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Didática

Marly Savioli

Aula 01

Fundamentos
da Didática
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Diretora Editorial
ANDRÉA CÉSAR PEDROSA
Projeto Gráfico
MANUELA CÉSAR ARRUDA
Autora
MARLY SAVIOLI
Desenvolvedor
CAIO BENTO GOMES DOS SANTOS
Autora
MARLY SAVIOLI
Olá! Meu nome é Marly Savioli. Sou mestranda em Educação e pós-
graduada em Ética, Valores e Cidadania na Escola. Além disso, sou formada
em Pedagogia, com especialização em Administração e Supervisão Escolar.
Tenho 35 anos de experiência técnico-profissional na área educacional,
durante os quais trabalhei para escolas particulares, Prefeituras Municipais e
Assessorias Educacionais em geral.
Como educadora, exerci nas escolas diversos papéis, como professora,
orientadora educacional, coordenadora pedagógica, vice-diretora e diretora.
Por acreditar nas pessoas e na capacidade de mudar o mundo por meio da
educação, trabalho atualmente para a Fundação Lemann como formadora
de educadores e gestores educacionais, orientando-os e subsidiando seus
trabalhos com caminhos mais eficazes. Por isso, fui convidada pela Editora
Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes.
Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e
trabalho. Conte comigo!
Iconográficos
Olá. Meu nome é Manuela César de Arruda. Sou a responsável pelo
projeto gráfico de seu material. Esses ícones irão aparecer em sua trilha
de aprendizagem toda vez que:

INTRODUÇÃO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimen- de se apresentar
to de uma nova um novo conceito;
competência;
NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram
vações ou comple- que ser prioriza-
mentações para o das para você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado sobre o tema em
ou detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e sidade de chamar a
links para aprofun- atenção sobre algo
damento do seu a ser refletido ou
conhecimento; discutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das
assistir vídeos, ler últimas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma ativi- quando o desen-
dade de autoapren- volvimento de uma
dizagem for aplicada; competência for
concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
A Didática: conceitualização e características.......................... 10

Conceitualizando a Didática................................................................................ 13

Grandes educadores e a Didática.................................................... 17

Dados históricos e tendências pedagógicas........................................22

Educação, suas definições e processos........................................28

Educação como forma de dominação...........................................32


Didática 7

01
UNIDADE

FUNDAMENTOS DA DIDÁTICA
8 Didática

INTRODUÇÃO
A disciplina Didática faz parte da cadeia de estudos da Educação
que busca compreender o processo de ensino e aprendizagem em sua
multidimensionalidade. O objetivo da disciplina é promover diferentes
formas e práticas de interação entre professores e alunos no contexto
educacional de aprendizagem e nas circunstâncias históricas, sociais e
culturais em que são construídos os conhecimentos.
Existe também a ação intencional de organizar de forma
sistematizada os conteúdos, buscando responder “por que’, ”para que”
e “como” fazer, além de “qual a importância da aprendizagem. Ademais,
pretende-se proporcionar a reflexão do processo da avaliação e as
formas como ele acontece.
Nesta unidade de ensino, vamos buscar clarear mais cada
aspecto que envolve a Didática, iniciando por suas acepções e históricos
e conhecendo diversos educadores que se destacaram por suas ideias
sobre a aprendizagem.
Entendeu? Ao longo desta unidade letiva você mergulhará nesse
universo!
Didática 9

OBJETIVOS
Olá! Seja bem-vindo a nossa Unidade 1, e o nosso objetivo é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até
o término desta etapa de estudos:

• Conhecer a conceitualização e as características dos fundamentos


didáticos;
• Identificar os grandes educadores e suas teorias sobre Didática;
• Refletir sobre a história do processo de ensino e as tendências
pedagógicas;
• Reconhecer as acepções e processos da educação.

Vamos, então, rumo ao conhecimento. Bons estudos!


10 Didática

A Didática: conceitualização e características


A escola se transformou em sua essência. O que, antes, era um
espaço de ensino, no qual professores eram os supremos conhecedores
da cognição científica, os alunos, meros expectadores, e a reprodução
do conhecimento, a base do trabalho pedagógico, hoje se transformou
em uma área de desafios constantes.
O professor já não consegue garantir o aprendizado com apenas
a transmissão do conhecimento em aulas expositivas, como fazia antes.
Até meados do século XX, a tendência pedagógica tradicional dominou
o cenário brasileiro. Dentro dessa perspectiva, a função do professor
centra- se na transmissão dos conhecimentos científicos visando à
adaptação do aluno à sociedade. Na abordagem tradicional, é o professor
quem ocupa o centro do processo educativo, sendo o único detentor do
conhecimento. O seu papel é garantir que, por meio da memorização e
da repetição de exercícios, o aluno memorize os conteúdos estudados.
Os procedimentos didáticos não levam em conta o contexto escolar
nem os problemas reais vivenciados na realidade social.
A diversidade cultural encontrada atualmente nas escolas
teve sua origem na democratização do ensino. Antes, os professores
lidavam com alunos oriundos das classes sociais mais abastadas. Com
a Constituição de 1988, a educação tornou-se um direito de todos e
um dever do Estado. Com isso, encontramos nas escolas pessoas com
diversas características e situações socioeconômicas múltiplas.
A tecnologia, a violência e as transformações da sociedade trazem
um desafio crescente para o educador. Como trabalhar conteúdos e
competências com alunos que não desejam estar no espaço escolar?
Como motivá-los? Como usar essa tecnologia como apoio didático?
Para responder a essa pergunta, precisamos mergulhar no universo
da didática, que abreviadamente pode ser entendida como a prática de
ensino que o professor escolhe para que ocorra a aprendizagem.
A palavra “Didática” vem do grego Téchne Didaktike, que significa
o dom de ensinar. Com o surgimento da Pedagogia Moderna, rompeu-
se a ideia de que para ensinar basta ter um dom ou gostar de crianças.
A Pedagogia como “a ciência que investiga a teoria e a prática da
Didática 11

educação tem como um ramo de estudo a Didática. A Didática, nesse


sentido, é entendida como a Prática do Ensino” (LIBÂNEO, 2013, p. 24).
A Didática é um ramo de estudo exclusivo da Pedagogia. Sendo assim,
seu objeto de estudo é o ensino- aprendizagem.
A Didática vem do campo das ciências humanas, da relação
interpessoal “eu e o outro”, isto é, da empatia do ato de ensinar. Define-
se a Didática a partir do tempo e do espaço dos fatos históricos, sociais
e econômicos que determinaram o processo de ensino e aprendizagem.
O que o ensino e a aprendizagem têm a ver com a Didática?
Apesar de serem palavras com sentidos diferentes, a ideia
de ensino e aprendizagem são congruentes e se complementam. E é na
didática que encontramos essa ponte entre teoria e prática. A didática
abrange o ato de ensinar e os métodos empregados no ensino.
O ensino está pautado no trabalho do professor. A aprendizagem,
por sua vez, refere-se ao resultado do esforço cognitivo do aluno. Um
depende do outro. Em tempos atuais, há uma variedade de concepções
de aprendizagem no contexto da educação, cada um deles decorrente
de variadas correntes epistemológicas e psicológicas.
A aprendizagem pode acontecer diante de uma vivência ou
um diálogo informal. Já o ensino é intencional e precisa ser planejado
didaticamente.
Segundo Pimenta e Carvalho:
“Quando narramos um acontecimento numa roda de amigos
ou quando a mãe relata aos filhos o seu dia de trabalho na
hora do jantar, não há intenção do falante de produzir uma
aprendizagem nos seus ouvintes. Já no ensino, todas as
atividades são concebidas e planejadas em função desse
objetivo. Portanto, a compreensão do conceito de ensino só
pode ser feita em referência ao conceito de aprendizagem.”
(PIMENTA E CARAVALHO apud CORDEIRO, 2007, p. 21)
Considerando essa realidade que abordamos, a Didática
atualmente transborda a prática de ensino e se afeta pela aprendizagem.
Dessa forma, sua conceitualização continua evoluindo.
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Figura 1: Ensino é diferente de aprendizagem

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019

Para Zabalza, Didática é, hoje em dia, esse campo de conhecimentos,


pesquisas, propostas teóricas e práticas que se centram, principalmente, nos
processos de ensino e aprendizagem.
O desafio central da escola é garantir o aprendizado. Será que
a educação brasileira está atingindo esse objetivo? Quais são seus
resultados no ranking mundial?
Diante da realidade atual em que o Brasil se encontra, em situação
de rebaixamento em seus resultados no Programa Internacional de
Avaliação (PISA), devemos nos preocupar com a forma como garantir
o aprendizado dos alunos. Na última edição do programa de avaliação,
realizada em 2015, em que 70 países foram analisados, o Brasil ficou entre
os dez últimos no ranking.
Um caminho é certo e deve ser percorrido nas escolas: a
formação dos professores. Prepará-los para a realidade da sala de aula,
instrumentalizando-os com caminhos didáticos, é fundamental.
As universidades formam, nos dias de hoje, professores
conhecedores de algumas teorias, mas poucas encaminham uma
prática voltada para o trabalho que o professor deve realizar em sala de
aula. Sabe-se que a articulação entre teoria e prática constitui um ponto
crucial na formação de qualquer educador (lembrando que a teoria se
ocupa da pesquisa a partir de problemas reais que aparecem no dia
a dia do professor). Dentro dessa perspectiva, a didática deve ocupar
posição central nos currículos de formação de professores.
Didática 13

Considerando essa realidade, as escolas e os coordenadores


pedagógicos devem assumir a responsabilidade formativa do corpo
docente. É fundamental que essa formação continuada dos professores
seja organizada nas escolas com base em uma reflexão conjunta sobre
a teoria e a prática pedagógica.
Claro que, para isso, o coordenador pedagógico também deverá
receber formação, pois normalmente ele fica totalmente imerso na
logística da escola, em detrimento da aprendizagem. Por isso, ele
precisa também ter encaminhamentos de como se organizar e o que
priorizar em sua atuação.
Nesse contexto, vamos, na sequência, buscar a conceitualização
da palavra “didática” e como ela interfere na educação escolar.

Figura 2: Professores e os alunos

Fonte: Pixabay

Conceitualizando a Didática
Alguma vez você ouviu alguém dizendo: “aquele professor não
tem Didática”? Ou então: “a Didática daquele professor é perfeita”? O que
essas pessoas estão querendo dizer?
Sem dúvida, a primeira está questionando a capacidade do professor
de ensinar e a segunda está reconhecendo sua habilidade de ensinar.
14 Didática

Libâneo (1992, p. 25) define Didática como “teoria do ensino por


investigar os fundamentos, as condições e as formas de realização do
ensino”.
A Didática representa a prática que o professor escolhe para
ensinar e, consequentemente, garantir a aprendizagem dos alunos. A
Didática escolhida pelo professor deve estar em consonância com a
realidade do aluno e facilitar o aprendizado.

Figura 3: Didática a serviço da aprendizagem

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019

VOCÊ SABIA?

Para Libâneo (1994), a Didática trata dos objetivos,


condições e formas de realização do processo de
ensino, ligando meios pedagógico-didáticos a objetivos
sociopolíticos. Não há técnica pedagógica sem uma
concepção de homem e de sociedade, isto é, sem uma
competência técnica para realizá- la educacionalmente;
portanto, o ensino deve ser planejado e ter propósitos
claros, preparando os alunos para viver em sociedade.
Segundo o autor, não existe neutralidade no fazer
pedagógico, pois, quando o professor planeja sua aula,
ele deixa explícita sua concepção de mundo e sociedade.
Para Libâneo, a prática pedagógica está vinculada a
condicionantes de natureza social e política.
Didática 15

Pesquisas Didáticas buscam encontrar alternativas que


transformem as aulas em um espaço de aprendizagem. É preciso
conhecer o aluno, o conteúdo, o objetivo e as formas de abordar esse
conteúdo para, dessa forma, garantir a aprendizagem.
Será que existe uma receita que ajude os professores a ensinarem
com garantias de aprendizagem? Algum teórico já garantiu que determinada
forma de ensinar assegura a aprendizagem? Com certeza a resposta para
essas perguntas é “não”.
Como sabemos, cada escola tem suas próprias características.
Cada sala de aula é um espaço diferente. Portanto, é impossível garantir
sucesso com uma única forma de ensino.
Fundamental é compreender que as ações dos professores não
podem ser improvisadas. É necessário que haja um plano de aula que
atenda a Didática escolhida, com um objetivo específico e uma estratégia
que leve os alunos a esse objetivo. Sua ausência pode incorrer em aulas
monótonas, desmotivadoras e ineficientes.
Como um ator, que nos emociona ou faz rir com sua atuação,
o professor deve garantir o aprendizado. O ator tem um script muito
bem orientado, o qual ele estuda para demonstrar a emoção do autor. O
professor, da mesma forma, precisa ter um plano de aula e pensar nos
detalhes para que seus alunos se sintam contemplados por sua atuação.
Por não ser uma questão tão simples, propomos o entendimento
da variação que a palavra Didática apresenta. Em uma perspectiva de
investigação, a Didática, como um campo teórico da Pedagogia, estuda
os procedimentos de ensino, entre eles os materiais didáticos, como os
livros didáticos utilizados por professores e alunos.
O que são livros didáticos? Normalmente, as pessoas se remetem
à ideia do livro que o professor usa para ensinar. Sim, o livro didático é
um apoio para ensinar. Ele também tem sofrido muitas transformações.
Houve uma época em que os livros didáticos eram apenas textos
que fundamentavam a aula expositiva do professor. Com o tempo, as
editoras foram aperfeiçoando esse instrumento e, atualmente, os livros,
em sua maioria, trazem imagens, dicas, perguntas e sugestões de
leitura. Existem, inclusive, livros chamados consumíveis, ou seja, os
16 Didática

quais já apresentam atividades a serem realizadas como fixação de


aprendizagem. O livro produzido nesse formato deve ser usado apenas
por um aluno.
Como escolher o livro didático? Tudo vai depender da escola, sua
concepção de educação e currículo. Por exemplo: uma escola pode
simplesmente abrir mão do uso de livros e adotar apostilas Didáticas.
Essas apostilas trarão a proposta de ensino que a escola defende.
[...] são os livros didáticos que estabelecem grande parte das
condições materiais para o ensino e a aprendizagem nas salas de
aula de muitos países através do mundo e considerando que são
os textos destes livros que frequentemente definem qual é a cultura
legítima a ser transmitida. (APPLE, 1995, p. 82)

EXPLICANDO MELHOR:

O livro didático deve trazer a concepção de educação na qual


a escola acredita, ele deve contribuir para a na aprendizagem
dos alunos, e não ser mais um “peso” na mochila das crianças.
O livro didático é um recurso didático extra.

Figura 4: Livro Didático

Fonte: Pixabay
Didática 17

Pensando em recursos didáticos, seria importante esclarecer até


onde podemos explorar essa expressão.
Recursos didáticos são todos os apoios que o professor usa para
realizar sua aula. Estamos falando de todo tipo de recursos. Pode ser um
apagador, a lousa, um livro, computador, sites de pesquisa, apostilas.
EXEMPLO: Se um professor ministrar uma aula de educação física, ele
precisará de alguns recursos, como bola, quadra e demais equipamentos
específicos. Se um professor ministrar aula de química, precisará de
instrumentos como tubos, materiais químicos, microscópio etc.
A teoria da educação está diretamente ligada à Didática. Por ser
um ramo de estudo da Pedagogia, sua fundamentação teórica deve ser
conhecida pelo professor, assim como sua história e os grandes
educadores que obtiveram bons resultados para orientar seu trabalho
como mediadores do ensino.
A ela (Didática) cabe converter objetivos sociopolíticos e
pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar conteúdos
e métodos em função desses objetivos, estabelecer os
vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o
desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos (...)
trata da teoria geral do ensino. (LIBÂNEO, 1990, p.26)

Grandes educadores e a Didática


Ser educador é uma profissão para poucos. Esses poucos
indivíduos que dedicam suas vidas à educação devem ter em mente
que o desafio é grande.
Muitos acham que é preciso ser alguém apaixonado pelos alunos
e pela profissão. Não desprestigiando a importância do amor à educação,
precisamos de profissionais competentes para realizar um trabalho de
grande influência na sociedade. Atualmente, não podemos aceitar a
ideia de que basta gostar de crianças para ser professor. Os desafios
contemporâneos exigem uma profissionalização cada vez maior dos
profissionais da educação.
18 Didática

Mais que aprender conteúdos, hoje, os professores são mentores,


exemplos, inspiradores que podem construir excelentes cidadãos no futuro,
ou então destruí-los em algumas aulas.
Iniciaremos com um pequeno resumo histórico sobre a Didática,
pois olhar para o passado nos permite encontrar as explicações das
variações e transformações vividas no presente. É muito importante
conhecer como se deram as mudanças que justificam a pluralidade
de propostas pedagógicas presentes em nossa realidade.
Esses personagens foram além da mesmice e estudaram,
pesquisaram e ousaram em suas práticas pedagógicas. Escreveram
sobre elas, foram criticados, admirados, rejeitados, contestados, mas
tentaram criar caminhos diferenciados para que o trabalho educativo
fosse mais significativo. Segundo Freire (1996, p. 39): “é pensando
criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a
próxima prática”.
Cabe-nos conhecer alguns nomes importantes desses estudiosos,
nos inspirar com seus trabalhos e talvez aperfeiçoar o que as suas teorias
trouxeram, com a nossa determinação e vontade de acertar. Vamos
conhecê-los?
Esses teóricos contribuíram significativamente para a educação.
No Brasil, eles inspiraram o movimento conhecido como “Manifesto
dos Pioneiros da Educação Nova”, que ocorreu na Europa e aqui no
Brasil na metade do século XX. No Brasil, o objetivo do Manifesto era
renovar o sistema educacional nacional. O documento do Manifesto foi
escrito por 26 educadores brasileiros, assinado e liderado por Fernando
de Azevedo, e apoiado por Aluízio de Azevedo, Anísio Teixeira, Cecília
Meireles e várias outras personalidades. Esses educadores acreditavam
em uma educação pública e de qualidade.
Uma educação que questionasse a escola tradicional, elitizada e
com matérias distantes da realidade concreta do estudante. Comecemos
por John Dewey (1859-1952), um filósofo norte-americano que foi o
grande precursor das ideias progressistas. Dewey iniciou uma verdadeira
reflexão sobre a importância de uma escola útil, que ouvisse os alunos e
ensinasse aquilo que é importante, trabalhando a partir de problemas
Didática 19

reais. Defendia os trabalhos manuais e o desenvolvimento com base


na vivência dos alunos com o conteúdo, explorando e expondo suas
visões. Ele acreditava que a democracia seria possível com um trabalho
na escola que estimulasse os alunos na percepção, reflexão, crítica e
definição do seu próprio “eu”.

Figura 5: Educadores

Fonte: Pixabay

• Ovide Decroly (1871-1932) foi um médico belga que defendeu


o que entendemos agora como metodologia ativa. Ele defendeu que o:
1. Conhecimento deveria partir do todo, e não das partes, como
é feito normalmente até os dias de hoje;
2. Aluno é capaz de conduzir sua aprendizagem, reforçando a
importância do “aprender a aprender”.
Foi um dos inspiradores do método global de alfabetização.
"A criança tem espírito de observação; basta não matá-lo", escreveu
Decroly.
Na sequência, vamos falar de um dos pensadores que foram muito
influenciados por Dewey: Anísio Teixeira (1900-1971).
Anísio Teixeira foi um grande defensor da democratização do
ensino gratuito no Brasil. Seguindo as ideias de Dewey, ele foi um
constante questionador da arte de ensinar, reforçando a relevância de
pesquisa e inovação.
Anísio defendia a importância de que os alunos conseguissem
transferir os conhecimentos da escola para a vida e da educação
integral, ou seja, todos os aspectos do cidadão deveriam ser abordados,
refletidos e discutidos na escola.
20 Didática

• Maria Montessori (1870-1952) nasceu na Itália, era médica e


pesquisadora. Acreditava que nascíamos com a capacidade de ensinar
e aprender. Defendia o potencial da criança, desde a primeira infância, e
a importância de estimular o aspecto criativo. Para ela, o conhecimento
deveria servir como instrumento de desenvolvimento pessoal, por meio
do qual os indivíduos fazem suas escolhas conscientes. Seus métodos
são usados atualmente nas escolas infantis, permitindo à criança
explorar diversas propriedades que a cercam, como o cheiro, as cores,
as brincadeiras etc.
• Celestin Freinet (1896- 1966), um pedagogo francês que
defendeu o trabalho como guia da escola. A escola deve formar o aluno
de maneira a torná-lo um trabalhador criativo e reflexivo. Ele acreditava
na importância do desenvolvimento afetivo e preocupava-se com o
desestímulo dos alunos, após o erro. Incentivou aulas em locais abertos,
como em passeios, visitas etc., e ainda valorizava o diálogo entre
professor e aluno.
• Carl Roger (1902-1987), psicólogo norte-americano,
argumentava que o professor tem a tarefa de facilitar o aprendizado, o
qual o aluno conduz a seu modo. Sustentava que o ser humano aprende
o que sente necessidade de aprender, e assim, na escola, aprenderá
o que julgar ser importante para sua vida. Dessa forma, o ensino deve
ser significativo para o aluno. Rudolf Steiner (1861-1925), austríaco, criou
a linha de pensamento que enxergava além do que é material e com
base na Antroposofia, criou a Pedagogia Waldorf (muito conhecida por
suas escolas espalhadas pelo Brasil). Ele considerava a espiritualidade,
a individualidade, a criatividade e o exemplo dos professores como
influenciadores da aprendizagem.
As formas de organizar a educação são diferentes. Os alunos têm
apenas um professor do 1º ao 8º ano, ensinando todas as disciplinas. A partir
do 9º ano surge a figura do tutor, que deverá acompanhar o aluno com
autorização legitimada pela amizade.
• Anton Seminionovich Makanko (1888-1939), educador ucraniano,
ajudou com suas pesquisas e seu trabalho centenas de crianças e adolescentes
marginalizados, transformando-os em cidadãos. A escola de Anton baseou-
se em exercícios físicos, trabalhos manuais, recreação, excursões, aulas
Didática 21

de música e idas ao teatro. Dessa forma, desenvolvia-se o contato com a


sociedade.
As conhecidas assembleias de escola, usadas atualmente para
discutir sobre situações comuns no cotidiano escolar, eram realizadas
desenvolvendo a cidadania e o poder de decisão coletivo dos alunos.
Anton criou personalidades sem rigidez, e sua obra serve de inspiração
para as escolas atuais. Muitas escolas se esforçam para mudar seus
padrões em função de sua teoria, na qual as habilidades e competências
individuais devem ser desenvolvidas por meio de uma metodologia que
contemple cada indivíduo.
• Jean Piaget (1896-1980), um biólogo sueco, investiu na
observação científica rigorosa com relação à aquisição do conhecimento.
Ele defendia que o pensamento infantil passa por quatro estágios, até a
adolescência, quando o raciocínio se torna pleno.
• Henri Wallon (1879-1962), um médico, psicólogo e filósofo
francês, considerava o corpo, a mente e as emoções das crianças na
educação. A reprovação era altamente condenável em sua obra, pois
segundo ele, o emocional é preponderante no desenvolvimento da
pessoa. Wallon afirmava que a aprendizagem não é linear, e sim marcada
por instabilidades, e provém das vivências, podendo sofrer avanços
ou recuos. Crítico da escola tradicional, Henri Wallon incentivava uma
sociedade democrática, justa, cooperativa e solidária.

Figura 6: Imagem de Wallon e Durkeim

Fonte: Wikipedia

Até aqui conhecemos diversos nomes que fizeram diferença


na educação, contribuindo com reflexões muitas vezes similares e
outras paralelas. No entanto, ainda existem muitos outros nomes para
22 Didática

estudar, como Johann Pestalozzi, Philippe Perrenoud, Burrhus Frederic


Skinner e outros educadores cujas obras contribuíram para a evolução
do pensar a Didática. Cabe-nos sempre pesquisar e aprofundar nossos
conhecimentos sobre esses estudiosos, pois, com isso, poderemos
ampliar nossas visões de educação.

Figura 7: Inteligências múltiplas de Philippe Perrenoud

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019

Dados históricos e tendências pedagógicas


A história, sua evolução e forte persuasão política sempre influenciaram
a escola e sua forma de ensinar. Conhecer sinteticamente dados históricos
e tendências pedagógicas nos fará entender melhor as características
contemporâneas e os processos que ainda poderão surgir para renovar a
Didática escolar.
Didática 23

Para iniciarmos essa navegação histórica, partiremos do início no


século XVII, quando a burguesia apoiava a monarquia.
Jan Amos Comenius (séc. XVII) era um bispo protestante que
acreditava que a Didática poderia mudar a Escola e que a educação
poderia criar uma sociedade mais justa e pacífica. Ele foi um dos
primeiros a expressar, em pleno século XVII, que a educação deveria ser
pública, e que todos, homens e mulheres, tinham o direito de aprender
a ler. Para Comenius, todas as pessoas deveriam poder ler a Bíblia e
fazer sua própria interpretação. Foi ele quem sistematizou um tratado
de educação em que a Didática era posta como a arte de ensinar tudo a
todos, em seu livro conhecido como Didática Magna, a arte universal de
ensinar tudo a todos. Ele foi considerado o primeiro pedagogo ocidental,
e seu trabalho contemplava a ideia de que todos os seres humanos
deveriam ter possibilidade de aprender.
A concepção da Didática Moderna nasceu com Comenius e teve
o respaldo de Jean Jacques Rousseau. Em 1762, Rousseau publicou um
livro conhecido como Emilio ou da Educação. Esse romance pedagógico
revolucionou a Pedagogia e serviu de inspiração para as teorias de
todos os grandes educadores dos séculos XIX e XX. De acordo com
Rousseau, o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe. Toda
a sua proposta fundamentava-se na ideia de que, se a criança tiver a
educação fortalecida na infância e na adolescência, ela se tornará um
ser incorruptível.
No século XIX, com a consolidação do modo de produção
capitalista, as empresas começaram a precisar de uma educação que
fornecesse profissionais para ocupar os cargos desse tipo de produção.
Ter somente a elite capacitada não produzia mão de obra necessária.
Johann Friedrich Herbart surgiu adotando a ideia de que o
indivíduo é formado pelas percepções que vêm do exterior. Assim,
o aluno deve ser preparado intelectual e fisicamente. Para Herbart, o
ensino deve percorrer as seguintes etapas: preparação, apresentação,
associação, generalização e aplicação. Herbart pode ser considerado
um dos responsáveis por organizar a Pedagogia como ciência. Nesse
sentido, ele resgatou a ideia do ensino por meio da instrução e da
24 Didática

disciplina. As escolas herbartianas transmitiam um ensino totalmente


receptivo, sem diálogo entre professor e aluno e com aulas que
obedeciam a esquemas rígidos e preestabelecidos. Ele é uma das
referências na tendência pedagógica tradicional.
Essas teorias se instalaram no século XIX pelas escolas públicas
mundiais.Com a abertura de espaço na educação para mais pessoas, a
burguesia se sentiu fragilizada, pois as classes mais baixas passaram a
ter acesso ao conhecimento.
John Dewey surgiu com a Escola Nova, que contestava a escola
tradicional e apontava a necessidade de um novo homem social. Sua
proposta adotou métodos de pesquisa como método didático. Contudo,
apesar de defender a democracia dentro da sala de aula, a Escola Nova
ainda era elitista e não se preocupava com o que acontecia socialmente
fora da escola.
No Brasil Colônia, as escolas jesuítas cumpriram o papel de
atender às necessidades políticas da coroa portuguesa, explorando
indígenas e os menos abastados financeiramente. O ensinamento cristão
fundamentou os trabalhos.
Manoel da Nóbrega inseriu as “escolas de ler e escrever”, as
quais foram contestadas inclusive pelos jesuítas. Os professores eram
formados pelos jesuítas e a ciência deveria ser interpretada como
imutável. A aprendizagem era avaliada pela memorização.
Em 1759, o Marquês de Pombal expulsou os jesuítas e causou
retrocesso na organização escolar.
Na Primeira República, o ensino continuava reforçando a
supremacia da classe dominante. O trabalho escravo era explorado
intensamente no país.
O Estado de São Paulo foi o primeiro a preocupar- se com a
educação pública, e em 1983 regulamentou a escola preocupada na
formação para o magistério. Esse acontecimento influenciou diversos
outros estados a buscarem um aperfeiçoamento educacional.
Na década de 1920, após a Primeira Guerra Mundial, a escola
brasileira iniciou seu encontro com a Escola Nova. O êxodo rural e as
Didática 25

necessidades de mão de obra especializada foram motivos para a


abertura de mais escolas. A Didática era compreendida como regras que
asseguravam boas aulas que orientassem o trabalho.
Em 1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, e
a oferta de escolas gratuitas foi ampliada. Nessa época, acontecia uma
renovação Didática em detrimento da tradicional.
Com a Constituição de 1934, foi elaborado o Plano Nacional
da Educação, que determinou a obrigatoriedade da escola do ensino
primário.
Em 1932, surgiu a primeira universidade brasileira. A origem
da Didática como disciplina na formação de professores aconteceu
em 1934, com a criação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da
Universidade de São Paulo.
A Constituição de 1937 abordou a educação introduzindo o ensino
profissional para atender às necessidades industriais. A Carta tornou
obrigatórias as disciplinas de Educação Moral e Cívica e Organização
Social e Política Brasileira.
Ainda na década de 1930, foi criado o Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos, do qual Anísio Teixeira foi diretor por duas décadas,
aproximadamente. Nesse período, ele realizou grandes reformas no ensino.
Em 1941, a Didática passou a ser um curso à parte, como uma
especialização.
Na Era Vargas, a educação estagnou-se e condicionou-se às
posições políticas.
Com a redemocratização, a Constituição de 1946 instituiu a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Ao final da década de 1950, com a expansão econômica e
industrial, a escola defendeu a liberdade, a iniciativa e a autonomia, e
enfatizou a atenção às diferenças individuais.
Segundo Saviani, entre 1930 e 1960, ideias da Escola Nova
predominaram na educação brasileira. Já a partir daí se iniciou um
período tecnicista.
26 Didática

Candau (1983) escreveu:


O ensino da Didática assume certamente uma perspectiva
idealista e centrada na dimensão tecnicista do processo de
ensino-aprendizagem. É idealista porque a análise da prática
pedagógica concreta na maioria das escolas não é objeto de
reflexão. Considerada tradicional ela justificada pela ignorância
dos professores que, uma vez conhecedores dos princípios
e técnicas escalavonistas, a transformariam. Para reforças
esta tese, experiências pedagógicas que representa, exceções
dentro do sistema e que, mesmo quando realizadas no sistema
oficial de ensino, se dão em circunstâncias excepcionais, são
observadas e analisadas. Os condicionamentos socioeconômicos
e estruturais da educação não são levados em consideração.
A prática pedagógica depende exclusivamente da vontade e
do conhecimento dos professores que, uma vez dominando
os métodos e técnicas que desenvolvidos pelas experiências
escalavonovistas, poderão aplica-los às diferentes realidades
em que se encontram. A base científica desta perspectiva se
apoia fundamentalmente na psicologia. (CANDAU, 1983, p.49)
Na década de 1960, Paulo Freire iniciou seu trabalho de
alfabetização de jovens e adultos com a metodologia em que acreditava
e que repercutiu em todo o mundo da educação.
Penso em um dos capítulos tão fecundos na história
da educação latino-americana: a educação popular e o
pensamento de Paulo Freire. Eles nasceram colados à terra
e foram cultivados em contato estreito com os camponeses,
com suas redes de socialização, de reinvenção da vida e da
cultura. Nasceram percebendo que o povo do campo tem
também seu saber, seus mestres e sua sabedoria. (ARROYO,
2000, p. 14)
Depois do Golpe Militar de 1964, a educação foi vinculada à
Segurança Nacional, e passou a sofrer controle e repressão, causando
um retrocesso no desenvolvimento educacional do país. O professor
retornou à Didática tradicional.
Didática 27

A partir de 1974, mesmo com a abertura do regime político,


instaurou-se um pessimismo em função da influência política que se
estabelecia a cada governo.
A partir da década de 1980, a escola começou a se reinventar,
questionando velhos métodos e redefinindo a política educacional. A
Didática passou a centrar seus esforços na formação integral do aluno.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/96)
foi reorganizada com grandes inovações.

Figura 8: LDB

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019

Atualmente, a educação já é vista com o vínculo sociopolítico e


preocupa-se com a formação social do cidadão. A busca é pela união
entre teoria e prática, conteúdo e forma, técnico e político, ensino e
pesquisa, professor e aluno.
A Didática precisa evoluir e acompanhar as mudanças
paradigmáticas que estão se instalando na sociedade. Para que essa
evolução continue, é preciso que os professores se conscientizem
da necessidade de serem pesquisadores de outras práticas que
não as historicamente conhecidas e também de sua própria prática.
É necessário fundamentar- se teoricamente, ousar no ato de planejar,
errar ou acertar, refletir e novamente ousar em planejar.
A Didática só evoluirá e será funcional se nossos educadores se
perceberem como eternos aprendizes.
28 Didática

Figura 9: Pesquisa-ação

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019

Educação, suas definições e processos


O direito a educação é assegurado por lei, independentemente
da procedência do cidadão. Esse direito é um caminho que garante
outros direitos.
Não é possível lutar por um direito que não se conhece, e a
escola nos traz informações essenciais sobre o que nos resguarda
constitucionalmente. Se a escola não cumpre esse papel, deverá repensar
seus caminhos. A escola deve ser um dos principais caminhos de acesso
à informação verdadeira, consistente e útil para a formação cidadã.
Mas o que é educação? Como conceitualizar uma palavra que
traz percepções diversas?

Figura 10: Fatores que envolvem a palavra “educação”

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019


Didática 29

Normalmente, quando as pessoas falam em educação, estão


se referindo à forma como se estabelece a convivência interpessoal.
É comum chamar alguém de “mal-educado”. Isso significa que a
pessoa não foi “bem educada” e não sabe tratar as pessoas das formas
especificadas pela sociedade como “educadas”. No entanto, a palavra
“educação” pode ser empregada de diversas maneiras, como educação
cultural, educação filosófica, educação científica, educação moral,
educação profissional, entre outras.
Entendendo a educação como o objeto de estudo da Pedagogia,
Libâneo (1990) define a educação como um conceito amplo que se
refere ao processo de desenvolvimento, envolvendo a formação de
qualidades humanas, físicas, morais, intelectuais e estéticas dentro de
um contexto de relações sociais.
Etimologicamente falando, a palavra “educação” provém de
educare, que, em Latim, significa alimentar, cuidar, criar. Por outro lado,
para alguns professores, a palavra se refere ao processo educacional
oferecido formalmente na escola.
Como tivemos a oportunidade de conhecer a história da Didática,
vimos que cada teórico enxergou a educação de uma forma. Para alguns,
é o saber acumulado, para outros, o desenvolvimento da cidadania.
No Brasil, temos a Constituição Federal, que, no capítulo III, artigo
205, apresenta o seguinte texto:
Art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para
o trabalho. (BRASIL, 1988, p. xx)
Nesse artigo, podemos verificar que a educação escolar é algo que
abrange o desenvolvimento integral do aluno, mas muitos professores
resistem a essa concepção alegando que na escola se deve aprender
disciplinas como Língua Portuguesa, Matemática, Ciências. Complementam
ainda que educação social é responsabilidade da família. Mas será que é só
da família?
30 Didática

Segundo a Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9394/96), em seu


artigo 1º:
Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se
desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho,
nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
§1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve,
predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.
§ 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho
e a prática social. (BRASIL, 1996, p. XX)
Como se pode notar, a LDB confirma a Constituição Federal e entende
a educação também como desenvolvimento social.
Somos educados a partir do momento em que nascemos.
Aprendemos a chorar para pedir alimento, pedir para trocar a fralda e
mostrar nossa insatisfação com alguma coisa. A vivência e a convivência
nos trazem educação. Também as formas culturais em que cada cidadão
estiver inserido serão fontes educativas. A religião que frequentamos, os
esportes que praticamos, a convivência e os exemplos que desfrutamos
sempre nos trarão formas de educação.

Figura 11: BNCC

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019

Para a escola e, atualmente com a Base Nacional Comum


Curricular, o desenvolvimento social, isto é, a educação integral, já
Didática 31

não é mais uma sugestão, e sim uma determinação. Sendo assim, os


professores podem achar que devem se eximir dessa obrigação, mas a
lei deixa clara a importância do desenvolvimento de 10 competências
gerais. São elas:
1. Conhecimento: reforço da importância da metacognição e
da transformação do aluno, que reconhece a importância do que foi
aprendido.
2. Pensamento científico, crítico e criativo: desenvolvimento
do raciocínio, da criatividade e da transferência do conhecimento para o
mundo real. Capacidade de correlacionar, questionar ideias, criar novas
soluções a partir de diferentes caminhos.
3. Repertório cultural: reconhecimento de diversas formas de
expressões culturais. Trata-se de ter conciência multicultural.
4. Comunicação: uso de diferentes linguagens, desenvolvendo
a escuta, a expressão, a discussão, o multiletramento e a contextual-
ização sociocultural.
5. Cultura digital: uso de tecnologias de forma crítica e
consciente.
6. Trabalho e projeto de vida: compreensão das relações
próprias do mundo trabalho e das escolhas a serem feitas para o seu
projeto de vida.
7. Argumentação: desenvolvimento de opiniões e argumentos
com base em dados e evidências.
8. Autoconhecimento e autocuidado: conhecimento de si,
identificação de características próprias e aprendizagem emocional.
9. Empatia e cooperação: exercício para a convivência
respeitosa.
10. Responsabilidade e cidadania: desenvolvimento da flexibili-
dade, resiliência, tomada de decisões, princípios éticos etc.
Talvez a maior dificuldade das escolas, hoje, seja capacitar os
professores para trabalharem essas questões, principalmente por meio
do exemplo, que deve ser dado em cada ação e movimento institucional.
Mas isso não é tão fácil. Devemos considerar que muitos professores
têm suas próprias “visões de mundo”, e muitas vezes sua conduta não é
exemplo para que se alcancem os objetivos esperados.
32 Didática

As Leis e Diretrizes e Bases da Educação Nacional é de


competência da União. As escolas, subordinadas aos estados e cidades,
podem realizar adequações, porém jamais mudar uma lei como essa.

Educação como forma de dominação


Todos os sentidos da palavra educação nos remetem ao caminho
de formação do indivíduo. Consideremos agora que a escola pode ser
manipuladora e reforçar cada vez mais o desnivelamento social. André
Borges (2004) baseia-se em (CLUNE; WITTE, 1990; COOKSON, 1994;
HESS, 1991) e em seu artigo, coloca que:
[...] nos Estados Unidos, tanto grupos conservadores e
tradicionalistas, quanto a esquerda liberal argumentaram, que
o reforço da "autonomia da escola" daria mais "voz" a minorias
étnicas e outros grupos marginalizados, que contribui para a
reversão de padrões prévios de segregação racial e de classes
no interior do sistema educacional. Aborda ainda, conforme
(JACOBS, 2000; THOMAS, 1993; WHITTY et al., 1998), que na
Inglaterra, Nova Zelândia e Austrália, os governos da Nova
Direita defenderam que formas de gestão participativas e
descentralizadas aumentariam a capacidade de pais e alunos
intervirem nas políticas internas da escola, reduzindo a influência
de professores e burocratas e suas práticas corporativistas.
Enquanto alguns alunos agradecem os professores pela forma
como abordaram temas políticos na sala de aula, fazendo-os enxergar
criticamente os diversos aspectos sociais, outros reclamam daqueles
que aproveitam a oportunidade para convencer os alunos de suas
convicções pessoais.
Sim, a educação pode ser usada como forma de manipulação
política e, por isso, reforça-se a importância de que os professores
passem por formações constantes, sendo orientados acerca de como
realizar um trabalho pós-crítico, ou seja, podem abordar a sua opinião
e posição política, mas também abordar todas as outras vertentes,
com respeito e aceitação às diferenças. Dessa forma, leva-se o aluno
Didática 33

a se posicionar segundo suas próprias convicções, sem desrespeitar as


pessoas cujas convicções são diferentes das suas.
Temos vários exemplos na história que demonstram como a
educação foi utilizada como instrumento de manipulação e dominação.
Podemos citar alguns, como:
• Nos EUA, tivemos o tão conhecido Macarthismo;
• No Brasil, tivemos o duro período da Ditadura Militar;
• Na Arábia Saudita, o islamismo é a religião oficial do país, e é
ele quem dita os conteúdos estudados nas escolas.
• No Brasil, houve um projeto de lei chamado “Escola sem
partido”.

Figura 12: Escola sem partido

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019

O projeto de lei é claro, porém muitas pessoas ainda não


acreditam que seja possível trabalhar o senso crítico do aluno sem,
com isso, influenciá-lo em alguns aspectos. Essa é uma questão a ser
estudada e refletida incessantemente.
Como exemplo, citamos agora parte do artigo 3º desse projeto:
Art. 3º. No exercício de suas funções, o professor:
I - não se aproveitará da audiência cativa dos alunos, para
promover os seus próprios interesses, opiniões, concepções ou
preferências ideológicas, religiosas, morais, políticas e partidárias;
II - não favorecerá, não prejudicará e não constrangerá os alunos
em razão de suas convicções políticas, ideológicas, morais ou
religiosas, ou da falta delas;
34 Didática

III - não fará propaganda político-partidária em sala de aula


nem incitará seus alunos a participar de manifestações, atos
públicos e passeatas;
IV - ao tratar de questões políticas, socioculturais e econômicas,
apresentará aos alunos, de forma justa, as principais versões,
teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito. (RIO
DE JANEIRO, 2019)
Considerando esse exemplo, é possível entender a neutralidade
da escola em relação às escolhas pessoais, porém muitos acreditam que
isso tirará do professor a possibilidade de trabalhar temas transversais,
como sexualidade e saúde.
O que precisa ficar claro em todas as questões abordadas é que
a escola poderá ajudar a educação integral, mas sozinha não dará conta
de tantas responsabilidades. É preciso que haja apoio da sociedade,
da família e da política. É claro que a escola influenciará todas esses
seguimentos também.
Ainda é possível verificar que a escola influenciará a sociedade, de
uma forma que poderá ser benéfica ou não. Citando Saldanha, 1980, p.147:
Se nos regimes democráticos a educação forme homens
livres, deixando livre a escolha da profissão e até preparando o
cidadão para a crítica social e para a vida partidária, nos regimes
ditatoriais a educação padroniza opressivamente o educando.
Na Alemanha nazista, por exemplo, a juventude era formada
no fanatismo belicoso e exaltada quase magicamente para o
culto do ‘Fuhrer’. (SALDANHA, 1980, p.147)
Considerando essas informações, é possível entender que
a escola não resolverá tudo na sociedade, porém poderá ser grande
influenciadora. Libaneo coloca que:
[...] Em síntese, a escola é um meio insubstítuível de contribuição
para as lutas democráticas, na medida em que possibilita às
classes populares, ao terem acesso ao saber sistematizaado
e às condições de aperfeiçoamento das potencialidades
intelectuais, participarem ativamente do processo político,
sindical e cultural. (LIBANEO, 1990, pg. 39)
Didática 35

Ainda pensando nos processos que se desenvolvem na escola,


haverá sempre uma dependência da legislação, que poderá mudar conforme
a influência política, as concepções de educação, a Didática, a forma de
encaminhar as situações cotidianas, o Projeto Político Pedagógico construído
periodicamente e a comunidade escolar, que precisará ser ouvida, entendida,
considerada em suas características gerais e necessidades.
Nesse contexto, o Plano de Educação tem ‘um caráter reflexivo,
organizador e articulador e não acontece em um percurso
linear’, sua implementação “depende da criação de mecanismos
para sua gestão, processo que se inicia no interior da Secretaria
de Educação, na análise de sua estrutura, organização e
funcionamento. (CENPEC, 2009, p. 25) 
Os processos educacionais são norteados por:
• Didática: em que se escolhem as formas de ensino em função
das necessidades locais e as formas de aprendizagem.
• Avaliação da aprendizagem: que poderá ser entendida como
forma de repressão, ou mesmo forma de acompanhamento e fonte, para
repensar a Didática escolhida pelo professor.
• Legislação: que fornecerá todo o apoio legal para os demais
processos educacionais.

RESUMINDO:

A Didática pode ser entendida como o caminho escolhido


pelo professor para ensinar e concretizar a aprendizagem
dos alunos.
As formas de trabalho atuais continuam muito tradicionais,
mas os pensadores da história nos mostraram vários
caminhos e concepções diversas de como ensinar. Todos
eles foram fortemente influenciados pela evolução histórica
e sociopolítica da humanidade.
Os processos educacionais dependerão das concepções
adotadas nas escolas e definirão as metodologias e
objetivos do ensino.
36 Didática

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