O documento discute como o necropoder usa o desaparecimento forçado para governar através da dessubjetivação. Isso é feito por meio da produção do cadáver desconhecido, removendo a vítima dos referenciais espaço-temporais e identidade. Historicamente, certos corpos são construídos como não humanos e passíveis de violência e extermínio. No Brasil pós-1964, o desaparecimento forçado se consolidou como nova racionalidade necropolítica, inspirando-se em técnicas estr
O documento discute como o necropoder usa o desaparecimento forçado para governar através da dessubjetivação. Isso é feito por meio da produção do cadáver desconhecido, removendo a vítima dos referenciais espaço-temporais e identidade. Historicamente, certos corpos são construídos como não humanos e passíveis de violência e extermínio. No Brasil pós-1964, o desaparecimento forçado se consolidou como nova racionalidade necropolítica, inspirando-se em técnicas estr
O documento discute como o necropoder usa o desaparecimento forçado para governar através da dessubjetivação. Isso é feito por meio da produção do cadáver desconhecido, removendo a vítima dos referenciais espaço-temporais e identidade. Historicamente, certos corpos são construídos como não humanos e passíveis de violência e extermínio. No Brasil pós-1964, o desaparecimento forçado se consolidou como nova racionalidade necropolítica, inspirando-se em técnicas estr
QUESTÃO 01) SE O NECROPODER MELANCOLIZA PARA PODER GOVERNAR, DESCREVA,
ENTÃO, COMO OS DISPOSITIVOS NECROGOVERNAMENTAIS DO DESAPARECIMENTO
PRODUZEM DESSUBJETIVAÇÕES E QUAIS OS EFEITOS ONTOLÓGICOS DA DESREALIZAÇÃO DO OUTRO.
Compreender a necropolítica, termo criado por Achille Mbembe, se baseia no
entendimento de que se trata do uso do poder político e social, especialmente por parte do Estado, de forma a determinar, por meio de ações ou omissões (gerando condições de risco para alguns grupos ou setores da sociedade, em contextos de desigualdade, em zonas de exclusão e violência, em condições de vida precárias), quem pode permanecer vivo ou quem deve morrer. Dessa forma, o necropoder entra em estado de melancolia objetivando o poderio governamental e para isso utiliza alguns dispositivos de desaparecimento para dessubjetivar às pessoas acerca do entendimento de morte. Inicialmente, o que se busca é a culminância da produção do cadáver desconhecido. Para produzí-lo, muitos fatores são expostos a fim de provocar uma progressiva perda dos referenciais espaçotemporais, da identidade e dos princípios de organização do comportamento. Para Suely Aires ( AIRES, S. 2018 ), histórica e politicamente é construída certa inteligibilidade, modos de reconhecer quais corpos e vidas são humanos. Ou seja, uma vida tem que ser inteligível como uma vida humana, tem de ser apreendida segundo certas regras ou normas que preparam o caminho para a aceitação de seu valor de vida a ser preservada. Retirados desse enquadramento, alguns corpos serão expostos à morte, conduzidos à morte, sem que sequer haja a admissão de que ali houve um assassinato, uma morte humana. Pura e simples eliminação do vivo. Para que uma vida seja deslegitimada como humana, diferentes procedimentos se articulam: a animalização, a objetalização, a abjeção, a construção de um inimigo mostram-se como recursos de grande impacto. Como bicho ou coisa se designa algo que já não mais se encontra sob o registro do humano, do semelhante. Não há qualquer vínculo comum entre o eu e o ele; ou entre o eu e o isso, que sequer pode ser claramente nomeado. Sem admissão da humanidade em jogo, abre-se o campo para a violência e o extermínio. Esses diferentes modos de exclusão do registro da humanidade inserem tais corpos e vidas em outra inteligibilidade, transformando-os discursivamente em vidas destrutíveis em potencial e corpos marcados para morrer. Segundo o livro, ao forçar um desaparecimento, o objetivo era ocultar dissidentes políticos, dissimular a execução sumária e conquistar a adesão da população por meio da gestão de seus afetos. Isso leva à invisibilização de si mesmos às últimas consequências em que buscarão alcançar uma dupla ausência: deles mesmos e de seus efeitos. Dessa forma, os centros clandestinos de detenção, tortura e extermínio existentes em todas as ditaduras latino-americanos, aos quais podemos acrescentar as sepulturas clandestinas, individuais ou coletivas, existiam “no discurso social da época da ditadura– quando muito– só na forma de um ‘espaço em branco’, de ‘segredo lúgubre’ou de ‘buraco negro’”. QUESTÃO 2) DESCREVA, COM BASE NA OBRA, DE QUE MANEIRA O DESAPARECIMENTO FORÇADO SE CONSOLIDOU COMO UMA NOVA RACIONALIDADE NECROPOLÍTICA NO BRASIL PÓS-1964. Após a chamada redemocratização do Brasil, cujo marco foi a promulgação da Constituição de 1988, essa guerra continuou, envolveu novos atores, voltou-se para outros alvos, uniu forças com as estruturas administrativas e legais instaladas previamente, aprimorou técnicas e estratégias bélicas, e se consolidou como a versão brasileira e avant la lettre do que Bernard Harcourt identificou nos Estados Unidos pós- 11 de Setembro como “um novo modo de governar inspirado pela teoria e prática da guerra de contrainsurgência”,¹ que opera permanentemente, quer haja uma insurgência ou revolução quer não. No Brasil, a inspiração para esse novo modo de governar, atesta Malhães, veio de fora e resultou numa profunda mudança na lógica carcerária até então predominante. Não que as prisões tenham sido abandonadas– isso a superpopulação carcerária no país não nos permitiria supor–, mas, a partir desse ensinamento estrangeiro, o dispositivo carcerário passou a se orientar por outra lógica: o desaparecimento.