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AS VERDADEIRAS CAUSAS DOS ELEVADOS PREÇOS DOS COMBUSTÍVEIS

NO BRASIL E SUAS SOLUÇÕES


Fernando Alcoforado*
Este artigo tem por objetivo analisar as verdadeiras causas dos elevados preços da
gasolina, óleo diesel e etanol anidro no Brasil. O preço da gasolina aumentou mais de
32% nos postos em 2021. O preço do diesel aumentou quase 50% desde maio
de 2020. Para abordar esta questão, foi analisada a cadeia de comercialização da gasolina,
do óleo diesel e do etanol anidro e a composição dos seus preços no Brasil, a carga
tributária aplicada aos preços dos derivados de petróleo no Brasil e em outros países, a
composição acionária da Petrobras para identificar quem manda efetivamente na
empresa, a política de preços de derivados de petróleo da Petrobras que está atrelada à
variação do preço do petróleo no mercado internacional e à variação do dólar e a evolução
da produção nacional, exportação e importação de petróleo no Brasil para identificar o
peso das importações de petróleo no suprimento de petróleo ao Brasil.
A Figura 1 mostra a cadeia de comercialização da gasolina, óleo diesel e etanol anidro no
Brasil.

Figura 1- Cadeia de comercialização da gasolina, óleo diesel e etanol anidro no


Brasil

Fonte: https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/02/05/como-sao-formados-os-precos-da-gasolina-e-
diesel.ghtml

Os preços da gasolina, óleo diesel e etanol anidro no Brasil são extremamente elevados
porque são impostos pela ação da Petrobras que é a empresa dominante no mercado e,
também, da venda pelo cartel de empresas privadas. A gasolina vendida nos postos de
combustíveis é uma mistura entre gasolina e etanol anidro. A divisão é de 73% e 27%,
respectivamente. O preço final da gasolina é formado por 44% de impostos (29% do
ICMS que é estadual e 15% do PIS/Pasep e Cofins que é federal), 29% para a Petrobras,

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15% para os fornecedores do etanol anidro e 12% de lucro para as revendedoras. Com o
óleo diesel a Petrobras fica com 47% do preço final, os impostos correspondem a 23% do
preço. O ICMS cobrado é maior, com 14% e o Cide, PIS e Cofins corresponde a 9%. Os
revendedores ficam com 16% do valor pago pelo diesel. Há também influência do
biodiesel porque é necessária uma mistura mínima ao diesel mineral em proporção de
12% pelas distribuidoras, segundo a Petrobras.
Um dos questionamentos que tem sido feito na atualidade principalmente pelo governo
Bolsonaro e pela direção da Petrobras é o de que os preços dos derivados de petróleo são
elevados porque resultam do valor elevado dos impostos neles incidentes. Se forem
comparados os valores que se cobra de imposto sobre derivados de petróleo no Brasil
com o de outros países, chega-se à conclusão que esta crítica não é verdadeira. Segundo
dados da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), a média dos países da
OCDE apresenta 53,8% de imposto sobre o preço final, enquanto a média dos países do
G7 é de 56,4%. O peso dos impostos no preço final dos combustíveis em média é de
36,5% no Brasil. De acordo com a Opep, o percentual de impostos no preço final de
combustíveis em alguns países é o seguinte: Reino Unido: 68,9%; Itália: 66%; França:
63%; Alemanha: 60,5%; Brasil: 36,5%; Canadá: 36,2%. Estados Unidos é uma exceção
com 23,9%.

A responsabilidade pelos valores extremamente elevados dos preços da gasolina, óleo


diesel e etanol anidro no Brasil está mais relacionada com quem exerce efetivamente o
poder na Petrobras: o capital especulativo nacional e estrangeiro. A análise da Figura 2
(Composição acionária da Petrobras) permite constatar que 48% do capital da Petrobrás
está em poder do governo brasileiro (União) e instituições a ele ligadas (BNDES,
BNDESPar e PREVI) que nem sempre atuam nos pregões das bolsas de valores, enquanto
os 52% restantes pertencem a aqueles que atuam nas bolsas de valores, sendo que deles
70% correspondem ao capital especulativo estrangeiro (Resol. 4373 e ADR’s). Conclui-
se, portanto, que o capital especulativo nacional e estrangeiro, que tem uma visão de
curtíssimo prazo buscando o máximo de lucratividade nas operações da empresa para
elevar o preço das ações nas bolsas de valores no Brasil e nos Estados Unidos é que impõe
a política de preços de derivados de petróleo que compromete os interesses da população
brasileira e do Brasil.

Figura 2- Composição acionária da Petrobras

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Fonte: http://www.fnpetroleiros.org.br/artigos/9/a-quem-deve-servir-a-petrobras-ao-brasil-ou-ao-
mercado-financeiro

A atual política de preços de derivados de petróleo da Petrobras, que começou a vigorar


em 2016 no governo Michel Temer estabelecendo reajustes baseados na paridade com o
preço do petróleo no mercado internacional, visa valorizar o preço das ações da empresa
nas bolsas de valores passando a atender o mais alto interesse de seus acionistas privados
em detrimento dos interesses nacionais. À época, a direção da Petrobras explicava que os
reajustes seriam baseados na paridade com o mercado internacional e mais uma margem
que seria praticada para remunerar riscos inerentes à operação, como, por exemplo,
volatilidade da taxa de câmbio e dos preços sobre estadias em portos, e lucro, além de
tributos. A Petrobras dizia ainda que a nova política de preços previa avaliações para
revisões de preços pelo menos uma vez por mês. Esta é a principal causa dos preços
extremamente elevados de derivados de petróleo praticados pela Petrobras em prejuízo
dos consumidores e do desenvolvimento do Brasil.
Foi a política de preços da Petrobras, que estabeleceu que os reajustes dos preços de
derivados de petróleo baseados na paridade com o mercado internacional, que contribuiu
para que, com a elevação do preço do petróleo no mercado internacional, a situação dos
preços de derivados de petróleo no Brasil chegasse à situação calamitosa atual. A
principal pressão sobre os preços dos combustíveis no Brasil vem dos preços
internacionais do barril do petróleo. Levantamento da consultoria Economatica mostra que o
barril de petróleo WTI acumula alta de 164% desde o início de maio de 2020. Alie-se a este fato
a desvalorização do real em relação ao dólar em consequência da fuga de capitais do
Brasil em consequência do estado pré-falimentar da economia brasileira resultante da
incompetente gestão da economia nacional e pela adoção da politica econômica
neoliberal. A Figura 3 mostra a evolução do preço do barril de petróleo no mercado
internacional de janeiro de 2018 a julho de 2021.
Figura 3- Evolução do preço do barril de petróleo no mercado internacional

Fonte: Tendências Consultoria

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Pode-se afirmar, pelo exposto, que uma das soluções imediatas para impedir a contínua elevação
dos preços da gasolina, óleo diesel e etanol anidro no Brasil é mudar imediatamente e
radicalmente a política de preços da Petrobras passando a considerar a variação do custo de
produção interna de petróleo em reais e a variação do preço internacional do petróleo incidente
apenas sobre o petróleo importado proporcionalmente à sua participação no suprimento interno
de petróleo do Brasil que correspondeu, em 2020, a 9,77%, que foi calculada com base nos
valores indicados na Figura 4.
Figura 4- Evolução da produção, exportação e importação de petróleo no Brasil

Fonte: https://www.ibp.org.br/observatorio-do-setor/snapshots/producao-importacao-e-exportacao-de-
petroleo/

O valor 9,77% foi calculado para 2020 considerando a produção nacional de petróleo destinada
ao mercado interno que foi de 3,01 milhões de barris menos as exportações de 1,44 milhão de
barris por dia (=1,57 milhão de barris por dia), enquanto a importação foi de 0,17 milhão de barris
por dia. A relação entre o valor da importação (0,17) com a soma da produção nacional para o
mercado interno com a importação de petróleo (1,74) corresponde a 9,77%. Isto significa dizer
que, além dos custos internos de produção nacional do petróleo em reais, apenas 9,77% da
variação do preço internacional do petróleo deveria ter sido considerado na determinação dos
preços dos derivados de petróleo da Petrobras em 2020. Isto significa dizer que seriam
considerados os interesses dos consumidores brasileiros e do Brasil e não apenas dos acionistas
nacionais e estrangeiros da empresa.
De tudo que acaba de ser exposto, pode-se considerar, portanto, como solução imediata para
evitar a escalada contínua dos preços de derivados de petróleo no Brasil, o abandono da política
atual de variação do preço dos derivados com base na variação do preço do barril de petróleo e
do dólar e sua substituição pela política que considera a variação dos custos internos de produção
do petróleo no Brasil e a variação do preço do barril do petróleo no mercado internacional e do
dólar incidente sobre a parcela do petróleo importado utilizado no suprimento interno do País. No
entanto, a solução definitiva para o problema da contínua elevação dos preços de derivados de
petróleo consiste em fazer com que a Petrobrás volte a ser uma empresa voltada para atender
os interesses da população brasileira e do Brasil, tendo em vista o aspecto estratégico do
petróleo, para a economia e o desenvolvimento nacional.
A Petrobras não deveria ter como objetivo principal a geração de lucros e a distribuição
de dividendos para seus acionistas como tem feito desde 1916 e sim atender os interesses

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da população brasileira e do desenvolvimento econômico e social do Brasil. Esta é a
solução que permitiria evitar as danosas consequências econômicas e sociais impostas
pelo aumento contínuo dos preços de derivados de petróleo no Brasil que fará com que
sejam elevadas as taxas de inflação que comprometem a renda da população brasileira e
o próprio desenvolvimento nacional. A Petrobras tem que voltar a ser instrumento da
promoção do desenvolvimento do Brasil.
* Fernando Alcoforado, 81, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema
CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor
nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, atuou durante 60 anos no setor de energia do Brasil, foi Subsecretário de Energia do
Estado da Bahia e é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O
Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora
Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado.
Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX
e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of
the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária
(Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o
progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo,
São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI
(Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o
Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba,
2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-
autoria), Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019) e A humanidade
ameaçada e as estratégias para sua sobrevivência (Editora Dialética, São Paulo, 2021).

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