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oiás
PASCALE BINANT
Universidade de Nanterre, França
SIBELI A. VIANA
PUC Goiás
Pascale Binant
binantpascale@gmail.com
Sibeli A. Viana
sibeli@pucgoias.edu.br
É a partir desta terceira fase que se de- dos abrigos com pinturas e no arran-
lineia o atual processo investigativo das jo das figuras no interior dos abrigos.
manifestações rupestres de Caiapônia, Esses aspectos serão apresentados, a
que se respalda na organização espacial seguir, de forma concisa.
ficou teias de significação criadas entre nas cores originais, que deveriam ser
a referida comunidade e as represen- mais marcantes, observar os tons mais
tações rupestres que estão localizadas vivos e os mais tênues, além das pin-
nas proximidades de suas residências, turas atualmente incompletas, desapa-
da área de trabalho e de lazer. Estes recidas e/ou parcialmente apagadas.
habitantes as reconhecem, enquanto Para tanto, as imagens fotográficas da
categorias místicas consideradas prin- década de 1970 têm sido importantes
cipalmente de origem “sobrenatural” fontes documentais para avaliar este
ou “divina”, as quais dão sentido às processo de modificação.
suas explicações acerca da presença e A localização dos sítios no ambiente e
do tempo em que estão naqueles locais. das figuras em seu interior é um ele-
Para além dessas considerações, a pre- mento importante para pensar tam-
sente pesquisa retoma o interesse de bém na conservação delas. Ainda que
Schmitz e equipe (1986: 293) pela “dis- existam exceções, em geral, as figuras
tribuição das figuras rupestres no espa- rupestres de Caiapônia estão em lu-
ço”, agora sob uma outra perspectiva. gares protegidos de chuva, de vento e
Tal aspecto vai ao encontro da proble- do sol. Elas apresentam diferentes es-
mática atual, que repousa na conside- tados de conservação, podendo variar
rações acerca da distribuição espacial até mesmo no interior do mesmo sítio,
dos abrigos pintados no território, bem como é possível observar no abrigo
como no posicionamento das pinturas GO-CP-35. As pinturas situadas sob o
no interior dos abrigos e na relação de- prumo rochoso são nítidas, bem con-
las com a configuração destes últimos. servadas, enquanto aquelas situadas no
As análises acerca do posicionamento frontão, sobre a parede exterior, são
dos sítios arqueológicos na paisagem recobertas de calcita, provavelmente
são temas considerados basilares para devido ao escoamento de água pelo
a arqueologia, com a investigação dis- paredão, o que faz com essas pinturas
tribucional destes e seus entrelaçamen- sejam manchadas e mais difíceis de se-
tos com as manifestações culturais. rem identificadas. A variação do esta-
As investigações comparativas entre do de conservação no interior de um
o acervo documental produzido pelas mesmo sítio, pode ser analisada sob
primeiras pesquisas na área e a análi- diferentes ângulos, dentre eles indicar
se in loco dos sítios e das manifestações momentos distintos de execução; na-
rupestres, de forma análoga, têm sido tureza de pigmentos e/ou aplicação de
essenciais para entender o posicio- técnicas distintas. As pinturas variam
namento das figuras em cada sítio de no curso do tempo, transformando-se,
Caiapônia. Sobre esta questão, há ciên- desvanecendo-se, desbotando, fundin-
cia de que o registro e a percepção das do, podendo até, eventualmente, desa-
pinturas estão sujeitas a modificações parecer. A má conservação é um esta-
segundo a luminosidade, a umidade do do natural ou antrópico ao qual, via de
ambiente e a vegetação mais ou menos regra, toda cultura material está sujei-
invasiva. Assim, é importante pensar ta. Enfim, todas as coisas, produzidas
Figura 8 - Vista geral do sítio GO-CP-33, apresentando detalhe da Aba A (teto e paredão
frontal) e Aba B (corredor lateral, na parte inferior, junto ao piso).
Por fim, essa forma de observar a or- obra tendo em vista o seu caráter históri-
ganização espacial das figuras parte de co, teve a sua 2ª edição em 2015, publicada
critérios considerados como coerentes pela PUC Goiás/IGPA.
para se entender parte da realidade das 2
Para caracterização deste Programa, con-
figuras de Caiapônia. Com isso, con- sultar Schmitz et al (1986).
corda-se com González-Ruibal (2007), 3
Para mais detalhes sobre a discussão do
que não está sendo projetado às socie- conceito de lugar, segundo as concepções
dades pretéritas que executaram as fi- de Tuan (1983), para os sítios de Palestina
guras rupestres, necessariamente, essa de Goiás, ver Viana et al. (2016).
forma de organização, mas, antes dis- 4
Viana a partir de 2006 retomou os estu-
so, uma forma coerente de entendê-las. dos na região, com apoio da PUC Goiás,
Por fim compreende-se ainda que a re- CNPq e FAPEG.
tomada dos estudos dos sítios rupes- 5
Todos estes materiais encontram-se acer-
tres de Caiapônia e os resultados até vados no IGPA/PUC Goiás e no IAP/
então obtidos consolidam os impor- Unisinos.
tantes dados documentados pelo tra- 6
Peclat (2011), com base no código de
balho de Schmitz e sua equipe (1986), Munsell, identificou os seguintes tons de
bem como atestam a importância de vermelho: Vermelho moderado (5R 4/6),
continuidade do desenvolvimento de Laranjado (5YR7/8), Vermelho escuro
estudos a partir das abordagens aqui acinzentado (5YR 4/2), Vinho escuro (5R
apresentadas e consideradas adequadas 2.5/2), Vermelho escuro (5R 3/4) e por
à área de pesquisa e, ao mesmo tempo fim, Vinho moderado (5R 3/2).
em sintonia com as atuais vertentes in- 7
Não foram encontrados os registros re-
terpretativas sobre arte rupestre. ferentes a 19 sítios rupestres. Dentre as
causas, está a ocorrência de arquivos cor-
A abordagem que ora apresentada,
rompidos e não possíveis de recuperação.
referenciadas numa relação dialética e
relacional entre as figuras, os posicio-
8
Aqui, incluem-se também atividades de
namentos delas nos paredões e a pró- aulas práticas, a partir de 2009, ministradas
pelo curso de arqueologia da PUC Goiás.
pria espacialidade do sítio na paisagem,
é considerada como uma possibilidade, 9
Trata-se do fluxo de água vermelha sobre
de alto potencial investigativo, para o pinturas situadas a montante do abrigo de-
entendimento da lógica representacio- nominado de Baixão do Paraguaio.
nal das pinturas rupestres de Caiapônia. 10
A relação que acabamos de apresentar
pode ser percebida entre sítios considera-
dos distintos e numerados sucessivamente,
NOTAS mas pode ser, igualmente, observada em
um único e mesmo sítio.
1
Trata-se do III Seminário Goiano de Arqueo-
logia, realizado em Goiânia. Os trabalhos
do referido evento foram publicadas pela REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Unisinos com o título Temas de Arqueologia
Brasileira (vol. de 1 a 5), tornando-se à épo- Binant, P. 2009. Peintures rupestres de la
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