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ESCOLA

SUPERIOR
DE EDUCAÇÃO
POLITÉCNICO
DO PORTO

L LICENCIATURA
Educação Musical

Órgãos portuenses: particularidades


e principais instrumentos
Ana Torres
Sara Pereira
Emanuel Garcês
José Marques

01/2024
1. Órgãos Portuenses

A cidade do Porto é bastante rica no que diz respeito à cultura organística. É um dos três
concelhos com mais extenso portefólio de instrumentos do género e históricos em Portugal,
sendo a cidade portuguesa com maior número de grandes órgãos nos últimos 50 anos.
Contribuem para o culto da população e são instrumentos que constituem obras de arte
barroca. Assim, o órgão tem uma importância inegável, como refere Robison Smith: “Os
órgãos simbolizam, no mais alto grau, a pompa e a grandeza do barroco. Hoje existem, pela
maior parte, num estado lamentável de abandono, sendo raríssimos os que funcionam, ainda
que parcialmente invulgares os que guardam toda a sua talha primitiva” (A Talha em Portugal,
Lisboa, 1962, p.167). Como no Porto os órgãos são muitos, ainda hoje o seu número não é
desprezável.

2. Órgãos da Sé do Porto

Na cidade do Porto, os órgãos não são muito recentes. Na Sé já existia na velha charola
românica (ou deambulatório) um órgão do século XII. Contudo esta desapareceu para dar
lugar à atual capela-mor.

Já na época de Frei Baltasar Limpo bispo do Porto de 1537 a 1550, o organeiro Heitor Lobo
contratou a construção de dois órgãos para a Sé, estando concluída a sua construção no ano
de 1538.

Estes órgãos sofreram restauro pela mão do mestre e organeiro português: Dinarte Machado.
Dada a relevância do conjunto de órgãos da capela-mor da Sé Catedral do Porto no contexto
dos órgãos históricos portugueses, a intervenção aconteceu de acordo com uma linha de
restauro crítico, apoiando-se na investigação e interpretação da documentação histórica
existente sobre os instrumentos e num estudo profundo das próprias fontes organológicas
históricas em causa.
Existe o órgão do Evangelho e o órgão da Epístola.

ÓRGÃO DO EVANGELHO

A nível de registação, o órgão do Evangelho dispõe, na mão esquerda, recímbala a 4 vozes,


címbala de 4 vozes, cheio de 5 vozes, dozena, charamela, dulçaina e fagote. Já na mão
esquerda dispõe de recímbala de 4 vozes, cheio de 5 vozes, 15ª e 19ª, flautado de 6 aberto,
flautado de 12 aberto, orlos e clarim. Ou seja, possui apenas um teclado e não tem pedaleira.
Este instrumento foi construído pelo Padre Manuel Lourenço da Conceição. Na parte inferior
do bastidor dos tubos labiais da parte central encontra-se uma inscrição com a data de 1730,
o que leva à conclusão de que este órgão terá sido construído entre 1727 e 1733. Embora
tenha sido submetido a algumas intervenções ao longo da sua história, está num estado
próximo à sua conceção original. Tem dois foles cuneiformes colocados na parte superior do
instrumento, ou seja, num terceiro plano da vertical, a partir da tribuna na qual o mesmo está
assente. Os tubos labiais e de palheta foram restaurados a fim de reparar a instabilidade das
soldaduras, mas foi mantido tal e qual como estava antes da intervenção. Em termos de
afinação, o diapasão utilizado (442.8 Hz) teve em conta a afinação suportada pelos tubos tal
como se encontravam. O temperamento desigual utilizado adequa-se à medida dos tubos do
instrumento, tendo sido definido em função do órgão fronteiro.

ÓRGÃO DA EPÍSTOLA

Este órgão também foi originalmente construído pelo Padre Manuel Lourenço da Conceição
entre 1727 e 1733 e completamente reconstruído por António José dos Santos, que aumentou
a extensão do teclado de 45 para 54 teclas, acrescentando um segundo manual
correspondente a um órgão de ecos e pisantes anuladores de cheios e palhetas horizontais.
No órgão principal, em termos de registos, dispõe de címbala de 5 vozes, cheio de 3 vozes,
clarão de 5 vozes, 19ª e 22ª, quinzena, flautado de 6 tapado, dozena, flautado de 6 aberto,
flautado de 12 tapado, flauta em 12, trombeta e fagote na mão esquerda, e címbala de 5
vozes, clarão de 4 vozes, cheio de 3 vozes, flautado de 6 tapado, flautim, flautado de 6 aberto,
corneta de 6 vozes, flauta doce, voz humana, flauta travessa, flautado de 12 aberto, clarim e
oboé na mão direita. Já no órgão de ecos, tem bordão, flautado de 6 tapado, quinzena, 19ª e
22ª, cheio de 4 vozes e oboé na mão esquerda e, na direita, flautado de 12 aberto, voz
humana, flautado de 6 aberto, flautado de 6 tapado, cheio de 5 vozes e oboé. Com o restauro,
foram construídos dois novos foles cuneiformes, segundo as medidas originais, em
substituição do fole paralelo que se encontrava na respetiva casa dos foles. Este instrumento
dispõe de um conjunto de tubaria composto por 1705 tubos. No que diz respeito à afinação,
o diapasão usado (442.9 Hz) teve em consideração a afinação suportada pelos tubos tal como
se encontravam antes do restauro, tendo sido o temperamento definido conjuntamente com
o órgão fronteiro.

3. Órgão de S. Bento da Vitória

No final do século XVIII, a cidade do Porto foi centro construtor de órgãos. O órgão da Igreja
de São Bento da Vitória, possui um órgão histórico ibérico da autoria de Frei Manuel de São
Bento (c.1720) e restaurado em 2001 pela Escola de Organaria de Pedro Guimarães e Beate
von Rhoden. Este órgão exerceu uma notável influência naqueles que foram construídos no
Norte durante o século XVIII.

Este instrumento dispõe de 5 grupos de tubos, sendo que três desses grupos estão projetados
em forma curva sobre uma varanda ornamentada com atlantes (figuras masculinas
esculpidas). A varanda é da autoria do mestre Gabriel Rodrigues. As suas trombetas estão
dispostas horizontalmente e é bastante rico em talha dourada.

O órgão de São Bento da Vitória é uma verdadeira orquestra em si, com sons que incluem
flautas, violões, trombetas, címbalos, clarins, cornetas e até vozes humanas. Todo este
conjunto de sons é abrigado num único e complexo instrumento, com uma estética barroca
que inclui caixas, varandas e torretas em talha dourada, além de uma pintura colorida nos
tubos, decorados com aves fantásticas, cúpulas e brasões. Contém dois teclados e não tem
pedaleira.
Assim, é conhecido pela sua decoração exuberante e elaborada, refletindo o estilo barroco.
Este tipo de instrumento costuma usar uma ação mecânica na qual as teclas estão
diretamente ligadas aos tubos, permitindo um controlo mais direto e sensível do som.

4. Órgão da Igreja dos Terceiros Franciscanos

A grandiosa Igreja da Venerável Ordem Terceira de São Francisco, conhecida também como
dos Terceiros de S. Francisco, ostenta no seu interior um órgão histórico de estilo ibérico,
meticulosamente projetado por Manuel de Sá Couto e construído em 1801.

A encomenda deste órgão foi feita no dia 20 de novembro de 1799 através de um contrato
que dizia que Manuel de Sá Couto deveria entregar o órgão à Ordem até o final de fevereiro
de 1801.

Este instrumento foi concebido com madeiras secas, estanho e chumbo do melhor. Dispõe de
oito registos para cada mão. Segundo a cláusula 11 do contrato celebrado entre a Ordem e o
Organeiro, este deveria desmontar, limpar e afinar o órgão durante 3 anos. Ficou ainda
estipulado um plano rigoroso para a confeção do instrumento. Assim, para a mão esquerda o
instrumento deveria dispor de um flautado, uma oitava real, tapadilho, quinzena, dozena,
clarão de cinco vozes, símbala de 3 vozes e baixãozilho. Já na mão direita, teria de ter um
flautado, flauta napolitana, voz humana, flautim, oitava real, corneta inglesa de seis vozes,
símbala de 3 vozes e clarim. Este conjunto seria comandado através de um pedal que tapa
todo o cheio harmónico, permanecendo só o flautado de 12 e 6 e a oitava real na mão
esquerda e o flautado de 12, flauta napolitana e flautim na mão direita.

Contudo, Manuel Sá Couto decidiu que estes não eram suficientes, acrescentando na mão
esquerda um violão que seria posto fora da caixa dos ecos e a oitava do violão, para servir de
fundamento ao outro e na mão direita um flautado de 12 agudo, um cornetilho com quatro
por ponto, oitava agudíssima e quinta sobreagudíssima e uma trombeta real para acompanhar
com rebecas.
Devido às alterações efetuadas, o instrumento passou a ter mais um fole, dispondo de três.

5. Órgão da Igreja da Misericórdia

A Igreja da Misericórdia do Porto abriga um órgão histórico notável, equipado com um teclado
manual e pedaleira, contendo vinte meios registos [I+P (10+10)]. O órgão instalado no coro da
igreja é de estilo e carácter ibérico e foi construído em 1888 por António dos Santos, organista
português de Mangualde que reaproveitou elementos de instrumentos anteriores. Foi objeto
de inventariação e proposta de restauração pela Oficina e Escola de Organaria de Pedro
Guimarães e Beate von Rohden, com sede em Esmoriz, no ano de 1996.

A caixa do órgão desta igreja foi contratada por Bento Ferreira imaginário e ensamblador. José
da Fonseca Lima foi o entalhador e foi tudo dourado pelo pintor-dourador Francisco José
Ferreira. Mais tarde, a Santa Casa tencionava construir um novo órgão para a sua igreja em
1871.

Possui um teclado de 58 notas, 20 faixas de semitom e vibrato e pedal de 13 notas, totalizando


1013 tubos. É um instrumento com uma vasta gama de comandos e um alcance único que não
é comum entre os órgãos de tubos portugueses de médio porte desta época. É constituída
por uma estrutura escultórica neoclássica com o brasão da Basílica da Misericórdia do Porto
no topo.

6. Órgão da Igreja de São Lourenço (Grilos)

A Igreja de São Lourenço, também conhecida como Igreja dos Grilos ou Igreja do Colégio,
alberga um histórico órgão de tubos de estilo ibérico com teclado manual [I;(14+14)] (c. 1785),
construído em 1998 Oficina e Escola de Organaria, restaurada por Pedro Guimarães e Beate
von Rohden em 2007.

A nível de registação, dispõe, na mão direita um flautado principal, voz humana, flauta doce,
flauta travessa, oitava real, corneta real de 7 filas, flautim, dozena, 15ª composta, clarão de 4
vozes, címbala de 5 vozes, trombeta magna, clarim e oboé. Já na mão esquerda, dispõe de
dois flautados principais, flauta doce, duas oitavas reais, 12ª, 15ª, 19ª, 22ª composta de 3
vozes, clarão de 4 vozes, címbala de 5 vozes, trombeta de batalha, baixãozilho e cornetilha.

7. Órgão da Igreja de Santo Ildefonso

A Igreja Paroquial de Santo Ildefonso, situada num local de significativa importância histórica
e cultural, abriga no seu interior um notável tesouro musical: um magnífico órgão de tubos
histórico de dois teclados manuais, cuja autoria é atribuída a Manuel de Sá Couto. Este
instrumento, construído no ano de 1811, representa não apenas uma expressão artística
notável, mas também uma peça fundamental na rica tradição musical da igreja. Em 2006, um
esforço dedicado à preservação do património cultural tomou forma quando o órgão passou
por um minucioso processo de restauração. Esta tarefa foi empreendida pela Oficina e Escola
de Organaria, sob a direção de Pedro Guimarães e Beate von Rohden, resultando no
ressurgimento do instrumento à sua antiga glória.
Referências Bibliográficas

COUTINHO, Xavier. Órgãos, Organeiros e Organistas da Cidade do Porto. Porto: Secção da


COOP. Povo Portuense, 1971;

COUTINHO, Xavier. Boletim da Associação Cultural Amigos do Porto: Órgãos do Porto. Porto:
Tip. Da COOP do Povo Portuense, 1971.

SANTOS, António Francisco et al. Restauro dos órgãos da Epístola e do Evangelho da Sé


Catedral do Porto. Porto: Cabido Portucalense, 2017

Webgrafia

https://www.meloteca.com/orgaos-do-distrito-do-porto/

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