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Transtornos e

Distúrbios da
Aprendizagem

Virna Mac Cord Catão

Livro didático
digital

Unidade 1
Os Distúrbios da
Aprendizagem
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Diretora Editorial
ANDRÉA CÉSAR PEDROSA
Projeto Gráfico
MANUELA CÉSAR ARRUDA
Autor
VIRNA MAC CORD CATÃO
Desenvolvedor
CAIO BENTO GOMES DOS SANTOS
Autor
VIRNA MAC CORD CATÃO

Olá. Meu nome é Virna Mac Cord Catão. Sou Pedagoga,


especialista em Administração Escolar e EAD e Mestra em
Educação, com experiência técnico-profissional e docente de
mais de 15 anos. Passei por instituições educacionais públicas e
privadas. Já atuei como docente na Educação Básica (Prefeitura
do Rio de Janeiro, Colégio Pedro II etc.), principalmente em
turmas de alfabetização e classes de progressão, inserindo-se
em diversos e diferentes contextos de aprendizagem, como
também na Educação Superior (UNIABEU, UFRRJ etc.). Na área
técnica já fui Pedagoga do CAP UERJ e do IFRJ e, inclusive,
Supervisora da UNIVESP. Sou apaixonada pelo que faço e
adoro transmitir minha experiência de vida àqueles que estão
iniciando em suas profissões. Por isso fui convidada pela Editora
Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes.
Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito
estudo e trabalho. Conte comigo!
Iconográficos
Olá. Meu nome é Manuela César de Arruda. Sou a responsável pelo pro-
jeto gráfico de seu material. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de
aprendizagem toda vez que:

INTRODUÇÃO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimen- de se apresentar
to de uma nova um novo conceito;
competência;
NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram
vações ou comple- que ser prioriza-
mentações para o das para você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado sobre o tema em
ou detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e sidade de chamar a
links para aprofun- atenção sobre algo
damento do seu a ser refletido ou
conhecimento; discutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das
assistir vídeos, ler últimas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma ativi- quando o desen-
dade de autoapren- volvimento de uma
dizagem for aplicada; competência for
concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Introdução......................................................................................10
Competências................................................................................11
Os distúrbios da aprendizagem..............................................12
Elementos fundamentais do processo de aprendizagem......13
Diferenciação entre transtorno, distúrbio e dificuldade
de aprendizagem..........................................................................23
Características dos distúrbios de aprendizagem......................26
O processo de inclusão e os distúrbios de aprendizagem....28
Bibliografia.....................................................................................31
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 9

01
UNIDADE

OS DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM
10 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

INTRODUÇÃO
Você sabia que os transtornos e distúrbios de
aprendizagem tem sido uma área muito estudada por
educadores, professores e psicólogos? Além de outras
áreas das ciências humanas? Isso tem ocorrido devido às
transformações e necessidades atuais. Transformações
no que diz respeito ao entendimento que as pessoas são
diferentes uma das outras. Necessidades que implicam
em dar voz e vez às pessoas com transtornos e distúrbios.
Todas as pessoas têm suas potencialidades de formas
diferentes, sua diferença deve ser respeitada. Mas, para
isso, precisamos entender como se processa a vida, o
conhecimento, as possibilidades de avanço que as pessoas
têm. Precisamos entender, nesta perspectiva, o que é a
aprendizagem, como se caracterizam esses transtornos/
distúrbios e os princípios de inclusão dessas pessoas
na sociedade. Percebeu a importância desta temática?
Ao longo desta unidade letiva você vai mergulhar neste
universo!
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 11

COMPETÊNCIAS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1 - Os Distúrbios
da Aprendizagem. Nosso objetivo é auxiliar você no
atingimento dos seguintes objetivos de aprendizagem até
o término desta etapa de estudos:
1. Compreender os processos fundamentais de
aprendizagem;
2. Diferenciar transtorno, distúrbio e dificuldade de
aprendizagem;
3. Caracterizar os distúrbios cognitivos e
comportamentais;
4. Refletir sobre o processo de inclusão de pessoas
com dificuldades de aprendizagem.

Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo


ao conhecimento? Ao trabalho!
12 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Os Distúrbios da Aprendizagem
Atualmente o tema “Distúrbios de Aprendizagem”
vem sendo uma questão muito debatida e preocupante.
É percebido que há generalização por partes de algumas
pessoas, de que toda dificuldade é um distúrbio. Porém, é
importante enfatizar que o erro faz parte do processo de
construção do conhecimento e que nem sempre ele é uma
fatalidade para aprendizagem.
Nessa direção, é necessário explicar primeiramente
que a aprendizagem é o momento de construção, de
interação e mediação e que o erro faz parte desse processo.
Uma dificuldade de aprendizagem não significa um
distúrbio, tampouco um transtorno. São definições distintas
que precisamos compreender para sabermos como agir.
É nessa distinção que encontraremos possibilidades de
ação. Por vezes, apenas adaptações às necessidades da
pessoa são suficientes para a promoção da aprendizagem.
Caracterizando essas questões abrimos portas para o
processo de inclusão de pessoas que aprendem de formas
diferentes.
Ao término deste capítulo você será capaz de
entender como ocorre a aprendizagem e o que caracteriza
e diferencia dificuldades, distúrbios/transtornos da
aprendizagem. Isso será fundamental para o exercício de
sua profissão, seja como professor ou outra profissão que
estuda a neuroeducação, como possibilidade de intervir
em processos de aprendizagem. E então? Motivado para
desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante!
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 13

Elementos Fundamentais do Processo de


Aprendizagem
Podemos definir aprendizagem como uma mudança
de comportamento oriunda de uma experiência. A
aprendizagem pode ocorrer tanto naturalmente, por
exemplo, ao nos relacionarmos com o mundo e as
pessoas, como pode ser intencional, por exemplo, no caso
de instituições de ensino, cujo objetivo é a promoção da
aprendizagem.
Figura 1: Aprendizagem intenciona na escola

Fonte:Pixabay
14 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Quando não conseguimos aprender, por exemplo, na


escola, dizemos que houve um “fracasso da aprendizagem”.
O fracasso da aprendizagem tem diversas causas. Por
vezes têm origem nos próprios sistemas de ensino que
não conseguem compreender e nem atender aos alunos,
suas alteridades e suas culturas. Nesse caso, a escola
deve estar atenta às diversas formas de manifestação das
aprendizagens, porque as pessoas são diferentes e são
oriundas de espaços e culturas diferentes.
A escola pode fracassar, mas, os demais contextos em
que os alunos estão inseridos, também interferem em suas
aprendizagens, levando ao fracasso e, portanto, também
fracassando. Esses fatores podem não ser determinantes
(por muito tempo acreditou-se nisto), mas, são considerados
interferências, por exemplo: o contexto familiar, cultural, as
relações sociais, as condições econômicas e políticas etc.
Nesta direção, o fracasso da aprendizagem não é um
objeto de estudo isolado, deve ser lido e compreendido
num contexto que envolve, pelo menos, três dimensões.
Figura 2: As dimensões do fracasso da aprendizagem

Filosófica

Dimensões

Psicológica Sociológica

Fonte: Elaborado pela autora, 2019


Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 15

Buscar culpados seria “chover no molhado”, o que


queremos é compreender melhor como a aprendizagem
é constituída e, assim, pensar modos de intervenção para
revertemos o quadro “fracasso” para “sucesso”.
Como observamos, temos a dimensão psicológica
que implica, diretamente, no entendimento do que
é aprendizagem e na sua promoção. Mas, o que é
aprendizagem? Tomemos como referencial, as teorias
interacionistas, ou melhor, o pensamento piagetiano, para
uma melhor compreensão.
Para Piaget, o conhecimento é produzido por meio de
uma interação do sujeito com seu meio, a partir de estruturas
já existentes. Dessa forma, a aquisição de conhecimentos
depende tanto das estruturas cognitivas do sujeito como
de sua relação com os objetos/meio.

Figura 3: Jean Piaget

Fonte: (cc) Unidentified (Ensian published by University of Michigan) / Wikimedia


Commons | Nbmachado | Public Domain
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Jean_Piaget_in_Ann_Arbor.png
16 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

VOCÊ SABIA?:
Piaget nasceu na Suíça, no ano de 1896. Vindo de
uma família culta, muito pequeno, precisamente,
aos 7 anos, tinha o interesse por determinados
estudos de ordem científica. Sua formação inicial foi
Biologia, mas, também estudou Filosofia e aos 22
anos, finalizou o Doutorado em Ciências Naturais.
Lançou diversos livros, tendo muita influência
no campo da Psicologia. De formação inicial em
Biologia, teve preocupações eminentemente
epistemológicas, tendo-se dedicado ao estudo
de como o ser humano constrói conhecimento.
Na verdade, estudando as origens dos seres vivos,
por meio dos estudos da ontogênese e filogênese,
é que foi caminhando sua pesquisa para as
características, essencialmente, humanas. Piaget
faleceu em 1980.

De acordo com Piaget, a inteligência é o mecanismo de


adaptação do organismo a uma situação nova e, como
tal, implica a construção contínua de novas estruturas.
Essa adaptação refere-se ao meio exterior. Para ele, os
indivíduos se desenvolvem intelectualmente a partir de
exercícios e estímulos oferecidos pelo meio em que
vivem. O comportamento de cada um de nós é construído
numa interação entre o meio e o indivíduo. Essa teoria é
caracterizada como interacionista. Quanto mais complexa
for essa interação, mais “inteligente” será o indivíduo. Para
Piaget a estrutura de maturação do indivíduo sofre um
processo genético e a gênese depende de uma estrutura
de maturação. Assim sendo, a aprendizagem depende do
desenvolvimento. Sua teoria nos mostra que o indivíduo
só aprende determinada coisa se estiver preparado
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 17

para recebê-la. Ou seja, se puder agir sobre o objeto de


conhecimento para inseri-lo num sistema de relações.

Em sua teoria, afirma que há dois processos


fundamentais para a organização do pensamento, a
assimilação e a acomodação:

Dois mecanismos são fundamentais nessa relação: a


organização e a adaptação, que constituem as invariantes
funcionais de todo ser vivo. Sem organização, não é
possível ao ser vivo ter um comportamento finalista,
voltado para a satisfação de suas necessidades biológicas
fundamentais. É a organização que dota o ser vivo da
capacidade de ter condutas seletivas, isto é, eficientes
do ponto de vista do atendimento das demandas
fundamentais à adaptação.

A adaptação tem duas faces que estão


indissoluvelmente ligadas: assimilação e acomodação. Em
tempo real, numa ação adaptativa, ambas são como faces
da mesma moeda, continuamente interligadas. Apensar
desta inter-relação no funcionamento, a assimilação e a
acomodação são conceitualmente distintas, opostas e
complementares. (AZENHA, 1998, p. 25)
Na Teoria Construtivista, o sujeito aprendente é
ativo, ou seja, Piaget parte do fundamento que há ações
“inteligentes” perante o conhecimento. É no levantamento
de hipóteses e na alternância erro-acerto que o sujeito
operacionaliza o conhecimento.
Para ocorrer esse processo, Piaget observou e
ponderou a ideia de adaptação do sujeito ao meio. Essa
adaptação é promovida pelo processo de reequilibrações
sucessivas. Isso significa que, ao se deparar com algo
desconhecido ou o novo objeto de conhecimento, que
temos um desordenamento dos esquemas já internalizados.
18 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Figura 4 – Processo de equilibração

Fonte: Elaborado pela autora, 2019

É desafiado e estimulado, buscando preencher alguma


lacuna, que o sujeito se "desequilibra" intelectualmente,
fica curioso e, por meio de assimilações e acomodações,
procura retornar ao equilíbrio.
No caso da aprendizagem da língua escrita, a teoria
piagetiana muito influenciou o processo de ensino-
aprendizagem. Equivocadamente, foi até confundida com
método em algumas escolas.
Figura 5: Escrita

Fonte: Freepik.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 19

Apesar de as ideias construtivistas não serem


um métodos, elas demonstram algumas questões
sobre a aprendizagem da escrita. Por exemplo, que as
manifestações escritas de crianças têm origem na sua
relação com o mundo e na estruturação de seu pensamento.
Então, um erro, nem sempre é um erro como pensamos, é
uma hipótese, de fato, inteligente, elaborada a partir das
experiências realizadas. O erro, muitas vezes é visto no
processo de aprendizagem como algo fatal e um fim em
si mesmo. Muitas pessoas dizem que quem erra não sabe.
Será que não sabe? O erro é parte das ideias elaboradas
para se tentar chegar ao acerto, assim como, o erro pode
ser apenas uma dificuldade que com a intervenção correta,
promoverá a aprendizagem.
Nesta direção, estamos contestando a ideia de que
a aprendizagem é algo estático ou que só depende do
sujeito aprendiz. Podemos entender que a aprendizagem
depende de todos os fatores já supracitados, mas, também,
do respeito aos diferentes níveis e formas de aprender.
Tratando-se da aprendizagem na escola, algo muito
polêmico, diz respeito à organização em ciclos. O ciclo não
é aprovação automática e, sim, progressão continuada da
aprendizagem, embora, muitos sistemas e escolas que
implantaram, pela forma equivocada, difundiram essa
questão. Quando falamos em progressão continuada
estamos observando, principalmente, no que diz respeito
ao processo de aprendizagem, a ideia de inacabamento,
pois, não podemos aprisionar a aprendizagem dos alunos
no ano calendário. Alguns aprendem a lógica da escrita e
sua representação em dois meses, outros em dez meses.
Portanto, o respeito aos diferentes ritmos também é um
dos princípios fundamentais do ciclo na educação escolar.
20 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Figura 6: O tempo para a aprendizagem

Fonte: Pixabay

A aprendizagem é um processo contínuo, ocorre


constantemente e ao longo da vida. Sempre estamos
aprendendo alguma coisa. Não há um único ritmo de
aprendizagem. As pessoas, inseridas em diversos contextos,
são diferentes, possuem características que a distinguem
das outras pessoas, aprendem, portanto, de formas e em
tempos/ritmos também diferentes.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 21

Figura 7: As pessoas são diferentes

g!
Guten ta
Bonjour

Hola!
SALAM!

Hello!
ciao!

Fonte: Freepik.

Para que o ato de aprender ocorra a nível fisiológico,


são necessárias algumas integridades básicas, como
as funções psicodinâmicas (ativadas ao internalizarmos
a experiência, que buscam a assimilação de forma
hierárquica), as funções do sistema nervoso periférico
(responsáveis pelos canais sensoriais da aprendizagem)
e funções do sistema nervoso central (armazenamento,
elaboração e processamento). Mas, essas funções,
veremos mais a frente, quando abordarmos os distúrbios/
transtornos mais especificamente.
Nesse processo de aprender, primeiro ocorre o
input, ou seja, a recepção das informações pelos sentidos,
geralmente, visual e auditivo. A partir do contato com
essas informações a cognição é ativada. A cognição é
responsável pela memorização, densidade, simultaneidade
e sequência das informações. O input é a resposta
22 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

devolvida, é responsável pelos processos motores, por


exemplo, desenhar, ler, escrever, e, resolver problemas). A
retroalimentação é a responsável pela organização de todo
o processo, isto inclui a capacidade de repetição, assim
como, o controle e realização das atividades.

Figura 8: O ciclo da aprendizagem

input

retroali-
Aprendizagem cognição
mentação

output

Fonte: Elaborada pela autora, 2019.

Alguns elementos podem causar alterações na


aprendizagem. Temos os fatores orgânicos, por exemplo,
o baixo peso ao nascer, as más formações congênitas, a
prematuridade. O fator genético é outro que também altera
a aprendizagem. Enfim, a aprendizagem de um sujeito não
pode ser analisar como um fato isolado, tampouco como
incapacidade. É necessária uma abordagem holística para
se compreender como a aprendizagem ocorre em cada
um e como pode ser potencializada.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 23

Diferenciação entre Transtorno,


Distúrbio e Dificuldade de Aprendizagem
A expressão “dificuldade de aprendizagem” objetiva
entender e explicar por que não ocorreu a aprendizagem de
uma pessoa. Porém, há um problema conceitual anunciado,
em que dificuldade é confundida com distúrbio ou transtorno.
Figura 9: Dificuldade de aprendizagem

Fonte: Freepik

De uma forma simples e direta, Furtado (2008) busca


elementos de diferenciação:

Constata-se que o termo distúrbio está quase sempre


associado a disfunções e lesões neurológicas, que
acabam acarretando prejuízos e danos à aprendizagem.
Já a dificuldade de aprendizagem geralmente está
relacionada aos fatores metodológicos e internos
do sujeito, como aspectos emocionais e familiares.
(FURTADO, 2008, p. 15)
24 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Uma pergunta central que deve ser feita, antes


de definir se é uma dificuldade ou distúrbio/transtorno
de aprendizagem é “por que determinada pessoa não
aprende?”.
Isso faz como que nos movamos em direção à
pesquisa. Precisamos, antes de tudo, observar, dialogar
com os sujeitos para que busquemos pistas sobre sua
aprendizagem. A pesquisa faz parte do cotidiano de quem
trabalha com educação e aprendizagem.

Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino.


Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro.
Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando.
Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago
e me indago. Pesquiso para constatar, constatando,
intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para
conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou
anunciar a novidade (FREIRE, 1996, p. 32).

VOCÊ SABIA?:
Paulo Freire foi um educador brasileiro de referência
no mundo todo. Seu principal questionamento diz
respeito ao posicionamento político da educação
e seu papel na vida dos alunos. Quando falava
de posicionamento político não se referia à
politicagem e sim à capacidade de fazer escolhas,
ou melhor, de se posicionar perante o mundo.
No livro “Pedagogia da Autonomia” o educador
aborda, de forma crítica, os saberes necessários
à prática educativa, dentre eles que “ensinar exige
pesquisa”.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 25

Em alguns casos não encontraremos respostas,


teremos apenas pistas que colaborarão para que
encaminhamentos a especialistas sejam realizados.
De qualquer forma, elementos de compreensão serão
incorporados e intervenções possíveis na aprendizagem
realizadas. Nem sempre intervenção significa medicação.
Quando, por exemplo, falamos de dificuldades de
aprendizagem, mudanças metodológicas, por parte de
quem ensina, podem colaborar para que o aluno chegue
ao objetivo proposto.
A dificuldade de aprendizagem, etimologicamente
falando, está associada ao vocábulo “difficultatem”, que
significa não conseguir fazer algo, um obstáculo, uma
barreira que impede que os sujeitos realizem e alcancem
determinados objetivos. É essa barreira que precisa ser
revelada. Descobrir o tipo de barreira. Esta barreira, este
obstáculo, estaria associado a questões internas (biológicas)
ou a questões externas (sociais, por exemplo)? Definir isso
é de suma importância para saber se é uma dificuldade ou
um distúrbio/transtorno de aprendizagem.
Figura 10: Criança com dificuldade de se concentrar

Fonte: Freepik.
26 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

Os transtornos de aprendizagem vão além do padrão


de dificuldade, pois, geralmente, estão associados à
capacidade cognitiva que é alterada por algum distúrbio
orgânico, geralmente, de origem neurológica.

Características dos distúrbios de


aprendizagem
Muitas crianças, em período escolar, apresentam
limitações em seu processo de aprendizagem. Já sabemos
que fatores internos e externos podem estar diretamente
ligados a estas limitações. Se, exclusivamente, são fatores
externos estamos falando de dificuldades de aprendizagem.
Mas, se são fatores internos, principalmente, de origem
neurológica, estamos de frente a casos de distúrbios/
transtornos de aprendizagem.
Geralmente, os distúrbios de aprendizagem alteram
capacidades mais específicas, como, o recebimento,
o processamento, a análise e/ou armazenamento de
informações. Pode se relacionar, por exemplo, à linguagem
ou até mesmo afetar a aprendizagem de conhecimentos
matemáticos.
De acordo com Furtado (2008) uma criança com
distúrbio de aprendizagem tem algumas características
peculiares, tais como:
Uma discrepância manifestada entre o potencial
intelectual esperado e o nível real de realização da
aprendizagem na escola;
Desordenamento básico do processo de
aprendizagem, como, por exemplo, não conseguir organizar
fatos em sequência lógica;
Apresentação ou não de disfunção do sistema
nervoso central, que é responsável pela linguagem,
estruturação do pensamento etc.;
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 27

Não apresentação de vestígios de debilidade


mental, de privação cultural, de perturbação emocional ou
de privação sensorial (visual ou auditiva);
Amostras de dificuldades de percepção, disparidades
comportamentais e problemas no processamento da
informação.

Furtado (ibdem), fazendo menção a “National Joint


Committe of Learning Desabilities, resume o conceito de
distúrbios de aprendizagem.

Distúrbios de aprendizagem é um termo geral que se


refere a um grupo heterogêneo de desordens manifestadas
por dificuldades significativas na aquisição e utilização
da compreensão auditiva, da fala, da leitura, da escola e
do raciocínio matemático. Tais desordens, consideradas
intrínsecas ao indivíduo, presumindo-se que sejam devidas
a uma disfunção do sistema nervoso central, podem ocorrer
durante toda a vida. (p. 16)
Os distúrbios/transtornos, por terem origem
biológicas/fisiológicas, necessitam de uma avaliação
de uma equipe multiprofissional. Nessa equipe devem
estar presentes médicos, pedagogos, psicopedagogos,
fonoaudiólogos e psicólogos, que juntos, irão analisar as
condições de aprendizagem dos sujeitos.
28 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

O Processo de Inclusão e os Distúrbios


de Aprendizagem
A inclusão de pessoas com distúrbios de
aprendizagem é um desafio. Aliás, todas aquelas pessoas
que são diferentes possuem este desafio, de serem
incluídas na sociedade e em suas instituições de forma que
o acolhimento as contemple.
A educação é um direito de todos. A nossa legislação
atual afirma que todos devem estar matriculados
regularmente no fluxo de ensino. Isto significa que

A política de educação inclusiva diz respeito à


responsabilidade dos governos e dos sistemas escolares
de cada país com a qualificação de todas as crianças
e jovens no que se refere aos conteúdos, conceitos,
valores e experiências materializados no processo de
ensino-aprendizagem, tendo como pressuposto o
reconhecimento das diferenças individuais de qualquer
origem. (GLAT, 2007, p. 16)

EXPLICANDO MELHOR:
Quando falamos de educação inclusiva não
podemos limitar o discurso (e a prática, claro) à
educação especial (embora a educação inclusiva
englobe também a educação especial). Inclusão,
no sentido amplo, simboliza ações para que as
pessoas acessem, permaneçam e obtenham
sucesso escolar.

Falar de inclusão é compreender que as pessoas


são diferentes em vários aspectos e que a escola deve
criar estratégias para que o ensino chegue a todos,
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 29

independentemente de etnia, cor, gênero, dificuldade e


ritmos de aprendizagem, cultura etc.
Neste sentido, deve-se respeitar todos os sujeitos e
seus respectivos contextos. E mais, deve estar atento às
singularidades para que a proposta apresentada seja de
ensinar todos.

SAIBA MAIS:
Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos
o acesso à seguinte fonte de consulta e
aprofundamento: Artigo: “Repensando os
distúrbios de aprendizagem a partir da psicologia
histórico-cultural” (Tuleski & Eidt), acessível pelo
link http://www.scielo.br/pdf/pe/v12n3/v12n3a10
(Acesso em 09/08/2019).
30 Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem

RESUMINDO:
E então? Gostou do que lhe mostramos? Agora,
só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos
resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido
que a aprendizagem é um processo inerente a
todo ser humano. Nem todos têm as mesmas
condições de aprendizagem. Por sermos pessoas
diferentes aprendemos de formas diferentes e em
tempos diferentes. Isto significa que o que aparenta
ser uma não aprendizagem pode estar relacionado
aos padrões estabelecidos de formas e tempos de
ensinar. Também aprendemos que dificuldade de
aprendizagem não é a mesma coisa que distúrbios/
transtornos de aprendizagem. Dificuldades de
aprendizagem todos nós podemos ter, e, muitas
vezes, estão associadas a fatores externos. Já os
distúrbios/transtornos de aprendizagem estão
ligados a questões biológicas, que vão além de
dificuldades comuns, implicam em diagnósticos
e intervenções específicas de uma equipe
multidisciplinar. Compreendendo estas questões,
entendemos que o processo de inclusão de
pessoas com dificuldades e/ou distúrbios/
transtornos de aprendizagem é importante, pois, a
aprendizagem é um direito intrínseco no direito à
educação.
Transtornos e Distúrbios da Aprendizagem 31

BIBLIOGRAFIA
CATÃO, Virna. Fazeres e Saberes do Cotidiano de
Classes oriundas das Distorções de Fluxo Escolar: Refletindo
sobre o Fracasso Escolar Instituído. Revista UNIABEU,
volume 2, 2009, p. 57-65. Disponível em http://revista.
uniabeu.edu.br/index.php/RU/article/viewFile/72/125.
Acesso 08/08/2019.

CIASCA, Sylvia Maria (org). Distúrbios de Aprendizagem:


Proposta de Avaliação Interdisciplinar. 2ª ed. São Paulo:
Casa do Psicólogo, 2003.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo:


Paz e Terra, 1996.

FURTADO, Valéria Queiroz. Dificuldades na


Aprendizagem da Escrita: Uma intervenção Psicopedagógica
via Jogos de Regras. Petrópolis: Vozes, 2008.

GLAT, Rosana (org.). Educação Inclusiva: Cultura e


Cotidiano Escolar. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007.

DOMINGUES, Klein; ROSEK, Marlene (orgs).


As Dificuldades de Aprendizagem e o Processo de
Escolarização. Porto Alegre: EIPUCRS, 2017.

SMITH, Corinne & STRICK, Lisa. Dificuldades de


aprendizagem de A a Z. Porto Alegre: Artmed, 2001.

WEISS, L.M.L.L. Psicopedagogia Clínica: uma visão


diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. Rio
de Janeiro: D.P & A. 1997.

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