FÍSICA NA
EDUCAÇÃO
INFANTIL
Educação motora
e cognitiva e a
inclusão da criança
com deficiência na
educação infantil
Daniel Neves Pinto
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
A conexão entre desempenho motor e cognitivo na infância é um tema antigo,
mas sempre atual e multidisciplinar, sobre o qual existem pontos de vista muito
diversos. As competências individuais de cada criança são visíveis em diferentes
habilidades motoras (coordenação, força e velocidade) — desenvolvidas desde
o primeiro ano de vida até por volta dos 10 anos —, em habilidades cognitivas
(inteligência verbal e não verbal), bem como em diferentes características da
estrutura corporal (altura, peso, índice de massa corporal). Todas essas informa-
2 Educação motora e cognitiva e a inclusão da criança com deficiência...
ções se relacionam com as deficiências, que, por sua vez, diferenciam-se em suas
extensões — a deficiência física influencia no desempenho motor e a deficiência
intelectual e sensorial pode influenciar no desenvolvimento cognitivo.
Considerando essas questões, neste capítulo, você vai ver o que inclui o conceito
de deficiência, reconhecendo como deve ser incluída a criança com deficiência na
educação infantil e a importância da educação física como promotora da inclusão
escolar de bebês e de crianças com deficiência.
O conceito de deficiência
Muitas foram as formas pelas quais as pessoas com deficiência foram chama-
das ao longo do tempo: provavelmente você já escutou os termos “deficiente”,
“retardado mental”, “pessoa com necessidades especiais”, entre diversos
outros. Para Godoy et al. (2000, p.10), “[...] deficiência é todo e qualquer com-
prometimento que afeta a integridade da pessoa e traz prejuízos na sua
locomoção, na coordenação de movimentos, na fala, na compreensão de
informações, na orientação espacial ou na percepção e contato com as outras
pessoas”. Ou seja, é uma disfunção ou a ausência de uma ou mais estruturas,
que podem ser psíquicas, físicas, fisiológicas ou anatômicas.
Sabemos que o termo “deficiente” se abriu para outras diversas termi-
nologias ao longo do tempo; atualmente, defende-se o uso da expressão
“pessoas com deficiência (PCD)”. Tal terminologia é utilizada hoje porque
permite tratar da inclusão dessas pessoas em diversos ambientes, como
o profissional e o educacional, enquanto as terminologias antigas, muitas
vezes, passavam o entendimento de que as pessoas com deficiência eram
incapazes de se inserir no mercado de trabalhou ou no cotidiano educacional.
O entendimento atual visa uma readequação dos mecanismos de inclusão,
como ambiente de trabalho, de educação e da cultura social, sem o foco nas
limitações das pessoas (ARAÚJO; FERRAZ, 2010).
Para ser considerada pessoa com deficiência e usufruir dos apoios sociais,
é necessário contar com um diagnóstico formal da deficiência. Nesse contexto,
para muitos, falar sobre deficiências, às vezes, não é fácil. Como você chama as
pessoas que não podem, por exemplo, ouvir, andar ou falar? Como você expressa
a deficiência de alguém e como descreve essa pessoa? As deficiências também
podem ter muitos motivos, como fatores genéticos, patológicos ou por lesões ao
longo da vida, e são classificadas em deficiência física, sensorial ou intelectual.
Nesse contexto, os autores Araújo e Ferraz (2010), afirmam que, con-
forme o enfoque trazido pela Convenção Internacional de Direitos da
Pessoa com Deficiência de 13 de dezembro de 2006 pela Assembleia Geral
Educação motora e cognitiva e a inclusão da criança com deficiência... 3
Deficiência física
A pessoa com deficiência física tem seus movimentos cessados ou desorga-
nizados em função de lesões motoras, neurológicas, orgânicas ou de doença
crônica; em outras palavras, trata-se de uma limitação fisiológica que dificulta
o estado comportamental voluntário na interação social.
No contexto da educação, a definição utilizada foi atribuída pelo Ministério
da Educação (MEC), que unificou a terminologia e o conceito para uso escolar.
A deficiência física abrange condições não sensoriais, que comprometem a
mobilidade do indivíduo, pode afetar a coordenação motora geral ou a fala,
pode ocorrer em decorrência de lesões neurológicas, neuromusculares,
ortopédicas e malformação e pode ser congênita ou adquirida (BRASIL, 2000).
O Decreto n. 3.298 de 1999 (BRASIL, 1999) da legislação brasileira, por sua
vez, descreve a deficiência da seguinte forma:
No Brasil, um marco para a inclusão das pessoas com TEA foi a Lei n.
12.764, de 2012 (BRASIL, 2012), que considera pessoa com TEA a que apresenta
as seguintes características:
Deficiência sensorial
Deficiência sensorial é o termo comumente usado para descrever cegueira,
deficiência visual, deficiência auditiva e deficiências sensoriais múltiplas
(surdo e cego) que ocorre nos períodos pré, peri ou pós-parto, por motivos
genéticos, patológicos ou acidentes, podendo ser reversível ou não (OLIVEIRA,
2010).
Diehl (2006) propõe algumas subdivisões e definições para as deficiências
sensoriais, como você confere a seguir.
Deficiência Limiar
Auditiva auditivo Exemplos aproximados
Leve 25 a 40 dB Sussurro/cochicho
Deficiência intelectual
A deficiência intelectual é um distúrbio do desenvolvimento neurológico
generalizado, causado por uma deficiência intelectual significativa, além de
déficits em dois ou mais comportamentos que afetam a vida diária. Anterior-
mente, a deficiência intelectual era focada quase exclusivamente na cognição,
mas, hoje em dia, inclui um componente relacionado à função mental e um
componente relacionado às habilidades funcionais da criança em seu am-
biente diário (DUARTE, 2018). Para Trancoso (2020), a deficiência intelectual
é caracterizada por limitações no funcionamento intelectual, normalmente
origina-se antes dos 18 anos de idade e traz como consequências a dificuldade
em desenvolver habilidades conceituais, sociais e práticas.
Veja, a seguir, alguns exemplos de deficiências intelectuais.
Aspectos motores
A atividade motora tem importante papel quando falamos em educação e em
inclusão da criança com deficiência, quando é preciso deixar de olhar exclu-
sivamente para a performance e passar a analisar o contexto da qualidade
de vida. Assim, o cuidado com a motricidade é importante tanto para uma
criança com deficiência física decorrente de uma paraplegia, por exemplo,
quanto para uma criança cega ou surda, que não tem problemas motores,
mas sensoriais (DIEHL, 2006).
No contexto da motricidade na educação infantil, é necessário que o
professor de educação física saiba identificar as características que indicam
algum tipo de déficit motor, pois, quanto mais cedo iniciarmos uma interven-
ção, melhores serão os ganhos motores, o que vai impactar de forma positiva
na qualidade de vida — essas melhoras podem ser progressivas e observadas
também na vida adulta (QUEIROZ, 2013; ZANELLA, 2014).
Um marco importante nessa área do conhecimento é a relação feita por Le
Boulch (1987) entre os desenvolvimentos afetivo, cognitivo e social e os bene-
fícios de uma intervenção que usa a potencialidade do corpo e do movimento.
Não obstante, Oliveira (2010, documento on-line) afirma que a intervenção
precoce para pessoas com deficiência apresenta como objetivo “[...] reduzir
ao máximo os efeitos dos factores de risco ou da deficiência existentes, no
desenvolvimento da criança, assentando no pressuposto de que quanto mais
precocemente forem accionadas as intervenções, mais longe se pode ir na
atenuação das limitações funcionais de origem”, o que confirma a hipótese
de que devemos intervir assim que a deficiência for identificada se quisermos
melhorar a qualidade de vida da pessoa com deficiência.
10 Educação motora e cognitiva e a inclusão da criança com deficiência...
Mas, afinal, como deve ser essa intervenção? Nas aulas de educação física
para pessoas com deficiência, a intervenção deve ser planejada de forma que
seja possível e fácil. Nesse sentindo, Farrell (2008) aponta que, em primeiro
lugar, o funcionamento da intervenção deve ser de fácil compreensão e análise.
Por exemplo, o trabalho com mobilidade deve ser eficaz para uma criança
com dificuldade nesse quesito, auxiliando-a de forma natural.
Além disso, os profissionais devem ter cuidado com falsas promessas
de técnicas que podem ser consideradas prejudiciais ou milagrosas: deve
haver evidências de que a intervenção ou abordagem já funcionou. Assim,
o profissional deve estar atento e ter conhecimento teórico sobre o que vai
aplicar — de preferência, deve ir a um local no qual a técnica é aplicada e
esteja funcionando para juntar informações que serão úteis para ele e para
outros profissionais. Também é preciso observar se realmente a intervenção
ensina à criança habilidades ou conhecimentos necessários e possibilita uma
aprendizagem efetiva. Desse modo, deve-se considerar se uma abordagem que
está funcionando em um determinado local também funcionará em outro com
outras crianças, visto que, para repetir a intervenção, as crianças devem ser
semelhantes em idade e nível cognitivo por exemplo. Dessa forma, entender
o processo, a metodologia aplicada, as especificidades e características dos
sujeitos e contextos envolvidos proporciona aos professores e profissionais
melhor análise e organização do trabalho realizado para que tenha sucesso.
Deve-se, então, trabalhar com aulas planejadas, nas quais o entendimento
das necessidades e adaptações necessárias se façam presentes, cuidando
para que haja facilidade de compreensão e aplicabilidade das tarefas que
se pretende trabalhar, de modo que, dessa forma, os objetivos possam ser
atingidos e o planejamento possa ter eficácia.
Alguma vez você já parou para pensar como acontece a inclusão em sala de
aula infantil entre alunos com e sem deficiência? Certamente, a participação
e a costura social são fatores-chave quando falamos em processos inclusivos.
Participar significa tomar parte, de modo que todas as crianças, sejam elas
com deficiência ou não, devem estar inclusas. Assim, é preciso estar atento
às práticas pedagógicas para não se cair no erro de, ao tratar da inclusão,
acabar excluindo outros com atividades muito simples e que não lhes são
desafiadoras em alguma medida.
Nesse contexto, o ideal no sistema de educação inclusivo infantil seria
que cada instituição pudesse acolher todas as crianças e fornecer ofertas
de apoio individuais — com as condições de enquadramento adaptadas,
não seria necessária uma posição especial para crianças com deficiência.
No entanto, o sistema educacional continua a insistir em medidas de in-
tegração e torna o desenvolvimento da educação inclusiva mais difícil. Os
profissionais da educação infantil, muitas vezes, não procuram capacitar-
-se e a escola não estuda uma mudança em sua perspectiva para remover
obstáculos e barreiras a partir da reflexão e da abordagem de processos
e situações obstrutivas.
As escolas e os pesquisadores na área da educação deveriam apelar
aos governos para que façam da inclusão uma meta vinculativa para a
educação infantil e para que sejam expandidas as ofertas de educa-
ção inclusiva que venham a garantir a qualidade da educação infantil
em termos de estrutura e conteúdo. Isso inclui o desenvolvimento de
oportunidades educacionais justas para todas as crianças, a introdução
de conceitos básicos (como educação em direitos humanos e educação
cultural) de acordo com a idade das crianças e a ampliação dos padrões
de qualidade para a formação e para a educação continuada dos pro-
fissionais da educação.
Todos devem ter a chance, o direito e a oportunidade de participar da vida so-
cial e ter acesso a educação, infraestrutura, trabalho e edificações sem barreiras.
[...] a educação especial deve ser oferecida na rede regular de ensino, para qualquer
educando com deficiência — seja ela transtorno de desenvolvimento ou altas
habilidades. Para tanto, cabe à escola oferecer apoio especializado nos casos em
que o aluno demandar um atendimento mais personalizado (AIX SISTEMAS, 2018,
documento on-line).
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