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AVALIAÇÃO FINAL

PERSÉFONE: DE DONZELA À RAINHA

UMA JORNADA DE TRANSFORMAÇÃO E EMPODERAMENTO

Kahleen Ariel Ribeiro Mello

Aluna do Curso de Letras (Português - Latim)

DRE N°118017957

Trabalho entregue ao Prof. Mestre


Vinicius Francisco Chichurra, na
disciplina Grego Genérico II.

Faculdade de Letras

Rio de Janeiro, 1º semestre de 2018


Sumário
1. Introdução 4

2. O Mito 5

2.1 – Análise do Mito 9

3. Símbolos e Atributos da Deusa e Seus Significados 15

3.1 – Atributos: 15

3.2 – Plantas e Animais: 18

3.3 – Outros Símbolos: 21

4. O Culto Antigo da Deusa 24

4.1 – Elêusis 24

4.2 – Culto à Perséfone e Hades 26

4.3 – Hino Órfico 29 à Perséfone 27

5. Perséfone e seu Culto na Era Moderna 29

5.1 – Culto Moderno 33

5.2 – Relatos de Devotos 34

6. Conclusão 49

7. Agradecimentos 50

8. Referências 51

8.1– Referências Digitais: 51


Ἡ θεά καλή καί αγαθή εστίν

(A deusa bela e boa é)

"Se você está andando na escuridão,

não tente fazer o sol nascer por auto-sacrifício,

mas espere em confiança pela aurora,

aproveite os prazeres da noite enquanto isso."

Aleister Crowley
1. Introdução
O trabalho aqui apresentado tem como objetivo usar a figura mítica da deusa helênica
Perséfone em um estudo que explica os arquétipos de transformação e empoderamento, para
que ao final possamos chegar numa conclusão a respeito da ligação da deusa grega com tais
atributos que são muito creditados a ela.

Perséfone é a deusa da primavera e das flores, mas também é a Rainha do Submundo


e dos mortos. Através desse aspecto bipolar de uma deusa que transita entre dois polos
completamente distintos, é pretendido averiguar a veracidade dos atributos de deusa da
transformação e empoderamento pessoal com análise de seu mito, seus símbolos, suas esferas
de domínios, os cultos – moderno e antigo –, a visão moderna dela, relatos de devotos e
escritos de estudiosos.
2. O Mito
Para entender o que será tratado no estudo apresentado, é importante conhecer a
história que cerca essa deusa tão interessante e pouco abordada, seja na cultura pop como na
própria mitologia. Segue abaixo uma adaptação minha do mito de Perséfone, vale ressaltar
que é de uma versão diferente da mais corrente.

A concepção de Perséfone foi algo que não estava nos planos de Deméter, a deusa da
agricultura e da fertilidade. Ela estava muito bem criando plantações e cuidando da safra dos
homens, porém, foi durante esse período que Zeus divorciou-se de Têmis e começou a
perseguir a deusa dos grãos para tomá-la como esposa. Deméter tentou resistir e fugir na
forma de serpente, mas seu irmão também toma a forma do animal e a possui.

Um tempo depois nasce Perséfone, que até então


carregava o nome “Kóre”, (em grego Κόρη – Kórē, significa
jovem, donzela), bela e jovem. Seus cabelos eram loiros e
longos como os da mãe, os olhos eram azul-celeste como os
do pai e a pele alva; algumas versões apontam como tendo
cabelo negros como o ébano. A jovem por um tempo foi
criada no Olimpo, mas devido aos avanços de diversos deuses
sobre a pequena flor de Deméter, a deusa dos grãos, a levou
para ser criada na terra onde poderia tê-la sempre próxima de
si. Deméter, além de Kóre, teve mais três filhos divinos, sendo
um deles Pluto (deus das riquezas) advindo da união da deusa
com Jasão, o herói argonauta, os outros serão mencionados mais adiante. Porém, mesmo com
quatro filhos divinos, Deméter sempre favoritou a bela Kóre, cuidando tanto da pequena
deusa que chegava a ser superprotetora. Ela ensinava, auxiliava e tomava as escolhas que
considerava sadias à filha que tanto amava.

Por muito tempo a criação da Kóre foi recheada de paz e tranquilidade. Kóre estava
cercada da companhia de um séquito de ninfas e – frequentemente – de suas irmãs, Ártemis
(deusa da Lua, da Caça e das Virgens) e Athena (deusa da Sabedoria, da Guerra justa e do
Artesanato). Por não ter tanto contato com o sexo oposto, Kóre começava a verter-se à
castidade que era um atributo forte de suas duas irmãs. Isso, para a sua infelicidade, deixava
uma deusa irritada: Afrodite, senhora da beleza e do amor.
Depois que a Titanomaquia terminou, os deuses venceram seus antecessores e os
expulsaram para o fundo do Tártaro. Porém, novos inimigos erguiam-se contra os deuses. Os
gigantes eram Tífon, Briareu, Encélado e muitos outros; monstruosas criaturas de poder
destrutivo imenso que quase foram a ruína dos deuses, mas foram sobrepujados e
arremessados dentro do Etna onde até hoje se debatem na tentativa de escapar, tais sacudidas
na ilha causam terremotos e a respiração de todos causava a erupção do vulcão, assim
chamada pelos homens.

Tudo isso ocorria acima da terra, acima dos domínios fúnebres de Hades, deus dos
mortos e Rei do Submundo, que ficou preocupado com a queda dos monstros que sacudia a
terra botando todo o seu reino em perigo, pois seria exposto a luz solar. Por conta disso,
tomou sua carruagem negra e com seus cavalos rumou às terras superiores a fim de averiguar
a região para verificar a extensão dos danos. Foi aí que do alto do Monte Eryx a deusa do
amor começou a observar o funesto deus e, brincando com o filho Eros (o deus do amor
carnal e do desejo), falou:

– Filho amado, use suas flechas invencíveis que sobrepujam todos, até Zeus, e finque
uma delas no peito do Regente Ctônico. Por que ele pode ser o único a escapar de nosso
poder? Aumente nossos domínios para que não
sejamos mais desprezados, como somos pelos que se
ausentam de viver o amor e a paixão. Se teu interesse
é o mesmo que o meu, junte-nos num só e atire sua
seta no peito dele.

Eros tomou sua aljava e arco pegando a flecha


mais afiada e dourada, retesou aquele e mirando no
peito de Hades disparou a seta. Ela acertou o coração
solitário do deus e o amor havia de ali nascer. Durante
a sua passagem na terra, ele encontrou a jovem deusa
colhendo flores de jasmim e lírios, próxima ao rio
Céfiso no vale Ena onde a primavera era perpétua, o
efeito da flecha do Erote acendeu e Hades
apaixonou-se por Kóre. Ele foi até ela e a cortejou convidando-a para ir junto dele aos seus
domínios subterrâneos, a jovem tranquilamente aceitou o convite e subindo na carruagem
negra foi levada aos reinos inferiores do deus. Lá ela percebeu que seu poder de trazer a vida
à terra também se manifestava naquele sombrio lugar, durante todo o passeio ela sentia que
aquelas terras inóspitas podiam ter vida, pois a vida e a morte andavam lado a lado.

Antes de voltar aos bosques onde foi encontrada, Hades ofereceu à Kóre uma romã
dos jardins de seu castelo, pois ele já sabia do intento da deusa em querer ajudar e disse que a
romã era a chave para sua liberdade e escolha pessoal. A donzela divina aceitou e comeu
algumas sementes.

Enquanto isso, na terra, Deméter estava enlouquecida atrás da filha. Triste, devastada,
enlutada e desligada de suas tarefas como deusa. Ela buscou ajuda com deuses Hécate e
Hélio, pois esta iluminou sua busca nas noites sombrias e fora o outro que contara do
ocorrido. A busca de Deméter pela filha havia começado com o destino, agora, definido. Ela
caminhou pelo mundo inteiro e depois de um bom tempo parou e sentou-se sobre uma rocha
permanecendo ali por nove dias e nove noites, triste e exausta. Celeus passava por ali com
sua filha que vendo Deméter com outras deusas (transfiguradas em velhas senhoras) correu
até ela dizendo “Mãe, porque fica aqui sozinha na rocha?” Ouvir alguém chamá-la de mãe
aqueceu seu coração. Celeus convidou a deusa para seu palácio em Elêusis, porém a Senhora
dos Grãos recusou o convite que foi refeito ao que pai e filha acabaram por chorar com a
Deméter.

Vendo a situação chorosa, ela terminou por aceitar o gesto de compaixão e foi guiada
para ao palácio do homem. No caminho, o homem que levava uma carga em suas costas
contou sobre o filho recém-nascido que andava doente, ouvindo isso colheu algumas
papoulas antes de entrar na casa. Metanira, esposa de Celeus, recebeu a deusa e esta foi até a
criança beijando-lhe os lábios, o que lhe trouxe lividez e um novo vigor. Eles mantiveram a
deusa muito bem recepcionada durante um tempo, enquanto a deusa cuidava do filho do
casal, Demofonte. Ela o alimentava com leite misturado com suco de papoula (outras versões
ela usa a própria bebida dos deuses, néctar). Até que certa noite, Metanira encontrou Deméter
untando o filho em óleo de ambrósia e o pondo dentro da lareira. A mãe gritou com a velha
senhora retirando o filho das chamas, o que irritou a deusa que assumiu sua verdadeira forma
e dizia:

– Mortal idiota! Seu amor cego pelo teu filho o privou dos melhores presentes. Eu ia
torna-lo imortal e você se meteu no processo, agora ele será apenas um grande herói – a
comoção trouxe Triptólemo, filho mais velho do casal, e os demais para o quarto do bebê. Ao
entender tudo o que acontecia ali, o garoto que vinha ajudando na busca de Deméter,
intercedeu pela mãe. – Pelo menos, Triptólemo é sensato e há de cumprir uma missão dada
por mim. Ensinará os homens o uso do arado, e também sobre os tesouros que o cultivo da
terra podem trazer. Não esquecerei de te recompensar, mas antes tenho que achar minha filha
– dizendo isso, ela partiu em sua busca.

Durante o tempo que andou ignorando a terra, o mundo morria e aquilo que nela
habitava enfraquecia. Acabou sendo violada por Poseidon e dele nasceu os gêmeos, Arion – o
cavalo mais veloz do mundo – e Despina – a deusa da neve e da geada. Esta ficou desolada
pelo abandono da mãe e do pai, acabando sendo criada por um titã de nome Anitos que lhe
deu seu nome. Despina com rancor de ambos os pais, destruía toda a vegetação criada pela
mãe e congelava qualquer fonte de água, pois lembrava do pai. Deméter andou pelo mundo
mais uma vez, encontrou-se com uma ninfa que contou a ela o que acontecera e como Kóre
havia se tornado soberana do reino dos mortos, aquilo chocou a deusa de tal forma que ela
não tinha palavras.

Quando reuniu informações suficientes foi até Zeus para que ele tomasse uma atitude.
E qual foi seu espanto ao descobrir que o próprio pai de sua filha e seu irmão sabia do que
estava acontecendo. Deméter ficou furiosa e mandou que ele concertasse aquela situação ou
ela nunca mais iria fazer a terra ser fértil novamente. Zeus, que logo ficou sem ter para onde
ir, convocou Hermes para que ele fosse aos domínios sombrios de Hades para trazer Kóre de
volta, desde que ela não houvesse comido nada dos reinos inferiores. Que pena para a doce
inocência deles, pois ela já havia provado da romã.

Chegando no mundo inferior, Hermes foi ao castelo do Zeus Ctônico, Hades, e disse
para que havia ido àquele local. Hades chamou por Kóre que estava diferente aos olhos de
Hermes, que fora um dos deuses que tentou desposá-la. Ela estava mais bela, mais radiante,
mais poderosa. Hermes explicou a situação e Kóre disse que iria, mas que não poderia ficar
para sempre já que havia não só comido a romã, como também queria continuar naquele
lugar onde agora ela era rainha. O deus dos mensageiros foi até Zeus e Deméter, que logo se
desesperou pela atitude da filha mediante o que Hermes contara. Junto de todo o Olimpo com
Kóre e Hades inclusos, Zeus chegou ao acordo de que a filha ficaria três meses com o – agora
– marido e o resto ficaria com Deméter (algumas versões dizem que seriam seis meses com
Deméter e seis com Hades, mas essa é uma versão mais tardia do mito; há também uma
versão na qual a própria Perséfone oferece a solução para o conflito e não pai, Zeus) pela
terra. E Zeus ainda proferiu que Kóre quando descesse aos domínios ctônicos, não mais
carregaria tal inocente nome e, sim, seria chamada de Perséfone (Περσεφόνη), “Aquela que
destrói (a luz) ”.

Depois disso, Deméter ainda voltou à casa de Celeus para ensinar Triptólemo e
mandou que fundassem um templo no monte acima das marulhas de Cálidon. Lá a própria
deusa ensinou os mistérios e ritos à família de Celeus e aos eleusinos, tal iniciação viria mais
tarde ser conhecida como os famosos Mistérios de Elêusis.

Na versão mais corrente do mito, Kóre é raptada pelo deus psicopompo e feita
prisioneira dele até que houve a intervenção de Zeus por meio de Hermes que foi busca-la,
sendo que antes a jovem acabou por comer três (variando até seis) sementes de romã dos
jardins de Hades, ficando assim eternamente ligada ao local e ganhando seu novo nome.

2.1 – Análise do Mito


De pronto já podemos traçar um paralelo do mito de Perséfone com os ciclos de
passagem da natureza. Uma vez que ela é a personificação da vida, sendo tratada numa
passagem de seu hino órfico como “puro rebento de Démeter” (veremos isso mais adiante na
parte quatro) o que denota sua ligação com esse ato das sementes romperem a si próprias e a
terra para crescerem como as demais plantas, uma analogia também de liberdade. Uma
possível comparação da deusa mediante o que foi dito anteriormente, é de que ela seria a
figura da semente em si que é posta sob o solo, que poderíamos dizer ser o próprio
submundo, para depois voltar a superfície em toda sua beleza e apogeu, ou seja, passando por
uma transformação.

Quando Afrodite incita Eros contra Hades, podemos imaginar que a ação pudesse ser
considerada um ato de tornar um solo antes infértil em um apto a sustentar a vida, pois Hades
seria as terras inóspitas e sem vida recebendo de Eros a força telúrica do amor (nesse caso, a
vitalidade), que pode ser considerada vinda Afrodite, uma vez que antes de ser deusa do
amor, ela também era cultuada como senhora da vida e da fertilidade. Aqui traçamos um
paralelo com um conceito de equilíbrio do Yin-Yang, em que um não existe sem o outro e
dentro de cada um existe um pouco daquele. Ou seja, se na terra havia a transição da vida
para morte, por que no submundo não haveria a passagem da morte para vida?

É aqui que Perséfone (vou trata-la dessa forma por conveniência social do nome mais
conhecido) entra na história. Ela é a deusa da primavera, das flores, frutos e perfumes,
inicialmente. O convite de Hades para levá-la ao submundo personifica a aceitação da parcela
faltante de algo em seu reino, que não respeitava esse equilíbrio comum do universo. Trazê-la
aos domínios ctônicos representava levar a vida ao local, que segundo Homero na Ilíada, era
podre, imundo e fétido. Ao aceitar o convite, Perséfone toma a primeira escolha importante
de sua vida, uma escolha que pode ser ou não carregada de rebeldia, mas que sem sombra de
dúvida representava o início de sua jornada pessoal de autoconhecimento. Isso traria à deusa
a liberdade de todos os estigmas e padrões aos quais ela estava imposta anteriormente pela
figura superprotetora da mãe.

Lá, como é relatado na versão do mito apresentada, Perséfone entende que seu poder
de fazer a vida crescer seria muito útil naquele lugar, pois somente através de seu poder que o
renascimento das almas seria possível. Muitos gregos acreditavam que para renascer
precisava-se da permissão de Perséfone, assim as almas passariam pela deusa Lete, que
cuidava do rio ctônico homônimo, para lavarem suas memórias da vida antiga para viver uma
nova experiência do zero.

Entrando na figura de Deméter agora, tem que se entender o que ela representa além
do fato de ser a deusa da agricultura. Ela, arquetipicamente falando, se mostra como a figura
da Mãe. Aquela que gesta, concebe, cuida, nutre e ensina. Mas é possível notar no mito que a
deusa possui sobre a filha uma obsessão doentia, privando a garota de viver uma vida livre,
uma vez que sempre tomava as decisões por ela e a mantinha numa zona de ignorância
perigosa para ela própria, Deméter. Ela também é responsável pela saúde da terra, pela
fertilidade do solo a ser cultivado e de seus resultados. Deméter é a própria terra que sustenta
a vida humana.

Ao ter sua filha “raptada”, Deméter ignora suas tarefas de deusa terrena e parte em
busca de Perséfone, sendo ela a deusa da fertilidade e do sustento da vida, sua partida
simboliza também o declínio vegetativo, a fragilização da saúde e bem-estar da terra e do
homem – visto que ela cura Demofonte, o que explicita seu epíteto Πλουτοδοτειρα
(Ploutodoteira), a Doadora das Riquezas, nesse caso a saúde e o bem-estar do bebê. Tirando
isso, ela era Δρεπανεφορος (Drepanephoros) – a portadora da foice – que cessava a
abundância por onde passava, condenando a todos pela sua tristeza e raiva. Outro título
possível para esse estado da deusa é Στειριτης (Steirites) – a Infértil.

Inclusive a figura do rapto em si é muito controversa, uma vez que na Grécia Antiga o
que se configura como rapto não é algo que parte da visão da vítima e, sim, daquele quem
perdeu a posse sobre o objeto ou pessoa. Isso também é evidenciado na Ilíada quando
descobrimos que Helena foi de “boa vontade” com Paris e não raptada como alegava
Menelau, o marido dela e, por conseguinte, seu “dono”. Logo, aqui Deméter que seria a
figura detentora de Perséfone, perde a posse a dela o que ao seu ver foi considerado um rapto,
mesmo que a jovem deusa tivesse ido de plena vontade em ir. Essa imagem pode configurar
também a perda da vida da terra, retratada na tristeza de Deméter pela partida da filha para o
Submundo.

As figuras de Hécate e Hélio são muito importantes para o mito também. Hélio,
titã-sol, é uma alegoria para a clareza que é despertada em Deméter, pois ele é aquele que
tudo vê. Ele pode ser encarado também como uma promessa de retorno da vida à Terra. Ao
passo que Hécate, deusa-titã da magia, das escolhas, dos caminhos e do Submundo, é
conhecida como a “Senhora das Tochas”. Hécate é quem ajuda Deméter durante as noites de
sua busca até que se encontrassem com Hélio. Hécate nesse caso é uma personificação da
esperança para a deusa, sendo assim, a fagulha de vitalidade que continua a manter a terra
viva.

Zeus é uma figura que como arquétipo de Pai, não se aplica apenas à filha Perséfone,
com quem não cumpriu tal papel (assim como com nenhum dos outros filhos), afinal ele é o
Pai-de-Todos e sua extensão de “cuidados”, por assim dizer, é muito mais vasta do que
apenas sendo literalmente a figura de pai. Ele é a figura de autoridade e aquele que preside no
alto e tudo observa, tendo momentos de atividade, como quando define a sentença perante a
situação da nova Rainha do Submundo e lhe atribui um novo nome.

Hermes é um dos poucos deuses helênicos que transitam entre os três mundos (mortal,
divino, subterrâneo). Ele é a ponte que permite o contato claro entre todas as terras. Hermes é
um deus que pode ser associado aos prenúncios de transformação da terra, dando os sinais de
declínio e renascimento das plantas. Ele também é um deus que ajuda os mortos a chegarem
ao Hades, logo um deus-psicopompo pela sua ligação com o Submundo. Isso denota que ele é
um deus que ajuda em transições de um estado a outro. Hermes também pode ser associado
ao elemento ar, que nos tempos antigos era muito usado para ter noção das fases sazonais
tanto quanto a posição do sol e o estado do solo.

Agora um aprofundamento das figuras de Hades e Perséfone.

Começando por Hades, ele é o deus dos mortos e do Mundo Inferior, um rei. Uma
forma de se olhar para o deus, além dele representar uma terra morta como dito
anteriormente, é como o desconhecido, as coisas ocultas e que, por vezes, deve ser temido.
Ao mesmo tempo em que personifica isso, ele é a tentação encarnada (não de uma forma
ruim, mas de algo que é proibido e que não se tem motivo
aparente), a chave para a liberdade que Perséfone nunca
pôde experimentar antes por viver sob a dura vigilância de
Deméter. Hades também é a figura de potencial a ser
descoberto por Perséfone, pois é através da romã oferecida
por ele que ela assume toda sua forma gloriosa de mulher
consciente, como a Rainha dos Mortos. Hades nunca olhou
para a donzela da primaveril como se ela fosse boba ou
inocente, ele viu dentro dela a mulher selvagem que lutava
para sair e, por isso, ofereceu a ela uma nova perspectiva.

Voltando à Perséfone, a jovem deusa é testada pelo


outro deus a ir ao Submundo, em uma analogia psicológica ao aprofundamento dentro de sua
própria essência para destravar seus bloqueios para assumir todo o seu potencial. Em outra
visão, coligando a deusa com o estado da natureza, temos o repouso da terra depois de toda
uma época de atividade, para que assim possa se recuperar para o próximo período. Muitos
pensam que nesse período a terra morria, mas repousar não é morrer. Se a terra morresse não
sustentaria a vida antes ali posta, como as árvores, mas a terra guardava as suas energias por
um tempo, diminuindo a nutrição do solo e plantas, sendo isso um ato de repouso e não
morte, porém o povo antigo podia não ter muito essa visão.

Como já foi dito antes, a jornada ao Submundo de Perséfone pode ser encarada como
uma profunda fase de transformação pessoal, já que a deusa buscava novos horizontes
mediante a vida ordinária que levava na terra. O Submundo pode ser considerado um local
sob a jurisdição de tudo que é inconsciente, desconhecido, não tocado, rejeitado e oculto.
Pode ser visto como um pedaço do caos, mas um caos dentro da ordem e isso quer dizer que
o Submundo é um lugar que guarda um potencial a ser explorado, trazido à tona e moldado.
Essa é a missão de Perséfone. Ir ao fundo de si para descobrir seus verdadeiros anseios e
personalidade, assumi-los para que assim possa moldar um novo eu a partir do anterior, sendo
mais verdadeira com seu Eu Interior.

Sobre a romã há duas interpretações que vão variar de acordo com a versão do mito
que a pessoa for ler. Seguindo a forma apresentada aqui, o ato de aceitar a romã de Hades,
lembre-se dele aqui como a figura daquele que detém o conhecimento oculto, Perséfone toma
uma escolha inteiramente importante para sua vida e com ela, não só ganha sua liberdade,
mas junto dela uma nova visão sobre as coisas. Aqui traça-se um paralelo com o
amadurecimento pessoal e tomada de responsabilidades, a chegada da fase adulta. Pode-se
dizer, dentro de um viés espiritual, que Hades foi o testador e iniciador da própria esposa nos
Mistérios da Vida.

Se for se guiar pela versão mais corrente do mito, a atitude de Perséfone em aceitar é
um eufemismo para o defloramento da jovem virginal, sendo esse ato consensual ou não,
embora sempre seja relatado como uma violência sexual. Por isso que ela não pode mais
deixar o lugar quando Hermes chega para buscá-la, pois era um costume que o homem que
tirasse a virgindade de uma mulher se casasse com ela, principalmente quando ela era de uma
família de renome, vale lembrar que Perséfone é filha do Rei dos Céus.

Existe um conceito germânico interessante, presente em uma tradição de bruxaria


chamada Wanen, que diz que todo lar, portal, local precisa de uma Guardiã. Basicamente,
essa função é só feita por mulheres que estão no auge de sua idade e força feminina.
Perséfone estava chegando lá e, assim como a postulante ao cargo de Guardiã, ela contesta o
poder de Guardiã para si. Mas de onde? Da terra ou do Submundo? É possível dizer que seria
do Submundo, já que o lugar carecia de uma força feminina que reinasse junto de Hades e
agisse como uma protetora do lugar. Então, ao invés da Guardiã atual testa-la, é Hades
fazendo esse papel de desafiador que a leva nessa jornada. Testando a coragem, caráter e
capacidade de ver a realidade de Perséfone. Ao fim da jornada a postulante “morre” e renasce
como Guardiã, no mito podemos afirmar que isso acontece na tomada da romã pela deusa.

Nesse momento em que ela assume essa nova postura de rainha e recebe seu novo
nome, Perséfone, a deusa ganha uma nova forma de encarar a vida, agora que conhece a
morte, e ao partir de seus domínios subterrâneos para se juntar a sua mãe por um curto
período de tempo, ela jamais deixa de usar todo o seu poder para fazer aquilo que ela sabe
que foi destinada a fazer. Trazer a transformação e equilíbrio a todos que a buscam, pois ela é
conhecida como Σωτειρα (Sotêira), a Salvadora, e Πραξιδικη (Praxidikê) a Executora da
Justiça. Em grego, Perséfone (Περσεφóνη), como já dito, significa “Aquela que Destrói (a
luz) ”. Se levar em conta a parte da luz, isso pode significar que ela é aquela que destrói a luz
que cega da verdade, guiando por um caminho escuro de coisas que antes eram ocultas, mas
que agora são reveladas. Se não levar em consideração, pode-se dizer que ela destrói tudo
aquilo que impede alguém de se transformar, quer isso seja doloroso ou não para a pessoa.

Perséfone é o arquétipo da pessoa que se torna salvadora de si própria, saindo de sua


zona de conforto para se descobrir e mudar de vida. Ela é a força de transformação do
mundo, seja presente na vegetação ou nos animais. Perséfone é a Grande Deusa e a Sábia
(Μεγαλα Θεα – Megala Thea, e Δαειρα - Daeira, respectivamente). É a deusa que leva tudo
até o estado mais profundo de pureza, pois é a Pura e Sagrada (Ἁγνη – Hagnê).

Sendo assim, além de ter todo um olhar sob a visão grega dos ciclos de passagem da
natureza, o que deriva as estações do ano, podemos também desmembrar cada ponto do mito
para chegar a novas conclusões. Afinal, a história carrega também toda a conotação
simbólica-psicológica onde todo o mito pode se ressignificar diversas vezes mediante a
diversos olhares e ângulos diferentes.
3. Símbolos e Atributos da Deusa e Seus Significados
Como toda divindade helênica, Perséfone também carrega seus símbolos e atributos
pessoais, pelos quais era possível para o povo grego usar para contatar a deusa em rituais,
orações e o que mais eles desejassem fazer. Tais símbolos já foram revestidos de significados,
tendo alguns se mantido e outros se perdido ou transmutados em algo um pouco diferente,
mas que guarda relação com o que sentido que lhe precedia. Determinados atributos foram
incorporados com a passagem do tempo e culto da deusa por diversos locais diferentes.

3.1 – Atributos:
Parte de ser uma divindade significa ter uma esfera de poder. E o que isso significa?
Significa ter um espaço de controle e influência, algo que fica sob seu domínio para atuar
livremente, por exemplo: Poseidon é o deus dos mares, logo ele controla as águas do mar e
tudo que está nela.

Perséfone por ser uma deusa que ora está junto da mãe na terra e ora junto do marido
no Submundo, possui dois lados diametralmente opostos, mas complementares. Ela é uma
deusa bipolar, no sentido de possuir esses dois lados.

Quando está com Deméter, ela é Kóre. A deusa da


primavera que traz as flores, o vigor da terra com seus frutos
e perfumes. É também aspectada como Melissa (em grego,
Μελισσα), a Senhora das Abelhas, uma vez que as abelhas e o
mel eram sagrados para a deusa, por sua simbologia de ser
como ouro, que era achado abaixo da terra como os demais
metais e pedras preciosas. Tudo no controle de Hades e
Perséfone. Tal aspecto também guarda relação com sua face
sombria, pois na civilização mnóica havia uma deusa
chamada Potnia Theron, personificação de toda feminilidade, que possuía diversas faces e
dentre elas estava presente a Senhora das Abelhas.

Um fato interessante é que essa face era tida também como a Senhora do Labirinto,
regente de todos os Mistérios, principalmente os iniciáticos, mais uma ligação com
Perséfone. Era mais do que comum que jarros de mel fossem ofertados à Senhora do
Labirinto na entrada do local. Outro ponto a ser explicitado é que na Grécia havia também
uma deusa do mel e das abelhas chamada Melissa e que o nome ao ser utilizado como epíteto
podia ser carregado por outras deusas, sendo a mais conhecida Afrodite.

Perséfone, quando na terra, é a vida pulsante que sobe dos confins da terra para
espalhar as bênçãos de Gaia para o povo. É a Princesa do Olimpo que através dos perfumes
que exala traz novas sensações a quem o sente, com os frutos ela traz o alimento que
sustentará as pessoas e que trará novas vidas através das sementes. Em seu aspecto luminoso,
a deusa também tem vínculo com as práticas de cura, saúde e fertilidade.

Ao descer ao Mundo Inferior, a deusa se torna a Rainha dos Mortos, Guardiã das
Terras Inferiores. Ela é a que intercede pelas pessoas em momentos de adoecimento ou morte,
nesse último caso ela ainda age como a que conduz a alma aos seus domínios em segurança.
Ela é a que pode propiciar o contato com os ancestrais. Perséfone como deusa dos Mistérios é
a desafiadora e iniciadora, como Hades foi consigo mesma. Ela é a que leva o postulante até
o fundo da escuridão para que só depois ele possa chegar à iluminação, luz e trevas aqui
fazendo analogia à consciência plena e o oculto, respectivamente. Logo, uma deusa das
transformações.

Perséfone é a deusa que traz a justiça, harmonia


e salva todos os que merecem. Nesse aspecto
sombrio uma divindade ctônica, por isso uma deusa
com uma profunda ligação com a terra, muito mais
do que em seu aspecto luminoso. Aqui ela não é a
infértil, e sim, a que guarda todo o poder feminino
que traz as coisas à vida. Ela é a luz do submundo
que guia as almas para a uma nova vida ou para um
repouso como é dito na inscrição de uma lamela órfica, pequenas placas ou lâminas de ouro
deixadas em túmulos órficos descobertas na Itália e na Ilha de Creta, que eram pendidas nos
pescoços dos iniciados, como talismãs.

Diz a deusa na inscrição:

“À esquerda da morada do Hades, tu encontrarás o Lago da Memória (Lethe), e os


guardiões estarão lá. Diga-lhes... ‘Eu sou o menino da Terra e
do Céu estrelado, mas estou morrendo de sede. Dá-me
rapidamente a água fresca que flui do Lago da Memória’(...)
Saúdo-te, toma o caminho da direita em direção aos prados
sagrados e aos bosques de Perséfone”.

Esta última parte ela dizia aos que não precisavam ou não optavam pela reencarnação.

Segue abaixo alguns dos epítetos que eram atribuídos à deusa por função ou
localidade:

Nome Grego Transliteração Tradução


Ποτνια Potnia Rainha
Μελιτωδης Melitōdēs Doce como o Mel ou
Melodiosa
Δέσποινα Déspoina Senhora
Χθονια Chthonia Da Terra, do Submundo
Καρποφορος Karpophoros Frutífera
Σωτειρα Sōteira Salvadora
Μεγαλα Θεα Megala Thea Grande Deusa
Ἁγνη Hagnē Pura, Sagrada
Δαειρα Daeira Sábia
Πραξιδικη Praksidikē ou Praxidikē* Executora da Justiça
Ἑρκυνα Herkyna Da Câmara de Pedra
Πρωτογονη Prōtogonē Primogênita
Ελευσινια Eleusinia De Elêusis
Μυστηρια Mystēria Dos Mistérios
Επαινη Epainē Temível
Λεπτυνις Leptynis Destruidora
Αζησια Azēsia Buscadora, A que faz secar
Βριμω Brimō Irada, Assustadora
Δειωνη Deiōnē Filha de Deméter (ou
Deus)
Μελαινις Melainis Negra (como a noite)
● Praxidikē com “x” é uma transliteração moderna, uma vez que a letra em questão
não existia na Grécia Antiga, por isso há uma com a transliteração mais correta
com relação ao alfabeto helênico e outra modernizada, respectivamente.

3.2 – Plantas e Animais:


A Romã

Começando pelo seu símbolo mais conhecido, a romã é a fruta associada por
excelência à Perséfone. Porque além de estar presente no mito da própria, diversas das
simbologias da fruta se encontram com as regências da deusa.

Em termos medicinais, a romã é a fruta que ajuda na recuperação de debilidades


vocais, pessoas usam o chá morno feito de suas cascas para fazerem gargarejos. Também
ajuda a regular o fluxo menstrual, reduzir a pressão arterial e precaver de certos problemas
cardiovasculares. Um estudo de uma universidade escocesa aponta que o consumo da romã
produz um aumento de testosterona que pode variar entre 16% e 30%.

Pela análise de Paracelso em seu livro de botânica oculta, o ocultista e estudioso


antigo fala que a romã é uma planta sob a regência do planeta Mercúrio, dentro do esoterismo
é o planeta da cura e da comunicação. Isso explica a sua função medicinal física. Por conta da
regência de Mercúrio, a romã também é usada para a prática divinatória.

Se for cortada ao meio, a aparência da fruta lembra muito um ovário, o que a conecta
a toda figura feminina. Pela quantidade abundante de sementes, a romã é o símbolo de
fertilidade e fartura. As sementes que ficam envolvidas por uma polpa vermelha translúcida
(que é comestível) já foi comparada a um zigoto, resultado da união de espermatozoide e
óvulo.

É uma fruta ligada também a deusa Hera e o motivo disso é por ser uma fruta ligada à
soberania. Por isso, o gesto de Perséfone ao tomar a fruta significa que ela aceita ser a
soberana do reino de Hades, mas acima de tudo de si, e consorte do Senhor do Submundo por
livre e espontânea vontade, assumindo assim controle total sobre sua vida.

Dentro do esoterismo também uma fruta ligada à persuasão, o que é compreensível


pelo próprio mito e pela relação com o planeta Mercúrio. É uma fruta do amor, podendo ser
usada para trazer o amor-verdadeiro, o amor-próprio e a harmonia do lar. Também é ligada
ao Submundo, dizem que quando alguém morre pode-se deixar uma romã junto do morto
para que ele faça uma passagem tranquila. Ela traz conexão espiritual e desenvolve esse lado
da pessoa, ajudando-a a entender os Mistérios da Vida. Outros atributos dela é atrair a sorte,
por isso muitas pessoas guardam suas sementes em carteiras a fim de atrair dinheiro, e, por
fim, auxilia na realização de desejos.

Menta

A erva muito conhecida por ser de um cheiro suave e trazer um frescor ao hálito,
quando presente em balas, é associada à deusa porque em um de seus mitos ela transforma
uma ninfa do submundo, de nome homônimo, na planta. Algumas versões dizem por ter dito
ser mais bela que a deusa, outras dizem que é por ter tido um caso com Hades. Minthê (em
grego, Μινθη) depois de ser transformada em planta, ficou responsável por guardar as
entradas das cavernas onde a planta era encontrada, muitos acreditavam que cavernas podiam
levar ao Hades.

A planta é muito usada para chá que trazem o relaxamento e recuperação de resfriados
e dores de cabeça por ser antisséptica e expectorante. Dentro do meio místico, também é
ligada à cura e saúde, foi usada em rituais funerários (principalmente na Grécia Antiga) e
junto de outros ingredientes compunha uma bebida enteógena usada nos ritos eleusinos.

Alecrim e Sálvia

Começando pelo alecrim, é uma erva regida pelo sol e que traz vitalidade, cura,
purificação e proteção. É uma erva que toda pessoa que lida com misticismo acaba tendo,
pois ela atua em diversos campos, inclusive sendo somente um potencializador energético.
Ela é extremamente fácil de se achar e cultivar e ajuda a retirar debilidades febris, pode atuar
como relaxante muscular e ativador de memórias. Pela sua força energética é capaz de trazer
disposição e ânimo. E as flores brancas pequeninas que brotam neles eram muito dedicadas à
deusa.

Já a sálvia, com sua regência jupteriana (Júpiter é o planeta considerado o Rei dos
Astros, ele é o berço de onde nascem reis e rainhas, logo, toda e qualquer divindade que
carrega tal título de soberania automaticamente está ligado a este astro), ela é muito usada
medicinalmente para acalmar e manter o equilíbrio em dias pesados, muito fácil de achar,
encontra-se até em doces e balas. Esotericamente é usada para limpezas, banimentos, atração
de sabedoria e longevidade, além de prover proteção em todos os sentidos, principalmente de
espíritos. Andar com um raminho de sálvia no bolso sempre o mantem protegido e em
equilíbrio energético.

Abelhas e Mel

Aqui o interessante de se observar é a relação de Perséfone com a deusa cretense,


pré-helênica, Melissa. Essa deusa tinha sacerdotisas que eram chamadas de “Abelhas”, título
cedido também às sacerdotisas de Afrodite do monte Eryx, que adoravam a mesma sob o
nome da deusa cretense, como um epíteto. Enfim, Melissa era uma deusa fazia essa conexão
entre vida e morte, pois aos cretenses a abelha significava “a vida que vem da morte”, como o
escaravelho para os egípcios.

As abelhas fazem hexágonos perfeitos, que é outro símbolo da deusa, por poder ser
composto de dois triângulos sobrepostos (um de ponta para cima e outro para baixo) que
simbolizavam a união dos céus e da terra, o perfeito equilíbrio. Tumbas em Micenas foram
reproduzidas como colmeias. As abelhas são representantes da interconectividade, da
dedicação e da organização.

O mel, além de ser visto como “o ouro que se come”, já foi usado para embalsamar e
preservar os corpos dos mortos. Ele tem uma natureza energética, antisséptica, cicatrizante e,
além disso, é o melhor tipo de adoçante natural que se encontra. Combate, insônia e
ansiedade, elimina toxinas, atua como antibiótico natural, suaviza a pele, fornece cálcio e
alivia dores. Por isso no meio ocultista, o uso do mel pode ser diverso indo de um tratamento
de cura, podendo chegar até um elaborado rito para trazer o amor.

Por essa qualidade tão intrínseca com a natureza, sempre numa questão harmônica e
ampla, a abelha e o mel se ligam à Perséfone. Até porque as abelhas também eram associadas
à realeza, que já foi dito ser um atributo de Perséfone.

Cachorro e Borboleta
Além das abelhas, os cães eram muito sagrados à deusa. Por uma questão simbólica
de ser sempre fiel aos seus princípios, justo e leal para com os que ama. Muitos acreditam
que a relação da deusa com o cachorro seria pelo fato dela ter “se tornado” dona do cão de
três cabeças Cérbero, mas não. Ela é a que detêm controle, não só sobre ele, mas como sobre
toda a matilha infernal presente no Mundo Inferior. Cães eram sacrificados para a deusa em
rituais em sua honra e quando não havia tal prática eles eram muito bem tratados.

As borboletas carregam em si todo o simbolismo da deusa que é abordado nesse


trabalho: a transformação e empoderamento. Afinal, ela vem de uma vida em que havia
grandes limitações e que através de uma “retirada” voluntária e temporária de todo o
ambiente que a cerca, ela volta transformada numa criatura de beleza grandíssima e com a
habilidade de voar, que antes não possuía. Em uma comparação, a lagarta durante esse
processo de isolamento assume toda sua verdadeira natureza e poder, traduzida na figura da
borboleta. Fora que elas também simbolizam boas mensagens, assim como Perséfone que dá
o aviso do início da primavera.

3.3 – Outros Símbolos:


A Tocha

A tocha, principalmente a eleusina, é um símbolo da deusa que guia os mortos para


um lugar de descanso e tranquilidade. É a metáfora da iluminação no caminho de um
postulante a ser iniciado nos Mistérios. Ela é que guia pelo caminho da provação, a que traz a
esperança para se chegar ao destino. Perséfone como a que carrega a tocha, seja para descer
ou subir de seus domínios funestos, é a detentora da chama de vida que vive em todos os
seres vivos e que jamais irá se apagar, nem mesmo depois de sua morte.

A Coroa

Logicamente tal objeto de poder não poderia ser deixado de lado, uma vez que antes
mesmo de ser uma rainha, a deusa em sua inocência já fazia diversas coroas de flores para si
mesma e aqueles que a acompanhavam. A coroa é um símbolo de poder, no sentido mais
amplo da palavra, ela lhe confere capacidade total de fazer o que acredita ser melhor. Ela
confere coragem, sensatez, perspicácia, entre outras qualidades. Claro que alguns podem se
deixar corromper, mas a essência da coroa é estar em pleno e total controle de si.
Serpentes

Muito pouco é difundido a respeito disso, mas Perséfone assim como sua mãe
Deméter, guarda relações com todos os tipos de serpentes e dragões. Possivelmente isso deve
se explicar pelo fator transmutativo das serpentes que mudam de pele com uma certa
constância, o que faz uma alusão às transformações da deusa ctônica.

Flores

Perséfone é a deusa flores e isso quer dizer, por consequência que é a deusa da
efemeridade. Não vou me alongar muito aqui, mas é importante ressaltar que muito embora
ela pudesse ser considerada Perséfone Antheia, a Senhora das Flores, ela tinha relações muito
próximas de algumas espécies, que são o lírio (este em especial, pois algumas versões de seu
mito dizem que ela colhia estas flores ao ser levada por Hades), a margarida, o jasmim e o
narciso. O que elas têm em comum é a cor branca, por mais que exista diversas cores de lírios
e narcisos, são os brancos dedicados à Perséfone, pois é uma de suas cores sagradas. A cor da
pureza e inocência.

Mais uma ressalva a ser feita é de que a ela era dedicado o asfódelo, planta que
nomeia um dos locais do Submundo (Campos Asfódelos) para onde iam as almas comuns
que nem mereceram as glórias dos Elísios e nem as torturas dos Campos das Punições.

Com isso, podemos ver que essa é uma deusa rica até dentro das coisas que a
caracterizam, pois mesmo nelas vemos a complexidade e abrangência que a própria
Perséfone carrega. Poderia ter citado mais coisas, como outros animais, cristais, plantas, etc,
porém se o fizesse essa parte ficaria muito extensa, podendo se perder do propósito do
trabalho.
4. O Culto Antigo da Deusa
O culto de Perséfone, pelo que apontam pesquisas, nunca foi um culto somente dela.
A deusa sempre esteve acompanhada em momentos sacros, fosse com sua mãe, Deméter, nos
Mistérios de Elêusis ou com seu consorte Hades, como aponta alguns achados antigos
esculpidos em pedras.

Mesmo com tal fato sendo presente, existe a peculiaridade em ambos os cultos de que
a deusa jovem se tornava o centro das atenções. De início vemos o caso de Elêusis que foi
fundado por ordem de Deméter para ser um culto dedicado a ela e somente ela. Então por
que, mesmo que fosse sua filha mais querida e importante, Perséfone ganhou destaque nos
Mistérios? Talvez porque por mais mitos que houvessem de Deméter, histórias que podem até
não ter chego aos nossos ouvidos, o conto da busca da deusa da agricultura pela sua filha teve
um impacto tão forte na civilização eleusina, digo ela especificamente pelo fato de que esse
mito pode ter tido origem ali naquela cidade-estado, que não teve como não trazer Perséfone
para o culto e com ela, Hades.

Então, Elêusis era um culto majoritariamente dedicado à Deméter, mas onde as


figuras de sua filha e deu genro e irmão eram tão importantes quanto.

4.1 – Elêusis
Como visto na primeira parte, o culto de Elêusis foi fundado por Celeus a mando da
própria deusa, que iniciou não só ele, mas também toda sua família nos Mistérios. Os ritos
sagrados tinham uma importância tão grande que seu alcance se estendeu quase que
universalmente, vindo pessoas de outras regiões do mundo para pedirem pela iniciação nos
Mistérios.

Muito se fala sobre a origem real dos ritos, desconsiderando os registros mitológicos.
Heródoto credita certas influências dos Mistérios aos egípcios. Maçônicos sustentam que os
Mistérios derivaram da Maçonaria, sendo mais comum acreditar o contrário. E alguns
especulam que os ritos eram celebrados pelos antigos habitantes de Atlântida.

Uma coisa que vale citar, que está presente no livro Ritos e Mistérios de Elêusis, de
Dudley Wright, é esse fragmento que selecionei de uma fala de Platão:
“Os Mistérios foram estabelecidos por homens de grande talento que, no início dos tempos,
esforçaram-se para ensinar a pureza, para superar a
crueldade da raça, para exaltar sua moral e refinar seus
modos, e para conter a sociedade por meio de vínculos mais
fortes do que aqueles impostos pelas leis humanas (...)”
(WRIGHT, 2005, p. 14).

Ou seja, com isso entendemos que o papel dos ritos eleusinos eram muito mais do que
imbuir alguém de simples títulos ou status social, os Mistérios eram algo que faziam o
indivíduo entrar em comunhão consigo mesmo e os deuses.

Os Mistérios eram divididos em duas partes, que nem sempre foram dessa forma, são
elas: os Mistérios Menores e os Mistérios Maiores. Os Mistérios Menores eram uma fase
preliminar na celebração dos Mistérios para os estrangeiros que vinham se iniciar. Dizia que
eles foram criados para que Héracles, Castor e Pólux pudessem ser iniciados, tendo eles
seguido ordens da deusa Deméter, que é a figura central do culto. Essa fase foi criada por
isso, para que fosse um momento de preparação geral para os Mistérios que se seguiriam. Os
Mistérios Maiores, diferente dos Menores que serviam para te situar de forma subjetiva da
condição impura da sua alma, aqueles serviam para ensinar o postulante a transcender a
condição de submissão material e mundana na qual vivia anteriormente. Aqui era
simbolizada a descida de Perséfone, outra figura tão importante quando a de Deméter, ao
Submundo. Outro deus muito importante é Hades, por seu papel como regente do Submundo.

As celebrações dos Mistérios duravam nove dias e havia um período de trégua geral
durante suas celebrações que devia ser honrado começando no 15º dia do mês das
Broedomias (aproximadamente o mês de setembro) até o 10º dia do mês seguinte. O
armistício era proclamado por um arauto em todas as cidades helênicas que deviam aceitar o
termo. Todos os preparativos eram feitos por duas famílias sacerdotais, os Eumólpidas e os
Cérices. Haviam muitos envolvidos no processo, mais de dez pessoas podiam ser contadas,
desde o Arconte Basílio (o Rei) até o mensageiro e cada qual tinha sua importância dentro da
celebração dos Mistérios.

O envolvimento de Perséfone no rito era representar essa figura que desce os confins
da terra e que lá encontra a verdade que a guia para a iluminação, essa condição era
reproduzida por aqueles que seriam iniciados, pois seriam postos em condições específicas
para que chegassem a esse grau de elevação espiritual. Aqui lembra-se a face de Perséfone
como uma deusa que lida com transformações e mudanças mais uma vez.

Píndaro fala o seguinte sobre os Mistérios de Elêusis:

“Abençoado é aquele que, observando aquelas preocupações comuns sobre a Terra, conhece
tanto o fim da vida quanto o fim de Zeus” (WRIGHT, 2005, p.
84).

Os Mistérios vivenciados tinham o propósito de unir o mundo com os deuses. Através


de todos os símbolos, gestos, dizeres e momentos pelo qual todos deviam passar para
atingirem o próximo nível, pois os Mistérios eram divididos em três graus, os iniciados
aprendiam através das dramatizações a refletirem sobre sua própria natureza, desenvolvendo
o autoconhecimento. Vale dizer que o que acontecia nos templos não podia ser divulgado,
nada dos Mistérios podia ser divulgado, isso era considerado uma infração grave e
condenável com a morte, outra coisa igualmente proibida é a entrada de não-iniciados nas
propriedades dos templos sagrados sem que esses tivessem passado pela aceitação nos
Mistérios Menores.

Em Elêusis e por todo mundo os Mistérios foram celebrados e sagrados por muitas
gerações, até que como tudo que o homem toca, o rito foi corrompido tendo seu declínio.

4.2 – Culto à Perséfone e Hades


Durante algum momento da cultura grega houve um culto dedicado à Perséfone e a
Hades. Aqui havia um grande corpo sacerdotal dedicado à deusa, todas eram mulheres, como
é apontado na obra de Jennifer Reif, Mysteries of Demeter: Rebirth of the Pagan Way. Isso é
um dos fatores que encoraja não só os devotos da deusa como estudiosos a não acreditarem
sobre a questão do estupro que muitos dizem ter sido sofrido por Perséfone, o que torna
Hades um vilão aos olhos de muitos.

Não há muito acerca desse culto à deusa, apenas uma imagem dela e de seu consorte
gravada em pedra sentados em tronos, lado a lado. Por esse e outros motivos que a ideia do
abuso sexual não é sustentada pelos estudiosos, que adicionam o fato de que não há menções
ao ato de violação nem no texto Homérico e nem no Órfico, eles dizem que a construção
dessa ideia é moderna e que ao se voltarem a estudos antigos, certos fatos caem por terra.

4.3 – Hino Órfico 29 à Perséfone


Perséfone, filha do grande Zeus, vem, venturosa

Deusa unigênita, e aceita, grata, os sacrifícios!

Esposa muito honrada de Plutão, diligente


doadora da vida

Que reges os portais do Hades nos recônditos da


terra;

Justiceira [Praxídice] de adoráveis tranças, puro


rebento de Démeter,

Genetrix das Eumênides; rainha subterrânea,

Donzela que Zeus engendrou em nefanda união;

Mãe do altitroante multiforme Eubuleu,

Lucífera de esplêndida forma que brinca com as


Horas,

Onipotente insigne, donzela florescente de frutos,

Cornígera brilhante deusa, só tu és desejada pelos mortais;

Na primavera te agradas com as brisas dos prados,

E revelas sua sagrada forma no desabrochar dos verdes frutos;

No outono, te tornaste noiva, levada à força ao leito;

És a vida e a morte para os mortais sofredores,

Perséfone! Sempre alimentas (Pherseis) a todos, e a todos aniquilas; (Phoneis);

Ouve-me, venturosa deusa, envia-nos os frutos da terra

Viçando em paz e saúde generosa,


E trazendo a uma vida afortunada o conforto da velhice

Em teu reino, soberana, e de Plutão poderoso.1

Na tradução acima feita pelo helenista reconstrucionista podemos ver diversos


momentos em que alterna os aspectos claros e escuros da deusa. Sendo ela a que alimenta, a
que cuida, a que traz justiça, mas também sendo a mãe das Erínias (as deusas da punição
dedicada aos mortais), a que carrega a vida e a morte. Quando é dita como “Mãe do
altitroante multiforme Eubuleu” é uma referência à Dionísio, que é creditado como um filho
da deusa com Zeus, tal nome também pode ser o sobrenome de outras divindades como
Hades. Ela é tida como o “puro rebento de Deméter” e “venturosa”, pois ela é caracterizada
como a força pulsante da vida em todo seu potencial quando é tratada como Kóre, a Donzela.

1
Tradução de Rafael Brunhara
5. Perséfone e seu Culto na Era Moderna
Hoje em dia não é difícil encontrar coisas que foram baseadas na deusa ou em seu
mito, ou, enxergar sua influência mediante a diversas coisas, principalmente dentro da cultura
pop que sempre faz uso de coisas antigas como referência ou base.

Perséfone já foi retratada ou citada em séries de


livro como Crônicas do Acampamento Meio-Sangue,
que é uma composta de três sagas sobre mitologia
greco-romana com autoria de Rick Riordan, na trilogia
Abandono de Meg Cabot; nas Crônicas das Irmãs
Bruxas de Jessica Spotwood; na saga Corte de Espinhos e
Rosas de Sarah J. Mass. Ela aparece em filmes como
Percy Jackson e o Ladrão de Raios (2010), interpretada por
Rosario Dawson, e em Hércules (1997) da Disney, em um frame muito rápido no qual
precisa-se pausar para vê-la.

A influência do mito da deusa é muito presente no conto A Bela e a Fera (1740), da francesa
Gabrielle-Suzanne Barbot, a Dama de Villeneuve, porém é a versão de 1756 de Madame
Jeanne-Marie LePrince de Beaumont que é a mais conhecida e difundida pelo mundo, mesmo
sendo mais tardia que a de Barbot. A história da jovem que troca de lugar com pai, se
tornando prisioneira de uma Fera solitária e amarga já ganhou diversas adaptações e
releituras, a mais conhecida é o filme de 1992 da Disney, dirigido por Kirk Wise & Gary
Trousdale, com direito à trilha sonora feita por Alan Menken & Howard Ashman, sendo
Menken considerado uma lenda nos estúdios por trabalhar na trilha sonora de A Pequena
Sereia (1989), que foi o filme responsável por tirar a Disney de uma possível falência. A
história eternizada em músicas inesquecíveis e numa animação muito bem-feita, que
permanece intacta através do tempo, ganhou um filme live-action em 2017 com Emma
Watson fazendo o papel da heroína da história.
O

paralelo entre Bela e Perséfone é justamente aquele em que


ambas acabam saindo de sua zona de conforto por vontade
própria e na vivência em um novo mundo, Submundo para a deusa e o castelo da Fera para a
Bela. Elas passam por uma jornada de autodescoberta e transformação, recebendo auxílio da
figura masculina regente do lugar em dados momentos, Hades e a Fera. Um ponto
interessante a se observar é que no filme evidencia que a transformação não foi somente para
a jovem camponesa, mas também para a Fera que ao final do filme transforma-se no príncipe
que fora antes, uma alusão muito bem-feita à transcendência da alma que sai da zona de
ignorância e selvageria em direção ao estado de clareza plena, que dizia-se atingir com os
Mistérios Sagrados. A figura de Bela é a própria representação da deusa que vai de curiosa e
sonhadora no início de sua vida até a ser aquela busca entender o local onde está e aquele que
o controla durante sua jornada de empoderamento; ela é ativa e não espera mais por terceiros
para decidir as coisas em sua vida, tudo isso e muito mais características são presentes
também na deusa helênica.

Outro lugar onde a deusa do Submundo ganha espaço são nos sites dedicados
às fanfics (do inglês “ficção de fã”, ou seja, histórias desenvolvidas por fãs de alguma obra ou
artista) onde diversas pessoas escrevem histórias usando os mitos da deusa como base para
suas narrativas, como Hope Springs Eternal: A Subterranean Romance, de Quantum Witch.
A história
de
Perséfone tão popular que ganhou uma versão moderna em quadrinhos onde os deuses se
habituaram ao mundo moderno, o nome da obra é Lore Olympus de Rachel Smythe, que até o
momento de término deste artigo não se encontra finalizada.
A figura da deusa e seu mito também já foram materiais de estudo em teses de
psicologia, como na tese defendida na conclusão de graduação por Maria Carolina de
Azevedo Antunes, Perséfone: A Morte como Transformação, e, no trabalho de Larissa
Fernanda Dittrich, O Mito de Perséfone e sua Relação com o Caráter Oral. Ótimos artigos
que cumpriram com o propósito das autoras, o último tem um tema voltado para a depressão
e dependência psicológica que é abordado de maneira fantástica.

Clarissa Pinkola Estés é uma acadêmica premiada de renome internacional,


psicanalista junguiana diplomada, poetisa premiada e cantadora (sábia de antigas histórias na
tradição latina) escreveu um livro chamado Mulheres que Correm com os Lobos no qual
aborda analiticamente a figura da deusa sob outros aspectos, como o de Andarilha. Mais um
título que lida com essa questão analítica de arquétipos no ser humano, principalmente na
mulher, é o livro A Deusa Interior: Um Guia Sobre os Eternos Mitos que Moldam Nossas
Vidas de Jennifer e Roger Woolger, no livro estuda-se algumas deusas, seus arquétipos e em
como eles estão entrelaçados ao íntimo de cada um.

Um fato curioso e interessante é que o dia vinte e cinco de novembro é dedicado a ela,
mas o que instiga a mente alheia é que neste dia também comemorado o Dia Internacional de
Combate à Violência Contra as Mulheres. O que muitos devotos acreditam é que houve uma
influência da própria deusa para que o dia fosse criado no ano 1999, visto que Perséfone é
tida para muitos ainda como uma figura de mulher que foi violentada. Eles dizem que isso
seria como se a deusa se posicionasse mediante ao assunto de violência à mulher, claro que
isso é algo que não pode ser afirmado de fato por ser uma gnose pessoal daqueles que seguem
e acreditam na deusa, mas vale a pena mencionar a curiosidade.

Há um trecho presente no livro Ladies: Retold Tales of Goddess and Heroines de


Boris e Doris Vallejo, muito bonito. Onde a própria deusa conta sobre sua condição dupla de
ser pertencente a dois mundos extremamente diferentes e em como ela não pode estar nunca
em ambos os lugares ao mesmo tempo. A narrativa segue com tom agridoce que pretende
tocar fundo nas pessoas com construções poéticas muito belas, abaixo seguirá o texto no
original e em seguida uma tradução feita por mim, note bem a nitidez e clareza com a qual
Perséfone explicita seus sentimentos, que são fortes e intensos. E justamente pela cadência
lírica e melódica no falar do trecho, seja em português ou inglês, traz mais desse jeito
artístico tão típico do povo grego que era conhecido por falar cantando.
"Here, in this dark uncanny world, I remember the sunny Earth as one might remember a
dream. I long for it, as one longs for music, in a world of
silence. Yet once I am back on the Earth again, surrounded by
the comforting and familiar, it is your absence that gnaws at
me like a ravenous bird. Then the lack of you expands in me
like a void, and the knowledge that you are here, that you love
me, that you eagerly await me, is achingly precious.

Thus my joys are tainted with sadness in the spring when I


leave you always to return. And my sadness is mingled with
joy in the autumn when I return – always and ever to leave
you”.

“Aqui neste mundo sombrio, eu me lembro da Terra


ensolarada como alguém se recorda de um sonho. Eu espero
por isso, como alguém aspira por música, num mundo de
silêncio. Ainda, uma vez que retorno à Terra de novo, cercada
pelo confortável e familiar, é a sua falta que me tortura como
um pássaro voraz. Então, a falta de você se expande em mim
como um vácuo, e o conhecimento de que você está aqui, que
me ama, que avidamente aguarda por mim, é dolorosamente
precioso.

Então minhas alegrias são manchadas com tristeza na


primavera quando eu o deixo para sempre voltar. E minha
tristeza é misturada com alegria no outono quando eu volto –
para sempre e sempre te deixar”.

5.1 – Culto Moderno


Na modernidade a deusa encontra devotos das mais diversas formas. Há aqueles que
seguem os preceitos da Antiga Grécia com o Reconstrucionismo Helênico, tendo uma forma
de culto mais regida por regras sistemáticas a fim de fazerem os ritos religiosos o mais
próximo possível do que se era feito na cultura grega pré-cristã. E também existem aqueles
que são adeptos de outros caminhos religiosos que adotam uma forma culto nova e, às vezes,
pessoal que segue alguns preceitos do que os antigos faziam.

A Bruxaria como um todo, abarca diversas vertentes e dentro delas há a Wicca (que
vem sendo muito difundida na atualidade) que é uma forma de resgate das práticas antigas
remontadas de uma nova forma nos tempos modernos, no intuito de se comungar com a
natureza e as forças divinas e espirituais presentes no universo. Na Wicca muitos praticantes
acabam por conveniência de aprendizado escolar lidando com deuses gregos primeiro e com
eles, vem Perséfone junto que bem aos pouquinhos foi espalhando seu culto entre os novos
devotos.

Há um trabalho de resgate do sagrado feminino


realizado por mulheres para curarem feridas causadas
pelos séculos de submissão e abuso pelo patriarcado.
Tal trabalho recorrentemente acaba por se tornar um
culto para a deusa da primavera, uma vez que ela
mesma passou por momentos de dor e adaptação no
Submundo, mas que superou tudo e ascendeu como
uma poderosa mulher divina e é isso que ajuda as
outras mulheres a conquistar, o controle sobre sua
feminilidade e aceitação de todo o seu poder e
existência.

Perséfone na visão pagã atual é uma deusa que


grita empoderamento. Uma deusa que representa a
dualidade da vida, pois ela é tão inocente quanto uma
criança e tão fatal quanto uma mulher enfurecida. Ela é uma das deusas em quem as bruxas
enxergam uma grande força de superação em seu mito e defendem ela quando ouvem alguém
alegar que Perséfone é apenas uma vítima e que é infeliz em seu reinado ao lado de Hades.
As devotas modernas refutam com bons argumentos que Perséfone jamais foi uma vítima e
que se não fosse pela sua coragem em querer mudar e desbravar o desconhecido (Submundo),
nada do que ela realizou ao se tornar – não só a Rainha do Submundo, mas – a ponte entre
dois mundos opostos teria chegado a nós, nenhuma de suas bênçãos, nem seus Mistérios.

No livro da escritora e praticante de bruxaria Mirella Faur, O Círculo Sagrado para


Mulheres Contemporâneas, Perséfone é relacionada à lua em dois aspectos, o da Donzela que
é ligado à lua crescente, e também ao aspecto de Deusa Negra ligado à lua nova, bem como a
minguante. Outros arquétipos no qual Faur encaixa a deusa são a Libertadora, a Renovadora,
a Mãe dos Grãos. A deusa poderia também facilmente ser encaixada em outros aspectos
baseado no que foi apresentado até então no trabalho, tais como a Transformadora, a Senhora
da Dança e da Mudança, a Guardiã do Fogo, a Senhora da Natureza e a Curadora. Perséfone é
uma deusa que consegue se adaptar com enorme facilidade e é isso que ela ensina àqueles
que a buscam ou àqueles que usam seu arquétipo para conseguir transformar a própria vida,
isso principalmente no caso daqueles não acreditam na existência da deusa.

A proposta do livro de Faur é que através de diversos rituais com deusas diversas, a
mulher encontra a cura de suas feridas para transcender a um novo estado de consciência
mais amplo e seguro. Perséfone combina muito com a obra da autora, já que ela cuida das
transformações da vida e da autonomia sobre si e seus potencias. Como foi dito anteriormente
na dissertação, Perséfone e o Sagrado Feminino andam lado a lado e esse aspecto é muito
presente em seu culto atual, seja homem ou mulher, a cura da energia feminina será trazida a
você, pois uma coisa que a deusa ensina é que todos devem se equilibrar.

5.2 – Relatos de Devotos


Como muitas divindades, Perséfone também possui
seus seguidores, quer sejam eles sacerdotes formais e
iniciados ou devotos de forte fé. E aqui, nesta seção, está
registrado a seguir diversos relatos de algumas pessoas que tem
uma relação bem construída e saudável ou breve com a
deusa.

Gabriel Alves, 19 anos, um jovem de São Paulo devoto de Perséfone, disse o seguinte
sobre seu relacionamento com a deusa ctônica e ainda deixando um parecer sobre a visão
social que tem da deusa:

“No início da minha prática eu cultuei ela e Hades, ambos se


manifestaram como guia dessa minha criança (13 anos na época)
conhecendo a bruxaria, passei uma roda com ela e foi o momento
de experimentação e crescimento mágico. E de nada Perséfone tem
de vítima. Ela é o poder e a sabedoria do sacrifício, numa
perspectiva menos machista se olhar para divindade vai ver que a
morte da inocência e a própria morte de si leva ela a ascencionar.
Digo machismo porque no mito de Odin (deus nórdico), ele se
sacrifica e é visto como louvável; ela por amar e abrir mão do que
tinha para conhecer o novo é vista como vítima”.

Draco Vendra Minuzzo, 23 anos, outro paulista de descendência italiana e praticante


de Stregoneria (ramo italiano de bruxaria), tem uma relação diferenciada com a deusa por
conta de sua prática pessoal, mas relatou:

“Meu contato com "Perséfone" se dá através da Madonna Nera,


que sintetiza a veneração ao mistério divino que é a Rainha do
Submundo, ou, como chamamos: Terra Silenciosa, Terra Sem
Retorno ou Mansão dos Mortos. Ela tem um papel duplo e que é
fundamental na minha vivência de sagrado. Nós a percebemos como
aquela que causa as pulsões da Vida aqui em cima e da Morte lá
embaixo.

Ela é também uma peregrina, que atravessa os reinos e as posições


de realeza. Ela se mostra calma, benevolente, porém severa nos
momentos apropriados. Enfim, encontro nela uma ajuda amigável,
não muito expansiva, uma sobriedade maternal ou jovial, ao
depender das estações e momentos em que ela é invocada. E é uma
Deusa à qual eu tenho muito carinho”.

Já Dítol Maveg embora diga, em seu relato que seguirá, que Perséfone não é uma
deusa presente em sua vida, deixou seu parecer mediante a uma experiência na qual a mesma
estava envolvida, ainda que ele não tenha tido contato com ela diretamente. Diz o carioca de
19 anos:

“Perséfone não é uma Deusa presente na minha vida. Nunca foi. Já


tive um contato superficial com ela e, nesta Roda, eu deveria ter
tido mais um. Ela faz parte das Deusas escolhidas pela autora do
livro Dark Goddess Craft, que reúne 12 meditações com Deusas
diferentes, divididas em 3 aspectos da clássica Jornada do Herói,
do Campbell. Descida ao Submundo, Desafios e Renascimento. Eu
devo dizer que tomei este trabalho mágico de forma leviana e nunca
poderia imaginar os resultados que ele traria para minha vida. Ele
me lançou com toda força em direção a uma Jornada do Herói de
fato, me fazendo vivenciar minha Noite Escura da Alma.

Perséfone era a última Deusa abordada, estando na seção de


Renascimento. Ao longo da Roda, eu vivenciei o sentimento de
abandono espiritual, como se não houvesse mais conexão entre os
Deuses e o eu. Houve um conflito interno muito grande. Por um
lado, eu não queria mais continuar minhas práticas espirituais por
ter perdido meu propósito e minha visão sobre elas. Por outro, uma
grande sensação de dever, derivada dos meus votos sacerdotais. Eu
fiquei com o básico a partir daí. Meus Esbats, que estavam sendo
reservados para essas meditações com Deusas, passaram a ser ritos
menos estruturados, mais voltados ao cerne da prática wiccana. A
última Deusa que eu celebrei, nesse contexto, foi a sétima, Éris, no
Esbat de Maio.

E apesar de não ter ido ao final do trabalho, nem manter um


contato profundo com Perséfone, em particular, Ela é uma Deusa
que tem relação direta com minha principal Deusa de culto, Hécate.
Todos os anos, Hécate é responsável por guiar Perséfone da Terra
para o Submundo, e vice-versa. E, pelo que eu observo de outros
devotos, todos nós podemos compartilhar, no mínimo, algum
momento de nossas vidas em que nós nos tornamos a própria
Perséfone. Descemos ao Submundo; nos deparamos com a fome
espiritual, o vazio; e ao se integrar a parte daquilo, consumindo as
sementes, reivindicamos nossa Soberania. Nos preparamos para
retornar para a superfície com ainda mais poder. Apesar das
diversas Deusas abordadas no trabalho da autora, de longe se pode
dizer que Perséfone melhor representa todo o contexto (Ok, Inanna,
você também!).
Uma das sacadas mais legais sobre o mito de Perséfone que a
autora aborda é também um dos temas recorrentes entre devotos de
Hécate, a escolha. Embora em algumas versões do mito seja
descrito que Hades forçou Perséfone a comer as sementes, a autora
questiona se, na verdade, ela não comeu por escolha própria,
abraçando o poder do Submundo. Esta é a mesma questão
abordada por diversos praticantes de Magia ao se falar sobre A
Noite Escura da Alma. 'The only way out is through.'”2

Aedan Gribnoy, 19 anos, postulante à iniciação da Tradição de Wicca e Bruxaria


Caminhos das Sombras, conta sobre sua experiência com a deusa e os diversos ensinamentos
que ela vem lhe dando:

“Inicialmente, ao conhecer os caminhos da deusa Perséfone fiquei


um tanto quanto fascinado com sua aventura ao Submundo, o que
naquela época me deixou com um pouco medo, mas ao mesmo
tempo, muito curioso, já que os mistérios do Submundo é algo que
faz-se acender chamas em meus olhos.

Durante minha vivência, sentir Perséfone muito próxima a mim,


porém assim como o seu mito ela obrigou-me a seguir algumas
regras básicas:

‘Esteja ciente antes de começar, que você terá que


deixar para traz tudo aquilo que está dentro da sua
bolha social, tudo que está dentro da sua zona de
conforto.

Seu mundo como conhecia antes, está por um fio, é


hora de crescer, garoto. Não irá ser fácil, pois assim
como eu, uma parte sua ficará no Submundo.
Conhecimento é alimento da alma e quem come do
Submundo, não poderá mais voltar, não como antes’.

2
Tradução: “O único caminho é passando”.
E foi assim que comecei, cheio de cláusulas com a deusa, já estava
totalmente ciente que não seria fácil, e de início ela se mostrou um
pouco rígida, mas acho que era o mais correto a se fazer. Ao longo
da vivência, ela foi se aproximando aos poucos, sempre preocupada
e perguntando se estava tudo bem, ainda hoje é assim. Perséfone
sabe o tamanho da dor ao deixar coisas importantes para traz, por
isso ela tem uma grande preocupação em saber se você está
precisando de algo, mesmo que seja apenas um abraço. Ela é
aquela que corta os maus hábitos, que muda toda a nossa rotina,
mas também é aquela que nos deixa mais próximos do nosso eu
verdadeiro, ela é aquela que nos enche de amor individual, assim
como de amor ao conhecimento. Ela é a chave do nosso eu pessoal
que nos leva ao mais profundo dos Submundos: ‘A nossa sombra’, e
nos vira do avesso, tudo para que possamos viver limpos, aceitando
cada célula do nosso corpo exatamente do jeito que ela é, aceitando
nossas feridas e mágoas.

Minha Experiência com ela foi totalmente diferente daquelas que já


tive com outras divindades, pelo simples fato de Perséfone ser
aquela que arranca nossas cabeças, mas também nos dá o melhor
dos remédios, ela é a Conhecedora. Resultado disso, é que hoje sou
uma pessoa muito melhor, me aceito do jeito que sou e ao sair do
meu pequeno mundo paralelo, conheci novas pessoas e aumentei
meus horizontes. Ela permitiu que acima de tudo, por mais amor
que sinto pelas pessoas mais próximas, é necessário deixa-las um
dia, pois cada um tem sua vida, assim é claro como sua morte, e que
o mais importante é se amar.

O mito da Deusa fala muito sobre amor e sua passagem de menina


para mulher, sua vida como a Dama do Submundo, cheia de
responsabilidades. Para mim, ela me mostrou apenas alguns
‘Feelings’ para me amar mais, digamos que foi ela quem aumentou
meu amor próprio, coisa que era totalmente inalcançável”.

Margo Moon, 24 anos, é mais uma devota de Perséfone e tem um blog dedicado a ela,
o Templo de Perséfone. Formada em Letras, a paulista trilha o caminho da auto-dedicação da
religião Wicca de maneira solitária, em seu blog encontra-se textos dedicados à deusa e
outras informações, dentre elas o texto abaixo que a bruxa disponibilizou.

“PERSÉFONE EM MINHA VIDA (12/02/2018)

Pelo que me recordo de mim mesma (brincadeiras à parte), sempre


flertei tanto com a doçura estilo ‘princesa Disney’, como também
com a altivez de uma Rainha, com a simplicidade de passar horas
de frescor em contato com a terra, mas também de ter o conforto de
um lugar aconchegante e bonito... talvez essas tenham sido as
primeiras manifestações da energia de Kóre/Perséfone em minha
vida, mesmo que eu não soubesse quando pequena.

Mas, quanto as minhas lembranças mais tenras de pensar em


Perséfone, foi na minha adolescência, acredito que a partir de uns
quinze anos... estudei Mitologia Grega na aula de História, no 1º
ano do Ensino Médio, o que despertou meu interesse por esse
panteão. Lembro de colher amoras do pé na escola e comê-las
embaixo das amoreiras a partir do 2º ano do Ensino Médio,
frequentemente pensando em Perséfone, porque as amoreiras me
fazem pensar na Primavera, e Kóre/Perséfone é a Deusa da
Primavera e eu sempre lembrava disso, mesmo antes de me tornar
Neopagã.

E sabe que algum passarinho fez cair uma semente de amora no


meu quintal, e hoje ela se transformou em uma frondosa amoreira?
E eu penso em quem? Perséfone, claro!

Depois que terminei o Ensino Médio que me tornei Wiccana.


Cheguei a passar uma Roda do Ano com Perséfone e Hades e
embora eles não tenham sido Deuses aos quais contatei logo de
início há certo tempo já me sentia fascinada por eles, sim, desde o
Ensino Médio, uma fascinação que foi crescente...

Quando passei a Roda do Ano com Perséfone e Hades me senti


mais próxima dele, Perséfone parecia misteriosa para mim. Com o
tempo, durante e após essa Roda, continuei a me interessar por ela
e, aos poucos, nossa proximidade foi crescendo.
Eu sinto Perséfone nas coisas inocentes, nos momentos em que dou
liberdade à minha criança interior, quando sinto prazer em andar
de bicicleta, quando recebo flores de quem amo, quando sinto o
amor da minha mãe, quando aprecio a beleza das flores, então eu
sinto Perséfone na sua face Kóre.

Perséfone, a Rainha do Submundo, eu sinto quando expresso minha


força feminina, quando me arrumo de maneira caprichosa e me
sinto uma Rainha, quando com um pouco de charme consigo aquilo
que quero, quando em meio a lágrimas encontro uma luz, quando
aprendo com a dor, quando me sinto poderosa!

Eu sinto Kóre/Perséfone enquanto escrevo neste templo virtual,


quando sinto minhas emoções equilibradas, quando sinto minha
força interior, quando consigo tanto cumprir com minhas
obrigações quanto ter tempo de ser menina de novo...”

Aileen Daw, 33 anos, sacerdotisa wiccana da Tradição de Wicca e Bruxaria Caminho


das Sombras, deixa claro em relato que a presença de Perséfone em sua vida começou desde
cedo, em 2004 quando tinha 18 anos, quando passou pelo processo de dedicação da tradição
da qual faz parte. Ela hoje é sacerdotisa consagrada à Aset (nome egípcio da deusa Ísis) e
parte de desse processo de consagração foi escrever o livro Vivendo Ísis, no qual ela chega a
comparar brevemente as duas deusas. Em seu relato, Aileen ainda conta sobre sua fase atual
de vida na qual ela teve de se mudar para Bélgica por conta de uma bolsa de estudos e
trabalho, a situação por mais favorável que possa parecer não era para ela, pois tinha muitas
coisas a se pensar, inclusive na vida familiar agora que tem seu filho pequeno, Felipe.

Aileen ainda fala de um projeto que criou no Padrim (sistema online de financiamento
coletivo) chamado Projeto Deusas e Laboratório Estelar onde a proposta era ajudá-la a criar
conteúdo para seus livros sobre magia e esoterismo através de vivências e estudos espirituais
obtidos pela assinatura de um dos planos mensais, do qual pude ter o prazer fazer parte. Um
dos lados do Projeto Deusas foi dedicado à Perséfone e nessa parte houve um trabalho de
“Descida ao Submundo”, no qual Aileen desenvolveu baseada na jornada do livro Journey to
the Dark Goddess: How to Return to Your Soul de Jane Meredith, onde a pessoa ia
voluntariamente aos confins de si mesma, assim enfrentando suas sombras e problemas, para
que depois emergisse no controle de sua própria vida, se tornando assim soberana de si.
Esse foi um dos relatos mais comoventes que foi dado para o artigo dedicado à deusa.

“Minha experiência com Perséfone começou com um teste na internet, quando eu tinha me mudado
de Brasília para Belo Horizonte para fazer faculdade. Eu me
identifiquei muito com esse lado de inocente dela, de ingenuidade,
de que foi superprotegida pela mãe e que estava aprendendo a ser
independente num lugar novo, foi muito isso... e durante toda minha
faculdade, eu me senti conectada com essa parte e as minhas
questões, tanto de independência quanto de autoestima, foram
muito importantes nesse tempo e acho que ela me ajudou muito
nisso. Eu era muito insegura e isso foi até eu ir para o sul, porque
eu fiz faculdade em Belo Horizonte. Foram cinco anos em Belo
Horizonte e mais dois de mestrado no Sul (Rio Grande do Sul), em
que eu sentia esse lado dela muito presente, porque eu não
conseguia ter tudo que queria num mesmo lugar. Então, eu tinha a
minha terra, Brasília, com os meus amigos, a minha família –
especialmente minha mãe porque eu ainda dependia muito dela. E
do outro lado no Submundo tinha outros amigos e, em alguns
momentos, o meu “Hades”, o meu amado estava no meu Submundo.

E eu sentia muito de não conseguir conectar esses dois lados, de


não ter tudo num lugar só. Então, isso me fazia se aproximar muito
desse aspecto de Perséfone: de nunca ter tudo num lugar só. E aí,
recentemente, depois que a gente trabalhou com ela no Padrim, que
foi quando eu me toquei que ela nunca tinha ido embora, porque
mesmo estando meu Hades, meu amado, na minha terra... os meus
Mundos eram diferentes. Meu mundo de bruxaria, todo esse
universo, ele não se compartilha com o da minha família. São
coisas diferentes e eu não consigo estar nos dois ao mesmo tempo,
mas também com ela e com Aset (Ísis), é claro, descobri que não
preciso, sabe? Que essas coisas não precisam se misturar. E isso foi
um amadurecimento recente depois dessas coisas que vivemos no
Padrim e a minha Descida (ao Submundo).

Acho que a minha última questão, assim, com Perséfone foi


aprender o desapego. Tudo é um ciclo e independente de onde você
está, as pessoas que você ama estão com você, sabe? Eu pensei isso
especialmente quando estava me preparando para vir para cá
(Bélgica), que também foi um processo que começou com o nosso
projeto no Padrim. Foi muito isso... foi eu entender que eu não
preciso estar perto para estar presente e a maioria dos meus amigos
de verdade não moram perto de mim e já não moravam antes.
Então, também aprender a ser independente da minha mãe e não
esperar pela aprovação dela para fazer as coisas foi um desapego
de muita coisa.

Tipo assim, quando a gente começou a pensar em sair do Brasil


antes da minha bolsa (de Pós-Doutorado) sair, a gente falava já
disso. Eu pensava “Poxa, mas aqui tem minha mãe que é minha
rede de apoio com o Lipe, tem os meus amigos, tem o Círculo
(grupo de praticantes), tem a nossa casa que a gente acabou de
montar... acabou deixar ela jeito que a gente quer... A gente vai
largar tudo para começar do zero com um monte de lugar
desconhecido?” Então, isso me prendia muito e quando a gente
começou a fazer a Descida ao Submundo lá no Padrim, eu comecei
a desapegar disso, entende? Que cara, não precisa de nada disso.

Isso para mim foi uma lição muito forte de Perséfone, e foi depois
que eu internalizei que eu realmente entendi isso, que a minha bolsa
saiu. Tanto que foi assim: eu subi (do Submundo) e cinco dias
depois eu recebi a bolsa”.

Por fim, mas não menos importante, segue o último relato de Eilonwy Swan
Hawthorn, a garota carioca de 22 anos está no mundo místico desde os 12 anos, quando
começou a estudar o assunto e tem uma relação com Perséfone tão íntima que em seu relato
conta sobre uma jornada espiritual que desenvolveu a pedido da própria deusa. A garota é
estudante universitária na faculdade de Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) e através de sua vivência com Perséfone conseguiu compreender muito sobre si de
forma tão profunda que poucos na sua idade conseguem ter a maturidade que a jovem tem em
diversos momentos da vida.

Esse é outro que relato muito tocante e especial, aqui pode ser quase tangível a força e
a presença da deusa.
“Minha relação com Perséfone começou quando busquei pelos
meus deuses pais, dentro da bruxaria é comum alguns praticantes
adotarem o conceito de que nossa essência foi forjada pelos deuses
antigos. Na época, eu fiquei cismada com algumas coisas que
vinham me acontecendo na minha vida pessoal e, então, foi nessa
hora que Perséfone chegou. Alguns acreditam que apenas se pode
ter uma mãe e um pai divino, mas outros veem a possibilidade de
mais de uma divindade, eu acredito nisso.

Enfim, quando a deusa chegou na minha vida eu pude sentir a


energia sutil dela me rodeando e no dia que senti a nova presença,
que não sabia ser a dela, acabei por sonhar que a encontrava numa
floresta. Ela me levou para um penhasco onde conversamos vendo o
pôr-do-sol no mar. Falo sobre mudanças e a dor que elas traziam,
mas que tudo sempre passava e que no final acabava por fortalecer
nosso espírito. Eu fiquei muito abismada com a conversa porque até
o momento eu não sabia quem ela era e quando perguntei seu nome
ela disse que eu descobriria quando abrisse meus olhos. Quando
acordei, me deparei com muitas borboletas e com uma amiga me
falando sobre mitologia grega e Perséfone.

Ao me abrir para a experiência com ela pude passar por diversas


transformações e nesse ano, 2018, eu desenvolvi uma jornada que é
ligada não só à deusa, mas também à lua, que no paganismo é
considerada uma manifestação de uma grande deusa. Nessa
jornada, cada mês tem um tema que é trabalho com Perséfone e a
lua, esta em cada uma das quatro fases, nas celebrações que
chamamos de esbat, que são dedicadas à lua. O que eu não sabia é
que eu seria sujeita a tantas mudanças em minha vida,
principalmente porque estive em conflito com meu gênero e foi
através de muitas coisas e da deusa que compreendi que era uma
pessoa genderfluid (gênero-fluido), e que eu era mais menina do
que menino, por isso pedi para ser tratada no trabalho como
garota, mesmo que tenha nascido num corpo de menino.

Desde o começo, ela se mostrou presente a todo instante. Ela é uma


deusa que se preocupa, e muito, com aquele que a procura, seja por
um breve momento ou para um sacerdócio até o fim da vida. Ela
tem essa preocupação, pois entende as aflições de um coração que
se encontra só e não vê saída de seu conflito. Ela passa a mão na
cabeça e te mostra as formas diversas com que pode resolver seu
dilema. Ela pode ser uma mãe, uma amiga, uma irmã, uma mestra.
Ela será para você o que você precisar que ela seja. Ela te ajuda a
atravessar o medo para achar a sua coragem, ajuda a ver além da
ilusão para que enxergue no espelho da alma a sua verdadeira
forma e beleza, para mim nesse aspecto Perséfone é uma ótima
deusa para se trabalhar o amor-próprio.

Entendo que Perséfone é uma deusa cíclica, isto é, uma deusa que
sempre está revivendo os mesmos ciclos de passagem, como as
estações do ano. Ela é uma força tão intrínseca dentro de todos nós
que se nos propuséssemos a entender as mudanças que a natureza
passa em paralelo com as nossas próprias, aprenderíamos a lidar
melhor com as mudanças que acontecem conosco. Perséfone me
ensinou a não me vitimizar pelo o que aconteceu comigo e a
entender que eu tenho que tomar o controle da minha própria vida e
de todos os meus potenciais.

Perséfone é muito mais do que uma donzela indefesa, muito pelo


contrário, ela é a donzela que aprendeu a se salvar. A mulher que
conquistou todo o seu poder e que agora o usa em prol de coisas
para si e para um bem maior. Ela me ajudou em todas as
transformações pelas quais passei, fosse direta ou indiretamente.
Ela é a força que pulsa na primavera, o calor do núcleo da Terra no
inverno. Perséfone jamais morre. Perséfone se transforma. Afinal, é
como disse Lavoisier: “Na Natureza nada se cria, nada se perde,
tudo se transforma” e Perséfone é isso. Transformação,
empoderamento, auto salvação, intuição, autoconhecimento,
transcendência. Não tem como ela não ser nada, quando já é tudo.

Se não fosse por essa deusa, que é tão especial e querida por mim,
não sei como estaria no dia de hoje e nem se estaria aqui. Porque
ela me ajudou a lutar contra a depressão e todas as ideações
suicidas que tive, me confortou em crises existenciais e de
ansiedade. Ela me ensinou o que era a Morte de fato e que eu não
tinha de fazer aquilo comigo mesma, eu só precisava me voltar para
dentro e confrontar meus demônios. Ela estendeu a mão dela para
mim e disse que nunca, jamais, sairia do meu lado e até hoje ela
está aqui. Não tenho palavras suficientes para agradecê-la, ela me
salvou... me salvou de mim mesma.

Ela é uma deusa que dá colo quando precisa, que te ensina o


caminho do meio, do equilíbrio. Ela é uma deusa que aprendeu com
o sofrimento da solidão, mas que agora consegue se adaptar a
qualquer coisa, uma verdadeira camaleoa. Ela oferece sua mão
para que aqueles que, assim como ela, passam por dificuldades e
não querem desistir, querem aprender com as mudanças. E isso ela
trouxe para minha vida... mudanças. Hoje em dia posso dizer que
vivo em função disso, pois assim como o verão acaba para o
inverno chegar, é só um pequeno instante até que o fôlego da
primavera retorne à Terra.

Bom, acho que é isso... ela é uma deusa fantástica e uma das que
mais vive presente na cultura pop. Seja em livros, filmes, séries... o
que for, ela está lá na maioria das vezes, ou algum fragmento do seu
mito, que para mim é muito injustiçado. Hades é um perfeito
cavaleiro com aquele ar sofisticado e sóbrio, carregado de
melancolia. Ele ama Perséfone e ela a ele. Sempre que converso
com Perséfone sobre amor, ela fala que é algo agridoce. E eu não
entendia, mas hoje em dia entendo e esse texto que discursei reforça
o que ela me disse. Lembro da primeira vez que perguntei se ela
amava mesmo Hades e ela respondeu: ‘Sim, o amo com o todo meu
coração. No começo foi difícil viver longe da minha realidade e eu o
culpava por isso, mas quando me permiti conhecê-lo não pude não
me apaixonar’. Gente... eu juro que chorei nesse dia. E teve uma
outra vez que fui meditar com Perséfone e vi Hades, ele nunca me
transmitiu nada ruim. Só pareceu caladão. Quando perguntei onde
Perséfone estava no castelo, certa vez, ele falou: ‘Nos jardins dela’
e apontou com a mão segurando uma taça de vinho.

Meu culto a ela é muito íntimo e profundo, converso com ela e peço
conselhos. Acendo velas e faço rituais com diversas finalidades... de
um simples feitiço de cura até um grande ritual de adoração e
honra a ela. Tenho certeza de que ela é uma das deusas que jamais
irá embora da minha vida, sinto isso nos meus ossos e no meu
espírito.

Perséfone é a dualidade, a mutação, a deusa que habitas dois


reinos. E assim como ela, eu sou assim. Uma pessoa que transita
entre os polos masculino e feminino e aprendeu a se amar, se
empoderar e viver uma vida mais conectada com o meu interior. Eu
aprendi a ser uma jovem donzela segura si, que ama se divertir e
ser gentil, mas também aprendi a ser mulher e a trazer a força do
feminino quando necessário. Perséfone é uma deusa sem
precedentes, ela é um doce de menina e uma mulher incomparável.

Ela me ensinou muito mais do que eu podia imaginar. Ela é uma


grande mãe, mas acima de tudo uma verdadeira amiga.

Perséfone simplesmente é”.


6. Conclusão
Podemos assim, concluir que Perséfone é muito ampla em toda sua natureza e que
pode ser muito explorada, tanto espiritualmente quanto arquetipicamente. As abrangências
dessa deusa como figura mitológica exalta a criatividade do autor, que personificou nela
tantas características que até hoje continuam sendo descobertas e exploradas. Como uma
deusa de importância tão extrema quanto Hera, Rainha do Olimpo e dos deuses, Perséfone
difere apenas no quesito proximidade com os seus devotos, como pudemos ver no decorrer
no trabalho. E é por sua proximidade com o homem e seu auxílio em transições de vida e
mudanças profundas, seja direta ou indiretamente, que tantos atributos lhe são conferidos.

Assim, encerro o trabalho deixando claro que Perséfone é uma figura complexa e que
exige muito daquele que for estuda-la, seja na área que for, mas que sem dúvidas corresponde
ao intento da pesquisa que era averiguar sua posição como deusa de transformação e
empoderamento por demonstrar estar presente em diversas pontos da vida humana quando
tais assuntos são postos em pauta.
7. Agradecimentos
Gostaria muito de aqui explicitar meus agradecimentos por poder ter realizado tal
trabalho que gratificou muito a minha pessoa. Quero deixar aqui minha profunda gratidão a
todos os envolvidos, meus amigos da faculdade, colegas bruxos. Aileen muito obrigada, pois
sem você e a inspiração que me passa esse trabalho não seria possível, obrigado pelo projeto,
por se predispor a ajudar antes mesmo de eu de fato começar a digitar este trabalho. A
Eilonwy, por sua coragem e bravura em abrir o coração e contar sua história íntima com a
deusa, meus parabéns, amiga, você merece muito. Ao Draco que vive me salvando entre
xícaras de café e cochiladas. Ao Aedan que esteve comigo durante o projeto do Padrim da
Aileen. Ao Gabriel, à Margo e ao Dítol pelas palavras tão lindas sobre a deusa.

Ao professor Vinícius, que deu um suporte num momento da minha pesquisa e me


acalmou durante alguns surtos, um agradecimento mais que merecido e especial.

Mas, principalmente, não posso deixar ela de lado. Quero agradecer à deusa Perséfone
que me guiou durante todo o momento, que sussurrou a ideia do trabalho nos meus ouvidos
me levando a encontrar informações, livros, sites, palestras e muitas coisas que foram cruciais
para o desenvolvimento deste extenso e profundo trabalho. Χαίρε Περσεφóνη (Khaíre
Persephónē)!
8. Referências
ANTUNES, Maria Carolina De A. Perséfone: A Morte Como Transformação. São Paulo:
Pontifícia Universidade Católica, 2008.

BULFINCH, Thomas. O livro da Mitologia. São Paulo: Martin Claret, 2006.

DITTRICH, Larissa F.; VOLPI, José Henrique. O mito de Perséfone e sua relação com o
caráter oral. In: ENCONTRO PARANAENSE, CONGRESSO BRASILEIRO DE
PSICOTERAPIAS CORPORAIS, XVIII, XIII, 2013. Curitiba: Centro Reichiano, 2013.

ESTÉS, Clarissa P. Mulheres que Correm com os Lobos. Rio de Janeiro: Rocco, 2014.

FAUR, Mirella. O Anuário da Grande Mãe. São Paulo: Alfabeto, 2016.

FAUR, Mirella. Círculo Sagrado para Mulheres Contemporâneas. São Paulo: Pensamento,
2011.

HESÍODO. Teogonia. São Paulo: Martin Claret, 2014.

HOMERO. Ilíada. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2013.

–––––––––. Odisseia. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2011.

MEREDITH, Jane. Journey to the Dark Goddess: How to Return to Your Soul. United
Kingdom: John Hunt Publishing, 2012.

REIF, Jennnifer. Mysteries of Demeter: Rebirth of the Pagan Way. Massachusetts: Weiser
Books, 2000.

RIORDAN, Rick. Percy Jackson e os Deuses Gregos. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2015.

VALLEJO, Boris. VALLEJO, Doris. Ladies: Retold Tales of Goddess and Heroines.
Pensilvânia: Running Press, 1999.

WOOLGER, Jennifer Baker. WOOLGER, Roger J. A Deusa Interior: Um Guia Sobre os


Eternos Mitos que Moldam Nossas Vidas. São Paulo: Pensamento-Cultrix, 1993.

WRIGHT, Dudley. Os Ritos e Mistérios de Elêusis. São Paulo: Madras, 2005.

8.1– Referências Digitais:


https://en.wikipedia.org/wiki/Persephone#Etymology Acessado em: 20/10/2018
https://pantheanism.files.wordpress.com/2011/06/temple-persephone.pdf Acessado em:
20/10/2018

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pers%C3%A9fone Acessado em: 20/10/2018

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