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TEORIA E MÉTODO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS

RECENSÃO CRÍTICA – THE SOCIOLOGY OF MUSIC

Identificação dos estudantes

1) Afonso Mateus
2) Andreia Sofia Cruz Graça – 38104
3) Ezequiel Domingues Costa Arrais – a2021127898
4) Joana Maria de Sousa Teles – a2021131295

Biografia

Katharine Ellis é uma musicóloga britânica, especializada em História da Música, cuja


área de estudo centra-se na França no século XIX. A autora estudou na University
College Oxford, assim como violino, na Guildhall School of Music. Para além dos
livros publicados, lecionou em St Anne's College Oxford e na Open University antes de
ir para a Royal Holloway onde leciona desde 1994.

Introdução

A Sociologia da Música tem como principal foco a Relação Música-Identidade. Debru-


ça-se nas relações entre a música e as pessoas que a produzem e/ou a executam, bem co-
mo, no contexto onde é utilizada. A Sociologia da Música centra-se nas pessoas, nos
grupos e nas estruturas socias, de modo a explorar os seus significados, a capital cultu-
ral, o mercado da música, o grau de exclusividade e as mentalidades inerentes às várias
comunidades e não se centrando, assim, somente no produto em si.

Assim, o que mais importa no estudo da sociologia da música é o público, os seus gos-
tos e a sua postura. O que nos faz apreciar e valorizar uma determinada música depende
da nossa postura no meio social e educacional, das nossas origens e das associações que
nós próprios fazemos relativamente à música.

Quando pensamos num determinado estilo musical, associamo-lo a um determinado es-


tilo de vida, pelo que, o estudo sociológico da música tende a explorar as redes humanas
em torno da música, ao invés de se focar nas características do estilo musical. O estilo
musical é apenas uma componente de algo muito maior. A música é mais do que apenas
música.

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Neste livro, An Introduction of Music Studies1, mais propriamente no capítulo número
três, The sociology of music, de Katharine Ellis, serão discutidos cinco assuntos-chave
para esta questão da Sociologia da Música.

1) Quais as principais questões da Sociologia da Música?


2) O problema da arte erudita
3) O ser génio é inato ou construído?
4) “Mundos da Arte” e a indústria musical
5) “Capital Cultural”, estatuto social e identidade

Principais questões da Sociologia da Música


Para fazer o estudo na sociologia da música é preciso ter um conjunto de métodos que
enfatizam a procura pelas pessoas, trabalho de campo e fazer o seu estudo através de
entrevistas e questionários. Por outro lado, a existência de uma base de dados de
estatística é de grande valor. Portanto, estes métodos acabam por ser um dos mais
importantes, senão os mais importantes pelo facto de recolhermos informação genuína e
com a qual podemos analisar e tirar hipóteses e evidências das atitudes, opiniões ou
gostos.

Por outro lado, a sociologia, bem como, a sociologia da música tem um caráter histórico.
Neste contexto a aproximação à opinião e comportamento das pessoas é normalmente
indireto feito através de memórias, cartas, reminiscências familiares, fotografias, material
de propaganda, relatórios de imprensa e filmagens antigas. Todos estes documentos
podem ajudar a conhecer muita das vezes o porquê de um género musical, por exemplo,
ter determinadas regras e características. Provavelmente deve -se a um processo realizado
ao longo da história que é necessária a investigação a nível sociológico. As questões são
praticamente as mesmas, mas a ênfase tende a mudar tendo uma música especifica como
objeto de estudo: Para quê as pessoas usavam essa música? Quão amplamente era
conhecida, e entre quais grupos sociais? Quais processos eram necessários para que a
música chegue ao domínio público? O que significa a música para aqueles que a
valorizaram ou denigrem? Como foi reinventada ao longo do tempo, através de diferentes
arranjos destinadas a diferentes tipos de público?

1
Ellis, Katharine. An Introduction of Music Studies – The sociology of music. New York: Cambridge
University Press. 2009.

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Será que a música é semelhante aos grupos sociais que se identificam com ela? Ou com
os que produziram a tal música? Será que a música é o reflexo de estruturas sociais? (Ideia
do campo a cantar as pessoas) O sociólogo e filósofo Theodor Adorno (1903-1969)
explora a ideia de que o Serialismo/Dodecafonismo de Schoenberg era totalitário (ligado
a um sistema político). Ele critica o facto desta técnica retirar a criatividade, a liberdade
do compositor. De facto, quanto somos enfrentados com uma quantidade enorme de
regras ou técnicas, nós tendemos a não ter tanto espaço para a criatividade nas melodias
e harmonias. Pode-se dar outro exemplo como o contraponto (uma técnica de composição
rígida na qual tem que se obedecer aos movimentos paralelos, oblíquos, contrários e à
questão dos saltos na melodia). Quando há mais liberdade há vários aspetos que nos
sobressaem: A composição pode ser espetacular, mas também pode ser confusa devido à
escrita sem regras. Entretanto, com esta questão encontra-se outra que é o facto de como
cada pessoa lida com a liberdade ou com uma escrita rígida. Mas voltando a Adorno, a
forma de compor o serialismo ia contra os seus ideais sociais. Entretanto conclui que os
artistas podem trabalhar, voluntariamente, com este método. Por fim, neste domínio da
sociologia, deparamo-nos com todos os tipos de crítica nos quais tem-se a questão de
aspetos da sociedade que estão imiscuídos na estrutura musical. Todas estas questões
devem-se ao facto da ligação entre sociologia e musicologia histórica.

Em Suma, a Sociologia da música não contém apenas um domínio, mas vários. O âmbito
de investigação é grande e muitos dos domínios aproximam-se da etnomusicologia,
psicologia, estudos de género, entre outro. Por outro lado, o método em sociologia passa
pelo estudo detalhado de interações humanas necessárias para o conhecimento de certos
grupos, bem como de um estudo mais alargado da cultura de massas.

O problema da arte erudita

O segundo tema do capítulo debruça-se sobre uma das questões que a autora refere co-
mo problemática no meio do estudo da sociologia da cultura – The problem of ‘High Art’.

A autora começa por explicar que muitos sociólogos têm vindo a definir o seu trabalho
como a rejeição de certos métodos e atitudes problemáticas no estudo das humanidades,
como a tendência de se concentrar o estudo apenas na dita ‘música erudita’ (ou ‘arte e-
rudita’) e da remoção das obras associadas a essa arte fora do seu contexto social e ape-
nas adotar uma visão restrita sobre elas – como um resultado/produto da genialidade do

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‘compositor-prodígio’. Ellis faz ainda referência a um conceito-chave que os sociólogos
sempre se questionaram – “the autonomous artwork” (Ellis 2009), ou seja, a obra de arte
independente - e explica que este termo parece descritivo, mas é na verdade, normativo,
que implica um sistema de valores específico, valores estes, no caso, que se concentram
na ideia de que uma obra de arte é “puramente um produto intelectual advindo de uma
mente artista incomumente criativa” (Ellis 2009) – o génio-compositor.

Essa distância que se cria entre a obra (objeto)/próprio compositor e o público (sujeito) é
criticado pela autora, que dá uma hipótese que elucide a ocorrência desse fenómeno –
distração e a maior concentração das obras que estamos a experienciar, estando a cami-
nhar num museu ou sentados numa sala de concertos, são explicativos para o distancia-
mento entre o objeto e o sujeito em questão. Refere ainda que seremos apenas observa-
dores/espetadores e não participantes, ilustrando com o facto de sermos chamados à a-
tenção, se tocarmos numa estátua num museu, ou cantarmos à medida que ouvimos um
concerto de Mozart, primeiro pelos seguranças e depois pelos próprios membros da au-
diência, que explica que eles perceberão “não somos um deles” porque não aceitamos as
regras de etiqueta e rituais associados a esta manifestação de arte. Ellis menciona ainda
algo de bastante revelevância no debate do tema em questão - “The aim (de muitos
museus e orquestras) is to reduce what is known as self-censorship – people turning away
from an art form they might potentially enjoy because they are intimidated both by its
rituals and by the kinds of people who are comfortable with those rituals.” (Ellis 2009).

Contudo, esta última ideia de Ellis, embora pertinente, concentra-se apenas numa visão
negativista sobre os rituais associados à ‘música erudita’, rituais que tiveram a sua própria
história de consolidação e que fazem parte das características desta mesma manifestação
de arte. A própria autora, no final do seu capítulo The sociology of music, declara “Human
beings invest music with value and meaning and use it as a way of defining themselves
socially and binding themselves into groups.” (Ellis 2009), o que significa que esses
mesmos rituais são o que conduzem um certo grupo de seres humanos a conferirem valor
a esta forma de arte e a vincularem-se nesses mesmos grupos sociais, com essas mesmas
características.

O ser génio é inato ou é construído?

Beethoven foi um dos génios mais famosos do Ocidente que, apesar da surdez progres-
siva, não deixou de compor, confiando na sua memória auditiva.

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Hegel, em Cursos de Estética I, escreveu “Quanto maior e mais rico for o talento e o gé-
nio, tanto menos dificuldade ele encontrará para a aquisição das habilidades necessárias
para a produção.” e “Ambos os aspetos, a produção interior e a sua realização, andam,
conforme o conceito da arte, completamente de mãos dadas.”2

Para Immanuel Kant, génio é o talento natural e inato do indivíduo, através do qual a
natureza dá a regra à arte. O compositor-génio teria de ter competências artísticas. No
entanto, o crescente reconhecimento da qualidade da música Beethoven não terá sido o
único motivo para o sucesso da sua carreira. Daí que, em Beethoven e a Construção do
Génio, Tia DeNora escreveu que a música «não existe como algo independente da soci-
edade, considerando que patrocinadores aristocráticos, editores, promotores de concer-
tos, diretores de teatro, críticos de música dos jornais locais agiram como “Porteiros da
exposição pública”»3.

Assim sendo, compositores que tinham contactos com as pessoas certas estariam em
vantagem nas suas carreiras e na sua reputação, mesmo após a sua morte, em relação
àqueles que estavam desprovidos dos mesmos contactos.

DeNora, através de pesquisa histórica, argumenta que as circunstâncias sociais benefici-


aram Beethoven que viu e negociou com sucesso o seu percurso, através do sistema de
mecenato, então em operação.

“Mundos da Arte” e a Indústria Musical

Sobre o tema "Art Worlds" and the music business, a autora começa por nos apresentar
uma definição teórica dos art worlds de 1982, de Howard Becker, referente às artes
visuais. Esta definição defende que o autor de uma obra não é apenas o artista, mas sim
todos os que influenciam o resultado final desta. Aplicando este conceito à música, há
vários intermediários, desde a criação de uma obra até esta chegar ao público, que
acrescentam uma dimensão essencial à música para além da peça musical em si. Até se
poderia afirmar que os ouvintes conseguem ser tão importantes como quem escreve a
peça, pois trazem uma nova perspetiva e significado a esta. Ellis prossegue para descrever
como é necessário, de forma à música ser financiada tanto por mecanismos públicos como
privados, atribuir-lhe um valor. No entanto, este financiamento presume que a música não

2
Hegel, G. W. F. Vorlesungen über die Ästhetik. De Gruyter Akademie Forschung. 2018.
3
De Nora, Tia. Beethoven and the Construction of Genius: Musical Politics in Vienna, 1792-1803.
Califórnia: University of California Press. 1996.

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se consegue sustentar, algo que a sociologia da música considera verdadeiro para alguns
tipos de música, mas não para todos. A indústria da gravação - recording industry - tem
realçado estas diferenças nos diferentes géneros de música, ao separar os lucros das
grandes empresas pelas respetivas divisões em vez de estes serem partilhados, um
processo que leva a que sejam expostas as perdas das divisões mais pequenas, atenuadas
anteriormente pelos lucros de outras áreas. Para evitar estas perdas, algumas divisões são
obrigadas a realizar mudanças para alcançar um público maior, algo que, na minha
opinião, limita a liberdade criativa do artista, como se vê frequentemente a acontecer na
música independente, onde é também posta em causa a autenticidade da música e dos
valores de alguns artistas para que estes se possam sustentar.

“Capital Cultural”, estatuto social e identidade

Pegando nalgumas ideias do assunto anterior, Ellis dá-nos agora uma definição de "capital
cultural" do sociólogo Pierre Bourdieu, que estabelece uma relação entre música e
estatuto social. Para exemplificar, temos tendência a associar ideias de requinte e
sofisticação a música clássica, que nos levam a pensar num escalão social elevado. A
ideia de Ellis de autocensura, discutida já em subcapítulos anteriores, é retomada com
esta relação entre géneros de música e estatuto social, que influencia o consumo musical
dos diferentes grupos sociais. É ainda referido como será possível alcançar um certo
estatuto social através da música que está associada a este, com um investimento cultural
(bilhetes e doações) que muitas vezes é exposto de forma pública, estabelecendo assim
uma posição social. A partir desta relação entre a música e estatuto social, Ellis prossegue
para uma análise da organização social que se observa através da música. Destaca como
grupos sociais de maiores dimensões terão um maior controlo no mercado, pois têm
tendência a valorizar a mesma música. A pesquisa nesta área tem sido realizada de uma
forma mais direta, para que se possam compreender os motivos de algumas atitudes
sociais. Assim, chegamos a uma ideia de identidade, percebendo que a música tem um
grande papel na formação desta à medida que crescemos, tanto individualmente como
coletivamente. Ellis menciona duas cenas musicais para demonstrar este sentido de
identidade, tomando como exemplo o heavy metal e a cena de clubbing do Reino Unido
dos anos 90. Apesar de nos parecerem ambientes completamente distintos, ambos
apresentam características demográficas, atitudes, visual adotado e posições tomadas pró-
prios, que geram um círculo social fechado e exclusivo. Esta exclusividade e sensação da
existência de uma barreira social expõe-nos a oposição de uma subcultura e mainstream,

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mas concluímos, segundo pesquisa de Sarah Thornton, que o conceito do mainstream não
passa de um conceito por definir, ou seja, no fundo este conceito é uma ilusão criada
dentro destes grupos para que se possam sentir especiais e exclusivos. O mainstream
assemelha-se ao conceito de "génio" de DeNora, no sentido em que acabam por ser
construções sociais que surgem dentro destes círculos exclusivos. Rematando este tema
da identidade na música, as políticas de identidade e a interligação da música e estatuto
social constituem assuntos importantes para a sociologia da música. Em suma, a música
está fortemente envolvida na nossa vida, daí esta ser uma área de estudo tão importante
da sociologia - é algo a que reagimos fortemente, e é importante o estudo do significado
da música e de questões como o que é que a música que ouvimos diz sobre nós.

Conclusão

1) A sociologia da música compreende diferentes maneiras de pensar sobre o


significado atribuído ao conceito de música e tenta explicar porque grupos sociais
diferentes valorizam géneros e estilos musicais diferentes;
2) A sociologia da música preocupa-se com as pessoas, a política e as instituições
sociais do que com a sonoridade da música em si;
3) A sociologia da música opõe-se à ideia da obra autónoma composta pelo génio
solitário, transcendente e incompreendido.

Bibliografia
De Nora, Tia. Beethoven and the Construction of Genius: Musical Politics in Vienna,
1792-1803. Califórnia: University of California Press. 1996.
Ellis, Katharine. An Introduction of Music Studies – The sociology of music. New York:
Cambridge University Press. 2009.

Hegel, G. W. F. Vorlesungen über die Ästhetik. De Gruyter Akademie Forschung. 2018.

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