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Psicologia da

Aprendizagem
Desenvolvimento do Psiquismo Humano
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
ALESSANDRA VANESSA FERREIRA DOS SANTOS
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
RAQUEL ELISABETH DUMASZAK
AUTORIA
Raquel Elisabeth Dumaszak
Sou formada em Psicologia, na modalidade Bacharelado e
Licenciatura, e desde então atuo com a Psicologia, Educação e
Aprendizagem. Tenho interesse por assuntos que envolvem neurociências,
comportamento e cognição, temáticas que segui na pós-graduação. Fui
convidada pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores
independentes e espero contribuir bastante com seu aprendizado teórico
e profissional!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do
desenvolvimento houver necessidade
de uma nova de apresentar um
competência; novo conceito;
NOTA: IMPORTANTE:
quando necessárias as observações
observações ou escritas tiveram que
complementações ser priorizadas para
para o seu você;
conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a
bibliográficas necessidade de
e links para chamar a atenção
aprofundamento do sobre algo a ser
seu conhecimento; refletido ou discutido;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso acessar quando for preciso
um ou mais sites fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das
assistir vídeos, ler últimas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando uma
atividade de competência for
autoaprendizagem concluída e questões
for aplicada; forem explicadas;
SUMÁRIO
O que é psiquismo humano?................................................................... 12
Fatores que impactam o desenvolvimento do psiquismo.......... 18
Aspectos biológicos....................................................................................................................... 18

Aspectos individuais, sociais e histórico-culturais..................................................26

Processos e Constituição do Psiquismo Humano.......................... 31


Atividade................................................................................................................................................. 31

Identidade..............................................................................................................................................33

Pensamento e linguagem do desenvolvimento humano...........38


Consciência......................................................................................................................................... 38

Emoções................................................................................................................................................. 41

Pensamento e linguagem do desenvolvimento humano..................................43


Psicologia da Aprendizagem 9

03
UNIDADE
10 Psicologia da Aprendizagem

INTRODUÇÃO
No âmbito das Ciências Humanas, diversas linhas teóricas buscam
compreender fenômenos humanos, explicando-os de diferentes formas,
que podem ser complementares ou contraditórias. Dessa forma, a
compreensão do psiquismo humano pode ser obtida a partir da relevância
que se dá aos seus diversos aspectos – biológicos, individuais, sociais
e histórico-culturais. A depender da abordagem, alguns deles serão
privilegiados. Além disso, para um melhor domínio do assunto, é preciso
entender os processos envolvidos em sua constituição.

Primeiramente, para nos familiarizarmos com o tema, precisamos


compreender que as ideias de psiquismo e sua formação são muito
discutidas em ambientes que trabalham o coletivo e o individual
em uma relação dialética, ou seja, a influência de um sobre o outro
ininterruptamente. Em segundo lugar, devemos saber que esse termo foi
muito discutido por Lev Semionovich Vygotsky e, por isso, aproxima-se
também do ambiente escolar. Em terceiro lugar, é imprescindível saber
que essa teoria foi influenciada por teorias e metodologias marxistas
soviéticas.

Com base nessas informações, será mais fácil pensar junto


com o autor, pois seu ambiente social influencia seu pensamento. Por
último, faz-se necessário mencionar dois importantes seguidores de
Vygotsky: Alexis Leontiev (1903-1979), psicólogo soviético marxista e
autor do clássico O desenvolvimento do psiquismo (1978); e Alexander
Romanovich Luria (1902-1977). Leontiev e Alexander Romanovich Luria
juntaram-se a Vygotsky e começaram a pesquisar a influência da cultura
no desenvolvimento humano. Por isso, sua linha de pesquisa recebeu
o nome de Psicologia Histórico-cultural, ou sócio-histórica (POLLON;
PADILLA, 2017).
Psicologia da Aprendizagem 11

OBJETIVOS
Que você seja muito bem-vindo à Unidade 3 – Desenvolvimento
do psiquismo humano. Nosso objetivo é auxiliar você no atingimento
dos seguintes objetivos de aprendizagem até o término desta etapa de
estudos:

1. Entender o que é o psiquismo humano, definir seus principais


conceitos e associar suas definições à vida prática do ser humano.

2. Identificar os fatores que impactam o desenvolvimento do


psiquismo.

3. Compreender os processos e a constituição do psiquismo humano.

4. Entender o pensamento e a linguagem do desenvolvimento


humano.

Então, preparado para uma viagem rumo ao conhecimento? Vamos


lá!
12 Psicologia da Aprendizagem

O que é psiquismo humano?


OBJETIVO:

Neste capítulo, vamos entender o que é o psiquismo


humano, definir seus principais conceitos e associar suas
definições à vida prática do ser humano. E então, preparado?
Vamos lá!

Figura 1 – Multidão de pessoas diferentes entre si

Fonte: Pixabay.

A Psicologia é marcada por uma diversidade de abordagens, não


há um objeto e método único, o que a torna singular na compreensão
dos fenômenos estudados. Durante a história humana, muitas propostas
sobre o psiquismo foram elaboradas. Assim, para compreendermos o
conceito de psiquismo humano, é importante ressaltar que este é um
conceito complexo, também influenciado por diversos paradigmas.

Existem várias definições para essa expressão. Elas variam em suas


explicações sobre a concepção de psiquismo, seu processo e aspectos
que influenciam a sua formação, de acordo com a valoração dada a
Psicologia da Aprendizagem 13

elementos como aspectos biológicos, individuais, sociais e histórico-


culturais.

Algumas definições enfatizam os aspectos biológicos


como principais na explicação de manifestações humanas, como
comportamentos, consciência e aprendizagem. Quando falamos em
abordagens focadas nos aspectos biológicos, dizemos que as hipóteses
dela sobre os fenômenos são, por exemplo, em termos de maturação
biológica, de características físicas, de predisposições ou tendências a
comportamentos inatos (não aprendidos). Outras podem apoiar-se em
explicações de cunho social, fazendo referência à função da interação
social no processo de desenvolvimento humano, na formação do
indivíduo com suas características peculiares e assim por diante. Vamos,
agora, conhecer alguns exemplos dessas definições.

Em relação aos pressupostos do ponto de vista biológico, psiquismo


“é o conjunto de características psicológicas de um indivíduo, ou o
conjunto de fenômenos psíquicos e processos da evolução mental de um
indivíduo” (INFOPÉDIA, 2003, on-line).

IMPORTANTE:

Ao falar de psiquismo e, principalmente, seu estudo sob o


ponto de vista biológico, devemos nos atentar que ele é o
resultado da apropriação da realidade, e esta é possível por
meio de funções psicológicas elementares e superiores.
As funções elementares advêm dos órgãos dos sentidos
e, como independem de organização cognitiva, estão
presentes também nos outros animais. Já as funções
psicológicas superiores, objeto de estudo de Vygotsky,
são propriedade exclusiva do homem. É a partir delas que
o sujeito humano decodifica e se apropria da linguagem
intelectualizada, contribuindo, assim, para a formação de
seu psiquismo. O objetivo deste capítulo não é discutir o
desenvolvimento das funções psicológicas superiores, e
sim como cada componente do psiquismo compõe uma
relação dialética na construção do indivíduo.
14 Psicologia da Aprendizagem

Já autores que defendem o ponto de vista histórico-cultural


compreendem o psiquismo como “a totalidade dos processos psíquicos
superiores e do comportamento social que possibilitam ao homem
constituir a unidade que é sua psique” (SOUZA; ANDRADA, 2013).
Estudiosos como Silvia Lane e Ana Bock enxergam o indivíduo por meio
da perspectiva social e consideram ainda que essa unidade se expressa
no modo peculiar de cada indivíduo ser no mundo – a subjetividade
(SILVA, 2009).

Sobre subjetividade e psiquismo, Silva (2009, p. 170) acrescenta:


Geralmente, subjetividade é entendida como aquilo que
diz respeito ao indivíduo, ao psiquismo ou a sua formação,
ou seja, algo que é interno, numa relação dialética
com a objetividade, que se refere ao que é externo. É
compreendida como processo e resultado, algo que é
amplo e que constitui a singularidade de cada pessoa.
A ideia de que a subjetividade é algo, mas sem definir
claramente o que vem a ser esse algo, é muito recorrente.

Dessa forma, a subjetividade tem papel fundamental na constituição


da identidade do indivíduo, conforme afirma Bock (2004, p. 6 apud SILVA,
2009, p. 170):
O fenômeno psicológico deve ser entendido como
construção no nível individual do mundo simbólico que
é social. O fenômeno deve ser visto como subjetividade,
concebida como algo que se constituiu na relação com
o mundo material e social, mundo este que só existe
pela atividade humana. Subjetividade e objetividade se
constituem uma à outra sem se confundirem.

Nessa perspectiva, o psiquismo tem origem no social e desenvolve-


se ao longo do percurso da história da sociedade humana de acordo as
relações sociais, históricas e culturais nela vigentes (SILVA, 2009; SOUZA;
ANDRADA, 2013).
Psicologia da Aprendizagem 15

IMPORTANTE:

Cabe ressaltar a importância de não se debruçar sobre


um único ponto de vista, pois isso dificultaria uma
compreensão mais ampla e ponderada dos fatos. Ao
estudarmos a constituição da psique humana, temos
diversas denominações, como, por exemplo, identidade ou
personalidade.

SAIBA MAIS:

Para saber mais sobre identidade, personalidade,


subjetividade e individualidade, leia o artigo Subjetividade,
individualidade, personalidade e identidade: concepções a
partir da Psicologia Histórico-cultural, de Flávia Gonçalves
da Silva. Acesse clicando aqui.

Além das vertentes supracitadas, outros processos participam da


constituição do psiquismo. A vertente histórico-cultural, por exemplo,
estuda a origem e o desenvolvimento do psiquismo, a fim de entender
os processos envolvidos. Assim sendo, aponta os processos intelectuais –
emoções, consciência, atividade, linguagem, desenvolvimento humano e
aprendizagem – como elementos participantes desse cenário.

REFLITA:

Cada um desses processos intelectuais é estudado


de maneira que sua função seja compreendida como
fundamental para a sobrevivência do indivíduo. Para
isso, diversas perspectivas se propõem a essa tarefa. Por
exemplo, você já se perguntou o que é uma emoção?
Qual a utilidade do sentimento de raiva? É uma emoção ou
sensação? Indagações como essas são respondidas à luz
de diferentes vertentes de pesquisa.
16 Psicologia da Aprendizagem

Figura 2 – Emoções

Fonte: Pixabay.

ACESSE:

Para saber mais sobre as emoções, assista ao vídeo O que


são emoções? do canal Minutos Psíquicos. Acesse clicando
aqui.

A partir dessa breve apresentação sobre as diferenças entre as


principais concepções de psiquismo, podemos prosseguir para um
conhecimento mais aprofundado sobre os fatores centrais que impactam
a sua constituição do e os processos envolvidos em sua formação.

Observe a Figura 3 e reflita: para você, qual imagem define este


conceito?
Psicologia da Aprendizagem 17

Figura 3 – Como podemos representar o psiquismo?

Fonte: Pixabay

RESUMINDO:

E então, compreendeu tudo que estudamos neste


capítulo? Vamos, então, revisar um pouco do que vimos.
Neste capítulo, você viu que em relação aos pressupostos
do ponto de vista biológico, psiquismo é o conjunto
de características psicológicas de um indivíduo, ou o
conjunto de fenômenos psíquicos e processos da evolução
mental de um indivíduo. Ainda, entendeu que alguns
autores defendem o ponto de vista histórico-cultural,
compreendendo o psiquismo como a totalidade dos
processos psíquicos superiores e do comportamento social
que possibilitam ao homem constituir a unidade que é sua
psique. Por fim, você compreendeu que alguns estudiosos
enxergam o indivíduo por meio da perspectiva social e
consideram ainda que essa unidade se expressa no modo
peculiar de cada indivíduo ser no mundo – a subjetividade.
18 Psicologia da Aprendizagem

Fatores que impactam o desenvolvimento


do psiquismo

OBJETIVO:

Neste capítulo, vamos identificar os fatores que impactam


o desenvolvimento do psiquismo. E então, preparado?
Vamos lá!

Aspectos biológicos
Os aspectos biológicos são considerados por algumas abordagens
da Psicologia como fatores preponderantes para a explicação do
desenvolvimento psíquico.

A partir da evolução histórica da Psicologia, podemos notar que, à


medida em que ela se aproxima das diretrizes da Ciência Experimental,
afasta-se da Filosofia antiga, ou seja, quanto mais adota métodos
científicos, baseados na objetividade, na observação, na precisão, mais
distante fica das teorias filosóficas e do estudo da mente. Assim, é possível
identificar que o surgimento da Psicologia está atrelado às ciências
naturais e ao experimentalismo e, por conseguinte, atribuiu ao psiquismo
bases biológicas.

Esse referencial propõe que os fenômenos biológicos têm mais


concretude que os demais. Sendo assim, as Ciências Humanas têm
um vínculo irrenunciável com as Ciências Biológicas, uma vez que
manifestações humanas, como a consciência, o conhecimento, o
pensamento, a linguagem, entre outras, estão ligadas a funções cerebrais
e, por isso, para essa abordagem, o psiquismo é considerado “um
conjunto de características psicológicas de um indivíduo ou o conjunto de
fenômenos psíquicos e processos da evolução mental de um indivíduo”
(INFOPÉDIA, 2003, on-line).
Psicologia da Aprendizagem 19

IMPORTANTE:

A definição de psiquismo, isto é, como ele é constituído no


ser humano, muda de acordo com a abordagem teórica.
Neste momento, estamos falando sobre a teoria que se
aproxima das ciências biológicas.

Com isso, podemos destacar algumas linhas teóricas que foram


fundamentais para o estabelecimento da concepção biológica do
psiquismo humano, como o Behaviorismo, que teve seu surgimento
favorecido pela mudança no objeto de estudo da Psicologia Científica.
Como exemplo da relevância dada aos termos biológicos e da influência
da mudança de objeto de estudo da Psicologia Científica, podemos
salientar o fato de que o Behaviorismo rejeitava a concepção de mente e
priorizava o estudo de aspectos puramente físicos e observáveis.

IMPORTANTE:

Outra importante abordagem que contribuiu para a difusão


das concepções biológicas foi a Psicanálise. Freud foi
um médico neurologista e, por isso, a herança fisiológica
estaria em suas obras e teorias. Sua teoria é metafisica,
na qual interpreta-se o comportamento do indivíduo
utilizando como base três estruturas formadoras da psique
humana: ID, EGO e SUPEREGO. Estas seriam incentivadas
pelos processos vividos conscientes, pré-conscientes e
inconscientes, responsáveis pelas ações e pulsões libidinais
do indivíduo.

A Teoria Psicanalítica é muito atual e empregada em diversas áreas


do conhecimento científico, desde a clínica tradicional, até em ambientes
organizacionais, educacionais e pesquisas embasadas na área cognitiva e
das neurociências.

ACESSE:

Caso você tenha interesse em se aprofundar em alguns


desses temas, leia o artigo A atualidade do projeto freudiano
de 1895, de Sidarta da Silva Rodrigues. Acesse clicando aqui.
20 Psicologia da Aprendizagem

Outros conceitos freudianos apresentam correlação com os


pressupostos biológicos, como o de pulsão de vida e o de pulsão de
morte, na medida em que atuam com base no princípio homeostático,
mantendo o equilíbrio entre o interno e o externo, entre o indivíduo e o
meio.

SAIBA MAIS:

Para saber mais sobre o conceito de pulsão, assista ao


vídeo A pulsão – Glossário Freud, de Christian Dunker.
Acesse clicando aqui.

A epistemologia genética também se constituiu nas bases


biológicas. A área central dos estudos piagetianos seria o terreno das
formações cognitivas (CRUXEN, 2002). Para Piaget (1971, p. 58):
As estruturas do conhecimento tornam-se necessárias ao
cabo de um processo de desenvolvimento, sem o serem
desde o início e não comportam programação prévia. Nas
formações cognitivas a hereditariedade e a maturação se
limitam a determinar as zonas de impossibilidade ou de
possibilidade de aquisições. É esse o relevo das bases
biológicas do psíquico.

EXPLICANDO MELHOR:

A Teoria Piagetiana segue um raciocínio amparado na


Biologia para explicar o desenvolvimento humano. Para
ela, cada indivíduo evolui cognitivamente de acordo com
uma previsão maturacional biológica para cada idade. Por
exemplo, é esperado que uma criança de 3 anos já saiba
falar e andar, mas ela ainda não tem estrutura cognitiva para
responder a questões mais complexas, como perguntas de
divisão e multiplicação ou, ainda, a profissão dos pais.

A resposta de um organismo ao meio, para Piaget (1971), depende


de sua estruturação cognitiva e de competências alcançadas pela
evolução de estágios de desenvolvimento cognitivo. No entanto, apesar
do amparo da abordagem biológica, Piaget não a considera a única
Psicologia da Aprendizagem 21

explicação para os fenômenos psicológicos, tampouco privilegia as


influências ambientais. Todavia, ele acreditava no impacto desses fatores
sobre os estágios cognitivos.

É contundente destacar que, assim como a epistemologia genética,


o Behaviorismo e a Psicanálise não mantiveram uma postura rígida na
adoção da vertente biológica do psiquismo. Eles consideraram esse ponto
de vista relevante para o esclarecimento dos conceitos e explanações de
suas teorias, contudo apreciaram outros aspectos insidiosos.
Figura 4 – Os níveis do desenvolvimento humano

Fonte: Pixabay.
22 Psicologia da Aprendizagem

Piaget (1971) definiu quatro períodos no processo evolutivo humano,


que são reconhecidos pelo nível máximo de desenvolvimento em cada
faixa etária ao longo do seu processo de crescimento. São eles:

•• Período sensoriomotor (0 a 2 anos):


Este período vai desde o nascimento até os 2 anos de idade,
o que o caracteriza como um momento de muitas mudanças, pois
a criança aprende a se equilibrar, sentar-se, andar, se alimentar –
desde a amamentação a outros alimentos – e ainda se prepara para o
desenvolvimento da linguagem.
Conforme exemplifica Dias (2010, p. 6):
Neste período, a atividade cognitiva do sujeito é de
natureza sensorial e motora, tendo como característica a
ausência da função semiótica (inicialmente não representa
mentalmente os objetos). A ação ocorre diretamente sobre
os objetos, o que irá possibilitar a atividade cognitiva
futura. O período que finaliza este momento inicial já inicia
a capacidade de representação.

Nesta fase, a criança age principalmente por meio de ações


reflexas e utiliza basicamente percepções sensoriais e esquemas motores
para a resolução de seus problemas. A criança não possui capacidade
de representar situações, nem tem noção de tempo passado e futuro. A
noção de tempo e causalidade é adquirida no decorrer do processo de
desenvolvimento, por meio do contato com outras pessoas.
Figura 5 – Período sensoriomotor (0 a 2 anos)

Fonte: Freepik.
Psicologia da Aprendizagem 23

•• Período Pré-operatório (2 a 7 anos):

Nesta fase, aparece a linguagem oral. A criança vai se tornando


capaz de utilizar esquemas que auxiliam na substituição de ações,
situações, pessoas e objetos por símbolos (palavras). O pensamento
predominante é o egocêntrico, no qual a própria criança é tida como
referência. Outras características dessa fase são o animismo (atribuição de
intenções e sentimentos a coisas e animais) e a irreversibilidade (a criança
identifica a possibilidade de retornar mentalmente ao ponto de partida).
Figura 6 – Período pré-operatório (2 a 7 anos)

Fonte: Freepik.
24 Psicologia da Aprendizagem

•• Período das Operações Concretas (7 a 11 ou 12 anos):

Neste período, o egocentrismo é abandonado, e a criança começa


a estabelecer correlações e a coordenar pontos de vista diferentes  e
integrá-los de modo lógico. A criança também passa a ser capaz de
interiorizar as ações, realizando mentalmente operações, e não somente
operações físicas, sem precisar medir fisicamente objetos para saber qual
é o maior.
Figura 7 – Período das Operações Concretas (7 a 11, 12 anos)

Fonte: Freepik.
Psicologia da Aprendizagem 25

•• Período das Operações Formais (12 anos em diante):

Neste período, há a ampliação das capacidades adquiridas no


período anterior. Assim, ocorre o raciocínio sobre hipóteses, possibilidade
de compreensão de conceitos abstratos e realização de operações
mentais dentro de princípios da lógica formal. Este período se diferencia
da infância porque aos 12 anos a criança já estabeleceu um padrão de
equilíbrio, isto é, o raciocínio cognitivo que ela levará durante sua vida.
Figura 8 – Período das operações formais (12 anos em diante)

Fonte: Freepik.
26 Psicologia da Aprendizagem

Aspectos individuais, sociais e histórico-


culturais
Apesar da importância dos pressupostos biológicos para o estudo
do psiquismo, outros fatores, como os aspectos individuais, sociais
e histórico-culturais, precisam de atenção por serem ativos em sua
formação e permitirem uma compreensão mais ampla e ponderada dos
fatores envolvidos.

Os aspectos individuais se referem às características pessoais,


peculiares, únicas e singulares que os indivíduos possuem. Essas
características formatam seu modo de existir e de se relacionar com o
mundo. Assim, tais aspectos dizem respeito ao indivíduo e à formação
do psiquismo. É, portanto, um fenômeno interno, que se relaciona
dialeticamente com a objetividade (com o externo).

As características biológicas do indivíduo (disposição física,


emoções, funcionamento do sistema nervoso, emoções e necessidades
biológicas), segundo Leontiev (1978), vão se tornando singulares e
permitindo a diferenciação entre eles. Isso ocorre por meio da apropriação
da realidade e dos processos de objetivação e da apropriação.

REFLITA:

Apesar das invariáveis controvérsias sobre a gênese dos


elementos individuais, há um entendimento preponderante
entre autores, como Vygotsky (1995 apud SOUZA;
ANDRADA, 2013), que, ao se referir a aspectos peculiares
do indivíduo, considera a parcialidade das origens dos
seus elementos constitutivos, ou seja, o desenvolvimento
do individual ocorre à medida que ocorre a dialética entre
o interno e o externo. Nesse intercâmbio com o meio, o
indivíduo se apropria das experiências, subjetivando-as
e transformando-as em uma maneira única e singular de
existir.

Podemos entender, conforme Bock (2004 apud SILVA, 2009), que


os aspectos individuais são construções do mundo social individual.
Psicologia da Aprendizagem 27

Dessa forma, Vygotsky foi um importante autor nessa área, pois,


ao atribuir complexidade à formação do psiquismo humano, ampliou
os estudos, sugerindo novos caminhos. Assim, trouxe o elemento
histórico-social do desenvolvimento psicológico e introduziu a noção
de historicidade no Psiquismo humano (fundamentada no materialismo
histórico-dialético proposto por Marx e Engels).

Vygotsky, então, indicou que, para se desenvolver e formar suas


características individuais, primeiramente, deve ocorrer a atividade
externa (o contato dialético do indivíduo com o ambiente), para a posterior
apropriação cultural e internalizarão pela atividade individual. Sendo
assim, para que haja apropriação, é necessária a interação com outros
sujeitos possuidores do conhecimento a serem internalizados.

VOCÊ SABIA?

Você sabia que o conceito de internalizarão diz respeito à


imposição que a criança faz a si para assimilar a mesma
forma de comportamento e condutas sociais em princípio
impostas a ela por outras pessoas? Pois é, dessa forma, a
internalização de condutas culturais ocorre inicialmente no
âmbito externo e, ao ser reconstruído, ocorre internamente.

Com isso, Vygotsky (2008) também aponta a interação dialética


com o meio social como fonte responsável pelo desenvolvimento de
importantes funções psíquicas, própria dos seres humanos, como a
linguagem, a escrita, o cálculo, o desenho, a atenção voluntária, a memória
lógica e a formação de conceitos, as ações conscientes, o pensamento
abstrato, entre outras (chamadas de funções mentais superiores).

EXPLICANDO MELHOR:

Observa-se que, apesar de não desconsiderar os aspectos


biológicos, em sua teoria, Vygotsky enfatiza a interação
contínua dos aspectos sociais no desenvolvimento
psicológico. Por isso, não se pode falar em mudanças
isoladas da personalidade, pois, sob o efeito das
multiplicidades de fatores, a mudança interna que ocorre
altera sua estrutura como um todo.
28 Psicologia da Aprendizagem

Assim, para o autor, tendo como base a correlação entre


desenvolvimento e aprendizagem, não se pode reduzir a compreensão
dos fenômenos a determinações de estágios de desenvolvimento.
Nesse caso, é imprescindível conhecer as relações que permeiam seus
processos. Para isso, Vygotsky dividiu em três zonas de desenvolvimento
os espaços de desenvolvimento e execução de atividades, diferenciadas
pelos níveis de necessidade de interferências e mediação. São elas:

1) Zona de desenvolvimento real: são as capacidades mentais


de solucionar problemas já alcançados pela criança. Nela, as
atividades são executadas sem o auxílio do outro.

2) Zona de desenvolvimento potencial: capacidade de solucionar


problemas com a ajuda do outro. O que faz hoje com colaboração,
poderá realizar sozinha amanhã.

3) Zona de desenvolvimento proximal: está entre a zona de


desenvolvimento real e a potencial. Refere-se às funções em
desenvolvimento.

EXEMPLO:

Vygotsky (1998 apud SOUZA; ANDRADA, 2013), para exemplificar os


conceitos delimitados, apresenta uma situação com duas crianças com
idade mental de 8 anos, considerando-se que elas estão no mesmo nível
real de desenvolvimento em relação ao que conseguem fazer sozinhas,
sem ajuda. Entretanto, há diferenças entre elas: uma conseguia, sem
ajuda, resolver problemas correspondentes à idade mental de 9 anos,
enquanto a outra realizava, sozinha, atividades características da idade
mental de 12 anos. Essa divergência entre a idade mental (exemplo de
desenvolvimento real) e o nível que a criança alcança ao resolver tarefas
com colaboração (exemplo de desenvolvimento potencial) é o que o
autor denomina zona de desenvolvimento proximal.
Psicologia da Aprendizagem 29

Figura 9 – Mapa mental sobre as Zonas de desenvolvimento Vygotskyanas

Zona de desenvolvimento proximal

Zona de Zona de
desenvolvimento Distância entre desenvolvimento
real potencial

Resolve-se Resolve-se o
o problema problema com
individualmente ajuda

Fonte: Educando o Amanhã (2016).

Assim, podemos perceber que Vygotsky rejeita explicações


deterministas e naturalizantes sobre o desenvolvimento humano. Seu
legado privilegia a apropriação da cultura como fator potencializador do
desenvolvimento psicológicos dos indivíduos (PASQUALINI, 2006 apud
CAMPOS, 2015).

EXPLICANDO MELHOR:

Para Vygotsky, os pensamentos superiores são assim


considerados por se distinguirem das ações reflexas
(processos psicológicos elementares), como, por exemplo,
a sucção do seio da mãe pelo bebê; das as associações
simples, como evitar o contato da mão com o fogo; e das
reações automatizadas, como virar a cabeça em direção a
um ruído repentino.
30 Psicologia da Aprendizagem

Figura 10 – Aprendizagem em diferentes culturas: visão histórico-cultural Vygotskyana

Fonte: Wikipedia.

RESUMINDO:

E então, compreendeu tudo que estudamos neste


capítulo? Vamos, então, revisar um pouco do que vimos.
Neste capítulo, você viu que os aspectos biológicos são
considerados por algumas abordagens da Psicologia
como fatores preponderantes para a explicação do
desenvolvimento psíquico. Ainda, entendeu que apesar da
importância dos pressupostos biológicos para o estudo do
psiquismo, outros fatores, como os aspectos individuais,
sociais e histórico-culturais, precisam de atenção por serem
ativos em sua formação e permitirem uma compreensão
mais ampla e ponderada dos fatores envolvidos. Por fim,
você compreendeu que as características biológicas do
indivíduo (disposição física, emoções, funcionamento do
sistema nervoso, emoções e necessidades biológicas) vão
se tornando singulares e permitindo a diferenciação entre
eles. Isso ocorre por meio da apropriação da realidade e
dos processos de objetivação e da apropriação.
Psicologia da Aprendizagem 31

Processos e Constituição do Psiquismo


Humano

OBJETIVO:

Neste capítulo, vamos compreender os processos e a


constituição do psiquismo humano. E então, preparado?
Vamos lá!

Entre os anos de 1924 e 1934, como expõem Libâneo e Freitas


(2009), Vygotsky iniciou uma pesquisa com a colaboração de psicólogos
e pedagogos, entre eles A. N. Leontiev e A. R. Luria. O estudo embasou
teoricamente a Psicologia Histórico-cultural quanto às formulações
sobre origem e desenvolvimento do psiquismo, processos intelectuais,
emoções, consciência, atividade, linguagem, desenvolvimento humano
e aprendizagem.

A seguir, serão abordados individualmente alguns desses


elementos.

Atividade

VOCÊ SABIA?

Libâneo e Freitas (2009), em seus estudos, informaram


que o conceito de atividade para a concepção histórico-
cultural é elementar, pois é fundamental para que se possa
explicar o processo de mediação. Para eles, é a atividade
que promove a relação entre o homem e a realidade
objetiva. Dessa forma, o homem não apenas responde
automaticamente aos estímulos, mas reage ativamente,
atuando e transformando tanto o meio quanto a si.

Leontiev (1903-1979), a partir das ideias da Teoria Histórico-cultural


da Atividade, também a investigou buscando demonstrar que a atividade
psíquica humana, como forma singular de atividade humana, expressa
elementos do desenvolvimento psíquico.
32 Psicologia da Aprendizagem

As concepções marxistas também contribuíram para o


entendimento da atividade, ao sugerir duas premissas: a primeira denota
que a natureza humana da atividade, ao afirmar que a atividade representa
a ação humana, promove a relação entre o homem (ativo) e o meio; a
segunda informa que o desenvolvimento das atividades psíquicas, como
processos psicológicos superiores, acontece a partir das relações sociais,
do contexto cultural.

Nesse sentido, entre 1930 e 1940, Leontiev estudou a relação entre


a atividade humana e os processos internos da mente. Ele entendeu que
as atividades só se concretizam por meio de ações, operações e tarefas se
instigadas por necessidades e motivações. Assim, a atividade humana se
materializa por meio de ações correspondentes: as atividades didáticas,
por meio das ações de aprendizagem; as atividades físicas, por meio de
exercícios físicos, entre outros exemplos.

NOTA:

Em suma, a atividade humana acontece e se materializa


com uma ação humana, ativa e devidamente motivada
por uma necessidade. Ela transforma reciprocamente o
homem e o social, à medida que eles interagem. Esses
eventos, além de permitirem a visualização de elementos
do desenvolvimento psíquico, podem promover o
desenvolvimento dos processos psicológicos superiores.
Figura 11 – Atividade Psíquica e aprendizado

Fonte: Pixabay.
Psicologia da Aprendizagem 33

Figura 12 – Desenvolvimento humano na perspectiva sócio-histórica

Fonte: Freepik.

Identidade
Os termos “subjetividade”, “individualidade”, “personalidade” e
“identidade” são, na Psicologia, utilizados com frequência para fazer
menção ao seu objeto de estudo, referindo-se a seus processos ou
resultados ou atuando sobre o entendimento desse objeto. Autores
brasileiros vinculados ao pressuposto histórico-cultural utilizam, por
vezes, os referidos termos como sinônimos ou dão prioridade a algum
em detrimento de outro, por considerarem que um deles retrataria melhor
as peculiaridades do assunto (SILVA, 2009).

Segundo Silva (2009, p. 170):


Na Psicologia Histórico-cultural (para alguns, Psicologia
Sócio-histórica), que tem em seus fundamentos teórico-
metodológicos as produções de Vygotsky, Leontiev,
Luria e outros autores soviéticos, o objeto de estudo é
a consciência, mas, para compreendê-la, é necessário
34 Psicologia da Aprendizagem

considerar os processos que a constituem e fazem com


que seja constituída. Entre estes estão a subjetividade, a
individualidade, a personalidade e a identidade.

Com isso, alguns conceitos que diferenciam esses termos são


apresentados no estudo da autora. No entanto, mesmo sabendo que
todos são termos que participam da constituição e compreensão da
consciente e, apesar da sua proximidade, nos restringiremos ao conceito
de identidade.

DEFINIÇÃO:

“Identidade” é um termo complexo estudado em diversas


abordagens das Ciências Humanas, como a Psicologia,
a Sociologia e a Antropologia. Para Stuart Hall (2011),
existem três tipos de identidades categorizadas de acordo
com o período histórico: identidade do sujeito iluminista
(identidade como um núcleo interno do homem, sendo
esse imutável ao longo da vida); identidade do sujeito
sociológico da idade moderna (existe um núcleo, mas ele é
modificado no contato social); e identidade do sujeito pós-
moderno da atualidade (para esse período, a identidade
é vista como fragmentada, havendo várias identidades).
O autor também menciona as identidades culturais como
sendo “aqueles aspectos de nossas identidades que
surgem de nosso ‘pertencimento’ a culturas étnicas, raciais,
linguísticas, religiosas e, acima de tudo, nacionais” (HALL,
2011, p. 8).

Dessa forma, não há um consenso sobre o tema. Entretanto,


seguiremos com o objetivo de abordar a identidade e suas influências
sobre o psiquismo humano a partir de um olhar mais amplo.
Psicologia da Aprendizagem 35

IMPORTANTE:

Nesse sentido, podemos, então, destacar Silvia Lane


e Antonio da Costa Ciampa, que, na década de 1980,
realizaram pesquisas em Psicologia Social, amparados
teoricamente nos estudos de Vygotsky e Leontiev. Esses
autores desenvolveram seus trabalhos posicionando-
se criticamente em relação à psicologia burguesa, que
entendia a identidade (referida pelo termo personalidade)
como algo individual, que, mesmo com interferências
externas, originava-se do indivíduo. Assim, abandonaram o
termo personalidade, preferindo utilizar o termo identidade,
por entenderem que este trata a constituição do eu de
forma crítica, multifatorial e dinâmica (SILVA, 2009).

Para Ciampa (1987 apud FARIA; SOUZA, 2011), identidade é como


metamorfose. Ela está sujeita a transformações constantes e pode,
assim, ser entendida como uma consequência temporária da relação
entre fatores como a história de vida do indivíduo, seus projetos e seu
contexto histórico e social. Ou seja, sugere que a identidade é dada a cada
diferente momento (possuímos várias identidades visíveis nos diferentes
papéis que exercemos), não sendo algo pronto, atemporal e imutável. Ela
está em um contínuo processo.

Ainda segundo o autor, “[...] identidade é o reconhecimento de


que é o próprio de quem se trata; é aquilo que prova ser uma pessoa
determinada, e não outra”. (CIAMPA, 2007 apud WONSOSKI; DOMINGUES,
2015). Para ele, ela se estabelece na relação entre diferença e igualdade,
posto que alguns elementos nos aproximam e nos diferenciam uns dos
outros (como o nome, que nos diferencia, e o sobrenome, que nos traz
uma relação de parentesco).
36 Psicologia da Aprendizagem

EXPLICANDO MELHOR:

Para entender a dinâmica e o processo de formação da


identidade, Ciampa (2007) utilizou o método da narrativa
e empregou também as categorias atividade (entendida
como ação, trabalho) e consciência para alcançar o
conhecimento sobre os conteúdos que participam da
formação da identidade. Assim, o indivíduo narrava os
fatos sobre si, sobre sua história e, com base nesse relato
permeado pela consciência, era possível observar e
conhecer o processo de individualização do sujeito na
atividade humana atuando sobre a formação da identidade.

Figura 13 – O que é identidade?

Fonte: Freepik.
Psicologia da Aprendizagem 37

RESUMINDO:

E então, compreendeu tudo que estudamos neste


capítulo? Vamos, então, revisar um pouco do que vimos.
Neste capítulo, você viu que o conceito de atividade
para a concepção histórico-cultural é elementar, pois
é fundamental para que se possa explicar o processo
de mediação. Ainda, entendeu que existem três tipos
de identidades categorizadas de acordo com o período
histórico: identidade do sujeito iluminista (identidade como
um núcleo interno do homem, sendo esse imutável ao
longo da vida); identidade do sujeito sociológico da idade
moderna (existe um núcleo, mas ele é modificado no contato
social); e identidade do sujeito pós-moderno da atualidade
(para esse período, a identidade é vista como fragmentada,
havendo várias identidades). Por fim, você compreendeu
que a identidade está sujeita a transformações constantes
e pode, assim, ser entendida como uma consequência
temporária da relação entre fatores como a história de vida
do indivíduo, seus projetos e seu contexto histórico e social.
38 Psicologia da Aprendizagem

Pensamento e linguagem do
desenvolvimento humano

OBJETIVO:

Neste capítulo, vamos entender o pensamento e a


linguagem do desenvolvimento humano. E então,
preparado? Vamos lá!

Consciência
Para compreender o conceito de consciência como componente
formador do psiquismo, é preciso, primeiramente, saber que, para os
teóricos sócio-históricos, a composição dela se deve à dinâmica dialética
entre o meio social e a criança (LORDELO, 2007 apud CASTRO; ALVES,
2012).

DEFINIÇÃO:

Termo criado por Karl Marx e Friedrich Engels para


compreender os fenômenos sociais que aconteciam em seu
país. Essa concepção filosófica defendia que o ambiente, o
organismo e os fenômenos físicos tanto modelam animais
irracionais e racionais, sua sociedade e cultura quanto são
modelados por eles, ou seja, que a matéria está em uma
relação dialética (WIKIPEDIA, 2021).

A consciência trabalha com signos formadores da linguagem,


conforme afirma Saviani (2013 apud POLON; PADILHA, 2017, p. 86):
A consciência é resultante do desenvolvimento da
linguagem e, portanto, do emprego dos signos, ou seja, um
lastro social e simbólico que, desvinculado do processo
evolutivo biológico, demarcou o desenvolvimento
socialmente histórico do ser humano.
Psicologia da Aprendizagem 39

SAIBA MAIS:

Signo é a linguagem propriamente dita, que pode ser


expressa por palavras, sinais, sons etc. Esse signo produz
um significante, que é o elemento perceptível na linguagem,
o produto dela, enquanto o conceito da linguagem é
chamado de significado. Vejamos um exemplo: Alguém
fala, escreve, interpreta em libras a palavra “cachorro” – o
que foi visto e decodificado por você é o significante, e o
que você tem como conceito de cachorro é o significado.

Figura 14 – Signos

Fonte: Freepik.
40 Psicologia da Aprendizagem

REFLITA:

Agora, convido você a fazer uma breve reflexão. Observe


a Figura 14 e reflita: você acredita que todos têm o mesmo
conceito de “cachorro”? Como é essa relação entre o
individual e biológico, no sentido de consciência, linguagem,
sensação, percepção e meio social? Os cachorros com que
uma pessoa interage estão sempre soltos, enquanto outros
só saem à noite. Isso exerce alguma influência? Agora,
vamos além: leve essa reflexão para a sala de aula. Como
você enxerga a relação dialética entre os indivíduos e a
escola?

Para fortalecermos a discussão a respeito de consciência, vejamos


a interpretação de Aita e Tuleski (2017, p. 101):
A consciência possui uma natureza social, e se desenvolve
pela maneira como o indivíduo se apropria da objetividade
da realidade. Ao apreender os significados sociais,
o indivíduo pode dar a eles um significado pessoal
relacionado com suas experiências particulares, com as
suas necessidades, seus motivos e sentimentos, ou seja,
com a sua própria vida.

A linguagem compartilhada provoca um efeito em quem ouve,


mas também em que fala. Esse efeito não é só ouvir e decodificar, mas
coordenar comportamentos, sensações e a consciência do outro e de
si mesmo. Por isso, o estudo de classes sociais, relação social, dentre
outras variáveis culturais, é essencial (CASTRO; ALVES, 2012). Para os
autores histórico-culturais, o processo de construção da linguagem deve
ser estudado em meio ao social, pois este, com seu meio de produção e
seu produto material, influencia diretamente a relação do indivíduo com o
material, refletindo a concepção do psiquismo. Essa relação, por sua vez,
não é imutável, tendendo a se modificar à medida que o indivíduo atribui
novos sentidos ao que foi apropriado por ele da realidade (AITA; TULESKI,
2017).
Psicologia da Aprendizagem 41

Emoções
Podemos dizer que o indivíduo tem acesso às emoções pelos
neurônios sensoriais, presentes nos órgãos dos sentidos, e pelos neurônios
presentes na região cerebral que decodifica os sinais. A sensação do
estímulo é biológica, mas a interpretação (percepção) dela é subjetiva. Esse
é um exemplo básico de como os mecanismos biológicos influenciam os
processos cognitivos e, como vimos anteriormente, influenciam também
a consciência, a linguagem e a subjetividade (MAGIOLINO, 2014).

IMPORTANTE:

Ao estudar o conceito de psiquismo humano em Vygotsky,


unimos sensação e subjetividade humana, e concluímos
que o contexto social pode influenciar na maneira como
elaboramos as sensações, ou seja, a sensação de quebrar
um dedo é assimilada mundialmente da mesma maneira,
pelos neurônios nociceptivos, mas a percepção dessa dor
pode sim, se modificar de acordo com a cultura do povo,
para alguns a dor pode ser algo mais significativo. Essas
interpretações são parte da constituição da subjetividade
humana. Como exemplifica Magiolino (2014, p. 51):

Para compreender o modo como às emoções


significam nas relações sociais e no processo
dramático de constituição do sujeito, é necessário
compreender essa intrincada relação da emoção
com as demais funções psicológicas na consciência
que, emerge na/pelas relações sociais. Isso nos
leva a indagar sobre as posições sociais ocupadas
pelos sujeitos e pelos sujeitos que se emocionam na
dinâmica das interações.

Podemos dizer que as emoções fazem parte das funções


psicológicas superiores, não somente para garantir a sobrevivência da
espécie, mas também para organizar a vida de cada indivíduo em seu
meio. Um exemplo disso é o indivíduo preocupado com uma iminente
chuva. A preocupação (ansiedade) só é possível se ele tiver memória,
pois se lembrará de algum evento traumático vivenciado anteriormente.
42 Psicologia da Aprendizagem

O homem se diferencia dos demais animais por essa capacidade, “o


planejamento das ações futuras”, o que resultou em nossa evolução.
As emoções por sua vez diferem o indivíduo entre si, pois cada ser
interpreta diferentemente um evento, isso proporciona a individualidade/
subjetividade e, ao mesmo tempo, modifica o ambiente.

DEFINIÇÃO:

As funções psicológicas superiores são a atenção, a


memória, a imaginação, o pensamento e a linguagem.

Figura 15 – Emoções e catarse no teatro

Fonte: Freepik.
Psicologia da Aprendizagem 43

IMPORTANTE:

A emoção é diferente do sentimento, pois esta se deve


a um processo inconsciente, involuntário. Como nos traz
Garcia (2005, p. 147):
As emoções são caracterizadas pelas vivências
afetivas mais simples, que estão relacionadas
à satisfação e à insatisfação das necessidades
orgânicas, tais como as sexuais, de alimento, de saciar
a sede, de defender-se dos perigos diários e tantas
outras. Também pertencem ao grupo das emoções as
reações afetivas relacionadas às sensações, as quais
exercem grande influência na vida do indivíduo, uma
vez que são provocadas pelos objetos e fenômenos
da realidade.

Ainda, para a autora, os sentimentos, dotados de processo cognitivo,


são parte construtiva do psiquismo humano. Garcia (2005, p. 147) ainda
ressalta:
Os sentimentos são diferentes das emoções, pois estão
relacionados às necessidades que vão sendo criadas no
processo de desenvolvimento da sociedade; dependem
das condições de vida, especialmente das necessidades
dos homens de se relacionarem entre si. São inseparáveis
das necessidades culturais. Fundamentadas na Teoria
Histórico-Cultural, sabe-se que não existe atividade
cognitiva desprovida de sentimentos ou reações
emocionais.

Pensamento e linguagem do
desenvolvimento humano
O pensamento e a linguagem estão diretamente relacionados ao
desenvolvimento humano, pois este é o produto das atividades mentais
superiores, as quais estão envolvidas no processo de aquisição, retenção
e uso do conhecimento, por meio do pensamento e linguagem. Juntos,
eles compõem a cognição.
44 Psicologia da Aprendizagem

DEFINIÇÃO:

Cognição é a capacidade de processar informações e


transformá-las em conhecimento.

Figura 16 – Pensamento/Cognição

Fonte: Freepik.

Enquanto para Vygotsky a linguagem e o pensamento são fruto


da interação sociocultural do indivíduo, para Piaget (1987, p. 15-16), a
inteligência é:
A solução de um problema novo, é a coordenação dos
meios para atingir um certo fim, que não é acessível de
maneira imediata; enquanto o pensamento é a inteligência
interiorizada e se apoiando não mais sobre a ação direta,
mas sobre um simbolismo, sobre a evocação simbólica
pela linguagem, pelas imagens mentais etc.
Psicologia da Aprendizagem 45

A Teoria Genética de Piaget defende um sistema de operações


interiorizadas e simbólicas que, posteriormente, serão convertidas
em pensamento. As ações desenvolvidas pela criança até então serão
atividades de autoconhecimento e de exploração do ambiente, as quais a
farão superar as fases iniciais do desenvolvimento.

REFLITA:

Acerca do que foi discutido até o momento, trazemos


as seguintes indagações: você consegue explicar o que
é pensar? O que é pensamento? Quando adquirimos
a capacidade de pensar? O que é linguagem? Como a
linguagem influencia o pensamento? Qual a relação entre
memória, pensamento e linguagem?

Para responder a algumas dessas perguntas, poderíamos recorrer às


fases do desenvolvimento infantil, quando a criança começa a desenvolver
seu pensamento abstrato e, assim, pode solucionar problemas. Então,
se pensar é a capacidade de solucionar um problema por meio de um
pensamento abstrato, como seria esse processo cognitivo?

Podemos, então, dizer que, para resolver um novo problema,


é necessário o uso das capacidades cognitivas. A cognição se refere
às atividades mentais envolvidas na aquisição, retenção e no uso do
conhecimento, que são a percepção, a aprendizagem e a memória
(PINTO, 2011).

Ainda, pensar inclui duas representações mentais conscientes a


fim de produzir inferências e conclusões: imagens mentais e conceitos.
As imagens mentais são a representação mental de objetos ou eventos
passados, e os conceitos são os agrupamentos de ideias a respeito
de um objeto (HOCKENBURRY, 2001). Nessa categoria, é possível
compreendermos a relação entre o meio e o indivíduo, pois, para os
autores sócio-históricos, ela interfere na formação de conceitos.
46 Psicologia da Aprendizagem

Figura 17 – Pensamento e linguagem

Fonte: Freepik.

REFLITA:

Para finalizar esta unidade, gostaríamos de chamar atenção


a temas atuais e que, por estarem presentes no meio social,
moldam a nossa psique. São eles: gênero, tecnologias e
bullying. Você consegue identificar algum?

SAIBA MAIS:

Agora, imagine uma pessoa que tenha vivido fora


do ambiente social. Como você acha que seria o
desenvolvimento de sua linguagem e de seu pensamento?
Reflita sobre a questão da estimulação e, após, assista ao
A maçã (1999), dirigido por Samira Makhmalbaf. O filme,
vencedor do Prêmio Troféu Sutherland, conta a história de
duas crianças privadas do convívio social. Compare o que
você assistiu com as fases de desenvolvimento piagetianas
e com a questão Vygotskiana acerca da relação entre meio
social e desenvolvimento.
Psicologia da Aprendizagem 47

RESUMINDO:

E então, compreendeu tudo que estudamos neste


capítulo? Vamos, então, revisar um pouco do que vimos.
Neste capítulo, você viu que a composição da consciência
se deve à dinâmica dialética entre o meio social e a criança,
e que ela é resultante do desenvolvimento da linguagem
e, portanto, do emprego dos signos. Ainda, você entendeu
que as emoções fazem parte das funções psicológicas
superiores, não somente para garantir a sobrevivência
da espécie, mas também para organizar a vida de cada
indivíduo em seu meio. Por fim, você compreendeu que o
pensamento e a linguagem estão diretamente relacionados
ao desenvolvimento humano, pois este é o produto das
atividades mentais superiores, as quais estão envolvidas no
processo de aquisição, retenção e uso do conhecimento,
por meio do pensamento e linguagem. Juntos, eles
compõem a cognição.
48 Psicologia da Aprendizagem

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