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COLÉGIO ESTADUAL DE PLANALTO - CEP Série: 3º ano

Disciplina: Filosofia / Professor: Agnaldo Machado Jr. Turma:


Aluno (a): Turno: FILOSOFIA

A Necropolítica

O historiador e filósofo camaronês Joseph-Achille Mbembe parte do conceito de Biopoder para


desenvolver uma nova abordagem sobre o poder e a política contemporânea. Ele cunhou os termos
necropolítica e necropoder para designar os regimes, sistemas ou técnicas de poder baseados em
políticas relacionadas à morte, os quais vigoram especialmente no Estado de Exceção (Ditadura /
Regime autoritário) ou Estado de Sítio (situação emergencial ou de crise).
Foucault havia refletido sobre o uso do biopoder para justificar as políticas relacionadas à
morte, como as praticadas nos regimes totalitários, nas guerras, nas ações de extermínio dos
inimigos externos e internos, nas colonizações etc. Como um Estado, que tem o objetivo central de
fazer viver, poderia utilizar a morte como um aparato desse poder? Foucault encontra essa
justificação no Racismo.
[...] o racismo vai permitir estabelecer, entre a minha vida e a morte do outro, uma relação que não é
uma relação militar e guerreira de enfrentamento, mas uma relação do tipo biológico [...] a morte do outro,
a morte da raça ruim, da raça inferior (ou do degenerado, ou do anormal), é o que vai deixar a vida em
geral mais sadia; mais sadia e mais pura. [...] A raça, o racismo, é a condição de aceitabilidade de tirar a
vida numa sociedade de normalização. (FOUCAULT, Michel. Em defesa da sociedade. São Paulo:WMF Martins
Fontes, 2010. p. 215.)
Mbembe concorda com o filósofo francês: o racismo é também uma tecnologia destinada a
permitir a morte de uns para a continuidade de outros. No entanto, a noção de biopoder não é
suficiente para compreendermos as diversas formas de submissão da vida ao poder da morte nas
sociedades contemporâneas.
Mbembe utiliza inúmeros exemplos de Estados necropolíticos, como o nazista e o fascista, mas
também eventos e sistemas que teriam prenunciado o necropoder, como as plantations e a situação
dos indígenas e africanos escravizados nas colônias, nas quais era permitido o estado de violência
permanente em nome da “civilização”. Mas, para ele, a forma mais bem-sucedida de necropoder
contemporâneo seria a ocupação colonial da Palestina, onde, além das mortes, houve fragmentação
territorial, para facilitar a vigilância, a reclusão e o controle. Isso incluiu ainda técnicas de
inabilitação do inimigo – sabotagem sistemática da rede de infraestrutura social e urbana;
apropriação dos recursos de terra, água e espaço; demolição de casas, estruturas de transmissão de
energia elétrica, estradas; destruição de hospitais, equipamentos médicos e símbolos culturais.
A ocupação da Palestina evidencia que a necropolítica não está sozinha, mas ligada a um
processo em que diversas formas de poder se misturam: o disciplinar (divisão e confinamento), o
biopolítico (controle sobre a vida) e o necropoder (controle sobre a morte).

O Necroestado
“O Estado brasileiro sempre foi um necroestado. É um Estado de organização da morte, do extermínio,
da espoliação [...] que é a maneira que o Estado tem de lembrar a uma parcela fundamental da população que
ela não tem nenhuma condição de sujeito, que ela não existe como sujeito. Por isso falar [...] que estamos
perdendo direitos, que nossa democracia está em perigo... Há uma contradição na colocação, porque não é
possível que algo que nunca existiu esteja em perigo.” (Intervenção oral do filósofo brasileiro Wladimir
Safatle no debate Trabalho e os limites da democracia no Brasil. TV Boitempo. Disponível em
<https://www.youtube.com/watch?v=D8HaJXn6Zbs>.Acesso em 16 jun. 2020).
Psicopolítica
Para o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, os conceitos de sociedade disciplinar e biopoder
não consideram uma característica central dos atuais regimes neoliberais, que, antes de tudo,
explorariam a psique humana, buscando internalizar na mente dos indivíduos os ideais relacionados
à produtividade. Por isso, Han cunha o termo de Psicopolítica para nomear as técnicas de poder do
neoliberalismo, que têm nas mídias digitais seu principal suporte.
“A técnica de poder do regime neoliberal assume uma forma sutil. Não se apodera do indivíduo de
forma direta. Em vez disso, garante que o indivíduo, por si só, aja sobre si mesmo de forma que reproduza o
contexto de dominação dentro de si e o interprete como liberdade.” (HAN, Byung-Chul. Psicopolítica: o
neoliberalismo e as novas técnica de poder. Belo Horizonte: Âyiné, 2018. p. 44.)
Produtividade, desempenho e eficácia são noções internalizadas, mas que podem ser
quantificadas. O sujeito se autoimpõe jornadas de trabalho cada vez mais intensas e metas mais
ambiciosas, de tal maneira que a linha divisória entre o trabalho e a vida se perde. Há uma espécie
de autoexploração que serve ao sistema neoliberal. Além disso, o indivíduo “empreendedor” age
como se fosse sujeito de seu destino, cujas ações visam concretizar uma vida de sucesso, um projeto
cujo êxito depende apenas dele.
No entanto, trata-se de um novo tipo de sociedade de controle com base em uma ilusão de
liberdade. O indivíduo se sente livre, mas todos os seus passos, comportamentos e desejos são
controlados por meio dos dados virtuais que ele, voluntariamente, oferece às grandes empresas e
aos governos quando utiliza os produtos e serviços tecnológicos. Ao mesmo tempo, como já vimos,
quem detém esses dados os usa comercial e politicamente, induzindo suas decisões em diversas
instâncias. O controle da sociedade neoliberal é muito mais intenso e preciso do que o da sociedade
disciplinar, que é restrito às instituições fechadas.

A política está morrendo?


O escritor bielorrusso Evgeny Morozov chama a atenção para mais uma consequência da lógica
informacional nas sociedades contemporâneas: a tendência de tratar os problemas como questões
informacionais, solucionáveis por meio das técnicas da informação e de aplicativos. De acordo com
Morozov, isso leva a uma descontextualização social, econômica, política e histórica do problema
em pauta.
Dessa maneira, as causas reais não são enfrentadas, e tenta-se, ilusoriamente, resolver os
conflitos tratando apenas de seus efeitos. Segundo o escritor, houve também uma ampliação do
gerenciamento algorítmico dos problemas – com base em cálculos e análise de dados – relativos a
saúde, educação, fome, pobreza etc., o que ocasiona o esvaziamento da política, isto é, do debate e
da tomada de decisões que não se restringem às soluções técnicas.
Doc. As reflexões de Morozov instigam uma pergunta que ainda não tem resposta definitiva, mas
que se apresenta como uma questão desafiadora para pensarmos o futuro próximo: o crescimento do
poder tecnológico seria o caminho para o fim da política e da liberdade?

Questões para reflexão:

1. Em linhas gerais, o que você entende sobre Necropolítica?

2. De que forma o filósofo Michel Foucault justifica no racismo, o uso do biopoder para justificar
as políticas relacionadas à morte?
3. Quais seriam os alvos do Necropoder?

4. Você concorda com a posição do filósofo brasileiro Wladimir Safatle, que afirma que o Brasil é
um necroestado? Justifique sua resposta:

5. Explique de que maneira a Psicopolítica atua como novo tipo de sociedade de controle, no
regime neoliberal:

6. O que significa a “morte da política”, segundo a visão de Morozov?

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