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Série Autores Gregos e Latinos

Pausânias

Descrição
da Grécia
Livro iii

Com introdução, tradução do grego e notas de


Maria de Fátima Sousa e Silva
Série “Autores Gregos e Latinos –
Tradução, introdução e comentário”
ISSN: 2183-220X
Apresentação: Esta série procura apresentar em língua
portuguesa obras de autores gregos, latinos e neolatinos,
em tradução feita diretamente a partir da língua original.
Além da tradução, todos os volumes são também carate-
rizados por conterem estudos introdutórios, bibliografia
crítica e notas. Reforça-se, assim, a originalidade cientí-
fica e o alcance da série, cumprindo o duplo objetivo de
tornar acessíveis textos clássicos, medievais e renascen-
tistas a leitores que não dominam as línguas antigas em
que foram escritos. Também do ponto de vista da reflexão
académica, a coleção se reveste no panorama lusófono
de particular importância, pois proporciona contributos
originais numa área de investigação científica fundamen-
tal no universo geral do conhecimento e divulgação do
património literário da Humanidade.

Breve nota curricular sobre a autora


Maria de Fátima Silva é Professora Catedrática Jubilada
do Instituto de Estudos Clássicos e membro do Centro
de Estudos Clássicos e Humanísticos da Faculdade de
Letras da Universidade de Coimbra. Autora de uma
tese de doutoramento intitulada Crítica do Teatro
na Comédia Antiga, dedicou-se a aprofundar a matéria
‘teatro grego, cómico e trágico’, sobre que publicou
vários livros e numerosos artigos. Produziu ainda
traduções de Aristófanes e Menandro, bem como de
outros autores como Heródoto, Aristóteles, Teofrasto
e Cáriton. Mais recentemente tem-se dedicado aos
estudos de receção, sobretudo no que diz respeito às
influências do teatro grego no teatro português.
Série Autores Gregos e Latinos
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Série Autores Gregos e Latinos

ISSN: 2183-220X

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Maria de Fátima Silva
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Universitat de les Illes Balears Susana Marques Pereira
Universidade de Coimbra

Todos os volumes desta série são submetidos


a arbitragem científica independente.
Série Autores Gregos e Latinos

Pausânias

Descrição
da Grécia
Livro iii

Com introdução, tradução do grego e notas de


Maria de Fátima Sousa e Silva
With introduction, translation from the Greek and notes
by Maria de Fátima Sousa e Silva
Série Autores Gregos e Latinos

Título Title
Descrição da Grécia. Livro III
Description of Greece (Book III)

Introdução, Tradução do Grego e Notas


Introduction, Translation from The Greek and Notes by
Maria de Fátima Silva
https://orcid.org/0000-0001-5356-8386

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ISSN
2183-220X
ISBN
978-989-26-2381-8
© novembro 2020
ISBN Digital
978-989-26-2382-5 Imprensa da Universidade de Coimbra
Classica Digitalia Vniversitatis
DOI Conimbrigensis
https://doi.org/10.14195/978-989-26- http://classicadigitalia.uc.pt
2382-5 Centro de Estudos Clássicos e
Humanísticos da Universidade de
Coimbra

Trabalho publicado ao abrigo da Licença This work is licensed under


Creative Commons CC-BY (http://creativecommons.org/licenses/by/3.0/pt/legalcode)
Descrição da Grécia.
Livro III

Introdução, Tradução do Grego e Notas


Introduction, Translation from The Greek and Notes by
Maria de Fátima Silva

Filiação Affiliation
Universidade de Coimbra – University of Coimbra

Resumo
O propósito deste livro é fornecer, em língua portuguesa, uma tradução da
Descrição da Grécia de Pausânias, Livro III, acompanhada de um estudo
introdutório e de um aparato de notas informativas.

Palavras-chave
Lacónia, Esparta, história, arqueologia, mitos.

Abstract
This book offers a Portuguese translation of Pausanias, Description of
Greece, Book I, with an introduction and a commentary.

Keywords
Laconia, Sparta, history, archaeology, myths.
(Página deixada propositadamente em branco)
Autora

Maria de Fátima Silva é Professora Catedrática Jubilada do Instituto


de Estudos Clássicos e membro do Centro de Estudos Clássicos e
Humanísticos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.
Autora de uma tese de doutoramento intitulada Crítica do Teatro na
Comédia Antiga, dedicou-se a aprofundar a matéria ‘teatro grego,
cómico e trágico’, sobre que publicou vários livros e numerosos artigos.
Produziu ainda traduções de Aristófanes e Menandro, bem como de
outros autores como Heródoto, Aristóteles, Teofrasto e Cáriton. Mais
recentemente tem-se dedicado aos estudos de receção, sobretudo no que
diz respeito às influências do teatro grego no teatro português.

Author

Maria de Fátima Silva is Full Professor at the Institute for Classical Stu-
dies and a member of the Centre for Classical and Humanistic Studies
of the Faculty of Letters of the University of Coimbra. Author of a PhD
thesis entitled Critique of Theatre in Ancient Comedy, she has dedicated
herself to deepening the subject ‘Greek comic and tragic theater’, on
which she has published several books and numerous articles. She has
also produced translations of Aristophanes and Menander, as well as of
other authors such as Herodotus, Aristotle, Theophrastus and Chariton.
More recently she has been dedicated to reception studies, especially
with regard to the influences of Greek theater on Portuguese theatre.

7
(Página deixada propositadamente em branco)
Índice

Introdução 11
A estrutura do Livro III e o trajeto histórico da Lacónia 11
Práticas, cultos e festas emblemáticos da Lacónia 22
A tradição homérica: uma garantia de prestígio e ancestralidade 28
Mitos influentes de origem lacónia 30

Bibliografia 35

Pausânias Descrição da Grécia


3.Lacónia 43

Índice de topónimos e antropónimos 175

9
(Página deixada propositadamente em branco)
Introdução

 estrutura do Livro III e o trajeto histórico da


A
Lacónia
Dentro do que parece ser uma preocupação constante de
Pausânias, o Livro III utiliza algumas menções de encadea-
mento com o fecho do Livro anterior.1 As estátuas de Hermes
situadas no Párnon, referidas em 2.38.7, marcam um ponto de
charneira para a passagem a uma nova região; são então estas
as palavras de abertura do Livro III: “A seguir aos Hermes, para
ocidente, já é Lacónia”. Assim, Pausânias prossegue um roteiro
das regiões dóricas do Peloponeso, a Lacónia após a Argólida,
a que se seguirá a Messénia.
Sobre a abordagem que o autor da Descrição da Grécia faz
da Lacónia, Musti e Torelli (2008) IX resumem com perti-
nência: “A Lacónia, (...), é apresentada por Pausânias em três
secções fundamentais: a área da Lacónia propriamente dita,
centrada em Esparta, mas articulada em vários itinerários, e
a área dos Eleuterolacones, subdividida por razões geográficas
óbvias nas duas grandes penínsulas do Párnon e do Taígeto,
ambas visitadas com itinerários próprios”. Com esta breve
introdução ficam determinados os percursos de um trajeto que
determinam, simultaneamente, a estruturação deste Livro III.
Além da opção estabelecida no encadeamento da obra, não
é menos regular um outro princípio – o da seleção – que Pau-

Cf. estratégia semelhante na articulação dos Livros I-II (Livro II,


1 

Introdução, pp. 11-4).


11
Descrição da Grécia

sânias entende útil recordar (3.11.1): “Ora, do mesmo modo


que, no relato dedicado à Ática, estabeleci o princípio de não
relatar tudo de fio a pavio, mas de tratar apenas daquilo que
considerasse digno de memória, vou aplicar a mesma regra à
Lacedemónia. De facto, por princípio a minha narrativa sele-
cionou, entre muitas coisas sem interesse que cada povo conta
sobre si, o que era mais relevante. Tomada esta decisão sensata,
não há razão para a alterar”. Heródoto parece, sem dúvida, ser
o inspirador deste critério seletivo do relato histórico.
Após a fórmula breve de articulação e a declaração meto-
dológica, Pausânias dá início à narrativa sobre a Lacónia,
avançando com uma primeira etapa de índole histórico-mítica
(3.1.1-3.10.5),2 pré-dórica na sua cronologia, procurando esta-
belecer as origens de uma dinastia fundadora para os Lacede-
mónios e, ao mesmo tempo, observando na nomenclatura da
região e seus habitantes – de Lelégia/Léleges para Lacedemónia/
Lacedemónios – testemunhos desse passado remoto. Os pró-
prios traços geográficos vêm associar provas a este propósito;
elementos importantes na paisagem natural e construída da
Lacónia, como o rio Eurotas, o monte Taígeto ou as cidades
de Esparta e Amiclas, retiram do mesmo passado distante e
obscuro a sua origem e o seu nome (3.1.1-3). A reivindicação
da autoctonia de Lélex (3.1.1) é, à partida, uma afirmação de
ancestralidade e distinção, que se repete de modo insistente
com diversas cidades gregas, desde logo com Atenas. Mas não

2 
Se uma síntese histórica é um elemento que se tornará constante
em Pausânias na abertura dos diferentes Livros, foi também já obser-
vado que é o Livro III a dar início a essa convenção e, neste caso, com
uma extensão apreciável. A diarquia espartana é naturalmente respon-
sável por isso. Sobre as fontes usadas por Pausânias, com relevância
particular para Heródoto no que respeita à primeira fase pré-histórica,
vide Meadows (1995).
12
Pausânias

menos expressiva e convencional é a inclusão, entre os ascen-


dentes do poder num lugar ou cidade, de algum deus, neste
caso o próprio Zeus (3.1.2).
A sucessão de Menelau ao trono de Tíndaro seu sogro,
dada a apoteose dos Dioscuros, os herdeiros diretos, marca
uma etapa relevante na fase pré-dórica deste território, em
que aos Léleges se sucedeu a autoridade aqueia (3.1.5); por
sua vez Tisâmeno, o filho de Orestes, iria protagonizar outro
momento decisivo, em que o domínio aqueu foi substituído
pelo dos Heraclidas.3 À invasão dos Dórios são atribuídas alte-
rações políticas e civilizacionais profundas, que teriam resul-
tado da repartição de poderes entre os chefes da campanha: o
estabelecimento de uma autonomia para a Messénia, atribuída
a Témeno, e a bipartição do governo da Lacónia entre os dois
filhos gémeos de Aristodemo contam-se entre as mais determi-
nantes (3.1.5).
À semelhança do que acontece no Livro I, em que uma
cidade – Atenas – centraliza a narrativa, idêntica função tem
Esparta no Livro III, apesar da atenção que as pequenas povoa-
ções do Peloponeso Sul merecem ao Autor. A existência de
duas linhagens no governo de Esparta, sempre rivais e confli-
tuosas, condiciona a própria narrativa.4 Pausânias considera
oportuno clarificar a metodologia que pretende seguir perante
este modelo excecional de governação (3.1.9): “Mas mesmo
que estivessem de acordo, eu não iria incluir numa lista comum
os descendentes deles. É que não correspondem totalmente em
idade, de modo que primo com primo e filhos de primos, como
também os seus descendentes, não coincidem em número uns

C. séc. XIII a.C.


3 

A par de Heródoto, Tucídides e Xenofonte, Pausânias constitui


4 

uma das grandes fontes de informação sobre a diarquia espartana.


13
Descrição da Grécia

com os outros. Portanto, vou passar em revista cada caso em


separado, sem as misturar a ambas ao mesmo tempo”. Este
propósito anuncia duas longas séries de capítulos, uma dedi-
cada aos Ágidas e outra aos Euripôntidas, em que a atenção
dispensada a cada um dos soberanos é muito assimétrica. Se,
com esta opção, Pausânias evita desfasamentos de gerações que
inevitavelmente não seguem em paralelo, não deixa de acarretar
um inconveniente: o de ter de repetir a narrativa de um mesmo
episódio quando houve, das duas linhagens, cooperação.5 Há
que reconhecer, no entanto, que a insistência num mesmo
episódio pode proporcionar um outro ângulo de visão sobre
acontecimentos que vão desde os tempos míticos de Héracles
até finais do séc. III a.C.
Da ação política da primeira destas dinastias, Pausânias
sobreleva, numa fase inicial, a expansão e tentativa de controle
de territórios adjacentes, como a Acaia, a Arcádia e a Cinúria,
e depois a dimensão colonizadora, primeiro na faixa costeira
da Ásia Menor (3.2-4), mais tarde na Magna Grécia, na dire-
ção ocidental (3.3.1). Mas a história dos séculos seguintes veio
colocar novas exigências e ampliar o espetro de intervenção de
Esparta na Grécia. O relacionamento controverso com Atenas
é salientado em múltiplas referências, que acentuam a intromis-
são que a cidade lacónia foi tendo na política interna da que
viria a ser a sua rival na Ática (3.4.2, 3.5.1, 3.7.8-9). Dispondo

5 
É o caso, por exemplo, da campanha contra Argos e a Cinúria,
narrada, a propósito dos Ágidas, em 3.2.2-4, e retomada a propósito
da ação dos Euripôntidas, em 3.7.2-3. Prezler (2007) 84 valoriza esta
síntese histórica sobre as duas casas reais espartanas como um eixo
essencial na Descrição da Grécia. Dada a importância política de
Esparta, as intervenções dos seus soberanos dentro e para além do
Peloponeso expandem de forma significativa a rede de episódios da
história geral da Hélade abarcada por Pausânias.
14
Pausânias

de um grande potencial militar, relevante foi também o papel


que os soberanos Ágidas tiveram na resistência à invasão persa,
onde os Lacedemónios escreveram algumas das melhores pági-
nas da sua história. Justa é, portanto, a memória da resistência
oposta aos Persas por Leónidas nas Termópilas (3.4.7-8), não
se omitindo igualmente o papel que o seu filho Pausânias veio
a ter na vitória decisiva contra o mesmo invasor em Plateias
(3.4.9). Não é menor a atenção que merece ao autor da Des-
crição da Grécia um conjunto de acontecimentos que agitaram
o mundo grego após o termo das Guerras Pérsicas até ao final
da Guerra do Peloponeso. Heródoto e Xenofonte são fontes
essenciais para lhe orientarem a narrativa dos conflitos que,
ao longo de todo o séc. V a.C., agitaram a Grécia.6 Ainda que
vencedores na Guerra do Peloponeso e por isso credores de
uma incontestada supremacia no mundo grego, os Lacedemó-
nios passaram a gerir mal essa vantagem. Algumas campanhas
desastradas, de resultado incerto, foram cavando a decadência
do seu poder (3.4-5); Leuctras representou, neste trajeto, um
golpe final, transferindo para a Beócia uma autoridade global
sobre a Grécia que escapava a Esparta (3.6.1). Reinados de
resultados inexpressivos ou projetos falhados, rivalidade entre
membros da mesma linhagem no exercício do poder, foram
ditando a instabilidade e decadência da cidade, no que toca à
responsabilidade dos Ágidas.
Terminado o relato da primeira das duas casas régias, Pau-
sânias volta-se para a intervenção dos Euripôntidas (3.7-10.5).
Os critérios usados são, naturalmente, coincidentes com os
seguidos a propósito dos Ágidas: acentuar sobretudo a política

6 
Importa também valorizar a influência das biografias de Plutarco,
decisiva quando se trata de acompanhar a atuação de uma determinada
figura em particular.
15
Descrição da Grécia

expansionista de Esparta e a projeção de um raio de influên-


cia crescente (3.8.3-5); integrar a participação espartana nas
Guerras Pérsicas (3.7.9) e, mais tarde, na do Peloponeso, em
que Arquidamo deixou uma marca decisiva (3.7.10-1). A intro-
missão nos assuntos internos de Atenas e da Ática repetiu-se
no caso dos Euripôntidas que, nessa investida, parecem ter
usado até de uma maior agressividade e ousado agir à revelia
das determinações oficiais de Esparta, ao serviço de um obje-
tivo radical, o de arrasar Atenas (3.8.6). Da amplitude das cam-
panhas levadas a cabo por Esparta após a Guerra do Peloponeso
foi responsável Agesilau II, a quem Pausânias dedica particular
atenção no que toca à atuação dos Euripôntidas (3.9-10).
Em termos ainda globais, Pausânias sublinha desde o início
da sua narrativa a sugestão de um relacionamento, ao mesmo
tempo inevitável – dada a proximidade geográfica – e polémico,
entre a Lacónia e a região vizinha da Messénia, no que constitui
um preâmbulo para a matéria do Livro que irá seguir-se. Desde
tempos míticos que as casas reais as aproximavam (3.1.4), não
sendo essa permeabilidade garantia de uma convivência pacífica
e estável. Com o curso do tempo (já a partir da segunda metade
do séc. VIII), episódios de uma natureza ambígua justificaram
conflitos consistentes entre as duas regiões. Exemplo disso foi
o caso do santuário de Limnas, que serviu de motivo à Pri-
meira Guerra Messénica (3.2.6, 3.7.4). Ainda que prometa para
mais tarde, para o Livro IV sobre a Messénia, um tratamento
aprofundado destes conflitos, Pausânias vai-lhes mesmo assim
adiantando o desfecho, com a vitória da Lacónia e o conse-
quente exílio ou submissão para os vencidos (3.3.2-5, 3.7.6).
Além da instabilidade política e social, os Messénios foram
sofrendo igualmente uma deterioração cultural; pôde assim
acontecer que alguns marcos do seu passado fossem reivindi-
cados pelos Lacónios, como Pausânias reconhece (3.13.2): “No
16
Pausânias

entanto, os desaires dos Messénios e o tempo em que estiveram


exilados do Peloponeso concorreram para que, no regresso, boa
parte do seu passado fosse desconhecida”.
Antes de passarmos a considerar o património construído
de Esparta a que alude este Livro III, será talvez oportuno
reproduzir a observação de Cartledge e Spawforth a este
propósito:7 “No tempo em que Plutarco e Pausânias visitaram
Esparta, a cidade tinha-se tornado uma atração turística e os
chamados costumes de Licurgo não tinham qualquer propó-
sito prático a não ser o de entretenimento para os turistas e de
promoção do orgulho cívico”. É, portanto, com esse olhar que
sublinharemos algumas das referências patrimoniais da cidade
e região guiados por Pausânias.
Associado ao percurso histórico está inevitavelmente o
património construído que dele foi cenário e testemunho. Sob
estes pontos de vista, o Livro que Pausânias dedica à Lacónia
segue uma preferência que se lhe vai tornando habitual: a de
valorizar sobretudo acontecimentos, bem como os edifícios ou
artefactos que marcam a presença das épocas arcaica e clássica.
Ao contrário de Tucídides (1.10.2) que sublinhara uma certa
pobreza no património construído em Esparta – “... dado que
a cidade não tem templos nem edifícios faustosos e não está
construída de forma conjunta, antes se constitui de povoações
dispersas à maneira da antiga Grécia, poderia parecer muito
inferior” –, o autor da Descrição da Grécia dá prova do contrá-
rio. Por outro lado, e reconhecendo a prioridade dada, no que
aos edifícios públicos diz respeito, aos templos ou a todos os
monumentos de alguma forma ligados ao culto, será interes-
sante registar palavras de Cartledge8 sobre a forma como todos

7 
Apud Flower (2018) 427.
8 
(2001) 170.
17
Descrição da Grécia

eles espelham uma certa mentalidade específica: “heroização,


sistema de iniciação, militarização das representações divinas,
distribuição e detalhes sobre as práticas dos festivais – a tudo
isto Pausânias empresta a cor e o aroma recuperáveis apenas
através dos dados arqueológicos e epigráficos”.
Cumprida a introdução histórica, a narrativa evolui então
para um roteiro de património construído, que tem como
ponto de partida a ágora de Esparta, ao tempo de Pausânias
na sua configuração da época romana. Louvada pela impo-
nência monumental – que a recomenda como “digna de ser
vista” (3.11.2) –, a ágora é olhada, antes de mais, como um
lugar de atividade política e administrativa. Musti, Torelli
(2008) 193 repartem a descrição da praça em quatro setores:
“o complexo dos archeia dos magistrados da Esparta romana,
a stoa pérsica, os templos de César e de Augusto, e o complexo
dos hiera arcaicos, estes últimos associados com alguns impor-
tantes túmulos de heróis e com edifícios políticos também da
Esparta arcaica”. Os diversos monumentos que a povoam, em
harmonioso anacronismo, têm portanto subjacentes episódios
determinantes da vida da cidade, como o “pórtico dos Per-
sas” (3.11.3) construído com despojos dos invasores vencidos.
A vénia feita a figuras de destaque entre os inimigos – Mar-
dónio, Artemísia – impõe a valorização da vitória conseguida.
Outra etapa mais recente da história de Esparta, mas igual-
mente bem marcada, é a da ocupação romana, de que os tem-
plos de César e de Augusto dão testemunho (3.11.4). Entre
esses polos situa-se a memória de momentos emblemáticos, na
perspetiva lacónia, da Guerra do Peloponeso, que Pausânias,
como visitante informado, extrai das estátuas dos seus prota-
gonistas (3.11.5).
Da ágora, Pausânias prossegue o seu percurso narrativo
com os vários acessos que se dirigem às povoações limítrofes
18
Pausânias

de Esparta. Sobressai entre elas a rua Afetaída, uma das artérias


axiais da cidade, com cujos edifícios se estabelecem associações
aos principais mitos da cidade, pela sua importância para a coe-
são política e cívica. Este é um espaço associado com o noivado
de Ulisses e Penélope, a filha de Icário, e povoado de templos
e de edifícios públicos do maior relevo, como a Booneta, tida
como antiga residência real (3.12.3-4). Os túmulos atribuí-
dos aos soberanos da era mítica da cidade sucedem-se também
neste mesmo espaço, enquanto os que abrigam os soberanos da
dinastia Euripôntida ocupam, no limite da Afetaída, uma espé-
cie de cintura da cidade (3.14.1-3). Por fim, ainda na mesma
zona anexa à ágora, mas num outro sentido, aquele que prova-
velmente conduz a Terapne, merece menção o Skiás (“Sombri-
nha”), edifício destinado às reuniões da assembleia (3.12.10) e
referências cultuais ligadas a Dioniso.
Não é menor a atenção prestada por Pausânias ao espaço
periférico da cidade, onde, além de memoriais e vários edifícios
de culto, se localizam os recintos desportivos, o Dromos e o Pla-
tanistas. O relevo que cerca Esparta merece ao nosso guia um
interessante comentário. Entre as particularidades do espaço
urbano desta pólis está o facto de não possuir uma acrópole
no verdadeiro sentido da palavra, “instalada num ponto alto
que se veja do espaço em volta” (3.17.1). Por isso os próprios
Espartanos, conscientes da estranheza da situação, passaram
a designar por “acrópole” a mais alta dessas elevações, que se
converteu num santuário que reunia diversos cultos, entre eles
um dos templos mais emblemáticos de Esparta, o de Atena
Chalkíoikos (3.17.1-8).
Pausânias passa depois às povoações suburbanas de Esparta.
Da relação política e administrativa entre elas diz Ducat (2018)
601: “Em certos aspetos cruciais, encontravam-se politicamente
sob o controle de Esparta. A política externa e a guerra eram as
19
Descrição da Grécia

áreas mais óbvias dessa dependência. Mas, além disso, aspetos


da gestão interna das cidades eram determinados por Esparta”.
Na rota que segue neste território, Pausânias dá prioridade a
Amiclas (3.18.6-3.19.6), inspirado pela importância do culto
de Apolo, associado ao de Jacinto, e pela imponência do seu
santuário. Alguns elementos de contexto geográfico e a identi-
ficação de alguns cultos são apenas uma introdução àquilo que,
na verdade, centra a atenção do visitante: o trono do deus e a
sua estátua, sobreposta ao túmulo do seu amado, Jacinto. Báti-
cles de Magnésia vem juntar-se aos nomes emblemáticos dos
artistas locais, como o de Gitiadas, e a outros, de proveniências
diversas e de grande gabarito (Aristandro de Paros e Policlito
de Argos, 3.18.8). O seu cruzamento por Amiclas é a maior
prova do prestígio de Esparta e, em particular, desta região
suburbana, palco de rituais e festas de grande repercussão em
toda a Grécia.
Foi de Báticles a responsabilidade pela construção e decora-
ção do trono de Amiclas (3.18.9). A calcular pela descrição de
Pausânias – após uma visita ao local (“o trono, eu vi-o e, por
isso, posso descrevê-lo em pormenor”, 3.18.9) –, esta seria uma
construção enorme e faustosa. Este edifício, com a configuração
de um pórtico, abrigava uma estátua colossal de Apolo – pelas
suas caraterísticas, de enorme antiguidade (3.19.2) – assente
sobre o túmulo de Jacinto. A estátua seria a peça mais antiga
do conjunto, datável do séc. VII a.C., entretanto cercada por
um complexo de finais do séc. VI a.C. Uma vez mais, Pausânias
é o autor da descrição mais pormenorizada de que dispomos,
na qual assentam as várias tentativas de uma reconstituição.
De acordo com essa descrição, a decoração do trono incluía
alguma estatuária e algo como 45 relevos, representativos de
diversos mitos, dispostos como um friso a circundar todo o
monumento. A sua interpretação suscitou a ideia de que não
20
Pausânias

se trata de uma série aleatória de figuras, mas que o conjunto


obedece a um propósito político, estabelecido de acordo com o
passado mítico de Esparta. A linhagem de Tíndaro e sobretudo
os trabalhos de Héracles (o leão de Némea, a hidra de Lerna, os
Centauros, o Aqueloo, Cicno, Nesso, Diomedes, os filhos de
Actor, o gado de Gérion, o cão Cérbero, ou ainda lutas menos
conhecidas contra o centauro Oríon e o gigante Túrio) detêm
uma evidente relevância. A par de Héracles, Perseu, Teseu e
Belerofonte abrem o espetro de influência cultural a um plano
pan-helénico. Além de toda a decoração exterior, Pausânias
ocupa-se do acesso ao túmulo de Jacinto, onde sacrifícios lhe
eram dedicados nas festas que dele receberam o nome. Um
sentido de ascensão ao convívio dos imortais parecia impregnar
toda a decoração.
Além da imagem de Amiclas, Apolo – “empunhando uma
espada numa mão e um arco na outra” – impunha-se em ati-
tude semelhante numa estátua implantada em Tórnax (3.10.8),
a pouca distância na direção norte da cidade. Era esta, por-
tanto, uma divindade forte na Lacónia, dotada de insígnias
guerreiras, como se tornou comum na representação dos deuses
em toda a região.
Depois de Amiclas, Pausânias prossegue com uma pas-
sagem em revista de diversas povoações do Peloponeso Sul,
sublinhando para cada uma delas os pontos considerados de
interesse, quer nos núcleos urbanos como nos itinerários que
para lá conduzem. Este é um dos momentos em que a sua
descrição – juntamente com a enumeração fornecida pelo
catálogo do Canto II da Ilíada - é decisiva para preservar um
rasto populacional de enorme antiguidade que, de outro modo,
se teria perdido. Aliás, algumas das povoações referidas, nem
mesmo existiam já no tempo de Pausânias. Terapne aparece em
primeiro lugar, seguida de Alésia (3.20.2) e Bríseas (3.20.4),
21
Descrição da Grécia

próximas das faldas do Taígeto, bem como Dereio e Harpleia


(3.20.7); na costa, sucediam-se Helos (3.20.6), Caracoma,
Pelana (3.21.2), Belemina (3.21.3), Gítio (3.21.4, 3.21.6),
Égias (3.21.5). E sob uma legenda comum de “cidades dos
Eleuterolacones”, Pausânias alista dezoito povoações (3.21.7),
tratadas com maior ou menor atenção dependendo das ‘curio-
sidades’ que detinham.
E não é sem intenção que as etapas finais desse percurso
pela Lacónia colocam em causa a pertença territorial de algu-
mas regiões reivindicadas pela Messénia (3.26.3, 3.26.7-8).
Pausânias preparava já, dentro do seu habitual critério, a tran-
sição para o Livro seguinte, justamente dedicado à Messénia.

Práticas, cultos e festas emblemáticos da Lacónia


Não menos determinante do que o fundamento histórico e
a realidade construída é a definição de uma ‘mentalidade espar-
tana’, claramente percetível, mesmo se tratada de forma menos
sistemática, no relato de Pausânias. À contingência histórica,
sem dúvida um fator primeiro no comportamento das comuni-
dades, a intervenção de alguns dos seus membros pode dar ao
mesmo resultado um contributo de peso. Este terá sido decerto
o caso de Licurgo, um quase mítico legislador em quem, reco-
nhecendo-lhe a influência na construção do futuro da cidade,
os Espartanos viram inspiração divina e a quem prestaram uma
homenagem devida a deuses (3.2.4, 3.14.8, 3.16.6). Além da
organização do Estado e do processo educativo que moldava
os cidadãos à medida de um projeto social, práticas, cultos e
festas cooperaram na idiossincrasia de Esparta como uma pólis.
Depois do excurso histórico, Pausânias repõe-nos de novo
junto aos Hermes (3.10.6) para dar início ao percurso da Lacó-
nia. A preparar o roteiro que se irá seguir, o nosso autor começa
22
Pausânias

desde logo com a valorização dos templos e estátuas de deu-


ses que povoam essa região ainda fronteiriça com a Argólida.
E talvez este seja o momento para recordar, de acordo com o
testemunho de Lisístrata de Aristófanes (1296-1315), os deuses
com atributos específicos que os Lacónios identificam como
seus: Apolo Amicleu, Atena Chalkíoikos, os Dioscuros e Árte-
mis Corifeia.

Deixa uma vez mais o Taígeto chedutor e vem,


Muja da Lacónia, chelebrar à nocha moda
o deus de Amiclas,
e Atena da morada de bronje,
e os nobres filhos de Tíndaro, que che ejerchitam na margem
do Eurotas.
Ei, em frente, ó!
Chalta com leveja, ó!
Para chelebrarmos Esparta,
que che encanta com as danchas em honra dos deujes,
e com o bater dos pés.
Lá onde, as mochas chaltam que nem potras,
nas margens do Eurotas,
a erguerem com os pés
nuvens de pó;
os cabelos agitam-che,
que nem bacantes que chacodem o tircho nas chuas danchas.
É a filha de Leda que as conduz,
a pura e propíchia chenhora dos coros.

Bastou percorrer os primeiros caminhos do norte da Lacó-


nia para se encontrar o templo de Ártemis Cariátide, recinto
de uma festa de grande tradição, onde “as jovens lacedemónias
fazem, todos os anos, danças, de acordo com a tradição local”
23
Descrição da Grécia

(3.10.7). Da antiguidade desta cerimónia fala a lenda que


atribuía aos Dioscuros a sua fundação. No centro de Esparta,
outros rituais, presumivelmente de caráter nupcial, envolviam
colégios de mulheres, caso das Dionisíadas e das Leucípides,
associados a Dioniso (3.13.7).
Apolo centra três dos grandes festivais espartanos: os Car-
neia, as Jacíntias e as Gimnopédias. Os Carneia, em honra de
Apolo Carneu (3.13.4),9 parecem ter tido uma difusão geral
pelas cidades de marca dórica. Eram cenário de concursos de
música e poesia muito celebrados. Um outro culto determi-
nante na Lacónia, responsável por uma festa bem conhecida, é
o de Jacinto, um belo jovem amado e involuntariamente morto
por Apolo, cuja tradição se liga naturalmente ao deus. Também
ele radica no passado pré-dórico da região e merece uma refe-
rência quando se trata ainda, para Pausânias, de sintetizar o
ascendente mítico da Lacónia (3.1.3). Da sua importância para
os Lacedemónios dá testemunho, por exemplo, a desmobiliza-
ção que Agesilau II consente de parte do seu exército, de forma
a garantir aos Amicleus a participação nos festejos (3.10.1).10
Do culto de Apolo em Amiclas, Pausânias faz uma longa descri-
ção do rito e do templo em que ele tinha lugar. À semelhança
do que os Atenienses faziam, com a oferta do peplos à sua deusa
protetora, também os Lacedemónios honravam Apolo com a
dádiva anual de uma túnica (3.16.2). Depois de confecionada

9 
Cf. Ateneu 131d-f, que associa as cerimónias dos Carneia com
práticas militares.
10 
Esta atitude, de acordo com Flower (2018) 428, explica-se por um
princípio que parece nortear a religião e o comportamento espartano
em geral: o que se poderia chamar “atuar de acordo com as regras”. Por
isso os vemos mais dispostos a suspender uma campanha militar do que
a alterar o seu calendário de celebrações.
24
Pausânias

em Esparta, num edifício destinado a esse objetivo e, por isso,


designado por “Túnica”, a oferenda seria levada para Amiclas.
Por fim, sobre as Gimnopédias – “a festa mais importante
para os Lacedemónios” (3.11.9) – e a sua natureza resume
Ferreira (2013) 72: “Este festival celebrado em honra de
Apolo tinha uma forte componente militar e educacional. (...)
Segundo um passo das Leis de Platão (1.633c), o programa
das Gimnopédias incluía exercícios de resistência física, cum-
pridos sob grande calor. Os escólios especificam que impli-
cavam lutar e jogar à bola (1.633b, s.v. ταῖς χερσί), e que se
punha à prova a coragem (ἀνδρεία) dos jovens (1.633a, s.v.
τέταρτον). Informa Pausânias (3.11.9) que os Espartanos
tinham ἀγάλματα, ‘imagens’, de Apolo Piteu, de Ártemis e de
Leto na ágora, espaço a que davam o nome de χορός, ‘o lugar
da dança’, por ser ali que durante as Gimnopédias os efebos
executavam as danças (χοροί) em honra de Apolo. A compe-
tição de coros é atestada por Plutarco (Ages. 29.2-3), além de
Ateneu (15.678b-c, cf. supra). A Suda (s.v. Γυμνοπαιδία) refere
a entoação de hinos por coros de rapazes. O Etymologicum
Magnum (s.v. Γυμνοπαιδία) sublinha a origem lacónica do fes-
tival e especifica que rapazes nus cantavam peanes a Apolo”.11
Ártemis Órtia merece também a Pausânias longas conside-
rações, por se tratar do culto a uma imagem com profundas
tradições: provavelmente aquela que Orestes e Ifigénia teriam
resgatado da Táuride e a que a imprevisibilidade do destino
reservou uma longa itinerância, na Grécia, de novo no Oriente,
para finalmente ser deposta na Lacónia (3.16.7-11). Para justi-
ficar a identidade da estátua aqui existente, Pausânias invoca o
ritual de flagelação que veio satisfazer a exigência de sacrifícios

11 
Vide Calame (2018) 182.
25
Descrição da Grécia

humanos colocada pela tradição bárbara do culto.12 Este era


um lugar emblemático de ritos de iniciação e de passagem,
relacionados com o crescimento dos jovens, rapazes e raparigas,
e com a sua inserção social.
Relevância assinalável era a do templo de Atena Chalkíoikos,
a deusa protetora da cidade, no cimo da chamada “acrópole”,
a colina mais elevada em volta de Esparta. O nome de Tín-
daro aparece associado à iniciativa da fundação deste culto,
cujo recinto se apresentava como memorial de algumas das
tradições mais destacadas da cidade – os trabalhos de Héracles
e o rapto das Leucípides pelos Dioscuros. Nomes destacados,
como o do artista Gitiadas, foram encarregados da decoração
de alguma forma exótica do templo e dos objetos que o rechea-
vam (3.17.2-3; cf. 3.18.8). Este era um lugar sagrado em que
os suplicantes encontravam proteção.
Não pode também deixar de referir-se, na ilha de Citera: “o
santuário de Afrodite Urânia é o mais sagrado e o mais antigo
de quantos santuários existem dedicados a Afrodite na Grécia”
(3.23.1); e, no cabo Ténaro, o famoso culto de Posídon (3.12.5,
3.14.2, 3.25.4-8).
A preparação física rigorosa e generalizada a homens e
mulheres produziu, como resultado identificativo de Esparta,
a superioridade do seu exército e a supremacia dos seus atletas.
Assim se justifica o relevo que Pausânias dispensa a estes dois
traços da mentalidade espartana, multiplicando exemplos sig-
nificativos da sua eficácia. Em plena ágora de Esparta, onde,
de acordo com a convenção, inúmeros templos e imagens de
deuses ou de personalidades emblemáticas se reuniam, o espaço

12 
Guarducci (1984) 99-100 prefere entender que, mais do que sig-
nificar a substituição de sacrifícios humanos por uma flagelação ritual,
a sujeição ao chicote era prova de resistência e maturidade.
26
Pausânias

designado por “Coro” era usado, como vimos, para os cantos


que, “nas Gimnopédias – a festa mais importante para os Lace-
demónios” – os efebos entoavam em honra de Apolo (3.11.9).
O seu sentido militar e pedagógico espelhava-se, de alguma
forma, do próprio nome.
Dentro do perímetro da cidade ficava o chamado Dromos,
que mantinha, ainda no tempo de Pausânias, a utilização espe-
rada como local de corrida (3.14.6), e dois ginásios. Ali perto,
a representação de Héracles, um herói lacónio, fundador dos
Jogos Olímpicos e vencedor de tantas façanhas a exigirem
pujança física, tinha toda a pertinência e centrava um lugar de
sacrifícios, associando ao espaço a interferência divina. Perto
do Drómos ficava um outro ponto central na vida desportiva
dos Espartanos, o Platanistas, uma espécie de ilha que rece-
bia o seu nome da quantidade de plátanos que a povoavam
(3.14.8). Nesta espécie de parque natural praticava-se a luta;
Héracles tinha aí uma outra representação, a par do legislador
Licurgo, que “estabeleceu a constituição em geral, mas também
o regulamento para o combate dos efebos”. A superioridade
física ganhava assim, na própria configuração da cidade, uma
pertinência religiosa e cívica evidente.
Por extensão das práticas desportivas e das competições rea-
lizadas em terreno lacónio, a participação espartana nos grandes
jogos pan-helénicos acumulou exemplos de excelência. Cinisca,
a filha de Arquidamo, é referida como “muito empenhada em
competir nos jogos olímpicos” e “a primeira mulher a criar
cavalos e também a primeira a vencer numas Olimpíadas”; ape-
nas a primeira, a que várias outras se seguiram (3.8.1, 3.15.1),
entre elas Eurileónida (3.17.6). Hipóstenes e Hetémocles, pai
e filho, cometeram outra façanha digna de registo: “venceram
a prova de luta, nos Jogos Olímpicos, entre os dois onze vezes”
(3.13.9, 3.15.7). Como extraordinários foram também: Quío-
27
Descrição da Grécia

nis, vencedor em sete corridas olímpicas (3.14.3); Eneto, vito-


rioso no pentatlo (3.18.7), que a morte teria colhido ainda
coroado pela vitória e que se celebrava em Amiclas, experiência
que Ladas, vencedor no duplo estádio, também viveu (3.21.1);
ou, natural de Ácrias, “Nícocles, um campeão olímpico, que
em duas competições obteve cinco vitórias” (3.22.5). Da galeria
de atletas vencedores, a Lacedemónia projetava, com amplitude
helénica, o resultado da sua política educativa.

 tradição homérica: uma garantia de prestígio e


A
ancestralidade
Homero, o cantor da Guerra de Troia – uma expedição
que mobilizou guerreiros das múltiplas cidades gregas, muitas
delas situadas no Peloponeso –, tornou-se uma referência visível
no relato de Pausânias. No catálogo das naus, no contingente
chefiado por Menelau é feito um inventário dessa participação
(Ilíada 2.581-90):

Os que detinham a ravinosa Lacedemónia cheia de grutas,


Fáris e Esparta e Messa cheia de pombas,
que habitavam Briseias e as agradáveis Augeias,
senhores de Amiclas e de Helo, cidadela junto do mar;
eles que detinham Laas e habitavam Étilo:
deles comandava o irmão, Menelau excelente em auxílio,
sessenta naus, separadamente alinhadas.
Entre elas se movimentava confiante na própria vontade,
incitando-os à guerra; muito queria ele no coração
vingar os estrebuchamentos e lamentações de Helena.13

13 
Tradução de Lourenço (2005).
28
Pausânias

Em Esparta, Menelau era considerado um chefe emérito.


No centro da cidade, perto da ágora, um lugar conhecido por
“Helénio” era por alguns identificado como o ponto de encon-
tro do chefe com as suas tropas quando se tratou de preparar a
campanha contra Troia (3.12.6). Dispersos pela cidade, outros
locais serviam de referência à presença do Atrida; assim a casa,
perto do Dromos, que se dizia ter sido a sua habitação (3.14.6).
Por fim, a escassos cinco quilómetros da cidade, em Terapne,
num templo que recebeu o seu nome – o Menelaion – ficava
o que se dizia ser o seu túmulo lado a lado com o de Helena
(3.19.9). Aí se dizia que os Dioscuros, irmãos de Helena, resi-
diam debaixo da terra.
Mas outras menções a figuras homéricas dispersam-se
pelo território em apontamentos inesperados, mas insistentes.
Assim, no trono de Amiclas, estava representada “uma dança
de Feaces e Demódoco a cantar” (3.18.11) numa alusão a um
episódio do nostos de Ulisses associado ao passado de Esparta.
Aquiles, por um lado ainda criança e confiado a Quíron, e, por
outro, quando encarnava já o feroz combatente que enfren-
tou Mémnon (3.18.12), tinha aí também representação. Um
santuário dedicado ao herói da Ftia recebia homenagens dos
competidores no Platanistas (3.20.8). Na povoação de Araíno,
recordava-se ainda a passagem de Aquiles – ou de Pátroclo –
aquando da sua vinda para pedir a Tíndaro a mão de Helena
(3.24.10-1). No final da descrição do trono de Amiclas, acu-
mulava-se a passagem de Menelau pelo Egito no regresso de
Troia, e os rituais fúnebres em honra de Heitor (3.18.16).
Mesmo quando Amiclas já tinha sido destruída pelos Dórios,
ainda contava, nas suas ruínas, com marcas desse passado épico:
um santuário e uma estátua de Cassandra, uma representação
de Clitemnestra e um túmulo dito de Agamémnon assinalavam
essa tradição (3.19.6).
29
Descrição da Grécia

Com este roteiro de marca homérica, Pausânias acentuava


a ancestralidade da região e, por consequência, o seu prestígio.

Mitos influentes de origem lacónia


Associados com a índole cultural da Lacónia são vários dos
mitos mais populares na tradição helénica. A insistência com
que Pausânias os refere é denunciadora da sua popularidade.
A descendência de Ébalo, bisnetos legítimos de Amiclas, Tín-
daro e Icário, foram inspiradores de mitos de forte penetração
no mundo grego em geral. A vida de Tíndaro foi, por um lado,
profundamente marcada pela disputa constante pelo poder a
que foi sujeito por parte do meio-irmão Hipocoonte, um bas-
tardo de Ébalo (3.1.4, 3.21.2). Mas não menos punitivo foi o
comportamento das filhas, Helena e Clitemnestra, que o teriam
levado ao ponto de pretender punir com cadeias Afrodite pela
interferência que pudesse ter tido no porte vergonhoso das
duas beldades (3.15.11). E, no entanto, Tíndaro tinha ten-
tado evitar o desastre que a formosura das filhas prometia. Era
recordado na Lacónia o lugar onde o soberano tinha vinculado
a um juramento os múltiplos pretendentes de Helena, de que
prestariam auxílio àquele que ela escolhesse para marido em
caso de perigo. Este juramento esteve, como é bem sabido,
na origem da mobilização dos heróis gregos para o ataque a
Troia (3.20.9), ou seja, projetou interesses lacónios sobre o
futuro do coletivo helénico. Todo o trajeto de fuga e retorno
da rainha de Esparta era assinalado em diversos locais e monu-
mentos do território; se, por um lado, o caminho da fuga da
bela Tindárida com Páris e o local da consumação do seu amor
andava associado à ilha de Cránae (3.22.1-2); por outro, após
o regresso e numa atitude de vingança, Menelau consagrou às
deusas Praxídicas, garantes da justiça, um santuário na região
30
Pausânias

continental, fronteiriça à mesma ilha (3.22.2) onde o adultério


da mulher se tinha consumado.
A geração seguinte não se mostrou mais harmoniosa. Era
célebre a lenda que opunha os “filhos de Tíndaro”, ou seja,
os Dioscuros, aos filhos do irmão de Tíndaro, Afareu, numa
concorrência por um mesmo casamento: Castor e Pólux não
se coibiram de raptar as Leucípides, filhas de Leucipo, rei da
Messénia, antes prometidas aos seus primos, Ibas e Linceu
(3.13.1, 3.18.11). Com a conivência de Zeus, trouxeram-nas
para Esparta onde as desposaram (cf. Teócrito 22.137-213),
depois de eliminarem os seus concorrentes; a marca dessa vitó-
ria tinha registo na cidade (no troféu que celebrava a vitória
de Pólux sobre Linceu, 3.14.7). Aí foi-lhes dedicado um culto,
assegurado por sacerdotisas que usavam o mesmo nome de
Leucípides (3.16.1). Em Esparta, os Dioscuros eram venerados
como benfeitores da cidade; por isso lhes era aplicado o epíteto
de Ambúlios (“Conselheiros”, 3.13.6). O ovo de Leda, de onde,
segundo a tradição, teriam nascido mostrava-se no santuário
dedicado às Leucípides (3.16.1). Patrocinavam as competições
desportivas, como é atestado pelo seu epíteto de Afetérios asso-
ciado à sua representação “no princípio do Drómos” (3.14.7).
Diversos templos, monumentos ou edifícios, em Esparta e na
região suburbana, eram a evidência do respeito que lhes era
devido (3.14.7, 3.16.2, 3.20.2, 3.26.2).
Não foram inócuas as paixões e o adultério cometido
pelas filhas de Tíndaro. Além da guerra, as dificuldades que o
regresso dos guerreiros experimentou na sua reintegração nas
cidades em que reinavam foram sinal da instabilidade produ-
zida, mesmo entre os vencedores, um pouco por toda a Grécia.
Micenas foi sem dúvida o exemplo mais sonante dessa crise,
que se estendeu à geração seguinte. O homicídio de Agamém-
non, que conduziu à inevitável vingança, transtornou a ordem
31
Descrição da Grécia

normal do exercício do poder na cidade argiva. A errância de


Orestes, tomado pela loucura após o matricídio, tinha deixado
rasto também na Lacónia. Perto de Gítio, uma pedra em bruto
assinalava o lugar onde enfim o matricida se tinha visto livre
da demência (3.22.1).
Por sua vez Icário, como pai de Penélope, deu também um
importante contributo para as lendas mais inspiradoras desde
época muito remota. A tradição que lhe estava associada espe-
lhava-se na toponímia central de Esparta, como a rua Afetaída
(“Partida”, 3.12.1; cf. 3.13.6), à saída da ágora, onde teria tido
lugar a competição por ele imposta aos pretendentes da filha e
ganha por Ulisses. Após esta vitória, contava a lenda que Icário
viu com tristeza a partida de Penélope e tentou, por todos os
meios, retê-la convencendo sem sucesso Ulisses a estabelecer-se
na Lacónia. Colocada entre uma escolha difícil – entre o pai e
o marido – Penélope deu sinal de pretender seguir o herói que
havia conquistado a sua mão; uma estátua erguida por Icário
ao Pudor recordava o gesto discreto de Penélope, velando o
rosto, e assim deixando clara a sua escolha (3.20.10-1). Diver-
sos templos seriam ainda de iniciativa de Icário, em homena-
gem à deusa sua protetora, Atena, com o epíteto de Celeuteia
(“Protetora dos caminhos”).
Por fim Héracles tem, na tradição da Lacónia, uma visibi-
lidade predominante. Vemo-lo intervir no destino político da
região, assumindo, por exemplo, a responsabilidade de repor
Tíndaro, o herdeiro preterido e exilado pelas pretensões de
Hipocoonte, no trono lacedemónio (3.1.5). Mas outros moti-
vos de índole pessoal são invocados para esta chacina (3.15.3-
5), que se associam com a vinda do herói a Esparta. Este é
talvez, na narrativa sobre a Lacónia, o episódio protagonizado
por Héracles que merece maior número de referências (3.10.6,
3.15.3, 3.18.11). No espaço urbano, a sua presença deixou
32
Pausânias

inúmeros vestígios: em memoriais dos filhos de Hipocoonte


(3.14.6); nos herôa de Álcon (3.14.7) e de vários dos seus
irmãos (3.15.1); no templo de Atena Vingadora que Héra-
cles ergueu em honra do patrocínio da deusa à sua desforra
(3.15.6); no santuário e nos sacrifícios que instituiu a Hera,
sua habitual inimiga, por não lhe ter criado obstáculo nesta
façanha (3.15.9). Mas a mesma visibilidade se estendeu a áreas
suburbanas. Assim, no caminho que de Amiclas conduzia a
Terapne, um templo dedicado a Asclépio Cotileu pelo próprio
herói dava mostras do reconhecimento de Héracles ao deus que
o curou de um ferimento contraído no confronto com os filhos
de Hipocoonte (3.19.7; cf. referência equivalente em 3.20.5).
Naturalmente que alguns dos seus trabalhos originaram lendas
locais sobre a sua presença no território; assim o Ténaro era
tido como o ponto em que o herói acedeu ao Hades e dele
trouxe o cão Cérbero (3.25.5).
Das informações incluídas no roteiro proposto por Pausâ-
nias sobressai a ideia, motivadora de uma enorme controvérsia,
de que Esparta estava muito longe de apresentar o perfil de
cidade sombria, fechada, ou mesmo um tanto provinciana, que
tende a ser-lhe imputado. Mais do que uma graduação den-
tro de uma escala de valores, ou de comparações desfavoráveis
com as suas principais rivais no mundo grego, o que sobretudo
sobressai do testemunho de Pausânias é a idiossincrasia que faz
de Esparta e da Lacónia um contributo de excelência para o
desenho de uma Grécia superior.

33
(Página deixada propositadamente em branco)
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41
(Página deixada propositadamente em branco)
PAUSÂNIAS
DESCRIÇÃO DA GRÉCIA
3.LACÓNIA
(Página deixada propositadamente em branco)
3.1.1. Origens míticas
A seguir aos Hermes,1 para ocidente, já é Lacónia. Ao que
dizem os próprios Lacedemónios, Lélex, um autóctone, foi
o primeiro a reinar naquela terra e dele receberam nome os
Léleges, de que era soberano.2 De Lélex nasceram Miles e um
outro filho mais novo, Policáon. Onde Policáon se foi estabe-
lecer e por que motivo, falarei adiante.3 Depois da morte de
Miles, foi Eurotas, o seu filho, quem assumiu o poder. Este
fez escoar para o mar a água que alagava a planície, através de
um canal; a esta corrente – porque a água restante formou o
curso de um rio – deu o nome de Eurotas.4 1.2. Como não

1 
Esta é uma expressão de encadeamento com o final do Livro II; em
2.38.7, Pausânias referiu-se às estátuas de Hermes existentes nas alturas
do monte Párnon, “onde se estabelece a fronteira entre os Lacedemónios
e os Argivos e Tegeatas”. Este pode ser o momento para mencionar
sinteticamente a configuração geográfica da Lacónia com as suas refe-
rências principais. Esta região ocupa a parte sudeste do Peloponeso,
e consta de uma vasta planície cruzada pelo curso do Eurotas. Nos
extremos oriental e ocidental, é circunscrita pelos montes Párnon e
Taígeto que, prolongando-se até aos cabos de Málea e Ténero, definem
o contorno do Golfo da Lacónia.
2 
O próprio território, a partir dele, usava o antigo nome de Lelégia.
Foi o genro de Eurotas, Lacedémon, quando mais tarde assumiu o
poder (vide infra 3.1.2), quem lhe mudou o nome para Lacedemónia.
Logo, Pausânias considera os Léleges os primeiros habitantes da
Lacónia. Musti, Torelli (2008) 167 resumem a propósito: “Portanto,
ao primeiro estrato de povoamento e tradições míticas sobre a Lacónia
pertencem nomes de mero significado étnico (não grego) e territorial:
um nível pré-dórico, construído com materiais míticos (que o mito
apresenta com a sua função fundamental de fantasia em torno do
passado), expresso através de noções principalmente geográficas e a
intuição de relações autênticas entre os Gregos e o ambiente em que
progressivamente penetraram”.
3 
Vide infra 4.1.2.
4 
“De bela corrente”. Com o seu curso de c. 100 km, o Eurotas é um
rio importante na região. Corre entre a Lacónia e a Messénia, cruza os
45
Descrição da Grécia

tinha filhos varões, legou o trono a Lacedémon, cuja mãe era


Taígete, de quem recebeu nome o monte;5 e o pai era, a fazer
fé no que se dizia, o próprio Zeus. Lacedémon casou com
Esparta, filha de Eurotas.6 Quando assumiu o poder, começou
por determinar que a região e os seus habitantes lhe adotas-
sem o nome; a seguir, edificou uma cidade a que, do nome da
mulher, chamou Esparta, nome esse que ainda hoje conserva.7
1.3. Amiclas, filho de Lacedémon,8 no desejo de ele próprio
deixar algo que o recordasse, erigiu uma cidade na Lacónia.9
Dos filhos que teve, o mais novo e mais esbelto, Jacinto, quis
a sorte que morresse primeiro do que o pai.10 O seu túmulo

montes Taígeto e Párnon e desagua no golfo da Lacónia.


5 
Taígeto era o nome do monte que separa a Lacónia da Messénia.
6 
Eurotas tinha uma outra filha, de nome Tíasa, referida infra
3.18.6.
7 
Heródoto 7.234.2 coloca na boca de Demarato a seguinte dis-
tinção entre Lacedemónios e Espartanos: “Na Lacedemónia, há uma
cidade – Esparta – com uns 8 000 homens aproximadamente. Todos
eles são iguais aos que aqui combateram. Os outros Lacedemónios,
desde logo, não se lhes podem comparar, embora sejam também valo-
rosos”. Por sua vez Richer (2007) 236 faz, a propósito das mesmas
designações, as considerações seguintes: “Os Espartanos eram um
subgrupo dos Lacedemónios, nomeadamente os que provinham da
própria Esparta, a principal cidade da Lacónia. Controlavam outros
homens livres, os ‘periecos’, que viviam nos arredores da cidade e eram
mobilizados sob o comando dos Espartanos. Em fontes antigas, o termo
‘Lacedemónios’ é muitas vezes usado para designar os Espartanos,
embora seja preferível manter essa velha distinção”.
8 
Filho de Lacedémon e de Esparta.
9 
A cidade de Amiclas, situada a escassos quilómetros de Esparta,
foi a maior da região, antes da chegada dos Dórios.
10 
Segundo Pausânias, os filhos de Amiclas seriam três: além de
Jacinto, Árgalo e Cinortas. Sobre a morte de Jacinto, cf. Apolodoro
1.3.3. A beleza de Jacinto encantou Apolo. As afinidades entre ambos
são enunciadas por Vergara Cerqueira (2019) 191 com estas palavras:
“Como metáfora da relação erastês/erômenos, J. passou a ser visto como
46
Pausânias

fica em Amiclas, por baixo da estátua de Apolo. Por morte


de Amiclas, o poder passou para Árgalo, o filho mais velho,
e mais tarde, quando Árgalo morreu, para Cinortas, que foi
pai de Ébalo. 1.4. Este tomou por mulher Gorgófone, filha
de Perseu, uma argiva, de quem teve Tíndaro. Hipocoonte,11
no entanto, disputou-lhe o poder, reclamando para si o trono
na qualidade de primogénito. Apoiado por Icário e pelas suas
tropas, ficou numa posição de grande vantagem sobre Tíndaro.
Então este – na versão dos Lacedemónios –, com receio, viu-
-se forçado a afastar-se para Pelana.12 A versão dos Messénios,
por seu lado, é esta: que ele se refugiou na Messénia, na corte
de Afareu, que era irmão de Tíndaro pelo lado da mãe, e filho

um protegido de A., que lhe ensinará o conhecimento da adivinhação, o


tiro de arco e a música (μουσικήν), o uso da lira sem notas discordantes
(λύρας μὴ ἀπῳδὸν εἶναι), e o encarregará dos jogos da palestra, e lhe
possibilitará percorrer, transportado sobre cisnes, todos os lugares que
eram caros a Apolo (Filóstrato, Jun. Im. XIV, 5-8)”. Conta a lenda que,
num jogo, o deus lançou um disco que, levado pelo vento – Zéfiro
vinga-se deste modo da indiferença de Jacinto ao seu amor –, acertou no
jovem e o matou. Penalizado com o acidente, o deus comprometeu-se
a celebrar o jovem com a sua lira e transformou-o em flor (cf. Ovídio,
Metamorfoses 10.162-219). Não admira, portanto, a vizinhança entre
o túmulo de Jacinto e a estátua de Apolo. Sobre este mito, vide ainda
Rodrigues (2021) 23-5.
11 
Hipocoonte era um filho bastardo de Ébalo e da ninfa Bátia e,
portanto, meio-irmão de Tíndaro e de Icário. Considerados filhos de
Ébalo, eles são, em outras versões, tidos por filhos de Gorgófone e de
Perieres, um primeiro marido que ela tinha tido antes de Ébalo. A
disputa que Hipocoonte, o bastardo, se permitiu travar em relação a
Tíndaro, justifica-se por Hipocoonte ser mais velho, ainda que nascido
fora do casamento; Tíndaro tinha a seu favor, além de ser legítimo,
talvez o facto de ter nascido quando o pai era já rei (sobre este último
argumento, cf. Heródoto 7.3.3). Sobre o assunto, vide supra 2.18.7 e
nota respetiva.
12 
Outra cidade da Lacónia; vide infra 3.21.2, 3.26.2.
47
Descrição da Grécia

de Perieres.13 E acrescentam que se instalou em Tálamas, uma


cidade messénia,14 onde lhe nasceram os filhos. 1.5. Tempos
mais tarde, regressou e foi reposto no trono por Héracles.15
A Tíndaro, sucederam no poder os filhos e Menelau, filho de
Atreu e seu genro;16 seguiu-se-lhe Orestes, que se casou com
Hermíone, filha de Menelau.17 Aquando do regresso dos Hera-
clidas – reinava então Tisâmeno, filho de Orestes –,18 cada uma
das partes do território, Messénia e Argos, ficaram sob a sobe-
rania a primeira de Témeno, e a segunda de Cresfonte.19 Na
Lacedemónia, sendo os filhos de Aristodemo20 gémeos, pas-

13 
Segundo o mito, Perieres, filho de Éolo, tornou-se rei da Mes-
sénia. Casado com Gorgófone, filha de Perseu e de Andrómeda, teve
dois filhos: Afareu e Leucipo (vide supra nota 12, infra 4.2.4). Tíndaro e
Icário, seus meios-irmãos, viriam a nascer do casamento de Gorgófone
com Ébalo; cf. Graves (1977) II.246.
14 
Vide infra 3.26.1-3. Naturalmente os Messénios reivindicam para
si a tradição ligada ao exílio de Tíndaro, dando voz à eterna rivalidade
entre as duas regiões.
15 
Héracles eliminou Hipocoonte e os filhos e restituiu o poder a
Tíndaro; cf. Apolodoro 2.7.3.
16 
Tíndaro tinha filhos varões, os Dioscuros, cuja apoteose os impe-
diu de dar continuidade ao poder do pai. Foi através do casamento de
Helena com Menelau que se encontrou um sucessor para Ébalo. Com
a subida de Menelau ao trono, o poder na Lacónia passou dos Léleges
para os Aqueus e com eles se manteria até à chegada dos Dórios.
17 
Cf. Eurípides, Andrómaca.
18 
Como filho de Orestes e de Hermíone, Tisâmeno reinava sobre
Argos, Micenas e Esparta, mas foi derrubado do poder pelos Heracli-
das. Com ele terminou, portanto, a dinastia atrida na Lacónia.
19 
Sobre a partilha do poder entre os Heraclidas, nomeadamente
Témeno e Cresfonte, vide supra 2.18.7-8 e notas respetivas. A Lacónia
coube aos filhos de Aristodemo, Procles e Eurístenes, que deram início
à diarquia espartana. Este processo teria ocorrido na segunda metade
do séc. X a.C.
20 
Aristodemo era um irmão já falecido de Témeno e Cresfonte, os
Heraclidas que chefiaram a conquista do Peloponeso; vide supra 2.18.7.
48
Pausânias

saram a existir duas linhagens régias, com o acordo da Pítia,


ao que consta. 1.6. Quanto a Aristodemo, encontrou a morte
em Delfos, segundo dizem, antes de os Dórios chegarem ao
Peloponeso. Há quem afirme, torcendo a história a seu favor,
que Aristodemo foi atingido com o arco por Apolo, por não
ter vindo consultar o oráculo, mas por ter sido informado por
Héracles, com quem antes tinha tido um encontro, da vinda
dos Dórios para o Peloponeso. Todavia é mais verosímil que o
tenham matado os filhos de Pílades e de Electra,21 que eram
primos de Tisâmeno, o filho de Orestes.22 1.7. Aos filhos Aris-
todemo deu os nomes de Procles e Eurístenes, que, apesar de
gémeos, eram muito diferentes.23 E embora tivessem chegado a
odiar-se profundamente,24 mesmo assim auxiliaram Teras, filho

21 
Medonte e Estrófio.
22 
Heródoto 6.52 testemunha ainda uma outra versão: Aristodemo
não teria sido morto, mas participado na conquista do território de que
lhe coube a Lacónia.
23 
Por a dinastia dos Ágidas ser considerada mais antiga, podia
admitir-se que Eurístenes fosse também mais velho do que o irmão.
A ideia de que se tratava de gémeos, por seu lado, ajudava a justificar
a monarquia dual (cf. Heródoto 6.52.2-4). Teria havido no processo
um artifício da mãe, Argia, para conseguir esse resultado. Morto
Aristodemo pouco depois do nascimento dos filhos, Argia, valendo-se
da semelhança entre eles, simulou não saber qual era o primogénito,
a quem os Lacedemónios pretendiam atribuir a sucessão. Perante a
dificuldade, a Pítia teria declarado que os designassem reis a ambos,
ainda que ao primogénito fossem atribuídas honras superiores (6.51.1,
6.52.5). Possivelmente esta justificação mítica aludia a algum acordo
estabelecido entre duas famílias poderosas que repartiram, em época
arcaica, o poder em Esparta. Sobre a diarquia espartana, cf. Sahlins
(2011).
24 
Heródoto 6.52.8 insiste na animosidade que sempre existiu entre
os dois irmãos.
49
Descrição da Grécia

de Autésion,25 irmão da mãe deles, Argia, e também seu tutor,


que projetava fundar uma colónia. Essa colónia Teras pretendia
estabelecê-la na ilha então chamada Caliste.26 Esperava que os
descendentes de Membliaro lhe cedessem voluntariamente o
poder. 1.8. E foi isso mesmo que eles fizeram, tendo em con-
sideração que Teras pertencia à família de Cadmo, enquanto
eles eram descendentes de Membliaro,27 um homem do povo a
quem Cadmo concedeu a autoridade sobre os colonos da ilha.
Teras mudou então o nome da ilha para o seu próprio, e ainda
agora as gentes de Tera todos os anos lhe prestam homenagem,
como seu fundador. Procles e Eurístenes, quando se tratou dos
interesses de Teras, puseram-se de acordo; de resto, a incompa-
tibilidade entre eles era total. 1.9. Mas mesmo que estivessem
de acordo, eu não iria incluir numa lista comum os descenden-
tes deles. É que não correspondem totalmente em idade, de
modo que primo com primo e filhos de primos, como também
os seus descendentes, não coincidem em número uns com os
outros. Portanto, vou passar em revista cada caso em separado,
sem as misturar a ambas ao mesmo tempo.28

25 
Segundo a tradição, Teras era um tebano, descendente de Polini-
ces (cf. Heródoto 4.147.1), e, em última análise, de Cadmo, o fundador
da cidade. Durante a menoridade dos sobrinhos, Teras foi regente em
Esparta. Seu pai Autésion tinha partido para Esparta em obediência a
um oráculo (vide infra 9.5.8); sobre Argia, cf. Heródoto 6.52.2.
26 
Nome antigo de Tera (cf. Heródoto 4.147.4). Este processo de
fundação da colónia terá ocorrido c. 750 a.C. Heródoto 4.147.3 justifica
este desejo de Teras com o repúdio por se ver governado por outros,
quando o trono da cidade passou para os sobrinhos, ele que até aí
detivera o poder.
27 
Um fenício, que acompanhou Cadmo na busca da irmã, Europa.
Cf. Heródoto 4.147.4-5, que, no entanto, identifica Membliaro como
parente de Cadmo.
28 
Sobre a linhagem dupla na casa real espartana, cf. Heródoto
6.51-60.
50
Pausânias

3.2.1. Os Ágidas
Ao que se conta, Eurístenes, o filho mais velho de Aristo-
demo, teve um filho, Ágis;29 daí que a descendência de Eurís-
tenes seja chamada Ágidas. 30 No seu reinado, o projeto de
Patreu, filho de Prêugenes, de instituir na Acaia uma cidade
que dele recebeu o nome de Patras – que ainda hoje conserva
–, teve a cooperação dos Lacedemónios. Concordaram também
que Gras, filho de Équelas, filho de Pêntilo, filho de Orestes,31
embarcasse a fundar uma colónia. Ele foi então aportar na
região situada entre a Iónia e a Mísia, que hoje em dia se chama
Eólia.32 É que o seu avô Pêntilo já se tinha antes apropriado
de Lesbos, a ilha fronteiriça ao continente. 2.2. No reinado
de Equéstrato,33 filho de Ágis, em Esparta, os Lacedemónios
expulsaram os Cinúrios em idade militar, invocando como
pretexto que, sendo eles parentes dos Argivos, permitiam que
bandidos da Cinúria arrasassem a Argólida, e eles próprios
faziam, às claras, incursões nesse território.34 Diz-se, de facto,
que os Cinúrios descendem dos Argivos, e afirma-se que são

29 
Eurístenes reinou entre c. 1102-1059 a.C. e Ágis a partir de então.
30 
Pausânias dedica a sua atenção à primeira das duas casas reais de
Esparta. Dentro de cada uma delas, a sucessão era hereditária. Na diar-
quia, o exercício do poder conferia direitos iguais a ambos os monarcas.
Heródoto 7.204 traça a genealogia ascendente de Ágis até Héracles.
Do reinado de Ágis I, Pausânias distingue a fundação de duas cidades,
Patras, na Acaia, e Eólia, entre a Iónia e a Mísia, na Ásia Menor.
31 
Pêntilo era um filho bastardo de Orestes, nascido de uma relação
com Erígone, filha de Egisto e Clitemnestra. Em Lesbos, fundou uma
cidade que dele recebeu o nome, Pêntile.
32 
Heródoto 1.149 enumera as cidades colonizadas na região da Ásia
Menor designada por Eólia. Esta ocupava um território situado no
noroeste da Anatólia, compreendendo sobretudo a faixa costeira e ilhas
adjacentes.
33 
C. 1058-1024 a.C.
34 
Situada a nordeste do Peloponeso, entre a Argólida e a Lacónia,
51
Descrição da Grécia

uma colónia fundada por eles, por iniciativa de Cinuro, filho


de Perseu. 2.3. Não muitos anos mais tarde, Labotas, filho
de Equéstrato, assumiu o poder em Esparta.35 Heródoto,36 no
seu relato sobre Creso, diz que esse Labotas, quando criança,
teve por tutor Licurgo, o legislador; mas o nome que lhe dá é
Leobotas, não Labotas. Foi nesse tempo que, pela primeira vez,
os Lacedemónios entenderam fazer guerra contra os Argivos. 37
Acusavam-nos, depois de eles, Lacedemónios, terem tomado
Cinúria, de interferirem e incentivarem à insubordinação os
periecos, que eram seus súbditos. Esta guerra, porém, não levou
a nenhum desfecho, nem produziu, ao que se diz, de nenhuma
das partes qualquer rasgo digno de registo. 2.4. Da mesma
linhagem, sucederam-se no poder Dorisso, filho de Labotas, e
Agesilau, filho de Dorisso, ambos tendo tido uma vida curta.38
Ainda assim, foi no reinado de Agesilau que Licurgo estabele-
ceu um código de leis para os Lacedemónios. Há quem diga
que ele estabeleceu esse código inspirado nesse sentido pela
Pítia, outros que ele teria trazido essa legislação de Creta.39

a Cinúria foi sempre motivo de conflitos entre as duas regiões; cf.


Tucídides 4.56.2, 5.14.4, 5.41.2.
35 
C. 1024-987 a.C.
36 
1.65.4. Na qualidade de tio do soberano.
37 
Como cidade militarizada, Esparta começou a desenvolver
uma política de expansão pelos territórios vizinhos. Ainda que muito
sumários, os tópicos destacados por Pausânias a propósito de cada nova
etapa na dinastia dos Ágidas são relevantes para o progresso do perfil
da Esparta arcaica.
38 
Dorisso, c. 987-958, e Agesilau I, c. 958-914 a.C.
39 
Cf. Heródoto 1.65.3-4, Xenofonte, Constituição dos Lacedemónios
8.5, Platão, Leis 1.624, Aristóteles, Política 1271b 20-1272b 23, Plutarco,
Vida de Licurgo 4.1, Políbio 6.45-7. Embora as diversas referências se
dividam entre a origem délfica ou cretense da legislação estabelecida
por Licurgo, a preferida pelos Espartanos era a délfica; não restam,
porém, dúvidas da existência de contactos ancestrais entre Esparta e
52
Pausânias

Por seu lado, os Cretenses dizem que devem o estabelecimento


dessas leis a Minos, não sem que antes Minos se tivesse acon-
selhado com um deus. Parece-me que também Homero alude
à legislação de Minos com estes versos:

Entre elas está Cnossos, uma cidade pujante, onde Minos,


Interlocutor de Zeus soberano, reinou por nove anos.40

2.5. Licurgo, então, irei recordá-lo mais adiante.41 O filho


de Agesilau foi Arquelau e, no seu reinado, os Lacedemónios
venceram na guerra uma cidade dos periecos,42 Égis, e redu-

Creta. Esta opção valorizava o ascendente sacro da lei, garantindo-lhe


assim uma maior autoridade. A legislação de Licurgo, a que Pausânias
dá relevo, constituiu de facto um passo importante na evolução de
Esparta, de pequena vila dórica para uma pólis de índole marcadamente
militar, com instituições – a gerousía e o eforato – estabelecidas. Sobre
Licurgo e o seu papel como legislador, vide Leão (2003c) 33-48, Nafissi
(2018) 93-123.
40 
Odisseia 19.178.
41 
Vide infra 3.14-8.
42 
C. 914-854 a.C. “Periecos” são “aqueles que vivem em volta”,
um estatuto conferido a algumas cidades dóricas, sobretudo em torno
de Esparta. Ducat (2018) 596 afirma a propósito: “Os historiadores
modernos, com os correspondentes antigos, concordam em definir os
periecos como a classe de gente que, quando unidos aos Espartanos
propriamente ditos, formavam a comunidade dos Lacedemónios”. Estas
populações, ainda que livres, não detinham direitos civis nem participa-
vam nas decisões políticas tomadas pelos residentes na cidade. Seriam
constituídos, sobretudo, por gente de origem aqueia, anterior à vinda
dos Dórios e, por isso, socialmente secundarizada. Era caraterístico
de Esparta uma espécie de pulverização de núcleos populacionais sem
que um centro urbano propriamente dito e uma cintura de muralhas
lhe conferisse um estatuto bem definido. Sobre esta categoria social,
cf. Domínguez Monedero, Pascual González (1999) 111-4. Pausânias
assinala aqui um primeiro conflito entre Esparta e a Arcádia, ainda que
confinado a uma povoação.
53
Descrição da Grécia

ziram-na à escravatura; suspeitavam de que os Égidas fossem


simpatizantes dos Arcádios. Carilau, o soberano da outra linha-
gem, aliou-se a Arquelau na tomada de Égis. Tudo aquilo que
ele, por sua conta, levou a cabo na chefia dos Lacedemónios,
vou narrá-lo quando passar ao relato a propósito dos chamados
Euripôntidas.43 2.6. O filho de Arquelau era Téleclo.44 No seu
reinado, os Lacedemónios venceram em combate os periecos
e tomaram Amiclas, Fáris e Gerantras,45 que pertenciam aos
Aqueus. A população de Fáris e de Gerantras, atemorizada
com a invasão dos Dórios, abandonou o Peloponeso, depois de
estabelecidos determinados acordos; mas quanto à de Amiclas
não bastou uma incursão para a expulsarem, porque opôs uma
enorme resistência armada e cometeu atos de grande heroísmo.
Os próprios Dórios o demonstram com o trofeu que erigiram
à vitória sobre os Amicleus, dando sinal de que, para eles, esta
tinha sido uma façanha gloriosa. Não muito tempo depois,
Téleclo foi morto pelos Messénios num santuário de Ártemis,
erigido na fronteira entre a Lacónia e a Messénia, numa região
chamada Limnas.46 2.7. Após a sua morte, Alcâmenes, filho

43 
Vide infra 3.7.3.
44 
C. 854-814 a.C.
45 
Esparta prosseguia com a expansão e absorção das pequenas
comunidades mais próximas, num período que antecedeu de pouco a
primeira guerra contra a Messénia (750-740 a.C.). Cepeda Ruiz (2006)
946 pode concluir: “A situação privilegiada de Esparta tornava possível
a sua expansão para os quatro pontos cardiais, levando, na direção
norte, a sua expansão até às colinas da Arcádia; para leste, atravessando
o monte Párnon, até Cinúria, onde se defrontaria com o seu eterno
inimigo dório, Argos; com ele tropeçaria também na direção sul, até ao
golfo da Lacónia. A anexação mais apetecível seria a ocidental, de uma
Messénia possuidora de grandes extensões de terras férteis”. Sobre Fáris
e Amiclas, cf. Ilíada 2.582, 584, Estrabão 8.363.
46 
Vide infra 4.4.1-3. Segundo a versão espartana, Téleclo teria sido
morto em defesa de jovens espartanas que participavam num festival a
54
Pausânias

de Téleclo, assumiu o poder.47 Foi então que os Lacedemónios


enviaram a Creta Cármides, filho de Êutis, um sujeito notável
em Esparta, para pacificar as convulsões entre Cretenses; e,
quanto às cidades bastante afastadas do mar e por qualquer
outra razão expostas, convencer os Cretenses a abandoná-las e,
em vez delas, a erigirem outras com uma localização costeira
mais favorável. Arrasaram também a cidade de Helos,48 junto
ao mar, de que os Aqueus se tinham apoderado, e venceram
em combate os Argivos, que tinham vindo em socorro dos
hilotas.49

3.3.1. Ainda a expansão de Esparta. Questões de sucessão


Morto Alcâmenes, Polidoro, o seu filho, ocupou o poder;
os Lacedemónios enviaram então uma colónia para Crotona,
na Itália, e outra para Locros,50 junto ao cabo Zefírio. Foi no
reinado de Polidoro que a chamada guerra messénica atingiu o

Ártemis, em Limnas, assaltadas por Messénios. Estes, por seu lado, con-
trapunham que Téleclo teria infiltrado no santuário rapazes disfarçados
de moças, na intenção de chacinar os Messénios que o frequentavam.
Este conflito estaria na base da Primeira Guerra Messénica.
47 
C. 814-777 a.C.
48 
Vide infra 3.20.6-7, situada um pouco a oriente de Gítio. Assim
prosseguia a expansão do poder de Esparta na Lacónia. Sobre a captura
desta cidade, vide Éforo, FGrHist 70 F117.
49 
Os hilotas tinham estatuto de escravos. Constituíam uma
população suburbana, sujeita a exercer um conjunto de tarefas ser-
vis destinadas a garantir, por exemplo, o abastecimento alimentar à
população citadina. A sublevação, entre eles, era um risco permanente
e efetivo. Sobre os grupos inferiores na sociedade espartana, cf. Domín-
guez Monedero, Pascual González (1999) 104-5.
50 
É mais ou menos consensual que Crotona era uma colónia aqueia
e não espartana; por seu lado, os Locros que habitavam o cabo Zefírio
eram um grupo de Locros ózolas e opúncios. Em ambos os casos trata-
-se de um processo de colonização no sul da Itália.
55
Descrição da Grécia

seu auge. Os Lacedemónios e os Messénios não coincidem nas


razões desse conflito. 3.2. O que é que uns e outros dizem, e
qual foi o desfecho desta guerra, é o que passarei a relatar mais
adiante na minha narrativa.51 Para já, bastará recordar que,
na sua maior parte, ela a princípio foi conduzida, do lado dos
Lacedemónios, por Teopompo, filho de Nicandro, membro
da outra linhagem.52 Levada a cabo a guerra contra a Mes-
sénia, com a derrota desta pelos Lacedemónios, Polidoro,53
que gozava de grande reputação em Esparta e detinha a maior
simpatia dos Lacedemónios, sobretudo do povo – de facto,
jamais cometia um ato violento ou tinha uma palavra sobran-
ceira fosse para quem fosse, bem pelo contrário, quando se
tratava de aplicar a justiça usava de uma correção não isenta
de humanidade –, pois tendo já Polidoro um nome célebre em
toda a Grécia, 3.3. foi morto por Polemarco, um lacedemónio
de origem sonante, mas com uma grande agressividade, como
ficou demonstrado. Quando ele morreu, os Lacedemónios pres-
taram-lhe muitas e merecidas homenagens.54 Todavia existe
também em Esparta um túmulo de Polemarco, ou porque antes
ele tivesse sido considerado um homem bom, ou porque os
parentes o tivessem sepultado clandestinamente.
3.4. No reinado de Eurícrates, filho de Polidoro, os Mes-
sénios resignaram-se a ser súbditos dos Lacedemónios, e, por
parte do povo argivo, não houve nenhuma perturbação. Mas,
no tempo de Anaxandro, filho de Eurícrates – numa altura
em que o destino expulsava os Messénios do Peloponeso –, os

51 
Vide infra 4.6-13.
52 
Vide infra 4.4.4, 4.6.4-5. Ou seja, um Euripôntida, rei no séc.
VIII a.C.
53 
Um Ágida.
54 
Vide infra 3.11.10 e 3.12.3.
56
Pausânias

Messénios rebelaram-se contra os Lacedemónios. Durante um


tempo opuseram resistência, mas, depois de vencidos, abando-
naram o Peloponeso; todos os que ficaram para trás, tornaram-
-se servos dos Lacedemónios, exceto aqueles que ocupavam
povoações costeiras. 3.5. O que aconteceu nesta guerra que os
Messénios travaram depois de se sublevarem contra os Lace-
demónios, não é oportuno relatá-lo nesta fase da narrativa.
De Anaxandro foi filho Eurícrates, e deste segundo Eurícrates
nasceu Léon. Nos seus reinados, os Lacedemónios sofreram
um sem número de reveses na guerra contra os Tegeatas. Mas
no tempo de Anaxândrides, filho de Léon, levaram a melhor
nessa guerra.55 Eis como tudo se passou. Um lacedemónio,
Licas56 de seu nome, veio para Tégea. Dava-se o caso de então
as duas cidades estarem em paz. 3.6. Com a chegada de Licas
puseram-se à procura dos ossos de Orestes. Os Espartanos
procuravam-nos por determinação de um oráculo. Ora Licas
percebeu que eles estariam na oficina de um ferreiro. A sua
ideia era esta. Tudo aquilo que via nessa oficina relacionou-o
com o oráculo de Delfos: os foles do ferreiro comparou-os aos
ventos, porque também eles expelem o ar com força; o golpe
e contra-golpe, ao martelo e à bigorna; o ferro correspondia
ao sofrimento humano, porque se usa o ferro nos combates;
pois no tempo dos chamados heróis, o deus tinha dito que a
causa do sofrimento humano era o bronze.57 3.7. Ao oráculo

55 
C. 550-520 a.C. Vide infra 4.15-23, Heródoto 1.67.1. Esta repre-
senta mais uma etapa nos conflitos entre Lacedemónios e Arcádios.
56 
Sobre Licas, cf. Heródoto 1.67-8. Pausânias parafraseia de perto
Heródoto, que é, no entanto, mais pormenorizado na narrativa.
57 
Sobre este oráculo e as questões que levaram à sua consulta, cf.
Heródoto 1.67.2; na versão do historiador de Halicarnasso, a pronúncia
do oráculo pretendia fornecer aos Lacedemónios uma solução para
levar a cabo com êxito o conflito contra os Tegeatas. A uma primeira
57
Descrição da Grécia

dado aos Lacedemónios sobre os ossos de Orestes, correspon-


deu um outro dado mais tarde aos Atenienses, encarregando-
-os de trazerem Teseu de Ciro para Atenas, sem o que não
poderiam tomar Ciro. Quem descobriu os ossos de Teseu foi
Címon, filho de Milcíades, usando de habilidade; não muito
depois tomou Ciro.58 3.8. Que as armas, no tempo dos heróis,
eram todas de bronze testemunham-no também os versos de
Homero a propósito do machado de Pisandro e da flecha de
Meríones.59 Concordantes são para mim, por outro lado, a
lança de Aquiles depositada no santuário de Atena em Fasélis e
o punhal de Mémnon no templo de Asclépio, na Nicomédia;60
da primeira, a ponta e o punho e o punhal na totalidade são
desse metal.
3.9. Estes são pormenores que sabemos serem assim. Ana-
xândrides, filho de Léon, foi o único lacedemónio que teve
duas mulheres e constituiu duas famílias ao mesmo tempo.

resposta sobre a obrigatoriedade de localizarem os ossos de Orestes,


seguiu-se uma outra, que precisava: “Existe na planície da Arcádia uma
Tégea onde sopram dois ventos, por forte necessidade; produz-se golpe
e contra-golpe e desgraça sobre desgraça. Lá, a terra fecunda retém o
filho de Agamémnon. Leva-o contigo e Tégea será tua”. Situada no
extremo sudeste da Arcádia, Tégea atraía, como planície fecunda, o
interesse espartano.
58 
Vide supra 1.17.6 e nota respetiva.
59 
Cf. Ilíada 13.611-4, 13.650-1. Ao tempo dos heróis corresponde
a Idade do Bronze. No entanto, a Ilíada já fala de ferro como metal
usado nas armas, uma combinação anacrónica própria dos problemas
colocados pela chamada Questão Homérica.
60 
Pausânias recorda agora duas tradições da Ásia Menor, eventual-
mente sua terra natal: a lança de Aquiles existente em Fasélis, na Lícia,
e o punhal de Mémnon na Nicomédia, na Bitínia. Mémnon é referido
por Aristófanes, em Rãs 963, juntamente com Cicno, como paradigmas
de heróis homéricos muito do gosto de Ésquilo, que teria usado Mém-
non como título de uma das suas tragédias. Cf. ainda Píndaro, Olímpica
2.82, Ístmica 5.39-41.
58
Pausânias

A sua primeira mulher, que em tudo o mais lhe agradava, não


conseguia ter filhos; por isso os éforos determinaram que ele
a repudiasse, determinação que ele recusou. Mas concordou,
além dessa, em casar com outra mulher; dessa relação teve um
filho, Cleómenes. Entretanto a primeira, que até aí não engra-
vidava, já Cleómenes tinha nascido, deu à luz Dorieu, a seguir
Leónidas e, depois deles, Cleômbroto.61 3.10. Quando Anaxân-
drides morreu, os Lacedemónios rejeitaram, ainda que contra
vontade, Dorieu, embora considerassem que ele era mais talen-
toso e dotado para a guerra do que Cleómenes; e foi a este que
atribuíram o poder de acordo com a lei, por ser o mais velho.62

3.4.1. Política da casa real ágida ao tempo das guerras pérsicas


Dorieu, que não suportava ver-se sujeito a Cleómenes se
ficasse na Lacedemónia, partiu a fundar uma colónia. 63 Mal
Cleómenes assumiu o poder, investiu contra a Argólida, depois
de reunir um exército de Lacedemónios e de aliados. Os Argi-
vos pegaram em armas, mas foram vencidos por Cleómenes.
E, como havia ali perto um bosque sagrado de Argos, filho

61 
Cf. Heródoto 5.39-41, e ainda Boardman, Hammond, Lewis,
Ostwald (21988) 356-7.
62 
Heródoto 5.42.1-2 narra a mesma versão com mais alguns por-
menores: as intrigas que se geraram em volta do nascimento de Dorieu,
por parte da família da segunda mulher de Anaxândrides, receosa da
concorrência de um outro herdeiro; o atraso mental de que Cleómenes,
enfim escolhido como rei, sofria; e o desagrado de Dorieu por se ver
preterido, o que o levou a partir de Esparta para fundar uma colónia
(vide infra 3.16.4-5, Diodoro 4.23.3). Cleómenes I foi soberano de
Esparta entre 520-488 a.C.
63 
O texto de Pausânias segue de perto a versão de Heródoto, em
5.42-8, que é, no entanto, muito mais explícito sobre o destino deste
projeto colonizador. Sobre as colónias fundadas por Dorieu, cf. ainda
Bury, Cook, Adcock (1969) 358-62.
59
Descrição da Grécia

de Níobe,64 cinco mil Argivos em fuga foram refugiar-se nele.


Cleómenes – que com frequência perdia o controle – ordenou
então aos hilotas que ateassem fogo ao bosque, de modo que
ele ardeu por completo, e com ele arderam igualmente esses
suplicantes. 4.2. Fez também uma campanha contra Atenas;
na primeira vez, restituiu a liberdade aos Atenienses em relação
aos filhos de Pisístrato,65 assim conquistando renome para si
próprio e para os Lacedemónios, em toda a Grécia; e, pouco
tempo depois,66 interveio em favor de um ateniense, Iságoras,

64 
Vide supra 2.20.8, 2.21.10, 2.22.5 e notas respetivas. Heródoto
6.76-83 refere-se ao mesmo episódio, mas coloca-o temporalmente não
no início do reinado de Cleómenes, mas perto já da sua morte. Esta
investida (c. 494 a.C.) contra Argos não se consumaria a não ser por
este golpe doloso e sacrílego; cf. Silva, Soares (2007) 39.
65 
Em 510 a.C. Cf. Heródoto 5.64.1-2. Afirmam Silva, Soares (2007)
41: “Num espaço temporal que vai de 512 a 503, assiste-se a cinco
expedições contra Atenas, importantes para desmitificar a reputação
antidespótica de que gozavam os Espartanos, consagrada nas pala-
vras de Tucídides (1.18.1) ...”. A cidade lacedemónia não desprezou a
oportunidade de ganhar influência junto de uma população então já
desgostada com o domínio dos tiranos, claramente em decadência como
o tiranicídio veio a provar.
66 
Em 508 a.C. Cf. Heródoto 5.70. Segundo o autor de Histórias, foi
Iságoras a apelar a Cleómenes, “com quem tinha laços de hospitalidade
desde o tempo do cerco aos Pisistrátidas”, e a sugerir-lhe mesmo a forma
de atuar contra os Alcmeónidas, seus concorrentes ao poder de Atenas.
De facto, depois de eliminados os tiranos, Atenas tornou-se cenário de
uma disputa entre dois grupos, ambos vinculados a famílias de prestígio
na cidade (Heródoto 5.66, 70, 73), os Alcmeónidas, de tendência mais
democrática, e Iságoras, defensor de uma ideologia oligárquica, que ia
ao encontro das preferências de Esparta. O objetivo passava por depor o
poder nas mãos de um grupo de trezentos cidadãos. Heródoto confirma
o fracasso desta campanha, que se deveu à reação defensiva do conselho
ateniense. “Cleómenes escapa com vida, mas sorte diversa suportaram
os apoiantes de Iságoras, presos e executados (5.73.1)” (Silva, Soares
(2007) 44). Por isso, a campanha veio a renovar-se anos mais tarde
(507-506 a.C.), com o mesmo objetivo, de garantir o poder a Iságoras.
60
Pausânias

para lhe abrir caminho para o poder sobre os Atenienses. Frus-


trado nessa esperança, porque os Atenienses se mobilizaram
com determinação em defesa da sua liberdade, aí Cleómenes
investiu contra a região e contra a chamada Orgada, lugar con-
sagrado às deusas de Elêusis, e dizem que a arrasou. Chegou
também a Egina,67 capturou os Eginetas mais distintos, que
eram simpatizantes dos Persas e tinham convencido os cida-
dãos a darem ao rei Dario, o filho de Histaspes, água e terra.68
4.3. Durante a permanência de Cleómenes em Egina, Dema-
rato, o soberano da outra linhagem, denegriu-o perante os
Lacedemónios. 69 Este, mal que voltou de Egina, arranjou
maneira de Demarato deixar de ser rei; subornou a profetisa
em Delfos, e ele próprio a industriou sobre como emitir orá-
culos aos Lacedemónios contra Demarato. Incentivou então
Leotíquides, um parente do rei e da mesma linhagem de Dema-
rato, a disputar-lhe o poder.70 4.4. Leotíquides aproveitou um

67 
Em 491 a.C. Cf. Heródoto 6.50.1-3. Em 7.138, Heródoto justifica
estes movimentos simpatizantes com os Persas como tentativas de algu-
mas cidades gregas de se protegerem da arremetida inimiga. Neste caso,
a contínua inimizade entre Atenas e Egina estimulou nos Atenienses o
receio de que semelhante aliança com a potência oriental lhes pudesse
trazer fortes inconvenientes. Por isso apelou ao apoio de Esparta.
68 
“Pedir água e terra” era um gesto simbólico da submissão que
a Pérsia reclamava dos povos que abordava com esta exigência; cf.
Heródoto 4.126, 5.17.1, 5.18.1, 7.131-3.
69 
Cf. Heródoto 6.61-74. Segundo esta versão, Aríston, apesar de ter
tido duas esposas, não tinha filhos. Ora foi de um terceiro casamento,
com a que tinha sido esposa de um amigo forçado por dolo a entregar-
-lha, que, antes do tempo de gestação, nasceu um filho, Demarato. Daí
que, ao ser confrontado com a notícia do nascimento do filho, Aríston
tenha negado a paternidade. Esta declaração que, na altura, não teve
qualquer efeito, veio mais tarde, já morto Aríston, a ter repercussões
pesadas na sucessão.
70 
Heródoto 6.65.1-4 explica o recurso à aliança com Leotíquides,
um inimigo de Demarato a quem este tinha subtraído a noiva. Foi
61
Descrição da Grécia

comentário que Aríston,71 um dia, por ignorância deixou esca-


par sobre a paternidade de Demarato: disse, então, que ele
não era seu filho. Nessa altura, os Lacedemónios fizeram uma
consulta ao oráculo de Delfos, como também noutros casos
costumavam fazer, a propósito da controvérsia a respeito de
Demarato. A Pítia transmitiu-lhes o que interessava a Cleóme-
nes.72 4.5. Demarato, por ódio de Cleómenes, perdeu injusta-
mente o poder.73 Mais tarde, Cleómenes morreu num acesso
de loucura; pegou na espada, desferiu golpes em si próprio e
trespassou o corpo por todo o lado.74 Os Argivos afirmam que
a sua morte foi a pena que pagou pelos suplicantes de Argos;75
os Atenienses atribuíam-na à destruição de Orgada; e os Délfios
ao suborno da Pítia, que ele corrompeu para mentir a respeito
de Demarato. 4.6. Esta seria então uma daquelas vinganças,

então Leotíquides quem fez a denúncia sobre a filiação de Demarato, o


que tornava ilegítimo o poder que exercia.
71 
Cf. Heródoto 6.61.2. Aríston partilhou com Anaxândrides o
poder de Esparta (cf. Heródoto 1.67), entre 560-520 e 560-510 a.C.,
respetivamente. É curioso que ambos tenham sofrido problemas seme-
lhantes de falta de herdeiros e recorrido a soluções não isentas de ficção
para ultrapassar a dificuldade.
72 
Vide infra 3.7.7; cf. Heródoto 6.66.1-3. A consulta pretendia o
esclarecimento sobre a paternidade de Demarato. Heródoto pormeno-
riza a estratégia de Cleómenes, que se serviu de um amigo poderoso em
Delfos para influenciar a Pítia. Mais tarde, o golpe viria a ser desco-
berto, o que levou à fuga de Cóbon, o délfio, e à destituição de funções
de Periala, a profetisa.
73 
Foi então que Demarato abandonou Esparta e se foi refugiar na
corte persa; cf. Heródoto 6.70.3. Lupi (2018) 274 enumera diversos
sinais, valendo-se sobretudo do testemunho de Heródoto, da simpatia
de Demarato pela cedência aos Persas, nomeadamente o apoio dado aos
Eginetas que tinham assumido a mesma posição.
74 
Cf. Heródoto 6.75.1-3.
75 
Sobre os motivos invocados para justificar a morte de Cleómenes,
cf. ainda Heródoto 6.84.1-3.
62
Pausânias

exercidas por heróis ou deuses em conjunto, dirigida contra


Cleómenes. Pois também Protesilau,76 que era em Eleunte um
herói não menos distinto do que Argos, exerceu vingança con-
tra um persa, Artaíctes;77 e contra os Megarenses que cultiva-
ram o solo sagrado, nunca as deusas de Elêusis apaziguaram
a sua cólera.78 Quanto à corrupção do oráculo, sabemos que
nunca ninguém, a não ser Cleómenes, ousou tal coisa.
4.7. Como Cleómenes não tinha filhos varões, o poder pas-
sou para Leónidas,79 filho de Anaxândrides, e irmão de Dorieu
por pai e mãe. Foi então que Xerxes invadiu a Grécia com um
exército, e que Leónidas, com trezentos Lacedemónios,80 lhe

76 
Protesilau, um guerreiro da Tessália aliado dos Aqueus invasores
de Troia, foi o primeiro a desembarcar em solo asiático e também a
primeira vítima da guerra (Il. 2.701). Recebeu, então, um culto no
Quersoneso Trácio (vide supra 1.34.2 e nota respetiva; cf. Píndaro,
Ístmica 1.58)
77 
Cf. Heródoto 7.33, 9.116.2. No primeiro destes passos, Heródoto
explicita qual o sacrilégio cometido por Artaíctes e o castigo a que foi
sujeito: “Os Atenienses, por ordem de Xantipo, filho de Arífron, cap-
turaram o persa Artaíctes, que era governador de Sesto, e cravaram-no
vivo numa tábua, porque costumava levar mulheres para o santuário de
Protesilau, em Eleunte, cometendo constantes sacrilégios”. No segundo,
a versão é diferente: “Em Eleunte, no Quersoneso, fica o túmulo de Pro-
tesilau e, à sua volta, um terreno sagrado, onde se encontram grandes
riquezas, taças de ouro e prata, bronze, vestes e outras ofertas votivas,
que Artaíctes saqueou com a anuência do rei”.
78 
Sobre esta impiedade dos Megarenses e a cólera que desencadeou
nas deusas eleusínias, vide supra 1.36.3 e nota respetiva.
79 
Vide supra 1.13.5 e nota respetiva. Cf. Heródoto 7.204, que elogia
Leónidas como o mais distinto dos generais reunidos nas Termópilas.
Como rei, Leónidas I ocupou o trono de Esparta entre 488-480 a.C.
80 
Heródoto 7.202, 7. 205.2 não só confirma este número, como
acrescenta um catálogo dos aliados na defesa das Termópilas. Chegada
a hora do confronto com os Persas, porém, essas forças de apoio foram
dispensadas e a resistência garantida apenas pelos 300 Espartanos. Ape-
sar da derrota espartana, a desproporção de forças entre as duas partes
63
Descrição da Grécia

fez frente nas Termópilas. Tem havido inúmeras guerras entre


Gregos, e de Bárbaros uns contra os outros, mas podem contar-
-se aquelas em que a coragem de um só homem se impôs à
consideração geral, como Aquiles, na guerra de Troia, e Milcía-
des na batalha de Maratona.81 O feito de Leónidas parece-me
ter ultrapassado os acontecimentos seguintes e os anteriores.
4.8. Pois Xerxes foi o mais determinado e o que mais feitos
cometeu de quantos reis os Medos e os Persas tiveram, e Leóni-
das, com um punhado de homens que conduziu às Termópilas,
barrou-lhe a passagem. E teria impedido o rei de ver sequer a
Grécia, e de incendiar a cidade de Atenas, se o Traquínio não
guiasse o exército de Hidarnes por um atalho através do Eta.82
Os Gregos viram-se assim cercados e, só depois de morto Leó-
nidas, os bárbaros penetraram na Grécia.83
4.9. Pausânias, o filho de Cleômbroto, não foi rei. De
facto, como tutor de Plistarco, o filho que Leónidas deixou
ainda criança comandou os Lacedemónios em Plateias,84 e a
seguir a armada no Helesponto. Mas a atitude de Pausânias
que sobretudo merece o meu elogio tem a ver com aquela
mulher de Cós – filha de Hegetórides, um sujeito distinto
da ilha, e neta de Antágoras –, que Farandates, filho de Teás-
pis, um persa, tomou, contra vontade dela, por concubina.
4.10. Quando, em Plateias, Mardónio foi derrotado e os bár-

neste confronto e as baixas que, apesar de tudo, Leónidas provocou nos


adversários, valeram por uma vitória; vide supra 1.13.5.
81 
Vide supra 1.17.6 e nota respetiva.
82 
Vide supra 1.4.2 e notas respetivas. Neste passo, Pausânias identi-
fica este homem como Efialtes de Tráquis (cf. Heródoto 7.215-8).
83 
Em 480 a.C. Vide supra 1.13.5 e nota respetiva.
84 
Em 479 a.C. Vide supra 1.13.4 e nota respetiva. Sobre a interven-
ção de Pausânias como tutor de Plistarco, cf. Heródoto 9.10.2.
64
Pausânias

baros foram aniquilados,85 Pausânias devolveu-a à família, em


Cós, com os adereços que o Persa lhe tinha dado e tudo o mais
que lhe pertencia. Não quis também que se ultrajasse o cadáver
de Mardónio, de acordo com a sugestão de Lâmpon de Egina.86

3.5.1. Os Ágidas após as Guerras Pérsicas


Plistarco, o filho de Leónidas, pouco depois de assumir
o poder morreu; foi então Plistóanax, o filho de Pausânias
comandante em Plateias, quem lhe sucedeu. De Plistóanax
nasceu Pausânias.87 Foi este quem invadiu a Ática,88 por inimi-
zade, ao que dizia, para com Trasibulo89 e os Atenienses, mas

85 
Vide supra 1.27.1 e nota respetiva.
86 
Cf. Heródoto 9.76-9.
87 
A Descrição da Grécia passa agora para uma outra fase da história
espartana e grega, num período que vai de 478-404 a.C., ou seja, do
pós-Guerras Pérsicas ao termo da Guerra do Peloponeso. A sua fonte
principal deixa de ser Heródoto para passar a ser Xenofonte. Vide supra
1.13.4 e notas respetivas.
88 
Em 403 a.C., tempo em que Esparta impunha o seu poder a uma
Atenas vencida na Guerra do Peloponeso. A motivação principal desta
campanha de Pausânias na Ática tinha por objetivo reforçar a autori-
dade dos Trinta Tiranos, colocados no poder pelo general espartano
Lisandro. Cf. Xenofonte, Helénicas 2.3.11, Plutarco, Vida de Lisandro
15. Apesar de terem sido investidos no poder com caráter provisório,
para preparar um conjunto de leis que haveriam de orientar o governo
de Atenas, dilatavam a tarefa de modo a, entretanto, tomarem medidas
totalmente arbitrárias e exercerem um poder baseado na violência.
A campanha de Pausânias fazia, portanto, frente aos objetivos de Lisan-
dro, então uma personagem poderosa na política espartana.
89 
O general ateniense Trasibulo representava uma tendência
democrática para a gestão de Atenas. Durante a governação dos Trinta
Tiranos foi forçado a exilar-se da cidade. Foi do exterior que organizou
uma arremetida, que lhe permitiu ocupar o Pireu. O povo de Atenas
estava então dividido entre os que se mantinham na cidade, sob a
autoridade oligárquica dos Trinta Tiranos, e os que se encontravam no
Pireu, defensores de um regime democrático.
65
Descrição da Grécia

na verdade para garantir a tirania àqueles a quem Lisandro


estabeleceu no poder. Venceu em combate os Atenienses que
detinham o Pireu, e, depois dessa batalha, levou de imediato
o exército de volta para casa por não querer associar a Esparta
o mais vergonhoso dos opróbrios, o de ter contribuído para
a tirania de uns sujeitos desonestos.90 5.2. Como voltou de
Atenas depois de levar a cabo uma campanha inútil, os inimi-
gos sujeitaram-no a um processo. Para julgar um rei dos Lace-
demónios tomam assento em tribunal os chamados ‘anciãos’,
em número de vinte e oito, juntamente com a magistratura
dos éforos, e, com eles, o soberano da outra linhagem régia.
Catorze desses anciãos, juntamente com Ágis, o soberano da
outra casa real, consideraram Pausânias culpado; os restantes
absolveram-no. 5.3. Não muito tempo depois, os Lacedemó-
nios mobilizaram um exército contra Tebas – por que razão
será dito no relato relativo a Agesilau.91 Nessa altura Lisandro
dirigiu-se à Fócida e recrutou os Focenses; depois, sem perda de
tempo, passou à Beócia e fez cerco à muralha de Haliarto,92 que

90 
Cf. Xenofonte, Helénicas 2.4.29-39, Plutarco, Vida de Lisandro 21.
Estes dois testemunhos são unânimes em considerar que Pausânias se
associou a Lisandro na campanha contra Atenas por temer a ambição
do general a tornar-se senhor da cidade. Escreve Plutarco (21.3): “Mas
os reis, que lhe tinham inveja e que temiam que ele se apropriasse uma
segunda vez de Atenas, combinaram que um deles se encarregaria desta
expedição. Partiu então Pausânias, aparentemente para apoiar os tiranos
contra o povo, mas na verdade para pôr fim à guerra e impedir que
Lisandro, com o apoio dos seus partidários, se tornasse no novo senhor
de Atenas”. Vide Ruzé (2018) 322.
91 
Vide infra 3.9-10.
92 
Cf. Ilíada 2.503, onde é referida a participação de Haliarto na
campanha troiana. Sobre o avanço de Lisandro contra a Fócida, cf.
Plutarco, Vida de Lisandro 28.1. Sobre o ataque de Lisandro a Haliarto,
esclarece Xenofonte, Helénicas 2.5.18: “Tentou primeiro persuadir os
habitantes a se destacarem de Tebas e se declararem independentes.
66
Pausânias

não tinha querido afastar-se dos Tebanos. Uns tantos Tebanos


e Atenienses tinham-se infiltrado na cidade clandestinamente.
Quando eles surgiram e alinharam diante da muralha, mor-
reram diversos Lacedemónios, entre eles também Lisandro.93
5.4. Pausânias associou-se tarde à luta, por estar a recrutar efe-
tivos entre os Tegeatas e no resto da Arcádia.94 Mal que chegou
à Beócia, foi informado da derrota das forças de Lisandro e
da sua morte; mas, mesmo assim, comandou os seus homens
até Tebas disposto a desencadear uma guerra. Nessa altura os
Tebanos organizaram a resistência, enquanto Pausânias rece-
bia a notícia de que Trasibulo não estava longe à frente dos
Atenienses;95 esperava que os Lacedemónios dessem início ao
combate e, quando isso acontecesse, tencionava atacá-los pelas
costas. 5.5. Pausânias, com receio de se ver apanhado entre
dois exércitos inimigos, fez tréguas com os Tebanos e recolheu
os caídos junto à muralha de Haliarto. Esta decisão não teve a
aprovação dos Lacedemónios, enquanto, na minha opinião, foi
louvável pelo seguinte: Pausânias sabia que os Lacedemónios
sempre perdiam quando apanhados entre inimigos, caso das
Termópilas96 e da ilha de Esfactéria;97 por isso temeu ser ele
próprio a causa de um terceiro desaire.98 5.6. Mas como os seus
concidadãos consideravam criminosa a demora dele em chegar

Mas como alguns Tebanos que se encontravam no local bloquearam a


tentativa, ele passou ao ataque”.
93 
Em 395 a.C. Vide infra 9.32.5, Xenofonte, Helénicas 3.5.17, Plu-
tarco, Vida de Lisandro 28-30.
94 
Cf. Plutarco, Vida de Lisandro 28.2: “Pausânias devia dar a volta
pelo monte Citéron para entrar na Beócia, enquanto que Lisandro, com
um corpo de tropas numeroso, iria ao seu encontro pela Fócida”.
95 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.5.17.
96 
Vide supra 3.4.7 e nota respetiva.
97 
Vide supra 1.13.5 e nota respetiva.
98 
Outros são os motivos elencados por Xenofonte, Helénicas 3.5.23.
67
Descrição da Grécia

à Beócia, não ficou à espera de ser levado a tribunal. Os Tegea-


tas receberam-no então como suplicante de Atena Álea.99 Este
santuário era, desde tempos muito antigos, venerado por todos
os Lacedemónios, e aos que nele se refugiavam era garantida a
máxima segurança. Foi disso que os Lacedemónios deram prova
em relação a Pausânias, como já antes dele a Leotíquides, e os
Argivos em relação a Crísis.100 Ao sentarem-se lá como supli-
cantes, não quiseram reclamar-lhes a extradição.
5.7. Ao tempo do exílio de Pausânias, os seus filhos Agesí-
polis e Cleômbroto eram ainda muito jovens; ficaram então sob
a tutela de Aristodemo, o seu parente mais próximo. Foi sob o
comando de Aristodemo que os Lacedemónios tiveram êxito
em Corinto.101 5.8. Quando Agesípolis cresceu o suficiente
para assumir o trono, dos povos do Peloponeso foi aos Argivos,
em primeiro lugar, que declarou guerra.102 Quando, a partir dos
Tegeatas, conduziu o exército para a Argólida, os Argivos envia-
ram um arauto a pedir a Agesípolis que reconhecesse uma regra
ancestral, praticada entre os Dórios. Ele, porém, não assentou
uma trégua com o arauto, continuou a avançar e arrasou o ter-
ritório. A divindade produziu um terramoto, mas nem assim
Agesípolis abandonou o projeto,103 ainda que, entre os Gregos,
seja sobretudo aos Lacedemónios – como, aliás, também aos

99 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.5.25, Plutarco, Vidas de Ágis e
Cleónimo 3.5. Segundo a tradição, este templo tinha sido erigido por
Aleu (vide infra 8.45.4-8.47.4). Tratava-se de um templo muito antigo,
imponente e prestigiado, que Pausânias considera distinto entre os que
povoavam o Peloponeso. Sobre a longa história do santuário, cf. Ostby
(2020).
100 
Sobre Crísis, vide supra 2.17.7 e nota respetiva, e sobre Leotíqui-
des, infra 3.7.9.
101 
Em 394 a.C. Vide supra 1.29.11, Xenofonte, Helénicas 4.2.9.
102 
Em 387 a.C.
103 
Esta campanha desastrada, como, de resto, as empreendidas pelo
68
Pausânias

Atenienses – que o medo mais aflige perante sinais divinos.


5.9. Acampava já junto à muralha dos Argivos e o terramoto
continuava. Houve até soldados que morreram fulminados,
outros enlouqueceram por efeito dos trovões. Mesmo con-
trariado, teve de abandonar a Argólida, mas passou a avan-
çar desta vez contra Olinto. Nesta guerra teve sucesso; tomou
várias cidades da Calcídica, e teve esperança de tomar até
Olinto; mas adoeceu de repente e morreu.104

3.6.1. Decadência dos Ágidas


Como Agesípolis morreu sem deixar filhos, o poder tran-
sitou para Cleômbroto. Foi sob sua chefia que os Lacedemó-
nios combateram contra os Beócios, em Leuctras.105 O próprio
Cleômbroto, que era um homem valente, morreu, logo no iní-
cio da campanha. Nas grandes derrotas, o destino começa por
eliminar o comandante, como aconteceu com os Atenienses,
abatido que foi Hipócrates, filho de Árifron, ao comando em
Délio, e, mais tarde, Leóstenes na Tessália.106

irmão de Agesípolis, Cleômbroto, condenaram à decadência Esparta e


a família dos Ágidas ao declínio.
104 
Em 380 a.C.
105 
Em 371 a.C., que resultou numa tremenda derrota para os Lace-
demónios, garantida pelos Tebanos sob o comando de Epaminondas.
Os vencedores entravam assim numa rota de predomínio na Beócia e
mesmo na Grécia inteira, enquanto os Espartanos entravam em declí-
nio, posto em causa o prestígio militar que a Guerra do Peloponeso
lhes granjeara. Vide supra 1.13.5-6 e nota respetiva; cf. ainda Xenofonte,
Helénicas 6.4.3-15.
106 
A batalha travada em Délio, na Beócia, ocorreu no decurso da
Guerra do Peloponeso, em 424 a.C.; Tucídides 4.76-7, 489-101 descreve
em pormenor esta campanha. Houve para esse confronto um objetivo
político suscitado por Beócios que pretendiam substituir a supremacia
exercida por Tebas na região por uma democracia e para isso negocia-
ram uma aliança com os generais atenienses Hipócrates e Demóstenes
69
Descrição da Grécia

6.2. O filho mais velho de Cleômbroto, Agesípolis, não fez


nada digno de registo; reinou, por morte do irmão, o filho mais
novo, Cleómenes.107 Este teve dois filhos, Acrótato e Cleónimo;
determinou o destino que Acrótato morresse cedo, ainda antes
de Cleómenes; quando, a seguir, morreu Cleómenes, instalou-
-se uma disputa pelo poder entre Cleónimo e Areu, filho de
Acrótato. Coube aos anciãos arbitrar a questão e foi a Areu,
filho de Acrótato, e não a Cleónimo que o atribuíram, por
um critério hereditário.108 6.3. Cleónimo ficou de tal modo
irritado por ter perdido o poder, que os éforos tentaram apa-
ziguá-lo com várias honras – atribuindo-lhe, por exemplo, o
comando dos exércitos –, para o dissuadirem de se tornar ini-
migo de Esparta. Por fim, ousou contra a pátria uma série de
golpes; atraiu mesmo Pirro, o Eácida, à região.109 6.4. Quando
Areu, filho de Acrótato, reinava em Esparta, Antígono, filho de
Demétrio, com forças de infantaria e com uma armada, inves-
tiu contra Atenas. Veio então em socorro dos Atenienses a frota
egípcia, comandada por Pátroclo, como também avançaram
em força os Lacedemónios, sob o comando do seu rei, Areu.110

(Diodoro Sículo 12.65-70). Hipócrates foi bem-sucedido na fortificação


de Délio, a partir de onde pensou organizar o confronto com os Beó-
cios. Mas a campanha resultou mal e o comandante ateniense contou-se
entre as baixas. Sobre Leóstenes, comandante ateniense na resistência
aos Macedónios, em Lâmia (323 a.C.), vide supra 1.1.3 e nota respetiva.
107 
Agesípolis II e Cleómenes II, portanto. Pausânias passa sobre
eles apenas com uma menção rápida, que significa o pouco relevo dos
seus reinados.
108 
Vide supra 1.13.5 e notas respetivas.
109 
Vide supra 1.13.4.
110 
Areu I merece a Pausânias uma atenção mais demorada, pelo
seu envolvimento numa campanha partilhada com Atenienses e forças
egípcias de Ptolemeu II Filadelfo, contra os Macedónios ao tempo de
Antígono II Gónatas. Vide supra 1.1.1, 1.7.3, 1.30.4 e notas respetivas.
Este episódio já amplamente tratado no Livro I merece agora atenção na
70
Pausânias

6.5. Mas Antígono assediou de tal forma Atenas, que blo-


queou o acesso à cidade a qualquer aliado. Nessa circunstân-
cia, Pátroclo enviou mensageiros aos Lacedemónios e a Areu
para que atacassem Antígono; logo que eles começassem, ele
próprio – ao que dizia – iria atacar os Macedónios pelas costas.
Antes disso, sendo eles Egípcios e marinheiros, não era possível
enfrentarem a infantaria macedónia. Os Lacedemónios avança-
ram desejosos de correr o risco por simpatia para com os Ate-
nienses e com o fito de levarem a cabo uma ação memorável.
6.6. Areu, porém, porque se lhe esgotaram os mantimentos,
entendeu levar o exército de volta. Considerava apropriado
investir esforço em questões domésticas e não desbaratá-lo no
interesse de outrem. Mas os Atenienses opuseram uma resis-
tência tão longa que Antígono teve de fazer a paz. Limitou-se
a instalar uma guarnição no Mouseîon111 e, com o tempo, ele
próprio tomou a iniciativa de retirar. Areu deixou um filho,
Acrótato, por sua vez pai de outro Areu, que por volta dos
oito anos morreu de doença.112 6.7. De modo que, da linha-
gem masculina da casa de Eurístenes113 restou apenas Leónidas,
filho de Cleónimo, já em idade muito avançada. E foi a ele
que os Lacedemónios conferiram o poder. Dava-se o caso de
esse Leónidas ter uma divergência profunda com Lisandro, o
neto de Lisandro filho de Aristócrito.114 Este último conseguiu

perspetiva da intervenção espartana. Para os Lacedemónios, o desfecho


esteve longe de ser brilhante.
111 
Vide supra 1.25.8-1.26.2 e notas respetivas.
112 
Cf. Plutarco, Vidas de Ágis e Cleónimo 3.5-8.
113 
Vide supra 3.1.7-9.
114 
Vide supra 3.5.1 e nota respetiva. Plutarco, Vidas de Ágis e
Cleónimo 3.9 acentua a incompatibilidade entre Leónidas “e os seus
concidadãos”. Os hábitos de luxo e desprezo pelos valores ancestrais
que Leónidas manifestava parecem ter sido as principais razões destes
conflitos.
71
Descrição da Grécia

o apoio de Cleômbroto, casado com uma filha de Leónidas.


Como íntimo da casa, acusou Leónidas, entre outros crimes,
de ter jurado ao pai, Cleónimo, quando era ainda uma criança,
que seria a ruína de Esparta. 6.8. Leónidas teve de renunciar
ao trono e, em vez dele, Cleômbroto assumiu o poder. Se Leó-
nidas cedesse à irritação e se refugiasse, a exemplo do que fez
Demarato, filho de Aríston,115 na corte da Macedónia ou do
Egito, bem os Espartanos se poderiam arrepender sem resul-
tado. Mas, condenado ao exílio pelos seus concidadãos, dirigiu-
-se à Arcádia, e de lá, não muitos anos depois, os Lacedemónios
chamaram-no e restabeleceram-no no poder.116 6.9. Quanto
a Cleómenes,117 filho de Leónidas, quais os atos de ousadia e
coragem que se lhe podem atribuir, e como pôs fim à soberania
espartana, já acima o esclareci ao tratar de Arato de Sícion.
Acrescentei mesmo o relato sobre como é que ele morreu no
Egito.118

3.7.1. Os Euripôntidas
Da linhagem de Eurístenes,119 dos chamados Ágidas, Cleó-
menes, filho de Leónidas, foi, em Esparta, o último rei. Sobre
a outra linhagem ouvi contar o seguinte. Procles, filho de Aris-
todemo, pôs ao filho o nome de Soo.120 Ao que se diz, Euri-
ponte, filho de Soo, ganhou tamanha fama que os soberanos

115 
Demarato refugiou-se na corte persa; cf. Heródoto 6.67.1, 7.3-4,
7.101-5.
116 
C. 241 a.C.
117 
Cleómenes III, morto em 219 a.C. e último monarca na dinastia
dos Ágidas.
118 
Vide supra 2.9.1-3 e notas respetivas.
119 
Vide supra 3.1.7 e nota respetiva.
120 
Plutarco, Vida de Licurgo 2.1-3 dá relevo à personalidade e
importância deste Soo, a que Pausânias não reserva mais do que uma
alusão.
72
Pausânias

desta linhagem, até então chamados Proclidas, dele passaram


a usar o nome de Euripôntidas. 121 7.2. Euriponte teve um
filho, Prítanis.122 No reinado de Prítanis, filho de Euriponte,
os Lacedemónios deram início ao conflito com os Argivos,
e ainda antes desta divergência, fizeram guerra aos Cinúrios.
Nos reinados seguintes – de Êunomo, filho de Prítanis, e de
Polidectes, filho de Êunomo123 – Esparta permaneceu em paz.
7.3. Carilo,124 filho de Polidectes, arrasou território argivo –
pois foi ele quem invadiu a Argólida – e, não muitos anos
depois, sob o comando de Carilo, aconteceu a incursão dos
Espartanos contra os Tegeatas, quando os Lacedemónios ali-
mentaram a esperança de ocupar Tégea e de anexar a respetiva
planície, na Arcádia, baseados num oráculo capcioso.125

121 
Cf. as genealogias dos Euripôntidas dadas por Heródoto (8.131.2-
3) e Plutarco (Vida de Licurgo 1.8), que não coincidem com a fornecida
por Pausânias. A expressão “ouvi contar o seguinte” sugere que as fontes
usadas pelo autor da Descrição da Grécia eram orais e a sua versão dis-
tinta de outras. O reinado de Euriponte situou-se entre c. 890-860 a.C.
Plutarco, Vida de Licurgo 2.4 sintetiza os motivos da popularidade deste
monarca da forma seguinte: “Deu-se aos soberanos desta linhagem o
nome de Euripôntidas, ao que parece, por Euriponte ter sido o primeiro
a abrandar o absolutismo excessivo da realeza, lutando pela populari-
dade e pelo agrado do povo”.
122 
C. 860-830 a.C. A propósito deste monarca dos Euripôntidas,
Pausânias repete as ações espartanas já relatadas supra 3.2.2-4, contra
os Argivos e Cinúria.
123 
O reinado do primeiro entre c. 830-800 a.C., e o do segundo
entre 800-780 a.C.
124 
Carilo – ou Carilau – reinou c. 780-750 a.C.
125 
Dominada a Messénia, os Espartanos voltaram-se então para a
Arcádia. Vide infra 8.1.6, 8.48.4; cf. ainda Heródoto 1.66.2, que relata
o fracasso desta campanha alimentada pela má interpretação de um
oráculo; este dizia assim: “Pedes-me a Arcádia? Muito me pedes, mas
não ta dou. Pois na Arcádia há muita gente comedora de bolotas que te
resistirá. Mas não quero ser-te adversa. Dou-te Tégea, que os teus pés
pisarão na dança, e uma bela planície que medirás com a corda”. Na
73
Descrição da Grécia

7.4. Morto Carilo, sucedeu-lhe o filho, Nicandro.126 Foi no


seu reinado que ocorreu a investida dos Messénios contra Téle-
clo, o soberano da outra linhagem, no santuário de Limnas.127
Nicandro atacou também a Argólida e arrasou a maior parte da
região. Os Asineus, que tinham participado com os Lacedemó-
nios nesta ação, pagaram, não muito depois, aos Argivos a pena
respetiva com a razia completa da sua pátria e a condenação ao
exílio.128 7.5. Teopompo, filho de Nicandro, sucedeu-lhe no
poder;129 hei de voltar a ele, quando chegar ao capítulo sobre a
Messénia.130 Quando Teopompo detinha o poder em Esparta,
ocorreu o conflito entre Lacedemónios e Argivos a propósito
da região chamada Tírea.131 Teopompo, então acabrunhado
pela velhice e pelo sofrimento, não participou nesta campanha.
É que, em vida de Teopompo, o destino levou-lhe Arquidamo.
7.6. Este, porém, não morreu sem filhos; deixou um, Zeuxi-
damo. A Zeuxidamo sucedeu no poder o filho, Anaxidamo. No
seu reinado, os Messénios abandonaram o Peloponeso, depois
de vencidos pela segunda vez pelos Lacedemónios. Anaxidamo
teve um filho, Arquidamo, e este, por sua vez, Agásicles. Ambos
tiveram a felicidade de viver toda a vida em paz, sem a pertur-
bação da guerra.

sua ambiguidade, o oráculo alude à derrota e escravização dos invasores,


forçados a pisar o terreno e a ‘medi-lo’ com a corda ao pescoço. Cf.
Asheri (21989) 309-10. Mais tarde, Esparta obteve sobre Tégea o sucesso
desejado; vide supra 3.3.5.
126 
C. 750-720 a.C.
127 
Vide supra 3.2.6 e notas respetivas, infra 4.4.2-3.
128 
Vide supra 2.36.4, infra 4.14.3.
129 
C. 720-675 a.C.
130 
Vide infra 4.4.1.
131 
Vide supra 2.38.5.
74
Pausânias

7.7. Aríston, filho de Agásicles,132 casou-se, ao que dizem,


com uma mulher que, enquanto jovem, era a mais feia da Lace-
demónia; mas veio a tornar-se a mais bela das mulheres graças
a Helena.133 Desse casamento nasceu um filho de sete meses,
Demarato. Num momento em que o rei se encontrava com
os éforos no conselho, chegou um escravo a anunciar o nasci-
mento da criança. Esquecido dos versos da Ilíada a propósito
do nascimento de Euristeu134 – ou talvez nem mesmo os com-
preendesse –, Aríston afirmou que, tendo em conta os meses,
o filho não era dele.135 7.8. Veio, mais tarde, a arrepender-se

132 
C. 550-515 a.C.
133 
Cf. Heródoto 6.61.2-5. Conta Heródoto como a ama da criança,
penalizada pela sua disformidade, a levava todos os dias ao templo de
Helena, em Terapne. As preces da serva não foram em vão; um dia apa-
receu-lhe, pelo caminho, uma mulher que, tocando a criança, anunciou
que ela se tornaria na mais bela de todas as Espartanas. Vaticínio que
se cumpriu. Este episódio serve como um aition para o estabelecimento
de um culto de Helena em Terapne (vide infra 3.19.9); cf. Isócrates,
Encómio de Helena 63, que afirma que, em Terapne, Menelau e Helena
recebiam homenagens como deuses. Vide Richer (2007) 237.
134 
Ilíada 19.91-133. Ao escusar-se da ofensa feita a Aquiles que,
ao desencadear-lhe a cólera, foi responsável por tantas mortes e reve-
ses para os Aqueus, Agamémnon argumenta com o poder de Ate, a
Obnubilação, que até ao senhor do Olimpo foi capaz de sujeitar. Foi
graças a Ate que Hera conseguiu enganar o divino marido, ao saber
do nascimento iminente de Héracles, filho de Alcmena, fruto de mais
uma infidelidade de Zeus. Vinculando-o a um juramento – “mas agora
jura-me, ó Olímpio, um poderoso juramento, / que a quantos vivem
à sua volta regerá o homem / que neste dia cairá entre os pés de uma
mulher, / da raça dos homens cuja origem vem do teu próprio sangue!”
(Ilíada 19.108-11, tradução de Frederico Lourenço) -, Hera manipulou
a palavra divina: apressou o nascimento de Euristeu, cuja gestação ia
ainda no sétimo mês, e atrasou o parto de Alcmena. Com esta jogada
garantiu o ascendente de Euristeu sobre Héracles.
135 
Vide supra 3.4.4 e nota respetiva.
75
Descrição da Grécia

do que tinha dito. Demarato,136 que era rei e, aliás, com muito
prestígio em Esparta, por ter, com Cleómenes, libertado os
Atenienses dos Pisístratos,137 devido à imprudência de Arís-
ton e à inimizade de Cleónimo, perdeu o trono. Dirigiu-se
então para a corte do rei Dario, na Pérsia, e pela Ásia ficou a
sua descendência durante muito tempo, tanto quanto se diz.
7.9. Leotíquides,138 que se tornou rei no lugar de Demarato,
associou-se aos Atenienses e ao seu general Xantipo, filho de
Árifron, na campanha contra Mícale.139 A seguir, avançou con-
tra os Alévadas, na Tessália.140 Como sempre saía vencedor nas
batalhas, ser-lhe-ia possível conquistar a Tessália inteira. Mas

136 
C. 515-491 a.C.
137 
C. 510 a.C. Vide supra 3.4.2 e nota respetiva.
138 
Leotíquides II reinou c. 491-469 a.C. Vide supra 3.4.4; cf. Heró-
doto 6.71.1.
139 
479 a.C. Trata-se de Xantipo, pai de Péricles (cf. Heródoto
6.131.2, 9.98-106). Tucídides 1.89.2 relata brevemente este episódio:
“Depois que os Medos se retiraram da Europa, vencidos em mar e terra
pelos Gregos, e que o resto das suas forças se tinham refugiado com os
navios em Mícale, foram derrotadas. Leotíquides, o rei dos Lacedemó-
nios, que comandava os Gregos em Mícale, regressou à pátria com os
aliados do Peloponeso”. Mícale é um promontório situado a noroeste
de Mileto, diante de Samos.
140 
Cf. Heródoto 7.6.2 a respeito da conivência que os Alévadas,
reis da Tessália, tinham tentado estabelecer com Xerxes. Trata-se de
uma família aristocrática, de grande poder, que se dizia descendente
de um rei mítico, Alevas, e que viria a assumir, na guerra, uma posição
pró-persa (cf. Heródoto 7.130.3, 9.58.2). Em 9.58.2, Heródoto refere
alguns nomes integrantes desta família de Larissa: Tórax e os seus
irmãos Eurípilo e Trasideu, que funcionavam como conselheiros de
Mardónio. Schrader (1983) 27 acentua que não se tratava propriamente
da família real tessália e que o termo βασιλεῖς aqui usado por Heródoto
se referia a “dinastas”. Não era desinteressado este apoio dado às pre-
tensões persas, fazendo crer ao rei que toda a Tessália estava envolvida
nessa posição pró-persa; quando na verdade os Alévadas esperavam de
Xerxes apoio recíproco, para estenderem o seu poder a toda a região.
76
Pausânias

os Alévadas subornaram-no com presentes. 7.10. Na Lacede-


mónia, foi sujeito a um processo e fugiu voluntariamente para
Tégea. Aí apresentou-se como suplicante de Atena Álea.141 Zeu-
xidamo, o filho de Leotíquides, ainda em vida do pai e antes
da sua partida para o exílio, foi vítima de uma doença mortal.
E assim, Arquidamo,142 filho de Zeuxidamo, depois da partida
de Leotíquides para Tégea, assumiu o poder. Este Arquidamo
causou grandes prejuízos ao invadir o território ático todos
os anos; de cada vez que se infiltrava através de toda a região
devastava tudo. E como os Plateenses eram favoráveis a Ate-
nas, pôs-lhes cerco à cidade.143 7.11. Não foi ele, no entanto,
a despoletar a guerra do Peloponeso contra os Atenienses, que
sempre repudiou e em que se empenhou por manter a tré-
gua.144 Foi Estenelaides, um homem poderoso em Esparta, que
então fazia parte dos éforos, o principal responsável por essa
guerra. Esse foi um conflito que abalou a Grécia nessa altura
ainda firme nos seus fundamentos. Mais tarde Filipe, filho de

141 
Vide supra 3.5.6 e nota respetiva.
142 
Arquidamo II, c. 469-427 a.C. A estratégia de Arquidamo foi
tão determinante que os primeiros anos da Guerra do Peloponeso, desde
o seu eclodir em 431 a.C. até à paz de Nícias, em 421 a.C., receberam
dele o nome. Cf. Tucídides 1.79-87, sobre o debate tido em Esparta a
propósito da conveniência de desencadear um ataque aos Atenienses: à
opinião dominante, que teve por porta-voz Estenelaides, que era favo-
rável a uma investida imediata, Arquidamo contrapôs argumentos de
prudência, salientando as dificuldades e risco que uma campanha mais
longínqua do que aquelas a que os Lacedemónios estavam acostumados,
no Peloponeso, exigente de meios e de perícia, podia acarretar. Sobre
a estratégia de incursões e devastação do território ático, cf. Tucídides
2.19.20.
143 
427 a.C. Sobre a invasão de Plateias pelos Lacedemónios perante
a sua cumplicidade com os Atenienses, cf. Tucídides 2.71-8.
144 
432 a.C.
77
Descrição da Grécia

Amintas, quando ela estava já dividida e enfraquecida, arrasou-


-a por completo.145

3.8.1. Ainda os Euripôntidas (c.427-398 a.C.)


Arquidamo, quando morreu, deixou dois filhos, Ágis e Age-
silau; na qualidade de mais velho foi Ágis quem assumiu o
poder.146 Arquidamo teve também uma filha, de nome Cinisca,
muito empenhada em competir nos Jogos Olímpicos, que foi
a primeira mulher a criar cavalos e também a primeira a ven-
cer numas Olimpíadas.147 Depois de Cinisca, outras mulhe-
res, sobretudo lacedemónias, obtiveram vitórias olímpicas,
mas nenhuma com maior brilho do que ela quanto a vitórias.
8.2. Os Espartanos, na minha opinião, são o povo que menos
admira a poesia e os elogios por ela expressos. À exceção do epi-
grama que alguém compôs para Cinisca148 e, já antes, o poema
de Simónides149 dedicado a Pausânias gravado numa trípode

145 
A avaliação de Pausânias sobre o enfraquecimento da Grécia, em
função da Guerra do Peloponeso e da vulnerabilidade que facilitou a
invasão e ocupação macedónia por Filipe II, é muito pertinente.
146 
427-400 a.C.
147 
Cf. Plutarco, Vida de Agesilau 1.1, sobre a descendência de Arqui-
damo II (469-427 a.C.), um Euripôntida; e ainda, em 20.1, a referência
à vitória de Cinisca na corrida de cavalos nos Jogos Olímpicos; vide
ainda infra 3.15.1, Xenofonte, Agesilau 9.6. Picazo Gurina (2008) 172
recorda a importância e aparato de que se revestiam as vitórias espar-
tanas em Olímpia. Foi a partir do séc. VI a.C. que se iniciaram nessas
competições. Das suas vitórias, erguiam, no recinto da competição,
monumentos vistosos, dadas as restrições que Esparta impunha a esse
género de celebração pública. A vitória de Cinisca foi obtida em 392
a.C. e dela foi também erigido um monumento no santuário olímpico.
148 
Cf. Antologia Palatina 13.6; vide infra 3.15.1, 6.1.6.
149 
Fr. 17a Page. Cf. Tucídides 1.132.2; trata-se do seguinte dístico:
“Depois de destruir o exército medo, o comandante dos Gregos, Pau-
sânias, consagrou a Febo este registo”. Esta trípode era de ouro e foi
78
Pausânias

consagrada em Delfos, nada existe, composto por um poeta,


que celebre os monarcas lacedemónios.
8.3. No reinado de Ágis, filho de Arquidamo, vários foram
os queixumes dos Lacedemónios contra os Eleus,150 sobretudo
por ter-lhes sido interdito o acesso aos jogos olímpicos e ao
santuário em Olímpia. Enviaram então aos Eleus um arauto
com um ultimato: que respeitassem a autonomia dos Lepreatas,
bem como a dos outros povos vizinhos e seus súbditos. Dos
Eleus receberam como resposta que, quando vissem livres as
populações em volta de Esparta, também eles libertariam as
suas. Foi então que os Lacedemónios e o rei Ágis atacaram a
Élide. 8.4. Nessa altura, quando tinham avançado até Olím-
pia e até às margens do Alfeu, um tremor de terra fez recuar
o exército. No ano seguinte, Ágis arrasou a região e obteve
um saque considerável. Xénias, um sujeito da Élide, ligado
por vínculos de hospitalidade particular a Ágis e procurador
dos Lacedemónios, juntamente com a classe endinheirada,
conspirou contra o povo. Antes que Ágis acorresse em seu
socorro com o exército, Trasideu, então no comando do povo
da Élide, venceu em combate Xénias e expulsou da cidade os
seus apoiantes. 8.5. Ágis recuou então com o seu exército, mas
deixou Lisístrato, um espartano, um destacamento e os exila-
dos de Élide, para, juntamente com os Lepreatas, devastarem

oferecida a Apolo em memória da vitória conseguida em Plateias contra


o invasor persa. Sobre este Pausânias, vide supra 3.4.9-5.1.
150 
C. 402-400 a.C. Cf. Xenofonte, Helénicas 3.2.21-31, que relata
os acontecimentos ocorridos entre 401-399 a.C. e é seguido de perto
por Pausânias. Após o termo da Guerra do Peloponeso, Ágis focou-se
em cidades que se tinham posicionado a favor de Atenas. Foi então
que atacou a Élide, obrigando os Eleus a prescindir do controle que
exerciam sobre as populações vizinhas.
79
Descrição da Grécia

a região. No terceiro ano de guerra,151 os Lacedemónios e Ágis


preparavam-se para um novo ataque contra a Élide. Mas os
Eleus e Trasideu – que estavam completamente depauperados –
fizeram um acordo: abdicavam do domínio sobre as populações
vizinhas e demoliam a muralha da cidade.152 Em contrapartida,
os Lacedemónios teriam acesso a Olímpia, poderiam sacrificar
ao deus e participar nos jogos. 8.6. Ágis invadia, com as suas
forças, continuamente a Ática e erigiu, em Deceleia, um forte153
contra os Atenienses. Venceu então a armada dos Atenienses na
batalha naval de Egospótamo.154 Depois ele e Lisandro, filho
de Aristócrito,155 desprezaram os juramentos feitos pelos deuses
que os Lacedemónios tinham assumido, publicamente, para
com os Atenienses, e por iniciativa própria, sem a adesão oficial
de Esparta, apresentaram aos aliados a proposta de arrasar Ate-
nas de raiz.156 8.7. Foram estes os principais sucessos militares
de Ágis. Em relação ao filho, Leotíquides, este Ágis cometeu a

151 
398 a.C.
152 
Sobre as questões suscitadas entre os comentadores pela existên-
cia desta muralha e pela sua demolição, vide Musti, Torelli (2008) 184.
153 
413 a.C. Tucídides 7.18.1 atribui a Alcibíades a insistência, junto
dos Lacedemónios, da fortificação de Deceleia; a seguir, 7.19.1-2, relata
a invasão da Ática pelas forças de Ágis II. Tucídides precisa ainda a
localização de Deceleia, entre Atenas e a Beócia e, portanto, com uma
boa posição estratégica. Sobre os objetivos espartanos desenvolvidos a
partir de Deceleia, cf. Tucídides 7.27.3. Agora que se tinham instalado
em território acessível ao inimigo, os Lacedemónios incrementaram as
devastações e saques.
154 
405 a.C.; cf. Xenofonte, Helénicas 2.1.21-30. Neste confronto
naval, a tradicionalmente poderosa armada ateniense enfrentou as forças
navais espartanas, recém-constituídas com apoio persa e comandadas
por Lisandro. A derrota ateniense nesta batalha foi um passo impor-
tante para afirmar a hegemonia de Esparta no mundo grego, nos anos
finais da Guerra do Peloponeso.
155 
Vide supra 3.5.1-4.
156 
Cf. Xenofonte, Helénicas 2.1.31.
80
Pausânias

mesma precipitação que Aríston em relação a Demarato.157 Por


desgraça, passou-lhe pela cabeça dizer, diante dos éforos, que
não se julgava pai de Leotíquides. Este foi um disparate de que
se veio a arrepender mais tarde. Numa altura em que o traziam,
doente, da Arcádia, quando se encontrava em Hereia, diante
de uma quantidade de testemunhas, declarou que Leotíquides
era seu filho, e recomendou-lhes, entre súplicas e lágrimas, que
transmitissem essa informação aos Lacedemónios.158
8.8. Depois da morte de Ágis, Agesilau disputou a sobe-
rania a Leotíquides, lembrando aos Lacedemónios o que Ágis
tinha dito um dia a respeito dele.159 Mas os Arcádios vieram
de Hereia, como testemunhas favoráveis a Leotíquides, do que
tinham ouvido de Ágis na hora da morte. 8.9. O oráculo de
Delfos agravou ainda mais a querela entre Agesilau e Leotíqui-
des; ali pronunciado, dizia assim:160

Fica atenta, Esparta, embora sejas orgulhosa,


que de ti, que tens pés fortes, não provenha um monarca coxo.
Pois durante muito tempo dores impensáveis te hão de afligir,
nas ondas agitadas de uma guerra homicida.

157 
Vide supra 3.4.4. Cf. Plutarco, Vida de Agesilau 3.3, que dá este
filho como fruto de uma relação entre a mulher de Ágis e Alcibíades, o
Alcmeónida, refugiado na corte espartana após a fuga da Sicília. Depois
de ter persistido em negar essa paternidade, Ágis teria sido, na hora da
morte, persuadido por Leotíquides a declará-lo como filho.
158 
Xenofonte, Helénicas 3.2.31, conta que Ágis tinha ido a Delfos
fazer oferendas ao deus em comemoração da vitória na Guerra do
Peloponeso. No regresso, adoeceu em Hereia, na Arcádia, foi levado de
volta para Esparta e, ao fim de pouco tempo, morreu.
159 
Sobre a questão sucessória entre Leotíquides e Agesilau e os
diversos testemunhos disponíveis, cf. Xenofonte, Helénicas 3.3.1-2; e
ainda Roy (2009) 437-43.
160 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.3.3, Plutarco, Vida de Agesilau 3.7.
81
Descrição da Grécia

8.10. Sendo assim, Leotíquides afirmou que o oráculo se


aplicava a Agesilau, que era coxo de um pé;161 Agesilau, por sua
vez, voltava-o contra Leotíquides, por não ser filho legítimo de
Ágis. Os Lacedemónios, embora dependesse deles, não reme-
teram esta disputa ao oráculo de Delfos. E o culpado foi, na
minha opinião, Lisandro, filho de Aristócrito,162 empenhado,
por todos os meios, em que o trono fosse para Agesilau.

3.9.1. Campanhas de Agesilau II


Agesilau, filho de Arquidamo, foi então rei163 e entendeu,
com os navios lacedemónios, atravessar para a Ásia,164 para
acabar com Artaxerxes, filho de Dario.165 Ficaram então a saber

161 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.3.3, Plutarco, Vida de Agesilau 2.3.
162 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.3.4, Plutarco, Vida de Agesilau 3.4;
este último refere a importância desse apoio, gozando Lisandro de
muito prestígio na altura; vide supra 3.5.1-4, 3.8.6.
163 
Entre 400-360 a.C.
164 
398 a.C. Sobre a decisão da campanha, cf. Plutarco, Vida de
Agesilau 6.1-4.
165 
Artaxerxes II foi rei entre 404-359 a.C. Era filho primogénito de
Dario II e de Parisátide, e irmão, entre outros (Ctésias situa em treze
o número dos filhos do casal), de Ciro, Otabes e Oxatres. De seu avô
com o mesmo nome, Artaxerxes I, parecia ter herdado a prudência e
revelava, nas suas atitudes, delicadeza, ao contrário de seu irmão Ciro,
naturalmente instável e violento (Plutarco, Vida de Artaxerxes 2.1, 4.4).
Os primeiros anos do reinado de Artaxerxes II foram agitados por
uma guerra sucessória; apesar de seu pai, Dario II, o ter indicado, na
qualidade de primogénito, como seu sucessor, um dos irmãos, Ciro,
com o apoio da mãe, Parisátide (Plutarco, Vida de Artaxerxes 2.3-4),
contestou a decisão e lançou-se num violento conflito contra o monarca
seu irmão, pela reivindicação do trono, a partir do próprio dia da coroa-
ção oficial (conflito de que Plutarco se ocupa em Vida de Artaxerxes 1-19,
e que teve muito eco na Grécia pela participação de inúmeros Gregos,
nele incorporados). Esta divergência teve o seu desfecho na batalha
de Cunaxa (Plutarco, Vida de Artaxerxes 8.2), em 401 a.C., que deu a
vitória a Artaxerxes e causou a morte de Ciro.
82
Pausânias

por vários magistrados, mas sobretudo por Lisandro,166 que


não tinha sido Artaxerxes, mas Ciro quem, na guerra contra
os Atenienses, lhes tinha fornecido dinheiro para os navios.
Agesilau – que recebeu o encargo de atravessar com o exército
para a Ásia e de comandar as forças de infantaria – enviou
aos povos do Peloponeso (exceção feita a Argos) e aos Gregos
que habitam fora do Istmo uma mensagem para que se lhe
aliassem. 9.2. Os Coríntios, embora de muito bom grado se
tivessem associado à campanha contra a Ásia, como um incên-
dio de repente lhes destruiu o templo de Zeus denominado
Olímpico,167 o que consideraram um mau presságio, viram-se
impedidos de o fazer, ainda que contrariados. Os Atenienses
vieram com o pretexto de que, em consequência da Guerra
do Peloponeso e da peste, a cidade estava longe da sua ante-
rior prosperidade. Mas o que sobretudo os reteve foi estarem
informados, através de mensageiros, de que Cónon, filho de
Timóteo,168 se encontrava na corte do rei persa. 9.3. Aristo-
mélidas, avô materno de Agesilau, partiu como embaixador
para Tebas; com os Tebanos ele tinha boas relações e fazia parte
daqueles que arbitraram, na tomada das muralhas de Plateias,
liquidar todos os capturados. Mas os Tebanos, pelos mesmos
motivos que os Atenienses, puseram-se à margem, e declara-

166 
Sobre a influência exercida por Lisandro na Ásia, causadora de
algum incómodo em Agesilau, cf. Plutarco, Vida de Agesilau 7-8.
167 
Vide supra 2.5.5.
168 
Cf. Plutarco, Vida de Artaxerxes 21.1-2: “Artaxerxes retirou
também aos Lacedemónios o império do mar, com a ajuda de Cónon,
general ateniense, que juntou a sua frota à do sátrapa Farnabazo; é que,
depois da derrota de Egospótamo, Cónon manteve-se na ilha de Chipre,
não tanto em nome da sua segurança, mas à espera de alguma mudança
nos acontecimentos, como se espera uma maré para embarcar. Sentia
que os projetos que tinha concebido exigiam um grande potencial, e
que faltava ao que o Rei possuía um homem capaz de o comandar”.
83
Descrição da Grécia

ram que não prestariam ajuda. Agesilau, depois de reunir um


exército de tropas próprias e dos aliados, e quando, ao mesmo
tempo, a armada ficou pronta, dirigiu-se a Áulis, para fazer um
sacrifício a Ártemis, pois também aqui Agamémnon tinha invo-
cado a deusa quando comandou a campanha contra Troia.169
9.4. Agesilau dava por seguro que era rei de uma cidade mais
próspera do que Agamémnon e que, como ele, comandava a
Grécia inteira. E parecia-lhe também que a façanha de dominar
o rei Artaxerxes e de se apoderar do património dos Persas era
mais notável do que tomar o poder de Príamo. Quando estava
a fazer o sacrifício, porém, os Tebanos irromperam em armas,
arrebataram do altar as coxas da vítima já em chamas e obriga-
ram-no a abandonar o santuário. 9.5. Para Agesilau foi um des-
gosto não ter terminado o sacrifício; de toda a forma atravessou
para a Ásia e avançou contra Sárdis.170 Nesse tempo a Lídia
constituía a parte mais pujante da zona baixa da Ásia, e Sárdis
distinguia-se pela riqueza e pelos recursos. Aí ficava a residência
do sátrapa dessa região costeira, tal como em Susa a do próprio
rei. 9.6. Na batalha que travou contra o sátrapa Tissafernes nos
campos da Iónia, na planície do Hermo,171 Agesilau venceu a
cavalaria persa172 e destroçou a infantaria, que era a mais nume-
rosa a seguir à que Xerxes tinha recrutado e, já antes, à que

169 
Sobre a referência a este sacrifício e a comparação com Agamém-
non, cf. Plutarco, Vida de Agesilau 6.6-11. Plutarco atribui ao modelo de
ritual adotado por Agesilau a investida dos Tebanos, desagradados com
o facto de não estar a ser seguida a sua norma nesse tipo de situações.
Musti, Torelli (2008) 186 sublinham a tendência propagandística dos
Gregos, quando se tratava de atacar a Ásia, de apelarem ao modelo
homérico, neste caso no recrutamento e no sacrifício propiciatório.
170 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.4.11-2.
171 
Rio situado a norte de Esmirna.
172 
Plutarco, Vida de Agesilau 9.5-6 pronuncia-se sobre a forma por
que Agesilau constituiu a sua poderosa cavalaria; e sobre a vitória de
84
Pausânias

Dario mobilizou contra os Citas e contra Atenas.173 Os Lace-


demónios, encantados com os feitos de Agesilau, distinguiram-
-no também com o comando da armada. Mas ele entregou o
comando das trirremes a Pisandro – com cuja irmã se dava o
caso de estar casado –,174 e ele próprio se ocupou com deter-
minação das forças terrestres. 9.7. Algum deus invejoso o terá
impedido de levar o seu projeto até ao fim. De facto, Artaxerxes
tomou conhecimento das vitórias obtidas por Agesilau, e de
como prosseguia sempre em frente com o exército, dominando
tudo o que lhe aparecia diante. Apesar de Tissafernes ter sido
antes seu benfeitor, condenou-o à morte, e enviou para a costa
Titraustes, considerado um sujeito habilidoso e com alguma
má vontade para com os Lacedemónios.175 9.8. Este, mal que
chegou a Sárdis, logo engendrou uma maneira de forçar os
Lacedemónios a reclamarem de volta da Ásia o seu exército.
Enviou, portanto, à Grécia Timócrates, um sujeito de Rodes,
com dinheiro, para promover o desencadear de uma guerra

Agesilau sobre as forças de Tissafernes, cf. Plutarco, Vida de Agesilau


10.1-4.
173 
Heródoto é o melhor testemunho destas campanhas empreendi-
das pelos dois monarcas persas e dos meios envolvidos. Cf., e.g., 7.60-81,
capítulos correspondentes ao catálogo das forças de Xerxes no ataque
à Grécia. Por sua vez 5.1-144 são os capítulos dedicados à campanha
cita de Dario.
174 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.4.28; Plutarco, Vida de Agesilau 10.11,
que se refere ao mesmo episódio, considera um erro esta concessão, que
se deveu mais a fatores de família do que ao verdadeiro interesse da
pátria. Sem esse condicionamento, a escolha poderia ter recaído com
vantagem noutros nomes experientes e idóneos.
175 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.4.25, Plutarco, Vida de Agesilau 10.5-
6. Tissafernes foi acusado de traição e, por isso, condenado à pena
capital.
85
Descrição da Grécia

contra os Lacedemónios.176 Aqueles que se deixaram comprar


com dinheiro, ao que se diz, foram: dos Argivos, Cílon e Soda-
mas; dos Tebanos, Androclides, Isménias177 e Anfítemis; parti-
ciparam também, em Atenas, Céfalo e Epícrates; e em Corinto,
os apoiantes dos Argivos, caso de Poliantes e Timolau.178 9.9.
Mas aqueles que mais claramente provocaram a guerra foram
os Locros de Anfissa. Dava-se o caso de os Locros terem uma
divergência de fronteiras com os Focenses. Por isso, instigados
pelos Tebanos partidários de Isménias, cortaram-lhes as searas
maduras e levaram com eles o saque. Então os Focenses investi-
ram contra a Lócride e devastaram a região.179 9.10. Os Locros,
com o apoio dos Tebanos, arrasaram a Fócide. Os Focenses
dirigiram-se então à Lacedemónia queixando-se dos Tebanos,

176 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.5.1, Plutarco, Vida de Artaxerxes
20.4-5.
177 
Cf. Plutarco, Vida de Artaxerxes 22.8.
178 
Estes são pormenores omitidos por Plutarco, Vida de Agesilau 15,
ao recordar a ordem de retirada dada a Agesilau pelos Lacedemónios.
Em contrapartida são também enumerados, por Xenofonte, Helénicas
3.5.1, os contactos estabelecidos, ainda que não haja coincidência total
nos nomes.
179 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.5.3-4: “Os chefes políticos, em Tebas,
convencidos de que, se não houvesse alguém que desse início à guerra,
os Lacedemónios não quereriam romper a trégua com os seus aliados,
convenceram os Locros Opúncios a saquear um território contestado
entre os Focenses e eles próprios; imaginavam que, perante este golpe,
os Focenses invadiriam a Lócride. E não se enganaram. Os Focenses
procederam de imediato à invasão e saquearam a dobrar. Por seu lado,
o partido de Androclides persuadiu facilmente os Tebanos a acudirem
em socorro dos Locros, porque estes teriam invadido não o território
em litígio, mas um território considerado amigo e aliado, a Lócride.
No entanto, quando, por sua vez, os Tebanos invadiram a Fócide e a
saquearam, logo os Focenses apelaram por socorro aos Lacedemónios,
com o argumento de que não tinham sido eles os agressores e de que
a invasão da Lócride tinha sido uma represália”. Sobre os Locros, vide
supra 1.23.4.
86
Pausânias

com o relato do que tinham sofrido da parte deles. Os Lacede-


mónios, em função disso, entenderam declarar guerra a Tebas.
Aduziram contra eles, entre outras acusações, a ofensa cometida
em Áulis, aquando do sacrifício de Agesilau. 9.11. Por sua vez
os Atenienses, ao terem notícia da intenção dos Lacedemó-
nios, enviaram embaixadores a Esparta com o pedido de que
não pegassem em armas contra Tebas e que os sujeitassem a
um processo judicial. A embaixada, porém, foi despedida com
má vontade pelos Lacedemónios. Os acontecimentos que se
seguiram à partida dos Lacedemónios e à morte de Lisandro,
já os expus na narrativa sobre Pausânias.180 9.12. A chamada
Guerra de Corinto, que teve por ponto de partida a incursão
lacedemónia na Beócia, foi-se sempre agravando. Foi então
perante esta contingência que Agesilau trouxe o exército de
volta da Ásia.181 Quando atravessou, com a armada, de Abido
para Sesto,182 e cruzou a Trácia até à Tessália, nessa altura os
Tessálios, na intenção de serem amáveis com os Tebanos, ten-
taram cortar-lhe a passagem. Existia também, entre eles e os
Atenienses, uma amizade antiga. 9.13. Agesilau, no entanto,
pôs em fuga a cavalaria deles e conseguiu passar; prosseguiu
então a travessia da Beócia, depois de vencer os Tebanos e os
seus aliados em Coroneia.183 Postos em fuga, houve uns tantos
Beócios que se refugiaram no santuário de Atena designada por

180 
Cf. Xenofonte, Helénicas 3.5.5. Sobre os acontecimentos já antes
expostos a propósito de Pausânias, vide supra 3.5.3-6.
181 
Em 394 a.C. Cf. Xenofonte, Helénicas 4.3.1-9.
182 
Abido situava-se na costa asiática, junto ao Helesponto, na zona
mais apertada do estreito. Tratava-se de uma colónia de Mileto. Por sua
vez Sesto era a principal cidade da costa europeia junto ao Helesponto,
fronteiriça a Abido.
183 
Cf. Xenofonte, Helénicas 4.3.15-23, Plutarco, Vida de Agesilau 18.
87
Descrição da Grécia

Itónia. Agesilau, que tinha sido ferido em combate, nem assim


deixou de respeitar esses suplicantes.184

3.10.1. Outras campanhas de Agesilau


Não muito tempo depois, os Coríntios no exílio por serem
partidários dos Lacedemónios celebraram os Jogos Ístmicos. 185
Os que então se encontravam na cidade, com receio de Age-
silau, mantiveram-se quietos.186 Mas quando ele partiu para
Esparta, então também eles celebraram os Jogos Ístmicos com
os Argivos. Sem perda de tempo, Agesilau voltou a Corinto
com o exército. E, como se aproximavam as Jacíntias, permi-
tiu o regresso a casa dos Amicleus para celebrarem os rituais
da tradição em honra de Apolo e de Jacinto.187 Pelo caminho
encontraram-se, por acaso, com os Atenienses e Ifícrates, que os
liquidaram.188 10.2. Agesilau dirigiu-se igualmente à Etólia em
socorro dos Etólios, oprimidos por uma guerra desencadeada
pelos Acarnanos. Forçou então os Acarnanos a porem fim à
guerra,189 quando estavam prestes a tomar Cálidon e as outras
cidades da Etólia. Mais tarde navegou também para o Egito,
em socorro dos Egípcios que se tinham revoltado contra o rei

184 
Cf. Xenofonte, Helénicas 4.3.20, Plutarco, Vida de Agesilau 19.1-2.
185 
Sobre os Jogos Ístmicos, vide supra 2.1.7 e nota respetiva.
186 
Cf. Xenofonte, Helénicas 4.5.1-2.
187 
Como filho de Amiclas, Jacinto fazia parte da mais estrita
tradição desta cidade, sendo as Jacíntias uma das principais festas de
Esparta. Vide supra 3.1.3 e nota respetiva. Cf. Heródoto 9.7, Xenofonte,
Helénicas 4.5.11. As festividades combinavam um primeiro momento
de luto pela morte de Jacinto, seguido de rituais festivos ligados à sua
apoteose.
188 
390 a.C. Cf. Xenofonte, Helénicas 4.4.15, 4.5.11, Plutarco, Vida
de Agesilau 22.3-4.
189 
Cf. Xenofonte, Helénicas 4.6.1-9, Plutarco, Vida de Agesilau
22.9-11.
88
Pausânias

da Pérsia.190 Lá foram muitos e dignos de memória os feitos


de Agesilau. Mas, como era já bastante velho, morreu na via-
gem. Então os Lacedemónios, depois de recuperarem o cadáver,
sepultaram-no com as honras máximas devidas a um rei.
10.3. No reinado de Arquidamo, filho de Agesilau, os
Focenses ocuparam o santuário de Delfos.191 Para combate-
rem contra os Tebanos, os Focenses contratavam por sua conta
mercenários pagos com o seu dinheiro. De comum acordo, os
Lacedemónios e os Atenienses intervieram: estes, em reconhe-
cimento de um favor antigo dos Focenses,192 e os Lacedemó-
nios com o pretexto da amizade – mas, na minha opinião, por
inimizade aos Tebanos. Teopompo, filho de Damasístrato,193
afirmou que Arquidamo aceitou ele próprio algum dinheiro e,
além disso, que Dinica, a mulher de Arquidamo, subornada
por gente de poder entre os Focenses, tornou Arquidamo mais
acessível a fazer aliança com eles. 10.4. Que ele tenha recebido

190 
Sobre esta campanha no Egito, cf. Xenofonte, Agesilau 2.27-
31, Plutarco, Vida de Agesilau 36. Reinava então, no Egito, Taco (c.
365-360 a.C.), que se revoltou contra Artaxerxes II da Pérsia. Agesilau
andava nessa altura pelos 80 anos de idade.
191 
Arquidamo III (c. 360-338 a.C.).
192 
Segundo Musti, Torelli (2008) 188, talvez a referência ao bene-
fício de que os Atenienses tinham sido objeto aluda à participação que
os Focenses tinham tido na campanha ateniense na Tessália, em 455
(cf. Tucídides 1.111.1).
193 
O historiador do séc. IV a.C. Cf. FGrHist 115F 312, autor de
uma versão fortemente anti-espartana, que incluía corrupção sobre o
monarca lacónio. Esta foi a Terceira Guerra Sagrada, que ocorreu entre
356-346 a.C., e se desencadeou devido a uma multa avultada imposta
aos Focenses, em 357 a.C., pela Anfictionia de Delfos, sob pretexto de
cultivo de terras sagradas. Neste conflito, os Tebanos tinham como
prioridade defender a sua prerrogativa na gestão do santuário de Delfos.
Com eles alinharam Espartanos e Atenienses, enquanto os Focenses
tinham do seu lado os Lócrios e os Tessálios. Pausânias regressa a este
mesmo episódio infra 4.5.4.
89
Descrição da Grécia

dinheiro sagrado e dado apoio a gente que tinha destruído o


mais emblemático dos santuários, não merece a minha apro-
vação. Mas houve pelo menos umas tantas coisas a merecerem
elogio; é que os Focenses propunham-se liquidar os Délficos
adultos, submeter à escravatura mulheres e crianças e reduzir a
cidade a cinzas; mas com isso Arquidamo não pactuou e inter-
veio junto dos Focenses para o não levarem a cabo. 10.5. Atra-
vessou, mais tarde, para a Itália, para se aliar aos Tarentinos,
assediados pelos bárbaros das vizinhanças.194 Justamente em
confronto com esses bárbaros encontrou a morte; o seu cadáver
ficou insepulto, por um impedimento interposto por Apolo,
em função do seu erro. Este Arquidamo teve dois filhos, Ágis,
o mais velho, que lhe sucedeu, foi morto em combate contra
os Macedónios e Antípatro; Eudâmidas, o mais novo, reinou
então em paz. Este foi pai de Euridâmidas, que, por sua vez,
foi pai de Ágis. O que lhes diz respeito já o relatei a propósito
de Sícion.195
10.6. Quem vem dos Hermes196 percorre uma zona toda
cheia de carvalhos. Escótita é o nome que lhe é dado,197 não

194 
Sobre esta campanha, cf. Diodoro Sículo 16.62.4-63.1, 16.88.3,
Ateneu 536 c-d, Plutarco, Vida de Ágis 3.3.
195 
Cf. Plutarco, Vida de Ágis 3.3: “Agesilau teve um filho, Arqui-
damo, que foi morto em Itália pelos Messápios, perto de Mardónio.
Ágis, o filho mais velho de Arquidamo, morreu frente a Megalópolis,
liquidado por Antípatro, sem deixar filhos, pelo que o trono de Esparta
passou para as mãos do seu irmão, Eudâmidas. O filho deste último,
chamado Arquidamo, foi pai de Eudâmidas, que teve por filho Ágis”.
Ambos os autores, Plutarco e Pausânias, referem Ágis III (rei entre
338-330 a.C.) e Ágis IV (rei entre 244-241 a.C.). Sobre a remissão feita
por Pausânias, vide supra 2.8.9 e nota respetiva.
196 
Vide supra 2.38.7, 3.1.1 e notas respetivas.
197 
Ou seja, “sombrio”. Talvez o epíteto de Zeus o associe com as
sombras do Hades.
90
Pausânias

pela espessura das árvores, mas por esse ser um epíteto de Zeus;
de facto, à esquerda do caminho, num desvio no máximo de
dez estádios,198 fica o santuário de Zeus Escótitas. Voltando à
estrada, quando se avança mais um pouco, de novo à esquerda
fica uma estátua de Héracles e um troféu. Ao que se diz, foi
Héracles quem o erigiu depois de matar Hipocoonte e os
filhos.199 10.7. Num terceiro desvio desse caminho reto, à
direita, há um carreiro que conduz a Cárias (Nogueiras) e ao
santuário de Ártemis. É que a região de Cárias é dedicada a
Ártemis e às ninfas; há mesmo uma estátua de Ártemis Cariá-
tide, no exterior. Aí, as jovens lacedemónias fazem, todos os
anos, danças, de acordo com a tradição local.200 Quando se dá
a volta e se regressa à rua principal, ficam as ruínas de Selá-
sia. Quanto a esta cidade, como antes escrevi,201 os Aqueus
reduziram-na à escravatura, depois de vencerem em com-
bate os Lacedemónios e o rei Cleómenes, filho de Leónidas.
10.8. No Tórnax, um pouco mais adiante, há uma estátua de
Apolo Piteu,202 feita segundo o mesmo modelo da de Amiclas.
Que estátua é essa, vou tratar noutro momento.203 Entre os
Lacedemónios a de Amiclas tem mais prestígio, a ponto de usa-

198 
O estádio corresponde a 192,27 metros.
199 
Vide infra 3.15.4-6, 3.19.7 e notas respetivas.
200 
Escrevem Musti, Torelli (2008) 189-90: “A grande festa femi-
nina anual, centrada em danças que eram célebres, fundada, segundo
a tradição pelos próprios Dioscuros (...), teve uma importância notável
na religião lacónica, talvez também pelas suas relações com os ritos
iniciáticos e a esfera dionisíaca (...) através da figura mítica de Cária,
filha de Díon, rei da Lacónia, e sacerdotisa amada por Dioniso, que a
transformou em nogueira”.
201 
Vide supra 2.9.2 e nota respetiva.
202 
Cf. Xenofonte, Helénicas 6.5.27. O Tórnax é uma colina situada
a nordeste de Esparta, na margem esquerda do Eurotas.
203 
Vide infra 3.19.2.
91
Descrição da Grécia

rem o ouro, que Creso, o lídio, enviou para a de Apolo Piteu,204


na ornamentação da de Amiclas.

3.11.1. Monumentos no centro de Esparta


Quando se vem do Tórnax fica a cidade, a princípio desig-
nada por Esparta; mas, com o tempo, a mesma assumiu tam-
bém o nome de Lacedémon, que era então o da região. Ora,
do mesmo modo que, no relato dedicado à Ática, estabeleci o
princípio de não relatar tudo de fio a pavio, mas de tratar ape-
nas daquilo que considerasse digno de memória,205 vou aplicar
a mesma regra à Lacedemónia. De facto, por princípio a minha
narrativa selecionou, entre muitas coisas sem interesse que cada
povo conta sobre si, o que era mais relevante. Tomada esta
decisão sensata, não há razão para a alterar.
11.2. Os Lacedemónios residentes em Esparta têm uma
ágora digna de se ver,206 onde fica o conselho dos anciãos,207

204 
Cf. Heródoto 1.69.4. Segundo Heródoto, Creso ofereceu aos
Lacedemónios o ouro que eles pensavam comprar para ornamentarem
a estátua de Apolo.
205 
Vide supra 1.39.3.
206 
Cavanagh (2018) 67 imagina a ágora de Esparta, nos seus pri-
mórdios, “como um ponto de reunião do exército, que só começou
a tomar forma no séc. VIII a.C.”. E acrescenta: “Certamente alguns
dos monumentos referidos pelo visitante Pausânias em época romana
pertenciam ao séc. VI a.C.”.
207 
A gerousía é, para Domínguez Monedero, Pascual González
(1999) 101, “uma reminiscência dos velhos conselhos de anciãos que
muitas póleis gregas tiveram em época arcaica”. Depois de nomeados
para o cargo, os membros da gerousía exerciam-no com caráter vitalício.
Era sua missão funcionar como tribunal superior em Esparta, além do
controle que tinham sobre as decisões da assembleia. Por isso, como
afirma Leão (2010c), “a importância do conselho de anciãos (Gerusia)
e o seu papel de moderador constitucional, prevenindo os riscos de
excesso de poder, seja da parte dos reis (a realeza espartana assentava
numa diarquia), seja da parte do povo”.
92
Pausânias

as sedes dos éforos,208 dos guardiães das leis209 e dos chamados


bidieios.210 O conselho dos anciãos é, para os Lacedemónios, o
órgão supremo do Estado, os outros são magistrados. Os éforos
e os bidieios são, cada um deles, em número de cinco; a estes
últimos está atribuída a organização do chamado Platanistas211
e de outras competições de jovens, enquanto os éforos se ocu-

208 
Com a decadência da monarquia, os éforos, uma magistratura
muito antiga, foram reforçando o seu poder e autoridade. Sobre esta
proporção no exercício do poder entre reis e éforos, escrevem Domín-
guez Monedero, Pascual González (1999) 96: “sendo desmedidos os
poderes dos reis, durante os anos prévios às Guerras Médicas houve
que estabelecer mecanismos de controle; os éforos, cujo caráter colegial
e cuja anuidade podia equilibrar o inconveniente de dotá-los de grande
poder, além de serem já uma velha magistratura tradicionalmente rela-
cionada com os distintos poderes (reis, gerousía, assembleia), seriam
assim vistos como a solução mais aceitável”. Sobre o espetro de funções,
de grande importância política e administrativa, que lhes estavam
atribuídas, cf. Domínguez Monedero, Pascual González (1999) 96-9.
209 
Neste enunciado, será de ter em conta a observação de Musti,
Torelli (2008) 191: “Pausânias parece, inicialmente, distinguir com
clareza três magistraturas, mas depois recorda apenas dois colégios, o
dos éforos e o dos bidieios. Será que ele entende simplesmente associar
de facto e conceptualmente as duas magistraturas, embora distintas
(éforos e νομοφύλακες), por terem em comum a ‘vigilância’ das leis,
ou chega a identificá-las?”
210 
De forma sintética, Pausânias traça a estrutura governativa de
Esparta na fase que se sucedeu à monarquia, com a morte de Cleóme-
nes III (vide supra 2.9.1-3). Musti, Torelli (2008) 191 dizem, sobre os
bidieios, que não têm qualquer outra referência em textos além de Pau-
sânias (embora referidos em inscrições): “Deve tratar-se de magistrados
que têm de ‘ver’, no sentido de manter o controle sobre o Platanistas
e outros concursos de jovens, uma magistratura, portanto, de caráter
organizativo, pedagógico e moral”.
211 
Platanistas designa, literalmente, um “lugar onde existem plá-
tanos, ou circundado de plátanos”, e aplica-se a um recinto em que se
praticava exercício físico e mesmo alguma competição. Este espaço,
rodeado por um canal, constituía uma espécie de ‘ilha artificial’; vide
infra 3.14.8. Cf. Sanders (2009) 199-200.
93
Descrição da Grécia

pam de assuntos de maior importância: de entre eles é desig-


nado o epónimo, do mesmo modo que, entre os Atenienses,
dos nove aí designados por arcontes, há um que é o epónimo.
11.3. O edifício mais notável da ágora é o pórtico dos Persas,
assim chamado por ter sido construído com os despojos dos
Medos; com o passar dos anos, sofreu alterações em dimensão e
decoração, até à forma atual. Sobre colunas erguem-se estátuas
de Persas em mármore branco, entre outros de Mardónio, filho
de Góbrias.212 Erigiu-se também uma estátua de Artemísia, a
filha de Lígdamis e rainha de Halicarnasso. Ao que se diz,213 foi
voluntariamente que ela se juntou às forças de Xerxes no ataque
à Grécia, vindo a cometer feitos notáveis na batalha naval de
Salamina. 11.4. Na ágora ficam os templos: de César, que foi
o primeiro, em Roma, a aspirar à monarquia, e o primeiro a
estabelecer o regime atual; e o dedicado a Augusto, um dos
seus filhos, que reforçou o império e gozou de maior prestígio
e poder do que o pai. Foi intitulado Augusto, que corresponde,
em grego, a “venerável”.214
11.5. Junto ao altar de Augusto, mostram uma estátua em
bronze de Ágias. Foi este Ágias quem – ao que se diz – pre-
disse a Lisandro que ele iria capturar a armada ateniense em
Egospótamo,215 à exceção de dez trirremes, que de facto se
escaparam para Chipre. As restantes foram capturadas pelos
Lacedemónios, elas e as respetivas tripulações. Ágias era filho

212 
O destaque dado a Mardónio indicia que se trata do saque
feito aos Persas em Plateias; sobre esta batalha, vide supra 1.27.1 e nota
respetiva.
213 
Cf. Heródoto 7.99, 8.68-9, 8.101-3.
214 
A menção de cultos imperiais romanos esclarece a imagem da
praça que Pausânias tem por referência. Nela se associam edifícios
antigos com novas construções que o fluxo histórico sugeriu.
215 
Vide supra 3.8.6 e nota respetiva.
94
Pausânias

de Agéloco e neto de Tisâmeno. 11.6. Tisâmeno era de Élide,


da família dos Iâmidas.216 Um oráculo anunciou-lhe que sairia
vencedor em cinco competições célebres; tratou então de se
preparar para o pentatlo olímpico, de onde regressou vencido,
ainda que fosse o primeiro em duas competições, na corrida
e no salto, contra Hierónimo de Andros. Mas derrotado por
ele na luta e depois de falhar a vitória, percebeu o sentido do
oráculo: que o deus lhe concedia, com o seu vaticínio, cinco
vitórias em combate. 11.7. Os Lacedemónios – que não desco-
nheciam o que a Pítia tinha anunciado a Tisâmeno – convence-
ram-no a partir de Élide para ser adivinho do povo espartano.
Então Tisâmeno obteve, em favor deles, cinco vitórias na
guerra:217 a primeira em Plateias, contra os Persas;218 a segunda
em Tégea, contra os Tegeatas e os Argivos coligados contra os
Lacedemónios;219 além destas, Dipeia, onde enfrentaram todos
os Arcádios menos os de Mantineia (Dipeia era uma cidade da

216 
Família a quem se atribuía um ascendente divino e que exercia
funções sacerdotais; vide infra 4.24.4. Sobre Tisâmenes diz Heródoto,
a propósito dos sacrifícios que precederam a batalha de Plateias (9.33.1):
“Da parte dos Gregos, o sacrificante era Tisâmenes, filho de Antíoco.
Seguia na expedição como adivinho; era eleu e da família dos Iâmidas,
mas os Espartanos tinham-lhe dado a cidadania”. E a seguir Heródoto
regista o mesmo oráculo sobre as cinco proezas anunciadas a Tisâmenes
(9.35.1-2) e, como condição para se transferir para Esparta, que lhe
fossem justamente concedidos direitos de cidadão (9.33.2-5).
217 
Masaracchia (1978) 170 salienta que: “Se se excetuarem Plateias
e Tânagra, trata-se de guerras causadas pelo movimento anti-espartano
no Peloponeso, por volta dos anos 470-460 a.C.”.
218 
479 a.C.
219 
Heródoto recorda os conflitos entre Lacedemónios e Tegeatas:
durante o séc. VI a.C. (1.66-8) e, de novo, c. 473-470 a.C. (9.35.2). Vide
ainda Powell (2018) 296.
95
Descrição da Grécia

Arcádia, em Menália);220 11.8. a quarta contra a sublevação dos


hilotas que saíram do Istmo para Itome;221 nem todos os hilotas
se revoltaram, mas apenas os da Messénia, que de há muito se
tinham separado dos antigos hilotas. Este é um episódio que
vou narrar adiante;222 para já, direi que os Lacedemónios dei-
xaram partir os revoltosos, a conselho de Tisâmeno e de acordo
com o oráculo de Delfos, depois de negociada uma trégua.223 E
a última quando Tisâmeno lhes vaticinou o confronto perante
Argivos e Atenienses em Tânagra.224
11.9. Foi isto o que ouvi dizer a respeito de Tisâmeno. Na
ágora de Esparta, há ainda estátuas de Apolo Piteu, de Ártemis
e de Leto. Todo esse lugar recebe o nome de “Coro” (Dança),
porque nas Gimnopédias – a festa mais importante para os
Lacedemónios – os efebos formam coros em honra de Apo-
lo.225 Lá perto há vários santuários: da Terra, de Zeus Agoreu,

220 
Esta batalha foi praticamente coincidente com a de Tégea, entre
470-465 a.C.
221 
464 a.C. Esta foi a Terceira Guerra Messénica, que Tucídides
descreve em 1.101-3. Itome era um monte com uma posição central
na Messénia, vizinho da capital da região. Sobre os hilotas, Tucídides
(1.101.2) esclarece: “A maior parte dos hilotas era constituída pelos
descendentes dos antigos Messénios há muito reduzidos à escravatura;
por isso todos foram designados pelo nome de Messénios”.
222 
Vide infra 4.24.4.
223 
Cf. Tucídides 1.103.1-2: “Os de Itome, após dez anos de assé-
dio, como não podiam continuar a resistir, fizeram um acordo com
os Lacedemónios em que se comprometiam a sair do Peloponeso sob
proteção do pacto para nunca mais voltar; quem quer que fosse apa-
nhado, tornava-se escravo de quem o tivesse capturado. Existia, além
disso, um oráculo pítico, antes comunicado aos Lacedemónios, que
lhes determinava que deixassem partir o suplicante de Zeus Itometa”.
224 
457 a.C.
225 
Pseudo-Plutarco, Sobre a Música 1134b-c informa, sobre a origem
destes festejos: “Pois, com efeito, a primeira das instituições musicais
em Esparta deveu-se a Terpandro. A responsabilidade da segunda
96
Pausânias

de Atena Agoraia,226 de Posídon, apodado de Asfálio (Que


garante segurança), e ainda o de Apolo e de Hera. 11.10. Lá
está também uma estátua de grandes dimensões do povo de
Esparta, e um santuário das Meras. Ao lado, está o túmulo de
Orestes, filho de Agamémnon; de facto, os ossos de Orestes,
por determinação de um oráculo, foram trazidos de Tégea e
sepultados aqui.227 Junto do túmulo de Orestes, está uma está-
tua de Polidoro, filho de Alcâmenes,228 que, de entre os reis, foi
tido em tal consideração, que se mantém o princípio de, seja
qual for o documento que qualquer magistrado tenha de selar,
o selar com o timbre de Polidoro. 11.11. Lá está também um
Hermes Agoreu com um Dioniso criança ao colo, e os chama-
dos antigos arquivos dos éforos. Entre eles está o memorial de
Epiménides, de Creta,229 e de Afareu,230 filho de Perieres. Sobre
esse Epiménides, estou em crer que o relato dos Lacedemónios

coube, como principais promotores, a Taletas de Gortina, a Xenodamo


de Citera, a Xenócrito de Locros, a Polimnesto de Cólofon e a Sácadas
de Argos. De facto, diz-se que foi sob a sua proposta que as Gimnopé-
dias foram instituídas na Lacedemónia, as Apodeíxeis na Arcádia e em
Argos as chamadas Endymátia”. Somos, portanto, levados a pensar que
se trata de um tipo de festas típicas do Peloponeso. Talvez seja signifi-
cativo que o De Musica associe a sua fundação ao nome de Taletas de
Gortina, que a tradição retratava como um orientador da vida política
e social de Esparta (cf. Plu. Lyc. 4. 2-3 = Thalet. test. 6, supra).
226 
Richer (2007) 239 chama a atenção para o facto de, repeti-
damente, Atena partilhar com Zeus, em Esparta, diversos epítetos:
além de “Agoreu” e “Agoraia”, os de “Xénio” e “Xénia” (3.11.11) e de
“Ambúlio” e “Ambúlia” (3.13.6).
227 
Vide supra 3.3.6 e nota respetiva, infra 8.54.4.
228 
Vide supra 3.3.1, infra 3.12.3.
229 
Vide supra 2.21.3.
230 
Vide supra 3.1.4, infra 4.2.7.
97
Descrição da Grécia

é mais verídico do que o dos Argivos. Onde estão as Meras, os


Lacedemónios têm Héstia, Zeus Xénios e Atena Xénia.231

3.12.1. Outros edifícios de Esparta, além da ágora


Na saída da ágora pela rua com o nome de Afetaída,
encontra-se a chamada Booneta. A narrativa exige-me, antes
de mais, uma explicação sobre o nome da rua. Dizem eles que
Icário232 propôs aos pretendentes de Penélope uma competição
de corrida. Ulisses ganhou essa prova, é evidente, e, ao que se
conta, a corrida fez-se ao longo dessa rua, Afetaída (Partida).
12.2. Ao que me parece, Icário estabeleceu essa prova da cor-
rida à imitação de Dánao.233 De facto, ele inventou esse expe-
diente no caso das filhas. Como ninguém as queria por esposas
devido à mancha de que eram portadoras, Dánao anunciou que
as daria sem exigir presentes, e que cada um podia agradar-se
de qualquer uma de acordo com a sua beleza. Aos poucos can-
didatos que se apresentaram, ele propôs uma prova de corrida.
O primeiro a chegar pôde escolher antes dos outros, depois
dele a mesma coisa com o segundo e assim sucessivamente até
ao último. Aquelas que restaram, tiveram de aguardar a vinda
de outros pretendentes e que se organizasse outra corrida.

231 
Cf. Musti, Torelli (2008) 197, que comentam: “O santuário das
Meras, que contém o túmulo de Orestes e os altares (preferencialmente
as estátuas) de Héstia, Zeus Xénios e Atena Xénia, funciona, junta-
mente com o antigo ephoreîon, como centro político-sacral da cidade
arcaica, com alguns túmulos heroicos de grande importância ideológica,
e com o culto da divindade protetora da hospitalidade”.
232 
Vide supra 3.1.4. Em sedução, Penélope podia competir com as
mais belas, deusas e mulheres: com a perfeição imortal de uma Calipso
(Odisseia 5. 209-10), ou com a juventude atraente de Nausícaa (Odisseia
7. 313). Sobre a competição pela conquista da mão da filha de Icário,
cf. Apolodoro 3.10.6, 3.10.9.
233 
Cf. Píndaro, Pítica 9.111-6.
98
Pausânias

12.3. Nessa tal rua, como já se disse, os Lacedemónios têm a


chamada Booneta,234 que dantes foi a residência real de Polido-
ro.235 Quando ele morreu, a mulher vendeu-a por um preço em
bois, pois nessa altura não havia moeda cunhada de ouro ou
de prata. Era ainda deste modo que se negociava, por troca de
bois, escravos, prata ou ouro. 12.4. Dizem os que viajam para
a Índia que levam mercadorias da Grécia para trocar por outras
indianas, e que não existe moeda, apesar de eles possuírem em
abundância ouro e cobre.
Do outro lado do arquivo dos bidieios236 há um santuário
de Atena. Conta-se que Ulisses consagrou à deusa a estátua a
que chamou Celeuteia,237 por ter vencido os pretendentes de
Penélope na corrida. Edificou à deusa com o epíteto de Celeu-
teia três santuários em locais diferentes. 12.5. Avançando-se
pela rua Afetaída, há as sepulturas de heróis, a de Íope, que
parece ter vivido na época de Lélex,238 de Miles239 e de Anfia-
rau, filho de Ecles.240 Esta última, consta terem sido os filhos
de Tíndaro a erigirem-na, por Anfiarau ser seu primo.241 Aí
está também o herôon do próprio Lélex, e lá perto o santuário
de Posídon do Ténaro – a que chamam simplesmente Tená-

234 
Ou seja, “comprada com bois, a troco de bois”. Este edifício
estava afeto aos funcionários que se encarregavam de adquirir bois para
os sacrifícios.
235 
Vide supra 3.3.2-3.
236 
Vide supra 3.11.2 e nota respetiva.
237 
“Protetora dos caminhos”.
238 
Vide supra 3.1.1 e nota respetiva.
239 
Vide supra 3.1.1 e nota respetiva.
240 
Vide supra 2.18.4 e nota respetiva.
241 
Hipermnestra, a mãe de Anfiarau, era irmã de Leda, a mãe dos
Dioscuros. Sobre Íope, possivelmente um herói local, não há mais
nenhuma informação. Quanto ao epíteto de Posídon advém do culto
que lhe era prestado no cabo Ténaro, na Lacónia.
99
Descrição da Grécia

rio.242 A pouca distância há uma estátua de Atena, que, ao que


dizem, foi erguida pelos colonos que partiram para Tarento, na
Itália. 12.6. O lugar a que chamam Helénio é assim referido
porque, quando Xerxes atravessou para a Europa, foi aí que
os Gregos que entenderam resistir deliberaram como fazê-lo.
Segundo uma outra versão, aqueles que se aliaram aos inte-
resses de Menelau na campanha troiana, foi ali que decidiram
como navegar para Troia, para punirem Alexandre pelo rapto
de Helena.243 12.7. Junto do Helénio mostra-se o túmulo de
Taltíbio; mas também a gente de Égio, na Acaia, mostra, na
sua ágora, um túmulo que dizem ser o de Taltíbio. A cólera
de Taltíbio244 pelo crime contra os arautos enviados à Grécia

242 
Vide infra 3.25.4, sobre o culto de Posídon no cabo Ténaro.
Esparta abunda em herôa. Sobre este tipo de culto e o seu significado
social e político, Ekroth (2007) 103 comenta: “A ocorrência de cultos
heroicos dá-se em paralelo com o surgir da cidade-estado, e podem
ser vistos como uma resposta às mudanças políticas e sociais. Já foi
sugerido que funcionam como mecanismos para os aristocratas e famí-
lias destacadas se afirmarem, ou como expedientes dos proprietários
de terras e pequenas comunidades reivindicarem direitos à terra e ao
território”.
243 
Cf. o comentário de Musti, Torelli (2008) 201: “Os dois
momentos de maior mobilização nacional, do ponto de vista histórico
dos Gregos de época mais tardia, e no conceito de Pausânias, fruto
da sistematização historiográfica, em particular do séc. IV a.C., são a
guerra contra Xerxes e, ainda antes, a de Troia”.
244 
Vide infra 7.24.1. Taltíbio era bem conhecido como arauto de
Agamémnon (cf. Ilíada 1. 320, 3.118, 4.192, 7.276, 19.196, 19.250, 19.267,
23.897, Eurípides, Troianas, Hécuba) e a sua ira desencadeou-se em
defesa da inviolabilidade da classe a que pertencia. Os seus descenden-
tes, os Taltibíadas, assumiram o desempenho de todas as missões com
origem em Esparta. Heródoto 7.134.1 dá testemunho desta linhagem
e suas prerrogativas: “Seja como for, sobre os Lacedemónios desenca-
deou-se a ira de Taltíbio, o arauto de Agamémnon. Em Esparta há um
santuário dedicado a Taltíbio e continua a haver descendentes seus, que
100
Pausânias

pelo rei Dario para pedirem terra e água245 fez-se sentir sobre
os Lacedemónios em geral e, em Atenas, atingiu em particu-
lar a casa de um único homem, Milcíades, filho de Címon.246
É que Milcíades foi o responsável, por parte dos Atenienses,
pela morte dos que vieram à Ática como arautos. 12.8. Os
Lacedemónios possuem um altar de Apolo Ácritas, e um san-
tuário da Terra, a que chamam Gasepto. Mais acima, edifica-
ram outro a Apolo Maleates.247 Ao fundo da rua Afetaída, já
muito perto da muralha, há um santuário de Dictina248 e os
túmulos régios dos chamados Euripôntidas.249 Junto ao Helé-
nio há um santuário de Arsínoe, filha de Leucipo e irmã de

recebem o nome de Taltibíadas e a quem se concede a prerrogativa de


desempenharem todas as embaixadas em representação de Esparta”.
245 
Esta era uma estratégia de submissão com que os Persas sonda-
vam os povos que pretendiam conquistar; caso dos Citas, Heródoto
4.126-7, e de Amintas I, da Macedónia, Heródoto 5.17.1. Cf. Heródoto
6.48.1-2, que justifica o envio de arautos por Dario, após a revolta
iónica, para pedir água e terra aos Gregos como um teste à sua dis-
posição de se submeterem ou de reagirem contra ele. Em 7.133.1-2.
Heródoto dá conta do trauma causado por este incidente: “Certamente
Xerxes não enviou arautos a Atenas e Esparta a exigir terra pela razão
seguinte: porque anos antes, quando Dario enviou arautos seus em mis-
são semelhante, os Atenienses lançaram os portadores dessa exigência ao
báratro, e os Lacedemónios a um poço, mandando-os retirar de lá terra
e água para levarem ao rei. Foi por essa razão que Xerxes não enviou
emissários a apresentar esse pedido”.
246 
Vide supra 1.15.3 e nota respetiva.
247 
Ácritas tem a ver com “altura”, “das alturas, elevado”. Maleates
associa-se com o cabo de Málea, no Peloponeso. Gasepto refere-se ao
“recinto da Terra”. Pausânias fixa-se agora num espaço sacro, onde
dominam Apolo e a Terra.
248 
Vide supra 2.30.3 e nota respetiva.
249 
Vide supra 3.7.3 e nota respetiva. Heródoto 6.58.1-3 pormenoriza
os cerimoniais aparatosos que eram prestados aos soberanos falecidos
pelos Lacedemónios. Richer (2007) 250 sublinha que a posição das
zonas tumulares dos soberanos das duas dinastias – a dos Euripôntidas
101
Descrição da Grécia

Pólux e Castor.250 Perto do que se chama “Presídios” (Phrúria),


fica o templo de Ártemis, e um pouco mais adiante edificou-
-se o túmulo dos adivinhos de Élide, chamados Iâmidas.251
12.9. Máron e Alfeu têm também um santuário; trata-se de
combatentes nas Termópilas que, ao que se conta, foram os
que mais se distinguiram no combate a seguir a Leónidas.252 Os
Dórios edificaram um santuário de Zeus Tropeu,253 pela guerra
travada contra os Aqueus que, nessa altura, tinham o domínio
da Lacónia, e pela vitória sobre os de Amiclas.254 O santuário
da Grande Mãe é, de todos, o mais venerado. A seguir, fica o
herôon de Hipólito, filho de Teseu, e o de Aulo, da Arcádia,
filho de Tlesímenes. Há quem considere Tlesímenes irmão
de Partenopeu, filho de Melânion, e outros como seu filho.255
12.10. Existe uma outra saída da praça, onde foi construído
o chamado Skiás (“Sombrinha”),256 onde ainda agora se reúne
a assembleia. Ao que consta, este Skiás é obra de Teodoro de
Samos,257 o primeiro a descobrir a arte de fundir o ferro para
moldar com ele estátuas. Foi aí que os Lacedemónios suspen-

provavelmente do lado sul, e a dos Ágidas a noroeste (vide infra 3.14.2)


– estabelecia uma espécie de anel protetor da cidade.
250 
Vide infra 3.16.1 e nota respetiva.
251 
Vide supra 3.11.6 e nota respetiva.
252 
Vide supra 3.3.9 e nota respetiva. Heródoto 7.226.2-227.1 refere
os mesmos gémeos e a valentia demonstrada nas Termópilas, embora os
coloque depois de Diéneces.
253 
Que põe em fuga os inimigos.
254 
Vide supra 3.1.6 e nota respetiva.
255 
Vide supra 2.20.5 e nota respetiva. Segundo a tradição, Tlesí-
menes associou-se aos Epígonos, como filho de Partenopeu, no ataque
a Tebas.
256 
Informa o Etymologicum Magnum que se trata de um odeón com
um teto em forma de “sombrinha”, skiádeion. No conjunto o edifício
deveria assemelhar-se a uma tenda.
257 
Um artista que viveu nas décadas centrais do séc. VI a.C.
102
Pausânias

deram a cítara de Timóteo de Mileto,258 para o punirem de,


às sete cordas tradicionais na cítara, ter juntado mais quatro.
12.11. Junto do Skiás há um edifício circular com estátuas de
Zeus e de Afrodite apodados de Olímpicos. Teria sido, ao que
dizem, Epiménides259 quem o fez erigir; aliás não concordam
com o que os Argivos afirmam sobre ele, e negam mesmo que
tenha havido uma guerra contra Cnossos.260

3.13.1. Cultos e tradições espartanos


Lá perto fica o túmulo de Cinortas, filho de Amiclas,261 e o
memorial de Castor, sobre o qual se construiu um santuário.
De facto, dizem eles que os filhos de Tíndaro 262 não foram

258 
Timóteo de Mileto (c. 450-360 a.C.) foi responsabilizado, entre
os seus contemporâneos (segunda metade do séc. V a.C.), pela degra-
dação da música. Assim, o poeta cómico Ferécrates, no Quíron (fr. 155
K.-A.), sugeria os atropelos então cometidos. Obscuro no pormenor,
este fragmento é, na generalidade, muito significativo. A Mousikê,
uma pobre mulher prostituída, responsabiliza pelas vicissitudes da sua
existência Melanípides, Cinésias, Frínis e, muito em especial, Timóteo.
E os testemunhos cómicos sobre a nova escola lírica, suas novidades e
cultores, multiplicam-se: cf. Aristófanes, Nuvens 335-9, Paz 828-37,
Aves 1373-1409, Rãs 153, Pluto 290-315; Ferécrates fr. 6 K.-A.; Êupolis
fr. 148 K.-A.; Anaxândrides fr. 6 K.-A.; Antífanes fr. 110 K.-A.; Aléxis
fr. 300 K.-A. Todos estes testemunhos vêm confirmar a afirmação
de Pseudo-Plutarco, Sobre a Música 1142b, acerca do empenho que a
comédia manifestou na denúncia da deterioração progressiva da música:
“também outros comediógrafos (Ferécrates, Aristófanes) denunciaram a
inaptidão daqueles que esfacelaram a música”. O sentido conservador de
Esparta manifesta-se também no repúdio por estas novidades musicais.
259 
Vide supra 3.11.11 e nota respetiva.
260 
Vide infra 3.21.3.
261 
Vide supra 3.1.3.
262 
Os Dioscuros. Segundo a tradição, do relacionamento amoroso
de Zeus com Leda nasceram Pólux e Helena, enquanto Castor e Cli-
temnestra seriam filhos de Tíndaro e Leda. Ibas e Linceu, por sua vez,
eram filhos de Afareu, irmão de Tíndaro (vide supra 3.1.4). Depois de
103
Descrição da Grécia

considerados deuses senão 40 anos depois da batalha contra


Idas e Linceu. Mostra-se, junto da Skiás, o túmulo de Idas e
Linceu. Mas, de acordo com a tradição, é mais natural que eles
estejam sepultados na Messénia e não aqui. 13.2. No entanto,
os desaires dos Messénios e o tempo em que estiveram exilados
do Peloponeso concorreram para que, no regresso, boa parte do
seu passado fosse desconhecida. E se eles não tinham informa-
ções claras, dão espaço a quem quiser para alimentar polémicas.
Diante do templo de Afrodite Olímpica, os Lacedemónios
possuem o de Perséfone Salvadora (Sóteira). Segundo uns foi
Orfeu da Trácia263 que o edificou, e segundo outros Ábaris,
quando chegou dos Hiperbóreos. 264 13.3. Carneu, apodado
de Oikétas (“da Casa”),265 recebia honras em Esparta já mesmo
antes da vinda dos Heraclidas,266 sediado em casa de Crio, o
profeta, filho de Téocles. A filha deste Crio, ao ir à água,
foi abordada por espias dos Dórios; meteram conversa com
ela e, de visita a Crio, ficaram a saber como tomar Esparta.

estabelecido um contrato matrimonial entre os filhos de Afareu e as


filhas de Leucipo, rei da Messénia – as Leucípides –, Castor e Pólux,
em plena boda, raptaram as noivas, o que justificou uma batalha entre
os primos. Nela pereceram Castor e Linceu.
263 
Vide supra 1.14.3 e nota respetiva.
264 
Píndaro, fr. 283 Bowra refere Ábaris como um contemporâneo
de Creso da Lídia, portanto situa-o no séc. VI a.C. Heródoto 4.36.1,
por sua vez, refere-se-lhe com o comentário: “É isto o que se me oferece
dizer sobre os Hiperbóreos. Porque a história que se conta de Ábaris,
considerado hiperbóreo, não a vou relatar. É uma história em que se
narra que ele passeou pela terra inteira sobre uma flecha, sem tocar num
alimento”. Essa era a flecha que Apolo depositara nos Hiperbóreos e
que lhe permitiu sobrevoar o mundo. Logo esta personagem associa-se
ao deus, de quem recebeu, segundo alguns, a arte da adivinhação e
poderes curativos.
265 
Aludindo à dimensão primitivamente “doméstica” do culto.
266 
Vide supra 2.12.3, 3.1.5.
104
Pausânias

13.4. Quanto a Apolo Carneu,267 é venerado por todos os


Dórios desde o tempo de Carno, um adivinho de Apolo origi-
nário da Arcádia.268 Quando este Carno foi morto por Hípotes,
filho de Filas, a cólera de Apolo atingiu o acampamento dos
Dórios. Devido a este crime, Hípotes foi exilado, e os Dórios
instituíram um culto para apaziguar o profeta da Acarnânia.
No entanto, o Carneu a que os Lacedemónios chamam “da
Casa” não é este, mas sim aquele que já tinha culto na casa
do profeta Crio quando os Aqueus eram ainda senhores de
Esparta. 13.5. Diz Praxila269 nos seus poemas que Carneu seria
filho de Europa e de Zeus, e que Apolo e Leto se encarregaram
de o criar. Conta-se também, sobre ele, uma outra história:
que, no Ida, em Troia, os Gregos cortaram cornisos (kráneia)

267 
Depois de venerado como um deus independente, Carneu foi
assimilado a Apolo e teve um culto entre os Aqueus em fase pré-dórica.
O seu nome provém de kárnos, uma palavra para “gado”, talvez em refe-
rência aos animais usados nos sacrifícios. As Carneias, uma das festas
de maior ressonância em Esparta, celebravam o termo da preparação
militar dos mancebos e a inclusão dos jovens adultos na comunidade.
Sobre as provas desportivas incluídas neste festival, vide Calame (2018)
181-2.
268 
Cf. Graves (1977) II.209-10, a propósito do regresso dos Hera-
clidas e da recuperação do Peloponeso: “Mais cedo teriam tido sucesso
na campanha, se um dos seus chefes não tivesse assassinado Carno, um
poeta da Acarnânia, quando se lhes apresentou a entoar versos profé-
ticos, por o terem confundido com um mago enviado contra eles por
Tisâmenes. Como castigo por este sacrilégio, a armada dos Heraclidas
naufragou e a fome dizimou-lhes o exército”.
269 
Praxila é uma poetisa de Sícion, mais ou menos contemporânea
de Telesila (vide supra 2.20.8 e nota respetiva), de meados do séc. V a.C.
O seu prestígio em Sícion ficou de certa forma reconhecido na estátua
que dela esculpiu Lisipo. Ainda que seja muito vago o conhecimento
que temos da sua produção poética (desenvolvida dentro dos modelos
da lírica coral), títulos como “Aquiles” e “Adónis” aludem a alguns dos
seus poemas. Cf. Lesky (1968) 207-8. Sobre o passo aqui em causa, cf.
fr. 7 Page; a etimologia sugerida não tem verosimilhança.
105
Descrição da Grécia

nascidos no bosque sagrado de Apolo para a construção do


cavalo de pau. Ao terem conhecimento de que tinham des-
pertado a ira do deus, apaziguaram-no com sacrifícios, e, dos
cornisos, passaram a chamar a Apolo Carneu, trocando-lhe o
-r- à maneira antiga.
13.6. Não longe do Carneu, está uma estátua dita de Afe-
teu. Afirma-se que foi lá que teve início a corrida dos pre-
tendentes de Penélope.270 Há também um sítio que tem um
pórtico de formato quadrangular, onde antigamente se vendia
mercadorias em segunda mão. Lá perto, há três altares, de Zeus
Ambúlio, de Atena Ambúlia e dos Dioscuros também apodados
de Ambúlios (Conselheiros). 13.7. Em frente, fica a chamada
Colona271 e um templo de Dioniso Colonatas. Ao lado fica o
santuário de um herói, que, ao que se diz, conduziu Dioniso a
Esparta. É a esse herói, mesmo antes de os fazerem ao deus, que
as Dionisíadas e as Leucípides fazem sacrifícios. As outras onze,
também chamadas Dionisíadas, disputam entre si uma prova
de corrida.272 Este costume provém de Delfos. 13.8. Não longe
do santuário de Dioniso fica o de Zeus do Bom Vento (Euáne-
mos) e, à direita, o herôon de Plêuron,273 de quem descendiam

270 
Vide supra 3.12.1.
271 
Uma das colinas, situada a sudeste do centro da cidade antiga.
272 
Trata-se, portanto, de uma corrida feminina incluída nas festas
de Dioniso. Informam Musti, Torelli (2008) 208, que este é um rito
de caráter nupcial sugestivo da disputa que Ulisses venceu na Afetaída
e que lhe garantiu a mão de Penélope. Sobre a possível relação entre as
Leucípides e as Dionisíadas, vide Baldassi (2018) 79-80. Esta autora
chama a atenção para a proximidade na referência a motivos associados
com bodas nupciais – o santuário de Hera Hiperquíria e a estátua de
Afrodite Hera –, o que abonaria do mesmo caráter quanto à corrida
das Dionisíadas.
273 
A Plêuron era atribuída a fundação de uma cidade com o seu
nome na Etólia. Musti, Torelli (2008) 209 sublinham o facto de este
106
Pausânias

os filhos de Tíndaro pelo lado da mãe. Segundo Ásio,274 Téstio,


pai de Leda, era filho de Agenor e neto de Plêuron. Há uma
colina perto do herôon e, sobre essa colina, há um templo de
Hera Argiva. Ao que consta, foi Eurídice, filha Lacedémon275 e
mulher de Acrísio, filho de Abas, quem o edificou. O santuário
de Hera Hiperquíria276 foi construído de acordo com um orá-
culo, na altura em que houve uma grande inundação do Euro-
tas.277 13.9. Lá está uma estátua de madeira muito antiga de
Afrodite Hera.278 Todas as mulheres com filhas casadoiras fazem
sacrifícios à deusa. No caminho à direita da colina, está uma
estátua de Hetémocles, filho de Hipóstenes. Tanto Hetémocles,
como Hipóstenes, o pai, venceram a prova de luta, nos Jogos
Olímpicos, entre os dois onze vezes, sendo que o pai suplantou
o filho em uma vitória.279

3.14.1. Cemitérios e espaços desportivos na periferia de Esparta


Ao sair da ágora, quando se toma a direção poente, foi eri-
gido o cenotáfio de Brásidas,280 filho de Télis. E não muito

mito estabelecer relações muito antigas entre “o mundo etólio e o


mundo dórico”.
274 
Vide supra 2.6.4 e nota respetiva.
275 
Vide supra 3.1.2.
276 
Epíteto relacionado com a intervenção da deusa na inundação,
hiperquíria, “que coloca a mão por cima”.
277 
Vide supra 3.1.1.
278 
Juntando-se a deusa do amor com a do casamento.
279 
Vide infra 3.15.7, 5.8.9. Hipóstenes saiu vencedor nas Olimpíadas
de 624, 620, 616, 612, 608 a.C.
280 
Brásidas foi um distinto general espartano ativo durante a
Guerra do Peloponeso, que mereceu a simpatia e atenção de Tucídides.
Na História da Guerra do Peloponeso (4.102-5.11) é dado particular relevo
à campanha da Trácia (424 a.C.), em que Brásidas comandou as forças
espartanas, contra as atenienses comandadas por Cléon, e onde viria a
perecer. Tucídides 5.11.1 dá esclarecimentos sobre as honras fúnebres e o
107
Descrição da Grécia

longe desse túmulo fica o teatro,281 em mármore branco, digno


de se ver. Em frente ao teatro, está o túmulo de Pausânias,282
comandante das forças em Plateias, e um outro de Leónidas;283
todos os anos se faz sobre eles discursos e organizam-se jogos,
em que não é admitido a competir quem não for lacedemó-
nio. As ossadas de Leónidas foram trazidas, quarenta anos
mais tarde, das Termópilas por Pausânias. Há também uma
estela que tem gravados os nomes e patronímicos daqueles
que nas Termópilas resistiram no combate contra os Medos.
14.2. Há em Esparta um lugar chamado Teomélida,284 onde
estão os túmulos dos soberanos Ágidas e, lá perto, a designada
Lésche dos Crótanos. Os Crótanos constituem uma parte dos
Pitaneus.285 Não longe da Lésche fica o santuário de Asclépio,
dito dos Ágidas. Continuando em frente, está o memorial de

sepultamento de Brásidas em Anfípolis: “Depois, mobilizados todos os


aliados com as suas armas na comitiva fúnebre, enterraram Brásidas a
expensas públicas na cidade, à entrada do que agora é a ágora; e a partir
daí, o povo de Anfípolis, reunido em volta do seu túmulo, imola-lhe
vítimas como a um herói, além de ter instituído jogos e festas anuais em
sua honra”. Portanto, como bem diz Pausânias, o que existia em Esparta
era um cenotáfio de Brásidas.
281 
Heródoto (6.67.2-3) e Plutarco (Vida de Agesilau 21.7-10, 29.3-4)
fazem menção de um teatro em Esparta. No entanto, Musti, Torelli
(2008) 211 sublinham que o teatro cujas ruínas ainda hoje se identi-
ficam em Esparta seria já helenístico. Cavanagh (2018) 85 descreve-o
como “um edifício imponente, semelhante em dimensões aos grandes
teatros gregos de Epidauro e Megalópolis”.
282 
Vide supra 3.4.9 e nota respetiva.
283 
Vide supra 3.4.7 e nota respetiva.
284 
Musti, Torelli (2008) 212 salientam a importância deste local em
função dos edifícios que o ocupam; em primeiro lugar, os túmulos dos
monarcas de uma das dinastias de Esparta, a dos Ágidas. Além disso
lá existia um espaço de reuniões, ou Lésche, neste caso com utilização
para cerimónias fúnebres, e diversos santuários a seguir enumerados.
285 
Os cidadãos de Pítane (vide infra 3.16.9).
108
Pausânias

Ténaro, de quem, ao que consta, o promontório que penetra


pelo mar recebeu o nome. Aí estão também os santuários de
Posídon Senhor dos Cavalos (Hipocúrio) e de Ártemis Egineia.
Voltando para trás em direção à Lésche, está o santuário de
Ártemis Issória,286 a que chamam também Limneia; todavia
não se trata de Ártemis, mas de Britomártis dos Cretenses.
Do episódio que lhe diz respeito já fiz menção a propósito
de Egina.287 14.3. Muito perto dos túmulos edificados para
os Ágidas, pode ver-se uma estela, que tem gravadas as vitó-
rias na corrida obtidas por um tal Quíonis,288 um Lacedemó-
nio, nas corridas olímpicas e em outras; mais precisamente,
conseguidas em Olímpia foram sete, quatro no estádio, e as
restantes na corrida dupla (diaulo).289 Então não se usava encer-
rar a competição com a corrida dos escudos. Ao que dizem,
Quíonis integrou-se na expedição com Bato, de Tera, e partiu
com ele a colonizar Cirene e a controlar os vizinhos líbios.290

286 
Plutarco (Vida de Agesilau 32.6) identifica com o nome de Issório
o local onde se situava este templo. Cartledge (apud Richer (2007) 243)
considera que vários santuários de Esparta estão localizados de forma a
delimitar a cintura da cidade e que esse é o caso do de Ártemis Issória,
situado no extremo noroeste. Sobre este culto, vide infra 3.25.4.
287 
Vide supra 2.30.3. Britomártis é o nome de uma deusa cretense
das montanhas, que por vezes se sobrepõe a Ártemis.
288 
Estas vitórias foram conseguidas nos anos de 668, 664, 660 a.C.
Cf. 4.23.4, 4.23.10, 6.13.2, 8.39.3.
289 
Inicialmente, a prova de corrida implicava apenas uma pista e
um sentido (entre 776-724 a.C.), antes de o percurso ser ampliado com
a ida e volta (c. 400 metros). A corrida simples, o chamado “estádio”
(192,27 metros), era a prova principal nos Jogos Olímpicos. Sobre a
introdução da corrida dupla, vide infra 5.8.6.
290 
Cf. Heródoto 4.153-9. Ao referir-se à campanha levada a
cabo por Tera sob a chefia de Bato, Heródoto não inclui o nome de
Quíonis. A sublevação dos Líbios contra os colonos de Tera deveu-se,
naturalmente, a um conflito de interesses que Heródoto traduz com
esta observação (4.159): “Quando uma grande multidão se encontrava
109
Descrição da Grécia

14.4. Quanto ao santuário de Tétis, eis qual a razão por que


se diz que foi construído. Quando combatiam os Messénios
que se tinham revoltado, o rei Anaxandro291 penetrou na Mes-
sénia e capturou umas tantas cativas. Entre elas estava Cleo,
uma sacerdotisa de Tétis. Leandris, a esposa de Anaxandro,
pediu-lhe essa mulher, e descobriu então que ela tinha uma
estátua de madeira de Tétis; com a sua ajuda, edificou à deusa
um templo. 14.5. Tudo isso porque Leandris teve em sonhos
uma visão. Essa estátua de Tétis guardam-na no maior segredo.
Quanto ao culto de Deméter Ctónia, os Lacedemónios dizem
que o receberam de Orfeu.292 Mas estou convencido de que
ele se deveu ao santuário estabelecido em Hermíone, onde a
veneram com esse nome.293 Os Espartanos possuem também
um santuário de Serápis,294 esse muito recente, e outro de Zeus
apodado de Olímpico.
14.6. Os Lacedemónios chamam Drómos (Corrida) a um
lugar onde ainda no meu tempo os jovens praticam a corri-
da.295 Quando se avança para esse Drómos a partir do túmulo
dos Ágidas, à esquerda fica o memorial de Eumedes, um dos

já concentrada em Cirene, os Líbios das redondezas e o seu rei (...)


sentiram-se de tal modo espoliados das suas terras e insultados pelos
Cireneus que enviaram uma embaixada ao Egito ...”.
291 
Vide supra 3.3.4-5. Musti, Torelli (2008) 214 justificam que a
conexão com a Messénia proporciona uma explicação para a existência
do culto de Tétis em Esparta, tão longe do mar.
292 
Vide supra 3.13.2 e nota respetiva, onde se repete a mesma apro-
ximação entre Orfeu e as deusas eleusínias. Sobre o culto de Serápis,
vide Sousa (2015, 2017).
293 
Vide supra 2.35.9.
294 
O único culto egípcio identificado na cidade. Outros cultos de
Serápis são referidos em Beas (3.22.13) e Étilo (3.25.10).
295 
O Drómos situava-se dentro da cidade e era o lugar destinado à
prática desportiva dos rapazes. Não é certamente por acaso que uma
estátua de Héracles se ergueu perto deste recinto.
110
Pausânias

filhos de Hipocoonte.296 Lá está também uma velha estátua de


Héracles, a que os Jogadores da bola (Esfereus) fazem sacrifícios
(jovens que se encontram entre a adolescência e a idade adulta).
No Drómos fizeram-se dois ginásios, um deles consagrado por
Êuricles, um espartano.297 Cá fora, junto da estátua de Héra-
cles, há uma casa que hoje é de um particular, mas dantes per-
tencia a Menelau. Continuando em frente, depois do Drómos,
fica o santuário dos Dioscuros e das Graças, além dos de Ili-
tia, de Apolo Carneu, e de Ártemis Condutora (Hegémone).298
14.7. À direita do Drómos está o templo de Ágnitas, ou seja,
de Asclépio que recebe este epíteto por a estátua ser feita de
agnocasto (agnos).299 O agnocasto tem um caule semelhante
ao do espinheiro. Perto do templo de Asclépio está um troféu,
que Pólux, ao que se conta, ergueu depois de vencer Linceu.300
Para mim, este troféu deixa claro que os filhos de Afareu301
não estão sepultados em Esparta. No princípio do Drómos
estão os Dioscuros Afetérios (“da Partida”), e um pouco mais
adiante o herôon de Álcon, ao que se afirma um dos filhos de
Hipocoonte.

296 
Vide supra 3.1.4-5, 3.10.6 e notas respetivas.
297 
Talvez Júlio Êuricles Herculano.
298 
Equivalente a déspoina, “senhora”. Este era um atributo da deusa
ligado com a fecundidade das plantas. Em 8.37.1, Pausânias descreve
uma imagem de Ártemis Hegémone como “segurando tochas”, o que a
poderia associar com um culto fúnebre. Themelis (1999) 174 considera
que “a iconografia, bem como o carácter ctónico de Ártemis Hegémone,
a relaciona com Ártemis Orthía ou Phósphoros venerada na Messénia”.
299 
Ἄγνος (Vitex agnus-castus L.); cf. Teofrasto, História das plantas
1.3.2, 1.14.2, 3.12.1-2, 4.10.2, 9.5.1. Esta era uma planta popular na
Antiguidade pelas suas diversas qualidades. O espinheiro (ῥάμνος)
é Ramnus lycioides L.; cf. Teofrasto, História das plantas 1.5.3, 1.9.4,
3.18.1-3, 3.18.12, 5.9.7.
300 
Vide supra 3.13.1 e nota respetiva.
301 
Vide supra 3.1.4 e nota respetiva.
111
Descrição da Grécia

A pouca distância do herôon está o santuário de Posídon,


a que eles chamam Domatites (Da casa). 14.8. Há também
um lugar, Platanistas, assim designado do nome das árvores,
plátanos altos e compactos que lá abundam.302 Esse lugar, cir-
cundado por um canal, está destinado à luta dos efebos e mais
parece uma ilha no meio do mar. O acesso é feito por duas
pontes. Numa dessas pontes há uma estátua de Héracles e na
outra uma de Licurgo, pois foi este Licurgo quem estabele-
ceu a constituição em geral,303 mas também o regulamento
para o combate dos efebos. 14.9. Os efebos têm igualmente
estas outras práticas. Assim no Febeu, sacrificam antes do
combate. O Febeu fica fora da cidade, não muito longe de
Terapne.304 Aí, os dois grupos de efebos sacrificam uma cadela
a Eniálio,305 considerando que ao mais corajoso dos deuses é
naturalmente devido o animal doméstico mais corajoso. Que
eu saiba, nenhuns outros Gregos sacrificam cachorros, a não
ser os Colofónios, que também sacrificam uma cadela preta à
deusa Enódia.306 O sacrifício que tanto os Colofónios como
os efebos lacedemónios fazem decorre durante a noite. 14.10.
Após o sacrifício, os efebos organizam combates de javalis
domesticados. Dá-se o caso de aqueles cujo javali sai vitorioso,
na maior parte das vezes saírem eles mesmos vencedores no

302 
Vide supra 3.11.2 e nota respetiva.
303 
Vide supra 3.2.4 e nota respetiva.
304 
Febeu relaciona-se muito provavelmente com um culto de Febo
(vide infra 3.20.2; cf. Heródoto 6.61.3). Terapne era uma povoação do
lado ocidental do vale do Eurotas, cujo nome, segundo a tradição, pro-
viria de uma filha de Lélex. Ficou conhecido por lá ter sido construído
um templo de Menelau (o Meneláion) onde, ao que se dizia, estavam
sepultados Menelau e Helena.
305 
Ou seja, Ares. Eniálio, uma designação micénica do deus, tor-
nou-se, em época clássica, num epíteto.
306 
Epíteto de Hécate.
112
Pausânias

Platanistas. Este combate decorre no Febeu. No dia seguinte,


um pouco antes do meio-dia, dirigem-se ao lugar que eu referi
por uma das pontes; a entrada por que cada grupo irá aceder é
destinada por sorteio durante a noite. Lutam a soco, a pontapé,
mordem-se e arrancam olhos. Homem contra homem lutam
como acabo de dizer, ou então investem em conjunto, com
toda a força, atirando os outros à água.

3.15.1. Outros monumentos e lendas de Esparta


A caminho do Platanistas, existe um herôon de Cinisca, filha
de Arquidamo, rei de Esparta. Foi ela a primeira mulher a criar
cavalos e a primeira a obter uma vitória olímpica na corrida de
carros.307 Aí existe um pórtico, vizinho do Platanistas, e atrás
dele outros herôa, de Álcimo, de Enársforo,308 um pouco mais
adiante o de Dorceu, e, junto deste, o de Sebro. Trata‑se, ao
que se diz, de filhos de Hipocoonte. 15.2. Do herói Dorceu
recebeu nome a fonte Dorceia, que fica ali perto, e o lugar é
chamado Sébrio de Sebro. À direita deste lugar está o túmulo
de Álcman,309 autor de melodias cujo encanto não foi preju-

307 
Vide supra 3.8.2 e nota respetiva.
308 
Álcman refere Álcimo e Enársforo no fr. 1 Page.
309 
Álcman participou, como poeta lírico, na fase de grande proje-
ção artística vivida por Esparta entre os séc. VII-VI a.C. Celebrizou-se
em particular pela composição de partheneia, cantos para donzelas, de
que sobreviveu o Grande Partenéion (fr. 1 Page). Nos partheneîa eram
celebrados os encantos das jovens da aristocracia. Calame (2018) 183
amplia o espetro de influência da poesia de Álcman: “A atividade de
Álcman como compositor e mestre de coros, conhecida essencialmente
através do que sobreviveu dos partheneîa, está associada a cada um dos
grandes momentos das festas e cultos que marcavam o ritmo da vida
política e social de Esparta. Vimos como a poesia de Álcman era usada
nas Gimnopédias, para iniciar os guerreiros. Vários dos seus poemas,
infelizmente muito fragmentários, referem-se também aos Dioscuros,
Castor e Pólux”. Sobre o pouco que os fragmentos conservados nos
113
Descrição da Grécia

dicado pelo dialeto lacónio, que não tem suavidade nenhuma.


15.3. Lá estão os santuários de Helena e de Héracles, aquele
próximo do túmulo de Álcman, e este muito perto das mura-
lhas. Nele existe uma estátua de Héracles armado e essa con-
figuração deve-se – ao que consta – ao combate que travou
contra Hipocoonte e os filhos. A ira de Héracles contra a famí-
lia de Hipocoonte, ao que se ouve dizer, deveu-se a que, após
a morte de Ífito, tendo ele vindo a Esparta para se purificar,
eles não lhe permitiram essa purificação.310 15.4. Um outro
motivo que contribuiu para o desencadear do conflito foi o
seguinte. Éono, filho de Licímnio, irmão de Alcmena – e, por-
tanto, primo de Héracles –, ainda um jovem, tinha vindo para
Esparta com Héracles. Num dia em que se passeava de visita
à cidade, quando se encontrava junto da casa de Hipocoonte,
um cão de guarda atirou-se a ele. Deu-se o caso de Éono lhe
ter atirado uma pedra e ter matado o cão. Aí acudiram os
filhos de Hipocoonte, e mataram-no à paulada. 15.5. Perante
o ocorrido, Héracles ficou furioso com Hipocoonte e os filhos.
E logo, raivoso, avançou contra eles. Naquela altura, ficou
ferido e retirou-se discretamente. Mas tempos mais tarde, ata-
cou Esparta para se vingar de Hipocoonte, e de facto vingou-se
dele e dos filhos pelo homicídio de Éono,311 cujo memorial fica
junto do Heracleion.
15.6. À saída do Drómos, tomando a direção nascente, à
direita há uma vereda e um santuário de Atena chamada Vin-

permitem entrever das criações de Álcman, vide ainda Rocha Pereira


(102006) 214-6.
310 
Vide supra 1.35.8 e nota respetiva.
311 
Pausânias volta ao mito dos filhos de Hipocoonte em 3.19.7,
3.20.5, 8.53.3; cf. Apolodoro, Biblioteca 2.7.3. Héracles, ferido,
refugiou-se no templo de Deméter, perto do Taígeto, onde o próprio
Asclépio se encarregou de o tratar.
114
Pausânias

gadora (Axiopêna). Teria sido construído por Héracles depois


do recontro com Hipocoonte e os filhos, de que tirou uma
vingança legítima; daí o santuário de Atena com o epíteto de
Axiopêna, porque os antigos chamavam “pena” à vingança.
Seguindo‑se por uma outra rua que parte do Drómos, há um
outro santuário de Atena, ao que se diz edificado por Teras,
filho de Autésion,312 neto de Tisâmeno e bisneto de Tersandro,
na altura em que partiu a fundar uma colónia numa ilha que
agora, em função dele, mudou o nome para Tera, quando no
passado se chamava Caliste.313 15.7. Lá perto fica o templo de
Hipóstenes, que acumulou muitas vitórias na luta.314 Veneram-
-no, por determinação de um oráculo, prestando-lhe honras
como a Posídon. Diante desse templo, existe uma antiga está-
tua de Eniálio,315 com cadeias. Imaginam os Lacedemónios
que, do mesmo modo que existe em Atenas uma Vitória (Níke)
dita Áptera (sem asas),316 nunca Eniálio, se tivesse cadeias, fugi-
ria deles e partiria, como também a Vitória dos Atenienses ali
havia de ficar para sempre por não ter asas. Foi então por isso
que as duas cidades erigiram as estátuas de madeira, de acordo
com este pressuposto.
15.8. Em Esparta há também uma Lésche chamada Poikíle
(Pintada)317 e, junto dela, ficam os herôa de Cadmo, filho de

312 
Vide supra 3.1.7 e nota respetiva. Sobre Tisâmeno, vide supra
2.18.7, 3.1.5.
313 
Vide supra 3.1.7-8 e nota respetiva.
314 
Vide supra 3.13.9 e nota respetiva.
315 
Vide supra 3.14.9 e nota respetiva.
316 
Vide supra 1.22.4 e nota respetiva.
317 
Lésche é a designação para um lugar público de encontro, reunião
ou convívio. Diferentemente do que acontece com a Stoá Poikíle de
Atenas que Pausânias descreve com alguma minúcia, não adianta, sobre
esta Lésche, mais do que o nome, eventualmente por a sua decoração
lhe não parecer digna de registo. Musti, Torelli (2008) 221 admitem
115
Descrição da Grécia

Agenor, e dos seus descendentes, o de Eólico, filho de Teras,


e o de Egeu, filho de Eólico. Ao que se diz, foram Mésis, Leas
e Europas, todos eles filhos de Hireu e netos de Egeu, quem
os edificou. Ergueram também o herôon de Anfíloco, porque
Tisâmeno, um seu antepassado, tinha por mãe Demonassa,
irmã de Anfíloco.
15.9. Os Lacedemónios são os únicos Gregos que vene-
ram Hera com o epíteto de Egóphaga (Comedora de cabras),
a quem sacrificam cabras. Dizem eles que foi Héracles quem
lhe erigiu o santuário e que, pela primeira vez, lhe sacrificou
cabras, por, na luta contra Hipocoonte e os filhos, a deusa não
lhe ter interposto obstáculo, como parecia ter feito nos outros
confrontos. Dizem que lhe sacrificou cabras, por não dispor de
outras vítimas. 15.10. Não longe do teatro, há um santuário
de Posídon Genétlio (Familiar),318 e os herôa de Cleodeu, filho
de Hilo, e de Ébalo.319 O mais importante dos santuários de
Asclépio fica junto à Booneta,320 que tem à esquerda o herôon
de Téleclo.321 A ele vou também fazer menção mais adiante,
quando tratar da Messénia.322 Um pouco mais à frente há uma

que se trate de um edifício destinado ao culto funerário da família dos


Egeidas, um clã aristocrata em Esparta. Dentro dessa linhagem podia
contar-se: Teras filho de Autésion, por sua vez filho de Tisâmeno, este
filho de Tersandro, filho de Polinices, descendente do fenício Cadmo,
o fundador de Tebas.
318 
Sobre este epíteto, vide supra 2.38.4.
319 
Todos parte dos invasores dórios. Sobre Ébalo, vide supra 2.2.3,
3.1.3.
320 
Vide supra 3.12.1 e nota respetiva. A chamada de atenção para
a importância deste santuário de Asclépio – que talvez resulte da sua
localização central na cidade – distingue-o de outros do mesmo deus
existentes em Esparta: vide supra 3.14.2, 3.14.7, infra 3.19.7.
321 
Vide supra 3.2.6 e nota respetiva.
322 
Vide infra 4.4.2, 4.31.3.
116
Pausânias

colina pequena e, lá no cimo, um templo antigo de Afrodite,


com uma imagem da deusa armada.323 Dos templos que eu
conheço este é o único com um piso superior, onde fica um
santuário dedicado a Morfo (Beleza). 15.11. Morfo é um epí-
teto de Afrodite; a deusa está sentada, de véu pela cara e com
cadeias nos pés. Segundo eles, foi Tíndaro quem lhe pôs as
cadeias, para significar, com os cadeados, que a fidelidade das
mulheres deve ser inviolável. Há, de facto, uma outra versão, de
que Tíndaro se vingava da deusa com as cadeias, considerando
Afrodite responsável pela ignomínia das filhas.324 Mas não acre-
dito nesta teoria, porque era completamente absurdo imaginar
que se tira vingança da deusa fazendo uma figurinha de cedro
e pondo-lhe o nome de Afrodite.

3.16.1. Outros cultos espartanos. Ártemis Órtia


Lá perto está o santuário de Hilaíra e de Febe.325 O autor
dos Cantos Cíprios326 deu-as como filhas de Apolo. Têm por
sacerdotisas moças jovens, chamadas Leucípides, tal como as

323 
Flower (2018) 434 chama a atenção para a raridade com que
Afrodite é representada armada e considera esta versão típica de um
entendimento espartano da divindade.
324 
De Helena, responsável de adultério e causadora da Guerra de
Troia, e de Clitemnestra, também ela traidora do marido, Agamémnon,
a quem assassinou no regresso da guerra.
325 
Ou seja, as Leucípides, que despertaram o interesse de Castor e
Pólux e foram por eles raptadas. Sobre os traços essenciais deste mito,
vide Baldassi (2018) 4-23. Sobre a relevância da informação proporcio-
nada por Pausânias quanto à antiguidade deste mito, escreve a mesma
autora (7): “Segundo Pausânias, o rapto das Leucípides era narrado nos
Cypria (provavelmente do séc. VII a.C.). Atesta também que a mesma
cena aparecia na decoração de um certo número de edifícios arcaicos,
tal como o templo de Atena em Esparta, o trono de Apolo em Amiclas,
o templo dos Dioscuros em Argos e o Anakeîon em Atenas”. Calame
(2018) 183 sublinha como o seu ascendente, simultaneamente divino
117
Descrição da Grécia
326

deusas.327 Leucípide, uma das suas sacerdotisas, ornamentou


uma das duas estátuas, dando-lhe ao rosto um aspeto muito
diferente do antigo e próprio dos dias de hoje.328 Mas quando
se preparava para fazer o mesmo à outra, teve um sonho que a
impediu. Nesse santuário há um ovo suspenso do teto cercado
de fitas. Dizem eles que esse é o ovo que, segundo a lenda,
Leda deu à luz.329 16.2. Todos os anos, as mulheres tecem uma
túnica para Apolo de Amiclas,330 e o edifício onde a tecem
designam-no por “Túnica” (Chitôn). Lá perto há uma casa;

e humano (como filhas de Leucipo ou de Apolo), as aproximava dos


Dioscuros, de que talvez fossem “uma versão no feminino”.
326 
Este é um célebre poema do ciclo épico, em onze cantos, de
autor desconhecido ou pelo menos incerto, que narrava os aconteci-
mentos anteriores aos relatados na Ilíada (casamento de Peleu e Tétis,
julgamento das deusas, rapto de Helena, acontecimentos em Áulis
e episódios bélicos anteriores à Ilíada). É para nós um texto apenas
conhecido indiretamente pela Crestomatia de Proclo. Lesky (1968) 103-
5. Pausânias volta a referir o autor dos Cantos Cíprios em 10.26.1.
327 
Sobre o culto das Leucípides Baldassi (2018) 78 escreve: “Dis-
punham de um culto peculiar, que lhes era exclusivo, tinham as suas
sacerdotisas, o seu templo, e provavelmente desempenhavam um papel
de relevo em ritos de iniciação, como os das parthénoi ao entrarem na
idade adulta”.
328 
Esta observação de Pausânias abona a antiguidade das estátuas,
que alguém tentou remodelar dentro de um estilo mais moderno.
329 
Contava a lenda que Leda, esposa de Tíndaro, foi seduzida por
Zeus sob disfarce de um cisne. Dessa união Leda gerou dois ovos, de
que nasceram, segundo algumas versões, Helena, Clitemnestra e os
Dioscuros (cf. Eurípides, Helena 256-9). Leda era filha de Téstio, por
sua vez filho de Agenor (vide supra 3.13.7).
330 
Vide supra 3.1.3. Apolo era a divindade mais marcante em
Esparta. A esta “Túnica” não é feita qualquer outra referência a não
ser a de Pausânias. Mas é plausível pensar que, depois de bordada em
Esparta, a túnica era levada em cortejo para Amiclas, onde era ofertada
a Apolo, provavelmente durante as Jacíntias. Este seria um dos vários
sinais da inclusão do elemento feminino no culto de Apolo e Jacinto;
cf. Vergara Cerqueira (2019) 195-6.
118
Pausânias

dantes, ao que consta, essa era a casa que habitavam os filhos


de Tíndaro,331 que mais tarde veio a ser comprada por Formião,
um espartano. Um dia os Dioscuros apareceram por lá disfar-
çados de estrangeiros. Diziam eles que vinham de Cirene e que
pretendiam instalar-se lá em casa. Pediram-lhe então o quarto
de que mais gostavam quando estavam ainda entre os homens.
16.3. Formião declarou que todo o resto da casa estava inteira-
mente à sua disposição, menos o tal quarto, que estava ocupado
pela filha que ele tinha, ainda uma jovem. No dia seguinte, a
moça e toda a criadagem ao seu serviço tinham desaparecido,
e no quarto encontraram estátuas dos Dioscuros, uma mesa e
sobre ela sílfio.332
16.4. Era isso que diziam ter acontecido. Na direção das
portas da cidade, quem vem da Túnica, fica o herôon de Quí-
lon, considerado um dos sábios,333 e o de Atenodoro que parti-
cipou, com Dorieu, filho de Anaxândrides, no grupo enviado

331 
Ou seja, os Dioscuros.
332 
Planta identificada como Ferula tingitana L.  Esta era uma
espécie própria de planaltos, cujo principal produtor era a região da
Cirenaica, na Líbia. Da sua importância para a economia da região fala
o facto de o sílfio figurar nas suas moedas. Heródoto (4.169, 4.192) refe-
re-se-lhe a propósito da fundação de Cirene, empreendida por colonos
de Tera (cf. Heródoto 4.147-158; vide supra 3.15.6), c. 631 a.C. Mas a
proposta de Teofrasto (História das plantas 6.3.3) indica uma fundação
um pouco mais tardia, c. 611 a.C. Esta região do norte de África gozou
de uma grande prosperidade, como produtora de cereais, lã, azeite e
sobretudo sílfio. A sua popularidade na Atenas clássica é testemunhada
pela insistência com que a comédia se lhe refere; cf. Aristófanes, Cava-
leiros 895, Aves 534, 1582, Mulheres na assembleia 1171, Pluto 925.
333 
O nome de Quílon (séc. VI a.C.) figurava entre os dos Sete
Sábios (cf. Heródoto 1.56.3). Era conhecido pelo pragmatismo e pela
piedade. Diógenes Laércio 1.68 parece sugerir que ele fosse responsável
pela criação do eforato, ou que o tenha reformado, com o que contri-
buiu para a estruturação do governo e da sociedade espartanos. Musti,
Torelli (2008) 224 não hesitam em chamar-lhe “o grande protagonista
119
Descrição da Grécia

para a Sicília.334 Empreenderam esta viagem convencidos de


que a região de Ericina pertencia aos descendentes de Héracles,
e não aos bárbaros que a ocupavam. De facto, conta a lenda
que Héracles lutou contra Érix nas condições seguintes: se
Héracles vencesse, o território de Érix ficaria para ele; 16.5. se
fosse vencido no combate, as vacas de Gérion – vacas essas que
Héracles conduzia, e que, depois de atravessarem a nado para
a Sicília, ele mesmo atravessou também a recuperá-las junto da
oliveira retorcida –, pois, no caso de derrota de Héracles, elas
ficariam para Érix.335 Mas a vontade divina não foi mais tarde
propícia a Dorieu, filho de Anaxândrides, da mesma maneira
que a Héracles; de facto, este último matou Érix, enquanto
Dorieu, ele e boa parte do seu exército, foram chacinados pelo
povo de Egesta.336

da política espartana do séc. VI”. Vide Leão (2003) 23-41, (2010b)


49-110.
334 
Vide supra 3.3.10, 3.4.1 e notas respetivas. Atenodoro é um parti-
cipante nesta expedição que não figura entre os nomes mencionados por
Heródoto 5.46.1: Téssalo, Parébates, Céleas e Eurileonte.
335 
Heródoto 5.43.1. Érix era o nome dado a um monte situado a
noroeste da Sicília. Segundo o mito de Héracles, o décimo trabalho do
herói – as vacas de Gérion – consistiu em levar, dos confins do oceano
a ocidente até Micenas, com vida, os animais que eram propriedade de
um lendário monstro de três cabeças, Gérion, que habitava Tartesso, na
Hispânia (cf. Heródoto 4.8.1-3). Foi no regresso à Hélade que, na passa-
gem pela Sicília, um dos animais se tresmalhou e foi invadir o território
de Érix, filho de Posídon, que o capturou. Da luta que Érix travou com
Héracles resultou-lhe a morte (cf. Apolodoro 2.5.10, Diodoro Sículo
4.23.1-3). Com base neste episódio, Heródoto defende a legitimidade
com que um espartano ocupava território dos Heraclidas, por tradição
antepassados da casa real espartana. Tucídides 6.2.3 identifica duas
cidades nessa região siciliana, com o nome de Érice e Egesta.
336 
Cf. Heródoto 5.46.1.
120
Pausânias

16.6. Os Lacedemónios erigiram também a Licurgo, o


legislador,337 um santuário, como se fosse um deus. Atrás do
templo, está o túmulo do filho de Licurgo, Eucosmo, junto
a um altar de Látria e Anaxandra. Trata-se de duas gémeas
que casaram com os dois filhos de Aristodemo, também eles
gémeos.338 Eram filhas de Tersandro, filho de Agamédides, rei
de Cleonas, e quarto descendente de Ctesipo, filho de Héra-
cles. Fronteiro ao templo fica o memorial de Teopompo, filho
de Nicandro,339 e o de Euribíades, comandante das trirremes
lacedemónias nas batalhas de Artemísio e Salamina, contra os
Medos.340 Lá perto está o chamado herôon de Astrábaco.341
16.7. No local designado por Limneu (Pantanoso) há um
santuário de Ártemis Órtia.342 Afirmam eles que a estátua de

337 
Vide supra 3.2.4 e nota respetiva.
338 
Vide supra 3.1.6-7 e nota respetiva.
339 
Vide supra 3.3.2 e nota respetiva.
340 
Cf. Heródoto 8.2.1-2, em que são alistados os povos que comba-
teram no Artemísio; a propósito do comando de Euribíades, Heródoto
escreve: “O comandante em chefe das forças navais, Euribíades, filho
de Euriclides, foi indigitado pelos Espartanos. É que os aliados fizeram
saber que, se o Lacónio não fosse o comandante, rejeitariam a chefia dos
Atenienses”; em 8.42.2, Heródoto abona ainda que, embora não perten-
cendo à família real espartana, normalmente encarregada do comando
das tropas, Euribíades manteve a mesma prerrogativa em Salamina; cf.
8.74.2; por fim, em 8.124.2, Heródoto complementa a informação com
as honras que os Espartanos lhe concederam em reconhecimento do seu
feito, ao mesmo nível das concedidas ao ateniense Temístocles, ambos
louvados pela sua determinação e astúcia.
341 
Cf. Heródoto 6.69.3.
342 
Cf. Ogden (2007) 237-8, que identifica o culto de Orthía como
patrocinador da transição da adolescência para a vida adulta. Acrescenta
ainda que a identificação de Orthía com Ártemis é tardia. E especula
sobre a interpretação dada ao qualificativo, como correspondente a uma
divindade que garante o crescimento “correto, direito”. O santuário de
Ártemis Órtia situava-se junto do Eurotas.
121
Descrição da Grécia

madeira é aquela que outrora Orestes e Ifigénia subtraíram


da Táuride, que se teria tornado propriedade lacedemónia
pelo facto de Orestes lá ter reinado. Esta é uma versão que
me parece mais credível do que a dos Atenienses.343 De facto,
qual poderia ser o motivo para Ifigénia ter deixado a estátua
em Bráuron? Ou então, porque é que os Atenienses, quando
tomaram a decisão de abandonar esse território, não a levaram
para bordo dos navios? 16.8. Todavia, ainda nos dias de hoje,
a deusa táurica goza de um tal renome, que os Capadócios e os
habitantes do Ponto Euxino disputam entre si a propriedade
da estátua; como a disputam também os Lídios, que possuem
um santuário de Ártemis Anaítis.344 Os Atenienses deixaram-na
partir como parte do saque dos Medos.345 De facto, de Bráuron
foi levada para Susa e, mais tarde, como oferta de Seleuco, teria
ido parar aos Laodicenos, na Síria, que ainda hoje a possuem.
16.9. De que a estátua que veio dos bárbaros seja a de Ártemis
Órtia que se encontra na Lacedemónia as provas que tenho são
as seguintes. Em primeiro lugar, Astrábaco e Alópeco, filhos de
Irbo, filho de Anfístenes, filho de Ânficles, filho de Ágis, mal
encontraram a estátua, enlouqueceram. Além disso, os habitan-
tes de Limnas, que são espartanos, e os de Cinosura, de Mésoa
e de Pítane,346 ao fazerem sacrifícios a Ártemis, entraram em
conflito e, a partir daí, passaram ao ressentimento e chegaram
ao homicídio. Uma boa parte deles morreu no altar, e os res-

343 
Vide supra 1.23.7, 1.33.1 e notas respetivas.
344 
Anaítis era uma deusa persa patrocinadora da fertilidade e da
procriação.
345 
Vide infra 8.46.3.
346 
Esparta não era uma cidade com a estrutura urbana existente
em outras cidades. Resultava de um agrupamento de povoações (obaí,
Limnas, Cinosura, Mésoa, Pítane, Amiclas), também elas agrupadas
por um sistema de sinecismo; cf. Tucídides 1.10.2.
122
Pausânias

tantes morreram de doença. 16.10. Um oráculo, perante estes


acontecimentos, anunciou que o altar devia ser tingido de san-
gue humano. Passou a sacrificar-se então alguém por tiragem à
sorte. Foi Licurgo quem substituiu esta prática pela flagelação
dos efebos, de modo a que o altar se cubra de sangue humano.
A sacerdotisa fica de pé, segurando a estátua que é pequena e
leve. 16.11. Se os flageladores alguma vez pouparem algum dos
miúdos, pela sua beleza ou distinção, a mulher tem logo a sen-
sação de que a estátua se tornou pesada a ponto de não poder
com ela. Aí ela acusa os flageladores e diz-se oprimida por causa
deles.347 A tal ponto se tornou agradável à estátua, recordada
dos sacrifícios na Táuride, o sangue humano. A esta estátua
chamam não apenas Órtia, mas também Ligodesma (atada com
vimes), por ter sido descoberta num tufo de juncos. E como
estava bem cercada, o junco manteve a estátua direita (orthía).

3.17.1. Outros edifícios e artistas de Esparta


Não longe da Órtia, há um santuário de Ilitia. Segundo
eles, foi o oráculo de Delfos a determinar que o edificassem e
que considerassem Ilitia como uma deusa.
Os Lacedemónios não têm uma acrópole instalada num
ponto alto que se veja do espaço em volta, como a Cadmeia
em Tebas,348 ou a Larissa em Argos.349 Mas tendo eles várias

347 
Este teste à resistência dos jovens, que já representava um avanço
instalado em época helenística, é também referido por Plutarco, Vida
de Licurgo 18.1, Cícero, Tusculanas 2.6.
348 
Esta era uma antiga fortaleza de Tebas, que ascendia a c. 1400
a.C. Veio a ser destruída, em 335 a.C., por Alexandre da Macedónia,
no seu ataque à Grécia, e reconstruída posteriormente (c. 316 a.C.) por
Cassandro. A tradição atribuía a sua construção ao fundador mítico da
cidade, Cadmo (vide supra 2.6.2 e nota respetiva).
349 
Vide supra 2.24.1 e nota respetiva.
123
Descrição da Grécia

colinas na cidade, à mais elevada chamam ‘acrópole’. 17.2. Aí


foi erigido um santuário de Atena designada por Polioûchos
(Protetora da cidade) e Chalkíoikos (Do templo de bronze).350
Foi Tíndaro, ao que consta, quem deu início à construção deste
santuário. Quando morreu, os filhos entenderam levar a cabo a
edificação, investindo nela os despojos que tinham saqueado ao
povo de Afidnas.351 Mas como a obra continuou inacabada, os
Lacedemónios, muitos anos mais tarde, fizeram um templo de
bronze, tal como a estátua de Atena. Foi Gitiadas, um homem
da região, quem se encarregou da obra.352 Esse mesmo Gitia-
das foi autor de cantos dóricos, entre eles um hino à deusa.
17.3. Esculpidos em bronze estão muitos dos trabalhos de
Héracles – e também vários daqueles que ele empreendeu

350 
Será oportuno citar Tucídides 1.10.2 a propósito da arquitetura
urbana de Esparta: “... a cidade não tem templos nem edifícios sump-
tuosos e não está construída de forma conjunta; antes é formada por
aldeias dispersas à maneira antiga da Grécia”. Quanto ao “templo de
bronze”, cf. Tucídides 1.128.2; vide ainda Gagliano (2015) 81-112. Sobre
a designação deste templo, Calonge Ruiz, Torres Esbarranch (1990) 339
especulam: “A denominação Calcieco pode ser diversamente interpre-
tada; podia dever-se ao bronze do templo, das portas ou do telhado,
ou à estátua da deusa. É, no entanto, provável que reflita uma antiga
relação de época micénica entre Atena e a classe dos artistas do bronze”.
Cavanagh (2018) 67 sublinha que, “embora os Espartanos tivessem
conhecimento da arquitetura em pedra e da ordem dórica, tinham um
gosto particular por traçados insólitos de edifícios (como o Meneláion, o
trono de Apolo em Amiclas, Atena Chalkíoikos), explorando um design
intrincado e materiais de valor (bronze, marfim, ouro), ainda que em
pequena escala”.
351 
Vide supra 2.22.6 e infra 3.18.5.
352 
Trata-se de um artista do bronze, de finais do séc. VI a.C., autor
também de três trípodes de Amiclas; vide infra 3.18.5. Era ainda de sua
autoria a estátua que se encontrava no templo de Atena Chalkíoikos,
como Pausânias aqui testemunha.
124
Pausânias

por conta própria –,353 e os dos filhos de Tíndaro, entre eles o


rapto das Leucípides.354 Está também Hefesto a soltar a mãe
das cadeias, episódio de que já dei notícia acima, no Livro
sobre a Ática.355 A Perseu, na hora de partir para a Líbia para
combater Medusa, as Ninfas estão a oferecer de presente um
elmo e umas sandálias, graças às quais ele podia atravessar os
ares.356 Foi também esculpido o nascimento de Atena,357 Anfi-
trite e Posídon, que, na minha opinião, são as peças de maiores
dimensões e mais dignas de uma visita. 17.4. Além desse, existe
ainda um outro santuário de Atena Ergáne (Deusa do trabalho).
Na direção do pórtico do lado sul, há um templo de Zeus com
o epíteto de Cosmêtas (Senhor da ordem) e, em frente dele, um
memorial de Tíndaro. No outro pórtico virado a poente, há um
par de águias semelhantes, que sustentam cada uma uma Vitó-
ria, oferta de Lisandro, em memória de ambos os seus feitos:
o de Éfeso, quando venceu Antíoco, o piloto de Alcibíades, e
as trirremes de Atenas; e, mais tarde, um outro também contra
a armada ateniense, que ele desmantelou em Egospótamo.358
17.5. À esquerda do Chalkíoikos (templo de bronze) foi
edificado um santuário das Musas, uma vez que os Lacede-

353 
Ou seja, além dos que lhe foram encomendados por Euristeu.
É o caso, por exemplo, do homicídio dos filhos de Hipocoonte (vide
supra 2.18.7).
354 
Vide supra 3.13.1 e nota respetiva. Além desta representação,
Pausânias refere ainda a presença do mesmo motivo no trono de Apolo
em Amiclas (vide infra 3.18.11).
355 
Vide supra 1.20.3.
356 
Vide supra 1.22.7, 2.21.6-7 e notas respetivas.
357 
Vide supra 2.24.2 e nota respetiva.
358 
A primeira em 407 a.C. e a segunda em 405 a.C. Sobre a
vitória obtida por Lisandro em Éfeso, vide Plutarco, Vida de Lisandro
5.1-2; sobre a sua intervenção em Egospótamo, vide supra 3.8.6 e nota
respetiva.
125
Descrição da Grécia

mónios partiam para a guerra não ao som das trombetas, mas


de cantos acompanhados à flauta, à lira e à cítara. Por trás do
Chalkíoikos, há um templo de Afrodite Areía (Da guerra).359 As
estátuas de madeira são antigas como não há outras na Grécia.
17.6. À direita do Chalkíoikos, há uma estátua de Zeus Hípato
(Supremo), que é, das estátuas de bronze existentes, a mais
antiga. Não se trata de uma obra feita de uma só peça, mas foi
sendo construída peça a peça, que foram depois muito bem
apertadas umas às outras, e seguras com pregos de modo a
não se soltarem. Foi, ao que se diz, Clearco de Régio360 quem
fez esta estátua. Tratar-se-ia, segundo uns, de um discípulo
de Dipeno e Cílis,361 ou, segundo outros, do próprio Dédalo.
Perto do chamado Escénoma (Tenda), está a imagem de uma
mulher, Eurileónida, que, segundo os Lacedemónios, saiu vito-
riosa em Olímpia na corrida de carros de cavalos.362
17.7. Junto do altar do Chalkíoikos perfilam-se duas está-
tuas de Pausânias, o comandante em Plateias.363 Quais foram
os seus feitos não os vou descrever, por serem por demais
conhecidos. Os escritos dos meus antecessores dão do assunto
um relato minucioso.364 Limito-me a acrescentar um porme-

359 
Nesta aceção a deusa era representada com armas, de modo
equivalente ao deus Ares. Atena e Zeus usavam o mesmo epíteto.
360 
As únicas referências a este artista são-nos dadas por Pausânias.
Vide infra 6.4.4, onde se diz que era discípulo de Euquiro de Corinto e
que, por sua vez, se tornou mestre de Pitágoras de Régio.
361 
Vide supra 2.15.1, 2.22.5.
362 
C. 368 a.C. Esta foi a segunda mulher a conquistar uma vitória
olímpica, depois da sua compatriota Cinisca, vencedora em 392 a.C.
(vide supra 3.8.1-2 e nota respetiva).
363 
Vide supra 1.13.4, 3.4.9 e notas respetivas.
364 
Cf. Heródoto 9.60-88, Tucídides 1.94-5.
126
Pausânias

nor. É que ouvi a um sujeito de Bizâncio que Pausânias, 365


depois de ter sido apanhado a conspirar, foi o único dos supli-
cantes do Chalkíoikos que não teve acolhimento, por não se
ter conseguido purificar do crime.366 17.8. Assim, quando
se encontrava ao comando, no Helesponto, dos navios lace-
demónios e de outros Gregos, apaixonou-se por uma moça
de Bizâncio. Chegada a noite, os encarregados de lhe traze-
rem Cleonice – era esse o nome da rapariga – vieram. Nessa
altura o ruído despertou Pausânias, que estava a dormir,
quando a moça, ao aproximar-se dele, involuntariamente
deixou cair a lamparina acesa. 17.9. Como Pausânias, cons-
ciente de que estava a trair a Grécia, vivia num desassossego

365 
Anos depois do termo das Guerras Pérsicas e da vitória de
Plateias, Pausânias comandou uma armada em direção à Ásia (c. 478
a.C.), com o intuito de ocupar territórios importantes para os inte-
resses persas, caso de Chipre e Bizâncio. A ameaça persa continuava,
naturalmente, latente. Mas caraterísticas do seu génio, motivadoras de
fricções com os homens sob seu comando, levaram a que fosse suspenso
de funções e intimado a regressar a Esparta. Pouco tempo depois do
regresso, foi eliminado sob acusação de traição: ou de ter conspirado
com os hilotas em desfavor dos interesses do poder espartano, ou de ter
negociado com o rei persa, o velho inimigo da Grécia.
366 
O templo era conhecido como lugar de refúgio para suplicantes,
ainda que perseguidos como criminosos. Pausânias foi acusado de ter
conspirado com Xerxes e de ter fomentado uma sublevação de hilotas.
Perante a possibilidade de ser preso, fugiu a refugiar-se no Chalkíoikos.
Mas os éforos deram ordem para o manterem lá fechado até morrer
de fome (c. 470 a.C.). Mais tarde, conscientes de que tinham violado
a regra de proteção aos suplicantes e incorrido na punição de Zeus
Hicésio, consultaram o oráculo de Delfos. Este ordenou-lhes que levas-
sem o túmulo de Pausânias para dentro do templo e dedicassem dois
corpos em vez de um à deusa. Foi por isso que erigiram duas estátuas
de Pausânias ao lado do altar de Atena. Tucídides 1.128-34 faz um
relato minucioso deste episódio. Gagliano (2015) 82 valoriza o facto de
o registo sobre este templo ter mais a ver com a sua intervenção política
do que propriamente com o culto nele executado.
127
Descrição da Grécia

e temor permanentes, saltou da cama e matou a jovem com


a espada. Esse foi o crime de que Pausânias não conseguiu
livrar-se, por mais purificações e súplicas que fizesse a Zeus
Fíxio,367 e apesar de ter ido a Figália, na Arcádia, a consul-
tar os necromantes. 368 Pagou então a pena devida a Cleo-
nice e ao deus. Os Lacedemónios, por ordem do oráculo de
Delfos, fizeram imagens de bronze e criaram um culto ao
génio Epidôtes (O que presta ajuda), afirmando que esse Epi-
dôtes afasta a cólera de Zeus Hicésio devido a Pausânias.369

3.18.1. Tesouro artístico de Amiclas


Perto das estátuas de Pausânias há uma imagem de Afro-
dite Ambologêras (Capaz de retardar a velhice), erguida de
acordo com um oráculo, e outras do Sono (Hypnos) e da
Morte (Thánatos), que, segundo narra a Ilíada, são irmãos.370
18.2. Continuando na direção do chamado Álpio, 371 está o
templo de Atena Oftalmítide (Protetora dos olhos). Ao que se
diz, foi Licurgo quem o erigiu, quando Alcandro lhe arrancou
um olho, porque as leis que promulgou não lhe agradaram.
Refugiou-se então neste lugar, sob a proteção dos Lacedemó-
nios, sem a qual teria perdido também o olho restante; por isso
dedicou o templo a Atena Oftalmítide.372 18.3. Continuando

367 
“Protetor dos criminosos arrependidos”.
368 
Sacerdotes que, com rituais propiciatórios, evocavam os mortos.
369 
Epidôtes era a designação de um “espírito” (daímon) da puri-
ficação, que acalmava a ira de Zeus Hicésio. Em Delfos, funcionava
de acólito de Apolo e presidia aos rituais de purificação destinados a
eliminar a poluição causada por um crime.
370 
Ilíada 14.231, 16.672.
371 
Um lugar do lado norte de Esparta.
372 
Este episódio é narrado em pormenor por Plutarco, Vida de
Lisandro 11. Aí se abona a reação desfavorável que a constituição elabo-
rada por Licurgo provocou entre a classe mais abonada, a ponto de o
128
Pausânias

em frente, fica o santuário de Ámon,373 já que, ao que parece,


desde o início os Lacedemónios foram, de entre os Gregos, os
que mais recorriam ao oráculo líbio. Há mesmo quem diga
que, quando Lisandro invadiu Afitis,374 em Palene, durante a
noite lhe apareceu Ámon, a aconselhá-lo de que seria melhor
para ele e para a Lacedemónia deixar o povo de Afitis em paz.
Então Lisandro levantou o cerco e incentivou os Lacedemónios
a prestarem ao deus um culto ainda maior; certo é que os Afi-
teus veneram Ámon não menos do que os Amónios da Líbia.
18.4. Quanto à tradição de Ártemis Cnágia, eis o que se
diz. Cnageu – dizem eles – era um sujeito da região que fez
campanha contra Afidnas juntamente com os Dioscuros. 375
Tendo sido capturado em combate, foi vendido como escravo
e enviado para Creta. Aí, os Cretenses tinham um santuário
de Ártemis; tempos depois, ele escapou com a sacerdotisa, que
levou na fuga a estátua da deusa. A partir daí, passaram a cha-

legislador se ter visto perseguido e agredido. Como punição, Alcandro


foi posto ao serviço de Licurgo que o tratou com tal humanidade que
fez dele um admirador. Plutarco refere também a construção do templo
em honra da deusa protetora dos olhos.
373 
O oráculo de Ámon, situado no oásis de Siwah, no deserto da
Líbia, era extremamente famoso na Antiguidade, rivalizando com os
de Dodona e Delfos na Grécia; Heródoto 1.46.2-3 refere-o entre os
oráculos mais prestigiados a que Creso enviou emissários; em 2.54.1,
o pai da História estabelece uma relação entre os oráculos de Ámon e
Dodona. Ámon, tal como Zeus, era uma divindade solar.
374 
Cidade situada no lado oriental da península de Palene, na Cal-
cídica, não longe de Potideia. Sobre este episódio, vide Plutarco, Vida de
Lisandro 20.4-5. Segundo este testemunho, após a advertência de Ámon,
Lisandro revindicou a necessidade de se deslocar à Líbia a apaziguar
o deus; mas o biógrafo prefere, como justificação desta viagem, uma
causa política: o temor que Lisandro tinha dos éforos, cuja autoridade
não suportava.
375 
Vide supra 1.17.5 e nota respetiva.
129
Descrição da Grécia

mar a Ártemis Cnágia.376 18.5. Mas não me parece que esse


tal Cnageu tenha ido para Creta pelo motivo referido pelos
Lacedemónios. Julgo eu que nem sequer houve combate em
Afidnas, numa altura em que Teseu se encontrava entre os Tes-
protos e os Atenienses não se punham de acordo, mas pendiam
mais para Menesteu.377 E mesmo se tivesse havido combate,
não seria credível que alguém, de entre os vencedores, fosse
feito prisioneiro; tanto mais que a vitória foi estrondosa, de tal
maneira que Afidnas foi tomada.
18.6. Quanto a este assunto, fiquemos por aqui. Quando
se desce de Esparta para Amiclas,378 encontra-se o rio Tíasa,
sendo que eles consideram Tíasa filha de Eurotas. Junto desse
rio, fica um santuário das Graças, Faena (Raio de luz) e Cleta
(Gloriosa), cantadas por Álcman.379 Ao que se diz, foi Lacedé-
mon quem edificou este santuário às Graças, como também
foi ele que lhes deu o nome. 18.7. Entre os monumentos de
Amiclas,380 um dos que merece ser visto é um atleta do pen-

376 
Ou seja, a estátua da deusa raptada de Creta foi objeto de um
culto em Esparta, de que Cnageu se tornou epónimo.
377 
Vide supra 1.17.5-6, 1.41.5.
378 
Sobre a localização de Amiclas, a escassos quilómetros a sul
de Esparta, na margem direita do Eurotas, cf. Políbio 5.18-9. Sobre a
edificação desta cidade pelo rei de Esparta com o mesmo nome, vide
supra 3.1.3.
379 
Fr. 62 Page.
380 
A longa descrição dedicada a Amiclas abona da sua monumen-
talidade. São sobretudo “dignos de se ver” o trono obra de Báticles e a
estátua de Apolo Amicleu. Vlachou (2017) 31 descreve assim a imagem
do deus: “A estátua de Apolo tinha dimensões colossais, dando a ideia
de um pilar de bronze a que se acrescentaram um rosto, mãos e pés; nas
mãos segurava uma espada e um arco”. E quanto ao trono, acrescenta
(41): “De acordo com a descrição de Pausânias (III 19), em vez de um
templo um enorme trono dominava a colina, no meio do qual se encon-
trava um altar, que dava acesso ao túmulo de Jacinto e à estátua em
130
Pausânias

tatlo, de nome Eneto, sobre uma estela.381 Depois de vencer


em Olímpia, diz-se que morreu ainda coroado. Dele há uma
imagem e trípodes em bronze. Delas as mais antigas passam por
ser o dízimo da guerra contra a Messénia. 18.8. Sob a primeira
das trípodes ergue-se uma imagem de Afrodite, na segunda
uma de Ártemis, ambas obras de Gitiadas, enquanto a terceira
é da autoria de Cálon, de Egina.382 Debaixo desta está gravada
uma imagem de Perséfone, filha de Deméter. Aristandro de
Paros e Policlito de Argos383 são autores o primeiro de uma
mulher com uma lira, a própria Esparta, e Policlito de uma
Afrodite chamada ‘do Amicleu’. Estas trípodes ultrapassam,
em dimensões, as restantes; foram consagradas após a vitória
em Egospótamo. 18.9. Báticles de Magnésia, o autor do trono
do Amicleu,384 ofertou também, além do trono, umas Graças
e uma estátua de Ártemis Leucofriene.385 De quem este Báti-
cles foi discípulo e quem reinava na Lacedemónia na altura
em que ele fez o trono, passo adiante. Mas o trono, eu vi-o

forma de coluna de Apolo. O caráter distinto da sua estrutura colocada


no topo da colina em Amiclas atraiu o interesse dos estudiosos já em
data muito antiga”. São vários os nomes dos artistas comprometidos
com a construção e decoração destes monumentos, atestando uma
época de prosperidade e abertura em Esparta. Tornaram-na também
célebre as Jacíntias que aí se realizavam e eram a festa mais emblemática
da cidade. A iconografia comprova a participação de rapazes e raparigas
em danças e uma prova atlética. A informação mais clara que temos
sobre esta cerimónia é-nos dada por Ateneu 4.138e-140b.
381 
Vide Tucídides 5.18.10, 5.23.5.
382 
Ativo nas últimas décadas do séc. VI a.C. Sobre Gitiadas, vide
supra 3.17.2 e nota respetiva.
383 
Aristandro era um artista do bronze, de finais do séc. V a.C.
Sobre Policlito, vide supra 2.17.4 e nota respetiva.
384 
Sobre este monumento, vide supra Introdução, pp.
385 
Vide supra 1.26.4 e nota respetiva. Provavelmente esta oferta do
escultor destinou-se a celebrar a magnitude e sucesso da obra.
131
Descrição da Grécia

e, por isso, posso descrevê-lo em pormenor.386 18.10. Duas


Graças e duas Horas sustentam este trono, à frente e atrás.
À esquerda, estão representados Equidna e Tífon387 e, à direita,
Tritões.388 Não pretendo passar em revista, em detalhe, cada
um dos elementos gravados – o que resultaria fastidioso para
os leitores –, mas fazer uma síntese, porque na sua maioria eles
são bem conhecidos. Posídon e Zeus levam Taígete, filha de
Atlas, e a irmã dela, Alcíone.389 Atlas também lá figura, bem
como o duelo entre Héracles e Cicno,390 e a luta dos Centauros,

386 
Nafissi (2020) 1 afirma, em termos gerais, a propósito da deco-
ração do trono: “A decoração – na minha opinião esculpida em pedra
– estava claramente dividida em três partes. No exterior, podiam ver-se
vinte e cinco cenas, catorze no interior (...) e, por fim, na base da estátua
colossal, havia relevos”.
387 
Tífon é referido em Ilíada 2.783; por sua vez Hesíodo, Teogonia
297-300 faz uma descrição minuciosa de Equidna: “Na cavidade de
uma gruta nasceu a divina Equidna, de espírito violento. O seu corpo
é metade mulher, de belas faces e olhos luzentes, e metade uma enorme
serpente, tão terrível quanto grande, matizada, cruel, moradora das
profundezas insondáveis da terra”; cf. Teogonia 304-8, 820-1, 869. Da
união de Tífon – “um bandido terrível e sem lei” – com Equidna nasceu
uma descendência de monstros.
388 
Os Tritões são criaturas marinhas, misto de homem e peixe. Cf.
Teogonia 930-3: “De Anfitrite e do tonitruante Sacudidor da terra, nas-
ceu o grande e poderoso Tritão que, nas profundezas marinhas, junto
da mãe e do nobre pai, habita um palácio de ouro, divindade terrível”.
389 
Trata-se de duas das Plêiades, as sete filhas de Atlas e da ninfa
Plêione. Da união com Zeus, Taígete tornou-se mãe de Lacedémon
(vide supra 3.1.2). Sobre Alcíone e a sua união com Posídon, vide supra
2.30.8, Apolodoro, Biblioteca 3.10.1.
390 
Cf. Graves (1977) II.197. Cicno, filho de Ares, costumava desa-
fiar os seus hóspedes para travarem com ele uma competição de carros
de cavalos. Sempre vencedor, Cicno degolava-os e usava os despojos
para decorar o templo do pai. Desagradado com Cicno, que costumava
desviar cabeças de gado enviadas em sacrifício a Delfos, Apolo incitou
Héracles a enfrentá-lo. Com a ajuda de Atena e de Iolau, no papel de
132
Pausânias

junto ao abrigo de Folo.391 18.11. O chamado Minotauro,392


não faço ideia por que é que Báticles o representou preso e
arrastado, ainda vivo, por Teseu. Há também, no trono, uma
dança de Feaces393 e Demódoco a cantar. Está igualmente escul-
pida a façanha de Perseu contra Medusa;394 passando adiante o
combate de Héracles contra o gigante Túrio395 e o de Tíndaro
contra Êurito,396 está o rapto das filhas de Leucipo.397 Quanto
a Dioniso e Héracles,398 o primeiro, ainda criança, é levado

cocheiro, o herói conseguiu vencer o inimigo, por sua vez apoiado pelo
próprio deus Ares.
391 
Vide Finglass 2021: 139. Esta é uma aventura provavelmente
situada na Arcádia, no regresso de Héracles da vitória sobre Gérion,
que Simónides relatava num poema perdido, intitulado Geroneida;
cf. Apolodoro, Biblioteca 2.5.4, Diodoro Sículo 4.12. Relata Finglass:
“Quando Folo destapa um jarro de vinho particularmente aromático,
chama a atenção dos outros Centauros, que Héracles tem de enfrentar
com fogo e flechas. Deste conflito resulta a morte involuntária de Quí-
ron e do próprio Folo, que Héracles sepulta antes de prosseguir viagem.
Por outro lado, o episódio de Folo é mais vulgarmente associado com
um outro trabalho, a caçada que Héracles desencadeou do javali de
Erimanto” e, nesse caso, anterior à aventura no extremo ocidente.
392 
Vide supra 1.27.10.
393 
Os poemas homéricos são também fonte de inspiração para
a decoração do trono. A excelência dos Feaces como bailarinos e de
Demódoco, o aedo da corte de Alcínoo, como cantor é também rela-
cionada em Odisseia 8.250-5, 261-367, 8.370-84.
394 
Sobre a vitória de Perseu contra a Medusa, vide supra 2.21.5,
2.27.2 e notas respetivas. Perseu, a par de Héracles, Teseu e Belerofonte,
compõe o conjunto de heróis pan-helénicos presentes no Trono.
395 
Um gigante desconhecido, mas Túrio é um epíteto lacónio de
Ares.
396 
Êurito é um dos filhos de Hipocoonte e sobrinhos de Tíndaro,
que o despojaram do trono. Vide supra 3.1.4.
397 
Vide supra 3.13.1 e nota respetiva.
398 
É interessante o comentário feito por Musti, Torelli (2008) 240 a
propósito desta referência: “O texto de Pausânias, com esta prolepse dos
nomes dos protagonistas, sublinha o efeito de ‘par lógico’, destas duas
133
Descrição da Grécia

para o céu por Hermes,399 enquanto Atena introduz Héracles


no convívio dos deuses.400 18.12. Peleu, por sua vez, confia,
para o criar, Aquiles a Quíron, que se diz ter sido também
seu mestre.401 Céfalo, pela sua beleza, é raptado por Hémera
(Aurora),402 e os deuses apresentam-se com dádivas nas bodas
de Harmonia.403 Está também representado o duelo de Aquiles

primeiras cenas, (...). em que o filho de uma mortal e de Zeus obtém a


imortalidade (apesar da divergência Dioniso criança / Héracles no final
da sua vida de mortal)”. A mesma aproximação entre os dois filhos de
Zeus e das respetivas mães mortais tinha uma longa tradição; cf. Ilíada
14.323-5, Hesíodo, Teogonia 940-4.
399 
Quando Sémele, mãe de Dioniso, foi fulminada pelo esplendor
do seu divino amante, Hermes encarregou-se de retirar a criança do
ventre materno e de a levar para o Olimpo, de modo a que a gestação se
completasse na coxa de Zeus.
400 
Héracles ascendeu ao convívio dos deuses depois de cometidos
todos os seus trabalhos. Foi então que a sua parte mortal pereceu nas
chamas de uma pira, sobre o monte Eta, enquanto Zeus reivindicava a
sua aceitação entre os imortais. A morte apoteótica de Héracles serve de
fecho a Traquínias de Sófocles. Aliás, Nafissi (2020) 2-3 sublinha que
a apoteose é um motivo transversal nos diversos mitos evocados pela
decoração do Trono, de acordo com a experiência do próprio Jacinto
nele venerado. E valoriza a representação de Héracles no conjunto
com o seguinte comentário: “A centralidade de Héracles no programa
decorativo é evidente: o Trono punha em cena o seu destino divino e a
sua extraordinária virtude, representando duas vezes a sua apoteose e
pelo menos doze dos seus trabalhos”.
401 
A tradição que faz do Centauro Quíron mestre de Aquiles é já
homérica; cf. Ilíada 4.219, 11.831-2, 16.140-4, 19.387-91. Píndaro insiste
nela; cf. Pítica 3.1-7, 4.101-15, 9.26-65.
402 
Vide supra 1. 3.1 e nota respetiva.
403 
As bodas de Cadmo e Harmonia foram o primeiro banquete em
que os deuses acederam a participar juntamente com humanos. Foram
então instalados na casa do noivo, em Tebas, doze tronos de ouro para
os acomodar. Todos eles compareceram trazendo presentes que, além
de preciosos, eram dotados de poderes positivos, como o de conferirem
uma beleza ímpar ou uma dignidade divina a quem os possuísse. Cf.
Graves (1977) I.198-200.
134
Pausânias

e Mémnon;404 Héracles vinga-se de Diomedes, rei da Trácia,405


e de Nesso nas margens do rio Eveno.406 Hermes conduz as
deusas à presença de Alexandre para serem julgadas;407 Adrasto

404 
Mémnon contava-se entre os aliados dos Troianos mortos por
Aquiles (cf. Píndaro, Olímpica, 2.82, Ístmica, 5.39-41). Ésquilo foi autor
de um Mémnon e de uma Psychostasía (Pesagem das almas), inspiradas
num tema épico, fonte muito da sua preferência. Já Homero (Ilíada
22.209-213) tinha colocado na mão de Zeus uma balança para avaliar
dos destinos de Aquiles e Heitor. Ésquilo teria, segundo Plutarco,
Questões Morais 16f-17ª, aproveitado o motivo na sua Psychostasía (Pesa-
gem das almas), onde Tétis e a Aurora, profundamente angustiadas,
assistiam à pesagem das almas dos respetivos filhos, procurando saber
qual deles morreria em primeiro lugar (cf. Taplin (1977) 431-2). De
facto, se Aquiles sai vencedor no duelo e mata Mémnon, ele próprio
está condenado a morrer em breve. Nafissi (2020) 6 comenta a pro-
pósito: “Pode pôr-se a hipótese de que o Trono proponha, neste caso,
uma meditação sobre o destino, a dor e a morte, na sua relação com a
imortalidade e apoteose”.
405 
Diomedes, rei da Trácia, habitava as costas do Mar Negro e
era famoso pelas éguas devoradoras de homens que possuía e a quem
abundantemente alimentava com a carne dos seus hóspedes. Roubar-lhe
esses animais que, depois de devorarem o próprio dono, se pacificaram,
foi o oitavo trabalho de Héracles. Cf. Graves (1977) II.122-4.
406 
O Centauro Nesso, filho de Ixião e Nefele (a Nuvem), foi
morto por Héracles por ter tentado violar Dejanira, depois de a ter
transportado na travessia do rio Eveno. Como vingança, Nesso, antes
de morrer, aconselhou a jovem a recolher um pouco do seu sangue e
assegurou-lhe tratar-se de um elixir que lhe garantiria a fidelidade do
herói. Foi quando Héracles tomou Ecália e se apaixonou por Íole que
Dejanira impregnou uma túnica com o veneno do Centauro e o matou.
Sófocles tomou este mito como assunto para Traquínias.
407 
Este é o célebre julgamento de beleza das deusas – Hera, Atena e
Afrodite -, ocorrido no monte Ida, junto a Troia, e arbitrado por Páris
Alexandre, surpreendido pela chegada das três beldades que Hermes
acompanhava. Deixando-se subornar por Afrodite, que lhe prometia a
mais bela mulher do mundo, Páris foi o causador da Guerra de Troia,
como aliás um oráculo tinha predito desde que ele nasceu. Este é um
tema frutuoso na literatura, nomeadamente na tragédia de Eurípides,
onde ocorre com frequência; cf. e.g., Andrómaca 274-92, Hécuba 644-6,
135
Descrição da Grécia

e Tideu põem fim à disputa entre Anfiarau e Licurgo, filho


de Prónax;408 18.13. Hera está de olhos postos em Io, filha
de Ínaco, já transformada em vaca;409 Atena escapa à perse-
guição de Hefesto.410 Além disso, pode ver-se, dos trabalhos
de Héracles, a luta contra a Hidra e como é que ele trouxe
do Hades o cão.411 Anáxias e Mnasínoo412 está cada um deles
montado no seu cavalo; Megapentes, filho de Menelau, e
Nicóstrato, montam o mesmo cavalo;413 Belerofonte liquida o
monstro da Lícia,414 e Héracles conduz as vacas de Gérion.415

Helena 357-9, 676, 678, Ifigénia em Áulis 180 sqq., 573 sqq., 1284-309.
Mas da sua antiguidade é testemunha uma referência da Ilíada 24.29-
30. Vide ainda Walcot (1977).
408 
Sobre Adrasto e Tideu como membros da campanha dos Sete
contra Tebas, vide 1.8.2 e nota respetiva. Não há versões literárias que
testemunhem o duelo entre Anfiarau e Licurgo, que poderá estar rela-
cionado com o mito de Hipsípila. Furiosas contra Hipsípila, que tinha
poupado seu pai Toas à matança que as mulheres de Lemnos perpetra-
ram contra todos os homens da ilha, a jovem viu-se expulsa juntamente
com os filhos. Capturados por piratas, todos foram vendidos a Licurgo,
rei de Némea. Encarregada de cuidar do filho do monarca, Ofeltes,
Hipsípila, enquanto indicava uma fonte aos guerreiros atacantes de
Tebas, descuidou-se e permitiu que a criança fosse trucidada por uma
serpente (sobre este mito, vide supra 2.15.2 e nota respetiva). Licurgo
quis então vingar-se de Hipsípila, do que foi impedido por Adrasto,
comandante da expedição.
409 
Sobre Io, vide supra 1.25.1 e nota respetiva.
410 
Sobre este episódio mítico de tradição ática, vide supra 1.2.6 e
nota respetiva.
411 
Sobre a Hidra de Lerna, vide supra 2.37.4 e nota respetiva; sobre
o rapto de Cérbero, o cão do inferno, vide supra 2.31.2 e nota respetiva;
Graves (1977) II.107-10, 152-8 respetivamente.
412 
Filhos dos Dioscuros.
413 
Vide supra 2.18.6 e nota respetiva.
414 
Vide supra 2.1.9 e nota respetiva.
415 
Sobre este considerado o décimo trabalho de Héracles e a sua
representação na literatura e nas artes, vide Graves (1977) II.132-44,
Finglass (2021). A primeira menção a este ‘trabalho’, certamente com
136
Pausânias

18.14. Na parte superior do trono, de um lado e do outro,


estão os filhos de Tíndaro a cavalo; sob os cavalos há esfinges e
feras numa corrida ascendente, de um lado um leopardo, e do
lado de Pólux uma leoa. Bem no alto do trono, estão represen-
tados, como um grupo de dança, os Magnésios que trabalha-
ram com Báticles na construção do trono.416 18.15. Por baixo
do trono, na parte interior, a partir dos Tritões, está o javali de
Cálidon e Héracles a matar os filhos de Actor;417 Cálais e Zetes
defendem Fineu das Harpias.418 Vêm a seguir Pirítoo e Teseu

uma tradição anterior, é feita por Hesíodo, Teogonia 287-94. Como neto
de Medusa, o próprio Gérion era também um monstro de três cabeças,
habitante de remotas paragens a ocidente. A eliminação de Gérion por
Héracles tornou-se um motivo popular na arte grega na sua fase arcaica,
séc. VII-VI a.C. Apolodoro, Biblioteca 2.5.10 e Diodoro Sículo 4.17.1-
4.25.1 dão um testemunho significativo dos pormenores deste mito.
416 
Para além dos motivos míticos, Báticles representou-se a si pró-
prio e aos seus colaboradores.
417 
Sobre a luta de Héracles contra o javali de Cálidon vide supra
1.27.6 e nota respetiva. Os filhos gémeos de Actor, rei da Ftia, eram
Eurícion e Ctéato, conhecidos pela sua força. Augias, rei de Elis, recor-
reu a eles, seus sobrinhos, na resistência contra Héracles, na divergência
que surgiu depois da limpeza dos seus estábulos, o quinto trabalho do
herói, que Augias se recusou a compensar como combinado. Sobre a
articulação deste motivo com o seguinte, protagonizado por Cálais e
Zetes, Musti, Torelli (2008) 243-4 escrevem: “O primeiro par, Héracles
e os filhos de Actor, Eurícion e Ctéato, e Cálais e Zetes e as Harpias,
caraterizam-se por estreitas simetrias ou polaridade: os protagonistas
(respetivamente negativos e positivos) são gémeos, o objeto é a liber-
tação de uma passagem obrigatória (terrestre e marítima), o pano
de fundo é o mar (descendentes de Posídon os Actóridas, passagem
marítima para as Harpias)”.
418 
Fineu, filho de Agenor, era rei da Trácia. Por ser demasiado
agudo na capacidade profética, os deuses puniram-no com a cegueira.
Passou a ser perseguido pelas Harpias, que lhe roubavam ou conspur-
cavam a comida e o puseram à beira da morte. Foi então que Cálais
e Zetes, filhos de Bóreas, integrados no grupo dos Argonautas, o
libertaram, expulsando as perseguidoras para as ilhas Estrófades. Em
137
Descrição da Grécia

depois de raptarem Helena;419 Héracles a estrangular um leão;


Apolo e Ártemis a atingirem Tício com o arco.420 18.16. Está
também representada a luta de Héracles contra o Centauro
Oríon e a de Teseu contra o Minotauro. Há ainda o combate
de Héracles contra o Aqueloo;421 e aquela história que se conta
de Hera, agrilhoada por Hefesto;422 Acasto institui uma com-

compensação, Fineu auxiliou os Argonautas a ultrapassar as Simplé-


gades, a caminho da Cólquida. Cf. Higino, Fábula 19; Graves (1977)
II.230-1.
419 
Vide supra 1.18.4 e nota respetiva.
420 
Entre estes dois episódios míticos, Musti, Torelli (2008) 244
estabelecem a relação seguinte: “Héracles contra o leão, Apolo e Ártemis
contra Tício, são por sua vez paralelos, enquanto mitos ligados com
a libertação da estrada que conduz a lugares pan-helénicos, respeti-
vamente Némea e Delfos”. Sobre a vitória de Héracles contra o leão
de Némea, vide supra 2.15.2 e nota respetiva. O segundo mito tem a
ver com a investida que o gigante Tício fez contra Latona, quando ela
levava a cabo um ritual. O gigante interrompeu-a, tentou violá-la e foi
então que os dois filhos de Latona, Apolo e Ártemis, o mataram com as
suas flechas; cf. Graves (1977) I.76-7.
421 
Musti, Torelli (2008) 244 procuram também articular estas
três aventuras: “O tríptico de Héracles e Oríon, Teseu e o Minotauro,
Héracles e o Aqueloo, além de proporcionar um terreno de analogia
iconográfica e conceptual (lutas contra seres semi-humanos), permite
articular de modo estreito as duas últimas, porque a monstruosidade
dos dois seres se apresenta inversa (homem com cabeça de touro o
Minotauro, touro com cabeça humana Aqueloo) e porque a luta condu-
zirá ambos os heróis a uma mulher”. A disputa entre Héracles e Aqueloo
teve a ver com a pretensão de ambos à mão de Dejanira, um mito usado
por Sófocles em Traquínias. As primeiras palavras que Dejanira profere
nessa peça são exatamente para recordar um passado em que, donzela
ainda, se viu requestada por um pretendente ameaçador, o rio Aqueloo,
um híbrido temível de touro, serpente e homem (9-14). Perante tal
monstro, Héracles não desperdiçou a oportunidade de cometer uma das
suas façanhas, libertando desta vez uma jovem do perigo temível de um
noivado inaceitável (20-1).
422 
Vide supra 1.20.3, 3.17.3. Este motivo mítico parece valorizar o
tópico da apoteose, forte no conjunto da decoração do trono como já
138
Pausânias

petição em honra do pai,423 e a história, narrada na Odisseia,424


de Menelau e de Proteu do Egito. Por fim, Admeto atrela ao
seu carro um javali e um leão,425 e os Troianos levam oferendas
fúnebres a Heitor.426

3.19.1. Ainda o Trono de Amiclas. Terapne


A parte do trono onde o deus se sentaria não é contínua,
mas apresenta vários assentos com um certo intervalo entre uns
e outros; é sobretudo no centro que o espaço é maior, pois é aí
que se ergue a estátua do deus. 19.2. Não conheço ninguém
que lhe tenha determinado a medida, mas parece-me que há
de andar pelos trinta côvados.427 Não se trata de uma obra de
Báticles, mas de uma peça antiga e feita sem arte; assim, salvo
o rosto, a ponta dos pés e as mãos, o resto parece-se com uma
coluna de bronze. Na cabeça tem um elmo, e nas mãos uma
lança e um arco. 19.3. A base desta estátua assemelha-se a um
altar, onde, ao que se diz, está sepultado Jacinto. Nas Jacíntias,
antes dos sacrifícios a Apolo, fazem-nos nesse altar a Jacinto,

vimos, ou seja, o regresso de Hefesto ao Olimpo.


423 
Vide supra 1.18.1 e nota respetiva.
424 
4.384-570, em que Menelau ouve as profecias do velho Proteu
que o iluminam sobre as peripécias envolvidas no seu regresso.
425 
Este é um motivo relacionado com o casamento de Alceste, uma
das filhas de Pélias. Incapaz de decidir por um dos muitos pretendentes
que assediavam a filha, o que seria inconveniente à preservação do seu
poder, Pélias proclamou que daria a mão de Alceste a quem fosse capaz
de atrelar um javali e um leão ao mesmo carro e de dar uma volta ao
hipódromo. Foi então que Admeto apelou a Apolo para que lhe desse a
solução. Com a ajuda de Héracles, que amansou as feras habitualmente
conflituosas entre si, Admeto pôde satisfazer o requisito e ganhar a
mão de Alceste.
426 
Este é um motivo dos funerais de Heitor, consagrado pela Ilíada
24.707-804.
427 
C. 15 metros.
139
Descrição da Grécia

acedendo por uma porta de bronze, situada à esquerda.428 Aí


está representada, de um lado, uma imagem de Bíris,429 e do
outro Anfitrite e Posídon. Perto do lugar em que Zeus e Hermes
conversam um com o outro, estão de pé Dioniso e Sémele, esta
última acompanhada de Ino.430 19.4. Sobre o altar, estão tam-
bém representados Deméter, Perséfone e Plutão e, a seguir, as
Meras (Moirai) e as Horas (Horai), juntamente com Afrodite,
Atena e Ártemis.431 Conduzem para o céu Jacinto e Polibeia, que,
ao que consta, era uma irmã de Jacinto que morreu ainda don-
zela. De resto, esta imagem de Jacinto já tem barba,432 enquanto

428 
Vergara Cerqueira (2019) 194 considera esta porta um acesso ao
interior da tumba, como seria próprio dos cultos a divindades ínferas.
Durante as Jacíntias, entrava-se no túmulo para oferecer sacrifícios
próprios aos mortos, adequados ao culto heroico.
429 
Ou seja, Íris, a mensageira dos deuses.
430 
Vide supra 1.42.7 e nota respetiva.
431 
Musti, Torelli (2008) 246 consideram esta enumeração de divin-
dades, constituindo uma assembleia, como a imagem da receção divina
aos dois irmãos, Jacinto e Polibeia. Este quadro de ascensão ao Olimpo
corresponde, de certa forma, a igual ascensão de Héracles ao convívio
dos imortais (vide supra 3.18.11, 3.19.5). A disposição das divindades é
coerente com os seus atributos, primeiro os deuses marinhos, depois os
dos infernos e, por fim, os celestes. Com Dioniso, um deus relevante
em Amiclas, estão a mãe, Sémele, e a ama, Ino. As Meras e as Horas
marcam, entre os diversos estatutos divinos, o destino e o tempo.
Musti, Torelli (2008) 247, registando a visibilidade pouco comum de
Polibeia, justificam a sua inclusão como o meio de integrar no culto e
nas celebrações das Jacíntias, ao lado do elemento masculino, também
o feminino. Sobre Polibeia, vide Vergara Cerqueira (2019) 194-5. Este
autor salienta, a par da afinidade entre Jacinto e Apolo, a que relaciona-
ria Polibeia com Ártemis, “enquanto pares de irmãos”.
432 
Sobre a simbologia deste pormenor, vide Vergara Cerqueira
(2019) 196-7: “Jacinto com barba, daí, presumivelmente adulto, em
contraste com a imagem geral de um erômenos, um efebo que se pre-
sumiria imberbe”.
140
Pausânias

Nícias,433 filho de Nicodemo, em referência à paixão de Apolo


por Jacinto, o pintou no esplendor da beleza. 19.5. No altar,
está também representado Héracles a ser levado para o céu
por Atena e pelos outros deuses. Lá estão também as filhas de
Téstio,434 as Musas e as Horas. Quanto ao vento Zéfiro, a como
Apolo matou Jacinto involuntariamente, e a propósito da lenda
da flor,435 talvez a história pudesse ser outra, mas fiquemo-nos
pela tradição.
19.6. Amiclas foi destruída pelos Dórios436 e dela resta ape-
nas uma aldeia, onde existe um santuário e uma estátua de
Alexandra, dignos de serem vistos. Os Amicleus dizem que
Alexandra é Cassandra, a filha de Príamo.437 Lá existe também
uma representação de Clitemnestra, e um túmulo dito de Aga-
mémnon. De entre os deuses, veneram Amicleu e Dioniso, a
que chamam, ao que me parece com muita propriedade, Psílax.
É que, em dórico, psila significa ‘asa’, e o vinho exalta as pes-
soas e eleva-lhes o ânimo não menos do que as asas às aves. Eis
o que há digno de registo em Amiclas.
19.7. A partir da cidade, há uma outra estrada que leva
a Terapne.438 Nessa estrada existe uma estátua de madeira de
Atena Álea.439 Antes de se atravessar o Eurotas, um pouco
acima da margem, pode ver-se um santuário de Zeus da

433 
Pintor ático, contemporâneo e colaborador de Praxíteles, da
segunda metade do séc. IV a.C. (cf. Plínio, História Natural 35. 40).
434 
As filhas de Téstio eram Leda (vide supra nota 331, 3.13.8) e
Hipermnestra, mãe de Anfiarau (vide supra 3.12.5 e nota respetiva).
435 
Vide supra 3.1.3 e nota respetiva.
436 
Apesar da resistência oposta pelos seus cidadãos, a cidade acabou
tomada por Tisâmeno (c. 750 a.C.); vide supra 3.2.6.
437 
Vide supra 2.16.6 e infra 3.26.5.
438 
Vide supra 3.14.9 e nota respetiva.
439 
Sobre o importante culto de Atena Álea em Tégea, vide supra
3.5.6 e nota respetiva.
141
Descrição da Grécia

Riqueza (Ploúsios). Após a travessia, fica um templo de Asclépio


Cotileu, que Héracles edificou e a que deu este nome por ter
sido curado da ferida na anca (kotyle) num primeiro combate
com Hipocoonte e os filhos. Quantos monumentos se edifica-
ram nesta estrada? O mais antigo de todos é um santuário de
Ares, que fica à esquerda da estrada; quanto à estátua, diz-se
que os Dioscuros a trouxeram da Cólquida. 19.8. Chamam-
-lhe Téritas, do nome de Tero, que se diz ter sido ama de Ares.
Talvez usem o nome de Téritas por o terem ouvido aos Col-
cos, pois os Gregos não conhecem uma ama de Ares com esse
nome. Na minha opinião, este é um epíteto dado a Ares não
devido à ama, mas por ser necessário, perante um inimigo, pôr
de lado qualquer tibieza.440 Daí que, em Homero, se diga de
Aquiles “como um leão só conhece selvajarias”.441
19.9. O nome de Terapne dado à região provém da filha de
Lélex.442 Lá fica um templo de Menelau, onde, ao que dizem,
Menelau e Helena estão sepultados.443 Os Ródios, porém, não
concordam com os Lacedemónios e afirmam que Helena, após
a morte de Menelau e ainda durante a errância de Orestes, foi
perseguida por Nicóstrato e Megapentes. Refugiou-se então em
Rodes, junto de Polixo, a mulher de Tlepólemo,444 de quem era
amiga. 19.10. É que Polixo pertencia também a uma família

440 
Pausânias inspira-se na similitude que há entre Téritas e theríon,
“fera”.
441 
Ilíada 24.41.
442 
Vide supra 3.1.1.
443 
Cf. supra nota 132.
444 
Tlepólemo, filho de Héracles, viu-se condenado ao exílio por ter
morto Licímnio, seu tio, e veio a tornar-se rei de Rodes, onde fundou
as principais cidades, Lindos, Camiro e Iáliso. Foi um dos pretendentes
de Helena e acabou morto por Sarpédon na Guerra de Troia (cf. Ilíada
2.653-70). Vide Diodoro Sículo 4.58-9. Sobre Nicóstrato e Megapentes,
filhos de Menelau, vide supra 3.18.13.
142
Pausânias

argiva e estava casada com Tlepólemo, a quem tinha acompa-


nhado no exílio em Rodes; lá reinava, depois que ficou com
o filho órfão. Acrescentam que essa tal Polixo, determinada
a vingar-se de Helena pela morte de Tlepólemo, quando a
teve na mão, no momento em que se banhava, lhe mandou
umas servas disfarçadas de Erínias. Essas mulheres captura-
ram Helena e enforcaram-na numa árvore; é por isso que os
Ródios têm o santuário de Helena Dendrítis (Da árvore).445
19.11. Vou ainda recordar aquela outra história que os Croto-
niatas contam sobre Helena, abonada pela gente de Hímera.446
Há, no Ponto Euxino, uma ilha, junto à foz do Istro,447 consa-
grada a Aquiles. O nome desta ilha é Léuce (Branca). Tem de
perímetro uns vinte estádios, e toda ela está coberta de uma
floresta densa com inúmeros animais selvagens e domésticos.
Lá fica um templo e uma estátua de Aquiles.448 19.12. Ao que
consta, o primeiro que para lá navegou foi Leónimo de Cro-
tona. Quando se desencadeou a guerra entre os Crotoniatas
e os Locros da Itália,449 estes, pela afinidade que tinham com
os Opúncios, apelaram a Ájax, filho de Oileu.450 Leónimo,

445 
Esta era uma das versões da morte de Helena.
446 
À tradição de Helena juntam-se agora versões da Magna Grécia,
narradas por colonos como os habitantes de Crotona e de Hímera.
447 
Danúbio.
448 
Segundo a tradição, Aquiles teria sido sepultado na ilha de
Leuce.
449 
Vide supra 3.3.1-2 e nota respetiva.
450 
Este Ájax, rei dos Locros, também conhecido como ‘segundo
Ájax’ para o distinguir do filho de Télamon (vide supra 1.5.2 e nota
respetiva) com o mesmo nome, teve, mesmo assim, um papel relevante
na Guerra de Troia. Em combate, os Lócrios tinham por hábito pre-
servar um espaço nas suas fileiras em honra de Ájax, seu compatriota,
convencidos de contarem com o apoio do herói. Foi por esse espaço
que Leónimo, num combate entre Locros e Crotoniatas, quis penetrar,
acabando ferido pelo fantasma do velho guerreiro. Como o ferimento
143
Descrição da Grécia

ao comando dos Crotoniatas, avançou contra os inimigos,


justamente no ponto em que ouviu dizer que Ájax estava ao
comando. Mas foi ferido no peito e, debilitado pela ferida,
dirigiu-se a Delfos, onde a Pítia, quando ele se lhe apresentou,
o mandou para a ilha de Leuce, dizendo-lhe que lá encontraria
Ájax e se curaria do ferimento. 19.13. Tempos passados depois
de obtida a cura, partiu de Leuce e passou a afirmar que tinha
visto Aquiles, além de Ájax, filho de Oileu, também Ájax, filho
de Télamon, e que tinha encontrado Pátroclo e Antíloco. 451
Dizia ainda que Helena estava casada com Aquiles452 e lhe tinha
recomendado que navegasse para Hímera; aí devia anunciar a
Estesícoro que tinha perdido a vista devido à cólera de Helena
para com ele. Foi então que Estesícoro compôs a palinódia.453

não se curava, o oráculo indicou-lhe o caminho da Ilha Branca, onde o


túmulo de vários heróis homéricos se situava. Aí pôde obter a cura do
mesmo Ájax que o tinha ferido.
451 
Antíloco era filho de Nestor e participou, juntamente com o pai,
na Guerra de Troia. Desempenhou a difícil missão de dar a Aquiles a
notícia da morte de Pátroclo (Ilíada 18.1-34). Acabou morto por Mém-
non, quando procurava cobrir a retirada de Nestor (Odisseia 4.187-8).
452 
Sobre esta lenda que se refere a que Helena, casada com Aquiles,
viveria em Leuce, cf. Cónon, FGrHist 26 F 2.
453 
Os principais testemunhos desta palinódia encontram-se em
Platão, Fedro 243a; Isócrates, Helena 64; P. Oxy. 2506 fr. 26 col. I.
Segundo a tradição, Estesícoro, que primeiro tinha difamado Helena
e por isso ficado cego, ao perceber o motivo da sua falta de visão,
produziu um “novo canto” (palinódia) a desdizer-se, isentando-a de
culpa pelo desencadear da guerra. Este é sem dúvida um dos casos mais
gritantes da versatilidade dos mitos. O texto por nós conservado em que
esta versão do mito de Helena tem mais impacto é a tragédia Helena de
Eurípides (cf. Allan (2008) 18-22). De facto, dois dos motivos essenciais
da criação euripidiana – o exílio de Helena no Egito e a presença do seu
fantasma em Troia – são inspirados em Estesícoro, e visam certamente
reabilitar a figura de Helena da versão que fazia dela uma espécie de
Pandora, origem de todos os males, personalidade que lhe tinha sido
atribuída por poemas do ciclo épico, nomeadamente os Cypria, e que
144
Pausânias

3.20.1. Terapne e outros subúrbios de Esparta


Em Terapne pude ver a fonte Messeis.454 No entanto, há
Lacedemónios para quem a fonte dantes chamada Messeis é a
que hoje chamamos “de Pólux”, não a de Terapne. Essa fonte
e o santuário de Pólux encontram-se à direita, na estrada para
Terapne.455
20.2. Não longe de Terapne fica o chamado Febeu,456 onde
existe um templo dos Dioscuros. É também aí que os efebos
fazem sacrifícios a Eniálio. Lá perto, há um santuário de Posí-
don, denominado Geáoco (O que sacode a terra).457 A partir de
lá, avançando-se na direção do Taígeto, há um lugar a que cha-
mam Alésia, por ter sido lá que pela primeira vez Miles, filho
de Lélex,458 inventou a mó, e foi o primeiro homem a moer
(alesai) no tal lugar de Alésia. Aí existe o herôon de Lacedémon,
filho de Taígete. 20.3. Depois de se atravessar o rio Félia, no
caminho que passa por Amiclas e se dirige diretamente ao mar,
existia outrora Fáris, uma cidade lacónia.459 Quem se desvia
do Félia, à direita, há um caminho que leva ao monte Taígeto.
Na planície, fica um recinto sagrado de Zeus Messapeu; rece-

várias referências trágicas abonavam. A possível relação entre a Helena


de Eurípides e a Palinódia de Estesícoro é tratada em pormenor por
Wright (2005) 86-110.
454 
Cf. Ilíada 6.457.
455 
Este era o santuário principal do culto dos Dioscuros; cf. Pín-
daro, Nemeias 10.55-9, Ístmicas 1.31.
456 
Vide supra 3.14.9-10 e nota respetiva.
457 
Sobre os rituais nele realizados, cf. Xenofonte, Helénicas 6.5.30.
Sobre os sacrifícios a Eniálio, no Febeu, vide supra 3.14.9.
458 
Vide supra 3.1.1, 3.12.5 e notas respetivas.
459 
Cf. Ilíada 2.584, Estrabão 8.363. Vide supra 3.2.6. Sobre a
origem cultural destas cidades, Musti, Torelli (2008) 254 especificam:
“Depois da cidade dos Tindáridas, Terapne, e da dos Pelópidas, Ami-
clas, (...) chegamos à cidade mais antiga, aqueia”.
145
Descrição da Grécia

beu este nome, ao que consta, de um dos sacerdotes do deus.


De lá, à medida que nos afastamos do Taígeto, fica um lugar
onde outrora existia a cidade de Bríseas.460 Dela resta ainda um
templo de Dioniso e uma estátua no exterior. A que está no
interior do templo só às mulheres é consentido vê-la, pois só
elas fazem lá sacrifícios, que são secretos. 20.4. No alto do Taí-
geto, acima de Bríseas, fica o Táleto, um santuário dedicado ao
Sol (Hélios). Lá sacrificam ao Sol, entre outras coisas, também
cavalos. Quanto sei, esse tipo de sacrifício é igualmente prati-
cado pelos Persas. Não longe do Táleto, fica o chamado Évora,
que abriga feras de vários tipos, sobretudo cabras selvagens. De
resto, o Taígeto em geral abunda nesse tipo de cabras, javalis,
mas sobretudo veados e ursos.461 20.5. Ao espaço entre o Táleto
e o Évora dá-se o nome de Teras (Caçadas). Dizem que Leto,
das alturas do Taígeto ...462 há um santuário de Deméter dita
Eleusínia. Foi aí, segundo os Lacedemónios, que Héracles foi
escondido por Asclépio enquanto se curava da ferida.463 Nele
existe uma estátua de madeira de Orfeu, que se diz obra dos
Pelasgos.464 Lá, quanto sei, pratica-se igualmente este outro
culto. 20.6. Na zona marítima, ficava a cidade de Helos, tam-
bém mencionada por Homero no catálogo dos Lacedemónios:

460 
Cf. Ilíada 2.583.
461 
Ao contrário da sua preferência habitual pela paisagem cons-
truída, neste caso Pausânias preocupa-se em insistir na descrição do
ambiente natural do Taígeto, uma das montanhas mais abruptas da
Grécia, estabelecendo uma fronteira entre a Lacónia e a Messénia.
462 
Fratura no texto. Musti, Torelli (2008) 255 imaginam que uma
ideia do tipo “observava as caçadas da filha, Ártemis” teria sentido a
preencher esta lacuna.
463 
Vide supra 3.19.7.
464 
Vide supra 1.28.3 e nota respetiva.
146
Pausânias

“Os detentores de Amiclas e Helos, cidade junto ao mar”.465


Fundou-a Hélio, o filho mais novo de Perseu.466 Mais tarde os
Dórios ocuparam-na e esses foram os primeiros Lacedemónios
a serem reduzidos à condição de escravos públicos. Foram tam-
bém os primeiros a receber o nome de hilotas, o que eles de
facto eram. A partir daí, todos aqueles que eram reduzidos à
escravatura, mesmo sendo Dórios da Messénia, passaram a cha-
mar-se hilotas, do mesmo modo que se deu ao povo grego em
geral o nome de Helenos, de Hélade, no passado uma região da
Tessália.467 20.7. Dessa tal Helos levam uma estátua de madeira
de Perséfone, filha de Deméter, em determinados dias para o
Eleusínio. A uns quinze estádios do Eleusínio fica o chamado
Lapíteo, do nome de um tal Lápites, um sujeito da região.
O Lapíteo fica no Taígeto, e não longe está Dereio, onde existe,
ao ar livre, uma estátua de Ártemis apodada de Dereátis. Junto

465 
Cf. Ilíada 2.584. O nome da cidade alude a “pântano”. Referem-
-se-lhe também Tucídides 4.54.4, Xenofonte, Helénicas 6.5.32.
466 
Cf. Apolodoro 2.4.7, Estrabão 8.5.2.
467 
Cf. Ilíada 2.684. Sobre as designações de Hélade e Helenos,
vide Ferreira (1983), (2005) 15-42. Ferreira (2005) 17-8 sistematiza a
ideia de que, embora a designação homérica para Gregos seja sobre-
tudo Aqueus, a par de Argivos e Dánaos (cf. Tucídides 1.3.3), mesmo
assim o etnónimo Helenos aparece registado em Ilíada 2.684, a
designar um povo subordinado ao comando de Aquiles. O topó-
nimo Hélade tem um uso mais frequente na épica homérica: cf.
Ilíada 2.683, 9.395, 9.447, 9. 478, 16.595. E acrescenta Ferreira em
uníssono com Pausânias: “tem sido interpretado em todas elas como
designando uma parte da Tessália pertencente ao reino de Aquiles,
precisamente o sítio onde habitavam os Helenos”; para de seguida
ampliar: “as ocorrências em Ilíada 9. 447 e 478 – (...) – parecem pres-
supor que, na Ilíada, esse topónimo designaria já uma ampla zona que
englobava pelo menos parte da Beócia, a Lócrida oriental e parte da
Tessália”.
147
Descrição da Grécia

dela fica a fonte a que chamam Ânono. Uns vinte estádios


adiante de Dereio, fica Harpleia, que se prolonga até à planície.
20.8. Se, de Esparta, se seguir o caminho para a Arcádia, há,
no exterior, uma estátua de Atena chamada Pareía, e a seguir
um santuário de Aquiles, que não se costuma abrir. Mas todos
os efebos que se preparam para competir no Platanistas468 cos-
tumam, antes da competição, sacrificar a Aquiles. Ao que dizem
os Espartanos, foi Prax, neto de Pérgamo, filho de Neoptólemo,
quem edificou esse santuário.469 20.9. A seguir, está o chamado
memorial do Cavalo, pois foi aí que Tíndaro sacrificou um
cavalo, e exigiu dos pretendentes à mão de Helena um jura-
mento, congregando-os sobre a vítima já esquartejada. Segundo
esse juramento, defenderiam Helena e aquele que a desposasse
de qualquer ofensa.470 Prestado o juramento, enterrou o cavalo
ali mesmo. Não longe deste memorial, há sete colunas erigidas,
julgo que segundo um padrão antigo, que dizem ser represen-
tações dos planetas. Pelo caminho, há um recinto sagrado de
Crânio, dito Estemátias,471 e um santuário de Ártemis Mísia.
20.10. A trinta estádios da cidade fica uma estátua do Pudor
(Aidôs), oferta de Icário, ao que ouvi dizer pela razão seguinte.
Quando Icário deu, como esposa, Penélope a Ulisses,472 tentou

468 
Vide supra 3.11.2 e nota respetiva.
469 
Ou seja, a fundação do templo que homenageava Aquiles atri-
buía-se a um seu bisneto, Prax. Seu pai Pérgamo era considerado filho
de Neoptólemo e Andrómaca. Após a morte de Heleno, um dos filhos
de Príamo, seu tio e padrasto Pérgamo atravessou para a Ásia onde veio
a fundar a cidade que usava o seu nome.
470 
Com este juramento, sugerido por Ulisses, a que vinculou alguns
dos mais prestigiados heróis da Grécia, Tíndaro pretendia evitar melin-
dres e garantir a paz entre o eleito e os concorrentes preteridos. Cf.
Hesíodo, Catálogo de Mulheres fr. 155.78-85.
471 
Este epíteto está associado com as coroas, stémmata.
472 
Vide supra 3.12.1.
148
Pausânias

que Ulisses residisse na Lacedemónia. Frustrado na sua expecta-


tiva, fez uma segunda tentativa junto da filha, pedindo-lhe que
ficasse. Na hora da partida para Ítaca, voltou a insistir e pôs-se a
seguir o carro. 20.11. Ulisses lá foi aguentando, mas acabou por
dizer à mulher que ou o acompanhava de boa vontade, ou que,
se preferisse, ficasse com o pai, na Lacedemónia. Ao que se conta,
Penélope não respondeu; perante a pergunta, limitou-se a velar
o rosto. Icário percebeu que ela preferia seguir Ulisses e deixou-a
partir. Dedicou então essa estátua ao Pudor, no preciso lugar em
que, ao que dizem, Penélope pôs o véu pela cara.

3.21.1. Outras povoações vizinhas de Esparta. Pelana e Gítio


A partir de lá, a uns vinte estádios, fica o curso do Eurotas,
muito perto da estrada. Aí está o túmulo de Ladas que batia
todos os do seu tempo pela agilidade na corrida. Ganhou a
coroa olímpica por ter vencido no duplo estádio,473 mas parece-
-me que, logo a seguir à vitória, caiu doente. E como a sua
morte, no regresso a casa, ocorreu aqui, foi sepultado do lado
da estrada. Um outro com o mesmo nome, também vencedor
em Olímpia, não no duplo estádio, mas no estádio, consta,
nos registos de Eleia dos vencedores olímpicos; 474 este era um
aqueu de Égio.475 21.2. Mais adiante, na direção de Pelana,476
existe o chamado Caracoma (Trincheira) e, a seguir, Pelana,

473 
C. 440 a.C.
474 
Sobre esta lista dos campeões olímpicos informa Plutarco, Vida
de Numa 1.6: “É difícil calcular datas com exatidão, sobretudo se se
quiser fazê-las concordar com a lista dos vencedores olímpicos, cuja
redação feita, ao que se diz, tardiamente por Hípias de Eleia não se
apoia sobre qualquer documento confiável”.
475 
Sobre Égio, vide supra 3.12.7. Vitória alcançada em 280 a.C.; vide
supra 2.19.7, infra 8.12.5, 10.23.14.
476 
Vide supra 3.1.4. Sobre estas diversas povoações arcaicas da
Lacónia (séc. X a.C.), vide Powell (2018) 62.
149
Descrição da Grécia

que dantes era uma cidade. Dizem que lá se instalou Tíndaro,


quando escapou de Esparta a Hipocoonte e aos filhos. Aí o
que vi de mais importante foi um santuário de Asclépio e a
fonte de Pelana. Ao que consta, uma moça que tirava água
caiu lá dentro e desapareceu, mas o véu que levava na cabeça
veio a aparecer numa outra fonte, chamada Lância. 21.3. A
cem estádios de Pelana, fica a chamada Belemina.477 Trata-se de
uma região da Lacónia particularmente rica em água, porque é
atravessada pelo curso do Eurotas e por dispor de uma enorme
quantidade de nascentes.
21.4. Quando se desce em direção ao mar, para Gítio, os
Lacedemónios têm a aldeia de Cróceas. A pedreira que lá existe
não é de uma pedra única e contínua, mas as pedras que se
extraem são parecidas, no formato, com as dos rios. São pedras
difíceis de trabalhar, mas se se moldarem, pode ornamentar-
-se com elas os santuários dos deuses, e dão também um bom
efeito nos banhos e nas fontes.478 À entrada da povoação erigiu-
-se uma estátua de pedra de Zeus Croceatas, e na pedreira há
uns Dioscuros de bronze. 21.5. A seguir a Cróceas, quando se
volta à direita depois de se sair da reta para Gítio, chega-se à
cidade de Égias. Ao que se diz, Homero, nos seus versos, deu
a esta cidade o nome de Áugias.479 Aí existe um lago, dito de
Posídon, e junto a esse lago há também um templo e uma está-
tua do deus. As pessoas temem pescar lá, porque consta que
quem o conseguir se transforma em raia.

477 
Esta cidade, situada na zona noroeste da Lacónia, fronteiriça
com a Arcádia, foi – embora esta versão não mereça a concordância de
Pausânias – disputada entre as duas regiões; vide infra 8.35.4.
478 
Vide supra 2.3.5 e nota respetiva.
479 
Ilíada 2.583.
150
Pausânias

21.6. Gítio fica a trinta estádios de Égias, e é uma cidade


edificada junto ao mar já em território dos Eleuterolacones,480
que o imperador Augusto libertou do domínio dos Lacede-
mónios, sendo eles súbditos de Esparta. O mar cerca todo o
Peloponeso, com exceção do Istmo de Corinto. As costas da
Lacónia abundam em conquilhas que são ótimas para a tintura-
ria, a seguir às do mar dos Fenícios. 21.7. As cidades dos Eleu-
terolacones são em número de dezoito: a primeira é Gítio,481
na descida de Égias para o mar; a seguir vêm Teutrone,482 Lás483
e Pírrico;484 no Ténaro, Cenépolis, Étilo, Leuctras, Tálamas,
Alagónia e Gerénia;485 a seguir a Gítio, frente ao mar, Asopo,

480 
“Lacónios livres”. Este processo de libertação de escravos
aconteceu em 21 a.C.; segundo Lafond (2018) 408‑9, representou prova-
velmente um gesto de reconhecimento de Augusto para com as cidades
do litoral da Lacónia, pelo apoio que lhe tinham dado na batalha de
Ácio. As cidades libertadas passaram a constituir uma confederação.
481 
Primeira não apenas na enumeração, mas também em importân-
cia, como porto e arsenal de Esparta, na foz do Eurotas. Por isso merece
a Pausânias uma descrição mais pormenorizada do que as restantes;
vide infra 3.21.8.
482 
Situada nas proximidades de Pírrico e não longe do cabo Ténaro,
teria sido fundada por um ateniense de nome Teutras. Como referências
da cidade são mencionados a fonte Naia e um culto de Ártemis Isória;
vide infra 3.25.4.
483 
Enquanto Gítio, o porto de Esparta situado próximo da embo-
cadura do Eurotas, era artificial, Lás era uma zona portuária natural, a
sul de Gítio e na costa do golfo da Lacónia.
484 
Esta última também costeira, mas voltada para o golfo da Mes-
sénia tal como Étilo e Tálamas.
485 
Estas eram duas cidades próximas, na região do golfo da Mes-
sénia. Segundo a tradição, Gerénia foi a cidade para onde Nestor se
retirou depois que Héracles conquistou Pilos. Macáon, filho de Asclé-
pio, tinha lá o seu túmulo e uma estátua.
151
Descrição da Grécia

Ácrias, Beas, 486 Zárax, Epidauro Limera,487 Brásias,488 Geron-


tras489 e Mário.490 Estas são as que restam, porque os Eleutero-
lacones tinham dantes vinte e quatro cidades.491 As outras a que
me refiro,492 saiba-se que estão subordinadas a Esparta, e não
são autónomas como as mencionadas acima. 21.8. Segundo
os Gitiatas, o fundador da sua cidade não foi um homem, mas
– dizem eles – quando Héracles e Apolo disputaram uma trí-
pode e depois se reconciliaram, terminado o combate edifi-
caram em comum a cidade. Na ágora erguem-se estátuas de
Apolo e Héracles e, perto delas, a de Dioniso. Num outro sítio
está Apolo Carneu, um santuário de Ámon e uma estátua em
bronze de Asclépio, cujo templo não tem teto. Há ainda a fonte
do deus, um santuário venerando de Deméter, e uma imagem
de Posídon Geáoco. 21.9. Aquele a que os Gitiatas chamam
“Velho” e dizem que habita no mar, descobri que se trata de

486 
Asopo, Ácrias e Beas na costa leste do golfo da Lacónia; todas as
seguintes na faixa oriental da Lacónia.
487 
Vide Tucídides 6.105.2.
488 
A soberania sobre esta cidade oscilou entre a Lacónia (séc.
VI-III) e, a partir de então, a Argólida. Tucídides (2.56.6, 6.105.2)
refere-se-lhe como vítima de uma primeira investida destruidora
comandada por Péricles, em 431 a.C., e de uma segunda, anos mais
tarde (414 a.C.), de novo pelos Atenienses. Sobre algumas tradições de
Brásias, vide infra 3.24.3-5.
489 
Gerontras era uma cidade já habitada antes da chegada dos
Heraclidas ao Peloponeso, que acabou destruída, juntamente com Ami-
clas e Fátis, pelos Lacedemónios, na época de Téleclo. Em Gerontras
havia um culto forte a Ares, aí homenageado com um templo e um
bosque sagrado, que serviam de cenário a festejos anuais em honra do
deus. Vide infra 3.22.6-8.
490 
Vide infra 3.22.8.
491 
Declínio que deve ter acontecido sob domínio romano.
492 
Ou seja, as seis que faltam às discriminadas para completar as
vinte e quatro: Citera, Cardamila, Túria, Faras, Cotirta, Hipola.
152
Pausânias

Nereu. Homero terá estado na origem deste nome, com as


palavras de Tétis na Ilíada:493

Vós, mergulhai agora nas vastas entranhas do mar,


Para verdes o velho marinho e a mansão paterna.

Neste lugar estão também as chamadas portas Castórides.


Na acrópole existe um templo e uma estátua de Atena.

3.22.1. Ampliando a paisagem urbana da Lacónia


A três estádios de Gítio está uma pedra em bruto. Ores-
tes – ao que se conta –, quando se lá sentou, viu-se livre da
loucura.494 Por isso, a pedra é designada, em dórico, como
Zeus Capotas.495 A ilha de Cránae é fronteiriça a Gítio, e diz
Homero que foi aí que Alexandre, depois de raptar Helena,
teve relações com ela pela primeira vez.496 Em frente da ilha, no
continente, há um santuário de Afrodite Migonítis (Da união),
e toda a região tem o nome de Migónio. 22.2. Ao que dizem,
foi mesmo Alexandre quem erigiu esse santuário. Depois de
tomada Ílio, ao fim de oito anos após a destruição de Troia,
Menelau, de regresso a casa, consagrou a Tétis uma estátua e
outra às deusas Praxídicas (Que exercem a justiça)497 perto da
Migonítis. O monte sobranceiro a Migónio, chamado Larísio,

493 
18.140-1.
494 
A loucura de Orestes causada pelo matricídio era um tema
muito popular e presente na tragédia (Ésquilo, Euménides, Eurípides,
Ifigénia entre os Tauros, Orestes). Sobre o mesmo tema, vide supra 2.31.4,
2.31.8-9.
495 
Forma dórica associada com καταπαύω, “cessar”, e correspon-
dente, no ático, a algo como καταπαύτης, “aquele que põe fim”.
496 
Ilíada 3.443-5.
497 
Sobre este culto em Haliarto, vide infra 9.33.3.
153
Descrição da Grécia

é consagrado a Dioniso. No princípio da primavera celebram


uma festa em sua honra; entre os diversos trâmites da festa, ao
que se diz, descobrem aqui um cacho de uvas maduras.
22.3. À esquerda de Gítio, avançando uns trinta estádios
por terra firme, ficam as muralhas da assim designada Trinaso
(Três ilhas). No passado, julgo eu, seria não uma cidade, mas
uma fortaleza. O nome provinha-lhe, creio, das ilhas situa-
das desse lado do continente, em número de três. Uns oitenta
estádios adiante de Trinaso estão as ruínas de Helos,498 22.4. e
avançando mais uns trinta estádios, sobre o mar fica a cidade
de Ácrias. Merecedor de uma visita é aqui um templo e uma
estátua em pedra da Mãe dos Deuses. Este é, segundo os habi-
tantes de Ácrias, o templo mais antigo da deusa de quantos
existem no Peloponeso. No entanto os Magnetes, que vivem
a norte do monte Sípilo, têm também eles, sobre o penedo de
Codino, uma estátua da Mãe dos Deuses que é a mais antiga
de todas. Dizem os Magnetes que foi Bróteas, filho de Tântalo,
quem a fez.499 22.5. A gente de Ácrias gaba-se de ter tido um
dia, como seu concidadão, Nícocles, um campeão olímpico,
que em duas competições obteve cinco vitórias. Para Nícocles
foi erigido um memorial entre o ginásio e a muralha que dá
para o porto. 22.6. Afastada do mar uns cento e vinte estádios,
acima de Ácrias, fica Gerontras. Era habitada antes da vinda
dos Heraclidas para o Peloponeso, e foi depois arrasada pelos
Dórios quando ocuparam a Lacedemónia.500 Estes expulsaram

498 
Cidade conquistada por Esparta, que está na origem do nome
dos hilotas.
499 
Vide supra 2.22.3, onde Bróteas é referido como pai de Tântalo.
A comparação é feita com a estátua existente na Magnésia, junto ao
Sípilo; vide infra 5.13.7.
500 
Vide supra 2.12.3.
154
Pausânias

os Aqueus de Gerontras e enviaram para lá colonos seus.501


Hoje em dia também eles fazem parte dos Eleuterolacones.
No caminho de Ácrias para Gerontras, há uma povoação cha-
mada Pálea (Antiga) e, em Gerontras, um templo e um bosque
sagrado de Ares. 22.7. Todos os anos fazem uma festa ao deus,
em que às mulheres não é consentido entrar no bosque sagrado.
Em torno da ágora existem fontes de água potável. Na acró-
pole, fica um templo de Apolo e a cabeça em marfim de uma
estátua. O resto ardeu juntamente com o templo anterior.
22.8. Mário é uma outra cidade dos Eleuterolacones, a uma
centena de estádios de Gerontras. Lá existe um antigo santuário
comum a todos os deuses, cercado por um bosque sagrado com
fontes. Também no templo de Ártemis há fontes, e não existe
outro lugar em que a água seja tão abundante como em Mário.
Mais acima, no interior, há uma povoação chamada Glípia.502
Entre Gerontras e uma outra povoação, Selinunte, há um per-
curso de vinte estádios.
22.9. São estas as cidades acima de Ácrias, para o interior.
Na direção ao mar fica a cidade de Asopo,503 a uns sessenta
estádios de Ácrias. Aí existe um templo dedicado aos impera-
dores romanos e, acima da cidade uns doze estádios, um san-
tuário de Asclépio. A este deus chamam Filolau (Amigo do
povo). No ginásio, são homenageados uns ossos que, apesar
do seu tamanho extraordinário, são humanos. Na acrópole há

501 
Sobre Gerontras, Christien (2018) 622 reconhece a extraor-
dinária importância como ponto de comunicação para a Lacónia,
justificativa de uma particular importância administrativa. Confir-
ma-o a abundância de uma epigrafia local. É, portanto, muito natural
que Esparta controlasse permanentemente este local, ou mantivesse
residentes lá.
502 
Pausânias refere-se agora ao extremo nordeste da Lacónia.
503 
De novo na costa do golfo da Lacónia.
155
Descrição da Grécia

um santuário de Atena, cognominada Ciparíssia. Lá em baixo


ficam as ruínas de uma cidade dita dos Aqueus Paraciparís-
sios.504 22.10. Existe também nesta zona, a cinquenta estádios
de Asopo, um santuário de Asclépio. Esse lugar, onde se situa
o Asclepieu, é chamado Hiperteléato.505 Ao promontório bem
projetado sobre o mar, a duzentos estádios de Asopo, chamam
“Queixada de Burro” (Ónou gnáthon). Lá existe um santuário
de Atena, sem imagem nem teto. Diz-se que foi Agamémnon
quem o erigiu. Há também o memorial de Cinado, que era
piloto no navio de Menelau. 22.11. A seguir ao promontório,
há um golfo com o nome de Beas, e numa das extremidades
desse golfo fica a cidade do mesmo nome. Foi Béu, um dos
Heraclidas, quem a fundou, e – ao que se conta – nela reuniu
populações de três cidades, Étis, Afrodísias e Side. Destas três
antigas cidades, duas, segundo a tradição, fundou-as Eneias
quando, em fuga para a Itália, foi arrastado pelos ventos para
esse golfo. Étis era, ao que se diz, a filha de Eneias. A terceira
foi designada por Side, de uma das filhas de Dánao. 22.12. Os
habitantes expulsos dessas cidades, que procuravam onde insta-
lar-se, consultaram um oráculo. Receberam então a profecia de
que Ártemis lhes mostraria onde estabelecer-se. Assim quando
desembarcaram, apareceu-lhes uma lebre, que eles adotaram
como guia do seu caminho. E quando ela se enfiou num mirto,
lá fundaram uma cidade. Daí considerarem o mirto uma árvore
sagrada, e a Ártemis darem o epíteto de Salvadora (Sóteira).
22.13. Há também um templo de Apolo na ágora de Beas e,
num outro lugar, de Asclépio, de Serápis e de Ísis. A não mais
do que sete estádios de Beas há umas ruínas. Quando se vai

Cf. Estrabão 8.363.


504 

Epíteto de sentido pouco claro, talvez “que garante o cumpri-


505 

mento”.
156
Pausânias

para lá, à esquerda, está uma estátua de Hermes em mármore


e, entre as ruínas, um santuário de Asclépio e de Higia que não
deixa de ter o seu interesse.

3.23.1. Ainda no sul da Lacónia


Citera fica diante de Beas; quanto ao Platanistunte, é aí que
a ilha está mais próxima do continente – pois, entre o promon-
tório de Platanistunte e aquele outro promontório continental
chamado Queixada de Burro, por mar são quarenta estádios.
Em Citera, na zona marítima, fica o porto de Escândea; de
lá até à cidade de Citera são uns dez estádios para o interior.
O santuário de Afrodite Urânia (Celeste)506 é o mais sagrado e
o mais antigo de quantos santuários existem dedicados a Afro-
dite na Grécia.507 A deusa, representada por uma estátua de
madeira, está armada.
23.2. Navegando de Beas para o cabo de Málea há um
porto chamado Ninfeu e uma estátua de Posídon em pé.
Mesmo junto ao mar há uma gruta onde existe uma fonte de
água doce. Este é um lugar muito povoado. Dobrado o cabo
de Málea, se se continuar por uma centena de estádios, chega-
-se a uma povoação costeira no extremo de Beas, onde há um
santuário de Apolo, dito Epidélio. 23.3. É que a estátua de
madeira de Apolo que agora aí existe dantes estava em Delos.

506 
Sobre este culto de origem fenícia e os lugares em que era mais
pujante, vide supra 1.14.7 e nota respetiva. A questão da antiguidade
relativa destes que são os principais cultos de Afrodite não coincide nos
testemunhos de Heródoto (1.105.2-3) e de Pausânias. Mas as referências
à “sagrada Citera” em Homero (Ilíada 15.432, Odisseia 9.81) são a prova
do prestígio da ilha e da antiguidade do culto.
507 
Talvez porque, na tradição mítica, Citera fosse identificada com
o local de nascimento de Afrodite. A atestar a importância deste culto
está o epíteto de Citereia, usado e.g. por Camões, Os Lusíadas 1.34.1,
9.53.8 e 57.5.
157
Descrição da Grécia

Nesse tempo em que Delos era, para os Gregos, um empó-


rio comercial,508 e em que a presença do deus o protegia de
qualquer atentado, Menófanes,509 general de Mitridates, quer
por arrogância pessoal, quer por ordem de Mitridates – por-
que para quem é ambicioso a religião conta menos do que o
lucro –, 23.4. pois esse tal Menófanes, como Delos não tinha
muralhas nem os seus habitantes estavam armados, atacou-
-a com as trirremes, matou os residentes estrangeiros e até os
próprios nativos.510 Apropriou-se de muitas mercadorias, de

508 
A tradição que fazia de Delos o lugar do nascimento de Apolo
garantiu à ilha uma posição de relevo como centro de culto e, em con-
sequência do cruzamento de muitos peregrinos e das muitas oferendas
que, por seu intermédio, lá se aglomeravam, também como espaço com
vivacidade económica. Sem dúvida que a sua prosperidade, durante o
séc. V a.C., esteve muito ligada à história política e cultural de Atenas,
que presidia à Liga de Delos, que nela tinha sede. Com a derrocada
de Atenas no final do século, a ilha sofreu decadência equivalente.
O destino de Delos como santuário de referência na época clássica
veio a alterar-se com a ocupação romana. Por ter apoiado a Macedónia
contra os interesses de Roma, a ilha viu-se privada de autonomia em
167 a.C. Delos foi então declarada porto livre, onde o comércio se
processava sem impostos e de uma forma muito ativa. A destruição de
Corinto pelos Romanos em 146 a.C. veio ainda contribuir para reforçar
a importância comercial de Delos. Muitos dos produtos de origem
oriental apetecidos pela aristocracia romana transitavam por Delos.
Este foi um tempo em que o prestígio comercial da ilha ultrapassou a
sua tradição cultual.
509 
Musti, Torelli (2008) 271-2 introduzem uma correção nesta
informação de Pausânias, de resto dissonante com outros testemunhos,
e pormenorizam a discussão gerada a respeito desta invasão. O saque
é geralmente atribuído a um outro general, Arquelau, em 88 a.C., e
não a Menófanes. Sobre o mesmo acontecimento, cf. ainda Apiano,
Mitridáticas 28.108.
510 
No séc. I a.C., ao tempo do conflito de Roma com Mitridates,
rei do Ponto, Delos foi mais do que uma vez saqueada, o que marcou o
início da sua derrocada definitiva. A chamada Primeira Guerra Mitridá-
tica (89-85 a.C.) representou uma reação do oriente contra a hegemonia
158
Pausânias

tudo quanto era oferendas, reduziu à escravatura mulheres e


crianças, e arrasou Delos por completo. Durante a pilhagem e
o saque, um dos bárbaros cometeu o ultraje de atirar ao mar
a tal estátua de madeira. A corrente recolheu-a e levou-a para
este ponto do território de Beas; daí terem-lhe dado o nome
de Epidélio. 23.5. Mas nem Menófanes, nem o próprio Mitri-
dates escaparam à cólera do deus. Menófanes, logo a seguir,
quando, depois de saquear Delos, se fez ao mar, uns merca-
dores sobreviventes fizeram-lhe uma emboscada aos navios e
meteram-nos no fundo. Quanto a Mitridates, mais tarde o
deus forçou-o a liquidar-se por suas próprias mãos, depois de
perder o poder e de se ver perseguido por toda a parte pelos
Romanos. Há também quem diga que pediu a um dos seus
mercenários o favor de lhe dar a morte. Foi esta a recompensa
da impiedade deles. 23.6. No extremo de Beas fica Epidauro
Limera,511 a uns duzentos estádios de Epidélio. A sua popu-
lação diz não descender dos Lacedemónios, mas da gente de
Epidauro, na Argólida. Ao navegarem para Cós, para o templo
de Asclépio, em missão oficial, vieram ter à Lacónia e, inspira-
dos por um sonho, lá ficaram e se estabeleceram. 23.7. Dizem
eles que uma serpente512 que traziam de casa, em Epidauro,
se lhes escapou do navio e se refugiou não longe do mar. A

romana na região. Diversas cidades gregas aliaram-se a Mitridates VI,


rei do Ponto, nesse processo de resistência. O desfecho do conflito resul-
tou em vantagem para os Romanos, obrigando Mitridates a recuar para
o seu território. Sobre esta guerra, vide supra 1.20.4-5 e nota respetiva.
Os estrangeiros residentes a que Pausânias se refere eram sobretudo
itálicos.
511 
Sobre a interpretação deste qualificativo, vide Musti, Torelli
(2008) 273, que o relacionam: ou com λιμός, e então seria “famosa”,
ou com λιμήν, “dotada de um bom porto”.
512 
A intervenção da serpente faz parte da mítica de Asclépio; vide
supra Livro II, nota 214.
159
Descrição da Grécia

partir da visão que tinham tido em sonhos e do sinal dado pela


serpente, entenderam que deviam ficar e instalar-se naquele
local. No sítio onde a serpente se escondeu, há altares de Asclé-
pio; à volta nasceram oliveiras selvagens.513 23.8. Continuando
em frente, à direita, existe uma toalha de água dita de Ino,514
do tamanho de um lago pequeno, mas muito profundo. Para
essa toalha de água, durante a festa de Ino, atiram pedaços de
pão. Se a água os retiver, é sinal de bom presságio para quem
os atirou; e de mau presságio se vierem ao de cima. 23.9. A
mesma coisa é assinalada pelas bocas do Etna;515 lá para dentro
lançam-se objetos de outro e prata, ou mesmo todo o tipo de
vítimas. Se o fogo se apoderar deles e os levar, eles alegram-se
com o bom presságio; se, pelo contrário, os rejeitar, acham que
traz desgraça à pessoa em causa. 23.10. No caminho de Beas

513 
Sobre a multiplicação dos cultos de Asclépio pelo mundo grego,
a partir de Epidauro, vide supra Livro II, nota 516.
514 
Sobre o mito de Ino, cf. Higino, Fábula 4: “Átamas, rei da
Tessália, convencido de que Ino, a sua esposa – de quem tinha dois
filhos – tinha morrido, desposou Temisto, filha de uma ninfa e dela
teve filhos gémeos. Mais tarde veio a saber que Ino estava no Parnaso,
onde se entregava a ritos báquicos. Mandou buscá-la e, quando lha
trouxeram, prendeu-a. Temisto soube que ela tinha sido encontrada,
mas não a conhecia. Apostou-se então em lhe matar os filhos. Deu a
saber a sua intenção a Ino, que julgava ser uma cativa; recomendou-lhe
que vestisse os seus próprios filhos com vestes brancas e os de Ino com
negras. Mas Ino fez exatamente o contrário. Então Temisto, iludida,
matou os próprios filhos. Quando percebeu o erro, suicidou-se. Átamas,
em consequência, tomado de loucura, numa caçada atingiu o seu filho
mais velho, Learco; nessa altura Ino, com o filho mais novo, Melicertes,
lançou-se ao mar e foi feita deusa”. Eurípides dedicou a este mito uma
tragédia que intitulou Ino. Sobre outros cultos de Ino em diversas
povoações da Lacónia, vide infra 3.26.1, 3.26.4
515 
Por efeito da ebulição vulcânica, o que se atirar para dentro da
cratera de um vulcão pode ser rejeitado. Este é, portanto, um ritual
também praticado na Sicília.
160
Pausânias

para Epidauro Limera, já no território de Epidauro, há um


santuário de Ártemis dita Limnátis. A cidade está construída
num ponto alto, não muito longe do mar. Lá merece ser visto
um santuário de Afrodite, um de Asclépio com uma estátua
de mármore em pé, e, na acrópole, um templo de Atena. Na
zona do porto há um templo de Zeus designado Salvador.
23.11. Correspondendo à cidade há um promontório, pro-
jetado no mar, chamado Minoa. O golfo não tem nada de
particular em relação às reentrâncias existentes nas costas da
Lacónia, a não ser que a praia está cheia de uns seixos com uma
configuração muito interessante e de todo o tipo de cor.

3.24.1. Prosseguindo o roteiro da Lacónia na costa oriental


De Epidauro Zárax dista cem estádios. Esta é uma região
dotada de um bom porto. Mas das cidades dos Eleuterolacones
é a que está mais em ruínas, porque Cleónimo, filho de Cleó-
menes e neto de Agesípolis, de entre as cidades da Lacónia, foi
essa a única que despovoou. De Cleónimo já se falou noutro
momento.516 Em Zárax não há nada de relevo a não ser um
templo de Apolo situado no extremo do porto e uma estátua
do deus com uma cítara.
24.2. Prosseguindo-se a partir de Zárax ao longo da costa
uns cem estádios e depois subindo-se para o interior uns dez
estádios, encontra-se as ruínas da chamada Cifanta, onde
existe uma gruta consagrada a Asclépio e a estátua do deus em
mármore. Lá há também uma fonte de água fria que brota da

Vide supra 1.13.4-5, 3.6.2-3 e notas respetivas. O parentesco entre


516 

Cleómenes e Agesípolis não coincide nos dois passos, filho neste caso,
irmão no passo anterior.
161
Descrição da Grécia

rocha. Ao que se conta, foi aí que Atalanta,517 morta de sede


quando andava à caça, tocou na rocha com a lança e fez brotar
a água.
24.3. Brásias é a última das cidades dos Eleuterolacones
nesta costa. Desde Cifanta até lá, por mar, são duzentos está-
dios. Os habitantes do lugar contam uma história que nenhuns
outros Gregos ratificam: que Sémele,518 depois de ter dado à luz
o filho de Zeus e de ter sido descoberta por Cadmo, foi metida
num cofre juntamente com Dioniso. Esse cofre foi depois
abandonado à corrente, que o levou para a terra deles. Sémele,
que já não encontraram com vida, sepultaram-na com todas as
honras; quanto a Dioniso, encarregaram-se de o criar. 24.4. É
por isso que a cidade deles, que até então se chamava Oríatas,
mudou o nome para Brásias por o cofre lá ter ido parar. É que,

517 
Atalanta era conhecida justamente como caçadora da Arcádia,
uma protegida de Ártemis. Ter sido abandonada ao nascer, amamen-
tada por uma ursa e criada por caçadores contribuiu certamente para
essa identidade. Participou, com distintos heróis, na caça ao javali da
Calidónia (vide supra Livro I, nota 561) e na aventura dos Argonautas.
Segundo a tradição, numa tentativa de precaver a virgindade tinha por
hábito prometer casamento àquele que a vencesse na corrida; aqueles
que o tentavam sem resultado eram mortos. Até que Hipómenes, com
a intervenção de Afrodite, que lhe deu três maçãs de ouro para distrair
Atalanta, conseguiu vencer o desafio. Dessa união resultou Partenopeu,
um dos Sete atacantes de Tebas.
518 
É bem conhecido o mito de Sémele, uma das filhas do rei de
Tebas, Cadmo, e uma das amadas mortais do deus supremo. Na versão
mais comum, Sémele, inspirada por Hera que pretendia eliminar a rival,
pediu ao amante divino que se lhe mostrasse em todo o seu esplendor
e foi fulminada. Foi então que Hermes lhe retirou do ventre o filho
que gerava para que a gestação se completasse na coxa paterna. Cf.
Graves (1977) I.56. Esta versão mencionada por Pausânias aproxima
a história de Sémele de outras célebres, como a de Dánae e Perseu.
Sobre a repercussão do mito de Sémele noutras partes do Peloponeso,
nomeadamente em Trezena ou Lerna, vide supra 2.31.2, 2.37.5.
162
Pausânias

ainda no meu tempo, quando uma coisa é devolvida à terra


pela corrente, usa-se em geral a palavra ekbébrasthai (lançar
fora). Os Brasiatas contam ainda uma outra história. Segundo
eles Ino, que andava errante, foi ter à sua região. E lá chegada,
propôs-se ser a ama de Dioniso. Mostram então a gruta onde
Ino519 teria amamentado Dioniso e à planície chamam também
“jardim de Dioniso”. 24.5. Lá existe um santuário de Asclépio,
outro de Aquiles, a quem todos os anos dedicam uma festa.520
Em Brásias há um pequeno promontório, que se estende sua-
vemente na direção do mar. Sobre ele há figuras de bronze não
mais altas do que um pé, com um barrete na cabeça. Não sei
se representam os Dioscuros ou os Coribantes.521 Mas são três,
além de uma quarta estátua de Atena.
24.6. À direita de Gítio fica Lás,522 a dez estádios do mar e a
quarenta de Gítio. Hoje em dia, está situada entre três montes,
o chamado Ílio, o Ásia523 e o Cnacádio, enquanto dantes ficava

519 
Vide supra 1.42.7 e nota respetiva.
520 
Sobre cultos de Aquiles existentes no Peloponeso, vide supra
3.20.8.
521 
O mesmo tipo de pequenas estatuetas é referido adiante, 3.26.3.
Coribantes eram divindades secundárias de origem oriental, que, pouco
a pouco, se foram disseminando por toda a Grécia. Os ritos que os
homenageavam eram danças de ritmo frenético, acompanhadas de
instrumentos de percussão. As caraterísticas do seu culto promoveram
a associação com os Cabiros e Curetes. Assimilados a estes últimos,
funcionaram como protetores de Zeus por incumbência de Rea, quando
ainda criança. Musti, Torelli (2008) 275 interpretam este conjunto de
estátuas como representativas de “Atena acompanhada, à semelhança
do que sucede em Imbro e Samotrácia, pelos Cabiros, (...) protetores da
navegação e referidos em número variável, de três a nove”.
522 
Vide supra 3.21.7 e nota respetiva. A comprovar a sua antigui-
dade está a menção que lhe é feita em Ilíada 2.585.
523 
Sobre a forte influência homérica nas tradições, cultos e toponí-
mia desta região da Lacónia, vide Introdução.
163
Descrição da Grécia

no cimo do monte Ásia. Ainda hoje existem as ruínas da cidade


antiga e, diante das muralhas, há uma estátua de Héracles e um
troféu dos Macedónios. Tratava-se de uma parte do exército de
Filipe, quando fez uma incursão na Lacónia.524 Desgarrados
dos outros, saqueavam toda a costa marítima. 24.7. Nas ruínas
existe um templo de Atena dita Ásia, que, ao que consta, teria
sido erigido por Pólux e Castor, vindos a salvo da Cólquida;
diz-se que havia também na Cólquida um templo de Atena
Ásia. Eu sei que os filhos de Tíndaro participaram na campa-
nha de Jasão, mas que os Colcos venerem Atena Ásia, registo
apenas o que ouvi aos Lacedemónios. Junto à cidade que agora
lá existe, há uma fonte a que eles chamam Gálaco (Leitosa),
devido à cor da água. Junto da fonte fica um ginásio. Lá está
uma antiga estátua de Hermes. 24.8. Quanto aos montes, no
Ílio há um templo de Dioniso e lá bem no cimo um de Asclé-
pio; no Cnacádio há um Apolo chamado Carneu. Do Carneu
a uns trinta estádios, na região de Hipsos, já nos confins de
Esparta, há um santuário de Asclépio e um de Ártemis dita
Dafneia.
24.9. Na zona marítima, sobre um promontório, fica o
templo de Ártemis Dictina, a quem todos os anos se cele-
bra uma festa. À esquerda desse promontório fica a foz do
rio Esmeno, que tem uma água agradável para beber, como
nenhum outro rio. A sua nascente fica no monte Taígeto, e
dista da cidade não mais do que cinco estádios. 24.10. Na
povoação chamada Araíno, fica o túmulo de Lás e, sobre
esse memorial, a sua estátua. Dizem que foi ele o fundador
da cidade. Acabou morto por Aquiles, quando o herói veio à

524 
Sobre a oportunidade do avanço de Filipe II sobre a Grécia e da
devastação causada, vide supra 3.7.11. A invasão da Lacónia por Filipe
II aconteceu em 337 a.C.; cf. Políbio 5.19.
164
Pausânias

região para pedir a Tíndaro a mão de Helena.525 Mas, para falar


verdade, foi Pátroclo quem matou Lás, porque o pretendente
de Helena era ele. O facto de Aquiles não estar incluído entre
os pretendentes de Helena no Catálogo das mulheres526 não é
uma prova de que a não tenha pedido. 24.11. Mas Homero
escreveu, no início do seu poema,527 que Aquiles teria vindo
para Troia para agradar aos filhos de Atreu, e não por estar vin-
culado ao juramento de Tíndaro. Nos jogos,528 fez ainda Antí-
loco dizer que Ulisses era mais velho do que ele uma geração;
e o próprio Ulisses, ao narrar a Alcínoo529 a sua passagem pelo
Hades, diz, entre outras coisas, que quis ver Pirítoo e Teseu, em
idade anteriores a ele. E nós sabemos que Teseu raptou Helena.
Logo é totalmente impossível que Aquiles fosse pretendente de
Helena.530

3.25.1. O Ténaro e as povoações adjacentes


Adiante desse memorial há um rio que desemboca no mar,
chamado Ciras, a partir do momento em que, depois de um
tempo em que não tinha nome, Pirro, o filho de Aquiles, aí
aportou com os seus navios, quando navegou de Ciro531 para
casar com Hermíone. Atravessado o rio, há um antigo santuá-
rio e, um pouco mais longe, um altar de Zeus. 25.2. A qua-

525 
Vide supra 3.19.13.
526 
Sobre esta obra atribuída a Hesíodo, vide supra 1.3.1 e nota
respetiva.
527 
Ilíada 1.158.
528 
Ilíada 23.790.
529 
Odisseia 11.627-31.
530 
Se Teseu, de uma geração mais antiga do que Ulisses, tinha
raptado Helena, Aquiles seria demasiado jovem para se candidatar à
mão da beldade.
531 
Sobre a ilha de Ciro, vide supra 1.17.6, 3.3.7 e notas respetivas.
Sobre o casamento de Pirro com Hermíone, vide Livro I, nota 208.
165
Descrição da Grécia

renta estádios do rio, para o interior, fica Pírrico.532 O nome


dessa cidade, ao que dizem, provém de Pirro, filho de Aquiles,
ou de Pírrico, um deus dos chamados Curetes.533 Há também
quem diga que Sileno, provindo de Málea,534 se instalou aqui.
Que Sileno foi criado em Málea atesta-o uma das odes de Pín-
daro.535

O impetuoso coreuta,
que o monte de Málea criou, esposo de Náiade,
Sileno.

Que o nome dele fosse também Pírrico, não é dito por


Píndaro, são os habitantes de Málea que o afirmam. 25.3. Em
Pírrico, existe na ágora um poço, que consideram ter-lhes sido
dado por Sileno. Estariam sujeitos a escassez de água, se este
poço se esgotasse. No seu território, são estes os santuários
existentes: de Ártemis dita Astrateia (Que detém a expedição),
porque as Amazonas suspenderam aí a sua expedição e não
foram mais longe;536 e o de Apolo Amazónio. Em ambos os
casos as estátuas são de madeira e, ao que consta, teriam sido
consagradas por essas mulheres vindas do Termodonte.
25.4. Quando se desce de Pírrico para o mar, fica
Teutrone;537 esta é, ao que dizem, uma fundação de Teutras,

532 
Vide supra 3.21.7 e nota respetiva.
533 
Pausânias hesita na etimologia do nome da cidade de Pirro. Ou
a relaciona com o nome de Pirro, o Eácida, ou com a dança pírrica dos
Curetes ou Coribantes (vide supra 3.24.5).
534 
Vide supra 3.23.2.
535 
Fr. 156 Snell-Maehler. Sobre Sileno, vide supra 1.23.5 e nota
respetiva.
536 
Sobre a invasão da Grécia pelas Amazonas, vide supra 1.2.1, 1.41.7
e notas respetivas.
537 
Vide supra 1.21.7 e nota respetiva.
166
Pausânias

um ateniense. De entre os deuses é sobretudo Ártemis Issó-


ria538 que veneram. Têm também uma fonte Náiade. A uma
distância de cento e cinquenta estádios de Teutrone, avançando
mar adentro, está o promontório do Ténaro e dois portos: o
de Aquiles e o de Psamatunte.539 Sobre o promontório há um
templo em forma de gruta e à entrada uma estátua de Posídon.
25.5. Alguns poetas gregos540 imaginaram que teria sido por lá
que Héracles trouxe o cão de Hades,541 mas nem existe, através
da gruta, nenhum caminho subterrâneo, nem é verosímil que
haja um reino subterrâneo dos deuses, onde as almas se reú-
nam. Hecateu de Mileto, no entanto, inventou uma sugestão
plausível, ao dizer que no Ténaro vivia uma serpente terrível, a
que se chamou “cão do Hades”, porque todo aquele que fosse
mordido por ela morria de imediato devido ao veneno.542 E
acha ele que essa teria sido a serpente trazida por Héracles a
Euristeu.543 25.6. Homero – o primeiro que chamou “cão de
Hades” àquele que Héracles teria trazido544 – não lhe deu um

538 
Vide supra 3.14.2 e nota respetiva.
539 
O cabo Ténaro é o ponto mais meridional da Grécia continen-
tal, separando os golfos da Lacónia do lado oriental e da Messénia,
a ocidente. Essa localização extrema sugeriu o mito de que Hades
habitava no Ténaro, tradição que Pausânias recusa com argumentos da
topografia local. Posídon, cujo culto estava muito disseminado pelas
ilhas e pelas regiões costeiras sobretudo do Peloponeso, era, no cabo
Ténaro, famoso. Este santuário gozava da prerrogativa de asilo (cf.
Tucídides 1.128.1). Sobre pormenores do culto e da história do Ténaro,
vide Plácido (1993) 127-35.
540 
Cf. Píndaro, fr. 249ª Snell, Sófocles, Traquínias 1098; cf. ainda
Diodoro Sículo 4.25.4, Estrabão 8.363.
541 
Vide supra 3.18.13 e nota respetiva.
542 
FGrHist 1F 27.
543 
Vide supra 3.7.7 e nota respetiva.
544 
Ilíada 8.367-8 (“quando, por ordem de Euristeu, foi à mansão de
Hades, o Guardião, para lhe trazer do Érebo o cão do terrível Hades”),
167
Descrição da Grécia

nome específico, nem lhe atribuiu uma imagem, como fez com
a Quimera.545 Foram os que vieram depois quem lhe chamou
Cérbero; quanto a outros traços, imaginaram-no semelhante
a um cão e atribuíram-lhe três cabeças, mesmo se por “cão”
Homero não tivesse dito que se trata de um animal doméstico
ou de uma serpente chamada “cão de Hades”. 25.7. Existem no
Ténaro outras oferendas, caso de Aríon o citaredo, em bronze,
montado num golfinho. A história desse Aríon e do golfinho
é narrada por Heródoto no seu relato da Lídia, como a ouviu
contar.546 Há em Poroselene547 um golfinho que mostra grati-

Odisseia 11.617-26, em que se narra a temível façanha de Héracles ao


serviço de Euristeu, sendo o herói, que Ulisses encontra no Hades,
levado a concluir: “Uma vez até para cá me mandou, para levar o cão
de Hades. Talvez pensasse que não havia missão mais difícil do que
esta. Mas eu levei o cão, trazendo-o da morada de Hades”. Realmente
o nome de Cérbero aparece depois em Hesíodo, Teogonia 310-2 (“Em
segundo lugar gerou (Equidna e Tífon) um monstro terrível, que mal se
pode descrever, o cruel Cérbero, o cão de Hades, de brônzea voz, com
cinquenta cabeças, implacável e poderoso”), 769-73 (“Um cão terrível
guarda-lhe a entrada, dotado de uma manha perigosa; aos que entram,
saúda-os ao mesmo tempo com a cauda e as orelhas; mas depois não os
deixa sair; põe-se de atalaia e devora todo aquele que apanhar a tentar
ultrapassar a porta”).
545 
Ilíada 6.178-83, em que se faz uma descrição pormenorizada
da Quimera. O contraste que Pausânias estabelece entre o tratamento
diferente dado por Homero a Cérbero e à Quimera faz sentido, na
medida em que ambos são filhos de Equidna e de Tífon; cf. Hesíodo,
Teogonia 319-25.
546 
Heródoto 1.24. A lenda de Aríon é também o relato da salvação
de um homem, neste caso o citaredo, um artista apreciado pelo tirano
de Corinto, Periandro. Na versão de Heródoto, quando regressava da
Sicília depois de fazer concertos e de ter ganho muito dinheiro, os mari-
nheiros do barco que o transportava compeliram-no a lançar-se ao mar,
desejosos de se apoderarem do seu tesouro. Foi então que um golfinho o
recolheu sobre o dorso e o depositou são e salvo no Ténaro, para depois
regressar a Corinto. A terminar este capítulo (1.24.8), Heródoto regista
168
Pausânias

dão, por ter sido curado 547por uma criança, depois de ferido por
pescadores. Eu mesmo vi esse golfinho, que respondia ao cha-
mamento da criança e a transportava fosse quando fosse que ela
quisesse montá-lo. 25.8. No Ténaro existe também uma fonte,
que hoje em dia não tem nada de espantoso; mas dantes, ao
que dizem, quem olhava para a água via portos e navios. Essas
visões teriam cessado quando uma mulher lá lavou roupa suja.
25.9. Do promontório do Ténaro, por mar, são qualquer
coisa como quarenta estádios até Cenépolis (Cidade nova).548
Dantes também ela tinha o nome de Ténaro. Lá existe um
mégaron de Deméter e, sobre o mar, um templo e uma imagem
de Afrodite, de pé e em mármore. A trinta estádios, fica Tírides,
um promontório do Ténaro, e as ruínas da cidade de Hípola,
onde se situa o santuário de Atena Hipolaítis. A pouca dis-
tância está a cidade e o porto de Messa.549 25.10. Desse porto
até Étilo550 são uns cento e cinquenta estádios. O herói que
deu o nome à cidade, de origem argiva, era filho de Anfíanax

as suas fontes e testemunha a existência da estátua no cabo: “Este é


o relato dos Coríntios e dos Lésbios. De Aríon existe uma estátua de
bronze no Ténaro, representando um homem montado num golfinho”.
Ao contrário de Heródoto, que relata uma história que ouviu contar,
Pausânias pode recordar outra semelhante, ligada à ilha de Poroselene,
que ele próprio viu.
547 
Ilha do mar Egeu, situada entre Lesbos e a costa da Mísia. Sobre
esta história, cf. Eliano, Natureza dos Animais 2.6, Opiano, Haliêuticos
5.458-518. Sobre as múltiplas histórias que testemunham a interação
entre homens e golfinhos, vide Guerreiro (2013).
548 
A mudança do nome da cidade acompanhou, com certeza, a pró-
pria evolução do círculo urbano, que Musti, Torelli (2008) 281 fazem
coincidir com “a constituição da confederação dos Eleuterolacones”. As
diversas cidades do Ténaro foram já enumeradas supra 3.21.7.
549 
Referida em Ilíada 2.582, Estrabão 8.363.
550 
Ilíada 2.585.
169
Descrição da Grécia

e neto de Antímaco.551 Em Étilo é digno de ver-se o santuário


de Serápis e, na ágora, a estátua de madeira de Apolo Carneu.

3.26.1. Prosseguindo a rota do Peloponeso sul


De Étilo a Tálamas há uma distância de aproximadamente
oitenta estádios. No caminho encontra-se um santuário e um
oráculo de Ino.552 Quem lá adormece recebe um oráculo sobre
aquilo que pretende saber, que a deusa lhe revela em sonhos.
Fora do santuário erguem-se duas estátuas de bronze, uma de
Pasífae e outra do Sol (Hélios).553 Há ainda uma terceira dentro
do templo, que não se consegue ver com clareza por causa das
coroas; mas, ao que dizem, é também de bronze. Lá corre, de
uma fonte sagrada, uma água boa para beber. Pasífae, para o
povo de Tálamas, é um epíteto de Selene (Lua) e não uma
divindade local.
26.2. De Tálamas, a uns vinte estádios, junto ao mar,
fica a chamada Pefno,554 situada diante de uma ilha pequena
que não é maior do que um rochedo dos grandes. Pefno, é
como ela se chama. Foi aí, ao que diz a gente de Tálamas,
que nasceram os Dioscuros. E o mesmo disse, tanto quanto
sei, Álcman num dos seus poemas.555 Ao que afirmam, eles
não foram criados em Pefno, mas foram levados por Hermes
para Pelana.556 26.3. Nesse ilhéu há estátuas dos Dioscuros

551 
Vide supra 2.19.1.
552 
Vide supra 3.23.8, 3.24.4, infra 3.26.4.
553 
Sobre o culto do Sol, vide supra 3.20.4. Pasífae (Selene, Lua) e
Hélios (Sol) constituem um par sagrado, com origem em Creta.
554 
Esta é uma região que confina com a Messénia, sempre sujeita a
conflitos pela definição de fronteiras.
555 
Fr. 23 Page.
556 
Vide supra 3.21.2.
170
Pausânias

em bronze,557 com não mais do que um pé de altura e que


estão ao ar livre. O mar não pretende movê-las, apesar de,
quando há tempestade, varrer o penedo; o que é considerado
um prodígio, como também as formigas que lá existem terem
uma cor mais clara do que a habitual nas formigas. Segundo
os Messénios, esta região dantes fazia parte do seu território,
de modo que consideram os Dioscuros mais pertença sua do
que dos Lacedemónios.
26.4. De Pefno até Leuctros são vinte estádios. De onde
é que possa vir o nome da cidade de Leuctros, não faço ideia.
Mas se provém de Leucipo,558 filho de Perieres, como afir-
mam os Messénios, parece-me muito lógico que, dos deu-
ses, seja a Asclépio que mais veneram, por o considerarem
filho de Arsínoe,559 filha de Leucipo. Lá existe uma estátua
em mármore de Asclépio e, num outro lugar, uma de Ino.
26.5. Foram também erigidos um templo e uma imagem de
Cassandra, filha de Príamo, a que a gente da região chama
Alexandra,560 além de uma estátua de madeira de Apolo Car-
neu, do mesmo tipo usado entre os Espartanos. Sobre a acró-
pole fica um santuário e uma estátua de Atena; em Leuctros
existe um templo e um bosque sagrado de Eros. No inverno,
a água da chuva inunda o bosque; mas as folhas das árvores
que caem na primavera não são levadas pela água, nem que
seja torrencial. 26.6. Vou registar aquilo que sei que acon-
teceu, no meu tempo, na faixa de Leuctros junto ao mar. O
vento empurrou o fogo para a floresta e queimou a maior

557 
Certamente na sua qualidade de divindades protetoras dos
navegantes.
558 
O pai das Leucípides, que desposaram Castor e Pólux.
559 
Vide supra 2.26.7.
560 
Vide supra 3.19.6. Nome que Lícofron, no séc. III a.C., daria ao
poema que dedicou a Cassandra.
171
Descrição da Grécia

parte das árvores. Quando a região ficou despida, lá apareceu


uma estátua de Zeus Itómata561 em pé. Dizem os Messénios
que essa é a prova de que Leuctros, no passado, lhes perten-
cia. Mas bem poderia também acontecer que desde o início,
quando os Lacedemónios ocupavam Leuctros, Zeus Itómata
fosse venerado por eles.
26.7. Cardámile, a que já Homero se referia entre os pre-
sentes prometidos por Agamémnon,562 passou a estar sob a
alçada dos Espartanos, depois que o imperador Augusto a des-
membrou da Messénia.563 Cardámile dista do mar oito estádios,
e de Leuctros sessenta. Lá, não longe da marginal, há um tem-
plo das filhas de Nereu, pois, ao que se diz, elas saíram do mar
para esse lugar, para verem Pirro, o filho de Aquiles, quando
se dirigiu a Esparta para casar com Hermíone.564 Na cidade,
há um santuário de Atena e um Apolo Carneu, segundo o uso
instalado entre os Dórios.
26.8. A cidade a que Homero, nos seus versos, chama
Énope, 565 habitada por Messénios mas pertencentes à liga
dos Eleuterolacones, no nosso tempo, recebeu o nome de

561 
Do monte Itome; vide supra 3.11.8 e nota respetiva.
562 
Ilíada 9.150, 9.292. A cidade figura entre as ofertas a que
Agamémnon se diz disposto no sentido de apaziguar a cólera de Aquiles
e de o fazer regressar ao combate.
563 
Esta conta-se entre as diversas medidas tomadas por Augusto
para favorecer Esparta. Vide infra 4.1.1, 4.30.2, 4.31.1-2, em que Pau-
sânias refere uma parte da Messénia anexada à Lacónia por Augusto.
Assim o imperador pretenderia mostrar gratidão para com uma cidade
que, com Mantineia, se mostrara a única no continente grego a não
tomar o partido de Marco António, na batalha de Ácio. Vide Lafond
(2018) 408.
564 
Sobre a relação do culto das Nereides com Aquiles, vide supra
2.1.8. Sobre o casamento de Pirro com Hermíone, vide supra 3.25.1.
565 
Ilíada 9.150, 9.292.
172
Pausânias

Gerénia.566 Dizem alguns que nessa cidade foi criado Nestor,


e outros que foi lá que se exilou, quando Pilos foi tomada por
Héracles.567 26.9. Em Gerénia, fica um túmulo de Macáon,
filho de Asclépio,568 a quem é consagrado um santuário muito
venerado, onde as pessoas podem encontrar a cura das doen-
ças. Ao lugar sagrado chamam Rodo, e nele existe uma estátua
de Macáon em pé, de bronze. Na cabeça tem uma coroa,
a que os Messénios chamam, no falar local, kíphos. Ao que
conta o autor da Pequena Ilíada, 569 Macáon foi morto por
Eurípilo, filho de Télefo.570 26.10. Daí provém aquilo que eu
sei ser prática no templo de Asclépio, em Pérgamo. Come-
çam por hinos a Télefo, sem qualquer referência a Eurípilo,
pois nem é permitido aludir-lhe ao nome dentro do templo,
por o considerarem o assassino de Macáon. Ao que consta,
foi Nestor quem recolheu os ossos de Macáon. Quanto a
Podalírio,571 consideram que, no regresso de Ílio, perdeu o
rumo e foi parar a salvo a Sirno, no continente trácio, onde
se estabeleceu.
26.11. Na região da Gerénia fica o monte Calátio, onde
existe um santuário de Claia junto a uma gruta, com uma

566 
Vide supra 3.21.7 e nota respetiva. Pausânias é insistente em
utilizar o testemunho homérico em defesa das pretensões messénicas
à região.
567 
Vide Livro II, nota 44; e ainda 2.18.7,
568 
Vide supra 2.26.10 e nota respetiva.
569 
Fr. 7 Kinkel. A Pequena Ilíada fazia parte dos poemas do ciclo
épico e era atribuída a Lesques. Provavelmente seria um relato dos acon-
tecimentos posteriores à morte de Heitor, dando assim continuidade ao
assunto da Ilíada. Vide Lesky (1968) 106.
570 
Vide supra 1.4.6 e nota respetiva. Eurípilo compareceu na Guerra
de Troia ao comando dos Mísios, como aliado dos Troianos (cf. Ilíada
11.819, 16.27); vide infra 9.5.15.
571 
Irmão de Macáon. Vide supra 2.26.10 e nota respetiva.
173
Descrição da Grécia

entrada estreita, mas que tem dentro coisas que merecem uma
visita. Quando se sobe de Gerénia para o interior uns trinta
estádios, encontra-se Alagónia, uma cidade que já referi572 na
lista dos Eleuterolacones. Merecem uma visita os santuários de
Dioniso e de Ártemis.

572 
Vide supra 3.21.7.
174
Índice de topónimos e antropónimos

Ábaris – 13.2 Afrodite – 15.11


Abas (pai de Acrísio) – 13.8 altares, templos, santuários
Abido – 9.12 Cenépolis – 25.9; Citera – 23.1;
Acaia, Aqueus - 2.1, 2.6, 2.7, Epidauro Limera – 23.10;
12.7, 22.6 Esparta – 13.2, 15.10, 17.5;
Acarnânia, Acarnanos – 10.2, Gítio – 22.1
13.4 epítetos
Acasto – 18.16 Amicleu – 18.8; Areía – 17.5;
Ácrias – 21.7, 22.4, 22.5, 22.6, Ambologêras – 18.1; Morfo
22.9 – 15.10, 15.11; Migoní-
Acrísio (filho de Abas) – 13.8 tis – 22.1, 22.2; Olímpica
Acrótato (filho de Cleómenes) – 12.11, 13.2; Urânia –
– 6.2, 6.4 23.1
Acrótato (filho de Areu) – 6.6 estátuas, imagens
Actor – 18.15 Amiclas – 18.8, 19.4; Cenépo-
Admeto – 18.16 lis – 25.9; Esparta – 12.11,
Adrasto – 18.12 13.9
Afareu (meio-irmão de Tíndaro) Agamédides (rei de Cleonas)
– 1.4, 14.7 – 16.6
Afareu (filho de Perieres) Agamémnon – 9.3, 9.4, 11.10,
– 11.11 19.6, 22.10, 26.7
Afetaída (rua de Esparta) – Agásicles (filho de Arquidamo)
12.1, 12.5, 12.8 – 7.6, 7.7
Afeteu – 13.6 Agéloco (pai de Ágias) – 11.5
Afidnas – 17.2, 18.4, 18.5 Agenor – 13.8, 15.8
Afitis, Afiteus – 18.3 Agesilau I (filho de Dorisso) –
Afrodísias (Lacónia) – 22.11 2.4, 2.5
175
Descrição da Grécia

Agesilau II (filho de Arquidamo Alcíone (irmã de Taígete)


II) – 5.3, 8.1, 8.8, 8.9, 8.10, – 18.10
9.1, 9.3, 9.4, 9.5, 9.6, 9.7, Álcman – 15.2, 15.3, 18.6, 26.2
9.10, 9.12, 9.13, 10.1, 10.2, Alcmena – 15.4
10.3 Álcon (filho de Hipocoonte)
Agesípolis I (filho de Pausânias) – 14.7
– 5.7, 5.8, 6.1 Alésia – 20.2
Agesípolis II (filho de Cleôm- Alévadas – 7.9
broto) – 6.2, 24.1 Alexandra (vide Cassandra) –
Ágias – 11.5 19.6, 26.5
Ágidas – 2.1, 7.1, 14.2, 14.3, Alexandre (Páris) – 12.6, 18.12,
14.6 22.1, 22.2
Ágis I (filho de Eurístenes) – Alfeu (rio) – 8.4
2.1, 2.2, 5.2 Alfeu (combatente nas Termópi-
Ágis II (filho de Arquidamo) – las) – 12.9
8.1, 8.3, 8.4, 8.5, 8.6, 8.7, Alópeco (filho de Irbo) – 16.9
8.8 Álpio – 18.2
Ágis III (filho de Arquidamo Amazonas – 25.3
III) – 10.5 Amiclas (filho de Lacedémon) –
Ágis IV (filho de Euridâmidas) 1.3, 13.1
– 10.5 Amiclas, Amicleus – 1.3, 2.6,
Ágis (pai de Ânficles) – 16.9 10.1, 10.8, 12.9, 16.2, 18.6,
Ájax (filho de Oileu) – 19.12, 18.7, 19.6, 20.3, 20.6
19.13 Amicleu (trono de) – 18.9
Ájax (filho de Télamon) – 19.13 Amintas (pai de Filipe II)
Alagónia – 21.7, 26.11 – 7.11
Alcâmenes (filho de Teleclo) – Ámon – 18.3, 21.8
2.7, 3.1, 11.10 Amónios – 18.3
Alcandro – 18.2 Anaxandra – 16.6
Alcibíades – 17.4 Anaxândrides (filho de Léon)
Álcimo – 15.1 – 3.5, 3.9, 3.10, 4.7, 16.4,
Alcínoo – 24.11 16.5
176
Pausânias

Anaxandro (filho de Eurícrates) Amiclas – 16.2; Beas – 22.13,


– 3.4, 3.5, 14.4 23.2; Cardámile – 26.7;
Anáxias – 18.13 Cnacádio (monte de Las) –
Anaxidamo (filho de Zeuxi- 24.8; Esparta – 11.9, 12.8,
damo) – 7.6 14.6; Gerontras – 22.7; Pír-
Androclides (de Tebas) – 9.8 rico – 25-3; Zárax – 24.1
Andros – 11.6 epítetos
Anfíanax (pai de Étilo) – 25.10 Amazónio – 25.3; Amicleu –
Anfiarau (adivinho, filho de 19.6; Ácritas – 12.8; Carneu
Ecles) – 12.5, 18.12 – 13.4, 14.6, 21.8, 24.8,
Ânficles (pai de Anfístenes) 25.10, 26.5, 26.7; Epidélio
– 16.9 – 23.2, 23.4; Maleates –
Anfíloco – 15.8 12.8; Piteu – 10.8, 11.9
Anfissa – 9.9 estátuas, imagens
Anfístenes (pai de Irbo) – 16.9 Amiclas – 1.3, 10.1; Beas –
Anfítemis (de Tebas) – 9.8 23.3; Esparta – 11.9; Étilo
Anfitrite – 17.3, 19.3 – 25.10; Gítio – 21.8; Leuc-
Ânono (fonte) – 20.7 tros – 26.5; Tórnax – 10.8;
Antágoras – 4.9 Zárax – 24.1
Antígono (filho de Demétrio) – Aqueloo – 18.16
6.4, 6.5, 6.6 Aqueus – 10.7, 12.9, 13.4, 22.9
Antíloco (Herói homérico) – Aquiles – 3.8, 4.7, 18.12, 19.8,
19.13, 24.11 19.11, 19.13, 20.8, 24.5,
Antímaco (avô de Étilo) – 25.10 24.10, 24.11, 25.1, 25.2,
Antíoco (comandante de Alci- 26.7
bíades) – 17.4 Aquiles (porto de) – 25.4
Antípatro (macedónio) – 10.5 Araíno – 24.10
Apolo – 10.5, 11.9, 13.4, 13.5, Arato (de Sícion) – 6.9
16.1, 16.2, 18.15, 19.4, Arcádia, Arcádios – 2.5, 5.4,
19.5, 21.8 6.8, 7.3, 8.7, 8.8, 11.7,
altares, templos, santuários 12.9, 13.4, 17.9, 20.8

177
Descrição da Grécia

Ares – 19.7, 19.8 Aristodemo – 5.7


altares, templos, santuários Aristomélidas (avô materno de
Gerontras – 22.6; Terapne Agesilau II) – 9.3
– 19.7 Aríston (pai de Demarato) –
epítetos 4.4, 6.8, 7.8, 8.7
Téritas – 19.8 Aríston (filho de Agásicles)
Areu I (filho de Acrótato) – 6.2, – 7.7
6.4, 6.5, 6.6 Arquelau (filho de Agesilau) –
Areu II (filho de Acrótato, neto 2.5, 2.6
de Areu) – 6.6 Arquidamo I (filho de Teo-
Árgalo (filho de Amiclas) – 1.3 pompo) – 7.5
Argia (mãe de Procles e Euríste- Arquidamo (filho de Anaxi-
nes) – 1.7 damo) – 7.6
Argólida – 2.2, 4.1, 5.8, 5.9, Arquidamo II (filho de Zeu-
7.3, 7.4, 23.6 xidamo) – 7.10, 8.1, 9.1,
Argos, Argivos – 1.4, 1.5, 2.2, 15.1
2.3, 2.7, 4.1, 4.5, 5.6, 5.8, Arquidamo III (filho de Agesi-
5.9, 7.2, 7.5, 9.1, 9.8, 10.1, lau II) – 10.3, 10.4, 10.5
11.7, 11.8, 11.11, 12.11, Arsínoe (filha de Leucipo) –
17.1, 18.8 12.8, 26.4
Argos (filho de Níobe) – 4.1, Artaíctes (persa) – 4.6
4.5, 4.6 Artaxerxes II (filho de Dario II)
Árifron (pai de Hipócrates) – – 9.1, 9.4, 9.7
6.1, 7.9 Ártemis – 9.3, 16.9, 18.15,
Aríon – 25.7 22.12
Aristandro (de Paros, escultor) altares, templos, santuários
– 18.8 Alagónia – 26.11; Cárias –
Aristócrito (pai de Lisandro) – 10.7; Creta – 18.4; Dério
6.7, 8.6, 8.10 – 20.7; Epidauro Limera –
Aristodemo (irmão de Témeno 23.10; Esparta – 12.8, 14.2,
e Cresfonte) – 1.5, 1.6, 2.1, 14.6, 20.9; Hipsos – 24.8,
7.1, 16.6 24.9; Lídia – 16.8; Lim-
178
Pausânias

nas – 2.6; Limneu – 16.7; Pelana – 21.2; Pérgamo –


Mário – 22.8; Pírrico – 26.10; Terapne – 19.7
25.3 epítetos
epítetos Ágnitas – 14.7; Cotileu – 19.7;
Anaítis – 16.8; Astrateia – 25.3; Filolau – 22.9
Cariátide – 10.7; Cnágia estátuas, imagens
– 18.4; Dafneia – 24.8; Cifanta – 24.2; Epidauro
Dereátis – 20.7; Dictina – Limera – 23.10; Gítio –
24.9; Egineia – 14.2; Hegé- 21.8; Leuctros – 26.4
mone – 14.6; Issória – 14.2, Ásia – 7.8, 9.1, 9.2, 9.5, 9.8,
25.4; Leucofriene – 18.9; 9.12
Ligodesma – 16.11; Limná- Ásia (monte em Las) – 24.6
tis – 23.10; Limneia – 14.2; Asineus – 7.4
Mísia – 20.9; Órtia – 16.7, Ásio (poeta) – 13.8
16.9. 16.11, 17.1; Salvadora Asopo – 21.7, 22.9, 22.10
– 22.12 Astrábaco – 16.6, 16.9
estátuas, imagens Atalanta – 24.2
Amiclas – 18.8, 19.4; Esparta – Atena – 17.3, 18.11, 18.13
11.9, 16.9, 17.2 altares, templos, santuários
Artemísia – 11.3 Asopo – 22.9; Beócia – 9.13;
Artemísio – 16.6 Cardámile – 26.7; Cólquida
Asclepieu – 22.10 – 24.7; Esparta – 11.9,
Asclépio – 20.5, 26.4, 26.9 12.4, 13.6, 15.6, 17.2, 17.4;
altares, templos, santuários Fasélis – 3.8; Gítio – 21.9;
Asopo – 22.9; Beas – 22.13; Hípola – 25.9; Las – 24.7;
Brásias – 24.5; Cifanta – Leuctras – 26.5; Queixada
24.2; Cós – 23.6; Epidauro de Burro – 22.10
Limera – 23.7; Esparta – epítetos
14.2, 14.7, 15.10; Hiper- Agoraia – 11.9; Álea – 5.6,
teléato – 22.10; Hipsos 7.10, 19.7; Ambúlia – 13.6;
– 24.8; Ílio (monte de Las) Ásia – 24.7; Axiopena –
– 24.8; Nicomédia – 3.8; 15.6; Calchíoikos – 17.2;
179
Descrição da Grécia

Celeuteia – 12.4; Ciparíssia Báticles (de Magnésia, escultor)


– 22.9; Epidauro Limera – – 18.9, 18.11, 18.14, 19.2
23.10; Ergáne – 17.4; Hipo- Bato (de Tera) – 14.3
laítis – 25.9; Itónia – 9.13; Beas (cidade) – 21.7, 22.11,
Oftalmítide – 18.2; Pareia 22.13, 23.1, 23.2, 23.4,
– 20.8; Polioûchos – 17.2; 23.6, 23.10
Xénia – 11.11 Beas (promontório) – 22.11
estátuas, imagens Belemina – 21.3
Amiclas – 19.4, 19.5, 19.7; Brá- Belerofonte – 18.13
sias – 24.5; Esparta – 12.5, Beócia, Beócios – 5.3, 5.4, 5.6,
20.8; Gítio – 21.9; Leuctros 6.1, 9.12, 9.13
– 26.5 Béu (Heraclida) – 22.11
Atenas, Atenienses – 3.7, 4.2, Biris – 19.3
4.5, 4.8, 5.1, 5.2, 5.3, 5.4, Bizâncio – 17.7, 17.8
5.8, 6.1, 6.4, 6.5, 6.6, 7.8, Booneta (edifício de Esparta) –
7.9, 7.10, 7.11, 8.6, 9.1, 12.1, 12.3, 15.10
9.2, 9.3, 9.6, 9.8, 9.11, 9.12, Brásias, Brasiatas – 21.7, 24.3,
10.1, 10.3, 11.2, 11.8, 12.7, 24.4, 24.5
15.7, 16.7, 16.8, 17.4, 18.5 Brásidas – 14.1
Atenodoro – 16.4 Bráuron – 16.7, 16.8
Atlas – 18.10 Bríseas (cidade) – 20.3, 20.4
Ática – 5.1, 8.6, 11.1, 12.7, Britomártis – 14.2
17.3 Bróteas (filho de Tântalo)
Atreu – 1.5, 24.11 – 22.4
Áugias (cf. Égias) – 21.5 Cadmeia – 17.1
Augusto (imperador) – 11.4, Cadmo – 1.8, 15.8, 24.3
11.5, 21.6, 26.7 Cálais – 18.15
Áulis – 9.3, 9.10 Calátio (monte) – 26.11
Aulo (filho de Tlesímenes) Calcídica – 5.9
– 12.9 Calcieco – 17.5, 17.6, 17.7
Autésion (tio de Procles e Eurís- Cálidon (cidade da Etólia) –
tenes) – 1.7, 15.6 10.2, 18.15
180
Pausânias

Caliste (nome antigo da ilha de Címon (filho de Milcíades)


Tera) – 1.7, 15.6 – 3.7
Cálon (escultor) – 18.8 Cinado – 22.10
Capadócios – 16.8 Cinisca (filha de Arquidamo) –
Caracoma – 21.2 8.1, 8.2, 15.1
Cardámile – 26.7 Cinortas (filho de Árgalo) – 1.3
Cárias – 10.7 Cinortas (filho de Amiclas)
Carilau (rei de Esparta) – 2.5 – 13.1
Carilo (filho de Polidectes) – Cinosura – 16.9
7.3, 7.4 Cinúria, Cinúrios – 2.2, 2.3,
Cármides (filho de Êutis) – 2.7 7.2
Carneu – 13.3, 13.5 Cinuro (filho de Perseu) – 2.2
Carno (da Arcádia) – 13.4 Ciras (rio) – 25.1
Cassandra (vide Alexandra) – Cirene – 14.3, 16.2
19.6, 26.5 Ciro (ilha) – 3.7, 25.1
Castor – 12.8, 13.1, 24.7 Ciro (o Jovem) – 9.1
Castórides (portas) – 21.9 Citas – 9.6
Cavalo (memorial) – 20.9 Citera – 23.1
Céfalo (de Atenas) – 9.8 Clearco (de Régio) – 17.6
Céfalo – 18.12 Claia – 26.11
Cenépolis – 21.7, 25.9 Cleo (sacerdotisa de Tétis)
Centauros – 18.10 – 14.4
Cérbero – 25.6 Cleodeu (filho de Hilo) – 15.10
César (Júlio) – 11.4 Cleômbroto I (filho de Anaxân-
Chipre – 11.5 drides) – 3.9, 4.9
Cicno – 18.10 Cleômbroto II (filho de Pau-
Cifanta – 24.2, 24.3 sânias) – 5.7, 6.1, 6.2, 6.7,
Cílis (escultor) – 17.6 6.8
Cílon (de Argos) – 9.8 Cleómenes I (filho de Anaxân-
Címon (pai de Milcíades) drides) – 3.9, 3.10, 4.1, 4.2,
– 12.7 4.3, 4.4, 4.5, 4.6, 4.7, 7.8

181
Descrição da Grécia

Cleómenes II (filho de Cleôm- Creta, Cretenses – 2.4, 2.7,


broto) – 6.2, 24.1 11.11, 14.2, 18.4, 18.5
Cleómenes (filho de Leónidas) Crio (filho de Téocles) – 13.3,
– 6.9, 7.1, 10.7 13.4
Cleonas – 16.6 Críside – 5.6
Cleonice – 17.8, 17.9 Cróceas – 21.4, 21.5
Cleónimo III (filho de Cleóme- Crótanos – 14.2
nes II) – 6.2, 6.3, 6.7, 7.8, Crotona, Crotoniatas – 3.1,
24.1 19.11, 19.12
Cleta (uma das Graças) – 18.6 Ctesipo (filho de Héracles)
Clitemnestra – 19.6 – 16.6
Cnacádio (monte em Las) – Curetes – 25.2
24.6, 24.8 Damasístrato (pai de Teo-
Cnageu – 18.4, 18.5 pompo) – 10.3
Cnossos – 2.4, 12.11 Dánao – 12.2, 22.11
Codino – 22.4 Dario I (pai de Xerxes) – 4.2,
Colofónios – 14.9 7.8, 9.6, 12.7
Colona – 13.7 Dario II (pai de Artaxerxes II)
Cólquida, Colcos – 19.7, 19.8, – 9.1
24.7 Deceleia – 8.6
Cónon (filho de Timóteo) – 9.2 Dédalo – 17.6
Coribantes – 24.5 Delfos, Délfios – 1.6, 3.6, 4.3,
Corinto, Coríntios – 5.7, 9.2, 4.4, 4.5, 8.2, 8.9, 10.3,
9.8, 9.12, 10.1, 21.6 11.8, 13.7, 17.1, 17.9,
Coro – 11.9 19.12
Coroneia – 9.13 Délio – 6.1
Cós (ilha) – 4.9, 4.10, 23.6 Delos – 23.3, 23.4, 23.5
Cránae (ilha) – 22.1 Demarato (filho de Aríston) –
Crânio – 20.9 4.3, 4.4, 4.5, 6.8, 7.7, 7.8,
Cresfonte (rei de Argos) – 1.5 7.9, 8.7
Creso (rei da Lídia) – 2.3, 10.8 Deméter – 18.8, 20.7

182
Pausânias

altares, templos, santuários Dioscuros – 13.6, 14.6, 14.7,


Cenépolis – 25.9; Eleusínio – 16.2, 16.3, 18.4, 19.7, 20.2,
20.7; Gítio – 21.8; Taígeto 21.4, 24.5, 26.2, 26.3
– 20.5 Dipeia – 11.7
epítetos Dipeno (escultor) – 17.6
Eleusínia – 20.5; Ctónia – 14.5 Dorceia (fonte) – 15.2
estátuas, imagens Dorceu (herói) – 15.1, 15.2
Amiclas – 19.4 Dorieu (filho de Anaxândrides)
Demétrio (pai de Antígono) – 3.9, 3.10, 4.1, 4.7, 16.4,
– 6.4 16.5
Demódoco (aedo) – 18.11 Dórios – 1.6, 2.6, 5.8, 12.9,
Demonassa (irmã de Anfíloco) 13.3, 13.4, 19.6, 20.6, 22.6,
– 15.8 26.7
Dereio – 20.7 Dorisso (filho de Labotas) – 2.4
Dictina – 12.8 Drómos – 14.6, 14.7, 15.6
Dinica (esposa de Arquidamo Ébalo (filho de Cinortas) - 1.3,
III) – 10.3 15.10
Diomedes (rei trácio) – 18.12 Ecles (pai de Anfiarau) – 12.5
Dionisíadas – 13.7 Éfeso – 17.4
Dioniso – 11.11, 13.7, 18.11, Egesta – 16.5
19.6, 24.3, 24.4 Egeu (filho de Eólico) – 15.8
altares, templos, santuários Égias (cf. Augias) – 21.5, 21.6,
Alagónia – 26.11; Bríseas – 21.7
20.3; Esparta –13.7, 13.8; Egina, Eginetas – 4.2, 4.3, 4.10,
Ílio (monte de Las) – 24.8; 14.2, 18.8
Migónio – 22.2 Égio (cidade da Acaia) – 12.7,
epítetos 21.1
Colonata – 13.7; Larísio – 22.2; Égis, Égidas (cidade) – 2.5
Psílax – 19.6 Egito, Egípcios – 6.5, 6.8, 6.9,
estátuas, imagens 10.2, 18.16
Amiclas – 19.3; Bríseas – 20.3; Egospótamo (batalha naval) –
Gítio – 21.8 8.6, 11.5, 17.4, 18.8
183
Descrição da Grécia

Electra – 1.6 Equidna – 18.10


Eleia – 21.1 Ericina (na Sicília) – 16.4
Eleunte – 4.6 Erínias – 19.10
Eleus – 8.3, 8.5 Érix – 16.4, 16.5
Elêusis – 4.2, 4.6 Eros – 26.5
Eleuterolacones – 21.6, 21.7, Escândea – 23.1
22.6, 22.8, 24.1, 24.3, 26.8, Escénoma – 17.6
26.11 Escótita – 10.6
Élide – 8.3, 8.4, 8.5, 11.6, 11.7, Esfactéria – 5.5
12.8 Esmeno (rio) – 24.9
Enársforo – 15.1 Esparta (esposa de Lacedémon)
Eneias – 22.11 – 1.2, 18.8
Eneto (atleta) – 18.7 Esparta, Espartanos – passim
Eniálio (Ares) – 14.9, 15.7, Estemátias – 20.9
20.2 Estenelaides – 7.11
Enódia (Hécate) – 14.9 Estesícoro – 19.13
Énope (cf. Gerénia) – 26.8 Eta (monte) – 4.8
Eólia – 2.1 Étilo – 21.7, 25.10, 26.1
Eólico (filho de Teras) – 15.8 Étis – 22.11
Éono (primo de Héracles) – Etna – 23.9
15.4, 15.5 Etólia, Etólios – 10.2
Epícrates (de Atenas) – 9.8 Eucosmo (filho de Licurgo)
Epidauro – 23.6, 23.7 – 16.6
Epidauro Limera – 21.7, 23.6, Eudâmidas I (filho de Arqui-
23.10, 24.1 damo III) – 10.5
Epidélio – 23.6 Eumedes (filho de Hipocoonte)
Epidotes – 17.9 – 14.6
Epiménides (de Creta) – 11.11, Êunomo (filho de Prítanis)
12.11 – 7.2
Équelas (pai de Gras) – 2.1 Euribíades – 16.6
Equéstrato (filho de Ágis) – 2.2, Êuricles – 14.6
2.3
184
Pausânias

Eurícrates (filho de Polidoro) Fáris (cidade) – 2.6, 20.3


– 3.4 Fasélis – 3.8
Eurícrates (filho de Anaxandro) Feaces – 18.11
– 3.5 Febe – 16.1
Euridâmidas (filho de Eudâmi- Febeu – 14.9, 14.10, 20.2
das I) – 10.5 Félia (rio) – 20.3
Eurídice (filha de Lacedémon) Fenícios – 21.6
– 13.8 Figália – 17.9
Eurileónide – 17.6 Filas (pai de Hípotes) – 13.4
Eurípilo (filho de Télefo) – Filipe II (Macedónia) – 7.11,
26.9, 26.10 24.6
Euriponte (filho de Sus) – 7.1, Fineu – 18.15
7.2 Fócide, Focenses – 5.3, 9.9,
Euripôntidas – 2.5, 7.1, 12.8 9.10, 10.3, 10.4
Eurístenes (filho de Aristodemo) Folo (um dos Centauros)
– 1.7, 1.8, 2.1, 6.7, 7.1 – 18.10
Euristeu (herói homérico) – 7.7, Formião (espartano) – 16.2,
25.5 16.3
Êurito – 18.11 Gálaco (fonte) – 24.7
Europa – 13.5 Gasepto (santuário da Terra)
Europas (filho de Hireu) – 15.8 – 12.8
Eurotas (filho de Miles) – 1.1, Gerantras (cidade) – 2.6
1.2, 18.6 Gerénia (cf. Énope) – 21.7,
Eurotas (rio) – 1.1, 13.8, 19.7, 26.8, 26.9, 26.11
21.1, 21.3 Gérion – 16.5, 18.13
Êutis (pai de Cármides) – 2.7 Gerontras – 21.7, 22.6, 22.8
Euxino (Ponto) – 16.8, 19.11 Gitiadas (artista) – 17.2, 18.8
Eveno (rio) – 18.12 Gítio, Gitiatas – 21.4, 21.5,
Évora (monte) – 20.4, 20.5 21.6, 21.7, 21.8, 21.9, 22.1,
Faena (uma das Graças) – 18.6 22.3, 24.6
Farandates (filho de Teáspis) Glípia – 22.8
– 4.9
185
Descrição da Grécia

Góbrias (pai de Mardónio) Hera – 18.13, 18.16


– 11.3 altares, templos, santuários
Gorgófone (esposa de Ébalo) Esparta – 11.9, 13.8
– 1.4 epítetos
Graças – 14.6, 18.6, 18.9, Argiva – 13.8; Egófaga – 15.9;
18.10 Hiperquíria – 13.8
Grande Mãe – 12.9 estátuas, imagens
Gras (filho de Equelau) – 2.1 Heracleion – 15.5
Hades – 18.13, 24.11, 25.5, Héracles – 1.5, 10.6, 14.6,
25.6 14.8, 15.3, 15.4, 15.5, 15.6,
Haliarto – 5.3, 5.5 15.9, 16.4, 16.5, 16.6, 17.3,
Halicarnasso – 11.3 18.10, 18.11, 18.12, 18.13,
Harmonia – 18.12 18.15, 18.16, 19.5, 19.7,
Harpias – 18.15 20.5, 21.8, 24.6, 25.5, 25.6,
Harpleia (povoação) – 20.7 26.8
Hecateu (de Mileto) – 25.5 Heraclidas – 1.5, 13.3, 22.6,
Hefesto – 17.3, 18.13, 18.16 22.11
Hegtórides – 4.9 Hereia – 8.7, 8.8
Heitor – 18.16 Hermes – 1.1, 10.6, 18.11,
Helena – 7.7, 12.6, 15.3, 18.15, 18.12, 26.2
19.9, 19.10, 19.11, 19.13, epítetos
20.9, 22.1, 24.10, 24.11 Agoreu – 11.11
Helénio (lugar em Esparta) – estátuas, imagens
12.6, 12.7, 12.8 Amiclas – 19.3; Beas – 22.13;
Helenos – 20.6 Esparta – 11.11; Las – 24.7
Helesponto – 4.9, 17.8 Hermíone (filha de Menelau) –
Hélade (na Tessália) – 20.6 1.5, 25.1, 26.7
Hélio (filho de Perseu) – 20.6 Hermíone (cidade) – 14.5
Helos (cidade cretense) – 2.7 Hermo (rio) – 9.6
Helos (cidade lacónia) – 20.6, Heródoto – 2.3, 25.7
20.7, 22.3 Héstia – 11.11
Hémera (Aurora) – 18.12
186
Pausânias

Hetémocles (vencedor olímpico) Icário (irmão de Tíndaro) – 1.4,


– 13.9 12.1, 12.2, 20.10, 20.11
Hidarnes (comandante persa) Ida (monte) – 13.5
– 4.8 Idas – 13.1
Hidra (de Lerna) – 18.13 Ifícrates – 10.1
Hierónimo (de Andros) – 11.6 Ifigénia – 16.7
Higia – 22.13 Ífito – 15.3
Hilaíra – 16.1 Ílio – 22.2, 26.10
Hilo (pai de Cleodeu) – 15.10 Ílio (monte em Las) – 24.6,
Hímera – 19.11, 19.13 24.8
Hiperbóreos – 13.2 Ilitia – 17.1
Hiperteléato – 22.10 Ínaco (pai de Io) – 18.13
Hipocoonte (meio-irmão de Índia – 12.4
Tíndaro) – 1.4, 10.6, 14.6, Ino – 19.3, 23.8, 24.4, 26.1,
14.7, 15.1, 15.3, 15.4, 15.5, 26.4
15.6, 15.9, 19.7, 21.2 Io – 18.13
Hipócrates (filho de Árifron) Iónia – 2.1, 9.6
– 6.1 Íope (herói de Esparta) – 12.5
Hípola – 25.9 Irbo – 16.9
Hipólito (filho de Teseu) – 12.9 Iságoras (Ateniense) – 4.2
Hipóstenes (vencedor olímpico) Ísis – 22.13
– 13.9, 15.7 Isménias (de Tebas) – 9.8, 9.9
Hípotes (filho de Filas) – 13.4 Istmo (de Corinto) – 9.1, 11.8,
Hipsos – 24.8 21.6
Hireu (filho de Egeu) – 15.8 Istro (rio) – 19.11
Histaspes (pai de Dario) – Ítaca – 20.10
4.2 Itália – 3.1, 10.5, 12.5, 19.12,
Homero – 2.4, 3.8, 19.8, 20.6, 22.11
21.5, 21.9, 22.1, 24.11, Itome – 11.8
25.6, 26.7, 26.8 Jacinto (filho de Amiclas) – 1.3,
Horas – 18.10, 19.4, 19.5 10.1, 19.3, 19.4, 19.5
Iâmidas – 11.6, 12.8 Jasão – 24.7
187
Descrição da Grécia

Lás – 21.7, 24.6 Leónidas II (filho de Cleónimo)


Labotas (filho de Equéstrato; cf. – 6.7, 6.8, 6.9, 7.1
Leobotas) – 2.3, 2.4 Leónimo (de Crotona) – 19.12
Lacedémon – 1.2, 1.3, 13.8, Leóstenes – 6.1
18.6, 20.2 Leotíquides I – 4.3, 4.4, 5.6,
Lacedémon (cf. Esparta) – 11.1 7.9
Lacedemónia, Lacedemónios Leotíquides II (filho de Ágis III)
– passim – 8.7, 8.8, 8.9, 8.10
Lacónia – passim Lepreatas – 8.3, 8.5
Ladas (atleta olímpico) – 21.1 Lésche – 14.2, 15.8
Ladas (atleta olímpico de Égio) Lesbos – 2.1
– 21.1 Leto – 11.9, 13.5, 20.5
Lâmpon (de Egina) – 4.10 Leuce (ilha) – 19.11, 19.12,
Lância (fonte) – 21.2 19.13
Laodicenos – 16.8 Leucípides – 13.7, 16.1, 17.3
Lapíteo – 20.7 Leucipo (pai de Arsínoe) – 12.8,
Lápites – 20.7 18.11, 26.4
Larissa – 17.1 Leuctros – 6.1, 21.7, 26.4,
Lás (fundador de Lás) – 24.10 26.6, 26.7
Látria – 16.6 Líbia – 17.3, 18.3
Leandris (esposa de Anaxandro) Licas – 3.5, 3.6
– 14.5 Lícia – 18.13
Leas (filho de Hireu) – 15.8 Licímnio (irmão de Alcmena)
Leda – 13.8, 16.1 – 15.4
Léleges – 1.1 Licurgo (legislador) – 2.3, 2.4,
Lélex – 1.1, 12.5, 19.9, 20.2 2.5, 14.8, 16.6, 16.10,
Leobotas (cf. Labotas) – 2.3 18.2
Léon (filho do II Eurícrates) – Licurgo (filho de Prónax)
3.5, 3.9 – 18.12
Leónidas I (filho de Anaxân- Lídia, Lídios – 9.5, 16.8, 25.7
drides) – 3.9, 4.7, 4.8, 4.9, Lígdamis (pai de Artemísia)
5.1, 10.7, 12.9, 14.1 – 11.3
188
Pausânias

Limnas (povoação) - 2.6, 7.4, Megarenses – 4.6


16.9 Melânion (pai de Partenopeu)
Limneu – 16.7 – 12.9
Linceu – 13.1, 14.7 Menália – 11.7
Lisandro (filho de Aristócrito) – Membliaro - 1.7, 1.8
5.1, 5.3, 5.4, 6.7, 8.6, 8.10, Mémnon (herói homérico) –
9.1, 9.11, 11.5, 17.4, 18.3 3.8, 18.12
Lisandro (neto de Lisandro) Menelau – 1.5, 12.6, 14.6,
– 6.7 18.13, 18.16, 19.9, 22.2,
Lisístrato (general espartano) 22.10
– 8.5 Menesteu – 18.5
Lócride, Locros – 3.1, 9.9, 9.10, Menófanes (general de Mitrida-
19.12 tes) – 23.3, 23.4, 23.5
Macáon – 26.9, 26.10 Meras – 11.10, 11.11, 19.4
Macedónia, Macedónios – 6.5, Meríones (herói homérico)
6.8, 10.5, 24.6 – 3.8
Mãe dos deuses – 22.4 Mésis (filho de Hireu) – 15.8
Magnésia, Magnésios – 18.9, Mésoa – 16.9
18.14 Messa – 25.9
Magnetes (povo) – 22.4 Messeis (fonte) – 20.1
Málea (cabo) – 23.2, 25.2 Messénia, Messénios –1.4, 1.5,
Mantineia – 11.7 2.6, 3.1, 3.4, 3.5, 7.4, 7.5,
Maratona – 4.7 7.6, 11.8, 13.1, 13.2, 14.4,
Mardónio – 4.10, 11.3 15.10, 18.7, 20.6, 26.3,
Mário – 21.7, 22.8 26.4, 26.6, 26.7, 26.8, 26.9
Máron (combatente nas Termó- Mícale – 7.9
pilas) – 12.9 Migónio – 22.1, 22.2
Medos – 4.8, 11.3, 14.1, 16.6, Milcíades (pai de Címon) – 3.7,
16.8 4.7, 12.7
Medusa – 17.3, 18.11 Miles (filho de Lélex) – 1.1,
Megapentes (filho de Menelau) 12.5, 20.2
– 18.13, 19.9 Mileto – 12.10, 25.5
189
Descrição da Grécia

Minoa (promontório) – 23.11 Olímpia – 8.4, 8.5, 14.3, 17.6,


Minos (rei de Creta) – 2.4 18.7, 21.1
Minotauro – 18.11, 18.16 Olinto – 5.9
Mísia – 2.1 Opúncios – 19.12
Mitridates – 23.3, 23.5 Orestes – 1.5, 1.6, 2.1, 3.6, 3.7,
Mnasínoo – 18.13 11.10, 16.7, 19.9, 22.1
Morte (Thánatos) – 18.1 Orfeu – 13.2, 14.5, 20.5
Mouseîon – 6.6 Orgada (lugar da Ática) – 4.2,
Musas – 17.5, 19.5 4.5
Museu – 6.6 Oríatas – 24.4
Náiade – 25.2 Oríon (centauro) – 18.16
Náiade (fonte) – 25.4 Pálea – 22.6
Neoptólemo – 20.8 Palene – 18.3
Nereu – 21.9, 26.7 Paros (ilha) – 18.8
Nesso (gigante) – 18.12 Partenopeu (filho de Melânion)
Nestor – 26.8, 26.10 – 12.9
Nicandro (pai de Teopompo) – Pasífae (epíteto de Selene)
3.2, 7.5, 16.6 – 26.1
Nicandro (filho de Carilo) – 7.4 Patras (cidade) – 2.1
Nícias (escultor, filho de Nico- Patreu (filho de Préugenes)
demo) – 19.4 – 2.1
Nícocles (atleta) – 22.5 Pátroclo (general egípcio) – 6.4,
Nicodemo (pai de Nícias) 6.5
– 19.4 Pátroclo (companheiro de Aqui-
Nicomédia – 3.8 les) – 19.13, 24.10
Nicóstrato (filho de Menelau) – Pausânias (filho de Cleômbroto
18.13, 19.9 I) – 4.9, 4.10, 5.1, 8.2,
Ninfas – 17.3 14.1, 17.7, 17.8, 17.9, 18.1
Ninfeu (porto) – 23.2 Pausânias I (filho de Plistóanax)
Níobe – 4.1 – 5.1, 5.2, 5.4, 5.5, 5.6, 5.7,
Oileu – 19.12 9.11

190
Pausânias

Pefno – 26.2, 26.4 Pirro (Eácida) – 6.3, 25.1, 25.2,


Pelasgos – 20.5 26.7
Pelana (cidade) –1.4, 21.2, Pisandro (herói homérico) –
21.3, 26.2 3.8
Pelana (fonte) – 21.2 Pisandro (cunhado de Agesilau
Peleu – 18.12 II) – 9.6
Peloponeso – 1.6, 2.6, 3.4, 5.8, Pisístratos (tiranos de Atenas) –
7.6, 7.11, 9.1, 9.2, 13.2, 4.2, 7.8
21.6, 22.4, 22.6 Pítane, Pitaneus – 14.2, 16.9
Penélope – 12.1, 12.4, 13.6, Pítia – 1.5, 2.4, 4.4, 4.5, 11.7,
20.10, 20.11 19.12
Pêntilo (pai de Equelau) – 2.1 Platanistas (em Esparta) – 11.2,
Perieres (1º marido de Gorgó- 14.8, 14.10, 15.1, 20.8
fone) – 1.4, 11.11, 26.4 Platanistunte – 23.1
Pérgamo (filho de Neoptólemo) Plateias, Plateenses – 4.9, 4.10,
– 20.8 5.1, 7.10, 9.3, 11.7, 14.1,
Pérgamo (cidade) – 26.10 17.7
Persas – 4.2, 4.8, 9.4, 11.3, Plêuron – 13.8
11.7, 20.4 Plistarco (filho de Leónidas) –
Perséfone – 13.2, 18.8, 19.4, 4.9, 5.1
20.7 Plistóanax (filho de Pausânias)
Perseu – 1.4, 2.2, 17.3, 18.11, – 5.1
20.6 Plutão – 19.4
Phrúria – 12.8 Podalírio – 26.10
Pílades – 1.6 Poikíle (Lésche) – 15.8
Pilos – 26.8 Polemarco (assassino de Poli-
Píndaro – 25.2 doro) – 3.3
Pireu – 5.1 Poliantes (de Corinto) – 9.8
Pirítoo – 18.15, 24.11 Polibeia – 19.4
Pírrico (cidade) – 21.7, 25.2, Policáon (filho de Lélex) – 1.1
25.3, 25.4 Policlito (de Argos, escultor)
Pírrico (deus) – 25.2 – 18.8
191
Descrição da Grécia

Polidectes (filho de Êunomo) – Prónax (pai de Licurgo) – 18.12


7.2, 7.3 Protesilau – 4.6
Polidoro (filho de Alcâmenes) Proteu (do Egito) – 18.16
– 3.1, 3.3, 3.4, 11.10, 12.3 Psamatunte (porto de) – 25.4
Polixo – 19.9, 19.10 Pudor – 20.10, 20.11
Pólux – 12.8, 14.7, 18.14, 20.1, Queixada de Burro (promontó-
24.7 rio) – 22.10, 23.1
Poroselene – 25.7 Quílon – 16.4
Posídon – 15.7, 17.3, 18.10, Quimera – 25.6
21.5 Quíonis (atleta) – 14.3
altares, templos, santuários Quíron (centauro) – 18.12
Esparta – 11.9, 12.5, 14.2, Régio – 17.6
14.7; Terapne – 20.2 Rodes, Ródios – 9.8, 19.9,
epítetos 19.10
Asfálio – 11.9; Domatites – Rodo – 26.9
14.7; Geáoco – 20.2, 21.8; Roma, Romanos – 11.4, 23.5
Genétlio – 15.10; Hipocú- Salamina – 11.3, 16.6
rio – 14.2; Tenário – 12.5 Samos – 12.10
estátuas, imagens Sárdis – 9.5, 9.8
Amiclas – 19.3; Gítio – 21.8; Sébrio – 15.2
Málea – 23.2; Ténaro – 25.4 Sebro – 15.1, 15.2
Prax (neto de Pérgamo) -20.8 Selásia – 10.7
Praxídicas (deusas) – 22.2 Selene (Lua) – 21.6
Praxila (poeta) – 13.5 Seleuco – 16.8
Príamo – 9.4, 19.6, 26.5 Selinunte – 22.8
Presídios – 12.8 Sémele – 19.3, 24.3
Prêugenes (pai de Patreu) – 2.1 Serápis – 14.5, 22.13, 25.10
Prítanis (filho de Euriponte) Sesto – 9.12
– 7.2 Sicília – 16.4, 16.5
Procles (filho de Aristodemo) – Sícion – 6.9, 10.5
1.7, 1.8, 7.1 Side – 22.11
Proclidas – 7.1 Sileno – 25.2, 25.3
192
Pausânias

Simónides (poeta) – 8.2 Téleclo (filho de Arquelau) –


Sípilo (monte) – 22.4 2.6, 7.4, 15.10
Síria – 16.8 Télefo – 26.9, 26.10
Sirno – 26.10 Télis (pai de Brásidas) – 14.1
Skiás (edifício de Esparta) – Témeno (rei da Messénia) – 1.5
12.10, 12.11, 13.1 Ténaro (cabo) – 12.5, 21.7,
Sodamas (de Argos) – 9.8 25.4, 25.5, 25.7, 25.8, 25.9
Sol (Hélios) – 20.4, 26.1 Ténaro (herói) – 14.2
Sono (Hypnos) – 18.1 Téocles (pai de Crio) – 13.3
Soo (filho de Procles) – 7.1 Teodoro (de Samos) – 12.10
Susa – 9.5, 16.8 Teomélida (lugar em Esparta)
Taígete (mãe de Lacedémon) – – 14.2
1.2, 18.10, 20.2 Teopompo (filho de Nicandro)
Taígeto (monte) – 20.2, 20.3, – 3.2, 7.5, 16.6
20.4, 20.5, 20.7, 24.9 Teopompo (filho de Damasís-
Tálamas (cidade da Messénia) – trato) – 10.3
1.4, 21.7, 26.1, 26.2 Tera (ilha; cf. Caliste) – 1.8,
Táleto (santuário) – 20.4, 20.5 14.3, 15.6
Taltíbio – 12.7 Terapne – 14.9, 19.7, 19.9,
Tânagra – 11.8 20.1, 20.2
Tântalo – 22.4 Teras (tio de Procles e Euríste-
Tarento, Tarentinos – 10.5, 12.5 nes) – 1.7, 1.8, 15.7, 15.8
Táuride – 16.7, 16.11 Teras (lugar) – 20.5
Teáspis (pai de Farandates) Termodonte – 25.3
– 4.9 Termópilas – 4.7, 4.8, 5.5, 12.9,
Tebas, Tebanos – 5.3, 5.4, 5.5, 14.1
9.3, 9.4, 9.8, 9.10, 9.11, Tero (ama de Ares) – 19.8
9.12, 9.13, 10.3, 17.1 Terra – 11.9, 12.8
Tégea, Tegeatas – 3.5, 5.4, 5.6, Tersandro (pai de Tisâmeno)
5.8, 7.3, 7.10, 11.7, 11.10 – 15.6
Télamon – 19.13 Tersandro (de Cleonas) – 16.6

193
Descrição da Grécia

Teseu – 3.7, 12.9, 18.5, 18.11, Tisâmeno (antepassado de Anfí-


18.15, 18.16, 24.11 loco) – 15.8
Tesprotos – 18.5 Tissafernes (sátrapa da Lídia) –
Tessália, Tessálios – 6.1, 7.9, 9.6, 9.7
9.12, 20.6 Titraustes (sátrapa) – 9.7
Téstio (pai de Leda) – 13.8, Tlepólemo (rei de Argos) –
19.5 19.9, 19.10
Tétis – 14.4, 14.5, 21.9, 22.2 Tlesímenes (pai de Aulo) – 12.9
Teutras – 25.4 Tórnax – 10.8, 11.1
Teutrone – 21.7, 25.4 Trácia – 9.12, 13.2, 18.12,
Tíasa (rio) – 18.6 26.10
Tíasa (filha de Eurotas) – 18.6 Trasibulo – 5.1, 5.4
Tício – 18.15 Trasideu (de Élide) – 8.4, 8.5
Tideu – 18.12 Trinaso – 22.3
Tífon – 18.10 Tritões – 18.10, 18.15
Timócrates (de Rodes) – 9.8 Troia, Troianos – 4.7, 9.3, 12.6,
Timolau (de Corinto) – 9.8 13.5, 18.16, 22.2, 24.11
Timóteo (pai de Cónon) – 9.2 Túnica – 16.2, 16.4
Timóteo (músico) – 12.10 Túrio (gigante) – 18.11
Tíndaro (filho de Ébalo) – 1.4, Ulisses – 12.1, 12.4, 20.10,
1.5, 12.5, 13.1, 13.8, 15.11, 20.11, 24.11
16.2, 17.2, 17.3, 17.4, Vitória – 15.7, 17.4
18.11, 18.14, 20.9, 21.2, Xantipo (filho de Árifron) – 7.9
24.7, 24.10, 24.11 Xénias (de Élide) – 8.4
Tírea – 7.5 Xerxes I – 4.7, 4.8, 9.6, 11.3,
Tírides – 25.9 12.6
Tisâmeno (filho de Orestes) – Zárax – 21.7, 24.1, 24.2
1.5, 1.6 Zefírio (cabo) – 3.1
Tisâmeno (de Élide) – 11.6, Zéfiro – 19.5
11.7, 11.8, 11.9 Zetes – 18.15
Tisâmeno (filho de Tersandro) Zeus – 1.2, 2.4, 13.5, 18.10,
– 15.6 24.3
194
Pausânias

altares, templos, santuários – 17.6; Itómata – 26.6;


Ciras – 25.1; Corinto – 9.2; Messapeu – 20.3; Olímpico
Epidauro Limera – 23.10; – 9.2, 12.11, 14.5; Ploûsios
Esparta – 11.9, 12.9, 13.6, – 19.7; Salvador – 23.10;
13.8, 14.5, 17.4; Olímpia – Scótinas – 10.6; Tropeu –
8.3; Taígeto – 20.3; Terapne 12.9; Xénios – 11.11
– 19.7 estátuas, imagens
epítetos Amiclas – 19.3; Esparta –
Agoreu – 11.9; Ambúlio – 13.6; 12.11, 17.6; Leuctros – 26.6
Capotas – 22.1; Cosmêtas – Zeuxidamo (filho de Arqui-
17.4; Croceatas – 21.4; Euá- damo) – 7.6
nemos – 13.8; Fíxio – 17.9; Zeuxidamo (filho de Leotíqui-
Hicésio – 17.9; Hípato des) – 7.10

195
(Página deixada propositadamente em branco)
Pausânias é o nosso único testemunho de literatura
periegética e o autor de um relato precioso sobre a
Grécia da época de ocupação romana (séc. II d.C.).
A sua descrição é a de alguém que viajou e sintetiza o
que ‘viu’, com um olhar que não é só o de um turista
curioso, mas de um intelectual que dispõe de uma só-
lida formação cultural e de uma informação ampla,
em resultado de uma recolha criteriosa de todo o tipo
de fontes, orais e escritas.
Para com Pausânias mantemos em aberto uma
enorme dívida: a de ter salvado um lastro de mo-
numentos, de acontecimentos históricos, de figuras
e de tradições que, sem ele, se teriam em definitivo
apagado da memória dos homens.
OBRA PUBLICADA
COM A COORDENAÇÃO
CIENTÍFICA

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