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Psicologia da

Aprendizagem
Unidade 3
Desenvolvimento do Psiquismo Humano
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
RAQUEL ELISABETH DUMASZAK
AUTORIA
Raquel Elisabeth Dumaszak
Olá! Sou formada em Psicologia, na modalidade Bacharelado
e Licenciatura, e desde então atuo com a Psicologia, Educação e
Aprendizagem. Tenho interesse por assuntos que envolvem neurociências,
comportamento e cognição, temáticas que seguí na pós-graduação. Fui
convidada pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores
independentes e espero contribuir bastante com seu aprendizado teórico
e profissional! Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de se apresentar um
de uma nova novo conceito;
competência;
NOTA: IMPORTANTE:
quando necessária as observações
observações ou escritas tiveram que
complementações ser priorizadas para
para o seu você;
conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a
bibliográficas necessidade de
e links para chamar a atenção
aprofundamento do sobre algo a ser
seu conhecimento; refletido ou discutido
sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso acessar quando for preciso
um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das
assistir vídeos, ler últimas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando uma
atividade de competência for
autoaprendizagem concluída e questões
for aplicada; forem explicadas;
SUMÁRIO
O que é Psiquismo Humano.....................................................................10

Fatores que impactam o desenvolvimento do Psiquismo..........15

Aspectos Biológicos....................................................................................................................... 15

Aspectos Individuais, Sociais e Histórico-Culturais................................................ 21

Processos e Constituição do Psiquismo Humano.......................... 26

Atividade.................................................................................................................................................26

Identidade..............................................................................................................................................28

Pensamento e Linguagem do Desenvolvimento Humano ........31

Consciência.......................................................................................................................................... 31

Emoções.................................................................................................................................................33

Pensamento e Linguagem do Desenvolvimento Humano...............................35


Psicologia da Aprendizagem 7

03
UNIDADE
8 Psicologia da Aprendizagem

INTRODUÇÃO
No âmbito das Ciências Humanas, diversas linhas teóricas buscam
compreender fenômenos humanos, explicando-os de diferentes maneiras
(que podem ser complementares ou até contraditórias). Dessa forma, a
compreensão do Psiquismo Humano, fenômeno estudado nesta unidade,
pode ser obtida a partir da relevância que se dá aos seus diversos aspectos,
como os biológicos, individuais, sociais e histórico-culturais. Dependendo
da abordagem, alguns deles serão privilegiados. Além disso, para um
melhor domínio do assunto, é preciso conhecer e entender os processos
envolvidos em sua constituição. Primeiramente, para nos familiarizarmos
com o tema, precisamos compreender que as ideias de Psiquismo e sua
formação são bastante discutidas em ambientes que trabalham o coletivo
e o individual em uma relação dialética, ou seja, a influência de um sobre
o outro ininterruptamente. Em segundo lugar, devemos saber que esse
termo foi bastante discutido por Lev Semionovich Vygotsky e, por isso,
ele se aproxima também do ambiente escolar. Em terceiro lugar, mas não
menos importante, é imprescindível saber que essa teoria se banhou nas
águas teóricas e metodológicas marxistas soviéticas.

Com base nessas informações, será mais fácil pensar junto com
o autor, pois seu ambiente social influencia seu pensamento (lembre-
se do capítulo 1 quando falarmos a respeito do espírito intelectual da
época, também chamado de zeitgeist). Por último, queremos mencionar
dois importantes seguidores de Vygotsky, os quais serão vistos neste
capítulo: Alexis Leontiev (1903-1979), que foi um psicólogo soviético
marxista e autor do clássico O Desenvolvimento do Psiquismo (1978), e
Alexander Romanovich Luria (1902-1977). Leontiev conheceu seu futuro
companheiro de trabalho, Alexander Romanovich Luria, e ambos se
juntaram a Vygotsky e começaram a pesquisar a influência da cultura
no desenvolvimento humano. Por isso, sua linha de pesquisa recebeu
o nome de Psicologia histórico-cultural (ou sócio-histórica, para alguns)
(POLLON & PADILLA, 2017).
Psicologia da Aprendizagem 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vinda (o). Nosso propósito é auxiliar você no
desenvolvimento das seguintes objetivos de aprendizagem até o término
desta etapa de estudos:

1. Entender o que é o psiquismo humano, definindo seus principais


conceitos e associando suas definições à vida prática do ser
humano.

2. Identificar os fatores que impactam o desenvolvimento do


psiquismo.

3. Compreender os processos e a constituição do psiquismo humano.

4. Entender o pensamento e a linguagem do desenvolvimento


humano.

Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento?


Ao trabalho!
10 Psicologia da Aprendizagem

O que é Psiquismo Humano


Figura 1: Multidão de Pessoas, diferentes entre si

Fonte: Pixabay

Entendendo que a Psicologia é marcada por uma diversidade de


abordagens, áreas e objetos de estudo podem notar que não há um objeto
e método único, uma forma singular de compreender os fenômenos
por ela estudados. Durante a história humana, muitas propostas sobre
o psiquismo foram elaboradas. Sendo assim, para compreendermos o
conceito de psiquismo humano, é importante ressaltar que este é um
termo complexo, também influenciado por diversos paradigmas.

Existem diversas definições para essa expressão. Elas variam em


suas explicações sobre a concepção de psiquismo, seu processo e
aspectos que influenciam a sua formação, de acordo com a valoração
dada a elementos como aspectos biológicos, individuais, sociais e
histórico-culturais.

Algumas definições enfatizam os aspectos biológicos


como principais na explicação de manifestações humanas, como
comportamentos, consciência e aprendizagem. Quando se fala em
Psicologia da Aprendizagem 11

abordagens focadas nos aspectos biológicos, significa dizer que as


hipóteses dela sobre os fenômenos são, por exemplo, em termos de
maturação biológica, de características físicas, de predisposições ou
tendências a comportamentos inatos (não aprendidos). Outras podem
se apoiar mais em explicações de cunho social, fazendo referência à
função da interação social no processo de desenvolvimento humano, na
formação do indivíduo com suas características peculiares e assim por
diante. Vamos conhecer agora alguns exemplos dessas definições:

Alinhada aos pressupostos do ponto de vista biológico, esta


definição de psiquismo é apresentada no Dicionário Infopedia de Termos
Médicos: “um conjunto de características psicológicas de um indivíduo,
ou o conjunto de fenômenos psíquicos e processos da evolução mental
de um indivíduo” (DICIONÁRIO INFOPÉDIA, 2003). Aqui podemos
verificar a correlação apenas com aspectos biológicos e evolutivos do
desenvolvimento, e não os sociais ou históricos.

IMPORTANTE:

Ao falar de Psiquismo e, principalmente, seu estudo sob


o ponto de vista biológico, devemos nos atentar que
ele é o resultado da apropriação da realidade, e esta é
possível por meio de funções psicológicas elementares e
superiores. As funções elementares advêm dos órgãos dos
sentidos e, como independem de organização cognitiva,
estão presentes também nos outros animais. Já as funções
psicológicas superiores, objeto de estudo de Vygotsky,
são propriedade exclusiva do homem. É a partir delas que
o sujeito humano decodifica e se apropria da linguagem
intelectualizada, contribuindo, assim, para a formação de
seu psiquismo. O objetivo deste capítulo não é discutir o
desenvolvimento das funções psicológicas superiores, mas
sim discutir como cada componente do psiquismo compõe
uma relação dialética na construção do indivíduo.

Já os autores que defendem o ponto de vista histórico-cultural


compreendem o Psiquismo como “a totalidade dos processos psíquicos
superiores e do comportamento social que possibilitam ao homem
12 Psicologia da Aprendizagem

constituir a unidade que é sua psique” (SOUZA & ANDRADA, 2013).


Enquanto que autores que enxergam o indivíduo por meio da perspectiva
social, como Silvia Lane ou Ana Bock, consideram ainda que essa unidade
se expressa no modo peculiar de cada indivíduo ser no mundo – a
subjetividade (SILVA, 2009).

Silva (2009) acrescenta sobre subjetividade e Psiquismo


Geralmente, subjetividade é entendida como aquilo que
diz respeito ao indivíduo, ao psiquismo ou a sua formação,
ou seja, algo que é interno, numa relação dialética com a
objetividade, que se refere ao que é externo. É compreendida
como processo e resultado, algo que é amplo e que constitui
a singularidade de cada pessoa. A ideia de que a subjetividade
é algo, mas sem definir claramente o que vem a ser esse algo,
é bastante recorrente (n.p.).

Dessa forma, a subjetividade tem papel fundamental na constituição


da Identidade do indivíduo, conforme afirma Bock (2004) apud Silva (2009)
O fenômeno psicológico deve ser entendido como
construção no nível individual do mundo simbólico que
é social. O fenômeno deve ser visto como subjetividade,
concebida como algo que se constituiu na relação com
o mundo material e social, mundo este que só existe
pela atividade humana. Subjetividade e objetividade se
constituem uma à outra sem se confundirem (p. 6)

Nessa perspectiva, o Psiquismo tem origem no social e se


desenvolve ao longo do percurso da história da sociedade humana, de
acordo as relações sociais, históricas e culturais nela vigentes (SILVA,
2009; SOUZA & ANDRADA, 2013).

Cabe ressaltar a importância de não se debruçar sobre um único


ponto de vista, pois isso dificultaria uma compreensão mais ampla e
ponderada dos fatos. Ao estudarmos a constituição da Psique Humana,
temos diversas denominações, como por exemplo, Identidade ou
Personalidade, você já se perguntou qual é a denominação para estes
dois conceitos? Se não souber, ao final deste capítulo você terá uma ideia!
Psicologia da Aprendizagem 13

SAIBA MAIS:

Caso se Interesse pelo tema Identidade, Personalidade,


Subjetividade e Individualidade e queira pesquisar
mais, acesse: SILVA, Flávia Gonçalves da Subjetividade,
individualidade, personalidade e identidade: concepções
a partir da psicologia histórico-cultural. Psicol. educ., São
Paulo , n. 28, p. 169-195, jun. 2009 . Clique aqui para acessar.

Além das vertentes supracitadas, outros processos participam


da constituição do Psiquismo. A vertente Histórico-Cultural, por
exemplo, se propôs a estudar a origem e desenvolvimento do Psiquismo
buscando entender os processos envolvidos. Assim, apontou os
processos intelectuais, emoções, consciência, atividade, linguagem,
desenvolvimento humano e aprendizagem como elementos
participantes desse cenário.

Cada um destes processos intelectuais é estudado de maneira que


sua função seja compreendida como fundamental para a sobrevivência
do indivíduo, para isso, diversas perspectivas se propõem a essa tarefa,
como por exemplo, você já se perguntou o que é uma emoção? Qual
utilidade tem o sentimento de raiva? Ela é uma emoção ou sensação?
Indagações como essa são respondidas a luz de diferentes vertentes de
pesquisa.
Figura 2: Emoções

Fonte: Pixabay
14 Psicologia da Aprendizagem

ACESSE:

Para saber um pouco mais sobre as emoções acesse o


vídeo “O que são Emoções?” do canal do Youtube “Minutos
Psíquicos” clicando aqui. Espero que goste.

A partir dessa breve apresentação sobre as diferenças fundamentais


entre as principais concepções de psiquismo, podemos prosseguir para
um conhecimento mais aprofundado sobre os fatores centrais que
impactam a constituição do Psiquismo e os processos envolvidos em sua
formação.

ACESSE:

Para refletir sobre as ideias apresentadas acima, a partir de


um vídeo bem-humorado, mas que pode contribuir para
reflexões acerca do inato e do aprendido (já nascemos
sabendo algumas coisas ou elas foram aprendidas?).
Clique aqui, assista e reflita, você com certeza vai gostar.

Agora, prezado (a) aluno (a), observe a imagem abaixo e reflita: “Para
você, qual imagem define esse conceito?”.
Figura 3: Uma representação do Psiquismo: como seria?

Fonte: Pixabay
Psicologia da Aprendizagem 15

Fatores que impactam o desenvolvimento


do Psiquismo
Aspectos Biológicos
Como já vimos brevemente nesta unidade, os aspectos biológicos
são considerados por algumas abordagens da Psicologia como fatores
preponderantes na explicação do desenvolvimento psíquico.

A partir da evolução histórica da Psicologia, apresentada na Unidade


1, podemos notar que, à medida que ela se aproxima das diretrizes da
Ciência Experimental, vai se afastando da Filosofia antiga, ou seja,
quanto mais ela adota métodos científicos, baseados na objetividade,
na observação, na precisão, por exemplo, mais ela se torna distante das
teorias filosóficas e do estudo da mente. Assim, é possível identificar
que o surgimento da Psicologia está atrelado às ciências naturais e
ao experimentalismo e, por conseguinte, atribuiu ao psiquismo bases
biológicas.

Esse referencial propõe que os fenômenos biológicos têm mais


concretude que os demais. Sendo assim, as Ciências Humanas têm
um vínculo irrenunciável com as Ciências Biológicas, uma vez que
manifestações humanas como a consciência, conhecimento, pensamento,
linguagem, entre outras, estão ligadas a funções cerebrais e, por isso,
para essa abordagem, o Psiquismo é considerado “um conjunto de
características psicológicas de um indivíduo, ou o conjunto de fenômenos
psíquicos e processos da evolução mental de um indivíduo” (DICIONÁRIO
INFOPEDIA, 2003).

A definição de Psiquismo, ou seja, como ele é constituído no ser


humano, muda de acordo com a abordagem teórica. Nesse momento,
estamos falando sobre a teoria que se aproxima das ciências biológicas.

Com isso, podemos destacar algumas linhas teóricas que tiveram


um papel fundamental no estabelecimento da concepção biológica do
Psiquismo Humano, como o Behaviorismo, que teve seu surgimento
favorecido pela mudança no objeto de estudo da Psicologia Científica.
16 Psicologia da Aprendizagem

Como exemplo da relevância dada aos termos biológicos e da influência


da mudança de objeto de estudo da Psicologia Científica, podemos citar
o fato de que o Behaviorismo rejeitava a concepção de mente e priorizava
o estudo de aspectos puramente físicos e observáveis.

No capítulo 4, estudaremos melhor a teoria Behaviorista, e veremos


que, para os teóricos desta abordagem, não se pode estudar o que
não é palpável nem observável; por isso, essa abordagem analisa o
comportamento observável.

Outra importante abordagem que contribuiu para a difusão das


concepções biológicas foi a Psicanálise. Freud foi um médico neurologista
e, por isso, obviamente, a herança fisiológica estaria em suas obras e
teorias, sua teoria é metafisica, na qual interpreta-se o comportamento
do indivíduo utilizando como base três estruturas formadoras da Psique
humana: ID, EGO e SUPEREGO. Estas seriam alimentadas pelos processos
vividos conscientes, pré-conscientes e inconscientes, responsáveis pelas
ações e pulsões libidinais do indivíduo.

A teoria Psicanalítica é muito atual e empregada em várias áreas


do conhecimento científico, desde a clínica tradicional, até ambientes
organizacionais, educacionais e pesquisas embasadas na área cognitiva
e das neurociências.

ACESSE:

Caso você tenha interesse em aprofundar em alguns


desses temas, leia o artigo: RODRIGUES, Sidarta da Silva.
A atualidade do projeto freudiano de 1895. Trans. Form.
Psicol. (Online), São Paulo, v. 2, n. 2, p. 100-113, 2009.
Clique aqui para acessar.

Outras conceituações freudianas apresentam correlações com os


pressupostos biológicos, como os conceitos de Pulsão de Vida e Pulsão
de Morte, na medida em que atuam com base no princípio homeostático
(mantendo um equilíbrio entre o interno e o externo, entre o indivíduo e
o meio).
Psicologia da Aprendizagem 17

SAIBA MAIS:

O conceito de Pulsão não será estudado aqui, pois ele


se aprofunda na temática Psicanalítica. Caso você tenha
se interessado e queira aumentar seus conhecimentos a
esse respeito, assista ao vídeo “A pulsão – Glossário Freud
| Christian Dunker | Falando daquilo 10”, disponível no canal
do Youtube: Christian Dunker. Clique aqui para assistir.

A Epistemologia Genética também se alimentou das bases


biológicas. De acordo com CRUXEN (2002), “a área central dos estudos
Piagetianos seria o terreno das formações cognitivas”. Para Piaget in
CRUXEN, 2002:
“as estruturas do conhecimento tornam-se necessárias ao
cabo de um processo de desenvolvimento, sem o serem
desde o início e não comportam programação prévia. Nas
formações cognitivas a hereditariedade e a maturação se
limitam a determinar as zonas de impossibilidade ou de
possibilidade de aquisições. É esse o relevo das bases
biológicas do psíquico.” (p.58)

A teoria Piagetiana segue um raciocínio amparado na biologia para


explicar o desenvolvimento humano. Para esse autor, cada indivíduo evolui
cognitivamente de acordo com uma previsão maturacional biológica
para cada idade. Por exemplo, para uma criança de 3 anos é esperado
que ela já saiba andar e falar, mas ela ainda não tem estrutura cognitiva
para responder a questões um pouco mais complexas, como a divisão e
multiplicação, ou, ainda, explicar no que os pais trabalham.

Para Piaget, a resposta de um organismo ao meio depende de sua


estruturação cognitiva e de competências alcançadas pela evolução de
estágios de Desenvolvimento cognitivo. No entanto, apesar do amparo
da abordagem biológica, Piaget não a considera como única explicação
para os fenômenos psicológicos, tampouco privilegia as influências
ambientais. Entretanto, ele acreditava no impacto desses fatores sobre os
estágios cognitivos.

É contundente destacar que, assim como a Epistemologia


Genética, o Behaviorismo e a Psicanálise não mantiveram uma postura
18 Psicologia da Aprendizagem

rígida na adoção da vertente biológica do Psiquismo. Eles consideraram


esse ponto de vista como relevante para o esclarecimento dos conceitos
e explanações de suas teorias, contudo apreciaram outros aspectos
insidiosos.
Figura 4: Os Níveis do Desenvolvimento Humano

Fonte: Pixabay

Piaget definiu quatro períodos no processo evolutivo humano, que


são reconhecidos pelo nível máximo de desenvolvimento em cada faixa
etária ao longo do seu processo de crescimento. São eles:

• Período Sensoriomotor (0 a 2 anos):

Esse período vai desde o nascimento até os dois anos de idade,


o que o caracteriza como um momento de muitas mudanças, pois a
criança aprende a se equilibrar, sentar-se, andar, se alimentar- desde
a amamentação aos outros alimentos, e ainda se prepara para o
desenvolvimento da linguagem.

Conforme exemplifica Dias (2010).


Neste período a atividade cognitiva do sujeito é de
natureza sensorial e motora, tendo como característica a
ausência da função semiótica (inicialmente não representa
mentalmente os objetos). A ação ocorre diretamente sobre
Psicologia da Aprendizagem 19

os objetos, o que irá possibilitar a atividade cognitiva


futura. O período que finaliza este momento inicial já inicia
a capacidade de representação (p. 06).

Nessa fase, a criança age principalmente por meio de ações


reflexas e utiliza basicamente percepções sensoriais e esquemas motores
para a resolução de seus problemas. A criança não possui capacidade de
representar situações, nem possui noção de tempo passado e futuro. A
noção de tempo e causalidade é adquirida no decorrer do processo de
desenvolvimento, por meio do contato com outras pessoas.
Figura 5: Período Sensoriomotor (0 a 2 anos)

Foto: Freepik

• Período Pré-operatório (2 a 7 anos): Nessa fase se dá o


aparecimento da linguagem oral. A criança vai se tornando
capaz de utilizar esquemas que auxiliam na substituição de
ações, situações, pessoas e objetos por símbolos (palavras). O
pensamento predominante é o egocêntrico (no qual a própria
criança é tida como referência). Outras características dessa fase
são o animismo (atribuição de intenções e sentimentos a coisas e
animais) e a irreversibilidade (a criança identifica a possibilidade de
retornar mentalmente ao ponto de partida).
20 Psicologia da Aprendizagem

Figura 6: Período Pré-operatório (2 a 7 anos)

Fonte: Freepik

• Período Pré-operatório (7 a 11, 12 anos): Nesse período, o


egocentrismo é abandonado e a criança começa a estabelecer
correlações e coordenar pontos de vista diferentes e integrá-los
de modo lógico. A criança também passa a ser capaz de interiorizar
as ações, realizando mentalmente operações, e não somente
operações físicas (sem precisar medir fisicamente objetos para
saber qual é o maior).
Figura 7: Período Pré-operatório (7 a 11, 12 anos)

Fonte: Freepik
Psicologia da Aprendizagem 21

• Período das operações formais (12 anos em diante): Nesse


período, há uma ampliação das capacidades adquiridas no
anterior. Assim, ocorre o raciocínio sobre hipóteses, possibilidade
de compreensão de conceitos abstratos e realização de operações
mentais dentro de princípios da lógica formal. Esse período se
diferencia a infância porque aos 12 anos a criança já estabeleceu
um padrão de equilíbrio, ou seja, o raciocínio cognitivo que ela
levará durante sua vida.
Figura 8: Período das operações formais (12 anos em diante)

Fonte: Freepik

Aspectos Individuais, Sociais e Histórico-


Culturais
Apesar da importância dos pressupostos biológicos para o estudo
do Psiquismo, outros fatores, como os aspectos individuais, sociais e
histórico-culturais, solicitaram atenção por serem ativos em sua formação
e permitirem uma compreensão mais ampla e ponderada dos fatores
envolvidos.
22 Psicologia da Aprendizagem

Os aspectos individuais se referem às características pessoais,


peculiares, únicas e singulares que os indivíduos possuem. Essas
características formatam seu modo de existir e se relacionar com o
mundo. Assim, tais aspectos dizem respeito ao indivíduo e à formação
do Psiquismo. É, portanto, um fenômeno interno, que se relaciona
dialeticamente com a objetividade (com o externo).

Para Leontiev (1978), as características biológicas do indivíduo


(disposição física, emoções, funcionamento do sistema nervoso, emoções
e necessidades biológicas) vão se tornando singulares e permitindo a
diferenciação entre eles. Isso ocorre por meio da apropriação da realidade
e dos processos de objetivação e da apropriação.

Apesar das invariáveis controversas sobre a gênese dos elementos


individuais, há um entendimento preponderante entre autores como Vygotsky
(1995) apud Souza & Andrada (2013), que, ao se referir a aspectos peculiares
do indivíduo, considera a parcialidade das origens dos seus elementos
constitutivos, ou seja, o desenvolvimento do individual ocorre à medida que
ocorre a dialética entre o interno e o externo. Nesse intercâmbio com o meio,
o indivíduo se apropria das experiências, subjetivando-as e transformando-
as em uma maneira única e singular de existir.

Podemos entender, conforme Bock (2004) apud Silva (2009), que os


aspectos individuais são construções do mundo social individual.

Dessa forma, Vygotsky foi um importante autor nessa área, pois,


ao atribuir complexidade à formação do Psiquismo Humano, ampliou
os estudos, sugerindo novos caminhos. Assim, trouxe o elemento
histórico-social do desenvolvimento psicológico e introduziu a noção
de historicidade no Psiquismo Humano (fundamentada no materialismo
histórico-dialético proposto por Marx e Engels).

Vygotsky então indicou que, para se desenvolver, para formar


suas características individuais, primeiramente deve ocorrer à atividade
externa (o contato dialético do indivíduo com o ambiente), para posterior
apropriação cultural e internalizarão pela atividade individual. Sendo
assim, para que haja apropriação, é necessária a interação com outros
sujeitos possuidores do conhecimento a serem internalizados.
Psicologia da Aprendizagem 23

VOCÊ SABIA?

Você sabia que o conceito de internalizarão diz respeito à


imposição que a criança faz a si para assimilar a mesma
forma de comportamento e condutas sociais em princípio
impostas a ela por outras pessoas? Pois é, dessa forma, a
internalização de condutas culturais ocorre inicialmente no
âmbito externo e, ao ser reconstruído, ocorre internamente.

Com isso, Vygotsky (2008) também aponta a interação dialética


com o meio social como fonte responsável pelo desenvolvimento de
importantes funções psíquicas, própria dos seres humanos, como a
linguagem, a escrita, o cálculo, o desenho, a atenção voluntária, a memória
lógica e a formação de conceitos, as ações conscientes, o pensamento
abstrato, entre outras (chamadas de funções mentais superiores).

Então, podemos observar que, apesar de não desconsiderar os


aspectos biológicos, em sua teoria, Vygotsky enfatiza a interação contínua
dos aspectos sociais no desenvolvimento psicológico. Por isso, não se
pode falar em mudanças isoladas da personalidade, pois, sob o efeito
das multiplicidades de fatores, a mudança interna que ocorre altera sua
estrutura como um todo.

Assim, para o autor, tendo por base a importante correlação entre


desenvolvimento e aprendizagem, não se pode reduzir a compreensão
dos fenômenos a determinações de estágios de desenvolvimento.
Nesse caso, é imprescindível conhecer as relações que permeiam seus
processos. Para isso, Vygotsky dividiu em três zonas de desenvolvimento
os espaços de desenvolvimento e execução de atividades, diferenciadas
pelos níveis de necessidade de interferências e mediação. São elas:

1. Zona de desenvolvimento real: são as capacidades mentais


de solucionar problemas já alcançados pela criança. Nela, as
atividades são executadas sem o auxílio do outro.

2. Zona de desenvolvimento potencial: Capacidade da criança de


solucionar problemas com a ajuda do outro. O que faz hoje com
colaboração poderão realizar sozinhos amanhã.
24 Psicologia da Aprendizagem

3. Zona de desenvolvimento proximal: está entre a zona de


desenvolvimento real e a potencial. Refere-se às funções em
desenvolvimento.

Vygotsky (1998) apud Souza & Andrada (2013), em sua obra, apresenta
uma situação para exemplificar os conceitos delimitados: duas crianças
com idade mental de 8 anos (considera-se que elas estão no mesmo nível
real de desenvolvimento, em relação ao que conseguem fazer sozinhas,
sem ajuda). Entretanto, há diferenças entre elas: uma conseguia, sem
ajuda, resolver problemas correspondentes à idade mental de 9 anos,
enquanto a outra realizava, sozinha, atividades características da idade
mental de 12 anos. Essa divergência entre a idade mental (exemplo de
desenvolvimento real) e o nível que a criança alcança ao resolver tarefas
com colaboração (exemplo de desenvolvimento potencial) é o que o
autor denomina Zona de desenvolvimento proximal.
Figura 9: Mapa mental sobre as Zonas de desenvolvimento Vygotskyanas

Zona de desenvolvimento
proximal

Zona de Zona de
desenvolvimento Distancia entre desenvolvimento
real potencial

Se resolve o Se resolve o
problema de forma problema com
individual ajuda

Fonte: Elaborado pela autora

Assim, podemos perceber que Vygotsky rejeita explicações


deterministas e naturalizantes sobre o desenvolvimento humano. Seu
Psicologia da Aprendizagem 25

legado privilegia a apropriação da cultura como fator potencializador


do desenvolvimento psicológicos dos indivíduos (Pasqualini, 2006 apud
Campos, 2015).

Para Vygotsky, os pensamentos superiores são assim considerados por


se distinguirem das ações reflexas (processos psicológicos elementares); por
exemplo, a sucção do seio da mãe pelo bebê; as associações simples, como
evitar o contato da mão com o fogo; e as reações automatizadas, como virar a
cabeça em direção a um ruído repentino.
Figura 10: Aprendizagem em diferentes culturas – a visão histórico-cultural Vygotskyana

Fonte: Wikicommons
26 Psicologia da Aprendizagem

Processos e Constituição do Psiquismo


Humano
Conforme Libâneo & Freitas (2009), entre os anos de 1924 e 1934,
Vygotsky iniciou uma pesquisa com a colaboração de psicólogos e
pedagogos, entre eles A. N. Leontiev e A. R. Luria. Tal pesquisa embasou
teoricamente a Psicologia histórico-cultural quanto às formulações
sobre origem e desenvolvimento do psiquismo, processos intelectuais,
emoções, consciência, atividade, linguagem, desenvolvimento humano,
aprendizagem.

Nos tópicos abaixo, abordaremos individualmente alguns desses


elementos, pois são conceitos importantes para a compressão do tema
em estudo.

Atividade

VOCÊ SABIA?

Você sabia que Libâneo & Freitas (2009), em seus estudos,


informaram que o conceito de atividade para a concepção
histórico-cultural é elementar, pois é fundamental para que
se possa explicar o processo de mediação? Para eles, é a
atividade que promove a relação entre o homem e a realidade
objetiva. Dessa forma, o homem não apenas responde
automaticamente aos estímulos, mas reage ativamente,
atuando e transformando tanto o meio quanto a si.

Leontiev (1903-1979), a partir das ideias da teoria histórico-cultural


da atividade, também a investigou buscando demonstrar que a atividade
psíquica humana, como forma singular de atividade humana, expressa
elementos do desenvolvimento psíquico.

As concepções marxistas também contribuíram para o


entendimento da atividade, ao sugerir duas premissas: a primeira denota
que a natureza humana da atividade, ao afirmar que a atividade representa
a ação humana, promove a relação entre o homem (ativo) e o meio; a
Psicologia da Aprendizagem 27

segunda informa que o desenvolvimento das atividades psíquicas, como


processos psicológicos superiores, acontece a partir das relações sociais,
do contexto cultural.

Nesse sentido, entre 1930 e 1940, Leontiev estudou a relação entre


a atividade humana e os processos internos da mente. Ele entendeu que
as atividades só se concretizam por meio de ações, operações e tarefas se
instigadas por necessidades e motivações. Assim, a atividade humana se
materializa por meio de ações correspondentes: as atividades didáticas,
por meio das ações de aprendizagem; as atividades físicas, por meio de
exercícios físicos, entre outros exemplos.

Em suma, a atividade humana acontece e se materializa com uma


ação humana, ativa e devidamente motivada por uma necessidade.
Ela transforma reciprocamente o homem e o social, à medida que eles
interagem. Esses eventos, além de permitirem a visualização de elementos
do desenvolvimento psíquico, podem promover o desenvolvimento dos
processos psicológicos superiores.
Figura 11: Atividade Psíquica e aprendizado

Fonte: Pixabay
28 Psicologia da Aprendizagem

Figura 12: Desenvolvimento humano na perspectiva sócia histórica

Fonte: Freepik

Identidade
Segundo Silva (2009), os termos subjetividade, individualidade,
personalidade e identidade são, na Psicologia, utilizadas com frequência
para fazer menção ao seu objeto de estudo, referindo-se a seus processos
ou resultados ou atuando sobre o entendimento desse objeto. Autores
brasileiros vinculados ao pressuposto histórico-cultural utilizam, por
vezes, os referidos termos como sinônimos ou dão prioridade a algum
em detrimento de outro, por considerarem que um deles retrataria melhor
as peculiaridades do assunto.

Assim:
“na Psicologia histórico-cultural (para alguns a Psicologia
sócio histórica), que tem em seus fundamentos teórico-
metodológicos as produções de Vygotsky, Leontiev,
Luria e outros autores soviéticos, o objeto de estudo é
a consciência, mas, para compreendê-la, é necessário
considerar os processos que a constituem e fazem com
que seja constituída. Entre estes estão a subjetividade, a
individualidade, a personalidade e a identidade (SILVA,
2009, n.p.)”.
Psicologia da Aprendizagem 29

Com isso, alguns conceitos que diferenciam esses termos são


apresentados no estudo dessa autora. No entanto, mesmo sabendo que
todos são termos que participam da constituição e compreensão da
consciente e, apesar da proximidade entre os termos, nos restringiremos
a adentrar somente o conceito de identidade.

O conceito de identidade é um termo complexo estudado por


diversas abordagens das Ciências Humanas, como a Psicologia, a Sociologia
e a Antropologia. Para Stuart Hall (2011), existem três tipos de identidades
categorizadas de acordo com o período histórico: identidade do sujeito
iluminista (identidade como um núcleo interno do homem; esse núcleo é
imutável ao longo da vida); identidade do sujeito sociológico da idade moderna
(existe um núcleo, mas ele é modificado no contato social); e identidade do
sujeito pós-moderno da atualidade (para esse período, a identidade é vista
como fragmentada, havendo várias identidades). Ele também menciona as
identidades culturais como sendo “aqueles aspectos de nossas identidades
que surgem de nosso ‘pertencimento’ a culturas étnicas, raciais, linguísticas,
religiosas e, acima de tudo, nacionais”. (HALL, 2011, p.8)

Dessa forma, como você já pode imaginar, não há um consenso


sobre o tema. Entretanto, seguiremos com o objetivo de abordar a
identidade e suas influências sobre o Psiquismo Humano a partir de um
olhar mais amplo.

Nesse sentido, podemos então destacar Silvia Lane e Antonio


da Costa Ciampa, que, na década de 1980, realizaram pesquisas em
Psicologia Social, amparados teoricamente nos estudos de Vygotsky e
Leontiev. Esses autores desenvolveram seus trabalhos posicionando-
se criticamente em relação à psicologia burguesa, que entendia a
identidade (referida pelo termo personalidade) como algo individual,
que, mesmo com interferências externas, originava-se do indivíduo.
Assim, abandonaram o termo personalidade, preferindo utilizar o termo
identidade, por entenderem que este trata a constituição do eu de forma
crítica, multifatorial e dinâmica (SILVA, 2009).

Para Ciampa 1987 apud Faria & Souza (2011), identidade é como
metamorfose. Ela está sujeita a transformações constantes e pode,
assim, ser entendida como uma consequência temporária da relação
30 Psicologia da Aprendizagem

entre fatores como a história de vida do indivíduo, seus projetos e seu


contexto histórico e social. Ou seja, sugere que a identidade é dada a cada
diferente momento (possuímos várias identidades visíveis nos diferentes
papéis que exercemos), não sendo algo pronto, atemporal e imutável. Ela
está em um contínuo processo.

Ainda segundo o autor: “[...] identidade é o reconhecimento de que é


o próprio de quem se trata; é aquilo que prova ser uma pessoa determinada,
e não outra”. (CIAMPA, 2007 apud WONSOSKI & DOMINGUES, 2015). Para
ele, ela se estabelece na relação entre diferença e igualdade, posto que
alguns elementos nos aproximam e nos diferenciam uns dos outros (como
o nome, que nos diferencia, e o sobrenome, que nos traz uma relação de
parentesco).

Para entender a dinâmica e o processo de formação da identidade,


Ciampa utilizou o método da narrativa, e empregou também as categorias
atividade (entendida como ação, trabalho) e consciência para alcançar
o conhecimento sobre os conteúdos que participam da formação da
identidade. Assim, o indivíduo narrava os fatos sobre si, sobre sua história e,
com base nesse relato permeado pela consciência, era possível observar
e conhecer o processo de individualização do sujeito na atividade humana
atuando sobre a formação da identidade.
Figura 13: O que é Identidade?

Fonte: Freepik
Psicologia da Aprendizagem 31

Pensamento e Linguagem do
Desenvolvimento Humano
Consciência
Meu caro (a), para compreender o conceito de consciência como
componente formador do Psiquismo, é preciso primeiramente saber que,
para os teóricos sócios históricos, a composição dela se deve à dinâmica
dialética entre o meio social e a criança (LORDELO, 2007 apud CASTRO
& ALVES, 2012).

Termo criado por Karl Marx e Friedrich Engels para compreender


os fenômenos sociais que aconteciam em seu país. Essa concepção
filosófica defendia que o ambiente, o organismo e os fenômenos físicos
tanto modelam animais irracionais e racionais, sua sociedade e cultura
quanto são modelados por eles, ou seja, que a matéria está em uma
relação dialética com o psicológico e o social.

A consciência trabalha com signos formadores da linguagem,


conforme afirmam Saviani (2013) apud Pollon & Padilla (2017):
“a consciência é resultante do desenvolvimento da
linguagem e, portanto, do emprego dos signos, ou seja, um
lastro social e simbólico que, desvinculado do processo
evolutivo biológico, demarcou o desenvolvimento
socialmente histórico do ser humano.” (POLLON &
PADILLA, 2013, p. 86).

Signo é a linguagem propriamente dita, que pode ser expressa


por palavras, sinais, sons etc... Esse signo produz um significante, que é o
elemento perceptível na linguagem, o produto dela, enquanto o conceito
da linguagem é chamado de significado. Vejamos um exemplo: Alguém
fala, escreve, interpreta em libras a palavra “Cachorro” – o que foi visto e
decodificado por você é o significante, e o que você tem como conceito
de cachorro é o significado.
32 Psicologia da Aprendizagem

Figura 14: Signos

Fonte: Freepik

REFLITA:

Agora, convido você, leitor, a fazer uma breve reflexão. “Você


acredita que todos têm o mesmo conceito de cachorro”?
Como é essa relação entre o individual e biológico, no
sentido de consciência, linguagem, sensação, percepção
e meio social? Os cachorros com que uma pessoa interage
estão sempre soltos, enquanto outros só saem à noite: isso
exerce alguma influência? Agora vamos um pouco mais
além: transfira essa reflexão para a sala de aula. Como você
enxerga a relação dialética entre indivíduos e escola?

Para fortalecermos a discussão a respeito de consciência, vejamos


a interpretação de Aita & Tuleski, 2017.
“A consciência possui uma natureza social, e se
desenvolve pela maneira como o indivíduo se apropria da
objetividade da realidade. Ao apreender os significados
sociais, o indivíduo pode dar a eles um significado pessoal
relacionado com suas experiências particulares, com as
suas necessidades, seus motivos e sentimentos, ou seja,
com a sua própria vida” (AITA & TULESKI, 2017, p. 101).
Psicologia da Aprendizagem 33

Ou seja, a linguagem compartilhada provoca um efeito em quem


ouve, mas também em que fala. Esse efeito não é só ouvir e decodificar,
mas sim coordenar comportamentos, sensações e a consciência do outro
e de si mesmo. Por isso, o estudo de classes sociais, relação social, dentre
outras variáveis culturais, é essencial (CASTRO & ALVES, 2012). Para os
autores histórico-culturais, o processo de construção da linguagem deve
ser estudado em meio ao social, pois este, com seu meio de produção e
seu produto material, influencia diretamente a relação do indivíduo com
o material, refletindo a concepção do psiquismo. Essa relação, por sua
vez, não é imutável, tendendo a se modificar à medida que o indivíduo
atribui novos sentidos ao que foi apropriado por ele da realidade (AITA &
TULESKI, 2017).

Emoções
Podemos dizer que o indivíduo tem acesso às emoções pelos
neurônios sensoriais, presentes nos órgãos dos sentidos, e pelos neurônios
presentes na região cerebral que decodifica os sinais. A sensação do
estímulo é biológica, mas a interpretação (percepção) dela é subjetiva, esse
é um exemplo básico de como os mecanismos biológicos influenciam os
processos cognitivos e, como vimos anteriormente, influenciam também a
consciência, a linguagem e a subjetividade (Magiolino, 2014).

Ao estudar o conceito de Psiquismo Humano em Vygotsky, unimos


sensação com subjetividade humana, e vemos que o contexto social
pode influenciar na maneira como elaboramos as sensações, ou seja, a
sensação de quebrar um dedo é assimilada mundialmente da mesma
maneira, pelos neurônios nociceptivos, mas a percepção dessa dor pode
sim, se modificar de acordo com a cultura do povo, para alguns a dor pode
ser algo mais significativo. Essas interpretações são parte da constituição
da subjetividade humana. Como exemplifica Magiolino:
“Para compreender o modo como às emoções significam
nas relações sociais e no processo dramático de
constituição do sujeito, é necessário compreender essa
intrincada relação da emoção com as demais funções
psicológicas na consciência que, emerge na/pelas
relações sociais. Isso nos leva a indagar sobre as posições
34 Psicologia da Aprendizagem

sociais ocupadas pelos sujeitos e pelos sujeitos que se


emocionam na dinâmica das interações.” (MAGIOLINO,
2014, p. 51).

Ainda sobre as emoções, podemos dizer que elas fazem parte


das funções psicológicas superiores, não somente para garantir a
sobrevivência da espécie, mas também para organizar a vida de cada
indivíduo em seu meio. Um exemplo disso é o indivíduo preocupado
com uma iminente chuva. A preocupação (ansiedade) só é possível
se ele tiver memória, pois se lembrará de algum evento traumático
vivenciado anteriormente. O homem se diferencia dos demais animais
por essa capacidade, “o planejamento das ações futuras”, o que resultou
em nossa evolução. As emoções por sua vez diferem o indivíduo entre
si, pois cada ser interpreta diferentemente um evento, isso proporciona a
individualidade/subjetividade e, ao mesmo tempo, modifica o ambiente.

As funções psicológicas superiores são: atenção, memória,


imaginação, pensamento e linguagem.
Figura 15: Emoções e catarse no Teatro

Fonte: Freepik
Psicologia da Aprendizagem 35

É importante pensar que emoção é diferente de sentimento, pois


a emoção se deve a um processo inconsciente, involuntário. Como nos
traz Garcia:
“As emoções são caracterizadas pelas vivências afetivas
mais simples, que estão relacionadas à satisfação e à
insatisfação das necessidades orgânicas, tais como as
sexuais, de alimento, de saciar a sede, de defender-se
dos perigos diários e tantas outras. Também pertencem
ao grupo das emoções as reações afetivas relacionadas
às sensações, as quais exercem grande influência na vida
do indivíduo, uma vez que são provocadas pelos objetos e
fenômenos da realidade.” (GARCIA, 2005).

Ainda, para a mesma autora, os sentimentos, dotados de processo


cognitivo, são parte construtiva do Psiquismo Humano.
“Os sentimentos são diferentes das emoções, pois estão
relacionados às necessidades que vão sendo criadas no
processo de desenvolvimento da sociedade; dependem
das condições de vida, especialmente das necessidades
dos homens de se relacionarem entre si. São inseparáveis
das necessidades culturais. Fundamentadas na Teoria
Histórico-Cultural, sabe-se que não existe atividade
cognitiva desprovida de sentimentos ou reações
emocionais.” (GARCIA, 2005).

Pensamento e Linguagem do
Desenvolvimento Humano
O pensamento e a linguagem estão diretamente relacionados
ao desenvolvimento humano, pois o desenvolvimento é o produto das
atividades mentais superiores, as quais estão envolvidas no processo de
aquisição, retenção e uso do conhecimento, por meio do pensamento e
linguagem. Juntos, eles compõem a cognição.

Cognição é a capacidade de processar informações e transformá-


las em conhecimento.
36 Psicologia da Aprendizagem

Figura 16: Pensamento/Cognição

Fonte: Freepik

Enquanto para Vygotsky a linguagem e o pensamento são fruto da


interação sociocultural do indivíduo, para Piaget a Inteligência é:
“a solução de um problema novo, é a coordenação dos
meios para atingir um certo fim, que não é acessível de
maneira imediata; enquanto o pensamento é a inteligência
interiorizada e se apoiando não mais sobre a ação direta,
mas sobre um simbolismo, sobre a evocação simbólica
pela linguagem, pelas imagens mentais, etc...” (PIAGET,
1987, n.p.).

A teoria genética de Piaget defende um sistema de operações


interiorizadas e simbólicas que, posteriormente, serão convertidas
em pensamento. As ações desenvolvidas pela criança até então serão
atividades de autoconhecimento e de exploração do ambiente, as quais a
farão superar as fases iniciais do desenvolvimento.
Psicologia da Aprendizagem 37

REFLITA:

Acerca do que foi discutido até o momento, trazemos a


você, futuro pedagogo, as seguintes indagações: Você
consegue explicar o que é pensar? O que é pensamento?
Quando adquirimos a capacidade de pensar? O que é
linguagem? Como a linguagem influencia o pensamento?
Qual a relação entre memória, pensamento e linguagem?

Para responder a algumas das indagações acima, poderíamos


recorrer às fases do desenvolvimento infantil, quando a criança começa
a desenvolver seu pensamento abstrato e, assim, pode solucionar
problemas. Então, se pensar é a capacidade de solucionar um problema
por meio de um pensamento abstrato, como seria esse processo
cognitivo?

Podemos então dizer que, para resolver um novo problema, é


necessário o uso das capacidades cognitivas. A cognição se refere
às atividades mentais envolvidas na aquisição, retenção e no uso do
conhecimento, que são: a Percepção, a Aprendizagem e a Memória
(PINTO, 2011).

Dizer também que “Pensar” inclui duas representações mentais


conscientes a fim de produzir inferências e conclusões. São elas: Imagens
Mentais e Conceitos. As imagens mentais são a representação mental
de objetos ou eventos passados, e os conceitos são os agrupamentos de
ideias a respeito de um objeto (HOCKENBURRY, 2001). Nessa categoria, é
possível compreendermos a relação entre o meio e o indivíduo, pois, para
os autores sócio históricos, ela interfere na formação de conceitos.
38 Psicologia da Aprendizagem

Figura 17: Pensamento e Linguagem

Fonte: Freepik

REFLITA:

Para finalizar essa unidade com um tema tão amplo,


gostaríamos de chamar atenção a temas atuais e que, por
estarem presentes no meio social, moldam a nossa psique.
São eles: gênero, tecnologias, bullying. E você? Consegue
identificar algum?

Agora imagine uma pessoa que tenha vivido fora do ambiente


social. Como você acha que seria o desenvolvimento de sua linguagem e
pensamento? Reflita sobre a questão da estimulação e, após isso, assista
ao filme: A Maçã – 1999, dirigido por Samira Makhmalbaf. É uma excelente
história, vencedora do prêmio Troféu Sutherland, sobre duas crianças
privadas do convívio social. Conheça essa história e compare com as fases
de desenvolvimento Piagetianas e com a questão Vygotskiana acerca da
relação entre meio social e desenvolvimento.

Então, até agora está tudo entendido, só temos mais uma unidade
para finalizar a disciplina.

Chegamos a mais um passo de nossa linga trilha de aprendizado,


espero que cada momento de reflexão, colabore com o seu crescimento
para ser um profissional de excelência.

Nos encontraremos em breve.


Psicologia da Aprendizagem 39

REFERÊNCIAS
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