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Copyright © 2022 - Islay Rodrigues


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EPÍLOGO
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Copyright © 2022 - Islay Rodrigues

É proibida a reprodução total e parcial desta obra de


qualquer forma ou quaisquer meio eletrônico,
mecânico e processo xerográfico, sem a permissão
da autora. (Lei 9.610/98)
Essa é uma obra de ficção. Os nomes,
personagens, lugares e acontecimentos descritos na
obra são produtos da imaginação da autora.
Qualquer semelhança com nomes e acontecimentos
reais é mera coincidência.
UMA VIRGEM PARA LORDE BLACK ♦ ERA UMA VEZ – 2

[primeira publicação – 20 de maio de 2022]


Eu não pensei muito sobre o que seria esse livro quando comecei a
escrevê-lo. Me permiti voltar para a época em escrevia no Wattpad e
publicava minhas histórias sem pretensão alguma. É isso que define
esse livro: sem pretensão. É apenas o que eu tenho de mais maluco
unidos em sessenta mil palavras. Ele não segue uma fórmula,
apenas fui escrevendo as ideias que vinham, sem me importar com
mais nada, e pela primeira vez em muito tempo me senti totalmente
contente com a criação de um livro. Eu sei que, mesmo que muita
gente não goste, ou que ele não me traga muitos feedbacks, eu vou
ser contente com ele pro resto da minha vida. Porque é um livro que
fala de caráter, escancara os sentimentos humanos em suas formas
mais puras. Fala de amor, de arrependimento e também de
emoções que nos condenamos por sentir, mas que fazem parte do
que nos torna seres humanos.

“Palavras são, na minha nada humilde opinião, nossa inesgotável fonte de magia.”
– Alvo Dumbledore

Eu espero que a minha magia toque o coração de vocês.


Escute a playlist no spotify!
Era uma vez um conde incapaz de amar…
— Me traga a cabeça do maldito!
— Milorde, talvez deva reconsiderar…

Um copo foi espatifado na parede.


— Alguém vai morrer hoje, Wilkins, e se quiser que não seja
você, sugiro que me traga o homem que teve a coragem de atirar

em mim! — O conde esbravejou, as mãos que antes seguravam o

copo agora tremiam pelo desejo de vingança.

O jovem criado balançou com a cabeça, exausto. A família de


Wilkins vinha servindo à nobre família Hyde há quatro gerações e

isso costumava ser motivo de orgulho para eles. Ter um propósito


de vida, zelar, guardar e manter seguros todos os segredos que as

paredes velhas de High Garden abrigavam, era a razão de viver


deles. Wilkins vinha sendo leal ao conde de Clarendon desde que

herdara a posição de criado pessoal e gostava de seu trabalho,


menos quando tinha que impedir lorde Hyde de cometer uma

loucura, momentos esses que vinham se tornando cada vez mais

frequentes com o passar dos anos.


— Milorde, suspeito que nem o seu título poderá livrá-lo da

forca se matar alguém! — O criado não sabia o que temia mais, a

morte do conde ou a promessa do desemprego.


O conde não tinha filhos, se ele morresse, o título iria para o

caixão com ele.

— Ótimo, assim eu estarei fazendo um favor a este mundo


voltando para o inferno.

O criado pressionou o pano com mais força no ferimento no


ombro do conde. O sangue jorrava sem cessar e mudara

completamente a cor branca do pano para vermelho.

Os criados de High Garden poucas vezes testemunharam

lorde Black Hyde em um estado tão profundo de fúria, e isso se

tornava ainda mais intenso quando o lorde estava bêbado, outra

coisa que vinha acontecendo com demasiada frequência nos


últimos anos.
As portas foram abertas abruptamente e quatro criados
entraram arrastando um homem maltrapilho pelos braços.

— Não! Eu imploro! Clemência! — A criatura sem sorte gritava

a plenos pulmões.

— Saia da frente. — Hyde empurrou a mão de Wilkins para

levantar.

Um silêncio abrupto tomou o saguão da grande mansão


quando o conde se ergueu da cadeira e puxou consigo uma arma

carregada.

Não era uma surpresa que Lorde Black Hyde provocava medo

nas pessoas por causa de sua aparência nem um pouco atrativa

aos olhos, mas, naquele instante, quem olhava para ele podia jurar

que uma besta infernal tomara seu corpo. Ele cambaleou para a

frente, bebera todo o estoque de uísque da mansão para adormecer


a dor do ferimento provocado pelo tiro. Foram necessários três litros

de uísque, e uma dose expressiva de láudano, para fazer efeito em

um homem do seu tamanho.

O caçador foi largado de qualquer jeito no chão e tentou fugir

no mesmo instante. Hyde ergueu seu mosquete e o derrubou com

um tiro em sua panturrilha.


Bang!
— AH!

O grito do caçador fez a pele de Hyde arrepiar-se de prazer.


Se sentiu um pouco vingado, mas nem de longe satisfeito.

Arrancaria daquele homem alguma coisa que fosse muito preciosa


para ele, a destruiria diante de seus olhos e o deixaria viver para
sempre com a culpa.

— Milorde! — Wilkins parecia que ia desmaiar.


— Cale a boca, Wilkins — Hyde rosnou.

O criado suspirou, provavelmente lembrando da proposta que


recebera há alguns anos para trabalhar como cavalariço na casa de

um duque. Na época, acreditou que cuidar de um lorde seria muito


mais fácil que cuidar de cavalos, ah, como fora tolo… Nem se
tivesse negado Jesus três vezes poderia ter se arrependido tanto.

Lorde Hyde andou até o homem que agonizava no chão e


pegou da mão de um dos criados a arma que o caçador usara para

matar seu precioso cervo. O conde se abaixou para dar nele uma
boa olhada, enxergava tudo vermelho e o ódio mastigava seu

coração sem misericórdia. O cheiro do sangue do seu cervo


presente nas roupas do caçador agia como combustível em sua ira.
Se o caçador tivesse apenas atirado em Hyde, o conde não estaria
tão furioso, mas não conseguia aceitar o fato de que esse homem

inferior invadira suas terras e matara um de seus animais.


Hyde estava há meses tentando domar aquele cervo depois

de o capturar de uma armadilha. O animal era orgulhoso e não


confiava nele, o que fez Hyde desejar ainda mais possuí-lo. Saber

que o cervo fora tirado dele antes que pudesse fazer isso, antes que
Hyde pudesse o tomar para si… era imperdoável. Imperdoável!
Agarrou o caçador pelo cabelo e o puxou. Os olhos do homem se

arregalaram de pavor ao verem o semblante doentio do conde.


— Como você ousa invadir a minha propriedade para atirar

em uma das minhas criaturas?


Seu grito soou como um rugido. O homem tremia tanto que
parecia que ia vomitar as tripas a qualquer minuto.

— Me perdoe! — Sua voz era tão covarde quanto sua


postura.

Hyde apontou o mosquete para o rosto dele e engatilhou.


— Una vita per l'altra.

— Não! — O homem engasgou, protegendo o rosto com as


mãos. — Não me mate, eu tenho filhas e uma esposa que
dependem de mim!
O dedo de Hyde, que antes estava pronto para afundar o
gatilho, fraquejou. O caçador percebeu nesse simples gesto de
fraqueza, sua chance de escapar.

— Sem mim elas estariam condenadas a uma vida de miséria.


— Cale-se, stronzo!

Hyde acertou o nariz dele com o cabo da arma. Sangue


explodiu por todo lado. O conde grunhiu por entre os dentes e se
odiou por ainda existir algum pingo de humanidade em seu coração.

Pensou que, por estar há tantos anos vivendo entre os animais, em


algum momento perderia de vez aquilo que distingue o homem de

uma fera, mas talvez fosse por viver entre eles que era incapaz de
dar um fim à vida daquele infeliz.

— Não me mate, não me mate. — O homem começou a


chorar, engasgando com o sangue que espirrava de seu nariz.
Hyde franziu os lábios, com nojo do que via.

— O cervo que você matou era precioso para mim. Eu não


posso deixar você sair daqui inteiro. Isso passaria a mensagem de

que sou um homem tolerante, o que não sou, e gente como você
acharia que pode entrar na minha terra, roubar de mim e sair
impune.

O homem abraçou as canelas do conde.


— Se me deixar ir, eu pagarei pelo cervo, pagarei como
quiser, por favor, senhor, piedade!
— Mantenha sua dignidade. — Hyde tentou afastá-lo, mas o

aperto do homem estava firme ao redor de suas canelas. — Acha


que dinheiro poderia substituir uma vida? Se é assim, eu vou enfiar

uma bala entre seus olhos e mandarei um punhado de dinheiro para


suas filhas, o que acha disso?
— Não! Se não quer dinheiro, pegue uma delas!

Hyde petrificou, incapaz de acreditar no que entrara em seus

ouvidos.
— O que disse? — indagou e seu cenho se franziu ainda

mais. O que não favoreceu em nada sua aparência já pouco

atraente.

O caçador estremeceu de pavor, ou talvez fosse repulsa.


— Deve ser muito solitária a vida de um homem com a sua

aparência, deve sentir falta do calor de uma mulher.

Hyde o chutou com toda a força e se afastou, o desprezo


tomando todo o seu rosto. O caçador se encolheu, com dor na

perna machucada.

O calor de uma mulher… há muito tempo Hyde não sabia o


que era isso. Fizera muitas coisas ruins para merecer ir para o
inferno sem passar por julgamento, sabia disso, mas jamais chegou

perto de ser tão ruim quanto aquele homem na sua frente. Oferecer
uma das filhas em troca da própria vida era o mais podre que um

homem podia ser. Hyde andou de um lado para o outro, pensando,

evitando o olhar de Wilkins que com certeza tentaria fazê-lo mudar


de ideia. Se perguntou que tipo de vida levavam as filhas de um

homem que as barganhava de maneira tão egoísta.

— Como se chama?

O caçador não lhe respondeu, então Hyde andou até ele e


chutou sua perna baleada. O homem soltou um grito penoso.

— Sandle, Digle Sandle!

— Alguma das suas filhas ainda é virgem?


Hyde odiou ter que fazer essa pergunta e ver o olhar nojento

que surgiu no rosto do caçador.

— A mais velha não posso garantir, mas minha filha mais


nova, Pearl, poderá satisfazer seu desejo.

Hyde ponderou, sem ter certeza se suportaria passar por isso

mais uma vez. Enquanto isso, Wilkins parecia esperar

pacientemente que o patrão fosse pedir seus conselhos porque era


o que acontecia sempre, independente de relutar contra isso.

Dito e feito.
— Não me olhe desse jeito, cazzo, vamos cuspa algum

conselho inútil! — Hyde exigiu, embora seu tom de voz autoritário

não surtisse efeito algum no criado. Depois de anos vivendo debaixo


dessas constantes ameaças, Wilkins aprendeu que sairia no lucro

se Hyde as cumprisse.

— Para quê? O senhor vai acabar ignorando de qualquer

forma.
— Você está cheio de opiniões ultimamente, não acha?

— É a esperança de que você me liberte deste suplício. —

Wilkins suspirou, ao fazer isso, parecia ter o dobro da sua idade.


— Nunca.

— Se é assim eu digo que deve trazer a moça, assim você

terá mais alguém para infernizar e me dará alguma folga.

— Se isso der errado outra vez, a culpa será sua.


— Se você precisa usar isso para se livrar da culpa, fique à

vontade.

Hyde fuzilou o servo com o olhar. Não tinha ajudado em nada.


Ele ainda devia ter esperanças? Ah, como se pudesse se

enganar…. Era claro que Hyde tinha esperanças. De qualquer

modo, o que ele tinha a perder? No pior lado da coisa, estaria

salvando uma pobre coitada de uma vida miserável. Desde que ela
não se apaixonasse por ele, tudo estaria bem. Nada podia ser pior

do que ter um pai como aquele.


Voltou para onde o caçador estava.

— Muito bem, Digle Sandle, me traga minha virgem amanhã

pela manhã.
Hyde arriscou um olhar em Wilkins e este o mirava como se o

lorde tivesse feito outra sujeira para ele limpar. O conde lidaria com

o criado depois.

— Você contará o que aconteceu aqui hoje, dirá cada detalhe


e que sua vida está em jogo. A moça deve vir por vontade própria.

Se você for bom pai o suficiente para sua filha desejar dar a vida por

você, então você viverá, mas se ela não vier, eu vou livrá-la da sua
existência.

Digle acenou com a cabeça, o olhar entre o alívio e o medo, e

ainda encolhido no chão, tremendo e sangrando, esperou até o

conde sumir nos corredores de sua masmorra antes de levantar e


fugir.
Emerald travava a batalha mais árdua da sua vida. Era
impossível vencer aquele inimigo maligno que a envolvia e a puxava

para uma felicidade tranquila. Suas pálpebras traiçoeiras insistiam


em se fechar, mesmo que ela lutasse com bravura para as manter
abertas. Estava com os cotovelos apoiados no balcão de madeira e

a cabeça pousada sobre a mão, quase se entregando nos braços do

sono tentador, quando um pernilongo passou zunindo ao lado da

sua orelha a fazendo dar um pulo de susto.


Irritada, ela usou a toalha que tinha no ombro para espantar a

coisinha barulhenta e deu uma olhada no relógio de parede, vendo


com desânimo que ainda faltavam alguns bons minutos até que

pudesse ir embora. O senhor Grant, dono da botica, deu ordens


estritas para ela fechar somente às oito horas, não importava se o

único ser vivo além dela fosse uma pequena mariposa que circulava
o fogo de uma luminária.

Estava cochilando uma segunda vez quando a porta da loja

foi aberta bruscamente. Emerald tirou o pano de prato do ombro e


fingiu que tirava uma mancha do balcão. Todo o seu futuro dependia

daquele emprego e ela não podia se dar ao luxo de perdê-lo. Era

muita generosidade do senhor Grant a ter contratado, mesmo sob o


risco de perder alguns clientes por causa dela.

A maioria dos outros empregadores achavam que ter uma

pessoa como ela por perto poderia atrair má sorte. Emerald já


estava acostumada com esse tipo de rejeição, agora aos vinte e

seis anos, isso já não a afetava tanto. Passou toda a sua vida
ouvindo o quanto era indesejada, primeiro pelo seu pai, que nunca

escondeu de ninguém que desejava filhos homens para o ajudar

com o negócio de caça. Segundo, pelo mundo que não estava

preparado para receber uma pessoa como ela.

— Senhorita Sandle! Senhorita Sandle!

O menino que entrara na loja correu até ela, afoito.


— O que há, Flynn?

— Deve ir para casa agora. — O garoto buscava fôlego.


Preocupada, Emerald rodeou o balcão, andou até Flynn, e o
agarrou pelos ombros ossudos. A primeira coisa que passou por sua

cabeça foi Pearl.

— O que aconteceu?

O rosto dela, antes relaxado pelo sono, adquiria feições

rígidas.

— A senhora Sandle pediu que eu dissesse a você que fosse


correndo para casa.

Emerald tirou o avental por cima da cabeça. Sua mãe nunca

mandaria a chamar no meio do expediente se não fosse urgente.

Ela saiu pela porta da frente sem se importar com mais nada.

Depois se explicaria para o Senhor Grant. Ele entenderia, o boticário

já a perdoara por deslizes muitos maiores.

Assim que irrompeu pela porta da frente da pequena casa, o


corpo de Emerald foi jogado para trás pelo de Pearl.

— Em, não deixe que ele me leve, por favor, não quero ir!

A garota chorava desconsolada contra o peito de Emerald,

que tentava entender o que estava acontecendo.

— O que houve? Por que está chorando, Pearl? — Emerald

tentou consolar a irmã, que a apertava com tanta força que doía.
— Sua irmã é uma filha ingrata, é o que houve. — Pearl foi

arrancada de Emerald, que quase foi levada pela brutalidade do


puxão de seu pai, e foi atirada no sofá. — Depois de tudo que eu fiz

por você, é desse modo que me retribui?


Emerald cerrou os punhos, contendo a vontade de desmaiar o
pai com um soco.

Para Digle Sandle, as manter dentro de uma casa caindo aos


pedaços a pão e água era generosidade. Ele acreditava que elas

deviam ser muito agradecidas pela vida miserável que levavam, pois
se pelo menos tivessem nascido homens, poderiam trazer sustento

para dentro de casa e não precisariam viver de migalhas. Era culpa


delas por terem tido o infortúnio de nascer em um corpo tão frágil. A
única serventia que tinham era conseguir casamentos vantajosos,

mas isso também estava fora do alcance das irmãs Sandle já que,
além de não serem bonitas, não tinham um dote.

Emerald notou que o pai tinha a perna ferida, pois mancava e


sangrava. O nariz também começava a ficar roxo, mas isso não era

tão estranho, já que era recorrente que ele aparecesse machucado


após passar a noite fora de casa em bebedeiras.
— Como poderá dormir à noite sabendo que é a culpada pela

morte do seu pai?


Pearl chorou com ainda mais força, soluçando.

— Não posso ir pai, por favor, não me faça ir.


O homem se armou para cima de Pearl e Emerald preparou-

se para se colocar na frente da irmã. Como fizera tantas vezes.


— Você vai sim, ou condenará sua mãe e sua irmã ao

escárnio público. — Disse o pai, com severidade.


Como podia continuar tão indiferente ao choro da própria
filha? Cada soluço que Pearl dava, era um tiro no peito de Emerald.

— Para onde Pearl estará indo? — Emerald se fez ouvir e os


olhos furiosos de seu pai caíram sobre ela.

— Aquele conde miserável! — Ele gritou e atirou um copo na


parede, os cacos de vidro voaram para todos os lados e a mãe
delas se encolheu no fundo, sem produzir um único som que seja.

— Ele ameaçou me tirar a vida por atirar em um maldito cervo. Tive


que oferecer sua irmã ou teria me matado.

Não! Não! Não! Apenas não!


— Como pôde oferecer sua filha em troca de um cervo, não

se envergonha? — Emerald nunca sentiu tanto nojo do sangue que


corria em suas veias. Se pudesse, trocaria de família por qualquer
outra, qualquer uma que não tivesse ligação com esse homem que

era obrigada a chamar de pai.


— Me envergonhar? Depois de encher a barriga de vocês por
anos, sua irmã deveria se orgulhar por finalmente poder me ser útil
de alguma forma. — Ele sentou-se e descansou a perna ferida em

cima de uma cadeira.


— Eu irei em seu lugar — disse Emerald, com bravura.

O homem apenas a encarou e explodiu em uma gargalhada.


— Olhe para você, acha mesmo que um conde a aceitaria em
sua cama? É capaz de ele mandar me prender se você aparecer em

sua porta. — Emerald abaixou seu rosto envergonhado para o chão.


Sabia que não era tão bonita quanto Pearl, na verdade, não podia

competir com mulher alguma, mas ter essa verdade esfregada em


sua cara sem nenhuma piedade doía mais do que seu orgulho

permitia admitir. — Se Pearl for generosa e se esforçar para agradar


ao conde, poderá virar amante dele e quem sabe nos dar uma vida
melhor.

Pearl soltou um som de desamparo em meio ao choro que fez


o coração já maltratado de Emerald se encolher até virar um grão de

poeira.
— Pai, por favor…
— Acha que temos escolha, maldição? — O homem explodiu

outra vez, e Emerald se conteve para não tremer de medo e mostrar


que ele tinha poder sobre ela. — Aquele fodido sabe o meu nome,
ele me buscará até nos portões do inferno, se não for sua irmã, será
eu, e se eu morrer, quem vai sustentá-las?

— Mamãe, por favor. — Pearl suplicou para mulher encolhida


do outro lado do cômodo, na vã esperança de que uma palavra de

sua mãe pudesse mudar seu cruel destino.


Emerald sequer ergueu a cabeça para olhar sua mãe. Depois
de tantos anos esperando uma atitude dela e se desiludindo,

aprendera que mantinha seu coração seguro de ser ferido se não

depositasse fé nas pessoas.


— Obedeça seu pai.

O som do choro que saiu de Pearl após ouvir as palavras frias

da mãe fez os olhos de Emerald se encherem de lágrimas, mas não

de tristeza pela sua realidade, mas ódio. Ódio por ter nascido com o
sangue desse homem em suas veias, ódio por ter nascido naquele

corpo, ódio por levar o nome dele, mas principalmente por não

poder fazer nada para mudar isso.


— Não darei espaço para mais perguntas, a leve para cima e

cuide de arrumar as malas dela! Amanhã pela manhã eu estarei

pronto para a levar para a casa de Clarendon.


Emerald estendeu uma mão para a irmã.
— Venha, Pearl.

A menina logo a acompanhou, desolada, em direção ao


quarto que compartilhavam no final do corredor. Emerald trancou a

porta ao passar.

— Vamos fugir — Pearl sugeriu de imediato.


A ideia já tinha passado pela cabeça de Emerald, mas elas

não poderiam fugir, não por enquanto, se não quisessem morrer de

fome. O dinheiro de suas economias duraria alguns meses, mas

eventualmente acabaria e foi um extremo sufoco que Emerald


conseguisse o emprego de atendente na botica, não conseguiria

emprego em outro lugar, não um que fosse digno, e não queria

arrastar Pearl consigo para o inferno. Emerald queria que Pearl


apenas estudasse, tudo estava perdido para ela, mas sua irmã

ainda tinha a chance de uma vida digna.

— Fique tranquila, Pearl, já tenho a solução para isso.


A irmã a olhou com olhos vermelhos e inchados, cheios de

esperança. Pearl era tão pura. A crueldade do mundo nunca

corrompeu o coração dela, diferente do de Emerald que era cheio

de ódio e rancor. A única parte do coração dela que ainda se


mantinha limpa era a parte em que Pearl habitava. O resto fora

comido por vermes.


— Tem?

Emerald anuiu.

— Nosso pai prometeu uma de suas filhas não foi? Eu irei em


seu lugar.

— Espere, não, não é a melhor solução.

— Tem algo melhor que isso?

A irmã mais nova ficou em um silêncio hesitante. Emerald


percebeu que doeu em Pearl não ter uma resposta.

— Morrerei de culpa se fizer isso por mim — sussurrou, com

os olhos azuis voltando a se encher de lágrimas.


Emerald a abraçou e a segurou bem forte junto ao peito.

— E eu morrerei de culpa se deixar que você vá.

A beijou na testa.

— Sinto muito, Em. Queria ser tão corajosa quanto você.


— Não sinta, mandarei cartas para você todos os dias. —

Emerald não sabia se podia prometer algo assim, mas queria

confortar sua irmã. A puxou para a cama e se aconchegou ao lado


dela. — Um dia eu levarei você para morar comigo.

— Fará mesmo? — indagou uma Pearl esperançosa.

Era o que fazia Emerald amar tanto sua irmã. A capacidade

de ter esperanças mesmo quando a desilusão era tão certa quanto


a morte.

— Sim, imagine nós duas vivendo na mansão do conde de


Clarendon. Lembra quando éramos crianças e ficávamos sonhando

com isso? — A irmã balançou a cabeça devagar. — Pois será como

nos nossos sonhos, cavalgaremos pelas pradarias e tomaremos sol


no gramado, faremos piqueniques sob a sombra das macieiras.

A garganta de Emerald apertou, sabendo que esse sonho

nunca seria possível. Quantas promessas como essa já fizera a

Pearl?
— Acha que o conde deixará que alimentemos seus animais?

Emerald engoliu em seco para desfazer o caroço que se

formou em sua garganta. Se abrisse a boca, choraria e não queria


passar a última noite ao lado de sua irmã dessa forma.

Duvidava muitíssimo que o conde fosse ter alguma clemência,

mas disse o que Pearl precisava ouvir para não adoecer de tristeza

quando ela partisse. A irmã teria que acreditar que um dia Emerald
voltaria. Isso a manteria viva.

Sonhos eram a única coisa valiosa que elas tinham.

Emerald continuou falando até que a respiração de Pearl


ficasse pesada, e quando teve certeza de que sua irmã dormia,

levantou devagar e começou a fazer sua mala. Se é que podia


chamar de mala uma trouxa com quatro vestidos, uma escova de

cabelo e dois pares de meias furados. Ela não podia esperar até o

nascer do sol. Emerald já sabia que seu pai nunca concordaria em a

levar e não queria arriscar que Pearl fosse levada à força.


Antes de sair pela janela do quarto ela olhou mais uma vez

para a irmã, prometendo em um sussurro que voltaria para a buscar

e só então partindo. Enquanto andava sozinha em direção à casa do


conde, Emerald só conseguia pensar que nem teve tempo de

explicar para o senhor Grant o porquê de não ir trabalhar no dia

seguinte, e nem nos dias que se seguiriam.

E também tinha Brice...


Remoer isso não adiantaria muito, pois a única certeza que

Emerald tinha era que não veria aquelas pessoas por um bom

tempo.
Emerald chegou nos portões da propriedade do conde de
Clarendon na aurora do dia. Os músculos das suas pernas

queimavam por ter andado todo o trajeto até ali, mas isso estava
sendo aplacado pelo receio do que a esperava a partir do momento
em que cruzasse aqueles portões. Ela tinha demonstrado tanta

coragem para Pearl, mas agora que estava longe da irmã não

conseguia mais se conter. Tremia de pavor só de pensar no destino

que o conde escolheria para ela.


Olhou para as grandes muralhas gastas que circulavam a

propriedade e para os portões que tinham barras de ferro da


espessura do seu braço, três vezes o seu tamanho e com pontas de

lança. Tudo naquela paisagem gritava: CORRA! Mas ainda assim,


contrariando seu senso de sobrevivência, Emerald deu um passo à

frente. O medo revirou seu estômago. A única coisa que a


tranquilizava era saber que a probabilidade de conviver com o

conde era pequena. Ela tinha pavor dele desde que ouvira falar em

seu nome. Black Hyde. Emerald sentia calafrios em todo o corpo só


de imaginar.

E quem não teria medo de um homem que vivia tão recluso

que ninguém sabia dizer como era seu rosto?


Ele era praticamente uma lenda. Um mito.

Emerald teve dificuldades para abrir o portão e um pouco

mais para o empurrar. O rangido que as engrenagens fizeram ecoou


muito longe, o que a fez pensar que há muito tempo ninguém o

abria. Quando conseguiu entrar, ela olhou para o grande pedaço de


terra que teria que andar para chegar até a mansão. Aquela era a

primeira vez que Emerald entrava nos terrenos de High Garden.

Quando criança, ouvira muitas histórias de um tempo em que

a mansão do conde Clarendon recebia os aldeões quase todos os

fins de semana. O antigo conde era um homem generoso e não

privava o povo de se deleitar com as riquezas da propriedade, dava


festas, permitia a caça e a pesca em seu terreno, mas um dia, o tiro

de um caçador acertou por engano o peito de um dos filhos do


conde. A morte do menino fez com que o homem entrasse em um
luto profundo. Ele ordenou que erguessem muralhas tão altas que

seriam vistas a quilômetros da cidade. Desde então, ninguém podia

mais adentrar aquelas terras e o que restara eram fábulas que se

perdiam cada vez mais com o tempo. O conde atual herdara o mal

gênio do seu ancestral e mantinha a tradição.

Emerald entendeu o porquê. Se fosse dona de tudo aquilo,


também morreria de ciúme. Existia vida em cada pedaço de terra.

Era possível ouvir o canto de vários pássaros enfeitiçando a manhã,

as árvores tinham as folhas alaranjadas por causa do outono e

muitas delas já estavam caindo, colorindo o solo. Na sua direta, ela

viu um lago e viu que vários animais bebiam água nas margens, em

perfeita harmonia. Claro que ela já ouvira que o terreno do conde

era rico em fauna, mas nunca imaginou algo dessa magnitude.


Emerald sentiu vontade de se sentar na grama para sentir o

calor do sol nascente em sua pele, mas seria uma péssima ideia,

então continuou. Como não viu ninguém na frente da mansão, deu a

volta na casa. Encontrou um vasto jardim, onde se erguia um

grande labirinto de cerca viva.

Emerald não pôde resistir quando viu um pequeno filhote de


veado bebendo água com os pássaros em um chafariz. Andou até lá
para ver o animal de perto. Nunca tinha visto uma criatura parecida,

pelo menos não com vida. Seu pai costumava os caçar. Fora da
época de caça era proibido abatê-los e a cada ano se tornava mais

raro conseguir um tão bonito. Tudo era aproveitado. Desde os


chifres em sua cabeça aos cascos de seus pés e por isso valiam
uma fortuna.

Emerald se encontrou surpresa ao se aproximar dos animais


e nenhum deles correr de medo dela, apenas a olharam com pouco

interesse e continuaram bebendo água, vagarosa e passivamente.


Ela chegou perto do filhote e se inclinou na borda do chafariz para

lhe tocar o pelo das costelas, foi quando de repente o animal


desviou de seu toque e ela passou direto, caindo de cara na água
fria da fonte. Emerald voltou para a superfície puxando o ar para os

pulmões, deu um olhar fulminante para o bicho. O veado parecia


estar zombando dela.

— Seu pequeno traiçoeiro.


— O que está fazendo?

Emerald sentiu o coração bater na garganta ao ouvir uma voz


poderosa atrás dela. Ela se virou na direção de onde vinha, mas não
vinha de lugar algum, não tinha ninguém lá. Questionou sua lucidez,

mas ela não podia estar louca, Emerald sentia que não estava
sozinha. Podia sentir olhos descendo sobre ela. Podia senti-los

rasgando suas roupas e se alojando sob sua pele. A devorando


parte por parte.

— Olá. — Sua voz saiu trêmula. — Me chamo Emerald


Sandle, e vim em nome de Digle Sandle para saldar sua dívida.

— Está aqui por vontade própria? — A voz imponente voltou a


invadi-la.
— Como?

Os dentes dela começaram a bater feito castanholas. Ela não


sabia se era de medo ou por causa do frio.

— Você veio até aqui porque quis ou porque o maldito do seu


pai a obrigou?
— É claro que eu não estaria aqui se tivesse nos dado outra

opção.
Ela se arrependeu da resposta atrevida antes mesmo de

proferir a última palavra. Era como se o olhar que pesasse em cima


dela ficasse ainda mais abrasador. Emerald mal podia respirar.

— Então dê meia volta e saia das minhas terras.


Ela sentiu que ele ia deixá-la, procurou com a vista para ver
se encontrava uma sombra, mas não viu nada.

— Eu retiro o que disse, sim, eu vim por conta própria!


Tudo ficou silencio por um bom tempo, um tempo tão longo
que Emerald achou que ele tinha ido embora. Por um momento, ela
sentiu desespero por imaginar como seria quando retornasse para

casa. Seu pai deixaria suas costas em carne viva.


— O que você é?

Seu coração deu um salto. Emerald gostaria de fazer a


mesma pergunta a ele.
— Não é óbvio?

— Quero saber por que tem essa aparência. — Ele parecia


impaciente.

— Ah, isso!
Emerald coçou a têmpora. Sem saber o que devia dizer.

Ela era muito nova quando aprendeu que era diferente das
outras pessoas. Emerald não pôde ir à escola porque acreditavam
que o que tinha era contagioso, além de que as outras crianças a

machucavam. Tudo só foi piorando à medida que foi crescendo,


mas ela aprendeu a se proteger.

Sua pele era muito branca, não como a de Pearl, que tinha
um fundo rosado, mas branca, como pétalas de lobélia, e ela não
sabia porquê. Apenas nasceu assim. Essa condição a fez ter uma
vida limitada. Seus olhos não suportavam muita claridade, e se
ficasse muito tempo em exposição ao sol, adquiria queimaduras.
Emerald não podia trabalhar colhendo algodão como sua

mãe, e os outros empregos exigiam um nível básico de estudos que


ela não tinha. Teve que ouvir a vida inteira o quanto era inútil pelos

lábios do pai e por vezes ele a culpava pelas desgraças que eles
passavam pois era por Emerald ser como era que eram tratados
com desprezo pelo restante do vilarejo.

— Você questiona por que o céu é azul?

— Às vezes.
Emerald esperava que ele dissesse que não, que tipo de

doido questiona a cor do céu?

— E você já teve uma resposta?

— Não.
— Pois bem, ele apenas é azul porque é. É o mesmo comigo.

— Ela disse, sem jeito.

Houve um momento de silêncio condescendente.


— O que estava fazendo? — ele perguntou de súbito e ela

jamais imaginou que sentiria alívio por ouvir aquela voz que mais

poderia ser a voz de um pesadelo, se pesadelos falassem.


— Eu apenas queria tocar no seu veado, mas ele desviou e

eu cai na água.
Ela abraçou o corpo para se proteger do frio e também porque

suas roupas se pregavam ao seu corpo, marcando muito suas

curvas.
— Certamente, ela deve ter sentindo que o sangue Sandle

não é boa coisa.

Emerald sentiu vontade de se encolher de vergonha. Ele tinha

razão. Ela ouvira isso sua vida inteira. Seu sangue era o seu fardo.
E nada a humilhava mais do que ser chamada de Sandle.

— Agora que estou aqui o que pretende fazer? — ela

indagou, desejando trazer logo um fim a aquilo. — Me dará um tiro


para se vingar do meu pai? Se for, peço que faça isso logo, odeio ter

que esperar.

Ela ficou lá parada, esperando que uma bala encontrasse seu


peito, mas de novo, tudo que ganhou foi o silêncio

— Se não vai me matar, me fará de escrava, sim? Me deixará

cuidando dos animais para o resto da minha vida como um castigo

pelo que meu...


— Cale-se e espere aqui.
A ordem a atingiu e ela engoliu as palavras. Se somente com

a voz aquele homem conseguia ser pavoroso, ouvir aquela voz

saindo de um rosto devia ser ainda mais amedrontador. Ela sentiu


um arrepio na espinha.

Uma porta nos fundos da casa se abriu e um homem passou

por ela. Emerald não precisava ouvir a voz dele para saber que não

eram a mesma pessoa. Ele andou até Emerald com as mãos na


frente do corpo e tinha uma aparência cansada, mas seus olhos

gentis a fizeram se sentir fora de perigo.

— Eu a levarei até os seus aposentos, senhorita — disse ele,


indicando que Emerald o seguisse.

Emerald olhou para dentro da casa escura e arregalou os

olhos quando um pensamento passou por sua cabeça.

— Oh céus, ele me dará de comer para a fera, não é?


O rapaz a olhou sem entender nada.

— A fera?

— Ouvi boatos de que tinha uma fera por aqui. As pessoas


escutam os rugidos à noite.

— Não tem fera nenhuma, senhorita — disse o rapaz, mas

não parecia ter muita certeza disso.


Emerald o acompanhou até a casa, cautelosa. Ele a levou por

uma escada e por muitos corredores cheios de janelas tampadas


por cortinas. Ela foi o trajeto todo com medo de uma fera horripilante

sair da escuridão e comê-la de uma bocada só. O criado parou de

frente para uma porta dupla, a abriu e deu espaço para Emerald
entrar. Logo depois saiu, a deixando sozinha sem saber o que fazer.

Emerald foi até as janelas, estranhando que fossem as únicas com

as cortinas abertas que viu na casa inteira, e as fechou, não queria

que a claridade do dia lhe desse dor de cabeça.


— Este será o seu quarto — disse a voz de antes e Emerald

colocou uma mão no coração.

— Maldição, pare de chegar desse jeito nos lugares — ela se


queixou, sentindo o coração louco no peito.

Olhou ao redor, procurando um lugar onde aquele homem

poderia estar escondido. Estava começando a suspeitar que ele era

uma assombração.
— Farei uma curta viagem, não deverá sair daqui até que eu

retorne, se você fizer eu saberei. — Ela estremeceu. — Os criados

trarão suas refeições e tudo que você precisa. Apenas não ande
pela casa.
— Espere, não vai me dizer o que pretende fazer comigo? —

novamente o silencio foi sua resposta e dessa vez, ela soube que

estava sozinha.
Emerald se virou e explorou o quarto. Era muito luxuoso.
Trabalhou uma vez na casa de um coronel em Bath e ficara muito

impressionada com a riqueza do homem, mas nada se comparava


àquilo. Ela se sentiu como uma mancha de dedo em uma prataria
bem polida. Tudo parecia tão caro que ela não conseguia deixar de

pensar que seu lugar não era ali.

Olhou para a grande cama coberta por um dossel de cortinas

verdes e sedosas pregadas no teto e lembrou da cama que dividia


com Pearl desde sua infância. Foi até o colchão alto e passou uma

mão pela coberta, somente o edredom já era muito mais grosso do


que o colchão cheio de palha que dividia com Pearl. O colchão era
tão fino que quando ela se deitava podia sentir os paus da grade

nas suas costas e isso tinha lhe gerado muitas dores nas costas.
Emerald sentiu vontade de subir naquela cama e pular em

cima como uma criança, apenas para saber qual seria a sensação,

mas estava molhada e suja. Se chegasse a estragar aquela obra de


arte não teria dinheiro suficiente para ressarcir o conde nem se

trabalhasse como uma mula até o fim dos seus dias.

Por que o conde a tinha instalado em um quarto tão opulento?


Ela foi até uma das janelas de novo, onde colocou a cabeça

para fora e olhou para baixo. Era alto demais para escapar com uma

corda ou para pular lá de cima. Talvez por isso ele a tivesse


colocado ali, para que ela não pudesse fugir na surdina. Frustrada,

ela andou até um armário de ébano que era acoplado na parede, as


maçanetas eram em formatos de rosas feitas com um material

branco, Emerald as puxou.

Ela sentiu seu queixo cair.

O armário de roupas que se abriu diante dela era maior do

que o seu quarto.

O chão era forrado por um carpete branco, feito de pele de


urso. Emerald não devia entrar, não queria ser pega bisbilhotando,

mas como poderia resistir a aquele paraíso? Tirou os sapatos e deu


um passo para dentro. Seus pés calejados eram incapazes de
apreciar a maciez do tapete. Passou a vista pelas roupas,

surpreendendo-se com a infinidade de peças e acessórios do

vestuário feminino. Vestidos, ligas, meias, espartilhos, camisolas,

tudo feitos em tecidos que Emerald nunca tinha visto tão de perto.

Ela tentou conter o formigamento nas pontas dos dedos, mas antes

que desse conta já estava tocando em tudo.


A sensação era indescritível. Os vestidos dela eram sempre

de chita e nem nos seus maiores sonhos poderia pagar por um

espartilho, usava apenas uma fina camisola por baixo das roupas, e

às vezes tinha que dividi-la com Pearl.

Ela moveu a cabeça para o lado e levou a mão ao coração

quando tomou um susto ao ver seu próprio reflexo. Um espelho

cobria toda uma parede. Emerald não conseguia exprimir a própria


fascinação. Através do espelho ela enxergou um manequim de

arame atrás dela, onde estava um vestido lilás perolado com

mangas bufantes e cheio de tules. Mesmo alguém ignorante como

ela podia reconhecer um vestido de noiva. Talvez o conde

planejasse se casar novamente e a função de Emerald seria ser a

criada pessoal da futura condessa.


Ele era um homem muito apaixonado se tinha feito algo tão

bonito como aquele armário para a noiva. Era possível ver em cada
detalhe que houve muita dedicação e que cada uma das peças foi

cuidadosamente pensada. Emerald jamais poderia colocar um


vestido como aquele em seu corpo, jamais alimentou um desejo
como esse, mas seria divertido vesti-los na condessa.

Ela voltou para o quarto, fechando bem as portas para


ninguém saber que esteve ali e sentou-se no chão para mexer na

bolsa com seus pertences, Emerald desenrolou a arma escondida


entre os panos e a colocou debaixo do colchão pesado, parecia ser

um bom esconderijo. A tinha pego entre as muitas do seu pai,


Emerald não hesitaria em usá-la se fosse necessário. Depois de
guardar tudo de volta fez a única coisa que podia. Esperar.

Enquanto permanecia sozinha na imensidão daquele lugar


desconhecido, Emerald sentiu falta de Pearl. A aquela altura seu pai

já saberia que ela não estava em casa. Só podia rezar para que ele
não descontasse em Pearl a raiva que sentiria dela. Emerald se

sentia sufocando só de imaginar isso e lutava contra a vontade de


correr para buscar sua irmãzinha. Pousou seus olhos em uma porta
do outro lado do quarto, mas não deu muita importância porque
sabia que a maioria das casas de nobres tinham todos os cómodos

interligados.
Ela acabou adormecendo no chão e acordou quando ouviu as

badaladas de um relógio. Estava se espreguiçando quando alguém


bateu duas vezes na porta e entrou em seguida, Emerald deu um

salto e o homem de mais cedo a olhou hesitante.


— Me desculpe senhorita, não queria assustá-la.
Emerald achou muito esquisito alguém da sua mesma posição

se referir a ela de modo tão subserviente.


— Está tudo bem. — Gesticulou com a mão, e as usou para

se esticar e ficar de pé. Bateu nas saias do vestido para


desamassar e tirar a poeira, embora duvidasse que fosse ter um
grão sequer de poeira no chão, era tão bem encerado que ela podia

ver seu próprio reflexo. Se tinha a possibilidade de alguém sujar


algo ali, era ela a de sujar o chão.

— Você não precisa se deitar no chão, a cama é muito mais


confortável — o criado disse, com uma calma risonha.

Emerald olhou para a cama, realmente parecia confortável e


convidativa, mas não parecia certo que ela se deitasse ali e se o
conde soubesse?
— O lorde Clarendon disse que trouxesse algo para o seu
desjejum. — Ele puxou um carrinho cheio de bandejas cobertas e o
deixou no meio do quarto. — À noite, após o jantar, prepararemos o

seu banho. — Ele parou perto da porta com as mãos juntas na


frente do corpo. — Deseja mais alguma coisa?

— Sim, até quando ele pretende me manter aqui?


— Tudo que sei é que devo trazer refeições quatro vezes ao
dia, senhorita.

Emerald viu que não conseguiria arrancar nenhuma


informação do criado, então deixou que fosse embora.

Ela desejou fazer uma greve de fome para começar a mostrar


seu descontentamento por estar sendo mantida em cárcere privado,

mas o cheiro que vinha das bandejas era divino e ela não comia
desde o dia anterior. Resolveu que poderia protestar de outra forma.
Andou até o carrinho e destampou as bandejas. Sentiu sua boca se

encher de saliva. Presunto, ovos mexidos, tiras de porco, tortas,


suco de laranja, torradas e mel.

Mel!
Emerald nunca comera nada que continha naquelas bandejas.
Sentou-se em uma cadeira e comeu usando as mãos. Era tão

bom que ela desejou chorar e se sentiu meio culpada por comer
tanto que sua barriga doeu a manhã inteira. Ela passou o restante
da manhã contando os minutos nos dedos e de novo trouxeram seu
almoço. Apesar de ainda estar farta do desjejum, Emerald não

conseguiu rejeitar a comida pois não sabia quando poderia comer


assim outra vez. Ela se encheu de carne, pudim de figo e bebeu

vinho de verdade. No jantar foi a mesma coisa. Foi servido peixe


com batatas fritas, tortas de rim, pudim e chá, no fim, Emerald
gemia de dor no estômago e sentia que poderia vomitar a qualquer

instante, mas nunca esteve tão satisfeita.

As sete da noite entraram algumas mulheres no quarto


carregando uma banheira pesada de cobre e começaram a enchê-la

com água quente. Adicionaram sais de banho na água e até pétalas

de flor de alisso. Emerald estava com vergonha por estar recebendo

tanta atenção quando na verdade merecia a miséria para pagar o


prejuízo que o seu pai causara ao conde. Ela precisava mesmo de

um banho, mas teria ficado feliz se tivessem a deixado se banhar no

lago da propriedade. Quando tudo estava pronto, ela esperou que


as criadas a deixassem sozinha, mas as mulheres permaneceram

no quarto, a olhando. Talvez elas estivessem esperando que ela as

dispensasse.
— Está tudo ótimo. Obrigada — disse, sem jeito, mas as

mulheres não se moveram.


— Nós devemos banhá-la, senhorita — disse uma delas e

Emerald as olhou além de horrorizada.

— Eu posso me banhar sozinha, venho fazendo isso


consideravelmente bem há vinte e seis anos. Quero dizer, ninguém

nunca reclamou. — Riu de nervoso.

— Você é convidada do Lorde Clarendon, devemos deixá-la

preparada de acordo com o gosto do lorde. — Disse a mais nova


dentre elas.

Emerald sentiu seu corpo arrepiar em cada pedaço de pele.

“Gosto do lorde”? O que isso queria dizer?


Emerald achou que devia recusar, mas viu que elas não iam

ceder, portanto deixou que as mulheres a despissem e muito

constrangida deixou que elas a banhassem. Ela nunca tomou um


banho tão intensivo antes. Elas desfizeram o coque trançado que

prendia seu longo cabelo e o lavaram com uma essência cheirosa

que fez espuma nos fios. Enquanto uma mulher massageava seu

couro cabeludo outra ralava seus pés com uma pedra. Também
cortaram suas unhas e esfoliaram a sua pele até que tirassem os

vinte e seis anos de pobreza dela.


As mulheres a vestiram com uma roupa de dormir de tecido

fino e macio, era como ser acariciada pelas penas das asas de um

anjo. Deixaram que seu cabelo secasse livre e depois saíram. Todas
aquelas regalias só podiam ter uma explicação: o conde estava

preparando-a para dá-la de oferenda para a fera que mantinha

escondida em alguma parte daquela casa enorme. Emerald estava

certa disso.
Andou até a luxuosa cama rodeada pelo dossel e deitou uma

mão ali, normalmente não se sentia tão cansada àquela altura da

noite, mas o cansaço parecia impeli-la para frente, a mandando se


deitar. E foi o que ela fez. Quando suas costas encontraram o

colchão, Emerald se sentiu deitada sobre uma nuvem. Foi

instantaneamente embalada pelo sono. Mesmo estando tão

confortável, Emerald teve sonos rasos, permeados de sonhos com


feras pulando em cima dela durante a noite e silhuetas robustas

escondidas nas sombras.


Ela era atraente de uma forma perturbadora, Hyde constatou,
com certo desprazer. Era muito errado que ele estivesse a

observando durante o sono. Ele sentia que era errado, mas não
conseguia conter esse desejo. Esteve ansiando por aquilo desde o
momento em que a viu pela manhã, molhada e iluminada pela luz

do dia, rodeada pelos pássaros e pela natureza, como uma ninfa.

Se pegou sem palavras, diante de um sentimento incapaz de

ser nomeado que se tem ao estar diante de algo magnífico. Por um


instante ele acreditou que ela era uma divindade mitológica e quase

saiu das sombras para vê-la de perto, para tocá-la e prendê-la em


uma gaiola de vidro, mas se fizesse isso seria capaz de assustá-la e

fazê-la fugir. Então esperou durante todo o dia, se escondendo em


seu quarto atrás da porta de comunicação, ouvindo seus

movimentos até que ela dormisse e quando a lua brilhou alto no


céu, ele se esgueirou para o quarto dela como um ladrão na noite

fria.

Ela não parecia real. Se não fosse a suave respiração que


deixava sua boca rosada, ele poderia dizer que ela era fruto de sua

mente louca. Os cabelos brancos, a pele translúcida, os olhos

violeta, alguém com essa aparência era a prova irrefutável de que


anjos existem. Como uma mulher nascida de alguém como Digle

Sandle podia ser tão… santo Deus, ele não tinha nem palavras para

descrevê-la.
Mesmo coberta por um farrapo e usando um penteado

horrendo, ela era fascinante. Hyde soube, no mesmo instante, que


Emerald era a sua solução. Hyde esperava que ela estivesse tão

desesperada quanto ele. A julgar pela maneira como o pai a

ofereceu, como um objeto para saciar os desejos dele, ela não devia

ter nenhum pretendente. Seu coração era puro, e seria dele.

Hyde desceu os olhos pelo corpo dela, uma voz em sua

consciência lhe dizia que aquilo era errado, mas ele a ignorou como
vinha fazendo há trinta e dois anos. Não via uma mulher tão
formosa há muito tempo e se tudo fosse de acordo com o que
planejava, em questão de dias aquilo não seria mais algo errado.

Pelo tecido translúcido da camisola de seda branca ele podia

ver absolutamente tudo. Seus seios caiam como duas meia luas,

suas costelas eram estreitas e sua cintura parecia ter sido esculpida

pelas mãos de Michelangelo, elas seguiam um desenho impecável

formando um quadril vantajoso e pernas formosas. Ela era cheia de


curvas. Com seios e coxas grossas, e o ventre saliente, uma mulher

feita para tentar.

Era verdade que ele teria ido adiante com seu plano mesmo

que não a achasse atraente, mas era muito conveniente que fosse.

O crápula do Sandle deveria estar achando que ele iria usá-la e

devolvê-la. Nunca. Hyde jamais deixaria uma criatura tão peculiar

como ela escapar de seu domínio. Ela entrou na masmorra dele por
vontade própria, se ofereceu como uma tola pelo pai inútil, e Hyde

jamais iria deixar que o sacrifício dela fosse em vão. Pelo que pôde

ver, ela tinha um péssimo gênio e um jeito de falar muito interiorano,

mas ele a domaria como fazia com todas as suas criaturas.

— Milorde.

Hyde cerrou os dentes por ter sido pego naquela situação


embaraçosa, não moveu a cabeça para não perceber que ele
estava envergonhado por ter sido pego contemplando sua nova

criatura.
— Não venha até aqui. — Ele disse, não queria soar tão

ameaçador, mas foi involuntário. Ninguém mais podia ver Emerald


daquela forma.
— Eu não tinha intenção de ir.

Hyde suspirou.
— Ela é bonita demais, isso pode ser um problema.

Se Emerald tiver consciência do quanto é tentadora, ela


jamais aceitará a proposta dele.

— Não acho que a beleza da moça seja o maior obstáculo


para ela aceitar esse acordo. O seu temperamento, milorde, é o que
devia preocupá-lo.

Hyde devia saber que Wilkins diria alguma coisa que o faria
desejar apertar seu pescoço.

— Você está encurtando cada vez mais seu tempo nessa


terra, Wilkins.

— Se não gosta dos meus conselhos poderia me demitir.


— Nunca. — Hyde quase tinha pena de Wilkins, mas não o
bastante para abrir mão dele. O rapaz assinou um contrato vitalício

com o demônio quando aceitou trabalhar para ele. Hyde sabia que o
criado jamais ia se demitir por uma questão de honra e princípios e

Hyde se beneficiava disso para mantê-lo ao seu lado. — Por que


está aqui?

— Está na hora de tomar o seu remédio, milorde.


— Acha que ela vai aceitar minha proposta? E seja honesto,

sem ironias e alfinetadas.


Wilkins suspirou, aceitando a oferta de paz temporária.
— Eu duvido que ela vá trocar o que você estará oferecendo

pela vida miserável que, com certeza, leva.


Ah, isso confortava, e muito, o coração inquieto de Hyde.

Ele vinha planejando aquele quarto há muitos anos, apenas


esperando a oportunidade, o encheu com vestidos e com todo tipo
de fascínio fútil que enche o coração das mulheres. Que mulher não

ficaria deslumbrada com a promessa de uma vida de conforto em


troca apenas de uma assinatura em um papel e o coração em uma

bandeja de prata? Claro que a parte mais difícil ainda estava por vir
e Hyde não podia ignorar sua aparência assustadora.

Afastou uma mecha do cabelo dela do rosto. Ela parecia


suave e delicada.
— Por favor, me ame. — Ele sussurrou para ela.
Torcendo, com desespero, para que seu pedido fosse
atendido.
Ele estava curioso para saber o que ela faria quando o visse.

Corria o grande risco de ela saltar da janela de pavor. Aceitaria


qualquer reação, mas nunca uma recusa. Hyde a viu estremecer só

de ouvir a voz dele, o que ela faria quando o visse por inteiro? Sua
estrutura abominável?
Ainda assim, Hyde estava acreditando que as circunstâncias

agiriam ao seu favor. Ele conseguiu convencer outras antes dela,


ela não seria diferente. Só precisaria saber o quanto ela estava

disposta a sacrificar e considerando a sua aparente pobreza, ele


não precisaria se esforçar muito para ganhá-la. A compraria. A

tomaria. A domaria. E faria com que ela o libertasse. Sim, era ela.
Tinha que ser ela. Emerald.
Ele a olhou dormindo mais um pouco, tão tranquila em seu

sono, sem saber que aquele era apenas o início de um longo e


penitente, pesadelo.
Essa rotina se seguiu por quatro dias. Foi o período mais
longo que Emerald levou sem fazer nada e isso estava a levando à

loucura. Principalmente, porque quando não estava ocupada com


algo, os pensamentos vinham atormentá-la.
Durante toda a sua vida, Emerald buscou as

responsabilidades para ela para poupar Pearl dos comentários

maldosos das pessoas e ao mesmo tempo da crueldade do seu pai.

Por muitos anos, aguentou a ira do homem sozinha para que não
respingasse em Pearl e agora que não estava ao lado de sua irmã,

seu pai a faria tomar a frente das responsabilidades que antes eram
de Emerald. Ela não conseguia nem imaginar o que Pearl estaria

passando nas mãos de seu pai sem sentir uma dor quase física.
Pensou na possibilidade de mandar uma carta escondida,

apenas para dizer que estava bem e que Pearl esperasse por ela,
mas duvidava muitíssimo que algum criado da residência fosse a

ajudar. Por mais que estivesse sozinha e recebesse a visita

somente do criado chamado Wilkins, Emerald não se sentia


sozinha. Era algo estranho, mas ocasionalmente imaginava estar

sendo espionada. A mansão do conde era silenciosa, não importava

a hora do dia. Até mesmo o arrastar do mais suave vento era capaz
de ser ouvido. Emerald pensou uma vez ou outra em abrir a porta e

correr para longe dali, mas tinha medo de tentar e ser engolida pela

fera.
A parte mais divertida foi que as criadas do conde passaram a

vestir Emerald com as roupas do armário. Algumas delas ficavam


apertadas em Emerald, impossíveis de fechar, e outras revelavam

pele demais. Claro, os vestidos foram feitos para uma mulher de

berço nobre, delicada e de aparência modesta. Emerald teve a

infelicidade de nascer com um corpo grande. Ela não ia mentir e

dizer que não apreciava ser bem tratada, mas não deixava de

pensar que uma hora o conde viria até ela para cobrar o preço pela
sua generosidade.
Ela sabia o que a esperava quando decidiu tomar o lugar de
Pearl e ir até a mansão do conde. Emerald era virgem, mas perdera

a inocência há muito tempo e quando percebeu que nenhum

homem estava disposto a levá-la para um altar, parou de alimentar o

desejo de preservar sua castidade para depois do casamento. Ou

dessa forma morreria virgem. Claro que seu pensamento mudou

quando, por alguma razão, Brice quis se casar com ela, mas se
tivesse que se tornar amante do conde em troca do bem estar de

sua irmã, então ela desempenharia esse papel sorrindo.

Com cinco dias de enclausuramento, ela estava observando o

arrastar lento dos ponteiros do relógio quando a porta de

comunicação que vivia fechada, soltou um estalo e se abriu sozinha.

Emerald continuou encarando a porta à espera de que algo se

revelasse por ela, mas nada veio, além do silvo do vento e de um


cheiro forte que fazia seu nariz pinicar.

As dobradiças rangeram quando ela empurrou a porta para se

abrir mais. Emerald percebeu que o aposento do lado do seu era um

quarto, quase idêntico ao dela, se não fosse pela decoração. Tinha

cheiro de orvalho, loção de barbear, e rosas. Uma combinação

excêntrica, que fez o coração dela bater mais forte. O que a fez ficar
realmente surpresa foram as rosas. Havia galhos com rosas
brancas por todas as partes, se pregando nas paredes e no teto, e

na madeira do dossel da cama e no chão. O cheiro forte vinha


delas.

Os mesmos galhos que circulavam toda a mansão do lado de


fora, se esgueiravam para dentro do quarto pela janela e
espalhavam rosas brancas em todos os lados. Seus olhos caíram

próximo à janela, onde uma rosa em particular lhe cativou a


atenção. Diferente das outras, muito extravagantes e cheias de

espinhos, ela era mais recatada, com sete pétalas protegendo seu
núcleo e o caule livre de espinhos. Mesmo que fossem todas iguais,

ela conseguia ser única, e lhe lembrou Pearl.


Emerald foi até a rosa e a puxou, a tirando de entre as outras.
— Não lhe ensinaram na escola que é errado roubar?

Emerald percebeu que não estava sozinha, se virou para


encarar seu visitante. Pela primeira vez ela pôde ver a sombra dele,

e seu corpo tremeu na base. Era medonho. Emerald nunca vira um


homem tão grande. Ela esperou que ele saísse da escuridão, mas

isso não aconteceu.


— Lamento, mas não fui à escola.
Ela deu dois passos cautelosos para trás. Seu peito frágil

incapaz de suportar a velocidade do seu coração. Emerald não


sabia distinguir onde seu medo terminava e sua excitação

começava.
— Solte essa rosa, você não fez nada para merecê-la! — ele

ordenou, em um rugido que a fez o temer. Emerald resistiu, todo o


seu esqueleto se dissolvendo de pavor da voz imponente.

— Você tem centenas de rosas como esta, ela não lhe fará
falta.
A verdade era que ela não queria abrir mão de sua rosa. A

apertou entre os dedos com força e sentiu uma fisgada de dor.


Emerald se enganara, achara que a rosa não tinha espinhos, mas

ela tinha um, que era letal o bastante para fazer o dedo de Emerald
sangrar.
— Não é o bastante o que eu tenho dado a você? Você tinha

que querer mais, não é? A ambição é o grande defeito dos Sandle,


pelo que vejo.

Emerald sentiu seu corpo esquentar de raiva.


— Palavras vindas de alguém que é tão covarde que não

consegue mostrar o próprio rosto.


Ela ouviu uma risada baixa. Perigosamente sensual.
— Poderia assustá-la se me visse.
Ela acreditou nele, mesmo que confiasse que ele não
desejava lhe fazer mal, sentia certa relutância no modo como ele
falava, parecia sombrio demais.

— Por quê? Acaso é um fantasma? — Ela riu com a própria


pergunta, sobretudo porque queria conhecer o rosto daquele

indivíduo peculiar.
— Não — Ele deu um passo a frente e ela contemplou sua
perna longa. — Eu sou uma fera.

Logo ele estava sendo banhado pela luz das velas. Emerald
sentiu um calafrio na espinha ao ver o rosto severo daquele homem.

Seus olhos pareciam pequenos fragmentos do caos presos em uma


redoma de vidro. Seu queixo tinha uma covinha e o maxilar era

proeminente e bem marcado. Os músculos de seu corpo eram


anormais. Ele era, na mais branda escolha de palavras, medonho.
Emerald soube no mesmo instante que jamais poderia se

tornar amante desse homem.


Ela desejou fugir dali uma segunda vez, mas se pulasse pela

janela viraria uma massa de sangue no chão. Mas a principal razão


por não ter feito isso, foi porque Emerald não o achava apavorante.
Na verdade, havia algo na periculosidade e no segredo que ele
escondia por trás daqueles olhos vazios que o tornavam
ligeiramente atraente.
Era um homem grande, alto e de postura. Poderia esmagá-la

só com os braços e Emerald sentiu seu corpo estremecer ao


imaginar aqueles braços fortes a rodeando. Não podia acreditar que

ele era o conde de Clarendon. Esperava alguém mais velho, e


menos… selvagem.
Só por instinto ela deu dois passos assustados para trás e viu

quando ele percebeu seu medo. Arrependeu-se por mostrar

fraqueza. Ele riu outra vez.


— Minha esperada, Emerald.

Ele disse o nome dela como uma promessa macia, de um

jeito que ela nunca tinha ouvido seu nome antes. Como se ela fosse

uma resposta, uma solução. Como se ela fosse preciosa. E em vinte


e seis anos de vida, Emerald nunca se sentira dessa maneira. Sabia

que era diferente, todos sempre faziam questão de deixar isso claro

quando olhavam para ela, mas aquele estranho a fez se sentir


diferente de uma maneira boa somente ao dizer seu nome.

— Você precisa fazer a barba. — As palavras deixaram a

boca dela involuntariamente.


— Você prefere assim?
Sim, ela preferia, mas não via motivos para expor sua opinião

e seria muito desrespeitoso criticar a aparência de um conde. Até


mesmo ela tinha limites.

— Tanto faz.

— Tsk. — Ele estalou a língua. — Deixarei que fique com a


rosa. — Emerald sentiu que ainda era cedo para comemorar. —

Desde que pague um preço por ela.

— Deixe-me adivinhar, quer minha alma?

Ela viu os lábios dele quase se esticarem em um sorriso.


Engraçado, ele já rira duas vezes, mas foi apenas agora que ela

sentiu que era verdadeiro.

— Quase isso. — Certo, ela estava começando a ficar


assustada. — Tenho comigo uma licença especial.

Apenas naquele momento ela notou que ele tinha um rolo de

pergaminho na mão.
— Para quê? — indagou, cautelosa.

— Para um casamento.

Emerald sentiu algo contrair em seu estômago, quase como

um sentimento de perda. Ele estava mesmo planejando se casar...


— Entendo, e você quer que eu seja a criada pessoal da

futura condessa?
Ela viu um brilho perverso passando pelos olhos dele.

— Não, eu quero você como minha condessa.

Ela observou o movimento arrogante da sobrancelha dele e


um pouco tarde demais, entendeu tudo. Arregalou seus olhos de

pavor.

— Você é louco.

Ele continuou inexpressivo.


— Nunca estive tão lúcido. Ao contrário do que dizem por aí.

— Você é um conde e eu a filha de um caçador.

— E?
Emerald estava perplexa. Isso era real? Ele estava mesmo

pedindo para se casar com ela? O conde? Esse homem?

— Eu sequer tenho estudos ou etiqueta, eu só serviria para

trazer vergonha a você.


— Isso é algo que pode ser facilmente resolvido, tenho planos

de contratar alguém para dar aulas de etiqueta para você.

Ela ficou boquiaberta, parecia que ele já tinha pensado em


tudo.

— Não seria mais fácil conseguir uma noiva que já soubesse

dessas coisas? Uma mulher que nasceu em seu meio? Eu sequer


tenho um dote e olhe para mim, mesmo que me cubra de roupas

caras ainda serei considerada inferior.


Ele levou os olhos para o chão por um momento.

— Sua "anormalidade" é o motivo para eu escolhê-la. Você é

perfeita para o que busco.


A verdade atingiu Emerald com toda força. Ele estava

propondo aquilo para ela porque a achava tão abominável que não

poderia recusar seu pedido pelo medo de não se casar nunca. Mas

isso não era verdade, ela ainda tinha Brice.


Esse homem horrível. Emerald teve certeza outra vez que

jamais seria capaz de ser amante dele. Jamais.

No entanto, ela sabia que tinha algo mais ali além do desejo
insano do conde de se casar da noite para o dia. Ele jamais

desceria a um nível tão baixo, o de casar com uma mulher como

ela, se não tivesse um objetivo mais forte por trás. Por acaso estava

morrendo e queria um herdeiro? Perderia o título caso não se


casasse até determinada data? Tinha que haver uma explicação!

— Qual o seu propósito com esse casamento lorde

Clarendon?
Ele juntou o polegar com o dedo indicador e começou a fazer

movimentos circulares com os dois.


— Teve um tempo que eu tive uma vida desgarrada. Era um

apostador, apostava em tudo, cartas, corridas de cavalos, lutas

clandestinas. Já fui reverenciado pelos meus parceiros pelas festas

que dava, e pela quantidade de mulheres que levava para cama em


uma semana... — Fez uma pausa reflexiva.

— E? — Emerald perguntou, ansiosa. Ele levantou os olhos

escuros para ela.


— E eu quero voltar a ter essa vida. — Ela o fitou, perplexa

por tamanha falta de escrúpulos. — Não tem nada que atice mais as

más línguas e capture mais a admiração dos homens do que um

homem casado que leva uma vida de libertinagem.


— E por que você acha que eu me submeteria a esse tipo de

matrimônio? — ela perguntou, ultrajada com a proposta daquele

conde perverso.
— Porque eu estou oferecendo uma saída para você, uma

vida onde não precise trabalhar nunca mais, onde não tenha que

aturar um pai intolerante e não tenha que sofrer mais com a

ignorância das pessoas. Sendo uma condessa você nunca mais


seria desrespeitada por ser diferente, você seria adorada. Olhe para

aquele armário. — Ele apontou para o bonito armário cheio de

vestidos e ela o fez, percebendo que ele também tinha acesso ao


armário por uma porta no quarto. — É apenas uma pequena parte

do que poderá ter.


Era uma covardia oferecer aquilo para alguém que estava

acostumada a trabalhar desde cedo para ter o que comer. Mas, por

baixo de toda a miséria, todos os defeitos e toda a sujeira, Emerald

ainda era uma mulher. O mundo a fez acreditar que por ser diferente
jamais podia almejar um casamento com amor, que devia se agarrar

a qualquer migalha de afeto porque nunca poderia ter mais do que

isso, mas ela era incapaz de abrir mão disso. Crescera com um pai
bêbado e apostador, e vendo a maneira como ele tratava sua mãe.

Teria mesmo coragem de se submeter à mesma vida? Não, ela não

tinha. Amava-se demais para isso.


— Ainda assim não me casarei com você. A vida de meu pai

não vale todo esse sacrifício.

O conde a fitou de cima a baixo, o maxilar torcido e os lábios

enrijecidos. A imagem do desprezo e arrogância.


— Você veio até aqui por vontade própria, comeu e bebeu da

minha comida, se abrigou no seio da minha casa e teve por cinco

dias a chance de ir embora, demostre gratidão. — Ele deu um passo


para a frente e ela deu um para trás.
— Gratidão não pode ser exigida, milorde. Além disso, você
me prendeu aqui.

— A porta esteve aberta a todo momento, se quisesse mesmo

ir estaria aqui esperando pelo meu retorno?


Emerald engoliu à força toda a sua indignação. Ela foi mesmo

burra, como não pôde simplesmente abrir a porta?

— Isso não quer dizer que eu esteja disposta a aceitar ser sua
esposa!

Ele caminhou até ela, os passos tão pesados quanto as

batidas do coração dela. Emerald não se acovardou, se fizesse isso

ele saberia que ela era fraca, portanto, o encarou com seu nariz em
pé. Não deixaria aquele olhar de desprezo desestabilizá-la. Era

pobre de bens, mas rica em tudo o que importava. Principalmente

de orgulho.
Clarendon pegou a mão dela e a levantou diante do rosto,

Emerald percebeu que o sangue do corte do espinho escorria em


abundância.
— Estou lhe oferecendo um título de condessa. — Emerald

observou imóvel ele levar seu dedo sujo de sangue à boca e sugá-
lo, em um único e eficiente movimento. Sua língua envolveu o dedo
dela, e o massageou. Estranho, ele tocou em seu dedo, mas ela o
sentiu em cada parte do seu corpo. — Qualquer mulher tirada da
lama o aceitaria sem pestanejar.
Ela tinha tão pouco valor assim?

Foi só então que Emerald percebeu a imensidão da proposta.


Ele estava oferecendo a ela o título de condessa. Um condado
inteiro. Tudo que sempre quis. Por lei ela seria dona de Wiltshire,

seria dona até das terras onde seu pai vivia. Emerald viu naquele
momento a chance, não só de se tornar guardiã legal de Pearl,
como também a de poder salvar sua mãe da vida desgraçada ao

lado de seu pai.


Emerald olhou para a boca daquele homem envolvendo o seu
dedo, seu olhar predatório e o cheiro que vinha dele e a entorpecia

e o odiou por oferecer tudo isso a ela, cobrando a única coisa de


valor que ela tinha. Sua dignidade.
Por que era tão difícil apenas dizer sim? Sacrificar a própria

felicidade em troca da de sua família deveria ser uma honra, mas e


se o conde quisesse filhos? Era natural que um nobre quisesse

perpetuar seu título de nobreza. Emerald tinha prometido para si


mesma que nunca teria filhos, ela sabia que seu problema era
hereditário pois estava manchando todos os seus antepassados e

não queria submeter seus filhos à mesma vida que levava, mas isso
era algo que o conde não precisava saber. Ainda assim, a ideia de
se tornar amante dele revirava seu estômago. Como podia dormir
com esse homem tão diferente de Brice em tudo?

Emerald puxou sua mão da dele e andou de volta até a porta


de comunicação, quando a mesma mão agarrou seu braço. Seu

corpo inteiro arrepiou-se com o prazer de ser puxada com força para
perto do conde. Ela não ousou se virar, mas sentiu a respiração dele
em sua nuca. Arrepiando todos os pelos do seu corpo.

— As portas estarão abertas. Se quiser sua vida antiga, então


adeus Emerald Sandle, mas se quiser o que lhe ofereci, eu estarei
amanhã às oito horas no centro do labirinto nos jardins — disse e a

soltou tão rápido quanto a segurou, a deixando para que decidisse


sozinha qual rumo seguir.
O da sua cama ou o da sua ruína.
— Ela não está demorando muito, milorde?
Hyde mirou um olhar cheio de raiva em Wilkins.

— Ela virá.
Ah, como queria acreditar nisso!
Queria tanto que seria capaz de fazer Emerald se materializar

em sua frente. De onde estava, tinha uma visão ampla do lugar por

onde ela entraria. Na verdade, Hyde chegara no labirinto antes do

padre, esteve esperando e quase abrindo um buraco em seus


sapatos de tanto andar para lá e para cá. A ansiedade da espera

rasgando suas veias. O conde já estivera frente a frente com a


morte algumas vezes, e em nenhuma das ocasiões sentiu tanto

medo como naquela. O medo de que Emerald não aparecesse.


No centro do labirinto, o padre, e alguns dos criados que

arranjou como testemunha, já esperavam para a realização da


cerimônia. Hyde não queria estar sob o olhar atento das pessoas,

por isso, permaneceu recluso nas sombras. Seria muito humilhante

se Emerald não aparecesse, e mesmo sabendo que a possibilidade


era grande, Hyde se mantinha firme no pensamento de que ela

jamais recusaria o que estava oferecendo. Deu oito horas da noite e

as tripas ardiam dentro dele. Cinco minutos depois já não ardiam,


queimavam.

Era impossível que ela tivesse se perdido nos corredores do

labirinto, Hyde ordenara que fizessem uma trilha de velas por todo o
caminho que a levaria até ele. Quando se passaram mais dez

minutos de atraso ele aceitou que Emerald tinha feito uma escolha.
Mulher burra! Fechou as mãos em punhos, desejando afundar

alguma coisa, e deu as costas para ir embora quando um

burburinho chegou às suas costas.

Emerald estava ali, ele podia sentir.

Saiu do meio das sombras para vê-la. Usava um vestido lilás,

da cor dos seus olhos. As saias eram de brocado, com muitos tules
cheios de pedrinhas de brilhantes, e nos cabelos brancos ela trazia

um véu com uma tiara de rosas brancas. Era esplendorosa. Seu


rosto, que era pálido por natureza, nesse momento parecia gesso.
Seus lábios volumosos estavam rígidos e formavam uma linha

vermelha em seu rosto. Ela parecia flutuar até o altar improvisado

onde o padre esperava impaciente, e só então Hyde saiu da

escuridão para ir até ela. Todos os olhares se voltaram para ele e

sentiu uma pontada em seu peito incomodá-lo.

Emerald apressou o passo até ele e o alcançou antes que


chegasse no altar. Ele a olhou de perto, Hyde quase não conseguia

desviar os olhos dela quando se movia, seus cílios brancos

emoldurando os olhos amendoados e angustiados. Era nítido que

ela estava apavorada por estar fazendo aquilo, mas fazia um

esforço muito grande para não demonstrá-lo. Ele admirou isso nela.

A teimosia dela o excitava.

— Antes de ir até o fim, quero garantir meus benefícios com


esse casamento.

Emerald falou baixo para que só Hyde ouvisse.

— Giusto. Eu a acharia tola se não fizesse.

Hyde tirou um cantil do bolso da casaca e o destampou, ao

erguer a vista a encontrou o julgando com o olhar.

— O quê?
— Você deveria estar bebendo agora?
Deu de ombros.

— Um casamento não é um casamento sem um pouco de


uísque para tornar as palavras mais fáceis de vir.

Emerald suspirou, resignada.


— Primeiro de tudo eu quero que traga minha irmã para viver
conosco e quero que garanta bons estudos para ela. Tudo que uma

mulher nascida em berço de ouro merece, aulas de piano,


equitação, dança, bordado, etiqueta e todo o restante da coisa.

Hyde anuiu. Percebendo que, quando ela falava rápido, o


sotaque caipira ficava tão forte a ponto de ele quase não entender

as palavras.
— Sua vontade será atendida.
— Também quero que ofereça uma saída para minha mãe.

Ela só está junto do meu pai porque não tem opções.


Ele continuou a ouvindo listar suas exigências e observou que

em nenhuma delas Emerald pediu algo para si, era sempre para
alguém. Bons estudos para a irmã, um dote, um bom marido para a

irmã, uma casa para a mãe. Ela era uma pessoa altruísta. Hyde
admirava características nobres nas pessoas, porque pessoalmente
não tinha nenhuma. Em seu meio isso era algo raro, quase

inexistente. Se teve uma coisa que aprendeu em seus trinta e dois


anos, foi que para se manter vivo todo mundo deve ter um pouco de

egoísmo dentro de si.


— E a última condição é a mais importante… — Ela prendeu

a respiração. — Não viveremos como marido e mulher.


E aí estava a pequena parte egoísta que habitava nela.

Hyde pressionou seus lábios na língua, ele não podia a culpar


por não querer se deitar com ele, tinha ciência da sua aparência,
sabia que não era um homem atraente, provocava medo e

repugnância nas mulheres, por isso jamais iria submetê-la a ele. Ele
precisava do coração de Emerald e não o conseguiria se impondo a

ela. Ele era um homem paciente. Não se importava se demoraria


um dia ou um ano, desde que ela viesse para a cama dele. Ele faria
ela pedir para ser fodida, não, ele faria ela implorar por isso.

— Aceito suas condições, não a forçarei a se deitar comigo,


mas deve saber que não tolerarei deslealdade. Enquanto estivermos

juntos seremos fiéis. Como você já deve saber, não gosto que
ponham a mão no que me pertence.

Emerald moveu os olhos espertos para os dele.


— É por eu ter essa aparência que afugenta os homens, que
está se casando comigo, não é, milorde? Você mesmo disse.

Dissera? Hyde não lembrava.


— Que seja, desde que não tente trapacear eu manterei
minha palavra. Em troca, quero que coma comigo todas as noites,
pontualmente, se você deixar de ir um dia sequer eu a castigarei da

maneira que achar eficiente.


Ele viu a garganta dela subir e descer.

— Então eu tenho que tomar cuidado para não fazer esse


favor a você.
Hyde não sabia porque, mas já esperava que ela fosse dizer

algo desse tipo. Desejou sorrir, e teria feito se não estivesse irritado
desde o início dessa negociação.

— Mas deve saber, senhorita, que temos que consumar o


casamento para se tornar legal.

Emerald parecia estar em um conflito interno. Mordeu o lábio


inferior e encarou o lenço prateado ao redor do pescoço de Hyde.
Ele observou os olhos violeta se moverem depressa enquanto

procuravam uma solução e quando pareceu pensar em algo, eles se


encheram de coragem. Hyde teve uma sensação ruim no seu

estômago. Não gostou disso.


— Faremos uma vez.
Ele engoliu em seco, tentando não se deixar abalar pela

promessa daquela única vez. Santo Deus, de repente Hyde estava


nervoso e meio trêmulo. Concordou com um ligeiro aceno de
cabeça e indicou o altar onde as pessoas fingiam não tentar ouvir o
que eles conversavam.

— Podemos? — Ele apontou para o altar.


Ela olhou para lá como se fosse o corredor para o inferno e

depois de exalar o ar de seus pulmões, andaram juntos para a


condenação.
Hyde se colocou ao lado dela, na frente do padre e de uma

estátua de querubins. Estavam rodeados por velas espalhadas pelo

gramado e banhados pela noite e pela lua que brilhava gloriosa no


céu. Quem os visse de cima, constatariam que eles eram opostos.

Ela representava a luz e ele as trevas. Seu cabelo parecia brilhar de

um jeito antinatural sob a luz do luar. Hyde se via atraído para essa

luz que emanava dela, ansiando o momento em que enfiaria seus


dedos nesses cabelos e a puxaria em direção à sua boca.

— Me perdoe, milorde, o senhor não me falou, que eu teria

que casá-lo com… isto.


Hyde foi puxado para uma infeliz realidade ao ver o olhar de

desprezo do padre em cima de Emerald.

— Não achei que tivesse que dar satisfações a você acerca


de com quem me caso. — A expressão que surgiu em seu rosto o
deixou ainda mais assustador.

O rosto do padre ficou muito vermelho.


— Entendo, milorde, mas vai contra meu juramento abençoar

alguém que…

Hyde deu um passo lento e meticuloso para frente. Um tom


ameaçador em seus movimentos.

— Alguém que o quê? — Hyde o desafiou a prosseguir.

O padre encheu o peito de coragem.

— Alguém que foi tocado pelo diabo!


Emerald revirou os olhos com força.

— Ah, é, esqueci de mencionar que está se casando com

uma bruxa. — Ela sussurrou para Hyde, fazendo o padre passar de


vermelho para branco em uma rapidez impressionante.

— É o quê?

Hyde não estava entendendo nada.


— Algumas pessoas no vilarejo acreditam que minha mãe se

deitou com o diabo e por isso tenho essas características.

Hyde nunca se segurou tanto para não rir.

— E sua mãe dormiu mesmo com o diabo?


O rosto dela se contorceu de um jeito que a fez parecer

encantadora.
— Por Deus, claro que não!

— Como ousa tocar no nome do senhor…

— Cale-se, maledetto! — Hyde rosnou para o padre. —


Melhor, não se cale, use sua boca para algo de útil e nos case

agora.

O homem bateu o pé no chão.

— Não caso!
Hyde o agarrou pelas lapelas da batina e o ergueu no ar.

— Nos case ou vou fazê-lo conhecer pessoalmente o seu

Deus.
— Você não pode ameaçar um padre! — Emerald agarrou o

braço dele.

Hyde rosnou. Irritado que ela estivesse tentando defender

alguém que estava a insultando.


— Por que não?

— Ameaçar um padre dá sete anos de azar.

— Isso é para quem quebra um espelho.


— De qualquer forma, não acho que traga boa sorte matar um

padre.

Hyde revirou os olhos e soltou o homem, que caiu de joelhos

puxando o fôlego e segurando a Bíblia ferrenhamente contra o peito.


— Nos case agora ou deixarei que ela jogue uma maldição

em você.
Os olhos assustados do padre se arregalaram para Emerald.

— Ela não faria isso.

— Ah, ela fará sim.


— É, eu farei.

O padre se benzeu e começou a orar baixinho. Hyde desejou

tomar a bíblia da mão do homem e a acertar na sua cabeça calva.

Sem erguer os olhos, o padre começou a falar palavras que Hyde


considerava inúteis.

— Corte a conversa fiada, apenas vá para o que interessa. —

Ele rosnou e achou que o padre fosse ter um troço. Se era possível,
o homem ficou ainda mais branco que Emerald.

— Não posso realizar essa cerimônia se o senhor não permite

que eu abençoe a união. Um casamento sem a benção de Deus

jamais dará certo — disse o padre, quase sem mover os lábios.


— Abençoada ou não a moça ainda estará se unindo ao

demônio.

Agora todos estavam chocados. Até mesmo Emerald, que


pela primeira vez olhou para Hyde com algo parecido com

admiração. Um olhar carrancudo, mas ainda assim era um olhar


intenso o bastante para fazê-lo estremecer por dentro. Hyde sentiu

sua pele ferver sob a casaca.

— Continue, senhor. — Ela pediu gentil para o padre que a

olhou como se ela fosse um inseto em sua sopa.


Hyde esperou impaciente até que o homem os abençoasse,

se balançando inquieto sobre os pés e suspirando pesado vez ou

outra. O padre terminou aquele discurso enfadonho e tirou um pano


de cetim de dentro da bata. A mão de Emerald foi colocada sobre a

dele e com o lenço, o padre as amarrou juntas. Fez tudo isso

tomando cuidado para não encostar em Emerald, o que fez Hyde se

controlar para não enfiar aquele lenço goela a baixo do


padre. Apesar de tudo isso, ela se mantinha impenetrável.

— Senhorita Sandle, você aceita o lorde Black Olivender

Hyde, como seu legítimo esposo? —Antes que Emerald abrisse a


boca para responder, o homem continuou: — Você compreende que

a partir do momento que disser sim, você estará ligada ao lorde para

o resto da vida. Estará amaldiçoando esse condado e condenando

todos nós à ruína.


— Stai zitto! — Hyde esbravejou, e o padre se escondeu outra

vez atrás da Bíblia, apontando ela para Hyde como se fosse uma
arma. Hyde só não o desmaiava com um soco porque não queria

piorar ainda mais sua situação perante Emerald.


— Sim. — A palavra saiu com esforço da boca dela.

— Lorde Hyde, você aceita Emerald Sand...

— Accetto. — Ele disse, firme e decidido.

Depois que as palavras foram ditas ele assinou seu nome


naquela licença especial e entregou a pena de escrever para ela.

Emerald tremia, mas conseguiu assinar seu nome no papel, uma

caligrafia feia que denunciava sua falta de estudo. Logo depois que
as testemunhas também assinaram o papel, ele tirou a aliança que

trazia no bolso e esperou que ela lhe entregasse a mão enluvada.

Ela tinha dedos esguios e bonitos e a pedra delicada do diamante


em formato de gota ficou muito bem vista no dedo dela, mesmo

estando coberto por uma luva. O padre disse mais algumas

palavras, mas não se prolongou muito, os abençoou e logo estava

dizendo:
— Eu vos declaro marido e mulher. Até que a sorte os separe.

— Ao dizer as últimas palavras, o padre não ficou ali nem mais um

segundo.
Hyde olhou para sua esposa, por mais que tivesse vestida de

noiva não parecia muito com uma. Estava infeliz, ele via isso nos
olhos dela. Ele desceu os olhos para o pescoço dela, onde ela
pousava uma mão delicada, e viu o colar escondido atrás do bustiê

do vestido.

Sem pensar, enfiou a mão no decote e o puxou.


— Ei, solte isso! — Ela bateu na mão dele, mas Hyde

precisava ver.

O pingente era um coração feito de latão e atrás dele tinha a


letra “B” grifada.

— Isso é… — Engoliu em seco. Não, não podia ser. Inferno,

que não seja! — Seu coração já tem um dono?

O rosto dela enrubesceu.


— Isso não é assunto seu.

— Se prometeu seu coração a alguém eu deveria saber! — A

voz dele saiu em um grito que a fez chacoalhar. — Dimmi!


Emerald deu um passo para trás, com medo dele.

— Isso não era uma exigência no acordo que fizemos.


Céus! De fato, Hyde apenas exigiu que ela fosse virgem e
nunca mencionou que seu coração devia ser tão intocado quanto

seu corpo.
Hyde sentiu seu peito latejando. Ela não lhe deu a resposta
que ele esperava, mas seus olhos foram sua confissão de culpa. Ela
tinha ido se casar com ele segurando a promessa de outro homem.
Oh, céus, quem teria adivinhado que ela era apaixonada por outro
homem?

A culpa era dele, estava tão desesperado para se casar com


ela pelo medo de que ela escapasse que não pensou em perguntar
antes se seu coração era intocado, e agora era irreversível. Ele

estava casado com outra mulher que não o amava e nem amaria.
Não devia ter se iludido com a ideia de que ela fosse se apaixonar
por ele. Antes de a ver ele não tinha nenhuma intenção com ela

além da de a livrar do pai imprestável. Hyde mordeu mais do que


pode mastigar. O corpo dele ficou frio. Ele não sabia o que estava
sentindo, mas era algo perigoso e destrutivo. Deu as costas e a

deixou lá antes que seus sentimentos ficassem visíveis.


Andou até o próprio quarto e começou a se despir das roupas
formais. Uivava de ódio. Em sua ira, arrancou com as próprias mãos

um galho cheio de rosas brancas, mesmo sabendo que não


demoraria muito até que novas rosas brotassem naquele lugar, as

pétalas voaram ao seu redor, pareciam rir dele, do seu esforço inútil
de se livrar delas, inflamando ainda mais a sua raiva. Bom, isso
mudava e muito o rumo dos seus planos. Podia pedir uma anulação,

mas isso seria injusto com Emerald. Prometeu a ela muitas coisas,
ela abrira mão de se casar com seu amado para pertencer a Hyde.
A reputação dela já estava arruinada de toda forma depois de
passar tantos dias sozinha na casa dele sem nenhuma companhia.

Hyde já estava condenado, então que fizesse sua última refeição.


Ele se sentia nervoso como o garoto que sabe que vai perder

a virgindade. Se fosse considerar o tempo que ele não praticava,


poderia até se considerar virgem novamente. Tinha estado com uma
mulher há tanto tempo que já tinha se esquecido das sensações. E

seu corpo nem tentava disfarçar que queria o de Emerald, ele tinha
desejos de vê-la nua para descobrir se sua pele era absurdamente
branca em todos os lugares. De que cor ela era no meio de suas

pernas e de que cor ficaria depois de judiar um pouco dela.


Ele ficou só com uma camisa fina e calções e esperou,
esperou ansioso até a noite se tornar profunda e escura e as únicas

acordadas serem as corujas que piavam na floresta afora. Então, só


então, ele entrou no quarto dela. Ela estava de pé próximo de uma
janela, encarando a lua. O vento frio que entrava pela janela, fazia

as faixas soltas de sua camisola de seda branca voarem ao seu


redor, ela era angelical e estava esperando por ele. Nenhuma outra

mulher esteve esperando por ele. Ele estava acostumado a estar


com mulheres maduras, que geralmente esperavam outro cliente
depois dele.

Isso foi suficiente para fazer a fera dentro dele se excitar e


ansiar por rasgar a camisola que se colocava entre ele e o que até
então nem ele sabia que queria tanto. E naquele momento, ele a

queria demais, muito mais do que desejava retornar para sua vida
antiga, muito mais do que qualquer outra coisa que já quis. E

diferente de todas aquelas coisas, ela estava ao seu alcance e por


toda uma noite ela seria dele.
Entre doses de uísque e sedas rasgadas

Emerald não sabia o que a fez dizer sim para a proposta de


Clarendon. Até a tarde estava certa de que não aceitaria, chegara
até a se preparar para ir embora, mas quando deu o primeiro passo

adiante, vislumbrou seu futuro. Teria mesmo coragem de voltar a

viver a vida que levava? Tendo que juntar cada penny para se livrar

de seu pai e, principalmente, para dar uma vida melhor para sua
irmã?

Foi quando ela tirou os olhos do chão e os focou no lugar


onde estava.
O conde lhe dava calafrios na espinha. Pelas fofocas que

ouvira em alguns grupos de mulheres, é normal o futuro marido dar


calafrios em sua noiva, mas esses calafrios não são na espinha, são

em um local bem distante de lá. No entanto, Emerald não podia

ignorar que Clarendon tinha sido a única pessoa na face da terra


que não tinha se assustado com a aparência dela. Claro, ele tinha

se casado com ela porque achava que ela era tão medonha que não

conseguiria outro pretendente, mas não demostrara que sentia nojo


dela, ou lhe fez mal, se fosse ver aquilo de forma bem realista,

Emerald não era ninguém, não tinha valor nenhum, se ele quisesse

fazê-la de sua amante, mesmo se ela se opusesse, ninguém iria


defendê-la. A mais pura verdade era que o conde estava sendo um

cavalheiro ao propor casamento.


Se bem que a forma como a proposta foi feita não chegava

nem perto de ser gentil, mas nada naquele homem era. Ele tinha o

corpo de um guerreiro, seu cabelo espesso caindo sobre as orelhas

era sensual e aquela cicatriz no lábio superior, embora tivesse a

assustado no primeiro momento, agora a fazia achá-lo

surpreendentemente atrativo aos olhos, mas contrapondo isso tudo,


ele tinha uma personalidade horripilante. Tudo sobre ele era

assustador e deixava Emerald nervosa.


Apesar disso, ele era um conde e estava propondo uma vida
melhor para ela. Emerald não teria que lutar para viver, quer dizer,

ela admirava muito quem trabalhava para se manter, mas ela tinha

que fazer três vezes mais o que uma pessoa normal faz. Não teria

que se preocupar quantas refeições teria no dia seguinte, ou se um

dia, quando o senhor Grant morresse, o que não estava muito longe

diga-se de passagem, onde ela conseguiria outro emprego.


Ela pensou também em Brice, o homem estava prometendo

uma vida melhor para ela há anos.

Antes ele dizia que precisava de independência financeira,

pois seu pai, um ex-capitão do exército, não aceitaria o casamento

dos dois. E depois, apareceu a oportunidade de um emprego

irrecusável em Londres. Emerald achou que só teria que esperar

apenas mais alguns meses e ele a levaria embora dessa terra de


ignorantes, mas isso já fazia dois anos. Isso era tempo o bastante

para mudar tudo. Tudo bem que Brice não tinha a mesma condição

de vida que Clarendon, mas de quanto mais tempo ele precisava?

Ambos tinham um emprego e sendo uma mulher casada

Emerald poderia levar Pearl para ir morar com ela. Brice sabia o

quanto isso era importante para Emerald, e não ter notícias dele há
tanto tempo, apenas piorava tudo. Infelizmente, a promessa de
Brice era algo incerto, enquanto que o conde estava propondo

aquilo para ela naquele momento. E quando deu por si, ela já estava
caminhando pela trilha de velas até o centro do jardim.

Era muito conveniente que o conde quisesse se casar em


uma cerimónia particular, sob a luz da noite. Dessa forma ela não
precisava se encher de roupas para se proteger do sol. E se fosse

se despir de todos os defeitos daquela cerimônia, Emerald achou


que estava tudo bastante romântico para um casamento feito às

pressas.
Infelizmente, a consciência pesada de Emerald a impediu de

se livrar do colar de Brice. Ela não tiraria o colar do seu pescoço até
esclarecer tudo com o rapaz. Ela podia estar casando com o conde,
mas tinha feito uma promessa para Brice. Já bastava que se

sentisse péssima por estar cometendo uma traição imperdoável ao


entrar naquele labirinto.

E agora Emerald estava na noite de suas bodas.


A mãe de Emerald tinha falado sobre sexo com ela. Ela não

era como essas pérolas da alta sociedade que são privadas de


assuntos adultos durante toda uma vida e são entregues como
cordeiros para o abate para seus maridos. Emerald já sabia muito

bem o que acontecia entre um homem e uma mulher na noite de


núpcias. Quando ainda morava em Wiltshire, Brice vivia tentando

levá-la para algum lugar escuro onde quase sempre tentava enfiar a
mão por baixo das saias dela.

Sua mãe vivia dizendo que após as usar, os homens perdiam


o encanto pelas mulheres e logo buscavam algo novo e mais jovem

para se distrair. Por isso, vivia a alertando de que Emerald


esperasse até estar casada e apenas por essa razão ela se
mantinha virtuosa. Assim não ficaria desamparada. No entanto,

Emerald não estava com a menor disposição para se tornar uma


mulher naquela noite, nem nas próximas noites de sua vida. Não

com Black Hyde e muito menos por obrigação.


Ela achava que as pessoas superestimavam o sexo, quando
na verdade ele era completamente dispensável para as mulheres. O

que tinha de prazeroso em ser invadida sucessivas vezes? É claro


que ela pensava em fazê-lo com Brice quando se casassem, mas

era um sacrifício que ela estava disposta a fazer pois gostava dele
e, bem, não teriam que fazer o tempo todo e Emerald não se

importaria se ele tivesse uma amante desde que isso a livrasse das
atividades conjugais.
Contudo o cenário era diferente, o homem com quem ela

estava casada não despertava nenhum tipo de desejo nela. Apenas


medo. Ela tinha dito para o conde que eles consumariam o
casamento, e não, não se sentia culpada por ter mentido e estar
tramando pelas costas dele. Ela não podia entregar sua virgindade

de bandeja para ele, esteve a guardando com tanto esforço durante


tantos anos e ele não a merecia.

Ela não era burra, sabia que tinha que fazer aquilo de um jeito
que o fizesse acreditar que tinham consumado o casamento.
Existiam muitos lados bons de se trabalhar com um boticário,

um deles, e talvez o maior, era aprender como preparar todo tipo de


solução, desde algo para curar a enxaqueca, até soluções capazes

de derrubar um cavalo. Emerald conhecia uma em especial que o


senhor Grant costumava vender para um tira-dentes de Dorset, uma

solução que quando ingerida fazia os pacientes caírem em um sono


profundo. Não traria muitos efeitos colaterais além de algumas
dores de cabeça no dia seguinte. Nada que um chá forte não

resolvesse.
Algumas criadas vieram a ajudar a se despir do vestido de

casamento e começaram a prepará-la para o ápice da noite. As


mulheres evitavam olhar para ela, quase como se sentissem pena
da sua pobre alma. Quando ela já estava pronta e as donzelas

começaram a sair, ela puxou uma pela mão.


A mulher tomou um susto e puxou a mão como se o toque lhe
queimasse. Sem jeito, Emerald recolheu suas mãos para perto da
barriga.

— Posso ajudá-la, milady?


Emerald estranhou o pronome de tratamento. Sacudiu a

cabeça. Nunca na vida imaginou que alguém fosse chamá-la de


milady.
— Eu não estou me sentindo bem, a ansiedade pela noite de

núpcias está me dando vertigens.

As faces da donzela ficaram vermelhas.


— Vai ficar tudo bem senhorita, o conde saberá cuidar da

senhora.

— Essa não é minha preocupação. — Emerald sabia que

poderia conseguir o que queria com mais facilidade se falasse de


forma direta. — O conde é um homem muito grande e já deve

imaginar o tamanho do seu equipamento.

— Meu Deus, senhora! Jamais imaginaria algo assim do


Lorde Clarendon.

A mulher arfou, colocando uma mão sobre a boca, o sangue

se tornando evidente sob a pele. Só o fato de ela ter ficado tão


vermelha denunciou que sim, pensara no equipamento do conde,
não havia nada demais nisso, ele era um homem enorme e até

mesmo Emerald se perguntara sobre o tamanho do seu apetrecho


quando o vira pela primeira vez.

— Eu estou apavorada, nunca estive com um homem, minha

preocupação é a de que seu... — Pensou em uma palavra —


instrumento, me faça desmaiar.

Emerald achou que a criada fosse cair durinha para trás.

Antes que isso acontecesse se apressou em dizer:

— Estive pensando se não poderia me trazer um chá, minha


mãe sempre me fazia quando estava nervosa — sugeriu.

A criada olhou para ela feliz com qualquer alternativa que a

tirasse daquele diálogo embaraçoso.


— Sim, senhorita, diga qual e eu providenciarei. — Pediu

solicita e Emerald, muito satisfeita, a instruiu a pegar a planta que

tinha visto no jardim do conde no dia em que chegara na mansão.


— Em vez de colocar no chá, apenas moa as pétalas e as

traga para mim. Elas surtem efeito mais rápido quando misturadas

com o álcool.

— Farei isso agora, milady — disse e saiu fechando a porta


ao passar.
Emerald esperou inquieta, com medo do conde entrar no

aposento antes do retorno da criada, mas parecia que ele não

estava com pressa para consumar o casamento.


A forma como ele reagiu ao ver o colar de Brice foi muito

assustadora, seus olhos negros quase engoliram Emerald, ela não

sabia o que pensar sobre isso e nem porque lembrar desse olhar a

deixava inquieta.
Meia hora depois, a criada retornou com a planta moída em

um recipiente de porcelana. Emerald esperou que ela saísse e

andou até um aparador no quarto onde tinha uma bandeja com uma
garrafa de uísque. Ela despejou metade do pó lá dentro e balançou

o líquido até que estivesse bem misturado. O amargor do uísque

camuflaria o da beladona.

Ela o esperou, esperou como uma condenada, e quando


achou que ele não viria mais, ouviu o som da porta ser aberta e logo

depois sentiu que ele estava ali. De novo os calafrios em sua

coluna.
Ela se virou para ele e, bem...

Estava só de calções e usava uma camisa branca com os

dois primeiros botões abertos. Revelando alguns pelinhos de seu

peitoral e a pele pálida por baixo. Os cabelos caiam ao redor do seu


rosto assimétrico, desordenados. Como se ele os tivesse

bagunçado. Ela o observou enquanto ele andava pelo quarto


apagando uma vela de cada vez até deixar somente as arandelas

ao lado da cama acesas. Afundando os dois na penumbra.

Ainda de costas, ele a olhou de soslaio, então traçou o curso


de seus passos para ela e o coração de Emerald disparou. Era

incrivelmente apavorante estar sob o foco dos olhos dele. Era

possível ver no profundo de suas íris que ele já imaginava todo o

tipo de depravação que faria com ela. Seus olhos entoavam


palavras de perigo e sedução.

Ele parou diante dela, quase nada entre eles, e seus olhos

desceram para o pescoço de Emerald. Ele ergueu uma mão e tocou


no colar que, até quatro horas atrás, era cheio de significados para

ela.

— Como se chama o malnascido que roubou seu coração? —

Ele perguntou, avaliando a joia com um misto de nojo e revolta.


Emerald não gostou do modo como ele se referiu a Brice. Ela podia

estar casada com ele, mas tinha carinho por Brice.

— Não fale assim dele — disse, e deu um tapa na mão dele


para afastá-lo do colar. Ela sentiu um frio atingir as suas entranhas

quando o olhar dele ficou negro e vazio com a atitude dela.


— Bernard? Benjamin? Benedict?

— Qual a importância que isso tem para você?

— Eu preciso de um nome! — Ele rangeu os dentes.

Emerald respirava com dificuldade. O cheiro forte de loção de


barbear, uísque e rosas a entorpecia.

— Não o terá.

Por um segundo, ela podia jurar que ele ia pular sobre ela e
fazê-la dizer o nome, mas não, em vez disso ganhou um olhar

inundado de desprezo. Emerald sentiu algo arder dentro de si ao

receber aquele olhar dele, porque até então ele era o único que não

tinha dirigido aquele olhar para ela.


Isso a ajudou apenas a ter a certeza de que estava certa ao

não se entregar para ele. Ele parecia querer beijá-la, mas não

estava certo se era algo que deveria fazer. Emerald ficou satisfeita
por ele não fazer isso, pois se fizesse iria rechaça-lo. Beijos eram

demonstrações de afeto e desejo e ela não sentia nenhum dos dois

por ele e duvidava que sentiria no futuro.

Emerald conseguiu mandar o comando certo para suas


pernas e caminhou até o aparador, se serviu de uma dose generosa

do uísque, voltou para ele devagar, e bebericou um pouco para se


livrar de suspeitas. O uísque fez sua língua arder e adormecer em

segundos.
— Como você prefere fazer isso? — Ele perguntou, quase

rude, tocando em uma mecha do cabelo dela. O contraste do seu

cabelo branco entre os dedos dele foi algo curioso de observar.

— Do jeito mais rápido e indolor possível.


Ela viu com nitidez a chama se apagar no olhar dele. Hyde

largou o cabelo dela e tomou o copo de uísque de sua mão, o

entornou até não restar nenhuma gota no copo. Agora quem estava
na frente de Emerald era apenas um homem implacável que tiraria o

que queria dela sem se preocupar com mais nada e podia parecer

loucura, mas Emerald sentiu um formigamento em seu baixo ventre.


Ele voltou para ela desabotoando a camisa e a tirando do

corpo pelos braços grandes. Emerald se perdeu por um momento

em seus movimentos precisos. O homem era algo a ser

memorizado. O tamanho dele a fazia tremer. Eram mais de dois


metros de muitos quilos bem distribuídos em músculos bem

modelados. Chegava a ser assustador. Ela mordeu o lábio inferior e

tirou a vista dele, se censurando por achá-lo atraente. O que era


estranho, porque, até meia hora atrás ela tinha certeza de que ele
era o homem mais feio que já vira na vida. Ele se sentou na borda
da cama.

Sem perder tempo com delicadezas, Hyde puxou seu membro

para fora. Emerald lutou para manter os olhos no rosto dele.


— Ajoelhe-se e o coloque na sua boca — ordenou, imperioso.

Emerald lutou para não demonstrar seu espanto e dar a ele o

gosto de vê-la assustada. Hyde não podia estar falando sério. Aquilo
jamais caberia na sua boca.

— Nunca.

A boca dele se esticou em um sorriso perigoso.

— Foi você quem disse que quer isso de forma rápida e


indolor. — Ele se tocou, deslizando a mão por todo o comprimento

daquela coisa monstruosa. — Você precisa o deixar molhadinho

para que não doa.


Emerald rangeu os dentes, indignada consigo mesma por

estar desejando acatar essa loucura.


— Então, molhe você mesmo!
Ele tocou no queixo dela com a mesma mão que um instante

atrás acariciava seu membro. Os dedos exercendo pressão, mas ao


mesmo tempo cuidadosos.
— Tesoro mio, apenas essa noite, eu não vou desperdiçar o
meu tempo fingindo que não desejo você. Torne esse momento
inesquecível para nós dois.

Emerald desceu os olhos para aquela coisa e engoliu em


seco. Poderia ter relutado mais, se agarrado com unhas e dentes ao
seu bom senso, mas a verdade era que ela estava um pouco

curiosa sobre isso.


A pele dela se arrepiou quando seus joelhos encontraram o
chão frio.

Hyde segurou o pênis pela base e com a outra mão segurou o


rosto dela pelo queixo, seus dedos envolveram o maxilar de
Emerald e Hyde esfregou a ponta da ereção nos lábios dela. O

fascínio em seu olhar deixava escancarado que ao fazer isso ele


realizava algum tipo de desejo pervertido.
Emerald decidiu ignorá-lo e apenas se concentrar no membro.

Seria como fazer um estudo, isso, seria o mesmo que fazer um


experimento. Era tudo por um bem maior. Ela notou que soltava um

líquido transparente e o lambeu por pura curiosidade. Hyde tinha um


gosto doce e uma textura viscosa. Ele gemeu grosso e ela percebeu
que isso devia ser o que se esperava dela. Lambeu outra vez, sentiu
a carne pulsando em sua língua, achou isso fascinante, e quando
menos esperava, Hyde o deslizou para dentro.
Emerald o sentiu ocupar toda a sua boca até a garganta e se

engasgou. Hyde a segurou pela nuca e se retirou, Emerald tossiu,


puxando ar com força e novamente sua boca foi preenchida antes

que pudesse se recuperar. Ela ergueu os olhos para xingá-lo, mas o


que encontrou fez todas as suas reações negativas se converterem
em um desejo abrasador.

O rosto dele se contorcia, com as pálpebras pesadas e os


lábios separados, Hyde gemia. Ele jogou a cabeça para trás e soltou
um urro, sua garganta saltando sob a pele de seu pescoço grosso,

cheio de veias. Sua barriga se contraía. Se a luxúria tivesse uma


forma, seria aquela. O movimento dos quadris dele eram
hipnotizantes e ver como ele se perdia de prazer fez algo nascer

entre as coxas de Emerald. Uma fome cruel e implacável que


crescia mais e mais. Aquilo não deveria ser tão bom. Por que ela
não estava odiando tê-lo em sua boca?

Ela apoiou as mãos nas coxas dele e seus quadris buscaram


um contato, qualquer contato que aliviasse o calor ardente entre

suas pernas. Suas coxas se abriram e ela se sentou no chão,


curiosamente, a frieza do chão que a incomodava ainda há pouco,
trouxe um alívio imediato para o calor em sua vagina. Emerald
moveu seus quadris, se esfregando no chão enquanto Hyde invadia

sua boca. Seus olhos lacrimejavam pela asfixia. Entre uma estocada
e outra, ele a deixava respirar brevemente, para judiar da boca dela
com ainda mais rudeza na estocada seguinte. Sua língua estava

dormente, mas era tão alucinadamente prazeroso que ela não


conseguia se afastar, nem pensar com coerência. Saliva escorria

pelo seu queixo e os gemidos de Hyde a embriagavam. Ela se


esfregou com mais força, sem saber o que buscava, mas ansiando
o alívio de forma esmagadora. Os olhos dela se encontraram com

os dele, e ele sorriu, invadindo a boca dela de forma primitiva e


egoísta para conseguir prazer. Subitamente, sua boca se encheu
de um líquido doce e espesso. Emerald sentiu a ânsia de vômito

arrepiar todo o seu corpo.


Se levantou para cuspir, mas foi impedida pelas mãos de
Hyde. Ele a segurou junto do seu corpo musculoso e a pegou pelas

bochechas. Emerald foi erguida do chão.


— Não cuspa. Eu o dei a você. É meu presente de
casamento. Não seja rude.

Havia algo no tom de voz áspero dele, que era encantador e


viciante, e Emerald nem sentiu quando o líquido em sua boca
escorreu por sua garganta.

Hyde sorriu, e naquele instante, nada nessa terra era mais


bonito que ele. O conde acariciou a boca de Emerald com seu
polegar.

— Você é interessante quando se torna obediente.


— E você tem um gosto horrível.
Ela arfou de susto quando foi içada por braços fortes e

abraçada contra o corpo dele, seus pés não tocavam o chão, ela
flutuou até a cama e foi atirada sobre ela, sem fôlego. Emerald

buscou por uma rota de fuga, mas, em seguida lorde Hyde tomou
sua visão assim como seu ar ao espremer seu corpo junto ao dela
no colchão.

— Milorde! — A voz de Emerald tremia. Ela não esperava


tanta determinação vinda dele. O coração dela ia explodir. Ser
desejada por aquele homem era sufocante.

A forma como ele a puxava e movia seu corpo para acalentar


o dela era tão possessiva que ela não conseguia parar de olhar.
Emerald manteve os olhos arregalados no abdômen dele, pois não

estava certa se seria capaz de olhá-lo nos olhos naquele instante.


A respiração dele bateu no topo de sua cabeça e uma mão
pesada tocou sua cintura devagar, todos os sentidos de Emerald
despertaram. Ela se assustou com o arrepio de desejo em seu
corpo. Atribuiu isso ao fato de que estava um pouco nervosa, estava
sozinha com um homem cheio de pensamentos lascivos e esse

homem era, para todos os efeitos, o seu marido.


Tudo se tornou mais estranho para ela quando ele juntou uma
mão a primeira, e as deslizou para cima e para baixo, ele chegava

próximo de seu quadril e logo subia de novo, passando pelas


costelas dela até chegar na base dos seus seios, a seda da roupa
dela facilitava muito o deslize. Ele estava a conhecendo e pelo jeito

manhoso que estava fazendo, estava gostando muito.


Era algo incomum um homem achá-la atraente. Emerald sabia
que não era atraente, os homens sempre preferiam as belezas de

pele morena e cabelos escuros e corpos esbeltos, enquanto o dela


era volumoso em partes que não deveriam ser. O seio dela encheu

a mão dele, ele a tocou-a ali ciumento, e foi como se seus seios
ficassem mais sensíveis e isso disparou uma flecha de fogo ardente
para o meio das pernas dela. Oh! Aquilo era inédito e inesperado.

Emerald abriu os olhos, surpresa. Quanto tempo mais demoraria


para a beladona fazer efeito? Em um adulto normal o efeito era
quase instantâneo, mas Hyde era um homem grande, ainda poderia

levar um tempo. Tempo suficiente para fazê-la mudar de ideia.


Emerald olhou para baixo, para onde a mão dele agarrava seu
seio de maneira exigente, e a outra permanecia na sua cintura,

quase a deixando imóvel, ele a puxou para frente, brusco, a


encaixando em cada curva de seu corpo. Ela puxou o ar com força
quando sentiu o contorno da ereção dele se espremendo na sua

carne, que ela percebeu agora, estar encharcada.


— Parece que não precisava deixar ele molhado, no fim de
tudo. — Hyde deu uma risadinha.

— É apenas uma reação natural.


— Sim, continue buscando desculpas para o seu desejo de
ser fodida por mim.

Ele afastou o cabelo dela para o lado e a respiração dele


raspou o pescoço dela antes de seus lábios molhados encontrarem
o pescoço de Emerald. Ela abriu a boca e arfou, capturada pela

sensação indescritível. Clarendon segurou cada lado da camisola de


seda com as duas mãos e Emerald só ouviu o som da seda sendo

estraçalhada.
— Meu Deus! Você é um animal. — Ela não queria ter dito
isso com uma voz tão manhosa. Por que estava apreciando tanto

toda aquela grosseria?


— Ha! — Hyde riu, como se tivesse feito uma grande
descoberta. Emerald sentiu o rosto em chamas e pensou em bater

na cabeça dele para adiantar o efeito da planta. — Você é um


milagre, Emerald Hyde.

Ela ficou imóvel, seus músculos duros como cimento. Os


olhos de Clarendon estavam meio trôpegos e ela chegou à
conclusão que foi a beladona fazendo efeito que o fez dizer essas

palavras. Não era sério, claro que não.


Ele acariciou a vulva dela, e seus quadris agiram por vontade
própria, girando sem nenhuma vergonha, implorando pelo carinho

dos dedos dele, a mão de Hyde foi explorando devagar e aquele


ponto pulsante parecia sentir a aproximação, os dedos dele pararam
sobre o clitóris dela e o corpo de Emerald sofreu um espasmo.

— Oh!
Ela não sabia se pela suavidade da seda, mas era alucinante.
Os dedos dele giravam em torno do seu clitóris uma vez e outras

mais, exigentes. Emerald sentiu algo vindo, agarrou nos ombros de


Clarendon e soltou um suspiro assustado e melífluo, suas pernas se

abrindo cada vez mais para liberar o prazer que crescia em grandes
cascatas. Ela se preparou para isso, mas de repente o toque
desapareceu, ela só precisou olhar para cima, para comprovar que

Clarendon não estava mais em si.


— Ick! — Ele soluçou antes de cair sobre ela. Totalmente
adormecido.

Uma enorme frustração se abateu sobre ela e Emerald olhou


para o corpo inerte e desmaiado do conde com raiva por perceber

um pouco tarde demais que tinha gostado mais daquilo do que


imaginou que gostaria.
Hyde primeiro ouviu um som distante, uma melodia temível
porém tranquilizadora. A sinfonia foi se aproximando, mais e mais

até ele ser capaz de distingui-la. Eram trovões. Ele forçou suas
pálpebras a abrirem e viu através das janelas abertas a tempestade
que caía lá fora. A primeira daquele inverno. Ergueu a cabeça para

reconhecer o lugar em que estava e sentiu pontadas nas têmporas.

Estava com uma dor de cabeça terrível. Aquela era um pouco

diferente das dores que costumava sentir. Essa era mais leve, mas
sua boca estava seca e seu corpo doía um pouco, pensando bem

parecia bastante com os sintomas de uma ressaca.


Mas em que momento da noite passada ele bebera? Encarou

o dossel da cama e tentou preencher a lacuna vazia em sua mente.


Ele desceu os olhos pelo próprio corpo e percebeu que estava nu da

cintura para cima, isso disparou um gatilho em sua memória. As


lembranças da noite passada vieram como os relâmpagos que

caíam lá fora.

Ele estava na sua noite de núpcias.


Hyde ergueu o tronco e percebeu Emerald toda encolhida ao

seu lado. Deslizou para fora da cama e andou de um lado para o

outro com os pés descalços no chão acarpetado, tentando refazer


seus passos na noite passada enquanto observava o quão delicada

ela parecia. Lembrava de ter ido ao quarto da esposa, lembrava de

vê-la e de ter conversado com ela, seus dedos ainda formigavam


com a memória da suavidade da pele dela e o cheiro doce que

Emerald exalava estava vivo em seu olfato. Ele lembrava da raiva


que sentiu quando ela defendeu o malnascido que roubou seu

coração. Também lembrava da sensação de estar na boca dela. De

se deitar sobre ela. De sentir uma forte necessidade de a possuir.

Todas essas sensações duelavam dentro dele, mas, além

disso, sua mente não mandava nada concreto, apenas borrões e

emoções imprecisas. E uma dúvida que não deveria existir se


instalou na cabeça dele. Hyde tinha consumado seu casamento?
Ele percebeu que só teria a resposta para essa questão
perguntando para a outra pessoa que esteve com ele noite passada.

Rapidamente, foi para seu quarto, se lavou e pediu que acordassem

Emerald e a preparassem para o desjejum.

— Para quem passou as últimas horas em companhia de uma

bela dama, o senhor não está com uma boa cara, milorde. —

Wilkins o cumprimentou com seu sarcasmo de sempre.


— Poupe-me dos seus comentários, Wilkins. Em vez disso me

prepare algo para dor de cabeça. — Hyde molhou o rosto em um

lavabo e se vestiu com as roupas que o criado depositou na cama.

Depois de pronto, ele caminhou para a sala de jantar e

encontrou a mesa posta como acontecia há dez anos. Seus criados

nunca se atrasavam, eram sempre pontuais, a diferença, era que

naquela manhã, ele teria companhia.


Emerald já estava sentada à mesa. O queixo apoiado na mão,

os olhos fechados e dormindo. Hyde pretendia dar um jeito na

postura dela o mais rápido possível, sua falta de delicadeza era um

traço que devia ser exterminado dela ou não sobreviveria por muito

tempo em meio à alta sociedade. As outras ladies jamais poderiam

suspeitar que Emerald era a filha de um caçador ou jamais seria


aceita. Ele não queria que ela sofresse mais do que já sofrera no
passado. Hyde prometera que ela seria respeitada. Boatos ruins

iriam surgir de uma forma ou de outra, por isso ele teria que
transformá-la em uma dama excepcional. Se bem educada, as

pessoas iriam ignorar as outras anormalidades.


Por mais que Hyde não tivesse a intenção de mantê-la por
muito tempo em Londres, somente o suficiente para que todos

soubessem que ele estava casado. Então ele deixaria ela ir para
onde quisesse, França, Portugal, Grécia, ou para qualquer outro

lugar, desde que fosse bem longe dele.


Só havia uma única pessoa no mundo que ele conhecia que

seria capaz de remodelar Emerald em somente dois meses. Hyde


sentia calafrios só de imaginar, esteve a evitando por tantos anos
que nem sabia o que diria quando a visse outra vez. Infelizmente,

não se pode fugir do carma para sempre.


Ele parou diante de Emerald e quando ela não abriu os olhos,

ele não conseguiu fazer nada. Apenas a observou, os cílios brancos


emoldurando seus olhos tranquilos. Os lábios inchados formando

um coração. Ele podia ver as veias dela sob a pele. Tão


encantadora, tão excepcionalmente bela. Hyde voltou para o quarto
e escolheu uma rosa entre as muitas em seu quarto. Ao retornar,

Emerald continuava do jeito que ele deixara.


O conde colocou a rosa sob o nariz dela. O cheiro de uma

única rosa pode ser a coisa mais suave e deliciosa para um olfato
bem apurado, mas em grande quantidade são capazes de

entorpecer, e encobrir até o odor da morte. O nariz de Emerald se


mexeu, farejou o cheiro da rosa e seus olhos violeta se abriram,

devorando Hyde por inteiro.


O corpo dele despertou de uma forma violenta, desejando a
mulher sem vergonha nenhuma. Ele sentiu uma quebra de

decepção, se tivessem mesmo consumado a relação, ele ia se


matar por não lembrar de nada.

— Ainda está cansada?


Quando ela não pegou a rosa, ele a soltou sobre o prato vazio
diante dela. Emerald evitava olhar nos olhos dele. Isso fazia Hyde

querer sorrir, a vermelhidão em suas bochechas a faziam bela.


— Um pouco.

— Você poderá dormir durante a tarde.


Ela o olhou, cuidadosa.

— Bem, já passamos a tarde e é quase noite, milorde.


Hyde arregalou os olhos, havia dormido a noite e o dia quase
todo? Isso era inesperado. Muito inesperado.

— Perdoe-me por ocupar sua cama o dia inteiro.


Outra vez os olhos dela escaparam dos dele, o que fez Hyde
desejar ir até ela e agarrar seu queixo para forçá-la a olhá-lo nos
olhos.

— Não se preocupe, dividi uma cama muito menor com minha


irmã por muitos anos. Ela não é tão grande quanto o senhor, mas

costuma ser tão espaçosa quanto.


Um sorriso surgiu nos lábios dela ao falar da irmã.
Hyde gostaria de ter experimentado alguma vez desse tipo de

amor. Teria ficado contente em ter experimentado qualquer tipo de


amor. Em sua família, essa palavra era como uma maldição.

Ele se serviu e ao perceber que ela não fazia o mesmo, a


encarou. Emerald mirava os talheres em completa confusão. Hyde

se sentiu estupido. Para ele era tão natural ter tantos talhares
durante um refeição que não pensara que nem todos tinham o
mesmo conhecimento.

— É de fora para dentro. — Ele disse, a pegando de surpresa.


Indicou os talheres em suas mãos. — A ordem que devem ser

usados é de fora para dentro.


Emerald timidamente repetiu o que ele fazia. O jeito em que
ela segurava os talheres era assombroso e a forma como cortava e

levava a comida a boca faria uma velha do Almack’s ter um infarto,


mas havia algo de prazeroso em vê-la comer. A forma como
apreciava a comida, fazia Hyde querer encher a mesa com mais e
mais comidas.

— Nós fizemos sexo noite passada?


Emerald engasgou com a sopa e teve uma crise de tosse.

Largou o talher sobre a mesa e bebeu um gole de chá para ajudar o


que estava preso em sua garganta a descer. Olhou para ele com os
olhos bem arregalados, mas Hyde permanecia indiferente e sereno.

Se eles tivessem mesmo feito sexo, uma simples conversa não

poderia ser algo inadequado. Ele tinha certeza que os dois nunca
experimentariam um nível maior de intimidade do que seu pau

dentro dela.

Ela levou uma mão em punho ao peito e abaixou os olhos

para o colo, ficou em silêncio por um momento e quando ergueu os


olhos para ele novamente eles estavam, para o horror de Hyde,

marejados.

— Como pode não se lembrar? — A voz dela saiu chorosa. —


Nossa única noite juntos significou tão pouco para você?

Hyde desejou que um buraco abrisse abaixo dele e o

engolisse inteiro, ou que o diabo viesse buscá-lo para pagar suas


dívidas, qualquer coisa era melhor do que passar por aquela
situação. Ele sabia fazer muitas coisas, mas lidar com mulheres

chorando não era uma delas. Lidar com mulher em geral não era
seu forte.

— Não é bem assim — disse, rezando para que isso fosse o

suficiente para fazê-la parar de chorar.


— Não lembra de nada? Nem mesmo das palavras de

carinho?

Todos os músculos dele cristalizaram.

— Palavras de carinho?
— Sim, logo após você sabe... — Não, ele não sabia inferno,

não se lembrava de nada! — Você me abraçou bem juntinho do seu

corpo e me pediu para chamá-lo de meu condezinho.


Santo Pai misericordioso!

Hyde sentiu o sangue sumir de seu corpo.

— Ridicolo. Eu nunca diria isso.


— Isso é algo que você nunca vai saber, não é mesmo? —

ela disse, com uma sobrancelha arqueada e bebeu um gole do chá.

Por que ele não podia lembrar de nada? Sequer tinha bebido

noite passada, somente um copo de uísque segundos antes de...


Hyde se deu conta de que esta era uma situação muito

suspeita. Era muito conveniente que ele tivesse tido um apagão logo
após beber uma bebida no quarto dela. Ele a olhou com os olhos

semicerrados.

— Provas — ele disse, e ela olhou para ele por cima da borda
da xícara de chá. — Quero provas de que nosso casamento foi

mesmo consumado.

Ela colocou a xícara no pires, devagar.

— O fato de ter acordado em minha cama seminu não é


suficiente?

Emerald parecia cautelosa.

— Não, quero algo mais contundente. — Ele examinou os


movimentos dela enquanto falava. — Mulheres costumam sangrar

em sua primeira noite, basta que vejamos os lençóis.

A tranquilidade que antes estava estampada no violeta dos

olhos dela sumiu por cinco segundos inteiros e isso serviu apenas
para reforçar a suspeita dele. Hyde levantou e andou a passos

largos até o segundo andar.

Emerald o segui quase correndo para alcança-lo.


— Espere, Clarendon! — ela gritou quando ele irrompeu

quarto adentro.

Hyde sentiu vontade de gritar quando olhou para a cama. No

lugar das vestes da noite passada, o que tinham eram novos


lençóis, limpos e sem vestígios.

Ele chamou um criado pela sineta e sem demora Wilkins


apareceu.

— Sim, milorde? — Perguntou, receoso. Era possível sentir a

fúria do conde no ar.


— O que aconteceu com os lençóis que estavam aqui?

— Eles foram levados para lavar.

Hyde apertou as mãos em punhos. Ele tinha certeza que

Emerald estava mentindo para ele, mas se não tivesse uma prova,
seria apenas a palavra dela contra a dele. Ele olhou para ela, iria

provar que ela estava mentindo, mesmo que tivesse que ir até os

seus extremos.
— Pode ir, Wilkins.

O criado obedeceu ligeiro, não sem antes dar a Emerald um

olhar de pena.

Emerald, que até então estava em silêncio e meio pálida,


agora parecia estar mais calma de novo.

— Parece que não lhe restam alternativas a não ser acreditar

em mim — disse ela, quase sorrindo.


Hyde arqueou uma sobrancelha, se ela tinha mesmo o

enganado, logo iria se arrepender disso.


— Na verdade existe outro método.

Até mesmo ele estava com medo do que faria se confirmasse

suas suspeitas.

— Quê? — Ela deu um grito.


Hyde sorriu, se sentindo diabólico.

— Terá de me deixar ver.


Emerald sentiu o sangue congelar em suas veias e agarrou as
saias do vestido com medo de que Clarendon pudesse erguê-las

somente com a força do seu olhar.


— Como se eu fosse deixar você fazer isso!
Ele colocou as mãos na cintura, algo no modo como ele

parecia tranquilo fez Emerald temer suas próximas ações.

— Nós fizemos um acordo, você prometeu que consumaria

nossa união e eu prometi que traria sua irmã. Até que me deixe
atestar a veracidade do nosso casamento, eu não a trarei para cá e

você estará proibida de vê-la.


Emerald sentiu uma raiva monstruosa brotando em seu peito.
— Tente fazer isso e descubra o gosto do próprio sangue —

sibilou, com os dentes trincados.


Ele riu alto, divertido com o que ela disse.

— Eu não vou forçar você a nada, tesoro mio. As opções

estão diante de você, você virá até mim por escolha própria. — Ele
andou para a saída do quarto, e sem se virar continuou: — Quando

mudar de ideia saberá onde me encontrar.

A porta foi fechada na cara de Emerald. Ela desejou afundar o


rosto no travesseiro e gritar. Foi por tão pouco! Não contava, de

modo algum, com a esperteza do conde. Quem poderia imaginar

que Hyde fosse tão perspicaz? Quantas vezes a mãe dela usara o
mesmo chá para acalmar seu pai nas vezes em que ele chegara

bêbado e violento em casa, e nunca suspeitara de nada na manhã


seguinte? Inúmeras!

Hyde não parecia um homem que fazia promessas vazias e

Emerald duvidava que outra coisa pudesse fazê-lo mudar de ideia,

se quisesse trazer Pearl para perto dela teria que provar que teve

um encontro sexual com ele e essa era uma coisa que não poderia

fazer, já que não acontecera.


Enquanto Pearl estivesse sob a custódia de seu pai, Emerald

nunca poderia ter um só minuto de sossego. Imaginar as coisas a


que ele poderia estar submetendo a sua irmã, sem que tivesse lá
para protegê-la, a deixava em completo desalento. Tinha que haver

outra forma de conseguir persuadir o conde.

A noite passada foi um tanto reveladora para ela.

Emerald nunca achou que fosse apreciar tanto o toque de um

homem, o calor, o gosto e até mesmo a respiração. Ela gostava de

Brice, e às vezes era bom ser abraçada e desejada, mas nunca se


sentia à vontade quando o rapaz tocava nela. Emerald sempre

buscava um jeito de fugir do alcance das mãos dele. Era

desconcertante que não tivesse sentido o mesmo desconforto com o

toque de lorde Hyde. Quando ele se enfiou na boca dela daquela

forma tão vulgar, por que não odiou? Por que não vomitou tudo

quando ele tocou no queixo dela e a fez engolir sua semente? Eram

questões perigosas e Emerald sentia que não devia focar sua mente
nelas.

Isso que ela sentiu pelo conde foi uma emoção intensificada

pelo seu período menstrual, que estava muito próximo de visitá-la.

Apenas isso, eram apenas delírios. Agora ela tinha que focar sua

mente em Pearl e em como poderia trazê-la para junto de si. Tinha

que achar outro jeito de ludibriar Hyde.


Ela tinha a opção de se deitar com ele e acabar com isso de

uma vez por todas. No entanto, Emerald não queria ser aquela a
abrir mão de algo, seu corpo era a única parte que ainda era só sua.

A única coisa de que ela era totalmente dona. Ela não queria dividi-
lo com mais ninguém, não daria para mais ninguém o poder de
controlá-lo. Somente o amor mais profundo poderia convencê-la a

se entregar e por mais que sentisse um pouco de gratidão por Hyde,


estava muito, muito, longe de ser amor.

Ela vislumbrou seu reflexo no espelho. Seus lábios estavam


um pouco inchados e seus seios ainda pesavam por alguma razão

desconhecida. Além disso, ainda tinha aquela sensação em seu


baixo ventre, suas paredes internas se contraiam vez ou outra e um
arrepio diferente a fazia ter espasmos.

Emerald não sabia o que aquele homem tinha feito com seu
corpo, mas não deixaria que isso mudasse a sua decisão.

Ela tocou em seus cabelos, eram sem forma e sem vida, mas
eram seus. Emerald que decidiria quem os tocaria. E não tinha nada

que ele fizesse que mudaria isso. Se Clarendon quisesse consumar


o casamento, teria que fazer isso usando da força e isso só provaria
que Emerald estava certa sobre ele. Ele até podia ser legalmente
dono dela, mas os dois sabiam que Emerald pertencia somente a si

mesma e a mais ninguém.


Mais ninguém.
Na manhã seguinte, Emerald ainda sentia fome pois não tinha
comido quase nada durante o jantar. Pensou em pedir comida pela

sineta, mas seu quarto era um lugar muito solitário e a noite ele
ficava mórbido e sepulcral, como um caixão. Então decidiu ir até o
único lugar na casa onde ela sabia que, com toda certeza,

encontraria pessoas. Aproveitou que agora tinha a liberdade para

sair de seu quarto e decidiu conhecer a casa no trajeto ate lá.

Ela já tinha estado na casa de um nobre antes. Na casa do


marquês de Standhurt, em Devonshire, não muito longe de

Wiltshire. O marquês e a esposa costumavam sediar todos os anos


uma festa no solstício de verão e o evento era tão grande que todos

no sul se deslocavam para Devonshire apenas para participar. Certo


que a casa do marquês era um castelo ancestral enorme, mas

essas casas ancestrais sempre tinham a mesma arquitetura, por


isso Emerald sabia onde ficava a cozinha.

No caminho até lá, ela passou pela biblioteca. Era gigantesca

e as estantes formavam um círculo, com uma escada acoplada a


um equipamento engenhoso com rodas que se deslocavam por toda

a sala. Era uma pena que não soubesse ler, Emerald teria gostado

de saber sobre o que aqueles livros falavam. De lá, ela entrou em


uma sala oval, onde o teto era bonito e aberto e de onde ela podia

ver as gotas da chuva borrar os vitrais coloridos. Lá tinha um bonito

piano cheio de ornamentos. Ela também visitou a galeria da


mansão, onde ficavam os retratos dos ancestrais de Clarendon.

Hyde era o oitavo conde, assumindo seu posto logo depois do pai,
que não teve outro filho. Black Hyde não se parecia em nada com o

pai, mas parecia bastante com a mãe. O pintor não soube trazer

para o quadro o fundamental sobre o homem que agora era marido

dela. Tinha sido fiel aos traços rudes de seu rosto, mas aquela

sombra maliciosa que o tornava atraente não estava lá.

Naquele momento, podendo vê-lo tão de perto, Emerald


observou que era como se Clarendon tivesse duas faces. Uma, era

a face de alguém inabalável e amedrontador, alguém que passara


por um inferno e sobrevivera, já a outra, era todo o oposto. A face
de alguém vulnerável, alguém que implorava para ser resgatado.

Qual das duas era a que comandava o coração dele?

Enquanto conhecia a casa, Emerald só pensou no quanto

Pearl ficaria feliz se estivesse ali. Sua irmã nunca tinha podido ver

um livro tão de perto, ou tomar um banho com água quente, nem

Emerald, era tudo novo e deslumbrante para ela, mas eram coisas
que ela teria gostado de compartilhar com Pearl. Na maior parte do

tempo, Emerald se sentia culpada e não conseguia desfrutar muito

bem de nada.

Passou por vários corredores e viu vários quadros. Um com

uma madona, outro com um padre, outro com um ferreiro e no

último um bonito corcel, estava distraída o admirando quando

percebeu estar em um corredor onde tinha uma única porta preta


com entalhes dourados. Emerald foi invadida por aquela sensação

que se tem quando uma resposta para uma pergunta esmagadora

está diante dos seus olhos, mas a ignora pelo medo dos estragos

que fará em sua vida. Levou a mão à maçaneta e a girou, mas a

encontrou trancada. Era a única porta de toda a mansão que se

encontrava assim. Emerald continuou forçando a fechadura.


— Milady, o que faz aqui?
Emerald quase morreu de susto com a voz de Wilkins.

Disfarçou o melhor que pôde a vergonha por ter sido pega


bisbilhotando.

— Eu estou com fome. — Era uma desculpa ridícula.


— Volte para o quarto que eu levarei algo do seu agrado.
Ela agradeceu por Wilkins não insistir na pergunta.

— Na verdade, eu gostaria de companhia também.


Aquelas não pareceram o tipo de palavras que Wilkins ouvia

com frequência. Ele inclinou a cabeça, surpreso e um pouco


confuso.

— Milady, eu não sei se poderia atender a esse seu desejo...


o lorde Hyde não deixaria você sair e muito menos alguém entrar na
propriedade.

Emerald já suspeitava, mas não era disso que falava.


— Com certeza há pessoas na cozinha, não é?

Wilkins não sabia o que responder.


— Bem, sim, mas…

— Me leve para lá.


O criado parecia relutante, mas Emerald não estava disposta
a mudar de ideia. Acompanhou Wilkins pela mansão até a cozinha.

Todos os criados, que eram dez ao todo, pararam seus afazeres


para encará-la quando Emerald entrou na cozinha logo depois de

Wilkins. A primeira coisa que ela soube foi que amou o cheiro
daquele lugar, e a segunda, foi que não era desejada ali.

— Sente-se, eu preparo algo para você — disse Wilkins,


indicando um lugar vago no banco que rodeava a mesa de madeira

onde estavam muitos ingredientes para o almoço.


Emerald sorriu com cortesia para os criados, mas foi ignorada.
Eles continuaram em suas funções com as cabeças baixas e

expressões carrancudas.
— É verdade o que dizem? — Uma voz gentil chegou até

Emerald, e ela percebeu que havia uma criança sentada não muito
distante dela, cortava batatas com suas mãozinhas pouco hábeis.
Por reflexo, Emerald jogou seu corpo para longe dela.

Crianças a aterrorizavam. Odiava crianças.


— Sobre o quê? — Encarou a menina com os olhos

arregalados. Pensando, que talvez uma daquelas batatas viesse


parar em suas roupas. Ela sabia melhor do que ninguém que

crianças podiam ser cruéis.


— Dizem que sua mãe fez um pacto com o diabo e por isso
você tem aversão ao sol.

Emerald fez uma carranca.


— Não tenho aversão ao sol. Posso andar livremente durante
o dia, só tenho que tomar cuidado pois minha pele é muito sensível
e me queimo com facilidade.

— Por quê?
Deu de ombros.

— Não sei.
— Que tal se você usar um chapéu grande?
Emerald inclinou a cabeça, ponderando.

— Talvez ajude, mas não tenho dinheiro para comprar um


chapéu.

A menina riu e Emerald percebeu que lhe faltavam dois


dentes na frente.

— Você é uma condessa, como não tem dinheiro?


Emerald percebeu, assim, de repente, que sim, era uma
condessa. Balançou a cabeça como se quisesse acordar de um

sonho. Não se acostumaria com isso nunca.


— Bem, não havia me dado conta ainda desse detalhe.

— Puff! — Emerald se pegou apreciando a risada da menina.


— Minha mãe fala que os adultos são mais inteligentes do que as
crianças, mas vejo que há uma exceção para tudo.
O sorriso de Emerald desapareceu e uma cara feia tomou seu
lugar.
— Você também não é muito inteligente. Não sabe nem

descascar uma batata.


Apontou para os nacos enormes que a menina tirava junto

com as cascas.
— Burrice se resolve com estudo e eu sou uma criança, eu
ainda posso aprender, agora feiura...

Era por isso que Emerald achava as crianças as coisinhas

mais cruéis que Deus já criou. Você vê um olho brilhante e um


sorriso inocente e nunca imagina que uma verdade tão dolorosa

possa sair de uma coisa tão adorável.

Devia ser verdade. Emerald não era mesmo bonita. Devia ser

por isso que Brice nunca voltara para se casar com ela. Deve ser
por isso que Hyde não tentou barganhar para tê-la em sua cama, só

a quis para consumar o casamento. Emerald não os culpava, de

qualquer forma não queria ser bonita.


— Eu posso tocar no seu cabelo?

Emerald foi pega de surpresa pela pergunta da menina.

— Por quê? Você pretende puxar, é? — Dessa vez Emerald


não a deixaria a pegar desprevenida.
— Oh, não. É que… parece o de uma fada.

Emerald não soube o que dizer. Talvez a principal razão para


ela não gostar de crianças fosse o fato de não conseguir dizer não

para elas. Fez que sim com a cabeça. Os dedinhos da garota se

esticaram ávidos, mas antes que pudessem saciar sua curiosidade,


a mão dela foi puxada para longe do alcance de Emerald.

— Emile! — Uma mulher arrastou a criança para fora do

banco com desespero. — Você está louca? Não faça isso nunca

mais!
Emile começou a chorar. Emerald observou toda a situação

meio em choque. A criada olhou para ela como se Emerald tivesse

culpa por fazer a criança chorar e saiu da cozinha puxando a


menina pela mão. Emerald sentiu seu estômago embolar pela visão

do rosto triste de Emile.

— Não ligue para isso, milady. — Wilkins a confortou.


— Claro que ela deve ligar — disse a cozinheira. Todos os

criados se voltaram para Emerald e ela se sentiu em um tribunal,

agradeceu por não estar, porque se aquele fosse seu julgamento,

podia ver pela raiva nos olhos de todos eles que ela seria declarada
culpada. — Ela condenou a todos nós quando decidiu se casar com

o conde. Pobre lorde Hyde, já sofreu tanto nas mãos de mulheres


cruéis e agora mais uma. Pobre homem, tem um grande coração,

mas o dedo podre!

— Edith!
— Alguém tem que dizer a verdade, Wilkins. — Emerald não

sabia o que dizer, não tinha palavras sequer para se defender. —

Ela pode andar por aí como se fosse normal, mas sabe que não é, e

cedo ou tarde Deus descerá a mão dele sobre ela.


Emerald se levantou e saiu da cozinha, apressada. Não ia

chorar. Não ia. Por muitos anos ela realmente acreditou ser

amaldiçoada, mas o que a diferenciava daquelas pessoas além das


características físicas? Acaso ela não sangrava se fosse

machucada? Acaso não sentia dor? Não chorava e sofria como

eles?

O que mais a irritava era não saber o porquê de ser assim.


Chegou a pensar que fez algo horrível para alguém na vida passada

e essa foi a forma de Deus puni-la. Ela podia contar nos dedos das

mãos os nomes das pessoas que foram genuinamente gentis com


ela na vida. Brice, Pearl, sua mãe e o senhor Grant.

Hyde se enganara. Nem mesmo sendo uma condessa as

pessoas podiam ignorar o que ela era. Emerald nunca seria

respeitada.
— Milady! — Wilkins vinha correndo atrás dela.

Emerald parou para o esperar. Ele não disse nada, apenas a


acompanhou em silêncio, talvez para se certificar de que ela iria

mesmo para o quarto e não xeretaria mais os aposentos.

— Não dê ouvidos a Edith, ela não quis dizer nada daquilo.


— Sim, ela quis, mas eu não a odeio por isso.

— Você é uma boa pessoa, senhora. — A última pessoa que

dissera isso a Emerald foi o senhor Grant. Que saudade ela tinha

daquele velho senil. — Eu levarei o que você quer comer no seus


aposentos, será melhor se ficar lá.

Talvez fosse. Emerald suspirou. Estava tão cansada da sua

vida.
— Onde o conde costuma ficar durante o dia?

— Quando não está em seus aposentos, fica na cabana no

bosque. Ele gosta muito da companhia dos animais.

Ela deveria ter imaginado.


Emerald entendia o porquê de Hyde passar a maior parte do

seu tempo com os animais na propriedade. A mansão era um lugar

muito solitário. As paredes pareciam preservar uma tristeza cruel,


como um lugar que passou por uma desgraça e nunca mais se
recuperou. Não importava quão magnífico fosse lá fora, ali dentro,

era todo o oposto.

— Essa noite eu tive a impressão de ter ouvido gemidos,

Wilkins, você saberia me dizer o que são?


— Existem muitos animais em Wiltshire, pode ser qualquer

coisa.

Emerald não conhecia muitos animais, mas podia dizer que


aqueles ganidos não eram deles. Parecia sobrenatural. Como se

sentisse dor e solidão. Em outra época ela pensaria que era a fera

de quem tanto falaram viver na prioridade de High Garden, mas

estava morando ali há alguns dias e a única fera que conhecera era
aquele que agora ela podia chamar de marido. Embora Hyde tivesse

um fragmento animalesco na forma como agia, não tinha nada de

bestial.
— Enquanto falava, a cozinheira mencionou que o lorde já

sofreu nas mãos de muitas mulheres, o que ela quis dizer com isso?

Wilkins encarou as próprias mãos, nervoso.

— Nós somos uma família, e servimos à família Hyde há


muitas gerações. E a única razão disso é porque somos leais,

milady, e eu estaria traindo o meu senhor lhe confidenciando tal

coisa. — Emerald mordeu o lábio para conter todas as perguntas


que desejava fazer, Wilkins apenas a deixou mais curiosa. — Mas…

— O criado abaixou um pouco a voz. — Se tentar entrar outra vez


na porta daquele corredor, talvez ache alguma resposta.

Emerald compartilhou um olhar cúmplice com Wilkins. Com

certeza visitaria essa porta na primeira oportunidade. Só tinha que

saber como faria isso com ela trancada, e sem que Hyde soubesse,
já que, se suas suspeitas estivessem corretas, ele devia ser o dono

da chave.

— Eu posso ajudá-la em mais alguma coisa, milady? —


Wilkins perguntou, solícito ao pararem em frente à porta do quarto

dela.

— Sim, que pare de me chamar de milady — ela falou,


mesmo sabendo que esse pedido jamais seria realizado. — E tem

mais uma coisa.


Á noite, Emerald jantou na grande sala acompanhada do
conde. Ela observava ele comer com o garfo e a faca. A engenharia

necessária para ele cortar o alimento e levá-lo à boca parecia


simples, tão fácil, mas exigia um nível de coordenação motora que
Emerald não dominava.

Mesmo com todos os xingamentos e mal tratamento que

recebia, foi a primeira vez na vida em que sentiu vergonha de ser

quem era. Nada trazia mais a sensação de inutilidade do que não


conseguir comer com um garfo e uma faca. Na noite passada,

Emerald comera apenas comidas fáceis, como frutas e pães e se


atreveu a bebericar um pouco da sopa já que era a única comida

que exigia apenas o uso de uma colher.


— Você não precisa se envergonhar, apenas coma — Hyde

disse, a assustando com o grave de sua voz. Sempre parecia que


ele estava com raiva dela.

Apenas um segundo atrás ela podia jurar que ele não

prestava atenção nela. Emerald o ignorou e largou os talheres.


— Na verdade, eu estou sem fome, comi bastante essa tarde

na companhia de Wilkins.

Os olhos dele se cravaram nela como flechas.


— Se você pretende se tornar uma lady apresentável não

deve comer junto da criadagem.

— Não faz muitas horas que eu fazia parte dessa


“criadagem”, milorde, e eles são a única companhia que eu tenho

aqui já que você se recusa a trazer minha irmã.


Ela viu os dedos dele se fecharem com força ao redor dos

talheres.

— Eu posso trazê-la se você me provar que cumpriu com sua

parte do acordo.

Emerald bufou.

— Você não tem medo?


— Medo? De quê? — Ele franziu o cenho.

— De se contaminar com o que tenho.


— Por quê? Algum criado destratou você?
Emerald não teria coragem de falar, mesmo que aquelas

pessoas a tivessem tratado mal, ela jamais seria capaz de expô-los

ao risco de perderem a única fonte de renda que tinham.

— É apenas uma dúvida.

Ele limpou a boca com o guardanapo e bebeu um demorado

gole de vinho. A taça de vidro parecia pequena na mão dele. Essa


mesma mão que tocou no queixo dela enquanto ele enfiava o

membro em sua boca.

Ele pigarreou, e os dois olharam um para o outro e ela soube,

de alguma forma, que eles pensavam na mesma coisa.

— Não, não tenho medo. Eu não teria uma sorte tão grande.

Emerald ficou estarrecida, seu pescoço esquentando e a

fazendo amaldiçoar baixinho. Ele achava mesmo que ser como ela
era uma sorte?

— Que seja. Eu só desci essa noite para lhe mostrar isso.

Ela retirou a camisola rasgada do colo e a ergueu no ar.

— É a primeira vez que ganho um presente como este. — Ele

ergueu o canto da boca em um sorriso sarcástico.

— Não é para você, é a camisola que estava vestindo


quando… — Ele ficou no mais profundo silêncio esperando que ela
continuasse — enfim, olhe com mais atenção.

Hyde fez isso, seus olhos vagaram pelo estrago que fizera na
roupa antes de parar na pequena macha de sangue no meio da

seda.
— Ah.
Ah?

Seu olhar mudou, e ele parecia... muito decepcionado.


Emerald desejou perguntar o porquê, mas não estava certa se

queria mesmo saber.


— Viu? Eu não menti, e agora você terá que cumprir com sua

parte do acordo. Eu quero minha irmã.


— Por que não me mostrou isso ontem?
Ele seguia desconfiado. Que homem mais teimoso!

— Porque... bem, é óbvio que eu só lembrei agora à tarde.


Ele cerrou os olhos, quase os fechando.

— Eu não confio em você.


— Não deveria mesmo, afinal, eu sou uma Sandle.

A mão dele bateu na mesa, fazendo tudo trepidar, inclusive o


coração de Emerald.
— Não diga isso nunca mais, você é uma Hyde agora.

Oh.
Emerald sentiu a mesma palpitação que afligiu seu corpo na

noite de núpcias quando ele a chamou de Emerald Hyde em seu


ouvido com sua voz grossa e autoritária. Era verdade, ela não tinha

mais o nome pavoroso de seu pai, mas saber que compartilhava um


nome com aquele homem a fez se sentir intimidada. Íntima dele de

alguma maneira muito crua e sua pele ardeu com a mesma


sensação de duas noites atrás. Quando ele a tocou.
— Muito bem, eu vou trazer sua irmã dentro de um mês.

— O quê? Isso é muito tempo!


— É o tempo que tenho para saber se está grávida do meu

filho.
Santo Deus. Emerald se levantou, arrastando a
cadeira consigo.

— Como pode saber que… — Ela não conseguia dizer as


palavras que pairavam em sua língua. — Como sabe que…

— Que gozei dentro de você?


Céus, Emerald achou que fosse desmaiar. Era o que ela

queria dizer, mas não com palavras tão sinceras. Como alguém
podia dizer algo assim sem nem piscar de vergonha? Ela o encarou
do outro lado da mesa, tão pleno em sua postura de conde tirano.

Que mais coisas sujas ele podia dizer e fazer com essa língua?
Ela não ia perder tempo bancando a inocente com ele.
— Sim.
Ele pegou o cálice de vinho e riu raspando os lábios

manchados de vermelho na borda.


— De fato, não costumo dar minha semente para qualquer

uma, até hoje, nenhuma mulher conseguiu tirar isso de mim, mas
com você… — O olhar dele a perfurou como uma bala. — Eu não
desperdiçaria nada, despejaria tudo bem fundo.

Emerald se perguntou se era humanamente possível derreter


de dentro para fora com o calor do próprio corpo. A sensação que

ela tinha era de que era possível que seus órgãos estivessem se
liquefazendo e virando uma massa incongruente dentro dela. Seu

corpo se tornando maleável como uma massa de pão, esperando


para ser sovado. Se ela fechasse os olhos, ainda podia sentir o
gosto erótico dele em sua boca.

Ela não costumava beber, mas sentiu que precisava de um


gole generoso de vinho.

— Isso não é justo, você me pede uma prova e eu dou, e


então me pede outra. Isso não é atitude de um homem de palavra,
lorde Clarendon.

Ele desceu a taça e a depositou na mesa, obstinado.


— Eu não forçarei você a me receber em sua cama outra vez,
mas em um mês se não estiver grávida eu farei você me provar que
não está mentindo para mim.

Emerald se deixou cair na cadeira. Todos os esforço que fez


foram em vão. Em um mês não estaria grávida e outra vez teria que

arrumar um jeito de ludibriar Hyde, pois ela duvidava que ele


acreditaria só em sua palavra. Ela teria um mês inteiro para pensar
em uma escapatória.

Seria um mês bastante longo.


— E então? — O padre Simons recebeu Wilkins assim que
ele entrou na cozinha torcendo as abas do seu uniforme, nervoso.

— O que foi dessa vez?


— Outro pedido peculiar? — indagou a cozinheira.
O criado parecia precisar sentar, então o fez.

— Pediu… — Respirou para reunir coragem. — Um pouco de

sangue de porco.

Os criados arquejaram, os rostos em horror.


— Eu disse, eu falei que ela era uma bruxa, e nenhum de

vocês me deu ouvidos. Agora estamos todos condenados — disse


Ruth, em desespero. — E pensar que ela quase tocou na minha
Emile! Minha menina já não é muito bem da saúde, o que poderia

ter acontecido?
— P-pode ser apenas um mal entendido — Wilkins disse

depois de molhar a garganta com algumas gotas de água. Ele se

negava a crer que alguém aparentemente tão dócil quanto Emerald,


seria capaz dessa barbárie.

— Para que uma mulher quer sangue de porco?

Ninguém teve resposta para essa pergunta.


— É o que eu disse. Ela é uma bruxa, primeiro pede beladona

e agora pede sangue! Que outra razão teria o conde para se casar

com alguém como ela? Ela o enfeitiçou! — Edith disse, com um


olhar que fez Wilkins desconhecê-la.

— Pobre senhor Hyde, já não basta ter sofrido nas mãos


daquelas mulheres, agora vem mais essa! — fungou Ruth, chorosa.

Todos os criados pareciam muito tristes. Eles se esforçaram

muitos anos para compensar a falta de uma mãe e todo o afeto que

faltara na vida do conde, e não podiam aceitar que sua vida

acabasse porque confiou em mais uma mulher errada.

— Está acabado. É questão de tempo até as paredes de High


Garden desabarem sobre nossas cabeças.
— Não se precipite ainda, Edith — o padre Simons disse e
passou uma mão pela cabeça de Emile, que seguia encolhida no

colo da mãe, tossindo vez ou outra. — Eu venho mantendo as

raízes venenosas da senhorita Sandle e a família dela longe da

cidade há anos. Eu consegui a maioria dos votos para que fossem

expulsas da igreja. Quando notei que aquele rapaz, Brice Howard,

mostrava interesse por ela, falei para o pai dele que o mandou para
Londres e garantiu que ele não voltaria mais. Não pude expulsá-la

da botica porque aquele velho Grant me desafia, mas meu rebanho

é fiel e não compra nada em seu pulgueiro. Eu, certamente, não a

manterei como condessa. Os Sandle nunca venceram de mim.

— O que faremos, senhor? Como faremos para tirar lorde

Hyde do feitiço dela? — Quis saber Ruth.

O padre bateu com o dedo polegar na lombada da Bíblia em


sua mão, reflexivo.

— Eu tive uma ideia, mas vai exigir a participação de todos os

criados. Se quisermos livrar o pobre lorde Hyde do feitiço dessa

bruxa, e arrancar de vez a ameaça dela sobre o condado, teremos

que agir todos juntos.

— Faremos qualquer coisa, padre.


Os criados concordaram e o padre sorriu, complacente e

satisfeito.
— No entanto, por hora, teremos que agir com perspicácia

para reunir as provas necessárias. Leve o sangue para ela, Wilkins.


O criado concordou, embora achasse que isso tudo era uma
grande maluquice.
Entre rosas brancas e espinhos

Emerald acordou com pingos de chuva molhando seu rosto.


Pela força do hábito, se levantou de um pulo e procurou Pearl para
ajudá-la a arrastar a cama para longe da goteira, mas, ao sentir o

vazio no lugar onde deveria estar sua irmã, se lembrou de que não

estava mais em sua antiga casa e sim na mansão do conde

Clarendon.
Os pingos de chuva que respingavam em seu rosto, vinham

da janela que ela deixara aberta antes de dormir. Emerald empurrou


a janela para baixo e voltou a se deitar, se enrolando em seus

muitos lençóis confortáveis e contou os clarões dos trovões que


invadiam a escuridão do seu quarto. A essa hora, Pearl era quem

estaria correndo pela casa para juntar os baldes a fim de aparar as


goteiras da chuva.

Se sentiu culpada por estar tão confortável entre as cobertas,

aquecida e protegida da tempestade, mas não teve muito tempo


para pensar na culpa que sentia pois um som mais esmagador que

o dos trovões chegou até ela. Emerald se sentou na cama e olhou

ao redor. Pensando se ouvira direto. Houve um longo tempo de


silêncio antes do som se repetir, mais alto e mais dilacerante. Era

um gemido, o mesmo que ouvira na noite anterior. Dessa vez

pareciam muito mais fortes. Lembrou-se da lenda da fera que vivia


na propriedade e seu espírito abandonou seu corpo.

Emerald começou a tremer sob as cobertas. Era muito


suspeito que o conde passasse o dia todo no bosque. Emerald

ficara ao pé de sua janela no dia anterior e o vira entrar no labirinto

ao meio dia e sair apenas ao entardecer. Será que realmente o

conde estava escondendo uma besta em sua casa? Será que essa

besta ficava trancafiada atrás daquela porta que passava o tempo

todo trancada? Isso explicaria muita coisa.


Lorde Black Hyde era um homem muito misterioso e tinha

uma personalidade tão sombria quanto seu nome.


Emerald não fazia o tipo que ficava deitada esperando a sorte
apiedar-se dela. Se levantou e viu que os gemidos vinham do quarto

ao lado. O quarto de Clarendon. Encostou o ouvido na porta e saltou

quando um grito de dor cruzou a madeira e espremeu seu coração.

Ela girou a maçaneta sem pensar e encontrou apenas escuridão e o

cheiro pungente de rosas. Um clarão iluminou o quarto e ela o viu.

Aquele som fantasmagórico e animalesco, vinha de Hyde. Era


estranho que ele estivesse produzindo aqueles gemidos, pois a

coisa mais bizarra era que ele estava dormindo. Seu corpo pingava

de suor. Ensopava os lençóis e se misturava ao cheiro das rosas

que parecia mais forte do que nunca. O lençol caia pelos seus

quadris, seu tronco estava despido e suas mãos grandes agarravam

os lençóis com muita força. Seu corpo era um aglomerado de

músculos firmes, prontos para dilacerar alguém, mas, submerso no


pesadelo, ele parecia vulnerável. E apavorado.

Emerald se aproximou e avistou algo no peito dele que não

vira na noite da lua de mel, talvez porque antes ele apagara todas

as chamas das velas. Era uma cicatriz disforme, como se garras

tivessem sido enfiadas em seu peito e dilacerado sua carne. Ela não

sabia se deveria acordá-lo, as pálpebras dele estavam inquietas e


ele parecia estar vivendo um horror em seu pesadelo. Bem, ela não
seria capaz de o deixar para trás daquele modo. Desejou se inclinar

sobre seu peito duro e ouvir os batimentos de seu coração, mas


logo se deu conta do quão estranho era desejar isso.

Timidamente, Emerald afastou os cabelos que se pregavam


ao suor da testa dele e o tocou para ver se tinha febre e no instante
que sua pele entrou em contato com a dele, os olhos castanhos de

Hyde se abriram.
— Ah! — Emerald deu um berro quando um trovão balançou

as janelas.
As mãos que agarravam os lençóis agarraram os braços de

Emerald e ela foi puxada. Emerald nem conseguiu gritar, em um


instante estava debaixo do corpo suado e todo firme do conde.
Ele queimava em cada centímetro de pele.

— Céus, você arde em febre! — Ela desejou tocar na testa


dele, mas suas mãos estavam presas pelas dele.

— Quem disse que pode entrar em meu quarto sem minha


permissão?

Emerald não deixou de se sentir insultada com o modo como


ele disse essas palavras. O rosto dela queimou de vergonha. De
fato, fora muito invasiva entrando no quarto dele assim e achando

que poderia tocá-lo.


— Eu ouvi você gritando e...

Ele não a deixou terminar. Apertou os pulsos dela com ainda


mais força, mas Emerald se recusava a emitir um protesto.

— Como você é bondosa. Così caritatevole! Eu devia estar


agradecido por ter alguém preocupado com minha saúde. Non è

vero?
Emerald queria saber porque ele estava sendo tão rude. Ela
havia até se preocupado com ele e feito a gentileza de acordá-lo.

— Que me pendurem não forca por me atrever a ajudar um


selvagem como você.

Algumas gotas do suor dele pingaram nos lábios dela.


Emerald resistiu com toda a força que tinha para não lambê-las. O
corpo de Hyde se espremia no dela, e ele se deu conta da posição

em que estavam.
— A única coisa que eu queria de você, você já deu a outro

homem.
Emerald muito rapidamente desejou ganhar distância dele.

Não queria pensar em Brice enquanto estava com Hyde em


uma cama, e menos ainda em uma posição como aquela e
com ele falando com aquela voz, que parecia… parecia carente.

— Do que está falando? — Emerald estranhou a própria voz.


Hyde balançou a cabeça, se negando a responder. Os quadris
dele se moveram em direção aos dela. Emerald sentiu
formigamento vindo de seu ventre e arrepios nas pontas dos seus

mamilos. Sob a camisola, seus seios ficaram duros. Assustou-se


com essa resposta tão avassaladora do seu corpo. Foi muito mais

rápido dessa vez.


— A febre está derretendo seu cérebro, milorde. Me solte! —
Ela se debateu um pouco, mas estava imobilizada.

Ela esperou que ele a soltasse, e quando fizesse isso, correria


sem nunca olhar para trás, mas em vez disso, Hyde apertou mais e

um gemido de dor escapou dela.


— Isso, não deveria ser algo estranho. Emerald. É a única

coisa que não deveria ser estranha entre nós.


— Milorde…
— Aiutami, per favore. Me ajude. — A voz dele saiu em um

suspirar de dor.
Hyde voltou a investir os quadris contra os dela. Emerald não

se moveu, o tecido da camisola e o da calça que ele usava os


impedia de ter qualquer contato mais íntimo, mas ela não estava
certa se isso era necessário pois a forma como ele se esfregava

contra ela era imoral. Imitando os gestos de uma relação sexual.


Colidindo os quadris com os dela e esfregando a ereção firme na
carne úmida dela sem pudor algum.
Hyde parecia alucinado, talvez fosse a febre. Emerald

percebeu que ele tremia. O cheiro do suor, a pele exposta, o homem


grande em cima dela, tudo isso excitava Emerald e ela se deixou

relaxar sobre o colchão, com ele a fodendo de uma forma muito


rude sem realmente fodê-la. Era violento, e com certeza ela o
sentiria no dia seguinte, mas de alguma forma, era prazeroso e

delicado. Emerald sentiu a mesma sensação da noite de suas

núpcias, vindo de dentro, a tensão se agrupando em seu baixo


ventre e esperando mais um golpe para ter liberação.

Seu corpo cedeu, e suas mãos deslizaram pelos cabelos de

Hyde em busca de abrigo. Emerald estava quase gozando. Ela

sabia disso porque a sensação era única demais para ser qualquer
outra coisa. Hyde estava uma bela bagunça, investindo cruelmente

seu sexo contra o dela na ânsia desesperada de conseguir aplacar

algum tipo de dor. Seus rostos estavam próximos o bastante para


respirarem o mesmo ar. Suor começou a emergir da pele de

Emerald e lambeu os lábios secos para não gritar quando sentiu que

ia receber sua generosa recompensa, mas, de repente, Hyde parou.


— Ah! — Ele apertou os olhos e caiu para o lado, segurando a

cabeça. Parecia estar em sufocando de dor. Ele desceu da cama e


cambaleando caminhou em direção a porta do quarto.

Emerald levantou-se, aterrorizada com aquela cena.

— O que foi?
— Me deixe sozinho! Escí! — Hyde gritou.

Emerald odiou a forma como ele falou, quando um instante

atrás estava tocando nela. Se sentiu meio traída.

— Sua falta de educação é o que ganho por me preocupar


com você?

— Em todo caso, eu não pedi sua preocupação!

Ele olhou para ela, os olhos vermelhos e as mãos na cabeça


como se quisesse a impedir de se partir em duas. Emerald o

encarou, morria de preocupação, mas o fato de apesar de estar

sentindo tanta dor ele ainda ter fôlego para ser um bruto selvagem
com ela, a fez se encher de raiva. Esse homem era uma incógnita!

Emerald saiu da cama. Percebeu, com muita vergonha, que

sua coxas tremiam e isso a deixou com ainda mais raiva dele,

porque, pela segunda vez ele atiçou aquela chama de desejo dentro
dela, apenas para apagá-la no instante seguinte com um grande

balde esse água fria. Doía. Inferno. E ela se sentia meio vazia.
— Da próxima vez eu não virei nem se você implorar! —

gritou e bateu a porta ao sair.


Entre chaves secretas e lábios amargos

— O que é isso?
Emerald encarou a caixa que Wilkins colocou diante dela na
mesa de desjejum em seu aposento privado.

— Lorde Clarendon pediu que eu a entregasse, milady.

Emerald bufou e fingiu não ter interesse em saber o conteúdo

quando a pegou. Puxou a tampa e encarou o colar cheio de pedras.


Ela descartou o presente em cima da mesa e voltou a

mastigar seu pão. Com ainda mais raiva do que estava antes de ver
aquele colar. Emerald esperou a manhã inteira que Hyde tivesse a

decência de se desculpar pela forma grosseira como a tratou, mas


desapontou-se porque Hyde não entrou pela sua porta e se ajoelhou

diante dela implorando seu perdão enquanto ela o esnobava com a


mão.

Ela não ia aceitar ser tratada dessa forma. Não ia. Ele estava

louco se achava que podia a tratar do jeito que quisesse se no dia


seguinte comprasse o bom humor dela com uma joia cara. Se ele

pensava que ela iria ficar em seu quarto trancada se martirizando,

ou convalescendo porque ele assim ordenou, ficaria chocado ao


descobrir que estava profundamente enganado. Nem mesmo toda a

"condestade" do mundo poderia tirar de Emerald seu orgulho e noite

passada Hyde o machucara de formas imperdoáveis.


— Como o tempo, o lorde Hyde tem seus períodos de

tempestade, milady. Dê a ele um tempo e ele voltará tão radiante


quanto o sol após a chuva.

Emerald percebeu que mastigava o pão com muita força e

respirava muito alto. Moveu seu olhar irritado para Wilkins.

— Isso deveria me acalentar?

O criado sorriu sem jeito.

— Funciona comigo.
Emerald entendeu tudo. Os criados daquela casa estavam

acostumado com a forma descuidada como o conde tratava as


pessoas apenas porque queria. Não encontrara ninguém que o
colocasse no eixo ainda. Bem, parece que essa tarefa sobraria para

Emerald e ela o faria com muito prazer.

Ela ignorou os conselhos de Wilkins e após o desjejum

caminhou a grandes passadas para a porta que encontrou trancada

no dia anterior, foi bem difícil encontrar o caminho agora que a raiva

a impulsionava. Levou um tempo até Emerald perceber que estava


dando voltas e mais voltas sem destino na mansão.

— Argh! Diabo de casa grande!

Ela se encontrou de frente para uma parede onde estava um

quadro onde uma madona amamentava seu filho. Emerald avistou

na ponta do corredor outro quadro familiar, e lembrou-se: a madona,

o padre, o ferreiro e o corcel. Eram esses os quadros que levavam

ao corredor com a porta trancada. Rumou na mesma direção, mas


ao dobrar o corredor, colidiu com uma parede que surgiu em sua

frente de uma hora para outra e caiu de traseiro no chão.

Era Hyde.

Ela o olhou de baixo a cima enquanto ele a encarava com

seus olhos castanhos e fundos com manchas roxas abaixo deles.

Ele também não tinha tido uma boa noite. Isso a fez se sentir um
pouco melhor.
— Bom dia.

— Você... seu homem selvagem e ingrato. — Ela acertou a


canela dele com o bico de sua bota.

Hyde deu um passo para trás.


— É assim que me agradece pela joia? Não gosta de rubis?
Pensando bem, você parece o tipo que prefere pérolas.

— Você pode pegar esse colar e enfiá-lo no seu traseiro


nobre.

Ele passou por ela sem dar a menor importância. Não teve
nem a cortesia de estender uma mão para ajudá-la a se levantar.

Emerald fez isso sozinha, limpou as mãos sujas de poeira nas saias
e o seguiu quase correndo, quando o alcançou, ele já dobrava o
corredor.

— Onde está a chave?


Ele parecia entediado e por causa disso Emerald ficou ainda

mais irritada.
— Que chave?

— Da porta que fica trancada naquele corredor!


Ele respirou fundo.
— Ser irritante é uma particularidade da família Sandle?

Emerald mordeu sua língua para não amaldiçoá-lo.


— Eu diria que ser rude é uma particularidade da família

Hyde, mas não conheço ninguém da sua família e seria injusto


acusar todos eles de serem horríveis como você.

— Não deseje conhecer minha família, seria melhor desejar


uma praga.

— O que guarda essa porta que vive trancada?


Ele a olhou de soslaio.
— Se fosse para você saber ela não estaria trancada, não

acha tesoro mio?


— Por que não?

Ele se virou para ela de um rompante, a fazendo colidir com


seu peito duro outra vez. O coração dela disparou, medo, tensão,
excitação. Brincar com Hyde era como cutucar com vara curta uma

fera, e rezar para conseguir escapar a tempo quando ela desse o


bote.

— Céus, mulher, você não pode apenas me obedecer?


Emerald tragou saliva, molhando sua garganta que secou de

repente. Ela sentiu o cheiro do hálito dele, algo forte, como, como
um remédio.
— Não, isso seria doloroso para mim.

Hyde exalou, descendo o olhar para a sua boca.


— Pare de me perseguir, se não deseja que eu descumpra o
nosso acordo.
A mente dela foi puxada para a noite anterior outra vez. A

imagem do corpo dele colidindo contra o dela violentamente


invadindo sua mente.

Emerald estava sofrendo, não sabia porque e nem de que,


mas alguma coisa inacabada a perturbava e fazia as paredes do
sexo dela arderem e ansiarem por atrito. Ela precisava sentir aquilo

de novo, precisava.
— Você não o está cumprindo — ela disse, baixinho, porque

agora ele estava respirando o mesmo ar que ela. Ela não sabia o
que tinham feito noite passada, mas sabia que era sexual pela

forma imoral como ele esfregara o corpo no dela.


— Não estou? Sabe o desafio que vem sendo não invadir seu
quarto durante a noite e roubar de você o que desejo? Sabe o

sacrifico que fiz noite passada para não invadi-la sem nem mesmo
prepará-la?

Emerald sentiu o colar de Brice apertando contra seu peito


quando sua respiração se tornou pesada. Os dedos de Hyde
deslizaram pela curva da sua cintura e paravam na borda de seu

seio.
— Você só está tentando mudar o meu foco.
— Está funcionando?
— O que você acha, lorde cruel?

Ela foi empurrada em direção à parede e amassada contra ela


pelo corpo de Hyde.

— Eu estou sendo muito leve com você, por isso sente que
pode falar como quer, agir como quer perto de mim. — Ele a
segurou pelas bochechas. — Eu devo recordá-la de que não é

porque eu não fodo você como eu quero e na hora que eu quero,

que eu não sou o seu marido. Você me deve respeito e obediência.


— Você está exigindo demais de alguém que não pretende

manter ao seu lado.

Para a surpresa dela, ele sorriu.

— Falando desse jeito, me faz acreditar que você quer estar


ao meu lado por tempo indeterminado.

— Eu tenho amor pela minha sanidade, milorde, estou

convencida de que alguns anos ao seu lado seriam o bastante para


me levar à loucura.

A mão do conde deslizou suavemente pela nuca de Emerald e

o corpo dela produziu um leve suspiro.


— Existem diversos tipos de loucura. Nunca ouviu ninguém

dizer que seria capaz de enlouquecer de paixão?


— Para mim, soa ainda pior.

A esse ponto, Hyde já estava com os lábios praticamente

colados aos dela, os dois respiravam uma coisa só.


— E que tal enlouquecer de prazer?

Emerald puxou ar para seus pulmões quando sentiu que seria

beijada, e foi o que Hyde fez. Ela tentou se debater, empurrá-lo, mas

ele era forte e, convenhamos, ela não podia fingir por muito tempo
que não desejava aquilo. As mãos que antes o empurravam, agora

o puxavam.

Diferente do que achavam, Emerald não era frágil, nem muito


menos precisava de proteção, aproveitou todas as chances que teve

para calar a boca de seu pai ou de alguém que duvidava de sua

capacidade, por isso foi uma surpresa para ela perceber que
adorava ser presa entre os enormes braços de Hyde. Ele não a

tratava como se ela fosse deficiente, ele não tinha medo de quebrá-

la e parti-la, ele apenas a tratava como alguém normal. Como um

homem que deseja possuir uma mulher incansavelmente até não ter
mais fôlego, e isso, sim, Deus, isso foi a perdição de Emerald. Ele
sorriu e ela sentiu os dentes dele em seus lábios. Hyde levantou o

queixo dela e raspou os dentes contra o seu maxilar afilado.

— Quem diria que uma pele tão branca poderia ser tão
quente.

Isso era verdade, Emerald sentia um grande calor e tudo

ardia, mas de dentro para fora. Era tão inusitado. Sua pele

queimava, mas só dessa vez, não era por causa do sol. Era o
conde, ele provocava isso nela.

— Lorde Clarendon...

Os dedos dele se fecharam ao redor do queixo dela.


— Você não sabe meu nome? — De novo o tom de voz

imperioso.

Emerald molhou seus lábios.

— Por que pergunta?


— Sempre me chama de milorde, senhor Hyde, Clarendon. —

O polegar dele desenhava a comissura do lábio dela e estava se

tornando difícil respirar.


— Esses são seus nomes, não são?

— Não, eu quero ouvir o meu nome na sua boca. Você o sabe

ou não?

Emerald fechou os olhos.


— Sei. — Isso foi apenas um suspiro.

— Então diga. — Ele exigiu, apertando-se contra ela, a


fazendo caber em seus músculos rígidos.

— B...Black.

Um rubor de timidez cobriu a pele de Emerald.


Ouviu um gemido grosso e seus lábios foram pressionados

com muita força pelos de Black. Ela suspirou, com medo das

reações em seu corpo e ele a puxou pela cintura para cima e ela

parou de sentir o chão sob seus pés. A língua de Black se juntou à


dela e Emerald a lambeu, agora ela sabia porque o hálito dele tinha

o cheiro forte. Era láudano. A toxina a pegou com força e seu corpo

atingiu um limite enlouquecedor de calor. Ela precisava ficar nua.


Black a apertava tanto que parecia não existir ar suficiente

para seus pulmões. Ele deixaria marcas. Ela se apoiou na barriga

dele e sentiu outra vez a ereção maciça se forçando em sua carne,

seus dedos seguraram os cabelos de Black e santo Deus, isso era


bom demais.

— Por que eu não consigo me lembrar? — ele murmurou com

a língua dela em sua boca. — Com certeza eu lembraria dessa


sensação.
Ele tocou no seio dela. Emerald se afastou para dar a ele

mais espaço. Os dedos de Black entraram em seu decote e tocaram

seu mamilo, de um jeito rude e tosco, mas muito prazeroso. Aquela

pulsação que perturbava Emerald, voltou com muito mais força, ela
começou a se esfregar em Black.

— Hum-hum.

Alguém pigarreou e os dois viraram a cabeça imediatamente


para o intruso. Emerald estava prestes a gritar por ter seu prazer

interrompido mais uma vez, mas o jeito como Black a soltou, a

deixou apreensiva.

Uma mulher estava parada na frente deles, carregando uma


linda sombrinha vermelha da cor de suas roupas. Atrás dela, vinham

sete criados carregando uma quantidade incontável de malas.

Emerald ficou perplexa pois viu o rosto de Black ficar


vermelho de vergonha e só quando ele abriu a boca ela soube o

porquê.

— Oi, mãe — ele disse.


Maldita hora para chegar e estragar tudo!
Black olhou para sua mãe e como em muitas vezes durante

sua vida sentiu vontade de envolver o pescoço dela e apertá-lo.


Suspirou, frustrado. Ele se recompôs e deu uma olhada em
Emerald. Os cabelos dela estavam em desordem e as marcas dos

dedos dele estavam carimbadas na pele dela. Gostou disso. Gostou

mais do que deveria. Emerald era como uma tela em branco, e

Black a pintaria com sua língua, dentes e dedos.


Clareou a mente e voltou sua atenção para sua mãe, que

ainda o olhava com um sorriso no canto da boca e uma sobrancelha


bem feita e arqueada.

— Oi, mãe.
A última vez que vira sua mãe foi no velório de seu pai. O

velho era a única coisa que os mantinha juntos, depois que partiu,
sua mãe voltou para a Itália e Black nunca fez questão de responder

a nenhuma de suas correspondências. Até aquele dia. Ela não tinha

mudado quase nada em dez anos, estava mais velha era verdade,
mas os traços da sua beleza ainda estavam vívidos.

— Como sempre você não consegue reprimir seus impulsos

mundanos. Deve ter herdado isso de mim, já que seu pai era um
pedaço de gelo.

A mulher andou até ele e parou na frente dos dois, trocando o

olhar de um para o outro, foi então que Hyde se lembrou de


Emerald.

— Mãe, essa é minha esposa Emerald, a nova condessa


Clarendon. — Ele apresentou a esposa envergonhada e a mãe dele

a estudou com olhos assíduos.

— Então é essa a moça que tirou de mim esse título

detestável. — Os olhos de sua mãe escrutinaram Emerald. Black

gostaria de ter preparado a esposa para isso. — É uma bela moça,

excêntrica, mas eu me pergunto qual membro dessa família não é.


Ela se inclinou para Emerald.
— Presumo que a sua postura seja uma das razões para meu
filho ingrato ter me chamado até aqui.

Emerald moveu os olhos para Black em busca de explicações.

Hyde escolheu ignorá-la.

— Milady? — Ela falou, meio tímida.

Sua mãe tinha o dom de deixar as pessoas assim.

— Milady não, deve me chamar de Francesca — a corrigiu.


Francesca se virou para a casa. — Nossa, agora me lembrei porque

evitava vir até aqui, eu odeio esse lugar. Essas paredes brancas não

trazem um desejo suicida?

Puxou as saias para cima e voltou a andar. Imediatamente

todos os criados voltaram a segui-la, e Black achou melhor fazer o

mesmo, puxou Emerald consigo.

— Então devemos começar o conserto o quanto antes, quanto


mais cedo terminarmos mais cedo poderemos ir embora, não é,

Emerald?

— Perdoe-me senhora, consertar o quê? — Emerald

perguntou, se esforçando para manter o ritmo das passadas da

mulher.

Francesca parou apenas para a olhar por cima do ombro.


— Ora, mas é claro que você, fiore!
Black pôde ver quando Emerald entendeu. Ela se virou para

ele, seus olhos violeta cheios de indignação. O corpo dele ainda


doía de prazer pelo encontro dos dois noite passada, se ela

continuasse olhando para ele desse modo, Black a levaria para o


quarto e descumpriria sua promessa com muita força.
— Por que sua mãe tem que me consertar?

— Estou cansado de ver você comendo pão toda a noite


porque não pode pegar corretamente um talher.

Ela baixou os olhos, envergonhada, não tinha notado que ele


percebera isso.

Black não achava que era culpa dela não saber comer, na
verdade, achava até um pouco bonitinho o jeito como ela pegava
uma colher quando pensava que ninguém estava vendo, ou como o

observava, mas não demoraria muito para descobrirem que o lorde


Clarendon estava com uma nova esposa e se ela se comportasse

em meio à nobreza do mesmo jeito que se comportava com ele,


seria comida viva pela alta sociedade.

— Não se preocupe, eu só quero que você seja bem recebida


quando for apresentada à sociedade, minha mãe vai ajudar você. —
Ele tocou o queixo dela e os dois compartilharam um olhar intenso.

Black se sentiu invadido e se afastou.


Percebera, também, o poder que um par de olhos incomuns

tem quando acompanhado de um belo rosto.


Lady Francesca passou como um furacão pela mansão. Em

meia hora a casa estava de pernas para o ar, todos obedecendo às


ordens da antiga condessa de Clarendon com diligência.

Acabaram em uma sala pequena que ela escolheu para


tomarem chá.
— Você não imagina minha surpresa quando li em seu bilhete

que tinha se casado — ela falou, bebendo um pouco de uísque de


malte.

Emerald estava quieta em um lado do sofá, Black do outro,


ambos em uma posição muito desconfortável. Black sabia que sua
mãe estudava o comportamento dos dois.

— Na verdade ele não me deu muitas opções — Emerald


disse, seria pedir demais que ela mantivesse a língua parada dentro

da boca.
Francesca ergueu a sobrancelha.

— Isso ele puxou do outro lado da família. Os Hyde são


possessivos por nascença, batem o olho e se decidem que querem
eles simplesmente vão lá e pegam.
Emerald sentiu o olhar de Black pesado sobre ela e curvou
seus ombros. Ela deu um salto quando sentiu o leque de Francesca
bater em suas costas.

— Ai!
— Ajeite a postura querida, se quer mostrar

descontentamento baixe sutilmente seu queixo, mas nunca curve


sua coluna desse jeito ou terá dores nas costas antes dos trinta.
Emerald fez o possível para ficar ereta.

— Desastroso — Francesca bufou. — Eu vou ter muito


trabalho com você pelo que vejo.

O lábio superior de Emerald começou a tremer e Black


percebeu que ela ia chorar. Desejou fuzilar a própria mãe.

— Eu não tive uma educação, milady, meu pai é um caçador.


Lady Francesca deixou a xícara cair no pires, perplexa.
— Santa madre! Eu não acredito que você foi capaz de se

casar com a filha de um caçador. De todas, ela foi a pior.


— Mãe…

— Eu sei me defender. — Emerald o cortou e com o queixo


erguido, levantou-se. — Eu sei que não sou adequada para um
título de condessa, tampouco acho que vá ser um dia, mas eu não

aceito que me tratem mal. Sim, sou a filha de um caçador e não sei
me sentar e muito menos usar um talher, mas não pedi por esse
casamento, nem para ser educada por você então se não for pedir
muito, poupe-me da sua falsa cortesia, madame.

Black sentiu suas calças se apertando, seu membro


crescendo com a intensidade do desejo que sentiu por Emerald

nesse momento ao enfrentar a mãe dele. Lady Francesca estava


com os olhos arregalados e pálida. Virou o rosto para Black.
— Adequada? Para ser sincera essa é a primeira vez que

sinto orgulho de você! De todas que você escolheu, ela é de longe a

mais interessante. — Francesca se virou para Emerald. — Você, por


que tem essa pele e cabelos tão brancos?

Emerald parecia pronta para uma discussão, então ficou

surpresa com a mudança repentina de humor de lady Francesca,

ela precisaria de um tempo até se acostumar com isso. Nem mesmo


Black sabia se tinha se acostumado e conhecia a mulher há muito

tempo. Tempo demais.

— Não sei dizer, senhora, existe um boato de que meu


tataravô era como eu. Talvez isso seja uma condição herdada.

— Não encolha os ombros, querida. — Francesca disse,

batendo com o leque nos ombros de Emerald que imediatamente se


empertigou. Francesca pegou nas mãos de Emerald e examinou
sua pele bem de perto. — Deve se queimar muito facilmente, sim?

— Emerald assentiu. — Minha intuição me diz que você ficará muito


bem em um vestido vermelho.

O rosto de Emerald acendeu em um sorriso.

Black ficou assustado com a rapidez com que elas foram de


inimigas para amigas em um instante. Precisaria dobrar suas doses

de uísque se quisesse sobreviver aos dias que viriam. Ficou feliz

em saber que fora uma escolha certa decidir trazer sua mãe para

cuidar de Emerald. Ela já era uma mulher mais velha e muito


teimosa, se ele fosse contratar uma preceptora tinha medo de

Emerald não se adaptar tão bem. Emerald precisaria de alguém que

tivesse uma linha de raciocínio parecida com a dela para que a


fizesse entender. Só precisava que sua mãe ensinasse o básico, e o

resto ela aprenderia com o tempo e o devido esforço.


Lady Francesca não perdeu tempo, ela já começou com as

correções logo no almoço.

Black sentiu vontade de sorrir pela primeira vez em algum

tempo, estava nítido que Emerald queria matar sua mãe em alguns
momentos, como quando conseguiu pegar um pouco de comida do

prato e ia levá-lo à boca, mas sua mãe bateu na colher e pediu para
ela fazer outra vez com mais graciosidade, mas a mulher era tão

intimidante que nem Emerald tinha coragem de enfrentá-la.

Quando foram se recolher após a refeição, Black acompanhou


a mãe até o quarto de hóspedes.

— É uma moça bonita, mas me preocupa o fato de que vocês

dois não parecem estar casados embora eu tenha presenciado

aquela cena pela manhã.


A última coisa que Black queria era falar sobre sua vida

conjugal com sua mãe, ou a falta dela.

— Não quero falar sobre isso com você, mama.


Francesca circulou a cintura do filho com os braços.

— Tudo bem, geralmente um casal leva um tempo até

estabelecer um relacionamento saudável, apenas não fique se

impedindo de ter uma relação feliz por causa de coisas que


aconteceram no passado.

Ele trincou o maxilar com raiva por ela tocar naquele assunto.

— O que você entende sobre uma vida conjugal feliz? Passou


os últimos anos de casada traindo o meu pai.

Ela se afastou como se tivesse sido atingida por um soco.

Imediatamente, Black se arrependeu de ter dito isso.


— Seu pai não me via como nada além de uma leitoa para

parir seus filhos, e não fale como se eu fosse uma rameira. Eu só


estive com um homem fora do casamento e este mesmo homem é o

que está me esperando na Itália enquanto eu faço o favor de

domesticar sua esposa. Você sabe que se eu tivesse tido outra


opção não teria me casado com seu pai nunca — ela se defendeu.

— Desculpe — ele pediu, a abraçando de volta. Não era

mesmo justo.

Francesca se aninhou por um tempo no peito do filho, depois


pegou os dois lados de seu rosto com as mãos.

— Você é o único que me restou e eu quero que seja feliz,

nem que para isso eu mesma tenha que lutar pela sua felicidade —
ela disse e beijou a bochecha dele, deixando lá sua saliva.

Black apreciou aquilo, apesar de fingir que não, estava feliz

em ter sua mãe por perto.


— Você nasceu aqui mesmo em Wiltshire?
Emerald anuiu. Tentava equilibrar uma xícara cheia de chá

quente em um pires ao mesmo tempo em que tentava não morrer


sem ar. Pela primeira vez ela vestira um espartilho e aprendeu que a
beleza cobra um preço muito alto. Sem falar das costelas que

pareciam brigar com suas entranhas por espaço.

— Sim, eu e minha irmã. — Falar era um sacrifício.

— A sua família já sabe que você se casou?


Foi a primeira vez que Emerald pensou no que sua família

faria se soubesse que agora ela era uma condessa.


— Não, meu pai tiraria um grande proveito disso.
Lady Francesca suspirou e Emerald a invejou por ter esse

privilégio. O espartilho tomava dela mais da metade da mobilidade


do seu corpo, o que só tornava possível para Emerald mover o

pescoço e as pernas, já que seus braços estavam ocupados com a

xícara de chá.
— Black a trouxe até aqui e a obrigou a se casar com ele?

Emerald não demorou para perceber de quem Black herdara

a honestidade. Assim como o filho, Lady Francesca gostava de ir


direto ao assunto. O relacionamento da mulher com o filho era algo

interessante. Um insulto soava como um elogio.

— Ele não me obrigou.


— Então vocês fizeram um acordo.

— Como sabe?
— Conheço o meu filho muito bem. Eu digo que ele herdou o

péssimo gênio do pai, porque não quero aceitar que sou uma mãe

tão horrível quanto a minha foi. Mas não estamos fadados a

reproduzir aquilo que mais odiamos?

Emerald preferia acreditar que não. Nunca seria como seu

pai, nunca.
— Ele me livrou da tutela de meu pai e em troca eu darei a ele

a vida de libertinagem que tinha antes.


Lady Francesca soltou uma risadinha.
— Foi isso que ele lhe disse?

— Há algo mais que eu deveria saber?

Ela fez um breve silêncio, um sorriso sereno no rosto.

— Sabe, eu trabalhava em um bordel quando o pai de Black

se apaixonou por mim. — Emerald quase deixou a xícara com o

pires cair. — Ele era meu cliente antes de me pedir em casamento.


Ela estava perplexa.

— Eu pensei que nobres não pudessem se envolver com… —

Ela não conseguiu concluir. Não queria insultar a mulher e sentia

que iria se continuasse.

— Não existe uma regra que diz que não pode. Eu era jovem,

tinha acabado de chegar da Itália e por isso não falava quase nada

de inglês, ele se apaixonou por minha subserviência. De qualquer


forma, estou certa de que se arrependeu quando eu não pude dar a

ele mais de um filho.

Emerald não entendia como ela conseguia falar sobre isso

com esse ar tão conformado, quase como se tivesse contando a

história de outra pessoa.

— Black sempre foi assim?


— Ah não. — Francesca balançou a cabeça cheia de cachos

fartos e negros. — Black era uma criança muito feliz, por mais que
seu pai fosse um stronzo, realmente gostava dele, e o tratava com

muito carinho. Ele era seu único herdeiro. Quando fez oito anos,
deixamos a casa de Londres e viemos para a Wiltshire, lorde
Clarendon queria ensinar Black e prepará-lo para herdar esta terra.

— Algo deve ter dado errado no meio do caminho, não é?


— Ah, ele sempre foi uma criança calada e singular, não fazia

o tipo que questionava o porquê das coisas, aceitava o que lhe era
dado e vivia com isso. Gostava de ser filho único e obedecia às

ordens do pai sem mostrar resistência ou vontade própria. Acho que


o maior sacrifico que ele teve que fazer foi aceitar uma esposa.
A xícara que ela lutara a manhã inteira para segurar, foi ao

chão, espalhando pedaços de porcelana e chá por todo o tapete.


Ainda assim, os olhos arregalados de Emerald permaneceram em

Francesca.
— Esposa?

Francesca anuiu, percebendo que talvez tivesse falado


demais.
— Oh, eu não sabia que isso deveria ser um segredo. — A

verdade era que uma coisa assim nunca passara pela mente de
Emerald. Black já foi casado? Por que não mencionara? E porque

isso a estava incomodando tanto? — Ele se casou pela primeira


vez logo depois que terminou os estudos, aos dezoito anos. O pai

dele escolheu uma moça bem nascida, talvez para compensar o


erro de ter desposado uma messalina. Black não se mostrou

relutante, mas era claro o desinteresse dele pela garota. Ela tinha
uma sede de afeto a que infelizmente, Black não podia
corresponder.

Emerald piscou, já nem tentava respirar.


— Você disse primeiro casamento como se houvesse mais.

Lady Francesca se levantou para chamar um criado para


limpar o tapete.
— Apenas termine o seu chá e depois vá conversar com

Black, ele poderá lhe dar todas as respostas para as suas


perguntas.

Emerald estava catatônica. Casamentos? Essa era uma coisa


que ela deveria saber. Quer dizer, não tinha importância realmente

se ele já fora casado, ela sequer gostava dele, mas Black poderia
ter mencionado. Não, ele definitivamente devia ter dito a ela. O que
era isso que ela estava sentindo em seu estômago, como garras, se

enfiando nele? Era irracional e revoltante, mas Emerald se sentia


traída e talvez com um pouco de raiva por pensar que Black já fora
casado.
Emerald se levantou ansiosa para se livrar desse

sufocamento que agora nada tinha a ver com o espartilho, mas


antes de passar pela porta se virou para a lady Francesca uma

última vez.
— O que significa tesoro mio? — Emerald tentou imitar o
sotaque italiano, mas saiu um fracasso.

Lady Francesca abriu um sorriso enorme.


— Meu tesouro.
Entre segredos sujos e verdades cruéis

Emerald pensou em ir até o quarto de Black, mas seus pés a


levaram até aquela porta que vivia trancada. Seu sexto sentido
berrava que aquela porta escondia todas as respostas para as suas

perguntas. Dessa vez ela foi disposta a arrombá-la se fosse preciso,

mas a porta estava, para sua surpresa, aberta.

Entrou sem fazer cerimônia e encontrou Black lá, sentado na


frente de um piano de cauda. Emerald passou os olhos pelo quarto,

era um grande armário com um monte de objetos velhos e


empoeirados. Em uma parede, estavam quatro quadros de quarto

mulheres, e em quatro cabides estavam quatro vestidos de noiva. O


cômodo era separado em quatro partes que comportavam uma

quantidade de objetos cada uma. Emerald se sentiu enojada.


Os olhos dele a encontraram e ele não parecia arrependido ou

surpreso, ostentava aquela expressão indiferente que ela estava

aprendendo a detestar.
— Você foi casado quatro vezes.

Black voltou a descansar a cabeça no braço que estava

apoiado no piano, sem dar importância para ela.


— Eu sabia que era uma questão de tempo até minha mãe

lhe contar, na verdade, até demorou. — Ele tocou em duas teclas do

piano, o som sendo abafado pela tampa de madeira da cauda.


— Eu não precisaria ter ouvido dela se você tivesse me dito

isso antes. — Sua boca amargava.


— Por quê? — ele indagou, genuinamente curioso, batendo

os dedos de forma brusca nas teclas.

Emerald pensou em uma resposta que não a fizesse soar

patética. Toda aquela situação a bombardeava de diversas formas e

não sabia o que devia pensar ou dizer, ou sentir. Nem sabia se tinha

permissão para sentir essas coisas.


— Porque eu posso ser a próxima a ocupar um quadro nesse

quarto.
Ela estava começando a se perguntar se fora tola de entrar
naquele acordo sem saber de nada sobre o homem que colocou um

anel em seu dedo.

— Não vá por esse lado, Emerald.

— O que você espera que eu pense? Você foi casado quatro

vezes! Quatro vezes! Você preparou uma armadilha para todas

elas? Deixe-me adivinhar, elas eram moças sem opções e você as


presenteou com um quarto cheio de vestidos e ofereceu a elas o

benefício de uma vida despreocupada ao seu lado?

As mãos dele bateram com força nas teclas, como se ela

tivesse dito algo imperdoável. O corpo de Emerald deu um pulo.

— Você não sabe de nada sobre mim!

E isso era culpa dela?

— Você mantém viva a memória de outras mulheres na


mesma casa onde sua esposa vive! — Agora os dois estavam

gritando.

— Não é você que carrega no pescoço o colar de outro

homem?

Emerald percebeu o tamanho da sua hipocrisia e arrefeceu.

— Isso é diferente — ela disse, sem jeito.


Black se levantou e o banco caiu para trás. Ele caminhou para

ela exibindo seu tronco nu pela camisa aberta. Ela podia sentir o
cheiro de álcool nele.

— Diferente? Por acaso esse colar não é uma promessa? —


Ele agarrou o colar e Emerald sentiu que ele ia arrancá-lo. — Ele
vive no seu coração.

Engraçado, até um mês atrás a promessa de Brice era tudo


que ela tinha, mas agora essa promessa parecia uma tolice.

— Eu nunca me casei com Brice.


— Não, porque ele não quis se casar com você.

Emerald levou uma mão ao peito, Black tinha enfiado uma


faca ali com aquelas palavras. Por mais que soubesse disso, jamais
tinha se permitido pensar que a única razão para Brice nunca ter

voltado para buscá-la, era porque nunca foi sua intenção em


primeiro caso.

— Não ouse.
Os lábios dele se esticaram em um sorriso cruel.

— Aposto que ele disse que iria para Londres atrás de uma
vida melhor para vocês e depois ia voltar para buscá-la e se casar
com você, não foi?
Emerald nada fez, não confirmaria que ele estava totalmente

certo sobre isso, mas nem foi preciso.


Seu orgulho sangrava.

— Cale a boca. — Seus dentes doíam de tanto que ela os


apertava para conter sua fúria.

Black deu um sorriso cretino.


— Quando foi a última vez que seu amado lhe mandou uma
carta?

Há muito tempo, mas isso era porque estava muito ocupado.


— Nem todos têm o privilégio de nascer em berço nobre.

— Hahahaha! — Emerald sentiu que seu corpo daria um


impulso violento se ele risse dela outra vez. — Que homem ocupado
esse que não tem tempo de mandar uma carta para sua amada.

— Eu disse para calar a boca, stronzo!


Black a agarrou com um só braço e a puxou contra seu corpo.

— Me solte! — Emerald afundou os dentes no peito dele.


— Você não suporta a verdade.

Vendo que ele não se mostrava afetado pela mordida, ela o


empurrou. O toque dele criava uma loucura de sentimentos dentro
dela. Quando viu que não conseguiria vencê-lo na força, ela

amoleceu seus músculos e deixou seu corpo cair. Hyde não


esperava por isso e a soltou. Emerald tentou correr o mais rápido
que podia de quatro até a porta, mas seu corpo foi pressionado
contra o chão e foi capturada pelo pescoço. Black estava sobre ela,

a prendendo apesar dos seus gritos e protestos. Emerald estava


imóvel e completamente dominada.

— Seu cretino cruel — ela choramingou.


A respiração dele bateu em seu ouvido e o corpo de Emerald
estremeceu.

— Evitar a verdade não vai deixar de torná-la real, Em. Esse


rapaz, nunca teve a intenção de se casar com você, ele não sente

de verdade o que disse.


Lágrimas escorriam pelos olhos de Emerald, e apesar de ela

tentar se convencer de que eram por orgulho, no fundo, no fundo,


entendia que não passavam de tristeza. Seu coração estava sendo
estraçalhado sem piedade por aquele homem, ao mesmo tempo

que a voz áspera e firme e a respiração dele a acalentavam de


alguma forma.

— Como você pode saber disso? Olhe para você. O que um


homem que foi casado quatro vezes pode saber sobre amor?
Ele ficou em silêncio, digerindo a pergunta dela, nesse meio

tempo, Emerald se tornou mais consciente do corpo dele sobre o


seu, do cheiro de láudano e bebida e rosas, da pressão que o pênis
dele fazia em seu traseiro e se odiou tanto por gostar disso que
chorou ainda mais.

— O que eu sei, é que, eu nunca teria deixado você ir


embora, nem mesmo se tivesse dito não ao meu pedido de

casamento. Eu teria ido atrás de você até no inferno e teria


amarrado você a mim.
Como ela deveria reagir a isso? O que essas palavras

significavam?

Claro que ela já ouvira palavras muito mais românticas de


Brice, o amor que ele lhe mostrava era longe desse, agressivo e

sufocante, mas essas palavras saindo dos lábios cheios de ódio de

Hyde a impactaram com muita força. Isso significava que ele tinha

sentimentos? Claro que não, para ele, ela era apenas mais uma
esposa que seria substituída por outra antes que seu cadáver fosse

comido por vermes.

— Eu não sou como as criaturas que você prende em sua


propriedade, dando-lhes coisas para se sentir bem achando que

está fazendo um favor a elas as mantendo em sua prisão luxuosa.

— Maledetta! — Hyde rugiu, e sem aviso bateu seus quadris


contra os dela. Emerald queria ter tido uma reação diferente, mas
em vez disso jogou a cabeça para trás e abriu a boca, um gemido

preso em sua garganta.


Percebeu, com raiva, que esteve esperando por isso esse

tempo todo. Por aquela vulgaridade. Hyde deslizou pelo corpo dela

e amontoou as saias do vestido nas costas de Emerald. Os dentes


dele se apertaram ao redor da carne do traseiro dela, a fazendo se

contorcer e abrir as pernas a espera do alívio que ele lhe devia

desde a noite de núpcias mal sucedida.

Black afundou o rosto entre as pernas de Emerald e o corpo


dela acendeu, como se estivesse apenas esperando por isso há

dias e tremendo de alívio. A língua de Black penetrou as dobras de

Emerald e ela se contorceu. Isso era imoral, obsceno, mas a névoa


de luxúria intoxicava o caráter dela.

Ele continuou assim, esfregando sua língua e lábios nela e

gemendo com ela em sua boca lasciva. Emerald foi virada e com
apenas uma mão Black puxou o bustiê de seu vestido e expôs os

seios dela, com aquela mão ele espremeu um seio e apertou seu

mamilo. Emerald colocou as mãos nos ombros dele, deveria ter

empurrado, mas em vez disso ela o puxou para si, exigindo que a
boca dele fizesse mais pressão em seu sexo faminto. A sucção da

boca de Hyde ao redor de seu clitóris foi o suficiente para fazê-la


gritar. Sua língua persistia, indo e voltando na intimidade dela com

ansiedade. Emerald se entregou assim, no chão, com as pernas

abertas sem oferecer resistência e um olhar suplicante, exigindo


prazer. Se contorcendo sob aquele homem enorme que ela odiava e

entre todos aqueles segredos que a entorpeciam e arrastavam para

um precipício sem fim.

— Black. — Foi assustador como foi fácil pronunciar o nome


dele na embriaguez da luxúria.

Hyde a buscou com os olhos, sua barba espessa arranhando

a carne interna das coxas dela. Ele brincou com a língua em uma
parte muito sensível, arrancando dela o último pingo de decência.

Seu maxilar bem marcado se movendo junto com sua língua

audaciosa. Ele continuou se apertando contra ela, respirando

pesado contra a sua carne e a fazendo gemer. Emerald abriu os


olhos e por cima da névoa da paixão enxergou os rostos daquelas

quatro mulheres a encarando. Ela quis puxá-lo e fazer com que ele

a fizesse mulher bem ali. De alguma forma irracional, Emerald


queria mostrar que ele era dela. Queria provar alguma coisa. Mas

ao mesmo tempo que queria isso, Emerald questionava sua

moralidade e se perguntava em que tipo de ser humano horrível o

que sentia por aquele homem a estava transformando.


— Solte-me. — Ela respirou com dificuldade, puxando o ar

que ele insistia em tomar dela. — Chega, Black, me deixe ir!


Ele soltou um rosnado e saiu de cima dela, seu corpo grande

convulsionando como se sentisse dor.

— Maldita seja, Emerald Sandle! Por que você precisa ser tão
irritante? Não pode apenas aceitar tudo sem precisar de respostas?

Emerald se ajeitou tentando ter alguma dignidade. Black

estava certo, ela não precisava de respostas, bastava aceitar o que

ele estava oferecendo e ser grata, uma hora eles iam se separar e
nunca mais iam se ver. Mas o coração dela estava sendo torturado

por essas indagações e Emerald era incapaz de ignorar.

— Se fosse você, milorde, ignoraria seus anseios e conviveria


com a dúvida?

Ele saiu pisando firme, lhe deixando como resposta seu típico

olhar de desprezo.

A pior parte sequer foi perceber que tinha sido enfiada em um


mar de mentiras e segredos, ou que ela também tinha um lado ruim,

ou mesmo perceber que sim, sentia alguma coisa muito perigosa

por aquele homem cruel. A pior coisa foi o ouvir chamá-la por
aquele nome.
Emerald encarou os quadros das quatro mulheres, se

perguntando o que elas fizeram para estar neles. Ela sentia a pele

queimar de vergonha pelo seu comportamento indecoroso, como se

aqueles quatro pares de olhos a tivessem julgando com pena, e


também porque no fundo ela sabia que estava com ciúme delas, por

perceber que apesar de acreditar que sim, não era especial.


— Você não podia apenas permanecer de boca calada, não
é? — Foi com essa pergunta que Black recebeu sua mãe na sala de

desjejum na manhã seguinte.


Lady Francesca puxou as mangas do seu vestido e soltou um
muxoxo, andando até a mesa para observar a criada lhe servir uma

xícara de chá com leite e mel.

— Você é um tolo se acha que ela não descobriria em algum

momento. Além disso, não é bom começar um casamento com


segredos.

Black alisou a testa, sua cabeça parecia estar sendo


espremida, quando isso acontecia ele podia adivinhar que teria uma

noite difícil pela frente.


— Eu gosto do tipo de casamento que temos agora.

— Do tipo que não existe?


Black encarou sua mãe, lembrando porque passara tantos

anos a evitando.

— Lady Emerald tem a intenção de viajar logo que fizermos


nossa apresentação à sociedade.

A mãe dele parou de mexer o chá com a colherzinha irritante.

— E você vai permitir?


Black riu da pergunta. Por alguma razão, a achou tola. Como

se pudesse impedir Emerald de fazer o que quer.

— Sim, e espero que isso seja o quanto antes.


Antes, Black desejava mantê-la ao seu lado. Ansioso para que

Emerald o libertasse da sua maldição, mas depois que descobriu


que o coração dela já pertencia a outro, o melhor a se fazer era a

mandar para o mais distante possível dele, quem sabe assim ela

não acabasse como suas outras esposas. Não era mais algo que

estava sob o controle de Black. Ele já não tinha esperança de que

uma mulher como ela fosse querê-lo em seu coração, um homem

que já fora casado quatro vezes e que em todas, fora odiado com a
mesma intensidade pelas esposas.
E também tinha o detalhe de que não estava feliz com as
coisas que Emerald vinha despertando em seu corpo, quando ela

estava afetando apenas seu desejo isso não era tão preocupante,

mas agora ela também estava fazendo seu coração bater diferente.

Enfiando suas garras envenenadas nele e o fazendo desejar um

futuro impossível para os dois. Ontem, ele quase disse coisas que

nunca perigaram sair de sua boca. Nunca. Nem com Georgina. Teria
enfiado seu pau nela se ela não tivesse lhe colocado bom senso.

— Parece que para você está tudo bem em se tornar um

fracasso em todos os seus casamentos. — Black encarou a mãe

dele com o cenho franzido. — Ah, porque você não acredita que ela

vai permanecer sozinha, crê? Você já deveria saber que nós

mulheres também temos necessidades, e se ela não se apaixonar

por você, fará pelo primeiro que for gentil com ela.
Black pensou no dono daquele colar; quão rápido ele teria que

estalar os dedos para Emerald correr até ele? Ela seria capaz de

fazer isso tão logo eles chegassem em Londres. Ela o amava, exibia

aquele colar no pescoço com orgulho, mesmo quando a beijava ele

podia sentir o frio deste maldito colar e seu coração se enchia de

coisas estranhas. Black gostaria de matar esse infeliz, fazê-lo


desaparecer para sempre do coração dela. Mas e então? Ela estaria
condenada a uma vida como a dele, um coração podre que jamais

poderia ser preenchido.


— Desejo a ela toda a sorte que não tive com o amor.

— Você é um idiota, meu filho.


Ele piscou para a mãe, tentando aparentar indiferença quando
seu esqueleto todo tremia com o pensamento de que Emerald iria

embora na primeira chance que tivesse.


Emerald revirou todas as roupas do armário à procura de seu
vestido. Não queria mais colocar em seu corpo aquelas roupas. No

momento em que soube o propósito delas, perderam o encanto.


Enquanto puxava os vestidos para fora do armário, ela os atirava
longe com tanta raiva que isso machucava seu ego. Descontar nas

roupas a raiva que tinha de Black não trazia nenhum conforto.


Ela não entendia porque estava tão irritada por Black ter

escondido dela que fora casado quatro vezes. Que ele armara
aquilo para atraí-la e capturá-la. Esse tempo todo esteve servindo
como uma substituta. Usando aquelas roupas e agindo de acordo

com o que ele queria. Emerald se detestou tanto, que desejou


chorar.

Correu até a porta e saiu no corredor.


— Wilkins! — Emerald gritou, e de longe pôde ouvir os passos

do criado correndo para atendê-la.


— Chamou, milady?

— Por que não acho o meu vestido? — Ela voltou para o


aposento.

— Estou vendo vários vestidos logo ali, milady. — Wilkins


apontou para o amontoado de roupas que ela jogara pelo quarto.
Emerald meneou a cabeça.

— Me refiro ao vestido que usava quando cheguei em High


Garden e os que trouxe comigo.

— Ah, esses! O conde pediu que queimássemos.


— Ele o quê? — Emerald berrou. — Que direito ele tinha?
Wilkins apertou os lábios um no outro.

— Ele é o seu marido, milady.


Marido, marido. Marido uma ova!

— Isso não dá a ele o direito de fazer o que bem quer.


— Na verdade, dá sim, milady.

Emerald teria matado Wilkins naquele momento se seu olhar


fosse mortífero.
— Argh! — Emerald rangeu os dentes. Não descontaria em

Wilkins a raiva que sentia desse conde estúpido. — Apenas escolha


um para mim, o mais simples que você achar.
O criado acenou e andou para dentro, pegando um roxo com
detalhes dourados. Sem espartilho, pelo menos. Emerald sentiu

como se a pele de outra pessoa fosse colocada sobre ela quando foi
vestida.

— O desjejum já está posto, o conde já comeu e foi para o


jardim e a lady Francesca está à sua espera para mais uma aula.
Emerald estava de saco cheio de todos os Hyde.

— Eu estou sem fome. — Só ao dizer isso ela percebeu que


de fato, não tinha vontade de comer nada.

Ah, não! Ela nunca ia perdoá-lo por fazê-la rejeitar comida.


Maldito!

A primeira esposa foi Lady Georgina Temple, a causa da


morte foi uma doença misteriosa que ninguém soube diagnosticar.
Apenas seis meses depois veio a segunda esposa, Lady Victoria

Greeves, a filha única de um barão, morreu ao cair de uma escada e


fraturar a coluna, oito meses depois Hyde se casou outra vez, com a

viúva de um conde chamada Cecily Brown, a mulher foi atropelada


por um cavalo desgovernado, e a quarta esposa, se chamava
Edwina Fitzgerald, ela foi atingida por um raio enquanto cavalgava
na chuva. Com exceção da primeira, todas morreram após um mês
de casamento com o conde.
Emerald fez as contas e estava casada com Black há uma

semana e dois dias. Isso era preocupante. Existia um padrão na


morte daquelas mulheres. Todas morreram em um acidente e de

formas dolorosas. Black não fez questão de deixar o quarto fechado


agora que Emerald descobrira seu segredo, e ela aproveitou o
tempo do desjejum para bisbilhotar. Encontrou o diários das

mulheres, junto com seus pertences. Após a morte da última, dez

anos atrás, Hyde se enclausurou em High Garden de onde nunca


mais saiu.

Ela se questionou, o que o fizera decidir se casar outra vez

após tantos anos.

Emerald não queria pensar nisso, ela sentia o ar lhe faltar só


de cogitar isso, mas e se Black estivesse por trás daquelas mortes?

Isso significava que a vida dela estava em perigo. Não dava para

confiar mais na palavra dele. Ela nem sabia se ele a deixaria ir como
prometeu que faria. Porque Hyde precisava dela para reconstruir

sua reputação? Nada fazia sentido. Ao mesmo tempo que ela tinha

essas dúvidas, se sentia culpada por questionar a moralidade do


conde. Ela não era louca por duvidar dele.
No dia seguinte, Emerald recebeu outro presente de Black.

Um par de brincos de pérolas. Ela o ignorou e o jogou juntos do


colar em sua penteadeira.

— Você chegou a conhecer lady Georgina, Wilkins? —

Emerald perguntou.
Ela passara muitas horas no dia anterior naquele quarto cheio

de pertences daquelas mulheres e muitas dessas horas ficara

encarando o rosto de lady Georgina. Emerald não sabia porque,

mas tinha a intuição de que tudo começou com ela. A primeira


esposa de Black.

— Ah, sim. Ela era uma boa mulher, embora tivesse um

temperamento assustador.
Emerald observou Wilkins por cima do seu bordado mal feito,

a nova lição que lady Francesca havia passado para ela, e tentava

fazer isso sem se furar demais com as agulhas.


— A relação dela com o conde era boa?

Wilkins olhou para Emerald, sério. O criado não costumava

ficar muito tempo na presença dela, mas desde o dia anterior ele a

seguia como uma sombra. Emerald tinha certeza que Black tinha
alguma coisa a ver com isso.
— Sim, embora a lady Georgina exigisse mais do conde do

que ele estava disposto a dar.

— Filhos?
Wilkins balançou a cabeça.

— Não, o lorde Hyde sempre gostou da ideia de ser pai.

Emerald apertou o bastidor de bordado em seus dedos. Argh,

isso era irracional e revoltante! Emerald se sentiu humilhada ao


perceber que estava com ciúme de uma defunta.

— Então o quê?

— Dizem, milady, que ela reclamava constantemente da falta


de afeição do lorde.

Afeição? Amor? Era isso? Black não a amava?

— Wilkins, seja sincero, você acha que o conde seria capaz

de… — Emerald não conseguia falar isso, mas nem foi preciso
porque Wilkins a entendeu com perfeição.

— Milady, você convive com lorde Hyde há alguns dias não

pode responder isso por si mesma?


Emerald mordeu seu lábio inferior, sem ter certeza de que

resposta dar a Wilkins. Percebendo que a cada pergunta que fazia

sobre Black e seu passado, mais se afundava naquela areia

movediça de segredos.
Mais tarde, na mesma noite, Emerald acordou com os gritos
de Black outra vez. Ela atravessou seu quarto e cruzou a porta de

comunicação para o quarto dele. O encontrou virando o recipiente


de láudano em sua boca.
— Pare com isso. — Emerald o arrancou das mãos dele antes

que bebesse.

— O que está fazendo em meu quarto? — Ele suava muito e

sua franja caia para a frente lhe dando um aspecto sensual demais
para a saúde do coração de Emerald. Ela ignorou essa pontada em

seu peito e focou em fazê-lo melhorar.


— Estou cansada de ouvir esses seus gritos e se eu não

tomar uma providência eles nunca vão parar.


— O que você entende sobre isso?

— Entendo que você está se tornando dependente desse


remédio e ele vai exigir cada vez uma maior quantidade para dar fim

ao seu sofrimento até o dia que não funcionar mais.

— Não me desobedeça. — Ela tremeu com o impacto da voz


dele acompanhada de um rugido. — Me dê o vidro.

— Está vazio de qualquer modo. — Ela o balançou no ar.

Hyde veio em sua direção para tomá-lo, mas de repente caiu


de joelhos segurando a cabeça. Ele devia estar sentindo uma dor

excruciante, um homem desse tamanho jamais se dobraria a uma

mera dor de cabeça.


— Saia do meu quarto! — ele gritou para ela, seu aspecto

selvagem a assustando.
Emerald andou para a saída, pensando em se trancar bem

longe daquele homem, mas então o ouviu gemer de dor e ao se

virar o encontrou deitado no chão.

Emerald sabia que um homem daquele tamanho podia fazer o

que quisesse com ela, e depois colocar a culpa em um acidente. Ele

era um conde e ninguém se atreveria a denunciá-lo, mas vê-lo tão


incapacitado no chão, sofrendo, era demais para ela. De qualquer

forma, daquele jeito ele jamais seria capaz de machucá-la.


Emerald se ajoelhou junto dele e por alguma razão não teve
medo de ser atingida por um movimento involuntário, tocou na

cabeça de Black. Ele abriu os olhos, confuso com a ação dela, mas

deixou que Emerald massageasse suas têmporas suadas.

— Suas mãos estão frias.

— Deixe-me cuidar de você.

Emerald sussurrou, os olhos negros de Hyde a encararam e


ele parecia um menino abandonado.

— Por quê?

— É uma boa hora para agir como uma esposa, não acha?

Tenho que dar a você motivos para sentir minha falta quando estiver

se divertindo em sua vida de libertinagem.

Hyde fechou seus olhos, sem rir da piada e sem dizer mais

nada, o que Emerald interpretou como um passe livre para fazer o


que quisesse.

— Vamos para a cama.

— Como eu queria ouvir isso de você em outras

circunstâncias.

— A dor em sua cabeça está fazendo você delirar.

Ele jogou a cabeça para trás em uma risada baixa.


— Estou lúcido, tesoro mio. — O sorriso dele fez um arrepio

percorrer todo o corpo dela.


Emerald passou um braço por baixo do dele e o ajudou a se

erguer. Black cambaleou um pouco até o colchão alto, e se atirou


em cima. Emerald chamou Wilkins e pediu um pouco de valeriana e
água quente.

Enquanto esperava, Emerald tirou a camisa que ele vestia e o


asseou com um pano úmido e frio. O tempo estava fresco, mas

Black estava tão quente que exalava calor feito uma fogueira.
Chegava a ser anormal. Ele era um homem muito grande e ela

levaria muito tempo para se acostumar com isso, agora mesmo, não
conseguia desviar o olhar desse corpo imponente. Ao mesmo tempo
que representava proteção, também representava perigo. Ele podia

protegê-la de todo mal, mas ser aquilo que a destruiria.


Não demorou para Wilkins retornar com o que ela pedira.

Emerald preparou o chá de acordo com o que se lembrava que o


senhor Grant lhe havia ensinado e voltou para cama para dá-lo a

Black. O ajudou a se sentar e se recostar nos travesseiros.


— Você não vai me envenenar vai? — Ele olhou desconfiado
para a xícara de chá que ela empurrava contra seus lábios.

— Você não teria valor nenhum para mim morto.


Ele foi capaz de rir outra vez, mesmo sentindo dor, e o tolo

coração de Emerald deu um salto.


— Esse cheiro, eu o conheço, o que é? — Ele apontou para o

chá.
— Valeriana, é ótima para combater dores de cabeça e

insônia.
— É o mesmo cheiro doce da sua pele.
— Há quanto tempo você sente essas dores de cabeça? —

ela indagou, ansiosa para escapar daquele olhar negro que a fazia
desejar beijá-lo.

— Doze anos.
— O senhor Grant cuidou de um homem em Bath que sofria
do mesmo mal. Um tratamento com esse chá ajudará a ficar bom

logo. Não tome mais láudano, ele pode ajudar no momento, mas
acabará criando outro problema.

— Existe uma cura para isso?


Ela se sentiu mal com a esperança na voz dele.

— Receio que não, mas o chá ajudará a diminuir.


Black suspirou, parecia já melhorar um pouco.
— Você parece um anjo, Emerald Hyde.

Emerald devolveu a xícara vazia para a bandeja.


— Voltei a me chamar Hyde? — Ela não pôde camuflar o
rancor em sua voz pela mágoa pela forma como ele a chamara da
última vez.

A mão dela foi capturada pelos dedos suaves de Black.


— Você não recebeu minha joia? — O corpo dela deu um

espasmo quando os lábios de Black encostaram em seu pulso. Ele


a beijou ali.
— O que isso deveria significar?

— Eu pedi desculpas. — O hálito dele fez cócegas na pele


dela.

— Não, você tentou comprar minhas desculpas.


Com o braço, Black enlaçou a cintura dela e a puxou para

mais perto, encostando a testa de Emerald na dele. Emerald sentiu


o frescor da valeriana no hálito dele e fechou os olhos, lutando
contra o ímpeto de beijá-lo.

— Você rejeita todas as minhas joias, mas esse colar de


merda você exibe no pescoço com orgulho.

Emerald tentava ignorar a sensação gostosa do aperto do


braço dele em sua barriga.
— É diferente.
Black esfregou sua barba no pescoço dela. As pernas de
Emerald falharam, mas ele a segurou bem a tempo, firme contra seu
corpo másculo.

— Eu o odeio.
— É apenas um colar.

— Não estou me referindo ao colar, mas a quem o deu a


você.
Emerald fechou os olhos quando os lábios dele beijaram seu

maxilar.

— Deve ser algo parecido com o que eu sinto ao vestir


aquelas roupas das suas antigas esposas. — Ela enfiou as unhas

nos ombros dele. Ele afastou o rosto para fitá-la.

— Elas não são roupas… o que você acha que eu sou? É

tudo novo!
— Isso só piora tudo. Quer dizer que você teria se casado

com qualquer uma que servisse. — Emerald sentiu seus olhos

lacrimejando, afundou o rosto no pescoço dele para não dar a ele a


satisfação de vê-la assim. Estava com tanta raiva dele, então

porque não conseguia se afastar?

Isso era bom para fazê-la se lembrar de quem era. Que não
era especial e que não tinha razão para essas coisas existirem em
seu coração. Que ele só a escolheu porque ela não poderia dizer

não.
Black beijou a têmpora dela.

— Você gostaria de saber que é a única?

— Isso seria uma mentira.


Ele suspirou, cansado. Ela também estava cansada de toda

essa complicação. Seria muito mais fácil se os dois apenas

parassem de desejar um ao outro e seguissem o acordo como

deveria ter sido desde o começo.


— Por que você não pode facilitar as coisas para mim,

tesoro? — A voz dele soava tão gentil, nem parecia ser a mesma

que a chamou de irritante.


— Não demoraria muito para eu ocupar aquela parede de

quadros.

Ela sentiu ele se tornando rígido e distante, mesmo ainda


estando embalada nos braços dele.

— Você está com medo de mim?

Ela podia sentir a surpresa e a revolta dele somente na forma

como sua voz trepidou.


Emerald virou o rosto para não ter que responder-lhe. Queria

negar, mas não podia confiar nele, não se ele não explicava nada
para ela. Os braços de Hyde se afastaram da cintura dela e ela

sentiu um frio enlouquecedor.

— Obrigado pelo chá. Já me sinto melhor, se não quiser


receber outra joia amanhã, peço que saia do meu quarto agora.

Emerald não queria sair assim, mas era melhor, eles

precisavam ver aquilo como era, um acordo, e não um casamento

de verdade e somente desta forma talvez escapasse sem


ferimentos graves.

Foi para o seu quarto e não olhou para trás. Por mais que

quisesse.
— Lady Francesca, não estou segura de que consigo fazer
isso.

Emerald sentia o estômago revirando a cada novo passo do

cavalo. Evitava olhar para baixo, pois se o fizesse tinha certeza de

que cairia. Nunca pensou que montar em um cavalo poderia exigir

tanta força. Admirou lady Francesca por conseguir fazer isso sem
parecer que era o trabalho que realmente era. Emerald fazia força

em todos os músculos do seu corpo e era certo que doeria tudo

mais tarde.

— Uma dama deve saber montar bem a cavalo, fiore. No

nosso meio, as crianças já nascem sabendo montar a cavalo. Das

meninas é exigido que saibam o básico de aritmética, mas nada que


amedronte um homem em uma conversa. Ela deve saber pelo
menos dois idiomas e deve ter uma habilidade que a destaque,

algumas mulheres preferem tocar um instrumento, sendo ele piano

ou violino, já outras preferem pintar ou tecer. Qualquer mulher que

domine esses requisitos, é bem aceita.

Quanto mais Emerald aprendia e ouvia sobre os costumes da

nobreza, mais ela achava que sua vida simples e ignorante era
melhor. Se ela pudesse ficar só com a comida e sua cama, seria

muito feliz.

— De que adiantará saber todas essas coisas se no meio do

passeio, eu colocar todo o almoço para fora.

Andar a cavalo não era nem de longe tão magnífico quanto

ela achou que seria, e fazer isso usando tantas anáguas e ainda

aquele espartilho, era uma tortura.


— Logo você vai se acostumar e não ficará mais enjoada. Eu

prometo.

Lady Francesca era muito paciente. Emerald ficava até

envergonhada por sentir que não era boa aluna o suficiente. Ela

dava tudo de si para aprender a ser uma lady, mas isso exigia mais

do que ela acreditou que exigiria. Sendo uma ninguém, Emerald


tinha mais liberdade.
— Está um ótimo dia. Não está? — A mãe de Black ergueu o

rosto para o céu, sorvendo o calor tranquilo do fim de tarde.


Depois de chover a noite toda sem cessar, o céu dera uma

trégua pela tarde, cedendo um pouco de espaço para o sol. Lady


Francesca vestiu Emerald com um vestido de mangas compridas e
calçou luvas de couro nas mãos dela, além disso, Emerald usava

um chapéu que cobria seu rosto. Não correria risco de pegar uma
insolação, mas em compensação estava fervendo debaixo de todas

aquelas roupas. Estava certa de que não era necessário, mas não
tinha coragem de dizer não para lady Francesca.

— Sim. Está sim. — Emerald quase não podia aproveitar


devidamente o passeio por estar lutando para o terminar com vida.
Entre morrer sufocada por aquelas roupas ou cair do cavalo.

— Eu estou com vontade de correr um pouco. Você se


importa?

— Não se preocupe comigo. Eu duvido que vá conseguir


descer desse cavalo de qualquer forma.

Lady Francesca sorriu e bateu com as rédeas, instigando o


cavalo a acelerar.
Emerald esperou até que ela sumisse de vista e parou o seu

cavalo. Se apoiou em uma árvore para descer, precisava respirar ou


desmaiaria. Deixou o cavalo pastando e caminhou pelas árvores,

percebeu estar um pouco atrás do labirinto e avistou uma cabana,


correu para lá. Emerald já entrou no lugar se livrando do chapéu e

das luvas, para depois puxar os fios de suas roupas.


— Você quer ajuda?

Ela deu um pulo e seu rosto ardeu de vergonha ao encontrar


Black olhando para ela com uma expressão comedida, se
segurando para não rir, sentado em uma poltrona do outro lado do

cômodo. Perto dele, Emerald viu um cervo de pelagem parda com


dois chifres que contavam seis pontas cada. Black organizava uma

valise com inúmeros itens médicos. Então, era isso que ele fazia
todos os dias fora da mansão.
— Você mentiu. — Ele a olhou interrogativamente. — Disse

que meu pai tinha matado esse cervo e por isso me exigiu como
pagamento, mas ele estava aqui todo esse tempo.

Ele continuou organizando os materiais na bolsa. Ela


aproveitou para dar uma olhada na cabana e percebeu que era

muito limpa e organizada.


— A primeira coisa que deveria dizer, não é a razão por estar
tirando suas roupas como se pegassem fogo?
Emerald nem tentaria formular uma desculpa. Para ele, ela
não precisava fingir nada.
— Me ajude com isso. — Ela o alcançou em cinco passadas e

virou de costas.
— Não sei se deveria. Se eu fizer isso me tornarei seu

cúmplice. — Ele parecia estar se divertindo com o sofrimento dela.


— Minha mãe vem fazendo um grande esforço para torná-la uma
condessa.

— Eu passei a manhã e metade da tarde vestindo isso, meia


hora não fará diferença.

Ela o ouviu rir baixinho.


— Você deve se acostumar. Não poderá tirar a roupa no meio

da sala de visitas de uma madame quando estiver em Londres.


— Até lá, arranjarei um jeito de sobreviver com essas roupas.
Vamos, me tire desse espartilho ou vou cair.

Houve um breve momento de silêncio até ela sentir os fios


sendo puxados. Seus pulmões foram aos poucos voltando ao seu

lugar. A sensação era maravilhosa. Em nenhum momento Black


tocou em sua pele. Ele soube abrir a roupa dela de um jeito rápido e
imperceptível. Depois de quatro esposas, ele deve ter adquirido

alguma prática em abrir espartilhos.


As roupas dela se amontoaram no chão e Emerald deixou
apenas a bata branca que a impedia de ficar nua.
— Eu não menti, acreditei mesmo que o cervo estava morto,

mas ele é resistente. Quando seu pai atirou contra ele eu o estava
alimentando, a bala pegou de raspão no meu ombro e deve ter

perdido a força quando o atingiu. Consegui salvá-lo a tempo. Alguns


dias achei mesmo que ele fosse morrer.
Emerald deu uma olhada neste cervo que tinha custado seu

futuro. Era um animal bonito.

— Por que ele está tão quieto?


— Está dopado. Ele fica agitado quando está acordado e não

me deixa limpar o ferimento. Logo estará de pé.

Emerald observou o jeito como ele falava desse pobre animal.

O jeito como cuidava dele, se dedicava. Todos os dias ele vinha


para essa cabana e passava horas aqui, cuidando dessa criatura.

Parando para pensar, a forma como os criados o defendiam, e o

jeito como Wilkins permanecia ao lado dele mesmo Black sendo um


patrão insuportável, e os animais que não tinham medo de ficar por

ali, tudo isso devia significar alguma coisa. Black os tinha feito se

sentirem assim. Até mesmo Emerald, sabendo do passado dele,


não conseguia se afastar.
— Então é isso que você faz aqui todos os dias. — Ela riu ao

perceber como era simples. — Eu imaginei um monte de coisas


mirabolantes. Um livro diabólico, alguns restos mortais.

Ele se levantou para colocar a maleta em um armário.

— Não é só por isso que eu venho. Aqui eu consigo fugir do


cheiro forte das rosas.

— Não seria mais fácil mandar arrancá-las?

— Não adianta. Elas sempre voltam.

Ele não se virou para ela, então Emerald não sabia dizer que
expressão ele tinha ao dizer isso.

Ela nunca parara para pensar como aquelas rosas só

habitavam os aposentos dele. Nunca as vira sendo regadas ou


podadas, ainda assim, se exibiam esplêndidas e impecáveis.

— Eu gosto do cheiro delas.

— Você sabe o que as rosas brancas significam? — Ele se


escorou no armário, os braços cruzados, com os bíceps sendo

ressaltados por baixo do tecido fino de sua camisa de linho branca.

— O senhor Grant me disse uma vez que elas significam

pureza.
— Ele está certo. As rosas brancas florescem nos caixões das

jovens que morrem virgens.


— Isso é apenas um mito. — Emerald riu, achando isso uma

tolice, mas vendo que ele permanecia sério, se perguntou se Black

estava tentando lhe dizer alguma coisa com aquela história.


— Você teve alguma outra crise?

Ele balançou a cabeça.

— Não, desde que tomei o seu chá. Estou começando a

achar que você é mesmo uma bruxa.


Tudo o que Emerald sabia era como preparar um chá, nada

demais.

— Você mencionou que suas dores de cabeça começaram há


doze anos. O que aconteceu?

— Por que você acha que aconteceu alguma coisa?

— O senhor Grant me disse que essas dores recorrentes

aparecem depois de algum estresse ou trauma.


Ele caminhou até a mesa de centro e serviu dois copos de

uísque, arrastando um para ela.

— Estou achando que esse senhor Grant sabe demais das


coisas.

— Não seja tão displicente.

— Foi depois da morte de Georgina. — Emerald parou o

uísque a caminho da boca. — Na primeira vez, foi uma dor tão


insuportável que acreditei ser a morte vindo me buscar, mas não,

ela nunca me leva.


—Você deve tê-la amado muito. — Emerald sentiu que

apertava o copo de vidro com força demais.

— Há! — Ele riu sem humor. — Foi por não amá-la que
acabei nessa situação.

Não amou? Emerald desejou perguntar, mas se deu conta do

quão desesperada pareceria. Bebeu o seu uísque, mas era muito

mais forte do que o que estava acostumada e tossiu, com a


garganta em chamas. Black a observou, divertido. Emerald achou

melhor não beber mais. Colocou o copo de volta na mesa e sentou

em uma cadeira.
— Se me deixar cuidar de você, com o tratamento do chá, a

frequência das dores diminuirá em alguns meses.

— Não acha crueldade me fazer promessas que não poderá

cumprir?
Emerald não o entendeu. Black girou o uísque em seu copo.

— Em alguns meses você não estará aqui. Irá para bem longe

de Wiltshire, como sempre sonhou. — O toque ácido na voz dele fez


alguma coisa pulsar dentro de Emerald e ela sentiu vontade de

sorrir.
— Se quer que eu fique, tudo que tem a fazer é pedir.

— Não diga insanidades. — Ele fez o possível para parecer

ofendido.

— Seu orgulho é proporcional ao tamanho do seu coração,


milorde.

Black a olhou, indignado.

— Você está louca?


Emerald saiu de sua cadeira e cruzou o espaço que os

separava, se sentando no colo dele e rodeando seu pescoço com os

braços.

— Você não pode mentir para mim, vê, eu sei que você tem
um coração enorme — ela sussurrou contra a orelha dele e sentiu a

pele de Black se arrepiar. Encostou os lábios no músculo dos

ombros dele.
Black não podia mais a enganar com sua língua ácida e seus

olhares sombrios, nem com sua aparência amedrontadora. Emerald

agora sabia que ele tinha um coração bom. A prova disso era o

cervo que dormia confortavelmente em uma almofada. De alguma


maneira, Black se tornou mais bonito diante dos olhos dela. Ela

deslizou o dedo pelo contorno do maxilar dele. Percebendo tarde

demais que a razão para seu coração estar tão acelerado nos
últimos dias não era por medo dele, era um sentimento pior, muito

pior.
Os braços de Black finalmente a envolveram e Emerald achou

que poderiam viver para sempre naquela cabana.

— É esse o problema de revelar minhas fraquezas, você não

tem mais medo de mim — o conde disse, e foi a primeira vez que
Emerald percebeu que a voz dele podia soar doce.

— Eu nunca tive medo de você.

Black abrigou o rosto em seu pescoço. O cheiro dele, vivo,


loção de barbear, rosas e uísque, a entorpeceu.

— Dulce, me deixe fazer amor com você. — Emerald fechou

os olhos, sendo tomada por essa voz tão sedutora. — Ou então,


apenas monte em mim e sente no meu pau do jeito que você achar

melhor.

Emerald podia sentir o membro dele tentando perfurar o

tecido da calça e se juntar a ela. Só de lembrar do tamanho, suas


pernas se abriam inconscientemente. Ela queria tanto acabar com

aquela agonia que ele despertou no seu corpo. Queria tanto exercer

sobre ele o mesmo poder que ele tinha sobre ela. Emerald abriu a
boca para dizer sim, sim, sim, quantos fossem necessários, mas
uma batida na porta os interrompeu. Ela ia levantar do colo dele,
mas as mãos de Black a seguraram firme contra seu corpo.

— Entre. — Ela escondeu o rosto no peito dele, morrendo de

vergonha. Estava seminua e no colo do marido. — O que é,


Wilkins?

O esqueleto dela tremeu com a aspereza na voz dele. Tão

diferente de um minuto atrás.


— Perdoe-me, milorde, mas vai ter que chamar um médico.

Emile, não está bem.


Emerald ficou satisfeita em acompanhar Black até a área dos
criados. O que a incomodou mesmo foi estar usando apenas o

vestido, ainda aberto nas costas. A peça de roupa era grande o


bastante para a cobrir onde importava, mas não ter nada a fechando
a fazia se sentir nua e não ajudava que o marido a olhasse como se

ela de fato estivesse.

Ela podia sentir o olhar dele perfurando sua nuca enquanto

caminhava atrás de Wilkins até o quarto onde estava a menina


Emile.

De qualquer forma, tudo isso foi deixado em segundo plano


quando eles adentraram o cômodo mal arejado onde a menina
estava. Respirar ali dentro era difícil, o cheiro forte de remédios,

sangue e mofo fazia Emerald querer vomitar.


Ela viu a criança encolhida na cama, parecia muito mais

magra do que vira da última vez, e muito mais pálida. A um passo

da morte. Seu braço estava esticado para fora da cama e


derramava sangue em uma bacia de ferro.

— O que vocês fizeram? — Emerald correu para a cama e

tentou estancar com as próprias mãos o sangue que caia de forma


lenta para fora de Emile. Emerald foi tomada por calafrios ao sentir a

pele fria de Emile. A respiração dela era tão fraca que quase não se

podia ouvir.
Os olhos de Emerald se encheram de lágrimas e

começou a tremer.
— Há quanto tempo ela está sangrando? — A garganta dela

ardia.

— Desde cedo, mandamos chamar o médico, mas a

tempestade deixou as estradas perigosas. Ele mandou um bilhete

ontem à tarde, dizendo que deveríamos fazer a sangria caso ela não

melhorasse.
— Ela está jorrando sangue desde de manhã? — Emerald

sentiu a revolta martelar seu coração.


Era um milagre que Emile não estivesse morta e pela forma
como respirava, não demoraria muito até que isso acontecesse.

— Não há razão para se preocupar, milady. — Wilkins tentou

acalmar Emerald vendo que ela ficava cada vez mais furiosa.

— Não veem que isso está apenas piorando a situação dela?

— gritou, as mãos escorregadias por causa de todo o sangue.

— Temos que esperar o padre Simons, ele vai saber o que


fazer — disse a mãe de Emile, ela estava aos pés da cama e só

então Emerald percebeu a presença dela. A cara dela não estava

nada boa.

— Até ele chegar aqui ela já terá morrido.

Emerald puxou uma das meias de sua perna e amarrou em

volta de um dos pulsos de Emile.

— O que está fazendo? Você vai matá-la! — As mãos dela


foram afastadas do braço de Emile e o sangue voltou a escorrer

para fora. Emerald caiu no chão, tamanha a força com que foi

empurrada pela mãe de Emile. — Pare de fingir que se importa com

ela, quando tudo isso é culpa sua, Emile piorou desde que você veio

para essa casa, você é a causa da nossa ruína!

Blam!
Houve uma pancada estridente que fez Emerald pensar que

alguém disparada um tiro no quarto, mas foi só Black que bateu o


punho contra uma mesa e a fez rachar.

— Eu não admito que você fale assim com sua senhora.


Ninguém teria coragem de ir contra Black, se não fosse pelo
seu título de conde, sua postura ameaçadora seria o bastante para

colocar medo em todos.


— Milorde, me perdoe. — A criada baixou a cabeça.

— Não há tempo para isso — Emerald disse e se levantou,


voltou para amarrar o pulso de Emile. — Me deixe cuidar dela.

— Não. — A criada se colocou entre ela e a criança.


— Isso não é um pedido. — Emerald se virou para Black. —
Não permita que essa criança morra.

— Não, se afaste dela! Não! Você vai matá-la!


A mãe de Emile foi arrastada para fora do quarto aos prantos.

— Do que você precisa? — Black perguntou, ansioso para


ajudar de alguma forma.

Emerald o olhou, as lágrimas não paravam de cair, e seu


coração se encheu de alguma coisa potente. Pensar que ele
confiava nela tanto assim, a fez ter ainda mais consciência dos seus

sentimentos. Emerald detestou perceber que sabotou a si mesma.


Interpretou seus sentimentos muito mal, talvez porque não queria

aceitar que não era imune às suas emoções humanas. O medo de


se magoar, a necessidade de sobreviver, tudo isso a cegou.

Emerald sempre foi muito franca consigo mesma, o que pensou


sentir por Brice não chegava nem perto do que sentia por Black.

— Algumas ervas e água quente. Traga ela para o meu


quarto. Lá é mais arejado. Enquanto isso, peça que limpem todos os
quartos dessa ala, troquem as cortinas e os carpetes e mandem

chamar o boticário, o senhor Grant, ele saberá dizer com mais


certeza o que ela tem.

Black pegou a menina em seus braços e a levou para o


segundo andar. Emile foi banhada com água morna e colocada na
cama de Emerald, onde teve seus inúmeros cortes tratados e

suturados pela condessa. Emerald preparou uma infusão de ervas e


as colocou para diluir na água quente, enquanto isso, tentou fazer

Emile ingerir um caldo forte para recuperar o vigor. Ela dormiria por
muito tempo, até ter suas forças devolvidas para seu corpo.

Horas depois, Emerald saiu do quarto para respirar. Encostou-


se na parede e deixou seu corpo deslizar para o chão.
— Você me acusa de ser uma boa pessoa quando é a melhor

delas. — Black surgiu no corredor e pegou Emerald em seus braços


da mesma forma que fizera com Emile mais cedo.
Pela primeira vez na vida Emerald sentiu que podia depositar
toda a sua segurança nas mãos de outra pessoa, isso a fez querer

chorar. Perceber que vinha lutando pela sua vida desde sempre,
perceber que nunca recebeu afeto nem de seus pais e que aquele

homem que tinha tudo para ser seu pior pesadelo estava ofertando
isso a ela sem pedir nada em troca. Ela fungou, vinha chorando sem
perceber há algum tempo.

— Eu sempre perco alguma coisa quando tento ser boa.


— O que você perdeu?

Ela encostou a cabeça no ombro dele e alguns fios de cabelo


fizeram cocegas no nariz dela.

— Era Pearl quem meu pai mandaria para saldar a dívida, ela
só tem dezesseis anos então, eu vim em seu lugar. Por ser boa.
Ela sentiu um ligeiro aperto ao redor do seu corpo.

— E em troca ganhou a admiração de sua irmã. Duvido que


exista alguém nessa terra que ela ame mais do que você.

Sim, Emerald sorriu, porque também tinha ganhado ele.


Emerald se espremeu contra aquele peito firme e quente. Aquele
podia ser seu refúgio. O lar que ela nunca teve. Black poderia

retribuir esse afeto?


— E agora, eu perdi minha cama.
Black beijou a testa dela levemente.
— Você pode dormir comigo.

Aquelas palavras acariciaram o peito dela, porque no fundo,


Emerald percebeu que esteve torcendo para ele dizê-las.

— É, parece que ser uma boa pessoa pode valer a pena.


— Sim, sim. Já vi um caso assim em Dorset. Alguma coisa
impedia essa criança de respirar, e por recomendações médicas os

pais viviam fazendo sangrias. Acabou morrendo. Uma pena. No


caso de Emile, se tivesse perdido um pouco mais de sangue teria
tido o mesmo destino. Emerald fez bem em servir chá de lobélia,

mas eu sei uma forma melhor de fazê-la inalar o chá para que suas

crises diminuam. Logo ela vai respirar melhor. — O senhor Grant

guardou o aparato com que ouvia o pulmão de Emile.


Ele chegara em High Garden logo pela manhã. Emerald ainda

dormia quando foi puxada para fora da cama por Wilkins. Estava
exausta. Dormira muito mal, pois passara a noite ao pé da cama de

Emile, enxugando sua testa pois a menina estava tendo convulsões.


Quando os primeiros raios de sol surgiram no céu, foi que ela se

deitou. Black já não estava mais na cama.


— Ela vai ficar bem? — Indagou a mãe de Emile, apreensiva.

Talvez fosse a única com uma aparência pior do que a de Emerald.

A mulher fora a única além de Emerald que passara a noite em


vigilância. Não falara uma única palavra enquanto isso.

A cabeça grisalha do senhor Grant balançou para cima e para

baixo.
— Sim, ela vai. Desde que parem de tirar sangue dela.

A mulher desabou, um choro doloroso de alívio, segurando a

pequena mão da filha. Sem perceber, Emerald também estava


chorando, porque sentia muita falta de Pearl, porque estava

cansada, porque suas cicatrizes nunca fecharam. Ela sentiu uma


mão grande pousar em suas costas e se virou para o dono daquele

calor gentil. Black, tentava acalentá-la. Aquele toque, tão protetor,

fez os anseios serem varridos para distante.

— Ah, agora alguém vai me servir um pouco de chá? — disse

o senhor Grant, com aquela sua voz animada e rouca. Apesar da

idade avançada, e de precisar da ajuda de uma bengala para


caminhar, ele nunca abandonava aquela alegria pueril.
— Por aqui, senhor. — Lady Francesca indicou o caminho.
Esperando que o boticário passasse na frente para fazer o mesmo.

— Fico feliz em vê-la bem, Emerald — o boticário disse para

Emerald quando já estavam instalados na sala de visitas e servidos

com chá e biscoitos de polvilho. — Depois que você parou de

frequentar a botica eu fiquei preocupado, os poucos fios de cabelo

preto que me restavam, sumiram. — Ele deu uma risada alta, o que
fez Emerald sorrir. — Cheguei a ir até a casa de seu pai, mas você

sabe como ele é. Foi sua irmã quem me explicou a situação.

O coração de Emerald espremeu no seu peito ao ouvir sobre

sua irmã. O órgão vinha tendo tantas emoções que uma hora

cansaria de bater.

— Como está Pearl? — Ela quase não conseguiu perguntar.

— Não a tenho visto muito, minha saúde debilitada me


impede de sair, mas na última vez que a vi ela parecia bem, mas

não dá para confiar nesses meus olhos de velho. Talvez eu a

contrate para ficar na botica agora que vejo que você está bem. —

Ele deu um olhar para Black, parado em pé próximo à janela.

Pairando sobre Emerald como uma nuvem, afugentando qualquer

um com sua aura ameaçadora.


— Eu agradeço sua gentileza, senhor, mas em breve eu a

trarei para junto de mim.


O senhor Grant pareceu muito animado em ouvir isso.

— Bom, bom. Na primeira vez que escutei que tinha sido


raptada pelo conde me preocupei com seu destino, mas talvez seja
uma boa coisa que você tenha se tornado a condessa de Wiltshire.

Estava na hora de alguém livrar essa terra da influência do padre


Simons.

O sorriso de Emerald sumiu devagar. Não sabia como dizer


para o boticário que na primeira chance que tivesse pegaria Pearl e

se mandaria daquele condado. Emerald tinha memórias ruins


demais daquele lugar e nunca mais queria ter nada a ver com o seu
pai, mas então, Emerald lembrou de Black. Ele a seguiria se ela

pedisse?
— Este homem ainda está vivo? — Lady Francesca parecia

surpresa. — Quando morei nessa casa, anos atrás, ele já era padre.
— Ah sim, ele tem muita influência neste condado — disse o

senhor Grant, terminando de mastigar um biscoito. — Quase todos


na cidade agem de acordo com suas ordens. Como o conde nunca
interferiu, pensei que também tivesse sob sua influência. O número

de crianças que têm falecido depois de uma sangria é enorme e


aquele que tenta ir contra seus métodos tem um destino terrível. Por

sorte, algumas pessoas ainda vêm até mim no último minuto.


— Ele é um padre. O que ele diz não é a vontade de Deus?

O senhor Grant pegou alguns biscoitos e os mordiscou, muito


animado. Era um homem em idade avançada com muito tempo livre

e ninguém para conversar.


— Ah, eu acredito em Deus, milady, mas não estou certo se é
o mesmo que esse padre. O Deus que nos criou não é o mesmo

que criou a natureza? Da mesma forma que nosso corpo é


composto por combinações que se completam, a natureza é um

complemento disso. O meu Deus não está presente em palavras,


mas na planta que eu uso para salvar a vida de uma criança. Desde
a erva para cicatrizar uma ferida ao chá que é capaz de derrubar um

cavalo, tudo isso foi Deus quem me deu, junto com o dom de saber
para que usá-los. — O senhor Grant deu uma gargalhada feliz.

— Existe uma erva capaz de derrubar um cavalo? — Black


indagou, interessado.

Emerald ficou imóvel. O pescoço reto e os ouvidos atentos


aos movimentos do homem em suas costas. Se o senhor Grant
tivesse olhado para ela, teria visto o olhar de pavor em seu rosto.
— Ah sim, se misturada com álcool você nem percebe o sabor
amargo. Ela entra no seu corpo e em questão de segundos você
dorme, no dia seguinte não lembra de nada, a não ser uma náusea

e talvez um pouco de dor de cabeça.


Os olhos de Black encontraram com os de Emerald

instintivamente. Nem precisou dizer nada para saber o que se


passava na cabeça dele. Ela não previu que isso aconteceria e pelo
olhar dele, ela soube que estava morta.

Emerald se levantou e fez o que qualquer pessoa em sua


situação faria.

Ela correu.
Entre a bela e a fera

— Emerald, você não pode se esconder de mim!


Ela conseguia ouvir os gritos de Black de longe.
Emerald sabia que se corresse para o quarto ele a acharia e a

teria encurralada, por isso correu para fora da mansão e entrou no

labirinto. Essa foi uma péssima, se não a mais burra, decisão que já

tomou na vida. Agora ela estava perdida, correndo em círculos.


Seus pulmões ardiam, sua garganta implorava por um pouco de

água, e suas pernas pareciam que iam ceder a qualquer instante.


Burra, burra, burra! Estava presa naquele labirinto e a cada segundo

que corria mais desesperada ficava.


Após parar duas vezes para respirar, Emerald avistou um

corredor familiar, dobrou nele e chegou no meio do labirinto, no


mesmo lugar em que, quase um mês atrás, ela se casara com Black

e prometera a ele seu corpo. E era exatamente lá onde ele a

esperava. Apoiado na estátua de querubins como se tivesse todo o


tempo do mundo, como se soubesse que o labirinto a levaria até ele

cedo ou tarde.

Emerald não aguentava mais correr. Apenas caiu de joelhos


no chão, dando a ele a vitória. Por sorte, a grama fofa amorteceu a

queda. Black riu alto, um sorriso malvado, comprido, e perigoso

enfeitando seu rosto cruel. Emerald seria estraçalhada. Ele


caminhou tranquilamente até ela, e Emerald percebeu, com raiva de

si mesma, que fez justo o que ele queria que fizesse. Ele era uma
fera e ela sua presa. As botas dele entraram no campo de visão

dela. Emerald tentava engolir a saliva que ainda lhe restava para

molhar a garganta em brasa.

A mão de Black agarrou seu queixo e ele a puxou para cima,

de repente a língua dele estava invadindo a sua boca, até a

garganta, a saliva dele fazendo o trabalho que o corpo exausto dela


era incapaz de fazer. Lubrificando toda a sua boca enquanto a punia

sem deixá-la respirar. Emerald foi solta e despencou no chão outra


vez, tossindo, a respiração aos poucos voltando para seu ritmo
normal.

— Sua trapaceira, eu acho que você me deve uma coisa.

Ela apertou os dentes, com raiva por ter sido descoberta.

Admitir sua derrota era muito pior do que estar rastejando naquele

chão perante ele.

— Você só está com raiva porque eu fui mais inteligente do


que você. — Ela cuspiu as palavras, exalando raiva.

Emerald sentiu seu corpo ser pressionado contra o chão, o

peso do corpo grande de Black estava sendo jogado sobre o dela

sem piedade. Sua carne se apertou contra a dele e ela gemeu de

dor e anseio.

— Sua lealdade a ele é tão grande assim que a fez mentir

para mim?
Emerald arfou, escandalizada, quando sentiu as costas de

vestido serem rasgadas. Seu corpo se arrepiou quando a brisa fria

do dia lambeu sua pele. De uma vez, ela foi virada e pôde ver que

por baixo do sorriso ardiloso, Black estava queimando de ódio.

— O que você pretendia? — Ele abriu as pernas dela sem

cerimônia e rasgou a roupa de baixo bem no meio. — Hein?


Black estava fora de si, e apesar disso, Emerald não estava

com medo. Seu vestido se amontoou em sua barriga, seus seios


estavam para fora, assim como sua vagina, ela estava rendida,

exposta e vulnerável e deveria estar em pânico, mas seu corpo


ebulia de desejo.
— Você ia dar o que é meu para ele quando o reencontrasse?

— Ela mal conseguia pensar nas palavras para responder. — Me


responda!

— Não, eu não ia fazê-lo.


De súbito, a boca de Black abocanhou seu seio. Emerald

soltou um gritinho de susto junto de um gemido de prazer. A saliva


dele estava fria, e sua língua era como um chicote. Beligerante.
— Isso é meu. — Ele espremeu o sexo dela em sua mão.

Havia tanta possessividade na forma como ele tocava no corpo


dela, que os ossos dentro da carne de Emerald se derretiam. — Eu

decido o que faço com você, quando e como. Eu! Entendeu?


Emerald sentiu o dedo dele entrando em sua cavidade.

— O que você está fazendo? — Ela conseguiu arranjar forças


para dizer. Ele estava tão perto que ela podia sentir o calor da pele
dele esquentando a sua.
— Eu avisei que se você tentasse me enganar eu a puniria do

jeito que achasse melhor. — Black deu seu sorriso mais cruel. — Eu
vou romper o seu hímen com os meus dedos e fazer você ver, para

que não reste nenhuma dúvida de que foi comigo que você o
perdeu.

Emerald não sabia a que ele se referia, sua cabeça dava


voltas, mas tudo soava possessivo e obsceno. Ela, que nunca foi
desejada por ninguém, estava sendo declarada dele, e Emerald

nunca quis tanto ser de alguém. Black segurou em sua nuca e a


curvou para que ela tivesse uma visão ampla dos seus dedos a

invadindo. Ele a manteve aberta com suas pernas.


— Black, isso é imoral! — Ela não aguentava ver seu corpo
exposto daquela forma. Seu rosto ardia de tanta vergonha.

— Sim, não é uma delícia? — Ele avançou com seu dedo, a


abrindo, a corrompendo, atento, olhando os dois para o mesmo

lugar. Emerald se contorcia e inconsistentemente seus quadris


buscavam os dedos dele.

Black alcançou algo dentro dela e quando prosseguiu,


obstinado, Emerald sentiu que alguma coisa dentro dela ia se
romper. Ficou apreensiva, até olhar para ele e ver que era aquilo

que ele buscava. Ela suportou a dor porque sentia que no fim disso
teria uma recompensa. Os dedos exigentes de seu marido se
moviam dentro dela, causando fricção com as paredes famintas de
seu sexo indefeso. Emerald apertou os dentes quando sentiu um

puxão doloroso dentro de si. Ela engoliu os dedos dele por inteiro.
— Não foi difícil, foi? — ele regozijou contra o ouvido dela, e a

voz dele estava envolvida por um timbre muito mais potente,


sedutor, entorpecente. Emerald se sentiu pulsar em volta dos dedos
dele.

Black gemeu e puxou seus dedos para fora, ela os viu


manchados com seu sangue.

— Você é minha, Emerald Hyde.


Cada vez que ele falava o nome dela, o corpo de Emerald

sofria uma descarga incontrolável de desejo. Para o inferno com


tudo!
Ela o beijou tão apaixonadamente que Black se assustou.

Naquela noite, Emerald daria fim ao desejo que crescia dentro de si.
Black não esperava que ela fosse se entregar dessa forma, ficou

petrificado, e logo depois a beijou com tanta paixão quanto ela o


beijava. Emerald foi empurrada na grama. Ela afastou as roupas
dele, possuída pelos instintos da sua carne. Puxou para fora o pênis
grosso de Black e o posicionou em sua entrada faminta,
determinada, Emerald puxou os quadris dele em direção aos seus.
— Ah! — Emerald soltou um gemido de prazer e dor. Foi

muito repentino, apesar de ter se livrado do hímen, seu corpo não


estava preparado para receber o tamanho e espessura dele.

— Cazzo! — Black uivou. — Você está me esmagando.


Ele se retirou por inteiro. A fricção do movimento fez Emerald
esquecer o desconforto. Ela envolveu a cintura dele com as pernas,

e o puxou pelo pescoço para junto de si.

— Você não vai escapar de mim.


Black arregalou os olhos, assustado com a determinação

dela.

Emerald voltou a puxá-lo para dentro de si. Até o fundo. Jogou

a cabeça para trás e apertou os dentes para não gritar. A dor era
suportável, o que a machucava era a necessidade de ter aquele

desejo aplacado. Black também se segurava. Suas veias saltavam

por todo o corpo tamanha a tensão. Emerald ergueu seus quadris


do chão, tirando Black de dentro dela e depois voltando para ele,

enchendo seu sexo com o dele outra vez. Black parecia não saber

como reagir. Apenas aguentava tudo, tentando não perder o


controle, apertando os dentes e olhando para a forma como

Emerald o engolia inteiro.


Ela só o soltaria depois que ganhasse sua tão esperada

recompensa. Emerald continuou metendo ele dentro de si por

bastante tempo, cada vez que seu corpo exausto descia, ela achava
que não poderia voltar a subir, mas ela encontrava um pouco mais

de determinação quando sabia que no fim, daquilo tudo, ela

conseguiria seu prazer.

— Você esteve guardando isso aí dentro por todo esse tempo,


tesoro mio? Dammi un bacio.

Black puxou ela para cima pelo braço. Ele beijou sua boca,

não, ele a comeu. Levantou as pernas de Emerald e começou a


meter dentro dela sem parar. Era disso que Emerald precisava. Ela

se entregou, se segurando nele pelos ombros, dominada pela

necessidade de gozar.
A grama arranhava suas costas, seus cotovelos doíam de ter

que se apoiar, seu sexo frágil sentiria dores pela maneira

animalesca com que estava sendo invadido. A boca de Black a

chupava em toda parte e suas mãos a seguravam pela cintura bem


firme para receber suas estocadas. Naquele momento, era difícil

dizer qual dos dois era a presa.


— Ah, nossa… — Ela podia sentir todas aquelas sensações

abrindo espaço dentro dela.

— Eu sei, tesoro, eu sei — Black disse, com o seio dela em


sua boca.

De repente, Emerald deu um grito mudo quando finalmente,

sentiu seu corpo convulsionar de prazer. Era magnífico. Sexo era

magnífico. Seu corpo espirrou alguma coisa em Black, que também


espirrou alguma coisa dentro dela. Ele tremeu em cima dela por um

bom tempo até voltar a beijá-la. Emerald queria mais, ela queria

fazer isso com ele para o resto de sua vida.


— Mais. — Sua voz saiu rouca e carente.

— O quê?

Ela ergueu seus quadris para ele.

— Eu quero mais.
Black parecia não saber o que dizer, seus olhos se abriam,

surpresos. Ela levou a mão para o sexo dele e o tocou. Ele estava

quente e úmido, e já começava a amolecer, mas bastou ela tocá-lo


um pouco para voltar a ficar rígido.

— Faça isso comigo de novo — Emerald choramingou, se

esfregando nele de forma manhosa.


— Você é louca, Emerald. — Black sorria, a olhando de uma

forma que fazia Emerald se sentir bonita e feminina. — Graças a


Deus.

Black segurou na cintura dela e Emerald foi virada. Seu rosto

foi espetado pela grama úmida. Ela nem se importou com isso, a
sensação de Black entrando nela de novo, nessa posição, era

alucinante. Ele encaixou a mão na curva do quadril dela, e com a

outra mão ele protegeu o rosto de Emerald do chão.

— Black, essa posição é muito reveladora. — Parecia que não


tinha nenhuma parte do corpo que ele não podia ver.

Ela sentiu o ar da risada dele em sua nuca.

— Sim, é por isso que é a preferida de muitos homens. Eu


não entendia porque, até agora.

O rosto de Emerald esquentou por saber do que ele estava

falando.

Black voltou a fazer os mesmos movimentos, mas dessa vez


a posição tornava as sensações diferentes. Emerald sentiu seus

olhos indo para trás de suas órbitas. O prazer era imenso. Os

encontros do corpo de Black no dela faziam seus seios suspensos


balançaram e seus mamilos roçavam na grama. Ela estava prestes

a implodir.
Emerald gemia, muito alto, contra sua vontade. Tendo seu

corpo invadido daquela forma selvagem por Black. Ela podia sentir

tudo. Por estar mais úmida, o entra e sai era escorregadio o que

tornava a sensação mais forte. Black virou o rosto dela e a fez olhá-
lo. Emerald o sentia entrando não só em seu corpo, mas também

em sua alma. A invadindo um pouco mais a cada vez que a

penetrava. A possuindo um pouco mais a cada nova arremetida.


Agora que a fome do desejo fora aplacada, o sexo estava sendo

mais sútil, com mais toques, com mais consciência um do outro.

Emerald percebeu os sons que ele fazia. A respiração falha, os

gemidos roucos, as palavras em italiano que ela gostaria de


entender.

— La mia attesa, Emerald — ele suspirou dentro da boca dela

antes de enchê-la com sua semente e fazê-la perder-se mais uma


vez na paixão.

Emerald caiu na grama, exausta, mas finalmente, satisfeita.


Não demorou para o corpo de Emerald se encher de manchas
roxas por toda a parte. Enquanto a carregava de volta para a

mansão, Black podia ver a pele dela nos lugares em que foi bruto,
escurecendo. Entrou pela porta dos fundos e caminhou até seu
quarto, onde a depositou na cama. Emerald não estava dormindo,

lutava contra o sono. Black a limpou com uma toalha úmida e a

observou, ela dormiu toda a tarde e a noite e pela manhã as

manchas roxas no corpo de Emerald eram tão profundas que ele se


sentiu um lixo.

Ela dormia de barriga para baixo. Isso não devia ser um bom
sinal. Ele a olhou entre as pernas, onde a invadira tantas vezes

como um animal no cio. Emerald estava vermelha e inchada. Devia


ter levado em consideração que era a primeira vez dela, pelo

menos. A forma como ela se entregou o fez esquecer. Ainda estava


surpreso com o jeito como ela o recebeu tão subserviente entre

suas pernas. Como o dominou para conseguir gozar. A forma como

usou o corpo dele para obter prazer. Nunca mulher nenhuma


ansiara daquela forma pelo corpo de Black. Nunca.

Ele ficou tão excitado que não pensou em mais nada. Quando

Emerald se olhasse no espelho, ficaria assustada. Se já não o


queria antes, com certeza não o faria de novo. Que lástima, Black

queria tanto fazer isso de novo com ela que doía em seus ossos.

— Noite vigorosa? — A mãe dele o recebeu para o desjejum


com um sorriso malicioso.

Por mais que gostasse de ter a mãe por perto, ter a sua
privacidade invadida era uma irritação. Black preferia os animais,

eles não o olhavam daquele jeito como se soubessem de todos os

seus pecados e rissem deles.

— Por que não ocupa sua boca com a comida, mia madre?

— Eu sei que você só fala italiano quando está nervoso. —

Black continuou a ignorando. — Você a deixou sozinha na cama?


— Isso. — Ele bebeu um gole do chá e percebeu que estava

muito amargo, colocou três cubos de açúcar e mexeu.


— Ah, isso é péssimo. Ela acordará e não achará você, será
pior.

Emerald era do tipo que gostava de espaço. Ela nunca reagia

às emoções como era esperado. Se ela tivesse algum problema

com isso, diria a ele. Além do mais, Black não queria estar lá

quando ela acordasse e visse o estado de seu corpo.

— Sabe, ser minha mãe não lhe dá o direito de se meter na


minha vida.

— Mas me dá o direito de falar o que eu quiser para você sem

receber um tiro.

Black a olhou de soslaio.

— Não me tente demais.

Francesca riu.

— Eu sou uma mulher e sei o que digo. Você devia me dar


mais ouvidos.

Black parou de mexer o açúcar em seu chá.

— Quando você pretende ir embora?

— Sútil como uma bala de canhão — Francesca suspirou. —

Mas o entendo, agora que de fato sua lua de mel começou, imagino

que queira privacidade.


Black duvidava que Emerald iria querer fazer sexo com ele

outra vez. Bebeu um gole do chá e percebeu que apesar de pôr três
cubos de açúcar ainda estava amargo. Talvez fosse apenas o gosto

dele mesmo.
— Mãe, eu não sei o que está tentando tirar de mim, mas não
conseguirá. — Ele desistiu do chá e se virou para os pães.

— Nossas aulas terminam em uma semana, e ela virá para a


Itália comigo.

Black endureceu com a mão no ar. Era pouco tempo. Ele


estava quase certo de que Emerald estava apaixonada por ele.

Inferno, estragou tudo tomando a virgindade dela daquele jeito. Se


pelo menos tivesse se segurado um pouco, teria feito amor com ela,
carinhoso, e teria dado prazer a ela, mas não, estragou tudo com

sua natureza rude e depravada. Agora não existia nenhuma


possibilidade de Emerald vir a amá-lo.

— Tenho certeza de que ela está ansiosa para isso.


— Você sabe que basta uma palavra sua e ela não irá, não

sabe?
Black olhou para sua mãe. O irritava que ela sempre fosse tão
esperançosa, apesar de se frustrar todas as vezes.

— Por que demônios eu faria isso?


— Porque no fundo é o que você quer.

Black ficou em silêncio, digerindo aquelas palavras azedas.


— Eu jamais me perdoaria. — Black percebeu essa

incontestável verdade.
Ele precisou se casar pela quinta vez para perceber que não

suportaria ser a causa da morte de mais uma pobre inocente. Não


era só isso, ele não conseguia imaginar um mundo sem Emerald
nele. Ainda que fosse longe, ainda que fosse com outra pessoa, ele

ainda queria saber que ela estava viva. Bem e feliz.


— Oh! — Francesca deixou a xícara cair no pires. — Não me

diga que você ainda acredita que Georgina amaldiçoou você?


Black retesou o maxilar. Sua mãe nunca acreditou nele. Que
outra explicação tinha para aquelas rosas? Georgina prometeu que

o atormentaria até o dia da morte dele e aquelas rosas brancas


eram a prova disso.

— Black, você está há anos buscando o amor


desesperadamente e é justamente isso que afasta ele de você.

Black se mexeu desconfortável na cadeira.


— Eu não estou pedindo conselhos a você, mãe!
— Não, claro que não, mas o fato de eu ser sua mãe me

permite dizer a você as verdade que ninguém mais pode quer você
queira ouvir ou não. Se os filhos ouvissem mais o que suas mães
dizem, não sofreriam tanto pelas consequências de suas escolhas.
— Francesca respirou fundo. — Quando você perceber que já tem o

que acha que precisa, será tarde demais.


Black se levantou da mesa, raivoso, sua manhã já estava um

tormento, não precisava da sua mãe para piorar.


Nesse instante, Emerald cruzou a porta. Ela brilhava tanto que
quase cegou Black. Não literalmente, mas foi essa a impressão que

ele teve, que ela cintilava. Deus, como ela ficava bem em um
vestido vermelho. Black estava tão encantado que não percebeu

que ela se aproximava. Ele ficou estarrecido quando a sua boca foi
pressionada pela de Emerald.

Ele ficou imóvel, sentia que sua alma tinha ido dar uma volta e
o que impedia seu corpo de despencar eram os lábios de Emerald.
— Milady? — ele falou quando voltou a si, empurrando ela

pelos ombros.
Ela estava bem? Sorria tanto que parecia outra pessoa.

— Você quer fazer alguma coisa hoje?


Hein? O que isso quer dizer? — Hyde pensou.
Os olhos violeta de Emerald sorriam, para ele. Ela

definitivamente não estava bem. Talvez tenha pego a enfermidade


de Emile. Em todos os seus casamentos, na verdade, nunca em
toda a sua vida mulher nenhuma o olhou dessa forma.
Black sentiu seu peito espremendo, uma dor em seu coração

que não sentia em muitos anos. Levou a mão ao peito. O que era
isso? Por que seu corpo parecia em combustão?

— Acho que não — ele disse a primeira coisa que veio à


mente.
O sorriso de Emerald desapareceu assim que entendeu as

palavras, seu rosto foi tomado pela decepção ao perceber que foi

rejeitada e Black apressou o passo para fora da sala antes de ter


que explicar alguma coisa.

— Homens! Eles nunca fazem o que é esperado deles, não é

querida? Chá? — Ele ouviu sua mãe dizer antes de sumir de uma

vez.
— Obrigada, milady. — Emerald aceitou a xícara oferecida por
lady Francesca e se sentou na cadeira que antes fora ocupada por

Black.
Por que sentia como se tivesse acabado de perder alguma
coisa?

Não esperava aquela reação dele. Emerald deveria ter agido

de outra forma? Apenas fez o que desejava fazer desde o segundo

em que abriu seus olhos e não o encontrou na cama. Não se


preocupou, em nenhum momento, com a forma como Black reagiria.

Agora que vira aquele olhar amedrontado no rosto dele, Emerald


saiu da neblina da paixão que ainda a envolvia desde a noite

anterior e começou a enxergar a realidade com mais nitidez.


Os segundos que levou para passar a geleia em sua torrada,

foram o suficiente para sua cabeça se encher de indagações e as


respostas eram tão desagradáveis que lhe roubaram o apetite. Se

tivesse percebido os sinais desde o momento que acordou sozinha

na cama, não estaria tão estarrecida e sentindo como se houvesse


um buraco em seu estômago.

Ah, céus, que papel ridículo tinha feito! Corrido para ele

naquela manhã apenas porque queria beijá-lo, achando que, o sexo


que tinham feito juntos mudara também para ele toda a perspectiva

da coisa como tinha sido para ela. Mas Emerald não tinha culpa. Ela

nunca fizera aquilo com ninguém, era óbvio que era inexperiente.
Diferente de Black que já teve quatro esposas, sem mencionar as

amantes. Emerald não devia ter sido nenhuma novidade para ele.
Talvez… bem, talvez ela tivesse sido horrível. O pior sexo que ele já

teve!

Agora que ela perdeu o apetite de vez. Black era o único

culpado por criar expectativas demais em cima dela. Era óbvio que

ela não seria uma profissional na sedução, afinal de contas era

virgem. Era injusto que ele exigisse tanto dela. Não era possível que
ela tivesse sido tão horrível que não merecesse sequer a chance de

melhorar.
Ela podia fazer melhor. Emerald aprendia rápido. Isso era tão
injusto. Se soubesse, teria feito isso com Brice quando teve a

chance, pelo menos, não se encheria de ideias tolas e não criaria

ilusões românticas por causa de uma simples junção de corpos.

Emerald bateu a testa na mesa.

— Você deve estar passando por um turbilhão de

pensamentos agora, mas não se deixe cair assim por um homem,


fiore, demonstre superioridade e ele vira até você. — Emerald se

esqueceu que lady Francesca ainda estava com ela na mesa.

Ajeitou sua postura e recebeu um sorriso de aprovação da

sogra.

Viu? Aprendia rápido.

Emerald se forçou a beber uns goles de chá e subitamente se

lembrou do senhor Grant. Ah, seu rosto ardeu tanto de vergonha


que doeu. Não sabia onde arranjaria coragem para olhar para o

senhor de novo depois de deixar a sala daquela forma. Emerald

levaria séculos para se recuperar de todas as vergonhas que

passou no dia anterior.

— Com licença, senhoras, vim informar que a menina Emile,

acordou. — Wilkins entrou na sala sem fazer o mínimo som, como


sempre.
Emerald se animou. Pelo menos podia se contentar com uma

notícia boa. Aproveitou essa desculpa para pular o desjejum e, se


sentindo um pouco menos mal, caminhou para seu quarto.

Encontrou Emile sendo asseada em uma banheira pela sua


mãe.
— Lady Emerald! — disse a menina, com uma voz muito

fraca, assim que a viu. Seu rosto pálido tentou esboçar uma
expressão de felicidade, mas ela ainda estava muito debilitada.

— Não se esforce, criança, eu vou até você. — Emerald


chegou perto da banheira e aceitou a mão que Emile ofereceu a ela.

— Minha mãe me falou o que fez por mim. — Emile apertou a


mão dela com toda a força que tinha, o que não era muita, e
Emerald sentiu como se seu coração se enchesse de cores vivas e

reluzentes. Talvez, não odiasse crianças no fim de tudo. Talvez,


quisesse ter uma só sua em um futuro próximo.

— Como você se sente?


Ela notou que Emile ainda se esforçava para respirar.

— Eu vou ficar bem para voltar a praticar a cortar batatas,


como nós combinamos. — Emerald sorriu e apertou a mão pequena
da criança. — Eu perguntei à minha mãe se você poderia ser minha

fada madrinha, e ela disse que eu deveria perguntar isso a você.


— Eu posso? — Emerald perguntou à mãe de Emile.

— Eu acho que seria uma forma pequena de demonstrar


minha gratidão, milady.

Emerald não esperava gratidão, muito menos um pedido de


desculpas, não fez nada do que fez esperando recompensa.

— Então, eu serei sua fada madrinha. — Emile sorriu, seus


olhinhos brilhando, e Emerald respirou mais tranquila ao ver que
sim, ela ficaria bem. Definitivamente queria ter uma criança só sua.

— Está bem, agora descanse, você precisará se recuperar logo pois


aquelas batatas não se descascarão sozinhas.

— Certo!
Emerald saiu do quarto acompanhada de Ruth quando Emile
já estava dormindo, à noite.

— O senhor Grant disse que o que ela tem é crônico, mas que
com a ajuda dessa erva ela poderá ter uma vida longa, com alguns

sacrifícios.
— Raras vezes o senhor Grant está errado, então isso me

tranquiliza.
Emerald foi parada pela mão de Ruth em seu braço.
— Milady, eu sinto que devo um grande pedido de desculpas.

Emerald meneou sua cabeça.


— Não sinta.
— Por favor, milady, minha Emile está viva por sua causa,
preciso que aceite minhas desculpas para que eu consiga suportar

esse peso na consciência. Eu não quero pensar no que poderia ter


acontecido se não tivesse me tirado daquele quarto. Então, já que

não posso recompensá-la de outra forma, me humilho diante de


você por perdão. — Ela se esforçava para não chorar.
— Eu perdoo você. — Emerald só queria não ter que estender

mais aquela conversa e também não sentia que devia perdoar nada.
Se Ruth precisava ouvir isso para ficar em paz, então Emerald não

via porque não conceder isso a ela.


A mulher balançou a cabeça e soltou a respiração de uma

vez.
Emerald entrou no quarto de Black e o encontrou da mesma
forma que o deixou pela manhã. Somente as rosas como sua

companhia.
— Ah, vou prepará-la para deitar, senhora — disse uma

criada, entrando no quarto, já se prontificando para livrar Emerald de


toda aquela quantidade exorbitante de roupas que ela sequer
percebera estar usando.

— E o lorde Hyde? — Emerald quis saber.


— Ele pediu que servissem seu jantar na cabana, é provável
que durma lá essa noite.
Emerald sentiu que atingiu seu limite. Percebera enfim esse

buraco em seu estômago que a perturbou o dia inteiro. Era seu


orgulho, falecendo. Black o ferira sem a menor consideração, e ela

não deixaria isso barato.


— Aqui o seu jantar, como pediu. — Wilkins colocou uma
única caneca de uísque na frente de Black, que a pegou e a levou

ansioso para a boca.


Deu uma olhada despretensiosa no criado, que o julgava com
aquele olhar de peixe morto.

— Estou começando a achar que o senhor está com um

problema com álcool, milorde.

Black gostaria que fosse isso.


— Você por acaso viu a condessa hoje? — Quis não parecer

tão desesperado ao perguntar isso.


— Lady Emerald passou a tarde na companhia da criança

Emile e já se recolheu em seus aposentos. Ela recusou o almoço e


o jantar.

— Acha que ela pode estar doente? — Isso explicaria muita


coisa.

— Sim, acho, mas não pelo mesmo motivo que o senhor.

Black arqueou uma sobrancelha para o criado.


— O que isso quer dizer, Wilkins?

— Ela perguntou pelo senhor antes de todas as refeições. —

Se ele esperava que isso fizesse Black entender alguma coisa,


estava colocando fé demais na inteligência dele.

— Sim, porque comer comigo fazia parte do nosso acordo.

Wilkins exalou ar pelas narinas.


— Suspeito que não tenha sido por isso.

— Então por quê?


— Para alguém que se gaba constantemente de estar sempre

um passo à frente dos outros, o senhor é um tanto atrasado quando

o assunto é sua esposa.

Black franziu o cenho.

— Você é atrevido, cazzo.

— O senhor quem me fez assim.


Black preferiu beber mais um gole de seu uísque do que

perder a cabeça com o criado rebelde.


Ele se sentiu estranho o dia inteiro. Seu coração batia
incontrolável. Não era fisicamente possível sentir o coração

clamando por alguém, mas era o que o seu estava fazendo. Aquele

órgão idiota que passou toda a vida dele em completo silêncio,

agora berrava o nome de Emerald como se dependesse dela para

funcionar. Isso assustou Black, de uma forma que feria seu orgulho

admitir.
Existiam vários tipos de beijos. Os que se dão por afeto, os

que são exigidos para obter prazer, e os que são confissões. Black

precisava saber em qual desses o que Emerald deu nele pela

manhã se enquadrava. Nas quatro vezes em que esteve casado,

Black nunca foi procurado por suas esposas. Era compreensível

pois nenhuma das mulheres que se casaram com ele, fizeram isso

por escolha própria. Dívidas, ganância, posição social, sempre havia


algo em troca. Foi da mesma forma com Emerald, então por que era

tudo tão diferente com ela?

Talvez, Black devesse seguir o conselho de sua mãe e

perguntar. Era ridículo. Esteve esperando por anos para ter uma

mulher apaixonada por ele, e agora que tinha não sabia o que fazer

ou como agir. Emerald era o oposto de Georgina, sua primeira


esposa não achava que amor era algo que devia ser dado de graça,
e exigia dele uma recompensa por sentir essas coisas. Emerald

apenas o entregava sem pedir nada em troca e era isso que deixava
Black tão desmontado. Sempre sendo pego desprevenido por ela.

Quando ele soubesse o que fazer iria até ela, mas enquanto isso
não acontecia Black teria como companhia o uísque e seus
pensamentos.

Era o que ele acreditava, até a porta da cabana ser atirada


com toda a força na parede. Em sua frente, vestida uma camisola

branca e os pés descalços sujos de lama, Emerald segurava uma


arma e apontava para ele.

— Saia Wilkins — ela disse, sem desviar o olhar assassino de


Black. Ele notou, mesmo sentado em sua poltrona, que o violeta das
íris dela estava mais escuro.

— Fique onde está Wilkins. — Black retesou o maxilar.


O criado olhou de um para o outro.

— Eu acho que o mais sensato é obedecer a quem tem a


arma. — Wilkins apressou o passo para a saída. — Boa sorte,

milorde.
Black soltou um rosnado. Wilkins seria o primeiro que Black
mataria depois que conseguisse arrancar essa arma da mão de

Emerald.
Ele permaneceu onde estava, bebendo despreocupado.

— Solte essa arma, tesoro mio, antes que você cause um


acidente.

Emerald puxou a trava da arma. O click metálico fez as


entranhas do conde se mexerem. O olhar dela era tão determinado

que Black passou a encarar aquela situação com a seriedade que


merecia.
— Você se esquece de que eu sou filha de um caçador. Se

uma bala deixar essa arma é porque eu quis assim. — O sorriso


sádico que surgiu no rosto dela fez Black duvidar de sua sanidade.

— E por que está apontado para o meu peito?


Ela deu um passo à frente. Era impossível ignorar o quão bela
ela ficava quando estava zangada. Só por causa disso Black não

pegaria muito pesado quando fosse castigá-la por apontar uma


arma para ele.

— Eu vim reaver a minha honra.


Black riu pelo nariz. Isso era um absurdo. Se recusava a levar

isso a sério. Se levantou da poltrona e foi encher para si outro copo


de uísque. Estava levando o copo à boca quando o som do disparo
fez seus ossos chacoalharem. Pedaços de madeira voaram para

todos os lados e um buraco fora aberto na mesa, a um metro dele.


O cheiro da pólvora forte queimou os pelos de seu nariz. Ele se
virou para ela, catatônico. Emerald estava vermelha de ódio e
carregava a arma com um outro tiro. Ela não estava para

brincadeira. Agora Black se encontrava em um profundo nível de


raiva. Ele faria ela se arrepender por ter atirado na direção dele. Não

importava o quanto implorasse, ele não teria misericórdia.


Primeiro o pai, e agora a filha. O que esses malditos Sandles
tinham na cabeça?

— Não acha que é uma reação exagerada por uma coisa tão
pequena?

Sim, ele tinha enchido o corpo dela de hematomas, mas não


foi intencional. Atirar nele era demais!

— Pequena? Meus sentimentos valem tão pouco para você?


— Ela apontou a arma para ele outra vez e Black ergueu os braços
na frente do corpo. A única forma de conseguir arrancar a arma dela

seria a tomando de sua mão pela força.


— Não é um pouco contraditório você vir recuperar sua honra

quando a deu para mim de bom grado?


— Tem razão, eu dei. Esqueça a honra, eu vim pelo meu
orgulho.

Black deu um passo à frente, quase imperceptível.


— Eu feri o seu orgulho?
Emerald apertou os dentes. Ele tinha mesmo a irritado. Black
sentia muito, queria poder desfazer o que fez, mas não levaria um

tiro por causa disso.


— Cruelmente. — Céus, ela ia chorar!

— Como?
— Como? Você acha que pode fazer o que quer e depois
fingir que nada aconteceu?

— Eu sinto muito.

— Você se arrepende?
— Sim, muito.

Emerald recuou como se tivesse sido machucada.

— Pelo amor de Deus, de quantas formas você vai ferir minha

dignidade?
A voz dela saiu chorosa e foi quando Black percebeu que toda

aquela vermelhidão não era raiva, mas sim magoa. Emerald estava

magoada. Ele desejou deixar de existir nesse mundo ao ver os


olhos dela cheios de lágrimas por causa dele.

— Eu prometo que não farei isso com você outra vez. —

Black teria rastejado até ela se isso a fizesse se sentir melhor.


Emerald apertou os lábios para reprimir alguma coisa, o rosto

se contorcendo como se sentisse dor. Black não estava entendendo.


Parecia que tudo que dizia para se desculpar surtia o efeito

contrário.

— Entendo. — Ela limpou as lágrimas do rosto, e empinou


seu queixo, o olhando com desdém. — Eu não vou pedir para você

fazer isso comigo de novo.

O quê? Black ouvira direito?

— Você quer fazer isso comigo outra vez? — ele perguntou,


de forma estúpida.

— A culpa é sua! — Ela apontou um dedo para ele. — Eu

vivia perfeitamente bem na minha ignorância até você me violar com


sua promiscuidade.

O rosto de Black devia estar muito engraçado naquele

momento porque ele não acreditava no que estava ouvindo.


— Ah, deixe-me ver se entendi. A razão por você estar com

raiva é por crer que eu não gostei de fazer amor com você? — Era

inconcebível até mesmo para falar.

— Você esteve me evitando o dia todo. — Ela abaixou os


olhos para o chão, envergonhada e dolorida. Era desconcertante

como parecia delicada, até mesmo com uma arma na mão.


Obrigado, Deus! — Black pensou.

— Não atire mais em mim — ele ordenou, a olhando no

profundo dos olhos e, quando soube que ela ia lhe obedecer,


marchou até ela. Queria apertar aquele belo pescoço como castigo

por ter atirado nele, mas em vez disso segurou ela pelo braço e

subiu um pouco uma manga da camisola que ela usava.

— Veja isso. — Com o polegar, ele circulou uma mancha roxa


na pele dela. O formato perfeito do mesmo dedo que agora a

acariciava.

— Sim.
— Você não tinha visto?

— Eu precisaria ser cega para não ver.

— Não é só isso.

Ele abriu a camisola dela até a altura de sua barriga e exibiu o


corpo dela. Emerald era linda, e Black era um canalha por achá-la

mais ainda com todas as inúmeras marcas que fizera nela por ser

um maldito animal. Naquele instante mesmo, ele não conseguia


controlar seu corpo, que latejava de vontade de fazer amor.

— Eu acordei nua essa manhã, milorde, seria estupidez

esperar que não os visse.


Black inseriu uma mão por dentro da camisola e a colocou na

cintura dela, indo para as costas quentes. Sentindo que ela também
se arrepiava.

— E mesmo assim você foi atrás de mim e me beijou?

Emerald franziu o cenho adorável.


— Você esperava uma reação diferente?

Black desejou rir por ser um maldito de sorte.

— Sim, eu achei que você fosse me repudiar. — Black

estranhou sua própria voz. Nunca se sentiu tão vulnerável. Nunca


se abrira daquela forma nem com sua mãe.

Emerald encostou a testa no peito dele, os braços o

circulando. Black gostava de ser maior que ela, gostava de pensar


que podia abraçá-la inteira, que podia ser a armadura de Emerald.

— Você é mesmo um stronzo. Até um cego teria percebido

que eu estava radiante por você.

Black fechou os olhos e envolveu a nuca dela para puxá-la em


direção à sua boca. Assim que seus lábios se encontraram ele se

deu conta do quão idiota fora, evitando-a para não aceitar o que

sentia por ela e por medo do que esse sentimento poderia fazer com
os dois. Primeiro pressionou os lábios nos dela com força, para
suprir a saudade que sentira dela durante o dia. Depois fez o

mesmo com o corpo dela. Esfregando Emerald em sua ereção.

— Você não está dolorida? — Ele a desejava mais do que o

pecado, mas podia esperar. Se só pudesse beijá-la e tê-la junto de


seu corpo seria estranhamente suficiente.

— Não me trate como se eu fosse algo frágil, Black, se tiver

alguma coisa me incomodando não duvide de que eu vou falar para


você, ou manifestar meu descontentamento de alguma forma.

Black arrancou a arma da mão dela e a deixou cair no chão.

Sua esposa o queria, e ele prometeu que nunca deixaria nada faltar

para ela. Ele a segurou pelas coxas e a ergueu, caminhando em


direção à mesa enquanto lambia e mordia a clavícula dela.

— Você me quer? — Ele precisava ouvir isso mais uma vez.

Emerald segurou os cabelos da nuca dele e os puxou para


fazê-lo olhar para ela.

— Você foi agressivo. — Ela chegou com a boca no ouvido

dele e sussurrou sem nenhum pudor: — Faça de novo.


— Você está pulsando dentro de mim. — Emerald entrelaçou
as pernas na cintura de Black, o fazendo entrar mais fundo.

Cada vez que ele chegava perto de desmoronar de cansaço,


ela o provocava com palavras maliciosas embaladas por essa voz
inocente e ele voltava a ficar tão duro quanto da primeira vez, como

se não tivesse acabado de esvaziar todo o seu corpo dentro dela.

Estavam fazendo isso há muitas horas.

Black se retirou devagar e a golpeou com um só impulso de


seus quadris. Emerald escancarou a boca com o grito preso em sua

garganta e Black a encheu com sua língua. Beijá-la era como


morder uma cereja. Delicada e firme por fora, de repente, uma

loucura de sensações em sua boca. A calda doce escorrendo em


sua língua e o gosto suave amaciando seu paladar. Essa

necessidade sufocante que ele sentia dela, seria a causa da sua


morte. A cada segundo Black tinha mais certeza disso.

— Nunca mais aponte uma arma para mim — ele rosnou,

esticando o lábio inferior dela com seus dentes.


Emerald inclinou sua cabeça em uma risada arguta e enterrou

os dedos nos cabelos dele. Os puxando com a mesma pressão com

que ele puxava o lábio dela.


— É só não fazer por merecer.

Louco por essa neblina sensual que exalava dela, Black

puxou seus quadris e meteu soltando o ar em um gemido que fez


sua garganta arder. Seu corpo pingava de suor e já não sentia os

músculos de suas pernas, mas não conseguia deixar de meter. Era


como se seu corpo fosse feito para esse movimento. Como se fosse

feito para preencher o dela. Ele a segurou pelas coxas, enterrando

os dedos em sua carne macia pois ela também estava suada e

escorregadia, e intensificou suas estocadas. Cada vez que ele

golpeava o sexo dela, Emerald produzia um som excitante que

despertava o lado mais depravado de Black.


Ele arranhou o pescoço dela com a barba e depois abrandou

a ardência com uma carícia de sua língua. O salgado do suor dela o


enchia de lascívia. O frio do colar que ela tinha no pescoço
encontrou com a língua de Black e ele o puxou com seus dentes, o

segurando com a boca como em uma coleira. Um sorriso malvado

enfeitando seu rosto. Ver aquele colar aumentava ainda mais o

desejo de maltratá-la para ouvi-la gemer em seu ouvido por causa

do seu pau. Por causa da força de suas estocadas. Por causa do

prazer que ele infligia a ela.


Nunca mais Emerald seria tocada por outro homem e aquele

que tentasse conheceria o frio da lâmina de sua espada.

Black sentia seu membro pesado, sensível e latejante.

Emerald estava quente por dentro e não queria deixá-lo sair.

Quando ele o puxava, ela o apertava com força. Black espremeu o

clitóris dela em seu polegar, esfregando ele com a ajuda do seu

esperma até fazê-la atingir o prazer e deixou seu gozo vir, junto com
o dela. Quando seu corpo despejou tudo o que ainda restava, ele a

beijou devagar para recuperar o fôlego, e aos poucos foi sendo

tomado pelas consequências da atividade física.

Seus joelhos falharam e ele tombou no chão, descansando o

rosto nas coxas de sua esposa. Emerald também não estava em

uma situação melhor que a dele. A respiração acelerada dos dois


ecoava nas paredes de madeira da cabana.
— Se fizermos isso todos os dias não viveremos o bastante

para o banquete de velório de minha mãe.


Emerald acariciou a cabeça dele, afastando os fios molhados

de seus olhos. Black fechou os olhos, perdido na carícia. Era muito


bom ser tocado por ela.
— Que coisa cruel de se dizer.

— E quem diz isso é a mesma mulher que atirou em um


homem desarmado e indefeso.

— Eu espero não ter que apontar uma arma para você toda
vez que quiser fazer amor.

Black envolveu a panturrilha dela com seus dedos, pôde ouvir


o suspiro que saiu da boca dela, e beijou o joelho de Emerald.
— Você vai querer fazer isso mais vezes, é? — Ele podia

sentir o cheiro que o suor dos dois misturados tinha. Era singular.
Era eles.

— Eu posso?
Ele a olhou nos olhos.

— Você deve.
Emerald sorriu, relaxada sobre a mesa de madeira.
— Ótimo. Não acho que vou conseguir ficar sem isso e como

você foi o anjo cruel que me trouxe para o pecado, deve tomar a
responsabilidade.

Black nem tentou reprimir o sorriso de orgulho que tomou


posse do seu rosto. Ter a consciência de que seu corpo provocava

desejo nela, criava uma conexão entre os dois que ele jamais
experimentara. Era bom saber que ela se sentia da mesma forma

que ele. A mesma possessão, a mesma obsessão.


De repente, os cabelos dele foram puxados com força e
Emerald estava olhando nos olhos dele de uma forma séria e

sombria.
— Não me importa se você sente falta da sua vida de

libertinagem, eu sou a única com quem você deve fazer isso de


agora em diante, lembre-se, eu sei mexer com ervas letais.
De alguma forma, o pau de Black começou a enrijecer outra

vez.
— O que isso quer dizer?

Emerald acariciou os lábios dele, e enfiou o polegar em sua


boca. Black a lambeu, submisso. Ansioso para agradá-la.

— Depois de quatro casamentos você já deveria saber dizer


quando uma mulher está apaixonada por você, milorde.
O peito de Black se encheu por uma força avassaladora. Não

era um sentimento novo, ele sentira isso desde o dia em que


conhecera Emerald, mas só naquele momento se deu conta disso
se expandindo em seu peito e sobrepujando as trevas com a luz.
Ele nunca se sentiu tão cheio de vida. Capturou a mão dela e a

beijou.
— E se um dia você passar a me odiar? — Black percebeu

que nada o amedrontava mais do que isso. Não podia esquecer o


seu passado. Só de pensar em perder Emerald, desejava nunca
mais deixá-la sair daquela cabana.

— Impossível. — Ela o puxou pelo queixo para perto de sua


boca.— Eu já te odeio agora.

Black sorriu, sentindo seu corpo leve como se tivesse sido


libertado de correntes pesadas e velhas.

— Obrigado. Obrigado. — Ele beijou a boca dela.


Passaria o resto de sua vida se humilhando perante ela e isso
nunca seria o bastante porque ela o libertou de sua prisão. Black

não precisaria mais se preocupar com o futuro, desde que Emerald


estivesse ao seu lado, não precisaria mais se preocupar com nada.
— Por que elas ainda não morreram?
Assim que Black entrou em seu quarto, carregando Emerald

dormindo em seus braços, encontrou as rosas brancas. Ele não


sabia o que esperava que fosse acontecer, mas não esperava que
elas ainda estivessem lá. Esperava encontrá-las murchas,

arrancadas, incineradas, mas definitivamente mortas. Depois de

colocar Emerald na cama, ele chamou Wilkins e esteve andando

para lá e para cá enquanto encarava aquelas malditas rosas.


Sentia como se elas rissem dele por ter tido esperança de que

aquele pesadelo tivesse acabado.


— Pode ser que você tenha se enganado, milorde.

Black meneou com a cabeça.


— Não. Emerald disse que me ama. — Ele nunca pensou que

fosse dizer isso com tanta aflição.


Ela dissera com todas as letras que estava apaixonada por

ele, mas, se ele parasse para pensar perceberia que ela também

dissera que o odiava. Emerald estaria confundindo seus


sentimentos de amor e ódio? Um era maior que o outro? A verdade

era que aquelas rosas deveriam ter desaparecido no instante que

ela confessou amá-lo. Então, por que ainda estavam empestando o


quarto com esse cheiro que causava nojo nele?

— Talvez o senhor deva arrancá-las, milorde.

Black olhou para Wilkins. Será? Perdera as constas de


quantas vezes ao longo dos anos tentara se livrar daquelas rosas.

Colocara fogo nesse mesmo quarto anos atrás em meio a uma crise
de dores de cabeça, mas elas voltavam a brotar, como se nunca

tivessem saído de lá. Black conseguira que uma virgem se

apaixonasse por ele, então a maldição de Georgina devia

desaparecer, quem sabe Wilkins estava certo.

Ele arregaçou as mangas da camisa até os cotovelos.

— Me ajude, Wilkins — ele pediu, já arrancando um galho


cheio de rosas.
Tomando o cuidado para não acordar Emerald, eles puxaram
cada galho que se esticava pelo quarto, atrás dos móveis e debaixo

da cama, também os do teto e os que se enrolavam na madeira do

dossel. Black continuava puxando, apesar dos espinhos cortarem

suas mãos.

Era como se os galhos quisessem se agarrar a ele.

Elas expeliam um cheiro cada vez mais forte a cada nova rosa
arrancada de seu caule. Quando não restava mais nada para

arrancar, Black juntou todas em um grande saco com a ajuda de

Wilkins e o levou para um lugar afastado da mansão para queimá-

las. Wilkins voltou para dentro logo depois pois o tempo estava

muito frio e ameaçava chover, mas Black ficou vendo a pequena

fogueira até não restar mais nada além de brasas e o aroma da

chuva sumir com o da fumaça agridoce.


Voltou para casa debaixo dos pesados pingos de chuva.

Rezando para que aquela água lavasse dele qualquer pecado que

ainda lhe restava. Enquanto caminhava, Black sabia que não viveria

em paz até ter a certeza de que Emerald estaria em segurança. Ele

faria o que estivesse ao seu alcance para garantir o bem de sua

esposa. Nem que para isso tivesse que deixar o seu pior lado sair.

— O que acha de outro passeio a cavalo agora que a chuva
cessou? — Lady Francesca afastou a cortina da janela e deu uma

boa olhada no céu.


Emerald colocou seu cérebro para construir uma desculpa
convincente para fugir dos planos da sogra. Seu corpo inteiro doía,

principalmente entre as pernas, e se tivesse que cavalgar não


estava certa de que chegaria ao destino inteira.

— Não acho uma boa ideia, milady. Pode voltar a chover a


qualquer instante. — Como se tivesse tentando castigá-la o sol

mandou um raio ofuscante bem na janela.


— Bobagem, é uma delícia cavalgar logo após uma chuva.
Vamos, nós não tivemos muitas aulas de equitação e dessa vez não

vou deixar você escapar de minha vista.


Emerald foi puxada para fora de sua poltrona e arrastada por

lady Francesca para a saída da sala. Assim que a mulher mais


velha abriu a porta, Black surgiu atrás dela com a mão ainda no ar, a
caminho da maçaneta.

— Para onde vão? — Ele perguntou, vendo que Emerald era


puxada em direção aos fundos da mansão.
— Cavalgar. — Lady Francesca disse, sem parar de arrastar

Emerald. Que implorava silenciosamente para alguma divindade


ajudá-la.

Nesse instante, o outro braço dela foi segurado com força e


foi puxada na direção contrária. Emerald sentiu como se seu mundo

fosse arremessado para longe.


Black a segurava contra seu peito, os braços a envolvendo
como um escudo, e não parecia disposto a libertá-la.

— Não.
— Não? — Lady Francesca repetiu. Tão chocada quanto

Emerald. Ela não sabia por que ele estava a segurando com tanta
força. Ela mal conseguia respirar.
— Não — Black repetiu, soando como um pai protetor.

Emerald não gostou nem um pouco da forma como ele a


segurava, como se ela fosse uma propriedade. Se debateu um

pouco.
— Se me recordo bem foi você quem me tirou do conforto de

minha casa em Londres e me trouxe para esse fim de mundo para


ensinar Emerald a se comportar como uma lady.
Black se virou para deixar o corredor e levou Emerald

consigo. Era como se ele sequer sentisse os esforços dela para


afastá-lo.
— Se essa é a única coisa que a mantém aqui, pode ir
embora.

— Black. — Emerald o repreendeu por falar assim com sua


mãe, mas eles já estavam presos em uma sala e os insultos de lady

Francesca estavam abafados e ao longe.


— Esqueça essa ideia de cavalgar. Se quiser fazer isso, faça
em mim. — Não foi dado a Emerald a chance de raciocinar, Black

puxou o vestido dela para baixo e escondeu um mamilo dela em sua


boca.

— Espere. — Ela jogou a cabeça contra a porta, já sentindo o


suor surgindo em sua pele.

A língua de Black era implacável, não importava se estava em


seu mamilo, em sua boca ou no meio de suas pernas. Era difícil
resistir quando fazia esse movimento giratório e depois sugava.

— Não me empurre — ele rosnou contra a pele dela.


Emerald não percebera que fazia isso. Devia ser sua

consciência se mantendo firme apesar de seu corpo já ter entregado


a batalha.
— Por que você está fazendo isso tão de repente? — Ela

molhou os lábios com a língua.


— Você me quis primeiro, tesoro mio. Cometeu o pecado de
me desejar, agora aguente.
Emerald foi pressionada contra a porta e invadida de uma vez

pelos dedos severos de Black. Reprimiu um gemido. O prazer criava


uma nuvem em sua mente, e ela queria contestar a forma como

aquilo estava acontecendo, mas não teve certeza se conseguia falar


quando a boca dele se juntou aos seus dedos. O ventre dela entrou
em ebulição. Se contraindo para expelir prazer em todo o corpo

dela.

— Santo Deus. — Emerald se apoiou nos ombros dele,


sentindo a língua do marido chicoteando seu clitóris penitentemente.

As pontas de seus mamilos latejavam. Todo o seu corpo ardia.

— Eu já disse que deve me chamar pelo meu nome. O sou o

único que você deve adorar entre quatro paredes. — Black a sugou
com mais força.

— Sim, Black. Black. Black. — Emerald delirava.

Agarrou os cabelos dele, mantendo a cabeça dele parada.


Black entendeu tudo sem ela precisar dizer nada. Manteve sua

língua para fora e rígida. Emerald se encaixou na boca dele e

ondulou seus quadris para frente e para trás, esfregou seu clitóris na
língua do marido até atingir o prazer intenso que ele provocou.
Espirrando sua essência no rosto dele. Black a lambeu até seus

espasmos cessarem e se colocou de pé, a puxando pelo pescoço


para um beijo com gosto agridoce. Ele tinha um cheiro embriagante.

Black puxou a perna dela para cima, e Emerald sabia que era

questão de tempo até ter ele enterrado até o fundo.


— Você não deve sair da mansão sem mim.

Emerald se apoiou em qualquer coisa que suas mãos

alcançaram para ter força para receber toda a potência desse

homem impiedoso. Ela queria ter um pouco mais de alto controle,


mas adorava a forma feroz como ele usava o corpo dela para obter

prazer.

— Parece que dias de tédio me esperam.


Ele riu, divertido, e ela sentiu o começo da ereção dele em

sua entrada faminta. Emerald ainda estava um pouco dolorida, mas

o orgasmo a relaxou o bastante.


— Não se preocupe, eu vou me esforçar para distrair você. —

Emerald deixou um grito sair de sua garganta quando foi

preenchida.

E Black conseguiu distraí-la nas horas seguintes, sem


precisar se esforçar para isso.
Quaisquer que fossem as razões para Black proibi-la de sair
da mansão, Emerald estava certa de que não podiam ser fortes o

suficiente para que colocasse Wilkins para segui-la o dia todo.


Ele não disse nada a ela, claro, mas depois de um tempo
Emerald percebeu sozinha. Onde quer que fosse, Wilkins estava lá.

Na sala de chá, ele passava vez ou outra pelo corredor e dava uma

olhada para se certificar de que ela ainda estava ocupada com as

lições de Lady Francesca, na biblioteca, durante a aula de gramática


ele fingia limpar uma estátua, nos corredores, ele perambulava atrás

dela tomando o cuidado de se esconder atrás dos móveis.


Emerald não estava preocupada no começo, achava que

Black a queria manter dentro da mansão para tê-la disponível, mas


agora, ela começava a desconfiar que os motivos eram mais fortes.

No dia anterior, enquanto tentava escapar do olhar astuto de


Wilkins correndo pelos corredores, Emerald encontrou aquele que

levava ao quarto onde estavam os objetos das antigas esposas e se

deparou com o aposento vazio. Ao questionar Wilkins ele apenas


disse que o lorde decidiu se livrar de tudo. Foi a mesma coisa com

as rosas. Ele as removera sem explicar nada. Tudo isso

encaminhava Emerald para um destino que a assustava. Ela sentia


que aquela situação era como um quebra-cabeça: para saber as

peças que faltavam ela devia dar um passo para trás para ter uma

visão ampla da coisa.


— Você não precisa fingir que não está me seguindo, Wilkins,

eu já vi você — Emerald falou depois de passar alguns minutos em


silêncio fingindo admirar um quadro na galeria da mansão.

Wilkins deu um passo envergonhado para fora da alcova em

que se escondia.

— Me perdoe, milady. — Ele pigarreou para limpar a garganta

e puxou as mangas do libré que já estava impecável.

— Você não precisa obedecer a tudo que ele diz.


— Não é exatamente isso que ser um criado quer dizer?
— Bem, agora você tem dois senhores. — Emerald deu a ele
um sorriso amigável. — Onde está meu marido?

A última vez que ela o vira fora pela manhã, quando se jogara

sobre ela como uma tempestade e só parou quando teve certeza de

que ela estava exausta demais para se mover para fora da cama.

Emerald ainda podia senti-lo entre suas pernas.

— O cervo está curado e ele foi soltá-lo na propriedade hoje.


Emerald balançou a cabeça, compreendendo. Ela tinha

certeza que Black não era indiferente aos seus sentimentos, o

tempo que passavam juntos não deixava dúvidas disso, mas Black

continuava a excluindo das outras coisas. Gostaria de ter sido

convidada para soltar o cervo com ele, ou ter ido cavalgar com ele

no dia anterior quando ele foi verificar uma árvore que havia sido

derrubada pela tempestade. A pior parte era saber que ele fazia isso
deliberadamente, e ver que ele nem se preocupava em como ela se

sentiria, machucava Emerald.

Ela se virou para Wilkins, ele era um criado muito leal, mesmo

que Black não merecesse isso, mas Black também era leal a ele,

Wilkins devia estar ao lado do marido dela há muito tempo.

— Há algum tempo eu venho suspeitando que a razão para


Black precisar se casar comigo envolve suas falecidas esposas.
Wilkins não expressou emoção alguma com o que ela disse,

pelo contrário, parecia esperar que Emerald fosse dizer isso.


— Não todas elas, milady, apenas uma. Lady Georgina.

Emerald já esperava que suas suspeitas estivessem certas,


mas não deixou de ficar surpresa e ferver por dentro de ciúme.
Pensar que Black nutria algum tipo de sentimento por essa mulher a

fazia querer conhecê-la para saber se ela era digna. Se Emerald


podia competir com ela de alguma forma. Era ridículo se comparar

com alguém que estava morta, mas Emerald não conseguia reprimir
isso. Essa característica humana que a fazia parecer tão deplorável.

— Eu sei que todos vocês são leais a Black. O fato de não


terem abandonado ele sozinho nessa mansão apesar de seu
temperamento, já diz tudo, e eu quero confiar nele também, por isso

eu vou pedir que você me conte o que aconteceu, Wilkins.


O criado deve ter sentido pena dela. Emerald estava sentido

pena de si mesma também.


— Nesse condado contam uma história de que o irmão do

lorde Cavey, pai de Black, levou um tiro no peito pela arma de um


caçador e morreu. Em resultado disso, transtornado pelo luto, o
conde fechou a propriedade para sempre.
— Sim, eu ouvi algo desse tipo, mas sempre achei que fosse

uma história inventada para manter as pessoas longe da


propriedade.

— A história é verdadeira, mas aconteceu com outro Hyde.


Foi lorde Black quem levou um tiro de caçador naquele dia.

— Isso explica a cicatriz que ele tem no peito.


Nunca pensou em perguntar a ele a razão dela, no entanto, se
tivesse perguntado duvidava que teria tido resposta.

— O lorde Cavey só tinha o Black de herdeiro e já deve


imaginar que depois desse episódio ele passou a proteger o menino

como um leão. Ergueu muros altos e demitiu mais da metade da


criadagem, deixando apenas os de maior confiança. Black foi criado
como um herdeiro, não como um filho, por isso que para ele sempre

foi muito difícil distinguir seus sentimentos.


— E lady Francesca?

— Lorde Cavey a considerava uma má influência e logo foi


mandada de volta para Itália. Nessa época, ela não era uma mulher

de opinião tão forte como hoje. Ela tinha apenas dezesseis anos.
Ninguém pode culpá-la por ter se omitido, não é?
— Claro.
Emerald nem conseguia mensurar o tanto de coisas pelas
quais sua sogra passara. Ela também tivera um passado ruim, mas
era grata porque sua anormalidade afastava as pessoas ao invés de

atraí-las.
Das muitas formas de uma mulher se tornar uma guerreira,

duas delas se destacam: ou ela quis assim ou foi obrigada a isso.


— O tiro que Lorde Black levou naquele dia gerou muitas
cicatrizes, além da que é visível. Ele associou a falta de afeto do pai

e a ausência da mãe e esse tiro, acredita até hoje que essa bala
danificou seu coração e por isso era incapaz de amar e ser amado.

Isso era uma tolice porque Emerald estava certa de que o


amava. Não apenas ela, mas Wilkins, os criados, e até mesmo

aqueles animais irracionais que vinham para ele sem que


precisasse fazer nada.
Emerald continuou calada, ansiosamente pelo desfecho

daquela história.
— Lorde Black e eu tínhamos a mesma idade quando ele

aceitou o casamento com lady Georgina. Ele foi considerado um


homem de sorte por ter sido escolhido pelo diamante da temporada,
mesmo tendo aquela aparência assustadora. — Emerald concordou,

mesmo que já não o achasse nada assustador. Tudo que antes a


assustava sobre ele, agora a encantava. — Acontece que lady
Georgina era uma criança mimada que não aceitava ter sua vontade
contrariada e ela queria ser amada por lorde Black. Por essa razão

ela o escolheu, porque ouvira que os homens Hyde eram incapazes


de amar e achou que seria um desafio divertido.

— Então ela não o amava de verdade?


— No começo não, mas estou desconfiado de que qualquer
um que atravesse a casca grossa de austeridade que lorde Black

ergueu em volta de si mesmo, corre o risco de se apaixonar por ele.

Foi o que aconteceu com lady Georgina. — Emerald sorriu, isso era
verdade, ela entrou naquele jogo com ele sem nenhuma chance de

ganhar. Teria se apaixonado por ele em qualquer circunstância. —

Seu amor não correspondido se tornou tão intenso a ponto de virar

uma obsessão e quando lorde Black se recusou a comparecer no


leito conjugal, ela passou a jogar sua fúria em qualquer um que

cruzasse seu caminho.

— Espera, está querendo me dizer que Black nunca


consumou seu casamento? — Emerald não podia acreditar nisso.

— Sim, em nenhum dos casamentos.

— Mas por quê? — Era um absurdo.


— Eu não sei, milady, ele nunca disse. Mas eu suspeito, que

ele estivesse esperando alguma coisa.


O quê? Emerald quis perguntar, a pergunta estava entalada

na garganta dela, mas, Deus, ela morria de medo da resposta.

— E quanto a lady Georgina? — Ela voltou ao assunto


principal.

— No leito de morte ela chamou o lorde Black e foi a única

vez que ele fez alguma coisa que ela pediu. Nesse dia ela jogou

nele uma maldição.


O coração de Emerald batia tão rápido que parecia que

chegaria a um limite onde pararia de uma vez.

— Que maldição?
— Uma virgem deveria se entregar a mim por amor. — Quem

disse isso foi a voz grossa de Black, fazendo Emerald ter calafrios

por dentro.
Ela girou nos calcanhares bem devagar e o encontrou parado

atrás dela.
— Você fez o suficiente Wilkins, me deixe sozinho com a lady
Clarendon.

Emerald sentiu seu corpo arrepiar, rejeitando aquele nome.


Wilkins deu a ela um olhar de misericórdia antes de a largar
sozinha com a fera. Emerald relutou, mas seus olhos encontraram

os de seu marido contra a vontade dela. Ela não sabia o que dizer o

que se passava na cabeça dele agora, não parecia furioso, nem

magoado, e ela preferia que ele estivesse assim do que não


demonstrando emoção alguma.

Ele cheirava a terra molhada, suor e a loção de barbear, e


agarrou o pescoço dela por trás para mantê-la em seu domínio.
— Diga, diga que me ama — ele ordenou, esfregando o rosto

no dela e machucando a bochecha dela com sua barba espessa.


Emerald rangeu seus dentes para controlar a raiva que

crescia como fogo em pólvora dentro dela. Se sentia patética por ter

sido usada por ele para libertá-lo de uma maldição.


— Maldito!

— Resposta errada.

Emerald teve seu fôlego arrancado ao ser engolida pela boca


dele. Ele a beijava de forma impiedosa, a sugando e a maltratando

na intenção de castigá-la. Quando ele a soltou, Emerald tossiu,

resfolegante.
— Vou pedir para me dizer mais uma vez, tesoro mio.

Emerald rosnou, a pele quente de ódio. Não ia dizer, não ia


dizer isso para ele nunca mais.

— Vou dizer em italiano para você entender melhor: Fotarsi!

— cuspiu o xingamento.

Black sorriu, e a mente desiludida de Emerald podia estar

enganando a si mesma, mas ele pareceu triste.

— Você ainda tem esperança de entrar no céu com essa boca


suja?
Outra vez ele encheu a boca dela com a língua. Beijando
Emerald com ganância e egoísmo, para arrancar dela à força o que

ela se recusava a dizer por orgulho. Seu corpo se curvava para

conseguir suportar o peso do dele, todo jogado sobre o dela.

— O que ela foi para você? — ela inquiriu, algo fez cócegas

em sua bochecha e percebeu estar chorando. Desejou limpar

aquela lágrima para que ele não a visse desse jeito, mas suas mãos
estavam presas pelas dele. Emerald não pensou que estivesse se

enganando quando decidiu confiar a ele seu coração, justo a ele,

talvez por isso estivesse tão magoada.

— Uma prisão.

Ela encarou os lábios dele, rígidos e mortais como veneno,

eram letais com suas palavras cruéis e eficientes na hora do amor,

mas nunca disseram que a amava. Black nunca disse a ela nada
além de palavras em italiano jogadas na hora do prazer e nunca

prometera que ficaria ao lado dela. Nos últimos dias, ele esteve

mantendo ela trancada não porque queria ela por perto, mas para

garantir que não morreria em um acidente como as outras esposas.

— O que eu sou para você?

Ela sentiu nojo de si mesma por parecer tão fraca. Mas não
conseguia evitar, esse amor a tornava vulnerável. E seus ouvidos
ansiavam por uma palavra dele para acalmar seu coração que doía.

Black abriu a boca, os olhos inexpressivos e o rosto


congelado, mas nada saiu por seus lábios. Emerald se encolheu,

doendo tudo por dentro, preferia que ele tivesse partido seu coração
da forma mais cruel do que não ter dito nada.
— Emerald!

Em algum lugar, uma voz familiar chamava o nome dela e


Emerald pensava ser o seu bom senso, mas os gritos não

cessavam e Black moveu sua cabeça para a direita, mostrando


estar ouvindo também.

— Me solte. — Ela lutou com ele para se soltar de seu aperto,


por um milagre, Black não fez resistência e ela correu para o hall da
mansão.

Do alto da escada, Emerald reconheceu os cabelos loiros de


Brice. Ele era segurado pelos guardas da mansão e exigia vê-la.

— Brice! — Emerald desceu a escada de dois em dois


degraus. Um sopro de ar fresco entrando em seus pulmões quando

correu para os braços de seu amigo.


No entanto, no meio do caminho, Emerald tropeçou nos
últimos anos que passara longe de Brice e percebeu que já não

podia mais considerá-lo seu amigo. Ela sequer sabia de que forma
chamá-lo. Foi estranho vê-lo e perceber que não passava de uma

pessoa que ela costumava conhecer. Ele parecia aliviado em vê-la.


— Soltem-no. — Foi a primeira ordem que Emerald deu desde

o dia em que se tornou condessa.


— Em! — Brice correu para ela assim que foi solto e a pegou

em um abraço atrapalhado. Emerald não retribuiu, o cheiro de Brice,


uma colônia cara, sempre foi a coisa que ela mais gostava nele,
mas agora irritou seu nariz. — Eu tive que invadir esse lugar para

ver você.
— O que você faz aqui, Brice? — Ela colocou uma distância

entre os dois.
Ele a olhou com estranheza.
— Como assim? Acaso esqueceu nossa promessa? — Os

olhos dele desceram para o pescoço dela e ele deu um singelo


sorriso. — Claro que não, você ainda está usando o meu colar.

Emerald odiou o peso daquele colar em seu pescoço. O tiraria


na primeira chance que tivesse.

— Você está atrasado. Alguém me enfiou em uma armadilha


antes de você fazer isso. — Emerald estava cansada de ser
enganada pelos homens que ela acreditava amar.
O olhar afetuoso de Brice foi se tornando sério ao
compreender a situação. Ele olhou para ela, para suas roupas e
cabelo.

— Ah. Já vejo, então os boatos na cidade são verdadeiros.


Emerald ergueu a cabeça, preocupada.

— Que boatos?
— Eu nunca esperava isso de você. — Ver aquele olhar
decepcionado dele e não sentir nada foi o que fez Emerald perceber

que nunca sequer chegou a amar esse homem. — Pobre, Pearl. Eu


não quis acreditar, nem mesmo quando fui à sua casa e ela me

disse que você a havia abandonado para viver com o conde.


Emerald se desesperou.

— Eu não a abandonei, eu vou buscá-la!


— Buscá-la? — Brice parecia saber de alguma coisa que
Emerald não. — Você sabe, não é, que o padre Simons mandou

queimarem sua antiga casa e levou sua mãe, irmã e pai?


Emerald sentiu como se o chão tivesse se aberto sob seus

pés. No instante que foi cair, uma mão a segurou pela barriga e foi
puxada para uma fortaleza quente e acolhedora. Ela sabia que era
Black, somente uma pessoa podia proporcionar aquele tipo de
emoção nela, apenas uma pessoa fazia ela se sentir daquela forma.
Era uma pena que tudo não fosse recíproco.
— Não. Pearl, não! — Era como ser engolida por uma solidão

sem fim. — Eu tenho que trazer Pearl para cá, eu tenho que
proteger minha irmãzinha.

— Nós vamos trazê-la, tesoro. Acalme-se, não chore. — As


mãos de Black eram a única coisa que a impediam de desmoronar.
As palavra dele eram como beijos. Emerald nem percebera

que chorava, essa dor em seu peito a impedia de sentir qualquer

coisa. Qualquer coisa exceto Black.


Black.

Emerald começou a tremer. Ódio tomando o lugar do sangue

em suas veias. Não sabia onde arrumou forças para empurrar Black

para longe. Ela sabia que aquela raiva irracional tomando seu
raciocínio não era culpa dele, mas não deixava de pensar que se ele

tivesse trazido sua irmã mais cedo, ela estaria segura.

— Se você tivesse trazido ela para junto de mim quando eu


pedi, isso não teria acontecido! — Emerald gritava, ela sabia que

estava assustando as pessoas, mas não sabia como parar.

Black a encarava como se não a reconhecesse.


— Tesoro mio…
— Não! — Emerald queria impedir as palavras de saírem,

mas eram muito mais fortes do que ela. — Maldita hora que eu
aceitei me casar com você achando que me salvaria do inferno,

você piorou tudo! Eu o livrei da sua maldição, mas você se tornou a

minha, Black Hyde!


Emerald acreditava que ele era incapaz de esboçar qualquer

reação além da de desprezo, mas o rosto de Black agora

demonstrava uma mágoa tão grande que ela teve certeza que ele

jamais a perdoaria por ter dito essas palavras.


— Vamos, Em, eu posso pedir a ajuda de meu pai para livrar

sua irmã, ainda não é tarde demais — Brice disse, tocando no braço

dela.
— Hahahaha! — Emerald sentiu seu coração tombar ao ouvir

uma risada sair de Black. — Isso. Vá com ele, Em.

Ela não queria ir, não sem ele, mas Emerald sabia que não o
perdoaria até que tivesse sua irmã a salvo. Não havia esperança

para os dois. Emerald envolveu seus dedos na mãos que Brice lhe

oferecia e o seguiu para a saída da casa.

— Dio mio, que gritaria é essa? — Lady Francesca entrou na


sala bem a tempo de ver Emerald deixar a mansão.
— Eu não achava que você fosse capaz de chorar — Brice
disse ao puxar um lenço do bolso e o estender para ela.

Emerald não o aceitou, porque achava que não demoraria

muito para tornar o pano inutilizável. Não parara de chorar desde

que deixara High Garden para trás. Ela não sabia dizer com

precisão porque chorava, já que havia tantas coisas acontecendo ao


mesmo tempo, mas aquela sensação de desolação não parecia que

ia abandoná-la nunca mais.

Brice tinha razão. Emerald também achara ser incapaz de

chorar, desejara que as lágrimas viessem muitas vezes para

acalentá-la, ou talvez para diminuir um pouco da carga emocional

que carregava desde pequena, mas nada foi tão doloroso quanto a
tristeza de perceber que todas aquelas coisas que ela achava que
tinha, não foram suas realmente.

Parecia loucura chorar por amor, depois de tudo que já

passara.

— Por que você não veio me buscar? — ela perguntou a

Brice, com raiva dele, mas não por ter sido enganada por ele, e sim

porque se ele tivesse vindo antes, Emerald não estaria chorando por
causa de Black Hyde.

Brice teve a decência de parecer envergonhado.

— Minhas promessas foram sinceras, eu viria atrás de você,

mas eu precisava garantir que não dependeria mais do meu pai

para poder ficar com você, Em.

Emerald não conseguia mais acreditar nisso.

— O amor verdadeiro sobrevive às dificuldades.


Brice voltou a guardar o lenço no bolso.

— Você está tentando me transformar em um vilão. Eu quis

levar você para morar comigo assim que deixei o condado, por

acaso não foi você quem disse que preferia garantir um sustento

antes de pensar em casamento?

Argh! Era péssimo ter que dar razão a ele. Emerald nem se
reconhecia mais. Estava mesmo tentando colocar toda a culpa em
Brice para de sentir melhor por ter sido tão fácil de ser iludida pelos

toques de Black.
— Alguma coisa mudou. — Ela disse, o balanço do cabriolé

de Brice a deixando enjoada.


— Sim, aquele conde mudou você. — Brice riu baixo. — A
Emerald que eu conheço sempre priorizaria o bem estar antes dos

sentimentos e é por isso que eu escolhi você.


Emerald encarou os olhos azuis de Bride e lembrou de como

costumava achá-los acolhedores, agora eles pareciam apenas olhos


azuis normais. Ele era tão diferente de Black, com sua aparência

indiscutivelmente linda e encantadora. Brice não precisava se


esforçar para ter a afeição das pessoas. Black era grande e
desastrado, com mãos ásperas por cuidar dos animais e das

pessoas. Ele não precisava de uma aparência angelical para tentar


ser acolhedor porque ser um protetor estava em sua natureza.

Agora que Emerald entendia mais os seus sentimentos por


Black, se perguntava se chegara a estar ao menos perto de ser

apaixonada por Brice ou se apenas pelo que ele representava. Uma


fuga, uma alternativa menos ruim para sua realidade, o desejo de se
agarrar em qualquer coisa que a afastasse de seu pai e de sua vida

antiga. Emerald podia ver como fora inocente, teria sido muito infeliz
se tivesse se casado com Brice e no fim sentiu gratidão por ele

nunca ter voltado.


Tudo era diferente de como se sentia quando estava com

Black. Quando ele a envolvia com seu corpo grande e a fazia achar
que poderia morrer se ele a soltasse, ou que até mesmo um vida de

pobreza seria rica, se fosse passada ao lado dele. Era por essa
razão que Emerald não podia mais usar aquele colar.
— Você tem razão. — Ela puxou a mão de Brice e a virou,

com a outra, arrancou o colar de seu pescoço e o depositou na mão


dele. — Talvez se eu tivesse percebido que o amor é mais

importante do que tudo antes, não teria sofrido tanto nas mãos de
meu pai e nem deixado minha irmã e minha mãe passarem o
mesmo.

Era por amá-las acima de qualquer coisa que Emerald as


salvaria e nunca mais as colocaria em segundo lugar outra vez.

Brice encarrou o colar.


— Você tem certeza disso? Se ficar ao meu lado pode usar a

influência da minha família para conseguir proteger a sua irmã.


Emerald anuiu.
— Eu não quero mais me apoiar em ninguém para proteger

minha família, eu farei isso sozinha. — Ela enxugou as lágrimas de


seu rosto ao reconhecer a rua de sua casa.
O cabriolé mal parou em frente à sua casa antiga e ela
desceu. Quase não reconheceu o lugar, tudo que antes era madeira,

tijolos e cimento, fora transformado em cinzas. Se sentindo


estranha, Emerald caminhou por aquele lugar. Lembrou de todas as

vezes que desejara ela mesma pôr fogo naquela casa para que
tivesse uma desculpa para ir embora, pensou que ficaria feliz, mas a
profunda tristeza que a assolou a fez desejar se vingar daquela

gente.
Eles tiraram tudo dela. Suas oportunidades. Sua felicidade.

Qualquer chance de ser feliz. E agora tomavam a única coisa que


ainda lhe restava.

— Você não precisa mais me acompanhar daqui, Brice —


disse, não precisava dizer mais nada para deixar claro que ali era
onde o destino deles terminava.

Emerald empurrou os escombros para conseguir passar e


marchou em direção à igreja.

O céu se fechava, anunciando o início de uma tempestade. As


pessoas paravam o que estavam fazendo para vê-la passar. Era
como se as nuvens a acompanhassem.
Emerald entrou na igreja pela porta da frente. Por muitos anos
fora proibida de entrar naquele lugar, e teve medo de que assim que
pisasse em solo sagrado fosse entrar em combustão espontânea,

mas nada aconteceu. O padre Simons estava ajoelhado no altar,


rezando de cabeça baixa. Ele a ergueu, e meticulosamente se virou

para ela.
— Senhorita Sandle, eu estava esperando você. — De longe
ela pode ver o sorriso ardiloso dele.

— Pretende me abençoar, padre?

Emerald estava convencida a não deixá-lo intimidá-la, mas


por dentro ela tremia. Sabia muito bem o poder que o padre tinha de

influenciar as pessoas. Com uma palavra, ele podia acabar com a

vida dela.

— De certa forma — ele respondeu, fechando a Bíblia com


um baque surdo e a segurando contra o peito.

— Eu quero ver minha irmã e minha mãe.

— Não precisa se exaltar. Eu não tenho intenção de proibi-la


de vê-las. — Ele falava suave e sempre com um sorriso dócil, e isso

preocupava Emerald. — Me acompanhe.

Ele indicou os fundos da igreja e quando viu que Emerald não


ia primeiro, andou e esperou que ela o acompanhasse. Eles
andaram por um extenso corredor estreito e o padre retirou uma

chave de suas vestes, a usou para abrir a única porta no corredor.


Emerald esperava encontrar um lugar insalubre, mas o cômodo

onde sua mãe e irmã estavam era muito aconchegante e iluminado,

embora fosse, sem sombra de dúvidas uma prisão.


— Em! — Pearl gritou assim que a viu. — Por que está aqui?

Vá embora!

Logo as lágrimas voltaram aos olhos de Emerald. Quentes e

dolorosas.
— Eu sei que está com raiva, Pearl, mas me deixe explicar, eu

não abandonei você, eu vinha buscá-la. Não fique com raiva de

mim, por favor. — Ela se agarrou aos braços da irmã.


— Não é isso. Você acha que estou com raiva de você? Não!

O padre, ele fez com que acusassem você de bruxaria.

Emerald enxergou o padre em sua visão periférica, ainda


parado junto à porta.

— Ele não tem provas, não pode prender ninguém baseado

em achismos.

O padre não tirava aquele sorriso do rosto, e isso estava


assustando Emerald cada vez mais.
— Eu tenho testemunhas — disse Simons, deliciado. — Por

acaso você não usou um chá para embebedar lorde Hyde na noite

de núpcias? Por acaso não pediu sangue de porco para um criado?


E os chás que deu à menina Emile? Bruxa!

Emerald mordeu a língua ao perceber que criara evidências

contra si mesma. Os criados de High Garden não gostavam dela,

mesmo que Emerald tivesse ganhado um pouco da afeição deles


depois de ter salvo a vida de Emile, sabia que eles jamais a

defenderiam.

— O que você quer? — Ela se dirigiu ao padre. Sabendo que


caminhava para a derrota, o mais sensato a se fazer era barganhar

com Simons.

Os olhos dele brilharam.

— A única maneira de livrar sua família disso, é você


assumindo a culpa pelos seus crimes.

Emerald o faria sem pestanejar.

— Tudo bem.
Pearl se agarrou ao braço dela.

— Não! Não minha filha não!

Emerald não teve reação quando sua mãe se colocou na

frente dela.
Percebera que estivera anos esperando que um dia sua mãe

a defendesse, que a abraçasse e a protegesse, mesmo que fingisse


não se importar esteve apenas ignorando a dor porque ela era

grande demais. Vendo ela agora em sua frente com os braços

abertos, disposta a levar um tiro por ela, de alguma forma fez todas
as cicatrizes fecharem. Sabia que isso era um grande passo para

sua mãe, e estava mais orgulhosa do que magoada. Desejou

chorar outra vez.

— Tudo bem, mãe, eu é que tenho que lidar com isso.


— Não diga bobagens. Você não sabe a pena para os

acusados de bruxaria, Em? — Pearl não soltava o braço dela e o

desespero nos olhos da irmã avisaram Emerald de que algo terrível


a espreitava.

Emerald procurou os olhos do padre e soube que o que sairia

da sua boca seria a pior coisa que já ouviu.

— A pena é purificação através do fogo.


— Wilkins! — Black berrou. — Wilkins!
— O que houve, milorde? — O criado entrou no aposento

afoito, esperando que o diabo estivesse lá dentro.


— Chame um médico. Acho que estou morrendo. — Black
não parava de massagear o peito enquanto andava em círculos pelo

quarto. Sentindo que aquela dor faria seu coração explodir.

— O que você está sentindo?

Black deixou seu corpo despencar na cama.


— Meu coração lateja e a cada batimento todo o meu corpo

dói, minha mente está se embaralhando e o ar está me faltando no


peito. — Black agarrou Wilkins pela blusa e o puxou para muito
perto do seu rosto suado. — Veja os meus olhos, veja se eles estão

vermelhos.
Wilkins encarou a cara de seu patrão com os olhos

arregalados por um tempo e para a surpresa de Black, abriu um

sorriso.
— Milorde, eu me demito.

— O quê? — Black se sentou na cama.

— Eu assumi esse cargo porque o senhor é meu amigo desde


que somos crianças, e a única razão para não ter me demitido é

porque eu não queria ser um daqueles que o abandonaram, engoli

todos esses anos de ingratidão e tolerei esse seu péssimo


temperamento, mas eu não preciso mais disso. Eu tenho trinta e

dois anos, nunca me casei, e tenho quase certeza de que vi um


cabelo branco na minha cabeça ontem. É isso, estou dando adeus.

Black estava boquiaberto. O que estava acontecendo que

todas as pessoas o estavam abandonando nesse maldito dia?

— Você vai me abandonar à beira da morte? Ingrato!

Wilkins gargalhou.

— O senhor não está morrendo.


Black o chutou na canela.
— É claro que estou. Que outra explicação tem para essa dor
no meu peito?

— Emerald. — Ouvir aquele nome fez a dor no peito dele se

tornar insuportável. Black se levantou e voltou a andar em círculos,

percebeu que a dor vinha crescendo e crescendo.

— Ela escolheu partir. — Black odiou a forma como sua voz

pareceu rachada.
Emerald escolheu o outro, não ele. Ela sequer deu a ele a

chance. Ele ofereceu a ela sua mão, mas ela a rechaçou para

aceitar a mão de outro homem.

— Você não fez muita questão de impedir.

— O que você esperava que eu fizesse?

— O senhor vem sendo um tirano há anos, fazendo o que

quer e como quer, e de repente resolveu agir conforme a moral


demanda?

Black lhe deu um olhar perigoso.

— Cuidado com a língua.

Wilkins deu de ombros, foi até o aparador de bebidas e serviu

a si mesmo uma dose de uísque.

— Eu não preciso mais tomar cuidado, eu não sou mais seu


criado. Eu fiquei ao seu lado por todos esses anos à espera de
alguém que você não conseguisse afugentar com seu péssimo

humor, alguém que enxergasse o seu verdadeiro eu, e agora que


você a encontrou, a deixou ir porque está com ciúme.

Black piscou. Tendo, vergonhosamente, uma visão honesta do


seu sentimento pela primeira vez em dias. Era isso, ciúme. Nunca
sentira isso antes portanto não sabia distinguir. Era magnífico,

desejar e sentir posse por alguém, ao mesmo tempo que era


desesperador. O que o fizera ter tanta raiva naquele momento foi

ver Emerald nos braços daquele homem e perceber o quão


diferente era dele em tudo. Não poderia nunca competir com aquilo.

Nunca. A única coisa que podia dar a ela era dinheiro e ele sabia
que para Emerald isso não significava nada.
Meu Deus!

Black tinha que arranjar um jeito de convencê-la a escolhê-lo


porque não podia viver sem ela.

— O senhor nunca esteve amaldiçoado, milorde, essas


mulheres morreram por infelicidade do destino.

Não podia ser apenas uma coincidência.


— Você estava lá no dia, viu que Georgina rogou uma praga
em mim. — Black conseguia ouvir as palavras em seus sonhos às

vezes.
“ Você pagará por toda a frustração que eu senti, por tudo o

que me negou, por todo o desprezo que me dedicou, pela


humilhação de morrer virgem depois de tanto tempo de casada. Eu

o amaldiçoo e jamais se livrará de mim, jamais terá uma noite de


sono tranquila, pois sentirá a dor que eu sinto agora! Padecerá em

desespero por essa dor e eu o farei se lembrar de mim e da minha


humilhação todas as vezes em que buscar seu quarto, seu leito,
onde eu nunca me deitei. Você verá, minha lembrança jamais sairá

de sua mente, você não terá sossego e muito menos felicidade, até
dormindo o perfume que simboliza a minha desgraça o perturbará.

Mesmo que se case novamente, quantas fezes for, você não será
feliz, pois sucederá às suas esposas o mesmo que logo acontecerá
comigo.”

No início Black não acreditou, e casou-se novamente alguns


meses depois. Mas após as rosas brancas brotarem

inexplicavelmente em seu quarto, as mesmas rosas que adornaram


o caixão e a sepultura de Georgina, depois de passar a sentir dores

de cabeça avassaladoras e, finalmente com a morte prematura de


suas esposas, não teve dúvidas de que fora efetivamente
amaldiçoado.
Durante dez anos ele se afastou de mulheres que poderiam
vir a se tornar sua esposa. Mas nos últimos dois anos passou a
desejar tanto o fim de seu tormento, que ousou sonhar que seria

possível encontrar uma virgem que se entregasse a ele por amor,


mesmo ele sendo uma criatura tão amedrontadoramente grande.

— Palavras só terão o poder de atingi-lo se você o der a elas.


Black balançou a cabeça.
— E quanto às rosas? Que explicação tem para elas

nascerem o tempo inteiro aqui?


Wilkins abriu os braços, indicando o quarto.

— O senhor sempre deixa esse quarto abafado, aqui é quente


e úmido, é o clima perfeito para elas.

Black piscou, debilmente, nunca parara para pensar nisso. Se


bem que, nos últimos dias Emerald esteve dormindo com ele e
compartilhando com ele o quarto, ela costumava deixar a janela

aberta e isso mantinha o quarto ventilado.


Black achara que as rosas não voltaram a crescer porque se

livrara da maldição, mas e se tudo fosse apenas porque o quarto


ficou mais arejado?
— E as dores de cabeça? Que explicação tem para elas?
— Como lady Emerald disse, elas eram provocadas pelo
trauma. O senhor melhorou depois que passou a beber o chá que
ela prepara todas as noites.

Black encarou Wilkins por muito tempo se sentindo muito,


muito parvo. Seu rosto ardeu de vergonha.

— Você deveria ter me dito isso antes, Wilkins! — Ele levou


as mãos à cabeça, pensando em todos os erros que cometera com
Emerald.

— Eu tentei.

Black parou de repente e se virou para o criado.


— Isso foi inaceitável, mas eu posso perdoá-lo se voltar a

trabalhar para mim. — Wilkins ia falar, mas Black foi mais rápido: —

Claro, que eu vou dar a você um aumento e o cargo de mordomo,

além disso você poderá tirar um mês para descansar uma vez por
ano. Assim que eu trouxer Emerald, farei um filho nela e eu gostaria

que você estivesse aqui para vê-lo crescer.

Wilkins pensou um pouco, suspirou, e rolou os olhos.


— Tudo bem.

Black deu um abraço nele para selar o acordo e também

como uma forma de agradecer-lhe por dizer todas as verdades que


precisava ouvir.
— Ela me ama mesmo não é? — Ele sorriu, incapaz de

controlar sua boca.


— Sim, não entendo o porquê, mas sim.

Era muito bom saber disso, mas não era a parte mais

importante, e sim que Black a amava também. Tanto que Emerald


jamais compreenderia. Black acreditava ser imune a esse

sentimento quando esteve esperando por ele por todos esses anos,

esperando que fosse dado a ele voluntariamente. Ninguém nesse

mundo poderia ter sido melhor do que ela.


— Eu vou buscá-la agora. — Ele marchou em direção à porta.

— Se aquele homem quiser tirá-la de mim, terá que passar por cima

do meu corpo morto.


Black desceu as escadas correndo e encontrou seus criados

aglomerados na porta.

Franziu o cenho.
— O que está acontecendo?

— É a lady Emerald, milorde, o padre vem armando há algum

tempo para condená-la à morte por bruxaria.

Black se desesperou. Se tivesse prestado a devida atenção


ao seu povo não teria dado tanto poder a esse padre.
Entre as pessoas, saiu uma pequena menina com duas

tranças e um sorriso banguela.

— Nós vamos com o senhor, milorde. Trazer a Lady Emerald


de volta — disse Emile.

Black sorriu, um pouco mais aliviado, percebendo que não

fora o único que sua esposa encantou.


Black chegou à igreja com os nervos à flor da pele. Uma
pequena multidão se reunia nas portas e uma euforia circulava as

pessoas. Ele teve um péssimo pressentimento sobre isso. Apressou


o passo, desejando ter pernas maiores para chegar até sua esposa
mais rápido.

— Precisará de anos para sumir a imagem da minha mente.

Ele ouviu alguém dizer enquanto abria caminho entre as

pessoas.
— Deu para ouvir os gritos de longe. — Outro cochicho.

— Terá sorte se escapar sem nenhuma sequela. — Mais


outro.
Black sentiu o desespero criar garras afiadas e as fincar em

seu coração. Esse sentimento de pavor, misturado com ansiedade e


nervosismo, o fez empurrar as pessoas com mais força. Seu

coração lamentava, à espera do pior e ele não tinha mais certeza se

queria encontrar Emerald. Agora entendia porque esteve lutando


contra o amor durante toda a sua vida, era o temor de sentir aquele

tipo de medo, o sentimento terrível de perder a pessoa amada.

Demorou demais, a perderia por ter sido negligente. Dessa vez ele
tinha certeza de que sua vida acabaria. Se a perdesse, Black

perderia também o sentido de viver.

Assim que conseguiu atravessar o mar de pessoas, Black se


deparou com o padre Simon desmaiado não muito longe do altar

enquanto Emerald se recuperava junto de uma moça muito parecida


com ela, só que com cabelos pretos. Black julgou ser sua irmã.

— Emerald! — Ele correu até ela e a puxou para se certificar

de que estava fora de perigo. Ele conseguiu se sentir mais aliviado

ao ver que ela não sangrava e nem parecia machucada.

Ela não esperava encontrá-lo ali. E ela não era a única. A

multidão que se aglomerava ao redor da confusão, começava a


cochichar sobre outro assunto: Black. O conde recluso que não

dava as caras em público há mais de dez anos.


— O que está fazendo aqui? — Emerald perguntou, cheia de
petulância no tom de voz.

Black sorriu, sem jeito.

— Eu vim salvar você.

— Chegou atrasado, mas pode ajudar o padre se quiser.

Black olhou para o corpo de Simons estatelado no chão, e

reparou que ele tinha um calombo enorme na testa.


— O que você fez?

— Ele disse que ia me queimar viva e eu o atingi com sua

bíblia.

Black a encarou, perplexo. E talvez um pouco amedrontado.

— Meu Deus, você me assusta.

Ela o olhou com aqueles grandes olhos de íris violeta

emoldurados por longos cílios brancos. Eles desarmavam Black de


qualquer reação. Ela era tão assustadora e linda. Black não sabia

como não percebera antes que esse sentimento sufocante e

aterrador que derrubava suas defesas e o tornava gigante era amor.

Deus, jamais pensou que fosse amar um dia, ou que esse amor

fosse ser tão grande que o faria cometer loucuras em nome dele.

— Você não precisa se preocupar comigo. Volte para High


Garden antes que chame mais atenção. — Black piscou. Ela por
acaso estava achando que existia alguma possibilidade de ele voltar

sem ela? Bem, se estava mesmo acreditando nisso ela não o


conhecia muito bem.

— Em, o que está acontecendo? — A moça que se agarrava


ao braço de Emerald disse. A esposa suspirou, desviando o olhar
confrontador de Black e mudando o semblante austero para um

mais simpático quando sorriu para apaziguar a irmã.


— Essa é minha irmã, Pearl, e essa é minha mãe, Ruby. —

Emerald indicou as mulheres atrás dela.


Fez uma reverência com a cabeça para a mãe dela, e para a

irmã Black deu um sorriso.


— Pearl, eu ouvi falar muito de você nas últimas semanas.
Você gosta de animais?

— Sim! — O olhar animado dela lhe lembrava muito o de sua


esposa, Pearl era bonita. Seria muito fácil arranjar um marido para

ela. Apesar de Black ainda achar que nada nesse mundo se


comparava à Emerald em beleza.

— Eu tenho muitos em High Garden. Se você convencer sua


irmã a vir conosco, poderá brincar com eles todos os dias.
Pearl segurou Emerald pelos ombros.
— Ouviu isso, Em? O conde está nos convidando para morar

com ele! — O tom de voz alegre dela fazia Black se sentir feliz. Ver
a forma como Emerald o olhava, o fez se sentir mais feliz ainda.

— Primeiro pergunte se ele não tem nenhum cadáver


escondido em seu quintal.

O sorriso de Pearl sumiu um pouco e Black sorriu sem humor.


Ia deixar essa provocação passar porque estava se sentindo feliz
demais.

— Emerald. — Ele chamou o nome dela daquele jeito que


apenas ele sabia. Emerald curvou o pescoço, se recusando a olhar

para ele. — Você me perguntou antes o que você era para mim.
Pois bem, você é tudo. Eu fui um homem sem propósito, eu achava
que não tinha um, mas estou convencido de que meu propósito é

você. Eu amo você, por favor, fique ao meu lado. Non posso vivere
senza di te.

Emerald tinha os olhos cheios de água, mas parecia lutar para


se manter impenetrável. Mesmo que estivesse fracassando de

pouco em pouco.
—Você é bom com as palavras, devia usá-las com mais
frequência. — Black sentiu que venceria a batalha assim que ouviu

a voz dela.
— Não sei, gosto da minha reputação e as pessoas veriam
que não sou tão assustador. Eu perderia o respeito.
Emerald não aguentou e soltou uma risada estranha. Meio

feliz e meio raivosa. Black desejou rir também, porque até mesmo
nisso ela era única.

— Olhe ao redor, milorde. Estamos em uma igreja lotada e


você está jogando palavras de amor para uma pobretona esquisita.
Você sabe que as pessoas vão falar sobre isso por muitos, muitos

anos, não é?
Black foi atraído para ela, por aquele sorriso audacioso que o

enlouquecia.
— Ótimo, está na hora de criar uma nova reputação para mim.

— Agora eles já estavam próximos o bastante para ele beijá-la


apenas abaixando sua cabeça.
— A reputação de um homem que foi enfeitiçado por uma

bruxa?
— Melhor, a reputação de um homem louco por sua esposa.

Black a beijou e naquele beijo ele depositou um céu de


promessas. Uma vida feliz, um amor inesquecível, conturbado,
feroz, e eterno. Acima do burburinho e das vozes estridentes, ele

ouviu as batidas do seu coração. Ele gritava um único nome. O dela.


Emerald. Emerald. Emerald.
Black sabia que esse seria o único que ele gritaria até o dia
que deixasse de bater.
Black levou muito tempo para conseguir ficar a sós com sua
esposa. Depois de dispersar a multidão na igreja eles voltaram para

High Garden sem fazer desvios. Eles vieram todo o caminho de


mãos dadas, mas tiveram que se separar logo em seguida pois
Emerald precisava conversar com a mãe e a irmã para deixá-las a

par dos recentes acontecimentos. Black preferiu dar a elas

privacidade.

À noite, ele pediu que servissem um banquete de boas vindas


e observou que o cardápio fosse cheio de comidas que não

requisitassem o uso de muitos talheres. A princípio, a irmã dela se


mostrou intimidada, mas logo estava comendo e conversando com

Emerald com muito entusiasmo sobre as coisas, diferente da mãe


dela, que permanecia ressabiada e abria a boca apenas para comer

uma vez ou outra.


Emerald não mencionou o pai nenhuma vez, mas Black soube

pelos moradores que ele conseguira barganhar com o padre Simons

depondo contra Emerald em troca de sua liberdade. Era ele quem


devia ter ido à mansão para buscar Emerald, e não o homem

chamado Brice Howard, mas em vez disso os moradores o viram

fugindo da cidade. Black achava melhor assim, pois se pusesse as


mãos nele iria matá-lo. Preferiu guardar essa história em segredo e

proteger Emerald, por mais que a esposa não gostasse do genitor,

ela não merecia saber que o último ato do canalha como pai foi traí-
la.

— Então, você é quem será minha próxima protegida? —


Lady Francesca se dirigiu a Pearl.

Black agradeceu em silêncio por sua mãe iniciar uma

conversação. Às vezes sua língua solta vinha bem a calhar.

A garota sorriu sem mostrar os dentes, envergonhada.

— Não sei se poderei fazer jus a essa gentileza, senhora.

Black percebeu naquele instante, ao ouvir o sotaque forte de


Pearl, que Emerald quase já não falava assim.
— Tenho certeza que não pode ser pior que sua irmã. Ela
pensa que eu não sei que ela afrouxa o nó do espartilho quando crê

que não estou olhando — Lady Francesca falou, apesar de sua

aparência elegante e refinada ser assustadora, seu tom de voz era

sempre risonho. Emerald ficou vermelha de imediato.

— Ah é? — Pearl riu. — Nesse caso, quando podemos

começar?
— Imediatamente. Sua primeira lição vai ser não me chamar

de senhora, pode chamar de Francesca em vez disso.

— Muito bem, lady Francesca.

A mãe de Black sorriu, contente.

— Na próxima semana voltarei para a Itália. Acredito que será

melhor para você, pois poderá frequentar escolas de artes com os

melhores professores e terá contato com outras moças da sua


idade, além de poder aprender um novo idioma.

Pearl agarrou a mão de Emerald sobre a mesa.

— Não, eu não quero me afastar da minha irmã.

Emerald colocou a outra mão sobre a de Pearl.

Black agora conseguia entender o afeto que uma nutria pela

outra. Era tocante. Perguntou-se se sua vida teria sido diferente se


tivesse tido um irmão.
— Está tudo bem, Pearl, serão apenas alguns meses. Você

não precisa mais se prender a esse lugar, pense em tudo que você
vai viver. Eu sempre achei que o seu destino era conhecer o mundo.

Foi o que sempre quis para você. Faça isso por mim.
Elas encostaram as testas uma na da outra.
— Será só por alguns meses, não é? — Pearl perguntou, com

a voz tremida pelo choro preso na garganta.


— Sim, nada poderá fazer você deixar de ser minha irmã. —

Emerald prometeu e as duas se abraçaram.


Black olhou para sua mãe, e percebeu que o que sentia por

ela era algo semelhante a isso, apesar de nunca ter demonstrado.


— Então, eu aceito ir com você, milady — Pearl disse para
lady Francesca assim que se soltou da irmã.

A mãe de Black sorriu, animada.


— E você também virá conosco. — Francesca disse para a

mãe de Emerald, que arregalou um pouco os olhos. — Será ótimo


ter uma companhia de minha idade. Me diga, sabe jogar carteado?

A sogra de Black balançou a cabeça.


— Bem, é muito simples.
Lady Francesca passou o restante do jantar explicando para

Ruby as regras do jogo e foi difícil haver silêncio na mesa depois


disso.

Emerald passou aquela semana inteira com sua irmã. Até


mesmo durante as noites. Dormiram juntas. Pescaram. Andaram a

cavalo. Alimentaram os bichos. Correram pelos corredores de High


Garden e Emerald mostrou seu avanço na leitura entoando um

soneto de Shakespeare na beira do lago. Dando um sorriso


orgulhoso no final.
Um dia antes da partida, Emerald encheu o baú de da irmã

com vários dos vestidos que estavam em seu armário mas não
cabiam nela. Elas passaram a noite acordadas conversando e pela

manhã Pearl, Ruby e lady Francesca se prepararam para partir pois


teriam que viajar muito de carruagem até chegar em Londres, onde
embarcariam em um navio para a Itália.

Emerald se despedia de sua irmã e mãe enquanto Black


permanecia de pé, desejando ser útil em alguma coisa, mas sem

saber se deveria se meter.


— Por que sinto que você está ansioso para me dar adeus?

— A mãe dele disse, chegando por trás e o pegando de surpresa.


— Não estou. — Black mal podia esperar para ficar a sós com
sua esposa, mas também se despedir da sua mãe era doloroso. Ele
sentia que dessa vez sentiria mais saudade dela do que da última
vez.
— Você mente muito mal, figlio mio. — Lady Francesca o

puxou para um abraço demorado. — Eu estou feliz por você ter


finalmente achado a voz do seu coração.

— Ti amo, mama. — Essas palavras que nunca pertenceram


ao vocabulário dele vinham se tornando cada vez mais fáceis de
pronunciar.

— Eu sei, ser meu filho o obriga a isso. — Ela sorriu.


— Não faço por obrigação. — Black a soltou do abraço, e lady

Francesca colocou a mão sobre o peito dele que um dia fora


baleado.

— Eu sei também. É o que o torna meu filho.


Black beijou a testa dela e a ajudou a entrar na carruagem.
Fez o mesmo com sua cunhada e sogra. Não demorou elas

estavam partindo.
Emerald soluçava de chorar vendo a carruagem se distanciar

e Black a puxou para o abrigo do seu corpo. Daria a ela todo o


tempo que precisasse para superar. Seria a muleta em que ela se
apoiaria. Seria tudo que Emerald necessitasse, pois eles

começariam suas vidas juntos a partir dali.


Só os dois.
Emerald passou todo o dia melancólica e chorosa. Os criados
tentaram animá-la mandando muitas comidas para seu quarto, mas

ela descobriu que perdia a fome quando triste. Não percebera antes

porque vivia com fome. À noite, ela se sentia um pouco melhor.

Aceitou que aquela distância era necessária para que Pearl tivesse

o futuro que Emerald sempre quis para ela. Era difícil porque elas
nunca passaram tanto tempo distante uma da outra, ainda mais com

um oceano as separando, mas Emerald precisava aprender a

conviver com isso. Afinal, a vida é feita de saudade.

Além do mais, ela também tinha Black e também estava com

muita saudade do marido. Mesmo que não estivessem longe um do


outro, na última semana ela não teve sequer um momento a sós
com ele. Queria conversar. Sentia falta de fazer amor.

Depois do jantar ela trocou suas roupas por uma mais fácil de

tirar, ou de rasgar, e foi até a cozinha para pegar a bandeja com o

chá que ele bebia todas as noites antes de dormir para evitar as

dores de cabeça.

Ela bateu na porta.


— Entre.

Equilibrando a bandeja em uma mão, Emerald usou a outra

para girar a maçaneta e o pé para empurrar e abrir. Black estava de

costas, terminado de desabotoar a camisa.

— Lady Emerald já se preparou para dorm… — Ele pensou

que fosse um criado, quando a viu, engoliu o restante da pergunta.

Emerald sorriu.
— Eu trouxe o seu chá.

Ela pode ver o pomo de Adão dele subindo e descendo.

— Obrigado.

Ele a acompanhou com os olhos enquanto ela caminhava

para a cama. Emerald se sentou na borda e bateu no colchão ao

seu lado.
— Venha cá.
As pernas de Black não titubearam nem por um instante.

Obedeceu Emerald diligentemente. Black se sentou ao seu lado,


calado.

Ela percebeu que ele tinha a respiração muito pesada. A


forma como ele a desejava de um jeito tão cru a deixava excitada e
pronta para ele. Ela adoçou o chá com quatro cubos de açúcar, do

jeito que ele gostava, e mexeu. Quando ficou satisfeita, devolveu a


colher para a bandeja e levou a xícara para os lábios do marido.

— Beba — ela disse, Black pegou a xícara das mãos dela e a


colocou em cima da mesa de cabeceira.

Emerald sabia que seria devorada naquele instante.


Como esperado, Black voltou-se para ela indo direto para seu
pescoço. A beijando e lambendo, mordendo e suspirando pesado

em sua orelha. Ela queria que ele metesse logo, sem mais
delongas, mas eles estavam afastados há uma semana, tinham que

fazer isso com calma.


— O seu chá vai esfriar — ela disse com dificuldade, pois sua

garganta estava seca.


— Tem outra coisa que está muito quente aqui. — Ele pegou
a mão dela e a colocou sobre seu membro. — Esfrie para mim.
Emerald o sentiu latejar em sua mão. Ela o apertou e fez seu

marido gemer. Emerald se ajoelhou entre as pernas abertas de


Black, puxou a calça um pouco para baixo e libertou a ereção

quente. Ela o acariciou um pouco e o introduziu em sua boca, que


se encheu de saliva ao sentir o gosto dele.

Black jogou a cabeça para trás, gemendo grosso, perdido na


luxúria. Dessa vez, foi Emerald quem o enfiou em sua boca, indo e
voltando, lambendo e sugando, até ele jorrar sua semente em sua

garganta.
— Tesoro mio, dammi un bacio.

Emerald sabia muito bem o que isso queria dizer. Ela já ouvira
muitas vezes enquanto faziam amor.
Se levantou e o beijou, louca e apaixonadamente. Os dois

tentando roubar o ar um do outro. Emerald puxou sua camisola e


ficou nua sobre ele. Não queria esperar mais. Com o auxílio da sua

mão, ela o encaixou em sua entrada e sentou sobre ele. Talvez não
devesse ter feito isso tão rápido, pois o tamanho de seu marido era

considerável e ela sentiu uma pontada de dor lá dentro.


— Ah! — gritou no meio do beijo.
Emerald rangeu os dentes, suportando essa ligeira sensação

que logo seria substituída por prazer.


— Sono pazzo di te, Emerald — Black disse, com a voz
aveludada. Pulsando sem parar dentro dela. — Quero envelhecer
ao seu lado.

Emerald adorava a forma como ele parecia perdido toda vez


que estava dentro dela. Ela puxou um pouco seus quadris para

frente e se sentou devagar, não precisava de muito para seu corpo


começar a se preparar para chegar ao clímax. Continuou nesse
ritmo, até suas pernas cansarem e Black segurar no traseiro dela

para subi-la e descê-la em sua ereção. Ele era muito menos piedoso
do que ela, a fazia bater em seu corpo com força. A penetrava com

desejo e ganância. Ela o sentia tão fundo, cada vez que entrava
parecia que atingia uma nova parte sua.

Black a encarava, o olhar negro dissimulado, sedutor e


ardente, sabendo o que provocava nela. Emerald sentiu o prazer se
expandindo em seu ventre e percorrendo todo o seu corpo. Ela o

apertou, tamanha a força do seu orgasmo, e Black não teve outra


opção a não ser se juntar a ela. Aquecendo o ventre dela com sua

semente.
Ela o abraçou pelos ombros e encostou a testa na dele. A
tristeza que Emerald sentira o dia inteiro foi varrida para longe.
Percebeu que era disso que precisava, do cheiro do seu marido.
Tudo ficaria bem.
— Posso perguntar uma coisa? — ela disse, quando os dois

conseguiram recuperar o ar.


— Claro. — Ele beijou a mão dela, demoradamente.

— Por que não consumou seu casamento com Georgina? —


Emerald não queria trazer esse assunto, mas ela sentia que tinha
que falar para enterrá-lo de vez.

— Ela me intimidava — ele disse a única coisa que ela não

esperava ouvir. —Eu também a achava muito jovem, e por causa


disso era muito impulsiva, quanto mais ela exigia de mim, menos

vontade eu tinha de fazer as vontades dela. As outras esposas

foram casamentos de conveniência, nenhuma delas queria estar

casadas comigo e eu não fiz muita questão de mudar a opinião


delas sobre mim.

Emerald o entendia muito bem. Alisou o cabelo dele.

— Acho bom que essa maldição tenha acabado. Se eu morrer


e você se casar com outra mulher eu vou voltar do além para lhe dar

bem mais do que uma dor de cabeça.

Black deu um risada silenciosa.


— Você acha que se livraria de mim tão fácil? Se você

morresse eu não demoraria para estar ao seu lado.— Era uma


declaração de amor mórbida, mas de alguma forma parecia muito

honesta. — Mas não fique preocupada com isso, não existia

maldição no fim de tudo. Era apenas minha consciência pesada.


Você ainda vai ter que me aturar por muitos anos aqui na terra antes

de me aturar por muitos anos no céu.

Foi a vez de Emerald rir, ela não via a hora de viver todos

esses anos com ele. Eles se beijaram demoradamente para selar


mais um acordo, dessa vez definitivo.

— O que acha que vai acontecer com o padre Simons? —

Como ela passara a semana focada em aproveitar o máximo de


tempo com Pearl, não soube o que tinha acontecido depois que

abandonou aquela igreja.

— Bom, ele desistiu de acusá-la de bruxaria quando os


criados de High Garden disseram que não iriam depor contra você.

Ele não terá provas para acusar você de nada.

Black passou uma mão pelas costas dela, da nuca até a base

da coluna. Emerald se contorceu, todo o seu corpo se arrepiou.


— E eu vou voltar a ser um membro ativo no parlamento. Vou

me dedicar mais ao título. Eu vou ser um bom marido. Um bom


conde. Quando isso acontecer eu poderei substituir Simons por

outro padre.

Emerald não se importava, desde que pudesse viver seus


dias em paz em sua mansão, com sua fera.

— Sua mãe disse que ainda não estou pronta para ingressar

em sociedade.

— Minha mãe não sabe de tudo.


Emerald girou seus quadris. Mexendo ele dentro dela. O olhar

de Black mudou instantaneamente, entendendo o que ela queria.

Emerald continuou mexendo seus quadris, até senti-lo bem duro


outra vez.
— Emerald — Black gemeu o nome dela, soou como uma

confissão. — A gente não pode escolher a família que teremos ao


nascer, mas podemos escolher a que vamos construir e espero que

você me escolha, porque eu escolhi você.

Se antes Emerald ainda tinha qualquer anseio em seu


coração, já não existia mais.

— Talvez devêssemos esperar mais um pouco antes de


pensarmos em ir a Londres.
Black concordou com a cabeça, mas ela não sabia dizer mais

se ele estava em seu juízo perfeito.


— É, em um mês ou dois — ele disse, girando seu corpos e
ficando por cima dela, se preparando para começar tudo outra vez.

Emerald sorriu, com certeza eles precisariam de muito mais


que apenas dois meses.
— O que diz a carta? — Black colocou a cabeça por cima do
ombro de Emerald, tentando ler alguma coisa no papel que tremia

por causa das mãos dela.


Assim que Wilkins entrou na sala informando que chegara
uma carta para ela com um remetente da Itália, Emerald correu para

lê-la. Era a primeira em meses.

— Pearl disse que está bem, que a vida na Itália é agitada e

que não me mandou nenhuma carta antes porque queria mandar


uma escrita por ela mesma. — Emerald levou a mão a boca,

emocionada. — Ela disse que mamãe está melhor do que jamais


esteve. Se tornou outra mulher desde que passou a acompanhar

lady Francesca em suas saídas, que está sorrindo e que até expõe
seus pensamentos quando está descontente. Ela finaliza a carta

com um recado de lady Francesca, sua mãe diz para você ficar
longe do uísque se não quiser herdar a pança do seu pai.

Black rolou os olhos.

— Típico.
— Veja a letra de Pearl, como é adorável. — Emerald esticou

a carta diante dos olhos dele. — Vê-se um pouco da personalidade

dela, não acha?


Black inclinou a cabeça, tentando enxergar por um outro

ângulo.

— Se você quer dizer que a personalidade dela é


assustadora, sim.

Emerald acertou o ombro dele com a mão.


— Você é meu marido, deveria concordar com tudo que eu

digo.

Ele riu e pegou a mão dela, a beijando e esfregando na sua

barba. Os olhos faiscando com um desejo que Emerald conhecia

muito bem.

— Tem razão, me perdoe. Sim, a letra da sua irmã é adorável


como ela.

Emerald cerrou os olhos.


— Você só está dizendo isso para agradar e me levar para a
cama.

O sorriso dele quase a cegou.

— Estou conseguindo?

— Você é um sedutor barato, Black Hyde.

Ele gargalhou e Emerald foi até a sua escrivaninha para

guardar a carta de sua irmã na gaveta. A colocou junto das joias que
ganhara de presente de Black e também da rosa que ele deu a ela

na noite seguinte à que se casaram. A rosa seguia

inacreditavelmente intacta. Do mesmo jeito que estava no dia que

ela a colocou ali. Emerald nunca disse a ele. As rosas nunca mais

voltaram a nascer, o que significava que a maldição se fora para

sempre. Eles não precisavam mais se preocupar com isso. Era

melhor que Black seguisse acreditando que ela jamais existiu.


— Estou pensando na próxima joia que quero lhe dar —

Black falou, a fazendo fechar a gaveta depressa e se virar para ele.

— Eu já disse para você parar de me dar joias para se

desculpar. — Ela caminhou para ele e rodeou seus ombros com os

braços, ao fazer isso ele sempre a erguia pela cintura para ela ficar

na altura dele.
— Essa é uma joia diferente. Temos um rubi, uma pérola e

uma esmeralda, que tal agora acrescentar mais uma joia à coleção?
Emerald compreendeu imediatamente. Para ser sincera, vinha

pensando em ter um filho com ele há alguns meses. Não era como
se eles tentassem não ter, pelo contrário, mas planejar a chegada
de uma criança tornava tudo ainda melhor.

— Você tem alguma sugestão?


Ele a beijou de leve. Emerald continuou com a boca meio

aberta e os olhos fechados, esperando que ele a beijasse com mais


força.

— Pensei em Sapphire, Amber, ou podemos chamá-la de


Jade.
Ela pensou um pouco, mesmo que estivesse um pouco difícil

de fazer isso com a boca dele passeando por seu pescoço.


Emerald acreditava que a felicidade só era alcançada através

do sofrimento, ficou contente em saber que se enganara. A


felicidade pode ser tão imediata e espontânea quanto qualquer outra

emoção, e o que a tornava tão rara era que para alcançá-la era
preciso construir memorias e momentos únicos ao lado das pessoas
que mais se ama. Ela queria viver todos eles com Black.
— Nunca pensei que pudesse ser tão feliz. — Ela beijou o

nariz dele. — Obrigada.


— Apenas me ame. Nas horas vagas, entre os minutos,

durante o anoitecer e pelas manhãs. Me ame quando for necessário


e mais ainda quando não for. Só me ame.

Emerald sorriu, sabendo que seria muito fácil. Entendendo

enfim que a verdadeira fórmula para felicidade era viver cada


momento, sem querer que eles durem para sempre.
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