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Encontro 4 – Paradigmas científicos

KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2011.

Este é um livro sobre a história da ciência, publicado em 1962 pelo filósofo Thomas
Kuhn. Sua publicação estabelece um marco para as disciplinas de história, filosofia e
sociologia do conhecimento, popularizando os termos paradigma e mudança de
paradigma. Kuhn desafiou ideia estabelecida (até então) do progresso científico como uma
acumulação de fatos e teorias. Ele argumentou que períodos de continuidade de
uma ciência normal são interrompidos por períodos revolucionários, cujas anomalias
geram novos paradigmas que questionam os anteriores, levando a pesquisa científica a
novos caminhos.
Publicado primeiramente como monografia, e depois como livro em 1962. Em 1969,
Kuhn agregou um apêndice de modo a responder às críticas que havia recebido em
relação à multiplicidade de significados que um dos principais conceitos propostos em sua
obra, o de paradigma científico, possuía na primeira versão publicada.
Kuhn declara que a gênese das ideias do livro ocorreu em 1947, quando lhe foi
encomendado ministrar um curso de ciência para estudantes de Humanidades, enfocando-
se em casos de estudos históricos. Mais tarde, declararia que até o momento nunca havia
lido nenhum documento antigo sobre temas científicos. A física de Aristóteles era
notavelmente diferente da obra de Newton no que concerne aos conceitos de matéria e
movimento -- chegando à conclusão de que os conceitos de Aristóteles não eram "mais
limitados" ou "piores" que os de Newton, apenas diferentes.
Kuhn adota um enfoque de História da Ciência e da Filosofia da Ciência centrado
em questões conceituais relacionadas aos tipos de ideias que são concebíveis em
determinado momento, aos tipos de estratégias e opções intelectuais disponíveis às
pessoas durante certo período, assim como a importância de não atribuir modelos de
pensamento modernos a autores históricos. A partir desta posição, argumenta que a
evolução da teoria científica não provém da mera acumulação de "feitos", senão que de
um grupo de circunstâncias e possibilidades intelectuais sujeitas a mudança. Com essa
perspectiva, Kuhn define o conceito de paradigma científico, que seriam os conjuntos de
práticas e visões de mundo compartilhadas por uma certa comunidade científica. Para o
autor, o desenvolvimento (chamado, também, de amadurecimento pelo autor) de uma
ciência ocorre quando uma determinada comunidade cientifica adota um paradigma para a
prática científica, em que todos os indivíduos pertencentes a essa comunidade participam
e autorregulam o paradigma.
Nos 9 capítulos lidos para a aula, (capítulos 4 a 12), ele vai dizer que se o objetivo
da ciência normal não são as grandes novidades concretas, e se o fracasso em se
aproximar do resultado antecipado é habitualmente um fracasso personificado pelo
cientista, então por que esses problemas acabam sendo enfrentados de uma maneira ou
de outra? Parte da resposta já foi desenvolvida. Pelo menos para os cientistas, os
resultados da pesquisa normal são significativos porque aumentam a abrangência e a
precisão com que um paradigma pode ser aplicado. Entretanto, tal resposta não explica o
entusiasmo e a devoção que os cientistas mostram ao resolver problemas de ciência
normal. Ninguém dedica anos para, digamos, desenvolver um espectrômetro melhor ou
dar uma solução mais aperfeiçoada ao problema das cordas vibratórias simplesmente por
causa da importância da informação que vai ser obtida. Os dados conseguidos pelo cálculo
de efemérides ou pelas mensurações adicionais com um aparelho já disponível podem ser
bem importantes, mas essas atividades são regularmente desdenhadas pelos cientistas.
Isso ocorre porque essas atividades são em grande medida repetições de procedimentos
que já foram feitos antes.
Os problemas de ciência normal são constituídos por charadas no sentido aqui
adotado, não precisamos mais perguntar por que os cientistas atacam-nos com tal paixão
e devoção. Uma pessoa pode ser atraída para a ciência por muitas razões. Entre elas está
o desejo de ser útil, a excitação de explorar um terreno novo, a esperança de encontrar
alguma ordem, e o impulso de testar o conhecimento estabelecido. Esses e vários outros
motivos também ajudam a determinar os problemas específicos em cuja solução ela se
engajará no futuro.
O cientista deve, por exemplo, estar interessado em compreender o mundo e em
aumentar a precisão e a amplitude com que ele foi ordenado. Tal compromisso deve, por
sua vez, levá-lo a examinar – tanto por si mesmo quanto pelo trabalho dos colegas –
algum aspecto da natureza com grande detalhamento empírico. Se esse exame revela
bolsões de aparente desordem, então esses bolsões devem desafiá-lo a um novo
refinamento de suas técnicas de observação e a uma nova articulação de suas teorias.
A determinação dos paradigmas compartilhados demanda um segundo passo. – Um
passo de um tipo relativamente diferente. Ao dar esse passo, o historiador deve comparar
os paradigmas da comunidade entre si e com os relatórios de pesquisa que essa
comunidade está produzindo. Assim fazendo, seu objetivo é descobrir que elementos
isoláveis, explícitos ou implícitos, os membros da comunidade investigada podem ter
abstraído dos seus paradigmas mais globais para utilizar como regras em sua pesquisa.
Qualquer um que tenha tentado descrever ou analisar a evolução de uma tradição
particular de pesquisa terá procurado, necessariamente, regras e princípios aceitos desse
tipo. É quase certo, como indica a seção precedente, que esse historiador terá pelo menos
algum sucesso nessa busca.
Algumas das razões para acreditar que os paradigmas efetivamente operam dessa
maneira. A primeira – que já foi discutida bem extensamente – é a enorme dificuldade de
se descobrirem regras que teriam guiado tradições específicas de ciência normal. Essa
dificuldade é aproximadamente a mesma que o filósofo encontra ao tentar expor aquilo que
todos os jogos têm em comum.
A segunda – da qual a primeira razão apontada é realmente um corolário – está
enraizada na natureza da educação científica. Já deveria estar claro que os cientistas
nunca aprendem conceitos, leis e teorias em abstrato e por si mesmos. Em vez disso,
essas ferramentas intelectuais são encontradas desde o início implícitas em um agregado
que lhes antecede histórica e pedagogicamente, e que as mostra juntamente com suas
aplicações e por meio de suas aplicações.
Uma nova teoria é sempre anunciada juntamente com suas aplicações a alguma
série concreta de fenômenos naturais. Sem essas aplicações ela não poderia nem mesmo
candidatar-se à aceitação. Depois que a teoria é aceita, tais aplicações – ou outras –
acompanham as teorias nos livros didáticos em que o futuro cientista vai aprender seu
ofício. Elas não estão lá meramente como enfeite, ou mesmo como ilustração documental.
Pelo contrário, o processo de aprendizagem de uma teoria depende do estudo de
aplicações, incluindo a prática de resolução de problemas que se desenvolve tanto com
lápis e papel quanto com o uso de instrumentos em um laboratório.
E como as revoluções se resolvem? Como é o processo pelo qual um candidato a
paradigma substitui o seu antecessor? Toda nova interpretação da natureza – seja ela uma
descoberta ou uma teoria – emerge primeiro na mente de um ou de poucos indivíduos.
Eles são os primeiros que aprendem a ver a ciência e o mundo de um modo diferente. Sua
habilidade para fazer a mudança é facilitada por duas circunstâncias que os diferencia da
maioria dos outros membros da profissão. Invariavelmente sua atenção foi concentrada
sobre os problemas que provocaram a crise. Ademais, em geral, são pessoas tão jovens –
ou tão novas no campo em que a crise é administrada – que uma prolongada prática da
ciência ainda não chegou a impregná-las tão profundamente da visão de mundo e das
regras determinadas pelo paradigma em vigor, quanto o fez com seus contemporâneos. –
Como elas se habilitam e o que devem fazer para converter a profissão inteira ou, pelo
menos, para converter os subgrupos profissionais relevantes ao seu próprio modo de ver a
ciência e o mundo? – O que leva o grupo a abandonar uma tradição de pesquisa normal
em favor de outra?
Termina Kuhn seu Capítulo 12:
No começo, um novo candidato a paradigma pode ter poucos apoiadores e,
ocasionalmente, os motivos dessas adesões podem ser conjeturais.
Todavia, se são competentes, esse apoiadores pioneiros vão aperfeiçoar o
paradigma, vão explorar suas possibilidades e mostrar como seria pertencer
a uma comunidade guiada por ele. Na medida em que isso prossegue – e
se o paradigma está destinado a vencer o seu combate – o número e a
força dos argumentos persuasivos em seu favor aumentarão. Mais
cientistas serão assim convertidos, e a exploração do novo paradigma terá
continuidade. Gradualmente o número de experimentos, instrumentos,
artigos e livros baseados no paradigma será multiplicado. Convencidas da
fecundidade da nova concepção, ainda mais pessoas adotarão o novo
modo de praticar a ciência normal, até que restem, por fim, apenas alguns
poucos intransigentes. Mas, mesmo esses, não podemos dizer que estejam
errados. Embora o historiador sempre possa encontrar pessoas – Priestley,
por exemplo – que foramirrazoáveis quando resistiram tão longamente à
mudança, não vai encontrar um ponto em que a resistência se torne ilógica
ou acientífica. No máximo, o historiador pode ter vontade de dizer que a
pessoa que continua a resistir depois que toda a sua profissão já se
converteu deixou, por esse fato mesmo, de ser um cientista.

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