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Neuroeducação

e Tecnologias
Educacionais
Educação e Tecnologia
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
FRANCIANE HEIDEN RIOS
AUTORIA
Franciane Heiden Rios
Olá! Sou formada em Pedagogia, especialista em Tecnologias
Educacionais e Educação Especial e Inclusiva, com mestrado em
educação. Estou na educação desde o início da minha vida profissional,
cursei magistério, então iniciei com estágios em escolas e nunca mais
sai. Esse espaço, rico de aprendizagens humanas, oportunizou-me pensar
sobre diferentes questões e perceber as pessoas em suas diferentes
necessidades. Durante dez anos fui servidora concursada, educadora e
professora dos municípios de São José dos Pinhais, Curitiba e Araucária.
Atuei como supervisora do curso de Pedagogia da UNIVESP, Universidade
Federal do Paraná e lecionei em diversas instituições de ensino superior,
sempre no curso de Pedagogia e em disciplinas correlatas à educação.
Atualmente, sou diretora pedagógica da Curiosidade, instituição que atua
em parceria com redes de ensino para desenvolvimento de boas práticas
educativas, tendo como subsídio a perspectiva do desenho universal para
a aprendizagem. Acredito no princípio básico da inclusão e no respeito
pela diversidade, portanto, escrever, palestrar, capacitar ou qualquer outra
ação, ou prática profissional relacionada ao tema, são hoje meu foco de
atuação. E, nesse cenário, as tecnologias são essenciais, afinal, elas são
ferramentas que permitem superar barreiras e ampliar possibilidades no
processo ensino-aprendizagem. Porém, como todo processo relacional,
é fundamental compreender que a tecnologia, por ela só, não significa
transformação, é a ação do educador, do professor, do ser humano por
trás dessa ferramenta que significa a condição humana
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de de se apresentar um
uma nova compe- novo conceito;
tência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou dis-
mento; cutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das últi-
assistir vídeos, ler mas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Definição de Tecnologias Educacionais............................................. 10
Compreendendo o Conceito de Tecnologia................................................................10

Tecnologias, Informação e Comunicação: Conceitos e Aproximações


com a Educação............................................................................................................................... 13

Afinal, o que são Tecnologias Educacionais? Ampliando e Discutindo


Perspectivas......................................................................................................................................... 17

Tecnologias Educacionais e as Relações no Processo


Cognitivo.......................................................................................................... 21
DIC, Conectividade e Ensino- Aprendizagem............................................................. 21

Interatividade e os Caminhos Possíveis para a Autonomia...............................25

Modelo de Ensino a partir das Competências Digitais........................................ 30

Racionalidade Instrumental e Determinismo Tecnológico........ 33


Nativos e Imigrantes Digitais...................................................................................................33

Modelo Geracional: Reflexões Necessárias................................................................ 36

Desafios Relacionados às Tecnologias Educacionais...................44


Letramento Computacional, Informacional e em Mídias: Ponderações
Necessárias..........................................................................................................................................44

Alfabetização e Letramento Digital................................................................................... 48

Fluência Digital................................................................................................................................. 50
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 7

01
UNIDADE
8 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

INTRODUÇÃO
“Gente, com esse tamanho, ele já sabe mexer no celular?” É
possível que você já tenha ouvido essa frase. Ainda, é cada vez mais
comum nos depararmos com crianças entretidas com seus tablets,
celulares e demais aparatos tecnológicos em diversos espaços, tais
como restaurantes, consultórios médicos, entre outros. Não somente as
crianças, os jovens, adultos e idosos se ocupam cada vez mais, cada um a
seu modo e convergentes às suas necessidades, às tecnologias e de suas
possibilidades. Nesse cenário, a educação não é, e nem deve ficar isenta,
isolada dessa relação tecnologia e comportamento humano. Mais que se
apropriar das ferramentas, cabe à Educação pensar sobre, com e a partir
da tecnologia e suas facetas o ensino, a aprendizagem e, sobretudo, a
concepção de sociedade que emerge dessas interações. Assim, no campo
da Neuroeducação, é fundamental compreender os conceitos inerentes à
tecnologia, desmistificando os sentidos de termos corriqueiros, porém, se
mal concebidos repercutem em práticas educativas questionáveis.
Com os termos esclarecidos, seguiremos nosso percurso de
aprendizagem questionando e identificando as implicações das
tecnologias educacionais nos objetivos de ensino e nas expectativas de
aprendizagem. Abordaremos as competências digitais esperadas diante
da TDIC, os conhecimentos, as habilidades e as atitudes objetivadas
nesse cenário. Os desafios para essas competências serão discutidos
na terceira competência, na qual identificaremos como as interferências
socioeconômicas e culturais influenciam nessa perspectiva, implicam na
apropriação tecnológica e, consequentemente, no processo de ensino-
aprendizagem mediado por elas. Tema que será expandido na última
competência, encerrando a proposta dessa unidade.
Mesmo aqui, nesse início de conversa, é possível afirmar que, como
todo tema relacionado à educação, a relação Neuroeducação e Tecnologia
não é diferente: apresenta desafios que precisam ser pensados e repensados
intermitentemente, assim, finalizaremos essa primeira unidade identificando
esses desafios no mundo contemporâneo. É da constante reflexão que se
avança na construção do conhecimento e fazemos melhores profissionais,
assim, a partir dessa premissa, convido você, estudante, para trilhar esse
percurso rico de aprendizagens, dando sentido e vida às reflexões e às
discussões propostas nesse material. Vamos juntos?
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso objetivo é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até o
término desta etapa de estudos:

1. Explicar o conceito de tecnologias educacionais.

2. Analisar as implicações das tecnologias educacionais nos objetivos


de ensino e expectativas de aprendizagem.

3. Refletir sobre as condições socioeconômicas e culturais que


implicam no processo de apropriação tecnológica no ensino-
aprendizagem.

4. Identificar os desafios contemporâneos relacionados à apropriação


tecnológica no processo ensino-aprendizagem e sua relação com
a Neuroeducação.

Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao


conhecimento? Juntos, um passo por vez, trilharemos esse caminho de
aprendizagem! Ao trabalho!
10 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Definição de Tecnologias Educacionais


OBJETIVO:
Ao término deste capítulo, você será capaz de conceituar
tecnologia, reconhecer as particularidades das tecnologias
quando relacionadas à informação e à comunicação (TIC)
e (TDIC) e compreender a relação entre essas tecnologias
e a educação, evidenciando o termo “tecnologias
educacionais”. Esses conhecimentos são fundamentais para
o exercício de sua profissão, afinal, a tecnologia permeia
as relações humanas, portanto, é ativa nos processos de
ensino-aprendizagem e, aqueles profissionais que não se
atualizarem acerca dessa temática terão cada vez mais
dificuldade de engajar seus alunos e, com isso, problemas
variados na escola ou em outros espaços de aprendizagem
serão cada vez mais acentuados. E então? Motivado para
desenvolver esta competência? Então, vamos lá. Avante!.

Compreendendo o Conceito de Tecnologia


Iniciaremos fazendo um questionamento para podermos definir o
conceito de tecnologia. Vamos lá! Qual imagem mental você associa à
tecnologia? Seria um notebook? Seria uma ferramenta de pedra talhada?

A partir das questões anteriores é que propomos “desconstruir”


o conceito de tecnologia, avançando para além das “máquinas”. Nos
exemplos anteriores, temos representadas tecnologias fundamentais à
humanidade em determinado tempo. Quando falamos de tecnologia, não
nos referimos apenas a computadores, celulares e internet, remetemo-
nos, principalmente, às três palavras: evolução, progresso e comodidade.

Com a necessidade humana, o homem moldou a pedra para caçar,


um grande progresso à sua condição de vida e, consequentemente,
um fator de comodidade, afinal, tem-se uma arma afiada para a disputa
com os animais, travada com “mãos vazias” ou com instrumentos menos
eficientes. Tem-se aqui uma tecnologia rudimentar que representa uma
evolução para a humanidade.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 11

A situação anterior nos permite avançar e sistematizar o conceito


de tecnologia:

DEFINIÇÃO:
Para Kenski (2002), tecnologia é a totalidade das coisas
resultantes da engenhosidade do cérebro humano. Está
presente em todas as épocas, em diferentes formas de uso
e para diferentes aplicações.

Na história da humanidade, vários são os exemplos de tecnologias


rudimentares desenvolvidas para garantir a sobrevivência. Essas
tecnologias rudimentares, a princípio em forma de instrumentos,
permitiam a melhor realização das tarefas essenciais do dia a dia.
Entretanto, conforme o homem foi evoluindo, passando da condição
nômade para sedentário, novas demandas surgiram em decorrência da
necessidade de adaptação ao meio.

Assim, outras ferramentas foram criadas, essas que operam no


campo simbólico, tais como a linguagem e os números. Afinal, há a
formação de organizações sociais, tais como povoados e cidades com
suas demandas que, com suas etapas de consolidação, contribuíram para
o desenvolvimento social e cultural dos povos.

O que é fundamental sabermos é que da pedra lascada para a


caça, à linguagem, à máquina a vapor, ao computador, à internet, todas
essas tecnologias foram decisivas para a evolução da humanidade em
determinado período histórico, transformando o homem e sua cultura,
influenciando diretamente em seu modo de vida das pessoas.
12 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Nesse momento, é possível que, a reflexão que abriu nossa


conversa, se feita novamente, já tenha respostas e novas perspectivas,
não é mesmo? Afinal, ampliamos o conceito de tecnologia identificando
a totalidade daquilo que o homem constrói a partir dos diversos recursos
naturais e de sua capacidade intelectual, resultando em ferramentas
instrumentais ou simbólicas, que são essenciais para a transposição das
barreiras naturais e a vida em sociedade. Ainda, é possível afirmar que:
Conhecimentos e princípios científicos que se aplicam
ao planejamento, à construção e à utilização de um
equipamento em um determinado tipo de atividade,
chamamos de “tecnologia”. Para construir qualquer
equipamento - uma caneta esferográfica ou um
computador -, os homens precisam pesquisar, planejar e
criar o produto, o serviço, o processo. Ao conjunto de tudo
isso, chamamos de tecnologias (KENSKI, 2002, p. 24).

Portanto, ao assumirmos a tecnologia sob essa perspectiva, é


evidente a relação de dependência tecnológica e o quão fundamental ela
é no processo social, atuando efetivamente nos processos de mediação
das ações. Vygotsky, um dos teóricos de referência da Psicologia Histórico-
Cultural e no campo da educação, afirma que a relação sujeito-ambiente
não se dava diretamente, era sempre mediada por um elo intermediário
que se interpunha entre ele (sujeito) e o mundo, seja um objeto, seja a
linguagem. Sendo assim, aproximando das nossas reflexões, para ele
sem a tecnologia não haveria a mediação inicial, o que torna fundamental
discutir e pensar acerca não só dos processos de mediação, mas também,
desses diante das tecnologias que surgem no mundo contemporâneo,
com suas especificidades e que operam significativas mudanças no modo
de vida em sociedade.

Essas são, a princípio, as Tecnologias da informação e comunicação


(TIC), que, no contexto histórico da humanidade, relacionam-se com a
informação e os processos de comunicação e, em tempos de internet
e virtualização, avançam para outras denominações, como Tecnologias
digitais da informação e comunicação (TDIC).
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 13

Tecnologias, Informação e Comunicação:


Conceitos e Aproximações com a Educação
O desafio que temos aqui, ao buscar conceituar TIC e TDIC, não
é em apresentarmos a relação de instrumentos, ferramentas ou objetos
que podem ser aceitos nessa categoria, afinal, essa lógica é simplista
e reduz o próprio objetivo desse termo. A Professora Drª Luciana Massi
com o excerto a seguir nos permite algumas reflexões fundamentais para
avançarmos nosso caminho de aprendizagem:
O simples conceito de Tecnologias da Informação e
da Comunicação, as famosas TIC, parece apontar para
mudanças mais efetivas, já que a tecnologia passa a ser
usada como fonte e meio de produção de informações
e como nova forma de comunicação. Nos parece claro,
então, que a tecnologia é uma nova forma de linguagem
e sua inserção e ampliação constante tornam quase
impossível a tarefa de elencar todos os exemplos que a
ilustrariam: desde a internet, com sua linguagem html,
redes sociais, blogs, wikis, passando por visualizações
de abstrações existentes apenas no mundo virtual dos
jogos e simulações; até novas formas de educação
proporcionadas pelos ambientes virtuais de aprendizagem
(AVA), para cursos de educação a distância (EAD) ou
“blended learning”, que unem EAD e educação presencial
(MASSI, 2015, p. 1).

Seriam, então, as TIC instrumentos, ferramentas, objetos,


equipamentos, as “máquinas” ou as possibilidades de comunicação que
elas possibilitam?

O próprio termo Tecnologias da Informação e Comunicação já nos


aponta a “saída” desse conceito: diz respeito às tecnologias que permitem
socializar informações e possibilitam que a comunicação seja possível.
Embora não possamos pensar em uma linearidade histórica efetiva para
um fenômeno tão complexo, podemos perceber o desenvolvimento
das TIC, a predominância das tecnologias e transformações associadas
para Lévy (1990) a partir do desenvolvimento da oralidade, da escrita
e da informática. Da escrita, temos o desenvolvimento das tecnologias
impressas e, da informática, as digitais. Ampliando essa concepção,
podemos perceber duas outras culturas que permeiam as tecnologias
impressas e as digitais:
14 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Figura 1 – Cultura de massas e cultura das mídias

Cultura de massas Cultura das mídias

Jornal Fotocopiadoras
Telégrafo Videocassetes
Fotografia Videogames
Cinema Revistas
Televisão Programas de rádio
especializados
TV a cabo

Fonte: Adaptado de Santaella (2003).

IMPORTANTE:

Mais que a tecnologia em si, essa classificação ocorre


em decorrência do modo de produção, distribuição e
consumo do conteúdo disponibilizado: a cultura de massa,
em associação ao próprio nome, tende a ser mais massiva
e passiva. Já a cultura das mídias, mais diversificadas e
individualizadas.

Entretanto, em tempos atuais, diante da intensa e rápida produção


e disseminação tecnológica, há a incorporação das tecnologias digitais,
essas que operam mudanças nessas perspectivas de organização de
Lévy (1990) e culturais de Santaella (2003) e marcam um novo período
de desenvolvimento. As TDIC repercutem significativamente nos diversos
âmbitos das atividades humanas e com elas podemos falar de uma nova
cultura: a cultura digital.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 15

DEFINIÇÃO:
Para Santaella (2003):

A cultura digital se dá em decorrência


do avanço das telecomunicações,
principalmente com o advento da
Internet e tem como característica
a convergência das mídias escrita,
audiovisual, telecomunicações e a
informática permitindo com que seu
conteúdo seja [...] traduzido, manipulado,
armazenado, reproduzido e distribuído
digitalmente (SANTAELLA, 2003, p. 60).

Essa cultura prevê a maior capacidade, facilidade e agilidade em se


obter, produzir e compartilhar informações, possibilitando uma forma de
comunicação nominada por Lévy (1997) do tipo “todos-todos”.

Uma nova sociedade se desenha e, sobre ela, Kenski (2012) aponta:


O surgimento de um novo tipo de sociedade tecnológica
é determinado principalmente pelos avanços das
tecnologias digitais de comunicação e informação e pela
microeletrônica”, afinal, é com a circulação mais eficaz da
informação que vários campos da sociedade avançam,
desde a economia, a medicina, à engenharia, até a
educação, havendo uma infinidade de avanços positivos
nessa evolução tecnológica possibilitada pelas TDIC
(KENSKI, 2012, p. 22).

Entretanto, novamente a complexidade vem à luz das nossas


reflexões: não apenas de pontos positivos o avanço das TDIC se manifesta,
há muito ainda que precisamos pensar, avançar e corrigir, principalmente
quando relacionado à condição humana de acesso e discernimento ao
uso do que está ali disponível. A diversidade de conteúdos e funções
dos novos aparelhos eletrônicos, em sua maioria conectados à internet,
resultam em ampla velocidade e interatividade, características, entre
outras, marcantes dessas tecnologias, que possibilitam a quem as
usam desenvolver competências e habilidades cognitivas para a
operacionalidade técnica, mas, e as questões éticas? Essas questões
ainda são essenciais e precisamos discuti-las.
16 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

EXPLICANDO MELHOR:

A Revista Galileu publicou em 24 de fevereiro de 2015,


em sua versão on-line, a matéria intitulada “Quem são os
trolls – e por que ninguém está livre deles”. Em seu texto,
são apresentados dados resultados de uma pesquisa
sobre o “comportamento troll” e quatro transtornos de
personalidade obtidos pela Universidade de Manitoba,
no Canadá. Sabendo que o troll pode ser definido como
usuários on-line que se utilizam das redes sociais para
ofender, ameaçar e perseguir pessoas que pareçam
vulneráveis, o que esses dados, de fato, podem contribuir
para responder à pergunta anterior?

Primeiramente, esse estudo define esse comportamento como: “a


prática de se comportar de forma enganosa, desordenada ou destrutiva
num local social da internet por um único motivo: prazer próprio”. Ainda,
após entrevistas, observaram que: “os trolls sentem um júbilo sádico com
o sofrimento dos outros. Os sádicos só querem se divertir, e a internet é
o seu playground”. Como segundo elemento, traze os seguintes dados:
“73% dos usuários adultos de internet testemunharam um assédio on-line,
e 40% deles viveram isso na pele”.

Assim, a frase “o mundo virtual é terra de ninguém” nunca fez


tanto sentido.Apesar dos avanços em termos de leis e punições, ainda
é preciso educar para, com e a partir das TDIC, afinal, operamos em um
campo em que as aprendizagens operacionais são necessárias, porém, é
fundamental e imperativo que avancemos para o que de fato “perturba”
nesse cenário tecnológico: o ser humano em desenvolvimento e a
sociedade em construção.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 17

Afinal, o que são Tecnologias


Educacionais? Ampliando e Discutindo
Perspectivas
Com as definições traçadas até aqui, é possível compreender e
definir tecnologias educacionais como o uso dos recursos tecnológicos
em prol do processo ensino-aprendizagem. Assim, novamente, não é
possível limitar ou restringir a computadores, tabletes, ou projetores o
conceito de tecnologias educacionais. Uma caneta e o quadro-negro são
tecnologias utilizadas no processo educacional que, de longa data, ainda
persistem nas relações desse processo.

Dessa visão, mais que discutir “o que são” importa discutir “o


porquê são” educativas e, dessa lógica, podemos afirmar que tecnologias
educacionais são aquelas utilizadas em prol da educação, promovendo
maior e mais qualificação do processo e do desenvolvimento social
e educativo diante da disponibilização, acesso e socialização das
informações.

DEFINIÇÃO:

Para Niskier (1993, p. 80), a tecnologia educacional é


concebida da “mediação do encontro entre Ciência,
Técnicas e Pedagogia”, entendida como “um exercício
crítico com utilização de instrumentos a serviço de um
projeto pedagógico”.
18 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Figura 2 – Tecnologias educacionais

Fonte: Freepik.

As tecnologias educacionais, portanto, não se limitam às TDIC e


como apontado por Brito e Purificação (2011), sua criação também se dá
mediante a necessidade do ser humano.

Um exemplo dessa necessidade é o ábaco. Uma tecnologia primitiva


que auxiliava os povos primitivos na contagem e pode ser considerado
como um primeiro “computador”.

A discussão do “porquê” está diretamente relacionada à inovação


educacional. É fato que a escola já avançou muito em sua apropriação de
diversas tecnologias, desde o uso de materiais concretos e ferramentas
tidas como tradicionais e, em tempos de internet e TDIC voltamos
ao “gancho” que encerrou nosso subtítulo anterior: o conhecimento
operacional e o conhecimento ético necessário para a incorporação das
tecnologias digitais, ligadas em rede, no processo educacional.

Um fato é fundamental e certo: não podemos mais excluir da escola


e dos espaços educacionais essas tecnologias, suas linguagens e suas
características. Assim, o uso do computados e da internet acontece –
com desafios e barreiras a serem transpostas – já é um grande passo.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 19

Para tanto, cabe pensarmos no que é preciso para que essas tecnologias
contribuam para a mais reflexiva do ser humano e de um mundo melhor.

Não há receitas, mas já sabemos que caminhos não seguir. O


trabalho com as tecnologias no campo educacional não pode e não
deve apenas substituir o “antigo” pelo “novo”, mas sim, deve potencializar
a tecnologia em recurso eficaz na quebra de paradigmas da cultura de
massa, promovendo a diversidade cultural que resulte na desmistificação
de estigmas históricos, o respeito mútuo, a solidariedade, firmando, de
fato, a “aldeia global” que tanto é propagado quando se faz referência às
relações em rede. Afinal, a educação é um processo que não se encerra
em si, dela se espera intervenções, significações, contextualizações,
transformações, espera-se ações e reflexões!

Com a incorporação das tecnologias digitais em rede na educação,


é possível fazer o que há tempos clamamos para a escola: romper com
didáticas tradicionais que privilegiam a transmissão de informações, o
que se torna obsoleto quando se tem a “um toque” vários resultados em
sites de busca, passando a privilegiar a construção de aprendizagens
significativas que permitam refletir, filtrar, questionar, selecionar, organizar
e tantas outras ações necessárias nesse fluxo extraordinário de informação
acessível.

Assim, definir tecnologias educacionais é mais que pensar em


ferramentas, é pensar em uma postura perante o que essa ferramenta/
recurso permite e seu uso na educação deve ser sempre compreendido
como um processo dinâmico, rápido e que se modifica diante do cenário
que opera. Para nós, tenhamos sempre em mente a afirmação de Lévy
(1990, p. 118) nesse processo formativo e em nossas práticas profissionais
“é mais difícil, mas também mais útil apreender o real que está nascendo,
torná-lo autoconsciente, acompanhar e guiar seu movimento de forma
que venham à tona suas potencialidades mais positivas”.
20 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

RESUMINDO:
E então? Gostou do que mostramos? Aprendeu mesmo
tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido
que tecnologia não se restringe a computadores, celulares
e internet, esse termo diz respeito à totalidade das coisas
resultantes da engenhosidade do cérebro humano. Está
presente em todas as épocas, em diferentes formas de uso
e para diferentes aplicações e se relaciona diretamente a
três palavras: evolução, progresso e comodidade. Ainda,
que o pensamento, que organiza o conhecimento e o
processo de construção de alguma ferramenta, também é
tecnologia.

Avançamos para o conceito de TIC e TDIC, respectivamente,


Tecnologias da Informação e Comunicação e Tecnologias Digitais da
Informação e Comunicação, conceituando-as, em termos gerais, como
c aquelas que permitem socializar informações e possibilitam que a
comunicação seja possível. Vimos que na relação com as TIC, Santaella
(2003) relaciona duas culturas: a de massa e as mídias; e à TDIC à
cultura digital. Cultura essa que se dá em decorrência do avanço das
telecomunicações, principalmente com o advento da internet e tem
como característica a convergência das mídias escrita, audiovisual,
telecomunicações e a informática. No que se refere às tecnologias
educacionais, vimos que elas podem ser entendidas como o encontro
entre Ciência, Técnica e Pedagogia, de forma crítica, em prol de um projeto
pedagógico. Além disso, não se às TDIC, mas, que são as tecnologias
digitais e em rede que recuperam a discussão sobre a necessidade
eminente de se quebrar paradigmas e superar práticas tradicionais,
privilegiando a construção de aprendizagens significativas que permitam
refletir, filtrar, questionar, selecionar, organizar e tantas outras ações
necessárias nesse fluxo extraordinário de informação acessível. Para tanto,
finalizamos reforçando a necessidade de se pensar além da ferramenta,
sendo necessário pensar a postura perante ela quando na interface com
a educação.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 21

Tecnologias Educacionais e as Relações


no Processo Cognitivo

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo, você será capaz de perceber,


identificar e analisar as primeiras relações das TDIC no
campo da educação. Conhecer os principais objetivos
relacionados à formação e, a partir dessas tecnologias,
é essencial incorporá-las às práticas docentes, seja na
escola, seja em acompanhamentos individuais, seja em
outros espaços educacionais, permitindo planejar e atuar
de forma assertiva e coerente na relação objetivos de
ensino e expectativa de aprendizagem. Desconhecer
as especificidades dessas tecnologias compromete sua
utilização, afinal, assim como toda ferramenta utilizada
em prol de um objetivo educacional, a insegurança do
profissional mediante o recurso, ou a má escolha, ou a má
gestão da ferramenta é operante para o fracasso. E então?
Motivado para desenvolver esta competência? Então,
vamos lá. Avante!

DIC, Conectividade e Ensino-


Aprendizagem
Você já parou para pensar sobre seu comportamento de leitor
quando está na internet? Já reparou nas conexões que realiza para além
do texto inicial que acessou? Já percebeu a relação entre as diferentes
linguagens que as TDIC disponibilizam para além das palavras escritas?
Já analisou a interferência de se ter um banner de “promoções” ao lado de
uma reportagem, ou um vídeo com um tutorial daquela receita que está
ali apresentada?
22 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Quando nos propomos a discutir a interferência das TDIC no


processo de aprendizagem, é necessário analisar sua estrutura para além
do espaço da escola ou de educação a que se propõe. Afinal, estamos
imersos nessa relação e as informações que estão disponíveis, apesar
da possibilidade de alguns filtros de moderação projetados, assumem
uma conexão de conectividade que, por vezes, nos faz perguntar “como
cheguei nessa página?”, “como cheguei nesse conteúdo?”, se a ideia e o
objetivo inicial eram divergentes do resultado final. Quem nunca acabou
em um site de compra analisando o mais novo modelo de celular, ou um
produto de destaque, ou qualquer outro serviço à venda, sem que essa
tenha sido a ideia inicial? Ou ainda, quem ao “navegar” pela rede nunca
acabou em um site com notícias de celebridades, seja sobre as roupas do
tapete vermelho, seja sobre os relacionamentos de celebridades?

Essas questões nos apresentam as principais características das


TDIC conectadas, por sua natureza são multilinguagens, conectivas e
hipertextuais, sendo que o processo de interação, leitura e associação se
configura como multitarefas, não lineares, autodidáticos, exploratórios e
colaborativos.

É fato que na interface da educação essas características não são


inéditas ou exclusivas dos ambientes conectados e virtuais, tampouco
as habilidades que essas características demandam não são distantes
dos objetivos de ensino e expectativas de aprendizagem que se espera
nos espaços de escolarização, entretanto, com o advento das TDIC, tais
características passam a ser encaradas como tendências contemporâneas
que, para Lévy (1990), são ao mesmo tempo produtoras e produtos de
uma ecologia cognitiva.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 23

Figura 3 – Conectividade

Fonte: Freepik

Nesse sentido, da interação com as TDIC e suas características há a


demanda de habilidades relacionadas à participação ativa, criativa, lúdica
e engajada por parte dos sujeitos, resultado em um novo estilo de ensino-
aprendizagem. Afinal, dessa interação tecnológica há o favorecimento de
novos modos de comunicação, de pensar, de lidar com a informação
e de produzir conhecimentos e de agregar e rastrear informações que
precisam ser consideradas, acolhidas e potencializadas.
24 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Figura 4 – Novos modos de aprender

Comunicar

de forma rápida e cifrada com o encurtamento de


palavras e utilização de ícones para tornar mais eficaz
a compreensão da mensagem.

Pensar

simultaneamente e/com acesso a várias “janelas”.

Lidar e produzir

por meio de poucos clicks é possível lidar com as


informações e produzir conhecimentos.

Agregar e rastrear

para produzir conhecimento por meio da mediação


do computador com acesso à internet.

Fonte: Adaptada de Venturi (2011).

Trazemos como imperativo, pois, conforme aponta Morin (2004)


é necessário mobilizar recursos cognitivos, investimentos individuais e
tenacidade para que esses novos modos de aprender se efetivem, afinal, as
competências que as TDIC demandam no processo ensino-aprendizagem
são inatas ao sujeito, são identificadas de maneira espontânea apenas em
pequena porção, cabendo à escola e aos profissionais a responsabilidade
de promover possibilidades para “uma crescente autonomia dos/as
estudantes, visando seu desenvolvimento pessoal e provendo-os com
ferramentas para pensar e agir de modo informado e responsável num
mundo cada vez mais permeado pela ciência e tecnologia” (CASTELI et
al., s. d.).
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 25

Interatividade e os Caminhos Possíveis


para a Autonomia
Lévy (1996, p. 97) define inteligência como o “conjunto canônico das
aptidões cognitivas, a saber, as capacidades de perceber, de lembrar, de
aprender, de imaginar e de raciocinar”. Com as TDIC, essas aptidões passam
a ser potencializadas, ao menos no exercício do usuário da ferramenta,
quando acessa as informações. E, aqui, temos o elemento que inicia
nossa discussão sobre os caminhos para a autonomia necessária para a
aprendizagem nesse cenário tecnológico conectado, a interatividade.

Esse conceito está diretamente relacionado à participação e


à intervenção ativa, ou seja, quando falamos em interatividade nos
remetemos à possibilidade do sujeito em atuar, contribuir, modificar,
questionar, enfim, agir a partir do conteúdo/informação a ser aprendido.
Com as TDIC, ampliou-se a possibilidade do estudante-autor, aquele que
constrói e produz, significa e altera, complementa e adequa o que está
ali disponível para sua aprendizagem, possibilidades oferecidas diante do
caráter tecnológico inovador das TDIC.

No campo das TDIC, a interatividade se configura em ideal de


comunicação entre humanos, direta ou indiretamente mediada pela
máquina. A isso, preconiza-se a ruptura de modelos comunicacionais,
pregando-se a transição do modo de comunicação “massivo” para o
“interativo” (LÉVY, 1999 apud ALONSO et al., 2014).

É uma nova realidade que se projeta nas ações educativas


“superando as antigas hierarquias, estabeleceria uma relação totalmente
outra, porque capaz de se dar de todos para todos” (LÉVY, 1999, p. 79). É
a possibilidade que o estudante tem de acessar tutoriais em vídeos, por
exemplo, buscando novos caminhos para construir sua aprendizagem. E,
é aí que o desafio se estabelece.
26 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Figura 5 – Tecnologias e cotidiano

Fonte: Freepik

Afinal, como categorizado por Coll e Monereo (2010), com o advento


da informatização digital, avançamos para o que se atribuiu o nome de
“tecnologias ubíquas” que são aquelas tecnologias que, de tão integradas
à vida das pessoas, passam a não ser mais percebidas em suas relações e
interações cotidianas, o que resulta na diminuição ou ausência de reflexão
acerca das influências que elas ocasionam.

DEFINIÇÃO:

Tecnologia ubíqua “se refere à progressiva interação


dos meios informáticos nos diferentes contextos de
desenvolvimento dos seres humanos, de maneira que
não são percebidos como objetos diferenciados” (COLL;
MONEREO, 2010, p. 46). .
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 27

O conceito de tecnologia ubíqua é fundamental, pois é ele que nos


permite avançar para o conceito de autonomia, para tanto, veja a seguinte
situação. Digamos que “navegando” por alguma rede social, você se
depara com a seguinte notícia: “Extraterrestes invadem o México – há 4
horas ninguém consegue contato com nenhuma autoridade local”. Por
curiosidade – ou angústia, não é mesmo? –, você clica e lê o texto e sobre
o que ele se refere.

Por experiência, você não compartilha e divulga a informação


sem antes verificar a veracidade da notícia. Depois do acesso e leitura
crítica, você identifica que se trata de uma chamada para um novo filme,
entretanto, durante o dia você vê em sua timeline diversas postagens de
outros usuários da rede social sobre a notícia tendo-a como verdadeira,
a ponto do estúdio que produz o filme ter que produzir um comunicado
oficial para “acalmar” determinada parcela da população.

Desse exemplo, podemos estabelecer o conceito de autonomia que


encaminha nossas discussões. Definimos autonomia como a competência
de poder escolher por si mesmo, de poder agir a partir de sua própria
vontade e, principalmente, de dispor de recursos que permitam pensar
de maneira crítica e reflexiva sobre essas ações exercidas, ou seja, a
premissa do exercício da consciência. Freire (2009) afirma que autonomia:
implica na apropriação crescente de sua posição no
contexto. Implica na sua inserção, na sua integração, na
representação objetiva da realidade. Daí a conscientização
ser o desenvolvimento da tomada de consciência.
Não será, por isso mesmo, algo apenas resultante das
modificações econômicas, por grandes e importantes que
sejam. A criticidade, como entendemos, há de resultar de
um trabalho pedagógico crítico, apoiando em condições
históricas propícias (FREIRE, 2009, p. 61).

Nesse sentido, interação e autonomia são faces da mesma moeda:


não se pode produzir conteúdo sem pensar sobre ele, não se pode
ser autor sem conhecer as responsabilidades de sua ação. Enquanto
profissionais, não podemos ignorar essas demandas e relações no
processo ensino-aprendizagem.
28 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

DEFINIÇÃO:

Do que vale o estudante saber acessar a internet ou fazer


o download de um jogo se ele não avança no processo de
aprendizagens contextualizadas, elaboradas, significativas
e essenciais, tais como: responsabilidade no uso da rede
não se colocando em perigo, respeito o outro, entre outros?

Essas premissas se consolidam enquanto legislação, a partir da


homologação da Base Nacional Comum Curricular – BNCC (BRASIL, 2017)
que propõe dez competências, tanto cognitivas como socioemocionais,
como objetivos de aprendizagem e desenvolvimento a serem alcançados
ao longo do ciclo da Educação Básica, inclusive relacionadas às TDIC.

Para tanto, os caminhos possíveis para que essas competências


sejam fomentadas são permeados pela educação baseada nas
competências digitais, na modernização da educação escolar e na
criação de oportunidades para que os estudantes sejam estimulados
a desenvolver e utilizar seu senso crítico com os mais diversificados
conhecimentos e na socialização do que aprenderam.

É fundamental lembrar que, apesar das TIDC serem qualitativamente


diferentes dos recursos convencionais, apenas sua utilização não
produz as mudanças necessárias no processo de desenvolvimento e
aprendizagem dos estudantes. Apenas o computador, o celular e/ou o
tablet estarem no espaço educativo, não significa a apropriação efetiva
da tecnologia sob a égide dos princípios da interatividade e autonomia.
Afinal, uma aula expositiva, mecânica e de baixa interatividade, é possível
tanto com o uso de multimídia como no quadro de giz, não é mesmo?

Para que as TDIC possam possibilitar a modificação, amplificação


e exteriorização de numerosas funções cognitivas como a memória, a
percepção, a imaginação, raciocínio é preciso a qualificação da mediação
pedagógica.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 29

Novamente lançamos mão de Lévy (2011), teórico-referência


nas discussões sobre a cibercultura e que, sobre essa qualificação de
mediação pedagógica, indica que as possibilidades são muitas e variadas
quando na relação com as funções cognitivas, por exemplo:

•• Memória: uso de banco de dados, mapas mentais, conectores


textuais, arquivos digitais, entre outros.

•• Imaginação: simuladores virtuais, instrumentos de criação


colaborativos e de representação abstratos, jogos de narrativas,
entre outros.

•• Percepção: sensores, realidade virtual, entre outros.

•• Raciocínio: principalmente por meio da inteligência artificial e pelo


compartilhamento entre os indivíduos, que aumentam o potencial
da inteligência coletiva.

SAIBA MAIS:

Para saber um pouco mais sobre o que é cibercultura,


seus conceitos e seus fundamentos, recomendamos a
leitura do artigo Cibercultura: um estudo contextualizador
e introdutório clicando aqui.

Nesse sentido, a mediação pedagógica se constitui na relação com


a mediação tecnológica, quando, enquanto profissionais, nos apropriamos
dos meios e recursos sustentados por essas tecnologias, privilegiando e
promovendo práticas que ampliam as possibilidades de comunicação que
rompem com o modelo unidirecional e passivo, anteriormente previsto ao
estudante. Assim, é fundamental compreendermos o modelo de ensino a
partir das competências digitais.
30 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Modelo de Ensino a partir das


Competências Digitais
Ensinar na relação com as TDIC deve, a priori, preconizar a promoção
de práticas que permitam aos sujeitos:
explorar e enfrentar as novas situações tecnológicas de
uma maneira flexível, para analisar, selecionar e avaliar
criticamente os dados e informação, para aproveitar o
potencial tecnológico com o fim de representar e resolver
problemas e construir conhecimento compartilhado e
colaborativo, enquanto se fomenta a consciência de suas
próprias responsabilidades pessoais e o respeito recíproco
dos direitos e obrigações (CALVANI et al., 2008, p. 186).

Espera-se, portanto, que do ensino proposto os sujeitos


desenvolvam competências necessárias para que estabeleçam relações
com as TDIC de forma consciente e reflexiva. Para tanto, três dimensões
são inerentes às competências digitais: tecnológica, cognitiva e a ética.
Figura 6 – Competências digitais

TECNOLÓGICA
Explora novas possibilidades
tecnológicas com
flexibilidade.

ÉTICA COGNITIVA
Interage de forma Acessa, seleciona e
responsável com as avalia de forma crítica as
tecnologias. informações.

Fonte: Adaptada de Silva e Behar (2019).


Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 31

Na integração dessas três competências, espera-se que o estudante


compreenda o potencial das TDIC para a construção do conhecimento
de forma colaborativa e cooperativa. Em um panorama geral, podemos
sistematizar as competências digitais em conhecimentos, habilidades e
atitudes.
Figura 7 – Conhecimentos, habilidades e atitudes relacionadas às competências digitais

CONHECIMENTOS HABILIDADES ATITUDES

Entender o Gerenciar a Criticidade, reflexão e


funcionamento das informação, distinguir autonomia.
tecnologias, suas o virtual do mundo
potencialidades, seus real, identificar as
benefícios e seus conexões entre esses
riscos relacionados, dois domínios, utilizar
a veracidade das os serviços básicos da
informações. internet como suporte
à criação e à inovação.

Fonte: Adaptada de Silva e Behar (2019).

Desses dois esquemas representados nas figuras anteriores,


podemos ampliar o conceito de competência digital para:
um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes,
estratégias e sensibilização de que se precisa quando se
utilizam as TICs e os meios digitais para realizar tarefas,
resolver problemas, se comunicar, gestar informação,
colaborar, criar e compartilhar conteúdo, construir
conhecimento de maneira efetiva, eficiente, adequada de
maneira crítica, criativa, autônoma, flexível, ética, reflexiva
para o trabalho, o lazer, a participação, a aprendizagem, a
socialização, o consumo e o empoderamento. (FERRARI,
2012, p. 3-4 apud SILVA e BEHAR, 2019)

Entretanto, existem outros elementos sociais, econômicos e


culturais que implicam na efetivação das competências digitais, que
serão discutidos na sequência.
32 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

RESUMINDO:
E então? Gostou do que mostramos? Aprendeu mesmo
tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter
aprendido que as TDIC conectadas são, por natureza,
multilinguagens, conectivas e hipertextuais, sendo
que o processo de interação, leitura e associação se
configura como multitarefas, não lineares, autodidáticos,
exploratórios e colaborativos. Características que não são
inéditas no processo de ensino-aprendizagem, mas que,
com o advento tecnológico, passam a ser encaradas como
tendências contemporâneas, demandando habilidades
relacionadas à participação ativa, criativa, lúdica e engajada
por parte dos sujeitos. Vimos dois conceitos fundamentais
relacionados ao ensino-aprendizagem na relação com as
TDIC: a interatividade e a autonomia.

O primeiro está diretamente relacionado ao “estudante-autor”,


que constrói e significa as informações disponíveis em prol de sua
aprendizagem diante das possibilidades oferecidas e do caráter
tecnológico inovador das TDIC. O segundo diz respeito à competência
de poder escolher por si mesmo, de poder agir a partir de sua própria
vontade e, principalmente, de dispor de recursos que permitam pensar
de maneira crítica e reflexiva sobre essas ações exercidas, ou seja, a
premissa do exercício da consciência. Vimos a necessidade da mediação
pedagógica para que as TDIC, de fato, cumpram com essas intenções
e, para isso, a prática deve objetivar, principalmente, o desenvolvimento
de competências digitais, essas compreendidas como um conjunto de
conhecimentos, habilidades e atitudes, estratégias e sensibilização de
que se precisa quando se utilizam as TIC e os meios digitais para realizar
tarefas, resolver problemas, comunicar-se, gestar informação, colaborar,
criar e compartilhar conteúdo, construir conhecimento de maneira efetiva,
eficiente, adequada de maneira crítica, criativa, autônoma, flexível, ética,
reflexiva para o trabalho, o lazer, a participação, a aprendizagem, a
socialização, o consumo e o empoderamento.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 33

Racionalidade Instrumental e
Determinismo Tecnológico

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo, você será capaz de perceber


as relações entre as condições socioeconômicas e
culturais e o desenvolvimento das competências digitais
trabalhadas na competência anterior. Compreender essa
relação permite, principalmente, identificar os elementos
que permeiam a relação TDIC – ensino – aprendizagem no
contexto brasileiro. Isto será fundamental para a qualificação
das TDIC em suas práticas pedagógicas, descontruindo
ideias pré-concebidas e massivas acerca do conhecimento
e competência dos sujeitos diante desses recursos. Sem
conhecer essa relação, o trabalho pedagógico pode
fracassar sem que o profissional identifique os motivos reais.
E então? Motivado para desenvolver esta competência?
Então, vamos lá. Avante!.

Nativos e Imigrantes Digitais


Como vimos, as tecnologias de forma geral surgem da necessidade
humana e, como consequência, transformam o modo de vida das
pessoas. Esse processo se dá em um ciclo retroalimentado: necessidade
– tecnologia – necessidade – tecnologia. E é assim também na relação
com as TDIC.

Ao facilitar o acesso à informação na viabilização e expansão da


cultura digital, essas tecnologias alteram as relações estabelecidas, seja
na vida em geral, seja no contexto educacional, surgindo como objeto de
pesquisa/estudo para alguns teóricos que buscam melhor compreender
e definir as especificidades, características e outras perspectivas dessas
relações na “era digital”.
34 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Entre esses teóricos, destacam-se Palfrey e Gasser (2011)


principalmente por serem eles os responsáveis pelos termos: nativos e
imigrantes digitais. Para eles, aqueles que nasceram após os anos 1980,
por serem contemporâneos às tecnologias, teriam maiores habilidades
para usar as TDIC. Seriam, portanto, os nativos digitais e o aspecto etário
que definiria a condição do usuário frente a ferramenta e seu conteúdo.

Já os imigrantes digitais são aqueles que não se enquadram nesse


grupo. A eles caberia conviver e interagir com os nativos digitais e “se
familiarizar” com a tecnologia emergente. Nesse cenário, ainda haveria
um terceiro grupo, os colonizadores digitais, que seriam as pessoas que
destoam do primeiro e do segundo grupo e corresponde àqueles que
cresceram pré-mundo digital – em mundo analógico –, mas que são
responsáveis ou vem contribuindo para a evolução tecnológica. Diferente
dos imigrantes, os colonizadores atuam conectados e fazem o uso
sofisticado das tecnologias.
Figura 8 – Nativos digitais

Fonte: Freepik.

Essa classificação geracional, ao ser transposta para o cenário


educacional, predispõe relações conflitantes, afinal, grande parte dos
professores em atuação poderiam ser categorizados como imigrantes
digitais frente a turmas de nativos digitais. Mais que um rótulo, esses
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 35

termos nos permitem pensar sobre a forma como cada um desses sujeitos
aprende, ensina e constrói conhecimento.

É provável, portanto, que o professor aprenda e construa


conhecimentos de forma diferente de seus estudantes, consequentemente,
sua forma de ensinar difere da forma como os estudantes percebem o
conhecimento e sua produção.

IMPORTANTE:

A perspectiva de nativos e imigrantes digitais contribui,


principalmente, para evidenciar as possíveis barreiras
e/ou dificuldades de comunicação que podem existir
entre professores e estudantes. Se pensarmos a partir do
proposto, considerando alunos e os professores de hoje,
respectivamente, nativos e imigrantes digitais, é possível
que nessa relação ambos busquem se fazer entender e ser
compreendido por meio de “línguas diferentes”.

Figura 9 – Dificuldades comunicativas

Fonte: Freepik.
36 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Assim, é possível que nessa relação os estudantes e suas demandas


de aprendizagem coloquem em xeque as formas e métodos pelas quais
os professores aprenderam e, consequentemente, ensinam.

É preciso destacarmos: as análises que fizemos até aqui podem


resultar em perspectivas simplistas, pressupondo-se que existam formas
prontas e acabadas sendo garantia de aprendizagem, afinal, superada a
dificuldade de comunicação, não haveria motivo para que o que se ensina
não seja aprendido, não é mesmo? Entretanto, sabemos que o processo
educacional é complexo e não opera nessa lógica matemática, tampouco
dessa forma linear.

Assim, quando pensamos no impacto positivo ou negativo das


inovações decorrentes das TDIC na educação, é preciso que consideremos
todo o cenário que comungam nesse processo dentro e fora do espaço
escolar. Portanto, é fundamental destacar as controvérsias que emergem
da perspectiva geracional apresentada.

Modelo Geracional: Reflexões Necessárias


Ao contrário de Palfrey e Gasser (2011), Monereo e Pozo (2010)
afirmam que não devemos considerar a idade como condição
determinante na relação com as TDIC. Apontam que não há um “abismo
geracional”, mas sim um “abismo sociocognitivo”, ou seja, a diferença está
no modo de pensar e de se relacionar com o mundo das pessoas que não
utilizam as tecnologias digitais ou as que utilizam de forma esporádica ou
cotidianamente.

Revisitando a sua primeira categorização, Prensky (2009) também


acaba considerando essas questões, tanto que sugere um novo conceito:
sabedoria digital. Esse conceito se refere tanto à sabedoria decorrente do
uso da tecnologia digital quanto à sabedoria de saber usá-la com ética.
Assim, indiferente da faixa etária, todos podemos nos tornar sábios no
mundo digital, como em qualquer aprendizagem, com maior ou menor
habilidade em determinados campos de operação.

Para tanto, é necessário perceber em que cenário se estabelecem


as relações com as TDIC que possibilitam a sabedoria digital. Conforme
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 37

dados do censo, 41% (quarenta e um por cento) das pessoas que


apontaram “falta de habilidade com o computador” são “mais velhas e
menos escolarizadas” (BRASIL, 2015, p. 51), a lógica etária parece fazer
sentido. Entretanto, dados divulgados pelo CETIC – Centro Regional de
Estudos para o desenvolvimento da sociedade da informação, publicados
em 2018, apontam que 33% (trinta e três por cento) das residências não
tem acesso à internet, ou seja, reduz a todos, indiferente de sua idade, a
possibilidade de avanços no sentido da sabedoria digital.

Essa condição – mazela – de exclusão digital decorrente das


condições sociais e econômicas pode ser definida como uma “fratura
digital”. Para Mattelart (2002), em uma sociedade desigual, dois papéis se
desenham: os “inforricos” - aqueles com uso proficiente das tecnologias e,
os “infopobres” - sujeitos marginalizados no cenário tecnológico.

No sentido de compreender a relação direta da pobreza com o a


exclusão digital, destaca-se o evidenciado por Sorj e Guedes (2005 p. 102).
“A pobreza não é um fenômeno isolado. A maneira
como ela é definida e percebida depende do nível de
desenvolvimento cultural, tecnológico e político de
cada sociedade. A introdução de novos produtos, que
passam a ser indicativos de uma condição de vida
“civilizada” (seja telefone, eletricidade, geladeira, rádio ou
TV), aumenta o patamar abaixo do qual uma pessoa ou
família é considerada pobre. Como o ciclo de acesso a
novos produtos começa com os ricos e se estende aos
pobres após um tempo mais ou menos longo (e que nem
sempre se completa), há um aumento da desigualdade.
Os ricos são os primeiros a usufruir as vantagens do uso e/
ou domínio dos novos produtos no mercado de trabalho,
enquanto a falta destes aumenta as desvantagens dos
grupos excluídos. Em ambos os casos, os novos produtos
TICs aumentam, em princípio, a pobreza e a exclusão
digital. As políticas públicas podem aproveitar as novas
tecnologias para” (SORJ, GUEDES, 2005 p.102)

Os autores destacam que a pobreza depende, essencialmente,


da maneira como os aspectos sociais são apresentados e, por isso, na
medida que surgem novos produtos e realidades na sociedade, as
condições econômicas e sociais modificarão e, consequentemente, o
desfavorecimento poderá surgir.
38 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Portanto, essa condição nos alerta para compreender a condição


brasileira no trabalho integrado às TDIC: as condições de usuário é um
fenômeno que engloba aspectos de ordens econômica e social, nos
quais os mais pobres, mais velhos e menos escolarizados, os primeiros
e os últimos em diferentes faixas etárias, são marginalizados do cenário
tecnológico por sua condição de existência (CASTELLS, 1998).

Portanto, é preciso considerar que muitos dos estudantes não


estão/não se encontram inseridos na cultura digital. Embora, esses
mesmos estudantes possam se engajar diante das TDIC em sua
aprendizagem, precisamos estar atentos para perceber a condição de
usuário desse estudante, fundamental na relação ensino-aprendizagem,
afinal, a inabilidade ou desinteresse, ou até mesmo o “fracasso”, nesse
processo pode estar relacionado diretamente ao fato de não terem
acesso às tecnologias cotidianamente em decorrência de sua condição
socioeconômica.

No que se refere às condições apresentadas na sociedade acerca


da inclusão digital, Sorj e Guedes (2005 p.102) destaca que, no Brasil, a
desigualdade social também se relaciona com o uso das tecnologias
da informação e que isso reflete, tão somente, a realidade global da
desigualdade que acomete o país.
“O processo desigual de disseminação do computador
entre a população das diferentes cidades do Brasil reflete
sem dúvida o nível desigual de riqueza e escolaridade
entre as diferentes regiões e cidades, em particular entre
as populações pobres das regiões Norte e Nordeste e do
Centro-Sul. A posse do computador, porém, está também
associada a um componente intangível: a disseminação
de uma cultura de valorização da informática associada
em especial à noção de que seu domínio é condição de
emprego e sucesso na educação”. (SORJ, GUEDES, 2005
p.102)

Ainda no que se refere ao processo de exclusão digital, convém


destacar que a desigualdade não é encontrada apenas no setor
econômico, mas em questões de gênero, grupos etários e comunidades
no geral, conforme observa Sorj e Gedes (2005 p.103)
“A exclusão digital se dá também no interior dos grupos
pobres, entre gêneros, raças e grupos etários, e entre
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 39

diferentes comunidades. A menção aos bairros pobres


pode dar uma falsa visão de homogeneidade, quando tanto
no interior de cada um como entre eles a desigualdade
em relação à posse de computador é muito pronunciada”
(SORJ, GUEDES, 2005 p.103).

Dessa maneira, para Koutropoulos (2011) é importante questionar a


existência de uma geração digital e as premissas – quase de mágicas –
de como ensinar e trabalhar com os “nativos digitais”, afinal, esse termo
carrega em si um estereótipo que precisa ser rompido e, infelizmente, em
decorrência das desigualdades sociais, representa minoria da população.

Assim, precisamos considerar como fator essencial para o trabalho


com as TDIC a inclusão digital entendida como a efetivação – mínima – de
três ações (BARRETO, 2009; CASTELLS, 1998; MATTELART, 2002):

1º) A disponibilização da tecnologia aos usuários.

2º) A formação técnica desses para o uso.

3º) A formação intelectual crítica para refletir sobre seu papel de


usuário.

É fato que na escola já avançamos significativamente na


disponibilização das tecnologias. Ainda é preciso avançar e para tanto, é
preciso participarmos ativamente das discussões sobre políticas públicas
para que a infraestrutura seja qualificada. A segunda ação podemos encarar
como decorrente, afinal, tendo a “ferramenta” disponível, identificaremos
a demanda do estudante e, a partir dela podemos intervir e avançar. Já
a terceira ação é o que irá, de fato, superar o abismo ocasionado pela
“fratura digital”, pois, é o uso proficiente e autônomo das TDIC, é sobre
essa ação que avançaremos na próxima competência.

Ainda no que se refere ao processo de inclusão no âmbito das


tecnologias da informação, destaca-se a necessidade de inserção de
políticas públicas que sejam capazes de equacionar os interesses e
realidades da sociedade, conforme destaca Sorj e Guedes (2005 p. 102)
que se encontra disposto da seguinte maneira:
“As políticas públicas podem aproveitar as novas
tecnologias para melhorar as condições de vida da
população e dos mais pobres, mas a luta contra a exclusão
40 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

digital visa sobretudo encontrar caminhos que diminuam


seu impacto negativo sobre a distribuição de riqueza e
oportunidades”. (SORJ, GUEDES, 2005 p.106)

Ainda no que se refere ao processo de inserção das tecnologias da


informação nos mais diversos setores da sociedade, com o objetivo de
auxiliar a acessibilidade, destaca-se que a supressão dos obstáculos para
este processo deve ocorrer, pois só a partir da retirada dos elementos
que podem dificultar a acessibilidade é que será possível perceber a
inclusão digital pelos setores mais marginalizados da sociedade. Ademais,
destaca-se que apenas com a inclusão, em todos os aspectos, é que será
possível identificar a massificação do uso das tecnologias da informação.
“As políticas de universalização de acesso devem
confrontar as complexidades associadas à apropriação
efetiva das TICs pelos setores mais pobres da população.
O valor efetivo da informação depende da capacidade
dos usuários de interpretá-la. Informação só existe na
forma de conhecimento, e conhecimento depende de
um longo processo de socialização e de práticas que
criam a capacidade analítica que transforma bits em
conhecimento”. (SORJ, GUEDES, 2005 p.116)

Por isso, torna-se evidente que para se conseguir a inclusão digital,


de maneira ampla, o pressuposto essencial é combater a exclusão
escolar, ou seja, a máxima do processo é trabalhar com uma educação
ampla, inclusão e de qualidade, pois conforme destaca Sorj e Guedes
(2005) a inclusão digital só tem efeito quando associada com a execução
de outras políticas públicas.
“Portanto, combater a exclusão digital supõe enfrentar
a exclusão escolar. As políticas de universalização do
acesso à Internet nos países em desenvolvimento serão
uma quimera se não estiverem associadas a outras
políticas sociais, em particular às da formação escolar. Não
haverá universalização de acesso às novas tecnologias
da informação e da comunicação sem a universalização
de outros bens sociais. Nos países em que as taxas de
analfabetismo funcional são altíssimas” (SORJ, GUEDES,
2005 p.116)

A potencialização da importância no processo de inclusão


educacional como pressuposto para a inclusão digital, não quer dizer que
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 41

esta só pode ser aplicada quando aquela ocorrer de maneira ampla, mas
tão somente destacar que são instrumentos importantes e que, podem de
fato, ser trabalhadas de maneira conjunta. Inclusive, pelas formas como o
processo educacional tem se apresentado, em especial em virtude dos
aspectos surgidos com a pandemia da Covid-19, não há como dissociar
as realidades.
“Obviamente, isso não significa que se deva esperar
que se chegue a erradicar o analfabetismo para se
desenvolver políticas de inclusão digital. Não podemos
esquecer que a luta pela inclusão digital é uma luta contra
o tempo. As novas tecnologias da informação aumentam
a desigualdade social, de forma que a universalização do
acesso não é mais do que a luta por um novo nivelamento
das condições de acesso ao mercado de trabalho”. (SORJ,
GUEDES, 2005 p.116)

Sobre esta relação tênue que deve existir entre inclusão escolar
e inclusão digital, destaca-se que decorre do processo observado no
próprio mercado de trabalho, visto que é pré-requisito, atualmente, para
assumir um emprego, não apenas o conhecimento técnico, mas essencial
o conhecimento informático.
“As exigências da economia e os novos empregos obrigam
a convivência de políticas públicas que trabalhem
simultaneamente com diferentes setores sociais e ritmos
desiguais de universalização de serviços públicos. Não se
pode, porém, desconhecer o imbricamento das políticas
sociais, e o fato de que o sucesso final depende de um
programa integrado de universalização dos vários serviços
públicos”. (SORJ, GUEDES, 2005 p.117)

Por isso, é compreensível e aceitável o posicionamento de Sorj


e Guedes (2005 p.117) ao considerar as escolas como instrumentos
essenciais para os processos de inclusão digital, visto que a medida em
que o aperfeiçoamento acadêmico da sociedade ocorrer, haverá também,
a inserção desta nova parcela da população no cenário informático.
“As escolas são instrumentos centrais para socializar as
novas gerações na Internet. Isso não implica transformar
a telemática num instrumento privilegiado do sistema
educativo, nem realizar um investimento exagerado em
computadores por escola”. (SORJ, GUEDES, 2005 p.117)
42 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Como consequência da materialização desta relação necessária,


destaca-se que será possível identificar mais nativos do que migrantes
no uso das tecnologias da informação, pois desde cedo as pessoas terão
mais acesso às novas tecnologias e, os indivíduos de hoje que recebem a
informatização, estará no mercado de trabalho. Por isso, a inclusão digital,
a construção de uma sociedade basicamente incluída é mecanismo lento
e de longo prazo, pois os resultados só serão identificados quando os
alunos de hoje assumirem o mercado de trabalho no futuro.

RESUMINDO:
E então? Gostou do que mostramos? Aprendeu mesmo
tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido
que Palfrey e Gasser (2011) são responsáveis pelos
termos nativos, imigrantes e colonizadores digitais. Esses
autores relacionaram as habilidades para o uso das TDIC
com a faixa etária populacional, assim, aqueles que
nasceram após os anos 80, por serem contemporâneos
às tecnologias, teriam maiores habilidades e seriam os
“nativos digitais”, os imigrantes seriam os que antecedem
essa geração e, portanto, precisariam “se familiarizar”
com a tecnologia emergente e, os colonizadores digitais,
seriam as pessoas que destoam do primeiro e do segundo
grupo, correspondendo àquelas pessoas que nasceram
em mundo analógico, mas são responsáveis ou vem
contribuindo para a evolução digital.

No cenário educacional, essa perspectiva contribui para


refletirmos sobre possíveis relações conflitantes em decorrência das
diferenças geracionais, permitindo pensar em como cada geração
constrói conhecimento e, no caso dos professores, acaba por ensinar, o
que resultaria em uma barreira comunicacional. Entretanto, vimos que
essa relação é mais complexa, afinal, há fatores sociais e econômicos
envolvidos, que interferem no acesso e proficiência na apropriação das
TDIC pelos sujeitos. Vimos que para Monereo e Pozo (2010), não há
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 43

um “abismo geracional”, mas sim um “abismo sociocognitivo”, ou seja,


a diferença está no modo de pensar e de se relacionar com o mundo
das pessoas que não utilizam as tecnologias digitais ou as utilizam de
forma esporádica ou cotidianamente. Premissa que resulta no conceito
de sabedoria digital, que acolhe a todos, na possibilidade de domínio das
TDIC. Vimos também que para a sabedoria digital ser algo possível, é
preciso considerar a “fratura digital”, compreendendo que grande parte
da sociedade não se encontra inserida na cultura digital por não terem
acesso, em decorrência de sua condição socioeconômica. Fato para
questionarmos a existência de uma geração digital e as “receitas mágicas”
para educá-los. Ainda, vimos que na relação com as TDIC é fundamental
que a inclusão digital seja efetiva e, para tanto, três ações são essenciais:
1º) a disponibilização da tecnologia aos usuários; 2º) a formação técnica
desses para o uso e; 3º) a formação intelectual crítica para refletir sobre
seu papel de usuário.
44 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Desafios Relacionados às Tecnologias


Educacionais

OBJETIVO:

Ao término deste capítulo, você será capaz de identificar


os desafios contemporâneos relacionados à apropriação
tecnológica no processo ensino-aprendizagem. Iremos
perceber como as competências digitais se desenvolvem
da perspectiva do letramento computacional à fluência
digital. Isto será fundamental para a promoção de práticas
em prol da inclusão digital e, consequentemente, para
a superação da “fratura digital” discutida anteriormente.
Ainda, no campo da Neuroeducação, operar no sentido de
possibilitar o desenvolvimento cognitivo dos estudantes na
interface com as TDIC. E então? Motivado para desenvolver
esta competência? Então, vamos lá. Avante!

Letramento Computacional,
Informacional e em Mídias: Ponderações
Necessárias
Vimos que para que a inclusão digital se efetive, três ações
essenciais são necessárias: a disponibilização da tecnologia aos usuários,
a formação técnica desses para o uso e, a formação intelectual crítica
para refletir sobre seu papel de usuário.

DEFINIÇÃO:

Letramentos digitais (LDs) são conjuntos de letramentos


(práticas sociais) que se apóiam, entrelaçam e apropriam
mútua e continuamente por meio de dispositivos
digitais para finalidades específicas, tanto em contextos
socioculturais geograficamente e temporalmente limitados,
quanto naqueles construídos pela interação mediada
eletronicamente. (BUZATO, 2006, p. 16)
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 45

A partir da definição apresentada acima e, tendo como pressuspoto,


a importância do conhecimento sobre o uso das tecnologias da
informação, destaca-se que letramento digital é essencial para o processo
de construção de uma estratégia para aquisição do conhecimento, visto
que se utiizará de ferramentas digitais importantes para a construção de
um cenário de conhecimento favorável para o desenvolvimento pessoal
intelectual e pessoal.
“A partir do exposto, compreendo letramento digital como
o conjunto de competências necessárias para que um
indivíduo entenda e use a informação de maneira crítica
e estratégica, em formatos múltiplos, vinda de variadas
fontes e apresentada por meio do computador-internet,
sendo capaz de atingir seus objetivos, muitas vezes
compartilhados social e culturalmente”. (FREITAS, 2010
p.340)

Dessa forma, podemos perceber que a inclusão segue um caminho:


acesso, uso e emancipação. Segundo Pettro (2008):
Produzir informação e conhecimento passa a ser, portanto,
a condição para transformar a atual ordem social.
Produzir de forma descentralizada e de maneira não-
formatada ou preconcebida. Produzir e ocupar espaços,
todos os espaços, através das redes. Nesse contexto, a
apropriação da cultura digital passa a ser fundamental,
uma vez que ela já indica intrinsecamente um processo
crescente de reorganização das relações sociais mediadas
pelas tecnologias digitais, afetando em maior ou menor
escala todos os aspectos da ação humana. Isso inclui
reorganizações da língua escrita e falada, as ideias, as
crenças, costumes, códigos, instituições, ferramentas,
métodos de trabalho, arte, religião, ciência, enfim, todas
as esferas da atividade humana. Até mesmo os aspectos
mais pessoais, como os rituais de namoro e casamento,
entre outras práticas, têm sua regulação alterada, dadas
as novas formas de interação vivenciadas na cultura digital
(PRETTO, 2008, p. 78).

De acordo com o que está sendo apresentado, destaca-se que


o processo do letramento digital depende não apenas do acesso aos
intrumentos informáticos e seu conhecimento básico sobre o uso, mas
essencial do conhcimento sobre estratégias de conhecimento para a
utilização das ferramentas de maneira adequada, ou seja, os profissionais
46 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

da educação devem ter conhecimento sobre as linguganes digitais que


serão utilizadas pelos alunos. E, quando o profissional apresenta esta
habilidade, percebe-se que o processo de integração entre professor,
aluno e sistema informático tende a apresentar bons resultados.
“Tenho observado, por meio de nossas pesquisas, que
escolas equipadas com computadores e acesso à internet
e professores egressos de cursos básicos de informática
educativa não têm sido suficientes para que se integrem os
recursos digitais e as práticas pedagógicas. Se o desejável
é que os professores integrem computador-internet à
prática profissional, transformando-a para melhor inseri-la
no contexto de nossa sociedade marcada pelo digital, é
preciso ir muito além. Os professores precisam conhecer
os gêneros discursivos e linguagens digitais que são
usados pelos alunos, para integrá-los, de forma criativa e
construtiva, ao cotidiano escolar. (FREITAS, 2010 p.341)

Diante desta necessidade de ser incutir o letramento digital nos


espaços educacionais, destaca-se a necessidade de compreender que
as tecnologias da informação nas escolas é uma realidade e que, por isso,
o primeiro passo para cumprimento da demanda no espaço educacional
está sendo observado: disseminar a tecnologia. E, por isso, de menor ou
maior escala, o acesso as TDIC nas escolas são uma realidade, cumprindo
a primeira ação, ao menos no espaço escolar, necessária para a inclusão
digital. E, portanto, no primeiro momento, a maneira como o sistema
informático se apresenta nas escolas é possível identificar que os aspectos
de inculsão estão sendo definidos.
Quando digo integrar é porque o que se quer não é o
abandono das práticas já existentes, que são produtivas
e necessárias, mas que a elas se acrescente o novo.
Precisamos, portanto, de professores e alunos que
sejam letrados digitais, isto é, professores e alunos
que se apropriam crítica e criativamente da tecnologia,
dando-lhe significados e funções, em vez de consumi-
la passivamente. O esperado é que o letramento digital
seja compreendido para além de um uso meramente
instrumental” (FREITAS, 2010 p.341)

Assim, nosso percurso de aprendizagem segue em busca da


compreensão dos caminhos já trilhados e a serem trilhados para a
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 47

sabedoria digital com vistas às competências digitais, pois como evidencia


Martín-Barbero (2006 p.54):
“O lugar da cultura na sociedade muda quando a
mediação tecnológica da comunicação deixa de ser
meramente instrumental para espessar-se, condensar-
se e converter-se em estrutural: a tecnologia remete,
hoje, não a alguns aparelhos, mas, sim, a novos modos
de percepção e de linguagem, a novas sensibilidades
e escritas” (MARTÍN-BARBERO, 2006, p. 54).A partir da
década de 1980, a novidade dos computadores, a principal
competência priorizada nos processos educacionais era
aquela relacionada à informática. O objetivo era, grosso
modo, possibilitar a familiarização e a experiência com o
computador. Com o avanço dessas tecnologias, passa-
se dessas competências – da informação -, para as
competências relacionadas à comunicação, avançando
para termos como letramento informacional, Educação
em Mídias, entre outros.

IMPORTANTE:

Essas perspectivas não se limitam apenas às TDIC, dizem


respeito às discussões estabelecidas de forma geral às TIC
e as suas influências no consumo e interferência na vida
cotidiana das pessoas.

As mudanças dos conceitos estão diretamente relacionadas ao


desenvolvimento tecnológico decorrente e a forma como se possibilitam
as relações com as tecnologias, suas funções e conexões no cotidiano.
Essa base nos permite afirmar a partir das discussões propostas na segunda
competência do nosso material, com base em Silva e Behar (2019), que
o conceito de competências digitais foi construído à medida que as TDIC
interferiam e modificavam as relações no âmbito da sociedade.

Ainda, a complexidade tecnológica faz com que a cada dia uma


nova necessidade “apareça” e uma nova tecnologia seja criada ou, uma
anterior seja atualizada, o que não nos garante que “ter” a ferramenta
digital seja sinônimo de “ser” digitalmente competente.
48 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Se, a partir do conceito de emancipação apresentado na abertura


dessa competência em convergência aos termos e suas perspectivas
apontados por Silva e Behar (2019), as práticas que efetivamos na
interface com as TDIC seriam, de fato, convergentes para uma educação
em prol da superação das desigualdades, o que possibilita a autonomia e
a competência dos estudantes?

Alfabetização e Letramento Digital


A reflexão proposta não pretende ser respondida, ela nos servirá
como “guia” nas análises que faremos sobre os termos que aparecem na
sistematização apresentada na figura anterior e que, por vezes, povoam
as práticas pedagógicas.

O primeiro diz respeito à Alfabetização e Letramento digital.


Aproximando ao conceito utilizado nos processos relacionado à Língua
Portuguesa, entendemos alfabetização como o domínio do código escrito,
com as habilidades de leitura e escrita, nessa perspectiva, o letramento,
opera na compreensão do caráter comunicacional dessa ferramenta
simbólica, em sua significação e identidade, ou seja, é o caráter de
autonomia e emancipação na utilização da linguagem.

IMPORTANTE:

O letramento digital se constitui como “uma complexa


série de valores, práticas e habilidades situados social
e culturalmente envolvidos em operar lingüisticamente
dentro de um contexto de ambientes eletrônicos, que
incluem leitura, escrita e comunicação. Nessa definição,
letramento digital refere-se aos contextos social e cultural
para discurso e comunicação, bem como aos produtos e
práticas linguísticos e sociais de comunicação, e os modos
pelos quais os ambientes de comunicação têm se tornado
partes essenciais de nosso entendimento cultural do que
significa ser letrado. (FREITAS, 2010 p.340)
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 49

Transpondo para as TDIC, alfabetizar e letrar passa a, obrigatoriamente,


agregar as mudanças tecnológicas, afinal, as demandas digitais e suas
particularidades são essenciais para que a comunicação se efetive. Coll
e Illera (2010) relacionam que ser alfabetizado e letrado, em tempos
de tecnologias digitais, é preciso necessariamente ter conhecimentos
e domínios das TDIC. Soares (2002) avança para as particularidades da
leitura em tela, da hipertextualidade e das características que as TDIC
agrupam ao código escrito.
O letrado digitalmente interage com as tecnologias,
realizando práticas como saber pesquisar, selecionar,
avaliar a informação, realizar trocas entre pares,
compartilhar, ser autor, sempre utilizando os recursos
da  Web, e utilizando diferentes ferramentas para isso
(SILVA, 2012, p. 74).

Nesse sentido, o processo de alfabetização e letramento –


tradicional e digital – são desenvolvidos em conjunto, de modo concreto,
mas acontecem em diferentes momentos.

Entretanto, muito embora se configure como realidade, o letramento


digital no sistema educacional se apresenta como certas limitações, pois
é bastante comum, conforme evidencia Freitas (2010 p.341) que a conexão
do profissional com as tecnologias da informação se dá, tão somente, a
partir do uso superficial sem, portanto, se estabelecer uma conexão com
os próprios instrumentos de aprendizagem, prejudicando, portanto, a
inclusão e integração do sistema educacional.
“Estuda-se sobre a informática na educação, mas não
se forma o futuro professor, trabalhando seu letramento
digital ou envolvendo-o em atividades de efetivo
uso do computador-internet como instrumentos de
aprendizagem. Debruçando-me sobre os dados e as
análises dessa pesquisa, chego a pensar que essa
aproximação com o letramento digital não deve ser feita,
necessariamente, a partir de determinada disciplina, mas
por meio de um trabalho contínuo, no interior de todas
as disciplinas nas quais o professor, em sua formação
inicial, possa experienciar o letramento digital no próprio
processo pedagógico”. (FREITAS, 2010 p.341)

Uma prática que representa essa lógica é a do laboratório de


informática. Os estudantes em processo de alfabetização desenvolvem
50 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

determinado conteúdo em sala e, em um período pré-agendado e


esporádico, vão a esse espaço para utilizar os recursos e realizar pesquisas,
sistematizar produções, entre outras ações.

Para Silva (2012), essas práticas podem até garantir o caráter de


alfabetização, porém fracassam no princípio do letramento – tradicional
e digital – afinal, descontextualizam as práticas sociais realizadas no
ambiente virtual.

A formação inicial de professores ainda está distante de enfrentar


computador e internet como instrumentos de aprendizagem. As
porcentagens que indicam a presença de disciplinas sobre tecnologias
nos currículos dos cursos analisados, por si só, mostram que esse é
um esforço ainda muito pequeno. A análise dessas ementas são ainda
mais eloquentes para dizerem que o futuro professor não está sendo
capacitado para utilizar, em sua docência, os recursos do computador-
internet. Pela nomenclatura das disciplinas e pelo conteúdo que abordam,
percebe-se que há preocupação com as tecnologias em si, mas não com
o letramento digital do professor em formação. (FREITAS, 2010 p.341)

Fluência Digital
Dessas considerações, podemos avançar para a perspectiva da
fluência digital. Essa condição de ser fluente diz respeito ao “algo a mais”
para se comunicar diante das peculiaridades das TDIC.

Hoje nas redes sociais é comum nos depararmos com “memes”, que
são imagens com textos ou outros formatos, geralmente com conteúdos
engraçados. Para compreender a “graça” que esse recurso carrega em si,
é preciso ser fluente na linguagem que o compõe, afinal, há um contexto
que o significa e faz como que ele seja, portanto, engraçado ao comunicar
sua mensagem.
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 51

IMPORTANTE:

O papel do professor na contemporaneidade como formador


de novos docentes, que terão como alunos nativos digitais.
Formação que deve ter uma ancoragem consistente na
epistemologia do conhecimento, compreendendo-o como
algo provisório e transitório, mas que tem regras e rigor.
Ou seja, o educador é aquela pessoa que tem de estar
sempre aberta ao novo, para investigá-lo e ver o que ele
representa para o conhecimento e para a aprendizagem.
Para formar futuros professores para o trabalho com nativos
digitais faz-se necessário enfrentar a responsabilidade
de uma constante atualização, a defasagem entre o seu
letramento digital e o do aluno, e manter o distanciamento
possibilitador de um olhar crítico diante do que a tecnologia
digital oferece. Assim, espera-se que, nessa era da internet,
o professor possa fazer de sua sala de aula um espaço de
construções coletivas, de aprendizagens compartilhadas.
(FREITAS, 2010 p.349)

Na relação entre alfabetização, letramento e fluência digital, podemos


sistematizar seus conceitos e perspectivas conforme a Figura 10:
Figura 10 – Relação entre o processo de alfabetização, letramento e fluência digital

Alfabetização digital Letramento digital Fluência digital

Considera a influência Evidencia a Compreende a


da tecnologia na importância da capacidade pessoal
definição da leitura capacidade de de avaliar, selecionar,
e da escrita. Com entender e usar aprender e usar as
as mudanças a informação em novas tecnologias da
tecnológicas, é
múltiplos formatos informação conforme
preciso considerar
apropriado para suas
os processos de
atividades pessoais
alfabetização
e profissionais
tradicional e
digital como (TAROUCO, 2013).
complementares.
Fonte: Adaptada de Silva e Behar (2019).
52 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

Portanto, a partir do desenvolvimento desses conceitos, é fato que


ainda é preciso avançarmos significativamente nas práticas desenvolvidas
na relação com as TDIC para que o conceito de competências digitais
almejado seja alcançado.

Entretanto, se ainda estivermos em alfabetização, em práticas de


letramento ou já avançando para a fluência, o importante é sempre ter em
mente que o objetivo maior de todo o trabalho na relação com as TDIC
é a formação do sujeito competente, crítico e capaz de se comunicar,
objetivos que variam de pessoa para pessoa, pois são várias as condições
que permeiam essa relação tão complexa.

Ainda, mesmo no campo das competências digitais, cabe


destacarmos seu caráter dinâmico e a necessidade constante de
atualização por parte dos profissionais que se predispõem a esse trabalho
desafiante.

PASSO A PASSO

No intuito de compreender um pouco melhor a maneira como o


letramento digital pode ser aplicado no âmbito educacional, indica-se a
leitura na íntegra do artigo de opinião: Você já ouviu falar em letramento
digital? Veja como trabalhá-lo!. O artigo é de autoria de César Martins e
durante a leitura será possível compreender não apenas a importância
do letramento digital para a formação do indivíduo, mas especialmente
quais as consequências que podem ser alcançadas com o processo de
letramento e, em especial, como se pode aplicar o letramento de maneira
adequada no ambiente educacional. O artigo pode ser acessado através
do link: https://escolasdisruptivas.com.br/steam/letramento-digital/
Neuroeducação e Tecnologias Educacionais 53

RESUMINDO:

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo,
vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido
que a inclusão digital segue um caminho que é acesso, uso
e emancipação na relação com as TDIC e, dessa relação,
algumas perspectivas se evidenciam. Perspectivas e
conceitos que sofrem mudanças com desenvolvimento
tecnológico e que permitem, na atualidade, compor o
conceito de competências digitais. Vimos que alfabetizar
e letrar passa a agregar as mudanças tecnológicas
considerando essenciais os conhecimentos e domínios das
TDIC, por exemplo: as particularidades da leitura em tela e
da hipertextualidade.

Portanto, evidenciou-se que essa perspectiva avança no sentido de


discutir o processo de alfabetização e letramento tradicional e digital de
forma conjunta, de modo concreto, porém por separá-los, acabam por
fracassar no princípio do letramento tradicional e digital, descontextualizam
as práticas sociais realizadas no ambiente virtual. Questão que nos
permitiu avançar para o conceito de fluência digital, entendida como o
“algo a mais” necessário para se comunicar diante das peculiaridades das
TDIC. Desses conceitos, foi possível discutir que ainda há um extenso
caminho para se concretizar as premissas das competências digitais, mas
que, ao profissional que se dispõe ao desafio de trabalhar com as TDIC,
é fundamental: formação do sujeito competente, crítico e capaz de se
comunicar, considerando a diversidade dos sujeitos, diante das condições
que permeiam essa relação tão complexa.
54 Neuroeducação e Tecnologias Educacionais

REFERÊNCIAS
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