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Transtornos e

Distúrbios da
Aprendizagem
Inclusão de Pessoas com Distúrbios e
Transtornos Cognitivos
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
VIRNA MAC CORD CATÃO
AUTORIA
Virna Mac Cord Catão
Sou Pedagoga, especialista em Administração Escolar e EAD e
Mestra em Educação, com experiência técnico-profissional e docente de
mais de 15 anos. Passei por instituições educacionais públicas e privadas.
Já atuei como docente na Educação Básica (Prefeitura do Rio de Janeiro,
Colégio Pedro II etc.), principalmente em turmas de alfabetização e
classes de progressão, inserindo-me em diversos e diferentes contextos
de aprendizagem, como também na Educação Superior (UNIABEU,
UFRRJ etc.). Na área técnica, já fui Pedagoga do CAP UERJ e do IFRJ e,
inclusive, Supervisora da UNIVESP. Sou apaixonada pelo que faço e adoro
transmitir minha experiência de vida àqueles que estão iniciando em suas
profissões. Por isso fui convidada pela Editora Telesapiens a integrar seu
elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você
nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de de se apresentar um
uma nova compe- novo conceito;
tência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou dis-
mento; cutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das últi-
assistir vídeos, ler mas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Distúrbios da Aprendizagem................................................................... 10
Transtorno, Distúrbio e Dificuldade de Aprendizagem................20
Características dos Distúrbios de Aprendizagem.......................... 23
Processo de Inclusão e os Distúrbios de Aprendizagem............ 25
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 7

01
UNIDADE
8 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

INTRODUÇÃO
Você sabia que os transtornos e distúrbios de aprendizagem tem sido
uma área muito estudada por educadores, professores e psicólogos, além de
profissionais de outras áreas das ciências humanas? Isso tem ocorrido devido às
transformações e necessidades atuais. Transformações no que diz respeito ao
entendimento de que as pessoas são diferentes umas das outras, implicando
a necessidade de dar voz e vez às pessoas com transtornos e distúrbios. Todas
as pessoas têm suas potencialidades de formas diferentes e essas diferenças
devem ser respeitadas. Mas, para isso, precisamos entender como se processa
a vida, o conhecimento, as possibilidades de avanço que as pessoas têm.
Precisamos entender, nesta perspectiva, o que é a aprendizagem, como se
caracterizam esses transtornos/distúrbios e os princípios de inclusão dessas
pessoas na sociedade. Percebeu a importância desta temática? Ao longo
desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo!
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1 - Inclusão de pessoas com
distúrbios e transtornos cognitivos. Nosso objetivo é auxiliar você a atingir
os seguintes objetivos de aprendizagem até o término desta etapa de
estudos:

1. Identificar os processos fundamentais de aprendizagem.

2. Diferenciar transtorno, distúrbio e dificuldade de aprendizagem.

3. Caracterizar os distúrbios cognitivos e comportamentais.

4. Discernir sobre a importância do processo de inclusão de pessoas


com dificuldades de aprendizagem.

Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento?


Ao trabalho!
10 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Distúrbios da Aprendizagem

OBJETIVO:
Ao término deste capítulo, você será capaz de entender
como ocorre a aprendizagem e o que caracteriza e
diferencia dificuldades de distúrbios/transtornos da
aprendizagem. Isso será fundamental para o exercício de
sua profissão, seja como professor ou em outra área que
estuda a neuroeducação como possibilidade de intervir
em processos de aprendizagem. E então? Motivado para
desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante!

Atualmente, o tema “Distúrbios de Aprendizagem” vem sendo


uma questão muito debatida e que gera preocupações. Percebe-se
que há uma generalização, por partes de algumas pessoas, de que toda
dificuldade é um distúrbio, porém, é importante enfatizar que o erro faz
parte do processo de construção do conhecimento e que nem sempre
ele é uma fatalidade para a aprendizagem.

Nessa direção, é necessário explicar, primeiramente, que a


aprendizagem é o momento de construção, de interação, de mediação
etc. Além disso, deve-se enfatizar que o erro faz parte desse processo.
Uma dificuldade de aprendizagem não significa um distúrbio, tampouco
um transtorno, sendo estas definições distintas que precisamos
compreender para sabermos como agir, pois é com base nessa distinção
que encontraremos possibilidades de ação.

Por vezes, apenas adaptações às necessidades da pessoa são


suficientes para a promoção da aprendizagem e, caracterizando essas
questões, abrimos portas para o processo de inclusão de pessoas que
aprendem de formas diferentes.

Podemos definir a aprendizagem como uma mudança de


comportamento oriunda de uma experiência que pode ocorrer tanto
naturalmente, ao nos relacionarmos com o mundo e as pessoas, como
intencionalmente, a exemplo do que ocorre no caso de instituições de
ensino, cujo objetivo é a promoção da aprendizagem.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 11

Figura 1 - Aprendizagem intencional na escola

Fonte: (cc)Pixabay.

Quando não conseguimos aprender na escola, dizemos que


houve um “fracasso da aprendizagem”. Este fracasso da aprendizagem
tem diversas causas e um deles pode ter origem associada aos próprios
sistemas de ensino, por não conseguirem compreender nem atender
aos alunos, às suas alteridades e às suas culturas. Nesse caso, a escola
deve estar atenta às diversas formas de manifestação das aprendizagens,
uma vez que as pessoas são diferentes e oriundas de espaços e culturas
também diferentes.

Claramente existe a possibilidade de ocorrerem falhas por parte


da escola nesse processo, no entanto, os demais contextos em que
os alunos estão inseridos também interferem em suas aprendizagens,
levando ao fracasso mútuo da absorção de conteúdo do aprendiz e de
seu cumprimento enquanto agente educador.

Esses fatores, aos quais os alunos estão expostos, podem não


ser determinantes, e por muito tempo acreditou-se nisto, mas são
considerados interferências no processo de aprendizagem. Alguns
exemplos são: o contexto familiar e cultural, as relações sociais, as
condições econômicas e políticas etc.
12 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Neste sentido, o fracasso da aprendizagem não é um objeto de


estudo isolado, posto que deve ser lido e compreendido num contexto
que envolve pelo menos três dimensões.
Figura 2 - As dimensões do fracasso da aprendizagem

Fonte: Elaborado pela autora (2019).

O objetivo não é buscar culpados, isso seria “chover no molhado”, o


que queremos é compreender melhor como a aprendizagem é constituída
e, desse modo, pensar em maneiras de intervenção para revertermos o
quadro de falhas e fracassos em resultados de sucesso.

Conforme observamos, temos a dimensão psicológica que implica


diretamente o entendimento do que é aprendizagem e a sua promoção.
Mas, o que é aprendizagem? Para melhor compreensão sobre o contexto,
tomaremos como referencial as teorias interacionistas, ou melhor, o
pensamento piagetiano.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 13

Para Piaget, o conhecimento é produzido por meio de uma interação


do sujeito com seu meio, a partir de estruturas já existentes. Seguindo este
pensamento, entendemos que a aquisição de conhecimentos depende tanto
das estruturas cognitivas do sujeito como de sua relação com os objetos/meio.
Figura 3 - Jean Piaget

Fonte:@Wikimedia

VOCÊ SABIA?
Piaget nasceu na Suíça no ano de 1896 e faleceu em
1980. Vindo de uma família culta, Piaget, ainda muito
pequeno, precisamente aos 7 anos, tinha o interesse por
determinados estudos de ordem científica. Sua formação
inicial foi em Biologia, mas também estudou Filosofia e
aos 22 anos finalizou o Doutorado em Ciências Naturais
e lançou diversos livros tendo muita influência no campo
da Psicologia. Teve preocupações eminentemente
epistemológicas, tendo-se dedicado ao estudo de como o
ser humano constrói conhecimento. Na verdade, estudando
as origens dos seres vivos, por meio dos estudos da
ontogênese e filogênese, é que Piaget foi caminhando suas
pesquisas para as características essencialmente humanas.
14 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

IMPORTANTE:

De acordo com Piaget, a inteligência é o mecanismo de


adaptação do organismo a uma situação nova e, como
tal, implica a construção contínua de novas estruturas.
Essa adaptação refere-se ao meio exterior. Para ele, os
indivíduos se desenvolvem intelectualmente a partir de
exercícios e estímulos oferecidos pelo meio em que
vivem. O comportamento de cada um de nós é construído
numa interação entre o meio e o indivíduo. Essa teoria é
caracterizada como interacionista, e afirma que quanto
mais complexa for essa interação, mais “inteligente” será o
indivíduo. Para Piaget a estrutura de maturação do indivíduo
sofre um processo genético e a gênese depende de uma
estrutura de maturação, dessa forma a aprendizagem
depende do desenvolvimento. Sua teoria nos mostra
que o indivíduo só aprende determinada coisa se estiver
preparado para recebê-la. Ou seja, se puder agir sobre o
objeto de conhecimento para inseri-los num sistema de
relações.

Em sua teoria, Piaget afirma que há dois processos fundamentais


para a organização do pensamento, a assimilação e a acomodação:
Dois mecanismos são fundamentais nessa relação: a
organização e a adaptação, que constituem as invariantes
funcionais de todo ser vivo. Sem organização, não é possível
ao ser vivo ter um comportamento finalista, voltado para a
satisfação de suas necessidades biológicas fundamentais.
É a organização que dota o ser vivo da capacidade de ter
condutas seletivas, isto é, eficientes do ponto de vista do
atendimento das demandas fundamentais à adaptação.

A adaptação tem duas faces que estão indissoluvelmente


ligadas: assimilação e acomodação. Em tempo real,
numa ação adaptativa, ambas são como faces da mesma
moeda, continuamente interligadas. Apensar desta inter-
relação no funcionamento, a assimilação e a acomodação
são conceitualmente distintas, opostas e complementares.
(AZENHA, 1998, p. 25)
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 15

Na teoria construtivista, o sujeito aprendente é ativo, ou seja,


Piaget parte do fundamento de que há ações “inteligentes” perante o
conhecimento. É no relevantamento de hipóteses e na alternância entre
erro e acerto que o sujeito operacionaliza o conhecimento.

Para ocorrer esse processo, Piaget observou e ponderou a ideia de


adaptação do sujeito ao meio, em que essa adaptação é promovida pelo
processo de reequilibrações sucessivas. Isso significa que, ao se deparar
com algo desconhecido ou com um novo objeto de conhecimento, tem-
se um desordenamento dos esquemas já internalizados.
Figura 4 – Processo de equilibração

Fonte: Elaborado pela autora (2019).

É sendo desafiado e estimulado ou buscando preencher alguma


lacuna que o sujeito se “desequilibra” intelectualmente, fica curioso e, por
meio de assimilações e acomodações, procura retornar ao equilíbrio.

No caso da aprendizagem da língua escrita, o pensamento


piagetiano muito influenciou o processo de ensino-aprendizagem.
Equivocadamente, a influência foi até confundida como método em
algumas escolas.
16 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Figura 5 - Escrita

Fonte: (cc)Freepik.

Apesar das ideias construtivistas não serem métodos, elas


demonstram algumas questões sobre a aprendizagem da escrita, como
o fato de que as manifestações escritas de crianças têm origem na sua
relação com o mundo e na estruturação de seu pensamento. Então, um
erro nem sempre é um erro como pensamos, e sim uma hipótese de fato
inteligente e elaborada a partir das experiências realizadas.

O erro muitas vezes é visto no processo de aprendizagem como


algo fatal e um fim em si mesmo. Muitas pessoas dizem que quem erra
não sabe, mas será mesmo que não sabe? O erro é parte das ideias
elaboradas para se tentar chegar ao acerto, assim como o erro pode ser
apenas uma dificuldade que, com a intervenção correta, promoverá a
aprendizagem.

Nesta direção, estamos contestando a ideia de que a aprendizagem


é algo estático ou que só depende do sujeito aprendiz. Podemos entender
que a aprendizagem depende de todos os fatores já supracitados,
inclusive do respeito aos diferentes níveis e formas de aprender.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 17

EXEMPLO:

Tratando-se da aprendizagem na escola, algo muito polêmico diz


respeito à organização em ciclos. O ciclo não indica aprovação automática
e sim a progressão continuada da aprendizagem, embora muitos
sistemas e escolas que o implantaram tenham difundido essa questão
de forma equivocada. Quando falamos em progressão continuada,
estamos observando, principalmente no que diz respeito ao processo de
aprendizagem, a ideia de inacabamento, pois não podemos aprisionar a
aprendizagem dos alunos no ano-calendário. Alguns aprendem a lógica
da escrita e sua representação em dois meses, outros em dez meses.
Portanto, o respeito aos diferentes ritmos também é um dos princípios
fundamentais do ciclo na educação escolar.
Figura 6 - O tempo para a aprendizagem

Fonte: (CC)Pixabay.

A aprendizagem é um processo contínuo que ocorre constantemente


ao longo da vida, pois sempre estamos aprendendo alguma coisa. Não há
um único ritmo de aprendizagem pelo fato de que as pessoas, inseridas
em diversos contextos, são diferentes e possuem características que as
distinguem das outras pessoas que aprendem, portanto, de formas e em
tempos e ritmos também diferentes.
18 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Figura 7 - As pessoas são diferentes

Fonte: (CC) Freepik.

Para que o ato de aprender ocorra no âmbito fisiológico, são necessárias


algumas integridades básicas, como as funções psicodinâmicas (ativadas
ao internalizarmos as experiências que buscam a assimilação de forma
hierárquica), as funções do sistema nervoso periférico (responsáveis pelos
canais sensoriais da aprendizagem) e funções do sistema nervoso central
(armazenamento, elaboração e processamento). Porém, observaremos
melhor essas funções mais à frente, quando abordarmos os distúrbios e
transtornos de forma mais específica.

Nesse processo de aprender, primeiro ocorre o input, ou seja,


a recepção das informações pelos sentidos visual e auditivo em um
processo no qual a cognição é ativada a partir dessas informações. A
cognição é responsável pela memorização, densidade, simultaneidade
e sequência das informações e o output é a resposta devolvida, que é
responsável pelos processos motores, como desenhar, ler, escrever,
e resolver problemas. Outro processo importante é a retroalimentação,
responsável pela organização de todo o processo e que inclui tarefas
como a capacidade de repetição, o controle e realização das atividades.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 19

Figura 8 - O ciclo da aprendizagem

Fonte: Elaborado pela autora (2019).

Alguns elementos podem causar alterações na aprendizagem.


Como exemplo. temos os fatores orgânicos, o baixo peso ao nascer, as
más formações congênitas, a prematuridade, além do fator genético, que
é outro elemento que também altera a aprendizagem.

Enfim, de acordo com este pensamento, entendemos que a


aprendizagem de um sujeito não pode ser analisada como um fato
isolado, tampouco como incapacidade. Para a análise, é necessária
uma abordagem holística com a finalidade de se compreender como a
aprendizagem ocorre em cada um e como pode ser potencializada.
20 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Transtorno, Distúrbio e Dificuldade de


Aprendizagem
A expressão “dificuldade de aprendizagem” possibilita entender e
explicar por qual motivo o processo de aprendizagem de uma pessoa
não ocorreu devidamente. No entanto, existe um problema conceitual
anunciado no meio dessa questão, em que a dificuldade é confundida
com o distúrbio ou transtorno.
Figura 9 - Dificuldade de aprendizagem

Fonte: (CC)Freepik.

De uma forma simples e direta, Furtado (2008) busca elementos de


diferenciação:
Constata-se que o termo distúrbio está quase sempre
associado a disfunções e lesões neurológicas, que acabam
acarretando prejuízos e danos à aprendizagem. Já a
dificuldade de aprendizagem geralmente está relacionada
aos fatores metodológicos e internos do sujeito, como
aspectos emocionais e familiares (FURTADO, 2008, p. 15).

Uma pergunta central que deve ser feita antes de definir se um


determinado caso se trata de uma dificuldade, de um distúrbio ou de
um transtorno de aprendizagem é: “por que determinada pessoa não
aprende?”
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 21

Esse questionamento faz como que nos movamos em direção à


pesquisa. Precisamos, antes de tudo, observar e dialogar com os sujeitos
para que busquemos pistas sobre sua aprendizagem. A pesquisa faz parte
do cotidiano de quem trabalha com educação e aprendizagem.
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino.
Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro.
Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino
porque busco, porque indaguei, porque indago e me
indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho,
intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer
o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a
novidade (FREIRE, 1996, p. 32).

VOCÊ SABIA?
Paulo Freire foi um educador brasileiro de referência no
mundo todo. Seu principal questionamento diz respeito ao
posicionamento político da educação e seu papel na vida
dos alunos. Quando falava de posicionamento político,
não se referia à politicagem e sim à capacidade de fazer
escolhas, ou melhor, de se posicionar perante o mundo.
No livro “Pedagogia da Autonomia”, o educador aborda de
forma crítica os saberes necessários à prática educativa,
dentre eles o fato de que “ensinar exige pesquisa”.

Em alguns casos, não encontraremos respostas, teremos apenas


pistas que colaborarão para que encaminhamentos aos especialistas
sejam realizados. De qualquer forma, elementos de compreensão serão
incorporados e intervenções possíveis na aprendizagem, realizadas.
Porém, nem sempre intervenção significa medicação. Isso ocorre quando
as mudanças metodológicas por parte dos que ensinam conseguem
colaborar para que o aluno chegue ao objetivo proposto, superando as
dificuldades de aprendizagem.

A dificuldade de aprendizagem, etimologicamente falando, está


associada ao vocábulo “difficultatem” que significa não conseguir fazer
algo, um obstáculo, uma barreira que impede que os sujeitos realizem
e alcancem determinados objetivos. A barreira à qual os indivíduos em
déficit de aprendizado estão sujeitos precisa ser descoberta e revelada.
22 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Esta barreira ou obstáculo estaria associado às questões internas,


como fatores biológicos, ou às questões externas, como fatores sociais,
por exemplo. Obter a definição clara é de suma importância para saber
se se trata de uma dificuldade, de um distúrbio ou de um transtorno de
aprendizagem.
Figura 10 - Criança com dificuldade de se concentrar

Fonte: (CC)Freepik.

Os transtornos de aprendizagem vão além do padrão de dificuldade,


pois geralmente estão associados à capacidade cognitiva que é alterada
por algum distúrbio orgânico, sendo na maior parte das vezes de origem
neurológica.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 23

Características dos Distúrbios de


Aprendizagem
Reconhecendo o fato de que muitas crianças durante o período
escolar apresentam limitações em seu processo de aprendizagem,
podemos concluir que os fatores internos e externos podem estar
diretamente ligados a estas limitações.

Quando falamos de dificuldades de aprendizagem, estamos


nos referindo, exclusivamente, às implicações dos fatores externos.
No entanto, quando se trata de casos de distúrbios ou transtornos de
aprendizagem, os envolvimentos podem estar ligados à fatores internos,
principalmente de origem neurológica.

De modo geral, os distúrbios de aprendizagem alteram capacidades


mais específicas como o recebimento, o processamento, a análise e/ou
armazenamento de informações. Neste caso, por exemplo, é possível
relacionar os efeitos à linguagem ou até mesmo afetar a aprendizagem
de conhecimentos matemáticos.

De acordo com Furtado (2008), uma criança com distúrbio de


aprendizagem tem algumas características peculiares, tais como:

•• Uma discrepância manifestada entre o potencial intelectual


esperado e o nível real de realização da aprendizagem na escola.

•• Desordenamento básico do processo de aprendizagem,


manifestado em situações como o indivíduo não consegue
organizar fatos em sequência lógica.

•• Apresentação ou não de disfunção do sistema nervoso central,


que é responsável pela linguagem, estruturação do pensamento
etc.

•• Não apresentação de vestígios de debilidade mental, de privação


cultural, de perturbação emocional ou de privação sensorial (visual
ou auditiva).

•• Amostras de dificuldades de percepção, disparidades


comportamentais e problemas no processamento da informação.
24 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Furtado (2008), fazendo menção ao National Joint Committee of


Learning Disabilities resume o conceito de distúrbios de aprendizagem
com a seguinte afirmação:
Distúrbios de aprendizagem é um termo geral que se refere
a um grupo heterogêneo de desordens manifestadas
por dificuldades significativas na aquisição e utilização
da compreensão auditiva, da fala, da leitura, da escola e
do raciocínio matemático. Tais desordens, consideradas
intrínsecas ao indivíduo, presumindo-se que sejam
devidas a uma disfunção do sistema nervoso central,
podem ocorrer durante toda a vida. (FURTADO, 2008 p. 16)

Os distúrbios ou transtornos, por terem origens biológicas e/ou


fisiológicas, necessitam de uma avaliação de uma equipe multiprofissional
constituída por médicos, pedagogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos,
psicólogos, entre outros profissionais que juntos irão analisar as condições
de aprendizagem dos sujeitos.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 25

Processo de Inclusão e os Distúrbios de


Aprendizagem

OBJETIVO:

A inclusão de pessoas com distúrbios de aprendizagem é


um desafio para os educadores, para as instituições e para
os próprios sujeitos. Na verdade, todas aquelas pessoas
que são diferentes possuem o desafio de serem incluídas
na sociedade e em suas instituições de forma que o
acolhimento contemple suas necessidades..

A educação é um direito de todos e a nossa legislação atual afirma


que todos devem estar matriculados regularmente no fluxo de ensino. De
acordo com essa afirmação,
A política de educação inclusiva diz respeito à
responsabilidade dos governos e dos sistemas escolares
de cada país com a qualificação de todas as crianças
e jovens no que se refere aos conteúdos, conceitos,
valores e experiências materializados no processo
de ensino-aprendizagem, tendo como pressuposto o
reconhecimento das diferenças individuais de qualquer
origem. (GLAT, 2007, p. 16)

EXPLICANDO MELHOR:

Quando falamos de educação inclusiva, não podemos


limitar o discurso e a prática à educação especial, embora
o modelo de educação inclusiva também a englobe.
O processo de inclusão, em amplo sentido, simboliza
ações para que as pessoas acessem ensino adequado,
permaneçam em constante aprendizado e obtenham
sucesso escolar.
26 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Falar de inclusão compreende o fato de que as pessoas são


diferentes em diversos aspectos e que a escola deve criar estratégias
para que o ensino chegue a todos os indivíduos independentemente de
etnia, cor, gênero, dificuldade, cultura, ritmos de aprendizagem, entre
outros fatores.

Neste sentido, é necessário que haja respeito por parte das escolas
a todos os sujeitos, suas particularidades e seus respectivos contextos,
além de um olha sempre atento a cada uma destas singularidades
para que a proposta apresentada de ensinar a todos seja efetivamente
cumprida.

SAIBA MAIS:

Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos o acesso


à seguinte fonte de consulta e aprofundamento: Artigo:
“Repensando os distúrbios de aprendizagem a partir
da psicologia histórico-cultural” (TULESKI; EIDT, 2007),
acessível aqui.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 27

RESUMINDO:

E então? Gostou do que lhe mostramos? Agora, só para


termos certeza de que você realmente entendeu o tema
de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que
vimos. Você deve ter aprendido que a aprendizagem é
um processo inerente a todo ser humano, porém nem
todos têm as mesmas condições de realizá-lo. Por sermos
pessoas diferentes, aprendemos de formas diferentes e
em tempos diferentes e isto significa que o que aparenta
ser uma não aprendizagem pode estar relacionado aos
padrões estabelecidos de formas e tempos de ensinar.
Também aprendemos que dificuldade de aprendizagem
não é a mesma coisa que distúrbios e transtornos de
aprendizagem, e grande parcela da humanidade pode
estar sujeita a isso em algum momento, devido ao fato
de que estas dificuldades muitas vezes estão associadas
aos fatores externos. Já os distúrbios e transtornos de
aprendizagem estão ligados às questões biológicas, indo
além de dificuldades comuns e exigindo diagnósticos e
intervenções específicas de uma equipe multidisciplinar.
Compreendendo estas questões, entendemos que o
processo de inclusão de pessoas com dificuldades,
distúrbios e transtornos de aprendizagem é importante,
pois a aprendizagem é um dever intrínseco ao direito à
educação.
28 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

REFERÊNCIAS
CATÃO, V. Fazeres e saberes do dotidiano de classes oriundas das
distorções de fluxo escolar: refletindo sobre o fracasso escolar instituído.
Revista UNIABEU, v. 2, p. 57-65, 2009.. Disponível em: http://revista.
uniabeu.edu.br/index.php/RU/article/viewFile/72/125. Acesso 08 ago.
2019.

CIASCA, S. M. (org.). Distúrbios de aprendizagem: proposta de


avaliação interdisciplinar. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra,


1996.

FURTADO, V. Q. Dificuldades na aprendizagem da escrita: uma


intervenção psicopedagógica via jogos de regras. Petrópolis: Vozes, 2008.

GLAT, R. (org.). Educação inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio


de Janeiro: 7 Letras, 2007.

DOMINGUES, K.; ROSEK, M. (orgs.). As Dificuldades de


aprendizagem e o processo de escolarização. Porto Alegre: EIPUCRS,
2017.

SMITH, C.; STRICK, L. Dificuldades de aprendizagem de A a Z.


Porto Alegre: Artmed, 2001.

WEISS, M. L. L. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos


problemas de aprendizagem escolar. Rio de Janeiro: D.P & A. 1997.

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