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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO DA UFBA

ESTUDANTE: BRUNO RAFAEL CONCEIÇÃO (RM Nº 217126137)

DISCIPLINA: ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL (DIR189)

PROFESSORA: FLORA AUGUSTA VARELA ARANHA

Fichamento da obra “A fragilidade da bondade: fortuna e ética na tragédia e na


filosofia grega”, da autoria de Martha C. Nussbaum.

Martha C. Nussbaum inicia seu texto afirmando, logo na primeira seção do


prefácio, que alguns dos pensamentos formulados nas edições iniciais foram mudando ao
longo dos quinze anos de existência da obra. Nele, Nussbaum partiu da análise da
vulnerabilidade do ser humano à luz da “fortuna”, trazida nos pensamentos dos poetas
trágicos, de Platão e de Aristóteles, e o seu papel na construção da virtude. Afunilou sua
análise para tratar da lacuna entre ser uma pessoa boa e conseguir viver uma vida baseada
em atividades virtuosas, e chegou à conclusão de que a bondade de que trata sua obra é a
do “bem humano”, tradicionalmente reconhecido como a Eudaimonia de Sócrates, e não
a da “bondade de caráter”.

Sob a influência da ética estoica, a autora tece breves comentários sobre a fortuna,
a pluralidade de bens e sua importância ética, a natureza das emoções e da amizade. Na
segunda seção do prefácio, trata da relevância de se refletir sobre as emoções em uma
percepção que vá além da sua função cognitiva, indicando a necessidade de modificação
do entendimento sobre o pensamento estoico em alguns pontos: quanto à necessidade de
explicar as emoções entre os adultos e as crianças e animais, pois os estoicos negavam
que estes dois últimos possuíssem emoções; quanto à necessidade de explicar a variedade
cultural da emoção; e quanto à necessidade do desenvolvimento de uma história genética
de como emoções adultas se desenvolvem para além das emoções arcaicas da infância e
da puberdade.

Na terceira seção, Nussbaum trabalha a concepção de homem enquanto ser


político e aborda o pensamento aristotélico numa perspectiva histórica, com a
apresentação de divergências de seu pensamento em forma de defeitos. O primeiro seria
em relação à falta de senso de dignidade humana universal, haja vista que Aristóteles
classifica mulheres como subalternas dos homens e escravos como subalternos dos
senhores. Compara com a visão estoica, para dizer que a todos é devida a mesma
dignidade.

O segundo defeito seria o fato de Aristóteles não reconhecer as ligações morais


existentes entre pessoas de cidades-estados distintas, enquanto que, para os estoicos, os
seres humanos são cidadãos do mundo, havendo, por isso, obrigações éticas e morais que
transcendem os limites das cidades-estados. O terceiro defeito aristotélico seria em
relação à carência de uma abordagem política moderna. Os estoicos, por sua vez, embora
também não apresentem, possuem pensamento progressista. A autora ainda reflete sobre
a necessidade de se promover o pluralismo e a discordância saudável de ideias, de modo
a política cumpriria um papel fundamental na construção de possibilidades e de escolhas.

Na quarta seção do prefácio, Nussbaum trabalha a teorização ética e da razão e as


mencionadas mudanças em seu pensamento, o que ocorreu ao longo dos quinze anos da
obra. Também apresenta teorias utilitaristas de filósofos, como Kant, Anette Baier e
Bernard Williams, sobre diferentes concepções de virtude e trata das percepções de
Aristóteles sobre a teoria ética e a Eudaimonia. Ao final, conclui que “a contemplação
intelectual por si só não é suficiente para uma vida humana florescente, e que as emoções
também desempenham um papel no raciocínio ético” (p. 14).

Já na quinta seção, a autora reflete sobre a relação que o ser humano possui com
a desgraça, indicando que a ética também se debruça sobre tal tema. Nussbaum aponta
uma relação entre a vulnerabilidade e os bens humanos e os trata como se fossem
intimamente ligados, a exemplo do amor às crianças, que é genuíno justamente pela
vulnerabilidade que acomete as crianças. Essa relação também pode ser observada nos
vínculos de amizade. Citando a filosofia de Hegel, a autora também aponta que o
reconhecimento da pluralidade de bens genuínos pode levá-los ao conflito, como o
embate, ainda existente para a mulher – embora com menor predominância –, entre a vida
familiar e a profissional.
Ao tratar das boas e das más notícias e indicar como os filósofos trabalham a
figura da desgraça, a autora informa sua aproximação com o estoicismo. Quando não há
mais nada o que se fazer, nem a quem culpar, haveria aí uma boa notícia, pois não seria
possível ocorrer nenhuma transformação capaz de alterar esse quadro. Também seriam
boas notícias aquelas que trazem fatos ruins, pois possibilitam um sentimento de
esperança a modificar tal panorama.

Martha C. Nussbaum inicia o capítulo “Fortuna e Ética” a partir da perspectiva de


Píndaro, que corresponde à sua visão sobre a vulnerabilidade do ser humano em face da
fortuna, sobre o fato de que a pessoa boa precisa ser cultivada pelo mundo exterior e não
só pelo próprio indivíduo. Em uma de suas passagens, indica que “nós precisamos nascer
com capacidades adequadas, viver em condições naturais e sociais favoráveis,
permanecer livres de catástrofes abruptas, desenvolver associações positivas com outros
seres humanos” (p. 16). Com isso, fica clara a posição antes mencionada, de que, para
Píndaro, a fortuna é vulnerável ao mundo externo, já que os seres humanos são seres que
se completam de forma coletiva, afinal, uns precisam dos outros.

Importante ressaltar que a autora, embora entenda a passividade do ser humano


no sentido acima tratado, também observa que, por ser dotado de razão, o homem pode
tomar decisões e se tornar ativo, não ficando inerte em relação à fortuna. Ainda afirma
que sua obra busca refletir sobre a autossuficiência a partir do pensamento ético grego de
tornar a bondade de uma vida boa imune à fortuna, o que faz por meio da razão. Também
se propõe a entender o quanto de fortuna poderia, para os gregos, tornar possível uma boa
vida.

Em seguida, Nussbaum trata da fortuna como traço próprio da excelência humana.


Segundo Kant, para além do fenômeno ocorrido no mundo, existe uma valoração no
campo da moral e da boa vontade que não está suscetível às mudanças da fortuna.
Conforme a autora, tal valoração é duvidosa, haja vista que são distintas as valorações da
moral e das demais espécies de valor.

Chegando ao fim de sua obra, a autora trabalha as divergências que observa entre
as visões dos poetas trágicos, as de Platão e as de Aristóteles sobre tragédias humanas.
Relata, nesse contexto, uma tentativa de Platão para imunizar o ser humano das
influências da fortuna por meio do diálogo e a perspectiva de Aristóteles nas situações
atravessadas por acontecimentos trágicos, em que predomina o exercício da razão prática.
Nussbaum ainda faz uma análise acerca das visões desses autores em relação à conduta
humana, vislumbrando uma oposição dialética entre elas, e cita autores da filosofia
moderna, bem como os contemporâneos, para tratar das suas pesquisas sobre o diálogo
do homem com a fortuna com base na concepção de fragilidade.

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