Você está na página 1de 11

Encontro 5 – Pesquisa no Direito

QUEIROZ, Rafael Mafei; FEFERBAUM, Marina. Metodologia da pesquisa em direito:


técnicas e abordagens para a elaboração de monografias, dissertações e teses. São
Paulo: Saraiva, 2019.

Metodologia Científica é uma disciplina teórica e normativa. Ela informa


a um pesquisador como ele deve proceder à análise de seu objeto de pesquisa
para que o faça de maneira cientificamente válida. Diz ainda como os
resultados da pesquisa devem ser registrados em um relatório final
(dissertação de mestrado, tese de doutorado etc.). O objetivo de quem realiza
uma pesquisa acadêmica é produzir um texto cientificamente respeitável.
Nesse sentido, não faz diferença se o tema do trabalho é algo muito teórico
(“Qual o conceito de validade jurídica em Hart?”) ou mais prático (“Qual a
diferença entre monopólio estatal e serviços prestados em caráter exclusivo
pelo Estado?”), pois se o seu autor pretende que ele seja reconhecido como
um trabalho científico, então deve escrevê-lo observando certas regras que a
comunidade acadêmica estabelece como pedigrees de trabalhos dessa
natureza.
Essas regras amparam-se em fundamentos filosóficos que a
disciplina de Metodologia Científica sintetiza, organiza e expõe.
Por esse motivo, tanto as disciplinas de metodologia científica que são
obrigatoriamente oferecidas em cursos de graduação e pós-graduação em
Direito quanto a bibliografia fundamental indicada para esses cursos dedicam
muita atenção a temas que interessam bastante a quem tenha curiosidade
teórica sobre o direito e seu status epistemológico, mas que interessam pouco
aos alunos que não tenham esse perfil.
Para quem quer fazer um trabalho de qualidade, mas nem por isso deseja se
converter em filósofo da ciência, ou em profundo teórico do direito, as preleções sobre
paradigmas da ciência moderna ou separação entre sujeito e objeto soam enfadonhas e
distantes.
Muitas vezes são frustrantes também, pois não ajudam, de maneira imediata,
a enfrentar os obstáculos mais corriqueiros que surgem durante a escrita de
um trabalho científico.
O papel dos trabalhos científicos no Direito mudou muito de alguns anos
para cá: hoje temos muitas (demasiadas, a bem da verdade) faculdades de
direito funcionando no Brasil, onde estudam milhares de alunos que têm,
todos, a obrigação de escrever trabalhos científicos – a temida monografia de
final de curso, ou trabalho de conclusão de curso – como requisito para seu
bacharelado. Boa parte desses alunos irá, pouco tempo depois da formatura,
perseguir uma especialização acadêmica em sua área de preferência em
algum dos muitos cursos de pós-graduação lato sensu existentes no mercado,
os chamados cursos de especialização, onde, eventualmente, terão de fazer
um trabalho científico. Embora a mais recente resolução do Conselho
Nacional de Educação (CNE) tenha deixado de mencionar a obrigatoriedade
de desenvolver um trabalho científico para obtenção do título de especialista,
os cursos de mestrado profissional estão se multiplicando pelo país e exigem,
para sua titulação, a produção de um trabalho acadêmico. Além disso, há
dezenas de programas de mestrado e doutorado em Direito no Brasil, cada
vez em maior número.
Assim, de pouco tempo para cá, os trabalhos
científicos no campo jurídico, que antes ficavam restritos ao mundo das
poucas pessoas que buscavam formação em pesquisa em cursos de mestrado
e doutorado em universidades públicas ou seletas escolas privadas, agora
pertencem ao universo da massa variada de estudantes de graduação e pósgraduação
em Direito. Esses estudantes têm interesses heterogêneos, mas é
certo que muitos deles não querem ser cientistas, filósofos ou metodólogos;
querem, isso sim, ser advogados tributaristas, juízes da infância e juventude,
defensores públicos, membros do Ministério Público, diplomatas,
procuradores etc. – querem, em outras palavras, perseguir carreiras jurídicas
práticas e não acadêmicas. Essas pessoas têm, via de regra, preocupações
formativas que passam longe da epistemologia jurídica ou da metodologia
das ciências sociais, mesmo porque tais conhecimentos, embora úteis, não
são condições necessárias para que se tenha sucesso em nenhuma dessas
profissões.
Nesse sentido, os bacharéis em Direito distanciam-se de quem
vem das outras ciências sociais aplicadas: nestas últimas, os conhecimentos
metodológicos são mais imediatamente constitutivos dos profissionais da
área, sejam eles acadêmicos ou não. Um sociólogo precisa saber fazer
pesquisa social quando atua como professor universitário, mas também
quando é responsável por, digamos, pesquisas de mercado sobre
comportamento de consumidores em uma agência publicitária. O mesmo não
vale para um advogado, magistrado ou promotor: todos podem ser ótimos
profissionais sem que estejam familiarizados com o estado da arte da
metodologia da pesquisa jurídica (muito embora conhecimentos
metodológicos sempre ajudem no bom pensar).
Este livro objetiva fornecer um guia prático para a elaboração de trabalhos
científicos em direito. Seu conteúdo é prático em um duplo sentido: primeiro,
porque espelha dúvidas mais recorrentes e importantes que alunos de
graduação e pós-graduação em direito fizeram e fazem aos seus autores,
todos professores da disciplina em diferentes instituições de ensino pelo
Brasil: como devo usar a jurisprudência na minha pesquisa? Tenho de
escrever um capítulo histórico? Como devo fazer entrevistas, caso necessite
delas? E assim por diante. Segundo, porque reflete também o estado da arte
das pesquisas em que as autoras e os autores estão envolvidos enquanto
acadêmicos, revelando desafios reais da investigação científica do direito e
estratégias concretamente adotadas para sua superação. O livro encontra-se,
portanto, no meio do caminho entre as dúvidas de alunos iniciantes na
pesquisa e os desafios de pesquisadores profissionais do direito, cada qual
escrevendo sobre sua área de expertise.
A concepção de objetividade e praticidade do livro que antecedeu a este
(Metodologia Jurídica, 2012) teve como referência o aluno de cursos de
especialização em direito, cujo perfil era o do profissional sem tempo para se
dedicar ao aprofundamento das questões teóricas relacionadas à produção
acadêmica. Mas esse perfil de aluno, ocupado e inexperiente, se espalha por
outros contextos: os acadêmicos não habituais e com pouca experiência de
pesquisa estão também nos cursos de graduação e mestrado profissional; são
seguramente a maioria nos cursos de pós-graduação stricto sensu também.
Acadêmicos não habituais não têm na pesquisa científica sua principal
ocupação, mas precisam, em algum momento particular, conhecer e aplicar
de alguma maneira as técnicas e métodos de pesquisa de modo competente e
funcional. Estamos entre aqueles que acreditam que essas habilidades não só
viabilizam bons trabalhos científicos, mas contribuem também para o
incremento de competências valorizadas nas profissões práticas do direito,
tais como localização de informações precisas, resolução de problemas
completos e clareza na argumentação escrita.
O livro também pode servir a acadêmicos mais experientes, que poderão
encontrar aqui informações úteis. Poderão consultá-lo como um manual
prático para sanar dúvidas pontuais sobre exigências formais específicas
(como uma referência bibliográfica pouco usual), bem como para aproveitar
as dicas objetivas e precisas sobre as várias etapas da produção científica, as
quais a experiência nem sempre é capaz de sistematizar com clareza. Não é
raro que o tempo apague da memória algumas das lições dessa matéria ou
que o hábito gere vícios pouco saudáveis.
Esta obra atende a diferentes necessidades em diferentes níveis, portanto.
Organizada como roteiro e estruturada como referência ponto a ponto entre
os requisitos, as convenções e as formalidades da produção científica, ela
pode ser consultada de diferentes maneiras, com distintos propósitos. Em
linhas gerais, este livro possui uma sequência lógica e concatenada de
capítulos, os quais podem ser lidos na ordem estabelecida ou consultados de
maneira independente e em diferentes níveis de profundidade.
Considerada em seu todo, esta obra revela sua utilidade como roteiro
prático, sendo de especial valia aos estudantes iniciantes na graduação e na
pós-graduação que tenham de fazer trabalhos de fôlego, seja em disciplinas
específicas, ou, ainda, e principalmente, nas etapas de término, quando
devem redigir seus trabalhos de conclusão de curso (TCC). Para os primeiros,
que não possuem senão uma vaga ideia do que seja uma produção científica,
uma leitura atenta deste livro, acompanhada de alguma atenção de seus
orientadores, já os ajudará a produzir um trabalho acadêmico respeitável.
Para os demais, muitos dos quais já passaram pelo temido trabalho de
conclusão da graduação, este roteiro os ajudará a pôr em ordem os trabalhos
de pós-graduação, cuja densidade de pesquisa exige um planejamento bem
estruturado desde o início.
Qualquer que seja o caso, este livro visa tornar acessível um conjunto de
técnicas científicas mais diretamente aplicáveis a trabalhos jurídicos, de
maneira concisa e abrangente, servindo a todos que necessitem de
informações descomplicadas e objetivas que os auxiliem na produção
científica em direito.
O mestrado profissional em direito é recente no Brasil. O programa
pioneiro foi o da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio
Vargas, iniciado em 2013. Depois deste, vários outros programas foram e
estão sendo criados, em número que só tende a aumentar.
A demanda por profissionais de mercado que buscam na academia uma
alta qualificação está crescendo. Em grande parte, esses alunos são
profissionais já com alguma experiência prática, mas que possuem pouca
familiaridade com normas acadêmicas. São também pessoas que não
possuem, como regra, folga de tempo disponível para se apropriar de rigores
e formalidades científicas.
Segundo a Portaria n. 17/20093, o mestrado
profissional é um curso stricto sensu, mas com público-alvo distinto. Os
alunos são profissionais com grande conhecimento e atuação no mercado,
que não necessariamente pretendem seguir uma carreira exclusivamente
acadêmica. Formam-se mestres, mas com foco voltado à pesquisa aplicada, e
não pesquisadores com atuação exclusiva na academia.
Este livro também está na medida do que mestrandos de programas stricto
sensu profissionais precisam. Uma fonte de consulta objetiva e prática para
auxiliá-los desde a formulação do seu problema de pesquisa até a execução e
registros científicos. O Capítulo 3 é inteiramente dedicado à pesquisa jurídica
no Mestrado Profissional.
Os leitores notarão que recursos visuais, como tabelas e quadros, são
frequentes no livro. Eles são estratégias de organização da informação
apresentada pelos autores, de modo a simplificar a sua consulta. Notará
também que todos os capítulos são recheados de exemplos, do que fazer e do
que não fazer, referentes a cada tipo de pesquisa. Todos os exemplos são
tirados de pesquisas reais, devidamente publicadas pelos seus autores.
Na área do direito, os trabalhos de conclusão de curso (ou TCCs) não
costumam ter a mesma variedade de formas das outras áreas do
conhecimento, como nas artes (em que se pode produzir um vídeo, executar
um número musical ou construir uma maquete) ou em áreas tecnológicas (em
que se pode construir um robô ou um protótipo de automóvel). No direito, os
trabalhos se apresentam sempre como textos escritos, no típico monográfico,
com um conteúdo invariavelmente homogêneo (conceito, natureza jurídica,
evolução histórica, o tema na jurisprudência etc.), o que faz pensar numa
espécie de modelo canônico a partir do qual toda produção jurídica
acadêmica é concebida e executada. Por isso, muitos têm a impressão de que
existe um único tipo de trabalho de conclusão em direito – “a” monografia,
como se não houvesse vários tipos de trabalhos monográficos – e que fazer
um trabalho acadêmico-jurídico é sempre produzir um texto à imagem e
semelhança desse cânone.
Não é o caso. Mesmo limitados à forma escrita, os trabalhos jurídicos não
são tão restritos como parecem à primeira vista. Além da conhecida
“monografia”, artigos científicos, dissertações e teses exemplificam a
variedade possível de trabalhos acadêmicos no campo jurídico. As opções à
disposição do aluno dependem, por sua vez, do tipo de programa e da
instituição de ensino em cujo âmbito o trabalho seja produzido, a qual pode
estabelecer quais formatos serão aceitos.
Por disposições regulamentares dos órgãos governamentais responsáveis
pelos programas de mestrado e doutorado no Brasil, os trabalhos de
conclusão nesses programas devem ser dissertações e teses, respectivamente,
defendidos em sessões públicas perante uma banca de examinadores
devidamente titulados. Já nos programas de graduação e pós-graduação lato
sensu (especialização), admitem-se variedades de formatos. Ainda assim, o
trabalho mais comumente solicitado nesses programas é a tradicional
“monografia”, às vezes chamada de TCC (trabalho de conclusão de curso). É
importante conhecer a especificidade de cada um desses trabalhos, de forma a
ter clareza do que se exige de quem venha a empreender qualquer um deles.
A “monografia” é o formato de trabalho mais adotado pelas faculdades de
Direito no cumprimento da exigência de um trabalho obrigatório de final de
curso. Como o nome indica, impõe conteúdo monográfico; ou seja, ela deve
focar-se em um assunto específico e ser completa na abordagem que dele
fizer. A monografia é um trabalho completo por si só, pois constrói um
argumento bastante em si mesmo, da dúvida que suscita a investigação ao
encaminhamento de uma possível conclusão, exaurindo o estudo da produção
científica mais relevante a seu respeito. “Qualquer trabalho que se proponha a
examinar um tema específico, esgotando a sua análise, seria subsumível no
conceito genérico de monografia” (BARRAL, 2003, p. 15). A monografia é
um gênero de trabalho acadêmico que pode compreender, portanto, desde um
artigo científico de fôlego até uma longa tese de doutorado, passando por
trabalhos de conclusão de cursos de graduação ou pós-graduação lato sensu,
dissertações de mestrado ou mesmo trabalhos disciplinares de matérias
específicas na graduação ou pós-graduação. No entanto, o nome
“monografia” acabou associado, no Brasil, especificamente a trabalhos de
conclusão de graduação e pós-graduação lato sensu.
O primeiro aspecto constitutivo de uma monografia é o seu tema. O tema
é a fronteira de um trabalho. Numa primeira aproximação, fixar um tema
implica não mais do que delimitar um assunto. A “responsabilidade civil”,
por exemplo, é uma primeira aproximação a um tema monográfico (ainda que
seja excessivamente amplo e necessite de ulteriores recortes). A
“responsabilidade civil do Estado por omissão” é outro exemplo, uma
especificação do primeiro. Essa primeira aproximação deve, nos casos de
trabalhos de pretensões mais científicas, ser mais delimitada e recortada de
modo a produzir novos temas, cada vez mais restritos, todos desdobramentos
da primeira aproximação ao tema: “responsabilidade civil objetiva por
atividades de risco” seria uma especificação dentro do amplíssimo tema da
“responsabilidade civil”, por exemplo. Porém, não importa o quanto seja
delimitado, um tema nunca se esgota, pois o que o constitui não é apenas o
assunto, mas também o enfoque de análise a que ele será submetido: uma
compilação bibliográfica ampla sobre a responsabilidade civil em atividades
de tratamento de resíduos tóxicos não se confunde com uma pesquisa
jurisprudencial exaustiva sobre esse mesmo tema, embora as duas foquem
nos mesmos institutos jurídicos.
É por isso que não basta discorrer sobre determinado tema para se
produzir uma monografia. É necessário fazê-lo de maneira direcionada, ou
seja, com um objetivo. Monografias, como trabalhos científicos que são,
partem de dúvidas e procedem de modo a respondê-las, colhendo dados e
informações e fazendo interpretações e análises tendentes à resposta das
perguntas iniciais. Essas dúvidas iniciais, a serem respondidas por meio do
trabalho de pesquisa e análise de argumentos e dados, formam o verdadeiro
tema de uma monografia. Se quero fazer uma pesquisa cujo propósito seja
descobrir as nuances da jurisprudência sobre a responsabilidade civil
decorrente de atividades de manejo de lixo tóxico, então o meu tema pode ser
apresentado como “as regras de responsabilidade civil no manejo de lixo
tóxico na jurisprudência” (faltaria ainda acrescentar o tribunal e o intervalo
de tempo focados na pesquisa, o que daria ainda maior precisão ao recorte
temático). O objetivo da minha investigação – aquilo que quero descobrir –
constitui meu tema, note-se bem, moldando-o a partir de um assunto mais
amplo (responsabilidade civil por atividades de risco inerente).
Nem todo objetivo é compatível com o conteúdo de um texto
monográfico. Textos com o objetivo de ensinar, explicar ou divulgar
determinado tema não são monográficos, normalmente, pois não possuem
foco, aprofundamento ou completude suficientes em relação a um tema,
elementos que uma monografia deve ter. Tratados, manuais e cursos, por
mais completos que sejam, não são monográficos, pois sua principal ambição
é, digamos, horizontal – cobrir todo um campo de conhecimento, não mais do
que panoramicamente –, enquanto que em uma monografia o propósito do
autor deve ser vertical: aprofundar-se em um aspecto bastante restrito de um
tema pontual. Um texto monográfico deve ter um ponto de partida
(perguntas), um caminho (coleta de dados ou argumentos, análises e
intepretações) e um ponto de chegada (conclusão), alinhados coerentemente
com vistas ao objetivo inerente ao tema da pesquisa.
Um bom critério para saber se um trabalho é monográfico é verificar se o
texto traz um raciocínio que conduz a uma conclusão. Não basta que ele
tenha um capítulo final intitulado “Conclusão” se esta não decorrer de um
desenvolvimento intencional e articulado do texto, com base em dados e
argumentos interpretados ao longo do trabalho. Não basta, portanto, escrever
um texto no estilo manual didático (conceito, natureza jurídica, evolução
histórica...), criar um tópico final denominado “Conclusão” e apresentar o
trabalho como se monográfico fosse. As leitoras e os leitores mais atentos já
terão notado que os mais populares manuais e cursos do mercado editorial
brasileiro não têm um capítulo de conclusão, o que faz perfeito sentido, já
que manuais não são construídos com o propósito de concluir coisa alguma.
Trabalhos que se pretendem monográficos, mas são elaborados à moda de
manuais em geral, mostram-se inconclusivos, não obstante, como aponta
Oliveira (2006), seus autores esforcem-se para, ao final, apresentar
conclusões que muitas vezes não superam o senso comum, e que não
dependem de uma pesquisa científica para que se chegue a elas: “o tema é
difícil”, “o assunto é instigante”, “há muitas nuances”, “é preciso decidir com
cautela” etc. Casos tais apenas demonstram que seus autores começaram
trabalhos que deveriam ser monográficos, mas não tinham seus objetivos bem
definidos: faltavam-lhes perguntas claras e uma ideia de como respondê-las.
Imaginemos um trabalho não monográfico sobre responsabilidade civil. O texto
apresentaria de início os elementos da responsabilidade: dano, nexo causal e
culpa. Explicaria, em seguida, cada um deles, detalhando cada teoria
envolvida. Seguiria, então, para a discussão dos sujeitos envolvidos, dedicando
um capítulo inteiro ao Estado. E por aí iria. Ao final, concluiria seu autor que a
responsabilidade civil é um tema complexo, que merece ser estudado em
minúcias, que certos aspectos só podem ser apreciados caso a caso etc. O
leitor desse texto certamente ficaria bem informado sobre os conceitos básicos
da matéria, mas tal conclusão não é aquilo que se espera de um trabalho
monográfico. Ou melhor, tal “conclusão” nem é, em sentido próprio, uma
verdadeira conclusão. Não basta incluir um capítulo chamado “Conclusão” para
que o trabalho, por mágica, torne-se conclusivo: a conclusão depende de um
concatenamento argumentativo que não existe em um trabalho com esse
conteúdo.
Em um trabalho verdadeiramente monográfico sobre o mesmo tema do
exemplo anterior, o autor passaria rapidamente pelos elementos da
responsabilidade, conceituando-os com brevidade e profundidade apenas
necessária ao enfrentamento de suas questões de pesquisa. Optaria, como
introdução do trabalho, por contextualizar a responsabilidade civil à luz da
Constituição de 1988, analisando o instituto a partir das decisões do Supremo
Tribunal Federal, especificamente nos pontos em que o entendimento da
corte mudou em relação à Constituição anterior. Observaria o autor que,
embora não tivesse havido quaisquer alterações relevantes de redação da
normativa constitucional da responsabilidade civil do Estado, a
jurisprudência da corte sobre esse tema mudou a partir da nova Carta.
*********************************************************

ADEODATO, João Maurício. Bases para uma metodologia da pesquisa em Direito. Revista
CEJ. Brasília. n 7. jan/abr. 1999

Este livro está dividido em cinco partes, fracionadas em 27 capítulos.


Cada parte representa uma etapa do roteiro de elaboração de um trabalho
científico em direito; e cada capítulo, um tópico possivelmente relevante para
cada uma dessas etapas. Embora as grandes partes cubram etapas necessárias
à produção de um trabalho científico (determinar o tipo de pesquisa a ser
feita, executá-la, redigir o trabalho), os capítulos dentro de cada uma delas
terão pertinências diferentes para diferentes tipos de pesquisa: quem for fazer,
por exemplo, um trabalho de pesquisa jurisprudencial deverá passar pelos
Capítulos 6 e 13, mas não precisará passar pelo Capítulo 8 se estiver
convencido de que seu trabalho não precisará de uma parte histórica.
Na primeira parte, há orientações gerais sobre os objetivos do livro e como
utilizá-lo (Capítulo 1), bem como os formatos possíveis de trabalhos
acadêmicos que alunas e alunos de direito podem ter de escrever (Capítulo 2).
Ela também inclui um capítulo sobre a pesquisa jurídica aplicada no âmbito
de mestrados profissionais (Capítulo 3).
A parte 2 pode ajudar o pesquisador na etapa inicial de construção da sua
pesquisa, oferecendo caminhos e inspirações para iniciar a concepção do seu
problema de pesquisa caso esteja com dúvida sobre o tema diante da área de
interesse (Capítulo 4). O Capítulo 5 cuida de uma das dúvidas elementares de
jovens pesquisadores: como é possível dar “cientificidade” à resposta de uma
questão jurídica controvertida, quando parece haver boas razões para ambos
os lados da contenda? Há também capítulos que ajudam a avaliar a
necessidade de uma pesquisa jurisprudencial (Capítulo 6), de um capítulo
histórico (Capítulo 8) ou de direito comparado (Capítulo 9). O Capítulo 7
trata de um tema inexplicavelmente negligenciado na pesquisa jurídica (salvo
raras exceções, como é o caso dos autores que o escreveram): a pesquisa
legislativa.
A parte 3 apresenta métodos e técnicas úteis para a execução de vários
tipos de pesquisa jurídica. Ele começa com o projeto de pesquisa, documento
básico para o planejamento de uma investigação minimamente adequada
(Capítulo 10). Em seguida, apresenta ferramentas para localização de
informação jurídica básica na internet (“doutrina” e legislação, pois
jurisprudência é cuidada no Capítulo 6). O Capítulo 12 apresenta um método
e técnicas para leitura de textos teóricos complexos. O Capítulo 13 explica
como coletar e organizar as informações coletadas em pesquisa
jurisprudencial de modo adequado e funcional. Os capítulos seguintes
abordam a realização de entrevistas (Capítulo 14) e a observação etnográfica
em contextos jurídico-institucionais (Capítulo 15). O Capítulo 16 apresenta
orientações para a realização de pesquisa em arquivos históricos, enquanto o
Capítulo 17 explica o uso do método do estudo de caso e sua aplicação para
temas jurídicos.
Na parte 4, apresentamos algumas agendas contemporâneas da pesquisa
jurídica, que podem apontar caminhos interessantes de pesquisa. Elas cuidam
de áreas interdisciplinares, cujo conteúdo não foi ainda “canonizado” por
manuais ou programas oficiais de disciplina, e que por isso costumam trazer
maiores dificuldades para pesquisadores menos experientes. Há capítulos que
apresentam os campos de pesquisa de Direito e Economia (Capítulo 18),
Direito e Políticas Públicas (Capítulo 19), Direito e Tecnologia (Capítulo 20),
Direito, Feminismos e Gênero (Capítulo 21), Direito e Discriminação
(Capítulo 22), e finalmente o estado da arte da agenda de pesquisa sobre o
Supremo Tribunal Federal (Capítulo 23).
Detalhamento e orientações sobre o registro formal e escrito da pesquisa
estão na parte 5. A pesquisa deve culminar com a redação de um texto
(artigo, TCC, dissertação ou tese) que a apresente e a comunique de maneira
clara, correta e eficiente. O Capítulo 24 traz apontamentos iniciais para a
redação de textos acadêmicos em direito. O Capítulo 25 explica as normas
para formatação do texto e padronização de textos e referências, conforme as
normas técnicas da ABNT ou o Manual de Chicago. O Capítulo 26 apresenta
ferramentas de informática necessárias para a formatação do trabalho final,
ensinando como resolver rapidamente dificuldades com processadores de
texto que roubam tempo de acadêmicos das humanidades. O Capítulo 27 é
dedicado às boas práticas éticas na pesquisa e na redação de textos jurídicos.

Você também pode gostar