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e-MI o Cru so : o gomiflcoçõo aplicado m

e espaços de convivênc io ........................................................................... 179

9 . Ataqu e cyb erbiológico: gomificoçõo e realidade


aumentado aplicados em museus .......................................................195 INTRODUÇAO -
1 o . Picos e vales: gomificondo uma aula STEAM ..........................205
CLIFT, CLOFT, STILL,
11 · Educoflix: como o gomificoçõo pode
transformar suas aulas em um seriado do Netflix ...................... 219
a porta se abriul
12. Closs Dosh: o ensino híbrido gom ificodo ................................. 231

13. Aprendendo o criar badges, cortas e avaliações


gomificodos .......................................................................................................263

PRLRIJRRS FltlRIS ............................................................................................. 279


bordão dito por um ser mecânico sinalizava que o visitante
havia seguido as instruções ou adivinhado a senha do dia: pu-
lar cm um pé só, imitar estátuas famosas, falar palavras começando
· m a letra b ou citar derivados do leite. Ao menos, na minha
memória, o porteiro do Castelo Rá-Tim-Bum 1 foi o primeiro per-
s nagem que vi utilizando na prática o conceito que abordo ao
ngo deste livro: a gamificação.
Na minha infància, o programa era uma porta de acesso a
um universo mágico, recheado de personagens, histórias e confli-
tos que não existiam no meu mundo real. Eu vibrava quando o
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Mau, uma criatura roxa, corria pelos encanamentos do castelo e,
dentro de sua toca, me desafiava a repetir trava-línguas. No lustre
do Castelo, as fadinhas Lara e Lana me deixavam curioso com os
inúmeros enigmas que apresentavam.
Depois de quase trinta anos, ainda me lembro do quão rico e
educativo era o Castelo Rá-Tim-Bum. Mas jamais imaginava o poder

1. Castclc> Rá- 'J'im-811111 é uma série de tcl('visão in fa ntojuvrn il produzida e exibida pcb TV C ultura entre
1994 ,. 1997 . A criação é de Cao l lan1bur~<T e F'l ávio de Souza .
T1AGO EuGENJO RULR EM JDGD

de influência que seus quadros exerceriam sobre a minha vida como Em 2007, no último ano da licenciatura em ciências biológi-
professor. Sempre apostei no lúdico, no inimaginável e no uso de re- cas, tive a oportunidade de perceber e experimentar o poder dos
gras e desafios para transformar uma experiência de aprendizagem em elementos dos jogos na educação. Na ocasião, a professora de Didá-
algo mais envolvente e motivador. Esse foi um dos mais importantes lica de Ensino de Ciências, doutora Lúcia Maria Paleari, organizava
aprendizados extraídos das centenas de horas investidas no acompa- uma exposição chamada Experimentando Ciência, em que os li-
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nhamento das aventuras de Nino, Zequinha, Pedro e Biba. ·cnciandos desenvolviam um projeto de divulgação científica e,
Muitas aulas gamificadas que crio são baseadas em memórias da em seguida, preparavam para mostrá-lo, didaticamente, a toda a
minha infància: dos programas educativos da TV Cultura aos pro- romunidade na forma de instalações. O Experimentando Ciência
gramas de plateia do SBT apresentados por Silvio Santos. Quem não l ra temido por muitos estudantes devido ao alto nível de exigência

se lembra do programa Tentação?3 Ali existiam regras interessantes, e da professora Lúcia, mas lembro muito bem de que minha turma
os participantes eram testados com perguntas de conhecimento ge- de graduação gostou do desafio e entrou de cabeça no projeto.
ral. Ainda nesse quesito, o programa Show do Milhão ia mais longe. Na minha vida, considero que já existiram vários "Clift, cloft,
No entanto, o que guardo mesmo na memória e utilizo em minhas -;till, a porta se abriu!", mas, definitivamente, no que diz respeito à
gamificações são as ajudas que cada participante e candidato pode- .1plicação da gamificação como estratégia de ensino, o Experimen-
riam obter para ganhar 1 milhão de reais, por exemplo: o acesso aos t.mdo Ciência foi o primeiro. Explico. Foram meses de trabalho
universitários, as placas numeradas da plateia, as cartas de baralho que d ·senvolvendo uma chave digital de identificação de artrópodes.
permitiam o candidato eliminar respostas incorretas e, claro, os pulos. No início, não fazia ideia de como realizaria o projeto, mas estava
Em Lençóis Paulista, no interior de São Paulo, a brincadeira d ·cidido de que queria modificar a experiência de aprendizagem
na rua era uma atividade na qual me envolvia bastante e, a partir com uma chave de identificação de animais. Pensei em utilizar um
dela, aprendi muito sobre jogos; diria que tanto a rua como a TV painel magnético, tiras de papel, montar umjogo de cartas, mas as
foram importantes para criar o meu repertório básico e primário .1plicações interativas que via nos CD-ROMs da época chamavam
de gamificação. É óbvio que na época eu nem imaginava que tudo muito a minha atenção.
aquilo que vivenciava era, de fato, gamificação. Para mim, não Comecei a trilhar o caminho da tecnologia querendo enten-
passava de uma brincadeira ingênua ou um passatempo. Hoje, o d ·r como se fazia aquelas imagens em movimento, as passagens
cenário é bastante diferente porque o repertório adquirido naquele de tela e a exploração do conteúdo de forma bonita, organizada e
período virou minha principal ferramenta e estratégia de ensino. 111tcrativa. A curiosidade e o desejo de dominar a ferramenta me
< onduziram à descoberta do Macromedia Flash - um software de

2. l'c·r.c>11.1gt•11, que v1sitav.1m praticamrntc todo' º' d1as o Castdo. < 1 i.1~· ã de animações interativas. No Flash, comecei a manipular
\ l'r<•l(r.1111.1 d<' tdrv"·'" .1pn·\l·111:1do pnr Slivio 'iantos fnto cm parct•na <'ntn· o 'iBI ,. o ll.111 d.1 IThnd.1de.
1l"l'""iwl 1·111 h1tt" //w"" 'hi< 11111 hr/v.111nl.1dc /,bt 11.1•\A.l'h/tiq11cpordcmro/ 10918~ J, rnln.1 d,, I• 111.1<.1<>· t ri.is e a scqu ~n ia de conteúdo que poderia expor aos usuários.
\t•lh 1n p 1· 1d,) 01u t thl llll 11\t 1 A, l Ml e. 111 2.7 h'v ~010.
N.10 fo1 1w. l.1 f.í il .1pr·1H..l·r a l'gi a do p1og1.1111.1, 111,ts • 111 di111i11uía .is lwH ·s d· .1 1d · 11td1ca~· ã ser fi·ita 'X Ju ivamcntc por
muita garra e p ·rsi t"\n ·ia de envoJvi uma chave de id ·ntificação do t1·11t.1tiva · ·rr - que nã cria condizente com a minha propos-
filo dos artrópode totalmente digital. Mais do que isso, havia criado a 1.1, qu' ·ra a de fazer o aluno observar minuciosamente o exemplar
minha primeira experiência gamificada como professor. Antes de dl' s ·u intcrc se e diagnosticar suas peculiaridades. Por outro lado,
interagir com o computador, os alunos observavam uma coleção ,t' t e tudante escolhesse corretamente todas as opções da chave,
de exemplares identificados apenas por um número e escolhiam t cria acesso a uma recompensa - um vídeo que lhe oferecia infor-
um de seu interesse. Em seguida, encaminhavam-se, com os exem- ma õcs sobre os aspectos biológicos e ecológicos do grupo ao qual
plares em mãos, para o computador, a fim de identificar o animal. 4 o seu exemplar de interesse pertencia.
No computador, o aluno interagia com a chave de identifica- A atividade com a chave de identificação digital no Experi-
ção digital encontrando, primeiro, o layout de escolha de exemplar llll'lltando Ciência foi um grande sucesso, mas não fiquei satisfeito
com 22 botões numerados - cada botão correspondia a um único .1pcnas com a empolgação dos estudantes. Em 2009, no estado
exemplar da coleção. Ao fazer a escolha, o aluno tinha a missão do Rio Grande do Norte, enquanto fazia mestrado e já atuava
de descobrir se o animal de seu interesse era um aracnídeo, crus- 101110 professor de ensino fundamental em Parnamirim, repliquei
táceo, myriapoda ou inseto. Para isso, era exigido que o estudante 1> projeto e coletei dados, buscando testar o efeito da ferramenta
soubesse, por exemplo, quantos pares de perna o animal possuía, 1 ksenvolvida e da experiência sobre a percepção e a aprendizagem
como era o design corporal; se existiam antenas, quelíceras etc. 1los alunos. Os resultados da pesquisa mostraram que os alunos
Conforme o aluno ia escolhendo suas opções, os layouts da chave qu' interagiram com a chave de identificação digital tiveram um
mudavam. Mas, e se ele, porventura, errasse, isto é, escolhesse uma 11 ·scmpenho melhor do que os alunos que assistiram a uma aula
opção da chave errada? Não importava que erro fosse cometido, os t 1 .1dicional, sugerindo um impacto positivo da ferramenta no pro-
layouts continuavam mudando normalmente. Porém, ao fazer pelo < ·sso de ensino e aprendizagem. As maiores diferenças constatadas

menos uma escolha incorreta, o aluno estava fadado a encontrar foram em questões que requeriam habilidades cognitivas, além da
uma mensagem de erro, na qual, clicando em "voltar", tinha o 111 mória, como: comparar e diferenciar os grupos de artrópodes,
acesso novamente ao layout de escolha de exemplar. 1 ktcctar erros e elaborar critérios próprios para a montagem de
Dessa forma, o aluno não sabia onde se encontrava o erro 11111a chave de identificação.
- necessitava saber todas as características para identificar devida- Essas primeiras constatações foram feitas e publicadas sem
mente o animal. Acreditei que essa seria a forma mais adequada 111 ·ncionar qualquer coisa relacionada à gamificação e ao jogo,
de se reproduzir o método científico. Além disso, com essa regra, t.111to que o foco do artigo que publiquei em 2012 era o uso da
l l'rnologia como recurso didático em sala de aula, contextualizado
4. Confi ra a apresentação do projeto cm um vídeo gravado pela profa. dra. Lúcia Mana Pakari. Disponívd .1 partir da abordagem de aprendizagem situada que considera a
rn1: <https://youtu.bc/vkjnNy7ERrnU>. Acesso cm: 27 fcv. 2020.

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og111~. o u111 produlo d.1 inL Ta~·ã cntr 11 >sso t '·1d)fo, n s p1 ok'lso1 '• wn1pr' · n. id ·rad um DESIGNER
e rp nos , mbicnte, mediada pela percepção e ação. 5 111 c implcm ·nt e r ·visa materiais gamifi ados cm conjunto com
Na primeira vez que submeti o artigo à revista, considerei a \!''""'designers. Além disso, o professor é um ORIENTADOR, res-
chave dicotômica como um jogo digital, tanto que a minha pri- IH 11sávcl pela avaliação do aprendizado dos alunos. Essa avaliação
meira sugestão de título era: "Utilização de um jogo digital para (: utilizada para gerar dados que são analisados e usados para fazer
identificação de artrópodes: avaliação de estudantes do Ensino .11 ustes no currículo, além de ajudar os alunos a definirem suas pró-
_Fundamental"; mas um dos revisores recomendou mudar o nome pria metas de aprendizado. O professor também precisa ser um
para ferramenta multimídia. De fato, há quase dez anos, a ideia de I' NSADOR SISTÊMICO e um INTEGRADOR DO BEM-
jogo em sala de aula era muito mais associada ao puro lazer e à sim- E 'T AR - capaz de entender o relacionamento entre os alunos e a
ples diversão. Os especialistas da área não enxergavam ainda o jogo t munidade escolar; e INTEGRADOR DE TECNOLOGIA pre-
digital, muito menos sua linguagem, como um recurso poderoso parado para utilizar a tecnologia como uma ferramenta de ensino.
de aprendizagem. E a gamificação? Ela estava dando os primeiros i> r fim a sexta dimensão é denominada como PROFISSIONAL
'
passos e sua aplicação era mais restrita ao marketing e aos negócios integra o conteúdo, faz uma boa gestão de sala de aula, estabelece
- pelo menos aqui no Brasil. Nos Estados Unidos, o conceito já uma boa comunicação com os pais, planeja suas aulas e se preocupa
era uma realidade na educação e estava repercutindo significativa- e m o engajamento dos alunos e os resultados pedagógicos.
mente na organização de currículos e escolas. O currículo da Q2L é estruturado e executado por meio de dois
Em 2012, aconteceu o meu segundo "clift, cloft, still, a porta tipos de atividades principais: Discovery Missions e Boss Level.
b . I" quan d o co nh eci a Quest to Learn (Q2L), uma escola
se a nu. As Discovery Missions são compostas por Quests, que são na ver-
pública nova-iorquina que trabalha com alunos do Ensino Fun- dade desafios que motivam os alunos a buscarem informações em
damental II e Ensino Médio. Fundada em 2009, após anos de livros e na internet, realizar experimentos e elaborar pesquisas com
planejamento curricular, a Q2L ganhou destaque internacional pessoas reais para chegar a um objetivo específico a partir dos da-
pelo seu pioneirismo no uso da gamificação para estruturar o cur- dos. O Boss Level é uma espécie de avaliação em que os alunos
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rículo escolar. No curso de pequena duração de que participei não apenas respondem a questões discursivas e de múltipla escolha,
em Manhattan, fui impactado pela forma como eles enxergavam 0 mas também apresentam os resultados de suas Quests, muitas delas
professor a partir de seis dimensões de desenvolvimento. 7 exibidas no formato de um jogo - tanto digital como analógico.
A Q2L conta ainda com uma rede social fechada, desenvolvida
5. Eu5;ENIO, Tiago josé Benedito. ( ltilizar111> de """'ferramenta 111ultimldi11 para ide111i/iração de <1rtrópodes: especialmente para os alunos da escola. A rede permite que apenas
11va!t11çao de estudantes do Ens1110 l'undammta{. Uauru, v. 18, n. 3, p. 543-557, 20 12. Disponívd l"m: <https://
do1.org/10.1590/S1516-73 132012000300004>. Acesso cm: 27 fcv. 2020.
os alunos postem seus trabalhos e criem comunidades de discussão.
6. Conhl"ça ma.is sobre a Qucst to L<.-am. S1t<' oficial da c.-;colJ: <https://www.q21.org/>. Aw•so cm: 27 fev. 2020.
7. Palestra ministrada por Katie S.Ucn no WISE 2013 Focus. No vídeo. Salcn nos conta rnmo a c.:.scola Qucst Nessa rede, os professores também podem postar atividades valen-
to Lt·am fo1 msp1radJ nos JOgos e ~omo uahzou "" linb•uagcm para cnJr urna experiência dl" •prendiz•gcm
mov•dorn para seus d.lunos. D1spo111vcl l"m: <hrrps://youru.be/UY! lnl'wY88w8>. Acesso cm: 27 fcv. 2020.

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d hrul.i!cs, p n l s · rga 111 za r alun s ' s grupos d· .ilunt s '111 Ouua rd'·1 "" nria i1nporl.111t • qu ·e nhc ·i no ur o da Q2L
um ranking. lll1 o l111gui. ta Jame. Paul G e, autor de vários livros sobre o uso
Na Q2L vi na prática a gamificação sendo aplicada em sala 1 ll' flidco.~mnes na educação. 10 Além disso, outro autor bastante co-
de aula e modificando por completo a experiência de centenas de 1 n ·11tad no curo foi Marc Prensky. 11 Ao ler as obras de ambos fui
alunos. Foi nessa escola também que conheci o trabalho de Jane 111 • nutrindo cada vez mais com ideias e argumentos sólidos para
McGonigal, uma game designer norte-americana responsável por defender a bandeira do uso dos jogos e, principalmente, de seus
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um dos TEDs mais assistidos no mundo inteiro. Jane é uma pa- 1 ll'mcntos e sua linguagem na educação.
lestrante e autora muito engajada no mundo dos jogos. Seu livro e volta ao Brasil, comecei a implementar o que aprendi nos
A realidade em jogo tem um discurso tão eloquente sobre o poder 1-.stados Unidos. É óbvio que não era possível fazer muita coisa,
dos jogos para transformar a realidade, que a gente às vezes se 11111a vez que eu não contava com tantos recursos e apoio para
sente desanimado por não viver de corpo e alma em realidades .1 realização das atividades. Nessa época lecionava em cursos de
alternativas. O livro coloca em xeque a realidade em que vive- graduação na Universidade Paulista (UNIP) e minha ferramenta
mos, explicando como ela é mais chata e desinteressante do que te ·nológica principal de trabalho era o Power Point. Foi com ela
os games. Por exemplo, McGonigal diz que "em comparação aos que segui minha jornada de gamificação, adicionando quests 12 no
jogos, a realidade é deprimente. Os jogos concentram nossa energia, 111eio das aulas, atribuindo pontos, organizando os alunos em gru-
com otimismo incansável, em algo no qual somos bons e aprecia- p s, realizando minigincanas, entre outros.
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mos fazer". Recebia uma resposta positiva dos alunos, mas confesso que
Depois que escrevi todos os capítulos deste livro e o revisei, muitas vezes me sentia cansado e perdido na aplicação dos elemen-
não tive dúvidas de que deveria seguir a mesma linha do livro de tos dos jogos em sala de aula.Já começava a perceber os desafios na
Jane: colocar em xeque a aula tradicional, mostrando que ela pode .1plicação da estratégia relacionados à imersão, ao monitoramento
ser mais motivadora e interessante com a adição dos elementos ao feedback instantâneo aos alunos, e sentia cada vez mais ne-
dos jogos. Nasceu assim a ideia de nomear esta obra simplesmente cssidade de tecnologias digitais para me auxiliar a reproduzir uma
como Aula em jogo. É importante destacar que isso não significa xperiência de aprendizagem gamificada mais consistente.
transformar a aula em umjogo propriamente dito, mas sim adicio-
nar elementos dos jogos em seu planejamento e execução. Mostrar
10. Visite a página oficial de James I'. Gcc. C lique em "Uooks" e "l'ublications" para conhecer os Li vros e
essas possibilidades de forma descomplicada é um dos propósitos .irti gos do autor (a maioria cst.i cm ing!Cs). Disponívd cm: < https://j:uncspaulgce .com/>. Acesso cm: 27
deste livro. lcv. 2020.
11 . Conheça a página oficial de Marc l'rl'n ksy. Disponível cm: < http://ma rcprrnsky.com/>. Acesso c111:
27 tCv. 2020.
8. MCGON IGAL, Janl'. Garning can make a bettcr workl. TED. fov. 2010. Disponível cm: <https://www. 12. No universo dos gam~s. quests são missões realizadas por um ou vários jogadores para r<'ccbcr alguma
tcd.com/talks/janc_mcgonigal_garning_can_makc_a_ b,·ttl'r_ world?bnguage=pt-br>. Acc&so cm: 27 tcv. 2020. rccomp,·nsa. As qucsts podrm tl' r divl'rsos propósitos, entre eles ganhar di nh eiro, receber algum item , obtl'r
9. MCGON IGA L, Jane. A realidade em joJ!''· R.io de Janeiro: BcstSdlcr. 2012. p.47. ;.tcc..<:so a uma án~a específica ou simplesmente por d i v1..~rsão.

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hoj' m' perguntarem s' ', possível trabalhar ·om gamifi- 1 id.1 p >r t d )S c;11111lios,111H'llll' r m ' ris. A lado dessa incrível
cação sem uso de tecnologia digital, respondo que sim. Porém, 1der · edu adora, me ·ei a participar de uma série de projetos
deixo claro que o processo fica muito mais vulnerável e trabalho- 1 11.1dos e liderados por ela e outros professores. O primeiro foi a
so. Quando falo em vulnerabilidade, quero dizer que os alunos 11! 1 ·ina de Mundos Virtuais, na qual os estudantes reproduziam oco-
podem questionar o professor sobre o processo de monitoramento 1{,gi dentro do ambiente virtual do Minecraft. Para além do jogo,
dos dados (pontos, por exemplo). Em um processo gamificado, a <s alunos estudavam sobre arquitetura, escala matemática e a história
avaliação subjetiva não é tão bem-vinda assim. Quando se instala d bairro da Vila Mariana na cidade de São Paulo. 13 O projeto era
contextos próximos a jogos com condições de vitória, recompen- 1 ·a lizado em parceria com a professora de história, Eva Turin. Já
sas e objetivos finais bem definidos, os alunos ficam muito mais n , sa oficina, em 2014, percebia o potencial dos games na educação
vigilantes e se sentem injustiçados quando o juízo de valor é mais orno eles podiam criar situações significativas para aprender e
subjetivo do que objetivo.
trabalhar com os alunos. Lembro até hoje quando um participante
Processos de gamificação puramente analógicos costumam da oficina inseriu um dragão no mundo virtual, destruindo boa
demandar uma quantidade enorme de material impresso, uma lo- parte do trabalho realizado pelos alunos. Aquela situação levou os
gística de organização dos alunos que pode esgotar a cognição do estudantes a pararem o que estavam fazendo e discutirem o que era
professor e demandar um trabalho árduo de muitas horas de pla- olaboração, respeito e trabalho em equipe tanto no mundo real
nejamento e organização dos materiais utilizados durante a aula. quanto analógico. Os alunos levaram muito a sério aquela missão
Por falta de apoio e, por exemplo, pela falta de internet em sala de reconstruir o colégio e perceberam que estavam fazendo algo
de aula, consegui avançar até certo ponto na aplicação da gamifi- maior que eles mesmos. O jogo era uma ferramenta, um meio
cação. Mas queria ir além! E, para conseguir isso, sabia que deveria para que se autoexpressassem e trabalhassem de forma colaborativa
tomar uma decisão importante. No fim de 2012, saí da universi- e propositiva.
dade e voltei para a educação básica, iniciando uma nova etapa na Outro projeto que tive a oportunidade de ingressar como pro-
minha carreira. Fui estagiário por seis meses na feira de ciências no fessor foi o BandForense, 14 que tinha por objetivo levar aos alunos
Colégio Bandeirantes, uma escola privada de São Paulo. E, no ano do nono ano do Ensino Fundamental II conhecimentos básicos de
seguinte, fui contratado como professor do laboratório de Biologia. biologia, fisica, química e matemática por meio da prática forense
No Bandeirantes ocorreu o meu terceiro "clift cloft still a
' ' '
porta se abriu!". A escola se transformou no meu laboratório vivo 13. Confira matc'ria publicada no portal G 1 qnc mostra imagens dos alunos e da oficim Mundos Virtuais.
' m inistrada de 2013 a 2016. G1 SÃO PAULO. Evento discute o uso da tecnologia e os novos rnrnos da
onde tinha recursos, apoio e espaço para testar hipóteses de apren- educação. C1. 28 abr. 2014. Disponível cm: <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/04/cvcnto-
discute-o-uso-da-tccnologia-c-os-novos-mmos-da-cdncacao. htm l>. Acesso cm: 27 fcv. 2020.
dizagem. O maior apoio nessa fase foi sem dúvida dado pela minha
14. Confira a inatéria: Professores usarn investigação fOrcnsc para ensinar conceitos de rnatcmática e fisica,
coordenadora, a professora Cristiana Mattos Assumpção - conhe- frita pelo programa Hoje Em Dia e publicada no Portal R 7. Dispon ível cm: <hups://rccordtv.r7._com/
hojc-cin-dia/videos/profrssorcs-usa111-i11vcstigacao-forcnsc-para-cns1nar-concc1tos-dc-matcmat1ca-c-
tisica- J 4102018>. Acesso cm: 27 fcv. 2020.

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l 111 ·stt 1 .1~. o 1 irn111.1l.
1
~ ss' projeto s· t 1 rH u t1111 L1l oratóri à M ·u ol~ ·l1vo 11, o · 1.1 v11 .11 um pr gramador ou criador de
part , mu1t n · e signifi ativo para cu de envolver e testar mi- 1ngo-> digitais, mas im pt, r mai ideias e recursos para melho-
nhas habilidades de gamificação, tanto que há um capítulo neste 1,11 111i11has aulas criar experiências de aprendizagem garnificadas
livro em que conto com mais detalhes a minha jornada e as práticas 111.1is m tivadoras e eficazes. Esse sempre foi o meu propósito. En-
de gamificação que desenvolvi com ele. t. o, comecei a explorar e aprender com softwares mais simples. O
Fora do Colégio Bandeirantes, ocorreu também outro "clift, ( :on truct 2 caiu como uma luva, permitindo criar experiências
cloft, still, a porta se abriu!". Para não perder a conta, esse foi o 111ais próximas de um game, conectando diferentes elementos de
quarto! Sempre tive curiosidade para entender como eram criados ll g s às aulas. O Construct 2 é um editor de jogos 2D baseado em
os games. Então, no início de 2014, entrei como aluno em um cur- 1 I MLS. 16 É um software destinado tanto para não programadores
so de desenvolvimento de jogos digitais da Escola de Arte, Game e quanto para programadores experientes. Ele permite a criação rápida
Animação, a SAGA. No curso, aprendi mais sobre os processos de d, jogos, por meio do estilo Drag And Drop, usando um editor vi-
criação dos jogos digitais, entrando em contato com os programas sual e um sistema de lógica baseado em blocos e comportamento.
responsáveis pela sua produção. Nessa época conheci diversos pro- A maior parte das experiências compartilhadas na segunda
gramas que abriram literalmente minha cabeça. Aprendi o básico parte deste livro foi possível graças ao uso de aplicações criadas
de Maya, 3D Max, Mudbox, Unreal e Unity - programas úteis no Construct 2 e em uma série de outras ferramentas gratuitas e
para o desenvolvimento de jogos digitais sofisticados para consoles disponíveis na internet. Outra plataforma importante, sem dúvida,
como PlayStation e Xbox. foi o Genial.ly, onde é possível criar gameaulas interativas e com
No entanto, já percebia que a área de educação não absor- templates predefinidos.17 Você perceberá que um bom número das
veria tão fácil essas tecnologias, especialmente pelo poder de ideias compartilhadas ao longo dos capítulos deste livro pode ser
processamento que esses softwares demandam. Mesmo em escolas reproduzido sem o uso do Construct, apenas utilizando o Power
de ponta não há computadores com placas de vídeo e de última Point ou outros programas como editores de vídeo e de imagens.
geração para rodar qualquer tipo de jogo ou aplicação desenvol- A utilização de softwares de criação rápida de jogos me permi-
vida no ambiente 3D. Além disso, o fluxo de desenvolvimento tiu reproduzir com mais contundência os elementos dos jogos em
com seftwares e tecnologia 3D exige muito tempo e conhecimento sala de aula. Foi assim que comecei a montar gameaulas que são
de linguagem de programação específica. na verdade storylines digitais que contam uma história (imersão);
orientam os alunos nas atividades (ação); e os engajam na pesquisa
15. ASSUMPÇÃO. Cristina Mmos; EUGENIO. TiagoJ 13. Casos crilllinais viraram jogos de invcsti!!:lçào e na coleta de dados para descobrir uma senha específica (desafio).
forense Porvir. 22 jul. 2015. Disponível cm: <https://porvir.org/casos-crirninais-viraram-jogo~-dc-
1nvcst1gacao-torcnsc/20150722/>. Acesso cm: 27 fcv. 2020.
l'ALI IAR.ES, lsabcla. l:'..scolas de São Paulo se inspiram c111 sé1ic rn lllinal para rnsinar. O H<tado de S. Paulo, 20 15. 16. Além do Constmct 2. existe também a wrsão mais moderna deste s~/iware chamado Consm1ct 3. Disponível
8 jun. 2015. Disponívd cm: . <https://cducacao.cstadao.corn.br/notic1as/gcral,escobs-sc---inspiram-cm- c· m: < https://www.scirra .com/>. Acc·sso cm: 27 fcv. 2020.
scnc-cnm111a l-para-cns111ar--11np-, 1701837>. Ac<'sso c111: 27 fc·v. 2020. 17. Disponívd cm: <https://www.gcnial.lyfrn>. Acesso cm: 21 jon. 2020.

20 21
Acc.:rtandc · )dig . · ·r t , n vas telas surgem (1 · 0111pcnsa), p r- 1 11 111 ,ti -. l' ll •,I ,llll ' lll O Jl l' ,tllllHl S l' lllll ,l ,qlll lllll / I ' l Ili 11111

mitindo que os grupos progridam sobre a narrativa (progressão). 11. 11 , 1 e oi >rar ·m pdti ca <.'SSl' pie púsito , t1v · que t0111.11 111111 .1

O storyline digital também modificou a forma como eu (pro- 11 , ,1 ir do lé•ri 13and ·ir. nt s, 20 um dos mais pr ·sti giad )S

fessor) lidava com o conteúdo. Como ocorre em uma série de 1 , p.d-. , para ontratado como designer
umprir minha mi são .
TV, um filme ou em um livro, o conteúdo se revelava conforme 21
1p1l'11di zaO'em na Rhyzos Educação, criei a plataforma Detecta

os grupos progrediam na narrativa, não sendo mais necessário que p 111 u rn storytellíng protagonizado por personagens e cenários
eu antecipasse ou até comprometesse esse importante processo de 111 1 rlcin s. riei esse projeto com o objetivo de escalonar o que
descoberta. A necessidade de o professor fazer contextualizações e 1, 1 11v lvi durante minha trajetória no BandForense.
explanações no início de uma aula é praticamente eliminada com ) meu quinto " clift, cloft, still, a porta se abriu!" aconteceu
a presença das gameaulas. O professor na verdade deve focar mais a I' 1111 d decidi fundar minha própria empresa e gerenciar de fo~a
organização dos grupos e aguardar até que solicitem algo - moti- 111 1.rllll ·ntc autônoma meus projetos. Em parceria com a neurops1co-
vados por uma necessidade real de auxilio pelo professor diante de 111 1 l.ig ga Ana Lucia Hennemann, fundei a Plataforma Educacional
um problema revelado pela narrativa. N ·ur ns22 - uma plataforma com diversos jogos que estimulam ha-
Todo esse processo é detalhado no capítulo 6, no qual conto 1111idades de aprendizagem com sistema de avaliação on-line para uso
como gamifiquei o Bandforense. Ainda dentro desse contexto e 23
1•du ·acional e clínico. Parti também para a criação do Escapeplay
desse objetivo de transformar a linguagem e a organização das aulas .iplicativos no formato de escape room desenhados para modificar
tradicionais em uma série de TV com temporadas e episódios, no 1 experiência de aprendizagem em aulas de ciências. E, mais re-
capítulo 11 conto como isso pode ser feito por qualquer professor 1 l'lltemente, investi no desenvolvimento de ferramentas rápidas e
com auxilio do Educaflix. d s omplicadas para o professor gamificar qualquer tipo de conteúdo,
Além do meu trabalho no Bandeirantes, criei e coordenei uma 24
rditando planilhas eletrônicas do Google Drive.
18
pós-graduação. Esse curso também foi um laboratório de apren- No fundo, todos os dias estou trabalhando na implementação
://
dizagem e um espaço ímpar para criar diversas experiências que do meu propósito e buscando recursos e alternativas para utilizar
compartilho também neste livro, inspirado principalmente pelos tra-
'O. Além de trabalhar cm projetos ligados ao uso de Minccrati: e de gamificaç:io .aplicados 3s práticas for:nses,
balhos desenvolvidos e publicados pela professora Eliane Schlemmer. 19 .. ·ta111 bc'n1 t11na oficina de criaç:io dCJ.O<>os digirnis chamada "C.mie St ,,dw: criação e progra111açao de
1ogos digitais" para alunos do oitavo e nono ano
llll CIC l "'
do Ensino Fundamental li no Co Ic~1 ' . ll d . . N t'
0 an c1rantcs. cs e
Em 2017, decidi que ajudaria outros professores e instituições ln;k, você pode assistir a minha palestra. cm que compartilho os procc.ssos de cnaçao de JOgos e dicas P";
11
npkmcntar uma oticina de jogos cm uma escola. Disponível cm: <https://youtu.bc/L8m6Dl_v6ZY ·
de ensino a usar todo o potencial da linguagem dos jogos para Acesso cm: 27 fcv. 2020. . . , ·
Em 2018, criei ocurso l'rof,'Tamaçfo de Ca111es VC.Makcr do wupo Positivo. Dispomve~cm: <l:ttp~://tccno 1ºWª·
educacional.corn.br/vcmakcr/vc-makcr-curso-prob'Tamacao-dc-gamcs/>. Acesso cm: _7 de fcv. -020.
18. OL!VEIRA, Maria Victória. Cm,;o de pós rnsina cultura pop egames a profcs,,orcs. f',m,ir. 9jun. 2015.
Dispornvcl cm: <https://porv1r.org/pos-gradnacao-cm-gamcs-inova-cn<ino-tradicional/>. Acesso cin- "7 21. Para ma1' informações. accsst·: <http://d,·recrn.app>. Acesso cm: 27 de fev. 2020.
fc~ww. ·- 22. Para mais infonnações, acesse: <http://clickneurons.eom.br/>. Acesso em: 27 fcv. 2020.
19. Sc~1lcmmer {· u111a cLis. 111aiorc~< rcfi.'rênciJs cm gamiticação <' educação on-line 110 Brasil. Artigos 23. Para mais informações, ,1c,·ssc: <http://aulacmJogo.com.br>. Acesso cm: 27 fcv. 2020.
d1spo111vc1s c111: <https://umsmos.acade111ia.edu/EliancSchkmrner>. Acesso cm: 21 jun. 2U2U. 24. Para mais informações. acesse: <http:/ /tügocugcnio.corn.br/curso-on-li1w>. Acesso n n : 27 fcv. 2U2U.

22 23
.1 li11 •u.i •t'lll lmjogos 11 · nt' t p •tL1góg1to l.1 111 ·lhrn forma
Atada p.1rlc e .1pítulo 1 ·~l.l bra pr ur apre entar a arquite-
possí ·J. s ·r ·ver st' Jivr me motivou a dar mai um pa o: criei 1111 .1 1 )S ~ mod , as passa<rens e reta e a possibilidades de usar as
um njunt de te1nplates e painéis interativos inspirados em jogos lc11.1111 'ntas e as tecnologias que este castelo da gamificação dispõe.
digitai famosos. A este cortjunto dei o nome de Class Dash.
No fim, posso assegurar uma única coisa: a certeza de que você jamais
livro também foi um bom pretexto para documentar e comparti- 111111istrará aulas como antes. Seu jeito de ensinar e aprender será trans-
lhar minha trajetória como professor e, mais recentemente, como lo1111ado para todo o sempre.
autor e empreendedor na área de educação.
tá preparado?
Quando se lê este texto como deve ser lido, de cima para baixo, ntão, seja muito bem-vindo ao Aula em joqo: descom-
até parece que minha jornada foi linear - tanto que poderia ser repre- plicando o qomificoção poro educadores.
sentada por uma curva contínua de crescimento linear. Ledo engano.
Diria que essa jornada mais se parece com uma montanha-russa com
inúmeros altos e baixos. Praticamente, todos os momentos de "clift O SUPERPODER DA
'
cloft, still, a porta se abriu!" exigiram renúncias de segurança e de- qomificoção no educação
sapego da zona de conforto da minha parte. Mudar nossos hábitos,
costumes e práticas cotidianas não é algo que agrade tanto nosso cé- Não há dúvida de que a educação sofreu diversas modificações
rebro. Exige muita disciplina, coragem e, principalmente, propósito! rios últimos anos. As tecnologias digitais possibilitaram formas diver-
Então, eu lhe pergunto: qual é o seu propósito? Minha tra- .ts e inovadoras de trabalhar, construir e se expressar. Atualmente,
jetória, assim como este livro, é parte de um processo inacabado .1s escolas lidam com estudantes que desenvolveram um modo de
- não tenho dúvidas que muitas portas e momentos de "clift, cloft, organizar o pensamento com base em meios não só analógicos, mas
still" estão por vir ainda. Mas chegou o momento em que não
t.11nbém digitais, e essa combinação está permitindo um nível de ação
quero mais atravessar apenas as portas. Desejo também as construir l' k interação mais dinâmico e instantâneo.
para que sirvam de passagem para outras pessoas.
Essa forma de se relacionar com o mundo é potencializada
Este livro tem como propósito mostrar o uso da linguagem p ·las diferentes mídias disponíveis, como aplicativos de mensagens
dos jogos na educação, inspirando professores e profissionais que instantâneas, conteúdo dos mais diversos formatos em streaming,
trabalham de alguma forma na área. Meu intuito é apresentar uma mídias sociais e games. Por exemplo, estima-se que a humanidade
pequena porta a você. Neste momento, por favor, considere-me d ·spenda em torno de 3 bilhões de horas por semana somente
como uma espécie de Porteiro do Castelo. No entanto, para entrar 1ogando videogames. 25 Não é por menos que professores relatam
nele, você não deve adivinhar a senha do dia, mas sim seguir a
leitura dos capítulos a seguir.
1
, KO W ER T. Rachel; QUAN DT. r horst<'n. T7ie Vidco Game Debate: Unravcll ing thc Physica l, Social.
'\11<1 l'~ych ological Elfcrn of Digital Games. Inglaterra: Routlcdgc. 2015.

24
25
frcqu ·nt · 1n ·1H s d ·saíi s de manter o int ·r ·ss · d s estudantes ' l ' I v.rnd< os jogos d · 1 1id1·c ~~''"" ' t 01110 b ns modcl s e recursos de
pelos conteúdos escolares diante de um admirável mundo novo .1pr ·ndizag · 111 . M as é importante destacar que gamificação não se
recheado de dispositivos móveis e gadgets.
l l 'S rin gc ao uso de jogos prontos, tanto analógicos como digitais,
As infinitas possibilidades de socialização, aprendizagens e •1n sala de aula. Compreender o conceito desse modo é subestimar
criação proporcionadas pela cultura digital são mais tentadoras para o poder de transformação real da gamificação. 28 O nome do concei-
11' a atenção do que o típico currículo escolar. 26 Essa suposta concor- to , atribuído a Nick Pelling em 2002, não ajuda tanto, por remeter
rência pela atenção do estudante tem promovido uma revolução diretamente aos games. No entanto, é bom destacar que gamificação
na educação e a ascensão de novas abordagens e metodologias ati- t ·m mais a ver com o comportamento humano e a psicologia do que
vas e estratégias de aprendizagem, entre elas a gamificação. e m jogos e diversão. A gamificação tem um compromisso com o
Gamificação é um fenômeno que emergiu e ganhou fôlego lúdico, mas está longe de defender que seja somente por meio disso
no início do século XXI graças às tecnologias da informação , que que as pessoas são motivadas e se engajam em uma proposta.
permitiram implementar, em outros contextos, elementos dos jo- Logo, se você ainda acredita que gamificar uma sala de aula é
gos, tais como controle, feedback instantâneo e conectividade. o mesmo que trabalhar com jogos prontos ou criar uma atmosfera
Originada como método aplicado inicialmente em programas mais divertida para os alunos aprenderem algo com menos esforço
de marketing e para web, com a finalidade de motivar, engajar e e mais diversão, este livro tem como meta lhe mostrar quão limi-
fidelizar clientes e usuários, a gamificação vem ganhando espaço tada é essa crença.
na educação, aplicada como estratégia de ensino e aprendizagem Mais uma vez, a gamificação mira o comportamento dos alu-
dirigida a uma geração que teve a infància permeada, sobretudo, nos. Assim, usamos gamificação quando queremos reduzir para
pelos videogames.
zero o índice de tarefas não realizadas pelos alunos e o número de
Evidências da neurociência apontam três elementos fundamen- ausências e atrasos no horário em que chegam à sala de aula, por
tais para que ocorra uma boa aprendizagem: motivação, atenção e exemplo. Usamos gamificação também para aumentar para 90%
27
memória. Os games são construídos por uma série de elementos ou 100% a participação dos alunos em atividades que envolvam
e mecanismos que motivam, demandam atenção e principalmente ler textos, assistir a um vídeo, participar de discussões, pesquisar
memória para superar os problemas e desafios propostos ao jogador ou responder a um formulário. E, sim, os alunos realizam essas
durante o jogo. Dessa forma, professores podem se beneficiar ob- atividades de forma mais divertida e leve, mas bastante cientes que
estão aprendendo e desenvolvendo novas competências.
26. GEE, .James Paul. What Vídeo Games Have to 'frarh Us About Lcamitte And Literary. 2nd cd. Londres:
Pa lgrave Macmillan Trade, 2007.

27. RA~OS, Angcla Souza da F Dados recentes da ncurociência fimdamcntam o método Brain-Boscd
28. DETERDING, Scbastian ct alii. Gamitication: Toward a Ddinition. Procccdings ofCHI 2011 Workshop
Lcam1n.g. Revista da Associação Hrasi/eira de Psicopedagogia, São Paulo: ABPP, edi~·ão 96, v. 31, 2014.
Ca mificatio11: Usuing Game Design Elcrncnts in Non-Garne Contcxts, 2011, p. 6-9. Disponível cm:
1)1spon 1vcl em: <http://www. rcvistapsicopcdagogia .com. br/ dctalhcs/64/ dados-rcccnrcs-da-ncuroci,· 11 cia-
1
'
fundarncntam-o-rnctodo-brain-based-lcami ng->. Acesso cm: 22 frv. 2020. < h ter:/ /gamific:ition -rcscarch.org/wp-contrnt/uploads/201 1/04/02-Dctcrding-Kh:ikd-Nacke-D1xon.pdf>.
1 li Acesso cm: 22 fCv. 2020.

26
27
A gamifi açã também p Tmit · por aos .dunos dif •rcnt · N.1 sl •11 a de hc11cfü 1os ( bs ·1 vamos ainda 111 a gamifi-
contextos de competição e colaboração. A vivência desses con- 1 .1\, o .lll ilia na d ·s · 11stru\·ã d ambiente tradicional da sala
textos, permeados por conflitos, interesses e objetivos comuns e d1 .1ul.1. Até algun . ano atrás, a formação escolar e também do
individuais são fundamentais para criarem um repertório de ex- 1 11 .. 1110 superior geralmente tinham como base ir até a escola,
periências sociais, por meio do qual podem expressar emoções e 11 11111panhar todas as aulas de forma presencial, contar com ma-
comportamentos, praticando as competências socioemocionais e 11·11.1 is d· suporte em papel (livros didáticos e paradidáticos) e ter
desenvolvendo as chamadas funções executivas. , 111pr ·a obrigatoriedade de cumprir uma carga horária com datas
O uso dos elementos de jogos em contextos que não são pro- 1 horas marcadas, diariamente ou quase todos os dias. Contudo,
priamente para jogos, como a sala de aula, torna viável também 1 nm o passar dos anos e com a crescente oferta de tecnologias
o chamado ensino híbrido - o ensino que mescla estratégias de p.11.1 todos os segmentos, a sala de aula começou a passar por uma
ensino on-line e off-line. 29 Plataformas virtuais de conhecimento t 1.111sformação.

podem se tornar inúteis quando não são gamificadas. Os alunos Se antes era imprescindível acompanhar uma aula presencial,
não encontram muito propósito em acessar um ambiente diferente ,1 •ora é possível fazer isso de forma parcial, ou seja, uma parte na
e executar uma tarefa como assistir a um vídeo antes da aula. Para 111stituição e outra em qualquer lugar que você estiver, contando
que isso ocorra, o professor precisa agir, por exemplo, relembran- q11 • tenha internet e um aparelho com acesso à rede. Mas, mais
do diversas vezes ao aluno sobre o material postado ou então 11111a vez, é um pouco ingênuo acreditar que os alunos realizarão as
' '
atribuindo uma nota (recompensa) para o aluno que fizer o dever .1tividades postadas em uma plataforma, especialmente adolescen-
de casa. Plataformas que exploram os elementos dos jogos encora- t cs e crianças do Ensino Fundamental 1 e II.
jam mais os alunos a realizarem as atividades, diminuindo o esforço A gamificação, nesse sentido, modifica esse comportamento
pessoal do professor de repetir e criar regras rígidas para forçá-los a por adicionar um propósito explícito, um senso claro de pro-
usufruírem do material criado com tanto esforço para ele. A gami- •rcssão e oportunidades de competir e colaborar remotamente
ficação costuma automatizar processos e retira a responsabilidade <0111. outros alunos, reproduzindo dinâmicas e mecânicas típi-
do professor também de gerenciar informações geradas pelos alu- l as de tantos jogos on-line. 30 Mas diferentemente dos games que
nos. Nesse ponto é que entra um pilar importante da gamificação: ,1presentam um gameplay (cenário virtual em movimento), a ga-
as tecnologias digitais - que diminuem o esforço atencional e o mificação se volta mais a quadros e dashboards com números, isto
serviço braçal do professor de gerenciar tantas informações e dados '·, pontos, moedas fictícias, itens, níveis etc.
criados em uma experiência de aprendizagem.
\O . Um bom exemplo de platafon na educacional que utiliz.a demcntos de jogos par.i motivar os alunos a rc·alizarem
uiv idadcs é a Khan Acadcmy, fundada por Salman Khan. Com a mis.o;ão de proporcionar uma educação gr.ituita
29. H ORN, Michael; S1 AKER. Hcathcr. Bl1'11ded: usando a inovação disruptiva para aprimorar a educação. , dt· alta qualidade par.i todo<, cm qualquer lugar, oferece uma coleção grátis de vídeos de diversos assuntos do
Porto Alegre: Pen,o, 2015. , 11rriculo escolar. Disponível cm: <http'O//pt.khanacaderny.org/> _ Acesso cm: 22 Íl' V. 2020.

28 29
R.ep.1r ·: .1 ga111Jf1 · .l~·j t '111 uma natu1Tz.1 111.11s 111.111tll.1tiva
> .ti
1 1111.1111 · 11t • l · ' J H •o qur >bscrv ·m muita pr duções bi-
fi a a per rman e do u uário cm determinada tare a. É a sim que lilH> •1.ífi ·as sobr · ) l ·111.1.
a gamificação gera dados e permite anali tas, professores, coorde- ( objetivo desta primeira parte é introduzir o uruverso da
nadores e gestores a olharem para esse conjunto de dados e tomar •.11111(1 ação, mas sempre aproximando seu conceito e sua aplica-
uma decisão mais assertiva. Por exemplo, entender se determinada , o .1 ontcxto pedagógico. Por isso, vamos discutir no primeiro
estratégia está funcionando ou não, se os alunos estão aprendendo 1 o que os games e a cultura pop podem ensinar aos
.1 pítul
ou não, se o u o de certo elemento de jogo está gerando mais re- pr fessores. No segundo capítulo , - o que é gamificação ? -,
sultado ou não. Essa é a base do Big Data que entende padrões de .111 ,tli s de perto o conceito de gamificação e desfaço uma série de
comportame nto, e, a partir disso, cria-se novas soluções, produtos "<:c1memitos" e mal-entendid os que rondam e assombram o sig-
e demandas para a educação e a sociedade. 111h ado real do termo. Por exemplo, abordo as diferenças entre

prcndizagem Baseada em Jogos (ABJ) , erious Game e gamifica-


, o. Em seguida, analisamos duas questões fundamentais quando
L Como este livro p ·nsamos no uso de qualquer ferramenta e estratégia: por que e
r ~stá orqanizad o? quando usar gamificação na educação.
O quarto capítulo tem o propósito de mostrar dois tipos de
A gamificação e o game design são propostas educacionais gamificação: a gamificaçã o de conteúdo e a estruturada .
muito defendidas por pesquisadores e especialistas das áreas de ino- Em seguida, nós analisan1os as bases para a construção de
vação, mas ainda pouco utilizadas em ambientes de aprendizagem . uma boa gami:ficaçã o na sala de aula , organizadas em três
Na verdade, professores alegam que a gamificação é uma estratégia pilares: conteúdo, escolhas e desafios. A primeira parte é finali-
dificil de colocar em prática e demanda muito tempo de planeja- zada com uma discussão sobre outros pilares (plataformas) que
mento e conheciment o.
podem variar de intensidade conforme o tamanho da sua sala de
Não vou mentir, implementar bons processos de gamificação aula. Nesse capítulo ainda há uma seção intitulada, gamificaçã o
é um trabalho árduo e requer muito planejamento . Mas existem para salas pequenas e grandes, em que discuto os elemen-
atalhos interessantes que facilitam o processo de implementa- tos de design apresentados por Jon l adoff: imersão , cooperação,
ção. Nesse sentido, este livro tem como propósito mostrar conquistas e competição.
como pode ser mais simples do que você imagina traba- A segunda parte deste livro tem como objetivo compartilha r
lhar com gamificação dentro da sala de aula. M eu intuito alguns processos de gamificação que venho implementa ndo
é apresentar, na primeira parte, os princípios básicos da gamifi- em minha sala de aula para alunos da Educação Básica,
cação. Todavia, este livro está bem longe de trilhar um caminho Superior e em workshops de formação para professores.

30
31
Por m i de s 'S r ' lat , bus o 111 stra o n1 0 {: .1 "atnifica- Ih tl.1 ~Ó i a útil •m quai squ •r ontexto s da aprendizagem
ção na prática. No primeiro capítulo, apresento um d s projeto ljllC pode gerar be neficios tanto para alunos quanto para
que mais me emocionaram ao longo da minha carreira como 1 r of • ores em qualquer disciplina ou tipo de currículo.
p rofessor - CSI na sala de aula: gamificando um curso de Por fim, apresento ferramentas e templates para auxiliar o
ciências forenses do Ensino Fundamental. Foi neste curso p1 nf ·ss r a implementar a gamificação dentro da sala de aula. Par-
que comecei a trabalhar com gameaulas e narrativas digitais mais 111 11larmente, acredito que as tecnologias digitais sejam próteses
sofisticadas, reproduzindo de forma mais contundente os elemen- 111 •nitivas que nos auxiliam a implementar e gerir processos. No
tos e as dinâmicas dos games em sala de aula. 1 ,1\0 da gamificação, a tecnologia é útil para modificar a experiên-
O capítulo design thinking gamificado: criando experiên- 1 1.1 d aluno no que diz respeito à interface em que os conteúdos
cias gamificadas em um curso para professores, mostra como . o disponibilizados, o tipo de acesso, a maneira como ele observa
utilizei a gamificação em uma disciplina de pós-graduação. Esse 1·1 1 progresso e obtém feedback. Com auxílio da tecnologia, o
capítulo inaugura uma sequência de outros relatos sobre como a professor consegue monitorar com mais eficiência o desempenho
gamificação pode ser utilizada para criar experiências pervasivas, hí- 1 le seus alunos , além de gerar experiências mais imersivas e com
bridas e multimodais. Assim, enquanto no capítulo Missão Crusoé: 11111a interface mais próxima dos games que os alunos tanto gostam.
a gamificação aplicada em bibliotecas e espaços de convi- N os últimos anos, venho estudando e criando ferramentas
vência, relato o uso da gamificação para levar alunos e professores a t ,\da vez mais rápidas e descomplicadas para professores gamifica-
um centro cultural. No capítulo Ataque cyberbiológico: gami- 1 cm suas aulas, tanto que desenvolvi um curso on-line chamado
ficação e realidade aumentada aplicadas em museus discuto Gamificação descomplicada para educadores ,32 no qual
como criei, em parceria com a professora Marly Machado Campos, ·ompartilho uma série de ferramentas que possibilitam gamificar
31
o projeto MOVAR: aprendizagem em movimento, que conduziu qualquer aula por meio de planilhas do Google Drive. Neste livro ,
alunos e professores em uma trilha gamificada dentro do M useu de apresento algumas delas . A primeira é a Educaflix, que poderá
Microbiologia do Instituto Butantã, em São Paulo. ser acessada em um curso de curta duração indicado neste livro.
O capítulo picos e vales: gamificando uma aula STEAM Assim, o primeiro capítulo dessa parte mais técnica tem como
mostra como a gamificação pode ser aplicada em currículos interdis- obj etivo mostrar a Educaflix e como o professor pode trans-
ciplinares, baseados em proj etos e mais mão na massa como demanda formar suas aulas em um seriado de sucesso.33
a proposta do STEAM.
Todas essas propostas são compartilhadas visando a um ob-
32. EUGENTO. Tiago J. ll. e,,,,,, cm-/í,,e Ca111ijicnção desam1plírmla para cducadorc•s. Disponível crn: <tiag;ocugcn io.
jetivo maior: mostrar que a gamificação é uma estratégia co m.br/curso-011-li nc>. Acesso rni: 22 fCv. 2020.
33. O tcm10 "série" aqui é uti lizado como série tckvisiva, série de TV ou tcksséric. isto é, um tipo de
programa televisivo ou programa on-line com um número predefinido de capítulos por temporada,
31. Disponível cm: <https://movar.com.br>. chamados episódios.

32 33
- p
Figura 1: Organ izaçõo geral das partes
Fonte: O a uto r.
e dos temas trabalhados nos capítulos deste livro. A
O próximo capítulo foi inspirado em diversos jogos que gosto
bastante como Plants Vs Zombies, Final Fantasy, Chrono Trigger,
R
Angry Birds, dentre outros. O capítulo Class Dash: o ensino
híbrido gamificado tem como objetivo compartilhar uma série
T
de templates para você gamificar aulas de qualquer disciplina, re-
E
produzindo na sala de aula dinâmicas competitivas e colaborativas.
Pensando em um processo de gamificação estruturada, no capítulo
Aprendendo a criar badges, cartas e avaliações gamificadas ,

compartilho também modelos de planilhas úteis para monitorar e
gerenciar o progresso dos alunos em uma sala de aula gamificada.
Finalizo o livro listando ferramentas para criar e exemplos de
uso de cartas para você experimentar tanto em situações analógicas
quanto em ambientes digitais. Na última seção do capítulo fina l,
compartilho os caminhos para você acessar um template de uma
avaliação gamificada feito em Power Point - mais uma prova de
que a gamificação está realmente ao alcance de todos.
34
O QUE OS GAMES
E A CULTURA POP
PODEM ENSINAR
AOS PROFESSORES?

R psicologia nos ensina e a indústria de game comprova que


todas as pessoas buscam três coisas: autonomia, competên-
ria e conexões sociais. Se você não sabe, esses três ingredientes e
elementos mágicos são as bases da chamada teoria da autodetermi-
nação. Somos motivados quando interagimos em ambientes que
ferecem de forma rápida e descomplicada esses três itens. Neste
·apítulo, vamos conhecer as bases da teoria da autodeterminação e
como os jogos eletrônicos fizeram uso dela para se reinventarem e
se tornarem a terceira maior indústria do planeta.
Tenho certeza de que, em algum momento da vida, todo
mundo jogou algum tipo de jogo - seja quando criança no parqui-
nho, chutando uma bola e tentando marcar um gol, seja jogando
um jogo de cartas, de tabuleiro ou algum jogo digital no smartphone
ou no console de videogame.
Os jogos fazem parte de todas as culturas e participam de qual-
quer experiência humana compartilhada. Mas, deixe-me fazer um
aviso: usar jogos prontos em sala de aula é uma coisa; usar elementos
dos jogos em uma aula (que não é umjogo) é outra. Essa outra coisa é o
que chamamos de ga111ifi ação. De forma bem ol~wt1v.1, a gamificação A 111dlistri,1 de g11111cs 101 p.1ulat111a111ente entendendo o com-
permite usar os elementos dos jogos e integrá-los à inten ionaJidade i 01t.11nent do jogador e criando jogos cada vez mais alinhados
pedagógica do professor. Essa integração oferece oportunidades únicas 111111 os pre supostos da teoria da autodetenninação. O mais sur-
para um engajamento dos alunos, tomando o aprendizado não apenas 1'' cc11d ·nte é que a incorporação dos pontos centrais ocorreu
tolerável, mas reahnente divertido e desejado. 11111110 mais rápido do que a pedagogia - que sofre ainda muitas
Basicamente, garnificação é sobre motivação e comportamento l'/l'S ·om uma práxis descontextualizada e desmotivadora.
humano. Como professores, queremos que os alunos prestem aten- A teoria da autodeterminação é uma abordagem para a moti-
ção ao conteúdo dado, cumpram as atividades e interajam com seus v.1~ iío e a personalidade humana sistematizada por Richard Ryan
pares para aprender e desenvolver novas habilidades. Então, quando l' Edward Deci na década de 1970. A teoria compreende o estudo
me refiro à gamificação na educação, estou falando sobre como os d.is necessidades psicológicas que constituem as bases da motivação
jogos podem ser modelos inteligentes e inspiradores para modificar pessoal, assim como as condições que promovem processos positi-
a experiência dos alunos em uma experiência de ensino e aprendi- vos de engajamento, envolvimento e aprendizagem.
zagem, e não simplesmente utilizar um.jogo pronto. Ryan e Deci (2000) 1 identificaram três necessidades básicas: a
Em uma sala de aula tradicional, provavelmente, muitos alu- m-rcssidade de autonomia, a necessidade de competência e a neces-
nos preferem jogar um jogo do que prestar atenção no professor. 'itdade de pertencimento. De forma bastante resumida, a necessidade
Mas por que isso acontece com tanta frequência? Afinal, o que de autonomia se refere ao senso de autodireção, de perceber que
faz dos games recursos tão fascinantes? Ironicamente, games são uma ação ocorre por vontade própria do indivíduo e não por pres-
recursos poderosos para a aprendizagem humana. Gostamos de são externa; a necessidade de competência se refere ao senso de
desafios. Nossos cérebros adoram receber feedbacks para saber se .1pcrfeiçoamento constante no domínio ou na aprendizagem de
estamos indo bem ou mal em uma determinada atividade. Gos- uma nova habilidade; e a necessidade de pertencimento se refere à
tamos também de perceber que estamos avançando, crescendo e percepção de que existem vínculos interpessoais e duradouros.
desenvolvendo competências, ficando cada vez melhor no que fa- Essas necessidades são inatas, mas hoje, com a explosão das
zemos. Não gostamos de ficar presos e reféns de outros. Zelamos tecnologias digitais e dos diversos canais de comunicação via inter-
e lutamos pennanentemente pela nossa autonomia e buscamos net, elas estão mais latentes e realçadas,justamente porque há muitos
constantemente novos vínculos sociais. meios interessantes para satisfazê-las de forma segura, rápida e bara-
Mas o que os games têm a ver com isso? A resposta é bem ta. Não me refiro somente aos jogos, mas também às redes sociais,
simples: os jogos conseguem reproduzir situações por meio das às plataformas de streaming, aos blogs, aos softwares de edição, às
quais todas essas necessidades são satisfeitas de forma muito eficaz,
rápida e barata. 1. D EC I, Edward !. : R YAN, R1 t hard M _ T lw "W hat" and "W hy". of Go:i l l'msuits: 1 lurna n Ncl'ds and
thc Sclf- Dçtcrm ination of Bc hav1or. l'syr/10/oiical l11q11iry, v. 11 , n. 4. 2000. p. 227-268. Di sponlw l l'rn:
https://www.tandfonli 11l'.co rn /do1/abs/1O. 1207 /s15327965pli1104_01 >. Acesso c111: 29 frv_ 2020.

38 39
plataformas de curso AD, ao apli ativos d· tlll't1s.1gens instan- .1liva~·· o da motiva~· ;io ·, lt ínse a - baseada cm recompen-

tâneas, aos fóruns, às comunidades virtuais, dentre muitos outros sas, notas e aprovação cm exames;
canais. As pessoas usam esses recursos simplesmente porque encon- IJ Alunos passivos - sem autonomia e que só recebiam a
tram neles espaço para se expressarem, construírem novos vínculos informação.
e desenvolverem novas habilidades. IJ Lições padronizadas e aprendizado robotizado, dire-
tamente associado à memorização.

GAMIFICAÇÃO Agora, neste mundo contemporâneo, pensa-se em múltiplos

e o upqrade na educação 1 1111inhos e formas de aprendizagem. Mais do que ensinar, é im-


p111 t,mte inspirar os alunos, ativar a motivação intrínseca, ou seja, a
Veja bem, o computador e o smartphone são esteiras rápidas 1111t,1de própria do estudante de aprender e descobrir coisas novas
para o ser humano satisfazer todas as necessidades previstas pela 11111 prazer e autossatisfação.
teoria da autodeterminação. Mas não há outro produto que repro- Além disso, em vez do controle, temos liberdade e flexibili-
duza de forma tão contundente essas necessidades senão os jogos dade como ideias predominantes. Pensa-se também em um senso
digitais. Assim, profissionais que trabalham com aprendizagem 111.1is voltado para a descoberta e a exploração, com alunos mais ativos
podem aprender muito com a evolução dos jogos eletrônicos, ob- ,. protagonistas, que produzam novos conhecimentos para o mundo.
servando-os como modelos inspiradores. O mais interessante é que essa atualização de mundo é tam-
Antes de entender isso, vamos a um adendo importante ou, li{· m percebida quando analisamos a evolução dos próprios jogos
melhor dizendo, a uma crença. Acredito que a gamificação seja digitais. Vamos entender como a mudança dessa indústria do en-
uma das estratégias mais certeiras e eficazes para promover um up- 11ctenimento se relaciona com as transformações do mundo.
grade do modelo educacional - de um mundo obsoleto, baseado na
lógica fabril e de produção em massa, para um mundo novo e con-
temporâneo, caracterizado pela sociedade em rede, multiplicação EVOLUÇÃO DOS GAMES
dos canais de produção e personalização -, assim como fez a in- e a teoria da autodeterminação
dústria de jogos com a experiência do jogador. Vejamos por que.
No passado, a educação, conhecida como tradicional, tinha as Nos anos 1960 e 1970, os games não ofereciam muita liber-
seguintes características: dade para os jogadores. Vejamos o exemplo de Pac-Man. Nele o
IJ Caminhos unidirecionais e métodos únicos de jogador movimentava o personagem somente para cima, para baixo,
aprendizagem, fortemente caracterizados pelo controle; para a esquerda e a direita. Não havia tanta autonomia, nem víncu-

40 41
1
si. tema, p i. Pa -M, n s ·111p1 t ' 101 u111.1 p po. ta 111 •11 {· o po 1·r d.t ,1g'\ n 1,1. • ·ss · poder de agência foi crescendo
de jogo solitário. Mas logo surgiram alguns mais m d 'm s, como 11 l.1 ".! mais, culminand em jogos em que a graça é geren-
foi o caso do Space Panic, que tem um herói que deve escalar es- 1 11 1 t·c urso ou construir suas próprias cidades, como é o caso de
cadas e cavar buracos pelo cenário. Depois surgiram outros jogos 1111 :ny, ou então, planejar e mobiliar uma casa virtual, além de
como Donkey Kong Jr. e o famoso Super Macio Bros., que per- 1 1 1l nriar a vida de avatares que formam uma verdadeira família -
mitia ao jogador ter mais autonomia e liberdade de movimento. 111110 , ntece em The Sims.
Era possível andar para frente, para trás, dar pulos e coletar itens As possibilidades de criação foram ficando cada vez mais
como cogumelos e estrelas. Mas mesmo nesses jogos icônicos o 11 crsificadas, especialmente após a comunicação em rede e o sur-
jogador permanecia em um único caminho, enfrentando os mes- •1111ento dos jogos on-line. Veja o caso do Minecraft, 5 um dos
mos desafios e, basicamente, só precisava ter uma boa coordenação 111 •os mais amados e idolatrados por crianças. Nele, o jogador
mão-olho, apertando corretamente os botões no joystick para ser p11 1· construir tudo e ainda convidar outras pessoas para jogar no
bem-sucedido no jogo. Com o passar do tempo, surgiram jogos 3D 1 11 mundo, conhecendo e navegando pelas suas construções.
com visão 360°, como ocorreu com o lançamento do Super Macio "olocar os jogadores na posição de criadores é uma tendência
64 da Nintendo. Esses jogos ofereceram muito mais liberdade e 1111! '. A própria franquia de jogos do Super Macio da Nintendo
flexibilidade aos jogadores. Assim, o jogo ganhou uma dimensão de 1 ompreendeu bem a importância disso e criou o Super Macio Maker, 6
exploração e não simplesmente de cumprimento de fases e tarefas. 111> qual os jogadores podem criar seu próprio levei design e compar-
2
Em Journey, por exemplo, o jogador deve vagar por um 1ilh ar com quem desejar.
deserto. A grande sensação é justamente explorar o cenário. Algo Em todos esses exemplos, percebemos os valores que a in-
3
que acontece também em ABZÚ, no qual o jogador é um mer- dústria de jogos tem para ensinar para a pedagogia. Se desejamos
gulhador e deve explorar as profundezas do mar. Nesse jogo, não 1 ealmente que os alunos prestem mais atenção nas aulas e se envol-
h á uma recompensa e um propósito épico tão explícito como sal- am na proposta pedagógica do professor, precisamos criar cenários
var uma princesa ou derrotar monstros alienígenas que desejam cm que o aluno tenha mais liberdade, flexibilidade e protagonismo.
destruir o planeta Terra, mas sim uma liberdade absurda que supe- !'recisamos pensar em itinerários em que os alunos se sintam auto-
ra a gana do jogador de cumprir qualquer objetivo. motivados e autodeterminados, que possam tomar decisões (senso
E, quando falamos sobre protagonismo , todos os jogos abrem
espaço para isso. Na verdade, a grande cereja do bolo de qualquer 1 l',1ra conhecer mais sobre a relaçao cntn: os jogos e o poder de agênci;1, leia o livro Hamlet "º Halodcck,
,.,trito pda doutora cm literatura Janet Murray. MURR.A Y, Janet. H1111let "'' I lofodeck. São Paulo: Editora
lllll'.Sp, 2003.

2. Confira o trailer oficial de lançamento para Playstanon 4 do jogo !Cito cm 2014. Disponível cm: <https:/ / Veja o primeiro trailer oficial do jogo de 2011. Na época, ele ainda pertencia:\ Mojang. Disponível cm:
youtu.bc/--fbwMuvShQ>. Acesso cm 29 ícv. 2020. lmps://youtu.be/MmB9bSnjVbA>. Acesso cm: 29 fcv. 2020.
3. Confira o trailer oficia! de lançamento para Playstation 4 do jogo !Cito cm 2016. Disponível cm: <https:// 11. Confira o trailer oficial ele lançamento do jogo para Wii U cm 2014. Disponível cm: <https://youtu.be/
youtu.be/P2G54w8H4oM>. Acesso cm 29 fcv. 2020. N LS458ckSEI>. Acc·sso crn: 29 frv. 2020.

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k aut li mia); qu' visualií'c1n c tenh,1111 ,wlrn um( ll'JH 1,1 de s us 1111•111.1 n mo M,11 d li Mon1 o· · ' lizab ·th aylor. O movimento
aprendizados e de env lvimcnt de nov s hal 1lidad ·s (s ' ll de 111 i~11 o ' pi diu n s meio de comunicação, em uma época que
competência) e que possam estabelecer vínculos com outro alu- 111111 1diu om o auge do cinema e da televisão e com a ascensão
nos, trabalhando em grupo e aprendendo em comunidade (senso li li.inda e artistas, como The Beatles.
de pertencimento). ( utra importante característica da cultura pop é que ela pro-
l111 l' limenta produtos voltados para um público essencialmente
I"' L 111, exercendo influência sobre ele, principalmente na moda
~LIÇÕES DA 11 > 'tilo. É o que aconteceu com a banda The Who, nos anos
cultura pop para a ftducaçã o l 1><10, quando ocorreu uma popularização de estilo de roupas co-
l1111da e calças justas. Ou então, mais recentemente, do K-pop,
A biologia nos ensina e a cultura pop comprova que inova- •1 nero musical originado na Coréia do Sul que contagia muitos
ção tem mais a ver com cópia, combinação e rem.ixagem do que 111vcns brasileiros.
7
com criação e originalidade propriamente dita. Para inovar em Na esteira desse movimento, não podemos nos esquecer das
qualquer contexto, você provavelmente vai ter que olhar a grama li1stórias em quadrinhos, dos heróis da Marvel, de jogos de RPG
do vizinho. No início, você pode ficar receoso de copiar, mas se 1 nmo Dungeons & Dragons e, claro, dos videogames. Se a música
não tiver repertório, talvez seja melhor isso do que não fazer nada. 111ílucnciou até hoje o estilo dos jovens e o modo como se vestem, os
Mas, é claro, eu não estou falando e fazendo apologia à uma cópia 11ideogames modificaram a maneira como as crianças brincam e apren-
despudorada. Existem limites e meios para você não copiar, mas d ·m. Jogos clássicos como Pac-Man, Super Macio Bros., Sonic
adaptar ideias e criar o seu próprio caminho. Saiba que esse é um e Donkey Kong sequestraram parcialmente as crianças das ruas e
dos grandes segredos de sucesso da cultura pop. .1presentaram um novo jeito de agir sobre o mundo, interagindo,
Quando falo de cultura pop, refiro-me a uma representação 111 lusive, com outras dimensões de universos virtuais fictícios .
artística que tem grande difusão na mídia e que aspira a atingir um Mas é importante destacar: as crianças não apenas jogam, elas
público cada vez maior. Falo do movimento do pop art que se ini- l,11nbém leem sobre o jogo - saiba que a Minecraft Wiki é uma
ciou principalmente nas artes plásticas, ligado ao pintor e cineasta das maiores enciclopédias digitais do mundo, recebendo contri-
americano Andy Warhol - que registrou os rostos de famosos do buições e dicas de jogadores do mundo todo. Para descobrir os
macetes do jogo, as crianças leem e assistem a muitos vídeos, ou
7. As evidências da ''volução dds cspfrics en1 11os;o planeta apontam que todos llÓS somos cópias de genes seja, consomem outros produtos criados pelos próprios jogado-
ancestrais com ligeiras modifi cações. Essas P'' qunias modificações (combinação ,. remixagcrn da in fonnação
genética) foram e são responsáveis por gerar a vanabi lidade genérica e traços q ue todas a5 espécies detêm. Para res. O desafio apresentado no game acende o pavio da curiosidade
mais infon naçõc·s. leia o livro r;,.,,/uçifo: e> sentido da bioloxia, escrito pelos bri lhantes proÍC'ssorcs e pesqu isadores
Diogo Meycr e C harbcl Ni1io El- Ham. MEYER., Diogo; EL-H AN I, Charbc l Nií'io. Evolução: o sentido da nas crianças, motivando-as a buscar infonnações para solucioná-lo .
biologia. São Pau lo: Editora Uncsp, 2005 .

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Nessa busca , as rian ças ·ntram cm ontato <. >111 outrns rnt ·úd s ! 111tm >111 • 11t~1ri os n ·g,1t1 vo s que a Paramount d ecidiu refa-
e conhecem também formas diferentes de contribuir e produzir ' n p · rs nag ·m e adiar o lançamento do filme para 2020.
8
para seus pares. l 111l.1via , mais do que criticar, alguns fãs decidiram recriar o
Foi assim que o Y ouTube cresceu e deu uma guinada im- 11111( p r conta própria e publicá-lo em suas contas pessoais
portante com as famosas lives e partidas gravadas pelos próprios 1111 ' l'witter. 9
jogadores (muitos deles crianças e adolescentes). Hoje, a Twitcam bx ·mplo 2: no livro Cultura da convergência, 10 Henry Jenkins
é uma poderosa plataforma, na qual milhares de jogadores se co- 11 l.11.1 um exemplo interessante de um grupo de crianças dos Estados
nectam para ver outros jogadores em ação. l !111 1 s que não esperou]. K. Rowling lançar a continuação da saga
Esse fenômeno nos conduz à primeira lição que devemos d1· l lnrry Potter e resolveu criar suas próprias histórias alternativas.
aprender com a cultura pop: transforme seus conteúdos em 1 k.tlhcr Lawver, uma menina de 13 anos, lançou na internet o The
desafios e desperte a curiosidade do aluno para que ele I >,11/y Prophet (O prefeta diário). Hoje o site está fora do ar, mas você
possa navegar por outros mares, descobrindo novos assun- pud ' encontrar informações no blog da Heather. 11
tos e conteúdos por conta própria. Heather criou uma espécie de jornal escolar, no qual dava
Com a ascensão das mídias sociais, os fãs passaram a participar 1 011tinuidade às histórias de ]. K . Rowling, autora de Harry Potter.
cada vez mais ativamente da produção e da distribuição dos pro- A J vem começou então a encorajar seus colegas para participar da
dutos culturais. E a cultura pop se consolidou como movimento publicação - se colocando no papel de um personagem que vive
de época porque passou a escutar ativamente seus fãs . Vamos co- cm Hogwarts - , por causa de frustrações com a escola ou com a
nhecer dois exemplos rápidos, um que envolve o lançamento de f.1mília. Ela pensou no jornal como um recurso para superar um
um filme e outro sobre a ação criativa de uma jovem que criou um evento traumático ou para compensar a hostilidade de crianças de
programa de letramento midiático e pedagógico inforn1al inspira- 'lia comunidade. De fato, as crianças usam histórias para fugir de
do nos livros de Harry Potter. 1 <.: rtos aspectos da sua vida, ou para reafirmá-los.
Exemplo 1: no início de 2019, a internet foi sacudida com Ela então começou a receber histórias de outras crianças e no-
a apresentação do visual de um dos personagens mais queridos tou que cometiam erros na hora de estruturar suas ideias. Por isso,
pela geração gamer: Sonic , o porco-espinho azul. Os fãs ficaram l leather não publicava as histórias imediatamente, mas pedia para
assustados com a versão live-action do personagem e teceram ,1 criança autora revisar o texto e enviava sugestões de mudança na

8. Aqui rr1c refiro à aprcndi:ragcm tangencial. P~ra mais infOrmaçõcs, rcconH.:ndo.i leitura dJ scg;u intc rcfcrfoncia:
<) GU IMAJl..ÃES, Clara. A internet odiou tanto o trailer de Sorlic que decidiu corrigir o personagem.
WEX ELL-MACHADO, Luís Eduardo; MA' !'TA R.,João. Apre11dingcm tangencial: revisão de litaaturasobrc C>fitar D\~ital.
2 mai. 2019. Disponível cm: < https://olhardigirnl. com.br/noticia/a-intemct-odiou- tanto-o-
os usos contcmporâm·os do concei to. Re11ista Hduca011/i11c, V. 11. n. 1, 2017. Disponível cm: <http://www.
tr.ulcr-de-sonic-quc-d ecidiu-co rrib~r-o-pcrsonagem/85358>. Acesso cm: 29 fev. 2020.
!atee. ufrj. br I revistas/ i nd,·x. ph p 'journal=cdu caon 11 nc&pagc= articlc& op= vi cw& path%5B%5 D=904 >.
Acesso crn: 29 fcv. 2020. 10. JENKINS , Henry. Cultum da wnve~~êuâa. São l'aulo: Alcph, 2009.
Assista ao vídeo Video Cawe a11d framing de Daniel Floyd para entender melhor o conceito de aprcndiragem 11. Veja o blog da 1-l cathcr, disponível cm: < https://www.hcathcrshow.com/dailyprophct/ >. Acesso cm:
tangcncia l. Disponível cm : < https://youtu .bl'lrNOqRKjfX3s> . Acesso cm: 29 frv. 2020. '9 fcv. 2020.

46 47
rganizaçã ia. id 'ias. A publi ar os t · tos, o~ .tlun s rc ·cbi, m A' l 011tinua~· <.:S d· 007, d t ·mívcl Jason e de Star Wars são
melhores feedbacks dos leitores, estabelecendo-se também uma 1•1111s dos e cmplo mai conhecidos da estratégia de rernixagem
relação social mais ampla. l.111(.lt11t.:nt infinito. A esses processos de cópias e reproduções
A cultura pop também ensina que para inovar não é n e- 1111pntl·itas", Kirby dá o nome de cultura de remixagem. Logo,
cessário reinventar a roda. Como falei no início, inovação tem 11 11.lo foJa cm uma cópia literal, no estilo Ctrl+C e Ctrl+V, mas
mais a ver com combinação, cópia e rernixagem do que com cria- 111 1 nlllbinação ou edição de material já existente para produzir
ção e originalidade propriamente dita. Veja o caso, por exemplo, 11 •11 novo - mesmo que não seja tão novo assim. Dessa forma,
do modelo de talk show apresentado antigamente por Jô Soares, p111 ll'mos falar sobre a quinta lição que professores podem apren-
praticamente uma cópia do programa norte-americano de David lt 1 com a cultura pop: tudo é uma c ópia, c o m binação ou
Letterman. Tatá Wemeck, Danilo Gentile e Ratinha Bastos têm aproveitamento de ideias preexist entes.
programas muito parecidos com os de Jimmy Fallon. A apresen- Se até a rainha dos baixinhos e uma das bandas mais incríveis
tadora Xuxa Meneghel cortou o cabelo, mudou a vestimenta e d11 rn k puderam copiar, por que há tanta resistência ainda no
apostou em um clone tropical de Ellen DeGeneres, uma das apre- 111odelo de cópia e rernixagem na sala de aula? Muitos professo-
sentadoras de maior sucesso nos Estados Unidos. Em seus clipes, ,,., se preocupam com o fato de as crianças estarem copiando o
a cantora Anitta não hesita em reproduzir elementos do estilo de , 1111tcúdo ou a ideia de uma mídia preexistente, em vez de criar
Beyoncé e Demi Lovato. Mas falando assim, até parece que os bra- , ,, próprios trabalhos originais. É claro que é necessário impor
sileiros copiam e os norte-americanos inovam. Não é bem assim. l1111itcs a isso, especialmente no que diz respeito a citar a fonte
O documentário Everything is a Remix, dirigido por Kirby Fergu- 1111ginal, respeitar o direito autoral e evitar uma cópia literal. A
son, mostra como toda invenção advém de uma cópia. 12 1 úpia seguida de uma remixagem (mesmo que mínima) é um
No documentário, fala-se como Led Zeppelin fez sucesso no t 1po de aprendizagem. Como destaquei nos exemplos, é impor-
mundo copiando estilos musicais de outros artistas. E, no despertar t.111tc compreender que jovens artistas sempre aprendem com os
de seu enorme sucesso, a banda mudou o status: passou de copiadora 111 ·stres consagrados e seguem seus padrões. As expectativas so-
para copiada por outros grupos, como Aerosmith, Heart, Boston e lir ·expressões originais são um fardo difkil para qualquer um em
até Eminem. Na segunda parte, Kirby fala que transformar o velho 111í io de carreira, imagina para uma criança ou adolescente da
no novo é um dos maiores talentos de Hollywood: livros viram fil- 1·ducação básica?
mes, que viram musicais ou vice-versa. Videogames viram filmes, que Se falo sobre essas lições da cultura pop em relação aos alunos,
depois viram desenhos e até seriados de TV e vice-versa. o mesmo raciocínio deve ser aplicado aos professores. A partir
disso, vem a sexta lição: se você n ão sabe por o n de c o m eç ar
12. Assista ao documentário kgcndado produzido por Kirby Ferguson. Disponível cm: <https://vi rn co.
o seu plano de aula, sua palestra ou workshop gamificado,
co m/3267784 1>. Acesso cm: 29 frv. 2020.

50 51
m p ire- cm modelos prontos! Adi ion ' aos pou s o seu Lição O que fazer
toque, mas tire primeiro o b ranco do papel. Jamais fique
olhando para o cursor piscar em sua tela. Escreva, mesmo que co- Transforme seus conteúdos cm desafios e desperte .1 curiosi-
dade do aluno para que ele possa navegar por outros mares,
piando literalmente uma parte de um livro, de um site ou qualquer ano e autonomia descobrindo novos assuntos e conteúdos por conta própria.

outro material que estiver disponível. Comece! Depois você volta ao Escute ativamente sua audicncia, entenda seus anseios L' se
mostre sempre aberto a mudanças durante o processo de
trecho copiado e entrelaça com outras ideias e com outros raciocínios. uto ativo e ílexibilidode ensino e aprendizagem.
Vai modificando aos poucos e adicionando o seu toque pessoal.
Valorize conteúdos recreativos que os alunos comentam e
Reforço isso simplesmente porque criar sequências didáticas lqnlílcodo e relevância com que se importam de verdade.
inovadoras, especialmente permeadas por narrativas gamificadas
Se você não sabe por onde começar o seu plano de aula, sua
não é uma tarefa trivial. Quando apresento uma proposta didática palestra ou seu workshop f,'<lmificado, copie! Ad icione aos
pio e remixoqcm poucos o seu toque, mas tire primeiro o branco do papel.
para algum amigo, diretor de escola ou consultor, muitos me re-
tornam: "Tiago, de onde vêm tanta ideia?". Respondo, claro, que 11111t.lro 1.1

vêm de inspirações de livros, programas de TV, seriados, jogos. 1 ""' Ooutor.

Enfim, tudo o que eu consumo enquanto mídia audiovisual. Não


me limito a exemplos de livros didáticos, muito menos à lógica
erudita e acadêmica de falar dificil como sinal de inteligência su- PIXAR:
prema. Se for pensar, muitas das minhas iniciativas educacionais uma fábrica de sonhos na educação
são peças metafóricas entre a mensagem que quero passar com o
contexto que os meus alunos conhecem e estão vivendo. E apro- A Pixar revolucionou o mundo com suas animações compu-
veitando esse ganho sobre a linguagem mais popular e acessível ao t .1dorizadas impecáveis, porém, mais do que tecnologia, a Pixar
público, vale aprofundarmos essa discussão olhando para as anima- , !iama a atenção de milhões de espectadores porque se conecta a
ções que conquistam plateias do mundo inteiro, as da Pixar. 1 le. por meio da linguagem pop lidando com valores universais
t' ·ulturais da espécie humana. Vida de inseto (1998) 13 é um filme
qu e fala essencialmente sobre inovação e colaboração. Muitas ve-
1cs, para mudar o mundo, é necessário partir para outros lugares,
( riar novas amizades e se fortalecer como fez Flik ao abandonar
14
seu formigueiro e ir em direção à cidade. Já Toy Story (1995) fala

1 \ Confira um trecho do filme Vida de inselú, lançado cm 1998. Disponível cm: < https://youtu.be/
nXchl IytQc M>. Acc,so c m : 2<J fev. 2020.
1 1 Confir-J o trailn oficial dr lan1·amc11to de "l l>y Story cm 1995. D isponível cm:<https:/ /youtu.bc/v- PjgY 1)rg70>.
Artsso '' m : 29 fcv. 2020.

52 53
sobr a imp rtân ia da< mizad ', dis ut · o it'rnit• de um brinqucd 11 11 pc1 so11agc11. principJts 11, o f:tlam nenhuma palavra, somente
caubói em relação a um astronauta tccnológi · t ·ma c mplcx , 111 11c111 sinais , ruídos sonoros. Mas, mesmo assim, é possível sentir
mas que se transforma em algo leve e divertido. , 1111cxao amorosa entre os dois, atingindo o ponto alto do filme:
Procurando Nemo (2003)15 destrincha a saga de um pai inex- 11111.,t1.1r que os sentimentos dos robôs também são os nossos.
penente e protetor que precisa vencer seus medos em busca de P ·r eba que todos os filmes da Pixar têm o compromisso de
eu filho num oceano aberto, repleto de desafios . Monstros S.A . 1 , .11 uma mensagem que se conecta de alguma forma com todos.
(2001) 16 é mais um exemplo incrível que nos faz refletir sobre a 1 11 111 i, afio e tanto fazer isso, mas eles escolheram uma estrutura e
, 1 •,t l' ii ·ntes bem conhecidos pela literatura de contos de fada focada
quebra de estereótipos, diversidade e a importância das relações 1

humanas no trabalho e das mudanças organizacionais. 11 1 .1ventura, desafios, magia, comicidade e metáforas. Daí vem a
Já o longa Os incríveis (2004) 17 segue a linha de Procurando Nemo 11111a lição: transforme seu conteúdo em metáforas e desa-
em sua mensagem familiar. Carros (2006) 18 questiona o significa- hos, recheado de magia e com uma pitada de comicidade.
do da vitória, oferecendo importantes lições morais ao protagonista l lci1c, o que mais se fala é sobre a importância de ensinar as chama-

Relâmpago McQueen. Ratatouille (2007) 19 é um filme surpreen- ' 1. 1., competências socioemocionais para as crianças; e por que não
dente que mostra um rato ministrando uma cozinha sob o chapéu 111 dizar o contexto de Vida de inseto para destacar o trabalho em gru-
21 . ft •

de um cozinheiro humano bastante atrapalhado. Remy, o pequeno pn, u então de Divertida Mente (2015) para mostrar a 1mportanc1a
rato, é a materialização da mensagem principal do filme: a impor- , 1.1 tristeza? Você pode criar percursos gamificados contextualizados
tância de buscar um sonho e a coragem para se livrar das amarras pm esses cenários, todos já bem conhecidos e amados pelas crianças.
naturais e sociais que o impedem de fazê-lo. E o que falar do robô V l:ja, você não precisa criar uma história/narrativa toda nova, elas já
fofo Wall-E (2008) ?20 Esse filme é um dos meus prediletos e apre- , . ·1stem e você pode utilizá-las para inspirar seus alunos para que eles
senta uma mensagem relevante sobre o meio ambiente e o futuro do 11
1terajam com o seu material e se conectem de forma plena e rica,
planeta Terra. O robô Wall-E se apaixona por Eve, uma conexão pt mcipalmente, com a sua intencionalidade pedagógica.
que enche os olhos dos espectadores. O que impressiona é que os

15. Confira um trecho do filme· Pn>Cur,mdo Nemo, lançado cm 200.l. Disponível cm: <https://yontu.bc/
TpkmyYZcUkc>. Acesso cm: 29 fcv. 2020.
16. Confira um trecho do filme Monslr<>s S.A., lançado cm 2001. Disponível cm: <https://youtu.bc/7tP1VlZ-
OqE>. Acesso em: 29 fcv. 2020.
17. Confira um trecho do filme Os incríveis, lançado em 2004. Disponível cm: <https://youru.he/1'7KM
DFpgXqk>. Acesso cm: 29 fcv. 2020.
18. Confira um trecho do fi lme Carros, lançado em 2006. D1sponívd cm: <https://youtu.bc/XEte lt
vorKI M>. Acesso cm: 29 fev. 2020.
19. Confira um trecho do fil me Rarmouillc. lançado cm 2007. Disponível cm: < https://youru.bc/6ZC
101 ASt8 1>. Acc·sso cm: 29 ti:v. 2020.
• J Confira trailer do filme Oii1ertida Mente, lançado cm 2015. Disponívd rni: < https://youtu.bc/ 1.Sp«M
20. Confir,1 o trailer do filme Wa ll-t:. lançado nn 2008. Disponível cm: < https://youtu.bc/mS _lluBX 0
KWk>. Acesso cm: 29 Fcv 2020. ( ; ltfY>. Acesso «111: 29 fcv. 2020.

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d · apr end izag · 111 ·111 alg p -
1 1111.1-. de t 1.111sr rnn .11 o ~c11 t· ~p.1~ o
GAMIFICAÇÃO j ld li, 011 Stj.I , püp .
adora, capaz de ma nte r
ct cu ltu ra po p na sa la dct au la .... tia d' aula precisa ser cur io a e d safi
está sur gin do e abr ir-s e para o
111l1'H'\<;l' d ·stu dan te sob re o que
, in isto
ari, pro fess or de hist ória na 1111 11 p ·rm an ·nte que
a nossa tecn olo gia pro voc a. Por isso
O aut or israelen e Yuv al No ah Har íssimos por
m, que esc rev eu os dois gra nde 111 .1 ( ultu ra pop e
os gam es car reg am elem ent os riqu
Uni ver sida de Heb raic a de Jeru salé
se basear e se insp irar qua ndo
best-sellers Sapiens e Homo-D eus, disse
em um enc ont ro de edu caç ão, 111 111 1 • qua i professores dev em
nci a de apr end izag em.
em São Pau lo, que não sabemos,
pela prim eira vez, o que ensinar 1 l 11H'J .llll alg um a ativ ida de ou exp eriê
. e fluido não dem and a uma
' .
.
22
Na
-
o tem os cert eza de qua is serão os con teú - Mas veja bem , esse cen ário inc erto
as nossas cna nça
ito men os um a exp eriê ncia de
qua ren ta anos. Na con cep ção d111 .1~·ã esvaziada de con teú do, mu
dos válidos daq ui a vin te, trin ta ou o
23
é um reflexo dire to dos tem pos 1 111,1 div ersã o. Ma is um a vez
, em bor a a gam ific açã o flerte com
de Bau ma n (2013), essa inc erte za
ificativo na apr end izag em , tra-
que isso que r dizer? Qu e as coi - l11dH o e rec onh eça seu pap el sign
liquidos cm que viv emo s. Ma s o
o cm sala de aula está mu ito
sas mu dam mu ito rap ida men te. Seg
und o o filósofo pol onê s, nad a é li illi.1r com cul tura pop e gam ific açã
r a me sma fon na por mu ito tem - ent rete nim ent o para os alunos.
par a dur ar, nada é capaz de ma nte d1st:111te de cria r exc lusi vam ent e
o con cei to
siderar: me smo que eu não saiba \' 1 ,, "' pod e até faze
r isso, mas saiba que estará usa ndo
po. Por ém , há um a que stão a con cad a.
er que o interesse e a cur iosi dad e 1 l1 gam ific açã o de
form a mu ito lim itad a e até equ ivo
o con teú do, é fun dam ent al ent end imp orta nte que voc ê en-
de um a criança e um jov em dev em
ser despertados. Para evi tar que isso oco rra, é mu ito
is
ções e da possibilidade de 1rnd a, de fato, o que é gam
ificação, o que não é e seus principa
Co m esse mu ndo saturado de informa
cas do ser hum ano por me io de gen eric ame nte de "gamemitos" .
satisfazer as necessidades mais bási quí voc os - que cos tum o cha má- los
que a sala de aula se insp ire par a h•s ' ão exa tam ent e os tóp icos
que discutirei no pró xim o capítulo.
um simples sma rtph one , é pre ciso
tore s e pen sad ore s da edu ca-
além dos escritos e dizeres de dou
ulo XIX e XX . A con sciê nci a
ção mo der na e pós -mo der na do séc
ndo ele rec onh ece que, nes te
crítica de um pro fess or cres ce qua
bém na míd ia, nos mo vim en-
mu ndo liqu ido , a edu caç ão está tam
s de enc ont ro da div ersi dad e.
tos sociais e nos esp aço s púb lico
sua visão e pos sibi lita dife ren tes
Ao faz er isso, o pro fess or amp lia

dada ao programa Roda Viva cm


laran. rcco1 11cnd o assrsnr a sua cntr<'vista
22. Para con hecer maisª -' icbas de 1 utu.b l'lpH QM0 85 1x0M >. Ac<'Sso cm: 01 mar. 2020.
rni: <http s://yo
1 1 de nove mbro de 2019. Drspon!vcl Man co. R.ro de Janei ro··
ju1,nit11de: conw Nas com R.rcardo
23. BAU MAN . /:ygm unt. Sobri· edtHação r
Zaha r, 2013 .

57
56
O QUE É
GAMIFICAÇÃO?

amificação é uma estratégia que usa os elementos, o pen-


samento e a estética dos jogos no mundo real, visando à
1110 lificação do comporamento das pessoas.
"'orno comentei no capítulo anterior, os game designers incorpo-
1,11,1111 de forma muito rápida pressupostos básicos da psicologia da
111oti vação e mostraram como os games podem motivar os jogadores
1 \l' envolverem de modo muito profundo e duradouro com a expe-
11 ência de jogo. Assim, começou-se a pensar no uso dos elementos
dos jogos em outros contextos, como em serviços e produtos. Essas
11 leias ganharam lastro, principalmente após a viralização do TED da
1•11111e designernorte-americanaJane McGonigal e a publicação de seu
livro A realidade em jogo. 1 Com isso, diversos negócios começaram a
11lilizar a gamificação para motivar usuários a realizarem determina-
1!,1 atividade - como ocorre, por exemplo, em aplicativos de corrida
(Nike Plus) e de aprendizagem de idiomas (Duolingo). 2

1 MCGON IGAL. Jane. A rcalidadl' e111 )o.~o: por que os .~w11e.< nos tomam mdhorcs e como eles podem
11 111d.1r o m undo. São Paulo: BestSl'l ler. 20 12.
' 1 luo lingo é um aplicativo garniticado de aprcndi7agcm de idiomas que pode ser usado cm smartphone
'\11dro1d e !OS. Disponível cm: <https://pt.dnolingo.corn/>. Acesso cm: I'' rn,1r. 2020.
M tivar p sso<s '• um a pr · cup,1\, o t ·11t1 .il para qu ·m atu a l"l , 1u.1n 1 ·ria111 >S ut11 ,1 ,1v,tl1a\·ã , precisamos atribuir algumas
1
como gerente, professor ou treinador e, por isso , a gamifi a ã •1.1s .1 ela. P r exempl , imputamos pontos a cada questão. To-
começou a ganhar cada vez mais espaço na educação escolar e cor- l 1 pod •111 valer a mesma quantidade de pontos ou então algumas
1

1 1
porativa. A literatura sobre o tema é farta e se ramifica em diverso ilrn1 mais - por serem mais difkeis e exigirem mais dos estudan-

protocolos e frameworks, com o passo a passo de como estruturar e 11 (,( , tumamos fazer o seguinte: " Ah, essa pergunta de múltipla
implementar a gamificação. Há uma forte fundamentação na psi- l 1 lha vale 0,2 pontos, como há cinco perguntas, o questionário
cologia e uma série de propostas para classificar os elementos dos .de 1 ponto. O trabalho em grupo vale mais 2 pontos. Para fina-
jogos e relacioná-los a cases de sucesso da gamificação em empresas 11:1'.lr bimestre, aplico uma prova com questões discursivas e de
globais como Nike, Foursquare, 3 Volkswagen, 4 LG, Samsung, 1111'dtipla escolha que vale 7 pontos, assim fecho meu bimestre com
Coca-Cola, Heineken e Nissan. 1 ,oma de todas atividades valendo 10 pontos" .
Mas, e na sala de aula? Qual é o significado da gamificação para Ainda, com base na nota final, você atribui um conceito a
o professor e para os alunos? Que fique muito claro: gamificação apli- , .ida aluno. Por exemplo, se ele tirou entre 9 e 10, é um aluno A
cada à educação não se trata de transformar a sala de aula em um lugar l' , clente! Se tirou entre 7 e 8, é B - ótimo. Se tirou entre 5 e
de puro entretenimento, muito menos em uma lan house em que os . {.· C - regular. Se somou abaixo de 5, é D - insuficiente. Nesse
alunos apenas jogam e se divertem. A gamificação aplicada à educação pt ocesso, que é rotineiro a todos os professores, temos as bases da
tem como objetivo motivar os estudantes por meio da linguagem dos •.1mificação como os pontos e os badges, e um desenho de nível,
jogos, valorizando a intencionalidade pedagógica do professor. llc lassificação do estudante. Não é para menos que afirmo que a
tn io momento professores estão criando sistemas que são, por na-
tureza, gamificados. O que a gamificação pode agregar ao trabalho
PROFESSORES 1 lo professor em sala é transformar esse raciocínio em um processo
'l a art'l d'l qamificar 111ais leve, contextualizado, imersivo e propositivo.
Assim, as notas podem ser transformadas em pontos de ex-
A boa notícia é que os professores são os profissionais que p ·riências,5 os quais podem ser obtidos à medida que os alunos
mais criam sistemas básicos de gamificação. O que falta na verdade ,1 lingem objetivos e avançam nos níveis. Conceitos podem ser
é uma aproximação maior com a linguagem dos games. Repare 11 ansformados em badges6 visuais que podem ser armazenados e
1
olecionados, tanto digitalmente como fisicamente. As atividades
3. No l'oursqu.1rc os usuários fo7ia111 d1erk-in quando dwgavam cm algum lugar. Eles g-•nhavam pontos e podem ser transformadas em missões. Dessa forma, ao completá-la,
quem tinha mais clwck-in cm um ,·stabdec1111cnto Sl' tomava prctê:ito daqudc local. O aplicativo era uma
tê:brc anos atrás.
~. 1 ambérn conhecido como X I' (F.xpcricncc Points). Os pontos de <'xpcriências são bastant<" utilindos cm
4. Recomendo conhecer o site Thc í'un TIH·ory que reúne uma série de miciativas gamificadas visando i
modificação do comportamento cfas pessoas. 1)isponívcl cm: <https://goodvcrtising.site/thc-ti.111-thcory/>. I "~º' de RPG (Rok-Phying Game).
Acesso cm: 1º mar. 2020. " Os bad,~e.< são també·m conhecidos corno selos ou meda lhas.

61

l
60
ganha-s ·XP ·, p r que nã , 111 'lL1s Ht d111lt ·110 (fr tí ·io, clar )) 11 qHl . P r · •111plo, '• possív ·I utilizar u1n Google Forms ou um
d111ot! 7 ·01110 ferramentas que oferecem feedbacks imediatos para
para que o aluno possa adquirir iten . , it ns p d ·m nfcrir
alguma vantagem ao aluno - como eliminar uma alternativa d , , 1 ..,, mLmtcs. Em tempo real, os alunos sabem se acertaram ou não
uma pergunta de múltipla escolha ou então o direito de consultar 11
11
.1 1·t 'nTtinada pergunta. Essa resposta é muito poderosa, pois os
1 1
a internet durante uma atividade em que não seja permitido. O 111111 a d modo muito mais efetivo e ajusta o seu comportamento
alunos podem formar times com um nome específico e juntos ga- 111 t ~· rnpo real - assim como faz os jogos.
nharem pontos pelas suas conquistas. Isso aumenta o sentimento )utro desafio para o professor quando utiliza gamificação é

de pertencimento e o trabalho em equipe. Os times, por sua vez, , •l'I ·nciamento das informações, como a quantidade de pontos,
podem competir com outros times, reproduzindo uma dinâmica 11 11 bui ção das medalhas, a progressão nos níveis, dentre outras
1

coopetitiva - colaborativa entre os estudantes e competitiva entre , 111-..is. Não é fácil fazer isso. São horas e horas tabulando notas
11 11 ,1balhos e provas convencionais dos alunos. Dependendo do
os grupos-, algo que ocorre em todos os esportes coletivos.
11 ,l' nho da sua gamificação, esse processo pode ficar muito mais
tl'nso e meticuloso, tomando-se mais demorado e enfadonho.
l' ntão que entra a importância dos recursos tecnológicos para
DESAFIOS PARA USAR
l.11 ri i tar o registro e o compartilhamento das informações com
a qamificação na sala d~ aula
, ,.., estudantes. As tecnologias digitais, nesse sentido, auxiliam o
É importante ressaltar que gamificação não é apenas inserir 111 n~·ssor a reproduzir de forma mais contundente a estética, o
elementos de jogos como medalhas ou pontos - é preciso ter uma IH'llsamento e os elementos de jogos em sala de aula.
abordagem mais profunda. Por exemplo, percebo que os alunos
valorizam muito a narrativa como elemento de contextualização e
atribuição de objetivo e propósito. O QUE NÃO É
Outra característica fundamental dos jogos é o feedback ime- qamificação
diato. De forma muito rápida, os jogos respondem se o jogador está
performando bem ou não. E , quando pensamos na gamificação em sala Escolas e empresas, no geral, andam muito mal informadas so-

de aula, reproduzir essa última característica dos jogos, a do feedback l ir, o conceito de gamificação e, a exemplo do que ocorre no campo
instantâneo, não é uma tarefa nada trivial. Em geral, aplicamos uma 1
la neurociência, são vítimas de especulações e mal-entendidos que
prova e depois de uma semana ou até mais retomamos com elas cor-
rigidas. Demora-se tanto que muitas vezes o aluno nem se lembra K.lhoot! é uma plataforma onde se pode criar questionários interativos e compartilhar com os alunos cm
d.ide aula. F.m tempo real, eles ocompanharn sua performance. bcrn como o núnwro de pontos adqumdos.
mais do conteúdo avaliado . Hoje, a tecnologia tem encurtado esse 1 , pndivcrtido e os alunos gostam bastant<'. Disponível ,·m: < https://kahoot.com/schools/>. Acesso cm:
11
1 rnar. 2020.

63
62
ali111 nt< m s hamad s NEUROMITOS. A t.il t.1 d· '/ ·I > an~llis · N ·ss · s ·11Lid , vai · .1 1 ·11 .1 l.1z ·r uma difcren iação conceitual.
profunda sobre a gam.ificação tem gerad div ·rs s cquív 0
1111 lo Karl Kapp (2012, p. 125), 8 " gamificação é o uso das
do termo . Esses chamo, genericamente, de GRMEMITOS.
111 e. :lni as baseadas em jogos, da sua estética e lógica para
V ej amos os cin co maiores deles a seguir:
11 •.1jar as pessoas, motivar ações, promover a aprendiza-
m resolver problemas em contextos de não jogos".
O~ 0 --- 1\S. a diferença é reforçada por outros especialistas da área como
Gamificaçõo é criar Gome e gamificaçõo 1 v111 W erbach ,9 B rian Burke, 10 Andrzej M arczewski,11 dentre o u-
e utilizar jogos de têm os mesmos
tabuleiro ou digitais. propósitos. 111 1', bnbora os co nceitos estejam relacionados, um não é sinônimo
111 n ulro, são bem distintos e essas diferenças precisam ser levadas em

º"----
Gamificaçõo visa
ao divertimento.
1111s1d ·ração no momento de apresentar soluções gamificadas.
() segundo gamemito é mais discreto, mas seu entendimento
111ui to im p ortante para compreender o valor da gamificação en-
p1.111to m éto d o p ara transformar o m un d o.

Gamificaçõo
Gamificaçõo
é sinônimo de
usurpa as pessoas.
entretenimento. A Khan Academy é uma plataforma de apren-
dizagem de conteúdos escolares. Ela é u m

e produto. V ocê pode acessá-la via aplicativo


ou página web. Agora, dentro do produto
Vamos d esfazê-los u m a um, começand o pelo mais enraizado . 1ome é produto,
gamificação é
Khan A cademy, há u m processo d e gamifica-
processo. ção que motiva o usuário a cumprir as
Esse é o primeiro gamemito que desfaço quan- atividades, assistir os vídeos e estudar cada vez

o do realizo uma palestra sobre o


Gamificar não é a mesma coisa q ue jogar um
tema. mais por meio de barra de progresso, badges e

Gamificação
jogo ou então transformar palestras, aulas, KAl' P, Karl M. TI1r Camificatio11 of L.ca111i1~~ a11d lnstructio11: Garne-b.1scd Mcthod' JJ1d Stratcgics for
não é o mesmo l o11111 11g and Educnion. Washington: Pft:1ffer & Company, 2012.

que criar e reuniões ou treinamentos em u m j ogo. Esse 1) pro tessor Kcvm Werbach tl'm vários livros publicados, o que mais gosto é o For thc Win: How Camr
l /1111 ki11;: Ca11 ReF<'lutio11i:e Yo ur B11siness. cm coautoria com Dan l luntcr. Wcrbach ta mbém tem 11m curso
utilizar jogos. tipo de conceituação, embora p ossa fazer cer- 1 11111 to sobre g-.1mificJção publicado na pl.1taforma Courscra. Vale muito a pena conferi- lo. D isponívd cm:
h11ps://pt.courscra.org/karn/s>:1mificatio11>. Acc•so em: 1° mar. 2020.
to sentid o, não é coerente com a d efinição da Ili HUR.KE, Bri.111. Cam!/lcar: como a gamificação motiva as pessoas a fa7crcm coisas extraordinárias. São
l' 11duc DVS Edit0ra, 2015.
metodologia e sua aplicação prática.
11 Conheça o site deste incrível autor sobre gamificação. Disponível cm: <https://www.gamificd.uk/>.
,."º cm: I" mar. 2020.

64
65
po11tos r<111h s p r Jtivicfad ·umpn la. N( tou .1 dilv1 ·1H_.1 ? ' 1111cs sã 11 1J'illltH 1llaH r le n1.1t ·1 i,il d1-;po11ibilizad , mai tro a de experi-
cxpcriên ias fechadas, enquanto gamifi açã é um pr · ·sso ab 'rt . 111 1.1s, mais colaboração entre s alunos (ou competição também
11 1do i·p·ndc como o processo é planejado e aplicado), mais
' li
111 q11011cia nas aulas etc.
li
MUNDO
1

- - - - EXTERNO _ _ _ __
O terceiro gamemito é emblemático. Embora
pareça contraintuitivo, a gami.ficação não está
associada à ideia pura de divertimento . Muitas
GAME pessoas partem da premissa de que é possível
Círculo mágico o diz respeito
FECHADO tornar todas as atividades divertidas acrescen-
xclusivomente
o divertimento. tando pontos e hadges, como em umjogo.
Há inúmeros sites, blogs, consultores e
Figura 2.1 artigos que afirmam que a gamificação pode
Fonte: O au tor.
1111nar atividades laborais e de aprendizagem mais divertidas. Jesse
, h ·ll, 12 professor de tecnologia do entretenimento na Carnegie
O que quero dizer com isso? Games costumam ter início, meio e Mdlon University, compara a gamificação à adição de cobertura
fim - é um produto que se cria e se distribui comercialmente ou não. de hocolate em cima de pratos salgados - como queijo cottage ou
Por outro lado, gamificação é um processo que se implanta, que modi- l11 ó olis, por exemplo - ou, inclusive, de coisas que nem são ali-
fica a experiência do usuário em uma atividade e resolve um problema 111entos - como grampeadores. O chocolate de fato torna alguns
de engajamento ou motiva mudanças específicas de comportamento. lll' ll S mais saborosos, porém esse efeito não é universal.
Embora dentro de um jogo de tabuleiro ou digital o jogador Na verdade, ele até brinca que a atitude de acrescentar cho-
resolva muitos problemas propostos pelo game designer e adquira ' o late a tudo é um fenômeno de "chocolatificação" um efeito
inúmeras habilidades no âmbito cognitivo, emocional e social, di- , olateral do excesso de gamificação ou de seu uso indevido em
ficilmente essas aprendizagens terão um impacto direto e imediato d iversos contextos. Para ilustrar, recomenda imaginar uma porção
sobre o mundo fora do jogo.
11• brócolis coberto com chocolate.
Processos gamificados buscam impacto direto e imediato para Na mesma linha, é um mito acreditar que gamificação é um
além do jogo. No âmbito da sala de aula, significa: mais motiva- 111ar cor-de-rosa, uma espécie de babá perfeita como Mary Poppins.
ção do aluno ao entrar em contato com a proposta do professor,
1 ' SCI IELL,Jessc. T1w Art o( Game Des\~11: A Book ofl.,'nscs. Massachuscts: A K Pctcrs/CRC l'rcss, 2014.

66
67
Aulas, r 1 llla~'( ·s . e rnsult nas l'lll g.1111rlH ··~· ) Jl, ( sJ ap 'I), s ( h.J< g >s 11, tê111 outro pr >pósit s ·nã o de entreter os par-
experiências de treinamento animadas · motivadoras. 13 ns pr - 111 q1.111t ·s (salv hamad serious games). Já a gamificação gira
fessores e consultores que trabalham com gamificação devem er 111 torn d' motivar jogadores a atingirem objetivos que são com-
propositivos e conhecer o problema real do seu público-alvo ou 1'·11 t ti lt ados pelo professor e pelo aluno jogador.
fazer uso de métodos de pesquisa e síntese para que o problema
seja revelado ou esclarecido. Só então devem recomendar ou não
a implementação de metodologias e processos gamificados para Finalmente, o último grande gamemito: a ga-
resolver o problema em análise.
mificação, como qualquer outra metodologia
ou ferramenta, é uma faca de dois gumes.
Gamificação
Tudo depende do design, propósito e uso dela
não usurpa,
O quarto gamemito é um desdobramento do
o
Gamificação
anterior. Vejamos o porquê. Enquanto games
mos engaj o
as pessoas.
no contexto escolhido. Gamificação exige sen-
so crítico e apuração ética rigorosa para separar
podem ser focados em entretenimento e dis- o joio do trigo. Como qualquer outra tecnolo-
não diz tração, a gamificação tem um compromisso gia ou metodologia, o juízo de valor atribuído
respe ito ao
absoluto com a motivação e a resolução de 111 seu uso depende exclusivamente do ser humano que a utiliza.
entretenimento
e à d istração. problemas. Dessa forma, os jogos deixam as l 'omo professor ou instrutor, você pode utilizar a gamificação para
pessoas escaparem do mundo real, transpor- , 11.ir um senso genuíno de colaboração entre a tum1.a ou, então, uma
tando-as para o interior do chamado círculo l rdadeira batalha competitiva e nociva entre os alunos.
mágico, como bem cunhou o historiador Johan Huizinga. 13 Como qualquer cozinheiro, você precisa saber escolher bem
Já a gamificação deixa as pessoas escaparem no mundo real 11s ingredientes (elementos dos jogos) e misturá-los de forma har-
delas. Lembre-se de que existe um círculo mágico, mas ele não é 111 oniosa (criar um bom game design) para obter um bom prato
fechado . O círculo mágico criado pela gamificação é semiaberto e (resultado). O que observo é que, quando a gamificação é mal
está em contato direto com a realidade. Essa é a maior promessa da planejada e executada, o processo pode, de fato, explorar o usuário
gamificação na verdade: transformar o mundo a partir do uso dos o u amargar as relações e criar um ambiente não esperado. Contu-
fundamentos da ciência da motivação e elementos do design dos do, quando é bem-feita, engaja as pessoas e promove mudanças de
jogos. Jogos de tabuleiro e digitais são inspirações, mas não o meio < mportamento, desenvolvendo habilidades e competências nos
pelo qual se realiza a transformação propriamente dita. usuários, bem como aumentando a produtividade e impulsionan-
d a inovação nos mais diversos contextos.

13. HU IZ INGA, J ohJn. H.>mt> Ludms. São Pau lo: l'crspcctiva, 2014.

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69
SEPARANDO O JOIO DO TRIGO: RENÇAS ENTRE
joqos (Z qamificação GOS, JOGOS SÉEIOS
GAMIFICAÇAO
Cada vez tenho mais certeza sobre a maior relevância de aber
gue um determinado conceito não é do que é. Parece confuso, mas
o princípio de exclusão é uma estratégia que nosso cérebro utiliza
para escolher e abraçar com mais força um determinado conceito
ou ideia. Professores, gerentes e treinadores de desenvolvimento
de RH sempre me escrevem perguntando sobre gamificação, mas
na realidade o que buscam é um jogo para mediar um processo de
aprendizagem, transpor conceitos técnicos e facilitar a conexão social
entre alunos e funcionários e integrantes de multiplicadores internos.
Deixa eu esclarecer uma coisa: essa busca incessante pelo jogo só
reforça a importância desse artefato nas organizações, bem como seu 1 '"" Adaptado
2.2
1 de The gomificotion of leorning ond instruc tion, de Karl Kop p .
111
uso em processos de aprendizagem. A bem da verdade, gamificação
não é um analgésico para todas as dores. Ela não resolve todos os
nossos problemas. Muito menos o jogo pelo jogo. É muito impor- Xadrez e Banco Imobiliário, assim como Macio Kart, Pac-Man
tante entender antes de tudo qual é o problema com o qual você está 1
Minecraft, são jogos propriamente ditos, pois têm como finalida-
lidando e o seu propósito enquanto professor ou líder de equipe. 1 li· básica o entretenimento dos usuários . Jogos sérios, por sua vez,
Em relação à gamificação, muitas pessoas confundem porque u idem ser utilizados de diversas formas, mas com um propósito
1
é uma palavra nova, a buzzword que seduz e muitas vezes gourmeti- ill' aprendizagem que vai além do entretenimento. Por exemplo,
H idemos criar quiz es para testar ou facilitar a memorização de
z a a prestação de serviço. Por isso, insisto: é importante diferenciar 1
os conceitos. Para facilitar essa diferenciação, costumo mostrar em 1 terminados conteúdos ou para lembrar com mais eficácia de
1 1

minhas palestras e treinamentos esse diagrama simples de três cír- , .1racterísticas de um produto.
culos. Ele sempre funciona e foi inspirado no livro The gamification Jogos de tabuleiro podem ser utilizados para desenvolver nos
of learning and instruction de Karl Kapp. .tlunos 0 senso de cooperação, destacar a importância do plane-
1,1111ento, do trabalho em equipe e do cumprimento das metas
.ir rdadas em um período de tempo limitado. Na mesma linha,

71
70
11
1

T1AGO EuGENIO RULR EM JOGO

jogos digitais como o famoso StarCraft podem ser adotados para lc'igicos ou virtuais de aprendizagem. No que tange à aprendizagem
trabalhar com planejamento estratégico e tomada de decisão. 1 distância (e-learning) ou então à implementação de metodologias
No âmbito dos chamados seríous games, jogos prontos e focados 111 vas como ensino híbrido e sala de aula invertida, a gamificação é
no entretenimento, como Minecraft, SimCity e Civilization, podem 11111a ferramenta estratégica poderosa por motivar e engajar os usuá-
ser adaptados e utilizados com um propósito de aprendizagem mais 1111s a participarem das atividades e discussões virtuais.
específico. Ainda, jogos, tanto digitais quanto analógicos, podem ser
criados com uma intencionalidade pedagógica explícita. 14 Quando
utilizamos jogos para facilitar processos de aprendizagem, na verdade Reprodução Possui usado usado
ndedlqna da Desenhado apenas
como um qamc elementos como um
para
estamos falando de uma aprendizagem baseada em jogos.15 Essa realidade de qamc qamc
diversão

metodologia ativa é fabulosa, eficaz e deve ser celebrada tanto quan-


to as conquistas obtidas pela gamificação. Piagct, Vygotsky e Wallon
defenderam em suas teorias a importância da educação mediada por
jogos, visando ao desenvolvimento pleno das crianças.
A aprendizagem baseada em jogos é uma tendência que vem
sendo incorporada cada vez mais na educação . Não é para menos
que hoje os jogos digitais são um dos meus principais eixos de
trabalho. Dessa forma, a apropriação dos jogos e de seus ele- DESISH
'"IPIRADD Lembra um gomes.
mentos em contextos educacionais pode ser vista em diversas "SllHE' 1
configurações. Em jogos projetados especificamente para a edu-
cação, conhecidos como jogos educacionais, jogos educativos '"""'o 2.1: Além dos dife re nças e ntre g om es.
serious gome e gomificoçõo. devemos ta mbém lembrar
• .1rnulodores e os aplicações insp irados e m gomes têm s uas dife re nças.
ou edutenimento, conteúdo e jogabilidade são criados especifica- 1 '"' Atloptodo de Mo rczewski (2015, p. 15). 17

mente para abordar temas de interesse de um professor.


Já a gamificação utiliza elementos e dinâmicas dos jogos, como (;;unifi cação é um dialeto que emergm a partir do jogo. A
níveis, progressões e pontuações, de forma lúdica, em ambientes ana- • 111t·1gênóa das tecnologias digitais transformou esse dialeto pri-
111t·110 em uma linguagem própria, viva e vibrante. Entenda assim:
14. Recomendo os jogos sérios prodmidos pelo grupo de pcsq nis.1 Com u nidades Virtuais da UNEll. Todos
os jogos são gratuitos e contérn guias de orin1ta~·õcs para o professor utilizá-los em sala de aula. Disponível
cm: < http://comunidadcsvirtuais.pro.br/cv/>. Acesso t•m: 1" mar. 2020. • 1 'I " 11 11 10 "' 1.1' uso de elementos de imagens, sons e intcraçfü·s qu<' lembram o u niverso dos j ogos para
15. Em parceria com a ncuropsicopcdagoga Ana Lúcia l lenncmann. criamos a Plataforma Educac1011.1l 1 li il • 11111111111 .11·fo. l'or ,·xcm plo: quando urna tela de in ternet sa i do ar ou uma sequl-ncia d,· slides cm
·li 1 1111 1 q111 1110>1r;1 11m,1 barra de progresso sendo preenchida.
Ncurons com jogos voltados p.1ra o <«tímu lo das fonçÕ<'S cognitivas <' outras habilidades dt' ,1prendingc111
A plataforma conta com urn sistema dt• ava liação 011-linc e J1wrsos jogos para u'o 11n ro11tntn cllnin1 < 1-\ lt( / l·WSl< I. A11dr1cj C. Even Ninja M,mkeys Uke to f>lny: Gamification, Game T hinking and
cduc,1ciona l cm crianças da Educaç~o Infantil,. E"'1110 h111J,1111c·ntal I. D1sponíwl r111 h11p I !t 111 ~11n11011\ 1 •li 1111111.11 1k'it-:n South .aro lina: Crcatcspace lndcpt•ndcm l'ublishing l'latfonn , 2015.
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ga111ijicaticm '. uma h11guagc111 que pode \ ·r ,1p l1r.1d,1 cm conte tos
VOCÊ QUER
não as ociados djretamente a jogos. nquanto linguagem, a gami-
SIMULAR, JOGAR ÁRVORE DE
ficação extrapola a estrutura do jogo e se mistura com o dia a dia TOMADA DE DECISÃO
OU GAMIFICAR? DE MARCZEWSKI
do usuário - você mal percebe que ela faz parte do seu cotidiano
quando utiliza Linkedln, Waze, Instagram, Facebook ou, ainda,
usa o cartão de crédito para acumular milhas e depois trocar por
uma passagem área.

Desejo e 1or um ambiente


virtual seg ro paro testar
de formo fidedigno
s da VIDA AEAL?

otne digital
Não há ne

gomeploy gomeploy

m
Diversão/Entretenimento os p soas em
SEU PROPÓSITO?

Figura 2.3
F ante: Traduzida de Marczewski (2015).

Voce provavelmente quer


um DESIGN INSPIRAOO
~M GAMI.

Figura 2.4
Fante: Traduzida de Marczewski (2015).

74 75
A despeito d ·ssas dt1<.·re11c;as " 1n1po1 l.111lc d ·st.1<.1r que d ·sign
de s luçõ nã pode fi ar refém delas . Essas ·sp · ·ifi idades nã
podem modelar a forma como pensamos cm resolver problemas.
A definição nos oferece a linguagem que precisamos para comu-
nicar nossas ideias. No entanto, se encontramos um desafio que POR QUE E
é mais fácil e prático de ser resolvido com o uso de um seríous QUANDO USAR
game, como para fazer a recepção de novos alunos e ensiná-los GRMIFIC:RÇÃO
sobre o ambiente escolar ou as regras de segurança em um labora- NA EDUCAÇÃO?
tório de ciências, criamos então um jogo sério e não oferecemos
uma solução garnificada para isso. O pulo do gato está justamente
em conhecer as necessidades do público-alvo e analisar ideias sobre
qual é o caminho mais recomendável a seguir.
gamificação é útil para a educação porque tem tudo a ver com
E, além de entender a natureza do conceito de garnificação, é
o engajamento nos níveis cognitivo e emocional do aluno. É
muito importante entender quando e porque utilizar garnificação
11111 isso que a estratégia é recomendável para um bom aprendizado.
em sala de aula. Esses são os dois principais tópicos discutidos no
e :.11nificação não é jogo, mas uma estratégia com uma linguagem
próximo capítulo.
1111 l.1 fundamentada nele. Então, vale a pena a pergunta: por que as
p1·ssoas jogam ou gostam tanto de jogar?
Muitas vezes o jogador comenta sobre o quanto é bom em
1ktcrrninado jogo (senso de competência), o prazer de superar um
desafio e a emoção de vencer e explorar o jogo (sensação de vi-
11\ria). Provavelmente, contará sobre o que se trata o jogo, qual
1· .1 história do personagem, suas motivações e objetivos dentro
d.1 jornada (contexto emocional). Comentará sobre sua evolução
(progressão) nas mudanças de níveis ou como foi difkil vencer
11rn cheta'.o após várias tentativas (desafio cognitivo). Deve também
1·nfatizar como criou uma estratégia para vencer e conquistar itens,
1ncdalhas e pontos no jogo (senso de conquista e posse), e ainda
.1ccrca da diversão de conhecer e colaborar ou competir com ou-
tros jogadores (interação social) .

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