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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP

Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica

Sandro José da Silva Leite

O DESLIGAMENTO INSTITUCIONAL DE ADOLESCENTES:


Intervenção por meio da técnica expressiva Paisagem Psíquica:
um enfoque junguiano

DOUTORADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

SÃO PAULO
2019
2

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP


Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica

Sandro José da Silva Leite

O DESLIGAMENTO INSTITUCIONAL DE ADOLESCENTES:


Intervenção por meio da técnica expressiva Paisagem Psíquica:
um enfoque junguiano

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia


Universidade Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de DOUTOR em
Psicologia Clínica, sob orientação da Profª Drª
Liliana Liviano Wahba.

SÃO PAULO
2019
3

SANDRO JOSÉ DA SILVA LEITE

O DESLIGAMENTO INSTITUCIONAL DE ADOLESCENTES:


Intervenção por meio da técnica expressiva Paisagem Psíquica:
um enfoque junguiano

Área de Concentração: PSICOLOGIA CLÍNICA


Data de Aprovação: / /

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________
Profª Drª Débora Dalbosco Dell’Aglio (UFRGS)

____________________________________________________
Profª Drª Laura Villares de Freitas (USP)

____________________________________________________
Profª Drª Denise Gimenez Ramos (PUC-SP)

____________________________________________________
Profª Drª Ida Kublikowski (PUC-SP)

____________________________________________________
ORIENTADORA: Profª Drª Liliana Liviano Wahba (PUC-SP)
4

O presente trabalho foi realizado com apoio da


Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES)
Código de Financiamento 001
Número de Processo: 88887.148063/2017-00
5

“Somente o outono revela o que a primavera produziu, e


somente a tarde manifesta o que a manhã iniciou”
(Jung [1934] 2012, § 290).
6

AGRADECIMENTOS

À equipe do SMADS (Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social) pelo


recebimento, orientações dadas e encaminhamento às pessoas capacitadas para avaliação do
projeto. A Nelson Alda Filho, do setor de Proteção Social Especial e Acompanhamento dos
Serviços de Acolhimento, e a Vânia Baptista Nery, do Comitê de Pesquisa do ESPASO
(Espaço Público do Aprender Social) que avaliaram, sem ressalvas, e recomendaram o projeto
para execução. A Ana Cristina Amaral Marcondes de Moura, do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo (DAIJ1 – Coordenadoria do Núcleo de Apoio Profissional de Serviço
Social e Psicologia) pelas orientações sobre os serviços de acolhimento. A Mônica Pereira,
Assistente de Coordenação do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da
PUC-SP, pela incansável disponibilidade e amorosidade para orientar sobre os trâmites
acadêmicos. A Marcos Aurélio de Oliveira, Secretário Executivo do CEP-PUC/SP Monte
Alegre, pelas incansáveis orientações para a aprovação do projeto. A Ronaldo Martins,
Coordenador Administrativo da Coordenadoria Geral de Estágios da PUC-SP, pelas indicações
de instituições com interesse pelo projeto. Aos Gerentes/Coordenadores, Psicólogos,
Assistentes Sociais e equipe multiprofissional das Casas Lares e SAICAS, que receberam o
projeto com entusiasmo e fizeram todos os esforços para que fosse executado. Às professoras
Débora Dalbosco Dell’Aglio, Denise Gimenez Ramos, Ida Kublikowski e Laura de Freitas
Villares, que gentilmente voltaram sua atenção à leitura, à avaliação e aos apontamentos
valiosos para a viabilização da pesquisa. Aos colegas do Núcleo Junguiano, que acompanharam
e apoiaram o desenvolvimento do projeto. A Paola Vieitas Vergueiro, pela inestimável
contribuição à leitura psicodinâmica dos estudos de casos. A Luciane Carvalho, professora de
Neurologia (EPM/Unifesp), pela incansável atenção e orientação relativas à análise estatística.
À CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pelo fomento à
pesquisa.

Um agradecimento especial à professora Liliana Liviano Wahba, Coordenadora do Programa


de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da PUC-SP e orientadora da presente
pesquisa, por acreditar nos caminhos inusitados e, por isso, instigantes de se fazer pesquisa.
Especialmente por acreditar nas transformações que a expressão plástica viabiliza.

À família e àqueles que apoiaram e compreenderam os desafios que envolvem uma pesquisa
desta magnitude.
7

A Paulo Roberto de Jesus pelo companheirismo, paciência e perseverança.

E aos ADOLESCENTES, os protagonistas que revelaram suas histórias e permitiram que


pudessem ser contadas.
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RESUMO

LEITE, S. J. da S. O desligamento institucional de adolescentes: intervenção por meio da


técnica expressiva Paisagem Psíquica: um enfoque junguiano.

A presente pesquisa propõe estudar um suporte psicológico para adolescentes, durante o


processo de desligamento institucional, por meio de uma intervenção com técnica expressiva.
Tem como principais objetivos investigar as expectativas quanto ao futuro e satisfação de vida,
compreender narrativas individuais, por meio de processamento simbólico e imagético dos
adolescentes, utilizando-se como instrumento de intervenção a técnica expressiva Paisagem
Psíquica. Para tanto, faz-se necessário fundamentar a técnica a partir do estudo dos quadrantes,
de acordo com a teoria de C. G. Jung. Os instrumentos de aferição são as escalas EEQF e
EMSVA, entrevistas inicial e final e processo de intervenção, com a aplicação da técnica. Os
participantes são 11 adolescentes de Casas Lares e SAICAs, com idade de 17 anos e um mês e
17 anos e 11 meses, de ambos os sexos, em processo do desligamento institucional. O método
usado é misto, com enfoque exploratório sequencial. Com cada um dos 11 adolescentes foram
realizados encontros semanais e individuais, e três desses jovens realizaram o procedimento
completo, incluindo-se aplicação das escalas EEQFA e EMSVA, entrevistas inicial e final e
oito sessões de intervenção. Os demais não completaram os encontros por motivos diversos.
Três estudos de caso complementam as informações. Após a intervenção, o estudo dos
quadrantes apontou algumas diferenças significativas: os que completaram os encontros
apresentaram mais formas que indicam circulação ao redor de um centro (espiral), assim como
as que se referem a introspecção (vertical), e menos formas de centralidade e proteção (círculo)
e de ênfase em corpóreo e físico (quadrante inferior direito); aqueles que não completaram os
encontros apresentaram apenas aumento na forma espiral. Em consideração aos estudos de caso,
foram identificados mais elementos nos primeiros encontros em relação aos últimos, indicando
discriminação ao longo da intervenção. Esses indicativos da técnica expressiva a respeito de
uma apreensão consciente - ainda que parcial - aliam-se aos resultados do instrumento EMSVA,
com aumento de pontuação - sem verificação estatística - das dimensões em satisfação de vida,
com exceção da escola. A diminuição de pontuação - sem verificação estatística - em relação à
expectativa quanto ao futuro (EEQFA) pode estar atrelada à proximidade do desligamento. A
análise qualitativa nos estudos de casos demonstra que os adolescentes puderam expressar
sentimentos, manifestar a imaginação livremente, esboçar planos futuros, tecer reflexões sobre
possibilidades e limitações em relação à vida fora da instituição, bem como tomar consciência
de atos cometidos no passado, o que embasa a possibilidade de reorientar atitudes e
comportamentos.

Palavras-chave: Paisagem Psíquica; técnica expressiva; adolescente; desligamento


institucional; quadrantes; futuro; satisfação de vida; Psicologia Analítica.
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ABSTRACT

LEITE, S. J. da S. The institutional detachment of adolescents: intervention through the


expressive technique Psychic Landscape: a Jungian approach.

The present research aims at studying psychological support for adolescents, during the process
of institutional detachment, through an intervention with an expressive technique. Its main
objectives are to investigate expectations regarding the future and life satisfaction, to understand
individual narratives through symbolic and imagistic processing of adolescents, using the
expressive technique Psychic Landscape as an intervention instrument. Therefore, it is
necessary to substantiate the technique with the study of quadrants, according to the theory of
C.G. Jung. The instruments of measurement are the EEQFA and EMSVA scales, initial and
final interviews and intervention process, with the application of the technique. The participants
are 11 adolescents from Casas Lares and SAICAs*, aged 17 years and one month and 17 years
and 11 months, of both sexes, in the process of institutional disengagement. The method used
is mixed, with a sequential exploratory approach. Individual weekly encounters were held with
each of the 11 adolescents, and three of these young people performed the complete procedure,
including the application of the EEQFA and EMSVA scales, initial and final interviews and
eight intervention sessions. The others did not complete the meetings for several reasons. Three
case studies complement the information. After the intervention, the study of the quadrants
pointed out some significant differences: those who attended the meetings presented more
forms that indicate circulation around a center (spiral), as well as those that refer to introspection
(vertical), and less forms of centralization and protection (circle) and of emphasis on corporeal
and physical (lower right quadrant); those who did not attend all the meetings presented only
increase in the spiral form. Considering the case studies, more elements were identified in the
first meetings in relation to the last ones, indicating discrimination throughout the intervention.
These indicatives of the expressive technique regarding a conscious - albeit partial -
apprehension are allied to the results of the EMSVA instrument, with an increase in the scoring
- without statistical verification - of life satisfaction dimensions, except for school. The
reduction of scoring - without statistical verification - in relation to the expectation regarding
the future (EEQFA) may be linked to the proximity of the detachment. The qualitative analysis
in the case studies demonstrates that adolescents were able to express feelings, to express their
imagination freely, to make plans to the future, as well as to reflect on possibilities and
limitations in relation to life outside the institution, and to become aware of acts committed in
the past, that which underlies the possibility of reorienting attitudes and behaviors.

*Institutional shelter services for children and teenagers in Brazil

Keywords: Psychic Landscape; expressive technique; adolescent; institutional detachment;


quadrants; future; life satisfaction; Analytical Psychology.
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RÉSUMÉ

LEITE, S. J. da S. Le détachment institutionnel chez les adolescents: intervention au moyen


de la téchnique expressive du paysage psychique: une approche junguienne.

La présente recherche se propose d’étudier, lors du processus de détachment institutionnel


des adolescents, un type de soutien psychologique qui leur est apporté par une intervention
s'appuyant sur une technique expressive. Les principaux objectifs sont de sonder les attentes
de ces derniers concernant leur avenir, d'appréhender leur degré de satisfaction de la vie et de
comprendre les récits personnels à travers le processus symbolique et imagétique des
adolescents, en utilisant comme instrument d’intervention la technique expressive du paysage
psychique. Cette dernière se base sur l’étude des quadrants, selon la théorie de C. G. Jung.
Faisant recours aux échelles de référence EEQFA et EMSVA, la mesure s'effectue par des
entretiens, initial et final, et inclut une phase d’intervention, où la technique citée est appliquée.
Les participants objets de l'étude sont onze adolescents de foyers et centres d'accueil (Casas
Lares et SAICA), âgés de 17 ans et un mois et 17 ans et 11 mois, des deux sexes, en cours de
processus de détachment institutionnel. La méthode employée est mixte avec une approche
exploratoire séquentielle. Des rencontres hebdomadaires et individuelles avec chacun des
onze adolescents ont été organisées, et trois de ces jeunes ont suivi la procédure complète,
prenant en compte l'application des échelles EEQFA et EMSVA, les entretiens initial et final,
et huit sessions d’intervention. Les autres n’ont pas achevé toutes les rencontres pour des
raisons diverses. Trois études de cas complètent les renseignements obtenus. Après
l’intervention, l’étude des quadrants a révélé différences significatives : ceux qui ont achevé les
rencontres ont présenté plus de formes qui indiquent circulation autour d’un centre (spiral), et
par rapport à l’introspection (vertical), et moins formes de caractère central et protection (cercle)
et d’un accent sur le corps et le physique (quadrant inférieur droit); ceux qui n’ont pas achevé
les rencontres ont présenté seulement augmentation de la forme spirale. Au sujet des études de
cas, les trois participants ont identifié d’éléments ont été trouvés dans les premiers rencontres
par rapport aux derniers et cela indique discrimination pendant l’intervention. Ces donnés de la
technique expressive concernant une appréhension consciente – même si partielle – s’allient
aux résultats de l’instrument EMSVA, avec augmentation du résultat, sans vérification
statistique, dans le domaine satisfaction de vie, sauf l’école. La diminution de résultat, sans
vérification statistique, par rapport aux attentes concernant l’avenir (EEQF) peut être liée à la
proximité du détachment. L’analyse qualitative dans les études de cas a montré que les
adolescents ont pu exprimer ses sentiments, manifester l’imagination librement, esquisser un
plan pour l’avenir, réflechir sur possibilités et limitations concernant la vie hors de l’instituition,
ainsi que prendre conscience des actes commis au passé, et cela soutient la possibilité de
réorienter attitudes et comportements.

Mots-clés: Paysage Psychique; technique expressive; adolescent; détachment institutionnel;


quadrants; l’avenir; satisfaction de vie; Psychologie Analytique.
11

LISTA DE FOTOGRAFIAS

Fotografia 01 – Cs = terceira configuração da superfície (Participante Naruto) .................... 81

Fotografia 02 – Is = nona e última configuração da superfície (Participante Naruto) ............ 81

Fotografia 03 – Cf = terceira configuração do fundo (Participante Naruto)........................... 81

Fotografia 04 – If = nona e última configuração do fundo (Participante Naruto) .................. 81

Fotografia 05 – As = primeira configuração da superfície (Participante Annabeth) .............. 90

Fotografia 06 – Df = quarta configuração da superfície (Participante Annabeth) .................. 90

Fotografia 07 – Af = primeira configuração do fundo (Participante Annabeth) ..................... 90

Fotografia 08 – Df = quarta configuração do fundo (Participante Annabeth) ........................ 90

Fotografia 09 – As = primeira configuração da superfície (Participante Romeu)................... 99

Fotografia 10 – Hs = oitava e última configuração da superfície (Participante Romeu) ........ 99

Fotografia 11 – Af = primeira configuração do fundo (Participante Romeu) ......................... 99

Fotografia 12 – Hf = oitava e última configuração do fundo (Participante Romeu) ............... 99


12

LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Distribuição topológica das categorias e subcategorias ....................................... 66

Figura 02 – Nuvem de palavras: frequência das 280 citações extraídas da obra de


C. G. Jung ................................................................................................................................. 67

Figura 03 – Resultados da análise de similitude: árvore de coocorrências ............................. 68

Figura 04 – Classes vocabulares: temas e contextos ............................................................... 69


13

LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Descrição do método misto da pesquisa ............................................................ 48

Quadro 02 – Identificação dos participantes da pesquisa por sexo, considerando o


número de encontros realizados e o motivo de interrupção das atividades .............................. 56

Quadro 03 – Descrição dos procedimentos realizados com os participantes que


completaram e os que não completaram os encontros ............................................................. 57

Quadro 04 – Categoria Forma e subcategorias, sinônimos e respectivas citações extraídas da


obra de C. G. Jung .................................................................................................................... 62

Quadro 05 – Categoria Localização e subcategorias, sinônimos e respectivas citações


extraídas da obra de C. G. Jung ................................................................................................ 63

Quadro 06 – Categoria Movimento e subcategorias, sinônimos e respectivas citações


extraídas da obra de C. G. Jung ................................................................................................ 64

Quadro 07 – Características sociodemográficas e do acolhimento dos três participantes


que completaram o procedimento de intervenção .................................................................... 78

Quadro 08 – Elementos identificados nas configurações pelo participante 02,


considerando-se a quantidade dos elementos mais citados e respectivas associações bem
como as categorias que emergiram do total de elementos identificados .................................. 83

Quadro 09 – Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com
o participante 02, considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista
final (E2 final) .......................................................................................................................... 85

Quadro 10 – Elementos identificados nas configurações pela participante 03,


considerando-se a quantidade dos elementos mais citados e respectivas associações bem
como as categorias que emergiram do total de elementos identificados .................................. 92

Quadro 11 – Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com
a participante 03, considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista
final (E2 final) .......................................................................................................................... 94

Quadro 12 – Elementos identificados nas configurações pelo participante 04,


considerando-se a quantidade dos elementos mais citados e respectivas associações bem
como as categorias que emergiram do total de elementos identificados ................................ 100

Quadro 13 – Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com
o participante 04, considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista
final (E2 final) ........................................................................................................................ 102
14

LISTA DE TABELAS

Tabela 01 – Características sociodemográficas e do acolhimento institucional...................... 71

Tabela 02 – Síntese dos escores médios dos domínios EEQFA e EMSVA para os
participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos encontros ........................................................... 74

Tabela 03 – Quantidades e porcentagens da variável Cor (quantidade) comparando-se os


encontros de 1 a 4 e de 5 a 8 para os 4 participantes que completaram 8 encontros e primeira
e segunda metades dos participantes que não completaram os encontros ................................ 75

Tabela 04 – Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-
se os encontros de 1 a 4 e de 5 a 8 para os 4 participantes que completaram 8 encontros ....... 75

Tabela 05 – Porcentagens da variável Forma (localização), comparando-se os encontros de


1 a 4 e de 5 a 8 para os 4 participantes que completaram 8 encontros ..................................... 76

Tabela 06 – Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-
se a primeira e segunda metade dos encontros para os participantes que não completaram 8
encontros................................................................................................................................... 77

Tabela 07 – Tabela referente à variável Forma, em relação aos tipos, movimentos e


localizações mais recorrentes do participante 02 ..................................................................... 82

Tabela 08 – Tabela referente à variável Forma, em relação aos tipos, movimentos e


localizações mais recorrentes da participante 03 ...................................................................... 90
15

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 – Escore médio do EEQFA para os participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos
encontros................................................................................................................................... 73

Gráfico 02 – Escore médio das dimensões do EMSVA para os participantes 02, 03 e 04,
antes e depois dos encontros ..................................................................................................... 73
16

LEGENDAS

BVJ Benefício Variável Vinculado ao Adolescente


C Centro
CNAS Conselho Nacional de Assistência Social
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
E1 Entrevista inicial e final
E2 Entrevista final
CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
CONJUVE Conselho Nacional de Juventude
DISOC Diretoria de Estudos e Políticas Sociais
EEQFA Escala de Expectativas Quanto ao Futuro de Adolescentes
EMSVA Escala Multidimensional de Satisfação de Vida em Adolescentes
ESPASO Espaço do Aprender Social
ID Inferior Direito
IE Inferior Esquerdo
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MDSCF Ministério do Desenvolvimento e Combate à Fome
MDSA Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário
PIA Plano Individual de Atendimento
SAICA Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes
SD Superior Direito
SE Superior Esquerdo
SEDH Secretaria Especial dos Direitos Humanos
SMADS Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social
SNJ Secretaria Nacional de Juventude
SUAS Sistema Único de Assistência Social
UNVPA Fundo de População das Nações Unidas
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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS ........................................................................................................... 06
RESUMO................................................................................................................................. 08
ABSTRACT ............................................................................................................................ 09
RÉSUMÉ ................................................................................................................................. 10
LISTA DE FOTOGRAFIAS ................................................................................................. 11
LISTA DE FIGURAS............................................................................................................. 12
LISTA DE QUADROS........................................................................................................... 13
LISTA DE TABELAS ............................................................................................................ 14
LISTA DE GRÁFICOS ......................................................................................................... 15
LEGENDAS ............................................................................................................................ 16
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 19
2. O ADOLESCENTE ACOLHIDO E O PROCESSO DE DESLIGAMENTO .............. 22
2.1 O acolhimento ................................................................................................................... 22
2.2 As leis ................................................................................................................................. 25
2.3 O adolescente acolhido ..................................................................................................... 26
2.4 O desligamento.................................................................................................................. 28
2.5 O adolescente e o processo de desligamento ................................................................... 29
2.6 A utilização de recursos expressivos com adolescentes no acolhimento e
desligamento institucional: revisão de literatura ................................................................. 34
3. ADOLESCÊNCIA E DESENVOLVIMENTO NO CONTEXTO DA
PSICOLOGIA ANALÍTICA ................................................................................................. 37
4. A TÉCNICA EXPRESSIVA PAISAGEM PSÍQUICA: fundamentação e descrição .. 41
4.1 A dinâmica consciente-inconsciente ................................................................................ 42
4.2 O processamento simbólico e imagético ......................................................................... 42
4.3 Estudo dos quadrantes e seus simbolismos a partir da obra de C. G. Jung ............... 44
5. MÉTODO ............................................................................................................................ 47
5.1 Objetivos ............................................................................................................................ 47
5.2 Ideia norteadora ............................................................................................................... 47
5.3 Desenho da pesquisa ......................................................................................................... 47
5.4 Participantes ..................................................................................................................... 49
5.4.1 Critérios de inclusão ........................................................................................................ 49
5.4.2 Critérios de exclusão ....................................................................................................... 49
5.4.3 Processo para escolha dos participantes .......................................................................... 49
5.5 Locais de atendimento ...................................................................................................... 49
5.5.1 Processo para escolha dos locais de atendimento ............................................................ 50
5.6 Instrumentos ..................................................................................................................... 50
5.6.1 Ficha de características sociodemográficas e do acolhimento ........................................ 50
5.6.2 Escala de Expectativas Quanto ao Futuro de Adolescentes ............................................ 50
5.6.3 Escala Multidimensional de Satisfação de Vida para Adolescentes ............................... 51
5.6.4 Entrevista semiestruturada individual (inicial e final) e final.......................................... 52
5.6.5 Técnica expressiva Paisagem Psíquica ........................................................................... 53
5.6.6 Formas de registro das entrevistas, das configurações (pinturas) e dos dados obtidos
durante os encontros ................................................................................................................. 55
18

5.7 Procedimento .................................................................................................................... 55


5.7.1 Procedimento de intervenção e de avaliação ................................................................... 55
5.7.2 Procedimento ético .......................................................................................................... 58
6. RESULTADOS ................................................................................................................... 60
6.1 Categorias e subcategorias que emergiram do estudo dos quadrantes e seus
simbolismos, a partir da obra de C. G. Jung ....................................................................... 60
6.1.1 Categorias encontradas .................................................................................................... 61
6.2 Resultados estatísticos, a partir da aplicação das escalas EEQFA e EMSVA, e das
variáveis Cor (quantidade e localização) e Formas (tipo, movimento e localização) ....... 70
6.2.1 Caracterização dos participantes estudados ..................................................................... 71
6.2.2 Escalas: Expectativas Quanto ao Futuro e Multidimensional de Satisfação de Vida
para Adolescentes ..................................................................................................................... 73
6.2.3 Variável Cor (quantidade e localização) ......................................................................... 74
6.2.4 Variável Forma (tipo, quantidade e localização) ............................................................. 75
6.3 Estudo de casos: Naruto, Annabeth e Romeu ................................................................ 77
6.3.1 Os adolescentes e seus pseudônimos ............................................................................... 78
6.3.2 Naruto .............................................................................................................................. 79
6.3.3 Annabeth .......................................................................................................................... 88
6.3.4 Romeu.............................................................................................................................. 97
6.4 Ressonâncias no pesquisador......................................................................................... 105
7. DISCUSSÃO ..................................................................................................................... 110
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 116
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 119
APÊNDICES ......................................................................................................................... 130
ANEXO .................................................................................................................................. 136
19

1. INTRODUÇÃO
A presente pesquisa dedica-se a uma temática que tem despertado cada vez mais
interesse, em psicologia clínica: o adolescente acolhido prestes a ser desligado da instituição de
acolhimento, seja porque retorna à família ou porque atinge a maioridade.
São vários os motivos que levam ao acolhimento institucional, e o reflexo dessa
estratégia protetiva e provisória, pelo menos como é estabelecida a partir do ECA (Estatuto da
Criança e do Adolescente), desperta no adolescente emoções intensas, que serão moldadoras de
sua vida, dentro e fora da instituição. É nesse momento de transição, entre a instituição que
acolhe e provê os recursos diários e a dinâmica de vida que precisa ser construída, entre o anseio
por libertação e as incertezas do que há por vir, entre os medos e as oscilações da saúde e aquilo
que a vida propõe como alternativa, talvez única alternativa, que esse adolescente mais precisa
de um espaço de escuta simbólica, sem censuras nem questionamentos.
Por isso, partindo-se do pressuposto de que ele vive, nesse processo, um momento
importante de mudança, propomo-nos a oferecer um recurso para expressão plástica espontânea
propiciando, a partir de um atendimento individualizado, um momento de atenção e cuidados.
O recurso expressivo visa oferecer a criação de um espaço que promova a expressão e o
agenciamento do eu. Este último, na concepção de Knox (2011), compreende a emergência da
capacidade de simbolização, o que prevê a mobilização de processos internos de
desenvolvimento, com vistas a um estado autorreflexivo e à ampliação de consciência.
Oferecer esse momento para expressão e escuta parece ser um caminho legítimo a ser
adotado. Direta ou indiretamente, está em consonância com o que se entende por atendimento
personalizado, disposto no Art. 92, Inciso III do ECA (2012). Condiz com a escrita de uma
história narrada em primeira pessoa, sem intermediários, para que possam ser trabalhadas
histórias de vida, incertezas, indagações assim como planos para o futuro.
Com tal intuito, foi proposto um modo de intervenção criado pelo autor do presente
projeto, uma técnica expressiva (pintura) denominada “Paisagem Psíquica” que vem sendo
aplicada em vários contextos. Considera-se pertinente na situação em foco, pois se assenta na
possibilidade de revelação de singularidades via expressão plástica, com o intuito de auxiliar o
jovem, no momento de transição tão importante e marcante - o do desligamento institucional.
Leite (2012), ao utilizar, durante a pesquisa de mestrado, a técnica expressiva Paisagem
Psíquica com adolescentes e jovens adultos, identificou que foi gerado um campo por meio do
qual a pessoa, ao ser sensibilizada e estimulada a criar livremente, teve a oportunidade de
conhecer o mundo interno e a relação com o externo, por meio de sua prática, reveladora de
formas e cores variadas e significativas. Mostrou também que, naquele contexto, foi marcante
20

o sentido prospectivo inferido nas produções plásticas e símbolos que emergiram durante o
processo de intervenção, indicativo da possibilidade de ativar um movimento autorreflexivo e
em direção ao futuro, a ser promovido mediante elaboração terapêutica.
A escolha dessa população vulnerável se justifica pela carência de programas oferecidos
a essa faixa etária, num momento que requer atenção especial para que o adolescente faça uso
de recursos que facilitem sua passagem para a vida adulta, de modo mais confiante e consciente.
Está em consonância com as diretrizes estabelecidas pelo ECA (2012) e coaduna-se ao
apontamento de Assis e Farias (2013), a partir do Levantamento Nacional dos Abrigos para
Crianças e Adolescentes, sobre a lacuna de serviços direcionados exclusivamente aos
adolescentes em acolhimento.
Metodologicamente a pesquisa se caracteriza por utilizar o método misto como
estratégia para explorar um determinado fenômeno, por ampliar os resultados qualitativos e por
utilizar os achados quantitativos para auxiliar na interpretação de resultados qualitativos. Tem
os seguintes objetivos: fundamentar a técnica expressiva a partir do estudo dos quadrantes,
investigar a percepção de futuro e de satisfação de vida e compreender o processamento
simbólico e imagético dos adolescentes na vivência do processo de desligamento institucional,
por meio da utilização da técnica expressiva Paisagem Psíquica.
A apresentação a seguir está estruturada da seguinte maneira: o capítulo 2 se inicia com
a discussão dos termos utilizados no contexto do acolhimento, problematizando-se essa
modalidade de proteção. Segue-se a definição de acolhimento, apresentam-se as leis que
sustentam essa prática e o perfil do adolescente acolhido. Na sequência, esclarece-se o
significado de desligamento institucional, destacam-se os termos utilizados nesse contexto,
apresenta-se o perfil do adolescente a ser desligado e os vários fatores associados a esse
processo. O capítulo termina com a apresentação de pesquisas de intervenção que se utilizam
de recursos expressivos no contexto do acolhimento institucional.
No capítulo 3, são apresentadas ideias de autores que discutem a adolescência a partir
do contexto da psicologia analítica, com destaque para os seguintes conceitos: primeiras
relações de cuidados, tendência prospectiva, regressão, agenciamento do eu e função reflexiva.
O capítulo 4 apresenta e problematiza a técnica expressiva Paisagem Psíquica,
instrumento principal de intervenção no processo de desligamento institucional por
adolescentes. O capítulo é complementado com o papel da dinâmica consciente-inconsciente,
o processamento simbólico e imagético e o estudo dos quadrantes a partir da obra de C. G. Jung,
que contribuiu para fundamentar a técnica expressiva e dar suporte à análise dos dados.
No capítulo 5, estão descritos o método de pesquisa e os objetivos.
21

O capítulo 6 apresenta os resultados obtidos na pesquisa, norteados por três segmentos:


o primeiro traz as categorias e subcategorias que emergiram do estudo dos quadrantes e seus
simbolismos, oriundas da obra de C. G. Jung. Elas fundamentaram a prática da técnica
expressiva Paisagem Psíquica e contribuíram como parâmetros para as análises quantitativas e
qualitativas; o segundo segmento apresenta os resultados estatísticos, a partir da aplicação das
escalas EEQFA e EMSVA, além das variáveis cor (quantidade + localização) e formas (tipo +
movimento + localização); o terceiro segmento apresenta os três estudos de casos como
ilustração da dinâmica observada durante o processo de desligamento institucional vivenciado
pelos adolescentes.
No capítulo 7, são discutidos os resultados obtidos, à luz da literatura que compõe e
fundamenta a pesquisa, seguindo-se então as considerações finais.
22

2. O ADOLESCENTE ACOLHIDO E O PROCESSO DE DESLIGAMENTO


Na literatura sobre o tema e também nas falas de alguns profissionais envolvidos na
dinâmica diária do acolhimento, é corrente a utilização dos termos abrigado e abrigamento. No
entanto, no presente trabalho, optou-se pela adoção dos termos acolhido, por caracterizar o real
papel das instituições - o de acolher aquele que necessita de cuidados e proteção -, e
acolhimento, derivado dessa ação, sem que se altere o sentido dos termos originais empregados
pelos autores citados ao longo do texto. Essa opção se justifica pela aproximação que pode ser
notada entre os termos abrigo e instituição total que, segundo Goffman (2015), representa um
espaço de fechamento, cujo objetivo é separar o indivíduo da sociedade, negando-lhe o direito
de desenvolver o sentido de “eu”, bem como pela constatação, a partir do trabalho de campo,
do compromisso e da dedicação dos profissionais que participam da vida diária dos adolescentes
(coordenadores/gerentes, psicólogos, assistentes sociais, educadores, cozinheiras, entre outros),
os quais promovem incansavelmente um ambiente de atenção e de cuidados às necessidades
deles.

2.1 O acolhimento
O Levantamento Nacional dos Abrigos para Crianças e Adolescentes, realizado em
2011, totalizando o número de 2.624 de indivíduos, já havia ressaltado uma lacuna considerável
nos serviços de acolhimento destinados especificamente ao público adolescente. Esse dado é
reforçado pelo artigo de revisão sobre acolhimento institucional, realizado por Malfitano e Silva
(2014), que destacam a prevalência de estudos em Psicologia sobre o tema bem como a
necessidade de produção de conhecimento para programas efetivos de intervenção social, uma
vez que não tem sido um tema prioritário nos estudos científicos. Do último censo
disponibilizado pelo SUAS em 2016, o total de instituições dedicadas a crianças e adolescentes
aumentou para 2.831 unidades de acolhimento.
O acolhimento institucional de adolescentes se qualifica como uma medida provisória e
excepcional, sem privação de liberdade, que funciona como medida preventiva sempre que a
família ou o responsável perde o direito de proteção. A principal conquista a esse respeito foi a
promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990 (Lei Federal n°
8.069/90), que estabelece o cumprimento da lei no que tange aos direitos de proteção às crianças
e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
O acolhimento, a partir de organizações governamentais ou não, se constitui de algumas
modalidades: abrigo institucional para pequenos grupos (com capacidade para, no máximo, 20
crianças e adolescentes, residentes na comunidade); Casa Lar (com capacidade para até 10
23

crianças e adolescentes, a qual se diferencia pelo papel do educador/cuidador); Casa de


Passagem (de curtíssima duração, que atua no processo de reinserção institucional ou familiar).
Tanto os abrigos como as casas estão sob a égide do termo Acolhimento Institucional, que se
refere a programas de acolhimento em entidade (CONANDA, 2013).
Além disso, há as seguintes estratégias: Serviço de Acolhimento Institucional para
Crianças e Adolescentes – SAICA (que difere da Casa Lar por comportar até 20 crianças e
adolescentes); Família Acolhedora ou Acolhimento Familiar (que se caracteriza pela guarda de
crianças e adolescentes em situação de risco por famílias voluntárias, por um período curto de
tempo (Kuabara; Klipan e Abrão, 2016; Rossetti-Ferreira et al, 2012); acolhimento em
Repúblicas (com capacidade para até 6 adolescentes, entre 18 e 21 anos, atribuindo-se a estes a
responsabilidade de autocuidado, de manutenção do espaço físico, das relações com os colegas
e das despesas pessoais (Assis e Farias, 2013; Porto; Szortyka; Heidrich, 2012; CONANDA,
2009; Martinez, Soares-Silva, 2008). Independentemente da modalidade, as entidades devem
promover acolhida, cuidado, espaço de socialização e condições para o bom desenvolvimento
dos adolescentes (CONANDA, 2013), devendo seguir os princípios estabelecidos no Art. 92 do
ECA.
O Artigo 92 - Inciso III do ECA (2012) pressupõe um atendimento personalizado, mas
realizado em pequenos grupos. Nesse contexto, o adolescente é visto e tratado como
componente de um grupo cujas necessidades se assemelham. De um lado, a padronização de
ações condiz com o fortalecimento do grupo e com o compartilhamento de experiências
comuns; de outro lado, há de se considerar a necessidade de um atendimento individualizado
com foco no perfil de cada adolescente. Para Azôr e Vectore (2008), as regras, as normas, as
mudanças institucionais assim como a ausência de liberdade e a distância da família
impossibilitam o desenvolvimento de identidade.
Há de se considerar também, como pontua Guirado (2004), que o tempo e o espaço
vividos no contexto do acolhimento institucional funcionam como moldadores desse
desenvolvimento, na medida em que substituem o espaço social externo e limitam as aspirações.
Esse caráter paradoxal está expresso na visão de Bleger (2004, p. 56): esses espaços podem
enriquecer e desenvolver a personalidade, mas também ser “fonte de empobrecimento e de
estereotipia do ser humano”.
A proteção excessiva que muitas vezes as instituições de acolhimento exercem pode ser
um impedimento para o processo de autonomia do adolescente (Martinez e Soares-Silva, 2008).
Na tentativa de querer suprir a ausência de cuidados da família de origem, pode-se priorizar a
proteção em detrimento do projeto de preparação do adolescente para a vida (Guirado, 2004)
24

bem como o coletivo em detrimento do individual (Goffman, 2015; Porto, Szortyka e Heidrich,
2012).
Essa ênfase, segundo Goffman (2015), Azôr e Vectore (2008), dificulta o
desenvolvimento e a preservação do eu. De um lado, não se deve tomar o acolhimento como
forma de salvação (Nascimento, 2012); de outro, espera-se que não sejam espaços cujos efeitos
negativos possam afetar o desenvolvimento integral do adolescente (Ferreira, Litting, Vecovi,
2014). Apostar em estratégias que foquem o atendimento individualizado e que deem espaço a
momentos de elaboração é uma meta a ser levada em consideração, especialmente quando se
nota a existência de ‘subjetividades’ colocadas entre os papéis que são, ou deveriam ser,
desempenhados pela família e pelas instituições de acolhimento (Aveiro, 2018).
Botelho, Moraes e Leite (2015) se questionam se, de fato, essas formas de acolhimento
cumprem o papel de proteção e de favorecimento da construção de sujeitos, na medida em que
o adolescente que ali está não é considerado o sujeito de direitos, mas aquele com problemas.
O ECA, como principal marco, delimita um campo de atenção e abre discussões sobre os
critérios que norteiam o acolhimento, como em relação à violência e aos maus-tratos que os
jovens sofrem (Braga, Dell’Aglio, 2012), e, a partir de seu Art. 23, abre-se um espaço para a
consolidação da negligência como item que fere esses direitos (Nascimento, 2012).
A negligência familiar, segundo Assis e Farias (2013), é o principal motivo para o
acolhimento, com percentual de mais de cinquenta por cento em relação aos outros motivos que
levam ao acolhimento. Fatores como família numerosa, doença mental, baixa escolaridade de
pais ou responsáveis e desemprego contribuem para esse quadro de vulnerabilidade, como
apontam Siqueira et al (2010). Incluem-se também dependência química, prisão e abuso sexual
dos pais ou responsáveis, vivência de rua e orfandade (Silva, 2004; IPEA/DISOC, 2003) como
fatores que levam ao abandono e consequente acolhimento de crianças e adolescentes. Esse
quadro se coaduna aos fatores associados ao comprometimento de um desenvolvimento
saudável, proferido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, 2011), como
pobreza, baixa escolaridade, exploração do trabalho, privação da convivência familiar e
comunitária, violência referente a assassinatos de adolescentes, gravidez, exploração e abuso
sexual, DTS, AIDS e abuso de drogas.
Importante destacar que a vulnerabilidade se atrela ao estudo sobre risco, especialmente
no contexto da pobreza em função da exclusão social e cultural das famílias (CONANDA,
2013), e, quando se trata da adolescência, entra em cena a relação entre vulnerabilidade e
comportamentos de risco. Segundo Alves e Dell’Aglio (2015, p. 166), a associação com a
adolescência se justifica por ser um “período que envolve transformações físicas e sociais, busca
25

de autonomia e o contato com novas experiências, podendo ser considerada um período de


maior vulnerabilidade ao risco”. As autoras destacam alguns fatores: uma tendência a haver
maior envolvimento em comportamentos de risco, no caso de adolescentes mais velhos (prática
sexual, uso de substâncias e comportamentos de risco total); influência de amigos na adesão
aos comportamentos de risco; ao contrário, o apoio da família e de professores contribui para o
menor envolvimento nos comportamentos de risco, como destaca o estudo de Gerard e Booth
(2015) sobre o papel da família e da escola na saúde mental de adolescentes; os do sexo
masculino tendem a experiências sexuais mais cedo, além de se envolverem em brigas, em
pichações, enquanto as adolescentes do sexo feminino, por expressar mais as emoções,
apresentam maior tendência ao comportamento suicida.

2.2 As leis
Além do ECA, outros marcos legais criaram condições para uma melhor atenção aos
adolescentes, como a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/90), que estabelece a saúde como um
direito social, a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei 8742/93), que promove o
direito à assistência social, a proteção especial à adolescência e o amparo aos adolescentes
carentes, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira – LDB (Lei 9.394/96), que confere
o direito à educação, direito público subjetivo do cidadão (UNVPA, 2010), a Política Nacional
de Assistência Social (MDSCF, 2004), que reitera os pressupostos do LOAS com vistas à sua
efetivação, tendo como foco a matricialidade sócio-familiar e o Plano Nacional de Promoção,
Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária,
de 2009, que, a partir da Lei 12.010 (Lei Nacional da Adoção), “fortalece o paradigma da
proteção integral e da preservação dos vínculos familiares e comunitários preconizados pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente” (CONANDA, 2013, p. 13). Na atualidade, a nova Lei
de Adoção, nº 13.509, de 22.11.2017, prioriza a adoção de adolescentes que tenham problemas
de saúde.
A Lei 12.010, de 2009, estabelece as diretrizes do Plano Individual de Atendimento
(PIA), já previstas no ECA e na resolução conjunta CNAS/CONANDA nº 01/2009
(Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes). Destaca a
importância da participação efetiva da família e do adolescente e se configura por duas
dimensões, descritas nas “Orientações para elaboração do plano individual de atendimento de
crianças e adolescentes em serviços de acolhimento” (MDSA, 2017): a avaliativa
interdisciplinar (apuração da realidade das necessidades do adolescente e da família) e o
26

planejamento operativo (atividades de cuidado, de apoio e educação durante o acolhimento e


preparação para o desligamento, como as visitas planejadas à família).
Somam-se a essas as deliberações referentes à Política Nacional da Juventude (UNVPA,
2010): o Grupo Interministerial de 2004, com a participação de dezenove ministérios, que
promoveu o levantamento dos programas federais destinados aos adolescentes e elaborou o
diagnóstico da situação dos jovens; a Secretaria Nacional da Juventude (SNJ), que articulou
programas e projetos para jovens de 15 a 29 anos; o Conselho Nacional da Juventude
(CONJUVE), que assessorou a SNJ na formulação de diretrizes da ação governamental; o
Projeto Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano, como uma ação continuada de
assistência social abrangendo jovens de 15 a 17 anos, e o Benefício Variável Vinculado ao
Adolescente (BVJ), um tipo de modalidade do benefício do Programa Bolsa Família (PBF).

2.3 O adolescente acolhido


Zappe e Dell’Aglio (2016), a partir de um estudo longitudinal com 503 adolescentes
entre 11 e 19 anos, destacam que o comportamento suicida alcançou o escore mais alto entre os
adolescentes acolhidos, em comparação com aqueles que moravam com suas famílias e com os
que cumpriam medidas socioeducativas, embora o percentual de comportamentos de risco tenha
sido alto nos três grupos pesquisados. Referem que o acolhimento institucional é uma
alternativa, embora os jovens estejam em desvantagem quando comparados àqueles que vivem
com suas famílias.
Considerando-se os eventos estressores relacionados ao acolhimento, destacam-se os
estudos de Fernandes et al (2015) com 30 adolescentes acolhidos, com idade entre 11 e 18 anos.
A escola, a pressão financeira, as situações de ordem jurídico-institucional, além de situações
de pobreza e violência, foram os itens mais citados. Calcing e Benetti (2014), no estudo
realizado com crianças e adolescentes com idade entre 7 e 18 anos, destacam o fato de terem
que viver no abrigo, a mudança de escola, as brigas entre irmãos, as notas baixas na escola e a
separação deles dos pais. Já Botelho, Moraes e Leite (2015), ao apresentar a visão do
acolhimento por meio da história oral de 30 adolescentes de 13 a 17 anos, acolhidos, salientam
que, apesar de relatar os conflitos familiares e episódios de violência sofridos, a maioria nutre
o desejo de voltar à família ou de constituir sua própria família. Destacam também a falta de
confiança nos profissionais, o que gera uma situação de desrespeito e enfatiza a violência
silenciosa. Na pesquisa realizada por Fernandes et al (2015), a escola foi considerada o evento
mais estressor na vida dos acolhidos, seguido da pressão financeira e dos da ordem jurídico-
27

institucional, o que reforça o papel da educação como possibilidade de melhores oportunidades


para o futuro.
Um dado que chama a atenção está relacionado à imagem de adolescentes
institucionalizados, o que também pode ser considerado um fator estressor. Rodrigues et al
(2014), ao estudar a percepção de preconceito e de autoestima dos adolescentes acolhidos, com
idades entre 12 e 17 anos, em comparação com aqueles que viviam com suas famílias, destacam
que o preconceito, mais evidente entre os acolhidos, se associa ao estigma relacionado à
institucionalização, muito embora o quadro de autoestima não apresente variação significativa
entre os grupos estudados. Acrescenta-se o estudo realizado por Wendt et al (2017) que, a partir
de entrevistas com adultos, identificou uma imagem social negativa dos adolescentes acolhidos.
Por sua vez, o estudo teórico de Patias, Siqueira e Dell’Aglio (2017, p. 8) aponta que essa
imagem está “atrelada às características negativas e pejorativas presentes ao longo dos séculos”.
Em relação ao tempo de permanência, crianças e adolescentes ficavam em média 24,2
meses nas instituições de acolhimento, e a idade influi no tempo de permanência, especialmente
dos adolescentes mais velhos (Assis e Farias, 2013). Embora tenha havido avanços desde a
promulgação do ECA, os dados obtidos a partir do Censo Suas, de 2014, apontam que das
34.326 pessoas atendidas 71,8% estavam acolhidas a menos de dois anos. Isso significa dizer
que, apesar dos esforços para o cumprimento da provisoriedade, esse tempo não estava sendo
cumprido para 28,2% das crianças e adolescentes acolhidos (Miranda, 2017).
Soma-se a isso o fato de serem maiores os prejuízos, quanto maior for o tempo de espera,
o que afeta da “sociabilidade à manutenção de vínculos afetivos na vida adulta” (Silva, 2004,
p. 64). Estudos realizados por Boesmans e Martins (2016) sobre as violações de direitos, por
Souza e Brito (2015) em relação ao não cumprimento de todas as diretrizes estabelecidas pelo
ECA, e por Ianelli, Assis e Pinto (2015) sobre os problemas relativos à reintegração familiar,
alertam sobre os esforços a serem investidos para a proteção efetiva de crianças e adolescentes.
De outro lado, como observam Sales e Rocha (2013, p. 327), apesar de esse tempo prolongado
trazer prejuízos, também desperta nos adolescentes “formas de resistência que estão ancoradas
em sua própria memória, na projeção dos sonhos, no desejo de encontros e reencontros com a
família e na espera de que algo aconteça para que possam construir uma vida diferente”.
Um tema ainda pouco estudado é a evasão. Rosa et al (2012) apontam o estudo realizado
por Silva (2010), que destaca dois fatores para ela: a busca de liberdade e de autonomia em
contraposição às regras institucionais e o retorno aos vínculos e ambientes anteriores ao
acolhimento. Num estudo mais recente, Lemos et al (2014) entrevistaram 30 adolescentes
institucionalizados, com idades entre 12 e 18 anos, e 47 profissionais, e destacam os seguintes
28

dados: adolescentes que já viveram nas ruas falam em liberdade, em atrativos, enquanto na
visão dos profissionais essa vivência é considerada um lugar de perdição; já o acolhimento
significa proteção. Quanto à aprendizagem, há um despreparo de profissionais para lidar com
as dificuldades dos adolescentes; as atividades profissionais priorizam tarefas mecânicas, e a
vigilância constante expressa o receio de anular os esforços de proteção. Nesse sentido, a evasão
implica uma descontinuidade do plano de atendimento, dificultado pela burocracia que envolve
o acolhimento e o desligamento institucional.
Sobre a gravidez no contexto do acolhimento, também um tema ainda pouco explorado,
destaca-se o estudo de Miura, Tardivo e Barrientos (2017, p. 343), cujo foco era o sofrimento
psíquico de mães adolescentes acolhidas. Três adolescentes com idades entre 13 e 16 anos
foram entrevistadas, e identificou-se que “nenhuma delas pareceu ter conseguido simbolizar,
elaborar, ressignificar o sofrimento psíquico carregado das experiências de violência
intrafamiliar”, mas que, apesar disso, cada uma delas podia lidar com a experiência mãe-filho
à sua maneira, apesar dos poucos recursos de que dispunham. O estudo realizado por Sanches
(2009) com adolescentes de 14 a 24 anos revela o desejo de elas terem filhos, mas não
necessariamente de assumirem o papel de mães, o que em muitas delas causa arrependimento.
E Martins (2016), num estudo realizado com quatorze adolescentes com idades entre 14 e 19
anos, destaca que, embora as experiências familiares sejam marcadas por riscos, as mães
adolescentes são dependentes do apoio social com que suas famílias as provêm.

2.4 O desligamento
Sempre que há possibilidade de retorno à vida familiar ou em função da maioridade, a
preparação dos adolescentes consiste em promover visitas contínuas à família para a qual será
designado, objetivando-se assim criar um vínculo gradual para sua reinserção (Malfitano; Silva,
2014; Siqueira et al, 2010); todavia, esses jovens podem também receber visitas de familiares
enquanto estiverem acolhido. Pesquisas indicam que, na maioria dos casos, eles voltam para
seus núcleos familiares (pais e mães, tios, avós, entre outros), uma vez que o processo de adoção
prioriza bebês e crianças/adolescentes entre seis e quinze anos de idade (média de 9,1 anos)
(Assis e Farias, 2013), e as meninas são mais adotadas que os meninos (Malfitano e Silva,
2014). Além disso, há a estratégia das Repúblicas, como um preparatório para uma vida
autônoma, especialmente para aqueles que não têm garantias de reintegração familiar.
Há várias nomenclaturas para o processo de saída do adolescente institucionalizado:
desapropriação, desacolhimento (Porto; Szortyka; Heidrich, 2012), desligamento institucional
(Rosa et al, 2012; Siqueira et al, 2010; Martinez e Soares-Silva, 2008), desabrigamento,
29

desinstitucionalização (Azôr e Vectore, 2008), desenraizamento (Martinez e Soares-Silva,


2008), desterro e desterritorialização (Bastos e Santos, 2005). O termo corrente utilizado pelos
profissionais vinculados à dinâmica do acolhimento institucional é desacolhimento. No entanto,
optou-se nesta pesquisa por utilizar o termo desligamento, citado acima por autores e também
disposto no Art. 92, item VIII do ECA (2012). Na atualidade, é um termo considerado mais
desprendido de alguns preconceitos.
A saída da instituição de acolhimento é um momento emblemático. Embora o processo
de desligamento seja assegurado como uma estratégia preparatória para a saída (ECA, 2012,
Art. 92, Inciso VIII), muitas vezes ele é cumprido de forma inadequada, ou mesmo inexiste uma
política efetiva de preparação do adolescente. Fatores como a defasagem escolar, dificuldades
cognitivas e de aprendizagem, a ausência de programas que desenvolvam o potencial criativo e
profissional, além da preparação não efetiva desse adolescente durante o processo de
acolhimento contribuem para criar um ambiente de insegurança, especialmente quando há a
iminência do desligamento (Porto; Szortyka e Heidrich, 2012; Martinez e Soares-Silva, 2008).
Historicamente, segundo Bernal (2004), vem desde o Período Colonial o despreparo das
instituições no processo de preparação do adolescente para a saída da instituição de
acolhimento. No entanto, verificam-se na atualidade iniciativas para suprir essa demanda, com
objetivo de amenizar os efeitos negativos do desligamento, segundo Miranda (2017).
Sair da instituição de acolhimento implica um corte com a proteção cumprida pela
instituição e uma tomada de atitude diante dos desafios do futuro, configurando-se uma relação
ambígua entre o desejo de liberdade de ação e o receio de perder os cuidados (Martinez, Soares-
Silva, 2008), ou uma sensação de despreparo para os novos desafios, em função mesmo da
proteção que recebiam (Benneti e Brino, 2016). Seja a instituição considerada a casa que
protege os adolescentes (Siqueira et al, 2010), em função da negligência a que foram submetidos
(Nascimento, 2012), seja ela preferida por eles, em lugar da família (Arpini, 2003), há
indagações sobre os limites de sua atuação, tanto positiva quanto negativa.

2.5 O adolescente e o processo de desligamento


Soares e Arpini (2009, p. 194) enfatizam que, para muitos adolescentes, a saída do
acolhimento institucional “representa angústia, incerteza e instabilidade. A perspectiva quanto
“ao que está por vir” constitui-se como algo distante das reais possibilidades desses jovens”.
Esse quadro se atrela ao fato de que algumas instituições ainda mantêm características das
instituições totais, e por isso é preciso rever seus papéis como espaços para o desenvolvimento
30

humano e de ressignificação do cuidado com adolescentes em situação de risco, conforme


apontam Carlos et al (2013).
Falhas na preparação para o desligamento marcam negativamente a vida do adolescente,
ocasionando-lhe indagações sobre sua real situação, suas limitações, especialmente diante de
um futuro iminente (Figueiró e Campos, 2013). Honorato (2011) destaca que não há preparação
gradativa para o desligamento: medo, insegurança e angústia são sentimentos presentes nas
falas dos adolescentes bem como o medo da solidão em relação aos desafios de sobrevivência.
Esses sentimentos são também identificados por Martinez (2006), que acrescenta a percepção
de práticas discriminatórias e promotoras de desigualdades. Siqueira et al (2010) ressaltam a
falta de preparo para o desligamento e de apoio após o desligamento de adolescentes entre 12 e
15 anos, também apontada por Martinez e Soares-Silva (2008).
Porto, Szortyka e Heidrich (2012, p. 281) acrescentam a necessidade de preparação para
a autonomia e a responsabilidade, uma vez que, no momento de desligamento, os adolescentes
“começam a apresentar sintomas compatíveis com depressão, como isolamento, desânimo,
desesperança e dificuldades de sono associados, na maioria das vezes, aos ataques de ira e
sentimentos de raiva persistentes”, além do contato com drogas, interrupção de medicação.
Estas duas situações, especialmente após o desligamento.
Em uma revisão de literatura sobre o futuro no contexto do acolhimento, Ramos, Seidl-
de-Moura e Pessôa (2013) apontam os três aspectos mais citados nas pesquisas: família,
educação e profissão. Zappe e Dell’Aglio (2016), a partir do estudo longitudinal citado
anteriormente, identificam que os adolescentes acolhidos apresentam uma evolução positiva em
relação à expectativa quanto ao futuro, embora apresentem menos oportunidades em relação
àqueles que vivem com suas famílias.
Em outro estudo, Zappe et al (2013) apontam os resultados de uma pesquisa realizada
com 945 adolescentes, com idades entre 14 a 19 anos, oriundos de instituições de acolhimento,
de escolas públicas ou que cumpriam medidas socioeducativas. Destacam que os adolescentes
de escolas públicas têm o maior escore total das expectativas quanto ao futuro, seguidos pelos
acolhidos, embora a única diferença significativa entre eles seja a expectativa de concluir o
Ensino Médio, que é menor entre os acolhidos; os adolescentes acolhidos apresentam maior
escore em relação à ideação e à tentativa de suicídio; os acolhidos e os que cumprem medidas
socioeducativas apresentam expectativas mais altas em relação a ter amigos, a ser respeitado na
comunidade e a ser saudável, o que leva a pensar num engajamento maior na restauração de si
e dos prejuízos relacionais em função dos sofrimentos a que foram submetidos.
31

Como ampliação sobre o tema, vale considerar o estudo de Germano e Colaço (2012),
ao se coletarem narrativas de jovens de escolas públicas socioeconomicamente desfavorecidos.
Mostra-se que a deficiência de acesso a recursos materiais e a experiências de poder e controle
interfere na projeção e no controle do futuro. Mas, mesmo assim, esses jovens são otimistas em
relação ao futuro, especialmente quanto ao investimento nos estudos como preparação para uma
melhor condição de vida, quanto à importância da família e ao investimento em recursos
próprios. Este último dado também aparece nos achados de uma pesquisa internacional,
realizada com 3.509 estudantes adolescentes, caracterizado no estudo como autoconfiança
(Iovu, 2014).
Em uma pesquisa realizada com 2.725 jovens paulistanos, em sua maioria entre 14 e 17
anos, categorizados em relação ao Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS),
provenientes de escolas e instituições não governamentais, com o objetivo de mapear os valores
positivos, Macedo e Kublikowski (2009) destacam, em relação ao futuro, os baixos índices na
capacidade de controle e de tomada de decisões, na capacidade de resistência a condições
adversas. No entanto, observa-se um alto índice em relação à visão positiva do futuro desses
jovens, justificado em parte por se tratar de uma etapa de construção da identidade.
Dos achados desses autores deve-se levar em consideração os seguintes pontos: embora
haja um otimismo em relação ao futuro, em função da conquista de liberdade, o adolescente
acolhido sente-se limitado em suas expectativas pelo tempo de acolhimento, defasagem escolar,
entre outros fatores. Portanto, segundo Martinez e Soares-Silva (2008), o processo de
desligamento deve levar em consideração dois fatores: a orientação ao jovem, em relação ao
futuro, e o passado e a história do adolescente, em relação ao tempo de acolhimento.
Ramos, Seidl-de-Moura e Pessôa (2013) ampliam a discussão sobre o futuro ao destacar
a importância de personalização das necessidades e motivações, ou seja, a consideração do
projeto de vida de cada adolescente e o importante papel da escolarização na projeção de metas
para o futuro. Importa compreender que a preferência pelo presente, em detrimento do futuro,
está relacionada aos riscos que o contexto de acolhimento oferece e também às características
da família e aos cuidados recebidos, ou seja, quanto mais precárias a estrutura familiar e as
relações parentais, mais interferência negativa haverá nas expetativas de futuro e da vida dos
adolescentes. Há de se considerar também que essa preferência é reforçada pela cultura do
imediatismo, colocando o adolescente em uma situação de maior vulnerabilidade.
A relação entre situação familiar e expectativas de futuro é destacada no trabalho de
Rosa et al (2012) com oito adolescentes de 14 e 18 anos, considerando-se o processo de
desligamento institucional. A partir dos relatos, identificam que, mesmo considerando histórias
32

de maus-tratos e negligência, alguns adolescentes citam o papel da família em seus relatos.


Zappe et al (2013) apontam que adolescentes acolhidos institucionalmente e aqueles cumprindo
as medidas apresentam escores mais altos em relação a fatores de risco, em comparação aos que
vivem com suas famílias, o que justifica a influência do contexto sociocultural. Em relação aos
adolescentes em acolhimento, esse quadro ilustra também a exposição a eventos estressores no
contexto familiar e o quanto os pais influenciam as expectativas de futuro de seus filhos.
Outro ponto importante se refere à relação entre tempo de acolhimento e expectativas
de futuro. Ferreira, Litting e Vescovi (2014), a partir dos relatos de adolescentes acolhidos,
puderam perceber uma desorganização de referências em relação ao passado, ao presente e
futuro. Siqueira e Dell’Aglio (2010) reiteram que os prejuízos podem estar relacionados à
percepção da proximidade do desligamento e à qualidade das relações. Sugerem que a
rotatividade de profissionais na instituição contribui negativamente para a manutenção das
relações interpessoais, o que leva os adolescentes a desenvolverem uma “couraça” como forma
de proteção, no momento da separação.
Quatro estudos realizados com adolescentes em situação de acolhimento institucional
prolongado, que foram desligados em função da maioridade, destacam a ambiguidade entre o
reconhecimento dos cuidados recebidos, a libertação das regras da instituição e as incertezas
que a saída desperta (Benetti e Brino, 2016; Gaspar, Santos e Alcoforado, 2015; Figueiró e
Campos, 2013; Porto, Szortyka e Heidrich, 2012). Segundo Benetti e Brino (2016, p. 153), o
desligamento “pode ocasionar sentimentos negativos devido ao fato de [os adolescentes]
julgarem não estar preparados emocionalmente, financeiramente, socialmente, culturalmente
para enfrentar a nova realidade”.
Em relação à satisfação de vida, embora não tenham sido encontrados estudos com
adolescentes na faixa etária dos 17 anos, vale destacar a pesquisa realizada por Siqueira e
Dell’Aglio (2010) com 155 crianças e adolescentes institucionalizados, com idades entre 7 e 16
anos. Destacam-se os seguintes achados: quanto maior a idade, menor a média total de
satisfação de vida; os participantes apresentam baixo desempenho escolar. Apesar desses
resultados, os dados revelam que os participantes têm boa satisfação de vida, considerando que
a partir do ECA houve grandes avanços nas estratégias de proteção, que o estar acolhido
promove oportunidades que não teriam se estivessem com a família e uma maior capacidade de
“avaliar a situação que estão vivendo, talvez com maior capacidade de reflexão e crítica” (p.
412).
Como ampliação do tema, Silva, Giordani e Dell’Aglio (2017), em pesquisa realizada
com 420 estudantes de escolas públicas, com idades entre 12 e 18 anos, apresentam médias
33

altas de satisfação de vida considerando os domínios amizade e família para os que disseram
ter alguma religião. Destacam que os investimentos na manutenção dos níveis de bem-estar
podem contribuir para uma melhor passagem desses adolescentes, nesse momento marcado por
grandes transformações.
Tais estudos, inclusive os realizados em contextos diversos, viabilizam a compreensão
do quadro de desligamento do adolescente como um momento propício para intervenções que
deem lhe suporte emocional, que lhe ofereçam um instrumento de expressão para que possa vir
a estruturar seu modo de se inserir no mundo, especialmente nos aspectos apontados por Ramos,
Seidl-de-Moura e Pessôa (2013): família, educação e profissão.
Além disso, a consideração de que o desenvolvimento autorreflexivo seja um dos pontos
importantes na construção da identidade do adolescente acolhido, o que pode ser definido como
agenciamento do eu (Knox, 2011; 2009), implica apontar como importante que as formas de
proteção assegurem o desenvolvimento com vistas à singularidade de cada pessoa, garantindo
assim condições adequadas diante das adversidades, especialmente no momento em que o
adolescente regressar ao seio familiar ou quando completar a maioridade.
Depreende-se dos estudos apresentados que a principal função do acolhimento
institucional é a de acolher e proteger (e as legislações e suas atualizações têm contribuído para
isso) e desligamento o termo utilizado atualmente, por parecer o mais desprovido de
preconceitos. No entanto, apesar dos esforços, os adolescentes são aqueles que ainda carecem
de programas especializados e individualizados que os preparem para a vida fora da instituição.
A proteção que recebem é uma tentativa de suprir as privações, o quadro de violências e
carências afetivas a que são submetidos; porém, essa proteção, por vezes, pode ser um
dificultador na transição da adolescência para a vida adulta, quando os cuidados se sobrepõem
às estratégias emancipatórias. Soma-se isso o alto percentual de comportamento de risco que
esses adolescentes apresentam, seu envolvimento com drogas, a ideação suicida, a gravidez
precoce, as evasões e o tempo de permanência na instituição. Apesar dos prejuízos que
apresentam, como defasagem cognitiva e escolar, das incertezas, do despreparo profissional,
pressão financeira e situações de ordem jurídico-institucional, demonstram perceber o futuro de
forma otimista, o que pode estar relacionado ao momento de construção da identidade. Entre os
itens mais citados em relação ao futuro estão a escola, a família e o trabalho. No tocante à
satisfação de vida, a percepção do acolhimento e dos cuidados que recebem é boa, desse modo
priorizar estratégias individualizadas para a preparação dos adolescentes, especialmente no
momento do desligamento institucional, parece ser um caminho legítimo, com o intuito de
minimizar os prejuízos acumulados em função do quadro de vulnerabilidade a que pertencem.
34

2.6 A utilização de recursos expressivos com adolescentes, no acolhimento e desligamento


institucional: revisão de literatura
A utilização de recursos expressivos com adolescentes, em diversos contextos, é referida
em trabalhos, em várias modalidades: escrita expressiva (Douce, Guzzo e Groleau, 2018);
desenho (Goldner, Abir e Sachar, 2016; Ritnour et al, 2015; Jacobs-Kayam, Lev-Wiesel e
Zohar, 2013; Fukuda, Garcia e Amparo, 2012; Conrad, Hunter e Krieshok, 2011); pintura
(Gatta, Gallo e Vianello, 2014); visual e poética (Brillantes-Evangelista, 2013); modelagem
(Jang e Choi, 2012); recursos mistos (Quinlan et al, 2015; Kim, Kim e Ki, 2014; Kim e Ki,
2014; Slayton, 2012; Lima et al, 2009).
Em relação ao acolhimento de adolescentes, destacam-se intervenções no contexto
brasileiro e internacional que demonstram a importância da utilização de recursos expressivos
e de sua variedade. Colombo (2018) se utiliza do desenho com crianças e adolescentes
acolhidos, com idades entre 4 e 16 anos, como meio expressivo para que eles possam contar
suas histórias, estratégia que permite um olhar diferenciado a cada subjetividade e sua relação
com a família, a partir da expressão dos sofrimentos, angústias, carências emocionais. Além
disso, Colombo considera poder estabelecer vínculos positivos com os acolhidos, acompanhar
a evolução deles e realizar psicodiagnóstico com o intuito de oferecer uma atenção diferenciada
de cuidados.
A partir do projeto “Boas Práticas em Acolhimento Institucional”, uma série de
atividades foram trabalhadas com adolescentes: Heumann e Costa (2018) desenvolvem
atividades expressivas e ocupacionais com foco na instrumentação para o mercado de trabalho,
como o grafite e o artesanato. Em relação à utilização de registros escritos, Siqueira e Faraj
(2018) adotam o “Caderno de Talentos”, que procura potencializar os vínculos e
comportamentos considerados adequados; Silva e Barros (2018) se utilizam do “Cantinho de
Recados” como forma de expressão de sentimentos, valores, opiniões, o que contribui para o
fortalecimento da comunicação entre os adolescentes e com a equipe profissional; Costa e Cruz
(2018) estimulam a criação de um livro pessoal, com os registros das experiências atuais bem
como com lembranças, registro que pode ser ilustrado com fotografias dos adolescentes, ao
longo do período do acolhimento. Cruz e Gonçalves (2018) trabalham com contação de
histórias, a partir de temas relevantes para o contexto dos adolescentes, além de recursos
expressivos, fantoches e fantasias para encenação de personagens. Bucher-Maluschke e Silva
(2018) partem da estratégia de utilizar o desenho e a colagem como recursos para registro de
histórias pessoais e expectativas de planos futuros para posteriormente os adolescentes
elaborarem o genograma e o ecomapa como dispositivos que possibilitam visualizar a dinâmica
35

familiar deles. Wendt e Dell’Aglio (2018) investem nas práticas educativas, com o intuito de
expor e valorizar as produções plásticas dos adolescentes, entre outras, como desenho, pinturas
e esculturas.
Camargo (2015) apresenta projeto, vinculado ao espaço comunitário e com foco no
processo de cidadania e de desenvolvimento criativo, que dispõe de um conjunto de atividades
para adolescentes acolhidos, como música, dança, gravura, pintura, bordado, visitas e passeios.
A partir da utilização desses recursos expressivos, observa os seguintes aspectos:
desenvolvimento de aptidões técnicas em diversas áreas, estratégias para ampliação do
conhecimento, criação de rotinas e equipes organizadas que funcionam como sustentadores de
processos de simbolização e de estruturação emocional.
Bartho e Uyeno (2015) se utilizam da leitura de uma obra literária, em formato de livro-
diário e escrito por uma autora adolescente, como dispositivo para inspirar 9 adolescentes
acolhidos, com idades entre 10 e 18 anos, a fazerem os registros de suas experiências, por meio
da produção de um diário. As autoras observam um posicionamento inicial de exclusão e
vitimização, para um papel de mais responsabilidade em função da prática de ler e de escrever,
como exercício de reflexão sobre si mesmo.
No trabalho desenvolvido por Tafner (2013), com uso de desenho e pintura, destacam-
se o vínculo ambivalente entre os acolhidos e as figuras parentais, o favorecimento da
integração e a elaboração de aspectos dissociados, relativos à vivência da institucionalização,
destacando-se projetos que foquem no processo de desligamento.
Darewych (2013) se utiliza do desenho com adolescentes acolhidos visando a vida
futura, as metas e esperanças. Destaca-se o Building Bridges (Construindo Pontes), um recurso
expressivo que avalia plasticamente a relação com o futuro. Além da possibilidade de os jovens
desenharem e de refletirem sobre suas vidas, o estudo destaca a habilidade de, mesmo
moderadamente, significarem as próprias vidas. Esse feito pode ser viabilizado por um tipo de
atividade que permita ao adolescente se expressar de forma espontânea e criativa. Como se trata
de um período transitório entre a infância e a idade adulta, como pontuam Ritnour et al (2015),
a utilização de recursos expressivos contribui para a formação do pensamento simbólico e
expressivo, gerando assim um campo de significados passível de ser representado visualmente
e verbalizado.
Brillantes-Evangelista (2013) utiliza modelagem, desenho, pintura e poesia como
recursos, em atividades grupais com adolescentes acolhidos, vítimas de abuso sexual. A
intervenção tem como foco a aplicação de sentido sobre o fazer artístico bem como o despertar
36

do senso de responsabilidade sobre o próprio processo de melhora, e foram observados


resultados positivos em relação à depressão e ao estresse pós-traumático.
Barth et al (2012) priorizam a expressão espontânea e a singularidade de adolescentes
acolhidos, fazendo uso de diversos recursos, como desenho, pintura, modelagem, dramatizações
e histórias. Após esse trabalho, foram observados vínculos significativos entre equipe e
monitores, além de maior autonomia, maior capacidade de expressão e de elaboração de
situações conflitivas.
Os recursos expressivos, nas várias dimensões de atuação e com a utilização de diversos
meios, parecem exercer um papel potencializador no contexto do acolhimento. Contribuem para
a expressão de subjetividades, do sofrimento, da angústia, mas também apontam para o
exercício reflexivo sobre o papel do acolhimento, dos vínculos e dos conflitos familiares e seus
desdobramentos. Também exercem a função de trabalhar noções de cidadania, responsabilidade
e desenvolvimento de instrumentação para o mercado de trabalho.
No que tange ao processo de desligamento, não foram encontrados registros de trabalhos
desenvolvidos com adolescentes que se utilizassem de recursos expressivos nem outros
recursos, em especial a pintura, que é uma especificidade do instrumento de intervenção
proposto na presente pesquisa – a técnica expressiva Paisagem Psíquica.
37

3. ADOLESCÊNCIA E DESENVOLVIMENTO, NO CONTEXTO DA PSICOLOGIA


ANALÍTICA
Jung ([1941] 2013a) já havia problematizado o papel das figuras parentais e seus futuros
desdobramentos na formação da personalidade. Na obra Estudos Experimentais ([1904] 2013b),
por exemplo, analisa a situação de uma família cuja filha é uma adolescente de 16 anos. Destaca
desse contexto que a desarmonia entre os pais afeta emocionalmente as crianças, ou seja, a
influência do meio ambiente familiar trará prejuízos diante do que está por vir; quando mais
jovens, ao se colocarem no mundo, terão dificuldade de adaptar-se ao mundo adulto, em função
das ‘rupturas’ que marcaram seus desenvolvimentos. Alerta que a influência familiar não se
processa apenas na consciência, mas especialmente no inconsciente. No texto “Da formação da
personalidade” ([1934] 2012), Jung reitera o papel das experiências iniciais de vida no processo
do desenvolvimento e acrescenta que o desenvolver-se se refere a uma ação curativa sobre o
indivíduo e implica uma ampliação de consciência.
Mas é na obra Símbolos da transformação (Jung [1911/1952] 2016a), dedicada a
analisar simbolicamente um caso de esquizofrenia, que a adolescência é revisitada e qualificada
como um momento de “tensão entre o desejo de regressar e permanecer criança e o desejo de
afirmação da individualidade e autonomia” (Feldman, 2014, p. 154). Segundo Jung
([1911/1952] 2016a), trata-se de um conflito marcado pela separação das figuras parentais,
também fisicamente. Identifica que o desenvolvimento da identidade do adolescente e todos os
agravantes envolvidos são simbolicamente característicos de um conflito heroico. A tensão a
que se refere está atrelada à dinâmica dos opostos e à sua função reguladora que, segundo Jung
([1950] 2011f, § 112), “constituem condições imprescindíveis e inerentes ao ato de
conhecimento, pois sem eles seria impossível qualquer tipo de diferenciação”.
Importante nesse sentido, segundo Bovensiepen (2014, p. 9), é a ênfase que Jung dedica
à “natureza criativa e regenerativa da regressão”. Essa noção é fundante do conflito vivenciado
pelo adolescente, na medida em que o movimento de recuo é, nesses casos, a condição sine qua
non para que a tendência prospectiva se processe, mas também há de se considerar o perigo de
que a regressão crie um impedimento para que a separação se efetive, originando assim
empecilho para os desenvolvimentos futuros. Kiepenheuer (1990) destaca que a direção
momentânea para trás é vivenciada pelo adolescente como um estado de solidão e se torna
necessária pois cria condições para um movimento prospectivo mais determinado. Segundo
Knox (2009, p. 39), reflete a necessidade de se “criar uma reação emocional real” que possa ser
aceita e acolhida, assim como seria em uma relação de cuidados parentais desejável.
38

Bovensiepen (2014) destaca que, diante desse quadro, pode ocorrer a inflação do ego
influenciada pelas fantasias coletivas, como, por exemplo, a identificação com heróis, heroínas,
guerreiros e também vítimas, provocando rupturas na conexão entre o ego e o self. Segundo
Davies (2014, p. 81), essas influências funcionam como “defesas contra a impotência,
desamparo, dependência e depressão”. Mas há de se considerar, de outro lado, que tais
personagens de poder possam cumprir provisoriamente a heroicidade necessária até que o
adolescente esteja preparado para se lançar ao mundo, a partir de seus próprios meios. Sidoli
(2014) alerta que esses recursos funcionam como uma luta pela sobrevivência, especialmente
quando as primeiras relações de cuidados não foram nutridoras e protetoras. Há um misto de
onipotência e desamparo, o que pode despertar as fantasias tanto genuinamente criativas quanto
suicidas.
As relações que se iniciam com os primeiros cuidados parentais também se estendem ao
longo da vida, através de outras experiências relacionais. A compreensão desses processos
pressupõe uma disposição reflexiva e complexa, como exigência para a ampliação de
consciência. Vilhena (2009, p. 40), por exemplo, destaca que “Jung é considerado um precursor
do pensamento sistêmico, pois lança as bases para se pensar nas mútuas influências da relação
pais-filhos, professor-aluno, assim como ele foi um dos primeiros analistas a conceber
dialeticamente a dinâmica da relação terapeuta-paciente”.
Na contemporaneidade, o aspecto relacional e os agentes interpretativos de mudança
têm sido foco de estudos no contexto da Psicologia Analítica, a partir de diversas vertentes
conceituais (Wilkinson, 2006; Knox, 2011, 2009; Sidoli, 2014; Bovensiepen, 2010; 2014;
Ryotovaara, 2010). Esses autores entendem que as primeiras experiências relacionais servirão
como moldadoras do desenvolvimento humano, porém passíveis de ser ampliadas a partir de
ambientes que propiciem um espaço seguro para novas conexões significativas.
Para Wilkinson (2006), a composição desses aspectos contribui para a emergência do
eu. Como exemplo, apresenta três pacientes, dois dos quais traziam espontaneamente pinturas
para a sessão como registros das experiências pelas quais estavam passando e um com rico
material onírico. O primeiro caso lhe serve como confirmação de que “cada imagem representa
um entre muitos estados do eu que compõem o eu relacional, que é multifacetado” (p. 163). Do
segundo caso, uma paciente com histórico de abuso sexual aos oito anos de idade, destaca o
processo de aproximação com a experiência traumática. Nessa condição, o eu tende a se retrair,
a se esconder do mundo, a partir de defesas protetivas. No decurso de seu processo criativo, a
paciente trouxe a imagem de uma concha protetora, compreendida como uma etapa apontando
para a emergência gradual de seu eu. Por fim, o caso de um paciente que se desenvolveu num
39

ambiente superprotegido, com mãe alcoólatra que tentou várias vezes se suicidar: na sucessão
dos sonhos, a autora destaca o processo que começa com a destruição da mãe interna, passando
por imagens que sugeriam conexão e tomada de controle para uma fase caracterizada pela
emergência da função reflexiva.
Knox (2011) apresenta a noção de agenciamento do eu como a capacidade de fazer
escolhas, de agir e de afetar resultados ou controlar situações, e a função reflexiva como a
habilidade de se relacionar e de fazer sentido em termos comportamentais, mentais e
emocionais. Considera que o senso do agenciamento do eu decorre das atribuições de
significado, estrutura e forma oriundos dos processos interativos com os primeiros cuidadores
que influenciarão o desenvolvimento. Destaca, por exemplo, que o uso da droga pode funcionar
como defesa diante da “inabilidade de experienciar relacionamentos reais” (p. 146) bem como
“a dor e a ansiedade envolvidas nas experiências de separação, perda, vulnerabilidade ou
desamparo” (147). Diante dessa perspectiva emergente da vida psíquica, indica que é preciso
ativar, oferecer meios para que o adolescente possa se desenvolver, especialmente porque a não
separação em relação às figuras parentais funcionará como impeditivo para a independência e
o sentido de agenciamento do eu (Knox, 2007).
Outros autores dedicados a lidar com adolescentes e interessados em sondar o papel do
aspecto relacional e do reflexivo destacam algumas facetas do desenvolvimento e dos
mecanismos que são acionados pelos adolescentes: a habilidade de manejar as situações da vida
diária depende do fortalecimento egoico (Sidoli, 2014); a dificuldade de adquirir uma noção de
tempo pessoal e realista pode estar relacionada às defesas relativas aos desenvolvimentos
futuros, provocando sentimentos de confusão, de se sentir perdido ou mesmo sua aniquilação
(Sidoli e Bovensiepen, 2014); o ataque ao próprio corpo, especialmente entre as adolescentes,
parece funcionar como uma “perda temporária da capacidade de sentir e de experienciar a si
mesma”, mas também desperta para uma forma de poder e sobrevivência (Bovensiepen, 2014,
p. 126); os problemas de simbolização decorrentes de experiências traumáticas refletem a
necessidade de relações restauradoras que promovam contenção e transformação (Bovensiepen,
2010; Ryotovaara, 2010).
Uma variante desenvolvimentista pode ser encontrada nos estudos de Frankel (1998) e
Kiepenheuer (1990), que, apesar de levar em consideração os aspectos acima tratados, lidam
com uma visão diferenciada sobre o adolescente, na medida em que transitam também pelas
expectativas arquetípicas, comunitárias e culturais. Os dois autores apresentam algumas ideias
em comum sobre a adolescência: é uma experiência única, originária; o processo de transição
é natural e universal, e, por isso, a visão teleológica (tendência prospectiva) deve caminhar junto
40

à história pregressa, na medida em que, como aponta Frankel (1998), os sintomas (como
símbolos) devem ser abarcados prospectivamente pois estão relacionados a um futuro que está
por vir, colocando o adolescente como agente em ação no mundo. Soma-se a isso a
compreensão de que o adolescente dispõe de recursos próprios para a restauração do processo
de crescimento, mesmo em contextos de grande privação externa.
Kiepenheuer (1990) destaca que, à medida que o futuro se aproxima, mesclam-se no
adolescente fantasias de conquistar o mundo e o medo de tomar o futuro a partir de um ponto
de vista pessoal, o que provoca a oscilação entre a supervalorização de si mesmo, por vezes sem
limites, e o desespero e pavor diante do mundo ao qual foi jogado. Trata-se da instauração de
um “conflito entre mundos se opondo e tendências internas contraditórias” (p. 6). Nesses
momentos são despertadas indagações sobre o propósito da vida, e na impossibilidade de sua
efetivação, podem tender para o uso de drogas, para quadros depressivos bem como para
tentativas de suicídio. Estes são indicadores de que os adolescentes estão clamando por um
“chamado de ajuda que faça sentido à vida deles” (p. 9).
De acordo com os autores citados, as experiências iniciais e a remodulação posterior
com outras figuras relacionais são importantes indicativos a ser considerados no manejo de
eventos futuros, em que os sintomas (símbolos) apontam direções e por isso precisam ser
tratados prospectivamente. Segundo Jung (2014, p. 165), trata-se de uma dimensão do tempo
em relação ao desenvolvimento: “Isto significa um passado e um futuro e, assim, o indivíduo
só é completo quando acrescentamos sua estrutura presente como resultado de acontecimentos
passados e, ao mesmo tempo, a estrutura presente tomada como ponto de partida de novas
tendências”.
Tomando-se como referência os estudos anteriormente apresentados, vale considerar a
situação vivenciada durante o processo de desligamento institucional: além de este ser um
momento de transição que traz muitas implicações para a vida dos adolescentes, estes vivem
em acolhimento apartados da convivência familiar e comunitária, e trazem em seus históricos
marcas de privações, violências, sofrimentos. Nesse sentido, a utilização da técnica expressiva
Paisagem Psíquica como recurso de expressão pode ser um facilitador para o acionamento do
agenciamento e da função reflexiva.
41

4. A TÉCNICA EXPRESSIVA PAISAGEM PSÍQUICA: FUNDAMENTAÇÃO E


DESCRIÇÃO
A técnica expressiva Paisagem Psíquica (Leite, 2012), uma técnica de pintura sobre a
água, foi criada pelo autor da presente pesquisa e estudada como projeto-piloto no Mestrado em
Psicologia Clínica, no Núcleo de Estudos Junguianos da PUC-SP. Estimula a expressão plástica
e a projeção de conteúdos inconscientes (dinâmica consciente-inconsciente), a função simbólica
e seu processamento na consciência.
O contato com os materiais plásticos, o fazer expressivo e a possibilidade de
autoexpressão são condições que a técnica convida a desenvolver e estão de acordo com os
apontamentos feitos por Feen-Calligan e Nevedal (2008). A autoexpressão funciona como uma
maneira de reforçar a autoimagem (Arteche et al 2010), e a imagem é a chave para a
compreensão da psique. Por meio desta se constrói uma história de sentido (McNamee, 2004)
que se intensifica mediante a produção simbólica.
Entre as especificidades da técnica expressiva Paisagem Psíquica podem-se destacar as
seguintes: a efetividade da técnica no acionamento do inconsciente; esse acionamento é
facilitado pelo modo como a técnica funciona, ou seja, prioriza-se a expressão espontânea e o
não controle sobre a produção final; a necessidade de ser utilizada em um ambiente seguro e
por profissional capacitado para lidar com as demandas do inconsciente e hábil na construção
simbólica do percurso de uma subjetividade, o que vai ao encontro do que foi destacado por
Nissimov-Nahum (2009) a partir de um estudo realizado por profissionais que se utilizavam de
recursos expressivos.
O manuseio adequado da técnica é uma condição sine qua non para que sejam atingidos
os objetivos de seu uso. Constitui um instrumento que visa facilitar a ponte entre consciente e
inconsciente e, se vier a ser utilizada indiscriminadamente e sem os cuidados necessários
processados em uma relação de cuidado, pode ser prejudicial, posto que desperta conteúdos por
vezes perturbadores, dolorosos. Como Jung ([1934] 2013c) pontua, a técnica é necessária, mas
por trás desta está a pessoa, e lidar com material psíquico exige tato e sensibilidade.
No contexto do desligamento institucional, a intervenção por meio da técnica expressiva
Paisagem Psíquica se justifica por alguns fatores: é uma técnica cujo procedimento não exige
conhecimento a priori ou domínio técnico, ou seja, é de fácil manuseio; contribui para a
expressão e para a escuta, ao ser aplicada individualmente; é importante por oferecer uma
modalidade de expressão criativa e narrativa subjetiva ao adolescente que está vivenciado um
momento marcante em seu desenvolvimento; essa expressão contribui para estimular a função
reflexiva, durante o processo criativo, com possibilidade de impulsionar o senso do
42

agenciamento do eu, entendendo-se que o amadurecimento e a ampliação de tais funções são


promovidos por elaboração psicodinâmica via psicoterapia, a qual pode utilizar o recurso dessa
técnica, que vem suprir um déficit de pesquisas que relatem a utilização de recursos expressivos,
no contexto do desligamento institucional.

4.1 A dinâmica consciente-inconsciente


Durante o processo de expressão plástica, ocorre a exteriorização de conteúdos
internos, o que aciona a dinâmica consciente-inconsciente. Jung ([1946] 2011a, § 385) observa
que a relação entre estes se processa de maneira fluida: “Não há um conteúdo consciente que
não seja também inconsciente sob outro aspecto. É possível igualmente que não haja um
psiquismo inconsciente que não seja, ao mesmo tempo, consciente”. As imagens exteriorizadas
são concretas e, além de revelar várias das facetas dessa dinâmica, apresentam qualidades
estéticas e demarcam uma existência tanto temporal quanto espacial (Schaverien, 1999).
A dinâmica consciente-inconsciente é estimulada não só pela ação criativa
desencadeada pela utilização da técnica, mas também pela própria constituição que a técnica
propicia ao gerar duas imagens: uma diretamente influenciada pela ação do participante, ao
utilizar deliberadamente as cores e as tentativas de criar formas sobre a superfície aquosa, e
outra gerada sobre a placa de gesso submersa que recebe grande parte da tinta depositada sobre
a superfície. Como foi observado em pesquisa anterior, a imagem da superfície, mais próxima
da dimensão consciente, gera mais associações por parte do participante, ao contrário da
segunda, ‘pintada’ involuntariamente e, por isso, mais profunda, com menos associações, em
função da proximidade com o inconsciente (Leite, 2012).
Uma das especificidades da técnica expressiva é a utilização da água, cujo símbolo se
conecta à qualidade de fluidez observada na dinâmica consciente-inconsciente que se processa
durante o desenvolvimento da técnica. É possível conjeturar que a técnica com água ative
experiências arquetípicas, constituintes do processo de geração de vida, uma imagem que é
referida por Kast (1997). A água é o elemento que liga as duas imagens produzidas: a da
superfície, que, por sua vez, gera a do fundo.

4.2 O processamento simbólico e imagético


Para Penna (2013; 2014), o processamento simbólico é a forma de abordar os símbolos
em sua compreensão, considerando que todo evento psicológico é uma autorrepresentação da
situação atual do inconsciente. Decorre disso que o símbolo é o produto psíquico que se origina
43

da cooperação entre consciente e inconsciente, oriundo do mecanismo autorregulatório da


psique e passível de ser investigado como fenômeno psíquico.
Mas, para que isso se processe, se faz necessária uma disposição da consciência de
abarcar o símbolo (Jung [1921] 2011b), considerando-se que, em função de sua complexidade,
há aspectos que são acessíveis e outros não. O objetivo desse processo é permitir que o material
desconhecido (inconsciente) seja integrado à consciência, promovendo sua ampliação (Penna,
2013). Decorre disso o que Jung ([1921] 2011b, § 908) chama de “atitude simbólica”, ou seja,
a disposição para lidar com os símbolos.
Uma vez que todo símbolo busca por uma concretização, como reitera Jung ([1925]
2014), as formas de presentificação (termo mais adequado do que representação) podem variar
de acordo com os meios disponíveis para isso e, como acrescenta, segundo os dotes pessoais
(Jung [1916] 2011c). Uma das possiblidades é tomar uma forma visível, configurando-se assim
como uma das expressões simbólicas que permite estudar as manifestações do inconsciente.
Segundo Parker (2008, p. 51), essas manifestações visuais carregadas de significados e valores
“ajudam a guiar a imaginação a níveis mais profundos e significativos da experiência”.
Inaugura-se assim uma discussão sobre os imbricados meios de acesso ao inconsciente
e os efeitos disso na consciência, singularmente pela materialização de uma imagem. Ratifica-
se, no entender de Penna (2013), que a expressão pictórica (plástica, visual, imagética) é uma
das formas de produção de conhecimento na Psicologia Analítica.
A dimensão imagética é, para Jacobi (2013, p. 157), a “representação simbólica de uma
psique, “olhada internamente”” e, ao mesmo tempo, segundo Penna (2014), enriquece e
aprofunda o espectro de facetas do símbolo quando inserido dentro de um contexto de
investigação. Exemplo da utilização dessa dimensão pode ser observada quando Knox (2011)
estabelece a imaginação ativa, a arte e o sand play como recursos na psicoterapia para o
desenvolvimento do agenciamento do eu, ratificando que a expressividade plástica do símbolo
é um agente poderoso no desenvolvimento humano.
Mas, apesar de lançar as bases para se pensar em termos de visualidade e de utilizar o
termo “atitude estética”, a qual pode definida como uma atitude parcial que revela apenas uma
parte e não a totalidade das coisas percebidas, Jung (1997, p. 919) é influenciado por um
pensamento disseminado desde o século VXIII, que vincula a estética apenas à sensação. Nesse
sentido, tece considerações parciais, embora significativas, alertando que falta a essa atitude o
pensamento e o sentimento, duas funções relativas à consciência.
Para Beebe (2010), esta atitude permite que o paciente experiencie o emergir do eu de
uma maneira diferente, além de estimular a criação de uma nova possibilidade simbólica para
44

a ampliação da consciência, enquanto Van Den Berk (2016) a considera como uma das fases
envolvidas no processo curativo. Já Maclagan (2001, p. 142), a partir desse contexto, inaugura
o termo “estética psicológica” ao problematizar os imbricamentos entre as qualidades estéticas
e os efeitos psicológicos, por isso considera a pintura como um importante e complexo meio
através do qual ocorre a objetivação da psique no mundo.
Em síntese, as ideias inauguradas por Jung demarcam um território de pesquisa que vem
sendo aplicado em vários contextos e se configura como estratégia de intervenção. Pressupõe
dois elementos recorrentes, em consonância com os autores também elencados: o processo
relacional que se estabelece a partir da dinâmica consciente-inconsciente e também ampliado
para as várias modalidades relacionais (primeiros cuidadores e bebê, terapeuta-paciente, entre
outros) e a emergência do processo reflexivo despertado pela concretização dos símbolos.

4.3 Estudo dos quadrantes e seus simbolismos a partir da obra de C. G. Jung


À minha frente o dia, e atrás a noite,
Sobre mim o céu, aos pés o oceano
(Fausto de Goethe apud Jung [1911/1952] 2016a, § 117).

Beleza antes de mim, atrás de mim,


beleza à minha direita, à minha esquerda,
beleza acima de mim e abaixo de mim.
Estou no caminho do pólen
(Caminho do pólen entre os Navajos apud Campbell, 1988).

Partindo-se do pressuposto de que a expressão pictórica é uma forma de produção de


conhecimento (Penna, 2013), foi despertada a necessidade de se compreenderem as produções
plásticas a partir de parâmetros objetivos. Trata-se do estudo do simbolismo topológico que
objetiva identificar, por exemplo, a disposição para se fazer movimentos espirais, o movimento
de baixo para cima, bem como as localizações como centro, esquerda, direita, entre outras, que
aparecem na obra de C. G. Jung.
O ponto de partida é o estudo dos quadrantes, assim denominado em função das divisões
topológicas da produção plástica para efeito de análise. É utilizado tanto no campo da Psicologia
Analítica (Cox, 2016; Furth, 2006; Abt, 2005; Bergeron, 2003; Ammann, 2002; Kellog, 2002;
Arrien, 1992; Bach, 1990; Perry, 1987) quanto nos estudos sobre técnicas projetivas da
Psicologia (Hammer, 1991; Jolles, 1971). A partir de um estudo quantitativo, Bergeron (2003)
apresentou dois achados: o quadrante IE foi referido como mais próximo do inconsciente, ao
45

passo que SD, mais próximo do consciente. No campo da arte, são relevantes os estudos de
Wolfflin (2015) e o paralelismo que Arnheim (2016; 1990) observa com os estudos sobre
neuropsicologia e percepção visual de Dodwell (1983).
O estudo sobre os quadrantes, as produções plásticas e os símbolos harmonizam-se com
o pressuposto de que certas ações, em função de sua importância e recorrência, delimitam uma
tendência compositiva, especialmente no campo criativo e de expressão plástica visual. A
contribuição para o campo da Psicologia Analítica se assenta na possibilidade de abarcar as
produções plásticas em termos de simbolização da espacialidade, por meio da qual é possível
estudar o psiquismo.
A ativação dessa tendência compositiva, tendo como dispositivo a intervenção com a
técnica expressiva Paisagem Psíquica, reatualiza-se no seio da individualidade, durante o
processo de concretizar imagens por meio da pintura. Decorrem dos estudos de Jung a noção
de método de imagens (picture method) (Jung, 1997) e recorrência de elementos básicos,
também explorados em sua época pelo historiador de arte Aby Warburg, e a ideia de
pathosformel, pelos estudos dos cartões de Rorschach1 bem como pela teoria das ideias
elementares (elementargedanke) de Adolf Bastian. Somam-se a esses autores os estudos que
relacionam essas duas áreas no contexto na Psicologia Analítica (Madden, 2016; van der Berk,
2012; Parker; 2008; Reiber, 2008; MacLagan, 2001, 2015; Kreinheder, 2005; McNiff, 1988).
O interesse pelo tema foi despertado durante o estudo piloto de mestrado realizado com
adolescentes e jovens adultos, com idades entre 18 e 21 anos, que estavam cursando o nível
superior, por meio da intervenção com a técnica expressiva Paisagem Psíquica (Leite, 2012).
Nesse contexto, foi possível identificar a utilização do quadrante esquerdo num primeiro
momento, referido como campo mais próximo do inconsciente, em direção ao direito, este mais
próximo da consciência, entendendo-se um sentido prospectivo bem como o surgimento da
centralização e simetria. Tais achados permitiram formular a hipótese de, que para esses jovens
estudados, a movimentação para a direita apontaria para a preparação do futuro, a qual está em
processo, antecedida por um acionamento do inconsciente.
Em vista desses achados, surgiu a proposta de investigar quais movimentos, formas e
localizações aparecem em adolescentes, no contexto de vulnerabilidade social, especialmente
naqueles que estão acolhidos e vivenciando o processo de desligamento institucional. Nesse
momento, as indagações sobre o futuro e as incertezas são despertadas, o que provoca o
surgimento de angústias ou o agravamento da saúde mental dos adolescentes, como atestam

1
A importância dos trabalhos desses dois autores foi apresentada na dissertação de mestrado: Paisagem Psíquica
(Leite, 2012).
46

alguns autores (Benetti e Brino, 2016; Gaspar, Santos e Alcoforado, 2015; Figueiró e Campos,
2013; Porto, Szortyka e Heidrich, 2012).
Foi importante, por isso, realizar o estudo dos quadrantes e seus simbolismos, a partir
da obra de C.G. Jung, com o intuito de fundamentar a intervenção com a técnica expressiva
Paisagem Psíquica e gerar parâmetros para se compreenderem esses movimentos, formas e
localizações. Para tanto, realizou-se um levantamento sistemático das citações referentes a
desenhos, pinturas e símbolos na obra de C. G. Jung, levantamento esse que serviu de base
conceitual para investigar a conexão entre a produção plástica e os símbolos que emergem a
partir dela.
O estudo apontou três grandes categorias e suas subcategorias, que serviram de
referência para a análise dos resultados da presente pesquisa: 1. Forma: vertical, horizontal,
círculo, simetria e espiral; 2. Localização: centro, superior, inferior, esquerda, direita; 3.
Movimento: de baixo para cima, de cima para baixo, da esquerda para a direita ou dextrogiro,
da direita para a esquerda ou sinistrogiro.
O estudo dos quadrantes e seus simbolismos também contribuiu para a elaboração de
um protocolo, utilizado durante as intervenções com os participantes da pesquisa (Apêndice 3).
47

5. MÉTODO

5.1 Objetivos
a) Realizar o estudo dos quadrantes e seus simbolismos, a partir da obra de C. G. Jung;
b) Aplicar esse estudo nas produções expressivas de adolescentes que vivenciam o
processo de desligamento institucional;
c) Examinar expectativas de futuro e satisfação de vida de adolescentes em processo de
desligamento institucional;
d) Compreender o processamento simbólico e imagético dos adolescentes, no decorrer
da intervenção, por meio da técnica expressiva Paisagem Psíquica.

5.2 Ideia norteadora


A técnica expressiva Paisagem Psíquica possibilitaria a expressão de conteúdos
conscientes e inconscientes favorecendo o adolescente a entrar em contato com estes a fim de
acionar recursos potenciais durante o processo de desligamento institucional.

5.3 Desenho da pesquisa


Trata-se de uma pesquisa de método misto, com enfoque exploratório sequencial
(Moscoso, 2017; Creswell, 2010), realizada com onze adolescentes que completaram 17 anos e
que estavam vivenciando o processo de desligamento institucional, cujo instrumento principal
de intervenção foi a técnica expressiva Paisagem Psíquica.
Esta pesquisa se caracterizou pelo método misto (MMR: Mixed-Methods Research), ao
combinar as abordagens quantitativa e qualitativa. A opção por essa metodologia se efetivou
em função de sua relevância na atualidade, especialmente nas ciências humanas e sociais.
Segundo Creswell (2010), qualifica-se por um tipo de pesquisa de natureza interdisciplinar que
possibilita obter mais efeitos do que se fossem aplicadas separadamente as abordagens
quantitativa e qualitativa (Quadro 1).
48

Quadro 01: Descrição do método misto da pesquisa

QUANTI-QUALI
Estudo dos quadrantes:
Categorias e subcategorias que emergiram a partir da obra de C. G. Jung

QUANTI
VI* Intervenção

Análise estatística
Expectativas Quanto ao Futuro de Adolescentes
Satisfação de Vida para Adolescentes

Análise estatístico-topológica
Cor (quantidade + localização)
Forma (tipo + movimento + localização)

QUALI-QUANTI
Estudos de casos
Elementos identificados (+ Associações + Amplificações) + variáveis Cor e Forma
Entrevistas (E1 inicial e final + E2 final)

Como possibilidade de operacionalização do método misto empregado na pesquisa, a


Estratégia exploratória sequencial delimita o método qualitativo como dominante como
também viabiliza a comparação e/ou integração dos resultados obtidos nas duas fases (Moscoso,
2017; Creswell, 2010). Este último (2010, p. 218) acrescenta que o modelo primário dessa
estratégia é explorar um fenômeno, expandir os resultados qualitativos e “usar os dados e
resultados quantitativos para auxiliar na interpretação de resultados qualitativos”.
O enfoque quantitativo levou em consideração os dados estatísticos oriundos das
aplicações de escalas antes e depois da intervenção assim como os dados coletados, a partir da
intervenção com a técnica expressiva, referentes a cor (quantidade e localização) e forma (tipo,
movimento e localização).
O enfoque qualitativo, segundo Creswell (2010), está relacionado à coleta de materiais
empíricos diversos, efetiva-se em um cenário natural e visa entender ou interpretar os
fenômenos. Para a presente pesquisa, utilizou-se o estudo de caso como forma de apresentação,
e levaram-se em consideração os seguintes dados: a) os conteúdos da entrevista aplicada no
primeiro encontro e reaplicada no final das intervenções; b) os conteúdos da entrevista final
aplicada somente no último encontro; c) os dados relativos às variáveis Cor (quantidade e
49

localização) e Forma (tipo, movimento e localização); d) os elementos identificados pelos


participantes em suas pinturas; e) as associações e amplificações que realizaram.
A pesquisa teve como instrumentos de avaliação a ficha de Características
Sociodemográficas e do Acolhimento, a Escala de Expectativas Quanto ao Futuro de
Adolescentes, a Escala Multidimensional de Satisfação de Vida para Adolescentes, uma
entrevista realizada no primeiro e no último encontro e uma entrevista final.

5.4 Participantes
Participaram da pesquisa onze adolescentes que tinham completado 17 anos de idade e
que estavam vivenciando o processo de desligamento institucional.

5.4.1 Critérios de inclusão


Adolescentes que vivessem em Instituições de Acolhimento, na modalidade de Casa Lar
e SAICA, Não Governamentais na cidade de São Paulo, dos sexos masculino e feminino, com
idade a partir de dezessete anos e que estivessem participando do Programa Individual de
Atendimento (PIA).

5.4.2 Critérios de exclusão


Foram excluídos adolescentes que apresentavam quadro psiquiátrico grave ou
deficiência intelectual, de acordo com dados fornecidos pelas instituições de acolhimento.

5.4.3 Processo para escolha dos participantes


Logo após a concordância das Instituições de Acolhimento, foram realizados encontros
com os adolescentes para que pudessem experimentar a técnica expressiva e receber orientações
sobre os benefícios desse trabalho. Os que se enquadraram nos critérios de inclusão foram
convidados a participar da pesquisa, e a adesão ocorreu de livre e espontânea vontade.
Alguns adolescentes que não se enquadravam nos critérios de inclusão também se
interessaram em participar. Como estratégia para acolher alguns deles, foram promovidos
alguns encontros para que pudessem experimentar a técnica, sendo orientados no sentido de que
a continuidade do trabalho tinha como foco os adolescentes com 17 anos completos.

5.5 Locais de atendimento


Os encontros foram realizados nos espaços das Instituições de Acolhimento, como sala
da equipe técnica e brinquedoteca, de acordo com a disponibilidade de cada um deles.
50

5.5.1 Processo para escolha das Instituições de Acolhimento


A escolha das instituições aconteceu em quatro etapas: a) envio de projeto para a
Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS); b) aprovação do
projeto pela equipe técnica de avaliação de projetos do Espaço do Aprender Social (ESPASO);
c) contatos telefônicos e envio de e-mails aos responsáveis pelas instituições de acolhimento,
com o resumo do projeto, contatos esses geralmente intermediados pelos
gerentes/coordenadores, psicólogos ou assistentes sociais; d) encontros presenciais nas
instituições com o intuito de apresentar o projeto em seus detalhes, objetivos e importância para
o adolescente institucionalizado.
Participaram cinco Instituições de Acolhimento nas modalidades Casa Lar e SAICA,
uma localizada na Zona Norte e outras quatro na Zona Leste, ambas na cidade de São Paulo
(Anexo 1).

5.6 Instrumentos
5.6.1 Ficha de Características Sociodemográficas e do Acolhimento Institucional
A caracterização é constituída dos seguintes dados sociodemográficos: idade,
frequência à escola, números de irmãos na instituição, contato com os pais e família, fuga da
instituição, tempo total de institucionalização, série escolar, motivo do acolhimento (Calcing e
Benetti, 2014; Serafini, 2004). O objetivo dessa caracterização é compreender o perfil do
adolescente acolhido, sendo os dados fornecidos pelas Instituições de Acolhimento, geralmente
pelos psicólogos e/ou assistentes sociais.
Alguns itens foram acrescidos, em função da especificidade da pesquisa e para efeitos
estatísticos: a) no item Idade, foram acrescentados os meses, em função da homogeneidade da
amostra – todos os adolescentes tinham 17 anos; b) foi introduzido o item Rendimento escolar
com o objetivo de se ampliarem os dados sobre a situação escolar do participante; c) foi
acrescentado o item Nº de irmãos não institucionalizados, com o intuito de serem ampliados os
dados sobre o número de irmãos; d) foram acrescentados dois itens em Motivo do acolhimento:
situação de rua e risco de morte na região de residência, pois surgiram durante a coleta de dados.

5.6.2 Escala de Expectativas Quanto ao Futuro de Adolescentes


Esse instrumento foi escolhido em função de ter sido elaborado para estudar o público
adolescente brasileiro e aplicado no contexto institucional. Originalmente elaborado para o
Questionário Juventude Brasileira – Etapa II (Dell’Aglio e Koller, 2011), a partir do Estudo
Nacional sobre Fatores de Risco e Proteção (Libório e Koller, 2009), foi utilizado por Gunther
51

e Gunther (1998), com jovens de 11 a 19 anos, e por Zappe et al (2013), com adolescentes de
14 a 19 anos. A Escala é composta de nove questões sobre as chances que o adolescente acredita
ter em relação a educação, trabalho, família e saúde. Alguns exemplos desse instrumento:
“concluir o ensino médio”, “ter um emprego que me garante boa qualidade de vida”, “ter uma
família”, “ser saudável a maior parte do tempo”. As respostas são em formato Likert de cinco
pontos: de muito baixas (1) até muito altas (5). No estudo realizado por Zappe et al (2013),
foram observados os seguintes resultados comparando-se adolescentes que viviam com suas
famílias, acolhidos, e aqueles que cumpriam medidas socioeducativas: a) não foram
encontradas diferenças significativas com relação ao escore total de expectativas quanto ao
futuro entre os adolescentes de escolas públicas e os de acolhimento institucional, com exceção
do item Ensino Médio, com maior pontuação para os adolescentes de escolas públicas; b) os
adolescentes acolhidos apresentaram escore mais baixo em relação aos fatores de risco, em
comparação aos que viviam com suas famílias; c) os adolescentes acolhidos apresentaram maior
escore total em relação aos que cumpriam medidas socioeducativas.

5.6.3 Escala Multidimensional de Satisfação de Vida para Adolescentes


Esse instrumento foi utilizado com o objetivo de sondar como o adolescente se sente em
relação à sua própria vida. A escala é composta por sete dimensões e teve como etapa inicial do
processo de validação a definição de qualidade de vida e felicidade, a partir de entrevistas com
adolescentes. Foi desenvolvida por Segabinazi et al (2010, p. 655-7) e aplicada com 425
adolescentes com idades entre 14 e 19 anos, de escolas privadas e públicas. Dimensões: 1.
Família – relacionada a “ambiente familiar saudável, harmônico, afetivo, de relacionamentos
satisfatórios”; 2. Self – refere-se a “características positivas, como autoestima, bom-humor,
capacidade de relacionar-se, capacidade de demonstrar afeto, além de indicações de satisfação
quanto à diversão”; 3. Escola – trata da “importância da escola, o ambiente escolar, os
relacionamentos interpessoais nesse espaço e nível de satisfação com relação a esse ambiente”;
4. Self comparado – caracteriza-se por realizar “avaliações comparativas do eu ao seu grupo de
pares (os itens contêm conteúdos relacionados aos temas lazer, amizade e satisfação de desejos
e afetos”; 5. Não-violência – envolve “o desejo de não envolvimento em situações de conteúdos
associados a comportamentos agressivos, como brigas e discussões” 6. Autoeficácia – engloba
“avaliações da capacidade de realização e competência no alcance de metas estabelecidas pelo
adolescente (os conteúdos do item estão relacionados a autonomia, lazer, satisfação material e
de desejos”; 7. Amizade – “trata dos relacionamentos com pares e do nível de satisfação desses
relacionamentos, algumas indicações de lazer e situações de diversão e apoio”. Dos achados,
52

os autores destacam a importância da família como fator positivo no desenvolvimento do


adolescente, a média mais alta na dimensão amizade, sendo a menor média obtida na dimensão
Escola. Cada item foi respondido por meio de uma escala de respostas de cinco pontos tipo
Likert, variando de (1) nem um pouco a (5) muitíssimo.

Obs.: As duas escalas citadas anteriormente foram padronizadas para a população brasileira e
estão disponíveis para uso. Os autores dos referidos estudos foram notificados sobre a utilização
das escalas na presente pesquisa.

5.6.4 Entrevistas semiestruturadas individuais: inicial e final


Foram elaboradas duas entrevistas, uma aplicada no primeiro e no último encontros (E1
inicial + E1 final) e a entrevista final (E2).
Jansen (2015) aponta que o papel da entrevista com adolescentes acolhidos os coloca
como competentes autores, momento em que podem narrar suas experiências, abrindo-se assim
um campo para novas possibilidades de desenvolvimento.
As entrevistas foram gravadas com o intuito de garantir fidedignidade às informações
coletadas e para que pudessem ser consultadas pelo pesquisador sempre que necessário. As que
se realizaram no primeiro e no último encontros (E1 inicial e final) tiveram como objetivo
coletar dados sobre como os adolescentes se sentiam e, em especial, sobre como viam o futuro:
1. Como você se sente em relação à vida fora da instituição?
2. Quais são suas expectativas de vida depois que sair da instituição?
3. Como se sente preparado para isso?
A entrevista final (E2 final) foi aplicada somente no último encontro. As questões dessa
entrevista versaram sobre a percepção do adolescente em relação ao que havia sido vivenciado
durante a intervenção com a técnica expressiva Paisagem Psíquica e sobre o momento de
desligamento.
4. Fale-me como foi para você ter participado dos encontros experimentando a técnica
de pintura.
5. Levando em consideração esse período que passamos juntos, você gostaria de contar
algo que lhe ocorreu? Pensou em possibilidades de ações após sua saída?
6. Como você percebe este momento, quando está prestes a sair da instituição?
53

5.6.5 Técnica Expressiva Paisagem Psíquica


Trata-se de uma técnica de pintura que produz duas configurações plásticas com
predominância abstrata: uma na superfície e outra no fundo. Compõe-se de quatro etapas: 1.
Preparação – consiste em despejar a água na bacia, seguido do gesso em pó; 2.
Desenvolvimento – aplicação livre da tinta sobre a superfície aquosa; 3. Apreciação –
apreciação das configurações plásticas; 4. Diálogo por meio das imagens – momento de
identificação dos elementos, associações e amplificações.
Ao se pingar a tinta sobre a superfície, esta reage em contato com a película composta
de gesso e água, de modo que a pessoa geralmente não consegue produzir o que havia
intencionado (com referência a motivos figurativos). O que se apresenta em geral são
configurações abstratas propiciadas pela acomodação aleatória da tinta sobre a superfície.
Enquanto a pessoa está pintando sobre a superfície, parte da tinta vai-se depositando no fundo
da bacia, onde o gesso está em processo de endurecimento. Quando essa configuração da
superfície é dispensada, pois está assentada sobre uma base líquida, dá lugar a essa segunda
configuração que não resguarda, necessariamente, qualquer relação formal com a da superfície.
Têm-se assim, em uma mesma produção, duas configurações: uma que pode ter alguma
referência figurativa (uma vez que o participante manuseou diretamente as tintas sobre a
superfície, e isso implica um certo controle ou pelo menos uma intenção), embora a
predominância seja de qualidade abstrata, e uma outra configuração abstrata. Essas duas
configurações - superfície e fundo - são identificadas por letras sequenciais do alfabeto,
iniciando-se com a letra A, seguidas pela indicação de “s” para superfície e “f” para fundo.
Exemplo: a primeira pintura realizada será codificada como As (primeira pintura ou
configuração da superfície), e a pintura correspondente ao fundo como Af (primeira pintura ou
configuração do fundo). A segunda pintura será codificada como Bs e Bf, e assim
sucessivamente.

São os seguintes os materiais utilizados:


a) Bacia branca retangular, cujas medidas são 41 cm de comprimento, 27 cm de largura e
7 cm de profundidade, e escolhida em função de sua neutralidade, além de apresentar
uma certa transparência, podendo-se assim controlar a quantidade de gesso nela
depositada e também acompanhar o movimento da tinta.
b) Água
c) Um quilo de gesso de secagem rápida
54

d) Tinta de qualidade líquida (nanquim). Em virtude de a pintura ser realizada sobre a água,
para que haja o efeito desejado, essa tinta precisa ser líquida de modo a permitir sua
dispersão na água, efeito este que não é possível com tintas de qualidade pastosa como
acrílica, óleo ou guache. A tinta nanquim tem pigmentos fortes, e, por isso, suas cores
são intensas, contribuindo para o resultado final. O gesso depositado na bacia recebe
parte da tinta colocada na água, formando-se espontaneamente configurações abstratas.
Dependendo da quantidade de tinta nanquim utilizada, principalmente nas cores branca,
prata e dourada, pode ocorrer o acúmulo de material em algumas regiões formando
relevos sobre a placa de gesso. A paleta definida para a presente pesquisa compõe-se
das seguintes cores nanquins: azul, amarelo, vermelho, verde, branco, preto, dourado e
prata. Em pesquisa anterior (Leite, 2012), utilizou-se a paleta de cores-pigmento de
acordo com a definição proposta pela Deutsches Institut für Normung (DIN)
(Guimarães, 2000), que são: cores primárias - magenta, azul cyan, amarelo; cores
secundárias - vermelho, azul violeta, verde; branco e preto, além de dourado e prata.
Como a paleta de cores da tinta nanquim não tem o magenta e o azul cyan, para essas
duas foram utilizadas as ecolines. No entanto, para efeito expressivo, observou-se que
no estudo realizado não foi um fator determinante a utilização da paleta de cores-
pigmento. Além disso, as ecolines são tintas com custo mais elevado do que as nanquins
(em referência às marcas utilizadas).
e) Outros materiais: avental, luva cirúrgica (caso o participante não queira colocar as mãos
diretamente na água, na hora de dissolver o gesso), tesoura sem ponta (para abrir o saco
de gesso). Sugere-se um ambiente com boa iluminação e pia.

Instruções para utilização da técnica:


O primeiro passo é preencher a bacia com água, e, na sequência, depositar o pacote de
gesso em pó dentro da bacia. Feito isso, o participante é convidado a colocar as mãos dentro da
bacia para mexer o gesso, com o intuito de dissolvê-lo completamente na água. Caso queira,
poderá utilizar as luvas descartáveis. Depois de três minutos de espera, ele é convidado a pingar
livremente as tintas que escolher sobre a superfície aquosa. Esse tempo é necessário para formar
uma fina película de gesso na superfície aquosa e para que o montante se deposite no fundo da
bacia. O participante é instruído a verbalizar, sempre que sentir vontade de fazê-lo, em qualquer
momento da produção, e poderá produzir em pé ou sentado. Assim que assinala ter terminado
a pintura, é convidado a apreciá-la. Nesse momento, recebe a consigna: aprecie a pintura que
você realizou, explore as formas, as cores, sinta-se à vontade para falar o que acha importante:
55

como se sentiu, se o fez lembrar alguma coisa, se consegue reconhecer alguma figura, o que
pode dizer sobre essas lembranças, sobre essas formas.
Assim que esse momento de diálogo termina, é avisado de que essa pintura dará lugar a
uma outra, formada na placa de gesso que, nesse tempo, endureceu e foi manchada com as cores
que ele utilizou durante a pintura na superfície aquosa. É convidado a despejar a água em uma
bacia reservada para esse fim, se assim o quiser. Pelo menos na primeira vez o pesquisador pode
despejar essa água em conjunto com o participante, a fim de mostrar-lhe a forma adequada de
fazê-lo, que deve ser lenta para que não caia água fora da bacia e não se danifique a pintura que
se formou na placa de gesso que está submersa. É novamente convidado a se sentar e a apreciar
a segunda pintura. Receberá a mesma consigna por ocasião da primeira pintura.

5.6.6 Formas de registro das entrevistas, das configurações (pinturas) e dos dados obtidos
durante os encontros
Para a fidedignidade dos relatos, todas as entrevistas (E1 inicial e final e E2 final) foram
registradas, com recurso de gravação disponível em celular (Lenovo K53b36). Esse registro
está explicitado no TCLE. Toda configuração (pintura) foi fotografada com câmera digital e
sem flash (Canon 60D) para que este não refletisse na superfície aquosa e interferisse na
qualidade da imagem, e um segundo registro foi realizado com câmera de celular (Lenovo
K53b36). Fotografaram-se todas as produções plásticas, sendo os registros dos elementos
identificados nas configurações, associações e amplificações realizados por meio do protocolo
desenvolvido para a pesquisa.

5.7 Procedimento
5.7.1 Procedimento de intervenção e avaliação
Após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa e anuência das instituições, foi iniciado
o procedimento de intervenção, que ocorreu de abril de 2017 a agosto de 2018, num total de
setenta e quatro encontros realizados com onze adolescentes. Os encontros foram realizados
respeitando-se a dinâmica das instituições em relação a dias e horários mais apropriados,
especialmente no contraturno escolar e profissional dos adolescentes.
No Quadro 02 estão descritos os participantes da pesquisa, o sexo, o número de
encontros que cada um realizou e o motivo da interrupção das atividades.
56

Quadro 02: Identificação dos participantes da pesquisa por sexo, considerando o número de encontros que
realizados e o motivo de interrupção das atividades
No. de Encontros
Sexo Motivo de interrupção das atividades
identificação que realizou
01 M 11 Completou
02 M 9 Completou
03 F 9 Completou
04 M 8 Completou
05 M 6 Desligamento
06 M 5 Desistiu após conflito com família
07 F 4 Trabalho
08 F 4 Evasão
09 F 2 Transferida
10 M 2 Excesso de atividades
11 F 2 Evasão

A pesquisa foi estruturada para ser realizada em oito encontros, levando-se em conta os
seguintes critérios: a) por se tratar de adolescentes cujos interesses são diversos, um número
maior de encontros poderia dificultar a adesão às atividades; b) em função da proximidade do
desligamento, o prazo de dois meses de intervenção pareceu pertinente. Participaram seis
adolescentes do sexo masculino e cinco do sexo feminino.
No entanto, optou-se, em alguns casos, por prolongar as atividades em função da adesão
e da disponibilidade dos participantes e também porque foram observadas necessidades de
apoio. Quatro participantes completaram o mínimo de oito encontros: o participante 01
completou onze encontros, os participantes 02 e 03 completaram nove encontros, e o 04
completou oito encontros. Os outros não completaram o mínimo de oito encontros, em função
dos seguintes motivos: o participante 05 foi desligado antes do tempo previsto; o 06, após uma
visita de final de semana à família, como parte do PIA, se envolveu em uma briga familiar e
após esse episódio desistiu de todas as atividades a que estava vinculado; a participante 07
interrompeu as atividades porque iniciou atividade profissional; as participantes 08 e 11
evadiram; a 09 foi transferida para uma unidade especializada em refugiados; o participante 10
interrompeu em função de excesso de atividades que estava realizando.
No Quadro 03 estão descritos os procedimentos de intervenção e avaliação realizados
com os onze participantes da pesquisa.
57

Quadro 03: Descrição dos procedimentos realizados com os participantes que completaram e os que não
completaram os encontros
PARTICIPANTE PARTICIPANTES PARTICIPANTES
Não completaram o mínimo
Completaram o mínimo de 8 encontros
de 8 encontros
01 02, 03, 04 05, 06, 07, 08, 09, 10 e 11
Levantamento inicial: Levantamento inicial: Levantamento inicial:

Características sociodemográficas e do Características sociodemográficas e do Características sociodemográficas e


acolhimento institucional acolhimento institucional do acolhimento institucional
Primeiro encontro: Primeiro encontro: Primeiro encontro:

TCLE TCLE TCLE


+ +
Aplicação das escalas: Aplicação das escalas:
Não foram aplicadas as escalas e EEQFA, EMSVA EEQFA, EMSVA
não respondeu à entrevista (E1 + +
inicial) Entrevista (E1 inicial) Entrevista (E1 inicial)
TCLE
+ 8 a 9 encontros de intervenção: 2 a 6 encontros de intervenção:
11 encontros de intervenção:
Intervenção com a técnica Intervenção com a técnica
Intervenção com a técnica expressiva Paisagem Psíquica expressiva Paisagem Psíquica
expressiva Paisagem Psíquica
Depois da intervenção: Depois da intervenção:

Entrevista (E2 final) Reaplicação das escalas Não foram reaplicadas as


+ escalas nem respondidas as
Não foram reaplicadas as escalas e Entrevista (E1 final) entrevistas (E1 final e E2 final)
não foi respondida a entrevista (E1 +
final) Entrevista final (E2 final)

Todos os participantes tiveram a ficha de Características Sociodemográficas e do


Acolhimento Institucional preenchidas. O preenchimento contou com a cooperação dos
psicólogos e/ou assistentes sociais responsáveis de cada instituição.
Os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido e de Assentimento foram preenchidos,
antes do primeiro encontro, tanto pelos participantes da pesquisa (Apêndice 1), quanto pelos
responsáveis/gerentes das Instituições de Acolhimento (Apêndice 2).
O participante 01, que realizou onze encontros, era um adolescente que vinha
apresentando comportamentos de risco, e, por isso, optou-se pelo início imediato das
intervenções. Dessa forma, não respondeu à entrevista inicial e final (E1 inicial e final) nem
preencheu as escalas, mas respondeu à entrevista final (E2 final).
Os participantes 02, 03 e 04 realizaram o procedimento de intervenção completo. Optou-
se por nove encontros com os participantes 02 e 03 pela necessidade verificada de apoio, e o
participante 04, que realizou oito encontros, foi reintegrado à família no mesmo dia da última
intervenção. Todos responderam às entrevistas (E1 inicial e final e E2 final) e às escalas EEQFA
e EMSVA antes e depois dos encontros.
58

Os participantes 05, 06, 07, 08, 09, 10 e 11, que realizaram de dois a seis encontros,
responderam à entrevista inicial (E1 inicial) e preencheram as escalas EEQFA e EMSVA antes
da intervenção com a técnica expressiva.
As entrevistas E1 final e E2 final foram realizadas somente com os participantes que
completaram oito encontros, considerando-se ser um número de encontros pertinente ao
aprofundamento no processo criativo. Os encontros foram realizados individualmente, e sua
duração variou entre quarenta e sessenta minutos.
O procedimento de avaliação levou em consideração todos os dados coletados. Para
análise estatística, foram utilizados os testes de Qui-quadrado e Fisher para as variáveis
categóricas (dados demográficos, Cor quantidade e localização, Forma quantidade, movimento
e localização, para os adolescentes dos sexos masculino e feminino) e o teste não paramétrico
de Mann-Whitney para as variáveis numéricas (escores dos questionários EEQFA e EMSVA).
Foram utilizados os softwares do Excel e IBM SPSS Statistics 21. Considerou-se significante
p<0,05.
Em relação à análise das variáveis Cor (quantidade e localização) e Forma (tipo,
movimento e localização), foram utilizadas as produções plásticas dos onze participantes para
efeitos estatísticos. Foram adotados os seguintes critérios em relação aos que completaram e
não completaram os encontros: a) quatro participantes completaram os encontros, variando de
oito a onze encontros. Foram considerados somente os encontros de 1 a 8, por isso optou-se
pela divisão entre os primeiros encontros (1 a 4) e os últimos (5 a 8) para os quatro participantes;
b) para os sete participantes que não completaram os encontros, variando de dois a seis
encontros realizados, optou-se pela divisão entre a primeira e última metade dos encontros
realizados.
Para a análise qualitativa foram considerados os elementos identificados pelos
participantes em suas respectivas configurações plásticas (pinturas), as associações, as
amplificações, os conteúdos das entrevistas e os dados estatísticos referentes às variáveis Cor e
Forma. Vale ressaltar que os elementos identificados pelos participantes nas pinturas, além de
fornecer dados para a análise de conteúdo, também são estudados em função de suas
localizações, assim como as variáveis Cor e Forma.

5.7.2 Procedimento ético


Esta pesquisa foi guiada pelas Resoluções: CNS/MS 466/12 do Conselho Nacional de
Saúde e 510/16, referente às diretrizes éticas para pesquisas em Ciências Humanas e Sociais.
59

Tramitou pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUC-SP, de acordo com a Deliberação n°


6/2007, e contou com o TCLE dos participantes e das Instituições de Acolhimento.
Recebeu o Parecer Consubstanciado do CEP no dia 25 de maio de 2017, sob o número
2.083.495.
60

6. RESULTADOS

6.1 Categorias e subcategorias que emergiram do estudo dos quadrantes e seus


simbolismos, a partir das obras de C. G. Jung
Para pesquisar os quadrantes, as produções plásticas e os símbolos, no primeiro
momento sistematizou-se uma análise qualitativa e temática (Ezzy, 2002), seguida por uma
análise quantitativa, categorizando informações a fim de encontrar temas recorrentes, em
função da localização espacial, ou estudo topológico. Para tanto, foi utilizado o software
Iramuteq.
A primeira etapa para o estudo topológico das produções plásticas tomou como ponto
de partida o Índice Geral das obras completas de C. G. Jung bem como escritos que não fazem
parte das obras completas. Como poucas obras estão digitalizadas na versão ebook e ainda não
são de domínio público, optou-se por definir a estratégia de estudo a partir da versão impressa.
As seguintes palavras-chave foram utilizadas: mandala, centro, movimento, superior, inferior,
esquerda, direita, vertical, horizontal, ascensão, descida, invólucro, espiral, circum-ambulação,
simetria, rotação, desenho, pintura. A partir da localização das obras que continham essas
palavras, a etapa seguinte foi acessar cada uma delas e, na sequência, a marcação da página ou
parágrafo correspondente. As obras coletadas se destacavam por abarcar alguns temas:
referências a obras de arte, ilustrações, gravuras, símbolos alquímicos, análise de sonhos,
análise de desenhos e pinturas oriundos da produção ou não dos pacientes de C. G. Jung.
Na segunda etapa, foram coletadas e organizadas em uma tabela digital todas as citações
que contemplavam as palavras-chave e também aquelas que se assemelhavam, em termos de
significado, permitindo assim agrupamentos por categorias como, por exemplo, centro, ponto
central, mandala.
Foram coletadas duzentos e oitenta citações, e, com essa estratégia, foi possível
identificar, por saturação, que os principais termos adotados por Jung se mantêm ao longo das
obras consultadas assim como os significados atribuídos aos termos. A adoção da saturação é
indicada por Charmaz (2006) quando não há muita coisa escrita sobre o tema, quando os dados
coletados alcançaram os objetivos e por se tratar de uma estratégia cuja coleta e análise ocorre
simultaneamente.
A terceira etapa consistiu na análise de cada uma das categorias pré-existentes e de novas
que iam surgindo, com o intuito de avaliar as nuanças internas e, depois, compará-las. Tal
análise visa inferir uma tendência compositiva que constitui um campo simbólico-topológico,
durante o processo criativo.
61

Na quarta e última etapa, esses dados foram inseridos no IRAMUTEQ, um software


desenvolvido por Pierre Ratinaud (Lahlou, 2012; Ratinaud e Marchand, 2012) e licenciado por
GNU GPL (v2), que permite análises estatísticas sobre corpus textuais, segmentos de textos e
tabelas indivíduos/palavras.

6.1.1 Categorias encontradas


A partir da compilação das palavras-chave iniciais, foram identificadas a princípio onze
categorias que serviram de base para a análise topológica e, na sequência, estas foram
agrupadas, dando origem a três grandes categorias e subcategorias. As categorias iniciais
agrupavam um conjunto de termos sinônimos, a partir da interpretação aplicada por Jung em
seus escritos: 1) centro, centralização, ponto, central, mandala; 2) superior, alto, em cima; 3)
inferior, baixo, embaixo, abaixo; 4) esquerda; 5) direita; 6) vertical, interior, introspecção,
introversão, para dentro; 7) horizontal, de fora, exterior, mundo exterior; 8) círculo, circular,
invólucro, receptáculo, recipiente, envolvimento; 9) simetria, simétrico, simetrização,
equilíbrio; 10) espiral: circum-ambulatio, circum-ambulação, deambulação, rotação,
circulação, circularidade, circulatio, roda, ronda, redondo, rotundidade, rotundum, uroboros;
11) movimento. Esta última subdivide-se em duas subcategorias: a) subida: ascendente,
ascensão, ascensus, elevação e pode ocorrer de baixo para cima, da esquerda para direita (ou
dextrogiro); b) descida: descendente, descensus, manifestando-se de cima para baixo, da direita
para a esquerda (ou sinistrogiro).
Nos Quadros 04, 05 e 06 são apresentadas as três categorias e subcategorias originadas
a partir da coleta de dados: 1. Forma: vertical, horizontal, círculo, simetria e espiral; 2.
Localização: centro, superior, inferior, esquerda e direita; 3. Movimento: de baixo para cima,
dextrogiro, de cima para baixo e sinistrogiro. Desse quadro evidenciam-se também a adoção de
um termo que melhor representasse cada categoria, destacado em letras maiúsculas, e as
respectivas citações selecionadas e extraídas das obras de C. G. Jung, como exemplos de suas
intepretações sobre cada termo. Vale ressaltar que o conjunto de citações extraídas de suas obras
reflete um caráter não determinista e a psique em organização dinâmica, e, portanto, vários
sinônimos ilustram um mesmo significado. No entanto, há uma distribuição topológica que
pode ser observada nas citações, especialmente referente a localizações: centro, esquerda,
direita, superior e inferior presentes, além de formas e movimentos que podem ser identificados
nessas localizações, tanto na produção individual como coletiva.
Há, por exemplo, certos movimentos que tendem a uma direção, como da esquerda para
a direita, de baixo para cima, indicativos de ascensão, sendo esta última ilustrada pelo símbolo
62

antropomórfico da árvore (Jung [1945/1954] 2011i). O contrário de ascensão equivale ao


movimento de cima para baixo, relativo a descida; da direita para a esquerda, indicativo de um
movimento em direção ao inconsciente (Jung [1950] 2011d); a centralização, também
representada pela figura mandálica, é uma das mais destacadas por Jung ([1944] 2011e). Como
centro organizador de elementos dispersos da psique, demarca um espaço regido tanto por
forças centrípetas quanto centrífugas: um ponto central como representação da totalidade
psíquica; a rotação indicaria movimento, diferentemente de formas repousadas, como: círculo,
receptáculo e invólucro, indicativos de proteção, envolvimento, contenção, mas também de
aprisionamento; o superior se relacionaria ao campo aéreo, e o inferior aos elementos terrestres
(Jung [1950] 2011d; 2014).

Quadro 04: Categoria Forma e subcategorias, sinônimos e respectivas citações extraídas da obra de C. G.
Jung
Termo adotado e Escolha de citações que melhor ilustram
Item Categoria Referência
sinônimos os significados dos termos
“De repente encontrei-me completamente
isolado. Isto, por mais desvantajoso que
possa ter sido, teve também uma vantagem
(Jung, 2014,
para mim como um introvertido; ou seja,
p. 65)
VERTICAL estimulou o movimento vertical da libido,
Interior fui pressionado a investigar plenamente as
Introspecção coisas dentro de mim”.
Introversão “[...] foi o pensamento cristão da Idade
Para dentro Média [...] trocando o destino celeste por
um destino terreno e passando, deste modo, (Jung [1950]
da linha vertical do estilo gótico para a 2011f, § 78)
linha horizontal da descoberta do mundo e
da natureza”
“[...] assim que aparecem no desenho
formas horizontais, temos a aparição das (Jung, 2014,
HORIZONTAL funções racionais, porque elas estão sobre a p. 141)
De fora nossa terra”.
Exterior “[...] movimento horizontal, de conquista (Jung [1950]
Mundo exterior da terra e de domínio da natureza”. 2011f, § 150)
“Desligado do movimento horizontal que a (Jung, 2014,
atividade do mundo exterior traz”. p. 65)
1 “A ideia de receptáculo é arquetípica. É
Forma
encontrada em toda a parte, sendo motivo
central de quadros inconscientes. É a ideia (Jung
do círculo mágico desenhado em volta de [1935/1943]
alguma coisa que deve ser impedida de 2011g, § 409)
fugir ou que deve ser protegida de algum
modo”.
(Jung
“O tema do envolvimento é uma simbólica
CÍRCULO [1911/1952]
materna”.
Circular 2016a, § 367)
Invólucro “A surpreendente quantidade de linhas e
Receptáculo camadas ondulantes na nossa mandala
Recipiente podem ser interpretadas como uma
(Jung [1950]
Envolvimento constituição de invólucros, isto é, como
2011d, § 576)
defesa contra o exterior. Trata-se de
formações protetoras as quais têm o mesmo
objetivo da consolidação interior”.
“Podemos então compreender por que se
recorre ao círculo protetor. Este deve
(Jung, [1929]
impedir a efluxão, protegendo a unidade da
2011h, § 47)
consciência contra a fragmentação
provocada pelo inconsciente”.
63

“A simetria perfeita da copa, da árvore, (Jung


mostra uma união correspondente dos [1945/1954]
contrários”. 2011i, § 307)
“A contenda acerca de direita e esquerda é
SIMETRIA (Jung [1944]
um conflito que irrompe no próprio
Simétrico 2011e, § 231)
sonhador ao ter que reconhecer a simetria”.
Simetrização
“A ideia de tornar simétrico poderia
Equilíbrio
significar assim um ponto culminante no
(Jung [1944]
reconhecimento do inconsciente e sua
2011e, § 226)
incorporação numa imagem geral do
mundo”.
ESPIRAL “O aproximar-se circundado, ou circum-
Circum-ambulatio ambulação, exprime-se, em nosso texto,
Circum-ambulação através da ideia de circulação. Esta última (Jung [1929]
Deambulação não significa apenas o movimento em 2011h, § 38)
Rotação círculo, mas a delimitação de uma área
Circulação sagrada”.
Circularidade “[...] a roda acentua a rotação que aparece
Circulatio (Jung [1950]
também como deambulação ritual em torno
Roda 2011f, § 352)
de um centro”
Ronda
Redondo “Psicologicamente, a circulação seria o ato
Rotundidade de se mover em círculo em torno de si (Jung [1929]
Rotundum mesmo, de modo que todos os lados da 2011h, § 38)
Uroboros personalidade sejam envolvidos”.

Quadro 05: Categoria Localização e subcategorias, sinônimos e respectivas citações extraídas da obra de
C. G. Jung
Termo adotado e Escolha de citações que melhor ilustram
Item Categoria Referência
sinônimos os significados dos termos
“O si-mesmo é, por definição, o centro e a
(Jung [1944]
circunferência dos sistemas conscientes e
2011e, § 310)
inconscientes”.
“Seu tema básico é o pressentimento de um
centro da personalidade, por assim dizer,
um lugar central no interior da alma, com o (Jung, [1950]
qual tudo se relaciona e que ordena todas as 2011j, § 634)
coisas, representando ao mesmo tempo
CENTRO uma fonte de energia”.
Centralização “Começa para aquele que se põe numa
(Jung,
Ponto relação, transcendental, com seu centro, um
[1911/1952]
Central processo de conscientização que tende para
2016a, § 427)
Mandala a unidade e para a totalidade”
“O símbolo do mandala tem exatamente o
significado de lugar sagrado, de temenos,
para proteger o centro. E é um dos mais
(Jung
importantes motivos na objetivação das
[1935/1943]
imagens inconscientes. Destina-se a
2011g, § 410)
proteger o centro da personalidade de ser
Localização invadido e influenciado por meios
2 exteriores”.
“o homem culmina, em cima, na ideia de (Jung [1950]
SUPERIOR um Deus luminoso e bom” 2011f, § 386)
Alto “bem como a mandala dividida, cuja parte
(Jung [1950]
Aéreo superior corresponde à esfera mais
2011d, § 536)
Em cima luminosa do salitre”
Espiritual “[...] de cima vem tudo o que é aéreo, (Jung [1950]
intelectual, espiritual”. 2011d, § 561)
“Cinza é um termo geral para o corpóreo (Jung [1954]
que fica embaixo”. 2016, § 131)
INFERIOR (Jung
“[...] embaixo, água, negrume, animal,
Baixo [1945/1954]
serpente”.
Embaixo 2011i, § 462)
Abaixo “A serpente desvia o movimento
Corpóreo psicológico aparentemente para o reino das
Terrestre (Jung, 2014,
sombras, dos mortos e das imagens erradas,
p.134)
mas também para a terra, para a
concretização”
(Jung [1944]
ESQUERDA “A esquerda significa o lado inconsciente”
2011e, § 166)
64

(Jung
“[...] uma esquerda, elemento feminino”. [1945/1954]
2011i, § 462)
“A esquerda é o lado do coração, do (Jung [1950]
emocional, onde o indivíduo é afetado pelo 2011f, § 409,
inconsciente”. nota 112)
(Jung [1944]
“[...] a direita representa a consciência”
2011e, § 225)
(Jung
“[...] uma direita, elemento masculino”. [1945/1954]
DIREITA
2011i, § 462)
“A direita é onde domina a razão (Jung [1950]
consciente. A direita é onde está o direito, o 2011f, § 409,
que é reto, o que é justo, o que é correto”. nota 112)

Quadro 06: Categoria Movimento e subcategorias, sinônimos e respectivas citações extraídas da obra de
C. G. Jung
Termo adotado e Escolha de citações que melhor
Item Categoria Referência
sinônimos ilustram os significados dos termos
“Em compensação surge na mandala um
movimento de certo modo para cima e
(Jung [1950]
para o claro, aparentemente numa
2011d, § 570)
tentativa de salvar a consciência do
escurecimento do mundo em torno”
DE BAIXO
PARA CIMA “[...] psique do homem, têm duplo
(Jung [1954]
aspecto, um se volta para cima e para a
Subida 2016b, § 165)
luz”.
Ascendente “[...] caminho de subida [...] é o período
Ascensão (Jung, 2014,
de crescimento, da juventude, da luz e do
Ascensus p. 68)
verão”
Elevação
“[...] o movimento para a direita deve
(Jung [1950]
produzir uma ascensão à claridade da
2011d, § 570)
DEXTROGIRO consciência”.
Da esquerda para “A transformação se processa da
direita esquerda para a direita, acompanhando o (Jung [1950]
movimento do sol, trata-se de um 2011f, § 409)
processo de tomada de consciência”.
“[...] ao aspecto psicológico de nossa
gravura, é evidente que se trata de uma
descida ao inconsciente. A travessia (Jung [1946]
noturna no mar é uma espécie de descida 2017, § 455)
3 Movimento
aos infernos, uma imersão no
DE CIMA PARA inconsciente”.
BAIXO “A descida a regiões cada vez mais
(Jung [1946]
profundas do inconsciente se converte
2017, § 493)
numa iluminação vinda de cima”.
“A obra alquímica começa justamente
(Jung, [1950]
com a descida às trevas ou ao
2011f, § 231)
inconsciente”.
Descida “A direção para a esquerda mostra
Descendente presumivelmente o movimento em Jung [1950]
Descensus direção ao inconsciente, portanto a 2011d, § 669)
imersão no mesmo”
“O caminho para a esquerda,
evidentemente, não conduz para cima,
SINISTROGIRO para o reino dos deuses e das ideias (Jung [1944]
Da direita para eternas, mas sim para baixo, para a 2011e, § 169)
esquerda história natural, para os fundamentos
instintivos animais do ser humano”.
“[...] o desenho não mostra equilíbrio, e
o vaso cai para a esquerda, para o lado (Jung
do inconsciente, demonstrando assim [1935/1943]
que o inconsciente ainda é todo- 2011g, § 411)
poderoso”.
65

Decorrente do levantamento feito, é possível inferir que: 1. VERTICAL se refere a


interior, introspecção; HORIZONTAL a exterior, mundo exterior; CÍRCULO a proteção,
envolvimento; SIMETRIA a equilíbrio; ESPIRAL se refere a circulação. 2. CENTRO se refere
majoritariamente a totalidade, centralização, mandala, mandálico; SUPERIOR a aéreo,
espiritual; INFERIOR a terrestre, corpóreo; ESQUERDA a inconsciente, feminino, emocional;
DIREITA a consciente, masculino, racional. 3. DE BAIXO PARA CIMA como crescimento,
em direção à luz ou DEXTROGIRO, que se refere a claridade, ambos indicativos de subida,
elevação, consciência; e DE CIMA PARA BAIXO ou SINISTROGIRO como contato com o
inconsciente, descida, inconsciência.

Na Figura 01, as três categorias e suas subcategorias estão identificadas


topologicamente. A categoria Localização, composta pelas subcategorias centro, superior,
inferior, esquerda e direita, atrela-se ao estudo dos quadrantes (Cox, 2016; Furth, 2006; Abt,
2005; Kalff, 2004; Bergeron, 2003; Kellog, 2002; Arrien, 1992; Bach, 1990; Perry, 1987) e,
por isso, ocupam posições fixas. Identificam-se por abreviações para se viabilizar o processo
de análise, como segue: centro (C); superior, composta por superior esquerda (SE) e superior
direita (SD); inferior, composta por inferior esquerda (IE) e inferior direita (ID). A categoria
Forma, composta por vertical, horizontal, círculo, simetria e espiral, que podem ocupar
quaisquer posições dentro das cinco subcategorias que compõem a categoria Localização. Por
fim, a categoria Movimento, composta por de baixo para cima, dextrogiro, de cima para baixo
e sinistrogiro, que também podem ocupar quaisquer posições dentro das cinco subcategorias
que compõem a categoria Localizações. A relação das categorias Forma e Movimento se
estabelece a partir das seguintes direções: Vertical – de baixo para cima ou de cima para baixo;
Horizontal, Invólucro e Espiral – da esquerda para direita ou dextrogiro e da direita para a
esquerda ou sinistrogiro.
66

Figura 01: Distribuição topológica das categorias e subcategorias

SE superior SD

centro
C

IE inferior ID

SE SD

esquerda direita

IE ID

círculo
espiral vertical
l
simetria

horizontal

de cima para baixo


sinistrogiro dextrogiro

de baixo para cima


67

Na Figura 02, são apresentados os resultados da nuvem de palavras, que têm como
objetivo representar graficamente a frequência das palavras oriundas das 280 citações da obra
de C. G Jung. Na análise, destacam-se os termos de maior frequência: centro, inconsciente,
círculo, mandala, esquerdo e símbolo. A recorrência dos termos ratifica a ênfase dos estudos de
Jung sobre o processo de centralização, simbolizado pelo mandala, e a importância do
inconsciente quando se trata de produção imagética, característicos do processo de organização
interna (totalidade) e pertinentes à noção de individuação, como também o círculo, como forma
relativa a proteção.

Figura 02: Nuvem de palavras: frequência das 280 citações extraídas da obra de C. G. Jung
68

Na Figura 03, são apresentados os resultados da análise de similitude, que têm como
objetivo a construção da árvore de coocorrências. Nessa análise é possível se identificarem as
coocorrências entre as palavras, e seu resultado indica a conexidade entre elas, o que auxilia na
identificação da estrutura da representação. Destacam-se alguns termos presentes nas
subcategorias com mais ocorrências, como centro, inconsciente, mandala, círculo, esquerdo e
símbolo.

Figura 03: Resultados da análise de similitude: árvore de coocorrências


69

Na Figura 04, aparecem as classes vocabulares contendo os temas e contextos que


compõem cada uma delas. Esse recurso do software serve para agrupar termos a partir das
principais classes de palavras, e destacam-se do quadro os seguintes achados: 1. há sete classes
de vocábulos diferentes presentes no total de citações extraídas das obras de C. G Jung; 2. As
classes 1 e 2, 3 e 4, 5 e 6 estão próximas em relação aos termos, o que significa que
compartilham termos em comum. 3. Em relação à categoria Localização, estão as classes 1 e 2
(esquerda e direita) e as classes 3 e 4 (centro). As últimas são derivadas da classe 7, referente à
categoria Movimento, o que sugere que o centro e a totalidade são alcançados a partir do
movimento; 4. As classes 5 e 6 se referem às categorias Localização e Movimento (superior e
inferior, subida e descida, respectivamente).

Figura 04: Classes vocabulares: temas e contextos

A partir das categorias encontradas tendo como referências citações das obras de C. G.
Jung, e somando-se os achados obtidos em pesquisa anterior (Leite, 2012), foi elaborado um
protocolo (Apêndice 3) utilizado durante a intervenção com a técnica expressiva Paisagem
70

Psíquica, cujo intuito é padronizar as anotações das informações sobre os procedimentos de


preparação da técnica, das produções plásticas, dos elementos identificados nas pinturas, bem
como associações e amplificações trazidas pelos participantes, e facilitar o processo de
tabulação das informações para efeitos estatísticos (quanti) e interpretativos (quali).
Embora o estudo dos quadrantes tenha sido o ponto de partida para fundamentar a
utilização da técnica expressiva Paisagem Psíquica, no contexto da Psicologia Analítica, ele se
limita à problemática topológica e seus significados. O presente estudo buscou ampliar a
dimensão topológica por considerar que a prática criativa é uma das maneiras de expressão que
revela uma organização estética, ou seja, todo ato criativo é uma reatualização do estético. Para
Jung ([1934] 2011d, § 16), por exemplo, “A experiência [...] ensina que o círculo protetor, o
mandala, é o antídoto tradicional para os estados mentais caóticos”. Disso decorre que, neste
caso, a utilização de elementos estéticos cumpre uma função no processo de organização
interna. A recorrência desses e de outros elementos e as disposições topológicas de que se
servem indicam que a emergência de certos padrões cumpre um papel no processo criativo.
Para Jung (2014, p. 141), “assim que aparecem no desenho formas horizontais, temos a aparição
das funções racionais, porque elas estão sobre a nossa terra”, ou seja, se a vertical indica um
movimento de introspecção (Jung, 2014, p. 88), a horizontal aponta para a relação com o
exterior, com o mundo. A apropriação desses padrões mostra as facetas abrangentes da
criatividade humana no que ela tem em comum.

6.2 Resultados estatísticos a partir da aplicação das escalas EEQFA e EMSVA, e das
variáveis Cor (quantidade e localização) e Formas (tipo, movimento e localização)
Para análise estatística foram utilizados os testes de Qui-quadrado e Fisher para as
variáveis categóricas (dados sociodemográficos, Cor quantidade e localização, Forma
quantidade, movimento e localização, para os adolescentes dos sexos masculino e feminino) e
o teste não paramétrico de Mann-Whitney para as variáveis numéricas (escores dos
questionários EEQFA e EMSVA). Considerou-se significante p<0,05 para as variáveis Cor
(quantidade e localização) e Forma (tipo, movimento e localização). Foram utilizados os
softwares do Excel e IBM SPSS Statistics 21.
Em relação às escalas EEQFA e EMSVA, foram considerados somente os resultados
dos três participantes que completaram os encontros e responderam às escalas antes e depois
das intervenções.
71

No que se refere às variáveis Cor (quantidade e localização) e Forma (tipo, movimento


e localização), foram considerados os resultados de todos os participantes. Optou-se pela análise
intragrupo, primeiro dos que completaram os encontros e depois dos que não completaram.

6.2.1 Caracterização dos participantes estudados

Tabela 01: Características sociodemográficas e do acolhimento institucional

Dados Sociodemográficos faixa Média

Idade 17a1m - 17a11m 17a8m

n %
sexo Feminino 5 45,5
Masculino 6 54,5
frequenta a escola Não 2 18,2
Sim 9 81,8
série escolar Ensino Fundamental 2 18,2
Ensino Médio 9 81,8
rendimento escolar Regular 10 90,3
Bom 1 9,1
número de irmãos na instituição Nenhum 9 81,8
1 2 18,2
números de irmãos não
institucionalizados Nenhum 2 18,2
Até 3 3 27,3
Mais de 3 6 54,5
contato com os pais Não 6 54,5
Sim 5 45,5
fuga da instituição Não 7 63,6
Sim 4 36,4
tempo de institucionalização 1 a 6 meses 1 9,1
6 meses a 1 ano 2 18,2
1 a 2 anos 2 18,2
2 a 3 anos 2 18,2
mais de 3 anos 4 36,3
motivo do acolhimento Negligência 4 36,3
Situação de rua 3 27,3
Morte dos pais 1 9,1
Conflito familiar 1 9,1
Risco de morte 1 9,1
Abandono 1 9,1

Idade: participaram do estudo 11 adolescentes. Todos já tinham completado 17 anos


quando iniciaram a participação na pesquisa, com idades variando entre 17 anos e um mês e 17
anos e 11 meses, com média de 17 anos e 8 meses.
72

Sexo: 5 participantes eram do sexo feminino (45,5%) e 6 do sexo masculino (54,5%).


Frequência à escola: quando iniciaram a participação na pesquisa, 2 participantes não
estudavam (18,2%) e 9 estudavam (81,8%). No entanto, ao final da participação, 4 dos 9 (44%)
que estudavam haviam abandonado a escola.
Série escolar: do total de participantes, considerando-se os que estavam estudando ou
não, 2 (18,2%) estavam no Ensino Fundamental e 9 (81,8%) no Ensino Médio.
Rendimento escolar: dos participantes que estudavam, 8 tinham rendimento escolar
regular (88,9 %) e 1, rendimento bom (11,1 %).
Número de irmãos na instituição: 9 participantes não tinham irmãos
institucionalizados (81%8), enquanto 2 tinham (18,2%).
Número de irmãos não institucionalizados: 2 dos participantes não tinham irmãos
institucionalizados (18,2%), 3 deles tinham até 3 irmãos (27,3%), e 6 tinham mais de 3 irmãos
não institucionalizados (54,5%).
Contato com os pais: 6 dos participantes não mantinham contato com os pais (54,5%),
enquanto 5 deles tinham contato (45,5%).
Fuga da instituição: 7 dos participantes não tinham histórico de fuga da instituição
(63,6%), enquanto 4 já haviam fugido (36,4%).
Tempo de institucionalização: 1 participante estava acolhido entre 1 e 6 meses (9,1%),
2 de 6 meses a 1 ano (18,2%), 2 de 1 a 2 anos (18,2%), 2 de 2 a 3 anos (18,2%), e 4 com mais
de 3 anos de acolhimento (36,3%).
Motivo do acolhimento: 4 participantes foram acolhidos em função de negligência
(36,3%), 3 por situação de rua (27,3%), 1 por morte dos pais (9,1%), 1 por conflito familiar
(9,1%), 1 por risco de morte (9,1%), e 1 por abandono (9,1%).

Comentário: a partir dos dados obtidos, vale destacar alguns pontos importantes: todos
os adolescentes que participaram tinham completado 17 anos: 9 adolescentes estavam com
idades entre 17 anos, oito e onze meses, e apenas 2 com 17 anos e um mês, ou seja, a maioria
dos adolescentes estavam prestes a ser desligados em função da maioridade ; embora a maioria
frequentasse a escola (81,8%), o rendimento era regular para 90,3%; a maioria não tinha contato
com os pais (54,5%); 8 dos 11 adolescentes estavam acolhidos a mais de um ano, e 4 deles
estavam a mais de 3 anos (36,3%), ou seja, com tempo prolongado de acolhimento institucional;
os principais motivos do acolhimento foram negligência (36,3%) e situação de rua (27,3%),
respectivamente.
73

6.2.2 Escalas: Expectativas Quanto ao Futuro e Multidimensional de Satisfação de Vida para


Adolescentes

Abaixo são descritos os resultados obtidos a partir da aplicação das escalas EEQFA e
EMSVA em três participantes que fizeram o processo completo de intervenção. Apesar de os
resultados não serem conclusivos, em função da amostra pequena, não havendo variação
significativa para EEQFA e EMSVA, o gráfico ajudará a ilustrar alguns pontos que mais
chamaram a atenção em relação aos três participantes que completaram os encontros.

Gráfico 01: Escore médio do EEQFA para os participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos encontros

36

35

34

33

32
antes
31
depois
30

29

28

27
2 3 4 todos

Gráfico 02: Escore médio das dimensões do EMSVA para os participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos
encontros
45
40
35
30
25
20
15 antes

10 depois
5
0
74

Tabela 02: Síntese dos escores médios dos domínios EEQFA e EMSVA para os participantes 02, 03 e 04,
antes e depois dos encontros

EEQF EMSVA
Família Self Escola Self Não Auto
Auto Amizade
Comparado Violência Eficácia
Eficiência
Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois
2 34 34 37 40 36 38 28 25 18 19 17 17 21 32 30 27
3 32 30 29 34 28 34 21 13 10 11 13 21 21 27 16 25
4 35 34 35 44 27 32 24 19 23 23 14 14 24 28 22 25
Média 33,7 32,7 33,7 39,3 30,3 34,7 24,3 19,0 17,0 17,7 14,7 17,3 22,0 29,0 22,7 25,7
±desvio ±1,5 ±2,3 ±4,2 ±5,0 ±4,9 ±3,0 ±3,5 ±6,0 ±6,5 ±6,1 ±2,1 ±6,1 ±1,7 ±2,6 ±7,0 ±1,1
padrão

Os 3 participantes que realizaram completamente o processo responderam à Escala de


Expectativas Quanto ao Futuro de Adolescentes (EEQFA) no início e ao final dos encontros
(Gráfico 01). Os participantes 02 e 04 eram do sexo masculino, e a participante 03 do sexo
feminino. Para o participante 02 não houve variação, para os participantes 03 e 04 houve
diminuição da expectativa quanto ao futuro. Na média dos escores para os 3 participantes antes
dos encontros foi de 33,7±1,5 e depois ficou em 32,7±2,3, ou seja, a pontuação foi menor ao
final dos encontros
Em relação à EMSVA (Gráfico 2), somente no domínio escola a média dos escores dos
3 participantes foi menor ao final dos encontros (19,0±6,0), enquanto no início foi de 24,3±3,5.
Nos outros domínios, para os três participantes a média total depois dos encontros foi maior
para todos os itens.
Comentário: em consideração aos três participantes que completaram as escalas
EEQFA e EMSVA, antes e depois dos encontros, a diminuição da média em relação à
expectativa quanto ao futuro pode estar ligada ao processo vivido por eles, na iminência do
desligamento, e aos efeitos emocionais decorrentes disso, como insegurança por não se achar
preparado para a vida adulta. Já em relação à satisfação de vida houve maior pontuação ao final
dos encontros nas dimensões família, self, self comparado, não violência, autoeficácia e
amizade, denotando um aumento da percepção que o adolescente tem sobre sua própria vida.

6.2.3 Variável Cor (quantidade e localização)


Em relação à variável Cor (quantidade e localização), foram considerados os resultados
de todos os 11 participantes, levando-se em conta que os participantes 01, 02, 03 e 04 que
completaram 8 encontros e que os participantes 05, 06, 07, 08, 09, 10 e 11 não completaram o
mínimo de 8 encontros. Nas tabelas abaixo estão descritas as porcentagens para cada variável.
75

Tabela 03: Quantidades e porcentagens da variável Cor (quantidade) comparando-se os encontros de 1 a 4


e 5 a 8 para os 4 participantes que completaram 8 encontros e primeira e segunda metades dos participantes
que não completaram os encontros
Completaram os 8 encontros Não completaram os 8 encontros
Variável Qtde(%) Qtde(%) Qtde(%) Qtde(%)
1-4 5-8 Primeira metade Segunda metade
Quantidades e porcentagens de
Cor 165(59%) 116(41%) 111(79%) 30(21%)
cores utilizadas

Em relação à variável Cor (quantidade), observa-se que tanto os participantes que


completaram os 8 encontros quanto os que não completaram utilizaram mais cores durante os
primeiros encontros, caracterizando-se por momentos de mais experimentação, para depois
ficarem mais seletivos.
Em relação à variável Cor (localização), não foram identificadas diferenças
significativas.

Comentário: a maior utilização de cores, nos primeiros encontros, é um indicativo da


novidade envolvida no manuseio de uma técnica de pintura sobre a superfície aquosa, por isso
haver mais experimentações. Ao longo dos encontros, tende a ser mais seletivo na escolha das
cores, mesmo porque vai adquirindo mais conhecimento, a partir dos possíveis efeitos
provocados pela ação da tinta sobre a superfície.

6.2.4 Variável Forma (tipo, movimento e localização)


Para a variável Forma (tipo, movimento e localização), também foram considerados os
resultados de todos os 11 participantes, incluindo-se os participantes 01, 02, 03 e 04, que
completaram 8 encontros. Somente os oito primeiros encontros foram computados, divididos
entre os primeiros e últimos encontros: 1-4 e 5-8, respectivamente. Para aqueles que
completaram os oito primeiros encontros, foram consideradas a primeira e a segunda metades
do total de encontros que realizaram, variando entre dois a seis. Nas tabelas abaixo, estão
descritas as porcentagens para cada variável.

Tabela 04: Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-se os encontros
de 1 a 4, e 5 a 8 para os 4 participantes que completaram 8 encontros
Completaram 8 encontros
Variável Tipo % %
p<0,05
1-4 5-8
Círculo 25(55,6) 15(23,4) <0,01
Forma Espiral 4(8,9) 20(31,3) 0,005
Vertical 6(13,3) 26(40,6) 0,002
76

Em relação à variável Forma (tipo), observou-se a maior utilização do círculo nos


primeiros encontros (55,6%;<0,05) em relação aos últimos encontros (23,4%;<0,05) para os
participantes que completaram os 8 encontros.
Em relação à variável Forma (tipo), observou-se uma maior utilização da espiral nos
últimos encontros (31,3%) em relação aos primeiros, dos que completaram os 8 encontros
(8,9%;p<0,05). O mesmo ocorreu para a vertical, com maior utilização nos últimos encontros
(40,6%), em relação aos primeiros (13,3%;<0,05).

Tabela 05: Porcentagens da variável Forma (localização), comparando-se os encontros de 1 a 4 e de 5 a 8


para os 4 participantes que completaram 8 encontros
Completaram 8 encontros
Variável Localização % %
p<0,05
1-4 5-8
C 31(21,8) 16(24,6) 0,65
IE 22(15,5) 11(16,9) 0,79
Forma SE 24(16,9) 14(21,5) 0,42
ID 32(22,5) 7(10,8) <0,04
SD 33(23,2) 17(26,2) 0,64

Em relação à variável Forma (localização), observou-se um decréscimo da utilização do


ID nos últimos encontros (10,8%;) em comparação aos primeiros dos participantes que
completaram os 8 encontros (22,5%;p<0,05).
Comentário: os dados chamam a atenção para os seguintes aspectos: o círculo como
forma relativa à proteção foi mais utilizado nos primeiros encontros pelos que completaram os
8 encontros, o que pode indicar que a emergência de conteú9dos dolorosos gerou formas
protetivas, de envolvimento mas também contenção; assim como a imersão no processo criativo
suscitou a maior utilização do ID nos primeiros encontros, que se refere ao terrestre, corpóreo,
a base natural protetora; b) a utilização da espiral que é indicativo de circundar, mover em torno
de algo importante, do centro, foi mais acionada nos últimos encontros, o que sugere uma
dinamização ocorrida; c) a maior utilização da vertical nos últimos encontros pode ter ocorrido
em função de contato com conteúdos internos, gerando uma disposição de introspecção.
Em relação à variável Forma (movimento), não houve diferenças significativas.
77

Tabela 06: Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-se a primeira
e segunda metade dos encontros para os participantes que não completaram 8 encontros
Não completaram 8 encontros
Variável Tipo % %
p<0,05
Primeira metade Segunda metade
Círculo 19(40,4) 19(35,8) 0,63
Forma Espiral 9(19,1) 24(45,3) <0,005
Vertical 2(4,3) 3(5,7) 0,74

Em relação à variável Forma (tipo), observou-se uma maior utilização da espiral nos
últimos encontros (45,3%) em relação aos primeiros dos que não completaram os 8 encontros
(19,1%;p<0,05).
Comentário: merece ser apontado que a espiral foi mais acionada nos últimos encontros
tanto pelos que completaram os encontros quanto pelos que não completaram, o que aponta
para a dinamização que a técnica possa ter gerado, especialmente porque essa forma é referida
como o ato de circular em torno de si mesmo, dinamizando todos os aspectos da personalidade.
No entanto, diferentemente dos que completaram os oito encontros, os que não completaram
não tiveram as formas círculo e vertical como significativas. Infere-se que, apesar da
dinamização despertada, se faz necessária a continuidade no processo de intervenção para que
possam ser observadas outras variantes, como o foi para aqueles que completaram pelo menos
oito encontros.
Em relação à variável Forma (movimento e localização), não houve diferenças
significativas.

6.3 Estudo de casos: Naruto, Annabeth e Romeu


Para o estudo de casos, foram utilizados os dados qualitativos referentes aos elementos
identificados pelos participantes, nas pinturas, as associações e amplificações, as entrevistas
bem como dados quantitativos oriundos das variáveis Cor (quantidade), Forma (tipo,
movimento e localização) e as escalas. Para tanto, usaram-se os softwares do Excel, IBM SPSS
Statistics 21 e Iramuteq.
O estudo de caso cumpre, no contexto da Psicologia Analítica, uma compreensão
psicodinâmica aliada à tarefa de acompanhar o processamento simbólico com vistas a uma
compreensão dos símbolos que emergem, dos caminhos que são trilhados e para onde apontam.
Os casos a serem apresentados foram escolhidos por serem os três adolescentes que
cumpriram todas as etapas do procedimento de pesquisa, o que vem a oferecer um panorama
completo do que foi proposto como estratégia de intervenção. Eles apresentam histórias de vida
78

intensas, marcadas por episódios de privações, e ilustram o período de transição da adolescência


para a vida adulta. Ademais, são sobreviventes!
Cada apresentação de caso segue um percurso que se inicia com informações sobre o
histórico pessoal de cada adolescente, seguidas da descrição do estilo de se expressar pela
pintura, dos elementos que se identificam em suas pinturas e suas respectivas localizações, das
entrevistas realizadas e das escalas aplicadas, para culminar na síntese do caso.

6.3.1 Os adolescentes e seus pseudônimos


A escolha de pseudônimos para os três adolescentes a partir de personagens ficcionais
levou em consideração algum aspecto em comum que os conectasse, seja porque foi citado pelo
participante, como no caso de Naruto, ou por analogia, como no de Annabeth e Romeu.
Naruto, na ficção, é um jovem ninja e principal personagem de uma série de mangá que
carrega dentro de si um demônio, por isso faz de tudo para ser reconhecido como grande
guerreiro e, assim, ser aceito por todos. Annabeth é uma adolescente com habilidades na luta e
deseja ser arquiteta, com o objetivo de reformar o mundo. É a personagem de ficção, filha de
Atena com o mortal Frederick Chase. Figura clássica da obra de Shakespeare, o jovem Romeu
vive o embate entre o amor e a morte, a circunstância e a infinitude da vida.
Dos três participantes, Naruto é quem identifica mais elementos em suas pinturas, num
total de 109, seguido por Romeu, com 90 elementos, e Annabeth com 10.

Quadro 07: Características sociodemográficas e do acolhimento dos três participantes que completaram o
procedimento de intervenção

Características sociodemográficas e PARTITICPANTE 02 PARTITICPANTE 03 PARTITICPANTE 04


do acolhimento institucional Naruto Annabeth Romeu
Idade no momento da adesão aos
17 anos e 5 meses 17 anos e 10 meses 17 anos e 1 mês
encontros
Sexo Masculino Feminino Masculino
Frequência à escola Sim, depois abandonou Sim Sim
Série escolar 2º Ensino Médio 1º Ensino Médio 3º Ensino Médio
Rendimento escolar Regular Regular Bom
Contato com os pais Não Não, pais falecidos Sim
Histórico de fuga da instituição Sim Não Não
Tempo total de institucionalização 5 anos 2 anos 6 meses
Negligência, situação Risco de morte na região
Motivo do acolhimento Negligência
de rua onde residia

Da ficha de Características Sociodemográficas e do Acolhimento Institucional (Quadro


07), destacam-se alguns dados: a) Naruto e Annabeth estavam próximos do desligamento
institucional em função da maioridade, e Romeu seria desligado em breve para voltar ao
79

convívio familiar; b) os três adolescentes estavam atrasados no ano escolar, e somente Romeu
apresentava bom rendimento escolar, enquanto Naruto abandonou os estudos próximo ao
desligamento; c) somente Romeu tinha contato frequente com os pais; d) somente Naruto tinha
histórico de fuga da instituição; e) Naruto e Annabeth estavam acolhidos por tempo prolongado,
acima do que está previsto no ECA; f) a negligência foi o principal motivo do acolhimento de
Naruto e Annabeth, ao passo que para Romeu foi o fato de se sentir ameaçado de morte na
região onde residia, por ter cometido ato de violência contra outra pessoa.
Os adolescentes demonstram três perfis bem diferentes, no entanto Naruto e Annabeth
apresentam mais prejuízos no desenvolvimento. Entre seus fatores estão a desestruturação
familiar e o ambiente social a que pertenciam, o baixo rendimento escolar, o tempo prolongado
de acolhimento, a impossibilidade de retorno à família e a baixa expectativa de
empregabilidade. Esses perfis confirmam alguns achados na literatura: o papel da escolarização
e o futuro (Ramos, Seidl-de-Moura e Pessôa, 2013; a situação familiar e o futuro (Zappe et al,
2013; Rosa et al, 2012); os prejuízos pelo tempo prolongado de acolhimento (Ferreira, Litting
e Vescovi, 2014; Siqueira e Dell’Algio, 2010); particularmente, a importância do ambiente
familiar no desenvolvimento infantil (Jung [1904] 2013b) e das primeiras experiências
relacionais (Sidoli, 2014; Bovensiepen, 2014, 2010; Jung [1941] 2013a; Knox, 2011, 2009;
Ryotovaara, 2010; Wilkinson, 2006).

6.3.2 Naruto
Naruto, o adolescente que iniciou os encontros com 17 anos e 5 meses, foi assim
chamado em função da recorrência de personagens e guerreiros que identifica em suas pinturas.
Com histórico de negligência, especialmente nas primeiras etapas do desenvolvimento, longo
tempo de acolhimento e várias evasões, Naruto é um adolescente originário de um estado do
Nordeste, vindo para São Paulo ainda criança e acompanhado de uma família adotiva. Em uma
cena de infância relembrada por Naruto, o pai e o padrasto brigam por estar alcoolizados.
Depois o jovem acrescenta: “na época gostava do meu pai e agora não mais. Foi preso e me
deixou na rua”. Em relação à mãe, lembra-se de uma cena em que ela estava doente, e nesse dia
chovia muito.
Seu comportamento arredio, baixa tolerância a frustrações, não adaptação às regras e
limites e dificuldades de adaptação nas escolas contribuíram para sua fuga às ruas. Já
adolescente, passou a viver em malocas no centro da cidade de São Paulo, onde se envolveu
com drogas, até o momento em que foi encaminhado para acolhimento. O uso de drogas se
manteve durante o acolhimento bem como o consumo elevado de cigarro.
80

No acolhimento, apresentava dificuldades de aceitação às regras, especialmente da


equipe feminina, e, por vezes, demonstrava atitude de machismo. O histórico de privações a
que foi submetido, a influência negativa de um ambiente familiar desestruturado e os desafios
da convivência em situação de rua desencadearam em Naruto uma dificuldade de formar e/ou
manter vínculos afetivos. Algumas vezes, estes ocorriam de forma intensa, especialmente com
pessoas do sexo masculino, mas se desfaziam abruptamente. Sempre que se sentia suprimido
de liberdade ou quando lhe imputavam regras, tinha como rota de fuga a evasão, passando assim
por vários acolhimentos, o que dificultou qualquer possibilidade de continuidade de um
processo de cuidado e de vinculação. Acrescentam-se a esse quadro as tentativas frustradas de
profissionalização e a dificuldade de permanência no emprego, nas oportunidades de trabalho
que lhe foram disponibilizadas.
Em um dos encontros para demonstração da técnica expressiva, aderiu ao processo e
ficou encantado com a variedade de elementos que conseguiu identificar em suas pinturas.
Depois do segundo encontro, evadiu e logo foi reintegrado em outra Casa, no mesmo bairro,
onde foi possível retomar as atividades. O processo de intervenção, que se realizou num total
de nove encontros, se estendeu ao longo de seis meses. Em um dos primeiros encontros, pareceu
tão empolgado com seu processo e com os elementos que identificou, que, ao final da atividade,
abraçou o pesquisador como forma de agradecimento; o abraço se definiu, assim, como o tipo
de cumprimento, em todos os encontros que se seguiram.

O estilo
Naruto é o adolescente que mais se utiliza de cores, indicando menos discriminação para
a experimentação da técnica. Suas pinturas apresentam muitas formas, e ele também é o que
identifica mais elementos (Fotografia 01: Cs = terceira configuração da superfície e Fotografia
02: Is = nona e última configuração da superfície). No entanto, é o que menos desenvolve um
processo reflexivo diante dos símbolos que emergem e, apesar de identificar grande quantidade
de elementos, não reflete sobre as associações feitas, apenas descreve lembranças e as coisas
de que gosta. Em função da grande quantidade de tinta que utiliza, o que pode ser considerado
tanto sinal de impulsividade como de recursos potencias, as configurações do fundo apresentam
grande densidade pelo acúmulo de tintas (Fotografia 03: Cf = terceira configuração do fundo e
Fotografia 04: If = nona e última configuração do fundo).
81

Fotografia 01 Fotografia 02
Cs = primeira configuração da superfície Is = nona e última configuração da superfície

Sempre solicitava que fosse retirada toda a água da bacia, no momento em que a água
da primeira configuração era dispensada para dar lugar à pintura sobre o gesso, porque lhe
causava incômodo. Essa sensação se justifica a partir de uma associação que fez no primeiro
encontro: quando criança, sua mãe ficou doente, e seu pai a levou para o hospital, num dia em
que chovia muito e havia muitos relâmpagos. Outras associações com o elemento água: água
parada, esgoto e outra cena de chuva forte, em sua cidade natal apontam para o medo do contato
com o inconsciente que evoca insegurança e transitoriedade, provavelmente traumática.

Fotografia 03 Fotografia 04
Cf = terceira configuração da superfície If = nona e última configuração da superfície

As variáveis Cor (quantidade e localização) e Forma (tipo, movimento e localização)


A partir das variáveis Cor e Forma, procurou-se observar os acionamentos nos
quadrantes, com ênfase nos resultados estatisticamente significativos.
82

Em relação à variável Cor (quantidade), enquadra-se na utilização de mais cores nos


primeiros encontros, o que indica mais experimentação e seletividade, nos últimos encontros
em relação aos primeiros (de 56,9% para 43,1%). Não há diferença em relação à variável Cor
(localização).

Tabela 07: Tabela referente à variável Forma em relação aos tipos, movimentos e localizações mais
recorrentes do participante 02
PARTICIPANTE 02
Naruto
Variável
1-4 5-8 p<0,05
n(%) n(%)
Invólucro 0(0) 2(6,7) 0,38
Espiral 2(18,2) 15(50,0) 0,06
Tipo
Vertical 6(54,5) 12(40,0) 0,40
Círculo 3(27,3) 3(10,0) 0,16
Sinistrogiro 0(0) 2(7,4) 0,49
Dextrogiro 0(0) 13(48,1) 0,02
Movimento
Forma Baixo-cima 5(83,3) 12(44,4) 0,08
Cima-baixo 1(16,7) 0(0) 0,03
C 2(16,7) 5(16,7) 1,00
IE 2(16,7) 11(36,7) 0,20
Localização SE 4(33,3) 0(0) 0,0008
ID 4(33,3) 11(36,7) 0,83
SD 0(0) 3(27,3) 0,25

Em relação à variável Forma (tipo, movimento e localização) (Tabela 07), observa-se


maior movimento de cima para baixo (16,7% para 0,0%) e localização no SE (superior
esquerda, 33,3% para 0,0%) nos primeiros encontros, em relação aos últimos. Também se
observa uma maior utilização do movimento dextrogiro (0,0% para 48,1%) nos últimos
encontros, em relação aos primeiros.
Considerando-se as variáveis no processo de Naruto, observam-se os seguintes achados:
houve diminuição do movimento cima-baixo, referido como descida, contato com o
inconsciente e da localização superior esquerda, referente ao aéreo, intelectual. No entanto,
houve aumento do movimento dextrogiro em direção à direita, o que indica ter apresentado, nos
últimos encontros, movimento para a claridade, consciência e diminuição da ativação
intelectual (ou fantasia), além de diminuição de contato com o inconsciente.

Os elementos identificados, suas categorias, associações e amplificações


Considerando o total de 109 elementos identificados nas pinturas de Naruto, 85 foram
identificados nas configurações da superfície e 24 nas do fundo, assim como foram
identificados mais elementos nos primeiros encontros em relação aos últimos.
83

Quadro 08: Elementos identificados nas configurações pelo participante 02, considerando-se a quantidade
dos elementos mais citados e respectivas associações bem como as categorias que emergiram do total de
elementos identificados

Elementos
PARTITICPANTE 02
identificados nas
Naruto
configurações

Elemento Qtde. Associação


Dinossauro 5 rapto da mãe e do filho dinossauros: a mãe foge e depois resgata o filho
Pessoa 4 pessoa com olho roxo, cortada ao meio, fumando e com vendas nos olhos
Dragão 4 dragão Shen Long e Dragon Ball Z
Mais citados
Leão 4 leão feroz, rugindo, personagem Scar do filme Rei Leão: o rejeitado
Fundo do mar 4 lembrança de infância: mergulhou no rio e viu o fundo. “Não tinha medo”
Ilha 4 vontade de estar na ilha e mergulhar
Mundo 3 mundo das trevas, destruído e mundo doce, colorido
Vulcão 3 fogo, destruição do mundo
Aquáticos baleia, carpa, água-viva, cavalo-marinho
Animais Aéreos águia, pássaro, dragão
leão, dinossauro, ratinho, pato, tartaruga, fera, caranguejo, urso, cachorro,
Terrestres
Total de coelho, gato, alce, pinguim, macaco, cobra
elementos ilha, raios, relâmpago, rio, fundo do mar, neve, pôr-do-sol, vulcão, flor de lótus, vulcão,
identificados Natureza
árvore, fogo, mundo
separados por Ser humano palhaço, guerreiro, cara fortão, mulher, cabeça, pessoa, velho
categorias King-kong, Donkey-kong, Moana, Gumble, Naruto, Guku, castelo do Drácula, Pacman,
Personagens
Madagascar, Zeus, Scar, monstro
faca, esgoto, jato, ideograma, jiu-jitsu, guitarra, cinzas, fumo, seta, robô, lâmpada-
Outros
mágica, árvore de natal, trilhas, carro, naipe, piscina, trevas

Dos elementos identificados por Naruto destacam-se a predominância de animais


terrestres, elementos da natureza e personagens (Quadro 08). Os animais cumprem um papel
especial no processo do adolescente, predominantemente os terrestres. Estão relacionados aos
animais que aparecem em seus desenhos preferidos e também porque os considera carinhosos
e obedientes: o coelho é fofo, e o cachorro: “você chama e o cachorro vem”. O leão é associado
a um animal feroz que ainda “está dentro do zoológico”, cuja amplificação é referida à principal
personagem da animação Madagascar, o leão Alex. Scar, do Rei Leão, personifica aquele que
é rejeitado e, por isso, se torna vingativo, ao passo que o dragão do Dragon Ball Z tem o poder
de realizar desejos. O dinossauro, um dos mais citados, é referido por Naruto a uma história em
que a mãe e o filho dinossauros são raptados: a mãe consegue escapar e depois volta para
resgatar o filho. Aqui o desejo de proteção aparece no contato simbólico primitivo com o
materno, um desejo inconsciente de ser salvo pela mãe, mas também pode se referir à mãe que
o abandonou, justificando assim a raiva que sente em relação às mulheres. Interessante notar
que a mãe foi associada ao elemento água, logo no primeiro encontro, acrescendo-se o fato de
que sempre pedia para retirar o excesso de água da bacia, sinalizando o medo de reconhecer
emoções em ações dolorosas.
84

Em suas pinturas, os animais, as associações e amplificações feitas demonstram uma


oscilação entre a necessidade de cuidado e carinho (coelho, cachorro), em função de se sentir
rejeitado pela família, em contraposição à identificação com um leão feroz que gosta de ser
notado (o leão Alex é o animal mais admirado pelo público que vai ao zoológico): alguém que
precisa de carinho e posa de leão para ser respeitado. Os animais recebem as projeções
relacionadas a seu histórico de vida, como personagens de uma animação que lhe são
significativos: o “rapto” de seu núcleo familiar, a não adequação às novas relações adotivas e
suas regras que contribuíram para a fuga às ruas em busca de liberdade e “notoriedade”, e que
acabaram por dificultar a construção de vínculos afetivos, geralmente rompidos drasticamente,
em função das evasões institucionais. Por não ter a experiência de se sentir acolhido, as regras
são vistas como limites à expressão e realização de si-mesmo, dada a experiência negativa
relacionada à figura paterna, que representa a lei.
Quando se refere aos elementos da natureza, Naruto contrapõe mundo doce e colorido
ao das trevas. O elemento vulcão (fogo) é associado a destruição e amplificado com o filme
2012, que narra a história de uma cidade destruída por uma grande explosão e depois engolida
pelo mar. De outro lado, destaca o elemento água e a vontade de estar em uma ilha e mergulhar,
ver o fundo do mar, denotando um desejo de imergir (inconsciente), de modo apaziguador.
Mas são os personagens da ficção e os poderes que lhe são característicos que mais
refletem o perfil de Naruto, um adolescente inquieto, imaginativo e disposto às aventuras:
“sempre fui danado, não tinha medo de nada, até hoje”. O personagem Naruto é a peça chave
de seu histórico e condiz com a busca incessante de se identificar com alguém que foi marcado
desde pequeno e que necessita do reconhecimento de todos, cumprindo assim uma jornada
heroica, assim como Moana, a jovem que desbravou o Oceano Pacífico. Nessa temática de
aventura e de reconhecimento, conecta-se com o personagem Gumble, aquele que se envolve
em situações constrangedoras e engraçadas, fazendo de tudo para chamar a atenção, assim como
o exibicionista Alex, o leão de Madagascar. Os personagens guerreiros representam para
Naruto a dedicação da vida à luta, a correr atrás do que se quer, a conquistas. Drácula é aquele
que “tomou o sangue do vampiro e ficou com a força de mil homens”. Em contraposição aos
personagens da ficção, a identificação de pessoas está atrelada a associações como pessoa com
olho roxo, cortada ao meio, fumando e com vendas nos olhos; pode-se interpretar como um
mecanismo que Naruto desenvolveu para se proteger das feridas geradas por relações humanas
marcadas por impedimentos e violência; daí a compensação através das figuras heroicas
ficcionais. A identificação de pessoas machucadas mostra que seu eu é marcado por destruição.
85

Considerados os elementos identificados por Naruto em relação às localizações (C, IE,


SE, ID e SD), destacam-se os seguintes: embora o C seja a localização menos acionada, é aí
que o personagem Naruto aparece, o que reforça a identificação especial com aquele que é
marcado desde pequeno e, por isso, traça sua jornada em busca de aceitação; a maioria dos
outros personagens identificados estão localizados à direita (ID + SD), ou seja, mais próximos
da consciência, do racional e de um futuro próximo. Os poderes que lhe são característicos
(Dragon Ball Z realiza desejos, Moana se aventura pelo mar) parecem exercer função de
projeção para a direita, em direção ao futuro, o que é reforçado pelo movimento dextrogiro,
predominante nos últimos encontros, e diminuição do SE, relativo ao aéreo, intelectual; os
elementos pessoa e vulcão, associados a cenas de violência e de destruição, aparecem mais no
IE, localização mais próxima ao inconsciente mais primitivo e originário, o que denota
elementos fragmentários e destrutivos, inconscientes, e o quadro de impulsividade
característico de Naruto; os elementos dinossauro, leão e mundo aparecem mais no SD, refletem
a percepção de força para enfrentar o mundo, o espírito aventureiro destacado por Naruto, e
direcionados para a direita, em direção ao mundo e exemplificado pela fuga às ruas e evasões.

As entrevistas
Quadro 09: Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com o participante 02,
considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista final (E2 final)

PARTITICPANTE 02
Entrevistas
Naruto
“Trabalhar”
“Quero ser livre” [sorri]
P1 “Arrumar minha casa”
“Aqui me sinto preso”
“Fazer minha família”
“Trabalho honesto “Ter trabalho, família, casa”
E1* E1
P2 “Meu trabalho “Quero ser MC [Mestre de Cerimônia,
Inicial Final
“Minha casa Rapper]”
“Quase não, um pouco”
P3 “Terminando os estudos, aos poucos” “Sim”
“Fazer um curso”
“Para mim foi uma coisa tipo que, uma coisa que aprendi. Estou desenvolvendo uma coisa que eu
P4
E2** não sabia”
Final P5 “As conversas que a gente conversou, sobre tudo, sobre os desenhos”
P6 “Só no trabalho mesmo, e ser uma pessoa honesta”
* E1 (inicial e final)
P1. Como você se sente em relação à vida fora da instituição?
P2. Quais são suas expectativas de vida depois que sair da instituição?
P3. Como se sente preparado para isso?
** E2 (final)
P4. Me fale como foi para você ter participado dos encontros experimentando a técnica de pintura.
P5. Levando em consideração esse período que passamos juntos, você gostaria de contar algo que lhe ocorreu? Pensou em possibilidades de
ações após sua saída?
P6. Como você percebe este momento, quando está prestes a sair da instituição?
86

Nas entrevistas realizadas no início e no final (Quadro 09), com foco nas expectativas
em relação ao futuro, Naruto identifica o trabalho e a família como os elementos mais
importantes. Nota-se que, na média, apresentou aumento da pontuação nas dimensões para a
satisfação de vida (família, self, self comparado, não-violência e autoeficácia), com exceção da
escola (baixo rendimento e quadro de evasões) e amizade (dificuldade de vinculação). Em
relação à pergunta sobre sentir-se preparado para isso, diz não se sentir preparado, mas ao final
responde que sim, o que pode ser interpretado como uma necessidade de afirmação sobre como
percebe o momento de desligamento institucional, mas também a expectativa de liberdade e de
ímpeto para conquistá-la no mundo.
Em consideração à entrevista final sobre como sentiu e o que pensou durante os
encontros, refere ter havido um aprendizado a partir das conversas sobre alguns temas, o que
indica reconhecimento de apoio recebido. No entanto, como apontado anteriormente, apesar da
grande quantidade de elementos identificados, nota-se pouco exercício reflexivo sobre sua real
situação, que denote algum tipo de planejamento para o futuro. Em relação à pergunta sobre
como percebe o momento do desligamento, destaca o trabalho como prioritário para sua vida e
ser uma pessoa honesta.

Síntese do caso
Depreende-se do processo de Naruto que seu aspecto extrovertido faz com que ele
busque soluções no mundo objetivo e tenha dificuldade de refletir, embora tenha expressado
gosto pelo trabalho proposto pela técnica, além de ter destacado um aprendizado e uma
mudança positiva na percepção de sentir-se preparado para a vida após saída da instituição. Ele
não pode confiar, talvez devido a trauma vivido, mas parece ter confiado no pesquisador. É
importante considerar que o histórico de evasões, a dificuldade de aceitação de regras
(especialmente as advindas de mulheres), a dificuldade de vinculação afetiva e o despreparo
profissional são dificultadores no processo de transição para a vida fora da instituição de
acolhimento. Mesmo assim, o desejo de ser livre o motiva a fazer essa transição, aplicando uma
energia para tanto (dextrogiro), nos últimos encontros; o longo tempo de permanência em
acolhimento, devido à impossibilidade de retorno à família, é um fator relevante em seu
processo; a maior quantidade de animais terrestres identificados nas pinturas parece denotar
uma necessidade de se colocar na realidade concreta ou de receber força dos animais, uma vez
que apresenta grande senso imaginativo e faz muitas referências a figuras heroicas, fantasiosas;
em consideração aos dados obtidos nas entrevistas, o sentido prospectivo denotado em seu
processo se vincula, em especial, ao desejo de ser livre e de conseguir um trabalho. Importante
87

destacar que, no início dos encontros, se sentia pouco ou nada preparado para o momento do
desligamento e que, ao final deles, acreditava estar. No entanto, em relação à percepção quanto
ao futuro na escala EEQFA, manteve a mesma pontuação, o que sugere que o sentido
prospectivo pode estar mais relacionado ao desejo de conseguir a liberdade do que às
expectativas positivas em relação ao futuro. Já, em relação à satisfação de vida, houve
pontuação mais alta após as intervenções em algumas dimensões, podendo ser considerados
indicadores que o impulsionam para o mundo, a partir dos benefícios obtidos durante o processo
de intervenção: em relação à família, definida como ambiente familiar saudável e de
relacionamento satisfatório, Naruto deseja ter família e casa; para o self, relacionado a
características positivas, autoestima, capacidade de se relacionar e de se divertir, diz ter
aprendido algo; o self comparado, como aquela capacidade de avaliações comparativas entre o
eu e os outros, pode estar relacionado à vontade de ser aceito pelas pessoas; a não-violência,
como a capacidade de não se envolver em comportamentos agressivos, pode-se atrelar à auto-
referência como uma pessoa honesta; a autoeficácia, como a capacidade de realizar metas, se
refere ao desejo de ser MC. Nas dimensões escola (refere-se à importância da escola, do
ambiente familiar) e amizade (relação com os pares e níveis de satisfação com esses), há
diminuição de pontuação. O primeiro indicador se justifica pelo abandono dos estudos e por
priorizar o trabalho após o desligamento, já o segundo reflete tanto o momento do desligamento
e de rompimento das relações de amizade quanto o fato de ter dificuldades de construir e/ou
manter laços afetivos.
A identificação de Naruto com os personagens ficcionais e seus poderes parece operar
como uma defesa contra a dor e os traumas que sofreu. Alguns elementos por ele identificados
retratam esse quadro de destruição: mundo das trevas, fogo, destruição, vulcão, raios, pessoa
cortada, esgoto. Embora tenha tecido ações e ativado desejos de realização no mundo, os meios
concretos para poder colocar em prática um projeto de vida podem ser dificultados pelo quadro
de impulsividade e de transitoriedade que apresenta. De outro lado, elementos positivos, como
a vontade de estar em uma ilha e de mergulhar para ver o fundo do mar, podem indicar
mecanismos resilientes que venham a ser acionados. Há de se pensar que a prevalência de
experiências traumáticas tenha contribuído como um dificultador do senso do agenciamento do
eu e do desenvolvimento da função reflexiva, e a fixação no mundo ficcional funcionasse
compensatoriamente para suprir a impossibilidade das relações humanas, que para ele se
apresentam como experiências dolorosas.
Segundo Bovensiepen (2014), fantasias coletivas podem suprir a insuficiência pessoal.
O trauma de Naruto vai continuar merecedor de atenção, e, de algum modo, o processo o
88

mobilizou, fazendo com que o inconsciente fosse mais ativdado nos primeiros encontros (cima-
baixo e SE: diminuição do aéreo, intelectual), ao revocar simbólica e plasticamente memórias
dolorosas. Consegue, apesar disso, como visto nos últimos encontros, movimentar-se para ação
no mundo, em seu processo criativo, para a direita (dextrogiro), característica de seu movimento
como extrovertido. Naruto apreciou os encontros, teve espaço para manifestar sua imaginação
livremente, ao se sentir acolhido, e esboçou alguns planos futuros. No entanto, seu quadro não
favorece a estruturação da personalidade, atirando-se assim para o mundo como o herói que se
lança ao perigo, sem garantias de sobrevivência. Necessitaria de um trabalho contínuo de
suporte para poder desenvolver meios de agenciamento do eu.

6.3.3 Annabeth
A adolescente iniciou as intervenções quando estava com 17 anos e 10 meses de idade
e estava em acolhimento havia mais de dois anos, em função de negligência e situação de rua.
Trata-se de uma adolescente que, apesar do histórico de vida marcado por perdas, violências e
privações, demonstrou ao longo do processo crescente consciência de sua situação,
apresentando reflexões de cunho social e da própria dinâmica do sistema de acolhimento.
Anseia ter controle sobre sua vida, e um dos objetivos do futuro é construir uma creche, parte
de seu projeto como Assistente Social, a profissão que pretende exercer.
Aos três anos de idade, Annabeth perdeu a mãe, supostamente por violência doméstica.
Permaneceu com o pai e outros irmãos, alguns não legítimos. Diante do quadro de violência a
que esses irmãos eram submetidos, a avó paterna solicitou cuidar de Annabeth, mas depois de
alguns dias a mandou de volta para casa, e, nesse ínterim, o pai suicidou. Ela permaneceu com
a avó até os oito anos de idade, momento em que foi levada a morar com outros familiares.
Depois de algum tempo, começou a apresentar comportamento opositor e rebelde e, aos
quatorze anos, foi enviada para ser cuidada por um irmão mais velho, mesmo que por um breve
período. Tempos depois, já no acolhimento, revelou que era vítima de violência sexual durante
o período em que esteve sob os cuidados da família que a acolheu, o que pode ter determinado
seu quadro de agressividade, não adequação às regras e também a desconfiança que sentia em
relação às pessoas. Ao deixar a casa do irmão, envolveu-se em um relacionamento marcado por
violência sexual e doméstica, tendo engravidado aos dezesseis anos, sendo que, no oitavo mês
de gestação, foi encaminhada para o acolhimento institucional. O uso da maconha e a
automutilação foram decorrentes dos maus tratos que sofria e do processo de vitimização, o que
agravou o quadro de fragilização do eu. No acolhimento, desenvolveu uma trajetória importante
para a ressignificação de sua identidade, mas, com a proximidade da maioridade, fato somado
89

ao agravante judicial que decidiria se sua filha de dois anos seria enviada para adoção ou ficaria
sob a guarda do irmão, e ao relacionamento homoafetivo conturbado com uma adolescente da
mesma Casa, deu-se um estado de desorientação, nesse momento emblemático do desligamento
institucional.
Annabeth se mostrou empolgada a participar dos encontros, mas iniciou as atividades
somente nos dois meses prévios ao desligamento, em função das atividades de preparação
profissional que estava desenvolvendo.

O estilo
Intensa, Annabeth declarou que “misturar a tinta relaxa, desestressa, para de pensar uma
coisa só”. Realizou suas pinturas com poucas cores e era rápida em sua produção. Apesar de ter
identificado poucos elementos em suas pinturas, estes suscitaram reflexões sobre os mais
variados temas, evidenciando um tom acentuado de crítica moral sobre algumas experiências,
como ter se arrependido de usar drogas, e também em falas relativas ao convívio com os
profissionais do acolhimento.
Tinha preferência por cores escuras. Já no primeiro encontro, assoprou a água,
espontaneamente e demoradamente, fazendo com que as poucas formas que tinha realizado se
misturassem. Talvez isso justifique, em parte, os poucos elementos que identificou em sua
produção (Fotografia 05: As = primeira configuração da superfície e Fotografia 06: Ds = quarta
configuração da superfície).

Fotografia 05 Fotografia 06
As = primeira configuração da superfície Ds = quarta configuração da superfície

No primeiro encontro e diante da placa de gesso manchada de tinta, depois que água foi
retirada, de início quis colocar um dedo e percebeu que o gesso estava umedecido. Isso a
motivou a colocar os cinco dedos e depois, com a palma da mão, foi mexendo até formar uma
grande massa. Enquanto mexia o gesso, cantou trechos de uma música Gospel: “Ressuscita-
90

me”, ação que se repetiu nos primeiros encontros. Exemplos desses efeitos estão nas
configurações fundo Af (Fotografia 07: antes de misturar o gesso fez quatro furos, um em cada
canto do gesso), Df (Fotografia 08: neste fez cinco furos, um em cada um dos quatro cantos e
um no centro). No quarto encontro, ocasião em que produziu a pintura apresentada na Fotografia
08, referiu que gostava de “novas misturas”, pois representavam “novidade, expressão”, e que
o assoprar estava relacionado ao “poder de escolha” e suas “consequências”. Diante da
configuração do fundo, sempre pedia para retirar qualquer resquício de água.

Fotografia 07 Fotografia 08
Af = primeira configuração do fundo Df = quarta configuração do fundo

As variáveis Cor (quantidade e localização) e Forma (tipo, movimento e localização)

Em relação à variável Cor (quantidade), difere dos outros ao se utilizar mais cores nos
primeiros encontros, pois o fez nos últimos (de 41,9% para 58,1%), o que pode estar associado
à flexibilização demonstrada diante do processo nos últimos encontros, em vista das
experiências traumáticas que viveu. Não há diferença em relação à variável Cor (localização).

Tabela 08: Tabela referente à variável Forma em relação aos tipos, movimentos e localizações mais
recorrentes da participante 03
PARTICIPANTE 03
Annabeth
Variável
1-4 5-8 p<0,05
n(%) n(%)
Espiral 2(25,0) 3(13,0) 0,42
Tipo Vertical 0(0) 13(56,5) 0,005
Círculo 6(75,0) 7(30,4) 0,02
Sinistrogiro 2(25,0) 7(28,0) 0,86
Dextrogiro 6(75,0) 3(12,0) 0,0004
Movimento
Baixo-cima 0(0) 11(44,0) 0,02
Cima-baixo 0(0) 4(16,0) 0,22
C 0(0) 1(4,0) 0,56
IE 1(12,5) 17(68,0) 0,006
Localização SE 0(0) 2(8,0) 0,40
ID 7(87,5) 5(20,0) 0,0005
SD 0(0) 0(0) --
91

Em relação à variável Forma (tipo, movimento e localização) (Tabela 08), nos primeiros
encontros em relação aos últimos, observa-se maior utilização do círculo (75,0% para 30,4%),
do movimento dextrogiro (75,0% para 12,0%) e localização no ID (87,5% para 20,0%).
Também se observa uma maior utilização da vertical (0,0% para 56,5%), com movimento de
baixo para cima (0,0% para 44,0%) e localização no IE (12,5% para 68,0) nos últimos encontros
em relação aos primeiros.
Considerando-se as variáveis no processo de Annabeth, foram observadas: houve
diminuição do círculo, indicativo de proteção e envolvimento, do movimento dextrogiro (para
a direita em direção à consciência) e da localização inferior, relativo ao terrestre. No entanto,
houve aumento da vertical, indicativo de introspecção, contato com o interior, do movimento
de baixo para cima, indicativo de crescimento, subida, e da localização esquerda no quadrante
relativo à maior ativação do inconsciente. As características do processo criativo de Annabeth
sugerem que houve ativação de introspecção e de conscientização (vertical, baixo-cima) e
parece que de autorreflexão, pois a consciência dirigida ao mundo (dextrogiro) diminuiu.
Talvez por isso, apesar de planos que preza, se sinta insegura, principalmente porque o mundo
a tenha machucado muito. A instintividade física, corpórea e material da localização inferior
direita diminuiu, ao passo que aumentou o inferior esquerdo, inconsciente primordial e
primitivo do corpo e das experiências primárias. O desligamento é desejado e temido, enfrentar
o mundo é difícil, e, portanto, compreensível que tenha havido diminuição na escala de
expectativas quanto ao futuro.

Os elementos identificados, suas categorias, associações e amplificações

Considerando o total de 10 elementos nas pinturas de Annabeth, 7 foram identificados


nas configurações da superfície e 3 nas do fundo, assim como foram identificados mais
elementos nos primeiros encontros em relação aos últimos.
92

Quadro 10: Elementos identificados nas configurações pela participante 03, considerando-se a quantidade
dos elementos mais citados e respectivas associações, bem como as categorias que emergiram do total de
elementos identificados

Elementos
PARTITICPANTE 03
identificados nas
configurações Annabeth
Qtde
Elemento Associação
.
Universo 2 os espanhóis vieram, dinheiro, antes as pessoas eram mais felizes, tudo
era pago, tudo tinha que ter valor, parar de ter medo

Bandeira da Jamaica 1 droga tira da realidade, quando eu fumava droga, fugir dos pais, queria
matar meu pai, não acredito em Deus, era revoltada, não tinha motivos,
não valeu a pena, só me traz arrependimento, agora que aprendi a me
Mais citados amar

Céu 1 noite, preto combina com qualquer coisa, destaca, gosto de cores escuras

fundo do mar, tudo que envolve a natureza eu acho bonito, a força


Coral 1 superior é nós mesmos, é só chorar que tudo passa, confiar em si mesmo,
não precisa de uma força maior, as pessoas vão à igreja como refúgio

Esgoto 1 sujeira, não gosto de coisa muito clara, traumas da vida


Total de Animais Aquáticos Coral
elementos
Natureza arco-íris, bandeira da Jamaica, universo, planetário, céu
identificados
separados por Ser humano Sangue
categorias Outros esgoto, sujeira

Por se julgar pouco imaginativa, Annabeth relata que não vê nada quando lhe é pedido
que aprecie sua pintura. Esses dados reforçam o perfil da adolescente que se interessa pelas
coisas práticas do dia a dia e pela maternidade, que lhe trouxe responsabilidades diárias.
Dos elementos identificados por ela (Quadro 10), os mais citados são de qualidade aérea:
arco-íris, bandeira da Jamaica, universo, planetário e céu. A referência à bandeira da Jamaica
trouxe algumas lembranças: por volta dos doze, treze anos de idade, reunia-se com outros
adolescentes para fazer uso de maconha e para ouvir música reggae. Fazia isso porque se sentia
“revoltada”, queria “fugir dos pais”. Pensar sobre esse período trouxe sentimento de
arrependimento: “droga tira da realidade, foge do problema”, mas agora “aprendi a me amar”
referindo que tinha motivo, a filha. Quando pequena se perguntava por que sua mãe havia
morrido tão cedo e também se lamentava porque gostaria de ter matado seu pai, mas já estava
morto. Diante desse quadro, depreende-se sua visão negativa em relação aos homens, sendo a
figura da mãe a vítima, a própria identidade ferida.
O elemento céu é associado por Annabeth à predileção pela noite, pelo escuro, presente
também nos elementos esgoto e sujeira. Nota-se que foi característico de seu estilo de pintura
assoprar ou misturar as tintas e o gesso com as mãos, buscando escurecer alguma parte que
tinha ficado com cor clara, assim como retirar todo o excesso de água restante na configuração
93

de fundo. Essa ação de ‘escurecer’ parece ser o mecanismo de defesa utilizado para neutralizar
os efeitos dos traumas sofridos, por isso a predileção pela noite e pelo escuro, em contraposição
à cor clara, associada por ela aos traumas da vida. Depreende-se que a cor clara remete à
consciência, ao ato de ver e olhar para aquilo que é traumático, e, por isso, é mais seguro manter-
se sob a ausência de luz da noite; em outras palavras, uma tendência de fechamento diante da
dor e do sofrimento, configurando-se como uma defesa necessária. Nota-se que, ao final dos
encontros, a tendência introspectiva (vertical) e o contato com o inconsciente (cima-baixo) se
intensificaram, sugerindo que a tomada de consciência rompeu parcialmente defesas e ativou o
movimento regressivo.
O universo, o elemento mais recorrente, lhe trouxe várias associações. Nesse contexto,
citou que, antes de os espanhóis chegarem, as pessoas eram felizes. Com a chegada dos
invasores, o dinheiro se instalou, e tudo passou a ser pago, a ter um valor. Depreende-se disso
a relação do social com valor negativo de consumo bem como sua preocupação com o ter
dinheiro para manter si mesma e a filha. Para Annabeth, o invasor parece representar aquele
que rouba a felicidade, assim como é invasivo o abuso sexual e a violência que sofreu. Mas,
apesar da vitimização, a associação com o universo e a natureza têm força vital: é preciso “parar
de ter medo”, porque “só pensar não faz bem não”, e, apesar dos erros que diz ter cometido no
passado (drogas, automutilação), reitera: “mudei muito, renovando cada dia mais”. No final dos
encontros, sua maior preocupação se referia ao fato de poder perder a guarda da filha com quem
morava na casa de acolhimento. Isso mostra um conflito que ela enfrenta entre ser sofredora ou
agente da própria vida.
Quando identificou o elemento coral relativo ao fundo do mar, se disse ateia porque
considera que “as pessoas vão à igreja como refúgio”. Essas palavras e as que seguem foram
pronunciadas no primeiro encontro, momentos antes de cantar o trecho de uma música gospel
intitulada “Ressuscita-me”, enquanto mexia o gesso com a mão: “A força superior é nós
mesmos. É só chorar que tudo passa”. O entoar a música gospel simbolizaria inconscientemente
a renovação do feminino, assassinado concretamente na figura da mãe e violentado nela.
Decorre de suas associações a desconfiança nos outros, a inveja, o que indica que, na vida, só
pode contar consigo mesma; por isso, tende a se colocar nas situações de forma realista, sem
fantasias, talvez decorrentes das defesas que construiu para poder suportar as experiências
dolorosas: “Confiar em si mesmo, não precisa uma força maior”, ou seja, o voltar-se para si
(inflação do ego) foi a maneira que encontrou para poder lidar com os conflitos, uma vez que
tudo o que vem de fora tende a ser nocivo. Depreende-se desse quadro que o fundo do mar é o
94

lugar de onde extrai forças para enfrentar as dificuldades da vida pois só pode contar consigo
mesma, simbolizando, por isso, fonte de resiliência.
No antepenúltimo encontro cantou o trecho da letra de uma música do Legião Urbana:
“às vezes o que vejo quase ninguém vê...”, e comentou que sempre a cantava quando estava
deprimida. Havia declarado anteriormente não gostar de conversar com os adolescentes e sim
com adultos, daí sua dificuldade de estabelecer amizades por não se sentir compreendida: o
“adolescente não tem muita vivência ainda”. No penúltimo encontro, trouxe a notícia da decisão
judicial sobre sua filha, que ficaria sob a guarda de seu irmão mais velho, e dos caminhos que
seguiria: ir para uma República e o desejo de fazer a faculdade de Serviço Social ou Direito. E
no último encontro, realizado próximo ao momento do desligamento institucional, identificou
o elemento arco-íris. Embora não tenha feito qualquer associação, apresentou decisões e
preocupações sobre o futuro e a vontade de começar uma nova etapa em sua vida.

As entrevistas
Quadro 11: Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com a participante 03,
considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista final (E2 final)

PARTITICPANTE 03
Entrevistas
Annabeth
“Não sei”
“Bem”
“Eu penso no lado bom e ruim da coisa”
P1 “Só mais responsabilidade, me virar
Lado ruim: “Sair daqui e não ter um apoio.
sozinha, independência, autonomia”
Aqui tem apoio, ajuda, orientação”
“Que eu consiga construir uma creche, na
E1* “Estar trabalhando, tendo minha casa e E1
P2 casa do meu irmão. Só mão de obra está me
Inicial minha filha e poder manter” Final
preocupando, porque material é barato”
“Sim”
“Tenho estudado, atrás de emprego,
P3 [Bocejou]... “Sim”
entregando currículo, mas tem uma hora
que desanima”
“Gostei, achei uma terapia”
P4
“Aliviou um pouco, distraiu. Pensei”
E2** “Não lembro de nada agora não”
Final P5 “Me organizar primeiro. Ver como vai ser esse negócio que preciso de muito dinheiro, casa”
“Não sei quanto eu tenho guardado [poupança]”
P6 “Pra mim é tranquilo, já sou acostumada”
* E1 (inicial e final)
P1. Como você se sente em relação à vida fora da instituição?
P2. Quais são suas expectativas de vida depois que sair da instituição?
P3. Como se sente preparado para isso?
** E2 (final)
P4. Me fale como foi para você ter participado dos encontros experimentado a técnica de pintura.
P5. Levando em consideração esse período que passamos juntos, você gostaria de contar algo que lhe ocorreu nesse período? Pensou em
possibilidades de ações após sua saída?
P6. Como você percebe este momento, quando está prestes a sair da instituição?

Nas entrevistas realizadas no início e no final (Quadro 11), em relação às perguntas com
foco nas expectativas em relação ao futuro, Annabeth citou o trabalho e a família. Denota-se
95

uma mudança positiva entre a entrevista inicial e a final – antes diz que não sabe sobre o futuro
e depois afirma sentir-se bem. Embora tenha destacado o desejo de cursar uma faculdade, nas
respostas prevalecem as prioridades mais imediatas. Faz apontamentos entre o apoio que recebe
no acolhimento e as responsabilidades advindas de uma vida com independência. Em relação à
pergunta sobre como se sente preparada para isso, embora tenha mantido a resposta de sentir-
se preparada, destacou o desânimo decorrente das dificuldades que enfrentava para poder se
preparar e, ao final, seu bocejo e um tempo prolongado de resposta antes do ‘sim’, reforçou que
as dificuldades permaneciam, o que pode estar atrelado à diminuição da pontuação em relação
às expectativas de futuro.
Em consideração à entrevista final, nas perguntas sobre como sentiu e o que pensou
durante os encontros, Annabeth destacou o aspecto de suporte e a possibilidade de pensar sobre
sua vida, ressaltando novamente a indecisão diante de um futuro iminente. Sobre a questão do
momento do desligamento, destacou estar tudo tranquilo, embora demonstrasse agitação
durante a entrevista e fizesse longas pausas para responder às perguntas, mostrando a vivência
de conflitos e ansiedade quanto a esse assunto. Completou a frase dizendo que já estava
acostumada a uma problemática que a tem acompanhado desde criança: a instabilidade e o
sofrimento decorrente dos vários lugares por onde tinha passado e as experiências pelas quais
passou em cada um deles. Justifica-se assim seu desejo de ‘construir’ uma creche para sua filha
e para as crianças da comunidade, como projeto de construção de um lar definitivo, duradouro.

Síntese do caso
Do processo de Annabeth, destacam-se os seguintes elementos: embora nos primeiros
encontros tenha apresentado a forma protetiva círculo e movimento para a direta (indicativo de
um sentido prospectivo) e na localização o inferior, o que remete ao terrestre, corpóreo
(oposição à predominância de elementos aéreos que foram identificados nas pinturas), nos
últimos encontros houve maior ativação de introspecção e conscientização (vertical, baixo-
cima) dirigindo para a autorreflexão e não em direção ao mundo. A regressão se justifica na
medida em que apresentou relativa consciência do momento do desligamento, das
responsabilidades que teria de assumir, moldadas especialmente pelo desejo de construir uma
creche para sua filha, e das dificuldades que indicou como agravantes para que isso se
efetivasse; no final das intervenções, Annabeth foi tomada por um misto de desânimo e de
vontade de ser independente). Destaca-se também que o histórico de maus tratos, abuso e
violência que sofrera ocasionaram mecanismos de defesa como recursos indispensáveis para
que seu ego não colapsasse. Decorrem desse quadro a desconfiança nas pessoas e suas crenças,
96

especialmente as do sexo masculino, o fato de não se sentir compreendida por adolescentes de


sua faixa etária, e o fato de estar acostumada a experiências de ‘desligamentos’, o que culminou
num quadro de isolamento e sentimento de não pertencimento. Ela acha que só pode contar
consigo mesma e pratica essa crença mediante defesas, e o longo tempo de acolhimento parece
ter contribuído para reforçar essa crença. As respostas nas entrevistas denotam um movimento
reflexivo assim como visto nos quadrantes; todavia, ao mesmo tempo, essa consciência trouxe
insegurança em relação a seu futuro, posto que receia ter poucos recursos para a independência
que almeja. Esse dado está em consonância com a diminuição da pontuação relativa às
expectativas quanto ao futuro, após as intervenções. As experiências traumáticas pelas quais
passou e a gravidez precoce foram determinantes para o declínio dos sonhos típicos da
adolescência, o que pode estar atrelado à percepção de futuro menos otimista e à irritação que
sente com os adolescentes. No entanto, Annabeth apresentou aumento da pontuação nas
dimensões da satisfação de vida: família, que se refere ao ambiente familiar, afetivo, e que é
referida por pelo desejo de cuidar da filha; o self, como as características positivas, autoestima
e demonstração de afeto, reitera que começou a pensar sobre as coisas e a parar de ter medo; o
self comparado, como a qualidade de avaliações, comparações de si em relação aos outros,
pontua que só pode contar consigo mesma; a não-violência, que se refere ao não envolvimento
em situações de conflitos, diz ter aprendido a se amar; a autoeficácia, que se refere as avaliações
e capacidades de alcançar metas, destaca o desejo de construir uma creche; e amizade, referente
aos relacionamentos com os pares, parece ter sido significativo o relacionamento afetivo no
acolhimento. Em relação à dimensão escola, há diminuição da pontuação, o que pode estar
atrelado à ênfase que deposita nos projetos da família e trabalho.
Annabeth, uma adolescente marcada por experiências traumáticas, ancorou-se nas
defesas que foram necessárias para lidar com as dificuldades da vida. Ao final dos encontros e
com a proximidade do momento do desligamento, sentiu-se insegura em relação a estar ou não
preparada para a vida fora da instituição, demonstrando oscilação entre a percepção dos
cuidados recebidos e os novos desafios para sustentar si própria e sua filha. O processo de
introspecção, de subida e de tomada de consciência pode ter contribuído para ativar um
movimento regressivo o qual, apesar de arriscar desestruturação e ansiedade, segundo Jung
([1911/1952] 2016a), Bovensiepen (2014) e Kiepenheuer (1990) relaciona-se também com a
função criativa e regenerativa da psique. À medida que vai tomando consciência de sua situação
a partir das reflexões tecidas, também pode entrar em contato com suas limitações. Segundo
Bovensiepen (2010) e Ryotovaara (2010), essas dinâmicas de conscientização se efetivam a
partir de relações restauradoras, como pode ser observado pelo vínculo estabelecido durante o
97

processo de intervenção e pelo desenvolvimento do agenciamento do eu. Ao se sentir acolhida,


pode expressar seus questionamentos sobre a vida, seus sofrimentos e desconfiança nas relações
humanas.

6.3.4 Romeu
Assim denominado devido ao relacionamento amoroso com uma adolescente, no
contexto do acolhimento institucional, e por nutrir o ideal de construir uma nova vida, Romeu
tinha 17 anos um mês quando aderiu às intervenções.
Diferentemente dos outros adolescentes, foi retirado do convívio social e familiar por
causa de uma ação violenta cometida contra outra pessoa, na região onde morava. Foi então
encaminhado para a Fundação Casa, onde permaneceu por quase dois meses e depois
direcionado para um SAICA (Serviço de Atendimento Institucional para Crianças e
Adolescentes), sendo acolhido por seis meses. O breve porém profundo sofrimento na Fundação
Casa, espaço que deveria fornecer proteção e acolhimento, provocou pesadelos frequentes
relacionados aos maus tratos e bullying que Romeu relata ter sofrido: “Falta de respeito, sofri
bullying. Os funcionários estão lá para cuidar e não para zombar. Toda noite eu sinto que estou
lá, fico deprimido”. Relatou que a reclusão lhe causou uma sensação de que o tempo não
passava, parecendo ter ficado muito mais tempo do que de fato ficou.
Já no SAICA, e numa tristeza profunda, apaixona-se certo dia por uma adolescente (com
possível diagnóstico borderline) que havia recém-chegado. Confessa que sua namorada o
completava, ajudava a aplacar a saudade da mãe e o consolava sempre que acordava à noite,
aterrorizado por pesadelos relativos ao período em que esteve na Fundação Casa. Sentia-se
excluído por alguns membros da família pela ação que cometera, mas as visitas constantes de
sua mãe o acalentavam. Relatou com pesar a cena da delegacia para onde foi levado após a ação
violenta que cometera: foi acompanhado do pai, um homem aparentemente severo, na visão de
Romeu, mas que havia chorado a ausência do filho e tudo o que lhe ocorrera: “tentou ser homem
naquelas partes difíceis e também quase não aguentou ver o próprio filho dormindo na
delegacia. Pior coisa, tratado pior do que um cachorro. Jogado no chão. É isso”.
Romeu se mostrou interessado, desde o primeiro momento, a participar dos encontros,
dizendo que aquele momento representava a possibilidade de fazer algo diferente, no contexto
monótono do acolhimento. Mostrou-se responsável, afetuoso, inteligente e empenhado, o que
foi posteriormente confirmado pela equipe de profissionais. Diferentemente dos outros dois
participantes, Romeu tinha uma família estruturada, era o caçula, e sua visão de futuro, embora
98

ainda idealizada, contaria com o apoio familiar. Demonstrou ter uma habilidade profissional
em informática, desejo de cursar faculdade e de abrir uma empresa.

O estilo
Romeu utilizou pouca tinta, e seu estilo de pintar consistiu em pingar sobre a superfície
uma gota de cor a cada vez e esperar a reação. Demonstrou uma atenção especial a esse efeito:
“Gosto quando expande... uoooh!”. As tintas que não expandem em função da densidade do
pigmento, como prata, branco e dourado, não lhe interessaram muito. As pinturas que realizou
apresentaram algumas características em comum: predomínio de uma grande forma próxima ao
centro; recorrência das cores vermelha, amarela, verde e azul; como utilizou pouca tinta, a
superfície que não recebeu cor apresentou transparência, e parte do fundo pôde ser apreciado
(Fotografia 09: As = primeira configuração da superfície e Fotografia 10: Hs = oitava e última
configuração da superfície).
Visualmente suas pinturas apresentaram pouca densidade e transparência, por ter usado
pouca quantidade de tinta, o que resultou em pouca tinta fixada na placa de gesso, tal como
aparecem nas configurações do fundo (Fotografia 11: Af = primeira configuração do fundo e
Fotografia 12: Hf = oitava e última configuração do fundo).

Fotografia 09 Fotografia 10
As = primeira configuração do fundo Hs = oitava e última configuração do fundo

Vale destacar que se fixou apenas um resquício de tinta na placa de gesso da pintura que
Romeu realizou, no último encontro (Hf: configuração de fundo), o que o surpreendeu. O último
encontro aconteceu no mesmo dia em que foi desligado e, a partir da conjunção dos
acontecimentos, a pintura em branco representou naquele momento que o futuro estava para ser
escrito, ou como ele mesmo associou: “Nova etapa, novo começo”.
99

Fotografia 11 Fotografia 12
Af = primeira configuração do fundo Hf = oitava e última configuração do fundo

As variáveis Cor (quantidade e localização) e Forma (tipo, movimento e localização)


Em relação à variável Cor (quantidade), confirma a utilização de mais cores nos
primeiros encontros em relação aos últimos (54,9% para 45,1%), o que indica maior
seletividade ao longo do processo. Não há diferença em relação à variável Cor (localização).
Não há registros em relação à variável Forma (tipo, movimento e localização), uma vez
que Romeu apenas pingava a tinta sobre a superfície, sem criar formas ou movimentos. Esse
dado é importante porque seu modo de pintar pode estar relacionado ao cuidado de não se
arriscar ou de ser cauteloso em suas ações, considerando que cometeu uma ação violenta
passando a adotar, por isso, uma atitude mais precavida.

Os elementos identificados, suas categorias, associações e amplificações


Considerando o total de 90 elementos nas pinturas de Romeu, 52 foram identificados
nas configurações da superfície e 38 nas do fundo, assim como foram identificados mais
elementos nos primeiros encontros em relação aos últimos.
100

Quadro 12: Elementos identificados nas configurações pelo participante 04, considerando-se a quantidade
dos elementos mais citados e respectivas associações, bem como as categorias que emergiram do total de
elementos identificados
Elementos
PARTITICPANTE 04
identificados nas
Romeu
configurações

Elemento Qtde. Associação


Areia 8 na praia me sinto tão livre, bem mais relaxado, quando completar 18 anos me
assusta um pouco, o mundo é grande
Coração 6 sempre quando está tudo bem, parece que sempre tem alguma coisa para
atrapalhar, coração preto, está negro, está ferido por dentro, se sentindo
preso, angustiado, tudo de ruim, quando o coração é vermelho a pessoa está
Mais citados
feliz
Sol 4 casa na praia
Vulcão 3 eu tenho medo que a terra explode
Bola de fogo 3 apocalipse
Sujeira 3 pessoas não cuidam
Pessoa 2 correr de alguma coisa, fugir do perigo, estou tentando fugir do erro, quase
toda a noite eu choro
Aquáticos água-viva, golfinho
Animais Aéreos pássaro, joaninha, beija-flor, gavião, morcego, borboleta
Total de lesma, gato, cachorro, dinossauro, raposa, porco, chifre, galinha, lobo,
Terrestres
elementos bichos
identificados Natureza areia, sol, vulcão, ilha, pôr-do-sol, fogo, flor, praia, mar, cometa, meteoro, sol, vento
separados por Ser humano pessoa, cabeça, célula, peruca, gueixa, cabelo, coração, bruxo, Buda, Cristo redentor
categorias
guitarra, Mario Bros, fone de ouvido, brinquedo, sombra, pião, muleta, carrinho,
Outros headphone, sinalizador, mangueira, hélice, bola, boneco, sujeira, bengala, chuveiro,
alumínio, cerveja

Dos elementos identificados por Romeu (Quadro 12), quatro chamam a atenção pela
recorrência e por se conectarem a seu histórico de vida e relações com o futuro: areia, coração,
animais terrestres e aéreos, natureza e pessoa.
A areia está relacionada à praia, lugar que considera tranquilo e para onde irá depois que
voltar ao convívio familiar: “na praia me sinto tão livre, bem mais relaxado”. Mas, ao mesmo
tempo, reflete sobre seu futuro nesse lugar: “quando completar 18 anos, me assusta um pouco,
o mundo é grande”. Destaca também a sujeira da areia, como uma crítica àqueles que não
cuidam da natureza, lugar onde irá erigir seu futuro lar com os pais. É possível interpretar esse
elemento como o próprio ato de violência que cometeu, uma sujeira, do qual se arrepende, e,
por isso, ir para um novo lar distante de onde morava é o que mais deseja. Ir para a praia também
é a estratégia que a família pensou adotar como melhor lugar para que Romeu possa morar em
função das disrupturas causadas na família e ameaças da vizinhança.
O coração recebe conotações cromáticas e de valor: o coração rosa se refere a perfume
e mãe, o vermelho indica estado de felicidade, enquanto o negro significa que “está ferido por
dentro, se sentindo preso, angustiado, tudo de ruim”. Ao coração estão diretamente ligadas a
figura de mãe, a mais presente na trajetória do acolhimento, e a da namorada, aquela que o
consola. Sua carência fez com que projetasse na namorada a figura de cuidado materno: “Eu
101

tinha acabado de sair da fundação e eu acabei me apegando”. O namoro se caracterizou por uma
relação de atenção e carinho, sem demonstração de interesse sexual, em parte porque as regras
do SAICA não permitem aproximações desse tipo e também pelo suposto diagnóstico
borderline da namorada.
Em relação aos animais, são os terrestres que prevalecem, seguidos dos aéreos. Romeu
destaca que sua gata, um dos elementos que são identificados na pintura, morreu de convulsão
nos braços dele. A relação com esse animal lhe trouxe sensações de bem-estar e carinho, ou
seja, remete a uma experiência afetiva, mas também aponta para um episódio de interrupção de
afeto. De outro lado, embora tenha considerado a lesma como um animal nojento, destaca que
“leva a casa”, o que aponta para um de seus maiores conflitos: ter sido retirado do convívio
familiar e desejar construir um novo lar. Em relação aos animais aéreos, associa a dinâmica de
vida do morcego como aquele que vive à noite e durante o dia só dorme, assim como seu pai, e
a borboleta associa à ação de voar: “olhar para baixo e ver o mundo passando”. No entanto, a
ação de voar é apontada como uma das estratégias defensivas para o ato de violência que
cometeu, diretamente ligada ao elemento pessoa, o qual recebe as seguintes associações: “correr
de alguma coisa, fugir do perigo. Estou tentando fugir do erro. Quase toda a noite eu choro”.
Faz referência aos elementos cabeça, cabelo, peruca, que podem reforçar o desenvolvimento
reflexivo. Essa ação indica não somente a sensação de liberdade que almeja, mas também
porque é uma forma de tentar “fugir do erro”, demonstrando assim o sentimento de culpa que
o assola desde então, sente que não é possível voltar atrás, viver onde vivia. Necessita começar
de novo e, nesse momento, faz a referência ao pai, aquele que será ajudado na reforma da casa
da praia, seu futuro lar, identificado na condição de paterno, aquele que estrutura a lei.
Os elementos ligados à natureza foram frequentemente relacionados a explosão,
destrutividade e calor, como sol, cometa, bola de fogo (“medo de que a terra explode”,
“apocalipse”), meteoro e, especialmente, o vulcão. Simbolicamente, o vulcão e as fontes de
calor se associam a centros de energia, assim como o coração: Romeu vive uma paixão no
espaço de acolhimento como um dos recursos para aplacar a dor, a tristeza e a solidão. A paixão
o aquece, e os elementos da natureza, como o vulcão, estão sempre prestes a explodir e precisam
ser controlados, tanto para a preservação de sua própria integridade física quanto mental.
O ato de violência que cometeu, tomado pela raiva, agressividade, impulsividade
simbolicamente representado pelo vulcão, identificado logo na primeira pintura e localizado à
esquerda (inconsciente), o fez entrar em contato com um poder de destruição que o assustou.
Em um determinado momento, referiu o seguinte: “quando fico nervoso, batia na parede”.
Justifica-se assim, em parte, que seu estilo ‘delicado e leve de pintar’ foi, compensatoriamente,
102

a maneira que encontrou para lidar com a tempestuosidade de seus impulsos, sua força física.
O namoro com a adolescente acolhida pode ter contribuído para amenizar sua impulsividade.
Considerando-se os elementos identificados por Romeu em relação às localizações (C,
IE, SE, ID e SD), a maior quantidade deles foi localizada no centro, indicando haver
centralização, o que pode expressar a busca de compreender o que fez e o que ele é. Destacam-
se os seguintes: a areia aparece mais no C, indicativo de que o novo lar, sua primeira meta, é o
que ele acha que lhe trará tranquilidade. No entanto, trata-se de uma idealização; o vulcão
aparece mais no IE, inconsciente mais primitivo, associado a outros elementos que parecem
indicar fontes de calor, movimento e crescimento: fogo, vulcão, coração, beija-flor, ovo, pôr-
do-sol, sol, vento, flor, vulcão, sinalizador.

As entrevistas

Quadro 13: Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com o participante 04,
considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista final (E2 final)

PARTITICPANTE 04
Entrevistas
“Romeu”
“Gostaria de fazer curso”
“Me preparar para um futuro melhor, para “Estou muito ansioso”
P1 poder ter uma empresa de TI” “Quando eu me acalmar, vou procurar um
“Ter um emprego bom, que eu seja o dono emprego e melhorar minha vida”
da empresa”
“Recomeçar uma nova vida”
E1* “Ser um homem honesto” E1 “Minha mãe passou coisas ruins e eu não
P2
Inicial “Saindo vou fazer curso e faculdade” Depois quero que ela passe de novo, ela quase
morreu por minha causa”
“Sim, sim”
“Me sinto confiável”
“Pouco”
P3 “Quando estou com minha família me sinto
“Eu estou me esforçando mais”
mais protegido, bem melhor, do que ficar
aqui”
“Você pôde me ajudar a pensar, refletir os erros para eu poder não errar depois de novo”
“Foi legal. Se tivesse como continuar eu ia querer continuar”
P4 “Estou meio triste porque vai acabar tudo isso [os encontros], mas também estou um pouco feliz que
eu vou com minha família”
“Nova etapa, novo começo”
“Quando a gente começou a conversar, assim, debater sobre a vida, sobre a “B”. Aí comecei a parar
e pensar, não só reagir, pensar nos erros”
P5
“Aí eu parei e pensei, falei é: só ter paciência, e eu me esforcei”
E2** “Me esforcei e chegou a hora”
Final “Primeiro vou ficar com minha família, aí depois que for para a praia vou buscar um emprego, e
escola”
“E tentar recuperar os anos que perdi de aula, procurar emprego, e ajudar meu pai a aumentar a casa”
“Meu pai é chato, sempre pega no meu pé. Aí eu pensei assim: vou voltar para casa, mas vai voltar a
P6 pegar no meu pé, minha mãe também. Mas pensando de outro lado, eles já me ajudaram muito, então
eu não ligo”
“Por exemplo, eu te xingo, mas você lembra que eu te ajudei. Aí você não vai ficar bravo porque eu
te ajudei numa coisa que estava preso, sufocado... você estava precisando de uma ajuda muito
importante, daquela ajuda mesmo”
* E1 (inicial e final)
P1. Como você se sente em relação à vida fora da instituição?
103

P2. Quais são suas expectativas de vida depois que sair da instituição?
P3. Como se sente preparado para isso?
** E2 (final)
P4. Me fale como foi para você ter participado dos encontros experimentado a técnica de pintura.
P5. Levando em consideração esse período que passamos juntos, você gostaria de contar algo que lhe ocorreu nesse período? Pensou em
possibilidades de ações após sua saída?
P6. Como você percebe este momento, quando está prestes a sair da instituição?

Nas entrevistas realizadas no início e no final (Quadro 13), em relação às perguntas com
foco nas expectativas em relação ao futuro, Romeu destaca no início o papel da escola e do
trabalho como importantes requisitos para uma condição melhor de vida. Cita o desejo de cursar
uma faculdade, ter sua própria empresa e ser um homem honesto. Mas depois sente-se ansioso
e com a necessidade de se acalmar. Cita o sofrimento da mãe e faz referências apenas ao
trabalho, não ao estudo. Note-se que a pontuação em relação às expectativas de futuro diminui
ao final dos encontros, assim como a dimensão escola. Na pergunta referente à percepção de se
sentir preparado para que suas expectativas se efetivem, destaca a família como fonte de
proteção e, especialmente, a percepção de que se sentia menos preparado no início dos
encontros e, ao final, mais confiante.
Em consideração à entrevista final, nas perguntas que se referem aos encontros, Romeu
destaca ter refletido sobre os erros do passado, sobre a necessidade de ter paciência e de pensar
antes de reagir, demonstrando assim um princípio de reflexão sobre suas ações e uma postura a
se adotar. Na pergunta referente à percepção do momento do desligamento institucional, destaca
novamente o trabalho, a escola e a família. O pai, aquele que “sempre pega no meu pé”, é
referido como figura que o ajudará na estruturação de uma nova vida.

Síntese do caso
Em relação ao processo de Romeu, destacam-se os seguintes aspectos: não criou formas
durante o processo de pintura, pois pingava uma gota de tinta de cada vez, e, por isso, os tipos,
localizações e movimentos não apareceram; contudo, foi possível observar o maior
acionamento do centro, a partir da localização dos elementos identificados, o que pode ser
indicativo de um processo de centralização durante seu processo criativo, e a maior quantidade
de animais terrestres identificados pode simbolizar a possibilidade de concretização em direção
à vida, em busca de recomeço, na praia e com sua família, bem como de uma especialização,
em um curso de informática; o estilo de Romeu e os elementos que associou e o fato de sua
pintura ser visualmente suave e transparente, em contraposição à densidade dos símbolos que
emergiram, indicariam um movimento compensatório que reflete seu conflito principal e
confronto entre opostos: ser ponderado, ter paciência em contraposição ao impulso violento que
104

sente e que precisa ser controlado: “Agora estou se sentido melhor, antes não. Guardava tudo”.
Pode-se considerar que seu estilo de pintar funcionou como um mecanismo de defesa, na
medida em que, ao intuir que poderia explodir a qualquer momento, realizou uma pintura
baseada essencialmente no ato de pingar a tinta sobre água e observar o efeito decorrente dessa
ação, sem propositar qualquer forma ou movimento. Embora não tenha apresentado dados para
a análise quantitativa referente à variável Forma, seu estilo de pintar pode denotar sua precaução
com não correr riscos, com formas de se aventurar; ainda que o tempo de permanência na
Fundação Casa tenha sido curto, foi suficiente para gerar traumas, e, no acolhimento, sentia-se
solitário e carente, buscando uma relação amorosa; em relação às entrevistas, depreendem-se o
desejo de regressar à família e planos relativos ao futuro, mas também os desafios que terá de
enfrentar: apesar de tais planos, apresenta indícios de conflito moral em relação ao ato de
violência que cometeu, o qual o retirou do convívio social e familiar, e começa a refletir sobre
ser uma pessoa explosiva e que precisa ter paciência e se controlar. Nota-se que há diminuição
da pontuação da expectativa quanto ao futuro após as intervenções, pois, embora se sinta
otimista, demonstra não estar suficientemente preparado profissionalmente para a
independência; seu maior desejo é a reintegração familiar. Sobre a satisfação de vida há
pontuação , após as intervenções, nas seguintes dimensões: família, que se refere ao ambiente
familiar e afetivo e se relaciona a seu grande desejo de reintegração; o self, definido a partir de
características positivas, autoestima, atrela-se à percepção de ter-se esforçado e de ter paciência;
a autoeficácia, como avaliação da capacidade de realizar metas, reflete a consciência dos erros
que cometeu, planos para o futuro e o desejo de recomeçar; amizade, relativo aos
relacionamentos com pares, refere-se ao fato de ter-se sentido acolhido e também pode estar
relacionado ao envolvimento afetivo no acolhimento. A pontuação se manteve em self
comparado (comparação de si com o grupo), não-violência (não se envolver em conflitos) e
diminuiu em escola. Os estudos foram interrompidos enquanto esteve na Fundação Casa e, no
acolhimento, conseguiu acesso à escola pouco tempo antes do desligamento.
Romeu, ao final dos encontros, não se sentia maduro o suficiente, pois depende da
família e, com a proximidade do desligamento, foi tomado por um misto de felicidade e
insegurança. No entanto, ao longo de seu processo ensejou reflexões importantes como
a avaliação de comportamentos e ações impulsivas, e a esboçar indícios de uma consciência
moral. Seu caso é atípico no contexto do acolhimento, e esse jovem se diferencia dos outros
participantes pelos seguintes aspectos: a estrutura familiar é coesa, ele não veio de uma situação
de vulnerabilidade nem de maus tratos, tem bom rendimento escolar, e sua idade é pertinente
ao grau de escolaridade. Jovem sonhador e imaturo, foi arrebatado por uma experiência
105

devastadora. Trafegou pela tensão entre os opostos, uma condição que pode ser reguladora para
centralizar a personalidade, assim como pode desestruturá-la, segundo Jung ([1950] 2011f).
Os encontros foram benéficos para ele porque se sentiu acolhido e sentiu tristeza quando
terminaram, dizendo que se pudesse continuaria o processo. A relação entre o ato de violência
cometida e todos os sofrimentos oriundos dos acolhimentos pôde ser expressa e, com isso,
Romeu entrou gradualmente em contato com conteúdos dolorosos, o que o auxiliou a tomar
consciência e a esboçar planos para o futuro, como uma possibilidade de recomeço.

6.4 Ressonâncias no pesquisador


1. OBSERVAR
Adentrar a dinâmica do acolhimento é um exercício avassalador e despertador das mais
diversas experiências. Psicologicamente é a tentativa propositada de penetrar o inconsciente, na
ânsia de fazê-lo revelar-se à luz de uma consciência parcial, porém investigativa, sem garantias
de controle daquilo que quiser se mostrar, seja em sua dimensão assombrosa ou iluminada.
Muitas impressões são fugidias, distantes de uma compreensão imediata e imunes ao perigoso
desejo de interpretações e julgamentos.
Nesse sentido, trata-se de praticar o exercício da observação: a grade: a presença de
uma grade separando os pavimentos superior do inferior, com o intuito de inibir os encontros
sexuais entre adolescentes na primeira visita a uma Casa Lar; tio: forma comum de chamamento
praticada pelos adolescentes; a punição do alimento: estratégia adotada em uma Casa Lar
quando os adolescentes se recusam a denunciar o responsável por arrombar a porta do armário
de um dos educadores para furtar cigarro; a droga: prática comum entre alguns adolescentes
como mecanismo de aliviar as tensões vivenciadas no contexto do acolhimento; o reforço: em
determinadas situações, a liberação para fumar fica condicionada a algum dever que o
adolescente deva cumprir; fim da esperança: alguns profissionais, mediante todos os esforços
realizados, se sentem desesperançosos em relação ao futuro de alguns adolescentes; o que
acontece na casa quando alguém é desligado: um sentimento estranho, uma ruptura, nada
será como antes, um desalento; a psique da instituição e a psique do adolescente: em que
medida a desestruturação de uma casa acolhedora ou sua coesão se reflete no desenvolvimento
do adolescente? Foram muitas visitas perdidas, muitos desencontros que poderiam ser evitados,
um telefonema, um email somente; a rotatividade de profissionais e os vínculos: a
permanência de um profissional em uma casa de acolhimento não é garantia para a construção
de vínculos pois estes podem ocorrer subitamente; no entanto, sua impermanência pode ser um
disparador de relações que atam e desatam sem deixar vestígios? Muitas vezes, a dificuldade
106

que o adolescente acolhido tem de se vincular, de se comprometer com algo, de se


responsabilizar, de manter oportunidades de trabalho poderiam ser considerados reflexos
microscópicos de uma dinâmica macro? Desabafo de um adolescente com quadro persecutório:
“Elas ouvem nossas sugestões, mas não as levam em consideração”.
2. SONHAR
Desde o início das visitas às casas de acolhimento e das intervenções, uma série de sonhos
com crianças e adolescentes compôs um cenário de aspectos diversos: as personificações do
inconsciente e suas cores, o contato com o desconhecido, o inconsciente como fonte criativa, a
somatização, além de evidências relacionadas aos quadrantes: localizações e movimentos.
Retrospectivamente, os sonhos parecem ter anunciado que, embora o contato com o
inconsciente seja indispensável para o acesso e para a integração de conteúdos internos, os
efeitos psíquicos e somáticos decorrentes podem ser amedrontadores. Além disso, fazem
emergir os elementos contratransferenciais decorrentes de relações novas, desconhecidas e
profundas, o que para Frankel (1998) é possível, especialmente no contato com adolescentes.
06.07.2017: notei que meu peito esquerdo havia crescido. Causou espanto, olhei no espelho.
Toquei para saber se havia algum nódulo, mas não havia. Era um tipo de seio, firme. (No dia
seguinte, iniciei a escrita do texto para a qualificação). Interpretação: o lado esquerdo
(inconsciente) como aspecto criativo acessado via indireta (espelho). A técnica expressiva,
como via de acesso ao inconsciente, também opera indiretamente, como espelhamento da
realidade interna projetada externamente. E ver-se ao espelho como possibilidade de enxergar
um outro.
24.10.2017: estava em uma sala cheia de alunos já conhecidos. Estavam bem barulhentos e
desinteressados. Chamei a atenção e disse que, na 3ª vez, apagaria as luzes. Reiniciei a aula e
os alunos começaram a sair. Aproximei-me do fundo da sala e me deparei com vários alunos
que eu ainda não conhecia, todos estavam sentados e comportados. Vestiam uniforme: camiseta
cinza. Interpretação: ritual de apagar as luzes (consciência) para entrar em contato com o
desconhecido, que está no fundo, ainda indiferenciado (cor cinza). A imersão na dinâmica do
acolhimento foi marcada, num primeiro momento, por expectativas e também por estereótipos
que acinzentaram minha visão sobre os adolescentes. Aos poucos, ao se revelar, mostraram suas
cores, diferenciando-se.
25.10.2017: meu filho, uma criancinha e eu iríamos fazer uma longa viagem. Fomos em um
grande ônibus de turismo, e eu como motorista. Minha visão estava distorcida pois estava
dirigindo na posição de passageiro. Passamos por um trecho de lama. A viagem foi tensa. Como
o percurso era longo, paramos em uma pequena vila. Havia um matagal e entramos ali. Avistei
107

de longe um grande macaco, que me olhou fixamente. Achamos uma casa desabitada e tentamos
dormir, mas não conseguia pegar no sono. Na cena seguinte, fomos de novo ao matagal, e o
grande macaco começou a correr em nossa direção. Assustado, falei para corrermos, e assim
voltamos para dentro da casa. O grande macaco chegou praticamente junto conosco. Deu tempo
de fechar a porta, mas havia uma fresta em cima. Ele colocou a mão para dentro e eu a toquei,
não senti medo. Uma mão grande, de pele rústica. Na sequência fui tentar fechar a janela que
ficava à direita, mas o próprio macaco, pelo lado de fora, fechou uma das folhas da janela.
Novamente toquei nele. Mas a janela tinha várias falhas, e, por isso, não seria possível fechá-la
totalmente. Aquele medo inicial se dissolveu. Interpretação: contato gradual com um animal
selvagem, porém muito próximo da natureza humana, primeiro pelo olhar e depois pelo toque,
configurando uma experiência concreta até sua integração na consciência. A mão como guia
para a expressão e, simbolicamente, como amparo para aquele que, em função de sua
vulnerabilidade, necessita de suporte para entrar em contato com seu mundo interior,
descortinando-o.
26.10.2017: estava passando e vi uma grande e espaçosa igreja. Não quis entrar e observei da
entrada. Em algum momento, o padre percebeu que, dentro da igreja, havia um grande leão e o
fez sair. O grande e belo leão era manso, e saiu tranquilamente. Essa cena se repetiu. Depois eu
entrei na igreja carregando um grande objeto. Fiz esforço para não atrapalhar a cerimônia, mas
o objeto encostou em alguma coisa e todos olharam para mim. Na última cena, depois que a
celebração acabou, todas as pessoas e eu começamos a sair. Fui à procura do leão. Ele estava a
uma certa distância. Vi-o brincar docilmente com uma criança. Interpretação: troca simbólica
obtida a partir da incursão no sagrado (oferecer um objeto) para compensar a expulsão do
grande animal (o rei da floresta) que se apresenta dócil, não perigoso. A dimensão sagrada
envolvida na pesquisa com seres humanos, especialmente com adolescentes que clamam por
atenção e cuidados, gerou em mim uma necessidade de rever o perfil adolescente e todos os
estigmas que estes carregam: o leão, animal feroz, porém dócil; assusta, mas o que ele quer é
só carinho. Foi um exercício doloroso e animoso de quebrar os paradigmas.
12.11.2017: havia um casal e seu filho adotivo, para quem eu tinha feito uma boa ação em outro
momento. Encontrei o pai, e ele quis me mostrar outro filho adotivo. A uma certa distância, vi
que era um bebê negro africano, sentado e brincando. Ao chegar perto, vi que não era humano,
parecia um animal muito semelhante a um bebê. Era muito negro e estava sentado sobre um
tecido feito de palha. Ao olhar essa palha, vi uma infinidade de bichinhos, insetos que se
moviam embaixo e em cima dela. Fiquei impressionado com aquilo, como se o bebê os estivesse
chocando. O pai chamou o bebê para brincar e o ajudou a levantar. Todos os bichinhos seguiram
108

o bebê. Interpretação: pujança criativa e revigorante do inconsciente bem como a relação


adotiva entre pai e filho, pesquisador e participante. Novamente a necessidade de ver de perto
e enxergar aquilo que parecer ser, mas não é.
15.01.2018: estava explorando um terreno com vários montes de terra, de diversas cores,
especialmente a cor cinza. Parecia uma pasta, pois a terra estava úmida, maleável, como se
tivesse chovido por ali, umedecendo tudo. (Depois que relembrei o sonho durante o dia, tive
uma vaga lembrança desse lugar em um sonho que tive quando criança/adolescente).
Interpretação: a retomada da cor cinza como símbolo de indiferenciação, para a cromaticidade.
O contato com os adolescentes foi revelador das várias facetas do humano, de histórias
exuberantemente coloridas.
3. VINCULAR
Não há garantias de que os vínculos aconteçam no contexto do acolhimento, pois assim
como é provisória a dinâmica protetiva, também o é o tempo que os profissionais por ali passam,
inclusive o pesquisador. A impermanência parece ser uma constante. No entanto, encontros
significativos são potencialmente favorecedores de experiências reparadoras.
Naruto: um adolescente desafiador, considerado pela equipe um caso improvável de
adesão a qualquer intervenção. Durante o processo de intervenção, evadiu, fui encontrá-lo em
outra casa, e pudemos seguir com os encontros. Quando me viu, ficou espantado: “vim aqui por
sua causa”, eu lhe disse. Sincronicamente, o longo tempo de permanência no acolhimento se
refletiu no período estendido das intervenções, marcado pela evasão e pelos estados de ânimo
oscilatórios de Naruto, momentos não favoráveis para a realização dos encontros. No penúltimo
encontro, ficou tão encantado com uma de suas pinturas que a fotografou e disse que a colocaria
na tela inicial do celular; bem antes disso, um abraço forte e caloroso ao final de um dos
encontros selou nossa parceria e, a partir dali, se configurou como nossa forma de cumprimento
a cada encontro.
Annabeth: sua justificável resistência ao contato e a quase ausência de elementos
identificados em suas pinturas fizeram com que, por algum tempo, eu desconfiasse da
efetividade da intervenção que estava em curso, até o momento em que lhe comuniquei que, em
função de uma viagem a trabalho, precisaria desmarcar nosso encontro seguinte, quando sua
reação foi inusitada, tamanho foi seu descontentamento. Revelou-se então que sua aparente não
demonstração de aderência ao processo era decorrente de um mecanismo defensivo,
desenvolvido como recurso autoprotetivo, o qual, a partir daquele momento, não seria mais
necessário.
109

Romeu: um misto de afetuosidade e um potencial para a destruição – um paradoxo. Se


pudesse, teria continuado os encontros, mas a vida o convocou para o retorno à família, como
era o desejo dele. Nosso vínculo ocorreu logo no primeiro encontro e se consolidou quando sua
namorada, com diagnóstico não conclusivo de borderline, se postou à minha frente e disse:
“preciso de terapia”. Isso aconteceu no mesmo dia em que Romeu fez o primeiro encontro.
Então, paralelamente ao trabalho com ele, realizei dois encontros com ela fora da pesquisa, e
foram utilizados o desenho e a escrita – eram expressões que ela já vinha desenvolvendo
espontaneamente. Depois do segundo encontro, ela evadiu.
4. DESISTIR
As dificuldades da pesquisa me fizeram pensar em desistir. Mas seria eu mais um a
abandoná-los? Foi esse o pensamento que me nutriu para continuar, mesmo sem garantias de
sucesso.
5. DESLIGAR
O último dia de intervenção ficou marcado por uma experiência impactante: assim que
uma funcionária da Casa Lar fechou o portão, fui tomado por um arrepio que me atravessou
todo o corpo, seguido por uma sensação de pavor. Imobilizado, e ainda na calçada diante do
portão fechado, fiz-me algumas indagações: Será que, depois de tudo o que foi feito, valeu a
pena? Será que todo o trabalho realizado foi suficiente para demonstrar algum resultado? Dias
depois, em orientação, a chave para compreender o que ocorrera veio à luz: eu havia sentido
aquilo que o adolescente sente no dia de seu desligamento!
110

7. DISCUSSÃO
A presente pesquisa foi realizada, em Casas Lares e SAICAS, com 11 adolescentes que
tinham completado 17 anos e estavam em processo de desligamento institucional.
O adolescente é, por natureza, caracterizado por uma instabilidade emocional, em
função do grande desafio que lhe é peculiar: a transição entre a infância e a vida adulta. Quando
se trata do adolescente acolhido, somam-se os prejuízos acumulados diante do quadro de
vulnerabilidade a que foi exposto. No acolhimento, a adesão às intervenções e à manutenção de
vínculos é um grande desafio no trato com adolescentes, especialmente com a proximidade do
desligamento institucional, momento marcado por incertezas, sofrimentos e também por planos
de futuro. Diante desse quadro, a intervenção com a técnica expressiva Paisagem Psíquica se
propôs a investigar as problemáticas envolvidas nesse momento emblemático, a partir da
investigação das expectativas quanto ao futuro e satisfação de vida, e também a compreender o
processamento simbólico e imagético vivenciado pelo adolescente durante o desligamento
institucional. Para tanto, o estudo buscou fundamentar a utilização da técnica a partir do estudo
dos quadrantes, embasado na teoria de C. G. Jung, contribuindo assim para a análise dos
resultados.
Vale destacar que, devido ao pequeno número de participantes, às dificuldades
encontradas com o referido público e ao contexto do desligamento institucional, a validade
estatística é bem limitada, não passível de generalizações. Os resultados demonstraram
mudanças do começo ao fim dos encontros, salientadas pelos resultados significantes nos
quadrantes. No entanto, não se pode afirmar que essas mesmas mudanças aconteçam com outros
participantes.
Embora a maioria dos jovens participantes estivesse estudando, com a proximidade do
desligamento alguns desistiram da escola. Corrobora-se, portanto, a relação que Gerard e Booth
(2015) estabelecem entre escola e os problemas relativos à saúde mental dos adolescentes, na
medida em que estes vivenciam momentos de insegurança, com a proximidade do
desligamento, oscilando entre a perda dos cuidados no acolhimento e os desafios relacionados
à vida fora da instituição, como as dificuldades de conseguirem emprego e sustento. Esse quadro
é agravado pelo baixo rendimento escolar que apresentaram, em consonância com o que é
pontuado por Calcing e Benetti (2014), Porto, Szortyka e Heidrich (2012), Siqueira e Dell’Aglio
(2010), Martinez e Soares-Silva (2008) e pela UNICEF (2011), como resultado do quadro de
vulnerabilidade que os afeta. De acordo com Fernandes et al (2015), a escola é considerada o
evento mais estressor nesse contexto.
111

O principal motivo de acolhimento foi a negligência, seguido da situação de rua. O


primeiro já se acha preconizado no ECA (2012) como o motivo que mais leva crianças e
adolescentes ao acolhimento, como referido por Assis e Farias (2013), Nascimento (2012) e
Rosa et al (2012).
O abandono e maus tratos foram vivenciados pelos participantes como dificultadores no
estabelecimento de relações coesas e permanentes, prejudicando, por exemplo, o
estabelecimento de vínculos no próprio acolhimento, dificuldades de manutenção e/ou adesão
a oportunidades de emprego, embora tenham apresentado planos para o futuro. Esses dados
reiteram as ponderações de Ramos, Seidl-de-Moura e Pessôa (2013) sobre os prejuízos
acarretados pelas condições familiares precárias, sobre o quanto a família produz efeitos na
saúde mental dos adolescentes (Gerard e Booth, 2015), bem como os apontamentos de Jung
([1941] 2013a) referentes ao ambiente familiar e ao desenvolvimento dos filhos.
Em relação ao tempo de acolhimento, mais da metade dos adolescentes estava acolhida
há mais de dois anos, o que vai de encontro ao que foi estabelecido pelo ECA (2012). Embora
tenha havido avanços na melhoria dos serviços de acolhimento, no Censo Suas de 2014, 28,2%
dos acolhidos ainda se encontravam em tempo prolongado de acolhimento (Miranda, 2017).
Importante destacar que, quanto mais longo o tempo de acolhimento, maiores os prejuízos no
desenvolvimento do adolescente, como é referido por Sales e Rocha (2013), Martinez e Soares-
Silva (2008), Guirado (2004) e Silva (2004).
No estudo de casos, destacaram-se alguns temas: em relação ao tempo de acolhimento
e futuro, foi observado em dois participantes um longo tempo de permanência. Vale destacar
que ambos estavam prestes a completar a maioridade. Esse perfil de adolescente é destacado
por Assis e Farias (2013), ao relacionarem a idade e o tempo de permanência, especialmente
dos adolescentes mais velhos. De outro lado, Ferreira, Litting e Viscovi (2014) reiteram que o
longo tempo de permanência no acolhimento pode provocar a desorganização de referências.
No entanto, um dos participantes, apesar de ter permanecido apenas cerca de dois meses e meio
na Fundação Casa, num total de seis meses e meio de acolhimento, referiu que a reclusão lhe
causou uma sensação de que o tempo não passava, parecendo ter ficado muito mais do que
realmente ficou.
Em relação à expectativa quanto ao futuro, a média do escore total dos três participantes
que completaram os encontros foi menor, ao final do procedimento de intervenção. É
importante destacar que não foram encontrados estudos sobre a percepção do futuro na
iminência do desligamento institucional. Apesar de os resultados não serem conclusivos, eles
sugerem alguns apontamentos: dois dos três participantes estavam com tempo prolongado de
112

acolhimento, o que traz prejuízos para os adolescentes como foi referido por alguns autores; a
proximidade do desligamento e o não preparo para ele são agravantes para esse quadro, como
é apontado por Figueiró e Campos (2013), Honorato (2011), Siqueira et al (2010), Martinez e
Soares-Silva (2008) e Martinez (2006). Por outro lado, os achados diferem do que esses autores
identificaram, ou seja, uma percepção positiva em relação ao futuro de adolescentes acolhidos
(Zappe e Dell’Aglio, 2016; Zappe et al, 2013) e de adolescentes socioeconomicamente
desfavorecidos (Iovu, 2014; Germano e Colaço, 2012; Macedo e Kublikowski, 2009). Pode-se
inferir que a proximidade do momento do desligamento venha a ser um fator que contribua para
a diminuição da expectativa quanto ao futuro.
Apesar do acima indicado, os participantes demonstraram o desejo de sair da instituição
com planos para o futuro. Liberdade, independência e recomeço foram destacados por eles,
além dos itens família, educação e profissão, o que é pontuado por Ramos, Seidl-de-Moura e
Pessôa (2013) como os mais citados nas pesquisas com adolescentes acolhidos. Os resultados
estão de acordo ao apontado por Martinez e Soares-Silva (2008) sobre o desejo de liberdade e
o receio de perder os cuidados recebidos, assim como não se sentir preparado para os novos
desafios, como é também referido por Benneti e Brino (2016).
Vale destacar que os estudos realizados por Zappe e Dell’Aglio (2016) e Zappe et al
(2013) apontaram evolução positiva quanto à expectativa de futuro em adolescente acolhidos,
embora apresentassem menos oportunidades em relação aos que viviam com suas famílias. No
entanto, os referidos estudos não tiveram como foco os adolescentes que estivessem
vivenciando o processo de desligamento institucional, uma população que merece ser mais
investigada.
A família foi citada em relação aos planos após o desligamento, o que ratifica o estudo
de Zappe et al (2013) sobre a influência que os pais exercem sobre o futuro. Esse dado reforça
a importância do tema sobre o desenvolvimento adolescente, no momento crucial de transição,
como é apontado por Frankel (1998) e Kiepenheuer (1990), assim como fazem referência aos
estudos de Jung ([1941] 2013a, [1904] 201b; Bovensiepen (2014, 2010), Davies (2014), Sidoli
(2014), Knox (2011, 2009), Wilkinson (2006) e Ryotovaara (2010) sobre como as relações de
cuidado, iniciando-se com as relações parentais, serão influenciadoras do desenvolvimento no
que se refere ao futuro.
Embora não tenham sido encontrados estudos sobre a satisfação de vida no contexto do
desligamento que pudessem servir de parâmetro, chamou a atenção qualitativamente - apesar
de os resultados não serem conclusivos -, o aumento da pontuação na média em seis das sete
dimensões, podendo estar atrelado aos benefícios da intervenção: família (ambiente e
113

relacionamentos), self (características positivas, capacidade de se relacionar e demonstrar


afeto), self comparado (realizar comparações do eu em relação ao seu grupo), não violência
(desejo de não envolvimento em situações conflituosas), autoeficácia (avaliação da capacidade
de realizar metas, competências) e amizade (relacionamentos com pares) ao final dos encontros,
com exceção do item escola, que teve menor pontuação. Foram observadas nas falas dos
participantes conteúdos relativos a essas dimensões, como desejo de ter família e casa, ser aceito
pelas pessoas, ter uma profissão, relacionamentos afetivos no acolhimento, pensar sobre as
coisas, não cometer erros do passado, ser paciente, honesto, contar consigo mesmo.
Em relação à dimensão escola, vale ressaltar que para Fernandes et al (2015) a escola,
como já citada, foi considerada o evento mais estressor entre os adolescentes acolhidos, ao
passo que Siqueira e Dell’Aglio (2010) destacaram o baixo desempenho escolar. É importante
considerar que dos três participantes do estudo de casos, um abandonou os estudos próximo ao
desligamento, e o outro interrompeu os estudos em função da transferência de unidade de
acolhimento.
Pelo estudo de caso, foram observados nos participantes alguns fatores relacionados aos
comportamentos de risco, o que corrobora os estudos sobre a adolescência como um período de
maior vulnerabilidade ao risco (Alves e Dell’Aglio, 2015). A automutilação apareceu no relato
de uma participante, e, de acordo com Zappe e Dell’Aglio (2016), evidencia-se maior
comportamento suicida entre os acolhidos do que naqueles que vivem com suas famílias.
Considera-se também que o ataque ao próprio corpo, segundo Bovensiepen (2014), pode
denotar tanto uma forma de poder e sobrevivência quanto a incapacidade de o adolescente se
sentir, ao passo que para Kiepenheuer (1990), pode ser um sintoma vivenciado diante do dilema
que se estabelece entre o propósito da vida e a impossibilidade de sua efetivação. A evasão,
recorrente em um dos participantes do estudo de caso, e também em alguns adolescentes que
por isso tiveram o processo de intervenção interrompido, pode estar atrelada à busca de
liberdade em contraposição às regras institucionais, bem como o desejo de retorno aos vínculos
e ambientes antes do acolhimento, como ratifica Rosa et al (2012).
Considerando-se os conteúdos que emergiram nas produções, os três participantes
apresentaram, em seus processos, oposições, como, por exemplo, ser ponderado e ter impulsos
violentos, perder os cuidados e desejar de ser livre. Segundo Jung ([1950] 2011f), a dinâmica
consciente-inconsciente subjaz à função reguladora dos opostos, o que constitui uma condição
preliminar para o ato de diferenciação e de conhecimento.
A respeito da produção dos três participantes pela técnica utilizada, destacam-se alguns
achados: foram utilizadas mais cores nos primeiros encontros em relação aos últimos, indicando
114

bastante experimentação nos primeiros. Esse dado é importante porque reitera os achados de
Leite (2012), em pesquisa anterior, e sugere um processo de discriminação e seletividade ao
longo das intervenções. Os três participantes identificaram mais elementos nos primeiros
encontros em relação aos últimos, indicando discriminação ao longo da intervenção.
No tocante ao estudo dos quadrantes, considerando-se todos os participantes, houve
diferenças significativas entre os que completaram os encontros na diminuição da forma círculo,
relativo à proteção, envolvimento (Jung [1911/1952] 2016a; Jung, 1929/2011h), e diminuição
da localização inferior, referente a terrestre e corpóreo (Jung [1954] 2016) com aumento da
espiral, referente a circulação, movimento (Jung [1929] 2011h) e aumento da forma vertical,
relativo a interior, introspecção (Jung, 2014; Jung [1950] 2011f). Destaca-se que a forma espiral
foi a única com aumento significativo também para os participantes que não completaram os
encontros e é referida por (Jung [1929] 2011h) como símbolo de circulação em torno de um
centro, dinamizando vários aspectos que compõem a personalidade.
Importante considerar que o acionamento da dinâmica consciente-inconsciente e a
manifestação de conteúdos inconscientes trazidos à consciência implica, como pontua Knox
(2011), a mobilização de processos internos de desenvolvimento com vistas a um estado
autorreflexivo. No entanto, foi observado que o histórico dos adolescentes de maus tratos e de
violência e as incertezas relativas à proximidade do desligamento institucional podem ser
considerados fatores que dificultaram o processo reflexivo. Destaca-se também que a vertical
foi acionada somente pelos participantes que completaram os encontros, especialmente nos
últimos. Esse dado é importante porque, apesar dos prejuízos decorrentes do histórico de vida,
da situação de acolhimento e da iminência do desligamento, processou-se, em alguns deles,
uma disposição para a introspecção e o contato com conteúdos interiores (Jung, 2014), como
observado em uma participante com histórico de abusos, abandono e trauma.
Sobressaem alguns resultados significativos nos casos particulares: o movimento dextrogiro,
em direção à direita, à consciência (Jung [1950] 2011d; [1950] 2011f), apareceu nas produções
de dois participantes, mas de modos diferenciados: para um participante aumentou ao final dos
encontros, sugerindo relacionar-se com a proximidade do desligamento, ao passo que, talvez
em decorrência desse mesmo fator, este diminuiu no outro participante.
No primeiro caso, a partir das associações o participante teceu poucas reflexões sobre
sua condição no acolhimento. Por causa de seu histórico de vida, de episódios de evasão, de
não conformidade às regras institucionais, o anseio de liberdade e de ir para o mundo poderia
ter acionado uma conscientização dirigida a essa saída, com planos específicos e imediatos. A
interpretação de diminuição do campo de ativação intelectual e de diminuição de contato com
115

o inconsciente pode ser lida como diminuição de fantasias inconscientes no plano das ideias.
Para a outra participante, ao mesmo tempo em que esse movimento diminuiu ao final dos
encontros, houve indícios de introspecção e ampliação de consciência, o que demonstra atitude
reflexiva, que se dá em suas falas, junto a mais acionamento do inconsciente, o que se interpreta
como decorrente provavelmente de insegurança e regressão diante da iminência do
desligamento; este último fato é corroborado pelos achados de Figueiró e Campos (2013),
Honorato (2011), Siqueira et al (2010), Martinez e Soares-Silva (2008) e Martinez (2006).
Embora de forma rudimentar, dois dos três participantes do estudo de caso apresentaram
na narrativa um acréscimo de consciência do momento que estavam vivenciando, dos benefícios
obtidos durante os encontros e das dificuldades após o desligamento, mas sem aparentemente
integrar o que se entende por agenciamento do eu, como a capacidade de fazer escolhas, agir e
afetar resultados ou controlar situações, segundo Knox (2011). Posto que se trata de um
processo de construção do eu desde a infância, há de se pensar que esses adolescentes
apresentam prejuízos acumulados em seu desenvolvimento (Jung [1941] 2013a; [1904] 2013b;
[1934] 2012; Knox 2011, 2009, 2007; Wilkinson, 2006), assim como entraves socioeconômicos
importantes e déficits relacionados à escolaridade (Fernandes et al, 2015; Calcing e Benetti,
2014; Porto; Szortyka e Heidrich, 2012; Martinez e Soares-Silva, 2008). Cabe o questionamento
sobre a tendência superprotetora das instituições de acolhimento como inibidoras desse
desenvolvimento (Goffman, 2015; Martinez e Soares-Silva, 2008; Azôr e Vectore, 2008,
Guirado, 2004; Bleger, 2004) e sobre os prejuízos relacionados ao tempo prolongado de
acolhimento (Ferreira, Litting e Vescovi, 2014; Siqueira e Dell’Algio, 2010). De outro lado, é
importante considerar que esses adolescentes buscam formas de resistência, entendidas por
Sales e Rocha (2013) como modos de fortalecimento interior, tais como, por exemplo, ancorar-
se nas próprias histórias de vida, na projeção de sonhos, no desejo de reencontros com a família
e na esperança de construir uma vida diferente. Apesar das limitações e das incertezas
acentuadas pela proximidade do desligamento, os adolescentes do estudo de casos teceram
planos para o futuro.
Até certo ponto, os atos de rebeldia poderiam constituir tentativas de autoafirmação.
Portanto, o agenciamento do eu se fortalece quando esses adolescentes acionam recursos
próprios – mesmo que incipientes. Em quadros de vulnerabilidade, importa que os profissionais
da saúde mantenham a meta de ativar recursos potenciais, distintos em cada indivíduo. As
técnicas expressivas constituem um dos meios de favorecer a emergência de tais recursos.
116

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa ofereceu indícios de que a intervenção com a técnica expressiva
Paisagem Psíquica pode ser benéfica para adolescentes em processo de desligamento
institucional, pois, ao estimular o acionamento do inconsciente e a manifestação de conteúdos
internos, funcionou como um meio de autoexpressão que lhes permitiu relatar suas histórias de
vida, traumas, sofrimentos, angústias, episódios de adição e de automutilação. Houve
demonstrações de consciência incipiente sobre comportamentos, narrativa de fatos importantes
da vida e de planos para o futuro. A escuta simbólica opera como um facilitador, sem
rotulações, proporcionando sentimento de acolhimento.
Considerando os objetivos da pesquisa, foi verificada a propriedade de fundamentação
da técnica expressiva a partir do estudo dos quadrantes, oriundo da obra de C. G. Jung,
possibilitando um direcionamento para a compreensão da psicodinâmica dos adolescentes, em
processo de desligamento, mediante a dimensão imagética como representação da psique
(Jacobi, 2013) e aplicação do estudo de símbolos, em um contexto de investigação (Penna,
2014).
Apesar do número reduzido de participantes que responderam aos instrumentos, antes e
depois da intervenção, portanto, sem possibilidade de generalização, a utilização das Escalas de
Expectativas Quanto ao Futuro e Multidimensional de Satisfação de Vida para Adolescentes
serviram para compreender o processo de desligamento vivenciado pelos adolescentes, a serem
mais investigados em estudos futuros. Por exemplo, a se investigar se a proximidade do
desligamento e o quadro de incerteza e insegurança gerado nesse momento afetam as
expectativas de futuro. O aumento da média - apreciado qualitativamente - de satisfação de
vida para os três participantes que completaram os encontros foi outro indicador, confirmando
a importância de intervenções com técnicas expressivas e de um atendimento individualizado,
como estratégia para atender às necessidades psicológicas de cada adolescente.
Por meio do estudo de casos, foi possível compreender o processamento simbólico e
imagético dos adolescentes que completaram os, elucidando-se os mecanismos que cada um
deles desenvolveu para lidar com suas dificuldades.
Como contribuições para o campo da Psicologia Analítica, depreende-se que seja
possível estudar a psicodinâmica de adolescentes, no processo de desligamento, por meio de
técnicas expressivas, neste caso, a técnica expressiva Paisagem Psíquica, aplicando-a em
intervenções no contexto do acolhimento.
117

Limitações do estudo e indagações futuras para a intervenção com adolescentes, em processo


de desligamento institucional
Apesar das limitações da pesquisa, não só devido ao perfil desse público como também
à dinâmica do acolhimento/desligamento, que impossibilitaram apresentar dados conclusivos e
dispor de grupos controle e experimental, foi possível compreender a psicodinâmica envolvida
no processo de desligamento, mesmo num período curto de intervenção, ilustrada por três
estudos de casos.
Os ambientes em que foram realizados os encontros eram espaços transitórios, não
fechados, ou seja, a interrupção das atividades foi uma constante, durante a realização da
pesquisa. Em vários momentos, elas não foram realizadas por causa do desencontro de
informações sobre a presença do adolescente no dia e horário estabelecidos; em outros, por
causa de punições aplicadas aos adolescentes; por vezes, o próprio ambiente era marcado por
discussões, situações de conflito. Somam-se a isso as evasões que impossibilitaram a
continuidade das intervenções. Mas, apesar dessas dificuldades, o efeito das intervenções
realizadas com os adolescentes foi o propulsor para a continuidade das atividades.
Estudos futuros podem investigar em que medida a transição, que é realizada de forma
compulsória, em especial em função da maioridade, acontece em consonância com os reais
propósitos do adolescente ou é fixada a partir de uma dinâmica sistêmica moldadora de
comportamentos. Esse tema subjaz o processo de desligamento institucional e está relacionado
ao período de transição vivenciado pelo jovem. Pareceu importante ser investigado na medida
em que esse público carece de programas de cuidados e de preparação para o futuro, a partir de
suas aptidões pessoais.
Outro ponto observado a ser investigado é o fato de os participantes que completaram
os encontros estarem acolhidos em instituições mais organizadas e com maior engajamento da
equipe profissional. Ao todo, foram realizados os encontros em cinco unidades de acolhimento,
com perfis diversos em termos de organização e de funcionamento. Estudos futuros podem
investigar em que medida a estrutura apresentada pela instituição e o funcionamento de sua
equipe impactam no processo de desligamento. Poderiam ser aplicadas escalas com foco na
satisfação profissional da equipe, entrevistas bem como dinâmicas de grupos para identificação
do funcionamento da unidade de acolhimento.
Pode-se investigar futuramente não só o impacto da intervenção com adolescentes no
processo de desligamento institucional como também durante o acolhimento, e com
adolescentes de perfis diferentes, como sugerem alguns estudos: comparativamente, são
118

estudados tanto os adolescentes acolhidos como os que vivem com suas famílias e os que
cumprem medidas socioeducativas (Zappe e Dell’Aglio, 2016; Zappe et al, 2013).
Sobre a técnica utilizada, é importante que se dê continuidade ao estudo de sua
aplicabilidade e efetividade com grupos experimentais e controle, inclusive em outros
contextos, assim como a utilização simultânea de distintas técnicas expressivas e de outras
também.
Por último, uma discussão se abre sobre a utilização da técnica expressiva Paisagem
Psíquica como instrumento expressivo ou projetivo: por si, promove a dinamização consciente-
inconsciente; acrescido às associações e à amplificação, possibilita o aprofundamento do
inconsciente e a manifestação de conteúdos transferenciais e contratransferenciais. De um lado,
faz-se necessário diferenciar seu uso no contexto psicoterapêutico, o qual requer conhecimento
especializado de psicodinâmica, de desenvolvimento da personalidade, de defesas e de
mecanismos de projeção, dos quadros e transtornos clínicos, assim como experiência
terapêutica com as projeções e introjeções na transferência e na contratransferência. De outro,
leva a se pensar nos limites entre a técnica e a subjetividade, mas também singulariza uma
peculiaridade da Psicologia Analítica quando se adota a dimensão imagética, que é para Jacobi
(2013, p. 157) a “representação simbólica de uma psique olhada internamente”.
Destaca-se a importância de um estudo inédito ao se utilizar um recurso expressivo com
adolescentes no processo de desligamento institucional. Considera-se, portanto, que o trabalho
todo é uma maneira de personalizar problemáticas e valorizar a individualidade de jovens em
vulnerabilidade, realçando a importância do apoio, em teoria e pesquisa sob esse enfoque.

“Vejo esperança nos olhos deles, embora o futuro seja incerto”


(Sandro Leite).
119

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130

APÊNDICES

Apêndice 1
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – Adolescente

Eu ................................................................................, responsável pela pesquisa que se chama:


O desligamento institucional em adolescentes: intervenção por meio da técnica expressiva
Paisagem Psíquica: um enfoque junguiano, estou fazendo um convite para você participar
como voluntário deste estudo. Esta pesquisa tem como objetivo oferecer a você uma técnica de
pintura, para que possa se expressar de forma livre. É uma técnica que não exige nenhum
conhecimento de pintura, é de fácil execução e você será informado passo a passo sobre como
ela pode ser realizada. Acredito que esta técnica seja importante porque o ajudará nessa fase tão
importante pela qual está passando. Para sua realização será feito o seguinte:

1. No primeiro encontro teremos uma conversa sobre a pesquisa, com assinatura do Termo
de consentimento livre e esclarecido, dois questionários e uma entrevista com algumas
perguntas;
2. Depois teremos encontros semanais por três meses, momento em que vamos utilizar
uma técnica de pintura e conversamos sobre temas importantes que quiser;
3. No último encontro falaremos sobre o que aconteceu durante o tempo que estivemos
juntos por meio de uma entrevista e também a aplicação de dois questionários.

Algumas coisas importantes que você precisa saber:

a. A pesquisa oferece risco baixo para você, ou seja, por se tratar de uma atividade de
pintura de fácil manuseio;
b. Os benefícios que esperamos como estudo são: que você tenha um momento só para
você, e a técnica de pintura o ajudará nisso; que possa pensar sobre essa fase do
desligamento e também pensar sobre o que virá depois que sair do abrigo;
c. Caso você decida não participar, é possível indicar outro tipo de atividade, caso queira;
d. Durante todo o período da pesquisa você tem o direito de tirar qualquer dúvida ou pedir
qualquer outro esclarecimento;
e. Em caso de algum problema relacionado com a pesquisa você terá direito à assistência
gratuita que será prestada pelo próprio pesquisador, ou, caso seja preciso, será realizado
encaminhamento para um profissional especializado, garantindo assim que você fique
bem;
f. Você tem garantido o seu direito de não aceitar participar ou de retirar sua permissão, a
qualquer momento, sem nenhum tipo de prejuízo ou retaliação;
g. As informações desta pesquisa serão confidenciais, e serão divulgadas apenas em
eventos ou publicações científicas, sem que você seja identificado, a não ser entre os
responsáveis por este estudo, sendo assegurado o sigilo sobre sua participação;
h. Os nossos encontros poderão ser gravados com um gravador digital e filmados com uma
filmadora com o objetivo de registrar tudo o que for importante durante nossos
encontros;
i. As pinturas que você criar poderão ficar com você, caso queira, ou poderão ser enviadas
as imagens das pinturas nas formas: impressa ou digital, já que todas serão fotografadas.
Esse envio será feito após o fim de todos os nossos encontros;
131

j. Os gastos necessários para a sua participação na pesquisa serão assumidos pelo


pesquisador, ou seja, você não terá nenhum gasto financeiro;
k. Fica também garantida indenização em casos de danos, comprovadamente decorrentes
da participação na pesquisa, conforme decisão judicial ou extrajudicial.

Autorização:

Eu, ......................................................................................................................................, após


a leitura (ou a escuta da leitura) deste documento e ter tido a oportunidade de conversar com o
pesquisador para esclarecer todas as minhas dúvidas, acredito estar suficientemente informado,
ficando claro para mim que minha participação é voluntária e que posso retirar este
consentimento a qualquer momento sem penalidades ou perda de qualquer benefício. Estou
ciente também dos objetivos da pesquisa, dos procedimentos aos quais serei submetido, dos
possíveis danos ou riscos deles provenientes e da garantia de confidencialidade e
esclarecimentos sempre que desejar. Diante do exposto expresso minha concordância de
espontânea vontade em participar deste estudo.

______________________________________

Assinatura do voluntário ou de seu representante legal

Pesquisador responsável pelo atendimento e pela pesquisa:

 Nome completo do pesquisador


Doutorando em Psicologia Clínica, Núcleo de Estudos Junguianos (PUC-SP)

Email:
Telefones:

 Comité de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo


(PUCSP), situada à Rua Monte Alegre, 984, Perdizes, CEP 05014-901, SP, Telefone:
(11) 3670.8000.
132

Apêndice 2
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido:
Instituição responsável pelo adolescente

Título do Projeto:
O desligamento institucional em adolescentes: intervenção por meio da técnica expressiva
Paisagem Psíquica: um enfoque junguiano.

O presente projeto está vinculado ao Programa Stricto Sensu: Doutorado em Psicologia Clínica
(Núcleo de Estudos Junguianos) sob orientação da Professora Doutora
.........................................., da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), situada
à Rua Monte Alegre, 984, Perdizes, CEP 05014-901, SP, Telefone: (11) 3670.8000. É um
projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCSP (CEP), que aprova e monitora
todos os projetos que lidam com pessoas.

Objetivos:
Investigar se há melhora em relação a: satisfação de vida e percepção de expectativas
quanto ao futuro com o uso da técnica expressiva Paisagem Psíquica, bem como compreender
o processo do momento de saída do abrigo de adolescentes que vivem em instituições.

Eu, ......................................................................................................................................,
Coordenador(a) e/ou Responsável pela Instituição ............................................................
..........................................................................................., e responsável pelo participante da
pesquisa ............................................................................................., autorizo a realização do
projeto de pesquisa intitulado: O desligamento institucional em adolescentes: intervenção por
meio da técnica expressiva Paisagem Psíquica: um enfoque junguiano desenvolvido por
..............................................................

Fui informado(a) dos objetivos do projeto e dos procedimentos de intervenção com os


adolescentes que estão na fase do desabrigamento: preenchimento de ficha: Características
sociodemográficas e do acolhimento institucional, das escalas: Multidimensional de Satisfação
de Vida Para Adolescentes e Expectativas Quanto ao Futuro, bem como a intervenção com a
técnica expressiva Paisagem Psíquica e entrevista final semiestruturada realizada
individualmente.

Estou ciente de que a participação do adolescente é voluntária, de que todas os dados coletados
servirão aos propósitos da pesquisa, contemplando as normas éticas de preservação da
identidade, e de risco baixo aos adolescentes.

Ressalta-se que a participação desta Instituição é voluntária, ficando explícito que a pesquisa
não trará qualquer tipo de apoio financeiro, dano ou despesas para a Instituição e para o
Adolescente. Fica também explicitada a possibilidade de interrupção da participação na
pesquisa por parte da instituição ou do adolescente a qualquer momento, sem que essa decisão
traga quaisquer consequências para ambos.

Todas a minhas dúvidas e questões pertinentes à pesquisa foram respondidas pelo pesquisador
responsável, colocando-se à disposição para eventuais dúvidas que possam surgir em qualquer
momento da pesquisa, ou mesmo após o seu término.
133

Também estou ciente de que este tipo de pesquisa exige uma apresentação de resultados e
análise. Por isso autorizo a divulgação destes resultados produzidos pelo pesquisador, bem
como o conteúdo do projeto para fins de publicação e divulgação científica.

Também fui informado(a) que o pesquisador responsável se compromete, caso a Instituição


tenha interesse, em receber uma apresentação formal com os resultados da pesquisa, em
momento oportuno, como uma forma de devolutiva.

.................................................. / ........../ ........../ .....................

Coordenador(a) ou Responsável pela Instituição: ...............................................................

Pesquisador: Nome completo: .............................................................................

CONTATO:
Email:
Telefones:
134

Apêndice 3
PROTOCOLO

A utilização do Protocolo criado para a técnica expressiva Paisagem Psíquica visa


objetivar a anotação das informações durante o processo de produção plástica, dos elementos
identificados e das associações/amplificações do participante da pesquisa. Foi elaborado a partir
dos procedimentos da técnica e das informações que surgiram durante o estudo piloto (Leite,
2012). Sua testificação foi aprimorada durante a realização do pré-teste com um adolescente
em processo de desligamento institucional, e sua versão final foi aplicada durante a coleta de
dados com os adolescentes que participaram da pesquisa. A adoção do protocolo justifica-se
em função da grande quantidade de informações que foram coletadas, permitindo assim maior
objetividade nos registros para fins estatísticos e interpretativos.
Para o item: Como deposita a água (localização), considera-se a primeira localização
onde o participante deposita a água, com o auxílio de um recipiente plástico. Para esse item são
consideradas as localizações fixas das cinco primeiras categorias: centro, superior, inferior,
esquerda e direita.
Para o item: Como deposita o gesso (localização + forma + movimento), considera-se,
além da primeira localização, a forma que possa surgir e sua trajetória durante a colocação do
gesso em pó sobre a superfície aquosa. Observa-se, com frequência, a forma do receptáculo e
movimentos de rotação (dextrogiro e sinistrogiro).
No item: Sequência cromática (cor + localização e formas + movimento + localização),
as cores escolhidas pelo participante são anotadas na sequência em que foram utilizadas. A
numeração corresponde à quantidade de cores, mesmo que uma cor seja utilizada mais de uma
vez. A localização de cada cor é anotada, bem como formas que possam surgir, se há movimento
(de baixo para cima, de cima para baixo, dextrogiro, sinistrogiro, da esquerda para direita ou
direita para esquerda), bem como a localização destas formas.
No item: Configuração superfície e Configuração fundo, anotam-se as sequências de
produções realizadas pelo participante. Por exemplo: a primeira configuração é denominada A,
seguida da letra s (superfície) e depois f (fundo). Como a técnica propicia a produção de duas
imagens em um mesmo encontro, tem-se a seguinte anotação referente a primeira pintura:
Configuração As e Af. No encontro seguinte, a sequência correta será: Configuração Bs e Bf.
As Configurações da superfície e fundo acompanham as anotações dos Elementos
identificados nas pinturas. Para cada Elemento identificado há um número correspondente.
Quando estes elementos recebem associações e/ou são amplificados pelo participante, no último
campo do protocolo (Anotações + Amplificações), anota-se o número referente ao Elemento
identificado e o que foi associado ou amplificado.
135

(Frente)

(Verso)
136

Anexo 1
MAPA DE ATUAÇÃO

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