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Brazilian Applied Science Review 358

ISSN: 2525-3621

Aspectos do tratamento da insônia na Atenção Básica

Aspects of insomnia treatment in Primary Care


DOI:10.34115/basrv5n1-023

Recebimento dos originais: 03/12/2020


Aceitação para publicação: 25/01/2021

Francisca Vitória Pereira de Souza


Residente em Medicina de Família e Comunidade
Centro Universitário de Patos
R. Horácio Nóbrega, S/N - Belo Horizonte, Patos - PB, 58704-000
E-mail: francisca-vitoria@hotmail.com

Miguel Aguila Toledo


Mestrado em Infectologia
Centro Universitário de Patos
R. Horácio Nóbrega, S/N - Belo Horizonte, Patos - PB, 58704-000
E-mail: migueltoledo@fiponline.edu.br

Milena Nunes Alves de Sousa


Doutorado e Pós-Doutorado em Promoção de Saúde
Centro Universitário de Patos e Faculdade São Francisco da Paraíba
R. Horácio Nóbrega, S/N - Belo Horizonte, Patos - PB, 58704-000
E-mail: milenanunes@fiponline.edu.br

RESUMO
A insônia é um problema comumente relatado nas unidades de Atenção Primária à Saúde
(APS), sendo descrita como uma insatisfação com o sono que deve estar acompanhada
de sofrimento e/ou prejuízos funcionais importantes. Seu manejo terapêutico
frequentemente utiliza benzodiazepínicos, a despeito dos riscos descritos e
recomendações de que seu uso deve ser limitado a um curto período de tempo. Objetivou-
se identificar recomendações consistentes para a abordagem da insônia na APS e
esclarecer demandas quanto ao uso de benzodiazepínicos nesse contexto. Trata-se de uma
revisão integrativa, utilizando os descritores “Distúrbios do Início e da Manutenção do
Sono”, “Hipnóticos e Sedativos”, “Atenção Primária à Saúde” e suas associações em
português e em inglês, nas bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e
PubMed. Os critérios de inclusão foram artigos publicados na língua inglesa ou
portuguesa, texto completo e congruência com a pergunta norteadora. Foram excluídos
estudos repetidos nas bases de dados selecionadas. Foram analisadas 10 publicações. Os
resultados mostram que a abordagem não farmacológica deve ser a escolha inicial. O uso
de benzodiazepínicos, quando necessário, deve ser restrito a um curto espaço de tempo e
levar em consideração outros fatores, como a presença de comorbidades. A utilização
prolongada da referida classe de medicamentos associa-se a prejuízos na qualidade de
vida dos pacientes. Compreende-se a relevância do manejo adequado da insônia na APS,
sendo necessário capacitar os profissionais e fortalecer a importância da abordagem
holística no cuidado dos pacientes.

Palavras-chave: Distúrbios do Início e da Manutenção do Sono, Atenção Primária à


Saúde, Hipnóticos e Sedativos.

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ABSTRACT
Insomnia is a problem commonly reported in Primary Health Care (PHC) units, being
described as dissatisfaction with sleep that must be accompanied by suffering and / or
important functional impairments. Its therapeutic management frequently uses
benzodiazepines, despite the risks described and recommendations for their use should
be limited to a short period of time. The objective was to identify consistent
recommendations for the management of insomnia in primary health care (PHC) and
explain issues about the use of benzodiazepines in this context. This is an integrative
review, using the descriptors “Sleep Initiation and Maintenance Disorders”, “Hypnotics
and Sedatives”, “Primary Health Care” and their associations in Portuguese and English,
in the databases of the Virtual Health Library (VHL) and PubMed. The inclusion criteria
were published articles in English or Portuguese, full text and congruence with the
guiding question. Repeated studies in the selected databases were excluded. Ten
publications were analyzed. The results show that the non-pharmacological therapy
should be the initial option. The use of benzodiazepines, whenever necessary, should be
restricted to a short time and consider other factors, such as the presence of comorbidities.
Prolonged use of this class of drugs is associated with losses in quality of life of patients.
The relevance of adequate management of insomnia in PHC is understood, and it is
necessary to train professionals and strengthen the importance of a holistic approach in
patient care.

Keywords: Sleep Initiation and Maintenance Disorders, Primary Health Care, Hypnotics
and Sedatives.

1 INTRODUÇÃO
A insônia é descrita como um transtorno do sono-vigília caracterizado pelo
descontentamento do indivíduo com a quantidade ou a qualidade do sono, apresentando
queixas relacionadas a dificuldades para adormecer, manter o sono ou o despertar
precoce. Esta insatisfação com o sono deve estar acompanhada de sofrimento e/ou
prejuízos funcionais importantes (DSM-5, 2014).
É um problema frequentemente relatado nas unidades de Atenção Primária à
Saúde (APS), sendo um dos mais prevalentes transtornos do sono. Aproximadamente um
terço da população adulta apresenta queixa de insônia e cerca de 10 a 15% revelam
prejuízos funcionais decorrentes (DSM-5, 2014). Atinge com maior frequência as
mulheres, indivíduos de classes com menor nível socioeconômico, divorciados e idosos
(NASCIMENTO; SANTOS, 2020). O diagnóstico pode ser feito de forma independente
ou associado a outra condição clínica. Em ambas as situações, nota-se uma influência
mútua: pacientes comórbidos apresentam maior risco para o desenvolvimento da insônia
e o transtorno de insônia parece aumentar o risco de outras patologias (DSM-5, 2014).
Existem duas modalidades para a abordagem terapêutica da insônia: tratamento
farmacológico e não farmacológico. É determinante que o profissional da saúde conheça

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e utilize a abordagem não farmacológica. Quando necessária, a associação da


farmacoterapia deve ser realizada de forma a respeitar as individualidades do paciente e
características específicas de cada situação (RIBEIRO, 2016).
As classes farmacológicas utilizadas no manejo da insônia são: antidepressivos
sedativos, agonistas seletivos de receptores benzodiazepínicos, benzodiazepínicos,
antipsicóticos, agonistas melatoninérgicos e melatonina, fármacos antiepilépticos, anti-
histamínicos, fitoterápicos, antagonista hipocretinérgico (BACELAR; PINTO JUNIOR,
2019). Entretanto, destaca-se a discussão acerca dos riscos versus benefícios do uso de
benzodiazepínicos no manejo da insônia, considerando aspectos referentes aos efeitos
adversos e tempo de duração do farmacoterapia (NASCIMENTO; SANTOS, 2020).
O uso prolongado de benzodiazepínicos associa-se a efeitos colaterais que afetam
a qualidade de vida de seus usuários (CARVALHO; GOLZIO; RODRIGUES, 2016). Em
idosos, benzodiazepínicos estão relacionados ao aumento do risco de quedas, prejuízos à
coordenação motora e déficits cognitivos (WANNMACHER, 2007).
Vivências clínicas no âmbito da APS mostram que os benzodiazepínicos são
bastante utilizados dentro do contexto da abordagem da insônia, sendo relevante o número
de pacientes em uso crônico de benzodiazepínicos, a despeito dos riscos descritos e
recomendações de que seu uso deve ser restringido a um curto período de tempo.
Percebe-se a relevância e o impacto da insônia sobre a qualidade de vida da
população e a necessidade do seu manejo adequado, considerando as implicações das
escolhas terapêuticas (NASCIMENTO; SANTOS, 2020). Fundamentando-se na
literatura disponível e nas discussões sobre a temática pelos autores, decidiu-se investigar
e aprofundar os conhecimentos a respeito do atual entendimento sobre o uso de
benzodiazepínicos no manejo da insônia na Atenção Primária à Saúde.
Assim sendo, o presente estudo objetiva identificar recomendações consistentes
para a abordagem terapêutica da insônia no âmbito da Atenção Primária à Saúde e
esclarecer demandas referentes ao uso de benzodiazepínicos nesta conjuntura. Outrossim,
pretende-se reunir orientações congruentes que possam nortear as decisões dos
profissionais de saúde na condução dos pacientes com transtorno de insônia.

2 MÉTODOS
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, visando à identificação de
publicações sobre o uso de benzodiazepínicos no manejo da insônia na Atenção Primária
à Saúde. A escolha do método ponderou a possibilidade de inclusão de estudos com

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metodologias variadas e a existência de etapas bem definidas para a estruturação do


artigo, garantindo uma percepção ampla do tema e o devido rigor metodológico.
Foram reproduzidas as seis etapas descritas por Botelho, Cunha e Macedo (2011)
para o processo de revisão integrativa: 1) identificação do tema e seleção da questão de
pesquisa; 2) estabelecimento de critérios de inclusão e exclusão; 3) identificação dos
estudos pré-selecionados e selecionados; 4) categorização dos estudos selecionados; 5)
análise e interpretação dos resultados; 6) apresentação da revisão/ síntese do
conhecimento.
Em referência ao tema escolhido, foi elaborada a seguinte pergunta de pesquisa:
Qual é o atual entendimento sobre o uso de Benzodiazepínicos no manejo da insônia na
Atenção primária à Saúde?
A pesquisa bibliográfica foi realizada nas bases de dados da Biblioteca Virtual em
Saúde (BVS) e da PubMed. Para a busca dos artigos foram utilizados os seguintes
Descritores em Ciências da Saúde e suas associações em português e em inglês:
“Distúrbios do Início e da Manutenção do Sono”, “Hipnóticos e Sedativos”, “Atenção
Primária à Saúde”. A seleção dos artigos foi baseada na leitura prévia de todos os títulos
e resumos, considerando a definição de critérios de inclusão, a saber: artigos publicados
na língua inglesa ou portuguesa, disponibilidade da publicação na íntegra e congruência
com a pergunta norteadora. Foram excluídos estudos repetidos nas bases de dados
selecionadas (Figura 1).

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Figura 1 - Fluxograma do processo de seleção dos artigos nas bases de dados BVS e PUBMED.

Fonte: SOUZA, F.V.P. et al., 2021.

A amostra final foi constituída por 10 artigos, procedendo-se à leitura detalhada


dos estudos selecionados e preenchimento de instrumento para organização dos dados
contendo as seguintes informações: autores, ano de publicação, título, base de dados,
revista, idioma, país, método, população do estudo e principais achados.
Em seguida, os estudos foram agrupados em duas categorias e quatro
subcategorias para análise, assim definidas: 1. Percepção sobre o uso de
Benzodiazepínicos (1.1 Não favoráveis ao uso; 1.2 Favoráveis ao uso com restrições); 2.
Fatores que influenciam a prescrição de Benzodiazepínicos (2.1 Relacionados aos
pacientes; 2.2 Relacionados aos prescritores).

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3 RESULTADOS
Nos Quadros 1, 2 e 3 é demonstrada uma perspectiva geral dos artigos
selecionados, enfatizando a caracterização, metodologias e categorização das
publicações.
Não foi estabelecida restrição temporal para a busca dos artigos. Entretanto,
observa-se que o maior número de publicações ocorreu após o ano 2000 (90%; n=9). Em
relação ao idioma, todas foram publicadas na língua inglesa (Quadro 1).
As publicações selecionadas foram realizadas em periódicos de excelência
internacional (A1- 30%; n=3) e excelência nacional (B1 e B2 - 40%; n=4), conforme
classificação Qualis Capes. Ademais, constata-se que a maioria dos estudos são oriundos
do Estados Unidos da América (EUA), com o total de quatro artigos (40% da amostra
final) (Quadro 1).

Quadro 1 - Caracterização geral dos artigos selecionados.


Autores/Ano Título do Artigo Base de Título do Qualis Idioma País
Dados Periódico Capes
Limandri (2018) Insomnia: Will Medication Medline Journal of Não Inglês EUA
Bring Rest? Pubmed Psychosocial identificado
Nursing and
Mental Health
Services
Linnet et al. (2016) Multimorbidity and use of Medline BMC Family B2 Inglês Islândia
hypnotic and anxiolytic Pubmed Practice
drugs: cross-sectional and
follow-up study in primary
healthcare in Iceland.
Cheung et al. (2014) Primary health care Medline Australian Não Inglês Austrália
practitioner perspectives on Pubmed Journal of identificado
the management of Primary
insomnia: a pilot study. Health
Simon e Ludman (2006) Outcome of new Medline General B1 Inglês EUA
benzodiazepine Pubmed Hospital
prescriptions to older adults Psychiatry
in primary care.
Johnson et al. (2016) Benzodiazepine and z- Medline British Journal B1 Inglês Escócia
hypnotic prescribing for Pubmed of General
older people in primary Practice
care: a cross-sectional
population-based study.
Hajak e Geisler (2004) Experience with zolpidem Medline CNS Drugs A1 Inglês EUA
'as needed' in primary care Pubmed França
settings. Alemanha
Lader (2011) Benzodiazepines revisited-- Medline Addiction A1 Inglês Inglaterra
will we ever learn? Pubmed (Abingdon,
England)
Kageyama et al. (1998) Prevalence of use of Medline Psychiatry and B1 Inglês Japão
medically prescribed Pubmed Clinical
hypnotics among adult Neurosciences

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Japanese women in urban


residential areas.
Doghramji (2014) Integrating modern Medline Postgraduate Não Inglês Não
concepts of insomnia and Medicine identificado identificado
its contemporary treatment
into primary care.
Falloon et al. (2011) The assessment and Medline BMJ A1 Inglês EUA
management of insomnia in
primary care.
Fonte: SOUZA, F.V.P. et al., 2021.

No que se refere à metodologia, metade dos estudos analisados utilizou a revisão


de literatura como método (50%; n=5) e a segunda maior parcela é composta por estudos
transversais (40%; n=4). A população alvo foi composta majoritariamente por pacientes
com quadro de insônia. Apenas um estudo foi direcionado aos profissionais de saúde
(clínicos e farmacêuticos). (Quadro 2).

Quadro 2 - Caracterização metodológica dos artigos selecionados.


Autores/Ano Título do Artigo Tipo de População do alvo Tamanho
pesquisa amostral
Limandri (2018) Insomnia: Will Revisão da Pacientes com Não identificado
Medication Bring Literatura insomnia
Rest?
Linnet et al. (2016) Multimorbidity Estudo Pacientes com 222.000
and use of Transversal múltiplas condições pacientes que
hypnotic and crônicas contataram 16
anxiolytic drugs: centros de saúde
cross-sectional atendidos no total
and follow-up por 140 médicos
study in primary de clínica geral
healthcare in
Iceland.
Cheung et al. (2014) Primary health Estudo piloto Profissionais de saúde 22 participantes
care practitioner qualitativo da atenção primária (8 clínicos gerais
perspectives on (clínicos gerais e e 14
the management farmacêuticos farmacêuticos
of insomnia: a comunitários) comunitários)
pilot study.
Simon e Ludman Outcome of new Estudo Pacientes 129 pacientes
(2006) benzodiazepine Transversal ambulatoriais com
prescriptions to idade > ou = 60 anos
older adults in que receberam novas
primary care. prescrições de
benzodiazepínicos de
médicos da atenção
primária
Johnson et al. (2016) Benzodiazepine Estudo Adultos com idade ≥ 879 492 pessoas
and z-hypnotic Transversal 65 anos
prescribing for de Base
older people in Populacional
primary care: a
cross-sectional

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population-based
study.
Hajak e Geisler (2004) Experience with Revisão da Pacientes de cuidados Mais de 3.000
zolpidem 'as Literatura primários pacientes
needed' in primary
care settings.
Lader (2011) Benzodiazepines Revisão da Pacientes usuários de Não identificado
revisited--will we Literatura Benzodiazepínicos
ever learn?
Kageyama et al. Prevalence of use Estudo Mulheres japonesas 3600
(1998) of medically Transversal adultas que vivem em
prescribed áreas urbanas
hypnotics among
adult Japanese
women in urban
residential areas.
Doghramji (2014) Integrating Revisão da Pacientes com Não identificado
modern concepts Literatura insomnia
of insomnia and
its contemporary
treatment into
primary care.
Falloon et al. (2011) The assessment Revisão da Pacientes com insônia Não identificado
and management Literatura
of insomnia in
primary care.
Fonte: SOUZA, F.V.P. et al., 2021.

Quanto aos resultados, todos os estudos se opõem ao uso indiscriminado dos


benzodiazepínicos no manejo da insônia. Entretanto, há pesquisas que defendem o uso
dos mesmos com restrições (50%, n=5) e investigações que se opõem totalmente à prática
(20%, n=2). Evidencia-se também o destaque dado aos fatores que influenciam a
prescrição de benzodiazepínicos, distinguindo-se aqueles relacionados aos pacientes
(mencionados em seis artigos) e aspectos associados aos prescritores (citados em dois
artigos) (Quadro 3).

Quadro 3 - Categorização dos achados.


Categoria Subcategoria Autores/Ano N %
Não favoráveis ao ▪ Lader (2011)
uso ▪ Linnet et al. (2016)
2 13,3

Percepção sobre o
uso de
Benzodiazepínicos Favoráveis ao uso ▪ Limandri (2018)
com restrições ▪ Simon e Ludman (2006)
▪ Hajak e Geisler (2004)
▪ Doghramji (2014) 5 33,3
▪ Falloon et al. (2011)
Relacionados aos ▪ Cheung et al. (2014)
pacientes ▪ Simon e Ludman (2006)
▪ Johnson et al. (2016)

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▪ Kageyama et al. (1998)


Fatores que ▪ Doghramji (2014)
influenciam a ▪ Limandri (2018) 6 40
prescrição de
Benzodiazepínicos

Relacionados aos ▪ Cheung et al. (2014)


prescritores ▪ Limandri (2018) 2
13,3
Fonte: SOUZA, F.V.P. et al., 2021.

4 DISCUSSÃO
A questão do uso de Benzodiazepínicos no manejo da insônia e as implicações
referentes aos potenciais riscos do uso de tal classe foi largamente mencionada na
literatura selecionada. Este fato pode ser explicado pela notoriedade do transtorno de
insônia no âmbito da Atenção Primária à Saúde, uma vez que esta apresenta-se como um
distúrbio comum entre adultos (DOGHRAMJI, 2014). Além disso, seu manejo
farmacológico é associado a utilização desmedida e prolongada de benzodiazepínicos
(NASCIMENTO; SANTOS, 2020). Observa-se que os problemas relacionados ao uso e
incertezas sobre riscos versus benefícios dos benzodiazepínicos perpassam gerações e
reforçam a necessidade de constante vigilância sobre o tema (LADER, 2011).
Ainda que a descrição da prevalência elevada da insônia seja bastante consistente
na literatura, deve-se salientar que muitos pacientes não relatam suas queixas de sono aos
médicos (DOGHRAMJI, 2014). Consequentemente, uma parcela importante de pacientes
insatisfeitos com o sono não recebem tratamento (KAGEYAMA et al., 1998). Tal
realidade ressalta a necessidade de aperfeiçoamento do manejo do transtorno da insônia,
tanto no que diz respeito ao seu reconhecimento quanto à terapêutica a ser instituída.
O tratamento não medicamentoso deve ser a opção inicial para a abordagem da
insônia, devendo-se reservar o uso de medicamentos àqueles que não tiveram resultado
satisfatório ou nos quais há urgência para a resposta (FALLOON et al., 2011). Entretanto,
apesar da terapia cognitivo-comportamental ser apontada como o tratamento de escolha
(DOGHRAMJI, 2014), esta é comumente menos utilizada em comparação aos hipnóticos
sedativos benzodiazepínicos e não-benzodiazepínicos (LIMANDRI, 2018).
De forma congruente, considera-se os fatores que influenciam a decisão pelo uso
de benzodiazepínicos, reportados por seis dos dez estudos avaliados. A busca por uma
resolução rápida para a insônia pode favorecer a escolha de determinados fármacos e
desconsiderar efeitos adversos, riscos de tolerância e dependência dos mesmos

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(LIMANDRI, 2018). Outrossim, também é descrito o encontro de resistência por parte


dos pacientes quando são propostas intervenções não-farmacológicas. Esta resistência
pode ser atribuída a uma dependência, por parte dos pacientes, aos tratamentos
farmacológicos e de rápido resultado (CHEUNG et al., 2014). Acrescenta-se ainda que,
entre as vantagens ofertadas pelos benzodiazepínicos, encontra-se baixo custo, rápida
resposta e boa tolerabilidade (DOGHRAMJI, 2014). No entanto, há autores que sugerem
que a eficácia dessas medicações, tanto a longo como curto prazo, são questionáveis
(LINNET et al., 2016).
Alguns autores defendem o uso de benzodiazepínicos. Todavia ressalta-se que a
duração do uso de hipnóticos sedativos não deve ultrapassar 2 – 4 semanas e outras
estratégias devem ser introduzidas paralelamente (LIMANDRI, 2018). De modo análogo,
é argumentado que, quanto ao uso dos benzodiazepínicos, deve-se desestimular o uso em
longo prazo, não havendo necessidade de restringir novas prescrições em condutas
iniciais (SIMON; LUDMAN, 2006). Não obstante, existe um impasse no que se refere a
como impedir que pacientes com indicação de uso destas medicações por curto período
se tornem usuários crônicos (LADER, 2011).
Dos artigos apresentados na presente revisão, apenas dois contestam a ideia de
perigo do aumento do uso crônico de benzodiazepínicos. Estudos realizados nos Estados
Unidos, França e Alemanha apontam que pacientes portadores de insônia crônica não
apresentam predisposição ao uso crônico de hipnóticos e conseguem restringir o uso de
tais substâncias ao longo do tempo (HAJAK; GEISLER, 2004). Outro estudo
desenvolvido nos Estados Unidos com 129 pacientes ambulatoriais que receberam novas
prescrições de benzodiazepínicos de médicos da atenção primária identificou que a
maioria dos idosos não desenvolve o uso crônico de benzodiazepínicos, apesar disso
deve-se manter a atenção para a possibilidade de tolerância e dependência (SIMON;
LUDMAN, 2006).
É significativa a parcela de pacientes com transtorno de insônia e que apresentam
outras comorbidades. A maioria dos pacientes apresenta múltiplas comorbidades, como
doenças mentais e dor, que podem causar alterações do sono e que devem ser levadas em
consideração para o planejamento terapêutico (LINNET et al., 2016). Neste contexto, é
importante a singularização dos casos, distinguindo aqueles em que a insônia possa estar
diretamente relacionada às demais condições comórbidas existentes, seja como causa ou
consequência das mesmas. Para pacientes em que a insônia pode ser consequência de
outra condição clínica de base, é necessário o tratamento da condição de base (FALLOON

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et al., 2011). Além disso, determinadas comorbidades podem favorecer a escolha de


benzodiazepínicos. Por exemplo, benzodiazepínicos são habitualmente prescritos para o
tratamento de ansiedade e insônia (SIMON; LUDMAN, 2006).
Quatro dos artigos analisados abordam de maneira mais específica o tema da
prescrição de benzodiazepínicos na população idosa. Em estudo realizado no Japão com
3600 mulheres adultas identificou-se que a proporção do número de prescrição de
hipnóticos cresce conforme o aumento da idade dos pacientes (KAGEYAMA et al.,
1998). Resultados obtidos em estudo feito na Escócia mostraram que idosos que moram
em casas de repouso são mais predispostos a serem receitados com benzodiazepínicos e
hipnóticos (JOHNSON et al., 2016). Enfatiza-se ainda que uma maior cautela deve ser
dispensada à população idosa que faz uso crônico destas medicações (LADER, 2011),
ponderando os riscos de adicção e tolerância (SIMON; LUDMAN, 2006).
A relevância dada à população idosa encontra respaldo em literatura adicional à
amostra deste artigo. É exposto que os riscos do uso de benzodiazepínicos, tais como
déficit cognitivos e quedas, superam os benefícios vistos; ademais, a referida classe de
medicamentos apresenta eficiência reduzida no que concerne ao tratamento de transtornos
do sono em idosos (WANNMACHER, 2007).
De modo geral, a abordagem combinada, terapia cognitivo-comportamental e
farmacoterapia se necessária, mostra-se favorável e propícia para o âmbito da atenção
primária (HAJAK; GEISLER, 2004). Além disso, há evidências indicando que a higiene
do sono promove benefícios a todos os pacientes (FALLOON et al., 2011). A escolha de
benzodiazepínicos na prática clínica deve ser ponderada com o surgimento de novas
opções para o tratamento de insônia e ansiedade, além de avaliação criteriosa sobre suas
indicações (LADER, 2011). Contudo, um estudo realizado na Islândia evidenciou
elevado número de prescrições de hipnóticos e ansiolíticos, sendo notável a quantidade
de pacientes em que foi prescrito uso de benzodiazepínicos com alta probabilidade de uso
prolongado, em desacordo com as recomendações da prática médica (LINNET et al.,
2016).
De maneira coesa, destaca-se a necessidade de aperfeiçoamento e capacitação dos
profissionais e do sistema da atenção primária para a abordagem da insônia (CHEUNG
et al., 2014). Paralelamente, torna-se fundamental a avaliação sobre a possibilidade do
encontro de comorbidades coexistentes com o transtorno de insônia. Salienta-se, assim, a
importância da abordagem holística (LINNET et al., 2016). Similarmente, defende-se que

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a assistência continuada durante o período de tratamento é essencial seja qual for o


método escolhido (DOGHRAMJI, 2014).
Por fim, é importante salientar que as limitações do presente estudo estão
relacionadas com a amostra, na medida em que foram incluídos apenas os artigos
publicados na língua inglesa ou portuguesa e disponíveis integralmente de forma online
e gratuita.

5 CONCLUSÃO
A insônia é uma queixa prevalente nas unidades de Atenção Primária à Saúde e
afeta significativamente a qualidade de vida dos pacientes. O seu manejo terapêutico pode
envolver modalidades farmacológicas e não farmacológicas. A abordagem não
farmacológica deve ser, preferencialmente, a escolha inicial. Reserva-se a farmacoterapia
àqueles casos que não atingiram respostas suficientes com a introdução de medidas não
farmacológicas de forma isolada ou nos quais há necessidade de melhora imediata. Entre
as classes de medicamentos, destacam-se os benzodiazepínicos, havendo a recomendação
de que seu uso não ultrapasse um curto período de tempo e que sejam ponderados outros
fatores, como a presença de comorbidades, para a escolha do fármaco a ser prescrito.
Entretanto, percebe-se ainda uma elevada utilização a longo prazo de
benzodiazepínicos para o manejo da insônia dentro do contexto dos cuidados primários à
saúde. Paralelamente, destaca-se a associação entre o uso prolongado de
benzodiazepínicos com prejuízos à cognição, além dos riscos de tolerância e dependência.
Compreende-se a relevância do manejo adequado da insônia na Atenção Primária
à Saúde, tanto pelo prejuízo causado pelo distúrbio quanto pelos riscos presentes a
depender da escolha terapêutica. É necessário capacitar os profissionais e fortalecer a
importância da abordagem holística no cuidado dos pacientes.

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REFERÊNCIAS

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transtornos mentais - DSM-5. 5 ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. 992 p.

BACELAR, A.; PINTO JUNIOR, L.R.P. (coord.). Insônia: do diagnóstico ao tratamento.


São Caetano do Sul: Difusão Editora, 2019; 174 p.

BOTELHO, L.L.R.; CUNHA, C.C.A.; MACEDO, M. O método da revisão integrativa


nos estudos organizacionais. Gestão e sociedade, v. 5, n.11, p. 121-136, 2011. Disponível
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