ombro esquerdo – essa última era uma
tribal.
― Lindas! ― Alisei suas tatuagens e desci com meus dedos por sua
barriga até a fivela do cinto. ― Gostei dessa fivela. ― Sorri meio tímida,
mas não deixaria a vergonha me consumir; naquele instante eu só queria me
divertir.
Ajoelhei-me à sua frente e tirei seu cinto, depois olhei para ele,
beijando o V perfeito do seu abdômen. Tudo isso era novo, mas eu estava
adorando, ainda mais depois que o senti estremecer.
― Botas primeiro ― ordenou rouco.
Tirei suas botas e abaixei sua calça ainda depositando beijos em sua
barriga com seis gominhos perfeitos. Tirei sua calça e a cueca boxer, então
vi seu pau duro na minha cara e o apertei com a mão.
― Sua pele fica mais linda quando cora. ― Ele afagou meu rosto.
― Sempre quis fazer isso em carne e osso, porque nos vibradores não é
bom...
― Você chupou um pênis de silicone? ― indagou incrédulo.
Dei de ombros.
― Sim, estava aprendendo a fazer um boquete. Aprendi em uma banana
também, ela ajuda muito. ― Comecei a fazer isso quando soube que Shade
gostava muito de sexo e de mulheres experientes... Expirei, não querendo
pensar nisso.
― Bom, então chupe o meu pau e engula tudo o que sair. Vai fazer isso?
― Acariciou meus lábios. ― Agora vamos ver o quão experiente você é
com um pênis de verdade, caipira.
Ele pegou meus cabelos, enrolou-os nas mãos e deu um puxão para trás,
não o suficiente para me machucar, mas o bastante para deixar minha
calcinha molhada.
Coloquei seu membro grosso, do qual saía pré-sêmen, na minha boca e
fiz tudo o que fazia com a banana. Passei a lamber e degustar aquele sabor
meio salgado, mas não era de todo ruim, eu estava gostando. Uma das mãos
segurava a parte de seu pênis que eu não conseguia colocar na boca em razão
do tamanho, e a outra apertava suas nádegas, puxando-o mais para perto de
mim.
Suas mãos eram firmes em meus cabelos, mas não me forçavam a
colocar mais dele em minha boca do que eu conseguia suportar.
― Porra, você é tão perfeita com esses lábios em torno do meu pau! ―
grasnou rouco.
Olhei para cima, encontrando os seus olhos, que estavam vidrados e
excitados, assim como os meus. Ele ainda me segurava enquanto eu
balançava a cabeça para frente e para trás.
― Eu estou quase gozando... Se não quiser que eu goze em sua boca,
então precisa tirar...
Tirei minha boca por um breve momento, fazendo-o gemer, porque dei
uma apertada em volta dele.
― Não era para eu fazer o que você quisesse? Por que está me dando
uma escolha? ― Arqueei minhas sobrancelhas.
Ele sorriu.
― Você tem razão. ― Ele pegou seu membro e o estendeu para mim. ―
Agora abre essa boquinha linda e chupa tudo.
Fiz o que ele mandou e voltei a sugar mais forte, trazendo seu orgasmo
e fazendo com que eu apertasse minhas coxas de desejo. Nossos gemidos
eram altos, mas não dei a mínima, não o tirei da minha boca até engolir tudo
e não restar mais nada.
― Nossa, estou todo mole... ― Ele me puxou para seus braços e me
beijou com fome. ― Você faz um boquete excelente, valeram as aulas
práticas ― sussurrou nos meus lábios. ― Agora chegou a minha vez de
despi-la e saborear esse corpo lindo.
Ele estava prestes a rasgar meu vestido quando o detive.
― O que está fazendo? Não pode rasgar o meu vestido, ele é lindo ―
falei, depois sorri. ― Posso ficar com ele?
― Por que iria querer um vestido de noiva se não vai usá-lo mais? ―
Ele me avaliava. ― Pode virar de costas, não vou rasgar.
― Apenas o quero, talvez possa me casar no futuro. ― Fiz o que ele
mandou, mas o olhei por cima do ombro. ― Quando eu tiver um casamento
de verdade.
Tay estreitou os olhos.
― Acho que o seu futuro marido não iria gostar que usasse um vestido
o qual usou para se casar com outro. ― Ele desabotoou o vestido e beijou
minhas costas no processo, fazendo minha pele se arrepiar.
― Você tem razão ― concordei ofegante ao ficar só de calcinha à sua
frente, já que não usava sutiã. Seus lábios foram para os meus seios.
― Seus peitos são saborosos. ― Ele sugou e mordiscou um deles como
se fosse seu alimento preferido no mundo.
Segurei seus cabelos, apertando sua cabeça para trazê-lo mais ao meu
encontro, tamanho a luxúria.
Taylor me pegou e me levou para a cama, pairando sobre mim.
― Seu toque é como brasa, Tay... ― sussurrei.
― Gosto de saber disso ― murmurou na minha pele, descendo pela
minha barriga. ― Estou louco para te lamber toda, pena que a tatuagem
atrapalha. Eu sei que a região está dolorida.
― Não ligo para isso, só quero sentir sua boca e matar esse fogo que
está me consumindo! ― respondi ofegante.
Ele riu na minha barriga, e o som me fez remexer na cama, então
começou o trajeto com a língua até perto da minha tatoo. Beijou a região
próxima a ela, mas de leve. Ela estava dolorida, ainda inflamada, eu sabia,
mas não deixaria isso estragar aquele momento lindo, que estava me
queimando por dentro.
Tay circulou com a língua em volta do meu umbigo, mas precisou firmar
meus quadris, que se ergueram, tomada por um desejo abrasador.
― Fique quieta, ou eu posso encostar no local da sua tatoo sem querer
― ordenou com a voz rouca.
Minhas pernas se abriram em um convite silencioso, como se tivessem
vida própria.
― Tay... ― gemi.
― Eu vou cuidar de você, caipira ― disse, rasgando minha calcinha.
― Acho que isso eu posso rasgar, não é?
― Sim! ― gritei quando ele sugou meu clitóris.
Envolvi minhas pernas com as botas em seu pescoço, pois acabei me
esquecendo de tirá-las antes e apertei sua cabeça ainda mais contra meu
centro. Sua língua andava em cada canto da minha boceta, fazendo-me
clamar seu nome, até que gozei forte.
― Puta que pariu!
― O que achou? Ou ainda não voltou para a Terra? ― sondou com um
sorriso na voz, pairando sobre mim assim que minhas pernas o liberaram.
Abri meus olhos e encontrei os azuis brilhantes dele.
― Você é bom, parece ter muita experiência ― falei, beijando seus
lábios. ― Agora vamos para o essencial.
― Eu achava que minha língua era essencial. ― Sorriu. ― E você tem
uma boca mágica.
― Você é ótimo! ― garanti.
― Que bom que pensa assim ― disse enquanto colocava a camisinha e
se encaixava. ― Eu não devia perguntar isso, já que preciso que faça o que
mando, mas você quer mesmo ficar comigo?
― Sim ― respondi sem tirar os olhos dele. ― Estou certa de que quero
fazer isso com você, então não hesite e vamos em frente.
Ele assentiu.
― Tudo bem, mas, enquanto estivermos transando, quero que pense em
mim e em mais ninguém. Pode fazer isso?
Senti-o na minha entrada, então assenti, pois era verdade. Até o
momento, tudo o que tivemos não me fez pensar em ninguém a não ser nele,
nos seus beijos e carícias, na fome que eu tinha de que ele possuísse meu
corpo.
― Sim ― prometi, enlaçando as pernas em sua cintura. ― Não quer
que eu tire as botas?
― Gosto delas ― afirmou, beijando-me com ardor e doçura enquanto
me penetrava com cuidado, mas prendi sua bunda, fazendo-o enfiar seu pau
de uma vez. Ele parou de se mover e me observou com os olhos estreitos. ―
Pensei que fosse virgem.
― De homem, eu sou, mas perdi com o dildo ― respondi ofegante.
Ele arregalou os olhos, com seu sorriso sexy de molhar calcinha.
― Você é impressionante! Mas como está se sentindo com um pênis de
verdade? ― Ele se remexeu dentro de mim, fazendo-me gemer.
― Puro êxtase... ― Balancei meus quadris. ― Agora se mexa e prove
o quanto é bom de cama.
Ele sorriu.
― Seu prazer é uma ordem ― declarou e logo estava me beijando com
fome e se movimentando, levando-me ao paraíso.
De repente, eu não queria que o momento acabasse, mas, como todo
conto de fadas, aquele também tinha um prazo de validade. O meu terminaria
no outro dia, então aproveitaria muito aquele homem naquela noite.
Capítulo quatro
LAUREL
Acordei cedo com um corpo forte e malhado ao meu lado e com uma
baita dor de cabeça por ter bebido na noite anterior. Contudo, não me
arrependia de ter ficado com Taylor.
Olhei para ele enquanto Tay dormia, cabelos levemente jogados sobre o
rosto, feições tão suaves quanto uma pluma, olhos fechados, lábios
saborosos entreabertos, tão lindo que eu queria ficar olhando-o a todo o
momento.
Franzi a testa ainda admirando-o, porque em nenhum momento da noite
passada eu havia pensado nos meus problemas ou em Shade. Estava tão
fascinada que só pensava em Tay, embora ainda amasse o Shade. Só desisti
dele porque o homem era carta fora do baralho, aliás, sempre foi. Todavia,
Taylor também não era homem para compromisso, afinal de contas, eu não
sabia nada sobre ele e nem o que fazia.
Tinha que ter em mente que a noite ao lado dele havia sido maravilhosa,
mas que não iria se repetir. Como uma mulher seria capaz de tirar um homem
do seu pensamento? Queria poder ficar com ele, mas isso era impossível,
afinal, eu não o amava, apesar de a química entre nós ser explosiva.
Levantei-me devagar para não o acordar, já que parecia estar em sono
profundo. Também, foram formidáveis as quatro vezes em que ficamos
juntos, fora o sexo oral esplêndido.
Depois de pôr a roupa que tinha usado para ir ao casamento de meu
irmão, peguei o vestido de noiva; não importava se no futuro me casaria com
outra pessoa, só queria levá-lo para guardar como lembrança dos momentos
maravilhosos que tivemos.
Apenas quando estava no avião de volta para Dallas me recordei do
fato de não ter assinado o contrato do divórcio.
― Puta merda! ― exclamei, e um senhor ao meu lado fechou a cara. ―
Desculpe.
Era tarde demais para voltar e procurar Taylor. Como não estava
pensando em me casar tão cedo, não me preocupei muito. Não contaria a
ninguém, porque, se minha família soubesse a forma como eu tinha me
casado, acabaria comigo. Meus irmãos caçariam Taylor até o fim do mundo.
Talvez nosso casamento não tenha validade, afinal de contas, foi em
Vegas, não é?, pensei com esperança. Entretanto, por via das dúvidas, eu
mandaria alguém procurá-lo para nos divorciarmos. Não queria ter
problemas no futuro.
Assim que desliguei o modo offline, meu telefone tocou. Merda, por
que Shade tinha que ligar?
― Onde você está? ― perguntou ele assim que atendi. ― Você não foi
ao casamento...
Suspirei, controlando a dor, porque, mesmo tendo ficado com Taylor,
meu peito ainda doía demais.
― Fui, mas por que iria dar os parabéns sendo que parecia que vocês
estavam indo para um enterro? ― retruquei enquanto saía do aeroporto de
Dallas.
― Não começa.
― Shade, eu sei que teve um motivo para se casar com aquela mulher
fria como uma maldita geleira. Não vou reclamar ou criticar, mas você
merecia coisa melhor do que ela. ― Suspirei. ― Preciso desligar.
― Pequena estrela...
Desliguei, porque ouvir sua voz estava me fazendo sufocar com a dor
em meu peito, mas expirei para me controlar e não deixar a dor me consumir,
afinal de contas, não existia ruptura sem dor.
Meu telefone passou a tocar sem parar, mas o ignorei, até que vi outro
número, um o qual não podia rejeitar.
― Shade disse que não quis falar com ele. Você está bem? ― Nilan
perguntou em tom preocupado. ― Te liguei ontem, mas você não atendeu.
Posso ir para Dallas agora se precisar de mim.
― Se você vier, todos vão querer vir junto, e não posso vê-lo agora,
preciso de tempo ― sussurrei, dando um suspiro.
― Eu sei, mas posso...
― Nilan, vocês estarão em uma turnê pela Europa durante esses dois
meses, então não precisa vir. Vou ficar bem, tenho a Sabrina e a vovó aqui
― controlei minha voz. ― Coração partido não é doença. É claro que você
não sabe de nada sobre o que diz em suas canções ― brinquei para não o
deixar preocupado.
― Isso não é verdade ― resmungou.
― Sabemos que é, sim, Nilan, mas vou ficar bem, meu irmão, não se
preocupe comigo. ― Meus irmãos nunca haviam se apaixonado, só catavam
mulheres e depois as dispensavam como objetos. Talvez um dia eles se
apaixonassem de verdade, eu torcia por isso.
― Tudo bem, mas, se precisar, me chama, ok? ― falou com um suspiro
triste.
Fui para a lanchonete de Sabrina, no Centro de Dallas. O
estabelecimento foi nomeado como Dália, o nome de sua filha, a minha
princesinha linda.
Sabrina era uma loura linda de corpo curvilíneo que deixava os homens
babando, mas ela não ligava para eles. Só Rome, o seu marido, importava
para ela. Ele era policial.
Eles não tinham ido ao casamento, porque a sogra dela estava doente,
além disso, Sabrina não gostava de Shade nem de Melissa. Nenhum deles
perdeu nada, já que aquele casamento foi tão real quanto o meu com o Tay.
Acho que o nosso foi mais verdadeiro, pelo menos foi assim ontem à noite.
Taylor poderia estar comigo, pois, com ele perto, eu não pensava em Shade.
Entrei na lanchonete pequena com paredes da frente de vidro e com
mesas e cadeiras nos dois lados, formando um corredor no meio.
Sabrina e eu éramos amigas desde crianças. Seus pais, os Bennetts,
eram donos da fazenda ao lado da minha, por isso íamos brincar na infância
nos pastos verdejantes e nos banhar no lago.
Dália estava sentada a uma mesa, desenhando. A menina de 8 anos era
loura como a mãe, mas com os olhos azuis como os do pai. Ela sorriu assim
que entrei no estabelecimento.
― Titia, olha o que eu desenhei. ― Apontou para o seu desenho. ― O
príncipe da senhora vai vir montado em um cavalo branco.
Na folha de papel tinha um cavalo e um homem em cima dele, e, perto
do animal, estava a figura de uma mulher. Ela só disse aquilo porque sua
mãe ficava falando que eu me casaria com um príncipe.
― É lindo, minha princesa ― elogiei, bagunçando seus cabelos. ― Eu
trouxe um presente para você.
― Presente? O que é? ― Gritou eufórica assim que abriu o pacote e
viu uma boneca com botas de caubói. Ela adorava colecionar todos os tipos
de bonecas, acredito que a menina tinha mais ou menos umas trezentas.
― Como é que se diz quando recebemos algo das pessoas, Dália? ―
inquiriu Sabrina para ela assim que chegou perto de nós.
― Obrigada, titia ― respondeu e saiu rumo à cozinha. Eu apostava que
tinha ido mostrar o presente para Julia, a cozinheira do lugar.
― Ela adorou a boneca, como imaginei que reagiria ― comentei com
um suspiro.
Sabrina me avaliava.
― Foi muito difícil lá, não foi? ― Ela me puxou para um canto vazio
da lanchonete. ― Queria ter ido com você, mas...
― Eu sei. Vê-lo se casando com outra, ainda mais com aquela garota
fria, foi... ― Sentei-me na cadeira de frente para ela.
Eu já havia chorado tanto no colo dela após ver Shade com outras
mulheres que perdi a conta, mas fiz uma promessa a mim mesma depois
daquela noite de que não iria mais chorar. Não seria fraca, não faria mais
isso.
― Oh, minha amiga ― sussurrou.
― Mas não quero falar dele agora, porque preciso te contar uma coisa.
― Expirei para me controlar. ― O que fiz em Las Vegas.
― O quê? Não me diga que transou em Vegas? Se o cretino do Shade
fez isso com você e se casou com outra, eu vou matá-lo, esquartejá-lo e dar
os pedaços aos porcos! ― Sua voz se elevou.
― Sim, transei, mas não foi com Shade. Jamais ficaria com um homem
casado ou comprometido. E não grite, quer chamar a atenção de todos?
Fique calma, já vou dizer.
― Se não foi com o Shade, foi com quem? Com algum desconhecido?
Lembra o que falamos sobre isso? Não é pelo fato de Vegas ser a cidade do
prazer que você deveria andar por lá fazendo loucuras ― recriminou ela.
― Eu conheci esse cara no avião, enquanto estava indo para lá... ―
comecei.
― Então ele é daqui de Dallas? ― Ela franziu o cenho.
― Creio que sim. ― Não tinha pensado nisso, porque, se fomos para
Vegas no avião que saiu de Dallas, então muito provavelmente Taylor
morava ali. Isso tornaria mais fácil encontrá-lo para assinarmos o papel do
divórcio.
― O que aconteceu depois?
― Ele me ajudou com o meu medo de avião, segurando minha mão e
me beijando. O homem é tão lindo, louro, com olhos azuis ― falei com um
suspiro. ― Também me ajudou a passar por tudo ontem à noite. Me fez
realizar três desejos os quais eu queria há muito tempo. Mas acho que
exagerei no segundo...
― O sexo? Ou fez mais alguma coisa... ― ela começou a falar, depois
se interrompeu com os olhos arregalados. ― Você não fez isso.
― Sim, além do sexo, fiz uma tatuagem de âncora entrelaçada com uma
flor-de-lis. ― Olhei ao redor para ver se não tinha ninguém nos observando.
Tinha uma árvore na frente do restaurante. Então abaixei um pouco o meu
short, mostrando a tatuagem.
― Nossa, ficou linda! ― exclamou ela de boca aberta assim que a viu.
― Você sempre quis essa âncora, mas por que a flor-de-lis?
― Foi ideia dele, que me disse que alguns significados da âncora não
combinavam comigo, então deu a ideia de fazer uma flor-de-lis, porque os
dois símbolos combinavam. Eu também a achei linda. ― Sorri. ― Foi o Tay
mesmo quem tatuou.
― Esse cara é bom mesmo nisso, porque ficou linda. Bem que podia
fazê-la em algum lugar visível ― comentou, avaliando-me.
― Isso porque você nem chegou a ver o restante dela. Depois te mostro
o desenho inteiro.
― Claro, mas o outro desejo é o que estou pensando? Não vai me dizer
que se casou, porque sempre sonhou com isso. ― Seu tom era incrédulo.
Assenti.
― Sim, eu me casei com Tay.
Ela ofegou.
― Casou-se? ― Ela pegou a minha mão, vendo a aliança ali. Eu a
achei tão linda que não quis tirá-la, mas deixei um cheque com ele no valor
do vestido e das joias que comprara para mim, corrente, brincos e anel. ―
Menina, esse anel vale uma fortuna!
Franzi o cenho.
― Não deve ser verdadeiro. ― Não podia ser de diamante. Se fosse, o
cheque que eu tinha deixado não faria nem cócegas no bolso dele. Eu não era
rica. Meus irmãos eram, mas o que era deles era apenas deles, não meu.
― Laurel, isso tem uns 10 quilates, mais ou menos ― sussurrou
espantada. ― Cadê esse cara? Afinal de contas, qual seu nome completo?
Porque acho que ele já a conhecia e gostava de você, porque ninguém dá um
diamante desses para quem viu apenas uma vez na vida. Você não o conhecia
de algum lugar?
― Não o conheço, e nos casamos ontem à noite, mas esqueci de assinar
o papel do divórcio hoje de manhã. Só lembrei quando estava chegando aqui
― sussurrei, passando as mãos nos cabelos. ― Se ele for daqui, como acho
esse homem?
― Posso saber de que homem está falando? ― sondou uma voz atrás de
mim.
Virei-me na direção da voz a qual achei que não ouviria tão cedo.
Contudo, Taylor estava ali, vestido com roupas de caubói, cabelos louros e
soltos ao lado do belo rosto e com um sorriso que fazia minha calcinha ficar
molhada só de olhar para ele. Peguei meu telefone e tirei uma foto; foi
impossível não fazer isso. Meu gesto o fez sorrir, o que me deixou de boca
aberta, porque gostava daquele sorriso lindo e sexy.
― O que foi? Vai ficar aí me olhando com a boca aberta? ― Tinha
humor em seu tom de voz.
― Uau, Laurel, por acaso esse é ele? O seu marido? ― Sabrina
questionou e depois brincou: ― Oh, se eu não amasse meu esposo, pegaria
você.
― Sabrina! ― exclamei, mas revirei os olhos e depois o fitei. ― O que
faz aqui? Como me achou?
― Primeiro, eu vim aqui porque moro em Dallas; segundo, estou neste
― ele olhou em volta e depois para mim ― lugar porque precisamos
conversar.
De certa forma, ele tinha razão. Certamente estava ali pelo divórcio,
para que eu assinasse os papéis, como era para eu ter feito antes, ou talvez
tivesse vindo pegar seus diamantes de volta, ainda mais se valessem uma
fortuna, como disse Sabrina.
― Vou deixar vocês a sós ― disse minha amiga. ― Mas estarei aqui se
você precisar de mim ― falou-me e saiu.
― Então fugiu sem deixar rastro? ― indagou com tom acusatório e, em
seguida, sentou-se à minha frente. ― Por quê? Não gostou da noite que
tivemos?
Estreitei meus olhos.
― Você ainda não respondeu. Como sabia que minha amiga tinha uma
lanchonete aqui? Por acaso você é um investigador particular ou algo assim?
― Bom, Laurel Mary, sei tudo sobre você, mas não precisa se assustar,
pois não sou nenhum lunático que anda perseguindo presas inocentes para
abusar delas. ― Ele colocou as mãos na mesa e sorriu. ― Você viu a forma
como abusei de você com minha boca, língua e...
Interrompi-o, remexendo-me na cadeira, porque cada palavra ia direto
ao meu centro:
― Entendi. ― E como o fazia, porque jurava que ainda o sentia na
minha pele. Era como se uma grande labareda me consumisse.
― Está incomodada com minhas palavras? Posso cuidar disso se você
quiser. ― Seu tom era meloso, quase me fazendo gemer.
― Não vai acontecer. Foi bom o que tivemos na noite passada, mas foi
só, porque não posso sair transando por aí sem estar apaixonada. Não posso
culpar a bebida por ontem, porque eu também queria aquilo. ― Suspirei
pensando no seu toque.
― Me diga uma coisa. Quando está comigo, você não gosta? ―
Meneou a cabeça de lado. ― A atração, o desejo e a fome que eu via nos
seus olhos quando estava me olhando ou quando ficamos juntos não eram
verdadeiros?
Engoli em seco.
― Pode ser, mas como posso ficar com um cara se amo outro?
Seus olhos escureceram.
― Pensou nele enquanto estava comigo? ― Tinha um toque amargo em
seu tom de voz, algo que não entendi.
Passei as mãos nos cabelos, evitando me remexer na cadeira com o
peso do seu olhar sobre mim.
― Não, mas não daria certo. Não sei se nasci para amizade colorida.
Dessa vez ele desatou a rir, não se importando se alguém o ouvisse e o
visse. Percebi Sabrina me olhando como se me perguntasse o que estava
havendo.
― Mulher, você acha que fui até Vegas à toa? Só para uma noite de
foda? Isso eu poderia ter feito em qualquer lugar, mas não foi isso que
aconteceu ― me disse assim que parou de rir.
― Você foi para o casamento do seu amigo ― comentei confusa,
porque foi isso que ele me falou.
― Não, fui porque sabia que você sofreria estando lá por amar o
Shade. Fui para ajudá-la a passar por tudo, e foi o que fiz, mas a noite de
ontem não foi o suficiente ao seu lado, eu quero mais. ― Tocou minha mão
sobre a mesa.
Franzi o cenho, ignorando como minha pele esquentou uns cem graus
com seu toque.
― Mas você nem me conhece. Pelo menos, eu não conheço você. ―
Com certeza teria me lembrado de alguém como ele.
― Lembra há dois meses, em Manhattan, no apartamento do Shade? Na
noite em que ele ficou com Melissa.
Assenti em choque, perguntando-me como ele sabia sobre aquilo.
― Como sabe sobre isso? Não me lembro de ter dito nada a você. ―
Será que bebi demais ontem e esqueci algumas coisas?
― Te encontrei no terraço naquela noite e conversamos por horas... ―
Ele se recostou na cadeira.
Franzi a testa. Lembrava-me de ter ido para o aniversário de Shade,
então, quando ia lhe dizer o que sentia por ele, vi-o com a Melissa indo para
o quarto. Naquele dia, bebi demais, tanto que só recordava o outro dia,
quando acordei com uma ressaca danada.
― Você estava no aniversário de Shade? Bebi muito naquela noite e
não me lembro de nada ― falei com um suspiro.
― Eu sei, você reclamou que o amava, mas que ele não retribuía e que
ficou com Melissa. Por isso estava bebendo sozinha no terraço. Fiquei lá
ouvindo sua lamentação até você adormecer. ― Suspirou. ― Foi a primeira
vez que quis bater em Shade.
― Desde quando o conhece? Porque, no avião, você demonstrou que
não o conhecia ― acusei-o.
― Somos amigos há muito tempo, mas fiquei com raiva por ele não ter
notado que você o amava ― falou com uma pontada de raiva. ― Lamento
não ter dito a você antes que o conhecia, mas quero que saiba que fui a Vegas
no intuito de ficar ao seu lado, porque sabia que sofreria e eu não queria
isso; já vi demais naquela noite em Manhattan.
Pisquei, chocada com o fato. O que eu ia fazer? Ficar com ele para
esquecer o Shade? Não achava justo usar uma pessoa assim, mas talvez eu
começasse a gostar dele de alguma forma. No entanto, Taylor não parecia me
amar, apenas se importava comigo, tanto que tinha ido a Vegas na noite
anterior só para me ajudar.
Eu queria me lembrar dele na noite do aniversário de meu irmão, mas
não conseguia, tudo ficava em branco quando insistia no assunto. Por isso
Tay impediu que eu bebesse no bar na última noite, sabia o que tinha
acontecido da outra vez em que eu bebi e que eu não me lembrava do que
tinha feito.
― Tudo bem, mas o que vamos fazer? Tipo, eu me esqueci de assinar o
papel do divórcio, então supostamente estamos casados, apesar de isso não
importar, pois não sei nada sobre você. Se você é amigo de Shade e dos
meus irmãos, com certeza é um mulherengo como eles, não é? ― Arqueei as
sobrancelhas. ― Então mentiu para mim? Odeio mentiras.
Ele suspirou.
― Não sei como posso dizer isso, mas fiquei com poucas mulheres na
minha vida. Não é porque sou amigo deles que sou igual a eles. Quando a vi,
não parei de pensar em você um segundo, por isso me mudei para Dallas,
assim ficaria mais próximo de você. ― Ele colocou a mão sobre a minha. ―
Vamos tentar. Não precisa namorar se não quiser, só tentar e ver como vai
ser.
― Se ficarmos juntos, você vai sair por aí à procura de outras
mulheres? ― Se fosse assim, eu não iria aceitar ficar com ele.
― Eu sou casado, lembra? Não vou trair minha esposa, uma caipira
linda e gostosa. ― Sorriu travesso para mim.
Sorri também, mas depois fiquei séria. Meu coração balançou por
dentro ao ouvir suas palavras.
― Não quer se divorciar? Pensei que tivesse vindo aqui para isso.
― Não, eu vim para recuperar a minha esposa fujona. ― Piscou.
Revirei os olhos.
― Posso estar louca por fazer isso, mas tudo bem. Você fica comigo
durante dois meses, esse é o tempo que meus irmãos vão levar para voltar da
turnê, e será bom para termos certeza do nosso caso...
― Caso não, o que temos é luxúria e prazer, apesar de que o que sinto
seja mais do que apenas sexo. Eu gosto de você de verdade ― falou com
intensidade na voz. ― Você também parece gostar de mim, você mesma
disse, só não se lembra disso.
― Será que é por isso que, quando estou com você, eu esqueço tudo?
― sondei mais para mim mesma. Gostei disso. Estava contando que o usaria
só para não pensar em Shade, mas talvez, com a ajuda de Tay, eu pudesse
esquecer o meu amor não correspondido por meu irmão e amá-lo só dessa
forma, como um parente.
Capítulo cinco
TAYLOR
Dois meses antes

Fui à casa de Shade, um amigo meu. Ele e seus irmãos, Nilan e Gave,
formavam uma banda muito famosa. Era aniversário de Shade naquela noite.
Eu estava animado, pois imaginava que nos divertiríamos muito, mas
não contava que fosse conhecer uma caipira linda e sexy com botas de
caubói. Ela era a única que se vestia de maneira diferente na festa; todos
usavam roupas e acessórios chiques, mas aquela garota estava com saia
jeans e uma camisa xadrez, fora as fodidas botas. Tinha cabelos castanhos
soltos em cascata em suas costas.
Ela nem notava que todos os caras olhavam para ela com desejo e
loucos para entrar em suas calças, ou melhor, em sua saia jeans. No entanto,
nenhum se aproximava ou conversava com ela. Seus irmãos eram protetores
demais com a menina, foram eles que colocaram o rótulo de “intocada para
todos” na testa dela.
Observando-a sentada mais afastada na sala, notei que olhava de forma
diferente para Shade, com grande interesse, mas ele nem notava, ainda mais
enquanto estava ficando com Melissa, uma cantora pop.
Vi a caipira saindo do apartamento. Parecia que estava difícil demais
para ela ver os dois juntos e se dirigindo para o quarto. Despistei seus
irmãos e a segui até o terraço do prédio para acompanhá-la; precisava saber
o que ela ia fazer lá em cima, ainda mais que estava com uma garrafa de
bebida nas mãos. Ela já tinha tomado algumas doses antes de subir.
Assim que entrei, vi-a em cima de um banco, e ela caiu para frente.
Corri e a peguei nos braços.
― Shade ― sussurrou com a voz um pouco grogue.
― Desculpe desapontá-la, mas não sou o Shade, e sim Taylor.
Ela piscou e depois saiu dos meus braços, mas vi dor ali. Ajudei-a a se
sentar.
― Senta, ou vai cair. ― A garota fez o que pedi. E eu me sentei ao seu
lado. ― Quer conversar? Sou um ótimo ouvinte.
― Uma vez Shade me salvou quando eu ia caindo de uma árvore.
Depois desse dia meu coração começou a bater por ele de um jeito diferente
― murmurou.
― Desde quando é apaixonada por ele?
Ela limpou as lágrimas.
― Desde os meus 14 anos. Mas ele nunca me notou.
― Cristo! Ele é cego, com certeza. ― Era verdade. Quem iria olhar
para alguém com aquela mulher por perto? Ninguém. Em poucos segundos
aquela caipira já estava nos meus pensamentos.
Ela riu triste.
― Você é um cavalheiro, não parece ser como eles. ― Apontou o dedo
para a escada que levava para o andar de baixo.
Se essa garota soubesse, não diria isso. É claro que sou cavalheiro,
mas não sou muito diferente dos irmãos dela.
― Por que não gosta de homens que ficam com mulheres a torto e a
direito? ― Não era bem uma pergunta, pois ficou claro que ela não gostava
daquilo. Acho que todas as mulheres do mundo odeiam homens assim. Isso
nunca tinha me incomodado antes, aliás, eu sempre gostara, mas a reação
dela me fez ficar confuso pelo modo como eu levava a vida.
― Eles são uns fodidos prostitutos que andam fodendo com qualquer
uma! Se Shade fode com todas, por que não pode me foder também? ― Ela
me olhou de lado. ― Tem algo de errado comigo? Será que vou ter de ser
igual a essas mulheres? Que vou ter de ser uma groupie vadia?
Cortei-a:
― Não tem nada de errado com você. Não precisa ser como elas para
um homem notá-la. Veja, eu estou até bobo, porque nunca conheci alguém
igual a você. ― Toquei seu rosto lindo com as pontas dos dedos. ― Você é
fascinante demais, acredite em mim.
― Como assim igual a mim? Uma caipira sem graça? ― Fungou.
― Você não é sem graça, e sim uma garota linda demais. ― Alisei sua
pele macia como seda. ― Nunca pense o contrário.
― Você me acha linda? ― Piscou chocada. ― Ficaria comigo?
― Sem pensar duas vezes. Se você não fosse esquecer o que estamos
conversando, eu ia te provar agora beijando essa boca linda.
― Não vou me esquecer disso. ― Ela sacudiu a cabeça ferozmente. ―
Pode me beijar, já que nunca fiz isso, bem, não conto com Samuel, que
roubou um beijo meu sem minha vontade.
― Me diz onde ele está, que acabo com ele. ― Meu tom saiu duro.
Ela riu. A risada e a voz com sotaque sulista me deixaram perdido.
Laurel, era esse o seu nome. Algumas pessoas a chamavam pelo apelido,
Lau.
― Meus irmãos fizeram isso, pode ficar tranquilo. ― Ela tocou meu
cabelo. ― São tão macios, parecem com os de Bec.
― Bec? É alguma amiga sua? ― Sorri, porque estava fazendo-a
esquecer um pouco o que sentia, a dor de um coração partido. Eu nunca
havia me apaixonado para sentir algo assim, mas já vira amigos meus
sofrendo por isso.
Lucky ficou um caco quando pensou que Sam o havia traído, seu mundo
ficou sem chão. Ryan quase enlouqueceu a ponto de se machucar quando
Angelina foi embora e o deixou. Jason foi pior, sofreu nove anos pela mulher
que amava; finalmente estava feliz.
Olhando para aquela caipira linda, por mais que eu gostasse dela e de
ficar perto dela, não queria sentir nada parecido com o que meus amigos
sentiam. Isso seria um maldito carma.
― Não é minha amiga, mas minha égua. Ela tem a crina tão loura
quanto a sua. ― Ainda sorria.
Dessa vez, eu gargalhei, porque já tinha sido chamado de gostoso, gato,
lindo e tudo mais, mas nunca me haviam dito que meus cabelos eram
parecidos com os de uma égua.
― Não ria, ela é linda ― Laurel sussurrou, colocando a cabeça no meu
ombro. ― Se eu não me lembrar de você amanhã, promete que vai me contar
sobre este momento?
― Não quer me esquecer? ― Arqueei as sobrancelhas para ela.
― Não, você parece ser um cara legal. Podemos ser amigos...
― Não sou amigo de mulheres; se você realmente me quiser por perto,
então teremos que transar. ― Passei o braço à sua volta.
― Transar? ― Ela beijou meu pescoço. ― Posso fazer isso. Já que ele
não me quer, você pode me ter na hora que quiser.
Eu queria poder dizer que ia ficar com ela, mas estaria morto se
tentasse alguma coisa; os seus irmãos acabariam comigo. Embora eu pudesse
arriscar algo assim, minha vida era toda bagunçada. Horas antes, eu tinha
recebido a notícia de que meu pai quase sofrera um acidente. Depois da
morte da minha mãe, ele ficou pulando de uma mulher para outra, pior do
que eu, que era novo. Entretanto, o pior era o alcoolismo. Naquele dia ele se
acidentara porque estava bêbado. Eu teria que contratar um motorista
particular para ele e evitar que se machucasse ou acabasse ferindo alguém.
Além do caos da minha vida, ao olhar para aqueles olhos chocolate me
fitando com ansiedade, como se quisessem aquilo, percebi que eu não podia
beijá-la quando, no outro dia, seria bem capaz de ela não se lembrar de
nada. Eu queria que Lau ansiasse por isso, assim como eu estava louco para
tê-la.
― Não posso beijá-la...
― Mas por quê? ― Sua voz falhou no final. ― Você é igual a ele, não
sente nada por mim nem sequer deseja me beijar...
Eu a interrompi beijando-a. Minha língua acompanhou cada canto da
sua boca com gosto de bebida, mas não liguei, porque estava como um
animal sedento, necessitando mais dela do que apenas beijos e amassos.
Laurel se sentou no meu colo e me abraçou forte, colocando uma das
mãos em meus cabelos e a outra nas minhas costas, apertando-me mais
contra si.
Eu estava como um viciado querendo uma droga, e naquele momento
aquela menina era a minha. Como eu podia ficar assim com um beijo? Já
beijara bastante na minha vida, mas assim? Nunca! Ela estava me deixando
excitado, mole e ofegante.
Ela gemeu, remexendo-se no meu colo. Tive que me controlar
duramente para não a possuir ali mesmo, ignorando meu bom senso, que me
dizia que ela não estava sóbria, que aquilo seria incorreto.
Afastei-me mesmo sem querer. Foi preciso muita força de vontade para
fazer isso.
― Tenho de parar, ou vai ficar pior e não poderei me controlar... ―
Merda, quando perdi o fôlego por beijar uma mulher?
― Mas está tão bom... ― Ela puxou meu cabelo e se escancarou em
mim, com sua boceta em cima do meu pau duro como rocha.
Segurei seus quadris, tentando parar seus movimentos, pois ela
rebolava em meu colo. Maldição!
Cara, se concentra, pedi mentalmente, como um maldito mantra. Não
podia deixar aquilo acontecer. Eu podia ser um mulherengo e muita coisa
mais, mas jamais ficaria com uma mulher embriagada, ainda mais se
corresse o risco de ela não se lembrar de mim no outro dia. Isso seria abuso,
e eu jamais faria isso.
― Tay... ― gemeu.
Afastei-me um pouco, respirando com dificuldade, mas me controlei.
― Não podemos fazer isso, e não é porque você não seja linda, pois é,
mas porque está bêbada e amanhã não vai se lembrar do que houve. ―
Toquei seu rosto e fitei seus olhos arregalados. ― Mas, se você se lembrar,
podemos continuar de onde paramos, com você sóbria.
― Mas e se eu não lembrar... então não vou ter você. ― Ela fez
biquinho.
― Se não se lembrar, eu a faço lembrar e depois ficamos juntos ―
menti, porque não poderia tocá-la. Meus amigos, irmãos dela, acabariam
comigo. Além disso, ela merecia alguém melhor do que eu, afinal de contas,
eu era como os irmãos dela, e Laurel disse que odiava homens do tipo.
― Promete? ― Ela escondeu o rosto em meu pescoço.
― Sim. Agora dorme, que cuidarei de você ― sussurrei, ajeitando-a
em meu colo como se fosse uma criança, embora fosse uma mulher linda,
olhando para seu rosto adormecido e sereno, tão perfeito que poderia
admirá-lo para sempre.
Carreguei-a para dentro do apartamento ignorando o fato de estar com
pau duro. Esperava que ele voltasse ao normal para que ninguém percebesse,
principalmente os irmãos dela.
Assim que entrei na sala com ela em meus braços, Nilan e Gave, que
estavam com uma garota – não estavam sem roupas, mas não ia demorar
muito para isso acontecer –, vieram correndo até mim, seus rostos cheios de
preocupação.
― Por que sempre me deixam por causa dessa garota sem graça? ―
rosnou a mulher.
Nilan fechou a cara para ela, e vi raiva em seus olhos, que eram da
mesma cor dos de Laurel.
― Chegou a hora de você ir embora. Se não gosta da minha irmã, que é
a pessoa que mais amo no mundo, então não serve para estar comigo ―
grunhiu, fuzilando-a, mas ela não partiu, então Gave, que se parecia com
Nilan, moreno e cheio de tatuagens, algumas até feitas por mim, bradou:
― Seguranças?! Tirem essa mulher daqui e não a deixem entrar mais!
― Em seguida veio correndo até mim. ― Por que ela está apagada? Lau está
bem?
Eu os tranquilizei, porque suas vozes se alteraram e podiam chamar a
atenção de Shade. Não queria vê-lo naquela hora, ou acabaria com ele, não
me importando se eu não tinha direito a isso.
― Laurel está bem, só bebeu demais. Eu vi quando ela foi para o
terraço e a segui, porque ela não parecia bem, então notei que estava bêbada.
― Não contei que a tinha beijado, ou seria linchado.
Nilan a olhou com tristeza e depois para a porta pela qual Shade tinha
passado, então eu soube que ele tinha ciência de que sua irmã estava
apaixonada pelo irmão. Já Gave não parecia saber disso.
― Eu fico com ela ― disse Nilan, estendendo as mãos para tomá-la
nos braços. ― Lau é fraca para bebidas.
― Ela também fala muito. Ela disse algo a você? ― sondou Gave.
Balancei a cabeça enquanto a entregava a Nilan. Queria colocá-la eu
mesmo na cama, mas não podia.
― Não, só estava falando coisas sem sentido. Bom, agora tenho que ir.
― Eu não queria partir, mas, se ficasse ali, eles acabariam me enchendo de
perguntas que eu não podia responder. Se Lau não lhes disse o que sentia por
Shade, não era eu que diria.
― Obrigado por estar com ela, cara, e não a deixar fazer uma besteira
― Gave agradeceu.
Assenti, lembrando-me de tê-la salvado de pular do banco. Apostava
que ia fazer aquilo com o intuito de Shade salvá-la de novo, assim como ele
havia feito uma vez. Talvez, de um jeito maluco em sua mente bêbada, ela
queria que aquilo se repetisse.
― Não foi nada, mas acredito que ela vá acordar com uma baita dor de
cabeça ― comentei, olhando mais uma vez para ela, nos braços de Nilan,
tão serena que eu só queria protegê-la contra o meu peito e não deixar mais
ninguém a magoar, nem mesmo meu melhor amigo.
― Têm mulheres; pode pegar uma e se divertir ― ofereceu Nilan. ―
Eu vou levar Lau para o quarto.
Olhei as mulheres no salão, todas lindas e gostosas, mas tão diferentes
da garota que havia estado em meus braços alguns minutos antes, com seu
cheiro de lavanda... seus gemidos...
Percebi que não queria nenhuma daquelas mulheres, por isso fui
embora, esperando ver aquela caipira novamente e cumprir a promessa de
lembrá-la do que tivemos, caso ela se esquecesse.
Capítulo seis

TAYLOR
Dias atuais

― Porra, cara, onde você está indo? ― inquiriu Daniel, meu amigo de
baladas.
Antes, eu tinha Lucky e Ryan Donovan e Jason Falcon, além de Daniel.
Nós saíamos para festas e pegávamos muitas garotas. Todavia, todos
estavam casados e felizes com suas mulheres, menos eu e Daniel, que ainda
continuávamos solteiros.
― Estou indo para Dallas. Assim que chegar lá, te dou um toque.
― Atrás dela de novo? Você sabe que está ferrado, não sabe? ―
comentou com uma risada. ― Os irmãos dela vão acabar com você.
― Obrigado ― resmunguei.
Dois meses antes, após ver Laurel e a sentir em meus braços, eu
descobri que não tive o suficiente daquela mulher, por isso fui para Dallas.
Prometi à caipira que, quando ela estivesse sofrendo, eu estaria ao seu lado.
O dia seguinte seria o “grande dia”, aquele em que meu amigo Shade
iria para a forca. Pouco tempo após o aniversário dele, no qual ficou com
Melissa, os dois resolveram namorar. Eu não sabia o que tinha acontecido
para ele estar casando-se com ela.
Shade era calado, não era de se abrir muito. O único para quem ele
contava tudo era o Gave, que também não disse nada sobre o assunto. Eu não
o forçaria a me contar seus motivos para se casar com alguém que não
amava.
Melissa não era vagabunda, mas era fria com todos. Ela era conhecida
como a Dama de Gelo. Eu não sabia o que ele tinha visto nela, a menina era
uma maldita geleira. Bom, gosto não se discute.
― Você é louco. ― Daniel sacudiu a cabeça.
Ele era dono da editora Luxem, que vendeu para Ryan Donovan para
que esse a desse de presente para sua mulher, Angelina. Loucura, eu dizia,
jamais farei algo assim. Bom, pensava isso antes de conhecer Laurel.
― Vai ficar tudo bem, não se preocupe com isso. Está tudo resolvido.
Depois que eu chegar lá, dou um toque. Infelizmente você não pode ir, já que
precisa treinar para a próxima corrida.
― Sim. Enquanto isso, tome cuidado, cara. Os irmãos dela vão matá-lo
caso saibam que você anda louco pela irmãzinha deles.
Depois que conheci Lau pessoalmente, passei a nutrir sentimentos por
ela, que, além de linda, era bondosa. A cidade inteira parecia gostar dela.
Quem não gostaria?
― Droga, Jordan, você sabe da furada e encrenca que isso pode te
causar? ― questionou Daniel quando me mantive calado. ― Se os irmãos
dela souberem, eles vão te castrar.
― Shade pediu que eu fosse a Dallas a fim de convencer Lau a vender
sua fazenda. Ele quer que eu a compre para que ela vá fazer alguma coisa
fora de lá. ― Suspirei.
Fiquei chocado quando Shade veio até mim me pedindo para comprar a
fazenda de Laurel. Ele me disse que gostaria que ela viajasse e descobrisse
o que mais gostava de fazer. O cara era cego, mesmo sendo irmão dela.
Laurel atravessava a cidade para ir a um haras que ficava longe de sua
fazenda. Eu podia ver seus olhos brilhando ao ver os cavalos correndo nos
pastos verdejantes, percebi que aquilo era sua paixão. Só não sabia o motivo
de ela não fazer o mesmo em sua fazenda. O lugar era tão lindo, perfeito para
fazer isso.
― Sim, pediu, mas não para você ficar cobiçando a irmã dele, que, por
sinal, morre de amores por ele. ― Daniel suspirou enquanto entrava em seu
carro de corrida. O cara era bom nisso.
― Não posso deixar que ela continue apaixonada por Shade. Amanhã é
o casamento dele. Você sabe como me sinto. Sabe como ela está? Machucada
e sofrendo. Não vou deixá-la se afundar em dor enquanto Shade se casa com
Melissa. ― Passei as mãos nos cabelos. ― Prometi que não a deixaria
sofrer, não por ele, como acontecerá amanhã.
― Está apaixonado por ela, cara? ― perguntou surpreso.
― Não, claro que não! ― respondi. Não existia amor à primeira vista,
então eu não podia estar apaixonado. Como isso aconteceria comigo, que
não acreditava nessas coisas? Se bem que a maioria dos meus amigos tinham
caído por mulheres e estavam casados. Isso não podia acontecer comigo,
podia?
― Não? Cara, você ficou mais em Dallas do que aqui durante esses
dois meses. Aposto que estava atrás dela, não é? ― Arqueou suas
sobrancelhas. ― Não venha me dizer que era a trabalho, porque isso é
besteira.
Daniel tinha razão quanto a isso, mas eu só estava preocupado com
Laurel e queria vê-la e saber o que fazia da vida. Isso não podia ser paixão,
podia? Sempre quando a via, o meu coração acelerava como se fosse sair do
peito. Reação estranha, a qual nunca havia sentido antes, bem, apenas
quando a beijei naquela noite.
― Isso não significa que seja amor ― retruquei.
Ele riu.
― É o que então? Perseguição? Jordan, pensa bem. Se for mesmo se
aproximar da garota, diga a ela o que Shade pediu para você, porque, depois
que ela souber que está perto dela apenas com a intenção de tentar convencê-
la a vender a fazenda, as coisas não vão ficar bonitas ― aconselhou, ligando
o carro. ― Agora vou treinar, pois tenho uma corrida semana que vem.
Assenti, ainda chocado. O que diria a Laurel? Que ficaria perto dela
para convencê-la a vender a fazenda? Porém, eu não estava indo para fazer
isso, e sim para ficar ao lado dela e protegê-la. Por quê? Eu não fazia ideia.

Fui a Dallas para ir ao casamento de Shade. Sabia que teria que me


aproximar de Laurel e contar a verdade. No fundo, torcia para que ela se
lembrasse de mim assim que me visse, mas ela não o fez. Assim que entrei
no avião e me sentei ao seu lado, ela nem notou.
Perguntei ao Nilan se ela tinha se lembrado de algo no dia seguinte em
que eu a deixara na casa deles, adormecida e bêbada. Ele disse que não. Por
isso fiquei afastado; caso ela se lembrasse, eu teria ido até sua fazenda ao
invés de ficar observando-a de longe.
Eu já tinha uma rede de hotéis em Dallas. Comprei-a quando fechei um
negócio ali para Lucky Donovan. Ele era meu amigo e chefe. Eu descobria e
fechava muitos negócios para ele. Não era à toa que o homem era bilionário.
Eu havia pedido a ele, havia alguns meses, um tempo para que eu pudesse
abrir minha própria rede de hotéis, mas o ajudava quando precisava de mim.
Ter um hotel ali era bom. Era uma desculpa para ficar perto da caipira.
Quando eu pensava em me aproximar de Laurel, achava que fosse ser
como amigo e conselheiro, o que era risível, porque, porra! Eu nunca tive
uma amiga mulher, só as usava para sexo e nada mais e gostava de fazer isso.
Como uma bêbada caipira tinha sido capaz de mudar isso? O pior era que
ela nem tinha noção do que me causara. Aliás, nem eu sabia, mas não
conseguia tirá-la da minha cabeça nenhum segundo.
No avião para Vegas, era para eu apenas acompanhá-la, mas não sabia
que a menina tinha medo de voar, nenhum dos irmãos King me avisou sobre
isso. Contudo, como eles avisariam, se não sabiam que eu andava seguindo a
irmã deles feito um louco? Se soubessem, com certeza me matariam. Shade
tinha noção de que eu ia para Dallas, mesmo assim não me falou nada sobre
Laurel e seu medo de avião.
Eu sabia que a mãe dela tinha morrido em um acidente aéreo havia
alguns anos. Depois disso, Laurel foi morar na fazenda e não havia quem a
tirasse de lá. Pude ver que ela amava aquele pedaço de terra, e não era só
por sua mãe gostar de lá; ela adorava tudo aquilo.
Na aeronave, fiquei ao seu lado, mas estava com raiva, porque ela
aceitou fazer uma coisa a qual temia apenas por amor ao Shade, como tinha
feito no aniversário dele havia dois meses, em Manhattan. Pelo que eu
soube, ela não viajava muito por rota aérea, preferia carros e ônibus, mas,
por ele, enfrentava o medo. Acredito que entraria na frente de uma maldita
bala, pensei amargo.
Fiquei feliz ao beijá-la para que não pensasse no local em que estava.
Funcionou, mas aquele beijo me consumiu mil vezes mais do que a primeira
vez em que a beijei. Sabia que estava longe de ficar saciado daquela mulher.
Se não estivéssemos em um avião, eu perderia a cabeça e a possuiria.
Minha função era ir para Vegas e ficar ao lado dela para não a deixar
triste. Eu estava fora de mim, pois podia sair por aí e foder à vontade, assim
como fiz na última vez em que estive ali, para o casamento de Lucky e
Samantha, mas não queria ninguém, só uma caipira que amava outro. A vida
era realmente uma cadela.
Depois de deixar Laurel no hotel, fui ver meus amigos antes do
casamento. Só a deixei porque ela queria ficar sozinha, provavelmente para
chorar por Shade de novo.
Assim que entrei no salão onde seria ministrada a cerimônia, eu o vi de
pé com a expressão igual a de quem estava indo para um enterro.
― Devia melhorar essa cara, homem ― falei assim que cheguei até ele.
― Parece que está em um enterro e não no seu casamento.
Shade me olhou e suspirou.
― Que bom que chegou. Hoje a Lau vai estar aqui, e quero que fique
perto dela. Sei que não faz sentido o que vou dizer, mas quero que não a
deixe sofrer por minha causa ― disse, ignorando meu comentário.
Não seria preciso ele pedir, porque eu já iria fazer justamente isso, mas
não precisava mencionar; talvez depois.
― Você sabe o que ela sente, então? Por que nunca disse nada? É pelo
fato de que não a ama da mesma forma?
Ele balançou a cabeça.
― Sim, eu sei, mas não posso retribuir. Só quero que ela viva e seja
feliz, que corra atrás de seus sonhos e não fique enfurnada em uma fazenda
por ser herança de sua mãe.
― Ela pode não querer tudo isso, e sim viver na fazenda por ela mesma
e não por causa de ninguém. Já pensou nisso?
Ele balançou a cabeça.
― É porque você não viu o desenho arquitetônico de uma casa que ela
fez para sua amiga. O modo como Lau desenha é tão intenso, como se amasse
fazer isso. Inclusive, ela ia se formar em arquitetura, mas aconteceu o
acidente e tudo mais, então desistiu e se afundou na fazenda ― sussurrou. ―
Quero que Laurel não desista de nada por pensar que sua mãe iria querê-la
naquele lugar, casando-se e tendo filhos.
Arquitetura? Então ela é boa nisso? Acho que sei exatamente o que
fazer.
― Me diga uma coisa: você realmente não a ama como mulher? ―
indaguei baixo, tomando o cuidado para a noiva dele não ouvir. Não queria
problemas, embora a cara dela não parecesse de uma noiva feliz por estar se
casando.
Ele olhou para Melissa, que estava perto da porta conversando com
uma mulher. Ela vestia um vestido branco e, como ele, não parecia feliz. Era
estranho aqueles dois estarem se casando sem gostar um do outro.
― Não, não a amo dessa forma ― afirmou, voltando seus olhos para
mim.
Suspirei de alívio, porque, se ele gostasse dela, eu não poderia fazer
minhas investidas. Embora, se Shade a amasse e não ficasse com ela, eu
arrebentaria sua cara por fazê-la sofrer.
Todos se prepararam para a cerimônia. Melissa entrou de braço dado
com Gave no corredor preparado em frente ao altar erguido. Pelo que eu
soube, ela não tinha irmãos ou família, ingressou na carreira musical cedo.
Era muito famosa, uma cantora pop de sucesso, quase igual à banda King.
Shade e Melissa falaram seus votos de casamento, prometendo amor
pela vida inteira e todas essas merdas. Contudo, eles jamais conseguiriam
ser felizes se não se amassem. Talvez fosse um negócio de publicidade,
porque ela não estava grávida. Eu imaginava que, se estivesse, com certeza
eles me contariam.
Laurel não apareceu. Notei que toda a sua família questionava a
ausência dela. Shade e Nilan pareciam preocupados. Supus que só os dois
sabiam sobre o que ela sentia, o amor por um homem que não podia ter.
Eu estava a ponto de sair dali quando olhei para um canto do salão e a
vi com os olhos molhados e vermelhos de chorar. Ninguém pareceu notá-la
ali, porque ela estava escondida atrás de uma planta. Só a vi porque varri
meus olhos pelo lugar à sua procura.
Quando o ministro declarou Shade e Melissa casados, Lau foi embora
quase correndo. Certamente aquilo foi muito difícil para ela.
Saí antes de desejar parabéns aos noivos, mas ninguém sentiria falta
disso, afinal, nenhum dos dois parecia querer estar ali.
Quando vi Laurel destruída num bar perto do hotel, quis matar Shade,
porque eu já a tinha visto sofrendo por ele em Manhattan, mas não daquela
forma. A dor estava evidente em seus olhos. Como naquela noite em que
fiquei ao seu lado percebi que a ajudei a esquecer a dor, faria isso
novamente. Se fosse preciso lhe dar prazer, com certeza eu o faria.
Aproximei-me de Laurel e falei que faria tudo por ela naquela noite,
que realizaria seus desejos, embora, quando soube do que Lau queria, fiquei
chocado por um segundo, porque a menina era linda e, se fosse em
circunstâncias diferentes, eu apostava que ela não seria virgem, não por ser
desavergonhada, mas pelo fato de Lau ter cara de quem queria algo assim,
mas não fez apenas por amar e querer Shade. No fundo, estava se guardando
para ele.
Não fiquei triste por isso, porque, após tê-la em meus braços, senti-a
toda linda e com um toque de inocência. Jamais havia ficado com uma
virgem. Se meus amigos soubessem, diriam que eu estava louco; talvez
estivesse. Quem se importava? O bom era realizar todos os meus sonhos e
desejos.
Apesar de inexperiente na cama, a mulher foi excepcional. Só de pensar
em seus lábios em volta do meu pau, sugando-o e lambendo-o com fome,
como se fosse seu alimento mais saboroso do mundo... Nossa! Eu nunca me
sentira assim, como se fosse um adolescente em meio à puberdade, louco e
ansioso por sua bela namorada.
Capítulo sete
LAUREL
Quando Taylor entrou na fazenda para ficar comigo, achei que ele não
ia gostar dali, daquela vida, porque tinha cara de ser rico. Na verdade, era;
suas roupas e o gasto que teve com o casamento, as joias e tudo mais
comprovavam isso.
Ele parecia admirado com o lugar, como se gostasse de ficar ali.
Apreciei isso. Aquele homem era o único que me falava para fazer o que
gostava; meus irmãos sempre impunham seus desejos, nunca perguntavam de
fato o que eu queria fazer. Uma vez Shade indagou isso para mim, o que eu
gostaria de fazer da minha vida. Menti, dizendo que não queria nada, mas
isso não era verdade, porque eu tinha um sonho, um que não havia contado a
ninguém, do haras e da pousada.
Fiquei feliz por ver como Tay agia em minha casa. Era um homem que
parecia entender e saber o que eu queria antes mesmo de eu falar algo ou
demonstrar o que desejava de fato. Era por isso que eu adorava estar com
ele; fazia-me esquecer tudo à minha volta, os problemas, o sofrimento. Era
egoísmo querê-lo apenas para amenizar a dor. Talvez no futuro eu viesse a
me apaixonar por ele. Taylor era um homem que parecia ser correto e gostar
de mim de verdade. Só se eu fosse uma idiota para ignorar e rejeitar ficar
com ele. Era alguém que mamãe com certeza aprovaria para ser meu
namorado.
― Você me impressiona a cada momento em que passo ao seu lado,
caipira. ― Ele alisou meu queixo. ― Sua avó já chegou de Vegas? Ela
costuma vir aqui direto?
― Por que você quer saber? ― Eu estava ofegante com o seu toque; ele
me deixava toda mole como marshmallow.
― Porque acho que ela não aprovaria as coisas que farei com você
agora. Ainda mais se ela chegar aqui para atrapalhar o que pretendo fazer ―
informou, também com dificuldade de respirar.
― O que seria? ― inquiri com um sorriso maroto. ― Porque vovó não
está em casa e não virá hoje. Ela foi visitar minha tia.
Ele me empurrou no sofá branco e rosa. Minha sala não era grande,
tinha duas janelas de madeira que se abriam para os dois lados, dois sofás
de dois e três lugares, e o maior era um sofá-cama. Foi nesse que Tay me
jogou, e caiu de joelhos no chão, à minha frente, com um sorriso pecaminoso
e sexy.
― Está louca para ter meu toque? ― Pegou minha blusa com botões na
frente e a puxou para os lados como se fosse um pano velho. Botões voaram
para todos os lados, mas o gesto me fez ofegar de tesão, tanto que gemi. ―
Lindos... ― Inspirou em meu sutiã branco.
Meu peito subia e descia de prazer. Seu toque me queimava por dentro
de forma intensa, deixando-me trêmula, principalmente minhas pernas, a
parte interna de minhas coxas. Meu centro pulsava querendo aquele homem,
ansiando por ele, cheio de luxúria. Não me importei que estivesse com
vergonha, não liguei por corar, apenas o queria como nunca quis nada na
minha vida, só precisava sentir mais dele, ou surtaria.
― Taylor... ― sussurrei ofegante.
― Sente-se quente? ― Sorriu, passeando com seus dedos sobre meu
decote e minha barriga plana, indo na direção onde eu ansiava por ele.
― E como! Por favor...
― O que deseja que eu faça? Me diz, que farei qualquer coisa ― disse
com desejo na voz. ― Realizarei suas fantasias mais profundas.
Pisquei.
― Jura?
― Sim, o que deseja?
― S-ser algemada na cama enquanto sinto sua... sua boca... ― gaguejei.
― Onde quer minha boca e língua? ― Seu tom era abrasador.
― Por todo o meu corpo... ― Eu não era puritana, e ele despertava
desejos escondidos que eu jamais admitira em voz alta.
― Vamos ter um problema. Não tenho algemas comigo, mas posso
providenciar algo parecido ― garantiu rouco.
― Eu tenho no meu quarto ― comentei com a voz fraca.
Ele franziu a testa.
― Seu quarto? Posso saber por que as tem? ― Senti um toque amargo
em sua voz ao pronunciar isso.
― Não é pelo motivo que está pensando ― apressei-me em dizer,
porque apostava que a sombra escura em seu rosto se devia ao fato de ele
pensar que eu queria usar as algemas com Shade, mas o estranho era que eu
nunca tinha pensado sobre isso. É claro que me imaginava transando com
ele, mas não da forma como queria com Tay.
― Fiz uma promessa com minha amiga. Sempre que uma das duas
perde uma aposta que fazemos, somos obrigadas a comprar algo de sex shop.
― Sempre? Quer dizer que tem mais coisas além de algemas? ―
Sorriu, levantando-se e me levando consigo. ― Me mostre o que tem.
― Agora? ― reclamei. ― Mas estávamos bem no momento...
Ele riu do meu tom relutante.
― Sim, agora vamos conferir o motivo de eu estar louco para possuir
você. ― Seu olhar era quente ao varrer os olhos sobre o meu corpo.
Não reclamei mais, só o levei para o meu quarto no final do corredor à
direita. O quarto era grande, com uma cama king size, um guarda-roupa perto
da porta do banheiro, uma penteadeira com as coisas que usava no dia a dia,
embora não gostasse muito de me maquiar, e janelas de vidro. Antes eram de
madeira, mas mudei porque gostava de ver o Sol nascendo através dela. A
vista era magnífica.
― Quarto lindo! ― observou olhando ao redor. ― Com uma vista
bonita para um riacho.
― Obrigada. Adoro a cachoeira, onde o Sol nasce no horizonte ―
sussurrei olhando para fora, para o verde e a cascata que caía não muito
longe da casa. Tinha outra cachoeira maior, mas ficava mais acima. Lá era
onde ficavam meus cavalos durante o dia, onde eu sonhava em construir um
haras futuramente.
― Linda mesmo ― elogiou, mas olhando para mim. ― Agora onde está
o que comprou? Quero ver tudo.
Assenti e fui até o armário pegar a grande caixa quadrada na qual
guardava todos os meus pertences adquiridos por causa das apostas
perdidas. Entreguei-a a ele e o observei enquanto a abria.
― Nossa! Quis usar isso? ― Sorriu, pegando um creme
dessensibilizante anal.
Corei.
― Aposta perdida, lembra? Por isso comprei.
Ele riu.
― Sim, mas você com certeza escolheu o que ansiava usar, não é?
― Pode ser, mas não estou pronta para isso hoje ― afirmei e depois
emendei, porque sua expressão desmoronou um pouco: ― Talvez outra
hora?
Ele sorriu de modo tão lindo!
― Claro ― disse e pegou um dildo, olhando-me com os olhos
estreitos. ― Foi com esse que rompeu seu hímen, tirando sua virgindade?
― Sim, há alguns meses. Fiquei curiosa e fiz ― sussurrei
envergonhada.
― Sente-se curiosa com mais alguma coisa além das algemas? Se
sentir, vamos fazer depois.
― Tudo bem ― respondi, indo até ele, mas Taylor se afastou sacudindo
a cabeça. ― O que foi?
Não sei se ele percebeu o tom resignado na minha voz, mas me puxou
para seus braços e beijou minha testa sem nunca tirar os olhos dos meus.
― Nada, só quero que se deite na cama, coloque as mãos para cima e
faça o que eu mandar. Vai fazer isso? ― Seus olhos estavam brilhantes.
Fiquei aliviada por ele ainda me querer. Quando me afastou, senti algo
que não entendi direito o que era, uma pontada dolorida em meu coração.
Esperava que no futuro ele não me machucasse caso eu me apaixonasse por
ele. Queria que nosso caso desse certo, porque ele era alguém que eu podia
ter e que valia a pena. Seu toque sempre me deixava quente e necessitada
por ele, de forma que me fazia quase suplicar por seus beijos e abraços, por
ele inteiro. Tay tinha tudo que um homem precisava para fazer uma mulher
realizada, porque eu me sentia assim de forma irrevogável.
Fiz o que ele me mandou, deitei-me na cama só de sutiã, calcinha e
botas. Não as tirei, pois sabia que ele gostava de me ver assim.
― Tay...
― O que deseja, minha caipira linda? ― Seus dedos esquadrinhavam
entre meus seios, deixando-me louca e me remexendo na cama como uma
lagarta na areia quente. E era assim que eu me sentia, quente, ardente. ― Me
diga, e vou ver se posso fazer, ou deseja que eu seja criativo?
Ofeguei com seu toque.
― Seja criativo; sei que vou gostar do... do que tem para mim. ―
Minha voz falhou devido ao fogo que me consumia.
Ele sorriu.
― Bom saber, minha linda. ― Tocou na ponta do meu nariz com o dedo
e se afastou, mexendo nas gavetas, até que achou o que procurava.
― Uma echarpe? ― Arqueei as sobrancelhas.
― Tenho que improvisar, já que você não tem uma venda. ― Chegou
perto de mim. ― Vou cobrir seus olhos, assim vai aproveitar mais.
Olhei em seus olhos azuis lindos, e ali parecia ter diversão, mas tinha
excitação também. Gostei muito disso.
― Confio em você ― declarei. Embora o tivesse conhecido, em tese,
no dia anterior, ainda assim confiava nele. Eu não me lembrava do que tinha
acontecido havia dois meses em Manhattan, mas talvez, de alguma forma,
meu subconsciente soubesse que ele era de confiança. Fosse como fosse, eu
estava adorando realizar tudo aquilo com ele.
Fechei os olhos enquanto sentia seus dedos e a echarpe cobrindo-os.
― Obrigado, linda. ― Sua voz era quente, parecia uma fornalha. Seus
lábios depositaram um beijo suave na ponta do meu nariz, um gesto tão
simples, mas muito intenso e carinhoso.
Eu adorava sentir seu calor, seu cheiro, era um sentimento estranho, mas
bom, como se eu tivesse esperado aquilo a minha vida inteira. E não queria
deixar de sentir nunca.
― Tay... ― choraminguei, abrindo minhas pernas como se não tivesse
controle sobre elas.
― Está molhada por mim?
Senti um dedo em minha entrada.
― Sim, e como! Quero que você mate esse fogo que está entre minhas
pernas! ― Falar com os olhos tampados me dava mais coragem.
― Estou contando com isso. Agora vou tomar conta de você, caipira ―
sussurrou com a voz rouca próxima à minha pele e seus dedos sobre a minha
calcinha, depois os deslizou para cima sobre minha pele. Onde tocava, um
rastro quente surgia, fazendo-me saltar de leve na cama.
― Vire-se de bruços com as mãos para cima e levante essa bundinha,
linda caipira ― ordenou com a voz intensa e sexy.
Ofeguei conforme seu toque me deixava como um vulcão em erupção.
― Isso, minha linda, agora com o rosto no colchão e as mãos para
cima, levante sua bunda no ar.
Tentei não corar ao imaginar como eu pareceria nessa posição, mas fiz
o que me foi mandado.
― Cristo, você é linda demais! ― exclamou.
Estremeci ao sentir seu hálito quente na minha bunda. Eu estava pronta
para tocá-lo, quando as algemas vieram para os meus pulsos, e Taylor os
prendeu na cabeceira da cama.
― Você presa é como um sonho deslumbrante que jamais quero perder
― rosnou, dando um tapa na minha bunda.
Quase gozei na hora; estava muito perto de isso acontecer.
― Acredita que fiquei mais molhada do que já estava? ― Minha voz
era fraca.
― Bom. ― Ouvi o sorriso em sua voz sexy. Ele deu um puxão, e minha
calcinha se foi. ― Sua boceta está brilhosa e escorrendo esse creme com
meu sabor preferido entre os lábios. Uma visão dos céus.
Enrubesci ao imaginar a cena e estremeci, remexendo minha bunda,
tamanho era o desejo que o atrito em minhas partes íntimas causava.
― Puta merda! ― gritei quando, do nada, sua língua e seus lábios me
cobriram, puxando meu clitóris e o degustando. Suas mãos fixaram-se em
meus quadris para mantê-los no lugar, porque eu me remexia feito louca,
querendo mais dele.
― Não puxa muito suas mãos para não ferir seus pulsos ― orientou,
então enfiou um dedo em mim, fazendo-me ofegar. ― Isso, geme, minha
caipira!
Não puxei mais minhas mãos, mas minha vontade era de me mexer e
tocá-lo. Gritei quando senti seu polegar esfregar meu clitóris.
― Porra, você está tão molhada para mim... ― De repente, seus dedos
mágicos se foram, mas, antes que eu protestasse, senti novamente sua língua
me invadir.
― Puta que pariu! — gritei e empurrei mais a minha bunda em sua
boca, não me importando com a vergonha. ― Isso é bom...
― Goza na minha boca, linda! ― Sua ordem foi direto ao meu centro,
porque tudo explodiu dentro de mim ao passo em que eu gritava seu nome.
Eu ainda estava tremendo quando senti seu pênis em mim, tão fundo que
gritei de êxtase. Logo Tay começou a bombear dentro de mim.
― Mais forte! ― pedi.
― Você quer ser fodida com mais força? ― Beijou minhas costas,
fazendo-me arrepiar ainda mais.
― Sim...
Suas mãos pegaram meu cabelo e o puxaram para trás. Gritei enquanto
ele me estocava com mais força.
― Oh, Deus! Isso é tão bom...! ― clamei.
Seus dedos apertaram meus quadris, e depois os senti em meu clitóris,
esfregando-o com força.
― Goza no meu pau, caipira! ― rosnou rouco, dando uma última
estocada, quando tudo brilhou e fui arrebatada. Ele seguiu logo atrás com um
rugido prazeroso.
Caí na cama com ele em cima de mim e ainda em meu interior. Seus
lábios estavam em meu pescoço, o que me fazia tremer. Logo seguiram para
o meu rosto.
― Mulher, assim você me mata ― declarou contra os meus lábios.
Sorri.
— Eu digo o mesmo, querido.
Ele tirou a echarpe que cobria meus olhos, e pisquei, vendo seus olhos
brilhantes. Tay saiu de mim, mas ficou ao meu lado.
Toquei seu glorioso rosto assim que ele retirou as algemas.
― Obrigada.
Ele arqueou as sobrancelhas.
― Pelo quê? Por fodê-la com força? ― Sorriu libidinoso. ― Isso é um
privilégio.
― Você é bom ― afirmei, tentando não pensar nas mulheres que ele
teve antes de mim.
― Então eu acho que vou ter que melhorar no quesito cama, já que
recebi somente um “bom”. Estava pensando que eu estava na categoria de
“maravilhoso e esplêndido”. ― Ele me virou e pairou em cima de mim.
Ri, tocando seus cabelos, que estavam caindo no seu rosto e no meu.
― Acho que vai ter que provar mais um pouco ― brinquei, porque, se
Taylor melhorasse, eu teria dificuldade em andar depois, embora estivesse
adorando fazer tudo aquilo com ele.
― Então se prepare ― disse sorrindo.

Acordei à noite com o som de uma voz linda cantando na escuridão uma
música de Ed Sheeran – Photograph.
Taylor estava tocando no meu violão, que ganhei da minha mãe. A voz
de Tay soava como a brisa, tão leve e tão pujante. Algumas palavras da
música tinham um acento intenso, como se ele estivesse sofrendo por amor.
Não achei que estivesse apaixonado por outra mulher. Seria por mim? Por
que um cara aceitaria ficar com uma mulher enquanto ela gostava de outro?
Aqueles sentimentos só podiam ser por mim; se fosse pelo sexo, ele poderia
ter qualquer mulher.
Meu coração se comoveu ao perceber que ele pensava que podia sair
machucado daquela relação. Mesmo assim, através da letra da música e o
sentimento com que Tay tocava, senti a sua promessa de nunca me deixar
sozinha, além de um pedido para que eu o esperasse voltar para casa. Ele
estaria pensando em ir embora? Não conseguiria esperar até que meus
sentimentos por Shade estivessem resolvidos? Porque era isso o que eu
queria, uma resolução, e lutaria para ter somente Taylor em minha vida, meu
corpo e coração.
As palavras da canção que ele cantava também diziam que amar podia
curar a alma. Será que era isso que Tay queria me dizer? Que através do
amor ele poderia me curar? Eu gostaria de perguntar a ele, mas não queria
estragar o momento. Fechei os olhos e fingi estar dormindo.
Assim que a música terminou, ele expirou como se estivesse com
dificuldade de respirar ou se doesse. Senti seus dedos em meus cabelos.
― Você tem essa capacidade de me machucar que nunca ninguém teve
― falou, e, por um breve segundo, pensei que soubesse que eu estava
acordada. No entanto, continuou: ― Eu vou correr o risco, porque não posso
ficar longe de você. Nunca vou deixá-la ir embora.
Ele se afastou após um momento e se levantou da cama. Ouvi um baque
surdo como se ele estivesse guardando o violão, depois uma porta sendo
aberta e fechada.
Abri as pálpebras e olhei para a porta fechada pela qual ele havia
saído. Meu coração estava doendo com o que acabei ouvindo. Taylor
realmente gostava de mim. O que isso me tornava? Eu era uma cadela que o
aceitava correndo o risco de não me apaixonar por ele. Deveria terminar o
que tínhamos? Estremeci só em pensar nisso.
Sacudi a cabeça, levantei-me e fui procurá-lo. Precisava lhe dizer tudo
o que eu sentia naquele momento.
Tay estava na cozinha, sentado à mesa, tomando um copo de água.
― Eu não vou machucá-lo ― sussurrei.
Ele me olhou, mas não disse nada, então fui até ele e me sentei em seu
colo, colocando os braços em volta de seu pescoço.
― Juro que não vou machucá-lo, mas quero que me prometa o mesmo
para quando eu me apaixonar por você ― pedi, alisando seu rosto.
Ele me pegou pela cintura e me colocou na mesa, puxando minha
camisola para fora do meu corpo. Logo estava me possuindo, preenchendo-
me, adorando-me.
― Com meu pau dentro de você, eu juro que não vou machucá-la ao se
apaixonar por mim. Que a amarei a cada segundo e a farei a mulher mais
feliz do mundo. ― Beijou-me, selando a promessa.
Capítulo oito
LAUREL
Os dias seguintes foram os mais felizes da minha vida até então. Taylor
não falou sobre o momento em que havia cantado, algumas noites antes.
Todavia, notei que ele estava feliz com o que eu disse a ele. Eu também
estava, afinal de contas, era verdadeiro. Com o passar do tempo ao seu lado,
eu não pensava mais no que sentia por Shade, na verdade, nem sequer
pensava mais nele, não com interesse amoroso ou sexual. Era isso o que eu
queria ter, apenas Tay na minha mente.
Estava deitada usando meu biquíni preto sobre um cobertor fino que eu
tinha colocado no chão em frente à cachoeira. Taylor estava ao meu lado, de
short de banho. Estávamos sozinhos naquele lado da fazenda.
Sentei-me e olhei para a frente, admirando a beleza do lugar, os pastos
do outro lado do riacho. Tinha uma cerca que impedia meus cavalos de
chegarem a ele.
― Este lugar é magnífico. Você já pensou alguma vez em vendê-lo? ―
sondou ele. ― Porque seria um desperdício.
Suspirei.
― Não, nunca vou vender. Até já tive propostas tentadoras, mas está
vendo aqueles cavalos lá? Aquele preto? ― Apontei para frente ― Eu o
chamo de Corcel Negro. Às vezes venho aqui e o vejo galopar. Ele é tão
lindo que eu adoraria montá-lo.
― Por que não o faz? ― Ele olhava para o animal belo, trotando com
sua crina voando ao vento.
― Porque ele é selvagem. Não consegui domá-lo, mas gostei dele
desde a primeira vez que o vi. Seu antigo dono ia sacrificá-lo por ele quase
ter matado a filha dele, que tentou montá-lo. ― Apertei as mãos com raiva,
lembrando-me do ocorrido. ― Ela sabia que ele era um cavalo selvagem e
foi avisada para não o montar, mas sabe aquelas pessoas turronas, que não
ouvem ninguém?
― Sim.
― Então essa mulher era assim. Ela tinha 23 anos, então sabia o que
estava fazendo, não é? Por que montá-lo? Depois que ela caiu, seus pais
queriam sacrificá-lo, mas não deixei e briguei com eles. Eram amigos da
minha mãe. Falei que ia comprá-lo. ― Ri amarga. ― Sabe o que o fodido
fez? Ele ia matá-lo, mas, quando eu disse que o compraria, pediu uma
quantia exorbitante. Shade o comprou para mim.
Taylor ficou calado por um segundo, então olhei para ele, que estava
sério.
― O que foi?
Ele sacudiu a cabeça.
― Nada ― falou e mudou de assunto: ― Por que vai ao haras do outro
lado da cidade? Por que não faz um aqui? Este lugar é simplesmente perfeito
para fazer isso. Há espaço.
Pisquei.
― Sabe que sempre quis fazer um aqui? Mas as coisas não saíram
conforme planejei.
Ele estava prestes a falar alguma coisa, mas fomos interrompidos pelo
meu celular.
― Alô? ― atendi sem olhar a tela, porque estava com os olhos em Tay.
Deitei-me de costas.
― Como está a minha princesa? ― perguntou Nilan com tom
preocupado.
― Estou bem, Nilan. Ficaria melhor se parasse de perguntar isso ―
respondi com um suspiro.
― Não pode me culpar por me preocupar com a minha irmãzinha linda
― disse com um sorriso na voz. ― Sabe que, se precisar de mim, é só gritar,
e eu irei correndo para você.
― Eu sei que viria correndo se eu precisasse, mas não preciso, porque
estou mais do que bem ― garanti e toquei o rosto de Tay, com a barba mais
cheia, o que eu estava adorando na hora do sexo oral. Alisei-a com a ponta
dos dedos.
Ele sorriu para mim, adivinhando o que eu estava pensando. Agachou-
se à minha frente e abriu minhas pernas. No dia anterior, eu lhe disse que
adorava o que estava sentindo com sua barba. Ele sorriu e disse que ia
mantê-la assim.
Sacudi a cabeça num pedido para que ele não fizesse o que eu estava
pensando. Tentei fechar as pernas, mas Tay não deixou e as abriu mais.
― Tudo bem, querida ― disse Nilan. ― Como a fazenda vai?
― B-bem... ― Minha voz tremeu assim que Tay puxou a calcinha do
biquíni para baixo e a tirou de mim.
― Não ― falei para Tay, mas sem deixar o som sair da boca.
Ele não disse nada, mas abaixou o rosto, levando-o à minha boceta e
sugando meu clitóris. Tive de reprimir um gemido de puro prazer.
― Você está bem? ― questionou Nilan preocupado.
― Sim...
― Parece estar ofegante ― observou em tom confuso.
― Estou malhando, o exercício é bem pesado... ― Merda! Peguei os
cabelos de Tay e os puxei, mas ele não saiu do lugar, apenas me degustou
mais intensamente.
― Você não precisa fazer essas merdas, seu corpo é perfeito ―
afirmou com orgulho, mas um leve tom amargo. ― Não sabe o tanto de
garotos na escola em que tive de bater, quando diziam que você era quente.
O “quente”, ele acertou em cheio, porque cada uma das minhas células
parecia estar em ebulição.
― Obrigada...
― Escuta, eu soube de um leilão de cavalos que vai ter em Dallas hoje
― avisou.
― Hummm, eu soube. ― Não entendi o motivo de ele ter mencionado
aquilo, mas estava com a mente vaga por causa da boca de Tay em mim, o
que não me deixava pensar direito.
― Bom, providenciei dois ingressos para você. Basta pegar na entrada.
Pode levar a Sabrina. Eu soube que vão ter dois cavalos Árabes lá. Se você
quiser fazer o lance, pode fazer, que eu pago o preço que for.
Pigarreei.
― Obrigada, Nilan, eu... ― comecei a dizer, comovida, mas minha voz
falhou devido a uma língua vagando em mim. ― Preciso ir... ― Desliguei e
gemi, encontrando os olhos de Tay. ― Merda, isso é bom demais, mas fazer
isso enquanto falo com meu irmão é constrangedor.
Ele tirou a boca de mim e sorriu de modo pervertido.
― Caipira, é só pensar que ele não poderá vê-la, nem ninguém. ― Ele
gesticulou ao redor. ― Estamos sozinhos, e você ficou tocando minha barba,
desejando-a entre suas pernas... Estou só realizando seu desejo.
― Quando foi que eu disse que o queria entre minhas pernas? ―
Ofeguei, puxando-o para mim e o beijando com fome.
― Hummm, ontem à noite ― sussurrou nos meus lábios.
Sorri.
― Certo, você venceu. Adoraria ficar a tarde inteira aqui, desfrutando
da natureza, mas... ― Empurrei-o de costas, abaixei seu short e subi nele,
encaixando-me em seu pau duro. Montei nele com as mãos em seu peito, e as
suas vieram para os meus seios, massageando-os e os apertando de forma
enlouquecedora.
― Cristo, essa visão é deslumbrante... ― rosnou ele. ― Rebole em
meu pau, linda.
Fiz o que Taylor me mandou, porque seu tom usado enquanto estávamos
transando era enlouquecedor, e eu adorava cada momento. Não queria perder
aquilo nunca.
Uma sensação de calor entrou em meu peito ao encontrar seus olhos
preciosos iguais ao céu sobre nossas cabeças.
Seus dedos foram até o meu clitóris, induzindo-me a tremer e gemer
com um orgasmo alucinante. Ele veio logo atrás e me puxou para um beijo
quente e selvagem.
― Você me tira o fôlego ― comentei, dando um selinho antes de sair de
cima dele. Olhei minhas coxas molhadas. ― Não usamos camisinha.
Taylor ajeitou seu short e pegou minha parte de baixo do biquíni.
― Bom, você começou a tomar anticoncepcional, então pensei em
parar de usar camisinha e sentir a sua boceta quente apertar o meu pau
quando goza. O calor é sensacional. ― Sorriu, entregando-me a calcinha. ―
A não ser que não acredite que estou só com você. Antes, eu sempre usei
camisinha, então não tenho qualquer doença.
Remexi-me com suas palavras intensas. Ao ouvir sobre doenças, franzi
o cenho.
― Acredito que você não está vendo ninguém, Tay, não é isso, é só que
me esqueço de tomar os comprimidos às vezes. Isso pode causar um efeito
colateral, já imaginou?
― Vou lembrá-la todos os dias, mas, se acontecer, eu estarei aqui para
você, embora queira aproveitar cada segundo antes de termos filhos ―
anunciou, levantando-se e me puxando para a cachoeira. ― Agora vamos dar
um mergulho.
Assenti, ainda de boca aberta por ele querer ficar para sempre ao meu
lado. Cada dia em sua presença comprovava que Taylor cumpriria a
promessa expressa naquela música, que estaria sempre comigo.
Vesti minha calcinha e o fitei; ele estava com os olhos em mim.
― Você é tão linda que eu podia ficar o dia todo olhando para você ―
disse admirado e me puxou para seus braços, beijando a minha boca.
Retribuí e me afastei, meio ofegante.
― Você que é lindo ― afirmei. Nadamos um pouco, então saí da água,
indagando: ― Vamos embora?
― Por que a pressa? ― perguntou enquanto me seguia.
Peguei minhas roupas e as vesti, fitando-o ainda de short e peito nu.
Isso me fazia babar por ele o dia todo, e eu não me cansaria de forma
alguma, aliás, amaria cada segundo. Tay era esplêndido. Quanto mais eu
tinha dele, mais queria ter, nunca era suficiente.
― Adoro esse olhar em seu rosto ― comentou com um sorrio maroto.
Corei.
― Parece que nunca é suficiente estar em seus braços ― falei a
verdade, o que aumentou o seu sorriso. ― Mas tenho um compromisso hoje,
então vamos ter que esperar para aproveitar nossa lua de mel.
Ele riu caloroso.
― Lua de mel, hein? ― Piscou. ― Estou adorando isso.
― Eu também. ― Sorri também.
― Que compromisso é esse, já que estamos no fim de semana? ―
sondou enquanto vestia a camiseta.
― Tem um leilão de cavalos acontecendo hoje aqui em Dallas. Nilan
me disse que comprou dois ingressos. Estou há muito tempo querendo ir para
comprar um cavalo árabe. Já tenho um persa, um andaluz, que é originário da
Espanha, e alguns outros, mas estava louca por um Árabe.
― Você vai a um leilão de cavalos hoje? ― Ele me avaliava. Tinha
algo em seu tom que revelava que algo o estava incomodando. ― Por que
não me falou antes?
― Sim, eu já sabia há alguns dias. ― Franzi o cenho. ― O que foi? Por
que parece estar incomodado com isso?
Ele suspirou.
― Nada.
― Se vamos fazer nosso casamento funcionar, não devemos mentir um
para o outro, porque odeio mentiras ― falei de braços cruzados.
Ele assentiu e respirou fundo.
― Desculpe, você tem razão. ― Aproximou-se e tocou meu rosto. ―
Eu só tinha um jantar planejado para nós dois.
Franzi o cenho.
― Para que horas está marcado o jantar? ― inquiri enquanto passava
os braços à sua volta.
― 7h da noite.
Sorri.
― Bom, podemos ir ao leilão, que será às 4h da tarde, depois jantar.
Isso se você não se incomodar em ficar horas ouvindo todos falarem de
cavalos...
Nós já tínhamos conversado sobre seus hotéis em Dallas. Pela forma
como ele falava, parecia amar aquilo. Eu iria com ele caso tivesse algum
coquetel em seus hotéis e não reclamaria. Entretanto, nem todos gostariam de
ir a um leilão de equinos.
― Acha que eu não iria só por ser um leilão de cavalos? ― perguntou,
e continuou assim que assenti: ― Então me diga uma coisa: quando eu tiver
uma festa ou inauguração de algum hotel, você iria comigo ou isso a
chatearia?
Suspirei.
― Entendo seu ponto, porque eu iria com você, e, se a festa fosse ruim,
a faria ficar interessante. ― Passei o dedo em sua barriga.
Ele sorriu e pegou minha mão, que descia para seu short.
― Então faço o mesmo caso não goste do leilão de cavalos. ― Beijou
minha mão e minha aliança. ― Agora vamos embora.

Chegamos ao local em que seria realizado o leilão, o Haras Dallas.


Seria ao ar livre, o que adorei. O lugar era belo, eu sempre vinha apreciar os
animais de lá.
― Lindo, não acha? ― falei assim que entramos no local.
Tay me olhou de lado.
― A que está se referindo? Ao lugar ou a você? ― Sorriu.
Dei um tapa nele.
― Estou falando do lugar. Sempre venho aqui, mas hoje terão cavalos
que eu adoraria ter e ainda trouxe você comigo, o que torna especial. Só
espero que ninguém dê muitos lances. Não posso usar muito o cartão de
Nilan, e meus fundos de investimentos são poucos, estava guardando para
comprar esse cavalo desde que o vi na internet e soube que eles o
leiloariam. ― Sentei-me ao seu lado em uma fileira de cadeiras. A nossa
ficava debaixo de uma árvore. Nilan pensara em tudo. ― Eu queria um da
raça Clydesdale, escocesa, mas não posso levar os dois, então vou ficar com
o Árabe.
― Por que não pode usar os fundos de investimento de Nilan? Aposto
que ele disse para gastar o valor que desejasse, não é? ― disse folheando o
mostruário com os animais para leilão.
Vi que estava na página do Clydesdale. Aquele cavalo era mágico.
― Ele é originário da Escócia, uma raça de cavalo de tração, com
animais grandes e fortes, muito famosa pelo seu temperamento. São cavalos
muito afetuosos com seus donos. Suas pelagens podem ser zaina, zaina negra,
negra ou tordilha. Esse é negro com pintas brancas nas patas cobertas de
pelos ― falei, passando os dedos na forma de sua crina. ― Seu rabo e crina
são lindos, como os do Árabe.
― Por que não leva os dois? Eles são realmente belos.
― Como eu disse, não gosto de usar muito o dinheiro dos meus irmãos,
só quando acho algum cavalo que me interesse.
Ele sacudiu a cabeça.
― Você é de outro mundo ― murmurou, então prestou atenção quando o
apresentador começou a falar de cada raça do leilão.
― O cavalo Árabe é uma das raças equinas mais antigas, com
evidências arqueológicas que remontam há cerca de 2.500 A.C. Ele se
difundiu pelo mundo mediante a guerra e o comércio, sendo usado também
na melhoria de outras raças. Atualmente, as linhagens árabes são encontradas
em quase todas as raças modernas de cavalos de montaria. Conhecido
também como Puro-Sangue Árabe, é utilizado principalmente em esportes
equestres olímpicos, em que apresenta desempenho superior a outras raças.
A cauda, como podem ver ― o cara do leilão apontou para o cavalo no
cercado andando como se fosse um modelo de passarela ―, é alta, e o
formato da cabeça faz dessa raça única no mundo dos cavalos e a mais cara
no mercado mundial. Os animais que temos hoje são premiados, por isso seu
lance inicial é de cinquenta mil.
Tinham muitos cavalos lindos e arrebatadores, mas os que eu queria
eram dois, então dei os meus lances, mas, quando chegaram a quinhentos mil
dólares, eu estava desanimada, porque era uma quantia muito alta para usar o
cartão de Nilan e o que eu tinha na minha conta.
― Merda, isso é muito dinheiro ― reclamei baixinho. ― Não vou
poder levá-lo.
Um cara de outra cidade do Texas, James Blod, estava quase
arrematando o meu Árabe. Ele era o que dava mais lances. Com certeza
estava querendo o animal para esportes olímpicos ou coisa do tipo.
― Oitocentos mil dólares ― disse Tay ao meu lado, fazendo-me
ofegar.
Fitei-o com os olhos arregalados, e ele estava sorrindo.
― Tay... ― comecei, mas o cara do leilão gritou “vendido!” para ele.
― Bom, agora você tem um cavalo Árabe campeão ― disse ainda
sorrindo.
― Eu não posso aceitar.
Sua expressão linda desmoronou.
― Por que não? Você aceitou o Corcel Negro de Shade, mas não pode
aceitar o Árabe de mim? ― Tinha algo em seu tom que apertava meu peito.
― Aceitou o presente dele, por que não pode aceitar o que estou dando a
você? Afinal de contas, eu sou seu marido, ele não.
Foi por isso que ele ficou calado quando eu mencionei sobre Shade ter
me dado o Corcel Negro? Com certeza estava pensando que eu o recebera
apenas porque amava Shade, mas isso não era verdade.
― Tudo bem, apesar de que, quando aceitei o Corcel Negro, foi porque
eu não tinha opção, não podia deixá-lo morrer ― comentei e peguei sua
mão, alisando sua aliança. ― Vai te fazer feliz me dar o cavalo de presente?
Ele sorriu tão brilhante e lindo quanto o Sol de fim de tarde.
― Excepcionalmente. ― Beijou meu rosto. ― Só quero que aceite algo
meu também.
― Obrigada.

― Ainda está com raiva? ― perguntou Taylor assim que nos sentamos
no restaurante Dallas Hills. Ele era cercado de vidro, com toalhas de linho
fino, com certeza caro.
Fuzilei-o.
― Não queria que eu ficasse? Você comprou dois cavalos que custaram
cerca de oitocentos mil cada, e nem gosta de cavalos!
― É claro que gosto, só não sou apaixonado por eles como você, que
concordou em receber o Árabe...
― Sim, eu o aceitei para deixá-lo feliz, porque gosto de vê-lo assim,
mas não dois, pois isso é loucura! ― reclamei.
Ele suspirou.
― Vamos fazer o seguinte: já que gosta de me ver feliz, você vai fazer
isso por mim, receber só o Árabe. E, quanto ao Clydesdale...
― O escocês ― rosnei. ― O que tem ele?
Taylor sorriu.
― Já deu nome para o meu cavalo? ― Seu tom parecia alegre. ― Ele é
meu, mas vou deixá-lo na sua fazenda, já que só tenho hotéis. O que acha?
Pensei nisso por um segundo.
― Então você comprou um cavalo para você, mas vai deixá-lo na
minha fazenda?
― Sim, você toma conta dele, já que não entendo de cavalos.
― Tenho Pietro, o veterinário e adestrador da fazenda. Ele trabalha lá
desde que eu era criança e cuida muito bem dos meus cavalos. Eu aceito,
mas você não vai vendê-lo depois, porque me apego fácil.
― Eu juro. ― Ele sorriu e enfiou a mão nos meus cabelos, puxando o
meu rosto para o dele e me beijando com fome, tanto que me esqueci de onde
estávamos.
Percebi que, de qualquer forma, havia ganhado dois cavalos, e tudo por
Tay ter me dado ambos. Ele não ia querer algo de que não entendia e pelo
qual não era apaixonado como eu. Um trapaceiro e tanto; no final das contas,
tinha o que queria desde o princípio. E eu também, porque amava seu
sorriso.
Capítulo nove
TAYLOR
Acordei com um fogo, um calor tomando conta de mim, lábios gostosos
me sugando e me fazendo gemer.
Abri os olhos e olhei para baixo para me deparar com uma visão a qual
jamais iria esquecer na minha vida. Eu já havia tido boquetes antes, mas,
porra, uma visão igual àquela, nunca!
― Puta que pariu!
Os lábios de Laurel estavam em volta do meu pau, chupando-o,
lambendo-o como se ela estivesse faminta. Uma de suas mãos estava ao
redor do meu pênis, na porção que ela não conseguia colocar na boca.
― Porra, adoraria ter uma câmera para filmar isso! Nunca vi nada mais
lindo!
Sua respiração acelerou, e seus olhos me fitaram tão quentes e famintos
que meu peito parecia querer explodir. Estava doido por aquela mulher
magnífica. Sorte minha que ela estava sentindo o mesmo. Esperava que ela
logo se apaixonasse por mim e esquecesse Shade completamente. Estava
ansioso por isso.
Dois meses antes, eu havia acordado à noite após ter um pesadelo com
ela me deixando, então olhei para o lado e a vi ali toda linda, adormecida.
Foi quando me deu vontade de cantar. Fazia anos que eu não tocava em um
violão, desde que minha mãe falecera.
Aquela música descrevia o que eu sentia naquele momento, mas não
achei que Lau estivesse ouvindo, apesar de que fiquei feliz por isso. Aqueles
dois meses com ela foram tudo de bom, aproveitamos cada segundo. Era
como se estivéssemos tendo nossa lua de mel na fazenda.
Nunca na minha vida eu quis ter um sentimento assim por uma mulher.
Ela veio e arrebatou meu mundo de tal forma que eu não conseguiria sair
daquela história sem me machucar e sem também machucá-la. Com certeza
eu faria de tudo para que isso não acontecesse. Precisava conquistá-la,
depois diria a verdade a ela, porque, se Laurel descobrisse que Shade me
pedira para vir tomar conta dela e depois convencê-la a vender a fazenda,
ela não entenderia, embora não fosse por isso que eu estava com ela. A
mulher conquistava todos por onde passava sem ao menos fazer esforço.
Expulsei os pensamentos ruins; lidaria com eles mais tarde, só queria
aproveitar o que tinha em mãos, mesmo que precisasse usar meu corpo e meu
charme para conquistá-la e ter somente a mim em seu coração e em sua
mente.
Peguei seus cabelos em minhas mãos, mas não a forcei a ir mais fundo.
Amava a sensação de tê-la chupando meu pau.
― Eu vou gozar nessa boquinha linda, caipira... ― anunciei, porque era
incapaz de me afastar. Eu era como um viciado, aquela mulher era meu
maldito vício, um muito bom, que eu adoraria ter para sempre.
Ela gemeu e acelerou mais os movimentos. Então fechei meus olhos e
me liberei com um grunhido feroz saindo do peito. Assim que gozei em sua
boca, puxei-a para se deitar de costas e fiquei em cima dela.
― Bom dia. ― Sorriu com o rosto corado. ― Vou ter mais prática a
cada dia.
― Você é linda! ― Beijei sua boca. ― Adoraria acordar sempre
assim.
― Então é ótimo que sejamos casados, não acha? ― disse com um
sorriso.
Esse sorriso doce me deixava todo mole. Adorava vê-la sorrir e pensar
em nosso casamento. Para ela, no começo foi um negócio, mas, dentro
daqueles dois meses em que estávamos juntos, percebi que ela estava
levando nosso casamento a sério, como eu gostaria que fizesse. Porque,
desde o início, eu o considerava assim, verdadeiro, como os meus
sentimentos por ela.
― Sim, é ótimo. Então agora vamos tomar banho e cuidar da lida. ―
Beijei seus lábios. ― Mas, antes, vou fodê-la no banheiro.
― Estou contando com isso ― respondeu se levantando da cama, nua.
A cada dia, Laurel perdia mais a vergonha comigo, embora sempre
enrubescesse quando eu olhava para ela.
Acariciei sua tatuagem linda de âncora, que eu mesmo fiz.
― Tão linda... ― comentei.
― Ainda bem que tenho um tatuador lindo e sexy para o caso de eu
desejar fazer outra, não é? ― falou me olhando de soslaio.
Sorri.
― Lindo e sexy? ― Puxei-a para os meus braços e a beijei.
Entramos no chuveiro, e a coloquei sentada sobre a enorme bancada da
pia. O banheiro era grande, com banheira de mármore da cor de areia da
praia.
Inclinei-me na sua frente e abri suas pernas, desfrutando da vista, a qual
eu já amava, lábios rosados e brilhantes de excitação.
― Tay...! ― clamou com um gemido.
― Uma visão linda, caipira, e só eu tenho a sorte de ter visto isso ―
rosnei e coloquei meus lábios naquela perfeição, lambendo, degustando.
Tomei seu broto rosa e o chupei.
― Porra, isso é tão bom! ― gritou ela, pegando minha cabeça e a
puxando mais contra si.
Dei mais a ela, conforme a sua necessidade, e a minha também, de certa
forma, porque adorava chupar sua boceta deliciosa.
Lau era uma mulher que não se envergonhava fácil, não na hora do sexo.
Em outras horas, ela até corava, mas não quando estava excitada. Eu amava
vê-la assim, eufórica e faminta.
Laurel explodiu na minha boca, e a degustei até ela parar de tremer,
depois a beijei e enfiei meu pau em sua entrada. Suas unhas entravam em
minha pele, apertando-me mais contra seu corpo.
― Mais forte! ― gritou em minha boca.
Grunhi e a fodi com mais vigor. Puxei seus cabelos, levando sua cabeça
para trás, e meus lábios foram para sua garganta.
― Vamos, minha caipira, goza para mim... ― rosnei, apertando mais
sua bunda e a trazendo para a borda, entrando mais fundo nela, tanto que
estava na porra das nuvens em questão de segundos. ― Puta merda! Você me
deixa louco! ― Respirei com dificuldade após termos gozado.
― Fico feliz com isso ― respondeu ela, dando-me um selinho. ―
Agora preciso falar com Rick e dizer o que precisa fazer com Bec e meus
outros cavalos, incluindo os que ganhei de você.
Estreitei os olhos. Os cavalos tinham chegado havia alguns dias.
― Rick?
― Sim, o filho de Pietro. Ele me ligou e disse que precisava viajar,
mas que seu filho viria no lugar. Ele também é veterinário e adestrador,
como o pai.
Tomamos banho juntos e nos vestimos. Ela saiu para receber Rick, e eu
fui atender uma ligação importante. Depois iria acompanhá-la aos estábulos.
― Onde você está? ― perguntou Lucky, meu melhor amigo, ou um
deles, além de meu chefe. ― Ouvi o recado de que não trabalharia por um
mês... mas já passa de dois meses, e você não retornou.
― Acredito que não irei tão cedo ― respondi, entrando na varanda da
casa e olhando para a cachoeira. Não aquela na qual ficamos no dia do
leilão, essa era mais em cima, uma cascata, na verdade. Ao redor tinham
bastantes árvores, tornando o lugar um paraíso, bem diferente da fervorosa
Nova Iorque – quer dizer, exceto pelo Central Park.
― Você está ferrado, sabe disso, não é? ― comentou com um sorriso
na voz.
Quando falei o que ia fazer para ele e Ryan, seu irmão, os dois quase se
mataram de tanto rir, mas não liguei muito. Todos sabiam o quanto os Kings
protegiam sua irmã. Eu estava ferrado, sim, mas não ligava, porque minha
vontade de ficar com Laurel superava tudo em minha vida, até levar uma
surra dos meus amigos, e, então, cunhados.
― Só para saber, quando os irmãos Kings forem decapitar você, estarei
ao seu lado, e poderemos enfrentar os três juntos ― informou.
Revirei os olhos. Ele sempre protegeria minhas costas, assim como eu,
as dele.
― Vou ter que passar por isso sozinho, mas não me arrependo de nada.
Nunca me senti assim na minha vida, até conhecê-la ― confessei, passando
as mãos nos cabelos. ― Porra! Estou ferrado...
Ele riu.
― Sim, está ― concordou entre risadas. ― Nem acredito que foi
fisgado, porra! Isso merece fogos de artifício e rojões.
― Muito engraçado ― rosnei. Não lamentava ter me apaixonado por
Laurel. O que estava me deixando inquieto era que, quando eu dizia que a
amava, ela não falava de volta.
― Em breve vamos comemorar o aniversário de Shaw. Você virá, não
é? Traga a garota se quiser; aposto que Angelina vai ficar louca ao conhecê-
la.
O bastardo ainda estava rindo e gozando à minha custa, provavelmente
se lembrando da aposta da cunhada.
― Sim, eu vou. Como está minha florzinha linda? ― perguntei,
mudando de assunto.
Beatriz era sua filha, uma garotinha esperta e fofa. Eu adorava ficar
com ela e com Victoria, a filha de Angelina e Ryan, mas o bastardo era muito
ciumento com sua filha, tanto que mal deixava as pessoas a pegarem.
Eu via meus amigos cercados de sua família e filhos. No princípio, não
queria algo assim para mim, mas, após conhecer Lau, percebi que o que
estava faltando na minha vida era isso, uma família que eu pudesse chamar
de minha, filhos que me chamariam de papai.
Olhei para o estábulo e vi Laurel do lado de fora, perto de uma égua
com crina loura. Bec, foi assim que ela me apresentou o animal. Na hora eu
ri, porque foi com a crina dessa égua que ela comparou meu cabelo quando
nos conhecemos. Definitivamente, o animal era lindo, com crina longa e
dourada.
Laurel estava de short jeans e botas de caubói e uma camisa xadrez
dobrada e amarrada no meio dos seios, deixando sua barriga linda exposta.
Seus cabelos estavam amarrados em um rabo de cavalo. Linda!
― Divina. Olhando para ela agora, eu agradeço a todos os santos... ―
respondeu Lucky à minha pergunta sobre Beatriz.
― Você não acredita em santos ― destaquei, sorrindo ao ver minha
garota penteando a crina da égua.
― É verdade, mas, seja quem for que me enviou a minha Rosa
Vermelha, eu agradeço; através dela sou completamente feliz e completo,
com nossa filha linda, a qual amo demais. ― Seu tom era orgulhoso.
― Fico feliz por você, cara. Quando um dia poderíamos pensar que
estaríamos assim, dominados por uma mulher? Que você e Ryan fossem
domados...
― Você também, não se esqueça disso ― lembrou-me.
― É verdade.
Ele suspirou.
― Mas tem certeza de que vai investir nela, quando ama outro cara? O
irmão?
Esfreguei minha têmpora. Era o medo que eu sentia a cada dia. Sabia
que Laurel gostava de mim, mas não tinha certeza se tinha esquecido Shade.
Queria que somente eu estivesse em seu coração.
― É um risco, eu sei, mas sinto que ela gosta de mim. Nesses dois
meses em que estamos juntos, foram raras as vezes em que a peguei sozinha
e pensativa, embora, quando isso acontecia, eu ficava imaginando se ela
estava pensando nele... Isso é uma maldita droga.
― Precisa resolver essa merda, Jordan. Isso não pode continuar assim.
Você a ama ou apenas gosta dela?
Continuei observando-a sorrir para sua égua, louco para tê-la de novo,
sentir seu corpo embaixo do meu e gemendo por mais. Não podia imaginar
alguém tocando-a da forma como eu fazia, na verdade, não queria que
ninguém a tocasse de forma alguma. Eu era capaz de acabar com qualquer
um que tentasse.
― Acho que esse silêncio prova que a ama. Pense bem, cara, mentiras
sempre são reveladas do jeito errado, nunca vêm como esperamos.
― Não estou mentindo para ela, só omitindo algumas coisas. Ela odeia
homens mulherengos. Acredito que ela só queria Shade porque, dos três
irmãos, ele é o mais quieto. Bem, e o único que não é de sangue. ― Suspirei.
― Se ela souber quantas mulheres tive, não quero nem pensar. Porra, nem eu
sei a soma. Imagina o que ela pensaria?
― Nessas horas é que lamentamos por ter ficado com tantas mulheres.
Mas ela tem que entender que isso faz parte do seu passado. Imagino que,
depois que a conheceu, não ficou com mais ninguém, não é?
― Sim, mas não sei como vou dizer a ela. Talvez eu a leve para jantar
esse fim de semana, assim revelo a verdade. ― Eu só torcia para que, no
final, ela me quisesse como eu a queria, porque não podia ficar longe dela
de forma alguma.
― Tenho um negócio para fechar em Dallas. Podemos nos encontrar no
seu hotel mais tarde.
― Se precisar de mim qualquer dia para fechar negócios, pode contar
comigo. Eu também tenho um lugar em que estou de olho para comprar e
fazer um hotel. Não vai acreditar, mas o local é mágico.
― Dallas é uma cidade linda ― concordou. ― Se precisar de mim,
estou aqui para qualquer coisa.
― Eu sei, cara, valeu. Encontro você no hotel mais tarde ― despedi-
me e desliguei.
Olhei para a caipira e a vi tão animada e alegre, bem diferente de
quando a conheci, tão triste e bêbada, mas ainda deslumbrante. Ela era
alguém que eu iria manter e enfrentaria a todos por isso.
Havia dois caras olhando para a minha garota, mas quem não olharia?
Um era Rick, e o outro estava ao lado dele. Ambos eram jovens, da minha
idade mais ou menos, um moreno e outro loiro, eu só não sabia quem era
quem. Lau não parecia perceber o que causava nos homens ao seu redor. Ela
me lembrava muito Angelina. A mulher era uma tremenda gata, mas não via
isso.
Fui na direção deles assim que um dos caras chegou mais perto de
Laurel.
― Ela parece estar se divertindo ― disse o homem olhando para a
égua.
Lau sorriu para ele.
― Sim, ela me ama. ― Voltou sua atenção para o animal. ― Bec é
linda.
― Sim, ela é ― ele concordou, mas olhando para minha mulher. ―
Escuta, eu queria saber se você quer jantar lá em casa hoje. Mamãe está
sentindo sua falta.
Fechei a cara.
― O que está acontecendo? ― perguntei com voz de aço.
Ela me olhou e sorriu tão deslumbrante que amenizou um pouco a minha
raiva, dirigida àquele cara por usar sua mãe para fazer minha mulher ir
comer na casa dele.
― Oi, Taylor, esse é Rick, aquele de quem te falei ― apresentou ela,
olhando nós dois e depois o loiro. ― Aquele é Scott. Rick, esse é Taylor...
um amigo meu.
Olhei para ela, que alisava o cavalo, e notei que sua mão direita estava
sem a aliança. Senti como se minha alma se partisse. Nunca havia sentido
algo como o que senti naquele instante.
― Seu “amigo”? ― Meu tom foi duro ao pronunciar a palavra. Porra!
Aquela palavra parecia ter um maldito veneno, que me rasgava por dentro.
Até aquele dia eu nunca havia pensado nas garotas com quem fiquei,
embora todas não tivessem passado de uma foda fácil. Eu não me lembrava
de ter almejado algo mais com alguma delas. Se quis, não liguei na época.
Perguntei-me se elas sentiam a mesma decepção que eu estava sentindo.
Usado, era como eu me sentia no momento.
O sorriso lindo de Laurel morreu.
― Tay...
― Então, durante todo esse tempo em que estamos juntos, não passei de
um amigo? ― Pronunciar aquela pergunta era como se brasas vivas
ardessem em minha garganta.
Ela se encolheu.
― Eu...
Ri amargo.
― Não acredito nessa porra! ― Tirei o anel do meu dedo e peguei sua
mão, colocando-o em sua palma. ― Bom, já que somos apenas isso durante
esse tempo todo, não precisamos de aliança, não é? Faça um bom proveito.
Porque eu não quero ser seu amigo.
Virei as costas e saí de lá antes que perdesse minha fodida mente,
embora a única coisa perdida fosse meu coração.
Capítulo dez

LAUREL
Passaram-se alguns minutos após Tay sair da fazenda usando seu
Mercedes. Meu peito estava doendo tanto que achei que estava faltando ar
em meus pulmões ou que eles estivessem com defeito.
― Algo está acontecendo entre vocês além da amizade, não é? ― Não
era uma pergunta de Rick. ― Posso ver que você o ama devido às lágrimas
que estão descendo pela sua face. Papai mencionou que estava namorando,
mas, pela aliança que ele te deu, vocês se casaram. Por que não soubemos
disso? ― Rick sempre foi um bom amigo, éramos assim desde crianças.
Nem notei que estava chorando, apenas segurei firme a aliança. Quando
tirara a minha mais cedo antes de ir ao estábulo, foi porque precisava falar
com as pessoas primeiro, com meus amigos, antes de eles virem a aliança de
casamento, porque alguns podiam contar aos meus irmãos antes que eu
falasse com eles. Todos na fazenda sabiam que eu estava namorando, mas
não casada. Jamais esconderia meu relacionamento com Taylor porque
sentia que éramos amigos. Ele era mais do que isso, a dor em meu peito
comprovava. Tay devia ter me deixado explicar as coisas antes de ter
partido.
― É complicado, mas agora preciso ir ― respondi. ― Depois conto
tudo com calma.
Fui para casa e fiquei esperando algumas horas para ver se Taylor
voltava, mas não apareceu. Eu o teria perdido de vez? De repente me
lembrei da música que ele havia cantado e do seu medo. Eu tinha jurado que
nunca o machucaria, mas fiz aquilo naquela manhã.
Eu já sentira dor profunda quando vi Shade com outras mulheres e
durante o seu matrimônio, mas nada igual ao que estava sentindo. Dois meses
com Taylor, e já sentia que o amava, mais do que um dia havia amado
alguém.
Meu telefone tocou enquanto eu estava de saída. Precisava falar com
Sabrina, pedir algum conselho sobre como fazer para encontrar Taylor, já
que ele se recusava a atender seu telefone.
― A-alô? ― atendi sem olhar, mas minha voz estava falha devido ao
choro.
― Laurel? O que minha bambina tem? Parece que está chorando ―
disse vovó.
Vovó morava em Dallas, do outro lado da cidade, em uma fazenda onde
plantava suas ervas medicinais, que vendia para as pessoas, como também
dava para aqueles que não tinham como comprar seus remédios naturais,
que, por sinal, eram excelentes.
Xinguei-me por dentro por não verificar no visor o nome de quem
estava ligando. Eu ia quase todo fim de semana à casa de vovó, ela até
conheceu Tay, mas não fez perguntas quando eu o levei lá, o que era bem
estranho, já que ela era pior do que uma casamenteira. Na visão da vovó,
seus netos deveriam estar casados antes dos 20 anos.
― Só estou gripada...
― Não me venha com essa, conheço quando você está chorando. Diga
o que houve. Pensei que estivesse bem com aquele seu namorado lindo, que
veio me visitar semana passada.
Não sei o motivo de ter dito isso a vovó, apenas soltei do nada:
― Eu me casei com Taylor em Las Vegas no dia do casamento de
Shade... Ele não é meu namorado, mas sim meu marido.
Ela gritou do outro lado da linha, e tive que afastar o aparelho da
orelha.
― O quê?! Como assim você se casou?! ― Ouvi o barulho de uma TV
sendo desligada. ― Menina, então, quando vieram aqui, vocês tiraram as
alianças?
― Quer me deixar surda? ― Entrei em meu carro conversando com
ela, coloquei no viva voz e dirigi para a cidade. ― Tive um desentendimento
com Tay.
― Quem é esse cara? Algum impostor querendo seus bens? Por que
razão ele se casou com você no primeiro dia em que a conheceu? ― Ela
suspirou. ― Ele pareceu ser boa gente.
― Vovó, não tenho bens, só a fazenda. E não é isso, eu que dei mancada
e o magoei, então ele foi embora. ― Contei-lhe tudo o que aconteceu entre
mim e Tay desde Vegas até o momento, só não dei detalhes do sexo, porque
isso não importava para ela.
― Me deixe ver se entendi: você se casou há dois meses pensando ser
um casamento de uma noite só e foi embora, mas ele bateu na sua porta, e
você decidiu ficar com ele. Você não tinha certeza de que amava seu marido
até ele deixá-la porque não gostou da forma como você se referiu a ele,
como amigo. Você não notou que ele estava com ciúmes do Rick ou algo
assim? Porque aquele garoto está louco para entrar em sua calcinha.
― Ele não está, além disso, nós somos amigos desde crianças. Não tive
a intenção de magoar Tay ao dizer que somos amigos. Eu não estava
pensando na hora. Sou uma idiota.
― Você é uma idiota ― concordou vovó.
― Vovó, era para a senhora estar do meu lado ― retruquei.
― Ficar do seu lado significa que estou do lado errado. Esse cara
parece gostar realmente de você pela forma que a olha, então me diz: você
teve alguma intenção de magoá-lo?
― Não, mas...
― Se ele amar você, vai perdoá-la pela mancada que deu. ― Ela
suspirou. ― Você está apaixonada por ele? Por que razão se casaria com um
homem sem conhecê-lo? E por que não me contou?
Vovó não sabia que eu amava Shade. De minha família, apenas Nilan e,
agora, Taylor sabiam. Esperava que continuasse assim.
― Quando estou com Tay, me sinto alguém que nunca fui antes, me sinto
viva, sabe? Como se eu quisesse gritar e cantar para o mundo que ele é meu
marido e que estar ao lado dele me enche de luz e paz. Sinto vontade de ficar
sempre ao seu lado. ― Limpei meus olhos. ― O que vou fazer se ele não me
perdoar?
― Você teve alguma intenção de magoá-lo? ― repetiu a pergunta, e
respondeu antes que eu dissesse algo: ― Não, então não pense nisso, e, pela
forma como falou, você o ama, querida. Até pensou em cantar! Apenas
precisa dizer a verdade a ele.
Eu não cantava mais desde que minha mãe morreu, sua partida precoce
até tirou a minha vontade de me entregar realmente à vida e deixar as coisas
acontecerem. Entretanto, com Tay, a minha vontade de pegar o violão e
deixar minha voz sair e gritar para todos que eu conhecia era imensa. Eu
queria realizar meus sonhos. Queria meu haras para cuidar dos cavalos, vê-
los galopando por todos os lugares, desenhar projetos e vê-los sendo
concretizados, como o de uma pousada perto do horas. Contudo, o mais
importante: eu queria isso com Tay na minha vida. Realizar tudo isso com
ele ao meu lado.
― Vou ver se o encontro na cidade. Tay me disse que possui negócios
aqui, então... ― Minha voz falhou, com medo de ele não querer me
desculpar.
― Não precisa temer, se ele realmente gostar de você, vai aceitar suas
desculpas; se não, depois acabo com ele por tocar em minha menina.
Ri.
― Obrigada, vovó ― sussurrei, entrando na cidade. ― Depois ligo de
volta. Não conta aos meus irmãos o que fiz, porque eles vão acabar com uma
úlcera, principalmente Nilan e Gave.
― De qualquer forma, mais cedo ou mais tarde, eles vão saber de tudo,
querida.
Suspirei.
― Eu sei, mas quero lhes contar pessoalmente e não por telefone, e eles
estão fazendo show neste momento, não quero atrapalhar o trabalho deles ―
disse, depois perguntei: ― Como acho uma pessoa em uma cidade deste
tamanho? Porque, em todo esse tempo, só fui com ele a um haras e um
restaurante, nem mesmo procurei saber mais profundamente sobre seus
negócios. Eu sou uma aberração de esposa.
Tay havia me falado sobre seus hotéis, mas eu não perguntei o nome de
nenhum deles. Como fui tola assim?, perguntei-me. Devia dar mais atenção
aos seus negócios.
― Você não se interessa por dinheiro. Amo isso em você, mas se
preocupar ou querer saber dos negócios do seu marido não vai fazer de você
uma interesseira, querida ― comentou vovó. ― Ele disse que é dono de um
hotel aqui, então geralmente a maioria coloca o sobrenome ou algo assim.
Estava no Centro e vi um hotel luxuoso com o nome Johnson Hotel.
― Acho que achei, vovó, e devo dizer que o lugar é bem chique, feito
só para celebridades ou algo assim. ― Minha boca estava aberta em choque.
― Acho que ele deve ter mais dinheiro do que meus irmãos juntos, ou
empata.
― Vá lá, garota. Qualquer coisa, eu estarei aqui para você! ― afirmou
com ferocidade. ― Amo você.
― Eu também, vovó ― respondi e encerrei a ligação. Desliguei o carro
e saí.
Nunca tinha me sentido tão nervosa e com medo na vida. Queria tanto
que Taylor estivesse ali e me perdoasse...
O hotel era cercado por vidro de cima a baixo. Tudo gritava luxo. Eu
não tinha a mínima ideia se conseguiria falar com Tay, porque com certeza o
local era cheio de seguranças.
Fui à recepção e vi um casal elegante perto do balcão. A mulher tinha
olhos parecidos com os de um lobo, pele branca e cabelos negros. O cara ao
seu lado não ficava atrás, um moreno de olhos verdes intensos e um sorriso
sexy dirigido à linda garota ao seu lado.
A recepcionista, uma loira linda, atendia o casal.
― Ele disse que já vai descer ― falou.
― Tudo bem, obrigada ― disse a mulher, que se sentou num sofá no
salão, ao lado do cara – imaginei que fosse seu marido, já que os dois
estavam juntos.
Aproximei-me do balcão.
― O-oi ― Minha voz estava fraca, então pigarreei para falar um pouco
mais alto: ― Oi.
― Pois não? ― A loira piscou. ― Você não é a irmã dos irmãos da
banda King?
Droga! Eu não queria ser reconhecida, mas talvez isso me ajudasse a
conseguir descobrir se Taylor estava ali.
― Sim ― respondi sorrindo. ― Você é fã deles?
Ela fez uma careta.
― Nem de longe ― respondeu em tom amargo.
Pisquei, surpresa.
― Oh, meu Deus, você é alguma de suas ex-namoradas? ― fui incapaz
de não perguntar, embora nenhum deles tivesse namorada, apenas ficantes.
Aquela mulher não parecia ser alguém que apenas ficasse sem compromisso.
― Namorada? Algum dia algum deles já namorou? ― Bufou. ― Não
sei como o mais velho se casou. ― Ela sorriu baixinho e piscou para mim.
― Eu sei que eles são seus irmãos, mas jamais ficaria com algum deles,
prefiro entrar em um convento e me tornar freira ou me tornar lésbica.
Ri alto. A garota era engraçada.
― Gostaria de dizer isso ao Nilan, aposto que não seria nada bom para
seu ego enorme. Como me conhece como irmã deles? Geralmente quem sabe
disso são os fãs deles, que xeretam tudo. ― Pensei em algumas ocasiões em
que algo assim aconteceu.
― Minha irmã faz aniversário mês que vem. Ela é fã deles, então estou
tentando conseguir que ela os conheça pessoalmente em um dos shows que
terão na região durante o próximo mês.
― Eu vou conseguir os ingressos para você ― falei, embora não
soubesse como; nunca havia pedido algo assim aos meus irmãos, mas
acreditei que eles me dariam.
― Yup! ― gritou ela batendo palmas. ― Ela ficará feliz com isso.
― Você está aqui para trabalhar e não para conversar ― rosnou uma
voz conhecida atrás de mim, parecendo muito irritada. ― Se não quiser ser
demitida, sugiro que faça seu trabalho.
Olhei para Taylor, sem acreditar na forma com que ele falava com a
menina. Até me esqueci do motivo de estar ali, porque fiquei com raiva pela
grosseria dele.
― Você não pode falar com ela assim ― grunhi com os punhos
cerrados.
Tay arqueou as sobrancelhas para mim.
― Não? Ela é minha funcionária ― destacou ele. Pelo visto, ainda
estava com raiva.
― Isso não lhe dá o direito de falar assim com a garota ― rebati e
olhei para ela. ― Se você quiser se demitir ou se ele o fizer, venha trabalhar
para mim.
― Hum-hum. ― Ela pigarreou, olhando entre mim e Taylor. ― Só por
curiosidade, o que eu faria para você?
Sorri.
― Vou montar um haras e vou precisar de uma secretária como você,
extrovertida e boa no que faz. ― Fuzilei Tay. ― Se seu patrão não te dá
valor, eu garanto que darei.
Ele estreitou os olhos, mas tinha um brilho ali que não entendi.
― Quando decidiu montar o haras? ― Seu tom era de surpresa.
― Neste momento. ― Pigarreei, sentindo-me nervosa.
Eu já sonhava em ter um haras, ele sabia disso, mas nunca arrecadara
dinheiro suficiente para isso. Meus irmãos ajudariam, mas eu não queria o
auxílio financeiro deles. Parecia idiotice, mas eu desejava fazer aquilo
sozinha. De fato, não havia lutado o bastante para conseguir antes.
Ele piscou.
― Você vai montar um haras, uma coisa que sempre sonhou, porém, que
nunca fez, e decidiu fazer hoje apenas para dar emprego à minha funcionária
e roubá-la de mim? ― Eu não sabia se tinha humor ou incredulidade em seu
tom.
― Sim ― respondi, mexendo em meus cabelos, ansiosa.
Notei que sua atenção estava em nossas alianças em meus dedos.
Colocara as duas ali, era como ficar ao lado dele e tê-lo por perto mesmo
que estivesse longe.
― Como me descobriu aqui? Nesses dois meses, você nunca se
interessou em conhecer o hotel.
Nesse ponto, ele tinha razão. Eu teria que me redimir e ser uma esposa
melhor.
― Na verdade, foi por acaso, estava te caçando, mas a cidade é imensa
para achar alguém, então, falando com a vovó, ela me disse que, na maioria
das vezes, as pessoas usam o próprio sobrenome para nomear suas
empresas, então passei por esse hotel, vi o nome dele, então entrei ― eu
falava sem parar, nervosa, e apontei para a secretária. ― Entrei aqui e
conheci, hummm... qual seu nome mesmo?
― Brittany Wolf ― ela respondeu.
Tay riu, a risada que eu amava.
― Convidou minha recepcionista para trabalhar para você e nem sabe
o nome dela? ― criticou.
Dei de ombros.
― Ela é legal e não está a fim dos meus irmãos, o que é um milagre.
Então não devo me preocupar que esteja fingindo ser minha amiga para
tentar fisgar um deles.
― Oh, meu Deus! Isso já aconteceu? ― indagou Brittany e olhou para
Taylor. ― Desculpe.
― Um par de vezes, mas eles têm regras que incluem não ficar com
minhas amigas, então elas caíram do cavalo e foram embora depois que
souberam que não iam conseguir nada. ― Dei de ombros, fingindo que isso
não havia me machucado na época.
Taylor me puxou um pouco para longe do balcão, provavelmente para
conversarmos em particular. Senti seus dedos no meu queixo, que ele
levantou para meu olhar colidir com o seu. Suas íris estavam ternas e puras,
além de expressarem um sentimento que não consegui identificar.
― Por que veio me procurar? ― Seu hálito quente banhou meu rosto.
― Queria me desculpar. Não queria dizer aquilo daquela forma. Só
pensei em dizer a todos primeiro, afinal de contas, eles são meus amigos...
― sussurrei com os olhos úmidos.
― O cara...
― Rick? Somos amigos desde crianças... ― comecei, mas ele me
cortou como se tivesse um gosto amargo na boca:
― Ele quer entrar em suas calças e gosta de você, mas não como
amigo.
― Eu gosto dele como um irmão. ― Mordi o lábio. ― Lamento pelo
que disse.
Ele me abraçou, beijando minha cabeça. Escorei meu rosto em seu
peito e o apertei forte, sentindo seu cheiro, que tanto amava. Nos seus
braços, senti-me confortada e ansiando por mais daquele homem.
― Não quero sentir de novo o que senti quando foi embora ―
sussurrei.
Seus braços se estreitaram em minha cintura.
― O que sentiu? ― Sua voz estava rouca.
― Como se meu coração estivesse se partindo ao meio, e um medo que
nunca senti antes... ― Minha voz falhou no final.
Ele se afastou, então temi que fosse me afastar para sempre. No entanto,
estava sorrindo e levantou sua mão direita.
― Acho que você está com algo que é meu ― falou ainda sorrindo. ―
Quero de volta. Agora vamos jurar que, por mais que briguemos, não vamos
tirá-las de nossos dedos por motivo nenhum.
Sorri, com meu coração batendo em ritmo normal de novo. Peguei o seu
anel, que estava meio frouxo no meu dedo, e o coloquei em sua mão
estendida.
― Sim, eu prometo. ― Joguei meus braços em seu pescoço e o beijei,
esquecendo-me do lugar e de todos à minha volta.
― Será que vou ter que encomendar seu caixão quando os irmãos dela
descobrirem que vocês se casaram em Vegas? ― sondou uma voz divertida
perto de nós.
Foi quando fui trazida de volta para o hotel. Parei de beijar Tay e olhei
para o casal que estava ali desde quando cheguei. Eles se aproximavam de
nós.
― Não seja estraga-prazeres ― disse a mulher, dando um tapinha em
seu peito de leve. ― Estou mais do que feliz por ele ter se apaixonado e
casado.
Taylor sorriu com doçura para a mulher.
― Obrigado, Sam. Esses são meus amigos, Samantha e Lucky Donovan
― apresentou-os a mim, em seguida disse a eles: ― Essa é Laurel. Vocês já
devem saber quem é, já que conhecem os irmãos dela, da banda King.
― Na verdade, não sei quem são eles... ― começou Sam, mas se
interrompeu: ― Espera, esses da banda King são os mesmos que vi na boate
do Alex? ― Olhou para Lucky.
O cara era lindo, mas tinha um rosto um tanto sombrio às vezes. Notei
que ele não gostava dos meus irmãos e fiquei curiosa para saber o porquê.
― Sim, eles mesmos ― grunhiu.
― Posso saber o que eles fizeram para não gostar deles? ― sondei.
Lucky olhou para mim.
― Na verdade, eles são legais, é só que...
― Quando conheci Lucky e achei que ele não me amava e tinha
brincado comigo, eu fui ao clube. Foi quando vi seus irmãos, bem, os vi de
longe, então Lucky soube que eu os achava bonitos e ficou bravo. ― Sam
sorriu e beijou a face de seu marido. ― Mas ele sabe que o amo com toda
minha alma.
Isso pareceu aliviar a cara sombria do homem, porque ele parecia
querer matar alguém. Dei graças a Deus que meus irmãos não estivessem ali.
― Vamos almoçar ou não? ― questionou ele, abraçando a mulher de
lado e olhando para mim. ― Você vai se juntar a nós?
Olhei a forma como eles estavam vestidos, tão elegantes, e eu com meu
jeans velho e botas. Não me parecia nada chique.
― Acho que não estou vestida apropriadamente para a ocasião ―
respondi e olhei para Taylor, que franzia a testa. ― Pode ir almoçar com
seus amigos, mas depois pode ir lá em casa?
― Não precisa trocar de roupa, você está linda ― disse com um
sorriso. ― Mas, se quiser trocar e ir conosco, tem uma loja aqui no hotel.
Vamos lá comprar alguma coisa para você. Acho melhor, porque, se
andarmos com você vestida assim, eu sou capaz de parar na cadeia.
― Assim como? ― Olhei para minhas roupas, depois para ele.
― Deixa para lá... Vamos? ― Ele me puxou antes que eu respondesse.
Olhei uma última vez para Brittany.
― Ligo para você depois ― anunciei falando um pouco alto, já que ela
estava um pouco longe de onde Tay e eu estávamos.
Capítulo onze
LAUREL
Na loja, Tay queria entrar comigo, mas fui com a Sam, pois, com outra
mulher, seria mais fácil escolher roupas, especialmente porque eu nunca
havia ligado para vestidos elegantes, sempre gostei do habitual e queria
deixar Taylor de queixo caído quando eu saísse dali.
Sam era uma mulher legal, era psicóloga infantil e parecia amar o que
fazia. Sua alegria era contagiante quando falava de seu trabalho. Era mãe da
Beatriz e do Shaw – um garotinho que havia adotado.
― Um gesto nobre, devo dizer ― comentei quando estávamos nas
araras de vestidos.
― Ele é uma criança que amei desde o início, sabe? ― Tinha muito
amor em sua voz. ― Agora tenho a Bia, a minha bonequinha linda.
― Onde eles estão?
― Com Angelina, a mulher de Ryan, irmão do Lucky. Não gosto de
ficar longe deles, mas viagens longas cansam, e Lucky tinha uma reunião
aqui e precisava de mim.
Assenti, vendo um vestido prata tomara que caia. Ele batia no meio das
coxas e, no busto, era amarrotado como duas conchas. Era lindo e
combinaria com minhas botas, embora um vestido daquele pedisse sapatos
de salto.
Não tire suas botas, Tay havia me dito antes de eu entrar na loja.
― Ficará lindo em você com saltos altos ― disse Sam enquanto
analisava o vestido também e apontava para um par de sapatos do outro lado
da loja.
― Tay me disse para manter as botas ― sussurrei, enrubescendo por
lhe obedecer, mas, com seu tom quente, ele me dizia que íamos aproveitar
depois.
Ela sorriu.
― Oh, eu ouvi. O fogo crepitava entre vocês de longe. Nunca imaginei
que ele fosse tão intenso assim. ― Ela parecia falar consigo mesma no final.
― Ele é intenso. ― Pensei nas noites que tivemos, e cada uma havia
sido melhor do que a outra. Por isso eu me apaixonei perdidamente.
― Estou vendo. ― Sorriu para mim e apontou para o vestido. ― Vista
ele.
Assenti e fui ao provador. Tirei minhas roupas, quando a mão dela
surgiu com um conjunto de lingerie de renda branca.
― Use isso. Acredito que seja seu número. Sei que, quando ele te vir
com essas roupas, haverá fogos de artifício pela forma como se olhavam no
salão. ― Senti um riso na sua voz.
Peguei aquelas peças sexy e as vesti. O sutiã era tomara que caia
também. Coloquei o vestido, que coube perfeitamente em meu corpo, soltei
meus cabelos anelados sobre os ombros e me olhei de corpo inteiro. Gostei.
Pensei que teria uma boa foda com Tay naquela tarde; só de pensar nisso,
minhas entranhas se apertavam de desejo.
― Mulher, você está um maldito avião ― comentou Sam assim que saí.
Sorri.
― Obrigada ― agradeci e suspirei, sondando assim que estávamos
pagando pelas roupas: ― Pode me dizer uma coisa?
― Claro.
― Você ia ficar com algum dos meus irmãos? Qual deles? Porque seu
marido parecia com raiva, e não era só por você achá-los bonitos.
Ela riu.
― Como disse antes, pensei que Lucky tinha se casado, então eu
precisava tirá-lo de dentro de mim. Foi quando fui à boate de um amigo meu.
Foi lá que vi Nilan e Gave, pelo menos foi assim que Lucky os chamou
depois que soube que eu os achei bonitos. ― Ela me olhou de lado. ― Alex
disse que eles só fazem em ménage, uma coisa interessante, mas não é minha
praia.
― A minha também não, não gosto de dividir nada, ainda mais um
homem.
― Sim, eu também, mas fui lá com o intuito de esquecer, então me
aproximei de um amigo dele. Na hora, eu não sabia que os dois eram amigos,
só depois, quando Jason Falcon me disse e Lucky chegou e, em seguida, me
levou embora. Mas, no fundo, eu não ficaria com ninguém, porque somente
Lucky me importa dessa forma.
― Jason Falcon? Já assisti a algumas lutas dele, mas soube que ele se
aposentou e agora é um treinador. Ele é lindo, embora meus irmãos também
sejam. Mas são mulherengos.
Ela arqueou as sobrancelhas.
― A maioria dos caras é assim antes de se apaixonar. ― Ela sorriu. ―
Talvez um dia eles consertem isso, não é?
― Tay não é assim. Ele disse que teve poucas mulheres, não um
milhão, como meus irmãos. ― Suspirei, pegando meu cartão.
― Ele disse isso? ― Sua voz tinha um tom estranho.
Olhei para ela.
― Sim, por quê?
Ela sacudiu a cabeça.
― Nada. Vamos pagar isso e ir embora, eles devem estar impacientes
― disse, mas seu tom parecia chateado.
― A roupa é por conta da casa ― respondeu a caixa da loja antes que
eu perguntasse o motivo da reação de Sam.
Pisquei, olhando para a mulher.
― O quê?
― Essa loja pertence ao senhor Johnson. Ele disse que tudo que você
quiser será seu, pois, já que são casados, tudo que é dele também é seu.
Eu não sabia o que dizer. Uma parte de mim estava feliz por ele dizer
que eu era mulher dele, mas tinha uma coisa na qual eu não tinha pensado
antes: nosso regime de matrimônio.
― Meu Deus! ― Coloquei a mão no rosto. ― Não sei se nos casamos
com comunhão de bens. Por que não pensei nisso antes?
― Esses caras são fera em nos enganar em relação a isso ― disse Sam
com um sorriso. ― Me casei em Vegas com Lucky e pedi com separação
total de bens, mas, na hora, ele trapaceou me beijando, e eu não li o contrato
de casamento. Fui saber bem depois que o regime foi com comunhão total.
Parecia que tinha um saco em minha cabeça me sufocando. Nunca tinha
pensado naquilo, mas, vendo tudo que ele tinha, por acaso ele pensava que
eu queria o seu dinheiro?
Chegamos ao lugar em que eles estavam nos esperando, na frente da
loja. Estavam sentados em uma cafeteria.
Aproximei-me de Jordan.
― Vamos nos separar ― informei a ele, que estava bebendo um café e
se engasgou, então olhou para mim com o cenho franzido.
― Repete?
― A funcionária da loja disse que tudo o que é seu também é meu,
então pensei: será que nós dois nos casamos com comunhão de bens? Não
li o papel. ― Minha voz demonstrava a irritação que eu sentia de mim
mesma.
Algo cintilou em seus olhos, mas foi tão breve que foi impossível
identificar.
― Sim, mas o que tem isso?
― O que tem isso?! ― Minha voz se elevou. ― Oh, meu Deus! Todos
vão achar que quero seu dinheiro, uma caipira dona de fazenda, casada com
um cara que é dono disso tudo. ― Apontei para o hotel, que mais parecia um
shopping. ― Merda! Vamos nos divorciar, eu assino um acordo pré-nupcial
dizendo que não quero seu dinheiro, nada dele, e podemos nos casar de
novo, mas com separação de bens, o que acha?
Ele piscou, parecendo chocado por eu lhe propor isso.
― O que eu acho? ― Sua voz saiu aguda.
― Sim, isso facilita as coisas, não é? ― Minha voz era urgente. ―
Podemos ir a Vegas e nos casar de novo.
Ele sacudiu a cabeça como se tentasse clarear a mente.
― Me deixa ver se entendi. Você quer assinar um documento que diz
que não quer nada meu, depois disso, nos divorciamos para, em seguida,
casar de novo, porém com separação de bens.
― Sim, não precisava repetir, só dizer que aceita. ― Mexia minhas
mãos, nervosa.
― Não aceito.
Arfei.
― Mas por quê? Sabe o que todos vão dizer quando souberem que
estamos casados? ― tentei persuadi-lo.
― Sim, vão dizer que tive uma puta sorte por estar casado com você.
― Ele pegou minha mão. ― Querida, você também tem bens.
― Só tenho a fazenda e uns cavalos e não isso... ― Gesticulei ao redor.
― Aposto que você tem mais do que hotéis em Dallas.
― Tenho vários em outros estados também e pretendo ter mais. ― Seus
dedos alisavam minha mão no intuito de me acalmar. ― Você também tem
muitos bens, uma casa no Havaí e uma em Veneza, uma em Los Angeles,
perto da Disneylândia. Um apartamento em frente à Torre Eiffel, além da
fazenda e cavalos de raça premiados.
Arfei e arregalei os olhos ante isso.
― Oh, Deus, você não...
― Eu? Não, foram seus irmãos. Devo dizer que são generosos em
relação a você.
― Oh, Senhor! ― Meus olhos estavam molhados. ― Nilan sabia que
meu sonho era me casar em Veneza e passar a lua de mel lá.
― Aposto que ele não ficou alegre com a parte da lua de mel ― ele
comentou sorrindo.
Sorri também.
― Na verdade, não, disse que não queria pensar em alguém me
tocando, porque ele seria capaz de me deixar viúva antes da hora. Mesmo
assim, ele me comprou uma casa lá.
― Quem você acha que te deu a casa no Havaí?
― Nilan também. Ele sabia que eu sonhava em ter uma casa lá, pois é
um paraíso, tão vivo. Eu assistia muito Hawaii five-0. Amo essa série, tem
cada paisagem linda! ― Meu tom estava chocado. ― A casa de Los
Angeles, aposto que foi o Gave. Teve uma vez que eu assisti a umas imagens
da Disney e comentei que um dia queria uma casa lá perto, para onde
pudesse levar meus filhos nas férias. Não achei que ele fosse fazer isso por
mim, achei que nunca ia realizar esse sonho.
― Eu vou lhe agradecer depois que tivermos os nossos filhos e os
levarmos lá. ― Sorriu para mim.
Arregalei os olhos.
― Você quer ter filhos? Porque me lembro de você dizendo que seria
mais para frente.
― Claro que sim, assim que contarmos aos seus irmãos que estamos
casados e passarmos a nossa lua de mel em Veneza. ― Seu tom era
divertido. ― Talvez daqui uns três ou quatro anos. Prefiro desfrutar sozinho
de você durante esse tempo.
Não imaginei que ele andava fazendo planos para nós no futuro, ainda
mais de ter filhos. Eu queria filhos, ainda mais se fossem parecidos com Tay,
loiros e de olhos azuis brilhantes. Seriam a coisa mais linda do mundo.
― E a casa em Paris, quem deve ter dado?
― Shade. Li sobre Jane Austen, e amava Paris, tão romântica. Uma vez
disse a vovó que queria ter um apartamento lá para ir com meu marido e
passear por todos os lugares. Ele estava perto, deve ser por isso que
comprou.
― Aposto que você queria passear com ele. ― Sua voz saiu como um
resmungo.
― Ei... ― Toquei seu rosto. Foi quando percebi que estávamos
sozinhos à mesa. Provavelmente Sam e Lucky tinham se afastado para nos
deixar discutir com privacidade. ― Não posso mudar o passado nem apagar
o que pensei na época, mas o que sei agora é que quero você, e, hoje, tive
medo de que não me quisesse mais...
Ele me beijou, interrompendo-me. Sua boca estava faminta sobre a
minha.
― Isso não vai acontecer ― respondeu contra os meus lábios. ― Sua
prisão comigo é irrevogável, jamais deixarei você ir. Apenas estava te
dando um tempo.
― Sou ruim com tempo, logo já penso o pior.
Ele sorriu e se levantou com os braços à minha volta.
― Vou me lembrar disso. Agora vamos comer, porque depois quero a
tarde inteira com você, quando desfrutarei de cada momento.
Fomos para o restaurante em frente ao hotel, onde Lucky e Samantha
estavam à nossa espera. Eu já tinha estado ali com meus irmãos. Embora
gostasse de coisas simples, como carne assada e galinhada, não disse nada,
apenas desfrutei do momento.
Meu chilique com seu dinheiro havia passado, primeiro, porque Taylor
não pensava que eu era interesseira, e segundo, porque, com tudo que meus
irmãos tinham comprado para mim, não me sentia mais tão inferior perto do
dinheiro do Tay.
Frisei em minha mente que, quando meus irmãos chegassem à cidade,
eu brigaria com os três por terem me comprado imóveis que eu nem sabia
que eram meus. Se não fosse por Taylor me dizer, eu jamais saberia. Isso me
lembrou de uma coisa.
Olhei para ele, sentado ao meu lado à mesa. Lucky e Sam estavam do
outro lado.
― Como sabia sobre as coisas que meus irmãos me deram, quando nem
eu tinha ideia?
Ele deu de ombros enquanto chamava o garçom.
― Fiz uma pesquisa sobre você ― disse Lucky ― assim que soube que
ele a estava namorando.
Olhei-o impressionada.
― Por que isso importaria a você? Por acaso achou que eu fosse
interesseira? ― Tentei esconder a raiva, mas Sam não escondeu a dela.
― Não acredito que fez algo assim, Lucky! ― Seu tom era descrente.
Ele suspirou.
― Não fiz isso por pensar que ela fosse uma golpista ou algo assim.
Conheço Shade e seus irmãos, sei o quanto faturam por show, fora as
propagandas... não, não os investiguei também ― falou assim que arregalei
os olhos. ― Sou amigo do agente deles, que é dono do Studio Music, e ele
comentou sobre o cachê deles, uma quantia exorbitante. Então pensei: se eles
ganham tanto dinheiro assim, por que deixam você enfurnada numa fazenda?
Achei que estavam se divertindo por aí e não pensavam em você.
― Então você pensou que, pelo fato de eu viver em uma fazenda, meus
irmãos não tomavam conta de mim? ― Meu tom era incrédulo.
― Sim, mas ainda bem que me enganei, pois isso me impede de
quebrar a cara deles quando os vir ― comentou, depois olhou para sua
esposa. ― Sinto muito, Rosa Vermelha.
Notei que ele se desculpara com ela, não comigo, embora estivéssemos
falando dos meus irmãos. Achei que ele não parecia ser gentil com outras
pessoas como era com sua mulher.
― Eles querem que eu viaje pelo mundo, que conheça lugares e tudo
mais ao invés de ficar na fazenda. ― Suspirei. ― Minha mãe morou lá.
Acho que ir para aquele lugar foi uma forma de me sentir mais perto dela.
Tenho muitos sonhos, e um deles é fazer o haras e uma imensa pousada com
vista para a cachoeira que tem na fazenda, perto do lago. Por isso nunca quis
vendê-la. Ali é o lugar perfeito para os dois empreendimentos. Estava
pensando em obter algum empréstimo ou coisa assim no próximo ano.
― E seus irmãos? ― Lucky arqueou as sobrancelhas.
― Quero fazer por mim mesma...
― Mas ninguém começa do zero, sempre tem uma porta a ser aberta
para ajudar. Quando montei o meu primeiro negócio, foi meu pai que me
emprestou a grana. Ele a daria a mim, mas fiz questão de lhe pagar depois.
Isso faz a gente dar mais valor ao nosso trabalho.
Pensei sobre isso. Não tinha cogitado pedir aos meus irmãos, até fui a
um banco uma vez, mas, como não tinha renda, além da fazenda para dar
como garantia, fiquei com medo. Talvez meus irmãos pudessem me
emprestar, e eu lhes pagaria, assim como Lucky fez com seu pai.
― Você pode estar certo. Obrigada. Vou falar com eles essa noite.
Quando eu disser que me casei em Vegas, eles vão surtar. ― Sorri para os
três à mesa. ― A única que amou a notícia foi a vovó. Ela adora isso,
sempre foi doida para nos ver casados, meus irmãos principalmente. Acho
que ela terá que rezar muito para isso acontecer.
― Shade se casou ― observou Lucky. ― Isso ainda a incomoda?
― Lucky, isso não é da sua conta ― rosnou Sam. ― Só diz respeito aos
dois.
― Concordo ― sibilou Tay, fuzilando-o. ― Você verificou a vida dela,
o que não deveria ter feito. Agora se afaste, cara. Estou falando sério. Fique
fora disso.
Estreitei os olhos, avaliando Lucky, e notei que ele parecia preocupado
com o amigo. Essa parecia sua forma torta de ajeitar as coisas.
Eu estava perto de responder que não gostava mais de Shade, não de
forma romântica, que somente Tay me importava daquela forma, mas a
garçonete chegou, e enrijeci.
Rachel me lançou um sorriso falso. Eu sabia que nada de bom viria
dela.
― Laurel? Faz tempo que não a vejo aqui. Cadê o Shade? Soube do
casamento dele com a cantora Melissa.
― Sim, eles se casaram há dois meses ― respondi em tom leve, não
aceitando suas provocações.
― Achei que você estaria em sua fazenda, chorando junto às suas vacas
por um cara que nunca a quis. Eu e Priscila pretendíamos ir lá nessa semana
para lhe oferecer apoio.
Fiquei com raiva, porque sua pergunta deixou Tay tenso. Eu podia ver
que o questionamento de Lucky ainda o estava incomodando, incômodo esse
que aumentou depois do que aquela cadela depravada disse.
― Não crio vacas, e sim cavalos de raça. Na verdade, estou ótima e
não estou chorando pelo Shade, só desejo que ele seja feliz. Talvez eu tenha
tido uma paixonite por ele, mas amar de verdade, só amei e amo um único
homem, e ele está aqui ao meu lado, o meu marido lindo, sexy e gostoso. ―
Sorri para Taylor.
Tay enfiou uma mão em meu cabelo e me puxou para si, com os olhos
abrasadores pregados nos meus.
― Repete? ― Sua voz estava ansiosa.
― Eu disse que amo você e que só tem espaço para você em meu
coração, para mais ninguém... ― declarei com fervor, mas, antes que eu
terminasse de me declarar, ele estava me beijando com amor, doçura e fome,
parecendo se esquecer de onde estávamos.
Ele se afastou, suspirou e fuzilou Rachel, que ainda estava atônita.
― Você está aqui para trabalhar e não para fofocar sobre a vida dos
outros, nem para causar intrigas. Se não está interessada em trabalhar, devia
ir embora. Agora leve seu traseiro daqui e traga nossos pedidos, o especial
da casa, antes que eu faça uma reclamação a Christian. Eu garanto que ele
não vai gostar nada de que sua funcionária tenha vindo infernizar a minha
esposa.
Ela saiu, ainda chocada com o que ouviu de nós dois. Não liguei por
ele ter sido rude com ela, porque aquela cobra peçonhenta merecia isso.
Sussurrei em seu ouvido:
― Se estivéssemos sozinhos, você já estaria todo nu, e eu agradeceria a
você de uma forma extremamente quente por me ajudar. ― Afastei-me assim
que ele gemeu.
― Você é uma trapaceira, caipira.
Sorri e notei o sorriso de Lucky.
― Acho que você teve sua resposta.
― Sim, eu tive.
O almoço correu de forma agradável após o episódio da cadela. Lucky
e Tay comentaram sobre negócios, enquanto Sam e eu falávamos dos meus
projetos.
Capítulo doze
TAYLOR
Eu só tinha uma coisa em mente depois de ouvir que Laurel me amava,
porque havia muito tempo esperava por isso. Devo dizer que gostei de
termos nos desentendido, pois só assim ela descobriu que me amava. Estava
louca para possuí-la de todas as formas possíveis.
Meu peito parecia estar mais do que aliviado ao descobrir aquilo.
Estava com medo de não ser a resposta que eu desejava, por isso não queria
Lucky insistindo no assunto da antiga paixão de Lau. Porra, o cara já tinha
feito muito vasculhando a vida dela e ainda sondando se ela me amava. Eu
sabia que ele se preocupava comigo, mas tinha exagerado. Fiquei feliz por
Lau não ter se zangado. Ela ficou apenas um pouco irritada, mas se
controlou, pois deve ter notado que ele queria me proteger. Lucky era assim.
Eu sabia o motivo de ela ficar na fazenda, notei isso assim que a ouvi
falando da sua mãe e do lugar em que morava. Apostava que seus irmãos não
tinham notado isso, ou não teriam me pedido para convencê-la a vender sua
propriedade.
Após o almoço, Lucky e Sam ficaram no hotel. Lau os convidou para
irem conosco à fazenda, mas sugeri que fossem no outro dia; eu passaria a
maior parte do tempo com ela no quarto.
Ela foi na frente com seu carro, e eu, com o meu logo atrás. Porra!
Estava louco para chegarmos, parecia um adolescente ao volante do
automóvel. Quando meu telefone tocou, pensei em deixar a ligação cair na
caixa de mensagens, mas eu conhecia aquele toque.
Não me dava bem com meu pai. Isso já acontecia antes de a mamãe
morrer, mas piorou depois disso, pois ele se lançou em bebidas e mulheres,
teve uma época que usou drogas, mas o coloquei na reabilitação, e as coisas
melhoraram. Isso fazia três anos. Até então, não teve recaídas.
Fiquei com algumas garotas que se aproximaram de mim para chegar
até ele. O pior era que ele pegava todas. Eu não ligava tanto para isso, só
não tolerava que ele bebesse, porque já havia sofrido dois acidentes; ainda
bem que saíra ileso e não ferira ninguém.
― O que você quer, papai? ― inquiri assim que apertei o botão do
painel do carro para responder no viva voz. ― Estou meio ocupado.
― Notei isso. Com uma mulher exuberante com botas de caubói, não é?
― Pela forma como ele falava, parecia estar bêbado. ― Ela é sexy pra
caralho.
Pisei no freio sem querer, e meu corpo foi lançado para frente.
― Porra, o que você disse?
― Você se casou em Vegas e nem convidou seu pai! É um ingrato igual
a sua mãe quando foi embora ― sussurrou ele.
― Mamãe morreu, papai. Você deveria aceitar isso. Agora me diz
como soube que me casei? ― perguntei com os dentes trincados, voltando a
dirigir. ― E não chame minha mulher de sexy, ela não é como as putas que
gostam de você pela fama.
― Calma, só estou dizendo que, quando os irmãos dela souberem, vão
acabar com você. Você vai levar uma surra por um rabo de saia?
Expirei, porque não ia discutir quando ele estava bêbado, ainda mais
por telefone.
― Como descobriu?
― Está em todos os jornais, na televisão e em revistas digitais, não
falam de outra coisa...
― Porra! ― rosnei. Estava chegando à fazenda. Parei o carro na
entrada. ― Maldição! Quem vazou isso?
― Não sei, mas não se fala de outra coisa, só no casamento do playboy
mais cobiçado dos Estados Unidos. Eu não sabia que você era tão cobiçado
assim. ― Ele riu. ― Você é meu filho.
Suspirei e ouvi uma buzina.
― Onde você está? ― indaguei preocupado.
― Indo para o carro para voltar para casa. Fiz um show na noite
passada, agora estou morto. ― Ele pareceu suspirar. ― Acho que estou
ficando velho.
― Você é velho. Cadê o Brad? Ele dirige quando você bebe. Onde ele
está?
― Ao meu lado. Sabe que posso dirigir, e você não precisa ficar tão
preocupado. Não sei o motivo de tanta histeria.
― Além do risco de você se matar ou matar um inocente? Você não
quer isso, nem eu, então deixe Brad dirigir. ― Passei as mãos nos cabelos.
― Agora tenho que ir.
― Se os irmãos da garota o deixarem vivo, traga essa garota para me
apresentar.
Nem fodendo, pensei. Desliguei e fui para casa, onde Lau estava na
varanda, esperando-me com um sorriso lindo estampado em seu rosto.
Como será que ela vai reagir depois de descobrir tudo o que eu não
disse a ela? Quem sou realmente, filho de um cantor famoso? Com isso, eu
sei que ela pode lidar. O pior será descobrir sobre as mulheres que tive na
minha vida, e não foram poucas, como disse a ela, além do pedido dos seus
irmãos para eu me aproximar dela para convencê-la a vender a fazenda
que tanto ama.
Liguei para o Lucky.
― Acabou de vazar na íntegra sobre mim. Você viu? ― questionei em
tom irritado.
― Sim. Você estava cercado de paparazzi em Vegas, já que um dos
garotos do rock se casou. Se queria a coisa bem escondida, deveria ter
tomado mais cuidado ou me chamado, pois eu o ajudaria. Mas, falando sério,
conta tudo. Essa garota ama você, ela vai entender. Fique tranquilo.
― Preciso de mais tempo com ela antes de contar ― falei um pouco
nervoso. ― Preciso ir para algum lugar afastado com ela, tipo uma maldita
ilha onde não tenha celular nem ninguém que me conheça ou a ela.
― Sério, Jordan, não é para tanto. ― Ele riu. ― Vai dar certo.
― Conta tudo você mesmo, porque vai ser pior se ela descobrir pela
boca dos outros ― disse Sam; com certeza tomou o telefone do marido. ―
Lembra quando não contei sobre mim e Bryan? A forma que Lucky descobriu
nos machucou muito. Ela vai ficar com raiva, sim, mas depois vai ver a
razão, afinal você não ficou com ninguém depois dela.
Sam se referia ao fato de não ter contado que era irmã de Bryan, e
Lucky pensou que os dois fossem amantes. Os bastardos dos seus pais
morreram pelas mãos de um assassino frio que buscava vingança por Bryan
estar casado com Alexia. Steve Lutner era um fodido doente mental que
prendeu Alexia e a violentou na sua adolescência, depois voltou buscando
vingança, então matou o pai de Bryan, que estava na cadeia na época, bem
como a cadela da mãe da Sam.
― Sim. Eu vou dizer a ela essa noite, antes de irmos para a cama.
Lucky, só impeça de os paparazzi virem à fazenda até amanhã.
― Sim, cara, eu farei isso ― ele afirmou e desligou.
Cheguei à varanda e puxei Laurel para os meus braços, devorando sua
boca, que eu amava. Não podia perder isso, não mesmo. Precisava fazê-la
entender que seríamos felizes e que não havia ninguém que a amaria mais do
que eu.
Peguei-a pela cintura enquanto ela colocava as pernas à minha volta e a
levei para dentro da casa, seguindo para o quarto. Escorei-a na porta e
rasguei sua calcinha, abaixei minha calça e soquei fundo em seu interior,
fazendo-a gritar e apertar minhas costas.
― Me fode mais forte! ― pediu levantando o rosto, a cabeça escorada
na porta e os olhos fechados, mas com sua boca aberta e gemendo.
Penetrei-a com mais força e puxei seu vestido para baixo, expondo seus
seios fartos. Coloquei um em minha boca, lambendo-o mais intensamente
enquanto acelerava mais as estocadas.
― Tay, eu...
Grunhi sentindo sua boceta espremer meu pau com sua necessidade. Eu
sabia que ela estava perto, então mordisquei seu mamilo e o puxei com mais
força, trazendo-a para a borda, assim como eu estava.
― Isso, goza para mim, minha caipira! ― grasnei e a vi se desmanchar
contra o meu corpo. Nunca tinha visto nada mais lindo na vida.
Eu a segui logo depois e escondi meu rosto em seu pescoço, sentindo
seu cheiro de lavanda, que se tornara minha essência preferida. Eu não podia
perder aquilo, não podia ficar longe dela de maneira alguma.
― Nossa! Isso foi maravilhoso, apesar de você ter estragado a lingerie
nova que eu estava pronta para estrear com você ― comentou ela, rindo e
beijando meu pescoço. ― Mas amei mesmo assim.
Afastei meu rosto e a olhei, depois observei o pedaço de pano no chão.
― Eu devia dizer que sinto muito, mas não seria verdade ― falei e a
coloquei sentada na cama.
― Você está bem? Parece nervoso desde o telefonema que recebeu.
Quem era? ― sondou, tirando o vestido e indo para o banheiro.
Olhei para a janela lá fora, pensando que a qualquer momento algum
repórter apareceria e ela descobriria realmente quem eu era.
― Pode me dizer ― falou, voltando ao quarto e enlaçando minha
cintura por trás. ― Sempre vou estar ao seu lado.
Eu queria poder acreditar em suas palavras, mas temia pelo pior assim
que contasse tudo.
― Jura? Porque fiz uma coisa e não sei se você vai ser capaz de me
perdoar, pois menti para você. Espero fervorosamente que me perdoe.
Seus braços sumiram do meu corpo, levando seu calor consigo e me
deixando vazio.
― Mentiu? ― Ouvi a dor e o medo na sua voz. ― O que fez?
Doía fundo em meu peito ver aqueles sentimentos em seu rosto e ouvi-
los em sua voz. Saber que eu era o causador disso me matava.
Suspirei e fitei seus olhos.
― Conheci você no aniversário de Shade, em Manhattan, como já
comentei antes. Bom, eu já tinha visto você algumas vezes antes disso.
Nunca tinha conhecido uma mulher desse jeito, sabe? Você não se importava
em se vestir na moda, não ligava para a opinião dos outros. ― Passei as
mãos nos cabelos.
― Não me lembro de você... ― Sua voz era só um sussurro. ― Eu
queria.
― Você estava muito bêbada para isso. Conversamos, e você contou
sobre o haras, sobre o sonho de ser arquiteta e sobre sua paixão por Shade.
Depois nos beijamos, então você disse que era seu primeiro beijo ―
expirei. ― Não sabe a alegria que senti por ser o primeiro.
Ela engoliu em seco.
― O que houve depois?
― Eu vim para Dallas depois disso. Já tinha hotéis aqui, mas queria
mais, para fazer uma imensa rede de hotéis. Perguntei ao Shade antes de
conhecê-la se você venderia a fazenda. Ele disse que não, mas que queria
que você vendesse. ― Olhei para ela, que estava de olhos arregalados. ―
Fui ao casamento porque não queria deixá-la sozinha, como disse antes, mas
Shade me pediu para me aproximar de você e convencê-la a vender suas
terras.
― Oh, meu Deus! ― gritou ela, chorando com a mão na boca. ― Você
ficou ao meu lado e me fez te amar para conseguir minha fazenda? E Shade
pediu que me levasse para a cama para conseguir...
Pisquei, assustado.
― Claro que não! Eu falei que Shade me pediu para convencê-la a
vender, mas não liguei para isso, porque já estava vindo ficar com você de
qualquer forma... E, quanto à fazenda, alguma vez me ouviu pedindo para
você vendê-la?
Ela sacudiu a cabeça.
― Não, mas isso deve estar em seus planos, já que me fez casar com
você com comunhão de bens, porque agora ela também é sua. ― Sua voz
estava sem vida. ― Não acredito nisso... Como fui idiota!
― Você não é idiota, e não me casei com você querendo nada seu!
Quero que você transforme esta fazenda em um haras, como é o seu sonho, e
não em um projeto que eu tinha antes de conhecê-la. Posso conseguir outro
lugar, mas esse é único para você. Um sonho que precisa realizar mesmo não
me querendo ao seu lado...
― Então é isso, você solta essa bomba em cima de mim e depois vai
embora?! ― gritou. ― Você é um tremendo filho da puta! Disse que nunca ia
me deixar, falou na música que tocou naquela noite!
― Eu não vou embora, mesmo se você me pedir, mas isso não é tudo...
Ela riu amarga.
― O que tem mais para contar? Que Shade te pagou para ficar comigo?
Recuei como se ela tivesse me dado um tapa.
― Porra! Você acha que eu seria capaz disso?! Posso ser um merda e
não ter dito algumas coisas, mas quis estar com você a cada segundo! Gostei
de você à primeira vista!
― Jeito bem estranho de demonstrar isso, mentindo para mim... O que
tem mais? Vamos acabar com isso.
― Conhece James Johnson? Cantor da banda Clave? ― Fiquei rodando
minha aliança no dedo.
― Ouvi falar. O que tem ele? ― parecia confusa com minha pergunta.
― Sou filho dele.
Ela estreitou os olhos.
― E...? Por que o fato de você ser filho de um cantor de rock é algo
que me perturbaria? Nós nem conversamos sobre seus pais ainda.
Definitivamente, sou uma esposa terrível. ― A amargura estava na sua voz.
Seria mais difícil do que eu pensava de fato, mas estava disposto a
tolerar e dar tempo a Laurel, como Sam disse. Não desistiria dela; não era
uma opção de modo algum.
― Menti sobre ter ficado com poucas mulheres. A minha vida antes de
conhecê-la era regada a festas e sexo... Tudo isso mudou a partir do
momento em que a vi e a quis para mim.
Ela parecia não ter ouvido o fim da frase, fixada apenas na parte das
mulheres e do sexo:
― Você está dizendo que é igual aos meus irmãos? Que vive com a
mulherada? Fode tudo o que se move?
― Vivia, fodia, no passado. Não faço mais isso desde que a conheci e
vim para Dallas atrás de você. Não me arrependo disso.
Ela expirou. Seus olhos estavam molhados. Eu não suportava vê-la
chorando, isso me doía fundo. O pior era eu ser o causador disso, e não
Shade, como eu presenciara outras vezes, com vontade de quebrar sua cara.
― Quero que vá embora. Meu advogado vai entrar com os papéis do
divórcio...
Meu peito se apertou, sufocando-me por um segundo. Lancei-me para
ela e a prendi na parede, pegando-a de surpresa.
― O que está fazendo? ― Notei que ela estava se segurando para não
voltar a chorar. ― Me solta agora.
― Você pode ter seu tempo, mas não vou dar a porra do divórcio,
entendeu? Não vou deixá-la por causa de um passado de merda e que não
tem como eu voltar atrás para mudá-lo...
― Você mentiu para mim ― lamuriou. ― Me fez amá-lo...
Aquilo foi como uma facada na porra do meu peito.
― Lamento por isso, mas só quero você e sempre quis desde que a
conheci. Sei que está se sentindo confusa e traída, por isso vou deixá-la
sozinha, mas não me peça o divórcio, porque isso eu não darei. ― Toquei
seu rosto, fazendo-a estremecer. ― Perder você não é uma opção.
― Nosso casamento foi uma farsa todo esse tempo, sou a mais
completa estúpida por ter caído em sua conversa e me apaixonado por você.
― Ela se afastou do meu toque como se fosse veneno e a ferisse.
― Não era uma farsa! O que sentimos não é uma farsa, e o que tivemos
também não, nunca pense isso! Você e eu não acabamos. Depois que colocar
sua cabeça no lugar, verá que não pode me acusar pelas mulheres que tive no
passado. Apenas pode me acusar por não ter contado a verdade a você.
Vamos ter nossa lua de mel em Veneza, e farei muitos filhos em você. Essa é
nossa vida, porra!
― Me solte! Não posso confiar em você! ― cuspiu. ― Você mentiu
para mim! Como posso acreditar que me ama?! Quero ficar sozinha! ―
pediu quase suplicante.
― Trabalhei muito para ter seu coração, fui através de seus sentimentos
por outro cara, lutei até que você o esquecesse e, agora que tenho seu amor,
não vou deixar que nada me faça perdê-lo. Você é a única coisa boa que
tenho, e eu vou até o maldito inferno para buscá-la. Lamento por ter mentido
e vou consertar isso. O que não posso e não vou é perdê-la porque fui idiota
e temi que não me perdoasse. ― Soltei-a e fui até a porta, mas olhei para
ela, encolhida na parede. ― Eu amo você, Laurel. A partir do dia em que a
conheci, você se tornou todo o meu mundo.
Saí porta afora, embora não quisesse fazer isso, só a queria em meus
braços para amá-la.
Cheguei ao meu carro e fiquei olhando para a casa, com esperança de
ela vir atrás de mim, mas não veio.
Meu telefone tocou.
― Papai, nós acabamos de nos falar...
― Seu pai teve uma overdose e está sendo levado por uma ambulância
― informou Brad.
Porra!
Capítulo treze

LAUREL
Estava deitada na cama, não querendo ver ninguém, nem sair dali.
Taylor havia ido embora, deixando-me com o coração despedaçado.
Ele não cumprira sua promessa de nunca me deixar. Bastara eu mandá-lo
embora uma vez, e ele logo se fora.
Sabia que era uma idiota por ter acreditado nele. Mesmo o amando, não
podia perdoá-lo pelo que ele tinha feito, não quando as feridas estavam
abertas e me matando a cada pulsação.
Sempre fui cercada de amigos que não me queriam de fato, só aos meus
irmãos, pela sua fama. Sempre fui usada; naquele momento me sentia da
mesma forma, mas o pior era por ser pelo homem que eu amava mais do que
um dia havia amado alguém.
Meus olhos estavam vermelhos e molhados, porque pesquisei sobre ele
na internet e o vi em festas com mulheres de todos os tipos, todas lindas,
algumas eram até modelos que eu inclusive tinha visto nas festas dos meus
irmãos. Acho que eles faziam rodízio das mulheres, pensei amarga.
Durante toda a minha vida, sonhei em ter um homem só meu, embora
isso fosse impossível, pois estávamos em pleno século XXI, mas Taylor
tinha que ser um playboy mulherengo, como as pessoas o chamavam, como
chamavam aos meus irmãos?
Merda! Eu era muito azarada mesmo. Primeiro, gostei do Shade, que só
vivia com mulheres em seu pescoço, embora nenhuma vez ligasse para
alguma delas, até se casar com Melissa. Será que ele a ama? Se ama, então
os “bad boys” podem ser capazes de amar e mudar?
― É claro que os bad boys são capazes de amar e mudar ― respondeu
vovó entrando no quarto.
Eu nem sabia que havia feito a pergunta em voz alta. Minha mente devia
estar longe, porque nem a vi chegando, ou a sua picape barulhenta, que
parecia um trem enferrujado.
Olhei para ela, ao lado da minha cama. Vovó era uma mulher linda, pele
branca e cabelos grisalhos.
― Se levante e vá tomar um banho, porque precisamos conversar ―
mandou ela sem me dar direito de recusar.
Encolhi-me nos travesseiros, sem ânimo para nada, não sem Tay ao meu
lado, sem o seu sorriso, sua animação contagiante. Eu não podia perdê-lo,
mas como podia esquecer que ele tinha mentido para mim?
― Não quero me levantar, aliás, quero ficar aqui para sempre ―
choraminguei.
― Você cheira a sexo, então precisa tomar banho... ― comentou vovó,
puxando a coberta.
― Sexo?! ― rugiu Nilan entrando no quarto, seguido por Gave. ― Eu
vou matar aquele filho da puta!
― Como ele ousa tocar em você e ir embora depois? ― sibilou Gave.
― Eu vou acabar com ele.
Fechei os olhos, tentando me controlar.
― Ele não foi embora, eu o mandei ir... ― Minha voz falhou devido à
realidade que batia à porta da minha mente, que parecia que ia explodir.
― Você o mandou embora depois de ele tê-la desonrado? ― indagou
Gave com asco na voz. ― Só de pensar nele tocando em você me dá vontade
de matá-lo.
Sentei-me na cama e estreitei meus olhos.
― Desonrado? Você quer matar um cara por ter fodido comigo? Vocês
não fazem isso o tempo todo? Não saem fodendo tudo o que se move?
― Você é nossa irmãzinha linda...
― Sou adulta, tenho 24 anos e não preciso que me tratem com uma
adolescente imatura ― interrompi Nilan. Peguei a toalha e fui para o
banheiro.
Depois do banho, coloquei um short e uma camiseta de Taylor que
estava no banheiro. Até tinha o seu cheiro.
Não vi ninguém no quarto, mas não significava que haviam desistido ou
que tinham me deixado sozinha com minha dor e saudade, além da
humilhação.
Fui para a cozinha, onde estavam todos sentados, incluindo Shade, que
fixou os olhos na camiseta que eu usava. Aposto que sabia que era do Tay.
Não consegui ler seus olhos, mas também não liguei.
Fui até o armário e peguei uma garrafa de bebida, mas ela sumiu da
minha mão. Olhei para Nilan.
― Que porra é essa? ― rosnei. ― Me deixe beber, pois preciso aliviar
a dor.
― Você não vai beber. Agora senta sua bunda aqui nessa cadeira e fala
o que aconteceu, porque na minha cabeça há vários cenários, e todos acabam
comigo matando o Jordan. ― Ele me puxou e me fez sentar de frente para
ele.
― Você não pode matá-lo, eu o amo ― grunhi, fuzilando todos.
― Você sabe quem é ele...
Cortei Gave:
― Ele me contou...
Estreitou os olhos.
― Me deixe reformular a pergunta: você sabia quem ele era antes de se
casar em Vegas?
Eu me encolhi.
― Não, o conheci no avião, mas ele me disse que nos conhecemos na
festa de aniversário do Shade. ― Olhei para ele, que estava calado. ― Mas
só soube disso depois de nos casarmos, já que eu tinha bebido muito naquela
noite.
― Para onde ele foi? Era para estar aqui e termos uma conversa ―
falou vovó. ― Porque, se vocês são casados, preciso saber qual a intenção
dele com a minha neta.
― Ele disse que ia me dar tempo para assimilar o que me falou sobre
ele, mas que depois voltaria e que não aceitaria o divórcio.
― Divórcio? Você pediu o maldito divórcio? ― perguntou Gave com
uma faca na mão. Com certeza queria matar alguém – Taylor.
― Sim, mas ele não aceitou e disse que não ia me dar ― respondi
olhando a mesa, mas sem nada ver.
― Ótimo, pois isso prova que ele ama você, minha querida ― falou
vovó se sentando ao meu lado.
― Não entendo. Eu sei que saíram muitas coisas na televisão a respeito
do casamento de vocês, mas por que pedir o divórcio se você sabe que ele...
ama você? ― sondou Nilan confuso.
Expirei.
― Ele era como vocês três, ficava com muitas mulheres... e...
― Não somos assim ― retrucou Gave com um suspiro.
Franzi o cenho.
― Não? Gave e Nilan, vocês ficam com uma mulher só, já imaginou o
que é isso? A porra de um ménage. Eu sei que os roqueiros fazem isso, foi
isso que papai fazia quando nos deixou ― sussurrei, colocando a mão na
testa. Na verdade, não eram as mulheres que Taylor teve que estavam me
incomodando, porque, depois de eu pensar, aquilo fazia parte do seu
passado, e ele não sabia que eu ia aparecer. O que fazia meu peito doer era
ele ter mentido para mim, uma coisa que odeio que façam.
Percebi que Nilan e Gave se engasgaram, embora não tivessem nada na
boca.
― Onde ouviu isso? Foi dele? ― indagou Nilan com a voz grossa.
― Não, foi de uma amiga minha, a Samantha Donovan. Alex disse a
ela, que me contou. Embora eu já soubesse, porque ouvi de outras pessoas
também. ― Dei de ombros.
― Essa Samantha é a esposa de Lucky Donovan? ― sondou Shade,
falando pela primeira vez.
― Sim, nós almoçamos hoje no Pleylis.
― Você sabe quem é o dono do Pleylis e do prédio em frente? ―
inquiriu Gave.
― O hotel, eu descobri que é do Tay, e o... Oh, meu Deus, o Pleylis
também é dele?! ― Minha voz saiu duas oitavas mais alta.
― Sim, assim como mais sete hotéis aqui. Ele queria fazer um aqui na
fazenda ― informou Nilan.
Encolhi os ombros.
― Eu sei, ele me contou que Shade lhe pediu para ficar comigo e me
convencer a vender minha fazenda. ― Alisei minha aliança enquanto olhava
para ele. Os outros também o fitaram.
― Você o mandou para ela? ― indagou Gave com raiva, como se
estivesse pensando em esmurrar Shade.
― Porra, me diz que você não fez isso só para empurrá-la para longe e
para fazê-la esquecer que era apaixonada por você. ― Os punhos de Nilan
estavam brancos de tão apertados.
― Apaixonada? O que você quer dizer com isso? ― Vovó olhou para
cada um de nós. ― Você amava o seu irmão? Meu Deus! ― Ela colocou a
mão na boca como se tivesse ouvido que eu ia sair nua na Times Square.
― Não somos irmãos de sangue, então não precisa olhar como se eu
tivesse cometido um pecado terrível ― comentei baixinho. ― Mas não amo
mais o Shade assim, apenas o Tay.
― Depois nós vamos falar sobre isso, mocinha ― ela disse, em
seguida olhou para Shade. ― Você sabia do que ela sentia?
Shade suspirou.
― Sim, mas achei que era uma paixão adolescente, até que soube que
ela bebeu muito no meu aniversário...
― Até eu esmurrá-lo na boca e dizer a verdade ― disse Nilan e me
olhou. ― Eu sei que não era para dizer, mas não podia continuar vendo você
daquela forma e não fazer nada.
― Então resolveu bater nele? ― rosnou vovó, fuzilando os três. ― Sua
mãe criou vocês melhor do que isso, ela se reviraria no túmulo caso visse
seus filhos brigando uns com os outros.
― Desculpe, vovó, não queríamos brigar e não vamos fazer de novo ―
avisou Shade envergonhado. ― Mas eu precisava acordar e ver o estrago
que estava acontecendo. Nilan me levou ao quarto, e eu a vi bêbada e
dormindo. Soube que não podia ficar no escuro. Mas...
― Você não podia fazer nada, já que me amava como uma irmã, não é?
― completei. ― Pode dizer, está tudo bem. Ninguém manda no coração.
Embora você não tivesse o direito de mandar Taylor para mim.
― Eu não mandei, só pedi para ele convencê-la a vender a fazenda, não
para dormir com você, ou pior, se casar. Fiz isso não com a intenção de fazer
você superar sua paixão por mim, mas para viver uma vida fora desta
fazenda, conhecer pessoas, namorar e outras coisas. Não tive a intenção de
machucá-la. Jordan é um cara legal, o cara perfeito para você, melhor do que
um dia desejei.
Olhando para ele naquela hora, eu me perguntei: onde tinha ido parar
aquele amor que eu sentia por ele? Era como se tudo tivesse desaparecido.
Foi quando pensei no que Tay me disse sobre ter trabalhado duro para me
fazer esquecer Shade e me ter inteira para si, por isso não ia desistir de mim.
― Se ele se aproximou de você para que vendesse a fazenda, eu vou...
Interrompi a ameaça de Nilan, que parecia real. Com certeza ele a
cumpriria e acabaria com Taylor, e eu não podia deixar isso acontecer; por
mais brava que estivesse, não podia deixar ninguém o machucar, doía demais
em mim imaginar isso.
― Ele não quer que eu venda a fazenda para fazer um dos seus prédios.
Na verdade, me aconselhou o contrário.
― Não? ― Shade sondou.
Suspirei e coloquei minhas mãos sobre a mesa, rodando o anel,
nervosa. Notei os olhos de todos na minha aliança.
― Um minuto comigo na festa do seu aniversário, Shade, e Tay soube
qual é a minha paixão, o que eu sonho em fazer aqui na fazenda.
― E que sonho é esse que não sabemos? ― questionou Gave.
― Fazer um imenso haras e uma pousada. Tenho tudo arquitetado.
Esperem, que vou buscar. ― Corri para fora da cozinha e peguei a planta do
lugar, que marcava o celeiro, os estábulos e tudo mais. Limpei uma brecha
na mesa e estendi o papel sobre ela, mostrando tudo.
― Aqui ― indiquei a área plana da fazenda ― vai ficar o campo e o
haras. Do lado direito, quero fazer a pousada. Do lado esquerdo, pretendo
reformar os estábulos e aumentá-los ainda mais.
Notei o silêncio e vi que todos estavam com os olhos em mim.
Pareciam chocados, impressionados.
― O quê?
― Isso é fantástico, porra, não sabia que minha irmãzinha era tão
talentosa assim. ― Nilan piscou. ― Esse projeto que arquitetou está
fantástico.
― Nilan, olha a boca ― repreendeu vovó.
― Desculpe, vovó. ― Sorriu para ela.
― Por que nunca nos disse que esse era seu sonho? ― indagou Shade.
― Não achei que conseguiria realizá-lo algum dia... ― Sentei-me.
― Por que não, po...? ― Gave se interrompeu, olhando vovó, que
fechou a cara.
Eles sempre falavam palavrões, mas, na frente de vovó, todos se
refreavam, embora muitas vezes esqueciam.
― Bom, tentei fazer um empréstimo, mas o banco queria hipotecar a
fazenda, então tive medo e deixei quieto, mas aí Tay chegou e me incentivou
a lutar por isso... a não desistir do que eu queria... ― Minha voz falhou. ―
Ele parece enxergar dentro de mim.
― Isso se chama amor, minha neta ― disse vovó. ― Vi nos olhos dele
quando foi nos visitar, o amor era evidente ali.
― Eu sei, mas como esqueço tudo? Ele se aproximou de mim por causa
de um pedido de Shade, apesar de Tay ter dito que se aproximaria de
qualquer forma, mas ele mentiu para mim. Como posso confiar em alguém
que fez isso? ― Enrolei meu projeto do haras e o deixei na mesa.
― Duvida do que ele sente por você? Acha que ele a enganaria algum
dia? ― sondou Shade. ― Conheço Jordan, ele não é esse tipo de homem.
Suspirei, porque Taylor não merecia isso, afinal de contas, depois que
ficamos juntos, ele só tinha estado comigo e mais ninguém, o que provava
que realmente me amava.
― Você tem razão. ― Suspirei. Já fazia quase seis horas que ele havia
saído. ― Ele me deu um tempo para pensar, e pensei; agora vou atrás dele.
Vovó sorriu como se tivesse ganhado na loteria.
― Isso, minha neta, vá atrás do seu futuro e seja feliz.
― E, quanto ao projeto, vamos dar o dinheiro a você para fazê-lo ―
notificou Nilan.
Olhei para ele, Gave e Shade e os vi assentindo para mim.
― Se vocês quiserem me emprestar...
― Por que faríamos essa merda? Vamos dar, e você vai aceitar ―
retrucou Gave. ― Somos uma família.
― Lucky Donovan disse que, quando começou, ele pegou dinheiro
emprestado com seu pai, que não queria que o filho pagasse, mesmo assim
Lucky pagou. Ele me disse que, quando fazemos algo com sacrifício, damos
mais valor ao que é nosso. ― Suspirei. ― Eu quero assim, quero fazer isso
por mim mesma, lutar por aquilo que quero. Se vocês me emprestarem, eu
aceito.
Eles ficaram em silêncio uns segundos. O primeiro a sorrir foi Nilan,
que me puxou para seus braços.
― Claro que sim, minha princesa. O que você quiser, pode fazer, só me
fale, que envio o dinheiro ― disse, beijando a minha cabeça. ― Agora vá
ser vestir para ir atrás de Jordan, porque tenho umas coisas para falar com
ele.
Afastei-me e o fuzilei.
― Vocês não vão lutar ― avisei. ― Isso só diz respeito a mim e a ele.
― Não vamos brigar, mas temos coisas para dizer a ele, porque você é
nossa irmã ― replicou Gave, também me abraçando.
Fui me trocar e optei por uma calça jeans, mas permaneci com a
camiseta de Tay. Quando meu telefone tocou, pensei que fosse ele, mas era a
Sabrina.
― Oi, minha amiga, como você está? ― sondou ela. ― Acabei de ver
na televisão que aquele loiro é, na verdade, o filho do astro do rock James
Johnson.
― Ele me disse isso hoje cedo. Por isso brigamos, porque eu não quis
aceitar que ele mentiu para mim.
― Estou na minha tia, em Seattle, mas, quando chegar aí, vou à sua
casa.
― Ok. Agora estou bem. Estou indo procurá-lo no seu hotel...
― Querida, você não assiste à televisão? O pai dele teve uma overdose
de remédios ou algo assim, e Tay está com ele no hospital, em Los Angeles.
Enquanto ela falava, corri para a sala, pegando o controle-remoto da
TV, que estava transmitindo uma partida de basquete, e mudando para o
canal CNN.
― Ei, estou assistindo ― reclamou Gave.
Na emissora de notícias, estava passando uma reprise do caso, cenas da
ambulância levando o cantor, depois na parte externa do hospital em que ele
foi internado.
― Oh, porra! É o James! ― Gave gritou. Nilan e Shade entraram na
sala junto à vovó. ― O pai de Jordan teve uma overdose.
― Aquele cabeça-dura sabe que não pode beber nem se drogar porque
tem diabetes! ― rosnou Shade. ― Maldição! Jordan deve estar um caco, ele
tem pavor de hospital...
― Por quê? Não tente me poupar ― falei e nem percebi que Sabrina
ainda estava na linha, apenas quando ela perguntou:
― Lau?
― Tenho que ir, depois nos falamos ― respondi e encerrei a chamada.
Na TV, mostrava o momento em que Tay chegou ao hospital com Lucky
e Sam ao seu lado. Ouvi as perguntas, que faziam Tay endurecer e seus olhos
se encherem de dor.
― Senhor Jordan, esse incidente vai atrasar a sua lua de mel? Sua
esposa não veio com você? ― perguntou um repórter. ― O que está
sentindo neste momento, vendo seu pai indo para o hospital do mesmo
jeito que sua mãe há nove anos? Na ocasião, ela não saiu com vida; acha
que seu pai vai conseguir?
― Bando de abutres... ― sibilou Shade. ― Não podem perder nada.
― Meu Deus, o hospital o faz lembrar sua mãe, não é? A dor que vi nos
olhos dele assim que chegou e ouviu essas perguntas... ― Minha voz se
quebrou. ― Preciso ir para Los Angeles. Vocês podem me levar? Ele está
precisando de mim.
― Sim, ele está, agora mais do que nunca ― respondeu Shade.
― Vamos levar você ― disse Gave.
― Sim, iremos ― concordou Nilan.
Olhei para os três.
― Obrigada, amo vocês ― declarei.
Só me faltava chegar ao meu homem para dizer tudo que estava
sentindo, que ele era o homem pelo qual eu estava completamente
apaixonada.
Capítulo quatorze
JORDAN
Saí da casa da caipira sem querer, mas precisava saber como papai
estava. Tinha de acreditar que estava bem, que nada ia derrubá-lo.
Eu não era muito amigo dele, mas, porra! Amava aquele velho. Um dia
ele havia sido mais carinhoso, embora ainda não deixasse de ser. Apenas
ficou meio distante por causa da minha mãe, que morreu pela mesma causa
pela qual ele acabava de ser hospitalizado.
Meu pai estava no auge da sua carreira mais de nove anos antes, e eu
podia apenas cogitar o que levara minha mãe a tomar remédios sem
necessidade. No começo, culpei a fama do meu pai, mas, conforme fui
ficando mais velho, percebi que não podia odiá-lo como gostaria.
Nós dois já havíamos tido várias discussões feias, durante as quais
quase chegamos a nos agredir fisicamente. Foi quando me mudei de sua casa,
em Los Angeles, para Manhattan. Com a distância, passamos a nos entender
mais.
Ele já tinha sido pego dirigindo bêbado algumas vezes e recebia uma
porrada de multas, então, para ele não se acidentar ou ferir alguém, contratei
Brad para dirigir e tomar conta dele, querendo meu pai ou não.
― Espero que tenha uma boa explicação para essa merda, ou vou
chutar sua bunda ― rosnei assim que ele me informou sobre meu pai ter tido
uma overdose.
― Chefe, ele estava festejando com seus amigos depois do show ontem
e acabou dormindo na boate, nos quartos que têm lá. Depois que ele acordou
hoje, só o vi beber e não achei que os caras da banda fossem loucos para dar
algo a ele. Passou mal pouco depois do telefonema para você.
― Descubra quem deu, estou chegando aí ― desliguei e telefonei para
o Lucky.
― Porra, cara! A coisa aqui está feia, repórteres por todos os lados,
mas eu os impedi de irem à fazenda, então fica tranquilo, mas contou tudo a
ela? A mulher reagiu bem? ― falou antes que eu dissesse algo.
― Sim, conversei com ela, mas não reagiu bem, como eu sabia que ia
acontecer caso descobrisse. Dei um tempo a Lau, mas, porra, estou ficando
louco! Agora isso acontece com meu pai...
― Vai dar tudo certo, cara. Acabei de ver na TV sobre James. Preparei
o jatinho, está pronto para irmos a Los Angeles.
― Você sabe que... ― Minha garganta se apertou ante seu gesto.
Desde que conheci Lucky, em Harvard, éramos melhores amigos, como
também Jason, Ryan e Daniel. Éramos inseparáveis, ajudávamos e
defendíamos uns aos outros.
― Jordan, nós somos mais do que amigos, somos irmãos, então só
vamos nessa. Já falei com Ryan e Jason, os dois estão indo pra lá também.
Tenho uma casa lá, caso não queira ficar na do seu pai, com a banda dele.
― Obrigado. Estou indo para o aeroporto, logo chego lá, e poderemos
partir.
― Não vai levar a Laurel? Porque, mesmo que ela esteja irritada com
você, aquela mulher vai querer estar lá por você. Ela é dessas. Estamos
saindo do hotel agora.
― Valeu, cara, mas não a quero no meio disso, dessa porra de abutres
que são esses repórteres. ― Suspirei. ― Agora entendo o motivo de os
irmãos a deixarem bastante isolada do meio deles.
― Certo, cara. Vamos esperar você lá.

Sentei-me no jatinho equipado, lembrando-me da última vez em que


tinha entrado nele, quando fui para o casamento de Lucky e Sam, em Vegas, o
dia mais feliz da vida do meu amigo.
Sam se sentou ao meu lado e segurou minha mão, apertando-a
firmemente.
― Seu pai vai ficar bem ― sussurrou. ― Não o conheço, mas Lucky
disse que ele é um cara forte.
― Obrigado ― agradeci apenas, porque não queria falar sobre aquilo,
por isso fiquei feliz quando ela mudou de assunto.
― Eu sei que não é da minha conta, mas Lucky disse que Laurel não
aceitou bem o que você disse a ela sobre a mulherada que já teve na vida. ―
Ela me olhou de soslaio. ― Não se preocupe, ela vai lidar com isso, afinal
de contas, é o seu passado.
― Ela foi criada vendo seus irmãos cercados de mulheres e as
descartando, então tomou algum tipo de... não chega a ser trauma, é mais
como...
― Receio. Ela não queria ser uma dessas meninas, que se apaixonam
por um bad boy e depois acabam quebradas. Essa é a sina de quem se
apaixona por um homem assim ― disse com tom suave. ― Mas nem tudo é
preto no branco; quando um cara assim se apaixona, ele pode ficar de quatro.
Sorri.
― Uma posição bem interessante ― brinquei, depois falei sério: ― Eu
não queria paixão ou procurava por ela, por isso fugia de meninas puras
como Laurel, você e Angelina. Mas, quando vi aquela coisa pequena vestida
naquela sainha jeans e naquelas malditas botas, não pude deixá-la de lado.
― Passei as mãos nos cabelos. ― Ela tinha visto Shade com Melissa. Eu vi
a dor nos olhos dela enquanto todos festejavam, inclusive seus irmãos. A
segui para o terraço e fiquei com ela, vendo sua dor, ouvindo-a falar de seus
sonhos, que ninguém sabia, mas ela os confiou a mim.
― Você é um cara legal e amigo, Jordan, e, mesmo bêbada, ela
enxergou isso. No pouco tempo que passei com Laurel, percebi o motivo de
você ter gostado dela desde o início e de ter se apaixonado. Espero que não
desista dela.
― Desistir? Nunca! Jamais a deixarei ir assim, sem lutar. Sei que ela
me ama, só está confusa e sofrendo por ter descoberto que menti. Ela odeia
mentiras...
― É um gesto nobre de sua parte não querer envolvê-la nisso.
― Lau tem medo de avião, só entrou em um quando precisou ir ao
aniversário e ao casamento de Shade. ― Apertei minhas têmporas, tentando
aliviar a dor de cabeça.
― E você acha que ela não faria o mesmo por você? Jordan, eu vi a
forma como ela o olhava. ― Ela sorriu para mim. ― Assim que Laurel
souber o que está acontecendo, vai para lá para estar com você.
― Estou contando com isso, porque, se ela vier até mim num avião, vou
saber que nosso relacionamento é duro como uma rocha. Entretanto, mesmo
se não for, vou atrás dela e trabalhar mais para conquistá-la novamente,
porque perdê-la não está nos meus planos de forma alguma.
Sam sorriu e passou a mão no meu cabelo.
― Vai dar certo, querido, e fico feliz que não queira desistir.
Depois disso, ficamos em silêncio. Eu me sentia num dilema; realmente
queria que Lau viesse para mim, mas ao mesmo tempo não queria, por causa
daquele bando de urubus da imprensa. Eu os odiava, queria poder fazer algo
para que nenhum deles estivesse no meu pé me enchendo o saco ou
interferindo na minha vida, como sempre faziam.
Cheguei a Los Angeles e fui direto ao hospital. Brad estava me
esperando na entrada, cercada de repórteres, o que tornava difícil até a
entrada no local.
Saí do carro junto a Sam e Lucky, então vieram as perguntas e as
câmeras posicionadas, tudo para uma porra de manchete de primeira página.
― Não ligue para nenhum deles ― falou Sam baixinho vindo para o
meu lado.
― Senhor Jordan, esse incidente vai atrasar a sua lua de mel? Sua
esposa não veio com você? ― perguntou um dos repórteres fodidos.
Ignorei-o, porque, com a raiva que eu estava, se eu dissesse algo, corria
o risco de voar na cara daquele merda e o espancar. Como ele ousava dizer
aquelas palavras? Porra, era o meu pai que estava internado ali! Queria que
ele saísse com vida e sem sequelas daquele hospital, não ligava para a lua
de mel naquele momento, pois teria tempo de sobra para isso depois. Era
como se o repórter pensasse que a única coisa que importava para mim fosse
sexo. Senti até vontade de vomitar.
― O que está sentindo neste momento, vendo seu pai indo para o
hospital do mesmo jeito que sua mãe há nove anos? Na ocasião, ela não saiu
com vida; acha que seu pai vai conseguir? ― continuou o repórter assim que
não respondi.
Meu corpo ficou duro como rocha, e uma dor lacerante me atravessou
dos pés à cabeça, fazendo-me querer gritar ou matar alguém.
Hospitais me traziam várias lembranças que eu não queria recordar de
forma alguma, mas, com as palavras daquele abutre, as portas de minha
memória se abriram, e elas inundaram minha mente. Eu estava a ponto de
enlouquecer, como aconteceu quando descobri sobre minha mãe. Na época,
derrubei vários repórteres que faziam perguntas idiotas. Estava fazendo tudo
para me controlar dessa vez, pois sabia que violência não levava a nada;
seria melhor processá-los.
― Vamos. ― Lucky pegou meu braço e me puxou. Finalmente entramos
no prédio.
― Jesus, eu não pensava que esses repórteres eram tão sem noção ―
comentou Sam. ― Não ligue, meu amigo, seu pai vai ficar bem.
Assenti, controlando a raiva e a dor, que estavam tentando me derrubar.
Só queria uma pessoa ali ao meu lado, mas ela estava longe e ainda com
raiva de mim.
― Senhor ― disse Brad ao meu lado. ― Peguei as câmeras do lugar e
vi qual foi o motivo da discussão que levou à overdose de James. O baixista,
Travis Willon, não aceitou muito bem que seu pai vai sair da banda.
Arregalei os olhos.
― O quê?
― Depois que falou com o senhor, ele foi ao clube em que Travis
estava e falou que não ia mais ser vocalista de banda, que estava cansado
dessa vida e que ia sossegar. Falou também que não ia viver cantando por aí
longe de você ― ele me olhou ―, que perdeu muito tempo até agora, e você
nem o chamou para o casamento. Ele queria ser um pai melhor para ir viver
em algum lugar tranquilo perto de você.
Parecia que meus pulmões estavam prestes a estourar com essa notícia.
Tanto que eu quis que ele fizesse aquilo antes de tudo acontecer com a
mamãe... Quando meu pai finalmente tomava essa decisão, ia parar em um
hospital. Aquilo aconteceu por eu não o ter convidado para o casamento?
Ele achou que eu o havia excluído da minha vida? Maldição! Nem eu sabia
que ia me casar.
― Você disse que Travis não aceitou bem? O que ele fez? ― Meus
punhos se cerraram com força. ― Onde estão as gravações de tudo que
aconteceu? Vou ver como meu pai está, depois quero vê-las.
― Hummm, um cara disse que era do FBI e falou que era seu amigo,
então pegou as gravações e disse que checaria os fatos. ― Ele parecia meio
nervoso.
― FBI?
― Sim, mas só dei as mídias depois que ele mostrou o distintivo. ―
Ele me seguiu para irmos para a sala de espera. ― Bryan Scott. Fiz errado
em dar os arquivos a ele? Só os entreguei porque ele me ouviu falando com
um amigo meu e dizendo que desconfio que seu pai não tentou se matar e que
foi tentativa de homicídio pela crise que seu parceiro de banda teve.
Suspirei. Bryan era um agente federal agora e conhecia muitas pessoas
que podiam chegar ao fundo daquilo sem causar alvoroço.
Eu estava furioso por alguém querer matar meu pai, principalmente um
cara que jurava ser nosso amigo e chamava meu pai de irmão. Como a
cegueira da fama podia fazer algo assim a uma pessoa?
Bryan e Alexia estavam na sala de espera, como também Daemon, de
braços cruzados e escorado na parede.
― Ryan e Jason estão vindo de avião ― disse Bryan assim que cheguei
até ele. ― Eu cheguei mais cedo com Alexia, porque estávamos perto, e
Daemon já estava conosco.
Daemon era um membro do clube MC Fênix. Na época em que eu fazia
faculdade, conheci Shadow, atual presidente do clube, e Kill, um dos
membros. Conheci Daemon quando Angelina deixou Ryan e ele o ajudou a
localizá-la.
― Deixa que eu cuido de tudo com Bryan sobre o incidente com James.
Você precisa saber como seu pai está ― falou Lucky.
― Obrigado, gente. ― Assenti e fui até a recepção à procura de
informações. Dirigi-me a uma jovem loira com óculos de grau. ― Oi, eu sou
filho de James Johnson e preciso saber como ele está.
Ela me avaliou como se estivesse sondando se era eu mesmo.
― Sim, conheço você da televisão. Seu pai foi levado para fazer uma
lavagem estomacal. Assim que terminar, o médico vai entrar em contato.
Também já avisei aos integrantes da banda. Só tinha um deles que estava
sóbrio.
― Me deixe adivinhar. Travis? ― Meu tom estava seco e cheio de
asco.
― Sim, ele parecia preocupado, inclusive perguntou se o Sr. Johnson ia
sobreviver.
Preocupado? Porra, se aquele fodido de merda fez algo para o meu
pai, vou acabar com ele!, pensei.
― Se ele aparecer ou ligar de novo, mande-o vir me procurar, mas não
diga nada sobre o estado do meu pai, o.k.?
Ela parecia confusa, mas assentiu. Voltei para a sala onde estavam os
outros e lhes contei o que a menina da recepção disse sobre Travis.
― Com certeza está com medo de seu pai sobreviver ― rosnou
Daemon. ― Só vamos esperar para saber o estado de seu pai, então vamos
procurar mais pistas.
― As gravações não são suficientes para colocá-lo na cena e prendê-
lo? ― sondei.
― Não, precisamos de mais provas, porque eles estavam discutindo e
nada mais, mas tem um lugar entre o salão e um corredor comprido que
chega à porta da frente e não tem câmeras, e foi ali que tudo aconteceu, tenho
certeza. Uma discussão não faz dele um assassino, não será preso por isso.
Precisamos de algo concreto ― respondeu Bryan com um suspiro.
― Então você acredita que o crápula é realmente culpado só porque
meu pai quis deixar a banda? ― Meu tom era um rosnado de fúria.
― Sim, tenho alguns amigos meus da polícia que estão cuidando disso.
Estamos trabalhando por baixo dos panos. Estava esperando você chegar
para saber o que faremos. Eles acham que é melhor você entregar à mídia o
vídeo da discussão deles, assim todos vão saber que esse cara é um
desgraçado fodido. Talvez assim ele faça alguma besteira que o entregue.
― Ele não conseguiu matar meu pai, então certamente Travis apenas
diria que está arrependido de ter brigado com ele. ― Suspirei. ― Preciso
de provas concretas para jogar na mídia, tipo, ele ameaçando meu pai ou
coisa assim.
― Certo, mas estudei mais a fundo o que aconteceu com sua mãe. As
substâncias que encontrei no lugar onde seu pai teve a overdose são as
mesmas apontadas no prontuário da sua mãe há nove anos.
― Que porra você quer dizer, Bryan? ― perguntei com meu coração
disparado.
― Também soube que, há nove anos, o seu pai queria deixar a banda,
como fez agora. Ele queria se mudar para Austin e viver com você e sua mãe
lá... Então, uma semana depois, ela tomou remédios em uma tentativa de
suicídio. ― Ele sacudiu a cabeça. ― Não faz sentido.
― Você está dizendo que ele pode... ter matado minha mãe? ― Minha
voz se elevou, então a abaixei ao fim da frase, incrédulo.
― Tudo indica que sim. Vou mais a fundo, preciso saber a que locais
ela ia na época, assim posso ver as gravações das câmeras, se ainda
existirem. Preciso de provas concretas, como você mesmo falou.
― Ela tinha uma floricultura na mansão, uma estufa, melhor dizendo.
Tinham câmeras lá e na casa, mas elas não funcionaram no dia em que
mamãe se matou. Os policiais da época tinham certeza de que ela havia
desligado as câmeras para ninguém ver o que ia fazer. ― Passei a mão no
rosto. ― Não acreditei, pesquisei fundo na ocasião também, mas não
cheguei a nada.
― Vou mais a fundo, assim o deixamos de mãos atadas. Acredito que,
quando ele se sentir encurralado, cometerá um erro, então o pegaremos ―
falou Bryan, depois apontou para Daemon. ― Estamos nós dois nisso.
Vamos fechar o círculo, pegar esse cara e descobrir toda essa podridão que
o cerca. O que acha? Devemos falar com a mídia e soltar nossas suspeitas?
― Acho bom, Jordan, isso ajudará no caso ― concordou Lucky.
Assenti para eles.
― Pode soltar essa bomba, assim os repórteres vão focar nisso e me
deixarão de lado com o meu pai. Quando acordar, ele não precisa dessa dor
de cabeça. ― Girei a aliança no dedo, numa tentativa de me controlar.
― Assim que James estiver fora de perigo, nós vamos ter que protegê-
lo 24 horas. Não podemos deixar Travis vir terminar o serviço. Vamos
deixar uma enfermeira, o médico e você entrar no quarto, mais ninguém.
Todos terão que mostrar uma identificação para entrar. Concorda com isso?
― Sim, concordo, Bryan. ― Fiquei mais aliviado por todos estarem
cuidando da proteção de meu pai, porque minha cabeça estava naquele
quarto com ele. ― Acha que, se Travis ficar acuado, pode querer vingança?
― Puxei sua ficha antes da fama. Ele foi preso quando tinha 16 anos
por posse de drogas e por ser muito briguento, causava confusão onde
passava. Quando fez 17, ele e um amigo se juntaram e bateram em um garoto
que roubou a namorada do outro cara, como também estupraram a garota.
Mas nunca foi provado nada, os dois tinham álibi. Apesar de que descobri
que ambos tinham grana, e isso compra muitas pessoas. Tive que cavar bem
fundo para conseguir descobrir isso.
Ele olhou para minha aliança, que eu ainda rodava no dedo.
― Soube do casamento, meus parabéns ― disse com um sorriso. ― Se
está preocupado com ela, não precisa; soube que seus irmãos estão ao lado
dela nesse momento.
― Obrigado ― sussurrei. ― Os três estão com ela?
Porra, eu ficaria doido ali, porque, naquele momento em que Lau estava
com raiva de mim, Shade estava lá com ela. Eu sabia que a caipira gostava
de mim, sentia isso toda vez que nos tocávamos, pela forma como ela me
olhava. Contudo, ela o amara primeiro, e ele talvez a estivesse abraçando
enquanto ela chorava pelo que eu lhe fiz.
― Não faz isso com você ― falou Lucky, sentado à minha frente com
Sam ao seu lado.
Levantei-me e fitei a janela, mas sem nada ver realmente.
― O quê? ― Fingi-me de desentendido, mas sabia ao que ele estava se
referindo.
― Agora aquela mulher ama você, então não pense no que não existe.
― Chegou perto de mim e deu um aperto em meu ombro.
Assenti, mas, dentro de mim, ainda restava a dúvida de que talvez, em
seu coração, restasse algum sentimento por Shade, mesmo que ela pensasse
que não.
Capítulo quinze
LAUREL
Sentei-me no jatinho particular dos meus irmãos, que eles usavam para
levá-los aos shows em lugares distantes. Estava inquieta com o voo, sempre
ficava assim quando viajávamos, o que era raro.
Expirei, segurando firme no assento e fechei os olhos por um momento.
― Está inquieta? ― inquiriu Shade se sentando ao meu lado.
Abri os olhos e o fitei.
― Sim, um pouco.
― Não fique, Jordan vai ficar bem, ele é um cara durão ― disse,
depois suspirou. ― Queria pedir desculpas por não ter notado que o que
sentia por mim era verdadeiro, não uma paixonite.
― Uma paixonite que doía como uma cadela quando eu o via com
mulheres, até com Sabrina, apesar de esse sentimento não ser nada
comparado ao que sinto por Tay. Eu o amo como nunca amei ninguém na
vida. Ele ficou ao meu lado no seu aniversário, depois que vi você com
Melissa. E você não tem culpa de nada, afinal ninguém manda no coração.
― Lamento por você sofrer... ― Ele suspirou de modo triste. ―
Aquela foi uma noite difícil, Melissa chegou e disse que estava grávida, e,
porra, a minha vida ficou de cabeça para baixo. ― Ele passou as mãos nos
cabelos. ― Sabia que não podia deixá-la sozinha, tinha que pensar no meu
filho.
Meus olhos quase saltaram das órbitas. Bem que eu tinha imaginado que
podia ser algo assim, mas descartei por nenhum dos meus irmãos ter
comentado. Só assim para ele se casar com uma garota fria como ela.
― Oh, meu Deus! Eu vou ser tia! ― Sorri. ― Acho que vou ter que
fazer as pazes com a Rainha do Gelo, não é?
Ele me avaliou por um tempo, depois sorriu.
― Acredito que sim. No começo foi difícil ficar casado, ainda mais
com ela sendo tão distante. Parecíamos separados pela Muralha da China.
― Ela parece uma princesa do gelo. A única coisa que você tem quer
ser é um príncipe do fogo e derreter a geleira que ela construiu à sua volta.
― Príncipe do fogo, hein? Vou pensar nisso ― disse e suspirou. ― Ela
não me deixa entrar.
― Se esforça mais. Não sou psicóloga, isso é trabalho da Sam, mas, se
uma pessoa não deixa a outra entrar em sua vida, em seu coração, talvez
tenha acontecido algo que a tenha machucado, e ela não queira passar por
isso de novo, ainda mais agora, casada com um cantor de rock mulherengo.
Ele empurrou meu ombro com o seu e sorriu.
― Ei, não sou mais assim, sou responsável quando firmo um
compromisso. ― Ele alisou sua aliança de casamento.
― Agora chegou a sua vez de ralar e ir à luta por ela, já que é preciso
uma união estável para um casamento funcionar e ser feliz, ainda mais com
uma criança envolvida.
― Sim, eu sei. Eu vou fazer isso assim que voltar para ela.
― Quando amamos alguém, temos que ir atrás, assim como vou atrás de
Tay ― sussurrei.
― Tay... Sabia que ele não gosta que ninguém o chame assim? Era
como sua mãe o chamava, mas ele se apresentou assim a você, não foi?
― Eu que perguntei a ele se podia chamá-lo assim, e ele consentiu. Na
noite do seu aniversário, eu estava bêbada, então não me lembro, mas sei
que nos beijamos, falei sobre meus sonhos. Depois o vi no avião indo para
Vegas. Ele ficou ao meu lado após descobrir sobre meu medo de avião...
― Medo de avião? ― questionou Nilan chegando até nós e se sentando
no assento ao lado do corredor.
Ele era moreno, com cabelos como os meus, castanho-escuros, olhos
cor de chocolate. Nós nos parecíamos muito. Seu corpo era forte e forrado
de tatuagens. Meu irmão era lindo. Gave não ficava atrás, com sua pele mais
clara, corpo igualmente musculoso e tatuado e olhos castanho-esverdeados
intensos.
Gave se sentou ao lado de Nilan. Pelo visto, os dois tinham deixado a
mim e Shade a sós para conversarmos. Talvez quisessem que nos
entendêssemos, afinal éramos irmãos.
― Sempre tive, só não demonstrava na frente de vocês, pois não queria
parecer fraca ― sussurrei. ― Depois que mamãe morreu, isso aconteceu
comigo. Tay sabia e ficou ao meu lado na minha viagem para Vegas.
― Por isso não viaja muito ― afirmou Gave. ― Porra, não acredito
que um cara conheceu você e, em poucos minutos, soube mais de você do
que nós, os seus irmãos!
― Isso é verdade ― concordou Nilan. ― Seus sonhos e tudo mais...
― Gente, eu me escondi de todos, até de mim mesma, não foi culpa de
vocês. Não estava disposta a agarrar com unhas e dentes o que queria.
Taylor me ajudou com isso. Algo nele me fazia querer ter mais e ser alguém
compatível com ele, além de uma caipira.
― Que porra está dizendo? ― rosnou Shade.
― No começo, não achei que alguém tão perfeito como ele ia me
querer, então, quando isso aconteceu, eu não podia deixá-lo escapar. ―
Olhei para Shade. ― Parte da minha vida, eu fui apaixonada por você, mas
nunca tive a chance...
― Lamento por isso... ― murmurou. ― Mas fico feliz por você amar o
Jordan. Ele é um cara de sorte ― disse ele com um sorriso gentil.
― Sabe? Desde o dia em que ele me conheceu, antes mesmo que eu o
conhecesse, Tay não ficou com ninguém. A partir do momento em que soube
que me amava, não quis outra pessoa. Isso acontece quando a gente ama.
Todas as mulheres e homens não significam nada, só a pessoa que amamos
importa. ― Sorri dos olhos arregalados de Nilan e Gave. ― Um dia vocês
vão entender do que estou falando.
― Nem fodendo quero que isso aconteça ― falou Gave estremecendo.
Nilan sacudiu a cabeça. Pensei ter visto uma pontada de dor em seus
olhos, mas foi tão breve que eu devia ter imaginado.

Cheguei ao hospital, ainda com um monte de repórteres do lado de fora.


Fiquei nervosa de repente, sentindo várias câmeras sendo viradas para mim
e meus irmãos enquanto passávamos, escoltados pelos seguranças dos meus
irmãos, Milton e Jared.
Vi o repórter que tinha falado com Tay quando ele chegou ali. Evitei-o
para controlar minha raiva por ele ter causado dor no meu marido.
Muitas perguntas relacionadas ao que eu achava sobre o que James e
Taylor estavam passando, bem como ao nosso casamento me foram feitas,
algumas educadas, outras pesadas.
― Sra. Johnson, eu soube do seu casamento com um dos homens mais
cobiçados do país. Como se sente em relação a isso?
― Onde você estava, que não veio com seu marido?
― Você está grávida? Por isso se casou em Vegas, escondida de sua
família?
― Acha que Jordan odeia o pai? Por isso não o convidou para o
casamento? Foi por isso que ele tomou os remédios?
Eu estava ignorando as perguntas, assim como Nilan me disse para
fazer, mas endureci ao ouvir o último questionamento. Mesmo não sabendo
da relação entre Tay e seu pai, não acreditava que ele o odiasse. Aqueles
repórteres eram capazes de qualquer coisa para conseguir uma notícia
bombástica.
Fuzilei o cara, que era o mesmo que provocara dor em Tay com suas
questões.
― Seu babaca, você fica fazendo perguntas sobre a recuperação do
James, se ele vai sobreviver ou morrer como a mãe do Taylor. O que há na
porra da sua mente?! É o pai dele lá em cima! ― Apontei para o hospital. ―
Meu marido está sofrendo, e você fica fazendo perguntas estúpidas como
essa?! Por que, ao invés de dizer asneiras, não acende uma vela e reza para
o James viver?! ― percebi que gritava, então me forcei a baixar o tom: ―
E, quanto à minha vida e a de Taylor, não é da sua maldita conta.
Shade passou a mão na minha cintura e me tirou da multidão, que estava
de boca aberta enquanto as câmeras não paravam de filmar e clicar. Não dei
a mínima para isso, só precisei soltar minha raiva.
― Tigresa, se controla ― pediu Nilan com um sorriso e piscou para
mim.
― Maninha, adorei aquilo ― falou Gave, orgulhoso. ― Vovó vai surtar
com você xingando na TV.
Corei.
― Eles vão falar de vocês também, que têm uma irmã bocuda ―
sussurrei.
― Quem liga para isso? ― falou Shade com um sorriso.
Parei assim que chegamos à sala de espera e olhei o lugar recheado de
rostos desconhecidos. Só conhecia Lucky e Sam. Perto deles estava uma
morena linda, parecida com um anjo, sentada ao lado de um cara com olhos
cor de uísque, e duas loiras fabulosas, uma com um vestido elegante ao lado
de um cara de olhos azuis e cabelos negros e a outra vestida com um
espartilho e calça de couro preta bem apertada, definindo suas curvas
perfeitas. Ela estava abraçada a Taylor. Foi um choque vê-lo com outra.
― Se acalma, aquela é Tabitta Rodrigues, mulher de Jason Falcon ―
informou Shade apertando minha cintura. Ele ainda me abraçava. Mesmo
receosa que Tay não entendesse, não tirei sua mão, pois éramos irmãos.
Assim que Shade falou, todos na sala olharam para nós, mas eu só
estava vendo uma pessoa ali, e seus olhos estavam em Shade com o braço
em minha cintura, cheios de dor. Isso quase me matou.
Afastei-me de Shade e fui até Taylor. Seus olhos me seguiam, atentos.
― Podemos conversar sozinhos?
Ele assentiu, mas não respondeu, só deu as costas e andou uns oito
metros de onde seus amigos estavam, entrando em um corredor comprido.
Ali ninguém nos ouviria. Tay parou e se virou para mim, mas não disse nada,
provavelmente me esperando dizer algo.
Respirei fundo.
― Sabe o que eu fiz depois que você foi embora? ― Não esperei sua
resposta. ― Conhece a música Lonely is the Night, de Air Supply? Ela
revela o que eu estava sentindo sem você. O vazio, a solidão, a perda, isso
era algo que estava acontecendo comigo. Essa letra mostra tudo isso, e não
quero viver assim.
― Eu... ― A dor era evidente em sua voz.
Cortei-o:
― Não ligo para o fato de, antes de me conhecer, você ter tido um
milhão de mulheres, ter sido cafajeste, mulherengo, depravado... Sei que não
há caras perfeitos e puros no mundo, acho que nem os padres são assim. ―
Franzi a testa. Quando ficava nervosa, eu falava demais. ― Bem, ao menos
nem todos, não é?
Ele começou a abrir a boca, mas falei antes que respondesse:
― Deixa pra lá, o que quero dizer é que, a partir do momento em que o
conheci de verdade, me apaixonei perdidamente por você, então não ligo
para o passado, para o que você viveu antes de eu aparecer na sua vida. ―
Cheguei perto dele. ― Você não sabia que eu existia. ― Peguei sua mão, que
estava com a aliança. ― Se por acaso você mentir para mim de novo, chuto
sua bunda com as minhas botas e te mando para a Lua.
― Não vou ― jurou e alisou meu anel no dedo. ― Você está usando a
aliança. Achei que fosse tirá-la.
― Tirar? Lembra que prometemos que, por mais que brigássemos, não
íamos tirar as nossas alianças? Então não tirei... ― Toquei seu dedo anelar
direito. ― Você também não tirou a sua.
― Não, ela vai ficar aí para sempre, caipira.
Sorri e joguei meus braços em seu pescoço.
― Eu amo você. ― Beijei sua boca de leve, mas ele me apertou mais
em seu corpo, aprofundando mais o beijo, até que fui puxada para longe dele
e abri os olhos, vendo a cara enojada de Nilan e Gave.
― Cristo! Não se peguem assim na nossa frente, porque minha vontade
é de matá-lo! ― rosnou Gave com os punhos cerrados.
― Isso, e nós estamos em um hospital ― grunhiu Nilan.
Pisquei, porque, por um breve segundo, tinha me esquecido de onde
estava.
Taylor me levou para perto dos seus amigos. Meus irmãos nos seguiram
com caras de poucos amigos. Bem, eles tinham que entender que eu tinha
crescido.
― Desculpe, como ele está? ― sussurrei e passei os braços à sua
volta. ― Você está bem?
Era uma pergunta idiota, mas ele parecia mais calmo, só um pouco
irritado.
― É bom esquecer um pouco as coisas. ― Ele se sentou em um sofá e
me puxou para seu colo. ― Estou bem na medida do possível.
― Não ligue para aqueles jornalistas idiotas. Acabei com eles assim
que entrei aqui. ― Passei a mão em seu cabelo liso e longo. ― Não gostei
da forma que eles falaram com você. Vi na TV.
Ele se afastou e me olhou.
― Você lidou com eles? O que fez?
Dei de ombros.
― Só disse umas verdades, embora ache que logo todos os jornais vão
dizer que você se casou com uma caipira louca. Mas não me arrependo de
ter defendido meu marido.
Seu sorriso era ofuscante.
― Marido, hein?
― Sim, é o que você é ― declarei, gostando de vê-lo sorrindo um
pouco.
― Sim. Obrigado por estar aqui comigo. Até veio de avião, superando
seu medo. ― Alisou meu rosto. ― Amo você, caipira, como nunca amei
ninguém na minha vida.
― Isso é bom, porque vim atrás do meu marido antes que alguma
vagabunda o roubasse de mim e eu tivesse que matá-la ― falei para distraí-
lo, não por ciúmes, afinal confiava nele.
Seus olhos brilharam divertidos, mas vi emoção ali. Gostei.
― Eu fui domado por você.
Gargalhei.
― Sou boa domadora.
Dessa vez, foi a vez de ele gargalhar. Só fiquei olhando-o, feliz por ele
esquecer um pouco os problemas.
Ouvi algumas pessoas suspirarem, foi quando notei que todos na sala
me olhavam de olhos arregalados, alguns agradecidos, outros
impressionados.
― O que foi? ― sondei corada.
― Agradeço por fazê-lo sorrir um pouco ― disse a morena com um
sorriso.
Assenti.
― Caipira, esses são os meus amigos. Essa morena linda é Angelina, a
esposa de Ryan Donovan, que está ao seu lado.
― Prazer em conhecer a mulher que domou meu amigo ― disse Ryan
com um sorriso. ― Fico contente por isso.
― Eu também. ― Sorri para ele.
Tay revirou os olhos.
― Essa loira ― ele apontou para a mulher elegante, que estava ao lado
do homem bonito de olhos azuis ― é Alexia, casada com Bryan, o irmão da
Sam, esse que está perto dela...
― Isso explica a familiaridade entre você dois. A cor dos olhos. ―
Olhei de um para o outro, que estavam sorrindo.
― Eu sou Tabitta, mas você já deve saber disso, já que seu irmão falou
meu nome ― disse a loira de espartilho. Ela estava ao lado de Jason Falcon
nesse momento. Lindo casal. Ele era alto, forte e com olhos da cor dos meus.
Assenti.
― Eu sou Laurel. Prazer em conhecer vocês ― falei e olhei para uma
TV, que estava ligada baixinho perto de nós. Estava passando a reprise do
meu bate-boca com o repórter, ou melhor, do momento em que acabei com
ele. Olhei para Tay, que estava com os olhos fixos na tela.
― Porra, essa mulher é uma fera... ― disse um cara lindo entrando no
local, de cabelos negros e vestindo um terno caro. Seus olhos piscaram para
mim, sentada no colo de Taylor. ― Merda, Jordan, agora entendo o motivo
de você tê-la escondido de nós. ― Sorriu. ― Uma mulher valente e, ainda
por cima, linda. ― Aproximou-se de mim e estendeu a mão. ― Sou Daniel
Luxem, amigo de Jordan.
Peguei sua mão e a apertei, falando meu nome, mas ele certamente já
sabia. Enrubesci enquanto Jordan bufava com um sorriso.
Daniel olhou para ele.
― Lamento pelo seu pai, cara. Como ele está?
Taylor apertou seu braço em minha cintura, como se eu fosse sua
âncora.
― Foi levado para o quarto após fazer uma lavagem estomacal, mas o
pior passou, ele vai sobreviver. ― Tinha um tom emocionado na sua voz.
Vi-o endurecer assim que três caras que pareciam roqueiros chegaram.
Eu já os tinha visto, na festa de aniversário de Shade. Eram os integrantes da
banda Clave, do pai de Tay.
― Como ele está? ― perguntou um cara moreno de meia-idade, aliás,
os três estavam na faixa dos 45 a 55 anos mais ou menos.
― Vai sobreviver, Silver ― respondeu Taylor. Tinha algo estranho no
seu tom, que ele tentou esconder, mas notei sua raiva controlada.
― Podemos vê-lo? ― sondou outro cara, que era ruivo e sardento.
― Não, Martins. A entrada no quarto dele está permitida somente para
mim, o médico e a enfermeira.
― Por quê? ― questionou o outro cara moreno. ― Por que ele, ao
tomar comprimidos e bebidas, seria mantido em quarentena? Somos seus
amigos.
Tinha algo acontecendo ali que eu não sabia, mas tinha a ver com o pai
de Taylor hospitalizado. Por que ele proibiria todo mundo de entrar no
quarto, quando aqueles que tinham vindo vê-lo eram seus amigos?
― O médico acha que foi tentativa de assassinato. Sua garganta estava
machucada, como se o tivessem forçado a engolir os remédios. ― Notei
seus punhos cerrados e brancos contra meu corpo.
Os integrantes da banda arregalaram os olhos.
― Eu também acho isso, o cara estava feliz por terminar sua carreira
― concordou Silver. ― Tivemos uma reunião ontem, mas ele já vinha há
dias falando nisso, em deixar tudo isso para trás. Eu estava feliz por ele.
― Eu também. Há nove anos ele ia fazer o mesmo, mas então houve o
incidente com a Julieta, e ele ficou na banda, mas se jogou na bebida e nas
mulheres ― falou Martins. ― Ele tem que sair agora, ou vai ao fundo do
poço.
Durante todo o tempo em que eles falavam, notei Bryan, Lucky e Taylor
observando o outro cara. Alguma coisa nele estava errada, a forma como ele
olhava para todos, principalmente para Tay e para mim. Estremeci e me
aproximei mais de meu marido.
― Você não tem nada a dizer, Travis? ― inquiriu Bryan. ― É o único
calado.
Seus olhos se voltaram para ele. Notei aço em seu olhar, mas foi breve,
logo ele estava sorrindo, mas percebi a falsidade ali.
― Claro que concordo, ele é nosso amigo ― respondeu.
― Bom ― disse Bryan. ― Estamos investigando todos que estavam na
boate. A nossa sorte é que o lugar possui câmeras, e isso vai nos ajudar a
descobrir o que houve.
Travis não poderia ficar mais branco; mesmo com sua pele morena, ele
parecia um fantasma.
― Quem é você? ― perguntou.
Bryan sorriu. E, minha nossa, o cara era lindo demais! Embora Taylor
fosse o mais perfeito de todos os homens que eu conhecia.
― Sou amigo de Jordan, mas também um agente do FBI e estou
trabalhando com a polícia para entender o que realmente aconteceu naquele
clube. A investigação está correndo debaixo dos panos até termos provas,
então soltaremos na mídia quem é o assassino.
― Vão soltar? ― indagou Travis, parecendo engasgado ou algo do
tipo.
― Sim.
― Você está dizendo que alguém tentou assassinar o James? ―
perguntou Silver.
― Mas quem faria isso? ― Martins piscou, chocado. ― Acha que é
algum fã maluco?
― Não sabemos ― falou Bryan, mas, pelo seu tom, ele parecia estar
mentindo. ― Mas saberemos em breve, não se preocupe.
Ficamos em silêncio mais alguns minutos. Então Travis pediu licença,
dizendo que tinha que fazer algo. Achei-o muito nervoso. Os outros dois
também foram embora logo depois.
― O que há com aquele cara? ― perguntei baixinho para Taylor.
― Nada ― disse ele e acenou para Bryan, que se levantou e partiu.
Não me queixei por ele mentir, mas estava confusa com tudo que havia
acontecido. Bem, se ele não disse nada, era porque tinha seus motivos. Eu só
tinha certeza de que tinha a ver com seu pai e a tal tentativa de assassinato.
Capítulo dezesseis
LAUREL
Quando cheguei à cidade na noite anterior, estava exausta, tanto que
Taylor queria que eu fosse embora para descansar, mas não o deixei em
nenhum momento. Descansei no dia seguinte, mas só por algumas horas,
depois voltei ao hospital para o lado de Tay. Não queria deixá-lo sozinho.
Já estava anoitecendo quando Tay me levou para visitar seu pai, mas
ele estava dormindo. Tinha soro em sua veia e uma sonda no nariz. Ele se
parecia com o filho, mais velho, claro. Era cheio de tatuagens também.
Taylor teve que dar uma saída para falar com alguém, então fiquei no
quarto com seu pai.
― Oi. Não sei se você está ouvindo, mas queria que soubesse que Tay
não o convidou para o casamento porque nenhum de nós dois sabia que
íamos nos casar, foi repentino. ― Sentei-me na cadeira e olhei para a figura
acamada. ― Ele me ajudou quando me conheceu, não me deixou chorar por
algo que tinha acontecido, me protegeu quando eu estava com medo e me
ajudou a realizar os meus desejos. Um deles era o casamento. Foi coisa de
momento, sabe? Vegas e tudo mais, mas, por causa desse momento, estamos
casados até hoje. Me apaixonei por ele perdidamente.
Olhei para a janela, depois novamente para James.
― Quando você acordar, nós vamos realizar uma reunião com minha
família e a dele. Isso inclui você, tudo bem? Então se levante dessa cama
logo para isso acontecer. Agora somos uma família. ― Inclinei-me mais e
cheguei perto do seu ouvido, sussurrando: ― Seu filho ama você, sabia?
Pude ver a forma como ele olhava para você nessa cama, vi a dor e o medo
que sentiu ao pensar que você poderia não voltar mais para ele, assim como
a mãe.
― O que você está fazendo? ― perguntou Tay entrando no quarto.
Endireitei-me e sorri.
― Conversando com seu pai. Não sei se ele ouve, já que está dopado,
mas não custa tentar. ― Fui até ele e peguei sua mão.
― Sério? O que estava dizendo? ― Deu-me um selinho.
― Bom, como foi nosso casamento, por que ele não foi convidado...
Prometi que, assim que ele melhorar, nós vamos fazer uma festa de
casamento com meus amigos e familiares e os seus ― anunciei.
Ele sorriu e me beijou, mas me afastei, dando um tapa nele.
― O que foi?
― Se comporta, não vamos nos agarrar na frente do seu pai.
Ele sacudiu a cabeça.
― Seus irmãos vão levar você para a casa que você tem aqui ―
informou.
Franzi a testa.
― E você?
― Eles também disseram que não vamos dormir juntos até que
estejamos casados pelo mesmo padre que casou seus pais, que eu tenho de
ficar em um hotel, não com você.
― Meus irmãos não têm nada a dizer sobre minha vida, sou maior de
idade e vacinada, portanto, vou dormir ao seu lado essa noite ― falei de
modo decidido. ― Não preciso me casar de novo com você, aquele nosso
casamento, em Vegas, é válido para sempre.
― Não quero brigar com eles, afinal de contas, comecei do jeito errado
ao me casar com você sem a presença deles, então...
― Então você não vai dormir comigo para não magoar meus irmãos?
Ele triscou meu nariz com a ponta dos dedos.
― Não é bem magoar, mas, se eles quiserem me derrubar e eu revidar,
a única ferida nisso tudo será você, e não quero isso. ― Beijou meu rosto.
― Agora vamos embora.
― Sim, vamos, mas vou dormir com você. Se vai para um hotel, vou
junto. Não vou deixá-lo sozinho. ― Peguei sua mão. ― Deixe que cuido dos
meus irmãos.
― Obrigado, linda. Eu adoraria passar a noite com você, mas antes
tenho que resolver algumas coisas.
― Eu sei que deve estar sendo difícil para você ser traído assim por
alguém que julgava amigo de seu pai ― falei baixo para James não ouvir
caso acordasse.
Taylor descobriu que foi Travis quem tentou matar seu pai, um homem
que era amigo de James desde a adolescência e, juntos, fundaram a banda.
Eu me perguntava por que as pessoas faziam algo assim, trair um amigo de
longa data?
Mais cedo naquele dia, Bryan e Taylor colocaram na mídia tudo o que
aconteceu, como provas que descobriram. Entretanto, antes que a polícia
prendesse Travis, o fodido fugiu.
― Sim, está. Bryan vai me contar o que eles descobriram até agora.
Parece que estão armando um plano para encontrar a localização dele ―
informou. ― A noite vai ser chata, embora todos os meus amigos vão estar
lá.
Antes de sair do quarto, Tay se despediu do seu pai dizendo que
voltaria cedo, pela manhã. Dois seguranças se postaram perto da porta.
― Eu não ligo, só quero estar ao seu lado. Posso ficar com a Sam e as
outras meninas, não tive muito tempo para conversar com elas. Onde vai se
encontrar com Bryan e os outros?
Desde a noite anterior os amigos de Tay estavam sempre com ele,
pessoalmente ou constantemente ligando em busca de notícias. Eram amigos
valiosos. Os meus irmãos também estavam por perto. Cancelaram alguns
shows para ir me procurar em Dallas após as fotos do meu casamento com
Taylor terem sido vazadas. Ainda bem que haviam parado de falar sobre
isso; só comentavam da tentativa de assassinato de James.
― No salão do Hotel Mystic; lá estão hospedados todos os meus
amigos. Lucky vai estar lá também, assim ele cuida da segurança não só de
Sam, mas de Angelina e das outras meninas, incluindo Rayla, que chegou
hoje à tarde com seu marido, Alex.
― Rayla e Alex?
― Sim, Rayla é irmã de Lucky e Ryan. Alex, de Alexia ― informou.
Depois me olhou de lado. ― Já que vai ficar conosco, então avise seus
irmãos.

Eu e as meninas estávamos no lado direito do salão do hotel. Depois de


algum tempo de conversa, eu conhecia um pouco delas.
Tabitta era uma ex-agente do FBI; tinha se tornado mãe de duas meninas
e cuidava dos irmãos de Jason. A mãe dele morrera e deixara os dois para o
filho mais velho tomar conta. Ela era namorada de Jason desde os tempos de
escola, mas seu pai, o chefe de um cartel, matou sua avó e foi atrás dela e de
seu amado. Ela o deixou para a própria proteção dele. Após anos,
reencontrou-o, e os dois tinham uma filha de nove anos que ele nem sabia
que existia. Depois que derrotou um cartel de drogas da máfia russa, ela se
demitiu do FBI e se tornou somente dona de casa.
Alexia era dona e diretora de uma escola, que seus pais haviam deixado
para ela, e era mãe de uma linda garotinha. Ela era uma mulher exuberante e
sua história era a mais pesada de todas. Estava com Bryan desde que ele
passou a protegê-la da perseguição de um psicopata doente que a havia
sequestrado e estuprado anos antes. Finalmente ele a tinha salvado e, com
sua ajuda, ela criava a filha que teve com o monstro e pensava que tinha
morrido no parto, mas enfim retornara aos seus braços.
Rayla era uma loira fabulosa, parecida com um de seus irmãos, Ryan.
Casara-se havia alguns meses com Alex, o irmão de Alexia. Ele não tinha
vindo ficar ao lado de Jordan, seu amigo, porque estava no Japão, num
trabalho. Além de dono do clube Rave, era DJ em boates de luxo.
Samantha a princípio não se entendia com Lucky nem com seu jeito
autoritário, pois ele a queria de qualquer jeito. Trabalhava para ele, mas se
demitiu após ele lhe fazer uma proposta idiota. Depois, ele conseguiu
trabalho para Sam sem que ela soubesse e ameaçou o chefe dela de fechar a
empresa caso ela não aceitasse se encontrar com ele. Na noite do encontro,
ela foi ameaçada pelo pai de Shaw, a criança que adotou, e Lucky a salvou.
A partir daí seu relacionamento se iniciou. Seu pensamento em relação a ele
mudou especialmente após ela descobrir sobre suas caridades e ações.
Angelina era autora e dona de uma editora, que antes era de Daniel, mas
Ryan a comprara para sua esposa gerir. Ela me contou que o conheceu
fazendo uma aposta. Ele queria que Sam desfilasse para sua agência de
moda, então os dois fizeram uma aposta de que ele ficaria com uma mulher,
mas sem transar; a escolhida foi Angelina. Só não contavam que fossem se
apaixonar. Depois, ela engravidou, mas não podia ter filhos, pois sofria de
uma cardiopatia. Mesmo arriscando sua vida, ela teve Victoria, a filha dos
dois.
― Não creio! Ele comprou uma editora para você? ― perguntei
aturdida.
Ela sorriu e assentiu.
― Sim, mas não deve ficar espantada ― ela disse e apontou para Sam.
― Com ela foi pior, Lucky deu uma empresa imensa para ela.
Arfei.
― Céus, isso é demais, não é? Gosto de conseguir as coisas suando e
ralando.
Elas sorriram.
― Eu também ― disseram as duas em uníssono, o que foi esquisito,
depois Angelina falou: ― Eu só soube muito tempo depois que ele tinha
comprado a editora.
― Mas soube que Jordan comprou dois cavalos para você ― informou
Angelina com um sorriso.
― Cavalos? ― indagou Alexia.
― Sim, um árabe e um escocês. Só de pensar no valor que Tay pagou
por eles, fico toda encolhida.
― Quanto mais ou menos? ― sondou Angelina. ― Tenho um chamado
Neve, ele fica no haras de Ryan. Eu vou lá sempre, e, pelo que sei de
cavalos, que também amo, eles não são baratos, ainda mais de raça e bom
pedigree.
― Não são ― concordei. ― Os compramos em um leilão em Dallas,
eram cavalos premiados. Oitocentos mil dólares cada.
Todas arfaram.
― Céus! ― Tabitta tomou um gole de sua bebida.
― Cristo! ― exclamou Sam.
― Sim, isso é...
― Sim ― interrompi Alexia ―, concordo que é demais. Nilan tinha me
dado um cartão para isso, para eu gastar o quanto quisesse com cavalos. ―
Olhei para elas. ― Eu não sou assim, não sou aquela irmã fresquinha que
gasta todo o dinheiro dos irmãos a torto e a direito. Gosto de conseguir por
mim mesma. Por isso ia perder o leilão, pois não aceitei aquele valor
exorbitante, então Tay deu seus lances e comprou os cavalos que eu mais
queria. Um, ele me deu de presente. Achei exagerado, então, quando ele deu
o lance pelo outro, surtei. O esperto me disse que comprou para ele, mas que
o deixaria na fazenda para que eu tomasse conta.
― Oh, o garoto sabe fazer as coisas ― disse Tabitta com um sorriso.
― Concordo com isso ― falei, tomando um gole de meu copo.
― Jordan é fera em fazer negócios, já fechou muitos contratos grandes
para Lucky ― comentou Sam sorrindo. ― Ele é bom.
Concordei com isso também.
― E você? ― perguntou Angelina.
― Eu? ― Franzi a testa.
― Sim, contamos sobre nós, agora fale como conheceu Jordan.
Suspirei e contei sobre o aniversário de Shade, quando o vi com
Melissa, e sobre minha paixão adolescente por ele. Era assim que intitulava
meus antigos sentimentos desde que passei a amar Tay.
― Nossa! ― exclamou Tabitta.
― Sim. Tay veio para mudar tudo. ― Sorri, pegando a bebida e
tomando mais um gole.
― Como conheceu Jordan e se casou com ele no mesmo dia? ―
Angelina sorriu. ― Isso é demais, não é? Casamentos geralmente levam
meses.
― Sim, mas nesse dia era o casamento de Shade, em Las Vegas, então a
coisa estava bastante ruim. Eu estava sofrendo, e Tay ao meu lado foi como
um porto seguro. Ele não me deixou ficar triste ou chorar, então me
perguntou qual era o desejo que eu tinha, mas que nunca havia realizado ou
tentado fazer. ― Olhei para ele, que conversava com os homens do outro
lado do salão. ― Eu tinha três desejos: me casar com um caubói, fazer uma
tatuagem e perder minha virgindade.
― Oh, meu Deus! ― gritou Tabitta, animada. ― Deve ter sido
magnífico! Ou foi desconfortável por não ser quem você queria?
Olhei para ela.
― Na verdade, durante o casamento e em cada momento que tive com
Tay, não pensei em Shade, por incrível que pareça. Pensei em Tay a cada
segundo. ― Passei a mão nos cabelos. ― Foi mágico! Tanto que no outro
dia era para nos divorciarmos, mas esqueci de assinar os papéis e só me
lembrei disso quando estava no avião.
― Cristo! ― gritou Alexia com a mão na boca, mas sorrindo.
― Sim. Você não imagina a surpresa que tive ao vê-lo chegando à
lanchonete da minha amiga. Ele estava magnífico, botas e cinto de fivela de
caubói, camisa xadrez e chapéu Stetson, a mesma aparência do nosso
casamento. ― Peguei meu celular e mostrei a elas as fotos que tirei no nosso
casamento e no dia em que o vi em Dallas. ― Olhem, da mesma forma que
se casou comigo. Lindo, não acham?
― Oh, meu Deus! ― Tabitta olhou para Tay e gritou: ― Você é o cara,
Jordan!
Todos os homens que estavam lá olharam para nós, meio confusos.
Sorri para ele.
― Ela está falando de você vestido de caubói sexy. ― Peguei a bebida
e a levantei como se estivesse brindando com ele.
Seu olhar amoleceu meus ossos. Se eu não estivesse sentada, estaria de
pernas bambas como uma bêbada.
Jason se levantou de onde estava e veio em nossa direção com os olhos
em sua esposa. Parecia sério e chateado, para não dizer mortal.
Eu estava prestes a perguntar qual era o seu problema, mas ele pegou o
celular da mão da Tabitta e olhou por alguns segundos a foto de Tay vestido
de caubói, então jogou o aparelho na mesa.
― Caubói sexy?
Ela não parecia preocupada, só estava sorrindo.
― A parte sexy fui eu que disse ― apressei-me a falar para acalmar o
homem.
Ela o abraçou e disse baixinho algo em seu ouvido. Sua expressão
sombria se foi como uma lâmpada apagada.
Levantei-me sorrindo para as meninas e fui na direção de Taylor, que
abriu os braços para mim, e me sentei em seu colo.
― O que foi tudo isso? ― sondou, beijando minha bochecha.
― Meu caubói sexy. ― Peguei a foto e a mostrei a todos. ― Ele não é
lindo?
Todos riram.
― Desculpe, querida, mas não tenho fantasias com homem, meu
negócio é mulher ― disse Daniel com um sorriso.
Todos na mesa concordaram com ele.
― O que se passa? Conseguiram pegar o Travis? ― questionei,
mudando de assunto.
Quando Travis foi ao hospital, no dia anterior, eles não tinham provas.
Quando acharam o que precisavam para mandá-lo para a cadeia pela morte
da mãe de Taylor e tentativa de assassinato de seu pai, o cara desapareceu.
Bryan estava montando uma armadilha para pegá-lo.
― Não, mas estamos perto. Daemon é um bom rastreador e vai
encontrá-lo ― disse Bryan.
Assenti e olhei para Tay, falando que ia ao banheiro e já voltava, mas,
antes que eu chegasse a uma das cabines, tudo escureceu.
Capítulo dezessete
LAUREL
Acordei e estava sentada em uma cadeira em um... Olhei ao redor e vi
que era um galpão abandonado ou algo assim. Havia duas mulheres ao meu
lado, uma de meia-idade e a outra entre 25 e 28 anos, amordaçadas.
O medo se infiltrou em mim ao perceber o que tinha acontecido. Merda,
eu havia sido sequestrada pelo assassino da mãe de Taylor. Tentei não
imaginar as coisas horríveis que sequestradores costumavam fazer.
Notei que minhas mãos e pés estavam amarrados.
― A Bela Adormecida acordou ― disse uma voz à minha frente.
Levantei a cabeça e tentei não hiperventilar. Precisava estar no
controle, ou surtaria.
À minha frente estava o homem que enganara Tay e seu pai durante
anos, fingindo ser amigo e irmão, mas no final tudo era mentira.
― Você... ― Tentei controlar a raiva que sentia daquele cara.
Travis estava sentado em uma cadeira em frente às nossas.
― O que tem eu? Sou parte de uma banda de rock famosa, meus fãs me
adoram ― disse com uma risada, depois ficou sério. ― Mas a cadela da
Julieta tinha que se meter e convencer James a deixar a banda.
Meu coração parou, sabendo o que aquele fodido de merda ia
confessar, embora eu já soubesse disso, mas estava com medo e com raiva
dele por ter traído o pai de meu marido daquele jeito.
― Você matou a Julieta, não foi? ― rosnei, lutando contra as cordas.
Ele me olhou de lado, depois apertou o play de uma TV que estava
perto de nós, então as imagens me fizeram ofegar de pavor e raiva. Não só a
mim, mas as duas mulheres ao meu lado também.
Eu queria perguntar quem elas eram, mas talvez ele pudesse ficar
furioso e nos machucar.
― Isso é o que a cadela me obrigou a fazer com ela, mas eu não queria
isso ― ele disse. ― Ela só precisava convencê-lo a não deixar a banda, mas
o que a puta fez? Me disse que não ia fazer isso, que a decisão era de James,
não dela.
Eu não disse nada, estava chocada demais vendo Julieta conversando
com aquele traste em uma estufa. Logo percebi que aquele vídeo era do dia
em que ela morreu, então o pior estava por vir, e eu não queria ver. Ela era
uma mulher linda, de pele branca, cabelos castanhos na altura das costas.
― Porra, aquela puta o controlava, e James faria tudo por ela caso
pedisse. Custava me ajudar? ― grunhiu sombrio.
― Ela o amava e percebeu que James estava infeliz com a vida que
levava ― retruquei.
Seus olhos hostis me fuzilaram; se fossem lasers, teriam me matado.
― Amor não existe. Ela era uma mulher cheia de frescura e o queria só
para ela...
― Você é louco? Às vezes a fama deixa as pessoas assim. Não sou
psicóloga para saber disso, mas é um fato, e você estava no auge da fama e
das mulheres, nunca tinha tido nada parecido. Quando James disse que ia
sair da banda, tudo desmoronou para você, não foi? Afinal de contas, ele era
o vocalista. Mas você poderia ter feito carreira solo.
Ele estreitou os olhos, e a raiva brilhava ali.
― Carreira solo?! ― gritou, lançando-se contra mim. Meus olhos se
arregalaram, pensando que ele iria me bater, mas parou a tempo. ― Eu
tentei, mas minha voz não é como a dele. Eu sou baixista. Então não podia
deixar toda nossa carreira acabar e voltar para minha antiga vida.
― E por causa disso sentiu a necessidade de matar Julieta no passado e
agora James? Já pensou que, de qualquer jeito, você perderia tudo o que
tinha? Porque, com a morte dele, a banda acabaria. Os outros integrantes
com certeza não vão querer mais olhar para sua cara ― falei sem hesitar,
embora tudo dentro de mim estivesse com medo do que poderia acontecer
comigo.
Ele olhou para a tela.
― Ela não me deixou escolha ― disse bem a tempo de eu vê-lo
imobilizando-a e a puxando para o quarto. Pegou alguns remédios e a forçou
a ingeri-los. Eu não queria ver aquelas imagens. ― Ela usava comprimidos
para dormir, só acelerei o processo.
― Você a matou! ― sibilei, querendo ficar livre e acabar com aquele
verme imundo.
― Sabe? Quando tivemos uma vida dura, pais violentos e dívidas para
pagar no passado, não queremos voltar para essa vida depois que nos
cercamos do bom e do melhor. Ninguém quer isso ― murmurou, depois
acenou para as mulheres. ― Olhe para elas.
― Quem são elas?
Ele olhou para a senhora. Ela o fuzilava e rosnava através da mordaça.
― Essa mulher ficou durante todos esses anos escondida e não abortou
a filha que eu disse para ela tirar há 26 anos. James ficou sabendo delas e as
localizou, então me perguntou como eu tinha feito algo tão cruel. Por culpa
dela, por não ter feito o que mandei, James ficou furioso e disse que não
queria trabalhar mais comigo, porque eu era um monstro. ― Ele riu, uma
risada debochada, cheia de raiva. ― Então ele quis sair da banda, mas eu
não podia deixar isso acontecer.
― Meu Deus, você é um monstro mesmo! Como pôde a mandar abortar
sua própria filha? ― Meu tom soou enojado.
― Você não entende, não é? Vocês três são as culpadas! ― gritou.
― Culpada de quê? Eu nem o conheço!
― Jordan, Mirian e Sarah, os três são culpados por James tentar deixar
a banda, e vou fazê-los pagar com juros tudo que perdi! Minha carreira
acabou por causa deles!
― Você vai nos matar?
― Você é um monstro desgraçado! Matou meu namorado e me estuprou
diariamente quando me levou com você! ― sibilou a mulher, falando pela
primeira vez, assim que Travis tirou sua mordaça. ― E, quando fiquei
grávida, me mandou abortar! Acha que eu queria seu maldito dinheiro? Eu
não quero nada seu, a não ser sua morte, seu filho da puta!
Ele ficou furioso e se lançou para ela, mas, antes que eu gritasse, houve
um estrondo na entrada do galpão.
Finalmente!

TAYLOR
― Vamos prender o fodido assassino que matou minha mãe e tentou
acabar com o meu pai ― falei assim que Bryan disse que tinha descoberto a
localização de Travis.
Tinham policiais indo para o local em que ele se encontrava naquele
momento, e eu estava feliz com isso.
Olhei para o corredor que dava para o banheiro aonde a caipira tinha
ido havia um tempo. Ela estava demorando.
Fui até as meninas para saber se tinham visto Laurel. Meu peito estava
apertado, uma sensação que eu não entendia.
― Vocês viram a caipira? ― perguntei a elas, que negaram e ficaram
preocupadas.
Minhas entranhas se apertaram. Algo não estava nos eixos. Corri para o
banheiro. Talvez ela tivesse passado mal ou algo assim. Todavia, ele estava
vazio, exceto por uma mensagem no espelho.
James tirou meus sonhos e minha felicidade, agora vou tirar o que
seu filho mais ama.
Meus músculos travaram e minhas mãos se apertaram em punhos.
Aquele desgraçado havia pegado a minha mulher e iria machucá-la!
Pessoas falavam ao meu redor, mas meus ouvidos pareciam tampados.
Ouvi Bryan gritar com alguém ao telefone.
― Travis está com ela?! Estou indo pra aí! Entra no lugar agora, não o
deixe machucá-la! ― ordenou.
Olhei para ele.
― O que está acontecendo? Eles sabem onde minha esposa está? Ela
está bem? Como ele entrou aqui quando estava sendo vigiado? ― Minha voz
se elevou: ― Porra, me diz que eles têm isso sob controle! Estou a um
segundo de perder minha mente!
― Sim, ela está bem. Sei onde estão, e meus colegas vão entrar agora
no lugar. Se quiserem ir, então vamos. Mas parece que ela não é a única
refém, também há uma mulher e a filha dele no lugar.
― Filha? Nunca soube que Travis tinha filhos. ― Segui-o para um
Mercedes.
― Sabe aquela história que eu disse sobre ele e um amigo terem
espancado o namorado de uma garota no passado e depois a terem
estuprado, mas nada ter sido comprovado? ― perguntou enquanto dirigia.
Assenti.
― A mulher é ela, mãe da menina, fruto do estupro.
― Porra! Se ele a tocar...
― Não vai, os policiais estão entrando lá agora. Se tivesse acontecido
algo a ela, eles já nos teriam dito.
Ficamos em silêncio enquanto nos aproximávamos de um imóvel não
muito longe do hotel em que estávamos. Parecia com um galpão, e estava
escuro, mas vi os carros de polícia. Meu coração martelou nas costelas,
porque as sirenes e os policiais me fizeram lembrar de quando encontraram
minha mãe morta nove anos antes.
Saí correndo do carro e fui na direção das viaturas. Vi Laurel ao lado
de duas mulheres. Um policial estava tomando seus depoimentos.
― Tay... ― sussurrou ela e veio correndo para os meus braços.
Peguei-a firme e a abracei forte, não querendo soltá-la nunca mais na
vida. A partir de hoje, ela vai andar sempre com segurança, pensei. Não
quero e não vou passar por isso de novo.
― Você está bem? Ele a tocou ou machucou você? ― perguntei em tom
preocupado.
Ela suspirou.
― Estou bem, só quero sair daqui e ficar com você ― disse com a voz
tremendo.
― Vamos embora.
Capítulo dezoito
LAUREL
Dois meses depois

Após meu sequestro em Los Angeles, o baixista da banda Clave, Travis


Willon, foi preso por assassinato, tentativa de assassinato e estupro.
A mulher, mãe da filha de Travis, depôs contra ele e contou tudo o que
aconteceu durante todos aqueles anos, o medo que tinha de Travis encontrá-
la e machucar a sua filha de alguma forma.
Fiquei apenas um dia em Los Angeles com Taylor, porque, quando meus
irmãos souberam do sequestro, trouxeram-me de volta para a fazenda. Eu
não queria, mas Tay concordou com eles que em Dallas eu estaria mais
segura.
Quando acordei no dia seguinte, Milton e outro cara, um moreno
chamado Ramires, estavam na minha propriedade.
― Seus guarda-costas ― disse Tay assim que liguei para ele
perguntando o motivo de os dois homens estarem em minha fazenda. ―
Milton foi contratado por seus irmãos, e Ramires, por mim.
― Não preciso de um guarda-costas, ainda mais de dois. Nunca
precisei.
― Não, mas agora precisa. Não vou correr o risco de perder você; essa
hipótese quase aconteceu ― falou Tay com a voz rouca. ― Vai ficar com
eles até eu chegar aí.
― Mas você mora em Manhattan, então não vai estar sempre comigo...
Oh, meu Deus, nós nunca conversamos realmente sobre isso, porque você
sempre morou lá, e eu, aqui. Não posso deixar a fazenda...
Ele me interrompeu:
― Eu moro onde você morar; se vai ficar na fazenda, então eu também
vou, além disso, a maneira que administro os meus negócios me dá
autonomia, não preciso estar lá todos os dias e tenho alguns negócios em
Dallas ― ele me disse com doçura. ― Vai ficar tudo bem, caipira. Vamos
fazer funcionar.
Depois disso, ele realmente se mudou para a fazenda, o que me deixou
feliz.
Seu pai, James, estava se curando. Ele foi traído por um cara que jurava
ser seu amigo, e esse homem matou sua esposa, que ele tanto amava.
― Fico feliz por Jordan ter você na sua vida. A forma como ele reage a
você é mágica ― James me disse uma noite, quando o trouxemos para a
fazenda.
― Tay é bom e lindo. Nós nos amamos.
― Tay... ― falou o apelido e fechou os olhos por um momento, depois
me olhou. ― A mãe dele o chamava assim. Depois que ela se foi, quando o
chamávamos dessa forma, ele se enraivecia e às vezes até brigava. Então
passamos a chamá-lo de Jordan.
― Shade me disse.
― Mas você? Eu vejo a forma como ele reage ao ser chamado assim
por você; sua expressão brilha de felicidade, amor e devoção.
― Sinto o mesmo por ele ― confessei, pigarreando. ― Tay é meu tudo,
meu porto seguro, minha fortaleza.
― Fico feliz com isso. Sei que minha cabeça não está em um bom lugar
agora, mas vou superar. Esta fazenda parece mágica, então vou lidar com
tudo.
Depois disso ficamos cada vez mais próximos. Tay e eu ficamos ao
lado dele e lhe mostramos a verdadeira razão da felicidade. Talvez um dia
tivéssemos o privilégio de ver James feliz; as suas feridas ainda estavam
cruas.
Brittany realmente saiu do hotel de Tay e passou a trabalhar comigo.
Ele não a demitiu, foi ela que pediu para sair, dizendo que adorava trabalhar
no campo.
Nessa época, eu e Taylor brigamos, porque ele ficou chateado por eu
ter pegado emprestado o dinheiro dos meus irmãos, mas Tay já tinha pagado
a obra inteira sem me avisar. Tentei devolver seu dinheiro, mas ele não
aceitou. Essa foi nossa primeira briga, ou melhor, discussão depois da
reconciliação.
― Nós somos casados ou não? ― perguntou ele com os dentes
trincados.
― Claro que sim, mas isso não quer dizer...
Ele me interrompeu:
― Quer dizer que tudo que você tem é meu, a fazenda, os cavalos e até
você mesma!
Quando ele disse isso, um fogo atravessou meu corpo de forma que me
fez ofegar e me remexer onde estava sentada, à mesa do café da manhã.
― Então não me critique por querer tomar conta do que me pertence ―
rosnou, vindo até mim. ― Se seus irmãos não estivessem em casa, eu a
colocaria sobre meus joelhos e a ensinaria a não me desobedecer.
Naquele dia, ele realmente me ensinou uma lição com suas palmas em
minha bunda.
Estava fazendo dois meses desde que ele me contara a verdade e quatro
do nosso casamento. Taylor mudara minha vida da água para o vinho.
― Tay ― chamei-o assim que saí do quarto à procura dele para lhe
mostrar minha surpresa.
Ele estava conferindo as obras da pousada e do haras, então lhe mandei
uma mensagem e o esperei no quarto, sentada. Tinha tirado uma foto minha
com a roupa que eu usava.
Numa noite em que estava navegando na internet, deparei-me com uma
fofoca sobre Taylor ser um homem controlador na cama e gostar de BDSM.
Tinha até uma foto de ele saindo de um clube com essa reputação. Pesquisei
sobre o assunto e vi as posições que faziam lá, os objetos que usavam. Nós
nunca havíamos feito nada parecido. Eu já tinha sido algemada, mas nada tão
pesado quanto o que eu estava vendo. Por isso comprei algo para iniciar o
que eu queria, porque queria tudo com ele, desejava que ele não se
controlasse comigo só porque eu era sua esposa. Se ele gostava de jogos, eu
também gostaria.
― Caipira ― disse meio ofegante conforme entrava no quarto.
Sorri.
― Oi.
Seus olhos estavam arregalados me vendo com um conjunto de lingerie
vermelha de renda.
― Espero não ter interrompido o meu marido em uma hora ruim ―
comentei em tom sexy.
― Nilan e Gave estão checando algumas coisas, e meu pai está com
eles.
Nilan e Gave estavam verificando a obra, a banda não tinha shows
agendados naqueles dias. Shade havia ido atrás de Melissa em Austin. Eu
ainda não sabia o que tinha acontecido entre eles. Depois ligaria para saber.
Precisava ter uma conversa com Melissa e ser amiga dela, só estava dando
tempo para os dois se acertarem.
― Mas o que é tudo isso? Não que eu esteja reclamando. ― Sorriu
com os olhos quentes.
― Que bom, porque comprei um brinquedinho para você usar em mim e
jogarmos. Soube que gosta disso.
― Soube?
― Vi uma foto em que você estava saindo de um clube de BDSM, então
pensei: por que não? Acredito que vou gostar, porque, só de pensar naquelas
posições, eu me sinto quente. ― Apertei minhas pernas uma na outra.
― Puta merda! ― Ele olhou para a cama, especificamente para o que
íamos usar, uma correia parecida com cinto, mas que prendia as duas coxas,
mantendo-as abertas e dobradas, e passava em volta do pescoço.
― Eu vi na internet e comprei. Sabe como colocar isso? Não li as
instruções ainda, mas, se não quiser...
Ele trancou a porta e veio na minha direção sem tirar os olhos dos
meus.
― Você quer jogar? ― Sua voz estava rouca.
― Sim ― respondi ofegante. As bolinhas de prata dentro de mim
estavam me deixando louca. Ele não tinha a mínima ideia de que eu as usava.
― Tire a calcinha e se sente na beirada da mesinha com as mãos
apoiadas para trás.
Fiz o que ele mandou.
― Ótimo! ― disse e pegou uma venda, que estava na cama, e veio até
mim, colocando-a em meus olhos. ― Vai dar mais excitação.
Assenti, muda. Ele me deu um selinho e se afastou um pouco, porque
seu calor sumiu.
― Agora erga as pernas como se fosse dobrá-las no peito, mas as deixe
abertas. Faça isso sem tirar as mãos do lugar, na mesa ― ordenou.
Minha respiração descompassou assim que fiquei tão exposta para ele,
embora Tay já tivesse visto cada parte de mim. Senti a correia em volta do
meu pescoço e logo prendendo minhas coxas, mantendo-as bem abertas e
com meus joelhos dobrados.
― Puta que pariu, isso é uma bolinha de prata? ― Agora foi sua vez de
respirar pesado.
Gritei assim que ele a puxou para fora:
― Puta merda!
― Isso resume tudo, querida. Seu mel está escorrendo aqui, pronto para
mim. ― Ouvi uma cadeira sendo puxada e depois senti seu hálito próximo à
minha boceta exposta. ― Linda demais...
― Você está me matando, Tay... ― sussurrei com um gemido.
― Eu vou comê-la agora, e não grite de novo, porque, se seus irmãos
chegarem para nos atrapalhar, sou capaz de esganá-los ― falou, e então sua
boca estava em mim. Fui arrebatada no mesmo instante.
Ele me sugou com tanta fome que quase me fez perder as forças, mas me
controlei e tentei não gritar, mas estava difícil.
― Tay...
Ele não respondeu, só acelerou mais o movimento da sua língua e
lábios mágicos em mim. Eu queria tocar sua cabeça e enterrá-lo mais em
mim, tamanho o meu desejo.
― Goza para mim, linda! ― rosnou e deu um puxão em meu clitóris,
que me fez gritar e me trouxe à beira do orgasmo.
No último segundo, ele estava dentro de mim, enchendo-me com seu
pau, que eu adorava. Suas mãos puxaram meu sutiã para fora, e sua boca
desceu para os meus peitos, lambendo-os e os chupando com intensidade.
― Mais forte, Tay! ― gritei.
Ele deu um puxão em meu cabelo, fazendo-me gemer, e me beijou com
um rosnado, impossibilitando-me de gritar e alguém ouvir, embora, nesse
momento, eu não estava ligando para nada nem ninguém.
Aprofundei mais o beijo enquanto ele me fodia com força, assim logo
explodimos.
― Está satisfeita agora, minha esposa linda? ― Ele me beijou de leve,
tirando minha venda.
Pisquei e encontrei seus olhos azuis brilhantes. Sorri.
― Muito, tanto que vou ceder sobre as construções na fazenda, vou
tentar não surtar com o seu dinheiro...
― Nosso e dos nossos filhos, que ainda vamos ter ― ele me disse com
um sorriso.
Fiquei feliz por ele ter dito isso naquele momento. Embora ele já
tivesse falado que queria filhos, as coisas estavam diferentes. Alguns dias
antes, eu tinha feito um teste de farmácia, porque minhas regras estavam
atrasadas, e dera positivo. Confirmei com o exame de sangue naquele dia,
pela manhã. Por isso organizei uma reunião de família ali, para revelar a
todos, mas, antes, precisava dizer ao Tay.
Ele tirou as fivelas da cinta que me prendia e saiu de mim, ajudando-me
a alongar minhas pernas, que tinham ficado rígidas devido à posição, mas
amei cada segundo daquilo.
Fui ao banheiro me limpar e, assim que voltei para o quarto, vi Taylor
ajeitando suas roupas. Ele sorriu para mim.
― Era para eu estar lá fora trabalhando ― disse.
Dei de ombros.
― Essa é a vantagem de ser o chefe. ― Sorri. ― Além disso, sua
prioridade é satisfazer sua esposa não importa a hora.
― Satisfazer minha esposa, hein? ― Beijou meus lábios.
― Claro, é sua prioridade.
Ele riu.
― Notei que seu apetite por sexo aumentou durante os últimos dias.
Nós transamos de três a quatro vezes por dia, ou mais. ― Ele me olhou de
lado.
― Está reclamando? ― Arqueei as sobrancelhas.
A ginecologista tinha dito, mais cedo, que aquele apetite era por causa
dos hormônios da gravidez.
― Imagina, estou amando cada segundo disso ― respondeu, dando um
aperto na minha bunda. Eu estava com sua camiseta preta.
― Que bom ― falei e suspirei. ― Preciso te dizer uma coisa, mas não
sei se você vai gostar ou ficar com raiva.
Ele se afastou e estreitou os olhos.
― O que foi?
― Não sei por onde começar. ― Meu coração batia forte.
― Laurel, me diz que porra está havendo. Você está tensa. ― Tocou
meu rosto.
― Lembra quando paramos de usar camisinha porque eu tomava
anticoncepcional, mas eu disse que me esquecia de tomar os comprimidos às
vezes? ― falei de uma vez. ― Bom, eu esqueci e descobri que estou
grávida.
― O quê?! ― Sua voz se elevou.
Eu me encolhi.
― Sinto muito, era para eu ser mais cuidadosa, mas...
Ele pegou meu rosto em suas mãos.
― Por que está com medo? Acha que não quero filhos?
― Mas você falou que os queria daqui uns anos, e agora eu estou...
― Laurel, eu amo você de uma forma que nunca imaginei ser capaz de
amar e estou completamente feliz por termos um filho ou filha. Seja o que
vier, será bem-vindo.
Limpei meus olhos molhados.
― Eu me sinto a pessoa mais feliz do mundo ― sussurrei. ― Também
amo você, meu caubói.
Ele sorriu.
― Bom, deixei Manhattan para viver em uma fazenda em Dallas com
uma caipira linda e sexy, então acho que mereço o título. ― Piscou.
― Linda e sexy? ― Sorri, passando a mão em seu peito. ― Essa
gravidez vai me matar de tesão. Acha que consegue mais uma?
Ele me olhou com desejo.
― Vamos, antes que seus irmãos cheguem. ― Ele me pegou nos braços,
colocou-me na cama e, em seguida, pairou em cima de mim. ― Eu amo
você.
― Também amo você, para sempre. ― Então o beijei, rendendo-me
àquele amor e agradecendo a quem o enviara para a minha vida.

Fim
Bônus
LUCKY
Já fazia dias que meu telefone tocava direto, ligações que eu não queria
atender. Mary tinha deixado de ser minha mãe quando me abandonou quando
eu era criança. Até então eu não sabia seus motivos, nem se tinha algum.
Talvez ela fosse apenas uma cadela fodida mesmo, não?
Três semanas, e eu estava sendo perseguido por ligações do advogado
dela. Até falei com meu advogado para que tentasse impedi-lo de me
atormentar com aqueles malditos recados, porque eu não queria saber dela
de forma alguma.
Entretanto, ela persistia com o recado de que precisava falar comigo
sobre uma coisa importante, e, se eu não fosse visitá-la, jamais saberia o que
realmente havia acontecido comigo e seus motivos para me abandonar tão
jovem.
Falei a mim mesmo que não queria saber, mas, no fundo, ainda restava a
dúvida dos motivos que a tinham levado a me odiar e desejar minha morte.
Sentei-me à mesa em frente à pessoa que um dia eu havia amado e
chamado de mãe – ao menos na infância. Eu ainda me recordava do
abandono; às vezes só queria apagar tudo da minha mente.
Mary estava acabada, não tinha mais nenhuma maquiagem ou cabelos
tratados pelos melhores da área. Parecia mais velha do que era.
― O que tem de tão importante para falar comigo? ― questionei em
tom duro. Sabia que a cadela era minha mãe, mas, além do abandono, ela
havia roubado meu dinheiro, então por que eu deveria ser educado e tratá-la
com luvas de pelica? Aquela mulher merecia mais do que minha frieza,
merecia o meu desprezo total.
Ela olhou para mim e Bryan, ao meu lado, e franziu o cenho.
― Por que não veio sozinho? Achou que eu mataria você? ― Seu tom
era incrédulo e raivoso, mas também cheio de sarcasmo. ― O que eu
poderia fazer aqui?
Eu não tinha levado o Bryan por medo. Ele apareceu na minha empresa,
a Onix, assim que eu estava saindo e decidiu vir junto.
― Você tentou isso uma vez, se esqueceu? Deixou-me sozinho em uma
casa, com fome, para morrer naquele lugar. ― O desdém era evidente na
minha voz.
Ela nem se encolheu ou piscou com minhas palavras. Certamente aquela
mulher era feita de pedra, por não se importar com o próprio filho. Eu amava
minha menina e, por ela, moveria Céu e Terra. Faria isso até por Shaw, que
não tinha meu sangue, mas eu o amava como se fosse meu. Por isso a frieza
daquela mulher me deixava com mais raiva.
― Soube que tem uma filha. Meus parabéns... ― começou, mas a
cortei, grunhindo:
― Não me chamou aqui para falar da minha família, porque você nunca
ligou para isso. ― Estava perdendo a paciência com toda aquela falsidade.
― Vá direto ao ponto, pois tenho mais o que fazer ao invés de olhar para
essa sua cara.
Ela estreitou os olhos.
― Preciso que me tire daqui...
Ri, sacudindo a cabeça com fúria; estava quase explodindo como um
maldito vulcão, logo estouraria, mas torcia para não matar minha própria
mãe – ou a mulher que me colocou no mundo, porque mãe de verdade ela
nunca havia sido.
― Você é louca? ― sibilei enfurecido. ― Você e o bastardo do seu
filho adotivo me roubaram! Acha que vou deixá-los soltos? Ninguém me
rouba e fica impune.
Mary foi presa depois que usou Kevin, que trabalhava para mim – a
mando dela, vale salientar – e era filho do homem com quem ela estava na
época, para desviar meu dinheiro. Certamente convenceu o trouxa a me
roubar, e por causa disso os dois estavam presos.
― Você tem muito dinheiro e não sabe nem o que fazer com ele. Se a
vadia da sua mulher não tivesse dado com a língua nos dentes...
Senti Bryan endurecer ao ouvi-la chamar sua irmã daquela forma.
― Não ouse manchar o nome da minha esposa, você é a única vadia
aqui. ― Levantei-me, ou quebraria a cara dela, embora soubesse que jamais
espancaria uma mulher. Só por isso ela ainda estava inteira. ― Se era
apenas isso que tinha a dizer, estou indo embora. Você não vai ver a luz do
dia fora deste presídio.
Ela suspirou, parecendo frustrada. Na verdade, ambos estávamos,
embora eu apostasse que fosse por motivos diferentes.
― Você é um homem arrogante, mas tudo bem... Se é assim que quer
jogar... ― apontou para a porta, dando de ombros ― vá embora sem saber
onde suas irmãs vivem e como andam até hoje.
Virei-me, porque já tinha quase alcançado a porta. Olhei para a víbora,
pensando não ter ouvido direito, mas, pela cara dela, era justamente o que eu
tinha acabado de ouvir.
― Irmãs? Eu não tenho irmãs, e você não tem nenhuma filha, porra!
Então não me venha com essa merda! ― grunhi. ― Não acredito em nada
que venha dessa sua boca mentirosa! O que uma pessoa não faz por
dinheiro?
Ela arqueou as sobrancelhas e se escorou na cadeira com um sorriso
diabólico.
― Não? Se você não acredita em mim, o problema é seu, mas elas
existem. São gêmeas e mais novas do que você. Dei as duas para pessoas
diferentes.
Uma cadela de rua era mais mãe do que aquela mulher tinha sido.
Estreitei os olhos.
― Então onde elas estão e com quem? ― perguntei, mas, conhecendo
Mary, sabia o que iria querer em troca da informação que acabava de
revelar.
Ela sorriu.
― Acha que vou dizer a troco de nada? Tire-me deste lugar, e eu falo,
ou você nunca saberá onde elas moram nem o que fazem ou como estão. Será
que estão bem ou passando dificuldade? E você cercado do bom e do
melhor... ― Ela checava as unhas enquanto falava, como se estivesse
analisando-as após sair de um salão de beleza.
Meu peito parecia ter sido socado com força. Eu não podia soltá-la,
mas como descobriria sobre minhas irmãs? O que elas faziam? Será que
estavam bem? Será que sofreram como eu, sendo abandonadas para morrer
de fome?
Porra! O que vou fazer agora?!
SEMPRE FOI VOCÊ
Série Dilacerados
Livro VI

IVANI GODOY
Copyright © - Ivani Godoy

Revisão: Analine Borges Cirne

Esta é uma obra ficcional.


Qualquer semelhança entre nomes, locais ou fatos da vida real é
mera coincidência.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser
utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem a
autorização por escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº.
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do código penal.
Prólogo

SOPHIE
Estava olhando para o garoto que eu amava bem na minha frente, o meu
melhor amigo desde criança.
Tínhamos perdido uma aposta, por isso estávamos naquele quartinho de
vassouras; teríamos que ficar ali até a meia-noite e nos beijar. Poderíamos
apenas dizer aos nossos colegas que tínhamos nos beijado, mas, no fundo, eu
queria muito aquilo.
O lugar em que Daniel e eu estávamos era bem apertado, e ficamos
colados um no outro.
Sua respiração estava tornando minha concentração difícil, e eu só
queria beijá-lo de forma enlouquecida.
― Seu coração está batendo muito rápido ― observou ele com seu
hálito quente.
― Não é nada. ― Tentei clarear minha mente nebulosa igual ao lugar
em que estávamos, com iluminação fraca.
― Quer mesmo que eu te beije? Posso falar que aconteceu, e ficamos
aqui até meia-noite, como é o esperado.
Ao ouvir aquilo, meu coração rachou. Então ele não queria me beijar?
― Se não quer me beijar, basta dizer, Daniel. Não precisa inventar
desculpas. ― Empurrei-o, mas seu corpo não se moveu do lugar.
Daniel, para sua idade – 17 anos –, era bem forte, corpo no lugar certo.
Eu não tinha qualquer chance com ele.
― Sophie, não é nada disso. É só que ouvi seu coração acelerado e
achei que você não quisesse.
― Vamos acabar com isso logo. ― Beijei seus lábios. No começo, ele
ficou parado, provavelmente em choque, mas logo depois aprofundou mais o
beijo, e suas mãos apertaram minha cintura.
Sua língua mergulhou em minha boca numa dança erótica e selvagem.
Cada puxão de língua me fazia gemer mais, tanto que não ligava para quem
ouvisse.
Senti minhas costas no chão e ele em cima de mim; não me importei que
não fosse uma cama a princípio nem que, para ele, aquilo fosse apenas uma
aposta que perdeu. Entretanto, para mim, era tudo, o amor que sempre sonhei
em ter um dia, a partir do momento em que descobri que o amava havia
alguns anos.
Suas mãos passearam em minhas coxas antes de abri-las e ele se
encaixar ali, fazendo-me perder o resto do fôlego.
― Esses malditos lábios são como mel ― rosnou no meu pescoço,
deixando-me respirar.
O meu centro pulsava, louco para ser saciado, um lugar que ninguém
jamais tinha tocado, embora eu desejasse que ele fizesse. Suas mãos estavam
uma em minha coxa, e a outra entre minhas pernas.
― Daniel... ― Não sabia o que pediria, só queria que ele me tocasse
mais do que apenas na boca.
Assim que falei, foi como se um interruptor houvesse sido desligado, e
então Daniel piscou, encarando-me ali, através da luz fraca do lugar. Percebi
naquele momento que ele tinha se arrependido de me tocar. Pelo menos foi o
que vi em seus olhos.
― Merda! Não era pra ter acontecido isso. ― Olhou para mim debaixo
dele, com o vestido levantado na cintura e sua mão perto de onde, outrora, eu
quis que ele tocasse. ― Me desculpe, não vai mais acontecer.
Ouvir aquelas palavras foi como receber um soco no estômago. Doeria
menos. Não pensei e só o empurrei antes de sair correndo do lugar sentindo-
me humilhada como nunca.
Aquela foi a primeira vez que Daniel quebrou meu coração.
Capítulo 1

SOPHIE
Passado

― Como está o menino Daniel? ― perguntou mamãe ao ligar para mim.


― Semana que vem é aniversário dele. Já pensou no que vai dar?
Não precisava responder dizendo que eu já sabia disso, mas sabia a
intenção dela ao comentar sobre o assunto. Todos sabiam que eu amava
Daniel, menos ele. Sempre que eu pretendia me declarar, as palavras
simplesmente não saíam.
Conhecia Daniel praticamente minha vida inteira. Meus pais
trabalhavam na casa dos pais dele antes mesmo que eu existisse, então
praticamente eu e o filho dos patrões crescemos juntos. Entretanto, eu não
via Daniel como um irmão ou amigo, era apaixonada por ele desde sempre,
mas sabia que não tinha a menor chance.
Havia um ano nós nos beijamos. Passamos um tempo juntos naquela
noite; não tivemos sexo, só amassos e beijos. Para ele, não foi nada, mas
para mim foi tudo, um lembrete de que o tive por uma noite – ou ao menos
alguns minutos dela –, mas o sonho de cinderela acabou e virou realidade no
instante em que notei que Daniel pareceu arrependido de ter me tocado ao
ponto de me pedir desculpas. Isso foi o pior. Fiquei uma semana sem falar
com ele, mas então o perdoei e nunca mais toquei no assunto.
― Sophie? ― mamãe chamou na linha, trazendo-me ao momento.
Ela e papai estavam na casa de campo na Itália com os pais do Daniel,
os Luxens, que decidiram viajar. Para não deixar Daniel solitário, a pedido
de mamãe, fiquei no quartinho dos empregados que havia na sua mansão de
estilo italiano em Manhattan, com jardins imensos, embora morasse com
meus pais em uma pequena casa para empregados cedida pelos patrões.
Nunca liguei para status, poder e riqueza. Dinheiro era importante, sim, mas
não era tudo. Eu era feliz com o que tinha e, no futuro, assim que me
formasse, seria médica e não deixaria meus pais continuarem trabalhando.
Tomaria conta deles.
Viver tão perto de Daniel não era fácil, ainda mais depois de descobrir
o que eu sentia por ele. Claro que sempre fomos amigos, mas, antes do nosso
beijo, notei que meus sentimentos mudaram. Talvez fosse porque não o via
mais como um garoto magricela que conhecia, e sim um com o corpo forte e
duro nos lugares certos. Isso se devia às horas de academia que fazia na sua
casa.
Com quase 18 anos, ele já tinha o corpo formado de homem, mas não
era só seu corpo e rosto que eram lindos, mas também seu coração; era um
garoto que valia ouro, por isso minha mãe perguntava sobre ele toda vez que
nos falávamos.
― Desculpe, mãe. ― Entrei na cozinha para pegar um copo de água. Já
eram quase 21h. Quando eu dormia na casa dos patrões, não gostava de ir
àquele cômodo à noite, ainda mais quando os Luxens não estavam. Daniel
tinha mania de trazer garotas para casa, e isso me machucava, então, para
evitar, eu normalmente ficava no quarto, apesar de que fazia um bom tempo
que eu não via nenhuma garota ir ali. Naquela noite, eu tinha me esquecido
de levar água comigo para a dependência de empregados.
― Tudo bem aí, na casa dos Luxens? Sei que você não queria ficar aí,
mas tudo vai se resolver. ― Ela parecia cheia de segredos. ― Daniel
precisa de amigos nesse aniversário, porque os pais dele não vão estar aí.
― Quando eles tiveram tempo para o Daniel ou ligaram para ele? ―
desdenhei, pois via meu amigo sozinho, sem os pais desde que me conhecia
por gente. ― Não sei como pessoas como eles têm filhos se, no final, não
ligam para eles.
Se um dia tivesse filhos, eu os amaria incondicionalmente e não haveria
nada mais importante que eles. Bem diferente de como era para os pais de
Daniel. Eu seria como meus pais, que, mesmo não sendo os verdadeiros,
ainda assim eram pais de verdade, que me deram amor e proteção.
Fui adotada quando era um bebê. Meus pais me encontraram sozinha em
uma lixeira próxima à casa deles, mas o pior era que era por volta das 9h da
noite. Que mãe larga seu filho assim, sozinho e desprotegido? Uma
criancinha indefesa? Essa pessoa não valia nenhum dos meus pensamentos.
Os Winters sempre foram meus pais e seriam para sempre, e eu os amava.
― Verdade. Eu nunca deixaria você desse modo, meu amor. Desde o
dia em que apareceu na minha vida, você foi a melhor coisa. ― Pude ouvir a
verdade ali.
― Sei disso, mamãe. ― Pigarreei, colocando o copo na pia. ― Sou
feliz com você e o papai.
― E com o menino Daniel. Aproveite esse final de semana com ele. ―
Suspirou. ― Quem sabe você não confessa o que sente pelo garoto?
Ri, sacudindo a cabeça.
― Dizer o quê? ― grunhi, colocando a chamada no viva-voz enquanto
lavava o copo.
Não foi por falta de tentar, porque eu sempre quis dizer tudo o que
sentia, mas travava e não conseguia. Queria ter mais coragem, mas
infelizmente era covarde demais para tal coisa. Quando nos beijamos, eu
quis contar-lhe que aquele momento não tinha sido só um jogo para mim, mas
que realmente o amava. Então ele disse que o beijo não deveria ter
acontecido, o que foi muito doloroso. E se eu me declarasse e ele fizesse
aquilo de novo?
― Sophie, querida, você ama esse rapaz, e acredito que ele também te
ama, porque vejo a forma que olha para você. Vocês dois precisam parar de
esconder o que sentem e ficar juntos.
Ri baixinho, pois não queria que ela sentisse minha tensão, já que não
tinha lhe contado sobre o beijo.
― Desde quando a senhora virou casamenteira? Não preciso de
cupido. Daniel é meu amigo, mas é um grande idiota e um galinha que fica
com todas as garotas. Não vou ser mais uma na sua lista, pois, quando chegar
o dia seguinte, sou eu que farei a caminhada da vergonha. ― Sacudi a
cabeça.
Aquilo era uma das coisas que mais doía e aumentava o medo de eu
confessar o que sentia, pois, se ficássemos juntos, talvez logo depois nos
tornássemos dois estranhos ou mudássemos o que sentíamos. Dessa forma,
ele me deixaria quebrada de forma que nunca mais eu conseguiria me
reerguer. Daniel tinha essa capacidade, mesmo não sabendo disso. Se um
único beijo foi desastroso e fez doer tanto quando ele não sentiu o mesmo
que eu, imagina o que teria acontecido se aquilo tivesse ido mais longe?
― Sophie, não acredito que o menino Daniel faça algo assim, ele
venera o chão que você pisa. ― Sua voz soou orgulhosa, embora sempre
fosse desse modo ao falar do Daniel. ― Você não ama esse garoto?
― É disso que se trata, mãe, Daniel é o amor da minha vida, mas é só
um sonho que não vai se realizar. É como se eu fosse o mar, e ele, o Sol,
sabe? ― Inspirei fundo. ― Como fogo e gelo. Então nunca poderemos ficar
juntos.
― Você é muito pessimista, minha filha. ― Suspirou de novo. ―
Deixe-me perguntar, você seria o gelo ou o fogo? Porque sei que a garota
que criei não deixaria ninguém pisar nela ou desmerecê-la.
― Não estou sendo pessimista, mamãe, só estou apontando o óbvio.
Mas chega de falar do meu amor não correspondido. O que posso dar de
presente a alguém que tem tudo?
Em todos os aniversários dele, eu o levava para almoçar ou jantar, ir ao
cinema ou outros passeios. Teve uma vez que comprei um relógio que me
custou várias horas extras na lanchonete em que eu trabalhava meio período.
Ele não gostou disso pelo fato de que tive de ficar até tarde no emprego
muitos dias para juntar dinheiro, então me propôs que passássemos a passear
ou ter encontros, então aceitei.
De qualquer forma, ele sempre estava feliz aonde íamos e com o que
fazíamos. Isso me deixava contente.
― Pode levá-lo para a praia e declarar o seu amor. Aposto que o
menino irá ganhar seu presente. ― Ouvi um sorriso na voz dela. ― Agora
tenho que ir. Ligo para você depois. Te amo, querida.
― Também amo você, mamãe, boa noite. Diga ao papai que também o
amo. ― Desliguei e suspirei. Quando me virei para ir ao quarto, dei de cara
com Daniel. Arfei com a mão no peito. ― Droga, Daniel! Quer me matar do
coração?
― Então quer dizer que você me ama? Por que nunca me contou?
Escondeu suas emoções tão profundamente que nunca pude ler. Achei que
gostava de mim, mas só como irmão ― disse Daniel de repente, escorado no
batente da cozinha. Ele estava de bermuda e sem camisa, mostrando seu
abdome definido, lindo com seus cabelos negros curtos e olhos escuros.
Meu coração martelou forte ao vê-lo ali parado e me olhando com uma
expressão quase traída. Não sabia o que o levou a ficar com aquela
expressão. Sabia que tinha escondido dele o que eu sentia, mas não era
traição ou algo assim. Não queria que ele sentisse culpa por não poder
retribuir o mesmo que eu. Aquele era um dos meus maiores medos. Além
disso, nossas vidas eram diferentes, pois eu era filha dos empregados dos
pais dele.
― Daniel, eu... ― comecei, mas o que diria? Que eu não era mulher
suficiente para enfrentá-lo e dizer o que sentia por ele? Poderia ter dito na
manhã depois de passar a noite com ele, mas não consegui.
Seus olhos se estreitaram.
― Vai negar o que sente? Porque estou aqui há alguns minutos e ouvi
tudo o que conversou com a dona Alísia. Então não minta para mim ―
pediu.
― Não ia fazer isso. Só não preciso dizer nada sobre o que sinto,
porque sei que não sente o mesmo...
Seus olhos pareceram ficar mais escuros.
― Está dentro de mim para saber o que sinto? Se soubesse, então
saberia que amo você e sempre amei ― declarou, vindo na minha direção.
Tentei ficar o mais longe possível de Daniel, porque, se me tocasse,
estaria perdida. Infelizmente, não cheguei a ir tão longe, porque ele puxou
meu braço e me imprensou na parede, colando seu corpo em mim sem nunca
tirar os olhos dos meus.
― Não me faça rir, Daniel. Você nunca me quis. Não tem muito tempo
que vi que estava com uma garota em sua cama, e aposto que hoje deve vir
outra para cá ― desdenhei, tentando passar por ele, mas não deixou. ― Isso
sem contar o que aconteceu entre nós há um ano. Se me ama como diz, por
que se arrependeu de me beijar? Não me venha com essa.
Tentei não demonstrar a dor que eu estava sentindo ao dizer aquelas
palavras.
― Quando descobri o que sentia por você, depois de beijá-la, eu ia me
declarar e perguntar se sentia o mesmo, mas então ouvi uma conversa sua
com a Stacy em que você dizia que jamais me amaria como um homem, mas
como irmão. ― Seu tom soou triste no final. ― Não imagina a dor que senti
ao ouvir isso.
Franzi a testa, tentando recordar-me dessa tal conversa com a Stacy
naquela época, então me lembrei.
― Mas eu só disse aquilo porque ela falou que você tinha acabado de
foder uma garota. Como acha que me senti naquele momento? Me beijou à
noite e, no dia seguinte, estava fodendo alguém.
Meneou a cabeça de lado, colocando as mãos na parede ao lado da
minha face.
― Não fodi ninguém por semanas antes de beijá-la, nem depois disso.
Acredito que Stacy mentiu, tanto é que vocês não são mais amigas. E, para
falar a verdade, ela dava muito em cima de mim. Aposto que foi por isso que
mentiu.
Descobri sobre isso não muito tempo depois daquela conversa. Ela me
chamou para ir a um baile e disse que Daniel tinha me chamado lá, mas no
final era só para que eu o visse com outra garota. Afastei-me dela não
apenas por isso, mas também porque senti o esfriamento em nossa amizade.
Acho que nunca fomos amigas de verdade. Éramos apenas colegas.
― Foi após o nosso beijo que você descobriu que me amava? Ou
antes? ― Seu hálito quente banhou meu rosto, impossibilitando-me de
pensar com coerência.
Sabia que, quando ele me tocasse, seria o fim, porque tinha consciência
do que sua presença me causava ao estar tão próximo como naquele
momento, em que eu podia sentir seu cheiro de lavanda e sabonete.
― Por favor, Sophie, eu preciso saber. ― Tocou minha bochecha,
deixando minha pele pegando fogo.
Fechei os olhos por um minuto, não querendo pensar nas suas palavras,
pois me senti humilhada e rejeitada.
― Foi há muitos anos, apesar de obter a certeza depois do nosso beijo.
Mas depois você me disse para esquecê-lo como se não tivesse sido nada.
― Sophie, por favor, abra os olhos, linda. Não gosto de vê-la triste ―
sussurrou. ― Lamento pelo que ouviu. Só preciso que saiba que fiz aquilo,
que falei para você esquecer, porque fui idiota, estava confuso com meus
sentimentos recém-descobertos, tanto que depois fui te procurar, mas ouvi
sua conversa com a Stacy e decidi ficar calado. Eu não queria que ficasse
com pena de mim por amar você.
― Doeu ouvi-lo falar aquilo, que nosso beijo não deveria ter
acontecido. Isso me fez pensar que você tinha se arrependido. Parecia que
tinha enfiado as mãos em meu coração e o esmagado. Nunca me senti dessa
forma, e piorava quando o via com uma garota ― murmurei. ― Por isso
estava pensando em ir para uma universidade distante...
Ele arregalou os olhos.
― Por que não me contou, Sophie? Eu só ficava com essas meninas
porque não podia ter você. Como disse, eu não sabia que você me amava
assim, porque sempre foi tão reservada em esconder as coisas de mim.
Também tinha o fato de você ter saído com o Adriano... ― Ele trincou os
dentes. ― Naquele dia, eu quis matá-lo. Só não o fiz porque não achei justo
me meter na sua vida.
― Adriano? Só fui acampar com ele e seus amigos. Stacy estava junto.
Além do mais, eu não transei com ele, como você fode outras garotas ―
grunhi.
Ele suspirou.
― Lamento pelo que fiz, mas prometo que, de agora em diante, se você
me quiser, serei apenas seu ― jurou. ― Não posso mudar o passado, mas
vou fazer de tudo para não ver essa dor em seus olhos de novo.
Algo que eu amava em Daniel era o fato de ele não mentir. Tudo que
dizia e prometia, fazia o possível para cumprir. Eu podia ver a verdade e a
jura em seus olhos naquele instante.
O nosso problema foi não termos dito o que sentíamos um pelo outro, o
amor que tínhamos. Eu não podia lutar contra ele, e para quê? Não queria
fazer isso.
Sorri.
― Isso aqui vai ser só meu? ― Coloquei a mão sobre seu coração e o
senti estremecer.
― Sim, eu me entrego de corpo e alma a você ― declarou com
intensidade. ― Agora vou fazer algo que estou morrendo de vontade de fazer
há muito tempo.
Seus olhos ficaram injetados, enquanto eu engolia em seco.
― O quê?
― Isso. ― Então sua boca estava na minha, beijando-me faminta. Acho
que o mais correto era afirmar que ele estava me consumindo, tanto que meus
ossos viraram gelatina, e, se seus braços não estivessem à minha volta, eu
teria caído.
Seus lábios macios nos meus me faziam ter a sensação de flutuar. Sentir
sua língua reivindicando a minha era como ser atingida por um raio, mas de
maneira boa, pois me deixava pegando fogo dos pés à cabeça, ao ponto de
flutuar. Suas mãos passeavam por todo o meu corpo, fazendo com que eu
fervesse com uma sensação maravilhosa. Desejei tanto aquele momento ao
lado dele de novo, estar ali tocando-o e sentindo suas carícias. Minhas mãos
também estavam em suas costas, e o senti estremecer, mas não reclamou,
então continuei.
Gemi, esfregando minhas pernas uma contra a outra para tentar aliviar a
excitação que o atrito ali causava. Queria que ela fosse contida, de
preferência por ele. Todos aqueles desejos eram novos, e eu os sentia
somente com Daniel.
― Por favor... ― Não liguei por corar nem me senti envergonhada por
suplicar, só queria que aquela dor em meu centro parasse de latejar.
Daniel rosnou, um som baixo e rouco, e me levantou do chão,
colocando-me na mesa. Fez tudo isso sem tirar os lábios dos meus.
― O tanto que sonhei com esses malditos lábios enquanto me
masturbava ― sussurrou na minha boca, depois se afastou. ― Deita na mesa,
bebê.
Assim que fiz o que me mandou, meu short de dormir e a calcinha foram
tirados de mim, e então senti sua boca onde eu mais necessitava de cuidados.
Uma voz fraca na minha cabeça me dizia para me preocupar em estar na
cozinha dos pais dele, mas meu cérebro estava frito, acho que nem se a casa
pegasse fogo eu conseguiria parar. Sentia-me como se estivesse em
combustão. Tudo em mim vibrava.
Sua língua dançou em meu nervo pulsante. Juro que fui arrebatada.
Senti-me no espaço cósmico, cercada pelas estrelas brilhantes.
― Tão doce como mel, porra! ― grasnou. ― Meu maldito céu!
Ele não me deixou recuperar o fôlego, colocando um dedo em mim.
― Daniel, isso é tão bom...
― Muito apertada. ― Seus olhos escuros estavam em meu rosto,
quentes como o Sol. ― Não acredito que esse broto suculento e rosa é
apenas meu. Eu o quis por tanto tempo.
Não conseguia abrir minha boca, nem sabia se conseguiria dizer meu
próprio nome, ainda mais quando ele acrescentou outro dedo em meu centro.
Entretanto, dessa vez estremeci com a intrusão. Nesse instante, ele parou de
se mover.
― Promete que só eu colocarei a boca aqui? ― ele falou enquanto
voltava a movimentar os dedos, dessa vez de leve, de forma que me fez
arrepiar. ― Jura que ninguém mais fará isso?
Minha mente estava nublada pelo desejo e luxúria, mas consegui dizer:
― Sim, Daniel. Só você tem meu corpo, alma e coração. Sou toda sua
para sempre... ― Minha voz falhou assim que seus dedos tocaram em um
ponto dentro de mim, e gritei pelo seu nome, sem me importar em parecer
uma louca por sexo, não só por isso, mas também por aquele garoto que tinha
cada parte da minha alma, cada parte de mim.
O prazer aumentou assim que ele começou a me foder com a boca e os
dedos; a palavra pode ser um pouco rude, mas, naquele momento, eu estava
amando ser fodida daquela maneira pelo Daniel.
― Porra! Isso é tão bom! ― Gemi, pegando sua cabeça e a
pressionando mais no meu centro. ― Mais rápido, Daniel!
Sua língua era vulcânica. Era assim que eu a chamava, porque me sentia
prestes a explodir como um vulcão a cada estocada de língua que ele me
dava. Era mais uma dança malabarista na minha boceta. Com um chupão
arrebatador em meu clitóris, explodi de forma tão intensa que meu corpo
teria sido lançado para cima se não fosse suas mãos em meus quadris.
Fiquei ali, esparramada na mesa, sem energia e de olhos fechados,
desfrutando da imensa sensação pela qual fui tomada. Nunca tinha me
sentido daquela forma.
Ele deu mais um beijo entre minhas pernas e tirou os dedos. Nessa
hora, senti falta de outra coisa dele, uma que também estava ansiando havia
muito tempo.
― Tão saboroso esse seu suco... ― Sua voz estava rouca de desejo e
luxúria.
Encontrei seus olhos famintos e abrasadores, mais poderosos que o Sol.
Seus dedos estavam em sua boca, enquanto ele lambia o que sobrou do meu
prazer. Juro por Deus que esse gesto quase me fez entrar em combustão de
novo.
Daniel me puxou para os seus braços e me beijou. Pude sentir a sua
necessidade, a protuberância em seu short, tão dura em minha barriga. Sabia
o que precisava fazer, e Daniel queria aquilo tanto quanto eu.
Afastei-me e vesti meus shorts e calcinha. Não podia ficar com ele na
cozinha, meus sentidos tinham voltado – ou ao menos o pouco que me restou
deles.
― Vamos para o meu quarto. Lá posso cuidar de você. ― Peguei sua
mão.
Daniel não tirou os olhos de mim por nenhum segundo, como se não
acreditasse que eu realmente estava ali. Eu não precisava ler mentes para
saber que ele pensava isso.
― Se não estiver pronta, posso esperar ― começou, mas eu sabia que
ele estava eufórico, louco para continuar, assim como eu.
― Esperei muito por você, escondi tanto o que eu queria. Agora que o
tenho ― apertei sua mão ―, quero você todinho para mim, Daniel. Estou
pronta para nós.
Ele assentiu.
Dei um passo rumo à dependência de empregados daquela casa, mas
Daniel me deteve.
― Podemos ir para o meu quarto.
Não reclamei quanto ao pedido, só o segui para a sua suíte no andar de
cima. Eu já tinha ido ali antes. A cama california king ficava à direita, onde
tinha uma vidraça que ia do teto ao chão. O lugar era enorme, quase do
tamanho da minha casa.
Daniel me beijou com fome enquanto tirava a minha roupa em tempo
recorde, depois me colocou na cama com delicadeza, como se eu fosse uma
pluma. Pairou sobre mim, e meu corpo já estava a todo vapor de novo. Seus
lábios sugaram meus seios, primeiro um, depois o outro, deixando-me
eufórica e febril.
― Lamento por não ter percebido naquela noite o que sentia por você.
Achei que era apenas uma noite de amassos para nós dois, então, quando
tive certeza dos meus sentimentos, ouvi aquilo que a Stacy disse. Depois
daqueles beijos e dos toques, senti uma paixão avassaladora.
― Daniel, quero você dentro de mim ― choraminguei, abrindo mais
minhas pernas. ― Sonhei tanto tempo com esse momento. O meu amor
também é avassalador.
― Minha querida, se soubesse o que você sentia por mim, não teria
esperado tanto tempo para tê-la clamando meu nome. ― Ele tirou sua
bermuda e se curvou, pegando uma camisinha no criado-mudo.
― Deixe-me fazer isso. ― Peguei o envelope e o rasguei. Em seguida,
pisquei ao olhar direito para seu pau duro e reto, que pingava seu pré-gozo,
mostrando sua excitação.
Assim que o cobri, ele se posicionou entre minhas pernas, e o senti em
minha entrada.
― Vou devagar, tudo bem? ― Daniel me avaliava e esperou que eu
assentisse para adentrar alguns centímetros.
Eu não estava nervosa, aliás, ansiava por aquilo igual a uma corsa que
almeja água. A cada porção que entrava em mim, eu sentia a intrusão e um
leve desconforto, mas, com seus beijos e carícias, logo tudo se transformou
em prazer.
Eu já havia tido sua boca, e era muito boa, mas não tinha nada como tê-
lo dentro de mim, ocupando cada centímetro. A cada estocada, ele me levava
ao limite, tanto que minhas unhas apertavam suas costas, mas ele não
reclamou, só gemeu.
― Goza no meu pau, linda ― ordenou com uma de suas mãos entre nós,
seus dedos circulando meu clitóris, então tudo em mim se dissolveu em luz.
― Tão perfeita, ainda mais quando goza. ― Sua voz estava rouca ao
estocar mais uma vez em meu interior, então gozou duro clamando meu nome.
Sorri toda mole assim que ele caiu em cima de mim, sem energia como
eu.
― Amo você ― declarei ao fitar seus olhos ardentes e cheios de amor.
Daniel beijou com doçura as minhas pálpebras e sorriu também.
― Também amo você, mais do que pode imaginar. ― Sua mão foi para
o centro do meu peito. ― Obrigado por me dar seu coração. Prometo
guardá-lo e protegê-lo com a minha vida.
― Você também me deu o seu. Então pode ficar com o meu. ― Beijei
de leve seus lábios. ― Tomarei conta dele e prometo amá-lo e jamais
machucá-lo.
― Para sempre irei amá-la, minha Sophie ― jurou.
Capítulo 2

SOPHIE
Presente

Seis meses atrás, descobri que tinha anemia aplástica e que precisava
de um transplante urgente. Todavia, estava sendo difícil conseguir alguém
que fosse compatível. Eu estava na fila de espera, então era só aguardar para
ver o que aconteceria dali para frente. Por isso, decidi que não queria trazer
mais pessoas para a minha vida, pois eu poderia morrer em pouco tempo.
Fui adotada quando criança e teve uma época em que quis saber quem
eram meus pais verdadeiros. Queria perguntar o motivo de minha mãe
verdadeira ter me abandonado. Eu teria sido um erro tão grande assim que a
levou a me deixar em uma lixeira? Fui tratada pior do que um cachorro
sarnento. Nem um animal merecia tal tratamento.
Depois de um tempo, não me importei mais em encontrá-la, então,
quando descobri a doença e que, para o transplante, haveria mais chance de
compatibilidade se fosse alguém da família, o meu amigo Wellington me
ajudou a descobrir quem minha mãe era, não só ela, mas meu irmão também.
Assim que eu soube, fui visitá-la. Mary estava na cadeia, porque
roubou dinheiro de seu próprio filho. Como uma mãe era capaz de tal ato?
Procurei-a não apenas para pedir ajuda, mas porque queria descobrir os
motivos que a levaram a me abandonar. Talvez ela tivesse sofrido depressão
pós-parto. Eu só queria entender suas razões.
Se eu quisesse apenas o transplante, irmãos eram mais prováveis, e
ainda assim a compatibilidade não era forte. Lucky Donovan poderia me
ajudar. Eu queria ir até ele... Só precisava ter coragem de contar-lhe que era
sua irmã. Quando eu soube que também tinha um irmão, fiquei imensamente
feliz. Na hora, só queria me apresentar a ele, mas precisava primeiro
assimilar tudo. Afinal, havia acabado de saber que tinha uma família
biológica.
Uma parte de mim me dizia que eu não deveria estar ali, naquele
presídio, mas a outra falava que eu precisava daquilo, mesmo que estivesse
com medo da reação dela. Poderia ser algo bom acabar com aquela angústia,
porque, senão, sempre teria uma parte de mim perguntando-se se poderia ter
sido diferente, se Mary poderia no fundo ter algo bom dentro de si.
Eu estava ali, na sala de espera, aguardando minha mãe. Tinha
ressentimento pelo que ela fez, mas seria capaz de esquecer, ou ao menos
tentar, se ela fizesse um mínimo de esforço para querer me conhecer, se
tivesse ao menos um pouquinho de preocupação em me perder, como uma
mãe de verdade teria.
― Ora, ora... Quem é viva sempre aparece. ― Ouvi uma voz soando
divertida e irritada ao mesmo tempo. ― Não achei que um dia você viria
aqui para me ver neste lugar.
Franzi a testa, olhando para a mulher de meia-idade. Não parecia ser
aquela que vi nas revistas, com roupas de luxo e toda maquiada, cabelo
feito. Essa parecia uma bagunça.
― Não me olhe com pena ― grunhiu enquanto se sentava diante de
mim. ― Você não é melhor do que eu.
Ignorei sua grosseria e foquei no que eu queria saber dela, os motivos
que a levaram a me abandonar sem se importar comigo. Algo em meu peito
se apertou, porque, no fundo, eu sabia que não aconteceria como eu
esperava, mas não imaginava que seria tratada com tanta frieza.
― Por que nunca me procurou? ― Fui direto ao ponto, não querendo
enrolar mais. ― Por que me abandonou daquela forma?
A maneira que me olhou, como se eu fosse idiota e ingênua, trouxe uma
pontada ao meu coração. É claro que eu sabia que não seria recebida com
flores e alegria, mas por que tanto ódio? Não fazia sentido.
― Acha mesmo que eu iria desperdiçar o meu tempo com você ou seus
irmãos? O pior erro da minha vida foi ter tido vocês, malditos bastardos. ―
O asco era evidente na sua voz.
― Por que nos teve então? Deveria ter evitado! Naquele tempo já tinha
a maldita camisinha e outros contraceptivos. Uma mulher só tem filhos se
quiser, pois há várias formas de prevenir. ― Cerrei os punhos com raiva. De
repente, algo que ela disse chamou a minha atenção. ― Você disse “você ou
seus irmãos”. Então quer dizer que tenho mais de um? Sei que Lucky
Donovan é um deles. Quem é o outro?
Ela fechou a cara.
― O que faz aqui mesmo? ― Riu, zombeteira. ― Veio atrás de mim
para eu ser sua doadora? Eu soube que pode morrer com sua doença e sabia
que logo viria até mim ou até seu irmão. Inclusive, estou surpresa de não tê-
lo procurado ainda.
Estreitei meus olhos.
― Como sabe tanto sobre mim? Anda me espionando? Uma mãe
deveria se importar com sua filha ― rosnei irritada.
Ela riu.
― Acha que eu me daria ao trabalho de segui-la? Você não vale a pena,
nem grana tem. Por que eu haveria de me importar com uma garota como
você? ― desdenhou.
― Então como...
― A velha da sua mãe veio me implorar essa manhã para salvar a sua
vida. Talvez eu possa ser uma doadora. Trouxe até uma foto sua para tentar
amolecer meu coração. ― Revirou os olhos. ― Como se eu me importasse
com suas lágrimas ou com o que acontecer com você.
Pisquei. Minha mãe tinha estado ali? Eu nem sabia que ela estava na
cidade. E, se tinha vindo, por que não foi até mim? Queria apenas conversar
com a Mary?
Meu coração doeu por saber que ela havia implorado ajuda àquela
mulher que me deu à luz. Falo dessa forma porque a palavra “mãe” é
sagrada, uma mãe se preocupa com seus filhos, diferente daquela cobra, que
zombava da dor dos outros. Ela se achava inabalável? Que o castigo de
Deus não poderia cair sobre si? Não se pode tratar nem ao próximo assim,
imagina uma filha ou um parente.
― Como pode ser assim? Minha mãe está sofrendo por minha causa
justamente por não poder fazer nada para me ajudar. Você não passa de um
monstro! ― Arfei, limpando as lágrimas do meu rosto.
― Não vou fazer nada sem dinheiro. Quanto vale a sua vida? ― Ela
colocou as mãos sob o queixo. ― O que fará para evitar morrer? Estaria
disposta a dar uma grande quantia? Também tenho outra condição, ou seja,
duas. O que vai fazer?
O solavanco em meu coração foi tão forte que mal consegui assimilar.
Como um ser humano podia pedir dinheiro para salvar alguém? Ainda mais
uma mãe em relação à própria filha? Dona Alísia não tinha meu sangue e,
mesmo assim, daria sua vida por mim. Até se deslocara até ali, disposta a se
humilhar para conseguir que Mary me ajudasse.
― Quanto você quer? Quanto almeja pela doação da medula? Quanto
quer para me dizer quem é meu outro irmão ou irmã? ― sondei. Talvez
minhas economias dessem, não pela medula, mas para eu saber sobre meu
outro parente. Senti-me feliz em saber que tinha mais alguém, não porque
poderia me salvar, mas porque minha família estava crescendo, e eu amava a
ideia de ter irmãos.
― Quinhentos milhões de dólares, além da minha liberdade definitiva.
Quero ficar livre dessa cadeia em que o maldito do seu irmão me colocou.
― Ela se recostou na cadeira e sorriu. ― Tem todo esse poder, garota? Se
tiver, então temos um acordo.
Arregalei os olhos.
― Você está doida? Como acha que tenho todo esse dinheiro? Nem se
eu trabalhasse toda a minha vida. ― Estava chocada e chateada por ter
perdido o meu tempo indo até ali, quando sabia que não valeria de nada.
Mary continuou sorrindo como se não se importasse com o meu estado
chocado e furioso.
― Isso não é problema, pois seu irmão Lucky tem mais do que isso,
pode acreditar. Aquele maldito fedelho é bilionário, então esse valor não vai
fazer nem cócegas na conta dele ― comentou, com inveja do meu irmão.
Levantei-me depressa, mortalmente decepcionada.
― Você é mesmo desequilibrada se acha que vou pedir esse dinheiro a
ele só para que me ajude. Como alguém é capaz dessa merda? Só sendo sem
escrúpulos como você! ― Tentei não gritar, porque corria o risco de os
guardas me colocarem para fora. De qualquer forma, eu só queria sumir
daquele lugar e nunca mais vê-la.
― Por que não? Se acha tão certinha a ponto de morrer sem pedir ajuda
ao seu irmão? ― zombou com um olhar afiado. ― Conheço mulheres como
você, querida, que se fazem de sonsas, mas não passam de golpistas.
― Fale por você. ― Trinquei os dentes. ― Não vou me aproximar do
Lucky e pedir algo assim a ele. Também não quero sua medula, só quero
saber onde está o meu outro irmão.
Eu já estava perto da porta, quando ela falou:
― Você vai morrer só para não ter que pedir ajuda? Isso é orgulho e
uma completa idiotice.
Dei de ombros.
― Não vou, porque, ao contrário de você, o Lucky pode me ajudar e
não irá querer nada em troca. Ele é um ser humano decente, e você, uma
vadia golpista que, se depender de mim, apodrecerá nesta cadeia. Só vim
aqui hoje pensando que talvez tivesse mudado com o tempo, mas vejo que
ficou pior, cheia de ressentimento, amargura e ambição pelas coisas dos
outros. De hoje em diante, para mim você está morta.
Saí daquele lugar antes que fizesse alguma besteira e acabasse atrás das
grades. Estava com raiva dela e tinha motivos para isso. Aquela mulher era
desumana, alguém que foi capaz de abandonar a própria filha dentro de uma
lixeira. Fui idiota por procurar saber dela. Pelo menos algo bom resultou
disso, acabei descobrindo que Lucky e eu tínhamos mais um irmão ou irmã,
embora eu não soubesse onde estava.
A cobra da Mary me pedia algo impossível para falar onde nosso irmão
estava. Eu não poderia pedir ao Lucky que a libertasse e que me desse
aquele valor em troca de ela dizer o paradeiro do nosso irmão. Seria uma
garota? Se sim, como estaria? Certamente também tinha sido abandonada,
como nós dois, Lucky e eu. Merda! O que fazer? Desistir não era opção,
mas as coisas estavam complicadas, tudo acontecendo ao mesmo tempo. Eu
não podia segurar aquele fardo sozinha, precisava me abrir com alguém, com
Lucky.
Capítulo 3

LUCKY
Já fazia dias que meu telefone tocava direto, ligações que eu não queria
atender. Mary tinha deixado de ser minha mãe quando me abandonou quando
eu era criança. Até então eu não sabia seus motivos, nem se tinha algum.
Talvez ela fosse apenas uma cadela fodida mesmo, não?
Três semanas, e eu estava sendo perseguido por ligações do advogado
dela. Até falei com meu advogado para que tentasse impedi-lo de me
atormentar com aqueles malditos recados, porque eu não queria saber dela
de forma alguma.
Entretanto, ela persistia com o recado de que precisava falar comigo
sobre uma coisa importante, e, se eu não fosse visitá-la, jamais saberia o que
realmente havia acontecido comigo e seus motivos para me abandonar tão
jovem.
Falei a mim mesmo que não queria saber, mas, no fundo, ainda restava a
dúvida dos motivos que a tinham levado a me odiar e desejar minha morte.
Sentei-me à mesa em frente à pessoa que um dia eu havia amado e
chamado de mãe – ao menos na infância. Eu ainda me recordava do
abandono; às vezes só queria apagar tudo da minha mente.
Mary estava acabada, não tinha mais nenhuma maquiagem ou cabelos
tratados pelos melhores da área. Parecia mais velha do que era.
― O que tem de tão importante para falar comigo? ― questionei em
tom duro. Sabia que a cadela era minha mãe, mas, além do abandono, ela
havia roubado meu dinheiro, então por que eu deveria ser educado e tratá-la
com luvas de pelica? Aquela mulher merecia mais do que minha frieza,
merecia o meu desprezo total.
Ela olhou para mim e Bryan, ao meu lado, e franziu o cenho.
― Por que não veio sozinho? Achou que eu mataria você? ― Seu tom
era incrédulo e raivoso, mas também cheio de sarcasmo. ― O que eu
poderia fazer aqui?
Eu não tinha levado o Bryan por medo. Ele apareceu na minha empresa,
a Onix, assim que eu estava saindo e decidiu vir junto.
― Você tentou isso uma vez, se esqueceu? Deixou-me sozinho em uma
casa, com fome, para morrer naquele lugar. ― O desdém era evidente na
minha voz.
Ela nem se encolheu ou piscou com minhas palavras. Certamente aquela
mulher era feita de pedra, por não se importar com o próprio filho. Eu amava
minha menina e, por ela, moveria Céu e Terra. Faria isso até por Shaw, que
não tinha meu sangue, mas eu o amava como se fosse meu. Por isso a frieza
daquela mulher me deixava com mais raiva.
― Soube que tem uma filha. Meus parabéns... ― começou, mas a
cortei, grunhindo:
― Não me chamou aqui para falar da minha família, porque você nunca
ligou para isso. ― Estava perdendo a paciência com toda aquela falsidade.
― Vá direto ao ponto, pois tenho mais o que fazer ao invés de olhar para
essa sua cara.
Ela estreitou os olhos.
― Preciso que me tire daqui...
Ri, sacudindo a cabeça com fúria; estava quase explodindo como um
maldito vulcão, logo estouraria, mas torcia para não matar minha própria
mãe – ou a mulher que me colocou no mundo, porque mãe de verdade ela
nunca havia sido.
― Você é louca? ― sibilei enfurecido. ― Você e o bastardo do seu
filho adotivo me roubaram! Acha que vou deixá-los soltos? Ninguém me
rouba e fica impune.
Mary foi presa depois que usou Kevin, que trabalhava para mim – a
mando dela, vale salientar – e era filho do homem com quem ela estava na
época, para desviar meu dinheiro. Certamente convenceu o trouxa a me
roubar, e por causa disso os dois estavam presos.
― Você tem muito dinheiro e não sabe nem o que fazer com ele. Se a
vadia da sua mulher não tivesse dado com a língua nos dentes...
Senti Bryan endurecer ao ouvi-la chamar sua irmã daquela forma.
― Não ouse manchar o nome da minha esposa, você é a única vadia
aqui. ― Levantei-me, ou quebraria a cara dela, embora soubesse que jamais
espancaria uma mulher. Só por isso ela ainda estava inteira. ― Se era
apenas isso que tinha a dizer, estou indo embora. Você não vai ver a luz do
dia fora deste presídio.
Ela suspirou, parecendo frustrada. Na verdade, ambos estávamos,
embora eu apostasse que fosse por motivos diferentes.
― Você é um homem arrogante, mas tudo bem... Se é assim que quer
jogar... ― apontou para a porta, dando de ombros ― vá embora sem saber
onde suas irmãs vivem e como andam até hoje.
Virei-me, porque já tinha quase alcançado a porta. Olhei para a víbora,
pensando não ter ouvido direito, mas, pela cara dela, era justamente o que eu
tinha acabado de ouvir.
― Irmãs? Eu não tenho irmãs, e você não tem nenhuma filha, porra!
Então não me venha com essa merda! ― grunhi. ― Não acredito em nada
que venha dessa sua boca mentirosa! O que uma pessoa não faz por
dinheiro?
Ela arqueou as sobrancelhas e se escorou na cadeira com um sorriso
diabólico.
― Não? Se você não acredita em mim, o problema é seu, mas elas
existem. São gêmeas e mais novas do que você. Dei as duas para pessoas
diferentes.
Uma cadela de rua era mais mãe do que aquela mulher tinha sido.
Estreitei os olhos.
― Então onde elas estão e com quem? ― perguntei, mas, conhecendo
Mary, sabia o que iria querer em troca da informação que acabava de
revelar.
Ela sorriu.
― Acha que vou dizer a troco de nada? Tire-me deste lugar, e eu falo,
ou você nunca saberá onde elas moram nem o que fazem ou como estão. Será
que estão bem ou passando dificuldade? E você cercado do bom e do
melhor... ― Ela checava as unhas enquanto falava, como se estivesse
analisando-as após sair de um salão de beleza.
Meu peito parecia ter sido socado com força. Eu não podia soltá-la,
mas como descobriria sobre minhas irmãs? O que elas faziam? Será que
estavam bem? Será que sofreram como eu, sendo abandonadas para morrer
de fome?
Porra! O que vou fazer agora?!
― Vamos, Lucky. Talvez seja tudo mentira mesmo ― Bryan falou pela
primeira vez. Com toda a merda que ouvi, acabei me esquecendo dele ali
comigo.
Se fosse dinheiro que ela quisesse, eu até lhe daria em troca da
informação, mas a liberdade? O pior não era isso, mas sim que não havia
garantia de que ela realmente estivesse dizendo a verdade. Eu precisava
apurar as informações antes. Sabia que conseguiria, mas precisava de algum
tempo.
― Não achei que fosse mesquinho ao ponto de não se importar com
alguém do seu próprio sangue ― ela continuou. ― Como alguém pode ser
capaz disso?
Eu devia ficar quieto quanto àquela réplica, mas estava furioso demais
para manter a compostura.
― Quem você acha que é para me julgar? Uma mulher que abandona
seus próprios filhos, como uma puta qualquer... Que garantia tem de elas não
estarem mortas? Era para eu estar, só não morri por causa dos Donovans,
que me salvaram, senão estaria numa tumba. O que faz você acreditar que
elas estejam vivas?
― Ao contrário do que aconteceu com você, eu sempre soube onde e
com quem elas estavam. ― Não havia remorso em sua voz pelo que ela tinha
feito com seus filhos. Se fosse só por má condição financeira... mas ela me
deixou da pior maneira possível, e eu não acreditava que com minhas irmãs
tinha sido diferente.
Bryan chegou perto de mim e falou baixo, só para que eu ouvisse:
― Vou procurar saber a verdade. Não dê o que essa mulher quer,
porque ela não merece sair deste lugar.
Sabia que Bryan estava certo quanto àquilo. Virei-me para a mulher que
me deu à luz, mas que nunca se importou comigo.
― Posso saber por que teve filhos se não gostava de nós? Nos
abandonou como se fôssemos lixo. Tem alguma razão por trás disso ou
realmente você é só uma cadela psicótica que adorava engravidar e maltratar
os filhos?
Ela não pareceu se importar com o que eu disse, aliás, nunca se
importava.
― Acha que ligo para a sua opinião? Não. Mas a verdade é que eu não
queria ter tido nenhum de vocês. ― Olhou-me de lado. ― Os três me
lembravam o morto de fome do seu pai, que acreditava que deveríamos ter
as coisas com o próprio suor; ele nunca quis ser rico ou ter uma vida boa,
sempre achando que viver na simplicidade era obra de Deus. Aquele maldito
não merecia nem estar vivo. Quem nasce com a alma de pobre morre pobre.
― Você sabe quem é meu pai? ― perguntei. Sempre achei que ele era
um maldito bêbado ou que ela nem sabia quem era, já que não passava de
uma puta.
― Claro que sei. Sei até onde o morto de fome mora ― rosnou. ― Se
quiser saber quem é, então me solte, que te dou essa informação como um
bônus. Assim você e suas irmãs podem ficar com a ralé. Você pode ter grana,
Lucky, mas não passa de ralé assim como ele.
― Não procurei sua opinião...
― O pai deles sabe que tem filhos ou você escondeu isso dele? ―
perguntou Bryan.
Sabia que ele estava checando para ver se ela soltava algo a fim de
facilitar seu trabalho de busca às minhas irmãs.
― Aquele pobretão não sabia de nada. Se soubesse que fiquei grávida,
com certeza teria vindo pegar vocês. Não faz muito tempo que descobriu
sobre os filhos, mas não conseguiu achá-los. ― Ela sorriu. ― O verme deve
estar arrasado.
Jesus! Como alguém assim existe?! Aquilo não era nem um ser
humano; certamente nem alma tinha.
― Não vou dar o que você quer. Vou procurá-las eu mesmo e sem sua
ajuda. Enquanto isso, apodreça neste lugar ― sibilei.
― Seu moleque atrevido... ― Ela começou a me xingar de vários
nomes que deixariam caminhoneiros de boca aberta, mas não me importei e
apenas saí dali.
Estava pisando duro quando cheguei ao meu carro. Não sabia o que
fazer. Queria minhas irmãs comigo e saber do meu pai também. Que tipo de
homem ele era? Se Mary falara mal dele e de seu ponto de vista, que não era
interesseiro, então ele devia ser parecido comigo. Ainda estaria nos
procurando?
― Vou achá-los para você. Irei pesquisar tudo sobre sua mãe, saber
onde deu à luz, porque isso pode ajudar ― disse Bryan, entrando no carro ao
meu lado. ― Fique tranquilo, cara.
― Tudo bem. Obrigado. ― Não queria preocupá-lo e dizer que minha
mente estava fodida. Aquela mulher tinha poder sobre mim, algo que eu
odiava. Até pensei que aquilo tinha passado, mas percebi com amargura que
não.
― Lucky... ― ele começou, mas eu mal ouvi, porque minha mente
estava a mil enquanto dirigia de volta ao trabalho.
Porra! Eu precisava me controlar e não deixar que nada me afetasse,
mas era difícil. Ouvir sobre minhas irmãs e não saber como elas estavam,
nem sequer se estavam vivas me agoniava. Como alguém podia viver dessa
forma? Eu não as conhecia, mas estava louco para isso. Estava preocupado e
sem saber o que fazer.
Bryan falou comigo sobre uma forma de encontrá-las, como também ao
meu pai. Assenti para tudo, mas o meu peito se sufocava, quase me deixando
sem fôlego.
― Você vai ficar bem, cara? Assim que eu souber de algo, te chamo.
― Estarei bem, só preciso da Rosa Vermelha. Ela afasta a escuridão
que há em mim. ― Inspirei fundo, mas tudo em mim parecia doer demais.
Bryan foi embora assim que estacionei em frente aos prédios da Ônix e
da Vênus. Fui até a sala de Samantha na Vênus à procura dela.
― Senhor Donovan. ― A recepcionista se colocou de pé assim que
entrei na recepção.
― Minha esposa está no escritório? ― perguntei com a voz estranha.
Eu me sentia estranho, como um vulcão prestes a explodir e gritar aos
quatros cantos.
― Não senhor, está atendendo...
Eu sabia que não deveria interromper a consulta de Sam; mesmo que eu
precisasse dela, havia crianças ali que necessitavam mais de sua presença
do que eu.
Ignorei a preocupação no rosto da mulher, que falou algo, mas não ouvi
e rumei para a Ônix, ao meu escritório. Servi-me de uma dose de uísque e
tomei um gole grande para me acalmar. Minhas mãos tremiam tanto que achei
que minha raiva transpirava pelos poros.
― Maldição! ― praguejei, sentando-me na minha cadeira e encarando
a vista de Manhattan.
Onde minhas irmãs estavam naquele momento? O que estavam fazendo?
Moravam ali ou em outra cidade? Queria tanto conhecê-las, saber o que
aconteceu em suas vidas até aquele momento. Esperava que tivessem tido
uma vida melhor que a minha, apesar de que, desde que fui adotado quando
criança, a minha vida foi só felicidade. Esperava que a delas também. Eu
tinha meus irmãos, Ryan e Rayla, mas adoraria ter aquelas duas também,
conhecer alguém do meu sangue além da víbora que me deu à luz.
― Porra! ― Joguei meu copo do outro lado da sala, quebrando tanto a
ele como a um jarro de vidro.
― Por Deus, Lucky! ― Sam arfou, entrando na sala e se deparando
com a bagunça que fiz. ― O que aconteceu para agir dessa forma?
Olhei para minha linda esposa, a mulher que roubou minha alma e
coração e me deu a coisa mais incrível da minha vida, minha princesinha.
― Rosa Vermelha, me desculpe. Mas é que as coisas com Mary saíram
do controle. Aquela cadela tem o dom de me tirar do sério e me fazer querer
matá-la. ― Respirei fundo para me acalmar e ir até ela.
― Você foi visitar sua mãe? ― indagou, sem entender meu gesto. Toda
a minha família sabia que eu não gostava da minha mãe. Eu nem entendia
como me referia a ela assim, mas não significava que a reconhecia dessa
forma. Era só uma palavra sem significado. ― Oh, meu amor... ― Sam me
abraçou forte. Senti muito conforto nisso. ― O que aquela mulher disse para
deixá-lo assim?
Contei tudo a ela sobre as minhas irmãs, que a Mary deu como se as
filhas não fossem nada. Expliquei que eu não tinha ideia de quem elas eram e
o que faziam, seus nomes nem muito menos se estavam bem.
― Oh, Lucky querido. ― Puxou minha mão para me sentar no sofá e
ficou ao meu lado. ― Vamos dar um jeito de descobrir quem são elas.
― Bryan disse que vai conseguir, e acredito nele. É só que isso tudo é
tão fodido. Como uma mãe é capaz de chantagear um filho em troca de dizer
onde suas irmãs estão? Mary não passa de uma vagabunda chantagista que só
pensa em si mesma e em mais ninguém. ― Passei as mãos nos cabelos. ―
Não posso retirar a queixa em troca dessa informação. Se soubesse que ela
me diria a verdade, eu até faria isso, mas não acredito nem um pouco nela;
quem roubou e mentiu uma vez faz sempre.
― Vamos esperar e ver se Bryan descobre alguma coisa. Meu irmão é
bom em desvendar coisas desse tipo. Então, se não conseguirmos,
poderemos pensar na possibilidade de aceitar a chantagem dela. Mas não
deixe que isso suba à sua cabeça. ― Ela olhou para o vidro quebrado. ―
Sei que é doído pensar nelas e não saber como estão vivendo, mas acredite
em mim, perder a mente não é a solução. Se precisar de mim, sempre estarei
com você.
― O que eu fiz para merecer uma mulher como você? ― perguntei
quase a mim mesmo.
Sam também foi humilhada e maltratada por seus pais. A mãe era louca,
e o pai se tornou abusivo quando pensou que ela não era sua filha. Foi a
cadela da própria mãe quem disse isso a ele, envenenando o marido por
causa de ciúmes. Que Deus me perdoasse, mas eu não sentia pela morte dos
dois, que foram assassinados por um serial killer que estuprou e sequestrou
a mulher de Bryan e matou a irmã de Angelina. Depois eu soube que aquele
assassino e estuprador só chegou aos pais de Sam e Bryan porque, de alguma
forma maluca, ele odiava pais que maltratavam seus filhos, provavelmente
por ter tido uma infância ruim, embora não fosse motivo para cometer
atrocidades. Tive uma infância de cão nos meus primeiros anos de vida e
não cometi algo hediondo nem me tornei desumano.
― Você é bom, Lucky. Sei que não vai descansar até encontrar suas
irmãs, e, acredite em mim, também quero conhecê-las. ― Sorriu com
candura. ― Por que não vamos embora agora? Ou tem mais alguma reunião?
― Não tenho mais nada, cancelei tudo. Não estou com cabeça para
nada. ― Beijei seus lábios. ― Amo você demais, Rosa Vermelha.
― Também amo você ― declarou com um sorriso doce. ― Sou uma
sortuda por ter conseguido chegar até aqui. ― Tocou meu coração. ― Vamos
então? Preciso te contar algo, mas não quero fazer aqui.
― Foi só você e sempre será ― afirmei, beijando-a e a deixando toda
derretida e excitada com meus carinhos, mas depois um pensamento me
ocorreu.
Fazia algumas semanas que eu vinha notando que o seu apetite por sexo
estava maior que o normal. Sempre fizemos amor diariamente, mas, quando
ela ficou grávida da nossa filha, a frequência aumentou... O que tinha a dizer
teria a ver com isso?
― Você está grávida? ― sondei, avaliando seu rosto lindo.
Seus olhos azuis me encararam.
― Como sabe disso? ― perguntou, confusa. ― Eu vim aqui para te
contar, mas então vi você naquele estado.
Alisei suas coxas, fazendo com que ela estremecesse, dando ênfase ao
que eu disse:
― Seu apetite por sexo aumenta sempre que está grávida. Mas não ligo,
porque amo fazer amor com você. Adoro ainda mais saber que tem um ser
pequenino aí dentro, assim como foi com minha bonequinha.
Ela sorriu, acariciando meu cabelo.
― Que bom que pensa assim. Quanto às suas irmãs, vamos encontrá-
las, assim como ao seu pai.
Beijei seus lábios.
― Obrigado por me fazer feliz dessa forma.
― É um prazer te fazer feliz, Lucky, e vai dar tudo certo, querido. Vou
estar aqui, e vamos fazer tudo juntos. ― Alisou meu rosto.
― Sempre ― jurei.
Capítulo 4

SOPHIE
Minha amiga Laurel faria o aniversário de 1 ano de sua filha, Jordana,
com seu marido, Jordan, o filho do cantor aposentado James Johnson. A festa
seria na casa dela, no Texas, bem na cidade onde meus pais adotivos
moravam, Dallas.
Eu não queria ir ali, porque encontraria Daniel, que era o melhor amigo
de Jordan desde a faculdade que fizeram juntos. Dessa turma faziam parte
também Lucky, Ryan e Jason. Eu soube disso quando voltei a visitar Laurel
tinha algum tempo. Já havia muito que eu não o via pessoalmente. A última
vez foi quando ele brincara comigo, deixando-me quebrada e destroçada.
Isso era algo em que eu não queria pensar, porque ele matou meus sonhos e
minha paixão por ele. Foi difícil na época, mas dei a volta por cima. Ao
menos era o que eu dizia a mim mesma a todo momento.
― Que bom que chegou ― disse Laurel, beijando ambos os lados do
meu rosto. Estava usando um vestido rosa salmão e com os cabelos presos
no alto da cabeça, mas com mechas caindo em seu rosto. Era muito linda, e
sua bebezinha era ainda mais. A garotinha parecia o pai, loirinha de olhos
azuis, mas tinha traços de Laurel também.
Conheci Laurel antes mesmo de ir para a faculdade, então nossos
caminhos foram separados. Bem depois nos reencontramos, e eu não ficaria
longe dela nem após saber que o seu marido era o melhor amigo de Daniel.
― Não perderia por nada a festa da minha princesinha linda. ― Sorri.
― Onde ela está?
Laurel sorriu.
― Com Jordan. Ela não o larga hora nenhuma. ― Gesticulou para que
eu entrasse. ― Entre, mas saiba que Daniel está aqui. Ele acabou de chegar.
Sabia que ele estaria aqui, pensei amarga. Sempre que ouvia que
Daniel estava em algum lugar, meu coração acelerava forte; ainda batia por
ele. Isso me dava raiva, porque ele não merecia, não após ter feito o que me
fez.
Expulsei esse pensamento e foquei em participar da festa para depois ir
embora e deixar de ver sua cara bonita e descarada de mulherengo.
― Sei disso, mas não ligo ― menti. Laurel sabia da minha paixão por
Daniel. Contei-lhe assim que rejeitei um convite no mês anterior para visitar
o haras dela, porque Daniel estaria lá também. Infelizmente, não pude
declinar o convite para o aniversário, afinal, por Jordana, valia a pena vê-lo.
― O ouvi perguntando ao Jordan sobre você ― disse. ― Talvez esteja
interessado...
Cortei-a:
― Está enganada. E, mesmo se ele estivesse, não ligo para o que o
bastardo pensa.
― Esse ressentimento que ouço na sua voz diz o contrário ― falou com
o olhar triste. ― Conversa com ele. Ouvi dizer que, quando Daniel tenta
conversar, você se esquiva. O deixe se explicar.
Não queria que ele explicasse nada do que houve, não porque eu fosse
rancorosa, mas por causa da minha doença, descoberta recentemente. Se eu
não conseguisse um doador, não sabia o que seria de mim. Já bastavam meus
pais, que estavam sofrendo por mim sem poder fazer nada.
Eu sabia que éramos jovens na época, mas tive meu coração partido por
Daniel quando o vi entrando em um motel com uma garota, aquela de quem
eu não gostava, a Stacy. Depois disso, fui embora e não tornei a vê-lo
pessoalmente, só em jornais e revistas. Quando aparecia na TV, eu mudava o
canal.
Passei um tempo rancorosa, mas não era mais. Só queria mantê-lo longe
de mim para quando as coisas ficassem piores, porque havia a chance de
isso acontecer. Eu esperava que não, afinal não queria morrer.
Quando saí do presídio onde visitei Mary no dia anterior, fui até a
empresa de Lucky contar a verdade a ele, mas não consegui entrar, tive
medo, não de ele não me ajudar e não me aceitar, porque sabia que ele me
apoiaria, mas sim de fazer mais pessoas sofrerem por mim. Estava ali,
naquela festa, não só para felicitar e beijar a Jordana, mas para finalmente
contar tudo ao meu irmão. Talvez fosse por isso que eu estava nervosa.
Também queria contar para Laurel sobre a minha doença, porém não queria
preocupá-la, assim como não queria ter feito com meus pais. Entretanto, não
pude evitar. Tinha a intenção de contar, só precisava me acostumar com a
ideia primeiro. Também gostaria de lhe contar sobre Lucky, mas precisava
revelar a ele primeiro.
― Melhor deixar como está ― respondi à sugestão de Laurel sobre eu
ouvir Daniel. ― Agora vamos ver a minha aniversariante mais linda do
mundo.
Assim que entramos, deparei-me com Lucky ao lado de sua esposa. Os
dois faziam um casal muito bonito. Ela tinha pele branca, cabelos negros e
olhos azuis. Já o Lucky tinha cabelos escuros e olhos verde floresta.
Meu amigo Wellington puxou a ficha de meus parentes no intuito de me
salvar e conseguiu encontrar Lucky. Surpreendi-me quando descobri que ele
também era amigo de Daniel e Jordan.
Naquele dia eu me aproximaria de Lucky e lhe diria quem era
realmente. Meu coração palpitava toda vez que o via; já tinha ido a três
lugares em que ele estava depois que soube que era meu irmão: a portaria do
seu prédio, no dia em que descobri a verdade; sua empresa, assim saí do
presídio onde Mary estava trancafiada; e agora ali, a casa de Laurel e
Jordan. Além disso, assisti a algumas palestras online que ele presidiu.
― Sophie, está ouvindo? Não acho bom que fique olhando para o
Lucky, ele é casado, e a mulher dele é muito boa. Alguém pode entender que
esteja interessada nele. ― Laurel estalou os dedos na minha frente, trazendo-
me ao momento. ― Ele é bonito, mas não faz seu tipo, além disso, é bem
casado.
― É claro que eu não me interessaria por um homem casado! É que já
ouvi palestras que ele deu e gostei bastante. ― Não era mentira, mas eu não
podia dizer a verdade completa. Não ainda.
Peguei uma taça com água.
― Lucky tem várias empresas beneficentes que ajudam crianças pelo
mundo. Ele é um cara fechado, mas parece gente fina ― comentou Laurel.
― Não tenho interesse nele...
― Interesse em quem? ― Ouvi uma voz que ficou gravada em meu
cérebro e acreditava que ficaria para sempre, porque, mesmo após quase 11
anos, ela ainda me fazia tremer.
Senti minha pele se arrepiar com uma sensação que eu só sentia estando
perto de Daniel. Sabia que fazia anos que não chegava pessoalmente perto
dele, mas a sensação abrasadora de estar ao seu lado nunca foi esquecida.
Era como se eu estivesse perto de uma fornalha.
Virei-me e fiquei de frente para o homem que um dia fora meu melhor
amigo e o amor da minha vida. Mesmo seguindo caminhos diferentes, eu
ainda o amava, nada parecia ter mudado. Podia sentir isso através do meu
coração traiçoeiro.
Tive alguns relacionamentos após Daniel ter me deixado, porém nunca
davam certo, porque eu ficava tentando encontrá-lo em todos os homens. Isso
me enfureceu por muito tempo, então chegou um tempo em que parei de
procurar e foquei na minha profissão, que eu amava. Porém, acabei
descobrindo aquela doença.
Meu relacionamento mais sério foi com o Neil. Ficamos juntos por um
ano. Nunca pude amá-lo como deveria, e naquele instante entendi o porquê.
Jamais consegui me esquecer realmente do Daniel, por isso não insisti ou
lutei para que nosso relacionamento desse certo. Não podia seguir em frente
por causa daquele homem ali, na minha frente, com aqueles olhos negros e
cabelos curtos e lisos, a forma como seus lábios estavam curvados em uma
careta. Aquele homem parecia um deus grego de terno, um que me quebrou,
e, após isso, foi difícil lutar para me reerguer.
Sorri de modo frio.
― Ah, sim, eu estava dizendo a Laurel que vou me casar. ― Levantei a
taça como se estivesse brindando.
Uma sombra escura atravessou suas feições perfeitas.
― Casar? ― cuspiu como se fosse veneno. ― Com quem vai se casar?
Além de parecer sombrio, tinha algo na voz dele que soava como
tormento, mas com certeza eu devia estar errada. Afinal, ele vivia cercado
de mulheres, então por que iria preocupar-se com quem eu estava saindo?
Ele tinha deixado claro havia anos que eu não fazia parte de sua vida de
forma alguma, por isso nunca apareceu nem para me dizer um “oi”.
― Isso não é da sua conta. ― Cheguei perto dele, quase o tocando. ―
Você me tirou da sua vida, então não tem que dar nem um piu a esse respeito,
lembra?
― Sophie...
― O que está acontecendo aqui? ― perguntou Jordan chegando até nós.
Minha amiga era uma mulher de sorte, o cara era um tremendo deus
loiro de olhos azuis, muito parecido com o gato do ator que protagonizava o
personagem Thor. Segurava Jordana nos braços.
― Nada que seja importante ― respondi e estendi minhas mãos para
minha bonequinha. ― Vem com a titia?
Sua boquinha com apenas dois dentinhos na frente sorriu para mim.
Peguei-a nos braços e me virei para sair dali, pois não queria mais ficar
perto de Daniel, mas ele segurou meu braço.
― Sophie, você vai mesmo se casar?
Cortei-o com os dentes cerrados:
― Por que se importa? O que não falta é mulher para aquecer sua cama.
― Dei um safanão, arrancando sua mão de mim, e saí dali antes que dissesse
algo mais.
Ficar assim, tão perto dele, fazia meu peito doer, algo que achei ter
superado, mas percebia que não. E temia nunca poder.
― Como está a minha florzinha linda? ― Fiquei nos próximos minutos
brincando com Jordana até que Laurel se aproximou, e ela quis a sua mãe.
― Por que disse aquilo ao Daniel? Ele está furioso com essa notícia,
até me perguntou se é verdade. ― Ela se sentou ao meu lado no sofá e pegou
a menina.
― Não contou a verdade, não é? Sou sua amiga, deve ficar do meu
lado, não do dele ― apontei.
Ela revirou os olhos.
― Não disse nada, mas ele vai descobrir logo. Vocês dois precisam se
entender, Sophie, já faz tantos anos. E a forma como vocês agem faz parecer
que ainda se amam.
― Vou comer alguma coisa. ― Coloquei-me de pé, não querendo ouvir
mais nada sobre Daniel, porque conversar sobre ele me deixava triste e
irritada.
― Continua fugindo ― ouvi-a dizer atrás de mim.
Ignorei-a e entrei na cozinha, que era em estilo fazenda, cheia de
armários de madeira. Coloquei a chaleira com água no fogo para fazer uma
xícara de chá verde. Enquanto isso, comia alguns bolinhos.
Estava bastante irritada. Na verdade, essa palavra era um eufemismo,
porque eu estava puta, mas comigo mesma. Daniel me fez sofrer muito e,
naquele momento, aparentemente, parecia estar com ciúmes por pensar que
eu tinha alguém. Isso me deixava com raiva. Como ele ousava ter aquela
reação após anos? Quando namorei Neil, ele nunca apareceu para me pedir
para voltar, então por que se importava?
Acho que o que me fez sofrer mais não foi só o fato de eu estar
apaixonada por ele loucamente, mas sim porque éramos amigos antes disso,
desde crianças, então tudo isso se perdeu também. Perder as duas coisas, o
amor e a amizade, foi um golpe que me deixou arrasada por anos.
Neil era legal, um cara que todos adoravam, e juro que tentei me
apaixonar por ele, mas não tinha como eu amar outro quando meu coração
não me pertencia mais. Ele sempre foi apenas de Daniel. Eu não sabia se foi
por Daniel ter sido meu primeiro amigo, meu primeiro amor, aliás, meu
primeiro em todas as experiências. Às vezes, eu até temia que ele tivesse
levado minha alma junto ao meu coração.
― Imbecil. ― Coloquei a chaleira na pia com um pouco mais de força
que o necessário.
― Daniel merece isso? ― inquiriu uma voz grave.
Olhei para cima e me deparei com Lucky escorado na quina da mesa.
Aquele era o momento perfeito para eu lhe dizer quem era, mas estava
furiosa demais com Daniel e não conseguia pensar em nada. Deixaria para o
dia seguinte, assim poderia falar com mais calma.
― Se veio aqui para defender o seu amigo, pode dar meia-volta ou
guarde sua opinião para você. ― Estava com muito mau-humor para ser
educada.
― Não vim defendê-lo, só vim pegar um copo de suco para a minha
esposa. ― Meneou a cabeça de lado. ― Mas estou curioso. O que ele fez?
Pisquei.
― Achei que contassem tudo um para o outro, já que são amigos.
― Nem tudo. Daniel é um cara reservado, não é de contar sobre sua
vida particular, embora eu suspeitasse que ele gostasse de alguém assim que
o conheci na faculdade.
Sacudi a cabeça.
― Deve ter sido outra pessoa, porque não era eu. E, mesmo se fosse,
não ia perdoá-lo, porque ele me traiu. Jamais me esquecerei daquilo nem se
ele percorrer as Muralhas da China de joelhos ― grunhi. ― Sabe o que
devia acontecer?
Ele me avaliava.
― Não, o quê?
― Todos os homens serem extintos da face da Terra. ― Tomei um gole
do chá no intuito de me acalmar. ― Tirando meu pai, o resto não devia
existir.
E tirando você também, pensei comigo mesma. Eu tiraria da lista dos
homens que deveriam ser extintos apenas os dois.
Dessa vez Lucky riu, uma risada rouca e gostosa. Por um segundo,
fiquei admirada com isso. Ele era conhecido por ser um empresário sério e
um pouco frio, mas ali mostrava o contrário. E tudo graças à sua mulher, pois
eu soube que ela o mudou bastante.
― Você tem muitos sentimentos reprimidos aí dentro. ― Apontou para
o meu coração sem tirar os olhos dos meus. ― Isso comprova que não vai se
casar. A não ser que seja com uma mulher, já que odeia os homens.
Não os odiava, é claro. Só porque o meu primeiro amor me estragou
para todos os outros, não significava que eu queria que todo o gênero se
extinguisse. Era só maneira de falar.
Bufei. Mesmo que aquela conversa fosse estranha, eu estava adorando
conversar com ele.
― Você não ia pegar suco? Está ali, na jarra. ― Apontei para a
geladeira. ― Pegue e vá aproveitar a festa.
Tomei todo o chá e coloquei a xícara na pia, em seguida me virei para
sair e desfrutar da presença dos outros. Contudo, assim que passei por
Lucky, uma vertigem me atingiu, e tudo escureceu.

― Sophie? ― Ouvi uma voz me chamar e senti braços em minhas


costas e sob as minhas pernas. Eu estava no colo de alguém? Tinha
desmaiado? Lembrava-me de que tudo tinha ficado escuro.
Pisquei com a claridade da luz e vi os belos olhos do meu irmão.
― Você está bem? ― sondou, ansioso e preocupado.
Eu estava ofegante como se tivesse corrido muito e de repente me
sentisse cansada.
― Lucky, o que está havendo? ― perguntou sua esposa enquanto pouco
a pouco eu tentava me recuperar.
Tentei me afastar dos braços de Lucky, mas ele me segurou mais forte,
como se eu fosse uma criança.
― Rosa Vermelha, ela desmaiou por um momento. Acho que devemos
levá-la a um médico. ― Sua voz soou urgente.
― O que está acontecendo? Por que está com a Sophie nos braços? ―
Dessa vez era a voz de Daniel. ― Lucky, o que houve com ela?
Expirei e me esforcei para sair dos braços de Lucky.
― Por favor, me coloque no chão ― pedi e depois emendei: ― Estou
bem.
― Sophie... ― Daniel começou, mas minha cabeça latejava, e eu me
sentia enjoada demais. Temia que vomitasse ali, na frente deles. Já me
bastava ter ficado tonta e desmaiado.
― Não houve nada, estou bem ― menti.
Depois de eu insistir que me colocasse no chão, Lucky o fez. Ajeitei
meu vestido pedindo a todos os santos que não desmaiasse de novo.
― Bem? Você está branca feito papel. ― Daniel estremeceu, dando um
passo até onde eu estava. ― Porra, Sophie! Eu vou te levar a um médico.
Suspirei e encarei Daniel, de pé ao lado de Lucky.
― Não preciso de médico ― repeti, esforçando-me para não passar
mal de novo, porque não queria ser levada a um hospital. Aquilo seria
desnecessário, já que não ia resolver. Eu sabia o que tinha. Nenhum deles
poderia fazer nada por mim naquele momento. Talvez Lucky fosse
compatível comigo, mas como eu pediria um transplante a alguém que nem
me conhecia? Ele era muito rico, talvez acreditasse que eu estava mentindo e
quisesse dar-lhe um golpe, como nossa mãe fez com ele. Não o queria na
minha vida só para que me salvasse, mas também para ficar ao seu lado.
Fosse como fosse, ainda não era hora de eu tocar naquele assunto. Precisava
me recuperar antes.
― Sophie ― insistiu Daniel.
― Já disse que estou bem, foi só uma queda de pressão. ― Tentei
deixar minha voz neutra, ignorando os sintomas que aquela doença causava
em meu corpo.
Ele franziu a testa.
― Desde quando tem isso?
― Você não sabe nada sobre mim. ― Fuzilei-o com os dentes cerrados.
― Agora esqueça que eu existo, porra!
Ele deu um passo para trás. Provavelmente o peguei de surpresa, mas
eu sabia que precisava magoá-lo para afastá-lo de mim.
Eu não queria fugir, mas precisava, ou desmoronaria ali na sua frente,
não só pela fraqueza causada pela anemia aplástica, mas porque doía ver o
Daniel sofrendo.
Não me despedi de ninguém, apenas corri dali antes que alguém me
impedisse de sair. Queria ir para longe de Daniel. Sabia que era o certo a se
fazer, pois, se eu ficasse perto dele, ele sofreria ainda mais, caso eu não
conseguisse sobreviver. Eu não queria isso. No fundo, estava protegendo-o
do pior.
Capítulo 5

DANIEL
Minha vida estava uma bagunça havia algum tempo. Meu pai era dono
da Editora Luxem e foi sócio de um homem que mexia com tráfico humano.
Não foi comprovado que ele estava envolvido, mas eu não colocava minha
mão no fogo. Aquele velho era um sádico fodido. O seu sócio, Franklin
Salazar, foi preso pela esposa de Jason Falcon, Tabitta, que era agente
federal na época. Meu pai já estava morto quando isso aconteceu, então não
pôde ser julgado. Ele me deixou tomando conta de tudo, apesar de eu ter
rejeitado. Eu não sabia que Franklin estava envolvido naquilo até que o FBI
me procurou depois que meu pai morreu e pediu minha ajuda para tomar o
lugar da parte do meu pai na editora a fim de buscar provas que colocassem
o maldito Franklin na cadeia. Só não achei que essa merda demoraria tanto.
Quase vomitei quando vi um dos contêineres que deveria ser usado
para transportar livros para o México, mas, em seu lugar, havia garotas entre
10 e 16 anos. Reportei o incidente ao FBI, e eles fizeram a apreensão de
todos os envolvidos.
O pior foi que, depois que Franklin foi preso, confessou que meu pai
também estava envolvido naquilo. Eu já odiava o velho por ter me separado
da Sophie, e piorou muito mais depois disso. Alguns bens do meu pai foram
congelados, mas não me importei, pois tinha meu próprio dinheiro.
Nunca contei aos meus amigos que odiava meu pai. Todos achavam que
nos dávamos bem antes de ele morrer. Sentia desprezo por ele, não só por
ter feito algo abominável como sequestrar crianças e vendê-las no mercado
negro, mas também porque me separou da única garota que eu já havia
amado na vida.
Sophie e eu éramos amigos desde crianças, mas, assim que ficamos
adolescentes e a vi ganhar corpo e revelar tanta doçura, apaixonei-me
perdidamente por ela. Foi um sentimento tão avassalador que não pude lutar
contra ele – nem queria.
Entretanto, meu pai descobriu e me obrigou a ficar longe dela. Se ele só
tivesse ameaçado a mim, eu até lidaria com isso sem problemas, mas
ameaçou fechar todos os caminhos dos pais dela. O velho os demitiu assim
que soube de nós dois. Fui um fraco, devia ter lutado mais, mesmo que isso
tivesse significado matar o desgraçado.
Ainda me lembrava de nossa primeira noite como se tivesse acontecido
no dia anterior, quando ela foi minha, quando a tive em meus braços, e ela
nos meus. Nós nos amamos loucamente. A felicidade durou pouco, apenas
alguns meses, pois tive que simular trair a Sophie, só assim ela me deixaria.
Se eu não a magoasse, ela nunca realizaria seus sonhos, como o de ser
médica. No fim das contas, atualmente ela não era uma, pois optou por ser
fisioterapeuta, e, pelo que eu soube, amava o que fazia.
Às vezes eu pensava no que teria acontecido se não tivéssemos nos
separado. Ela estaria feliz? Porque meu pai não era homem de não cumprir
suas ameaças. Eu sabia disso por experiência própria.
Queria contar-lhe o que fiz por ela, o sacrifício que foi deixá-la viver
longe de mim. Viver todos aqueles anos longe de Sophie foi a pior coisa que
já fiz.
Só contei aos meus amigos que amava Sophie recentemente. Escondi a
verdade não por vergonha ou coisa do tipo, mas porque precisava arrumar a
bagunça que meu pai fez primeiro. Não queria trazer perigo para ela, como o
cartel mexicano com o qual o nome da nossa família estava envolvido.
Queria limpar tudo, porque tinha sido meu pai a se envolver naquilo, não eu
e a minha mãe.
Foi declarado havia algumas semanas que estava tudo limpo e não
havia mais problemas com carteis e nada que envolvesse meninas raptadas
usando o nome da minha família. Eu queria ir limpo para Sophie. Sabia que
não tinha feito nada, mas queria ficar com ela sem nenhum sinal de perigo.
Conquistá-la seria um trabalho difícil e árduo, primeiro, porque ela me
odiava por ter machucado seu coração quando parti, e segundo por achar que
a traí, quando não o fiz, embora eu estivesse disposto a tudo para tê-la de
volta em minha vida, ainda mais sabendo que não tinha mais ninguém que
ameaçasse nem minha família nem a dela.
Sophie sempre foi uma mulher doce e gentil desde que a conheci, então
vê-la com raiva de mim me pegou de surpresa. É claro que eu merecia mais
do que isso por tê-la machucado de uma forma que chegava a ser criminosa,
tudo por culpa do meu pai, que me obrigou a ficar tanto tempo longe dela.
Depois que ele morreu, fui atrás de Sophie, mesmo não merecendo, já que a
tinha magoado demais e não queria estragar sua vida. No entanto, apareceu o
problema com a editora e o envolvimento do meu pai com o FBI. Novamente
tive que ficar longe dela. Devo dizer que foram tempos sombrios, quando a
saudade dela era tanta que eu achava que estava morrendo.
No momento, eu estava em Dallas para o aniversário de 1 ano da filha
de Jordan e Laurel. Soube alguns meses antes que tanto Laurel quanto Sophie
se conheceram antes de elas irem para a faculdade. Depois disso, ambas
ficaram um tempo sem se ver, quando Sophie foi para Manhattan trabalhar e
Laurel ficou em Dallas tomando conta da fazenda de seus falecidos pais.
Sophie trabalhava para a Speed Car, uma empresa que promovia
corrida de carros. Não era tão popular como a antiga em que eu trabalhava, a
Stor Corry.
A Speed ficava em Manhattan, e a Stor, em Seattle, então, para ficar
mais perto de Sophie, deixei o cargo em que ganhava mais para estar em um
lugar pequeno, embora eu não trabalhasse pelo dinheiro. Eu amava correr,
pois a sensação era maravilhosa. A adrenalina em minhas veias me
emocionava e fascinava.
Deixei de pensar nisso e foquei na mulher deslumbrante à minha frente.
Sophie usava um vestido que mostrava suas curvas. Ela tinha encorpado bem
mais durante os últimos anos, afinal naquela época éramos adolescentes, e
nos tornamos adultos. Ficou mais linda do que já era.
Ela toda já tinha sido minha um dia, e eu lutaria para tê-la de novo e
não deixaria mais ninguém se meter em meu caminho, nem mesmo ela. Se eu
soubesse que Sophie não me queria mais, eu me afastaria e não lutaria,
mesmo que tudo em mim me matasse, mas sabia que ela me desejava e ainda
me amava, só estava magoada por eu tê-la machucado, e não tirava sua
razão.
Assim que ela disse que ia se casar, parte de mim pareceu morrer. A
dor foi inigualável. Todavia, depois de pensar um pouco, não consegui me
lembrar de vê-la namorando alguém nos últimos anos, embora não tivesse
cem por cento de certeza.
Ainda desorientado, peguei um copo de uísque e bebi todo o líquido em
um gole só.
― Daniel, isso precisa parar. Você não pode mais viver dessa forma.
― Jordan chegou até onde eu estava de pé, vendo Sophie brincar com a
Jordana.
Sabia que ele tinha toda razão, pois tinha chegado a hora de eu lutar por
aquela mulher e derrubar todos os meus empecilhos. Meu pai era a pedra no
meu sapato, porém, ele já não existia, então eu não ficaria mais longe. A
vida de Sophie e sua família não corria mais perigo. Então por que me
manter afastado? Não tinha sentido, quando na verdade eu a amava.
― Vai dizer a verdade a ela? O motivo para ter se afastado mesmo a
amando? ― Jordan continuou. ― Porque, se não vai, acho melhor se afastar,
porque essa menina ainda ama você, só está ferida.
Laurel se aproximou de nós e ficou ao lado de Jordan. Falou antes que
eu respondesse a ele:
― Não vou me meter nisso, mas conheço Sophie há alguns anos e me
lembro que ela estava destruída na época. E até agora sofre quando vê você
desfilando em revistas com mulheres ― censurou. ― Você não a merece,
então fique longe ou lute por minha amiga.
Ela saiu batendo suas botas de caubói antes que eu tivesse tempo de
comentar que não tinha a intenção de magoar a Sophie.
― Porra! ― praguejei.
Sabia que posava para fotos em revistas algumas vezes, mas era para
provar ao meu pai que eu tinha superado a Sophie, pois assim ele não a
perseguiria. Porém, nunca fiquei com nenhuma delas. Aliás, depois que
terminamos, só fiquei com mulheres quando ela estava com alguém, tentando
me superar. O seu relacionamento que durou mais foi com o Neil, o último
de que eu tinha ideia. Ficaram juntos por um ano. A cada relacionamento de
Sophie, eu sofria mais.
Durante um desses relacionamentos dela, três anos atrás, resolvi me
reaproximar da família Winter e de Sophie e fui à fazenda. Meu pai
descobriu e quase conseguiu que os Winters perdessem sua fazenda. Tive
que intervir. O bastardo comprou algumas pessoas para fazer surgir uma
dívida imensa de onde não tinha. Eu sabia que os pais de Sophie poderiam
ganhar na justiça com um bom advogado, mas isso geraria mais gastos e
duraria muito tempo, então paguei a dívida. Naquele dia, tive uma briga feia
com meu pai e por pouco não o matei. Só não o fiz pela minha mãe, porque
ela sofreria com a morte do velho. Por coincidência ou não, pouco depois de
nossa briga, os Winters tiveram um acidente. Graças a Deus não foi fatal e
não se machucaram, mas isso me lembrou da vez em que o aquele monstro
quase matou a Sophie mandando alguém atropelá-la, o que a faz ficar
semanas internada em um hospital. Tentei conseguir provas para incriminar
meu pai por ambos os incidentes, mas, como ele era aliado ao cartel, tudo
foi encoberto. A vida de Sophie e de seus pais valia mais do que meu
sofrimento por estar longe dela, por isso me mantive afastado.
Que Deus me perdoasse, mas eu era grato por meu pai ter morrido,
assim eu não carregaria mais aquela cruz. Sabia que era errado desejar a
morte dos outros, mas o velho merecia coisa pior do que enfisema pulmonar
por ter fumado demais, merecia ficar preso para sempre.
― O que vai fazer? ― Jordan sondou de novo. ― Acho que ela não
tem noivo, pois, se tivesse, o traria aqui, não acha?
Expirei, não gostando de pensar que Sophie estivesse com alguém, não
quando finalmente eu poderia tê-la, ou melhor, lutar por ela.
― Vou checar as coisas e, se ela tiver... um noivo, vou deixá-la em paz.
― Precisei respirar fundo ao dizer isso. ― Mas, se não, vou lutar por ela,
implorar se for preciso para que me perdoe.
Bebi mais um gole da bebida, sem tirar os olhos de Sophie. O sorriso
dela era lindo, doce e meigo. Até irritada ela ficava linda. A sua risada
gostosa era algo que sempre amei nela. Fascinava-me mesmo após todos
aqueles anos.
Ela foi para a cozinha, e fiquei tentado a ir atrás dela, mas lhe daria
espaço. No dia seguinte, iria à casa dos pais dela bem cedo e imploraria seu
perdão se fosse necessário. Demoraria um pouco para eu ter sua confiança,
mas conseguiria.
Minha falecida avó sempre dizia que o que é bom nunca vem fácil e
precisamos lutar por ele. Eu faria isso nem que demorasse minha vida toda.
Sabia que, para viver o que sentíamos um pelo outro, teríamos muitas coisas
a enfrentar, a perdoar, mas estava confiante de que conseguiria ter minha
vida ao lado de Sophie, como sempre sonhei, casar, ter filhos e ser feliz,
pois isso foi tirado de mim por muitos anos. Estava cansado de esconder as
coisas dela, então lhe contaria tudo o que fiz e o porquê. Já tinha guardado
segredos demais e por muito tempo; era hora de jogar as cartas na mesa.
Esperava que Sophie me perdoasse por tudo que escondi dela. Então
por que me sentia tão nervoso sobre a sua resposta? Talvez fosse porque ela
podia ser a que eu não esperava ouvir: que eu nunca seria perdoado.
Lucky tinha ido à cozinha, onde Sophie estava, já havia algum tempo e
ainda não tinha voltado. É claro que eu não tinha ciúmes dele, afinal meu
amigo morria de amores pela Samantha, sua esposa, além disso Sophie não
era dessas, jamais se interessaria por homens casados. Eu podia ter ficado
muitos anos longe dela, mas isso com certeza não mudara.
Quando vi Sam ir até a cozinha e não voltar também, resolvi ir até lá.
Talvez estivesse acontecendo algo. Assim que passei pela porta, fiquei de
queixo caído ao ver Sophie nos braços de Lucky; poderia ter pensado que
estava rolando algo entre eles, mas ela estava branca feito giz. A palidez de
sua pele era assustadora, e ela estava ofegante, como se tivesse corrido e de
repente necessitasse de ar.
Lucky me informou que ela tinha desmaiado antes que eu entrasse no
lugar. Isso me deixou mais louco da vida, com medo de que ela estivesse
doente. Ofereci-me para levá-la a um médico, mas Sophie não quis. Sempre
foi muito teimosa, fazendo-se de forte para que não percebêssemos que não
estava bem, como quando quebrou o braço na infância. Nem chorar, ela
chorou. Ou quando foi atropelada e, mesmo com costelas quebradas, se
recusava a ir a um hospital e teve que ser forçada a isso.
Ela me disse que foi uma queda de pressão, apesar de que eu nunca
soube que ela teve isso, mas Sophie tinha razão, eu não sabia mais da sua
vida. Perdi tanto, momentos que deveríamos ter passado juntos, mas não
pude.
― Você não sabe nada sobre mim. ― Ela me olhou com fúria. ― Agora
esqueça que eu existo, porra!
Assim que ela falou tais palavras, foi como se tivesse me lançado um
soco na boca do estômago, então saiu correndo dali antes que eu dissesse
mais alguma coisa.
― O que aconteceu, Lucky? Ela disse a você o que tem? ― indaguei
após me recuperar da dor em meu peito, não por sua frieza, mas sim pelo
sofrimento que ouvi na sua voz.
― Não disse nada além de que odiava a raça dos homens. ― Lucky
pegou a mão da Sam. ― Ela parece realmente doente. Talvez seja mesmo
queda de pressão.
Antes que eu comentasse algo, Laurel apareceu ali, furiosa, como uma
mamãe galinha.
― Vi Sophie sair correndo daqui. Mas o que diabos aconteceu, Daniel?
― Cerrou os punhos, olhando-me. ― Se você machucou a minha amiga, vou
fazer muita serventia das minhas facas de cozinha.
Jordan apareceu por trás dela e a abraçou forte para não deixar sua
garota me atacar.
― Calma, caipira, não ataque o meu amigo. Na verdade, a Sophie
desmaiou ― comentou Jordan. ― Ela lhe contou que estava doente ou algo
assim?
Depois de pensar um pouco, acabei me lembrando de que notei que sua
pele estava pálida demais, mas achei que pudesse ser ausência de sol, afinal
em Manhattan não fazia tanto calor como em Dallas.
― Laurel? ― Olhei para ela em busca de uma resposta. ― Sabe
alguma coisa?
Ela sacudiu a cabeça.
― Não, Sophie não me disse nada. ― Sua voz soou preocupada no
final. ― Mas, pensando bem, senti que tinha algo de errado, apesar de ela
ter se esquivado quando perguntei. Ela não contou nada para mim. Se fosse
algo sério, ela me diria, não é?
― Não acho que ela deveria andar sozinha hoje, ainda mais dirigir ―
disse Sam. ― Acha que ela pode estar grávida? Porque gravidez dá enjoos e
tontura.
Laurel arregalou os olhos.
― Acha que isso é possível? Que ela esteja realmente grávida?
Grávida? Pensar nisso era tão ruim quanto pensar que ela estivesse
doente. Tinha chegado a hora de eu realmente desistir? Amei aquela mulher
por anos. Seria a hora de eu deixá-la ser feliz longe mim? Eu sabia que não
poderia ser assim sem ela. Nunca deixei entrar em meu coração as mulheres
com quem fiquei depois dela, porque no fundo sempre tive esperança de que
um dia fosse tê-la de volta à minha vida.
Sentia-me como se tivesse sido atropelado por um ônibus em
movimento. Todavia, naquele momento, esforcei-me para relegar isso,
porque a prioridade era evitar que Sophie dirigisse por aí sozinha, ainda
mais depois de desmaiar. Se ela estivesse grávida, poderia correr o risco de
perder o bebê.
Pude ouvir todos me chamando, mas só me virei e saí correndo atrás
dela.
― Sophie! ― gritei para o carro que acabava de arrancar dali em alta
velocidade.
Porra! Se eu não tivesse perdido tanto tempo conversando com os
outros, ainda a teria encontrado antes que saísse dali. Entrei no meu carro e a
segui até a fazenda dos pais dela, que não ficava muito longe dali.
Os Winters compraram a propriedade logo depois que meu pai os
demitiu. Eu sabia que eles tinham algumas economias guardadas, mas não
dariam para comprar um imóvel grande como aquele, então, na época, vendi
dois dos meus carros, paguei a diferença e pedi à corretora para comentar
que estava em promoção e que jamais revelasse a verdade.
Ajudei os Winters não por causa da Sophie, mas sim porque amava os
dois. Aquela família foi melhor para mim do que a minha de sangue. Deixá-
los ir foi uma das coisas mais dolorosas que já fiz, quase tão difícil quanto
deixar a Sophie. Viver longe dela foi como estar no limbo, foi insuportável.
Eu precisaria me conformar caso ela realmente me dissesse que estava noiva
e grávida. Na hora em que ela disse que se casaria, não acreditei nisso, mas,
depois que passou mal, eu já não sabia de mais nada. Precisaria saber a
verdade e também lhe contaria tudo o que fiz. Pensar em nunca mais vê-la
era como se eu estivesse sendo torturado vivo.
Não demorou muito até que ela chegasse em frente à fazenda e saísse do
carro, arregalando os olhos ao ver o meu automóvel.
Desliguei o carro e fui até onde ela estava, parecendo uma estátua linda
de Afrodite.
― Daniel? O que faz aqui? ― Sua expressão tinha um misto de
preocupação e choque.
― Está mesmo doente ou é só uma gravidez? ― questionei. ― Quero
dizer que não me importo se estiver grávida, a não ser que diga que ama
outra pessoa.
― Como ousa, seu bastardo?! ― Lançou-se contra mim e começou a
bater no meu peito. ― Já disse para sumir da minha vida!
― Vou sumir se me disser que não tenho mais chance com você e que
nossa relação acabou há anos.
Ela riu com frieza.
― Você me traiu, mentiu para mim, seu bastardo filho da puta! Foi
embora e me deixou quebrada! O que há para recuperar? Agora está aqui me
querendo de volta depois de todos esses anos? ― desdenhou. ― Não me
faça rir, seu desgraçado...
Não respondi, só a peguei pela cintura e a beijei de forma louca e
desesperada. Sabia que tinha coisas a perguntar, mas a fome de tocá-la era
demais. Não foi um simples beijo, foi como se eu tivesse sido arrebatado,
um desejo insaciável que eu não sentia havia anos, ao menos não depois
dela.
Sophie lutou contra o beijo no início, mas depois o retribuiu com
tamanho vigor que pude sentir que ela ainda me amava. Ali eu soube que não
deveria desistir a não ser que ela amasse alguém, mas, pelo tipo de beijo que
estávamos tendo, não parecia ser possível.
Ela gemeu, e eu a escorei no carro, fazendo-a gemer mais. Minhas mãos
foram parar entre suas pernas. De repente, o feitiço se perdeu, fazendo com
que ela se afastasse de mim e estapeasse o meu rosto, pegando-me de
surpresa. Doeu mais em meu peito do que na minha carne, mas eu não podia
perder as esperanças.
― Como se atreve a me beijar, seu filho da puta?! ― esbravejou. ― Já
não destruiu meu coração o suficiente? Passei anos tentando recuperar o que
você destroçou! Agora vem aqui e me beija dessa forma e me diz que quer
voltar? Acha que vou aceitá-lo depois de ter ficado com todas aquelas
mulheres, com a Stacy? Você só pode estar louco!
Inspirei fundo, controlando a dor causada por suas palavras, embora
elas fossem verdadeiras.
― Você também ficou com caras. Acha que não sei? ― apontei com
amargura. ― Posso ter ficado com algumas mulheres, mas nunca fiquei com
Stacy. Agora vou te contar a verdade do que realmente aconteceu para eu tê-
la deixado.
― Você me traiu, porra! ― gritou, sacudindo a cabeça. ― Não quero
ouvir nada!
― Você vai ouvir, ou eu vou ficar aqui a noite inteira. ― Aquilo era
verdade. Não sairia dali sem revelar a verdade.
Capítulo 6

DANIEL
Passado

Nunca pensei em me relacionar com uma garota, ao menos não com as


que eu ficava antes de me apaixonar por Sophie. Ela me mostrou o que era
amor, compromisso e amizade. A garota se tornou meu tudo.
Olhei para a mulher linda e maravilhosa debaixo de mim, que me
agarrava tão apertado que, provavelmente, deixaria marcas em minhas
costas, mas eu não ligava, pois elas me fariam sentir amado e querido.
Sophie era o meu mundo inteiro, a luz que brilhava à noite, o sol que
iluminava o dia. Sem ela, eu seria um morto-vivo andando pelas ruas.
Suas pernas envolveram a minha cintura, fazendo-me entrar mais fundo
nela.
― Tão perfeita, porra! ― grasnei, metendo o mais profundo que fui
capaz.
A maravilha que eu sentia quando ela arqueava o seu corpo como se
quisesse flutuar era fenomenal. A forma como se contorcia de prazer... Eu
nunca tinha visto nada mais perfeito.
― Mais forte, Daniel! ― gritou Sophie em pleno desejo e luxúria.
Eu amava seus gemidos e gracejos, amava tudo nela. Abaixei a cabeça
e sussurrei, triscando a boca no lóbulo de sua orelha e a fazendo estremecer:
― Adoraria ouvir seus gritos ainda mais altos, mas a qualquer hora os
seus pais podem entrar.
Nós estávamos na casa dos pais de Sophie. Sabia que os Winters eram
pais liberais, mas não ao ponto de ouvir a filha gritando de prazer comigo
dentro dela.
― Vou tentar não... ― Sua voz falhou assim que fiz um movimento com
o quadril, e ela gemeu, apertando-me mais, como se quisesse me fundir a ela.
Era como se eu fosse sua tábua de salvação. Ela era a minha e sempre seria.
― Estou tão perto... ― choramingou, balançando seus quadris no ritmo dos
meus.
Uma de minhas mãos foi parar entre suas pernas e tocou em seu broto,
que eu tanto adorava. Depois capturei seus lábios e a beijei faminto.
A cada movimento que fazíamos, eu me encontrava mais perto da porta
do Céu. Sabia que ela também estava assim, notei pela forma que me
segurava e clamava meu nome. As paredes de sua boceta apertaram meu pau,
trazendo-me para mais perto da borda, mas nem fodendo eu me liberaria
antes dela.
Sophie também estava perto de gozar, então acelerei mais o movimento
dos meus dedos, assim a veria desmoronar sob mim. Não demorou muito
para que ela suplicasse.
― Oh, Deus! Estou tão...
Dizer que eu adorava vê-la gritar de prazer era eufemismo, pois amava
cada som que saía de sua boca. Seus olhos estavam fechados, então se
abriram, fitando-me com amor.
― Amo você, pequena. ― Bati com mais força dentro dela, e suas
paredes me prenderam, quase tirando o meu maldito ar. ― Cristo!
― Daniel, eu...
Acelerei mais a pressão dos meus dedos em seu clitóris, aumentando o
seu prazer. Eu já estava a ponto de soltar minha liberação, mas queria que
ela o fizesse primeiro.
― Goza! Enche meu pau com o seu gozo, querida... ― Assim que as
palavras saíram da minha boca, ela gozou, e eu segui logo atrás dela,
clamando seu nome com adoração.
Nossos corpos estavam grudados e molhados devido ao suor do
momento. Toquei seu rosto quente e beijei sua testa de forma delicada.
― Você é linda demais. ― Nunca me cansava de vê-la corar com
minhas palavras, seu rosto em forma de coração e os olhos brilhantes de
amor.
― Você também é lindo, Daniel ― ela declarou, meio sem fôlego. ―
Amo você demais, não quero que nada disso aqui acabe. Parece que estou
em um sonho lindo.
Beijei de leve seus lábios abrasadores como o sol.
― Que bom que me ama. Juro que estamos apenas começando e
prometo dar mais sonhos como esse para você. ― Sorri. ― Isso significa
que vai a um lugar comigo agora.
Estávamos comemorando três meses de namoro. Todo mês, eu fazia
uma surpresa para ela e esperava continuar assim. Estava tendo problemas
com meu pai devido ao nosso relacionamento, mas não dava a mínima para
isso. Ninguém me afastaria da Sophie, nem mesmo ele.
Ela sorriu.
― Aonde vamos? ― perguntou ansiosa.
― Vamos tomar um banho e nos vestir. Depois conto a você. ― Saí de
dentro dela e a puxei para o banheiro.
― Sou ansiosa demais, por que não me conta antes? ― pediu assim que
terminamos o banho.
Nós nos vestimos, e eu estava pronto para levá-la aonde queria e lhe
mostrar minha surpresa. Como não podia levá-la a uma ilha no Caribe, como
era seu sonho, eu a levaria a uma perto dali.
A porta do quarto se abriu, e a dona Alísia entrou com o rosto banhado
em lágrimas. Ela sabia que eu e sua filha namorávamos, nunca se importou
em ser discreta, era uma mãe que só queria que sua filha fosse feliz. Dona
Ally, era assim que eu a chamava e a considerava como uma segunda mãe.
Ela esteve ao meu lado desde criança, amando-me e protegendo-me e não só
porque trabalhava para a minha família, mas porque realmente me amava de
verdade.
Ao vê-la entrar ali chorando, percebi que certamente não era coisa boa.
Deveria ter acontecido algo.
― Dona Ally, o que foi? ― Fui até ela, querendo ajudá-la de alguma
forma.
― Oh, querido... ― Sua voz falhou.
― Mamãe? ― Sophie arregalou os olhos e correu para a sua mãe.
Algo em meu instinto me dizia que aquilo era relacionado ao meu pai.
― Que bom que está aqui, minha filha. Preciso que arrume suas coisas,
porque vamos embora desta casa e não vamos mais voltar. ― A dor era
evidente na sua voz, mas também havia raiva.
Pisquei. Aquela casa pertencia à minha família, era nela que os
empregados moravam. Se dona Ally fosse embora dali, isso significava que
pararia de trabalhar para os meus pais? E levaria a Sophie consigo?
― O quê? Por que a senhora disse isso? ― sondou Sophie, confusa,
não entendendo nada do que a mãe dizia. Entretanto, eu já suspeitava de que
tinha o dedo do meu pai naquela história.
Seu olhar triste se dirigiu a mim.
― O senhor Luxem nos despediu, a mim e ao meu marido. Ele nos
mandou embora de sua casa. ― Ela estremeceu, seus olhos molhados.
Arquejei. Embora estivesse fervendo de raiva pelo que ele fez, não
devia me surpreender, pois, alguns dias depois de saber do meu namoro com
a Sophie, meu pai me mandou ficar longe dela, mas eu não quis e disse que
jamais faria isso. Durante todos aqueles meses, ele ficou no meu pé para que
eu a deixasse. Seria uma vingança contra mim?
― Não pode ser. Meu pai não pode fazer isso! A senhora está aqui a
vida toda... Não... ― Sacudi a cabeça, tonto, e encarei a Sophie, que também
estava tão atônita quanto eu. O que aconteceria conosco? Se os Winters
fossem embora e levassem a minha menina, o que seria de mim?
Ela olhou para sua mãe e para mim. Eu podia ver que estava confusa e
com o mesmo medo que eu sentia estampado em seu rosto lindo. Não podia
deixar que aquilo acontecesse.
― Não entendo. Por que ele demitiria vocês dois? Vocês não fizeram
nada. Por que o senhor Luxem os demitiu? ― Sophie franziu a testa.
Ela não entendia, mas eu, sim. O velho era um bastardo de coração frio,
aliás, eu nem sabia se ele tinha um em seu peito. Meu pai não gostava muito
de mim, então eu não ligava muito para ele. Quando sabia que ele estava em
casa, eu fazia de tudo para evitá-lo, embora o velho nunca se importasse
comigo. Então por que tinha feito isso? Seria só por eu não ter ficado longe
de Sophie como exigiu?
Meu pai era dono de uma editora de sucesso e mandava bem no assunto,
então não tinha tempo para ficar em casa ou ligar para nós, minha mãe e eu.
Nem meus aniversários, eles passavam comigo, sequer ligavam para me dar
parabéns, só compravam carros e viagens para mim, como se isso bastasse.
Finalmente eu havia encontrado a felicidade ao lado da Sophie, e ele queria
destruir tudo?
Filho da puta!
― Vou cuidar disso ― falei à dona Alísia, esperando tranquilizá-la,
bem como à minha garota. ― Não se preocupe com nada, ninguém irá
embora...
Dona Ally deu um sorriso triste, não parecendo ter alguma esperança de
que eu conseguisse algo.
― Não será possível. Seu pai me disse coisas terríveis, e eu não
poderei esquecer tão cedo e muito menos ficar aqui depois de tudo o que
ouvi. ― Ela pegou minhas mãos. ― Sinto muito, filho, mas ele chegou longe
demais.
Sacudi a cabeça, meio tonto, tentando imaginar o que ele tinha dito para
deixá-la naquele estado, ao ponto de não querer continuar ali, embora eu não
devesse ficar surpreso, porque meu pai sabia ser cruel quando lhe convinha.
― O que ele disse? ― Talvez eu pudesse reverter aquela merda de
alguma forma, mas, conhecendo meu pai, sabia que seria meio difícil. O
velho era um idiota, não só isso, era o maldito demônio em pessoa. Como
minha mãe ainda continuava casada com ele?
― Nada em que você deva se meter, meu filho, ou ele pode fazer algo
que não queira. Não quero estragar nada para você. É melhor deixar como
está ― disse com os olhos molhados. ― Lamento não poder ficar perto de
você.
Ela era uma senhora, e seus cabelos estavam começando a ficar
grisalhos. Os olhos eram castanhos, como os da Sophie, mesmo que não
fosse sua mãe de verdade. Sophie amava a senhora Ally como se fosse sua
mãe biológica, assim como eu, já que a minha mal tinha tempo para mim. Se
não fosse dona Ally, eu não sabia o que teria sido de mim naquela casa.
Certamente seria cercado de solidão e tristeza.
Sangue não simbolizava uma família. Eu tinha a minha, mas nenhum de
seus integrantes se preocupava comigo. A família da Sophie, sim, me amava,
então por que meu pai queria tirar as únicas coisas boas que eu tinha?
― Por favor, me diga! Não quero que vá embora... ― Peguei a mão de
Sophie e a apertei.
― Melhor não saber, filho. Antônio, vá arrumar as nossas coisas para
nossa saída daqui. O senhor Luxem nos deu uma noite para sair de sua
propriedade. ― Tinha um toque amargo na voz dela.
Meu coração temia o pior, mas me controlei. Mesmo que eles saíssem
dali, eu ainda poderia continuar vendo a Sophie, afinal eles poderiam ficar
na cidade. Não era porque seus pais deixariam de trabalhar na minha casa
que eu não poderia ver a minha garota.
― Para onde vocês vão? Ainda vou poder ver a Sophie, não é? ―
perguntei. Não existia um mundo onde eu pudesse seguir vivendo sem ela.
Todo aquele tempo ao lado de minha garota não me permitia cogitar a
ideia de ficar longe dela. Não passava um dia sem que eu a visse ou a
desejasse, não falava só em termos sexuais; eu a queria para toda a vida. No
futuro, pretendia me casar com ela e não deixaria meu pai atrapalhar os meus
planos.
A tristeza nos olhos de dona Ally quase me fez cair de joelhos ali na
sua frente. Já temia o pior; não precisava nem que ela dissesse algo, pois a
resposta estava estampada em seu rosto.
― Mamãe? ― A dor e o medo estavam na voz de Sophie assim como
estavam em mim. ― Vamos ficar na cidade, não é?
― Não, queridos. Nós não podemos ficar aqui. Vamos voltar para
Dallas. Por enquanto, vamos ficar na casa da minha irmã... Sei que vocês
estão namorando, mas, pelo que o senhor Luxem me disse, ele não aprova o
seu namoro.
Uma sensação horrível apertou meu estômago. Quem ele pensava que
era para se meter na minha vida só porque era meu pai? Eu já tinha 18 anos e
podia viver por conta própria.
― Como assim não aceita o nosso relacionamento? Disso eu já sabia,
mas... ― Encarei-a, piscando. ― Não vai me dizer que ele a despediu só
porque estou namorando a Sophie? Não acredito que aquele desgraçado fez
isso!
Se eu pudesse contar com minha mãe... mas ela fazia tudo o que meu pai
queria, como um cachorro obediente, então não iria me ajudar, aliás, nunca
fez tal coisa. Isso era entre mim e ele.
Andei de um lado a outro do quarto. Não podia deixar que ele me
afastasse de Sophie. Ela era o amor da minha vida. Como eu poderia ficar
longe dela? Não poderia, não quando tive tão pouco tempo como seu
namorado. Queria me casar com ela assim que nos formássemos. Não
deixaria que ninguém entrasse no meu caminho.
― Daniel... ― Sophie me encarou com os olhos assustados. ― O que
vamos fazer?
Respirei fundo. Não podia deixar que ela visse a preocupação que eu
estava sentindo, precisava me manter calmo para resolver o problema. Teria
que enfrentar meu pai e faria isso naquele momento. Se ele não voltasse atrás
em sua decisão, eu me mudaria de sua casa e o cortaria da minha vida para
sempre.
― Vou resolver isso, prometo. ― Beijei os lábios dela de leve.
― Daniel ― sussurrou, agarrando-me como se não quisesse me soltar
mais.
Suspirei.
― Fique com a sua mãe. Assim que eu conseguir falar com meu pai,
venho te procurar.
― Mas só temos até a noite para sairmos...
― Vou resolver tudo antes disso ― prometi, interrompendo seu
desespero.
Deixei-os ali e fui à procura de meu pai. Precisava ter uma conversa
séria com ele. Não podia permitir que o bastardo me dissesse o que fazer.
Era maior de idade, então poderia escolher quem eu deveria namorar.
Estava com raiva demais para ser educado, então apenas entrei no seu
escritório em nossa casa sem bater. Minha vontade era acabar com o
maldito, mas precisava manter a calma.
― Como ousa entrar aqui dessa forma? Cadê os modos, garoto? ―
rosnou.
Eu era parecido com ele, cabelos e olhos escuros. Dava graças a Deus
por não ter herdado sua frieza e crueldade.
― Eu que pergunto como você pôde despedir a dona Alísia e o senhor
Antônio? Eles trabalham para nós há anos, e você irá dispensá-los como se
não fossem nada? ― rosnei com os dentes trincados. ― Como se não
significassem nada?
Ele endureceu e depois ficou furioso, mas isso não era novidade;
sempre se irritava só com a minha presença. Às vezes eu pensava que seu
ódio significava que eu não fosse seu filho biológico, e agradeceria aos Céus
se isso fosse verdade, mas, infelizmente, não era. Minha mãe jamais trairia
aquele verme maldito.
― Eles não são nada, apenas empregados. E aquela garota órfã que
anda com você para cima e para baixo não passa de uma golpista atrás de
sua fortuna ― sibilou. ― Não vou permitir isso. Quero que você se
relacione com pessoas do nosso nível e não com uma garota morta de fome.
Eu nunca tinha visto tamanha raiva por uma pessoa que jamais fez algo
de ruim para ele.
― Você deve estar louco. Nós dois nos amamos, mas acho que você
não entende isso, não é? Não sei como ainda está casado com a minha mãe.
Devia ficar sozinho. ― Cerrei os punhos, ou logo esmagaria sua cara.
Ele se levantou e me encarou com superioridade, aquele poder que
pensava que exercia sobre mim. Eu não via a hora de sumir daquele lugar e
esquecer que aquele homem tinha meu sangue, não mais respirar no mesmo
ambiente que ele.
― Casamo-nos por obrigação. Seus avós a escolheram para mim.
Somos do mesmo círculo social. Sua mãe não era uma caipira sem graça e
caçadora de fortunas. ― Apontou para a porta como se Sophie estivesse ali.
― Aquela garota não vai ficar com você.
Fulminei-o com ira.
― Isso não é um assunto seu. Se insistir, posso sair, deixando todos
nesta maldita casa. Minha mãe é fraca demais para ir contra você; se ela não
é capaz, eu sou. ― Aquilo era verdade. Eu não deixaria aquele maldito
verme estragar minha vida e destruir minha felicidade com a Sophie.
Dessa vez, ele riu zombeteiro, mas vi fúria em seus olhos.
― Como vai se sustentar? Onde vai morar? Com o que vai pagar as
contas? É com o meu dinheiro que faz tudo isso. Onde terá a vida de luxo e
regalias a que está acostumado? ― Meneou a cabeça de lado. ― Você é um
garoto imprestável que não serve para nada, só me dá despesas. Vai viver à
custa do braço?
Eu não queria ser filho daquele homem. A frieza dele para comigo era
demais, embora ele sempre fosse dessa forma com todo mundo, até com a
minha mãe.
― Não preciso do seu dinheiro, o que preciso é da Sophie e de mais
ninguém ― falei com um suspiro duro.
Não queria deixar que ele visse o quanto eu estava preocupado em
viver sozinho, não por ser um cara que não soubesse fazer nada, mas sim
porque as coisas se complicariam. Eu podia ficar com os Winters, eles já me
amavam como filho. O que não podia era perder minha namorada. Poderia
ficar com eles até que nos formássemos, depois me casaria com a Sophie e
viveria uma vida feliz longe de tudo aquilo.
Meu pai se levantou e me fuzilou. Suas narinas se dilataram como se ele
quisesse me bater. Eu até gostaria que o fizesse, pois assim o derrubaria.
Tinha mais força e agilidade que ele.
― Isso não vai acontecer. Se você se preocupa com essa garota, então
vai ficar longe dela. ― Sua ameaça estava em cada palavra que ele dizia.
Endureci.
― Não ligo para as suas ameaças. Não ouse tocar em Sophie, porque
mando você para o inferno na mesma hora com passagem só de ida. ―
Aquilo era uma maldita promessa.
― Não vou tocá-la, porque não faz o meu gênero. Entretanto, fecharei
todos os caminhos dos pais dela. Eles nunca mais irão encontrar emprego em
nenhum lugar. Está disposto a viver um romance que não vai dar em nada e
ver a família dela perder tudo? ― A cada palavra sua, eu sentia mais
vontade de acabar com ele.
― Você não ousaria fazer isso... ― Era para soar com ímpeto, mas foi
só um sussurro.
Ele riu de novo, mas parecia um sorriso glacial.
― Experimente. Vamos ver se essa garota ainda continuará te amando
quando souber que ficará sem nada e que, por sua culpa, sua família vai
perder tudo. Vou fechar todos os caminhos deles, tanto que não encontrarão
nada para viver a não ser pedir esmolas nas ruas.
Eu nem me incomodei com o primeiro argumento, pois tinha certeza de
que Sophie ainda me amaria; ela não era dessas que ligavam para dinheiro.
O que me preocupou e deixou meu coração apertado tanto pelo medo da
perda como pela dor foi saber que sua família perderia tudo. Sabia que seria
assim, porque conhecia meu pai; ele não ia deixar barato.
― Também tenho influência. Não se esqueça de que tenho o dinheiro
que minha avó me deixou, no qual você não colocará as mãos. ― Bati
minhas mãos na mesa. ― Se você se aproximar dela, eu vou derrubá-lo. A
partir de hoje, por ameaçar a minha mulher, você está morto para mim.
Morto, porra!
Dei as costas para ele.
― Se sair por essa porta, irá se arrepender amargamente, Daniel. Você
não sabe com quem está lidando. ― Sua voz era sombria e mortal.
― Se for preciso confrontá-lo, eu o farei. ― Saí dali sabendo que
aquela família não era mais a minha, e sim os Winters. Tirava só minha mãe
disso, mas ela nunca me seguiria. Naquele momento, eu pensaria só em
Sophie e em mais ninguém.
Capítulo 7

DANIEL
Passado
Três semanas depois

A minha vida na casa dos Winters era maravilhosa. É claro que acordar
cedo na fazenda para ajudar na lida me baqueou um pouco, mas eu estava
fazendo aquilo com muito gosto. Era bom estar cercado de pessoas que me
amavam e se importam comigo. Sempre fui cercado de tudo que o dinheiro
podia comprar, mas nunca fui feliz. Ali, naquela cidade, na simplicidade, eu
me sentia realizado.
O senhor Antônio era um homem muito bom, e eu gostava bastante dele.
Ensinou-me a dirigir um trator, a capinar e arrumar cercas. Martelei meu
dedo na primeira tentativa.
― Comprar esta fazenda foi um sonho realizado. Não achei que
conseguiríamos, mas a corretora de imóveis nos fez um preço promocional.
― Ele parecia extasiado enquanto olhava para a vasta fazenda, que tinha
uma área grande cheia de gado, um curral onde prendia as vacas e um
estábulo para os cavalos. Na frente da casa tinha um lago de águas azuis
rodeado de árvores.
Quando surgiu a oportunidade de eles comprarem aquela fazenda, todos
da família ficaram eufóricos, mas era um pouco cara em relação ao valor
que a senhora Alísia e o senhor Antônio tinham economizado a vida inteira.
Eu dispus de dois dos meus carros e dei o restante que faltava direto à
corretora, em segredo, pois sabia que eles não aceitariam.
― É muito lindo este lugar ― admiti e me virei para ele. ― Só queria
lhe agradecer por me deixar ficar com vocês. Sei que receberam ameaças do
meu pai por causa disso, mas juro que não deixarei que nada lhes aconteça.
Era uma promessa. Saí das garras do meu pai, e, por isso, ele não
estava feliz comigo, mas eu não dava a mínima para o que ele pensava.
O senhor Antônio sorriu.
― Você é um garoto especial. Se não fosse, a minha Sophie jamais teria
se apaixonado. Conheço minha filha. ― Pegou um dos martelos e pregou
algumas tábuas no celeiro, que estavam quebradas.
― Eu a amo. Assim que terminarmos a faculdade, vou me casar com
ela, se assim o senhor deixar. ― Estava ansioso para isso, mas esperaria
Sophie se formar em Medicina como era o seu desejo.
Eu ainda não sabia no que me formaria; tinha até o começo do ano para
me decidir, mas Sophie já sonhava em ser médica havia anos. Estava ansioso
por aquela fase da minha vida, embora já estivesse muito feliz namorando
minha menina e longe do meu pai. Isso era uma benção, pois eu tinha Sophie
e sua família, que já considerava como minha.
― Sei que o relacionamento de vocês é bastante sério, até porque
deixou tudo por ela e nos acompanhou. ― Suspirou. ― Daniel, o que eu
quero saber é: você tem certeza de que nunca irá se arrepender? Porque essa
vida aqui não é igual à que você tinha antigamente, é de pessoas que ralam
no pesado. Outra coisa, seu pai pode ser duro de lidar, mas é seu pai no final
das contas, e isso não vai mudar.
― Entendo o que está querendo dizer, mas não ligo para serviço duro e
para isso. ― Levantei minhas mãos, mostrando alguns calos. ― Sophie vale
qualquer coisa, e não vou perdê-la porque meu pai acha que eu tenho que
ficar com alguém do mesmo status da sociedade, uma patricinha mimada
vivendo à custa dos pais.
Ele assentiu.
― Você tem o seu próprio dinheiro e pode montar o que desejar na sua
vida, o que amar de verdade ― disse com tom orgulhoso.
― Vou realizar meus sonhos também, só quero que Sophie vá para a
universidade, o que é o seu sonho. ― Stanford sempre foi seu sonho,
inclusive ela mandou uma carta para a instituição, bem como para algumas
outras universidades de renome, como a do Alabama, e eu esperava que
fosse aceita em uma delas e que ganhasse uma bolsa integral. As inscrições
nessas instituições de ensino eram bastante seletivas, mas minha garota era
brilhante, quase um gênio, então tiraria de letra.
― Para qual você vai? ― perguntou assim que terminamos de pregar as
tábuas soltas e se virou para mim.
Eu não tinha pensado nisso, porque só tinha uma coisa que gostaria no
momento, que era ver os sonhos de Sophie sendo realizados. No futuro, eu
gostaria de ser piloto de carros de corrida e competir por todo o país e até
pelo mundo.
― Faculdade? Não sei direito no que quero me formar ainda ― admiti,
seguindo para guardar as ferramentas.
― Sei que ama a minha filha e pensa no futuro dela, mas você também
precisa pensar no seu. Agora por que não vai tomar um banho? Soube que
vão ao cinema hoje à noite, antes da festa surpresa de aniversário que
estamos preparando para Sophie.
Era aniversário de Sophie, que estava completando 18 anos. Eu tentaria
distraí-la para que não pensasse muito na data, embora achasse que ela
pensava que iríamos passear naquele dia por causa disso. Mesmo ela não
dizendo nada, eu a conhecia bem. Depois de sua festa surpresa, eu a levaria
a uma ilha não muito longe dali. Esse tinha sido o plano antes de meu pai
demitir os Winters. Essa seria a minha surpresa para ela. Ficaríamos
sozinhos no local por uma semana. Dona Ally e o senhor Antônio deixaram
sua filha ir comigo, pois sabiam que estaria segura. Nenhum deles era cego
ao ponto de não saber que não transávamos, mas tinham certeza de que eu a
respeitava e do quanto Sophie significava para mim. Ela era tudo na minha
vida.
― Preciso ajudá-lo a dar comida aos animais e... ― comecei, mas ele
me cortou com tom grave, como de um pai de verdade:
― Vá e se divirta, Daniel, deixe que eu cuido do resto. Está faltando
pouca coisa aqui. ― Deu um sorriso. ― Já trabalhou demais, então tire uma
folga e saia um pouco com minha filha.
Não discuti, só me virei e fui para casa, direto para o quarto tomar
banho.
Se minha mãe me visse daquele jeito, todo sujo de trabalho duro, teria
um enfarto. Ali aprendi muito, tanto a valorizar mais a vida como a perceber
quem realmente se importava comigo. Por isso eu não media esforços para
ajudar os Winters. Minha mãe não ligou mais para mim desde que lhe falei
para não telefonar caso o assunto da conversa fosse o meu pai, que para mim
estava morto.
Sob o chuveiro, pensei que já tinha algum tempo desde a última vez que
eu e Sophie havíamos transado. Não tínhamos oportunidade, e eu achava
errado continuar ficando com Sophie sob o mesmo teto dos pais dela sem
nos casar. Como éramos novos ainda para tal coisa, teríamos que arrumar
outro jeito para fazer sexo.
Foquei os pensamentos na minha garota, na forma como seu corpo
reagia ao meu. Segurei meu pênis duro e me concentrei nisso, no seu cheiro,
nos seus lábios em volta dele, nos seus gracejos que eu tanto amava.
― Espero que esteja pensando em mim ― disse uma voz rouca. ―
Porque é uma visão muito sexy.
Abri meus olhos e me deparei com Sophie nua vindo na minha direção
com os olhos quentes, quase me deixando sem fôlego. Eu poderia ter caído
na sua frente em razão das pernas bambas, só não o fiz por estar escorado na
parede.
― Sua mãe...
― Foi ajudar o meu pai. Então aproveitei para vir aqui. ― Tocou meu
peito e desceu sua mão, fazendo-me gemer. ― Estou faminta, Daniel, e não
posso aguentar mais ficar sem você. Só precisamos ser rápidos. Acha que
consegue?
Sorri de modo provocativo.
― Vamos descobrir. Por que não se ajoelha e chupa o meu pau? ―
Sacudi-o para que visse a forma como fiquei mais excitado apenas por vê-la
daquela forma na minha frente.
Ela não discutiu e fez o que mandei. Logo estava com o meu membro na
boca, chupando-o forte como em meus pensamentos havia pouco, embora a
realidade superasse tudo, fosse mais do que perfeita.
― Isso, gatinha, suga tudo de mim. ― Peguei seus cabelos molhados
devido à água que caía sobre nós. Sophie estava tão magnífica e molhada,
toda para mim.
Quanto mais ela me chupava, mais eu ficava perto da borda. Era tão
intenso que tive que me segurar na parede com uma das mãos enquanto me
esforçava para, com a outra, não forçar sua cabeça a ter mais de mim do que
ela aguentava.
― Por mais que eu ame sua boca saborosa, preciso gozar dentro de
você. ― Puxei-a pela cintura, coloquei-a contra a parede azulejada do
banheiro e, em seguida, entrei nela sem proteção, sentindo seu calor que eu
tanto adorava.
Sophie disse que ia começar a tomar anticoncepcional para evitar
gravidez, afinal ter filhos naquele momento não seria nada bom. Éramos
jovens e queríamos aproveitar muito apenas nós dois.
Beijei-a enquanto metia duro nela, tão forte que suas unhas foram parar
em minhas costas, apertando-me mais contra si.
― Goza em meu pau, querida. ― Mordisquei sua orelha, fazendo-a
gritar, então a calei com minha boca, pois não queria que ninguém ouvisse.
Abafei os sons que eu adorava ouvir, mas poderia ser bem constrangedor se
os pais dela nos escutassem.
― Eu amo você demais, Daniel ― declarou nos meus lábios assim que
gozamos juntos. ― Agradeço a você por estar aqui, por não ter desistido de
nós dois.
― Desistir de você seria como deixar de respirar. Agora vamos tomar
banho antes que meus sogros saibam o que fizemos.
Ela riu.
― Não quero ter que explicar isso a nenhum dos dois.
Após tomarmos banho e nos vestimos, Sophie questionou:
― Vamos ao cinema agora? Estou animada.
Sempre que havia alguma estreia interessante, nós íamos assistir. Não
era tanto os filmes que amávamos, mas estarmos juntos. Aquela mulher era a
razão da minha felicidade.

Assistimos ao filme “Amor ao Luar”, com um ator que eu não conhecia,


um romance. Foi uma pena que, no final, o personagem perdia sua mulher
para uma doença fatal, e o cara ficou num estado lastimável. Aquilo me
tocou, porque, em uma situação assim, eu não saberia o que fazer, acho que
acabaria definhando a cada dia igual àquele personagem. Eu não queria
pensar em algo assim, só queria ser feliz ao lado da mulher que amava.
― Amei esse filme. O final foi estupendo, embora meio triste.
Poderiam ter feito a garota conseguir se curar para que eles ficassem juntos
― Sophie disse, fungando.
Puxei-a para meus braços.
― Não devia assistir a esse tipo de filme, pois isso a faz chorar. ―
Alisei seu rosto corado, com os olhos úmidos e vermelhos pelo choro.
― Não foi nada, estou bem. Gosto de romance. ― Puxou minha mão
para irmos à sorveteria.
― Isso não é romance, é a porra de um drama. ― Sacudi a cabeça. ―
Podemos tomar um sorvete antes de voltar para casa.
Estávamos a ponto de entrar na sorveteria quando o meu telefone tocou.
― Alô? ― Franzi a testa, porque era o número da minha mãe. Eu não
queria falar com ela, mas podia ser algum problema.
― Sua mãe está no hospital. Se você se importa e quer se despedir
dela, então venha visitá-la antes de sua morte. ― Ouvi a voz do meu pai do
outro lado da linha antes de ele desligar sem sequer se despedir.
Detive-me com um aperto no peito.
― Filho da puta! ― rugi, tentando ligar de novo, mas a ligação não
concluía.
― O que foi, Daniel? ― sondou Sophie, preocupada.
Sacudi a cabeça, tentando me recuperar do aperto no peito que me
sufocava.
― Meu pai ligou e disse que minha mãe está no hospital e que ela... ―
Minha voz falhou.
Não sabia o que tinha acontecido com a minha mãe. E se ela... Eu não
podia abandoná-la naquela hora.
― Querida, é seu aniversário, mas tenho que ir lá para ver como ela
está.
Sophie piscou.
― Vou com você...
Sacudi a cabeça.
― Não quero o meu pai perto de você. ― Temia só em imaginá-lo
tocando nela. Suas ameaças ainda estavam vívidas em minhas lembranças.
― Mas...
― Por favor, linda. ― Beijei seus lábios de leve. ― Vou levá-la para
casa e depois vou ao aeroporto.
Por sorte, eu andava com todos os meus documentos.
― Te levo ao aeroporto e depois vou com o seu carro para a fazenda.
― Tocou meu rosto. ― Fique seguro.
Aquela mulher valia ouro, era a melhor do mundo. Eu agradecia a fosse
quem fosse que a havia enviado a mim.
― Obrigado, linda ― agradeci assim que saí do carro para entrar no
aeroporto.
― Se precisar, me chama. ― Ela me abraçou. ― Saiba que amo você.
― Também amo.

Cheguei a Manhattan com o coração na mão. Fui direto para a casa dos
meus pais, já que o desgraçado do Michael não especificou o hospital em
que ela estava nem deixou que eu perguntasse algo, apenas desligou.
Entrei quase correndo na sala da casa e me deparei com a mamãe
sentada no sofá, olhando uma revista.
Parei, franzindo o cenho.
― Mãe? A senhora está bem? ― questionei, indo até ela e checando
sua temperatura para verificar o seu estado.
Ela sorriu.
― Meu filho, você voltou! ― Abraçou-me forte, fungando como se
estivesse se segurando para não chorar.
Eu nem sabia que ela sentia minha falta daquela forma, pela maneira
como sempre havia me tratado.
― Achei que você estivesse doente e que tinha ido para o hospital. ―
Algo dentro de mim me dizia que meu pai havia me enganado.
Mamãe se afastou e estreitou os olhos.
― Estou bem. Quem disse que eu estava passando mal?
Sacudi a cabeça, tentando controlar a raiva, embora estivesse aliviado
por ela estar bem.
― Meu pai ― grunhi. ― Onde ele está?
Ela piscou.
― Ele deve ter dito isso porque ficou preocupado e quer você de volta.
Inspirei fundo e me controlei para não ser grosseiro com ela por causa
da sua cegueira em relação ao meu pai, por não reconhecer a cobra que o
homem era.
― Onde ele está?
― No escritório dele. ― Ela me avaliou. ― Não vai brigar com ele,
não é? Seu pai te ama muito, meu filho.
Amar? Aquele homem não conhecia aquela palavra nem o seu
significado. Não respondi, apenas lhe dei as costas e fui até onde o
desgraçado estava.
Como um pai é capaz de mentir ao filho dizendo que sua mãe está
doente? Isso é incabível, pensei com amargura.
Entrei no escritório pisando duro.
― Como ousa mentir sobre a minha mãe, seu filho da puta?! ― rugi,
indo em sua direção.
Ele estava sentado atrás de sua mesa, o que não era novidade, já que
ele não saía dali. Tinha um notebook aberto na sua frente.
― Vejo que aquela caipira está mudando o seu linguajar. Está bem
inapropriado. ― Fuzilou-me.
Ignorei seu comentário, ou voaria contra seu pescoço.
― Você mentiu sobre a minha mãe. Para quê? ― Cerrei os punhos. ―
Diga que porra você quer, porque não quero mais ver a sua cara.
― Devia me respeitar, pois sou o seu pai, querendo você ou não.
― Se vai me obrigar a deixar a Sophie, isso não vai acontecer. Os
Winters são mais minha família do que você já foi um dia ― cuspi.
A fúria tomou suas feições, mas ele logo se controlou.
― Você não vai ficar mais com aquela família. Eu me livrei da garota
de uma vez por todas. ― Apontou para a tela.
Meu coração gelou por dentro, pensando que, de algum modo, ele
tivesse tocado em Sophie. Fui até o computador e vi um carro capotado. Era
o meu carro, com o qual Sophie tinha dirigido até a fazenda. Reconheci a
estrada.
O mundo caiu aos meus pés. A dor se apossou de mim de tal forma que
achei que surtaria e mataria aquele homem à minha frente.
― Deixe aquela família, ou o pior vai acontecer com os pais dela
também, e o único culpado será você. ― Ouvi-o dizer atrás de mim.
Eu poderia matá-lo, mas precisava ir até a Sophie e conferir se aquilo
era verdade; depois acertaria minhas contas com ele.
Meu telefone tocou assim que me encaminhei para o aeroporto na
intenção de retornar a Dallas. Já tinha tentado entrar em contato com a
Sophie e os meus sogros, mas não consegui, e aquela falta de contato estava
me deixando desesperado.
― Oh, graças a Deus que atendeu! ― exclamou a voz chorosa de dona
Alísia. ― Tem algo que preciso dizer.
Meu coração se encolheu do tamanho de uma noz. Lágrimas caíam dos
meus olhos. Não, não, ela não poderia ter morrido! Se o pior tivesse
acontecido, eu mataria meu pai e não ligaria se passasse a vida toda na
cadeia.
― Sophie...
― Ela sofreu um acidente e está no hospital, mas graças a Deus está
bem. Teve duas costelas e uma das pernas quebradas, mas está bem. ―
Suspirou, um pouco aliviada.
Deixei um suspiro escapar também, embora tudo em mim ainda doesse,
porque era culpa minha o fato de ela ter parado no hospital e quase ter
morrido. Não quis ouvir a ameaça daquele monstro que me mandou ficar
longe dela.
O que fazer? O velho conhecia muitas pessoas influentes, então seria
capaz de tudo o que prometeu que faria, a prova era o atentado à vida da
minha garota. Como eu poderia ter Sophie e não a prejudicar, bem como aos
seus pais? Se ficasse com ela, sua família perderia tudo... Como podia
conviver com isso?
Maldição! Queria poder matar aquele homem com minhas próprias
mãos. O único problema nisso era que eu não era assassino, caso contrário,
ele já estaria em uma tumba.
Só havia uma coisa a ser feita, eu não tinha escolha, tudo graças ao
maldito que destruiu minha vida. Tudo dentro de mim doía como se meus
órgãos fossem cortados por uma navalha. O vazio se expandia em meu
interior, pois eu sabia que no final me veria sozinho e perderia a única
pessoa que já havia amado e amaria por toda a minha vida.
Nunca tinha pensado que seria altruísta ao ponto de abrir mão da minha
felicidade só para proteger não só a ela, mas também a sua família. Como eu
viveria sem Sophie?
Contudo, não ficaria longe dela por muito tempo; só precisava ser mais
poderoso que o meu pai para conseguir proteger Sophie e sua família. Se,
para que todos ficassem seguros e longe das garras do meu pai, eu tivesse
que fazer um acordo com o diabo, eu faria. Lutaria contra ele e o derrubaria.
Provaria que ele foi o causador do acidente dela e o mandaria para a cadeia.
Um dia, faria aquele demônio pagar por cada lágrima que eu fizesse a
Sophie derramar.

Presente
Sophie piscou.
― Depois que você ficou comigo durante meses até que eu me curasse,
me traiu com a Stacy. Está me dizendo que fez isso para que eu não corresse
mais perigo? ― A dor e a incredulidade eram evidentes na voz dela.
― Não consegui comprovar o envolvimento do meu pai no acidente,
então o procurei e lhe pedi que me deixasse ficar ao seu lado até que se
curasse. Depois disso, procurei Stacy, já que você não gostava dela na
época. ― Encolhi-me. ― Propus à garota que forjássemos um envolvimento
naquela noite, pois sabia que você me seguiria. Você precisava ver aquilo
para seguir em frente sem mim, ou acabaria sendo morta. Foi um milagre ter
sobrevivido àquele acidente, que na verdade foi um atentado, e eu não
correria o risco de novo.
― Só o segui porque o senti estranho durante todo aquele tempo; estava
distante demais, e eu precisava saber o que estava acontecendo. Então quer
dizer que nunca aconteceu nada entre você e a Stacy? ― Sua voz estava
grave.
― Não. Eu jamais trairia você ou algo assim; só precisava que seguisse
com sua vida, segura, até que eu pudesse resolver tudo. Mas, infelizmente,
demorou demais. ― Expirei. ― Só preciso que me responda a uma pergunta
e, dependendo da resposta, te deixarei em paz para sempre. ― Aquilo era
verdade, mesmo que a ideia de deixá-la me matasse.
Sophie saiu de perto de mim, levando consigo seu calor, que eu tanto
adorava.
― Por favor! ― supliquei, pegando seu braço.
Ela suspirou.
― O que é?
― Você está noiva e grávida? Ou só se sentiu mal mesmo?
Ela piscou, mas a noite dificultou a leitura da sua expressão.
― Entendo o seu lado por ter feito o que fez, mas foi fraco ao ceder ao
seu pai. Eu precisava saber da verdade, e você não me incluiu na sua vida.
Agora retorna querendo saber sobre mim?
― Quero você na minha vida e vou lutar por isso dependendo da sua
resposta.
― Não para nenhuma das duas perguntas. ― Seus olhos estavam
molhados. ― Não tenho noivo, nem sequer um namorado nem estou grávida.
Porém isso não quer dizer que vou perdoá-lo pelo que fez comigo, pela dor
que me fez sofrer. Segui em frente, Daniel.
― Senti em seus beijos que me deseja e me quer tanto quanto eu. ―
Toquei seu rosto. ― Fico feliz que esteja melhor e lamento que tenha
sofrido, mas prometo que, se me der mais uma chance, nunca mais vou
magoá-la, Sophie.
Ela sacudiu a cabeça, meio tonta, parecendo estar procurando uma
resposta.
― Não precisa dizer nada agora. Se resolver que me quer em sua vida,
vou aceitar qualquer coisa que me der até estar pronta para receber o meu
amor de novo. ― Dei mais um selinho em seus lábios, aproveitando que ela
estava confusa.
― Você...
― Eu te vejo no clube daqui uns dias, e você me dá uma resposta.
Tenho uma viagem para fazer nessa semana. Enquanto isso, por favor, pense
bem, apesar de que não desistirei de você. Nunca. ― Beijei sua testa. ― Se
passar mal de novo, me chame. Boa noite.
Deixei-a ali e fui embora, mas não desistiria dela nem naquele momento
nem nunca. Sophie seria minha de novo. Na verdade, ela nunca tinha deixado
de ser.
Capítulo 8

SOPHIE
Eu sabia que tinha sido egoísta ao dizer ao Daniel que tinha seguido em
frente, quando na verdade isso não havia acontecido. Só não queria que ele
soubesse o quanto sofri por sua perda. No entanto, o que eu devia fazer? Ou
dizer? “Daniel, ainda amo você e mais do que antes”. Não era algo para
ser dito. Também não queria dizer que não poderia superá-lo de forma
alguma. Tinha consciência de que precisava fazer isso para seguir em frente,
mas como conseguir, se não fui capaz em quase 11 anos? Temia sofrer de
novo caso lhe desse mais uma chance, como ele me pediu.
Sacudi a cabeça para não pensar mais nesse assunto. No momento, só
queria aproveitar meu dia com meus amigos no clube em Dallas. Dentro de
alguns minutos, iria encontrá-los.
Tinha se passado uma semana após meu encontro com Daniel, e pensei
bastante sobre ele e o que fez. Merda. Tudo o que houve foi culpa do seu
maldito pai, que queria nos separar, e Daniel foi fraco por ter se deixado
coagir assim.
Peguei uma foto onde estávamos juntos; sempre a guardava na cômoda
do meu quarto. Deveria ter me livrado dela, mas, na imagem, os olhos dele
estavam brilhantes enquanto me fitavam, tão quentes e ternos que me fazia ter
saudade da forma como me olhava. Vi o mesmo olhar na festa de Laurel. Não
sabia o que fazer.
― Imbecil! ― grunhi, guardando com tanta força o porta-retratos que
até fez barulho.
― O que o porta-retratos fez a você? Já disse que devia deixá-lo no
criado-mudo, não guardado na gaveta ― disse mamãe escorada no batente
da porta do meu quarto, linda com seus cabelos anelados emoldurando o
rosto e com seus olhos escuros.
Arfei.
― Não devia bater antes de entrar? ― Peguei meu celular sobre a
cômoda a fim de checar se tinha algum recado. Havia apenas um da Laurel,
lembrando-me do nosso encontro no clube. Já tínhamos estado ali antes, mas
agora Daniel estaria junto a todos.
― Desde quando isso importa para mim? ― Entrou no cômodo. ―
Quanto tempo vai demorar para a sua raiva do Daniel passar? Vocês ainda se
amam, minha querida.
― Não posso amá-lo, mamãe, ele é um idiota e me machucou demais.
Por que ele não foi forte o suficiente para me dizer a verdade? Eu tinha o
direito de saber de tudo.
― Daniel teve suas razões. Fiquei magoada também quando ele me
contou tudo na semana passada, mas sei por que ele fez aquilo. Eu, como
mãe e por amar você, teria feito o mesmo, pois só quero que fique segura,
assim como ele. Eu sei, querida, que tudo é doído, mas às vezes temos que
enfrentar alguns riscos. A vida é curta demais para não aproveitarmos ao
máximo as coisas boas que ela oferece. Não estou dizendo isso por causa de
sua doença, meu amor, mas porque você amou tanto esse garoto e, pelo que
vi, ainda não deixou de amá-lo.
Sacudi a cabeça.
― Não...
― Sei que está magoada e muito ferida por tudo o que houve. ― Ela
veio na minha direção. ― Mas foi bom vocês terem exposto tudo o que
estava entalado, assim podem resolver suas desavenças.
― É difícil esquecer o que ele fez, mamãe ― murmurei, encolhida.
― Vem cá, meu anjo. ― Ela se sentou no sofá-cama e bateu ao seu lado
para que eu me sentasse.
Sentei-me ao seu lado e coloquei a cabeça em seu colo, com meus
olhos úmidos.
― Ele me deixou... ― Fazia tempo que eu não chorava nos braços da
minha mãe.
― Sophie, o menino Daniel teve motivos para isso. ― Alisou meu
cabelo.
Olhei para ela.
― Sim, ele foi ameaçado pelo seu maldito pai. Mas eu não queria que
tivesse feito aquilo para me proteger...
Balançou a cabeça, discordando.
― Eu sentia que tinha acontecido algo que o obrigou a deixá-la,
querida. Nunca acreditei que aquele menino, que venerava você, que ia até
levá-la a uma ilha em seu aniversário após nossa festa surpresa, tivesse sido
capaz de traí-la. Eu tinha quase certeza de que era obra do pai dele.
Confirmei quando o vi algum tempo atrás.
Ergui o tronco depressa.
― O quê? Ele veio aqui? E como sabe que não está mentindo?
Daniel não era de mentir, aquela era uma qualidade que eu amava nele,
mas os anos se passaram, e eu não sabia mais o que pensar.
― Sim, veio, pouco antes do acidente que eu e seu pai sofremos, há uns
três anos. E não sei por que acredito nele, mas o faço. Cuidei desse menino
desde criança, eu o conheço.
― Como posso lidar com tudo isso? Ele ficou com tantas mulheres. ―
Minha voz falhou.
― Querida, você é adulta agora e também teve namorados depois dele,
não se esqueça. Tentou seguir sua vida, mas não conseguiu. Seu
relacionamento com Daniel não acabou. ― Ela apertou minhas mãos, que
segurava. ― A vida é muito boa para desperdiçá-la pensando em coisas
fúteis como o medo de não dar certo.
― Não é só isso... Se fosse, eu podia lidar, mas como vou contar sobre
minha doença a ele? Não o quero comigo por pena.
― Aquele garoto não fica com ninguém por pena. ― Olhou-me de lado.
― Daniel adora o chão que você pisa, aquele garoto a ama de verdade. Vou
lhe contar uma coisa, meu anjo. Devia ter feito isso há muito tempo ―
murmurou. ― Eu só não disse porque você namorava o Neil na época e
achei que não deveria estragar as coisas entre vocês dois.
― O que é? ― incitei-a para que continuasse, porque estava curiosa
demais. Mamãe nunca foi de esconder algum segredo de mim.
― Lembra quando viemos para Dallas?
― Quando viemos para cá a fim de comprar esta fazenda depois que o
pai do Daniel os demitiu? ― Não gostava daquele velho idiota e prepotente,
pois ele se achava melhor do que todo mundo.
― Era quase impossível achar uma boa fazenda com a quantidade de
dinheiro que tínhamos. Mesmo com todas as nossas economias, ainda iria
faltar. Mas então conseguimos este lugar. A corretora disse que estava em
promoção, era como se soubesse exatamente o valor que tínhamos para
dispor. ― Ela suspirou. ― Eu soube que Daniel pagou o restante e pediu
para a agente imobiliária não contar nada.
Meus olhos pareciam saltar das órbitas.
― Mas como? Mamãe, ele tinha acabado de fazer 18 anos e não tinha
muitos recursos. ― Franzi a testa. ― Como soube disso? Alguém contou a
você?
― A corretora deixou escapar quando eu e seu pai fomos negociar a
casa que compramos para você aqui há alguns anos. Ela deixou escapar que
não podia fazer preço promocional dessa vez, e, quando o caso da fazenda
foi mencionado, informou que alguém pagou o restante do valor da compra
naquele dia, e foi uma soma exorbitante. Só depois de algum tempo, eu
investiguei e descobri que foi Daniel quem nos ajudou com a compra.
Também tem aquela viagem que seu pai e eu fizemos a Cancún, lembra?
― Mas, pelo que me disseram, vocês a ganharam em um sorteio de
supermercado, não foi? ― indaguei de forma dúbia. ― Como sabe que foi
ele que pagou por isso também?
Não conseguia acreditar que Daniel foi capaz de tudo aquilo por mim e
minha família.
― Foi ele mesmo, eu o vi lá, em Cancún. Ele até perguntou por você.
Falei que, se estivesse realmente preocupado, deveria ir vê-la e conversar.
― O que ele disse?
― Daniel falou que não podia fazer isso para sua própria proteção e
que desejava que você fosse feliz. Vi nos olhos dele o tanto que a amava,
que só a deixou obrigado, para sua segurança.
― Obrigado? Ele já era um homem, não precisava ter cedido às
ameaças do seu pai.
Lembrava-me que o senhor Luxem sempre quis que seu filho ficasse
longe de mim, mas ele o enfrentava, não se deixava ser coagido pelo velho
asqueroso, ao menos enquanto criança e adolescente.
― Aquele homem morre por você. Ele nos ajudou comprando esta
fazenda, assim como nessa viagem. ― Tinha veneração na voz da mamãe ao
falar de Daniel. Era sempre assim.
― Não pode ter certeza ― falei, não acreditando ou não querendo
acreditar, mas senti no seu beijo o tanto que ele me amava.
― Sophie, ele cuidou de você assim que você se acidentou, então se
afastou para o seu bem e só voltou para nossas vidas depois que o pai
morreu. Por isso acho que sempre foi ameaçado. ― Mamãe tocou meu rosto.
― Você deve falar com ele e resolver todos os problemas.
Eu sabia que ela tinha razão quanto àquilo. Mesmo que me faltasse
tempo para ter uma vida ao seu lado, precisava conversar com Daniel de
alguma forma. Se nos acertássemos, então por que não vivenciar aquele
amor? Eu podia aproveitar e ser feliz ao lado dele nem que fosse por
enquanto. Se não voltássemos, podia ao menos ficar ao seu lado. Assim, se
por acaso eu me fosse, ele não se sentiria culpado por ter estado longe de
mim, como eu sabia que Daniel se sentiria.
Quando o senhor Michael foi morto, fui ao cemitério, não por respeito
ao defunto, já que ele não merecia nada, mas sim por Daniel. Quis me
aproximar e reconfortá-lo, mas só não o fiz por medo. Era medrosa demais.
Recordei-me, enquanto falava com mamãe, que, alguns dias antes de
seu falecido pai morrer, Daniel me ligou para falar alguma coisa sobre ele, e
eu falei que o senhor Michael podia morrer. Estava com raiva na hora, mas
não achei que aquilo fosse acontecer.
― Vou falar com ele, mamãe. ― Deixei meus pensamentos culpados
para trás. Não podia viver pensando naquilo, não quando eu poderia não
sobreviver.
Ela sorriu de modo tão brilhante, como se eu tivesse lhe dado o melhor
presente do mundo.
― Estou tão contente com isso. ― Beijou minha testa, então me afastei,
mudando de assunto.
― Eu vi o Lucky na festa da Laurel.
Ela arfou com os olhos estatelados, mas vi esperança ali.
― Contou a ele que são irmãos? ― Não parecia ter esperança no seu
tom.
― Não. Eu ia contar, mas então o Daniel apareceu e estragou a minha
semana. Não pude, mas pretendo contar a ele hoje. Eu soube que Lucky vai
estar no clube também. Pretendo falar apenas sobre nosso laço sanguíneo,
depois digo sobre a doença. Preciso deixá-lo digerir nosso parentesco
primeiro. ― Naquela semana, evitei ir à cidade só para o caso de Daniel
aparecer.
― Faça isso, meu amor. Revelar pelo menos um pouco da verdade é
suficiente por enquanto. Depois você conta o resto a ele, porque precisamos
agilizar o procedimento. Não vou deixar que a situação se agrave. ―
Naquela noite, passei mal de novo, com tontura e náuseas. ― Te dou até a
semana que vem para resolver as coisas, então, se não fizer nada, entro em
contato com o Lucky e digo a verdade. Acho que ele, por ser seu irmão pelos
dois lados, tem mais chance de ser compatível com você do que sua mãe
biológica. ― Ela suspirou. ― Não vou ficar parada e ver a situação piorar
antes de tomar precauções.
― Mas, mamãe...
― Não, Sophie. Já esperei demais, não posso deixar essa enfermidade
avançar tanto, porque isso pode ser perigoso, você ouviu o que o médico
disse. Temos no máximo alguns meses, e, meu amor, não vou ficar sentada
esperando um doador na fila de espera, quando tem alguém do seu sangue
com mais chances de ser um. Você precisa ao menos fazer os testes e ter
certeza.
Eu não gostava de ver minha mãe sofrendo daquela forma.
― Vai dar certo, mamãe.
Puxou-me para seus braços.
― Não posso deixar que isso a leve de mim.
Meu coração se quebrou devido à sua dor. Não podia mais deixar que
ela sofresse daquela forma só porque eu estava com medo de enfrentar o
Lucky, embora ainda não o tivesse feito não por temor, mas por culpa do
Daniel. Com minha cabeça no lugar, eu contaria a verdade – ou parte dela –
ao meu irmão. Não podia deixar que minha situação se agravasse. Mamãe
tinha razão. Eu não podia deixar uma doença me matar, tinha de lutar contra
ela e vencê-la. Faria isso de cabeça erguida, mesmo que fosse difícil. Sabia
que todos nós morreríamos um dia, mas eu ainda não havia tido tempo de ser
feliz.
Devolvi o abraço de dona Alísia, fazendo-me a promessa de nunca a
deixar chorar de novo, não se eu pudesse evitar. Se eu não tivesse algum
parente biológico, contaria apenas com a sorte na fila de espera de um
transplante. Todavia, com meu irmão e minha genitora, a situação mudava, eu
tinha mais chances. Só precisava ter fé em que um deles fosse compatível.
Se havia uma chance, eu precisava agarrá-la. Também tinha outro irmão ou
irmã cuja identidade eu ainda não sabia, e talvez ele ou ela também pudesse
me ajudar.
― Oh, mamãe, eu vou lutar! ― prometi. Não queria que ela chorasse
mais.
― Obrigada, meu amor. ― Afastou-se de mim sem tirar os olhos do
meu rosto e limpou suas lágrimas, sorrindo. ― Tenho fé em que tudo dará
certo. Agora se arrume e desça. Vou preparar o café da manhã para você.
Ela foi em direção à porta, mas parou e se virou para mim.
― Não tenha medo do que acontecerá quando for até o seu irmão,
porque ele vai amar você, meu anjo.
Queria ter tanta certeza como ela, mas faria um esforço para que isso
acontecesse, como também ouviria o que Daniel tinha a dizer, depois tomaria
uma decisão. Os motivos para ele ter me deixado foram explicados, e eu os
entendia, mesmo não tendo gostado. Fosse como fosse, se eu ficasse
estagnada, seria uma covarde, algo que nunca fui.
― Foi bom ver o meu irmão. Sempre que estou perto dele, o meu
coração acelera. Quase lhe falei quem eu era, mas então Daniel apareceu e
tudo se enrolou. Vou vê-lo de novo hoje, então conversarei com ele, e
também vou aproveitar para falar com Daniel.
― Já te disse, vou te dar uma semana para contar tudo ao Lucky. Se não
disser nada, eu mesma falarei com ele ― ela ameaçou de novo.
― Tudo bem, eu entendi. ― Sorri para acalmá-la. Se mamãe soubesse
que, além da noite passada, também passei mal na festa e que ainda
amanheci com tonturas ficaria bem mais preocupada. ― Já vou descer. Só
vou me vestir, não vou tomar café da manhã aqui, porque combinei de me
encontrar com Laurel no clube e comer lá, então não precisa fazer nada para
mim.
― Estarei aqui ansiosa para que você faça as pazes com o Daniel. Não
gosto de ver você triste desse jeito. ― Ela saiu do quarto.
Tinha chegado a hora de eu enfrentar meu destino, de encarar mais uma
vez o homem que eu amava e amaria para sempre.
Capítulo 9

SOPHIE
Cheguei em frente ao clube e estava descendo do carro quando meu
telefone tocou.
― Oi, Richard. Aconteceu alguma coisa? ― Ele era o meu chefe, e eu
o adorava. Era difícil encontrar um patrão que fosse um bom amigo, mas fui
felizarda com isso. Ele promovia corridas de carro na Speed Car, a mesma
coisa que Daniel fazia, mas em uma empresa diferente.
― Como estão indo as férias? Pegou algum caubói? ― sondou com um
sorriso na voz.
Eu o conhecia havia muitos anos, mesmo antes de trabalhar como
fisioterapeuta para sua empresa.
― Não foi possível, já que cheguei aqui há apenas uma semana, mas
também não tenho a intenção de arrumar um namorado. ― Com Daniel em
meu coração, eu não podia ter outra pessoa. ― Além disso, tenho você.
Ele riu.
― Tenho idade para ser seu pai, e minha esposa te mataria. ― Tinha
amor em seu tom.
Olinda era uma coroa enxuta que passava várias mocinhas novas no
chinelo, uma mulher maravilhosa.
― Mas, falando sério, tenho algo a dizer ― começou, mudando de
assunto. Senti-o eufórico do outro lado da linha.
― Deve ser algo importante, pois você parece estar nas nuvens. Nem
conseguiu me esperar chegar aí. ― Fechei a porta do carro e dei a chave
para o manobrista.
― A melhor notícia do mundo! Consegui contratar Daniel Luxem, que
corria pela Stor Corry. Ele vai correr para mim por menos do que recebia lá,
sendo mais específico, quase 15 milhões a menos. Não sei por que ele
aceitou minha oferta de tanto tempo atrás, embora eu não esteja reclamando;
seja qual for seu motivo para aceitá-la, agradeço ― falou em um fôlego só.
Pisquei.
― Daniel Luxem?! ― gritei, fazendo algumas pessoas olharem para
mim.
Não podia ser... Seria coincidência ele ter aceitado o trabalho ou tinha
feito aquilo por mim? Se fosse para ganhar um salário maior, eu até poderia
entender, mas trabalhar por menos? Não tinha muito tempo que ele começou
sua carreira, mas Daniel era bem procurado por todas as equipes de corrida.
― Sophie, está me ouvindo? ― Richard me trouxe de volta dos meus
pensamentos.
Sacudi a cabeça para clarear minha mente. De repente, fiquei meio
tonta, e não tinha nada a ver com minha doença.
Entrei no clube pisando duro e querendo estrangular alguém. Ignorei
todos ali e foquei em uma pessoa só. Um maldito corredor.
― Filho da puta! ― rugi, virando o corredor que dava para a piscina.
Já tinha estado ali algumas vezes. ― Vou matá-lo!
― O quê? Eu não fiz nada a não ser contratar o melhor piloto do mundo
― disse Richard.
― Desculpe, não disse isso para você. Preciso ir, depois nos falamos.
― Desliguei e fui para onde vi Laurel, sentada à beira da piscina com várias
mulheres, duas de cabelos negros – Samantha e Angelina – e três loiras –
Tabitta, Rayla e Alexia.
― Sophie! Que bom que chegou aqui! ― declarou Laurel. ― Nós
estávamos esperando você.
― Cadê o Daniel? Preciso falar com aquele idiota desgraçado. ―
Minhas mãos tremiam devido à raiva.
Ela arregalou os olhos.
― O que ele fez? ― Apontou para uma mesa de bilhar à esquerda dali.
― Depois nos falamos, pois agora vou decapitar certo alguém. ― Fui
na direção que ela apontou.
Daniel, Jordan, Jason, Bryan, Ryan, Alex e Lucky estavam jogando
sinuca, todos de short de banho, com os músculos à mostra, mas eu só tinha
um deles em mente.
Daniel estava ali em toda a sua glória e beleza, barriga tanquinho onde
era possível ver o V perfeito na base do abdome. Diferente de seus amigos,
não possuía tatuagens. Meu irmão estava de costas para mim, e tinha uma
tatuagem impressionante no dorso.
Tentei não me abalar com a visão de tanta pele nua de Daniel, só passei
por Lucky e peguei seu taco. Daniel se curvou para dar uma tacada, mas bati
com o do meu irmão na mesa, fazendo-o pular.
― Mas que porra! ― Ele piscou, olhando-me ali ao seu lado. ―
Sophie?
Ficamos nos encarando por um tempo. Olhar para ele sempre foi um
colírio para meus olhos, não só seu rosto e corpo, como também sua alma,
que eu não acreditava que tivesse mudado. Sua boca sempre foi minha
fraqueza, ainda mais quando pensava na forma como deslizava por meu
corpo. Isso me dava vontade de provar mais. Sentia tanta falta disso. Tive
uma prova de sua boca na última noite em que o vi, mas foi pequena e eu
queria mais. A vontade de ter aquele homem nunca acabaria. Certamente foi
por isso que nunca segui em frente com minha vida, porque ele sempre
esteve em minha mente.
― Sophie... o que... ― Ele não terminou de falar, pois apontei o taco
para seu corpo. É claro que não bateria nele, mas vontade não me faltava
depois de saber o que fez.
― Você tem dois segundos para me dar uma resposta honesta, ou juro
que esse taco vai acertar outro tipo de bola! ― ameacei com veemência.
Alguns dos seus amigos riram, enquanto ele arregalou os olhos,
avaliando-me, provavelmente se perguntando se eu teria coragem, e deve ter
pensado que eu falava sério, porque assentiu.
― O que quer saber? ― Pigarreou. ― Vou fazer o possível para
responder suas perguntas, e depois vamos conversar como eu disse que
faríamos.
― Ótimo, que bom ouvir isso. Fiquei sabendo que vai trabalhar para a
Speed Car. é verdade?
― Sim ― respondeu, parecendo confuso com minha pergunta. Talvez
pensou que eu fosse perguntar algo sobre nós.
Assenti para mim mesma.
― Saiu da Stor, onde ganhava muito mais, para entrar na Speed? Por
quê? Isso não faz o menor sentido!
Franziu a testa.
― O que isso tem a ver com o meu salário? ― Colocou seu taco na
mesa sem tirar sua atenção de mim. ― Apenas quero ficar em Manhattan.
― Então por que não foi para a Belliver Trwer? Eles são de Manhattan
e queriam você, além disso, pagariam bem mais do que a Speed.
― Apenas queria novos ares. ― Deu de ombros. ― Não posso fazer
isso? E gostei da Speed.
Trinquei os dentes e dei um passo para ele, que se afastou e ficou atrás
da mesa. Homem esperto por temer minha fúria.
― Falei para dizer a verdade. Por que mudou de empresa? Ainda mais
para aquela em que eu trabalho? ― Já suspeitava da razão, mas queria a sua
confirmação. Minha raiva começou a amenizar.
― Por você ― falou sem hesitar. O olhar que me deu era como o Sol,
tão quente e abrasador, tão cheio de amor, como eu me lembrava.
Encarei-o de forma dúbia, não acreditando que ele tinha feito algo
assim por mim. Ainda não sabia como me surpreendia, pois Daniel sempre
foi assim e nunca ia mudar.
― Por mim? Você ficou doido? Não sabe fazer cálculos? Olha o quanto
perdeu nessa troca de empresas! ― quase gritei, então expirei e continuei:
― Não pode fazer isso. Precisa voltar para onde estava.
Ele voltou a dar de ombros, não se incomodando com a minha
preocupação.
― Se eu fizer isso, quebrarei o contrato que assinei ― disse, como se
estivesse falando de algo banal e não de uma perda de quase 15 milhões.
― Por que não? ― rosnei, trincando os dentes. ― Já quebrou um
contrato antes, por que não fazer de novo?
― Não dou a mínima para a porra do contrato ou para o que me pagam,
porque essa é a única maneira de eu ficar perto de você. ― A voz dele
estava rouca.
― Perto de mim? ― Ri amarga. ― Você teve anos para fazer isso e não
fez; por que agora? O que mudou?
― Meu pai morreu... ― Ele passou a mão no rosto. Sempre fazia isso
quando estava frustrado ou com raiva de alguma coisa.
Seus amigos estavam calados e pareciam confusos, mas eu não.
― Ele morreu há quase três anos. Por que não me procurou nessa
época? Tente outra desculpa.
― Vamos deixar vocês conversarem a sós ― disse Lucky com o cenho
franzido para Daniel. Parecia um pouco curioso com o assunto, então não
devia saber de nada ou talvez soubesse e só estivesse torcendo para Daniel
abrir logo o jogo comigo.
― Aproveitem que o clube está quase vazio, assim podem conversar
com mais privacidade ― comentou Jordan e sorriu para mim. ― Cuidado
com esse taco para não estourar as bolas do meu amigo.
Arqueei as sobrancelhas.
― Por quê? Você vai fazer uso delas? ― provoquei com um sorriso.
Minha raiva estava um pouco mais contida.
Todos riram, mas a única risada que me tocou foi a de Daniel, tão linda.
A rouquidão o deixava mais perfeito do que já era.
― Eu devia retrucar e falar algo espertinho, mas Laurel chutaria minhas
bolas. ― Jordan revirou os olhos. ― Isso se Daniel não fizesse primeiro.
Daniel bufou.
― Seus cunhados chegaram. Por que não vai lá e me deixa falar com a
Sophie?
Segui seu olhar e vi três homens entrarem no clube. Eu os conhecia não
só pessoalmente, mas também por serem famosos. Os irmãos Kings faziam
parte de uma banda de rock muito famosa. Nilan era alto, assim como o
irmão, Gave. Ambos eram fortes e lindos. Shade era o irmão mais velho,
também muito bonito, e se casara havia alguns anos. Gave era o mais
encantador dos três, possivelmente por ser o mais espirituoso.
― Será que vou ter que matar o Gave para fazer você parar de olhar
para ele? ― grunhiu Daniel.
Voltei minha atenção para ele, com as sobrancelhas franzidas devido ao
seu ciúme, mas deixei aquilo de lado, pois tínhamos coisas mais sérias para
tratar.
― Voltando ao nosso assunto... quero saber tudo. Qual a razão de não
ter aparecido antes? Quero a verdade, Daniel.
― Vou responder todas as suas perguntas, esclarecer o motivo de eu
não ter ido atrás de você assim que meu pai morreu. ― Não havia amor ou
saudade quando ele falava do pai morto, na verdade, nunca houve. Daniel
não tinha amizade ou respeito para com seu pai, pois o senhor Michael nunca
se importou com ele ou fez algo que demonstrasse que amava o filho. O
homem sempre foi rude, grosso e ignorante, além de um assassino, por ter
tentado me matar naquele acidente de carro. Os freios foram cortados, o que
me fez capotar, pois perdi o controle na estrada inclinada e cheia de curvas
que levava à fazenda onde meus pais moravam.
― Ótimo! Então me conte, porque descobri muitas coisas que você fez
pela minha família e estou ansiosa para saber o porquê. ― Escorei o quadril
na mesa, mas, antes que ele dissesse algo, uma garota de cabelos escuros e
olhos claros apareceu ao seu lado toda eufórica, tão perto que poderia pular
em seu pescoço.
― Daniel Luxem! Eu sou sua fã! Tenho seguido suas corridas desde o
começo! ― Sua voz estava excitada e era muito sensual, não só a voz, mas
também o corpo, ainda mais com aquele vestidinho apertado, com os peitos
quase pulando do decote.
Senti-me contente por ele não olhar para ela, mas sim para mim, além
de parecer um pouco irritado com a interrupção em nossa conversa.
― Você pode me dar um autógrafo aqui? ― Ela puxou mais o decote,
mostrando quase o bico do peito. ― Assim faço uma tatuagem.
Eu sabia que, por ele ser famoso, vivia cercado de fãs, mas tudo tinha
limite. Se a garota apenas tivesse pedido um autógrafo, eu não me
incomodaria, mas quase mostrar os peitos? Aí já era demais.
Bati o taco com força na mesa, trazendo a atenção dela para mim.
― Ele não vai autografar porcaria nenhuma. Agora suma daqui antes
que precise fazer uma plástica pela forma como vou deixar seu rosto de
Barbie ― sibilei, querendo lançar aquele taco na cabeça dela, mas me
controlei, afinal eu não tinha o direito de ter ciúmes.
― Você não pode me ameaçar ― insurgiu-se a garota.
Sorri de modo frio.
― Quer mesmo testar? Se você quiser um autógrafo, procure uma
caneta e papel, então poderemos conversar. Se não quiser, vaze daqui. Não
estou com muita paciência hoje. ― Gesticulei para que ela saísse dali. Sabia
que estávamos em um lugar público, mas não estava a fim de ser
interrompida.
A menina teve um pouco de decência e saiu sem reclamar, apenas com
um murmúrio para Lucky e os outros – não muito longe de nós: “ela é louca”.
Ouvi alguns rirem, assim como Daniel, que estava gargalhando feito
uma hiena, o que me deixou bem furiosa.
― Engula a porra desse riso, ou vai ficar sem os dentes ― grunhi,
descansando o taco na mesa. Escorei-me nela de novo para continuar nossa
conversa. ― Agora abra o jogo.
― Estava com saudades de ver como você fica ainda mais linda
quando está furiosa. Porra! Tão sexy ― O brilho nos olhos dele quase me
fez cair de joelhos na sua frente como uma submissa.
― Daniel ― avisei, porque não estava para brincadeira ―, fale logo a
verdade. Se não disser, eu vou sair da Speed...
Ele riu, cruzando os braços. Isso me fez encarar seus músculos e a pele
bronzeada.
― Você nunca deixaria o Richard, gosta demais dele para fazer tal
coisa. ― A certeza na sua voz me fez ver que ele procurou saber tudo sobre
mim. Tinha razão, pois eu amava meu trabalho e adorava a todos lá,
incluindo meu chefe e sua adorável esposa. ― Vou contar os meus motivos
para não ter entrado em contato com você há alguns anos... Deixar você foi a
decisão mais difícil que já precisei tomar. Foi como se eu estivesse morto. A
dor e o vazio foram quase impossíveis de aturar. Quebrado, essa palavra mal
descreve o que eu sentia e ainda sinto por não ter você na minha vida.
O fôlego pareceu ter sido sugado dos meus pulmões, porque senti a
verdade em cada palavra dita por ele.
Capítulo 10

DANIEL
Sophie me avaliava com o rosto atormentado.
― Te abandonar foi a coisa mais difícil que já fiz na minha vida, mas
foi para o seu bem...
― Meu bem? ― rosnou, pegando o taco novamente. ― Você não tinha
o direito de fazer essa escolha por mim, seu idiota!
Ela era ainda mais linda quando ficava brava. Senti saudade daquilo em
todos os anos longe dela. Como consegui ficar afastado por tanto tempo?
― O que você queria que eu fizesse? Que deixasse meu pai acabar com
a vida dos seus pais e matar você? Naquele atentado, você teve sorte de ter
sobrevivido, mas e se houvesse outro? ― Olhei ao redor e vi que o lugar
estava ficando cheio. Não queria conversar com ela cercado de gente. ―
Vamos conversar ali, que está menos cheio.
Por incrível que pareça, Sophie não discutiu comigo. Esperava que ela
entendesse os meus motivos para ter feito o que fiz, o sacrifício que foi ficar
todos aqueles anos longe dela, a dor e o vazio que enfrentei. Merda!
― Daniel, o que você fez para os meus pais? ― Ela sussurrou,
encolhida. ― Sei que os ajudou a comprar a fazenda deles, não é?
Eu não queria confessar, mas também não queria mais mentir para ela.
Já tinha mentido por tempo demais.
― Sim. Se eu oferecesse aos seus pais o restante do dinheiro, eles não
aceitariam. Não me arrependo.
― Pelo que sei, o seu pai morreu há quase três anos; então por que só
veio atrás de mim agora? ― Sophie parecia desconfiada. ― Não faz
sentido.
Aquilo não era algo de que eu gostaria de me lembrar, mas precisava,
se isso a fizesse entender os meus motivos.
Tentei ficar mais poderoso que meu pai durante os seus últimos anos de
vida para poder enfrentá-lo, mas não consegui. O maldito conhecia gente da
pesada, e esse era um caminho que eu não queria seguir para alcançar seu
patamar, então por isso a demora em voltar para ela. Quando finalmente o
velho morreu, deixou uma bomba às minhas costas.
― Após a morte do meu pai, tive problemas por causa dele. Não sei se
você leu em algum jornal sobre o fato de o sócio do meu pai ser um
tremendo de um ordinário que usava a nossa editora para fins de tráfico
humano. ― Suspirei.
― Ouvi algo assim. O seu pai estava envolvido?
Estávamos sozinhos em uma sala de jogos, o que facilitaria o que eu
tinha para dizer a ela.
― Não sei, mas não ponho minha mão no fogo por ele. Com a morte do
velho, um agente do FBI me procurou e revelou o que o sócio da editora
fazia. Se eu não a administrasse e cooperasse com eles, poderia ser
considerado um cúmplice da porcaria em que ele estava metido. Eu não
queria você envolvida nisso, por isso me mantive longe depois que ele
morreu até que tudo acabasse. Lamento, porque sei que demorou mais do que
deveria. ― Aproximei-me dela e segurei sua mão. ― Queria vir para você,
mas aconteceram muitas coisas que me impediram. Realmente sinto muito
pelo que houve e por ter deixado você sozinha e mentido que não a amava
mais.
― Daniel...
― Você é a única pessoa que já amei na vida, a única pelo qual já fiz
algum sacrifício. ― Toquei seu rosto lindo. ― Não importa o preço que eu
tenha que pagar, o farei se assim a deixar segura.
Sonhei tanto que aquele momento viesse a acontecer de novo, e ali
estava eu, sentindo a sua pele de pêssego tão macia quanto pluma. Estava
louco para beijá-la de novo, não consegui ter o suficiente dela na última vez.
Tinha algo em seus olhos que me mostrava que ela queria o mesmo que eu,
embora não fosse só isso, eu podia ver que tinha algo mais, só não entendia
o que era. Sabia que teria um longo caminho a percorrer até que tivesse a sua
confiança de volta. Faria tudo que pudesse para que isso acontecesse.
― Lamento por tudo o que houve e espero que um dia me perdoe ―
sussurrei, inclinando-me para beijar seus lábios sem tirar os olhos dos dela.
― Posso? Não quero receber outra bofetada.
Ela meneou a cabeça de lado.
― Você mereceu, então não reclame. Podemos tentar. Minha mãe disse
uma coisa; acho que ela pode estar certa. ― Sorriu com doçura, aquele
sorriso que eu tanto amava.
Arqueei as sobrancelhas.
― O que a senhora Ally disse? ― Estava curioso. Em todos aqueles
anos, senti falta dela e do senhor Antônio. Esperava voltar para a vida deles
em breve.
― Que a vida é curta para não aproveitarmos ao máximo o que ela
oferece. ― Seus dedos traçaram meu peito e minha barriga, parecendo
gostar do que viu.
Quando a deixei, eu ainda era um moleque e não tinha o corpo tão
definido, afinal, malhava bastante atualmente. Sorri.
― Fico feliz com isso. Então quero te convidar para jantar hoje à noite.
Aceita? Quero fazer tudo certo dessa vez. Inclusive falar com os seus pais...
Ela parou de sorrir, e isso fez meu coração gelar como se eu tivesse
recebido uma injeção de água gelada nas veias.
― Vamos com calma, pois preciso digerir tudo antes. Só vamos viver o
momento, sim? Hoje vamos aproveitar e ficar juntos com os nossos amigos.
À noite, nós jantamos e conversamos mais sobre tudo. ― Encostou seu
corpo no meu, fazendo com que eu me arrepiasse dos pés à cabeça. ― Só
preciso que me beije agora. Vamos viver um dia de cada vez. O que acha?
Senti vulnerabilidade em sua voz, não detectei nada mais do que isso,
mas Sophie sempre foi boa em esconder o que sentia, mesmo antes de tudo o
que nos aconteceu. Sabia que ela estava certa, precisávamos ir com calma,
embora eu quisesse que Sophie voltasse logo a ser minha namorada. Eu não
podia “colocar a carroça na frente dos bois”, como dizia dona Alísia, teria
que ir com calma para não espantá-la e levá-la para longe de mim.
― Podemos fazer isso. Vou com calma, prometo.
Encostei meus lábios nos seus, tão maravilhosos. O beijo começou
simples, mas depois senti sua língua na minha, a doçura que eu tanto amava e
com a qual sonhava. Passei meus braços à sua volta e a puxei contra mim,
deliciando-me com os seus beijos.
Tentei ter em mente que estávamos em um lugar público e que eu não
podia agarrá-la do modo como gostaria, como necessitava havia muitos
anos. Ainda me lembrava da forma como era ter seu corpo debaixo ou em
cima do meu, gemendo o meu nome na sua ânsia por prazer, o jeito que ela
corava e implorava por mais de mim. Era algo de que eu nunca me
esqueceria.
O meu corpo estava quente como o de Sophie. É claro que tive sexo
antes e depois dela, pois, de alguma forma, eu precisava de algo que me
mantivesse longe de sua presença até o momento certo. Contudo, o sexo com
outras mulheres nunca foi tão bom ou me fez sentir como se minha alma
estivesse saindo do corpo, como se fosse entrar em combustão a qualquer
momento. Sophie era a única mulher que me fazia cair de joelhos, quase a
ponto de implorar. Para tê-la, eu não me importava se tivesse que rastejar.
As labaredas, eu só as sentia com ela, e faria de tudo para ter essa sensação
de novo.
Ela também gemia nos meus lábios e me agarrava de forma que pensei
que não queria mais me soltar, e, para falar a verdade, eu não queria que
minha garota me soltasse.
― Vejo que se entenderam ― disse uma voz divertida perto de nós. Eu
queria ignorar o Lucky, mas Sophie se afastou após suas palavras.
Naquele momento, eu quis quebrar a cara do meu amigo. Não entendia
o motivo para ele estar ali. Só queria sentir mais o corpo quente da minha
menina.
Ela sorriu para ele e corou.
― Vamos nos entender, isto é, se ele não fizer mais besteiras. ― Olhou
para mim e depois para ele.
Sacudi a cabeça. Sabia que veria a desconfiança nela por um tempo,
mas esperava que, em breve, aquilo acabasse. Não queria que Sophie
continuasse tendo dúvidas em relação a nós dois.
― Não irei, eu prometo ― garanti. E manteria minha promessa.
Sophie assentiu, mordendo o lábio inferior e respirando com
dificuldade devido provavelmente aos nossos amassos. Ela também tinha
sido afetada pelo meu toque, assim como antigamente. Recordava-me das
vezes em que um mero beijo a fazia derreter-se em meus braços.
Com aquele beijo, pude ver que ela ainda me queria assim como eu a
desejava. Aquilo não tinha mudado, aliás, parecia que estávamos famintos
um pelo outro. Eu não via a hora de a noite chegar e, com ela, o nosso jantar,
embora não tivesse certeza de que faríamos sexo.
― Espero não estarmos interrompendo vocês, mas acho melhor assim,
ou vocês seriam presos por atentado ao pudor. ― Jordan sorriu de modo
provocativo.
Logo atrás dele estavam Jason e Bryan, que reviraram os olhos com a
provocação de Jordan.
― Você é um idiota. Não sei como Laurel aguenta você ― disse Sophie
meneando a cabeça para os lados.
Jordan piscou.
― Ela me ama.
Sophie bufou.
― Vou para onde as meninas estão. ― Virou-se para mim. ― Depois
vamos falar sobre o seu novo emprego e a burrada que acabou fazendo.
Precisamos ver se ainda tem chance de voltar atrás.
Eu sabia da decisão que tomei ao me mudar de empresa, mas fiz isso
para ficar perto dela, não ligava para o dinheiro. Além disso, Richard era
um homem de negócios e leal aos seus empregados. Benny, o meu antigo
chefe, também era. Entretanto, para estar perto de Sophie, eu faria qualquer
coisa.
― Não temos nada para falar sobre isso, não vou voltar atrás. Além do
mais, não posso me livrar de outro contrato. Achei que Richard e você eram
amigos. Pelo que me disse, ele está ansioso para que eu corra para ele.
Ela fez uma careta.
― Depois falamos disso, mas é uma loucura o que está fazendo, porque
vai perder muito dinheiro, e para quê? Não faz sentido. ― Sophie parecia
confusa.
― Não precisa entender. E não é só por sua causa que vou trabalhar em
Manhattan. ― Eu tinha meus amigos e minha mãe lá. Sabia que ela nunca
havia se importado comigo, mas tinha Mal de Alzheimer, e eu não podia
simplesmente abandoná-la, embora não pretendesse contar a Sophie ainda.
Deixaria para dizer mais para frente.
Assim que ela saiu para encontrar as meninas, os caras vieram até mim.
Alguns estavam por dentro da minha história com a Sophie – Ryan e Jordan.
Tinha contado a eles um tempo atrás. Ryan sabia desde a compra da editora,
mas pedi a ele que não dissesse nada a ninguém até estar tudo resolvido com
a lei. Não queria que nenhum bandido cercasse minha menina à procura de
vingança por seu negócio ter sido interrompido. Jordan soube assim que
Sophie veio visitar a casa dele pouco tempo atrás e ele ouviu sua esposa e
ela falando de mim, então lhe contei tudo sobre ela e o que fiz para ficar
longe de minha garota para o seu bem e o de sua família.
― Eu achava que éramos amigos, e aqui está você, guardando segredos
de mim ― acusou Lucky, mas não ouvi censura em seu tom.
Lucky Donovan era um empresário bem-sucedido e um homem que teve
uma vida de cão quando pequeno, mas deu a volta por cima e agora tinha
amigos, uma esposa e filhos.
― Não foi por maldade, mas aconteceram muitas coisas envolvendo
Sophie, o meu pai e o bandido do Franklin Salazar, que usava a editora para
promover tráfico humano. Tudo isso bagunçou a minha vida. ― Respirei
fundo, controlando-me. ― Deixá-la foi a coisa mais difícil que já fiz.
― Sabia que era altruísta a ponto de fazer uma escolha dessas ― disse
Jason. ― Não sei se eu faria tal coisa.
Suspirei.
― Acredito que faria. Você só nunca chegou a ser encurralado ao ponto
de ter que fazer uma escolha. Porque quem ama de verdade faz sacrifícios.
― Peguei um taco. ― Querem jogar?
Passamos as próximas horas jogando bilhar e conversando, mas eu
queria mesmo era estar com a Sophie. Talvez pudéssemos passar a semana
juntos, afinal, eu só tinha que trabalhar na próxima semana, mas apenas se
ela não estivesse ocupada demais.
― Talvez tenha razão, sabe? Sobre fazer sacrifícios. Por Taby, eu sou
capaz de tudo nesta vida. ― Jason sorriu e bateu de leve no meu ombro. ―
Espero que eu nunca precise fazer tal escolha. Agora vamos apreciar as
nossas mulheres.
Sorri também.
― Acho que agora você acabou com as festas regadas a mulheres. ―
Ryan suspirou. ― Mas, pensando bem, faz tempo que não vejo você com
uma.
Fazia, sim, desde que eu soube que Sophie tinha deixado o seu último
namorado. Eu nem sabia o motivo do término, mas eles ficaram juntos por
um ano mais ou menos. Isso foi pouco depois da morte do meu pai. Foi um
dos motivos que me impediu de ir até ela assim que ele se foi.
Não gostava de pensar nela com outros homens, mas não podia viver no
passado. Agora só queria Sophie e não ligava para mais nada. Já tinha
sofrido demais quando soube que ela tinha namorados. É claro que eu não
era ingênuo para pensar que ela me esperaria a vida toda, afinal, eu nem
sabia quando me livraria do meu pai.
Por causa de tudo que meu pai faz para me separar de Sophie e
prejudicar os Winters, eu tinha certeza da sua participação nas tramoias de
seu antigo sócio, Franklin, que estava preso, bem como de sua participação
nos atentados contra a Sophie e seus pais. Procurei provas para mandá-lo
para a cadeia, mas Michael conhecia muita gente influente. Depois que eu
soube do envolvimento com o cartel, entendi o motivo de ele nunca ser
punido por suas falcatruas e crimes.
― Pode ser, pois não havia sentido ficar com outras mulheres, quando
eu só quero uma na minha vida. Agora que toda essa merda acabou, vou lutar
para reconquistar a confiança dela e ter seu amor de volta. ― Aquilo era
uma promessa que eu manteria até meu último fôlego de vida.
― Não acho que precise lutar muito. Vejo a forma que ela olha para
você, da mesma maneira que a Rosa Vermelha me olha ― disse Lucky. ―
Nunca estive tão feliz quanto quando ela entrou na minha vida.
Ganhei de quase todos os meus amigos no bilhar, mas perdi para o
fodido do Jordan, que era melhor do que eu naquele tipo de jogo, além disso
fazia tempo que eu não jogava, então estava enferrujado.
Fomos para a área da piscina, onde as garotas estavam sentadas
conversando. Parei assim que vi Sophie de pé perto da piscina. Ela vestia
um biquíni branco que combinava com sua pele, tornando-a mais linda,
cabelos soltos nas costas e curvas em que eu estava louco para passar as
mãos. Queria possuí-la por completo, saciar a fome que eu estava sentindo.
De repente, algo me fez ofegar, o que estava tatuado acima de sua bunda
perfeita e redonda, na região do cóccix. Estava escrito em hebraico ‫תזדיין‬
‫אותי‬. Foda-me.
― Porra! ― grunhi, porque notei que alguns caras que a estavam
olhando também entenderam o que estava escrito, ou apenas estavam de olho
na sexy região tatuada em seu corpo. ― Como ela pôde tatuar isso?
Ouvi a risada do Lucky logo atrás de mim.
― Não são todos que entendem o significado, não é? ― Olhou para
meus amigos.
Sacudi a cabeça.
― Você entende, então outros podem entender também ― grunhi com os
punhos cerrados.
Ele sorriu.
― Eu entendo porque tenho uma empresa em Israel e precisei aprender
o idioma para facilitar as negociações sem precisar de tradutor ― revelou.
― Também entendo, porque viajei bastante ― comentou Jason, indo até
onde Tabitta estava sentada numa cadeira. ― Oi, linda. Como você anda?
― Muito bem, querido, só esperando você para entrarmos na piscina.
― Ela sorriu.
Taby era uma loira deslumbrante que tinha meu amigo na palma da mão.
Fui até Sophie, que estava se preparando para pular na piscina, e passei
meus braços ao seu redor, fazendo com que ela soltasse um gritinho
assustado, mas relaxou assim que me viu.
― Tatuagem interessante. Só não sei se concordo que todos os machos
desse lugar leiam e tentem fazer um avanço. ― Beijei seu ombro. ― Se
fizerem, vou ter que colocar as aulas que tive em prática e ensinar uma lição
a esses bastardos.
Ela sorriu para mim.
― Aprendeu a lutar? Lembra-se da vez que te chamei para participar
de uma aula e você não aceitou? Aposto que estava com medo ― provocou.
― Medo, hein? Vou te mostrar o medo. ― Peguei-a nos braços, rindo.
― Tá doido? Coloque-me no chão, seu idiota, não somos mais
adolescentes imaturos... ― ela se interrompeu assim que pulei na piscina
com ela nos meus braços.
― Idiota! ― gritou, voltando a cabeça molhada à superfície e limpando
a água dos olhos.
Sorri. Senti tanta falta daquela garota. Os anos que fiquei longe foram
terríveis. Eu não queria fazer aquilo nunca mais. Fiz um juramento e
pretendia cumpri-lo. Por ora, iria aproveitar aquele momento ao lado dela e
dos meus amigos.
Percebi que em seu peito tinha outra tatuagem que dizia Alma gêmea.
Lembrava-me de ter-lhe dito que ela era minha alma gêmea.
― Ficou linda! ― Alisei as letras.
Ela bufou.
― Você só quer pegar no meu peito ― brincou.
Ela não estava errada.
― Isso significa que perdi a aposta?! ― gritou Angelina na beira da
piscina. Ela vestia um biquíni preto e sorria de modo brilhante.
― Aposta? ― Sophie a encarou.
― Há alguns anos, nós fizemos uma aposta de que todos eles seriam
domados por uma mulher. Eles disseram que não, mas aqui estão todos...
― ...domados? ― Sophie sorriu, terminando a frase. ― Por que você
perdeu, Angelina?
― Porque tinha um prazo, e ele não se apaixonou no tempo que
estipulei, então...
Peguei a cintura de Sophie.
― Na verdade, foi antes disso. Amei a Sophie desde os meus 17 anos,
acho até que antes disso. Então venceu a aposta, Angelina. Marque o dia, e
eu lhe darei o que prometi.
― Vou fazer uma festa para comemorar ― anunciou ela. ― Assim que
eu marcar, aviso a vocês.
― Estaremos lá ― prometi e beijei o ombro da minha garota,
esquecendo-me de todos à minha volta. Naquele momento, só existia Sophie
para mim.

SOPHIE
Meus amigos e eu estávamos nos divertindo no clube, mas tinha mais
alguém ali com quem eu precisava me entender, não só Daniel.
Lucky estava sentado ao lado de Sam com um sorriso imenso. Meu
peito inchou de alegria por vê-lo feliz, mas ao mesmo tempo se apertou ao
pensar que em breve eu teria que lhe dizer sobre a minha enfermidade. Por
ora, revelaria apenas que era sua irmã.
Levantei-me da cadeira e me virei para Lucky. Havia chegado a hora da
verdade.
― Posso falar com você a sós? ― Não queria soltar aquilo na frente
dos amigos dele. Poderíamos lhes dizer depois; eu só não queria jogar a
notícia de supetão e pegar meu irmão desprevenido.
Lucky franziu a testa, olhando de mim para o Daniel e Sam e depois
para mim de novo, então assentiu e se levantou.
― Sophie? ― Daniel parecia confuso.
Virei-me e dei um selinho em seus lábios.
― Não vou demorar. Assim que conversar com ele, falo com você
também e com os outros. ― Afastei-me dele e fui a um canto mais afastado
no clube.
Pelo que notei, aquela era uma área que não tinha muitas pessoas,
estávamos somente nós. Isso se devia aos irmãos Kings, pelo que ouvi. Onde
eles chegavam, a entrada de novas pessoas era reduzida, ou o staff não
conseguiria administrar a quantidade de fãs.
Lucky me seguiu e, assim que estávamos longe de todos, se virou para
mim com o cenho franzido.
― É algo relacionado ao Daniel?
Sacudi a cabeça.
― Não. Já faz um pouco de tempo que eu queria te contar isso, desde a
festa de Laurel, para ser mais exata, mas então Daniel pareceu, e tudo se
enrolou. Não posso mentir para você temendo o pior ― divaguei, sem
entender o porquê do nervosismo.
― Você está me deixando confuso, Sophie. O que precisa me dizer que
Daniel não pode saber... ― Ele se interrompeu e ficou tenso. ― Será que
você...
Pisquei, entendendo a sua dúvida.
― O quê? Não. Eu jamais pensaria em você dessa forma. ― Inspirei
fundo e soltei de uma vez: ― Sou sua irmã.
Ele arfou.
― O quê?
― Sou adotada, e há pouco tempo um amigo meu me ajudou a descobrir
sobre os meus parentes, então localizei a Mary, que está na cadeia por tê-lo
roubado. Descobri que você é o filho que ela abandonou em uma casa
sozinho para morrer. Não foi diferente comigo, pois aquela mulher me
deixou em uma maldita lixeira. Se não fosse os meus pais, eu não sei o que
teria sido de mim. ― Fitei seus olhos estatelados.
― Você é mesmo minha irmã? ― Sua voz soou grave. ― Eu soube
disso há pouco tempo e pedi para o meu cunhado descobrir onde você
estava.
― Estava há meses procurando a minha família, mas descobri sobre
vocês apenas alguns dias antes da festa da Laurel. Fui visitar Mary a fim de
descobrir os motivos que a levaram a nos abandonar, mas nela só vi frieza e
desdém. ― Sacudi a cabeça, limpando os olhos. ― Ela também disse que
temos mais um irmão ou irmã. A puta velha não me deu muitas informações,
mas disse que tínhamos mais um parente e pediu dinheiro para me revelar o
nome.
― Mary me disse que temos uma irmã. ― Ele soltou um suspiro. ―
Pensei em dar o que ela quer, já que dinheiro não é o problema, mas ela quer
ser solta, e isso sim seria uma complicação. Aquela mulher é uma sociopata.
Acabaram de surgir alguns casos em que ela está sendo acusada de matar
seus maridos com veneno apenas para ficar com a grana deles.
Ofeguei.
― Merda! Eu não sabia disso! Mas não me surpreendo, depois de tudo
o que nos fez. ― Minha voz falhou. ― Será que nossa irmã foi jogada como
nós?
― Não sei, mas não duvido de nada. ― Chegou mais perto de mim. ―
Por que não me disse a verdade antes?
― Como te falei, ia contar na festa, mas então passei mal e veio o
Daniel e não consegui pensar em mais nada.
Ele colocou a mão nos cabelos.
― Porra! Você é minha irmã, a mesma mulher que Daniel ama! ― Ele
parecia falar consigo mesmo. ― É verdade, você passou mal naquele dia.
Foi gravidez ou queda de pressão?
Queria revelar a verdade, mas não podia ainda; não queria que ele
sofresse ao saber da minha condição logo ao descobrir quem eu era.
Esperaria mais uma semana, então revelaria tudo. Primeiro, tinha que contar
ao Daniel.
Ri.
― Gravidez? Não, foi só um mal-estar. ― Sorri para ele. ― Quando eu
soube que tinha um irmão, fui até o prédio em que você mora, mas tive medo
de me aproximar e dizer quem eu sou...
Ele franziu a testa.
― Por quê? Não devia ter medo. ― Pegou minha mão e a apertou.
― Não sei, acho que uma parte de mim acreditava que você pensaria
que sou igual a nossa mãe, interesseira e sem escrúpulos ― sussurrei. ―
Queria ter entrado lá, o abraçado e dito o quanto me sentia feliz por ter um
irmão como você.
Lucky me puxou para seus braços e beijou meu cabelo.
― Estava ansioso para conhecê-la e jamais pensaria mal de você. Se
Daniel a ama e fez tanto por você, é porque vale a pena. Além disso, sei
quando as pessoas não valem nada. Seus pais te criaram muito bem, minha
irmã. ― Seu tom saiu triste no final. ― Só falta encontrarmos a nossa outra
irmã.
Alguém arfou ao nosso lado.
― “Nossa irmã”? ― Era a voz de Daniel.
Afastei-me e olhei para ele, parado ao lado da Sam perto de nós, com
os olhos arregalados. Acho que, ao nos ver abraçados, eles se aproximaram
para buscar explicações. Eu teria feito o mesmo, isso se não quebrasse a
cara de Daniel antes.
Lucky segurou minha mão e estendeu a outra para a sua esposa, que
estava confusa, mas parecia esperançosa.
― Rosa Vermelha, eu achei uma das minhas irmãs. Bem, ela me
encontrou. ― Lucky parecia eufórico.
Fui até Daniel e peguei a sua mão.
― Eu ia contar a você depois de dizer ao Lucky, mas você veio antes e
ouviu o final.
― O que queria que eu fizesse? Vimos vocês dois abraçados, e eu quis
quebrar a cara do Lucky. ― Daniel sacudiu a cabeça, olhando entre nós dois.
― Então são irmãos? Merda, nunca nem suspeitei que isso fosse possível.
― Nem eu ― anunciei. ― Mas venho procurando por meus parentes há
algum tempo e, há mais ou menos duas semanas, eu soube quem eram. Tive o
prazer de saber que tenho o Lucky como irmão, já foi um desprazer conhecer
a minha mãe biológica. Nenhuma mãe pode ser igual àquela cobra venenosa.
Sam sorriu para mim e me abraçou.
― É um prazer saber que você é minha cunhada. ― Riu. ― Até achei
que teria que bater nos dois por se abraçarem desse jeito.
Ri também.
― O único homem que me importa de forma romântica é o Daniel.
Acredito que ele me estragou para todos os outros.
Daniel beijou meu rosto.
― Fico feliz em ouvir isso. ― Ele parecia extasiado.
Naquele momento, eu me senti completamente feliz; tinha o cara que eu
amava e meu irmão ao mesmo tempo.
Capítulo 11

SOPHIE
Quando Daniel me contou toda a história que aconteceu com ele e os
motivos que o levaram a me deixar, fiquei furiosa com ele, mas já tinha
sentido raiva por anos, além disso, suas razões tinham algum sentido, o que
amenizou a minha raiva.
Entretanto, o que fez com que eu me decidisse de verdade a lhe dar uma
chance foram as palavras da minha mãe, quando ela me disse que a vida era
curta. Ela não quis dizer com isso que eu tinha pouco tempo de vida,
obviamente, era só maneira de falar, mas não deixava de ser verdade. Eu
poderia não ser capaz de sobreviver, afinal corria o risco de Lucky não ser
compatível comigo mesmo sendo meu irmão.
Eu poderia já ter dito a ele a verdade sobre a minha doença, mas
precisava de mais tempo, pois me assustava imaginar a reação e o
sofrimento de Lucky. Também teria que contar a verdade ao Daniel, e nós
nem havíamos começado um relacionamento ainda.
Eu queria isso, queria dar uma chance a nós, pois já tínhamos perdido
muitos anos. Nossos caminhos foram separados e seguiram em direções
opostas, mesmo assim eu desejava viver todos os meus momentos com
Daniel, porque nunca o esqueci, nem cheguei perto disso.
Quando namorávamos, nunca pensei na palavra “fim”, planejava viver
com ele a minha vida toda, casar-me e ter filhos, um sonho que foi
interrompido por anos por causa do pai dele. Sabia que o maldito estava
morto e que não deveríamos falar mal dos mortos, mas aquele filho da puta
merecia muito mais.
No clube Trons, em Dallas, nós tivemos momentos maravilhosos com
nossos amigos, mas eu estava contando os minutos para a nossa noite juntos.
Jantaríamos e conversaríamos, e, depois que ficássemos sozinhos, eu
esperava poder matar a saudade que tinha dele, de tocá-lo e beijá-lo, de
senti-lo dentro de mim, dos sons que fazia quando ficávamos juntos. Só em
pensar nisso, eu começava a sentir uma pulsação dolorosa entre minhas
pernas, um desejo louco que precisava ser saciado.
Depois do clube, eu e as meninas fomos a um salão de beleza e ao
shopping. Eu precisava me arrumar para a noite. Estava tão ansiosa que mais
parecia uma adolescente louca para ter seu primeiro encontro.
― Então você decidiu dar mais uma chance para o Daniel? ―
perguntou Laurel.
A cabeleireira estava arrumando nossos cabelos. Resolvi deixar o meu
da mesma cor e apenas aparar as pontas.
― Não tem sentido lutar contra esse sentimento, já tentei por anos e não
resolveu nada. Cansei de lutar, então hoje só quero viver... ― como se fosse
o último dia, pensei em complemento.
Ela sorriu.
― Fico feliz com isso.
― Também estou. O cara me fez sentir tanta raiva, mas estou cansada
de tudo isso. ― A vida era curta, e tínhamos que aproveitar cada segundo.
― Mas então me diz: como anda o haras? Soube que comprou mais cavalos.
Seus olhos brilharam. Era sempre assim quando comentava sobre seus
cavalos e o haras, assim como eu me sentia ao falar da minha profissão. Eu
amava ser fisioterapeuta, ajudar e incentivar as pessoas a se estabilizarem e
a se curarem.
― Jordan comprou dois da raça Árabe para mim no mês passado ―
disse ela.
― O que aquele homem não faz por você, não é? ― Sacudi a cabeça,
sorrindo.
Desde a adolescência Laurel foi apaixonada por Shade, o seu irmão,
não de sangue, claro, mas esse amor nunca foi correspondido. Ela o amou até
conhecer Jordan no casamento de Shade. Agora os dois estavam casados e
felizes e com a minha bonequinha linda, filha deles.
Toda vez que eu olhava para Jordana, sentia uma imensa vontade de ser
mãe, embora não tivesse certeza de que seria possível, pois talvez eu não
conseguisse ser curada. Ainda não tinha perguntado isso ao médico, mas,
assim que tivesse a minha próxima consulta, falaria com ele e perguntaria
sobre o assunto.
― O Daniel não fica atrás. Jordan disse que ele tentou se reaproximar
de você uma vez, um pouco antes de você namorar aquele cara ruivo. ―
Olhou-me de lado.
― Neil? Mamãe me disse que Daniel foi à fazenda, mas eu não estava
em Dallas na época.
Em todos aqueles anos, eu não o vi pessoalmente, sempre foi através da
TV e revistas que falavam de sua profissão, colunas sociais de jornais e até
canais de notícias na época do que houve envolvendo a editora Luxem.
― O pai dele descobriu que ele foi à procura de você e da sua família,
então comprou gente corrupta, que atribuiu uma dívida inexistente imensa à
fazenda dos seus pais. Se Daniel não tivesse pago, eles a teriam perdido.
Talvez, se recorressem, ganhariam a causa, mas isso envolveria advogados,
gastos e tempo. Depois que o pai dele morreu, você começou a namorar o
Neil, e ele se manteve longe não só para não estragar sua vida, como para
protegê-la. ― Ela suspirou. ― É um amor estilo romance de livro, não
acha? Angelina vai ter uma lista imensa de histórias para inspirá-la a
escrever seus livros.
Pisquei, chocada. Não acreditava no que ele tinha feito por mim. No
entanto, como eu ainda tinha dúvida? Daniel sempre foi bom com todos e
ainda mais com quem ele amava. Lembrava-me de que minha mãe dizia que
toda sogra iria adorar tê-lo como genro. Assim também dizia o papai.
Depois que os dois descobrissem o que mais ele fez por nós, certamente o
tratariam como a um deus, embora não fosse esse o motivo para gostarem
dele.
Eu desejava agradecer-lhe infinitamente pelo que ele fez por mim;
sacrificou-se tanto por minha família, diferente da cadela da minha mãe
verdadeira, que me jogou na lixeira perto da casa dos meus pais adotivos. Se
não fosse uma das câmeras na rua, eu nunca teria descoberto quem era a
vadia desalmada.
Tudo o que Daniel fez para e por mim provava o quanto tinha me amado
e ainda amava, porque, se não amasse, ele não estaria atrás de mim.
Eu não acreditava que o destino fosse tão fodido assim, mantendo-nos
separados por todos aqueles anos e sofrendo com a dor, a raiva e a desilusão
e, agora, com a possibilidade de, depois da reconciliação, não podermos
viver nosso amor. O que eu podia fazer era apenas lutar contra a maldita sina
que queria nos separar por causa de uma doença.
Após o salão de beleza e a compra do vestido certo, senti-me esgotada
e febril, mas evitei falar qualquer coisa às meninas; não podia contar sobre
minha enfermidade a mais ninguém antes de dizer a Daniel e Lucky, pois
seria traição. Daniel tinha uma entrevista e um ensaio em Savannah dentro de
três dias, e, assim que voltasse, eu contaria tudo.
― Me liga para contar como tudo aconteceu ― pediu Laurel. ―
Apesar de eu saber que vai ser mais do que perfeito. Aquele homem morre
por você.
Eu não gostava de pensar naquela palavra, pois a morte andava
pairando muito sobre a minha vida nos últimos meses.
― Pode deixar ― assegurei com um sorriso.
Cheguei em casa com algumas coisas que comprei para mim e meus
pais.
― Mamãe, cheguei! ― chamei e logo me sentei no sofá, ofegante, com
tontura e náuseas. Odiava me sentir assim tão enfraquecida. ― Droga!
Ela apareceu na porta da cozinha e arregalou os olhos quando me viu
ali, adoentada.
― Meu Deus, Sophie! O que houve? ― Correu até mim e tocou minha
testa. ― Está ficando quente... ― Pegou minha bolsa. ― Onde estão seus
remédios?
Inspirei fundo, tentando não a preocupar com isso; por esse motivo não
quis voltar para Dallas quando descobri sobre minha doença. Assim mamãe
não presenciaria meu corpo definhando.
― No quarto. Acabei me esquecendo de levá-los hoje cedo ―
sussurrei. ― Desculpe, mamãe.
― Temos que entrar em contato com o seu irmão imediatamente! Não
posso ficar esperando você tomar a decisão! ― A dor estava em cada
palavra sua.
Escorei-me no encosto do sofá e encarei minhas mãos, que estavam
suando frio.
― Eu sei. Vou resolver isso. Eu lhe contei hoje que sou sua irmã, e ele
me aceitou. Foi emocionante!
Mamãe alisou meu rosto.
― Não quero perder você, meu amor, não posso...
― Não vai, mamãe. ― Não queria que ela se preocupasse com isso,
então por enquanto deixaria quieto. ― Preciso subir e me arrumar para sair.
― Tentei me levantar, mas senti uma tontura.
― Não pode sair desse jeito, precisa descansar. Já se divertiu bastante
hoje, é ótimo que aconteça, mas precisa ter mais cuidado, não pode se
esforçar muito ― pediu. ― Agora vamos subir, que vou preparar uma sopa
enquanto você toma os remédios. Seja o que for que ia fazer hoje, vai ter que
adiar.
Eu sabia que ela tinha razão, mas não queria ficar em casa e desmarcar
o meu encontro com o Daniel.
― Resolvi seguir o seu conselho e dar uma chance para o Daniel, ainda
mais depois de saber tudo o que ele fez por mim. ― Olhei para ela. ― Tinha
razão sobre ele.
Contei-lhe tudo o que Daniel fez por minha causa e pela deles. Assim
que terminei, havia lágrimas em seus olhos; pude ver tristeza, gratidão e um
forte carinho neles. Ela sabia sobre a ajuda dele na compra da fazenda, mas
não sobre a maldita hipoteca falsa que meus pais teriam enfrentado só
porque Daniel resolveu me fazer uma visita, dívida à qual ele honrou.
― Oh, Deus! Não consigo imaginar o que o menino Daniel deve ter
passado ― sussurrou com os olhos molhados. ― Ele é um garoto de ouro, e
sei disso ainda mais agora, que soube o que ele fez por nós, além de tê-la
deixado para sua proteção. O senhor Luxem foi um monstro por tentar matá-
la...
Ela me deixou na cama e me entregou os remédios. Aquela era a minha
rotina desde que descobri sobre a anemia plástica, mas eu tinha esperanças
de que logo não precisaria mais deles. Odiava remédios, sempre odiei.
― Eu sei que ele foi um idiota, pois não deveria ter me afastado ―
comentei. ― Mas, pelo que fez por você e pelo papai, não só por mim,
peguei leve com ele, apesar de ainda estar brava por não ter me contado
tudo. Queria ter estado ao seu lado. ― Sacudi a cabeça.
― Se o senhor Luxem mandou alguém cortar os freios do carro, isso
significa que ele era um demônio. ― Suspirou. ― Fique deitada, eu já volto.
Vou fazer sua sopa.
Sorri um pouco, sentindo-me melhor da fadiga e da tontura, mas ainda
tinha febre.
― Nunca gostei daquele velho, que achava que todos os pobres eram
lixo e que só quem pertencia à alta sociedade era gente. ― Meneei a cabeça
de lado. ― Mãe?
― Sim, querida? ― Seus olhos eram avaliadores, cheios de
preocupação.
― Eu ia sair com o Daniel hoje, até fui ao salão de beleza e comprei
um vestido para usar, mas como posso encontrá-lo me sentindo mal desse
jeito? Não quero lhe contar sobre a doença por enquanto, preciso primeiro
saber como a nossa relação vai caminhar. Quero que ele fique comigo
porque quer, não por pena. ― Sabia que era bobagem pensar assim, mas não
conseguia evitar. Queria algo real com ele, sem pensar que tudo poderia
apenas fazer parte de um sonho.
Ela arregalou os olhos.
― Vocês iam a um encontro? ― Mamãe parecia triste e, ao mesmo
tempo, feliz.
Assenti.
― Sim, mas agora estou tão esgotada que não sei se conseguirei ir...
Mamãe suspirou.
― Para que hora está marcado o encontro? Talvez você possa
descansar um pouco e, assim que acordar, estar se sentindo bem. Dessa
forma, poderá ir. Ou então vocês podem ficar por aqui mesmo. ― Colocou o
cobertor sobre mim e passou a mão em meus cabelos como fazia quando eu
era criança e ficava doente.
― Talvez tenha razão, afinal ainda faltam algumas horas até as 19h ―
murmurei, expirando e fechando os olhos.

Acordei ouvindo vozes não muito longe de mim. Reconheci a voz da


minha mãe e a do Daniel. Ele estava ali? Então tinha vindo para o nosso
encontro?
― Foi tão difícil ficar longe dela. Cada dia que passava, eu queria
pegar um carro ou avião e ir até onde Sophie estava, mas sempre dizia a mim
mesmo que não podia. ― A dor e a raiva na voz dele eram evidentes,
certamente direcionadas ao pai.
Eu já havia tido minha cota de raiva, além disso tinha coisas mais
urgentes com as quais me preocupar para pensar na dor que o velho nos
causou. De toda forma, ele nem estava mais entre nós.
― Sinto muito, querido, por tudo. Você sofreu tanto quanto a minha
filha ― mamãe disse baixinho.
― Está tudo bem, dona Ally. Não quero pensar no passado, só no
presente ao lado de Sophie. ― Senti dedos na minha bochecha.
Eu poderia dizer que estava acordada, mas não queria estragar o seu
momento com minha mãe. Também estava amando seu calor em volta do meu
corpo. Tantas vezes passei mal e estava sozinha no meu apartamento em
Manhattan, o que tornava tudo pior... mas ali, em Dallas, estavam meus pais
e Daniel. Com eles ao meu lado, ficava mais fácil lutar e ter esperança de
me salvar.
― Mesmo assim, não deve ter sido fácil. Sempre te amei como a um
filho, na verdade te criei e troquei suas fraudas...
― Não é bom para um homem formado ouvir coisas assim. ― Daniel
parecia estar rindo, porque senti seu corpo vibrar. Minha cabeça estava
apoiada em seu peito duro, mas tão confortável.
Mamãe riu, parecendo deliciada.
― Sei que é um homem, mas ainda me lembro da vez que me chamou
de mãe, então tive que lhe ensinar que era errado, porque sua mãe era a
Felicia. Acho que seus pais ficavam muito tempo fora, e você só tinha a mim
e ao Antônio. ― Seu tom de voz estava triste. ― Um garotinho lindo e
alegre que não deixou nenhuma vez com que seu sorriso se desvanecesse do
rosto.
― Minha mãe sempre gostou de aparências, ir a bailes, fazer compras e
outras coisas banais, então nunca fui sua prioridade, sempre fui deixado de
escanteio. ― Sua voz era baixa. ― Se não fosse por vocês, eu teria uma
vida de solidão.
― Sempre o amei como a um filho. Mas saiba que fiquei com raiva
quando partiu o coração de Sophie. ― Suspirou. ― Só depois soubemos o
que você fez.
― Não fiz nada que não fosse o certo. Como disse, tenho vocês dois
como os meus pais. ― Ele respirou fundo, e o senti encolhido. ― Sinto tanto
por tê-los feito sofrer. ― Senti um calor e algo macio na minha testa; deviam
ser seus lábios. ― A febre abaixou. Não gosto de vê-la doente. Será que foi
porque a joguei na piscina? Eu não sabia que ela podia ficar resfriada por
causa disso.
Se ele soubesse o que eu tinha, ficaria louco. Eu não pretendia esconder
a verdade para sempre, mas queria aproveitar um pouco mais ao seu lado.
― Foi só um resfriado. Eu já estava com ele antes de entrar na piscina
― falei, mostrando que estava acordada. Levantei a cabeça e observei os
seus belos olhos, que estavam carregados de culpa. ― Não foi por sua
causa, eu já estava de biquíni, então obviamente pretendia entrar na água,
não acha?
― Sophie...
― Vou deixar vocês a sós ― disse mamãe, colocando-se de pé e se
afastando da poltrona perto da cama. ― Você está bem, querida?
Sorri para tranquilizá-la.
― Sim, estou melhor, então não se preocupe. ― Suspirei. O cansaço
estava controlado. ― Que horas são? Acha que dá tempo de irmos jantar?
Tentei me levantar, mas Daniel não deixou e me fitou intensamente.
― Daniel...
― Fique aqui. Vou arrumar algo se estiver com fome, mas não vamos
sair hoje. Vamos ficar aqui até você se recuperar, não quero que fique mais
doente. ― Ele colocou minha cabeça no travesseiro e se levantou.
Eu não tinha notado, mas ele estava usando um terno escuro que
destacava bastante sua beleza, tornando-o mais lindo do que já era. Daniel
sempre tinha gostado de se arrumar; nunca aderiu ao estilo bad boy, com
jeans e camisas largas.
Ele tirou o paletó e ficou só com a camisa branca.
― Fique aqui, que vou cuidar de tudo...
Sacudi a cabeça.
― Não, preciso me levantar. ― Sentei-me e coloquei os pés no chão.
Minha mãe já tinha saído de fininho e nos deixado sozinhos. Ela era
uma mãezona de primeira, tive tanta sorte em tê-la na minha vida.
― Sophie, cheguei aqui esta noite todo alegre com o nosso encontro.
Nunca me senti mais empolgado e emocionado, então sua mãe disse que
você não estava se sentindo bem. Fiquei louco. Ao menos é só uma gripe,
né? Com os remédios certos, você ficará boa em pouco tempo. ― Ele tocou
meu rosto. ― Então poderemos ter um encontro de verdade. Por ora, vamos
comer aqui.
Senti meu corpo quente, e não tinha nada a ver com a febre de horas
atrás, mas pelo toque dele, que emanava calor em minha pele de forma
abrasadora.
― Você fica lindo de terno. ― Coloquei meus braços à sua volta e o
puxei para mim. ― Estava ansiosa por hoje, ainda mais depois de ter
descoberto que você veio atrás de mim antes da morte do seu pai. Lamento
que ele o tenha obrigado a se afastar e que você não tenha conseguido provar
que ele era o mandante do meu acidente.
Daniel me sentou na poltrona perto da mesinha de cabeceira e ficou à
minha frente.
― Fique aqui, que vou pegar sua comida. Já volto para podermos
conversar sobre o que quiser. ― Deu um beijo na minha testa e saiu antes
que eu dissesse algo mais.
Sempre gostei dos cuidados dele. Uma vez machuquei o meu pé e fiquei
alguns dias sem poder andar. Daniel ficou ao meu lado e me carregou para
todos os lugares. Eu andava em suas costas como uma garotinha, e amei cada
momento. Certamente, naquela noite não seria diferente.
Peguei minhas roupas e fui para o banheiro, pois precisava tomar banho
para tirar o suor causado pela febre, que estava grudado em meu corpo,
deixando-o pegajoso. Não poderia sair, mas pelo menos me sentiria limpa.
― Sophie? ― ouvi Daniel chamar do quarto.
― Estou tomando banho ― respondi. ― Vou sair logo.
Antes que eu desligasse a água, a porta foi aberta num rompante, e ele
emergiu ali com os olhos preocupados, porém os arregalou assim que me viu
nua.
― Sua mãe contou que, além de febre, você estava com tontura. ― Ele
correu até onde eu estava. ― E se ficasse tonta enquanto estava aqui, no
chuveiro? Poderia cair e se machucar, Sophie.
Eu poderia ter rido dele pelo exagero, mas sua preocupação era
evidente, então me controlei e deixei meu coração ser aquecido por seu
cuidado.
― Estou bem. Só precisava tomar um banho antes de comermos ―
falei, aproximando-me mais dele.
Sabia que, por ter passado mal, não deveria estar pensando em seus
braços ao meu redor e nele dentro de mim, mas não conseguia evitar.
― Sophie, pegue isso. ― Ele olhou meu corpo por um breve instante e,
em seguida, me deu uma toalha.
Eu poderia ter me sentido insultada por isso, mas a forma como seus
olhos devoraram cada centímetro do meu corpo nu me acendeu, porque vi o
fogo ali, embora ele o tivesse escondido logo depois.
― O que foi? Não gosta do que vê? ― provoquei-o, mas me enrolei na
toalha.
Seus olhos foram para o meu rosto enquanto ele me oferecia um sorriso
lindo, do qual tanta falta senti e que amava.
― Não sabe as coisas que quero fazer com você, a forma que quero
possuir cada polegada sua. ― Sua voz se tornou rouca, então ele pigarreou
antes de continuar: ― Mas está doente, então vamos ter um pouco de
paciência. Depois vou fazer tudo que eu quiser com você por horas.
Ri, sacudindo a cabeça enquanto me vestia com um pijama de bolinhas.
― Você se acha mesmo, não é? Vejo que isso não se perdeu. ― Sequei
os cabelos.
Apesar de minhas palavras, ele estava certo; eu o queria todo para mim
naquele momento, no dia seguinte e no outro, para sempre.
― Não; ainda posso ler você e seu corpo como o meu próprio, então
sei o que deseja. ― Ele alisou meu rosto. ― Também quero fazer amor com
você, mas o mais importante agora é que se alimente e fique boa. Assim
poderemos continuar de onde paramos... ― Abaixou o rosto sobre o meu,
beijando-me de leve, só um roçar de lábios.
― Está bem, então ― murmurei de má vontade.
Jantei canja de galinha devido ao meu falso resfriado. Deveria ter dito
que era outra enfermidade, assim, em vez daquilo, eu poderia ter comido
algum prato italiano ou mexicano.
― Está saciada? ― sondou, levando-me para a cama. O relógio do
despertador indicava 10h da noite.
Passei a mão no peito dele.
― Ainda não, mas vou ficar em breve. ― Sorri, deitando-me e o
puxando para mim. ― Pode ao menos dormir aqui? Preciso dos seus braços
à minha volta.
― Não estava planejando ir embora. ― Deitou-se ao meu lado e se
virou de frente para mim. Seus olhos eram intensos nos meus.
Cheguei mais perto dele e coloquei a cabeça em seu peito, assim como
estava quando acordei mais cedo.
― Não quero dormir ― sussurrei, aspirando o cheiro dele e fechando
os olhos. ― Tenho medo de que, quando eu acordar amanhã... você não
esteja aqui.
Ouvi-o respirar fundo, e suas mãos quentes tocaram meu rosto, tão
abrasadoras como o Sol. Isso me fez suspirar, porque amava cada toque
dele.
― Sophie, abra os olhos ― pediu gentilmente e continuou assim que o
fiz: ― Prometo que estarei aqui amanhã cedo e no dia seguinte e assim por
diante caso você quiser. Jamais irei a lugar nenhum. ― Ele colocou a minha
mão, que segurava, sobre seu coração, que batia descompassado. ― Isto
aqui sempre foi seu e isso jamais vai mudar.
Sorri e descansei o rosto em seu peito duro, mas tão confortável e
quente.
― Obrigada por tudo, por não desistir de mim ― sussurrei, não
querendo pensar no quanto a vida era injusta, pois voltava a tê-lo, mas corria
o risco de morrer.
Não, não podia pensar nisso, tinha que confiar que passaria pelo vale
das sombras e seria feliz com Daniel e minha família.
― Desistir de você é a mesma coisa que desistir da minha vida, da
minha alma. Jamais farei isso novamente ― jurou.
Capítulo 12

SOPHIE
Cheguei ao hospital em Manhattan, porque tive que sair mais cedo de
Dallas para minha consulta. Ao menos aproveitei cada segundo dos três dias
que tive ao lado do Daniel.
Depois que tive aquele mal-estar e precisei faltar ao nosso encontro,
nós decidimos, ou melhor, ele decidiu que deveríamos ficar na fazenda com
os meus pais, onde aproveitamos cada segundo ao lado um do outro. Algo
me incomodou durante aquele tempo, o fato de ele não ter me tocado
intimamente de nenhuma forma, além de beijos. Eu queria mais, só que, por
alguma razão, ele estava hesitante. Eu tinha certeza de que era por eu ter
adoecido naquele dia, mesmo eu tendo dito que era só um resfriado.
“Você precisa se recuperar. Depois nós faremos o que quisermos”,
foram suas palavras quando insisti. Eu já estava bem, mas Daniel foi
categórico quanto àquilo. Imagina quando soubesse o que eu tinha de
verdade?
Descobri que, poucos dias atrás, assim que souberam do meu problema,
alguns amigos da empresa em que eu trabalhava vieram fazer exames para
descobrir se eram compatíveis comigo. Naquele momento, eu saberia os
resultados dos exames. Tinha esperança de que algum deles pudesse ser meu
doador, pois os sintomas estavam um pouco mais fortes. Vinha amanhecendo
sempre com um pouco de enjoo, o que era uma droga.
Era bom saber que ainda havia pessoas boas no mundo ao ponto de
fazerem uma campanha para ajudar uma colega, tudo graças ao Richard.
Mesmo que nenhum deles fosse compatível comigo, talvez fosse de outra
pessoa com o mesmo problema que eu ou outros que dependiam de doação
de sangue e medula.
Daniel estava em um compromisso em Savannah, mas voltaria logo
para Manhattan, e então nos encontraríamos em seu apartamento.
Meu telefone tocou assim que entrei no hall do hospital.
― Oi, como foi sua entrevista? ― perguntei ao Daniel. ― Não tive
tempo de assistir a ela.
Ele riu.
― Legal. Foi apenas uma conversa sobre a nova corrida que farei em
alguns dias, a primeira que farei para o Richard. ― Suspirou. ― Ele está
ansioso por isso.
Sacudi a cabeça.
― Não duvido disso. Ele sempre quis você trabalhando para a Speed.
― Isso era verdade. Cansei de ouvi-lo comentando sobre contratá-lo. Na
época, eu ficava torcendo para que não o fizesse, pois assim eu não correria
o risco de vê-lo.
― Como está se sentindo hoje? Sua mãe disse que você esteve enjoada.
― Sua voz soou preocupada, mas tinha uma nuance que não entendi a
princípio. ― Por que não me ligou?
Eu teria que ter uma conversa com minha mãe para que ela não ficasse
comentando sobre meus sintomas com Daniel, não antes de eu contar a
verdade a ele.
― Estou bem, não se preocupe comigo. Minha mãe exagera demais. ―
Tentei soar despreocupada, assim ele não notaria a minha preocupação com
a consulta que eu teria em breve.
Sabia que mentiras em um relacionamento não funcionavam e não
pretendia esconder aquilo dele por muito tempo mais, mas precisava saber o
que fazer, ainda mais depois da resposta do médico na consulta dentro de
alguns minutos. Tinha feito outros exames para descobrir o motivo de eu
estar passando mal direto.
― Tem certeza? ― indagou, ainda em dúvida. ― Se você estiver...
sabe... Quero que saiba que não ligo se...
Levei um momento para entender o que ele estava tentando dizer. Pensei
nos sintomas que eu estava sentindo, e alguns deles se pareciam com os de
uma gravidez: tonturas, enjoos, mal-estar.
― Oh, não, eu não estou grávida ― assegurei. ― Não há a mais remota
possibilidade de isso ter acontecido, não se preocupe, Daniel. Se eu
estivesse, você seria o primeiro a saber. Acho que já disse isso.
Até quando eu namorava o Neil, quase não fazíamos sexo. Foi uma das
razões que levou ao nosso término, pois ele vivia frustrado. Pensando
naquela época, percebi que em nenhum momento chorei ou sofri por causa
do rompimento. Eu ainda não conseguia entender o motivo de ter ficado um
ano com ele.
― Só queria que soubesse que, mesmo se você estivesse grávida, não
mudaria nada do que sinto por você. Mas vamos conversar à noite, assim
que eu chegar. ― Ouvi verdade em seu tom. Meu coração se aqueceu com o
que ele disse.
― Tudo bem, mas prometo que não é nada disso ― tranquilizei-o.
― Se não melhorar, precisará buscar um médico. Promete fazer isso?
― Sim, prometo. ― Desliguei assim que cheguei à recepção e vi a
Kamille, a recepcionista. Ela era alta e bonita e usava óculos de grau.
Conversávamos às vezes. Conheci-a depois que comecei a me tratar naquele
hospital.
― Sophie! Que bom vê-la. ― Sorriu para mim.
― Também é bom vê-la. ― Olhei ao redor. ― Tenho uma consulta
marcada. O doutor vai me atender agora ou terei que esperar?
Estava ansiosa demais e com os nervos à flor da pele. O meu coração
batia forte. Podia conversar tranquilamente com todos, mas só eu sabia o que
estava sentindo ao torcer para encontrar alguém, dentre todos que fizeram os
exames, que fosse compatível.
— O doutor Eduardo está esperando por você ― disse com um sorriso
doce, bastante animadora. ― Seja o que for que estiver nos exames, estou do
seu lado, Sophie, pode confiar.
Respirei fundo.
― Obrigada, Kamille. Espero que eu tenha bons resultados.
Entrei na sala.
O médico estava sentado atrás da mesa, olhando uns papéis, mas parou
assim que entrei. O senhor de meia-idade suspirou e me encarou. Tentei ler
sua expressão, mas era impassível.
― Boa tarde, doutor Michigan. ― Sentei-me na cadeira que ele
apontou.
― Prazer em vê-la, senhorita Winter. Sei que está ansiosa pelos
resultados, tanto dos exames de compatibilidade quanto dos que você fez.
Então vou direto ao ponto, como me pediu uma vez.
Quando fui diagnosticada com aquela doença, o médico me explicou
tudo sobre ela. Pedi-lhe que sempre fosse direto ao ponto, porque assim
seria mais fácil para o meu entendimento.
Pela expressão do médico, deduzi que as notícias não seriam boas.
Provavelmente nenhum dos meus colegas era compatível. Ao menos eu inda
tinha uma chance com o Lucky. Sabia que estava enrolando para contar
aquilo a ele, mas primeiro precisava ver as opções que eu tinha nas mãos.
― Sophie, tem uma chance de 25 a 30% de o seu irmão ser compatível.
Por que não o traz aqui?
― Então nenhuma daquelas pessoas é compatível? ― sondei, embora
já soubesse a resposta.
― Não, lamento. Era um risco que corríamos. Por isso digo que, se
você tiver mais irmãos, nós poderemos fazer um teste. Entretanto, com
pessoas sem vínculo genético, as chances são mais remotas, embora não
impossíveis. A compatibilidade é maior quando o doador é da família.
― Eu...
― Não sei por que está hesitando tanto em chamar o seu irmão. Devo
informar que as coisas estão piorando. Se não conseguir um doador urgente,
os sintomas vão avançar, Sophie.
Ele falou mais coisas, mas minha cabeça estava longe, pensando no que
fazer com aquela descoberta. Não seria somente eu a sofrer com aquilo, mas
também meus pais, meus amigos... e Daniel.
O que fazer? Além de Lucky, eu tinha outra irmã cujo paradeiro não
tinha a mínima ideia. Não sabia se tinha mais irmãos espalhados pelo
mundo, afinal de contas, Mary era uma mulher sem escrúpulos e ficava com
vários homens ricos que davam uma vida estável a ela.
E se a única pessoa compatível comigo fosse Mary? Ela nunca iria me
ajudar. Era tão difícil ter esperanças e, no final, perdê-las.
Saí do consultório com o médico me dizendo para não desistir ainda e
que também havia a possibilidade de eu conseguir um doador compatível na
fila de espera. Entretanto, eu pensava que, se quase dez pessoas fizeram
exames e não deu em nada, a fila de espera seria quase improvável. Minhas
esperanças estavam começando a findar, porque, se minha família de sangue
não fosse compatível, que outra pessoa seria, ainda mais se eu precisasse
encontrá-la em pouco tempo?
― Sophie! ― ouvi Wellington me chamando não muito distante, até que
fui puxada para os braços fortes do meu amigo, um lindo loiro de olhos
verdes. ― Oh, querida, sinto muito pelo resultado... Queria tanto que tivesse
dado positivo... ― Sua voz falhou. ― Não podemos perder a esperança.
Ele me puxou para sentar-nos em um banquinho na frente do hospital.
― O que eu faço agora? ― Meus olhos estavam molhados. Tinha
esperança de que tivesse mais tempo e de que um de meus colegas fosse
compatível, mas percebi que só me restava a minha família biológica. Ainda
assim, as chances eram pequenas.
Ele tocou meu rosto, limpando as lágrimas.
― Vou dar um jeito. Somos amigos há mais de uma década, não a
deixarei ir assim tão fácil.
Ele era médico naquele hospital. Eu o tinha conhecido havia mais de
dez anos, logo depois que me separei do Daniel. A sua bravura e sinceridade
me faziam lembrar-me do amor que eu havia perdido, e logo viramos
melhores amigos. Sua namorada era fisioterapeuta como eu, Zoe, uma mulher
maravilhosa com quem ele estava havia alguns anos.
― Obrigada, mas acho que ninguém pode fazer nada quanto a isso... ―
sussurrei, encolhida. ― O único jeito é o Lucky, mas fico arrumando
desculpas para não pedir a ajuda dele.
― Podemos localizar o restante da sua família. Talvez possamos
encontrar mais irmãos ou então ir até sua mãe ou seu pai biológicos. É uma
chance pequena, mas podemos tentar, apesar de que o Lucky seja mais
provável na compatibilidade, e ele mora aqui, na mesma cidade.
Sacudi a cabeça.
― O doutor disse o mesmo. O Lucky tem no máximo 30% de chances.
O pior é a esperança, sabe? Temos tanta, e, na hora, não dá em nada... Isso
acaba com a gente.
― Se não fizer nada para ir atrás do seu irmão, irei falar com ele,
Sophie ― ameaçou, igual a minha mãe.
― Primeiro, vou contar ao Daniel, depois irei atrás do meu irmão.
― Algum problema aqui? O que precisa contar ao Daniel e depois a
mim?
Meu corpo travou nos braços de Wellington, então me afastei depressa
e encarei o homem que podia ser o único que me salvaria.
― Lucky? ― Franzi a testa, levantando-me e ficando à sua frente.
Seus olhos verdes avaliavam os meus, que estavam molhados, e
Wellington ao meu lado. Ele parecia confuso, e eu sabia exatamente o
porquê. Lucky me viu nos braços de outro cara e devia estar pensando que,
de alguma forma, eu estava traindo o Daniel.
― O que houve? Por que está chorando? ― Ele sondou e olhou ao
redor. ― Por que está neste hospital? Aconteceu alguma coisa para você
ficar nesse estado?
Suspirei e me virei para Wellington.
― Pode nos deixar a sós? Te ligo depois ― falei, apertando sua mão.
Wellington sabia quem Lucky era, já que foi ele quem me ajudou a
descobrir quem era a minha mãe biológica. Meu amigo era bom no que fazia,
e, se não fosse por ele, eu jamais teria descoberto sobre o meu irmão. Na
noite anterior, eu tinha ligado para ele e dito que contei ao Lucky que era
irmã dele.
Ele assentiu.
― Você tem certeza? Tenho pacientes para ver, mas, assim que
terminar, te ligo para saber como está indo. ― Beijou minha testa e levantou
o queixo para Lucky, depois entrou no hospital.
― Achei que estivesse com o Daniel. Não sei o que está havendo aqui,
mas meu amigo está na sua, e agora não sei o que pensar. ― Ele colocou a
mão na cabeça, avaliando-me. ― Só me diga que não está enganando-o e
que... droga! Eu não sei. Há outro motivo para você estar chorando abraçada
àquele médico?
Eu deveria ficar com raiva por ele ter pensado o pior, mas, no lugar
dele, eu pensaria o mesmo ao presenciar a cena. Fiquei feliz por ele se
preocupar com o amigo.
Sentei-me de volta no banco e ignorei as pessoas ao redor. Não sabia o
que dizer a ele, só não podia deixá-lo pensar besteira a meu respeito.
― Quando eu era pequena, sonhava em ser médica para ajudar as
pessoas, fazer tudo o que pudesse e que estivesse ao meu alcance. ―
Expirei, apontando o queixo para o hospital. ― Fui escoteira e, na
faculdade, após o pre-med, tentei fazer Medicina, então uma vez meu pai
quebrou o pé e precisou fazer fisioterapia, pois poderia ter sequelas e não
andar normalmente de novo.
Lucky não disse nada, só me encarava confuso, mas não me
interrompeu.
― Estávamos sem grana para as despesas médicas, então passei a fazer
o curso de fisioterapia. Nas horas vagas da faculdade, eu ia até o meu pai e
aplicava o que aprendi ― sussurrei. ― Foram meses trabalhosos, mas
consegui, e ele ficou bom. Não teve sequela nenhuma. ― Sorri, lembrando-
me daquele momento. ― Depois decidi que era isso o que eu queria e passei
a amar a profissão.
― Não entendo. O que isso tem a ver com o fato de você chorar nos
braços daquele cara? Algum paciente seu não conseguiu se recuperar?
Sacudi a cabeça.
― Não, o que quero dizer é que eu sempre quis salvar as pessoas, mas,
no final, não posso nem me salvar... ― Abaixei a cabeça e chorei. ― Como
posso ficar com o Daniel se não vou estar para sempre ao lado dele? —
Virei-me para o Lucky. ― Lamento dizer isso, queria protegê-lo, mas não
posso.
Ele arfou.
― O que foi? Você está doente ou algo assim? ― Sentou-se ao meu
lado.
― Tenho anemia aplástica e preciso de um transplante de medula óssea
urgente, ou não vou conseguir... ― Respirei fundo.
Não achei que fosse contar isso a ele antes de dizer ao Daniel, mas o
aparecimento de Lucky ali foi providencial para eu ter coragem de lhe
revelar a verdade.
― Por acaso é maligna? ― Sua voz estava baixa. ― Isso quer dizer...
― Está querendo saber se eu posso morrer? Sim, tem essa
possibilidade se eu não conseguir um doador rápido.
Ele tocou minha mão.
― Uma coisa que aprendi com a minha esposa é que devemos ter
esperança e fé, pois, com isso, nós podemos conseguir qualquer coisa. Se
precisar de mim, entro em contato com algumas pessoas para ver o que
consigo. Posso fazer o teste também se precisar de mim.
Pude ver sinceridade em seus olhos lindos; sabia que podia contar com
ele. Falar com meu irmão trouxe uma chama de esperança ao meu coração.
― Lucky, eu acabei de falar com o médico, e ele disse que as coisas
estão se agravando. Preciso de uma medula, e as chances de compatibilidade
com um parente de sangue são maiores, especialmente irmãos de pai e mãe.
Então é mais provável que a sua medula possa ser compatível.
Puxou-me para seus braços.
― Farei qualquer coisa para ajudá-la. O que não posso é perdê-la, não
agora, que a tenho comigo. ― A dor estava em cada palavra.
― Obrigada, Lucky. Gostaria de mantê-lo fora disso, mas os sintomas
estão piorando... ― Funguei, afastando-me dele.
Meu irmão se colocou de pé, puxando meu braço.
― Vamos lá dentro, quero falar com o médico ― disse.
Entramos no hospital de novo.
― Posso falar com o médico da minha irmã? ― perguntou ele à
recepcionista. ― Preciso saber de tudo em relação ao estado dela.
Kamille pegou o telefone e conversou com o doutor, que felizmente
estava disponível para nós.
― Tudo bem, vou mandá-los entrar. ― Desligou e nos levou até a sala
da qual fazia pouco tempo que eu tinha saído. ― Doutor Michigan? Aqui
estão a Sophie e seu irmão.
― Lucky Donovan. ― Apresentou-se ao médico. ― Preciso saber a
situação da minha irmã. Seja o que for que precisar de mim, vou fazer para
salvar a vida dela.
Meu coração balançou ouvindo a veemência em seu tom; sabia que meu
irmão faria tudo por mim. Fui idiota por ter esperado tanto para lhe contar a
verdade.
O doutor sorriu.
― Que bom. Se quiser, nós já podemos fazer o exame de
compatibilidade e alguns testes que comprovem que você é sadio ―
informou o médico.
― Como ela está, doutor? ― perguntou preocupado.
Mesmo eu tendo lhe dito, acho que ele queria uma opinião profissional.
― Como informei à senhorita Winter, a situação dela está se agravando,
por isso precisa urgentemente de um transplante. O seu mal-estar está
piorando a cada dia. Falei para ela procurar o irmão, pois com ele teria mais
chances. ― Sorriu para nós. ― Que bom que está aqui. Agora vamos fazer
os exames?
― Claro, faço qualquer coisa para que ela fique boa. ― Senti seus
dedos apertando a minha mão.
Com ele ao meu lado, eu podia lidar com tudo que viesse. Só faltava
contar ao Daniel.
― Não ia entrar no hospital quando me viu? ― perguntei a Lucky assim
que entramos em uma salinha e passamos a esperar a enfermeira que viria
colher o seu sangue.
Ele negou com a cabeça.
― Estava indo ao prédio ao lado, mas então vi você aqui com aquele
cara e vim ver o que estava havendo. Às vezes, as coisas têm outra
explicação além do que parece à primeira vista. ― Ele me lançou um olhar
triste. ― Lamento pelo que pensei de vocês dois.
― Você estava apoiando um amigo, eu o entendo. Mas o Wellington é
só meu amigo, quase como um irmão. O plano, quando fizemos o pre-med,
era nos formarmos médicos juntos, mas escolhi outro curso, e ele continuou e
se especializou em cardiologia. Apesar de a fisioterapia também ser na área
de saúde, não tem o mesmo status da medicina, mas amo minha profissão. ―
Apertei sua mão que ainda segurava, tão confortável e quente. ― Obrigada
por tudo.
Ele assentiu.
― Se me permite um conselho, não esconda nada do Daniel. Segredos
tendem a ser descobertos de uma forma que machuca demais; sei disso por
experiência própria. ― Deu um aperto suave na minha mão. ― Não vou
dizer nada a ele, sei que você irá fazer isso. Quero que saiba que estou aqui
no caso de precisar. Meu amigo ficará arrasado, assim como estou, mas
estou esperançoso que eu possa ser compatível.
Sabia que ele estaria comigo.
― Daniel tem sorte de ter um amigo leal como você ― comentei e
depois sussurrei: ― Se algo acontecer comigo, quero pedir que não o deixe
se perder. É difícil Daniel amar alguém, mas, quando o faz, é para sempre.
Queria que ele não sofresse, entretanto não poderei evitar isso. Só não o
deixe fazer nenhuma besteira caso eu venha a...
— Eu protegeria você também se soubesse como.
Ele me puxou para seus braços, e chorei.
― Não vai acontecer nada, prometo que vai dar tudo certo. Mesmo se
eu não for compatível, nós vamos dar um jeito, Daniel e eu, assim como os
seus amigos. ― Tinha muita confiança na voz dele. ― Se os sintomas
piorarem mais, não nos deixe de fora, o.k.? Isso não é bom. Além disso,
como poderemos ajudar se não soubermos como se sente?
― Prometo que lhes direi e que não deixarei nem Daniel nem você de
fora. Vou abrir o jogo com ele essa noite, só estava esperando-o chegar de
viagem. ― Senti-me muito acalentada ao estar nos braços do meu irmão,
assim como quando abraçava meus pais.
Meu irmão valia ouro.
Capítulo 13

SOPHIE
Lucky fez os exames, e o resultado sairia no dia seguinte, logo cedo.
Após isso, mesmo tendo recebido a mensagem de Daniel avisando que ia
demorar um pouco mais para chegar, fui para o seu prédio, portando as
chaves de seu apartamento, que ele me deu para caso eu quisesse ir até ali.
Meu irmão não queria me deixar sozinha, mas, como Sam tinha exames de
gravidez para fazer, insisti que partisse, dizendo que ligaria para ele. Eu
precisava conversar com Daniel sozinha. A situação não ia ser nada boa,
afinal, de um jeito ou de outro, ele sofreria por minha causa.
Meu telefone tocou assim que entrei no apartamento dele. Era na
cobertura de um dos prédios mais populares de Manhattan. Ele tinha
praticamente herdado tudo depois que o pai morreu, já que sua mãe estava
doente, como ele me disse uns dias atrás.
Entretanto, nunca me importei com fortuna, portanto me sentia triste e
pequena quando o senhor Michael me jogava na cara que eu nunca seria
mulher suficiente para o Daniel, que ele logo se cansaria de uma garota
simples como eu; ficou provado que ele estava errado, contudo, pois Daniel
fez sacrifícios que nenhum outro homem já tinha feito por mim. Ele me
esperou durante aquele tempo todo, nunca desistiu de nosso amor.
Eu não podia fraquejar! Precisava lutar! Sabia que o tempo estava
passando e que eu logo poderia ter um fim que não desejava. Eu tinha de
orar e continuar em busca de um doador caso meu irmão não fosse
compatível comigo, além de procurar a outra irmã que Mary mencionou.
― Sophie, estou te ligando faz horas. ― A voz de Wellington soou
preocupada. ― Onde você está? Está tudo bem? Soube que seu irmão foi
fazer o exame. Vai dar certo.
Expirei fundo, varrendo os olhos pela sala decorada como uma revista
especializada, mas de um jeito masculino. Tudo estava limpo, nada fora do
lugar. Daniel sempre foi organizado.
A vidraça dava para uma vista magnífica do rio Hudson.
― Estou bem ― menti.
Wellington não acreditou.
― Percebo que não é verdade. Onde está?
― No apartamento do Daniel. Ele me deu uma chave ― sussurrei.
― Sophie, por Deus! O que houve? ― ele quase gritou. ― Sua voz
parece quebrada...
Acho que estou quebrada, pensei. Ver as pessoas que eu amava
sofrerem não era nada bom; minha mãe, meu pai, Lucky e logo o Daniel, isso
sem contar os meus amigos.
― Onde fica o prédio dele? ― questionou meu amigo, e eu lhe disse,
informando também que o apartamento era na cobertura.
Coloquei minha bolsa na mesinha de centro e fui até a cozinha em estilo
italiano; poderia admirá-la se não estivesse com tantos problemas. Sabia que
a qualquer momento iria desmoronar e chorar, mesmo que já tivesse feito
isso em todo o trajeto até o apartamento.
― Estou chegando, já estava perto. Só deixe avisado na recepção que
eu vou subir ― disse, e ouvi o som de um carro acelerando.
― Não precisa correr, pode se machucar, e Zoe te esganará ― pedi.
― Não estou. Agora vou desligar e em dois minutos estarei aí. ―
Encerrou a ligação.
Liguei para a recepção, alertando da chegada do Wellington e que
poderiam deixá-lo subir. Ele sempre esteve do meu lado nas horas boas e
ruins, não seria diferente naquele momento.
Telefonei para o Daniel a fim de avisar que um amigo meu viria ao seu
apartamento, mas ele não atendeu, então lhe mandei uma mensagem, depois
fiz um chá calmante e fui para a varanda admirar o horizonte, pensando que
talvez não pudesse voltar a fazê-lo no futuro. Se eu tinha pouco tempo e
chances, poderia pelo menos aproveitar ao máximo a vida que me restava.
Meu peito se apertou tão forte que me senti sem ar, porque não queria
morrer, ainda mais depois que reencontrei o Daniel. Não tive nenhuma
chance de viver uma vida com ele. Tinha tão pouco tempo. Não era justo.
A campainha tocou, e fui abrir a porta para o Wellington.
― Devia olhar pelo olho mágico antes de abrir a porta, porque poderia
ser um assassino ― repreendeu-me.
― Um assassino em um prédio como esse? ― Sacudi a cabeça. ―
Entra.
Ele me puxou para seus braços um segundo depois, levou-me para o
sofá da sala e ficou ao meu lado.
― Então contou ao seu irmão que é irmã dele. Ele parecia realmente
preocupado com você, pela forma como agiu na frente do hospital.
― Assim que soube o que tenho, ele me levou direto ao médico para
conseguir mais informações e pediu para fazer os exames. O doutor lhe
explicou que, se ele fosse compatível, eu teria que passar por um processo
de quimioterapia.
― Acho que você tem uma grande sorte por ser beneficiada com um
irmão como ele, tão diferente da sua mãe.
― Fui visitá-la. As coisas não saíram como eu gostaria. O que aquela
mulher disse...
― O que a bruaca falou?
Contei-lhe tudo o que aconteceu na minha visita a Mary, suas palavras,
seu ar de desdém. Assim que terminei, vi a fúria em sua expressão.
― O quê? Ela pediu dinheiro para salvá-la? Como uma mãe é capaz
disso? ― Ele parecia falar consigo mesmo, mas respondi ainda assim:
― Não me surpreendeu nada, afinal, ela nos abandonou e ainda roubou
grana do filho. ― Escorei-me no sofá. ― Quando vir a chance de conseguir
dinheiro do Lucky, ela não vai desperdiçá-la, mas, por mim, não terá nada.
― Vai dar certo com o Lucky. Pelo que vi hoje no hospital, ele se
importa com você.
― Sim, eu sei. Cogitou até fazer campanhas em benefício de doações,
se ele não for compatível ― sussurrei, com meu coração aquecido ao me
lembrar do que ele me disse enquanto tinha seu sangue colhido.
Wellington sorriu.
― Vai ser compatível com ele, Sophie. Não tenha medo do resultado
dos exames. Sei que é esse o seu maior medo, como também sei que não
quer que o Lucky sofra por ver você doente.
Assenti. Ele me conhecia muito bem, afinal éramos amigos havia anos.
― Vou fazer o possível para não ficar com medo. Mas também não vou
criar expectativa...
― Ter confiança é muito bom, querida, não perca isso jamais. A fé é
algo maravilhoso, e não devemos perdê-la. ― Alisou meu cabelo. ― Nunca
vou deixar que você desanime, irei estar ao seu lado e segurarei a sua mão.
Se eu pudesse ser doador, doaria, mas não posso, então vamos confiar em
quem pode.
― Mesmo o Lucky se dispondo a isso, ainda não é garantido cem por
cento de compatibilidade, no máximo 30%. E, mesmo se a Mary for
compatível, ela jamais me daria seu sangue e sua medula, pois cobrou
quinhentos milhões para revelar onde estava a minha outra irmã e para fazer
os exames. ― Sacudi a cabeça, com raiva de que pudesse existir alguém
mau àquele nível.
― Quinhentos milhões? ― Wellington assoviou com a quantia pedida.
― Sei que as chances com meu irmão não são muitas, mas podemos
tentar e confiar.
― Mais do que precisamos. Agora se deite aqui, pois estou sentindo
você meio pálida. Está se sentindo bem? Precisa que eu a examine? ―
Sondou meu pulso.
Sacudi a cabeça, negando.
― Estou bem, não se preocupe. ― Tinha passado mal no dia anterior e
sentido um leve mal-estar ao acordar mais cedo, naquela manhã, mas eu não
tinha como fugir disso, pelo menos até fazer o transplante.
― Lamento que esteja passando mal, querida. Eu queria poder fazer
algo para seus sintomas diminuírem, mas, como não posso tirar a sua dor,
vou fazer o que tiver ao meu alcance para ajudá-la da forma que seja.
― Obrigada. ― Ele e a Zoe eram amigos fiéis. Ela estava na Espanha
fazendo um curso na área da Medicina. — E quanto à possibilidade de eu e
Lucky termos uma irmã, se Mary não estiver mentindo? Não sei se posso
confiar nela. ― Deitei-me no sofá e coloquei a cabeça na perna dele. ―
Queria conhecê-la...
― Vou fazer o possível para encontrá-la, só preciso descobrir os
hospitais em que sua mãe se internou. ― Beijou minha testa. ― Durma um
pouco, querida.
― Não posso dormir, Daniel vai chegar logo... Mandei mensagem para
ele avisando que você estava aqui... ― O chá devia estar fazendo efeito.
Meus olhos estavam pesados. Sentia-me esgotada não só fisicamente, mas
mentalmente também. ― Você é o melhor amigo do mundo.
― Não liga, querida, só descanse. Eu vou tomar conta de você ―
jurou. ― Eu te amo.
― Também te amo. ― Assenti, fechando os olhos e torcendo para que
o dia seguinte fosse melhor.
Capítulo 14

DANIEL
Eu ainda custava a acreditar que Sophie era minha novamente e que ela
ainda me amava mesmo depois de todos aqueles anos. Ela não tinha me
esquecido depois de tudo o que vivemos. A solidão que senti ao ter ficado
longe dela, algo que nunca quis, finalmente tinha acabado. Jamais fiz algum
esforço para tirá-la da minha mente e do meu coração, sempre tive esperança
de um dia tê-la novamente comigo.
Entretanto, mais cedo, a sua mãe me ligou dizendo que Sophie tinha
passado mal de novo, sentido tontura e náuseas. Eu não entendia muito do
corpo feminino e suas reações, mas sabia que aqueles sintomas eram de uma
mulher grávida. Porém, como podia ser aquilo, se ela não tinha ficado com
ninguém recentemente? Seu último namoro terminara havia anos, e Sophie
não era dessas que ficam com caras por uma noite só.
Mesmo quando ela disse que estava noiva na festa da Laurel, uma parte
de mim sabia que era mentira, que ela disse aquilo para me magoar, como fiz
com ela no passado. Fosse como fosse, eu faria tudo por minha garota.
Sophie me garantiu que não estava grávida, e eu acreditava nela com
cada fibra do meu ser, mas falei sério quando lhe disse que não me
importaria caso ela estivesse, afinal, isso teria acontecido antes de estarmos
juntos. Apesar de tudo, um peso saiu dos meus ombros assim que ela negou
que aquilo fosse possível. Eu acreditava em Sophie, pois ela jamais mentiria
para mim, o que me levava a crer que minha garota estava doente mesmo,
por isso cancelei todos os compromissos da minha agenda da semana e
passaria meus dias com ela até que se recuperasse 100%. Também não
conseguia me concentrar em nada a não ser em saber se ela estava bem.
Peguei o primeiro voo para Manhattan, com uma saudade imensa da
minha garota, mesmo que a tivesse visto havia poucos dias. Já tinha ficado
tanto tempo longe dela no passado que não conseguia ficar de novo.
Teríamos que trabalhar isso, afinal, às vezes teríamos que viajar a trabalho.
Meu telefone tocou assim que acabei de sair do saguão do aeroporto.
Atendi sem olhar na tela, pensando ser a Sophie.
― Oi, já estou chegando...
A voz alterada do outro lado me interrompeu:
― Senhor Luxem? Aqui é da casa da sua mãe, é Salina, a empregada.
― Aconteceu alguma coisa? ― Caminhei até o estacionamento, onde o
carro se encontrava com o meu motorista, Luigi. Eu gostava de dirigir, mas,
como vim direto, decidi chamá-lo.
― Lamento informar que dona Felicia quase colocou fogo na casa,
então a levei para o hospital para checar se não houve nada sério.
Meu coração bateu forte, temendo que algo tivesse acontecido com a
mamãe. Sabia que ela nunca tinha se importado comigo, mas também não era
ruim como o meu pai. Além do mais, era minha mãe, então eu não podia
abandoná-la só por não ter tido o carinho dela.
Eu vinha adiando a ideia de colocá-la numa casa de repouso. Não
queria fazer isso com ela, mas não podia mais evitar. Portadores de
Alzheimer têm que ter certos cuidados que eu não poderia dar a ela, não se
quisesse continuar com a minha carreira. Eu já tinha desistido da minha vida
e dos meus sonhos por tempo demais. Primeiro, meu pai não aceitava a
mulher que escolhi; quando ele morreu, tive que tomar conta dos negócios
dele, nem que fosse para ajudar o FBI. Eu amava minha mãe e não deixaria
nada lhe faltar onde quer que ela estivesse, mas não podia me dedicar
pessoalmente a cuidar dela. Poderia visitá-la sempre que estivesse em
Manhattan. Por isso tinha ido visitar uma casa de repouso chamada Recanto
do Vovô, perto de onde eu estava construindo minha casa, pois jamais iria
morar novamente na mansão onde cresci; assim poderia vê-la todos os dias
quando estivesse na cidade. O meu apartamento não era um lugar seguro para
ela.
Sophie me mandou mensagem dizendo que tinha ido para meu
apartamento. Eu queria estar com ela, mas minha mãe vinha em primeiro
lugar naquele momento, pois tinha acontecido algo sério.
― Bom dia, senhor Luxem ― cumprimentou Luigi assim que entrei no
carro. ― Como foi de viagem?
― Bem...
Ele me avaliou.
― Algum problema? Parece preocupado ― comentou. ― Aonde o
levo?
― Para a casa da minha mãe. Parece que ela tentou colocar fogo na
casa. ― Suspirei.
Luigi arregalou os olhos com preocupação.
― Ela está bem?
― Parece que sim, mas só vou ter certeza quando vê-la.
Mandei uma mensagem para Sophie dizendo que ia demorar um
pouquinho.
― Se o senhor me permite dizer, acho que deveria colocar a sua mãe
em um local especializado na doença dela ou então contratar alguém que
tenha especialidade nesse assunto. ― Olhou para mim pelo retrovisor
enquanto dirigia. Ele trabalhava para a minha família havia anos, então meu
pai morreu, e, para não despedi-lo, o contratei como meu motorista, porque
sabia o quanto Luigi era um homem correto e íntegro. Mesmo trabalhando
para o meu pai, ele jamais compactuou com as coisas erradas que o velho
fez.
Assenti, porque sabia que ele tinha razão.
― Farei isso. Já vinha pensando em hospedá-la numa casa de repouso.
Dependendo de como ela estiver, quando minha casa estiver pronta, talvez
eu contrate alguém para cuidar dela, apesar de que eu soube pela
supervisora do local que os pacientes geralmente gostam de lá. ― Guardei o
telefone após enviar a mensagem para a Sophie.
Cheguei à casa dos meus pais. Era uma mansão em estilo italiano que
foi construída antes de eu nascer. Mamãe contou que teve a ideia depois de
uma viagem à Itália. Saí do carro às pressas, mas confiava em Salina, que
garantiu que mamãe estava bem.
― Onde ela está? ― perguntei à empregada assim que entrei na sala.
Salina também trabalhava para minha família havia um bom tempo,
mais de uma década. Foi contratada depois que meu pai despediu os
Winters. Eu gostava da senhora. Não éramos próximos como acontecia com
a dona Alísia e o senhor Antônio, mas Salina era uma boa pessoa. Os
funcionários do meu pai que seguiam à risca suas ordens mesmo quando elas
eram erradas ou criminosas foram presos ou despedidos, porque eu não
queria gente assim trabalhando para mim.
― Está na estufa molhando as plantas. Tentei levá-la para dentro, mas
não consegui, ela não queria, e tentei não deixá-la alterada por
recomendação do médico ― disse com tom triste. ― Acho que o senhor
deveria contratar uma enfermeira ou algo assim, porque ontem ela subiu em
uma escada na biblioteca dizendo que precisava limpar os livros. Por sorte,
cheguei na hora.
Eu sabia que ela tinha razão; pessoas como minha mãe precisavam de
cuidados especiais, e eu tomaria providências quanto àquilo antes que algo
mais sério acontecesse.
― Arrume as coisas dela, pois a levarei para um lugar onde ela
receberá os cuidados necessários ― falei com tom triste, embora fosse o
melhor. Se, mais para frente, ela melhorasse, eu a levaria para morar
comigo, quando minha casa estivesse pronta.
― Sim, senhor, farei isso ― informou a senhora, indo para o primeiro
andar da casa.
Fui à procura de mamãe. A estufa estava bem-cuidada, não só por ela,
mas também pelo jardineiro. Jardinagem era algo que minha mãe sempre
amou, mas não se dedicava muito a isso antes da morte do papai. Depois, ela
deixou de ser uma socialite e foi cuidar do jardim e da estufa como um
hobby. Não fazia muito tempo desde que fora diagnosticada com Mal de
Alzheimer, mas eu via o quanto ela havia mudado, especialmente quanto à
perda da memória recente. Eu tinha certeza de que, em parte, sua doença foi
desencadeada pela morte do marido.
Ela estava molhando as plantas enquanto cantava uma canção. Usava
um vestido florido comum e tinha seus cabelos bagunçados. O que meu pai
fez àquela mulher? O maldito foi embora e a deixou quebrada. O pior era
que minha mãe se esquecia de quase tudo, menos dele.
― Mamãe, como está? ― Fui até onde ela estava e a beijei na testa.
Ela sorriu.
― Bem, mas agora estou molhando as plantas, porque não quero que o
Michael reclame ― disse e voltou ao trabalho.
Meu coração se apertou.
― Papai me mandou buscá-la para levá-la a um lugar. Ele me disse que
ia encontrá-la lá. ― Eu não gostava de mentir, mas era a única forma de
levá-la dali sem que ficasse alterada demais. Já tinham acontecido momentos
parecidos com aquele, em que ela se esquecia de tudo, até de onde estava, e
começava a gritar pedindo ajuda, dizendo que a estavam sequestrando. Foi
por isso que a levei a um médico e, através de exames, o seu problema foi
diagnosticado.
Seus olhos brilharam. Mais uma facada em meu peito. Como ela podia
amá-lo assim? Aquele filho da puta não merecia. Não merecia nada.
― Ele vai estar lá? Faz tempo que ele foi viajar e ainda não voltou
para casa ― sussurrou.
Às vezes, ela se lembrava de que ele tinha morrido, mas em outras
acreditava que estava viajando. Eu não a corrigia para que não sofresse
mais.
― Sim, o papai vai estar lá, não se preocupe. ― Suspirei, meu peito se
enchendo de tristeza.
Peguei suas coisas e a levei para o meu carro; eu poderia ficar com ela
no meu apartamento naquela noite, mas lá não era seguro, não tinha proteção
na varanda, fora o fato de que Sophie estava lá, e eu não sabia bem qual
seria à reação de minha mãe a ela. Na última vez que a mamãe a viu comigo,
não a tratou bem. Talvez as coisas sejam diferentes agora, pensei com
esperança.
― Já fez as pazes com o seu pai? Ele não é mau, apenas quer o seu
bem.
― Meu bem? ― Franzi a testa.
― Sim. Ele me contou que aquela menina que você namora só está
interessada no nosso dinheiro. Seu pai sabe das coisas ― ela falou,
remexendo as mãos no colo.
Sophie nunca se importou com quem eu era ou com quanto eu tinha na
minha conta bancária. Meu pai era um filho da puta sem escrúpulos que só
pensava em enriquecer e não dava a mínima para a própria família. Contei
até dez, porque assim não falaria nenhuma besteira, ainda mais para quem
estava doente. Ela pensava que ainda estávamos naquela época. Se soubesse
das coisas que o maldito fez, talvez entendesse, porém havia se esquecido de
tudo.
Após deixar minha mãe na casa de repouso e conversar com a diretora
do lugar, a senhora Silver, fui para o meu apartamento. A minha cabeça
estava cheia, sem saber como lidar com tudo. Talvez um dia eu pudesse
trazer a minha mãe para minha casa, se ela aceitasse Sophie como a minha
mulher.
Assim que abri a porta do meu apartamento, levei um imenso susto ao
focar na visão à minha frente.
― Que porra é essa?! ― esbravejei.
Sophie estava dormindo no sofá com a cabeça na perna de um cara. A
luz da sala estava apagada, mas a do abajur estava acesa, e a cena fazia meu
coração bater forte, não no bom sentido, mas de uma forma que doía pra
caralho.
O rosto do cara virou na minha direção. Ele se levantou, ajeitou a
cabeça de Sophie numa almofada e veio na minha direção com um olhar
duro.
― Espero que não esteja pensando mal dela agora, ou vamos ter um
problema ― falou baixo, mas com um tom tão firme quanto a expressão em
seu rosto. ― Ela lhe mandou mensagem avisando sobre minha presença aqui.
Olhei meu telefone e notei a mensagem, bem como uma ligação perdida
dela. Certamente as recebi quando fui buscar minha mãe para levá-la à casa
de repouso. Eu não sabia o que pensar, minha cabeça estava a mil por hora
com tantas coisas de uma vez acontecendo em minha vida. Todavia, mesmo
que tivesse ficado longe de Sophie todos aqueles anos, sabia que ela jamais
me trairia ou mentiria para mim. De repente pensei nas tonturas que ela vinha
tendo.
Reconheci o cara como sendo o melhor amigo de Sophie desde a
faculdade. Embora nessa época eu já não estivesse com ela, sempre mantive
os olhos em minha menina e no que fazia, ainda que de longe. Foram
momentos difíceis que tive que suportar, vê-la seguindo em frente sem mim.
― Sophie está passando mal? ― perguntei após um momento, indo na
direção dela e passando pelo cara.
― Ela está passando por alguns problemas difíceis de lidar ― rosnou
ele com os punhos cerrados.
Ela estava mesmo doente? Eu só esperava que fosse um simples
resfriado, nada mais sério, embora quisesse que me dissesse, mas, pelo
visto, ela preferia se abrir com o seu amigo. Tentei não me sentir magoado
com isso e acreditar que ela tinha um motivo para fazer aquilo. Eu não podia
reclamar; a tive no passado e a deixei ir embora, então precisava lidar com
as consequências da minha decisão. Não podia culpá-la por se sentir mais
confortável com outras pessoas.
― Não pode me dizer o que ela tem? Sei que anda passando mal desde
que voltamos a conviver, mas achei que fosse algo simples, um resfriado,
uma virose qualquer ― comentei, sentando-me na mesinha de centro, perto
de onde seu rosto lindo estava no sofá.
Ele curvou a cabeça para o lado como se me sondasse, então a sacudiu.
― Não posso dizer. Isso é entre vocês dois. E espero que você fique do
lado dela.
― Desde quando sabe sobre esse problema que anda deixando a minha
garota doente? ― perguntei, mas já sabia que não era algo muito recente.
― Algum tempo...
Sacudi a cabeça, tonto, porque me sentia traído por ela ter aberto o jogo
com o seu amigo, e não comigo. Desde crianças sempre fomos próximos.
Antes mesmo de começarmos a namorar, contávamos tudo um para o outro.
Por que ela não me contou? Talvez estivesse com medo da minha reação,
pensasse que eu não reagiria bem ou algo assim. Tal pensamento me deu um
calafrio na espinha.
― Lembre-se de que estou na vida da Sophie há mais de dez anos,
então não fique pensando que ela confia mais em mim do que em você,
porque não é isso. Além disso, eu sou médico. Só espere até amanhã, porque
acredito que Sophie vai lhe dizer tudo. ― Ele veio até nós e tocou de leve o
rosto dela. ― Têm coisas ruins para acontecer. Só prometa que ficará com
ela não importa o que ocorra.
Não era necessário que ele me dissesse isso, pois, por Sophie, eu faria
tudo, estaria ao lado dela independentemente de qualquer coisa. Contudo, o
que ele disse me preocupou. O quão grave era o que ela estava me
escondendo?
― Não pode me dizer do que se trata? ― inquiri, preocupado. ― Tem
a ver com o fato de ela vir passando mal ou é outra coisa?
― Sim, mas é melhor que ela lhe conte. Não quero fazer as coisas pelas
costas dela. ― Deu um tapinha no meu ombro. ― Só fique ao seu lado.
― Não há nada que Sophie diga que fará com que eu me afaste dela.
Nada. Ela é a razão da minha existência. Já fiquei longe dela tempo demais,
e isso não acontecerá novamente.
Ele sorriu, contente com minha resposta.
Meu peito estava apertado. Eu não parava de pensar em minha conversa
com a Sophie assim que ela acordasse. Só esperava que não fosse nada tão
grave quanto parecia.
― Fico feliz com isso ― confessou, dando um beijo na testa dela e se
afastando. ― Essa garota é como uma irmã para mim, então, se machucá-la
ou a fizer chorar de novo, vou partir você ao meio.
Franzi a testa.
― De novo?
― Falo dos anos que ficou longe dela, pois vi a dor e o sofrimento que
lhe causou... Não quero ver aquilo de novo. Se a deixar outra vez, não
importa se o papa obrigá-lo a se afastar, farei com que pague caro. ― A
ameaça estava em cada palavra.
― Jamais irei abandonar a Sophie. Só fiz isso antes porque precisava.
Mas fiz um juramento a mim mesmo de que nunca mais vou deixá-la e o
manterei custe o que custar. ― Essa era uma promessa que eu sustentaria ao
pé da letra.
― Ótimo.
― Obrigado por protegê-la e ficar ao seu lado enquanto estive longe.
― Estendi a mão para ele, que deu um aperto firme.
― Sempre vou fazer isso, mesmo que você tenha voltado para a vida
dela. Seja o que for que tenha para conversar com Sophie, deixe para
amanhã. Ela está esgotada. Agora preciso ir.
Assenti, levando-o até a porta.
― Valeu, cara. Por tudo ― agradeci.
― Wellington ― apresentou-se. ― É bom conhecer você pessoalmente,
Daniel. Se continuar amando a minha garota, acredito que seremos amigos.
― Também acho.
Assim que ele se foi, voltei-me para Sophie, ainda adormecida. Peguei-
a nos braços, levei-a para o meu quarto e a depositei na cama.
― O que será que você esconde de mim?
Ela se remexeu.
― Daniel... ― sussurrou, sonolenta. ― Tem algo que preciso dizer...
― Shiii ― silenciei-a. ― Amanhã cedo conversaremos, minha
pequena.
Deitei-me ao seu lado e a puxei para os meus braços.
― Durma um pouco, querida. Eu estarei aqui quando acordar ―
prometi.
Ela apertou os braços à minha volta, mas parecia ainda estar dormindo.
― Nunca me deixe ― pediu em um sussurro.
― Jamais ― jurei, beijando sua testa. ― Vou amá-la para sempre,
minha doce Sophie.
Capítulo 15

DANIEL
Mal consegui dormir naquela noite. Não conseguia parar de pensar no
que Sophie tinha a me dizer. Deveria ser algo importante, porque senti a
urgência na voz dela, mas não consegui pensar em nada. Não queria imaginar
que pudesse ser algo letal... Não podia nem cogitar algo assim. Parei de
pensar quando percebi que aquilo não me levaria a nada. Fosse o que fosse,
eu precisava ser forte para ela assim que Sophie acordasse.
Minha cabeça não estava muito boa por tudo que aconteceu no dia
anterior, não só com Sophie, mas também com mamãe. A revelação de
Sophie estava me deixando inquieto. Para piorar, mesmo com ela dormindo,
eu a ouvia chorar, provavelmente em seus sonhos.
Levantei-me sem acordá-la e fui para a cozinha preparar o café da
manhã para ela; queria fazer-lhe uma surpresa como antigamente.
Estava a ponto de ligar para Lucky e perguntar se ele sabia de algo, mas
meu telefone tocou assim que entrei na cozinha.
― Como vai o meu piloto favorito? ― perguntou Richard. ― Temos
uma corrida para você amanhã. Frey Dex se machucou e vai ficar de fora,
então conversei com o seu agente, e ele concordou, se assim você quiser. ―
Ele parecia ansioso.
Frey era um dos melhores pilotos dele, e eu soube pelo jornal que tinha
se acidentado, mas, graças aos Céus, estava bem, embora precisasse ficar
sem correr por um tempo. Já Cássio Ortis era meu agente, ótimo, por sinal.
Com ele, fechei vários contratos. O único com que ele não concordou foi
com a agência do Richard, porque perdi muito, mas lhe expliquei meus
motivos para querer estar na Speed. No final, ele concordou e torceu por
mim.
Até estava pensando em aceitar cobrir o Frey, mas, depois do que
aconteceu no dia anterior e o jeito que estava minha mente naquele momento,
quando eu só sabia pensar na minha conversa com a Sophie, não conseguia
raciocinar. Eu não podia planejar mais nada por enquanto, já que não sabia o
que ela tinha para me contar.
― Vou dar a minha resposta mais tarde. Primeiro vou ter uma conversa
com a Sophie e não sei como tudo vai se desenrolar. ― Suspirei enquanto
fazia torradas, a chamada no viva voz.
Minhas palavras deixaram Richard em silêncio por um momento. Eu
não sabia se ele estava por dentro do que acontecia com a Sophie, mas os
dois eram muito amigos.
― Sophie? Ela decidiu contar a verdade a você? Isso me deixa mais
aliviado. Aquela garota é uma alma muito boa e vai vencer tudo o que está
acontecendo ― disse em tom triste.
Franzi a testa.
― Sabe do que se trata? ― Estava começando a ficar com raiva por
todos saberem, menos eu.
― Não se preocupe, pois nossa menina vai passar por isso e nós
estaremos aqui do seu lado ― falou meio depressa. ― Acho que vou
colocar o Victor na corrida; você não vai ter cabeça para isso por um bom
tempo. Agora preciso ir.
Estava a ponto de perguntar o que ele queria dizer, mas Richard
encerrou a ligação.
― Maldição! Que porra está acontecendo aqui?!
Ia começar a ajeitar o café da manhã em uma bandeja para levá-lo para
Sophie, mas ela entrou na cozinha. Estava com minha camisa, que batia em
suas coxas. Seus cabelos estavam bagunçados e seu rosto, sonolento, mesmo
assim era a mulher mais linda do mundo. Como alguém podia amar com a
intensidade que eu a amava?
― Cheiro maravilhoso. ― Ela inspirou o aroma do café que tinha
acabado de ser coado. Ficou na entrada da cozinha de pé, parecendo
nervosa; percebi isso devido às suas mãos, que grudavam nas laterais da
camisa que usava.
― Eu ia levar o café na cama para você, mas, já que está aqui, sente-se,
que a sirvo. ― Também estava nervoso devido ao que ela ia me revelar.
Sophie assentiu e veio até mim, tocando meu coração como se ouvisse
o martelar dele ou sentisse quanto eu estava ansioso. Acredito que fez isso
para me tranquilizar.
― Obrigada, Daniel. ― Sentou-se à mesa com um sorriso lindo e doce.
― Por nada, linda. ― Servi-a de bolo, ovos e torradas, chá e café,
assim ela decidiria o que desejava comer.
― Está muito bom ― confessou, comendo a torrada aos pedacinhos,
como costumava fazer antes. ― Como eu me lembrava, mas acho que ainda
melhor.
Também tomei café da manhã. Mesmo me sentindo tão ansioso, eu
precisava ser forte, embora o medo que eu sentisse fosse um pouco maior.
Acreditava que Sophie estivesse doente, a cor pálida de sua pele
demonstrava isso. Contudo, o que ela tinha? Esperava que não fosse nada
mortal. A vida não seria tão injusta comigo, seria? Não podia pensar no
pior; tinha que ser outra coisa, não algo que a levasse de mim para sempre.
― Daniel. ― Ela colocou as mãos sobre a mesa e as olhou por um
segundo, depois a mim. ― Precisamos conversar. Sei que devia ter dito
antes, mas...
Assenti.
― Sei que precisa me contar algo, mas, antes, quero que saiba que, seja
o que for, eu vou estar ao seu lado, e vamos passar por qualquer que seja o
problema que Wellington me disse que você tem. Vamos passar por isso
juntos. ― Eu só queria deixar aquilo claro para ela antes que me dissesse a
verdade.
Sophie piscou.
― Ele te disse mais alguma coisa? ― Tinha algo na voz dela que não
entendi. Eu devia estar imaginando coisas, ela não tinha motivos para se
preocupar com o que seu amigo havia me contado, tinha?
― Não me disse nada. Só comentou que você estava com um problema
sério e que precisaria da minha compreensão e ajuda. ― Coloquei minhas
mãos na mesa também. ― Seja o que for, eu estarei aqui.
Sophie me deu um sorriso triste, mas, ainda assim, lindo como eu
amava.
― Essa é uma qualidade que sempre amei em você e continuo a amar.
― Respirou fundo, como se doesse fazer aquilo ou apenas estivesse tensa
como eu.
― Então o que é? Sei que tem algo acontecendo e a cada momento fico
mais nervoso, sem saber o que pensar.
― O que vou dizer vai machucá-lo, e lamento muito por isso, pois, se
pudesse evitar, eu o faria. Mas não posso e não vou mentir para você. ― A
dor estava em cada linha do seu rosto.
― Só preciso saber a verdade não importa o quanto doa. ― Expirei. ―
Tenho notado que anda pálida e vem passando mal ultimamente. Então o que
tem? Está doente ou é outra coisa?
Sua respiração estava desigual enquanto me encarava com dor nos
olhos.
― Sim, estou doente. Não queria que você sofresse, por isso fiquei
relutante em dar uma chance para nós dois, pois não queria que passasse
pelo que vai passar estando ao meu lado. Porque, no final, não poderei
protegê-lo disso. ― Sua voz era só um sussurro.
A dor que ela estava sentindo me matava não só por vê-la sofrer, mas
por medo também; algo me dizia que a notícia não seria boa. Estava mais
para uma bomba.
― O que você tem? ― Não sabia se gostaria de saber a resposta, mas
precisava. Não podia ficar no escuro, imaginando o pior.
― Descobri há alguns meses que tenho anemia aplástica e preciso de
um transplante de medula óssea urgente.
O solavanco que meu peito deu foi tão forte que juro que poderia ser
ouvido a quilômetros dali. Se eu não estivesse sentado, aposto que teria
caído no chão com as pernas bambas. Custei a acreditar no que meus
ouvidos ouviram, e meu corpo estremeceu como se tivesse recebido uma
descarga elétrica que me deixou sem fôlego. Precisei respirar fundo, mas
doeu como se eu tivesse brasa viva em meus pulmões.
Não, não pode ser, ela não pode estar doente a ponto de precisar de
um transplante! Não quando nem tive a chance de ter uma vida ao seu
lado! Acabei de recuperá-la, droga! A vida não pode ser tão injusta assim,
não é?
Eu já tinha ouvido falar daquela doença, mas não sabia muito sobre ela,
só o bastante para saber que Sophie precisaria ter alguém compatível, e a
chance seria maior se houvesse parentes de sangue, o que piorava tudo,
porque ela era adotada.
Porra!
Levantei-me meio trôpego e saí da cozinha, pois precisava de ar para
recuperar o fôlego. Tudo em mim doía como uma maldita navalha me
cortando.
― Daniel, por favor, não me deixe... ― Ouvi a dor na voz dela atrás de
mim.
Virei-me e a vi ali, de pé com as mãos caídas nas laterais do corpo,
parecendo tão pequena, os olhos castanhos molhados e machucados com a
minha reação.
― Por Deus, Sophie! ― Corri até ela e a puxei para os meus braços.
― Acha mesmo que a deixaria após ouvir tudo isso? Não sou egoísta!
Seus braços à minha volta me apertaram firme.
― Você saiu...
― Não saí, eu só ia à varanda para tentar recuperar o fôlego um minuto.
― Tentei não deixar que visse o que aquela informação me causou; não
queria preocupá-la mais do que ela já estava.
― Desculpe, Daniel... Lamento por tudo isso.
Caí de joelhos à sua frente com a cabeça em seu estômago, não
querendo perdê-la nunca. Sabia que devia ser forte para ela, mas não
consegui frear as lágrimas. O desespero estava apertando meu peito a ponto
de me fazer querer gritar.
― Tive medo de contar, não escondi por mal...
Uma bomba tinha sido jogada em cima de mim. Eu imaginava que ela
tinha uma doença difícil, mas com mais possibilidade de cura, mas aquilo?
Havia uma possibilidade de ela conseguir um doador, mas corria contra o
tempo. Por que aquilo estava acontecendo comigo? Mamãe estava doente, e
agora Sophie.
― Vai ficar tudo bem, querido. Vamos passar por isso juntos, não é?
Era para eu consolá-la, e ali estava eu sendo consolado por ela.
Precisava tirar forças do mais profundo do meu ser e ter fé em que
conseguiríamos passar por aquela batalha juntos. Superaríamos e
venceríamos no final.
Olhei para cima e notei seu rosto molhado, mas também havia
esperança. Então eu também teria, mesmo que meu coração estivesse tão
pequeno por temer o pior.
― Parte meu coração não poder tirar esse medo de seus olhos. ― Ela
alisou meu rosto molhado.
Coloquei-me de pé e toquei sua face.
― Vou fazer tudo que puder para conseguir um doador compatível. ―
Essa era uma promessa que fiz a mim mesmo e a ela. Esperava conseguir
realizá-la. ― Vou conseguir o melhor médico.
Seu sorriso era doce, tão lindo... Mesmo com ela passando por aquilo,
ele não se perdeu. Eu também queria ter a mesma fé e esperança dela.
― Isso não tem a ver com o melhor médico e especialista, mas em
conseguir um doador compatível. ― Pegou minha mão e me puxou para o
sofá, sentando-se ao meu lado.
― Vou fazer o impossível para conseguir. Não posso perder você,
Sophie. ― Beijei sua testa. ― Como funciona essa anemia? Pode me dizer?
Já ouvi falar dela, mas não muito.
Ela me contou sobre a doença, seus sintomas e o modo como avançava,
as chances de compatibilidade que tinha, tratamentos que fazia. Também
disse que tinha pouco tempo para conseguir um doador, porque, no caso
dela, estava avançando muito rápido.
― Pouco tempo? ― sussurrei. Não podia ser, porque os dias em
situações como aquelas passavam voando.
Eu não sabia bem o que fazer, mas de uma coisa tinha certeza: faria de
tudo para não perder aquela mulher, não só porque não saberia viver sem
ela, mas também porque Sophie era muito jovem e linda, tinha um futuro
inteiro pela frente.
― Vamos conseguir, Daniel. ― Ela apertou minha mão. ― Acredito
que Lucky seja compatível. Eu o terei ao meu lado, assim como você, que
era o meu porto seguro. Não sei como sobrevivi todos esses anos sem você.
Puxei-a para o meu colo.
― Foi um completo tormento viver na solidão sem você... Não vou
passar por isso de novo. ― Inspirei fundo para controlar a dor e tudo que
estava sentindo. Não deixei transparecer mais minha preocupação a ela, não
mais do que o necessário. ― Pelo que me disse, tem uma chance a mais com
parentes de sangue, não é? Especialmente irmãos. Então as chances são
maiores de o Lucky ser compatível. Conheço meu amigo; se ele souber
disso, com certeza ajudará.
Ela respirou fundo, parecendo encolhida. Não entendi sua reação.
― O que foi, Sophie? Você já disse ao Lucky o que tem? Se ele não for
compatível, podemos ir atrás da sua mãe.
Dona Alísia amou mais a Sophie do que a própria mãe dela; certamente
estava sofrendo com tudo o que estava acontecendo com minha garota.
― Ela me abandonou, Daniel... em uma maldita lixeira. ― Respirou
fundo e saiu do meu colo, ficando de pé. ― Mas isso não é o pior...
― Tem coisa pior do que isso?! ― indaguei num surto de raiva.
Sempre reagia assim em relação àquela mulher. Nem a conhecia e já a
odiava, primeiro pelo que fez com o meu amigo, e agora, por saber o que fez
a Sophie.
― Conheci a minha mãe. O Wellington conseguiu localizá-la. Sabe, no
começo, até quis ir até ela sem ser pelo motivo de eu estar doente; queria
entender os motivos que a levaram a me deixar, mas então senti a frieza
dessa pessoa. A forma como ela reagiu à minha presença... ― Sacudiu a
cabeça. ― Ela nunca vai me ajudar. Não falo sobre fazer os exames, porque
acredito que Lucky será compatível, mas sim porque eu queria saber sobre a
minha irmã.
Pisquei aturdido.
― Ela a maltratou em sua visita? ― Senti vontade de acabar com
aquela mulher.
Sophie riu com amargura.
― Ela não vai me ajudar sem ter alguma coisa em troca. ― O dissabor
era evidente na sua voz.
― O que você quer dizer? Ela sabe sobre a sua situação e pediu algo?
Assentiu.
― Minha mãe foi até ela para pedir ajuda, mas ela se negou. E, quando
fui visitá-la, me disse a mesma coisa. O pior é que ela disse que só me
ajudaria a encontrar a irmã que eu e Lucky temos se eu pagasse uma quantia
exorbitante. ― Ela estremeceu.
Arregalei os olhos com descrença. É claro que, pelo que eu sabia de
Mary, não seria nada diferente; a mulher era gananciosa demais, só pensava
em dinheiro.
― Pago qualquer preço se, no final, ela ajudar você, além de também
lhe dizer sobre sua irmã.
― Eu não devia ficar surpresa com tal atitude de uma mulher que teve
coragem de abandonar a própria filha como se ela fosse lixo. ― Trincou os
dentes. ― No fundo, queria que ela ao menos tivesse se arrependido do que
fez.
― Lamento por isso, querida. Saiba que jamais vou sair do seu lado ―
jurei.
― Eu sei, mas não quero que você dê o que aquela mulher quer ―
pediu suplicante.
Sacudi a cabeça.
― Não posso prometer isso, não quando há chances de você ser
curada. Se Lucky não for doador compatível, eu irei até ela.
Entendia os seus motivos para não querer nada daquela mulher, mas não
havia tempo para pensar assim. Se sua mãe quisesse dinheiro, então eu lhe
daria. O que me importava era a minha Sophie curada e feliz.
― Ela pode não ser compatível e ter mentido sobre ter mais filhos.
Mary disse que tenho mais um irmão, e Lucky me disse que é uma mulher,
mas não sei se confio nela quanto a uma informação tão importante, não
quando está pedindo milhões em troca. ― O asco era evidente na sua voz.
― Também tem outra condição. Ela quer sair da cadeia. ― Apertou as mãos
uma na outra, parecendo furiosa ou com frio.
Peguei suas mãos e as esfreguei enquanto falava com ela:
― Vou dar um jeito nisso.
― Wellington está tentando descobrir alguma coisa. Ele é bom nisso.
― Ela colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha, sinal de que estava
nervosa. Sophie sempre fazia isso, um gesto que não se perdeu com o tempo.
― Se Lucky sabe da sua irmã, então com certeza Bryan a está
procurando agora e arrumando uma forma de ajudar você. ― Naquele
momento, fiquei feliz que ela tivesse encontrado o meu amigo, seu irmão. O
aperto em meu peito ainda estava ali, mas minha esperança floresceu ao
pensar em Lucky e tudo o que estava ao alcance dele.
― Eu ia contar a você antes de dizer a ele, mas Lucky me viu na saída
do hospital e tive que falar. Só queria protegê-los, mas não pude... ― Passou
a mão nos cabelos. ― Preciso tomar meus remédios. ― Ficou de pé. ― Já
volto, depois continuamos a conversa. ― Beijou meu rosto. ― Obrigada por
tudo. Sabe que amo você e sempre irei amei.
― Também amo você ― declarei.
Após ela sair, suspirei, sacudindo a cabeça para clarear meus sentidos,
então peguei meu telefone e liguei para o Lucky.
― Podemos conversar, Lucky? Pode vir à minha casa? ― Era melhor
ele vir até nós; eu não queria que Sophie saísse.
― Daniel? Aconteceu alguma coisa? ― Sua voz estava estranha, e não
consegui perceber por quê.
― Sabe sobre a doença de Sophie? Não posso perdê-la...
Ele deu um suspiro.
― Não vamos perdê-la. Os resultados dos meus exames saem ainda
hoje, então saberemos. Estou motivado e confiante que dará certo.
― Pode vir aqui? Preciso falar com você.
― Estou a caminho.
Sophie ficaria bem. Aquela era uma promessa que eu cumpriria.
Moveria céu e Terra para que acontecesse.
Capítulo 16
LUCKY
― Você não pode ceder às chantagens da sua mãe ― disse Sam. ― Sei
que deseja saber onde a sua irmã está, mas deixar uma mulher como ela solta
depois de tudo o que fez?
Bryan estava tentando localizar a minha outra irmã. Essa espera estava
acabando comigo. Não saber onde e como ela se encontrava estava me
fazendo perder o sono.
Fazia quatro dias que eu descobri que Sophie era minha irmã, e nunca
estive mais feliz, embora ainda faltasse a sua irmã gêmea. Porém, ficou mais
fácil para o Bryan procurar usando a imagem de Sophie nos bancos de dados
da polícia, já que as duas eram gêmeas idênticas. Isso facilitaria as coisas.
― Eu sei, Sam, mas estou enlouquecendo sem saber onde ela está. E se
ela tiver a mesma doença que Sophie, ou pior, se já teve e... ― Minha voz
falhou. Não podia pensar na possibilidade de que ela estivesse morta.
Rosa Vermelha veio até mim e pegou minha mão, dando-lhe um aperto
delicado.
― Ela está bem, meu amor, não aconteceu nada, o.k.? Não fique
pensando nisso ― pediu. ― Bryan vai conseguir localizá-la.
― Fiquei animado e esperançoso, então conheci Sophie e agora sei que
ela está doente. Se eu a perder também... ― murmurei, bebendo um pouco de
vodca. Precisava de algo forte para não pensar demais.
Depois que soube que tinha irmãs, não conseguia me concentrar direito
no trabalho, em nada. Ao descobrir o que Sophie tinha, as coisas ficaram
piores. O medo de perdê-la estava me deixando inquieto, por isso pedi que
um amigo meu me ajudasse com a situação de Sophie. Ele era um médico
especialista na doença que ela tinha. Eu sabia que minha irmã já tinha um
médico, mas confiava naquele e em que tudo daria certo. Precisava ter
esperança.
― Lamento pela Sophie, querido, mas vai dar tudo certo. Você será
compatível e poderá salvar a sua irmã, e meu irmão encontrará a outra. Se
não conseguirmos nada até o final de semana, aí vamos até sua mãe ― falou
Sam. ― Se fosse só pelo dinheiro, nós poderíamos até lhe dar o que ela
quer, mas aquela mulher quer ser solta, e isso é injusto, porque fez muitas
coisas erradas para você e suas irmãs. Ela merecer continuar presa e ter a
chave jogada fora!
Ri da fúria de Samantha. Eram raras as vezes em que minha linda
esposa reagia assim em relação às pessoas. No entanto, Mary merecia aquilo
e muito mais.
― Você fica tão linda quando está com raiva. ― Sorri, puxando-a para
meus braços e beijando seus lábios. ― Se não fosse você e nossos filhos, eu
não sei o que seria de mim.
― Eu não seria feliz sem você, disso tenho certeza. Você, Lana e Shaw
são a razão para que eu me sinta realizada e lute todos os dias. ― Colocou a
mão na barriga. ― Além desse bebê que vai nascer.
Sam estava grávida de três meses. Não sabíamos o gênero ainda, mas,
independentemente do sexo, eu amaria aquela criança.
Aquela mulher e tudo o que ela me deu eram a única razão para eu me
manter são, pois, se não fosse isso, não sei o que eu teria feito ao descobrir
tudo que Mary fez além de me abandonar para morrer; com certeza, alguma
besteira.
― Você é a luz da minha vida. — Apertei mais meus braços ao seu
redor.
― Te amo, Lucky. ― Beijou-me com fervor e paixão, e retribuí
igualmente, prestes a tirar suas roupas.
― Estou interrompendo? ― Ouvi um grunhido. ― Não acho que gosto
da forma que está agarrando a minha irmã.
Bryan entrou na sala e veio em nossa direção com os olhos estreitos.
― Acho que vou demitir a minha secretária, já que não está fazendo o
trabalho dela direito. ― Afastei-me de Sam e olhei para o meu cunhado. ―
Não devia bater antes de entrar?
Samantha ajeitava as roupas e retocava o batom, que estava um pouco
borrado. Ela limpou a minha boca também, ignorando o irmão.
― Bati umas dez vezes, até achei que você não estava aqui, mesmo a
secretária dizendo que estava. Acho que estava ocupado demais para ouvir
alguma coisa. ― Ele foi até sua irmã e a beijou na testa. ― Não gosto de
presenciar uma cena dessas, pois me dá vontade de matá-lo.
― Não comece a criticar, pois ele é meu marido. ― Ela fez uma careta
linda. ― Devia guardar energia e implicância para quando Ariane crescer e
quiser namorar.
Se, com sua irmã, ele era protetor assim, imagina quando as suas filhas
crescessem? Eu tinha até pena delas, embora imaginasse que eu seria
igualmente protetor com a Lana.
― Se alguém chegar perto dela, eu mato ― rosnou, afastando-se de
Sam.
Ela bufou.
― Vai sonhando. Continue com isso por alguns anos, até conhecer seu
genro. Aposto que Ariane vai amar que você atire no namorado dela ―
provocou.
Bryan fechou a cara e estava a ponto de discutir, mas pensou melhor.
Entregou-me um envelope grande.
― O que é isso? ― sondei, checando o material por fora. ― É o que eu
acho que é?
Ele assentiu.
― Sim, são as informações que consegui sobre as suas irmãs e seu pai,
mas...
Ele foi cortado por uma batida na porta, então Leidy, a secretária,
entrou.
― Desculpe interromper, senhor Donovan, mas tem uma senhora aqui
que deseja falar com o senhor. ― Ela parecia nervosa, provavelmente por
ter deixado Bryan entrar sem me avisar.
Eu sabia que às vezes era rígido demais, mas estava tentando mudar um
pouco as coisas; percebia que estava diferente do homem grosseiro e
arrogante que era antes de conhecer Sam. Ela me ensinou a ser alguém
melhor, mais gentil e educado.
― Uma mulher? ― Não estava esperando ninguém. ― Pode mandar
esperar...
Naquele momento, eu só desejava ver o que havia no material que
Bryan conseguiu. Esperava que minha irmã estivesse bem fosse lá onde
estivesse no momento.
― Sim, senhor... ― Ela se virou para sair, mas então uma senhora de
cabelos levemente grisalhos invadiu o escritório. Logo a reconheci.
― Dona Alísia? ― Estava confuso, sem entender o que ela estava
fazendo ali.
Dona Alísia era a mãe adotiva de Sophie e era como uma mãe para o
Daniel, que a amava como se fosse. Eu não a conhecia pessoalmente, só por
fotos que ele me mostrou, em seu apartamento. Ela estava parada perto da
porta, olhando-me, então acenei para que a Leidy saísse e nos deixasse a
sós, junto a Sam e Bryan. Eu não mantinha segredos deles.
― Desculpe entrar dessa forma, mas não sei mais a quem recorrer. ―
Ela expirou, parecendo sofrida. ― Posso falar um minuto com você?
Acreditei que era sobre o problema que Sophie tinha. Quando ela me
contou no dia anterior, senti-me mal e inútil antes de saber que podia ser seu
doador, porque pensei que não pudesse fazer nada, diferente de quando
salvei um amigo meu, o Logan, ao doar um pedaço de meu fígado a ele. O
garoto sobreviveu e se tornou forte e estava feliz com sua família adotiva.
Na época, depois que seu pai o espancou a ponto de acabar com seu
órgão, fiquei com o Logan e o ajudei a se curar. Sabia que podia tê-lo
adotado, mas minha mente estava tão fodida que eu pensava que não seria um
bom pai para educar uma criança, então consegui uma casa para ele, e agora
o garoto morava em Seattle e estava feliz com sua nova família. Samantha
mudou minha forma de pensar ao trazer Shaw para as nossas vidas. Com ele,
descobri que eu podia, sim, ser pai e amar uma criança, que não me
assemelhava em nada à minha mãe, que teve coragem de abandonar o
próprio filho.
Assim que eu soube da Sophie, percebi que precisava ajudá-la de
alguma forma, pois não podia perder a minha irmã, não quando ela tinha
acabado de chegar à minha vida. Além disso, se ela se fosse, meu amigo
sofreria demais. Daniel era um cara fechado, embora fosse um amigo leal e
fiel aos seus. Ele tinha muita dificuldade em deixar alguém entrar em sua
vida, mas, quando se abria, era para sempre. Amava a Sophie desde que
eram adolescentes e nunca a esqueceu, então eu sabia que meu amigo seria
destruído caso perdesse aquela mulher. Por tudo isso eu não podia deixar
que minha irmã perecesse. Promoveria campanhas para conseguir a ajuda de
quantos fossem possíveis no caso de a minha medula não ser compatível com
a dela. Sophie precisava viver e ser feliz com o meu amigo. Fosse o que
fosse que dona Alísia precisasse, eu iria ajudá-la.
Olhei para a mulher sofrida à minha frente, seus olhos vermelhos e
úmidos pelas lágrimas. Notei que tinha algo de errado... Isso queria dizer
que Sophie...
― Aconteceu algo com a Sophie? ― indaguei com preocupação.
Sam me olhou por um segundo e depois para a dona Alísia.
― A senhora é alguma coisa de Sophie? Ela está bem? ― indagou
Rosa Vermelha com preocupação.
― Sou mãe dela. E... ― Dona Alísia veio para perto de mim. ―
Sophie está bem na medida do possível, mas o que tenho a dizer não vai ser
fácil. Preciso da sua ajuda, Lucky.
― Minha?
― Sim. Eu prometi a Sophie que deixaria que ela falasse com você,
mas acho que, devido ao medo da minha filha, ela está hesitando demais.
Está com medo de você, do que poderá pensar. ― Encarou-me com dor nos
olhos.
Franzi a testa.
― Medo de mim? Mas eu falei que estou ao lado dela para o que der e
vier e que, mesmo se os resultados dos exames não forem o que esperamos,
vou fazer de tudo para conseguir salvá-la.
Foi a vez de dona Alísia franzir o cenho.
― Ela te contou tudo?
― Que ela é minha irmã e que tem anemia aplástica? Sim. Ontem eu a
vi saindo do hospital chorando, então perguntei o motivo, e ela disse.
Ela suspirou de alívio.
― Que bom que ela revelou a verdade. Vim aqui como uma mãe
desesperada. ― Começou a chorar. ― Não posso deixar que minha filha
morra... Não posso perdê-la!
Peguei suas mãos e a levei para o sofá.
― Creio que dará tudo certo, senhora ― tentei tranquilizá-la.
Olhei para a Rosa Vermelha à procura de ajuda, porque não sabia o que
fazer. Ela pegou um copo d’água e veio até onde dona Alísia estava.
― Tome um pouco de água para se acalmar um pouco ― pediu
gentilmente.
Dona Alísia assentiu, tomando um gole da água e respirando
longamente como se tentasse se tranquilizar.
― Obrigada. Antônio e eu nunca pudemos ter filhos. Eu quis tanto que,
ao longo dos anos, quando éramos mais jovens, nós tentamos, mas
fracassamos. Então acabei desistindo. Em uma noite, vínhamos da mansão
dos Luxens, e, quando chegamos em casa, ouvi um choro de bebê não muito
longe. Quando fomos à lixeira ali perto, havia uma menina linda e suja
chorando. Ela estava no meio daquele lixo todo. Procuramos a mãe pelo
bairro e não avistamos ninguém. ― Seus olhos perderam o foco enquanto
sua mente vagava para longe.
Fiquei em silêncio, sem saber o que dizer, tentando segurar a raiva que
eu sentia da Mary, porque isso era tudo culpa dela. Nossas vidas não foram
diferentes, no fim. Eu fui deixado em uma casa sozinho para morrer de fome,
e Sophie, em uma lixeira; o destino de nossa outra irmã não deveria ter sido
diferente. Eu temia só em pensar.
― Na época, não acreditei que alguma mãe tinha sido capaz disso, mas
o fato se provou certo. Sua mãe a deixou como se ela não fosse nada.
Antônio e eu decidimos adotar a Sophie e a amamos como se fosse nossa. ―
Ela olhou para mim. ― Queria ter o sangue dela para poder salvá-la, mas
não posso. As chances são maiores com um parente biológico, então só resta
você.
― Não há somente eu como irmão. Nós temos mais uma irmã. ― Olhei
para o Bryan à procura de uma resposta. ― Conosco, as chances são
maiores.
― Foi difícil descobrir a verdade, tive que procurar no fundo do baú.
Por sorte, nos arredores de onde a Mary deixou Sophie, tinha uma câmera.
― Ele olhou para mim. ― Os antigos donos do imóvel perto da lixeira
tinham colocado uma câmera externa de segurança e são daqueles que não
jogam nada fora, então vi as imagens e observei Mary deixando a bebê ali.
Depois achei imagens do hospital, enquanto ela saía com duas crianças no
colo. Não ficava longe de onde Sophie foi deixada.
― E a outra? ― apontei.
― Ela primeiro deixou a Sophie perto da casa que os Luxens cediam
aos empregados. ― Ele se virou para a mãe de Sophie. ― Onde vocês
moravam.
― A outra irmã de vocês é gêmea da minha garota? ― Dona Alísia
piscou. ― Quando penso em tudo o que essa mãe de vocês fez... Só queria
que ela nunca mais saísse da cadeia.
― Sophie foi visitar a genitora dela no intuito de receber ajuda, mas foi
tratada com desprezo. Mary pediu grana tanto para fazer os exames quanto
para revelar quem é a outra irmã, além de exigir sair da cadeia. ― Bryan
cerrou os punhos. ― Aquela mulher não merece ficar livre, não depois do
que fez a você, Lucky, como também a Sophie e à outra irmã de vocês.
― Se você achou Sophie em uma lixeira, onde a puta da Mary deixou a
outra? ― Virei-me para dona Alísia. ― Ela deixou só uma bebê lá ou tinha
outra e vocês ficaram apenas com a Sophie?
Então me lembrei que Mary falou que tinha separado as duas e as
colocado em lugares diferentes.
― Só tinha a Sophie lá, não vi mais ninguém ― respondeu dona Alísia.
Bryan pigarreou.
― Ela foi deixada longe, em outra cidade, na frente da sede de um MC
cujos integrantes até já foram presos. A garota tinha uma vida de cão... ―
Ele estremeceu. ― Ficou lá até os seus 16 anos, como prostituta do lugar,
sendo obrigada a fazer coisas impuras e horríveis, apesar de não ser culpa
dela, e sim daqueles malditos bastardos fodidos, então fugiu de Louisville e
veio para cá, onde conheceu o marido dela. Não teve sorte com ele, pois
apanhava demais. Sei disso pelos relatos dos vizinhos.
― Oh, Deus! ― sussurrei, sentindo ânsia de vômito ao imaginar os
dissabores que minha outra irmã tinha passado. ― Preciso saber onde ela
está e ajudá-la de alguma forma. Qual é o nome dela e onde mora?
Bryan hesitou.
― O que foi? ― insisti.
― Esse marido a tratava mal, mas ela nunca o denunciou. Os vizinhos
disseram que Laila queria um lar e não queria deixar o filho dela sem pai,
mas o cafajeste um dia bebeu e bateu tanto nela que... a matou na frente do
filho.
Meu corpo tremeu como se tivesse sido atingido por um raio. Aquela
notícia era como uma bomba jogada na minha cara.
― Ela morreu? ― Minha voz parecia sem vida. Meu peito estava
apertado como se a pulsação estivesse falhando. Sonhava em encontrar
minhas duas irmãs, e no final só tive a sorte de ter uma delas.
― Sim. Essa mulher é a mãe de Shaw ― falou, avaliando sua irmã.
Fiquei de pé subitamente.
― Meu filho? ― questionei. Lembrei-me da vez que Shaw contou o
que o pai fez com a sua mãe, as atrocidades que presenciou e o tanto que ela
sofreu. Quando eu poderia imaginar que ele estivesse falando da minha
irmã?
O pai do garoto tentou abusar da minha esposa. Eu deveria tê-lo matado
naquele dia. Se tivesse feito isso, aquele desgraçado estaria no inferno,
apesar de eu saber que, na prisão onde Raul estava, ele já tinha ido parar até
na enfermaria por causa de surras e coisas piores. Então, de certa forma, ele
vivia o inferno na Terra.
De qualquer modo, o que eu fizesse com ele não traria a minha irmã de
volta. A culpada de tudo era a Mary, e eu jurava por Deus que aquela bruxa
pagaria.
Bryan abraçava a irmã, que estava chorando.
― Lamento por isso.
Sam conteve as lágrimas.
― Lucky, Shaw sempre teve o seu sangue ― sussurrou em choque.
Meus olhos estavam estatelados. Por um lado, eu estava feliz por saber
que o garoto que amava como filho era também meu sobrinho, o filho da
minha irmã. Por outro, estava triste, porque nunca conheceria a Laila,
destruído por ela ter sido assassinada. Se eu soubesse dela e do Shaw antes
de tudo, os teria protegido do que aconteceu.
― Vou matar aquela puta desgraçada. ― Cerrei os dentes e olhei para
dona Alísia. ― Desculpe por dizer essa palavra na sua frente.
― Tudo bem. Que Deus me perdoe, porque já pensei o mesmo dela. ―
Ela veio até onde eu estava e me abraçou. ― Obrigada por tudo, e lamento
pela sua irmã.
Eu não me lembrava da última vez que fui abraçado dessa forma sem
ser pela Sam, pelo Shaw ou pela minha mãe adotiva, Laura Donovan, antes
de ela morrer. Ela era um anjo em minha vida, e eu também a havia perdido.
Os Donovans me salvaram, me adotaram e me amaram como filho. Eu os
tinha perdido em um acidente de carro, e agora sabia que também não
poderia ter uma de minhas irmãs comigo, além de ter a possibilidade de
perder a outra.
― Obrigado. ― Afastei-me dela. ― Lhe agradeço por ter cuidado e
amado a Sophie. Me sinto aliviado por pelo menos uma de minhas irmãs ter
sido criada com amor. Se eu soubesse delas antes, teria ido atrás no mesmo
instante.
― Eu sei que sim. Se fez isso cuidando de seus irmãos adotivos depois
que os Donovans morreram, sei que faria o mesmo pelas de sangue.
― É verdade, querido. Sei que você fez de tudo para saber onde suas
irmãs estavam a partir do momento em que soube delas. Mal dormia e
andava feito louco atrás de descobrir seu paradeiro. ― Sam pegou minha
mão. ― Nada de ruim que aconteceu é culpa sua.
― Eu sei, mas é que eu queria ter feito mais pela Laila. E agora a
Sophie está doente... Não posso perdê-la também. ― Esperava que eu fosse
compatível, porque não suportaria perder outra irmã.
― É bom você olhar o dossiê, Lucky. Há informações sobre seu pai aí.
Consegui encontrá-lo, e acho que você vai gostar de saber o que descobri ―
Bryan disse.
Abri o envelope, tirei os documentos de dentro dele e, à medida que
lia, meus olhos se arregalavam e meu queixo caía.
De repente, meu telefone tocou e, quando vi o nome do Daniel, meu
coração deu uma batida forte.
― Podemos conversar, Lucky? Pode vir à minha casa? ― pediu com
tom estranho.
― Daniel? Aconteceu alguma coisa? ― Eu não sabia se Sophie havia
contado a verdade a ele, por isso desconversei.
― Sabe sobre a doença de Sophie? Não posso perdê-la... ― ele
declarou com a voz perdida.
― Não vamos perdê-la. Os resultados dos meus exames saem ainda
hoje, então saberemos. Estou motivado e confiante que dará certo.
― Pode vir aqui? Preciso falar com você.
Falei que estava a caminho. Precisava revelar a Sophie a verdade sobre
nossa irmã.
Capítulo 17

SOPHIE
Não achei que teria coragem de contar ao Daniel sobre minha doença,
pois parecia que eu tinha algo entalado no peito. Até achei que ele sairia
desgovernado e sem rumo devido ao que ouviu, e eu não tiraria sua razão.
Entretanto, após se afastar um pouco para respirar, ele ouviu tudo o que eu
disse e ficou comigo o tempo todo. Matava-me aos poucos ver a dor e a
impotência em seus olhos.
No fundo, eu estava escondendo dele e de Lucky justamente por isso,
por não querer ver os dois destruídos. Daniel ficou arrasado e até chorou. Eu
queria protegê-los, mas não podia mais; esconder isso me mataria, e os dois
sofreriam ao me perderem.
Eu não podia morrer ainda. Precisava me casar com Daniel primeiro,
viver e ser feliz ao lado do homem que eu amava. Queria ter filhos e uma
vida plena ao lado da minha família: Daniel, meu irmão, meus pais e meus
amigos. Inclusive, eu precisava encontrar a irmã que eu nem conhecia ainda.
Tinha confiança de que Wellington a encontraria para mim. Eu iria amá-la; na
verdade, já a amava antes mesmo de conhecê-la. Só a ideia de ter mais uma
irmã me deixava eufórica. A vida ou o destino não poderia ser tão injusto ao
me fazer não receber tal benção. Obviamente eu não era santa, mas também
não havia cometido tantos pecados assim para pagar um preço alto e não
poder realizar os meus sonhos.
A fadiga, a febre e a tontura estavam piorando. Amanheci cheia de
hematomas no corpo. Daniel nem viu, e eu estava torcendo para que, quando
visse, não surtasse.
Bem, eu não podia ficar pensando no pior, tinha que dar forças a ele e
não ao contrário; sabia que Daniel se fazia de forte, mas no fundo estava
sofrendo por não poder fazer nada para me salvar. Eu, no lugar dele, estaria
sentindo o mesmo.
Passei meses sem esperança, e, quando descobri sobre Lucky, ela
retornou para mim com força total, mas o medo veio acompanhando-a, por
isso hesitei em dizer a eles; queria protegê-los, pois, no final, eu não poderia
evitar machucá-los, mesmo sem querer.
Tomei meus remédios e voltei para a sala, onde deixei Daniel, porém
ele estava com alguém que não vi chegar, embora tivesse ouvido a
campainha tocar minutos antes.
― Porra, essa merda não pode ser verdade! ― ouvi Daniel praguejar
na sala.
Parei no corredor, encolhendo-me por dentro ao pensar que talvez
Daniel não conseguisse ficar ao meu lado para enfrentarmos aquela luta
juntos.
― Também fiquei furioso quando eu soube. ― Era a voz de Lucky.
Lucky? Ele está aqui? Será que também ficou furioso por saber da
verdade? Então por que não me disse quando lhe contei tudo? Acho que foi
pelo meu estado. Será que eles estão bravos comigo?, pensei.
Talvez não estivessem falando de mim. Eu não podia imaginar nenhum
dos dois com raiva de mim. Ambos jamais me dariam as costas, ainda mais
naquele momento.
― Quando você soube que tinha irmãs? ― Daniel perguntou.
Eu sabia que deveria mostrar a eles que ouvia a sua conversa, mas
estava curiosa; precisava descobrir se por acaso estavam chateados comigo,
porque seu tom de voz não estava agradável.
― Mary me ligou há pouco tempo me pedindo para vê-la. Ao chegar lá,
ela me disse que eu tinha duas irmãs. Desde então, eu estava à procura delas.
Demorou, mas consegui as informações que eu precisava, apesar de Sophie
ter se apresentado a mim antes de elas chegarem. Não imagina a surpresa ao
saber que uma de minhas irmãs estava perto de mim e eu nem sabia disso...
― Ele deu um suspiro. ― Também ajudou na investigação o fato de que
Sophie foi visitar a Mary, pois Bryan ouviu a conversa das duas ao
conseguir as filmagens. E dona Alísia foi me ver agora há pouco para pedir a
minha ajuda. Ela não sabia que eu já sabia da verdade.
Ofeguei ao imaginar o Lucky tendo acesso à minha conversa com Mary.
As coisas que aquela mulher disse... Meu irmão não deveria nunca escutar
nada daquilo. Esperava que ele não tivesse visto o vídeo.
E minha mãe foi até o Lucky, como prometeu. Pelo jeito, cansou-se de
me esperar contar a verdade sobre a minha doença a ele. Com tudo o que
aconteceu, eu me esqueci de ligar para ela e dizer que nós já tínhamos
conversado sobre esse assunto.
― Ainda bem... ― murmurei ao perceber que não estavam com raiva
de mim, mas de Mary, fazendo com que os dois olhassem para onde eu
estava.
Saí do corredor e os encarei. Lucky estava de pé perto da janela, e
Daniel, na frente dele. Ouvi vozes de mulheres na cozinha. Não sabia dizer
de quem eram, mas no momento não me importei. Minha vida não podia estar
mais confusa.
Observei os dois homens da minha vida. Tanto os olhos escuros de um
quanto os verdes do outro me encaravam com preocupação.
― Sophie... ― Daniel veio até mim e tocou meu rosto com suavidade.
Tentei ler sua expressão, mas não vi nada além de preocupação. ― Está tudo
bem? Parece cansada. ― Puxou-me para o sofá grande em forma de L e se
sentou ao meu lado.
― Estou bem, só senti um pouco de falta de ar, mas nada que não tenha
sentido antes ― tentei brincar para aliviar a tensão, mas não fui bem
sucedida.
A porcaria tinha me deixado quase sem fôlego, então fechei os olhos,
inspirando pelo nariz e não querendo ver a dor que estava nos olhos dos
dois.
Merda! Como eu queria que não sofressem assim por minha causa...
Talvez eu devesse ter ficado longe de Daniel até ficar curada, então voltaria
para ele depois. Todavia, só com a mera ideia de não o ter, eu me sentia
como se estivesse morrendo, e não era uma hipérbole. Eu realmente não
podia mais ficar longe do homem que era meu suporte, meu porto seguro.
Então, fosse o que fosse, eu queria ambos, meu homem e meu irmão, ao meu
lado. Não só eles, mas toda a minha família e meus amigos. Eu ainda não
tinha contado a Laurel, que era minha melhor amiga. Logo ligaria para ela e
contaria a verdade eu mesma; não queria que ela soubesse por ninguém além
de mim.
― Sophie... ― A dor estava na voz de Daniel.
― Logo vai passar ― tentei tranquilizá-lo.
― Vamos levá-la ao hospital. Eu até falei com um especialista ― disse
Lucky. ― Seu médico e o doutor Klaus ficaram de fazer uma reunião para
ver os seus exames e os meus. Assim que eu sair daqui, vou lá para ver o
resultado.
Fitei os olhos do meu irmão e vi esperança neles.
― Você vai doar a sua medula? Dizem que isso provoca efeitos
colaterais, dores de cabeça e outras coisas.
― Não ainda. Primeiro, vamos ver os exames que comprovem que
estou sadio e o de compatibilidade. O doutor me disse que, antes de receber
a minha medula, no caso de eu ser compatível, você passará a receber altas
doses de quimioterapia e, talvez, também de radioterapia, com a finalidade
de destruir a medula antiga para que possa receber a nova medula óssea. ―
Seu tom era triste.
O médico já havia me dito sobre o que eu teria de fazer caso
encontrasse um doador e todas as complicações que poderiam resultar disso.
Senti Daniel prender o fôlego, então alisei sua mão para confortá-lo.
― Quando você soube disso? ― inquiriu ele.
― Ontem, o doutor Michigan, médico da Sophie, me falou algumas
coisas. Então entrei em contato com um médico em Houston, do mesmo
hospital em que Angelina foi operada. Ele é muito bom. ― Olhou para mim.
― Desejo que eu seja compatível com você e que seja curada, não posso
perdê-la... ― Tinha um tom estranho em sua voz, como se ele estivesse
sofrendo ainda mais. Seria por minha causa? Eu estava a ponto de
tranquilizá-lo, quando ele continuou: ― Tem algo que preciso lhe dizer, e
não quero que saiba por ninguém além de mim.
― Não acho que seja o momento ― interveio Daniel, parecendo estar
ainda mais preocupado.
Franzi a testa.
― O que não quer me contar, Daniel? Do que quer me proteger?
Os dois trocaram um olhar cujo significado não entendi.
― Daniel? Lucky? ― Fiquei de pé, esperando não ficar tonta, ou eu
corria o risco de ser internada mesmo sem querer. ― Quero a verdade,
droga! ― gritei, pegando ambos de surpresa. Então suavizei meu tom a fim
de incentivá-los a dizer o que estavam escondendo de mim: ― Por favor,
preciso saber da verdade seja ela qual for.
― Senta aqui. ― Daniel me puxou para seu colo como se quisesse
me confortar. ― Não vai ser fácil.
O meu coração gelou, com medo de que algo tivesse acontecido.
― Minha mãe e o papai estão bem? Não aconteceu nada com eles, não
é?
Lucky se sentou na mesinha de centro à nossa frente e segurou minha
mão.
― Não é isso, eles estão bem. Mas descobrimos quem é nossa irmã.
Nossa irmã? E não era para ser uma notícia boa? Por que Daniel não
queria que o Lucky me contasse? As batidas do meu coração aceleraram
tanto que achei que ele pararia. De repente, não queria ouvir mais nada, mas
precisava saber o que aconteceu com ela. Pela dor nos olhos do Lucky, as
notícias sobre nossa irmã não seriam o que eu esperava. Será que ela... não!
Eu não podia pensar nisso; precisava acreditar que tudo estava bem.
― Ela está... ― Não consegui terminar a frase. A morte estava me
rodeando havia alguns meses, e eu não me imaginava perdendo alguém que
gostaria de ter na minha vida para sempre.
― Sim, ela morreu há uns poucos anos, mas eu só soube hoje. ― Lucky
foi até a janela e mirou além dela com os pensamentos distantes, ficando de
costas para mim. ― Queria ter feito algo. Se eu soubesse dela ou de você,
teria me apresentado. Agora é tarde... ― O tormento era evidente na sua voz.
O meu peito parecia vazio, e, ao mesmo tempo, latejava dolorosamente
a cada pulsação. Doía demais.
― O que aconteceu com ela? Como se chamava? ― Fiquei de pé com
Daniel ao meu lado segurando minha cintura como se quisesse me apoiar,
mas permaneceu calado.
― Seu nome era Laila. Ela foi abandonada por Mary igual a nós dois,
mas, ao contrário de nós, não teve alguém que a protegesse e a amasse... A
sua vida foi só sofrimento. ― Então Lucky falou da vida sofrida dela com os
MCs que a usaram desde criança. Quando cresceu, ela fugiu de lá e conheceu
o seu marido, o mesmo homem que a matou na frente do filho de ambos.
― Oh, meu Deus! ― Cobri minha boca de choque e dor. As lágrimas
caíram por minhas bochechas. Pensei que ela tivesse partido por causa de
uma doença, não que tivesse sido assassinada pelo próprio marido.
Desde que eu soube que tinha outra irmã, sonhei que pudesse vê-la de
alguma forma e abraçá-la, mas, com essa bomba que foi jogada contra mim,
percebi que nunca poderia fazer nada disso, e tudo por culpa daquela
maldita cadela.
― Penso em todo o dinheiro que tenho, a forma como vivi, comendo do
bom e do melhor... Enquanto isso, ela estava vivendo no inferno. ― A voz
de Lucky era um sussurro dolorido.
― Lucky. ― Fui até meu irmão, deixando Daniel para trás, e peguei
suas mãos. ― Não é culpa nossa.
Ele se virou para mim com os olhos úmidos; os meus já pareciam uma
enxurrada.
― Por que aquela mulher fez isso? Por que ter filhos se nos odiava?
Ela não devia ter tido nenhum de nós. ― Cerrou os punhos. ― Viveu no seu
maldito palácio em Moscou, enquanto nossa irmã sofria, e o tempo todo
aquela maldita sabia onde Laila estava. Se não queria ajudá-la, devia ter me
falado, que eu teria ido ao inferno para buscá-la.
Puxei-o para os meus braços. Mesmo dilacerada por dentro, senti
conforto por estar nos braços dele.
Laila... Mesmo sem conhecê-la, eu já amava a ideia de ter mais irmãos.
Era uma pena que ela tinha partido.
― Por que ela ao menos não deixou vocês duas juntas? Se tivesse feito
isso, agora ela estaria aqui conosco. ― Os braços de Lucky se estreitaram
ao meu redor, como se ele precisasse de apoio.
― A odeio por ter nos separado ― murmurei.
― Aquela maldita fez isso porque é perversa. O que nossa irmã sofreu
com o abuso desde cedo, a dor que ela deve ter sentido... Com certeza deve
ter pensado que todos da sua família a abandonaram e que era sozinha no
mundo, quando, na verdade, nós não sabíamos dela. ― Chorou. ― Lamento
por tudo. Devia ao menos ter checado, sei lá, feito alguma coisa...
Afastei o rosto do dele e o fitei.
― Não se culpe, Lucky, Mary é a culpada de tudo, de toda a nossa dor,
de tudo o que aconteceu com Laila. ― Evitei pensar em meu próprio
sofrimento e foquei em confortar Lucky e afirmar que ele não era culpado,
afinal, nem sabia sobre nós. ― Quero que ela jamais seja solta.
― Não vai. Eu irei fazer tudo que puder para impedir isso ―
assegurou.
― Ela era bonita? Nossa irmã?
Lucky assentiu.
― Tão linda quanto você. ― Limpou as lágrimas do meu rosto. ―
Você era igual a ela, afinal eram gêmeas.
Éramos gêmeas? Dizem que os gêmeos são ligados pela alma.
Acredito que Laila e eu seríamos assim se tivéssemos sido criadas juntas,
pensei. Desejava que tivesse acontecido, mas não era possível.
Lucky pegou uma fotografia no bolso e me entregou.
― Olha aqui...
A foto mostrava uma mulher de cabelos anelados e escuros e com
expressão envelhecida, mesmo que não fosse. Devia ter sofrido muito.
Mesmo assim, naquele retrato, seus olhos estavam amorosos ao fitar o filho
no seu colo. O menino de cabelos escuros a observava como se ela fosse a
pessoa mais perfeita do mundo. Havia amor ali, entre os dois.
Sim, definitivamente éramos iguais. Poderíamos ter enganado muita
gente nos passando uma pela outra. Quase ri desse pensamento. Um sonho
que foi interrompido por uma maldita víbora doentia.
O que aquela criança teve que presenciar? Tudo graças a pais que não
deviam ter filhos. O pai dele era um monstro, assim como minha mãe.
Mesmo ela não estando lá com aquele assassino, teve sua culpa na morte de
Laila, porque não a protegeu quando sabia tudo sobre ela. Eu jamais a
perdoaria por minha irmã ter sofrido e sido assassinada, como também pelo
que meu sobrinho passou.
― Com quem ele está? Qual o nome desse garotinho lindo? ― A
criança não me parecia estranha. Passei o dedo no rostinho dele sobre a foto,
tentando recordar, mas não consegui.
― Sim, ele é lindo e se chama Shaw. É o meu filho agora. ― Ouvi a
voz da Samantha.
Virei-me e a vi na porta da cozinha ao lado da minha mãe, que eu não
sabia que tinha vindo com eles.
A tristeza vincava os olhos de Sam.
― Filho?
Shaw? De repente me lembrei de onde o vi. Foi em uma revista que
mostrava a família Donovan unida. Eu sabia que Lucky e Sam tinham
adotado um garotinho que viu o pai matando a mãe. Então essa tal mulher era
a minha irmã?
― Ainda custo a acreditar que Shaw é sobrinho de Lucky e que, de
alguma forma, foi enviado para as nossas vidas ― disse Sam, limpando as
lágrimas.
― Rosa Vermelha, não chore. ― Lucky foi até ela e a puxou para seus
braços.
Samantha forçou um sorriso.
― Estou bem, só feliz por ter meu garoto, mesmo que desejasse que ele
estivesse com a sua mãe. Mas ao menos ele veio para os tios dele. ― Ela me
olhou. ― Hoje, nós vamos contar a Shaw sobre você. Assim que ele a olhar,
poderá pensar que está vendo coisas, e não quero sua cabecinha confusa. ―
Ela sacudiu a cabeça. ― Tomei conta de Shaw e até olhei a ficha dele e vi a
foto de sua irmã. Na época eu não te conhecia, portanto nem fiz uma ligação
entre vocês duas. Além disso, ela parecia muito mais velha, cansada. A vida
judiou bastante de Laila. O sofrimento faz isso com as pessoas.
― O monstro que a assassinou está preso, né? ― Eu esperava que sim,
porque não podia aceitar que ficasse livre depois do que fez.
― Sim, não vai ver a luz do dia tão cedo ― garantiu Lucky. ― E Mary
também.
Assenti e depois falei uma coisa que estava me incomodando:
― Deixe para falar com Shaw sobre mim depois que eu fizer o
transplante, se você for doador. ― Olhei entre meu irmão e Sam. ― Não
quero que ele me veja ainda, porque, se por acaso eu não conseguir, a
criança ficará devastada, pois me pareço com a mãe dele, e isso poderá lhe
trazer lembranças que o afetarão.
Todos me encararam de olhos arregalados. Vi que não queriam
concordar comigo, mas no fundo sabiam que eu estava certa. Mesmo que
Lucky fosse compatível, eu passaria a fazer tratamento quimioterápico e
talvez até radioterápico, e tinha consciência de que era algo doloroso,
difícil, com muitos efeitos colaterais, apesar de ajudar para evitar a rejeição
do transplante. Era um processo pelo qual, de qualquer jeito, eu teria que
passar. Como eu não poderia proteger quem estava ao meu lado, pelo menos
faria isso com Shaw, que já tinha sofrido demais na vida. Eu só queria estar
bem para trazê-lo para minha vida, porque, quando ele estivesse nela, ficaria
para sempre.
― Sophie... ― começou Daniel, sacudindo a cabeça.
― Não quero que ele sofra mais do que já sofreu no caso de eu não...
― Ele estremeceu, assim como Lucky. ― Assim que eu estiver boa, vocês
falam com ele. Sei que concordam comigo; mesmo sendo difícil, é o certo.
― Os resultados saem hoje ― falou Lucky. Tinha certo nervosismo na
sua voz, como também esperança.
― Estou imensamente feliz por vocês terem adotado Shaw e o amado.
Nessas horas acredito em destino. ― Olhei para a foto de Laila. ― Acredito
que ela ficaria feliz com isso. Não podia ter escolhido família melhor.
― Você também foi acolhida e amada, assim como eu. ― Lucky deu um
sorriso para minha mãe, e eu repeti seu gesto, meu coração cheio de amor
por ela e papai; embora a dor que sentíssemos pela perda de Laila estivesse
em nós dois, a felicidade por termos nos encontrado, bem como ao nosso
sobrinho, também estava. ― Agora não sairei mais da sua vida. Terei você e
Shaw. Já o amava antes de saber quem ele era.
― Bryan também encontrou o pai de vocês, Sophie ― informou Daniel.
Virei-me para ele de olhos arregalados.
― Meu pai? ― Desde que eu soube da verdade, sempre imaginei que
ele fosse igual a Mary, que não se importasse o bastante conosco. ― Ele
sabe o que a Mary fez com a gente?
Lucky suspirou.
― Não sabia até Mary contar que teve três filhos com ele. Seu nome é
Joaquin Law, e ele mora em Savannah. Pelo que eu soube, nosso pai estava
tentando nos localizar, mas a Mary não lhe contou onde nos abandonou. Ele
gastou tudo que tinha com detetives particulares até não ter mais nada e,
obviamente, não conseguiu nos achar ― disse com emoção na voz.
Pisquei, aturdida. Então nosso pai tentou nos encontrar? Como ele
seria? Se vendeu tudo para nos achar, então se importava muito conosco.
― Ele sabe de nós agora?
Ele assentiu.
― Já deve saber. Bryan foi procurá-lo para falar sobre nós. Eu queria
ter ido, mas precisava falar com você e receber os resultados dos exames.
― Bryan vai contar que estou doente... ― Mais um que eu não poderia
proteger.
― É preciso, Sophie. Ele pode fazer os exames também, já que você é
filha dele. ― Estendeu-me outra fotografia.
O homem ali era alto, com cabelos escuros e cheios de mechas
grisalhas, olhos verde floresta e barba por fazer.
― Você se parece com ele ― sussurrei para o Lucky. ― Tão lindo!
Não vejo a hora de vê-lo.
Gostava de saber que tinha minha família biológica, exceto a Mary,
pois acreditava que quanto mais parentes, melhor. Passei a vida toda só com
meus pais adotivos, sem irmãos. Em um intervalo curto de tempo, ganhei um
irmão, um sobrinho e outro pai.
― Bryan vai trazê-lo, e poderemos falar com ele ― Lucky falou.
― Onde ele vai ficar? Posso ficar com nosso pai no meu apartamento...
Daniel me cortou:
― Você não vai embora daqui, então, se quiser, pode trazê-lo para cá.
Não vou deixar você sair do meu lado por nada.
― Joaquin vai ficar na minha casa, não se preocupe. Vai dar tudo certo,
Sophie. ― Lucky declarou.
Assenti. Não me incomodava com onde ele ficasse, desde que estivesse
na mesma cidade para que eu pudesse vê-lo em breve.
Depois disso, cumprimentei minha mãe com um abraço e um beijo,
então todos nos sentamos para conversar. Lucky e eu falamos sobre nossa
infância, amigos, pais. Mamãe às vezes complementava o que eu dizia.
Também contei como fui feliz ao lado de Daniel na minha vida até o
momento em que nos afastamos, sobre como primeiro fomos amigos, depois
o primeiro amor um do outro, então a nossa separação e agora o reencontro.
Lucky olhou feio para Daniel.
― Espero que nunca a deixe, ou juro que acabo com você, sendo meu
amigo ou não ― ameaçou.
Daniel não ligou para ele, só me olhava com tanto amor que meu
coração balançou e meu ventre latejou.
― Jamais poderei viver sem a minha alma ― declarou com fervor,
puxando-me para seus braços.
Mesmo com tudo o que eu teria que passar para continuar vivendo
aquela realidade ao lado das pessoas que amava, estava ansiosa para ter
uma família com aquele homem, que era a razão da minha vida.
Capítulo 18

SOPHIE
― Você não me contou ― acusou Laurel. ― Pensei que éramos amigas.
Contei a ela sobre a doença assim que chegou ao apartamento de
Daniel. Tinha ligado para Laurel e decidi chamá-la até ali, já que no
momento eu não poderia sair de Manhattan, uma vez que estávamos
esperando os resultados dos exames de Lucky, que não deveriam demorar a
sair. Eram para ter saído no dia anterior, mas tinha ocorrido um atraso.
Mamãe e papai estavam no meu apartamento, pois não quiseram ir
embora para Dallas sem saber os resultados. Logo depois, dependendo
deles, eu teria que começar as sessões de quimioterapia, e meus pais não me
deixariam passar por isso sem sua presença e apoio.
― Lamento, Laurel, as coisas ficaram tão confusas, sabe? A descoberta
da doença, a dor dos meus pais por não poderem fazer nada, a procura pelos
meus parentes e a esperança de me salvar.
Contei-lhe tudo sobre a conversa que tive com a Mary.
― O quê? Ela pediu dinheiro para salvar a filha? ― rosnou Laurel com
os dentes cerrados.
Ri amarga.
― Essa mulher fez coisas piores, Laurel, nos abandonou de forma que
nenhuma mãe faz. Poderia, sei lá, nos entregar a um orfanato. Até o maldito
Estado era uma saída, mas ela não quis. E o pior foi que minha irmã... Por
Deus, ela foi deixada em um clube de motoqueiros! ― exclamei com raiva.
― Nem todos os clubes de MCs são ruins ― interveio Daniel, olhando
uns papéis. Já fazia horas que ele estava vendo aquilo. Eu não sabia o que
era.
Quando Laurel chegou, ele nos deixou sozinhas na cozinha e ficou na
sala de estar mexendo em seus documentos. Jordan estava com ele.
― Até agora não ouvi coisas boas sobre nenhum ― declarei.
― Os MCs Fênix são pessoas boas. Conheço Shadow há alguns anos.
Sua irmã foi deixada em frente à sede do MC Scorpion. Parece que quem
ficou com ela foi o pai de Black, o presidente do clube até pouco tempo ―
disse Jordan.
Franzi a testa. Eu não era de julgar ninguém sem conhecer, mas aqueles
MCs transformaram uma criança em prostituta até o ponto de ela fugir e
aceitar qualquer coisa, como um marido violento.
― O que houve com o pai desse tal Black? ― Esperava que ele
estivesse preso e nunca mais saísse da cadeia.
Jordan suspirou.
― Black o matou e tomou seu lugar. Foi nessa época que sua irmã fugiu
de lá, pois aproveitou o reboliço.
― E esse Black?
― Morto. Ele ousou tocar na mulher do Daemon, um dos motoqueiros
do MC Fênix. Parece que o pai adotivo da garota a deu para o Black. Seu
nome é Emília. Enfim, Daemon matou o padrasto dela e no final soube que
ela era irmã de um chefe de cartel, Miguel, que mandou alguém na cadeia
matar o Black. ― Virou-se para mim com um meio sorriso. ― Acredite em
mim, não sobrou nada dele para contar história.
Laurel franziu a testa.
― Como sabe tanto sobre isso?
Seu sorriso direcionado à sua esposa era cheio de carinho e amor, o
mesmo que eu via em Daniel quando o dirigia a mim.
― Fiquei amigo do Axel, um dos membros do clube. Ele é leal aos
seus; se me contou algo assim foi porque sabe que eu nunca diria a qualquer
um. Só estou falando para vocês porque não há alguém em quem eu confie
mais e porque não é da nossa conta para nos metermos, a não ser que a gente
queira ir para uma cova, afinal o cartel está envolvido. ― Deu de ombros,
sem parecer se importar. ― O resto do grupo do MC Scorpion está preso.
Eu não diria nada a ninguém sobre aquilo. Estava aliviada que Black e
seu pai estivessem mortos. Tiveram o que mereceram.
― O que quero dizer é que nem todos os motoqueiros são bandidos ―
comentou Daniel. ― Acredito que, se vocês conhecessem os integrantes do
MC Fênix, pensariam o mesmo. Conheço Shadow, o presidente dele. Todos
os membros do clube ajudaram a resgatar a Samira e a Tabitta, que foram
sequestradas pela máfia russa há alguns anos. Eles são leais, uma família na
qual um morreria pelos outros.
― Você parece gostar deles ― deduzi.
Daniel deu de ombros.
― Aprecio a lealdade deles, pois é como a que tenho com Jason,
Lucky, Ryan, Jordan e Bryan. Daríamos a vida um pelo outro, assim como os
MCs. Não os vejo muito, Jason e Bryan são mais amigos deles do que eu. ―
Daniel levantou os olhos dos papéis e me encarou. Estava lindo com óculos
de grau. ― Vou apresentar vocês um dia. Acredito que vão se dar bem. As
esposas deles são gente fina. Conheci a Evelyn, esposa de Dominic, que
todos chamam de Shadow, acho que pelo ar sombrio que predomina nele,
mas parece legal e ama aquela mulher.
Talvez um dia eu pudesse conhecer aqueles motoqueiros e, de alguma
forma, agradecer-lhes por terem acabado com a corja do MC Scorpion.
Daniel e Jordan voltaram a atenção para os documentos e o laptop.
― Lamento mesmo não ter lhe contado antes sobre mim, mas juro que,
de agora em diante, não esconderei mais nada. ― Voltei ao meu assunto com
Laurel.
― Eu sei por que você fez isso, Sophie. Sempre teve essa mania de
querer proteger a todos. Só quero que saiba que estaremos aqui para o que
precisar, tanto eu quanto o Jordan ― afirmou. ― Sei que a caminhada será
longa, pois ouvi falar que não é fácil passar pela quimio.
Encolhi os ombros.
― Eu sei. Até pensei em não voltar para o Daniel no intuito de protegê-
lo da verdade. Também foi por isso que adiei contar ao Lucky. ― Sorri. ―
Mas agora, com todos aqui, me sinto mais esperançosa e entusiasmada,
querendo apenas que a provação passe logo, com fé em que tudo dará certo.
― A família nos dá mais força para enfrentar as lutas. Se não fosse a
minha, eu não teria conseguido sobreviver após perder minha mãe. Com
meus irmãos, sou mais forte, e agora mais ainda com Jordan e minha filha.
A mãe e o padrasto de Laurel, pai de Shade, seu irmão adotivo,
morreram quando o avião caiu alguns anos atrás. Isso deixou minha amiga
arrasada.
― Verdade. Agora, cercada de pessoas que amo e que me amam, estou
bem e tenho forças. ― Peguei sua mão. ― Espero não perder sua amizade
em razão do meu medo e por tentar protegê-la da verdade.
― Vem cá. ― Puxou-me para seus braços. ― Não tem nada para
perdoar, você não fez por mal, só queria me proteger da dura realidade.
Ficamos mais alguns minutos conversando, depois nós quatro
almoçamos.
― Se precisar de mim, eu estarei aqui, amiga ― disse Laurel assim que
estava de saída junto ao marido para pegar Jordana na casa de Lucky. ―
Falei com o Jordan, e vamos ficar no apartamento dele aqui até que o
transplante aconteça e você esteja bem.
Meu coração se apertou.
― Obrigada. Você é uma amiga que vale ouro. ― Beijei seu rosto.
Assim que eles se foram, voltei para a sala, onde Daniel ainda estava
sentado no sofá com o computador e os documentos.
― Para que esse monte de papel? Faz horas que está mexendo neles ―
sondei curiosa.
Ele fechou a pasta com os documentos e depois se virou para mim.
― É o contrato de um imóvel que estou comprando. ― Sorriu.
Meneei a cabeça.
― Está lindo com esses óculos. ― Sentei-me em seu colo e o beijei,
faminta como sempre quando estava com ele. Daniel retribuiu cada toque e
beijo.
Minha mão foi para suas calças, mas em dois segundos ele a pegou e a
afastou. Isso sempre acontecia quando as coisas esquentavam entre nós. Eu
já estava cansada disso. Ele estava me rejeitando desde a noite na casa de
minha mãe, quando nosso jantar foi interrompido em razão de minha febre.
Eu tinha consciência de que ele fazia isso por eu estar doente, mas eu não
estava sentindo nenhum sintoma naquele momento.
― Sophie...
― Mas que droga, Daniel! ― Saí do colo dele. ― Nós ainda não
ficamos juntos depois que voltamos! Sempre que me aproximo, você se
afasta!
Ele suspirou, mas vi dor em seus olhos.
― Só vamos esperar mais um pouco...
― O médico disse que minha doença não atrapalha o sexo. Só
precisamos usar camisinha ― tentei convencê-lo.
― Sophie...
Joguei minhas mãos para cima em um gesto exasperado e frustrado.
― Não vou ficar aqui implorando para que me toque, vou cuidar de
mim mesma, já que o meu homem fica me rejeitando. ― Saí da sala e fui
para o quarto, ignorando seu chamado.
Não estava magoada por ele querer esperar que eu ficasse curada, mas
sim irritada. Fiquei só de calcinha e sutiã e peguei o vibrador em forma de
pênis que comprei mais cedo. Queria ver a reação de Daniel quando o visse,
se me deixaria ser fodida por um vibrador ou se faria o serviço ele mesmo.
Eu estava de costas para a porta, mas ouvi quando ele a abriu e logo o
seu ofegar.
― Que porra vai fazer com isso?! ― rosnou, parecendo enraivecido.
Bom, éramos dois, então.
Virei-me de frente e levantei as sobrancelhas.
― O que acha? Satisfazer minhas necessidades, já que você não me
quer. ― Deitei-me na cama e olhei para ele enquanto tirava minha calcinha.
― Pode ficar e me assistir ser fodida por esse pênis, já que está me negando
o seu. O ruim é que esse não tem como eu lamber, beijar e chupar, assim
como faria com o seu pau.
Ele prendeu a respiração e ficou ali, tentando se controlar.
Vou empurrá-lo mais um pouco, pensei. Veria se Daniel era capaz de
superar o medo que tinha de me machucar caso ficássemos juntos. Se eu
estivesse passando mal, até entenderia, mas, desde o dia anterior, não sentia
nada, nem mesmo fadiga, e, além disso, o sexo era permitido, só
precisávamos nos proteger, já que eu não podia ficar grávida com uma
doença como aquela.
Abri mais as minhas pernas, e seus olhos seguiram o movimento,
vidrados.
― Não tem vontade de colocar a sua boca em mim? De lamber meu
clitóris e chupá-lo como se estivesse com fome? ― Minha voz era gutural de
desejo. ― De enfiar seu pau em minha boceta pulsante? Vê-la engolir todo o
seu pênis? Me ouvir gemer em seu ouvido?
Ele engoliu em seco.
― Não queria que sua ereção fosse esse vibrador para me preencher e
me levar ao êxtase? ― Olhei para ele enquanto levava o vibrador entre
minhas pernas. ― Daniel... ― gemi, fechando os olhos assim que o objeto
triscou meu clitóris.
Não demorou muito para ele agir. Assim que comecei a enfiar o
vibrador, ele foi arrancado da minha mão, e ouvi um baque não muito longe,
como se ele tivesse sido jogado contra a parede ou algo assim.
― Nenhum maldito pau de silicone ou qualquer outro irá entrar nessa
boceta ― grunhiu. ― Ela é só minha, Sophie, só eu possa usá-la e comê-la
da forma que eu quiser.
Meus olhos se abriram, e juro que meu coração parou por um segundo
ao vê-lo ali, em cima de mim, furioso e com tesão. Pude ver através de seu
short.
― Vai colocar esse brinquedo em ação? ― Apontei para a sua ereção
em pleno vigor. ― Porque estou aqui pingando e latejante por você. ― Dei-
lhe um olhar sensual.
― Você é uma provocadora, gostosa demais! ― Pairou em cima de
mim, com os olhos nos meus. ― Sophie, você não precisa implorar para
ficar comigo; sou todo seu.
Sorri.
― Bom saber. ― Coloquei minhas mãos em suas calças. ― Eu gosto
muito disso aqui.
Ele rosnou e trilhou um caminho de beijos do meu pescoço aos seios.
Tirou o meu sutiã e o jogou longe, e logo sua boca estava fartando-se deles.
― Merda! Era disso que tanto senti falta! ― choraminguei, agarrando
seus cabelos macios.
Foram anos até ter aquele homem de volta bem ali, onde estava, nos
meus braços. Cada toque seu era como um raio em meu corpo.
― Vamos fazer isso, Sophie. ― Ele olhou para mim. ― Mas precisa
me dizer se começar a se sentir mal. Não importa o sintoma, você precisa me
falar.
Assenti. Sabia que, por estar doente, não deveria pensar em sexo, mas
no fundo não sabia o que dariam os exames de Lucky. Se dessem positivo, eu
teria que fazer tratamentos, o meu corpo ficaria dolorido depois das sessões
de quimioterapia, por isso eu o queria agora, antes de as coisas ficarem
feias.
― Prometo. Agora eu só quero você! ― clamei, beijando seus lábios.
Não queria pensar em mais nada, apenas em nós dois naquele momento,
fingir que era sadia e que apenas estava fazendo amor despreocupadamente.
Foquei no homem em cima de mim, passeando com sua boca deliciosa
pelo meu corpo, barriga e ao sul dali. Daniel me possuía da mesma forma
que eu me lembrava. Sentia muitas saudades da sua boca em mim.
Cada deslizar de língua em meu ponto pulsante, cada intrusão dela em
meu interior, cada chupão me consumia.
― Daniel, isso é tão bom... ― disse, pegando seus cabelos e apertando
mais seu rosto contra meu centro.
Sabia que logo gozaria, pois ter aquele homem me tocando era como se
um vulcão tomasse conta de mim. Com ele na minha vida, eu teria mais
forças para lutar e vencer aquela doença custasse o que custasse.
― Goza, minha linda. Goza na minha boca. Eu quero provar esse mel
de que tanto senti falta ― grunhiu, enfiando dois dedos em minha boceta e
me fazendo gemer.
Sua língua e dedos estavam me deixando louca, então explodi vendo
milhares de estrelas.
― Quero você dentro de mim, Daniel ― pedi, mas senti o mal-estar
chegando... Não, droga! Sentia-me ofegante, mas não sabia se foi pelo
orgasmo ou porque já estava mesmo para acontecer.
― Sophie ― chamou Daniel ao meu lado, tocando meu rosto. A dor
estava na sua voz. ― Lamento, querida.
Abri os olhos, que nem percebi que tinha fechado, tentando recuperar o
fôlego.
― Não foi culpa sua, Daniel, eu que insisti e o seduzi para entrar em
ação ― falei, tentando tranquilizá-lo. ― Se tem alguém que precisa se
desculpar aqui sou eu, já que o deixei duro.
Ele sacudiu a cabeça.
― Acha que vou ligar para isso quando estou vendo a forma como essa
doença está tomando o seu corpo? Vi as marcas nele, os hematomas nas suas
costas. Como acha que me sinto com isso? ― A impotência era evidente em
suas palavras.
Abracei-o forte, querendo tirar todos aqueles sentimentos negativos
dele.
― Desculpe-me por ter sido insensível e por...
― Não lamente por me fazer tocá-la. Nunca faça isso. Anseio por você,
Sophie, mas, nesse momento, só quero que fique curada. Não posso pensar
em tocá-la, quando sei que passará mal, assim como agora. Isso me mata,
porque não posso tirar esse mal de você e colocá-lo em mim, pois, se
pudesse, eu o faria. ― A verdade estava em cada linha do seu rosto.
Deitei-me com a cabeça em seu peito.
― Às vezes me pergunto: por que eu? Por que tenho isso, logo agora,
que tenho você? ― Comecei a chorar. Nunca tinha feito isso nos braços de
alguém além dos da minha mãe, mas sucumbi nos braços de Daniel.
― Não sei, querida, mas vamos passar por isso juntos e vamos vencer.
― Alisou meu rosto.
― Acredito em você. ― Beijei sua face. ― Como tive a sorte de ter
alguém como você? É o homem mais perfeito do mundo.
Ele pigarreou, parecendo emocionado.
― Sophie, eu a amo demais! ― declarou com fervor.
― Se eu não conseguir...
Ele colocou os dedos nos meus lábios, interrompendo-me.
― Não, Sophie, não vamos ter essa conversa.
Peguei sua mão.
― Só quero dizer que, se eu não conseguir, não quero que você se
afunde. Prometa que não fará nenhuma besteira. ― Eu precisava ouvir isso
dele, sua afirmação.
Seus olhos se fecharam, e o vi respirar com dificuldade. Isso me fez
chorar ainda mais.
Oh, Deus! Que o senhor me cure para que esse homem não sofra com
minha perda!
― Não vai acontecer nada. ― Aninhou-me em seu peito, evitando meus
olhos, mas não me passou despercebido que ele não prometeu nada.
Eu estava a ponto de forçá-lo a jurar, mas meu telefone tocou na
mesinha de cabeceira. Afastei-me de Daniel para atendê-lo, mas ele o pegou.
― Eu atendo. Só fique aqui, deitada ― pediu e atendeu com uma das
mãos, envolvendo-me com o outro braço. ― Alô? ― Ele ouviu algo. ― Tem
certeza?
Afastei-me e olhei para ele, que parecia estar com uma grande
esperança no olhar.
― Vamos preparar tudo. Obrigado. ― Desligou o celular e me encarou.
― O que é, Daniel? Alguma notícia do hospital?
Ele sorriu.
― Lucky é compatível, e o médico vai interná-la. ― No final da sua
frase, o sorriso sumiu.
― Vai ficar tudo bem. ― Toquei seu rosto. ― Como você disse: vamos
enfrentar isso juntos.
― Juntos ― afirmou.
Era hora de eu enfrentar o cativeiro, mas valeria a pena se, no final,
conseguisse viver ao lado de Daniel e minha família.
Capítulo 19

SOPHIE
Após o telefonema do Lucky com a confirmação da compatibilidade,
senti-me feliz, mas também nervosa pelo que eu teria que passar. Nas minhas
idas ao hospital, vi muitas pessoas como eu, como a Bailey, uma garotinha
de 12 anos que estava fazendo quimioterapia depois de ter conseguido um
doador. Era o sofrimento que ela tinha de enfrentar para que seu corpo não
rejeitasse a nova medula. Eu não sabia como ela estava, porque seu
tratamento ainda não tinha terminado, mas esperava que estivesse bem.
Cheguei ao hospital e fui ao consultório do doutor Eduardo Michigan.
Lucky queria me levar para Houston, mas não achei necessário, afinal ali
teria o mesmo tratamento e chances.
― É muito bom que seu irmão seja compatível ― o médico disse. ―
Mas agora virá uma fase difícil. Eu sei que passou meses recebendo sangue,
e os sintomas aumentaram, não é? Com a quimioterapia, eles vão piorar.
Coloquei minhas mãos no colo, nervosa, e Daniel as segurou firme. Ele
estava ao meu lado, assim como Lucky e mamãe. O papai também queria
entrar, mas já tinha muita gente na sala do médico.
― Sim, eu sei que o processo é difícil. Quem poderá ficar comigo
aqui?
― É permitido que uma pessoa fique para ajudar quando a situação
ficar difícil. Mas você terá enfermeiros sempre que precisar.
― Minha...
Daniel me cortou:
― Não vou deixar você, Sophie. ― Sua mão me apertou mais um
pouco.
Olhei para ele, querendo encontrar um jeito de não o deixar ver a forma
como eu ficaria. Isso iria machucá-lo ainda mais, ver-me fraca e doente e
não poder fazer nada.
― Daniel...
Sacudiu a cabeça.
― Não, Sophie. Eu sei por que não me quer com você, para que eu não
a veja durante a administração dos medicamentos. ― Tocou meu rosto e me
fitou. ― Não posso ficar longe. Preciso vê-la não importa como você esteja.
Lembra-se do que me disse? Que faríamos tudo juntos? Então vamos fazer.
Meu coração rachou por dentro. Escolher minha mãe em vez de Daniel
para ficar comigo durante o tratamento não queria dizer que eu o amava
menos; eu sabia que mamãe era forte e me ajudaria com tudo, já o Daniel me
veria em uma situação nunca vista. Eu perderia peso, meus cabelos cairiam,
ou seja, eu teria que ficar careca antes de começar. Uma parte feminina
minha se importava com a ideia de ele me ver assim.
Ele limpou com seus lábios as lágrimas que desciam pelas minhas
bochechas.
― Vai ficar tudo bem, querida. Eu serei forte por você. Prometo.
― Não sabemos quanto tempo você vai precisar da quimioterapia.
Quanto menos precisar dela, melhor, e isso vai depender de como ela reagirá
em seu sistema sanguíneo ― informou o médico. ― Não costumo fazer isso,
mas posso liberar duas pessoas, sua mãe e seu namorado.
Fiquei escorada em Daniel, mas voltei minha atenção ao doutor.
― Poderei visitá-la sempre que puder? ― sondou Lucky.
― Lamento, senhor Donovan. Já estou abrindo exceção para mais uma
pessoa, não posso abrir mais. Ela precisará ficar isolada por um tempo, pois
suas defesas estrão muito baixas, mas vamos torcer para que seja breve. ―
Sorriu para mim.
Lucky não gostou muito disso, mas não reclamou, o que me
surpreendeu, já que eu soube que ele tinha o hábito de querer comprar a tudo
e a todos. Realmente meu irmão estava mudando.
― Tudo bem, mas precisarei que me mantenha informado sobre como
ela vai reagir. ― Senti-o encolhido, talvez pensando no quanto aquele
tratamento me machucaria.
― Avisarei ― garantiu Dr. Michigan. ― Agora se despeça dos seus
familiares, Sophie, e depois a enfermeira vai ajudá-la a cortar os seus
cabelos. Ou você prefere esperar que caiam sozinhos?
Encolhi-me por dentro. Não era tão vaidosa com meus cabelos, mas
adorava o fato de eles serem compridos. Nunca gostei deles curtos e gostaria
ainda menos raspados...
Inspirei fundo.
― Tudo bem. ― Não deixei transparecer como eu me sentia na frente
da minha família.
Saí da sala meio rígida. Precisava ter forças, mas não sabia como
conseguiria.
― Sophie...
― Vou ficar bem, Daniel ― tranquilizei-o e depois murmurei: ― Só
queria que vocês não vissem as mudanças no meu corpo. Será doloroso para
você e mamãe.
― Não vamos falar sobre isso de novo. Eu vou estar com você e ponto
final. Vou ser sua âncora. Serei tudo o que precisar. ― Apertou os braços ao
meu redor.
― Sou sua mãe, e é minha função cuidar de você. Você vai entender
isso quando tiver filhos ― mamãe disse. ― Queria ficar no seu lugar, mas,
como não posso, ao menos quero estar lá para quando precisar de mim.
Limpei as lágrimas quando chegamos à sala de espera.
― Lamento por fazer vocês sofrerem assim. Se pudesse, eu jamais faria
isso. ― Olhei para todos na sala, que, por sinal, estava abarrotada com
pessoas da minha família e amigos; papai; Jason e Tabitta; Ryan e Angelina;
Sam; Alexia; Rayla e o marido dela, Alex, que por sinal era irmão de
Alexia; Wellington e Zoe.
Abracei meus amigos e lhes agradeci por estarem ali comigo e me
darem força, então chegou a vez do papai.
― Não chore, papai, eu vou ficar bem. Vai dar tudo certo. Por favor,
tome o seu remédio para pressão nos horários certos, não deixe que ela se
altere, pois não posso perder você. ― Abracei-o forte. ― Eu te amo.
― Vai dar tudo certo, Abóbora. Também te amo. ― Beijou minha testa.
Olhei a todos.
― Obrigada por estarem aqui.
Queria que meu pai biológico estivesse ali também. Bryan informou a
Lucky que Joaquin tinha quebrado a perna e estava internado em Savannah.
Eu sabia que ele não podia ir até Manhattan ainda, mas eu poderia pelo
menos falar com ele por chamada de vídeo, já que não sabia quando sairia
do confinamento.
Estava a ponto de pedir o número dele ao Lucky para conversar com o
meu pai, quando Bryan entrou. Eu tinha sentido a sua falta. Atrás dele vinha
um homem com muletas e roupas de hospital com uma jaqueta por cima.
Pisquei, reconhecendo-o. Ele parou onde estava e varreu os olhos em
todos, demorando-se no final entre mim e Lucky. Certamente devia ter visto
nossas fotos, assim como vimos as dele. Joaquin estava magro e com os
cabelos mais grisalhos, além de com olheiras fundas.
― Não devia estar no hospital? ― Lucky foi até ele e depois virou a
cabeça na direção do Bryan.
― Ele ouviu que Sophie seria internada e ficou louco para vir. Não tive
escolha, senão trazê-lo.
Joaquin suspirou.
― Desculpe, eu só precisava vê-la antes que fosse internada, porque
me disseram que depois não poderá receber visitas por um tempo. ― Ele
parecia nervoso, mexendo nas muletas.
Fui até perto dele, ficando ao lado de meu irmão.
― Falei que o Lucky se parecia com você. ― Sorri. ― O senhor deve
ter partido corações quando moço.
Ele sorriu.
― Um pouco. ― Seu sorriso morreu. ― Sei que temos pouco tempo
para falar, então vou ser breve. Depois falamos mais, quando você ficar boa.
― Sente-se aqui e apoie o pé no sofá, ou isso lhe trará sequelas e muita
dor depois ― pedi.
Pelo que Lucky explicou, nosso pai caiu da escada quando estava
arrumando uma janela. Pelo que eu soube, ele trabalhava com construção.
― Fisioterapeuta brilhante ela é, né? ― Sorriu nervoso para o Lucky e
se sentou na cadeira. ― Só queria lhes dizer que eu não sabia de vocês, mas,
quando descobri, contratei vários investigadores, mas não consegui
encontrá-los. Essa semana, eu soube que a Eliana está presa há algum tempo
e que, na verdade, ela se chama Mary. Nem o nome verdadeiro ela me disse,
e isso dificultou bastante meu desejo de descobrir sobre ela e sobre vocês
durante todos esses anos. ― Suspirou. ― Espero que me perdoem e juro
que, daqui para frente, estarei aqui sempre que precisarem de mim. ― Ele
olhou para o meu pai, logo atrás de mim. ― Não quero tomar seu lugar de
pai, não tenho esse direito. Me contento apenas com um espaço no coração
dela.
― Você é pai dela também e não sabia de nada, então nós dois
poderemos ocupar esse espaço em sua vida ― papai disse.
Beijei meu pai de criação, pois ele amenizou a culpa que Joaquin
sentia, então abracei meu pai biológico, tomando cuidado para não machucar
sua perna.
― Não há nada para perdoar. O senhor não está roubando o lugar do
meu pai, pois posso muito bem ter dois pais. ― Beijei seu rosto barbudo. ―
Fique bem, pois, assim que eu voltar, nós vamos marcar um almoço, você,
Lucky e eu. O que acha?
― Perfeito. ― Ele sorriu para mim e meu irmão, que assentiu. ― Seu
tratamento vai dar certo. Lamento por conhecer vocês nessa situação e não
poder fazer nada para ajudar.
― Precisamos ir, meu amor. ― Mamãe sorriu para meu pai biológico.
― Sou Alísia, a mãe dela.
― Prazer em conhecer vocês pessoalmente. Bryan mostrou as fotos das
famílias dos meus filhos, das pessoas que os amam e protegem. Fico feliz
por isso e nunca poderei agradecer-lhes o suficiente por tudo o que fizeram
para a minha filha. Infelizmente, não pude conhecer e abraçar a Laila.
― Não precisa agradecer. Ela é a melhor coisa que aconteceu na minha
vida e na do Antônio.
Fiquei de pé, preparando-me para ir ao quarto onde ficaria trancafiada.
― Antes de irmos, quero pedir a mão de Sophie a vocês dois, Joaquin
e Antônio ― ouvi Daniel falar atrás de mim. ― Sei que não é o momento,
mas, ao mesmo tempo, é. Não há nada que eu mais ame nesse mundo do que
ela.
Pisquei, chocada.
― Você o aprova? ― Joaquin olhou para meu pai de criação, que
respondeu:
― Sim, ele é como um filho para mim. Daniel merece minha filha,
porque não há ninguém que a ame mais do que ele. ― Sorriu para meu
namorado. ― Tem a minha benção, filho.
― A minha também ― disse Joaquin.
Daniel caiu de joelhos e me ofereceu um anel de ouro com uma pedra
em forma de meia-lua. Isso me fez ofegar.
― Eu poderia esperar para pedir que se case comigo depois de tudo
isso passar, como era previsto, mas, pelo visto, tenho que provar que vou
estar ao seu lado na dor, nas lutas, aqui, neste lugar ― olhou ao redor ―,
naquele leito onde você ficará... Não importa se seus cabelos vão cair ou
não, porque não ligo para isso. Vi a preocupação em seu rosto. Só quero que
saiba que para mim você é tudo, a razão de eu viver e o ar que respiro.
Coloquei a mão na boca. Ele continuou:
― Ficarei com você na doença, como neste momento, e também na
saúde, porque, após sair deste lugar, você estará boa, e eu me casarei com
você e terei uma família, uma com a qual sonho há anos. ― O amor brilhava
em seus olhos, e a emoção estava em sua voz. ― Prometo amá-la e respeitá-
la para sempre. Aceita se casar comigo?
Sorri em meio às lagrimas.
― Sim. Mil vezes sim.
Ele colocou o anel no meu dedo e o beijou.
― Te amo e vou te amar para sempre. ― Ele se levantou e beijou meus
lábios.
Nesse momento, não liguei de estar chorando de novo, porque era um
choro de felicidade, que parecia fazer meu peito transbordar.
― Também te amo ― declarei, pulando nos seus braços. ― Te amo
demais!
Em meio a todo o meu sofrimento, ganhei três presentes: a
compatibilidade da medula do meu irmão; a visita do meu pai biológico
antes da minha internação; e o pedido de casamento do Daniel.
Ouvi aplausos dos meus amigos e familiares e até de outras pessoas que
estavam naquela área do hospital.
No fundo, com Daniel ao meu lado, seria mais fácil passar por tudo até
que eu ficasse boa. Ele me daria as forças que eu não tinha para lutar e viver.
― Você é a Lua que ilumina minhas noites escuras, as estrelas que
brilham em minha vida e o Sol que clareia os meus caminhos. Com você ao
meu lado, Daniel, terei forças e passarei pelo vale das sombras. ― Beijei
sua boca, selando minha promessa.
Capítulo 20

DANIEL
Sophie entrou na sala branca onde cortaria os cabelos; ela decidiu que
faria isso ao invés de esperar que eles caíssem. A enfermeira iria ajudá-la.
Apesar da resolução, vi a forma como Sophie olhava para a tesoura e a
máquina de cortar cabelo na mesinha.
Eu queria poder fazer alguma coisa para que ela não passasse por isso,
mas, como não tinha jeito, eu seria a sua força, sua âncora, como disse antes.
Ignoraria meus medos e a dor em meu peito por vê-la sofrendo daquela
maneira.
― Sophie. ― Beijei sua testa. ― Não me importa se você terá cabelos
ou não, porque te amarei da mesma forma.
Ela me fitou com os olhos banhados em lágrimas.
― Mas...
― Me deixa te perguntar uma coisa: se eu ficasse careca agora, você
me acharia feio e me deixaria?
Ela piscou como se eu tivesse feito uma pergunta absurda.
― Não, jamais deixaria você por causa disso. ― Segurou minhas
roupas. ― Eu só...
― Eu sei. Quero que feche os olhos. Eu mesmo vou fazer isso ― avisei
à enfermeira, que me entregou a tesoura.
― Daniel...
― Vai ficar tudo bem, querida. ― Sentei-a na cadeira. ― Feche os
olhos se preferir, pois poderá ser mais fácil.
Ela assentiu, fazendo o que pedi. Pensei que, se visse os cabelos
caindo, seria pior. Tomei as mechas em minhas mãos e as cortei, deixando-
as cair ao chão, então liguei a máquina e a passei na sua cabeça, ouvindo-a
choramingar.
― Vão crescer de novo, querida ― garanti para tranquilizá-la. Assim
que terminei, tirei o pano que cobria sua roupa.
Peguei um lenço branco de dentro do bolso; tinha pedido para Sam
comprar um para mim. Nele, estavam escritas mensagens de nossos amigos.
Coloquei-o na cabeça de Sophie.
― Abra os olhos ― pedi com meu rosto perto do dela e a beijei de
leve. ― Ainda é a mulher mais linda do mundo.
Ela fez o que pedi e piscou ao ver o pano todo rabiscado de caneta em
sua cabeça.
― São mensagens dos nossos amigos. Nelas, eles estão dizendo que vai
dar tudo certo e que você vai se curar. ― Entreguei a máquina a ela. ―
Agora é sua vez.
Ela franziu a testa, ainda olhando o lenço pelo espelho.
― O quê?
― Sua vez de cortar o meu cabelo. ― Sorri, tirando-a da cadeira e me
sentando no lugar.
Ela piscou.
― O quê? ― Seus olhos foram para os meus cabelos. ― Não, Daniel,
não posso fazer isso...
― Ou você corta, ou pedirei à enfermeira ali fora ― falei decidido. Se
ela se sentia mal por estar sem cabelos, talvez, se eu também raspasse os
meus, seu incômodo amenizasse. Eu esperava que sim, porque não suportava
ver a dor em seus olhos enquanto observava seu reflexo. Preferia mil vezes
chorar a vê-la chorando e não choraria por causa dos meus cabelos, mas sim
por vê-la sofrendo.
Sophie olhou para a porta e fez uma careta linda. Quase ri ao imaginar a
loira lá fora tocando-me; não foi nem preciso ler sua expressão para eu
saber que era isso que ela pensava. Eu a conhecia e sabia quando ela ficava
com ciúmes.
― Vou cortar, mas não precisa fazer isso por mim ― sussurrou.
Sorri.
― Você faria o mesmo. ― Dei um selinho na ponta do seu nariz. ―
Além disso, nossos cabelos crescerão juntos.
Ela tentou me convencer do contrário dizendo que estava bem e que não
ia dar mais chilique sobre os cabelos, mas no fundo eu sabia que aquilo
ainda a estava ferindo, e eu suavizaria sua dor, ou tentaria, já que não podia
fazer nada mais.
Como não mudou minha resolução, Sophie raspou meus cabelos até
minha cabeça estar lisa como a sua. Fiquei de pé assim que terminou e sorri
para ela.
― Como estou? Feio?
Ela sorriu um pouco.
― Você nunca ficaria feio, Daniel ― declarou, abraçando-me forte. ―
Obrigada. Não sei como tive a sorte de ter um homem como você.
― Fui eu que tive sorte por você continuar me amando todos esses
anos. Posso soar egoísta, mas agradeço por não ter seguido com sua vida e
esperado por mim. ― Peguei sua mão e a puxei para fora da sala.
― Eu também. ― Olhou para a enfermeira, que me olhava com um
sorriso.
― Vejo que a ama muito ― disse a mulher. ― Sempre acompanho a
rotina dos acompanhantes dos internos, e alguns tomam a mesma atitude. —
Apontou para minha cabeça. — É uma demonstração de amor.
― Ele não precisava ter feito isso, porque sei o quanto me ama. ― O
tom de Sophie era cheio de fervor. ― Assim como eu o amo.
Entramos no corredor e fomos para o elevador, seguindo até o último
andar, onde tomamos outro corredor. Quanto mais andávamos, mais Sophie
ficava nervosa, até que parou de repente.
― O que foi? ― indaguei, avaliando o lugar para entender o motivo de
ela ter parado.
À nossa frente tinha uma garotinha de aproximadamente 12 anos. Usava
um vestido comprido e um lenço como Sophie, mas com estampa de
corações. Ao seu lado estava uma mulher com um lenço também, então
entendi o que a enfermeira disse sobre o que alguns acompanhantes faziam
pelos pacientes.
― Bailey? ― Sophie questionou e depois sorriu. ― Está tudo bem?
― Bem. O doutor falou que logo vou para casa. ― Sorriu para Sophie
e me olhou, avaliando minha cabeça careca. ― Minha mãe também raspou a
cabeça para ficar igual a mim.
― Isso quer dizer que ela te ama ― declarei. ― Assim como amo a
Sophie.
― Você é namorado dela? ― perguntou a garotinha, então arregalou os
olhos. ― Você é o Daniel Luxem? Não o reconheci a princípio por estar sem
cabelos, mas meu irmão é seu fã. Ele ama carros e diz que será um piloto
quando crescer.
Notei que aquela menina fofa gostava muito de conversar, ou tinha
ficado muito tempo sozinha de quarentena e estava aproveitando a
possibilidade de falar com outras pessoas.
― Fico contente com isso. Assim que sairmos daqui, marco um
encontro com vocês dois. O que acha?
A garotinha riu, impressionada.
― Ele vai amar isso! Vocês são namorados? ― Ela olhou entre nós
dois.
― Somos noivos. Ele acabou de me pedir em casamento. ― Sophie
levantou o anel para a menina.
Bailey arregalou os olhos.
― Tão lindo! É a Lua.
― Sim, Sophie é a minha Lua, o meu tudo ― declarei. ― Espero que
saia logo daqui e fique bem.
Bailey assentiu.
― Obrigada. ― Virou-se para Sophie. ― A quimioterapia vai ser
ruim. Dói muito, mas você vai conseguir. A mamãe disse que tudo ia ficar
bem e que era para eu ter forças, que, no futuro, eu seria modelo. É o meu
sonho.
― Modelo, hein? ― Avaliei sua mãe, que sorria.
― Se ela quiser, nós daremos o maior apoio ― disse a mulher. ― O
importante é ela ser feliz.
― Bom, se, quando completar 18 anos, ainda continuar com esse sonho,
me procure, que apresentarei você ao Ryan Donovan...
Parei de falar com os gritos da menina.
― Bailey, por favor ― repreendeu sua mãe, segurando a menina, que
parecia meio sem forças ou se recuperando ainda. ― Desculpe, mas ela é fã
desse cara e não perde nenhum desfile nas redes sociais.
― Jura? Pode me apresentar a ele? Posso conhecê-lo assim que você
vir meu irmão. ― Ela estava quicando de tão animada.
― Vamos, Bailey, nós precisamos ir para o quarto, e eles precisam
seguir para o deles ― falou a mulher.
Percebi que a garotinha não sairia dali enquanto eu não prometesse.
― Farei isso. Agora vá se cuidar para ficar boa e concretizar o sonho
de ser modelo no futuro.
― Obrigada. ― Virou-se para a Sophie. ― Você vai conseguir, assim
como eu.
― Vou, sim, tenho muitos motivos para viver. ― Sophie apertou minha
mão, dando ênfase ao que dizia.
Assim que a menina se foi com a mãe, eu me virei para a Sophie
enquanto caminhávamos para o quarto. Dona Alísia tinha ido à frente para
ajeitar algumas coisas no quarto para minha garota. Eu amava a minha sogra.
― Ela é muito fofa. Quando a conheceu?
― Ela ficou doente antes de mim. Em uma das minhas vindas ao
hospital, eu a conheci e, algum tempo atrás, soube que tinha conseguido
alguém compatível. Eu não tinha vindo visitá-la ainda porque ela, igual a
mim agora, não podia receber visitas. ― Sophie olhou para onde a menina
tinha ido. ― Fico feliz que ela tenha conseguido. Espero que se recupere
logo.
― Para você também vai ser assim. Sei que será doloroso e lamento
por isso, por não poder fazer nada, mas quero que saiba que vou estar do seu
lado sempre.
― Eu sei, Daniel. Você até raspou sua cabeça por mim. ― Sorriu um
pouco.
Ela suspirou assim que entramos no quarto, e notei o motivo: o cômodo
estava cheio de máquinas. Havia duas camas em um canto e cadeiras no
outro lado.
O doutor estava ali junto a uma enfermeira e, ao seu lado, dona Alísia.
― Pode ir se trocar no banheiro. Nós podemos esperar ― disse o
médico.
Sophie saiu com a dona Alísia, enquanto eu esperei para falar com o
doutor.
― Quantas sessões de quimioterapia ela vai precisar? ― inquiri. Sabia
que os efeitos eram devastadores e muito dolorosos para o paciente.
― Depende de como ela reagir. O tratamento é basicamente matar a sua
medula antiga e preparar o corpo para receber a nova para que ela possa
crescer e se desenvolver dentro do corpo dela, sem rejeição e com a
produção de todas as células sanguíneas normalmente.
― Vai ser ruim, doutor? ― Conversava baixinho para que Sophie não
ouvisse do banheiro.
― Ela vai sentir muito mais do que sentiu até agora, pois as células
precisam morrer, e isso poderá fazer seu corpo dar sinais de colapso.
Encolhi-me, mas logo me recuperei assim que Sophie saiu do banheiro
vestida com uma bata azul.
― Você escolhe se quer ficar na cadeira ou deitada na cama. ―
Gesticulou o médico.
Sophie assentiu. Vi que ela estava nervosa a ponto de suas mãos
estarem em punhos. Fui até ela e segurei seu ombro, dando-lhe forças.
― Cadeira por enquanto. ― Sentou-se e expirou. ― Me sinto como se
estivesse entrando em um consultório de dentista.
Ri para romper a tensão.
― Isso porque você tem medo de dentista, daquela maquininha que faz
barulho.
Enquanto eu falava com ela, o doutor e a enfermeira colocavam uma
agulha e um cateter no seu braço esquerdo.
Sentei-me na cadeira ao seu lado, segurando sua mão direita.
― Como os dois vão ficar aqui, arrumei o quarto ao lado; assim vocês
dois poderão se revezar se quiserem.
Sacudi a cabeça.
― Não saio daqui. Se estiver cansado, me deito nessa cama. ―
Apontei para a cama que não era cercada de aparelhos. ― Vou ficar bem. A
dona Ally pode ficar com o outro quarto.
Por nada eu sairia do lado de Sophie. Vi que ela queria retrucar, mas
senti que pareceu aliviada. Minha garota se mostrava forte, mas no fundo
estava com medo de ficar sozinha.

Algumas semanas depois e com as sessões de quimioterapia, vi os


efeitos em Sophie, na forma como estava ora tão pálida, ora com uma
coloração amarelada ocre. Os olhos da minha garota ficaram amarelados
também, isso sem contar a fraqueza ao extremo, a ponto de não conseguir se
levantar da cama.
Eu sabia que o objetivo do tratamento era que o paciente chegasse ao
fundo do poço, mas doía demais vê-la daquela forma. Mantinha-me firme
enquanto ela estava acordada, mas chorava como criança quando dormia. O
que mais doía era a impotência, vê-la naquele estado sem poder fazer nada,
não poder tirá-la de lá ou ao menos ocupar seu lugar. Teria feito isso sem
pensar duas vezes.
― Daniel, você precisa dormir um pouco ― disse Sophie com a voz
fraca.
No dia anterior, os médicos fizeram uma bateria de exames para saber
como ela estava reagindo ao tratamento. Estávamos torcendo para que
cortassem a quimio e fizessem logo o transplante.
Sorri, escondendo a preocupação.
― Estou bem...
Ela me cortou, sacudindo a cabeça, mas foi apenas um movimento
fraco:
― Daniel, os seus olhos estão fundos por não dormir direito ―
sussurrou.
Mal preguei os olhos desde que ela se internou; minhas noites eram só
de cochilos. Até a dona Alísia me pediu para dormir, mas, sempre que eu o
fazia, acordava com Sophie tendo enjoos e outros sintomas que a deixavam
mal, então eu não dormia de novo.
― Sei o que está fazendo, mas você precisa parar com isso ―
repreendeu-me.
― O quê? Não estou fazendo nada, só não quero dormir agora.
― Você está se martirizando como se quisesse sofrer. Como não pode
fazer nada por mim, fica sem dormir e até sem comer. Olha para você,
perdeu peso. ― Seu tom era triste. ― Sei que cortou o seu cabelo por mim,
até aceito isso, mas as outras coisas, não. Por favor, não faça isso.
Algumas das coisas que eu amava em Sophie eram a sua inteligência e
o fato de ela ser observadora. Sabia que minha garota tinha razão. A perda
de peso era porque eu não conseguia comer nada. Se me esforçasse,
conseguiria, mas por que faria isso se ela mal podia comer? Sophie perdeu
muito peso durante aquelas semanas; ela já estava magra quando a
reencontrei, mas, com o tratamento, ficou muito mais, tanto que doía em mim
vê-la assim. Já a falta de sono não era para eu sofrer como ela. Eu só não
conseguia pregar os olhos depois de vê-la passar mal. Tinha medo de fechar
os olhos e... não. Eu não podia pensar nisso.
― Vou ficar bem, Sophie. Prometo que vou dormir e comer. ― Não
queria que ela se estressasse com mais nada. Se, para isso, eu tivesse que
dormir e comer, mesmo não querendo, faria.
Ela deu um pequeno sorriso moribundo.
― Obrigada. Quero você sadio para quando sairmos daqui. Ou com
quem vou me casar? ― Deu um aperto leve em minhas mãos. ― Agora vá
descansar um pouco. Minha mãe fica comigo.
Eu poderia retrucar e insistir, mas isso iria estressá-la, o que não seria
bom para sua recuperação.
― Fico com ela, Daniel ― disse dona Ally, entrando no quarto. ―
Quero um tempo a sós com a minha filha.
De repente, eu me senti egoísta, pois só pensava em mim e na minha
dor. A dona Ally também amava a Sophie e estava sofrendo por ela estar
naquela situação. Como eu ficava com minha menina direto, a sua mãe quase
não ficava ali. Ela também precisava de um tempo a sós com Sophie, assim
como eu. Nós dois a amávamos e só queríamos seu bem. Então, por mais que
doesse ficar um segundo longe da minha garota, eu faria isso. Queria seu
bem, não só dela, mas da minha sogra também.
Seria essa a sensação que Ryan teve ao ver Angelina acamada? Quando
teve sua filha, Victoria, Angelina quase morreu, já que não podia ter filhos
por causa da sua cardiopatia. Um descuido, e ela engravidou. Não querendo
tirar o bebê, decidiu ter a criança mesmo arriscando a vida deles. Isso
destruiu o meu amigo, ele foi ao fundo do poço.
A dor de ver Sophie sofrer e definhar era demais, mas, como prometi,
eu tinha que ser sua âncora. Seria forte para ela se apoiar em mim, e não o
contrário.
― Vou fazer isso. ― Fiquei de pé e dei um beijo de leve na sua testa.
― Te amo demais.
― Também te amo. Agora vá dormir um pouco. ― Sorriu de leve. ―
Ainda estarei aqui quando chegar.
Sair daquele quarto foi mais difícil do que pensei que seria; minhas
mãos suavam, meu coração gelava por dentro temendo o pior. Eu não podia
ficar com aquele medo.
Tomei banho e me deitei um pouco na cama do quarto ao lado, tentando
dormir, mas não consegui. Então me levantei e comi algo mesmo sem fome.
Não obstante, como eu tinha feito uma promessa, não poderia ir para o
quarto dela ainda, ou Sophie saberia que não dormi. Decidi visitar a
garotinha, que eu não via havia semanas. Fazendo companhia à Sophie,
fiquei alheio a tudo ao meu redor, pois só ela me importava.
Entrei no quarto onde a vi entrando quando Sophie e eu chegamos ali.
Não fazia ideia se a garotinha já tinha recebido alta ou não; torcia para que
sim.
O quarto era quase igual ao da Sophie, mas com menos aparelhos.
Contudo, não vi a menina, e sim um homem adulto, mais ou menos da minha
idade.
― Desculpe, eu achei que esse quarto fosse de uma garotinha chamada
Bailey ― apressei-me em explicar assim que entrei no local.
O cara estava sem cabelos e muito magro. No canto, uma mulher dormia
em um sofá.
― Falo para ela ir para o quarto, mas minha mãe não vai ― disse ele.
― Sou Tony. Você também está doente? Essa doença acaba com a gente.
Meneei a cabeça para os lados.
― Não, só estou aqui acompanhando a minha noiva, que tem anemia
aplástica. Ela está fazendo quimioterapia... ― Minha voz falhou.
Ele assentiu.
― Nossa! Aquilo é terrível. Eu achei que morreria por causa da dor e
daqueles sintomas todos. ― Encolheu-se, assim como eu. ― Depois do
transplante, piora um pouco, mas melhora com o tempo. Estou melhor agora.
― Que bom! A minha garota é forte e guerreira, então sei que vai
conseguir passar por isso ― declarei firme.
Ele me contou que corria bastante, mas de repente começou a sentir
muita fadiga, até que procurou o médico.
― Foram meses esperando um transplante, até que meu irmão doou a
sua medula. Ele estava no exército e teve que vir para fazer os exames. Mas
não são todos que têm essa sorte.
― Minha noiva vai receber do irmão dela também ― comentei.
― Com parentes do mesmo sangue é mais fácil de o corpo não rejeitar
a medula nova. Assim o médico disse. ― Suspirou. ― Foi o que houve com
a garotinha que estava aqui antes de mim. Ela recebeu de alguém de fora da
família. Teria dado certo se ela não sofresse do coração. Teve uma parada
cardíaca e morreu.
Arfei, pensando na garotinha sorridente que era fã do Ryan. A dor que
deveria estar assolando a sua família... E se algo assim acontecesse com a
Sophie? Eu não podia perdê-la...
Despedi-me de Tony e corri para o quarto em que eu deveria estar
dormindo. Porém, como eu conseguiria fazer isso com tudo o que estava
acontecendo?
Caí de joelhos no chão daquele cômodo e, pela primeira vez na minha
vida, rezei para um Deus que estava vivo no Céu, pedindo que Ele salvasse
a Sophie, que a livrasse daquela quimioterapia e que o transplante desse
certo, sem complicações. Não me incomodei de chorar como um garoto
assustado. Só queria que Ele a salvasse.
Não sei quanto tempo fiquei ali, suplicando pela cura da minha garota.
Minha cabeça estava tão confusa, meus sentimentos estavam a mil por hora.
O que eu podia fazer era confiar que tudo daria certo.
Esperei dar a hora para voltar para o quarto com a Sophie; sabia que
não tinha conseguido dormir como ela me pediu, mas não podia fazer isso
longe dela. A distância me deixava pior do que eu já estava, e o medo do
que aconteceu com a Bailey me assolava como se fosse acontecer com a
Sophie...
Assim que abri a porta do quarto, vi o médico e uma enfermeira.
Parecia que eu tinha feito um barulho alto ao entrar, pois todos me fitaram de
olhos arregalados. Levou um segundo para que eu notasse que tinha gritado.
Logo senti um grande alívio ao ver Sophie ali
Ignorei a todos e corri para ela, deitada na cama e me avaliando.
― Você está bem? Não parece que dormiu ― acusou.
Forcei-me a controlar meus sentimentos de medo e tormento.
― Só tive um pesadelo. ― Achei melhor dizer isso a lhe contar sobre a
garotinha. Não queria que ela soubesse que não tinha sobrevivido, pois a
notícia poderia prejudicar a sua recuperação.
Olhei para o médico.
― O que está acontecendo? ― Avaliei cada um deles e depois me virei
para a minha garota. ― Sophie, você está bem?
― Os exames que ela fez mostraram êxito. Já vamos nos preparar para
o transplante. O irmão dela já foi para a sala onde será feito o procedimento
― informou o médico.
Pisquei.
― Graças a Deus! Ele ouviu as minhas preces! ― exclamei, inspirando
fundo.
O queixo de Sophie caiu.
― Você rezou?
Sorri.
― Sim, e parece que o Cara Lá de Cima respondeu às minhas orações.
Vou agradecer-lhe para sempre. ― Toquei seu rosto.
― Senti sua falta. ― Pressionou minha palma em sua face.
― Também senti. ― Ela nem fazia ideia do que senti ao estar longe
dela.
― A enfermeira Neide vai preparar você, Sophie ― falou o doutor. ―
Vai dar tudo certo.
― Sim, vai ― afirmei e me inclinei para beijar seus lábios de leve. ―
Logo vamos para casa. Para nos casarmos.
― Podemos nos casar em uma ilha. O que acha? ― Sorriu mais
animada.
Para ela sorrir daquele jeito, eu faria qualquer coisa.
― Será onde você quiser. ― Pouco depois da internação, pedi por
telefone ao Luigi e à Samantha e às meninas que preparassem tudo para mim.
Era uma surpresa para Sophie. A cerimônia seria numa ilha no Caribe que
não fazia muito tempo que eu tinha comprado. Custou-me uma pequena
fortuna, mas valia a pena cada centavo pago. Por aquela mulher, eu faria
tudo.
Capítulo 21

DANIEL
Lucky doou a sua medula para a minha garota, que a recebeu em forma
de transfusão. Ela já se encontrava no quarto, dormindo. Eu torcia para que
funcionasse e que Sophie não ficasse pior do que quando estava fazendo a
quimioterapia. Ao menos o doutor disse que havia uma chance grande de a
medula fluir e não ser rejeitada, porque a compatibilidade deles era grande.
Isso me deixou mais aliviado.
― Vai dar tudo certo. Sei que esse processo é difícil, mas a quimio foi
mais. ― Dona Ally estremeceu.
― Sabe do Lucky? ― perguntei, pois não o tinha visto. Não queria sair
do lado da Sophie, como quando ela me obrigou. Foi difícil deixá-la naquele
dia.
― Se recuperando bem. Ele quer vir aqui, mas ainda está se
restabelecendo. ― Meu amigo estava em uma sala de recuperação no
terceiro andar do prédio. Dona Ally suspirou. ― Aquele garoto adora a
minha menina.
― Quem não adora? ― Um segundo com Sophie, e todos passavam a
amá-la. Com o irmão dela não seria diferente.
Quando eu poderia imaginar que meu amigo era irmão da menina que eu
amava e conhecia desde a infância? Se eu ao menos sonhasse, teria feito os
dois se encontrarem antes de tudo aquilo. Ainda bem que a verdade foi
descoberta a tempo de o irmão dela poder salvar sua vida.
― Verdade. ― Dona Ally sorriu. ― Desde criança foi assim. Onde
Sophie estava, iluminava o lugar.
― Às vezes eu penso que poderia ter ido atrás da sua família; poderia
ter tentado encontrar algum deles. Acho que não fiz muito por ela ―
sussurrei, segurando a mão da minha garota.
Foi preciso o seu amigo ir à procura deles. Ela poderia ter conhecido
Lucky antes de tudo aquilo acontecer. Talvez até tivesse encontrado a Laila
também. Todavia, era tarde demais.
Dona Alísia arfou.
― Não fez o suficiente, Daniel? ― Sacudiu a cabeça. ― Querido, você
fez tanto por ela, por nós... Olha o que sofreu para nos proteger... para
protegê-la. Aquele acidente em que quase a perdemos... Ainda custo a
acreditar que seu pai foi capaz disso. Se eu soubesse, teria ido até ele buscar
uma justificativa. ― Ela se aproximou de mim e tocou meu ombro. ― Não
pense nisso, filho, porque você fez mais do que podia. ― Ela olhou para sua
filha adormecida. ― Agora, com esse transplante, creio em Deus que tudo
dará certo. Nossa menina vai ficar boa.
― Vou dever ao Lucky para sempre por salvá-la. ― Respirei fundo.
Não queria pensar no que podia ter acontecido se ele não fosse
compatível ou se ela não o tivesse encontrado... Não gostava de imaginar a
ideia de perdê-la, nem de nunca mais vê-la. Vivendo aqueles dias ali,
naquele quarto hospitalar, e vendo-a moribunda sem poder fazer nada, eu
soube que não podia viver sem ela. Se a perdesse... não... isso não
aconteceria! Sophie ficaria bem, e nos casaríamos em uma ilha, como ela
sugeriu. Minha menina sempre foi apaixonada por ilhas desde que éramos
jovens.
― Não vamos pensar no pior, sim? Agora ela está indo bem e vai
continuar assim, porque Sophie é uma mulher muito forte, capaz de lutar para
não perder quem ama, ou seja, nós. ― Ela apertou meu ombro.
― Sim ― concordei. ― Não há ninguém mais forte do que ela.
― Isso é verdade ― assentiu dona Alísia.
Toquei o anel de noivado no dedo de Sophie como se fosse para
comprovar que, finalmente, ela era minha.
― Sophie foi para a faculdade para cursar medicina, mas então o
Antônio se machucou e precisava fazer fisioterapia. Nosso convênio não
cobria muito na época. Minha filha deixou a Universidade do Alabama,
voltou para Dallas e mudou seu curso para fisioterapia, tudo para ajudar o
pai. Olha que insisti que não fizesse isso, mas não teve jeito. ― Dona Ally
suspirou.
― Ela é muito teimosa ― comentei.
― Sim. Ela esteve em alguns relacionamentos, mas nunca deram certo.
O mais longo foi com o Neil, há poucos anos. Acho que queria tentar seguir
em frente, mas no fundo nunca conseguiu, tanto que não trouxe nenhum deles
para os conhecermos. Embora tenha ficado um ano com o Neil, ela nunca o
amou. Acredito que por isso terminaram. ― Seu olhar se fixou em mim. ―
No fundo, sei que ela não seguiu em frente com ele ou com qualquer outro
porque ainda amava você. Mesmo depois de todos esses anos, ela não o
esqueceu. Acho que foi por isso que fez aquela tatuagem. ― Dona Alísia
apontou para o peito de Sophie. ― Alma gêmea. Sophie sabe que você é
isso para ela.
Assenti a tudo o que ouvi. Pensar nela com outros homens não era bom,
sofri bastante na época, mas no momento só queria seguir em frente ao lado
daquela mulher e me esquecer do seu passado e do meu após deixá-la.
― Ela não falou o motivo de ter feito essa tatuagem, mas tenho certeza
de que foi por você ― continuou dona Ally.
Passei a mão na minha cabeça, onde estavam nascendo alguns fios de
cabelo.
― Eu lhe dizia que ela era minha alma gêmea, o Sol, a Lua e as
estrelas. ― O meu coração se apertava forte no peito. ― Sophie é tudo isso
e muito mais. ― Às vezes, eu pensava que não a merecia, mas era incapaz
de ficar longe dela.
― Isso é bom, porque eu não saberia viver sem a minha alma. ―
Sophie abriu os olhos e me encarou. Parecia cansada; os medicamentos
contra rejeição a estavam deixando baqueada, embora a quimio parecesse
deixá-la pior. Sabia que ainda haveria um processo longo a percorrer, e eu
estaria ali para ela.
― Você está bem? ― Sabia que era uma pergunta idiota.
― Estou ― ela sussurrou. ― Como está o Lucky? Deve estar passando
mal.
― Não o vi ainda, mas ouvi dizer que está se recuperando. Ele está no
terceiro andar deste prédio. ― Toquei seu rosto.
― Não o queria doente. Disseram que o doador fica com dor de cabeça
e outros sintomas péssimos ― falou baixinho.
― Ele está bem. Agora você só precisa se recuperar, porque ele vai
querer isso. Logo o seu irmão virá para ver você. ― Eu não gostava de vê-la
se sentindo culpada e triste.
Sophie me deu um pequeno sorriso.
― Sei que está dizendo isso para ameninar a minha culpa ― revelou e
virou a cabeça para a sua mãe. ― Não chore, mamãe, eu vou ficar bem.
― Só tenho a agradecer a Deus por isso. Agora você ficará conosco
por um longo tempo. ― Dona Alísia beijou a sua testa. ― Te amo muito,
querida.
― Também te amo, mamãe. ― Depois me olhou. ― Por favor, procure
Lucky e veja como ele está.
Sacudi a cabeça.
― Não vou deixar você...
― Estou bem ― interrompeu-me. ― Daniel, vá lá por mim, por favor.
Eu desejava negar o seu pedido, mas não queria estressá-la. Além
disso, Lucky estava no mesmo prédio, então levaria apenas alguns minutos.
Logo eu voltaria para ela.
― Enquanto você vai lá, eu vou dormir um pouco. ― Logo estava
dormindo de novo.
Fiquei contente em vê-la descansar, porque, com a quimioterapia, ela
quase não dormia, acordava praticamente todas as noites. Eu tinha
consciência de que logo os efeitos do transplante surgiriam e que eles seriam
bem fortes. Queria estar ali para ela.

Dona Alísia ficou com a Sophie enquanto eu visitava o Lucky; não


queria deixá-la, mas não negaria o seu pedido. Também prometi ao Lucky
que o manteria informado sobre a irmã.
Entrei no quarto e o vi deitado de lado na cama. Pelo que eu soube,
tiraram a medula de algum lugar das costas dele.
― Como está indo, cara? ― Sentei-me na cadeira ao lado da cama. ―
Cadê a Sam ou o seu pai?
― Estou bem. A Rosa Vermelha foi comer alguma coisa, e acho que
meu pai foi falar com o médico. ― Lucky fez uma careta. ― A cada hora,
ele vai falar com o doutor para saber sobre mim e Sophie. ― Sua voz tinha
um tom quase orgulhoso. ― Não sei o que sinto com tanta proteção paternal.
Só tive isso quando Miguel e Laura eram vivos, e já faz anos.
― Isso é coisa de pai e mãe. Minha sogra vai procurar o doutor a cada
hora também, buscando informação sobre a Sophie. Também faço isso.
― Ela sempre nos liga para informar do estado da filha. Fiquei
sabendo que o processo da quimioterapia foi terrível e me matou não estar
lá. ― Encolheu-se.
― Foi bom; quanto menos gente para vê-la naquela situação, melhor.
Sophie só se sentiria pior. ― Estremeci. ― A impotência é uma merda. Teve
uma garotinha que estava internada aqui e morreu. Sophie a conhecia. Isso
me deu o maior medo.
Lucky arregalou os olhos.
― Ela sabe?
― Não, achei melhor não lhe contar nada, porque poderia estressá-la e,
nesse momento, não quero fazer isso. É por esse motivo que estou aqui e não
ao lado dela.
― Como assim?
― Sophie me pediu para vir vê-lo e saber se está bem. ― Sacudi a
cabeça. ― Mesmo na situação em que está, ela ainda se preocupa com os
outros.
― Sim. Quando voltar, diga que amanhã irei vê-la se o médico liberar
a visitação. ― Ele suspirou. ― Disseram que o processo após o transplante
piora um pouco...
Estremeci por dentro pensando no quanto minha garota ainda sofreria.
Se eu pudesse ao menos amenizar sua dor...
― E então? Como anda a sua relação com o Joaquin? Ouvi você
chamando-o de pai.
Lucky sorriu um pouco.
― O velho é gente boa e odeia a Mary tanto quanto eu. Ele irá depor
contra ela por ter deixado os filhos em situações que quase os mataram.
Acho que ela não verá a luz do sol nunca mais. ― A raiva estava na sua voz
ao falar da mãe.
― Se eu visse essa mulher na minha frente, faria uma besteira. ―
Sacudi a cabeça. ― Dona Alísia não tem seu sangue, mas ama a Sophie
como sua. A mulher não saiu do lado dela desde que minha menina foi
internada aqui, enquanto a outra só queria grana.
― Juro que nunca quis machucar uma mulher como quero fazer com
essa. Se eu não tivesse tanto a perder, a mataria. Mas o que tenho é valoroso
demais, e todo esse ódio não vale a pena. ― Expirou. ― Sophie, Sam e
Shaw são tudo na minha vida, assim como minha filha e o outro que virá.
Sorri.
― Sam está grávida de novo? Meus parabéns, cara.
― Obrigado. Eles são tudo na minha vida. Então o que farei é esquecer
que essa mulher alguma vez existiu.
― E quando pretende contar a verdade para o Shaw?
― Estava falando com a Rosa Vermelha agora há pouco sobre isso.
Assim que Sophie receber alta, nós diremos tudo a ele, porque sei que,
assim que souber que somos seus tios, Shaw vai querer ir até Sophie, ainda
mais se falarmos que elas eram gêmeas.
Certamente o garoto pensaria que estaria vendo coisas ao conhecer a
Sophie e constatar que sua mãe era a cara dela. Seria difícil de assimilar.
― Ele já vai fazer 11 anos, talvez possa lidar com a situação, mas
talvez não, devido ao que já passou. Pararam para pensar que talvez ele
queira viver com a Sophie quando a vir? ― questionei. ― Na mente de uma
criança, talvez isso possa ser o mais próximo de ter a sua mãe de volta.
Uma sombra cruzou o rosto do meu amigo.
― Eu e Sam conversamos sobre a possibilidade. Ela não demonstra,
mas sei que esse é o seu maior medo. Se Shaw decidir ir embora, vai
destruir a minha mulher. ― Ele respirou fundo. ― Espero que, no final, o
amor de Shaw por nós seja suficiente para mantê-lo ao nosso lado. Não
gosto nem de pensar em ver a Rosa Vermelha sofrendo.
― Se ele quiser ficar conosco, saiba que tomaremos conta dele, mas
farei o que puder para fazer com que ele entenda que vocês dois são os pais
dele, afinal ele pode ter a Sophie e vocês ao mesmo tempo. ― Fiquei de pé;
estava ansioso para voltar para a minha garota.
Lucky olhou para mim com gratidão.
― Lhe agradeço, mas, com Shaw, temos que ter cuidado com o que
dizemos.
― Não se preocupe, eu não direi nada que faça com que ele tenha
alguma lembrança ruim ― tranquilizei-o.
― Valeu, cara. ― Ele apontou para a porta. ― Agora vá para a minha
irmã, pois sei que está ansioso para estar com ela neste momento. Eu também
queria estar com ela.
― Eu vou, mas antes quero lhe agradecer por salvá-la. ― Peguei sua
mão e a apertei.
― Estou feliz por ter feito isso. Queria ter feito algo por Laila também.
― Ele respirou fundo.
― Não se culpe por isso. ― Forcei um sorriso. ― Agora me deixe ir.
Ficar longe dela me deixa nervoso e temeroso. Não quero que ela acorde e
não me veja lá.
Despedi-me de Lucky e saí do quarto, mas, quando passei pela sala de
espera, vi o Shaw ao lado da Sam. O garoto estava crescido; no começo, ele
não falava, mas, pelo que eu soube, já não era de falar muito antes da
tragédia com sua mãe. Com a ajuda de Sam, ele estava se comunicando
melhor, embora não muito.
― Como vai, Shaw? ― Levantei o punho cerrado e o choquei contra o
seu quando ele me imitou.
― Bem, mas o Lucky se machucou ― sussurrou.
Ninguém devia ter-lhe contado sobre o fato de Lucky ter doado a
medula; provavelmente estavam esperando para contar tudo de uma vez.
Olhei para a Sam e vi que era isso.
― Lucky é cavalo velho, nada o derruba ― brinquei, embora fosse
verdade; meu amigo tinha passado por muita coisa quando criança.
Ele sorriu.
― Lucky é forte, sim, vai se recuperar logo e me ensinar a lutar. ―
Notei que estava ansioso por isso.
― Lutar é bom, porque deixa você musculoso para as meninas. ―
Pisquei. ― Vá ver como ele está.
Shaw assentiu e seguiu em direção à porta do quarto. Percebi que era
hora de visitação para os doadores, mas não para quem recebeu transplante,
em razão da baixa imunidade. Uma enfermeira me disse que, assim que
melhoravam, os pacientes eram transferidos para o andar de baixo, onde
podiam receber visitas. Eu não via a hora de Sophie ir para lá.
― Obrigada por não dizer nada ao meu filho ― Sam agradeceu.
― O assunto não é meu para falar, mas seu e de Lucky. Seja como for,
eu estarei aqui se precisarem de mim. ― Dei um tapinha em seu ombro. ―
Agora preciso ver a minha garota, mas, antes, quero lhe agradecer por ter me
ajudado a preparar tudo para o casamento.
Ela sorriu.
― Sophie sabe?
― Será surpresa.
― Como não sabemos quando ela vai sair, não corri atrás do bufê, mas,
assim que você souber, é só me dizer, que ajeito isso rapidamente.
― Obrigado.
Estava ansioso para me casar com a Sophie, porque significaria que ela
seria minha para sempre. Passaríamos dificuldades, mas no final
venceríamos. Minha linda garota conseguiria, e eu seria seu suporte. Como
ela me disse uma vez: eu era o seu porto seguro, assim como ela era o meu.
Capítulo 22

SOPHIE
Cinco meses depois

Os últimos meses foram difíceis de superar. Depois do transplante,


sofri com os sintomas, mas o pior era ver Daniel sofrendo; ele tentava
esconder, mas eu notava.
Eram meses que eu desejava esquecer, pois não queria me lembrar da
dor. Felizmente o meu corpo não rejeitou a medula. Depois do transplante,
precisei ficar mais uns dias internada para que a medula se estabelecesse e
eu finalmente pudesse sair do hospital.
Ainda me recordo do rosto de todos da minha família e meus amigos no
saguão do hospital; todos me aplaudiram por eu ter vencido aquela luta,
mesmo perdendo quase 15 kg.
Estar ao redor de todos que eu amava me deixava feliz. Foi gratificante
rever a luz do sol e sentir o vento no meu rosto. Não há nada que nos faça
valorizar o que temos como os momentos de aflição. Eu não tinha o direito
de reclamar. Muitas pessoas não conseguiram obter o mesmo êxito que eu.
Nas minhas idas ao hospital para novos exames, conheci algumas pessoas
transplantadas. Procurei Bailey, e foi quando o Daniel me contou que
infelizmente a garotinha não havia conseguido. Nesse dia, chorei bastante
nos braços dele. Ela era tão cheia de vida, mas não sobreviveu.
Conversei com outros pacientes lá e ficamos de manter contato. Era
bom conversar com quem tinha passado pela mesma luta que eu.
Tive de evitar sair de casa nos três primeiros meses após o transplante,
inclusive precisei ficar perto do hospital para fazer os exames de rotina. Foi
bom o fato de o apartamento de Daniel não ficar longe; já o meu, era do
outro lado da cidade. Assim que eu pudesse, andaria por todos os lugares.
Dentro de cinco meses, eu estaria livre dos remédios e poderia fazer o que
quisesse, como visitar meus amigos no hospital.
Durante os primeiros cinco meses, tentei recuperar o peso perdido, mas
consegui engordar apenas 10 kg. Com as dietas que tive de fazer devido aos
remédios, era quase impossível engordar, mas consegui. No final das contas,
acabei gostando do meu peso atual.
Nesse meio tempo, o meu pai biológico foi ficar comigo por um tempo.
Ele cozinhava que era uma beleza. Acredito que por isso ganhei peso tão
rápido. Essa era sua meta, assim disse ele. Meus pais também ficaram um
tempo comigo, mas estavam no meu apartamento. Daniel disse que tinha
mandado construir uma casa e que eles poderiam ficar lá; não era longe do
apartamento. Minha mãe o abraçou e o beijou, dizendo que ele era o homem
mais perfeito do mundo, além do meu pai Antônio, claro. Nunca estive mais
realizada do que com a minha família.
Lucky ia me visitar direto. Não havia um dia em que ele não fosse até lá
para perguntar como eu me sentia. E eu o amava por isso, por sua bondade.
Nós dois e nosso pai fomos visitar o túmulo da Laila. O lugar em que ela foi
enterrada estava abandonado, porém o arrumamos, porque agora ela tinha
uma família, não era uma indigente, tinha quem se importasse com ela. Nesse
dia, chorei nos braços do meu irmão e do meu pai, que também estavam
emocionados.
Só faltava uma coisa para minha felicidade estar completa, e era por
isso que eu estava nervosa enquanto me aproximava da casa de Lucky.
― Você está preparada? ― sondou Daniel ao meu lado.
Nos últimos meses, ele também tinha voltado ao seu peso; perdeu
bastante, pois mal comia ou dormia. Eu até insistia para que ele fosse
embora, mas não arredou o pé do meu lado até que eu saísse daquele
hospital. Como não amar um homem desses?
Seus cabelos tinham crescido, estavam iguais a antes. Os meus também
cresceram, mas ainda estavam curtos. Eu quis ficar melhor e com aparência
mais normal para poder conversar com o Shaw. Lucky e Sam já haviam
contado a ele sobre mim. Meu garoto ficou louco para me conhecer.
― Estou nervosa com a possível reação dele ― admiti com um
suspiro.
― O Lucky disse que ele aceitou bem a ideia de vê-lo como tio e não
pai. Disse que até ficou feliz. Mas você...
Assenti.
― Comigo é mais complicado, já que me pareço tanto com a Laila ―
terminei a frase por ele.
― Sim, eu sei, mas vai dar certo. ― Ele segurou minha mão quando
estávamos no elevador do prédio do Lucky.
Eu estava louca para conhecer o filho da minha irmã pessoalmente. Sam
me enviava fotos e vídeos dele brincando com a Lana.
O elevador parecia demorar séculos para subir, tudo graças ao meu
nervosismo e ansiedade. Minhas mãos suavam frio.
― Sophie, fique tranquila, vai dar tudo certo, querida ― pediu Daniel.
Assenti e tentei controlar os meus batimentos cardíacos. Um segundo
depois, as portas se abriram para a imensa sala de meu irmão. Lucky tinha
nos dado o código para a cobertura. Soube que estavam construindo uma
casa, pois Sam queria espaço para as crianças brincarem e correrem no
quintal.
Daniel já tinha uma casa construída também, embora eu ainda não a
tivesse conhecido, mas mamãe disse que se parecia com aquelas de contos
de fadas. Eu até quis ir até lá, mas Daniel falou que estava arrumando tudo
para me fazer uma surpresa. Ele sempre gostou de fazer isso.
Ele ficou ao meu lado nos momentos mais sombrios; ajudou-me a ter
forças; mostrou-me o tanto que me amava e me adorava. Agora estava ali,
dando-me forças para enfrentar o Shaw, um garotinho de 11 anos.
Shaw estava no sofá olhando para suas mãos. Parecia tão nervoso e
ansioso quanto eu. Seus olhos focaram em mim e Daniel. Juro que ficaram
enormes como os de uma corsa ante os faróis de um carro.
Parei onde estava, não muito longe dele. Ficamos nos encarando,
enquanto eu queria abraçá-lo e torcia para que ele entendesse quem eu era.
― Shaw, querido, essa é a Sophie, irmã gêmea da sua mãe ― disse
Sam. ― Sei que ela se parece com...
― Mamãe... ― Ele ficou de pé sem tirar sua atenção de mim, como se
tivesse medo de que eu desaparecesse como mágica. Não entendi se ele
terminou a frase da Samantha ou se me chamou de mãe. Torcia para que
fosse a primeira hipótese, ou isso destruiria a Sam.
Forcei um sorriso para aliviar a tensão na casa.
― Sou a Sophie. ― Dei um passo à frente, mas ele correu para os meus
braços e me abraçou forte, chorando e me fazendo arfar com o impacto.
Sam estava com os olhos marejados, e lhes pedi com o olhar que me
deixassem sozinha com o Shaw. Os três foram para a cozinha, e fiquei
apenas com aquele menininho, que parecia estar confuso e feliz ao mesmo
tempo. Sabia que era muita coisa para sua cabecinha; uma criança normal até
poderia aceitar melhor o fato, mas Shaw tinha presenciado coisas horríveis
que eu jamais queria que tivesse visto. A perda da sua mãe o abalou
bastante.
Percebi que foi difícil para a Samantha ver o filho chorando e, mesmo
assim, deixá-lo ali comigo. Deixei que Shaw chorasse até se acalmar.
― Está melhor, querido? ― Alisei seus cabelos no intuito de
tranquilizá-lo e tentar clarear sua mente confusa.
Ele sacudiu sua cabeça com um sim. Eu sabia que ele não era de falar
muito, só com a Sam e o Lucky, embora conversasse com os amigos do meu
irmão também. Ele só precisava conhecer as pessoas para se abrir. Era
naturalmente um garoto tímido, além de não confiar em ninguém. O amor de
Sam e as sessões de terapia que ele fazia com ela o estavam ajudando a se
abrir.
Eu sabia desse tipo de coisa porque frequentei psicólogos e uma
espécie de fraternidade para pessoas com doenças como a minha.
Precisávamos de esperança, ou enlouqueceríamos. Aprendi muitas coisas lá
e tentaria colocá-las em prática.
― Pode me mostrar o seu quarto? ― Tentei outro meio para fazê-lo
conversar comigo.
Conhecia crianças como ele, que também presenciaram uma tragédia,
pois auxiliei como voluntária no orfanato Raio de Luz, em Dallas, enquanto
fazia faculdade. Podia ver que Shaw estava melhor, mas ainda estava
confuso ao me ver.
Ele se afastou e assentiu de novo, pegando minha mão, depois me levou
para a escada.
― Então está virando um rapaz, hein? Muito lindo, devo dizer. ― Ele
já batia no meu ombro, era alto para a idade.
― Já sou grande ― falou por fim. Eu quis dar um gritinho de alegria
por ter conseguido fazê-lo dizer alguma coisa.
Sorri.
― Claro que sim. ― No seu quarto tinha uma cama de casal, uma
estante com TV e um Xbox. ― Você joga?
Eu estava tentando fazer com que ele conversasse mais, que confiasse
em mim, pois só assim me ouviria.
― Sim, eu gosto de jogo de zumbi! ― disse, parecendo animado. ―
Podemos jogar...
Coloquei a mão na cabeça, sobre o meu lenço. Pretendia usá-lo até que
meu cabelo crescesse bastante.
― Você me pegou, porque não sei jogar essa coisa cheia de botões.
― É simples. ― Pegou o controle, ligou a TV e o aparelho de Xbox.
Um jogo de zumbis apareceu na tela.
Tentei jogar com ele após aprender o que era e para que servia cada
botão, porém perdi todas as vezes.
― Mamãe...
Meu coração rachou, fazendo-me falhar em uma missão que estava
jogando. Não entendi se ele falou da mãe ou se estava me chamando como
fez na sala, mas achei melhor esclarecer as coisas e não o deixar mais
confuso.
― Shaw, querido, eu sei que será doloroso para você ouvir isso, mas
preciso falar. Sou sua tia, não a sua mãe, embora eu amasse ser mãe de um
menino como você. ― Era verdade, pois o garoto era um amor, tudo o que
uma mãe desejaria.
Shaw baixou as mãos com o controle em seu colo.
― Sei que, por mais parecida que seja com a minha mãe, você não é
ela. Falei que sou adulto. Eu só ia dizer que sinto muita falta da mamãe. ― A
dor estava na sua voz.
Abracei-o forte para confortá-lo, perguntando-me se não havia me
excedido ao deixar clara a verdade. No entanto, estava aliviada que ele não
estivesse me chamando de mãe; só queria falar sobre ela.
― Queria tanto tê-la conhecido... ― sussurrei.
― Mamãe amaria você e o Lucky ― declarou, parecendo se recompor.
― Você o ama também, não é? ― Eu precisava entender a sua mente, o
que estava sentindo, para não dizer a coisa errada.
― Sim, eu o amo. Ele disse que, quando eu crescer, posso ser piloto. É
o meu sonho.
― Piloto, hein? ― Eu não tinha certeza se, com seu histórico, ele se
daria bem nas Forças Armadas, pois aquilo poderia trazer mais pesadelos à
sua vida. ― Lucky possui um jatinho e tem um piloto.
― Sim, já viajei com ele para Aspen. Voar é tão bom! ― Ele parecia
animado. O tema afastou a dor em seus olhos quando falou da minha irmã.
― Então você pode trabalhar para o Lucky. Ele já o ama como um
filho, e a Sam, como uma mãe. Os dois são os seus pais agora e o amam
demais.
Ele me olhou como se nunca tivesse pensado nisso.
― Meus pais?
― Pais não são apenas quem têm nosso sangue, mas aqueles que nos
criam, cuidam, protegem e amam. Olha para mim; a minha mãe de sangue me
abandonou e não se importou comigo, mas a que me criou me ama como se
eu fosse filha dela. É assim que Sam e Lucky se sentem em relação a você.
― Peguei sua mão, que estava trêmula.
― E minha mãe? Ela me amou e tentou me proteger... Também a amo.
― Sei que sim, querido, e ela também o amava. Mas, lá do Céu, onde
Laila está agora, ela ficará feliz com a sua segunda mãe. ― Sorri de lado. ―
Você pode ter as duas, não precisa deixar uma para ter a outra. Faça como
eu, que tenho meu pai Antônio, que me criou, e também tenho o Joaquin, que
é seu avô, meu pai de sangue, que também me ama. Sou feliz por ter os dois
ao mesmo tempo.
Shaw abaixou a cabeça, parecendo pensar no que eu disse. Samantha
também devia ter dito isso a ele. Eu entendia o lado dela, não tinha como ser
psicóloga e mãe ao mesmo tempo.
― Posso ficar na sua casa de vez em quando?
― Claro que pode. Sou sua tia, Shaw. Sempre que quiser ficar na minha
casa, você será bem-vindo. Mas tem de morar aqui, porque, se for embora,
isso irá destruir a Sam, vai partir o coração dela ― tentei falar calmamente
para que entendesse que as portas de meu lar estavam abertas para ele, mas
que Sam sofreria caso ele a preterisse.
Ele se encolheu.
― Não gosto que ela sofra. Eu não estava pensando em ir embora,
jamais deixaria a Sam. Só preciso dela e de você.
Eu sabia que ele necessitava de tempo para poder assimilar tudo com
calma.
― Sei que eu aparecer assim deixou você um pouco confuso, mas juro
que, de agora em diante, virei ver você direto. Não ficarei longe. ― Fiquei
de pé. ― Que tal descermos agora para você tranquilizar o coração da Sam?
Ele franziu a testa.
― Ela está sofrendo? ― Ficou de pé parecendo preocupado.
― Sam pensa que você vai deixá-la para ir morar comigo. ― Eu não
era leitora de mentes, mas vi o medo nos olhos dela quando ele me abraçou e
ela precisou sair da sala.
Ele piscou.
― Jamais iria deixá-la, eu a amo ― afirmou com veemência.
Fiquei contente com a sua resposta.
― Então vamos descer para que você diga isso à sua segunda mãe. Fale
como se sente em relação a ela e ao Lucky.
Ele assentiu, e descemos para a sala, que antes estava vazia, mas
naquele momento estava abarrotada de gente, não só de adultos, mas de
crianças também.
Shaw desceu as escadas correndo e foi na direção da Sam, que ficou de
pé ao ver nossa aproximação. Ele a abraçou assim como fez comigo quando
cheguei.
― Shaw, meu amor... ― Ela parecia não saber o que dizer ou fazer.
― Nunca vou deixá-la. ― Respirou fundo. ― Você pode ser a minha
segunda mãe? ― Sua voz estava baixa e ansiosa, mas todos na sala
pareceram prender a respiração, menos as crianças, que brincavam alheias
ao que acontecia com os adultos. Luna brincava num canto com Victoria,
Jordana e a filha de Tabitta. Do outro lado, estavam algumas crianças
maiores, quase da idade do Shaw. Acreditei que eram Shane e Lira, irmãos
de Angelina, e a filha do Jason, Emily. Também havia alguns adolescentes
jogando no celular, provavelmente os irmãos de Jason.
Sam caiu de joelhos na frente dele com os olhos banhados em lágrimas.
― Não gosto quando você chora assim. ― Ele limpou o rosto dela, que
sorriu e o puxou para seus braços.
― É de felicidade. Aceito ser a sua segunda mãe e morar em seu
coração.
― Você já mora ― declarou e olhou para o Lucky. ― Você também.
Adoraria que fosse meu pai. Eu amo demais vocês dois.
Lucky parecia estar prestes a chorar também e foi até a sua mulher e o
seu filho para abraçá-los.
Senti braços envolvendo minha cintura e me virei para encarar Daniel,
que parecia exultante.
― Você parece ter o dom de salvar as pessoas. ― Beijou meu rosto.
Nós dois e nossos amigos fomos para a sala ao lado, deixando Sam e
Lucky apreciando o filho deles, o meu sobrinho lindo e doce.
― Não me lembro de ter salvado ninguém ― murmurei.
― E aquele piloto que machucou o braço? Acho que se chamava Will
Canner. Ele tinha desistido, mas você o incentivou, e agora ele corre de
novo. Aposto que houve outros. ― Sorriu com candura. ― Oh, sim, não
vamos nos esquecer do seu pai.
Eu só tinha feito o meu trabalho e dado alguns conselhos.
― Isso não conta, é um dever da minha profissão. De qualquer forma,
só falei com o Shaw de modo doce. Ele precisava da verdade que muitos
não disseram por medo de ele sofrer, mas meu sobrinho é esperto, um garoto
brilhante que dá valor ao que tem.
Daniel sorriu.
― Modo doce? Nunca ouvi isso.
Revirei os olhos e me virei para os meus amigos – Alexia, Bryan Jason,
Tabitta, Ryan, Angelina, Rayla, Alex, Jordan e Laurel, embora estivesse
faltando o Wellington, que foi fazer uma viagem de férias com a Zoe. Ele
esteve do meu lado o tempo todo depois que saí da quimioterapia. Era um
amigo que valia ouro, mas também merecia descansar.
Meus pais não puderam vir, tinham algo a resolver, e papai Joaquin
tinha ido fazer um trabalho de carpintaria em sua cidade. Eu queria poder
ajudá-lo de alguma forma para tirá-lo do seu trabalho perigoso, afinal, por
causa dele, tinha caído e quebrado a perna. No entanto, isso significava que
eu teria de pedir ajuda ao Daniel e ao Lucky, porque eu não tinha condições.
Entretanto, Lucky foi mais rápido e se ofereceu para ajudá-lo
financeiramente, mas meu pai não quis. Ele disse que amava o seu trabalho.
Lucky e Daniel insistiram, preocupados que ele se machucasse de novo,
então meu pai cedeu e disse que aceitaria apenas receber uma força, como
um novo trabalho ou algo assim, pois não aceitaria receber dinheiro de
nenhum dos dois. Seu sonho era montar uma empreiteira, mas com seu
próprio suor, não com dinheiro dado pelos seus filhos. Meu pai era um
homem íntegro, diferente da megera que me deu à luz. Eu não entendia o que
Joaquin viu nela, pois a mulher não valia nada. Uma vez lhe perguntei isso, e
ele me disse que era jovem e idiota e a achou bonita.
Sacudi a cabeça, focando no presente.
― Poderíamos fazer a festa da aposta depois, à noite. Eu posso
organizar para sairmos a fim de nos divertir ― disse Angelina, parecendo
animada.
― O Anjo está certo, nós perdemos, e ela ganhou. ― Ryan sorriu para
a sua esposa.
Daniel revirou os olhos.
Com tudo o que aconteceu, aquela comemoração havia sido adiada, e
podíamos muito bem fazê-la, embora eu ainda tivesse de seguir uma dieta
balanceada, não podia sair da linha.
― Tudo bem, mas não vamos comemorar fora. Se quiser, podemos
brindar à sua aposta, Angelina. ― Ele apertou minha mão. ― Vamos viajar
hoje.
Tinha algo em seus olhos, como se estivesse guardando um segredo. O
que seria?
― Como não sei sobre isso? ― Arqueei as sobrancelhas. ― Aonde
vamos?
― Vai ser uma surpresa. ― Ele olhou ao redor. ― Vamos brindar aqui
mesmo, só temos três horas.
Eu sabia que ainda não podia aproveitar tudo o que queria, mas podia
viajar, pois me cuidava e tomava todos os meus medicamentos direitinho.
― Se não me contar do que se trata, não vou a lugar algum ― falei.
Tinha insistido que nos casássemos ainda naquele mês, ele até topou.
Seria isso? Contudo, eu nem havia procurado um vestido de noiva nem
pensado em todo o restante dos detalhes da cerimônia e da festa.
― O que posso dizer é que vamos nos casar, mas onde ainda é uma
surpresa. ― Beijou meu rosto.
Arfei.
― Você não está falando sério! Preparar um casamento não pode ser
assim tão rápido! Eu não vou para Vegas, pois meu pai estriparia você. ―
Sacudi a cabeça. ― Para eu me casar, preciso arrumar muitas coisas, como
vestido, festa e muito mais.
Seu sorriso não sumiu.
― Está tudo resolvido. Sua mãe e seus pais estão no local, assim como
o Wellington e a Zoe, cuidando do restante dos preparativos para a
cerimônia e a festa depois. Sam e todos aqui ajudaram muito neles desde sua
internação.
Meus olhos estavam arregalados. Eu poderia retrucar, mas o senti tão
animado com a ideia, brilhando de felicidade, então resolvi apenas
aproveitar a surpresa. Estava ansiosa para ser sua esposa, para dormir ao
seu lado e acordar com ele. Durante todos aqueles meses em que passei tão
mal, não pensava muito em sexo, apesar de que já estava sem sintomas havia
dois meses. Sabia que minha caminhada levaria mais uns cinco meses, aí
estaria livre, mas podia, durante esse tempo, aproveitar o Daniel; sentia falta
dele, de nos tocarmos com mais intimidade. Ele nunca cobrou ou quis algo
quando eu não podia, aliás, o homem chegava a se afastar de mim quando a
situação ficava intensa. Podíamos ter feito oral, eu até quis quando fiquei
livre dos sintomas, mas ele não aceitou, afirmando que faria o certo, que
esperaria até quando eu estivesse cem por cento. No momento, eu podia
dizer que, mesmo tomando remédios, estava bem e podíamos fazer sexo e
muito mais.
― Vocês ajudaram nisso? ― Virei-me para nossos amigos.
― Sim. ― Laurel sorriu. ― Como não podíamos ficar ao seu lado no
hospital, apoiando-a, tentamos organizar algo que a deixasse feliz quando
recebesse alta e se recuperasse.
― Vamos ao champanhe ― disse Ryan, abrindo uma garrafa e
distribuindo as taças. ― Como você não pode tomar álcool, Sophie, assim
como o Anjo, então poderá beber suco.
― Também quero suco ― falou Sam, voltando para a sala com Lucky
ao seu lado.
A mulher estava perto de dar à luz, não faltava muito, eu acreditava que
em um mês mais ou menos.
― Obrigada. ― Ela veio até mim e me abraçou. ― Por tudo.
― Não foi nada. ― Devolvi o abraço. ― Vocês merecem o filho que
têm. Ele é um garoto especial.
― Sim, ele é ― concordou com um sorriso brilhante. ― Lamento por
organizar as coisas do seu casamento sem falar com você. No princípio
cuidei de tudo, mas tive de contar com a ajuda dos outros, pois essa gravidez
me deixa cansada demais.
Sorri.
― Tudo bem, eu adoro surpresas, e Daniel sabe disso. Acho que é por
esse motivo que ele sempre faz. Eu amei.
― Lembro-me do meu casamento com Lucky. Eu só soube no dia,
quando fomos para Vegas ― comentou Sam, sorrindo para o marido.
― O momento mais feliz da minha vida. ― Ele sorriu de volta.
― O meu também ― afirmou Sam e olhou para a outra sala, onde Shaw
estava com Shane. ― Este agora também é um dos mais felizes.
― Um brinde à felicidade de todos e ao hospital do coração. ―
Angelina levantou a taça com suco.
― E então? Como foi a sua primeira tarefa? ― indaguei para ela, que
sorriu.
― Não foi preciso muito. Na noite em que fizemos a aposta, eu soube
que Jason conhecia a Tabitta e que, por alguma razão, ele gostava dela. Era
um amor do passado, aquele que fica na pele como uma tatuagem, assim
como o seu com o Daniel.
Jason estava de mãos dadas com Tabitta.
― Como ficou ao meu cargo conseguir as garotas, eu as escolheria, mas
os dois se encontraram antes e, apesar de tudo o que enfrentaram, agora
estão juntos e casados.
Jason foi deixado por Tabitta quando eram adolescentes, porém ela fez
isso porque seu pai era um criminoso e chefe de cartel e queria matar o
Jason. Por isso ela decidiu fugir, para protegê-lo. Finalmente se
reencontraram e estavam juntos.
― Com Bryan, eu também não precisei fazer nada, porque sabia que ele
e Alexia se amavam. Só eram turrões para dar o braço a torcer. ― Apontou
para os dois no canto do sofá. ― Eles trilharam o próprio caminho para a
felicidade.
Bryan ajudou Alexia, já que era da polícia; ela era procurada por um
antigo namorado, um bandido psicótico que a estuprou e a engravidou em sua
adolescência. Então seus pais a internaram em um sanatório e, quando ela
teve a criança, disseram-lhe que a menina tinha morrido. Achei crueldade
demais da parte deles. Alexia sofreu pela perda da filha; ela a amava e não
se importava com a maneira como foi gerada. Anos depois, acabou
descobrindo que sua filha estava viva e foi criada por uma antiga funcionária
dos pais dela. No final, Bryan a protegeu e amava Ariane como sua filha, e o
bandido foi preso.
― Isso daria um livro, sabe? ― apontei. Sabia que tinham acontecido
atrocidades, mas aprendi que elas nos tornavam fortes. ― O que acha? Os
“bad boys” domados? Ou Os “play boys” laçados?
Angelina sorriu, batendo palmas.
― Você é brilhante. Acho que vou escrever sobre cada um de nossos
casais.
― Faça isso. Eu tenho os seus outros livros e gosto bastante. Adoro
romance. ― Com a doença, parei um pouco de ler, afinal tinha muita
preocupação na cabeça.
― Também gosto de um homem turrão e chucro sendo laçado por uma
mulher ― declarou Laurel, sorrindo para o marido. ― Assim como fiz com
você.
― Caipira, não se esqueça de que tive que suar muito para ter o seu
amor. ― Ele a puxou para os seus braços.
― Não muito, bastou um olhar e um sorriso sexy.
Sorri. Naquele momento, agradeci a Deus por ter me dado mais uma
chance para viver momentos assim, não só ver meus amigos felizes, mas ser
feliz também ao lado do Daniel. Podia dizer que estava realizada.
Capítulo 23

DANIEL
Durante todo o tempo em que Sophie ficou no hospital e durante sua
recuperação após a alta, preparei, com a ajuda de meus amigos, familiares e
funcionários, a minha surpresa para ela. Tinha certeza de que minha garota
venceria aquela maldita doença.
Não gostava do fato de ela precisar tomar remédios, mas felizmente só
faltavam cinco meses para que ela se curasse por completo. Eu não via a
hora de tudo acabar.
Sabia que tínhamos passado por muitas coisas tanto antes quanto depois
do nosso reencontro, mas vencemos todos os obstáculos. Contudo, não
conseguimos sozinhos, pois nossa família e amigos ajudaram.
Principalmente, Deus ouviu minhas preces.
No dia do brinde, quando revelei a ela que viajaríamos, levei-a para a
ilha que comprei para ela, no Caribe, onde passaríamos as nossas férias e
viríamos em qualquer ocasião que quiséssemos.
O chalé ao qual a levei era de madeira avermelhada, com janelas de
vidro de cima a baixo e telhado na forma de V de cabeça para baixo. Era
perfeito e pequeno. Um grande naquele mesmo estilo foi construído no sul da
ilha pelo pai dela.
Eu soube que Joaquin estava precisando de dinheiro e trabalhava duro
para pagar algumas contas que fez ao tentar localizar Sophie, Laila e Lucky,
então me ofereci para pagar suas dívidas e ajudá-lo a se aposentar, não por
sua profissão ser vergonhosa, longe disso; a construção e a carpintaria eram
funções honestas, mas eu vi o medo de Sophie depois de saber que ele caiu
da escada.
Entretanto, meu sogro era daqueles velhos teimosos que não aceitam
dinheiro fácil. O que me veio à mente foi passar o trabalho da cabana para
ele fazer e lhe pagar mais do que seu serviço valia. O problema foi que ele
percebeu e quis apenas o valor justo. Para lidar com meu sogro, era preciso
ter muita paciência.
Lucky não aceitou a sua recusa e lhe pagou as dívidas; por causa disso,
foi a primeira briga entre pai e filho. Ao menos no outro minuto já estavam
se falando de novo. Lucky jogou minha garota e Shaw na conversa que teve
com meu sogro, dizendo que, se ele caísse e se machucasse gravemente, eles
sofreriam demais.
O meu amigo também sofreria se perdesse o pai, pois vi a forma como
estavam se dando bem durante todos aqueles meses. A doença de Sophie os
uniu mais ainda. Por isso falou ao pai que, já que ele queria continuar
trabalhando, então que abrisse uma construtora e arrumasse pessoas para
fazer o serviço pesado, afinal o homem estava ficando velho, tinha quase 60
anos, para subir em escadas e andaimes. Ele soube que Joaquin chegou a ter
uma, mas teve que fechá-la para tentar localizar os filhos.
Relutante, Joaquin aceitou a ajuda do filho como um empréstimo. O
homem arrumou até uma promissória, porque não deixaria Lucky pagá-la.
Deu-me vontade de bater naquele velho teimoso. O homem era gente fina; o
que precisássemos e ele pudesse dar, estaria em nossas mãos. Tinha apenas
aquele problema, sua tenacidade.
No final, deu certo, e o meu chalé ficou lindo, tudo o que Sophie
merecia. O homem sabia realmente trabalhar naquele ramo. Eu tinha ido lá
durante a manhã, enquanto Sophie dormia. Ela não tinha conhecimento do
outro chalé, só saberia dele no dia do nosso casamento, ou seja, no dia
seguinte, logo cedo.
Eu trouxe um médico especialista para cuidar dela enquanto
estivéssemos na ilha, embora o doutor Eduardo, o mesmo que cuidou de sua
doença, disse que isso não era necessário, pois ela ficaria bem. Eu o
convidei para o casamento.
Para ir do lugar em que estávamos ao outro chalé era preciso atravessar
a floresta ou ir pela praia.
― Este lugar é magnífico! Se você fizer chalés para alugar ou vender...
― Compre sua própria ilha para fazer isso ― cortei Jordan. ― Quando
eu estiver aqui, só quero sossego e mais nada.
Ele sorriu.
― Eu poderia comprar outra, mas Laurel disse que quer fazer um chalé
aqui.
― Rosa Vermelha também ― disse Lucky, balançando a cabeça.
― Acho que todas combinaram pedir isso. ― Ryan bufou. ― Até a
Angel, que não liga para nada dessas coisas, se apaixonou pelo lugar.
Estava na floresta com Jordan, Lucky, Ryan, Jason e Bryan, voltando da
visita ao chalé maior. Não era longe de onde eu ficaria aquela noite com
Sophie.
― Ouvi Taby dizer que elas querem um chalé cada uma, porque,
quando voltarmos aqui em outras ocasiões, nós poderemos ficar em lugares
separados. ― Jason sorriu. ― São muitas crianças, e isso a deixa louca,
mesmo ela as amando.
― Filho é algo bom, nos traz felicidade e nos faz valorizar mais o que
temos ― falou Ryan. ― Eu amo a minha como nunca amei alguém. E meus
cunhados são como meus filhos.
― Você pretende ter filhos? ― perguntou Bryan a mim.
É claro que eu sonhava em ter filhos com Sophie, mas primeiro teria
que falar com o doutor, porque não perguntei sobre isso; tínhamos que saber
quando ele liberaria a Sophie para engravidar.
― Eu gostaria, mas ainda preciso pesar os prós e os contras. Não vou
tentar antes de conversar com o médico.
― Daniel! ― ouvi Sophie gritar da varanda do chalé.
Olhei para todos ali.
― Vão embora, pois ela não pode ver vocês aqui. Para todos os
efeitos, o nosso casamento será em outra ilha. Pelo menos, ela pensa assim.
― Fode muito hoje... ― Jordan foi interrompido por um tapa de Lucky
na sua cabeça.
― Veja como fala da minha irmã ― rosnou.
Ri, sacudindo a cabeça.
― Você também, Lucky, fode muito com a sua mulher... ― Corri dali
assim que Bryan pegou um pedaço de pau para jogar contra mim.
Ouvi o restante deles rir e o rosnado de Lucky e Bryan. Não liguei e só
saí dos arbustos para caminhar em direção à mulher que me chamava. Sua
voz era como o canto de uma sereia.
Eu nunca me cansava de olhar para aquela perfeição de mulher, que
estava só de biquíni verde. Sabia que ela não gostava de tirar o lenço da
cabeça, porém eu não entendia se era por vergonha ou apenas costume. O
cabelo dela estava mais longo e a cada dia crescia mais, porque usava
produtos para estimular o processo de crescimento. Eu já não ligava, deixei
o meu crescer sozinho, no tempo certo.
― Você está a cada dia mais linda ― falei com o corpo pegando fogo.
Aquela mulher fazia isso comigo apenas com um olhar.
Seu olhar comia cada centímetro meu. Eu estava sem camiseta e usando
uma bermuda de surf. A fome estava em seu olhar, assim como acontecia
comigo.
― Que bom que gosta da vista ― provoquei, puxando-a para meus
braços.
Esperava que todos tivessem ido embora e não estivessem nos
espiando.
― Você não sabe o quanto estou com fome disso. ― Sua mão foi até a
minha bermuda, e minha ereção ficou mais dura. ― Daniel, eu estou bem,
então vamos fazer sexo. Se eu não fizer logo, vou subir essas paredes como
uma aranha.
Eu já havia resistido muito, e não foi por não desejar, mas por querer
que ela se recuperasse por completo, que atingisse seu peso ideal e que sua
saúde ficasse estável. Busquei a opinião do médico sobre isso, e ele deu o
aval, contanto que nos protegêssemos, afinal, ela não poderia engravidar
tomando toda aquela bateria de remédios.
Peguei-a pela cintura, e ela envolveu as pernas e braços ao meu redor.
Levei-a para dentro, não querendo que ninguém visse nada, muito menos seu
irmão, que era capaz de vir chutar a minha bunda.
― O único lugar onde você vai subir hoje é no meu pau ― falei em seu
ouvido.
― Minha boceta agradece. ― Mordicou minha orelha, fazendo-me
gemer.
Porra! Aquela mulher ainda iria me matar. Nunca pensei que poderia
morrer de tesão.
Coloquei-a na cama e pairei em cima dela, beijando seus lábios.
― Vamos transar, mas, se sentir qualquer coisa diferente, quero que me
avise. O médico disse que sexo está liberado, desde que não nos excedamos.
Eu vou fazer tudo, e você fica quietinha, tudo bem? ― Não queria que ela se
esforçasse muito.
Seus olhos se arregalaram.
― Perguntou sobre sexo ao médico?! ― Sua voz subiu duas oitavas.
― Claro. Eu não iria tocá-la se não tivesse um aval médico. ―
Suspirei. ― Lembra-se da outra vez que a toquei? Nunca me senti tão
péssimo quanto naquele momento, com sua falta de ar. Senti-me como um
canalha louco por sexo.
― Daniel, eu seduzi você. Não havia como um homem resistir, só se
não gostasse da coisa, o que não é o seu caso. ― Sorriu de lado. ― A não
ser que você tenha virado...
Rosnei, abaixando-me, tirando sua parte de baixo do biquíni e abrindo
suas pernas; ali estava aquela parte que eu tanto adorava e amava em seu
corpo, uma pela qual estava faminto demais.
Assim que minha boca alcançou aquele broto rosa, eu me senti em casa.
Lambia e chupava com toda a fome que estava sentindo. Seus gritos eram
como música para meus ouvidos.
― Oh, Deus! Isso é bom demais! ― Suas mãos apertavam mais minha
cabeça. ― Juro, se um dia cortar seus cabelos de novo, eu vou chutar sua
bunda, pois adoro ter onde pegar, como agora...
Sorri, puxando seu brotinho com os dentes.
― Para quê? Se desejar mais da minha língua, será só pedir, querida
noiva. ― Segurei seu quadril. ― Lembra-se do que eu disse sobre não nos
excedermos?
― Pare de falar e me coma logo, porque está bom... ― Ela suspirou. ―
Isso, assim... ― Implorou assim que chupei seu clitóris: ― Não para, está
tão gostoso!
Sorri e voltei à ação, gostando da forma como ela estava, tão fogosa e
eufórica.
― Prometa que mais ninguém tocará assim em você. ― Eu tinha lhe
pedido isso uma vez, então nos separamos, e ela teve namorados, algo em
que eu não queria pensar naquele momento.
― Nunca houve. Ninguém nunca me tocou assim, além de você ―
declarou.
Levantei a cabeça para ela, não acreditando no que estava ouvindo.
― Mas você teve...
― Não fizemos oral. E vamos parar de falar sobre isso quando sua
boca está em mim. Não quero pensar no que fizemos no passado. ― Ela
tocou o meu rosto. ― O importante é estarmos aqui agora e nos amarmos.
Sophie tinha razão quanto a isso. No dia seguinte, ela seria minha para
sempre.
― Só me responde o motivo...
Ela deu de ombros.
― Acho que foi pela promessa que fiz a você. Eu não conseguia
descumpri-la.
Sorri, pensando em como poderia amá-la mais do que já amava.
― Também não fiz isso com ninguém. ― Toquei seu rosto. ― Só com
você. E, a partir de agora, será tudo só com você.
― Amo você para sempre ― declarou nos meus lábios, meio sem
fôlego. ― Quero você dentro de mim, Daniel.
Eu não ia deixar minha garota esperar.
― Tantos anos sonhando com isso, com você nos meus braços. E
amanhã será minha para sempre. ― Coloquei a camisinha, pois não queria
correr nenhum risco. ― Na verdade, sempre foi.
Beijei seus lábios conforme entrava nela com delicadeza, mas de forma
tão intensa quanto o sol. Cada centímetro que eu possuía dela era como
minha volta para casa.
Suas mãos foram parar nas minhas costas; a forma como me agarrava
me deixava louco.
― Me fode com força, Daniel! ― implorou.
Mesmo ouvindo seu pedido, embora me custasse negar isso a ela,
peguei leve. Estar dentro de Sophie me levava ao limite. Eu sabia que não ia
durar muito, mas de forma alguma gozaria sem que ela o fizesse junto a mim.
Toquei seu clitóris enquanto a beijava e acelerava mais meu quadril até
sentir minhas bolas batendo em sua pele.
Vê-la se desmanchando debaixo de mim, não havia prazer melhor que
isso. A forma como gemia e clamava meu nome. O jeito que me agarrava
como se não quisesse me deixar nunca mais ou estivesse agradecendo a Deus
por eu estar ali.
Nossos olhos se conectaram, e agradeci aos Céus por ela estar bem e
viva, por me dar mais uma chance de ter aquela mulher de novo.
― Goza para mim. ― Assim que essas palavras soaram, foi como um
tiro; eu a vi desmoronar e a segui logo depois. Caí ao lado dela e a puxei
para meus braços.
― Essa foi rápida, mas prometo que vamos demorar mais na próxima
vez. ― Sorri, indo ao banheiro me livrar do preservativo.
― E então? Onde vai ser o casamento, Daniel? ― perguntou ela vindo
atrás de mim.
Sorri comigo mesmo. Toda hora Sophie perguntava isso, e, para evitar
sua pergunta, eu a distraía até que esquecesse. Tive ideia de como teria uma
noite agitada. Não estava reclamando; na verdade, adorando.
― Vem tomar banho comigo. Aqui faz muito calor. ― Puxei-a para
debaixo do chuveiro e tirei o seu lenço.
― Daniel...
― Sophie, você não precisa usar isso por achar que fica estranha com
seus cabelos assim. ― Toquei os fios curtos e molhados. ― Não ligo, linda,
o que me importa é você. Não ligo para cabelos, além disso, eles logo irão
crescer.
― Eu sei, mas acho que o uso do lenço virou um costume; fiquei tanto
tempo com ele quando estava careca que é estranho não o usar. ― Tocou
meu coração. ― Nunca pensei que você me deixaria por estar sem cabelos,
afinal enfrentou tudo ao meu lado... É difícil alguém fazer tal coisa.
― Alguém que ama faz, sim, Sophie, assim como eu amo você. Perdê-
la não era uma opção. ― Tracei sua face. ― Não sei viver sem isso aqui em
minhas mãos. ― Segui para seus seios. ― Ou isso.
― Meus peitos?
― Não sabe como eles são saborosos. ― Coloquei um na minha boca e
tomei o bico entre os dentes.
― Vamos para a segunda rodada. Acha que consegue? Afinal está meio
velho, não é mais um adolescente na puberdade ― provocou com um sorriso
safado como o pecado.
Oh, ela não sabia do que eu era capaz. Com um sorriso, caí de joelhos
na sua frente e abri suas pernas, colocando uma em meu ombro. Então a
devorei debaixo do chuveiro; cada lambida, e eu a fazia gritar ainda mais.
Então a penetrei com dois dedos conforme chupava seu clitóris.
Tive que segurar seu quadril, ou ela cairia ali, com as pernas bambas.
Devorei-a e a degustei como se fosse uma comida que eu adorava. Senti suas
paredes apertarem meus dedos, então coloquei outro, e logo ela gozou com
um grito. Não parei de lambê-la até ela que ela parasse de tremer em minhas
mãos e boca.
Afastei-me com um sorriso, colocando os dedos na boca.
― Deliciosa. Ainda vai falar que sou velho?
Seus olhos foram para a minha ereção em pleno vigor. Sorriu.
― Vamos ver. ― Caiu na minha frente, levando a mão ao meu pau duro.
Gemi, cerrando minhas mãos em punhos, deixando que ela fizesse o que
quisesse.
Sophie passou a ponta da língua na coroa, fazendo gotejar pré-sêmen.
Juro que nunca vi visão mais perfeita do que aquela.
― Tão gostoso quanto eu me lembrava. ― Seus olhos molhados pela
água do chuveiro se lançaram em minha direção. ― Senti muita falta dele
inteiro.
Engoli em seco.
― Ele é seu para fazer o que quiser ― consegui dizer, rouco.
― Oh, eu vou abalar o seu mundo. ― Sua boca tomou o meu pau. Se
alguém podia fazer isso, era ela. Com uma chupada, quase caí de joelhos,
tive que me equilibrar na parede de azulejos. Desliguei a água para apreciar
a visão da boca macia preenchida pelo meu pênis.
― Uma visão de outro mundo. ― Levei uma mão ao seu rosto. ― Tão
linda.
Seu olhar não deixou o meu por nenhum segundo e brilhava como o sol.
A parte do meu pau que ela não conseguiu colocar na boca, segurou. Então
sua cabeça passou a balançar para cima e para baixo com a sucção.
Meu corpo se convulsionava, tremendo; sabia que era por causa
daquela visão do meu pênis sumindo e aparecendo em sua boca. Meus olhos
se fecharam, e escorei a cabeça na parede, sem forças.
Empurrei meu quadril mais em sua direção.
― Porra, esses lábios... ― Interrompi-me quando ela acelerou mais os
seus movimentos. ― Vou gozar...
Estava a ponto de explodir em sua boca, quando um dedo foi enfiado na
minha bunda e seus movimentos aumentaram, puxando-me para o
arrebatamento.
― Jesus Cristo! ― exclamei, quase subindo pelas paredes, e gozei com
a força de um vulcão. A porra teve uma explosão que me deixou de pernas
bambas, mole feito um bêbado, mas com uma overdose de sexo.
― Está vivo? Ou terei que chamar o médico para saber se você teve um
ataque cardíaco após o sexo oral? ― Seu tom era provocante.
Meus olhos vidrados se abriram, e os foquei nela, que sorria brilhante.
Até minha visão ficou embaçada.
― Você conseguiu mesmo abalar o meu mundo ― consegui dizer,
ofegante.
Ela sorriu e ficou de pé. Em seguida, ligou o chuveiro para nos
lavarmos.
― Eu falei que faria isso. Aprendi o negócio do dedo no livro da
Angelina. ― Olhou-me enquanto se ensaboava. ― Parece que você gostou
disso. Acho que ela fez com o Ryan.
― Acho que não consigo me mexer ― sussurrei ainda sem fôlego e a
puxei para os meus braços. ― Você sabe deixar um homem de joelhos.
― Essa é a ideia ― retribuiu o beijo. ― Mas não pense que esqueci.
Você me distraiu sobre o casamento.
Quase gemi, mas dei um selinho em suas pálpebras.
― Sophie, minha linda noiva, só quero ficar essa noite com você.
Deixe a sua família organizar tudo. Lembra-se, no passado, quando falei que
tinha uma surpresa para fazer? Não tive tempo na época, então me deixa
fazer essa surpresa para você amanhã.
Ela piscou.
― Ia me pedir em casamento?
Ri.
― Não, mas eu ia levar você a uma ilha. Não podia comprar uma, mas
ao menos poderia passar aquele dia ao seu lado. ― Toquei seu rosto. ― Me
deixa fazer isso por você? Quero que seja feliz.
― Eu sou, Daniel. ― Sua voz estava cheia de emoção. ― Te amo
demais.
Beijei-a, dando graças aos Céus por aquela mulher me amar e nunca ter
desistido de mim.
Epílogo

SOPHIE
Quando Daniel me disse que faria uma surpresa em relação ao nosso
casamento, pensei que seria em uma igreja ali, no Caribe, perto da ilha em
que estávamos.
Eu estava no quarto grande de madeira branca, com janelas de vidro,
embora fechadas com cortinas. Estava totalmente proibida de sair para ver
como tudo estava indo. Poderia dar uma espiada, mas queria realizar o
pedido de Daniel.
Ele tinha me deixado ali, naquele quarto, havia algumas horas, para que
eu me arrumasse. Trouxe-me vendada. Todavia, o que me surpreendeu foi
que não pegamos helicóptero nem barco, então o casamento seria ali mesmo,
naquela ilha, em algum lugar não muito longe, porque andamos pouco de
onde estávamos, no chalé.
No fundo, achei divertido ser vendada e levada para não ver a surpresa.
Não sabia como estava a organização do local lá fora, mas de uma coisa
tinha certeza: eu amaria cada momento promovido pelos meus amigos e
parentes, assim como pelo homem que eu amava.
No quarto, mamãe, Laurel e Alexia estavam cuidando de mim. Até o
vestido tinham comprado, o meu tamanho atual. Eu não sabia como tinham
feito isso, mas conseguiram. Apostava que tinha o dedo do Daniel.
Ali, vendo-me refletida no espelho de corpo inteiro naquele vestido
branco, era como se eu estivesse em um sonho. Ele se moldava ao meu corpo
como uma luva, marcava minha cintura e era rodado. Na região dos seios
tinha diamantes em forma de Lua, as quatro estações. Um véu estava preso na
minha cabeça.
― Uma coisa azul. ― Mamãe me entregou uma corrente com uma pedra
azul-turquesa.
Eu já tinha uma coisa nova, os brincos que Tabitta havia me dado. A
coisa velha era uma pulseira que estava no fundo do baú, um antigo presente
de Daniel. Eu não a usava porque me trazia muitas lembranças na época.
― Só falta algo emprestado ― falou Alexia, examinando-me para ver o
que estava faltando. Enfim ela pegou um broche seu e o colocou no meu
decote. Por incrível que pareça, ficou bonito.
― Obrigada ― sussurrei.
― Está tão linda, meu amor. ― Mamãe colocou a mão na boca como se
tentasse conter o choro emocionado.
― Oh, mamãe, não chore ― pedi, abraçando-a.
― Sempre foi o meu sonho que você se casasse com ele. Demorou
anos, mas se cumpriu. ― Sorriu.
― Ele é o genro que você sempre quis, não é? ― Ri, sacudindo a
cabeça.
― Verdade ― concordou.
― A senhora o ama como a um filho.
A mãe de Daniel não viria ao casamento; ele não queria trazê-la,
porque temia que se alterasse ao ver nosso matrimônio. Eu não me
incomodava com isso, porque entendia que ela estava doente. Falei a ele
que, depois que nos casássemos, ela moraria conosco. Não poderíamos
tomar conta dela em razão dos nossos trabalhos, mas poderíamos contratar
alguém qualificado.
― Sophie, está na hora. ― Alexia me trouxe de volta dos meus
pensamentos.
Naquele momento, eu só queria focar em Daniel e vê-lo no altar
esperando por mim com aquele sorriso sexy que eu amava demais. Com ele
ao meu lado, enfrentei vários obstáculos, mas havia chegado a nossa vez de
sermos felizes ao lado um do outro.
― Pare de pensar, Sophie. Agora é hora de agir. ― Mamãe sorriu.
Uma batida na porta soou, e meu pai Joaquin surgiu ali, com um terno
azul, cabelo penteado de lado.
― Está um gato, papai. ― Sorri assim que mamãe e as meninas saíram.
― Você está tão magnífica, meu anjo. ― Beijou meu rosto. ― Só vim
desejar que você seja feliz, minha filha.
― Obrigada, pai. — Beijei seu rosto.
Soube por ele quando conversamos – assim que saí do hospital –, o
motivo de a Mary ser daquele jeito; ela foi tratada como alguém indesejada
pelos próprios pais e sempre viveu na pobreza, por isso desprezava tanto
quem não tinha dinheiro. Mesmo que ela tivesse se apaixonado por ele, isso
não era suficiente. A cadela queria ficar com o meu pai como um amante,
mas casada com outro cara, um russo rico. Foi assim que ela teve Laila e a
mim, em uma recaída, anos depois de abandoná-lo. Papai disse que, depois
de alguns anos, Mary voltou e quis ter outra noite com ele mais uma vez, mas
ele não quis. Foi quando ela contou sobre nós e ele tentou nos encontrar.
Para mim, o jeito como ela foi criada não justificava o que fez com seus
filhos, por isso não me importei quando soube que ela levou uma facada na
cadeia, indo parar na enfermaria. Parece que alguém ficou sabendo o que ela
fez com seus filhos. Mesmo que eu preferisse que isso não tivesse
acontecido, ela mereceu, porque, por sua culpa, eu não tinha a Laila ao meu
lado.
― Vou esperar lá fora ― falou assim que ouvimos outra batida na
porta. Eu sabia que era meu pai Antônio.
― Tudo bem. Só quero que saiba que amo você ― declarei.
― Também a amo demais. ― Beijou minha testa e saiu.
Ouvi-o falando com o meu pai lá fora.
― Oi, meu amor. Está pronta? ― perguntou meu pai Antônio.
― Papai, o senhor se magoaria se eu pedisse ao Joaquin para me levar
ao altar também? Vocês dois juntos? ― pedi com cuidado, pois não queria
ferir os sentimentos dele.
― Não me importo, querida, e acredito que ele vai ficar imensamente
feliz. ― Sorriu. ― Eu não poderia ter criado uma filha melhor.
No corredor, estavam duas crianças, as damas de honra, Ariane, com o
seu belo vestido rodado, e Lira, com seus cachinhos loiros brilhantes. Elas
seguiam na frente, e eu atrás delas, com meu pai. Esperava encontrar o outro
na entrada do local em que seria realizado o casamento.
Olhei ao redor, notando que aquele lugar se parecia com o outro chalé
em que estávamos horas antes, só que maior.
Passamos pela sala e saímos pela porta da frente.
Arfei.
― Todos vocês fizeram isso? ― questionei assim que consegui
recuperar o fôlego.
Encarava o mar azul e a areia branquinha, com coqueiros ao redor
fazendo sombra. À direita do chalé, de costas para o oceano, tinha uma tenda
grande com várias cadeiras ocupadas. Sob a tenda, tinham milhares de flores
de todas as cores, e uma guirlanda estava pendurada na entrada dela. Entre
as fileiras de cadeiras, um corredor coberto com um tapete verde seguia ao
altar improvisado. Às minhas narinas chegavam aromas florais, e a brisa
marinha soprava contra meu rosto.
― Sim. Aquele homem é louco por você. Olha o que ele fez. ― Meu
pai Antônio sacudiu a cabeça. ― Nunca poderei lhe agradecer o suficiente.
Meu coração se aqueceu por dentro. Daniel era assim, um homem
honrado e muito prestativo.
Olhei para a direita, e meu pai Joaquin estava ao meu lado com um
sorriso.
― Está feliz, meu amor? ― Ele parou sob a guirlanda.
― Demais, pai! Daniel é tudo o que eu sempre quis. Quer me
acompanhar também? ― inquiri.
Pensei que o sorriso que me deu iluminaria todo o lugar, e sabia que ele
logo choraria. Puxou-me para seus braços de urso.
― Muito obrigado pela honra, minha filha. ― Afastou-se e ficou ao
meu outro lado, curvando a cabeça de leve para o meu pai Antônio. ―
Obrigado.
Fiquei no meio dos dois e peguei seus braços. Ainda bem que o
corredor era grande e cabia nós três.
Meus olhos vagavam pelo lugar, que parecia um sonho encantado. Do
lado direito, estavam os meus amigos e minha família, além de meu chefe e
alguns colegas de trabalho. Do lado esquerdo, estavam os amigos do Daniel
e parentes, primos que eu não conhecia pessoalmente, mas sabia que tinha.
Vi dois homens desconhecidos no canto da tenda, quase do lado de fora.
Eles vestiam jaqueta preta com o emblema e o nome de uma fênix. Um era
alto, de cabelos curtos e sorriso sexy. O outro era um pouco mais baixo, com
cabelos em tom castanho e muito atraente. De repente me lembrei de que
Jordan e Daniel conheciam alguns MCs do bem. Eles não me pareceram
maus, apenas lindos.
Respirei fundo e olhei para o altar improvisado e, ao fundo, o mar. Ali
estava o homem por quem meu coração batia e eu respirava; aquele que me
deixava de pernas bambas. Se não fossem meus pais ao meu lado, eu teria
caído ou sairia correndo para ele.
Na noite anterior, nós fizemos amor algumas vezes, e eu realmente
fiquei esgotada, por isso dormi como uma pedra.
Chegamos ao altar, e Daniel veio ao meu encontro com um sorriso
lindo, quase maior que o Sol.
Meus dois pais me entregaram a ele fazendo algumas ameaças, mas eu
sabia que estavam brincando. Todos sabiam o que Daniel sentia por mim.
― Eu a farei feliz ― jurou, apertando minha mão ao prometer aos meus
pais que me amaria para sempre.
Nó nos viramos para o padre que ministraria a cerimônia.
― Estamos aqui hoje para celebrar o casamento de Daniel Frederic
Luxem e Sophie Winter.
Assim que terminou, ele pediu para que declarássemos os nossos votos.
Peguei a aliança e fiquei de frente para o Daniel.
― Nunca acreditei em alma gêmea até me apaixonar por você. Mesmo
com tudo o que aconteceu, a dor, o vazio e a solidão ao perder você, não me
arrependo de tê-lo conhecido. Daniel, o nosso amor sobreviveu a tudo isso,
à doença e ao vale da morte. Naquele hospital, sentindo dor, eu só tinha uma
coisa em mente: sobreviver. Porque, se perdesse a batalha pela vida, eu
perderia você, e essa não era uma opção. ― Respirei fundo. ― Você é o
meu Sol, a Lua e as estrelas. O Universo inteiro.
Seus olhos estavam marejados.
― Minha doce Sophie, a partir do momento em que me apaixonei, eu
sabia que não viveria sem você. Quando fiquei longe, era como se estivesse
morto; mesmo respirando, era como se eu tivesse perdido a minha alma. No
caso, você. ― Suas mãos apertaram as minhas. ― Hoje, eu a tenho de volta,
a minha alma está inteira, e nunca estive mais vivo. Mesmo naqueles
momentos em que achei que a perderia, no fundo tive fé e pela primeira vez
rezei para um Deus que eu não conhecia. E, no final, Ele me ajudou e a
deixou viva para mim. Amo você para sempre.
O padre nos declarou marido e mulher. Não perdi tempo e pulei nos
braços de Daniel, beijando-o e lhe mostrando todo o meu amor. Um amor
que sobreviveu à alegria, à saúde, à tristeza e à doença, capaz de abalar o
mundo.
Sobre a autora

IVANI GODOY
Nasceu em Nova Xavantina, Mato Grosso, em 1981, mas hoje vive em
Birigui, São Paulo. É casada há dezessete anos e mãe de três filhos, que são
sua razão de viver. Começou a se interessar por livros ainda criança, quando
fugia para a biblioteca da escola por sofrer bullying.
Acredita que o amor ultrapassa barreiras e preconceitos, sendo capaz
de superar tudo. Com esse pensamento, seguiu em frente e passou a escrever
histórias de amor, pois é o que ela mais gosta de fazer.
Convites
Venham conhecer meus outros livros também: “Híbrida”, uma
história de fantasia, é o primeiro livro da série “Destinos”. Um romance
entre uma garota metade elfo e metade humana que se apaixona por um
vampiro, o filho de seu pior inimigo.

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[1]
Nota da autora: o Gato de Cheshire, Gato Risonho, Gato Listrado ou Gato Que Ri é um gato fictício,
personagem do livro Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carrol. Ele se caracteriza por seu
sorriso pronunciado e sua capacidade de aparecer e desaparecer.
[2]
Nota da autora: nas igrejas, local destinado aos ofícios divinos e aos cânticos, situado em diversos
lugares consoante a época (à frente do altar, sobre a porta de entrada principal etc.).
Table of Contents
VOCÊ É MINHA
Sinopse
Prólogo
1 – Injustiçada
2 – Conflito
3- Descoberta
4 – Influência
5 - Armação
6 – O Troco
7 - Escolha Difícil
8 - Renúncia
9 – Sobrevivendo
10 - Clube Rave
11 - Pedido Especial
12 - Desejo Ardente
13 – Casamento
14 - A Viagem
15 - O Fim
16 – Tormento
17 - A Verdade
Epílogo
A APOSTA
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Epílogo
LOUCO POR VOCÊ
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Epílogo
MARCA DA ESCURIDÃO
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Epílogo
DOMADO POR VOCÊ
Sinopse
Capítulo um
Capítulo dois
Capítulo três
Capítulo quatro
Capítulo cinco
Capítulo seis
Capítulo sete
Capítulo oito
Capítulo nove
Capítulo dez
Capítulo onze
Capítulo doze
Capítulo treze
Capítulo quatorze
Capítulo quinze
Capítulo dezesseis
Capítulo dezessete
Capítulo dezoito
Bônus
SEMPRE FOI VOCÊ
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Epílogo
Sobre a autora
Convites

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