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JEE

Jornal de Estudos Espíritas 8, 010201 (2020) - (9 pgs.) Volume 8 – 2020

Evocação direta de Espíritos: quatro condições necessárias para


fazê-la com um fim sério
Alexandre Fontes da Fonseca1
1
Campinas, SP
e-mail: a.f.fonseca@bol.com.br
(Recebido em 10 de Setembro de 2019 e publicado em 08 de Janeiro de 2020).

R ESUMO
Cresce no movimento espírita, o interesse na realização de evocações
diretas de Espíritos numa reunião mediúnica. O principal argumento
para esse interesse é a recomendação positiva de Kardec para isso. Em
contraponto, autores espirituais, como Emmanuel pela psicografia de
Francisco Cândido Xavier, sugerem e recomendam que não se realizem
evocações diretas de Espíritos em reuniões mediúnicas. E recomendam
que deixemos para os bons Espíritos a escolha dos Espíritos que irão
se comunicar. Em vista deste impasse, propomos uma análise reflexiva
das condições necessárias para a realização de evocações diretas com
“um fim sério”, conforme orienta Kardec. Mostramos que esse trabalho
é possível de ser realizado, porém exige estudo, preparo e planejamento
que muitos adeptos espíritas podem não ter condições de realizar. Con-
cluímos não em desfavor da realização de evocações diretas, mas alertando que sem satisfazer as condições neces-
sárias propostas aqui, a realização dessas evocações pode não ter “um fim sério”. Nisso, também concluímos que
recomendações de se evitar a evocação direta, como feita por Emmanuel, são sensatas pois atendem às condições
da maioria dos adeptos do Espiritismo.
Palavras-Chave: Evocação direta; reunião mediúnica; Kardec; Emmanuel.
DOI: 10.22568/jee.v8.artn.010201

I I NTRODUÇÃO manuel nessa questão particular da evocação direta? Ha-


veria alguma razão para Emmanuel ter sugerido não rea-
Um tema controverso no meio espírita, mas que tem lizar evocações diretas? É possível seguir essa cautela de
crescido nas publicações, discussões e mídias sociais é Emmanuel e, mesmo assim, agir de acordo com Kardec?
sobre evocações de Espíritos. De um lado, vemos compa- Neste artigo, apresentamos uma reflexão bastante sé-
nheiros que buscam resgatar e praticar o pensamento e ria a respeito da questão. Não condenaremos nenhum
orientações de KARDEC (1996, Cap. XXV do Livro dos lado em particular ou em absoluto, mas pretendemos ofe-
Médiuns (LM)), explicitando recomendações em favor da recer subsídios para que o leitor, interessado na questão
evocação direta de determinados Espíritos nas reuniões sobre evocações diretas, possa avaliar se satisfaz condi-
mediúnicas. De outro, temos a prática tradicional de reu- ções mínimas de preparo para realizar esse tipo de tarefa
niões mediúnicas de muitos grupos espíritas, nos quais com a devida importância, seriedade e responsabilidade
evocações diretas1 não são realizadas. Além disso, há que ela exige. Se, de um lado, não há nenhum impedi-
na literatura espírita opiniões como a de Emmanuel, na mento doutrinário à realização de evocações diretas, de
questão 369 da obra O Consolador (XAVIER, 1985) que outro, mostraremos que a recomendação de Emmanuel
recomenda os adeptos espíritas a não realizarem evoca- em evitar-se esse tipo de evocação também tem respaldo
ções diretas nas reuniões mediúnicas ordinárias das Casas doutrinário. Concordamos que a recomendação de Em-
Espíritas. Ambos, Kardec e Emmanuel, apresentam bons manuel não deve ser considerada como uma proibição à
argumentos em favor de suas respectivas recomendações, evocação, mas devemos mostrar que o bom senso precisa
porém, alguns condenam a recomendação de Emmanuel ser empregado na análise da viabilidade de realização de
só por ser diferente da de Kardec. evocações diretas. Cumpre destacar que as reuniões me-
O que fazer diante desse impasse? Seguir Kardec diúnicas realizadas pelo movimento espírita, sem evoca-
como recomendam fazer todos os bons Espíritos como ções diretas, não deixam de estar em muito boa sintonia
Bezerra de Menezes (FRANCO, 1976; XAVIER, 1975) e coerência com as recomendações da Doutrina Espírita.
Camilo (TEIXEIRA, 2006) e o próprio Emmanuel (XA- Veremos, por exemplo, que as dificuldades que a vida mo-
VIER, 1998)? Ou agir com a cautela sugerida por Em- derna impõe a todos torna a recomendação de Emmanuel
1 Adiante comento sobre o que entender por evocações indiretas.

Seção 02: Artigos Regulares 010201 – 1 ©Autor(es)


Evocação direta de Espíritos: quatro condições necessárias . . .

bastante sensata, no sentido de prevenir a realização de LM). Isso ocorre nas reuniões mediúnicas ordiná-
reuniões mediúnicas infrutíferas e maximizar seus benefí- rias de todos os Centros Espíritas no país, isto é,
cios para encarnados e desencarnados, sem a necessidade os Espíritos sofredores que são atendidos através do
dos compromissos que um trabalho de evocação direta diálogo ou doutrinação fraternos não são escolhidos
exige dos encarnados, e que vamos explicitar a seguir. pelos encarnados.
Recentemente, Jader SAMPAIO (2019) publicou um
estudo breve sobre a origem, no Brasil, da restrição às 3. Kardec afirma no item 269 do LM que nos locais
evocações de Espíritos. Embora muitos pensem que a “em que se faz um trabalho continuado, há sempre
origem da recomendação de evitar evocações seja de Em- Espíritos habituais que a elas comparecem, sem que
manuel, sabe-se que tal restrição já houvera sido recebida sejam chamados, por estarem prevenidos, em vir-
pela via mediúnica em 1914. Isso mostra que o tema é tude mesmo da regularidade das sessões.” Como as
anterior ao que se pensa e de interesse tão antigo quanto reuniões mediúnicas usuais são regulares, em geral,
a própria Doutrina em nosso país. O que analisamos a se- semanais, não é inseguro evitar a evocação direta
guir em termos da recomendação de Emmanuel, valerão de Espíritos.
igualmente para a restrição citada acima. 4. Também no item 269 do LM, Kardec afirma “As co-
Primeiramente, lembremos que as reuniões mediúni- municações espontâneas inconveniente nenhum
cas largamente realizadas nos grupos e Centros Espíri- apresentam, quando se está senhor dos Espíritos
tas sérios e compromissados com a Doutrina, de todo o e certo de não deixar que os maus tomem a dian-
país, já seguem muito das recomendações de Kardec no teira. (. . . ) O exame escrupuloso, que temos
tocante à forma, condições e objetivos de um bom inter- aconselhado, é, aliás, uma garantia contra as co-
câmbio mediúnico. Se evocações diretas de personalida- municações más.” (Grifos em negrito, meus). Os
des escolhidas não são feitas, nem por isso se deixa de grupos mediúnicos sérios no movimento espírita re-
fazer evocações de um modo que podemos chamar de in- alizam análises escrupulosas, com base na Doutrina
direto por ocasião das reuniões mediúnicas. Escrevemos Espírita, de toda comunicação e mensagem me-
sobre isso no passado em nossa primeira reflexão sobre diúnicas. Assim, evitar as evocações diretas não
evocações no movimento espírita (DA FONSECA, 2015). apresenta inconveniente nenhum a esses grupos, se-
Vamos apenas resumir, aqui, as 5 razões doutrinárias pe- gundo Kardec. Note que, em grupos mediúnicos
las quais se pode concluir que o movimento espírita já que não estudam regularmente a Doutrina e não fa-
realiza, correta e coerente com a Doutrina Espírita, as zem exame escrupuloso das comunicações, não há
suas reuniões mediúnicas: segurança alguma na prática do intercâmbio me-
diúnico, com ou sem evocações diretas.
1. Quando se roga, em preces, proteção e amparo
dos bons Espíritos para a realização de uma reu- 5. No item 278 do LM, ao falar, agora, sobre possíveis
nião mediúnica, se está evocando, de modo relati- inconvenientes da evocação direta, Kardec afirma
vamente direto, os bons Espíritos. Não se evoca que “O inconveniente é nulo, quando são chamados
essa ou aquela personalidade em particular, mas com um fim sério, qual o de os instruir e melho-
como é válida aquela afirmação de Jesus de que: rar.” (Grifos em negrito, meus). Nesse último as-
“onde quer que se encontrem duas ou três pessoas pecto, o de desejar instruir e melhorar, temos que
reunidas em meu nome, eu com elas estarei.” (MA- reconhecer que a maioria das reuniões mediúnicas
TEUS, XVIII, 20), a evocação feita na prece é dos grupos e casas espíritas sérias ocorrem com esse
direcionada à segunda classe, a dos bons Espíri- fim sério, de instruir e melhorar tanto os partici-
tos (KARDEC, 1995, questão 111). Além disso, pantes encarnados quanto os desencarnados que são
quando boas vibrações são pedidas, em preces, por atendidos pelo diálogo ou doutrinação. Portanto,
determinadas pessoas, desencarnadas ou encarna- podemos considerar que o movimento espírita, em
das, que acreditamos necessitarem de auxílio, isso, geral, já realiza reuniões mediúnicas com segurança
de certa forma, é uma evocação que chamamos de e de acordo com as orientações de Kardec.
indireta. Indireta porque, no caso de pessoas desen-
carnadas, não exigimos a presença delas em nossa Entretanto, tem crescido o número de companheiros
reunião, mas rogamos a Deus e aos bons Espíri- que desejam realizar evocações diretas em reuniões me-
tos que as auxiliem. Se a presença desses Espíritos diúnicas da forma como Kardec recomendou, e não vemos
desencarnados for possível e permitido por Deus, nenhum empecilho em particular, exceto o de se prepa-
certamente eles comparecerão. Indireta, no caso de rarem adequadamente. O item 5), do parágrafo anterior,
pedidos por encarnados, porque Espíritos ligados indica e deixa claro que a evocação direta não apresenta
a eles ou que os estejam influenciando para o mal nenhum inconveniente se for feita com “um fim sério”.
podem ser auxiliados na reunião mediúnica. Em vista da importância, seriedade e responsabilidade
envolvidas em qualquer trabalho de intercâmbio mediú-
2. Kardec, ao contrário do que alguns poderiam pen- nico, enumeramos a seguir quatro condições necessárias
sar, não exclui nem rejeita os benefícios das comu- ou indispensáveis para a realização de evocações dire-
nicações ditas espontâneas, isto é, as que ocorrem tas com segurança e com “um fim sério”. Mencionamos
sem ter recebido uma evocação direta (item 269 do a título de lembrança, mas não serão analisadas aqui

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da Fonseca, A. F.

outras condições como, por exemplo, a importância do mações sobre a entidade, ou consultar fontes incomple-
nível moral-doutrinário (esforço na transformação mo- tas como sites de internet, por exemplo. Também não é
ral e no estudo), compromisso e assiduidade, afinidade suficiente munir-se apenas de dados pessoais como local
e amizade de todos os componentes do grupo mediú- e data de nascimento, ou quem foram seus pais, onde es-
nico, bem como ter comprovada a ostensividade da ferra- tudou ou sua profissão, etc. Esse tipo de informação é
menta mediúnica do(s) que se prestarão ao intercâmbio. importante e útil, mas não será apenas para conferir sua
Acrescente-se a isso o comentário de Kardec no item 272 identidade que um Espírito elevado será evocado. Deve-
do LM de que “Freqüentemente, as evocações oferecem se estudar o máximo possível sobre o que houver a res-
mais dificuldades aos médiuns do que os ditados peito da entidade, seus feitos, suas produções literárias,
espontâneos, sobretudo quando se trata de obter respos- científicas, filosóficas, etc. além de situações marcantes
tas precisas a questões circunstanciadas. Para isto, são de sua vida, de acordo com o que se dispõe de informa-
necessários médiuns especiais, ao mesmo tempo flexíveis ção. Isso é importante para o grupo poder analisar o con-
e positivos e já em o no 193 vimos que estes últimos são teúdo da comunicação e verificar a identidade e legitimi-
bastante raros, . . . ” (grifos em negrito, meus), e ve- dade do que o Espírito disser. Espíritos inteligentes, mas
mos como é importante também se certificar qual o tipo mal-intencionados podem se fazer passar pelos evocados
de mediunidade o grupo tem a disposição. O que Kar- (veja-se os comentários de Kardec nos itens 239 e 246 do
dec exemplifica, mas muitos companheiros não analisam, LM) e o grupo deve estar preparado. Como a evocação
é o esforço e o trabalho por trás da realização plena e direta de Espírito elevado vai requerer algum tipo de aná-
com qualidade de evocações diretas, algo muito além do lise e verificação da identidade do mesmo, ou pelo menos
meramente chamar esse ou aquele Espírito. Teriam os de sua superioridade, se compatível com a do nome evo-
companheiros interessados na evocação direta a devida cado, talvez convenha, embora não seja absolutamente
disposição, capacidade e disponibilidade para realizarem necessário, os médiuns não conhecerem o planejamento,
todo o preparo que essa tarefa exige para satisfazer “um de antemão, e não conhecerem quem será evocado para
fim sério”? Vejamos. evitar ou minimizar qualquer influência própria, anímica,
A seguir, apresentamos quatro condições necessárias nas comunicações do Espírito evocado. O grupo terá que
para a realização de evocações diretas com “um fim sé- conhecer bem seus médiuns, pois se algum médium tiver
rio” conforme Kardec. predileção por alguma entidade em especial, ele(a) pode
ter em sua mente bastante informação sobre ela e, se
evocada, tornar duvidosa a genuinidade da comunicação.
II P RIMEIRACONDIÇÃO PARA REALIZA -
Se o evocado for um Espírito sofredor, igualmente o
ÇÃO DE EVOCAÇÕES DIRETAS
dirigente e auxiliares terão que estudar e estar a par de
Assim como para bem realizar todas as tarefas da um conjunto mínimo de informações sobre ele(a) para
vida, a primeira condição para um bom trabalho de evo- poder ajudar, dialogando com fraternidade e cumprindo
cação direta é realizar um bom planejamento, com a de- a orientação de Kardec do item 269 do LM de ajudar
vida antecedência, das evocações que se deseja realizar. a instruir e melhorar o Espírito comunicante. Se a evo-
Questões como: que Espírito(s) será(ão) evocado(s) em cação de um Espírito sofredor tiver a intenção, além de
cada reunião? Com que fim? Haverá uma ordem? Essa instruí-lo e melhorá-lo, de se retirar alguma lição, um
ordem tem algum propósito didático/instrutivo? Que planejamento prévio permite preparar perguntas a serem
questões devemos preparar para fazer a eles, caso aten- feitas ao Espírito que sejam, ao mesmo tempo, respei-
dam o chamado? Como, em geral, os grupos se reúnem tosas à sua condição de sofredor, e instrutivas para o
semanalmente, é recomendável ter, adiantado, uma pro- grupo. Não se improvisam questões de qualidade sem
gramação de nomes de Espíritos para evocação direta em um preparo e conhecimento prévios. Cumpre lembrar de
cada reunião, para algumas semanas, pelo menos, para alguns casos descritos por Kardec como o que ele relata
evitar imprevistos e decisões repentinas de escolhas de nos itens 94 e 95 do LM, sobre os fatos ocorridos em
nomes que, naturalmente, terão boa chance de fracassar, junho de 1860, na rua des Noyers, em Paris. Kardec, an-
pois quase sempre os Espíritos são bastante ocupados tes de evocar um Espírito menos evoluído, consulta São
para nos atender assim de pronto. Luís quanto à possibilidade/adequação ou não da evoca-
Nesse planejamento, há duas escolhas gerais para a ção da entidade. Se esse tipo de consulta for necessário,
evocação direta: A) Espíritos elevados, e de nomes co- para realiza-la, logicamente, temos que ter um médium
nhecidos; ou B) Espíritos de evolução mediana ou baixa ostensivo bem preparado, pois se trataria, então, de duas
cujo perfil, problema pessoal, caso, etc. conhecemos, pelo evocações.
menos, em parte. Parece simples, mas adiantamos que Para formar uma ideia da responsabilidade envolvida
não é bem assim. em uma atividade de evocação direta, suponha que fo-
Suponha que se deseja evocar diretamente um Espí- ram planejadas as evocações de determinado Espírito do
rito elevado, do tipo A). Tirando o médium ou grupo tipo A) e Espírito do tipo B) em uma reunião mediúnica
de médiuns que ficarão à disposição da manifestação do semanal. Quanto tempo de estudo prévio sobre esses Es-
Espírito, é importante que o dirigente e seus auxilia- píritos serão necessários para que a evocação possa atin-
res façam um estudo aprofundado sobre a personalidade gir “um fim sério” como Kardec recomenda? É possível
que se pretende evocar. Não basta ler algumas infor- determinar quanto tempo de dedicação devemos oferecer

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ao estudo de cada personalidade? Podemos formar uma com maior ou menor número de grupos mediúnicos. Es-
ideia do tempo necessário para conhecer bem uma dada ses grupos devem se reunir ao longo dos dias e horários
personalidade, pelo tempo que um biógrafo leva para jun- disponíveis na semana, em turnos diferentes da manhã,
tar as informações que precisa sobre ela, acrescentados do tarde ou noite, e a situação mais comum é se reunirem
tempo de reflexão sobre essas informações para poder te- uma vez por semana. Para ilustrar o problema, supo-
cer seus próprios comentários. Já dá para perceber que nha que cada grupo queira fazer uma evocação direta dos
não é algo rápido. Precisamos fazer desse jeito, igual Espíritos de Kardec, Erasto, Santo Agostinho, e/ou al-
ao biógrafo? Certamente que não. Mas quanto tempo gum cientista, religioso, filósofo ou personalidade conhe-
pode ser considerado adequado? Não há uma regra esta- cida e elevada da nossa história. Pensando apenas nessa
belecida sobre isso, mas o cuidado e responsabilidade em Casa Espírita grande de nosso exemplo, algum compa-
realizar tal trabalho nos faz refletir que uma coisa é certa: nheiro responsável pelas atividades mediúnicas da Casa
quanto mais elevado for o Espírito, mais tempo necessi- poderá organizar um cronograma de evocações que, natu-
taremos para estudá-lo. Uma solução viável seria evocar ralmente, será mais complexo que o planejamento de um
um mesmo Espírito por várias semanas/reuniões mediú- único grupo mencionado anteriormente, mas que deverá
nicas, mas há um problema. Quanto mais elevado for um conter uma programação de evocações diferentes para
Espírito, mais difícil garantir-se que seja ele(a) mesmo(a) cada grupo. Fazendo as contas de modo aproximado,
que estará presente, e/ou que possa dedicar ao grupo vá- supondo que, em média, se reúnem 50 ÷ 7 ou, aproxima-
rias semanas. Agora ponderemos: se o movimento espí- damente, 7 grupos mediúnicos por dia da semana, e su-
rita já não se dedica ao estudo da Doutrina Espírita como pondo que todos os grupos queiram evocar diretamente
deveria, imaginem toda semana, ou todo o mês, ter que Kardec, por exemplo, admitindo (o que provavelmente
realizar um trabalho quase que de pesquisa e investigação não será verdade, mas supondo que sim) que Kardec es-
profundos sobre uma dada personalidade, para poder se teja disponível para visitar diariamente os grupos dessa
preparar para avaliá-la em uma evocação. Como se não Casa Espírita, ele gastará 7 × 7 = 49 dias para atender,
bastasse, não se pode esquecer que o Espírito evocado pelo menos uma vez, à evocação direta de todos os gru-
diretamente pode estar reencarnado, vivendo em outros pos só desta Casa. Já é possível perceber as dificuldades.
mundos, e/ou totalmente impossibilitado de atender às Como não é razoável que Kardec esteja à disposição de
solicitações, de maneira que um limite máximo de ten- uma única Casa Espírita mesmo que ao longo de 49 dias
tativas, em termos de tempo de evocação, deveria ser (e supondo que os grupos queiram evocá-lo uma única
estabelecido previamente (ver 3a questão do item 282 do vez), percebe-se a insensatez de se incentivar esse tipo de
LM). Isso já permite perceber que não se deve criticar o escolha de evocação direta.
movimento espírita por realizar reuniões mediúnicas sem Apresento uma ressalva sobre os argumentos do pará-
evocações diretas. grafo anterior e uma discussão. Nas questões 30 e 30a do
Portanto, a primeira condição para a realização de item 282 do LM, Kardec pergunta se um Espírito pode
um trabalho mediúnico continuado de evocações diretas responder à evocação de dois ou mais grupos diferen-
e com “um fim sério” é: Realizar um bom planeja- tes. Os Espíritos respondem que sim, se for um Espírito
mento, que envolve e consiste do estudo apro- elevado (questão 30), e comparam isso ao Sol que, da
fundado das informações disponíveis da perso- posição em que está, irradia seus raios para muitos lu-
nalidade a ser evocada. Isso naturalmente depende gares ao mesmo tempo (questão 30a). Kardec, em nota
de capacidade, conhecimento e disponibilidade do grupo à essa última questão diz: “É o que sucede com um ho-
para o estudo. mem que, sem mudar de lugar, pode transmitir seu pen-
samento por meio de sinais perceptíveis de diferentes la-
dos.” Notemos, entretanto, que isso é possível desde que
III S EGUNDA CONDIÇÃO PARA REALIZA -
o pensamento do Espírito seja o mesmo. Isto é, ele pode
ÇÃO DE EVOCAÇÕES DIRETAS
sim irradiar pensamentos para vários grupos ao mesmo
Um problema que precisa ser levado em conta por tempo, mas não pode responder, ao mesmo tempo, ques-
causa do número de grupos mediúnicos existentes no mo- tões distintas. Se um médium leva 1 minuto para psico-
vimento espírita, nos levará à segunda condição para a grafar uma dada resposta a uma questão, por exemplo,
realização de um bom trabalho de evocação direta. Con- pelo menos durante esse intervalo de tempo, outro mé-
sideremos para efeito de raciocínio, uma Casa Espírita dium não poderá escrever sobre outro assunto. Outro
que possa ser considerada de grande porte, para explicar médium em outro lugar, pode escrever sobre o mesmo
a questão. Suponha que uma Casa Espírita assim, tenha assunto, durante o tempo em que o Espírito irradia seu
algo da ordem de 1000 colaboradores espíritas e, desses, pensamento. Isso torna ainda mais necessária a análise
750 participem de reuniões mediúnicas. Considerando do conteúdo da comunicação.
um número médio aproximado de 15 participantes por Mas vamos além considerando, agora, o número de
reunião mediúnica (sem considerar que um mesmo cola- Centros Espíritas no país. Segundo site de dúvidas
borador possa participar de mais de um grupo mediú- da FEB (2019), o número de centros espíritas no Brasil
nico), e teremos algo em torno de 50 grupos mediúnicos é de aproximadamente 15 mil. Considerando, por baixo,
nessa Casa. Esses números não são absolutos e podem que cada centro espírita tenha, pelo menos, um grupo
haver Casas com número grande de colaboradores, mas mediúnico, teremos pelo menos 15 mil grupos mediúni-

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cos no movimento espírita. Suponha que todos os grupos cias.” Alguém poderia considerar essa afirmativa
mediúnicos de todos os Centros Espíritas desejem evocar e pensar que ao evocar uma personalidade ele-
diretamente Kardec. Quanto tempo cada grupo deverá vada, outros Espíritos igualmente evoluídos pode-
esperar? Vejamos. Suponha que a distribuição de nú- riam responder por e em nome dela. Não discor-
meros de reuniões mediúnicas por dia seja, em média, damos, mas ponderamos o seguinte. Essa última
homogênea ao longo dos dias da semana, e teremos algo frase de Kardec foi dita no seguinte contexto, tam-
em torno de 15000 ÷ 7 ∼ 2140 grupos mediúnicos se reu- bém contido no mesmo item do referido capítulo
nindo por dia. Mesmo que houvessem, por dia, um grupo do LM: “A questão da identidade é, pois, como
se reunindo a cada período de uma hora ao longo das 24 dissemos, quase indiferente, quando se trata de
horas de um dia, teríamos algo como 89 grupos mediúni- instruções gerais, uma vez que os melhores Es-
cos realizando a reunião mediúnica simultaneamente. É píritos podem substituir-se mutuamente, sem maio-
impossível Kardec estar presente em 89 grupos ao mesmo res conseqüências. Os Espíritos superiores formam,
tempo! Se Kardec visitar um grupo mediúnico por dia, por assim dizer, um todo coletivo, cujas individu-
levaria algo em torno de 5 anos e 10 meses para visitar, alidades nos são, com exceções raras, desconheci-
pelo menos uma vez, cada grupo mediúnico. Já imagina- das. Não é a pessoa deles o que nos inte-
ram se todos esses grupos mediúnicos desejassem evocar ressa, mas o ensino que nos proporcionam.”
diretamente Kardec, Erasto, Santo Agostinho, Sócrates, (Grifos em negrito, meus). A menos que se de-
Einstein, ou qualquer uma das grandes personalidades da seje identificar o Espírito comunicante, o que então
nossa humanidade? Mas suponha que se deseja evocar di- implica que sua mensagem ou comunicação não se
retamente personalidades boas, mas, digamos, “menores” trata de instrução geral, “Não é a pessoa deles o
em evolução como, por exemplo, André Luiz, Emmanuel, que nos interessa, mas o ensino que nos proporci-
Bezerra de Menezes, Yvonne do Amaral Pereira, Hermí- onam.” Veja que, se a intenção de uma evocação
nio de Miranda, Chico Xavier, Batuíra, Caibar Schutel, direta for receber instruções gerais, isto é, que sir-
Eurípedes Barsanulfo, etc. Mesmo assim, seria possível vam para muitas pessoas, não é necessário evocar
eles visitarem cada grupo mediúnico? Com frequência? ninguém em particular, mas sim fazer uma evoca-
Mais de uma vez? ção do tipo indireta, rogando a permissão que um
Como não há como organizar uma “agenda” de evo- bom Espírito esteja presente e nos traga orienta-
cações de cada personalidade dessas, para cada grupo ções e esclarecimentos. Ainda nas palavras de Kar-
mediúnico, ocorrerá que muitos grupos desejarão evocar dec, “Ora, desde que esse ensino é bom, pouco im-
Kardec ou outra personalidade elevada, ao mesmo tempo. porta que aquele que o deu se chame Pedro,
O resultado será uma de duas alternativas: ou Paulo. Deve ele ser julgado pela sua qua-
lidade e não pelas suas insígnias.” (Grifos em
a) O desejo muito forte de ouvir respostas de um Es- negrito, meus). Por causa, então, disso que Kardec
pírito muito elevado por conta de sua evocação di- diz que a evocação perde o caráter “direto”, pois
reta, pode causar uma mistificação. Na questão para receber instruções de um Espírito elevado, não
36 do item 283 do LM, depois que os Espíritos é necessário evocar nenhum nome em particular.
afirmaram que Espíritos de animais não podem ser
evocados porque não permanecem na erraticidade, Ou seja, mesmo que seja o próprio evocado quem
quando perguntados por Kardec sobre pessoas que comparecesse para trazer sua comunicação, é mais im-
obtiveram respostas de animais espirituais evoca- portante o conteúdo dessa comunicação do que a pessoa
dos diretamente, os Espíritos responderam da se- ou o nome em si mesmo. Nisso, há que ponderar se real-
guinte maneira: “Evoca um rochedo e ele te respon- mente é necessário fazer a evocação direta de determina-
derá. Há sempre uma multidão de Espíritos pron- das personalidades pelas razões acima enumeradas.
tos a tomar a palavra, sob qualquer pretexto.” Ou Portanto, a segunda condição para a realização de
seja, Espíritos mentirosos e levianos podem tomar um trabalho de evocações diretas com “um fim sério”, é
e usar o nome da personalidade evocada, e enganar evitar ou apenas raramente escolher persona-
um grupo inteiro fazendo-se passar por ela. Se o lidades muito elevadas, a menos que se queira correr
grupo não for vigilante, e mantiver uma insistência o risco de sofrer uma mistificação ou se contente com a
e crença cegas na evocação direta, podem sofrer a ideia de que um Espírito de mesma evolução possa subs-
mistificação por parte de Espíritos menos evoluí- tituir o evocado.
dos.
b) Diz Kardec no capítulo XXIV do LM, sobre a iden- IV T ERCEIRA CONDIÇÃO PARA REALIZA -
tidade dos Espíritos, no item 256, que “À medida ÇÃO DE EVOCAÇÕES DIRETAS
que os Espíritos se purificam e elevam na hierar-
quia, os caracteres distintivos de suas personalida- A terceira condição para a realização de um trabalho
des se apagam, de certo modo, na uniformidade de evocações diretas com “um fim sério” é ainda mais di-
da perfeição;” Nisso, adiante nesse mesmo item fícil do que a primeira. É, digamos, o maior desafio para
Kardec comenta que “os melhores Espíritos podem um grupo mediúnico. Ela se refere ao conteúdo da evo-
substituir-se mutuamente, sem maiores conseqüên- cação em si! Em outras palavras, que perguntas devem

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Evocação direta de Espíritos: quatro condições necessárias . . .

ser feitas ao Espírito evocado? O que lhe será dito? A mado ao mesmo tempo em pontos diferentes, responderá
gravidade dessa terceira condição foi bem capturada em a ambas as evocações, se forem ambas sérias e fer-
um comentário de Emmanuel presente no capítulo 54 da vorosas. No caso contrário, dá preferência à mais
obra Pão Nosso (XAVIER, 2004) em análise à seguinte séria.” (Grifos em negrito, meus). O grupo que decidir
frase de Pedro, o apóstolo: “Pelo que, sendo chamado, pelas evocações diretas tem que ser maduro para aceitar
vim sem contradizer. Pergunto pois: por que razão man- o muito provável desapontamento de não ter a respectiva
dastes chamar-me?” – Pedro. (ATOS 10:29). Emmanuel evocação direta atendida pela entidade pretendida. Por
analisa exatamente a questão da evocação e, no referido isso, a terceira condição é bastante importante.
capítulo, resume o problema em torno da terceira condi- Como planejar a terceira condição? O grupo deve pre-
ção para evocações diretas assim: parar as questões que irá fazer ao Espírito. Para isso, o
grupo precisa previamente estudar o assunto relacionado
Imaginai-vos chamando Simão Pedro a determinado
círculo de oração e figuremos a aquiescência do ve- ao que se deseja que o Espírito esclareça. Isso é impor-
nerável apóstolo ao apelo. Naturalmente, sereis obri- tante pois não pretendemos chamar um Espírito elevado
gados a expor ao grande emissário celestial os mo- “tão-somente para ouvi-lo falar”, mas sim para que suas
tivos da requisição. E, pautando no bom senso as palavras sejam proveitosas ao aprendizado e crescimento
nossas atitudes mentais, indaguemos de nós mesmos de todos. Por exemplo, suponha que um grupo deseja
se possuímos bastante elevação para ver, ou- evocar Platão ou Aritóteles para fazer-lhe perguntas ou
vir e compreender-lhe o espírito glorioso. Quem obter esclarecimentos sobre a filosofia espírita. Bom, o
de nós responderá afirmativamente? Teremos, assim, mínimo que se espera do grupo é que todos (não apenas
suficiente audácia de invocar o sublime Cefas, tão- o dirigente) estudem previamente e com certo aprofun-
somente para ouvi-lo falar? (Grifos em negrito,
damento, tanto a Doutrina Espírita quanto alguns fun-
meus).
damentos da Filosofia e o pensamento dos filósofos mais
Vejam, Emmanuel não diz que é proibido evocar o Espí- conhecidos, incluindo os daquele que será evocado. Se-
rito do apóstolo Pedro! Mas que é razoável e respeitoso ria muito proveitoso até mesmo para se precaver contra
realizar um preparo prévio para que não venhamos mal- mistificações, estudar algumas das várias escolas e pen-
baratar o tempo e a boa vontade de um Espírito elevado samentos filosóficos, as principais teorias materialistas e
com questões de menor importância. Vejam que isso é espiritualistas, etc. Não há como escapar da seguinte re-
bastante sério! Espíritos superiores são sempre muito gra de ouro: quanto mais elevado for o Espírito a ser
ocupados para desperdiçar o tempo deles com questões evocado, mais extensos e profundos devem ser os
que nós mesmos podemos responder pelo estudo. O pró- estudos prévios e preparatórios dos componentes
prio KARDEC (1993), como descrito em Obras Póstu- do grupo, pois seria muita falta de respeito evocar um
mas (OP), só contou com o Espírito de Verdade, por Espírito elevado para fazer-lhe perguntas triviais e ba-
“um quarto de hora” a cada mês, e isso para ajudá-lo nais. Banalizar o tempo de Espíritos elevados é também
com nada menos que a própria Codificação do Espiri- falta de caridade. Um Espírito muito elevado, provavel-
tismo. Como veremos adiante, se não cumprirmos bem a mente, não irá atender a uma evocação de grupos que não
terceira condição, provavelmente um Espírito muito ele- se preparam adequadamente e, como já comentado, isso
vado não virá e a insistência do grupo abrirá brecha para pode deixar uma brecha para que Espíritos levianos e in-
Espíritos levianos trazerem suas ideias. teligentes possam fascinar e prejudicar o grupo. O grupo
Assim, todos concordamos que Espíritos elevados não deve lembrar-se que as perguntas precisam ser, ao mesmo
tem o tempo livre e plenamente disponível para atender tempo, inteligentes e não serem questões cujas respostas
ao primeiro chamado que lhes seja feito. Isso, sem contar podem ser pesquisadas e encontradas pelos próprios en-
com o fato comentado anteriormente de que, com base carnados nas diversas obras espíritas ou do conhecimento
na estimativa do número de grupos mediúnicos existen- humano. São Luiz, na mensagem XVII do cap. XXXI
tes no movimento espírita, há uma grande chance de num do LM a respeito das questões de ciência, diz que: “a
dado dia e horário, mais de um grupo evoque uma mesma missão dos Espíritos não é resolvê-las, poupando-vos ao
personalidade, um mesmo Espírito elevado. Nisso, va- trabalho das pesquisas.” Kardec também alerta sobre isso
mos supor que um Espírito elevado possa atender a uma em A Gênese (GE) (KARDEC, 2010, item 50 do capí-
evocação em um dado dia e horário. E vamos supor, tulo I): “Os Espíritos só ensinam exatamente o que é
também, que nesse dia e horário vários grupos o evocam preciso para ajudar a compreender a verdade, mas se
diretamente. Ele(a) vai ter que escolher um dos grupos abstêm de revelar o que o homem pode descobrir
para ir pessoalmente e/ou, se achar relevante, mandar um por si mesmo, deixando-lhe o cuidado de discutir,
representante à sua altura como sabemos que também é verificar e submeter o todo ao cadinho da razão,
possível. Certamente que o Espírito elevado que tem a deixando mesmo, muitas vezes, que adquira experiência
disponibilidade de comparecer a um chamado por evo- à própria custa.” (Grifos em negrito, meus).
cação direta, dentre vários que estejam evocando-o, terá Uma comparação pode ajudar nessa questão. Imagi-
que escolher o grupo que ofereça maior oportunidade de nem que um cientista premiado com o Nobel, visite uma
instrução e benefícios para si e para o próximo. É exata- escola de crianças ainda nas primeiras séries do ensino.
mente isso que os Espíritos dizem em resposta à questão Certamente, esse cientista falará de bom grado sobre ge-
30a do item 282 do LM: “Um Espírito superior, cha- neralidades da Ciência e da sua área de pesquisa pre-

J. Est. Esp. 8, 010201 (2020). 010201 – 6 JEE


da Fonseca, A. F.

miada, bem como estimulará os pequeninos ao estudo. Kardec recomenda. Argumentamos que esse trabalho,
Decerto, poderá responder a alguma pergunta infantil, muito digno por sinal, requer um preparo e dedicação
mas temos que ser sensatos e convir que um cientista muito elevados de todos os participantes do grupo me-
prêmio Nobel não atenderá a todos os pedidos e convites diúnico. Sem esse preparo, um trabalho de evocação di-
de escolas de ensino fundamental para falar sobre genera- reta de Espíritos, mesmo os menos elevados, não terá
lidades. Certamente, ele(a) receberá convites de grupos “um fim sério”. A realização de evocações diretas com
de pesquisa tão avançados no conhecimento quanto ele ausência desse tipo de preparo configura-se em prática
mesmo, grupos esses que não somente ouvirão o cientista de curiosidade e empirismo cego, o que são incondizen-
falar, mas farão perguntas em nível avançado justamente tes e incoerentes com a própria Doutrina Espírita. É fácil
para poder aproveitar a oportunidade de aprender mais. verificar que o preparo descrito neste artigo é muito difícil
Assim, a terceira condição consiste da realização de se realizar em função de diversas razões que vão desde
constante, por parte de dirigente e auxiliares as dificuldades de estudo naturais, até os compromissos
do grupo, de um preparo cuidadoso de perguntas diários que nos tomam tempo. Vimos que o aprofunda-
e questões que serão apresentadas ao Espírito mento no estudo sobre a personalidade a ser evocada bem
evocado, se for do tipo A), ou de questões e comen- como no tema que se deseja perguntar é necessário não
tários instrutivos e fraternos se o Espírito evocado somente em função do respeito que se deve ao tempo e
for do tipo B). A terceira condição requer duas etapas: dedicação da entidade, mas também para que o próprio
i) dispender um bom tempo estudando o tema das per- grupo seja capaz de avaliar as respostas e tirar delas as
guntas que serão feitas ao evocado, até mesmo para não lições necessárias ao seu aprimoramento. As dificuldades
passar a vergonha de ouvi-lo dizer que a resposta está inerentes ao cumprimento desses requisitos não devem
nas obras doutrinárias ou outras que teríamos à dispo- servir de desestímulo à prática de evocações diretas, mas
sição para estudo. A evocação precisa ter um objetivo lembrar aos interessados da responsabilidade inerente a
bem claro e só é possível conceber um bom objetivo após todo trabalho sério e importante. Um trabalho mediú-
muito estudo sobre um determinado assunto; ii) planejar, nico com evocações diretas requer condições e preparo
então, as perguntas relevantes tendo em mente o objetivo condizentes com os seus propósitos de elevação.
que se deseja atingir. As perguntas devem demonstrar o Nossa análise aqui, serve de alerta aos dirigentes de
grau de reflexão do grupo a respeito do tema, e precisam reuniões mediúnicas que, por ouvirem críticas sobre au-
envolver questões relevantes, moral e intelectualmente, ao sência de evocações diretas, mesmo com base em Kardec,
mesmo tempo que não configurem questões que tirariam decidem realiza-las sem o devido preparo.
o nosso esforço e trabalho de pesquisa. Se repararmos bem, Kardec realizou e satisfez todas
essas condições. Primeiro, pela sua cultura e estudos, ele
V Q UARTACONDIÇÃO PARA REALIZAÇÃO dominava muito bem tanto as teorias científicas quanto
as diversas escolas de pensamento filosófico e religioso de
DE EVOCAÇÕES DIRETAS
sua época. Segundo, porque Kardec dedicava até mesmo
O estudo aprofundado do tema a ser questionado e suas horas de descanso ao estudo e análise das comunica-
conversado com o Espírito evocado também serve de base ções. Kardec, igualmente, planejava as questões que iria
para a proposta da quarta condição para a realização de apresentar aos Espíritos com base no estudo prévio do
um trabalho de evocações diretas com “um fim sério”: fenômeno espírita que ora investigava. Sua capacidade
análise posterior minuciosa do conteúdo da comunicação. intelectual elevada o permitia conduzir uma sequência
Isto é, o grupo não deve acreditar cegamente nos comen- de questões de modo elevado, respeitoso e, mais impor-
tários e respostas dados pelo Espírito evocado, principal- tante, instrutivo. Assim, quando Kardec recomenda a
mente daqueles que são considerados elevados. Parece realização de evocações diretas, não se pode considerar
contradição, mas as características do intercâmbio me- que devam ser feitas de qualquer jeito, mas sim com cui-
diúnico e a seriedade necessárias para um bom trabalho dado, preparo e planejamento como ele mesmo, Kardec,
de evocação direta requerem preparo anterior à evocação exemplificou.
e um minucioso trabalho de análise posterior à mesma. A Notem que o volume e a complexidade dos estudos
evocação direta não presume a aceitação direta de tudo sobre a personalidade a ser evocada fica menor quanto
o que o Espírito diz. E isso é a própria Doutrina Espírita menor for a evolução da mesma. Isto é, para Espíritos do
que ensina, isto é, que “é melhor repelir dez verdades do tipo B) como descrito anteriormente, o grau de complexi-
que admitir uma única falsidade, uma só teoria errônea.” dade dos estudos é menor. Porém, engana-se quem pensa
(Erasto, item 230 do LM). A quarta condição, portanto, que a evocação direta de Espíritos do tipo B) pode ser
consiste do grupo dedicar tempo, também, para feita sem preparo. O primeiro tipo de planejamento diz
estudo e análise das respostas. respeito às escolhas desses Espíritos. Que critérios serão
usados nessas escolhas? Serão Espíritos desconhecidos do
VI D ISCUSSÃO E C ONCLUSÕES vulgo? Serão Espíritos de pessoas conhecidas e/ou famili-
ares dos membros do grupo? Mas então qual a motivação
Apresentamos aqui quatro condições necessárias para de os evocar? Ajudá-los? Devem ser feitas perguntas de
a realização de evocações diretas a determinados Espíri- natureza pessoal ao Espírito para identifica-lo? Como se
tos em reuniões mediúnicas, com “um fim sério” como certificará de que o Espírito evocado é mesmo o da pessoa

JEE 010201 – 7 J. Est. Esp. 8, 010201 (2020).


Evocação direta de Espíritos: quatro condições necessárias . . .

que desejou-se evocar sem fazer-lhe perguntas desrespei- rito são raros. Se são raros, naturalmente nem todos os
tosas? Que tipo de informações exatamente se deseja grupos (dos 15 mil ou mais) terão à disposição médiuns
saber a partir do Espírito? O que é que de diferente do com tal capacidade, e isso certamente colocará em dú-
conteúdo das obras fundamentais da Doutrina Espírita, vida os resultados dos trabalhos de evocação direta de
se deseja aprender ou descobrir que só a evocação direta numerosos grupos.
permitirá? Se essas perguntas não puderem ser respon- Concluo, então, o artigo perguntando: quantos gru-
didas de modo coerente e satisfatório, descobre-se que pos ou pessoas teriam disponibilidade e capacidade de,
não há, de fato, razões para se fazer uma evocação direta semanalmente, se prepararem à altura, para um traba-
com “um fim sério”. Ademais, o tempo de desencarna- lho de evocações diretas com “um fim sério”? Será que,
ção, ou seja, o tempo de permanência no mundo espiri- então, para essa grande maioria de trabalhadores de reu-
tual pode fazer com que o Espírito tenha mudado alguns niões mediúnicas, Emmanuel não está correto em reco-
ângulos de sua visão. Quanto maior o tempo de errati- mendar evitar-se as evocações diretas nas reuniões me-
cidade/intermissão, maior tende a ser essa mudança na diúnicas?
personalidade/individualidade do Espírito. Somente es-
tudiosos que conhecem significativamente sobre o mundo
espiritual podem avaliar de forma minimamente apropri-
ada esse fator de mudança. R EFERÊNCIAS
Que se realize, portanto, como Kardec realizou, to-
DA FONSECA, A. F. 2015. “Evocação no Movimento Espírita:
dos os preparos necessários para que as evocações sejam quem disse que não há?”, Jornal Alavanca 512, p. 4 (2015).
proveitosas, instrutivas e culminem em “um fim sério”. Artigo reproduzido neste link.
Não se entenda das reflexões apresentadas aqui que esta- FEB. 2019. Site “Dúvidas mais Frequentes” – https:
mos apoiando alguma proibição ou restrição à prática de //www.febnet.org.br/blog/geral/o-espiritismo/
evocações diretas. Apenas alertamos para as condições duvidas-mais-frequentes/, acessado em 07/09/2019.
necessárias para isso. Embora essas condições deixem de FRANCO, D. P., por Bezerra de Menezes. 1976. “Unificação pau-
existir no intercâmbio mediúnico espontâneo, lembramos latina, união imediata, trabalho incessante. . . ”, mensagem re-
que o estudo e aprofundamento das obras de Kardec é ab- cebida em 20/04/1975 na sessão pública da Federação Espírita
Brasileira, em Brasília – DF, publicada em Reformador 1763,
solutamente necessário para qualquer tipo de atividade p. 19 (1976).
espírita.
KARDEC, A. 1993. Obras Póstumas. IDE Editora, 1a Edição, Ara-
A questão mencionada anteriormente sobre a ostensi- ras, SP.
vidade do médium merece considerações adicionais. Ela
KARDEC, A. 1995. O Livro dos Espíritos. Editora FEB, 76a Edi-
deve ser investigada junto com outra característica que ção, Rio de Janeiro, RJ.
Kardec menciona como fundamental para o sucesso de
KARDEC, A. 1996. O Livro dos Médiuns. Editora FEB, 62a Edi-
um trabalho de evocações diretas: a necessidade de ter à ção, Rio de Janeiro, RJ.
disposição médiuns especiais, flexíveis e positivos. Em-
KARDEC A. 2010. A Gênese, Editora CELD, 3a Edição, Rio de
bora já tendo citado mais acima, repetiremos aqui algu-
Janeiro, RJ.
mas orientações do próprio Kardec no item 272 do LM,
SAMPAIO, J. “ORIGEM DA RESTRIÇÃO ÀS EVOCAÇÕES
para melhor analisá-las:
DE ESPÍRITOS NO BRASIL”, Blog Espiritismo Comentado,
272. Freqüentemente, as evocações oferecem mais (2019), acesso através deste link.
dificuldades aos médiuns do que os ditados es- TEIXEIRA, J. R., por Camilo. 2006. “Definição e trabalho em tem-
pontâneos, sobretudo quando se trata de obter pos difíceis”, mensagem recebida em 11/11/2005 em a reunião
respostas precisas a questões circunstanciadas. do CFN da FEB, publicada em Reformador 2122, p. 30 (2006).
Para isto, são necessários médiuns especiais, ao XAVIER, F. C., por Bezerra de Menezes. 1975. “Unificação”, men-
mesmo tempo flexíveis e positivos e já em o no 193 vi- sagem recebida em 20/04/1963 em reunião da Comunhão Espí-
mos que estes últimos são bastante raros, por rita Cristã, publicada em Reformador 1761, p. 275 (1975).
isso que, conforme dissemos, as relações fluídicas nem XAVIER, F. C.. 1985. O Consolador, pelo Espírito Emmanuel,
sempre se estabelecem instantaneamente com o pri- Editora FEB, 11a Edição, Rio de Janeiro, RJ.
meiro Espírito que se apresente. (Grifos em negrito,
XAVIER, F. C.. 1998. Opinião Espírita, pelos Espíritos Emmanuel
meus, em itálico, originais).
e André Luiz, Editora CEC, 9a Edição, Uberaba, MG.
Depreende-se do comentário acima de Kardec que os mé- XAVIER, F. C.. 2004. Pão Nosso, pelo Espírito Emmanuel, Editora
diuns que permitem a evocação direta de qualquer Espí- FEB, 24a Edição, Rio de Janeiro, RJ.

Title and Abstract in English

Direct evocation of Spirits: four necessary conditions to perform it with a serious end

J. Est. Esp. 8, 010201 (2020). 010201 – 8 JEE


da Fonseca, A. F.

Abstract: The interest in performing direct evocations of Spirits in a mediumistic meeting grows in the spiritist movement.
The main argument for this is Kardec’s positive recommendations for this practice. In contrast, individual spiritual writers, such
as Emmanuel from Francisco Cândido Xavier’s psychography, recommended that no direct evocation of Spirits should happen
at mediumistic meetings. He recommended us to leave to the good Spirits the choice of the Spirits that will communicate during
the meeting. In view of this impasse, we propose a reflexive analysis of the conditions necessary for direct evocations with “a
serious end”, as Kardec pointed out. We analyse the issue and show that the direct evocation is possible as long as the groups
interested in that get prepared by a lot of study, preparation and planning. However, the amount of preparation is so high that
it might not be possible to be accomplished by the most of the spiritists. We conclude by the possibility of direct evocations,
but warning that without fulfilling the necessary conditions as discussed and proposed here, these evocations may not have “a
serious end”. We also conclude that the recommendations to avoid direct evocation, as made by Emmanuel, are wise as they
meet the conditions of most adherents of Spiritism, and are in accordance to the Spiritist Doctrine.
Keywords: Direct evocation; mediumistic meeting; Kardec; Emmanuel.

JEE 010201 – 9 J. Est. Esp. 8, 010201 (2020).

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