Você está na página 1de 39

“E todos foram cheios do Espírito Santo”: apontamentos históricos e tipológicos sobre as

origens e trajetória do pentecostalismo brasileiro

Daniel Rocha1

Na primeira página do jornal Los Angeles Daily Times de 18 de abril de 1906, registrou-
se, entre os destaques daquela edição, uma reportagem sobre a “estranha Babel de línguas”
(weird Babel of tongues) que estaria sendo testemunhada pelos presentes nas reuniões que
ocorriam na rua Azusa nº 312, em Los Angeles. O jornal falava dos participantes de uma “nova
seita de fanáticos” que praticavam rituais bizarros, pregavam “as teorias mais selvagens e se
entrega[vam] a um estado de louco êxtase”.2 O olhar cético e mesmo jocoso da imprensa em
relação àquele movimento também se fazia presente nas avaliações de algumas lideranças
protestantes sobre esse novo “movimento das línguas”. Outras viam aquelas manifestações
como uma forma desvirtuada de cristianismo cuja inspiração seria demoníaca. O pregador
conservador George Campbell Morgan referia-se ao movimento como “o último vômito de
Satanás” – the last vomit of Satan (Apud BROWN, 1996, p. 197).

Já aqueles envolvidos com os “sinais e prodígios” dessa nova descida do Espírito Santo
– que tinha na glossolalia, o “dom de línguas”, seu sinal confirmatório – acreditavam fazer parte
de um plano divino de restauração da fé do cristianismo primitivo, da fé dos apóstolos. O que
estava acontecendo em Los Angeles e outras partes dos Estados Unidos seria um sinal do
iminente retorno de Cristo em um cumprimento das profecias bíblicas sobre a “última chuva”
(latter rain) antes do fim dos tempos, “como um prelúdio da Segunda Vinda de Jesus Cristo,
desta vez para estabelecer o seu reino visível” (COX, 1995, p. 47).

Passado mais de um século de história, aquele movimento considerado, no mínimo,


exótico por grande parte da sociedade norte-americana do final da primeira década do século
XX se tornou o maior fenômeno em termos de crescimento quantitativo no âmbito das religiões
ao redor do mundo. Especialmente na América Latina e em alguns países da África, os cristãos
pentecostais já se consolidaram como uma parcela significativa das populações locais, não

1
Doutor em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (2017). Bolsista PNPD/CAPES e professor
colaborador no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais. Endereço eletrônico: danielrochabh@yahoo.com.br
2
Tradução nossa. O mesmo ocorre em todas as outras citações originalmente em inglês.
podendo mais ser vistos como uma pequena minoria sem maior relevância na vida religiosa e,
também, nos contextos social e político desses países. No caso do Brasil, os pentecostais
formam o grupo que mais cresce no campo religioso nacional de acordo com os dados dos
últimos Censos demográficos. Em 2010, 25.370.484 milhões de brasileiros se autodeclararam
membros de alguma igreja pentecostal, 13,3% do total da população. Com o adiamento do
Censo que deveria ter sido realizado em 2020, ainda não temos como mesurar a evolução do
número de pentecostais na última década, mas pesquisas recentes – com amostragens bem
menores que a do Censo do IBGE, é claro – têm indicado que a trajetória de crescimento dos
pentecostais tem se mantido ao longo dos últimos anos.3

O pentecostalismo tem se tornado cada vez mais familiar aos brasileiros. Juntamente
com o crescimento numérico vieram a expansão das igrejas, a grande visibilidade através da
mídia e da presença de seus templos na paisagem urbana, a participação de políticos
declaradamente pentecostais no espaço público, os grandes eventos que mobilizam milhares de
pessoas – como a “Marcha para Jesus” – e o convívio pessoal cada vez mais frequente de
brasileiros com amigos, familiares ou colegas de trabalho que são (ou se tornaram) pentecostais.
E esse movimento religioso não tem passado despercebido aos estudos acadêmicos. Se há
algumas décadas as pesquisas sobre o pentecostalismo eram raras e aquela parcela antes
reduzida e de tendência sectária da população brasileira não despertava maior interesse dos
estudiosos das religiões no Brasil, hoje em dia o quadro é bem diferente. O interesse dos
pesquisadores sobre o pentecostalismo tem sido crescente, embora tenha se apresentado de
maneira desigual entre as áreas – com, por exemplo, mais trabalhos entre antropólogos e
sociólogos do que entre historiadores – e entre os objetos de pesquisa analisados – com estudos
sobre a Igreja Universal do Reino de Deus sendo abundantes e trabalhos sobre outras
denominações pentecostais, como a Igreja do Evangelho Quadrangular e a igreja O Brasil Para
Cristo, escassos.

Os objetivos e recortes deste texto precisam ser compreendidos a partir do seu lugar e
de função dentro desta obra. Nossa pretensão é apresentar um texto introdutório, tão breve
quanto possível, sobre o pentecostalismo moderno e os estudos do pentecostalismo no Brasil,
especialmente os debates sobre as tipologias e “divisões internas” do campo pentecostal. A
abordagem tem um perfil histórico, de longa duração, procurando apresentar as origens, o

3
Por exemplo, em pesquisa realizada pelo instituto Data Folha nos dias 5 e 6 de dezembro de 2019, o percentual
do total de evangélicos encontrado foi de 31% dos entrevistados. Fonte:
<https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/01/cara-tipica-do-evangelico-brasileiro-e-feminina-e-negra-aponta-
datafolha.shtml>. Acessado em 05 de outubro de 2021.
desenvolvimento e as “rupturas e permanências” na história do pentecostalismo brasileiro. Não
nos aprofundaremos no histórico e nas peculiaridades teológicas, organizacionais e perfis
socioeconômicos de denominações pentecostais específicas, pois esse trabalho será feito nos
capítulos posteriores.

O texto está dividido em quatro seções, sendo as duas primeiras sobre as origens do
pentecostalismo moderno e a terceira e quarta sobre o desenvolvimento e debates a respeito do
pentecostalismo no Brasil. Na primeira seção, procuraremos apresentar, brevemente, as raízes
históricas do pentecostalismo dentro da tradição protestante a partir dos movimentos de
renovação espiritual do século XVIII e nas transformações do protestantismo norte-americano
de tradição avivalista ao longo do século XIX, no qual elementos do pentecostalismo, ou um
proto-pentecostalismo, já podiam ser observados ainda nas últimas décadas dos oitocentos. Na
segunda seção discutiremos o advento do pentecostalismo moderno e debateremos o papel de
alguns de seus personagens centrais, como Charles Fox Pahram, William J. Seymour e William
H. Durham. Também discutiremos o legado do movimento da rua Azusa e o “pentecostalismo
de Chicago”, com o qual os pioneiros do pentecostalismo brasileiro tiveram contato.

Na sequência, abordaremos a experiência do pentecostalismo no Brasil a partir da


proposta, quase sempre revisitada entre os pesquisadores do tema, de Paul Freston da tipologia
do pentecostalismo brasileiro dividida em “três ondas”. Em diálogo com o modelo das ondas
de Freston, procuraremos discutir as possibilidades abertas por tal classificação, mas também
suas limitações frente à experiência histórica do pentecostalismo no Brasil contemporâneo. Por
fim, procuraremos apresentar quatro pontos que entendemos serem importantes para nos ajudar
a entender a atual configuração do pentecostalismo no Brasil e a apontar algumas veredas a
serem percorridas pelos pesquisadores do tema: as relações entre pentecostalismo e
fundamentalismo; transformações nas concepções escatológicas pentecostais; a diluição das
fronteiras teológicas entre as igrejas pentecostais; e o ocaso do sectarismo pentecostal frente às
“coisas do mundo”.

1. Contando uma história – as raízes

Nos primeiros anos do século XX, um pregador de origem metodista, mas


profundamente influenciado pelos movimentos avivalistas no protestantismo norte-americano
do século XIX, chamado Charles Fox Parham, ensinava a seus alunos do Bethel Bible College,
na cidade de Topeka, Kansas, sobre a doutrina do batismo no Espírito Santo e seu sinal
confirmatório: o dom de línguas. Após algum tempo, experiências de glossolalia ocorreram
entre os alunos de Parham, e a mensagem da “Fé Apostólica” foi ensinada por ele e seus
seguidores em várias cidades dos Estados Unidos. Na passagem de Parham por Houston, Texas,
um negro, filho de escravos, chamado William J. Seymour, ouvia – do lado de fora da sala
devido às posturas segregacionistas de Parham – as explicações sobre o batismo no Espírito
Santo. Dali, Seymour partiu para Los Angeles onde, após ter seus ensinamentos rejeitados em
uma comunidade holiness, iniciou seu ministério em 1906 em um antigo salão abandonado de
uma Igreja Metodista Episcopal africana. Aquele espaço na rua Azusa nº 312 tornou-se um
local de êxtases religiosos, profecias, curas divinas, “línguas estranhas” e, também, de
dissolução de barreiras étnicas, raciais e de gênero. O local atraiu a atenção de críticos
(especialmente da imprensa e do protestantismo tradicional), mas também de entusiastas que
entrando em contato ali com o “movimento das línguas” ajudaram a disseminá-lo pelo país e
pelo mundo.

Essa é a “versão curta” da história que se consolidou nos relatos sobre as origens do
pentecostalismo moderno. Quando se trata do caso brasileiro, normalmente, acrescenta-se a
informação de que William H. Durham recebeu o “batismo no Espírito Santo” em Azusa e
levou a mensagem para sua igreja na North Avenue em Chicago, onde os pioneiros do
pentecostalismo brasileiro (Daniel Berg e Gunnar Vingren das Assembleias de Deus e Luigi
Francescon da Congregação Cristã no Brasil) tiveram contato com o pentecostalismo. Essa é
uma forma de se contar a história das origens do pentecostalismo moderno, mas não é a única
e, no nosso entendimento, não é a mais adequada. Assim como o próprio pentecostalismo, a
historiografia e os debates em torno de suas origens e desenvolvimento têm passado por um
processo de profundas transformações. Allan Heaton Anderson, por exemplo, observa que,
tendo por base fontes históricas do período inicial do pentecostalismo, normalmente
confeccionadas por pastores e missionários brancos dos Estados Unidos, por muito tempo
perdurou uma história do pentecostalismo contada de uma “perspectiva predominantemente
norte-americana branca, negligenciando (se não ignorando completamente) o trabalho vital e
muitas vezes mais significativo de pioneiros pentecostais asiáticos, africanos, afro-americanos
e latinos” (ANDERSON, 2019, p. 19).

Augustus Cerillo Jr. (1997, p. 30) argumenta que os estudos sobre as origens do
pentecostalismo moderno têm tomado, de forma geral, quatro diferentes caminhos
interpretativos: a) uma história providencialista: visão defendida por autores pentecostais
(especialmente os que foram contemporâneos do pentecostalismo inicial) que entendem o
movimento como uma intervenção divina na história; b) interpretações que privilegiam as
raízes históricas do pentecostalismo: os adeptos dessas abordagens entendem o
pentecostalismo mais como uma continuidade em relação aos movimentos avivalistas do século
XIX do que uma ruptura na história do cristianismo; c) a ênfase no pentecostalismo como um
fenômeno multicultural: essa corrente de autores prioriza o papel dos negros no advento do
pentecostalismo e a experiência da rua Azusa como paradigmática no sentido de trazer à tona
uma forma de espiritualidade extremamente influenciada pelas crenças, práticas e ritos de
origem africana e, também, uma experiência comunitária que buscava romper com as divisões
baseadas em gênero, cor e etnia; d) por fim, uma perspectiva funcionalista: os pesquisadores
que adotam essa linha procuram entender as funções (sociais, psicológicas, políticas etc.) que
o pentecostalismo assumiu em determinado contexto, que ajudam a explicar a aderência das
pessoas às suas formulações teológicas e à sua experiência religiosa. Dentre as rotas traçadas
por Cerillo Jr., os leitores logo perceberão que este texto procura entender o pentecostalismo
como um fenômeno de longa duração e que não pode ser devidamente compreendido se
desconectado das transformações do protestantismo norte-americano do século XIX. Mas,
como o próprio autor observa, “poucos historiadores utilizam apenas uma das abordagens em
suas interpretações das origens do pentecostalismo” (CERILLO JR., 1997, p. 30). A
combinação de elementos das diferentes abordagens nos permite uma análise mais coerente e
aberta à complexidade do objeto pesquisado. Por exemplo, muitas vezes análises funcionalistas
e históricas são complementares e não excludentes.

Mas a história que contaremos talvez não seja a que gostaríamos de contar. Todo texto
histórico necessita de certos recortes relacionados à sua proposta e, obviamente, todo recorte
envolve um certo nível de arbitrariedade. De antemão, procuramos deixar claro para o leitor
que nossa abordagem é direcionada por nosso objetivo – analisar as raízes e o desenvolvimento
do pentecostalismo no Brasil – e limitada, em termos de detalhes históricos e aprofundamento
em certas questões, pelos limites que um texto de caráter introdutório e de menor “fôlego”
evidentemente possui. Se nosso objetivo é traçar alguns apontamentos gerais sobre o
pentecostalismo que chegou ao Brasil, então nos detivemos nos pontos que, entendemos, são
mais pertinentes para entendermos o pentecostalismo que Berg, Vingren e Francescon
trouxeram em suas “malas”, vindos dos Estados Unidos para o Brasil. Dessa forma, em vários
momentos, acabamos nos aproximando do enredo da “versão curta” que contamos
anteriormente e do pentecostalismo dos “homens brancos” mencionado por Anderson. Mas
procuramos, sempre que possível, deixar clara a pluralidade que marca essa história das origens
do pentecostalismo e indicar algumas referências sobre o tema.4

Como ponto de partida, podemos dizer que o pentecostalismo moderno é herdeiro de


uma série de transformações e tensões internas do protestantismo, que remetem aos
movimentos de renovação espiritual do século XVIII, especialmente o pietismo dentro da
tradição luterana e o metodismo entre os anglicanos. Tais movimentos buscaram revitalizar a
vida espiritual dos fiéis e reafirmar que o cristianismo autêntico não poderia ser limitado ao
conhecimento intelectual das “doutrinas corretas”. Procurou-se renovar as práticas religiosas e
comunitárias, incentivar as reuniões para orações e estudos bíblicos, enfatizar a necessidade do
“novo nascimento” e da “vida santificada”. Dreher (2006) diz que o pietismo contrapunha a
necessidade de uma “teologia da experiência” em oposição a uma “teologia do conhecimento”.
Já John Wesley, líder do movimento metodista, enfatizava o papel da subjetividade do fiel na
vida espiritual e no processo de salvação. “O ‘sentimento interior’ [...] constituía para ele a mais
convincente das provas. Para ele próprio a experiência de fé era uma ‘vivência que aquece o
coração’ e que pode ter data e hora, e não apenas o assentimento a uma reta doutrina”
(MOLTMANN, 1998, p. 161).

Tais movimentos inseriram uma nova dinâmica dentro do protestantismo, quebrando


certos formalismos, enfatizando o papel das emoções e, em contraposição ao “protestantismo
de Estado” e baseado em vínculos étnicos e lealdades nacionais que ainda prevalecia em boa
parte da Europa, ajudou a consolidar um protestantismo que é “por excelência, e radicalmente,
uma religião de conversão individual” no qual “conta menos como validação da fé professada
a herança religiosa [...] do que o ingresso voluntário como born again numa congregação de
‘renascidos’” (PIERUCCI, 2006, p. 120). Tais movimentos de renovação espiritual no
protestantismo europeu ganharam uma dimensão atlântica e chegaram às colônias inglesas nas
Américas:

Começando na década de 1730, os dois lados do Atlântico testemunharam uma explosão de


entusiasmo religioso, na qual pregadores itinerantes iam de um lugar para outro dando
testemunho de suas experiências religiosas e encorajando trabalhadores, onde quer que
estivessem, a se tornarem [...] instrumentos de sua própria salvação (LINEBAUGH;
REDIKER, 2008, p. 204)

Nesta época, teve início nas colônias inglesas na América do Norte o que se tornou
conhecido como o Primeiro Grande Avivamento. O foco inicial desses avivamentos – que

4
Na bibliografia disponível em português, uma obra que procura apontar para a diversidade regional, racial e de
gênero no surgimento e na história do pentecostalismo é o já mencionado texto de Anderson: ANDERSON, Allan
Heaton. Uma introdução ao pentecostalismo: cristianismo carismático mundial. São Paulo: Loyola, 2019.
tiveram como grandes expoentes os pregadores calvinistas Jonathan Edwards e George
Whitefield – foi a Nova Inglaterra da terceira geração de puritanos, que já haviam, de certa
forma, se afastado do “fervor religioso” e ideal ascético das gerações anteriores dos chamados
“Pais Peregrinos”. De acordo com Marsden (2015, p. 29), “em alguns lugares, as igrejas
congregacionais estavam começando a mover-se em direção a tornarem-se mais como igrejas
paroquiais do velho mundo, nas quais todos eram batizados na igreja e os padrões para a
aceitação de membros adultos não eram severamente estritos”. Os pregadores avivalistas
causaram grande impacto, ressaltando a ira vindoura de Deus contra os impenitentes e a
necessidade de uma conversão pessoal e genuína para que as pessoas fossem salvas e
participassem das congregações locais. O movimento gerou uma grande corrida às igrejas. Os
avivamentos se espalharam pelas colônias, tornando-se um assunto de repercussão tanto nas
colônias quanto na Inglaterra e na Escócia.5

Ao longo do século XVIII, os avivamentos perderam força, mas o século XIX foi
marcado, logo em suas primeiras décadas, por uma nova onda de fervor religioso nos já
independentes Estados Unidos da América. Se os avivamentos do século XVIII tiveram como
centro irradiador a Nova Inglaterra dos congregacionais e seus pregadores de matriz calvinista,
o século XIX seria o “século dos metodistas”.6 Além da mensagem mais acessível e da sua
identidade com a teologia/prática dos avivamentos, o metodismo se adaptou melhor ao período
do alargamento das fronteiras, com a expansão do país rumo ao oeste. Nesse contexto, a “fé
despertada era avessa ao intelectualismo, à teologia e às instituições teológicas formadoras de
um clero esclarecido”, uma religião “prática, colada aos problemas da vida cotidiana aos quais
procurava apresentar soluções espirituais” (CAMPOS, 2005, p. 106). Também foi prática
corrente a organização de camp meetings, espécie de acampamento/retiro espiritual, nos quais,
durante alguns dias, os fiéis se reuniam para uma série de pregações, estudos bíblicos, orações
e cânticos – inclusive há uma série de relatos de experiências de êxtase religioso no ambiente
informal desses acampamentos.

O chamado Segundo Grande Avivamento, cujo ápice foi em torno da década de 1830,
foi profundamente marcado pela “Era Metodista”, mesmo que alguns dos seus principais
expoentes, como Charles Finney, fossem de origem calvinista. Finney levou a lógica dos camp

5
As séries de pregações de George Whitefield nas colônias inglesas na América do Norte, por exemplo,
dominavam as manchetes dos jornais da época. Ver: LAMBERT, Frank. “Pedlar in divinity”: George Whitefield
and the Great Awakening (1737-1745). Journal of American History, v. 77, n. 3, p. 812-837, 1990.
6
De acordo com Reily (2003, p. 40), se “quando da pequena criação da Igreja Metodista Episcopal em 1784, havia
menos de 15 mil metodistas nos Estados Unidos; nos meados do século XIX, estes já constituíam a maior Igreja
do país”.
meetings para as grandes cidades com suas campanhas evangelísticas que duravam vários dias.
Nessa época, ganharam ainda mais espaço as pregações profundamente emocionais; a
utilização de novos métodos para levar a mensagem ao público; o uso intensivo da música como
ferramenta evangelística e devocional; e o foco cada vez maior no indivíduo e em seu livre-
arbítrio em relação à salvação.

A busca por novas experiências de avivamento e, de acordo com Marsden (2001, p.


163), a convicção de alguns novos grupos que surgiam dentro do protestantismo norte-
americano de que as grandes denominações não eram “suficientemente espirituais” estão na
origem dos “últimos passos” que nos levam ao surgimento do pentecostalismo moderno. Se,
por um lado, o metodismo, de maneira geral, se acomodava ao formato tradicional das grandes
denominações protestantes dos Estados Unidos – inclusive em busca de maior “respeitabilidade
social” –, alguns grupos dentro das igrejas metodistas buscavam resgatar a intensidade
espiritual dos avivamentos que parecia estar se perdendo com o tempo. Em reação à perda de
“vigor avivalista” dos herdeiros de John Wesley, sugiram movimentos internos no metodismo,
que buscavam renovar a intensidade das experiências espirituais e reforçar a necessidade de
pureza e santidade pessoal dos cristãos. Tais movimentos ficaram conhecidos como holiness
(santidade).

Na contramão do processo de elitização, intelectualização e acomodação aos novos


padrões da modernidade urbana que se consolidava entre as lideranças do metodismo nos
Estados Unidos, os movimentos de holiness enfatizavam a necessidade de uma real experiência
de conversão e transformação de vida por parte das pessoas. A “primeira bênção” a ser buscada
seria o novo nascimento, a conversão, a convicção interna de ser um born again Christian
através de uma experiência pessoal (e muitas vezes dramática) de regeneração. Mas o cristão
deveria almejar também uma “segunda bênção”: a santificação pessoal. Tal processo de
santificação já era enfatizado por John Wesley, mas no movimento holiness a principal
popularizadora dos ideais de perfeição cristã foi Phoebe Palmer,7 autora de The Way of

7
O papel das mulheres como pregadoras, organizadoras de grupos e difusoras dos ideais de santificação foi
fundamental para o crescimento do movimento holiness, sendo um exemplo marcante do que Vítor Izecksohn
(2021, p. 73) chamou de “‘feminilização’ da religião tanto em termos de adesão como de culto” no protestantismo
norte-americano da segunda metade do século XIX. Diferentemente das grandes denominações protestantes do
país, nos pequenos grupos holiness as mulheres exerciam autoridade e se destacavam entre as escritoras e
distribuidoras de livros e textos ligados ao movimento. Outra mulher que se destacou nesse período foi a
evangelista negra Amanda Berry Smith, que pregou nos camp meetings de holiness por todo o país e, inclusive,
viajou ao redor do mundo levando sua mensagem de “santidade” em encontros religiosos na Europa e na África.
Sobre a atuação das mulheres no movimento holiness e, posteriormente, nos primeiros anos do pentecostalismo,
ver: MENDIOLA, Kelly Willis. The hand of a woman: four holiness-pentecostal evangelists and American Culture
(1840-1930). Tese de Doutorado, University of Texas – Austin, 2002.
Holiness, obra essencial para se entender a natureza e as ênfases do movimento. Palmer
sintetizou a busca pela santificação em “três passos simples: a consagração da vida totalmente
a Deus; a crença na promessa de Deus para a santificação; e dar testemunho do que Deus fez”
(HEMPTON, 2005, p. 140).

Especialmente após o fim da Guerra de Secessão, o movimento holiness perdeu seu


caráter predominantemente regional, baseado em encontros semanais de oração e busca de
santidade nas igrejas metodistas locais, para se tornar um movimento nacional. Os grupos de
holiness dispersos dentro do metodismo norte-americano começaram a se organizar em
associações, como a National Association for the Promotion of Holiness e a publicar uma série
de jornais disseminando a mensagem da santidade. Mas o grande destaque do movimento a
partir da década de 1870 foram os holiness camp meetings, agora organizados pelas associações
holiness. Tais acampamentos que buscavam promover avivamentos regionais passaram a
mobilizar uma série de pessoas que passavam vários dias nesses encontros, nos quais as
pregações emocionais e os episódios de êxtases espirituais se tornaram cada vez mais
frequentes. Além disso, nos movimentos holiness destacavam-se “duas outras doutrinas que
não eram tipicamente enfatizadas no protestantismo tradicional: o poder das curas miraculosas
e a expectativa do retorno iminente de Cristo para estabelecer seu reino milenar na Terra”
(MARSDEN, 2001, p. 165). Êxtases espirituais, curas milagrosas e expectativas sobre a
iminência do fim dos tempos ajudaram a pavimentar o caminho para o “despertar” do moderno
pentecostalismo.

Mas, antes de prosseguirmos, é importante termos consciência de que o contexto


religioso no qual o pentecostalismo foi gestado não se limitava às heranças metodistas e ao
movimento holiness. É preciso lembrar que o século XIX nos Estados Unidos foi marcado por
uma série de “inovações” no campo religioso, como o surgimento de novos grupos e tendências,
muitos dos quais já “flertavam” com doutrinas que viriam a caracterizar o pentecostalismo
moderno. Correntes religiosas que advogavam a proximidade do fim dos tempos proliferaram
durante o século XIX, como os seguidores das ideias de William Miller que havia previsto o
retorno de Cristo à Terra em 22 de outubro de 18448 e a Watchtower Bible and Tract Society –
cujos participantes ficaram conhecidos como testemunhas de Jeová –, fundada por Charles Taze
Russell em 1884, que foi organizada com base em uma previsão de que o fim do mundo

8
Como Jesus não retornou, os mileritas tornaram-se motivo de piada, e do que sobrou do movimento após o
“grande desapontamento” – como ficou conhecido chamado esse episódio –, alguns seguidores de Miller, sob a
orientação de Ellen White, formaram o que viria a ser, até hoje, uma importante denominação: os Adventistas do
Sétimo Dia.
ocorreria em 1914 (STROZIER, 2002, p. 187). Também é importante observar que a glossolalia
não era uma experiência espiritual que havia ficado “esquecida no tempo” e teria ressurgido
subitamente no início do século XX. Por exemplo, Joseph Smith, o patriarca do mormonismo,
em 1842 afirmava que a igreja dos santos dos últimos dias acreditava no dom de línguas e
interpretação de línguas (VOGEL; DUNN, 1993). Um exemplo relatado entre os mórmons é o
de Elisabeth Ann Whitney que, após receber uma bênção de Joseph Smith em uma reunião em
1835 – na qual Smith lhe prometera o “dom de cantar de forma inspiradora” –, se levantou e
passou a cantar em uma língua desconhecida, sendo interpretada por Parley P. Pratt.9

Experiências pentecostais muito semelhantes às da primeira década do século XX já


haviam ocorrido no século XIX. Edward Irving, um pastor presbiteriano escocês que liderava
uma congregação da Igreja Escocesa na Regent Street em Londres na virada da década de 1820
para 1830, passou a defender algumas posições teológicas controversas (tendo em vista sua
filiação ao presbiterianismo).10 Após manifestações de glossolalia em sua congregação, Irving
manteve uma defesa fervorosa do “dom de línguas”, pois “é o meio pelo qual ‘Deus edifica a
alma (...) pela comunicação direta do Espírito Santo’. Tão vital é o dom, ele insistia, que todos
os crentes deveriam buscá-lo e usá-lo regularmente” (ALLEN, 1997, p. 54). As posições de
Irving levaram à sua expulsão da igreja da Escócia por heresia e à criação da Igreja Católica
Apostólica em 1835 – na qual manifestações que viriam a ser consideradas como marcas do
pentecostalismo moderno já eram praticadas várias décadas antes da rua Azusa, tanto na Europa
quanto nos próprios Estados Unidos. Em uma matéria publicada em 10 de janeiro de 1856 no
The New York Times, na descrição que o jornal fez dos cultos na Igreja Católica Apostólica de
Nova Iorque, fala-se de períodos dedicados ao “profetismo” durante os quais eram emitidas
“palavras em tom de canto que raramente transmitem ao observador uma ideia definida do que
se está falando. Em outras ocasiões, as palavras são repetidas em uma língua chamada ‘língua
desconhecida’, a qual requer um segundo profeta para revelar” (Apud ELLIOT, 2019, p. 332).

Se já existiam “línguas estranhas” antes do pentecostalismo, um fato também importante


a ser observado é a presença de “batismos no Espírito Santo” e de “igrejas pentecostais” antes
do pentecostalismo. E aqui é importante que tenhamos em mente uma percepção cara à História
dos Conceitos que é a constatação de que “as palavras permanecerem as mesmas não [é], por

9
Cf. em <https://www.churchofjesuschrist.org/study/church-historians-press/at-the-pulpit/part-1/chapter-
2?lang=por>. Consultado em 24 de out. de 2021.
10
De acordo com Elliot (2019, p. 329), Irving defendia: a escatologia pré-milenarista; “uma cristologia que
defendia que Cristo havia sido plenamente humano, mas permaneceu sem pecado através do poder do Espírito
Santo; e a abertura à disponibilidade [e contemporaneidade] dos dons carismáticos”.
si só, um indício suficiente da permanência do mesmo conteúdo ou significado por elas
designado” (KOSELLECK, 2006, p. 105). Nas últimas décadas do século XIX, tornou-se
frequente entre os grupos de holiness o uso de expressões e termos que, posteriormente, seriam
identificados com o pentecostalismo moderno. Um exemplo disso é o uso de “batismo no
Espírito Santo” para se referir à santificação, a “segunda bênção” da terminologia herdeira do
pensamento de Wesley e consolidada por Phoebe Palmer. Mas, nesse período, tal batismo no
Espírito Santo ou, batismo com fogo – um importante grupo de holiness do período era chamado
de Fire-Baptized Holiness Church, denominação fundada por Benjamin H. Irwin –, não estava
ligado à glossolalia. Variações nas ênfases teológicas do movimento começavam a aparecer e
alguns já falavam em uma “terceira bênção”.11

Assim como “batismo no Espírito Santo”, o termo “pentecostal” também foi muito
utilizado no século XIX, mas não estava diretamente vinculado às manifestações de glossolalia.
O termo foi empregado, inicialmente, como um sinônimo para santidade. Os movimentos de
holiness acabaram dando origem a uma série de cisões dentro do metodismo norte-americano
e ao surgimento de igrejas locais e pequenas denominações de alcance, normalmente, regional.
Nesse processo, várias igrejas adotaram o termo “pentecostal” em seus nomes. Por exemplo,
William Howard Hoople organizou três congregações de holiness em Nova Iorque entre 1894
e 1895: Utica Avenue Pentecostal Tabernacle, Bedford Avenue Pentecostal Church e
Emmanuel Pentecostal Tabernacle. As três congregações se uniram para formar a Associação
de Igrejas Pentecostais da América (Association of Pentecostal Churches of America). Essa
associação se uniu a uma série de outros pequenos grupos de holiness, dando origem, em 1907,
à Pentecostal Church of the Nazarene, que mais tarde mudaria seu nome para Igreja do
Nazareno.12

2. O pentecostalismo inicial

11
O pregador canadense R. C. Horner defendia a ideia do batismo do Espírito Santo como uma terceira bênção
que fornecia ao crente um poder especial para o trabalho evangelístico, para “ganhar almas” (DAYTON, 1987, p.
99). Dessa forma, para Horner, teríamos três ações distintas da graça divina: a “primeira bênção” seria a conversão,
a “segunda bênção”, a santificação e a “terceira bênção”, o batismo no Espírito Santo.
12
A Quinta Assembleia Geral (1919) mudou o nome oficial da denominação para Igreja do Nazareno. De acordo
com Blumhofer (1989, p. 183), a abolição da “palavra ‘pentecostal’ do nome da Igreja do Nazareno [...]
simbolizava a rejeição da ‘heresia da terceira bênção’ e o seu desejo de se dissociar do pentecostais”. Em
documento oficial da Igreja do Nazareno, é dito que “A Assembleia Geral de 1919, em resposta a memoriais de
35 assembleias distritais, oficialmente mudou o nome da organização para Igreja do Nazareno devido aos novos
significados que se tornaram associados ao termo ‘pentecostal’” (CHURCH OF THE NAZARENE, 2009, p. 20).
Neste ponto, retomamos nossa “história curta” contada no primeiro parágrafo da seção
anterior. No alvorecer do século XX, o pregador independente, mas de formação metodista e
profundamente identificado com as doutrinas do movimento de holiness,13 Charles Fox Parham
havia iniciado a defesa de uma nova interpretação sobre a “terceira bênção”. Em Topeka, no
Bethel Bible College, Parham defendia que existiria uma bênção diferente da santificação e cujo
sinal seria a manifestação do dom de línguas. Dessa forma, a proposta de Parham guarda várias
continuidades com os debates que já ocorriam dentro dos movimentos de holiness ao inserir a
glossolalia em uma já conhecida matriz wesleyana de aperfeiçoamento cristão e, também, como
sinal visível de uma experiência com o Espírito Santo.14

Em uma reunião de oração de passagem de ano, em 1º de janeiro de 1901, a insistência


de Parham com seus alunos para que buscassem o batismo com o Espírito Santo e sua
confirmação através do dom de línguas teve sucesso. Agnes Ozman “pediu a Parham que
impusesse as mãos sobre sua cabeça e orasse para que ela fosse batizada no Espírito Santo [...].
Já passava da meia-noite quando Ozman teria começado a ‘falar em língua chinesa’”
(CARTLEDGE, 2016, p. 71).15 Apesar de nem todas as reações aos eventos de Topeka terem
sido positivas,16 Parham se dedicou a divulgar o que chamava de Fé Apostólica (Apostolic
Faith), em vários pontos do país através de pregações, camp meetings e cursos de curta duração,
conseguindo simpatizantes entre alguns pregadores vindos dos movimentos de holiness.

13
De acordo com Blumhofer (1989, p. 74), apesar de Charles Parham não mencionar ter participado do movimento
holiness, suas perspectivas sobre santificação correspondiam às da National Holiness Association.
14
Alguns autores ressaltam a importância do contato de Parham com Frank Sandford, polêmico líder do
movimento The Kingdom que organizou, em 1893, uma comunidade chamada Shiloh no Maine.. Kay (2011) diz
que provavelmente Parham tenha ouvido sobre a relação entre a glossolalia e o batismo com o Espírito Santo em
seu encontro com Sandford em 1900. Ver também Blumhofer (1989, 76-81) e Peters (2008, p. 81-85).
15
As dúvidas sobre o fato de se estarem falando línguas dos homens ou “línguas dos anjos”, que estão presentes
no contexto de Parham, nos dão oportunidade de se fazer uma distinção entre glossolalia e xenoglassia (ou
xenolalia). De acordo com Robert Mapes Anderson (1992, p. 16), o termo glossolalia tem sido utilizado para “se
referir tanto a vocalizações ininteligíveis quanto para o uso milagroso de uma língua que o falante nunca
aprendeu”. Com o objetivo de evitar ambiguidades, pesquisadores têm utilizado glossolalia para classificar
manifestações de línguas ininteligíveis e xenoglassia para o uso – miraculoso – de um idioma desconhecido pela
pessoa “abençoada”. Em termos práticos, o uso de glossolalia para descrever os fenômenos das línguas no
pentecostalismo normalmente é aplicável em todos os casos, dado que, ainda segundo Anderson (1992, p. 16-17),
os estudos realizados não conseguiram comprovar experiências reais de xenoglassia. Mas, para Parham, a
experiência da xenoglassia também era uma realidade: “Eu tenho falado muitas vezes no idioma iídiche, uma
linguagem compreendida por todos os judeus da Europa Central, e eu espero que Deus me dê um maravilhoso
ministério entre os judeus em Jerusalém. [...] Eu acredito que Deus tomará minha língua e falará através destes
lábios de barro, pois o Espírito Santo é a inspiração, ele é capaz de falar qualquer língua do mundo através de nós”
(PARHAM, s/d, p. 67).
16
Em entrevista à imprensa local, S. J. Riggins, aluno de Parham disse: “Eu acredito que todos eles estão loucos.
Nunca vi nada parecido. Eles estavam correndo pela sala, falando, gesticulando e usando essa linguagem estranha
e sem sentido que afirmam ser a palavra do Altíssimo” (apud BLUMHOFER, 1989, p. 84).
Pessoas eram atraídas pelos relatos de conversões, curas divinas e, especialmente, pelas
manifestações do dom de línguas.

Em 1905, Parham estava ministrando um curso em Houston, no Texas, onde teve


contato com William Joseph Seymour. Nascido em uma família de ex-escravos na Louisiana,
Seymour passou por uma espécie de peregrinação religiosa até entrar em contato com os
ensinamentos e teorias de Parham. Nasceu e foi batizado na Igreja Católica, converteu-se em
uma igreja batista na adolescência e, posteriormente, tornou-se membro da Igreja Metodista
Episcopal. Depois “se uniu aos holiness, frequentando uma igreja pastoreada por uma mulher,
que logo em seguida deixou Seymour como sucessor e foi trabalhar na casa de Charles Parham
como governanta” (CAMPOS, 2005, p. 111). Em Houston, como dissemos, Seymour teve
contato com a doutrina da “terceira bênção” através dos ensinamentos de Parham. Pouco tempo
depois, partiu para Los Angeles.

Em Los Angeles, Seymour foi convidado a pregar em uma comunidade holiness e


encorajou seus ouvintes a buscarem a “terceira bênção” que ele afirmava ser comprovada pelo
dom de línguas – mesmo que o próprio Seymour, até aquele momento, ainda não tivesse ele
próprio passado por essa experiência (BLUMHOFER, 1989, p. 97). A nova doutrina
“escandalizou” lideranças holiness e as portas das igrejas se fecharam para ele na cidade.
Entretanto, a mensagem atraiu alguns adeptos e Seymour continuou ensinando sobre o batismo
no Espírito Santo em reuniões nos lares. Nessas reuniões, algumas pessoas, além do próprio
Seymour, receberam a “terceira bênção” e começaram a falar em línguas. Com o crescimento
do grupo, Seymour alugou um antigo imóvel onde funcionara anteriormente uma Igreja
Metodista Episcopal dando início à Missão da Fé Apostólica.

Com pisos sujos de serragem e tábuas ásperas como bancos, as reuniões diárias começavam
por volta das dez da manhã e geralmente iam até tarde da noite. Eram completamente
espontâneas e geralmente emocionais, sem programação ou oradores planejados. Cantar em
línguas e pessoas caindo ao chão “sob o poder” ou “mortas no Espírito” eram fenômenos
comuns. A integração racial nesses encontros era singular na época e pessoas de minorias
étnicas descobriram o senso de dignidade e de comunidade que lhes era negado na cultura
urbana em geral. A equipe de liderança central de Seymour era totalmente integrada, com
homens e mulheres negros e brancos sendo responsáveis por vários aspectos do trabalho. [...]
Centenas de visitantes de todo o continente e do exterior vinham para ver o que estava
acontecendo e ser batizados do Espírito. Muitos deles inauguraram centros pentecostais em
várias cidades dos Estados Unidos e, gradualmente, em locais mais distantes (ANDERSON,
2019, p. 54-55).

O avivamento da rua Azusa e o ministério de Seymour têm sido tratados por muitos
autores como o marco inicial do movimento pentecostal moderno. Entretanto, entendemos que
esse papel atribuído à rua Azusa pode acabar por encobrir as raízes plurais do pentecostalismo
moderno. Joe Creech (1996) procurou contestar o que ele considera uma “compreensão mítica”
do movimento da rua Azusa como a raiz da qual todo o pentecostalismo floresceu. Essa
compreensão não tem se limitado às narrativas internas de grupos pentecostais, mas também
tem sido responsável por visões, até certo ponto, distorcidas nos estudos acadêmicos sobre as
origens do pentecostalismo. O avivamento de Azusa se tornou, em alguns relatos, como a
experiência característica do pentecostalismo inicial (cuja originalidade e inocência se
perderam no tempo), sendo esse então marcado por “espontaneidade, liderança carismática,
êxtase e a subversão das categorias de raça, classe e gênero”, sendo percebido, dessa forma,
como “como um movimento homogêneo exibindo um ethos igualitário e sectário comum”
(CREECH, 1996, p. 406).

Entretanto, o fato é que a pluralidade marcou o início do pentecostalismo moderno antes,


durante e depois da rua Azusa. Creech chama a atenção para o equívoco constante nos estudos
sobre o período inicial do pentecostalismo de se entender o papel de Parham apenas como um
precursor de Seymour. O ensino de Parham sobre o dom de línguas como o sinal distintivo do
batismo no Espírito Santo, juntamente com o entendimento de que esse novo “derramamento
do Espírito” seria um sinal de que Deus estaria preparando o mundo para o fim dos tempos,
permaneceu extremamente influente e possivelmente tenha sido o ponto em comum entre os
diferentes grupos pentecostais nas primeiras décadas do século XX. Além disso, “o ethos do
Movimento da Fé Apostólica de Parham refletia aquele das áreas rurais e pequenas cidades do
Kansas, Texas, Arkansas, Oklahoma e Missouri, onde o movimento floresceu” (CREECH,
1996, p. 412). A defesa da segregação racial de Parham não seria um “ponto fora da curva” no
pentecostalismo inicial, mas uma posição adotada por parte considerável de seus primeiros
entusiastas.

Dessa forma, podemos falar de pelo menos duas tendências (ou subculturas) no
movimento pentecostal da primeira década do século XX: o Movimento da Fé Apostólica
capitaneado por Seymour e o que Creech chama de “Velho Movimento da Fé Apostólica” (Old
Apostolic Faith Movement), herdeiro das posições teológicas e das perspectivas conservadoras
de Parham. Assim, buscar essas variadas facetas e raízes nos ajuda a entender o pentecostalismo
inicial: como um movimento não somente urbano, mas também enraizado nas pequenas cidades
do meio rural, e a perceber que a experiência de quebra de barreiras baseadas em cor e etnia, de
informalidade e de grande participação de lideranças femininas de Azusa, conviveu mesmo em
sua época com críticas de outros adeptos da crença na contemporaneidade dos dons do Espírito
Santo, que tinham percepções muito mais restritivas e socialmente limitadas (e mesmo
segregacionistas) em relação à “liberdade” que poderia ser proporcionada pelo agir do Espírito
Santo.

Entretanto, Parham não conseguiu se manter por muito tempo como uma liderança de
maior relevância nacional mesmo na corrente branca/conservadora do pentecostalismo. Uma
outra tendência – que, inclusive, partia de pressupostos teológicos diferentes dos de Parham –
rapidamente se estabeleceu como um polo alternativo e, posteriormente, conflitante com Azusa.
William H. Durham, pastor de formação batista e que liderava a Chicago’s North Avenue
Mission, “visitou a missão da rua Azusa em Los Angeles, onde recebeu o batismo no Espírito
Santos e falou em línguas no dia 02 de março de 1907” (BURGESS; MCGEE, 1988, p. 255).
Com o retorno de Durham a Chicago, a North Avenue Mission se transformou em um
importante centro de difusão do pentecostalismo, rivalizando “com a rua Azusa em influência
e resultou indiretamente na criação de várias congregações pentecostais de imigrantes europeus
em Chicago, especialmente italianos e escandinavos” (ANDERSON, 2019, p. 59).

Se em Parham e, posteriormente, Seymour, a herança teológica que deu origem às suas


formulações sobre a “terceira bênção” e o batismo no Espírito Santo tinham origens no
metodismo e no movimento holiness, o pentecostalismo de Chicago possuía raízes teológicas
diferentes. Apesar da força do metodismo nos Estados Unidos do século XIX, o avivalismo de
matriz calvinista – herdeiro direto dos primeiros avivamentos – ainda se fazia presente entre
setores de igrejas congregacionais, presbiterianas e, também, batistas. Nessa tendência
avivalista, da qual algumas lideranças iriam aderir ao pentecostalismo, duas correntes
teológicas se tornariam muito importantes a partir das últimas décadas do século XIX: 1) o
dispensacionalismo, uma perspectiva escatológica pré-milenarista na qual o plano de Deus
relativo à salvação do homem deve ser compreendido a partir de uma divisão em dispensações
ou sete períodos atestados biblicamente, sendo o último período o reinado milenar de Cristo na
Terra;17 2) o Higher Life Movement (Movimento de Vida Elevada), também conhecido por
movimento de Keswick, devido ao fato de suas ideias centrais terem sido difundidas nas

17
Segundo os dispensacionalistas, a Bíblia anuncia uma perspectiva de história dividida em sete eras ou
“dispensações”. C. I. Scofield (1967, p. 5), o principal divulgador das crenças dispensacionalistas nos Estados
Unidos no início do século XX, afirmava que “uma dispensação é um período de tempo durante o qual o homem
é testado em relação à sua obediência a alguma revelação específica da vontade de Deus”. As dispensações, ou as
diferentes formas como Deus teria lidado com a humanidade ao longo do tempo, seriam as seguintes: 1) a
“Inocência”, que terminaria com a Queda e a expulsão de Adão e Eva do Paraíso; 2) a “Consciência”, que se
findaria com o Dilúvio; 3) “O Governo Humano”, que seria encerrado em Babel; 4) a “Promessa”, que acabaria
na escravidão no Egito; 5) a “Lei”, que terminaria com a rejeição e crucificação de Cristo; 6) a “Graça” ou “Período
da Igreja”, que se encerraria com o governo do Anticristo durante a Tribulação, a Batalha do Armagedom e a
Segunda Vinda de Cristo; e, por fim 7) o “Milênio”, no qual Cristo reinaria pessoalmente na Terra junto aos seus
santos.
convenções realizadas naquela cidade inglesa. O movimento de Keswick apresentava uma
compreensão de santificação diferente da tradição wesleyana que era adotada pelos movimentos
de holiness e defendida por Parham e Seymour. Partidário dos ensinos de Keswick sobre o
tema, Durham, mesmo tendo sido “batizado no Espírito Santo” em Azusa, estabeleceu uma
discordância pública em relação à crença na santificação como uma obra da graça divina
recebida posteriormente, como uma “segunda bênção:

O que estava em questão era o ensinamento do movimento de santidade da “santificação


inteira”, que havia sido adotado por Seymour e pela maioria dos primeiros pentecostais, mas
que Durham declarara não bíblico em 1910. Durham ensinava que a santificação não era uma
“segunda bênção” ou uma “experiência de crise”, mas que Cristo havia proporcionado a
santificação em sua expiação e que essa era recebida na conversão pela identificação com
Cristo em um ato de fé. Ensinava, portanto, uma obra da graça em “dois estágios”
(justificação e batismo no Espírito) em vez de “três estágios” (ANDERSON, 2019, p. 59-60).

O pensamento de Durham e sua perspectiva sobre a “obra consumada de Cristo” se


tornaram muito influentes no pentecostalismo posterior. Se é verdade que muitos entraram em
contato com a mensagem pentecostal em Azusa e dali a disseminaram pelos Estados Unidos e
pelo mundo afora, a matriz pentecostal de Chicago não é menos relevante. Importantes
lideranças do pentecostalismo tiveram contato com Durham antes de iniciarem seus ministérios,
como E. N. Bell, que seria o primeiro superintendente geral das Assembleias de Deus nos
Estados Unidos e Aimee Semple McPherson, fundadora da Igreja do Evangelho Quadrangular.
E, muito importante para a história do pentecostalismo brasileiro, tiveram contato com o
pentecostalismo através do ministério de Durham três imigrantes europeus que posteriormente
trariam a mensagem do “novo pentecostes” para o Brasil: Luigi Francescon, Daniel Berg e
Gunnar Vingren.

O pentecostalismo com o qual os missionários que fundaram as primeiras igrejas


pentecostais no Brasil tiveram contato nos Estados Unidos em Chicago, apesar da crença no
batismo no Espírito Santo confirmado pelo dom de línguas, partia de premissas teológicas e de
uma experiência religiosa, étnica e social diferente do avivamento da rua Azusa. Apesar da
herança metodista-holiness de Seymour, o avivamento da rua Azusa representou um espaço de
valorização e expressão de elementos da herança africana da religiosidade dos negros, como a
“oralidade da liturgia; teologia e testemunhos oralmente apresentados; inclusão de êxtase,
sonhos e visões nas formas públicas de adoração; holismo quanto às relações corpo-alma;
ênfase nos aspectos xamânicos da religião; uso de coreografias e de muita música no culto”
(CAMPOS, 2005, p. 112). Se o pentecostalismo da North Avenue em Chicago apresentava certo
nível de integração étnica, especialmente entre os nativos e imigrantes europeus, os elementos
de africanidade e da crença no poder do Espírito para romper divisões de cor e classe do início
do avivamento de Azusa tinham ali pouca representatividade.

3. A dimensão histórica das tipologias do pentecostalismo no Brasil

As implicações e o “peso” da herança norte-americana sobre o pentecostalismo no


Brasil têm sido alvo de debates entre os pesquisadores do tema. Apesar de os missionários que
fundaram as igrejas pentecostais pioneiras no país terem vindo dos Estados Unidos, autores
como Gedeon Alencar (2013) chamam a atenção para as características muito específicas que
o pentecostalismo ganhou no Brasil, as quais as origens italianas e suecas dos missionários
pioneiros ajudaram a delinear. Outro fator recorrentemente apresentado é a importância do
contexto religioso, cultural e social brasileiro na modulação do pentecostalismo ao longo do
século XX. Pensando no caso latino-americano de forma geral, Bonino (2002, p. 55) afirma que
“a semente poderá ter sido produzida em Los Angeles ou Chicago, mas foi plantada em terra
latino-americana, alimentou-se das substâncias vitais desta terra e as novas massas populares
[...] comprovaram que o sabor de seus frutos correspondia às exigências de seu paladar”. Tais
observações são totalmente pertinentes. Entretanto, entendemos que as relações entre o
pentecostalismo brasileiro e o pentecostalismo dos Estados Unidos precisam ser levadas em
conta, tanto para as pesquisas a respeito da implantação do pentecostalismo no Brasil quanto
em relação aos seus desenvolvimentos posteriores, com a chegada de novos missionários e
novas tendências teológicas ao longo do século XX. As especificidades do background
religioso e vivencial dos missionários, o contexto receptor da mensagem e a matriz teológica
norte-americana do pentecostalismo devem ser trabalhadas como perspectivas complementares
na análise da história do pentecostalismo brasileiro.

O pentecostalismo já chega ao Brasil marcado por certa diversidade interna. Se a crença


na contemporaneidade dos dons do Espírito Santo, em especial a glossolalia, era algo
compartilhado entre os missionários pioneiros e os primeiros grupos pentecostais formados no
Brasil, as diferenças em relação a outras questões teológicas, às formas de governo eclesiástico,
aos padrões de “usos e costumes”, à composição étnica e social das congregações etc. também
eram facilmente identificáveis. O trabalho de se estabelecer conceitos e categorias de análise
sempre trazem desafios aos pesquisadores – como a tensão entre os pontos em comum e as
diferenças de fenômenos listados dentro da mesma categoria ou os riscos de se prender a usos
extremamente restritos ou exageradamente abertos de um determinado conceito. Desafios
semelhantes se colocam diante dos pesquisadores interessados em estabelecer princípios em
comum e, ao mesmo tempo, diferenciações internas entre os grupos pentecostais brasileiros. Se
o pentecostalismo já chega ao Brasil marcado pela diversidade interna, “com as surpreendentes
transformações ocorridas nessa religião nas últimas décadas, que ampliaram sua diversidade
teológica, eclesiológica, institucional, social, estética e política, o trabalho de classificação
tornou-se mais difícil, mais intrincado e mais sujeito a controvérsias” (MARIANO, 2005, p.
23).

A exposição na mídia e as diversas polêmicas protagonizadas pela Igreja Universal


parecem ter servido de mola propulsora para que os estudiosos do fenômeno religioso se
mobilizassem para tentar explicar e categorizar tal fenômeno. Fortaleceu-se entre os
pesquisadores a sensação de que não existiam mais apenas os protestantes históricos e os
pentecostais: “o resultado é um verdadeiro debate a respeito não só de como caracterizar o
protestantismo dos pentecostais, mas também de como apreender suas distinções internas.”
(GIUMBELLI, 2001, p. 90). Frente aos debates em relação às diferentes possibilidades de
construção de tipologias do pentecostalismo brasileiro, a abordagem do sociólogo Paul Freston
sobre a existência de três diferentes ondas do pentecostalismo no Brasil se consolidou como um
referencial utilizado por quase todos os pesquisadores do tema, mesmo que demonstrem
discordâncias sobre alguns aspectos ou apontem limitações da proposta das “ondas do
pentecostalismo”. Anos antes, David Martin (1990, p. 5, 27) já havia proposto um modelo que
falava de três ondas principais de expansão do protestantismo anglo-saxão: a puritana, a
metodista e a pentecostal. A ideia das ondas foi utilizada por Freston em sua tese de
doutoramento defendida em 1993, na qual apresentou uma abordagem que tinha uma
preocupação histórico-temporal (ordem de chegada/instalação no Brasil), mas que também
procurava apresentar algumas características gerais que seriam pontos em comum das igrejas
participantes dessas diferentes ondas de pentecostalismo.

A primeira onda é representada pelas igrejas pioneiras, as Assembleias de Deus (ADs)


e a Congregação Cristã no Brasil (CCB), sendo a noção de pentecostalismo clássico geralmente
utilizada para indicar esse ramo já centenário que chega ao Brasil ainda nos anos 1910,
“momento da origem mundial e expansão do pentecostalismo para todos os continentes”
(FRESTON, 1994, p. 72). Essas denominações representaram praticamente a totalidade do
campo pentecostal brasileiro – convivendo com pequenas dissidências internas18 – até os anos

18
Campos (2005, p. 113) menciona divisões nas Assembleias de Deus já na década de 1930 com o surgimento no
nordeste da Igreja de Cristo e da Igreja Adventista da Promessa.
1950. Sobre as particularidades teológicas da primeira onda, Freston aponta a ênfase nas
manifestações de glossolalia como o ponto em comum entre as ADs e a CCB. Outro tópico de
aproximação, também em harmonia com as tendências predominantes no pentecostalismo
inicial, era a crença na iminência da Segunda Vinda de Cristo. Já em outros aspectos teológico-
doutrinários, o “pentecostalismo sueco” e o “pentecostalismo italiano” apresentavam (e
continuam apresentando) muitas diferenças. Mendonça (2002, p.48) afirma que enquanto os
assembleianos se caracterizavam por uma “teologia arminiano-wesleyana e eclesiologia
batista”, a CCB somava à sua crença na contemporaneidade dos dons do Espírito Santo uma
“teologia e eclesiologia residualmente presbiterianas”. Freston voltou a estabelecer
similaridades entre as igrejas do pentecostalismo clássico no perfil socioeconômico de seus fiéis
– normalmente pobres e de nível de escolaridade mais baixo –, no seu crescimento nas primeiras
décadas longe do ambiente das grandes cidades, nos padrões comportamentais/morais muito
rígidos e nas tendências sectárias mais radicais, com um discurso muito forte de rejeição das
“coisas do mundo”.

A segunda onda do pentecostalismo proposta por Freston, que, adotando nomenclatura


proposta por Mariano (2005, p. 32), chamaremos de deuteropentecostalismo, tem início em
meados dos anos 1950. O marco inicial dessa segunda onda é a chegada ao Brasil da Igreja do
Evangelho Quadrangular (IEQ) com a sua Cruzada Nacional de Evangelização em 1954. Mas
outras denominações pentecostais também seriam representantes dessa “segunda onda”, sendo
as principais a Igreja Evangélica Pentecostal O Brasil Para Cristo (fundada em 1956) e a Igreja
Pentecostal Deus é Amor (fundada em 1962). Em relação à primeira onda, não temos, de fato,
nenhuma ruptura teológica expressiva. Como vimos, a fundadora da Igreja do Evangelho
Quadrangular nos Estados Unidos, Aimee Semple McPherson, também foi influenciada pelo
pentecostalismo de Chicago e a mensagem do Evangelho Quadrangular (“Jesus salva”, “Jesus
batiza no Espírito Santo”, “Jesus cura” e “Jesus voltará”) é muito semelhante aos princípios
teológicos centrais das Assembleias de Deus.19 Se em relação a questões teológicas não temos
maiores mudanças, na segunda onda o apelo à glossolalia perde espaço (o que não significa que
seja abandonado) para a ênfase na mensagem da cura divina, o “carro-chefe” da segunda onda,
refletindo uma tendência da época: de acordo com Mariano (2005, p. 31), “o evangelismo
baseado na cura foi o grande responsável pela explosão pentecostal em diversas partes do

19
Na declaração de fé da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, no item “A missão da igreja”, é
dito que: “A Igreja foi eleita para a adoração e louvor da glória de Deus, recebendo, também, a missão de proclamar
o evangelho da salvação ao mundo todo, anunciando que Jesus salva, cura, batiza no Espírito Santo e que em breve
voltará”. Disponível em: <https://assembleia.org.br/wp-content/uploads/2017/07/declaracao-de-fe-das-
assembleias-de-deus.pdf>. Acessado em 27 de outubro de 2021.
mundo a partir de meados dos anos 1940” e, especialmente, por sua expansão na América
Latina, Ásia e África.

Podemos dizer que o deuteropentecostalismo é marcado por seu contexto de expansão


e, também, mais pela “forma” do que pelo conteúdo de sua mensagem. As igrejas da segunda
onda se implantaram e se desenvolveram em um momento da história brasileira caracterizado
por progressiva urbanização e migração de grandes contingentes de trabalhadores das regiões
norte e nordeste e das áreas rurais para os grandes centros urbanos do sul e do sudeste,
especialmente São Paulo. Nesse ambiente urbano, o novo pentecostalismo de então conseguiu
se consolidar utilizando com grande desenvoltura o “evangelismo de massa”, com o uso das
tendas e concentrações em praças públicas na Cruzada Nacional de Evangelização e através do
rádio, meio de comunicação mais popular do período. Naquele contexto, segundo Freston
(1993, p. 84), “a cura divina em si não era novidade, mas a sua massificação e prática em locais
públicos, sim”. A IEQ, implantada no Brasil por missionários norte-americanos, já possuía um
know how consolidado na evangelização no meio urbano e no uso da mídia, sendo sua
fundadora, a “Irmã” Aimee, uma das pioneiras no uso religioso do rádio nos Estados Unidos
(ainda na década de 1920) sendo, em sua época, uma “genuína celebridade” e uma das mulheres
mais conhecidas dos Estados Unidos, “colocando, definitivamente, o pentecostalismo no mapa”
(COX, 1995, p. 124). A adaptação à nova formatação da sociedade urbana no Brasil se deu
também pelo menor grau de sectarismo e rigorismo moral que caracterizava as igrejas do
pentecostalismo clássico naquele momento.

A terceira onda do pentecostalismo brasileiro teve início na virada dos anos 1970 para
os 1980 e representa a vertente pentecostal mais estudada pelos pesquisadores nas últimas
décadas, especialmente a sua principal representante: a Igreja Universal do Reino de Deus
(IURD). Com poucas exceções, as igrejas dessa última onda da tipologia de Freston são
chamadas de neopentecostais, termo que inclusive foi se consolidando na mídia e no senso
comum, muitas vezes com conotação negativa.20 Além da IURD, as principais igrejas da
terceira onda são a Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD), a Renascer em Cristo, a
Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra e, de histórico mais recente mas com grande
visibilidade midiática, a Igreja Mundial do Poder de Deus, do Apóstolo Valdemiro Santiago.

20
Como bem observado por Ismael de Vasconcelos Ferreira (2017, p. 15): “É preciso destacar também que a
terminologia neopentecostalismo não encontra lugar no cotidiano religioso dos ditos representantes deste termo.
Nenhum fiel se considera neopentecostal. Esta classificação veio de fora, de uma tentativa acadêmica de se
compreender a religiosidade pentecostal, e que acabou por se popularizar, na academia e mesmo nos espaços
religiosos, sendo que neste se dá sempre de modo reprovativo.”
Apesar de os líderes das duas principais denominações neopentecostais – Edir Macedo (IURD)
e Romildo Ribeiro Soares (IIGD) – terem iniciado sua vivência no pentecostalismo na Igreja
Nova Vida do missionário canadense Robert McAlister, uma característica das igrejas da
terceira onda é seu caráter “autóctone”: organizadas e comandadas por lideranças nacionais.
Em relação às ondas anteriores, as igrejas neopentecostais guardam algumas semelhanças,
especialmente com igrejas da segunda onda, como os cultos voltados para a cura divina, sua
proliferação preponderantemente no meio urbano e o uso intenso dos meios de comunicação,
com programas de rádio, mas, dada a ampliação da presença de televisores nos lares dos
brasileiros, também ocupando espaço considerável nas grades de programação das emissoras
de TV através da compra de horários e, no caso da IURD, da aquisição de emissoras de
televisão.

A terceira onda do pentecostalismo se caracterizou por uma série de inovações


litúrgicas, teológicas e organizacionais. Dentre as novidades introduzidas pelo
neopentecostalismo, duas perspectivas teológicas podem ser consideradas como peças-chave
nessa virada neopentecostal: a teologia da prosperidade e a noção de batalha espiritual.
Resumidamente, na teologia da prosperidade – chamada por alguns autores norte-americanos
de health and wealth gospel – crê-se no poder dos cristãos de influir na esfera espiritual
determinando a realidade material. De acordo com Mariano (2005, p. 152-153), a teologia da
prosperidade está ligada à noção de “confissão positiva”, que seria a “crença de que os cristãos
detêm poder – prometido nas Escrituras e adquirido pelo sacrifício vicário de Jesus – de trazer
à existência, para o bem ou para o mal, o que declaram, decretam, confessam ou determinam
com a boca em voz alta”. Por sua vez, a batalha espiritual parte da concepção de que “como a
esfera espiritual controla a realidade material, as mudanças materiais dependem da
neutralização dos demônios no campo espiritual. Por isso é que existe a guerra espiritual. É uma
luta para libertar as pessoas da opressão causada pelos demônios” (SIEPIERSKI, 1997, p.53).
Nos cultos neopentecostais, os rituais de exorcismo ganharam espaço sendo realizados dentro
da gramática da batalha espiritual. Na perspectiva do combate aos espíritos malignos, os
neopentecostais vêm estabelecendo uma relação tensa – com vários episódios de violência física
e simbólica – com outras tradições religiosas no Brasil, especialmente com as religiões de
matriz africana. De acordo com Vagner Gonçalves da Silva (2007, p. 207):

O neopentecostalismo, em conseqüência da crença de que é preciso eliminar a presença e a


ação do demônio no mundo, tem como característica classificar as outras denominações
religiosas como pouco engajadas nessa batalha, ou até mesmo como espaços privilegiados
da ação dos demônios, os quais se “disfarçariam” em divindades cultuadas nesses sistemas.
É o caso, sobretudo, das religiões afro-brasileiras, cujos deuses, principalmente os exus e as
pombagiras, são vistos como manifestações dos demônios. Uma outra face desse processo é,
paradoxalmente, a “incorporação” da liturgia afro-brasileira nas práticas neopentecostais de
algumas igrejas.
De acordo com Ricardo Mariano, a justificativa principal para a divisão das duas
primeiras ondas – o pentecostalismo clássico e o deuteropentecostalismo – está no “corte
histórico-institucional, os quarenta anos que as separam. No caso do neopentecostalismo,
porém, são suas consideráveis distinções de caráter doutrinário e comportamental, suas
arrojadas formas de inserção social e seu ethos de afirmação no mundo” (MARIANO, 2005, p.
37). O historiador Paulo Siepierki chega a criticar a utilização do termo neopentecostalismo. O
neopentecostalismo representaria mais ruptura do que continuidade com o pentecostalismo que
existia no Brasil até os anos 1970. O prefixo “neo” estaria mais conectado a uma noção de
continuidade, por isso Siepierski sugeriu o uso de pós-pentecostalismo para designar um “outro
pentecostalismo” que se distanciava de suas feições anteriores e se afastava mais ainda da
matriz protestante.

Os elementos protestantes do pentecostalismo – cristocentricidade, biblicismo, união da fé


com a ética – estão praticamente ausentes no pós-pentecostalismo. Isso sugere que, se o pós-
pentecostalismo se distancia do pentecostalismo, seu distanciamento do protestantismo é
ainda maior, rompendo com os princípios centrais da Reforma. O pós-pentecostalismo é
genealogicamente protestante, mas não o é teologicamente (SIEPIERSKI, 1997, p. 52).

O modelo das ondas elaborado por Freston tem o mérito organizar sob alguns padrões
a diversidade do pentecostalismo e, como ele próprio afirma, ressaltar “de um lado, a
versatilidade do pentecostalismo e sua evolução ao longo dos anos e, ao mesmo tempo, as
marcas que cada igreja carrega da época em que nasceu” (FRESTON, 1993, p. 66). Entretanto,
algumas limitações precisam ser apontadas em relação à tipologia das ondas do
pentecostalismo. Alguns desses problemas podem ocorrer através de um uso muito fechado ou
mesmo ingênuo da cronologia das ondas. Por exemplo: apesar de uma tendência das igrejas que
surgiram no Brasil no início dos anos 1980 poderem ser classificadas como neopentecostais, ou
de terceira onda, isso é uma tendência e não uma regra. Igrejas pentecostais surgiram nesse
período com caraterísticas mais ligadas à segunda onda. Mesmo igrejas que mencionamos como
exemplos da terceira onda, como a Renascer em Cristo, não possuíam, inicialmente uma ênfase
muito clara na teologia da prosperidade e na batalha espiritual (a igreja ficou conhecida no
começo dos anos 1990 por seu trabalho de evangelismo com jovens e suas bandas de rock e
heavy metal gospel). Por outro lado, elementos, que viriam a ser característicos do
neopentecostalismo, já estavam presentes em algumas igrejas da segunda onda, como o
pragmatismo nos pedidos e os exorcismos “espetacularizados” na Deus é Amor e o chamado à
batalha espiritual contra as religiões afro-brasileiras na Igreja Nova Vida, tendo o livro Mãe de
Santo (1968) de Robert McAlister grande influência na retórica neopentecostal posterior.

Entre a segunda e a terceira onda do pentecostalismo, é importante ressaltar o impacto


pentecostal sobre as denominações protestantes tradicionais e, inclusive, sobre o catolicismo.
Quando se fala em carismatismo – ou movimento carismático –, o conceito normalmente é
utilizado para designar movimentos que defendem a contemporaneidade das manifestações dos
chamados dons do Espírito Santo (como a glossolalia, o poder de cura e o dom de profecia) que
se desenvolvem dentro de denominações cristãs que não são “oficialmente” pentecostais ou nas
quais o entendimento em relação ao batismo no Espírito Santo é diferente do que se consolidou
no pentecostalismo moderno. Embora no caso do catolicismo a noção de carismatismo tenha se
consolidado com o movimento da Renovação Carismática Católica, no meio protestante o
termo carismático aparece mais em textos acadêmicos – o próprio Freston (1993, p. 113) fala
em “renovação carismática protestante” –, sendo o adjetivo “renovado” mais usual: por
exemplo, fala-se em “batistas renovados” e muito raramente em “batistas carismáticos”, sendo
que no catolicismo ocorre o inverso. No caso brasileiro, o movimento de renovação ganha força
dentro das igrejas protestantes no período da chamada segunda onda, mas seu impacto
permanece até os dias de hoje. Leonildo Silveira Campos descreve esse movimento inicial de
renovação carismática no protestantismo brasileiro:

Os anos 50 e 60 assistiram uma vigorosa penetração do pentecostalismo no interior do


protestantismo histórico brasileiro [...]. A princípio essa invasão pentecostal foi facilitada
pela existência de uma atitude acolhedora. As lideranças do protestantismo histórico
pensavam que poderiam se valer de um “reavivamento religioso” sem quaisquer custos
institucionais, para retomar o crescimento perdido. Em todas as denominações pertencentes
ao protestantismo histórico programavam-se campanhas de “oração e jejum” para que um
“avivamento” acontecesse e os membros das igrejas voltassem a “evangelizar”. Os
pregadores convidados eram avivalistas de fama internacional. Mas, passado o primeiro
impacto, as tensões ressurgiam, pois os adesistas ao “avivamento” questionavam abertamente
a instituição eclesiástica e a sua rigidez, em nome de um evangelismo “espiritual” e “trans-
denominacional” (CAMPOS, 2011, p. 513).

Como resultado dessa tensão interna criada pelos movimentos de renovação dentro do
protestantismo brasileiro, ocorreu uma série de cismas nas igrejas que deram origem a novas
congregações independentes e novas denominações, como a Metodista Wesleyana (1967), a
Presbiteriana Renovada (1972) e a Convenção Batista Nacional (1965). Além dessas que
mantiveram os nomes das denominações de origem, uma série de pequenas comunidades e
outras denominações também surgiram desse movimento, sendo a mais conhecida a Igreja
Cristã Maranata (1968), tendo se originado do movimento de renovação carismática dentro do
presbiterianismo.
Como situar tais igrejas na tipologia das ondas? Concordamos com Leandro Seawright
Alonso (2008, p. 40) quando ele afirma que a classificação de Freston deixa um “grande vácuo”
em relação às igrejas surgidas no movimento de renovação espiritual a partir dos anos 1960.
Embora Freston traga as noções de “Renovação Carismática Protestante” e “Comunidades
carismáticas”, essas ficam deslocadas em relação à sua tipologia do pentecostalismo brasileiro.
Além disso, Alonso alerta para o fato de que Freston utiliza uma noção de carismatismo que
“funciona” na análise do caso norte-americano, “onde os pentecostais são mantidos no âmbito
das igrejas históricas” (ALONSO, 2008, p. 40), mas que não é facilmente aplicável ao caso
brasileiro. Faria algum sentido uma diferenciação entre igrejas pentecostais e igrejas
carismáticas, sendo essas últimas as originárias dos cismas das igrejas protestantes tradicionais?
No nosso entendimento, tal diferenciação carece de referenciais mais objetivos. O ser originário
de cismas protestantes é algo recorrente na história das igrejas pentecostais. No próprio
histórico da maior delas, as Assembleias de Deus, podemos traçar suas origens a uma polêmica
causada pela pregação da doutrina por seus missionários pioneiros em uma igreja batista.
Também não podemos considerar a questão da nomenclatura (a manutenção da tradição
denominacional de origem no nome da igreja) como um padrão para tal divisão: Igreja
Presbiteriana Renovada e Igreja Cristã Maranata são oriundas do presbiterianismo. Deveriam
ser classificadas de forma diferente apenas pela opção de nomenclatura feita? Dessa forma,
embora saibamos que seja uma questão aberta a debates, consideramos que essas igrejas devem
ser classificadas como igrejas pentecostais, sendo a noção de carismatismo utilizada para definir
movimentos de caráter renovado/pentecostal, mas que permanecem dentro das estruturas
eclesiásticas das igrejas cristãs tradicionais (não “oficialmente” pentecostais).

Também é importante que observemos como as doutrinas e práticas pentecostais têm se


expandido no campo religioso brasileiro para além das igrejas declaradamente pentecostais.
Como dissemos, no caso protestante, o movimento de “renovação espiritual”, que ganhou força
na década de 1960, e só vem se fortalecendo ao longo dos anos, “concorreu para tornar o
protestantismo brasileiro ainda mais predominantemente pentecostal” (CAVALCANTI, 2002,
p. 215). Há uma tendência de boa parte das lideranças das igrejas tradicionais de “tolerar esses
movimentos pentecostalizantes, tentando acomodar seus adeptos sem hostilizá-los, mesmo
porque, em muitos casos, eles têm-se tornado maioria no conjunto dos membros das igrejas”
(BAPTISTA, 2002, p. 13). Se os pentecostais já são maioria absoluta no agregado evangélico,
conforme atestado pelas últimas pesquisas do IBGE, tais números não refletem a real proporção
e abrangência das doutrinas e práticas pentecostais no Brasil. Apesar da força desses números,
é preciso relembrar que eles não levam em conta a presença de tendências e movimentos
pentecostais dentro das igrejas tradicionais. Estima-se que os fiéis que têm uma orientação
pentecostal ou que, pelo menos, creem na contemporaneidade dos “dons do Espírito” sejam,
inclusive, maioria entre os membros das igrejas protestantes históricas. Almeida compartilha
dessa perspectiva: a expansão pentecostal “tem um alcance maior do que a própria adesão de
fiéis ao pentecostalismo. Se este cresce demograficamente, muito maior tem sido a influência
sobre outras religiões assim como na própria sociedade” (ALMEIDA, 2008, p. 55). Os números
geram “uma sensação de que os evangélicos estariam sob forte pressão do crescimento
pentecostal. Em outras palavras, eles tendem ao crescimento na medida em que assimilarem as
estratégias dos movimentos pentecostal e carismático” (CAMPOS, 2008, p. 35). Esse processo
de “pentecostalização” ultrapassa o campo evangélico e se torna cada vez mais visível no
próprio catolicismo na expansão da Renovação Carismática Católica (RCC) − com a
proliferação de grupos de oração, comunidades carismáticas, “missas de cura” e,
principalmente, com a ocupação do espaço midiático através de suas próprias rádios e emissoras
de televisão. Concorda-se aqui com Leonildo Silveira Campos (2008, p. 45) quando ele afirma
que “efetivamente, não se pode mais estudar o campo religioso brasileiro sem se levar a sério a
carismatização do catolicismo e a pentecostalização do protestantismo histórico”.

4. Enquanto Jesus não volta: algumas observações sobre o pentecostalismo no Brasil atual

Até este momento, procuramos apresentar as raízes históricas do pentecostalismo, seu


surgimento enquanto “pentecostalismo moderno” nos Estados Unidos da primeira década do
século XX e, na seção anterior, sua chegada, desenvolvimento e diferenciações internas no caso
brasileiro. Nesta última seção, buscando encerrar esse nosso panorama introdutório sobre o
pentecostalismo brasileiro, gostaríamos de abordar brevemente quatro pontos que entendemos
serem importantes para nos ajudar a entender a atual configuração do pentecostalismo no Brasil,
a problematizar alguns “sensos comuns” e a apontar algumas veredas a serem percorridas pelos
pesquisadores do tema: as relações entre pentecostalismo e fundamentalismo; a diluição das
fronteiras teológicas entre as igrejas pentecostais; o ocaso sectarismo pentecostal frente às
“coisas do mundo”; e as transformações nas concepções escatológicas pentecostais;

1) Pentecostalismo e fundamentalismo: Fundamentalismo e pentecostalismo são


movimentos que tiveram seu nascedouro num contexto histórico e geográfico semelhante: os
Estados Unidos do início do século XX. Representam diferentes respostas dentro do
protestantismo à experiência da vida moderna nos Estados Unidos: o primeiro voltado para a
oferta de “certezas” ancoradas na “letra” das Sagradas Escrituras em um ambiente de profundas
transformações, e o segundo para a oferta de experiências de caráter extático em um período de
predominância e popularização da racionalidade científica. Apesar de se tratarem de diferentes
movimentos com diferentes ênfases, as relações entre os dois, especialmente no senso comum,
mas, também, no meio acadêmico, não tem sido tratada de maneira clara. Normalmente, afirma-
se que todo pentecostal seria fundamentalista, mas nem todo fundamentalista seria pentecostal.
O pentecostalismo seria uma espécie de “ramo” do fundamentalismo, que agregaria ao
literalismo bíblico a crença na contemporaneidade dos dons do Espírito Santo, como a
glossolalia e a crença em curas milagrosas. O fundamentalismo reagiu no plano teológico e
intelectual. A solução para as crises instaladas pela modernidade estaria na reafirmação das
doutrinas fundamentais do cristianismo que seriam a base da civilização ocidental. O
pentecostalismo, por outro lado, considerava que: “a falha não estava no pensamento incorreto
mas no colapso dos sentimentos. Não o declínio da ortodoxia, mas a decadência da devoção
estava na raiz do problema [...] O que era necessário não era um novo argumento para as mentes,
mas uma nova experiência para os corações” (SPLITTER, 1994, p. 108).

No período inicial do pentecostalismo, as principais lideranças fundamentalistas dos


Estados Unidos faziam severas críticas ao “movimento das línguas”. Os próprios editores de
The Fundamentals, os dispensacionalistas A. C. Dixon e R. A. Torrey, também se posicionaram
de forma crítica ao que estaria ocorrendo nas comunidades pentecostais. Em um texto publicado
na edição de janeiro de 1922 do The King’s Business – jornal do Bible Institute of Los Angeles
(BIOLA), Dixon afirmava que o Tongues Movement se baseava em uma interpretação
equivocada da carta de Paulo aos coríntios. O formato e as expressões corporais nos cultos
pentecostais também eram criticados e chamados de “confusão desordenada”. Por fim, Dixon
alertava seus leitores sobre o possível caráter satânico de certas expressões pentecostais:
“Precisamos nos proteger contra as astutas ciladas do diabo, que está pronto para falsificar
qualquer ação espetacular do Espírito que possamos buscar em desobediência à verdadeira
vontade revelada do Espírito de Deus” (DIXON, 1922, p. 19).

Em 1920, Torrey escreveu um pequeno texto com o título Is the present tongues
movement of God?,21 no qual refutava os rumos do pentecostalismo que ganhava espaço no
país. Sua resposta à pergunta do título do texto era um sonoro “não”. Torrey afirmava que a

21
Disponível em: <https://digitalcommons.biola.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1023&context=biola-pubs>.
Acessado em 14 de julho de 2021.
ideia de que quem não tenha recebido o dom da glossolalia não teria, de fato, recebido o batismo
do Espírito Santo, contrariava o texto bíblico. Aumentando o tom de suas críticas, Torrey dizia
que as lideranças pentecostais faziam uso de métodos ligados, por um lado, ao charlatanismo
e, por outro, a cultos de possessão de outras tradições religiosas. Alguns que dos que entravam
nessa espécie de transe e começavam a falar em línguas estranhas estariam, segundo Torrey,
possuídos por demônios e não pelo Espírito Santo. Concluindo, Torrey afirmava que o
pentecostalismo é “um movimento que todo aquele que crê e obedece a Palavra de Deus deve
abandoner, exceto para expor, caso haja oportunidade, os males e erros grosseiros ligados a
ele”.

Entretanto, é importante perceber que, apesar das divergências e críticas feitas por
lideranças fundamentalistas, as nascentes igrejas pentecostais foram, progressivamente,
incorporando os princípios fundamentalistas às suas declarações de fé. A espontaneidade, o
primado da oralidade sobre a tradição teológica e uma certa informalidade que marcou os
primórdios do movimento pentecostal na tradição de Azusa foram, aos poucos, tendo que
conviver com um processo lento e gradual de institucionalização em igrejas locais e
denominações de caráter nacional. Novas “revelações do Espírito Santo” levaram a sucessivas
cisões dentro dos incipientes grupos pentecostais.22 Outro ponto importante a ser observado é
a proximidade que o ramo mais conservador (e branco) do pentecostalismo, especialmente o
“pentecostalismo de Chicago”, tinha com os ensinamentos da tradição de Keswick e a
escatologia dispensacionalista, dois movimentos que, junto com o literalismo bíblico,
formavam a base teológica das principais lideranças do movimento fundamentalista.

Saulo Baptista (2002, p. 26) afirma que “o movimento pentecostal não tinha um corpo
de doutrinas próprio, além da afirmação do batismo com o Espírito Santo, associado com o dom
de línguas. Esse vazio de doutrina os pentecostais procuraram preenchê-lo adotando o conjunto
de dogmas fundamentalistas”. No mesmo sentido, José Miguez Bonino (2003, p. 40) diz que
“em algumas denominações, particularmente das igrejas de santidade e dos nascentes
movimentos pentecostais, sua tradição pietista e evangélica foi como que moldada novamente
pela influência fundamentalista”. Apesar de terem sido, como vimos, alvos constantes de

22
Um exemplo importante dessa dinâmica do pentecostalismo norte-americano é o caso das Assembleias de Deus
(Assemblies of God).22 Enfrentando uma série de divergências teológicas internas, especialmente em relação a
adeptos do Jesus Name Movement (também chamado de Oneness Pentecostalism) que, entre outras coisas, negava
a doutrina da Trindade, lideranças das Assembleias de Deus decidiram deixar claras suas crenças básicas e
inegociáveis. Nesse espírito, foi aprovado, em 1916, o primeiro Statement of Fundamental Truths das Assembleias
de Deus norte-americanas, contendo 17 artigos. Tais “verdades fundamentais” incluíam a reafirmação da doutrina
da Trindade, a divindade de Cristo, a perspectiva escatológica pré-milenarista, o batismo por imersão entre outros
pontos.
ataques de lideranças fundamentalistas, as igrejas pentecostais que começaram a se organizar
nos Estados Unidos na década de 1910 aderiram a vários dos princípios fundamentalistas e à
escatologia dispensacionalista. Podemos dizer que as crenças confessadas pelas igrejas
pentecostais uniam literalismo bíblico – a defesa da infalibilidade e inerrância da Bíblia –, pré-
milenarismo dispensacionalista e a crença na contemporaneidade dos dons do Espírito Santo,
sua crença diferencial.

Essa herança fundamentalista tem se feito presente ao longo da história do


pentecostalismo no Brasil. Nos seminários e cursos teológicos ligados às denominações
pentecostais brasileiras, a bibliografia utilizada e a forma de leitura dos textos sagrados
aprendida são, majoritariamente, de matriz fundamentalista. Entretanto, é importante
entendermos as razões históricas dessa aproximação e estarmos atentos para o fato de que as
afinidades entre pentecostalismo e fundamentalismo são muito tênues para que uma conexão
imediata seja estabelecida entre os dois. Some-se a isso a constatação feita por autores como
Bonino e Hollenweger de que o pentecostalismo surgiu como um “fenômeno típico das classes
populares”, com uma religiosidade basicamente oral, marcada pela expressão corporal através
da dança, dos cantos e dos êxtases religiosos. O pentecostalismo seria uma expressão religiosa
“pré-conceitual, da qual não se pode esperar uma teologia explícita e sistematizada” (BONINO,
2003, p. 57). A tensão entre o apego fundamentalista à “letra” das Escrituras e a liberdade da
ação do Espírito Santo vem marcando a história do pentecostalismo moderno. Bonino aponta
neste sentido ao afirmar que:

Quando se colocam lado a lado a conceitualidade fundamentalista com a qual se expressa


doutrinariamente o significado da Escritura e a vivência da mesma e a interpretação e o uso
dos textos na pregação ou exortação, percebemos uma incongruência: são duas aproximações
ao ‘livro’ totalmente diferentes: uma busca nele “verdades” irrefutáveis; a outra, uma
inspiração, um poder, uma orientação para viver e atuar, uma resposta a sua angústia ou uma
expressão de sua alegria. Uma tenta acertar indubitavelmente a ‘letra’ e interpretá-la a partir
do positivismo do “senso comum”; a outra discerne nela o que ‘lhe diz o Espírito’ e a
interpreta no âmbito do “milagre” (BONINO, 2003, p. 71).

Se há uma aproximação no que diz respeito a interpretações pré-críticas e literalistas dos


textos bíblicos tanto no fundamentalismo quanto no pentecostalismo, mesmo a forma como
esse literalismo ocorre nos dois grupos precisa ser analisada criteriosamente. Hollenweger
(1972, p. 300) afirma que no fundamentalismo Pentecostal há uma defesa da infalibilidade da
Bíblia sem maior preocupação com embasamento teológico dessa afirmação. A preocupação é
com os ataques demoníacos às verdades bíblicas. A Bíblia é a “espada” que deve ser empunhada
pelo crente na sua luta que não é “contra carne ou sangue”. Em algumas igrejas neopentecostais,
a preocupação fundamentalista com a infalibilidade, historicidade e inerrância do texto bíblico
normalmente perde espaço para aplicações “utilitárias” de versículos e histórias de personagens
bíblicos que devem servir de palavras de motivação e de exemplos de vida para o crente de
hoje.

2) Pentecostalismo e escatologia: Como vimos, a questão escatológica logo se destacou


entre os pentecostais. A “nova descida” do Espírito Santo seria um sinal da aproximação do fim
dos tempos. Esse novo despertar seria a latter rain prevista pelo profeta Joel e conferia aos
pentecostais um lugar especial na história do cristianismo e nos planos de Deus em relação ao
futuro da humanidade. Entretanto, a crença na latter rain foi perdendo espaço para as teorias
da escatologia pré-milenarista dispensacionalista. As principais lideranças fundamentalistas dos
Estados Unidos já na década de 1910 eram adeptas desse método de interpretar o texto bíblico
organizado por John Nelson Darby e popularizado no país através da Bíblia de Estudos
Scofield.

Entre os pentecostais brasileiros, a perspectiva pré-milenarista e dispensacionalista


ainda é a narrativa majoritária na área da escatologia. Na seção “Em que cremos” do site oficial
do principal dos ramos das Assembleias de Deus (Convenção Geral das Assembleias de Deus
do Brasil), vemos a reafirmação das crenças pré-milenarista e de elementos dispensacionalistas,
como o Arrebatamento pré-tribulacional: Crê-se “na segunda vinda de Cristo, em duas fases
distintas: a primeira — invisível ao mundo, para arrebatar a sua Igreja antes da Grande
Tribulação; a segunda — visível e corporal, com a sua Igreja glorificada, para reinar sobre o
mundo durante mil anos”.23 Best sellers de autores dispensacionalistas famosos como Hal
Lindsey e Tim LaHaye tiveram grande impacto nas interpretações escatológicas dos
pentecostais brasileiros nas últimas décadas do século XX, especialmente no contexto da
Guerra Fria.
Importantes estudiosos do pentecostalismo vincularam a apatia política, o sectarismo e
o desinteresse por questões sociais dos pentecostais a essa perspectiva escatológica pré-
milenarista.24 Por que se engajar politicamente se não se poderia esperar nada de melhor deste
mundo antes da volta de Jesus? Como buscar uma sociedade cristã se as instituições mundanas

23
Disponível em: <https://assembleia.org.br/em-que-cremos/>. Acesso em 15 de jun. 2020.
24
Entre os pesquisadores brasileiros que se dedicaram ao estudo das práticas sociais e políticas dos pentecostais,
o livro O refúgio das massas do suíço Christian Lalive D’Epinay (1970) exerceu um grande impacto. Para
D’Epinay, uma característica central da visão pentecostal do mundo é a radical separação entre a “vida espiritual”
e as “coisas do mundo”. Uma das bases teológicas que embasariam tal posicionamento seria a hegemônica
perspectiva escatológica pré-milenarista. O pré-milenarismo seria, na opinião do historiador Paulo Siepierski
(2004, p. 81), o “responsável” por uma separação do mundo por parte daqueles que o confessam. “Essa separação
revela-se, por exemplo, no desprezo ao prazer, no isolamento cultural, na passividade sociopolítica e no
pessimismo em relação a qualquer esforço para transformação da sociedade”.
estavam sob a influência “demoníaca” e todo o planeta seria em breve subjugado por uma
liderança política manipulada pelo próprio Satanás? Se a derrota na arena política era inevitável,
por que lutar? A luta justificável seria aquela por conquista de almas para Jesus numa batalha
contra as tentações do mundo e as forças espirituais satânicas. Mais do que determinante de
uma visão negativa dos “negócios humanos”, especialmente a política, o pessimismo
escatológico dos pentecostais era uma expressão de descontentamento de um grupo religioso
minoritário, muitas vezes discriminado e composto por fiéis que se encontravam nos estratos
economicamente inferiores da sociedade. Os “sinais dos tempos” não indicavam a possibilidade
de um período de paz e prosperidade para os pentecostais na terra. Isso só seria viável após a
intervenção sobrenatural de Deus na história e a Segunda Vinda de Jesus Cristo. Entretanto,
mesmo os observadores menos atentos do campo religioso brasileiro podem perceber que o
sectarismo, o desinteresse pela política e a rejeição das “coisas do mundo” não são mais
características da grande maioria do pentecostalismo no Brasil – talvez a Congregação Cristã
no Brasil ainda seja um dos últimos resquícios desse pentecostalismo old school. Se a
escatologia pré-milenarista era a razão do sectarismo e do “pessimismo” sociopolítico, porque
a postura dos pentecostais frente ao “mundo” mudou se a crença escatológica “oficial”
permaneceu a mesma?
As crenças escatológicas são ininteligíveis se dissociadas de seu contexto de formação
e, nos termos de Koselleck (2006), das experiências e expectativas dos grupos que as
confessam. Uma nova percepção sobre o presente pode ser responsável por uma transformação
em relação ao futuro esperado. Dessa forma, compreender a passagem, por exemplo, do
discurso de o “crente não se envolve em política” para o chamado a “ganhar o Brasil para Jesus”
passa, obrigatoriamente, por entender uma série de transformações internas e externas ao
pentecostalismo, que tiveram profunda influência na forma como parte de suas lideranças
passaram a pensar seu papel no contexto político e “espiritual” do Brasil. A partir de meados
dos anos 1980, o pentecostalismo passou por uma série de experiências sem precedentes em
sua história até então: afirmação como força política-eleitoral a partir de 1986 com a eleição de
diversos representantes pentecostais nas casas legislativas e mesmo no comando do poder
executivo em importantes cidades brasileiras; o já mencionado crescimento contínuo do número
de pentecostais atestado pelos últimos Censos demográficos, o que vem fomentando sonhos de
um Brasil majoritariamente pentecostal dentro de algumas décadas; diversificação do perfil
socioeconômico dos pentecostais no Brasil, com o fortalecimento desse grupo entre setores da
classe média; e a popularização entre os pentecostais de tendências teológicas que valorizam o
sucesso e o recebimento das bênçãos de Deus (bênçãos materiais, inclusive) neste mundo, como
a já mencionada teologia da prosperidade, mas também a chamada Teologia do Domínio. A
principal influência entre lideranças pentecostais brasileiras é a perspectiva de Teologia do
Domínio sustentada pelo teólogo e pastor norte-americano C. Peter Wagner. De acordo com
Nina Rosas (2015, p. 246), Wagner defende
que o domínio e a autoridade sobre a terra foram dados por Deus aos homens desde
Adão, mas foram perdidos pelo pecado original. Recuperados por Jesus através do
sacrifício vicário, devem ser retomados pelos crentes. Isso se daria por meio de luta
espiritual contra o diabo, que estaria bloqueando a atmosfera da terra e impedindo o
fluxo do céu e a emanação de bênçãos advindas do alto. Como corolário, pensa-se
que os fiéis não estariam em seus locais de trabalho apenas para sobreviver. Teriam
a oportunidade de exercer liderança, dominar e ditar regras de acordo com os valores
do reino de Deus.
Mesmo com a popularização entre os pentecostais de crenças ligadas, direta ou
indiretamente, a uma perspectiva escatológica de fundo pós-milenarista, as igrejas pentecostais
brasileiras continuaram confessando, com pouquíssimas exceções, uma narrativa escatológica
pré-milenarista e dispensacionalista. Podemos afirmar que as transformações estão ocorrendo
mais no nível prático do que no teológico. Se, por um lado, não houve uma adesão “oficial” ao
pós-milenarismo que tenha precedido a mudança da relação dos pentecostais com a política,
por outro lado, apesar de continuarem crendo que o advento do Milênio só ocorrerá após a
parousia, o pré-milenarismo não tem fomentado a alienação política e o afastamento do
“mundo” que a literatura especializada considerava como consequência lógica de tal crença.
Uma hipótese que podemos levantar, com alguma segurança, é a de que o pessimismo
pentecostal – em sintonia com sua crença pré-milenarista/dispensacionalista – tinha como uma
de suas principais razões a consciência de que o poder político e/ou a hegemonia cultural
estariam distantes deles e, baseado em seu antagonismo visceral, em poder de “forças
malignas”. O questionamento de tal poder “diabólico” era feito baseando-se em uma forma
antagônica de política e de governo. Uma forma que expressaria os valores divinos, um modelo
de reino milenar legitimamente cristão. Sendo a possibilidade da implementação de tal reino
algo muito distante e impalpável, tendia-se ao pessimismo e à ansiedade para que essa nova era
fosse implantada através de uma interferência divina, dando fim à história e aos governos
iníquos. Por outro lado, quando há uma virada nesse quadro – como tem ocorrido nas últimas
décadas – e grupos que se consideravam marginalizados começam a acreditar na possibilidade
de influir de maneira decisiva nos rumos da nação e a se identificarem como parte da “maioria
cristã e conservadora” da população, o pessimismo cede espaço para um discurso que alimenta
expectativas intra-históricas de resgate do sonho da “nação cristã”.
3) As divisões teóricas e as dissoluções de fronteiras “práticas”: Se, seguindo a
proposta de Freston, conseguimos estabelecer alguns padrões para a divisão interna do campo
pentecostal no Brasil em uma perspectiva de duração mais longa, um recorte recente sobre o
campo pentecostal brasileiro torna tais diferenças mais nebulosas. Podemos dizer que mesmo
uma diferenciação rígida entre igrejas pentecostais clássicas e igrejas neopentecostais ou pós-
pentecostais precisa ser relativizada. Já nos anos 1990, Pierre Sanchis (1994, p. 52) afirmava
que “há uma evolução no mundo pentecostal, evolução complexa, se se atentar para o fato de
que o estilo das igrejas de cura já começou a contaminar algumas das igrejas mais ‘clássicas’”.

Observa-se o avanço de um processo de “neopentecostalização” ou “pós-


pentecostalização” – utilizando-nos do conceito de Siepierski – do pentecostalismo brasileiro
com a consolidação da teologia da prosperidade e da batalha espiritual em grande parte das
igrejas do pentecostalismo clássico e do deuteropentecostalismo. Apesar de algumas
resistências internas de líderes pentecostais relutantes quanto aos “novos tempos”, podemos
perceber uma homogeneização progressiva nas bases teológicas das mensagens cada vez mais
voltadas para o “aqui e agora”, como observamos na questão escatológica. Não se quer dizer
aqui que o modelo de fé e prática, por exemplo, da Igreja Universal do Reino de Deus, será, em
breve, adotado por todas as igrejas pentecostais. O que se quer dizer é que as fronteiras entre as
diferentes igrejas não são tão estanques quanto alguns costumam afirmar e, apesar das
influências mútuas entre as diferentes correntes do pentecostalismo, o poder de persuasão de
doutrinas que oferecem as bênçãos de Deus neste mundo têm se saído melhor, em um contexto
de extrema competição religiosa, do que as que postergam tais bênçãos para o “celeste porvir”.
Chamando as igrejas pós-pentecostais de “religiões de estilo pós-moderno imediatista”,
Antonio Gouvêa Mendonça, em um de seus últimos trabalhos, fez a seguinte observação:

Por que as religiões tradicionais perdem espaço para as pós-modernas? Uma resposta inicial
poderia ser esta: enquanto as tradicionais insistem numa ética salvacionista que expressa
grandes princípios dogmáticos universais transcendentes, as pós-modernas pregam e agem
fora de sistemas de verdades eternas e imediatas. A um Deus transcendente que age em outra
escala de tempo, opõem um Deus imanente que opera na contingência humana. Não há
verdades eternas, mas verdades provisórias que “são verdadeiras” na provisoriedade do
existir, na contingência do sujeito (MENDONÇA, 2006, p. 91).

Talvez, a validade da noção de pós-pentecostalismo de Siepierski, seja mais aplicável


ao atual campo religioso brasileiro, não como uma categoria que defina algumas igrejas
pentecostais de surgimento recente, mas sim como um “espírito” ou uma forma de religiosidade
que, claro, é bem característica de algumas denominações pentecostais, mas que tem deixado
sua marca em todo o universo pentecostal e também nas igrejas tradicionais, incluindo-se entre
elas a Igreja Católica. Refletindo a partir das contribuições de Mendonça e Siepierski,
entendemos que os pesquisadores do pentecostalismo no Brasil devem estar atentos aos rumos
e influência dessa tendência “pós-pentecostal pós-moderna” no campo religioso brasileiro e
algumas de suas características como a individualização e pragmatismo, falta de vínculos mais
fortes entre os fiéis e suas denominações e comunidades de fé (com um aumento espantoso do
trânsito religioso e dos pentecostais sem vínculo denominacional) e por uma crença
escatológica periférica e voltada para o presente.

3) Os pentecostais e as “coisas do mundo”: Já mencionamos a diminuição do


sectarismo no pentecostalismo brasileiro, mas é importante reforçar essa percepção de que esse
grupo pensa e se comporta cada vez menos como “peregrinos” em uma terra que não lhes
pertence. Segue uma tendência colocada por Freston de que uma “característica do movimento
atual é que a religião evangélica se torna religião de massas. À medida que cresce, vai se
tornando mais parecida com a sociedade que a recebe” (FRESTON, 1994, p. 14). O caso, por
exemplo, das Assembleias de Deus, com o fim da insistência em disciplinas sobre “usos e
costumes” dos fiéis, o uso de todos os meios de comunicação e de mídias modernas, a
participação ativa na política eleitoral, entre outros, mostram que os pentecostais estão cada vez
mais integrados à sociedade brasileira e sendo cada vez menos “alienígenas” no horizonte
cultural nacional.

Esse sentimento de pertencimento a este mundo, no caso do pentecostalismo brasileiro,


ganha força com o crescimento quantitativo do número de pentecostais e sua diluição entre os
diferentes grupos sociais e econômicos do Brasil. Embora a média de renda dos pentecostais
seja inferior à média nacional, não se pode mais falar que o pentecostalismo é uma expressão
religiosa exclusiva. dos extratos inferiores da população. De acordo com Baptista (2009, p. 90),
“a partir dos anos 1970, acentuou-se um processo de mobilidade social ascendente no campo
pentecostal.” O incremento do número de pentecostais de classe média fortaleceu os vínculos
destes com o mundo e embalou sonhos de sucesso pessoal, profissional e político intraterrenos.
Os “usos e costumes”, o sectarismo e a apatia política poderiam ser viáveis para pequenas
congregações pentecostais no ambiente de pequenas cidades. Mas, a partir da expansão
numérica e diversificação social do campo pentecostal, tais características passaram a ser
questionadas. Tornavam-se impraticáveis para novos pentecostais de uma classe média
ascendente que queriam manter sua fé, mas também desejavam melhorar seu nível de vida e,
inclusive, influenciar a esfera política para defender seus interesses. Seria ingenuidade não crer,
como vimos, que tais transformações tiveram implicações nas expectativas escatológicas dessas
pessoas. Podem até mesmo crer que o retorno de Jesus era iminente, mas também estão
preocupados em “melhorar de vida”, em adquirir bens materiais, comprar casas e automóveis
utilizando financiamentos de longo prazo, contratar planos de saúde e previdência privada etc.

Considerações finais

Muito ainda há para se dizer e pesquisar em relação ao pentecostalismo brasileiro. De


um lado, ele se apresenta como um objeto ainda pouco explorado por diferentes áreas do
conhecimento científico, indo desde a escassez de trabalhos historiográficos sobre o
pentecostalismo no Brasil às possibilidades em aberto de estudos no campo da neurociência,
que já possui trabalhos sobre experiências místicas25 (não seria o caso de pesquisas nessa área
sobre as experiências de glossolalia nas igrejas brasileiras?). De outro lado, existem temas
importantes para se entender algumas tendências no pentecostalismo brasileiro atual, mas que,
devido aos limites deste texto, não conseguimos explorar: a presença de elementos e símbolos
judaizantes e de ideais do sionismo cristão nas igrejas pentecostais e as novas formas de
organização interna das igrejas com o movimento de células. No campo da teologia pentecostal,
vemos o crescimento de tendências teológicas que buscam se descolar da influência
fundamentalista e retomar as raízes de Azusa, com suas implicações teológicas e sociais, no
sentido de oxigenar o pentecostalismo brasileiro.

Neste texto procuramos fornecer ao leitor uma breve introdução ao pentecostalismo e


oferecer algumas referências gerais que possam dar subsídios para a leitura dos trabalhos
seguintes que discutirão as histórias e crenças das denominações pentecostais caso a caso. O
texto procurou apresentar as origens e o surgimento do pentecostalismo moderno e, nas duas
últimas seções, o desenvolvimento histórico e as diferenciações internas do pentecostalismo no
Brasil além de apontar alguns tópicos que, cremos, são fundamentais para entender algumas
dinâmicas do pentecostalismo brasileiro atual. Cremos que o aumento qualitativo e quantitativo
das pesquisas sobre o pentecostalismo brasileiro são fundamentais para que os estudos sobre o
campo religioso brasileiro consigam captar os elementos que vêm moldando a nova face da
religiosidade brasileira, pois concordamos com a consideração de Almeida quando ele afirma
que “o estereotipo do jeito de ser religioso neste país cada vez mais fica com a cara evangélica.

25
Por exemplo: BEAUREGARD, Mario; PAQUETTE, Vincent. EEG activity in Carmelite nuns during a mystical
experience. Neuroscience letters, n. 444, 2008, p. 1-4.
Mais ainda do que as igrejas pentecostais, o que se expande são as características desta
religiosidade” (ALMEIDA, 2008, p. 55).

Referências bibliográficas

ALENCAR, Gedeon Freire de. Pentecostalismo clássico: Congregação Cristã no Brasil e


Assembleias de Deus. In. DIAS, Zwinglio Mota; RODRIGUES, Elisa; PORTELLA, Rodrigo
(Orgs.). Protestantes, evangélicos e (neo) pentecostais. São Paulo: Fonte Editorial, 2013, p.
167-187.

ALLEN, David. Regent Square Revisited – Edward Irving: precursor of the Pentecostal
movement. Journal of the European Pentecostal Theological Association, v. 17, n. 1, p. 49-
58, 1997.

ALMEIDA, Ronaldo de. Os pentecostais serão maioria no Brasil? Revista de Estudos da


Religião, São Paulo, v. 4, p. 48-58, 2008.

ALONSO, Leandro Seawright. Poder e experiência religiosa: uma história de um cisma


pentecostal na Convenção Batista Brasileira na década de 1960. Dissertação (mestrado em
Ciências da Religião), Universidade Metodista de São Paulo, 2008.

ANDERSON, Allan Heaton. Uma introdução ao pentecostalismo: cristianismo carismático


mundial. São Paulo: Loyola, 2019.

ANDERSON, Robert Mapes. Vision of the disinherited: the making of American


Pentecostalism. Peabody: Hendrickson Publishers, 1992.

BAPTISTA, Saulo de Tarso Cerqueira. “Fora do mundo”- dentro da política: identidade e


“missão parlamentar” da Assembléia de Deus em Belém. Dissertação (Mestrado em
Sociologia), Universidade Federal do Pará, 2002.

BAPTISTA, Saulo de Tarso Cerqueira. Pentecostais e neopentecostais na política brasileria:


um estudo sobre cultura política, Estado e atores coletivos religiosos no Brasil. São Paulo:
Annablume; São Bernardo do Campo: Instituto Metodista Izabela Hendrix, 2009.

BLUMHOFER, Edith L. The Assemblies of God: a chapter in the history of American


Pentecostalism. Vol. 1. Springfield: Gospel Publishing House, 1989.

BONINO, José Miguez. Rostos do protestantismo latino-americano. São Leopoldo: Sinodal,


2002.

BROWN, Michael L. From holy laughter to holy fire: America on the edge of revival.
Shippensburg: Destiny Image Publishers, 1996.

BURGESS, Stanley M., MCGEE, Gary B. Dictionary of Pentecostal and charismatic


movements. Grand Rapids: Zondervan Publishing House, 1988.

CAMPOS, Leonildo Silveira. As origens norte-americanas do pentecostalismo brasileiro:


observações sobre uma relação ainda pouco avaliada. Revista USP, n. 67, p. 100-115, 2005.
CAMPOS, Leonildo Silveira. Os mapas, atores e números da diversidade religiosa cristã
brasileira: católicos e evangélicos entre 1940 e 2007. Revista de Estudos da Religião, São
Paulo, v. 4, p. 9-47, 2008.

CAMPOS, Leonildo Silveira. Pentecostalismo e protestantismo “histórico” no Brasil: um


século de conflitos, assimilação e mudanças. Horizonte – Revista de Estudos de Teologia e
Ciências da Religião, v. 9, n. 22, p. 504-533, 2011.

CARTLEDGE, Mark J. Charismatic glossolalia: an empirical-theological study. New York;


London: Routledge, 2016.

CAVALCANTI, Robinson. Cristianismo e política: teoria bíblica e prática histórica. Viçosa:


Ultimato, 2002.

CERILLO JR., Augustus. Interpretive approaches to the history of American Pentecostal


origins. Pneuma, v. 19, n. 1, p. 29-52, 1997.

CHURCH OF THE NAZARENE. Manual: History, constitution, government, ritual. Kansas


City: Nazarene Publishing House, 2009.

COX, Harvey. Fire from heaven: the rise of pentecostal spirituality and the reshaping of
religion in the twenty-first century. Cambridge: Da Capo Press, 1995.

CREECH, Joe. Visions of glory: the place of the Azusa Street Revival in Pentecostal history.
Church History, v. 65, n. 3, p. 405-424, 1996.

DAYTON, Donald W. Theological roots of Pentecostalism. Grand Rapids: Baker Academic,


1987.

D`EPINAY, Christian Lalive. O refúgio das massas: estudo sociológico do protestantismo


chileno. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970.

DIXON, A. C. Speaking with tongues: the plain replies of the Word of God to some modern
and dangerous views of the matter. King’s Business, p. 14-19, jan. 1922. Disponível em:
https://online.flippingbook.com/view/914391/

DREHER, Martin Norberto. Fundamentalismo. São Leopoldo: Sinodal, 2006.

ELLIOT, Peter. Discreet proto-pentecostals: The Catholic Apostolic Church in North America.
Journal of Religious History, v. 43, n. 3, p. 328-341, 2019.

FERREIRA, Ismael de Vasconcelos. Ser crente: experiência e linguagem religiosa da vida


pentecostal. Tese de Doutorado (Ciência da Religião), Universidade Federal de Juiz de Fora,
2017.

FRESTON, Paul. Protestantes e política no Brasil: da Constituinte ao impeachment. Tese


(Doutorado em Sociologia), Unversidade Estadual de Campinas, 1993.

FRESTON, Paul. Breve história do pentecostalismo brasileiro. In: ANTONIAZZI, Alberto et


al. Nem anjos nem demônios: interpretações sociológicas do pentecostalismo. 2ª ed.
Petrópolis: Vozes, 1994. p. 67-159.
GIUMBELLI, Emerson. A vontade do saber: terminologias e classificações sobre o
protestantismo brasileiro. Religião e Sociedade. Rio de Janeiro, v. 21, n. 1, p. 87-119, 2001.

HEMPTON, David. Methodism: empire of the spirit. New Haven; London: Yale University
Press, 2005.

HOLLENWEGER, Walter J. The pentecostals: the charismatic movement in the churches.


Minneapolis: Augsburg Publishing House, 1972.

IZECKSOHN, Vitor. Estados Unidos: uma história. São Paulo: Contexto, 2021.

KAY, William K. Pentecostalism: a very short introduction. New York: Oxford University
Press, 2011.

KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio
de Janeiro: Contraponto; Ed. PUC-Rio, 2006.

LAMBERT, Frank. “Pedlar in divinity”: George Whitefield and the Great Awakening (1737-
1745). Journal of American History, v. 77, n. 3, p. 812-837, 1990

LINEBAUGH, Peter; REDIKER, Marcus. A hidra de muitas cabeças: marinheiros, escravos,


plebeus e a história do Atlântico revolucionário. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo brasileiro. 2ª ed.


São Paulo: Loyola, 2005.

MARSDEN, George M. Religion and American culture. 2ª ed. Harcourt College Publishers,
2001.

MARSDEN, George M. A breve vida de Jonathan Edwards. São Paulo: Fiel, 2015.

MARTIN, David. Tongues of fire: the explosion of Protestantism in Latin America. Oxford;
Cambridge: Blackwell, 1990.

MENDIOLA, Kelly Willis. The hand of a woman: four holiness-pentecostal evangelists and
American Culture (1840-1930). Tese de Doutorado, University of Texas – Austin, 2002.

MENDONÇA, Antonio G. Evolução histórica e configuração atual do protestantismo no Brasil.


In. MENDONÇA, Antonio Gouvea; VELASQUES FILHO, Prócoro. Introdução ao
protestantismo no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Loyola, 2002.

MENDONÇA, Antônio Gouvêa. Evangélicos e pentecostais: um campo religioso em ebulição.


In: TEIXEIRA, Faustino; MENEZES, Renata (Orgs.). As religiões no Brasil: continuidades e
rupturas. Petrópolis: Vozes, 2006. p. 98-110.

MILLER, Donald E.; YAMAMORI, Tetsunao. Global pentecostalism: the new face of
Christian social engagement. Los Angeles/Berkeley: University of California Press, 2007.

MOLTMANN, Jürgen. O espírito da vida: uma pneumatologia integral. Petrópolis: Vozes,


1998.
PARHAM, Charles Fox. The everlasting gospel. Baxter Springs: Apostolic Faith Bible
College, s/d.26

PETERS, Shawn Francis. When prayer fails: faith healing, children and the law. New York:
Oxford University Press, 2008.

PIERUCCI, Antônio Flávio. Religião como solvente: uma aula. Novos Estudos (CEBRAP),
n. 75, p. 111-127, 2006.

REED, Harold William. The growth of a contemporary sect-type institution as reflected in


the development of the Church of the Nazarene. Tese de Doutorado (Teologia). University
of Southern California, 1943.

REILY, Duncan Alexander. História documental do protestantismo no Brasil. 3ª ed. São


Paulo: Aste, 2003.

ROSAS, N. Dominação evangélica no Brasil: o caso do grupo musical Diante do Trono.


Contemporânea – Revista de Sociologia da UFSCAR, São Carlos, v. 5, n. 1, p. 235-258,
2015.

SANCHIS, Pierre. O repto pentecostal à “cultura católico-brasileira”. In: ANTONIAZZI,


Alberto et al. Nem anjos nem demônios: interpretações sociológicas do pentecostalismo. 2ª
ed. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 34-63.

SCOFIELD, Cyrus I. (Ed.). The Scofield Reference Bible. New York: Oxford University
Press, 1967. [A primeira versão da Bíblia de Estudo Scofield foi publicada nos Estados Unidos
em 1909, sendo reeditada em 1917 e 1967].

SIEPIERSKI, Paulo. Pós-pentecostalismo e política no Brasil. Estudos Teológicos, v. 37, p.


47-61. 1997.

SIEPIERSKI, Paulo. Contribuições para uma tipologia do pentecostalismo brasileiro. In:


GUERRIERO, Silas (Org.). O Estudo das Religiões: Desafios contemporâneos. 2ª ed. São
Paulo: Paulinas, 2004, p. 71-88.

SILVA, Vagner Gonçalves da. Neopentecostalismo e religiões afro-brasileiras: significados do


ataque aos símbolos da herança religiosa africana no Brasil contemporâneo. Mana, v. 13, n. 1,
p. 207-236, 2007.

SPLITTER, Russell R. Are Pentecostals and Charismatics Fundamentalists? A Review of


American Uses of These Caregories. In. POEWE, Karla (Ed.). Charismatic Christianity as a
Global Culture. Columbia: University of South Carolina Press, 1994. (p. 103-116)

STROZIER, Charles B. Apocalypse: on the psychology of fundamentalism in América.


Eugene, Wipf and Stock Publishers, 2002.

26
Esse texto, muito provavelmente, foi escrito por Parham em 1911, mas não temos como confirmar tal data. Na
cópia consultada de The Everlasting Gospel, não conseguimos identificar a data da publicação da edição. No
prefácio escrito pelo filho de Parham, Robert L. Parham, é dito que o texto foi escrito em 1911 e que “estamos
agora em meio à Segunda Guerra Mundial”. Então, crê-se ser uma edição publicada entre 1939 e 1945. Entretanto,
ao analisar a obra, é possível perceber a presença de textos de Parham que tratam de episódios ocorridos após
1911. Possivelmente, trata-se de uma coletânea de textos escritos por Parham em diferentes períodos de sua vida
VOGEL, Dan; DUNN, Scott C. “The tongue of angels”: glossolalia among Mormonism’s
founders. Journal of Mormon History, v. 19, n. 2, p. 1-34, 1993.

Você também pode gostar