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IMPLEMENTAÇÃO DO PNAE EM UM CAMPUS DO INSTITUTO

FEDERAL DE PERNAMBUCO SEM ESTRUTURA DE REFEITÓRIO

Mônica Gomes da Silva1


Jamille Mendonça Reinaldo2
Silvia Patrícia de Oliveira Silva Bacalhau3
Elaine Cristina da Rocha Silva4
Andreia Cristina Lira5

INTRODUÇÃO

O
Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) tem por objetivo oferecer
refeições que cubram as necessidades nutricionais dos estudantes durante o
período letivo para que esses cresçam, se desenvolvam biopsicossocialmente,
tenham um bom rendimento escolar e, através de ações de educação alimentar e nutricional,
absorvam e pratiquem hábitos alimentares saudáveis (BRASIL, 2009).
Sigman et al. (2014) ratificam a relação existente entre a aprendizagem e a alimentação
destacando que, independente dos métodos pedagógicos empregados, a alimentação inadequada,
mais comum em estudantes de classes menos favorecidas socioeconomicamente, dificulta o
aprendizado. De acordo com as informações cedidas pelos estudantes no ato da matrícula, a gestão
do campus observou que em torno de 60% são oriundos da rede pública. Visando a importância do
PNAE para a comunidade escolar, como também a necessidade de implementar estratégias que
contribuam para permanência e êxito dos discentes, o Campus Caruaru resolveu unir esforços
para iniciar a oferta de alimentação para seus estudantes. Dessa forma, pretende-se relatar as
articulações realizadas pela gestão e equipe do campus a fim de executar o programa.

1 Nutricionista, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE). E-mail: monica.gomes@
caruaru.ifpe.edu.br.
2 Nutricionista, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE). E-mail: jamillemendonca@
barreiros.ifpe.edu.br.
3 Nutricionista, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE). E-mail: silvia.oliveira@
reitoria.ifpe.edu.br.
4 Professora EBTT, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE).E-mail: dg@caruaru.
ifpe.edu.br.
5 Auxiliar em Administração, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE). E-mail:
andreia.lira@caruaru.ifpe.edu.br.

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O Campus Caruaru faz parte da 2ª fase de Expansão do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE), como resultado do processo de interiorização da Rede
Federal de Educação Profissional e Tecnológica. Inaugurado em 27 de agosto de 2010, inicialmente
ofereceu apenas a modalidade subsequente dos cursos técnicos. Em 2012, o campus passou a ofertar
os cursos técnicos integrados ao Ensino Médio e o curso superior em Engenharia Mecânica.
O IFPE vem há alguns anos trabalhando para consolidar a oferta da alimentação escolar,
entretanto dos dezesseis Campi, apenas quatro possuem estrutura de refeitório, são eles: Barreiros,
Belo Jardim, Pesqueira, e Vitória de Santo Antão. Com o aumento expressivo no número de estudantes
no Campus Caruaru, ficou evidente a necessidade da oferta da alimentação escolar, fazendo com que
a direção mostrasse interesse em implementar o PNAE mesmo com a ausência de refeitório.
Entre os anos de 2017 e 2018, um grupo multiprofissional reuniu-se a fim de promover
articulações com agricultores e executar a oferta de alimentos pelo Campus. O grupo era composto
por nutricionistas da Reitoria e dos Campi Barreiros e Vitória de Santo Antão, coordenadora de
Extensão Rural da Pró-reitoria de Extensão, coordenadora da Assistência ao Estudante e diretora
do Campus Caruaru.
Pelo menos 30% dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE) devem ser destinados à aquisição de produtos da agricultura familiar local
(BRASIL, 2009). Com o objetivo de uma correta e efetiva utilização desse recurso, a Diretoria de
Assistência ao Estudante/Reitoria recebeu a visita de uma extensionista do Instituto Agronômico
de Pernambuco (IPA). A mesma agendou uma reunião em um Assentamento do Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Normandia, localizado no município de Caruaru.
Os agricultores e mulheres boleiras de Normandia já tinham experiência no fornecimento de
alimentos para as escolas municipais através do PNAE e assim iniciaram-se as tratativas visando
a realização de chamada pública utilizando o recurso repassado ao Campus.
De início, os assentados mostraram-se resistentes, pois considerando a experiência
deles com o município, o IFPE possuía um recurso muito inferior. Ainda assim, mostraram-se
dispostos em fornecer informações para o mapeamento, bem como cotações, pois para eles, o
objetivo maior seria o fortalecimento da agricultura familiar.
O primeiro passo foi realizar o levantamento dos produtos e a sazonalidade da produção,
o que foi dialogado com agricultores, fruticultores, caprinos e ovinocultores, grupo de mulheres
boleiras, dentre outros grupos responsáveis pelas produções no município. Esse passo foi dado na
primeira reunião que aconteceu no assentamento, onde as servidoras do IFPE foram apresentadas
aos produtos beneficiados com um momento de degustação e visita às áreas de produção.

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Figura 1 - Reunião entre representantes do IFPE e assentados do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
de Normandia - Caruaru, 2017

Foto: Sílvia Bacalhau (2017)

Para que toda a comunidade agrícola da região participasse da chamada pública, o


mapeamento foi realizado com outros agricultores e a divulgação da chamada aconteceu de forma ampla.
Além de observar a viabilidade do fornecimento, também foi estudada a logística, a
disponibilidade para entrega e o armazenamento, uma vez que o campus não possui refeitório,
mas uma área de armazenamento de produtos e outra área de convivência para os estudantes.
Apesar da ausência de uma Unidade de Alimentação e Nutrição completa, a direção do campus
estava empenhada em realizar a aquisição e a distribuição da alimentação, devido a importância
do PNAE para o público atendido pela instituição e para os agricultores familiares da região.
Após algumas reuniões com os agricultores, foi possível para a nutricionista da DAE/
Reitoria elaborar um cardápio que atendesse aos critérios do PNAE e as limitações físicas do
Campus. Assim, para compor o cardápio foram escolhidas frutas que precisavam de manipulação
mínima, respeitando a produção e a cultura alimentar local, além de alimentos beneficiados,
como pães e bolos.
Todas essas etapas demonstram que o encontro da alimentação escolar com a agricultura
familiar exige boa articulação entre quem compra (definição da demanda de alimentos) e quem vende
(oferta de alimentos produzidos na região), considerando todos os atores envolvidos no processo e
as especificidades locais.

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Para que o recurso destinado à alimentação fosse suficiente, o campus tomou atitudes
de conscientização junto à equipe e aos estudantes, como, por exemplo: economia dos recursos
destinados a eventos e substituição de todas as torneiras por outras com acionamento automático,
visando redução das despesas com água.
Apesar dos desafios, em outubro de 2018 o fornecimento dos lanches para os estudantes
foi efetivado, com o cardápio considerando as especificidades exigidas pela ausência de uma área
para produção dos alimentos e um local para armazenamento dos gêneros inferior ao tamanho
necessário. Nesse mesmo ano aconteceu capacitação para as servidoras envolvidas, bem como
avaliação do estado nutricional dos estudantes e testes de aceitabilidade junto a eles(elas)
foram aplicados.
O assentamento vencedor da chamada pública localiza-se próximo ao Campus, facilitando
as entregas que acontecem de duas a três vezes por semana, conforme cronograma elaborado
junto aos agricultores, respeitando o tempo de maturação e perecibilidade dos gêneros. As
entregas ocorrem preferencialmente no período da manhã e os alimentos são ofertados nos três
turnos de funcionamento da escola. Os produtos beneficiados são distribuídos no mesmo dia em
que são recebidos e as frutas, entregues já higienizadas pelos agricultores, são separadas para
distribuição por turnos.
Como o campus não tinha previsão contratual para funcionários de um setor de alimentos,
foi instituído um Núcleo de Alimentação. Esse Núcleo, composto por servidores de vários setores,
tinha a função de receber e organizar os gêneros e realizar as entregas dos lanches aos estudantes
nos três turnos de aulas.
Inicialmente, os itens eram entregues embalados em saquinhos individuais para evitar
o contato direto com o alimento. Porém, os estudantes observaram um excesso na produção de
lixo, por isso, solicitaram que os itens fossem entregues sem os saquinhos, apenas higienizados.
Também foi observado pela equipe do Núcleo que a sala de armazenamento dos gêneros estava
favorecendo o rápido amadurecimento. A solução encontrada foi a instalação de um ar-condicionado
para que a temperatura ficasse adequada, principalmente no período da tarde. Dessa forma, foi
possível conservar os gêneros por mais tempo e negociar um tempo de entrega mais tranquilo com
o assentamento.
Em 2019, após empenho da gestão em melhorar o atendimento aos estudantes, foi
possível a aquisição de um código de vaga para nutricionista e a contratação de uma auxiliar de
cozinha. Esta última ficando responsável não somente para a distribuição, mas também para a
manipulação de algumas frutas. Nesse período, também foram adquiridos alguns equipamentos
para o setor como freezer e liquidificadores industriais. Com a chegada dos equipamentos foi possível

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variar o cardápio com a inclusão de salada de frutas e sucos, melhorando a aceitação de algumas frutas
pelos estudantes. Nesse ano foram servidas em torno de 9.000 pequenas refeições por mês, nos três
turnos de funcionamento.
A introdução de frutas, hortaliças e legumes de época, produzidos de forma sustentável
pela agricultura familiar das proximidades é sempre bem aceita para a formação de hábitos e
atitudes alimentares saudáveis (MONTEIRO; MENDES; TONEZER, 2017). A compra da agricultura
familiar favorece ainda a diminuição da insegurança alimentar no campo, o desenvolvimento
regional, a economia local, a inclusão social, a oferta de alimentos mais frescos e a promoção de
educação alimentar e nutricional para além do espaço escolar.

Figura 2 - Atividade de Educação Alimentar e Nutricional com alunos dos cursos integrados - Caruaru, 2019.

Fonte: Mônica Gomes (2019)

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Além dos benefícios oferecidos aos agricultores familiares locais e aos estudantes,
quando se considera a qualidade do alimento entregue aos mesmos, o PNAE traz à referida
instituição federal de ensino atividades de Educação Alimentar e Nutricional desenvolvidas por
nutricionistas da instituição, bem como a inclusão de temas relacionados à alimentação de forma
transversal, trazidos pelos professores. No Campus Caruaru, os resíduos das refeições (cascas de
frutas) são utilizados como compostagem na horta escolar.
O atendimento ao direito à alimentação na escola foi e continua sendo possível considerando
o incansável trabalho da gestão e de toda a equipe, a curta distância entre o campus e o assentamento,
bem como as adaptações feitas no cardápio pela nutricionista do Campus. Mesmo diante dos desafios
já citados e de outros que surgem no dia a dia, a experiência do campus contribui para que o IFPE
utilize esse recurso e garanta um direito básico aos seus estudantes.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº. 11.947 de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro
Direto na Escola aos alunos da educação básica; [..]. Brasília, DF: Presidência da República. 2009. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 21 out. 2021.

BRASIL. Resolução/CD/FNDE nº 6 de 8 de maio de 2020. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da
educação básica no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE. Diário Oficial da União, Seção 1, n. 89, p.
38, 12 maio 2020. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-n-6-de-8-de-maio-de-2020-256309972.
Acesso em: 21 out. 2021.

MONTEIRO, L. C.; MENDES, R. M. de O.; TONEZER, C. Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e a Segurança
Alimentar na aquisição de produtos provenientes da Agricultura Familiar em São Lourenço do Oeste – SC. Territórios,
Redes e Desenvolvimento Regional: perspectivas e desafios Santa Cruz do Sul, RS, Brasil, 13 a 15 de setembro de 2017.
Disponível em: https://online.unisc.br/acadnet/anais/index.php/sidr/article/view/16513/4360. Acesso em: 21 out. 2021.

SIGMAN, M.; PEÑA, M.; GOLDIN, A. P.; RIBEIRO, S. Neuroscience and education: prime time to build the bridge. Nature
Neuroscience, v. 17, n. 4, p. 497-502, abr. 2014. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24671066/. Acesso em:
6 set. 2021.

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