Avaliação II - FL211 - HISTÓRIA DA FILOSOFIA ANTIGA 1 - Prof.
Anastácio Borges - Aluno:
Bruno Luize Oliveira Sarabia - Filosofia: bacharelado - Primeiro período - 25/10/2022
1) Para o personagem Sócrates existe conhecimento verdadeiro (episteme) e o
conhecimento aparente (doxa). Quais as suas características, as diferenças entre eles e sobre o quê eles se referem? Resposta: O livro V da “República” de Platão aborda (entre outros assuntos) a relação entre ideal e real, bem como explora a definição de filósofo. Os personagens Sócrates e Glauco passam a discutir quem seria o verdadeiro filósofo (a partir de 475-d). O filósofo é aquele que busca provar todos os conhecimentos, estudando com alegria e sem manifestar fastio (apetite insaciável). Ao contrário, quem não revela amor ao estudo (ignorante) jamais poderá ser chamado de filósofo. Afinal, possui aversão ao conhecimento e não será capaz de buscar aquilo de que sente repugnância. Ademais, não é qualquer tipo de saber que busca os amantes da sabedoria. Desse modo, Glauco propôs a Sócrates que seriam também filósofos os amantes de espetáculos (sentem prazer em aprender qualquer coisa) e os esquisitos (que se deixam levar pelo ouvido). Porém, uma distinção precisa ser feita. Não é qualquer saber buscado pelos filósofos. De modo claro: o verdadeiro filósofo é aquele que se satisfaz em contemplar a verdade (que cultiva o conhecimento). A partir desse momento, é necessário distinguir opinião (doxa), ignorância e conhecimento (episteme) para saber de que trata o filósofo. Em primeiro plano, farei as devidas distinções. São elas: 1) Episteme: conhecimento que supera a aparência (o sensível múltiplo), em direção a essência (eidos - unidade). Refere-se ao ser puro (é infalível). Cultivada pelos amantes da sabedoria, os filósofos. 2) Ignorância: conhecimento de nada (por não sentir deficiência, não busca conhecer). Refere-se ao não-ser absoluto. Diz respeito aos humanos que sentem aversão ao conhecimento. 3) Opinião: conhecimento que se mantém na aparência. Refere-se ao intermediário entre o ser puro (episteme) e o não-ser absoluto (ignorância) - capaz de erro. Configura-se à parte, faculade equidistante do conhecimento e da ignorância. Menos obscura que a ignorância, mas não tão clara quanto o conhecimento. Relaciona-se com os amantes de espetáculos, amigos das artes e homens práticos. Com isso, apresento dois exemplos para esclarecer o assunto. São eles: 1) Beleza: em termos de aparência, o belo aparece sempre relacionado ao feio, ou seja, surge na combinação. Esses opostos parecem múltiplos (misturados) nos corpos e ações (manifestações sensíveis). Por isso, o conhecimento aparente (opinião) nos levará a crer que belo/feio são múltiplos. Contudo, na verdade, beleza e feiura constituem unidades. O conhecimento verdadeiro (episteme) nos revela a existência do belo em si (da unidade do belo, sem necessidade do seu contrário). Ademais, somente pela existência do belo em si é que as manifestações do belo se tornam possíveis. Por exemplo, um corpo belo participa da beleza em si (não seria possível sem ela). Logo, o conhecimento aparente é amigo da opinião. Já o conhecimento verdadeiro é amigo da sabedoria (filosofia). 2) Sono e vigília: dizemos que alguém está dormindo a partir do momento que toma as imagens fabricadas na mente como a realidade. Nesse sentido, existe uma analogia possível com conhecimento do belo. Uma pessoa que admite a existência das coisas belas (corpos/ações), mas rejeita o belo em si e seu ensino vive sonhado. De modo simples: o amante das belas vozes, formas e cores toma a imagem da beleza (sua aparência) pela própria coisa com a qual ela se parece (a beleza em si). Podemos afirmar que vive sonhando aquele que vive somente através da opinião (conhecimento aparente). De modo oposto, está desperto aquele que supera a aparência e consegue enxergar a unidade do belo (conhecimento verdadeiro) sem jamais confundir essência e aparência. 2) O que é uma dynamis? Dê exemplo de dynamis. Qual a utilidade do conceito de dynamis? Viu o uso desse conceito em algum outro diálogo de Platão? Resposta: No livro V de “A República” de Platão, em meio a discussão entre Sócrates e Glauco sobre a distinção entre conhecimento e opinião, surge o conceito de “dynamis”. Ele é o seguinte: sinônimo de faculdade (habilidade). Ou seja, aquilo através do qual realizamos algo (um meio para um fim). É apreendida por sua direção (seu sentido) e seus efeitos (resultados produzidos). Por exemplo, a visão e audição seriam faculdades. Pois, é através da visão que enxergamos, bem como com a audição ouvimos. Por outro lado, no dicionário da língua grega “dynamis” corresponde a “força”, “potência” - aquilo que possibilita poder o que podemos. Nesse sentido, o conhecimento seria a faculdade mais poderosa. Leva em consideração a maneira de atuar e os resultados produzidos, não considera a aparência (forma, cor). Isto é, sempre aponta para o objeto que lhe acompanha. Sua utilidade consiste em permitir falar sobre aquilo que não pode ser acessado diretamente. Assim fala-se de algo como potência a partir de seus efeitos (resultados), mesmo sem falar diretamente compreendemos seu sentido e resultado. De outro modo: a habilidade do conhecimento nos permite conhecer (superando a opinião e a ignorância, dynamis menores em poder). Portanto, só através dessa potência podemos filosofar (superar a aparência do âmbito da opinião em direção ao conhecimento da essência). Esse conceito também pode ser encontrado no diálogo “O Banquete” de Platão. No contexto da obra, existe um festa (simpósio) realizado na casa de Agatão para celebrar sua vitória no concurso de tragédias. Para tanto, por sugestão de Erixímaco, decidem elaborar cada participante um discurso em louvor ao Amor (Eros). Em algumas passagens, os palestrantes tratam do poder de Eros (como Dynamis, potência). Por exemplo, o discurso de Diotima (relatado por Sócrates). Diz ela que: a filosofia significa investigação, busca pelo conhecimento verdadeiro (episteme). Porém, ao lado desse impulso meramente intelectual, há uma parte afetiva. A própria palavra “filosofia” denota “amor pela sabedoria”. De modo claro: aquilo que impulsiona e motiva o filosofar não é o conhecimento, mas sim o desejo (amor) de conhecer. Por isso, Eros, em alguma medida, faz parte de todo movimento filosófico (sua motivação). A partir da natureza mítica de Eros, conclui-se que seria forçado que ele fosse filósofo. Ele foi concebido no dia do nascimento de Afrodite - por isso faz parte do séquito dessa deusa. Filho de Poros (o deus da riqueza, recurso) e Penúria (deusa da pobreza, miséria), possui uma natureza dupla. Sempre está a meio caminho da sabedoria e da ignorância, da abundância e da falta. Afinal, Eros não é belo, nem bom. Mas é amor do belo e do bom. De modo análogo ao filósofo, ele também busca investigar seu objeto de desejo, sem jamais alcançá-lo, posto que segue sempre procurando. Logo, o motor da atividade filosófica é a força (dynamis) de Eros. Outro exemplo é o discurso de Aristófanes. Ele inicia dizendo que os homens não percebem o tamanho poder de Eros. Caso contrário, eles esgueriam belíssimos altares e lhe prestaram as melhores oferendas. Para explicar esse fato, recorre ao mito do andrógeno. Para Aristófanes, a natureza humana primitiva é muito diferente da atual. No começo, havia três tipos de criaturas humanas: masculinas, femininas e andróginas. Todo humano era um duplo (duas cabeças, quatro braços e pernas). Todos eram geometricamente redondos e fortes, além de soberbos. Justamente por essa força, em algum momento, decidiram se revoltar contra os deuses. Assim, Zeus decidiu cortá-las ao meio em forma de punição. Das criaturas masculinas, surgem os homens que amam seus pares. Das femininas, as mulheres que são amantes de mulheres. Dos andrógenos, a relação heterosexual. Em todo caso, o Eros é a força que busca reconstruir uma totalidade perdida. A ideia de buscar a sua “metade da laranja” deriva dessa concepção (cada pessoa é um complemento de outra). Logo, a influência de Eros em nossas vidas é gigante. Porque o tempo todo buscamos a parte que irá nos completar, já que nos encontramos sozinhos e desamparados. Sendo o amor uma cura de uma natureza fragmentada (a “dynamis” que nos impulsiona a isso).