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A Manutenção está na linha de tiro da crise econômica, o abandono dos investimentos em manu-

tenção já é realidade. A desistência da busca pela confiabilidade ocorre, juntamente com o com-
pleto desmoronamento das estratégias deste importante setor. O Fim da Manutenção!

Um giro de 180º nas estratégias de manutenção, ocasionado pela crise econômica mundial. Ape-
sar das 10 grandes crises que acometeram o Brasil nos últimos 30 anos, essa é diferente.

Tão diferente, que se tornou igual.

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O conteúdo a seguir tem como objetivo alertar profissionais da área de manutenção sobre as
implicações de como uma crise econômica sem precedentes pode afetar seus empregos, seus
negócios e no seu bolso, bem como, de forma prática, trazer o passo a passo do que fazer para se
blindar desses potenciais desdobramentos.

“Caro Gestor,
a manutenção acabou!’’

O ideal de um setor que era sustentado pela busca incessante pela disponibilidade e confiabilida-
de dos ativos, pela garantia da segurança nas instalações e uma corrida pela redução dos custos
chegou ao fim, assim como não existe mais qualquer expectativa de investimentos no setor, ou
de implantação de novas tecnologias, contratações e melhorias nos processos. Não há mais qual-
quer um desses elementos na pauta da alta direção.

A velha forma de fazer manutenção, o famoso “quebra-conserta”, apagando incêndios em um


ambiente de trabalho 100% reativo, mais uma vez, prevaleceu. A manutenção se tornou persona
non-grata. Mais uma vez, após abalos econômicos, foi a primeira a ter a sua “Função Estratégica”
descartada e passou a ser encarada como penduricalho, centro de custo e que não dá retorno.
Estamos diante de um dilema em que resta saber se vamos ter um fim terrível, ou seja, um cená-

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rio de demissões em massa e uma pulverização do setor ou um terror sem fim, um setor que se
arrasta com doses homeopáticas de sofrimento.

Inicia agora, uma nova era para a manutenção. A era do retrocesso.

A evolução da manutenção vinha caminhando desde meados de 1950, após a segunda revolução
industrial. Até 1950, manutenção era simplesmente o ato de consertar. A manutenção era lembra-
da apenas quando alguma coisa quebrava.

A glória do homem de manutenção era colocar uma linha de produção de volta à operação, após
um longo período de pane. E por mais que isso tivesse custado alguns milhões ao caixa da em-
presa, era disso que ele se orgulhava. Após a segunda guerra mundial, a demanda por produtos
dos mais diversos tipos cresceu muito. No entanto, ao mesmo tempo, a oferta de mão de obra
industrial caiu. A produtividade tornou-se um foco. E a mecanização aumentou.

Na década de 50, máquinas cada vez mais complexas estavam em uso em quase todas as indús-
trias. A indústria como um todo passou a depender das máquinas e à medida que essa depen-
dência cresceu, tornou-se mais importante reduzir o tempo de inatividade do equipamento. ‘A
Manutenção Corretiva’ não era mais uma opção. Dessa forma, a manutenção preventiva começou
a ser introduzida no ambiente industrial.
Iniciada no ambiente aeronáutico e direcionada ao ambiente industrial, a manutenção preventiva
seguia com foco na prevenção de falhas de equipamentos e assim, surgiu a ideia de que as falhas
poderiam ser evitadas com a manutenção certa no momento certo. Em outras palavras, a indús-
tria mudou da manutenção de avarias para a manutenção preventiva baseada no tempo. As revi-
sões ou substituições em intervalos fixos para evitar falhas tornaram-se normas. Essa abordagem
de manutenção preventiva é conhecida como Manutenção de Segunda Geração.

Entre as décadas de 1960 e 1970, nasceu a terceira geração da manutenção originada na indústria
da aviação. Após a Segunda Guerra Mundial, as viagens aéreas tornaram-se amplamente acessí-
veis. O número de passageiros cresceu rapidamente. Em 1958, a Federal Aviation Administration
(FAA) passou a se preocupar com a confiabilidade das aeronaves e segurança dos passageiros.

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Na época, o pensamento dominante era que os componentes tinham uma vida específica e que
esses componentes iriam falhar após atingir uma certa “idade”. Substituir os componentes antes
que eles atingissem essa idade evitaria falhas. Pelo menos, assim que os profissionais da época
imaginavam que seria.
Nas décadas de 1950 e 1960, a revisão básica do motor de uma aeronave acontecia a cada 8.000
horas. Porém, quando o setor se deparou com um número crescente de falhas, a conclusão foi
fácil. Obviamente, a idade do componente deveria ser inferior às 8.000 horas que estavam sendo
presumidas. Portanto, a manutenção deveria ser feita antes disso. O tempo entre as revisões foi
reduzido.
Mas aumentar a quantidade de manutenções preventivas teve três resultados muito inesperados.
Resultados que viraram o mundo da manutenção de cabeça para baixo.
Em primeiro lugar, diminuiu a ocorrência de algumas falhas. Isso era exatamente o que todos
esperavam que acontecesse. Até aí, tudo estava dentro do planejado.
O segundo resultado foi que um número maior de falhas ocorreu com a mesma frequência de an-
tes. Isso não era esperado e causou espanto na equipe. O terceiro resultado foi que a maioria das
falhas ocorreu com mais frequência.
Em outras palavras, mais manutenção leva a mais falhas. Isso era contra-intuitivo para a época
e foi um choque para o sistema. Ali nascia a manutenção centrada na confiabilidade, também
conhecida como RCM, do inglês, Reliability Centered Maintenance.
A terceira geração da manutenção aproveitava o trunfo da chegada da robótica, comandos lógicos
programáveis e da informática para modernizar a manutenção. Os primeiros registros do que viria
a ser a manutenção centrada na confiabilidade, aconteceram em 1968. Fruto de uma força tarefa
entre a FAA (Federal Aviation Administration) e engenheiros das companhias com o objetivo de
encontrar a melhor solução para o alto número de falhas através do desenvolvimento de progra-
mas de manutenção. Essa força tarefa foi chamada de MSG-1 - Maintenance Steering Group 1. Ou
seja, grupo de direcionamento da manutenção.
Após analisar um histórico com 12 anos de dados de operação e manutenção, o MSG concluiu
que as revisões programadas, ou seja, a manutenção preventiva com base no tempo teve pouco
ou nenhum efeito na confiabilidade ou segurança das aeronaves. Isso foi evidenciado no relatório
final e produto dessa análise intitulado como “Maintenance Evaluation and Program Develop-
ment”, publicado no dia 10 de julho de 1968 e foi escrito especificamente para o Boeing 747-100.

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Através das novas diretrizes de manutenção propostas pelo MSG-1, ficou claro que a manutenção
preventiva com base no tempo não era a estratégia mais eficiente em relação a confiabilidade,
disponibilidade e segurança da aeronave. Além disso, o custo desse tipo de atividade era altíssi-
mo. Para se ter ideia, quando a aeronave Douglas DC-8, atingia 20.000 horas de vôo, ela já tinha
consumido 4 milhões de homem-hora em serviços de manutenção.

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O Boeing 747, dentro das mesmas 20.000 horas de vôo, consumiria 66.000 homem-hora em
serviços de manutenção, adotando as diretrizes do MSG-1.

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Isso significava uma redução de 98,35% nos custos ligados a mão de obra de manutenção dado
pela adoção de duas estratégias de manutenção indicadas no MSG-1:

1. Hard-Time
2. On-Condition

Hard-time são substituições preventivas baseadas no tempo de operação (dado em dias, horas,
ciclos, km’s, etc).

On-condition consiste na coleta dos tempos até a falha dos componentes e na análise dos dados
de vida, chamada também de LDA. Com base nos LDA’s é possível definir o melhor intervalo para
as atividades de manutenção.

Você deve estar se perguntando: “Ok, legal.. Mas eu não trabalho com aeronaves! Trabalho com

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indústria! O que eu tenho a ver com isso?!”

Calma que você irá entender!

Em 1970, surgiu o MSG-2. O MSG-2, além da Boeing, várias outras companhias aéreas aderiram e
surgiu uma nova estratégia de manutenção, o chamado CM - Condition Monitoring.

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O Condition Monitoring consiste na adoção de inspeções programadas para determinar o estado
de operação dos componentes e monitorá-los para encontrar o melhor período de substituição de
acordo com a sua condição.

Em 1973, a ATA - Air Transport Association iniciou uma nova força tarefa para melhorar o MSG-2,
dando início ao MSG-3.

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O MSG-3 nascia com dois propósitos claros:

Separar os itens que representavam riscos de segurança dos riscos econômicos;


Definir os tratamentos adequados para as falhas ocultas.

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Dessa forma, o número de inspeções aumentou e o número de intervenções invasivas, como
substituições preventivas com base no tempo, caíram. Assim, se produziram padrões de seguran-
ça ainda mais elevados e reduziram os efeitos de mortalidade infantil dos componentes provoca-
dos por manutenções excessivas.

Também em 1978, dois engenheiros da United Airlines, Stanley Nowlan e Howard Heap, elabo-
raram o estudo AD-A066-579 que evidenciou uma metodologia de engenharia de manutenção
rigorosa, de forma que as atividades de manutenção maximizaram a segurança e confiabilidade
das aeronaves, minimizando os custos e tempo de inatividade.

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Essa abordagem ganhou o nome de Manutenção Centrada na Confiabilidade e revolucionou a
forma que a manutenção era feita na indústria aeronáutica, usinas nucleares, ambientes aeroes-
paciais e até que ganhou uso comercial em indústrias comuns.

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Nowlan e Heap provaram que todos estavam errados quando acreditavam que a manutenção
preventiva aumentava a confiabilidade dos sistemas. Um dos pressupostos básicos da teoria da
manutenção sempre foi que existe uma relação de causa e efeito fundamental entre a manu-
tenção programada e a confiabilidade operacional. Essa suposição foi baseada na crença de que,
como as peças mecânicas se desgastam, a confiabilidade de qualquer equipamento está direta-
mente relacionada à idade operacional. Portanto, quanto mais o equipamento era revisado, mais
protegido ficava contra a probabilidade de falha. O único problema era determinar com exatidão
os intervalos de tempo necessários para garantir uma operação confiável.

No caso de aeronaves, também era comumente assumido que todos os problemas de confiabi-
lidade estavam diretamente relacionados à segurança operacional. Entretanto, com o passar dos

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anos descobriu-se que a maioria das falhas não podiam ser evitadas, não importa o quão inten-
sas fossem as atividades de manutenção.

Os projetistas de aeronaves foram capazes de lidar com esse problema, não evitando falhas, mas
evitando que tais falhas afetassem a segurança. Na maioria das aeronaves, as funções essenciais
e críticas são protegidas por recursos de redundância que garantem que, no caso de uma falha, a
função necessária ainda estará disponível em alguma outra fonte.

Apesar da crença consagrada de que a confiabilidade estava diretamente relacionada aos interva-
los entre as revisões programadas, a pesquisa e estudos de Nowlan e Heap com base na no his-
tórico de falhas do Boeing 747 sugeriu que as políticas tradicionais de manutenção preventiva era,

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além de cara, ineficazes e ineficientes no controle das taxas de falhas.

O motivo disso é que para muitos itens a probabilidade de falha não aumentava de fato com o
aumento da idade. Consequentemente, uma política de manutenção baseada exclusivamente
com base no tempo de operação teria, independentemente do limite de idade, pouco ou nenhum
efeito sobre a taxa de falha.

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Com base no histórico de falhas do 747, Nowlan e Heap definiram que existiam 6 padrões de
falhas comuns e característicos, que seriam:

PADRÃO A - Curva da Banheira: Sem sombra de dúvidas é o padrão mais popular entre profis-
sionais de manutenção, mesmo representando apenas cerca de 4% dos casos. Composta de três
fases, sendo: mortalidade infantil, período de vida útil e fim de vida útil.

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PADRÃO B - Aumento lento da taxa de falhas com zona de desgaste: Basicamente, existe um
ponto de vida útil e uma exponencialidade da taxa de falhas ao fim da vida útil. Esse padrão re-
presentou 2% dos componentes analisados.

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PADRÃO C - Envelhecimento lento: segundo após segundo, minuto após minuto, ciclo após ciclo,
metro após metro, o componente se desgasta ao passo que o equipamento opera. Esse padrão
representou 5% dos componentes analisados.

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PADRÃO D - Taxa de falhas com crescimento lento e aleatório: 7%

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PADRÃO E - Taxa de falhas totalmente aleatórias: 14%

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PADRÃO F - Mortalidade Infantil seguida de aleatoriedade: 68%

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Ou seja, após o estudo ficou provado que 89% dos componentes analisados possuem padrões
de falhas que não estão ligadas ao tempo de operação ou idade dos equipamentos. Ou seja, são
falhas aleatórias.

Apenas 11% dos componentes possuíam padrões de falhas que estavam ligadas ao tempo e que
poderiam ser tratadas com a manutenção preventiva de forma eficiente.

Ali nascia a manutenção preditiva. Os softwares de manutenção também estavam prestes a sur-
gir, ainda de forma embrionária.

Nessa época, a manutenção dava o seu maior salto de performance e começou a viver sua época
de ouro. Predizer falhas ainda em estágio inicial e programar o melhor momento para se realizar
intervenções passou a ser possível. Através de curvas de tendência o gestor de manutenção tinha
o poder de ter uma bola de cristal nas mãos. Já era possível monitorar as condições básicas dos
equipamentos e intervir apenas quando, de fato, fosse necessário, aumentando a disponibilidade

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dos ativos, garantindo a confiabilidade e tudo isso ao menor custo já visto. As coisas foram avan-
çando até a chegada da chamada “quarta revolução da manutenção”.

Em 2011, o termo Indústria 4.0 foi apresentado publicamente pela primeira vez. Partindo de um
grupo de representantes de diferentes áreas (como empresários, políticos e acadêmicos) em uma
iniciativa para aumentar a competitividade da indústria alemã frente ao mundo.

O governo federal alemão adotou a ideia em sua Estratégia de Alta Tecnologia para 2020. Poste-
riormente, um Grupo de Trabalho foi formado para aconselhar ainda mais sobre a implementação
da quarta revolução industrial.

Enquanto a primeira revolução industrial foi marcada pela mecanização através da energia da

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água e do vapor; A segunda revolução industrial foi marcada pelo ganho de velocidade obtido pela
energia elétrica. A terceira revolução foi marcada pela automação dos processos através da chega-
da da informática; a quarta revolução industrial seria marcada pela autonomia dos processos.

Entrávamos na era dos Ciber-físicos. Sistemas Ciber-físicos compreendem máquinas inteligentes,


sistemas de armazenamento e instalações de produção capazes de trocar informações de for-
ma autônoma, disparar ações e controlar uns aos outros de forma independente. Cada máquina
passou a ter vida e decidir o que é melhor não só para ela, mas para o processo como um todo e
isso se tornou possível pela chegada e aprimoramento de 9 tecnologias que trabalham de forma
integrada. São elas:

• O Big Data e analytics;


• Robôs autônomos colaborativos;
• Realidade aumentada;
• Integração de sistemas;
• Manufatura aditiva;

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• Cybersegurança;
• Nuvem de dados;
• iIoT;
• Industrial Internet of Things;

Estudos do Boston Consulting Group projetaram que a implantação e integração dessas tecnolo-
gias seriam capazes de trazer ganhos extraordinários para a indústria, como por exemplo:

• Redução de até 50% dos custos operacionais;


• Redução dos custos de manutenção entre 10 e 40%;
• Redução do Consumo de Energia entre 10 e 20%;
• Aumento de eficiência de 10 a 25%;

Além de um aumento da produtividade industrial na ordem de 90 a 150 bilhões de euros até


2025. É claro que esses números chamaram a atenção e o termo “Indústria 4.0” virou moda.

Na manutenção, não poderia ser diferente. Diversas soluções e promessas quase que milagrosas
começaram a aparecer e encher os olhos dos gestores de manutenção, como sensores, sistemas,
softwares e penduricalhos que prometiam reduzir o índice de corretivas, aumentar a produtivida-

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de da mão de obra, reduzir custos, entre outros. Foi aí que a manutenção começou a morrer!

Deixou-se de analisar e tratar as causas para tentar minimizar aquilo que era apenas as conse-
quências. Consequências da falta de métodos bem definidos, processos testados e validados e
pessoas bem treinadas e orientadas.

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