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UNIFESP – ABI Ciências Sociais - UC Filosofia Geral B – 2022 - Profª Cristiane

Aluna: Ana Flora Ferreira de Freitas – 157.024 - Noturno

“A República”, de Platão, é considerado uma das obras mais importantes da


Antiguidade Clássica -- não apenas pela sua densidade conceitual, mas por tratar
de temas muito pertinentes a filosofia, como política; educação; arte; justiça; virtude;
a imortalidade da alma; etc. Sendo assim, o objetivo principal da obra como um todo
é refletir e conceituar um ideal de uma cidade plena, com cidadãos e governantes
íntegros, que buscam alcançar o verdadeiro intento de suas almas através do
conhecimento e da razão.
O livro X é o último livro d’A República. Nele, Sócrates, principal personagem da
narrativa, num diálogo com Glauco, tece duras críticas à arte da imitação e também
aos poetas. Nesse diálogo platônico, o filósofo define a poesia como mimética, isto
é, imitadora, pois não reflete a realidade de maneira legítima ou racional, como é de
fato, e por isso está a três níveis abaixo do real, apartando os homens de suas
virtudes.
Sócrates vai exemplificar sua hipótese da seguinte maneira: para ele, a primeira
espécie seria aquela criada pelos deuses, isto é, a origem das coisas, aquilo que faz
brotar tudo o que vêm da terra, modela os seres vivos e a si próprio, os astros, as
estrelas e a natureza. Já a segunda espécie, a cópia da obra original produzida por
um profissional. Para esta espécie, Sócrates utiliza o exemplo de um artesão que
faz uma cópia de uma cama a partir de uma original, que o serviu de “molde” ou
inspiração (primeira espécie). Por fim, a terceira espécie, a qual é criada pelo artista,
faz uma reprodução da cópia do original, ou então a “cópia da cópia”, representando
elementos que já existem. No entanto, de acordo com o filósofo, a aparência de um
determinado objeto pode variar totalmente de acordo com o ponto de vista, o que
torna possível ter diversos resultados diferentes na representação de um mesmo
objeto. Dessa forma, um pintor, por exemplo, ao imitar a aparência de um certo
objeto a partir da subjetividade de sua perspectiva, está absolutamente longe da
verdade.
Dessa maneira, para Sócrates, a arte existe não à serviço da consagração da
verdade, pois é guiada e redigida unicamente a partir das aparências, mas sim para
confundir o indivíduo e aprisioná-lo ainda mais no mundo sensorial, o que o afasta
da essência verdadeira da espécie. Segundo ele, a arte, por aproximar o indivíduo
do mundo sensível (habitado pelas sombras, pela ignorância e pela sensibilidade,
ou “a caverna” na metáfora de Platão) e recriar o mundo inteligível de maneira
ilusória, estaria então fazendo um desserviço a filosofia, pois, ao contrário desta,
que aproxima o indivíduo da sabedoria transcendental através da lógica; razão e
racionalidade, a arte mantém o indivíduo preso à materialidade, o afastando das
formas, da clareza e das ideias.
Assim é também quanto às tragédias encenadas nas peças de teatro. Segundo o
filósofo, ao interpretar situações onde o homem não exprime suas maiores virtudes,
como coragem; virilidade e inteligência, por exemplo, mas ao contrário, expressa
situações de total vulnerabilidade, fracasso ou tristeza, posturas não prestigiadas
num homem, a imitação estaria, dessa forma, estimulando o pior de um homem,
causando ruína à alma daqueles que assistem.
Podemos, com razão, censurá-lo e considerá-lo o par do pintor.
Assemelha-se a ele por só produzir obras sem valor, do ponto de
vista da verdade, e assemelha-se também por estar relacionado com
o elemento inferior da alma, e não com o melhor dela. Estamos,
então, bem fundamentados para não o recebermos num Estado que
deve ser regido por leis sábias, visto que esse indivíduo desperta,
alimenta e fortalece o elemento mau da alma e assim arruina o
elemento racional, como ocorre num Estado que se entrega aos
maus, deixando-os tomar-se fortes e destruindo os homens mais
nobres. Diremos o mesmo do poeta imitador que introduz um mau
governo na alma de cada indivíduo, lisonjeando o que nela há de
irracional, o que é incapaz de distinguir o maior do menor, que, pelo
contrário, considera os mesmos objetos ora grandes, ora pequenos,
que só produz fantasias e se encontra a uma distância enorme da
verdade. (PLATÃO, 2000, p. 442)

A arte, portanto, potencializa a experiência sensível, e não a racional, o que


prejudicaria a formação do cidadão nessa cidade estruturada dentro de moldes
racionais, uma vez que a arte não teria uma contribuição educativa fundamental
para esse projeto político. Por essa maneira, Sócrates -- assim como Platão -- vai
defender não apenas que, para um Estado pleno e ideal, os pintores, atores, poetas
e todos os artistas devem ser banidos da República, como também que as obras
artísticas em geral deveriam ser totalmente moldadas pelo Estado, afim de
influenciar e moldar o indivíduo desde a infância com ideais de virtude, força,
inteligência e justiça, em prol do governo e do coletivo.
No entanto, a visão desses filósofos contrasta gravemente com a nossa visão
contemporânea de arte. O que Platão e Sócrates não levavam em consideração, é
que além de podermos sim encontrar na arte uma grande força transformadora;
aliada à desconstrução de antigos padrões e pensamentos, a mesma pode ser um
meio de intervenção política, onde atua como um dos mecanismos para a
transgressão de paradigmas. Hoje, entendemos a arte não apenas como meio de
expressão, mas também como linguagem, que nos possibilita expurgar o mais
íntimo de nossas almas e encontrar força nisso. Através dela, encontramos um
caminho que também nos leva a nossas almas e percebemos na mesma uma
grande companheira na jornada do conhecimento. Ao contrário do que os filósofos
gregos acreditavam, a arte atua como potência libertadora.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
PLATÃO. A República. 3ª Ed. Belém, Pará. EPUFPA: 2000.

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