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PALESTRA - ROTEIRO DE ATUAÇÃO PARA A LEGALIZAÇÃO


DO ABATE E DA VENDA DE CARNE BOVINA

1) Saudar e agradecer a presença de todos e lembrar que existe uma lista de presença que os
açougueiros e comerciantes deverão assinar (colocar uma pessoa responsável por preencher
em letra de forma o nome do açougueiro e o do estabelecimento (e telefone), dando em
seguida a lista para que o mesmo assine. Justificativa: muitos são semi ou totalmente
analfabetos.

2) Lembrar que a reunião faz parte de uma das metas do planejamento estratégico do
Ministério Público que é a legalização do abate e comércio de carne bovina em toda a Bahia
e que nesta reunião será dado um prazo para a adaptação e o cumprimento da legislação.
Ressaltar que os açougueiros, comerciantes, pecuaristas e outros interessados terão a
oportunidade de tirar todas as dúvidas.

3) Destacar que o município já está muito atrasado no processo de legalização do abate e da


comercialização da carne bovina, pois a Portaria Nº 304 do Ministério da Agricultura foi
publicada no ano de 1996 e já houve tempo demais para a adaptação. Outros municípios já
estão muito mais adiantados. Não se pode alegar desconhecimento para descumprir uma
norma, pois quando ela é publica há uma presunção legal de que todos tomaram
conhecimento. Além disso, os jornais escritos e as televisões têm divulgado constantemente
que o abate clandestino e a comercialização sem higiene é ilegal e pode causar uma série de
doenças. Assim, não existe desculpa em dizer “que não sabia”. Se alguém trabalha em uma
atividade profissional deve procurar se inteirar da legislação pertinente e obedecê-la.
Ademais, se os açougueiros têm ouvido constantemente que é ilegal a forma como estão
trabalhando e não procuraram se adaptar até o momento, é porque estão apostando na
impunidade.

4) Ressaltar a gravidade do problema da carne e as doenças que ela pode causar, como
tuberculose, verminoses, cisticercose, brucelose, etc.

5) As pessoas sempre comeram carne dessa forma (sem fiscalização), então passaram a
acreditar que não haveria qualquer problema em continuar com esse hábito. A exigência da
inspeção seria assim uma medida desnecessária. Essas pessoas estão enganadas, pois não se
tem uma estatística precisa informando quantas pessoas vão parar nos hospitais em
decorrência da ingestão de carne contaminada. Só para se ter uma idéia, em um hospital
psiquiátrico de Minas Gerais, quase metade dos leitos são ocupados por pessoas com
cisticercose cerebral (doença oriunda de um verme que se instala na carne bovina ou suína).
É bom ressaltar que há bactérias que são resistentes a uma simples fervura, não morrendo
facilmente. Além disso, existem aquelas pessoas que gostam da carne “mal assada”, o que
agrava ainda mais o perigo da transmissão de doenças. Isto sem contar que a dona de casa
ou o próprio açougueiro poderão se contaminar ao manusear a carne crua, quando estiverem
limpando, antes do cozimento.

6) Destacar que por causas desses problemas de contaminação e doenças, a repressão ao


abate e venda clandestina de carne é, na verdade, uma questão de SAÚDE PÚBLICA.
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7) Esclarecer que a maioria das pessoas não possui plano de saúde e quando adoecem vão
parar nos hospitais públicos, aumentando significativamente o gasto do setor. E quem paga
a conta dos hospitais públicos?? Resposta: o imposto pago por toda a sociedade.

8) Pelo motivo de ser uma questão de saúde pública é que o Ministério Público, isto é, os
Promotores de Justiça estão empenhados em resolver o problema, ou seja, na defesa da
sociedade. OBS: Discorrer sobre a função do Ministério Público: fiscal da lei e defensor da
sociedade. Explicar que o Promotor, para cumprir a missão de defender a sociedade, possui
as mesmas garantias constitucionais que os Juízes, como a inamovibilidade e que nenhum
político poderá remover um Promotor de sua Comarca.

9) Falar que a legalização do abate e da comercialização da carne bovina faz parte do


planejamento estratégico do Ministério Público e que todos os Promotores irão trabalhar
nessa missão. Além disso, o próprio Governo Estadual também está interessado em
legalizar o setor, já que beneficia a população em geral e os próprios comerciantes de carne
(exportar para outros Estados ou países). OBS: Lembrar do episódio nacional em que todo o
Brasil deixou de exportar carne para a Rússia porque existia um foco de febre aftosa em
Manaus.

10) Diante de todas essas questões é que o processo de legalização é irreversível, ou seja,
não tem mais volta. Todos terão que se adaptar ou então deverão sair do mercado. Quem
não tiver condições de oferecer carne de qualidade para a população, infelizmente terá que
mudar de ramo. A saúde pública e o direito da maioria da sociedade devem sempre
prevalecer.

11) O que as normas sanitárias e a Portaria Nº 304/96 exigem não é muito (é o básico em
termos de higiene). Apenas que o boi seja abatido de maneira adequada e em local próprio;
que o animal e a carne sejam inspecionados por um veterinário treinado para verificar
doenças existentes; que a carne saia do matadouro, em caminhões baú refrigerados, a uma
temperatura de no máximo 7º C (sete graus centígrados) no interior da carcaça; que na
venda da carne, além da higiene, também seja mantida a refrigeração, com balcões com
vidro, protegendo o produto de moscas, poeiras e outras formas de contaminação. OBS: A
vigilância sanitária também deverá exigir dos açougueiros que tenham bancadas de aço
inox, mármore, granito ou fórmica, deixando de lado o famigerado ‘CEPO’. O “CEPO”
equivale a um tronco de árvore, onde normalmente se corta a carne, sendo um grande foco
de doenças, já que durante a noite ratos e baratas “passeiam” por cima do cepo, comendo os
restos de carne e urinando. Também o açougueiro deverá adquirir ou uma serra elétrica ou
uma serra manual inox (que não custa caro).

12) Os açougueiros, diante de toda a população do município são na verdade uma minoria
(obs: fazer uma comparação concreta da quantidade de habitantes com o número de
açougueiros). Considerando que estamos numa democracia, pergunta-se: - O que deve
prevalecer então, o interesse de toda uma sociedade ou de alguns açougueiros??

13) É certo que os Promotores não têm a intenção em prejudicar ninguém, mas devem fazer
cumprir a lei, a qual não foi feita pelos Promotores, nem pelos órgãos de fiscalização ou
pelo Prefeito, mas sim pelos deputados em Brasília, que são os representantes do povo. E
neste aspecto os deputados acertaram, pois estas normas protegem toda a sociedade. Os
Promotores, nem a Prefeitura Municipal, nem a Vigilância Sanitária, enfim, nenhum órgão
ou funcionário público pode deixar de cumprir o que determina a lei, sob pena de cometer
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crime de prevaricação. Se, por exemplo, a Prefeitura deixar cumprir a sua parte o Ministério
Público poderá mover uma ação civil pública ou processo por crime de prevaricação.

14) Aquele que insistir em desobedecer a lei vendendo carne oriunda de abate clandestino
(sem inspeção) ou mesmo que de origem legal, esteja sendo vendida sem refrigeração ou
exposta sem proteção do balcão (com vidro) poderá ser preso em flagrante, respondendo por
crime previsto na Lei 8.137/90, Art. 7º, IX, com pena de 02 a 05 anos de detenção.

15) Aliás é bom frisar que se o Promotor quisesse já poderia fazer uma blitz desde logo,
prendendo em flagrante quem estivesse irregular, pois o crime está ocorrendo. Mas,
comprovando que a intenção não é prejudicar ninguém, é que se está fazendo esta reunião
prévia e dando a oportunidade para que os açougueiros e comerciantes se adaptem.

16) Convém lembrar que os açougueiros devem ter em mente que os fiscais também são
obrigados a fiscalizar, não podendo se recusar. Nessa função são tidos como autoridades.
Portanto, se forem ofendidos ou ameaçados, o responsável poderá ser preso em flagrante
pelo crime de desacato ou ameaça. Em Santo Antônio de Jesus, por exemplo, vários
açougueiros já foram presos porque desacataram ou ameaçaram fiscais. Além de serem
presos e processados, a atitude deles em nada adiantou, pois a fiscalização foi feita e hoje o
abate e a comercialização são totalmente legalizados.

17) Definir o prazo que se recomenda seja de 60 a 90 dias (no máximo) para a instalação de
balcões frigoríficos, isto é, balcões com vidro para expor a carne devidamente refrigerada e
protegida das moscas e poeira, além das demais recomendações quanto à higiene: bancada
de aço inox, granito, mármore ou fórmica, serra elétrica ou serra manual inox (e outras
exigências das normas sanitárias como o fardamento dos empregados, azulejamento da área,
não uso de adereços como anéis, pulseiras, relógios para não acumular bactérias, etc.). Além
disso, ressaltar que quanto ao abate clandestino não se poderá dar prazo, pois o Promotor
não pode dar o aval para que um grupo de açougueiros continue por um tempo estipulado
cometendo delitos contra a população. O que o orador (Promotor) pode fazer é dizer que a
equipe não estará pronta para fazer qualquer blitz antes de 15 dias. OBS1: Se houver
contestação, mandar aguardar até o final da exibição do vídeo para depois serem
esclarecidas as dúvidas. Porém, quanto ao prazo o Promotor não deverá ceder. Deverá
argumentar o seguinte: os açougueiros têm constantemente visto reportagens nos jornais, na
televisão e até no Globo Repórter falando do abate clandestino, além de boatos a respeito da
legalização em outros municípios próximos, assim, se fossem responsáveis com a sua
própria profissão, já deveriam ter se preocupado em procurar orientação para se
regularizarem. Se isto não ocorreu é porque apostaram na impunidade. OBS2: O Promotor
não deve comentar com ninguém, mas caso se esgote o prazo do abate clandestino e o
Promotor verifique que os açougueiros se esforçaram, mas por circunstâncias alheias não
conseguiram ainda se adaptar, poderá adiar a blitz alguns dias. Quanto ao prazo da
adaptação dos balcões não deverá estender o prazo, pois, mesmo que os açougueiros não
tenham condições de obter os balcões frigoríficos, poderão obedecer a Portaria 304/96,
vendendo a carne dentro de frízeres ou caixas de fibra de vidro ou de isopor com gelo, como
já ocorreu em alguns municípios. O importante é não vender carne sem refrigeração e
exposta às moscas e à poeira. Lembrar que quando há interesse, o comerciante sempre dá
um jeito de vender a mercadoria, da maneira que o cliente exige. Um exemplo é a venda de
cerveja “geladíssima” em rincões distantes, onde não existe sequer energia elétrica.
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18) É certo que toda mudança é difícil. As pessoas em geral têm medo do que é
desconhecido. Mas pode-se afirmar, com convicção que essa mudança será melhor para
todos. Existirão vários obstáculos a serem superados, mas como diz o ditado: “Só não existe
solução para a morte”. Muitos têm medo que haja muito desemprego ou que haja
desabastecimento na cidade. Na prática nada disso vai ocorrer. Os outros municípios
(grandes e pequenos) onde se implantou a fiscalização são exemplos disso, como Santo
Antônio de Jesus, Nazaré, Cruz das Almas, Varzedo, Dom Macedo Costa, Salinas, etc.

19) Os próprios açougueiros depois da fase inicial, passam a gostar da medida. Deixam de
ter que acordar de madrugada para ir para o meio do mato fiscalizar e ajudar na matança;
recebem a carne já totalmente limpa e gelada; evitam ser contaminados, etc.

20) Neste aspecto é bom lembrar que todos os açougueiros terão que fazer exame de saúde
para saber se estão contaminados com alguma doença, já que durante todo esse tempo
manusearam carne crua, de procedência duvidosa (qualquer feridinha na mão pode levar à
contaminação). Nenhum trabalhador pode lidar com alimentos sem se saber do seu estado
de saúde, pois ele pode levar doenças graves para a população, como a tuberculose que, a
propósito, está aumentando rapidamente no Brasil. Em Santo Antônio de Jesus houve até o
caso de um açougueiro que foi agradecer a Dr. Julimar Ferreira porque, com a fiscalização,
ele foi obrigado a fazer exame de sangue e o médico disse que ele estava contaminado, mas
que ele iria ficar curado porque descobriu a doença a tempo. Caso ele não descobrisse logo
a doença, ela não iria ter cura.

21) Vale também salientar que a população será educada para apoiar esse trabalho e haverá
propaganda nas rádios e campanhas nas escolas. Com isso o próprio consumidor deverá
cobrar do açougueiro a regularização da atividade (fiscalizando a refrigeração, o carimbo na
carne e a nota fiscal). Inclusive na campanha irá se combater um certo preconceito que
existe contra a carne gelada. A origem desse preconceito é a seguinte: no processo
clandestino, o gado é abatido no mato à noite para ser vendido durante todo o dia seguinte,
durante a feira. Por exemplo, seria abatido numa sexta-feira para ser vendido no sábado. No
final do dia de sábado, quando estava acabando a feira, o açougueiro congelava a carne (que
já estava em processo de decomposição) e vendia depois a consumidores desavisados.
Assim, a pessoa que comprava a carne e a consumia já estragada, raciocinava (de modo
errôneo), que CARNE CONGELADA NÃO PRESTA. Na verdade não é a carne congelada
que não presta, mas sim a carne oriunda do abate clandestino.

22) Deve ser deixado bem claro que os Promotores de Justiça não defendem os interesses de
nenhum matadouro-frigorífico, pois o Ministério Público está fazendo um trabalho
totalmente independente. Os açougueiros ficarão completamente livres para escolher e
negociar com qualquer matadouro à sua escolha. O único interesse dos Promotores é que a
lei seja efetivamente cumprida.

23) Os açougueiros, de preferência, deverão se reunir em alguma associação, de modo a


obter um maior poder de negociação ou barganha com os matadouros, devendo visitá-los (o
matadouro pode até fornecer o transporte, pois o interesse também é deles) e negociar a
forma de entregar o boi, pagar a taxa e receber a carne. Alguns matadouros não cobram a
taxa de entrega da carne já refrigerada. A taxa de abate cobrada para cada animal é de R$
30,00 (trinta reais), em média. É importante destacar que esse valor é facilmente deduzido
do valor que o açougueiro vai ganhar com a valorização do couro. Explica-se: quando o
animal é morto no abate clandestino, o seu couro fica imperfeito, danificado e por isso perde
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valor de mercado. No entanto quando o animal é abatido num matadouro legalizado, pelo
método adequado, o couro não é “ferido” ou danificado. Assim, o couro ganha mais de
100% em valorização. Também vale destacar que alguns matadouros fornecem os balcões
frigoríficos aos açougueiros, na condição que eles paguem o investimento por meio dos
couros dos animais abatidos. Alguns matadouros também se dispõe a colocar câmaras frias
nos municípios em troca do compromisso dos açougueiros em abater o gado no
estabelecimento mencionado. OBS: Câmara fria equivale a um galpão refrigerado onde a
carne pode ficar depositada, servindo de entreposto para que os açougueiros possam pegar
gradativamente o produto, à medida em que o seu estoque vai acabando no açougue.

OBS: A ADAB – Agência de Defesa Agropecuária da Bahia tem o poder de fiscalizar o


abate clandestino nas fazendas (pode entrar livremente) e nas rodovias, enquanto que a
vigilância sanitária municipal é encarregada de fiscalizar a venda a varejo nas feiras livres e
nos açougues. Apesar da tarefa de fiscalização dentro das cidades ser exclusiva da vig.
sanitária, nas blitz promovidas pelo Ministério Público, a ADAB poderá participar ajudando
a vigilância. Basta que o Promotor requisite o apoio. Se o Promotor verificar que a
vigilância não tem dado o apoio devido ou não tem a estrutura adequada, poderá, para a
realização das blitz, pedir o apoio da DIRES responsável pelo município.

OBS: A existência de matadouro público não inspecionado no município não implica que o
Promotor deva, necessariamente, mover ação civil pública pedindo a interdição do mesmo.
Justificativa: O Promotor irá perder tempo e transferirá o poder de resolver a questão para o
Juiz, o qual poderá não ter o conhecimento concreto do problema e proferir uma decisão
desfavorável para o Ministério Público e a sociedade, prejudicando desse modo todo o
trabalho. A sugestão é que o Promotor realize a grande reunião com todos os açougueiros e
representantes da sociedade, convidando inclusive o Magistrado, advertindo que, por se
tratar de crime (inclusive de maus tratos contra animais, art. 32 da Lei 9.605/98), se o
matadouro continuar funcionando a partir da data estipulada, o Promotor poderá,
simplesmente, requisitar o apoio da polícia e prender todos os responsáveis. Ou então,
poderá requisitar da ADAB que faça uma barreira do lado de fora do matadouro e impeça
que a carne saia do local com destino à comercialização. São medidas mais simples e
eficazes.

Julimar Barreto Ferreira


Promotor de Justiça
Cadastro N° 351.300

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