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Doutrina Militar GUERRA HÍBRIDA – Breve Ensaio.
GUERRA HÍBRIDA – Breve Ensaio.
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Criméia, Março 2014. Pretensos rebeldes, mas pelo armamento e fardamento acreditase que sejam
forças militares russas operando. Uma característica da Guerra Híbrida; Quem afinal está Lutando?
A possibilidade do conflito contínuo com combates pouco definidos no tempo e no espaço,
disputado em diferentes níveis por um conjunto de forças nacionais e subnacionais indica
que é provável que... a guerra... passe de uma divisão nítida a categorias indistintas.
Michael Evans. From Kadesh to Kandahar
Naval War College Review, summer, 2003.
Frederico Aranha
Advogado e Historiador
aranha.frederico@gmail.com
Roger Trinquier, Coronel do Exército Francês (originalmente um Colonial – Infantaria da
Marinha Francesa) foi um notável operador de guerra irregular. Em 1953, o
MajorTrinquier era o responsável por todas as operações atrás das linhas inimigas na
Indochina. Comandava mais de 20.000 nativos e regulares franceses do GMI (Groupement
Mixte d’Intervention), engajados em guerra sem quartel às forças comunistas num teatro de
operações de milhares de quilômetros quadrados de território inimigo.
Após o desastre de Dien Bien Phu, a Convenção de Genebra selou o fim da formidável
operação. Proibia à França suprir as forças partisan que permaneciam de qualquer modo
lutando contra as forças comunistas no norte.
No relatório final, Trinquier, amargurado, lamenta a sorte da sua gente: A total supressão do
apoio logístico ... resultará na progressiva liquidação dos nossos elementos (infiltrados).
Não há a menor esperança dos líderes do nosso maquis escaparem da “clemência” do
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Presidente Ho Chi Minh. Após uma estada na França no Centro de Paraquedismo do
Exército é promovido a Tenente Coronel e transferido para a 10ª Divisão de Paraquedistas,
na Argélia, assumindo a área de inteligência da unidade.
O alto comando francês ordenou à Divisão que ocupasse Argel com a missão de limpar a
cidade dos terroristas que infernizavam a vida dos cidadãos e desestabilizavam a
autoridade, praticando atentados com bombas, assassinatos seletivos, sequestros e
extorsão. Trinquier planeja, organiza e opera o desmantelamento de toda a estrutura da
FLN (Front Nationale de Libération) na cidade, mediante o emprego (também) de métodos
não convencionais de investigação e operação policial (entre eles tortura e ações de caça e
extermínio).
Essa operação ficou plasmada em relatórios, estudos acadêmicos e militares, livros e filmes
como A Batalha de Argel. Apesar do amplo sucesso da ofensiva, erradicando o problema, o
destino da Argélia já estava traçado. De Gaulle apenas bateu o martelo da independência
da colônia. Com base na sua intensa experiência de guerra irregular, identificou uma
dicotomia entre a guerra praticada até a IIª GM, a que chamou deguerre traditionale, e a
surgida posteriormente – guerra subversiva ou guerra revolucionária – a que
denominou guerre moderne.
Explica: (...) Difere (esta) fundamentalmente da guerra do passado, pois a vitória não resulta
do choque de dois exércitos no campo de batalha. Essa confrontação, que em tempos
passados ocasionava a aniquilação do exército inimigo em uma ou mais batalhas, não mais
subsiste. A guerra é agora um sistema articulado de ações – política, econômica,
psicológica, militar – que visa a derrubada da autoridade estabelecida no país e sua
substituição por outro regime. Conhecia como ninguém a doutrina revolucionária de Mao
Tse Tung, pois não só lutara contra os adeptos dela como até a adotara no comando de
forças irregulares. Podese dizer que praticou embrionariamente a chamada Guerra Híbrida.
Outro inovador, o teórico militar israelense Martin van Creveld prognosticou nos idos de
1980 que o conflito convencional entre forças regulares de NaçõesEstado declinaria em
freqüência ao passo que conflitos de baixa intensidade, levados a cabo por guerrilhas,
milícias religiosas, grupos terroristas e pelo crime organizado cresceriam de forma
exponencial no mundo em desenvolvimento.
Suas previsões materializaramse nas últimas décadas, resultando num desafio direto à
ortodoxia dos sistemas militares ocidentais fundados no pensamento de Clausewitz.
Salientese que o mestre prussiano passou ao largo das Guerras Medievais ao formular sua
doutrina. Considerou que foram conflitos de NãoEstados caracterizados pela participação
de exércitos de senhores da guerra, de facções religiosas, mercenários e de bandos de
criminosos, ausentes, portanto, o Estado e exércitos nacionais. Na visão ortodoxa
de Clausewitz o exame dessas guerras não tinha lugar reservado nas grandes questões
que sobressaltavam e afligiam estadistas e estrategistas na era pósNapoleão Bonaparte,
período conturbado de transição da história política e militar universal. De fato, a Idade
Média presenciou, levando em conta os degraus históricos que os separam, conflitos
manifestamente assemelhados aos do cotidiano de hoje em dia.
São incontáveis as interpretações de especialistas buscando caracterizar a cognominada
Guerra Híbrida: Nathan Freier do CSIS (Center for Strategic and International Studies),
supostamente criador do termo, resume a Guerra Híbrida em quatros ameaças:
(1) tradicional ou convencional;
(2) irregular;
(3) terrorismo catastrófico e,
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(4) caos.– proporcionando campo aos ativistas para explorar a melhor tecnologia visando
contra atacar a superioridade militar.
O Tenente Coronel David Kilcullen (Australian Army, Ret.), conselheiro do Departamento de
Defesa Americano e assessor do Gen. David Petraus, antigo Comandante Supremo no
Iraque e no Afeganistão, classifica “Guerra Híbrida” como a melhor definição para os
conflitos modernos, abrangendo uma combinação de guerra irregular, terrorismo e crime
organizado para alcançar objetivos políticos.
Amanda Paul, jornalista investigativa turca de nomeada, afirma que a operação de
ocupação e anexação da Criméia é o mais recente exemplo de Guerra Híbrida:
(...)Começou com a presença em Fevereiro de 2014 dos ‘little green men’ na península,
homens fortemente armados sem insígnia e identificação. Espraiaramse e tomaram pontos
chave da infraestrutura, pavimentando o caminho para a separação da Criméia. Na ocasião,
Putin, questionado, insistiu que se tratava de ‘forças de autodefesa locais’. Mais tarde, após
a anexação, admitiu que tropas russas estavam envolvidas na operação. A expressão little
green men é um eufemismo de active intelligenceempregada pelos soviéticos para
abertamente cognominar grupo de irregulares (na verdade regulares) comandados e
patrocinados secretamente pelo Estado.
O primeiro registro do termo se encontra em memorando de Stalin a Molotov datado de 07
de outubro de 1929, se referindo aos grupos armados de tropas soviéticas sem identificação
infiltrados na Manchúria para combater e eliminar as milícias dos Senhores de Guerra
chineses ao longo do eixo da Estrada de Ferro Chinesa do Leste, que a União Soviética por
fim passou a controlar (Letters Stalin Molotov. 1925 1936. Collection of Documents. M.,
"Young Russia", 1995, str.167168).
Ao examinarmos essas e outras definições e evidências, verificamos que todas têm em
comum a mesma raiz: o conflito descentralizado, disperso (mas capaz de se concentrar
rapidamente), caótico e, aparentemente, sem um objetivo estratégico convencional. Na
verdade, a Guerra Híbrida não pode ser entendida e explicada à luz dos pensamentos
político e militar ortodoxos.
O país mais sensível às profundas alterações da estratégia conservadora é os EEUU. De
acordo com o manual National Defense Strategy, melhorar a capacidade das forças
armadas dos Estados Unidos em guerra irregular é a prioridade máxima do departamento
de Defesa. Em artigo na Foreign Affairs, o antigo Secretário de Defesa americanoRobert
Gates declarou enfaticamente que era hora de fomentar algumpensamento não
convencional no Pentágono.
Mas, afinal, o que é a Guerra Híbrida? Podese cogitar de um conflito no qual os atores,
Estado ou NãoEstado, exploram todos os modos de guerra simultaneamente, empregando
armas convencionais avançadas, táticas irregulares, tecnologias agressivas, terrorismo e
criminalidade visando desestabilizar a ordem vigente.
Essas atividades multimodais podem se realizar por meio de unidades operacionais
separadas embora capazes de serem dirigidas e coordenadas de forma operacional e tática
no âmbito da batalha principal, de forma a obter efeitos sinergéticos na dimensão física e
dimensão psicológica do conflito. Sem embargo, o Coronel Frank G. Hoffman(USMC, Ret.),
formulador da teoria da Guerra Híbrida, admite que a guerra híbrida não significa a derrota
ou substituição da guerra antiga ou guerra convencional pela nova. Ainda assim, representa
um fator embaraçoso para o planejamento da defesa no século 21.
Enfatiza que ocombate futuro premiará as forças versáteis, ágeis, adaptáveis e de mente
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expedicionária. Se refere, sem dúvida a tropas de elite, forças especiais e congêneres,
unidades vistas com reserva por militares conservadores, o grosso dos altos comandos no
mundo ocidental. A guerra ainda significa aplicar a força cinética, não importa o apelido que
se lhe dê e o meio que se emprega.
A mais recente doutrina naval estadunidense reflete a visão de futuro do comando do Corpo
de Fuzileiros Navais, do Chefe das Operações Navais e do comandante da Guarda Costeira
a respeito: Os conflitos se caracterizam cada vez mais por uma mescla híbrida de táticas
tradicionais e irregulares, planejamento e execução descentralizados e agentes que são
NãoEstado e que utilizam tecnologias simples e as sofisticadas de forma inédita.
A Guerra Híbrida pode ser uma variação moderna do que se chamou guerra composta–
começa com uma força regular e aumenta sua capacidade operacional agregando
atividades irregulares ou viceversa. Na Guerra da Península Ibérica Wellingtonexpulsou os
franceses da Espanha conduzindo uma luta convencional contra os marechais de Napoleão
enquanto empregava as guerrilhas espanholas em ataques à retaguarda francesa. O
Marechal de Campo Allenby operou de igual forma na Palestina contra os turcos na Grande
Guerra, lançando um amplo assalto frontal de armas combinadas ao mesmo tempo em que
irregulares beduínos e árabes, sob o comando de Lawrence da Arábia, infiltravamse nas
linhas interiores turcas, interrompendo comunicações e linhas de abastecimento e
destruindo a infraestrutura.
Mao Tse Thung foi o primeiro a entender a alternância entre técnicas de guerra regular e as
de guerra irregular. O líder chinês deduziu a teoria original da guerra revolucionária como o
emprego de um misto de técnicas de guerra. Estabeleceu que a guerra revolucionária é,
antes de mais nada, política, não militar, e que a primeira fase do conflito sempre envolve
técnicas de guerra irregular. Não obstante, a vitória só será alcançada por meio do combate
regular com forças convencionais. Destarte, sem cunhar o termo, o conceito da Guerra
Híbrida nascia. Ho Cho Min empregoua com sucesso contra japoneses, franceses,
vietnamitas do sul e norteamericanos.
O plano operacional da Guerra Híbrida de que tratamos, inicia com a guerra irregular – as
forças irregulares aumentam sua capacidade com armas convencionais. O termo em si
captura a essência do problema ao definir sua organização e meios. Como já se viu neste
século, essa situação cria um novo nível de ferocidade, combinando o fanatismo da guerra
irregular com a capacidade militar convencional. Um bom exemplo é o Hezbolah na sua luta
contra o Estado de Israel, acionando forças regulares as quais acresce grupos irregulares
aptos a operar armas sofisticadas e atuando de forma independente com comando
descentralizado.
Cenário Operacional Típico da Guerra Híbrida. Iraque 2015.
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Milicianos do Hezbolah em jipes Safir iranianos equipados com lançafoguetes,
deslocandose para Tikrit
Lançafoguetes iraniano de 122 mm; a viatura é um Humwee americano cedido
ao Hezbolah pelo Iraque.
Pode ocorrer também quando uma NaçãoEstado converte suas formações regulares em
combatentes irregulares como fez Saddam com seus fedayens em 2003. Exemplo marcante
é o das forças regulares chechenas do antigo Exército Soviético transformadas em facções
irregulares independentes, agindo em pequenas unidades e impondo derrotas contundentes
ao Exército Russo.
Ron Tira, do Jaffa Center de Israel, observa que os atores híbridos são geralmente imunes
à aplicação da força convencional, como o fazem os EEUU e Israel: empregar o conceito
Schock and Awe e o método operacional de resultados contra uma organização guerrilheira
do tipo Hezbolah, usando força alheia às circunstâncias, aos fatos e à natureza da guerra, é
como tentar quebrar os ossos de uma ameba.
É, talvez, a assimetria moral o maior diferencial no campo de operações da Guerra Híbrida.
Insurgentes taliban, iraquianos e soldados do Hezbolah, entre tantos outros irregulares,
lutam, de um modo geral, por sua terra, sua religião e sua família, e mostram uma
determinação de assumir ações de risco e morrer, o que tem alta significação tática.
O que parece perdido neste e em outros debates em que há empenho constante para
reinventar princípios e teorias de guerra é o fato de ambos terem permanecido constantes,
embora com nuances resultantes do desenvolvimento tecnológico, da ordem e desordem
econômica e política, das ideologias e da alteração do quadro de poder mundial.
O criador e formulador da Teoria da Guerra de Quarta Geração, uma das variantes que
pretende conceituar os conflitos contemporâneos, Coronel Thomas X. Hammes(USMC,
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Ret.), após o 11 de Setembro ponderou a respeito: Não há nada de misterioso com relação
à Guerra de 4ª Geração. Assim como todas as guerras, objetiva alterar a posição política do
inimigo. (...) Como todas as guerras reflete a sociedade de que faz parte. (...) Como todas
as prévias gerações da guerra, evolui em consonância com a sociedade como um todo.
Evolui porque gente prática resolve problemas específicos relacionados com suas metas
políticas e com as lutas contra inimigos mais poderosos. Frente a adversários que não
podem bater empregando a guerra convencional, adotam outra conduta.
O famigerado Tenente–General confederado Nathan Bedford Forrest, considerado por
muitos historiadores militares o mais destacado comandante de cavalaria da Idade
Moderna, tinha razão: Guerra quer dizer lutar e lutar quer dizer matar.
Os denominados paradigmas revolucionários da arte da guerra não podem alterar esta
realidade.
Fontes de Consulta
Bibliografia
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HAMMES, Thomas X. The Sling and the Stone. On War in 21st Century. Minneapolis: Zenith
Press, 2006.
HOFFMAN, Frank. Conflict in 21 st Century. The Rise of Hybrid Wars. Arlington: Potomac
Institute for Policy Studies, 2007 8. Disponível em www.potomacinstitute.org. Acesso em
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KILCULLEN, David. The Accidental Guerrilla: Figthting Small Wars in the Midst of the Big
One. Oxford: Oxford University Press, 2011.
TRINQUIER, Roger. Modern Warfare. A French View of Counterinsurgency. London: Pall
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VAN CREVELD, V. Martin .The Transformation of War. New York: Free Press, 1991.
Enlaces eletrônicos
http://www.dtic.mil/cgibin/GetTRDoc? AD=ADA514564
http:/www.navy.mil/maritime/MaritimeStrategy.pdf
http://www.civilwarhome.com/natbio.htm
http://www.inss.org.il/
http://www.defense.gov/news/2008 national defense strategy.pdf. 3
http://www.szona.org/gibridnayavoina/
http://www.wsj.com/articles/SB10001424052702303799404579284450431896952
http://jsou.socom.mil/JSOU Publications/JSOU 134_McCulloh,Johnson_Hybrid
Warfare_final.pdf
http://www.todayszaman.com/columnist/amandapaul/thechallengeofhybrid
warfare_375901.html
https://www.marxists.org/reference/archive/mao/works/1937/guerrillawarfare/
A A A
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