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Resumo e Fichamento I – Prática e Ensino I

A Música e o Risco – Rose Satiko Gitirana Hikiji

Referência:

HIKIJI, R. S. G.; A Música e o Risco: etnografia da performance de crianças e jovens


participantes de um projeto social de ensino musical, São Paulo: EDUSP, 2006.

Resumo:

 Capítulo 1: Das possibilidades de uma Audição da Vida Social – Música e


antropologia - e um pouco de teatro, cinema...

O capítulo inicial do livro A música e o Risco é apresentado pela autora, Rose Hikiji, como
uma tentativa de confrontar o valor e a significação dos sons musicais e do fazer música em
diferentes situações sociais e culturais. Trazendo seu ponto de vista como antropóloga e
musicista ela busca traçar paralelos entre as dificuldades de compreender a diferença entre a
importância que a música e os próprios sons ocupam nas diferentes partes da sociedade
humana.
Logo no início ela busca evidenciar comparações que observou com diferentes povos na
intenção de enfatizar a prática musical como análise, levando-se em consideração que uma
das ideias do capítulo é analisar um projeto de educação musical conhecido como Projeto
Guri.
O capítulo também traz uma discussão sobre como a audição possui um valor igual e algumas
vezes até mesmo maior do que a visão em algumas sociedades, mostrando como as razões
sensoriais possuem suas particularidades ligadas à cultura.

“Ao pensarem sobre a surdez, quando chegam a pensar, as pessoas tendem a considerá-la menos grave
que a cegueira, a vê-la como uma desvantagem, um incômodo ou uma invalidez, mas quase nunca como algo
devastador num sentido radical.” (SACKS, Vendo vozes. Uma viagem ao mundo dos Surdos, São Paulo, 1998,
p.22.)
Ainda sobre Sacks a autora ressalta o papel fundamental que a audição possui para o processo
de aquisição da linguagem, o que torna, segundo Sacks, infinitamente mais grave nascer surdo
do que cego.
Logo em seguida, a autora busca evidenciar o distanciamento quase natural dos estudiosos das
Ciências Sociais da linguagem musical, pois estes se prendem muito mais aos aspectos
verbais e visuais do que aos sonoros. Segundo a autora, os antropólogos preferem lidar com
os fatos sociais da existência humana do que com os culturais, sendo assim ela nos apresenta
Steven Feld que propõe uma análise do conhecimento através da performance, pois essa seria
a forma de compreensão mais profunda das manifestações sensíveis.
Também é importante citar John Blacking que reforça a ideia de que a música deve ser
estudada de em suas dimensões não-verbais tanto quanto verbais.
Numa primeira subdivisão do capítulo (Uma Antropologia bem temperada – contaminações
musicais, cinematográficas e teatrais), a autora traz brevemente a discussão para as possíveis
relações entre a linguagem cinematográfica e o caráter narrativo da música tonal ocidental.
Assim como os reflexos que ambas as formas de arte sofrem no decorrer de grandes eventos
que ocorrem na transformação dessas formas de expressão, por exemplo: como o
dodecafonismo, a música concreta, a inclusão do ruído dentro das dimensões musicais e o
considerável aumento do uso de dissonâncias e polifonias na música ocidental e no que isso
influenciou o cinema e vice-versa.
Na segunda subdivisão do capítulo (Música e Sociedade), a autora foca numa abordagem
sobre Anthony Seeger, onde apresenta uma tentativa de conceitualização de música,
objetivando não limitar o estudo apenas na parte cultural, mas também podendo considerar a
própria cultura como um evento que acontece na música.

“É necessário aprofundar a discussão acerca da relação entre música e sociedade. Por um lado, é consensual o
fato de que, do ponto de vista da antropologia, não é possível estudar música sem se referir à cultura. No entanto,
há bastante controvérsia sobre a relação entre essas esferas. Seeger atribui à música a capacidade de produzir

cultura e transformar a sociedade.” (HIKIJI. 2006, p.63)

Em seguida o capítulo segue na intenção de causar uma reflexão entre as relações entre as
experiências musicais no auxilio ou conflito com as atividades sociais.
Para finalizar o capítulo (Variações sobre um mesmo tema), a autora retoma alguns elementos
apresentados no início do capítulo sobre a prática musical como elemento transformador na
vida de jovens e/ou como acesso ao exercício de cidadania, tomando como base
especificamente o Projeto Guri. Dessa forma ela consegue trazer a discussão para a realidade
da sociedade brasileira em si e sobre as dificuldades de ensinar música em uma sociedade em
que a aprendizagem musical é muito ligada às possibilidades de inserção profissional.
Para concluir ela afirma que a ‘marginalização’ da música como expressão artística afeta
muito a aprendizagem musical e prejudica a absorção do conhecimento como forma de
enriquecimento pessoal, porém não é fator determinante para impedir que esse tipo de
atividade aconteça.

“O pedestal em que são colocadas as atividades artísticas - são reconhecidas, desejadas, mas isoladas, quase
inalcançáveis - impede a um setor da sociedade que reconhece como arte/música o que fazem os jovens
aprendizes do Guri. Mas para esses jovens, a música está efetivamente acontecendo: ela faz parte de suas vidas e
está modificando seus corpos, seus pensamentos, seus desejos, sua percepção. Fazer música, para eles, é belo, é
bom, é correto, é o presente, é uma possibilidade de futuro.” (HIKIJI. 2006, p.70)

 Capítulo 2: Música como intervenção social

Música e política: Apresentação da ideia central do capítulo, demonstrando que as intenções


deste são abordar o ensino de música como forma de intervenção social. “O objetivo não é
formar um músico, mas mudar a vida do jovem. A música como meio”. A autora diz que
pretende levantar elementos que permitam a melhor compreensão entre o as ideias de
“desenvolvimento de cidadania”, “afastamento do perigo das ruas” e “recuperação da auto-
estima”; dentro da do convívio social.
Villa-Vobos e música civilizatória: Nesse momento a autora aborda o momento histórico em
que houve a iniciativa do maestro Heito Villa-Lobos com o Canto Orfeônico, desenvolvido
no Estado Novo e sendo considerado (até então) o único projeto nacional de ensino de música
no sistema de educação básica do país. Porém, como a autora demonstra, a ideia do canto
orfeônico não foi desenvolver a sensibilidade musical, mas sim usar o potencial do ensino
musical para desenvolver valores como: civismo, disciplina, trabalho e patriotismo.
Reverberações: Divisão onde a autora começa a exemplificar os trabalhos posteriores ao
projeto de educação cívico-musical de Villa Lobos tanto quanto as diferenças entre os
discursos dos músicos e políticos do Estado Novo e dos dias atuais. Também demonstra as
marcas na educação musical das práticas do canto orfeônico, pois o projeto se estendeu por
mais de uma década (fazendo paralelos até mesmo com o projeto Guri). É feito ainda uma
análise das classes sociais e também do fato do contato inicial de grande parte dos músicos
profissionais de orquestras em São Paulo ter se originado devido ao hábito de algumas igrejas
evangélicas que mantêm uma orquestra para tocar nos cultos e oferecem aulas de
instrumentos aos fiéis.
A Arte como instrumento de intervenção social: Aqui a autora evidencia que a maioria dos
projetos que visam o ensino musical são direcionados para comunidades de baixa renda, o
que, segundo ela, é um indicativo do poder transformador social da música.
O risco: (único ponto interessante do capítulo) onde a autora aborda o conceito da situação de
risco que alguns jovens e crianças acabam sendo enquadrados e no que isso implica em
relação aos acessos a todo tipo de benefício social, cultura, ensino, educação, saúde. Também
é levantada a ideia de que atualmente a ‘rua’ é vista como um perigo iminente e que há uma
enorme dificuldade em permitir que a criança permaneça tempo demasiado brincando ou sem
alguma atividade pré-estabelecida. “...quando não se tem nada para fazer, se aprende
besteira.”...
Auto-estima: relação feita entre as possibilidades e o desafio de conseguir usar o processo de
ensino musical para ajuda na auto-estima das crianças/jovens em situação de risco.
Cidadania: intercala os conceitos de cidadania e auto-estima apresentado na subdivisão
anterior e finaliza o capítulo.

Citações:

“É necessário aprofundar a discussão acerca da relação entre música e sociedade. Por um


lado, é consensual o fato de que, do ponto de vista da antropologia, não é possível estudar
música sem se referir à cultura. No entanto, há bastante controvérsia sobre a relação entre
essas esferas. Seeger atribui à música a capacidade de produzir cultura e transformar a
sociedade.” (HIKIJI. 2006, p.63)

“O pedestal em que são colocadas as atividades artísticas - são reconhecidas, desejadas, mas
isoladas, quase inalcançáveis - impede a um setor da sociedade que reconhece como
arte/música o que fazem os jovens aprendizes do Guri. Mas para esses jovens, a música está
efetivamente acontecendo: ela faz parte de suas vidas e está modificando seus corpos, seus
pensamentos, seus desejos, sua percepção. Fazer música, para eles, é belo, é bom, é correto, é
o presente, é uma possibilidade de futuro.” (HIKIJI. 2006, p.70)

“Nas falas dos diversos autores pesquisados, quase em uníssono, é destacado o risco da ‘rua’.
A rua da metrópole é associada à crescente criminalidade, que envolve cada vez mais pessoas
mais jovens. No espaço urbano, as formas de sociabilidade passam por mudanças radicais. A
rua – outrora espaço da brincadeira, do encontro, dos vizinhos – é associada agora ao perigo.
Deve-se evitar ‘deixar as crianças na rua’. O tempo ocioso, outrora sinal de diacrítico da
infância – que tem o tempo do estudo e da brincadeira, que é lembrada nostalgicamente pelo
adulto ‘que não tem tempo para nada’ – é visto agora como ‘tempo perigoso’: quando não se
tem o que fazer, ‘se aprende besteira’, ‘fica-se sujeito às más influências da rua’. O tempo
livre, antes tão valorizado, é agora tempo a ser ocupado.” (HIJIKI. 2006, p. 82-83)

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