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JOSÉ ARTHUR NOGUEIRA

PRINCIPAIS MOLÉSTIAS DE ORIGEM


PARASITARIA ENCONTRADAS EM
LOBO-GUARÁ

BRASÍLIA
2009
JOSÉ ARTHUR NOGUEIRA

PRINCIPAIS MOLÉSTIAS DE ORIGEM


PARASITARIA ENCONTRADAS EM
LOBO-GUARÁ

Monografia apresentada para a conclusão do


Curso de Especialização Latu sensu em Clínica
Médica e Cirúrgica de Animais Selvagens e
Exóticos – CMCASE
Orientador: Prof. Dr. Raul Ávila Junior

BRASÍLIA
2009
Resumo

O lobo-guará (Chrysocyon brachyurus, Illiger, 1815) é o maior canídeo


sul-americano e se distribui pelo cerrado e pradarias da região central do
continente. Sua população está ameaçada pela redução e fragmentação de
seu habitat devido à expansão agropecuária e urbana. Em conseqüência
disso, essa espécie tem sido exposta a patógenos de animais domésticos,
aos quais em sua maioria, é suscetível. Relatos de estudos estão
comprovando a suscetibilidade desse canídeo a enfermidades de cães e
gatos domésticos, inclusive zoonoses, e ainda a predisposição a desenvolver
metabolopatias. Apesar da escassa literatura relacionada às doenças que
acometem o lobo-guará, este trabalho busca mostrar as principais moléstias
de origem parasitaria encontrado em lobos-guará.
Sumário

1. Introdução................................................................................................1
2. Taxonomia, características físicas e comportamento do lobo-guará...2
3. Principais enfermidades parasitárias.....................................................7
3.1. Dioctofimose (Dioctophyma renale).............................................7
3.2. Toxoplasmose.............................................................................11
3.3. Neosporose.................................................................................14
3.4. Ancilostomose............................................................................16
3.5. Leishmaniose..............................................................................18
3.6. Dirofilariose.................................................................................22
4. Bibliografia.............................................................................................26
Lista de figuras

Figura 01 - O lobo guará .....................................................................................2

Figura 02 - Ocorrência do lobo guará na América latina...................................3

Figura 03 - Fruta do lobo.....................................................................................5

Figura 04 - Dioctophyma renale..........................................................................7

Figura 05 – D. renale...........................................................................................7

Figura 06 - Ovos de D. renale..............................................................................9

Figura 07 - Lobeira (Solanum lycocarpum).........................................................9

Figura 08 - Fruta do lobo...................................................................................10

Figura 09 - Toxoplasma gondii.........................................................................11

Figura 10 - Neospora caninum..........................................................................14

Figura 11 - Ancylostoma caninum....................................................................16

Figura 12 - Leishmania Chagasi.......................................................................19

Figura 13 - L. amazonensis...............................................................................19

Figura 14 - L. braziliensis..................................................................................19

Figura 15 - Dirofilaria immitis no coração de um canídeo...............................23


Lista de tabelas

Tabela 1: Relação das espécies de Leishmania com seus respectivos


vetores...............................................................................................................21
1. Introdução

Estudos relacionados à exposição e suscetibilidade de animais

selvagens a diversas doenças de animais domésticos estão sendo

desenvolvidos mundialmente, inclusive no Brasil. O lobo-guará (Chrysocyon

brachyurus), por ser um canídeo, apresenta suscetibilidade à maioria dos

patógenos e parasitas de carnívoros domésticos. Esse fato está causando

grande preocupação em relação à conservação da espécie, pois devido à

expansão agropecuária e urbana, há intensa redução e fragmentação do

habitat desse canídeo. Assim, sua interação com animais domésticos,

principalmente cães, gera competição por recursos limitados e introdução

de moléstias, podendo resultar a diminuição das populações de lobo-guará e

até mesmo seu desaparecimento.

É de grande importância o conhecimento acerca das enfermidades de

animais domésticos a que as espécies selvagens são suscetíveis, pois há

possibilidade de algumas serem zoonoses e assim se tornarem reservatórios.

Além disso, pode auxiliar no manejo de populações silvestres em áreas de

conservação, zoológicos e criadouros, assim como no diagnóstico,

tratamento e profilaxia de doenças.

Esta revisão bibliográfica teve como objetivo reunir as principais

moléstias de origem parasitaria que podem ser encontradas em lobo-guará.

1
2. Taxonomia, características físicas e comportamento do lobo-guará

O Lobo Guará (Chrysocyon brachyurus) (figura 01) - também conhecido

como Aguarú guazú ou zorro de potrillero na Argentina; Boroche na Bolívia; e

Gueken, Huika ou simplesmente Guará entre as nações indígenas – é uma

animal pertencente a Classe Mammalia, Ordem Carnivora e Família

Canideae. Esse animal é considerado o maior canídeo da América do sul e foi

primeiramente descrito por D`Azara em 1801. Desenvolveram-se nos

planaltos centrais do Brasil durante a era Pleistocena de um ancestral

canídeo. Ocorre desde o Nordeste (exceto áreas costeiras) e Centro Oeste

do Brasil, norte da Argentina, Paraguai, leste da Bolívia e a oeste até os

pampas del Health no Peru, atingindo um total de aproximadamente 5

milhões de km² (figura 02). Seus Habitats favoritos incluem o cerrado,

gramados e florestas de arbustos (CICCO, 2007).

Figura 01 – O lobo guará

Fonte: Guia ilustrado. O mundo dos animais: Mamíferos Vol. 1. São Paulo;

Editora nova cultural, 1990.

2
Figura 02 – Ocorrência do lobo guará na América latina
Fonte: MOREIRA, J.R. et al. . I Maned Wolf International

Workshop, 2005.

Em relação a suas características físicas é dito que não há dimorfismo

sexual em aparência e nem em tamanho; a altura nos ombros pode variar

entre 75 e 90 centímetro; o comprimento da cabeça e corpo varia entre 100 e

125 centímetros; o comprimento da cauda varia entre 30 e 45 centímetros; e

o peso de um animal adulto fica próximo de 30 quilos, enquanto que os

filhotes possuem peso aproximado de 350 gramas ao nascer. Pode-se dizer

ainda que suas pernas são longas, permitindo por exemplos uma melhor

3
visualização e movimentação por sobre capins altos; A pelagem é de um

vermelho ferrugem no corpo; o focinho e a extremidade das pernas são de

tom marrom escuro ou preto e existe ainda uma mancha de pêlos marrons

escuros ou negros atrás da nuca e parte dos ombros do animal sendo que

esses pêlos são maiores do que os do resto do corpo e em certos momentos,

como encontros agonísticos por exemplo, podem se eriçar dando um aspecto

de “crina” ao lobo guará; A garganta, dentro das orelhas e a ponta da cauda

são brancas (GOROG, 2007).

Através da Portaria nº 1.522, de 19 de dezembro de 1.989 e da Portaria

nº 45-N, de 27 de abril de 1992, o IBAMA tornou pública a lista oficial de

espécies da fauna brasileira ameaçada de extinção. O Lobo guará faz parte

desta lista e é uma espécie em vias de extinção. A recuperação a longo

prazo dos habitats viáveis para o lobo guará é pouco provável devido à

conversão pelos rancheiros da maior parte dos gramados em fazendas,

destruindo assim seu habitat (IBAMA, 1992).

Os lobos guarás selvagens são onívoros e se alimentam de uma

grande variedade de itens, sendo que mudanças sazonais na disponibilidade

de alimento resulta em mudanças dos componentes da Dieta do animal.

Entre alimentos vivos incluem pequenos mamíferos (Como, por exemplo,

roedores e tatus), gastrópodes, répteis e ovos de aves (BRANCO, APARECIDO

e JUNIOR, 1998).

Em relação a sua dieta vegetariana, seu principal alimento é o

Solanum lycocarpum, comumente chamado de lobeira ou fruta do lobo

(Figura 3). Essa fruta, não estacional, é um componente importante na dieta

do lobo guará por todo o ano. A lobeira parece um tomate grande de cor

amarelada quando maduro e, de acordo com Matera (1968), desempenha um

papel importante no tratamento do verme gigante do rim, um parasita

comum em lobos guarás, embora a evidencia científica ainda não é 100%

comprovada; Cerca de 58% da dieta dos lobos guarás é com lobeira, 28%

com pequenos mamíferos, 2,3% com aves e 11,7% nos restantes de

alimentos pertencentes a dieta do animal, como répteis, gastrópodes e

demais alimentos não classificados (DIETZ, 1984; SHELDON, 1992;

FLETCHALL, 1995).

4
Figura 03 – Fruta do lobo

Fonte: Arquivo Pessoal

Os lobos guarás vivem em pares familiares que ocupam, em média,

uma área de cerca de 30 km². Esses animais costumam ser noturnos ou

crepusculares em relação a suas atividades. Geralmente um casal,

monogâmico por toda a vida, divide a mesma área, mas raramente são vistos

juntos exceto durante a estação de reprodução. Os territórios são marcados

por locais específicos de defecação e demarcações que representam

barreiras físicas, como rios e em alguns casos estradas. Essas marcações

por defecação geralmente são feitas em superfícies elevadas, como morros.

Acredita-se que o lobo guará se utiliza de latidos tanto para localização

dentro do território quanto para promover o espaçamento dos indivíduos pela

fuga (DIETZ, 1984; SHELDON, 1992; FLETCHALL, 1995).

Acredita-se que o lobo guará em seu estado selvagem seja monoestro

com presença de estro por aproximadamente 5 dias. A gestação de uma

fêmea varia entre 63 e 70 dias e ao dar a luz geralmente nascem de 2 a 5

5
filhotes, sendo que a maioria das crias nascem durante estações de secas

(RODDEN, 2002; RODRIGUES 2002).

As fêmeas escondem o alimento na sua toca antes de dar a luz. Essas

tocas são geralmente pontos estratégicos pertencentes a própria topografia

da região aonde o animal vive, como por exemplo pontos baixos de capinzais

ou morro que tenha passado por algum processo de erosão, já que não existe

provas de que um lobo guará seria capaz de escavar sua própria toca. O

tamanho considerado ideal de uma toca esta próxima a 60 centímetros de

largura por 100 centímetros de profundidade. Ao dar a luz, o casal defendem

os locais do ninho ou toca até que os filhotes consigam achar seu próprio

alimento (FLETCHALL, 1995).

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3. Principais enfermidades parasitárias

3.1. Dioctofimose (Dioctophyma renale)

A Dioctofimose é causada pelo helminto Dioctophyma renale (Goeze,

1782), também conhecido como “verme gigante do rim” (figura 4 e 5). Esse

parasito é um nematódeo de coloração vermelho-sangue. Na forma adulta as

fêmeas podem atingir 20-130 cm e os machos 14-45 cm (BORCHERT, 1981).

Figura 4 - Dioctophyma renale

Fonte: Arquivo Pessoal

Figura 5 – D. renale

Fonte: http://winnipeghumanesociety.ca/clinic/?p=9

7
É uma parasitose de distribuição mundial e tem como hospedeiros

definitivos cães, raposas, lobos, visons e outros mamíferos, inclusive o

homem. O verme geralmente é encontrado no rim direito, devido à migração

através da parede duodenal, ou livre na cavidade abdominal do hospedeiro.

Os animais e o homem adquirem o nematóide a partir da ingestão de carne

de peixe pouco cozida e de anelídeos aquáticos infectados com a forma

larval do parasito (MONTEIRO et al., 2002).

Os ovos de D. renale são eliminados para o ambiente externo através

da urina do hospedeiro definitivo, a seguir desenvolvem-se na água até o

estágio infectivo (durante 1 a 7 meses). Quando esses ovos são ingeridos por

um hospedeiro intermediário (oligoqueta aquático), ocorre a eclosão da larva

I, que se encapsula e desenvolve-se até o 3º estágio larval. O hospedeiro

paratênico ou transportador (peixes ou rãs) que se alimentar do oligoqueta

infectado desenvolve o encistamento da larva, então o hospedeiro definitivo

infecta-se ao ingerir esse animal. Logo após, o verme penetra a parede

gástrica ou entérica, migrando para a cavidade peritoneal ou para o rim

direito, onde atinge a forma adulta (MEASURES; ANDERSON, 1985).

A existência dos hospedeiros paratênicos (peixes e rãs) e definitivos

(roedores), pode esclarecer a possibilidade de infecção por D. renale no lobo-

guará, visto que esses hospedeiros podem fazer parte de sua dieta. (LEITE et

al., 2005).

Esse parasito aloja-se na pelve renal destruindo o parênquima, até que

o rim seja reduzido á uma cápsula fibrosa com o nematódeo e um exsudato

purulento. Na cavidade abdominal pode causar peritonite e aderências

viscerais, quando situado no fígado pode destruir a superfície do órgão

formando nódulos, assim como no baço e epiplon (BORCHERT, 1981).

Os sinais clínicos costumam não ser percebidos, mas pode-se

observar disúria, hematúria, dor abdominal e lombar, anorexia e vômitos. A

ausência de sintomatologia na maioria dos casos deve-se ao fato de haver

uma hipertrofia compensatória do rim não afetado. Por isso, o diagnóstico

geralmente é feito ao acaso devido à presença de ovos de D. renale (figura 6)

em exame de sedimento urinário e líquido ascítico (quando o parasita for

8
fêmea), procedimentos cirúrgicos (ex. laparotomia ou histerectomia),

radiografias, ultra-sonografias e achados de necropsia. O tratamento dessa

parasitose consiste em remoção cirúrgica do parasito e do rim afetado

(MONTEIRO et al., 2002).

Figura 6 - Ovos de D. renale

Fonte: http://www.tierklinik.de/medizin.00146

Especula-se que o fruto da lobeira (Solanum lycocarpum, S. Hil, 1833)

(figuras 7 e 8) pode ter efeitos terapêuticos no lobo-guará, auxiliando na

proteção contra o D.renale (Manual de Manejo do Lobo-guará). A ”fruta do

lobo” é o item vegetal da dieta do lobo-guará mais frequentemente

consumido. A presença de sementes de lobeira em 74% das amostras de

fezes de Chrysocyon brachyurus de vida-livre analisadas (RODRIGUES, 2002).

Figura 7 - Lobeira (Solanum lycocarpum)

Fonte: Arquivo Pessoal

9
Figura 8 - Fruta do lobo

Fonte: Arquivo Pessoal

A primeira descrição desse helminto no Brasil deve-se a MOLIN (1860)

observada em um lobo-guará. Foi realizado um estudo no estado de São

Paulo entre julho de 1997 e maio de 2003, em que os achados macroscópicos

de necropsia revelaram que seis dos quatorze lobos-guarás (42,8%)

estudados apresentavam D. renale em um dos rins, predominando o

parasitismo do rim direito (83,3%) em relação ao rim esquerdo (16,6%).

(LEITE, 2005)

Mattos (2003) realizou uma pesquisa epidemiológica em lobos-guará

de vida livre no nordeste do estado São Paulo, no qual observou em exame

de sedimentação urinária a ocorrência de ovos de D.renale em 42% dos

animais estudados. Um estudo retrospectivo realizado por Diniz et al. (1999)

descreveram lesões no parênquima renal causadas por D. renale e presença

de ovos na urina de lobos-guará jovens e adultos, mantidos em cativeiro no

Zoológico de São Paulo. Ao verificar as causas de mortalidade de animais

cativos com base no registro de nascimento e óbito no International

Studbook for Maned Wolf, no período de 1980- 1998, MAIA et al. (2002)

relataram óbitos em sete animais capturados na natureza, decorrentes de

infecção provocada por D. renale (LEITE et al., 2005).

10
3.2 Toxoplasmose

A Toxoplasmose tem como agente etiológico um parasito intracelular

obrigatório pertencente ao Filo Apicomplexa, Classe Sporozoea, Subclasse

Coccidia. Ordem Eucoccidiida, Subordem Eimeriina, Família Sarcocystiidae,

Subfamília Toxoplasmatinae, Gênero Toxoplasma e Espécie Toxoplasma

gondii. Seu ciclo biológico envolve felídeos como hospedeiros definitivos e

intermediários, e ainda possui uma grande gama de hospedeiros

intermediários como os animais de sangue quente, incluindo o homem,

representando então uma zoonose (DUBEY et al., 2003).

A maioria dos indivíduos infectados por T. gondii (Figura 9) resiste à

infecção, tornando-se portadores. Assim a toxoplasmose-infecção é mais

comum em relação à toxoplasmose-doença, que se desenvolve geralmente

em casos de imunodepressão (CÔRREA; CÔRREA, 1992).

Figura 9 – Toxoplasma gondii

Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/toxoplasmose/

toxoplasmose-6.php

A transmissão desse protozoário ocorre pela ingestão de carnes cruas

ou mal cozidas contendo cistos do protozoário, ingestão de oocistos

esporulados presentes no solo contaminado, em verduras ou legumes

contaminados, ingestão de taquizoítos presentes no leite cru ou saliva,

11
acidentes de laboratório, transplacentária, transfusões de sangue e

transplante de órgãos (ISHIZUKA; YASUDA, 1981 citado por CADEMARTORI,

2005).

No ciclo biológico desse parasito a produção de oocistos acontece

somente no intestino dos felídeos. Após a liberação para o ambiente ocorre a

esporulação desses oocistos, que se constitui de dois esporocistos,

contendo quatro esporozoítos em cada (BIANCHI, 2005).

Após a ingestão dos oocistos esporulados pelo hospedeiro

intermediário ocorre a liberação dos esporozoítos e instalam-se em células

de qualquer tecido, passando a dividir-se rapidamente por cissiparidade

(cissi=divisão; paridade=aos pares: divisão direta de uma célula em duas) ou

endodiogenia (endo=gentro; dio=divisão; genos=gerar: geração por divisão

interna), sendo conhecidas como taquizoítos. Esses diferenciam-se em

bradizoítos, os quais realizam divisões lentas e formam um agregado com

uma membrana própria constituindo um cisto bradizoítico, que pode fixar-se

na musculatura esquelética e cardíaca. Tanto os taquizoítos quanto os

bradizoítos são infectantes para os animais susceptíveis (CORRÊA, 1992).

O T. gondii, nos hospedeiros intermediários, pode causar lesões em

tecidos como intestino, fígado, pulmão, coração, músculo esquelético,

pâncreas, intestino, globo ocular, sistemas nervoso e linfóide (STORTS,

1998).

Por ser uma das zoonoses mais difundidas no mundo, a toxoplasmose

torna-se de grande importância à saúde pública. Através da transmissão

transplacentária (congênita), o parasito pode infectar o feto, podendo

provocar abortos e má-formações nos recém-nascidos como hidro ou

microcefalia, coriorretinite, estrabismo, nistagmo e retardamento mental

além de causar cegueira ou problemas mentais em crianças recém-nascidas

(BIANCHI, 2005).

A infecção nos animais geralmente é assintomática, e a

sintomatologia clínica inclui febre, anorexia, depressão, sinais de alterações

no sistema ocular, neuromuscular, respiratório, digestório, cardíaco e

reprodutor (STORTS, 1998).

12
O diagnóstico da toxoplasmose pode ser realizado através sinais

clínicos, exame de sangue, secreções nasal e ocular (coradas com Giemsa),

no qual eventualmente é possível observar os taquizoítos em macrófagos,

biópsias de linfonodos infartados e achados de necropsia. E ainda, o soro

pode ser submetido a provas imunológicas, como Imunofluorescência

Indireta e Inibição de Hemoaglutinação (CORRÊA; CORRÊA, 1992).

No tratamento da parasitose pode-se utilizar uma associação de

pirimetamina (dose: 0,5mg/kg – dose canina) com sulfanilamida (dose:

100mg/kg – dose canina), administradas por via oral em dose diária, durante

duas a três semanas (CORRÊA; CORRÊA, 1992).

Os animais selvagens são comumente portadores de T. gondii,

especialmente os canídeos, devido aos seus hábitos alimentares. O lobo-

guará sendo uma espécie onívora pode alimentar-se de frutas e pequenos

animais possivelmente infectados, sendo assim, suscetível à toxoplasmose

(VITALIANO, 2004).

No Brasil, Vitaliano (2004) realizou um estudo de soroprevalência de

T.gondii em lobos-guará de cativeiro nas regiões sudeste e centro-oeste, no

qual observou soropositividade em 44 (74,6%) dos 58 animais testados,

relacionando esse resultado ao contato entre animais silvestres e

domésticos, especialmente os felinos.

Em um levantamento feito por Proença (2007) a respeito da

soroprevalência de toxoplasmose na Estação Ecológica de Águas

Emendadas (DF), obteve-se a positividade nos três lobos-guará analisados.

Nesse estudo, a autora sugeriu a relação dos dados obtidos à alta

contaminação ambiental da Estação, o que pode ser atribuído à proximidade

da Estação com zonas urbanas e a invasão da unidade por gatos domésticos

possivelmente contaminados.

Deem et. al. (2005) concluíram um estudo na Bolívia, o qual avaliou a

exposição do Chrysocyon brachyurus à alguns agentes infecciosos e

parasitários. Em relação ao T. gondii, foi observada a positividade em teste

sorológico de um espécime dentre os quatro analisados. No trabalho, foi

sugerido que a exposição ao patógeno deve-se à presença de cães

domésticos em povoados nos arredores do parque avaliado.

13
Sedlák & Bártová (2005) relataram a soroprevalência positiva em seis

lobos-guará (100%) testados e originados de zoológicos das Repúblicas

Tcheca e Eslováquia. A infecção alimentar e ambiental foram citadas pelos

autores como principais fontes de infecção dos animais.

Uma das formas de prevenir a Toxoplasmose em animais de cativeiro,

dentre eles o lobo-guará, é o fornecimento de carnes inspecionadas na

alimentação, o que poderá evitar a infeccção alimentar pela presença de

cistos na dieta desses animais. (Comunicação pessoal, Gabriella Terra de

Souza).

3.3 Neosporose

O Neospora caninum (Figura 10) é um protozoário pertencente ao Filo

Apicomplexa e à subfamília Toxoplasmatinae, sendo o agente etiológico da

Neosporose. É um parasito intracelular obrigatório de morfologia e biologia

similar ao T. gondii, entretanto são antigenicamente distintos, conforme a

demonstração de ausência de reação cruzada entre eles (DUBEY, 2003). É

uma enfermidade de distribuição mundial, com grande importância

econômica, por causar abortos no gado bovino (CORREA, 1992).

Figura 10 - Neospora caninum

Fonte: http://www.limousin.com.br/pages/artigos/vendo.asp?ID=127

Sabe-se que é um patógeno capaz de infectar animais silvestres,

entretanto, pouco é conhecido a respeito da patogenicidade dessa infecção

nessa população. Foi descrito que a sintomatologia causada por esse

parasito em canídeos é similar a da toxoplasmose (DUBEY, 2003). Os cães e

coiotes são os únicos hospedeiros definitivos conhecidos (DUBEY;

14
THULLIEZ, 2005), sendo que os cães podem ser também intermediários e

ainda, há possibilidades que outros canídeos também sejam hospedeiros

definitivos (YAI et al., 2005). Os ruminantes e os eqüinos são hospedeiros

intermediários, e ainda, alguns herbívoros e canídeos selvagens têm sido

descritos, sugerindo a existência de um ciclo silvestre do parasito

(PROENÇA, 2007).

O parasito pode ser transmitido por via transplacentária (vertical),

ingestão de oocistos presentes nos alimentos, água e cistos em tecidos

infectados (DUBEY, 2003). Seu ciclo biológico é similar ao da toxoplasmose,

os hospedeiros intermediários adquirem a enfermidade ingerindo os oocistos

esporulados liberados nas fezes de cães infectados. Então, o protozoário, na

forma de taquizoítos, se multiplica nas células nervosas, macrófagos,

fibroblastos, células do endotélio vascular, rins e fígados, e então se

transformam em bradizoítos agregando-se em cistos. Os hospedeiros

definitivos são infectados através da ingestão de carcaças, membranas

fetais, placenta e fetos abortados contendo traquizoítos ou cistos. Os

caninos podem apresentar como sinais clínicos paresia e paralisia dos

membros pélvicos, dificuldade de deglutição, miocardite, dermatites e

pneumonia (HAY et al., 1990). Nos hospedeiros intermediários o principal

sinal clínico é a ocorrência de abortos. Os filhotes congenitamente

infectados geralmente são clinicamente normais, podendo em alguns casos

apresentar baixo peso, com membros fortemente flexionados ou estendido e

sinais neurológicos (DUBEY, 2003).

No diagnóstico laboratorial podem ser utilizados testes sorológicos

(Imunofluorescência indireta (RIFI), ELISA, Teste de aglutinação direta e

PCR) e imunohistoquímico de tecidos supostamente infectados (CANADA et

al., 2002; citado por DUBEY, 2003).

As espécies onívoras estão expostas a Neosporose, pois fazem parte

de sua dieta frutas e carcaças, as quais representam possíveis fontes de

infecção. Portanto, há possibilidade do Chrysocyon brachyurus tornar-se um

hospedeiro no ciclo dessa doença. (Vitaliano et al., 2004)

15
Sedlák e Bártová (2005) em estudo de soroprevalência de anticorpos

para N. caninum em zôos das Repúblicas Tcheca e Eslováquia obtiveram um

espécime positivo de seis lobos-guará testados.

Em pesquisa realizada por Vitaliano et al. (2004), foi detectado pela

primeira na vez na América do Sul a presença de anticorpos para N.caninum

em animais selvagens. Ao analisarem lobos-guará de cativeiro (zôos)

obtiveram soropositividade em quatro animais (8,5%) no estado de São Paulo

e um em Uberlândia (MG).

3.4 Ancilostomose

A ancilostomose é causada por nematódeos da Família

Ancylostomatidae, Subfamília Ancylostomatinae, Gênero Ancylostoma e

espécies braziliense, caninum (Figura 11), duodenale e tubaeforme. Somente

as duas primeiras parasitam os cães (BOWMAN, 1995).

Figura 11 – Ancylostoma caninum

Fonte: http://www.ehow.com/about_5336756_life-cycle-ancylostoma-

caninum.html

Os parasitos são de coloração vermelho-escuro, possuem uma grande

cavidade bucal com dois ou três pares de dentes (lâminas cortantes),

seguindo a direção dorsal e oblíqua, em forma de gancho. Os machos

apresentam bolsa copuladora, na forma adulta medem de 9 a 12 milímetros

(mm) de comprimento e as fêmeas 15-20 mm (BORCHERT, 1981).

16
No ciclo biológico do Ancylostoma sp. após a cópula, as fêmeas

depositam os ovos no intestino delgado do hospedeiro, permitindo que sejam

liberados juntamente com as fezes. No meio externo, em condições

adequadas (temperatura e umidade altas, boa oxigenação), a larva abandona

o ovo e após seu desenvolvimento passa para o estágio infectante

(BOWMAN, 1995).

A infecção por essa larva no hospedeiro ocorre por penetração ativa

através da pele ou por ingestão da larva. Se ocorrer a penetração através da

pele, as larvas atingem a circulação sangüínea ou linfática migrando para o

coração e pulmão. A partir dos brônquios pulmonares atingem a traquéia,

faringe, laringe, sendo deglutidas e alcançam o intestino delgado, seu

habitat preferencial. Quando adultos, os vermes fixam-se na mucosa

intestinal por meio de seus dentes, causam pequenas hemorragias, e aí se

reproduzem (BOWMAN, 1995).

Quando a forma de contágio for pela ingestão de larvas, o ciclo se

reduz à sua migração do estômago para células da mucosa intestinal, onde

sofrem as mudas necessárias e, então, retornam a luz do intestino para

fixação, término do desenvolvimento e posterior reprodução (BORCHERT,

1981).

Outras formas de transmissão dessa parasitose são a transplacentária

e a transmamária, na qual os filhotes infectam-se com as larvas ao ingerir o

leite da mãe portadora (BOWMAN, 1995).

Se as larvas infectarem um hospedeiro que não o seu, normalmente

não serão capazes de evoluir no mesmo, podendo realizar migrações pelo

tecido subcutâneo ou visceral. É o caso da síndrome conhecida como “larva

migrans” (Bicho-geográfico). A larva se locomove no tecido subcutâneo,

causando prurido, mas não atingem a maturidade sexual e acabam não

sobrevivendo (BORCHERT, 1981).

O Ancylostoma sp. remove grandes quantidades de sangue de seus

hospedeiros, por isso tem a capacidade de causar anemia. E ainda podem

provocar bronquite ou alveolite, nos pulmões, úlceras intestinais e

hipoproteinemia. A magnitude da doença é determinada pela patogenicidade,

quantidade de vermes e resistência do hospedeiro. Por isso, os indivíduos

17
parasitados podem ser assintomáticos ou manifestar a doença em vários

graus de severidade (BOWMAN, 1995).

Fármacos como o pamoato de pirantel, diclorvos, mebendazole,

febantel, fenbendazole, milbemicina oxima e nitroscanato são eficazes no

tratamento da ancilostomose. O diagnóstico pode ser obtido com a pesquisa

de ovos, parasitas e sangue oculto nas fezes. Realizar também hemograma

para avaliar a anemia (BOWMAN, 1995).

Alguns estudos estão confirmando a presença dessa doença no

Chrysocyon brachyurus. Gilioli e Silva (2000), pesquisaram a ocorrência de

parasitoses em 31 lobos-guará de zôos do estado de São Paulo e obtiveram

45% de espécimes portadores de A. caninum. Em outro estudo similar na

região do Triângulo Mineiro, Mundim et al. (1991) observaram a presença de

ovos do parasito em sete dos nove lobos-guará de cativeiro e vida-livre

analisados. No estudo restrospectivo de Diniz et al. (1999) foi detectada

enterite verminótica por Ancylostoma sp. em 38% dos lobos-guará no zôo de

São Paulo no período de 30 anos estudado.

3.5 Leishmaniose

As leishmanioses cutânea (tegumentar) e visceral (calazar) são

zoonoses, as quais possuem como agentes etiológicos protozoários

pertencentes ao sub-reino Protozoa, ordem Kinetoplastida, família

Trypanosomatidae, gênero Leishmania. Esse parasito é intracelular

obrigatório e entre as espécies L. chagasi (Foto 12), L. donovani, L. infantum,

L.amazonensis (Foto 13), L. guyanensis, L. braziliensis (Foto 14), a primeira é

mais relacionada com a forma visceral e a três últimas com a forma cutânea

no Brasil. (CARVALHO, 2005).

18
Figura 12 – Leishmania Chagasi

Fonte: http://www.profissionaisdasaude.com.br/article.php?article=219

Figura 13 - L. amazonensis

Fonte: http://memorias.ioc.fiocruz.br/103%287%29.htm

Figura 14 - L. braziliensis

Fonte: http://www.alunosonline.com.br/biologia/doencas-causadas-por-

protozoarios-2/

19
A Organização Mundial de Saúde (OMS) direciona muita atenção à

leishmaniose e estima em 350 milhões de pessoas expostas ao risco de

adquirir a doença e 12 milhões de infectados em 88 nações, com

predominância nos países emergentes. Recentemente está ocorrendo um

aumento na incidência tanto da leishmaniose tegumentar como da visceral

em todas as regiões brasileiras (MARZOCHI; MARZOCHI, 1994).

São doenças que acometem o homem e diferentes espécies de

mamíferos silvestres e domésticos das regiões tropicais e subtropicais

(CARVALHO, 2005). Inicialmente eram consideradas de caráter

eminentemente rural. Entretanto, recentemente, vem se expandindo para

áreas urbanas de médio e grande porte e se tornou crescente problema de

saúde pública no país e em outras áreas do continente americano, sendo

uma endemia em franca expansão geográfica (PASTORINO et al., 2002).

Na área urbana, o cão (Canis familiaris) é a principal fonte de

infecção. A enzootia canina tem precedido a ocorrência de casos humanos e

a infecção em cães tem sido mais prevalente que no homem. No ambiente

silvestre os principais reservatórios são as raposas (Dusicyon vetulus e

Cerdocyon thous), os marsupiais (Didelphis albiventris) e roedores

(Nectomys squamipes) (CARVALHO, 2005).

Devido à importância do cão como reservatório da leishmaniose

visceral (LV), a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) adota no Brasil como

medida de controle em áreas endêmicas, a eliminação destes animais

quando são soropositivos para Leishmania chagasi. Essa estratégia,

entretanto, tem apresentado resultados controversos, demonstrando que

muitos aspectos relacionados ao papel do cão na epidemiologia da LV ainda

são desconhecidos, sugerindo a necessidade de reformulação das medidas

empregadas para o seu controle (SILVA et al., 2005).

O vetor transmissor leishmaniose pode pertencer a várias espécies de

flebotomíneos (conhecido como palha, cangalhinha, tatuquira, mulambinho,

ou catuqui), e de diferentes gêneros (Psychodopigus, Lutzomyia),

dependendo da localização geográfica. Assim como os reservatórios, os

vetores também mudam de acordo com a espécie de Leishmania (tabela 1)

(Guia de vigilância epidemiológica, 2005).

20
Espécie Vetor
L. amazonensis Lutzomyia flaviscutellata,

L. reducta e L. olmeca nociva


L. guyanensis Lutzomyia anduzei, L.

whitmani e L. umbratilis
Psychodopigus wellcomei (área silvestre)

L. braziliensis Lutzomyia whitmani, L. intermedia e L. migonei

(área rural, peridomiciliar)

L. chagasi Lutzomyia longipalpis e L. cruzi (recentemente).

Tabela 2: Relação das espécies de Leishmania com seus respectivos


vetores.
Fonte: Guia de vigilância epidemiológica / Ministério da Saúde, 2005.

No ciclo biológico da doença ocorre a transmissão do protozoário ao

hospedeiro mamífero através da picada da fêmea do flebotomíneo infectado

que inocula as formas promastigotas (flagelada e extracelular) do parasito

no mamífero. Nesse, as formas promastigotas infectam macrófagos e

transformam-se em amastigotas (intracelular e sem movimentos). Estas se

multiplicam até que ocorra o rompimento dos macrófagos inicialmente

infectados, quando então, as formas amastigotas liberadas infectam novos

macrófagos, resultando no desenvolvimento da doença (OLIVEIRA & MACIEL,

2003).

A sintomatologia leishmaniose tegumentar é caracterizada por lesões

de pele localizada ou disseminada, podem ocorrer também lesões nas

mucosas, na maioria das vezes, secundária às cutâneas, surgindo

geralmente meses ou anos após a resolução das lesões de pele (Guia de

vigilância epidemiológica, 2005).

Na leishmaniose visceral as apresentações clínicas variam de formas

assintomáticas até o quadro clássico da doença que, no período de estado, é

caracterizado pela presença de febre, anemia, hepatoesplenomegalia,

manifestações hemorrágicas, além de linfadenomegalia, perda de peso,

21
taquicardia e, menos freqüentemente, tosse seca e diarréia. Os sinais e

sintomas de desnutrição se desenvolvem com a progressão da doença,

incluindo edema periférico, queda de cabelos e alterações de pele e das

unhas. Essas manifestações se não forem tratadas podem evoluir ao óbito

(PASTORINO et al., 2002).

Nos caninos os sinais clínicos de leishmaniose geralmente

encontrados são caquexia, alopecia, úlceras de pele e mucosas, onicogrifose

(excessivo crescimento das unhas) (MATTOS JR. et al., 2004).

O diagnóstico laboratorial para a leishmaniose visceral consiste nos

exames através dos testes parasitológicos (pesquisa direta, cultura e

isolamento em material de linfonodos e medula óssea), imunológicos

(Reação de Imunofluorescência Indireta – RIFI, ensaio Imunoenzimático –

ELISA) e Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) (CARVALHO, 2005).

Os estudos relacionados à leishmaniose no lobo-guará ainda são

escassos. Curi et al. (2006) realizaram uma pesquisa acerca da evidência

sorológica de infecção por Leishmania em canídeos silvestres e domésticos

do Parque Nacional da Serra do Cipó e na Área de Proteção Ambiental Morro

da Pedreira, Minas Gerais. Nesse estudo as amostras foram processadas

pelos métodos ELISA e RIFI, constatando soropositividade em dois dos sete

Chrysocyon brachyurus capturados. Os autores citaram que o resultado

obtido é um indicativo de que essa espécie pode estar envolvida como um

reservatório do ciclo da leishmaniose.

3.6 Dirofilariose

A dirofilariose é causada pelos nematóides Dirofilaria immitis (Leidy,

1856), conhecido também como “verme do coração”. Ocorre com acentuada

prevalência em áreas litorâneas de países localizados nos cinco continentes,

inclusive no litoral brasileiro (ex. Maranhão, São Paulo, Rio de Janeiro e

Minas Gerais) (BRITO, et al., 2001).

É uma parasitose transmitida por mosquitos da família Culicidae,

sendo que no Brasil os vetores mais prováveis são das espécies Culex

quinquefasciatus, Aedes taeniorhynchus, Aedes aegypti e Aedes scapularis

22
(LABARTHE et al., 1998). Esse nematóide, habita o ventrículo direito e

freqüentemente o tronco principal das artérias pulmonares de canídeos e

outras espécies de animais domésticos e silvestres, os quais representam o

papel de hospedeiro definitivo (Figura 15). Na forma adulta são longos

(machos 12-20 cm e fêmeas 25-31 cm), de coloração esbranquiçada, com

acentuado dimorfismo sexual. As microfilárias, que são a forma imatura,

medem em torno de 315 µm (295-325 µm) de comprimento e 6 a 7 µm (5,0-7,5

µm) de diâmetro (LEITE et al., 2006).

Figura 15 - Dirofilaria immitis no coração de um canídeo

Fonte: http://vetaltominho.wordpress.com/2009/02/19/dirofilariose/

O ciclo de vida da dirofilariose inclui a passagem obrigatória das

microfilárias pelos mosquitos culicídeos suscetíveis, que são os hospedeiros

intermediários. Esses adquirem a infecção ao se alimentar do sangue de um

hospedeiro definitivo com microfilárias circulantes. Então, essas larvas se

dirigem aos túbulos de Malpighi, onde ocorre o desenvolvimento. Quando

alcançam o estágio infectivo (L3) migram pelo tórax em sentido cranial,

retornando para as glândulas salivares do mosquito. Por ocasião de um novo

repasto sangüíneo, são transmitidas aos hospedeiros definitivos, penetrando

no orifício resultante da picada, onde migrarão ativamente pelos músculos e

tecidos subcutâneo e adiposo, realizando mudas para as fases larvais L4 e

L5 (BOWMAN, 1995). Após essas fases se dirigem ao ventrículo direito, onde

23
após seis meses atingem a maturidade sexual. Por ser um parasito vivíparo,

produzem as microfilárias L1, que são liberadas diretamente na circulação

do hospedeiro definitivo (microfilaremia), completando o ciclo do parasito

(LEITE et al., 2006).

Os processos patológicos causados pelos nematóides adultos são

lesões endoteliais, tromboembolismo, hipertensão pulmonar, pneumonite,

congestão hepática, ascite, glomerulonefrite como conseqüência da

deposição de imunocomplexos nos glomérulos, hiperemia pulmonar,

hipetrofia hepática e esplênica (BORCHERT, 1981). Segundo Paes-de-Almeida

(2003) citado por Leite et al. (2006), as alterações patológicas no sistema

cardiovascular do hospedeiro definitivo ocorrem em conseqüência de lesões

provocadas pela ação de parasitas adultos e migração das microfilárias,

hipertrofia e insuficiência cardíaca congestiva do lado direito (ETTINGER,

1996).

Os sintomas clínicos são reflexos do número de dirofilárias

infectantes, duração da infecção e da resposta do hospedeiro definitivo.

Geralmente, a parasitose é assintomática, mas pode ocorrer tosse seca,

dispnéia, intolerância a exercício físico, febre e hematúria (BORCHERT,

1981).

O diagnóstico da dirofilariose consiste na avaliação dos sinais

clínicos, presença de microfilárias na circulação periférica (em gota de

sangue coletada no lobo distal da orelha), radiografia torácica,

eletrocardiograma e teste sorológico (ELISA) (ETTINGER, 1996). O

tratamento deve iniciar com a remoção dos parasitos adultos com a

administração intravenosa de tiacetarsamida e prosseguir, após três

semanas, a eliminação de microfilárias circulantes com aplicação de

ivermectina ou milbemicina oxima (BOWMAN, 1995).

Os animais susceptíveis a dirofilariose em áreas endêmicas devem

fazer parte de um programa preventivo, o qual consiste na administração

oral diária de dietilcarbamazina até dois meses após o término da atividade

do mosquito transmissor (BOWMAN, 1995).

Alguns casos de dirofilariose no lobo-guará têm sido relatados. Diniz

et al. (1999), em estudo retrospectivo de enfermidades em Chrysocyon

24
brachyurus, pertencentes ao zôo de São Paulo, observaram um caso de

doença cardiovascular provocada por Dirofilaria sp, no qual as dirofilárias

adultas estavam alojadas na veia cava e no coração direito do animal. Deem

et al. (2005), realizaram, na Bolívia, pesquisa sorológica de anticorpos para

D. immitis em lobos-guará de vida-livre. Nesse estudo foi identificado um

espécime soropositivo para dirofilariose dentre os quatro animais

analisados.

25
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