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SÃO PAULO
2019
2
SÃO PAULO
2019
3
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________________
Profª Drª Débora Dalbosco Dell’Aglio (UFRGS)
____________________________________________________
Profª Drª Laura Villares de Freitas (USP)
____________________________________________________
Profª Drª Denise Gimenez Ramos (PUC-SP)
____________________________________________________
Profª Drª Ida Kublikowski (PUC-SP)
____________________________________________________
ORIENTADORA: Profª Drª Liliana Liviano Wahba (PUC-SP)
4
AGRADECIMENTOS
À família e àqueles que apoiaram e compreenderam os desafios que envolvem uma pesquisa
desta magnitude.
7
RESUMO
ABSTRACT
The present research aims at studying psychological support for adolescents, during the process
of institutional detachment, through an intervention with an expressive technique. Its main
objectives are to investigate expectations regarding the future and life satisfaction, to understand
individual narratives through symbolic and imagistic processing of adolescents, using the
expressive technique Psychic Landscape as an intervention instrument. Therefore, it is
necessary to substantiate the technique with the study of quadrants, according to the theory of
C.G. Jung. The instruments of measurement are the EEQFA and EMSVA scales, initial and
final interviews and intervention process, with the application of the technique. The participants
are 11 adolescents from Casas Lares and SAICAs*, aged 17 years and one month and 17 years
and 11 months, of both sexes, in the process of institutional disengagement. The method used
is mixed, with a sequential exploratory approach. Individual weekly encounters were held with
each of the 11 adolescents, and three of these young people performed the complete procedure,
including the application of the EEQFA and EMSVA scales, initial and final interviews and
eight intervention sessions. The others did not complete the meetings for several reasons. Three
case studies complement the information. After the intervention, the study of the quadrants
pointed out some significant differences: those who attended the meetings presented more
forms that indicate circulation around a center (spiral), as well as those that refer to introspection
(vertical), and less forms of centralization and protection (circle) and of emphasis on corporeal
and physical (lower right quadrant); those who did not attend all the meetings presented only
increase in the spiral form. Considering the case studies, more elements were identified in the
first meetings in relation to the last ones, indicating discrimination throughout the intervention.
These indicatives of the expressive technique regarding a conscious - albeit partial -
apprehension are allied to the results of the EMSVA instrument, with an increase in the scoring
- without statistical verification - of life satisfaction dimensions, except for school. The
reduction of scoring - without statistical verification - in relation to the expectation regarding
the future (EEQFA) may be linked to the proximity of the detachment. The qualitative analysis
in the case studies demonstrates that adolescents were able to express feelings, to express their
imagination freely, to make plans to the future, as well as to reflect on possibilities and
limitations in relation to life outside the institution, and to become aware of acts committed in
the past, that which underlies the possibility of reorienting attitudes and behaviors.
RÉSUMÉ
LISTA DE FOTOGRAFIAS
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE QUADROS
Quadro 09 – Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com
o participante 02, considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista
final (E2 final) .......................................................................................................................... 85
Quadro 11 – Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com
a participante 03, considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista
final (E2 final) .......................................................................................................................... 94
Quadro 13 – Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com
o participante 04, considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista
final (E2 final) ........................................................................................................................ 102
14
LISTA DE TABELAS
Tabela 02 – Síntese dos escores médios dos domínios EEQFA e EMSVA para os
participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos encontros ........................................................... 74
Tabela 04 – Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-
se os encontros de 1 a 4 e de 5 a 8 para os 4 participantes que completaram 8 encontros ....... 75
Tabela 06 – Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-
se a primeira e segunda metade dos encontros para os participantes que não completaram 8
encontros................................................................................................................................... 77
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 – Escore médio do EEQFA para os participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos
encontros................................................................................................................................... 73
Gráfico 02 – Escore médio das dimensões do EMSVA para os participantes 02, 03 e 04,
antes e depois dos encontros ..................................................................................................... 73
16
LEGENDAS
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS ........................................................................................................... 06
RESUMO................................................................................................................................. 08
ABSTRACT ............................................................................................................................ 09
RÉSUMÉ ................................................................................................................................. 10
LISTA DE FOTOGRAFIAS ................................................................................................. 11
LISTA DE FIGURAS............................................................................................................. 12
LISTA DE QUADROS........................................................................................................... 13
LISTA DE TABELAS ............................................................................................................ 14
LISTA DE GRÁFICOS ......................................................................................................... 15
LEGENDAS ............................................................................................................................ 16
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 19
2. O ADOLESCENTE ACOLHIDO E O PROCESSO DE DESLIGAMENTO .............. 22
2.1 O acolhimento ................................................................................................................... 22
2.2 As leis ................................................................................................................................. 25
2.3 O adolescente acolhido ..................................................................................................... 26
2.4 O desligamento.................................................................................................................. 28
2.5 O adolescente e o processo de desligamento ................................................................... 29
2.6 A utilização de recursos expressivos com adolescentes no acolhimento e
desligamento institucional: revisão de literatura ................................................................. 34
3. ADOLESCÊNCIA E DESENVOLVIMENTO NO CONTEXTO DA
PSICOLOGIA ANALÍTICA ................................................................................................. 37
4. A TÉCNICA EXPRESSIVA PAISAGEM PSÍQUICA: fundamentação e descrição .. 41
4.1 A dinâmica consciente-inconsciente ................................................................................ 42
4.2 O processamento simbólico e imagético ......................................................................... 42
4.3 Estudo dos quadrantes e seus simbolismos a partir da obra de C. G. Jung ............... 44
5. MÉTODO ............................................................................................................................ 47
5.1 Objetivos ............................................................................................................................ 47
5.2 Ideia norteadora ............................................................................................................... 47
5.3 Desenho da pesquisa ......................................................................................................... 47
5.4 Participantes ..................................................................................................................... 49
5.4.1 Critérios de inclusão ........................................................................................................ 49
5.4.2 Critérios de exclusão ....................................................................................................... 49
5.4.3 Processo para escolha dos participantes .......................................................................... 49
5.5 Locais de atendimento ...................................................................................................... 49
5.5.1 Processo para escolha dos locais de atendimento ............................................................ 50
5.6 Instrumentos ..................................................................................................................... 50
5.6.1 Ficha de características sociodemográficas e do acolhimento ........................................ 50
5.6.2 Escala de Expectativas Quanto ao Futuro de Adolescentes ............................................ 50
5.6.3 Escala Multidimensional de Satisfação de Vida para Adolescentes ............................... 51
5.6.4 Entrevista semiestruturada individual (inicial e final) e final.......................................... 52
5.6.5 Técnica expressiva Paisagem Psíquica ........................................................................... 53
5.6.6 Formas de registro das entrevistas, das configurações (pinturas) e dos dados obtidos
durante os encontros ................................................................................................................. 55
18
1. INTRODUÇÃO
A presente pesquisa dedica-se a uma temática que tem despertado cada vez mais
interesse, em psicologia clínica: o adolescente acolhido prestes a ser desligado da instituição de
acolhimento, seja porque retorna à família ou porque atinge a maioridade.
São vários os motivos que levam ao acolhimento institucional, e o reflexo dessa
estratégia protetiva e provisória, pelo menos como é estabelecida a partir do ECA (Estatuto da
Criança e do Adolescente), desperta no adolescente emoções intensas, que serão moldadoras de
sua vida, dentro e fora da instituição. É nesse momento de transição, entre a instituição que
acolhe e provê os recursos diários e a dinâmica de vida que precisa ser construída, entre o anseio
por libertação e as incertezas do que há por vir, entre os medos e as oscilações da saúde e aquilo
que a vida propõe como alternativa, talvez única alternativa, que esse adolescente mais precisa
de um espaço de escuta simbólica, sem censuras nem questionamentos.
Por isso, partindo-se do pressuposto de que ele vive, nesse processo, um momento
importante de mudança, propomo-nos a oferecer um recurso para expressão plástica espontânea
propiciando, a partir de um atendimento individualizado, um momento de atenção e cuidados.
O recurso expressivo visa oferecer a criação de um espaço que promova a expressão e o
agenciamento do eu. Este último, na concepção de Knox (2011), compreende a emergência da
capacidade de simbolização, o que prevê a mobilização de processos internos de
desenvolvimento, com vistas a um estado autorreflexivo e à ampliação de consciência.
Oferecer esse momento para expressão e escuta parece ser um caminho legítimo a ser
adotado. Direta ou indiretamente, está em consonância com o que se entende por atendimento
personalizado, disposto no Art. 92, Inciso III do ECA (2012). Condiz com a escrita de uma
história narrada em primeira pessoa, sem intermediários, para que possam ser trabalhadas
histórias de vida, incertezas, indagações assim como planos para o futuro.
Com tal intuito, foi proposto um modo de intervenção criado pelo autor do presente
projeto, uma técnica expressiva (pintura) denominada “Paisagem Psíquica” que vem sendo
aplicada em vários contextos. Considera-se pertinente na situação em foco, pois se assenta na
possibilidade de revelação de singularidades via expressão plástica, com o intuito de auxiliar o
jovem, no momento de transição tão importante e marcante - o do desligamento institucional.
Leite (2012), ao utilizar, durante a pesquisa de mestrado, a técnica expressiva Paisagem
Psíquica com adolescentes e jovens adultos, identificou que foi gerado um campo por meio do
qual a pessoa, ao ser sensibilizada e estimulada a criar livremente, teve a oportunidade de
conhecer o mundo interno e a relação com o externo, por meio de sua prática, reveladora de
formas e cores variadas e significativas. Mostrou também que, naquele contexto, foi marcante
20
o sentido prospectivo inferido nas produções plásticas e símbolos que emergiram durante o
processo de intervenção, indicativo da possibilidade de ativar um movimento autorreflexivo e
em direção ao futuro, a ser promovido mediante elaboração terapêutica.
A escolha dessa população vulnerável se justifica pela carência de programas oferecidos
a essa faixa etária, num momento que requer atenção especial para que o adolescente faça uso
de recursos que facilitem sua passagem para a vida adulta, de modo mais confiante e consciente.
Está em consonância com as diretrizes estabelecidas pelo ECA (2012) e coaduna-se ao
apontamento de Assis e Farias (2013), a partir do Levantamento Nacional dos Abrigos para
Crianças e Adolescentes, sobre a lacuna de serviços direcionados exclusivamente aos
adolescentes em acolhimento.
Metodologicamente a pesquisa se caracteriza por utilizar o método misto como
estratégia para explorar um determinado fenômeno, por ampliar os resultados qualitativos e por
utilizar os achados quantitativos para auxiliar na interpretação de resultados qualitativos. Tem
os seguintes objetivos: fundamentar a técnica expressiva a partir do estudo dos quadrantes,
investigar a percepção de futuro e de satisfação de vida e compreender o processamento
simbólico e imagético dos adolescentes na vivência do processo de desligamento institucional,
por meio da utilização da técnica expressiva Paisagem Psíquica.
A apresentação a seguir está estruturada da seguinte maneira: o capítulo 2 se inicia com
a discussão dos termos utilizados no contexto do acolhimento, problematizando-se essa
modalidade de proteção. Segue-se a definição de acolhimento, apresentam-se as leis que
sustentam essa prática e o perfil do adolescente acolhido. Na sequência, esclarece-se o
significado de desligamento institucional, destacam-se os termos utilizados nesse contexto,
apresenta-se o perfil do adolescente a ser desligado e os vários fatores associados a esse
processo. O capítulo termina com a apresentação de pesquisas de intervenção que se utilizam
de recursos expressivos no contexto do acolhimento institucional.
No capítulo 3, são apresentadas ideias de autores que discutem a adolescência a partir
do contexto da psicologia analítica, com destaque para os seguintes conceitos: primeiras
relações de cuidados, tendência prospectiva, regressão, agenciamento do eu e função reflexiva.
O capítulo 4 apresenta e problematiza a técnica expressiva Paisagem Psíquica,
instrumento principal de intervenção no processo de desligamento institucional por
adolescentes. O capítulo é complementado com o papel da dinâmica consciente-inconsciente,
o processamento simbólico e imagético e o estudo dos quadrantes a partir da obra de C. G. Jung,
que contribuiu para fundamentar a técnica expressiva e dar suporte à análise dos dados.
No capítulo 5, estão descritos o método de pesquisa e os objetivos.
21
2.1 O acolhimento
O Levantamento Nacional dos Abrigos para Crianças e Adolescentes, realizado em
2011, totalizando o número de 2.624 de indivíduos, já havia ressaltado uma lacuna considerável
nos serviços de acolhimento destinados especificamente ao público adolescente. Esse dado é
reforçado pelo artigo de revisão sobre acolhimento institucional, realizado por Malfitano e Silva
(2014), que destacam a prevalência de estudos em Psicologia sobre o tema bem como a
necessidade de produção de conhecimento para programas efetivos de intervenção social, uma
vez que não tem sido um tema prioritário nos estudos científicos. Do último censo
disponibilizado pelo SUAS em 2016, o total de instituições dedicadas a crianças e adolescentes
aumentou para 2.831 unidades de acolhimento.
O acolhimento institucional de adolescentes se qualifica como uma medida provisória e
excepcional, sem privação de liberdade, que funciona como medida preventiva sempre que a
família ou o responsável perde o direito de proteção. A principal conquista a esse respeito foi a
promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990 (Lei Federal n°
8.069/90), que estabelece o cumprimento da lei no que tange aos direitos de proteção às crianças
e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
O acolhimento, a partir de organizações governamentais ou não, se constitui de algumas
modalidades: abrigo institucional para pequenos grupos (com capacidade para, no máximo, 20
crianças e adolescentes, residentes na comunidade); Casa Lar (com capacidade para até 10
23
bem como o coletivo em detrimento do individual (Goffman, 2015; Porto, Szortyka e Heidrich,
2012).
Essa ênfase, segundo Goffman (2015), Azôr e Vectore (2008), dificulta o
desenvolvimento e a preservação do eu. De um lado, não se deve tomar o acolhimento como
forma de salvação (Nascimento, 2012); de outro, espera-se que não sejam espaços cujos efeitos
negativos possam afetar o desenvolvimento integral do adolescente (Ferreira, Litting, Vecovi,
2014). Apostar em estratégias que foquem o atendimento individualizado e que deem espaço a
momentos de elaboração é uma meta a ser levada em consideração, especialmente quando se
nota a existência de ‘subjetividades’ colocadas entre os papéis que são, ou deveriam ser,
desempenhados pela família e pelas instituições de acolhimento (Aveiro, 2018).
Botelho, Moraes e Leite (2015) se questionam se, de fato, essas formas de acolhimento
cumprem o papel de proteção e de favorecimento da construção de sujeitos, na medida em que
o adolescente que ali está não é considerado o sujeito de direitos, mas aquele com problemas.
O ECA, como principal marco, delimita um campo de atenção e abre discussões sobre os
critérios que norteiam o acolhimento, como em relação à violência e aos maus-tratos que os
jovens sofrem (Braga, Dell’Aglio, 2012), e, a partir de seu Art. 23, abre-se um espaço para a
consolidação da negligência como item que fere esses direitos (Nascimento, 2012).
A negligência familiar, segundo Assis e Farias (2013), é o principal motivo para o
acolhimento, com percentual de mais de cinquenta por cento em relação aos outros motivos que
levam ao acolhimento. Fatores como família numerosa, doença mental, baixa escolaridade de
pais ou responsáveis e desemprego contribuem para esse quadro de vulnerabilidade, como
apontam Siqueira et al (2010). Incluem-se também dependência química, prisão e abuso sexual
dos pais ou responsáveis, vivência de rua e orfandade (Silva, 2004; IPEA/DISOC, 2003) como
fatores que levam ao abandono e consequente acolhimento de crianças e adolescentes. Esse
quadro se coaduna aos fatores associados ao comprometimento de um desenvolvimento
saudável, proferido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, 2011), como
pobreza, baixa escolaridade, exploração do trabalho, privação da convivência familiar e
comunitária, violência referente a assassinatos de adolescentes, gravidez, exploração e abuso
sexual, DTS, AIDS e abuso de drogas.
Importante destacar que a vulnerabilidade se atrela ao estudo sobre risco, especialmente
no contexto da pobreza em função da exclusão social e cultural das famílias (CONANDA,
2013), e, quando se trata da adolescência, entra em cena a relação entre vulnerabilidade e
comportamentos de risco. Segundo Alves e Dell’Aglio (2015, p. 166), a associação com a
adolescência se justifica por ser um “período que envolve transformações físicas e sociais, busca
25
2.2 As leis
Além do ECA, outros marcos legais criaram condições para uma melhor atenção aos
adolescentes, como a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/90), que estabelece a saúde como um
direito social, a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei 8742/93), que promove o
direito à assistência social, a proteção especial à adolescência e o amparo aos adolescentes
carentes, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira – LDB (Lei 9.394/96), que confere
o direito à educação, direito público subjetivo do cidadão (UNVPA, 2010), a Política Nacional
de Assistência Social (MDSCF, 2004), que reitera os pressupostos do LOAS com vistas à sua
efetivação, tendo como foco a matricialidade sócio-familiar e o Plano Nacional de Promoção,
Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária,
de 2009, que, a partir da Lei 12.010 (Lei Nacional da Adoção), “fortalece o paradigma da
proteção integral e da preservação dos vínculos familiares e comunitários preconizados pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente” (CONANDA, 2013, p. 13). Na atualidade, a nova Lei
de Adoção, nº 13.509, de 22.11.2017, prioriza a adoção de adolescentes que tenham problemas
de saúde.
A Lei 12.010, de 2009, estabelece as diretrizes do Plano Individual de Atendimento
(PIA), já previstas no ECA e na resolução conjunta CNAS/CONANDA nº 01/2009
(Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes). Destaca a
importância da participação efetiva da família e do adolescente e se configura por duas
dimensões, descritas nas “Orientações para elaboração do plano individual de atendimento de
crianças e adolescentes em serviços de acolhimento” (MDSA, 2017): a avaliativa
interdisciplinar (apuração da realidade das necessidades do adolescente e da família) e o
26
dados: adolescentes que já viveram nas ruas falam em liberdade, em atrativos, enquanto na
visão dos profissionais essa vivência é considerada um lugar de perdição; já o acolhimento
significa proteção. Quanto à aprendizagem, há um despreparo de profissionais para lidar com
as dificuldades dos adolescentes; as atividades profissionais priorizam tarefas mecânicas, e a
vigilância constante expressa o receio de anular os esforços de proteção. Nesse sentido, a evasão
implica uma descontinuidade do plano de atendimento, dificultado pela burocracia que envolve
o acolhimento e o desligamento institucional.
Sobre a gravidez no contexto do acolhimento, também um tema ainda pouco explorado,
destaca-se o estudo de Miura, Tardivo e Barrientos (2017, p. 343), cujo foco era o sofrimento
psíquico de mães adolescentes acolhidas. Três adolescentes com idades entre 13 e 16 anos
foram entrevistadas, e identificou-se que “nenhuma delas pareceu ter conseguido simbolizar,
elaborar, ressignificar o sofrimento psíquico carregado das experiências de violência
intrafamiliar”, mas que, apesar disso, cada uma delas podia lidar com a experiência mãe-filho
à sua maneira, apesar dos poucos recursos de que dispunham. O estudo realizado por Sanches
(2009) com adolescentes de 14 a 24 anos revela o desejo de elas terem filhos, mas não
necessariamente de assumirem o papel de mães, o que em muitas delas causa arrependimento.
E Martins (2016), num estudo realizado com quatorze adolescentes com idades entre 14 e 19
anos, destaca que, embora as experiências familiares sejam marcadas por riscos, as mães
adolescentes são dependentes do apoio social com que suas famílias as provêm.
2.4 O desligamento
Sempre que há possibilidade de retorno à vida familiar ou em função da maioridade, a
preparação dos adolescentes consiste em promover visitas contínuas à família para a qual será
designado, objetivando-se assim criar um vínculo gradual para sua reinserção (Malfitano; Silva,
2014; Siqueira et al, 2010); todavia, esses jovens podem também receber visitas de familiares
enquanto estiverem acolhido. Pesquisas indicam que, na maioria dos casos, eles voltam para
seus núcleos familiares (pais e mães, tios, avós, entre outros), uma vez que o processo de adoção
prioriza bebês e crianças/adolescentes entre seis e quinze anos de idade (média de 9,1 anos)
(Assis e Farias, 2013), e as meninas são mais adotadas que os meninos (Malfitano e Silva,
2014). Além disso, há a estratégia das Repúblicas, como um preparatório para uma vida
autônoma, especialmente para aqueles que não têm garantias de reintegração familiar.
Há várias nomenclaturas para o processo de saída do adolescente institucionalizado:
desapropriação, desacolhimento (Porto; Szortyka; Heidrich, 2012), desligamento institucional
(Rosa et al, 2012; Siqueira et al, 2010; Martinez e Soares-Silva, 2008), desabrigamento,
29
Como ampliação sobre o tema, vale considerar o estudo de Germano e Colaço (2012),
ao se coletarem narrativas de jovens de escolas públicas socioeconomicamente desfavorecidos.
Mostra-se que a deficiência de acesso a recursos materiais e a experiências de poder e controle
interfere na projeção e no controle do futuro. Mas, mesmo assim, esses jovens são otimistas em
relação ao futuro, especialmente quanto ao investimento nos estudos como preparação para uma
melhor condição de vida, quanto à importância da família e ao investimento em recursos
próprios. Este último dado também aparece nos achados de uma pesquisa internacional,
realizada com 3.509 estudantes adolescentes, caracterizado no estudo como autoconfiança
(Iovu, 2014).
Em uma pesquisa realizada com 2.725 jovens paulistanos, em sua maioria entre 14 e 17
anos, categorizados em relação ao Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS),
provenientes de escolas e instituições não governamentais, com o objetivo de mapear os valores
positivos, Macedo e Kublikowski (2009) destacam, em relação ao futuro, os baixos índices na
capacidade de controle e de tomada de decisões, na capacidade de resistência a condições
adversas. No entanto, observa-se um alto índice em relação à visão positiva do futuro desses
jovens, justificado em parte por se tratar de uma etapa de construção da identidade.
Dos achados desses autores deve-se levar em consideração os seguintes pontos: embora
haja um otimismo em relação ao futuro, em função da conquista de liberdade, o adolescente
acolhido sente-se limitado em suas expectativas pelo tempo de acolhimento, defasagem escolar,
entre outros fatores. Portanto, segundo Martinez e Soares-Silva (2008), o processo de
desligamento deve levar em consideração dois fatores: a orientação ao jovem, em relação ao
futuro, e o passado e a história do adolescente, em relação ao tempo de acolhimento.
Ramos, Seidl-de-Moura e Pessôa (2013) ampliam a discussão sobre o futuro ao destacar
a importância de personalização das necessidades e motivações, ou seja, a consideração do
projeto de vida de cada adolescente e o importante papel da escolarização na projeção de metas
para o futuro. Importa compreender que a preferência pelo presente, em detrimento do futuro,
está relacionada aos riscos que o contexto de acolhimento oferece e também às características
da família e aos cuidados recebidos, ou seja, quanto mais precárias a estrutura familiar e as
relações parentais, mais interferência negativa haverá nas expetativas de futuro e da vida dos
adolescentes. Há de se considerar também que essa preferência é reforçada pela cultura do
imediatismo, colocando o adolescente em uma situação de maior vulnerabilidade.
A relação entre situação familiar e expectativas de futuro é destacada no trabalho de
Rosa et al (2012) com oito adolescentes de 14 e 18 anos, considerando-se o processo de
desligamento institucional. A partir dos relatos, identificam que, mesmo considerando histórias
32
altas de satisfação de vida considerando os domínios amizade e família para os que disseram
ter alguma religião. Destacam que os investimentos na manutenção dos níveis de bem-estar
podem contribuir para uma melhor passagem desses adolescentes, nesse momento marcado por
grandes transformações.
Tais estudos, inclusive os realizados em contextos diversos, viabilizam a compreensão
do quadro de desligamento do adolescente como um momento propício para intervenções que
deem lhe suporte emocional, que lhe ofereçam um instrumento de expressão para que possa vir
a estruturar seu modo de se inserir no mundo, especialmente nos aspectos apontados por Ramos,
Seidl-de-Moura e Pessôa (2013): família, educação e profissão.
Além disso, a consideração de que o desenvolvimento autorreflexivo seja um dos pontos
importantes na construção da identidade do adolescente acolhido, o que pode ser definido como
agenciamento do eu (Knox, 2011; 2009), implica apontar como importante que as formas de
proteção assegurem o desenvolvimento com vistas à singularidade de cada pessoa, garantindo
assim condições adequadas diante das adversidades, especialmente no momento em que o
adolescente regressar ao seio familiar ou quando completar a maioridade.
Depreende-se dos estudos apresentados que a principal função do acolhimento
institucional é a de acolher e proteger (e as legislações e suas atualizações têm contribuído para
isso) e desligamento o termo utilizado atualmente, por parecer o mais desprovido de
preconceitos. No entanto, apesar dos esforços, os adolescentes são aqueles que ainda carecem
de programas especializados e individualizados que os preparem para a vida fora da instituição.
A proteção que recebem é uma tentativa de suprir as privações, o quadro de violências e
carências afetivas a que são submetidos; porém, essa proteção, por vezes, pode ser um
dificultador na transição da adolescência para a vida adulta, quando os cuidados se sobrepõem
às estratégias emancipatórias. Soma-se isso o alto percentual de comportamento de risco que
esses adolescentes apresentam, seu envolvimento com drogas, a ideação suicida, a gravidez
precoce, as evasões e o tempo de permanência na instituição. Apesar dos prejuízos que
apresentam, como defasagem cognitiva e escolar, das incertezas, do despreparo profissional,
pressão financeira e situações de ordem jurídico-institucional, demonstram perceber o futuro de
forma otimista, o que pode estar relacionado ao momento de construção da identidade. Entre os
itens mais citados em relação ao futuro estão a escola, a família e o trabalho. No tocante à
satisfação de vida, a percepção do acolhimento e dos cuidados que recebem é boa, desse modo
priorizar estratégias individualizadas para a preparação dos adolescentes, especialmente no
momento do desligamento institucional, parece ser um caminho legítimo, com o intuito de
minimizar os prejuízos acumulados em função do quadro de vulnerabilidade a que pertencem.
34
familiar deles. Wendt e Dell’Aglio (2018) investem nas práticas educativas, com o intuito de
expor e valorizar as produções plásticas dos adolescentes, entre outras, como desenho, pinturas
e esculturas.
Camargo (2015) apresenta projeto, vinculado ao espaço comunitário e com foco no
processo de cidadania e de desenvolvimento criativo, que dispõe de um conjunto de atividades
para adolescentes acolhidos, como música, dança, gravura, pintura, bordado, visitas e passeios.
A partir da utilização desses recursos expressivos, observa os seguintes aspectos:
desenvolvimento de aptidões técnicas em diversas áreas, estratégias para ampliação do
conhecimento, criação de rotinas e equipes organizadas que funcionam como sustentadores de
processos de simbolização e de estruturação emocional.
Bartho e Uyeno (2015) se utilizam da leitura de uma obra literária, em formato de livro-
diário e escrito por uma autora adolescente, como dispositivo para inspirar 9 adolescentes
acolhidos, com idades entre 10 e 18 anos, a fazerem os registros de suas experiências, por meio
da produção de um diário. As autoras observam um posicionamento inicial de exclusão e
vitimização, para um papel de mais responsabilidade em função da prática de ler e de escrever,
como exercício de reflexão sobre si mesmo.
No trabalho desenvolvido por Tafner (2013), com uso de desenho e pintura, destacam-
se o vínculo ambivalente entre os acolhidos e as figuras parentais, o favorecimento da
integração e a elaboração de aspectos dissociados, relativos à vivência da institucionalização,
destacando-se projetos que foquem no processo de desligamento.
Darewych (2013) se utiliza do desenho com adolescentes acolhidos visando a vida
futura, as metas e esperanças. Destaca-se o Building Bridges (Construindo Pontes), um recurso
expressivo que avalia plasticamente a relação com o futuro. Além da possibilidade de os jovens
desenharem e de refletirem sobre suas vidas, o estudo destaca a habilidade de, mesmo
moderadamente, significarem as próprias vidas. Esse feito pode ser viabilizado por um tipo de
atividade que permita ao adolescente se expressar de forma espontânea e criativa. Como se trata
de um período transitório entre a infância e a idade adulta, como pontuam Ritnour et al (2015),
a utilização de recursos expressivos contribui para a formação do pensamento simbólico e
expressivo, gerando assim um campo de significados passível de ser representado visualmente
e verbalizado.
Brillantes-Evangelista (2013) utiliza modelagem, desenho, pintura e poesia como
recursos, em atividades grupais com adolescentes acolhidos, vítimas de abuso sexual. A
intervenção tem como foco a aplicação de sentido sobre o fazer artístico bem como o despertar
36
Bovensiepen (2014) destaca que, diante desse quadro, pode ocorrer a inflação do ego
influenciada pelas fantasias coletivas, como, por exemplo, a identificação com heróis, heroínas,
guerreiros e também vítimas, provocando rupturas na conexão entre o ego e o self. Segundo
Davies (2014, p. 81), essas influências funcionam como “defesas contra a impotência,
desamparo, dependência e depressão”. Mas há de se considerar, de outro lado, que tais
personagens de poder possam cumprir provisoriamente a heroicidade necessária até que o
adolescente esteja preparado para se lançar ao mundo, a partir de seus próprios meios. Sidoli
(2014) alerta que esses recursos funcionam como uma luta pela sobrevivência, especialmente
quando as primeiras relações de cuidados não foram nutridoras e protetoras. Há um misto de
onipotência e desamparo, o que pode despertar as fantasias tanto genuinamente criativas quanto
suicidas.
As relações que se iniciam com os primeiros cuidados parentais também se estendem ao
longo da vida, através de outras experiências relacionais. A compreensão desses processos
pressupõe uma disposição reflexiva e complexa, como exigência para a ampliação de
consciência. Vilhena (2009, p. 40), por exemplo, destaca que “Jung é considerado um precursor
do pensamento sistêmico, pois lança as bases para se pensar nas mútuas influências da relação
pais-filhos, professor-aluno, assim como ele foi um dos primeiros analistas a conceber
dialeticamente a dinâmica da relação terapeuta-paciente”.
Na contemporaneidade, o aspecto relacional e os agentes interpretativos de mudança
têm sido foco de estudos no contexto da Psicologia Analítica, a partir de diversas vertentes
conceituais (Wilkinson, 2006; Knox, 2011, 2009; Sidoli, 2014; Bovensiepen, 2010; 2014;
Ryotovaara, 2010). Esses autores entendem que as primeiras experiências relacionais servirão
como moldadoras do desenvolvimento humano, porém passíveis de ser ampliadas a partir de
ambientes que propiciem um espaço seguro para novas conexões significativas.
Para Wilkinson (2006), a composição desses aspectos contribui para a emergência do
eu. Como exemplo, apresenta três pacientes, dois dos quais traziam espontaneamente pinturas
para a sessão como registros das experiências pelas quais estavam passando e um com rico
material onírico. O primeiro caso lhe serve como confirmação de que “cada imagem representa
um entre muitos estados do eu que compõem o eu relacional, que é multifacetado” (p. 163). Do
segundo caso, uma paciente com histórico de abuso sexual aos oito anos de idade, destaca o
processo de aproximação com a experiência traumática. Nessa condição, o eu tende a se retrair,
a se esconder do mundo, a partir de defesas protetivas. No decurso de seu processo criativo, a
paciente trouxe a imagem de uma concha protetora, compreendida como uma etapa apontando
para a emergência gradual de seu eu. Por fim, o caso de um paciente que se desenvolveu num
39
ambiente superprotegido, com mãe alcoólatra que tentou várias vezes se suicidar: na sucessão
dos sonhos, a autora destaca o processo que começa com a destruição da mãe interna, passando
por imagens que sugeriam conexão e tomada de controle para uma fase caracterizada pela
emergência da função reflexiva.
Knox (2011) apresenta a noção de agenciamento do eu como a capacidade de fazer
escolhas, de agir e de afetar resultados ou controlar situações, e a função reflexiva como a
habilidade de se relacionar e de fazer sentido em termos comportamentais, mentais e
emocionais. Considera que o senso do agenciamento do eu decorre das atribuições de
significado, estrutura e forma oriundos dos processos interativos com os primeiros cuidadores
que influenciarão o desenvolvimento. Destaca, por exemplo, que o uso da droga pode funcionar
como defesa diante da “inabilidade de experienciar relacionamentos reais” (p. 146) bem como
“a dor e a ansiedade envolvidas nas experiências de separação, perda, vulnerabilidade ou
desamparo” (147). Diante dessa perspectiva emergente da vida psíquica, indica que é preciso
ativar, oferecer meios para que o adolescente possa se desenvolver, especialmente porque a não
separação em relação às figuras parentais funcionará como impeditivo para a independência e
o sentido de agenciamento do eu (Knox, 2007).
Outros autores dedicados a lidar com adolescentes e interessados em sondar o papel do
aspecto relacional e do reflexivo destacam algumas facetas do desenvolvimento e dos
mecanismos que são acionados pelos adolescentes: a habilidade de manejar as situações da vida
diária depende do fortalecimento egoico (Sidoli, 2014); a dificuldade de adquirir uma noção de
tempo pessoal e realista pode estar relacionada às defesas relativas aos desenvolvimentos
futuros, provocando sentimentos de confusão, de se sentir perdido ou mesmo sua aniquilação
(Sidoli e Bovensiepen, 2014); o ataque ao próprio corpo, especialmente entre as adolescentes,
parece funcionar como uma “perda temporária da capacidade de sentir e de experienciar a si
mesma”, mas também desperta para uma forma de poder e sobrevivência (Bovensiepen, 2014,
p. 126); os problemas de simbolização decorrentes de experiências traumáticas refletem a
necessidade de relações restauradoras que promovam contenção e transformação (Bovensiepen,
2010; Ryotovaara, 2010).
Uma variante desenvolvimentista pode ser encontrada nos estudos de Frankel (1998) e
Kiepenheuer (1990), que, apesar de levar em consideração os aspectos acima tratados, lidam
com uma visão diferenciada sobre o adolescente, na medida em que transitam também pelas
expectativas arquetípicas, comunitárias e culturais. Os dois autores apresentam algumas ideias
em comum sobre a adolescência: é uma experiência única, originária; o processo de transição
é natural e universal, e, por isso, a visão teleológica (tendência prospectiva) deve caminhar junto
40
à história pregressa, na medida em que, como aponta Frankel (1998), os sintomas (como
símbolos) devem ser abarcados prospectivamente pois estão relacionados a um futuro que está
por vir, colocando o adolescente como agente em ação no mundo. Soma-se a isso a
compreensão de que o adolescente dispõe de recursos próprios para a restauração do processo
de crescimento, mesmo em contextos de grande privação externa.
Kiepenheuer (1990) destaca que, à medida que o futuro se aproxima, mesclam-se no
adolescente fantasias de conquistar o mundo e o medo de tomar o futuro a partir de um ponto
de vista pessoal, o que provoca a oscilação entre a supervalorização de si mesmo, por vezes sem
limites, e o desespero e pavor diante do mundo ao qual foi jogado. Trata-se da instauração de
um “conflito entre mundos se opondo e tendências internas contraditórias” (p. 6). Nesses
momentos são despertadas indagações sobre o propósito da vida, e na impossibilidade de sua
efetivação, podem tender para o uso de drogas, para quadros depressivos bem como para
tentativas de suicídio. Estes são indicadores de que os adolescentes estão clamando por um
“chamado de ajuda que faça sentido à vida deles” (p. 9).
De acordo com os autores citados, as experiências iniciais e a remodulação posterior
com outras figuras relacionais são importantes indicativos a ser considerados no manejo de
eventos futuros, em que os sintomas (símbolos) apontam direções e por isso precisam ser
tratados prospectivamente. Segundo Jung (2014, p. 165), trata-se de uma dimensão do tempo
em relação ao desenvolvimento: “Isto significa um passado e um futuro e, assim, o indivíduo
só é completo quando acrescentamos sua estrutura presente como resultado de acontecimentos
passados e, ao mesmo tempo, a estrutura presente tomada como ponto de partida de novas
tendências”.
Tomando-se como referência os estudos anteriormente apresentados, vale considerar a
situação vivenciada durante o processo de desligamento institucional: além de este ser um
momento de transição que traz muitas implicações para a vida dos adolescentes, estes vivem
em acolhimento apartados da convivência familiar e comunitária, e trazem em seus históricos
marcas de privações, violências, sofrimentos. Nesse sentido, a utilização da técnica expressiva
Paisagem Psíquica como recurso de expressão pode ser um facilitador para o acionamento do
agenciamento e da função reflexiva.
41
a ampliação da consciência, enquanto Van Den Berk (2016) a considera como uma das fases
envolvidas no processo curativo. Já Maclagan (2001, p. 142), a partir desse contexto, inaugura
o termo “estética psicológica” ao problematizar os imbricamentos entre as qualidades estéticas
e os efeitos psicológicos, por isso considera a pintura como um importante e complexo meio
através do qual ocorre a objetivação da psique no mundo.
Em síntese, as ideias inauguradas por Jung demarcam um território de pesquisa que vem
sendo aplicado em vários contextos e se configura como estratégia de intervenção. Pressupõe
dois elementos recorrentes, em consonância com os autores também elencados: o processo
relacional que se estabelece a partir da dinâmica consciente-inconsciente e também ampliado
para as várias modalidades relacionais (primeiros cuidadores e bebê, terapeuta-paciente, entre
outros) e a emergência do processo reflexivo despertado pela concretização dos símbolos.
passo que SD, mais próximo do consciente. No campo da arte, são relevantes os estudos de
Wolfflin (2015) e o paralelismo que Arnheim (2016; 1990) observa com os estudos sobre
neuropsicologia e percepção visual de Dodwell (1983).
O estudo sobre os quadrantes, as produções plásticas e os símbolos harmonizam-se com
o pressuposto de que certas ações, em função de sua importância e recorrência, delimitam uma
tendência compositiva, especialmente no campo criativo e de expressão plástica visual. A
contribuição para o campo da Psicologia Analítica se assenta na possibilidade de abarcar as
produções plásticas em termos de simbolização da espacialidade, por meio da qual é possível
estudar o psiquismo.
A ativação dessa tendência compositiva, tendo como dispositivo a intervenção com a
técnica expressiva Paisagem Psíquica, reatualiza-se no seio da individualidade, durante o
processo de concretizar imagens por meio da pintura. Decorrem dos estudos de Jung a noção
de método de imagens (picture method) (Jung, 1997) e recorrência de elementos básicos,
também explorados em sua época pelo historiador de arte Aby Warburg, e a ideia de
pathosformel, pelos estudos dos cartões de Rorschach1 bem como pela teoria das ideias
elementares (elementargedanke) de Adolf Bastian. Somam-se a esses autores os estudos que
relacionam essas duas áreas no contexto na Psicologia Analítica (Madden, 2016; van der Berk,
2012; Parker; 2008; Reiber, 2008; MacLagan, 2001, 2015; Kreinheder, 2005; McNiff, 1988).
O interesse pelo tema foi despertado durante o estudo piloto de mestrado realizado com
adolescentes e jovens adultos, com idades entre 18 e 21 anos, que estavam cursando o nível
superior, por meio da intervenção com a técnica expressiva Paisagem Psíquica (Leite, 2012).
Nesse contexto, foi possível identificar a utilização do quadrante esquerdo num primeiro
momento, referido como campo mais próximo do inconsciente, em direção ao direito, este mais
próximo da consciência, entendendo-se um sentido prospectivo bem como o surgimento da
centralização e simetria. Tais achados permitiram formular a hipótese de, que para esses jovens
estudados, a movimentação para a direita apontaria para a preparação do futuro, a qual está em
processo, antecedida por um acionamento do inconsciente.
Em vista desses achados, surgiu a proposta de investigar quais movimentos, formas e
localizações aparecem em adolescentes, no contexto de vulnerabilidade social, especialmente
naqueles que estão acolhidos e vivenciando o processo de desligamento institucional. Nesse
momento, as indagações sobre o futuro e as incertezas são despertadas, o que provoca o
surgimento de angústias ou o agravamento da saúde mental dos adolescentes, como atestam
1
A importância dos trabalhos desses dois autores foi apresentada na dissertação de mestrado: Paisagem Psíquica
(Leite, 2012).
46
alguns autores (Benetti e Brino, 2016; Gaspar, Santos e Alcoforado, 2015; Figueiró e Campos,
2013; Porto, Szortyka e Heidrich, 2012).
Foi importante, por isso, realizar o estudo dos quadrantes e seus simbolismos, a partir
da obra de C.G. Jung, com o intuito de fundamentar a intervenção com a técnica expressiva
Paisagem Psíquica e gerar parâmetros para se compreenderem esses movimentos, formas e
localizações. Para tanto, realizou-se um levantamento sistemático das citações referentes a
desenhos, pinturas e símbolos na obra de C. G. Jung, levantamento esse que serviu de base
conceitual para investigar a conexão entre a produção plástica e os símbolos que emergem a
partir dela.
O estudo apontou três grandes categorias e suas subcategorias, que serviram de
referência para a análise dos resultados da presente pesquisa: 1. Forma: vertical, horizontal,
círculo, simetria e espiral; 2. Localização: centro, superior, inferior, esquerda, direita; 3.
Movimento: de baixo para cima, de cima para baixo, da esquerda para a direita ou dextrogiro,
da direita para a esquerda ou sinistrogiro.
O estudo dos quadrantes e seus simbolismos também contribuiu para a elaboração de
um protocolo, utilizado durante as intervenções com os participantes da pesquisa (Apêndice 3).
47
5. MÉTODO
5.1 Objetivos
a) Realizar o estudo dos quadrantes e seus simbolismos, a partir da obra de C. G. Jung;
b) Aplicar esse estudo nas produções expressivas de adolescentes que vivenciam o
processo de desligamento institucional;
c) Examinar expectativas de futuro e satisfação de vida de adolescentes em processo de
desligamento institucional;
d) Compreender o processamento simbólico e imagético dos adolescentes, no decorrer
da intervenção, por meio da técnica expressiva Paisagem Psíquica.
QUANTI-QUALI
Estudo dos quadrantes:
Categorias e subcategorias que emergiram a partir da obra de C. G. Jung
QUANTI
VI* Intervenção
Análise estatística
Expectativas Quanto ao Futuro de Adolescentes
Satisfação de Vida para Adolescentes
Análise estatístico-topológica
Cor (quantidade + localização)
Forma (tipo + movimento + localização)
QUALI-QUANTI
Estudos de casos
Elementos identificados (+ Associações + Amplificações) + variáveis Cor e Forma
Entrevistas (E1 inicial e final + E2 final)
5.4 Participantes
Participaram da pesquisa onze adolescentes que tinham completado 17 anos de idade e
que estavam vivenciando o processo de desligamento institucional.
5.6 Instrumentos
5.6.1 Ficha de Características Sociodemográficas e do Acolhimento Institucional
A caracterização é constituída dos seguintes dados sociodemográficos: idade,
frequência à escola, números de irmãos na instituição, contato com os pais e família, fuga da
instituição, tempo total de institucionalização, série escolar, motivo do acolhimento (Calcing e
Benetti, 2014; Serafini, 2004). O objetivo dessa caracterização é compreender o perfil do
adolescente acolhido, sendo os dados fornecidos pelas Instituições de Acolhimento, geralmente
pelos psicólogos e/ou assistentes sociais.
Alguns itens foram acrescidos, em função da especificidade da pesquisa e para efeitos
estatísticos: a) no item Idade, foram acrescentados os meses, em função da homogeneidade da
amostra – todos os adolescentes tinham 17 anos; b) foi introduzido o item Rendimento escolar
com o objetivo de se ampliarem os dados sobre a situação escolar do participante; c) foi
acrescentado o item Nº de irmãos não institucionalizados, com o intuito de serem ampliados os
dados sobre o número de irmãos; d) foram acrescentados dois itens em Motivo do acolhimento:
situação de rua e risco de morte na região de residência, pois surgiram durante a coleta de dados.
e Gunther (1998), com jovens de 11 a 19 anos, e por Zappe et al (2013), com adolescentes de
14 a 19 anos. A Escala é composta de nove questões sobre as chances que o adolescente acredita
ter em relação a educação, trabalho, família e saúde. Alguns exemplos desse instrumento:
“concluir o ensino médio”, “ter um emprego que me garante boa qualidade de vida”, “ter uma
família”, “ser saudável a maior parte do tempo”. As respostas são em formato Likert de cinco
pontos: de muito baixas (1) até muito altas (5). No estudo realizado por Zappe et al (2013),
foram observados os seguintes resultados comparando-se adolescentes que viviam com suas
famílias, acolhidos, e aqueles que cumpriam medidas socioeducativas: a) não foram
encontradas diferenças significativas com relação ao escore total de expectativas quanto ao
futuro entre os adolescentes de escolas públicas e os de acolhimento institucional, com exceção
do item Ensino Médio, com maior pontuação para os adolescentes de escolas públicas; b) os
adolescentes acolhidos apresentaram escore mais baixo em relação aos fatores de risco, em
comparação aos que viviam com suas famílias; c) os adolescentes acolhidos apresentaram maior
escore total em relação aos que cumpriam medidas socioeducativas.
Obs.: As duas escalas citadas anteriormente foram padronizadas para a população brasileira e
estão disponíveis para uso. Os autores dos referidos estudos foram notificados sobre a utilização
das escalas na presente pesquisa.
d) Tinta de qualidade líquida (nanquim). Em virtude de a pintura ser realizada sobre a água,
para que haja o efeito desejado, essa tinta precisa ser líquida de modo a permitir sua
dispersão na água, efeito este que não é possível com tintas de qualidade pastosa como
acrílica, óleo ou guache. A tinta nanquim tem pigmentos fortes, e, por isso, suas cores
são intensas, contribuindo para o resultado final. O gesso depositado na bacia recebe
parte da tinta colocada na água, formando-se espontaneamente configurações abstratas.
Dependendo da quantidade de tinta nanquim utilizada, principalmente nas cores branca,
prata e dourada, pode ocorrer o acúmulo de material em algumas regiões formando
relevos sobre a placa de gesso. A paleta definida para a presente pesquisa compõe-se
das seguintes cores nanquins: azul, amarelo, vermelho, verde, branco, preto, dourado e
prata. Em pesquisa anterior (Leite, 2012), utilizou-se a paleta de cores-pigmento de
acordo com a definição proposta pela Deutsches Institut für Normung (DIN)
(Guimarães, 2000), que são: cores primárias - magenta, azul cyan, amarelo; cores
secundárias - vermelho, azul violeta, verde; branco e preto, além de dourado e prata.
Como a paleta de cores da tinta nanquim não tem o magenta e o azul cyan, para essas
duas foram utilizadas as ecolines. No entanto, para efeito expressivo, observou-se que
no estudo realizado não foi um fator determinante a utilização da paleta de cores-
pigmento. Além disso, as ecolines são tintas com custo mais elevado do que as nanquins
(em referência às marcas utilizadas).
e) Outros materiais: avental, luva cirúrgica (caso o participante não queira colocar as mãos
diretamente na água, na hora de dissolver o gesso), tesoura sem ponta (para abrir o saco
de gesso). Sugere-se um ambiente com boa iluminação e pia.
como se sentiu, se o fez lembrar alguma coisa, se consegue reconhecer alguma figura, o que
pode dizer sobre essas lembranças, sobre essas formas.
Assim que esse momento de diálogo termina, é avisado de que essa pintura dará lugar a
uma outra, formada na placa de gesso que, nesse tempo, endureceu e foi manchada com as cores
que ele utilizou durante a pintura na superfície aquosa. É convidado a despejar a água em uma
bacia reservada para esse fim, se assim o quiser. Pelo menos na primeira vez o pesquisador pode
despejar essa água em conjunto com o participante, a fim de mostrar-lhe a forma adequada de
fazê-lo, que deve ser lenta para que não caia água fora da bacia e não se danifique a pintura que
se formou na placa de gesso que está submersa. É novamente convidado a se sentar e a apreciar
a segunda pintura. Receberá a mesma consigna por ocasião da primeira pintura.
5.6.6 Formas de registro das entrevistas, das configurações (pinturas) e dos dados obtidos
durante os encontros
Para a fidedignidade dos relatos, todas as entrevistas (E1 inicial e final e E2 final) foram
registradas, com recurso de gravação disponível em celular (Lenovo K53b36). Esse registro
está explicitado no TCLE. Toda configuração (pintura) foi fotografada com câmera digital e
sem flash (Canon 60D) para que este não refletisse na superfície aquosa e interferisse na
qualidade da imagem, e um segundo registro foi realizado com câmera de celular (Lenovo
K53b36). Fotografaram-se todas as produções plásticas, sendo os registros dos elementos
identificados nas configurações, associações e amplificações realizados por meio do protocolo
desenvolvido para a pesquisa.
5.7 Procedimento
5.7.1 Procedimento de intervenção e avaliação
Após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa e anuência das instituições, foi iniciado
o procedimento de intervenção, que ocorreu de abril de 2017 a agosto de 2018, num total de
setenta e quatro encontros realizados com onze adolescentes. Os encontros foram realizados
respeitando-se a dinâmica das instituições em relação a dias e horários mais apropriados,
especialmente no contraturno escolar e profissional dos adolescentes.
No Quadro 02 estão descritos os participantes da pesquisa, o sexo, o número de
encontros que cada um realizou e o motivo da interrupção das atividades.
56
Quadro 02: Identificação dos participantes da pesquisa por sexo, considerando o número de encontros que
realizados e o motivo de interrupção das atividades
No. de Encontros
Sexo Motivo de interrupção das atividades
identificação que realizou
01 M 11 Completou
02 M 9 Completou
03 F 9 Completou
04 M 8 Completou
05 M 6 Desligamento
06 M 5 Desistiu após conflito com família
07 F 4 Trabalho
08 F 4 Evasão
09 F 2 Transferida
10 M 2 Excesso de atividades
11 F 2 Evasão
A pesquisa foi estruturada para ser realizada em oito encontros, levando-se em conta os
seguintes critérios: a) por se tratar de adolescentes cujos interesses são diversos, um número
maior de encontros poderia dificultar a adesão às atividades; b) em função da proximidade do
desligamento, o prazo de dois meses de intervenção pareceu pertinente. Participaram seis
adolescentes do sexo masculino e cinco do sexo feminino.
No entanto, optou-se, em alguns casos, por prolongar as atividades em função da adesão
e da disponibilidade dos participantes e também porque foram observadas necessidades de
apoio. Quatro participantes completaram o mínimo de oito encontros: o participante 01
completou onze encontros, os participantes 02 e 03 completaram nove encontros, e o 04
completou oito encontros. Os outros não completaram o mínimo de oito encontros, em função
dos seguintes motivos: o participante 05 foi desligado antes do tempo previsto; o 06, após uma
visita de final de semana à família, como parte do PIA, se envolveu em uma briga familiar e
após esse episódio desistiu de todas as atividades a que estava vinculado; a participante 07
interrompeu as atividades porque iniciou atividade profissional; as participantes 08 e 11
evadiram; a 09 foi transferida para uma unidade especializada em refugiados; o participante 10
interrompeu em função de excesso de atividades que estava realizando.
No Quadro 03 estão descritos os procedimentos de intervenção e avaliação realizados
com os onze participantes da pesquisa.
57
Quadro 03: Descrição dos procedimentos realizados com os participantes que completaram e os que não
completaram os encontros
PARTICIPANTE PARTICIPANTES PARTICIPANTES
Não completaram o mínimo
Completaram o mínimo de 8 encontros
de 8 encontros
01 02, 03, 04 05, 06, 07, 08, 09, 10 e 11
Levantamento inicial: Levantamento inicial: Levantamento inicial:
Os participantes 05, 06, 07, 08, 09, 10 e 11, que realizaram de dois a seis encontros,
responderam à entrevista inicial (E1 inicial) e preencheram as escalas EEQFA e EMSVA antes
da intervenção com a técnica expressiva.
As entrevistas E1 final e E2 final foram realizadas somente com os participantes que
completaram oito encontros, considerando-se ser um número de encontros pertinente ao
aprofundamento no processo criativo. Os encontros foram realizados individualmente, e sua
duração variou entre quarenta e sessenta minutos.
O procedimento de avaliação levou em consideração todos os dados coletados. Para
análise estatística, foram utilizados os testes de Qui-quadrado e Fisher para as variáveis
categóricas (dados demográficos, Cor quantidade e localização, Forma quantidade, movimento
e localização, para os adolescentes dos sexos masculino e feminino) e o teste não paramétrico
de Mann-Whitney para as variáveis numéricas (escores dos questionários EEQFA e EMSVA).
Foram utilizados os softwares do Excel e IBM SPSS Statistics 21. Considerou-se significante
p<0,05.
Em relação à análise das variáveis Cor (quantidade e localização) e Forma (tipo,
movimento e localização), foram utilizadas as produções plásticas dos onze participantes para
efeitos estatísticos. Foram adotados os seguintes critérios em relação aos que completaram e
não completaram os encontros: a) quatro participantes completaram os encontros, variando de
oito a onze encontros. Foram considerados somente os encontros de 1 a 8, por isso optou-se
pela divisão entre os primeiros encontros (1 a 4) e os últimos (5 a 8) para os quatro participantes;
b) para os sete participantes que não completaram os encontros, variando de dois a seis
encontros realizados, optou-se pela divisão entre a primeira e última metade dos encontros
realizados.
Para a análise qualitativa foram considerados os elementos identificados pelos
participantes em suas respectivas configurações plásticas (pinturas), as associações, as
amplificações, os conteúdos das entrevistas e os dados estatísticos referentes às variáveis Cor e
Forma. Vale ressaltar que os elementos identificados pelos participantes nas pinturas, além de
fornecer dados para a análise de conteúdo, também são estudados em função de suas
localizações, assim como as variáveis Cor e Forma.
6. RESULTADOS
Quadro 04: Categoria Forma e subcategorias, sinônimos e respectivas citações extraídas da obra de C. G.
Jung
Termo adotado e Escolha de citações que melhor ilustram
Item Categoria Referência
sinônimos os significados dos termos
“De repente encontrei-me completamente
isolado. Isto, por mais desvantajoso que
possa ter sido, teve também uma vantagem
(Jung, 2014,
para mim como um introvertido; ou seja,
p. 65)
VERTICAL estimulou o movimento vertical da libido,
Interior fui pressionado a investigar plenamente as
Introspecção coisas dentro de mim”.
Introversão “[...] foi o pensamento cristão da Idade
Para dentro Média [...] trocando o destino celeste por
um destino terreno e passando, deste modo, (Jung [1950]
da linha vertical do estilo gótico para a 2011f, § 78)
linha horizontal da descoberta do mundo e
da natureza”
“[...] assim que aparecem no desenho
formas horizontais, temos a aparição das (Jung, 2014,
HORIZONTAL funções racionais, porque elas estão sobre a p. 141)
De fora nossa terra”.
Exterior “[...] movimento horizontal, de conquista (Jung [1950]
Mundo exterior da terra e de domínio da natureza”. 2011f, § 150)
“Desligado do movimento horizontal que a (Jung, 2014,
atividade do mundo exterior traz”. p. 65)
1 “A ideia de receptáculo é arquetípica. É
Forma
encontrada em toda a parte, sendo motivo
central de quadros inconscientes. É a ideia (Jung
do círculo mágico desenhado em volta de [1935/1943]
alguma coisa que deve ser impedida de 2011g, § 409)
fugir ou que deve ser protegida de algum
modo”.
(Jung
“O tema do envolvimento é uma simbólica
CÍRCULO [1911/1952]
materna”.
Circular 2016a, § 367)
Invólucro “A surpreendente quantidade de linhas e
Receptáculo camadas ondulantes na nossa mandala
Recipiente podem ser interpretadas como uma
(Jung [1950]
Envolvimento constituição de invólucros, isto é, como
2011d, § 576)
defesa contra o exterior. Trata-se de
formações protetoras as quais têm o mesmo
objetivo da consolidação interior”.
“Podemos então compreender por que se
recorre ao círculo protetor. Este deve
(Jung, [1929]
impedir a efluxão, protegendo a unidade da
2011h, § 47)
consciência contra a fragmentação
provocada pelo inconsciente”.
63
Quadro 05: Categoria Localização e subcategorias, sinônimos e respectivas citações extraídas da obra de
C. G. Jung
Termo adotado e Escolha de citações que melhor ilustram
Item Categoria Referência
sinônimos os significados dos termos
“O si-mesmo é, por definição, o centro e a
(Jung [1944]
circunferência dos sistemas conscientes e
2011e, § 310)
inconscientes”.
“Seu tema básico é o pressentimento de um
centro da personalidade, por assim dizer,
um lugar central no interior da alma, com o (Jung, [1950]
qual tudo se relaciona e que ordena todas as 2011j, § 634)
coisas, representando ao mesmo tempo
CENTRO uma fonte de energia”.
Centralização “Começa para aquele que se põe numa
(Jung,
Ponto relação, transcendental, com seu centro, um
[1911/1952]
Central processo de conscientização que tende para
2016a, § 427)
Mandala a unidade e para a totalidade”
“O símbolo do mandala tem exatamente o
significado de lugar sagrado, de temenos,
para proteger o centro. E é um dos mais
(Jung
importantes motivos na objetivação das
[1935/1943]
imagens inconscientes. Destina-se a
2011g, § 410)
proteger o centro da personalidade de ser
Localização invadido e influenciado por meios
2 exteriores”.
“o homem culmina, em cima, na ideia de (Jung [1950]
SUPERIOR um Deus luminoso e bom” 2011f, § 386)
Alto “bem como a mandala dividida, cuja parte
(Jung [1950]
Aéreo superior corresponde à esfera mais
2011d, § 536)
Em cima luminosa do salitre”
Espiritual “[...] de cima vem tudo o que é aéreo, (Jung [1950]
intelectual, espiritual”. 2011d, § 561)
“Cinza é um termo geral para o corpóreo (Jung [1954]
que fica embaixo”. 2016, § 131)
INFERIOR (Jung
“[...] embaixo, água, negrume, animal,
Baixo [1945/1954]
serpente”.
Embaixo 2011i, § 462)
Abaixo “A serpente desvia o movimento
Corpóreo psicológico aparentemente para o reino das
Terrestre (Jung, 2014,
sombras, dos mortos e das imagens erradas,
p.134)
mas também para a terra, para a
concretização”
(Jung [1944]
ESQUERDA “A esquerda significa o lado inconsciente”
2011e, § 166)
64
(Jung
“[...] uma esquerda, elemento feminino”. [1945/1954]
2011i, § 462)
“A esquerda é o lado do coração, do (Jung [1950]
emocional, onde o indivíduo é afetado pelo 2011f, § 409,
inconsciente”. nota 112)
(Jung [1944]
“[...] a direita representa a consciência”
2011e, § 225)
(Jung
“[...] uma direita, elemento masculino”. [1945/1954]
DIREITA
2011i, § 462)
“A direita é onde domina a razão (Jung [1950]
consciente. A direita é onde está o direito, o 2011f, § 409,
que é reto, o que é justo, o que é correto”. nota 112)
Quadro 06: Categoria Movimento e subcategorias, sinônimos e respectivas citações extraídas da obra de
C. G. Jung
Termo adotado e Escolha de citações que melhor
Item Categoria Referência
sinônimos ilustram os significados dos termos
“Em compensação surge na mandala um
movimento de certo modo para cima e
(Jung [1950]
para o claro, aparentemente numa
2011d, § 570)
tentativa de salvar a consciência do
escurecimento do mundo em torno”
DE BAIXO
PARA CIMA “[...] psique do homem, têm duplo
(Jung [1954]
aspecto, um se volta para cima e para a
Subida 2016b, § 165)
luz”.
Ascendente “[...] caminho de subida [...] é o período
Ascensão (Jung, 2014,
de crescimento, da juventude, da luz e do
Ascensus p. 68)
verão”
Elevação
“[...] o movimento para a direita deve
(Jung [1950]
produzir uma ascensão à claridade da
2011d, § 570)
DEXTROGIRO consciência”.
Da esquerda para “A transformação se processa da
direita esquerda para a direita, acompanhando o (Jung [1950]
movimento do sol, trata-se de um 2011f, § 409)
processo de tomada de consciência”.
“[...] ao aspecto psicológico de nossa
gravura, é evidente que se trata de uma
descida ao inconsciente. A travessia (Jung [1946]
noturna no mar é uma espécie de descida 2017, § 455)
3 Movimento
aos infernos, uma imersão no
DE CIMA PARA inconsciente”.
BAIXO “A descida a regiões cada vez mais
(Jung [1946]
profundas do inconsciente se converte
2017, § 493)
numa iluminação vinda de cima”.
“A obra alquímica começa justamente
(Jung, [1950]
com a descida às trevas ou ao
2011f, § 231)
inconsciente”.
Descida “A direção para a esquerda mostra
Descendente presumivelmente o movimento em Jung [1950]
Descensus direção ao inconsciente, portanto a 2011d, § 669)
imersão no mesmo”
“O caminho para a esquerda,
evidentemente, não conduz para cima,
SINISTROGIRO para o reino dos deuses e das ideias (Jung [1944]
Da direita para eternas, mas sim para baixo, para a 2011e, § 169)
esquerda história natural, para os fundamentos
instintivos animais do ser humano”.
“[...] o desenho não mostra equilíbrio, e
o vaso cai para a esquerda, para o lado (Jung
do inconsciente, demonstrando assim [1935/1943]
que o inconsciente ainda é todo- 2011g, § 411)
poderoso”.
65
SE superior SD
centro
C
IE inferior ID
SE SD
esquerda direita
IE ID
círculo
espiral vertical
l
simetria
horizontal
Na Figura 02, são apresentados os resultados da nuvem de palavras, que têm como
objetivo representar graficamente a frequência das palavras oriundas das 280 citações da obra
de C. G Jung. Na análise, destacam-se os termos de maior frequência: centro, inconsciente,
círculo, mandala, esquerdo e símbolo. A recorrência dos termos ratifica a ênfase dos estudos de
Jung sobre o processo de centralização, simbolizado pelo mandala, e a importância do
inconsciente quando se trata de produção imagética, característicos do processo de organização
interna (totalidade) e pertinentes à noção de individuação, como também o círculo, como forma
relativa a proteção.
Figura 02: Nuvem de palavras: frequência das 280 citações extraídas da obra de C. G. Jung
68
Na Figura 03, são apresentados os resultados da análise de similitude, que têm como
objetivo a construção da árvore de coocorrências. Nessa análise é possível se identificarem as
coocorrências entre as palavras, e seu resultado indica a conexidade entre elas, o que auxilia na
identificação da estrutura da representação. Destacam-se alguns termos presentes nas
subcategorias com mais ocorrências, como centro, inconsciente, mandala, círculo, esquerdo e
símbolo.
A partir das categorias encontradas tendo como referências citações das obras de C. G.
Jung, e somando-se os achados obtidos em pesquisa anterior (Leite, 2012), foi elaborado um
protocolo (Apêndice 3) utilizado durante a intervenção com a técnica expressiva Paisagem
70
6.2 Resultados estatísticos a partir da aplicação das escalas EEQFA e EMSVA, e das
variáveis Cor (quantidade e localização) e Formas (tipo, movimento e localização)
Para análise estatística foram utilizados os testes de Qui-quadrado e Fisher para as
variáveis categóricas (dados sociodemográficos, Cor quantidade e localização, Forma
quantidade, movimento e localização, para os adolescentes dos sexos masculino e feminino) e
o teste não paramétrico de Mann-Whitney para as variáveis numéricas (escores dos
questionários EEQFA e EMSVA). Considerou-se significante p<0,05 para as variáveis Cor
(quantidade e localização) e Forma (tipo, movimento e localização). Foram utilizados os
softwares do Excel e IBM SPSS Statistics 21.
Em relação às escalas EEQFA e EMSVA, foram considerados somente os resultados
dos três participantes que completaram os encontros e responderam às escalas antes e depois
das intervenções.
71
n %
sexo Feminino 5 45,5
Masculino 6 54,5
frequenta a escola Não 2 18,2
Sim 9 81,8
série escolar Ensino Fundamental 2 18,2
Ensino Médio 9 81,8
rendimento escolar Regular 10 90,3
Bom 1 9,1
número de irmãos na instituição Nenhum 9 81,8
1 2 18,2
números de irmãos não
institucionalizados Nenhum 2 18,2
Até 3 3 27,3
Mais de 3 6 54,5
contato com os pais Não 6 54,5
Sim 5 45,5
fuga da instituição Não 7 63,6
Sim 4 36,4
tempo de institucionalização 1 a 6 meses 1 9,1
6 meses a 1 ano 2 18,2
1 a 2 anos 2 18,2
2 a 3 anos 2 18,2
mais de 3 anos 4 36,3
motivo do acolhimento Negligência 4 36,3
Situação de rua 3 27,3
Morte dos pais 1 9,1
Conflito familiar 1 9,1
Risco de morte 1 9,1
Abandono 1 9,1
Comentário: a partir dos dados obtidos, vale destacar alguns pontos importantes: todos
os adolescentes que participaram tinham completado 17 anos: 9 adolescentes estavam com
idades entre 17 anos, oito e onze meses, e apenas 2 com 17 anos e um mês, ou seja, a maioria
dos adolescentes estavam prestes a ser desligados em função da maioridade ; embora a maioria
frequentasse a escola (81,8%), o rendimento era regular para 90,3%; a maioria não tinha contato
com os pais (54,5%); 8 dos 11 adolescentes estavam acolhidos a mais de um ano, e 4 deles
estavam a mais de 3 anos (36,3%), ou seja, com tempo prolongado de acolhimento institucional;
os principais motivos do acolhimento foram negligência (36,3%) e situação de rua (27,3%),
respectivamente.
73
Abaixo são descritos os resultados obtidos a partir da aplicação das escalas EEQFA e
EMSVA em três participantes que fizeram o processo completo de intervenção. Apesar de os
resultados não serem conclusivos, em função da amostra pequena, não havendo variação
significativa para EEQFA e EMSVA, o gráfico ajudará a ilustrar alguns pontos que mais
chamaram a atenção em relação aos três participantes que completaram os encontros.
Gráfico 01: Escore médio do EEQFA para os participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos encontros
36
35
34
33
32
antes
31
depois
30
29
28
27
2 3 4 todos
Gráfico 02: Escore médio das dimensões do EMSVA para os participantes 02, 03 e 04, antes e depois dos
encontros
45
40
35
30
25
20
15 antes
10 depois
5
0
74
Tabela 02: Síntese dos escores médios dos domínios EEQFA e EMSVA para os participantes 02, 03 e 04,
antes e depois dos encontros
EEQF EMSVA
Família Self Escola Self Não Auto
Auto Amizade
Comparado Violência Eficácia
Eficiência
Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois Antes Depois
2 34 34 37 40 36 38 28 25 18 19 17 17 21 32 30 27
3 32 30 29 34 28 34 21 13 10 11 13 21 21 27 16 25
4 35 34 35 44 27 32 24 19 23 23 14 14 24 28 22 25
Média 33,7 32,7 33,7 39,3 30,3 34,7 24,3 19,0 17,0 17,7 14,7 17,3 22,0 29,0 22,7 25,7
±desvio ±1,5 ±2,3 ±4,2 ±5,0 ±4,9 ±3,0 ±3,5 ±6,0 ±6,5 ±6,1 ±2,1 ±6,1 ±1,7 ±2,6 ±7,0 ±1,1
padrão
Tabela 04: Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-se os encontros
de 1 a 4, e 5 a 8 para os 4 participantes que completaram 8 encontros
Completaram 8 encontros
Variável Tipo % %
p<0,05
1-4 5-8
Círculo 25(55,6) 15(23,4) <0,01
Forma Espiral 4(8,9) 20(31,3) 0,005
Vertical 6(13,3) 26(40,6) 0,002
76
Tabela 06: Porcentagens da variável Forma (tipo) das formas mais recorrentes, comparando-se a primeira
e segunda metade dos encontros para os participantes que não completaram 8 encontros
Não completaram 8 encontros
Variável Tipo % %
p<0,05
Primeira metade Segunda metade
Círculo 19(40,4) 19(35,8) 0,63
Forma Espiral 9(19,1) 24(45,3) <0,005
Vertical 2(4,3) 3(5,7) 0,74
Em relação à variável Forma (tipo), observou-se uma maior utilização da espiral nos
últimos encontros (45,3%) em relação aos primeiros dos que não completaram os 8 encontros
(19,1%;p<0,05).
Comentário: merece ser apontado que a espiral foi mais acionada nos últimos encontros
tanto pelos que completaram os encontros quanto pelos que não completaram, o que aponta
para a dinamização que a técnica possa ter gerado, especialmente porque essa forma é referida
como o ato de circular em torno de si mesmo, dinamizando todos os aspectos da personalidade.
No entanto, diferentemente dos que completaram os oito encontros, os que não completaram
não tiveram as formas círculo e vertical como significativas. Infere-se que, apesar da
dinamização despertada, se faz necessária a continuidade no processo de intervenção para que
possam ser observadas outras variantes, como o foi para aqueles que completaram pelo menos
oito encontros.
Em relação à variável Forma (movimento e localização), não houve diferenças
significativas.
Quadro 07: Características sociodemográficas e do acolhimento dos três participantes que completaram o
procedimento de intervenção
convívio familiar; b) os três adolescentes estavam atrasados no ano escolar, e somente Romeu
apresentava bom rendimento escolar, enquanto Naruto abandonou os estudos próximo ao
desligamento; c) somente Romeu tinha contato frequente com os pais; d) somente Naruto tinha
histórico de fuga da instituição; e) Naruto e Annabeth estavam acolhidos por tempo prolongado,
acima do que está previsto no ECA; f) a negligência foi o principal motivo do acolhimento de
Naruto e Annabeth, ao passo que para Romeu foi o fato de se sentir ameaçado de morte na
região onde residia, por ter cometido ato de violência contra outra pessoa.
Os adolescentes demonstram três perfis bem diferentes, no entanto Naruto e Annabeth
apresentam mais prejuízos no desenvolvimento. Entre seus fatores estão a desestruturação
familiar e o ambiente social a que pertenciam, o baixo rendimento escolar, o tempo prolongado
de acolhimento, a impossibilidade de retorno à família e a baixa expectativa de
empregabilidade. Esses perfis confirmam alguns achados na literatura: o papel da escolarização
e o futuro (Ramos, Seidl-de-Moura e Pessôa, 2013; a situação familiar e o futuro (Zappe et al,
2013; Rosa et al, 2012); os prejuízos pelo tempo prolongado de acolhimento (Ferreira, Litting
e Vescovi, 2014; Siqueira e Dell’Algio, 2010); particularmente, a importância do ambiente
familiar no desenvolvimento infantil (Jung [1904] 2013b) e das primeiras experiências
relacionais (Sidoli, 2014; Bovensiepen, 2014, 2010; Jung [1941] 2013a; Knox, 2011, 2009;
Ryotovaara, 2010; Wilkinson, 2006).
6.3.2 Naruto
Naruto, o adolescente que iniciou os encontros com 17 anos e 5 meses, foi assim
chamado em função da recorrência de personagens e guerreiros que identifica em suas pinturas.
Com histórico de negligência, especialmente nas primeiras etapas do desenvolvimento, longo
tempo de acolhimento e várias evasões, Naruto é um adolescente originário de um estado do
Nordeste, vindo para São Paulo ainda criança e acompanhado de uma família adotiva. Em uma
cena de infância relembrada por Naruto, o pai e o padrasto brigam por estar alcoolizados.
Depois o jovem acrescenta: “na época gostava do meu pai e agora não mais. Foi preso e me
deixou na rua”. Em relação à mãe, lembra-se de uma cena em que ela estava doente, e nesse dia
chovia muito.
Seu comportamento arredio, baixa tolerância a frustrações, não adaptação às regras e
limites e dificuldades de adaptação nas escolas contribuíram para sua fuga às ruas. Já
adolescente, passou a viver em malocas no centro da cidade de São Paulo, onde se envolveu
com drogas, até o momento em que foi encaminhado para acolhimento. O uso de drogas se
manteve durante o acolhimento bem como o consumo elevado de cigarro.
80
O estilo
Naruto é o adolescente que mais se utiliza de cores, indicando menos discriminação para
a experimentação da técnica. Suas pinturas apresentam muitas formas, e ele também é o que
identifica mais elementos (Fotografia 01: Cs = terceira configuração da superfície e Fotografia
02: Is = nona e última configuração da superfície). No entanto, é o que menos desenvolve um
processo reflexivo diante dos símbolos que emergem e, apesar de identificar grande quantidade
de elementos, não reflete sobre as associações feitas, apenas descreve lembranças e as coisas
de que gosta. Em função da grande quantidade de tinta que utiliza, o que pode ser considerado
tanto sinal de impulsividade como de recursos potencias, as configurações do fundo apresentam
grande densidade pelo acúmulo de tintas (Fotografia 03: Cf = terceira configuração do fundo e
Fotografia 04: If = nona e última configuração do fundo).
81
Fotografia 01 Fotografia 02
Cs = primeira configuração da superfície Is = nona e última configuração da superfície
Sempre solicitava que fosse retirada toda a água da bacia, no momento em que a água
da primeira configuração era dispensada para dar lugar à pintura sobre o gesso, porque lhe
causava incômodo. Essa sensação se justifica a partir de uma associação que fez no primeiro
encontro: quando criança, sua mãe ficou doente, e seu pai a levou para o hospital, num dia em
que chovia muito e havia muitos relâmpagos. Outras associações com o elemento água: água
parada, esgoto e outra cena de chuva forte, em sua cidade natal apontam para o medo do contato
com o inconsciente que evoca insegurança e transitoriedade, provavelmente traumática.
Fotografia 03 Fotografia 04
Cf = terceira configuração da superfície If = nona e última configuração da superfície
Tabela 07: Tabela referente à variável Forma em relação aos tipos, movimentos e localizações mais
recorrentes do participante 02
PARTICIPANTE 02
Naruto
Variável
1-4 5-8 p<0,05
n(%) n(%)
Invólucro 0(0) 2(6,7) 0,38
Espiral 2(18,2) 15(50,0) 0,06
Tipo
Vertical 6(54,5) 12(40,0) 0,40
Círculo 3(27,3) 3(10,0) 0,16
Sinistrogiro 0(0) 2(7,4) 0,49
Dextrogiro 0(0) 13(48,1) 0,02
Movimento
Forma Baixo-cima 5(83,3) 12(44,4) 0,08
Cima-baixo 1(16,7) 0(0) 0,03
C 2(16,7) 5(16,7) 1,00
IE 2(16,7) 11(36,7) 0,20
Localização SE 4(33,3) 0(0) 0,0008
ID 4(33,3) 11(36,7) 0,83
SD 0(0) 3(27,3) 0,25
Quadro 08: Elementos identificados nas configurações pelo participante 02, considerando-se a quantidade
dos elementos mais citados e respectivas associações bem como as categorias que emergiram do total de
elementos identificados
Elementos
PARTITICPANTE 02
identificados nas
Naruto
configurações
As entrevistas
Quadro 09: Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com o participante 02,
considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista final (E2 final)
PARTITICPANTE 02
Entrevistas
Naruto
“Trabalhar”
“Quero ser livre” [sorri]
P1 “Arrumar minha casa”
“Aqui me sinto preso”
“Fazer minha família”
“Trabalho honesto “Ter trabalho, família, casa”
E1* E1
P2 “Meu trabalho “Quero ser MC [Mestre de Cerimônia,
Inicial Final
“Minha casa Rapper]”
“Quase não, um pouco”
P3 “Terminando os estudos, aos poucos” “Sim”
“Fazer um curso”
“Para mim foi uma coisa tipo que, uma coisa que aprendi. Estou desenvolvendo uma coisa que eu
P4
E2** não sabia”
Final P5 “As conversas que a gente conversou, sobre tudo, sobre os desenhos”
P6 “Só no trabalho mesmo, e ser uma pessoa honesta”
* E1 (inicial e final)
P1. Como você se sente em relação à vida fora da instituição?
P2. Quais são suas expectativas de vida depois que sair da instituição?
P3. Como se sente preparado para isso?
** E2 (final)
P4. Me fale como foi para você ter participado dos encontros experimentando a técnica de pintura.
P5. Levando em consideração esse período que passamos juntos, você gostaria de contar algo que lhe ocorreu? Pensou em possibilidades de
ações após sua saída?
P6. Como você percebe este momento, quando está prestes a sair da instituição?
86
Nas entrevistas realizadas no início e no final (Quadro 09), com foco nas expectativas
em relação ao futuro, Naruto identifica o trabalho e a família como os elementos mais
importantes. Nota-se que, na média, apresentou aumento da pontuação nas dimensões para a
satisfação de vida (família, self, self comparado, não-violência e autoeficácia), com exceção da
escola (baixo rendimento e quadro de evasões) e amizade (dificuldade de vinculação). Em
relação à pergunta sobre sentir-se preparado para isso, diz não se sentir preparado, mas ao final
responde que sim, o que pode ser interpretado como uma necessidade de afirmação sobre como
percebe o momento de desligamento institucional, mas também a expectativa de liberdade e de
ímpeto para conquistá-la no mundo.
Em consideração à entrevista final sobre como sentiu e o que pensou durante os
encontros, refere ter havido um aprendizado a partir das conversas sobre alguns temas, o que
indica reconhecimento de apoio recebido. No entanto, como apontado anteriormente, apesar da
grande quantidade de elementos identificados, nota-se pouco exercício reflexivo sobre sua real
situação, que denote algum tipo de planejamento para o futuro. Em relação à pergunta sobre
como percebe o momento do desligamento, destaca o trabalho como prioritário para sua vida e
ser uma pessoa honesta.
Síntese do caso
Depreende-se do processo de Naruto que seu aspecto extrovertido faz com que ele
busque soluções no mundo objetivo e tenha dificuldade de refletir, embora tenha expressado
gosto pelo trabalho proposto pela técnica, além de ter destacado um aprendizado e uma
mudança positiva na percepção de sentir-se preparado para a vida após saída da instituição. Ele
não pode confiar, talvez devido a trauma vivido, mas parece ter confiado no pesquisador. É
importante considerar que o histórico de evasões, a dificuldade de aceitação de regras
(especialmente as advindas de mulheres), a dificuldade de vinculação afetiva e o despreparo
profissional são dificultadores no processo de transição para a vida fora da instituição de
acolhimento. Mesmo assim, o desejo de ser livre o motiva a fazer essa transição, aplicando uma
energia para tanto (dextrogiro), nos últimos encontros; o longo tempo de permanência em
acolhimento, devido à impossibilidade de retorno à família, é um fator relevante em seu
processo; a maior quantidade de animais terrestres identificados nas pinturas parece denotar
uma necessidade de se colocar na realidade concreta ou de receber força dos animais, uma vez
que apresenta grande senso imaginativo e faz muitas referências a figuras heroicas, fantasiosas;
em consideração aos dados obtidos nas entrevistas, o sentido prospectivo denotado em seu
processo se vincula, em especial, ao desejo de ser livre e de conseguir um trabalho. Importante
87
destacar que, no início dos encontros, se sentia pouco ou nada preparado para o momento do
desligamento e que, ao final deles, acreditava estar. No entanto, em relação à percepção quanto
ao futuro na escala EEQFA, manteve a mesma pontuação, o que sugere que o sentido
prospectivo pode estar mais relacionado ao desejo de conseguir a liberdade do que às
expectativas positivas em relação ao futuro. Já, em relação à satisfação de vida, houve
pontuação mais alta após as intervenções em algumas dimensões, podendo ser considerados
indicadores que o impulsionam para o mundo, a partir dos benefícios obtidos durante o processo
de intervenção: em relação à família, definida como ambiente familiar saudável e de
relacionamento satisfatório, Naruto deseja ter família e casa; para o self, relacionado a
características positivas, autoestima, capacidade de se relacionar e de se divertir, diz ter
aprendido algo; o self comparado, como aquela capacidade de avaliações comparativas entre o
eu e os outros, pode estar relacionado à vontade de ser aceito pelas pessoas; a não-violência,
como a capacidade de não se envolver em comportamentos agressivos, pode-se atrelar à auto-
referência como uma pessoa honesta; a autoeficácia, como a capacidade de realizar metas, se
refere ao desejo de ser MC. Nas dimensões escola (refere-se à importância da escola, do
ambiente familiar) e amizade (relação com os pares e níveis de satisfação com esses), há
diminuição de pontuação. O primeiro indicador se justifica pelo abandono dos estudos e por
priorizar o trabalho após o desligamento, já o segundo reflete tanto o momento do desligamento
e de rompimento das relações de amizade quanto o fato de ter dificuldades de construir e/ou
manter laços afetivos.
A identificação de Naruto com os personagens ficcionais e seus poderes parece operar
como uma defesa contra a dor e os traumas que sofreu. Alguns elementos por ele identificados
retratam esse quadro de destruição: mundo das trevas, fogo, destruição, vulcão, raios, pessoa
cortada, esgoto. Embora tenha tecido ações e ativado desejos de realização no mundo, os meios
concretos para poder colocar em prática um projeto de vida podem ser dificultados pelo quadro
de impulsividade e de transitoriedade que apresenta. De outro lado, elementos positivos, como
a vontade de estar em uma ilha e de mergulhar para ver o fundo do mar, podem indicar
mecanismos resilientes que venham a ser acionados. Há de se pensar que a prevalência de
experiências traumáticas tenha contribuído como um dificultador do senso do agenciamento do
eu e do desenvolvimento da função reflexiva, e a fixação no mundo ficcional funcionasse
compensatoriamente para suprir a impossibilidade das relações humanas, que para ele se
apresentam como experiências dolorosas.
Segundo Bovensiepen (2014), fantasias coletivas podem suprir a insuficiência pessoal.
O trauma de Naruto vai continuar merecedor de atenção, e, de algum modo, o processo o
88
mobilizou, fazendo com que o inconsciente fosse mais ativdado nos primeiros encontros (cima-
baixo e SE: diminuição do aéreo, intelectual), ao revocar simbólica e plasticamente memórias
dolorosas. Consegue, apesar disso, como visto nos últimos encontros, movimentar-se para ação
no mundo, em seu processo criativo, para a direita (dextrogiro), característica de seu movimento
como extrovertido. Naruto apreciou os encontros, teve espaço para manifestar sua imaginação
livremente, ao se sentir acolhido, e esboçou alguns planos futuros. No entanto, seu quadro não
favorece a estruturação da personalidade, atirando-se assim para o mundo como o herói que se
lança ao perigo, sem garantias de sobrevivência. Necessitaria de um trabalho contínuo de
suporte para poder desenvolver meios de agenciamento do eu.
6.3.3 Annabeth
A adolescente iniciou as intervenções quando estava com 17 anos e 10 meses de idade
e estava em acolhimento havia mais de dois anos, em função de negligência e situação de rua.
Trata-se de uma adolescente que, apesar do histórico de vida marcado por perdas, violências e
privações, demonstrou ao longo do processo crescente consciência de sua situação,
apresentando reflexões de cunho social e da própria dinâmica do sistema de acolhimento.
Anseia ter controle sobre sua vida, e um dos objetivos do futuro é construir uma creche, parte
de seu projeto como Assistente Social, a profissão que pretende exercer.
Aos três anos de idade, Annabeth perdeu a mãe, supostamente por violência doméstica.
Permaneceu com o pai e outros irmãos, alguns não legítimos. Diante do quadro de violência a
que esses irmãos eram submetidos, a avó paterna solicitou cuidar de Annabeth, mas depois de
alguns dias a mandou de volta para casa, e, nesse ínterim, o pai suicidou. Ela permaneceu com
a avó até os oito anos de idade, momento em que foi levada a morar com outros familiares.
Depois de algum tempo, começou a apresentar comportamento opositor e rebelde e, aos
quatorze anos, foi enviada para ser cuidada por um irmão mais velho, mesmo que por um breve
período. Tempos depois, já no acolhimento, revelou que era vítima de violência sexual durante
o período em que esteve sob os cuidados da família que a acolheu, o que pode ter determinado
seu quadro de agressividade, não adequação às regras e também a desconfiança que sentia em
relação às pessoas. Ao deixar a casa do irmão, envolveu-se em um relacionamento marcado por
violência sexual e doméstica, tendo engravidado aos dezesseis anos, sendo que, no oitavo mês
de gestação, foi encaminhada para o acolhimento institucional. O uso da maconha e a
automutilação foram decorrentes dos maus tratos que sofria e do processo de vitimização, o que
agravou o quadro de fragilização do eu. No acolhimento, desenvolveu uma trajetória importante
para a ressignificação de sua identidade, mas, com a proximidade da maioridade, fato somado
89
ao agravante judicial que decidiria se sua filha de dois anos seria enviada para adoção ou ficaria
sob a guarda do irmão, e ao relacionamento homoafetivo conturbado com uma adolescente da
mesma Casa, deu-se um estado de desorientação, nesse momento emblemático do desligamento
institucional.
Annabeth se mostrou empolgada a participar dos encontros, mas iniciou as atividades
somente nos dois meses prévios ao desligamento, em função das atividades de preparação
profissional que estava desenvolvendo.
O estilo
Intensa, Annabeth declarou que “misturar a tinta relaxa, desestressa, para de pensar uma
coisa só”. Realizou suas pinturas com poucas cores e era rápida em sua produção. Apesar de ter
identificado poucos elementos em suas pinturas, estes suscitaram reflexões sobre os mais
variados temas, evidenciando um tom acentuado de crítica moral sobre algumas experiências,
como ter se arrependido de usar drogas, e também em falas relativas ao convívio com os
profissionais do acolhimento.
Tinha preferência por cores escuras. Já no primeiro encontro, assoprou a água,
espontaneamente e demoradamente, fazendo com que as poucas formas que tinha realizado se
misturassem. Talvez isso justifique, em parte, os poucos elementos que identificou em sua
produção (Fotografia 05: As = primeira configuração da superfície e Fotografia 06: Ds = quarta
configuração da superfície).
Fotografia 05 Fotografia 06
As = primeira configuração da superfície Ds = quarta configuração da superfície
No primeiro encontro e diante da placa de gesso manchada de tinta, depois que água foi
retirada, de início quis colocar um dedo e percebeu que o gesso estava umedecido. Isso a
motivou a colocar os cinco dedos e depois, com a palma da mão, foi mexendo até formar uma
grande massa. Enquanto mexia o gesso, cantou trechos de uma música Gospel: “Ressuscita-
90
me”, ação que se repetiu nos primeiros encontros. Exemplos desses efeitos estão nas
configurações fundo Af (Fotografia 07: antes de misturar o gesso fez quatro furos, um em cada
canto do gesso), Df (Fotografia 08: neste fez cinco furos, um em cada um dos quatro cantos e
um no centro). No quarto encontro, ocasião em que produziu a pintura apresentada na Fotografia
08, referiu que gostava de “novas misturas”, pois representavam “novidade, expressão”, e que
o assoprar estava relacionado ao “poder de escolha” e suas “consequências”. Diante da
configuração do fundo, sempre pedia para retirar qualquer resquício de água.
Fotografia 07 Fotografia 08
Af = primeira configuração do fundo Df = quarta configuração do fundo
Em relação à variável Cor (quantidade), difere dos outros ao se utilizar mais cores nos
primeiros encontros, pois o fez nos últimos (de 41,9% para 58,1%), o que pode estar associado
à flexibilização demonstrada diante do processo nos últimos encontros, em vista das
experiências traumáticas que viveu. Não há diferença em relação à variável Cor (localização).
Tabela 08: Tabela referente à variável Forma em relação aos tipos, movimentos e localizações mais
recorrentes da participante 03
PARTICIPANTE 03
Annabeth
Variável
1-4 5-8 p<0,05
n(%) n(%)
Espiral 2(25,0) 3(13,0) 0,42
Tipo Vertical 0(0) 13(56,5) 0,005
Círculo 6(75,0) 7(30,4) 0,02
Sinistrogiro 2(25,0) 7(28,0) 0,86
Dextrogiro 6(75,0) 3(12,0) 0,0004
Movimento
Baixo-cima 0(0) 11(44,0) 0,02
Cima-baixo 0(0) 4(16,0) 0,22
C 0(0) 1(4,0) 0,56
IE 1(12,5) 17(68,0) 0,006
Localização SE 0(0) 2(8,0) 0,40
ID 7(87,5) 5(20,0) 0,0005
SD 0(0) 0(0) --
91
Em relação à variável Forma (tipo, movimento e localização) (Tabela 08), nos primeiros
encontros em relação aos últimos, observa-se maior utilização do círculo (75,0% para 30,4%),
do movimento dextrogiro (75,0% para 12,0%) e localização no ID (87,5% para 20,0%).
Também se observa uma maior utilização da vertical (0,0% para 56,5%), com movimento de
baixo para cima (0,0% para 44,0%) e localização no IE (12,5% para 68,0) nos últimos encontros
em relação aos primeiros.
Considerando-se as variáveis no processo de Annabeth, foram observadas: houve
diminuição do círculo, indicativo de proteção e envolvimento, do movimento dextrogiro (para
a direita em direção à consciência) e da localização inferior, relativo ao terrestre. No entanto,
houve aumento da vertical, indicativo de introspecção, contato com o interior, do movimento
de baixo para cima, indicativo de crescimento, subida, e da localização esquerda no quadrante
relativo à maior ativação do inconsciente. As características do processo criativo de Annabeth
sugerem que houve ativação de introspecção e de conscientização (vertical, baixo-cima) e
parece que de autorreflexão, pois a consciência dirigida ao mundo (dextrogiro) diminuiu.
Talvez por isso, apesar de planos que preza, se sinta insegura, principalmente porque o mundo
a tenha machucado muito. A instintividade física, corpórea e material da localização inferior
direita diminuiu, ao passo que aumentou o inferior esquerdo, inconsciente primordial e
primitivo do corpo e das experiências primárias. O desligamento é desejado e temido, enfrentar
o mundo é difícil, e, portanto, compreensível que tenha havido diminuição na escala de
expectativas quanto ao futuro.
Quadro 10: Elementos identificados nas configurações pela participante 03, considerando-se a quantidade
dos elementos mais citados e respectivas associações, bem como as categorias que emergiram do total de
elementos identificados
Elementos
PARTITICPANTE 03
identificados nas
configurações Annabeth
Qtde
Elemento Associação
.
Universo 2 os espanhóis vieram, dinheiro, antes as pessoas eram mais felizes, tudo
era pago, tudo tinha que ter valor, parar de ter medo
Bandeira da Jamaica 1 droga tira da realidade, quando eu fumava droga, fugir dos pais, queria
matar meu pai, não acredito em Deus, era revoltada, não tinha motivos,
não valeu a pena, só me traz arrependimento, agora que aprendi a me
Mais citados amar
Céu 1 noite, preto combina com qualquer coisa, destaca, gosto de cores escuras
Por se julgar pouco imaginativa, Annabeth relata que não vê nada quando lhe é pedido
que aprecie sua pintura. Esses dados reforçam o perfil da adolescente que se interessa pelas
coisas práticas do dia a dia e pela maternidade, que lhe trouxe responsabilidades diárias.
Dos elementos identificados por ela (Quadro 10), os mais citados são de qualidade aérea:
arco-íris, bandeira da Jamaica, universo, planetário e céu. A referência à bandeira da Jamaica
trouxe algumas lembranças: por volta dos doze, treze anos de idade, reunia-se com outros
adolescentes para fazer uso de maconha e para ouvir música reggae. Fazia isso porque se sentia
“revoltada”, queria “fugir dos pais”. Pensar sobre esse período trouxe sentimento de
arrependimento: “droga tira da realidade, foge do problema”, mas agora “aprendi a me amar”
referindo que tinha motivo, a filha. Quando pequena se perguntava por que sua mãe havia
morrido tão cedo e também se lamentava porque gostaria de ter matado seu pai, mas já estava
morto. Diante desse quadro, depreende-se sua visão negativa em relação aos homens, sendo a
figura da mãe a vítima, a própria identidade ferida.
O elemento céu é associado por Annabeth à predileção pela noite, pelo escuro, presente
também nos elementos esgoto e sujeira. Nota-se que foi característico de seu estilo de pintura
assoprar ou misturar as tintas e o gesso com as mãos, buscando escurecer alguma parte que
tinha ficado com cor clara, assim como retirar todo o excesso de água restante na configuração
93
de fundo. Essa ação de ‘escurecer’ parece ser o mecanismo de defesa utilizado para neutralizar
os efeitos dos traumas sofridos, por isso a predileção pela noite e pelo escuro, em contraposição
à cor clara, associada por ela aos traumas da vida. Depreende-se que a cor clara remete à
consciência, ao ato de ver e olhar para aquilo que é traumático, e, por isso, é mais seguro manter-
se sob a ausência de luz da noite; em outras palavras, uma tendência de fechamento diante da
dor e do sofrimento, configurando-se como uma defesa necessária. Nota-se que, ao final dos
encontros, a tendência introspectiva (vertical) e o contato com o inconsciente (cima-baixo) se
intensificaram, sugerindo que a tomada de consciência rompeu parcialmente defesas e ativou o
movimento regressivo.
O universo, o elemento mais recorrente, lhe trouxe várias associações. Nesse contexto,
citou que, antes de os espanhóis chegarem, as pessoas eram felizes. Com a chegada dos
invasores, o dinheiro se instalou, e tudo passou a ser pago, a ter um valor. Depreende-se disso
a relação do social com valor negativo de consumo bem como sua preocupação com o ter
dinheiro para manter si mesma e a filha. Para Annabeth, o invasor parece representar aquele
que rouba a felicidade, assim como é invasivo o abuso sexual e a violência que sofreu. Mas,
apesar da vitimização, a associação com o universo e a natureza têm força vital: é preciso “parar
de ter medo”, porque “só pensar não faz bem não”, e, apesar dos erros que diz ter cometido no
passado (drogas, automutilação), reitera: “mudei muito, renovando cada dia mais”. No final dos
encontros, sua maior preocupação se referia ao fato de poder perder a guarda da filha com quem
morava na casa de acolhimento. Isso mostra um conflito que ela enfrenta entre ser sofredora ou
agente da própria vida.
Quando identificou o elemento coral relativo ao fundo do mar, se disse ateia porque
considera que “as pessoas vão à igreja como refúgio”. Essas palavras e as que seguem foram
pronunciadas no primeiro encontro, momentos antes de cantar o trecho de uma música gospel
intitulada “Ressuscita-me”, enquanto mexia o gesso com a mão: “A força superior é nós
mesmos. É só chorar que tudo passa”. O entoar a música gospel simbolizaria inconscientemente
a renovação do feminino, assassinado concretamente na figura da mãe e violentado nela.
Decorre de suas associações a desconfiança nos outros, a inveja, o que indica que, na vida, só
pode contar consigo mesma; por isso, tende a se colocar nas situações de forma realista, sem
fantasias, talvez decorrentes das defesas que construiu para poder suportar as experiências
dolorosas: “Confiar em si mesmo, não precisa uma força maior”, ou seja, o voltar-se para si
(inflação do ego) foi a maneira que encontrou para poder lidar com os conflitos, uma vez que
tudo o que vem de fora tende a ser nocivo. Depreende-se desse quadro que o fundo do mar é o
94
lugar de onde extrai forças para enfrentar as dificuldades da vida pois só pode contar consigo
mesma, simbolizando, por isso, fonte de resiliência.
No antepenúltimo encontro cantou o trecho da letra de uma música do Legião Urbana:
“às vezes o que vejo quase ninguém vê...”, e comentou que sempre a cantava quando estava
deprimida. Havia declarado anteriormente não gostar de conversar com os adolescentes e sim
com adultos, daí sua dificuldade de estabelecer amizades por não se sentir compreendida: o
“adolescente não tem muita vivência ainda”. No penúltimo encontro, trouxe a notícia da decisão
judicial sobre sua filha, que ficaria sob a guarda de seu irmão mais velho, e dos caminhos que
seguiria: ir para uma República e o desejo de fazer a faculdade de Serviço Social ou Direito. E
no último encontro, realizado próximo ao momento do desligamento institucional, identificou
o elemento arco-íris. Embora não tenha feito qualquer associação, apresentou decisões e
preocupações sobre o futuro e a vontade de começar uma nova etapa em sua vida.
As entrevistas
Quadro 11: Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com a participante 03,
considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista final (E2 final)
PARTITICPANTE 03
Entrevistas
Annabeth
“Não sei”
“Bem”
“Eu penso no lado bom e ruim da coisa”
P1 “Só mais responsabilidade, me virar
Lado ruim: “Sair daqui e não ter um apoio.
sozinha, independência, autonomia”
Aqui tem apoio, ajuda, orientação”
“Que eu consiga construir uma creche, na
E1* “Estar trabalhando, tendo minha casa e E1
P2 casa do meu irmão. Só mão de obra está me
Inicial minha filha e poder manter” Final
preocupando, porque material é barato”
“Sim”
“Tenho estudado, atrás de emprego,
P3 [Bocejou]... “Sim”
entregando currículo, mas tem uma hora
que desanima”
“Gostei, achei uma terapia”
P4
“Aliviou um pouco, distraiu. Pensei”
E2** “Não lembro de nada agora não”
Final P5 “Me organizar primeiro. Ver como vai ser esse negócio que preciso de muito dinheiro, casa”
“Não sei quanto eu tenho guardado [poupança]”
P6 “Pra mim é tranquilo, já sou acostumada”
* E1 (inicial e final)
P1. Como você se sente em relação à vida fora da instituição?
P2. Quais são suas expectativas de vida depois que sair da instituição?
P3. Como se sente preparado para isso?
** E2 (final)
P4. Me fale como foi para você ter participado dos encontros experimentado a técnica de pintura.
P5. Levando em consideração esse período que passamos juntos, você gostaria de contar algo que lhe ocorreu nesse período? Pensou em
possibilidades de ações após sua saída?
P6. Como você percebe este momento, quando está prestes a sair da instituição?
Nas entrevistas realizadas no início e no final (Quadro 11), em relação às perguntas com
foco nas expectativas em relação ao futuro, Annabeth citou o trabalho e a família. Denota-se
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uma mudança positiva entre a entrevista inicial e a final – antes diz que não sabe sobre o futuro
e depois afirma sentir-se bem. Embora tenha destacado o desejo de cursar uma faculdade, nas
respostas prevalecem as prioridades mais imediatas. Faz apontamentos entre o apoio que recebe
no acolhimento e as responsabilidades advindas de uma vida com independência. Em relação à
pergunta sobre como se sente preparada para isso, embora tenha mantido a resposta de sentir-
se preparada, destacou o desânimo decorrente das dificuldades que enfrentava para poder se
preparar e, ao final, seu bocejo e um tempo prolongado de resposta antes do ‘sim’, reforçou que
as dificuldades permaneciam, o que pode estar atrelado à diminuição da pontuação em relação
às expectativas de futuro.
Em consideração à entrevista final, nas perguntas sobre como sentiu e o que pensou
durante os encontros, Annabeth destacou o aspecto de suporte e a possibilidade de pensar sobre
sua vida, ressaltando novamente a indecisão diante de um futuro iminente. Sobre a questão do
momento do desligamento, destacou estar tudo tranquilo, embora demonstrasse agitação
durante a entrevista e fizesse longas pausas para responder às perguntas, mostrando a vivência
de conflitos e ansiedade quanto a esse assunto. Completou a frase dizendo que já estava
acostumada a uma problemática que a tem acompanhado desde criança: a instabilidade e o
sofrimento decorrente dos vários lugares por onde tinha passado e as experiências pelas quais
passou em cada um deles. Justifica-se assim seu desejo de ‘construir’ uma creche para sua filha
e para as crianças da comunidade, como projeto de construção de um lar definitivo, duradouro.
Síntese do caso
Do processo de Annabeth, destacam-se os seguintes elementos: embora nos primeiros
encontros tenha apresentado a forma protetiva círculo e movimento para a direta (indicativo de
um sentido prospectivo) e na localização o inferior, o que remete ao terrestre, corpóreo
(oposição à predominância de elementos aéreos que foram identificados nas pinturas), nos
últimos encontros houve maior ativação de introspecção e conscientização (vertical, baixo-
cima) dirigindo para a autorreflexão e não em direção ao mundo. A regressão se justifica na
medida em que apresentou relativa consciência do momento do desligamento, das
responsabilidades que teria de assumir, moldadas especialmente pelo desejo de construir uma
creche para sua filha, e das dificuldades que indicou como agravantes para que isso se
efetivasse; no final das intervenções, Annabeth foi tomada por um misto de desânimo e de
vontade de ser independente). Destaca-se também que o histórico de maus tratos, abuso e
violência que sofrera ocasionaram mecanismos de defesa como recursos indispensáveis para
que seu ego não colapsasse. Decorrem desse quadro a desconfiança nas pessoas e suas crenças,
96
6.3.4 Romeu
Assim denominado devido ao relacionamento amoroso com uma adolescente, no
contexto do acolhimento institucional, e por nutrir o ideal de construir uma nova vida, Romeu
tinha 17 anos um mês quando aderiu às intervenções.
Diferentemente dos outros adolescentes, foi retirado do convívio social e familiar por
causa de uma ação violenta cometida contra outra pessoa, na região onde morava. Foi então
encaminhado para a Fundação Casa, onde permaneceu por quase dois meses e depois
direcionado para um SAICA (Serviço de Atendimento Institucional para Crianças e
Adolescentes), sendo acolhido por seis meses. O breve porém profundo sofrimento na Fundação
Casa, espaço que deveria fornecer proteção e acolhimento, provocou pesadelos frequentes
relacionados aos maus tratos e bullying que Romeu relata ter sofrido: “Falta de respeito, sofri
bullying. Os funcionários estão lá para cuidar e não para zombar. Toda noite eu sinto que estou
lá, fico deprimido”. Relatou que a reclusão lhe causou uma sensação de que o tempo não
passava, parecendo ter ficado muito mais tempo do que de fato ficou.
Já no SAICA, e numa tristeza profunda, apaixona-se certo dia por uma adolescente (com
possível diagnóstico borderline) que havia recém-chegado. Confessa que sua namorada o
completava, ajudava a aplacar a saudade da mãe e o consolava sempre que acordava à noite,
aterrorizado por pesadelos relativos ao período em que esteve na Fundação Casa. Sentia-se
excluído por alguns membros da família pela ação que cometera, mas as visitas constantes de
sua mãe o acalentavam. Relatou com pesar a cena da delegacia para onde foi levado após a ação
violenta que cometera: foi acompanhado do pai, um homem aparentemente severo, na visão de
Romeu, mas que havia chorado a ausência do filho e tudo o que lhe ocorrera: “tentou ser homem
naquelas partes difíceis e também quase não aguentou ver o próprio filho dormindo na
delegacia. Pior coisa, tratado pior do que um cachorro. Jogado no chão. É isso”.
Romeu se mostrou interessado, desde o primeiro momento, a participar dos encontros,
dizendo que aquele momento representava a possibilidade de fazer algo diferente, no contexto
monótono do acolhimento. Mostrou-se responsável, afetuoso, inteligente e empenhado, o que
foi posteriormente confirmado pela equipe de profissionais. Diferentemente dos outros dois
participantes, Romeu tinha uma família estruturada, era o caçula, e sua visão de futuro, embora
98
ainda idealizada, contaria com o apoio familiar. Demonstrou ter uma habilidade profissional
em informática, desejo de cursar faculdade e de abrir uma empresa.
O estilo
Romeu utilizou pouca tinta, e seu estilo de pintar consistiu em pingar sobre a superfície
uma gota de cor a cada vez e esperar a reação. Demonstrou uma atenção especial a esse efeito:
“Gosto quando expande... uoooh!”. As tintas que não expandem em função da densidade do
pigmento, como prata, branco e dourado, não lhe interessaram muito. As pinturas que realizou
apresentaram algumas características em comum: predomínio de uma grande forma próxima ao
centro; recorrência das cores vermelha, amarela, verde e azul; como utilizou pouca tinta, a
superfície que não recebeu cor apresentou transparência, e parte do fundo pôde ser apreciado
(Fotografia 09: As = primeira configuração da superfície e Fotografia 10: Hs = oitava e última
configuração da superfície).
Visualmente suas pinturas apresentaram pouca densidade e transparência, por ter usado
pouca quantidade de tinta, o que resultou em pouca tinta fixada na placa de gesso, tal como
aparecem nas configurações do fundo (Fotografia 11: Af = primeira configuração do fundo e
Fotografia 12: Hf = oitava e última configuração do fundo).
Fotografia 09 Fotografia 10
As = primeira configuração do fundo Hs = oitava e última configuração do fundo
Vale destacar que se fixou apenas um resquício de tinta na placa de gesso da pintura que
Romeu realizou, no último encontro (Hf: configuração de fundo), o que o surpreendeu. O último
encontro aconteceu no mesmo dia em que foi desligado e, a partir da conjunção dos
acontecimentos, a pintura em branco representou naquele momento que o futuro estava para ser
escrito, ou como ele mesmo associou: “Nova etapa, novo começo”.
99
Fotografia 11 Fotografia 12
Af = primeira configuração do fundo Hf = oitava e última configuração do fundo
Quadro 12: Elementos identificados nas configurações pelo participante 04, considerando-se a quantidade
dos elementos mais citados e respectivas associações, bem como as categorias que emergiram do total de
elementos identificados
Elementos
PARTITICPANTE 04
identificados nas
Romeu
configurações
Dos elementos identificados por Romeu (Quadro 12), quatro chamam a atenção pela
recorrência e por se conectarem a seu histórico de vida e relações com o futuro: areia, coração,
animais terrestres e aéreos, natureza e pessoa.
A areia está relacionada à praia, lugar que considera tranquilo e para onde irá depois que
voltar ao convívio familiar: “na praia me sinto tão livre, bem mais relaxado”. Mas, ao mesmo
tempo, reflete sobre seu futuro nesse lugar: “quando completar 18 anos, me assusta um pouco,
o mundo é grande”. Destaca também a sujeira da areia, como uma crítica àqueles que não
cuidam da natureza, lugar onde irá erigir seu futuro lar com os pais. É possível interpretar esse
elemento como o próprio ato de violência que cometeu, uma sujeira, do qual se arrepende, e,
por isso, ir para um novo lar distante de onde morava é o que mais deseja. Ir para a praia também
é a estratégia que a família pensou adotar como melhor lugar para que Romeu possa morar em
função das disrupturas causadas na família e ameaças da vizinhança.
O coração recebe conotações cromáticas e de valor: o coração rosa se refere a perfume
e mãe, o vermelho indica estado de felicidade, enquanto o negro significa que “está ferido por
dentro, se sentindo preso, angustiado, tudo de ruim”. Ao coração estão diretamente ligadas a
figura de mãe, a mais presente na trajetória do acolhimento, e a da namorada, aquela que o
consola. Sua carência fez com que projetasse na namorada a figura de cuidado materno: “Eu
101
tinha acabado de sair da fundação e eu acabei me apegando”. O namoro se caracterizou por uma
relação de atenção e carinho, sem demonstração de interesse sexual, em parte porque as regras
do SAICA não permitem aproximações desse tipo e também pelo suposto diagnóstico
borderline da namorada.
Em relação aos animais, são os terrestres que prevalecem, seguidos dos aéreos. Romeu
destaca que sua gata, um dos elementos que são identificados na pintura, morreu de convulsão
nos braços dele. A relação com esse animal lhe trouxe sensações de bem-estar e carinho, ou
seja, remete a uma experiência afetiva, mas também aponta para um episódio de interrupção de
afeto. De outro lado, embora tenha considerado a lesma como um animal nojento, destaca que
“leva a casa”, o que aponta para um de seus maiores conflitos: ter sido retirado do convívio
familiar e desejar construir um novo lar. Em relação aos animais aéreos, associa a dinâmica de
vida do morcego como aquele que vive à noite e durante o dia só dorme, assim como seu pai, e
a borboleta associa à ação de voar: “olhar para baixo e ver o mundo passando”. No entanto, a
ação de voar é apontada como uma das estratégias defensivas para o ato de violência que
cometeu, diretamente ligada ao elemento pessoa, o qual recebe as seguintes associações: “correr
de alguma coisa, fugir do perigo. Estou tentando fugir do erro. Quase toda a noite eu choro”.
Faz referência aos elementos cabeça, cabelo, peruca, que podem reforçar o desenvolvimento
reflexivo. Essa ação indica não somente a sensação de liberdade que almeja, mas também
porque é uma forma de tentar “fugir do erro”, demonstrando assim o sentimento de culpa que
o assola desde então, sente que não é possível voltar atrás, viver onde vivia. Necessita começar
de novo e, nesse momento, faz a referência ao pai, aquele que será ajudado na reforma da casa
da praia, seu futuro lar, identificado na condição de paterno, aquele que estrutura a lei.
Os elementos ligados à natureza foram frequentemente relacionados a explosão,
destrutividade e calor, como sol, cometa, bola de fogo (“medo de que a terra explode”,
“apocalipse”), meteoro e, especialmente, o vulcão. Simbolicamente, o vulcão e as fontes de
calor se associam a centros de energia, assim como o coração: Romeu vive uma paixão no
espaço de acolhimento como um dos recursos para aplacar a dor, a tristeza e a solidão. A paixão
o aquece, e os elementos da natureza, como o vulcão, estão sempre prestes a explodir e precisam
ser controlados, tanto para a preservação de sua própria integridade física quanto mental.
O ato de violência que cometeu, tomado pela raiva, agressividade, impulsividade
simbolicamente representado pelo vulcão, identificado logo na primeira pintura e localizado à
esquerda (inconsciente), o fez entrar em contato com um poder de destruição que o assustou.
Em um determinado momento, referiu o seguinte: “quando fico nervoso, batia na parede”.
Justifica-se assim, em parte, que seu estilo ‘delicado e leve de pintar’ foi, compensatoriamente,
102
a maneira que encontrou para lidar com a tempestuosidade de seus impulsos, sua força física.
O namoro com a adolescente acolhida pode ter contribuído para amenizar sua impulsividade.
Considerando-se os elementos identificados por Romeu em relação às localizações (C,
IE, SE, ID e SD), a maior quantidade deles foi localizada no centro, indicando haver
centralização, o que pode expressar a busca de compreender o que fez e o que ele é. Destacam-
se os seguintes: a areia aparece mais no C, indicativo de que o novo lar, sua primeira meta, é o
que ele acha que lhe trará tranquilidade. No entanto, trata-se de uma idealização; o vulcão
aparece mais no IE, inconsciente mais primitivo, associado a outros elementos que parecem
indicar fontes de calor, movimento e crescimento: fogo, vulcão, coração, beija-flor, ovo, pôr-
do-sol, sol, vento, flor, vulcão, sinalizador.
As entrevistas
Quadro 13: Transcrição dos principais trechos extraídos das entrevistas realizadas com o participante 04,
considerando-se a entrevista inicial e final (E1 inicial e final) e entrevista final (E2 final)
PARTITICPANTE 04
Entrevistas
“Romeu”
“Gostaria de fazer curso”
“Me preparar para um futuro melhor, para “Estou muito ansioso”
P1 poder ter uma empresa de TI” “Quando eu me acalmar, vou procurar um
“Ter um emprego bom, que eu seja o dono emprego e melhorar minha vida”
da empresa”
“Recomeçar uma nova vida”
E1* “Ser um homem honesto” E1 “Minha mãe passou coisas ruins e eu não
P2
Inicial “Saindo vou fazer curso e faculdade” Depois quero que ela passe de novo, ela quase
morreu por minha causa”
“Sim, sim”
“Me sinto confiável”
“Pouco”
P3 “Quando estou com minha família me sinto
“Eu estou me esforçando mais”
mais protegido, bem melhor, do que ficar
aqui”
“Você pôde me ajudar a pensar, refletir os erros para eu poder não errar depois de novo”
“Foi legal. Se tivesse como continuar eu ia querer continuar”
P4 “Estou meio triste porque vai acabar tudo isso [os encontros], mas também estou um pouco feliz que
eu vou com minha família”
“Nova etapa, novo começo”
“Quando a gente começou a conversar, assim, debater sobre a vida, sobre a “B”. Aí comecei a parar
e pensar, não só reagir, pensar nos erros”
P5
“Aí eu parei e pensei, falei é: só ter paciência, e eu me esforcei”
E2** “Me esforcei e chegou a hora”
Final “Primeiro vou ficar com minha família, aí depois que for para a praia vou buscar um emprego, e
escola”
“E tentar recuperar os anos que perdi de aula, procurar emprego, e ajudar meu pai a aumentar a casa”
“Meu pai é chato, sempre pega no meu pé. Aí eu pensei assim: vou voltar para casa, mas vai voltar a
P6 pegar no meu pé, minha mãe também. Mas pensando de outro lado, eles já me ajudaram muito, então
eu não ligo”
“Por exemplo, eu te xingo, mas você lembra que eu te ajudei. Aí você não vai ficar bravo porque eu
te ajudei numa coisa que estava preso, sufocado... você estava precisando de uma ajuda muito
importante, daquela ajuda mesmo”
* E1 (inicial e final)
P1. Como você se sente em relação à vida fora da instituição?
103
P2. Quais são suas expectativas de vida depois que sair da instituição?
P3. Como se sente preparado para isso?
** E2 (final)
P4. Me fale como foi para você ter participado dos encontros experimentado a técnica de pintura.
P5. Levando em consideração esse período que passamos juntos, você gostaria de contar algo que lhe ocorreu nesse período? Pensou em
possibilidades de ações após sua saída?
P6. Como você percebe este momento, quando está prestes a sair da instituição?
Nas entrevistas realizadas no início e no final (Quadro 13), em relação às perguntas com
foco nas expectativas em relação ao futuro, Romeu destaca no início o papel da escola e do
trabalho como importantes requisitos para uma condição melhor de vida. Cita o desejo de cursar
uma faculdade, ter sua própria empresa e ser um homem honesto. Mas depois sente-se ansioso
e com a necessidade de se acalmar. Cita o sofrimento da mãe e faz referências apenas ao
trabalho, não ao estudo. Note-se que a pontuação em relação às expectativas de futuro diminui
ao final dos encontros, assim como a dimensão escola. Na pergunta referente à percepção de se
sentir preparado para que suas expectativas se efetivem, destaca a família como fonte de
proteção e, especialmente, a percepção de que se sentia menos preparado no início dos
encontros e, ao final, mais confiante.
Em consideração à entrevista final, nas perguntas que se referem aos encontros, Romeu
destaca ter refletido sobre os erros do passado, sobre a necessidade de ter paciência e de pensar
antes de reagir, demonstrando assim um princípio de reflexão sobre suas ações e uma postura a
se adotar. Na pergunta referente à percepção do momento do desligamento institucional, destaca
novamente o trabalho, a escola e a família. O pai, aquele que “sempre pega no meu pé”, é
referido como figura que o ajudará na estruturação de uma nova vida.
Síntese do caso
Em relação ao processo de Romeu, destacam-se os seguintes aspectos: não criou formas
durante o processo de pintura, pois pingava uma gota de tinta de cada vez, e, por isso, os tipos,
localizações e movimentos não apareceram; contudo, foi possível observar o maior
acionamento do centro, a partir da localização dos elementos identificados, o que pode ser
indicativo de um processo de centralização durante seu processo criativo, e a maior quantidade
de animais terrestres identificados pode simbolizar a possibilidade de concretização em direção
à vida, em busca de recomeço, na praia e com sua família, bem como de uma especialização,
em um curso de informática; o estilo de Romeu e os elementos que associou e o fato de sua
pintura ser visualmente suave e transparente, em contraposição à densidade dos símbolos que
emergiram, indicariam um movimento compensatório que reflete seu conflito principal e
confronto entre opostos: ser ponderado, ter paciência em contraposição ao impulso violento que
104
sente e que precisa ser controlado: “Agora estou se sentido melhor, antes não. Guardava tudo”.
Pode-se considerar que seu estilo de pintar funcionou como um mecanismo de defesa, na
medida em que, ao intuir que poderia explodir a qualquer momento, realizou uma pintura
baseada essencialmente no ato de pingar a tinta sobre água e observar o efeito decorrente dessa
ação, sem propositar qualquer forma ou movimento. Embora não tenha apresentado dados para
a análise quantitativa referente à variável Forma, seu estilo de pintar pode denotar sua precaução
com não correr riscos, com formas de se aventurar; ainda que o tempo de permanência na
Fundação Casa tenha sido curto, foi suficiente para gerar traumas, e, no acolhimento, sentia-se
solitário e carente, buscando uma relação amorosa; em relação às entrevistas, depreendem-se o
desejo de regressar à família e planos relativos ao futuro, mas também os desafios que terá de
enfrentar: apesar de tais planos, apresenta indícios de conflito moral em relação ao ato de
violência que cometeu, o qual o retirou do convívio social e familiar, e começa a refletir sobre
ser uma pessoa explosiva e que precisa ter paciência e se controlar. Nota-se que há diminuição
da pontuação da expectativa quanto ao futuro após as intervenções, pois, embora se sinta
otimista, demonstra não estar suficientemente preparado profissionalmente para a
independência; seu maior desejo é a reintegração familiar. Sobre a satisfação de vida há
pontuação , após as intervenções, nas seguintes dimensões: família, que se refere ao ambiente
familiar e afetivo e se relaciona a seu grande desejo de reintegração; o self, definido a partir de
características positivas, autoestima, atrela-se à percepção de ter-se esforçado e de ter paciência;
a autoeficácia, como avaliação da capacidade de realizar metas, reflete a consciência dos erros
que cometeu, planos para o futuro e o desejo de recomeçar; amizade, relativo aos
relacionamentos com pares, refere-se ao fato de ter-se sentido acolhido e também pode estar
relacionado ao envolvimento afetivo no acolhimento. A pontuação se manteve em self
comparado (comparação de si com o grupo), não-violência (não se envolver em conflitos) e
diminuiu em escola. Os estudos foram interrompidos enquanto esteve na Fundação Casa e, no
acolhimento, conseguiu acesso à escola pouco tempo antes do desligamento.
Romeu, ao final dos encontros, não se sentia maduro o suficiente, pois depende da
família e, com a proximidade do desligamento, foi tomado por um misto de felicidade e
insegurança. No entanto, ao longo de seu processo ensejou reflexões importantes como
a avaliação de comportamentos e ações impulsivas, e a esboçar indícios de uma consciência
moral. Seu caso é atípico no contexto do acolhimento, e esse jovem se diferencia dos outros
participantes pelos seguintes aspectos: a estrutura familiar é coesa, ele não veio de uma situação
de vulnerabilidade nem de maus tratos, tem bom rendimento escolar, e sua idade é pertinente
ao grau de escolaridade. Jovem sonhador e imaturo, foi arrebatado por uma experiência
105
devastadora. Trafegou pela tensão entre os opostos, uma condição que pode ser reguladora para
centralizar a personalidade, assim como pode desestruturá-la, segundo Jung ([1950] 2011f).
Os encontros foram benéficos para ele porque se sentiu acolhido e sentiu tristeza quando
terminaram, dizendo que se pudesse continuaria o processo. A relação entre o ato de violência
cometida e todos os sofrimentos oriundos dos acolhimentos pôde ser expressa e, com isso,
Romeu entrou gradualmente em contato com conteúdos dolorosos, o que o auxiliou a tomar
consciência e a esboçar planos para o futuro, como uma possibilidade de recomeço.
de longe um grande macaco, que me olhou fixamente. Achamos uma casa desabitada e tentamos
dormir, mas não conseguia pegar no sono. Na cena seguinte, fomos de novo ao matagal, e o
grande macaco começou a correr em nossa direção. Assustado, falei para corrermos, e assim
voltamos para dentro da casa. O grande macaco chegou praticamente junto conosco. Deu tempo
de fechar a porta, mas havia uma fresta em cima. Ele colocou a mão para dentro e eu a toquei,
não senti medo. Uma mão grande, de pele rústica. Na sequência fui tentar fechar a janela que
ficava à direita, mas o próprio macaco, pelo lado de fora, fechou uma das folhas da janela.
Novamente toquei nele. Mas a janela tinha várias falhas, e, por isso, não seria possível fechá-la
totalmente. Aquele medo inicial se dissolveu. Interpretação: contato gradual com um animal
selvagem, porém muito próximo da natureza humana, primeiro pelo olhar e depois pelo toque,
configurando uma experiência concreta até sua integração na consciência. A mão como guia
para a expressão e, simbolicamente, como amparo para aquele que, em função de sua
vulnerabilidade, necessita de suporte para entrar em contato com seu mundo interior,
descortinando-o.
26.10.2017: estava passando e vi uma grande e espaçosa igreja. Não quis entrar e observei da
entrada. Em algum momento, o padre percebeu que, dentro da igreja, havia um grande leão e o
fez sair. O grande e belo leão era manso, e saiu tranquilamente. Essa cena se repetiu. Depois eu
entrei na igreja carregando um grande objeto. Fiz esforço para não atrapalhar a cerimônia, mas
o objeto encostou em alguma coisa e todos olharam para mim. Na última cena, depois que a
celebração acabou, todas as pessoas e eu começamos a sair. Fui à procura do leão. Ele estava a
uma certa distância. Vi-o brincar docilmente com uma criança. Interpretação: troca simbólica
obtida a partir da incursão no sagrado (oferecer um objeto) para compensar a expulsão do
grande animal (o rei da floresta) que se apresenta dócil, não perigoso. A dimensão sagrada
envolvida na pesquisa com seres humanos, especialmente com adolescentes que clamam por
atenção e cuidados, gerou em mim uma necessidade de rever o perfil adolescente e todos os
estigmas que estes carregam: o leão, animal feroz, porém dócil; assusta, mas o que ele quer é
só carinho. Foi um exercício doloroso e animoso de quebrar os paradigmas.
12.11.2017: havia um casal e seu filho adotivo, para quem eu tinha feito uma boa ação em outro
momento. Encontrei o pai, e ele quis me mostrar outro filho adotivo. A uma certa distância, vi
que era um bebê negro africano, sentado e brincando. Ao chegar perto, vi que não era humano,
parecia um animal muito semelhante a um bebê. Era muito negro e estava sentado sobre um
tecido feito de palha. Ao olhar essa palha, vi uma infinidade de bichinhos, insetos que se
moviam embaixo e em cima dela. Fiquei impressionado com aquilo, como se o bebê os estivesse
chocando. O pai chamou o bebê para brincar e o ajudou a levantar. Todos os bichinhos seguiram
108
7. DISCUSSÃO
A presente pesquisa foi realizada, em Casas Lares e SAICAS, com 11 adolescentes que
tinham completado 17 anos e estavam em processo de desligamento institucional.
O adolescente é, por natureza, caracterizado por uma instabilidade emocional, em
função do grande desafio que lhe é peculiar: a transição entre a infância e a vida adulta. Quando
se trata do adolescente acolhido, somam-se os prejuízos acumulados diante do quadro de
vulnerabilidade a que foi exposto. No acolhimento, a adesão às intervenções e à manutenção de
vínculos é um grande desafio no trato com adolescentes, especialmente com a proximidade do
desligamento institucional, momento marcado por incertezas, sofrimentos e também por planos
de futuro. Diante desse quadro, a intervenção com a técnica expressiva Paisagem Psíquica se
propôs a investigar as problemáticas envolvidas nesse momento emblemático, a partir da
investigação das expectativas quanto ao futuro e satisfação de vida, e também a compreender o
processamento simbólico e imagético vivenciado pelo adolescente durante o desligamento
institucional. Para tanto, o estudo buscou fundamentar a utilização da técnica a partir do estudo
dos quadrantes, embasado na teoria de C. G. Jung, contribuindo assim para a análise dos
resultados.
Vale destacar que, devido ao pequeno número de participantes, às dificuldades
encontradas com o referido público e ao contexto do desligamento institucional, a validade
estatística é bem limitada, não passível de generalizações. Os resultados demonstraram
mudanças do começo ao fim dos encontros, salientadas pelos resultados significantes nos
quadrantes. No entanto, não se pode afirmar que essas mesmas mudanças aconteçam com outros
participantes.
Embora a maioria dos jovens participantes estivesse estudando, com a proximidade do
desligamento alguns desistiram da escola. Corrobora-se, portanto, a relação que Gerard e Booth
(2015) estabelecem entre escola e os problemas relativos à saúde mental dos adolescentes, na
medida em que estes vivenciam momentos de insegurança, com a proximidade do
desligamento, oscilando entre a perda dos cuidados no acolhimento e os desafios relacionados
à vida fora da instituição, como as dificuldades de conseguirem emprego e sustento. Esse quadro
é agravado pelo baixo rendimento escolar que apresentaram, em consonância com o que é
pontuado por Calcing e Benetti (2014), Porto, Szortyka e Heidrich (2012), Siqueira e Dell’Aglio
(2010), Martinez e Soares-Silva (2008) e pela UNICEF (2011), como resultado do quadro de
vulnerabilidade que os afeta. De acordo com Fernandes et al (2015), a escola é considerada o
evento mais estressor nesse contexto.
111
acolhimento, o que traz prejuízos para os adolescentes como foi referido por alguns autores; a
proximidade do desligamento e o não preparo para ele são agravantes para esse quadro, como
é apontado por Figueiró e Campos (2013), Honorato (2011), Siqueira et al (2010), Martinez e
Soares-Silva (2008) e Martinez (2006). Por outro lado, os achados diferem do que esses autores
identificaram, ou seja, uma percepção positiva em relação ao futuro de adolescentes acolhidos
(Zappe e Dell’Aglio, 2016; Zappe et al, 2013) e de adolescentes socioeconomicamente
desfavorecidos (Iovu, 2014; Germano e Colaço, 2012; Macedo e Kublikowski, 2009). Pode-se
inferir que a proximidade do momento do desligamento venha a ser um fator que contribua para
a diminuição da expectativa quanto ao futuro.
Apesar do acima indicado, os participantes demonstraram o desejo de sair da instituição
com planos para o futuro. Liberdade, independência e recomeço foram destacados por eles,
além dos itens família, educação e profissão, o que é pontuado por Ramos, Seidl-de-Moura e
Pessôa (2013) como os mais citados nas pesquisas com adolescentes acolhidos. Os resultados
estão de acordo ao apontado por Martinez e Soares-Silva (2008) sobre o desejo de liberdade e
o receio de perder os cuidados recebidos, assim como não se sentir preparado para os novos
desafios, como é também referido por Benneti e Brino (2016).
Vale destacar que os estudos realizados por Zappe e Dell’Aglio (2016) e Zappe et al
(2013) apontaram evolução positiva quanto à expectativa de futuro em adolescente acolhidos,
embora apresentassem menos oportunidades em relação aos que viviam com suas famílias. No
entanto, os referidos estudos não tiveram como foco os adolescentes que estivessem
vivenciando o processo de desligamento institucional, uma população que merece ser mais
investigada.
A família foi citada em relação aos planos após o desligamento, o que ratifica o estudo
de Zappe et al (2013) sobre a influência que os pais exercem sobre o futuro. Esse dado reforça
a importância do tema sobre o desenvolvimento adolescente, no momento crucial de transição,
como é apontado por Frankel (1998) e Kiepenheuer (1990), assim como fazem referência aos
estudos de Jung ([1941] 2013a, [1904] 201b; Bovensiepen (2014, 2010), Davies (2014), Sidoli
(2014), Knox (2011, 2009), Wilkinson (2006) e Ryotovaara (2010) sobre como as relações de
cuidado, iniciando-se com as relações parentais, serão influenciadoras do desenvolvimento no
que se refere ao futuro.
Embora não tenham sido encontrados estudos sobre a satisfação de vida no contexto do
desligamento que pudessem servir de parâmetro, chamou a atenção qualitativamente - apesar
de os resultados não serem conclusivos -, o aumento da pontuação na média em seis das sete
dimensões, podendo estar atrelado aos benefícios da intervenção: família (ambiente e
113
bastante experimentação nos primeiros. Esse dado é importante porque reitera os achados de
Leite (2012), em pesquisa anterior, e sugere um processo de discriminação e seletividade ao
longo das intervenções. Os três participantes identificaram mais elementos nos primeiros
encontros em relação aos últimos, indicando discriminação ao longo da intervenção.
No tocante ao estudo dos quadrantes, considerando-se todos os participantes, houve
diferenças significativas entre os que completaram os encontros na diminuição da forma círculo,
relativo à proteção, envolvimento (Jung [1911/1952] 2016a; Jung, 1929/2011h), e diminuição
da localização inferior, referente a terrestre e corpóreo (Jung [1954] 2016) com aumento da
espiral, referente a circulação, movimento (Jung [1929] 2011h) e aumento da forma vertical,
relativo a interior, introspecção (Jung, 2014; Jung [1950] 2011f). Destaca-se que a forma espiral
foi a única com aumento significativo também para os participantes que não completaram os
encontros e é referida por (Jung [1929] 2011h) como símbolo de circulação em torno de um
centro, dinamizando vários aspectos que compõem a personalidade.
Importante considerar que o acionamento da dinâmica consciente-inconsciente e a
manifestação de conteúdos inconscientes trazidos à consciência implica, como pontua Knox
(2011), a mobilização de processos internos de desenvolvimento com vistas a um estado
autorreflexivo. No entanto, foi observado que o histórico dos adolescentes de maus tratos e de
violência e as incertezas relativas à proximidade do desligamento institucional podem ser
considerados fatores que dificultaram o processo reflexivo. Destaca-se também que a vertical
foi acionada somente pelos participantes que completaram os encontros, especialmente nos
últimos. Esse dado é importante porque, apesar dos prejuízos decorrentes do histórico de vida,
da situação de acolhimento e da iminência do desligamento, processou-se, em alguns deles,
uma disposição para a introspecção e o contato com conteúdos interiores (Jung, 2014), como
observado em uma participante com histórico de abusos, abandono e trauma.
Sobressaem alguns resultados significativos nos casos particulares: o movimento dextrogiro,
em direção à direita, à consciência (Jung [1950] 2011d; [1950] 2011f), apareceu nas produções
de dois participantes, mas de modos diferenciados: para um participante aumentou ao final dos
encontros, sugerindo relacionar-se com a proximidade do desligamento, ao passo que, talvez
em decorrência desse mesmo fator, este diminuiu no outro participante.
No primeiro caso, a partir das associações o participante teceu poucas reflexões sobre
sua condição no acolhimento. Por causa de seu histórico de vida, de episódios de evasão, de
não conformidade às regras institucionais, o anseio de liberdade e de ir para o mundo poderia
ter acionado uma conscientização dirigida a essa saída, com planos específicos e imediatos. A
interpretação de diminuição do campo de ativação intelectual e de diminuição de contato com
115
o inconsciente pode ser lida como diminuição de fantasias inconscientes no plano das ideias.
Para a outra participante, ao mesmo tempo em que esse movimento diminuiu ao final dos
encontros, houve indícios de introspecção e ampliação de consciência, o que demonstra atitude
reflexiva, que se dá em suas falas, junto a mais acionamento do inconsciente, o que se interpreta
como decorrente provavelmente de insegurança e regressão diante da iminência do
desligamento; este último fato é corroborado pelos achados de Figueiró e Campos (2013),
Honorato (2011), Siqueira et al (2010), Martinez e Soares-Silva (2008) e Martinez (2006).
Embora de forma rudimentar, dois dos três participantes do estudo de caso apresentaram
na narrativa um acréscimo de consciência do momento que estavam vivenciando, dos benefícios
obtidos durante os encontros e das dificuldades após o desligamento, mas sem aparentemente
integrar o que se entende por agenciamento do eu, como a capacidade de fazer escolhas, agir e
afetar resultados ou controlar situações, segundo Knox (2011). Posto que se trata de um
processo de construção do eu desde a infância, há de se pensar que esses adolescentes
apresentam prejuízos acumulados em seu desenvolvimento (Jung [1941] 2013a; [1904] 2013b;
[1934] 2012; Knox 2011, 2009, 2007; Wilkinson, 2006), assim como entraves socioeconômicos
importantes e déficits relacionados à escolaridade (Fernandes et al, 2015; Calcing e Benetti,
2014; Porto; Szortyka e Heidrich, 2012; Martinez e Soares-Silva, 2008). Cabe o questionamento
sobre a tendência superprotetora das instituições de acolhimento como inibidoras desse
desenvolvimento (Goffman, 2015; Martinez e Soares-Silva, 2008; Azôr e Vectore, 2008,
Guirado, 2004; Bleger, 2004) e sobre os prejuízos relacionados ao tempo prolongado de
acolhimento (Ferreira, Litting e Vescovi, 2014; Siqueira e Dell’Algio, 2010). De outro lado, é
importante considerar que esses adolescentes buscam formas de resistência, entendidas por
Sales e Rocha (2013) como modos de fortalecimento interior, tais como, por exemplo, ancorar-
se nas próprias histórias de vida, na projeção de sonhos, no desejo de reencontros com a família
e na esperança de construir uma vida diferente. Apesar das limitações e das incertezas
acentuadas pela proximidade do desligamento, os adolescentes do estudo de casos teceram
planos para o futuro.
Até certo ponto, os atos de rebeldia poderiam constituir tentativas de autoafirmação.
Portanto, o agenciamento do eu se fortalece quando esses adolescentes acionam recursos
próprios – mesmo que incipientes. Em quadros de vulnerabilidade, importa que os profissionais
da saúde mantenham a meta de ativar recursos potenciais, distintos em cada indivíduo. As
técnicas expressivas constituem um dos meios de favorecer a emergência de tais recursos.
116
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa ofereceu indícios de que a intervenção com a técnica expressiva
Paisagem Psíquica pode ser benéfica para adolescentes em processo de desligamento
institucional, pois, ao estimular o acionamento do inconsciente e a manifestação de conteúdos
internos, funcionou como um meio de autoexpressão que lhes permitiu relatar suas histórias de
vida, traumas, sofrimentos, angústias, episódios de adição e de automutilação. Houve
demonstrações de consciência incipiente sobre comportamentos, narrativa de fatos importantes
da vida e de planos para o futuro. A escuta simbólica opera como um facilitador, sem
rotulações, proporcionando sentimento de acolhimento.
Considerando os objetivos da pesquisa, foi verificada a propriedade de fundamentação
da técnica expressiva a partir do estudo dos quadrantes, oriundo da obra de C. G. Jung,
possibilitando um direcionamento para a compreensão da psicodinâmica dos adolescentes, em
processo de desligamento, mediante a dimensão imagética como representação da psique
(Jacobi, 2013) e aplicação do estudo de símbolos, em um contexto de investigação (Penna,
2014).
Apesar do número reduzido de participantes que responderam aos instrumentos, antes e
depois da intervenção, portanto, sem possibilidade de generalização, a utilização das Escalas de
Expectativas Quanto ao Futuro e Multidimensional de Satisfação de Vida para Adolescentes
serviram para compreender o processo de desligamento vivenciado pelos adolescentes, a serem
mais investigados em estudos futuros. Por exemplo, a se investigar se a proximidade do
desligamento e o quadro de incerteza e insegurança gerado nesse momento afetam as
expectativas de futuro. O aumento da média - apreciado qualitativamente - de satisfação de
vida para os três participantes que completaram os encontros foi outro indicador, confirmando
a importância de intervenções com técnicas expressivas e de um atendimento individualizado,
como estratégia para atender às necessidades psicológicas de cada adolescente.
Por meio do estudo de casos, foi possível compreender o processamento simbólico e
imagético dos adolescentes que completaram os, elucidando-se os mecanismos que cada um
deles desenvolveu para lidar com suas dificuldades.
Como contribuições para o campo da Psicologia Analítica, depreende-se que seja
possível estudar a psicodinâmica de adolescentes, no processo de desligamento, por meio de
técnicas expressivas, neste caso, a técnica expressiva Paisagem Psíquica, aplicando-a em
intervenções no contexto do acolhimento.
117
estudados tanto os adolescentes acolhidos como os que vivem com suas famílias e os que
cumprem medidas socioeducativas (Zappe e Dell’Aglio, 2016; Zappe et al, 2013).
Sobre a técnica utilizada, é importante que se dê continuidade ao estudo de sua
aplicabilidade e efetividade com grupos experimentais e controle, inclusive em outros
contextos, assim como a utilização simultânea de distintas técnicas expressivas e de outras
também.
Por último, uma discussão se abre sobre a utilização da técnica expressiva Paisagem
Psíquica como instrumento expressivo ou projetivo: por si, promove a dinamização consciente-
inconsciente; acrescido às associações e à amplificação, possibilita o aprofundamento do
inconsciente e a manifestação de conteúdos transferenciais e contratransferenciais. De um lado,
faz-se necessário diferenciar seu uso no contexto psicoterapêutico, o qual requer conhecimento
especializado de psicodinâmica, de desenvolvimento da personalidade, de defesas e de
mecanismos de projeção, dos quadros e transtornos clínicos, assim como experiência
terapêutica com as projeções e introjeções na transferência e na contratransferência. De outro,
leva a se pensar nos limites entre a técnica e a subjetividade, mas também singulariza uma
peculiaridade da Psicologia Analítica quando se adota a dimensão imagética, que é para Jacobi
(2013, p. 157) a “representação simbólica de uma psique olhada internamente”.
Destaca-se a importância de um estudo inédito ao se utilizar um recurso expressivo com
adolescentes no processo de desligamento institucional. Considera-se, portanto, que o trabalho
todo é uma maneira de personalizar problemáticas e valorizar a individualidade de jovens em
vulnerabilidade, realçando a importância do apoio, em teoria e pesquisa sob esse enfoque.
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WENDT, B.; DELL’AGLIO, D. D. Práticas educativas positivas em contextos de acolhimento
institucional: valorização dos méritos das crianças e adolescentes. In: CAVALCANTE, L. I. C.
et al. Acolhimento Institucional de crianças e adolescentes: teorias e evidências científicas
para boas práticas. Curitiba: Juruá, 2018. Cap. 13, p. 189-204.
WENDT, B.; DULLIUS, L.; DELL’AGLIO, D. D. Imagens sociais sobre jovens em
acolhimento institucional. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 37, n. 2, p. 529-541, 2017.
129
APÊNDICES
Apêndice 1
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – Adolescente
1. No primeiro encontro teremos uma conversa sobre a pesquisa, com assinatura do Termo
de consentimento livre e esclarecido, dois questionários e uma entrevista com algumas
perguntas;
2. Depois teremos encontros semanais por três meses, momento em que vamos utilizar
uma técnica de pintura e conversamos sobre temas importantes que quiser;
3. No último encontro falaremos sobre o que aconteceu durante o tempo que estivemos
juntos por meio de uma entrevista e também a aplicação de dois questionários.
a. A pesquisa oferece risco baixo para você, ou seja, por se tratar de uma atividade de
pintura de fácil manuseio;
b. Os benefícios que esperamos como estudo são: que você tenha um momento só para
você, e a técnica de pintura o ajudará nisso; que possa pensar sobre essa fase do
desligamento e também pensar sobre o que virá depois que sair do abrigo;
c. Caso você decida não participar, é possível indicar outro tipo de atividade, caso queira;
d. Durante todo o período da pesquisa você tem o direito de tirar qualquer dúvida ou pedir
qualquer outro esclarecimento;
e. Em caso de algum problema relacionado com a pesquisa você terá direito à assistência
gratuita que será prestada pelo próprio pesquisador, ou, caso seja preciso, será realizado
encaminhamento para um profissional especializado, garantindo assim que você fique
bem;
f. Você tem garantido o seu direito de não aceitar participar ou de retirar sua permissão, a
qualquer momento, sem nenhum tipo de prejuízo ou retaliação;
g. As informações desta pesquisa serão confidenciais, e serão divulgadas apenas em
eventos ou publicações científicas, sem que você seja identificado, a não ser entre os
responsáveis por este estudo, sendo assegurado o sigilo sobre sua participação;
h. Os nossos encontros poderão ser gravados com um gravador digital e filmados com uma
filmadora com o objetivo de registrar tudo o que for importante durante nossos
encontros;
i. As pinturas que você criar poderão ficar com você, caso queira, ou poderão ser enviadas
as imagens das pinturas nas formas: impressa ou digital, já que todas serão fotografadas.
Esse envio será feito após o fim de todos os nossos encontros;
131
Autorização:
______________________________________
Email:
Telefones:
Apêndice 2
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido:
Instituição responsável pelo adolescente
Título do Projeto:
O desligamento institucional em adolescentes: intervenção por meio da técnica expressiva
Paisagem Psíquica: um enfoque junguiano.
O presente projeto está vinculado ao Programa Stricto Sensu: Doutorado em Psicologia Clínica
(Núcleo de Estudos Junguianos) sob orientação da Professora Doutora
.........................................., da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), situada
à Rua Monte Alegre, 984, Perdizes, CEP 05014-901, SP, Telefone: (11) 3670.8000. É um
projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCSP (CEP), que aprova e monitora
todos os projetos que lidam com pessoas.
Objetivos:
Investigar se há melhora em relação a: satisfação de vida e percepção de expectativas
quanto ao futuro com o uso da técnica expressiva Paisagem Psíquica, bem como compreender
o processo do momento de saída do abrigo de adolescentes que vivem em instituições.
Eu, ......................................................................................................................................,
Coordenador(a) e/ou Responsável pela Instituição ............................................................
..........................................................................................., e responsável pelo participante da
pesquisa ............................................................................................., autorizo a realização do
projeto de pesquisa intitulado: O desligamento institucional em adolescentes: intervenção por
meio da técnica expressiva Paisagem Psíquica: um enfoque junguiano desenvolvido por
..............................................................
Estou ciente de que a participação do adolescente é voluntária, de que todas os dados coletados
servirão aos propósitos da pesquisa, contemplando as normas éticas de preservação da
identidade, e de risco baixo aos adolescentes.
Ressalta-se que a participação desta Instituição é voluntária, ficando explícito que a pesquisa
não trará qualquer tipo de apoio financeiro, dano ou despesas para a Instituição e para o
Adolescente. Fica também explicitada a possibilidade de interrupção da participação na
pesquisa por parte da instituição ou do adolescente a qualquer momento, sem que essa decisão
traga quaisquer consequências para ambos.
Todas a minhas dúvidas e questões pertinentes à pesquisa foram respondidas pelo pesquisador
responsável, colocando-se à disposição para eventuais dúvidas que possam surgir em qualquer
momento da pesquisa, ou mesmo após o seu término.
133
Também estou ciente de que este tipo de pesquisa exige uma apresentação de resultados e
análise. Por isso autorizo a divulgação destes resultados produzidos pelo pesquisador, bem
como o conteúdo do projeto para fins de publicação e divulgação científica.
CONTATO:
Email:
Telefones:
134
Apêndice 3
PROTOCOLO
(Frente)
(Verso)
136
Anexo 1
MAPA DE ATUAÇÃO