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Rafael Borges Machado, matrícula n° 150074, turma A (manha)

Disciplina: Fundamentos de Filosofia


04 de agosto de 2021.

No mundo da Grécia antiga, o amor era representado por Eros, para


alguns, Eros seria um deus e para outros um gênio - entidade
intermediária entre os humanos e deuses. Nesse contexto, Platão
escreve uma das mais belas obras da filosofia, “O banquete”, que cria um
debate acerca das perguntas: O que é Eros? O que é o amor?
Primeiramente, é necessário saber que a obra é narrada através de
um personagem do texto, Apolodoro, que conta o que aconteceu há muito
tempo atrás em um banquete na casa de Agaton, a fim de comemorar a
vitória de um dos personagens em um concurso de retórica no dia
anterior. Nesse encontro, foi proposto que cada um realizasse uma
definição de Eros/amor e o elogiasse, dessa forma, seis personagens
exprimem suas ideias e discordam/concordam entre si.

O primeiro a se pronunciar é Fedro e diz, resumidamente, que o


amor é um deus, e quem ama se torna divino, como Eros. Esse Deus,
sendo ele o mais antigo, faz com que ao amarmos, nos divinizamos; e,
também, o amor produz uma força que nos leva a se sacrificarmos ao
objeto que amamos.
Segundo o conceito anterior, Fedro nos traz três exemplos desse
sacrifício por ideal amoroso, sendo o primeiro o de Alceste, filha de Pélias,
uma mulher que oferece e se sacrifica no lugar de seu marido e devido a
tamanha coragem, segundo a lenda, o herói Héracles a resgata de
Hades. Outro exemplo é Orfeu, filho de Eagro, que desce ao inferno para
resgatar sua amada (Eurídice), contudo, o resgate não é bem sucedido,
pois ela acaba olhando para atrás e falece, então, em seguida, Orfeu é
despedaçado pelas ninfas. O último exemplar é Aquiles, que morre em
batalha ao vingar seu falecido amado (Pátroclo), morto por Heitor,
enfrentando todo o exército troiano, e, posteriormente, acabou por matar
Heitor e em seguida morreu.
“E quanto a morrer por outro, só o consentem os que amam, não apenas os
homens, mas também as mulheres. [...] Assim, pois, eu afirmo que o Amor é dos
deuses o mais antigo, o mais honrado e o mais poderoso para a aquisição da
virtude e da felicidade entre os homens, tanto em sua vida como após sua morte.”
(Fedro, pág. 6)
Na mitologia grega, existiam duas Afrodite, uma, a mais velha, é a
filha de Urano que se chamava Urânia, a Celestial, e a outra, mais jovem,
filha de Zeus e Dione chamada de Pandêmia, a Popular. Então, seguindo
esse raciocínio, Pausânias, discordando de Fedro, afirma que há dois
Eros (amor), um bom e um ruim. O Eros bom, assim como Afrodite celeste
que era bela, é o amor pela alma e, portanto, não terminaria quando o
corpo morre. No sentido contrário, o Eros ruim, tal como a Afrodite popular
que era mais feia, é um amor mal-apanhado, pois ele morreria assim que
o corpo deixasse de ser belo.
“E é mau aquele amante popular, que ama o corpo mais que a alma; pois não é
ele constante, por amar um objeto que também não é constante. [...] Ao contrário,
o amante do caráter, que é bom, é constante por toda a vida, porque se fundiu
com o que é constante.” (Pausânias, pág.8)

Na sequência, Erixímaco, um médico, discorda de ambos que já


realizaram seus discursos anteriormente. Para ele, Eros não é apenas o
sentimento de uma pessoa pela outra, e sim é uma força que move todos
os seres - por eles se reproduzirem - e, também, é a força de
harmonização - uma arte - dos contrários na natureza, como o sadio e o
doente, o frio e o quente. Nesse sentido, tudo é Eros, todos somos
atravessados pelo amor.
Seguindo ainda, de acordo com Erixímaco, assim como na
Medicina, que é um objeto que harmoniza o corpo humano, e na Política,
que harmoniza/intermedeia a relação Estado e cidadão, o Eros também
é uma força erótica (leia-se: algo que provoca amor; do grego erotikós).
“A combinação em todos esses casos, assim como lá foi a medicina, aqui é a
música que estabelece, suscitando amor e concórdia entre uns e outros;”.
(Erixímaco, pág. 10)

O próximo a discursar é Aristófanes, comediante, meu preferido,


que relaciona o amor a uma teoria da evolução humana, o mito do
andrógino. Segundo esse mito, o ser humano, em sua origem, era
completo, tinham uma forma esférica (referência à forma da perfeição
pelos gregos), 4 braços, 4 pernas e duas cabeças. Havia, também, 3
gêneros que eram descendentes do sol, da terra e da Lua,
respectivamente, o primeiro era o Andros (masculino), o segundo se
chamava Gynos (feminino) e o último era Andróginos (metade homem,
metade mulher). Então, por serem completos, se sentiam poderosos, e
tentaram escalar o monte Olimpo a fim de roubar o trono dos deuses.
Contudo, Zeus e os demais deuses decidiram que, apesar da
afronta, não podiam matá-los, afinal, a honra e os templos que lhes
vinham dos homens desapareceriam. Desse modo, Zeus impôs uma
punição e os cortou, através dos seus raios, pela metade, e ainda os
dispersou pela Terra.
Nesse sentido, a partir desse momento cada metade fica
procurando pela sua outra metade desesperadamente, e muitas vezes,
elas se encontram, outras até chegam a se verem, mas não se encaixam.
E, finalmente, Aristófanes nos revela que Eros seria a carência
fundamental originária em busca da união com sua outra metade, e esse
sentimento, que é como um impulso erótico, nos completaria.
Por último, essa fissura, mesmo encontrando a outra metade,
sendo feliz e tendo o amor como guia, nunca se preencheria. Pode-se
considerar isso, na minha visão, como um aviso constante que fala sobre
a humildade, para que não nos coloquemos acima do divino e/ou da
natureza, porque caso tentarmos novamente seremos punidos, dividindo-
nos novamente.
“Em primeiro lugar, três eram os gêneros da humanidade, não dois como agora,
o masculino e o feminino, mas também havia a mais um terceiro, comum a estes
dois, do qual resta agora um nome, desaparecida a coisa; andrógino era então um
gênero distinto, tanto na forma como no nome comum aos dois, ao masculino e
ao feminino” [...] Eis por que eram três os gêneros, e tal a sua constituição,
porque o masculino de início era descendente do sol, o feminino da terra, e o que
tinha de ambos era da lua, pois também a lua tem de ambos; [...] que é assim que
nossa raça se tornaria feliz, se plenamente realizássemos o amor, e o seu próprio
amado cada um encontrasse, tornado à sua primitiva natureza.” (Aristófanes,
pág. 11 e 13)

De acordo com o anfitrião Agatão, contrariando Fedro, Eros é o


deus mais jovem, também, é o ser mais delicado. Dessa forma, ele
consegue penetrar de maneira imperceptível na alma, tanto de humanos
quanto de deuses, e quando menos se espera o ser já está apaixonado.
O amor, sendo o mais jovem, é muito belo, e devido a isso nada o atinge.
Logo, ninguém pode fazer oposição ao amor, nem mesmo o poderoso e
corajoso deus da guerra Ares.
“Digo eu então que de todos os deuses, que são felizes, é o Amor, se é lícito dizê-
lo sem incorrer em vingança, o mais feliz, porque é o mais belo deles e o melhor.
[...] Nos costumes, nas almas de deuses e de homens ele fez sua morada, e ainda,
não indistinta-mente em todas as almas, mas da que encontre com um costume
rude ele se afasta, e na que o tenha delicado ele habita. [...] Com efeito, a Amor
não pega Ares, mas Amor a Ares - o de Afro-dite, segundo a lenda - e é mais
forte o que pega do que é pegado: dominando assim o mais corajoso de todos,
seria então ele o mais corajoso.” (Agatão, pág. 14 e 15)

Em seguida, Sócrates, inicia sua fala - a mais esperada e completa


- afirmando que não irá fazer um discurso retórico, e sim narrar um
diálogo que ele teve com uma mulher que lhe ensinou as coisas sobre o
amor, essa mulher se chama Diotima, de Mantinéia, uma sábia
sacerdotisa nas questões do amor.
Primeiramente, segundo ele, Eros não é um deus, mas é um gênio
(daemon socrático), uma entidade intermediadora entre os deuses e os
seres humanos. Eros, segundo o pensamento socrático, é filho de
Recurso e Pobreza, e devido a isso é pobre, duro, seco, descalço e sem
lar, como sua mãe, e, também, é cheio de recurso, corajoso, decidido,
energético, sofista, feiticeiro e ávido de sabedoria, assim como seu pai.
Dessa forma, Eros, carente e astuto, ora vivo, ora morto, é uma
força que busca a plenitude, e é ele que coloca e desperta nos seres
humanos o desejo de imortalidade. Pode-se dizer que esse desejo é
dividido em duas vertentes, a imortalidade física, concedida pela
transmissão de seus genes através de suas crias, e o desejo pelo
conhecimento, a fim de que se ascenda ao plano das ideias, dar-se à luz
às ideias. Por último, Eros é definido, também, como um impulso erótico
que nos move ao conhecimento das ideias, da filosofia, da beleza.
Ademais, a busca da beleza começa pela admiração dos belos
corpos, e devido ao impulso anteriormente descrito, não paramos por aí.
Em seguida, se admira as qualidades da alma, da virtude.
Posteriormente, é admirado a beleza das leis e de outras ideias, a fim de
que, por último, se possa chegar ao próprio belo. Em suma, essa busca
é incessante, então, Eros é um desejo, uma carência, pelo conhecimento,
pela verdadeira beleza.
Portanto, pode-se afirmar, também, que o amor é uma
necessidade, um desejo pelo o que é bom, uma carência, por aquilo que
não é de nossa posse atual ou futura.
“- Será então - continuou - que é tão simples assim, dizer que os homens amam
o bem?
- Sim - disse-lhe.
- E então? Não se deve acrescentar que é ter consigo o bem que eles amam?
- Deve-se.
- E sem dúvida - continuou - não apenas ter, mas sempre ter?
- Também isso se deve acrescentar.
- Em resumo então - disse ela - é o amor amor de consigo ter sempre o bem.
- Certíssimo - afirmei-lhe - o que dizes.” (Diálogo entre Sócrates e Diotima, pág.
23)

Por último, inesperado e bêbado, Alcibíades chega como ponto final


na longa conversa sobre o amor. Primeiramente, ele rompe com o acordo
prévio de falar sobre Eros, e, então, conduz seu discurso a Sócrates,
enaltecendo-o e dizendo que, por mais feio e horroroso que seja o exterior
de Sócrates, seu interior representa a divindade de sua alma. Feio no
exterior e divino no interior, Alcibíades cria, então, uma contradição.
Essa contradição, ao meu ver, é proposital e resgata a própria
concepção contraditória de Eros de Sócrates (nem Deus, nem humano;
pobre e provido de recursos), atribuindo-o essa característica de
intermediário entre sua alma e seu corpo, o tornando um ser especial.

“Afirmo eu então que é ele muito semelhante a esses silenos coloca-dos nas
oficinas dos estatuários, que os artistas representam com um pifre ou uma flauta,
os quais, abertos ao meio, vê-se que têm em seu interior estatue-tas de deuses.
Por outro lado, digo também que ele se assemelha ao sátiro Mársias.”
(Alcibíades, pág. 29)

O meu discurso favorito foi o de Aristófanes, pois achei o mais


emblemático. Ele conta a história do Mito do Andrógino, que diz que os
seres humanos, na antiguidade, eram mais potentes, mais fortes, mais
belos (aspecto esférico se referindo a forma geométrica perfeita pelos
gregos) e possuíam membros em dobro, como duas pernas, dois braços
e duas cabeças. Essas criaturas, por serem fortes, se sentiram potentes
o suficiente para desafiar os deuses, e no final, acabaram sendo divididos
no meio pelos deuses. Na minha visão, achei esse mito perfeito. Essa
prepotência humana em achar que consegue/conseguirá dominar o
mundo é desastrosa, pois, assim como no mito, os deuses/natureza se
encarregará de nos punir, e essa punição poderá dar fim à humanidade.
Ainda nesse discurso, acredito, assim como o autor, que possuíamos
almas gêmeas – no plural - e nosso sentido nesse mundo é encontrá-las,
para que uma delas você ache e tenha a máxima felicidade e amor.
Contudo, penso ainda, que é plenamente possível de obter a felicidade e
outros bons sentimentos sem sua alma gêmea, em níveis menores, é
claro.

Portanto, é fulcral salientar que essa obra foi de extrema


importância para mim, porque me permitiu questionar a mim mesmo
sobre qual é a minha concepção de amor. Assim como dito pelos autores
anteriormente, eu nunca tive a preocupação de me questionar o que seria
o amor, qual a sua importância, o que ele fazia. Nesse sentido, pude
concordar com ideias de alguns desses, assim como discordar de outras,
e formular, finalmente, um apanhado geral que faça sentido para mim
sobre as questões amorosas.

Edição disponível em: <http://livros01.livrosgratis.com.br/cv000048.pdf>

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