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Rio de Janeiro
2020
Isabela Santos de Lima
Rio de Janeiro
2020
Isabela Santos de Lima
Banca examinadora:
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Rio de Janeiro
2020
DEDICATÓRIA
Sou Negro
Sou negro
meus avós foram queimados
pelo sol da África
minh`alma recebeu o batismo dos tambores
atabaques, gongôs e agogôs
Contaram-me que meus avós
vieram de Loanda
como mercadoria de baixo preço
plantaram cana pro senhor de engenho novo
e fundaram o primeiro Maracatu
Na minh`alma ficou
o samba
o batuque
o bamboleio
e o desejo de libertação
Solano Trindade
RESUMO
Sumário
INTRODUÇÃO.........................................................................................................10
APÊNDICES ............................................................................................................84
INTRODUÇÃO
10
padrão a ser almejado, ao negar a identidade negra e localizá-la enquanto elemento
negativo na construção social do país.
Nos debates sobre o período da escravidão alguns autores, dentre os
utilizados aqui, usam o termo escravo para se referirem aos negros nesse período.
Entendemos, porém que o ser escravo não é uma condição de existência. Por isso
utilizaremos o termo escravizados para nos referir aos negros que foram
forçadamente colocados nesta condição.
Enquanto elemento que perpassa todos os aspectos da vida o racismo
atravessa toda a discussão de saúde e se constitui enquanto um profundo
determinante social. Entretanto os estudos em saúde mostram que seus impactos
são negligenciados dentro deste campo, evidenciando a profundidade do racismo e
da democracia racial vigente na atualidade.
As transformações na abordagem sobre saúde, a instituição de um sistema
único de saúde e dos princípios que o regem trazem à tona a necessidade do
combate às expressões do racismo no interior das instituições de saúde. Esse passa
a assumir um caráter central de reflexão e intervenção vinculado ao debate sobre a
equidade no SUS.
A trajetória de luta dos movimentos negros ocupa um lugar essencial no
combate ao racismo e nas discussões sobre a saúde desta população. Questionam
a negação do direito a identidade deste grupo racial, a realidade social que é
imposta as/os negras/os marcada pela desumanização, pelo genocídio, pela
negação de direitos e por condições de saúde que expressam o abismo de
desigualdade social entre brancos e negros e que tem esse fenômeno social como
um aspecto fundamental para sua explicação.
Os debates no Serviço Social apontam avanços, ainda recentes, para a
abordagem do tema principalmente nas questões relacionadas ao campo da saúde.
E estão relacionados com o racismo presente no espaço universitário e com uma
debilidade ao se abordar este tema na formação profissional.
Este quadro se expressa, por exemplo, nas produções teóricas que não
relacionam as discussões de saúde e racismo. Impactando profundamente na
formação profissional dos estudantes que atuarão nas instituições de saúde e se
colocando como um obstáculo para a concretização dos princípios profissionais e do
projeto ético político da profissão.
11
Este trabalho busca refletir sobre esses aspectos, visto que estes possuem
implicações práticas ao exercício profissional. É também um elemento real que
marca a vida dos sujeitos atendidos e que estão inseridos nesta realidade.
É uma necessidade urgente o aprofundamento deste debate no serviço
social. Por isso, desde uma análise da abordagem da relação entre racismo e saúde
nas disciplinas de estágio na Faculdade de Serviço Social da UERJ e de produções
teóricas sobre o tema busca-se contribuir para uma reflexão sobre sua compreensão
e dos aspectos que dificultam sua abordagem.
O trabalho está organizado em introdução, três capítulos e considerações
finais. No primeiro capítulo são apresentados aspectos sobre a construção, o
desenvolvimento e a manutenção do racismo enquanto uma característica que
fundamenta a estrutura social. No segundo serão abordados os aspectos estruturais
do racismo como determinante da dinâmica na sociedade brasileira contemporânea,
que perpassa todos os aspectos da vida social na sua relação com as discussões de
saúde. No terceiro são tratadas as particularidades dos aspectos que envolveram a
pesquisa empírica, o seu contexto, a caracterização das/os participantes, os
instrumentos utilizados na coleta, os resultados e a análise dos dados.
12
CAPÍTULO 1
13
fenômeno social e de como este permeia as relações sociais, é possível visualizar
seu desenvolvimento e sua dinâmica social.
Kabengele Munanga1 (2003) ao realizar uma abordagem conceitual das
noções de raça, racismo identidade e etnia demostra de maneira didática a
transformações ocorridas no emprego do conceito de raça no decorrer da história.
Demostra como o conceito de raças, e o conceito de raças “puras”, tem sua
utilização primeiramente vinculada nos estudos das ciências naturais. Destaca que é
nos séculos XVI-XVII que este conceito vai começar a assumir, na França, um lugar
efetivo nas relações sociais.
Munanga (2003) demarca que o conceito de racismo foi criado por volta de
1920 a fim de denominar as relações desiguais que teriam como base a divisão
entre as “raças” humanas onde as características físicas determinariam, a partir da
articulação entre elementos físicos, intelectuais, morais e culturais, a localização
subalterna de todas as raças frente a raça “branca”. Partindo então de uma
abordagem que tem a “raça” como ponto inicial “o racismo é essa tendência que
consiste em considerar que as características intelectuais e morais de um dado
grupo, são consequências diretas de suas características físicas ou biológicas”
(Ibidem, n.p). Socialmente a articulação destes elementos e a hierarquização da
humanidade em raças superiores e inferiores se mantém no ideário das massas a
despeito dos avanços científicos e se reproduzem nos mais diversos âmbitos da vida
social.
Silvio Almeida (2018, p.15) afirma que “(...) sociedade contemporânea não
pode ser compreendia sem os conceitos de raça e de racismo”. Esse não seria um
elemento patológico ou uma expressão de anormalidade, mas responsável por
constituir uma lógica desigual e violenta que vai moldar a forma social
contemporânea. Vai se expressar em toda a vida social manifestando uma relação
política e econômica profunda. A construção de uma ideologia que localiza o homem
branco como ideal se liga ao processo de desumanização de povos e culturas, no
colonialismo. Determina como variações menos evoluídas os sistemas e culturas
15
que não condizem com o tipo ideal e vai reger a organização da sociedade a partir
de normas e padrões racistas. O racismo vai se configurar então como um processo
de caráter sistêmico.
As regras e padrões racistas atuam na ordem social vigente para que seja
possível a sua perpetuação. Neste aspecto as instituições vão ganhar um destaque
ao ser por meio delas que se materializa a estrutura social e o modo de socialização.
Elas serão responsáveis por reproduzir o racismo, já que este é:
2
Aníbal Quijano é um sociólogo decolonial peruano que desenvolveu o conceito de “colonialidade do poder”
para compreender a formação da modernidade no momento de inflexão do desenvolvimento do capitalismo,
em sua dimensão globalizada desde o desenvolvimento histórico do colonialismo.
16
a imposição mundial de um novo padrão de organização social que começava a se
desenvolver (Ibidem).
Aníbal Quijano localiza no quadro do desenvolvimento histórico mundial, a
“descoberta” das Américas como um processo de globalização responsável por
localizar “(...) o capitalismo colonial/moderno e eurocentrado como novo padrão de
poder mundial” (Ibidem, p.117). Sendo, portanto, parte constitutiva do nascimento,
evolução e consolidação da burguesia enquanto classe dominante e da constituição
de um mundo que correspondesse aos seus interesses.
17
metrópoles a partir do tráfico, da comercialização de africanas/os e da expropriação
compulsória de seu trabalho para funcionamento e desenvolvimento das colônias.
3
C.L.R. James foi um revolucionário negro fundador da Quarta Internacional, dirigente do S.W.P. Partido
Socialista Norte americano e da Oposição de Esquerda. Teve sua produção intelectual voltada ao tema da
escravidão, do racismo, sobre a Revolução do Haiti, a Revolução Russa e sobre stalinismo.
4
Clóvis Moura utiliza o conceito de escravidão moderna para referir-se ao processo de escravização do negro
africano como um modo de produção o qual pode-se notar no processo de acumulação primitiva de capital.
18
Williams chama atenção para as possibilidades abertas com a descoberta de
novos mercados, o desenvolvimento de novos bens de consumo e o aumento da
capacidade produtiva que se expandia a cada novo desenvolvimento da indústria. E,
apesar de focar sua abordagem nas colônias do Caribe, ele destaca elementos
gerais que se estenderam nos territórios colonizados: o latifúndio, a monocultura e a
escravidão negra.
A escravização negra se institui então como um elemento essencial para a
lucratividade das metrópoles a partir do tráfico e comercialização de africanos e da
expropriação compulsória de seu trabalho para funcionamento e desenvolvimento
das colônias. “A escravidão, de sua condição de fator insignificante na vida
econômica da colônia, tornou-se a base sobre a qual ela se estabeleceu.” (Ibidem,
p.31). A centralidade do trabalho escravo nas colônias ligado ao aspecto econômico
fundamental que estas representavam para as metrópoles e para o desenvolvimento
da burguesia exigiu um fluxo constante e intenso de negras/os escravizadas/os pelo
Atlântico.
Todavia os males reais desse processo mancharam todo o Atlântico com o
sangue daquelas/es que foram arrancadas/os do continente africano e
comercializadas/os como mercadoria. Os povos que compunham o continente
africano tiveram suas estruturas sociais desmanteladas pela dinâmica imposta pelos
interesses colonizadores.
A vida tribal foi destruída e milhões de africanos sem tribos foram jogados
uns contra os outros. A interminável destruição da colheita resultou no
canibalismo; as mulheres cativas se tornaram concubinas e degradavam a
condição de esposas. As tribos tinham de suprir o comércio de escravos,
ou então elas mesmas seriam vendidas como escravas. A violência e a
ferocidade tornaram-se as necessidades para a sobrevivência, e foram a
violência e a ferocidade que sobreviveram. Crânios sorridentes na ponta
de estacas, os sacrifícios humanos, a venda dos próprios filhos como
escravos: esses horrores foram o produto de uma intolerável pressão
sobre os povos africanos, que se tornavam mais ferozes, no decorrer dos
séculos, à medida que a exigência da indústria aumentava e os métodos
de coerção se aperfeiçoavam (James, 2010, pp. 21-22).
Aos poucos aquele sistema tido como glorioso vai perdendo seus aliados ao
se movimentarem os eixos econômicos para as poderosas indústrias que constituem
o novo núcleo de desenvolvimento. Porém, as diferenças raciais que funcionaram
como pretexto ideológico para justificar o processo de colonização e a escravidão
ainda correspondiam à necessidade de dominação do capitalismo. Foi sendo então
remanejada a função do racismo diante das novas necessidades impostas pelo
20
desenvolvimento, mas se manteve seu aspecto enquanto elemento de dominação
econômica, política e cultural permitindo sua perpetuação (Moura, 1994).
Moura (Ibidem, p.22) reivindica essa periodização porque considera que são
marcos que ajudam a “(...) situar mais precisamente o apogeu, a decadência e a
decomposição” da escravidão no Brasil.
22
É no Escravismo pleno que as relações escravistas desenvolvem suas
características fundamentais e que se consolidam as formas jurídicas,
administrativas e sociais necessárias à sua manutenção. Trata-se de um período
que abrange cerca de 380 anos, o que exige incorporar na análise os rebatimentos
das transformações pelas quais o capitalismo desde sua origem até as fases
concorrencial e monopolista passa nesse tempo.
23
amplo, as preocupações das autoridades e, principalmente organização dos
escravos contra a escravidão.
O pensamento de qual seria a posição dos negros após serem livres, foi
sempre uma preocupação presente desses políticos e dos proprietários de
terras. Era uma interrogação preocupante porque, pela legislação vigente o
Estado era proprietário das terras e somente a ele, através de doações, as
terras podiam ser adquiridas (Op. Cit, p.70).
A lei de terra tinha, no fundo, um conteúdo político. Ela deu um cunho liberal
à aquisição de terras no Brasil, mas visava impossibilitar uma lei
abolicionista radical que incluísse a doação pelo Estado de parcelas de
gleba aos libertos, e, de outro, estimular o imigrante que via a partir daí a
possibilidade de transforma-se em pequeno proprietário, aqui chegando
(Ibidem).
6
Sobre a reação da elite brasileiro conferir: MARINHO, Celia. Onda negra, medo branco: o negro no
imaginário das elites.
27
análise dos aspectos sociais, políticos, econômicos, ideológicos e psicológicos deste
processo.
28
desenvolvimento da nação. Os séculos de uma estrutura social colonial baseada na
escravidão, o saque direto das riquezas do território nacional, os encargos e tarifas
impostos pelos governos alinhados aos interesses da coroa Portuguesa, a
ingerência do capital internacional no território nacional são elementos dispensados
nas análises sociológicas ditadas pelo racismo. Munanga identificou nesses
ideólogos que a incapacidade negra somente poderia ser superada pela
miscigenação que permitiria a aproximação do ideal branco e de suas características
físicas, morais e intelectuais superiores.
[...] ele explica esses problemas com base na diferença do eugenismo entre
as três raças e, consequentemente, na potencialidade ascensional de cada
uma delas, o que é uma visão darwinista-social e uma legitimação das
desigualdades que ele nega no campo político. Defende claramente a ideia
de democracia racial, rechaçado no plano biológico fatos e acontecimentos
indubitavelmente de ordem sociológica (Munanga,1999, p.71-72).
31
produção de subjetividades. Isso significa que a reprodução das condições
de desigualdade etnicorraciais ocorre em todas as dimensões da vida social
(Silva, 2017, p.251).
Essa forma estrutural de racionalidade que atua como norma na vida social, e
que é estrutural pela sua localização enquanto elemento presente em todas as
dimensões da sociedade, onde seu surgimento e desenvolvimento se articula com
cada uma das etapas de construção da sociedade capitalista e da sociedade
brasileira e que se articula profundamente com outras formas de opressão a fim de
garantir a perpetuação desta mesma sociedade, vai se expressar profundamente
nas instituições (Ibidem).
Os impactos dos padrões referidos por Paixão, que são determinados por
fatores individuais, ideológicos, políticos, histórico-sociais etc., colocam uma
impossibilidade do estabelecimento de um padrão universal para esta variável. Aqui
o elemento do reconhecimento individual à determinado grupo étnico-racial também
entra como um elemento complicador para uma padronização universal, além de
impactar os resultados das análises, já que estes podem sofrer alterações de acordo
com a compreensão étnico-racial existente e com a força dos elementos de
dominação do grupo tido como ideal. Além destes elementos há ainda os interesses
políticos que perpassam o levantamento das amostras, principalmente por parte do
Estado (Paixão, 2013). Uma discussão que vem se reavivando desde a eleição de
presidente Jair Bolsonaro e de setores abertamente racistas ao poder no ano de
2019 é a supressão deste quesito no âmbito das políticas públicas.
33
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em texto para
discussão datado de 2003 sobre a classificação adotada nos últimos anos ressalta
que:
Mas como nos mostra Paixão (2013) o sistema classificatório com cinco
categorias é recente e encontrado apenas nas pesquisas posteriores ao ano de
1991, quando foi incluída nas opções de resposta a categoria indígena e a pergunta
desta varável modificada para cor ou raça.
Antes de 1991 ocorreram nove censos no país sendo o primeiro datado do fim
do século XIX, em 1872. Dos doze censos realizados até 2010, nove contaram com
a presença da variável cor ou raça, sendo que nos três onde a variável não se fez
presente dois datam da primeira metade do século XX, 1900 e 1920
respectivamente, e um diz respeito ao censo ocorrido nos anos de 1970, período da
ditadura civil-militar7.
7
Para Netto (2014, p. 74): “O regime derivado do golpe do 1º de abril sempre haverá de contar, ao
longo da sua vigência, com a tutela militar; mas constitui um grave erro caracterizá-la tão somente
como uma ditadura militar — se esta tutela é indiscutível, constituindo mesmo um de seus traços
peculiares, é inegavelmente indiscutível que a ditadura instaurada no 1º de abril foi o regime político
que melhor atendia os interesses do grande capital: por isto, deve ser entendido como uma forma de
autocracia burguesa (na interpretação de Florestan Fernandes) ou, ainda, como ditadura do grande
capital (conforme a análise de Octávio Ianni). O golpe não foi puramente um golpe militar, à moda de
tantas quarteladas latino-americanas [...] — foi um golpe civil-militar e o regime dele derivado, com a
instrumentalização das Forças Armadas pelo grande capital e pelo latifúndio, conferiu a solução que,
para a crise do capitalismo no Brasil à época, interessava aos maiores empresários e banqueiros, aos
latifundiários e às empresas estrangeiras (e seus agentes, ‘gringos’ e brasileiros)”.
34
O termo raça aparece nos censos de 1872 e 1890, e o termo cor nos censos
realizados entre 1940 e 1980. A retomada do quesito racial ocorre no período
democrático, permanecendo vigente até o último censo do país, em 2010 como
dado cor ou raça. (Paixão, 2013).
36
Quanto ao mercado de trabalho e ao rendimento médio mensal, por hora e
per capita os dados mostram o seguinte quadro: as/os negras/os corresponde a
54,9% da força de trabalho do país ao mesmo tempo que são 64,2% das/os
desocupadas/os e 66,1% das/os subutilizadas/os e, enquanto o percentual de
brancas/os na taxa composta de subutilização é de 18,8%, 29% da população negra
se enquadra nesta taxa. Da população branca 34,6% estão ocupações informais e
47,3% das/os negras/os se enquadram na mesma situação.
O rendimento mensal da população branca ocupada é equivalente a 2,766
reais, ou seja 73,9% a mais que o rendimento mensal das/os negras/os que
correspondia a 1.608 reais em 2018. Por hora as/os brancas/os recebem 17 reais
em média enquanto as/os negras/os recebem 10,1 por hora. As/os brancas/os
recebem um valor superior ao da população negra independente de terem um
vínculo formal ou informal de trabalho.
A renda média domiciliar per capita das/os brancas/os equivale a 1.846 reais
enquanto as/os negras/os possuem 934 reais. O homem branco, em comparação
com qualquer outro setor da população, recebe mais e o valor que uma mulher
negra recebe equivale somente a 44,4% deste valor.
A taxa de pobreza da população branca está em 15,4% e da população negra
em 32,9%, as/os brancas/os que recebem menos de 2 dólares equivalem a 3,6%, já
entre as/os negras/os a porcentagem chega a quase 9%. 68,6% dos cargos
gerenciais são ocupados por brancas/os e 29,9% por negras/os.
Enquanto na representação política as/os negras/os correspondem a 24,4% e
as/os brancas/os (e outros) correspondem a 75,6% os dados de violência
escancaram a real localização social das/os negras/os. Uma pessoa negra possui
2,7 vezes mais chances de morrer em decorrência de um homicídio letal do que uma
pessoa branca. E se, para as/os brancas/os as estatísticas de homicídio se
mantiveram estáveis no período entre 2012 e 2017 na população negra, em 6 anos,
se registraram 255 mil mortes em decorrência de homicídios no país. Entre os
jovens a taxa de homicídios a cada 100 mil significou 98,5 para as/os jovens
negras/os e 34 para as/os jovens brancas/os. Da juventude que frequenta o nono
ano do ensino fundamental 5,7% das/os brancas/os frequentam escolas em área de
risco, entre negras/os esse percentual atinge 53,9%.
37
A realidade de moradia do país nos mostra que: das pessoas que residem em
domicílios onde não há coleta direta ou indireta de lixo 6% correspondem a
população branca e 12,5% a população negra. Das que não possuem
abastecimento de água por rede geral 17,9% fazem parte da população negra e
11,5% da população branca. Das que não possuem esgotamento sanitário por rede
coletora ou pluvial são 26,5 das/os brancas/os e 42,8% das/os negras/os.
O censo demográfico de 2010 mostrou que no Rio de Janeiro e em São
Paulo, principais capitais do país, uma pessoa negra possui quase que o dobro de
chance de residir em um aglomerado subnormal que uma pessoa branca, sendo que
no Rio 30,5% da população negra reside em aglomerados subnormais e 14,3% é o
percentual da população branca na mesma situação.
Acreditamos que os dados falam por si no que diz respeito a realidade da vida
das/os negras/os no país, que quando comparados com os de décadas atrás
apresentam melhoras em índices relacionados a políticas especificas direcionadas a
essa população, mantém a desigualdade com as populações brancas. Trata-se de
uma desigualdade racial persistente e resultante do racismo estrutural que marca a
história do país. Isto porque, como evidência Almeida (2014) o racismo impacta
todos os aspectos da vida para retirar qualquer aspecto humano daqueles que são
seus alvos e em uma sociedade onde esse elemento é estrutural, por mais que se
tente negá-lo, ele se revela óbvio.
Como podemos observar o racismo possui uma lógica que vai moldar a forma
social contemporânea. A escravização dos negros e negras e todo o papel que
cumpriu histórica e socialmente este período, onde o racismo se expressava por
meio de uma relação onde o negro era uma propriedade deixa de existir, mas o
racismo se mantém mesmo pós abolição. A busca por apagar as/os negras/os, sua
contribuição, e todas as formas de manifestação negra no país se mantém, em nova
roupagem, até os dias atuais.
38
No Brasil, desde sua origem, a sociedade é profundamente marcada pelo
racismo e a organização social, incluindo aqui todos aparelhos ideológicos,
administrativos, jurídicos, as forças repressivas, instituições, se organizam a fim de
garantir a sua produção e reprodução. A roupagem universalista, que busca negar
as desigualdades sociais que são oriundas da discriminação racial pode ser
observada nos dados, nas análises do pensamento social e nas discussões sobre
saúde.
8
Marcha realizada em Brasília 300 anos após a morte de Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra,
para denunciar o preconceito, o racismo e a ausência de políticas públicas para a população negra no Brasil.
39
da População Negras, que foi instituída no ano de 2009. São passos iniciais em um
largo debate em torno do tema da saúde no país.
40
CAPÍTULO 2
41
2.1 – O racismo enquanto determinante social e o debate de equidade e
iniquidade em saúde
43
população que se encontra em condições mais precárias de vida e,
consequentemente, de saúde. Neste sentido,
O que o campo saúde da população negra apresenta como
reivindicação – em consonância com essa noção ampliada de justiça
social que articula reconhecimento e distribuição – é a possibilidade
de enfrentar as iniquidades raciais em consonância com a busca pela
universalização do direito à saúde. (Faustino, 2017, p.)
44
Inegavelmente o processo sanidade/enfermidade é multifatorial e complexo,
nele estão entrelaçados influências do meio ambiente físico, social, político
e cultural, todas em interação com as condições biológicas de cada ser
humano. A condição biológica humana não pode ser abstraída na análise do
processo saúde/doença, pois sendo ela a materialização da existência
humana não podemos omiti-la. (Oliveira, 2001, p.33)
45
[...] como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não
meramente a ausência de doença ou enfermidade, inserida na
Constituição da OMS no momento de sua fundação, em 1948, é uma
clara expressão de uma concepção bastante ampla da saúde, para além de
um enfoque centrado na doença (Buss; Filho, 2007, p.80 grifos nosso)
Barata (2009, p. 30) destaca, a despeito que “os indivíduos façam escolhas
que possam implicar comportamentos sadios ou nocivos à sua saúde, estas
escolhas estão situadas em contextos familiares, econômicos, culturais, políticos e
históricos.” Os modos de vida expressam as características sociais, econômicas,
políticas e culturais, e os comportamentos individuais, dos grupos sociais e dos
indivíduos a eles correspondentes.
Dóra Chor e Claudia Risso de Araujo Lima (2005) localizam a discussão dos
impactos da discriminação racial ao apresentarem uma série de indicadores
referentes a saúde desagregados por cor ou raça, relacionando-os com a discussão
socio econômica, enquanto responsável por efeitos próprios na saúde. Mostram
como os indicadores apresentam piores resultados, em causas evitáveis de óbitos,
óbitos por causas mal definidas, assistência médica, acesso a serviços de saúde,
taxa de mortalidade materna e outros, quando desagregados por raça ou cor.
Evidenciando como a discriminação racial contribui para as desigualdades raciais
em saúde.
47
A constatação destes determinantes e o avanço no mapeamento da realidade
por meio de um conjunto de indicadores sociais e específicos do campo da saúde
tem auxiliado para o fortalecimento das discussões em torno da equidade e na
construção de caminhos e mecanismos que visam prover condições de saúde
verdadeiramente igualitárias.
Acerca do debate da equidade vale retomar algumas definições conceituais
apresentadas por Vieira-da-Silva e Almeida Filho (2009) que localizam as variações
na distribuição desigual de saúde na sociedade como um fenômeno característico
da contemporaneidade e de extensão universal para, desde aí, realizarem uma
análise crítica sobre o tema.
Dentre os debates conceituais envolvendo o termo equidade, em artigo
publicado no Caderno de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz, é
apresentada a relação entre esse conceito e a concepção de justiça inerente nas
concepções filosóficas do mundo ocidental. Os autores apresentam as diferentes
abordagens teóricas realizadas em torno deste conceito e assinalam que
[...] desigualdades em saúde podem ser interpretadas como resultado de
diferentes formas de tratamento a indivíduos que pertencem a categorias
essenciais ou grupos sociais. Já equidade em saúde pode ser interpretada
como resultado de políticas que tratam indivíduos que não são iguais de
formas diferentes. Nesse sentido “equidade” e “iniquidade” correspondem a
conceitos relacionados com a prática de justiça e à intencionalidade das
políticas sociais e dos sistemas sociais (Vieira-da-Silva; Almeida Filho,
2009, p .221).
O termo equidade, conforme Sarah Escorel “(...) foi formulado por Margaret
Whitehead incorporando o parâmetro de justiça à distribuição igualitária.” Tendo sido
recentemente incorporado nas discussões de saúde e do movimento da Reforma
Sanitária, podendo ser abordado mediante dois tipos de análise. Uma análise que
diz respeito ao tratamento igual de iguais, a equidade h0orizontal e outra,
denominada de equidade vertical, que corresponde ao tratamento desigual de
desiguais (Vieira-da-Silva; Almeida Filho, 2009)
48
desnecessárias e evitáveis e que são ao mesmo tempo consideradas injustas e
indesejáveis. O termo iniquidade tem, assim, uma dimensão ética e social. A
iniquidade se situa então como um sinônimo de injustiça que tem como essência as
desigualdades e o problema da distribuição de bens dentro da sociedade, se
caracterizando como um processo histórico que determina as condições de
existência dos grupos subordinados e explorados socialmente (Vieira-da-Silva;
Almeida Filho, 2009). A compreensão deste conceito auxilia a visão e abordagem do
racismo enquanto uma iniquidade social no campo da saúde”.
49
ainda hoje naturalizada nas instituições de saúde, pode ser observada como um dos
motores de reinvindicações que desembocaram na construção da Política Nacional
de Saúde Integral da População Negra.
Cunha (2012) ressalta que no processo político-ideológico que teve como eixo
a necessidade da implementação do recorte racial para análise das condições
socioeconômicas e demográficas da população, o movimento de mulheres negras
desempenhou um papel imprescindível. Dentre os debates presentes no fim da
década de 1970 e na década de 1980 se apoiam na discussão do direito à diferença
e a igualdade que perpassavam o movimento feminista internacionalmente trazem
para o campo dos debates raciais os mesmo fundamentos destacando as
particularidades que são resultado das diferenças, mas que não justificam as
desigualdades (Oliveira, 2001). Desde aí abordam principalmente as discussões
ligadas a saúde reprodutiva da mulher negra. Cumprem dessa forma um papel
protagonista fundamental que se vincula a atores políticos e sociais presentes na
Academia, em organizações filantrópicas, nos movimentos sociais e no movimento
negro de conjunto (Brasil; Trad, 2012).
50
(...) distinguir as necessidades concretas dos beneficiários, orientando a
formulação de políticas públicas mais sensíveis as demandas particulares,
seja de saúde ou segurança enfocando a equidade – entendida como a
superação das diferenças injustas e evitáveis – no acesso aos serviços de
inclusão dos grupos mais vulneráveis nos processos de participação,
particularmente de prevenção. (Ibidem)
51
descriminalização do aborto, aparecem nesses documentos que datam de diferentes
momentos (Oliveira, 2001).
Se institui nos anos do governo Lula medidas com caráter mais concreto do
que as do governo anterior como a Lei 10.639/2003 que institui o ensino de História
e Cultura Afro-brasileiras nas escolas de todo país, a política de ações afirmativas
nas universidades públicas, o Estatuto da Igualdade Racial etc.
9
Realizada entre agosto e setembro de 2001 e organizada pela ONU em Durban, Africa do Sul, esta conferência
vai ser um marco ao elaborar acordos e um Programa de Ação Internacional para o combate ao Racismo, a
Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância.
54
Este é um processo contraditório já que escancara os limites entre as
garantias legais e os resultados práticos de mudanças estruturais. Dizemos isso,
porque ao mesmo tempo que essa série de mecanismos foram instituídos
legalmente, que se implementaram as políticas de combate à pobreza no país, ao
qual não se pode negar os efeitos na vida de milhares de brasileiros, em sua maioria
negras/os, estruturalmente o papel que cumpre o Estado e a realidade das/os
negras/os não seguiu os caminhos de avanços das conquistas legais. Aspectos
visíveis, por exemplo, nos dados de encarceramento do país com o aumento
vertiginoso na população carcerária neste período ou o aumento da precarização do
trabalho pela via da terceirização que impacta essencialmente negras/os mostram a
perpetuação dos interesses estruturais de um estado racista.
Este comitê elabora então uma política, que é tida como inovadora no âmbito
do SUS e vinculada com os seus princípios buscar garantir o acesso, a integralidade
dos cuidados e a equidade m saúde partindo de entender cada indivíduo desde suas
necessidades individuais que são também determinadas pelas suas necessidades
coletivas (enquanto grupo racial) e o meio em que vivem. E que essa reflexão deve
determinar as condições de atendimento e cuidado de cada usuário do SUS e que
tem na implementação do quesito raça cor nos atendimentos e dados referentes a
saúde um mecanismo para que se avance numa visão da realidade da saúde da
população negra (Dias; Gioventti; Santos, 2009). Mas que também:
56
Almeida assinala que dentro do campo da seguridade social, onde se inclui o
Sistema Único de Saúde, a realidade é de um navio negreiro no mundo
contemporâneo
10
Primeira organização de mídia no Brasil orientada por dados para qualificar o debate sobre equidade de
gênero
57
Apesar dos quase 10 anos da portaria 992/2009 neste levantamento só 28% dos
municípios teriam incluído ações previstas na política em seus planejamentos
municipais de saúde e somente 3% teriam uma instituição voltada às ações de
saúde para a população negra.
58
CAPÍTULO 3 - Um olhar inicial sobre este debate no Serviço Social desde a
experiencia do estágio na FSS-UERJ
59
O HMMC compõe o SUS como parte da rede municipal de prestação de
serviços públicos de atendimento à saúde. É um dos hospitais públicos de média e
alta complexidade da cidade do rio de Janeiro, sendo também a referência para o
atendimento de urgência e emergência dentro da área Programática 2.1 11.
Para isso foram organizadas cinco questões para composição do perfil das/os
estudantes e oito questões referentes ao tema abordado neste trabalho. Nossa
hipótese é que o debate do racismo enquanto determinante social encontra-se
ausente na formação acadêmica, em especial nas disciplinas de estágio em saúde.
Para isso, além de uma pesquisa quantitativa realizada com os estudantes
presentes nos campos de estágio da saúde, foi realizada uma revisão bibliográfica.
Os questionários foram aplicados nas últimas semanas do 2° semestre de
2019 e abarcaram alunos das disciplinas de: saúde do adulto; saúde da mulher,
criança e adolescente; saúde coletiva e saúde mental. Não foram abordadas/os
estudantes das turmas de trabalho e previdência/saúde do trabalhador e saúde do
idoso/terceira idade.
No total nas passagens em sala foram aplicados questionários para 36
alunas/os. No começo do semestre o quantitativo total de estudantes inscritas/os em
11
Atualmente no município do Rio possui uma divisão territorial para o atendimento à saúde da
população denominada de Áreas Programáticas. São dez áreas programáticas no município (1.0, 2.1,
2.2, 3.1, 3.2, 3.3, 4.0, 5.1, 5.2 e 5.3) que incluem as Clínicas da família, os Centros Municipais de
Saúde (CMS), as Policlínicas, os Centros de Atenção Psicossocial (CAP, CAPad e CAPsi), Unidades
de Pronto Atendimento (UPA), Hospitais e Maternidades e as Coordenações Regionais de
Emergência (CER).
60
campos de estágio da saúde fornecido pela coordenação de estágio foi de 47,
porém na listagem a que tivemos acesso no final do semestre contendo os nomes
das/os inscritas/os e as turmas constavam 65 alunas/os. Trabalharemos com a
mostra total de 65 alunos e destes 55,3% responderam ao questionário.
As primeiras 5 questões que buscam construir o perfil dos estudantes
abordam os seguintes aspectos: identidade de gênero; quesito raça-cor; período de
Estágio que a/o estudante estava cursando; ano e período de matrícula na FSS
UERJ; e a disciplina correspondente ao campo de estágio. Alguns alunos não
responderam, ou responderam de forma incorreta, o ano e período de matrícula,
mas dentre os que responderam de forma correta foi possível observar que o
questionário cobriu alunas/os matriculadas/os entre o primeiro período de 2012 e
último de 2016.
As questões sobre o tema abarcam os conteúdos e referências bibliográficas
relacionadas ao debate de racismo e saúde, a presença deste debate nas aulas e no
campo de estágio, o conhecimento e a abordagem da PNSIPN na disciplina e no
campo de estágio, a presença do dado raça cor na construção do perfil das/os
usuárias/os atendidas/os pelo serviço social, o entendimento dos alunos quanto a
relação dentre o debate de racismo e saúde. Além disso, uma questão se relaciona
com a quantidade de textos que abordam a questão racial e o racismo que os alunos
tiveram contato durante o período da graduação enquanto bibliografia obrigatória.
Além de responder os questionários os alunos assinaram o termo de consentimento
livre e esclarecido.
Junto a isso foi realizada uma revisão acerca do tema a partir dos exemplares
das revistas Serviço Social e Sociedade e Em Pauta disponíveis na Biblioteca do
Serviço Social da UERJ e por meio de busca eletrônica no site SciELO – Scientific
Eletronic Library Online. A revista Serviço Social e Sociedade, publicada pela Editora
Cortez, recentemente completou 40 anos de existência e possui um lugar de
destaque dentre as publicações que discutem temas referentes a profissão e pelo
papel que ocupa nacionalmente foi escolhida para esta análise. Já a revista Em
Pauta se insere aqui enquanto publicação específica da Faculdade de Serviço social
da UERJ e acreditamos que expressa as preocupações e temas relevantes não só
para a profissão quanto dentro do debate da própria Faculdade e na academia de
conjunto.
61
O site SciELO é uma ferramenta recorrentemente usada para busca de
artigos. As publicações dos conteúdos científicos disponíveis no site são
organizadas por meio de uma divisão nacional tendo cada seção sobre a
responsabilidade de ser gerida por uma organização científica reconhecida
nacionalmente. Reúne artigos de pesquisa, estudos de caso, comunicações
relacionadas à pesquisa, editoriais, artigos de revisão e outros textos. Nesta busca
foram utilizados os seguintes marcadores: saúde, racismo e serviço social.
Gráfico 1 – Gênero
2; 6%
1; 3%
Mulher Cis
Mulher trans
Homem Cis
Homem trans
Travesti
Não binário
33; 92%
2; 6%1; 3%
2; 6%
10; 28% Branca
Parda
Preta
Amarela
Indígena
Sem resposta
11; 31% Inválida
10; 28%
Período de estágio
3; 8% 5; 14%
1°
2°
9; 25% 5; 14% 3°
4°
Sem resposta/inválido
14; 39%
63
Como observado o gráfico 39% (14) das/os alunas/os encontram-se no 3°
período de estágio, ou seja, já completaram mais de um ano nessa experiência. A
segunda maior porcentagem, 25% (9) diz respeito as/os alunas/os que estão no
último período do estágio, 4° período. 14% (5) estão no 1° período e 14% (5) é
também a porcentagem dos alunos que estão no segundo período. Tiveram suas
respostas invalidadas por erro ou não responderam 8% (3) do total dos
questionários.
Disciplina de estágio
3; 8%
1; 3%
Saúde do adulto
5; 14% Saúde da mulher, criança e ado-
14; 39% lescente
Saúde coletiva
Saúde da mulher, criança e ado-
lescente (externo)
Saúde do adulto (externo)
Saúde mental
7; 19%
6; 17%
A divisão das/os alunas/os nas turmas de estágio mostra que 39% (14) são
inscritas/os na turma Saúde do adulto, campo da UERJ, e 3% (1) são inscritas/os na
turma de saúde do adulto (campo externo), totalizando 42% do total de respostas
obtidas. O segundo maior bloco de respostas desta questão corresponde as
disciplinas de saúde da Mulher 31% do total, divididos em 17% (6) campos próprios
da universidade e 14% (5) campos externos. A disciplina de Saúde coletiva
corresponde a 19% (7) do total, enquanto 8% (3) são alunos da disciplina de saúde
mental.
64
A análise dos dados reafirma o perfil característico da profissão e do curso de
serviço social da UERJ que é majoritariamente feminino. Destaca-se também que
as/os negra/os correspondem a quase 60%, não sendo somente profissionais que
atuarão cotidianamente com usuárias/os que em sua maioria são negras/os, mas
também parte deste mesmo grupo racial.
As disciplinas de saúde da mulher e saúde do adulto comportam a maior
porcentagem das que responderam ao questionário, sendo responsáveis por 73%
das respostas obtidas. 64% dos questionários respondidos concentram-se nos 2
últimos períodos de estágio o que acreditamos contribuir para uma visão mais
consolidada concreta desta experiência que abarca 4 períodos.
Gráfico 5 – Pergunta 1
5; 14%
7; 19%
Sim
Não
Não sei responder
24; 67%
65
Por exemplo, a revista Serviço Social e Sociedade tem sua primeira
publicação no ano de 1979, possuindo atualmente 136 números publicados, sendo o
último referente aos meses de setembro a dezembro de 2019. E a partir da análise
de todos os títulos e resumos dos artigos escritos até o número citado, somente na
edição de n° 133 (set/dez 2018) que discute o tema “Racismo e suas expressões
sócioinstitucionais: traços estruturantes da sociedade brasileira” foi possível
encontrar um artigo que relaciona o debate do racismo (no caso o racismo
institucional) e a discussão da saúde com centralidade. O artigo
“Interseccionalidade, racismo institucional e direitos humanos: compreensões à
violência obstétrica”, de Jussara Francisca de Assis, que apresenta o seguinte
resumo:
66
A busca eletrônica no site SciELO – Scientific Eletronic Library Online nos
permitiu ter acesso, por meio de busca com os marcadores serviço social, racismo e
saúde, a dois artigos. Um deles é o artigo presente na Revista Serviço Social e
Sociedade, de Jussara Francisca Assis, já mencionado. E o outro é de autoria de
Luís Eduardo Batista, Daphne Rattner, Suzana Kalckmann, Maridite Cristóvão
Gomes de Oliveira com o título “Humanização na atenção à saúde e as
desigualdades raciais: uma proposta de intervenção”. Uma busca no mesmo site por
artigos utilizando somente os marcadores serviço social e saúde nos leva a um
resultado com mais de 1300 artigos distribuídos em 90 páginas.
Gráfico 6 – Pergunta 2
1; 3%
Sim
11; 31%
Não
Não sei responder
24; 67%
Gráfico 7 – Pergunta 3
67
3.No campo de estágio em algum momento foi abordado o tema racismo
e saúde?
23; 64%
Gráfico 8 – Pergunta 4
68
4. A Políti ca Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN),
insti tuída pela Portaria nº 992, de 13 de maio de 2009, busca atender as
especificidades do conjunto da população negra do país e contribuir
para a garanti a da equidade no que diz resp
Sim
13; 36%
Não
Não sei responder
23; 64%
1; 3%
1; 3% 4; 11%
Sim
Não
Não sei responder
Não respondeu
30; 83%
69
Ao avaliar se a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra
(PNSIPN) foi abordada no campo de estágio, a grande maioria, 83% afirma que não,
enquanto apenas 11% afirmam que sim. Um dado alarmante que junto ao resultado
do gráfico 8, nos mostra que esse debate quando realizado em campo não parte da
abordagem da política existente. O que faz com que estudantes e profissionais que
atuam diariamente junto à população negra realizem esse debate sem a
referenciação na única política pública específica para a população negra no âmbito
do SUS.
Gráfico 10 – Pergunta 5
1; 3%
2; 6%
Sim
Não
Não sei responder
9; 25% Não respondeu
24; 67%
Gráfico 11 – Pergunta 6
Sim
Não
17; 47% Não sei responder
19; 53%
Gráfico 12 – Pergunta 7
71
7. No seu entendimento racismo e saúde estão relacionados?
1; 3%
Sim
Não
Não sei responder
35; 97%
Gráfico 13 – Pergunta 8
72
8. No decorrer das disciplinas de graduação quantos textos que abor -
davam questão racial ou racismo constavam na bibliografia obrigatória?
4; 11% 3; 8%
Nenhum
de 1 a 5
7; 19% de 5 a 10
mais de 10
Não sei responder
22; 61%
Márcia Campos Eurico (2013) localiza essa discussão enquanto uma urgente
necessidade de articulação das discussões teóricas da profissão com outras áreas
das Ciências Sociais apontando um caminho ainda não explorado de
potencialidades. A mesma autora ressalta que esse cenário, na atualidade, não
apresenta mais justificativas para se manter e que os elementos que caminham no
sentido contrário da sua superação expressam uma falta de compromisso com o
projeto ético-político profissional. Isso porque a lógica a qual a questão precisa ser
entendida é a partir da apropriação das determinações expressas no projeto ético-
político, no Código de Ética Profissional (2013), nas diretrizes curriculares e, no
campo da saúde, nos Parâmetros de Atuação do Serviço Social na Saúde (2010).
Uma atuação profissional que busque a garantia de direitos, que vise uma
prática não discriminatória, que incentive o exercício pleno da democracia, que
tenha a liberdade como elemento fundamental, compromissada com a justiça, a
igualdade e a cidadania, ou seja, preocupado com a emancipação humana precisa
partir de uma análise que que não naturalize a dinâmica do racismo na sociedade
brasileira (Almeida, 2013). Uma tarefa árdua já que,
76
[...] racismo o racismo perpassa todas as esferas da vida cotidiana, se
reproduz nas instituições e constantemente é naturalizado. A banalização
da questão racial atinge inclusive uma parcela importante da população
negra que não consegue perceber a trama de relações sociais e de
culpabiliza por sua condição social. (EURICO, 2013, p. 298)
77
CONSIDERAÇÕES FINAIS
78
encontradas na profissão e que esta pesquisa expõe uma pequena parcela. Este é
um desafio essencial na busca pela equidade e por um SUS que seja universal não
de maneira abstrata, mas partindo da população que o acessa. A formação e
atuação profissional precisa se colocar nesta perspectiva.
Um outro elemento que gostaríamos de destacar dentre os limites observados
é o da própria discussão do combate ao racismo dente as instituições,
principalmente as diretamente vinculadas ao Estado brasileiro. Ao mesmo tempo
que a garantia de politicas de combate ao racismo se relacionam com demandas
concretas e levantadas por setores sociais e são pontos de apoio para este combate
nas instituições não deve se perder de vista que o Estado que as institui é o mesmo
que funciona de maneira a garantir a perpetuação do racismo.
O Estado é responsável por permitir condições de vida, trabalho, inserção
política, repressão, perseguição a cultura e religiões negras e do genocídio da
população. O faz pela importância do racismo enquanto ferramenta essencial para a
perpetuação da opressão a maioria da população o que garante ao sistema
capitalista que esse siga tendo o racismo como um elemento fundamental a sua
perpetuação política e econômica.
Acreditamos que uma política de formação antirracista precisa se apoiar nos
instrumentos, como a PNSIP, para incidir no combate ao racismo institucional, sem
perder de vista a relação entre capitalismo, Estado e racismo estrutural, para desde
aí seguir pensando caminhos para a sua superação.
79
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARATA, R. B. Como e por que as desigualdades sociais fazem mal à saúde. Rio
de Janeiro: Fiocruz, 2009.
DIAS, J., GIOVANETTI, M. R.; SANTOS, N. S. (orgs.). Perguntar não ofende – Qual
sua cor ou raça/etnia? Responder ajuda a prevenir. São Paulo: Secretaria de Estado
da Saúde de São Paulo / Centro de Referência e Treinamento de DST/Aids – SP,
2009. Disponível em:
81
<http://www3.crt.saude.sp.gov.br/arquivos/arquivos_biblioteca_crt/
livro_quesito_cor.pdf>.
Gorender, J. O Escravismo Colonial, São Paulo, Ática, 1978. 6.ed, 1992. 2.imp, 2001
82
MUNANGA, K. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus
identidade negra. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.
83
VIEIRA-DA-SILVA, L. M.; ALMEIDA-FILHO, N. de. Equidade em saúde: uma análise
crítica de conceitos. Cad. de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 15, supl. 2, 2009
Sites Visitados:
https://g1.globo.com/economia/noticia/populacao-que-se-declara-preta-cresce-149-
no-brasil-em-4-anos-aponta-ibge.ghtml Acessado em: 12/01/2020
https://g1.globo.com/politica/noticia/brasil-dobra-numero-de-presos-em-11-anos-diz-
levantamento-de-720-mil-detentos-40-nao-foram-julgados.ghtml Acessado em:
16/01/2020
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf Acessado
em: 14/01/2020
84
APÊNDICES
APÊNDICE
INFORMAÇÕES INICIAIS
( ) Travesti ( ) Indígena
( ) Não binário
Período de Estágio
( ) 1° ( ) 2° ( ) 3° ( ) 4°
85
Ano e período de matrícula na FSS _______/____
Disciplina de estágio
87
APÊNDICE 2
Eu_______________________________________________________________________,
portador(a) do RG de número/órgão expedidor ________________________________estou
sendo convidado a participar da pesquisa denominada Abordagem da relação entre racismo
e saúde nas disciplinas de estágio do campo da saúde do Curso de Serviço Social da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro que tem como objetivo identificar a abordagem de
conteúdos da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) e do
racismo como determinante social em saúde para colaborar junto com outros elementos na
construção de um panorama acerca do debate sobre racismo institucional e saúde no curso.
A seguinte pesquisa está sendo desenvolvida por Isabela Santos de Lima (201310212011)
estudante da graduação do Curso de Serviço Social da Faculdade de Serviço Social da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), sob a orientação da Prof.ª Ana Paula
Procopio da Silva (matrícula 38.622-7).
Estou ciente que meus dados estão sendo coletados anonimamente em forma de
questionário encaminhado às/aos estudantes inscritas/os nas disciplinas de estágio no
campo da saúde no período 2019-2 e contribuirão como parte das pesquisas de elaboração
do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) da aluna supracitada.
__________________________________ ___________________________________
88
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo
proposto, de como será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste
estudo, declaro o meu consentimento em participar da pesquisa, como também concordo
que os dados obtidos na investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em
eventos e publicações). Estou ciente que receberei uma via desse documento.
_____________________________________________________________________
Caso necessite de mais informações sobre o presente estudo entrar em contato com a
pesquisadora Isabela Santos de Lima - Telefone: (21) 9 7472-9750
89