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Educação Infantil

Analice Oliveira Fragoso

Unidade 1

Analice Oliveira Fragoso


Educação
História da
Construção da
Infantil
Infância
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autor
ANALICE OLIVEIRA FRAGOSO
A AUTOR
Analice Oliveira Fragoso
Olá! Meu nome é Analice Oliveira Fragoso. Sou formada em
Pedagogia, especialista em Psicopedagogia, mestre e doutora em
Distúrbios do Desenvolvimento. Tenho experiência como professora no
ensino superior há mais de quatro anos, tanto no curso de graduação em
Pedagogia quanto no curso de especialização em Neuropsicopedagogia.
Sou apaixonada por educação, por isso há mais de sete anos realizo
pesquisas nessa área do conhecimento. É um grande privilégio transmitir
minha experiência àqueles que estão iniciando suas profissões. Agradeço
à Editora Telesapiens pelo convite para integrar seu elenco de autores
independentes e estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de
muito estudo e trabalho. Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

INTRODUÇÃO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de de se apresentar um
uma nova compe- novo conceito;
tência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou dis-
mento; cutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das últi-
assistir vídeos, ler mas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Definindo infância.........................................................................................12

História da criança.......................................................................................17

A história da criança no Brasil................................................................................................. 19

Construção da infância..............................................................................23

Construção da infância: uma perspectiva histórica................................................23

Modernidade: influências científicas..................................................................................27

História da educação de crianças de 0 a 5 anos............................ 29

História da educação no mundo........................................................................................... 31

Educação primitiva....................................................................................................... 31

Educação oriental......................................................................................................... 31

Educação na Grécia Antiga....................................................................................34

Pensadores gregos...................................................................................35

Educação em Roma................................................................................................... 36

Educação na Idade Média......................................................................................37

História da educação no Brasil ............................................................................................ 38

Estudos e teorias sobre o desenvolvimento infantil ............................................ 40


Educação Infantil 7

01
UNIDADE
8 Educação Infantil

INTRODUÇÃO
A infância é um conceito muito estudado nos dias de hoje e também
é considerada uma etapa fundamental para o desenvolvimento integral
da criança, mas isso nem sempre foi assim.

Antigamente, a criança era conhecida como um adulto em miniatura


e seu desenvolvimento se dava a partir do aprendizado das tarefas do dia
a dia. Por isso, a infância era considerada um período de transição sem
importância.

Com o passar dos anos, essa concepção foi se modificando e


ganhando um espaço importante na educação das crianças.

Ao longo dessa unidade, você, futuro professor, compreenderá


que alguns marcos ao longo dessa história contribuíram para a criação
de creches e a educação infantil e entenderá as especificidades de cada
uma dessas etapas para o desenvolvimento da criança. Vamos lá!
Educação Infantil 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso objetivo é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até o
término desta etapa de estudos:

1. Explicar a definição da infância no curso do desenvolvimento;

2. Interpretar a história da criança e seus principais marcos;

3. Reconhecer as concepções da infância ao longo da história;

4. Identificar as influências da história da educação para crianças de


0 a 5 anos.

Então? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao


conhecimento? Ao trabalho!
10 Educação Infantil

Definindo infância

INTRODUÇÃO:

Neste capítulo estudaremos a definição de infância, como


ela foi era e é considerada na história e suas fases até o
momento atual.

A infância é compreendida como a concepção ou a representação


que os adultos fazem sobre o período inicial da vida ou como o próprio
período vivido pela criança (KUHLMANN, 2004).

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no


art. 2º, “considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze
anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito
anos de idade” (BRASIL, 1990). Nos dias de hoje, não são poucos em nossa
sociedade aqueles que gostariam de voltar à infância, passar os dias sem
nenhuma responsabilidade, dedicando a maior parte do tempo para se
divertir, não é mesmo?

Hoje sabemos distinguir de forma muito clara as diferentes etapas


da vida, mas será que isso sempre foi assim?

Nós temos a tendência de naturalizar certos sentimentos que foram


socialmente construídos ao longo da história. Um exemplo é o amor
materno incondicional que as mães devem ter pelos seus filhos. Esse
sentimento, assim como a infância, não é inato do ser humano. Ele foi
construído ao longo dos séculos.

Para iniciarmos nosso estudo sobre a infância, utilizaremos a


classificação proposta pelo educador italiano Franco Frabboni (1990)
em seu texto “A Escola Infantil entre a Cultura da Infância e a Ciência
Pedagógica e Didática”. Frabboni se baseia nos estudos realizados pelo
historiador francês Philippe Ariès, que é conhecido mundialmente como
uma referência no estudo da infância como uma construção social.

A primeira fase descrita por Frabboni é conhecida como infância


negada ou criança-adulto, que tem duração até o século XV. A segunda
é conhecida como a infância industrializada, que vai do século XVI até o
Educação Infantil 11

século XVIII. A terceira, conhecida como a infância de direitos, teve início


no século XIX e permanece até os dias de hoje.

Vamos entender um pouco mais sobre cada uma dessas fases?

Primeira fase: Conhecida como a infância negada ou criança-adul-


to (duração até o século XV). Nesse período, o historiador francês Philippe
Ariès (1981) concluiu que a sociedade medieval desconhecia a infância.
Tal descoberta se deu através da observação de obras de arte nas quais
não havia a representação de crianças e, quando raramente essa repre-
sentação acontecia, ela se assemelhava a miniadultos, conforme ilustrado
na Figura 1.
Figura 1: Comparativo entre crianças do século XII e crianças dos dias atuais

Fonte: Wikimedia Commons/Pixabay.

IMPORTANTE:

Algumas obras de arte na sociedade medieval ilustravam


as crianças de mãos dadas com representações da morte
em alusão à alta mortalidade infantil.

Com o alto índice de mortalidade infantil na época, poucas crianças


conseguiam passar dos seis anos de idade. Aquelas que completavam
sete anos de idade eram introduzidas no mundo adulto sem nenhum
preparo para exercer as tarefas do dia a dia. A grande preocupação da
12 Educação Infantil

sociedade medieval em ter filhos era para que esses viessem a cuidar de
seus pais anos depois, ou seja, o pensamento já era de introduzi-los no
mundo do trabalho (ARIÈS, 1981).

O desconhecimento em relação à infância era tão grande que até o


amor incondicional materno, conforme citado no início deste tópico, não
existia. Quando as mães perdiam um filho, sabiam que logo esse seria
substituído por outro.

A infância também era negada na escola, pois, naquela época,


a escola era reservada apenas para formação dos clérigos e não tinha
como função a formação da criança (ARIÈS, 1981).

Nessa primeira fase, a infância não tinha características próprias.


Por isso, as crianças eram vistas e tratadas como adultos com uma
estatura menor. Não significa que os adultos não tinham afeto pela
criança, mas sim que não existia a compreensão da infância como um
estágio específico do desenvolvimento humano, diferente do adulto.

A segunda fase, que durou aproximadamente do século XVI até o


século XVIII, foi marcada pela Revolução Industrial e pelo surgimento da
família moderna. Com isso, houve uma separação entre a indústria (local de
trabalho) e a casa (onde fica a família). Essa separação levou ao fechamento
do núcleo familiar, o que favoreceu a formação de um sentimento de afeto
muito forte pelas crianças (cuidado, afeto) (FRABBONI, 1998).
Figura 2: Surgimento da família moderna com a Revolução Industrial

Fonte: Pixabay
Educação Infantil 13

Com o surgimento da família moderna, os pais já não colocavam


filhos no mundo apenas com o objetivo de terem mais membros da família
trabalhando, mas sim porque tinham a convicção de que precisavam lhes
proporcionar uma preparação para a vida. E essa preparação não poderia
ser somente para o filho mais velho, o primogênito. De acordo com a
nova ordem moral, todos os filhos, incluindo as filhas mulheres, deveriam
ser preparadas para a vida. Assim, tal preparação ficou assegurada pela
escola (ARIÈS, 1981).

IMPORTANTE:

No início, esse formato de família era constituído apenas


em famílias de classes mais altas.

Dentro desse contexto, com a criação da escola formal, as crianças


deixaram de aprender a vida apenas com o contato direto com os adultos
e passaram a ser separadas de suas famílias para frequentarem a escola
(ARIÈS, 1981). O autor define esse momento como um “enclausuramento”
das crianças, em que elas deixam de conviver e aprender com os adultos
(normalmente os familiares) para serem confinadas, em grande parte em
internatos.

Segundo Ariès (1981), foi nesse período que as ordens religiosas


se tornaram responsáveis pelo ensino das crianças e dos jovens. Dentro
dos internatos, os diretores e mestres possuíam uma autoridade superior,
dispondo do dever de educar moralmente e de forma rigorosa a criança
frágil e inocente, surgindo o conceito da disciplina dentro da escola.

Por causa disso, as primeiras escolas mantinham uma doutrina bem


específica e rígida. Esse sistema foi definido a partir de três características:
a vigilância constante, a delação e a aplicação ampla dos castigos
corporais (ARIÈS, 1981).

A diminuição da mortalidade infantil também foi decisiva nessa


época para o fortalecimento do sentimento em torno da infância, resultado
de melhores condições de higiene e da menor taxa de infanticídio. Assim,
a sociedade pouco a pouco foi aderindo à nova ideia de infância.
14 Educação Infantil

A terceira fase é conhecida como infância de direitos (início no


século XIX até os dias de hoje). Podemos iniciar refletindo sobre como a
infância é vista hoje.

Já parou para pensar que atualmente, mesmo com todos os


direitos reservados à infância, as crianças ainda enfrentam maus-tratos,
abusos sexuais, miséria, exploração para o trabalho etc. Agora imagine
antigamente, quando a infância não era reconhecida.

Também vale lembrar que os avanços que ocorreram no


reconhecimento da infância eram nas classes mais privilegiadas
economicamente. Será que isso mudou na sociedade atual? Apesar de
ainda convivermos com inúmeras violações de direitos da criança, a ideia
de criança como um sujeito que necessitava de cuidados específicos,
construída no decorrer da história, abriu caminhos para futuras políticas
implantadas no decorrer do século XX.

Essa nova fase é marcada pelas novas ciências, a Psicologia, a


Pedagogia e a Psicanálise. Essas ciências modernas mostraram ao longo
de suas pesquisas que a qualidade da infância — e não apenas a sua
existência — é essencial para o desenvolvimento humano. E foram esses
saberes históricos que marcaram as concepções de infância na atualidade.

SAIBA MAIS:

Para saber mais sobre o assunto leia o artigo “Concepções


de infância ao longo da história”, de Mariane Rocha Niehues
e Marli de Oliveira Costa, disponível em:
https://bit.ly/3bSDFkg.

RESUMINDO:

Vimos ao longo deste tópico a construção do conceito


de infância como uma construção social, criada pela
modernidade, tendo sofrido influências dos períodos
históricos que contribuíram para os grandes avanços
científicos e políticos que conhecemos hoje.
Educação Infantil 15

História da criança

INTRODUÇÃO:

De acordo com o que estudamos no tópico anterior,


pudemos constatar que as crianças eram vistas como
adultos em miniatura, não havendo diferenciação entre os
diferentes estágios do desenvolvimento. Assim, as crianças
realizavam as mesmas atividades sociais que os adultos:
trabalhavam, casavam-se, iam para as guerras, vestiam-se
da mesma maneira. A única coisa que as diferenciava dos
adultos era a menor estatura (ARIÈS, 1981). Neste capítulo,
nos aprofundaremos na história da criança, quais foram as
mudanças que ocorreram até a modernidade.

A palavra “criança” só foi aparecer nos dicionários no início do século XIX.

Durante a Idade Média era comum encontrar crianças nas


plantações, nas pescas e caças, auxiliando em tarefas que traziam
sustento para a família. Como já mencionamos anteriormente, nessa
época não havia a necessidade de escolas, pois o único contato que as
crianças tinham com o aprendizado era aprender as tarefas do cotidiano,
ou seja, a figura de criança sempre existiu, só não havia o reconhecimento
de suas peculiaridades (ÁRIES, 1981).

REFLITA:

Já parou para pensar como seria passar a vida sem


desfrutar dos prazeres de ser criança? E o que a ausência
de diferenciação entre as idades poderia causar?

Devemos lembrar que foi somente a partir do século XV que


pequenas mudanças começaram a acontecer. Parte da sociedade
começou a perceber peculiaridades nas crianças, então se passou a
confeccionar vestimentas adequadas para diferenciá-las dos adultos.
Inicia-se, assim, uma nova relação entre crianças e adultos por meio de
uma convivência mais saudável (ARIÈS, 1978).
16 Educação Infantil

Com essa forma de diferenciar as crianças dos adultos, a criança


passou a ser vista como ingênua, meiga, engraçada e gentil. Por isso, os
adultos começaram a observá-las tendo esse momento como distração
e relaxamento (ARIÈS, 1978). Esse novo sentimento ficou conhecido como
“paparicação”.
Figura 3: Crianças brincando

Fonte: Wikimedia Commons

De acordo com Ariès (1978), os adultos brincavam com a criança


como se elas fossem um macaquinho, algo que servia para entreter e
passar o tempo. Por exemplo, o adulto inicia uma contagem, dezoito,
dezenove... e a criança completa... “dezedez”. Então os adultos, diante da
resposta da criança, caem na gargalhada, beijando-as e acariciando-as
como se elas tivessem dito algo correto.

Mesmo com esse novo sentimento em relação às crianças, não


eram todas as pessoas que o tinham. Alguns criticavam quem valorizava
essa diferença entre crianças e adultos, até então desconhecida pela
grande maioria das pessoas.

Como já mencionamos, esse sentimento relacionado à criança


foi historicamente construído de acordo com os acontecimentos
sociais, históricos, econômicos, culturais e políticos.
Educação Infantil 17

A história da criança no Brasil


Até então falamos da construção social da infância e da compreensão
de criança, desde uma perspectiva europeia, baseada nos estudos do
historiador francês Philippe Ariès. Agora vamos abordar brevemente a
história das crianças brasileiras.

A história da criança no Brasil foi de grandes dificuldades e com


inúmeras tragédias. Não foi muito diferente da criança descrita por Ariès.
No entanto, quando pensamos na história da criança brasileira, temos que
considerar de que criança estamos falando. Não é possível compreender
as infâncias vividas pelas crianças brasileiras descontextualizas dos seus
contextos sociais, políticos e econômicos. Isso nos possibilita compreender
as diferenças culturais entre as crianças indígenas, africanas filhas de
pais escravizados, filhas dos colonos europeus ou mesmo aquelas cujos
pais eram abastados. Não há dúvidas de que essas crianças viviam suas
infâncias de maneira bastante diferente.

No Brasil colônia, era comum a prática do abandono de recém-


nascidos, principalmente das crianças que viviam em situação de pobreza.
Essa prática foi introduzida pelos portugueses (DEL PRIORI, 2006). Essas
crianças, conhecidas como “enjeitadas”, comumente eram filhas de
mulheres indígenas ou africanas que foram abusadas sexualmente; ou
crianças órfãs, filhas de mulheres e homens escravizados.

As crianças que nasciam em cativeiro também pertenciam aos


senhores, tais como seus pais. Assim, se conseguissem sobreviver,
poderiam ficar com suas mães ou serem vendidas pelo senhor dos
escravos.

Desde a perspectiva da historiadora e professora Mary Del Priore,


que aborda essa temática, principalmente no livro A história das crianças
no Brasil, até mais ou menos o século XVIII, as crianças que conseguiam
sobreviver eram designadas pelos adultos com termos como “meúdos”
ou “ingênuos” (DEL PRIORI, 2006). Esse conceito foi introduzido porque
acreditava-se que as crianças até sete anos não sabiam diferenciar o bem
e o mal.
18 Educação Infantil

No início do século XIX, com a chegada da família real portuguesa ao


Brasil, era o calendário religioso que regia grande parte das atividades. As
crianças que completavam sete anos de idade participavam da primeira
comunhão, ingressando oficialmente no catolicismo (DEL PRIORI, 2006).
No Brasil colônia, a maioria das crianças indígenas estava sob os cuidados
dos padres da Companhia de Jesus, responsáveis pela catequese e
educação. Esse conceito veio da representação que os Jesuítas tinham
de criança santa, pois as viam como puras e consideravam essa fase
a oportunidade de ensiná-las antes que fossem contaminadas com os
maus costumes dos adultos (DEL PRIORI, 2006).

Esse ingresso no mundo religioso permitia o exercício de atividades


sociais na igreja em que a criança era inserida. Mas assim que a criança
ganhava a possibilidade de diferenciar o certo do errado ingressando no
mundo religioso, ela também era inserida no mundo do trabalho.

Não podemos falar de infância brasileira, mas de diferentes infâncias.


Isso dependia da classe social que a criança fazia parte. Se pertencia à
família de elite, tinha sua identidade reconhecida, recebendo educação e
usufruindo de momentos de brincadeira. É notório que as diferenças sociais,
de raça, de credo e de gênero sempre sustentaram diferentes tratamentos
voltados à primeira infância no Brasil. E até hoje essas diferenças marcam
as diversas formas das crianças viverem suas infâncias.
Figura 4: Diversidade social

Fonte: Pixabay
Educação Infantil 19

Agora vamos entender um pouco as diferenças entre as crianças de


elite, as escravizadas e as indígenas.

Durante o Império, os professores estrangeiros que vinham ao Brasil


com o objetivo de ensinar as crianças de elite reclamavam dos maus
costumes que tinham as crianças brasileiras e as viam como endiabradas.
Essa visão mostra uma clara incompreensão em relação aos diferentes
hábitos e costumes entre as diferentes civilizações (DEL PRIORI, 2006).

Vamos entender o porquê. Apesar de as crianças de elite


pertencerem ao mundo da infância, tendo acesso à educação e à
brincadeira, suas vestimentas não eram compatíveis com essa realidade.
O modelo de roupa usado nas crianças de elite era baseado em roupas
europeias, ou seja, feito de tecidos muito quentes, considerados
inadequados para o clima tropical do Brasil (DEL PRIORI, 2006). Diante do
calor e das vestimentas desconfortáveis, as crianças ficavam impacientes,
não suportando o calor. Assim, logo se desmazelavam durante as
brincadeiras, explicando a indisciplina das crianças brasileiras vista pelos
estrangeiros.

Até o período de amamentação, considerado um estreito laço de


afetividade entre mães e filhos, era uma tarefa atribuída às “amas de leite”.

O número de mortalidade infantil era menor entre as crianças de


elite, pois devido ao avanço da medicina, essas tinham acesso a vacinas
contra doenças consideradas letais (DEL PRIORI, 2006).

Vimos até aqui como viviam as crianças de elite no Brasil. Será que
as crianças escravizadas viviam a mesma realidade?

Primeiramente, é importante entender que durante o período


colonial, os estrangeiros imigrantes valorizavam mais as pessoas
escravizadas nascidas no Brasil do que as que haviam nascido no
continente Africano, pois eram consideradas mais dóceis e menos
propensas a fugas (DEL PRIORI, 2006).

Com isso, o nascimento de escravos no Brasil era estimulado,


considerando as crianças como mercadorias. Então, assim que nasciam,
eram logo separadas de suas mães para serem vendidas. As mães eram
alugadas como “amas de leite para amamentar as crianças de elite” (DEL
PRIORI, 2006).
20 Educação Infantil

Além disso, essas crianças, diferentemente das crianças de elite,


não tinham acesso à educação, tampouco a brincadeiras, pois desde cedo
eram imersas no mundo do trabalho, sendo sujeitadas a muitas privações.

O número de mortalidade entre as crianças escravizadas também


era maior, considerando a privação que tinham em relação às condições
de saúde e higiene.

No Brasil Colônia e parte do Período Imperial, o número de crianças


abandonadas era muito grande e isso acontecia por diversas razões,
dentre elas podemos citar a falta de recursos financeiros, filhos fora do
casamento, mulheres escravizadas que sofriam abusos e engravidavam
de seus donos, que as obrigavam a abandonar os filhos, entre outros.

Somente em 1871 que foi promulgada a Lei do Ventre Livre,


também conhecida como Lei Rio Branco, que determinava que os filhos
de mulheres escravizadas nascidos a partir desta data ficariam livres. A
promulgação dessa Lei veio atender à exigência dos ingleses, tendo em
vista os grandes investimentos que eles fizeram em território brasileiro.
Não foi por razões humanitárias.

Será que essa realidade se refere apenas à sociedade de


antigamente? Reflita sobre a questão do abandono de crianças no
início do século XIX e esse fato nos dias de hoje.

SAIBA MAIS:

Para saber mais sobre o assunto, assista à entrevista com


Mary Del Priori, professora e doutora em História pela USP,
falando sobre a criança e as concepções de infância no
decorrer da história. Disponível em: https://bit.ly/3rOjYiZ.

RESUMINDO:

No Brasil, a história da criança é marcada por muitas


dificuldades e privações. Podemos ver isso nos maus-tratos,
abusos sexuais, mortalidade infantil, miséria, fome, crianças
abandonadas, entre outras situações que as colocam em
posições desfavoráveis por sua fragilidade.
Educação Infantil 21

Construção da infância

INTRODUÇÃO:

Neste momento, vocês já perceberam em nossos estudos


as mudanças que ocorreram ao longo dos séculos.
Atualmente, a criança é compreendida como um sujeito de
direitos. No Brasil, existe um conjunto de leis que designa
o Estado, a família e a sociedade como responsáveis por
assegurar a prioridade absoluta e a garantia de todos os
direitos fundamentais à vida, à educação, à dignidade
e à convivência familiar e comunitária da criança e do
adolescente (BRASIL, 2010), porém nem sempre foi
assim. Antigamente até existia a nomenclatura “infância”,
mas as crianças não eram entendidas como sujeitos em
desenvolvimento, com certas especificidades relacionadas
à sua faixa etária.

No entanto, antes de alcançarmos tais descobertas do desenvolvi-


mento infantil e a construção da infância atual, as crianças passaram por
outros contextos históricos e são eles que vamos estudar agora. Vamos lá?

Construção da infância: uma perspectiva


histórica
Hoje, um bebê ao nascer já sai da maternidade com registro em
cartório, com nome e sobrenome, bem como data e horário precisos de
nascimento. Dos primeiros meses de sua vida até completar um ano, a
família geralmente acompanha mês a mês, estimula e comemora cada
conquista.

No momento em que a criança começa a falar, é muito comum


ensiná-la a dizer algumas palavras, como o seu nome, “mamá”, “papá”
e até mesmo quantos anos ela tem. Ao fazer essas perguntas e ver a
criança respondendo corretamente, sentimentos como o orgulho e a
felicidade tomam conta dos familiares. Com isso, eles logo buscam novos
ensinamentos e assim segue durante toda a infância, adolescência, fase
22 Educação Infantil

adulta — por toda a vida. Não paramos de aprender e sempre estamos


nos adaptando a novos lugares, rotinas, regras para viver e conviver em
sociedade (ARIÈS, 1981).

Contudo, na Idade Média não se tinha uma precisão da idade. Ela


podia ser contada com dois anos a mais ou a menos e, em alguns casos,
a data e o lugar do nascimento eram escritos em retratos. Com o tempo,
os retratos foram datados e se tornaram documentos da história familiar
(ARIÈS, 1981).

EXEMPLO: A obra dos Van Gindertaelen, concedida por Pourbus,


mostra um casal com seus dois filhinhos brincando, datada de 1559.

No século XVI, as crianças poderiam até saber sua idade, porém


as boas maneiras na época as ensinavam a ser reservadas e não falar
claramente (ARIÈS, 1981, p. 33).
Figura 5: A família registrada através das pinturas

Fonte: Pixabay

A partir daí, surgiu o termo “idades da vida”, expressão que ocupava


um importante lugar nos documentos pseudocientíficos da Idade Média.
Os autores da época nomeavam a divisão dessas idades como: infância
e puerilidade, seguida por juventude e adolescência, velhice e senilidade
(ARIÈS, 1981).
Educação Infantil 23

DEFINIÇÃO:

Puerilidade (imaturidade, ingenuidade) e senilidade


(caduquice, idade avançada, loucura).

Os textos mais antigos da Idade Média relatam que as idades


representam os planetas, contadas de 7 em 7: primeiro a infância (0-7
anos). Essa fase era caracterizada por pessoas que não sabiam falar, ou
seja, não se expressavam verbalmente nem conheciam bem as palavras.

Após a infância, vinha a segunda idade (7-14 anos), que era seguida
da terceira idade, chamada de adolescência, que iniciava aos 14 e
terminava aos 21 anos, etapas não muito valorizadas por toda a sociedades
(ARIÈS, 1981); a valorização se iniciava a partir dos 21 e se estendia até os
45 anos (quarta idade).

Temos a quinta idade entre os 45 e 59 anos (não tão velha, mas


já passada a juventude) e, por fim, a idade da velhice até a morte,
compreendida dos 60 anos em diante.

No século XVIII, surgiu uma nova maneira de representar a idade.


Em primeiro lugar, estava a idade dos brinquedos, caracterizada por
brincadeiras com bonecas, cavalos de pau e moinhos ou pássaros
amarrados. Em segundo, a idade da escola, onde os meninos carregavam
livros e estojos e aprendiam a ler enquanto as meninas aprendiam a tecer.
Em terceiro, as idades do amor e do esporte, as quais eram voltadas à
cavalaria e à corte, como o passeio dos moços e das moças e as festas.
Em quarto, as idades da guerra. Por último, as idades sedentárias,
caracterizadas pelos homens de lei, os estudos e a ciência (ARIÈS, 1981).

Mesmo com todas essas fases da vida, os adultos demoraram


para perceber a criança ao longo dos séculos. Como sabemos, a criança
necessita de cuidados básicos, principalmente nos primeiros anos de vida.
Era exatamente quando a criança não precisava mais desses cuidados
vindos de sua mãe e sua ama que ela se tornava adulta. Não existia afeto
na relação da criança com seus pais (ARIÈS, 1981).
24 Educação Infantil

Durante o século XVIII, com a influência do catolicismo, a infância


começa a ser notada pelos adultos e novas práticas são aplicadas:
cuidados de higiene, melhor alimentação, vacina para prevenir doenças,
comportamento voltado para boas maneiras, linguagem e histórias
adequadas com o contexto infantil. Tudo isso se enquadrou na ideia de
“inocência infantil” (ARIÉS, 1981). De acordo com o autor, a Igreja Católica
começou a acusar quem matasse crianças para praticar bruxaria. A
difusão desses novos pensamentos potencializou o surgimento de novos
modelos familiares, que ressaltavam a importância dos laços de sangue.
Assim, a criança começou a ocupar um novo lugar dentro das famílias.
Ela era mediadora do céu e da terra e era através dela que as falas de
sabedoria vinham à tona. Foi nesse cenário que o sentimento de infância
emergiu.

No entanto, essas transformações não ocorreram de forma


homogênea. As mudanças se deram, principalmente, nas classes
mais abastadas, portanto nem todas as crianças tiveram suas infâncias
reconhecidas. As que pertenciam às classes populares continuavam a
ser escravizadas como mão de obra infantil nas indústrias têxteis (ARIÈS,
1981).
Figura 6: Trabalho infantil

Fonte: Pixabay
Educação Infantil 25

SAIBA MAIS:

O Canal Educação Física disponibilizou uma videoaula


acerca da “Infância e Adolescência: Evolução do olhar sobre
a criança”. Assista agora: https://bit.ly/3rXhNJS.

Modernidade: influências científicas


O avanço científico teve grande influência na compreensão que
hoje temos da infância como um estágio específico do desenvolvimento
humano. Atualmente, pais e professores têm um novo olhar para a criança
e para o seu desenvolvimento, respeitando as necessidades específicas
de cada faixa etária.

Muitos estudos do desenvolvimento aconteceram durante a Se-


gunda Guerra Mundial, aspectos como o tempo e o lugar influenciaram a
vida das pessoas e consequentemente a educação e o desenvolvimento
infantil. Percebe-se, assim, que o desenvolvimento pode sofrer influên-
cias de diversas ordens: hereditária, ambiental, maturação, familiar, condi-
ção socioeconômica, cultural e étnica (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2006).

Além disso, quando pensamos no desenvolvimento infantil, é preciso


buscar entender os diversos aspectos que envolvem aquela criança:
físico, cognitivo e psicossocial. Todos esses aspectos estão interligados e
um influencia o outro. A seguir, vamos descrever de forma suscinta cada
um desses aspectos. É importante frisar que o desenvolvimento infantil
ocorre de forma integral. Não existem avanços no desenvolvimento da
criança que ocorram de forma isolada. A criança é um ser integral.

Iniciamos pelo desenvolvimento físico, que se refere ao crescimento


do cérebro e do corpo, das habilidades motoras e sensoriais e da saúde.
Quaisquer alterações em algumas dessas questões podem impactar os
outros aspectos do desenvolvimento, por exemplo, uma criança com
recorrentes infecções no ouvido pode vir a desenvolver a linguagem mais
devagar do que as outras crianças com a mesma faixa etária (PAPALIA;
OLDS; FELDMAN, 2006).
26 Educação Infantil

O desenvolvimento cognitivo envolve as habilidades de


aprendizagem, memória, linguagem, atenção, criatividade, pensamento,
funções executivas e julgamento moral, todas relacionadas ao
físico e emocional. Por exemplo, a habilidade para falar decorre do
desenvolvimento físico da boca e do cérebro. A criança que apresentar
alguma dificuldade de se expressar com palavras o que sente pode
apresentar prejuízos para si mesma e nas relações com outras crianças
(PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2006).

O desenvolvimento psicossocial envolve as mudanças e também


a estabilidade de comportamentos e personalidade — para si e para as
relações sociais. Por exemplo, a entrada na escola ou a mudança de
professora de um ano para o outro. O apoio dos envolvidos pode ajudar
a criança a lidar com os diferentes sentimentos, buscando melhoria para
a saúde física e mental (emocional) (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2006).

Quando falamos de desenvolvimento, não podemos nos esquecer


da aprendizagem, pois ela sustenta esse processo. Os estudiosos
da aprendizagem, também conhecidos como teóricos, enxergam o
desenvolvimento como algo constante. Eles contribuíram para que o
estudo do desenvolvimento humano pudesse se transformar em ciência
(PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2006).

RESUMINDO:

Neste tópico, estudamos brevemente a construção da


infância e a demora para que essa fase da vida fosse
valorizada na sociedade. No próximo tópico, vamos estudar
um pouco sobre a história da educação nas crianças de 0
a 5 anos e algumas abordagens teóricas que influenciaram
esse período.
Educação Infantil 27

História da educação de crianças de 0 a


5 anos

INTRODUÇÃO:

Como você percebeu em nossos estudos até o momento,


a concepção que temos de criança sofreu grandes
transformações no decorrer da história. Ao mesmo tempo
que o temo infância era nomeado durante a Idade Média, a
criança não ocupava um lugar na história. Os adultos nem
sempre valorizaram a infância da forma como entendemos
na atualidade.

Antigamente, a criança e o adolescente passaram por ensinamentos


e formações, porém como se davam esses processos? Existia alguma
orientação direcionada a cada faixa etária? E durante a primeira infância?

Neste tópico, tentaremos responder essas perguntas. Inicialmente,


faremos um breve percurso na história da educação, no mundo e no
Brasil. Depois, seguiremos com as contribuições dos principais teóricos
da aprendizagem e suas ideias (ou teorias).

Antes de iniciarmos, vamos pensar no significado de educação? Pode-


se dizer que a educação é a capacidade do indivíduo de aprender novos
conhecimentos, influenciando, assim, o seu comportamento. Esse processo
pode ser individual, através de vivências e descobertas, e por ensinamentos
de um indivíduo para o outro, sendo muito importante na luta do homem
para a conservação da vida humana (COTRIM; PARISI, 1979).

De acordo com o Dicionário Aurélio (online), educação define-


se como: 1. Ação ou efeito de educar, de aperfeiçoar as capacidades
intelectuais e morais de alguém: educação formal; educação infantil.
2. Processo em que uma habilidade se desenvolve através de seu
exercício contínuo. 3. Capacitação e/ou formação das novas gerações
de acordo com os ideais culturais de cada povo. 4. Didática; reunião
dos métodos e teorias através das quais algo é ensinado ou aprendido;
relacionado com pedagogia: teoria da educação. 5. Formação de hábitos
28 Educação Infantil

e comportamentos que incentivem o desenvolvimento corporal e mental,


através de exercícios sistemáticos, jogos ou esportes.

Em algum momento você já pensou algo do tipo: “para que eu apren-


do?” ou “o que eu devo aprender?”. Esses questionamentos acontecem des-
de a antiguidade e as respostas dadas pelos educadores variam conforme os
pensamentos da época. Assim, existe um consentimento de que a educação
tem objetivos e finalidades, porém há divergências de opiniões para defini-los.

Veremos que, ao longo da história, são variadas as finalidades para a


educação. Na época primitiva, a educação era baseada em sobrevivência
e acontecia desde a infância, por meio da imitação. Na Grécia Antiga,
enquanto Atenas direcionava a formação com base na razão, filosofia, artes
e ciências, Esparta preparava suas crianças para a vida militar, estimulando
desde cedo o preparo físico. Em Roma, a finalidade era incluir o sujeito na
vida social. Na Idade Média, a educação era fundamentada na religião.
Com o Renascimento, novos caminhos se abriram para uma educação,
através das construções científicas. Com isso, os educadores passaram
a estudar o desenvolvimento humano e defenderam, com o passar do
tempo, a importância de a criança ter equilíbrio em seu crescimento em
cada fase da vida. Vale ressaltar que os objetivos da educação foram
impactados pelas questões econômicas, sociais e políticas de cada época
(COTRIM; PARISI, 1979).
Figura 7: Criança na guerra

Fonte: Pixabay
Educação Infantil 29

A história das nossas crianças pode nos proporcionar conhecimentos e


reflexões para assim buscarmos novos caminhos para o futuro.

História da educação no mundo


Educação primitiva
Na sociedade primitiva não existiam escolas ou métodos de
educação. Os primitivos utilizavam uma educação prática, ou seja, a criança
aprendia e construía o conhecimento através da imitação para adquirir
as necessidades básicas: vestimentas, abrigo e alimentação. Durante os
primeiros anos de vida, era considerada uma imitação “inconsciente”.

Através de brincadeiras, por exemplo, para aprender a equilibrar-


se e um dia conseguir remar uma canoa, as crianças brincavam com
pequenas toras de madeira na água. As meninas brincavam de fazer
peças de barro e cozinhar. Em seguida vinha a imitação “consciente”,
que era voltada para meninos e meninas e exigia deles o trabalho de
fato. Depois, a educação teórica, que compreendia danças, práticas de
feitiçaria e cerimônias religiosas (MONROE, 1988).

Educação oriental
A educação oriental, composta de povos hindus, egípcios, hebreus
e chineses, detinha um conhecimento mais complexo de linguagem.
Por conta disso, a China possuía seu método de educação chinesa: nos
primeiros anos, as crianças iam para a escola treinar a memória e suas
lições se baseavam em decorar, decorar e decorar (MONROE, 1988).

Em um tempo anterior a esse método, a educação chinesa se


preocupava em manter os aspectos morais da sociedade e as boas
relações. Formava seus discípulos cedo com prática das virtudes: equilíbrio,
tolerância e moderação. Seus ancestrais tinham forte influência, pois eram
os modelos a serem seguidos para as próximas gerações, tanto que era
muito comum consultar o passado para tomar futuras decisões. Outro
objetivo em sua educação, desde a infância, era capacitar os indivíduos
30 Educação Infantil

para auxiliar o imperador. Assim, quando adulto, quem alcançava os altos


cargos era conhecido como mandarim (COTRIM; PARISI, 1979).

A China também passou por algumas influências filosóficas e


religiosa em sua educação:

• Budismo: com o objetivo de libertar o homem do sofrimento,


Buda desenvolveu As quatro nobres verdades e o nobre caminho
das oitos etapas. A primeira refere-se às causas do sofrimento
do homem; a segunda, aos caminhos para se seguir e se libertar
desse sofrimento;
Figura 8: Budismo

Fonte: Pixabay

• Confúcio: precursor do Confucionismo, acreditava que para


adquirir virtudes básicas para uma boa educação era necessário
mantê-las por toda a vida, desde a infância: respeitar seus pais,
venerar seus antepassados, ser humilde e dominar as paixões.
Com essa base, seria possível alcançar o respeito às leis na
sociedade e da natureza;
Educação Infantil 31

Figura 9: Confúcio

Fonte: Pixabay

• Taoismo: desenvolvido por Lao-Tsé, acreditava em sabedorias


para o equilíbrio e a harmonia do universo. Essas sabedorias não
eram encontradas nas escolas, pois eram fruto de uma busca
interior (COTRIM; PARISI, 1979).
Figura 10: Taoismo

Fonte: Pixabay

Na Índia, a educação era baseada na posição social dividida em


4 castas: brâmanes (sacerdotes), xátrias (nobres guerreiros e militares),
vaixás (agricultores e comerciantes) e sudras (camponeses e operários). A
criança pertencia a uma casta desde o nascimento até a morte. De acordo
32 Educação Infantil

com a casta, seguia as atividades religiosas e profissionais (COTRIM;


PARISI, 1979).

Casta significa qualquer grupo social ou sistema rígido de


estratificação social, de caráter hereditário.

Para os sudras, a educação era voltada às atividades domésticas


e agrícolas. A educação essencial dos vaixás e dos xátrias era dada
pela família desde a infância, até atingirem o mesmo papel social de
seus pais. Eles até poderiam estudar nas escolas dos brâmanes, porém
os ensinamentos eram limitados nas cerimônias religiosas e nos textos
sagrados. A educação humanista superior pertencia aos brâmanes a
partir de textos clássicos da literatura hindu. Nessa casta, a criança era
direcionada a um mestre da mesma castra aos 8 anos (COTRIM; PARISI,
1979).

Educação na Grécia Antiga


A história da educação na Grécia Antiga se dividiu em três períodos:
homérico, cívico e helenístico.

O período homérico, descrito por Homero nos famosos poemas


épicos, Ilíada e Odisseia, era formado por aristocratas que comandavam
o Estado e a massa do povo com os trabalhos inferiores. A educação se
baseava em formar guerreiros. Desde cedo, os ensinamentos eram feitos
nos palácios voltados para o preparo físico através da prática de exercícios
e esportes. Já a educação da mulher era voltada para as práticas do lar
(COTRIM; PARISI, 1979).

O período cívico é conhecido pelas cidades-Estados gregas mais


famosas: Esparta e Atenas (COTRIM, PARISI; 1979).

Na educação espartana, o homem enxergava seu corpo como


a principal arma para a guerra. Por esse motivo, as crianças que não
nascessem saudáveis eram sacrificadas. A partir de uma política
aristocrática, as crianças seguiam um treino de direção geral de educação
e permaneciam sob cuidados de suas mães até os 7 anos. Depois, eram
encaminhadas para organizações, passando por vários estágios até os 30
Educação Infantil 33

anos, sendo preparadas para a guerra (COTRIM; PARISI, 1979) (MONROE,


1988).

Em Atenas, a educação tinha como princípio o desenvolvimento


intelectual. No decorrer dos primeiros anos de vida, os meninos pertenciam
a uma educação familiar e recebiam os primeiros ensinamentos. Eram
praticados jogos na rua e no campo. Como os primitivos, a educação
também era de forma inconsciente. Suas mães eram responsáveis pelos
treinos físicos e morais. Por volta dos 7 anos de idade, esses meninos
pertencentes às famílias gregas livres iniciavam a vida escolar. Já as
famílias economicamente incapazes permaneciam até os 8 ou 9 anos.
As meninas eram desde cedo educadas para os deveres domésticos por
suas mães (COTRIM; PARISI, 1979) (MONROE, 1988).

Nessa época, as crianças ficavam sob a responsabilidade de um


pedagogo, para cuidados gerais e zelo moral até os 16 anos.

No período helenístico, comandado por Alexandre, as escolas


públicas com uma educação voltada mais para o intelectual (escrita, leitura
e cálculo) do que para o físico tiveram início. O aluno ingressava aos 7 anos
no ensino primário, seguido pelo ensino secundário e pela universidade
(COTRIM; PARISI, 1979).

Pensadores gregos
Conhecido pela sua máxima “Só sei que nada sei”, Sócrates
acreditava que uma boa virtude deveria vir de pensamentos treinados
por exercícios movidos pela disciplina mental. A frase “Conhece-te a ti
mesmo” era a base da sua filosofia, sendo esse o ponto de partida para o
autoconhecimento. Seus ensinamentos aconteciam em praça pública em
duas fases: a ironia e a maiêutica (COTRIM, PARISI; 1979).

Discípulo de Sócrates, Platão, era famoso pela Teoria das Ideias e o


Mito da Caverna. Para ele, a educação era de extrema importância para a
reestruturação da sociedade e os filósofos deveriam influenciar o governo
com base na sabedoria e na justiça. Do seu ponto de vista, sociedade ideal
era dividida em três classes: filosófica, militar e trabalhadora (COTRIM;
PARISI, 1979).
34 Educação Infantil

Para o desenvolvimento educacional, dividiu as fases de


aprendizagem da seguinte forma:

1ª fase (0-3 anos): a educação acontecia no lar, junto aos pais,


para seguir seus exemplos. Nessa fase, era muito importante ensinar a
criança a lidar com o medo que iria encontrar durante os desafios da vida,
incentivando-a a ser corajosa e independente;

2ª fase (3-6 anos): a criança era ensinada por seus educadores a


partir dos grandes nomes da mitologia grega, por meio das histórias e
leituras. As boas atitudes deveriam ser recompensadas, enquanto as más
atitudes eram castigadas;

3ª fase (6-13 anos): os meninos eram separados das meninas e


iniciavam os estudos de matemática, religião, letras e música;

4ª fase (13-16 anos): todos seguiam as mesmas matérias, porém


com um nível de dificuldade maior, com ênfase em matemática e música;

5ª fase (16-20 anos): acontecia o preparo físico e o treinamento


militar;

6ª fase (20-30 anos): educação superior para filosofia e ciências


(COTRIM; PARISI, 1979).

O projeto educacional de Platão está descrito em sua obra:


República de Platão.

Educação em Roma
Roma recebeu uma herança grega das bases educacionais que
foram adaptadas para a sociedade. Dois grandes períodos da educação
se formaram.

Primeiro período: uma educação voltada somente para o lar.


Do nascimento até os 7 anos, os meninos e as meninas ficavam sob
os cuidados de suas mães. A partir de 7 anos, enquanto as meninas
continuam aos cuidados das mães para os ensinamentos domésticos, os
meninos passam a acompanhar seus pais no trabalho, para desde cedo
se prepararem para aprender as atividades profissionais. Aos 17 anos, o
jovem pode escolher a carreira a seguir: militar, política, comercial ou
Educação Infantil 35

agrícola. É importante aqui dizer que esse padrão era seguido pela classe
dominante, enquanto a classe econômica não tinha instruções e era
explorada.

Segundo período: com a influência da cultura helênica, perde-se


a educação familiar e surgem novas escolas particulares com três níveis
de ensino: escola do literato, escola do gramático e escola do retórico
(COTRIM; PARISI, 1979).

Roma também teve um nome importante para a educação: Marco


Fábio Quintiliano. Suas principais ideias consistiam em:

• O professor deveria respeitar e se adequar ao perfil do aluno;

• Era contra o castigo físico;

• Os estudos deviam ter pausas para pequenos “descansos”.

Para Quintiliano, o desenvolvimento educacional era composto por três


fases:

1ª fase - acontece na primeira infância. Os ensinamentos aconteciam


no ambiente familiar. Com seus pais, a criança deve iniciar seus estudos na
leitura, escrita e aritmética. Depois, os pais direcionavam os ensinamentos
das línguas latina e grega para um gramático;

2ª fase - a criança é direcionada a uma escola aos cuidados do


mestre, que tem como objetivo identificar a personalidade do aluno, para,
assim, adaptar as necessidades ao seu método de ensino. As matérias de
geometria, oratória, música e literatura são estudadas;

3ª fase - educação de nível superior, chamada de Escola da


Retórica, era direcionada somente aos melhores alunos (COTRIM; PARISI,
1979).

Educação na Idade Média


Na Idade Média, alguns movimentos impactaram a educação: o
Renascimento provocou mudanças em todos os pensamentos e na prática
educativa; a reforma com mudanças sociais, políticas e principalmente
religiosas; e a contrarreforma, como o próprio nome diz, surgiu contra o
36 Educação Infantil

último movimento, visando uma educação com congregações de ensino,


entre elas a Companhia de Jesus. Durante a reforma e a contrarreforma,
surgiram grandes educadores, como João Calvino, Martinho Lutero e
Filipe Melanchthon (MONROE, 1988).

A Companhia de Jesus foi o principal movimento, com o objetivo de


pregação, ensino e confissão para educar futuros membros e juventude e
resolver os problemas educativos. Houve toda uma organização baseada
em formação dos professores, das matérias de estudo e dos métodos de
ensino. Repercutiu, assim, por toda a Europa, com mais de 200 escolas,
até chegar ao Brasil (MONROE, 1988).

História da educação no Brasil


Quando a Companhia de Jesus chegou ao Brasil, em 1549, na Vila
de Pereira, os padres jesuítas tinham como principal preocupação o
ensino das crianças. Eles desejavam formá-las em “letras e virtudes”, para
que futuramente multiplicassem, no lugar onde vivessem, os valores da
companhia. Havia na época muitos colégios na Europa regidos por essa
companhia, onde era possível comprovar a sua importância na educação
de crianças e adolescentes (DEL PRIORI, 2006).

Mesmo com toda essa influência, a Companhia de Jesus


permanecia em constante discussão das matérias e principais diretrizes
para a educação. Tudo isso foi muito importante para a relação que os
religiosos determinaram com os portugueses, os índios e as próprias
crianças durante o século XVI. (DEL PRIORI, 2006).

Nesse período, a infância estava sendo descoberta a partir dos


resultados das relações vistas entre o sujeito e o grupo, o que ocasionou
novas formas de afetividade, “sentimento da infância” e problemas de
ensino em que Estado e Igreja tiveram uma importante função. Não
havia ainda uma predefinição, mas aos poucos foi se estabelecendo uma
política para as crianças ao longo desse século (DEL PRIORI, 2006).

No início dessa nova missão jesuíta no Brasil, apesar dos padres


perceberem dificuldades em evangelizar os meninos índios, com o tempo
eles foram se convertendo mais rápido, até o momento em que se firma a
Educação Infantil 37

ideia de que essas crianças construíram uma “nova cristandade”, ou seja,


estavam doutrinados nas virtudes e assim seriam “firmes e constantes”.
Assim, tempos depois, seriam possíveis as “substituições de gerações”
com a doutrinação: a fala, a escrita e a leitura em português, ou seja,
esses meninos poderiam “suceder seus pais” (DEL PRIORI, 2006).
Figura 11: Castelo jesuíta

Fonte: Pixabay

Nesse contexto, pode-se dizer que as ações praticadas pela


Companhia de Jesus foram responsáveis por converter os nativos do
Brasil, de acordo com o modelo europeu, através de catecismo, cartas,
poemas e gramática propostos pelos missionários, para direcioná-los à
fé, à lei e a um rei. A criança poderia ser mística (inocência e pureza na
ingenuidade) ou santa (divindade, doçura e bom comportamento baseado
no menino Jesus) (DEL PRIORI, 2006).

Assim, essa educação influenciou as relações de poder entre adultos


e a construção da infância no Brasil (DEL PRIORI, 2006).

Essas influências trouxeram também alguns conflitos e resistências


por causa da doutrinação de crenças, leis e reorganização social. Havia
38 Educação Infantil

grupos distintos com crianças escravas, nativas e até mesmo filhas


dos senhores de engenho, gerando, assim, diferentes grupos sociais:
classe social, étnico-racial e gênero. Meninas e mulheres obtiveram
uma educação diferenciada dos meninos e homens e demoraram para
ingressar na escola (DEL PRIORI, 2006).

SAIBA MAIS:

Para complementar seus estudos sobre a história da


educação no Brasil, assista à sugestão de aula sobre o
tema disponível em: https://bit.ly/38HKzqv.

De modo geral, desde a idade primitiva até o século XVIII, as


crianças eram educadas na forma de imitação. Isso acontecia até os 7
anos, quando eram direcionadas para outras atividades de acordo com a
cultura, religião e princípios da época. Entres os séculos XVIII e XIX, novas
teorias da aprendizagem começaram a influenciar o olhar e o conceito de
infância. Vamos conhecer esses teóricos?

Estudos e teorias sobre o desenvolvimento


infantil
Muitos estudiosos contribuíram com suas pesquisas para o
desenvolvimento infantil. Seus resultados trouxeram novos olhares para
o crescimento das crianças. As tendências psicológica, sociológica e
científica não se especificam claramente, mas se conversam durante todo
esse período (MOROE, 1988).

Jan Amos Comenius (1592-1670) foi o maior educador da sua


época. Ele acreditava no princípio de ensinar tudo para todos, ou seja,
não deveria haver restrição a ninguém, independentemente de sua classe
social, religião, condições mentais ou físicas.
Educação Infantil 39

Figura 12: Jan Amos Comenius

Fonte: Wikimedia Commons

Comenius escreveu, em sua obra Didática Magna, algumas das


suas principais ideias acerca da educação:

1ª - a aprendizagem deveria iniciar na “meninice” e o conteúdo


deveria estar de acordo com a idade do educando;

2ª - os assuntos deveriam ser apresentados sempre seguidos dos


exemplos;

3ª - não ensinar conteúdos que estejam acima do que o educando


possa aprender;

4ª - construir o conhecimento aos poucos e não avançar sem ter a


certeza de que o educando compreendeu o tema estudado;

5ª - durante o aprendizado, deve-se primeiro compreender e


somente depois memorizar;

6ª - para se aprender o tema estudado de forma geral, deve-se


estudar suas partes;

7ª - preparar o caminho sem dar “saltos na aprendizagem”;

8ª - as escolas devem estar localizadas em lugares tranquilos e


afastados para evitar distratores que possam atrapalhar o aprendizado;
40 Educação Infantil

9ª - o objetivo principal da aprendizagem é direcionar um caminho


e não trazer confusões, ou seja, o educador deve ter cuidado ao falar de
assuntos com outras linhas sem influências e trazer livros mal escritos ou
incorretos (COTRIM; PARISI, 1979).

John Locke (1632-1704) acreditava que a mente era uma tábula rasa
e que ela era preenchida com o conhecimento através da experiência.
Figura 13: John Locke

Fonte: Wikimedia Commons

A educação deveria partir de três aspectos fundamentais: educação


física, para trazer um equilíbrio entre o corpo e a mente através de
exercícios, boa alimentação e boas horas de descanso; educação
intelectual no ensino das matérias de escrita, desenho, geografia, latim,
história, matemática, música, ciências e esgrima; e, por último, educação
moral, para se construir os conceitos de bem e mal com base nos
ensinamentos religiosos (COTRIM; PARISI, 1979).

Influenciado por Locke e Compêndio, Jean-Jacques Rousseau


(1712-1778) defendeu uma escola ativa, de acesso e igualdade para todos.
Acreditava que o educando adquiria conhecimentos através da sua
curiosidade e sem influências sociais.
Educação Infantil 41

Figura 14: Jean-Jacques Rousseau

Fonte: Wikimedia Commons

O educador deveria mostrar caminhos, com ideias justas e claras,


para que o educando possa aprender por si só a resolver os problemas
e não apenas receber uma solução para reaplicar. Defendia, assim, a
importância do aprendizado através do erro, sendo um aspecto natural
nessa construção do conhecimento, pois ajuda o educando a desenvolver
suas próprias opiniões e não ser apenas “espelho” das outras pessoas.
Além de ensinar, o professor deveria passar o prazer em aprender
(COTRIM; PARISI, 1979).

• Educação de 1 a 5 anos: era contra o padrão de vestimentas, a


punição ao erro e as vontades naturais. Acreditava que estimular a
criança a ser forte contribuiria para torná-la boa;

• Educação de 5 a 12 anos: era preciso estimular os sentidos para


alcançar a força e os fenômenos da natureza. A criança descobria
a leitura por si só;

• Educação de 12 a 15 anos: principal fase para desenvolver o co-


nhecimento;

• Educação de 15 a 20 anos: após educar o corpo, os sentidos e o


intelecto, cabe aqui moldar seu “coração” (MOROE, 1988).
42 Educação Infantil

Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), partindo das ideias de


Rousseau, desenvolveu projetos e dedicou-se à formação de crianças
pobres. Para ele, o ensino elementar era primordial para o desenvolvimento
humano.
Figura 15: Johann Heinrich Pestalozzi

Fonte: Wikimedia Commons

O método de Pestalozzi era fundamentado na intuição, ou seja,


as experiências e vivências do educando estimulam a observação e o
raciocínio. As atividades deveriam ser conduzidas do simples para o mais
complexo, partindo do conhecido para o desconhecido, do particular para
o geral e do concreto para o abstrato (COTRIM; PARISI, 1979).

Friedrich Wilhelm August Fröbel  (1782-1852), influenciado pelas


ideias de Pestalozzi, acreditava que a escola era o principal lugar para a
criança aprender as questões mais importante da vida: desenvolver sua
personalidade, a justiça, a responsabilidade, as relações casuais — tudo
através da vivência.
Educação Infantil 43

Figura 16: Friedrich Wilhelm August Fröbel 

Fonte: Wikimedia Commons

Fröbel  criou o Jardim da Infância com o objetivo de fazer a criança


aprender a expressar-se e a desenvolver-se através do gesto, do canto e
a da linguagem (MONROE, 1988).

Para Jean Piaget (1896-1980), o desenvolvimento humano ocorre


através da maturação biológica e da interação que se estabelece com
o meio em que vive. Assim, as crianças constroem e adquirem seus
conhecimentos e aprendizados na relação com o outro e o mundo. Seu
principal questionamento era “Como conhecemos o mundo?” e “Como
passar de uma fase de menor conhecimento para uma fase de maior
conhecimento?”.
44 Educação Infantil

Figura 17: Jean Piaget

Fonte: Wikimedia Commons

Ele desenvolveu os principais conceitos que influenciariam as


fases do desenvolvimento. São eles: a adaptação é caracterizada em
como a criança vai lidar ao receber novas informações; a assimilação é o
momento em que adquire novas informações, sendo preciso adaptá-las
às estruturas cognitivas já presentes; e a acomodação é a mudança das
estruturas cognitivas ao introduzir um conhecimento novo.

Entre a assimilação e a acomodação, temos a equilibração. Como


o próprio nome diz, tal conceito busca um equilíbrio no processo de
mudança entre as duas fases. Vamos pensar, por exemplo, em um bebê
que está habituado a mamar no peito e na mamadeira e começa a usar
um copo com canudo. Num primeiro momento, ele vai sugar o canudo
da mesma forma que suga o peito e a mamadeira, pois é a forma que já
conhece aplicada a algo novo. Esse processo é a assimilação.

Com o tempo, esse bebê vai perceber que precisa de outros


movimentos com a boca e a língua, diferentes dos quais usava com o
peito e a mamadeira, para poder sugar o canudo. Esse processo é a
acomodação. Nessa adaptação da mamadeira e do peito para o canudo,
o bebê se esforça para manter um equilíbrio.
Educação Infantil 45

Assim, podemos perceber que a assimilação e a acomodação


trabalham juntas para alcançar o equilíbrio e o crescimento cognitivo
(PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2006).

Ao identificar que as estruturas cognitivas mudam a partir de


comportamentos e interações com os meios social e físico, desenvolveu
a teoria dos estágios do desenvolvimento, a qual compreende do
nascimento à adolescência:

No estágio sensório-motor (0-2 anos), a criança se relaciona com o


mundo a sua volta por meio de comportamentos que executa no ambiente,
como movimentos e percepções, ou uma coordenação sensório-motora.
A função simbólica e a linguagem ainda não estão desenvolvidas, por isso
a exploração e a relação com o meio em que vive acontecem através
dos sentidos. Da perspectiva educacional, as vivências da criança nesse
estágio são importantes para que ela possa alcançar o próximo. Para
isso, espera-se que os programas educacionais voltados para a primeira
infância possibilitem práticas sensoriais produtivas. Com isso, é possível
construir as estruturas de conhecimento esperadas.

No estágio pré-operatório ou intuitivo (2-7 anos), o pensamento


da criança passa por algumas mudanças de desenvolvimento: linguagem,
função simbólica para brincadeiras (semiótica), inteligência intuitiva e a
sua relação social com o adulto. No entanto, o pensamento da criança é
egocêntrico: ela ainda não é capaz de pensar de forma diferente.

Esses estágios são seguidos pelo operatório concreto (7-11 anos),


que é quando a criança passa a compreender o mundo através de um
pensamento lógico, e pelo operatório formal (11-16 anos), marcado pelo
início da adolescência e pela transição de pensamento do estágio anterior
para esse.

Dessa forma, pode-se concluir que Piaget apresentou um


importante conceito para a pedagogia da infância: o papel ativo da criança
na construção do conhecimento (OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO;
PINAZZA, 2011).

Temos também Lev Vygotsky (1896-1934), para o qual é importante


olhar o contexto social, cultural e histórico que a criança está inserida,
para assim entender seu pensamento.
46 Educação Infantil

Figura 18: Lev Vygotsky

Fonte: Wikimedia Commons

A criança aprende com a interação social. O adulto deve orientar o


processo de aprendizagem da criança até que ela possa internalizar esse
conhecimento. Com essa mediação, a criança tem o apoio para passar
pela zona de desenvolvimento proximal (ZDP): distância entre o que ela já
sabe fazer sozinha e o que ela ainda está aprendendo. A criança, quando
está nessa zona, está aprendendo novas habilidades e por esse motivo
precisa de ajuda para executar determinada tarefa (PAPALIA; OLDS;
FELDMAN, 2006).

Maria Montessori (1870-1952) começou seus trabalhos com crianças


“retardadas”, termo muito usado na época em um hospital psiquiátrico.
Essa fase foi muito importante, pois além de sucesso com suas técnicas,
ela abriu seu caminho para desenvolver o seu próprio método.
Educação Infantil 47

Figura 19: Maria Montessori

Fonte: Wikimedia Commons

O Método Montessoriano, baseado em uma educação sensorial,


tinha o objetivo de fazer a criança alcançar a autoeducação através dos
brinquedos. Para a criança chegar à fase escrita, ela deve ser mediada e
estimulada pela família, com o mundo ao seu redor, desde o nascimento.
Ela dizia que a linguagem escrita era uma extensão da linguagem oral.

Assim, a criança, desde os primeiros momentos, deve ser incluída na


vida social. É necessário ouvi-la e conversar com ela, bem como explicar
todas as coisas que pertencem ao seu meio para mais tarde reproduzi-
las de forma tanto oral quanto escrita. Na prática educativa sensorial, é
disponibilizado um espaço para que ela possa escolher o brinquedo que
vai explorar de acordo com as suas necessidades. O educador deve ser
discreto de modo a observar antes de ajudá-la a manusear o material
(COTRIM; PARISI, 1979) (LILLARD, 2017).
48 Educação Infantil

RESUMINDO:

Estamos finalizando a primeira unidade do nosso estudo. Os


pressupostos teóricos aqui apresentados abordam o tema
de perspectivas relativamente independentes entre si. As
escolas teóricas vistas aqui podem oferecer explicações
que se contrapõem, portanto, é fundamental ter essa
compreensão para poder entender as dualidades que se
apresentam. Essas perspectivas ainda hoje são utilizadas
para compreender e explicar o desenvolvimento infantil.
Seguiremos nossos estudos com os aspectos políticos da
educação infantil.
Educação Infantil 49

REFERÊNCIAS
ARIÉS, F. História social da criança e da família. Rio de Janeiro:
LTC, 1981.

BRASIL. Emenda Constitucional nº 65, de 13 de julho de 2010.


Altera a denominação do Capítulo VII do Título VIII da Constituição Federal
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Educação Infantil
Analice Oliveira Fragoso

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