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A Xícara de Café

Estava calmamente preparando meu café na madrugada, a chaleira já chiava, a xícara estava na mesa.
Eu fiquei procurando por alguns minutos o pó de café, mas percebi que havia acabado. Eu precisava sair de
casa, sair de casa no meio da madrugada.
Apesar de madrugada calma e da cidade pacata em que eu vivia, ainda tinha medo de algo me
ocorrer durante o percurso, mas a vontade de uma boa xícara de café ainda era maior que meu medo.
Abrir a carteira, peguei o dinheiro necessário, desliguei as luzes, fechei a porta e saí de minha casa.
Fui em direção ao mercado mais próximo, o mais rápido que podia caminhar. Desde casa, me sentindo
observado, mas não deveria passar de uma impressão. 
Estava a duas quadras do meu objetivo, quando escutei sussurros dos becos em que eu estava
passando. Nesse momento meu coração congelou, meu sangue parou de correr, sentir todo meu corpo e
meus pelos arrepiarem-se esse ponto final. Os sussurros intensificaram-se, cada vez mais perto. Foi quando,
num gesto de desespero, decidi correr. Senti algo caindo da minha mão, mas a adrenalina estava tomando
conta de mim e nem tive tempo de ver o que era. Quando percebi, já estava lá, no mercado.
Umas das mulheres que estava no caixa olhou-me assustada e disse:
— O senhor está bem? Veio correndo pela rua, o senhor me parece apavorado, como se fugisse de
algo.
— Realmente estava fugindo, mas não posso lhe dizer do quê, pois nem mesmo eu sei. Só corri para
cá. Existe algo naqueles becos, ou melhor, alguém?
— Bom, que eu saiba, não. Nunca vi nada lá! Sempre passo por essa rua para começar meu turno,
chego às onze da noite e nunca tive nenhum problema. Será que o senhor não ouviu algum animal? Nessa
cidade nada acontece. Estamos no interior do país, mal chega eletricidade em todas as casas, vai haver
bandidos e sequestradores? Posso falar seriamente? Acho impossível acontecer algo desse tipo aqui!
— Acredito que não eram sons de animais, realmente pareciam sussurros humanos, os quais não
consegui compreender, mas a senhorita tem razão, nada acontece nessa cidade. Talvez o medo me fez ouvir
coisas de mais.
Agradeci e fui pegar o café. Passei no caixa, paguei, coloquei na sacola, despedi-me dela e fui em
direção a minha casa, agora mais tranquilizado.
Andei a primeira quadra, nada ouvi. Passei pela segunda, onde realmente havia escutado o sussurro,
nada novamente. Estava aliviado. Talvez fosse algo da minha cabeça mesmo, quem sabe um animal? Andei
calmamente até minha casa. Nenhum barulho estranho. Uma madrugada comum para aquela cidade. O
vento gelado, os sons de animais ao longe, as belas estrelas e majestosa Lua iluminando aquele céu.
Foi quando cheguei na rua de minha casa e observei que a porta estava entreaberta. Havia esquecido
de trancar? Havia alguém entrado nela? Os mesmos sentimentos de antes voltaram a tomar conta de mim.
Foi quando lembrei de que eu havia deixado algo cair, o som era metálico e logo liguei os pontos.
Alguém achou minha chave e estava dentro de casa. Era pior do que poderia imaginar.
Todas as casas estavam com as luzes apagadas, quem estaria acordado a essa hora? Aparentemente
só havia eu e com uma vontade enorme de tomar uma xícara de café! Não tinha para onde correr, minha
única opção era entrar em casa.
Mesmo sabendo dos riscos, entrei. Nada havia. Seria mais uma maluquice de minha cabeça? De
repente senti algo estranho e desmaiei.
Foi quando ouvi alguém dizendo:
— Corta! Terminamos amanhã o curta-metragem! — gritou o diretor.
Agora sim eu poderia sair do personagem e tomar uma café no meu camarim.

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