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DA RELEVÂNCIA DO ENSINO DE ESCRITA CRIATIVA NA EDUCAÇÃO BÁSICA

BRASILEIRA COMO ENSINO DE LITERATURA

Como, nos termos bakhtinianos, todo gênero tem memória e esta traz consigo o “tesouro
técnico” do gênero, pensando-se seja em crianças, seja em adolescentes, quer dizer, em indivíduos da
Educação Básica do Brasil, convém, em uma proposta de ensino de escrita criativa, de antemão,
garantir a cada estudante que mostre o quanto coletiva e individualmente acessa a memória e o
“tesouro técnico” de um gênero. Conforme nossa ementa, está proposto o ensino de escrita criativa
do poema e do conto. A memória do gênero costuma nos dizer como eles vêm sendo, que implica em
acúmulo de práticas criativas. Sobre o poema, esse acúmulo está, por exemplo, tanto em gênero ser
monódico quanto em geralmente ser versificado e recorrer a metáfora – seja em alguns versos, em
todos ou no conjunto do poema. Tal acúmulo implica também tanto no monologismo bivocal do conto
quanto no conflito devido à recursiva prática de ser dado como texto de extensão breve. O “tesouro
técnico” do poema, devido à memória de versificação, contém modos de versificar entre outros
valores, como a estrofação e a rima. O “tesouro técnico” do conto, devido ao monologismo bivocal,
contém pelo menos um narrador e uma personagem, ainda que esta e aquele sejam a mesma figura,
entre outros valores, como o recurso a um problema que desencadeia um conflito a ser tratado pelo
princípio de causa e consequência da progressão textual.

Uma vez que abrimos este texto citando termos bakhtinianos, convém destacar que Mikhail
Bakhtin, ao lado de Valentin Volochinov, de Pavel Medvedev e comentaristas, será recursivamente
retomado. Sobre o ensino de escrita criativa na Educação Básica, porque é um ensino que orienta
estudantes a produzirem textos literários, quer dizer, orienta uma prática autoral literária, de imediato
importa destacar que trabalhamos com a concepção de autoria de Bakhtin, partilhada por Volochinov
e Medvedev, bem como pelos demais membros do Círculo de Vitebsk. Dessa concepção, importa de
antemão que Bakhtin e demais refutavam as concepções românticas de liberdade e de criatividade.
Sabe-se que a perspectiva romântica considerava a liberdade individualmente, pelo primado liberal
de que a liberdade de um indivíduo termina na liberdade de outro, por sua vez, dado isso, o estilo é
sempre uma idiossincrasia. Uma vez que o estilo é tal, romanticamente, “meu estilo sou eu”, conforme
George-Louis Leclerc, o Conde de Buffon, destacou em conferência proferida na Academia Francesa
esta conhecida sentença: “O estilo é o homem”, implicando que o estilo é algo que uma expressão do
indivíduo, como se uma tradução de seu caráter. Logo, uma vez que a liberdade coincide com o
indivíduo, em ênfase, seu estilo é ele mesmo. Em relação a essa concepção de liberdade, a concepção
romântica de criatividade destaca essa como algo excepcional. Nesse sentido, a criatividade está fora
da cadeia causal do contexto e é redundada a uma irrupção súbita. No estudos de escrita criativa que
levam ao ensino desta, as concepções de liberdade e de criatividade são caras e implicadas em um
debate com as concepções de intuição e inspiração. Entenda-se que não há relativismo sobre nenhum
desses termos. Na perspectiva romântica, a liberdade sempre diz respeito exclusivamente ao
indivíduo, e por sua vez, a criatividade emana somente deste. Logo, para criar, o indivíduo intui, quer
dizer, alcança algo espontaneamente, de modo involuntário, influenciado por uma força invisível que
a ele acorre misteriosamente, força que o toma e o leva à criação. Ainda nesse ideário romântico
pautado em tais concepções de liberdade e de criatividade, ao intuir, o indivíduo se inspira, e inspirado
é despertado transitoriamente da práxis para a criação. Esse ideário traz, ainda que de modo sui
generis, a antiga concepção de inspiração como possessão. Uma vez que a criatividade dependa de
possessão, ela não é ensinável, e logo, não é aprendível. Qualquer processo educacional que se
permita confiar que a criatividade somente é possível por inspiração não tem como levar a cabo
nenhuma educação artística. Nisso, ensinar a criação de qualquer arte seria uma quimera, e restaria à
educação artística apenas o ensino da análise de obras artísticas, e quando muito, da crítica.

Em acordo com a concepção bakhtiniana de autoria, porque a liberdade e a criatividade são


implicadas tanto individual quanto socialmente, também refutamos aquelas concepções românticas –
não só de liberdade e de criatividade, como também de intuição e de inspiração. A liberdade sempre
foi, ainda que variável mediante as ordens políticas, uma mediação das individualidades, logo, uma
reguladora interindividual. Inclusive dizer que a liberdade de alguém termina quando começa a de
outrem implica uma interação, logo, um contexto de convívio entre individualidades, uma vez que se
a liberdade de alguém termina quando começa a de outrem isso se dá em vice-versa, quer dizer, em
uma via única de mão dupla, e assim, até esse princípio liberal declara, embora não assuma, que a
liberdade existe em uma relação mútua entre os indivíduos, até porque não se deixa de ser livre porque
alguém o é nem se é livre somente consigo. A memória de um gênero e seu “tesouro técnico” são
elementos suficientes, embora não seja os únicos, para fazer-nos observar que a criatividade não
resulta de uma irrupção súbita. Tais elementos são chamados de memória e “tesouro” porque integram
a história do gênero, quer dizer, a história da prática de produção (de criação) do gênero. Ao escrever
criativamente, qualquer indivíduo responde a esses elementos. A resposta envolve aqueles elementos
como formas para um conteúdo, havendo este, inclusive, como conteúdo-aí, preexistente, logo, a
escrita criativa responde a uma forma e a um conteúdo como responde a seu material, a linguagem
verbal, que não existe individualmente – caso contrário, o resultado da criação seria ininteligível.
Responder corresponde ao ato responsável, à responsabilidade que o indivíduo tem em todos os
momentos de sua vida. Responsabilidade e criatividade integram parte da tarefa do trabalho da vida
diária. Nisso, há o labor e o estudo – que não são necessariamente formais (escolares, acadêmicos) –
da prática escrita, quer dizer, há esforço, trabalho, que inclui a relação do indivíduo com o contexto
(tanto literário quanto do mundo) mediante sua liberdade. Esta leva à peculiaridade da resposta,
tornando-a criativa pela individualidade mediante a coletividade. Considerar, conforme a
compreensão romântica, que realizar uma criação artística se limita ao acontecer de uma irrupção
súbita no indivíduo é considerar a criatividade como meramente decorrente das forças centrípetas do
existir intelectivo-sensível e da capacidade emotiva-volitiva do indivíduo, excluindo as forças
centrífugas, correspondentes às relações que o indivíduo estabelece com outros em seu contexto.
Sobre isso, em “O autor e a personagem na atividade estética”, glosando Bakhtin, em todas as
composições estéticas, há uma categoria organizacional, o posicionamento axiológico do outro em
face do posicionamento axiológico do eu em uma relação que leva a uma ampliação axiológica, a um
excedente axiológico. Isso existe mediante a exotopia do indivíduo, que é sua extra localização diante
de outros e que dá em sua capacidade de responder. A exotopia faz cada indivíduo jamais agir como
único participante de um evento, como o ato criativo, leva-o a admitir a criatividade como trabalho,
pois o lugar de qualquer indivíduo em um acontecimento existe graças a outros ou graças a colocar-
se ao lado de outros.

Ninguém vá esperar que crianças e adolescentes da Educação Básica produzam um poema ou


um conto trazendo para seu texto toda a memória desses gêneros, e muito menos todo seu “tesouro
técnico”. Não se espere por isso porque toda a memória de um gênero e todo seu “tesouro técnico”
não se configuram em nenhum texto, afinal, apesar de quiçá ser até hoje a peça mais complexa da
poesia ocidental, a Divina comédia, de Dante, não apresenta todo o acúmulo da poesia, sequer da
poesia toscana, até 1321, mesmo levando-se em conta sua breve parte introdutória seguida de mais
três extensas partes em trinta e três cantos cada, formando todas um conjunto de cem cantos com um
total de catorze mil duzentos e trinta e três versos. Convém dizer que não é propriamente a extensão
que torna a Divina comédia ou qualquer obra, pois a extensão decorre, ao contrário, as complexidade,
que envolve os discursos, os posicionamentos axiológicos, a amplitude da exotopia, as imagens da
obra sequências de respostas a respostas à vida, aos contextos (literários e de mundo), bem como a
cada elemento, categoria, forma, conteúdo e material. Embora seja dado com a peça teatral mais
extensa da literatura ocidental, o Fausto, de Goethe, mesmo com sua primeira parte distribuída em
três prólogos e vinte e cinco cenas, e sua segunda parte distribuída em cinco atos com um total de
vinte e quatro cenas, tudo isso com quase o dobro de versos da Divina comédia, não apresenta todo
o acúmulo da dramaturgia literária, nem mesmo apenas da tragédia, até 1832 – e nesse caso, também
vale a mesma ressalva sobre a extensão. Por sua vez, apesar de ser considerado um dos mais
complexos romances de todos os tempos, A montanha mágica, de Thomas Mann, também não
apresenta todo o acúmulo da ficção verbal em prosa sequer da Alemanha até 1924, mesmo levando-
se em conta seu detalhado sumário de cinquenta e um capítulos distribuídos em sete partes em uma
extensão, em geral, de mais de oitocentas páginas. É preciso que se entenda que a memória de um
gênero não é estanque, não é jamais dada por resolvida. Isso diz respeito à noção de acúmulo, pois, a
título de exemplo, a inserção da rima entre meados do século XIII e o início do IX, devido à ocupação
moura na Península Ibérica, interferiu profundamente na poesia ocidental, assim também ocorreu à
poesia ocidental uma grande mudança a partir da criação e recriação do soneto durante o século XIII
na Itália, nos fins do reinado de Frederico II da Lombardia, imperador romano-germânico e rei da
Itália. Outras duas mudanças fundamentais foram o recurso ao verso livre a partir da versificação do
“Velho testamento” bíblico e o recurso à escrita cursiva (em prosa) da poesia na Alemanha da segunda
metade do século XVIII. Foi somente devido ao recurso de fluxo de consciência, à estética do
fragmento, à estética da citação, ao primado do experimentalismo artístico, à criação do teatro do
absurdo (do nonsense) e da técnica de desfocalização ao longo da Modernidade que em 1975 Paulo
Leminiski pode tornar possível a escrita de seu romance Catatau. Enfim, uma variedade de novidades,
tanto em poesia quanto em prosa de ficção, vem se dando desde sempre, e isso amplia a memória do
gênero e seu “tesouro técnico”, pois este é implicado por aquela de modo tão inseparável quanto
indelével. Veja-se nessas considerações que não é somente a memória e o “tesouro técnico” do gênero
que tornam a criatividade não estritamente individual, mas também a articulação (a arquitetônica, nos
termos bakhtinianos) entre os posicionamentos axiológicos, devido à exotopia, que dá no excedente
axiológico, e isso inclui discursos e imagens, que são, como aqueles respostas, as quais tornam cada
ato criativo individual responsável do eu para si e para o outro, assim como do outro para o eu, uma
vez o outro, pela exotopia, é participante da criação, torna, no caso da escrita criativa, possível a
inteligibilidade da leitura, como apreciação (ou contemplação), interpretação e crítica, as quais
ampliam a expectativa de recepção da obra e também tornam possível novas criações.

Para observar o acesso à memória de um gênero e seu “tesouro técnico”, sugiro que se evite
uma espécie de diagnóstico que faça o alunado dizer o que sabe de poema e de conto – pelo menos
no que diz respeito ao ensino inicial da escrita criativa. A prática do diagnóstico é demasiadamente
escolarizada, quer dizer, é muito institucionalmente protocolar mediante às políticas gerais de ensino.
Logo, fazer uma espécie de diagnóstico tal seria como empregar um fundamento de Teoria da
Literatura padrão, que solicita um conceito de poema (que geralmente termina levando em conta um
conceito de poesia) e um de conto. De maneira prática, seria como, diante de alguns poemas e contos,
questionar o alunado sobre quais textos são de um gênero e de outro e por quê. Não se vá pensar, no
entanto, que esse tipo de questionamento, assim como a prática do diagnóstico, seja inútil nem
indevido. Considere-se que esse tipo de estratégia pode muito mais inibir a escrita criativa estudantil
do que auxiliá-la. Diante dos dois polos da Educação Básica, se qualquer docente se solicitar a um
alunado do quinto ano do Ensino Fundamental e a um alunado da terceira série do Ensino Médio a
escrita de um poema e a escrita de um conto, os indivíduos de ambos os alunados – bem como dos
demais alunados no interstício entre os dois polos – saberão, de algum modo, o que fazer. Será
possível notar que, por exemplo, ninguém do quinto ano escreverá um poema inicialmente dizendo
algo como “Era uma vez”, como também será notável que ninguém da terceira série escreverá um
poema inicialmente dizendo “Certo dia, quando saía de casa…”. Uma vez que ninguém fará nem isto
nem aquilo, logo, assertivamente o alunado tem consigo parte da memória de ambos os gêneros,
poema e conto, e assim, parte do conhecimento de seu “tesouro técnico”. A bem da verdade, artistas
da estética verbal, da literatura, sempre detêm apenas parte (por mais ampla que seja) da memória e
do “tesouro técnico” de qualquer gênero. Os exemplos a respeito das obras referidas de Dante,
Goethe, Mann e Leminski tiveram também a finalidade de mostrar isso. Tais exemplos, certamente
por evidência, foram escolhidos porque correspondem a três casos consagrados pelo cânone ocidental
– a Divina comédia, o Fausto e a Montanha mágica – e a um caso frequentemente dado no Brasil
como exemplar de ficção experimental na literatura contemporânea – embora outro igualmente
lembrado, principalmente a respeito da poesia, que é Galáxias, de Haroldo de Campos. Não se vá
entender as obras referidas como uma apologia ao cânone nem a casos exemplares ou hegemônicos.
De todo modo, via de regra, casos canônicos, exemplares e hegemônicos têm mais circulação, e isso
por serem valorados tacitamente como notáveis, que termina com que sejam dados como referências
– seja para serem seguidos (parafraseados ou parodiados), transgredidos ou subvertidos.

Nos termos da Matriz de Referência do ENEM conforme o INEP, aplicar aquela espécie de
diagnóstico seria observar os seguintes eixos cognitivos do alunado: II. Compreender fenômenos (no
caso, construir e aplicar conceitos de Teoria da Literatura); III. Enfrentar situações-problemas (no
caso, selecionar, organizar, relacionar e interpretar dados e informações para encontrar soluções sobre
o poema e o conto); e IV. Construir argumentação (no caso, relacionar dados e informações de Teoria
da Literatura mediante soluções encontradas a respeito do poema e do conto). Tudo isso, conforme o
primeiro eixo apresentado, sempre mediante à Teoria da Literatura no que diz respeito ao
conhecimento dos gêneros literários, e em particular, ao poema e ao conto. Ainda nos termos da
mesma Matriz, no que diz respeito à Competência de Área 5 (Analisar, interpretar e aplicar recursos
expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante a natureza, função,
organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção),
aplicar aquele diagnóstico seria como observar se o alunado responde (e como responde) à Habilidade
16 (Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto
literário). Não se vá pensar que mensurar como o alunado responde àqueles eixos cognitivos e à
Competência de Área 5 no âmbito da Habilidade 16 é uma estultícia, é inútil ou é indevido. Trata-se
de que essa mensuração implica uma produção escrita de análise e interpretação crítica do objeto
artístico, e não na produção deste. Como já foi dito, inicialmente, convém solicitar ao alunado que
produza poema e conto. Apenas isso. O diagnóstico, a partir das primeiras produções, será útil
(devido) no sentido de mensurar ao quê da memória e do “tesouro técnico” de tais gêneros o alunado
recorre. Conforme também já foi dito, essa observação é tão coletiva quanto individual. Disso, note-
se: como o ensino formal é e somente pode ser escolarizado, sua prática é institucional e responde às
políticas educacionais vigentes, logo, é muitíssimo recorrente que a quase totalidade do alunado
recorra a uma mesma parcela da memória e do “tesouro técnico” de um gênero. Pode haver, contudo,
quem faça algo diferente, quer dizer, pode haver quem mostre um conhecimento mais amplo do
gênero. [Certa vez, na cidade de Goiás, ministrei uma oficina de poema para crianças entre oito e
nove anos – crianças do segundo ano do Ensino Fundamental. Com exceção de uma criança, uma
menina, todas as demais ou escreveram sobre a mãe ou sobre a cidade e compuseram versos rimados
de extensão mais ou menos idêntica (todos entre cinco e oito sílabas) distribuídos em quadras e/ou
quintetos. O recurso à variedade métrica não significa que as crianças soubessem de escansão, mas
que ouvem, desde mais jovens, cantigas e canções, que são (principalmente aquelas) redondilhadas
(às vezes em cinco, e mais recorrentemente, em sete sílabas). Isso fica inculcado. Versificar integra a
memória do gênero, o modo da versificação (na variante de arte menor de cinco a oito sílabas) integra
o “tesouro técnico” do gênero. A criança de produziu por exceção em relação às demais, a menina
que mencionei, por sua vez, criou um poema de versos livres bem irregulares sobre o pôr-do-sol. Essa
menina é filha – não precisei averiguar, porque já sabia – de uma família que introduzia poesia,
música, dança, teatro e cinema para ela, sua irmã e seus irmãos desde a infância mais tenra. Logo, a
memória e o “tesouro técnico” do gênero é, para aquela menina, maior, quer dizer, ela apresentava
mais conhecimento (mais acúmulo) do gênero por experiência de leitura.]

Por que a advertência de evitar aquela espécie de diagnóstico? Ora, os eixos cognitivos da
Matriz de Referência do ENEM conforme o INEP, bem como suas competências de área e respectivas
habilidades a respeito do ensino de língua e literatura, dizem respeito à capacidade discente de fazer
crítica mediante análise e interpretação de dados e informações de acordo com os princípios e
fundamentos de uma área de conhecimento. Entenda-se que embora literatura, música, pintura e
dança sejam artes (entre outras), e ainda que – com exceção da literatura – essas artes tenham sua
prática produtiva (criativa) ensinada na escola, o ENEM avalia mediante o conhecimento discente do
que há da história, do patrimônio, da partilha social, dos procedimentos e das estruturas das artes.
Chamei atenção para o ENEM porque, embora seja nominado Exame Nacional do Ensino Médio, ele
avalia conhecimentos adquiridos ao longo do Ensino Básico. Para que se entenda isso, observe-se:
quando se estuda a poesia do trovadorismo na primeira série do Ensino Médio, anteriormente, ao
longo do Ensino Fundamental, o alunado já teve acesso à leitura e à análise de poemas e de canções.
Assim, isto implica naquilo, uma vez que a poesia trovadoresca era feita para o canto acompanhado
de instrumentos musicais. O ENEM, contudo, não avalia a “aptidão artística” de ninguém. Esse tipo
de avaliação existe nas universidades depois de alguém passar pelo ENEM e conseguir o pré-ingresso
para o curso indicado no Sisu. Certos cursos exigem um VHCE (Vestibular de Habilidades e
Competências Específicas). Esse é o caso da maioria dos cursos de artes. No entanto, para ingressar
na quase totalidade dos cursos de Letras do Brasil, até mesmo em um curso de Literatura do grau de
bacharelado, não há avaliação da “aptidão artística” do alunado pré-aprovado. Quer dizer, embora os
cursos de Letras brasileiros costumem incluir quase sempre o ensino de literatura, que é uma arte, tais
cursos, via de regra, não ensinam a produção (criação) artística verbal, ensinam sua análise e
interpretação de dados e informações para que se faça crítica, incluindo nisso o ensino de teorias e de
métodos, assim como de História da Literatura. A respeito da literatura, os cursos de Letras se
limitam, em geral, ao ensino de uma escrita descritiva (de fichamentos, resumos e sinopses) e
dissertativa (como resposta a questões sob um comando orientador, de artigos e de trabalhos de
conclusão de curso) sobre poemas, contos, novelas, peças teatrais e romances mediante uma ou mais
abordagens teórico-críticas, bem como uma ou mais metodologias de estudo e de pesquisa. Assim, se
alguém espera se tornar poeta ou ficcionista depois de cursar Letras no Brasil, em geral, dará com os
burros n’água.

Uma vez que estudantes que concluam a Educação Básica não passarão por uma avaliação de
suas possíveis habilidades e competências de criação literária para ingressar na universidade, como
muito menos passarão por uma avaliação dessa espécie se não ingressarem na universidade e forem
diretamente para o mercado de trabalho apenas com a formação básica, para que cargas d’água ensinar
escrita criativa na escola? Antes de responder a isso, convém destacar que não se faz essa indagação
sobre o ensino artístico de música, dança, pintura, desenho e de outras artes na escola. Se se observar,
se se fizer um levantamento estatístico de dados sobre quantos indivíduos que concluem a Educação
Básica ingressam em cursos, por exemplo, de Música, Artes Visuais, Artes Cênicas e Dança, será
notado que são pouquíssimos. Ainda assim, exceto mediante políticas de exceção – como no caso do
governo de Michel Temer, aprofundado pelo governo de Jair Bolsonaro, a respeito de fazer barreira
à compulsoriedade do ensino das artes na escola –, não se questiona por que, enquanto estiveram na
Educação Básica, tais indivíduos passaram por aquelas artes pelo modo produtivo da criação ou da
interpretação criativa. A performance (interpretação criativa) é comum, por exemplo, no ensino
escolar da música e da dança, uma vez que comumente não se orienta o alunado a compor peças
musicais nem apresentações de dança, pois o alunado é apenas orientado a performar música (cantar
e tocar peças alheias) e a performar dança (dançar apresentações de composição alheia). Nesse
sentido, pode-se dizer que o ensino das artes, como exceção da literatura, por mais limitado ou mesmo
deficiente que seja no Brasil, é bem mais eficaz. Essa eficácia, inclusive, diz respeito ao que acontece
na universidade às artes – com ênfase à exceção da literatura. Quem ingressa no curso de Música,
Artes Visuais, Artes Cênicas ou no de Dança aprenderá, além do que previamente pode aprender na
escola e do que passou se seu curso exigiu um VHCE (como é mais comum aos cursos de Música), a
produzir (criar, além de performar) música, alguma/s das artes visuais, algo de teatro ou de dança.

Ainda não respondendo diretamente àquela primeira pergunta, veja-se esta: por que o ensino
das outras artes é mais eficaz? Essa segunda pergunta importa porque sua resposta orientará a resposta
da primeira, que não é demais lembrar: para que cargas d’água ensinar escrita criativa na escola? Ora,
não se espera que ao ensinar na escola a produção criativa (ou de interpretação criativa, performática)
das outras artes que os indivíduos se tornem artistas. (Conveio ressalvar que na escola porque na
universidade, sim, espera-se que estudantes de arte se tornem artistas.) Se alguém se torna artista de
música, pintura, desenho, dança ou de outra arte mediante o ensino de criação artística escolar, esse
efeito é colateral, logo, não é principal. Entenda-se que, principalmente, o ensino prático (criativo) de
uma arte prevê, antes de tudo, o desenvolvimento algo que mais íntimo de apreciação da arte.
[Lembro-me de quando, da primeira vez em que falei sobre escrita criativa na Faculdade de Letras da
Universidade Federal de Goiás (FL/UFG), em 2009, eu estava em uma mesa de debate com a
Professora Goiandira Ortiz Camargo, que foi minha orientadora, e com a Professora Zaira Turchi,
então Diretora da FL/UFG na época. Hoje ambas são professoras aposentadas. Estamos em outro
tempo. À parte do dado sobre a aposentadoria daquelas professoras, convém chamar a atenção para
uma fala da Professora Zaira Turchi na época, enquanto compartilhávamos da mesma mesa de debate.
Na ocasião, aquela professora disse que durante a infância e parte da adolescência estudava a prática
do piano. No frigir dos ovos, ela não se tornou pianista compositora nem intérprete. Mas, conforme
o depoimento dela, seu estudo de piano a fez saber não somente apreciar mais de perto a música de
peças para piano, mas a música em geral – e nisso, mais notadamente, a música erudita. Conforme
também a Professora Zaira Turchi declarou na época, se ela fosse tocar piano, mal saberia o que fazer,
embora tenha dito que saberia fazer algo, ainda que pouco. Mal saber fazer algo posteriormente,
depois que deixou o estudo de piano, contudo, não afetou sua capacidade de apreciação da música.
Ou seja, o efeito principal, de educar à apreciação da arte de modo mais íntimo, efetivou-se.]

Chegamos ao ponto. Como foi dito, a resposta àquela segunda pergunta orientaria a resposta
à primeira, que é a pergunta que importa mais objetivamente. [Serei indireto.] Em 20 de julho de
1974, aquele que pode ser dado como o poeta máximo da língua portuguesa – com o risco de tudo de
excessivo que há nesse julgamento –, Carlos Drummond de Andrade, publicou no Jornal do Brasil,
diário do Rio de Janeiro, o artigo de opinião “A educação do ser poético”. [Vocês tiveram acesso a
esse artigo porque lhes foi enviado previamente ao início desta disciplina.] No artigo, Drummond diz
que se o ensino de poesia fosse recursivamente mantido na escola, esta arte, nas palavras do Poeta,
“como primeira visão direta das coisas e, depois, como veículo de informação prática e teórica”,
poderia manter o senso criativo nas crianças e adolescentes. Antes de dizer isso, Drummond adverte
que não pretende cometer, em seu texto, o crime de incitar as escolas a formarem “milhões de
poetinhas”. Mais adiante, ele diz que mediante esse modo de ensino, a “vocação” (“aptidão”) poética
teria uma “franca largada”. Com isso se entenda que o principal do ensino de escrita criativa,
conforme nossa ementa, de poemas e contos, não enseja a formação de um sem-número de poetas e
contistas na escola. Embora seja um efeito colateral, não se deve perder de vista, no entanto, que tal
ensino é capaz de algo que guiar um caminho para quem desejar ou passar a desejar se tornar poeta
ou contista. [Eu diria ficcionista, mas o ensino de escrita criativa de novela e romance na escola
demandaria um tempo muito extenso, que se deve às peculiaridades desses gêneros, os quais
costumam gerar textos em uma maior extensão de escrita em relação a outros gêneros literários.
Contudo, não se vá pensar que um projeto escolar de orientação à escrita criativa de novela ou
romance é impossível, assim como não é impossível um sobre a escrita criativa do roteiro de filme
de longa-metragem.] Mesmo havendo a possibilidade daquele efeito colateral, o principal, conforme
já foi destacado, é o desenvolvimento da capacidade mais íntima de apreciação da arte literária. Antes
mesmo do conhecimento histórico, teórico, crítico e metodológico, importa que experimentar a escrita
da literatura promove uma primeira visão direta das coisas – e isso por adaptação daquilo que
Drummond declarou sobre a poesia. A de discutir-se – e será discutido – se alguém tem “vocação”
(“aptidão”) para qualquer arte que seja.

Observe-se: na conferência Aula, proferida em 7 de janeiro de 1977, por ocasião de assumir a


cátedra de Semiologia Literária do Collège de France, Roland Barthes disse que a máthesis (μάθησις)
da literatura é a própria vida. Primeiramente, entenda-se que máthesis – pelo menos, aqui no Ocidente,
desde o largo da obra do filósofo grego antigo Epicuro, que viveu entre os séculos IV e III a.C. – é o
saber produzido e dado como o cerne de um conhecimento. Assim, quando Barthes orientou que a
máthesis (o cerne do saber) da literatura é a própria vida, ele disse, em outras palavras, que a literatura
é, na linguagem verbal, a primeira visão direta das coisas. Não se vá entender disso que haja uma
obra literária que trate de toda a vida conhecida. Antes se entenda que toda a vida conhecida – a vida
que houve, a que há e a que haverá – não escapa do conhecimento produzido (criado) pela literatura.
Assim, cada poema, cada conto, cada novela, cada peça teatral, cada romance dão uma primeira visão
direta de algo da vida. Quando Drummond falou que a escola não deveria se abster da poesia da
matemática, da geografia, da linguagem, ele disse, em outras palavras, e conforme toda a discussão
de seu artigo “A educação do ser poético”, que aprender a escrever literatura tem, sobretudo, por
finalidade assumir um posicionamento discursivo em relação a todo o conhecimento humano, de
modo a desenvolver em cada estudante uma educação sentimental (uma educação poética, estética,
sensível), que inclui o desenvolvimento lúdico, intuitivo e criativo. Entenda-se intuir, conforme
Bakhtin, Medvedev e Volochinov, expressar um saber tacitamente assimilado mediante as relações
dialógicas da vida sem que se encadeie a expressão de acordo com uma sequência organizada de
sentenças reguladas como lógicas. Além daquela finalidade, de assumir um posicionamento
discursivo em relação a todo o conhecimento humano, convém dizer que para entender de modo mais
eficaz o funcionamento de algo é preciso uma interação não somente analítico-interpretativa, mas
também produtiva. A respeito disso, por exemplo, ao ensinar-se sobre eletricidade em física, seria
mais eficaz, além da aquisição do conhecimento abstrato (teórico, conforme Bakhtin), uma discussão
sobre como é feita a distribuição de energia elétrica nas residências, que deveria incluir um laboratório
mínimo no qual o alunado pudesse fazer medição de eletricidade, e isso incluiria discutir medidas de
segurança, logo, também incluiria o estudo da reação entre o corpo humano e a eletricidade, bem
como poderia levar a uma discussão sobre como o sistema político incute valor econômico sobre a
distribuição de energia elétrica. No caso da escrita criativa, interessa que embora orientar o alunado
a escrever poemas e contos não vá necessariamente produzir poetas e contistas, vai inevitavelmente,
importa enfatizar, fazê-lo interagir de modo mais íntimo com a arte. Isso permite ao alunado conhecer,
de certo modo, a arte por dentro, em seu funcionamento, pois terá de enfrentar sua realização
(produção, criação). Além disso, o alunado descobrirá que a arte não decorre meramente de obra de
indivíduos iluminados, que inspiração é um estado de disposição à realização (produção, criação)
artística, e não uma intervenção divina ou uma irrupção súbita, até porque, se a arte decorresse desta
irrupção ou daquela intervenção, o indivíduo que a produz não seria seu autor, seria um mero veículo
da divindade autoral que se valeu de alguém para que a arte existisse ou alguém fora das causalidades
contextuais da vida sob a influência de algo invisível, misterioso. Enquanto no caso daquela
intervenção o indivíduo é desprovido de autoria, no caso da irrupção, o resultado da criatividade, por
dizer respeito apenas ao indivíduo, seria ininteligível. Uma vez que há autoria e que o produto da arte
(as obras) é inteligível, logo, um caso (a intervenção divina) e outro (a irrupção súbita) não procedem.
No mais, como discute Longino em seu tratado Do sublime, do século III de nossa era, se quem tem
“talento” (“vocação”, “aptidão”) para a arte não praticá-la, o “talento” será apenas suposto, e uma vez
que quem realiza a arte faz isso por prática (trabalho), não há como dizer que havia nem que não
havia previamente “talento”, afinal, mesmo que houvesse, sem prática, a arte não iria acontecer. Em
vez de “talento”, “aptidão” ou “vocação”, convém falar de afecção.

Para efeito de retomada, espera-se claro por que não é viável iniciar o ensino de escrita criativa
na escola a partir de um diagnóstico do tipo descrito. Por sua vez, convém inicialmente apresentar às
crianças e adolescentes uma proposta de escrita aberta ou livre. Depois, convém apresentar um
fechamento da abertura, e isso nos termos da orientação open-ended, que ainda será apresentada. Não
se vá com isso ignorar a presença da Teoria, da Crítica e da História da Literatura na escola. [Nem
me seria devido ignorar tais conhecimentos, afinal, minha formação é, sobretudo, em Teoria da
Literatura. Inclusive, meus estudos, minha pesquisa, assim como minha orientação têm como foco
um dos elementos mais fundamentais da Teoria da Literatura, que é a autoria, a qual é tópico desta
disciplina que lhes apresento. Considero apenas, à guisa de Drummond, que esses conhecimentos
especializados são posteriores à prática objetiva da criação literária. Inclusive, na medida em que se
estuda literatura paralelamente experimentando-a na prática, tenho sempre a expectativa de que
indagações de ordem teórica, crítica e histórica serão formuladas pelo alunado.] Sobre a prática como
trabalho da criatividade, fica a pergunta: como, pois, começar? Ora, escrevendo, quer dizer,
solicitando e orientando crianças e adolescentes a escrever. Isso é, de certo modo, como sugere o
título deste livro de Drummond de 1985: Amar se aprende amando. Entenda-se essa referência por
analogia: escrever se aprende escrevendo. No início desta conferência, dito o seguinte: “Como, nos
termos bakhtinianos, todo gênero tem memória e esta traz consigo o ‘tesouro técnico’ do gênero,
pensando-se seja em crianças, seja em adolescentes, quer dizer, em indivíduos da Educação Básica
do Brasil, convém, em uma proposta de escrita criativa, de antemão, deixar que mostrem o quanto
coletiva e individualmente acessam a memória e o ‘tesouro técnico’ de um gênero”. Isso foi dito
mediante uma ressalva, conforme a ementa da disciplina, sobre o poema e o conto. Neste estágio da
discussão, aquela declaração inicial incutia que crianças e adolescentes da Educação Básica, que,
conforme é de conhecimento, inclui o Ensino Fundamental (do primeiro ao nono ano e seus ciclos
correspondentes) e o Ensino Médio (da primeira à terceira série) têm experiência de leitura, por mais
parca que seja e por mais que o aprendizado da leitura e da escrita da língua esteja aquém do esperado
em cada ano e série.

Em ênfase do que já foi dito, agora de modo mais ampliado, o alunado, desde a primeira
infância, conhece cantigas, canções, estórias, lendas, mitos. Sobre isso, há todo um folclore
enciclopédico, telúrico, rural e urbano, e além disso, o alunado cresce assistindo a animações, seriados
de TV, filmes, como não raro, lê gibis. Ou seja, conhece a ficção. No mais, desde a primeira infância,
há certo acesso a livros infantis e depois juvenis. Sugiro que não se perca isso de vista. Tudo esse
conhecimento da criança e do adolescente é específica e parcialmente obra da criação verbal. Assim,
se se diz que é para escrever um poema, o alunado saberá mais ou menos o que fazer. O mesmo vale
para se se diz que escreva um conto, uma estória curta, uma “história inventada”, uma ficção. A
primeira observação disso dá em como a memória do gênero se revela, e por sua vez, com ela, o
“tesouro técnico” do gênero. Se se educa crianças, pelo menos até o sétimo ano, em geral, será
observado que elas conhecem poemas com versos mais ou menos de mesma extensão (em geral, em
torno das sete sílabas, que é o verso mais popular do português), estrofados em quadras e/ou quintetos
e com rimas, ainda que irregulares entre emparelhadas, alternadas (ou cruzadas) e interpoladas (ou
intercaladas). Ainda que a sentença “Era uma vez” não apareça, é possível se observar que as
narrativas poderiam ter essa sentença incutida logo no início. Essa sentença, no geral das orientações
de escrita criativa, equivale ao princípio de “E se” (What if), que ainda será apresentado. Será possível
observar também que haverá um narrador e pelo menos uma personagem. O poema escrito por
qualquer estudante, sobretudo se mais jovem, ainda criança, poderá não apresentar nenhuma metáfora
além das mais usais da língua, pois como bem advertiu Aristóteles, tanto na Retórica quanto na
Poética, a metáfora é uma figura pedestre, quer dizer, coloquial, e, conforme os estudos de Semântica,
não há comunicação linguística sem metáfora. “A mulher é uma flor”, “Minha mãe mora em meu
coração”, “Engoliu o mundo”, “Olha o alface”, “Fulano/a pulou o corguinho de ré”, “Não vou nem a
pau”, “Deu com os burros n’água”, “Ixi, deu merda”, “Rapadura é doce, mas não mole não” são
metáforas. O conto escrito por qualquer estudante, igualmente se mais jovem, poderá não ter um
conflito, e sem conflito não há trama, ainda que possa haver enredo (articulação de início,
desenvolvimento/andamento e fim ou desfecho). Incialmente, tanto faz. Tudo isso, tenha-se certeza,
acontecerá. Uma vez que acontecerá, significa que o alunado tem alguma memória do gênero, e logo,
ainda que de modo mínimo, conhecimento do “tesouro técnico”. Alguma experiência em relação à
existência também será observada. Há sempre um recorte da vida a aparecer. A experiência poderá
ter sinal de mais próxima do vivido ou mais próxima do vicário, da alteridade.

Convém adiantar, conforme mais adiante da disciplina será discutido de modo mais detido,
que nos termos bakhtinianos somente haverá autoria artística na medida em que pelo menos duas
consciências se apresentarem. Uma é mais imediata, porque diz respeito ao que da memória do gênero
e do “tesouro técnico” for mostrado. Essa implica uma formação estética e linguística, ainda que
mínima. É muito possível observá-la, além daquilo que for notado sobre a versificação, as rimas, a
figuração da linguagem, o enredamento de tempo, espaço, narrador e personagens, bem como por
escolha de tema – e, sim, isso implica que é conveniente, de início, deixar a escrita dada a temas livres
–, por seleção vocabular e estratégias de articulação sintática. A primeira, do par mínimo de
consciência, ainda conforme Bakhtin, revela-se também nos tons (de humor, ironia, sarcasmo,
exagero, atenuação, agressividade e outros), nas volições (gosto pelo cômico, pelo trágico, por
afetações diversas, pela surpresa, pelo suspense, pela sentimentalidade, pelo confessionalismo e
mais), nos valores (julgamentos negativos, positivos, neutros e parciais), nas bases ideológicas
(familiares, regionais, nacionais, sociais, políticas, econômicas, religiosas, místicas) e identitárias (de
classe, gênero, região ou nação, etnia e faixa etária). Todas essas observações apenas serão de ordem
artística no sentido do que for identificado sobre a memória e o “tesouro técnico” do gênero por uma
consciência que sabe deste e daquela (como resposta ao mundo) e por outra consciência, configurada
no texto (que responde à primeira consciência). Não se espere de imediato, porque esta é uma resposta
à primeira, encontrar a outra segunda consciência do par mínimo nas produções iniciais do alunado.
Até o âmbito da primeira, o que se verá será menos uma consciência consciente, e mais uma
consciência decorrente da formação, do coletivo, mas ainda não necessariamente cônscia disso. Nesse
sentido, as experiências mais visíveis serão a de memória de leitura e do vivido. Somente quando
houver uma experiência vicária configurada no texto, aquela de revelar uma alteridade, uma empatia
– não uma simpatia – com o que é alheio, ou de revelar algo difuso entre vivido e vicário, será
observada uma consciência própria de uma arquitetônica literária nos termos bakhtinianos. Isso
porque essa segunda consciência do par mínimo é uma consciência mais propriamente criada e faz
saber que a primeira é uma consciência consciente. Logo, até a segunda consciência não está
devidamente configurada, a primeira não deverá ser tratada como uma consciência consciente.

A consciência consciente, nos termos de Bakhtin equivale à autoria-pessoal, isto é,


corresponde à pessoa que realiza a criação escrita, e ao fazer isso, responde ao mundo. A resposta ao
mundo é tanto resposta ao contexto dos valores do mundo quanto ao contexto dos valores literários.
Ao escolher um assunto, por exemplo, as condições de vida da classe trabalhadora, e ao afunilar o
assunto em um tema, por exemplo, a exploração do trabalho, bem como ao assumir um discurso, a
exemplo de declarar o ódio que há no Brasil contra a classe trabalhadora, a autoria-pessoal dá
respostas ao contexto dos valores do mundo. Se qualquer estudante escolhe escrever um poema, o
modo de versificação (incluindo rimas ou não), a figuração da linguagem (incluindo a seleção
vocabular e as estratégias sintáticas), o tipo mais recorrente no texto (narração, descrição, declaração,
injunção ou outro), o foco da voz (em primeira ou terceira pessoa no singular ou no plural) e o
direcionamento da voz (para si, para outrem, para algo) são respostas às respostas da autoria-pessoal
mediante o contexto dos valores literários. Bakhtin chama a consciência configurada textualmente
que responde à autoria-pessoal de autoria-criadora. E, conforme foi dito, essa somente ganhará forma
na medida em que quem escreve toma consciência da própria consciência, para com isso criar outra
consciência no texto, geralmente vicária ou difusa entre a experiência de leitura, do vivido e a vicária.
Difusa porque não se espera artisticamente que a consciência configurada textualmente seja idêntica
à consciência da pessoa que escreveu o texto, mas também não se espera que seja indiferente, apenas
que seja diferente. Antonio Candido, ao descrever sua teoria do sistema literário no primeiro volume
de Formação da Literatura Brasileira, comentou sobre a necessidade de escritores/ras conscientes
de seu papel, ou seja, de agentes da escrita literária que não se limitam a descrever, narrar, informar
ou declarar algo sobre si, mas de saberem por que fazem isso, quando, onde e para quê. No poema
“A flor e a náusea”, do livro A rosa do povo, de 1945, Drummond apresenta um acontecimento que
se insurge contra o mundo de ódio voltado contra a classe trabalhadora. O acontecimento, como se
sabe, é o nascimento de uma flor que surge algo como uma esperança contra tudo que enjoa e enoja
nas práticas do mundo contra a classe trabalhadora, práticas que causam ódio. O termo flor está para
poema, conforme é empregado tradicionalmente a partir do grego ᾰ ̓́νθος (ánthos), que deu para o
português o termo antologia (a partir do termo florilégio, de origem latina). Como pessoa autoral,
Drummond responde ao contexto dos valores do mundo causadores do ódio contra a classe
trabalhadora configurando uma voz subjetiva lírica que responde à resposta do poeta ao mundo
enquanto declara que a poesia é uma arma de resistência. A consciência textualmente figurada não é
idêntica à consciência autoral-pessoal, embora não sejam mutuamente indiferentes. Não há como
dizer que o poema é uma declaração de Drummond sobre si mesmo, logo, não há como dizer que o
poema é apenas produto da experiência do vivido, pois, mesmo Drummond estando no lugar de quem
sofria aquele ódio, a voz subjetiva lírica do poema é também de alteridade, abre-se, ainda que em
primeira pessoa singular, como voz de toda a classe trabalhadora. Isso é um exemplo do que foi falado
sobre a relação difusa entre a experiência do vivido e a vicária entre aquelas duas consciências
mínimas que figuram um texto como obra da criação verbal, da literatura.

Convém, como docente, não se frustrar quando parte de seu alunado ao final de todas as
práticas de escrita criativa apresentadas não revelar na produção no mínimo duas consciências. Isso
não é simples de dar por resolvido. Além do mais, a produção da escrita criativa poderá não efetivar
afecção em certos indivíduos. Há indivíduos que produzirão de acordo com as propostas de escrita
criativa apresentadas, mas que não demonstrarão empenho de envolvimento de fato nisso. Não se vá,
mediante essa situação bastante possível, uma vez que acontecerá, desprezar quem não apresenta, ao
final de uma série de orientações, a afecção esperada pela arte literária. É bom tem em mente que o
principal de tudo é levar a um desenvolvimento da capacidade de apreciação da arte verbal, e somente
de modo colateral a uma provocação de que, senão todo mundo, quase todo mundo, pode, a sua
maneira, produzir literatura, como muita gente canta e dança sem ser artista. Note-se: não aprecia
menos o samba quem não sabe sambar. Pode-se performar desenho sem demonstrar criatividade nessa
arte. É preciso entender que performar uma arte não é necessariamente agir de maneira criativa. Nesse
caso, como já dito, não se pontua performance como criação artística, conforme é vigente e legítimo,
mas como desempenho de protocolos de uma arte. Como é produto da linguagem verbal, a literatura,
antes de ser produzida, precisa ser lida. Como é verificável, a cada oficina de escrita criativa,
inevitavelmente, para realizar as tarefas, o alunado terá de ler mais do que costumeiramente ler. E
levar o alunado a ler mais é de interesse mais devido do que levá-lo a escrever literatura. Afinal, quem
faz crítica literária necessariamente não produz literatura. Entenda-se também que a literatura é uma
arte peculiar, e isso não por ser uma arte melhor nem superior às demais, mas apenas porque ela é
aquela que em tudo se vale do material mais cotidianamente empregado na comunicação: a linguagem
verbal. Quem não entende uma língua, não tem como, para além do bailado ou do ruído dos sons,
entender nada da literatura oral da língua. Por sua vez, quem não sabe ler uma língua não tem como
apreciar nada da literatura escrita da língua. Mas é muito possível apreciar mediante uma volição-
emotiva – que é uma escolha decorrente de afecção – um balé russo sem nada saber de russo, bem
como apreciar um concerto para violino de Beethoven sem nada saber de alemão, e assim apreciar o
quadro “Impressão, nascer do sol”, de Claude Monet, sem nada saber de francês. Quer dizer, o código
da dança, da música e da pintura não são linguísticos a priori, embora sejam discursivamente
exprimíveis quando alguém dá expressão à apreciação (ou contemplação) daquilo que experimentou
com essas artes. Inclusive, na prática da apreciação geral, que não é de ordem crítica, é possível
contemplar como demonstrar prazer (fruição ou gosto) sobre aquele balé, aquele concerto e aquele
quadro sem ter conhecimento de dança, música nem pintura. Para isso, basta dar expressão às
sensações sentidas. Quiçá por isso, historicamente, o ensino artístico de dança, música e pintura pela
prática criativa seja mais eficaz, afinal, embora exista comunicação bailada, musical e pitoresca, é a
comunicação linguística (oral, escrita e de sinais) a mais vital nas relações humanas em geral. Isso
pode implicar um empecilho, pois muito bem diversos indivíduos podem se distanciar da literatura
porque têm outras relações com a linguagem verbal. Contudo, levando em conta que o principal é
desenvolver a capacidade de apreciação, espera-se que o empenho gere afecção principalmente pela
leitura de literatura – e isso, claro, porque estamos tratando de escrita criativa, não de oralidade
criativa, nem de vocalização criativa nem performática, que são outras atividades da estética verbal.
No mais, convém destacar que chamamos de escrita o conjunto de signos gráficos organizados para
representar as línguas orais e de sinais, muito embora, neste curso, estejamos sob a limitação das
línguas orais.

Vários tópicos até então já foram apresentados. Todos eles mediados pelo interesse de
conversar sobre quais as perspectivas mais gerais do ensino de escrita criativa na Educação Básica.
A título de revisão, foi recursivamente destacado que o principal interesse desse ensino é o
desenvolvimento da capacidade de apreciação de literatura (quanto à escrita, conforme ressalvado),
notadamente, no sentido fruitivo, e somente depois, no sentido crítico. A crítica é um conhecimento
fundamentado em analisar, interpretar e julgar informações e dados sobre alguma coisa (as artes, a
política, a economia, a sociedade, as religiões, as ideologias, os usos das linguagens, outros
conhecimentos/saberes). Somente se faz crítica se se conhece o objeto a ser analisado, interpretado e
julgado (comentado valorativamente). Para fazer-se crítica, comumente, é preciso paixão, profundo
interesse, e isso, por sua vez, envolve prévia paixão pelo objeto a ser criticado. Dado isso, que somente
com paixão à literatura poderá haver crítica, que é um conhecimento que a escola, ainda que de modo
básico, incute ao ensinar literatura. Ao participar do processo criativo, ao envolver-se com ele
escrevendo literatura, via de regra, há a perspectiva de que o alunado mostrará mais interesse, mais
paixão pelo objeto, afinal, não se ama aquilo que não se conhece. Por exemplo, se se ama a imagem
de alguém, suas feições e sua compleição física, ama-se tal imagem porque ela é conhecida, porque
alguém se avizinhou dela, inclusive chega-se, por amar, a criar uma imagem dessa imagem, uma
imagem mental, que na ausência da imagem mesma que se ama, ela é admirada por obra de
imaginação. Assim, se qualquer docente pretende fazer seu alunado escrever literatura, deveria fazer
isso de modo que o alunado tenha a possibilidade de amar a literatura, no sentido de não querer apenas
apreciá-la, mas produzi-la. Ainda que a maior parte do alunado não vá continuar produzindo
literatura, terá a possibilidade de amar essa arte, pois teve uma relação íntima com ela enquanto a
produzia. Nesse sentido, comumente, amamos mais alguém se podemos tocar nessa pessoa, se
conseguimos ter intimidade com ela. No caso da literatura, haveria, assim, pela prática da escrita
criativa, o amor de contemplar e o amor de tocar, que são dois modos de intimidade. Comumente, a
escola aposta em apenas uma dessas intimidades, a da contemplação. Contudo, a contemplação se
aprofunda quanto há toque, quando uma pele roça na outra pele, quando um corpo se une a outro,
porque assim, além da intensidade da contemplação, acontece a profundidade disso, devido à
penetração de um corpo no outro, à união, à comunhão dos corpos – é quando os dedos de um corpo
tateiam e penetram em outro corpo, que também repete tais gestos, e assim os dedos de um corpo e
outro se entrelaçam, terminando por desejarem-se e se enamorarem. Essa é a relação esperada pela
prática da escrita criativa. No entanto, quando a maioria do alunado, como é também esperado, deixa
de escrever literatura, diferentemente dessa relação individual de um corpo amante de outro, há
grande possibilidade da permanência da contemplação, isso que se equivale à apreciação, que
somente é possível porque o desejo restou como permanente. Há com isso de querer que, mesmo
quando a afecção mal seja de produzir literatura ou quando foi e deixou de ser, que se mantenha,
porque houve intimidade pela escrita criativa, de modo que arte verbal possa permanecer ali como
algo que se pode visitar sempre que for desejado, como quando, jamais com abuso, pode-se
reencontrar quem se ama depois da distância do convívio para tocar, deixando em todas as expressões
o prazer do reencontro, de modo visível e vívido, sem meios-termos. Isso como porque, como foi
dito, ama-se o que se conhece, e o amor, como se sabe, há na distância, na proximidade e na
interioridade. Para quem um dia teve uma frequente relação pela interioridade da literatura, que se dá
pela prática da escrita criativa, ainda que mediante a distância, senão a interioridade, a proximidade
será sempre possível. Isso é como, parafraseando a penúltima estrofe do poema “Pequena ode a uma
pétala seca ou a esperada ressurreição da rosa”, do livro Algumas partituras, de 2002, fosse possível
dizer que da distância à proximidade, da pétala seca de uma rosa, agora visitada, a “rosa se torne a
ser o que foi rosa outrora”.

Em um poema de João Cabral de Melo Neto, “O postigo”, publicado no livro Agrestes, de


1985, na quarta estrofe (primeira estrofe do segundo movimento do poema), diz-se: “O que acontece
é que escrever/ é ofício dos menos tranquilos:/ se pode aprender a escrever,/ mas não a escrever certo
livro”. A lição de Cabral parece clara: a escrita criativa (a literatura) é ensinável para que sua produção
aconteça, no entanto, isso não significa que o aprendizado necessariamente gerará uma obra notável,
ou mesmo uma obra que possa de fato ser considerada artística. Há aí três níveis, dos quais dois já
foram comentados. O primeiro, anteriormente comentado, diz respeito a produzir mediante
procedimentos tipicamente artísticos, mas, ao final, revelar apenas uma consciência. O segundo, já
de fato artístico, porque revela pelo menos duas consciência, dá em arte. Já o terceiro – que está muito
longe do interesse do ensino de escrita criativa – implica que o produto criado será grande arte – coisa
que somente o público apreciador e o público crítico, mediante o contexto dos valores literários
vigentes, poderão decidir. Na perspectiva aqui orientada, alcançar o primeiro nível já forma
indivíduos para uma apreciação mais íntima da literatura. O segundo nível aprofunda essa relação. O
terceiro, como foi dito, não é garantido, embora possa ser previsto – até porque, para acontecer, quem
do alunado se interessar em constituir uma carreira literária terá de tornar sua escrita criativa uma
prática constante e submetida àqueles públicos até que o reconhecimento aconteça. Contudo,
conforme vem sendo insistente nesta conferência, parafraseando Drummond, o objetivo não é formar
milhões de poetinhas e contistinhas. A decisão de fazer uma carreira literária não será de quem ensina
a escrita criativa em face de ninguém do alunado, será da pessoa desse grupo que por esse caminho
se decidir. Isso dado por resolvido, tomando-se consciência disso para que se faça a transposição
didática da escrita criativa, até quem ensina literatura que não tem carreira de escritor/a poderá ensinar
a escrita criativa. Diferentemente do alunado, é quem ensina que precisa de conhecimentos de Teoria,
Crítica e História da Literatura. Logo, com base nesses conhecimentos, quem ensina poderá avaliar
(analisar, interpretar e julgar/comentar) a criação do alunado. Evidentemente, assim como quem
ensina ao preparar aulas estuda os conteúdos, bem como ao preparar atividades avaliativas formula
e/ou prever respostas, convém que ao propor oficinas de escrita criativa faça a oficina previamente.
Ora, assim como não se espera com o ensino de escrita criativa que o alunado se torne artista da
palavra, não há, por analogia simples, que qualquer docente que oriente tal ensino seja escritor/a.
Inclusive, um/a escritor/a de renome necessariamente não ensinará bem a escrita criativa, poderá se
limitar a falar de como escreve, que procedimentos adota e de como é sua rotina de escrita. Isso, sem
dúvida, pode causar encantamento, mas não necessariamente aprendizagem.

Além de tratar da perspectiva de desenvolver a capacidade de apreciação literária e de


possivelmente gerar interesse em escrever literatura como objetivo de vida – que é um efeito colateral,
conforme já foi comentado –, mais tópicos foram apresentados. Esses serão revisados
processualmente conforme foi destacado. Assim, de início, tenha-se a atenção para considerar, nas
primeiras produções, o conhecimento prévio da memória e do “tesouro técnico” do gênero, tendo em
vista, conforme a ementa desta disciplina, o poema e o conto. Com isso, convém cuidar da expectativa
parcial sobre esse conhecimento, mesmo depois de o alunado passar por oficinas de escrita criativa.
Até para quem frequenta a literatura sempre, seja como leitor/a ou escritor/a, a parcialidade é vigente.
Foi sugerido evitar emprego de diagnóstico pautado em tópicos sobre gêneros literários da Teoria da
Literatura, bem como sobre os eixos cognitivos e as habilidades da Competência de Área 5 da Matriz
de Referência do ENEM conforme o INEP. Enfatizou-se sobre observar aquilo que for demonstrado
pelo alunado, coletiva e individualmente, a respeito do conhecimento prévio da memória e do
“tesouro técnico” do gênero. Houve uma atenção específica sobre a necessidade de compreender que
não é de tradição que os cursos de Letras em geral, assim como a escola, tenha como pauta o ensino
de literatura mediante sua produção (criação). Daí, o tópico mais discutido foi enfatizado, sobre o
entendimento de que o ensino de escrita criativa não é principalmente pautado em formar
escritores/ras, pelo menos em âmbito escolar, e conforme o formato acadêmico dos cursos de Letras
em geral, nem em âmbito universitário, uma vez que se torna escritor/a quem se interessa pela criação
literária e busca por isso. Foi apresentado um tópico à parte, sem desconectá-lo do todo da discussão,
sobre o conhecimento de que a máthesis da literatura é a própria vida, logo, essa arte não tem assunto,
tema nem discurso específicos. Voltando à sugestão sobre as primeiras orientações, foi indicado
iniciar qualquer proposta escolar de escrita criativa por uma tarefa aberta, livre, sobre um gênero
(como o poema ou o conto). Em outro retorno, sobre a memória e o “tesouro técnico” do gênero, foi
destacado que o alunado, desde a primeira infância, conhece cantigas, canções, estórias, lendas, mitos,
e isso faz com que tenha certo conhecimento da literatura para produzi-la. Para tudo isso, falou-se
sobre as autorias, a pessoal e a criadora, e isso em termos de consciências – que, conforme muitas
vezes se destacou, em termos bakhtinianos, na arte verbal são pelo menos duas, considerando que a
segunda, comumente, é principalmente da ordem da experiência vicária.

Em tudo, nesta longa conferência de apresentação desta disciplina, além dos tópicos revisados
nos três parágrafos imediatamente anteriores, importou que se tenha acesso ao que em geral se espera
do ensino de escrita criativa na Educação Básica: a princípio, os conhecimentos teórico, crítico e
histórico é de quem ensina, e somente lateralmente, na medida em que o ensino da escrita criativa é
ministrado, o alunado vai tendo acesso a esses conhecimentos. Note-se que mesmo tendo esse acesso
lateralmente, tudo que for da ordem teórica, crítica e histórica da literatura aparecerá ao alunado de
modo parcial, pois, como se sabe, o ensino de literatura na escola não se equivale a esse ensino nos
cursos de Letras. Se quem ensina não toma consciência disso tudo, a possibilidade de conduzir, por
orientação, o alunado a ter consciência da literatura, de conviver com ela, da existência dela aí, na
vida, há muitíssimo longa data, do interesse em produzi-la para, sobretudo, atingir o interesse de
apreciá-la – até porque, quem é escritor/a principalmente é mais leitor/a em assiduidade –, será bem
remota. Não se deve esperar muito nem menos. Por exemplo, se se diz ao alunado: escreva um poema
ou escreva um conto, deve-se esperar que escreva e em seguida avaliar (analisar, interpretar e
julgar/comentar) o que foi escrito, observando se algo próximo, parecido, semelhante ou igual ao que
comumente são poemas ou contos terminou sendo produzido. Caberá a quem propôs, ou seja, a quem
ensina, na sequência, discutir. Convém, posteriormente, e isto não foi propriamente apresentado,
sugerir nova escrita, desde que a discussão de quem ensina a escrita criativa tenha deixado o mais
evidente possível o que normalmente acontece em poemas e contos aconteceu no que foi escrito para
que a próxima produção decorra de mais conhecimento adquirido. Na sequência, os eixos cognitivos
previstos pela Matriz de Referência do ENEM conforme o INEP podem se úteis, se compreendidos
em torno do ensino de escrita criativa. Para isso, convém tornar o princípio open-ended a mola-mestra
das propostas seguintes de escrita criativa. No entanto, por questão de cronologia própria à apreensão
do que aqui vem sendo discutido, somente serão apresentados modelos de oficinas acerca do poema
e do conto do princípio open-ended no último encontro desta disciplina. Mas convém um
adiantamento. O termo em inglês trata de algo simultaneamente aberto e fechado. Sobre isso, sim, o
Céu é o limite. Mas é para lá de bastante possível fazer restrições. O princípio de restrição que será
fundamentado diz respeito à teoria do pré-comprometimento racional de Jon Elster. Essa teoria será
associada à noção de contexto dos valores literários de Bakhtin. Funciona mais ou menos assim, a
título de exemplo sobre o poema: alguém que escrever sonetos, em específico, uma suíte, quer dizer,
um conjunto de sonetos mediante um assunto, um tema, um motivo ou uma forma – sim, não há
apenas a forma italiana e sua variante francesa de soneto. Essa aí é a restrição, o pré-
comprometimento racional, aquilo escolhido a ser feito e que, porque escolhido, deverá ser cumprido.
O contexto dos valores literários diz não somente o que pode ser um soneto e como pode ser, mas
também que é vigente, que ainda é – e muito – praticado, logo, que tem valor para quem aprecia
poesia, para o público, tanto o público contemplador fruitivo quanto o público contemplador crítico.
Coadunando isso à teoria de sistema literário de Antonio Candido, entende-se que, escrevendo
sonetos, porque isso foi decidido porque pretende escrevê-los mediante porque sonetos têm valor
vigente, tem-se consciência do papel autoral, do qual se participa. Escrevendo sonetos, mediante
aquele papel, quem os escreve integra o contexto literário, uma vez que há público possível de
apreciar sonetos. Por sua vez, se também se coadunar tudo isso à teoria do campo literário de Pierre
Bourdieu, além de tudo que diz a teoria de sistema, que inclui haver público, haverá circulação de
sonetos, âmbito editorial, e logo, livrarias ou outros espaços (como os digitais), que podem tornar os
sonetos acessíveis, bem como a teoria de Bourdieu diz, no sentido aqui discutido, que há mais gente
na atualidade publicando sonetos e que o alunado que escrever poemas em tal gênero será avaliado
em face dessa produção publicada. Essa descrição, é claro, é muito sumária, aliás, sintética, e portanto,
elementar, mas decerto serve.

Na prática do exemplo dado, em uma situação open-ended de oficina de escrita criativa,


convém fazer o que segue. Primeiramente, apresenta-se a proposta em torno de um valor literário ou
de um valor de mundo a ser literariamente tratado. No primeiro caso, mantendo o exemplo dado, o
soneto é um valor literário. Note-se: para dizer a um alunado que escreva um soneto, mantendo a
orientação apresentada, antes de tudo apenas se solicite isso e se espere pelo resultado. Se se diz isso
de chofre em uma sala de aula em que há estudantes quase que somente com caderno e caneta/lápis
na mão, deve-se ter atenção para que o resultado seja de pouco a pouquíssimo correspondente à
expectativa geral do que é e de como é um soneto. O normal, se aparecer nesse contexto algo como
um soneto, será, dada a tradição em língua portuguesa, uma variante entre soneto italiano e francês.
Se isso acontecer, será visto poemas (alguns poucos ou mesmo apenas um) com duas estrofes que
semelham dois quartetos e duas estrofes que semelham dois tercetos. Decerto, dada a variante entre
soneto italiano e francês, será visto algum esquema de rimas. Provavelmente, porque estamos na
contemporaneidade, será visto poemas (supostos sonetos) de tal modo estrofados, mas sem
progressão com apresentação, desenvolvimento/andamento, volta e desfecho. Muito menos será visto
poemas (idem) com chave-de-ouro, pois, apesar de ser um caso de soneto da Modernidade (do
Parnasianismo), é um caso menos praticado atualmente – nesse sentido, apesar de o desfecho ser
clássico, mais antigo do que o Parnasianismo em torno de trezentos anos, ele é mais possível, porque
ainda é praticado, embora que bem pouco. Se acontecer algo parecido com um soneto em algumas
(ou em uma só) produções, a probabilidade de que trate do amor é grande, uma vez que ao longo dos
quase seiscentos anos de história do soneto esse é ainda um assunto que não deixou de ser visitado,
inclusive, no conjunto dos séculos do soneto, é o mais visitado. Apresentar essa proposta de escrita
de soneto é um caso aberto porque não se propôs assunto, tema, motivo, linguagem nem tipo de
soneto – no caso do tipo, nem convém propor mesmo, pois é matéria pouco conhecida inclusive de
profissionais da literatura. Por sua vez, a proposta também é fechada, pois não se espero por um
poema livre, por uma canção ou por outro caso, espera-se algo como um soneto. Embora isso, uma
proposta open-ended pode considerar um assunto, um tema, um motivo, e isso independentemente da
forma. Assunto, tema e motivo integram o contexto dos valores de mundo que são tratados
literariamente. Pode-se criar uma proposta do tipo: escreva um poema mediante qualquer modo de
versificação e de estrofação, com a linguagem que você quiser, mas com no mínimo oito e no máximo
vinte e dois versos que trate da miséria em quaisquer de seus aspectos. Entenda-se com tudo isso que
o princípio open-ended fecha e dar abertura à proposta. Quer dizer, há parte do que é proposto que
deve ser seguido a rigor e parte que pode ser feito livremente. Como isso, esteja claro, o Céu é o
limite. Embora tenha sido dado exemplo de poema, o mesmo pode ser feito sobre o conto. Basta que
se diga que se espero que seja escrito um conto de não menos de uma lauda e meia e de não mais de
duas laudas em Times New Roman tamanho 12 pt em espaçamento 1 ½ de margens iguais de 2,5 cm
que já se terá uma proposta open-ended. Pode-se, como foi dito, delimitar assunto, tema ou motivo.
Pode-se até delimitar que não haja diálogo. Pode-se delimitar que narrador/a e personagem sejam a
mesma figura. Pode-se delimitar que o conto seja fabuloso. Pode-se delimitar que haja exatamente
uma personagem feminina e uma masculina em tensão. Enfim, como foi dito, o Céu é o limite.

Ainda mantendo a orientação discutida, e recorrendo ao exemplo do soneto, somente vem ao


caso de discutir esse gênero da poesia depois da primeira produção proposta. Cabe considerar que,
diferentemente do contexto apresentado, possa haver um alunado com smartphone em sala de aula e
acesso a Wi-Fi, ou mesmo pode ser que se tenha um laboratório de informática à disposição para
trabalhar com o alunado. Em um caso ou outro, sem dúvida, no mínimo a quase totalidade de
estudantes irá acessar a internet para pesquisar sonetos e, é bem provável, parafraseá-los. [Já passei
por uma situação e outra, justamente como as descrevi. E, claro, em nada me opus a essa pesquisa.
Por que me oporia? Além de o smartphone, o computador, o laptop e o tablet serem tecnologias à
mão como o caderno e a caneta ou o lápis, são tecnologias de informação como em boa parte é o que
se encontra em uma biblioteca. Além disso, ninguém se enganem, escritores/ras desde sempre
escrevem a partir de outrem, que escreveu a partir de outrem e assim regressivamente de modo a gerar
sucessão. Não faz o menor sentido impedir a pesquisa para a escrita criativa em ato em sala de aula
quando, uma vez em casa, isso será feito, e mais ainda, todo mundo que produz literatura vive de
pesquisa estética, retórica, linguística, gramatical, discursiva, temática e o mais que haja à disposição.
Eu sou escritor e não escrevo sem pesquisa. Frequentemente tenho dúvida e me felicito em ter dúvida.
Quando me flagro parecendo que não tenho dúvida, sempre desconfio de mim, pois penso que é muito
falho, além de pretencioso, julgar que se tem certeza frequentemente. Tenho atualmente trinta anos
de escrita de poesia e dez anos de escrita de ficção em prosa, mesmo assim, faço pesquisa e tenho
dúvida. Vou eu esperar que um alunado da Educação Básica não faça pesquisa nem tenha dúvida?
Jamais. Seria, no mínimo, cinismo, para não dizer canalhice.]

Observe-se: uma pessoa adolescente de dezessete anos é adolescente há apenas quatro ou


cinco anos, e uma criança de dez anos está na segunda infância igualmente a apenas quatro ou cinco
anos. A infância, assim como a adolescência é muito transitória, já a vida adulta é bem longa, pois
transita da casa dos vinte anos até meados da casa dos sessenta anos, ou seja, dura em torno de
quarenta e cinco anos. [Eu tenho quarenta e seis anos, logo, sou adulto há em torno de vinte e seis
anos no máximo, isto é, eu tenho um pouco mais da metade da vida adulta até então. Medir isso com
a infância e a adolescência é, no mínimo, cruel.] Naqueles dois contextos que apresentados, se se
propõe um soneto – não se vá fazer isso com crianças por razões de conhecimento enciclopédico ou
de memória de leitura –, deve-se aceitar e até se felicitar que o produto resulte de pesquisa. Contudo,
depois da primeira proposta, pela qual se deixa que o alunado escreva livremente seu soneto, somente
na sequência, como foi dito, discute-se o resultado. Na discussão, procura-se ampliar o conhecimento
sobre o soneto – a respeito da memória e do “tesouro técnico” do gênero. Posteriormente, faz-se uma
nova proposta open-ended mais a rigor em torno do soneto, que somente será diferente da primeira
porque agora se fez o alunado acessar mais conhecimento sobre esse gênero. Conforme o resultado,
a depender do envolvimento do alunado com o soneto, pode-se fazer uma nova proposta, mostrando
diferenças entre o soneto clássico, o romântico, o parnasiano e o modernista. Se se quiser avaliar texto
até cansar a vista, as mãos e a mente, pode-se solicitar que o alunado, discente a discente, faça um
desses sonetos. Contudo, para quem ensina ter cuidado consigo pelo tempo disponível em relação ao
trabalho de avaliação, convém solicitar uma escolha. Mediante a escolha, certamente será visto quem,
se houver quem, ousou produzir um dos dois casos mais rigorosos, clássico e parnasiano.

É importante retomar o comentário sobre haver utilidade ao ensino de escrita criativa a


respeito dos eixos cognitivos da Matriz de Referência do ENEM conforme o INEP. O eixo I diz sobre
Dominar linguagens. A respeito da língua (linguagem verbal), a Matriz prevê o que é chamado de
“norma culta”. Daquele eixo, contudo, importa mais observar os registros de usos linguísticos que o
alunado pode apresentar. O eixo II diz sobre Compreender fenômenos. Literalmente, a Matriz diz
sobre: “construir e aplicar conceitos das várias áreas do conhecimento para a compreensão de
fenômenos naturais, de processos histórico-geográficos, da produção tecnológica e das manifestações
artísticas”. A um caso open-ended como escrever um conto com uma personagem feminina e outra
masculina em tensão, esse eixo pode ser apropriado. O eixo III diz sobre Enfrentar situações-
problema. Qualquer caso open – conforme desde o início foi sugerido como mais devido pelo menos
à primeira proposta de escrita criativa –, assim como qualquer caso open-ended (ou mesmo um caso
ended, como por exemplo: escrever um conto fabuloso de apenas uma lauda em Times New Roman
tamanho 12 pt de espaçamento 1 ½ com margens iguais de 2,5 cm em terceira pessoa, envolvendo
apenas duas personagens, além do/a narrador/a (conforme Bakhtin, quem narra é personagem, ainda
que não participe ativamente da narrativa), de sorte que uma seja uma mulher idosa e a outra seja um
homem jovem, e que haja entre ambas uma tensão de gênero, classe e etnia com resultado trágico)
calha a esse eixo. O IV diz sobre Construir argumentação. Esse é o eixo [eu diria] menos próprio para
a escrita criativa, uma vez que, via de regra, textos literários não são teses ou coisas do tipo. No
entanto, como se sabe, há ficção dessa ordem, como o romance de tese, que muito bem, embora seja
difícil, devido à extensão, pode ter seus princípios aplicados a um conto. Esse eixo IV, no entanto,
pode servir para discussão sobre os resultados das oficinas propostas no momento em que se leva
para a sala o resultado da avaliação – jamais no sentido meramente de correção, mas de ampliação
do conhecimento sobre a memória e o “tesouro técnico” do gênero, bem como, na medida do possível,
do excedente axiológico (excedente de pontos de vista, que implica em dialogia e heteroglossia).
Finalmente, o V é o eixo que diz de Elaborar propostas. Mediante essa adaptação dos eixos, pode-se
empregar esse eixo em estágio [eu diria] mais avançado do trabalho com escrita criativa. É o caso de
propor ao alunado, depois de uma produção livre, outra produção livre mediante discussão da anterior,
em seguida, uma produção open-ended de menor rigor e uma produção mediante esse princípio, mas
de maior rigor, depois de discussão da anterior, que implique pré-comprometimento racional. Nisso,
nem em tudo, as políticas que preveem como o alunado adquire, assimila, reproduz e produz
conhecimento são inúteis, quer dizer, valendo-se delas de modo sui generis é possível repensá-las
sem abdicar do que preveem para que não se diste o alunado do mínimo de cognição a adquirir, no
entanto, jamais a rigor nem de maneira formular (regrada). Em síntese, seria como variar os cinco
eixos previstos pela Matriz para: I. Lidar com linguagens; II. Compreender e aplicar conceitos; III.
Operacionalizar problemas; IV. Pensar/refletir sobre o que se fez; V. Pré-comprometer-se
racionalmente com uma proposta. É possível verificar-se que foi assim que se aproveitou dos eixos
cognitivos previstos pela Matriz neste parágrafo.

A Competência de Área 5 pode também ser levada em conta quanto ao ensino de escrita
criativa na escola. Recobre-se o texto de caput da Competência de área 5: “Analisar, interpretar e
aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante a
natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção
e recepção”. De imediato, vale também recobrar que análise e interpretação somente são possíveis
mediante tomada de consciência do conhecimento que se tem. Se duas vezes por semana alguém vai
até uma frutaria comprar banana prata e sempre faz escolha de certa quantidade de bananas mediante
certo aspecto da fruta, esse/a alguém reproduz um conhecimento. Reproduz se não pensa a respeito
do conhecimento. A quantidade recursivamente escolhida, sem dúvida, vem de uma prática de
consumo que o/a alguém tem, incluindo nisso que deve ter consigo uma prática de evitar desperdício,
não somente daquilo que compra, mas também de dinheiro. Já sobre o aspecto da fruta, deve ter um
gosto em particular, mas, sem dúvida, esse é mediado a algo que aprendeu a respeito do consumo de
bananas, que, provavelmente, de modo mais imediato, vem de sua casa familiar. Se apenas faz aquilo,
enfatize-se: reproduz-se um conhecimento adquirido. Se se pensa a respeito e se apresenta respostas,
deixa-se de reproduzir, e se passa a produzir conhecimento, pois tomou-se consciência, ainda que não
haja mudança propriamente do que se fazia, muito embora, ao tomar consciência, a tendência é que
se refine mais a escolha, tanto de quantidade quanto de aspecto sobre as bananas. Não vai o alunado
que nunca é levado a escrever poemas nem contos, ou que simplesmente fez isso aqui e ali mediante
uma proposta aleatória, ser capaz de analisar e interpretar o que fez de imediato nem mesmo em curto
prazo. Por isso interessa, de início, solicitar que somente escreva, e depois discutir sobre o que foi
escrito. Aplicar recursos expressivos da linguagem vai acontecer sempre. Mas fazer isso relacionando
(outros) textos com seus contextos, corresponde à aquisição do eixo cognitivo I, sobre Lidar com
linguagens, conforme a variação apresentada dos eixos. Isso mediante “a natureza, função,
organização, estrutura das manifestações” tem haver com o eixo II. Compreender e aplicar conceitos,
e com o eixo III. Operacionalizar problemas, conforme foi apresentado. Tudo isso realizado “de
acordo com as condições de produção e recepção” corresponde ao eixo IV. Pensar/refletir sobre o
que se fez, para, depois de um dado estado de trabalho com a escrita criativa, V. Pré-comprometer-se
racionalmente com uma proposta. Ou seja, uma vez que a variação dada sobre os eixos cognitivos da
Matriz pode funcionar a respeito da prática da escrita criativa, o fundamento geral da Competência
de Área 5 também pode funcionar. No entanto, o caput dessa Competência, sobre analisar e
interpretar, somente funciona depois das primeiras produções, diferentemente de aplicar, que é algo
que se faz conscientemente ou não. De todo modo, os eixos cognitivos previstos articulados ao
fundamento geral da Competência de Área 5 atendem, mediante uma variação, à didática exposta:
primeiro apresentar uma proposta de escrita criativa livre, ainda que mediada por um gênero (poema
ou conto) e somente depois discutir, para ampliar o conhecimento e apresentar nova proposta.

Já sobre as Habilidades daquela Competência, a primeira delas, a 15, diz: “Estabelecer


relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico,
social e político”. Na escola, notadamente durante o Ensino Médio, isso tende a ser convertido no
conhecimento sobre as escolas, as vanguardas e os movimentos literários. O alunado a ser orientado
é contemporâneo e não há como não ser. Logo, se tem uma coisa que a produção de escrita criativa
desse alunado será, e sem alternativa, é contemporânea. Por mais que se encontre alguém na escola
[eu já encontrei] que por algum motivo tenha forte afecção pela produção literária de um período
anterior ao século XX, se essa pessoa for escrever, ainda que siga à risca a estilística geral dada como
do período, isso resultará apenas em formalidade técnica, pois, dialogicamente, não há como fugir
dos valores vigentes. Inclusive, se o ensino da escrita criativa for voltado para uma pessoa de setenta
anos que nunca escreveu nenhum texto literário, embora se saiba que essa pessoa traz consigo valores
pretéritos, esses não vivem na pessoa sem mediação de valores vigentes. A simples frase de uma
pessoa idosa quando diz “Hoje em dia é assim, mas no meu tempo…” já mostra uma tensão de
valores, e mostra de sorte que nem um nem outro prevalece, pois se atravessam. Isso, nos termos de
Bakhtin, é obra da dialogia. Se, entre outros sonetos parnasianos largos (sonetos em versos
alexandrinos com chave-de-ouro), for apresentado o conjunto de dois sonetos “Musa impassível”, de
Francisca Júlia, que apesar do nome quase que apagado, foi a maior voz do Parnasianismo no Brasil,
e com isso for proposta uma oficina de soneto parnasiano, incluindo, por obviedade, oficina de
métrica, de rima e de figuras de palavra e de pensamento, mediante motivo clássico (um objeto ou
mito grego ou romano, ou um valor dado como universal como o amor, a morte ou a razão), ainda
que via paráfrase, será visto de resultado recursos à linguagem e a algum valor contemporâneo. Em
escrita criativa, esse tipo de exercício, dado a ser feito a partir de um ou mais textos, é chamado de
exercício de estilo. Na prática, contudo, essa Habilidade, a 15, jamais fará ninguém, mediante uma
proposta de escrita criativa, produzir um poema de feição própria do passado na atualidade. Ou seja,
no máximo, essa Habilidade serve para um diálogo entre tempos, quer dizer, para o que chamamos,
também em escrita criativa, de atualização, que implica na reescrita de algo decorrente de valores
antigos mediante valores vigentes. Entenda-se: não é que em escrita criativa se deve deixar de almejar
esse diálogo, não é que se deve deixar de ter em vista o que foi feito no passado como lição, contudo,
jamais o passado poderá ser dado de todo novamente, pois, no máximo, ele poderá ser analisado, e
somente isso, uma vez que, ao ser submetido, depois da análise, à interpretação, o passado estará sob
vários ruídos, dado que seu tempo é outro.

A Habilidade 16 da Competência de Área 5 diz sobre: “Relacionar informações sobre


concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário”. Essa é, e isto já foi destacado,
a Habilidade mais objetiva ao conhecimento da memória e do “tesouro técnico” do gênero. Nela,
“informações sobre concepções artísticas” é um trecho que indica o contexto dos valores literários.
Estilos, temas e formas estão aí previstos. Observe-se, por exemplo, algo que não foi escrito até então
nesta conferência: a cultura do verso livre. Esse é um caso de forma. Observe-se também, que
igualmente, embora de modo sui generis, a cultura da identidade entre narrador/a e/ou personagem
protagonista e autoria-pessoa, no caso da ficção, é um caso de forma. No primeiro caso, se
visitássemos diversas antologias da poesia que se faz da década de 1960 até a atualidade,
observaremos que a livre versificação foi sendo até se tornar a prática escrita da poesia mais recorrente
da contemporaneidade. Em A invenção das tradições, Eric Hobsbawm e Terence Ranger descrevem
a tradição como: “Um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras tácitas e abertamente
aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de
comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente, uma continuidade em relação
ao passado”. Ao longo desse livro de Hobsbawm e Ranger, entendemos que o passado na relação
com as tradições não é necessariamente um passado longínquo. Na verdade, entendemos que nem é
perto disso, porque é costumeiramente um passado próximo. Quer dizer que um período tem suas
“práticas, normalmente reguladas por regras tácitas e abertamente aceitas” vindas de um período
anterior, mas a sua maneira, e assim, sucessivamente, período a período posterior, “práticas,
normalmente reguladas por regras tácitas e abertamente aceitas” vão sendo transmitidas, mas
mediante certas modificações. Nesse sentido, o conservadorismo de hoje jamais é igual ao
conservadorismo que o precedeu. O que conservadorismos têm em comum é serem adversos a ideias
progressistas, contudo, progressistas de sua época, pois, se compararmos o conservadorismo do Brasil
vigente entre as décadas de 1920 a 1940, o conservadorismo de hoje em dia parecerá progressista, e
assim, o progressismo de tal período parecerá um conservadorismo em relação ao progressismo atual.
Mas isso não é relativismo, no sentido de que tudo é variável etc. Em um caso e outro, o período entre
1920 a 1940 e o período atual, o princípio conservador é o de manutenção de costumes do poder
vigente contra costumes insurgentes, que são progressista em qualquer época.

O verso metrificado e o verso livre são dois valores literários vigentes, quer dizer, ambos
convivem. Hoje em dia, somente certos indivíduos ou certos que se dedicam à poesia os tencionam.
No entanto, o verso metrificado passou, na cultura poética escrita, a ser cada vez menos e menos
praticado, diferentemente do verso livre. De sorte que, a anterior capacidade de notar a metrificação
de um poema na leitura ou na audiência cada vez mais foi se perdendo, e está quase que totalmente
perdida. Logo, aquilo que foi uma oposição ao verso metrificado, o verso livre, quer dizer, aquilo que
foi uma fuga à regra, tornou-se regra, porque se tornou tácito e abertamente aceito. Já não se julga
mais um poema pela métrica nem pela sua falta de métrica. Inclusive, a leitura e a audiência já nem
é afeita a isso. Por sua vez, na prosa de ficção, enquanto nas três décadas finais do século XIX era
comum encontrar-se contos, novelas e romances em primeira pessoa singular, com quem narra sendo
quem protagoniza a estória como personagem, via-se nisso uma figura inventada, em nada
convergente com a pessoa autoral. Já a partir dos anos 1990, cada vez mais vemos narrativas de ficção
escritas com quem narra sendo quem protagoniza a estória como personagem, em primeira pessoa
singular, no entanto, essa figura, em geral, assemelha-se de modo identitário à pessoa que escreveu a
narrativa. Isso, a sua maneira, alterou os “procedimentos de construção do texto literário”, variou os
valores, inventou novas tradições, porque relaciona o presente ao passado mais próximo. [Em minhas
oficinas de poesia, por exemplo, costumo dizer que nada é mais esperado, salvo raríssima exceção,
que todo mundo comece a escrever em versos livres, coisa quase impossível de levar em conta para
a quase totalidade de poetas iniciantes até pelo menos o trânsito entre as décadas de 1940 e 1950.
Nesse sentido, que diz respeito objetivo à memória do gênero e a seu “tesouro técnico”, quiçá, ou
certamente, a Habilidade 16 da Competência de Área 5 é a mais eficaz, sem excluir que seja mediada
pela Habilidade 15 conforme as ressalvas apresentadas, para uma orientação à escrita criativa na
escola.

Ainda a respeito da Competência de Área 5, a Habilidade 17 diz sobre: “Reconhecer a


presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional”.
Até este ponto: “Reconhecer a presença de valores sociais e humanos”, essa Habilidade aponta para
aquilo que, conforme foi pontuado mediante à referência a Roland Barthes, é a máthesis da literatura,
a própria vida, afinal, “valores sociais e humanos” correspondem à própria vida conforme a
conhecemos. “Atualizáveis e permanentes”, por sua vez, indicam, por ordem, tanto aquilo que foi
dito sobre a Habilidade 15, a respeito de em termos de escrita criativa nada do passado ter
possibilidade de ser escrito novamente sem presença de valores contemporâneos, quanto indicam
aquilo que comentado sobre a Habilidade 16, a respeito das tradições como valores tácitos e
abertamente aceitos, mas mediante um passado mais recente em relação ao presente. Note-se com
isso que o caso da Habilidade 15 somente se torna viável à expectativa de produção do alunado sob
um ensino de escrita criativa porque o caso da Habilidade 16 se faz impor pelos valores literários
vigentes, jamais por tudo aquilo que seja “informações sobre concepções artísticas e procedimentos
de construção do texto literário” em todas as épocas. Para orientar oficinas de escrita criativa na
escola, de todo modo, a chave da Habilidade 17 está entre seus polos, se assim a descrêssemos:
“Reconhecer a presença de valores sociais e humanos no patrimônio literário nacional”. Observem:
que os “valores sociais e humanos” estarão na escrita do alunado é inevitável, tanto porque todos os
indivíduos do alunado vivem socialmente quanto porque são humanos, mas que o alunado escreverá
mediante “o patrimônio literário nacional” somente é possível se ele for levado a visitar aquilo que
orienta a Habilidade 15. Um caso: queira que não se queira, tudo que se fez em escrita no samba é
um patrimônio nacional, está tão extensa quanto profundamente arraigado na cultura do povo
brasileiro. Qualquer coisa que alguém do alunado escrever parecido com um samba apresentará, de
certo modo, no mínimo, resquício desse patrimônio. O mesmo vale para as imagens de nação e de
região do Romantismo, bem como para a valorização de tematizar o cotidiano do Modernismo.
Enquanto lê a literatura do país, formando sua enciclopédia de referência, inevitavelmente, o alunado
assimilará coisa desse tipo. Nesse sentido, somente como exercício de estilo o conhecimento previsto
por essa Habilidade 17, assim como pela Habilidade 16, é útil ao ensino de escrita criativa sem que
se limite, como é de costume no Ensino Médio, a serem, ambas as Habilidades, convertidas em
conteúdos da História da Literatura Nacional. No sentido de toda a discussão apresentada a respeito
dos eixos cognitivos e das Habilidades da Competência de Área 5, no propósito de não transformar o
ensino de escrita criativa na escola uma estratégia paralela ao ensino dos conteúdos de literatura, as
Habilidades 15 e 17 somente parecem viáveis como formas adaptáveis de exercícios de estilo que
façam o alunado dialogar com as épocas de produção literária pela mediação da Habilidade 16, desde
que não restrita a ser dada como um conjunto de conteúdos de formas literárias, mas de valores
literários vigentes. Logo, somente uma forte atuação docente para adaptar as Habilidades da
Competência comentada, bem como para variar os eixos cognitivos, tornará tais políticas úteis ao
ensino de escrita criativa, pois a Matriz prevê apenas o ensino de conteúdos para análise e
interpretação de informações e dados.

No final das contas, foi feito um longo exercício forçoso de discussão, devido àquele
documento-chave a respeito do que se espera do alunado ao final da Educação Básica a respeito do
conhecimento de literatura. Tal exercício forçoso foi feito no sentido de mostrar que, mais para mal
do que para bem, pelo menos em termos de escrita criativa, de pouco a pouquíssimo a quase nada, os
eixos cognitivos e aquela Competência e suas Habilidades podem servir ao ensino de escrita criativa,
uma vez que se exigiu variação e adaptação. Claro que de pouco a pouquíssimo a quase nada também
é servir, senão seriam desnecessárias a variação e a adaptação apresentadas. [Particularmente, até
porque eu, comigo mesmo, somente posso ser particular, não arriscaria meu pescoço promovendo
oficinas de imitação de estilo para discentes da Educação Básica.] Entenda-se: nós estamos na
contemporaneidade, e mais do que nós, mais estão na contemporaneidade todo o alunado da Educação
Básica, e isso pelo simples fato de ser mais jovem, bem mais jovem. Isso não implica ignorar o
passado e muito menos as tradições. Já foi dito: as tradições mais vigentes são aquelas decorrentes
do passado mais próximo do presente. Além disso tudo, o longo exercício forçoso também foi útil
para observar-se que as políticas de ensino de literatura na Educação Básica não preveem o ensino de
escrita criativa, caso contrário, nenhuma ou quase nenhuma variação e adaptação seria necessária.

Voltando ao início, em termos de estratégia de ensino da escrita criativa, é importante repetir:


comece-se [insisto] deixando o alunado produzir para saber o que da memória e do “tesouro técnico”
do gênero revela em sua atividade criativa com a palavra escrita. Note-se que, independentemente de
formas de tradição mais inculcadas, apesar de a maioria do alunado conhecer a literatura por livros
didáticos, em termos de seleção vocabular, estruturação sintática, discursividade, valores literários e
de mundo, a quase totalidade do alunado conversa com a produção literária recente – em geral, de no
máximo quinze anos atrás. Isso precisa ser ouvido. A cada audiência, e somente a cada audiência,
algo, aos poucos, de preferência, bem aos poucos, de novo conhecimento deve ser transmitido, e isso
via discussão. Por exemplo, se é para fazer exercício de imitação de estilo, que se busque poemas e
contos o mais contemporâneos possíveis escritos por vozes que estão aí a público na faixa etária dos
vinte e dos trinta anos. Haverá nisso identificação, sem dúvida. Para evitar maiores problemas e,
sobretudo, frustrações, convém não recorrer frequentemente a canções, filmes, seriados e gibis, mas
a poemas e contos publicados por autores/ras naquelas faixas etárias. Paralelamente, entre uma oficina
e outra, importa acrescentar nomes de gerações anteriores – principalmente nomes em atividade, de
autores/ras na faixa etária dos quarenta e dos cinquenta anos. Posteriormente, pode-se acrescentar
nomes acima de sessenta anos. De preferência, vale ressalvar, ainda em atividade. Não se vá entrar
em crise com isso, pois nas demais aulas de literatura, nomes do passado terão seu lugar ao Sol, que
já está para lá de garantido. Nesse processo, como um estilingue é puxado da frente para trás a fim de
chegar adiante, e não ao contrário, logo se chega a Drummond com nenhuma ou quase nenhuma crise,
e assim também se chega a Machado de Assis e depois a Camões. Entenda-se que o gosto docente,
devido a todos os aspectos da formação, quase nunca calha ao gosto do alunado. Mas poderá haver
diálogo, desde que a expectativa de ceder se dê em duas vias. Disso, interessa indagar o que um/a
docente faria se na primeira oficina de poema para o Ensino Médio aparecerem textos semelhantes
ao da música sertaneja? Isso é para lá de possível. É o estágio mais de inércia do estilingue. [Desafio
quem me mostre que nessas formas de produção não haja muitos dos elementos próprios da memória
e do “tesouro técnico” da poesia.] Importa orientar o alunado para um estágio que o leve para além
de onde já se encontra, que é acrescentar (produzir acúmulo), sem forçar a barra, algo novo, que é
velho, na verdade. Textos da música sertaneja dialogam com parte da poesia romântica. Por sua vez,
o rap e o hip-hop dialogam com parte da poesia marginal. A poesia romântica e a marginal estão em
dois polos temporais distantes. Cabe a quem ensina, no final das contas, puxar o estilingue
primeiramente até esses dois polos, no sentido de uma identificação mais imediata, e posteriormente,
voltá-lo até o ponto de inércia e puxá-lo de novo, agora aos poucos, que é quando se passa por outros
momentos da poesia, conforme o exemplo de gênero dado, para que o alunado possa ter acesso a
outras formas de prováveis identificações.

REFERÊNCIAS:

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