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As janelas de Pedro

Criança
Realização Pedro dos Reis

Professora
Carolina de Freitas

Acompanhamento Pedagógico da
investigação
Paulo Fochi
Condução da Pesquisa Luciane Varisco Focesi - 2016
Alexandra Bitencourt - 2017

Fotos e Organização do Processo Documental


Carolina de Freitas
Pedro dos Reis
4 anos

“TEM SANGUE NO MEU OLHO.”


APRESENTAÇÃO
Motivada pelos estudos do grupo do OBECI (Observatório da
Cultura Infantil), a proposta foi realizada no ano de 2016 com as
crianças da EMEI João de Barro na faixa etária 3 anos, onde o eixo
central era o desenho gráfico dos olhos. Nas sessões realizadas, as
crianças desenhavam a partir de um percurso investigativo de
experimentação e exploração. Investigaram formas, pensaram a
respeito das mesmas e criaram suas hipóteses. Compartilhamos e
retroalimentamos dando continuidade no processo de cada criança.
No ano de 2017, o grupo do OBECI volta a se reunir e discutir
sobre todo o processo desenvolvido em 2016, tendo como proposta
interpretar o material produzido no ano referendado. Sendo assim,
neste documento, dou visibilidade ao processo do Pedro.
AS JANELAS DE PEDRO

Pedro vivência com seriedade muitos encantos da


infância e foi assim que fez dos dias o seu tempo na João
de Barro em 2016. Para Pedro, tudo se transforma com o
seu olhar, ampliando assim, seu repertório com suas
descobertas e interações. Suas brincadeiras acompanham
suas argumentações e observações, estabelecendo
relações com objetos, pessoas e interagindo um mundo até
então misterioso por ele. Espontaneamente ao tecer
experiências, explorar o desconhecido e o conhecido, o
brincar, Pedro reproduz de maneira significativa e lúdica
suas vontades e vivências.
Ao iniciar uma sessão de desenho gráfico com a proposta
de investigar os olhos, as crianças passam a se
posicionar de forma espontânea em frente ao espelho na
sala referência. Diferentes olhares se constituem naquele
momento. Abre e fecha; olha para o lado, para o outro; E
o toque se dá. Pedro observa curiosamente as ações do
seu colega e volta-se o seu olhar para o meu, como se
quisesse questionar qual era o objetivo de tudo aquilo.
Assim, pergunto-lhe: “O que tem no seu olho?” Pedro
“TEM JANELA! ABRE E FECHA.” com toda a sua segurança e experiência de olhos e
olhares responde: “Tem janela! Abre e fecha.” Nesse
momento, numa pausa de pensamentos e diálogos, Pedro
mais uma vez deixa suas “janelas” abertas para que o
mundo perpasse por elas novos olhares.
Pedro demonstra olhar para fora de suas “janelas”. É na sua vivência interna que ele correlaciona suas
aprendizagens com a sua família. Dialogando sobre o que está fazendo e explicando suas ações, Pedro em
seus primeiros desenhos sobre os olhos retrata a sua família de forma carinhosa, demonstrando todo o
cuidado e conhecimento que tem sobre cada um deles.

“Este olho é do João. Ele é “Este olho é do Israel. É bem “Este olho é da minha avó. Ela usa
bebê e não tem muitos grandão”. (pai) óculos. Por isso tudo isso oh”.
cílios”.
E num piscar de olhos ou no abre e fecha de janelas, Pedro
demonstra todo o seu encantamento com suas novas descobertas,
sempre questionando o porquê dos fatos ao mesmo tempo em que ele
argumenta e expõe suas próprias conclusões. Em uma das sessões
de investigação, ao ser ampliado os olhares das crianças e convidá-
las para que façam o registro gráfico, Pedro silenciosamente se
posiciona em frente ao seu olhar e observa concentrado. Quebra-se o
silêncio. Ao descobrir o sangue em seus olhos Pedro solicita para
complementar o seu desenho, pois estão faltando elementos.

“PROFE! TEM SANGUE NO


OLHO. OLHA AQUI...”
ABRE E FECHA DE JANELAS

PEDRO: “Terminei profe!”


PROFESSORA: “Onde está o olho”?
PEDRO: “Está aqui óh. Não ta vendo”?
(Pausa) “Fiz um olho fechado... Ora”!

Os modos como eu e Pedro vemos a escultura são diferentes. Escutar o Pedro é um convite a compreender o
invisível, a acolher o universo deste menino.

Rinaldi (p.206) nos diz que, “embora não seja original, a “pedagogia relacional e da escuta”, que se origina
precisamente da ideia de que as crianças são os mais ávidos investigadores do significado e da significância, e
produzem teorias interpretativas.”
Para Pedro o sangue que visualizou em seu
olho transforma-se numa grande investigação.
São muitas as surpresas e afirmações que
Pedro compartilha sobre os olhos com material
não estruturado. Neste momento Pedro
estabelece uma relação pessoal consigo
mesmo sobre o seu olhar e de como ele fica em
determinadas situações. Ao questiona-lo o que
eram os elementos pretos em seu olho, Pedro
me surpreende, afirmando que é quando se
sente complicado. Complicação essa que ele
mesmo relaciona com a fala de mãe, quando a
mesma reproduz:

“Tu ta complicado hoje, heim Pedro”.

O mesmo também trás outras informações para


“O olho tem muitas bactérias. O meu olho é diferente porque a bactéria este momento, em que obteve e vivenciou no
esconde a carne para o sangue se esconder. Pra ninguém saber que o seu círculo familiar, como no caso de haver
sangue tá escondido.” bactérias no olho.
“QUANDO EU ME FICO COMPLICADO.”
O OLHAR DO OLHO
A cor branca dos olhos (esclera) desperta sua atenção e o mesmo faz uma
conexão com o sangue. Ao criar suas hipóteses, Pedro chega a conclusão que
só há sangue no olho quando se está doente, fazendo uma comparação do seu
olho com o da sua avó. Assim, em seus desenhos seguintes Pedro deixa de
desenhar o sangue pois segundo ele, não está doente.

- “O sangue do olho só existe quando ele tá doente”.


- “Eu não to doente. Ta vendo oh? Tá tudo branco e não tem sangue”.
- “Agora eu vou desenhar o olho da minha avó. Tem sangue no olho dela.”
CONSIDERAÇÕES

À medida que o desenvolvimento das propostas foi provocando a investigação


de como as crianças estão construindo seus imaginários mediados pela cultura visual,
a criança tem mais possibilidades de ampliar o seu percurso gráfico, potencializando
suas aprendizagens através do desenho, que é uma das formas de transpor seu
pensamento. Entendo que precisamos romper com a lógica dos estereótipos, com
desenhos prontos para a criança pintar. É necessário oferecer as crianças na
educação infantil diversas propostas de exploração. Propostas, onde percebemos que
as marcas das crianças vão se transformando durante a experimentação, a riqueza
destes momentos está justamente no processo que a criança vive e não somente no
resultado final.
REFERÊNCIAS
EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. As cem linguagens da criança: A abordagem de
Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto Alegre: Artmed, 1999.

FOCHI, Paulo. Observatório da Cultura Infantil. 2015.

RINALDI, Carla. Diálogos com Reggio Emilia: escutar, investigar e aprender. Revista teórica
Marília Dourado. 2ª ed. Rio de Janeiro/ São Paulo: Paz & Terra, 2014.

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