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daEpístola e do Evangelho da
Sé Catedral do Porto
Restauro dos Órgãos
da Epístola e do Evangelho da
Sé Catedral do Porto
índice
5. Ao Serviço da Liturgia e da Arte
ANTONIO FRANCISCO DOS SANTOS
135
cRÉDrros ForocnÁncos
tuffi
Iliffiltjfl cABrDo
PORTUCALENSE
53
De forma muito geral e sintética pode-se descrever um típico órgão paroquial de
cariz
castelhano em meados do século XVII como um instrumento composto por um coro de
Flautados (Principais) - fundamentalmente em estanho - desdobrado a partir de uma
intonação (tubaria de fachada) de 13 palmos (ou de segunda espécie segundo o eminente
teórico aragonês Pablo Nassarrea) e conformado, sucessivamente, pelos registos de oitavo,
Dozena, Quinzena, Dezanovena, Cheio e Címbala. O coro de Nasardos ou registros bastardos
propriamente dito - em madeira ou com liga metálica mais pródiga em chumbo encon-
-
trava-se ainda em processo desenvolvimento intrínse co. As palhetas dividiam-se em dois
tipos: as regalias ou tubos de palheta de ressoador curto - com a primazia dada àsDulçainas,
tanto dispostas dentro das caixas como horizontalmente nas fachadas dos instrumentos
-
e as de ressoador longo - com a supremacia inequívoca d aTrombetareal, sempre
encerrada
na caixa do instrumento -. o teclado manual, único e sempre com a primeira oitava curta,
compunha-se usualmente de 4z teclas (C/D/E /F/G/AlB/H/c-a,,), a cujas primeiras notas
acoplavam-se oito pisantes (correspondentes às notas C/D/E /F/G/A/BlH). A partir dos
anos r6z0, ao someiro partido, sempre de réguas corrediças, passou-se a acrescentar um
pequeno someiro aparte, elevado do someiro principal, destinado a sustentar o registo de
corneta reol (mutação composta costumeiramente de 5 ou 6 fileiras à época).
Para além da referida partição do teclado manual, duas inovações decisivas ideali-
zadas no último quartel do século XVII pelo mestre organeiro franciscano frei ]oseph de
Eizaga Echevarría, e posteriormente desenvolvidas pelos organeiros adscritos à célebre
escola por ele instaurada, lançariam as bases de uma evolução inexorável que levaria o
órgão ibérico ao máximo apogeu, alcançado no último quartel do século xvIII: o advento
das caixas ou arcas de ecos, que dariam lugar à criação de autênticos órgãos de ecoss, e
a implantação horizontalmente na fachada dos instrumentos de registos de palheta
de
ressoador longo, em artilharia6. As palhet as en forma d.e tiros, nas palavras do seu próprio
criador - precedidas, por certo das Dulçainas, já presentes nas fachadas dos órgãos de cariz
castelhano desde os anos r58o -, são, sem sombra de dúvidas, o elemento visual mais
evidente, posto que já visível à distância, e característico de um órgão barroco ibérico
plenamente constituído.
No que se refere ao coro de flautas, deve-se, igualmente, ao espírito visionário e
especulativo do padre Echevarría a criação do Cheio d.e NasardosT, que vem a constituir
o segundo coro fundamental do órgão ibérico; um coro mais cálido e pródigo em cor
e,
nesse sentido, contraposto ao caráter imponente e cintilante do coro principal, o Cheio
de Flautados, cujo brilho o mestre organeiro franciscano reforçará através do
acrescento
54
do registo de Sobrecímbala de três fileiras8, enfatizando ainda mais a oposição de caráter
entre ambos os cheios.
No que tange à organaria em Portugal ao longo século XVII, contrariamente ao
caso espanhol - fecundamente documentado principalmente ao nível dos protocolos
notariais, embora também, através da existência de notáveis fontes organológicas que
ainda conservam quantidades bastantes substanciais de material histórico seiscentista -,
as incontornáveis lacunas documentais, associadas à raríssima existência de um corpus
instrumental íntegro remanescente daquele período, são um grande obstáculo a que se
possa chegar ao estabelecimento de um conhecimento sistemático acerca da sua evolução
intrínseca. Nesse sentido, é de se considerar altamente a af,rmação do organólogo Gerhard
Doderer: "entre t68t e q4z, importaram-se, construíram-se e remodelaram-se em muitas
igrejas paroquiais e conventuais instrumentos de dimensões consideráveise, que ainda
hoje testemunham o recomeço da produção organística, marcando o início de uma
autêntica e genuína cultura da organaria portuguesa"'o.
Efetivamente, nos alvores do século XVIII, uma arte organeira ainda de cariz conserva-
dor dividia-se entre as influências da organaria do Norte da Europa - em cujo enquadra-
mento adquirem especial relevo as flguras do flamengo Miguel Hensberg" e do hamburguês
Johann Heinrich Hulenkampf" - e da organaria ibérica propriamente dita - com especial
destaque para a atividade desenvolvida porTeodósio Hemberg (também citado documen-
talmente como Teodoro Hensberg)'3, frei Manuel de São Bentot4 e frei Manoel Lourenço da
Conceição. Ambas as vertentes, e mais a autóctone num primeiro momento, estavam mais
voltadas às experiências do século XVII.
No que concerne mais particularmente à atividade desenvolvida pelo frei Manoel
Lourenço da Conceição, religioso pertencente à Ordem de São João Evangelista ao abrigo
do antigo Conventode Santo f lói do Porto's, sabe-se que a r de Março de t7t9 o mestre
organeiro passou contrato junto a dois procuradores do cabido portuense, sede episcopal
vacante, para a construção do novo órgão do coro-alto da catedral, cuja história regista a
existência de outros órgãos, ao menos desde os anos r530'6.
Instrumento monumental e invulgaríssimo foi o desaparecido órgão instalado no
coro-alto da catedral portuense por Manoel Lourenço da Conceição, o qual se tratava, efeti-
vamente, de um instrumento de primeira espécie nassarriana, com o plano sonoro assente
numa intonação de z4 palmos. A Obrigaçaõ e Fiança a Inteira Satisfacam e/Íaçaõ do orgaõ
grandeq.'fezoP.'Lour.'oda/Com.ç" daComgregÍo deSamJoaõeVang.odes/taCid."aopRimr."
de M.'o de rytgo'instituída entre o padre organeiro, de uma parte, e os cónegos Sebastião
55
de Prada Lobo e Luiz de carvalho Póvoas, de
outra, perante o tabelião portuenseAntónio
Mendes de Mattos, estabeleceu que o órgão, cuja
caixa era composta de oito castelos, entre
pequenos e grandes, devia ser entregue perfeitamente
acabado até ao dia 15 de Março de
1720, correndo tudo - parte instrumental e
caixa - a cargo do mestre organeiro loio, que
receberia a expressiva quantia de quatro mil
cruzados pela empreitada, ademais do órgão
velho, do qual apenas dois registos deveriam ser
aproveitados no novo. o instrumento
deveria apresentar o seguinte plano sonoro:
56
..1'i'. .J '.t ."Í ! #
..de"* ,'l* i t.
:
Assinatura do padre Lourenço da Conceição no contrato relativo ao antigo órgão do coro-alto da Sé do Porto. Fonte: ADp,
Tabelião António Mendes de Mattos, obrígaçao e FianÇa a tnteira Satist'acam elfaçaõ do orgaõ grande q.e Íez o p." Lour.," dal
Com.ço da Comgreg."^ de Sam loaõ evang.' deslta Cid." ao pRimr." de M.,, de 171gos, f . i63 v.
Oculo dolfrontespicio; Tem huã boã baçia q." Suzpendem doiz At-/Lantez de
grande Estatura; E Emsima da mesma bacia huã/Varanda feita com boã Idea: E
emcostadaz aoz piLaÍez do-/Mesmo vaõ huãs Metaz donde dezCarregaõ Seuz
Capiteiz,/ARquitravaz, frizos, Simalhaz, E por Sima das MezmaS/bõnz Rematez, E
muitaz figuraz. Toda Esta fabrica/hê feita de boã talha, e escultura, E tudo dourado
E p."/os follez Se fez tambem huã Caza ao Lado da torre,s.
Com base no acima exposto, vê-se, claramente, que se tratava de um órgão cuja
conceção estética gravitava entre as tradições organeiras norte-europeia e ibérica, embora
já dotado de uma arca de ecos e de tubos de palheta de ressoador longo dispostos em
artilharia e, por conseguinte, em certa medida, já afeito à vanguarda da organaria ibérica.
Não obstante, o contrato de construção do órgão real da Misericórdia de Viana do Castelo,
datado de g de Janeiro de rTzt'o - o órgão mudo de mesmo aspeto exterior seria erigido
pouco depois do real" -, revela, ademais de um pleno conhecimento técnico referente à
construção das palhetas em artilharia por parte do mestre organeiro loio, uma indisfarçá-
vel reserva do mesmo acerca da sua disposição horizontalmente em fachada:
57
em q.'o a rezistos de palhetaria, por outro nome: trombetas, são mt.o boas
e
estrondozas e p." o ornato de vista, e não ha dif,culdad." algüa o fazerêce athe g
variedad."'dellas, porem, não tenho visto nestes orgãos modernos q. sustente
afinação, e nem todos os organistas tem capacidad." p.. as afinar; antes pelo
contrario, estes q. agora se uzão harmadas como hartelharia desaf,nã-ce mais
por estarem ao ar,,.
Mais Entre as ditas janellaz/se abriu de cada Lado huã tribuna, ou coreto
de Maior/
grandeza, p." Muzicos, E p." os Orgaõs pequenos, q.. depoiz
Se=/puzeraõ; p." o q."
se flzeraõ Logo nellas ornatos de boã talha,/com pilares, capiteiz, Arquitravas,
5B
flizos, Simalhaz, e bõnzlrematez, com muita Escultura e Suas baciaz, e em Sima/
das mesmas boãz grades taõbem de talha'6.
O mesmo documento informa que os acessos a ambos os órgãos, bem como os recintos
destinados a abrigar os respetivos sistemas de alimentação de ar, foram realizados a
propósito durante a construção dos mesmos; do que se pode inferir que se este trata, efe-
tivamente, do primeiro conjunto de órgãos duplos inserido na presente capela-mor da
Sé do Porto, que contou, desde meados do século XVII com um órgão, instalado in cornu
Evongelii. Destes acessos, apenas subsiste, na atualidade, o correspondente ao órgão do
Evangelho, ao passo que, no que tange à casa dos foles, apenas se conserva a do lado da
Epístola:
Mais Se Fizeraõ duas Cazas p."/Os folles dos ditos Orgaõs, fundadaz Em Sima
de pillarez/de pedraria; E desta taõbem Se flzeraõ EScadaz p." aS/mesmas cazas;
E nellaz, E naz ditas Escadas Se fize-lraõ janellas com gradez de ferro, Redes, E
Vidraças'7.
Outra informação digna de nota presente na referida descrição das obras realizadas na
atual capela-mor da catedral portuense - ratificada pelo estudo realizado pelo organeiro
Dinarte Machado ao nível das próprias fontes organológicas aquando da consecução do
presente restauro dos órgãos duplos da Sé do Porto - é a compra de pau preto para os
"respaldos" dos dois órgãos, uma vez que ambas as consolas se encontravam, na origem,
localizadas na parte posterior dos instrumentos'8:
59
santos, que deixou a seguinte inscrição sobre o espelho do segundo
teclado manual do ins-
ITUMENtO: ,.FOI FEITO ESTE ORGAÕ P.'/ANTONIO
IOZE DOS SANTOS;/NO ANNO DE r869".
Não obstante se tratar, efetivamente, de uma reconstrução
do antigo órgão de Lourenço
da conceição, santos reutilizou uma expressiva quantidade
de material do órgão original,
demonstrando um notável respeito para com o mesmo, prova
da sua elevada qualidade.
António José dos santos ampliou a extensão do teclado manual
- das +5 teclas da origem
(c/D/E/F/clA/B/H/c-c"') para 54 teclas (c-f") o que,
-, evidentemente, supôs a reconstrução
integral do someiro, acrescentando também um segundo
teclado - e respetivo someiro -
correspondente a um órgão de ecos e, como era natural, diversos
registos a condizer com o
gosto musical da época. Ambos os instrumentos
foram restaurados entre 1969 e r97o pela
empresa holandesa Flentrop-orgelbouw, numa intervenção que
visou, em linhas gerais, a
conservação do que se havia encontrado, realizada sob
os auspícios da Fundação calouste
Gulbenkian3o.
De todo o acima exposto, deve-se considerar artamente
que as duas principais
inovações técnicas advindas no último quartel do século
xvII e que, junto à partição
do manual, ocorrida na centúria anterior, configuraram
as bases para a prena evolução
do órgão de tipo ibérico setecentista - a implantação
das palhetas de ressoador longo
em artilharia e a colocação de determinados registos, quando
não de um órgão inteiro,
dentro de uma arca de ecos -, embora fossem de todo conhecidas
dos organeiros ativos
em Portugal no segundo decênio do século XVIII,
ainda estavam longe de alcançar uma
sistematização efetiva, uma vez que a influência de alguns princípios
construtivos da
organaria do Norte da Europa - que, por sua vez, dão testemunho
do impacto da atividade
desenvolvida pelo flamengo Miguel Hensberg sobre os
seus prováveis discípulos, no caso
portuense - ainda dividia a cena com a vertente
organeira ibérica, tal era a convivên-
cia entre instruúentos compostos por registos inteiros partidos,
e com uma expressiva
presença de registos de sesquiáltera, e, por conseguinte,
consideravelmente influenciados
pela tradição organeira da Europa setentrional
e instrumentos mais afeitos ao cânone
da tradição organeira peninsular autóctone. Neste
contexto, é fundamental o labor do
padre Manoel Lourenço da conceição, sobremodo,
nos órgãos duplos da capera_mor da
sé do Porto, que dão um notabilíssimo impulso plena
à afirmação da escola ibérica sobre
as influências norte-europeias. Nesta perspetiva,
os dois instrumentos devem ser consi-
derados um ponto de inflexão decisivo na consolidação
do modelo de órgão ibérico em
Portugal, o qual, a partir de então, enriquecendo-se igualmente
do contributo de outros
mestres organeiros forâneos - sobretudo de origem galega3,
e italianar, -, evoluirá de forma
6o
inexorável rumo ao pleno estabelecimento, a partir do último quartel do século XVIII, de
um modelo de órgão iniludivelmente português3r.
O presente restauro, realizado com elevado critério e sensibilidade artística pelo mestre
organeiro Dinarte Machado, assumiu lucidamente o desafio de restituir individualidade
a
estética a cada um dos órgãos duplos da Sé do Porto, cada qual testemunha f,dedigna por
antonomásia de uma forma de conceber a organaria do seu tempo e apropriada à execução
de um tipo de repertório que lhe é próprio, não se furtando, contudo, a dotar o conjunto de
uma subtil unidade que só um conhecimento profundo e uma maestria técnica def,nidora
do verdadeiro ofício da arte organeira seriam capazes de conseguir, buscando a unidade
na diversidade e revelando um reflnamento e rigor que só fazem acrescentar à relevância
de um conjunto instrumental único na sua historicidade e excelência artística. Tal facto,
associado à recente revitalização do conjunto histórico de órgãos duplos da Igreja dos
Clérigos, coloca o Porto na linha fronteira da preservação do patrimônio organístico
ibérico, não apenas a nível nacional, mas também europeu, ao contar com dois conjuntos
de órgãos duplos de inequívoco valor histórico em plenas condições de uso.
Notas
6z
de ressoador longo em fachada, da mão dos artífices adscritos à escola Echevarría, chegaria em r7z5 à construção do primeiro
Cheio de Palhetas que se documenta. Realizado por Mathías de Rueda em santa Maria de Tolosa, o mesmo era composto de
Trompeta de batalla, Bajoncillo e Chirimía (m.i.) eTrompetamagna,Claríny oboe/Clarín(m.d.). Esta realização deve ser conside-
rada como um passo de grande transcendência que daria lugar à posterior sistematização do conceito, que se impôs com força
ao nível de todos os instrumentos de maior prestígio da Península Ibérica, f,cando praticamente inalterado, no seu princípio
fundamental, embora sempre tendendo a uma cada vez maior monumentalidade, até fins do século XIX.
7. A respeito do Cheío de Nasartes, num memorial relativo ao órgão de santa Maria de Tolosa, Echevarría escreveu: "siguense
los flautados, los quales no se echan con el lleno/ro - Mas lleua vn flautado muy suabe Gndatin Y con el se hacen muchas
misturas/el qual flautado-/sirue para aflnar la voz humana. Y el octauo tono viene por cesolfaut/rr - À,las lleua otro flautadillo
tapado el qual es muy necesario, para acompaf,ar a voces delicadas y delgadas/rz - ltas lleua la diferencia del nasarte mayor,
Gradatin/rl - Mas lleua el nasarte mediano, Gradatin/r4 - Mas lleua el nasarte menoÍ, Gradatin/r5 - Mas lleua la diferencia
llamada tolosana (aliâs la churumbela/cradatin)/r6 - Mas lleua la diferencia llamada claron (es bien extÍaordinaria) y que a
los que la han oydo de suspen/sion con estos Registros se foÍma vn lleno bien particular, poÍ no parecerse en nada al lleno
Principal/que lleuan los organos: el qual lleno es muy acornetado, Y es mas alauado que lo Restante que tiene el/organo por lo
extraoÍdinario Y se executan otÍas muchas misturas con dichos Registros" - AGG, escribano Juan de AstoÍq1Jiza, Memoria de
las diferencias, con sus Reqisrros que se an de executar En el organo de laYglesía Matriz de laNoble villa de Tolossa, Segun que el P.e
Joseph de Hechau(trria delinioY ordeno enlatraza de laCajaparacuiaesposicionfuellamado eld.ho P.e maestro elAfio de 168,1682,
-. A princípio, este novo coÍo conservaria a individualização de cada flleira de registos, guarnecida do seu correspondente
f. 47v.
manúbrio. No decurso do século xVIII, a acumulação de registos nasalados - clarAo, Nasardos e corneta - acarreará a busca de
novas soluções tendentes à sua sistematização, ademais de lhes facilitar o uso por parte do organista, através da submissão de
várias fileiras de registos à aÇão de um mesmo manúbrio.
8. A respeito da sobrecímbala de três f,leiras, Echevarría preconizou no memorial correspondente ao órgão por ele construído
na igreja de São João Batista de Mondragôn (t67fl: "por quanto la capacidad de la Yglesia no tener el Eco suficiente que otras/
Yglesias, es necesario Que las voces de dicho organo sean mas abultadas - pa/ra 1o qual se le an de aiadir dos diferencias para
el lleno que son importantes -/La una a de ser segundo flautado abierto, de la misma medida del flautado prin-/cipal, aunque
es Verdad que a de ser mas suspenso para las diferencias que pide el-/oido. La segunda diferencia a de ser La sobrezimbala,
tres caflos poÍ tecla/en la qual oiferencia llena La imperfecta [teÍça], como esta executada dicha »iferencia/En el organo de
san Diego de Alcala para af,nar las voces de todo el lleno del/organo". AHPG, escribano Francisco de Arescurenaga, tú Escrip.a
de oblíqacion de hazer El organo nuevo de Ia lglessío. de San luan Bap.ta de esto. villa Y su paga por El Maíordomo de su fabrícay la
d.haVilla fiadora, 1677, f. t57v.
Su
6:
35oo cruzados' Não obstânte, o contrato referente ao órgão que Hulenkampf
deveria construir até r5 de Julho de rTzz para o
antigo convento do carmo de Lisboa revela uma composição
completa, muito afeita à tradição norte-alemã, da qual inferimos
aexistênciadedoissomeirosedoiscorrespondentestecladosmanuais: princípalde12,euintadende24,outavade6,euintade
4y2' super outavade l, Flaufd de 13,
Q uinzena de z, Flautade 4y2, sísquíatta (il), Misturachea, Trombeta
deÍ2, Regalde 6, Ftauta
sonoraderz'Tapadode6,outavâde3, spisÍlautade3,Quinzenad,e2%,Nazatd,ery2,cornetad.ery2,seisquialta(rr),Dutcian
de n, Dulsaines de 6, tudo (caixa incluída) pelo preço total de
5ooo cruzados - c/. Marcello Martiniano Ferr eiÍa: Arp schnítger:
Doís orgõos conqêneres de rTor' suas destinaÇões atuais e cl.racterístícas técnicas,Niterói, edição particular
do autor, r99i (tese
dedoutoramento'InstitutoPontifíciodeMúsicasacÍadeRoma,r985),pp.214-215.
.outrosdoisinstrumentosprovenientes
da manufatura schnitger de Hamburgo são os órgãos atualmente
preservados na sé de Faro e na sé de Mariana (Minas
Brasil)' Apesar das lacunas na documentação referente cerais,
às origens do órgão atualmente preservado na sé mineira
até ao seu
envio à América Portuguesa em meados do século XVuI, o seu
escrínio protetor dá eloquente testemunho da sua destinação
original em Poftugal - uma igreja franciscana segundo as armas
da seráf,ca ordem que apresenta - e da sua datação,
próxima a do seu congénere da sé algarvia, cujo asse nto de certo
d,o Lívro dos Acórdaos da sé vacante, r7t5-Í6
de 23 de setembro de
t715' f' t7v', relata que Hulenkampf, "oficial de órgãos",
encontrava-se em Faro naquela data.,para eleger e ver o lugar
mais
conveniente' em o qual se houvesse [o] órgão que o muito reverendo
cabido tinha ordenado se mandasse fazer,,. c/.
dAlvarenga:"oórgãodasécatedraldeFaro".RuiPaiva João pedro
(ôÍgão),DietrichBuxtehude(rgz-r7o7):orgãodasécatedraldeFaro,
Lisboa' Academia de Música de santa cecília, 2oo7, (cD booklet),
apud. António Alves Alferes perei Ía: A sé de Faro 17r6-rBB:
homens e acção musícdl, Lisboa, universidade de Lisboa
- Faculdade de Letras, 2006 (dissertação de mestra do), pp- t46-t47.
r3 É de todo provável que haja existido algum laço de parentesco
entre Teodósio Hemberg e Miguel Hensberg, bem como
uma filiação profissional entre aquele e este. Dois contratos
de construção de novos instrumentos atestam a sua
conceção
organeira' caracterizada pela busca de um compromisso
entÍe as tradições norte-europeia e ibérica. A 2r de Novembro
de
r725' Hemberg passou o contrato para construção do órgão
das carmelitas oescalças de cuimarães, instrumento
composto
deumFlautadoabertodeD,oitavqde6,Quintade4,oitavadel,Quíntadez,sesquiáttera(t;
registopartido), sesquíáltera(tv;
registo paÍtido), Misúura (Iv; registo partido), Tambor (II),
caixa em forma de armário, teclado de 45 teclas, dois foles _
c/. D. de
PinhoBrandão: obradetalhadourada,ensamblagemepinturanacídadeediocesed.oporto:Documentaçd.oII,r7ooarz2s,poÍto,
câmaraMunicipaldoPofto, Íg85,pp.718-720-.A3odesetembroderT3zfoipassadoocontratorelativoàconstruçãodoórgão
do convento de são Domingos do Porto, devendo o instrumento
compo Í'-se de Flautado d.e 12, oítavad.e 6,
de 3' Quínta de 2, sesquíáltera (V; m.e. e m.d.), sesquiáttera (IV; euintade 4, oítava
m.e. e m.d.), sesquiáltera(Ill; m.d.), Místurd (IV; m.e.
e m.d.),
Trompeta magna de 12 (m.e.), Baíxao de 6 (m.e.), clarim
de r2 (m.d.), segundo clarim de 12 (m.d.), Dulçaina de r2, ,,toda
a tÍom_
petaria será armada de artilharia por fora em seus varões
de ferro". o teclado teria a5 teclas, e o instrumento
deveria ter 3 foles
correntesou2grandesadependerdoespaçodisponível.cíD.depinhoBrandão,
obradetathadourada...,1986,pp.z4L 25o.
14 4 respeito de frei Manuel de são Bento não se conhecem
mais do que dados de cariz biográfico. Nascido em r683 em
(Arouca)' o seu nome de batismo era Manuel da costa Fermedo
Pinto. A 20 de Dezembro de r7o9, altura em que residia em
Braga, foi
admitido no seio dos beneditinos como irmão donato, graças
às suas capacidades como construtor de órgãos. Faleceu
Mosteiro do salvador de Paço de sousa a r5 de Março de r757. no
A sua principal obra, o órgão do antigo Mosteiro de
são Bento da
vitória do Pofto' um dos raros instrumentos de primeira espécie
nassarriana em portugal, passou por diversas remodelações,
1758-1761' 1783-1786 (atribuída ao frei Domingos de
são José varela), r88o (António
José dos santos), tendo sido o plano sonoro
de r786 restituído na restauração do instrumento levada
a cabo por pedro cuimarães (r999-2oor): a) órgão
crande, teclado
superior' 54 teclas (c-f"'): mão esqu erda - Flautado de 24, Flautado
de 12, Borddo de:l,-, Diapasao de 12, oítava de 6, Tapo.do d.e
6, Dozena, Quinzena, Dezanovena, ctarão (llr), címbata (v),
Trombeta real, Doiçaína,Barxao - e mão d iÍeita _ Flautado
d,e 24,
Flautado de 12, Flauta alemd de12, Flauta d.e r2,vozhumanad.e
12, oit(lvad.e 6, Flautímd,e 6, Dozenad,e 2,
euinzena de z,Demnovena
Qrl) ' corneta imperial (vlr), címbala (v), clarim, DolÇaina, oboé
-; b) órgão de ecos, teclado inferior: mão esquerda Bordao
-
deÍ2,oitavareald.e6,Dozena,Quinzena,Dezanovena,cheia(lr),Dolçaina-,emãodireita
-Flautad.od.e12,Flautad.ocede12,
oitavarealde4,DozenaeQuinzena,corneta(v),ctarím-;c)Registosdeadorno:passarinhos,2Tambores,2Guízos.cÍ.pedro
Guimarães von Rohden: "o órgão de tubos da igreja de
são Bento da vitória no porto e o seu restauro,,, patr imónio
2oo2, pp. r60-r63.
- Estud.os,2,
15' segundo Manuel valença, o padre Manoel Lourenço
da conceição professou na congregaÇão de sãoJoão
Evangelista (convento
dos Loios do Porto) Desligou-se dela e passou a utilizar
o nome de padre Lourenço de sousa. Viveu à Rua do paraíso porto. no
Manuel Valença: Árte organística em portugar: c. 1326-1750, Mottariol, Editorial Franciscana, r990, v.r, p.
259.
t6 SegundoainformaçãosistematizadaquefiguranowebsitedosIpA*sistemadeInformaçâoparaopatrimónioArquitectónico
- http://www'monumentos'pt (cons ÚlÍado a r4/C,3/r7) -, é possível referir a seguinte cronologia
histórica relativamente aos
6a
órgãos da Sé do Porto (sécs.xvl-xx): 1537/1538 - HeitoÍ Lobo constÍói um órgão por r5o$ooo; 28 de Maio de 154o - pagamento
a Heitor Lobo pelo consefto dos órgãos; r54o - referência a um pequeno órgão que estaria na Capela de Nossa senhora do
eresépio; 1558 - Heitor Lobo reforma do órgão do coro-alto, introduzindo "doçainas, charamelas e orlos"; 5 de Setembro de
1564 - conserto dos órgãos por Heitor Lobo; 24 de Agosto de 1571 - consefto dos órgãos por Heitor Lobo; 1587 - aflnação dos
órgãos porAmbrósio de Ponte; meados do séc. xVll - colocação, ao lado do Evangelho, de um órgão na capela-mor; r de Março
de 1719 - contrato com o padre Manuel Lourenço da conceição para a execução de um órgão novo para o coro-alto pela quantia
de 4.ooo cruzados; zo de maio de r719 - Sebastião Fernandes, Manuel FerreiÍa, Manuel do Couto e Marcos Rodrigues de Novais
recebem a quantia de 7o$oo relativa à execução da casa dos foles do órgão do coro-alto e escada da torre; 1719/u26 - execução
do órgão e do novo coro-alto construído em pedra a propósito da sua implantação; u25 - Manuel Pinto Monteiro e Luís Correia
douram o órgão do coro-alto; r7z5l1726 - o mestre Manuel Carneiro Adão executa quatro imagens para as varandas do órgão;
1726 - acrescento dos ecos no órgão do coro-alto; zz de Fevereiro de 1727 - r6 de Maio de u33 - substituição do antigo órgão do
lado do Evangelho da capela-mor; pagamentos ao padre Manoel Lourenço da Conceição relativos à construÇão dos dois novos
órgãos da capela-mor; 4 de Março dei27 - 2o delaneiro de u28 - pagamentos a Luís Pereira da Costa pela execução das caixas
dos órgãos da capela-mor; 173o - construção da caixa do órgão f,ngido da Capela de são vicente; 1738 - Teodoro Hensberg
acrescenta um dos órgãos da capela-mor; 1869 - reconstrução do órgão do lado da Epístola da capela-mor porAntónio José dos
Santos; 4 de MaÍço de í966 - a Fundação Calouste culbenkian manifesta à DGEMN o seu interesse em promover o restauro
dos órgãos da Sé; Outubro de r97o - as peças dos órgãos, restauradas pela empresa Flentrop-orgelbouw, já se encontram em
Poftugal; 8 de Dezembro de 1980 - primeira referência à intenção de se colocar um novo órgão no coro-alto; 1981 - o coro da
Sé Catedral do Pofto responsabiliza-se pela construção do novo órgão do coro-alto; z3 de Abril de r982 - constituição de uma
comissão executiva paÍa aquisiÇão do órgão, formada pelos responsáveis do Coro da Sé, do Seminário Maior, do Concelho
de Leigos da Diocese, da Associação Comercial, da Associação Industrial, da Fundação Engenheiro António de elmeida e da
Juventude Musical Portuguesa; 22 deJulho de r983 - celebração do contrato para a construção do novo órgão do coÍo-alto entre
o Cabido e a firma alemã orgelbau-meisterbetrieb ceorgJann; Junho/Agosto de 1985 - instalação do novo órgão do coro-alto; r9
outubro de r985 - inauguração do novo órgão do coro-alto. Ampliando esta cronologia até ao século XXI, deve-se acrescentar:
201612ou - restauro crítico dos órgãos da capela-mor pelo mestre organeiro Dinarte Machado.
1z Arquivo Distrital do PoÍlo (AoP),llt4lz -42, Tabelião António Mendes de Mattos, obrigaÇaõ e Fiança alnteíra Satísfacam e/façaõ
do orgaõ grande q." íez o P." Lour.' da/Com.ç ^ dacomgreg.*'de Sam loaõ evang.'des/ta Cíd." ao pRimr." de M.'" de r7ry"', f . Í63Í.
18. lgnora-se a data de desaparecimento do antigo órgão grande da Sé do Porto.
19. ADP, Mitra da Sé do Porto, Klz6/6/4 - r93.2or, Doc. Í, Estracto das Obros q.e Se=/rtzeraõ na Sê do Porto, E daz Maíz a ella per=/
tencentez, f. 7t.
20. Segundo o qual a composição do instrumento erai Flautado de D, Flautado de 6, Quinta de 4, Tapado de 1 de m.e. e Flauto
aberta de m.d., Quinzena de j, Requínta de z, víntedozena de ry,, Sesquiáltera ot Tresquiá,ltera (V), Mistura (Iv m.e. /v m.d.),
Tapado de om.d. "e serâ sô na mão direlta p.'adoçar os Tiples, e na mão esquerda não o levará, por q. faz as vozes fúnebres".
José Rosa de AÍaijo: A lgreja da Santa casa da Misericórdia de víana do castelo, viana do Castelo, Edição da Santa Casa de
Misericórdia, 1983, pp. 6r-62.
zr. 'Aos três dias do mês de Z.bro do anno de mil sete centos e vinte hü nesta notavel V.a deVianna fos do Lima etc. no Concistorio
desta S. Casa da Miz.a estEndo em Mesa o Provedor della Francisco Vieyra Guedes e mais Irmãos abaixo asinados p.lo d.o
Provedor foi proposto parecera mui conveniente à perfeição da Igreja e boa regularid.e das suas obras se fizesse por corres-
pondência hüa Caixa prespectiva do órgão verdadr.o p.a a outra p.te do Coro p.a a qual tinha hü bom oficial esculptor q. se
ofrecia a fazella com mt.o cómodo e augmentar alguas perfeiçoins ao órgão verdad.o e dita Cayxa do q. mt.o carecia nos seus
fundam.tos por ter f,cado mt.o liza e sem obra algüa". J. R. de Araújo, op. cít.,p. 64.
22. Id., tbid., p.62.
23. ADB Mitra da Sé do Pofto, Kh5l6 - 8, f. r8ZÍ.
24. D. de Pinho Brandão, Obr(t de talha d.ouro.da..., 1986, p. 88. Na mesma documentação estudada por Pinho Brandão, encontra-se
igualmente um pagamento realizado a r5 de Janeiro de r728 digno de especial nota: "Paguei ao P. M." da Capp.'P." Luiz da S.4
oitenta/e Seis mil e quatÍo centos r's, p.'pagam.t'de/hum cravo p.' a Sé", instrumento que deve ter sido utilizado pelo coro
enquanto os órgãos não eram dados por concluídos. ADP, Mitra da sé doPoÍto,Kl26l6l5, Doc. 89, i 8lr.
25. D. de Pinho Brandeo, obra de talha dourada..., 1986, p. 88.
26. ÀDP, Mitra da Sé do Porto, Klz6l6/a - r9l.2or, Doc. t, Estracto das Obrcs q.' Se=/frzeraõ na Sê do Porto, E daz Maiz a ella per=/
tencentez, f. 2t.
27. Id., Ibíd., loc. cit.
6S
28. Ademais disto, a consola do órgão da Epístola é afeita ao estilo Dona Maria I, assim como abalaustrada dos varandins de ambos
os instrumentos, o que evoca a hipótese da inversão das duas consolas na época em causa; reforma esta não documentada
ao nível filológico, mas muito evidente na caixa do instrumento em causa e em ambas as tribunas, ao passo que a consola do
órgão do Evangelho mantém o estilo joanino original do resto da caixa.
29. ADR Mitra da sé do Porto, K/26/61 a - r9t.2or, Doc. \ Estracto das obras q." Se=/frzeraõ na Sê do Porto, E daz Maiz a ell(t per=/
tencentez, ff. zÍ., iÍ.
3o. A composição do Órgão do Evangelho resultante desta intervenção foi: extensão (ClDlElFlGlAlBl}flc-c"') - Flautado deD,
Flautado de 6, Dozena, Quinzena, Cheio (lV N; m.e./m.d.), Címbala (lv', m.e./m.d.), Recímbala (lv), Charamela (m.e.), Orlos em
artilharia(m.d.), CIarim em artilharia (m.d.) -. No que tange ao Órgão da Epístola, a composição restituída foi a seguinte:
a) Órgão pÍincipal: mão esquerda (C-c') - Flautado aberto de n, violão d,e rz, PrestAo de 6, Bordão de 6, Dozena, Quinzena,
Dezanovena, Clarõ.o (v), Cheio (III), Címbala (V),'trombeta, Oboé em aÍtilharia - e mão direita (c's-f"') - Flautado aberto de D,
Flauta doce de 12, Flauta travessa de tz, Voz humana, Flautado de 6, Prestão de 6, Flautím de 6, Dozena (Il), ChrAo 0V), Cheio
(ilt), Címbala (v), Corneta, Trombetaem artilharia, oboé em artilharia -; b) órgão de ecos: mão esquerda (C- c') - Bordõo de D,
Borddo de 6, Quinzena, Cheio (lv), oboé - e mão direita (c's-f"') - Flautado aberto d,e D, Prestão de 4', voz humano, Cheio (v),
oboé -. cí. htlpl/ lww.flentrop.nl/restauratie/ (Consultado a r4lo3lr7).
31. Cujas f,guÍas de proa incontestáveis na primeira metade do séc. XVIII foram o valisoletano Dom Benito Gómez de HeÍrera
e o galego frei Simón de Fontanes. Ambos foram os principais responsáveis pela introdução efetiva em Poftugal da escola
Echevarría de organaria. O primeiro desenvolveria uma arte muito pessoal e ao mais alto nível técnico e estético - consi-
deravelmente influenciado pelo paradigmático óÍgão erigido pelos frades franciscanos Joseph de EchevaÍría e Domingo de
AguiÍre na Catedral de Palencia (r688-r69r) -, legando instrumentos como os órgãos de Santa Cruz (reconstru ção, r71g-r724) e
da capela da Universidade de Coimbra (r732-r733), bem como o do Convento de Arouca (r739). O segundo, oblato do Convento
de São Francisco de Santiago de Compostela, instauraria nos órgãos duplos da Sé Primacial de Braga G737-39) uma incontor-
nável simetria visual e sonora, a raiz da qual alguns organeiros de origem galega, com absoluto destaque para Juan Fontanes
de uaqueira - cuja obra máxima é o excecional órgão de z4 palmos em fachada da Igreja de São Vicente de Fora de Lisboa
(r765) - e Francisco António de Solha - mestre organeiro que da sua oficina de Guimarães dominou o panorama organeiro do
Norte de Portugal na segunda metade desta centúria -, que através da sua atuação desenharão, do Minho à Lisboa, a definitiva
e inexorável expansão da escola Echevarría em território poftuguês, cuja conceção organeira, até finais dos setecentos,
secundara de forma decisiva.
32. Para além da importação de instrumentos, sobretudo, positivos, vindos de Itália, a atividade exercida no Alentejo e no Algarve
desde os anos r74o por Pasquale caetano Oldivini (Gênova, ? - Évora, 1785) deve ser altamente considerada. Para além da
reconstrução do órgão da Sé de Faro em decorrência dos sérios danos advindos do terramoto de r255, Oldovini construiu, entre
diversos realejos ou instrumentos de pequenas dimensões, os órgãos fixos das catedrais de Évora (capela-mor, r758) e Elvas
(r762) e dos Conventos do Carmo e de São FÍancisco (c.r7ao) de Évora. A conceção organeira de Oldovini pode ser sintetizada
da seguinte forma: a) emprego de someiros diatônicos, com a colocação dos tubos maiores a ambos os flancos do mesmo,
colocação do meio registo de m.e. de Trompete sempre na parte posterior do someiro e do CIarim de m.d. em artilharia sobre a
fachada, construção de someiros complementares paÍaos Cofttrabatxos de z4 palmos; b) preponderância dos registos inteiros
sobre os partidos,.dos quais a grande maioria é de mão direita; c) manutenção da conceção italiana ao nível dos cheios, Ripieno,
compostos poÍ registos independentes, por vezes de duas f,leiras; d) presença da Voz Humana nametade aguda do manual,
registo labial ondulante e, como tal, típico da tradição organeira italiana; e) teclado manual de 45 teclas, excecionalmente, 47
teclas (C/D/E/F/G lAlBlH-c-d"'i Sé de Elvas, conventos do Carmq e são Francisco de Évora) - partido à italiana, entre h e c' (siz
e dó3) nos instrumentos dos conventos do Carmo e de São Francisco de Évora - e existência ocasional de um segundo teclado
paraaCorneta de (catedrais de Elvas e Évora); f) oito pisantes acoplados à primeira oitava do teclado man]dâl (clDlF./F lG/
ecos
A/B/H). Acerca da produção instÍumental de Pasquale Gaetano Oldovini, CÍ João Paulo Janeiro: "Pascoal Caetano Oldovini:
a actividade de um organeiro genovês no Sul de Portugal, no século XVIII', organi Ligurí - Rívísta Annuale dí Iníotmazione e
Documentazíone org(místíca e organaria, zoo), s/n.
33. Segundo o eminente organista e musicólogo João Vaz: "actualmente, embora não se disponha de um inventário oflcial do
património organístico poÍtuguês, existe informaÇão suf,ciente para fazer uma comparação genérica entre os instrumentos
constÍuídos em Portugal e Espanha durante a segunda metade de setecentos, e de Íeconhecer a introdução, ao longo daquele
período, de significativas alteraçÕes na organaria poftuguesa que viriam a transformar a sua imagem, distinguindo-a def,niti-
vamente da factura espanhola" - Joã.ovaz: A obra para órgdo de Fr- Iosé Marques e Sílva (U82 tgil e o fim da tradiÇão organísticq
portuguesanoAntígoRegime,Évora,UniversidadedeÉvora,zoog(tesededoutoramento),v.r,p.r48.Emlinhasmuitogerais,
66
a característica mais evidente do modelo de órgão tipicamente poftuguês é a presença generalizada de pistões ou pedais para
ativar/anular as seções do someiro reservadas aos cheios e, porvezes, às Palheúas, favoÍecendo uma imediata alternância entre
o Flautadoloítava e os Cheios possibilitada por uma engenhosa economia de meios e presente, inclusive, em instrumentos
de dimensÕes bastante reduzidas: "o tipo de cheio pretendido era preestabelecido na consola, sendo o momento da sua
efectiva introdução deflnido através da acção do pedal ou estribo. O organista podia, assim, alternar constantemente entre
os patamares dinâmicos fofte e piano sem que isso peÍturbasse o trabalho das mãos no teclado" - J. vaz, Á obra para órgão de
Fr.losé Marques e silvd..., v. t, p. rS4 -. Para além disto, é de se ter na mais alta conta a presença do Íegisto labial ondulante de
voz Humana nos ôrgãos portugueses: "embora não se possa atribuir com segurança a oldovini a introdução em Portugal da
voce umana, o facto é que a colocação deste registo na região da 'mão direita' se popularizou, passando a ser extremamente
comum em órgãos construídos poÍ organeiros portugueses a partir da segunda metade do século XVIII e vindo a tornar-se uma
das marcas distintivas da organaria poftuguesa em relação à sua congénere espanhola" - l. vaz, A obra para órgão de Fr. Iosé
Marques e Silva...,v. r, p. r5o -. Este modelo instrumental, cuja gênese correspondia certamente à uma demanda musical deter-
minada, encontra a sua melhor tradução na obra do frei José Marques e Silva (Vila Viçosa, rZ82 - Lisboa, r837), que apÍesenta
rápidas alternâncias de registação originalmente grafadas pelo compositor: "a escrita para órgão de Fr. 1osé MaÍques e Silva
- e, por extensão, a dos organistas portugueses seus contemporâneos - revela uma completa adaptação aos instÍumentos
portugueses da época, fazendo regularmente uso de algumas características inovadoras da organeria portuguesa de flnais do
século XVIII. É lícito, pois, af,rmar que Portugal assiste nos f,nais do século xVIII, através da acção de organistas como FÍ. José
Marques e Silva e de organeiros como António Xavier Machado e Cerveira ou Joaquim Antonio Peres Fontanes, ao desenvol-
ver de uma forma diferente de conceber a música para órgão que, sem quebrar uma continuidade de séculos, se afastou dos
modelos espanhóis ao absorver gradualmente influências italianas (tanto no plano musical como organológico) e que veio a
sucumbiràs com,ulsões políticas e sociais provocadas pela implantação deflnitiva do tiberalismo, à eliminação das entidades
promotoras da música sacra no Antigo Regime e às consequentes mudanças operadas no gosto musical português" - Frei José
Marques e Silva, Obras completas pl.ra órgão, Porto, Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes/Universidade
Católica Portuguesa, 2orr (introdução e edição crítica de João Vaz), p. 8 -. Para um maior aprofundamento no tema, C/.,
igualmente, l. Vaz: "Dynamics and orchestral effects in late eighteenth century Portuguese oÍgan music: the works oflosé
Marques e Silva (r782-r837) and the organs of António xavier Machado e cerveira (r756-r828)". Andrew wooley, John Kitchen
(eds), Interpretíng historicalkeyboard music: sources, contexts and períormace, Farnham, Ashgate Publishing,2otS, pp. t57-172.
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