Você está na página 1de 43

Psicomotricidade

Unidade I
Fundamentos da Psicomotricidade
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
VIVIANA GONDIM DE CARVALHO
AUTORIA
Viviana Gondim de Carvalho
Sou doutoranda em Humanidades, Culturas e Artes, mestre em
Letras e Ciências Humanas, pós-graduada em Psicopedagogia e Docência
do Ensino Superior. Sou especialista em Informática Educativa e graduada
em Pedagogia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.
Autora de artigos e livros didáticos. Atuo na área Educacional, com ênfase
em Educação a Distância, Psicopedagogia, Comunicação, Recursos
Humanos e Neuroeducação. Atuei em grandes empresas Nacionais e
Multinacionais consolidando a educação virtual, desenvolvendo materiais
didáticos e preparando ambientes multimidiáticos. Coordenei Fábricas de
Conteúdos, desenvolvendo produtos para Educação a Distância, como
apostilas, games, simuladores, vídeos etc. Atualmente atuo na Educação
a Distância e desenvolvo pesquisas sobre a utilização de tecnologia a
fim de melhorar o desempenho dos alunos por meio das ferramentas
tecnológicas.
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de de se apresentar um
uma nova compe- novo conceito;
tência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou dis-
mento; cutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das últi-
assistir vídeos, ler mas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Psicomotricidade..........................................................................................12

Psicomotricidade, história e conceituação................................................................... 12

Elementos base da psicomotricidade ................................................16

Esquema e imagem corporal.................................................................................................. 17

Coordenação Global...................................................................................................................... 18

Equilíbrio................................................................................................................................................ 20

Lateralidade........................................................................................................................................ 20

Dominância Lateral..................................................................................................... 20

Desvio da lateralidade............................................................................................... 21

Orientação espacial, latero-espacial e temporal...................................................... 22

Tônus.........................................................................................................................................................23

Tônus muscular e tônus motor ..........................................................................24

Ritmo.........................................................................................................................................................25

Movimento e gesto......................................................................................................26

Coordenação dinâmica das mãos.......................................................................................27

Diferentes abordagens psicomotoras, teoria e prática.............. 29

Psicomotricidade relacional.....................................................................................................29

Psicomotricidade instrumental.............................................................................................. 31
Hemisférios cerebrais na psicomotricidade.....................................35

Sistema psicomotor humano (SPMH)............................................................................... 38

Divisão funcional do córtex cerebral................................................................................ 38

Lobo frontal......................................................................................................................................... 39

Lobos occipitais................................................................................................................................ 40

Lobos temporais.............................................................................................................................. 40

Lobos parietais................................................................................................................................... 41
Psicomotricidade 9

01
UNIDADE
10 Psicomotricidade

INTRODUÇÃO
Você já observou como seu corpo se movimenta? A ciência que
estuda o ser humano por meio do seu movimento nas diversas relações
chama-se Psicomotricidade. O objeto de estudo dela é o corpo e a
sua expressão dinâmica e tem três princípios básicos: movimento ou
motricidade, intelectivo/cognição/pensamento e o afeto/emoção/
sentimento. A psicomotricidade é baseada na concepção unificada da
pessoa, ou seja, a inclusão das áreas cognitivas, sensório-motoras e
psíquicas para que seja possível compreender todos os movimentos
e interações dos seres humanos. Ela é constituída por uma gama
de conhecimentos antropológicos, fisiológicos, psicológicos e inter-
relacionais nos quais o corpo é utilizado como mediador. Entendeu? Ao
longo desta unidade letiva você irá mergulhar neste universo!
Psicomotricidade 11

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vinda (o). Nosso propósito é auxiliar você no
desenvolvimento das seguintes objetivos de aprendizagem até o término
desta etapa de estudos:

1. Compreender a psicomotricidade e a sua importância na saúde e


na educação.

2. Entender os aspectos históricos e as bases da psicomotricidade.

3. Discernir sobre os aspectos conceituais da psicomotricidade que


caracterizam o desenvolvimento psicomotor.

4. Reconhecer a importância da psicomotricidade, entendendo


suas abordagens e aplicação ao ciclo vital, como os hemisférios
cerebrais, por exemplo.

Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento?


Ao trabalho!
12 Psicomotricidade

Psicomotricidade

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo você será capaz de entender


como funciona a Psicomotricidade. Isto será fundamental
para o exercício de sua profissão. E então? Motivado para
desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante!

Psicomotricidade, história e conceituação


Compreender a abordagem da Psicomotricidade implica buscar na
França suas fontes históricas. No início do séc. XX o pensamento da Psiquiatria
Infantil estava ligado às correspondências anátomo-neurofisiológicas do
psiquismo. Neste quadro de predomínio do neurologismo surgiu a noção
de “paralelismo psicomotor” de Dupré, desenvolvida por Heuyer: “Há uma
estreita ligação entre o desenvolvimento da motricidade, da inteligência
e da afetividade”.
Figura 1 – Gestos e a psicomotricidade

Fonte: Pixabay (2021)


Psicomotricidade 13

VOCÊ SABIA?

Os franceses se conscientizavam sobre a importância do


gesto e pesquisavam profundamente os temas corporais.
Tanto que foram eles que cunharam as primeiras palavras-
chave da Psicomotricidade.

A Psicomotricidade surgiu, portanto, no âmbito da Neuropsiquiatria


e da Educação. Suas primeiras teorizações ocorreram no início deste
século. Neste primeiro momento o conceito de Psicomotricidade
privilegiou o funcionamento corporal e utilizaram-se técnicas de
reeducação instrumentais que “desenvolviam” aspectos específicos
como o tônus, a coordenação, o ritmo, a organização espacial e a noção
de esquema corporal. Criaram-se instrumentos de avaliação e aferição
das capacidades e exercícios curativos que visavam a coordenação,
a tonicidade, ao esquema corporal, a orientação espacial, a afirmação
da lateralidade e ao ritmo etc. A ênfase maior era dada à performance,
sobretudo escolar.

ACESSE:

Para saber mais sobre o surgimento da Psicomotricidade,


clique aqui.

Um conhecido teórico da Psicomotricidade, Ajuriaguerrac, junto


com Diatkine, acabaram por romper com o “imperialismo neurológico”
durante suas práticas no Hospital Henri Rousselle. Ajuriaguerrac deu
ênfase à Psicologia Genética e sintetizou as teorias de Piaget e Wallon
com as da Psicanálise de Freud e seus seguidores. Teve início aí uma
nova classificação de distúrbio psicomotor que ia além da perturbação do
paralelismo psicomotor.

Jolivet continuou o trabalho iniciado no Hospital Henri Rousselle e


em 1970 definiu a Psicomotricidade como a “motricidade em relação”.
14 Psicomotricidade

A partir desse momento, duas tendências no tratamento


psicomotor passaram a coexistir. De um lado, a reeducação psicomotora,
mantendo-se próxima do instrumental e do cognitivo, visando promover
o desenvolvimento tônico-motor e espaço-temporal com exercícios
estruturados, a organização do esquema corporal e a afirmação da
lateralidade. De outro, a terapia psicomotora, por meio de atividades
psicomotoras livres dando-se mais ênfase à expressão corporal, à
relação afetiva, como meio de atingir as fantasias e conflitos da criança, e
proporcionando a afirmação de seu desejo e a busca de conhecimento e
pesquisa da realidade, de um jeito mais espontâneo.

Alguns psicomotricistas começaram a difundir sua prática e fizeram


publicações de seus métodos e técnicas. André Lapierre foi um deles
e era considerado o psicomotricista de maior peso, sendo o criador da
Psicomotricidade Relacional.

NOTA:

André Lapierre é considerado o pai da Psicomotricidade


Relacional, uma vertente da Psicomotricidade que dá
ênfase aos aspectos afetivo-emocionais e relacionais do
ser humano.

Lapierre foi professor de Educação Física, cinesioterapeuta,


psicoeducador e foi presidente da Sociedade Francesa de Educação
e Reeducação Psicomotora. Começou a se afastar da Fisioterapia em
1977, pois entendia que essa profissão, junto com a Educação Física,
teria herdado da medicina um modelo mecânico do corpo, sobretudo a
psicoafetiva, na qual observa os fantasmas corporais.

Segundo Lapierre (2002, p. 39), na Psicomotricidade existe a mesma


regra de associação livre psicanalítica: “substituindo o dizer pelo fazer, o
discurso pela a ação. É o que chamamos espontaneidade”.
Psicomotricidade 15

RESUMINDO:

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos revisar o que vimos. Você deve ter aprendido que no
início do séc. XX o pensamento da Psiquiatria Infantil estava
ligado às correspondências anátomo-neurofisiológicas
do psiquismo. A Psicomotricidade surgiu, portanto, no
âmbito da Neuropsiquiatria. Criaram-se instrumentos de
avaliação e aferição das capacidades e exercícios curativos.
Então, surgiu a reeducação psicomotora, mantendo-se
próxima do instrumental e do cognitivo, visando promover
o desenvolvimento tônico-motor e espaço-temporal
com exercícios estruturados, a organização do esquema
corporal e a afirmação da lateralidade.
16 Psicomotricidade

Elementos base da psicomotricidade

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo você será capaz de entender os


elementos base da psicomotricidade. Isto será fundamental
para o exercício de sua profissão. E então? Motivado para
desenvolver esta competência? Então vamos lá.

A Psicomotricidade é caracterizada pelos seguintes elementos:

a. Esquema e imagem corporal.

b. Coordenação global.

c. Equilíbrio.

d. Lateralidade.

e. Orientação espacial, latero-espacial e temporal.

f. Tônus.

g. Ritmo.

h. Coordenação dinâmica das mãos.

Todos esses elementos são considerados base para o


desenvolvimento do indivíduo e são pré-requisitos para a aquisição e
desenvolvimento da leitura e escrita, conhecimento do corpo em relação
aos objetos, bem como o controle e organização do espaço e do tempo.

O homem é, antes de tudo, um ser falante e, ao denominar-se, fala


de seu corpo: eis o que o caracteriza. Em contrapartida, seu corpo fala
por ele e até, por vezes, à sua revelia. O sentir é vital, tudo que é vivido,
sentido, passado na vida fica marcado no corpo. É a partir do sensório-
motor é que passamos dar sentido ao nosso viver.

A partir das experiências Sensoriais (os cinco sentidos) visão,


audição, paladar, tato e olfato e dos estímulos recebidos no dia a dia
desde a vida intrauterina é que nos constituímos e nossa percepção de
Psicomotricidade 17

tudo partirá das sensações que sentiremos ao sermos expostos a esses


estímulos sensoriais.

Vejamos a seguir especificidades de cada um desses elementos.

Esquema e imagem corporal


A Imagem Corporal está ligada ao afeto, emoção e o Esquema
Corporal é o conhecimento do corpo, o esquema é real. A Imagem
Corporal só existe se o corpo for tocado ou falado. O que interessa para o
ser humano é a diferença. “EU não sou o outro”.

O lactente é um corpo que sofre em sua prematuridade orgânica,


e só sobrevive graças ao corpo do outro. Encontra-se em total estado de
simbiose com quem cuida dela, não distingue o eu do não eu. Depois, a
criança entra na fase do espelho e começa a perceber a diferença entre
o eu e o outro, reconhecendo as partes do seu corpo e a se reconhecer
diante do espelho formando assim sua Imagem Corporal.

NOTA:

O termo imagem corporal, com base na psicomotricidade,


refere-se à imagem ou representação mental, que abrange
aspectos afetivos, sociais e fisiológicos.

Figura 2 – Esquemas corporais

Fonte: Pixabay (2021)


18 Psicomotricidade

Schilder, em seu livro A Imagem do Corpo (1994) diz que:


A Imagem do Corpo humano é a imagem do nosso
próprio corpo que formamos em nosso espírito, por outras
palavras, o modo como nosso corpo se apresenta a nós
mesmos. (SCHILDER, 1994, p. 35)

EXEMPLO:

A estimulação do Esquema Corporal torna o corpo da criança como


um ponto de referência básico para a aprendizagem de todos os
conceitos indispensáveis à alfabetização (noções de em cima,
embaixo, na frente, atrás, esquerdo, direito). Algumas brincadeiras
são essenciais para o desenvolvimento do esquema corporal, tais
como:

• Estátua.

• Jogos de imitação.

• Cantar músicas que falassem sobre as partes do corpo.

• Apontar as partes do corpo em si mesmo e no corpo do colega

• Juntar as partes de um boneco desmontável (quebra-cabeça).

• Desenhar uma figura humana no quadro, parte por parte.

• Deitar no chão e desenhar o contorno do corpo de uma das


crianças, depois completar suas partes.

• Explorar o próprio corpo com as mãos, de olhos abertos e


fechados, depois representá-lo utilizando vários materiais como:
guache, espuma, gel, farinha.

• Releituras de obras artísticas que privilegiassem o corpo humano

• Completar o desenho de uma figura humana com o que estiver


faltando etc.

Coordenação Global
A coordenação global é caracterizada por um bom domínio do
corpo. Quando há algum distúrbio no desenvolvimento da coordenação
Psicomotricidade 19

(tanto na global quanto na dinâmica das mãos), o indivíduo poderá


apresentar dificuldades escolares, como disgrafia, escrever ultrapassando
as linhas e margens do caderno e dificuldade nos gestos.
Figura 3 – A habilidade manual ou destreza constitui um aspecto particular da
coordenação global

Fonte: Freepik

IMPORTANTE:

A coordenação global é uma condição mínima necessá-


ria para uma boa aprendizagem, e constitui a estrutura da
educação psicomotora. O desenvolvimento da psicomotri-
cidade necessita do apoio constante através de estimula-
ção. Deste modo, não é um trabalho exclusivo de um único
profissional, e sim, de todos profissionais envolvidos no pro-
cesso ensino-aprendizagem.

Por meio da coordenação motora global é possível ter controle dos


movimentos amplos do corpo como andar, correr, rolar, saltar, rastejar,
engatinhar, entre outros.
20 Psicomotricidade

Equilíbrio
O equilíbrio pode ser compreendido como a capacidade que
o indivíduo possui de manter a postura bípede, tanto quando está
parado quanto em movimento. Segundo Luria (1981, p. 18) o equilíbrio
é o responsável pelos ajustes posturais antigravitários, estabelecendo
autocontrole nas posturas estáticas e no desenvolvimento de padrões
locomotores. O equilíbrio depende essencialmente dos sistemas
labiríntico e plantar.

EXEMPLO:

O equilíbrio é dividido em dois:

Equilíbrio dinâmico – caminhar sobre uma prancha, equilibrar-se


sobre um pé só, inclinar-se verticalmente para frente e para trás.

Equilíbrio estático – Manter-se sentado corretamente, andar na


ponta dos pés, andar com um copo cheio de água na mão. Andar
em cima de uma corda estendida no chão.

Lateralidade
A Lateralidade é a capacidade motora de percepção dos dois lados
do corpo, ou seja, direita e esquerda. A predominância de um dos lados
do corpo nas atividades do indivíduo ocorre em função do hemisfério
cerebral mais utilizado. Vejamos a seguir a determinação da dominância
lateral.

Dominância Lateral
A dominância lateral é definida a partir da preferência neurológica
que se tem por um lado do corpo, no que diz respeito à mão, pé, olho
e ouvido. Tal preferência é muito importante para o desenvolvimento de
diferentes atividades, incluindo a leitura.

Alguns indivíduos são ambidestros, ou seja, utilizam ambas as


partes do corpo com a mesma habilidade e destreza. Outros utilizam a
parte direita do corpo, são chamados indivíduos destros. E ainda há os
Psicomotricidade 21

que se utilizam da parte esquerda, que são os canhotos. O indivíduo que


tem preferência pela mão de um lado do corpo e pelo olho e pé do lado
oposto aplica-se o termo lateralidade cruzada. Lateralidade indefinida é
usada para as crianças que ainda não estabeleceram sua preferência por
um dos lados.
Figura 4 – Indivíduos ambidestros utilizam ambas as partes do corpo com a mesma
habilidade e destreza

Fonte: Freepik (2021).

Algumas dificuldades de aprendizagem podem surgir em crianças


que ainda não têm sua lateralidade definida e naquelas que são canhotas,
mas foram obrigadas a escrever com a mão direita. Tais dificuldades
podem ser referentes ao tipo de grafia que elas apresentam (disgrafia, letra
ilegível), à orientação espacial na folha de papel e a posturas inadequadas
no ato de escrever.

Desvio da lateralidade
A lateralidade só se estabelece por volta dos 5/6 anos. Quando ocorre
algum fato que comprometa a compreensão da lateralidade dizemos que
há um desvio da lateralidade. Tal desvio pode ocorrer por alguns motivos,
por exemplo, um acidente que provoque uma amputação ou uma paralisia
no lado dominante faz com que a pessoa passe a usar o outro lado.
Além disso, podem ocorrer, casos em que esta mudança de prevalência
manual mude por motivo de identificação com alguém ou por imposição
dos pais ou professores ou por motivo afetivo ou por qualquer outro.
22 Psicomotricidade

Vejamos outro exemplo de desvio de lateralidade:

EXEMPLO:

Quando o indivíduo nasce canhoto, porém, é obrigado a escrever


com a mão direita, pode haver desvio de lateralidade.

A criança destra, mesmo tendo sua mão direita ocupada, é capaz


de abrir uma porta com a mão esquerda. Este fato é diferente da
dominância lateral que é a maior habilidade desenvolvida num dos
lados do corpo devido à dominância cerebral, ou seja, pessoas
com dominância cerebral esquerda têm maior probabilidade de
desenvolverem mais habilidades do lado direito do corpo e, por
isso, são destros.

A lateralidade é importante na evolução da criança porque


influência a ideia que a criança tem de si mesma, a percepção da simetria
de seu corpo, a formação de seu esquema corporal, além de contribuir
para determinar a estruturação espacial, porque percebendo o eixo de
seu corpo, a criança percebe também seu meio ambiente em relação a
esse eixo.

Orientação espacial, latero-espacial e


temporal
A estruturação espacial é parte integrante da nossa vida. Ela não
nasce com o indivíduo e é, na verdade, uma construção mental, uma
elaboração que se inicia desde pequeno. A orientação latero-espacial
ocorre naturalmente no indivíduo e desenvolve-se da seguinte maneira:
por volta dos seis anos, quando a criança já tem conhecimento do lado
direito e esquerdo do seu corpo, aos sete anos já é capaz de perceber
a posição relativa entre dois objetos, aos oito anos já reconhece o lado
direito e esquerdo em outras pessoas e aos nove anos consegue realizar
movimentos realizados por outras pessoas com o mesmo lado do corpo
no qual a pessoa que está realizando o movimento. Já a orientação
espacial é a que permite que o indivíduo se localizar em acontecimentos
do passado e projetar-se no futuro. É por meio da orientação espacial que
termos domínio das noções sociais do tempo (hora, mês, estações etc.).
Psicomotricidade 23

Para Fonseca (1995, apud CEZAR; PEREIRA; ESTEVES, 2008, p. 2),


um objeto situado à determinada distância e direção é percebido porque
as experiências anteriores da criança levam-na a analisar as percepções
visuais que lhe permitem tocar o objeto. É dessas percepções que
resultam as noções de distância e orientação de um objeto com relação a
outro, a partir das quais as crianças começam a transpor as noções gerais
a um plano mais reduzido, que será de extrema importância quando na
fase do grafismo.

A reversibilidade é a possibilidade de reconhecer a mão direita ou


a mão esquerda de uma pessoa à sua frente. Além disso, é a noção de
reversibilidade que possibilita, pouco a pouco, às crianças a compreensão
de igualdades como:

EXEMPLO: 8 + 5 = 3 + 10 7 X 3 = 3 X 7 10 – 3 = 7

Tônus
O tônus é o primeiro sistema funcional complexo que compreende a
psicomotricidade e é considerado o estado de tensão ativa dos músculos.
Se não há a organização tônica como suporte, não é possível desenvolver
a atividade motora e a estrutura psicomotora. É possível determinar o tipo
de tônus muscular observando a amplitude dos movimentos, a resistência
ao movimento passivo e a palpação da atividade flexora e extensora dos
diferentes músculos.
Figura 5 – A tonicidade se desenvolve desde o nascimento até os 12 meses de vida

Fonte: Freepik
24 Psicomotricidade

Tônus muscular e tônus motor


O tônus muscular refere-se à pessoa em estado passivo, sem
movimento, em repouso, o músculo não possui atividade contrátil interna.
Quando palpado, o músculo pode parecer retesado ou macio, e nesse
estado passivo diz-se que o músculo tem tônus muscular.

No tônus motor, o estado ativo ocorre quando um músculo está


se contraindo em resposta a um comando do sistema motor. Quando
palpado, ele mostrará vários graus de retesamento, dependendo da força
de contração. Esse estado do músculo é denominado tônus motor.

As diferenças criadas pelo tônus muscular e motor podem


ser prontamente palpadas no músculo normal. O desenvolvimento
psicomotor normal precisa do equilíbrio dos tônus muscular e motor.

Tônus Motor e Muscular Anormais: em circunstâncias normais, o


músculo tem flexibilidade funcional de passar de um estado para outro
sem qualquer dificuldade ou problema residuais. Todavia essa flexibilidade
pode falhar, por exemplo, em consequência de atividade excessiva ou
lesão do sistema motor. Haverá alterações tanto no tônus muscular como
no tônus motor que se denominará “tônus anormal”, que pode ser definido
como tônus que não mantém o movimento funcional e que pode durar
mais do que a atividade que o desencadeou.

O Tônus Motor e Muscular Anormal pode ser causado por:

1. Lesão no sistema motor – observado em quadros neurológicos


diversos como AVC, paralisia cerebral, doença de Parkinson etc.

2. Tensão psicológica, tensão emocional, ansiedade e excitação


constituem alguns dos estados psicológicos que vão influenciar
no tônus motor geral. Essa alteração no tônus não está associada
com patologia do sistema motor.

3. Atividade muscular protetora após lesão – é comum


constatar a existência de tônus motor sustentado após lesão
musculoesquelética. Trata-se de um mecanismo protetor usado
para imobilizar a lesão ou evitar o uso da área afetada.
Psicomotricidade 25

4. Perda de tônus motor – existem várias condições graves em que


o tônus motor para o músculo é reduzido ou quase totalmente
abolido. Em caso de lesões do sistema nervoso central e do nervo
periférico, o tônus motor pode ser reduzido, resultando num
músculo flácido.

SAIBA MAIS:

Para saber mais sobre tonicidade e outros elementos


da psicomotricidade leia o livro Psicomotricidade -
Filogênese, Ontogênese e Retrogênese, do autor Vitor da
Fonseca, Editora Wak.

Ritmo
RITMO, s. m (poes.) Sucessão regular de sílabas acentuadas, de
que resulta impressão agradável ao ouvido; (mús.) combinação simétrica
de sons, sob o ponto de vista da intensidade e do tempo; cadência;
movimento regular e medido; (med.) proporção de intensidade entre
as pulsações arteriais; correlação harmoniosa entre as partes de uma
composição literária ou artística. (Do gr. rhythmos). Dicionário Brasileiro da
Língua Portuguesa O GLOBO p. 610).
Figura 6 – O exercício ritmo é importante para trabalhar a concentração e a atenção

Fonte: Freepik (2021)


26 Psicomotricidade

O ritmo é marcado no ser humano desde a vida intrauterina, no


contato direto do feto com o ritmo cardíaco da mãe. Conhecido como a
primeira forma de comunicação humana. O bebê quando nasce já tem
memória musical. E a última estrutura do sistema nervoso a ser atingido
no Mal de Alzheimer é o arquecerebelo, local onde se processam os
ritmos e a musicalidade, por isso, é de suma importância o trabalho na
psicomotricidade com os recursos musicais como o ritmo.

PASSO A PASSO:

• Nunca comece um trabalho com músicas sem conhecer a música


nem os componentes do grupo.

• Sempre que começar uma música, vá com essa até o final para
que a música não fique ecoando nos ouvidos.

• Não conhecendo o grupo, comece por meio de ritmos e sons de


preferência produzidos pelas próprias pessoas do grupo.

• Busque conhecer o ritmo da pessoa com quem irá trabalhar, para


que caminharem no mesmo ritmo.

• Trabalhe com música para a reeducação da lateralidade.

Movimento e gesto
O gesto diz algo e o motor é uma ação. Cada gesto é feito de um
conjunto de ações que se complementam para atingir um objetivo final.
Todos os nossos gestos são globais. Para Fonseca (1985 p. 151, 161), “o
movimento humano reflete uma interligação dos processos emotivos,
volitivos e intelectuais, dado que constitui em si uma conquista biológica
da espécie humana. Conclusão, o movimento é fundamentalmente um
meio de interação humana entre o mundo interno da pessoa e o mundo
externo dos objetos e dos outros”.

IMPORTANTE:

As atividades rítmicas devem ser trabalhadas de forma a


causar – descontração, prazer, calma e confiança.
Psicomotricidade 27

O Gesto pode ser a postura, a mímica, o sorriso etc. Todas essas são
reações corporais que traduzem mais ou menos conscientemente nossos
estados psicoafetivos. Segundo Lapierre (1984, p. 58), essas mensagens
são decodificadas pelo outro com referência às suas próprias reações
psicotônicas.

Coordenação dinâmica das mãos


A coordenação dinâmica das mãos é o domínio harmonioso e
delicado dos gestos. O desenvolvimento da habilidade manual incluindo
o movimento de pinça, facilita a escrita (grafismo). Algumas atividades
podem desenvolver a habilidade da coordenaçãodinâmica das mãos,
como por exemplo, recorte, escrita e desenho. Tais exercícios tidos como
óculo-manuais tem como objetivo o domínio do campo visual, associado
a motricidade fina.
Figura 7 – A coordenação envolve concentração, organização dos movimentos e
coordenação visuo-motora

Fonte: Freepik (2021).

A coordenação motora fina é a capacidade de controlar pequenos


músculos para a realização de habilidades finas. Os exercícios de
coordenação dinâmica das mãos podem ser realizados com atividades,
como modelagem de massinhas e atividades de pesquisa e recorte
de letras, visando estimular a destreza, a velocidade e a precisão dos
movimentos.
28 Psicomotricidade

RESUMINDO:

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos revisar o que vimos. Você deve ter aprendido que a
psicomotricidade é caracterizada pelo esquema e imagem
corporal, a Coordenação global, o equilíbrio, a lateralidade,
a orientação espacial, latero-espacial e temporal, o tônus,
o ritmo e a coordenação dinâmica das mãos. Todos esses
elementos são considerados base para o desenvolvimento
do indivíduo e são pré-requisitos para a aquisição e
desenvolvimento da leitura e escrita, conhecimento do
corpo em relação aos objetos, bem como o controle e
organização do espaço e do tempo.
Psicomotricidade 29

Diferentes abordagens psicomotoras,


teoria e prática

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo você será capaz de entender


as diferentes abordagens da psicomotricidade. Isto será
fundamental para o exercício de sua profissão. E então?
Motivado para desenvolver esta competência? Então
vamos lá. Avante!

De acordo com Martins (2001, p. 18), os psicomotricistas consideram


que as potencialidades mentais, emocionais e motoras de um paciente
estão em frequente interação com o corpo, considerando-o o local de
manifestação de todo o ser. Desse modo, a manifestação do ser humano
está nas posturas, nas atitudes, nos gestos e mímicas transformando
a consciência corporal condição e instrumento da consciência de si. A
psicomotricidade está dividida em duas vertentes: a psicomotricidade
relacional e a psicomotricidade instrumental. A seguir veremos cada
uma delas.

Psicomotricidade relacional
A Psicomotricidade relacional é uma prática que permite à criança,
ao jovem e ao adulto a expressão e superação de conflitos relacionais,
interferindo de forma clara, preventiva e terapêutica sobre o processo de
desenvolvimento cognitivo, psicomotor e socioemocional, na medida em
que estão diretamente vinculados a fatores psicoafetivos relacionais, de
acordo com Lapierre (2002, p. 24).

A Psicomotricidade relacional surgiu na década de 1970 a partir


de congressos da área da Psicanálise que contribuíram com uma nova
visão do corpo como um meio de vivência e espaço de prazer e desejo.
As sessões de psicomotricidade relacional utilizam em especial de jogos
espontâneos fundamentados na afetividade e no conteúdo emocional das
vivências e no desenvolvimento socioemocional. Na Psicomotricidade
30 Psicomotricidade

relacional, o psicomotricista trabalha de forma mais permissiva e menos


diretiva e atua criando uma segurança emocional permitindo uma
evolução do sujeito.

A intervenção relacional não leva em consideração uma avaliação


comparativa a uma norma estabelecida. Em vez disso, observa o
comportamento e parâmetros psicomotores em relação ao próprio
corpo, espaço, o outro, o tempo, os objetos e a linguagem e realiza uma
avaliação individualizada.
Quadro 1 – Objetivos da Psicomotricidade Relacional adaptados de Àragon (2006)
Psicomotricidade 31

Fonte: Elaborado pela autora (2021).

Psicomotricidade instrumental
A corrente mais tradicional da psicomotricidade enquanto
reeducação é a Psicomotricidade instrumental. Essa corrente aponta que
o processo de desenvolvimento humano é decorrente dos processos
de maturação, baseando-se em princípios biomédicos, cognitivistas
32 Psicomotricidade

e neuropsicológicos. Esta vertente da psicomotricidade, também


conhecida como funcional ou normativa, baseia-se em aspectos motores
e cognitivos, tendo com fundamentação uma concepção normativa do
desenvolvimento humano, tendo como referência os comportamentos
e competências esperados para cada etapa do desenvolvimento. A
Psicomotricidade centrada na intervenção com componente instrumental
contém uma base mais cognitiva e neuropsicológica iniciada privilegiando
o uso de situações-problema, fazendo com que haja reflexão, invenção,
expressão e transposição, promovendo a possibilidade das atividades
propostas funcionarem como um escape criativo, libertador do imaginário
do indivíduo.

SAIBA MAIS:

Corpo e Afeto: Reflexões em Ramain-Thiers é um livro


que aborda questões sobre o ser da atualidade, suas
ações, seus pensamentos e suas emoções. A Metodologia
Ramain-Thiers, desenvolvida por Solange Thiers, tem
como base a Psicomotricidade, a Psicanálise e a Filosofia. A
visão total do ser integral, por meio do seu corpo, afetos e
ação, propicia o fazer, gerando uma sensação produtiva de
inserção social e grupal.

Figura 8 – Psicomotricidade Relacional

Fonte: Freepik (2021).


Psicomotricidade 33

Figura 9 – Psicomotricidade instrumental

Fonte: Freepik (2021).

Os objetivos da Psicomotricidade instrumental deverão ser


definidos a depender do instrumento de avaliação escolhido, que pode
ser padronizado e mais qualitativo ou quantitativo.

SAIBA MAIS:

Para ver exemplos de alguns aspectos da psicomotricidade


relacional, assista ao filme Patch Adams (1998), que trata
de um médico que sai de uma instituição e entra em uma
faculdade com seus métodos poucos convencionais que
causam inicialmente espanto, mas que, aos poucos, vai
conquistando todos, com exceção do reitor, que quer
arrumar um motivo para expulsá-lo, apesar dele ser o
primeiro da turma.

Em um contexto mais genérico, Arágon (2006, p. 52) expõe os


objetivos em que a Psicomotricidade instrumental pode ser utilizada,
sendo organizados em três esquemas psicomotores que servem para
orientar a intervenção:
34 Psicomotricidade

• Esquema corporal, abrangendo objetivos específicos ao nível


da percepção global do corpo, tónus e relaxação, equilíbrio,
lateralidade e coordenação global e segmentária.

• Esquema espacial, em específico a orientação espacial e as


noções espaciais sobre o outro.

• Esquema temporal, englobando a aquisição de noções básicas


de (velocidade, duração, continuidade, irreversibilidade e
intervalo), bem como a tomada de consciência de relações de
simultaneidade, sucessão, diferentes momentos do tempo,
consciência da sucessão e a coordenação de diversos elementos.

RESUMINDO:

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos revisar o que vimos. Você deve ter aprendido que
os psicomotricistas consideram que as potencialidades
mentais, emocionais e motoras de um paciente estão em
frequente interação com o corpo, considerando-o o local de
manifestação de todo o ser. Estudamos a psicomotricidade
relacional e a psicomotricidade instrumental. A corrente
mais tradicional da psicomotricidade enquanto reeducação
é a psicomotricidade instrumental.
Psicomotricidade 35

Hemisférios cerebrais na psicomotricidade

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo você será capaz de entender


como funcionam os hemisférios cerebrais e sua relação com
a psicomotricidade. Isto será fundamental para o exercício
de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver esta
competência? Então vamos lá.

Os hemisférios cerebrais têm funções distintas e bem definidas


no gerenciamento do corpo humano, capacidade esta que, de certa
forma pré-definida por alicerces genéticos, que, além disso, os permitem
funcionar parcialmente independentes mesmo quando isolados um
do outro. O cérebro é formado por aproximadamente 100 bilhões de
células nervosas chamadas neurônios. Eles se comunicam por meio de
transmissões de sinais eletroquímicos.

O cérebro realiza várias tarefas, por exemplo, ele controla os nossos


movimentos físicos ao andarmos, falarmos, sentarmos ou ficarmos de
pé. Além disso, controlar a temperatura corpórea, a pressão arterial, a
frequência cardíaca, a respiração nos deixa pensar, sonhar, raciocinar,
sentir emoções, recebe milhares de informações vindas dos nossos
sentidos (audição, visão, olfato, tato, paladar). O cérebro é dividido em dois
hemisférios: o direito e o esquerdo que, apesar de parecerem espelhadas,
possuem funções e competências diferentes.

Por exemplo, o mecanismo de processamento do hemisfério direito


tem superioridade sobre o esquerdo nas tarefas espaciais e as não verbais.
Além disso, esse mesmo hemisfério processa também um importante
sistema de controle dos movimentos rítmicos, processando ritmo interno
com o ritmo externo, possibilitando a harmonia da dança, do caminhar,
do falar; de perceber automaticamente a diminuição ou o aumento de
velocidade enquanto dirige e fazer o reajuste automático na velocidade
desejada (possibilitada pela perfeita harmonia da intercomunicação
36 Psicomotricidade

hemisférica), onde a temporalidade e ritimicidade têm competência no


hemisfério esquerdo.

Já o hemisfério esquerdo tem superioridade ao direito nos


processamentos temporais, verbais e outros tais, como: harmonia da
motricidade processando o tempo da ação do movimento desejado,
assim como organizando o programa sequencial do movimento e fazendo
a transição de um movimento para outro, dando melhor performance
com a contribuição da informação declarativa no processo que estiver
desempenhando.
Figura 10 – OS hemisférios cerebrais

Fonte: Freepik (2021)

Vejamos no quadro a seguir as competências de cada hemisfério


cerebral:
Psicomotricidade 37

Quadro 2 – Competências dos hemisférios cerebrais

Fonte: Elaborado pela autora (2021)


38 Psicomotricidade

Sistema psicomotor humano (SPMH)


De acordo com Vayer & Toulouse (1982, p. 35), o SPMH baseia-
se em estruturas simétricas do sistema nervoso, compreendendo
o tronco cerebral, o cerebelo, o mesencéfalo e o diencéfalo, que
constituí a integração e a organização psicomotora da tonicidade, da
equilibração e parte da lateralização e também de estruturas assimétricas
compreendendo os dois hemisférios cerebrais, que asseguram a
organização psicomotora da noção do corpo, da estruturação espaço-
temporal e da praxia global e fina, exclusivas de espécie humana devido
à sua complexidade organizativa e sistemática.

A dinâmica sistemática do SPMH prevê a participação conectada


e dinâmica das três unidades funcionais do cérebro, que são: integração
(Unidade I), elaboração (Unidade II) e expressão do movimento voluntário
(Unidade III).

A primeira unidade abrange as funções psicológicas vitais da


integração e da atenção e que é responsável pelos fatores psicomotores
da tonicidade e do equilíbrio. A segunda unidade abrange as funções
psicológicas de análise, síntese e armazenamento, que são responsáveis
pela noção do corpo e da estruturação espaço-temporal. E a terceira
unidade abrange a planificação, programação e regulação responsáveis
pela praxia global e da praxia fina.

As três unidades em permanente integração formam uma


constelação de trabalho que processa a motricidade, organizando-a
antecipadamente antes que se constitua em produto final. Tal constelação
de trabalho, verdadeiro sistema harmonioso e autogeneralizado,
composto de subsistemas espalhados pelo todo cerebral, preside a
organização psicomotora humana, como conjunto de componentes
ordenados e integrados.

Divisão funcional do córtex cerebral


O córtex cerebral é a fina camada de substância cinzenta que
recobre o cérebro. Ele é uma das regiões mais importantes do Sistema
Psicomotricidade 39

Nervoso Central (SNC). Ele recebe impulsos de todas as vias da


sensibilidade, sendo o responsável pela interpretação e resposta de
todas essas informações. O córtex cerebral é responsável por muitas das
funções mentais mais complexas e desenvolvidas, como a linguagem e o
processamento de informações.

O córtex cerebral é dividido em áreas denominadas lobos cerebrais,


cada uma com funções diferenciadas e especializadas. São os lobos:
frontal, parietal, temporal e occipital.
Figura 11 – Cérebro

Fonte: Freepik (2021).

Lobo frontal
No lobo frontal, localizado na parte da frente do cérebro (testa),
ocorre o planejamento de ações e movimento, bem como o pensamento
abstrato. Nele estão incluídos o córtex motor e o córtex pré-frontal.

O córtex motor controla e coordena a motricidade voluntária, sendo


que o córtex motor do hemisfério direito controla o lado esquerdo do
corpo do indivíduo, enquanto que o do hemisfério esquerdo controla o
lado direito. Um trauma nesta área pode causar fraqueza muscular ou
paralisia.
40 Psicomotricidade

São executados pelo córtex pré-motor a aprendizagem motora e os


movimentos de precisão. Essa área fica mais ativa do que o restante do
cérebro quando pensamos em um movimento sem executá-lo. Lesões
nesta área não chegam a comprometer a ponto de o indivíduo sofrer
uma paralisia ou problemas para planejar ou agir, porém, a velocidade de
movimentos automáticos, como a fala e os gestos, é comprometida.

Lobos occipitais
Os lobos occipitais ficam localizados na parte inferior do cérebro e
são cobertos pelo córtex cerebral. Eles processam os estímulos visuais
e, por isso, também são conhecidos por córtex visual. Possuem várias
subáreas que processam os dados visuais recebidos do exterior depois
deles terem passado pelo tálamo, uma vez que há zonas especializadas:
a visão da cor, do movimento, da profundidade, da distância, e assim por
diante. Após passarem por esta área, chamada área visual primária, as
informações são direcionadas para a área de visão secundária, onde são
comparadas com dados anteriores, e permitem que o sujeito identifique,
por exemplo, um gato, uma moto ou uma maçã.

O significado do que vemos, porém, é dado por outras áreas


do cérebro, que se comunicam com a área visual, considerando as
experiências passadas e nossas expectativas. Isso faz com que o mesmo
objeto não seja percepcionado da mesma forma por diferentes indivíduos.
Quando esta área sofre uma lesão provoca a impossibilidade de
reconhecer objetos, palavras e até mesmo rostos de pessoas conhecidas
ou de familiares. Esta deficiência é conhecida como agnosia.

Lobos temporais
Os lobos temporais ficam localizados acima das orelhas e
apresentam como função principal o processamento de estímulos. Como
acontece nos lobos occipitais, as informações são processadas por
associação. Ao estimular a área auditiva primária, os sons são produzidos
e enviados à área auditiva secundária, que interage com outras zonas
do cérebro, atribuindo um significado e assim permitindo ao indivíduo
reconhecer ao que está ouvindo.
Psicomotricidade 41

Lobos parietais
Os lobos parietais estão localizados na região superior do cérebro
e são constituídos por duas subdivisões, a anterior e a posterior. A
subdivisão anterior também é conhecida como córtex somatossensorial e
tem a função de possibilitar a percepção de sensações, como o tato, a dor
e o calor. Por ser a área responsável em receber os estímulos obtidos com
o ambiente exterior, representa todas as áreas do corpo humano. Essa é
a zona mais sensível, deste modo que ocupa mais espaço do que a zona
posterior, uma vez que tem mais dados a serem interpretados, captados
pelos lábios, língua e garganta.

Na zona posterior, que é uma área secundária, ocorre a análise,


a interpretação e a integração das informações recebidas pela anterior,
que é a zona primária, permitindo ao indivíduo se localizar no espaço,
reconhecer objetos através do tato etc.

RESUMINDO:

Vejamos agora o resumo dos papéis dos dois hemisférios


cerebrais:

O HEMISFÉRIO ESQUERDO É RESPONSÁVEL POR:

• Linguagem / matemática (lógica, sequência).

• Análise / palavra (praxias).

• Atividades simbólicas e acadêmicas.

O HEMISFÉRIO DIREITO É RESPONSÁVEL POR:

• Rima / música (ritmo).

• Simultaneidade (pintura, síntese).

• Imagem (postura).

• Atividades criativas, não simbólicas.


42 Psicomotricidade

REFERÊNCIAS
ARÁGON, M. Manual de psicomotricidad. Madrid: Ediciones
Pirâmide, 2006.

CABRAL, S. Psicomotricidade relacional. Rio de Janeiro: Revinter,


2001.

CEZAR, K.P.L.; PEREIRA, L.A.; ESTEVES, M.C.D.C. O uso de jogos


e a contribuição no desempenho da escrita nas series iniciais,
2008. Disponível em: http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.
asp?entrID=1016. Acesso em: 22 fev 2019.

FONSECA, V. Manual de observação psicomotora: significação


psiconeurológica dos fatores psicomotores. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1995.

GAINZA, V. Conversas com Gerda Alexander, vida e pensamento


da criadora da Eutonia. São Paulo: Summus, 1997.

LAPIERRE, A. Fantasmas Corporais e Prática Psicomotora.


Barueri: Manole, 1984.

LAPIERRE, A. Da Psicomotricidade Relacional à Análise Corporal


da Relação. Curitiba: UFPR/CIAR, 2002.

LEDERMAN, E. Fundamentos da terapia manual. Barueri: Manole,


2001.

LURIA, A. R. Fundamentos de neuropsicologia. Livros Técnicos e


Científicos. São Paulo: EDUSP, 1981.

MARTINS, R. Questões sobre a identidade da Psicomotricidade.


As práticas entre o instrumental e o relacional. In: Fonseca, V. & Martins,
R. Progressos em psicomotricidade. Lisboa: Edições FMH, 2001.

SCHILDER, P. A Imagem do Corpo: as energias construtivas da


psique. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

VAYER, P. & TOULOUSE, P. Linguagem corporal. Porto Alegre:


Artes Médicas, 1982.

Você também pode gostar