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Ética e Cidadania

Conceitos Fundamentais sobre Ética e


Cidadania
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
ANA LUCIA GUIMARÃES
AUTORIA
Ana Lucia Guimarães
Olá! Sou doutora em Ciências Humanas e tenho mais de 20 anos
de atuação como professora na Educação Superior. Além disso, tenho 12
anos de militância como dirigente sindical da causa dos professores, o que
me agrega conhecimentos e experiências para ser autora desta disciplina.
Portanto, atuar e defender a causa da educação laica, democrática e de
qualidade é mais do que um princípio em minha formação e trajetória
profissional, é um compromisso de ofício. Por isso, fui convidada pela
Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes. Estou
muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho.
Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de de se apresentar um
uma nova compe- novo conceito;
tência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou dis-
mento; cutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das últi-
assistir vídeos, ler mas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Fundamentos de Ética e Cidadania...................................................... 10
Conceitos, Objetivos e Princípios da Ética e da Moral..........................................10

Conceito de Cidadania............................................................................... 18
Ética Social e Política.................................................................................26
A Ética e a Moral na Contemporaneidade......................................... 32
Ética e Cidadania 7

01
UNIDADE
8 Ética e Cidadania

INTRODUÇÃO
Você sabia que estudar ética e cidadania tem uma importância
significativa nos tempos atuais? Isto porque os indivíduos estão cada vez
mais confusos em relação à construção de suas atitudes e pensamentos
quanto às rápidas e volumosas transformações de nossa sociedade. Trata-
se de entender como e de que forma devemos interagir com os diferentes
sujeitos sociais e seus diferentes pertencimentos culturais e políticos.

Enquanto a ética imprime uma ideia de valores e normas sociais


construídos historicamente de acordo com as diferentes demandas
sociais dos grupos que integram a sociedade, a ideia de cidadania nos
remete ao pertencimento a uma localidade e ao compartilhamento de
valores e normas sociais dela. Portanto, tanto a questão da cidadania
quanto a ideia da ética fornecem mapas referenciais para nossas ações e
interações, com o objetivo de identificar a qual conceito de moral estamos
submetidos. Entendeu? Vamos explorar mais este debate ao longo desta
unidade.
Ética e Cidadania 9

OBJETIVOS
Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso objetivo é auxiliar você no
desenvolvimento dos seguintes objetivos de aprendizagem até o término
desta etapa de estudos:

1. Diferenciar os conceitos de ética e moral.

2. Identificar o conceito de cidadania.

3. Demonstrar o conceito de ética social e sua relação com a ética


política.

4. Ponderar a relação entre ética e moral em tempos contemporâneos.

Então, preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento?

Ao trabalho!
10 Ética e Cidadania

Fundamentos de Ética e Cidadania

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo, você deverá dominar os


conceitos de ética e moral, sabendo diferenciá-los e
identificar sua importância para a vida em sociedade. Na
atualidade, quando os indivíduos não sabem identificar
situações de caráter moral, podem emitir julgamentos e
agir de forma a serem julgados negativamente pela ordem
social constituída. Vamos lá?.

Conceitos, Objetivos e Princípios da Ética


e da Moral
Iniciamos nossos estudos sobre ética e moral procurando entender
a definição desses conceitos e a diferença entre eles.

Para Cortella (2009), a ética é o princípio orientador de nossa


conduta em sociedade, ela nos permite distinguir e definir nossas ações
e pensamentos em relação a diferentes experiências no mundo social. A
ética está em nosso dia a dia. Em qualquer situação ou acontecimento,
vemos várias inferências dos moralistas a solicitar necessidade de
afirmação ética. Realmente, há um desgaste em falar de ética em tempos
atuais, mas ainda é muito necessário entender o conceito e valorizar sua
aplicação.

Pode-se ousar dizer que é impossível avançar no conceito de ética


sem abordar o conceito de valores. O que são valores, então? Desde
que nascemos, somos ensinados sobre o que é certo e errado, a partir
daí, vamos direcionando nosso olhar, bem como disseminamos valores
impostos pela sociedade. Se considerarmos que o valor moral é uma
necessidade para a sobrevivência em sociedade, estaremos começando
a entender mais sobre ética, moral e vida social, no sentido relacional —
ou seja, de interação de uns com os outros.
Ética e Cidadania 11

Figura 1 - Ética e vida coletiva

Fonte: Pixabay

Por isso, Cortella (2009) afirma que a ética é compreendida no bojo


dos estudos da filosofia e tem relação com a construção da moralidade,
pois, a partir dessa relação, nasce a ideia de um “exercício de condutas”.
Isso significa para o autor que, a partir da concepção ética, espera-se de
um indivíduo que ele aja de uma forma previsível em uma determinada
situação, pois entende-se que incorporou as regras morais para compor
seu comportamento social.

Com essa definição pode-se inferir que a ética é a vida pensada,


isto é, uma proposta de ação a partir do que a moral estabelece. Nesse
sentido, precisamos compreender que a ética está no centro da construção
de relações sociais harmônicas e benéficas para a preservação do todo
social, isso porque ela aponta a ideia de uma ação que leva em conta o
outro e que se fundamenta na forte presença dos valores morais.

DEFINIÇÃO:
Ética: define-se como um modo de agir a partir de uma
norma moral incorporada, refere-se à uma orientação de
vida que deve, supostamente, levar em consideração a
preservação positiva da vida em sociedade.
12 Ética e Cidadania

Ainda explorando o conceito de ética como parte da Filosofia, a


qual fundamentalmente implica em entendimento do comportamento
moral, vejamos de forma ágil como os clássicos filósofos consideravam
esse conceito.

Nos estudos de Chauí (2010), encontramos que, para os sofistas, a


ética era relativista, pois, em suas concepções, não havia normas universais
de definição para a vida social. Sócrates, tanto quanto Kant, buscava o
entendimento da ética a partir da compreensão da alma humana, pois
acreditava que nela residiriam fundamentos da moral. Já nos ideais de
Platão, vemos a separação entre corpo e alma, para ele, o corpo sujeito
a paixões poderia desviar-se do bem, por isso, o Homem só conseguiria
desenvolver a ética para o bem comum na Pólis.

Ainda em Chauí (2010), vemos que, para os estoicos, a ética constituía


uma ideia de autocontrole que levava a uma aceitação da realidade, uma
clara noção de destino traçado sob a égide de uma razão universal, o que
levava à imperturbabilidade da alma. Em contrapartida, os epicuristas ao
falarem de ética e imperturbabilidade da alma mostravam que esta era
uma finalidade dela.

Entretanto, os epicuristas adotavam quatro princípios para o


entendimento da ética: o primeiro era que o homem não devia temer aos
deuses; o segundo indicava que o homem não devia temer a morte; o
terceiro apontava que a felicidade era possível de ser alcançada; e, por
fim, o quarto princípio dizia que qualquer dor pode ser suportada. Com
essas ideias, esses filósofos pretendiam afirmar que a ética, enquanto
bem fundamental, é a defesa do prazer, não o prazer sexual, mas o prazer
relacionado ao sentimento de amizade. Em Aristóteles veremos, mais
adiante, que a ética está relacionada à busca pela felicidade, que deve
ser encontrada no bem comum e na ação do homem na Pólis.
Ética e Cidadania 13

Figura 2 - Reflexão sobre ética

Fonte: Freepik

Falamos muito sobre o conceito de ética, e não podemos deixar


de nos aprofundar sobre o conceito de moral. Portanto, o que é a moral?
Podemos inferir que a moral é um conjunto de regras, normas de uma
sociedade ou localidade, tornando-se relevante pela proporção do
desrespeito das pessoas às leis. A moral funciona como um conjunto
de condutas que devem direcionar as diferentes formas de agir dos
indivíduos.

DEFINIÇÃO:

Moral: o conjunto de condutas e normas que os indivíduos


costumam aceitar como válidas. Essas regras são adquiridas
na educação, por meio da cultura e das tradições dos
diferentes grupos sociais. Cada grupo tem suas regras e
concepções morais.

Para Chauí Kant (1921), que foi quem mais discutiu a ética formal,
a moral do comportamento reside na vontade e nos motivos do agente
considerado. 
14 Ética e Cidadania

IMPORTANTE:

É importante entender que aquilo que não é moral, pode


ser:

IMORAL: com conotação de tudo aquilo a que se opõe


a moral, por exemplo, o questionamento da atuação dos
políticos no Brasil.

AMORAL: um homem que se comporta de forma


independente dos juízos sobre o bem e o mal, ele não
considera qualquer parâmetro de moral para sua conduta.

Figura 3 - Perspectivas da ética


Ética e Cidadania 15

Fonte: Pixabay

Figura 4 - Regras morais para o erro ou acerto social

Fonte: Freepik

EXPLICANDO MELHOR:

A ética e a moral andam de mãos dadas, mas são


essencialmente conceitos diferentes. É preciso saber que
a ética é importante porque revela o respeito aos outros
e à dignidade humana. Todos nós temos ética, só temos
que desenvolver e acreditar no bem. A ética orienta-nos e
ajuda-nos para que tenhamos uma vida boa.

Observe o quadro abaixo sobre as diferenças entre esses conceitos:


Quadro 1 - Ética e moral: apontamentos diferenciais

ÉTICA MORAL
Princípio teórico-reflexivo Regras de condutas específicas
Ética é temporal Moral é temporária
Ética é universal Moral é cultural
Fonte: Elaborado pela autora (2021).
16 Ética e Cidadania

Assim, a ética pode ser entendida como um parâmetro, a lei do


que seja ato moral, o controle de aplicação da moral. Dessa forma, são os
códigos de ética que devem ser exercidos para os diferentes conjuntos de
grupos dentro do sistema social mais abrangente. Já a moral, por sua vez,
de acordo com Kant em Chauí (2010), “é tudo aquilo que precisa ser feito,
independentemente das vantagens ou prejuízos que possa trazer”. Se
praticarmos um ato moral, podemos até sofrer consequências negativas,
já que o que é moral para uns pode ser amoral ou imoral para outros.

Quadro 2 - Diferenças entre ética e moral

ÉTICA MORAL

Lida com o CERTO e o Lida com o CERTO e o ERRADO.


ERRADO.

Modo social de agir: implica Modo pessoal de agir: é adquirida


no consenso e na adesão da e formada ao longo da vida por
sociedade. experiências.

Normas e regras sociais: Normas e regras pessoais: é guiada


é guiada pela cultura da pela consciência.
sociedade.

Coletivo: se constrói a partir do Individual: é o que fundamentada


consenso de várias morais. a ética.

Fonte: Elaborada pela autora (2021).

SAIBA MAIS:

Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos o acesso


ao vídeo “Moral e ética: conceitos e diferenças”, o qual traz
uma boa discussão sobre a diferença entre ética e moral.
Disponível aqui.
Ética e Cidadania 17

RESUMINDO:

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu um


pouco mais? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido
que ética e moral são conceitos complementares, porém,
diferentes em sua essência. Procuramos marcar que
ética é a reflexão e a teoria da internalização dos valores
morais, que são específicos para cada grupo ou sociedade.
Cada grupo social possui suas normas e orientações de
conduta. Ao escolhermos orientar nossa ação pensando na
preservação positiva da interação social e no bem do outro,
estamos atuando de forma ética. Nem sempre, durante a
história, a ideia de ética foi pensada como o conceito que
hoje devemos adotar. A ética nos faz discernir entre certo
e errado, mas com foco na organização e preservação do
social e da manutenção do bem-estar alheio.
18 Ética e Cidadania

Conceito de Cidadania
Pensar em um conceito de cidadania nos remete a um sentimento
de pertencimento a um Estado, uma nação ou um Estado-nação. Devemos
entender que esse conceito vem a ser um grande ponto de referência
para extrairmos a compreensão de direitos, obrigações e deveres de
cada indivíduo mediante o todo social que, a partir de uma representação
política, pode direcionar ou não os interesses de um grupo de indivíduos
em um sistema político. Esses indivíduos podem, ou não, constituírem-se
como cidadãos. O que é ser cidadão? O que podemos entender sobre
cidadania?

Para Carvalho (2002), o conceito de cidadania foi relacionado a um


costume de desdobrar esta em direitos civis, políticos e sociais. Nesse
olhar, segundo o autor, o cidadão pleno seria aquele que tivesse os três
direitos, mas ainda teríamos os cidadãos incompletos, cujos direitos se
resumiriam em alguns poucos; já aqueles que não tivessem direitos
seriam considerados não cidadãos.

Para ele, ao se resumir o conceito de cidadania a posse e gozo de


direitos civis, políticos e sociais, também é preciso compreender o que
significa cada um desses direitos. Nesse sentido, de acordo com o autor,
vemos que:

•• Direito civil – aquele que garante o ir e vir, bem como o


agrupamento em movimentos, como sindicatos, a realização de
greve etc.; possuir seus próprios bens (propriedade privada); livre
organização religiosa ou mesmo ideológica.

•• Direito político – realiza-se no ato de votar e ser votado, na


participação da vida política do país. O indivíduo pode ser
candidato à representação e também pode escolher quem quer
que o represente.

•• Direito social – refere-se a ações governamentais e da sociedade


civil organizada em prover serviços ao cidadão, como saúde,
educação e políticas sociais.
Ética e Cidadania 19

Figura 5 – Cidadania e relação com os direitos e deveres

Fonte: Elaborada pela autora. (2021).

Marshall (2002), ao desenvolver a discussão sobre o conceito de


cidadania, mostra que essa foi construída na Inglaterra antes da Revolução
Industrial, em contexto de necessidade de afirmação de direitos, uma
vez que o reconhecimento de direitos aos nobres, e posteriormente aos
burgueses e até à classe trabalhadora, mostrou-se uma tarefa primordial
à organização das relações de produção, que se consolidariam mais tarde
na sociedade moderna.

Para o autor, a evolução da cidadania só se concretiza com a


conquista de direitos ao longo da história. A cidadania é pensada por ele
considerando aspectos civis, políticos e sociais.

Então, se buscarmos a origem histórica do conceito, com­


preenderemos que sua origem como palavra vem do latim “civitas”,
que significa cidade. Essa palavra, “cidadania”, era comumente utilizada
no contexto da Roma Antiga para identificar a situação política de uma
pessoa e os direitos que essa pessoa poderia usufruir.

Com esse histórico de debates e conceitos, vemos que a ideia de


cidadania não é algo estável, definido ou adquirido sem um entendimento
de ação. Com isso, destaca-se que não é a conquista de um direito que
significa que ele vá de fato ser efetivado. A cidadania é um exercício de
saber e agir que é preciso ser incluído e desejar participar da construção
de novas relações e consciências de efetivação de direitos.
20 Ética e Cidadania

VOCÊ SABIA?
É muito comum acharmos que a ideia de cidadania pode
ser resolvida apenas com a efetivação de direitos para cada
indivíduo ou grupo social? Pois é, seria necessário destacar
que a cidadania envolve uma compreensão dos deveres
de cada um para com a sua cidade, estado ou localidade
onde habita. Ter deveres é assumir que há uma relação de
troca recíproca entre receber, obter ou conquistar direitos e
praticar a realização de deveres. Exercitar o cumprimento
de um papel social que possui tarefas para continuamente
fortalecer e ressignificar a vida social.

Figura 6 – Direitos e deveres do cidadão brasileiro

DIREITOS DIREITOS
DIREITOS CIVIS DEVERES
SOCIAIS POLÍTICOS
Participar
Garantia de voto
das eleições,
direto e secreto,
Direito à vida Educação escolhendo e
com igual valor
votando nos seus
para todos.
candidatos.
Direito a ser
Estar atento ao
Direito à liberdade candidato a
Saúde cumprimento das
de expressão um cargo nas
leis do país.
eleições.
Pagar os impostos
Liberdade de ir e vir. Alimentação __________
devidos.
Participar da
Igualdade entre
Trabalho __________ escolha das
homens e mulheres
políticas públicas.
Proteção da Respeitar os
intimidade e da vida Moradia __________ direitos dos outros
privada cidadãos.
Liberdade para
Proteger o
exercer sua Transporte __________
patrimônio público.
profissão.
Proteger o meio
Direito à propriedade Lazer __________
ambiente.
Fonte: Elaborada pela autora. com base em Lenzi ([s. d.]).
Ética e Cidadania 21

Figura 7 – Cidade e cidadania

Fonte: Freepik

IMPORTANTE:

Com toda a discussão apresentada, é possível lembrar de


uma obra de Dimenstein (1994), O cidadão de papel, que
aborda o fato de que, no Brasil, a cidadania está no papel,
mas não existe de verdade. Isso é perceptível, uma vez que
o autor destaca a violência social e a juventude dos anos
1990, a ausência de projetos de educação, informação e
a pobreza. De lá para cá, muitas situações se atualizaram,
mas, de todo modo, essa obra nos faz refletir o quanto
ainda temos por conquistar com atitudes verdadeiramente
de participação e reclamação de nossos direitos. Vale a
pena conhecer mais esse debate.
22 Ética e Cidadania

Figura 8 – Obra O cidadão de papel

Fonte: Reprodução de Oliveira (2014).

DEFINIÇÃO:

Cidadania: refere-se a um conjunto de ações com caráter


de reivindicação que se volta para o interesse coletivo. É
em seu exercício que se aprimoram práticas de convivência
melhores e tratam a qualidade de vida dos habitantes da
cidade.  É um conceito diretamente ligado a uma ideia
de aprendizagem social, que busca a culminância do
atendimento de direitos e a compreensão de compromisso
e deveres a cumprir.

SAIBA MAIS:

Saber que as possibilidades de debate para a compreensão


do conceito de cidadania e como podemos alcançá-lo é
um privilégio, vamos ler mais um pouco? Então, clique aqui.
Ética e Cidadania 23

É muito importante entender também a relação entre o conceito de


cidadania e a educação, pois, com o processo educativo, desenvolvem-
se valores e consciência da preocupação com o outro, além da questão
da responsabilidade para com a vida social. Nesse sentido, no Brasil
e na América Latina, a partir das décadas de 1980 e 1990, a discussão
sobre cidadania, direitos humanos e democracia ganha muito destaque,
sobretudo nos exercícios da educação formal e informal. Dessa forma,
foram criados documentos formais para orientar a educação para a
formação da cidadania. Exemplos claros dessas iniciativas encontram-se
nos documentos listados a seguir:

•• Constituição de 1988.

•• Lei de Diretrizes e Bases (LDB) - 1996.

•• Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - 1990.

•• Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) - 1996.

•• Propostas de Políticas Educacionais.

É notável que existem sentimentos e valores educacionais que


podem ser desenvolvidos e aprendidos na família ou na escola, na
educação formal ou informal, e que podem colaborar para o despertar da
cidadania. São eles: cooperação, perdão, respeito, sinceridade, diálogo,
solidariedade, combate à violência e bondade. A princípio podem parecer
valores presentes em nossa humanidade, mas de fato o são, e, quando
bem trabalhados, podem otimizar responsabilidades e aptidões para o
fortalecimento de relações sociais pautadas na garantia recíproca de
efetivação de direitos e deveres.

SAIBA MAIS:

Veja como a LDB nº 9394/96 direciona suas diretrizes para


uma educação voltada à formação de um sujeito cidadão
acessando-a aqui. Em seguida, assista ao vídeo sobre
educação e formação do cidadão clicando aqui.
24 Ética e Cidadania

Sacristan (2000) infere que a distância entre os direitos no papel e


a efetiva cidadania só é possível quando os envolvidos tomam para si a
atitude de fomentar ideias práticas.

Almeida e Soares (2010) apontam que a ligação entre vida individual


e comunitária só ocorre quando há um reconhecimento mútuo da
relevância recíproca entre os dois. Este, para os autores, é o verdadeiro
sentido da cidadania, sem exclusões sociais.

Sobre a relação cidadania e educação, Freire (2011) orienta que o


homem deve ser o sujeito da sua ação, criando e transformando o mundo.
Em seu olhar, a escola deve funcionar como um espaço que tende a
oferecer ao indivíduo exercício da cidadania e possibilidade de redefinição
da realidade.
Figura 9 – Escola e cidadania

Fonte: Freepik
Ética e Cidadania 25

RESUMINDO:

E então, como foi a experiência de aprendizagem com


o conceito de cidadania? Vamos resumir um pouquinho
sobre o que vimos para que você realmente possa fixar
mais o estudo deste capítulo. Você deve ter aprendido
que é muito importante compreender que cidadania é um
conceito que articula nossos direitos e deveres, bem como
que o exercício dela torna a coletividade ativa e integrada
para uma harmonia social. A cidadania destaca a liberdade
e a convivência comunitária muito mais do que qualquer
questão de relações de poder ou governo constituído. Ser
cidadão é participar de forma ativa da realidade social em
que se está inserido, protagonizando a busca de qualidade
de vida para seus membros pela via da efetivação de
direitos. No entanto, não devemos esquecer de que
também possuímos deveres com a nossa comunidade.
Por fim, vimos o importante papel que a educação ocupa
na formação do cidadão. Por meio da educação formal
e a informal, é possível transmitir os valores da formação
à cidadania, oferecendo liberdade e autonomia para os
indivíduos atuarem na sociedade de forma digna.
26 Ética e Cidadania

Ética Social e Política


Iniciamos nossos estudos sobre a ética e a política considerando
o pensamento de Arendt (2003), que nos mostra que política é ação e,
portanto, nenhuma questão política pode, segundo ela, estar submetida
a subjetividade. Na visão dessa autora, o entendimento da ideia de práxis
é a mola mestra para a compreensão de seu conceito de ética, que muito
está relacionado com o que já vimos aqui. Para ela, ética envolve-se com
o cuidado com o mundo, com o espaço das relações humanas e também
com o local que permite a vida e a singularidade humanas.

Arendt (2003) preocupa-se não com a subjetividade do homem, mas


sim com os homens em pluralidade. Assim, percebemos que o conceito
de ética social está direcionado para este olhar. Arendt (2003) nos aponta
que as atividades humanas são o resultado da produção desenvolvida
no mundo da vida ativa, é no mundo (na práxis) que o homem transita e
desenvolve atividades que ele condiciona sua existência. O cuidado com
o mundo é, por conseguinte, o cuidado com a singularidade humana,
para a autora.

Permanecendo nesse raciocínio, colabora para nosso conhe­


cimento sobre a questão política, pois ela define que a política não deve
se submeter às questões morais. Ela se contrapõe ao pensamento de
Maquiavel, ao afirmar que a política não deve ser guiada para atingir meios
e fins. Como sabemos, Maquiavel, clássico da política, aponta que os fins
justificam os meios. Já Arendt (2003) acredita que se a praticidade é o agir,
então a forma instrumentalizada que o autor traz de calcular formas para
atingir objetivos em política acabam por se configurarem em pré-ação
e teoria para controlar a ação. Segundo ela, a política não deve seguir
qualquer natureza ou espírito, mas sim ter o compromisso com o “espírito
correto”, algo que se define em si mesmo, sem qualquer teleologia
ou previsibilidade. A ação política informa a distinção articular de cada
homem.

Ainda seguindo seu pensamento, a ética é a pluralidade humana


constitutiva do mundo, o que faz a ideia de uma ética social ser mais
forte e presente para que as relações humanas se processem de forma
operativa. Visto dessa forma, Arendt (2003) mostra que a ética varia de
acordo com o espaço político. O agir é livre de qualquer determinação.
Ética e Cidadania 27

A discussão que trouxemos até aqui serve para evidenciar que a


experiência coletiva das pessoas e sua respectiva construção cultural têm
em si mesmas um valor significativo para a compreensão do conceito de
ética social. Isso pois, ao abordarmos tal conceito, estamos, na verdade,
no campo de pensar, o que pode ou não ser aceitável socialmente,
isso se deve ao próprio princípio que o conceito traz consigo: a ideia de
que os membros de uma comunidade precisam de cuidados de forma
homogênea.

DEFINIÇÃO:

Ética social: conjunto de regras e diretrizes que balizam


escolhas e comportamentos de uma sociedade que
resolveu adotar aqueles padrões de conduta. Ela
funciona como um roteiro, um código de conduta. Não há
necessidade de dizer o que se deve ou não seguir, apenas
fundamentalmente seguir.

A ética social apresenta princípios que precisamos conhecer: a


dignidade da pessoa, o direito de propriedade, a primazia do trabalho, a
primazia do bem comum, a solidariedade e subsidiariedade.

Sá (2010) desenvolve a ideia de que existem hábitos dignos de


louvor, isto é, existe uma conduta virtuosa padrão que serve de referência
quando pensamos no respeito a todos os seres humanos. O autor busca
em Aristóteles a lógica da virtude. Para ele, se um homem adota uma
conduta virtuosa em um local onde não há a prática comum dessa
conduta, então este seria um homem virtuoso.

Em Aristóteles (1997), vemos também uma iniciativa em considerar


que o verdadeiro sentido da ética é voltar-se para a comunidade na
amplitude desta e no exercício da cidadania, objetivando a formação e
organização da consciência política humana. Para ele, “o homem é um
animal político”.
28 Ética e Cidadania

Figura 10 – Obra de Aristóteles

Fonte: Reprodução de Livraria da Travessa.

Dessa forma, é possível traçar imediatamente uma relação entre a


ética social e a política. A política é o campo da busca do bem comum,
conforme Aristóteles demarca em seus estudos. Nesse sentido vale a
ideia de que ética e política devem caminhar lado a lado, uma vez que
ambos os conceitos apresentam um viés corporativo, aquele que conduz
ao bem-estar da comunidade, do coletivo, do social.

Dissecando sobre a palavra política, observamos que ela é originária


do grego pólis (politikós) e seu significado diz respeito ao urbano, ao civil,
ao que é da cidade (da pólis).

Weffort (1987) mostra que os clássicos da política podem nos guiar


muito mais sobre o conceito de política que consideramos fundamental
para sustentar a relação ética e a política, já iniciada anteriormente.
Segundo o autor, para Thomas Hobbes a humanidade vivia em estado
Ética e Cidadania 29

de anarquia e, ao criar a sociedade, por meio do pacto social, criou


conjuntamente a chamada sociedade política. Segundo ele, os homens,
mediante seu estado de guerra, abriram mão de suas decisões e escolhas
mais individuais para constituírem o estado soberano, que não permitiria a
volta ao estado de natureza. Tal movimento fez com que a representação
política desses homens fosse delegada ao soberano, que deveria garantir
o grupo ao exercer seu poder em favor do bem comum.

O autor também revela que, em John Locke, vemos que o estado


de natureza não teria significado de caos, mas ordem e razão. Segundo
ele, o Estado surgiu para assegurar a lei natural, bem como para manter
a harmonia entre os homens. Locke não destaca que houve uma cessão
dos direitos naturais ao Estado, pelo contrário, acredita que a soberania é
um valor e que deve ser exercido pela maioria, assim como o respeito aos
direitos à vida, à liberdade, à propriedade.

Weffort (1987) apresenta, ainda, a teoria de Jean Jacques Rousseau,


que parte do princípio de que houve um estado de natureza que não se
constituía no caos de Hobbes e nem no mundo ordeiro e racional, como
assegurava John Locke. Os homens viviam em caráter de desigualdades,
mas eram livres e felizes. A sociedade política surge, então, como um mal
necessário para manter a ordem e evitar o retorno das desigualdades.
Assim, na criação do Estado a partir do contrato social, o indivíduo cedeu
parte de seus direitos naturais para a criação de uma entidade detentora
de uma vontade geral, portanto, a soberania do Estado é a incorporação
da vontade geral de todos.

NOTA:

Os clássicos da política, John Locke, Thomas Hobbes e


Jean Jacques Rousseau integram os teóricos que discutem
a criação do Estado a partir de um pacto social fomentado
pelos homens. Para saber mais sobre tais teorias, leia:
WEFFORT, Francisco. Os clássicos da política. São Paulo:
Editora Ática, 1989.
30 Ética e Cidadania

Figura 11 – Clássicos da política

Fonte: Sabedoria Política.

A questão é que todos esses pensadores falam de política como


um lugar de representação de todos, e essa possibilidade de ação está
diretamente vinculada à concepção de ética social. Isso porque quando se
analisa a criação do contrato social, a organização da sociedade política e
a soberania da vontade geral, deve-se considerar o princípio de comando
político com referência da orientação ética, do governar para o outro.

Semelhante a como pensamos, a questão da ética social nas


empresas na atualidade, vemos que na sociedade empresarial existem
comportamentos de valorização e dimensionamento da preservação
ambiental. Ideias e projetos ecológicos que, inclusive, fundem-se com
perspectivas de responsabilidade social, muitos líderes corporativos
precisam, por normas éticas, doar uma porcentagem dos lucros
anuais para instituições de caridade. Essa pode ser uma ação que está
diretamente vinculada com a real necessidade de ajuste para condutas
que são aceitas, valorizadas e instituídas socialmente. Temos muitos
padrões que fortalecem a ética social e que se incluem nos valores
familiares, nas crenças religiosas, na moralidade e na integridade.
Ética e Cidadania 31

Figura 12 – Problemas para a ética social

Fonte: Elaborada pela autora (2021).

Os desafios para a ética social, aliada a representação política,


são desafios do mundo atual. Com base neles, é preciso rever práticas e
condutas de gestão de comunidades, recursos e da própria concepção
de coletividade e bem comum.

SAIBA MAIS:
Para saber mais, assista ao vídeo: “Aristóteles: Ética e
política” clicando aqui.

RESUMINDO:

Entendeu um pouco da relação entre ética social e política?


Neste capítulo, procuramos demonstrar como os conceitos
de ética social e política devem estar associados para a prática
do bem comum. Pois reforçamos que a ética consiste em
uma regra usada para focar na construção do relacionamento
com os outros. O sentido e o conceito de ética social foram
desenvolvidos como verdadeiros códigos de conduta que são
aceitos e praticado pelos membros de um grupo social. Falamos
dos clássicos da política, Hobbes, Locke, Rousseau, com o
intuito de mostrar que, em meio ao caos social, os homens
criam a ordem, delegam sua concepção de representação
ao estado, acreditando que este pode gerir suas vontades
comuns. Cada uma com sua teoria, mas no bojo conceitual, o
principal é entender que a política deveria conduzir a sociedade
pela lente da ética, já que em sua originalidade conceitual, elas
podem voltar-se para o bem comum.
32 Ética e Cidadania

A Ética e a Moral na Contemporaneidade


Chegamos até uma reflexão que será muito importante para o olhar
sobre diferentes situações nos tempos atuais que vivemos. Devemos
abordar a relação ética e moral na sociedade contemporânea para que
possamos entender mais sobre diferentes posicionamentos em diferentes
culturas e grupos sociais.

Vimos no tópico anterior que existem desafios impostos à nossa


análise da ética social, vinculada à política, mas, a partir de agora,
precisamos pensar na generalidade da concepção de ética e moral já
aprendidas para o entendimento de tais desafios.

Vamos iniciar escolhendo um dos grandes desafios da humanidade,


cuja dimensão nos entristece: a fome mundial. A fome é uma questão
social. Mas observe que podemos eleger a relação que os países de
primeiro mundo têm em relação ao trato da questão. Você poderá
entender melhor acionando os conceitos de ética e moral para pensar
sobre as reportagens a seguir.

PRIMEIRA REPORTAGEM

Fome extrema atinge mais de 113 milhões no mundo


África é o continente mais afetado
Influenciado por conflitos armados

Mais de 113 milhões de pessoas em 53 países sofreram “insegurança alimentar


aguda” em 2018, afirma um relatório global da ONU sobre a crise alimentar
divulgado nesta terça-feira (02/04).

O relatório apresentado pela União Europeia (UE), Organização das Nações


Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e o Programa Alimentar
Mundial (PAM), entre outras organizações, destaca que o problema afeta
principalmente o continente africano.

Os países que atravessaram as mais graves crises alimentares são:  Iêmen,


República Democrática do Congo, Afeganistão, Etiópia, Síria, Sudão, Sudão
do Sul e o norte da Nigéria.

Dominique Burgeon, chefe de emergências da FAO, afirmou que os países


Ética e Cidadania 33

africanos são atingidos de forma  “desproporcional”  pela fome aguda, com


quase 72 milhões de pessoas afetadas. Segundo o documento, nos últimos três
anos, cerca de 50 países vivem dificuldades cada vez maiores para alimentar
a suas populações.

A principal causa da insegurança alimentar em todo o mundo foram as


guerras. Cerca de 74 milhões de pessoas, ou seja, dois terços da população
que enfrenta a fome aguda, estavam em 21 países ou territórios localizados
em zonas de conflito, assim como já havia ocorrido em 2017.

“Nesses países, até 80% das populações afetadas dependem da agricultura”,


afirmou Burgeon.  “Estas pessoas precisam receber assistência humanitária
de emergência para poder  se alimentar e condições para impulsionar a
agricultura.”

Em 2018, o número total de pessoas que sofreram fome aguda apresentou


leve redução em comparação a 2017 (124 milhões). Isso pode ter ocorrido em
razão de alguns países estarem menos expostos a riscos climáticos violentos,
como secas, inundações ou chuvas.

“Este recuo no valor absoluto é um epifenômeno”, minimizou Burgeon.


A redução ocorreu  “devido à ausência do fenômeno climático ‘El Nino’,
que afetou muito as culturas na África Austral e no Sudeste Asiático em
2017”. “Por causa dos violentos ciclones e tempestades em Moçambique e
no Malawi este ano, já sabemos que esses países estarão no relatório do ano
que vem”, observou.

José Graziano da Silva, diretor-geral da FAO, avalia que, apesar da ligeira


queda em 2018 no número de pessoas com insegurança alimentar aguda, a
forma mais extrema de fome, “o número ainda é alto demais”.

Ele diz que é preciso investimentos de grande porte no desenvolvimento,


ajuda humanitária e na construção da paz  “para construir a resiliência das
populações afetadas e pessoas vulneráveis”, acrescentando que “para salvar
vidas, também temos que salvar os meios de subsistência”.

O diretor-executivo do PAM, David Beasley, observou que para erradicar a


fome é necessário atacar suas causas fundamentais. “Conflitos, instabilidade,
impacto dos choques climáticos. Rapazes e moças precisam ser bem nutridos
e educados, as mulheres precisam ser verdadeiramente fortalecidas, a
infraestrutura rural deve ser fortalecida para conseguirmos esse objetivo de
fome zero”, destacou.
34 Ética e Cidadania

O relatório pede o fortalecimento da cooperação entre a prevenção, preparação


e reação no atendimento às necessidades humanitárias urgentes e às causas
profundas, que incluem as mudanças climáticas, choques econômicos,
conflitos e deslocamentos.

Fonte: WELLE, D. Fome extrema atinge mais de 113 milhões no mundo. Poder 360. 2019.
Disponível aqui. Acesso em: 10 ago. 2021.

SEGUNDA REPORTAGEM

Saiba quem é a brasileira que doou R$ 88 milhões a Notre-


Dame

Viúva de banqueiro, ela tem sala em sua homenagem no Louvre

Uma brasileira está entre os bilionários que doaram grandes somas para a
reconstrução da Catedral de Notre-Dame, de Paris, atingida por um grande
incêndio na segunda-feira (15). Lily Safra, 81 anos, viúva do banqueiro
Edmond Safra, enviou para a campanha de reconstrução um cheque de 20
milhões de euros - cerca de R$ 88 milhões. Segundo o Glamurama, ela tem
fortuna estimada em 1,3 bilhão de dólares (R$ 5,1 bilhões). 

A bilionária atualmente se divide entre casas que tem na Europa - vive entre
Mônaco, Londres, Nova York e a própria Paris. Ela já recebeu uma Légion
d’Honneur, uma medalha de honra dada para pessoas que contribuíram com
a França. Uma sala no Museu do Louvre, a Galeria Edmond et Lily Safre,
é batizada em homenagem a ela e ao falecido marido. O ambiente é todo
decorado com mobiliário do século 18 doado pelo casal. 

Um livro da jornalista canadense Isabel Vincent chama a bilionária de “Lily


Dourada”, nome da biografia. A escritora, que era na ocasião repórter do New
York Post,  passou cerca de um ano no Brasil entrevistando pessoas sobre
o casal. A publicação traz detalhes sobre o suicídio do segundo marido de
Lily, o empresário Alfredo Monteverde. No almoço antes da morte, Lily e o
marido discutiram detalhes do divórcio. Quando ela saiu, ele tirou a própria
vida.

O pai de Lily era um inglês do ramo de ferrovias que chegou ao Brasil no


início do século XX. Ela nasceu em Canoas, no Rio Grande do Sul. Seu
primeiro marido, o argentino Mario Cohen, era um milionário fabricante de
meias de náilon. O casal viveu no Brasil, Argentina e Uruguai e teve três
filhos - o mais novo, Claudio, morreu em 1986 em um acidente de carro. A
relação com Monteverde veio depois - ela se divorciou para ir morar no Rio
Ética e Cidadania 35

com a nova paixão, que era empresário e foi fundador da rede Ponto Frio.
Monteverde tirou a própria vida em 1969. Eles tiveram dois filhos.

Depois, Lily se mudou para o Reino Unido, onde morou por 10 anos. Ela
chegou a casar em 1972 com um inglês, mas o casamento foi posteriormente
anulado. Então conheceu Safra, na época o brasileiro mais rico do mundo. Os
dois se aproximaram durante uma disputa em um leilão, segundo a revista
Joyce Pascowitch. Edmond, já quarentão, ganhou e comprou a escultura, mas
presenteou Lily com a obra. Libanês naturalizado brasileiro, era um homem
muito discreto. Viveram muitos anos em Nova York, em uma cobertura
repleta de pinturas e esculturas - arte era uma paixão de ambos.

O casamento durou  23 anos, até que em 1999 Safra morreu. Em Mônaco,


onde passavam temporadas, Edmond Safra foi vítima de um incêndio.
Seu corpo foi achado na banheira de uma suíte, próximo ao de sua enfermeira.
O julgamento sobre o caso considerou culpado pelo incêndio um de seus
enfermeiros, Ted Mahrer, que teria ateado fogo a uma lixeira para salvar o
patrão, como herói, depois. Trancado no banheiro por seis horas, o empresário
morreu asfixiado pela fumaça. Safra lutou nos últimos anos de vida contra o
Mal de Parkinson e tinha acompanhamento especializado em casa. Em 1998,
ao revelar que sofria a doença, ele fez doação de 50 milhões de dólares a uma
instituição de pesquisa sobre o tema. 

Desde a morte do marido, Lily passou a se desfazer de parte dos bens e se


envolver mais com ações filantrópicas, com a Fundação Edmond J. Safra.
Em 2004, ela doou 10 milhões de dólares à Universidade Harvard e o mesmo
valor para uma entidade criada pelo ator Michael J. Fox para pesquisar a
origem do Mal de Parkinson. Em 2005, colocou à venda 800 peças de sua
coleção particular de arte pela casa de leilão Sotheby’s. “Minha vida e meus
interesses mudaram, e já não tenho tempo nem escala nas casas para apreciar
a coleção como fazíamos antes. Tive então que tomar uma decisão difícil: é
hora de transferir aos outros o prazer de possuir estes tesouros”.

Arrecadação. A campanha  para reformar Notre-Dame arrecadou até agora


quase 1 bilhão de euros. Entre os doadores famosos está François-Henri
Pinault, marido da atriz Salma Hayek, do grupo Kering, que afirmou que vai
contribuir com 100 milhões de euros. O grupo LVMH, da bilionária família
Arnault, também doou € 200 milhões (R$860 milhões).

A empresa francesa de cosméticos, L’Oréal, dará 200 milhões de euros, um


valor agregado aos 200 milhões doados pelo grupo LVMH e aos 100 milhões
prometidos respectivamente pela família Pinault e pela petrolífera Total.
36 Ética e Cidadania

O presidente francês Emmanuel Macron disse que a França iria contar com
ajuda de “talentos” para reconstruir a torre mais alta da construção, que ficou
destruída. Ela afirmou que em 5 anos o local estará totalmente renovado e
“ainda mais bonito” [...]
Fonte: SAIBA quem é a brasileira que doou R$ 88 milhões a Notre-Dame. Correio 24 horas.
2019. Disponível aqui. Acesso em 10 ago. 2021.

Vejamos possíveis análises para a questão da fome.

Sob a ética do bem comum, quando comparamos as duas


reportagens, logo nos vêm uma ideia de que a bilionária que doou
milhões para a reconstrução da Catedral de Notre-Dame, na França, não
está apresentando uma preocupação ética em relação aos números da
fome africana, apresentada na segunda reportagem.

Esse tipo de reflexão, na verdade, é importantíssimo para nossa


compreensão sobre ética e moral. Pois vemos que, devido à bilionária
ter tanto dinheiro e pensar na reconstrução de um patrimônio histórico
da humanidade, a Catedral de Notre-Dame, poderíamos compreender
que para sua moral (a moral que a formou e a cultura que pertence) há
um sentido de nobreza em tal atitude. No entanto, podemos conceber
como imoral a atitude dela em relação a não se disponibilizar para doar
qualquer dinheiro para o combate à fome na África. Esta é só uma forma
de debatermos questões contemporâneas com o olhar da ética e da
moral.

Semelhante a essa reflexão, vemos também a situação da violência


que invade as escolas no mundo inteiro. Há diversos casos de jovens
e adultos que cometeram atentados sem qualquer melindre, fazendo
alunos e alunas inocentes vítimas fatais de suas ações, de forma que nos
colocamos perplexos, sem palavras, transtornados e tristes diante dessas
notícias.
Ética e Cidadania 37

Figura 13 - Bullying

Fonte: Pixabay

Tal fenômeno suscita nossas reflexões sobre a moralidade do


contexto em que ocorre, sobre nossas próprias crenças éticas e sobre se
é possível explicar tais atitudes assassinas por uma suposta situação de
violência que o assassino tenha sofrido na infância ou uma situação de
bullying, por exemplo. Isso serviria para explicar que as escolas precisam
estar atentas na formação de seus alunos, fortalecendo valores morais de
bem comum, de promoção pessoal de cada aluno.
38 Ética e Cidadania

IMPORTANTE:

O importante em todas essas ideias e reflexões é


compreender a relatividade das situações, além da
profundidade e contextualização dos conceitos de ética e
moral. Com isso, não estamos aqui a defender assassinos,
indivíduos negligentes com a questão social, estamos
mostrando que matar não é ético, mas a qual moral pertence
àquele que o pratica. Dessa forma, consideramos que, na
atualidade, com as situações desafiadoras trazidas pela
era da globalização, a crise das representações políticas,
a recessão econômica, a individualização, a tendência
ao xenofobismo, o avanço das tecnologias digitais e os
estudos das possibilidades de mutações genéticas, vemos
a grande importância da educação para a formação da
moralidade nos indivíduos.

Bencostta (2007) afirma que as instituições educacionais são


fundamentais para a aprendizagem de conhecimentos específicos
na formação de indivíduos autônomos capazes de interagir com as
diferentes situações que podem vivenciar no mundo contemporâneo.
Vázquez (2003) nos lembra bem que a função social da moral deve ser
a de regulamentação das relações entre os homens para contribuir na
manutenção e garantia da sociedade. Além disso, a ética é uma prática
diretamente relacionada à ação humana.

Bencostta (2017) fala do trabalho de Svitras (2017), que reforça


que a atividade em sala deve ser capaz de desenvolver habilidades e
competências que colaborem e definam soluções para dilemas sociais. É
na escola que se pode criar um ambiente ideal para prática e aprendizagem
da ética e a formação do caráter; é possível falar de respeito, justiça,
solidariedade e moral.
Ética e Cidadania 39

O autor relaciona propostas de trabalho para que isso aconteça na


escola:

•• Trabalhar conceitualmente – definir o conceito de ética e promover


o debate criativo. Aceitar e mediar as opiniões das turmas.

•• Construir uma atividade relacional – fornecer desafios para que os


alunos e alunas convivam com a diferença.

•• Incentivar a tomada de decisões – Levar alunos e alunas a pensar


nas situações concretas e como seria decidir pelo certo ou errado
naquela situação. Como exemplo, desde contar uma mentira para
sair mais cedo da escola a até mesmo pensar a corrupção na
política.

•• Jogar com situações limítrofes – apresentar situações em que o


aluno é levado a pensar como se um familiar ou amigo estivesse
em situação de risco, por exemplo.

•• Criação de regras com a turma – essa situação leva a debates


quanto ao que os alunos querem para suas rotinas em termos de
normas de conduta e o que realmente fazem, uma reflexão de
pensamento e ação.
Figura 14 - Discussão sobre ética na sala de aula

Fonte: Freepik.
40 Ética e Cidadania

SAIBA MAIS:

Para você se aprofundar ainda mais neste tema, leia o


artigo Moral e ética no mundo contemporâneo, de Yves de
La Taille. Disponível aqui.

RESUMINDO:

Neste tópico, fomos capazes de revisar nossos conceitos


de ética e moral, você percebeu? Pensando sobre situações
do contexto contemporâneo, vimos que a ética está sempre
ligada à nossa formação moral. Ética e moral são conceitos
que devem ser trabalhados na educação formal, na escola.
Não se pode prescindir de considerar que na crise de
valores, os indivíduos deixem de agir desconsiderando a
moral e a ética vigentes.
Ética e Cidadania 41

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